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Espeleologia
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FICHA TÉCNICA
TÍTULO
ESPELEOLOGIA
VERSÃO Nº2
ELABORAÇÃO
VITOR AMENDOEIRA
REVISÃO
ROSÁRIO PINHEIRO
FOTOGRAFIA
VITOR AMENDOEIRA, MARTA BORGES, ROSÁRIO PINHEIRO E VITOR TOUCINHO
DESENHOS TÉCNICOS, PREPARAÇÃO
VITOR AMENDOEIRA
DATA
Abril 2010
Espeleologia
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INDICE
I - Espeleologia ............................................................................................ 10 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................... 10 1.1. História da Espeleologia em Portugal ........................................................ 10 1.2. A Espeleologia e a Ciência ....................................................................... 12 1.3. Noções de Geologia ................................................................................ 13
1.3.1. Tectónica de Placas ........................................................................... 13 1.4. TEMPO GEOLÓGICO ............................................................................... 15 1.5. Tipos de rochas ..................................................................................... 15 1.5. Formação das Grutas .............................................................................. 18 1.6. Principais afloramentos calcários em Portugal ............................................ 22 1.7. ESPELEOTEMAS ..................................................................................... 23 1.8. A Arqueologia ........................................................................................ 24 1.9. A Fauna ................................................................................................ 24
1.9.1. Os Morcegos .................................................................................... 25 1.10. Climatologia cavernícola ....................................................................... 31
1.10.1. Temperatura do ar – o que a influencia? ............................................ 31 1.10.2. A humidade do ar ........................................................................... 32 1.10.3. O dióxido de carbono (CO2) e outros gases ........................................ 32 1.10.4. Movimentos de ar ........................................................................... 33
1. EQUIPAMENTO PESSOAL ........................................................................... 36 1.1. VESTUÁRIO ........................................................................................ 36
1.1.1. Fato de Espeleologia. ..................................................................... 36 1.2. CALÇADO ........................................................................................... 36 1.3. LUVAS ............................................................................................... 36 1.4. CAPACETE .......................................................................................... 37 1.5. ILUMINAÇÃO ...................................................................................... 37
1.5.1. Frontal eléctrico ............................................................................. 37 1.5.2. Caixa da pilha ............................................................................... 37 1.5.3. Luz eléctrica .................................................................................. 37 1.5.4. Iluminação “Led” ........................................................................... 38 1.5.5. Lanterna de mão ........................................................................... 38
1.6. ILUMINAÇÃO DE ACETILENO ................................................................... 39 1.6.1 Gasómetro ..................................................................................... 39 1.6.2. Frontal de acetileno ....................................................................... 39
1.7. COMO GUARDAR E TRANSPORTAR O CARBURETO ...................................... 39 1.8. LUZ DE PARAGEM .................................................................................. 39 1.9. CUIDADOS A TER ................................................................................... 40 1.10. “ARNÉS” ............................................................................................. 40
1.10.1. “cuissard” ................................................................................... 40 1.10.2. “torse” ........................................................................................ 40 1.10.3 Cinto ........................................................................................... 41
1.11. BLOQUEADORES .................................................................................. 41 1.11.1 Bloqueadores de Mão ou Punho de “Jumar” ...................................... 41 1.11.2. Basic .......................................................................................... 41 1.11.3. “Croll” – Bloqueador de Peito ......................................................... 42 1.11.4. “Pantin” – Bloqueador de Pé .......................................................... 42 1.11.5. “Shunt” ...................................................................................... 42
1.12. BLOQUEADORES IMPROVISADOS ........................................................... 43 1.12.1. Nó de “Prusik” ............................................................................. 43 1.12.2. Nó “Machard” .............................................................................. 43 1.12.3. Auto-bloqueante com mosquetão ................................................... 43
1.13. DESCENSOR DE ROLDANAS FIXAS ......................................................... 43 1.13.1. Descensor auto-bloqueante ........................................................... 44 1.13.2. Deterioração dos aparelhos ........................................................... 44
1.14. “Longe” dupla assimétrica ..................................................................... 44 1.15. Pedal .................................................................................................. 44
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1.16. CONSERVAÇÃO DO MATERIAL ............................................................... 45 1.17. ESPELEÓLOGO EQUIPADO ..................................................................... 45 2.1 Mosquetões ............................................................................................ 46 2.2 – “Maillons” rápidos ................................................................................. 46
2.2.1. Conservação dos mosquetões e “maillons” ........................................ 46 2.3. ESCADAS .............................................................................................. 46 2.4. Cordas .................................................................................................. 47
2.4.1. Cordas dinâmicos .......................................................................... 47 2.4.2. Cordas semi-estáticas .................................................................... 47 2.4.3. Considerações gerais...................................................................... 47 2.4.4. Enrolamento das cordas ................................................................. 48
2.5.“Sangle” ................................................................................................ 48 2.6. Protecções de corda ............................................................................... 48 2.6. NÓS ..................................................................................................... 49
2.6.1. Nós de amarração .......................................................................... 49 2.7. Roldanas ............................................................................................... 52
2.7.1. “Fixe” ........................................................................................... 52 2.7.2. “Mini Traxion” ............................................................................... 52
2.8. “PITONS” .............................................................................................. 53 2.8.1. Colocação dos “pitons” ................................................................... 53 2.8.2. Extracção de “pitons” ..................................................................... 53 2.8.3. Considerações ............................................................................... 53
2.9. “SPIT” .................................................................................................. 54 2.9.1. Colocação do “spit” ........................................................................ 54 2.9.2. Localização ................................................................................... 54 2.9.3. Polimento preliminar ...................................................................... 54 2.9.4. Casa do furo ................................................................................. 54
2.10. AS “PLAQUETES” .................................................................................. 55 2.11. O MARTELO ......................................................................................... 55 2.12. ENTALADORES ..................................................................................... 55 2.13. SACO ESPELEO. ou “Kitbag” .................................................................. 56 2.13. PUNHO DE “SPIT” OU BURILADOR .......................................................... 56 II- MÉTODOS E TÉCNICAS DE ESPELEOLOGIA .................................................. 57 1. TÉCNICAS DE PROGRESSÃO ...................................................................... 57 1.1. TÉCNICAS DE CORRIMÕES ...................................................................... 57 1.2. TÉCNICAS DE OPOSIÇÃO ........................................................................ 57 2. A APLICAÇÃO DO MATERIAL ....................................................................... 59 2.1. DESCIDA COM DESCENSOR SIMPLES ....................................................... 59
2.1.1. Passagem de fraccionamento .......................................................... 60 2.1.2. O uso do descensor "STOP" ............................................................. 60 2.1.3. Passagem de fraccionamento com descensor "STOP" ......................... 61
2.2. SUBIDA DE JUMAR "MÉTODO DED" .......................................................... 62 2.2.1. Material usado ............................................................................... 62 2.2.2. O uso do “Pantin” .......................................................................... 63 2.2.3.O ritmo da subida de “jumar” ........................................................... 64 2.2.4. Passagem de fraccionamento .......................................................... 65 2.2.5. Passagem de Nó de Ligação ............................................................ 65 2.2.6. A saída do poço ............................................................................. 66
2.3. O MÉTODO "MAO" .................................................................................. 66 2.4. PASSAGEM "TIROLESA" .......................................................................... 67
2.4.1. Material usado ............................................................................... 67 2.5. CORDAS COM ARGILA ............................................................................ 67 3. TÉCNICA DE ESCADAS .............................................................................. 68 3.1. COMO SUBIR / DESCER ESCADAS ............................................................ 68 3.2. SEGURANÇA .......................................................................................... 68 III- EQUIPAMENTO DOS POÇOS ..................................................................... 69 1. CONSIDERAÇÕES ..................................................................................... 69 1.1 PREPARAÇÃO DO MATERIAL ..................................................................... 69 1.2 JUNTO AO POÇO ..................................................................................... 69
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1.3. AMARRAÇÕES ........................................................................................ 70 AMARRAÇÕES SOBREPOSTA .......................................................................... 70 1.4. EQUIPAGEM .......................................................................................... 74 1.5. DESEQUIPAGEM ..................................................................................... 79 1.6. Introdução a técnicas de resgate ............................................................. 80
1.6.1. “Polie”/travamento......................................................................... 80 1.6.2. “Palan” ......................................................................................... 80
IV- ORGANIZAÇÃO ESPELEOLÓGICA ............................................................... 81 1. OBJECTIVOS ............................................................................................ 81 1.1. OBJECTIVOS DAS EXPLORAÇÕES ............................................................. 81
1.1.1. Exploração em Acção de Formação .................................................. 81 1.1.2. Exploração de Reconhecimento ....................................................... 81 1.1.3. Exploração de Ponta ....................................................................... 81 1.1.4. Exploração em Trabalho Específico ................................................... 81
1.2. CONSTITUIÇÃO DE EQUIPAS ................................................................... 81 1.2.1. Número Adequado de Elementos por Equipa ..................................... 81 1.2.2. Nível Técnico dos Constituintes duma Equipa .................................... 82 1.2.3. Especialidades dos Constituintes duma Equipa .................................. 82
1.3. MATERIAL COLECTIVO ............................................................................ 82 1.3.1. Quantidade e Especificidade do Material Colectivo .............................. 82
1.4. TRANSPORTE ......................................................................................... 82 1.4.1. Providenciar o Transporte Adequado em Número e Tipo ..................... 82
1.5. ESTUDO PRÉVIO E ELABORAÇÃO DE RELATÓRIOS ..................................... 82 1.5.2. Leitura da Carta da Região .............................................................. 82 1.5.3. Elaboração de um Caderno de Campo .............................................. 83 1.5.4. Elaboração de um Relatório ............................................................. 83
2. CÓDIGO DE ÉTICA .................................................................................... 84 2.1. Código de ética espeleológica .................................................................. 84 2.2. Código de Ética da UIS ........................................................................... 85 ANEXOS ...................................................................................................... 87 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................. 92
Espeleologia
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I - Espeleologia
1. INTRODUÇÃO
Sendo uma actividade que se dedica ao estudo das cavernas, a Espeleologia não se
resume aos aspectos técnico desportivos da progressão em grutas.
Ao estudar a génese, a evolução, o meio físico e biológico do mundo subterrâneo, a
espeleologia é igualmente uma disciplina técnico científica que se interliga com
ciências como a Geologia, Biologia, Arqueologia e Antropologia.
Outras técnicas utilizadas e igualmente importantes são a Fotografia, Topografia e
Cartografia, que complementam a actividade do espeleólogo.
Desde tempos imemoriais que o homem se sente atraído pelas cavernas, quer
como abrigo temporário ou definitivo quer como local mágico religioso dedicado ao
culto dos deuses ou encantamento de inimigos, quer ainda como antecâmara do
inferno ou local de actividades ligadas à magia negra. Também como um simples
local que lhe chama a atenção e desperta a curiosidade, convidando a uma simples
olhadela curiosa, a uma visita turístico desportiva ou a um paciente e apurado
trabalho de estudo e investigação científica.
Mais ou menos em todos os locais existem cavidades no solo (naturais ou artificiais)
mas é sobretudo, nas regiões onde existem extensões de rocha calcária que se
encontram, verdadeiramente, o que é uso e costume designar-se por cavernas ou,
mais popularmente, por grutas, covas, furnas ou algares.
Apesar de em todas as épocas, desde a mais remota antiguidade, haver referências
escritas, mais ou menos interpretativas, sobre a existência das cavernas, é só no
último quartel do século passado que começa o estudo propriamente dito dos
fenómenos que estão na origem, evolução e morte das cavernas, através de um
homem (francês de nascimento e formação) que, enfrentando as mais variadas e
por vezes rocambolescas e incríveis dificuldades, se "atirou" à exploração e
primeiros estudos de carácter científico das cavernas. Esse homem é o famoso e
inesquecível Eduard Alfred Martel, verdadeiro pai da Espeleologia moderna que,
primeiro em França e depois noutros países, lançou as sementes do que viria a ser
o grandioso e útil movimento espeleológico mundial. Seria, todavia, injusto não
realçar igualmente a coragem, dedicação e esforço dos continuadores da obra de
Martel que com ele vêm construindo e dignificando todo um edifício de saber
técnico científico que dá pelo nome de ESPELEOLOGIA.
Neste ponto é natural colocarem-se as questões: O que é a Espeleologia? Do que
trata? Qual ou quais os seus domínios e instrumentos de trabalho? Qual a sua
utilidade?
Comecemos, então, pela definição do termo ESPELEOLOGIA que provém dos
vocábulos gregos SPELAION (caverna) e LOGOS (tratado ou estudo). Pelo que a
espeleologia consiste, essencialmente, no estudo das cavernas. Mais elucidativa,
porém, é a definição de um consagrado estudioso das cavernas B. Géze e que diz o
seguinte: "Espeleologia é a disciplina consagrada ao estudo das cavernas, da sua
génese e evolução, do meio físico que representa, do meio biológico actual ou
passado, assim como do meio e das técnicas adequadas ao seu estudo". Por estas
definições já se fica a saber o que é, do que se trata e qual o domínio da
Espeleologia.
1.1. História da Espeleologia em Portugal
Os primeiros registos da actividade espeleológica no nosso país datam de 1758,
ano em que o Padre Manuel Dias descreveu a exsurgência dos Olhos de Água. Em
1854 foram publicados os escritos das escavações em grutas da região de
Condeixa, da autoria de Costa Simões e em 1872 foi publicado, no Diário Ilustrado
nº 127, a descrição de uma visita à Gruta das Alcobertas, da autoria de B. Soveral.
A realização em Lisboa do IX Congresso Internacional de Antropologia e
Arqueologia Pré-Histórica, em Setembro de 1880, incluiu uma visita às grutas do
Poço Velho em Cascais, importante necrópole neolítica, o que contribuiu
decisivamente para o nosso reconhecimento no estrangeiro. Desde essa data até
aos finais do século XIX, Portugal acompanhou a evolução europeia nestes
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 11
domínios, publicando e apresentando em congressos internacionais diversos
trabalhos sobre grutas nacionais. Os investigadores estrangeiros não ficaram
indiferentes a este caudal de informação e antes do virar do século começaram a
trabalhar nas nossas grutas, quer na área da antropologia quer na da biologia e
hidrogeologia. Entre estes salienta-se P. Choffat que em 1891 iniciou a sua
actividade em Portugal, cujos trabalhos se revestem de grande importância para o
conhecimento geológico do país.
No princípio deste século renovam-se as visitas de cientistas estrangeiros (W.
Brindley, G. Eugenaud e E. Harlé), mas foi apenas nos anos vinte que estudiosos
mais distintos nos visitaram, como H. Breuil, R. Jeannel, E. Racovitza e E. Fleury.
Este último publicou em 1923, o livro "Portugal Subterrâneo" e devido ao seu
contributo nos campos da geologia e geoespeleologia nacionais pode ser
considerado o pai da espeleologia em Portugal.
Na década de trinta verificou-se uma retoma dos portugueses aos trabalhos nas
áreas da arqueologia e biologia. Na década de quarenta aparecem os primeiros
espeleólogos, os quais começam como auxiliares e colaboradores das expedições
científicas e que posteriormente se agrupam, tornando-se assim autónomos. Ainda
nos anos quarenta surgiu o primeiro inventário de cavidades portuguesas,
publicado na revista científica e literária de Coimbra "O Instituto" (1945); em 1948
é criado o primeiro clube de espeleologia e publicado um verdadeiro inventário das
cavernas calcárias de Portugal, da autoria de Bernardino e António B. Machado. A.
F. Martins em 1949 publica um estudo global da geografia física do Maciço Calcário
Estremenho. O fim da década de 40 e o princípio da de 50 foram de grande
importância para a espeleologia, com a exploração do complexo Moinhos Velhos -
Pena - Contenda. Em 1957 efectua-se precisamente neste sistema uma expedição
de alunos da Universidade de Londres. Assim, Moinhos Velhos e o seu sistema
mantêm até 1985, o 1º lugar do "ranking" das cavidades em Portugal. Em 1956 e
1957 foram publicados estudos regionais sobre a Beira Litoral da autoria de A.F.
Soares, L.N. Conde e A.F. Tavares.
Nos anos 60 a espeleologia começou a evoluir fora dos meios universitários e
científicos: foi ainda na década de 60 que se formaram vários clubes de
espeleologia e que surgiram os primeiros cursos de formação. Em 1961 é publicado
por A. V. Moreira, na Escola Comercial Veiga Beirão, um folheto com o título
"Noções de Espeleologia". Em 1963 o mesmo autor publicou "Espeleologia" nos
cadernos de Educação Física. A década de 60 caracterizou-se ainda pelo início da
actividade espeleológica nos Açores: um clube local, a Sociedade de Exploração
Espeleológica - Os Montanheiros, faz explorações na Ilha Terceira; em 1963 V. H.
Forjaz descreve uma cavidade da Ilha do Pico; em 1966 foi publicado pelo Centro
de Instrução Especial de Espeleologia um trabalho sobre os canais lávicos da Ilha
Terceira e em 1967 o Grupo de Espeleologia da Faculdade de Ciências de Lisboa
realizou uma expedição aos Açores.
Na década de 70 a formação de espeleólogos passou a ter melhor qualidade,
começando espeleólogos portugueses a realizar estágios em França e os clubes a
apostar em cursos de formação. Surgem ainda publicações especializadas como:
Speleo (Novembro de 1970), Boletim dos Serviços de Exploração Subterrânea;
Espeleo Notícias (1972), Boletim do Gabinete de Estudos Espeleológicos do Centro
Universitário de Lisboa; Algarocho (Julho de 1976), Boletim da Sociedade
Portuguesa de Espeleologia.
Em 1973 teve lugar o 1º Encontro Nacional de Espeleologia onde estiveram
presentes o Centro de Espeleologia de Coimbra, o Centro de Espeleologia de Lisboa,
o Núcleo de Espeleologia de Leiria e Torres Novas, o Centro Piloto de Espeleologia e
o Serviço de Exploração Subterrânea.
Na década de 80 surgiram mais duas publicações de natureza espeleológica: O
Mundo Subterrâneo, da Associação de Espeleólogos de Sintra (1980) e
EspeleoDivulgação, do Núcleo de Espeleologia da Associação de Estudantes da
Universidade de Aveiro (Junho de 1982). As explorações estrangeiras a Portugal
foram retomadas em 1983, com a realização de uma expedição francesa à
nascente do Alviela. Em 1985 é publicado o livro "Grottes et Algares du Portugal"
de C. Thomas; no mesmo ano o seu trabalho, juntamente com o SAGA - Sociedade
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dos Amigos das Grutas e Algares, na gruta do Almonda tornaram esta cavidade na
1ª do "ranking" nacional. Em Agosto de 1987 realiza-se mais uma expedição
francesa ao nosso país, constituida por 12 espeleólogos e 8 mergulhadores que
exploraram alguns algares e mergulharam as Nascentes do Alviela e Almonda,
chegando na primeira a 425 metros de distância e atingindo a cota de mergulho de
- 60 metros. No ano seguinte, uma outra expedição francesa à nascente do Alviela,
desta feita com uma equipa da Comissão de Mergulho Subterrâneo da F.F.E.S.S.M.,
atingiu a cota dos - 78 metros e topografa 820 metros de galerias.
Em 1990 surgiu mais uma publicação versando o território continental, o livro de
Lúcio Cunha "As Serras Calcárias de Condeixa - Sicó - Alvaiázere. Estudo de
Geomorfologia".
Em Abril de 1994, o Grupo de Arqueologia e Espeleologia de Pombal descobre uma
importante rede subterrânea na região de Penela, a qual é um dos maiores
acontecimentos espeleológicos dos últimos tempos. No decorrer desta importante
descoberta, o Centro de Investigação e Exploração Subterrânea, o Grupo Protecção
Sicó, o Núcleo de Espeleologia de Condeixa, a Sociedade dos Amigos das Grutas e
Algares e a Sociedade Torrejana de Espeleologia e Arqueologia descobrem, em
1997, mais uma importante gruta associada ao mesmo sistema - o Algarinho.
A Gruta do Frade descoberta em Maio de 1996 numa actividade de prospecção.
Após uma pesquisa de três anos conseguiu-se efectuar uma desobstrução que no
dia 21/06/99 revelou mais de 1,5 km de percurso. Por ser uma das cavidades com
formações muito raras e de grande interesse espeleológico, foi elaborado no final
de 1999 um projecto para uma investigação da cavidade. Foi concluída a 1ª fase do
projecto no final de 2000, apoiado pela Câmara Municipal de Sesimbra.
A partir de 1998 os espeleólogos do Núcleo de Espeleologia de Condeixa começam
a participar em explorações de ponta nas montanhas dos Picos de Europa, em
Espanha. Ano após ano batem sucessivos recordes nacionais de profundidade,
tendo em Agosto de 2000 chegado à cota dos -943m de profundidade, recorde
absoluto português.
A Sociedade Portuguesa de Espeleologia apoia uma expedição Francesa em
Setembro de 2001 na nascente do Alviela. São topografados 1370m e atinge-se os
-125m
Em Março de 2006 um grupo de amigos regista uma nova associação o GEM –
Grupo de Espeleologia e Montanhismo.
1.2. A Espeleologia e a Ciência
Para que se possa explorar e estudar uma caverna, a Espeleologia teve necessidade
de recorrer aos conhecimentos já existentes em outros ramos do conhecimento
para poder levar a bom termo o seu objectivo. É assim que podemos considerar a
actividade espeleológica sob o duplo aspecto desportivo e científico. O aspecto
desportivo prende-se, fundamentalmente, com as técnicas relacionadas com o
alpinismo, além das propriamente espeleológicas, já que é necessário vencer
inúmeros e, por vezes, difíceis obstáculos em que só uma boa resistência física,
aliada a um bom conhecimento das técnicas existentes, permite ultrapassar. Estão
neste caso a descida de poços, a escalada de chaminés e paredes ou a progressão
em passagens estreitas, como exemplos.
Do aspecto científico, imensamente vasto e complexo, destacaremos apenas,
devido ao seu peso no conjunto da actividade espeleológica, o agregado das
ciências geológicas (Geologia, Hidrologia, Tectónica, Morfologia - superficial e
subterrânea, Paleontologia, etc), a Biologia, a Arqueologia e as técnicas da
Topografia, a Fotografia, o Cinema, entre muitas outras.
Quanto à utilidade da Espeleologia apenas chamaremos a atenção para os
aproveitamentos das reservas hídricas existentes nos calcários, instalações
hospitalares para doenças específicas, instalações científicas para investigação,
refúgio e protecção de populações em caso de conflito ou como aproveitamento
turístico.
Estas são muito resumidamente as partes boas da utilidade das cavernas, mas
também aqui existe o reverso da medalha com utilizações que consideramos
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 13
abusivas do património natural pertença de todos nós, centrado no aproveitamento
para fins militares das redes subterrâneas ou, então, como autêntico caixote de lixo
ou esgoto, sem qualquer respeito pelos outros indivíduos, afectando, deste modo,
populações por vezes bastante distantes devido às características peculiares de
circulação hídrica nos maciços calcários.
1.3. Noções de Geologia Geologia, do grego γη- (ge-, "a terra") e λογος (logos, "palavra", "razão"), é a ciência que estuda a Terra, sua composição, estrutura, propriedades físicas, história e os processos que lhe dão forma.
É uma das Ciências da Terra. A Geologia foi essencial para determinar a idade da
Terra, que se calculou ter cerca de 4.6 mil milhões (br. bilhões) de anos. e a desenvolver a teoria denominada tectónica de placas.
A Geologia relaciona-se directamente com muitas outras ciências, em especial com
a Geografia, e Astronomia. Por outro lado a Geologia serve-se de ferramentas
fornecidas pela Química, Física e Matemática, entre outras, enquanto que a Biologia
e a Antropologia servem-se da Geologia para dar suporte a muitos dos seus estudos.
1.3.1. Tectónica de Placas
A teoria da tectónica de placas diz-nos que a camada superficial da terra (litosfera)
está fragmentada numa meia dúzia de placas maiores, e algumas outras menores,
que estão em movimento relativo umas às outras, assentes sobre uma camada
estrutural mais quente, menos rígida e mais móvel (astenosfera), constituída
essencialmente por rochas em fusão. Esta matéria fundida é arrastada pelas
correntes de convecção geradas pelo calor do magma, que por sua vez movem e
transportam as placas superficiais por arrastamento (efeito de correia). Uma
manifestação deste fenómeno dá-se ao longo de grandes falhas longitudinais,
existentes no fundo oceânico. À medida que as placas se vão afastando, o magma
novo proveniente de grandes profundidades da terra sobe facilmente ao longo
destas zonas de fraqueza, e ao ser expelido cria uma crusta oceânica, afastando
mais as placas oceânicas. Este processo, operando durante muitos milhões de anos
construiu um sistema de 50.000 quilómetros denominado de cristas ou dorsais
médio-oceânicas.
Principais placas tectónicas, cristas e fossas. As setas azuis indicam os grandes movimentos das placas.
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Uma das cristas mais conhecidas é a crista oceânica Médio-Atlântica. Esta
gigantesca montanha submersa, estende-se desde o Oceano Árctico até ao extremo
sul de África. A velocidade de expansão das placas ao longo da crista oceânica
Médio-Atlântica é de aproximadamente 2,5 centímetros por ano. Esta velocidade de
expansão pode parecer lenta para os padrões humanos, mas se pensarmos que
este processo teve a sua origem há cerca de 200 milhões de anos, o resultado é um
afastamento das placas da ordem dos milhares de quilómetros. Esta expansão fez
com que o Oceano Atlântico crescesse a partir de uma minúscula entrada de água,
entre os continentes da Europa, África e das Américas, dando origem ao vasto
oceano que hoje existe. Mas o facto de o tamanho da terra ser praticamente constante desde a sua formação, implica que a crusta tem de ser destruída segundo uma velocidade mais ou menos idêntica à que é criada. Tal destruição da crusta ocorre ao longo dos limites convergentes das placas que se movem umas contra as outras (fossas), onde uma das placas é empurrada para baixo, em direcção ao manto. A região onde uma placa mergulha por baixo de outra é chamada zona de subducção. O tipo de convergência que ocorre entre placas depende do tipo de litosfera envolvido. A convergência pode ocorrer entre uma placa oceânica e uma continental, entre duas placas oceânicas, ou entre duas placas continentais. O choque entre placas foi responsável, por exemplo, pelo surgimento das grandes cadeias montanhas como os Alpes e os Himalaias. O fenómeno de subducção condiciona fortemente a idade da crusta oceânica: a zona mais antiga é aquela que se encontra mais afastada da crista médio-oceânica, e que é consumida onde os limites das placas oceânicas deslizam para debaixo dos continentes limítrofes, para então descer para as profundezas do manto e serem digeridos nas zonas internas e quentes da Terra. Por
esta razão, não se encontra crusta oceânica com mais de 200 milhões de anos.
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1.4. TEMPO GEOLÓGICO
A história da terra é muito longa, tendo-se formado acerca de 4,6 mil milhões de
anos, a partir da condensação de uma nebulosa. As rochas mais antigas conhecidas
estão datadas de 3,8 milhões de anos, testemunhando que os continentes já
existiam por esse tempo. Ao que se pensa, as rochas mais antigas portuguesas
encontram-se na chamada Unidade Alóctone Superior (Terreno Continental do
Nordeste) que ocupa o núcleo dos Maciços máficos e ultramáficos de Bragança e
Morais. Têm sido considerados do Neo-Proterozóico, a que corresponde uma idade
rondando os 1 100 milhões de anos.
A cronologia da terra é subdividida em eons, que são subdivididos nas eras, que
são subdivididas em períodos, que por sua vez são divididos em séries, podendo
ainda serem decompostas em andares:
O andar é designado muitas vezes pelo nome de uma localidade ou região
geográfica onde pela primeira vez foi estudado e definido, acrescido do sufixo
«iano»: por exemplo, Oxfordiano para Oxford, em Inglaterra, e Albiano no caso de
Albe, em França. O estratótipo é o padrão que serviu para definir o andar;
corresponde a uma dada sucessão de camadas geológicas num afloramento e
lugares precisos: por exemplo as bancadas de calcários azuis com moluscos em
Semur-en-Auxois, no caso do andar Sinemuriano.
Vários andares sucessivos constituem um sistema ou período cujo nome é
decalcado a partir de uma região natural (Jurássico, por ter sido estudado e
definido pela primeira vez nos montes do Jura, localizados entre a França e a Suiça)
ou a partir das características da época que representa (Carbónico em virtude do
grande desenvolvimento de camadas de carvão, ou Cretácico pela abundância de
camadas de cré - calcário branco poroso, formado por conchas de forminíferos).
Muitas vezes um acontecimento biológico importante e global delimita um sistema:
início do Câmbrico - aparecimento dos orgãos esqueléticos; fim do Cretácico -
desaparecimento dos dinossauros, das amonites, das belemnites e dos rudistas.
Os períodos são agrupados em eras, cujos limites estão igualmente relacionados
com a história da vida: fim do Primário ou Paleozóico - desaparecimento das
trilobites.
Um grupo de eras formam um eon, e o seu nome termina normalmente em zóico,
porque estes intervalos de tempo são reconhecidos com base na vida animal. As
rochas formadas durante o Eon Proterozóico contêm fósseis de organismos muito
simples, tais como bactérias, algas, e de animais vermiformes. As rochas formadas
durante o Eon Fanerozóico apresentam fósseis de organismos complexos de
animais e de plantas tais como os répteis, mamíferos e árvores.
1.5. Tipos de rochas
As rochas, quanto à origem, podem distribuir-se por três grandes famílias:
• Rochas sedimentares;
• Rochas magmáticas (ou eruptivas);
• Rochas metamórficas.
Rochas Sedimentares
As rochas sedimentares são resultantes do transporte e acumulação de detritos
provenientes quer da destruição (erosão) de rochas pre-existentes, quer de
partículas derivadas das partes mineralizadas de organismos (conchas, esqueletos,
espícutas, etc.), ou ainda da precipitação química de sais.
Grande parte é de origem marinha, formadas no fundo dos mares a diversas
profundidades. Dispõem-se, geralmente, em camadas (leitos ou estratos)
paralelamente empilhadas e, na sua origem, apresentam-se horizontais, já que
resultaram da deposição, pela água do mar, dos materiais carregados dos
continentes para o mar. São exemplos destas rochas, os calcários, os
conglomerados, os arenitos ou grés, os argilitos, etc.
16 16
Outras podem ter uma origem continental, depositada no fundo de lagos
(sedimentos lacustres) ou em leitos de rios (aluviões), ou resultarem da
acumulação de materiais que sofreram transporte pelo vento (areias de dunas,
siltes), pela gravidade (depósitos de vertente), etc.
Consoante a proveniência dos materiais que constituem essas rochas, podemos ter:
• rochas detríticas - constituídas por fragmentos minerais (elementos) de
calibres variados: grosseiros (que podem ultrapassar 1 metro, mas que geralmente
são da ordem dos centímetros), médios (da ordem dos milímetros), finos ou até
muito finos, de tal modo que apenas podem ser vistos pelo microscópio electrónico;
• rochas biodetríticas - formadas por restos de conchas ou plantas (calcários
fossilíferos);
• rochas de origem química - resultantes de precipitações a partir de sais em
solução (gesso, sal gema, dolomitos, certos calcários);
• rochas biogénicas - edificadas por organismos vivos, como os coraliários
(recifes de corais), esponjas, algas, etc.
Frequentemente, as rochas sedimentares têm uma origem mista.
Outras classificações podem ser consideradas para as rochas sedimentares, tendo
como fundamento outros critérios selectivos como, por exemplo, os que se baseiam
na sua composição química:
• siliciosas - riscam o vidro pois são formadas à base do quartzo ou sílica,
como as areias e os arenitos siliciosos, o silex, etc;
• calcárias - estas rochas fazem efervescência com os ácidos e são riscadas
pelo canivete, como os calcários e margas;
• argilosas - bafejadas cheiram a barro, fazem pasta com a água (são
moldáveis) e são riscadas pela unha, como os argilitos;
• salinas - como o gesso e o sal gema;
• combustíveis - como os petróleos, os carvões (turfas, lenhites, hulhas e
antracites.
Rochas magmáticas (ou eruptivas)
As rochas eruptivas resultaram da solidificação, rápida ou lenta, à superfície ou em
profundidade, de materiais rochosos em fusão (magma).
O magma gera-se a grandes profundidades (mas geralmente acima dos 200 Km) e
durante a sua ascensão pode estacionar em câmaras magmáticas onde vai
arrefecendo mais ou menos rapidamente e sofrendo diferenciações químicas. Pode
subir ainda para níveis mais superficiais, sob a forma de filões, ou sair directamente
para a superfície.
Consoante a profundidade a que os materiais rochosos em fusão consolidaram
podem ser classificadas como:
• Rochas plutónicas - resultantes da cristalização lenta do magma, já que se
instalam em profundidade (vários quilómetros), facilitando o desenvolvimento de
cristais sendo, por isso em geral, granulares. O granito e o gabro são exemplos de
rochas deste tipo.
• Rochas efusivas ou vulcânicas – resultantes do arrefecimento rápido de um
magma mais ou menos viscoso, de origem profunda, mas que solidificou muito
perto da superfície ou mesmo à superfície, podendo gerar aparelhos vulcânicos.
Exemplo deste tipo de rochas é o basalto e o riolito.
Se as emissões dos materiais emitidos pelos vulcões se fazem de modo explosivo,
originam-se rochas ditas piroclásticas, tais como bombas vulcânicas, cinzas, lapili,
tufos, etc. Quando o magma é mais fluido derrama-se à superfície, no estado
pastoso, constituindo as lavas.
As rochas vulcânicas apresentam-se, muitas vezes, com fraco desenvolvimento de
cristais.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 17
Rochas metamórficas
Ao conjunto de processos que dão origem ao aparecimento de rochas metamórficas
chama-se metamorfismo. Grande parte das rochas metamórficas resulta da
transformação (cristalização), em profundidade, de rochas pré-existentes
(sedimentares ou eruptivas sob os efeitos da temperatura e/ou pressão diferentes
daquelas em que se originaram). Geralmente são acompanhadas de deformação
que, muitas vezes, é acompanhada de um folheado (xistosidade) e que facilita a
sua divisão em placas.
Este metamorfismo que acabámos de referir, e que se encontra frequentemente
associado à formação de cadeias montanhosas, diz-se "regional", já que afecta
grandes conjuntos de rochas com espessuras e superfícies consideráveis.
As rochas metamórficas podem resultar também de alterações térmicas ligadas à
implantação de maciços magmáticos intrusivos. Fala-se então de "metamorfismo de
contacto". Localiza-se à volta dos maciços e resulta principalmente da acção das
temperaturas elevadas destes, sobre as rochas que os encaixam
(termometamorfismo).
O metamorfismo pode ainda resultar de compressões devidas a grandes acidentes
de origem tectónica, ou derivar da circulação de fluidos a temperaturas elevadas.
Como exemplos de rochas metamórficas temos:
• Xistos - resultantes do metamorfismo de rochas argilosas e quartzo
feldspáticas, apresentando folheado (xistosidade);
• Gnaisses - derivados de rochas argilosas e quartzo feldspáticas,
apresentando com bandas, geralmente milimétricas a centimétricas, quartzo-
feldspáticas alternadas com bandas mais máficas, derivada de processos de
segregação metamórfica que culminam em rochas migmatíticas.
Rocha dura com quartzo e feldspato. Serve para produzir brita.
• Quartzitos - resultantes do metamorfismo de areias e arenitos siliciosos,
apresentando coalescência dos grãos de quartzo, ou quartzo e feldspato, quando
impuros;
• Mármores - provenientes da recristalização de calcários.
FOTO – MARTA BORGES
18 18
1.5. Formação das Grutas
Gruta
Gruna ou gruta (do latim vulgar grupta, designação de crypta) é toda a cavidade
natural rochosa com dimensões que permitam acesso a seres humanos. Em alguns
casos essas cavidades também podem ser chamadas de caverna (do latim cavus,
buraco), tocas, lapas, abrigos, algares ou abismos.
Os termos relativos a grutas geralmente utilizam a raiz espeleo-, derivada do
grego spelaios (caverna).
As grutas podem ter desenvolvimento horizontal ou vertical em forma de galerias e
salões. Ocorrem com maior frequência em terrenos formados por rochas
sedimentares, mas também em rochas ígneas e metamórficas, além de geleiras e
recifes de coral. São originárias de uma série de processos geológicos que podem
envolver uma combinação de transformações químicas, tectónicas, biológicas e
atmosféricas. Devido às condições ambientais exclusivas das grutas, o seu
ecossistema apresenta uma fauna especializada para viver em ambientes escuros e
sem vegetação nativa. Outros animais porém, como os morcegos podem transitar
entre o interior e exterior.
As grutas foram utilizadas, em idades remotas, como ambiente seguro e morada
para o homem primitivo, facto comprovado pela imensa variedade de evidências
arqueológicas e arte rupestre encontrados no seu interior.
As grutas são estudadas pela espeleologia, uma ciência multidisciplinar que envolve
diversos ramos do conhecimento, como a geologia, hidrologia, biologia,
paleontologia e arqueologia.
Formação
De acordo com a sua formação, as grutas dividem-se em dois grupos: Primárias e
as Secundárias.
Grutas primárias
FOTO – MARTA BORGES
Tubo de lava em S. Vicente na ilha da Madeira.
São grutas primárias cuja formação é contemporânea à formação da rocha que a
abriga.
Tubos de lava são exemplos de grutas primárias.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 19
Grutas vulcânicas
Em regiões com vulcanismo activo, a lava escoa para a superfície através de um
fluxo contínuo. A lava escoa por canais à medida que o fluxo arrefece e solidifica,
formando os chamados tubos de lava muitas vezes de vários quilómetros de
extensão. Em alguns casos, após o vulcão se tornar inactivo, esses tubos ficam
vazios e preservados formando cavidades acessíveis do exterior. Também podem
ser formadas pela existência de bolsas de ar ou outras irregularidades no magma
durante o seu escoamento ou arrefecimento. Nestas grutas costumam formar-se
salas ou canais de pequenas dimensões. As grutas de lava não possuem formações
exuberantes como as grutas criadas por dissolução química. Em geral possuem
paredes lisas e uniformes.
Grutas de coral
Cavidades criadas durante o crescimento de recifes de coral, uma vez calcificados e
litificados os corais. Essas cavidades podem ser preservadas e em alguns casos
formam galerias ou salões penetráveis de pequenas dimensões dentro do recife.
Grutas secundárias
Grutas secundárias são aquelas que se originam após a formação da rocha que as
abriga. É o caso mais comum de formação de grutas e que envolvem os mais
variados processos de formação.
Grutas cársicas
O processo mais frequente de formação de grutas é a dissolução da rocha pela
água da chuva ou de rios, um processo também chamado de carsificação. Este
processo ocorre num tipo de paisagem chamado carso ou sistema cársico, terrenos
constituídos predominantemente por rochas solúveis, principalmente as
carbonáticas (calcário, mármore e dolomitos) ou outros evaporitos, como gipsita.
As regiões cársicas costumam possuir vegetação cerrada, relevo acidentado e alta
permeabilidade do solo, que permite o escoamento rápido da água. Além de grutas,
o carso possui diversas outras formações produzidas pela dissolução ou erosão
química das rochas, tais como dolinas, furnas, cones cársicos, canyons, vales
secos, vales cegos e lapiás.
FOTO – VITOR AMENDOEIRA
Uma paisagem típica de relevo cársico
Fase inicial da espeleogénese. A rocha calcária possui diversas fendas e fracturas
por onde as águas superficiais escorrem em direcção ao lençol freático.
20 20
O processo de carsificação ou dissolução química é resultado da combinação da
água da chuva ou de rios superficiais com o dióxido de carbono (CO2) proveniente
da atmosfera ou das raízes da vegetação. O resultado é uma solução de ácido
carbónico (H2CO3), ou água ácida, que corrói e dissolve os minerais das rochas. O
escoamento da água ácida ocorre preferencialmente pelas fendas e planos de
estratificação. Os minerais removidos combinam-se ao ácido presente na água e
são arrastados para rios subterrâneos ou para camadas geológicas mais baixas,
onde se podem sedimentar novamente. Em outros casos podem ser arrastados
para fora por rios que ressurgem e passam a correr pela superfície. As fendas aos
poucos alargam-se e tornam-se grandes galerias.
Fase intermediária. A água corrói e carrega os sais removidos da rocha, formando
galerias ao longo de fracturas e camadas de estratificação. O rio superficial pode se
tornar subterrâneo após a formação de um sumidouro e deixa um vale seco no
terreno por onde corria.
Quando o nível freático baixa naturalmente devido à dissolução e aumento de
permeabilidade de camadas inferiores, as galerias formadas esvaziam-se. Em
muitos casos, tectos que eram sustentados pela pressão da água podem-se
desmoronar, formando grandes salões de abatimento. Estes desmoronamentos
podem levar ao rebaixamento do solo acima dos salões, o que cria dolinas de
colapso (dolina de abatimento). Em alguns casos, essas dolinas abrem-se
totalmente até o nível da sala, resultando numa entrada da gruta (dolina-algar).
Outras entradas podem ser formadas em sumidouros (pontos em que rios entram
no solo formando rios subterrâneos) ou ressurgências (pontos de saída da água
subterrânea).
Fase avançada. O nível freático rebaixado deixa as galerias secas. O tecto em
alguns troços cede, formando salas de abatimento que ficam cheias de detritos. O
solo da superfície baixa sobre os pontos em que ocorreram colapsos (dolinas de
abatimento) ou pela dissolução do solo (dolinas de subsidência). Espeleotemas
começam a formar-se nas galerias e salas.
A carsificação nessas galerias passa a ser construtiva, ou seja, a sedimentação dos
minerais dissolvidos na água passa a construir formações no interior da caverna.
Quando a água atinge as galerias secas através de fendas ou pela porosidade
difusa das rochas (exsudação), o gás carbónico é libertado para a atmosfera e a
calcite ou outros minerais dissolvidos precipitam-se, criando formações de grande
beleza, chamadas colectivamente de espeleotemas.
FOTO – MARTA BORGES
Embora haja grutas formadas de diversas rochas carbonatadas, as rochas calcárias
são mais estáveis e resistem mais a desabamentos que as dolomitas ou gipsitas.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 21
Por essa razão a maior parte das grutas de dissolução existentes actualmente são
calcárias.
Grutas de colapso e erosão mecânica
Alguns minerais não são solúveis em água e não permitem que o processo de
carsificação ocorra. Por exemplo, os quartzos, sílicas e argilitos são pouco solúveis
e rochas compostas principalmente por esses minerais, como granitos e arenitos,
não permitem a formação de relevo cársico a não ser em condições muito
especiais, como por exemplo o clima semi-árido. Neste tipo de rochas, podem
ocorrer cavidades formadas por fracturas ou colapsos resultantes de actividade
tectónica como terramotos e dobras da rocha. Grutas de colapso também podem
ocorrer quando uma camada solúvel abaixo de uma camada de granito ou arenito é
dissolvida e remove a sustentação das camadas superiores. As fracturas resultantes
dos dois processos podem eventualmente atingir grandes dimensões e quando se
estendem até à superfície, permitem a visitação. Se estas fissuras estão total ou
parcialmente abaixo do nível freático, a água pode aumentar a caverna por erosão
mecânica, mas não por dissolução. Em muitos casos as grutas de arenito podem
ser expandidas também pela erosão eólica. Grutas desse tipo são muito estáveis e
em geral são originadas por processos geológicos mais antigos que as grutas por
dissolução química.
Como o processo de formação e crescimento dessas grutas não é químico, elas não
costumam possuir espeleotemas, a não ser em raros casos em que uma camada de
rocha carbonatada esteja acima da caverna. Em condições especiais, podem
ocorrer espeleotemas de sílica em grutas de arenito, como os presentes na Gruta
do Lapão e na Gruta do Riachinho, na Chapada Diamantina, Bahia, Brasil.
Grutas de gelo
Gruta de gelo é o nome dado a algumas grutas de rocha, formadas por qualquer
dos processos descritos acima, que podem localizar-se em regiões muito frias do
globo e possuem temperaturas abaixo de 0°C durante todo o ano em pelo menos
uma parte da sua extensão. Estas grutas têm o seu interior congelado ou com a
presença de precipitações de gelo tornando-as tão exuberantes como as grutas
cársicas.
Grutas glaciares
Este tipo especial de caverna não é formado na rocha, mas no gelo de glaciares. A
passagem da água da parte superior da geleira para o leito rochoso produz tubos
que podem ter desenvolvimento horizontal ou vertical. Embora durem muitos anos,
estas grutas são instáveis e podem desaparecer completamente ou mudar de
configuração ao longo dos anos. Ainda assim podem ser utilizadas para estudar o
interior das geleiras e são valiosas por permitirem o acesso a amostras de gelo de
diversas idades, usado em estudos de paleoclimatologia.
Grutas marinhas
Grutas marinhas podem ser totalmente submersas no leito oceânico ou formações
parcialmente submersas em falésias rochosos da costa. As primeiras são abismos
ou fendas que podem atingir grandes profundidades e são visitáveis por
mergulhadores ou robots submersíveis. Estas grutas em geral, são de origem
tectónica.
Grutas de costa podem resultar de diferentes processos. Um deles é a erosão
mecânica das ondas que abre cavidades na rocha. Em alguns casos, pode abrir-se
outra extremidade no lado da terra e permitir o acesso por ambos os lados. Grutas
formadas por processos tectónicos ou dissolução química podem-se tornar
parcialmente submersas com o rebaixamento do terreno ou pelo aumento do nível
do mar. Também é possível que rios subterrâneos originários de grutas cársicas
próximas à costa desagúem directamente no mar, abrindo passagens entre a terra
e o oceano. Nestes casos também pode ser possível o acesso por ambas as
extremidades. Algumas dessas grutas podem atingir grandes extensões.
22 22
1.6. Principais afloramentos calcários em Portugal
Em Portugal os maciços calcários são zonas montanhosas constituídas
essencialmente por calcários jurássicos, dispondo-se no território continental junto
das Orlas ocidental e meridional, excepção da Serra de S.Mamede no Alto Alentejo.
As principais zonas calcárias em Portugal são:
1ª zona Maciço de Condeixa-Sicó-Alvaiázere - Nesta zona situa-se a grande mancha calcária de Condeixa-Serra de Sicó-Alvaiázere-Tomar, que abrange parte dos
distritos de Coimbra e Santarém. É a zona do país onde o NEC actua a maior parte do tempo. Esta
mancha é essencialmente constituída por calcários do Lias, com acentuado desenvolvimento, e do Dogger, aparecendo as formações calcárias do Malm apenas a sul de Pombal. Um pouco mais a norte encontra-se os afloramentos
de calcários das vilas de Anadia e Mealhada, no distrito de Aveiro, e a oeste encontram-se as manchas de Cantanhede, Coimbra, Figueira da Foz, Verride e Montemor-o-Velho, situadas no distrito de Coimbra. Maciço Estremenho - Caminhando para sul deparamos com a zona dos grandes maciços calcários,
vulgarmente designada Maciço calcário estremenho, bem como os pequenos retalhos de Maceira e Pataias. Esta grande unidade está delimitada pelas seguintes
localidades: Leiria, Vila Nova de Ourém, Alcanede, Rio Maior, Benedita, Turquel e Alcobaça, administrativamente incluídas nos distritos de Leiria e
Santarém. É a zona com maior potencial espeleológico e onde se encontram as maiores grutas e algares de Portugal. Montejunto - A sul do Maciço calcário estremenho, junto à costa, podemos encontrar as manchas calcárias da Serra d'EI-Rei-Nazaré (distrito de Leiria),
e um pouco mais para o interior, o grande cemplexo de Montejunto e Alenquer-Vila Franca de Xira, no distrito de Lisboa. Arrábida - Na península de Setúbal (a sul do rio Tejo)
encontram-se os afloramentos da área de Sesimbra-cabo Espichel e, em no Baixo Alentejo, mas ainda no
distrito de Setúbal, os afloramentos calcários da pequena bacia de Santiago do Cacém. 2ª zona Alto Alentejo – No distrito de Évora, compreendido
pelos afloramentos da Serra de S. Mamede. 3ª zona Maciço Algarvio - Por fim, na orla meridional, a que corresponde o distrito de Faro, deparam-se-nos os
grandes afloramentos que constituem a Bacia
sedimentar algarvia.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 23
1.7. ESPELEOTEMAS Nome criado por Moore (1952) para designar todas as deposições minerais em cavernas, originadas por processos químicos de dissolução e precipitação. Tem origem no grego spelaion (caverna) e thema (depósito).
Os espeleotemas são resultado da carsificação construtiva, ou seja, os minerais que
foram removidos de camadas superiores da rocha e se encontram dissolvidos na
água se cristalizam e criam diversos tipos de formação no tecto, paredes e chão
das grutas.
Quando a água rica em carbonato de cálcio entra em contacto com a atmosfera da
caverna, ocorre libertação de gás carbónico (CO2) para a atmosfera, o que torna a
solução mineral supersaturada e faz com que ocorra precipitação. No caso do
precipitado ser carbonato de cálcio (CaCO3), ele forma cristais de calcita ou
aragonita. O mesmo ocorre se os sais contêm magnésio (como CaMg (CO3)2),
quando há precipitação de dolomita. As formas construídas pelos cristais dependem
de diversos factores. Elas podem se formar no tecto, nas paredes e no chão, podem
ser resultado de gotejamento por frestas no tecto, por disseminação da água
através da porosidade de paredes e tecto (exsudação) ou também pela
sedimentação e decantação em poças e represas. As formações mais comuns são
descritas abaixo: Estalactites - As estalactites têm forma vertical, cónica ou cilíndrica e nascem no tecto, desenvolvendo-se para o solo. São originadas pelo lento pingar da água, que cai dos tectos das grutas. A gota de água transporta consigo cristais de calcite que vai deixando ficar, agarrados ao tecto. Gota após gota, a formação vai crescendo lentamente. Estalagmites - As estalagmites são semelhantes às estalactites, crescendo do chão em direcção ao tecto. São originadas pelo lento pingar da água que cai dos tectos. Normalmente onde existe uma estalagmite, existe por cima uma estalactite. Ver estalactite
Colunas - Formação calcária cilíndrica em consequência da união de
uma estalagmite e de uma estalactite que crescem na mesma direcção mas
em sentidos opostos.
Cortinas e Bandeiras - Formação em tectos inclinados, em que a
água não goteja, mas ao escorrer obliquamente permite a precipitação de
filetes de carbonato de cálcio. Cria finas paredes de rocha que aos poucos
engrossam em forma de cortinas cheias de ondulações. Couve-Flor - Formação rugosa, semelhante a uma couve-flor. Resulta normalmente dos salpicos da água na rocha, ou então devido à infiltração da água. É também conhecida por coral.
Excêntricas - Figuras que se formam em tectos, paredes, chão e
mesmo sobre outros espeleotemas e não seguem um caminho de
crescimento vertical desfiando a lei da gravidade. Podem resultar da acção
de correntes de ar, essas formas criam espirais, fitas e curvas em diversas
direcções.
Flores - Cristalizações de aragonita, calcita ou gipsita, que se
irradiam a partir de um ponto central ou de um eixo em todas as direcções.
Algumas são esféricas como um dente-de-leão, outras lembram cachos de
flores ou flocos de algodão.
Cascatas – É o nome genérico das formações originadas pelo
escoamento, por paredes inclinadas ou verticais, do depósito essencialmente
de carbonato de cálcio com volume importante.
Represas de travertino - Represas com paredes de travertino, uma
forma muito resistente de rocha calcária, que podem variar de pequenas
cavidades próximas ao chão a grandes barragens que podem atingir muitos
metros de altura. Em muitos casos podem ter vários níveis, em degraus. As
suas paredes externas costumam possuir ondulações ou escorrimentos e no
seu interior uma grande diversidade de formações de sedimentação podem
ocorrer, tais como jangadas e plataformas (precipitações que flutuam na
superfície da água), pérolas (formas esféricas ou ovóides criadas por
24 24
sedimentação) e vulcões, criados pela lenta deposição de anéis de
sedimentos em um represa.
Outros tipos de formações podem ser criados pela acção de organismos vivos.
Chamados de biotemas ou espeleogens, essas formações são criadas por
colónias de bactérias que modificam a composição da rocha que lhes serve de
substrato. O biotema mais conhecido é o leite-de-lua, depósitos brancos de
consistência pastosa ou porosa que se depositam sobre outras formações.
1.8. A Arqueologia
As grutas e os abrigos foram desde sempre escolhidos pelo homem e por muitos
animais, para se abrigarem do frio, da chuva, do calor e do vento, tornando-se
locais confortáveis para viver, principalmente nas épocas glaciares. Após o
desenvolvimento das habilidades e ferramentas, o homem aprendeu a construir
casas e cidades e abandonou as grutas. Depois disso, elas tornaram-se ambientes
estranhos ao homem, mas ainda assim continuaram a despertar o seu interesse. Ao
longo da história várias populações usaram a caverna como o seu primeiro abrigo,
local de sepultura e também para rituais religiosos.
Foram também sítios preferenciais de acumulação de sedimento trazidos pelas
águas das chuvas, juntamente com artefactos e restos de fauna.
As principais jazidas pré-históricas estão em grutas e a cooperação entre
espeleólogos, arqueólogos e biólogos tem dado extraordinários frutos ao
conhecimento dos vários aspectos da evolução humana e do ambiente que o
rodeou. O clima, as plantas, os animais, os homens, as ferramentas e as
respectivas adaptações não foram sempre os mesmos.
Dos sedimentos de uma gruta podem ser retirados fragmentos humanos, animais,
ferramentas, carvões, sementes, esporos e pólen, que nos permitem ter a imagens
das diferentes épocas. No seu conjunto e dentro da sequência estratigráfica, essas
imagens são, como fotogramas de uma película que é o filme da evolução do
ambiente ao longo de milhares de anos de uma região.
1.9. A Fauna
O habitat no interior das grutas é conhecido por cavernícola ou hipógeo
(subterrâneo), em oposição ao meio epígeo (o meio externo). O meio hipógeo é, na
maior parte das vezes, totalmente desprovido de iluminação natural. Podem, no
entanto, ser iluminados nas proximidades das entradas e aberturas naturais
causadas por desmoronamento ou pelo caminho da água. Além da iluminação há
uma série de outros factores que tornam esse ambiente muito diferente do
exterior, como a pequena variação de temperatura, e humidade.
A ausência de luz impede o crescimento de vegetação fotossintetizante. Pode
ocorrer a presença de alguns fungos, além de folhas, frutos e sementes trazidos
pela água ou animais, mas de forma geral pode-se considerar que a flora é
praticamente inexistente.
Os animais podem usar as grutas como abrigo ou habitá-la durante toda a sua
vida. De acordo com seus hábitos esses animais são divididos em grupos:
Trogloxenos. Animais que utilizam a caverna apenas para abrigo,
reprodução ou alimentação, mas saem para realizar outras etapas das suas
vidas. Todos os mamíferos cavernícolas podem ser classificados nesse
grupo. Os principais trogloxenos são os morcegos.
Troglófilos. Animais que podem viver tanto dentro como fora da
caverna, embora não possuam órgãos especializados. Essas espécies são
suficientemente adaptadas para viver toda a sua vida dentro das grutas,
mas nada impede que vivam igualmente bem fora dela. Entre eles estão
alguns crustáceos, aracnídeos e insectos.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 25
Troglóbios. Animais que se especializaram para a vida dentro das
grutas. A maioria não possui pigmentação e pode ter os olhos atrofiados ou
mesmo ausentes. Ao invés disso possuem longas e numerosas antenas ou
órgãos olfactivos muito sensíveis. Entre esses há diversos tipos de peixes,
insectos, crustáceos, anelídeos e aracnídeos.
Acidentais - apenas ocupam cavernas de forma ocasional.
Dentro destes grupos, provavelmente os mais interessantes são os troglóbios, os
verdadeiros cavernícolas que não sobrevivem no exterior. Entre eles podemos
contar maioritariamente com artrópodes (aranhas, pseudoescorpiões,
palpígrados, diplópodes, colêmbolos, dipluros, coleópteros, isópodes,
decápodes, anfípodes) mas também com anfíbios (e.g. Proteus do karst
Esloveno) ou peixes (presentes em cavernas de quase todo o mundo, ausentes no
entanto na Europa). Frequentemente apresentam modificações morfológicas,
comportamentais e fisiológicas adaptadas ao meio, modificações que permitem
vingar em ambiente tão aparentemente inóspito como é o meio subterrâneo.
Embora não haja plantas na maior parte das grutas, elas podem se desenvolver
próximas às entradas. A água e animais trogloxenos e troglófilos podem trazer
fragmentos usados para a alimentação dos animais vegetarianos da caverna.
Algumas bactérias e fungos vivem no guano de morcego, podendo servir de
alimento para alguns insectos.
1.9.1. Os Morcegos
Os Morcegos pertencem ao grupo dos mamíferos:
Têm o corpo coberto de pelos;
Alimentam os bebés com o leite da mãe;
Mantêm a temperatura do corpo constante.
Mas são os únicos mamíferos que voam.
Espécies de morcegos
Espécies de morcegos existentes em Portugal
Fotografia Nome vulgar Nome específico Estatuto *
Morcego-de-ferradura-
grande
Rhinolophus
ferrumequinum
E
Morcego-de-ferradura-
pequeno
Rhinolophus
hipposideros
E
Morcego-de-ferradura-
mediterrânico
Rhinolophus euryale E
Morcego-de-ferradura-
mourisco
Rhinolophus mehelyi E
Morcego-de-bigodes Myotis mystacinus
26 26
Fotografia Nome vulgar Nome específico Estatuto *
Morcego-lanudo Myotis emarginatus E
Morcego-de-água Myotis daubentonii NT
Morcego-de-franja Myotis nattereri E
Morcego de Bechstein Myotis bechsteinii E
Morcego-rato-grande Myotis myotis E
Morcego-rato-pequeno Myotis blythii E
Morcego-anão Pipistrellus Pipistrellus NT
Morcego de Nathusius Pipistrellus nathusii
Morcego de Kuhl Pipistrellus kuhli NT
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 27
Fotografia Nome vulgar Nome específico Estatuto *
Morcego da Madeira (M) Pipistrellus
maderensis
K
Morcego de Savii Pipistrellus savii K
Morcego-hortelão Eptesicus serotinus NT
Morcego-arborícola-
grande
Nyctalus noctula I
Morcego-arborícola-
pequeno
Nyctalus leisleri
leisleri
V
Morcego Arborícola da
Madeira (M)
Nyctalus leisleri
verrucosus
I
Morcego-arborícola-
gigante
Nyctalus lasiopterus I
Morcego dos Açores (A) Nyctalus azoreum R
Morcego-orelhudo-
castanho
Plecotus auritus I
28 28
Fotografia Nome vulgar Nome específico Estatuto *
Morcego-orelhudo-
cinzento
Plecotus austriacus NT
Morcego-negro Barbastella
Barbastellus
I
Morcego-de-peluche Miniopterus
schreibersii
V
Morcego-rabudo Tadarida teniotis R
Legenda:
(M) Madeira; (A) Açores;
E – Em perigo
NT – Não ameaçado
K – Insuficientemente conhecido
I – Indeterminado
V – Vulnerável
R – Raro
(Livro Vermelho de Vertebrados de Portugal, SNPRCN, 1990).
Quantos?
Em Portugal existem 24 espécies destes mamíferos voadores, que variam muito no
tamanho, aparência, comportamento e noutros aspectos da sua biologia.
Como vivem?
Alimentam-se de insectos, que caçam durante a noite.
Algumas espécies capturam insectos voadores, outras conseguem apanha-los no
solo e em rochedos, paredes e plantas ou superfícies de águas calmas.
Para poderem capturar estas presas, os morcegos têm um voo extremamente ágil.
Ainda que tenham boa visão, durante a noite utilizam principalmente o seu sistema
de ecolocação que consiste na localização dos objectos e presas através das ondas
de ultra-som que emitem pela boca e pelo nariz com frequência muito alta. Essas
ondas atingem obstáculos no ambiente e voltam em forma de ecos com frequência
menor.
Na primavera dão à luz uma única cria, que cresce rapidamente.
Durante os meses quentes do ano, acumulam grandes quantidades de gordura, que
serve de reserva alimentar para o Inverno.
Durante o Inverno a maioria dos morcegos hibernam por longos períodos devido à
falta de alimento.
Este ciclo repete-se ao longo dos cerca de 30 anos que estes pequenos animais
chegam a viver.
Esta longevidade é surpreendente tendo em conta as suas pequenas dimensões.
Os morcegos da nossa fauna variam entre 3 a 10 cm de comprimento.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 29
Onde se abrigam?
Algumas espécies abrigam-se quase exclusivamente em grutas, minas e outros
subterrâneos. Outras preferem pequenas cavidades nos troncos das árvores, como
ninhos de pica-pau abandonados.
Há também espécies que se abrigam em casas e igrejas, em geral em salas pouco
perturbadas, no forro, na cave ou em espaços apertados (entre telhas, por trás de
pinturas, etc.).
Outras espécies passam o dia em estreitas fendas, em muros, pontes ou rochedos.
Não ocupam em geral o mesmo abrigo ao longo de todo o ano, chegando por isso a
fazer migrações com centenas de quilómetros.
A utilidade dos Morcegos?
Os morcegos são inofensivos e não causam prejuízo. São até muito úteis pois
destroem grandes quantidades de insectos, combatendo pragas agrícolas e
florestais e vectores de doenças.
Numa só noite, um morcego pode comer mais do que o seu próprio peso em
insectos!
Espécies em perigo
Tal como no resto da Europa as populações de muitas das nossas espécies têm
vindo a diminuir, havendo em Portugal 9 em perigo de Extinção.
Morcego-de-ferradura-grande;
Morcego-de-ferradura-pequeno;
Morcego-de-ferradura-mediterrânico;
Morcego-de-ferradura-mourisco;
Morcego-rato-grande;
Morcego-rato-pequeno;
Morcego-lanudo;
Morcego-de-franja;
Morcego de Bechstein.
Porque estão ameaçados?
A destruição ou perturbação dos vários tipos de abrigos é um dos factores
responsáveis pela diminuição das populações de morcegos.
O abate de velhas árvores restringe os abrigos disponíveis para as espécies
arborícolas.
As espécies cavernícolas são as mais afectadas, devido à grande concentração dos
indivíduos num número reduzido de abrigos. É por esta razão que a maior parte
das espécies cavernícolas está em perigo.
Em edifícios, nem sempre são bem recebidos, são mortos ou obrigados a
abandonar os seus abrigos.
São também afectados por alterações dos habitats e aplicação de pesticidas.
Por serem muito úteis e estarem ameaçados os morcegos estão protegidos por Lei.
Que podemos fazer?
Se nada for feito em favor destes animais, as 9 espécies em perigo, e talvez
mesmo outras, acabarão por se extinguir no nosso país.
Ajuda-os evitando a destruição e perturbação dos abrigos e esclarecendo as
pessoas sobre a necessidade de respeitar estes úteis e interessantes animais.
Recomendações
Antes de mais, convém recordar que os morcegos estão legalmente protegidos
(entre outros aspectos, é proibido fotografá-los e manuseá-los sem autorização do
ICNB) e são espécies particularmente vulneráveis a perturbações. Por exemplo, a
simples presença de algumas pessoas durante um período relativamente curto,
junto de indivíduos em hibernação, poderá provocar o seu despertar fora de época
(por aumento da temperatura ambiente, pelo ruído provocado, etc.), podendo vir a
originar a morte do(s) indivíduo(s), por falta de reservas energéticas (durante o
30 30
inverno, os insectos são escassos, o que não permite uma alimentação em
condições).
Existem uma série de locais a nível nacional, que se encontram classificados como
abrigos de Importância Nacional, classificação atribuída consoante o número de
indivíduos e a diversidade específica que possuem ao longo do ano, e em particular
nas épocas de hibernação e de criação. Durante esses períodos (de Novembro a
meados de Março para a hibernação; de Abril a fins de Julho para a criação), as
visitas a estes locais estão interditas, salvo autorização prévia por parte do ICNB
(em http://www.fpe-espeleo.org/ pode ser consultada a lista de alguns destes
abrigos e respectivos períodos de interdição). Recomenda-se ainda que sempre que
se detectem colónias de hibernação e criação, se evitem as visitas,
independentemente do número de indivíduos presentes.
Para além destes períodos, deve-se evitar as visitas a qualquer local onde se
encontrem pelo menos, cerca de 100 indivíduos. Regra geral, os abrigos não estão
ocupados ao longo de todo o ano, pelo que normalmente é possível efectuar visitas
sem grandes preocupações noutras alturas.
Por fim, sempre que detectarem colónias de morcegos, informem o GEM
([email protected]) do local, data, hora da visita e caso seja possível, do número de
indivíduos e espécies detectadas.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 31
1.10. Climatologia cavernícola 1
A compreensão dos fenómenos que regem o clima de uma cavidade, bem como a
dinâmica da sua atmosfera, demonstra-se de extrema utilidade em variadas
situações, para além de em última instância contribuir para o nosso conhecimento
mais aprofundado de um meio que nos propomos explorar, e proteger.
A atmosfera de uma cavidade, e os seus fenómenos, têm ligação directa com a vida
de todos os seres cavernícolas, com a morfologia da cavidade, proporcionando um
precioso instrumento na orientação de desobstruções, e com a formação de
espeleotemas.
Por todas estas razões e algumas mais, os estudos climáticos de cavidades
apresentam-se de extrema importância, nomeadamente no âmbito da protecção
das mesmas, tendo em especial atenção às que se encontram abertas ao público
que, por várias razões, são as que correm maiores riscos de sofrerem alterações
climáticas graves, com repercussões em vários sentidos.
1.10.1. Temperatura do ar – o que a influencia?
Numa cavidade, exceptuando na sua entrada que é fortemente influenciada pela
acção solar e correntes de ar, a temperatura é normalmente muito estável,
apresentando amplitudes térmicas anuais que raramente excedem os 2 ºC. No
entanto esta temperatura sofre influência de variados factores:
Factores geográficos
A temperatura de uma cavidade é aproximadamente igual à média anual da
temperatura no exterior, tendo que o valor para a temperatura média anual é
apenas uma aproximação feita por extrapolação, a partir das observações
meteorológicas da zona em causa (não se aplica em cavidades com cursos de água
activos, devido à enorme quantidade de energia transportada pela água).
Tendo em vista que a temperatura numa cavidade é a temperatura média anual no
exterior, e que esta depende da latitude e da altitude do local em causa, vários
investigadores têm-se esforçado no sentido de formular uma lei que defina a
temperatura em função da latitude e altitude.
Em cavidades com duas entradas (funcionamento em tubo de vento), a
temperatura da cavidade é a média entre os valores das temperaturas verificadas
na zona do exterior de cada uma das entradas.
Factores internos às cavidades
A temperatura pode ainda ser influenciada por factores internos da cavidade,
nomeadamente pelas reacções químicas que aí ocorrem e que libertam energia sob
a forma de calor. A mais frequente é a decomposição do guano que chega a induzir
elevações de temperatura na ordem dos 7º C. Sendo a reacção de hidratação da
anidrite também responsável pela subida da temperatura em algumas cavidades.
Factores externos
Temos ainda, embora que apenas significativo em zonas de alta montanha, o fluxo
geotérmico que é responsável pelo aumento da temperatura de uma cavidade com
a profundidade. Este gradiente de temperatura deve-se em grande medida ao calor
proveniente da litosfera, libertado pela radioactividade das rochas graníticas (no
entanto algumas cavidades de alta montanha apresentam um gradiente de
1 por Pedro Tiago Martins (monitor FPE)
32 32
temperatura inverso, provocado pela acumulação de ar frio nas partes mais fundas
da cavidade devido à sua densidade).
1.10.2. A humidade do ar
Uma das características principais das grutas é, sem dúvida, a elevada humidade
relativa da sua atmosfera que raramente apresenta valores abaixo dos 95%2. Este
factor é em grande parte responsável pela especificidade e sensibilidade dos seres
que habitam as cavidades, “o que faz deles prisioneiros das cavernas” (Jeannel).
Os elevados teores de humidade verificados nas cavidades devem-se,
essencialmente, à existência de numerosas superfícies de evaporação
(espeleotemas, argilas, aquíferos).
Esta elevada concentração de vapor de água no ar das cavidades, faz com que o
ponto de saturação seja atingido com facilidade, quantos de nós já não
presenciámos a diminuição da visibilidade numa cavidade, devida a uma espécie de
“neblina”.
Se no entanto atendermos ao facto de que uma vez saturado, o ar não terá
capacidade para deter mais vapor de água então, para cada molécula de água que
é lançada na atmosfera, uma outra terá que condensar nas paredes da gruta. Visto
assim este pormenor não terá qualquer relevância, mas apliquemos então esta
situação no decorrer de uma visita a uma cavidade...
Cada cavidade tem um clima estável, mesmo ao longo do ano, não apresentando
grandes variações sazonais, no entanto basta colocar uma pequena equipa de
espeleólogos para provocar algumas alterações, senão vejamos:
Ao respirarmos consumimos oxigénio e libertarmos vapor de água, dióxido de
carbono, e calor. Daqui advém uma elevação quer da temperatura quer dos teores
de CO2 e H2O no ar. Em breve, e apesar do aumento da temperatura retardar a
saturação do ar, esta acabará por se dar. A partir desse momento para cada
molécula de H2O libertada para a atmosfera da gruta uma outra condensará nas
paredes da mesma.
O CO2 que agora é mais abundante no ar, diluir-se-á no vapor de água que se vai
condensando, o que resultará no nosso bem conhecido ácido carbónico, só que
desta feita irá corroer aquilo que se costuma ajudar a construir, os espeleotemas.
Quando os espeleólogos abandonarem a cavidade, a temperatura irá descer
favorecendo ainda mais a saturação, e então será atingindo um pico de nocividade
para a cavidade que só recuperará a sua estabilidade climática após algum tempo
que depende directamente das trocas de ar com o exterior, e é claro da
constituição do ar exterior.
Este factor toma dimensões ainda maiores numa cavidade aberta ao público, pois a
sua visita faz-se com muita mais frequência, daí que se torne imperiosa a
elaboração de modelos climáticos das cavidades em causa, a partir dos quais será
possível estabelecer com uma certa margem de segurança, cargas de visita e
tempos de repouso para estas grutas.
1.10.3. O dióxido de carbono (CO2) e outros gases
Já aqui se falou deste gás que, como se sabe, tem um papel importantíssimo na
formação de espeleotemas. Efectivamente o CO2 é mais abundante na atmosfera
cavernícola do que na atmosfera “livre”, embora a sua abundância varie bastante
de cavidade para cavidade e ao longo do tempo.
Estes elevados níveis de CO2, devem-se essencialmente aos processos biológicos
(respiração e fermentação) que têm lugar no solo sobrejacente às cavidades. O CO2
é então transportado para o interior das grutas pelas águas de infiltração.
Os teores de CO2 variam bastante com o tempo. A variação da actividade biológica
no solo e a maior ou menor infiltração de água (factor que depende directamente
2 Mesmo em climas áridos como o do atlas Argelino este valor não desce dos 70%.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 33
da pluviosidade), explicam satisfatoriamente essas variações periódicas. Mas
existem oscilações em curtos espaços de tempo (dias ou horas), que segundo
alguns investigadores, são apenas resultado de correntes de ar e da pluviosidade
que é bastante irregular mesmo em curtos espaços temporais.
Em relação a outros gases, as concentrações são idênticas às verificadas à
superfície: O azoto (N2) apresenta valores ligeiramente variáveis, que ainda não
convenientemente explicados;
O oxigénio (O2) encontra-se em deficit contrabalançando pelo CO2, o que é fácil
de explicar pois os processos que produzem CO2 consomem obviamente O2;
Quanto aos gases vestigiais (raros), assim se mantêm.
Existe ainda um gás que vale a pena destacar, o radão, que é bastante utilizado
como indicador de renovação de ar, já que é proveniente não do exterior mas sim
do interior da terra. O seu aparecimento está associado a fenómenos hidrotermais,
bem como a mecanismos de descompressão da rocha. A actividade hidrotermal
pode ainda levar ao aparecimento de outros gases muitas vezes altamente tóxicos.
1.10.4. Movimentos de ar
Os movimentos de ar que têm lugar nas cavidades são habitualmente denominados
de correntes de ar. A localização destas correntes de ar serve muitas vezes como
indicador de possíveis locais de desobstruções promissoras, embora na maioria das
vezes sejam provocadas por factores que não aqueles que todos nós esperamos,
nomeadamente a existência de grandes galerias ou até cursos de água para lá dos
estrangulamentos.
São conhecidos três processos que originam estas correntes de ar, são eles: Reorganização de massas volúmicas (correntes de convecção);
Restabelecimento de equilíbrio de pressões;
Movimentos de água.
Correntes de convecção
Habitualmente, as massas de ar, quando em equilíbrio, organizam-se para que o ar
mais pesado fica sempre subjacente ao mais leve. Se por algum motivo esse
equilíbrio for perturbado, o ar terá tendência a movimentar-se no sentido de
restabelecer o equilíbrio perdido, a esses movimentos chamamos correntes de
convecção.
É usual em passagens mais estreitas, especialmente se tivermos alguém abaixo de
nós, sentirmos correntes de ar que nos fazem imaginar grandes galerias à saída da
estreiteza que tentamos transpor.
Geralmente estas correntes de ar não são
mais que convecção provocada pelo calor
dos nossos corpos.
O corpo humano “liberta” calor que irá
aquecer, por condução, o ar adjacente.
Como o ar quente é menos denso, dado a
energia cinética das suas moléculas ser
maior, este subirá dando lugar a ar mais
frio, assim quer o indivíduo colocado numa
posição superior, quer o indivíduo colocado
numa posição inferior, sentirão uma
corrente de ar de origem convectiva (ver
Figura 2.1).
Verificam-se também movimentos
convectivos provocados por factores
internos às cavidades.
Movimentos de convecção.
34 34
Imaginemos uma cavidade que algures tem duas salas ligadas entre si por uma
pequena galeria, numa delas a temperatura é a normal em toda a cavidade, a outra
no entanto contém uma grande colónia de morcegos, o que, como já vimos antes,
será o suficiente para aumentar a temperatura através da decomposição do guano.
Teremos então uma diferença de temperatura que será suficiente para criar um
movimento convectivo, no sentido de reorganizar as massas de ar (ver Figura 2.2).
Movimentos convectivos provocados por diferença de temperaturas entre duas salas.
Restabelecimento de equilíbrio de pressões
A pressão atmosférica no interior de uma cavidade é, regra geral, mais elevada que
a pressão verificada na zona da entrada. Este factor é em parte responsável pelas
trocas de massas de ar feitas entre a cavidade e o exterior.
Apesar da pressão das cavidades acompanhar as oscilações barométricas do
exterior, este processo de acompanhamento diz-se retardado, pois nas grutas as
oscilações dão-se de uma maneira gradual e lenta, não havendo por isso alterações
bruscas de pressão. Este facto leva a que em algumas situações, em que atmosfera
exterior sofre pequenas e rápidas oscilações de pressão, nas cavidades nada se faz
sentir.
Algumas disparidades entre pressões cavidade/exterior são por vezes criadas por
ventos mais ou menos fortes que se fazem sentir à superfície.
A pressão tem um papel preponderante em todos os fenómenos termodinâmicos de
qualquer atmosfera (seja ela terrestre o apenas cavernícola), sendo por isso um
factor a nunca negligenciar, como por vezes o é.
Movimentos de água
Uma cavidade onde se verifique uma circulação hídrica permanente ou sazonal
apresenta características climáticas distintas, e muito particulares: Temperatura variável, não correspondente à média anual no exterior;
Ciclo do vapor de água bastante alterado, devido à temperatura, e a existência
de uma grande massa de água líquida, com influência clara nos níveis de
evaporação;
Os cursos de água subterrâneos são ainda responsáveis por deslocamento de ar
associados ao seu próprio movimento.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 35
Grupo de Espeleologia e Montanhismo
TÉCNICAS DE ESPELEOLOGIA
FOTO – VITOR AMENDOEIRA
36 36
II- MATERIAL DE ESPELEOLOGIA E SUA UTILIZAÇÃO
1. EQUIPAMENTO PESSOAL
O Espeleólogo deve sentir-se confortável, seguro e conhecedor exímio do seu
equipamento. O Equipamento utilizado deve ser homologado por normas CE. O
equipamento não deve ser usado fora do prazo de vida efectivo, garantido pelo
fabricante.
1.1. VESTUÁRIO
O fato de macaco foi usado nesta prática, tendo sido melhorado e adaptado
consecutivamente, à actividade de espeleologia.
1.1.1. Fato de Espeleologia.
O Fato de Espeleologia é uma das peças principais do equipamento individual.
Procura-se que este conserve a temperatura do corpo, não trave os movimentos,
proteja do meio (água, argila), e proporcione conforto.
A sua constituição é a mais variada para os diversos meios de actuação sendo de
salientar os que melhor se adaptam às nossas cavidades.
Distinguem-se por dois tipos de tecidos diferentes sendo o primeiro Nylon, e o
segundo de Nylon reforçado com um PVC extremamente flexível e resistente.
O primeiro é mais ligeiro, de uma boa resistência e não podendo ser considerado
impermeável, sendo uma combinação excelente para a maioria das nossas
cavidades.
O segundo mais robusto e menos ágil, com uma boa resistência é por excelência o
ideal quando se tenha que rastejar na argila, descer ou subir cascatas em pleno
débito e transposição de ribeiras. Em grutas sem ribeiras activas, torna-se pesado e
quente, devido à transpiração, desgastando bastante o espeleólogo fisicamente.
1.2. CALÇADO
Deve usar-se botas de borracha com piso retalhado tipo montanha, e de cano alto.
1.3. LUVAS
De preferência tipo estaleiro ou em PVC. As últimas têm utilidade primordial em
grutas com muita água.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 37
1.4. CAPACETE
O Capacete é de uso obrigatório na espeleologia. Deve ser ligeiro, sólido, sem
arestas, com jugular. Estas características encontram-se nos capacetes construídos
com policarbonato e ABS, com grande resistência aos choques. Depois de um
choque importante deve ser substituído, mesmo que as rupturas não sejam
perceptíveis.
Deve evitar-se os capacetes de estaleiro construídos com polietileno e
polipropileno.
1.5. ILUMINAÇÃO
A iluminação deve ser de tipo frontal, aplicada directamente no capacete,
facilitando a progressão do espeleólogo. Permite ficar com as mãos livres, e uma
boa visão na direcção do olhar.
Ela divide-se em dois tipos, eléctrica e acetileno, sendo normalmente usado o
sistema misto.
1.5.1. Frontal eléctrico
Deve ser leve e pouco volumoso, o interruptor deve estar protegido do contacto
com a argila e ser facilmente manobrável.
1.5.2. Caixa da pilha
A pilha tem uma caixa própria, na traseira do capacete. Geralmente leva a vulgar
pilha de 4.5 V ou adaptador com 4 acumuladores de 1.2 V.
1.5.3. Luz eléctrica
Os inconvenientes;
- Com lâmpadas incandescentes e de halogéneo o foco estreito fatiga os olhos no
acompanhamento obrigatório da zona de luz.
- Com lâmpadas incandescentes e de halogéneo em mesmo numero de horas é
mais caro que o acetileno. O custo das pilhas, pode ser atenuado com utilização de
acumuladores.
As vantagens;
- Leveza e tamanho reduzido;
- Pode utilizar-se em quedas de água;
- Indiferente a correntes de ar;
- Prospecção sinuosa e estreita.
38 38
1.5.4. Iluminação “Led”
Qualidade de luz e autonomia
Os díodos electroluminiscentes (“Led”) difundem um halo luminoso branco muito
homogéneo. Consomem 10 vezes menos energia que uma lâmpada Xénon
halogéneo*. Quando as pilhas estão descarregadas, os “Led” iluminam ainda com
uma luz mais fraca, enquanto que a lâmpada de incandescência deixa de iluminar.
Os “Led” tem um tempo de vida quase ilimitado, não necessitam portanto de ser
substituídos. Inquebráveis, resistem a impactos e vibrações. A maioria, das
lanternas têm um nível que decresce à medida que as pilhas se descarregam, mas
há no mercado lanternas que mantêm o nível de luz constante, graças à
iluminação “Led” regulado por sistema electrónico. Tal permite conservar
uma luz da mesma intensidade até que as pilhas estejam quase descarregadas. A
luz diminui então e passa automaticamente para um nível de iluminação de
emergência. A autonomia da lanterna é assim prolongada com uma iluminação
fraca, com o fim de dar ao utilizador o tempo suficiente para mudar as pilhas.
* Dados válidos para lâmpadas utilizadas pela “Petzl”
FOTO – VITOR AMENDOEIRA
1.5.5. Lanterna de mão
Deve usar-se como luz preventiva, estando devidamente acondicionada.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 39
1.6. ILUMINAÇÃO DE ACETILENO
O gás acetileno é o meio de iluminação mais usado e mais rentável. Obtêm
deixando pingar água sobre o carbureto. Essa reacção dá-se num gasómetro.
1.6.1 Gasómetro
Compõe-se de dois reservatórios sobrepostos. O primeiro contém água que cai por
intermédio de uma abertura regulável no segundo, que contêm o carbureto.
Um pequeno tubo recolhe o gás libertado, encaminhando-o até ao queimador, que
se encontra no frontal de acetileno.
O gasómetro mais usado, é o de 300g com autonomia de 6 a 8 horas, normalmente
e transporta-se preso à cintura.
O tubo deverá ser colocado por detrás das costas e no sentido transversal. Não
deve ser excessivamente grande para não prender constantemente nas arestas
salientes, mas o suficiente para se movimentar a cabeça.
Nos gasómetros clássicos em cima do carbureto deve usar-se uma rodela de "scoth
brite" do diâmetro do gasómetro, para evitar que os resíduos tapem o orifício de
passagem da água, esta opção foi ultrapassada na concepção do “Ariane” da
PETZL.
O gasómetro não se deve carregar com mais de 2/3 da sua capacidade, o resíduo
do carbureto ocupa volume superior ao do carbureto em pedra.
1.6.2. Frontal de acetileno
É constituído por um queimador, reflector e isqueiro.
O queimador é um pequeno tubo de latão com uma pastilha de cerâmica perfurada
por dois pequenos orifícios de onde saem dois jactos de gás que se opõem. A
chama obtida é larga, fina e relativamente estável.
O reflector é constituído por uma simples chapa cromada.
O isqueiro electrónico: um cristal de quartzo vê aparecer nas suas extremidades
uma tensão elevada, a faísca atraída entre dois eléctrodos acende o gás.
1.7. COMO GUARDAR E TRANSPORTAR O CARBURETO
Deve guardar-se o carbureto em câmaras-de-ar de automóvel, cortadas e fechadas
com dois elásticos do mesmo material. São perfeitamente estanques e fáceis de
transportar.
1.8. LUZ DE PARAGEM
Quando se está algum tempo parado no mesmo sítio deve-se aproveitar para
poupar carbureto ou pilhas. Para isso, deve-se fechar as torneiras de alguns
gasómetros, ou desligar algumas lâmpadas.
40 40
1.9. CUIDADOS A TER
As embalagens do carbureto devem estar bem fechadas. Estas mal fechadas,
podem entrar em contacto com água libertando o acetileno, que pode inflamar com
as chamas.
1.10. “ARNÉS”
O arnês é o conjunto de “sangles” e acessórios dispostos em volta do corpo. Tem
por função suportar o peso do espeleólogo e de repartir a força de choque no corpo
por pontos escolhidos.
É composto por duas partes distintas:
- “Cuissard”
- “Torse”
São fabricados em fibras de poliamida ou poliéster. As fibras envelhecem de forma
natural em contacto com o ar.
1.10.1. “cuissard”
O “cuissard” distribui o peso pelas ancas e coxas.
Utiliza-se sempre que se esteja pendurado.
Deve estar adaptado e bem ajustado ao corpo.
Os modelos actuais englobam o “cuissard” numa peça única, simplificando o ajuste,
regulável através de fivelas nas pernas e cintura.
1.10.2. “torse”
O “torse” é uma fita de “sangle” que fecha com uma fivela.
O “torse” mantêm o bloqueador de peito "croll" em posição vertical e ajustado ao
corpo, na altura da subida de “jumar”, assegura a estabilidade do corpo mantendo
o centro de gravidade e evitando que o corpo vire se houver perda de sentidos.
Espeleologia
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1.10.3 Cinto
O cinto compõe-se de uma “sangle” de 27mm. Nas pontas tem dois triângulos em
aço e um que desliza ao longo do cinto ou argolas de porta material, serve para
pendurar e suportar o gasómetro e transportar material.
1.11. BLOQUEADORES
1.11.1 Bloqueadores de Mão ou Punho de “Jumar”
É um bloqueador “Dressler”, prolongado por um punho anatómico em policetileno.
O bloqueador de mão, é uma das peças mais utilizadas aquando de uma ascensão
pela corda. Este aparelho permite-nos auto-segurar a uma corda e progredir por ela
com toda a segurança. No equipamento pessoal o punho deve estar conectado à
“longe” por um mosquetão. Este bloqueador rompe a corda antes de alcançar os
600Kg, Há punhos direitos e esquerdos.
Conservação: aplicar uma gota de óleo no eixo antes de cada saída.
1.11.2. Basic
Destina-se a auto-segurança, ou bloqueador multifunções.
Pode ser aplicado em substituição do punho ou do “croll”, pois tem as mesmas
características.
42 42
1.11.3. “Croll” – Bloqueador de Peito
Tem as mesmas características que o punho. A sua forma é mais específica para
ser utilizado como bloqueador de peito durante as subidas.
Conservação: Aplicar uma gota de óleo no eixo antes de cada saída.
1.11.4. “Pantin” – Bloqueador de Pé
O bloqueador de pé, fica preso à bota do espeleólogo por umas fitas.
Pode eventualmente suprimir o pedal ou ser utilizado em conjunto passando o
pedal para a perna esquerda.
A sua missão é permitir uma maior comodidade na subida mantendo a corda
vertical e esticada em relação ao “Croll”, ao mesmo tempo que proporciona um
maior rendimento.
Facilita o alojamento à amarração do fraccionamento.
1.11.5. “Shunt”
È um bloqueador concebido para auto-assegurar uma descida em corda duplo ou
simples, ou auto-assegurar na subida de uma escada directa ou indirectamente.
Pode usar-se como segurança também em corrimões.
- Resistência ao choque:
Com corda único de 9mm desliza aos 200kg.
Com corda duplo de 9mm desliza aos 500kg.
Com corda duplo de 10mm desliza aos 550kg.
Com corda único de 10mm desliza aos 250kg
Espeleologia
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1.12. BLOQUEADORES IMPROVISADOS
São constituídos por “cordeleta” ou pelo conjunto de uma “cordeleta” e um
mosquetão.
Destinam-se a substituir como recurso os bloqueadores em caso de avaria
(“Shunt”, Punho, “Croll” e “Basic”).
1.12.1. Nó de “Prusik”
Necessita de uma “cordeleta” ligada por um nó de pescador duplo.
É o mais utilizado na auto-segurança em substituição do (“Shunt”).
1.12.2. Nó “Machard”
O nó “Machard” auto-bloqueia num único sentido. Não é tão seguro como o
“prusik”, a ligar as pontas da “cordeleta” faz-se o nó de pescador duplo.
1.12.3. Auto-bloqueante com mosquetão
Precisa de uma “cordeleta” ligada por um nó e um mosquetão. É auto-bloqueante
apenas de um lado, o peso deve ser aplicado sobre o mosquetão da parte inferior.
Desbloqueia-se facilmente elevando o mosquetão de cima.
1.13. DESCENSOR DE ROLDANAS FIXAS
È um aparelho para descer por corda estática em “rapel”.
Feito em duro alumínio, parafusos em aço inoxidável e composto por duas roldanas
fixas em volta das quais a corda descreve um "S".
- Resistência 1500kg
Há descensores duplos mais largos para receber duas cordas.
- Resistência 1500kg
44 44
1.13.1. Descensor auto-bloqueante
Este é da mesma constituição dos anteriores, apresentando um manípulo que solto,
bloqueia a corda parando a descida.
Não deve ser controlada a descida com o manípulo, pelo que não se deve nunca
largar a corda de travamento.
Existe a possibilidade de suprimir o bloqueio automático colocando um mosquetão
no orifício próprio, que anula a operação do manípulo.
A vantagem deste é prescindir o uso do “shunt” ou dos nós "Prusik” e “Machard"
tornando a descida prática e cómoda em termos de material e igualmente segura.
- Resistência 1500kg
1.13.2. Deterioração dos aparelhos
- O atrito da passagem da corda nas roldanas, desgasta-as.
1.14. “Longe” dupla assimétrica
A “longe” pode ser feito em corda dinâmica ou adquirido em “sangle” costurada de
fábrica. Tem a função de suster o peso do corpo quando ligado pelo mosquetão a
um ponto fixo.
Ela também pode ser utilizada para progredir num corrimão, permanece-se sempre
“alojado” (conectado) mesmo durante a passagem das amarrações intermédias.
1.15. Pedal
Pedal é feito por uma “cordeleta” ou um “sangle” composto por uma argola em
cada ponta feita com um nó de oito, ou costurada de fábrica com fecho de ajuste.
Este acessório é fundamental para a ascensão na corda, conecta-se ao punho com
um mosquetão (com segurança). O comprimento, correcto, do pedal é a distância
do pé ao peito.
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1.16. CONSERVAÇÃO DO MATERIAL
O espeleólogo, deve após cada saída, verificar o estado do material. Disso depende
a segurança duma próxima saída. Deve também deixá-lo lavado e lubrificado,
pronto a utilizar, sendo a melhor forma de o conservar.
1.17. ESPELEÓLOGO EQUIPADO
1- Capacete em ABS/com fixação
jugular
2- Conjunto de iluminação frontal
eléctrico + acetileno
3- Caixa das baterias do frontal
4- Fato de espeleologia
5- Torse
6- Gerador de acetileno
7- Descensor
8- Saco de transporte de material
9- Galochas em borracha
10- Pedal
11- Cuissard
12- Bloqueador de peito
13- Luvas em P.V.C.
14- Bloqueador de mão
15- Corda estática
46 46
2.1 Mosquetões
Os mosquetões usados na espeleologia devem cumprir a norma EN 362, com uma
resistência mínima de 22KN fechados e 6KN com o “dedo” aberto. Normalmente
são construídos em aço inox ou em liga zicral, sendo os primeiros mais resistentes,
robustos e pesados e os segundos menos robustos, mas no entanto mais leves.
Actualmente no mercado, podemos encontrar uma grande variedade de modelos de
mosquetões sendo os mais frequentes os em forma de pêra, ovais, em forma de D
e assimétricos.
2.2 – “Maillons” rápidos
Os “Maillons” são utilizados na Espeleologia em inúmeras situações, quer no
equipamento individual, como no colectivo. Construídos em aço inox ou em liga de
alumínio, os “maillons” possuem uma carga de ruptura superior aos mosquetões
que varia entre os 22KN e os 27KN.
2.2.1. Conservação dos mosquetões e “maillons”
Devem ser bem limpos e lubrificados, após cada saída.
2.3. ESCADAS
As primeiras escadas eram rígidas, em madeira. Seguiram-se as de corda com
grandes degraus de madeira que pesavam quase um quilograma por metro.
As actuais escadas pesam 100 g por metro ou até menos.
As cordas são de aço galvanizado ou aço inoxidável de 3 mm.
Os degraus são tubo duro alumínio de 10-12 mm comprimento, 12 cm para
introduzir o pé.
As escadas ligam-se por anéis de aço (italiano).
- Peso 10 m 1150 g.
- Resistência do cabo de aço 500 kg.
- Resistência dos anéis italianos 250 kg.
Após a exploração deve ser limpa e bem seca.
Desde que se começou a usar a corda para progressão vertical, as escadas só são
usadas para aceder a algum ponto da gruta em trabalho específico.
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2.4. Cordas
A importância da corda tornou-se fundamental na espeleologia.
Dependendo do uso, utilizam-se cordas semi-estáticas ou dinâmicas com uma
resistência mínima de 22 kN (normas EN 1891 e EN 892), e de ruptura com nó de
oito 18KN. E nó de nove 20KN.
O material de fabrico actual é poliamida, poliéster, polietileno, polipropileno ou
kevlar.
A corda divide-se em duas partes alma e a camisa (malha helicoidal).
A alma assegura por si cerca de 60% de resistência da corda. A camisa tem a
função protectora da alma.
2.4.1. Cordas dinâmicos
São aqueles que travam a queda eventual do primeiro ponto de fixação, ficando
seguro no segundo. A corda absorve a energia adquirida pelo acidente, alongando-
se devido à sua elasticidade.
A elasticidade mede-se pela percentagem de alongamento da corda quando lhe é
suspenso um peso de 80 kg, em relação a um comprimento superior a 40m, de
corda sem carga.
Este alongamento sob 80kg pode atingir 6 a 8%.
2.4.2. Cordas semi-estáticas
Têm fraco alongamento, 1 a 4% sob 80 kg. São as mais usadas em espeleologia.
A camisa da corda estática é mais resistente a roços.
2.4.3. Considerações gerais
As cordas dinâmicas são mais usadas no montanhismo. Devido ao efeito de “yo-yo”
são menos cómodas na subida de “jumar”. Servem no entanto para segurança na
subida de escadas, “tirolesas”, etc.
As cordas semi-estáticas, não devem ser usadas como segurança.
Não deixar as cordas em fricção.
Uma corda em actividade moderada dura 2 anos, ao fim dos quais a perda
capacidade é da ordem dos 50%.
Lavar as cordas muito bem depois de cada saída, só com água.
Manter as cordas em locais escuros e protegidos da humidade, de gasolinas e
outros derivados do petróleo.
48 48
2.4.4. Enrolamento das cordas
As cordas devem manter-se bem enroladas, para não criar problemas na utilização.
A primeira coisa a fazer, é verificar, que está isento de nós.
O mais comum será segurar, com a mão esquerda uma ponta enquanto a direita
vai dando argolas de corda, sempre da mesma medida que a esquerda vai
segurando. As argolas podem ser todas no mesmo sentido, criando uns círculos
pequenos, que a mão agarra num ponto do seu aro ou em sentidos alternados.
Cria-se um círculo maior que a mão agarra em dois pontos opostos.
Quando só houver 2 m de corda, fecham-se todas as argolas na parte superior, por
umas quantas voltas em redor, passando por fim dobrado no interior do anel.
2.5.“Sangle”
As “sangle”, geralmente feitas em nylon, podem ser planas ou tubulares. As planas
são mais resistentes à abrasão e as tubulares mais maleáveis, podendo ser
adquiridas a metro ou em anéis costurados de medidas “standard” com resistência
de 22KN.
As “sangle” são utilizadas, para criar pontos de amarração podendo-se com elas
abraçar elementos suficientemente resistentes.
2.6. Protecções de corda
As protecções de corda, normalmente em PVC, servem para proteger a corda de
roços que possam vir a danificá-la.
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2.6. NÓS
Um nó deve ser:
- Adaptado ao uso que vai ter.
- Resistente e seguro.
- De fácil execução.
- Fácil de verificar depois de feito.
- Bem feito, ajustado.
- Fácil de desfazer.
Dividem-se em nós de amarração, junção e. bloqueadores (referidos no parágrafo
1.11).
2.6.1. Nós de amarração
- NÓ DE OITO
É o mais universal de todos os nós usados em espeleologia. Utilizado em todo o
tipo de amarrações, obtém-se com este nó a melhor relação, resistência/volume.
A sua elaboração é fácil, podendo ainda ser desdobrado em outros nós
especializados, como por exemplo o nó de coelho.
A sua resistência à ruptura é de:
13KN numa corda estática de 10,5 mm.
- NÓ DE NOVE
É o mais resistente de todos os nós, utilizado em todo o tipo de amarrações é no
entanto mais volumoso que o nó de oito.
A sua elaboração é simples, sendo uma das suas virtudes a facilidade de se
desfazer após estar sujeito a cargas elevadas.
A sua resistência à ruptura é de:
16KN numa corda estática de 10,5 mm.
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- NÓ DE COELHO
O nó de coelho, é elaborado a partir de um nó de oito, obtendo-se com ele duas
argolas.
A sua utilização é basicamente nas amarrações de equipagem em “Y”, sendo o seu
ajuste de grande facilidade, permitindo desviar o prumo da corda de um eventual
roço ou qualquer outro impedimento na vertical do poço.
A sua resistência à ruptura é de:
15KN numa corda estática de 10,5 mm.
- NÓ DE VACA
O nó de vaca é usado especialmente como amortecimento do choque, suportado na
amarração de segurança numa eventual cedência da amarração principal.
Assim, quando sujeito a uma carga elevada este nó desliza sobre si próprio,
absorvendo parte da força exercida na amarração de segurança.
Este nó é também muito utilizado para elaborar anéis de “sangle”, sendo fácil de
desatar mesmo quando sujeito a uma força elevada.
A sua resistência à ruptura é de:
11KN numa corda estática de 10,5 mm
14KN num anel de sangle de 28 mm
10KN num anel de sangle de 18 mm.
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- NÓ DE MARIPOSA
Este nó é geralmente utilizado na montagem de corrimões ou linhas de vida.
A sua resistência à ruptura é de:
?KN numa corda estática de 10,5 mm.
NÓ DE “SANGLE”
O nó de “sangle” é elaborado a partir do nó de vaca e utilizado quando se pretende
obter um anel com uma “sangle”.
A sua resistência à ruptura é de:
14KN numa “sangle” tubular de 28 mm
10KN numa “sangle” tubular de 18 mm.
52 52
NÓ DUPLO DE PESCADOR
O nó duplo de pescador é elaborado a partir de duas cordas e consiste em efectuar
um nó de corda oposta com cada uma delas.
Este nó é muito utilizado na elaboração de anéis de corda e também quando há
necessidade de acrescentar uma corda.
A sua resistência à ruptura é de:
13KN numa corda estática de 10,5 mm.
2.7. Roldanas
2.7.1. “Fixe”
Componente ideal para todos os sistemas de desmultiplicação de forças, a roldana
simples pode ser facilmente acoplada a um bloqueador oferecendo deste modo a
função anti-retorno. Este tipo de roldana deverá cumprir a norma EN 12278. Carga
de ruptura 22kN e carga máxima de trabalho 5kN.
2.7.2. “Mini Traxion”
A “Mini Traxion” é uma roldana e ao mesmo tempo um bloqueador. Pouco
volumosa muito leve e duma facilidade de montagem excepcional, ela substitui a
montagem tradicional da roldana / mosquetão / bloqueador geralmente utilizada
para içar cargas ou pessoas. Carga máxima de trabalho 5kN.
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2.8. “PITONS”
Os “pitons” são lâminas em aço que se introduzem nas fissuras com a ajuda de um
martelo.
Há quatro tipos de “pitons”:
- Verticais.
- Horizontais.
- Universais.
- Com argola.
2.8.1. Colocação dos “pitons”
Na colocação de um “piton”, deve soar um som claro, tornando-se agudo á medida
que ele penetra. Diz-se então que ele "canta".
Um barulho oco e baço indica má qualidade da rocha ou que o “piton” é muito fino.
2.8.2. Extracção de “pitons”
Para extrair um “piton” da sua fissura vai-se abanando lateralmente até que esteja
solto. Há martelos munidos de um bico que se passa no olho do “piton” para
facilitar a extracção.
2.8.3. Considerações
Nunca se faz passar uma corda directamente no olho de um “piton”, interpõe-se
sempre um mosquetão.
Os “pitons” de argola, não são de grande confiança devido à argola ser soldada.
54 54
2.9. “SPIT”
Um “spit” é um pequeno cilindro em aço. Numa extremidade é dentado na outra
tem uma rosca.
O “spit” tem a função de ponto de amarração resistente, quando a rocha é dura e
compacta.
Deve ser colocado na perpendicular da parede, de forma a evitar qualquer roço da
corda.
É a amarração mais recomendada em espeleologia.
Enroscado num punho de “spit”, fura o seu próprio buraco e por fim leva uma
bucha cónica que provoca o alargamento do “spit”.
Em espeleologia são mais usados os M.F. 8.
2.9.1. Colocação do “spit”
A resistência do “spit” depende da dureza, homogeneidade da rocha em que será
implantado e da qualidade da aplicação.
2.9.2. Localização
Deve ser escolhida rocha de qualidade. Com um martelo dão-se pequenas
pancadas. O som deve ser claro.
2.9.3. Polimento preliminar
Bater a rocha com o martelo para soltar as escamas. Depois de obtida uma
pequena superfície onde os dentes não moam, pode iniciar-se o furo.
2.9.4. Casa do furo
Faz-se dando pequenos golpes de martelo no punho imobilizado. Já com o “spit”
enroscado e mantido na perpendicular da parede, roda-se o punho após cada golpe
de martelo.
Os primeiros 5 mm são uma tarefa meticulosa.
Tirar o “spit” de tempos a tempos e soprar o pó que se acumula no buraco.
O buraco está completo quando o “spit” couber completamente nele.
Limpar bem o buraco e de seguida introduzir a bucha cónica na extremidade
dentada do “spit”.
Pressionar o punho no “spit” e martelar firmemente sem rodar.
Desenrosca o punho ajudando com o martelo se necessário.
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2.10. AS “PLAQUETES”
As “plaquetes”, complemento indispensável dos “spit”, são colocadas com um
parafuso de cabeça hexagonal de 13. Excepcionalmente as “Coeur Goujon” e
“Batinox” não necessitam do “spit” sendo colocadas directamente como ilustra a
figura.
As “plaquetes” permitem a ligação do mosquetão da corda ou aplicação directa da
corda à “plaquete” consoante o tipo que se use.
1 - Coeur
2 – Coeur Goujon, Batinox ou Coll’ínox
3 - Vrillee
4 - Coudee
5 - Anneau Asymétrique
6 – Clown
2.11. O MARTELO
Deve ser próprio para a espeleologia, ter um bico para “despitonagem” e o cabo ter
um sistema para ajustar os parafusos.
2.12. ENTALADORES
Encaixam nas fissuras largas, dispensam o uso de martelo.
A cabeça é em liga leve, tomam formas diversas. A cauda é uma “cordeleta” ou um
cabo de aço onde liga o mosquetão.
56 56
2.13. SACO ESPELEO. ou “Kitbag”
O saco espeleo. deve ser resistente e concebido para não ter problemas nas
passagens estreitas.
O material é em nylon ou revestido com PVC, tornando-o impermeável.
Deve ter alças reguláveis e bem cozidas.
O saco transporta-se curto, normalmente preso á cintura quando se desce em
“rapel” ou na subida de “jumar”. Em progressão horizontal deve ser transportado
às costas e nas passagens estreitas passa à frente (quando possível, devendo
haver ajuda entre a equipa na passagem dos sacos) na mão.
2.13. PUNHO DE “SPIT” OU BURILADOR
O punho é cilíndrico munido de uma rosca na qual se aplica o “spit” servindo este
para colocar o mesmo.
FOTO – VITOR TOUCINHO
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II- MÉTODOS E TÉCNICAS DE ESPELEOLOGIA
1. TÉCNICAS DE PROGRESSÃO
Apesar da progressão em corda ser bastante frequente, a deslocação depende na
maior parte do tempo apenas das nossas possibilidades físicas.
Assim para ultrapassar eficazmente e sem fadiga excessiva os diferentes
obstáculos, impõe-se uma boa técnica gestual.
Tal como um ginasta que repete incansavelmente um mesmo movimento, o
espeleólogo deverá adquirir a exactidão dos gestos e o seu encadeamento à força
de treino.
FOTO – MARTA BORGES
1.1. TÉCNICAS DE CORRIMÕES
Os corrimões são geralmente montados para passar dum ponto a outro, onde
exista perigo de queda, se não for auto-seguro. O espeleólogo engata o “longe”
curto na corda de segurança, fazendo depois a travessia.
1.2. TÉCNICAS DE OPOSIÇÃO
Na progressão em diáclases e meandros por vezes as paredes são desprovidas de
apoios ou os mesmos são pouco consistentes.
Nestes casos faz-se uso das técnicas de oposição.
58 58
Nesta técnica, o corpo funciona como cunha, exercendo força equilibrada para
afastar as duas paredes verticais.
Como é necessário empregar um esforço considerável, aproveitam-se as posições
menos fatigantes para descansar.
O saco é transportado pelo “longe” ou ás costas.
Nos meandros muito estreitos, pode ser necessário retirar do corpo o equipamento
individual de progressão que entrava os movimentos, içando-o posteriormente.
FOTO – VITOR AMENDOEIRA
FOTO – VITOR AMENDOEIRA FOTO – VITOR AMENDOEIRA
Espeleologia
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2. A APLICAÇÃO DO MATERIAL
2.1. DESCIDA COM DESCENSOR SIMPLES
Para efectuar a descida, a primeira coisa a fazer é alojar-se a um ponto de
amarração na boca do algar.
Abrir o descensor que está ligado ao “maillon” do “cuissard” através de um
mosquetão.
Fazer passar a corda pelas roldanas.
Fechar o descensor.
Aplicar o mosquetão no “maillon” ao lado do descensor, fazendo passar a corda
neste.
Não esquecer de fechar todos os mosquetões.
De seguida fazer o nó de travamento no descensor.
Aplicar o “prusik” ou “shunt” logo acima deste, ao qual se liga o “longe” curto.
Retirar o “longe” do ponto de amarração e ligr ao “longe” curto.
Desfazer o nó de travamento do descensor e iniciar a descida, controlando a corda
com a mão direita e o “prusik” ou “shunt” com a esquerda, fazendo-o acompanhar
a descida sempre com folga. Para travar a descida basta levantar a mão direita
provocando um ângulo da corda no mosquetão de travamento.
Caso se retire a mão direita da corda o “prusik” ou “shunt” bloqueia a descida
automaticamente, evitando-se assim um acidente.
Para desbloquear o “prusik” ou “shunt”:
Faz-se um nó de travamento no descensor, com a corda.
Coloca-se o punho na corda, iça-se sobre o pedal, retira-se o “prusik”, retira-se o
punho, desfaz-se o nó de travamento e a descida pode continuar.
A descida deve ser regular, sem choques e de velocidade moderada.
O saco deve ser transportado pendurado pela cintura.
FOTO – MARTA BORGES
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2.1.1. Passagem de fraccionamento
Alguns fraccionamentos permitem ter os pés apoiados, outros porém não tem
qualquer apoio para os pés.
Para passar um fraccionamento, desce-se até à altura do novo troço.
Com a “longe” curta aloja-se a um ponto da amarração.
Desmonta-se o descensor e monta-se na corda do novo troço, sem esquecer de
fazer o nó de travamento no descensor.
Muda-se o “prusik” ou “shunt” para a corda do novo troço, retira-se a “longe” curta,
destrava-se o descensor e a descida recomeça.
Quando se chega ao fim da descida, retira-se imediatamente o descensor, dado a
sua temperatura, tira-se o “prusik” ou “shunt” da corda e avisa-se o companheiro
seguinte que a corda está livre.
2.1.2. O uso do descensor "STOP"
Este veio suprimir o uso de bloqueadores e nó de travamento no descensor.
Apresenta um manípulo que quando solto bloqueia a corda.
Para efectuar a descida aloja-se a um ponto da amarração na boca do algar.
Abre-se o descensor, faz-se passar a corda pelas roldanas e fecha-se.
Passa-se a corda no mosquetão.
Retira-se a “longe” do ponto de amarração.
Prime-se o manípulo e inicia-se a descida controlada pela mão direita. Não se deve
controlar a descida com o manípulo.
Caso se largue o manípulo este trava a descida.
FOTO – MARTA BORGES
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2.1.3. Passagem de fraccionamento com descensor "STOP"
Desce-se até à altura do novo troço.
Pára-se a descida e trava-se o manípulo do descensor.
Com a “longe” curta aloja-se a um ponto da amarração.
Coloca-se o “croll” na corda e o espeleólogo suspende-se nesta. Desmonta-se o
descensor e monta-se na corda do novo troço
Retira-se a “longe” curta.
Usando a bossa do fraccionamento para apoio do joelho, retira-se o “croll”.
Prime-se o manípulo e a descida recomeça.
FOTO – MARTA BORGES
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2.2. SUBIDA DE JUMAR "MÉTODO DED"
É o aparecimento dos bloqueadores que permite abandonar as escadas. As
vantagens são muito menor peso e volume a transportar, uma acção muito mais
rápida sobre a corda, mais facilidade e rapidez na montagem e desmontagem do
equipamento do poço e um menor tempo de espera na subida.
2.2.1. Material usado
Um “croll” no peito, um punho de “jumar” com pedal e uma “longe”.
O “croll” fixa-se directamente ao “maillon” que fecha o “Cuissard”, sendo ajustado
no peito pelo “Torse”.
O punho fica ligado por um mosquetão à “longe” comprida que está ligado ao
“maillon” que fecha o “Cuissard”.
O pedal vai ligar ao punho no mesmo mosquetão. O comprimento do pedal deve
ser medido de maneira que o punho fique à altura do “croll” com as pernas
esticadas. Só assim se pode, tirar um bom rendimento na subida.
A subida é a repetição alternada de dois movimentos:
- Encolhendo as pernas, subir o punho;
- Esticando as pernas, subir o “croll”;
- Repetição alternada dos dois movimentos.
FOTO – VITOR AMENDOEIRA
No início da subida ou após um fraccionamento, a corda tem pouco peso e tem
tendência a subir acompanhando o “croll”.
A solução é segurar a corda entre os dois pés, durante a subida do punho, até ter
peso.
Quando a subida é feita junto a uma parede, utiliza-se apenas um pé no pedal,
porque o outro tem que trabalhar como afastador da parede e ao elevarmo-nos
sobre o pedal, é necessário puxar a corda debaixo do “croll”, com a mão.
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2.2.2. O uso do “Pantin”
Com o uso do “Pantin” o problema da corda subir por falta de peso é ultrapassado
porque este estica a corda. A figura abaixo ilustra duas técnicas de progressão com
“pantin”. Técnica de progressão simultânea, a menos fatigante e técnica de
progressão alternada a mais rápida.
64 64
2.2.3.O ritmo da subida de “jumar”
É sempre um erro querer subir demasiado rápido, sobretudo depois do período de
espera quando os músculos estão frios.
Deve-se subir calmamente, ao ritmo da respiração.
Evitar olhar constantemente para cima, cansa muito os músculos do pescoço e os
olhos ficam desprotegidos do capacete.
As causas de cansaço durante a subida são devido a:
- Falta de treino;
- Fome;
- Material mal ajustado;
- Cadência da subida.
Melhor do que parar, é evoluir calmamente e por curtas braçadas.
Se a paragem for inevitável que seja curta, mas proveitosa.
Para isso, deve repousar o busto contra a corda, braços caídos ou cruzados, pernas
em posição sentada, pés repousando no pedal.
FOTO – MARTA BORGES
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2.2.4. Passagem de fraccionamento
Quando se vai a subir de “jumar”, para passar um fraccionamento, deve fazer-se:
- Subir o punho até quase ao nó de amarração, (não encostar ao nó).
- Subir o “croll” até perto do punho.
- Alojar com a “longe” curta a um ponto de amarração (facilita retirar o “croll”) (C).
- Elevar-se sobre o pedal, abrir o “croll” e colocá-lo na corda superior (B).
- Retirar o punho da corda inferior (A) e colocá-lo na corda superior (B).
- Retirar a “longe” curta e continuar a subir.
Passagem de um fraccionamento na subida: deslocar sempre o CROLL antes do punho.
2.2.5. Passagem de Nó de Ligação
Quando se vai a subir de “jumar”, para passar um nó de ligação de cordas, deve
fazer-se:
- Subir o punho até quase ao nó de amarração, (não encostar ao nó);
- Subir o croll até perto do punho;
- Alojar com o “longe” curto à argola de fim de corda (C);
- Retirar o punho da corda inferior (A) e colocá-lo na corda superior (B);
- Colocar o mais corda possível o peso na corda (B);
- Elevar-se sobre o pedal, abrir o “croll” e colocá-lo na corda superior (B);
- Retirar o “longe” curto e continuar a subir.
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2.2.6. A saída do poço
- Subir o punho até ao nó de amarração (mas não encostar ao nó).
- Alojar-se com a “longe” curta no corrimão ou na argola da dupla amarração.
- Apoiando-se no pedal ou num apoio do poço tirar o “croll” da corda.
- Sair do poço e retirar o punho.
- Verificar se a corda está apta a ser usada pelo companheiro seguinte.
FOTO – VITOR AMENDOEIRA
2.3. O MÉTODO "MAO"
Escolhido por um grande número de espeleólogos italianos, é uma variante do
“jumar” que utiliza a compensação por uma “polie” ou um mosquetão.
O pedal encontra-se preso à parte superior do “croll” vindo a passar pela “polie” ou
mosquetão no punho. Torna a subida mais lenta mas menos esforçada.
Este método é muito útil para uma equipa fatigada.
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2.4. PASSAGEM "TIROLESA"
Consiste numa passagem muito particular de um dado ponto a outro na horizontal.
Este tipo de passagem usa-se para passar por cima de um rio subterrâneo.
2.4.1. Material usado
A progressão deve ser feita sobre corda estática e ter uma corda dinâmica de
segurança.
O punho fica ligado por um mosquetão, apanhando as duas cordas e ligando à
“longe” comprida.
um mosquetão liga as duas cordas ao “maillon” do “Cuissard”.
A progressão é feita colocando uma perna sobre as cordas e a deslocação é feita
com ajuda do punho.
2.5. CORDAS COM ARGILA
Quando a corda tem muita argila os bloqueadores dentados acabam por deslizar
com a acumulação desta entre os dentes.
O punho é geralmente o primeiro a ceder por ir à frente a limpar a corda.
Quando isto acontece, substitui-se de imediato o punho pelo “prusik”, que não tem
dentes e não provoca este problema.
Durante a subida, se o “croll” também deslizar, o espeleólogo deve suspender-se
no “prusik” e limpar cuidadosamente os dentes do croll com o limpador de bico do
capacete.
Se o “croll” continuar a dar problemas e existir um descensor "STOP", deve colocar-
se a corda neste, retirar o “croll”. Prosseguir com a mão direita no punho e a mão
esquerda na corda, puxando a mesma quando o espeleólogo se eleva no pedal.
68 68
3. TÉCNICA DE ESCADAS
Apesar das escadas terem caído em desuso, na equipagem para exploração de
algares, o espeleólogo deve continuar a saber usá-las e utilizá-las em situações
específicas.
Na exploração de grutas horizontais surgem pequenas passagens para galerias
inferiores ou superiores torna muito útil o uso das escadas para aceder a estes
níveis. No caso das galerias superiores, é previamente feito uma escalada e
montada de seguida, para facilidade de toda a equipa.
Nestas circunstâncias é mais fácil transportar um lance de escadas e uma pequena
corda dinâmica para segurança, do que carregar com toda a “quinquilharia” para a
técnica de “jumar”. Normalmente esta escada fica montada no local, servindo todas
as incursões necessárias até finalizar o estudo desse nível, facilitando os
espeleólogos.
3.1. COMO SUBIR / DESCER ESCADAS
As mãos agarram o degrau por trás, os pés um pela frente outro por trás, fazem os
movimentos alternadamente, tendo em atenção que só se move as mãos com a
certeza que os pés estão bem fixos e assim sucessivamente. Não se deve colocar
as mãos pela frente do degrau para não se perder o centro de gravidade na escada
Esta incorrecção faz com que haja maior dispêndio de energia, menor rentabilidade
e descuido na segurança.
FOTO – ROSÁRIO PINHEIRO
3.2. SEGURANÇA
Na subida / descida deve ser feita auto-segurança sobre corda dinâmica fixa,
através de bloqueador ao cinto individual.
Caso o espeleólogo esteja fatigado há sempre a possibilidade de se alojar a um
degrau para descansar.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 69
III- EQUIPAMENTO DOS POÇOS
1. CONSIDERAÇÕES
Equipar uma gruta consiste em instalar correctamente o material indispensável
para garantir a segurança e permitir a progressão da equipa.
De uma boa montagem depende o bom desenrolar da exploração.
Por isso não se deve negligenciar nenhum pormenor, por insignificante que pareça.
Os conhecimentos sobre montagens são tão importantes para quem desce como
para quem equipou o poço.
Nenhum espeleólogo se deve pendurar na corda sem avaliar as condições,
da amarração.
1.1 PREPARAÇÃO DO MATERIAL
Uma saída espeleológica deve ser preparada com antecedência, com vista a saber
as necessidades do material a usar nessa incursão.
Na preparação dos “Kitbag”, deve ser verificado o estado do material tendo especial
atenção aos troços de cordas que se pretendem usar passando-os à mão para
detectar eventuais variações de diâmetro reveladoras de uma alteração interna da
alma.
O material deve ser distribuído por tantos sacos quanto o número de espeleólogos
que vão constituir a equipa de ponta.
As cordas são arrumadas nos “kitbag” como mostra a figura.
Os mais compridos ficam por baixo, os mais curtos podem ser enrolados e atados
em molhos, para facilitar a sua retirada do saco quando se procura um outro.
Na ponta de cada corda fazem-se dois nós de segurança, este pormenor é
muito importante para não haver o risco de se sair da corda quando esta
não chega ao fundo.
1.2 JUNTO AO POÇO
Caso não seja conhecida a profundidade do primeiro poço a primeira coisa a fazer é
sondar a altura deste. Para isso usa-se a iluminação eléctrica de um frontal até esta
atingir o fundo, sendo assim fácil estimar a sua altura. Outro método é deixar cair
uma pedra de 200 a 300 g no poço, de forma a que esta não bata nas paredes
laterais tendo em atenção quantos segundos ela levou a atingir o fundo. Usar a
seguinte fórmula: P=35+25(t-3); VER TABELA. Recentemente apareceu o medidor
“laser” que permite medir com precisão milimétrica a altura dos poços.
De seguida há que limpar a boca do algar de pedras soltas que possam cair durante
a exploração.
Avaliar se alguma amarração natural fiável, está bem colocada para a primeira
amarração.
70 70
Como geralmente não acontece isso, deve avaliar-se a solidez da rocha e iniciar a
equipagem.
T em s m
2,5 25
3 35
3,5 50
4 60
4,5 75
5 85
1.3. AMARRAÇÕES
As amarrações devem ser sempre duplas, sendo a segunda tanto ou mais
resistente que a principal.
Escolher a posição relativa ao poço.
Nas amarrações sobrepostas, reduzir o comprimento da corda que as liga e sempre
que possível, fazer entre elas um nó amortecedor (nó de vaca).
Usar sempre que possível amarrações em "Y" para evitar roços.
Em caso de ruptura, deve sempre fazer-se um exame cuidadoso do que se passa.
FOTO – VITOR AMENDOEIRA
AMARRAÇÕES SOBREPOSTA
(P) - Amarração principal
(S) - Amarração de segurança
(1) - As duas amarrações são sobrepostas; a corda que as reúne não apresenta
folga, podendo até estar ligeiramente estendida.
Em caso de ruptura da amarração principal (P), a amarração de segurança (S)
suportará a carga sem choque. Nesta situação, a corda não será animada de um
movimento pendular. Um espeleólogo pendurado na corda praticamente não se
aperceberia de nada.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 71
(2) - A qualidade da rocha ou a posição das falhas, levam frequentemente a optar
por este esquema.
A folga entre as duas amarrações é inútil não sendo no entanto perigosa, pois o
factor de queda é inferior a 1.
Em caso de ruptura da amarração principal (P) a amarração de segurança (S)
sustentará a carga com um ligeiro choque.
O esticão dado pela corda é insignificante e poderá ser anulado por um nó de
amortecimento entre (P) e (S).
(3) - A amarração de segurança (S), embora sobreposta à principal, encontra-se
muito próxima desta.
Na cedência do "spit" da amarração principal (P), a amarração de segurança (S)
não suportará o choque provocado pelo esticão resultante da excessiva folga entre
as duas amarrações.
(4) Nesta amarração sobreposta, existe uma falsa folga resultante da bossa.
Deixada, com o intuito de possibilitar um apoio para os pés.
No entanto, a folga real entre as duas amarrações é diminuta da qual a cedência da
amarração principal (P), a segurança (S) suportará um choque muito próximo do
factor 1 (máximo admitido em cordas semi-estáticas).
AMARRAÇÕES DE FACTOR 2
A amarração principal (P) está acima da amarração de segurança (S).
Na cedência da amarração principal (P), o espeleólogo suspenso na corda, cairá o
dobro da distância entre as duas amarrações (FACTOR 2).
A amarração de segurança (S) sofrerá um choque difícil de suster. A cedência desta
provoca a ruptura da corda, praticamente inevitável.
As consequências de uma queda não são em função da altura, mas sim do factor de
queda.
Numa queda de 2 metros por 40 metros de corda utilizada, o factor de queda é
0.05
(F = 2/40):
Numa queda de 2 metros por 1 metro de corda utilizada, o factor da queda é 2
(F = 2/1).
As cordas semi-estáticas não resistem a uma força choque provocada por
um factor 2, pelo que este é expressamente proibido.
72 72
EQUIPAGEM COM CORRIMÃO DE ACESSO
(1) - As amarrações principal (P) e de segurança (S), estão situadas praticamente
na horizontal.
Na cedência da amarração principal (P), a corda ficará a roçar na aresta cortante da
plataforma de acesso.
(2) - Esta equipagem é a alternativa correcta à da fig. 1.
Consiste num corrimão de acesso até à equipagem sobreposta: Amarração principal
(P).
Na cedência da amarração principal (P) a amarração de segurança (S) suportará o
choque e impedirá o roço na plataforma de acesso.
2 x SP
FACTOR 2
AMARRAÇÕES DE FALSO
FACTOR 2
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 73
(1) e (2) - Amarrações em falso factor 2.
Embora a amarração principal (P) se encontre acima da amarração de segurança
(S), um nó (D) na corda suspensa reduz o factor de queda para próximo de 0.
Na cedência da amarração principal (P) o espeleólogo sustentadp na corda, apenas
cairá a distância que separa a amarração de segurança (S) do nó na corda (D).
Assim quanto menor for a distância "(SD), menor será o DD' e o factor de queda
será sempre perto do 0".
AMARRAÇÕES NATURAIS
Amarrações naturais, são indicadas excelência para amarrações do primeiro poço.
(1) - Para que a carga na laçada de ligação não seja superior à carga na corda, o
ângulo da laçada não deve ser nunca superior a 20º.
(2) - Algumas das formações apresentam arestas cortantes que colocam a corda
em risco (roço); na salvaguarda da corda utilizam-se anéis intermediários (“sangle”
ou corda) não dispensando no entanto a eliminação a martelo das arestas mais
vivas e/ou o dobrar do anel em dois (aumentando a superfície de contacto)
reduzindo assim a acção desgastante na corda/”sangle”.
(3) (4) - Para evitar que a corda/”sangle” salte da formação de fixação, faz-se um
nó de correr envolvendo a formação com várias voltas de corda.
74 74
AMARRAÇÕES EM "Y"
A amarração em "Y" é importante por poder posicionar-se a corda de forma a
evitar-se roços.
A força distribui-se pelos seus dois braços de forma equivalente.
O nó que constitui o centro do "Y" é em nove.
Um dos braços é a argola resultante deste nó.
O outro é a ponta restante da corda com um nó em oito, onde vai ligar também a
amarração de segurança.
(1) - O ângulo formado pelo nó do centro deve ser, idealmente, 90º.
(2) - 120º é o ângulo máximo que não convém ser ultrapassado. A partir daqui, a
força a que se submetem os braços do "Y" passa a ser superior à que está sujeita a
corda (3).
(4) - Pode acontecer que o "Y" tenha que ser assimétrico. Neste caso, quando um
dos braços for horizontal, a amarração de cima vai suportar mais força. Convém ser
esta a receber a corda dobrada.
1.4. EQUIPAGEM
O espeleólogo que desce em primeiro lugar mune-se do material necessário a
instalar (“plaquetes”, “spits”, martelo, mosquetões, “sangles”, entaladores, “pitons”
e corda suficiente), procurando:
- deixar as amarrações na máxima segurança;
- evitar roços;
- facilidade nas saídas dos patamares em que o poço se fracciona.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 75
O espeleólogo procura a amarração em função da boca do algar.
Para equipagem, o espeleólogo deve ter a corda tensa, usando para isso o
descensor "STOP" como ilustra a figura.
Nesta montagem com fraccionamento em caso de ruptura, a queda será de 2 m,
mas esta será amortecida por 2+18=20 m de corda.
O factor de queda é muito pequeno, assim como a força de choque.
76 76
O espeleólogo deve procurar desviar a corda de roços usando para isso entaladores
ou anéis de “sangle”.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 77
As situações ocorridas nas figuras anteriores, podem ser facilmente contornadas
por desvio, ou fraccionamento como mostra última figura.
Num poço em que corre uma cascata, há possibilidade de esta aumentar o seu
caudal. Por esta razão e para não se correr riscos, a equipagem deve ser feita de
acordo com essa possibilidade.
78 78
Por vezes uma gruta termina num obstáculo (sifão, cone de pedras), sendo
importante tomar atenção a pequenas passagens que se abrem lateralmente e que
podem levar à zona terminal da gruta. Nestes casos é necessário recorrer à técnica
do pêndulo.
Deve ter-se em atenção o movimento da corda, ou seja verificar se não toca em
lâminas (arestas em rochas). O balanço deve ser controlado e ter sempre atenção
às paredes.
FOTO – MARTA BORGES
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 79
Esquema idealizado para a equipagem dum Algar.
1.5. DESEQUIPAGEM
Caso o material fique na cavidade para uma próxima exploração a corda deve ser
sempre retirada, para a água não acelerar o processo de destruição desta.
O espeleólogo que desequipa deve ter em atenção a sua segurança.
Se o peso da corda e restante equipamento for grande, a colaboração da equipa é
imprescindível, podendo, montar-se para retirar o equipamento, um sistema de
“polie”/travamento ou um “palan”.
80 80
1.6. Introdução a técnicas de resgate
As duas técnicas aqui apresentadas são o principio base de todas operações para
resgatar carga, ou uma vítima de acidente.
1.6.1. “Polie”/travamento
Uma “polie” montada no cimo do poço com um auto-bloqueador evita a descida da
carga, podendo os espeleólogos içar a carga com segurança. Para facilitar puxar a
corda usa-se o punho.
1.6.2. “Palan”
Necessita de duas “polies” e dois auto-bloqueadores.
Um “polie”/travamento ajusta-se a uma segunda “polie” livre, ligando esta ao
segundo auto-bloqueador.
A corda deve ser puxada no sentido vertical.
Este processo é mais fácil para içar a carga, devido á repartição da força a exercer.
– “Polie”/travamento
- Segundo auto-bloqueante
- Contrapeso
– Carga
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 81
IV- ORGANIZAÇÃO ESPELEOLÓGICA
1. OBJECTIVOS
1.1. OBJECTIVOS DAS EXPLORAÇÕES
O objectivo de uma determinada exploração, pode ser:
- Formação;
- Reconhecimento;
- Ponta;
- Trabalho específico.
1.1.1. Exploração em Acção de Formação
Estas explorações visam transmitir em ambiente próprio, conhecimentos e
situações reais dos temas já abordados nas aulas teóricas, dando ao formando uma
maior percepção da realidade espeleológica.
1.1.2. Exploração de Reconhecimento
As explorações de reconhecimento são pequenas incursões nas cavidades com a
finalidade de determinar o seu potencial, bem como futuros trabalhos a realizar.
Assim, o espeleólogo deve ter em conta o tamanho da gruta, possíveis
desenvolvimentos e o grau de dificuldade da sua exploração. A existência de
verticais, laminadores, sifões, meandros, etc, são particularidades que deve
registar, entre outras.
A sensibilização para a observação directa de artefactos arqueológicos: (utensílios,
ossadas, desenhos), assim como, a amplitude de antigas entradas, ou a existência
de algares obstruídos, podem perspectivar indícios de ocupação humana ou de sua
utilização acessória, na construção de locais de culto ou de necrópoles.
É igualmente importante, registar o estado e o risco de deterioração, quer dos
artefactos já referidos, quer da estrutura geológica da cavidade.
Uma chamada de atenção para a fauna cavernícola, nomeadamente a existência de
morcegos, sua quantidade, localização na gruta e se possível a identificação das
espécies.
Por fim, e como elemento obrigatório de uma exploração de reconhecimento, deve
ser elaborado um relatório detalhado, contendo um croqui de apoio a futuras
explorações.
1.1.3. Exploração de Ponta
A exploração de ponta, tem como finalidade atingir o potencial desenvolvimento de
uma cavidade ou de uma galeria.
Os procedimentos já indicados no ponto anterior, serão complementados com a
elaboração de um croqui, contendo a orientação das galerias principais.
1.1.4. Exploração em Trabalho Específico
De todas as explorações, a de trabalho específico é aquela que dá corpo à
espeleologia. Como exemplo, temos a topografia, enquadramento em escavações
arqueológicas, medição da orientação das falhas, identificação e contagem de
morcegos, recolha para análises de água, medições de temperatura, de humidade e
dos caudais das ribeiras subterrâneas.
1.2. CONSTITUIÇÃO DE EQUIPAS
1.2.1. Número Adequado de Elementos por Equipa
O número adequado de espeleólogos numa exploração, depende do seu objectivo,
do tipo e tamanho da cavidade.
O número mínimo a considerar será de 4 elementos. Ocorrendo um acidente com
um deles, deverão ser mobilizados todos os elementos; ficando um no
acompanhamento do sinistrado, os restantes procurar auxilio.
82 82
O número máximo será aquele que permita cumprir o objectivo da exploração, sem
que com isso se aumente em demasia a permanência na cavidade e/ou o risco de
acidentes.
Em acções de formação, deve ter-se em conta a maturidade dos formandos, bem
como o nível da formação, de forma a garantir o melhor enquadramento.
1.2.2. Nível Técnico dos Constituintes duma Equipa
O nível espeleológico dos elementos que constituem uma equipa, deve estar em
consonância com os factores atrás mencionados estando sempre presente um
espeleólogo experiente e pelo menos um socorrista.
1.2.3. Especialidades dos Constituintes duma Equipa
Sendo a exploração de ordem específica, deverá fazer parte da equipa um
especialista da área ou um espeleólogo por este instruído, procedendo de forma a
realizar um trabalho correcto e isento de quaisquer danos.
1.3. MATERIAL COLECTIVO
1.3.1. Quantidade e Especificidade do Material Colectivo
Na organização de uma exploração, é da maior importância a elaboração dos kits
de material colectivo.
A FALTA ou a INSUFICIÊNCIA de um determinado tipo de material, assim como
o seu EXCESSO, poderá ter uma influência determinante no sucesso da
exploração, podendo mesmo chegar-se ao ponto da sua inviabilização.
Pormenores a considerar, serão por exemplo a profundidade e quantidade de
poços, o número de fraccionamentos, o tempo estimado como duração da
exploração, a existência ou não de água na cavidade e a natureza do trabalho a
efectuar.
São factores determinantes, o comprimento e número de cordas, a quantidade de
carboneto, o transporte de água e a especificidade do material, (ex. bússola e fita
métrica para um trabalho de topografia).
Mas, nem só a falta de material é sinónimo de má organização e de potenciais
malogros. O seu excesso ou má distribuição pelos elementos da equipa, poderá
atrasar ou cansar demasiado parte ou toda a equipa, impedindo-a de atingir o
objectivo desejado.
1.4. TRANSPORTE
1.4.1. Providenciar o Transporte Adequado em Número e Tipo
Providenciar um transporte, já por si não é tarefa fácil. Devemos no entanto fazê-
lo, tendo em conta o número de elementos e quantidade de material a transportar.
Factor muito importante é a distância a percorrer e o tipo de terreno.
1.5. ESTUDO PRÉVIO E ELABORAÇÃO DE RELATÓRIOS
1.5.1. Apreciação de Relatório Anteriores
Uma leitura cuidada dos relatórios das explorações anteriores, ou na sua
inexistência, uma conversa com alguém conhecedor da cavidade, pode contribuir
de forma decisiva para uma "saída" organizada e bem sucedida.
1.5.2. Leitura da Carta da Região
A leitura da carta da região, torna-se indispensável, quando se trata de um
trabalho de prospecção ou de cartografia. Nos restantes casos, a sua leitura é
igualmente importante, visto que dados como o tipo de acesso à cavidade ou
morfologia do terreno circundante, podem facilitar a boa realização dos trabalhos.
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 83
1.5.3. Elaboração de um Caderno de Campo
A elaboração de um "Caderno de Campo" ou “Ficha da Cavidade”, é facultativa, se
verificar a existência de modelos de relatórios pré-informados. É no entanto, uma
boa base de trabalho, na elaboração do Cadastro Espeleológico, assim como na
organização de futuras explorações.
1.5.4. Elaboração de um Relatório
Na elaboração de um relatório é indispensável para a boa continuidade dos
trabalhos, assim como para a inventariação ou sua complementação no Cadastro
Espeleológico.
A existência de modelos pré-informados, contribui, para uma mais correcta e
completa informação.
O seu uso, consiste em assinalar ou complementar dados já disponíveis no modelo,
tornando-se por isso mais fácil a sua elaboração e leitura, ver ANEXO.
FOTO – VITOR AMENDOEIRA
84 84
2. CÓDIGO DE ÉTICA
2.1. Código de ética espeleológica1
Os espeleólogos devem promover a protecção das grutas (particularmente as que
tiverem interesse científico, didáctico, estético ou outro) e do ambiente envolvente,
a todos os níveis e por todos os meios ao seu alcance, contra acções poluidoras
como a poluição, as pedreiras, as estradas e explorações desregradas;
Não se devem partir ou danificar concreções e outras formações, muito menos se
for para “levar uma recordação”; a quebra de concreções só é admissível se não
houver outra alternativa para atingir uma passagem, ou se for imperativo para
evacuar de emergência um acidentado;
Os seres vivos não devem ser molestados: para análise biológica devem ser
recolhidos poucos espécimes, e apenas se houver a certeza de irem beneficiar de
um conveniente estudo científico;
Grutas com colónias de morcegos não devem ser visitadas durante o dia nem
durante o Inverno (por causa da maior sensibilidade durante a hibernação) nem no
período Março/Maio (época de reprodução); nem se deve fazer ruído inútil ou usar
iluminação intensa;
Todo o lixo produzido em exploração, em especial latas, plásticos e resíduos de
comida, deve ser transportado para o exterior, incluindo os resíduos de carbureto;
se for encontrado outro lixo deve envidar-se transportá-lo para fora, excrementos
devem ser evitados e, se necessário, ficar enterrados em zonas desviadas das
zonas principais;
Deve ser tomado cuidado para não se sujar, pisar ou de outra forma obliterar
quaisquer formações, sejam elas de concreções calcíticas, depósitos de argila ou
montes de guano; se for indispensável para a progressão, deve escolher-se o
caminho menos danificador e usar apenas esse;
Não se deve fumar no interior da gruta – além de pernicioso para a saúde e de
diminuir o rendimento físico, o fumo do tabaco é incomodativo para quem não fuma
e frequentemente até para quem fuma, o seu cheiro pode perdurar durante dias
numa cavidade, e é provavelmente nocivo para a fauna cavernícola;
O acesso às grutas deve, por princípio, ser livre e natural, apenas eventualmente
condicionado por exigências de protecção devidamente justificadas; os
espeleólogos devem abster-se de facultar ou dificultar artificialmente o acesso às
cavidades naturais, devem encarar com reserva a abertura de “grutas turísticas” e
só prestar alguma colaboração a este tipo de empreendimento se for assegurada a
devida protecção da cavidade e ambiente envolvente.
Lema internacional da espeleologia
- Nas grutas nada se tira a não ser fotografias; - Nada se mata a não ser o tempo;
- Nada se deixa a não ser pegadas; - Nada se leva a não ser saudades.
1 por João Joanaz de Melo (monitor FPE)
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 85
2.2. Código de Ética da UIS
para prática da espeleologia em países estrangeiros pt
Aceite pela União Internacional de Espeleologia (UIS) na Assembleia Geral do 12°
Congresso Internacional de Espeleologia (La Chaux-de-Fonds, Suíça, 1997).
Modificado pela Assembleia geral do 13° Congresso Internacional de Espeleologia
(Brasília, Brasil, 2001). Futuras traduções ou modificações deste Código serão
feitos tomando-se por base o texto em inglês. A UIS apoia as actividades internacionais das sociedades espeleológicas, grupos de exploração de cavernas e cientistas do carso, por entender que são importantes:
para a descoberta de novas cavernas e extensão daquelas já cavernas conhecidas;
para a investigação sobre seus recursos minerais, biológicos, arqueológicos e
antropológicos;
para a divulgação de informações sobre o carso e cavernas e técnicas seguras de
exploração em todo o mundo;
e para ajudar na protecção e preservação do património espeleológico.
Para evitar mal entendidos com a população local, governo e organizações
espeleológicas locais e nacionais do país onde se desenvolverão expedições para
exploração ou pesquisa espeleológica, a Directoria da UIS chama a tenção para as
seguintes recomendações:
1. Antes de sair do país de origem
Frequentemente é necessário obter permissão oficial de autoridades no país a ser
visitado. Além disso, a organização espeleológica nacional do país a ser visitado
e/ou o delegado nacional da UIS também deverão ser informados. Se possível, expedições conjuntas com os espeleólogos do país a ser visitado deverão ser organizadas. As organizações espeleológicas nacionais conhecem as exigências oficiais para expedições visitantes e relativas à entrega de relatórios e outras publicações, os regulamentos para colecta de materiais das cavernas pela expedição e sua expedição para outros países, com a finalidade científica.
2. Durante a expedição
Os membros da expedição deverão estar cientes e respeitar as leis do país bem
como as tradições locais. Algumas cavernas podem ser locais sagrados de alto
significado religioso e/ou cultural, fato que pode restringir explorações e pesquisas
nas mesmas. Os membros da expedição não deverão danificar nem o carso e nem as cavernas. Eles deverão, quando possível, educar e aconselhar as comunidades locais quanto à protecção e à preservação do seu património espeleológico.
3. Depois da expedição
Amostras das cavernas e do carso eventualmente colectadas pelos membros da
expedição deverão ser levadas das cavernas e do país apenas se os procedimentos
correctos de colecta e exportação forem seguidos e permitidos. Cópias de todo o material impresso produzido pela expedição, juntamente com mapas e informações sobre a localização das cavernas, deverão ser enviados para os grupos espeleológicos participantes e para a organização espeleológica nacional, e/ou para o delegado nacional da UIS. A assistência recebida de organizações do país visitado deverão ser agradecidas em todas as publicações da expedição.
4. O respeito pelo trabalho de outros grupos
Antes de iniciar uma expedição em uma região, o grupo deve pesquisar sobre
trabalhos prévios ou em andamento, realizados por espeleólogos locais ou
estrangeiros, de maneira a não interferir em projectos desenvolvidos na área. Nos relatórios da expedição deve-se dar os devidos créditos aos trabalhos prévios realizados na área consultados. Caso mais de um grupo actue na mesma área, torna-se oportuna a troca de conhecimentos e a promoção de um trabalho coordenado.
5. Adenda ao Código de Ética da UIS (Aceito em Brasília, Brasil, 2001)
a. A UIS solicita a todos os membros do sua Direcção e a todos os Delegados que
possuam informações sobre alguma expedição a ser realizada em países
estrangeiros, que informem imediatamente o Delegado Nacional do país alvo da
expedição.
86 86
b. Se um membro do Direcção da UIS descobrir uma violação do Código de Ética por uma expedição estrangeira, contactará o delegado do país de origem da expedição sugerindo que não aceite os resultados oficiais e relatórios da expedição nas publicações oficiais deles, e informando que os mesmos não serão aceitos em qualquer publicação ou evento apoiados pela UIS. c. Para expedições organizadas por países com espeleologia desenvolvida em países de mais baixo desenvolvimento espeleológico, o grupo da expedição fará o melhor possível para a transferência de conhecimentos e para a promoção da actividade espeleológica local.
(http://www.uis-speleo.org/ethic-pt.html)
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 87
ANEXOS
ANEXO . RELATÓRIOS TIPO USADOS NO GRUPO DE ESPELEOLOGIA E
MONTANHISMO
Relatório Síntese de Actividades de Espeleologia
Nº Data
Acesso (breve descrição, ou remete para ficha da Gruta)
Equipa (nome dos elementos):
Gruta:
Freguesia: Local:
Coordenadas:
Carta 25000 nº: Carta Geológica nº: Altitude:
Topografia: Existe: sim não Topo Nº:
Exploração
Reconhecimento Ponta Prospecção Fotografia Topografia Formação
Actividade:
Observações:
Concelho Técnico e Cientifico
Conferido em:
88 88
Relatório de Actividades Espeleologia
Nº Data
Gruta:
Freguesia: Local:
Coordenadas:
Carta 25000 nº: Carta Geológica nº: Altitude:
Topografia: Existe: sim não Topo Nº:
Acesso (breve descrição, ou remete para ficha da Gruta)
Equipa (nome dos elementos):
Exploração
Reconhecimento Ponta Prospecção Fotografia Topografia Formação
Actividade:
Espeleometria
Foi elaborado croki de acesso sim não
Foi elaborado croki da cavidade sim não
Foi elaborada topografia da cavidade sim não
Notas:
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 89
Geologia
Tipo de terreno no qual se abre a cavidade (carta / obs. directa / bibliografia)
Tectónica
Estratigrafia
Direcção dos Estratos:
Pendor:
Fácies:
Natureza do Solo
Na boca:
No Interior:
Concreções:
Outros:
Espeleogénese (formação da Cavidade)
Hidrologia
Sistema hidrológico: sim não
Águas correntes: sim não
Águas estagnadas: sim não
Perigo de Cheias sim não
Condições (preencher em caso afirmativo):
Sifões: sim não
Condições (preencher em caso afirmativo): Data/Hora:
Cota: Profundidade:
Débito: Temperatura:
Notas:
90 90
Meteorologia
Estado do Céu: limpo pouco nublado nublado coberto
Fenómeno: Nevoeiro: sim não Precepitação sim não
Na gruta:
Correntes de ar: sim não
Gases tóxicos: sim não
Condições (preencher em caso afirmativo):
Temperatura: Humidade:
Notas:
Bioespelologia
Fauna existentes na cavidade: Flora existente na cavidade:
Morcegos:
Existe uma colónia com: 20/20cm 50/50cm 1/1m +1/1cm
Quantidade 1 a 50 50 a 100 100 a 500 500 a 1000 + 1000
Encontradas anilhas nº:
Localização na Gruta:
Notas:
Arqueologia
Existe Estação: sim não
Notas: (Observação de ossos, cerâmicas, artefactos, etc)
(Em caso de descoberta deve ser comunicado às autoridades competentes)
Observações:
Concelho Técnico e Cientifico
Conferido em:
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 91
92 92
BIBLIOGRAFIA
Espeleologia
Usa material de:
Sites web
Espeleo fórum da Associação de Espeleólogos de Sintra (http://forum.aesintra.org)
Site consultado em 31/10/2006
Wikipédia a Enciclopédia Livre (http://pt.wikipedia.org/wiki/Caverna)
Site consultado em 22/01/2007
ICN – Instituto da Conservação da Natureza (http://portal.icn.pt/ICNPortal/vPT/)
Site consultado em 31/10/2006
Técnicas de Espeleologia
Rocurt, Marbach "Techniques de la Spéléologie Alpine"
Meredith Martinez "Guide de la Spéléologie Verticale"
Catálogo de Material "PETZL"
Espeleologia
GEM - Grupo de Espeleologia e Montanhismo 93
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