FACUI
CIÊNCIAS DA NUTRIÇÃO E ALIMENTAÇÃO
DA UNIVERSIDADE DO PORTO ■
M GALACTOSBfIA CLÁSSICA H
C ,*::
Vl
#. o Júlio César Leite da Fonseca Rocha
1999/2000
INDICE
1. Introdução
2. Os Hidratos de Carbono
2.1. Digestão e absorção dos Hidratos de Carbono
2.2. Metabolismo da Galactose
2.3. Alterações ao Metabolismo da Galactose
2.3.1. Défice em Galactocínase
2.3.2. Défice em Galactose-1-P Uridiltransferase
2.3.3. Défice em UDP-Galactose 4x-epimerase
3. Galactosemia Clássica
3.1. Genética
3.2. Alterações metabólicas
3.3. Fisiopatologia
3.4. Complicações
3.4.1. S.N.C, e nervo
3.4.2. Olho
3.4.3. Fígado
3.4.4. Rim
3.4.5. Esqueleto
3.4.6. Gónadas
3.4.7. Sistema Cardiovascular
3.5. Apresentação clínica
3.6. Diagnóstico
3.7. Tratamento
3.7.1. Tratamento dietético
3.7.1.1. Tratamento dietético no recém nascido
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3.7.1.2. Tratamento dietético no adulto 40
3.7.1.3. Tratamento dietético durante a gravidez 41
3.7.2. Outros tratamentos 41
3.7.3. Tratamento no défice parcial da enzima 42
3.7.4. Avaliação do tratamento 43
3.8. Prognóstico 44
4. Conclusão 45
Bibliografia
Galactosemia Clássica
1. INTRODUÇÃO
A máquina humana, de todas as existentes à superfície da Terra, é talvez a
mais complexa e a mais difícil de entender. O seu estudo tem suscitado o interesse do
mundo. Senão vejamos: tudo o que o homem constrói tem como finalidade satisfazer
uma determinada necessidade sua.
Todavia, a necessidade primária do homem, baseia-se tão simplesmente na
manutenção da sua própria vida. Para tal, a maquinaria interna humana terá de
funcionar bem. O problema surge quando assim não acontece. O pior ocorre quando o
próprio homem, não consegue resolver esse mesmo problema.
Com muitos erros inatos do metabolismo, acontece isso mesmo. O homem
detecta-os, embora não os consiga resolver em pleno. O metabolismo do homem como
garante da perfeita utilização dos recursos energéticos de que dispõe, permite o bem
estar interno, para que o externo seja, então possível.
Na Galactosemia Clássica, o metabolismo interno do homem não funciona em
pleno. Os possuidores desta metabolopatia podem ver comprometido o seu
desenvolvimento.
Aqui, como noutras situações deste tipo, a nutrição tem uma palavra a dizer!
2. OS HIDRATOS DE CARBONO
Os hidratos de carbono são compostos aldeído ou cetona aos quais se ligam
grupos hidróxil. A sua fórmula empírica é (CH20)n (1).
Constituem, juntamente com as proteínas, os ácidos nucleicos e os lípidos, uma
das quatro maiores classes de biomoléculas. São constituintes da maioria da matéria
orgânica existente à superfície da Terra, possuindo múltiplos papeis nas diversas
formas de vida(1).
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Galactosemia Clássica
Servem como reservas de energia, combustíveis e intermediários no
metabolismo. O amido nas plantas e o glicogénio nos animais são polissacarídeos que
podem ser rapidamente mobilizados para originar glicose, essencial para a produção
de energia. O ATP, como forma de energia universal, é um derivado de um hidrato de
carbono fosforilado, bem como diversas coenzimas (1).
Açúcares como a ribose e a desoxiribose fazem parte da estrutura dos
constituintes do RNA e DNA, onde a sua própria conformação desempenha um papel
importante na armazenagem e na expressão da informação genética(1).
Há polissacarídeos que constituem elementos estruturais das paredes celulares
de bactérias e plantas e dos exoesqueletos dos artrópodes. A celulose, como maior
constituinte das paredes celulares nas plantas, é dos compostos orgânicos mais
abundantes na biosfera(1).
Os hidratos de carbono estão ligados a muitas proteínas e lípidos, entrando na
constituição das proteínas transmembranares, entre outras. Muitos processos de
reconhecimento entre as células têm como intermediários unidades de hidratos de
carbono, na sua superfície (1).
Os hidratos de carbono, presentes nos alimentos, classificam-se em três grupos
- monossacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos - de acordo com o seu grau de
polimerização, o qual constitui o factor preponderante na determinação das suas
propriedades físicas, químicas e fisiológicas(2).
Os monossacarídeos são os hidratos de carbono mais simples, constituindo
unidades que, quando combinadas, formam polímeros. Existem duas séries de
monossacarídeos : a do gliceraldeído, apresentando as formas D e L que servem de
base para a classificação da estrutura dos monossacarídeos, e a série da
dihidroxiacetona (1,2). Deste modo, teremos aldoses e cetoses, conforme estejamos
na presença de um monossacarídeo que apresente um grupo aldeído ou um grupo
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Galactosemia Clássica
cetona, respectivamente (1). Relativamente ao número de átomos de carbono, teremos
tetroses, pentoses e hexoses, conforme estejamos na presença de uma molécula com
quatro, cinco ou seis átomos, respectivamente (1,2,3). Como exemplo de duas
aldohexoses, temos a glicose e a galactose contendo o grupo aldeído no carbono 1
(Cl) ( 3 ) . Estes dois monossacarídeos apresentam poder redutor, uma vez que o seu
grupo hidróxil tem capacidade para reduzir metais como o cobre e o ferro (1,3). São
então designados açúcares redutores (1,3). Comparativamente, apresenta-se a frutose
como uma cetohexose, porque se verifica a presença de um grupo cetona no
carbono 2 (C2)(3). As diferentes estruturas químicas dos monossacarídeos irão ditar o
seu comportamento químico, o seu sabor, poder edulcorante e como tal, a sua
distribuição pelas fontes alimentares bem como a eficácia a nível da absorção
intestinal (3). Existem também compostos derivados dos monossacarídeos que
constituem importantes componentes de polissacarídeos ou são usados como
ingredientes de géneros alimentícios. São exemplo: os ácidos urónicos, formados pela
oxidação de grupos álcool; os compostos resultantes da redução a metil do grupo
álcool, como é o caso da desoxigalactose; os açúcares álcool que constituem o produto
final da redução do grupo aldeído ou cetona de um monossacarídeo (2).
Os oligossacarídeos, segundo o sistema da União Internacional de Química Pura
e Aplicada, são o resultado da junção de unidades de monossacarídeos até um máximo
de nove (2). Destes, destacam-se a sacarose, composta por glicose e frutose, sem
poder redutor uma vez que os monossacarídeos estão ligados através dos seus grupos
hemiacetal(2). O grupo hemiacetal é o resultado da reacção entre um grupo aldeído e
um grupo álcool (1). Por outro lado, temos dois dissacarídeos, que apresentam poder
redutor(2). São eles a lactose originada pela junção de uma molécula de glicose e uma
outra de galactose e a maltose constituindo um dissacarídeo de glicose (2). A rafinose,
um trissacarídeo formado por galactose, glicose e frutose, e a estaquiose, um
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Galactosemia Clássica
tetrassacarídeo formado por duas moléculas de galactose, uma de glicose e uma de
frutose, são bons exemplos de oligossacarídeos que escapam à eficácia dos processos
digestivos, sendo principalmente substratos para fermentações no intestino grosso(3).
Os polissacarídeos são, segundo o sistema da União Internacional de Química
Pura e Aplicada, o resultado da polimerização de mais de nove resíduos de
monossacarídeos (ou ácidos urónicos) (2). É conhecida uma vasta gama de
polissacarídeos que diferem, entre si, pelo tipo de monossacarídeos que os constituem,
pela conformação e tipo de ligações efectuadas entre si, pela extensão da molécula e
grau de ramificação (2). Como exemplo temos o amido, exclusivamente de origem
vegetal. Com a produção de glicose, resultante do processo da fotossíntese, a
necessidade inata de armazená-la, é concretizada pela produção de amido,
constituindo este uma reserva(3). Assim, teremos dois tipos fundamentais: a amilose,
de dimensões mais pequenas e com menor grau de ramificação e a amilopectina, de
maiores dimensões e apresentando maior número de ramificações. Na cadeia linear,
entre os resíduos de glicose, temos ligações glicosídicas a-1,4, enquanto que nos locais
de ramificação são a-1,6 (1,3). Ainda nas plantas, temos a celulose como um dos
compostos orgânicos mais abundantes na biosfera (1). Esta constitui um polímero de
glicose não ramificado com ligações glicosídicas (3-1,4 entre os seus resíduos(1).
Nos animais, os hidratos de carbono ingeridos em excesso, comparativamente
às necessidades energéticas do momento, são armazenados sob a forma de um
polissacarídeo - o glicogénio (3). O glicogénio é um polímero de glicose ramificado
semelhante à amilopectina, embora as suas ramificações sejam mais pequenas e de
menores dimensões(3).
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Galactosemia Clássica
2.1 . DIGESTÃO E ABSORÇÃO DOS HIDRATOS DE CARBONO
Como já foi referido antes, os hidratos de carbono apresentam graus de
complexidade diferentes. Assim, nos alimentos, eles vão aparecer-nos sob a forma de
polissacarídeos complexos, oligossacarídeos e monossacarídeos, com necessidades
diferentes no que respeita a processos digestivos.
Quanto aos polissacarídeos, o glicogénio, exclusivamente de origem animal,
não tem grande significado na alimentação pois, durante o processo de abate há
conversão a lactato, integrando o processo de maturação da carne. Por outro lado, o
amido, derivando dos cereais e das plantas, corresponde, em média, a cerca de
metade da ingestão em hidratos de carbono digeríveis, sendo, como tal, o
polissacarídeo com maior importância na alimentação humana (4). A celulose e outros
polissacarídeos encontrados nos vegetais, vulgarmente designados por fibras, não são
digeridos no intestino delgado sofrendo a acção das bactérias fermentadoras a nível do
intestino grosso (4,5).
Outras fontes de hidratos de carbono são o leite, que contribui com o
dissacarídeo lactose, as células de frutos e vegetais que fornecem frutose, glicose e
sacarose entre outros oligossacarídeos como a rafinose e a estaquiose (4).
A maioria dos hidratos de carbono encontra-se, nos alimentos, sob a forma de
macromoléculas, algumas destas insolúveis, o que inviabiliza a sua absorção directa a
nível intestinal (6). Deste modo, o processo digestivo visará obter substâncias mais
simples e com maior grau de solubilidade que facilitam o processo de absorção (6). A
digestão dos hidratos de carbono inicia-se na boca com a acção da amílase salivar,
uma endoenzima com afinidade para as ligações a-1,4 (4,5). A acção desta enzima é
influenciada pelo tempo de contacto bem como da proximidade com o substrato,
sendo para tal aconselhada uma boa mastigação (4,5). Seguidamente, a nível do
estômago, a amílase salivar é inibida devido ao pH ácido que lhe é desfavorável,
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Galactosemia Clássica
embora, dependendo da constituição da refeição, esta possa ter ainda alguma
actividade (4,5,7). Não é possível quantificar o papel que a amílase salivar possa ter em
todo o processo de digestão dos amidos(7). A digestão do amido é depois retomada a
nível do intestino delgado, através da acção da amílase pancreática (4,5). Os produtos
da digestão pelas amílase salivar e pancreática são oligossacarídeos, nomeadamente
maltoses e maltotrioses e pequenas cadeias ramificadas de monómeros de glicose (4,5).
Estes produtos, juntamente com outros dissacarídeos ingeridos, como a sacarose,
lactose ou mesmo a maltose, são posteriormente digeridos para que possam ser
absorvidos (4,5). Esta nova acção enzimática é da responsabilidade das dissacaridases
ou hidrolases (4,5). Estas enzimas existem, principalmente, nas microvilosidades do
duodeno e no jejuno, nomeadamente na membrana da parte apical dos seus
enterócitos(4,5). Como exemplos temos a lactase, que desdobra a lactose em galactose
e glicose, a sacarase, que digere a sacarose em frutose e glicose, entre outras como a
maltase, a isomaltase, a trealase e a sacarase-isomaltase (4). Todavia, existem amidos
resistentes e fibras alimentares que escapam aos processos digestivos normais,
seguindo para o cólon onde funcionam como substratos bacterianos. A sua
fermentação pelas bactérias resulta na formação de ácidos gordos de cadeia curta
como os ácidos acético, butírico e propiónico, dióxido de carbono, hidrogénio e metano
(7)_
Os monossacarídeos glicose, galactose e frutose, resultantes da digestão dos
hidratos de carbono, atravessam então a mucosa das células do epitélio intestinal e,
através dos capilares das microvilosidades, entram na corrente sanguínea (6). Embora a
glicose e a galactose pudessem atravessar a mucosa intestinal por um processo de
difusão de acordo com o gradiente, a lentidão do processo é de tal ordem que a água
circularia em sentido inverso anulando o gradiente de concentração (8). Os dois
monossacarídeos são então absorvidos no epitélio da mucosa intestinal e no tubo
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Galactosemia Clássica
proximal do rim, por um processo de transporte activo, através de um transportador
proteico dependente do sódio (Na+) (4,6,8). É nesta base que assenta o princípio dos
líquidos ricos em glicose e sódio para a rehidratação de atletas ou de crianças com
diarreia (6). O gene que codifica a informação para a síntese do referido transportador
encontra-se no cromossoma 22, tendo já sido demonstrada a mutação responsável
pelo défice do transportador que causa um síndrome de malabsorção de glicose e
galactose (4,8). O processo de transporte activo acarreta gastos energéticos. Estes
gastos são suportados pela energia gerada por uma bomba Na+-K+-ATPase existente na
membrana basolateral do enterócito (4). Deste modo, a absorção destes dois
monossacarídeos é conseguida pelo facto da referida bomba causar a diminuição da
concentração intracelular de sódio (4). Posteriormente, o sódio entra pela parte apical
da célula arrastando consigo uma molécula de glicose ou de galactose na proporção
molar de 1:1 (4). Por outro lado, a frutose é absorvida mais lentamente e por um
processo de difusão facilitada, eventualmente também algo dependente do Na+ (6).
Todavia, o transporte não se efectua contra um gradiente de concentração, embora a
participação de um transportador permita taxas de absorção superiores às esperadas
com uma difusão simples(4).
Quando os monossacarídeos atingem a corrente sanguínea, através dos
capilares das microvilosidades, são encaminhados até ao fígado pelo sistema porta (6).
Pode também acontecer que algumas moléculas de monossacarídeos atravessem a
membrana basolateral da célula intestinal, atingindo o espaço intersticial, passando, só
depois, à circulação portal por um processo de difusão (4). A glicose é então
transportada para os tecidos, embora alguma seja armazenada sob a forma de
glicogénio hepático e muscular (6). Relativamente à frutose, é possível que alguma
quantidade deste monossacarídeo seja convertida em glicose na célula intestinal, antes
de entrar na corrente sanguínea (6). Porém, tal como acontece com a galactose, a
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Galactosemia Clássica
maioria é transportada para o fígado para que seja convertida em glicose e deste
modo possa ser utilizada a nível celular(6).
2.2. METABOLISMO DA GALACTOSE
No homem, a glicose constitui a energia primária usada pela maioria das células
(2). Só o cérebro, pode utilizar cerca de 80 a 100g de glicose por dia, embora estes
valores variem de acordo com a frequência e composição das refeições (2). À medida
que nos afastamos da última refeição a supremacia da glicose diminui dado que
começam a ser utilizados ácidos gordos, como fonte energética (2). Um aspecto
fundamental no metabolismo dos hidratos de carbono, diz respeito ao facto da energia
provir da dieta de modo intermitente, o que obriga o organismo a fazer reservas,
principalmente de hidratos de carbono e de lípidos (2). Todavia, mesmo para a
completa utilização das reservas de lípidos, como fonte de energia, são necessários
hidratos de carbono (2).
Parece então, por demais evidente, a importância do metabolismo dos hidratos
de carbono na fisiologia do homem (2). Como tal, a digestão dos hidratos dos carbono
provenientes da alimentação, tem que possibilitar que estes sejam absorvidos e
posteriormente utilizados. Os produtos finais dessa digestão são quase inteiramente
compostos por cerca de 80% de glicose, a que se seguem por ordem de importância a
frutose e a galactose (2). Após a sua absorção, muita da frutose e quase toda a
galactose, tendem a ser rapidamente convertidas em glicose no fígado (2).
O fígado constitui o órgão onde se metaboliza a maior quantidade de galactose
(2). A apreciação da função hepática pode ser feita através da avaliação da eficácia de
remoção da galactose do sangue, após uma administração intravenosa (2). A conversão
da galactose em glicose é de tal modo eficaz que, cerca de metade da galactose
fornecida a um indivíduo, encontrar-se-á já convertida em glicose, após trinta minutos
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Galactosemia Clássica
decorridos (2). A lactose constitui a maior fonte de galactose para o homem, estando
presente em 7% no leite humano e em 5% no leite de vaca (9). Tal facto parece ir de
encontro às necessidades fisiológicas de manutenção dos níveis séricos dentro dos
limites normais, já que, a mesma quantidade de galactose, quando em presença de
glicose, produz uma galactosemia menos marcada do que na ausência desta(2).
A galactose tem de ser convertida em glicose-6-P, para que posteriormente
possa ser utilizada na síntese do glicogénio (9). Pode, igualmente, ser oxidada no
sentido de formar piruvato ou acetil-CoA, para produção de energia ou síntese de
ácidos gordos(9).
A conversão da galactose em glicose-6-P ocorre em quatro etapas(10).
A primeira reacção da via metabólica de interconversão da galactose em glicose
(via metabólica de Leloir) consiste na fosforilação da galactose a galactose-1-P pela
enzima galactocínase (GALK) (̂ 0,11,12,13,14,15̂ |\jesta reacção há consumo de energia sob
a forma de ATP (8,9). O equilíbrio da reacção é no sentido da fosforilação da galactose
(8). Todavia, esta é uma reacção reversível (8). Seguidamente, a galactose-1-P
produzida reage com UDP-glicose e, por aquisição do grupo UDP desta, origina UDP-
galactose e glicose-1-P (8,9'10). A reacção é catalisada pela enzima galactose-1-P
uridiltransferase (GALT) (8-9<10'12'15). A glicose- 1-P produzida pode ser convertida
posteriormente em glicose (11). Um fígado normal consegue converter rapidamente
cerca de 80% da galactose em glicose (11). Uma vez que a galactose não constitui um
substrato da hexocínase, a enzima UDP-galactose 4'-epimerase (GALE) inverte a
configuração do grupo hidróxil do carbono 4 (C4) da UDP-galactose e converte-a em
UDP-glicose (8'9-12'15). Desta forma, a UDP-glicose é regenerada, uma vez que tinha
participado na reacção anterior, que conduzia à formação de glicose-1-P (8'10'15). Ao ser
regenerada, a UDP-glicose, intervém novamente na via metabólica, permitindo que a
galactose que entra no ciclo seja convertida a glicose-1-P (8,10'15). Parte desta UDP-
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Galactosemia Clássica
glicose, pode também participar directamente na síntese do glicogénio, uma vez que
constitui um precursor dessa síntese (8'10'15). A enzima UDP-galactose 4'-epimerase
catalisa igualmente a reacção no sentido inverso (8'10'15). Esta possibilidade reveste-se
de muita importância quando não há galactose proveniente da alimentação (8'10'15).
Nestas circunstâncias, a UDP-glicose será epimerisada a UDP-galactose que é essencial
para a síntese de glicolípidos e glicoproteínas (8'10'15). Posteriormente, a degradação
destas moléculas complexas de lípidos e glicoproteínas, pode originar galactose livre
(8,io,i5)_ Q eqU j | íDr j0 en tre a UDP-glicose e a UDP-galactose é mantido, em quase todas
as células, pela GALE (15). A UDP-galactose formada pode sofrer uma clivagem
pirofosforilítica, constituindo assim uma fonte celular de galactose-1-P (15).
Posteriormente, esta galactose-1-P pode ainda ser convertida em galactose por uma
fosfatase (15). Como tal, mesmo na ausência de galactose vinda do exterior, as vias
metabólicas apresentam a reversibilidade suficiente para disponibilizar galactose bem
como todos os seus metabolitos(15).
Na impossibilidade da galactose ser metabolizada segundo as vias apresentadas
anteriormente, devido a deficiências enzimáticas, esta pode ainda seguir duas vias
alternativas (15). Uma delas é a da catalisação pela enzima aldose redutase (15). Nesta
reacção, a galactose é reduzida produzindo-se galactitol (15). A outra possibilidade diz
respeito à oxidação de que a galactose pode ser alvo por acção de uma oxidase,
produzindo-se galactonato ou ácido galactónico (15). Este pode ainda ser
posteriormente metabolizado a C02 e xilulose (15).
2.3. ALTERAÇÕES AO METABOLISMO DA GALACTOSE
Até à data são conhecidos três defeitos genéticos que afectam o metabolismo
da galactose (12,15). As alterações genéticas são expressas, a nível celular, pelo défice
de três enzimas fundamentais para o normal funcionamento da única via metabólica de
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o (O o T -(O
CM CO CM o o Ti
Galactosemia Clássica
conversão da galactose em glicose (12,15). Os três erros inatos do metabolismo da
galactose apresentam um modo de transmissão autossómico recessivo (12,15).
2.3.1. DÉFICE EM GALACTOCÍNASE (GALK)
A GALK constitui a primeira enzima envolvida no metabolismo da galactose. A
sua deficiência foi descrita pela primeira vez em 1965 num homem de 44 anos que
tinha cataratas e a quem foi detectada galactosúria após ingestão de leite(13,15).
Os indivíduos com deficiência de GALK, não conseguem fosforilar a galactose.
Desta forma, não se produzindo galactose-1-P, praticamente toda a galactose ingerida
terá de ser excretada sob a forma de produtos resultantes das vias metabólicas
alternativas, ou seja, galactitol e galactonato, com o primeiro a constituir a maior
parte.
As cataratas são a única manifestação constante da doença, embora já tenham
sido descritos pseudotumores cerebrais em alguns doentes(12,15). As cataratas resultam
da acumulação de galactitol a nível ocular, o que determina alteração da pressão
osmótica e conduz à desnaturação das proteínas (12,15). Contrariamente à GC, que será
abordada mais adiante, no período neonatal verifica-se ausência de sintomatologia
aguda, fundamentalmente caracterizada pela inanição, disfunção gastrointestinal, bem
como alterações a nível hepático, renal e cerebral (12,15). Posto isto, qualquer criança
que apresente cataratas, deve ser alvo de suspeita de deficiência em galactocínase
(12,15) Q diagnóstico d a doença é efectuado através da pesquisa de substâncias
redutoras na urina (12,15). Posteriormente, este é confirmado por doseamento da
actividade enzimática no sangue, nos eritrócitos, no fígado ou nos fibroblastos (12). A
incidência da doença é de cerca de 1:150000, mas apenas cerca de 1:40000 diz
respeito a indivíduos homozigóticos (12,15). Foram identificados dois genes responsáveis
pela codificação da GALK (12). Um destes genes, o GK1 encontra-se localizado no
cromossoma 17 enquanto que o outro gene, o GK2 faz parte do cromossoma 15 (12).
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Galactosemia Clássica
Para já, ainda só foram descobertas três mutações responsáveis pela doença, todas
elas no gene GK1 (12). Está documentado que os heterozigóticos apresentam uma
actividade enzimática intermédia. A sua predisposição para a formação de cataratas
ainda não se encontra totalmente esclarecida. Assim, e para já, recomenda-se o
seguimento do tratamento dietético como medida profiláctica (12,15).
No que respeita ao tratamento, este consiste na eliminação da galactose da
dieta (12'14'15). Quando o diagnóstico é efectuado rapidamente e o tratamento se inicia
de imediato, isto é, nas duas a três primeiras semanas de vida as cataratas podem
reverter(12,15). De outro modo, a sua remoção só é conseguida cirurgicamente(12,15).
2.3.2. DÉFICE EM GALACTOSE-1-P URIDILTRANSFERASE (GALT)
A deficiência em GALT é responsável pela doença de pior prognóstico dentro
das doenças hereditárias do metabolismo da galactose. É vulgarmente referida como
Galactosemia Clássica. Não vai ser descrita agora, uma vez que será alvo de
apresentação detalhada mais adiante.
2.3.3. DÉFICE EM UDP-GALACTOSE 4-EPIMERASE (GALE)
A deficiência em GALE foi primeiramente descrita em 1972 (16). O gene que
codifica a enzima encontra-se no cromossoma 1 (12). A sua deficiência existe em duas
formas (12'15-17). Ambas causam acumulação de UDP-galactose após a ingestão de
galactose proveniente da dieta (12'15-17). são característicos, igualmente, níveis
aumentados de galactose-1-P devido à sua acumulação (12<15'17). Os níveis de GALK e
GALT são normais <12-15<17).
A forma benigna é a mais frequente t12-15-17). Nesta, a deficiência da GALE não
se exprime de modo sistémico (12'15'17>. A nível das células do sangue, nomeadamente
nos eritrócitos e leucócitos, é nítida uma ausência total de actividade enzimática
(12,15,17) P o r o u t r o | a c j 0 í e m cu|tura de fibroblastos de pele ou em análises a tecido
hepático, constata-se exactamente o contrário (12'15'17). Deste modo, a única
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Galactosemia Clássica
consequência da doença traduz-se numa acumulação de galactose-1-P nos eritrócitos o
que, aparentemente, não tem consequências fisiopatológicas (12'15'17). A avaliação de
doentes portadores do défice enzimático comprova-o cabalmente: não há distúrbios de
crescimento bem como de capacidade de metabolizar a galactose ingerida (12'15-17).
A forma mais severa, sendo muito rara, praticamente relembra todo o quadro
que caracteriza a GC (12'15'17). Deste modo, no período neonatal, os sintomas, icterícia,
vómitos, perda de peso, hipotonia, hepatomegalia, aminoaciduria generalizada e
galactosúria são comuns (12'15'17). Esta sintomatologia atenua-se após a implementação
de uma dieta restrita em galactose (12'15-17). De referir que, a actividade da GALT nos
eritrócitos é normal. Relativamente ao prognóstico da doença prevêem-se alterações
de desenvolvimento psicomotor, embora as cataratas não se verifiquem (12-15'17).
Suspeita-se de deficiência em GALE quando o teor de galactose-1-P eritrocitária
é mensurável, juntamente com uma actividade normal da GALT (12'15'17\ o diagnóstico
confirma-se por determinação da actividade enzimática da GALE nos eritrócitos (12'15<17).
Normalmente, os progenitores dos indivíduos afectados têm valores diminuídos de
actividade enzimática (12'15'17). Na forma severa, os sintomas clínicos, os sinais
bioquímicos e uma deficiência enzimática evidente são determinantes para o
diagnóstico (12'15'17).
No que respeita ao tratamento, no caso da forma severa, este deve ser mais
rigoroso (12'15-17). Tal prende-se com o facto do indivíduo ser incapaz de converter
glicose em galactose, comportando-se, como tal, como um dependente deste
monossacarídeo (12<15'17). Uma vez que, como já assinalamos antes, a galactose é
fundamental para a síntese de compostos galactosilados, o indivíduo afectado com
esta doença deverá ter algum aporte de galactose através da dieta (12,15'17). Todavia, a
dificuldade reside em definir qual a quantidade necessária, sem correr o risco do
aporte ser excessivo, sob pena de se tornar tóxico (12'15'17). Esta dificuldade justifica-se
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Galactosemia Clássica
pela ausência de um parâmetro químico que permita basear as necessidades em
galactose (12'15'17).
Relativamente aos indivíduos portadores da forma benigna, não será
necessário tratamento, embora devam ser sempre acompanhados para que o seu
desenvolvimento psicomotor seja constantemente avaliado (12'15'17).
3. GALACTOSEMIA CLÁSSICA (GC)
O termo "Galactosemia" tem sido usado para definir síndromes de toxicidade
provocados pela ingestão de galactose em indivíduos com deficiências enzimáticas na
via de metabolização deste monossacarídeo. Por outro lado, também faz referência aos
níveis séricos de galactose. Devido ao facto de existirem diversas etiologias para a
galactosemia, este termo, tornou-se inadequado. Como tal, as doenças deveriam ser
designadas como galactosemia por deficiência da transferase, galactosemia por
deficiência da galactocínase e galactosemia por deficiência da epimerase. O termo
galactosemia clássica é usado para descrever a galactosemia por deficiência da
transferase, uma vez que esta doença apresenta uma sintomatologia mais complexa,
tem a maior taxa de incidência e, das três, constitui a de pior prognóstico(15).
Em 1908, Von Reuss relatava o caso de uma criança que, em aleitamento
materno, apresentava atraso de crescimento, hepatoesplenomegalia e galactosúria. A
excreção de galactose pela urina cessou quando foi suspenso o aleitamento. Todavia a
criança faleceu e o resultado da autópsia revelou cirrose hepática. Pensa-se que foi
dado chá com conhaque à criança, o que poderia explicar a cirrose e a galactosúria.
Como tal, o diagnóstico não foi reconhecido pela comunidade científica. Contudo,
considera-se que constitua a primeira descrição de galactosemia. Em 1917, Goeppert
observou galactosúria numa criança com hepatomegalia e atraso mental. Outros
Júlio César Rocha 14
Galactosemia Clássica
pequenos avanços se sucederam, todos apontando para uma base hereditária desta
doença (18).
A primeira descrição detalhada de GC surge em 1935 por Mason e Turner(15).
Seguiram-se diversos relatos de outros casos e em 1961 já eram discutidas variações
nas manifestações clínicas de 45 doentes (15). Mais recentemente, em 1990, Waggoner
e colaboradores, analisando os dados de 350 doentes, tentam definir as linhas gerais
do prognóstico da doença (,5I9).
3.1. GENÉTICA
A GC é uma doença de transmissão autossómica recessiva, com uma incidência
de 1:55000 (12). O gene que codifica a informação necessária para a síntese da enzima
galactose-1-P uridiltransferase (GALT) está situado no cromossoma 9 (12,15). O DNAc
(ácido desoxiribonucleico complementar) correspondente já foi clonado e sequenciado
(15). Consiste em 11 exons e 10 introns, contabilizando um total de 1295 bases, que
codificam um polipéptido com 379 aminoácidos de 43 kDa (15).
Através de diversos estudos têm tentado identificar-se maior número de
mutações no gene responsável pela codificação da GALT, por amplificação do DNAc
obtido do RNA de células linfoblásticas de diversos doentes com GC(15). Determinaram-
se as consequências funcionais, de mutações nos aminoácidos correspondentes às
posições 44, 62, 142, 148, 188, 195, 314, 319 e 333 (15). As alterações nas posições
148 e 319 traduzem-se na síntese de uma proteína instável, enquanto que as restantes
causam uma diminuição da actividade da GALT(15).
São já conhecidas mais de 120 mutações no gene responsável pela codificação
daGALT(20).
As mutações mais comuns são a Q188R e a K285N, com uma prevalência de
cerca de 60 e 30% respectivamente, em populações diferentes de indivíduos com
Júlio César Rocha 15
Galactosemia Clássica
galactosemia (20<21<22'23). Estas mutações são mais frequentes na raça Caucasiana e
ambas causam GC (20,21). A redução da actividade da GALT para valores nulos e a
concomitante gravidade do quadro clínico que provocam são semelhantes (20). A
mutação Q188R é devida a uma alteração no nucleótido 591, do exon 6, que leva à
substituição da arginina por glutamina ao nível do códão 188 (24,25). Para os indivíduos
homozigóticos com esta mutação estabelece-se o pior prognóstico, mesmo com
diagnóstico e instituição de terapêuticas de forma atempada (15'20'25).
Se é certo que, entre os Caucasianos, a mutação Q188R apresenta uma
prevalência de 60%, entre os Negros tal não excede os 12% (26). A mutação mais
comum entre a raça negra é a S135L, na qual, devido a uma alteração a nível do
nucleótido 1158, se verifica substituição da serina pela leucina no códão 135 (26). O
resultado da síntese proteica origina uma GALT instável com acelerada taxa de
degradação que culmina com a deficiência de actividade manifestada claramente a
nível eritrocitário (26). Está descrito que os indivíduos homozigóticos para a mutação
S135L têm bom prognóstico desde que diagnosticados cedo e submetidos a dieta
restrita em galactose (26). Tal ficará certamente a dever-se ao facto de apresentarem
frequentemente actividades da GALT de cerca de 10% a nível hepático e da mucosa
intestinal (24'27).
Para além das mutações, das quais se destacam as apresentadas
anteriormente, existem também situações em que se verifica uma deficiência parcial
da GALT <12'23'28>. Normalmente, encontram-se actividades enzimáticas de 10 a 50%
relativamente aos indivíduos normais (12,28). A mais comum de todas estas situações é
determinada pela variante de Duarte, inicialmente descrita em 1965, por Beutler e
colaboradores (15,23). Esta mutação traduz-se numa diminuição da actividade da GALT a
nível dos eritrócitos, que não acarreta sintomatologia clínica (15). Na variante de Duarte
(N314D), ao nível do exon 10, ocorre uma alteração, da qual resulta a conversão da
Júlio César Rocha 16
Galactosemia Clássica
asparagina em ácido aspártico no códão 314 (25). Contrariamente aos homozigóticos
para a mutação Q188R, nos quais não se verifica actividade da enzima, os indivíduos
que possuam nos dois alelos as mutações N314D, têm 50% de actividade da GALT(25).
Os heterozigóticos para o alelo de Duarte e para um alelo da GC terão cerca de 25%
de actividade da enzima (25). Estes indivíduos e os homozigóticos para o alelo de
Duarte, não terão a sintomatologia característica da GC que adiante referiremos e
desconhece-se se existem diferenças de prognóstico entre eles (25).
Para além da variante de Duarte, existem ainda outras como a de Rennes e
Chicago (16). As variantes Indiana, com sinais típicos de galactosemia acarretam
também diminuição e instabilidade da actividade enzimática a nível dos eritrócitos (16).
Na variante de Munster, a inibição da GALT pela glicose-1-P está na origem da doença
(16)
3.2. ALTERAÇÕES METABÓLICAS
Os indivíduos com deficiência em GALT, conseguem fosforilar a galactose
ingerida, embora, não consigam metabolizar a galactose-1-P (12'15'29>. Como resultado
directo não se produz UDP-galactose e acumula-se galactose e galactose-1-P (12-15'29\
Com a acumulação de galactose e galactose-1-P, tornam-se importantes duas
vias metabólicas alternativas ( n ) . A primeira delas, conduz à formação de galactitol
através da redução do grupo aldeído da galactose. Esta reacção é mediada, como
assinalamos, pela enzima aldose redutase (11'30'31). A outra via metabólica alternativa
leva à formação de galactonato através da oxidação da galactose (11'30'31).
Relativamente ao galactitol, embora a sua presença no organismo e a sua
excreção renal constituam sinais bioquímicos característicos, temos de assinalar que a
sua taxa de produção não é constante. A afinidade da enzima aldose redutase para a
galactose é relativamente baixa (30). Como tal, para que se observem as taxas mais
Júlio César Rocha 17
Galactosemia Clássica
elevadas de síntese de galactitol, as concentrações intracelulares de galactose têm de
ser bastante elevadas, como as que se verificam nos doentes possuidores de GC (30).
Uma vez formado, o galactitol não será metabolizado (30). Posto isto, só serão atingidas
grandes concentrações intracelulares de galactitol, quando, a nível sistémico, as
concentrações de galactose também estejam muito aumentadas (30). A excreção de
galactitol em doentes com deficiência da GALT é cerca de 10 vezes superior à excreção
registada em indivíduos normais constituintes de um grupo testemunha (32). Como já
foi referido, mesmo na ausência de galactose proveniente da dieta, os galactosémicos,
produzem-na endogenamente na quantidade de cerca de 1 a 2 mg/Kg por hora (31).
Deste modo, a excreção de galactitol provém, em cerca de 20%, da galactose de
origem endógena (31'32'33). A excreção urinária de galactitol depende da idade, quer nos
galactosémicos quer nos indivíduos normais (34). Em todas as idades, os indivíduos com
GC, homozigóticos para a mutação Q188R, na ausência de actividade da GALT e
submetidos a dieta restrita em lactose, excretam 5 a 10 vezes mais galactitol que os
indivíduos normais constituintes de um grupo testemunha (34). Os galactosémicos com
o mesmo genótipo e com idades superiores a 6 anos, excretam, em média, metade da
quantidade de galactitol quantificada no grupo de doentes anterior(34). Menores taxas
de excreção de galactitol observam-se em indivíduos que têm actividade residual da
GALT (34). Os indivíduos portadores da mutação S135L, excretam menores quantidades
de galactitol, do que os portadores da Q188R (34). Todavia, os valores continuam a ser
elevados identificando-os claramente como possuidores de galactosemia (34).
Relativamente aos níveis plasmáticos de galactitol, não se verificam grandes variações
entre os galactosémicos mais novos com grandes taxas de excreção e os
galactosémicos mais velhos com menores taxas de excreção (34). Tal facto, parece
sugerir que os galactosémicos mais novos têm maior taxa de formação de galactitol a
partir da galactose resultante da síntese endógena (34).
Júlio César Rocha 18
Galactosemia Clássica
Outra via metabólica alternativa permite a oxidação da galactose a galactonato
(11,15,31,32,33,35) E s t e £ ODtido por uma série de reacções em que o carbono 1 da
galactose é preferencialmente libertado sob a forma de C02, enquanto que o carbono 2
é mantido para constituir o primeiro carbono da xilulose resultante (33,35). Esta via
metabólica tem importante significado já que, mesmo nos galactosémicos em
tratamento, se verificam excreções significativas de galactonato (35). Por outro lado, o
galactonato não é detectado na urina de indivíduos normais qualquer que seja a idade
(35). Todavia, quando expostos à ingestão oral de 50g de galactose excretam, na urina,
grandes quantidades de galactonato, o que prova a importância do potencial de
oxidação da galactose, principalmente quando a capacidade de metabolização da via
de Leloir é ultrapassada (35). Para tentar avaliar a capacidade de oxidação da galactose,
procede-se à administração de [l-13C]galactose em quantidade definida em função do
peso do indivíduo (32). Seguidamente realizam-se testes respiratórios com a finalidade
de identificar a percentagem da dose eliminada sob a forma de 13C02 libertada por
minuto (32). Verifica-se então que, os indivíduos possuidores de GC devido à mutação
Q188R, são os que apresentam valores percentuais mais baixos, seguidos dos
homozigóticos para a S135L(32).
A relação entre a excreção de galactitol e de galactonato é cerca de 7:1 até ao
ano de idade, baixando para cerca de 3:1 após os dois anos de vida (31). O
metabolismo da galactose no indivíduo com défice em GALT fica a dever-se ao balanço
entre estas duas vias metabólicas alternativas, à pouca galactose que deve provir da
dieta e da resultante da síntese endógena (31).
Júlio César Rocha 19
Galactosemia Clássica
3.3. FISIOPATOLOGIA
Quando, em 1935, Mason e Turner afirmavam que, ao eliminarem a galactose
da dieta de um indivíduo com galactosemia revertiam a sintomatologia aguda, estavam
ainda certamente longe de imaginar que, mesmo assim, não conseguiam evitar as
complicações a longo prazo que a doença invariavelmente acarreta (31). Passado tanto
tempo mantém-se o enigma. De facto, não se compreende a ineficácia do tratamento
dietético na prevenção das complicações tardias da GC. Certamente que existirão
mecanismos específicos, que estarão na base da etiologia das complicações da doença.
Dado que ainda não foi encontrada justificação adequada para a ineficácia do
tratamento dietético, mantêm-se as três causas hipotéticas para o mau prognóstico
generalizado da GC (11). A primeira delas diz respeito à intoxicação crónica com a
galactose resultante da produção endógena ou veiculada pela dieta t11-36-37-38). A
segunda prende-se com uma depleção de metabolitos como o poliol cíclico, o inositol e
a UDP-galactose, que poderá estar na origem de um defeito no processo de
galactosilação t11-39-40-41). A terceira causa possível relaciona-se com "in útero" (11<42'43).
A intoxicação crónica resulta de, mesmo nos indivíduos melhor tratados, se
verificar que a galactose-1-P eritrocitária se encontra cronicamente aumentada
relativamente aos valores normais e se acompanha de excreções de galactitol cerca de
dez vezes superiores ao normal (n'36'37). Qual seria então a fonte de galactose para
justificar estas constatações bioquímicas? A nível endógeno existe uma constante
produção de galactose-1-P através da clivagem da UDP-galactose, a qual é
normalmente formada via UDP-glicose (11'36'37). Por outro lado, a degradação de
inúmeras moléculas galactosiladas complexas origina libertação de galactose em
quantidades indefinidas (11). Diversos estudos apontam para taxas de produção
endógena de 1.1 a 1.3g de galactose por dia. Estas ultrapassam largamente a ingestão
verificada através da dieta (36). A galactose exógena, isto é, a galactose alimentar, é
Júlio César Rocha 20
Galactosemia Clássica
impossível limitar na íntegra, uma vez que, compostos como galactanos e outros
hidratos de carbono complexos, com galactose ligada, podem libertar galactose, cuja
quantidade, não é possível detectar (11). Todos estes factores poderiam permitir
aumento dos níveis de galactose-1-P, e daí resultar patogénese da GC (38).
Estudos realizados em animais permitem demonstrar que a galactose-1-P pode
estar na origem da inibição da glicose-6-fosfatase. Igualmente, a inibição da glicose-6-
fosfatase desidrogenase pode constituir o mecanismo responsável pela formação de
cataratas em animais intoxicados pela galactose. A galactose pode também interferir
na captação de oxigénio, inibindo a respiração ao nível dos eritrócitos. Há igualmente
referência à inibição da fosfoglucomutase, que capta galactose-1-P convertendo-a em
glicose-1-P, embora por um mecanismo mais lento, bem como da fosforílase a nível
hepático, interferindo no metabolismo do glicogénio. Obviamente que estes estudos,
uma vez que são experimentais, são apenas hipotéticos(38).
Por outro lado, sabe-se que, a via da pirofosforílase converte a glicose-1-P em
UDP-galactose, mas talvez não converta a galactose-1-P em UDP-galactose (38). Esta
galactose-1-P pode então ser desfosforilada a galactose, completando-se a biogénese
da auto-intoxicação (38). Todavia, esta desfosforilação nem sempre acontece o que
provoca a retenção de fósforo e resulta na perda da regeneração de ATP (38).
A segunda hipótese, relacionada com a diminuição da concentração de
determinados metabolitos, parece ganhar corpo a partir do momento em que a nível
do olho e do nervo periférico são observadas baixas concentrações de inositol e poliol
cíclico em animais experimentalmente intoxicados com galactose ( n ) . Esta situação
pode resultar numa alteração do metabolismo do fosfatidilinositol com perturbação da
condução de sinais a nível intracelular (11). Devido à deficiência da enzima GALT,
levantou-se a possibilidade de que presumíveis baixos níveis de UDP-galactose
levariam a síntese deficiente de galactolípidos, galactoproteínas e outras moléculas
Júlio César Rocha 21
Galactosemia Clássica
galactosiladas (11). A deficiência da galactosilação da FSH, pode eventualmente ser
devida ao défice de UDP-galactose a nível celular (31). Autópsias realizadas revelam
níveis baixos de galactolípidos, bem como glicoconjugados alterados (31). Os estudos
que compararam a relação UDP-glicose:UDP-galactose bem como os níveis de UDP-
galactose a nível dos eritrócitos, fibroblastos e leucócitos circulantes, permitem
constatar que as anomalias nas concentrações dos metabolitos só se verificam a nível
eritrocitário e podem estar relacionadas com a acumulação de galactose-1-P (39).
Recentemente, têm sido publicados casos de doentes com GC que apresentam
isoformas patológicas de transferrina, relembrando os CDGS (síndromes das
glicoproteínas deficientes em hidratos de carbono) tipo I ( 4 0 ) . Apesar de tudo isto, não
podemos esquecer que ocorre síntese endógena de UDP-galactose por acção da GALE
convertendo a UDP-glicose (41)!
De facto, é evidente que existe um defeito no processo de galactosilação (39).
Falta ainda esclarecer se este defeito é devido aos baixos níveis de UDP-galactose e à
baixa relação UDP-glicose:UDP-galactose (39). Será que estes factos funcionam como
um possível mecanismo etiológico das complicações da GC (39,44)? Quais serão as
concentrações de UDP-hexoses nos tecidos mais afectados como por exemplo as
células ováricas ou o cérebro (44)?
A outra possibilidade responsável pela fisiopatologia poderá ser a toxicidade a
nível uterino (11). O fundamento assenta em diversas constatações.
Por um lado, observam-se diversas anormalidades no período neonatal, como
por exemplo, cataratas a nível fetal (11). Está descrito um caso em que foram
detectadas cataratas ao nascer, apesar da mãe ter cumprido uma dieta restrita em
galactose (42).
A acumulação de metabolitos parece constituir outra peça para a evidência (11).
Por volta da décima semana de gestação, o fígado fetal já possui as enzimas
Júlio César Rocha 22
Galactosemia Clássica
responsáveis pelo metabolismo da galactose (42). Durante os segundo e terceiro
trimestres de gravidez, as actividades da GALK e da GALT revelam índices não mais
observados em nenhum outro período da vida, enquanto que a GALE apresenta uma
actividade compatível com a observada nas crianças e nos adultos (42). Mesmo com a
mãe de um feto galactosémico a cumprir uma dieta restrita em galactose, são
detectáveis valores anormais de galactitol no líquido amniótico, indicando que esta
substância se está a formar no novo ser em desenvolvimento (11). Adicionalmente,
verificam-se níveis elevados de galactose-1-P (11). Estes valores alterados são já
detectados cerca das vinte semanas de gestação (42). Estas observações comprovam a
exposição do feto à galactose e a existência de metabolismo prenatal de galactose
alterado (11). Obviamente que parte da galactose a que o feto se encontra exposto
provém da mãe. Todavia, está assente que a restrição dietética por parte da mãe não
influencia os níveis de galactitol observados no líquido amniótico ou os níveis de
galactose-1-P avaliados no cordão umbilical (42). Mesmo assim, estes valores são
inferiores aos observados no recém nascido exposto a galactose (42). De acordo com
estas evidências, verifica-se a produção, por parte do feto, de galactose-1-P tendo
como substrato a glicose-1-P (42). Por outro lado, verifica-se também a síntese de UDP-
galactose, quer por ausência de galactose vinda da dieta, quer por défice de GALT, de
modo a fazer face às necessidades impostas pela síntese de galactoconjugados (42). Há
igualmente relatos de fetos que, a meio da gestação, revelavam valores elevados de
galactose, galactose-1-P e galactitol a nível hepático (42).
Paralelamente, verifica-se através de estudos experimentais que, gestantes
alimentadas com altas doses de galactose, geram crianças com alterações metabólicas
dado que a galactose atravessa rapidamente a placenta (11,43). O resultado destas
alterações metabólicas torna-se evidente pela presença de cataratas no recém nascido,
pelo baixo peso e reduzida quantidade de DNA cerebrais e pelo aumento da
Júlio César Rocha 23
Galactosemia Clássica
quantidade de galactitol nas terminações nervosas com metabolismo anormal do
inositol a nível do cérebro (11,43). Também se verifica número reduzido de oócitos nos
ovários das fêmeas, em fases mais avançadas das suas vidas(11).
Parece então que, há manifestações clínicas para os efeitos da galactosemia a
nível uterino, uma vez que a cirrose, as cataratas e os pseudotumores cerebrais,
parecem ter origem a nível fetal(42). Para finalizar, o baixo peso à nascença registado
nos indivíduos afectados, parece explicitar bem os efeitos da galactosemia prenatal(42).
3.4. COMPLICAÇÕES
Enigmaticamente, apesar do diagnóstico e tratamento precoces que aliviam a
toxicidade aguda da doença, os indivíduos com GC têm diversas complicações a longo
termo (31). Estas consistem basicamente em atraso de crescimento, perturbações da
fala, deficiência mental, síndromes neurológicos, dificuldade de orientação espacial e
da percepção visual e falência ovárica (12,15). Habitualmente, nem todos os doentes
apresentam o conjunto de todas as complicações. Todavia, uma grande parte delas
manifesta-se em quase todos (12).
A actividade da enzima GALT é variável nos diversos tecidos dos organismo. À
luz da própria regulação da expressão genética da GALT, sugere-se que muitas das
complicações vistas na GC estejam relacionadas com uma sensibilidade específica dos
órgãos à deficiência enzimática (45).
3.4.1. S.N.C. ENERVO
As alterações do tecido nervoso constituem uma manifestação da toxicidade da
galactose que pode ocorrer de modo irreversível.
Ainda não são conhecidos com certeza os mecanismos pelos quais a galactose
e ou os seus metabolitos causam atraso mental ou sintomas neurológicos específicos
(46). Porém, levantam-se três hipóteses que são bastantes discutidas: edema tóxico
Júlio César Rocha 24
Galactosemia Clássica
devido ao aumento das concentrações cerebrais de galactitol; alterações na via do
segundo mensageiro e alteração dos níveis energéticos no cérebro (46).
No que respeita ao galactitol, as enzimas responsáveis pela sua síntese a nível
cerebral encontram-se activas, de modo que, este acumula-se em grandes quantidades
(15). Diversos estudos experimentais permitem afirmar que o cérebro, imediatamente a
seguir ao olho, é o segundo local de maior acumulação do galactitol (15). Esta
acumulação leva a um aumento de pressão com edema que pode justificar o facto de
animais intoxicados terem diminuição da condução nervosa (15). Este aumento de
pressão relaciona-se com a desmielinização das fibras nervosas o que caracteriza a
neuropatia periférica que se instala (15). No entanto, o edema que se verifica nos
nervos periféricos dos animais pode ser revertido através da administração de um
inibidor da aldose redutase como é o caso do sorbinil(15,46).
A exposição do feto à galactose conduz a uma alteração da conversão da
glicose em mio-inositol (15). Deste modo, duas autópsias a recém nascidos vitimados
pela doença revelaram reduções marcadas, até cerca de 80%, dos teores de mio-
inositol livre bem como de fosfatidilinositois, em comparação com indivíduos
testemunha (46).
A degradação neurológica observada inclui a formação de pseudotumores
cerebrais que pode estar relacionada com o aumento das concentrações de galactitol
ou com a alteração do fornecimento de energia ao próprio cérebro (46). Porém, estudos
experimentais permitem deduzir que talvez não sejam as alterações do metabolismo
energético a justificar a degradação neurológica, uma vez que, em alguns casos, se
assiste a um aumento da energia disponível aquando de altas ingestões de galactose
(46)_
Avaliações feitas a grupos de crianças revelam que o anormal funcionamento
cognitivo, os defeitos na fala e na linguagem e, em alguns casos, as sequelas
Júlio César Rocha 25
Galactosemia Clássica
neurológicas graves, estão presentes numa percentagem substancial dos indivíduos
(47). Verifica-se, no entanto, que os níveis cognitivos mais elevados se registam nos
indivíduos mais novos (47,48). Como não se prevê que, com o avanço da idade, se
verifique uma diminuição desses mesmos níveis cognitivos, as diferenças encontradas
não têm, para já, justificação (47). É observado nas crianças um atraso generalizado do
desenvolvimento da fala (47'48'49). Este atraso manifesta-se numa incapacidade de
realização de movimentos precisos da musculatura responsável pela articulação das
palavras, de modo que, a produção dos sons é prejudicada (49).
Curiosamente, as alterações da substância branca verificadas nos doentes, não
se relacionam com os sintomas neurológicos, com a idade de diagnóstico, com a
severidade da doença bem como, com os níveis cognitivos, o que acarreta dificuldades
à melhor compreensão deste verdadeiro enigma chamado Galactosemia Clássica (47).
3.4.2. OLHO
A nível ocular a maior complicação da GC são as cataratas (15,50). As
investigações desenvolvidas com o intuito de elucidar a causa da formação das
cataratas, evidenciam que alimentando animais com altas doses de galactose (40 a
50% da dieta), se induz facilmente a formação de cataratas. A indução é tanto mais
eficaz quanto maior a dose de galactose e menor a idade dos indivíduos.
Relativamente ao sexo, há a destacar o facto da prolactina acelerar todo o processo.
As cataratas revertem-se desde que a galactose seja retirada da alimentação. O
mecanismo de formação da catarata terá eventualmente a ver com a presença
significativa, a nível do olho, da enzima aldose redutase, responsável pela formação do
galactitol. Dietas ricas em galactose bem como níveis altos de magnésio têm um papel
favorável no aumento da concentração da referida enzima. Após a síntese do
galactitol, este torna-se osmoticamente activo devido à dificuldade em se difundir
através dos tecidos oculares. Ocorre então uma chamada de água que, causará
Júlio César Rocha 26
Galactosemia Clássica
precipitação das proteínas, conduzindo, assim, à formação de cataratas ( 6). Os
inibidores da aldose redutase, prevenindo a formação do poliol, previnem,
concomitantemente, a formação das cataratas. A evidência de que seja, de facto, o
galactitol, e não a galactose-1-P, o responsável pela formação das cataratas, é
reforçada pelo facto, dos indivíduos que têm deficiência da enzima galactocínase,
formarem cataratas invariavelmente, na ausência de galactose-1-P(15).
São muitos outros os mecanismos bioquímicos que conduzem à formação das
cataratas. Estes incluem, alterações da síntese proteica, da produção de RNAm
codificador de proteínas fibrosas, do transporte de aminoácidos, do conteúdo em
sódio, da actividade das bombas Na+/K+, dos níveis de RNAm, da biosíntese das
prostaglandinas, das enzimas do metabolismo dos hidratos de carbono e da glutationa
redutase. Após o edema, verifica-se primariamente uma descida dos níveis da
glutationa. Por outro lado, as alterações dos níveis de ATP, são mais tardias no
desenrolar de todo o processo. A glicólise e a respiração a nível ocular reduzem-se em
cerca de 30%. Todo o aumento da acumulação de galactitol parece diminuir o
conteúdo de inositol, embora as repercussões deste facto não estejam esclarecidas(15).
Apesar de tudo isto, as cataratas não constituem a única complicação da GC a
nível ocular (50). Foram descritos nove casos de hemorragia a nível do vítreo, com
coagulopatia associada, pode conduzir à cegueira (50). Esta situação é rara, está
normalmente associada às complicações perinatais e não tem relação com as
hemorragias intra-retinais tipicamente benignas resultantes do parto(50).
3.4.3. FÍGADO
Contrariamente ao que se passa com as cataratas, os motivos que conduzem à
intoxicação hepática ainda não estão bem definidos. Contudo, é certo que os
indivíduos não tratados evoluem para cirrose hepática (12).
Júlio César Rocha 27
Galactosemia Clássica
A afectação severa do fígado, frequentemente observada nos doentes com GC,
não é observada em animais sujeitos a uma dieta rica em galactose. Embora no fígado
das crianças, se acumule galactose-1-P e galactitol, nos animais, apenas se acumula
galactose-1-P. Por outro lado, os doentes com deficiência em galactocínase, que
ingerem galactose em excesso, produzem grandes quantidades de galactitol, sem que
haja repercussões a nível hepático. Deverá, portanto, existir um outro metabolito ainda
desconhecido, que provoque as alterações hepáticas responsáveis pela cirrose do
órgão (15).
A presença de galactonato no fígado, quer de animais alimentados com dietas
ricas em galactose, quer em crianças, poderá constituir uma pista para investigações
futuras. Por outro lado, sabe-se que a galactosamina induz alterações hepáticas em
animais. No entanto, a transposição deste facto para os humanos ainda não foi
efectuada (15).
Muitas outras questões se levantam sobre a fisiopatologia das alterações
hepáticas, quer sobre a diminuição dos níveis de glicogénio quer sobre os menores
índices de fosforilação das hexoses. No que respeita às hipoglicemias que por vezes
ocorrem a sua causa parece ser predominantemente hepática, uma vez que se sabe
que a galactose não estimula a libertação de insulina pelas células /3 do pâncreas. A
sobrecarga alimentar com galactose em doentes com GC permite verificar que se
desencadeiam alterações da glicogenólise hepática e que a resposta ao glucagon se
encontra atenuada. A biópsia hepática de um doente permitiu verificar a alteração da
síntese do glicogénio (15).
Há ainda muito trabalho a desenvolver para se apurarem com certeza as causas
das alterações hepáticas dos galactosémicos.
Júlio César Rocha 28
Galactosemia Clássica
3.4.4. RIM
Provavelmente não é neste órgão que as maiores complicações da GC se fazem
sentir. Todavia, a galactose-1-P e o galactitol têm sido detectados no rim de doentes
com esta doença hereditária do metabolismo. A aminoaciduria característica dos
indivíduos com défice de GALT não é observada nos que apresentam deficiência da
galactocínase e que excretam grandes quantidades de galactitol. Esta aminoaciduria
pode ser induzida pela administração de galactose intravenosa.
Estudos experimentais permitem verificar que, sempre que as dietas são muito
ricas em galactose, ocorre acumulação de galactitol a nível renal com aminoaciduria e
aumento da excreção de albumina e N-acetilglicosaminidase. Admite-se que as
grandes quantidades de galactose, provenientes da dieta, possam alterar o modo de
acumulação dos aminoácidos nas células tubulares renais(15).
Diversos estudos experimentais permitem constatar que a galactose e o
galactitol são metabolitos amplamente excretados pelo rim e que as suas
concentrações são superiores às observadas no fígado e no cérebro (51).
3.4.5. ESQUELETO
O atraso de crescimento é frequentemente observado em indivíduos com GC e
constitui uma das grandes complicações da doença (12). A importância que o cálcio
desempenha no crescimento ósseo encontra-se bem documentada. Admite-se que a
GC possa conduzir a osteoporose pelo hipogonadismo associado como pela baixa
ingestão de cálcio (52). Por isso se sugere a suplementação com cálcio desde que se
evite a hipercalciúria através da avaliação bioquímica sistemática destes doentes(53).
3.4.6. GÓNADAS
A atrofia ovárica com evidências clínicas e bioquímicas de disfunção parece
constituir outra grande manifestação da toxicidade da galactose. Embora as bases da
Júlio César Rocha 29
Galactosemia Clássica
toxicidade ainda não estejam completamente definidas, esta disfunção encontra-se
presente em grande número de mulheres (75 a 96%) com GC (15'54-55).
A alteração manifesta-se em idade jovem por elevação dos níveis da FSH e da
LH, as hormonas estimuladoras dos folículos e do corpo lúteo, respectivamente (56). A
presença ou ausência de insuficiência ovárica não se relaciona com a precocidade do
tratamento (55<56-57<58).
As principais consequências da disfunção gonadal podem traduzir-se por
alterações do desenvolvimento pubertário, amenorreia primária e secundária
menopausa precoce(54).
A observação de folículos normais em crianças recém nascidas com GC faz
supor que as alterações ováricas não tenham origem fetal (15,55). Por outro lado, a
avaliação prolongada de mulheres com GC, permite constatar que, a partir de
determinado momento, se altera o funcionamento normal do ovário e muitas das
vezes, diminui o número de folículos normais (15). Estas observações foram feitas em
mulheres cuja terapêutica era seguida correctamente, pelo que parece haver uma
toxicidade específica no ovário (15). Biópsias ováricas em mulheres com GC, permitem
mostrar diminuição do número de folículos primordiais, numerosos folículos atrésicos e
completa ausência de folículos de Graff(57).
São muitos os estudos e as tentativas para explicar os mecanismos da
toxicidade a nível ovárico. Uma das principais teorias aponta para uma deficiente
galactosilação da FSH. A FSH, sendo uma glicoproteína, contém cadeias laterais de
oligossacarídeos com resíduos de galactose e N-acetilgalactosamina. O deficiente
conteúdo de galactose nas cadeias laterais, não permite a ligação a estas, do ácido
siálico e dos sulfatos. Deste modo, o ponto isoeléctrico da glicoproteína formada é
superior ao normal, traduzindo-se por um valor de pH quase neutro. Deste modo, a
alteração do ponto isoeléctrico que vai determinar o comportamento da hormona,
Júlio César Rocha 30
Galactosemia Clássica
conduzirá a que a FSH apresente uma acção antagónica a nível dos receptores
celulares (56). Por outro lado, há estudos que apontam o galactitol como principal
causador da toxicidade uma vez que este se encontra no líquido amniótico e tem assim
tempo suficiente para exercer efeitos tóxicos no ovário fetal (54). Contudo, esta
hipótese é logo contestada pelo facto dos indivíduos com deficiência em galactocínase,
que têm valores elevados de galactitol, não manifestarem este tipo de complicações
ováricas (54). Outras opiniões marcam a génese das alterações para o momento da
migração das células germinativas primordiais (54). Se assim fosse, as alterações
deveriam atingir igualmente as espermatogónias, o que parece não acontecer(54).
A falência ovárica juntamente com as baixas ingestões de cálcio e os defeitos
da síntese do colagéneo são apontadas, por alguns autores, como causas da
osteoporose que por vezes se observa (59).
No entanto, embora a maioria das mulheres com GC seja infértil, existem
relatos de concepções bem sucedidas (55,60).
Relativamente aos homens, é menor o número de estudos realizados nesta
área (56). Todavia, a maioria dos estudos aponta para uma função gonadal normal com
níveis normais de gonadotropinas (56). O atraso do desenvolvimento pubertário é pouco
frequente, bem como a atrofia testicular(54,56).
3.4.7. SISTEMA CARDIOVASCULAR
As complicações cardiovasculares, embora existam, não são habitualmente
encontradas em doentes com GC (61). Todavia, estão descritos casos de alterações da
coagulação por envolvimento de todos os factores do complexo da protrombina (61).
Assim, a depleção destes factores pode estar na origem de algumas hemorragias (61). A
redução dos teores de fibronogénio, embora possível, é pouco usual(61).
As alterações da coagulação observadas nos doentes com deficiência de GALT
poderiam estar dependentes das complicações a nível hepático (61). Os mecanismos
Júlio César Rocha 31
Galactosemia Clássica
serão indubitavelmente complexos, uma vez que, crianças com cirrose hepática, mas
sem GC, não apresentam complicações tão profundas e com uma rapidez de
agravamento tão elevada (61).
3.5. APRESENTAÇÃO CLÍNICA
A gama de sinais clínicos, evidente no período neonatal e característica dos
recém nascidos com GC, é muito ampla. A maioria dos sintomas aparece na segunda
metade da primeira semana de vida (12,15). Toda a sintomatologia sofre um forte
agravamento a partir da ingestão do leite, pelo facto de este veicular grandes
quantidades de galactose (12,15).
Mesmo com peso ao nascer dentro da normalidade, imediatamente se assiste a
uma má evolução. A perda de peso é notória a partir da alimentação láctea. Este
constitui o sinal inicial mais comum. Poucos dias após se ter iniciado a ingestão de
leite, surgem os vómitos por vezes acompanhados de diarreia. Instala-se igualmente
um quadro de recusa alimentar, com irritabilidade. Muitos dos doentes, nas primeiras
semanas de vida revelam uma icterícia marcada. Nos casos menos severos o recém
nascido pode não apresentar sinais clínicos de atingimento hepático agudo. Todavia,
os indivíduos com GC não tratada, evoluem, invariavelmente, para cirrose hepática.
Análises histológicas, por vezes revelam infiltrados de gordura a nível hepático bem
como ligeiras alterações inflamatórias. A ascite encontra-se com alguma frequência,
mesmo em doentes com ausência de hipertensão portal ou hipoalbuminemia severa.
As cataratas, quando presentes, são detectadas, pelo oftalmologista, poucos dias após
o nascimento, tornando-se irreversíveis dentro de poucas semanas. Por vezes,
encontram-se sinais de elevação da pressão intracraniana e edema cerebral. De um
modo geral, a letargia e a hipotonia são evidentes. Quando desfavoráveis, os primeiros
Júlio César Rocha 32
Galactosemia Clássica
meses de vida, podem ser suficientes para que já se evidencie algum atraso do
desenvolvimento mental(12,15).
Quando o diagnóstico não era efectuado rapidamente, com instituição imediata
das medidas terapêuticas, a morte neonatal por sepsis, provocada por Eco//, era muito
frequente (12-15<62>.
Os casos de deficiência parcial da enzima GALT são, normalmente,
assintomáticos (12).
3.6. DIAGNÓSTICO
Porque a GC conduz à morte inexoravelmente é crucial que o aleitamento do
recém nascido seja suspenso mal surja a suspeita do diagnóstico, sendo retomado,
quando terminem todas as investigações necessárias à sua exclusão (12).
Para além de toda a sintomatologia característica, que foi apresentada
anteriormente, os dados laboratoriais serão decisivos para o diagnóstico (12).
Deste modo, para além dos indicadores de disfunção hepática, deve procurar-
se a presença de substâncias redutoras na urina, o que constitui uma das primeiras
pistas analíticas para o diagnóstico (12,15). Concomitantemente com a elevação marcada
a nível sérico, a galactose está presente na urina, desde que, da última refeição não
diste muito tempo e desde que os vómitos não tenham ocorrido de modo sistemático
(12). Esta galactosúria é marcada e não deve ser confundida com a transitória,
frequentemente observada nos recém nascidos pré-termo devida à sua imaturidade
hepática (63). Na urina, estão presentes, de igual forma, glicose e aminoácidos, como
prova de que se desenvolve um síndrome de toxicidade a nível do túbulo proximal
renal, induzido pela galactose (12). Contudo, um dos primeiros sinais de alteração da
função renal é a albuminúria, a qual pode ocorrer um a dois dias após a ingestão de
galactose, desaparecendo, depois, com a instalação da terapêutica dietética (15). Outro
Júlio César Rocha 33
Galactosemia Clássica
dado fundamental para o diagnóstico, reside no facto de que, uma vez suspensa a
ingestão de leite, a galactosúria é atenuada, enquanto níveis elevados de galactitol e
aminoácidos continuarão a ser excretados, em grandes quantidades, por mais alguns
dias (12). A acidose metabólica pode ser secundária ao distúrbio gastrointestinal, à
diminuição da ingestão ou ser o resultado da disfunção tubular renal nos mecanismos
de acidificação da urina (15).
O galactosemia) em aleitamento pode atingir valores de galactose sérica de
175 mg/dl a 275 mg/dl, para um normal inferior a 5 mg/dl (15). Por outro lado, a
galactose-1-P encontra-se aumentada nos tecidos e a nível eritrocitário (15). Nos
tecidos, no sangue e na urina, os valores de galactitol são igualmente elevados. O
galactonato urinário encontra-se também aumentado (15).
Toda a sintomatologia característica bem como todos os dados laboratoriais,
apenas sugerem o diagnóstico. Este só é estabelecido definitivamente após a avaliação
da actividade da enzima GALT (12,15). Esta terá de ser avaliada no sangue ou em
hemolisados de eritrócitos.
Embora a sintomatologia da GC apareça muito cedo, no período neonatal, a sua
evolução é rápida, e com um final fatal, se os cuidados necessários não forem
implementados atempadamente. É no seguimento desta constatação que faz sentido
falar em rastreio da doença, por forma a permitir uma maior rapidez de actuação,
mesmo antes de todos os sintomas estarem perfeitamente definidos. Desde 1964 que
se encontram disponíveis métodos para a realização do rastreio da GC (64). Apesar de
se tratar de uma doença rara, foram muitos os países a incluir o rastreio da GC nos
seus programas nacionais(64).
Ao longo dos anos, muitos métodos para a avaliação da actividade da enzima
GALT foram sendo desenvolvidos (64). Até ao presente o método de eleição foi o
sugerido por Beutler (64). Trata-se de um teste qualitativo, no qual a actividade da
Júlio César Rocha 3 4
Galactosemia Clássica
enzima GALT é avaliada, com a ajuda da fosfoglucomutase e da glicose-6-fosfatase
desidrogenase, através da visualização da fluorescência do NADP+ reduzido sob a luz
ultravioleta (64,65). Este teste permite uma imediata detecção dos doentes com GC. Tem
como limitações o facto de estar dependente da avaliação visual, bem como do calor,
da humidade e da instabilidade enzimática que pode originar resultados falsamente
positivos (64). Por outro lado, falsos negativos podem surgir na sequência de
transfusões sanguíneas nos recém nascidos (64,66). Por isso começam já a surgir
alterações ao método. É proposta uma avaliação quantitativa da enzima, através da
modificação instrumental da análise, permitindo a determinação precisa da actividade
da enzima, tendo em consideração a influência das variações de temperatura e de
humidade, a duração entre a amostragem e o teste propriamente dito, e os casos de
anemia (65).
Com a gravidade da GC cada vez mais e melhor documentada, muito tem sido
debatida a justificação do diagnóstico prenatal para esta doença hereditária do
metabolismo (67). O referido diagnóstico é possível através da avaliação da actividade
da enzima GALT em cultura de células amnióticas, por biópsia às vilosidades
coriónicas ou por doseamento do galactitol no líquido amniótico (67). Este último
permite uma detecção mais fácil, rápida e eficaz. O diagnóstico prenatal: permitirá
fornecer informações aos pais sobre os seus futuros filhos (67). Por outro lado, o
tratamento poderá ser iniciado mais cedo, embora a necessidade de restrição de
galactose na alimentação da mãe ainda permaneça motivo de debate (67).
Contudo, uma vez que, uma dieta restrita em galactose, durante a gestação,
não parece ter grande relação com a instalação e gravidade das complicações futuras
da criança, a justificação do diagnóstico precoce pela necessidade de tratamento da
mãe, parece talvez insuficiente(67).
Júlio César Rocha 35
Galactosemia Clássica
3.7. TRATAMENTO
0 tratamento do recém nascido com GC, consiste na exclusão de toda a
galactose da dieta, devendo ser iniciado imediatamente, mesmo antes de todos os
resultados dos testes de diagnóstico estarem disponíveis (12). Quando a dieta é
instituída atempadamente, a sintomatologia da fase aguda desaparece, sendo que, a
icterícia se resolverá dentro de dias, as cataratas poderão clarear e retornarão à
normalidade as funções renal e hepática. Deste modo, evita-se a evolução para cirrose
hepática (12). Há contudo, autores que referem não existir relação entre a rapidez de
instituição do tratamento e o aparecimento das complicações, ou seja, por muito cedo
que seja instituída a dieta, os problemas surgirão de igual forma (68). Talvez resida
neste aspecto a base de todo este grande dilema (11-31'68).
Quando se aborda a complicada questão do tratamento há alguns aspectos que
devem estar bem presentes. O primeiro deles, prende-se com o facto do organismo
humano, desde a vida embrionária, ser capaz de sintetizar a sua própria galactose e
por isso não depende da sua presença nos alimentos. Então, qual deveria ser a
ingestão segura de galactose diária? A resposta ainda não se encontra formulada.
Apenas se sabe que pequenas quantidades deste monossacarídeo provocam uma
subida apreciável da galactose-1-P nos eritrócitos, assumindo-se que o mesmo
acontecerá em tecidos igualmente sensíveis como o rim, fígado e cérebro. Uma dieta
restrita em galactose para um adulto, fornecerá cerca de 20 a 40mg do
monossacarídeo por dia. No entanto, sabe-se que a síntese endógena, a partir da
glicose, chega a atingir valores entre 1 e 2g por dia (12,31). Este "auto-abastecimento"
contínuo dificulta a prevenção da instalação de complicações tardias em caso de
doença! Para dificultar mais o tratamento, contrariamente ao que acontece em
algumas outras doenças hereditárias do metabolismo, não há qualquer desconforto ou
aversão durante a ingestão de alimentos ricos em galactose (12). Em resumo, podemos
Júlio César Rocha 36
Galactosemia Clássica
afirmar que a dieta evita a morte do recém nascido, embora não previna a instalação
de complicações tardias. Tal facto é comprovado pela elevada incidência destas
complicações em indivíduos que sempre cumpriram os regimes alimentares prescritos
(12,69)_
3.7.1. TRATAMENTO DIETÉTICO
As necessidades nutricionais e energéticas para recém nascidos e crianças com
GC em tratamento, são iguais às recomendadas para indivíduos normais da mesma
idade, sexo e nível de actividade física. Ainda não está esclarecido se, aportes de
energia e proteínas acima do normal, evitam o atraso de crescimento frequentemente
observado nestes doentes(70).
A elaboração de uma dieta pobre em galactose parte do princípio do perfeito
conhecimento das formas de apresentação do monossacarídeo.
O leite e os seus derivados são as fontes mais conhecidas de caseínas e lactose
(69,70) E s t a | a c t o s e / depois de desdobrada, biodisponibilizará facilmente galactose.
Como exemplo, temos o caso do iogurte que, por cada 100g, contém de 900 a
1600mg de galactose (71). As diferentes formas de caseínas contêm quantidades
variáveis de galactose. Assim, por cada 100g, as a-caseínas contêm cerca de 75mg de
galactose, as p-caseínas cerca de 52mg e as y-caseínas 48mg (69). Consequentemente,
o leite e os seus derivados são tradicionalmente eliminados de uma dieta restrita em
galactose (71). Os hidrolisados de caseína presentemente usados na produção de
fórmulas infantis também contêm galactose, cujos teores se situam entre 60 e 75mg/L
de fórmula (69). Desde há 50 anos que diversos estudos têm sido desenvolvidos no
sentido de apurar o conteúdo em galactose de diversos alimentos t69-70-71-72). Deste
modo, a galactose no seu estado livre, foi encontrada em muitos e variados alimentos
como o feijão, as lentilhas, carnes, órgãos e vísceras, diversos legumes, cereais bem
como em frutos e outros produtos hortícolas (71). A investigação dos conteúdos de
Júlio César Rocha 37
Galactosemia Clássica
galactose destes subgrupos de alimentos é importante, uma vez que os que
apresentarem teores mais elevados, terão de ser retirados da dieta.
Mas a galactose não aparece apenas na sua forma livre. Este monossacarídeo
encontra-se igualmente conjugado em diversos compostos. Uma delas é a lactose que
também é usada em diversos medicamentos, devendo como tal ser dada atenção
especial a esta fonte. Por outro lado, compostos como arabinogalactanos, galactanos,
glicolípidos, galactinol, lactobionato de cálcio apresentam, na sua constituição,
galactose. Preparados hormonais incluindo agentes contraceptivos orais contêm
igualmente galactose entre as suas listas de ingredientes. A parede celular da maioria
das plantas, nomeadamente das suas partes edíveis, têm na sua constituição
polissacarídeos com apreciáveis teores de galactose. De realçar igualmente, nessas
mesmas plantas, a presença de oligossacarídeos como rafinose, estaquiose e
verbascose que podem conter até três moléculas de D-galactose.
Galactocerebrosídeos, gangliosídeos e lactosil sulfatídeos, constituem compostos
encontrados nas partes edíveis de certas vísceras por vezes usadas na alimentação
como cérebros, rins, fígados, pâncreas e baços. Estes compostos são degradados
libertando galactose(69).
Todavia, se a galactose livre apresenta uma biodisponibilidade elevada, a
contida nas fracções ligadas estará dependente da acção das enzimas específicas para
a degradação desses compostos. As a-galactosidases encontram-se nos tecidos
humanos e serão provavelmente responsáveis pela degradação dos
galactosilcerebrosídeos humanos, bem como dos galactosilsulfatídeos e dos
gangliosídeos. Estas a-galactosidases também se encontram distribuídas na maioria,
senão em todos, os tecidos das plantas, sendo responsáveis pela digestão das ligações
a através das quais a galactose se liga nos diversos compostos, como é o caso da
rafinose (69,70). Por outro lado, as p-galactosidases são também encontradas em
Júlio César Rocha 38
Galactosemia Clássica
diversos alimentos, bem como no intestino humano (69,70). Estas enzimas digerem não
só a lactose mas também compostos com galactose ligada por ligações p-1,4(69,70). Em
estudos que tentaram avaliar o grau de importância que compostos como a rafinose e
a estaquiose, teriam na biodisponibilização de galactose, observou-se que, doentes
cujas dietas eram restritas nestes compostos, apresentavam valores de galactose-1-P
eritrocitária mais baixos (73). Estes resultados vêm confirmar a eficácia de actuação das
enzimas existentes na parte terminal do nosso intestino (73). Outra constatação prende-
se com o facto dos doentes que ingerem grandes quantidades de rafinose e
estaquiose, terem normalmente sensação de flatulência, devido à degradação destes
compostos pela flora bacteriana (73).
3.7.1.1. TRATAMENTO DIETÉTICO NO RECÉM NASCIDO
O leite humano contém cerca de 6 a 8% de lactose. O leite de vaca contém 3 a
4%, observando-se 7% na maioria das fórmulas comerciais(70).
O tratamento dietético no recém nascido consiste na administração de uma
fórmula isenta de lactose biodisponível t12-15-70'71). será então preferível o uso de uma
fórmula de soja da qual foram retiradas a estaquiose e a rafinose (12). Fórmulas com
estes compostos na sua composição podem conter até 14mg de galactose por litro (70).
A fórmula satisfaz as necessidades nutricionais do recém nascido até aos 4-6
meses, altura em que são introduzidos cereais sob a forma de papas (71). As papas sem
adição de outros constituintes, como leite, são relativamente pobres em galactose livre
(71). Os teores variam de 0.3 a 1.5mg de galactose por 100g de papa (71). Todavia, a
adição comercial de maçã ou banana, bem como de outros frutos, faz subir os valores
de galactose livre (71). Gradualmente, dos 5 aos 8 meses de idade, serão introduzidos
os frutos e vegetais (71). Alguns sumos de frutos para bebés podem conter até 2mg de
galactose por 100g (71). Os teores em água bem como outros ingredientes adicionados
Júlio César Rocha 39
Galactosemia Clássica
podem fazer variar de algum modo a concentração e o contributo em galactose (71).
Nos vegetais, os teores vão de vestigiais até mais de 50mg de galactose por 100g (71).
Posto isto, torna-se então imperioso, o conhecimento em termos de composição
nutricional, do maior número possível de alimentos disponíveis, para uma determinada
população, para que a planificação da dieta seja a mais correcta. Para o efeito, terão
de contribuir igualmente os pais, prestando a devida atenção aos rótulos de alimentos,
bem como de medicamentos. Atenção especial deverá ser dada às alterações da
composição nutricional de alimentos não tornadas públicas, bem como às fontes
ocultas de galactose como por exemplo as pastas de dentes (12,71).
3.7.1.2. TRATAMENTO DIETÉTICO NO ADULTO
Embora haja a consciência de que será impossível eliminar totalmente a
galactose da dieta, este objectivo não poderá ser retirado da nossa mente (71). Como
tal, a dieta deverá ser cumprida da mesma forma, não havendo lugar para
liberalizações com o avançar da idade (70). Tal é apoiado pelo facto dos indivíduos com
GC que se viram privados de alimentos de origem láctea durante largos anos, não
apresentarem menores índices de lactase a nível intestinal (15). Deste modo, durante
possíveis "fugas à dieta" a galactose seria biodisponibilizada de modo igualmente
eficaz. O não cumprimento da dieta, com o avançar da idade, acarretaria a acumulação
de galactose-1-P e de galactitol podendo estes fazer sentir os seus efeitos nefastos a
nível dos órgãos alvo. Isto é confirmado pelos resultados de estudos que não
evidenciam um aumento da capacidade de metabolizar a galactose com o avançar da
idade (15). Particularmente nos indivíduos do sexo feminino, a dieta nunca deverá
perder importância para reduzir as frequentes complicações a nível ovárico (70).
Para além da questão da restrição em galactose, os níveis de cálcio, nos
galactosémicos, devem ser monitorizados. Como já foi referido anteriormente, podem
ocorrer casos, nos quais a mineralização óssea não se efectue convenientemente,
Júlio César Rocha 40
Galactosemia Clássica
necessitando então, estes doentes, de suplementos de cálcio e, eventualmente, de
vitamina D (53'59<70).
3.7.1.3. TRATAMENTO DIETÉTICO DURANTE A GRAVIDEZ
Uma vez que se pressupunha que os metabolitos tóxicos resultantes da
galactose ingerida pela mãe heterozigótica se podiam acumular no feto com GC, as
mães eram aconselhadas a fazer alguma restrição em leite, derivados e outros
alimentos ricos em galactose, durante a gravidez (12). Todavia, sabe-se que, apesar do
tratamento dietético, a galactose-1-P e o galactitol se acumulam no feto e no líquido
amniótico. Por outro lado, como o próprio feto sintetiza a sua própria galactose a nível
endógeno, este não dependerá da mãe para a obtenção deste monossacarídeo tão
importante para as suas biosínteses de galactolípidos e galactoproteínas,
indispensáveis para a diferenciação celular e para o seu crescimento (12). Posto isto, o
tratamento dietético durante a gravidez deverá ser implementado, sem que isso
acarrete prejuízos para a mãe ou para o feto(12).
3.7.2. OUTROS TRATAMENTOS
Por tudo o que foi dito anteriormente, ficam bem patentes as dúvidas e
dificuldades do tratamento de um doente com GC.
Muitas sugestões têm sido feitas no sentido de encontrar novos meios para o
tratamento. É certo que alguns indivíduos possuem alguma actividade da enzima
GALT. Haveria, então, alguma possibilidade de estimular a actividade residual da
enzima nesses indivíduos? Há trabalhos onde se relata que doses farmacológicas de
ácido fólico ou progesterona, poderão aumentar essa actividade residual (11). A
concretizar-se, esta possibilidade já seria uma grande vitória, uma vez que, os
indivíduos Negros, a maioria deles portadores da mutação S135L, como têm uma
actividade enzimática da ordem dos 10%, conseguiriam metabolizar maiores
quantidades de galactose. Deste modo, conseguir-se-ia aumentar o fluxo através da
Júlio César Rocha 41
Galactosemia Clássica
via metabólica de degradação da galactose, diminuindo a acumulação de galactose-1-
P, evitando teores muito baixos de UDP-galactose, os quais constituem possíveis
mecanismos através dos quais as complicações se instalam (11).
Relativamente às vias metabólicas alternativas, estas também poderiam ser
alvo de uma intervenção. Deste modo, poder-se-ia estimular a produção de
galactonato, uma vez que este constitui um metabolito oxidável (11). Por outro lado a
diminuição da síntese de galactitol pode ser efectuada através de inibidores da enzima
aldose redutase (11). Em estudos experimentais, a prevenção da formação de galactitol
tem permitido corrigir a toxicidade deste (11).
A suplementação dos metabolitos alvo de depleção deve igualmente ser
considerada. Uma possibilidade seria a administração de altas doses de inositol para
colmatar os défices verificados em determinadas situações experimentais. Outra
medida poderia estar relacionada com o aumento do nível de UDP-galactose através
da administração de uridina (11).
Finalmente, surge a terapêutica genética como meio de substituição do gene
mutado. Esta hipótese é colocada, uma vez que, a sequência completa do DNAc e todo
o gene já são conhecidos. Faltará saber se, a substituição a nível do fígado, seria
suficiente ou, se esta teria de se generalizar a outros tecidos, principalmente o cérebro
e os ovários, por forma a impedir a perda das suas funções. Mais estudos necessitam
de ser desenvolvidos nesta área para que, da esperança, se passe à realidade ( u ) .
3.7.3. TRATAMENTO NO DÉFICE PARCIAL DA ENZIMA
Ainda não está completamente definido se, os indivíduos com défice parcial da
enzima GALT, necessitam realmente de cumprir uma dieta restrita em galactose(12).
As direcções de alguns centros de tratamento espalhados pelo mundo apoiam a
ideia de que, a todos os recém nascidos rastreados, deve ser dado um leite isento de
lactose. No final da primeira semana, é feita uma experiência através da
Júlio César Rocha 42
Galactosemia Clássica
suplementação de 2 a 3dl de um leite com lactose. Se, mesmo assim, os valores de
galactose-1-P eritrocitária se mantiverem inferiores a 2mg/dl com uma aminoaciduria
normal, a criança, poderá então regressar a uma alimentação normal(12).
Por outro lado, existem outras opiniões que se direccionam no sentido da
manutenção dos objectivos do tratamento. Deste modo, a liberdade que
eventualmente poderão ter relativamente à dieta estará de acordo com a percentagem
de actividade da enzima. Doentes com actividades da enzima GALT da ordem dos 5 a
10% comparativamente ao normal poderão tolerar pequenas quantidades de galactose
contida nas carnes musculares, nas frutas e vegetais (70).
3.7.4. AVALIAÇÃO DO TRATAMENTO
Por forma a classificar o êxito do tratamento, normalmente procede-se à
avaliação do desenvolvimento psicomotor, da função hepática e visual. A eficácia do
tratamento dietético é determinada através das concentrações de galactose-1-P
eritrocitária e galactitol urinário (70,74). De facto, a determinação da galactose-1-P, é
importante, na medida em que permite identificar, as sempre comuns, "fugas" à dieta
(15). Por outro lado, o galactitol continua muito aumentado nos doentes com GC,
mesmo nos que cumprem rigorosamente as suas dietas (15). Como tal, a correlação
entre os níveis de galactose-1-P eritrocitária e a excreção de galactitol na urina é baixa
(15). Por outro lado, verificam-se grandes variações intraindividuais que dificultam as
interpretações em grupos (74). O uso da hemoglobina galactosilada Ai como um
indicativo do controlo do tratamento dietético tem sido sugerido, embora constitua um
método menos sensível resultante de um teste indirecto (70).
Júlio César Rocha 43
Galactosemia Clássica
3.8. PROGNÓSTICO
Até à data, a intervenção nutricional parece constituir o principal meio de
tratamento destes doentes.
Muitas têm sido as questões e dúvidas colocadas no que diz respeito à eficácia
da terapêutica dietética nesta Doença Hereditária do Metabolismo. Todavia, não nos
esqueçamos que, a maioria dos estudos realizados com grupos de indivíduos com GC,
são retrospectivos. Antes de ser apontado o dedo à ineficácia do tratamento dietético,
deverão entretanto ser feitos mais estudos, mas agora, prospectivos, pois nada
garante que até aqui, os resultados negativos, que sistematicamente são encontrados,
não tenham sido devidos a uma escolha infeliz dos doentes (12).
Júlio César Rocha 44
Galactosemia Clássica
4. CONCLUSÃO
A Galactosemia Clássica é um enigma.
Inicialmente, aquando da realização dos primeiros estudos, sempre se pensou
que, com a remoção da galactose da dieta o problema ficaria resolvido. Todavia,
passadas algumas dezenas de anos, com inúmeros estudos realizados, constata-se que
a doença exige mais atenção. Trata-se de uma doença degenerativa, de afectação
sistémica, cujos meios para controlar a sua evolução ainda não se encontram
totalmente esclarecidos.
Como este, outros erros inatos do metabolismo, causam entre nós, um
sentimento de pequenez e revolta. Contudo, não vamos nós cair também no erro, não
inato, mas adquirido, de, volto a frisar, desrespeitar a doença.
Enquanto a ciência avança e as respostas a muitas das questões que deixamos
expressas no texto que elaboramos forem sendo dadas, importa lembrar com
Gitzelman,
"Whenever you consider a galactose disorder,
stop milk feeding first
and only then
seek a diagnosis!"
Júlio César Rocha 45
%
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