Julho | 2012
Artigo de opinião - A (des)educação e o novo Estatuto do Aluno
Cristiana Carvalho | Membro do secretariado da JS Maia e Coordenadora do Núcleo Maia
Centro/Leste
Terminado o ano escolar torna-se importante refletir sobre aquilo que foram as
principais alterações no ensino em Portugal. O novo Estatuto do Aluno, revela a
“solução” apresentada pelo Governo para melhorar a qualidade do ensino público no
nosso país: desresponsabilizar a escola e responsabilizar as famílias. E é dando o
exemplo de “atirar com as culpas” para o colega do lado que pretendemos formar os
nossos alunos, com estes exemplos de cidadania e estes valores de solidariedade e
entreajuda.
Na realidade, ao retirar os apoios sociais às famílias dos alunos com problemas de
indisciplina, estabelece-se implicitamente uma relação de causa e consequência entre
alunos com problemas de indisciplina e pais omissos ou de estrato socioeconómico
mais baixo, o que, por si só, é já uma assunção grave sem dados científicos concretos
que o comprovem. Contudo, importa mais referir que esta medida, entre outras, não é
mais do que uma tentativa de desresponsabilizar a escola, culpabilizando as famílias,
quando, na verdade, tanto escola como família são corresponsáveis. Se é verdade que
é função da família transmitir normas de boa conduta e princípios e valores de civismo
e cidadania, é igualmente verdade que é no espaço escolar que as crianças e
adolescentes passam a maioria do seu tempo, aprendendo muito mais do que os
conhecimentos transmitidos na sala de aula.
Tomemos como exemplo um aluno dito “problemático”, que evidencie atitudes de
desrespeito para com os seus colegas, professores e funcionários e manifeste um
evidente desinteresse pela escola e pelo seu processo de aprendizagem. Qual será a
solução proposta para ajudar o aluno em questão? Suspendê-lo, dar-lhe uns dias de
“férias forçadas”? É preciso refletir se essa será uma punição adequada, pois,
enquanto profissional docente, parece-me que não mais se fará do que dar um
“prémio” ao aluno, que assim terá liberdade de ação fora da escola. Não seria mais
produtivo, mais educativo, inclusivamente para o seu desempenho escolar, que o
aluno cumprisse a sua punição no espaço escolar, realizando tarefas escolares
prescritas por docentes? Se a proposta de lei entregue da Assembleia da República nos
fala em “prevenir situações de abandono escolar”, qual o objetivo então de ser a
própria escola a proibir os seus alunos de a frequentarem?
É um facto que são necessárias mudanças. É efetivamente imperioso reforçar a
autoridade dos professores, aumentar o nível de exigência e acabar com o facilitismo
que permite que alunos mal preparados transitem de ano, agravando ainda mais as
suas dificuldades. Mas é igualmente necessário fazê-lo com a consciência de que todas
as mudanças devem ser graduais e ser implementadas de forma a não
prejudicar os alunos, os principais destinatários do sistema educativo.
Afinal, é por eles e para eles, para garantir a sua formação académica e pessoal e o
futuro do nosso país, que existe um sistema de ensino público e universal.
Mais uma vez, e com medidas como as enunciadas neste Estatuto do Aluno e Ética
Escolar, o governo português evidencia como resolve as situações problemáticas com
que se depara, solução que o povo, sabiamente, descreve com expressões como “lavar
as mãos”, “assobiar para o lado” ou “passar a batata quente”. Esta solução, utilizada
em outros contextos da política nacional, é aqui aplicada, mais uma vez, à Educação,
pondo assim em causa não só os princípios republicanos da gratuitidade e
universalidade do ensino público, mas principalmente o futuro dos nossos alunos e,
consequentemente, o futuro do nosso país.