UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Estudando relações entre configuração espacial, artifícios de segurança
e violência urbana no bairro Manaíra, João Pessoa, Paraíba.
Lia Tavares M.
Orientadora: Profa. Dra. Edja Trigueiro
Natal/RN 2012
Lia Tavares M.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA Estudando relações entre configuração espacial, artifícios de segurança
e violência urbana no bairro Manaíra, João Pessoa, Paraíba.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo, sob a orientação da professora Dra. Edja Trigueiro.
Natal/RN 2012
Catalogação da Publicação na Fonte. UFRN / Biblioteca Setorial de
Arquitetura
Tavares, Lia. Arquitetura da (in)segurança: estudando relações entre configuração
espacial, artifícios de segurança e violência urbana no bairro Manaíra,
João Pessoa, Paraíba. / Lia Tavares Monteiro. – Natal, RN, 2012.
192 f.: il.
Orientadora: Edja Trigueiro.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Centro de Tecnologia. Departamento de Arquitetura.
1. Violência urbana – Arquitetura – Dissertação. 2. Violência – João
Pessoa/PB – Dissertação. 3. Segregação espacial – Dissertação. 4.
Insegurança – Dissertação. I. Trigueiro, Edja. II. Universidade Federal do
Rio Grande do Norte. III. Título.
RN/UF/BSE-ARQ CDU 72:323.285
Lia Tavares M.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Estudando relações entre configuração espacial, artifícios de segurança
e violência urbana no bairro Manaíra, João Pessoa, Paraíba
Aprovada em ____/_________/2012.
Natal/RN
__________________________________________________
Prof. Dra. Edja Bezerra Faria Trigueiro (orientadora) – UFRN
__________________________________________________
Prof. Dra. Gleice de Azambuja Elali - UFRN
__________________________________________________
Prof. Dra. Circe Gama Monteiro - UFPE
__________________________________________________
Prof. Dr. Lucas Figueiredo Medeiros - UFPB
Ofereço aos meus avós,
Luiz Tavares Junior e Silene Barrocas Tavares.
AGRADECIMENTOS
Este trabalho surgiu a partir de reflexões e inquietudes a
respeito da qualidade arquitetônica e urbana que está sendo produzida
nas cidades brasileiras, decorrentes principalmente do medo, da (in)segurança.
Para sua concretude, contei com o apoio de pessoas e instituições
que foram essenciais neste caminho que foi trilhado.
Venho agradecer...
À Minha Família;
Às Minhas Orientadoras:
Edja Trigueiro e Gleice Elali;
Aos Meus Educadores:
Edja Trigueiro, Gleice Elali, Françoise Dominique,
Edna Pinto, Nelci Tinem, Virgínia Dantas,
Angelina Costa, Lucas Figueiredo, José Pinheiro, Frederico Holanda;
Aos Professores que contribuíram para
a qualidade deste trabalho:
Circe Monteiro e Lucas Figueiredo;
Aos funcionários e colaboradores do PPGAU-UFRN;
À Secretaria de Segurança Pública da Paraíba:
Especialmente à Major Valtânia F. da Silva e
ao Secretário de Segurança, Dr. Gustavo Ferraz Gominho;
Aos funcionários da 10° Delegacia Distrital de João Pessoa;
Aos amigos que conquistei nesse caminho:
Kelly Cabral, Alysson, Fernanda Linard, Juliana Sá,
Carol Costa, Rodrigo Nascimento, Eugênio Medeiros,
Luci Donega, Eudes Raony, Ana Paula Gurgel,
Josimar Corcino, Lia Mamede, Fúlvio Teixeira,
Marieta Tavares, Matheus Peixoto,
Christiane Rolim, Cecília Nicodemos;
Aos familiares que me acolheram:
Grace Barrocas, Lara, Michele e Dudu Esmeraldo e
A todos que contribuíram direta ou indiretamente para esta conquista.
Muito Obrigada!
RESUMO
João Pessoa, apesar de ser considerada uma capital tranquila, no litoral do nordeste
brasileiro, assim como acontece nas grandes metrópoles, o medo, a violência e a
segregação acompanham o crescimento dessa cidade. A nova situação vem evidenciando
as desigualdades sociais, com a criação de espaços restritos, que segregam e provocam o
enclausuramento dos habitantes, acarretando a morte dos espaços públicos, restando-nos a
herança de espaços sem vida e, portanto, perigosos que se pode definir como “desurbanos”.
O estudo apresentado investiga aspectos físicos ambientais e sua relação com dois tipos de
crime: roubo a pessoas e furto a imóveis, registrados em 2008 e 2009 pela Secretaria de
Segurança Pública da Paraíba, no Manaíra, bairro de classe média alta de João Pessoa,
também considerado um dos mais violentos da cidade. Buscou-se compreender nexos
entre essas ocorrências e aspectos morfo-sociais do ambiente construído, sendo
examinadas propriedades espaciais, tais como acessibilidade da malha urbana, a presença
de medidas de controle e segurança dos edifícios e seus usos. Propriedades espaciais
foram, também, validadas mediante a observação de fluxos de pedestres em pontos
estratégicos da área objeto de estudo. Concluiu-se que, enquanto a presença de fluxos mais
intensos contribui para atrair potenciais “meliantes”, medidas físicas de controle e segurança
pouco oferecem em termos de proteção.
PALAVRAS-CHAVE
medo. insegurança. segregação. violência urbana.
ABSTRACT
João Pessoa, the capital city of the state of Paraíba (Northeast Brazil), is reputed throughout
the country as a quiet place, although it has been acquiring, over the past years, an urban
character with social implications similar to those of major metropolitan Brazilian areas. The
new situation is evident by the social inequalities, with the creation of confined spaces, which
segregate and cause enclosure of the inhabitants, leading to death the public space. This
study correlates accessibility in spatial structure with two types of crime data, burglary and
robbery, recorded in 2008 and 2009, by the Secretaria de Segurança da Paraíba (The
government agency public in charge of safety), in the district of Manaíra, an upper middle
class neighborhood, which has, in recent times, been considered one of the most violent
areas in João Pessoa. Sought to understand connections between these events and
morpho-social aspects of the built environment, where examined the spatial properties, such
as accessibility of the urban net, the presence of control measures, the safety of buildings
and their uses. Spatial properties were also validated by the observation of pedestrian flows
at strategic points of the study area. It was concluded that the presence of intense flows
helps to attract potential thieves, physical security and control offers little protection.
KEY-WORDS
fear, insecurity, segregation, urban violence.
LISTA DE SIGLAS
ArqViol - Arquitetura da Violência
BNH - Banco Nacional de Habitação
BO - Boletim de Ocorrência
CEF - Caixa Econômica Federal
CIOP - Centro Integrado de Operações Policiais
CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CPTED - Crime Prevention Through Environmental Design
CURA - Comunidades Urbanas de Recuperação Acelerada
DAC - Design Against Crime
EUA - Estados Unidos da América
FAPERJ - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro
GREM - Grupo de Pesquisa em Antropologia e Sociologia da Emoção
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPTU - Imposto Predial e Territorial Urbano
LATTICE - Laboratório de Tecnologias de Investigação da Cidade
PMJP - Prefeitura Municipal de João Pessoa
Rn - Radius global
R3 - Radius local
SARA - Scanning, Analysis, Response and Assessment
SBPE - Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo
SEPLAN - Secretaria Estadual de Planejamento
SFH - Sistema Financeiro de Habitação
SIG - Sistema de Informação Geográfica
STTRANS - Superintendência de Transportes e Trânsito
UFPE - Universidade Federal de Pernambuco
ZT - Zona Turística
ZR - Zona Residencial
ZA - Zona Axial
LISTA DE FIGURAS
CAPÍTULO 1
Figura 1.1 - Relações sociais responsáveis pela desestruturação da urbe. 24
Figura 1.2 - Capa de abertura do DVD ArqViol do grupo Arquitetura da Violência – UFF. 32
Figura 1.3, 1.4, 1.5, 1.6 - Imagens DVD ArqViol - Arquitetura da Violência, UFF, 2008. 33
Figura 1.7, 1.8, 1.9, 1.10 - Imagens DVD ArqViol - Arquitetura da Violência, UFF, 2008. 33
Figura 1.11 - Cabrini High-Rises, 1959. 34
Figura 1.12 - Stateway Gardens, 1959, Chicago, prédios de habitação popular. 34
Figura 1.13 - Pruitt-Igoe, construído em 1960, St. Louis 36
Figura 1.14 - Pruitt-Igoe, demolição em 1972. 36
Figura 1.15 - Tipos de habitações familiares. 37
Figura 1.16 - Tipos de habitações familiares no Brasil. 39
Figura 1.17 - Organograma das abordagens do crime. 41
Figura 1.18 - Cartilhas de Segurança, desenvolvidas pela polícia militar e financiadas pelo CREA-PR. 48
Figura 1.19 - Análise Sintática Espacial da rede viária, de um bairro em Londres, x roubo residencial 54
Figura 1.20 - Análise Sintática Espacial da rede viária, de um bairro em Londres, x roubo a pessoa 54
Figura 1.21 - MUGGING : Ocorrências de roubos por dia da semana 56
Figura 1.22 - THEFT: Ocorrências de furtos por dia da semana 56
Figura 1.23 – Profundidade x crime. FONTE: MONTEIRO E IANNICELLI, 2009. 56
Figura 1.24 - Hot-spots de roubos de automóveis em Los Angeles 57
Figura 1.25 - Padrões de atividade criminosa. 57
CAPÍTULO 2
Figura 2.1 - Mapa intitulado Afbeelding Der Stadt En Fortressen Van Parayba. 59
Figura 2.2 - À esquerda, mapa de João Pessoa Imagens do Brasil Colonial, Frederica Civitas 1640 à 1647. 60
Figura 2.3 - A direita, planta da cidade da Parahyba por volta de 1640. 60
Figura 2.4 - Planta da cidade da Parahyba, em 1855. 62
Figura 2.5 - Linha férrea Cruz do Peixe, 1924, futura Avenida Epitácio Pessoa. 63
Figura 2.6 - Avenida Epitácio Pessoa de encontro com o mar, 1950 63
Figura 2.7 - Planta geral da cidade de João Pessoa em 1953. 64
Figura 2.8 - Mapa da ocupação urbana de João Pessoa. 66
Figura 2.9 - Mapa de João Pessoa, destaque da orla marítima. 67
Figura 2.10 - Anúncio Loteamento no Manaíra, 1957 69
Figura 2.11 - Anúncio Loteamento Jardim Panamérica, Tambaú, 1958 69
Figura 2.12 - Anúncio Edifício de Apartamentos Manaíra, 1960 69
Figura 2.13, 2.14 e 2.15 – Residências unifamiliares do bairro, período de construção de 1970 a 1980. 70
Figura 2.16 - Mapa do Zoneamento e Uso Ocupacional de João Pessoa 71
Figura 2.17, 2.18 e 2.19 - Residências unifamiliares, 2010, muros altos e artifícios de segurança. 72
Figura 2.20 - Shopping Manaíra 72
Figura 2.21 - Mapa de localização 72
Figura 2.22 - Mag Shopping 73
Figura 2.23 - Mapa de localização 73
Figura 2.24 - Praça Desembargador Silvio Porto. Fonte: arquivo pessoal, 2010. 74
Figura 2.25 - Praça Alcides Carneiro. Fonte: PMJP, 2010. 74
Figura 2.27 - Praça Chateaubriant de Souza Arnaud. Fonte: arquivo pessoal, 2010. 74
Figura 2.28 - Quadra do Manaíra. Fonte: arquivo pessoal, 2010. 74
Figura 2.26 - Mapa de Localização das praças 74
Figura 2.29, 2.30, 2.31, 2.32, 2.33, 2.34 - Paisagens do bairro Manaíra, 2010. 77
CAPÍTULO 3
Figura 3.1 - Esquema do CIOP 81
Figura 3.2 – Exemplo de planilha de ocorrências criminais nos bairros de João Pessoa, 2008. 82
Figura 3.3 - Exemplo de registro de ocorrências no bairro Manaíra, 2008. 82
Figura 3.4 - Exemplo, continuação 83
Figura 3.5 - O bairro Manaíra e seu entorno. 87
Figura 3.6 - Vista das principais vias do bairro Manaíra. 88
Figura 3.7 - Mapa de tipologia residencial. 90
Figura 3.8 - Mapa de uso do solo. 91
Figura 3.9 - Mapa de classificação e codificação dos usos do solo. 93
Figura 3.10 - Tipologia mural dos lotes do bairro Manaíra. 97
Figura 3.11 - Tipos de nível de segurança por lote, no bairro Manaíra. 100
Figura 3.12 – Representação cartográfica, com definição linear, destaque Manaíra, João Pessoa. 102
Figura 3.13 - Representação linear, destaque Manaíra, João Pessoa. 102
Figura 3.14 - Três representações axiais de uma mesma curva 103
Figura 3.15 – Representação linear no mapa axial - integração global 105
Figura 3.16 - Representação linear do mapa de continuidade - integração global 105
Figura 3.17 - Mapa axial, integração global 106
Figura 3.18 - Mapa de continuidade, integração global 106
CAPÍTULO 4
Figura 4.1 - Pedaço da Malha Axial de João Pessoa 109
Figura 4.2 - Mapas de continuidade - integração global, de João Pessoa. 111
Figura 4.3- Mapas de continuidade integração local, de João Pessoa. 113
CAPÍTULO 5
Figura 5.1 - Manchete do Jornal O NORTE 117
Figura 5.2 - Mapa de Ocorrências criminais nos bairros de João Pessoa e a Média do rendimento nominal
mensal das pessoas responsáveis por domicílios particulares permanentes. 124
Figura 5.3 - Mapa de Ocorrências criminais nos bairros de João Pessoa e a Média do rendimento nominal
mensal das pessoas responsáveis por domicílios particulares permanentes. 125
CAPÍTULO 6
Figura 6.1 – Pontos de observação no bairro Manaíra. 139
Figura 6.2 - Pontos de Roubo e Mapa de Continuidade (Integração Local) 2008. 141
Figura 6.3 - Mapa de Continuidade (Integração Local) x roubo 2009. 143
Figura 6.4 Mapa de Continuidade (Integração Local) x furto 2008 150
Figura 6.5 - Mapa de Continuidade (Integração Local) x furto 2009 152
CAPÍTULO 7
Figura 7.1 - Mapa de Kernell: crimes roubo e furto, 2008 e 2009. 160
Figura 7.2 - Mapa de Kernell: roubo, 2008 e 2009. 160
Figura 7.3 - Mapa de Kernell: furto, 2008 e 2009. 160
Figura 7.4 - Mapa de Kernell: roubo 2008 161
Figura 7.5 - Mapa de Kernell: roubo 2009 161
Figura 7.6 - Mapa de Kernell: Furto 2008 162
Figura 7.7 - Mapa de Kernell: Furto 2009 162
Figura 7.8 - Ocorrências Criminais, 2008 e 2009. 163
Figura 7.9 - Principais atratores de crime: grandes empreendimentos comerciais 163
Figura 7.10 - Outros atratores de crime: praças. 163
Figura 7.11 - Outros atratores de crime: zona turística 163
Figura 7.12 – Destaque: lugares com pouca ocorrência 164
Figura 7.13 – Destaque: lugares com pouca ocorrência: Praça Chateaubriant Souza Arnaud 164
Figura 7.14 – Destaque: lugares com pouca ocorrência: Praça Gilvandro Carreira de Almeida 164
Figura 7.15 – Destaque: lugares com pouca ocorrência, Av. Sapé, próximo a Praça Alcides Carneiro. 164
Figura 7.16 – Mapa: roubo e uso do solo, 2008 165
Figura 7.17 – Destaque: proximidade de colégios 2008 165
Figura 7.18 - Mapa: roubo x ocupação do solo 2009 165
Figura 7.19 – Destaque: roubos, 2009 165
Figura 7.20 - Mapa: roubo a pessoa x ocupação do solo 166
Figura 7.21 - Mapa: roubo a pessoa x altura do muro, 2008. 166
Figura 7.22 - Mapa: roubo a pessoa x proteção mural 166
Figura 7.23 - Mapa Axial x ônibus x roubo a pessoa 166
Figura 7.24 – Roubo a pessoa x ocupação do solo 2009. 167
Figura 7.25 – Roubo a pessoa x altura do muro 2009. 167
Figura 7.26 – Roubo a pessoa x proteção mural 2009. 167
Figura 7.27 - Mapa de axial x ônibus x roubo a pessoa 2009. 167
Figura 7.28 - Mapa: furto x ocupação do solo 2008. 168
Figura 7.29 – Destaque: furtos 2008. 168
Figura 7.30 - Furto 2009 x ocupação do solo 168
Figura 7.31 e 7.32 – Destaque: furtos 168
Figura 7.33 – Furto a imóvel 2008 x uso e ocupação do solo 169
Figura 7.34 – Furto estabelecimento x muro, 2008. 169
Figura 7.35 – Furto estabelecimento x proteção, 2008. 169
Figura 7.36 - Furto imóveis x mapa axial x parada de ônibus 169
Figura 7.37 – Furto a imóvel 2009 x uso e ocupação do solo 170
Figura 7.38 – Furto a imóvel x altura muro 170
Figura 7.39 – Furto a imóvel x proteção mural 170
Figura 7.40 – Furto a imóvel x mapa axial x parada de ônibus 170
Figura 7.41 - Roubo a pessoa x altura do muro. 171
Figura 7.42 e 7.43 - Ruas do bairro Manaíra, 2010. 172
Figura 7.44 - Roubo a pessoa x Nível de Proteção Mural 173
Figura 7.45 - Furto a imóvel x Altura do muro. 174
Figura 7.46 e 7.47- Ruas do bairro Manaíra, 2010. 175
Figura 7.48 – Furto em Estabelecimento x Nível de Proteção Mural. 176
LISTA DE GRÁFICOS
CAPÍTULO 3
Gráfico 3.1 - Porcentagem dos tipos murais em Manaíra 98
Gráfico 3.2 - Altura dos Tipos Murais, Manaíra. 98
Gráfico 3.3 - Nível de segurança pelo tipo mural 100
Gráfico 3.4 - Porcentagem do nível de segurança 100
CAPÍTULO 4
Gráfico 4.1 - Relação entre integração global e local, variável de João Pessoa e do entorno do bairro. 115
Gráfico 4.2 - Relação entre integração global e local, variável somente do bairro Manaíra. 115
CAPÍTULO 5
Gráfico 5.1 - Condutas Criminais em João Pessoa, 2008 e 2009. 120
Gráfico 5.2 - Comportamento da criminalidade nos bairros de João Pessoa, 2008 e 2009. 121
Gráfico 5.3 - Ocorrências Criminais nos 4 bairros mais violentos de João Pessoa, 2008 e 2009. 121
Gráfico 5.4 - Incidências criminais no bairro Manaíra, 2008 e 2009. 122
Gráfico 5.5 - Crimes no bairro Manaíra, 2008 e 2009, respectivamente. 123
Gráfico 5.6 - Principais crimes de furto e roubo no bairro Manaíra, 2008 e 2009. 123
Gráfico 5.7 - Ocorrência Anual de Criminalidade, Manaíra: Roubo 2008 126
Gráfico 5.10 - Tipos de ocorrências mais freqüentes de roubo em 2008. 127
Gráfico 5.8 - Categorias de roubo 2008 127
Gráfico 5.9 - Horário: Roubo 2008 127
Gráfico 5.11 - Ocorrência Anual da Criminalidade: Roubo 2009 128
Gráfico 5.12 - Categorias de roubo 2009 128
Gráfico 5.13 - Horário: Roubo 2009 128
Gráfico 5.14 - Tipos de ocorrências mais freqüentes de roubo em 2009. 129
Gráfico 5.15 - Ocorrência Anual da Criminalidade: Furto 2008 130
Gráfico 5.18 - Tipos de ocorrências mais freqüentes de furto em 2008. 131
Gráfico 5.16 - Categorias de furto 2008 131
Gráfico 5.17 - Horário: Furto 2008 131
Gráfico 5.19 - Ocorrência Anual da Criminalidade: Furto 2008 132
Gráfico 5.20 - Categorias de furto 2009 132
Gráfico 5.21 - Horário: Furto 2009 132
Gráfico 5.22 - Tipos de ocorrências mais freqüentes de furto em 2009. 133
CAPÍTULO 6
Gráfico 6.1 - Valores de integração x Quantidade de Roubo. 136
Gráfico 6.2 - Valores de integração x Quantidade de Furto. 137
Gráfico 6.3 - Quantidade de Pedestres no final de semana, dia 20/11/2011. 139
Gráfico 6.4 - Quantidade de Pedestres na semana, dia 21/11/2011 140
Gráfico 6.5 - Integração Local x Ocorrências de roubo, 2008 142
Gráfico 6.6, 6.7 e 6.8 - Combinações de Roubo, 2008 142
Gráfico 6.9 - Integração Local x Ocorrências de roubo, 2009. 144
Gráfico 6.10, 6.11 e 6.12 - Combinações de Roubo 2009. 144
Gráfico 6.13 - Gráfico de barras – Integração Local(R3) 146
Gráfico 6.14 - Gráfico de barras - Roubo 2009 146
Gráfico 6.15 - Quant. de roubos nos eixos, 2008. 146
Gráfico 6.16 - Quant. de roubos nos eixos, 2009. 146
Gráfico 6.17 - Comprimento Total dos Níveis de Acessibilidade. 147
Gráfico 6.18 - Comprimento do nível de acessibilidade pela quantidade de roubo, em 2008 e 2009. 147
Gráfico 6.19 - Comprimento do nível de acessibilidade pela tipo de roubo específico, em 2008 e 2009. 148
Gráfico 6.20 - Acessibilidade, Turno e Roubo a pessoa, em 2008. 148
Gráfico 6.21 - Acessibilidade, Turno e o Roubo a pessoa, em 2009. 149
Gráfico 6.22, 6.23 e 6.24 - Combinações de Furto2008 151
Gráfico 6.25 - Integração Local x Ocorrências de furto, 2008 151
Gráfico 6.26, 6.27 e 6.28 - Combinações de Furto2009 153
Gráfico 6.29 - Integração Local x Ocorrências de furto, 2009 153
Gráfico 6.30 - Gráfico de barras – Integração Local(R3) 154
Gráfico 6.31 - Índice de Integração local x Furto 2009. 154
Gráfico 6.32 - Quant. de furtos nos eixos, 2008. 154
Gráfico 6.33 - Quant. de furtos nos eixos, 2009. 154
Gráfico 6.34 - Comprimento do nível de acessibilidade dividido pela quantidade de furto, em 2008 e 2009. 155
Gráfico 6.35 - Comprimento do nível de acessibilidade pela tipo de furto específico, em 2008 e 2009. 156
Gráfico 6.36 - Acessibilidade, Turno e Furto em estabelecimento, em 2008. 156
Gráfico 6.37 - Acessibilidade, Turno e Furto em estabelecimento, em 2009. 157
CAPÍTULO 7
Gráfico 7.1 - Roubo x Caixa Mural 172
Gráfico 7.2 - Muro Total X Percentual de Roubo 172
Gráfico 7.3 - Roubo x Nível de Segurança 174
Gráfico 7.4 - Nível de segurança total e Roubo 174
Gráfico 7.5 - Muro total x Percentual de Furto 175
Gráfico 7.6 - Furto x Tipo de Muro 175
Gráfico 7.7 - Nível de segurança total e Furto 2008 176
Gráfico 7.8 - Furto 2008 x Nível de segurança 176
LISTA DE QUADROS
CAPÍTULO 3
Quadro 3.1 - Uso e Ocupação do Solo 89
Quadro 3.2 - Classificação e codificação dos usos do solo, Código de Urbanismo PMJP 92
Quadro 3.3 - Níveis de dificuldade, artifícios de proteção utilizados em um invólucro mural 99
CAPÍTULO 7
Quadro 7.1 - Pontos Quentes e Frios do crime da relação com uso, barreira e proteção. 177
Quadro 7.2 - Pontos Quentes e Frio do crime da relação com a acessibilidade. 178
LISTA DE TABELAS
CAPÍTULO 2
Tabela 2.1 - Densidade Demográfica Urbana de João Pessoa. 63
CAPÍTULO 3
Tabela 3.1 - Relação entre Categoria e Correlação 107
CAPÍTULO 4
Tabela 4.1 - Resultados Gerais da Conectividade, com relação à cidade, ao entorno e ao bairro. 114
Tabela 4.2 - Resultados gerais de integração global e local, com relação à cidade e ao entorno. 115
CAPÍTULO 5
Tabela 5.1 - Ocorrências criminais registradas, em João Pessoa, Paraíba. 119
Tabela 5.2 - Ocorrências criminais registradas 119
CAPÍTULO 6
Tabela 6.1 - Resultados gerais de integração global e local, com relação ao bairro. 136
Sumário
Introdução 19
1. PISTAS URBANAS: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E METODOLÓGICA 23
1.1 O MEDO 25 1.2 A VIOLÊNCIA URBANA 28 1.3 A SEGREGAÇÃO ESPACIAL 30 1.4 ESTUDOS URBANOS DO CRIME - REVISÃO DA LITERATURA 34 1.5 ESTUDOS MORFOLÓGICOS E O CRIME - REFERENCIAL METODOLÓGICO 50
1.5.1 O MOVIMENTO NATURAL 51
1.5.2 A SINTAXE DO ESPAÇO E O CRIME 53
2. CONTEXTUALIZANDO: O ESPAÇO OBJETO DE ESTUDO 58
2.1 UM POUCO DE HISTÓRIA 59 2.2 MANAÍRA, ENQUANTO ESPAÇO URBANO 67 2.3 MANAÍRA: O “VALE DO MEDO”, “O AMBIENTE HOSTIL” 75
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DE INVESTIGAÇÃO 78
3.1 ANÁLISE SOBRE CRIME 80 3.1.1 LEVANTAMENTO E COLETA DE DADOS 81
3.1.2 GEORREFERENCIANDO A CRIMINALIDADE 83
3.2 ANÁLISE SOBRE ESPAÇO 86 3.2.1 LEVANTAMENTO FÍSICO-ESPACIAL DO BAIRRO 87
3.2.2 ANÁLISE SINTÁTICA DO ESPAÇO 101
3.2.2.1 MAPA AXIAL OU MAPA DE CONTINUIDADE? 103
4. PADRÕES SINTÁTICOS E MORFOLÓGICOS DO OBJETO DE ESTUDO 108
4.1 CIDADE GLOBAL OU CIDADE LOCAL? 111
5. PADRÕES ESPACIAIS DE OCORRÊNCIAS CRIMINAIS 117
5.1 O QUE OS DADOS OFICIAIS TÊM A DIZER? 118
5.2 ROUBO 126
5.3 FURTO 130
6. SOBRE OCORRÊNCIAS, ACESSIBILIDADE E MOVIMENTO 134
6.1 ROUBO 141
6.2 FURTO 150
7. SOBRE OCORRÊNCIAS, USO, OCUPAÇÃO E BARREIRAS FÍSICAS 158
7.1 PONTOS QUENTES E FRIOS DO CRIME 159
7.2 CRIME VERSUS USO E OCUPAÇÃO DO SOLO 163
7.2.1 LUGARES DE DESTAQUE DO CRIME 163
7.2.2 LUGARES DE DESTAQUE SEM CRIME 164
7.3 ROUBO VERSUS USO 165
7.4 FURTO VERSUS USO 168
7.5 CRIME VERSUS TIPOLOGIA DE BARREIRAS FISICAS 171
7.5.1 ROUBO A PESSOA 171
7.5.2 FURTO A IMÓVEL 174
7.6 SÍNTESE DOS PONTOS QUENTES E FRIOS DO CRIME 177
Considerações Finais A Insegurança da Segurança 178
Referências Bibliográficas 185
Introdução
Esse estudo parte do interesse em identificar se as características urbanas e
arquitetônicas teriam alguma repercussão na incidência de roubo e furto, enquanto eventos
facilitadores ou inibidores de insegurança urbana no bairro Manaíra, na capital paraibana.
Baseado nesse questionamento o trabalho, Arquitetura da (in)segurança - estudando
relações entre configuração espacial, artifícios de segurança e violência urbana no
bairro Manaíra, João Pessoa, Paraíba, investigou relações entre: tipologias de uso,
propriedades morfológicas do espaço e segurança privada, nesse bairro.
O trabalho desenvolvido partiu da premissa de que o espaço urbano não é neutro,
mas atua como elemento passivo ou ativo para as ocorrências criminais. Enquanto elemento
passivo existem atos criminosos que independem das características do lugar, estando mais
relacionados com as circunstâncias do delinquente e de questões sociais, que o trabalho
não abordará; já na segunda proposição, onde o local é um elemento ativo, percebe-se que
as propriedades do espaço urbano: tipologias de uso, propriedades morfológicas e
segurança privada, interferem na ocorrência ou não da violência urbana, intra e extramuros.
Partindo deste indício, descobriu-se que alguns estudiosos e pesquisadores têm
voltado suas pesquisas para análises da arquitetura urbana e suas relações com o crime,
alguns desses estudos proporcionaram elaborar um quadro teórico e metodológico para
fundamentar o estudo em questão.
O trabalho teve como objetivo principal investigar e compreender como se dão as
relações entre os padrões espaciais e a violência urbana no Manaíra, identificando através
das linhas de acessibilidade, dos campos de visibilidade e do tipo de uso do solo como se
comporta o crime. Além de pesquisar uma bibliografia que servisse de embasamento teórico
e metodológico, identificou-se junto ao órgão de Segurança Pública da Paraíba como a
criminalidade do bairro Manaíra se comporta com relação à cidade de João Pessoa e
especificamente dentro de seus limites; foram registradas em uma base SIG (Sistema de
Informação Geográfica) as características de uso e ocupação do solo, tipologia mural e
barreiras de proteção do bairro Manaíra, para, com isso, correlacionar as propriedades
espaciais desse bairro com as ocorrências criminais ali documentadas.
A pesquisa bibliográfica correspondeu à primeira etapa do trabalho e visou obter
fontes necessárias à execução de um referencial teórico que possibilitasse a compreensão
sobre o tema da pesquisa. A bibliografia consultada voltou-se para a análise da violência
urbana e seus traços básicos, o medo, a segregação e a violência. Buscou-se, também,
recursos analíticos utilizados por pesquisadores no estudo de relações entre forma e usos
de espaço e, em particular, entre ocorrência de comportamento anti-social e desenho
urbano.
Na pesquisa de natureza documental, foram utilizadas informações provenientes da
base de dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e de trabalhos
acadêmicos que esclarecessem informações relativas à evolução urbana, ao tipo de
edificações e ao crescimento da população de João Pessoa. Com relação especificamente à
criminalidade, foram obtidos dados registrados pelo CIOP (Centro Integrado de Operações
Policiais) das ocorrências criminais, nos anos 2008 e 2009, através da Secretaria de
Segurança Pública da Paraíba.
Na pesquisa de campo realizaram-se levantamentos nas ruas, com observação e
registro in loco sobre as edificações do bairro, identificando-se principalmente o tipo de uso,
e as barreiras físicas existentes nos pontos onde se deram os crimes.
Para o estudo da configuração espacial urbana foram empregados mapas axiais e
de continuidade, de João Pessoa, mais especificamente do bairro Manaíra (conforme
explicitados no capítulo 3), tendo como intuito analisar a acessibilidade através das linhas de
movimento, com base nos fundamentos da teoria da sintaxe espacial. Tais mapas foram
trabalhados juntamente com os mapas temáticos de uso e ocupação do solo e de barreiras,
tendo como intuito identificar se a acessibilidade das vias públicas e a presença, ou não de
visibilidade, influencia o comportamento antissocial delinquente. O crime foi correlacionando
entre as variáveis de integração, à tipologia edificada e à forma de proteção.
No intuito de fornecer referências sobre o local do estudo buscou-se compor um
pequeno histórico acerca do desenvolvimento de João Pessoa, para melhor situar o bairro
Manaíra em seu contexto, evidenciando-se elementos que configuram a estrutura espacial
do bairro. Em sequência, identificou-se as ocorrências criminais mais freqüentes do objeto
do nosso estudo por julgar que estas, por serem mais constantes, teriam peso maior no
sentimento de insegurança pública vivido pela população do bairro, além de se poder
associar tais ocorrências aos aspectos físicos do ambiente construído. Assim o roubo a
20
pessoas e furto a imóveis se tornaram o foco de estudo. Os dados obtidos foram
organizados e tratados estatisticamente em: tabelas, gráficos e mapas, que evidenciam
episódios de correlação entre violência, uso e movimento, em áreas do bairro nas quais
predominam determinados aspectos físico-ambientais.
O trabalho foi desenvolvido na seguinte ordem: o primeiro capítulo exporá a
realidade sociocultural do problema em questão, explicitando três circunstâncias que
provocam a desestruturação urbana com relação ao crime: o medo, a violência urbana e a
segregação social, correspondendo ao referencial teórico; nesse mesmo nível analítico
serão relatados alguns estudos urbanos de investigação realizados por pesquisadores, no
Brasil e no mundo, que dão base à revisão da literatura; no segundo capítulo apresenta-se
uma contextualização do objeto de estudo, com um pequeno histórico do espaço urbano de
João Pessoa até chegar à formação do bairro em questão, tendo como intuito compreender
o processo de estruturação espacial da cidade e do bairro; o tratamento dos dados será
descrito no terceiro capítulo, a metodologia, expondo-se como se deu a coleta dos dados e
quais os instrumentos de análise utilizados na sua avaliação; o quarto capítulo abordará os
padrões sintáticos e morfológicos do bairro, objeto de estudo; o capítulo quinto explorará
os padrões espaciais de ocorrências, na cidade e no bairro em estudo; os capítulos sexto e
sétimo correlacionarão dados entre as características morfológicas de movimento do bairro
com os padrões espaciais dos crimes analisados; e relações entre os crimes e as variáveis
investigadas de uso do solo, tipologia mural e barreiras de proteção, também, enfocou-se,
em perspectiva comparativa, algumas áreas específicas que se destacaram pela
concentração de delitos ou ausência deles.
A conclusão procurará esclarecer até que ponto as medidas arquitetônicas de
prevenção privada dos crimes de roubo e furto, adotadas pela população, repercutem
positiva ou negativamente nas relações sociais urbanas, bem como no sentimento de
segurança da população do bairro Manaíra, na cidade de João Pessoa.
A escolha desse tema deve-se ao fato das cidades brasileiras estarem passando por
mudanças de cenário, devido a sensações de medo e insegurança, que vêm ocasionando o
isolamento e o enclausuramento dos habitantes citadinos. Dentro das atuais circunstâncias
urbanas, a violência tornou-se um problema que vem se agravando e preocupando toda a
sociedade, provocando uma grande mudança, principalmente na forma do habitar, pois as
residências estão virando “verdadeiras fortalezas”, com seus muros altos, estrepes, cercas
elétricas, fosso, dentre outros artifícios, tornando-se esconderijo do homem urbano das
ameaças e dos perigos cotidianos da cidade. Tornamo-nos reféns de nós mesmos,
21
perdemos nossa liberdade devido à maneira de avaliar, enfrentar e resolver os problemas
urbanos.
Os reflexos de ineficiência política, sobretudo em relação à segurança, fizeram surgir
setores privados que pontuam soluções específicas para amenizar os problemas urbanos,
oferecendo ao comércio mercadorias que movimentam o negócio da segurança privada.
Como esse comércio só existe devido às políticas que conduzem ao aumento da violência,
os encaminhamentos adotados por ele não atingem as questões estruturais, tornam-se
apenas procedimentos pontuais que proporcionam momentaneamente a sensação de
segurança. Privilegia-se o uso de equipamentos para a área interna dos edifícios, deixando
ao espaço externo, o público, a insegurança. As edificações viram as costas para a rua,
ocasionando seu abandono e favorecendo as oportunidades sorrateiras dos delinquentes.
22
1.
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica
Os moradores do bairro Manaíra, na capital paraibana estão em estado de
medo por causa da violência [...]. Parte das casas do bairro tem cerca
elétrica e vigilância, mas as pessoas continuam sendo vítimas de assaltos
na área. Na sexta-feira passada, uma bala perdida atingiu a janela de um
apartamento. (GONÇALVES, Lidiane. CORREIO DA PARAÍBA, João Pessoa, 6 mar.
2006. Disponível em: <http://www.portalcorreio.com.br>.Acesso em 10 de Junho de 2010.)
João Pessoa, capital paraibana, é considerada uma cidade tranquila e segura,
chegando a ser requisitada como local de moradia para pessoas que fogem de cidades
maiores, violentas e poluídas. Ela tem 723.515 habitantes (IBGE, 2010), fica localizada no
litoral nordestino, conta com belas paisagens, temperatura agradável e população afável.
Todavia, atualmente, o medo e a insegurança fazem parte das preocupações de seus
habitantes, o que tem levado a população a procurar se proteger através de artifícios de
segurança, como demonstrado no recorte de jornal que inicia este capítulo.
Como em todo trabalho investigativo buscam-se pistas que orientem o desvelamento
do problema, assim, procurou-se identificar nas áreas urbanas da atualidade, mais
especificamente na arquitetura vigente, quais as consequências desse modelo arquitetônico
para a sociedade. Tendo por paradigma de análise o referencial teórico já produzido sobre o
tema, os estudos de Jacobs (1960/2009), Newman (1996), Caldeira (2003), Villaça (2001),
Bauman (2009), Foucault (1995), Ferraz (2003/2004), que abordam a vida urbana na
atualidade, temos neles revelados circunstâncias sociais que nos levam a identificar três
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 24
traços marcantes da circunstância social de insegurança urbana, elementos essenciais para
o fundamento teórico da pesquisa. O medo, a segregação espacial e a violência urbana, nos
parecem elementos básicos para se falar sobre a (in)segurança urbana, pois refletem as
relações sociais presentes, tanto nas grandes cidades quanto em pequenos aglomerados
urbanos e mesmo em pequenos povoados rurais. Identificados como responsáveis pela
desestruturação da urbe, esses fatores interagem entre si, num círculo vicioso presente nas
relações citadinas, repercutindo na interação social das cidades e que se configuram
esquematicamente na figura 1.1.
Figura 1.1 - Relações sociais responsáveis pela desestruturação da urbe.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Assim, para maior esclarecimento pareceu conveniente buscar definições e ideias
sobre tais conceitos. Outro aspecto importante é o modo como as edificações deram as
costas às ruas, com seus muros altos, afastando-se das relações sociais, do sentimento de
co-presença, advindas do ambiente urbano, ocasionando a perda da vida coletiva; alguns
estudos identificam que isso salientou a violência urbana e a sensação de insegurança, não
só fora, mas dentro dos lares.
Partindo desses questionamentos desenvolveu-se uma revisão da literatura que
utiliza métodos de análise do espaço com crime, dentre eles tem-se Hillier (2007, 2008),
Bondaruk (2007), os grupos ArqViol, LATTICE; também situou-se a existência de guias de
orientação contra o crime, que após uma análise dos espaços foram elaborados por
departamentos de governo norte americano, europeu, canadense e brasileiro, temos: o
CPTED, safer places, design against crime e algumas cartilhas brasileiras.
Com o intuito de compreender melhor esse contexto, comum em muitas cidades
brasileiras e do mundo, buscou-se fundamentação em pesquisadores que têm desenvolvido
trabalhos, dando encaminhamentos para diminuir a insegurança nas cidades. Para
proporcionar maior clareza sobre estas expressões urbanas e seus significados sociais,
conduziu-se uma síntese elaborada através das análises de vários estudiosos.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 25
1.1 O Medo
Na vida urbana, o sentimento de ansiedade gerado pelo medo tornou-se uma
presença constante para muitas pessoas, mesmo sem terem passado por um trauma,
apenas por tomarem conhecimento através de relatos da vizinhança e da mídia de fatos que
ocorreram. “A imaginação aumenta imensuravelmente o tipo e a intensidade de medo no
mundo dos homens” (TUAN, 2005: 11).
Observando a evolução histórica, o medo tem sido companheiro da nossa espécie;
muitas sociedades chegam a utilizá-lo para justificar sua intenção política de dominarem
outros povos e de controle social, o que explicaria, na atualidade, a política armamentista
que ajuda a preservar e desenvolver a indústria bélica, bem como a indústria de segurança.
Essa lógica é abordada por Michael Moore nos documentários “Tiros em Columbine” e
“Fahrenheit 9/11”.
O medo não expressa somente uma mera questão de sobrevivência individual, mas
de sobrevivência da espécie como um todo, bem como de estratégia de submissão de um
povo. Bauman (2009) indica que o meio urbano oferece expectativas e sensações de
confiança e medo aos seus habitantes, pois a cidade aglomera pessoas visando proteção,
confiança, solidariedade, trabalho e, ao mesmo tempo, cria circunstâncias que geram
insegurança.
Os seres humanos temem o caos, a desordem, acontecimentos que proporcionem o
descontrole; devido a isso, passaram a almejar a perfeição física, a regularidade, uma
ordem socioestética. A cidade, então, foi construída para corrigir a aparente confusão e o
caos da natureza, porém ela se transformou em um meio ambiente físico desorientador.
“Apesar de cada rua e prédio [...] serem, sem dúvida, os produtos de planejamento e
reflexão, o resultado final pode ser um imenso labirinto desordenado” (TUAN, 2005: 234).
Nos primórdios da organização da humanidade os primeiros ajuntamentos
humanos devem ter sido formas de reação ao medo. Certamente surgiram
da idéia central de que, os homens vivendo bem próximos, poderiam
apoiar-se mutuamente e se solidarizar ante os perigos que vinham de fora
do grupo. Mas à medida que se dá um enorme salto na história, percebe-se
que aquilo que passou a existir com vistas à comunhão e à solidariedade foi
feito em um simples aglomerado humano para produção. (MORAIS,
1998:31)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 26
Evoluindo, tecnologicamente, os artifícios de proteção se adaptaram às diversas
circunstâncias sociais. Hoje o homem teme a violência, a cidade e o outro. Os novos medos
têm sofisticado os mecanismos de proteção. Nesse sentido, os temores humanos iniciais
relativos às adversidades da natureza passaram a ser preenchidos pelos temores do que a
cidade passou a oferecer. Os habitantes da cidade, que antes criavam artifícios para se
protegerem, com muralhas, dos invasores externos, hoje, enfrentam a “barbárie” vigente nas
cidades, que se alimenta das relações sociais aí existentes, onde as desigualdades sociais,
os preconceitos, o desrespeito, geram revolta.
Atualmente, muitas cidades são atormentadas por fantasmas. No cotidiano urbano,
estão presentes fantasias de perseguições, agressão e medo, que assustam os habitantes,
gerando cidadãos atormentados pelo vizinho e pela mídia, que alimenta tal ciclo vicioso com
relatos sensacionalistas e pontuais da violência.
Em Cloé, cidade grande, as pessoas que passam pelas ruas não se
reconhecem. Quando se veem, imaginam mil coisas a respeito umas das
outras, os encontros que poderiam ocorrer entre elas, as conversas, as
surpresas, as carícias, as mordidas. Mas ninguém se cumprimenta, os
olhares se cruzam por um segundo e depois se desviam, procuram outros
olhares, não se fixam. [...] Se os homens e as mulheres começassem a
viver os seus sonhos efêmeros, todos os fantasmas se tornariam reais e
começaria uma história de perseguições, de ficções de desentendimentos,
de choques, de opressões, e o carrossel das fantasias teria fim. (CALVINO,
2009:51 e 52, grifo nosso)
Este texto retrata o sentimento que surge em uma cidade, onde o outro é um
desconhecido e na qual o isolamento impede a descoberta de afinidades ou oposições. Os
espaços públicos - o ambiente natural às relações humanas nas cidades - tornou-se cercado
por paredões de proteção, transformando as ruas em „Vales do Medo‟. Para Tuan (2005), as
infinitas manifestações de se controlar o caos, pela construção humana, mental ou material,
definem paisagens do medo. O crescimento urbano desordenado é visto como uma selva,
um espaço de caos, determinado por ruas e movimentos que desorientam e assustam seus
ocupantes e recém-chegados. Apesar de toda essa desordem, a maior ameaça, que se
destaca em uma cidade, vem das outras pessoas. Elas “podem ser a maior fonte de
segurança, mas também podem ser a causa mais comum do medo, [pois podem] ser
indiferentes às nossas necessidades, trair nossa confiança ou procurar diligentemente nos
fazer mal” (TUAN, 2005: 14).
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 27
A alienação distorce a percepção da realidade: a sociedade passa a associar
violência à pobreza e quem tem poder aquisitivo se isola em guetos de “bem-estar”,
contribuindo para o aumento da exclusão social, consequentemente, favorecendo as
oportunidades de violência, gerando o medo. O medo é percebido pela sociedade atual, não
só pelo comportamento reservado de seus habitantes, ele transparece, também, na forma
do habitar, as residências estão cercadas por muros cada vez mais altos e incorporam, a
cada dia, mais artifícios de segurança; percebendo tais fatos, discute-se sobre o nível de
medo dos moradores do bairro Manaíra, através da quantidade de artifícios de segurança
utilizados no fechamento mural dos lotes. Seguindo esse pensamento, o trabalho mostrará a
relação de medo dos moradores do bairro, através de uma escala de níveis de proteção
(segurança), tendo como intuito verificar se essa forma de reagir ao medo é fator positivo ou
negativo para a segurança residencial e do bairro.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 28
1.2 A Violência Urbana
Os assaltos e roubos no Manaíra, em João Pessoa, estão se tornando cada
vez mais violentos, com diversos relatos de agressões físicas e psicológicas
contra as vítimas. Na última semana, o aposentado João Batista foi
assaltado e agredido a socos e chutes por dois rapazes bem vestidos,
enquanto caminhava próximo à Avenida João Câncio da Silva. (CORREIO DA
PARAÍBA, João Pessoa, 15 out. 2008. Disponível em: <http://www.portalcorreio.com.br>.
Acesso em 10 de Junho de 2010.)
A expressão “violência urbana” corresponde a uma contradição histórica, pois os
primeiros aglomerados humanos tinham como intenção juntar forças para se protegerem
das adversidades da natureza, como destaca Morais (1981:31), segundo o qual “os homens
vivendo bem próximos poderiam apoiar-se mutuamente e se solidarizar ante os perigos que
vinham de fora do grupo.” O esperado era que a cidade expressasse uma aglomeração de
pessoas com parâmetros de relacionamento, cujo princípio seria a solidariedade, a cortesia,
a proteção.
Como, então, um espaço, que deveria ser „civilizado‟, tornou-se local de violência,
onde a barbárie, o desrespeito, o crime e, consequentemente, o medo se tornaram
preocupantes? Segundo Morais (1981), a partir de uma visão marxista, a produção
tornou-se o fator mais importante nas relações humanas postas pela urbanidade, essas
reproduzem as relações de produção vigentes no capitalismo, determinando relações
sociais adequadas aos valores do sistema produtivo. Nesse contexto, vigora uma
circunstância social que diferencia segmentos sociais segundo condições financeiras,
papéis no sistema de produção e posse de bens.
A população nas cidades se agrupa por setores, isolando-se espacialmente em
segmentos distintos. No perímetro urbano, distinguem-se regiões habitadas pelos donos dos
meios de produção; outras, pelos executivos do sistema; outras, pelos burocratas; outras,
por operários e trabalhadores avulsos. Para cada um desses segmentos surgem serviços
públicos e privados diferenciados. Em decorrência dessa política de diferenciação, os
extratos mais baixos da sociedade habitam zonas insalubres e sofrem constante
discriminação no atendimento dos serviços sociais prestados, que envolvem questões
referentes à saúde, à educação, às condições sanitárias, às moradias, etc. Essa
discriminação gera insatisfação e violência. Parte das pessoas desses extratos sociais
termina por intuir que lhes resta ser colecionador de frustrações sucessivas. Em
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 29
decorrência, tornou-se comum o contato diário da população urbana com fatos ou atos de
violência, sejam sofridos pelos indivíduos, relatados por terceiros, ou anunciados pela mídia,
situação que se repete na realidade brasileira. Essa circunstância social expressa o projeto
político em vigência.
Problemas relacionados com o espaço urbano têm a ver com o elemento
político, pois o espaço, uma vez habitado por seres humanos, se transforma
em uma coisa política, o Estado usa o poder para instituir certa ordem de
coisas ou para corroer uma ordem vigente. (Morais, 1981:28)
Na atualidade, a violência resultante das desigualdades sociais assumiu o papel
principal no enredo da vida cotidiana brasileira, gerando mudanças nas relações sociais e
espaciais do ambiente urbano. Tais mudanças são incentivadas pelo medo do outro, do
desconhecido e das adversidades do mundo externo. Pautadas nessas sensações as
pessoas reagem com atitudes defensivas ou agressivas, para protegerem seus familiares e
bens.
É evidente que os interesses e conflitos econômicos estão na base de toda
esta realidade política. Assim, olharemos para a metrópole e nela veremos
favelas, bairros pobres da periferia, regiões habitadas pela chamada classe
média e outras habitadas pelos ricos e muito ricos. Isto produzirá
necessariamente um clima de disputa e guerra fria. (Morais, 1981:31)
Nesse contexto, como agente da ordem/desordem, o estado gere as distinções entre
as classes sociais, dividindo os recursos sociais (para saúde, educação, habitação, serviços
sanitários, segurança, entre outros), apesar da existência próxima de alguns bairros pobres
de bairros ricos, percebem-se duas realidades econômicas distintas.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 30
1.3 A Segregação Espacial
Em seu constante medo das adversidades da vida, o ser humano capta as ameaças,
não mais decorrentes do meio natural, mas das relações sociais. As relações subsidiadas
pela divisão de classes sociais se configuram como segregacionistas e se expressam na
intolerância e na opressão, tornando-se, portanto, recheadas de perigo. Para se proteger
disso, o ser humano deixou de agir conjuntamente e em prol de um grupo, e passou a
adotar soluções individuais de isolamento e exclusão social.
Ao comentar as relações humanas do contexto vivenciado nas cidades, Calvino
(2009) enfoca os aspectos econômicos e sociais e descreve as características físicas do
espaço, observando que elas geram tensões próprias as quais identificam a cidade e se
expressam em desejos, sonhos, medos e comportamentos específicos de seus habitantes.
Tais descrições nos revelam mundos idênticos aos que percebemos nas esquinas, bairros e
casas das cidades que conhecemos. Destaca-se a seguir a descrição de Pentesiléia, cidade
caracterizada pelo autor como fonte de medo, pois seus habitantes são dominados por
fantasmas e alimentados pelo pavor. Nessa circunstância, os visitantes e até mesmo
habitantes, pouco conhecidos, são considerados suspeito que convivem em um cidade
murada onde os edifícios dão as costas para a rua, para a vida.
No planalto poeirento uma cinta de muralhas, [...] vigiada por guardas
aduaneiros que fitam com suspeita os seus pacotes. Até alcançá-la, você
permanece do lado de fora; depois de passar por uma arcada, você se
encontra dentro da cidade. [...] Você avança por horas e não sabe com
certeza se já está no meio da cidade ou se permanece do lado de fora.
(Calvino, 2009:142)
As relações sociais da vida urbana são cercadas por significados simbólicos que
definem o grupo social a que pertencem os indivíduos. Tais significados simbólicos
referem-se aos hábitos do cotidiano, às relações do morar, aos hábitos de consumo, à
forma de circular e como os indivíduos vivenciam suas relações no cotidiano. Como salienta
Scocuglia (2000:15), “os grupos sociais são vistos como portadores de convenções, de
valores socialmente compartilhados que se atualizam mediante um determinado estilo de
vida.” Tais grupos sociais diferenciam-se na forma de se relacionar e se inserir, no meio
urbano, estabelecendo sítios sociais específicos. Isso promove a concentração das classes
sociais em distintas regiões, com significados simbólicos específicos, definindo um processo
de segregação social (Villaça, 2001).
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 31
Observando esse tipo de relações humanas, Flávio Villaça identificou que “a
segregação é um processo dialético, em que a segregação de uns provoca, ao mesmo
tempo e pelo mesmo processo, a segregação de outros,” (2001:148). Assim, viver em um
mundo de exclusão e preconceitos tornou-se realidade constante das cidades e esta
realidade denigre quem habita o espaço de exclusão, criando uma atmosfera de rancor e
inferioridade, ao mesmo tempo em que gera antipatia e desconfiança.
Segundo Lojkine (apud Villaça, 2001:17), existem três tipos de segregação urbana: a
primeira, que se dá quando há uma oposição entre o centro e a periferia; a segunda existe
quando ocorre uma separação crescente entre zonas de moradia reservadas às camadas
sociais mais privilegiadas e zonas de moradia popular; o terceiro tipo de segregação revela
o esfacelamento das funções urbanas em zonas geograficamente distintas e cada vez mais
especializadas com zona exclusivas para escritório, zona industrial, zona de moradia etc.
Villaça (2001:147) considera que o segundo tipo de segregação urbana define melhor “as
principais forças atuantes sobre a estruturação do espaço metropolitano no Brasil”, onde
existe uma clara disputa por localização dos grupos sociais e entre classes sociais. O autor
distingue como motivos fundamentais para a segregação urbana: (i) grupos sociais
distinguidos pela etnia ou nacionalidade; (ii) e grupos separados mediante a posse de bens,
os ricos e os pobres, aos quais muitas vezes se associam os grupos étnicos. Como a
questão de distribuição de renda está estreitamente ligada à divisão das classes sociais, nos
detivemos especificamente na relação da segregação vinculada às classes sociais,
considerada mais evidente na sociedade brasileira.
Os estudos de Kent (1997) sobre as transformações da sociedade ressaltam que, à
medida que vão se tornando mais complexos social e politicamente, os centros urbanos se
tornam mais segmentados em relação à cultura, ao comportamento, ao uso do espaço e à
cultura material ou arquitetônica. Isso ocorre particularmente com respeito à segregação e
organização da edificação, em que o padrão espacial, definido por tamanho das áreas,
saneamento, pavimentação de vias de circulação, permeabilidade e barreiras, é
profundamente influenciado pelas exigências das classes sociais mais altas.
Josué de Castro (1946), estudando a distribuição no espaço geográfico urbano da
desigualdade social, faz uma analogia entre a localização das classes sociais e as
condições alimentares dos habitantes. A figura 1.2, produzida pelo grupo ArqViol1 (2008),
sintetiza bem a ideia do autor em sua obra A Geografia da Fome.
1 Grupo de Pesquisa Arquitetura da Violência, Departamento de Arquitetura da Universidade Federal Fluminense, coordenadora Sônia Ferraz. 2 Esta obra foi publicada originalmente em inglês com o título THE DEATH AND LIFE OF GREAT AMERICAN
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 32
Figura 1.2 - Capa de abertura do DVD ArqViol do grupo Arquitetura da Violência – UFF.
(FONTE: ArqViol, 2008.)
Devido a tais circunstâncias indaga-se se o aumento da violência urbana também é
um reflexo da segregação social, na maneira como a sociedade enfrenta os problemas
fechando-se em guetos. Dessa forma, o estudo visa avaliar as relações entre forma do
ambiente construído e comportamento antissocial.
Cenas do cotidiano brasileiro retratam a preocupação pela segurança e salientam o
processo de segregação, medo e violência, ao quais os habitantes das cidades estão
sujeitos. É comum, nas grandes cidades, as pessoas que detêm algum poder aquisitivo (e
mesmo as que não têm) procurarem viver dentro de muralhas cercadas de grades, com
câmeras de segurança, guarita e vigilância que proporcionem alguma forma de segurança.
No entanto, a própria criação desses artifícios impede as relações de vizinhança: não se
sabe quem é o vizinho, o próximo, o outro. Tais sensações de medo e insegurança refletem
no modo de habitar humano, onde as residências passam a não ser mais uma forma de
integração urbana, tornando-se hoje claustros isolados, protegidos do ambiente externo.
Sônia Ferraz (2003) destaca a existência de uma „uniformização‟ urbana influenciada
pela mídia e o mercado da segurança, identificando a existência de padrões de proteção
individuais que se repetem no cenário urbano. Gerando uma visível uniformidade e
padronização dos artifícios de segurança nas edificações, o que proporciona o surgimento
de uma „nova coletividade‟. Todavia a autora observa que essa coletividade não gera uma
sociabilidade, pois não parte de um interesse público e coletivo, simplesmente se define
pelo somatório das repetições de aspectos particulares. Nesse sentido, ela identifica essa
„nova coletividade‟, caracterizando dois ambientes urbanos: o Rio de Janeiro, como a cidade
das grades, e São Paulo, a cidade dos muros. Ver figuras 1.3 a 1.6.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 33
Rio de Janeiro: cidade das grades São Paulo: cidade dos muros Figura 1.3, 1.4, 1.5, 1.6 - Imagens DVD ArqViol - Arquitetura da Violência, UFF, 2008.
(FONTE: ArqViol, 2008.)
Nos estudos de Teresa Caldeira (2003/2008) sobre os problemas urbanos de São
Paulo, ela refere-se à existência de uma „estética da segurança‟, na qual cercas, barras e
muros passam a ser considerados elementos que destacam status social, sendo
incorporados a estrutura das edificações, não só como elementos de proteção, mas de
beleza, requinte estético e status. “Parece que os moradores de São Paulo estão
aprendendo a transformar restrições, limitações, incertezas e medos em seu proveito, ao
manipularem a estética da segurança: eles estão transformando suas casas em prisão, mas
suas prisões dizem muito sobre sua posição social.” (CALDEIRA, 2008: 297). Ver Figuras
1.7 a 1.10.
Estética da segurança: consertina, bunker, grade, câmera
Figura 1.7, 1.8, 1.9, 1.10 - Imagens DVD ArqViol - Arquitetura da Violência, UFF, 2008. (FONTE: ArqViol, 2008.)
No Brasil, apesar da maior frequência de estudos sobre a violência e a criminalidade
ocorrerem nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, observações sobre o surgimento de
uma „nova coletividade‟ e de uma „estética da segurança‟ são facilmente identificadas em
outras cidades, mesmo de pequeno e médio porte, cada uma com especificidades em
relação aos elementos estéticos de segurança adotados.
O medo da violência urbana, cada dia mais presente nas emoções dos habitantes
citadinos, reflete-se na segregação urbana, acarretando o fechamento da cidade. Partindo
dessa percepção, busca-se identificar as propriedades do crime em um bairro de classe
média e alta de João Pessoa, com relação ao nível de (in)segurança, a partir da quantidade
de artifícios de proteção mural deste bairro, visando avaliar as relações entre forma do
ambiente construído e comportamento antissocial.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 34
1.4 Estudos Urbanos do Crime - Revisão da Literatura
Vários estudiosos e pesquisadores investigam problemas urbanos referentes à
arquitetura, ao espaço e ao crime; além de identificarem, criticarem e esclarecerem tais
questões, alguns deles fazem sugestões e desenvolvem técnicas para enfrentar o medo e a
insegurança e criam artifícios contra ações delituosas e transgressivas. Esse item se baseia
em algumas dessas reflexões, tanto em nível internacional quanto nacional.
A década de 1960 representa o início de uma fase de preocupações a respeito das
desordens urbanas, da criminalidade e da violência. Nos EUA e na Europa estudiosos e
críticos urbanos se interessam pelo assunto, visando entendê-lo para solucioná-lo. “O
governo federal norte-americano criou fundos para projetos de pesquisa que visassem às
conexões entre projeto ambiental e criminalidade em áreas residenciais, especialmente
naquelas criadas pelas políticas públicas de habitação popular” (TAYLOR, 2002: 414). Ver
figuras 1.11 e 1.12.
Figura 1.11 - Cabrini High-Rises, 1959. Figura 1.12 - Stateway Gardens, 1959, Chicago, prédios de habitação popular.
(FONTE: www.encyclopedia.chicagohistory.org/pages/253.html)
Surgem, então, nos Estados Unidos, mais precisamente em Chicago, grupos de
estudiosos preocupados com os problemas urbanos das cidades norte-americanas. A
Escola de Chicago, considerada o berço da sociologia moderna norte-americana, passou a
discutir os problemas enfrentados por essa cidade, dentre tantas outras, através de estudos
sobre o desenvolvimento urbano, a civilização industrial, a morfologia da criminalidade, além
de outros estudos relacionados à cidade e à sociedade moderna. Tal escola tornou-se
importante devido às contribuições de seus sociólogos para o desenvolvimento de métodos
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 35
de investigação empírica, que se tornaram referência para o desenvolvimento de outros
grupos de estudo.
Jane Jacobs (1961/2009)2 analisa e critica as cidades a partir de fatos reais e de
observações in loco, pois considerava necessário sentir, perceber a cidade através de seus
olhos e dos olhos da rua.
Cidades, [...] um imenso laboratório de tentativa e erro, fracasso e sucesso,
em termos de construção e desenho urbano. É nesse laboratório que o
planejamento urbano deveria aprender, elaborar e testar suas teorias. Ao
contrário, os especialistas e os professores dessa disciplina têm ignorado o
estudo do sucesso inesperado e pautam-se por princípios derivados do
comportamento e da aparência [...]; as vantagens e o comportamento das
grandes cidades têm sido inteiramente confundidos com as qualidades, as
necessidades, as vantagens e o comportamento de outros tipos de
assentamentos menos ativos. (JACOBS, 2009:5)
Seguindo a própria sugestão, a autora relata em seus textos exemplos vivenciados
em sua vizinhança, comentando suas percepções e a percepção das pessoas comuns,
consideradas autores principais e coadjuvantes daqueles espaços.
Jacobs procura nos orientar sobre como os espaços urbanos podem se transformar,
com uso diversificado de comércio, serviço, lazer, entre outros equipamentos, configurando
uma diversidade urbana. Comenta, também, sobre espaços que proporcionem a presença
de pessoas em diferentes horários, a existência de quadras curtas, a valorização de
esquinas e percursos, além da convivência entre edificações antigas e contemporâneas.
Para ela a permeabilidade do ambiente urbano permite o movimento circulatório de pedestre
por todos os espaços, evitando o ócio e o desuso de locais que podem atrair transgressores.
A autora salienta a importância das relações sociais urbanas e a melhoria da qualidade de
vida, através dos „olhos da rua‟, que não são vigias fardados, nem câmeras que registram e
inibem a espontaneidade dos cidadãos e, sim, as relações humanas, a vizinhança que
mantém viva as interações sociais em um espaço público.
As luzes não têm efeito algum se não houver olhos e não existir no cérebro
por trás dos olhos a quase inconsciente reconfirmação do apoio geral na rua
para a preservação da civilidade. (JACOBS, 2009:43)
2 Esta obra foi publicada originalmente em inglês com o título THE DEATH AND LIFE OF GREAT AMERICAN
CITIES, em 1961.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 36
Apesar de ter desenvolvido suas críticas e opiniões sobre o rumo que as cidades
estavam tomando na primeira metade do século XX, as observações contidas no livro „Morte
e Vida de Grandes Cidades‟ ainda são relevantes nos dias de hoje, sendo uma leitura
utilizada correntemente pelos pesquisadores posteriores, cujas observações se pautam nas
suas reflexões.
Outro estudioso dos problemas das cidades norte-americanas, principalmente com
relação à criminalidade e à segregação social, foi Oscar Newman, que desenvolveu
estudos sobre os espaços defensáveis, nos quais identifica características espaciais de
lugares seguros e inseguros e indica modos de contornar problemas de criminalidade.
Segundo Newman (1996), seu interesse em pesquisar o espaço defensável surgiu
na década de 1970, quando presenciou a demolição do conjunto habitacional Pruitt-Igoe, em
St. Louis, construído para cerca de 2.740 famílias carentes (figuras 1.13 e 1.14).
Considerado a princípio um projeto urbano e arquitetônico modelo, baseado nos princípios
da arquitetura moderna, devido à falta de controle social e de identidade dos moradores com
suas residências o conjunto se tornou um local suscetível a crimes, roubos e vandalismo,
principalmente nas áreas comuns, como os corredores, escadas e hall.
Figura 1.13 - Pruitt-Igoe, construído em 1960, St. Louis Figura 1.14 - Pruitt-Igoe, demolição em 1972.
(FONTE: NEWMAN, 1996.)
A partir desta demolição, Newman passou a estudar mecanismos que pudessem
oferecer uma melhor qualidade de vida, como o controle comunitário já sugerido por Jane
Jacobs, em seus 'olhos da rua'. Apesar de identificar a importância dos habitantes enquanto
atuantes na segurança dos espaços públicos, o grupo de Newman constatou que “quanto
maior o número de pessoas que compartilham um território, mais difícil para as pessoas
identificarem-no como sendo delas, [...] facilitando o acesso e a permanência de estranhos
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 37
nas áreas internas do edifício.” (1996:17)3. Tal situação proporcionaria o surgimento de
vândalos e o descompromisso cada vez maior do morador para com o prédio em que reside.
Newman se preocupou em definir morfologicamente, através de tipologias de
edificações, modos para estruturar um „espaço defensável‟, onde o habitante não se
sentisse como um sujeito à parte, e sim como alguém responsável por aquilo que é seu e do
público. Ele identificou três grupos comuns de edificações de moradia (figura 1.15):
residências unifamiliares; edificações com até três pavimentos e sem elevadores; e edifícios
verticais, acima de três pavimentos, com elevadores. Em cada grupo, analisou áreas
privadas, públicas, semipúblicas e semiprivadas, a partir do que foi possível verificar os
melhores pontos de observação e cuidado comunitário.
Figura 1.15 - Tipos de habitações familiares. (FONTE: NEWMAN, 1996, adaptado pela autora.)
Observações de Newman (1996), quanto às características privadas e públicas das
habitações:
Nas habitações unifamiliares todos os espaços interiores estão sob o domínio
privado da família, a quem pertence o solo dentro do lote. Existe um limite bem
definido entre o privado e o público e há um domínio semiprivado sobre a rua.
Na habitação multifamiliar com até três andares, sem elevadores, há uma área de
circulação comum no interior do edifício, espaço este considerado semiprivado
porque é compartilhado por um número reduzido de famílias. O número de famílias e
3 Do original em lingua inglesa: “The larger number of people who share a communal space, the more difficult it is
for people to identify it as theirs [or to feel they have a right to control or determine the activity taking place within it.] It is easier for outsiders to gain access to and linger in the interior areas of a building” Tradução livre da autora.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 38
pessoas que compartilham essas áreas comuns depende da forma como os
acessos, corredores e escadas estão distribuídos. A única área privativa se reduz à
parte interna do apartamento. O solo pode pertencer a uma família, mas também
pode ser compartilhado com outros habitantes do prédio. A rua faz parte da área de
influência da habitação.
Na habitação multifamiliar com mais de três andares, a única área privada
corresponde ao apartamento; as demais, como os corredores, as escadas, os
elevadores, os halls e as áreas externas, são consideradas semipúblicas ou mesmo
públicas.
Newman identificou que o modo como as pessoas apreendem o espaço é tanto
responsabilidade delas quanto da forma das edificações, que influencia diretamente o
comportamento de vigilância. A questão central passa a não ser apenas os „olhos da rua‟,
mas como esses olhos são capazes de identificar o outro e suas próprias responsabilidades.
A vigilância natural passou a apresentar duas correntes de pensamentos similares e
distintas, a similaridade corresponde à necessidade de existirem sempre pessoas capazes
de observar a dinâmica urbana, a diferença entre Jacobs e Newman corresponde a que
Jacobs defende a necessidade de existirem espaços abertos e permeáveis que favoreçam a
circulação indistinta de pessoas ao longo do tempo, enquanto Newman sugere espaços
fechados e impermeáveis, tornando-o acessível à circulação apenas de seus habitantes,
que são capazes de identificar pessoas ou atos estranhos, tornando-se, assim, mais
seletivos.
[Surgiu] um enorme interesse sobre a idéia de que mudanças no projeto dos
conjuntos habitacionais públicos poderiam motivar os residentes a cuidar de
suas áreas comuns, a fiscalizar o seu uso, e assim auxiliar na prevenção de
crimes. Newman criticou especialmente os projetos de edificações de
grande altura, essas torres minimalistas (Wolfe, 1981), construídas em
massa nas cidades norte-americanas ao longo dos anos de 1959 e 1960.
(TAYLOR, 2002: 416)
As reflexões dos dois estudiosos são bastante relevantes e concernentes para a
pesquisa, porém, tais críticas e análises foram elaboradas para a realidade norte-americana.
De qualquer maneira, busca-se compreender como tais observações são aplicadas na
realidade brasileira. Observa-se que as configurações das habitações familiares no Brasil
apresentam algumas das características identificadas por Oscar Newman (ver figura 1.15 e
1.16), porém existe um elemento físico que altera bastante as percepções de espaço
enquanto responsabilidade social: o muro, artefato que passou a ser incorporado na
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 39
residência brasileira no momento em que as casas passaram a ser recuadas em uma das
laterais dos lotes, nas chácaras construídas pelos barões do açúcar (no Nordeste) e do café
(no Sul). E apesar da proposta modernista de se criar espaços livres de circulação e
movimento, no Brasil o muro estava presente, mesmo de forma discreta, com poucos
centímetros de altura, elevados de cobogós, ou gradis, mas estava lá delimitando um
espaço privado, porém até essa etapa ainda se permitia certo controle da rua, por parte dos
moradores e dos pedestres. Nos últimos anos esse elemento foi se tornando cada vez mais
alto e impermeável, não existem mais as áreas semipúblicas, e as semiprivadas são
restritas aos moradores das habitações multifamiliares, tais espaços proporcionavam um
diálogo, uma ligação, uma preocupação, um controle como sugere Jane Jacobs e salienta
Oscar Newman. No entanto, observa-se na maioria das cidades brasileiras um fechamento
de seus lotes por muros cada vez mais altos, impermeáveis e adornados com equipamentos
de segurança. Os espaços ficaram divididos basicamente entre privados e públicos, os
“olhos da rua” ficaram limitados pelos pontos cegos dos muros. Verifica-se que tal atitude é
adotada como medida de segurança, contudo questiona-se: será que as pessoas estão
seguras dentro e fora desses muros.
Figura 1.16 - Tipos de habitações familiares no Brasil.
(FONTE: NEWMAN, 1996, adaptado pela autora.)
Outra presunção a se considerar nesse trabalho é o movimento natural de pessoas
nos espaços públicos, que Jacobs denomina de permeabilidade do solo urbano,
considerado por ela como um fator positivo que permite o movimento circulatório de
pedestre por todos os espaços, pois este por possibilitar a existência do movimento natural,
torna assídua a copresença de pessoas que são elementos chaves para a segurança
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 40
urbana; tal conjectura também é argumentada por Bill Hillier em sua teoria da Sintaxe
Espacial, em que ele analisa a estrutura da malha urbana a partir de suas relações de
integração, profundidade, acessibilidade, visibilidade dentre outros padrões de análise; com
o intuito de identificar não só uma economia de movimento, mas padrões de seguridade na
malha urbana. Assim, surgiu o interesse em identificar em nosso objeto de estudo se o
parcelamento do solo e a forma da malha urbana permitem o movimento natural, além de
identificar a existência de amostras nas variáveis sintáticas da morfologia urbana que
favoreçam ou desfavoreçam a criminalidade.
Os problemas concernentes à criminalidade urbana se tornaram preocupações do
sistema de justiça e policial dos Estados Unidos, a partir da década de 1970. O órgão
responsável por resolvê-los é o Instituto Nacional de Justiça4, que desenvolve estudos e
apresenta propostas para um desenho ambiental apropriado, além de propor uma
manutenção mais efetiva de suas recomendações. Tais procedimentos proporcionam
espaços mais controlados, prevenindo-se, com isso, ações delinquentes. (TRAVIS, 1996)
Dentre os grupos mais antigos, dedicados a esses estudos, está o CPTED (Prevenção do
crime através da arquitetura ambiental) 5.
A base do Crime Prevention Trough Environmental Design (CPTED) é que o
desenho adequado e o uso efetivo do ambiente construído podem reduzir a
incidência e o medo do crime. Por sua vez, leva à melhoria da qualidade de
vida. (CPTED, 20036)
Segundo Bondaruk (2007), a expressão Crime Prevention Through Environmetal
Design foi criada em 1971 por Ray Jeffery, no livro “O Comportamento Criminal e o
Ambiente Físico”7. A partir de então esse termo passou a ser utilizado pelos pesquisadores
e estudiosos que abordavam conceitos relacionados à prevenção da criminalidade urbana
através do desenho arquitetônico, principalmente nos Estados Unidos e no Canadá. Apesar
de abordar os mesmo conceitos, o Reino Unido e a Austrália utilizavam a expressão Design
Out Crime (Projetando a exclusão do Crime). Atualmente, na Inglaterra, utiliza-se o termo
Design Against Crime (Desenho contra o crime), e suas propostas, além da questão
arquitetônica e urbana, abrangem artigos de consumo em geral, como mobiliário, vestuário e
acessórios. O Gabinete do vice-primeiro ministro de Londres, envolvido com questões de
4 National Institute of Justice
5 Crime Prevention Through Environmental Design
6 Do original em lingua inglesa: “The basis of Crime Prevention Through Environmental Design (CPTED) is that
proper design and effective use of the built environment can reduce the incidence and fear of crime. This in turn leads to improvements in the quality of life.” Tradução livro da autora. 7 Criminal Behavior and the Physical Environment
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Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 41
sustentabilidade, solicitou a criação, em 2004, de um guia com o intuito de promover os
princípios da prevenção da criminalidade, conhecido como Safer Places – The Planning
System and Crime Prevention.8
A figura 1.17 mostra como se estruturam as organizações preocupadas com o crime,
nos EUA e no Reino Unido, que, ainda hoje, são referência para outros países.
Figura 1.17 - Organograma das abordagens do crime.
(FONTE:TOWN, DAVEY, WOOTTON, 2003.)
Partindo dos conceitos da CPTED (ZAHN, 2007), existem quatro princípios básicos a
serem levados em consideração em um projeto arquitetônico, que partiram das indicações
de Jane Jacobs (2009) e Oscar Newman (1996) e agem de forma preventiva, a fim de evitar
futuros incidentes criminais. Tais medidas não implicam em coagir ou punir a prática
criminosa, sendo estas consideradas responsabilidade policial por esses estudiosos.
A vigilância natural – o olhar, a visibilidade do outro inibe a ação de criminosos;
O controle de acesso (natural) – instalação de barreiras adequadas com o intuito de
não autorizar o acesso de estranhos;
O reforço territorial – definir fronteiras claras entre áreas públicas e privadas para
estimular os moradores a cuidarem do que é seu e ao mesmo tempo respeitarem o
território dos outros, desestimulando potenciais infratores.
A administração e manutenção desse sistema – o cuidado com o lugar promove o
reforço territorial, as pessoas se sentem mais à vontade para frequentar, olhar e
cuidar desses espaços.
8
Lugares mais seguros – O Sistema de Planejamento e Prevenção do Crime.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 42
Tais princípios definem estratégias que podem ser tomadas como referência na
elaboração de um projeto que melhore as relações de segurança, são eles: permitir linhas
de visão clara; fornecer iluminação adequada; minimizar rotas isoladas e escondidas; evitar
o aprisionamento; reduzir o isolamento; promover a mistura de uso do solo; existência de
atividades diversificadas no mesmo espaço; criar senso de propriedade por meio da
manutenção e gestão; fornecer sinais de informação; e melhorar a concepção global do
ambiente construído.
Percebe-se que, em alguns países, devido à falta de atitude governamental com
relação à segurança pública, a população adota medidas particulares para se prevenir
contra o crime. A principal atitude é a criação de um reforço territorial: criam-se
condomínios, instalam-se sistemas de controle de acesso único e estipulam-se regras
internas de conduta. Observa-se, também, a busca em aplicar alguns pontos básicos
indicados por Jacobs e Newman, cabe, todavia, um questionamento: tais procedimentos
individuais resolvem o problema ou o agravam? Não existe um consenso entre usuários
urbanos e nem estas medidas resultam de estratégias que visem à coletividade, além do
principal ponto, a vigilância natural, não ser levado em consideração nas recomendações e
nas estratégias seguidas.
A seguir são sugeridas algumas estratégias de segurança elaboradas por órgãos
internacionais, já comentados anteriormente, que podem servir de base para análise,
elaboração e implementação de propostas que venham a melhorar a segurança de uma
comunidade.
Foi definido pelo CPTED (ZAHN, 2007) um processo de reconhecimento e resolução
de problemas conhecido como SARA (scanning, analysis, response, and assessment), que
requer um reconhecimento do problema, análise, resposta e avaliação, explicitadas no
Quadro 1.1, que apresenta uma estrutura simples e de fácil compreensão para o
desenvolvimento de um trabalho de segurança junto à comunidade.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 43
Processo SARA Resolvendo problemas com CPTED:
Reconhecimento do
problema (Scanning)
1. Identificar, definir e investigar a existência / incidência de um
problema;
2. Identificar as partes envolvidas na solução do problema.
3. Definir a combinação de reuniões e atividades necessárias para
resolver o problema e criar uma agenda para o trabalho a ser
desenvolvido.
Análise (Analysis) 4. Reunir-se com as partes interessadas para esclarecer o
problema e definir as metas e os objetivos do processo.
5. Coletar e analisar dados e informações sobre o problema.
6. Avaliar as ligações ou relações entre o problema e as condições
ambientais.
Resposta (Response) 7. Estabelecer os objetivos a serem alcançados através da
implantação das estratégias do CPTED ou outras.
8. Identificar estratégias alternativas para alcançar as metas da
implantação.
9. Avaliar a questão social, a viabilidade política, jurídica, financeira
e tecnológica para a execução de cada estratégia.
10. Selecionar as estratégias mais promissoras, bem como criar e
aprovar um plano para melhoria, que identifique estratégias
específicas, definindo questões financeiras e outras
necessidades de recursos, além de atribuir uma
responsabilidade pela implantação e supervisão do processo,
com apresentação de um calendário para a execução do plano e
estabelecimento de indicadores de sucesso.
11. Empregar a medida mais promissora e viável (combinação de
respostas imediatas), com melhorias de curto e longo prazo.
Avaliação (Assessment) 12. Monitorar o progresso em relação aos indicadores de sucesso
especificados na etapa 10.
13. Decidir se o processo deve ser repetido, devido à falta de
progresso ou o surgimento de novos problemas.
Quadro 1.1. - Resolução de problemas: empregando princípios da Prevenção do Crime Através do Desenho Ambiental. (FONTE: ZAHN, 2007)
O Design Against Crime (DAC) é outro programa que visa à prevenção da
criminalidade através de um projeto de educação e prática profissional, desenvolvido no
Reino Unido por uma comissão de projetistas e pelo Departamento de Comércio e Indústria
(TOWN, DAVEY, WOOTTON, 2003). O envolvimento dos profissionais do design
possibilitou menor uso de equipamentos de segurança, como cadeados, cercas, sistema de
TV e alarmes, considerados desagradáveis, pois até podem reduzir a vulnerabilidade de
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 44
crimes, porém aumentam a sensação de medo, não oferecendo realmente segurança aos
cidadãos.
O grupo parte de exercícios sobre como o ladrão invasor se comportaria no espaço,
evitando criar artifícios que aumentam o medo e acabam criando problemas sociais, ou
aumentando a gravidade dos crimes. Tal grupo identificou algumas características do
desenho urbano que podem gerar o medo do crime, como: lugares isolados; falta de
vigilância natural; iluminação insuficiente nas ruas e espaços públicos; falta de sinalização
(orientação), proporcionando sentimento de vulnerabilidade; e falta de artifícios que possam
evitar situações de ameaça. A partir dessas constatações, foram desenvolvidas propostas
para reduzir o medo do crime através do design (TOWN, DAVEY, WOOTTON, 2003), entre
as quais se destacam:
Identificar o problema– descobrir informações sobre a natureza, o medo do crime, e
qual o impacto que esse medo causa na sociedade;
Definir objetivos e desenvolver uma estratégia – identificar onde e qual o tipo de
crime;
Trabalhar em parceria – identificar diferentes perspectivas sobre como solucionar o
problema atuando junto com a comunidade, os projetistas, os planejadores urbanos,
a polícia etc.;
Inovar e aprender através dos bons exemplos – informações sobre bons exemplos
são necessárias para indicar como proceder melhor;
Selecionar e analisar as intervenções específicas – identificar o local do crime e
requisitar soluções específicas;
Implementar e gerir – buscar uma intervenção correta, eficiente, sustentável e
sensata;
Avaliar – analisar como o projeto está sendo desenvolvido, quais os resultados junto
à comunidade e aos órgãos responsáveis pela segurança.
O guia Safer Places é uma proposta do governo inglês, que tem como intuito ajudar
a promover o planejamento de comunidades seguras e sustentáveis, preocupadas com a
qualidade de vida urbana, proporcionando lugares onde as pessoas se sintam seguras e
salvas, onde o crime e a desordem não prejudiquem a qualidade de vida. O grupo que
coordena o projeto, juntamente com um conselho administrativo, trabalhou com profissionais
da área, a indústria, a polícia e a comunidade.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 45
A partir desses estudos e recomendações pode-se inferir que a prevenção do crime
e a segurança da comunidade são problemas que autoridades locais deveriam considerar,
quando instituírem Planos e Legislação para a vida das cidades, além de procurarem
proporcionar espaços que as pessoas queiram ocupar e usar, criando assim um senso de
identidade comum entre os habitantes.
As propostas do Safer Places (2004) para fazer uma comunidade sustentável são:
1. Economia local que gere emprego e renda para a comunidade;
2. Uma liderança forte que responda positivamente às mudanças;
3. Engajamento e participação local das pessoas;
4. Um ambiente seguro e saudável com espaços públicos bem projetados e verdes;
5. Tamanho, escala e densidade;
6. Bons transportes públicos e planejamento de uma infraestrutura boa de transporte;
7. Edifícios, individual e coletivo, com diferentes usos;
8. Casas bem integradas e decentes para diferentes tipos de vizinhança;
9. Diversidade cultural;
10. “Senso de Lugar”;
11. Integração entre a legislação regional, nacional e da comunidade internacional.
O guia é apresentado por meio de estudos de casos bem sucedidos, servindo como
lições para o planejamento e concepção de lugares seguros. Tais estudos ilustram os sete
atributos propostos a comunidades sustentáveis, relevantes para a prevenção da
criminalidade, definidos pelo Safer Places, que são:
1. Acesso e circulação: lugares bem definidos com vias, espaços abertos e entradas que
proporcionem o movimento, sem comprometer a segurança;
2. Estrutura: lugares estruturados de modo que diferentes usos não causem conflito;
3. Fiscalização: espaços públicos acessíveis não negligenciados;
4. Propriedade: lugares que promovem uma sensação de propriedade geram respeito,
responsabilidade territorial e sentimento de comunidade;
5. Proteção física: lugares que utilizam recursos de segurança bem concebidos;
6. Atividade: locais que oferecem recursos humanos, como atividades de lazer e comércio,
são apropriados pela comunidade, criam um risco reduzido de criminalidade e
aumentam o sentimento de segurança;
7. Gestão e manutenção: os lugares projetados com gerenciamento e manutenção
desencorajam o crime no presente e no futuro.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 46
O Safer Places define a ocorrência de um crime, a partir de uma conjunção de
oportunidades criminais, definidas pela motivação e disposição de um criminoso numa
situação favorável para o crime; a situação compreende um alvo e um ambiente favorável; o
alvo pode ser um objeto ou uma pessoa e o ambiente favorável proporciona ao criminoso
executar a ação delitiva e fugir sem ser capturado.
Com o intuito de evitar ações delitivas, o grupo Safer Places procurou orientar como
tais ações ocorriam em um espaço físico, pensando a partir de uma “mente criminosa”,
buscando identificar como criminosos exploram e utilizam o ambiente para suas ações,
observando como o ambiente afeta a avaliação dos criminosos quanto ao esforço, ao risco e
à recompensa na decisão de agir. Há considerações, também, acerca de como o criminoso
age, levadas em consideração para o momento de um planejamento coercivo.
Esses estudos e propostas são resultado de análises realizadas a partir de
circunstâncias de países desenvolvidos que possuem grupos de pesquisas financiados pelo
governo e apoiados pelos departamentos de segurança pública, há bastante tempo, e visam
desenvolver propostas que melhorem a qualidade de vida urbana com relação à segurança.
Como nos centros urbanos de países avançados o Brasil também apresenta
problemas relacionados à violência, à insegurança nas ruas, à segregação social, entre
outros. Segundo Gilberto Velho (2000), a criminalidade e a insegurança nas ruas não
chegam a ser uma absoluta novidade entre nós, mas nos últimos vinte anos têm atingido
dimensões epidêmicas, afetando toda a sociedade brasileira.
A bibliografia a respeito da criminalidade e do espaço urbano no Brasil é restrita,
recente e, ainda, muito atrelada à literatura internacional sobre o tema. Esses estudos
começam a surgir entre nós no final da década de 1970 e início da década de 1980,
focalizando a criminalidade e o espaço urbano. Alguns autores se fundamentam na Escola
de Chicago, como Wagner Freitas (2002), em seu livro „Espaço Urbano e Criminalidade‟,
que foca principalmente a sociologia do crime, a delinquência juvenil e o controle social,
concluindo que estes proporcionam o aumento da segregação e dos índices de
criminalidade.
Teresa Caldeira (2008) produziu uma bibliografia sobre os problemas urbanos da
cidade de São Paulo, relacionados ao crime, à segregação e ao tipo de política adotada pela
comunidade. Com abordagem antropológica a autora faz reflexões acerca da realidade
brasileira, analisando como o crime, o medo da violência e o desrespeito aos direitos da
cidadania têm se combinado, gerando transformações urbanas, produzindo um novo padrão
de segregação espacial, os enclaves fortificados. Para essa estudiosa “muro” é um
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 47
elemento que estabelece diferenças, impõe divisões e distâncias, constrói separações,
multiplica regras de evitação e exclusão, e restringe o movimento; este elemento, porém, é
utilizado como artifício de proteção privada no Brasil, intensificado a partir da década de
1970 com a redemocratização, sendo erigido principalmente nos bairros de classe média e
alta, onde a vida social passou a ser privatizada e interiorizada por trás desses muros.
Esse tipo de organização do espaço público se espalhou pelo mundo
inteiro no momento em que muitas sociedades que o adotam passam
por transformações de democratização política, fim de regimes
racistas e crescente heterogeneização resultantes de fluxos
migratórios, indicando a complexidade das ligações entre formas
urbanas e formas políticas (CALDEIRA, 2008: 12).
Assim, o medo, a segregação e o desejo de segurança do habitante urbano
alteraram a qualidade do espaço público principalmente nos bairros, onde não foram
considerados os ideais de heterogeneidade, acessibilidade e igualdade, sugeridos pelos
teóricos modernos e pós-modernos, pois a própria observação participativa (método
proposto por Caldeira) torna-se inviável neste espaço, já que observadores são sempre
vistos como suspeitos e tornam-se alvos dos serviços de segurança privada.
As reflexões de Caldeira tornam-se relevantes para o embasamento desse trabalho,
que tem como enfoque o problema da criminalidade no bairro Manaíra, já que a pesquisa se
aprofunda especificamente sobre este assunto no Brasil, e analisa alguns enclaves
fortificados em São Paulo, utilizando como variável o muro.
Atualmente, existem grupos de pesquisas em instituições de ensino superior no
Brasil desenvolvendo estudos relacionados à violência, crime e medo urbano; dentre tais
grupos podemos destacar o da “Arquitetura da Violência”, da Universidade Federal
Fluminense, financiado pela FAPERJ (Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à
Pesquisa do Estado de Rio de Janeiro) e o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico). Este grupo, coordenado por Sônia Maria Taddei Ferraz, tem
desenvolvido trabalhos sobre a arquitetura da violência, principalmente em grandes cidades
brasileiras, como Rio de Janeiro e São Paulo.
O grupo de pesquisa LATTICE - Laboratório de Tecnologia e Investigação da
Cidade, na UFPE - Universidade Federal de Pernambuco, coordenado por Circe Maria
Gama Monteiro e José de Souza Brandão Neto, tem desenvolvido estudos sobre espaço e
crime em Recife.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 48
O GREM, Grupo de Pesquisa em Antropologia e Sociologia da Emoção da
Universidade Federal da Paraíba, desenvolve trabalhos dentro da linha de pesquisa Medos
urbanos e sofrimento social; tem como coordenador o professor Dr. Mauro Guilherme
Pinheiro Koury.
Também existem trabalhos desenvolvidos nos departamentos de Polícia e
Segurança Pública de alguns estados brasileiros. Em 2006, o Tenente Coronel da Polícia
Militar do Rio de Janeiro, Marco Antonio Amaro, lançou o livro Arquitetura contra o crime:
prevenção do crime através da arquitetura ambiental, e, no ano seguinte, o Coronel da
Polícia Militar do Paraná, Roberson Luiz Bondaruk, publicou o livro A Prevenção do Crime
Através do Desenho Urbano. Tais autores buscam identificar como a criminalidade se
comporta no Brasil e indicam procedimentos para impedir a criminalidade.
Bondaruk (2007) pesquisou, nos anos de 2005 e 2006, residências com maior
ocorrência criminal na cidade de Curitiba. Infere-se nessa pesquisa que certas soluções
contra atos delinquentes podem ter efeitos negativos ou contrários à desejada proteção,
pois se identificou que ao se fechar um lote residencial por trás de muros altos, para o
meliante é uma boa oportunidade de realizar seus crimes, pois a partir do momento que se
consegue entrar na residência ninguém de fora consegue ver ou perceber o que se passa
por dentro da edificação, fato percebido nas residências vitimizadas e relatado pelos
presidiários que comentem furtos.
A polícia militar do Estado do Paraná, juntamente com o Coronel Roberson Luiz
Bondaruk desenvolveu uma série de cartilhas que orientam cidadãos e moradores a se
prevenirem contra atos criminosos; tais cartilhas visam à prevenção através da educação e
da prática profissional. As cartilhas (figura 1.18) estão disponíveis na internet e servem de
orientação não apenas para os municípios do Paraná, mas para todas as cidades do Brasil,
que compartilham dos mesmos problemas urbanos e sociais e veem estes problemas com a
mesma ótica do autor desses estudos.
Figura 1.18 - Cartilhas de Segurança, desenvolvidas pela polícia militar e financiadas pelo CREA-PR.
(FONTE: http://www.antidelito.net/?arquivo=cartilhas.htm)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 49
Tanto Amaro (2006) quanto Bondaruk (2007) procuram orientar e encaminhar a
população brasileira para uma melhor forma de se planejar e proteger contra o crime em
uma edificação ou espaço urbano, sugerindo recomendações que não facilitem atos de
criminalidade, nos espaços residenciais, comerciais, públicos e de lazer. Nos dois autores,
todavia, identifica-se uma visão mais externa do crime que superficializa uma problemática
bem mais complexa, que tem fundamento cultural, político, social e econômico.
Os estudos e pesquisas explorados até então, serviram de embasamento ao
trabalho quanto aos objetivos de análise, que se referem ao controle social com relação ao
tipo edificado e ao crime; aos campos de visão e relações de copresença entre edifício e
espaço público. Esclarecem formas de avaliação e observação do problema através de
análises e observações, principalmente do elemento construído, para em seguida
desempenhar procedimentos que amenizem ou eliminem atos delinquentes.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 50
1.5 Estudos Morfológicos e O Crime - Referencial Metodológico
Como o trabalho procura identificar possíveis relações entre crime e espaço urbano,
houve uma necessidade de se conhecer as características morfológicas do espaço em
estudo. No âmbito da cidade, a morfologia estuda e analisa a aparência urbana, procurando
compreender como as pessoas interagem no contexto, considerando sua forma e função.
A análise urbana a princípio estudava apenas a forma dos elementos topográficos do
espaço construído, havia uma deficiência com relação ao processo histórico e às relações
estabelecidas nessa forma urbana. Ao longo dos últimos anos, a Morfologia Urbana passou
a abordar o planejamento da cidade, o parcelamento do solo, a imagem urbana e o edifício,
as permanências e rupturas através de uma visão da história urbana. A edificação passou a
ser um elemento relevante nos estudos morfológicos.
Existem diferentes tipos de abordagem do comportamento morfológico dos lugares,
analisados por diversos pesquisadores, dentre tais abordagens, temos: a Escola de Chicago
e Jane Jacobs, que avaliam as expectativas psicossociais, identificando como os indivíduos
reagem e se comportam no ambiente; Choay e Barthes, que enfocam as expectativas da
informação, em que se trabalha com o significado de símbolos e signos; Kevin Lynch e
Gordon Cullen, que abordam a análise topoceptiva da imagem mental; além de outros
pesquisadores, que trabalham com estudos das cidades e seus elementos constituintes,
mediante análises tipológicas, trama urbana, entre outras abordagens.
A Morfologia Urbana, portanto, estuda a forma da cidade ou dos aglomerados
humanos, colocando-se em evidência a paisagem e a estrutura global das cidades, sendo
definida em: solo, lote, quarteirão, logradouro, conjunto edificado, fachada, rua, traçado,
praça, monumento, vegetação, mobiliário, entre outros elementos que são articulados entre
si e definem os lugares que constituem o espaço urbano.
Um dos elementos primordiais a ser observado nesse estudo é a rua, pois é nesse
espaço citadino onde acontece a maioria das ocorrências criminais que integraram nosso
estudo. Na visão de Roberto da Matta (1997), a rua é um local ocupado por categorias
sociais que ali vivem como se estivessem em casa, porém, segundo a visão do antropólogo,
há uma diferença de comportamento na casa e na rua: no primeiro existe um senso de
coletividade, não se admite contradição, todos que se apropriam desse espaço participam
de uma relação próxima de afinidade; enquanto que a rua é o local da individualização, cada
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 51
um está por si. A rua é o local do desconhecido, „terra que pertence ao governo ou ao povo‟,
terra de ninguém.
[...] até hoje a sociedade parece fiel à sua visão interna do espaço da rua
como algo movimentado, propício a desgraças e roubos, local onde as
pessoas podem ser confundidas com indigentes e tomadas pelo que não
são. (MATTA, 1997: 58)
Nesse pequeno trecho, o autor expõe a „rua como algo movimentado‟, onde se
realizam ações, porém, ao mesmo tempo, algo perigoso, desconhecido, onde o indivíduo
pode ser confundido com indigente ou marginal. Com isso, a rua, além de ser um elemento
formal do espaço urbano, também é um local funcional, sendo seus espaços um fator
importante na dinâmica da cidade.
Estudando a questão formal e funcional da cidade, Bill Hillier (2007: 113) entende
que “a maneira como organizamos o espaço em determinada configuração é a chave tanto
para as formas da cidade, quanto para a maneira como os seres humanos funcionam nas
cidades” 9. O autor identifica as cidades como sistemas de meios e fins, onde os meios são
físicos e os fins funcionais, todavia ressalta-se uma ignorância no modo como as cidades
estão sendo analisadas e planejadas, pois não existe um compartilhamento de decisões
entre o objeto físico e espacial e os processos funcionais, ocasionando uma desestruturação
urbana.
No estudo morfológico da criminalidade, Hillier distingue dois processos
interdependentes que apresentam características específicas. São eles: o movimento
natural e a Sintaxe Espacial.
1.5.1 O Movimento Natural
O termo movimento natural, foi uma expressão adotada por Hillier (1993, 1996/2007)
para explicar a relação entre o movimento na cidade e a configuração da malha urbana.
Este movimento é a capacidade de deslocamento dentro de uma estrutura urbana através
de suas rotas de acesso, que podem ser mais ou menos acessíveis dependendo da maior
ou menor ligação com outras rotas de uma mesma malha urbana.
9 Do original em inglês: “How we organize space into configuration is the key both to the forms of the city, and
how human beings function in cities.” Tradução do texto Edja Trigueiro e D. Pereira, para uso em sala de aula. (p.3)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 52
As pessoas apreendem os espaços urbanos e interagem com ele de acordo com as
suas impressões: de proximidade ou distância dos percursos que pretendem tomar; dos
lugares mais acessíveis; dos lugares mais seguros; dos espaços a se evitar; de como
acham a cidade inteligível, dentre outras intenções e referências de quem se locomove.
Porém, há um fator em comum, pertinente em todas as cidades às „forças
socioeconômicas‟, que são definidas pelo movimento natural e pela estrutura da malha
urbana: o primeiro influencia na configuração espacial, e o segundo é o elemento definidor
da circulação de pedestres e/ou veículos, como argumenta Hillier (1996/2007). Esse
movimento independe dos atrativos físicos ou de magnetos, ele é determinado, apenas, pela
configuração da malha urbana, sendo esta definida pelas rotas de acesso, vias de
circulação.
Para Hillier o fator fundamental de correlação com a configuração espacial é o
movimento e os dois estão intrinsecamente relacionados: enquanto o movimento dita a
configuração do espaço na cidade, a configuração espacial, por sua vez, determina o
movimento, permite a circulação, favorece a relação de copresença entre os diversos
grupos que interagem em um espaço urbano, possibilitando a presença e a observação dos
que estão dentro e fora desses lugares. Como Jacobs (2009) já argumentava, o movimento
é um potencial de segurança e de pertinência com o lugar.
Tudo parece relacionar-se com espaço, e, portanto com movimento de
alguma forma: comércio varejista, densidade edilícia, a maioria dos tipos de
uso do solo parece ter uma lógica espacial que pode ser expressa como
uma relação estatística entre as medidas espacial e funcional. Até mesmo
crime pode ser espacialmente correlacionado. (HILLIER, 2007: 124)10
Hillier identifica “uma fissura entre compreensão e projetação, entre pensamento e
ação.” (2007: 111)11. Para ele não existe uma preocupação em promover a interação entre o
elemento edificado e o urbano, entre o físico e o funcional; não se avalia o movimento
natural. As decisões projetuais, mesmo pequenas, constroem espaços que serão lidos e
apreendidos por seus usuários, na sua configuração, como um conjunto de potencialidades,
porém o mau conhecimento das propriedades espaciais pode gerar lugares vulneráveis,
perigosos, inseguros e desurbanos.
10 Do original em inglês: “everything seems to relate to space, and therefore to movement in some way: retail,
building densities, indeed most types of land use seem to have some spatial logic which can be expressed as a statistical relation between spatial and functional measures. Even crime can be spatially correlated.” Tradução do texto Edja Trigueiro e D. Pereira, para uso em sala de aula. (p.11) 11 Do original em inglês: “a split between understanding and design, between thought and action.” Tradução
do texto Edja Trigueiro e D. Pereira, para uso em sala de aula. (p.2)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 53
Com o intuito de compreender as características que definem um espaço, Hillier,
juntamente com outros estudiosos, desenvolveu a teoria da sintaxe espacial, que tem como
um de seus componentes a noção de movimento natural. Tal pesquisador argumenta que
não só as tipologias edilícias relacionam-se com o espaço urbano, o crime também pode ser
analisado pelas propriedades espaciais. Sendo assim, o trabalho utilizou como ferramenta a
sintaxe espacial juntamente com dados criminais, com o intuito de identificar alguma
correlação entre a estrutura da malha urbana e o crime.
1.5.2 A Sintaxe do Espaço e o Crime
A Sintaxe Espacial teve suas primeiras reflexões no início da década de 1970, com
textos que esclareciam as primeiras ideias sobre essa abordagem, produzidos por Hillier e
Leaman. Nessa época, Hillier cunhou a expressão “Sintaxe Espacial”, até hoje adotada,
para identificar esse instrumento de análise urbana. Na década de 1980, com a publicação
do livro - The Social Logic of Space12, de Hillier e Hanson, essa teoria foi trabalhada
epistemologicamente, com a definição de conceitos e a criação de categorias analíticas das
várias feições dos elementos do espaço urbano (HOLANDA, 2002).
Um dos métodos da sintaxe parte da análise axial do espaço, no qual se avalia
trechos do espaço urbano, como ruas e praças através das sequências ordenadas ao longo
de linhas retas, que são definidas pelo menor número possível das linhas mais longas que
cobrem um espaço aberto e formam uma matriz viária. Cada linha tem uma profundidade
mínima, que não é definida em função do seu tamanho, mas da relação com todas as outras
linhas da malha urbana, identificando-se em cada uma delas, propriedades espaciais
relacionadas com a possibilidade de movimento, sendo elas: integração global e local,
conectividade, inteligibilidade, dentre outras.
A Integração Global, também conhecida por Raio-n ou Rn, é uma variável da sintaxe
espacial que analisa o quão profunda é uma linha com relação a todas as outras linhas da
malha urbana; essa propriedade é o melhor indicador da escala maior de movimento,
principalmente veicular, ou de como a cidade é apreendida com relação ao todo de sua
malha urbana. (HILLIER, 2007)
A Integração Local, ou variável R3, difere da Integração Global, com relação ao nível
de profundidade de análise de cada linha, que é calculado a partir de três passos. Esta
variável, segundo Hillier (2007:101), é o melhor indicador da menor escala de movimento,
12 A Lógica Social do Espaço
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 54
ou seja, a escala dos pedestres, pois estes tendem a percorrer caminhos mais curtos,
observando a malha de uma forma mais localizada.
A Conectividade é uma medida de acessibilidade que indica o número de conexões
por linha axial; já a inteligibilidade é a relação entre o numero de conexões (conectividade)
pela propriedade espacial de integração, ou seja, quanto mais bem conectado e integrado
for às linhas axiais de um malha urbana, mais inteligível é o sistema (Hillier, 2007).
Através desses mapas, estabeleceram-se padrões de relações entre as barreiras e a
permeabilidade dos diversos tipos de espaços; identificou-se a existência de propriedades
urbanas que se correlacionavam entre si, e, atualmente, essa técnica de análise abrange
uma infinidade de grupos de pesquisas que trabalham com análises não só sobre o
ambiente urbano, mas sobre a própria composição dos espaços edilícios (TURNER, 2004).
De acordo com Chiaradia, Hillier e Scwander (2009), a maioria das pesquisas de
sintaxe e crime enfoca as condições espaciais do desenho urbano, da micro para a macro-
escala; algumas delas foram utilizadas como referência para o desenvolvimento desse
trabalho. Tais pesquisas indicam os vários pontos de vista pelos quais os padrões espaciais
podem ser analisados: o ambiente construído, a diferenciação espaço-tempo, e a relação
das distribuições de atividades e risco de vítimas. As figuras ilustram um processo de
análise sintática espacial da rede viária, de um bairro em Londres, nas quais se identificam
os pontos de roubo residencial na figura 1.19, e roubos a pessoas na figura 1.20. Identifica-
se, neste estudo, que o roubo residencial tende a acontecer com maior frequência em vias
menos acessíveis, já o roubo a pessoas é mais linear, ocorre nas vias mais integradas,
destacadas nas linhas em vermelho e laranja. Esse estudo proporcionou explorar como o
crime se comporta com relação às linhas de movimento do objeto de estudo, identificando
as especificidades de crime, entre roubo a pessoas e roubo a residências.
Figura 1.19 - Análise Sintática Espacial da rede viária, de um bairro em Londres, x roubo residencial Figura 1.20 - Análise Sintática Espacial da rede viária, de um bairro em Londres, x roubo a pessoa
(FONTE: CHIARADIA, HILLIER E SCWANDER, 2009)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 55
Existem pesquisas que analisam as relações espaciais da rua em termos de espaços
públicos e privados, identificando como a configuração espacial afeta as pessoas, além de
enfocar aspectos ligados à criminalidade e como a condição espacial da escala macro e
micro afeta o roubo a residências (AKKELIES VAN NES, 2005; LÓPEZ e AKKELIES VAN
NES, 2007); outras demonstram interesse na relação entre o ambiente construído e o crime,
especificamente o roubo, destacando como diferentes aspectos do espaço afetam as
diferentes maneiras de roubo (SAHBAZ E HILLIER, 2007). Tais trabalhos enfocam a
acessibilidade como fator relevante para a investigação de ações antissociais.
BARA, SMITH E TOKER (2007), utilizaram o método de geoprocessamento
juntamente com space syntax; no qual analisaram as ocorrências de eventos criminais e a
configuração espacial, confirmando a visão de Jacobs, que observa serem a circulação de
pessoas e a valorização dos espaços públicos elementos cruciais para a vitalidade urbana e
a vigilância natural; SHU (2009) analisa dois estudos de caso em Taiwan e compara com
cidades inglesas, enfocando três elementos principais: os tipos de vias, o grau de
acessibilidade e como se caracterizam as imediações de cada habitação com relação a
incidentes criminais; AWATUCH (2009) trabalhou com dois estudos de caso localizados na
Polônia - um é considerado o mais seguro da cidade de Gdansk, enquanto o outro, com
características similares, era considerado o mais inseguro, trabalharam diretamente com a
relação espacial forma e função.
MONTEIRO E IANNICELLI (2009) realizaram uma pesquisa no Brasil, na cidade do
Recife, Pernambuco, abordando como estudo de caso um dos bairros mais miscigenados
da cidade - Boa Viagem -, com uma variância de população extremamente rica à
extremamente pobre. Analisou-se que os crimes urbanos mais comuns dessa região, furto e
roubo, estão associados respectivamente com aspectos espaciais: global e local; também
foram identificadas a hora mais propícia ao crime e qual a relação da proximidade do crime
com as favelas do bairro. As figuras 1.21, 1.22 ilustram os dias e as horas das ocorrências
de roubo e furto, respectivamente, no bairro de Boa Viagem. Identifica-se que o roubo é
mais frequente na sexta-feira à noite, enquanto que o furto é mais comum no sábado à
tarde.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 56
Figura 1.21 - MUGGING : Ocorrências de roubos por dia da semana Figura 1.22 - THEFT: Ocorrências de furtos por dia da semana
(FONTE: MONTEIRO E IANNICELLI, 2009.)
Também se identificou nessa pesquisa que os lugares perigosos não ficam
imediatamente próximo das favelas, mas está relacionado a um conjunto de fatores como a
existência de “equipamentos que atraem um grande volume de público em horários
específicos e as questões ambientais” (MONTEIRO E IANNICELLI, 2009). Tal processo foi
identificado pela medida sintática de profundidade, que compreende o número de passos a
partir de cada via para se chegar a outra via. Na figura 1.20, identifica-se um dos exemplos
desse trabalho, observa-se que na Av. Visconde de Jequitinhonha o crime aumenta a partir
do segundo e terceiro nível de profundidade a partir da favela do Veloso, onde se encontram
bancos, mercados, comércio e hotéis. Enquanto que na Av. Fernando Simões Barbosa,
apresenta-se uma grande quantidade de crimes no primeiro nível de profundidade, que
aumenta no segundo, e se reduz do terceiro para o quarto nível, fato este identificado pela
existência de alguns restaurantes e bares próximo a esta favela.
Figura 1.23 – Profundidade x crime. (FONTE: MONTEIRO E IANNICELLI, 2009.)
NETTO e JELVEZ (2009) trazem questionamentos a respeito do papel passivo do
espaço nos estudos de criminalidade e espaço urbano. Destacam o recurso do
geoprocessamento para mapear as incidências criminais e o consideram uma ferramenta
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Pistas Urbanas: Fundamentação Teórica e Metodológica 57
importante para identificar, policiar e intervir, como nos hot-spots (pontos com maior
ocorrência criminal), porém, tal recurso traz algumas ressalvas com relação à forma de
representação, pois desconsidera a diferenciação entre espaço público, espaço privado e
espaço edificado, não identificando as características morfológicas e usuais do espaço,
sendo este tratado apenas como pano de fundo. As figuras 1.24 e 1.25 mostram dois mapas
de hot-spot, nos quais se pode identificar, pelas cores mais quentes, onde ocorre maior
incidência criminal, porém, torna-se difícil especificar como tais crimes se comportam
morfologicamente com relação à distribuição de atividades e usos destes espaços.
Figura 1.24 - Hot-spots de roubos de automóveis em Los Angeles Figura 1.25 - Padrões de atividade criminosa.
(FONTE: http://www.ipam.ucla.edu/programs/chs2007/ apud Netto e Jelvez, 2009.)
Os autores, então, passaram a discutir a necessidade de se utilizar instrumentos
complementares ao geoprocessamento, levando em consideração o papel ativo do espaço
urbano, utilizando ferramentas que definem as características configuracionais das cidades,
como a sintaxe espacial de Hillier, a distribuição do uso e ocupação do solo, a identificação
da distribuição de densidades e centralidades urbanas, além de trabalhar, também, com
variáveis sociológicas.
Pesquisas sobre a criminalidade tornaram-se recorrentes ao longo dos últimos
cinquenta anos. Estudiosos e pesquisadores partiram de análises sociais, chegando a
identificar, através de ferramentas georreferenciadas, ocorrências de criminalidade
pontuadas em mapas urbanos, associadas com características urbanas, sendo possível
identificar como o espaço urbano favorece a incidência criminal. As propostas atuais
procuram ir mais além, antevendo futuras distribuições de crimes e orientando a
comunidade através de guias e cartilhas de prevenção.
Este trabalho traz um recorte da cidade de João Pessoa, num bairro específico de
classe média e alta; desse espaço foram analisados alguns elementos morfológicos, para
identificar as correlações entre o crime e a estrutura urbana considerada, desta enfocamos:
a rua, a densidade edilícia, os padrões e a diversidade do uso do solo. Neste estudo busca-
se adotar as abordagens e instrumentos de análises descritos neste capítulo.
2.
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo
O universo do crime oferece imagens que permitem tanto expressar os
sentimentos de perda e decadência social [...] quanto legitimar o tipo de
reação que se vem adotando: segurança privada para garantir o isolamento,
encerramento e distanciamento daqueles que são considerados perigosos.
(CALDEIRA, 2008:10)
Os reflexos da violência urbana, da segregação espacial, do medo e da insegurança
fazem parte da estruturação urbana de muitas cidades do mundo, da América Latina e do
Brasil. Visando configurar mais adequadamente o objeto do estudo, pareceu relevante situar
o bairro Manaíra no contexto histórico da cidade de João Pessoa. Os espaços geográficos,
os bairros, as ruas, etc, embora expressem realidades específicas, distintas, revelam,
todavia, traços do contexto social mais amplo onde se situam, no tempo e no espaço.
Esse capítulo tem por intuito esclarecer o processo de urbanização da cidade de
João Pessoa, onde se revela a segregação social e urbana, presente na formação de muitas
cidades brasileiras. Enfoca-se a formação do bairro objeto de estudo, apresentando suas
características sociais e morfológicas. Por fim, situa-se as transformações recentes do
Manaíra, onde a violência e o medo integram o cotidiano de seus habitantes, percebidas nas
medidas adotadas pelos moradores e comerciantes para se prevenirem contra atos
delinquentes.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 59
2.1 Um Pouco de História
Figura 2.1 - Mapa intitulado Afbeelding Der Stadt En Fortressen Van Parayba. Autor: Claes Jansz Visscher, 1634. À esquerda localização da cidade de Nossa Senhora das Neves (João Pessoa) e à direita os três fortes da Parahyba. (FONTE: Adonias, 1993)
A fundação da cidade de Nossa Senhora das Neves, capitania da Parahyba, em 5 de
Agosto de 1585, seguiu as recomendações da metrópole portuguesa para com suas
colônias. Foi implantada a quarenta metros acima do nível do mar e a vinte quilômetros da
foz do Rio Parahyba, sendo gradativamente erguidas algumas fortificações para proteção do
território: a Fortaleza de Santa Catarina, ao sul; o Forte de Santo Antônio, ao norte; e o
Fortim de São Bento, situado na Ilha da Restinga (ver figura 2.1). O local oferecia fatores
importantes para a localização da cidade, como a existência de pedra calcária e a presença
de fontes de água doce (PIZZOL, COUTINHO, LIMA, 2006).
Por muitos séculos, a malha urbana ficou restrita ao seu núcleo inicial, dividida entre
cidade baixa e cidade alta; na primeira área, conhecida como varadouro, localizavam-se as
atividades comerciais, com armazéns, lojas, o Porto do Capim e a alfândega; na segunda
área se acomodaram as edificações administrativas, religiosas e residenciais. Contribuíram
para essa estagnação, não só o processo de ocupação portuguesa nas colônias, explorando
Cidade de Nossa Senhora das Neves Fortalezas e Fortes
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 60
a matéria-prima e instalando apenas pequenos núcleos urbanos para garantir a posse das
terras, como a proximidade com as vilas de Recife e Olinda, na capitania de Pernambuco,
onde a vida urbana era mais dinâmica.
Figura 2.2 - À esquerda, mapa de João Pessoa Imagens do Brasil Colonial, Frederica Civitas 1640 à 1647.
Figura 2.3 - A direita, planta da cidade da Parahyba por volta de 1640.
(FONTE: Nestor Goulart Filho, 2000 apud SOUSA e NOGUEIRA, 2008, adaptação da autora.)
As figuras 2.2 e 2.3 ilustram a cidade de João Pessoa no século XVII, ilhada entre o
rio e a mata atlântica, com trilhas de caminho para leste, em direção às praias de Cabedelo
e Tambaú; ao sul, Olinda, Pernambuco; e oeste, interior da capitania da Paraíba.
Na segunda metade do século XIX, o Estado da Paraíba passou por sérias crises
econômicas, como a do açúcar, provocada pelas secas de 1877 e de 1898, o que causou a
migração das pessoas do campo para a cidade. Com o crescimento populacional, a cidade
alta se firmou como área residencial, administrativa e financeira e passou por melhorias na
infraestrutura, com a instalação de equipamentos urbanos que atendessem às necessidades
básicas da população, o que passou a atrair, também, a burguesia rural.
A „concentração‟ da zona residencial nas ruas Nova e Direita, e do comércio
no Varadouro e nas Convertidas, levava a aristocracia emigrada não mais a
procurar o sobrado como simples residência de inverno, [...], mas como
único meio viável de estar presente nas zonas socialmente mais
importantes da cidade. E morar em sobrado, distante de tudo o que se
passasse na rua, resguardado das aventuras imprevisíveis de um contacto
mais direto com o exterior [...] morar assim, encastelado, veio a se tornar
sinônimo de importância, de prestígio e riqueza. Viver em sobrado queria
dizer, portanto, segurança e posição e garantia status social. (AGUIAR e
OCTÁVIO, 1989:107):
N
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 61
A descrição dos historiadores paraibanos encontra paralelo nos textos de Gilberto
Freyre, indicando que o ambiente da Casa-Grande e Senzala (1933/2006) de um país
colônial passou a dar espaço aos Sobrados e Mucambos (1936/1996), com a vinda do
príncipe regente e a Primeira República. No habitar urbano, a casa se tornou a unidade
basilar, embora os sobrados, residência da população abastada, negassem a rua,
considerada o lugar do pobre, espaço apenas de circulação e residual.
Como argumenta Leitão, “a arquitetura, que começa a definir o espaço edificado nas
cidades brasileiras vai refletir, naturalmente, o lugar social de cada morador, não apenas na
forma, no emprego de materiais nobres, mas também no volume edificado.” (2005:236)
Assim, as cidades brasileiras continuam a refletir as relações coloniais, com a exclusão
social e a segregação dos espaços entre ricos e pobres, configurando-se como espaços de
disputa.
As dimensões de João Pessoa se expandiam aos poucos, com ocupação dos vazios
urbanos e de alguns espaços entre sítios e fazendas vizinhas. Silveira (2004) aponta uma
diferenciação na concentração urbana em dois setores distintos: o crescimento sul, pelas
avenidas das Trincheiras e Cruz das Armas; e o crescimento nordeste/leste, sentido Bica do
Tambiá. Posteriormente, foi instalado o sistema de bondes, favorecendo a ampliação da
malha urbana para esses dois sentidos, ver na figura 2.4. “Sobre os trilhos do bonde, ricos e
pobres, brancos e negros se deslocavam pela cidade, fosse a trabalho, durante os dias
úteis, fosse a passeio, nos finais de semana.” (COUTINHO, 2004:49).
Com a instauração da República, o Brasil passou por mudanças econômicas e
estruturais, baseadas nos valores burgueses e positivistas dos países europeus, sob o
trinômio sanear, circular e embelezar. A mudança na estrutura urbana colonial do Rio de
Janeiro, então capital do Brasil, tornou-se exemplo de reforma urbana para as outras
cidades brasileiras, nas quais médicos, engenheiros sanitaristas e inspetores de saúde
pública passaram a produzir relatórios que identificavam pontos preocupantes a serem
melhorados, nesse período realizou-se a abertura de grandes avenidas, com a consequente
eliminação dos cortiços insalubres; foram criados grandes eixos com belas perspectivas;
padronizou-se a altura das edificações; construíram praças e parques urbanos.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 62
Figura 2.4 - Planta da cidade da Parahyba, em 1855, levantada por Alfredo de Barros e Vasconcelos 1º Tenente do Corpo de Engenheiros.
(FONTE: Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba, editado pela autora.)
No início do século XX, incentivado pelas recomendações higienistas dos ares
litorâneos, o governador da cidade da Parahyba, o engenheiro sanitarista João Machado,
promoveu alguns benefícios de infraestrutura. Em 1906, a partir dos trilhos da linha de
bonde de Tambiá, ele criou a Ferrovia de Tambaú, que saía da Cruz do Peixe, e tinha como
destino o atual bairro de Tambauzinho, impulsionando o crescimento da cidade na direção
leste. No ano seguinte, com a construção da ponte sobre o Rio Jaguaribe, houve uma
expansão dos trilhos até o distrito da Praia de Tambaú. A ocupação dessas novas áreas
repercutiu igualmente sobre a construção diferenciada e setorizada do espaço, demarcando
a expansão urbana da cidade, como aponta Silveira (2004).
Em 1918, seguindo os trilhos da linha férrea, foi aberta uma avenida de trinta metros
de largura com cinco quilômetros de extensão, que partia da Usina Cruz do Peixe até a
Enseada de Tambaú. No entanto, a construção da ponte sobre o Rio Jaguaribe permaneceu
incompleta até a década de 1930, sendo finalizada apenas em 1936, ver figuras 2.5 e 2.6.
LEGENDA:
Primeiros
aglomerados
urbanos:
Cidade Alta
Cidade Baixa
Ocupação
espontânea
Expansões:
Nordeste/Leste
(Tambiá)
Sul (Jaguaribe)
N
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Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 63
Figura 2.5 - Linha férrea Cruz do Peixe, 1924, futura Avenida Epitácio Pessoa. (FOTO: Voltaire. FONTE: http://paraibanos.com/joaopessoa/fotos-antigas.htm)
Figura 2.6 - Avenida Epitácio Pessoa de encontro com o mar, 1950 (FONTE: PEREIRA, 2008)
Com a conclusão da Avenida Epitácio Pessoa, no trajeto entre Cruz do Peixe e
Tambaú, e a substituição do bonde a tração animal pelo bonde movido a energia elétrica, na
década de 1940 houve uma frequência maior de pessoenses à orla marítima, não só para
veraneio, mas para lazer nos fins de semana. O bonde foi desativado, em 1950, e o
automóvel passou a exercer influência direta sobre a relação transporte - uso do solo
(SILVEIRA, 2004). Os sítios e fazendas, situados à margem do percurso da Ferrovia
Tambaú e posteriormente da Avenida Epitácio Pessoa, então valorizados, levaram à criação
de vários bairros entre o centro e a praia, e ampliando a malha urbana em direção ao mar.
ANO POPULAÇÃO ÁREA (Km²) DENSIDADE
HAB/HA
1634 - 0,46 -
1855 20.099 1,86 108,14
1889 18.645 2,14 87,08
1923 52.990 5,06 104,69
1930 73.661 10,72 68,70
1946 106.828 14,45 73,95
1954 136.200 18,23 74,70
1972 221.546 29,01 76,36
1978 308.303 38,05 81.03
1983 395.060 58,68 67,33
1994 549.363 80,32 68,40
2004 649.410 110,61 58,71
2010 723.514 211 34,28
Tabela 2.1 - Densidade Demográfica Urbana de João Pessoa.
(FONTE: OLIVEIRA, 2006; IBGE Cidades, 2010.)
Entre os anos de 1920 e 1950, tanto a população cresceu, quanto a área urbana de
João Pessoa se expandiu, como se pode observar na tabela 2.1. Entre 1923 e 1954, o
acréscimo populacional foi de 128,51% habitantes, e a área urbana da capital aumentou
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 64
mais de três vezes, de modo que uma diminuição da densidade urbana também evidencia a
expansão da área urbana.
No final do ano de 1952, a Avenida Epitácio Pessoa estava pavimentada, algumas
residências familiares começaram a se fixar nesta região, iniciando um novo processo de
ocupação, com o deslocamento das famílias abastadas que viviam nos casarões do bairro
Tambiá, nos arredores do Parque Solón de Lucena e do bairro Jaguaribe, para a nova
avenida. Nesse período se iniciou um processo de seletividade urbana, a orla marítima
passou a abrigar residências fixas, que se espalhavam no eixo dessa avenida, para regiões
situadas ao sul e ao norte da cidade (figura 2.7).
Figura 2.7 - Planta geral da cidade de João Pessoa em 1953.
(FONTE: PEREIRA, 2008, legenda da autora.)
Entre os eixos de crescimento de João Pessoa, leste e sul, observa-se uma
diferenciação de classes sociais: no primeiro, localizam-se as áreas mais bem servidas de
infraestrutura, habitadas por uma população de maior poder aquisitivo; no segundo eixo
situam-se as áreas deterioradas próximas ao centro e aos bairros periféricos, acomodando a
LEGENDA:
Parque Solón de Lucena
Ponto de Cem Réis
Av. Getúlio Vargas
Praça da Independência
Jardim Miramar
Av. Epitácio Pessoa
N
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Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 65
população de menor poder aquisitivo. Silveira (2004) argumenta que a ocupação territorial
de João Pessoa está associada ao processo de evolução das redes sociais de alta e média
renda na cidade, criando qualidades espaciais características relacionadas à segregação.
Na década de 1960, o espaço urbano de João Pessoa passou por novas mudanças
estruturais e de ocupação. Para suprir problemas relacionados à moradia popular, foram
implementados conjuntos habitacionais, a princípio, financiados pela Fundação da Casa
Popular e pelo Instituto de Previdência.
Em 1964, o Regime Militar passou a interferir diretamente na ocupação urbana das
cidades brasileiras, criando o Sistema Financeiro de Habitação (SFH), tendo como frente o
Banco Nacional de Habitação (BNH), que financiava a construção de conjuntos
habitacionais para as classes média e baixa, os quais passaram a “ocupar a linha de frente
como vetor de direcionamento dos rumos da expansão da cidade” (Lavieri e Lavieri, 1992:9)
O Sistema Financeiro de Habitação (SFH) contribuiu para o desenvolvimento urbano,
com a ampliação dos serviços de água e luz da cidade e a valorização seletiva do solo, o
que em João Pessoa aprofundou a segregação e a exclusão social.
Na década de 1970, o aumento nos financiamentos isolados para habitação pelo
SFH contribuiu para a ocupação de bairros de melhor padrão, próximos à Avenida Epitácio
Pessoa e à orla marítima, cujas necessidades de infraestrutura urbana foram enfrentadas
pela implantação do projeto CURA13, que atuou nos bairros da orla marítima (Cabo Branco,
Tambaú e Manaíra) e do Cristo Redentor. As obras de pavimentação de vias,
redimensionamento da rede de água, instalação da rede de esgoto e implantação de
equipamentos urbanos para áreas de lazer incentivaram a procura por moradia pela classe
média e alta nestas regiões, também, beneficiadas pelo SBPE14, que passou a financiar as
unidades individuais de domicílio (SCOCUGLIA, 2000).
O projeto CURA proporcionou melhorias urbanas para alguns bairros de João
Pessoa, porém, devido às intenções de aumentar a receita fiscal, através do IPTU, tais
melhorias se restringiram às áreas mais nobres da cidade. Esse contexto favoreceu um
acelerado processo de expulsão de moradores com baixa renda desses espaços e o
surgimento das primeiras nucleações de favelas, que passaram a ocupar áreas impróprias à
exploração imobiliária, como cercanias de rodovia, vales, mangues, margens de rios, dentre
outros.
13 Comunidades Urbanas de Recuperação Acelerada 14 Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo
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Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 66
Ao longo dos anos, tais diferenciações sociais só vieram a se agravar, aumentando a
segregação socioespacial da cidade. A evolução da ocupação urbana de João Pessoa está
ilustrada pela figura 2.8; as cores mais quentes, vermelho e laranja, correspondem à região
com ocupação mais antiga, onde se registram aglomerados urbanos a partir de 1634, sendo
hoje o centro antigo da cidade, local de intensa atividade comercial e de serviços prestados.
A partir de 1923, a cidade começou a se espalhar, para leste e sul. Na década de 1930, a
cidade se desenvolveu até a praia, proporcionando as ocupações posteriores (OLIVEIRA,
2006), áreas assinaladas com as cores mais frias, azul claro e escuro, ainda estão em
processo de ocupação.
Figura 2.8 - Mapa da ocupação urbana de João Pessoa. (FONTE: OLIVEIRA, 2006)
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Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 67
2.2 Manaíra, enquanto espaço urbano
[...] onde hoje se localiza a praia de Manaíra era, naquelas priscas eras,
uma espécie de pueblo abandonado, onde as ruínas da velha Escola de
Marinheiros traíam os mais recônditos desejos de ser diferente. Os cajueiros
abundavam em sua fartura e liberdade absoluta. Os que não procuravam
uma aventura amorosa longe dos olhares citadinos faziam-na como rotina
em busca de passarinhos, de cajus, de guajirús e algumas pescarias
furtivas. (Waldemar Duarte apud AGUIAR e OCTÁVIO, 1989: 245)
Figura 2.9 - Mapa de João Pessoa, destaque da orla marítima. (FONTE: SEPLAN, editado pela autora)
N
LEGENDA:
Bairro Manaíra
Bairro Bessa
Bairro Tambaú
Bairro Cabo Branco
Bairro São José Av. Epitácio Pessoa
Av. Rui Carneiro
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Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 68
No início do século XX, a orla marítima era composta basicamente por pescadores,
algumas casas de veraneio e poucos moradores que trabalhavam na área urbana de João
Pessoa, sendo conhecida como distrito de Tambaú. A partir da década de 1960, com o
crescimento da cidade em sentido leste, a orla começou a ser loteada, o distrito se dividiu
em três bairros que assumiram a nomenclatura de Tambaú, localizado no centro entre as
Avenidas Rui Carneiro e Epitácio Pessoa; Cabo Branco, localizado ao sul, após a Avenida
Epitácio Pessoa; e Manaíra, localizado ao norte, após a Avenida Rui Carneiro (figura 2.9).
Na década de 1970, os lotes da praia se valorizaram, principalmente devido aos
incentivos do projeto CURA15. Com a melhoria na infraestrutura urbana dessa região, os
bairros Tambaú, Cabo Branco e Manaíra passaram a ser efetivamente ocupados pela
população de classe média e alta, e os pescadores e a população de menor poder aquisitivo
deixaram tais regiões, pois a valorização da área vinha conjuntamente com “a aplicação de
uma Lei Municipal que regulamenta o aumento progressivo dos impostos fundiários”
(RODRIGUES, 1981 apud LIMA, 2004: 104). Assim, a população de baixa renda aos poucos
foi “expulsa” das áreas valorizadas, passando a habitar, principalmente o vale do Rio
Jaguaribe, entre a encosta da falésia e a borda oeste do bairro Manaíra, iniciando o
processo de formação da Favela Beira-Rio (denominada bairro São José, em 1983).
Com o intuito de manter as mesmas relações sociais, parte dessa população se
alocou próximo de suas antigas moradias, porém em zonas de risco. Santos, expõe que as
famílias “expulsas dos locais de moradia e ao mesmo tempo presas pelas oportunidades de
mercado de trabalho, [...] começaram a ocupar a área [...] com características naturais
peculiares” (2007: 19), e apesar de não haver infraestrutura e do rio estar poluído, a cada
dia mais se intensifica a ocupação dessa área.
Assim, Manaíra foi perdendo sua paisagem natural de cajueiros, coqueiros e
mistério, para dar lugar a um bairro de moradia permanente, valorizado por um mercado
imobiliário crescente e incentivado pelo Sistema Financeiro de Habitação (SFH) da CEF16,
que na primeira metade da década de 1970 investiu 18% dos financiamentos em habitações
unifamiliares somente na área da orla marítima (LAVIERI & LAVIERI, 1992), estimulando
cada vez mais a ocupação dessa região.
Os anúncios publicitários da época encorajavam a ocupação residencial nos bairros
da orla marítima, (figuras 2.10, 2.11 e 2.12), também, noticiando as melhorias urbanas,
consideradas fatores atrativos não só para o veraneio, mas para a moradia permanente,
como a localização na faixa balneária, transporte urbano na porta, vias pavimentadas, luz
15 Comunidades Urbanas de Recuperação Acelerada 16 Caixa Econômica Federal
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Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 69
elétrica, água encanada, serviço telefônico, além da boa vizinhança, fator de referência aos
futuros compradores.
Figura 2.10 - Anúncio Loteamento no Manaíra, 1957 (FONTE: COSTA, 2010)
Figura 2.11 - Anúncio Loteamento Jardim Panamérica, Tambaú, 1958 (FONTE: PEREIRA, 2008)
Figura 2.12 - Anúncio Edifício de Apartamentos Manaíra, 1960 (FONTE: PEREIRA, 2008)
Entre 1960 e a primeira metade da década de 1980, os tipos de habitações, do
bairro, eram basicamente unifamiliares, na sua maioria térreas, com uma área média de
construção de 186m² (SCOCUGLIA, 2000). As edificações eram recuadas dos limites do
lote, pautadas pelo Código Municipal de 1955 e posteriormente pelo Código de Urbanismo
da Prefeitura Municipal de João Pessoa de 1976; os volumes eram arranjados segundo
setores funcionais; e tinha-se cuidado com o conforto térmico dessas habitações.
Alinham-se as ruas, alicerçam-se e sobem as casas [...] Casas isoladas,
bonitas, modernas, térreas, sobre pilotes [sic] ou super-postas [sic] em
andares que se elevam conforme o gabarito de cada vida. (MANAÍRA, 1956,
p. 2 apud PEREIRA, 2008:83).
Essa proposta urbanística oferecia uma unidade à configuração espacial do novo
bairro, pautada em um estilo de vida moderno e elitista, do qual o pobre, considerado „má
vizinhança‟, não fazia parte, sendo identificado como algo externo ao bairro. Há uma relação
entre a aparência da residência e demais fatores sociais, de modo que o tipo da casa define
o valor cultural da sociedade que a edifica, sendo uma “expressão manifesta, clara,
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 70
explícita, material, de um conjunto enorme de valores, desejos, opções socialmente
definidos.” (LEITÃO, 2009:47)
Os lotes do bairro tinham dimensões mínimas de 15m de frente por 30m de
profundidade, destinado à habitação unifamiliar, que apresentava, em sua maioria, muros
com altura média ou baixa e até inexistente, figuras 2.13 a 2.15.
Figura 2.13, 2.14 e 2.15 – Residências unifamiliares do bairro, período de construção de 1970 a 1980. (FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
A partir de 1980, os construtores do setor imobiliário de João Pessoa passaram a
oferecer um novo tipo de moradia: os edifícios residenciais, presentes desde a década de
1920 em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Recife, e já existentes, desde a década
de 1950, no centro urbano de João Pessoa, porém até então ausentes do cenário da orla
marítima.
Embora a moradia vertical tenha sido, a princípio, considerada uma solução para a
população de menor poder aquisitivo, sua manutenção demandava grandes despesas, o
que a tornou inviável; rapidamente esse quadro alterou-se e a classe média, por dispor de
alguma margem financeira, se evidenciou adequada para habitar as edificações
multifamiliares verticalizadas, em João Pessoa.
A população residente na orla marítima se enquadra nas classes média e
alta, que, ao contrário das camadas sociais de baixa renda, têm condição
de arcar não só com a manutenção da habitação vertical, mas também com
o aumento progressivo dos impostos fundiários (MOREIRA, 2006:41).
Como morar na praia passou a significar maior status social, o lote valorizou-se e a
densidade populacional na região aumentou em virtude da multiplicação da área do lote pelo
número de unidades oferecidas.
A princípio, construíram-se edifícios com pilotis mais três pavimentos; porém ao
longo dos últimos anos, a construção de prédios com grande número de pavimentos foram
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 71
sendo edificados no bairro, respaldados pelo Plano Diretor e novo Código de Urbanismo da
Cidade (2001).
Figura 2.16 - Mapa do Zoneamento e Uso Ocupacional de João Pessoa
(FONTE: PREFEITURA MUNICIPAL DE JOÃO PESSOA, 2007.)
Em 2001, foram definidas novas áreas de distribuição em um novo Código de
Urbanismo; o Art. 167 determina as áreas de distribuição dos usos previstos em Zonas e
Setores (figura 2.16). As primeiras quadras estão delimitadas para Zona Turística (ZT2),
faixa já definida na Constituição Estadual de 1988, com testada de 12,90m de altura; a Zona
Residencial (ZR1) tem índice básico de aproveitamento 1,00; e a Zona Axial (ZA3), zona
adensável com índice de aproveitamento que pode chegar a 4,00 (definido no Art. 20 do
DECRETO Nº 4.225 DE 11 DE ABRIL DE 2001), ou seja, uma edificação pode distribuir a
área do lote em andares verticais de até quatro vezes o espaço correspondente deste lote.
Ao longo dos anos, aumentou o número de moradias verticalizadas construídas em
grandes lotes, ou em lotes remembrados17 de uma mesma quadra, formando condomínios
com acesso único, com portarias, muros altos, cercas eletrificadas e câmeras de vigilância.
A população do bairro Manaíra se fechou dentro dos muros, reduzindo as ruas à condição
de espaço de ninguém, lugar de conflito, de violência. Tereza Caldeira (2008) identificou
essa nova característica da forma do habitar pós-moderno das cidades brasileiras, em
“Cidade de Muros”; e Frederico Holanda (2010) argumenta que tais modos do habitar geram
a negação da urbanidade, a morte dos espaços públicos, a morte das cidades. Nas figuras
17 Remembramento é a reunião de dois ou mais lotes, anteriormente lotados, para construir uma nova divisão legal. (Código de Urbanismo, Prefeitura Municipal de João Pessoa, 2001. Art. 79)
ZT2 – Zona Turística 2
ZR1 – Zona Residêncial 1
ZA3 – Zona Axial 3
N
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Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 72
2.17 a 2.19 é possível identificar essa realidade, onde muros de residências foram
aumentados e foram incorporados artifícios de segurança.
Figura 2.17, 2.18 e 2.19 - Residências unifamiliares, 2010, muros altos e artifícios de segurança.
(FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
Além das edificações residenciais, o bairro Manaíra também apresenta espaços de
comércio e lazer, como o Shopping Center Manaíra, instalado desde 1989 ao norte do
bairro, próximo à falésia do bairro São José e ao Rio Jaguaribe, que tem como vias de
acesso principal a Avenida Governador Flávio Ribeiro Coutinho e Avenida Manuel Arruda
Cavalcanti. Esse espaço passou a oferecer facilidades de consumo, com uma concentração
diversificada de lojas, praça de alimentação, faculdade, salão de festas, casa de show,
bancos, estacionamento, entre outros serviços. Esse estabelecimento passou a simular um
verdadeiro centro diversificado, incentivando o deslocamento de muitas atividades do centro
comercial para a área litorânea, reduzindo os deslocamentos de quem habita nas zonas
norte e leste de João Pessoa. As figuras 2.20 e 2.21 ilustram a fachada principal do
shopping e o mapa de localização.
Figura 2.20 - Shopping Manaíra
(FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
Figura 2.21 - Mapa de localização
(FONTE: Google Earth, 2010.)
Outro centro comercial de grande porte do bairro é o Mag Shopping, situado na
mesma Avenida Gov. Flávio Ribeiro Coutinho com fachada frontal voltada para a orla
N
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Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 73
marítima, Avenida João Maurício. Tal espaço oferece uma área de lazer com restaurantes,
bares, salas de cinema, dispõe de lojas comerciais e bancos, além de ter salas para
atendimento clínico e terapêutico, alguns órgãos municipais, instituições de ensino. As
figuras 2.22 e 2.23 apontam a fachada principal e a localização aérea desse espaço.
Figura 2.22 - Mag Shopping
(FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
Figura 2.23 - Mapa de localização
(FONTE: Google Earth, 2010.)
Manaíra também oferece espaços de lazer como o calçadão da orla marítima e as
praças: Chateaubriant de Souza Arnaud, Alcides Carneiro, Desembargador Silvio Porto e a
Quadra do Manaíra. Esses espaços foram e estão sendo reformados pela Prefeitura
Municipal de João Pessoa. Apesar de serem espaços públicos, são pouco utilizadas pelos
moradores do bairro. Tais praças estão representadas pelas figuras 2.24, 2.25, 2.27 e 2.28 e
marcadas no mapa na figura 2.26.
N
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 74
Figura 2.24 - Praça Desembargador Silvio Porto.
(FONTE: arquivo pessoal, 2010.) Figura 2.25 - Praça Alcides Carneiro.
(FONTE: PMJP, 2010.)
Figura 2.27 - Praça Chateaubriant de Souza Arnaud. (FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
Figura 2.28 - Quadra do Manaíra.
(FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
Figura 2.26 - Mapa de Localização das praças
(FONTE: Google Earth, 2010.)
N
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 75
2.3 Manaíra: O “Vale do Medo”, “o ambiente hostil”
Não havia que negar, por outro lado, que aquelas extravagantes cumeeiras
pontiagudas e aqueles singulares torreões suspensos formavam um cenário
adequado a terríveis e trágicos desígnios. (DOYLE, 1915)
A expressão „o vale do medo‟ foi retirada de um dos livros de Doyle (1915) para
caracterizar o mistério que os muros encerram. No atual contexto brasileiro, acentuado pelo
cenário urbano da violência, as atitudes de isolamento se materializam, particularmente, nas
edificações, principalmente residenciais, protegidas por muros altos e equipamentos de
segurança. Com isso, os espaços públicos da cidade tornam-se „mal vistos‟ e a rua,
considerada um espaço de relações de vizinhança e lazer tem seu movimento restrito a
passantes apressados e temerosos, apertados no espaço estreito que margeia vias, pelas
quais circulam rapidamente os veículos, ladeados por paredões fechados.
Esse traço de diferenciação da ocupação do solo na capital paraibana, fortemente
vinculada ao extrato social de seus habitantes, é também observado por Lavieri e Lavieri ao
afirmar que “o uso do solo tornou-se mais estratificado e as novas ocupações que foram se
formando na cidade já surgiram bem mais marcadas pelo nível de renda de seus ocupantes”
(1992:48).
No espaço urbano de João Pessoa, apesar da relativa mesclagem social que esteve
presente tanto na cidade colonial quanto na urbanização ocorrida no início da República,
percebe-se que desde aquela época a única coisa em comum entre as classes sociais era a
rua, apreciada e usufruída de modos diferentes pelos habitantes: enquanto a população de
baixo poder aquisitivo a torna uma extensão do seu habitar, espaço de liberdade, encontros,
negócios e brincadeiras, a população com maior poder aquisitivo a encara com
desconfiança, como espaço dos marginalizados, do plebeu, do perigo, a ser evitado e se
fecha em seus muros.
Gilberto Freyre (1996) mostra que essas relações com a rua são traços de um
patriarcalismo brasileiro, vindo dos engenhos para os sobrados, onde houve uma relação
simbiótica da casa-grande e a senzala, com o sobrado e o mocambo.
Na segunda metade do século XIX, houve uma aproximação dos habitantes
citadinos à rua. Com a presença da corte, o aumento da população urbana, de uma classe
trabalhadora de ex-escravos e imigrantes estrangeiros, e, posteriormente, com a
implantação de indústrias, as cidades brasileiras passaram por um processo de
reestruturação, com melhorias, principalmente de infraestrutura urbana. A rua, então,
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 76
torna-se local não só de circulação, mas de encontros, negócios, lazer. Porém, a
concentração da população em centros maiores favoreceu a proliferação da criminalidade,
embora restrita a delitos de pouca importância, como: furtos, muitos decorrentes da miséria
e da fome, ou tumultos em via pública, em casos de descontentamento político, como na
Revolução de 1930 e no Estado Novo.
Nesse período, não só a cena política estava agitada, como havia uma busca, por
parte dos intelectuais, por uma identidade brasileira. Além de movimentos artísticos, surgem
novos ideais urbanos, pautados pelos preceitos modernistas corbusianos de moradia,
trabalho, lazer e circulação. Apesar da procura por novas referências culturais, percebe-se a
permanência das relações sociais seculares, presentes desde a colônia. Bruand identifica
duas tendências nacionais, presentes nesse período: a vontade de progredir, o que significa
romper com o passado, e um apego, ao mesmo tempo sentimental e racional, a esse
passado (2003: 25).
O Brasil viu-se então numa situação social intermediária, entre a civilização
industrial de tipo europeu ou norte-americano e o antigo regime, cujas
conseqüências podem ser sentidas ainda hoje [...] Assim é que a residência
particular de alto padrão e mesmo [as destinadas à classe média], conserva
uma clientela; com todo o conforto moderno associado à abundância de
empregadas domésticas (BRUAND, 2003: 20)
A habitação moderna buscou uma socialização com a rua, a casa se abriu com
amplas janelas, jardins tropicais delimitados por muros baixos e translúcidos, havendo uma
interação entre a área interna e a área externa; entre a casa e a rua.
Atualmente, as cidades brasileiras passam a assumir “um aspecto caótico,
proveniente da justaposição desordenada de edifícios concebidos isoladamente e não em
função de um conjunto.” (BRUAND, 2003:24) As relações de sociabilidade se perderam e
voltamos a nos assemelhar, com o habitar do período imperial brasileiro, onde os sobrados
se fechavam para as ruas, e agora temos condomínios fechados e protegidos por seus
“bunkers” de segurança. Desse modo, a rua, nos bairros da elite, voltou a ser um espaço de
negação da urbanidade (HOLANDA, 2010), ver figuras 2.29 a 2.34, que representam
paisagens urbanas do bairro Manaíra.
Todavia, também nos bairros populares estão presentes alguns desses traços, como
muros altos, grades, cercas. Contudo, ainda permanecem presentes as práticas de
encontros na calçada, festas nas ruas, feiras, diferentemente do que ocorre nos bairros mais
elitizados, onde a rua se torna um espaço restrito à circulação, principalmente veicular.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Contextualizando: O Espaço Objeto de Estudo 77
Figura 2.29, 2.30, 2.31, 2.32, 2.33, 2.34 - Paisagens do bairro Manaíra, 2010.
(FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
3.
Procedimentos Metodológicos de Investigação
O procedimento investigativo foi trabalhado a partir de um estudo comparativo entre
a morfologia urbana e o crime; para tanto se buscou métodos que proporcionam a
representação, quantificação, observação e análise de uma realidade espacial, com o intuito
de identificar como os atributos físicos interagem com ações delitivas. Dessa maneira, a
pesquisa desenvolvida abrange multimétodos (PINHEIRO; GÜNTHER, 2008), devido à
necessidade de se obter mais de uma base de informação para a aquisição de dados que
favoreçam a compreensão de um fenômeno socioespacial, tendo como intuito captar
elementos que possam esclarecer melhor a realidade sobre a violência urbana, que provoca
o medo e gera a insegurança.
A pesquisa adotou como procedimento o método estruturalista, relacionado com os
problemas operacionais, no qual partiu-se da investigação de um fenômeno concreto e sua
análise a nível abstrato, por intermédio da construção de um modelo representativo do
objeto de estudo, retornando, por fim, ao nível do concreto, dessa vez como uma realidade
estruturada e relacionada com a experiência observada (LAKATOS & MARCONI, 2004).
A analogia é emprestada para as cidades, as palavras sendo os itens físicos
componentes e o significado a compreensão das relações entre eles. O
enquadramento da abordagem como relacional e estruturalista pressupõe
que a significação será encontrada por meio do estudo da estrutura
relacionada neste sistema estabelecido. A cidade como um sistema fechado
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 79
resultará num artefato passível de análise e interpretação, com base nesta
delimitação precisa (MEDEIROS, 2006: 90).
Medeiros (2006) argumenta que a noção de estrutura também contempla uma
referência espacial, sendo aplicável à interpretação no domínio das formas-espaços, através
de um princípio topológico capaz de estabelecer propriedades existentes entre prioridades e
diferenças, hierarquias e distinções. Adotou-se este método com o intuito de relacionar o
fenômeno da criminalidade, objeto do estudo, com relação às características físicas e
morfológicas do espaço onde ele ocorre.
A partir do material que compôs o referencial teórico, pode-se identificar que a
problemática enfocada é recorrente nos países desenvolvidos e subdesenvolvidos, e com
base nos estudos metodológicos foi possível conhecer o processo das pesquisas realizadas,
identificando-se os objetos pesquisados, métodos e procedimentos utilizados, além de
novos referenciais bibliográficos que favoreceram o enriquecimento e orientação do trabalho
desenvolvido. Tais dados possibilitaram uma análise quantitativa, permitindo a estruturação
de planilhas e gráficos que esclarecessem como a violência se comporta na cidade e no
bairro específico. Para o desenvolvimento desse trabalho realizou-se coleta de dados junto
ao Centro Integrado de Operações Policiais – CIOP, da Secretaria de Segurança Pública da
Paraíba.
As informações foram articuladas numa base de representação espacial, o Sistema
de Informação Geográfica (SIG), no qual foi permitido manusear e analisar as variáveis
morfológicas e criminais, obtendo-se com isso mapas temáticos e gráficos de correlação;
além de permitir a identificação das propensas vias de insegurança, partindo da
compreensão do movimento natural e de como as propriedades sintáticas dos espaços
poderão fornecer dados relevantes para a descoberta de espaços com tendências mais ou
menos favoráveis à criminalidade.
O uso dessas técnicas de levantamento de dados possibilitou a identificação dos
fatos e fenômenos que cercam o contexto espacial e social, com relação à criminalidade
urbana tão frequente nas cidades atuais, além de descobrir fatores que influenciam ou
determinam opiniões e condutas dos habitantes. Esses procedimentos são detalhados a
seguir nos tópicos que integram este capítulo do trabalho.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 80
3.1 Análise sobre Crime
As estatísticas criminais surgiram a partir da necessidade de se obter dados que
possam subsidiar a tomada de decisões dos órgãos governamentais responsáveis pela
segurança pública. A princípio, no Brasil, a informação de dados estatísticos de
criminalidade ficava restrita somente a determinados órgãos governamentais, não sendo
permitida sua divulgação.
O recurso ao sigilo e ao segredo, historicamente utilizado no Brasil como
tática de não transparência dos atos governamentais na área de justiça
criminal e segurança pública, perde força política em razão de mudanças
legislativas, pressões de grupos sociais organizados e investimentos em
informatização. (LIMA, 2005:11)
A partir da década de 1980, a transparência pública começa a se tornar pressuposto
estruturador das ações do Governo, porém existiam incompreensões na análise dos
relatórios estatísticos. Somente em meados da década de 1990, a produção de estatísticas
criminais começa a se consolidar, o problema passa a não ser mais a produção dos
relatórios e sim como estes estariam disponíveis à compreensão de quem iria interpretá-los.
Ao se reconstituir e mensurar as ocorrências criminais, a partir de registros e
documentos disponíveis de instituições responsáveis pela produção de dados estatísticos,
há que se estar atento à maneira como os dados são registrados pelas instituições que os
produzem, o que eles revelam com relação às categorias e tipos de criminalidade, e como
expõem tais informações. Os dados oficiais têm o intuito de divulgar informações, através da
quantificação de como determinados atos criminais se comportam em uma nação, estado,
cidade, ou especificamente, um bairro, a partir de pressupostos de políticas sociais
desenvolvidas pelos governos.
Em algumas cidades brasileiras passam a surgir materiais de informação que
facilitam a compreensão dos dados estatísticos de criminalidade, como: o sistema de
geoprocessamento de ocorrência, a disponibilização de processos judiciais na internet, a
rede de informações INFOSEG, entre outros. Porém tais informações são tratadas e
fornecidas para um público que conhece a leitura desses processos e muitas das páginas
disponíveis na internet, são acessadas com senha específica.
Outro problema identificado são as „cifras negras‟, que são a parcela das vítimas que
não chega a denunciar aos distritos policiais as ofensas criminais sofridas, chegando a
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 81
tornar os dados estatísticos oficiais diferentes do que a sociedade compreende e percebe
(LIMA, 2005). Além disso, os dados estatísticos oficiais indicam certa tendência ou como a
criminalidade se comporta, principalmente, se for analisada por um longo período, não
correspondendo ao total real de crimes cometidos, porém permitindo detectar a evolução e o
movimento dos crimes durante determinado tempo.
3.1.1 Levantamento e Coleta de Dados
Tentando compreender como se comporta a violência em João Pessoa e no bairro
Manaíra, primeiramente buscaram-se informações junto à Delegacia Distrital do Bairro, onde
foram analisados os boletins de ocorrência. Percebeu-se uma grande inconstância dos
dados fornecidos. A Delegacia tem plantão 24 horas, com diversas equipes e diferentes
delegados, e cada um desenvolve um B.O diferente, não existindo um padrão no
armazenamento das informações. Dessa maneira, optou-se por recolher dados oficiais do
CIOP (Centro Integrado de Operações Policiais), fornecidos pela Secretaria de Segurança
Pública da Paraíba, nos anos de 2008 e 2009, que poderiam disponibilizar informações não
só do bairro específico, mas de toda a capital.
A Secretaria Nacional de Segurança Pública da Paraíba, no Departamento de
Pesquisa, Análise da Informação e Desenvolvimento de Pessoal em Segurança Pública,
com o intuito de promover a integração das organizações de segurança pública criou o
CIOP (Centro Integrado de Operações Policiais), que tem por finalidade cadastrar as
ocorrências policiais que chegam através do número de telefone de emergência 190. Este
órgão funciona 24 horas e é responsável por centralizar as ações da Polícia Civil, Militar e
do Corpo de Bombeiros, além de colaborar com a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária
Federal. Na figura 3.1 configura-se esquematicamente como funciona o CIOP na Paraíba.
Figura 3.1 - Esquema do CIOP
(FONTE: arquivo pessoal.)
ColaboraçãoAçãoLigação
190
CIOP
Polícia Militar
Polícia Civil
Corpo de Bombeiros
Polícia Federal
P. Rodoviária Federal
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 82
Com a autorização do Secretário de Segurança, Dr. Gustavo Ferraz Gominho, e a
colaboração da Major Valtânia F. da Silva, responsável pelo Centro Integrado de Operações
de Segurança e Defesa Social, em 2009 e 2010, obtive-se informações de como a
criminalidade se distribuiu em todo o município de João Pessoa, além de se identificar,
especificamente, as ocorrências do bairro Manaíra. Os dados apresentados foram coletados
com o intuito de comparar e identificar como a criminalidade se comporta na cidade e no
bairro específico, nos anos de 2008 e 2009.
Os dados foram fornecidos por duas planilhas do Excel: uma quantificava o tipo de
ocorrência criminal de cada bairro, entre os anos definidos, ver figura 3.2; e a outra planilha,
mais detalhada, caracterizava as ocorrências do bairro Manaíra, definindo a natureza do
crime, o local, a data, a hora, algum ponto de referência, o relato do solicitante, a solução da
viatura que foi ao local, além de definir características do envolvido, como nome, cidade,
bairro e endereço onde mora, idade, profissão, seja o envolvido vítima, acusado ou
testemunha. Exemplo de planilha nas figuras 3.3 e 3.4, sendo esta última apenas uma
continuação da primeira.
Figura 3.2 – Exemplo de planilha de ocorrências criminais nos bairros de João Pessoa, 2008.
(FONTE: CIOP, 2010, adaptado pela autora.)
Figura 3.3 - Exemplo de registro de ocorrências no bairro Manaíra, 2008.
(FONTE: CIOP, 2010, adaptado pela autora.)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 83
Figura 3.4 - Exemplo, continuação Figura 3.3.
(FONTE: CIOP, 2010, adaptado pela autora.)
Os dados estatísticos da criminalidade, obtidos junto à Secretaria de Segurança,
passaram por um tratamento específico de limpeza e triagem de informações,
primeiramente com a definição específica da natureza do crime; em seguida, exclusão dos
dados repetidos, em que mudava apenas o agente: vítima, testemunha ou acusado; além
das informações incompletas, principalmente com relação ao local. Isso permitiu,
posteriormente, desenvolver gráficos que esclarecessem de uma forma simples e objetiva
como se comporta a violência em João Pessoa e no Manaíra. Além de favorecer o
mapeamento dos pontos de ocorrências criminais e com isso desenvolver diversos mapas
que pudessem ilustrar como a criminalidade atua.
Na análise dos dados, dois fatores foram importantes e necessários, um refere-se ao
quantitativo, que facilitou a construção de gráficos; e o outro, à especificação das
ocorrências, que proporcionou mapear o crime no bairro. Dessa forma, os dados tratados
permitiram uma melhor compreensão dessas informações.
3.1.2 Georreferenciando a Criminalidade
Com o intuito de identificar “onde” a criminalidade ocorre e quais os elementos
espaciais que colaboram para a oportunidade do crime, como argumentado anteriormente,
adotou-se como ferramenta o SIG (Sistema de Informação Geográfica), que é um processo
capaz de armazenar, manipular e analisar elementos espaciais e não espaciais, a partir de
um conjunto de dados. As informações registradas em um programa SIG são
georreferenciadas, ou seja, estão associadas a uma determinada coordenada geográfica.
Dessa maneira, os dados do CIOP foram geocodificados, de acordo com os pontos de
referência registrados na ocorrência, em mapas georreferenciados, por uma base
cartográfica; e geoprocessados por uma ferramenta de Sistema de Informação Geográfica
(SIG) através de softwares capazes de reconhecer, armazenar e manipular as informações
existentes. Vale ressaltar que os pontos localizados nos mapas das ocorrências criminais
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 84
não possuem coordenadas geográficas definidas pelo CIOP, tais pontos foram marcados de
acordo com o endereço e pontos de referência fornecidos na planilha desse órgão.
Para armazenar os dados de criminalidade do CIOP no SIG foram adotados os
procedimentos, detalhados nos cinco itens que se seguem:
1. CONSTRUÇÃO DO MAPA DE CRIMINALIDADE DE JOÃO PESSOA
Primeiramente foram acrescentadas as ocorrências gerais de cada bairro, em
um mapa completo de João Pessoa; a construção desse mapa teve como
intuito identificar e explicitar os bairros mais violentos da cidade, nos anos de
2008 e 2009.
Os mapas foram trabalhados com dados cadastrais, ou seja, as informações foram
acrescentadas em objetos identificáveis que possuíam atributos físicos, como os limites dos
bairros. Acrescentaram-se informações gerais da criminalidade de cada bairro, com o intuito
de se identificar como a violência se comporta nos bairros de João Pessoa e,
especificamente, Manaíra. A quantidade de ocorrências foi dividida em cinco grupos,
definidos por bolas centróides que crescem e mudam de cor (com escala do amarelo ao
vermelho), de acordo com a maior incidência de crimes, nos anos de 2008 e 2009. Também,
foi registrado o rendimento mensal por domicílio particular permanente no ano de 2000, nos
61 bairros da cidade, de acordo com os dados do IBGE, ver figuras 5.2 e 5.3.
2. TRIAGEM E SELEÇÃO DOS CRIMES MAIS COMUNS DO BAIRRO
Trabalhou-se com 3.298 registros de ocorrência, apenas do bairro Manaíra,
sendo 1.801 no ano de 2008, e 1.497 no ano, de 2009. Foram identificados
mais de 70 tipos diferentes de natureza do crime: de agressão até violação de
domicílio.
Realizou-se uma triagem dos registros referentes à incidência de roubo, furto,
tentativa de roubo e tentativa de furto. Em seguida foi feita uma análise mais
objetiva, na qual se identificou que partes destes dados apresentavam
dificuldades e inconsistências, sendo por isto descartado, além de algumas
ocorrências possuírem informações repetidas, dependendo da quantidade de
registros de vítimas e acusados; devido a esse fato foi considerado apenas
um registro. Também verificou-se que existem ocorrências com dados
incompletos, principalmente com relação à localização, sendo essas
eliminadas.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 85
Dentre os furtos no ano de 2008 foram registradas 239 ocorrências. Após
uma seleção, foram mantidos 179 registros, que correspondem a: 1 furto a
igreja, 22 a pessoas, 10 de bicicleta, 10 de carro, 1 de moto, 50 em
estabelecimento (comercial), 1 em estabelecimento de ensino, 51 em
residência, 8 em veículo e 31 tentativas de furto.
Os furtos registrados no ano de 2009 foram 165, mantendo-se apenas 131,
que são: 19 furtos a pessoas, 6 de bicicleta, 5 de carro, 1 de moto, 35 em
estabelecimento (comercial), 31 em residência, 9 em veículo e 25 tentativas
de furto.
Com relação aos incidentes de roubo, no ano de 2008, foram documentadas
412 ocorrências, sendo selecionadas apenas 300, que foram: 1 roubo a
farmácia, 222 a pessoas, 1 a posto de combustível, 7 a residência, 23 de
carro, 1 de moto, 18 em estabelecimento (comercial), 1 em transporte
coletivo, 1 em veículo e 25 tentativas de roubo.
Em 2009, de 373 registros, restaram 271 ocorrências com informações
seguras, que são: 1 roubo a farmácia, 1 a padaria, 186 a pessoas, 3 a posto
de combustível, 11 a residência, 15 de carro, 2 de moto, 21 em
estabelecimento (comercial), 3 em transporte coletivo, 1 em veículo e 27
tentativas de roubo.
Houve uma perda de cerca de 25 % das informações fornecidas pelo CIOP,
após a triagem dos registros criminais, nos respectivos anos.
3. CRUZAMENTO DE INFORMAÇÕES DA PLANILHA COM O MAPA
Com as planilhas selecionadas, foi acrescentada uma coluna ID (identidade),
em cada linha de informação criminal; na coluna ID foram acrescentadas
numerações de ordem crescente. Cada número ia sendo pontuado no mapa
georreferenciado do bairro e, em seguida, os dados da planilha foram unidos
aos atributos dos pontos no mapa, permitindo visualizar espacialmente as
informações da planilha do CIOP. Todo esse procedimento foi realizado no
programa Openjump.
4. PROBLEMAS DE PERCURSO
A base cartográfica de João Pessoa não apresenta a numeração dos lotes e
nem o entorno das edificações. Além de alguns endereços fornecidos pelo
CIOP não apresentarem número e, sim, ponto de referência. Com isso, boa
parte dos registros teve que ser verificada in loco, para ser pontuada com
segurança.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 86
5. OBSERVAÇÃO IMPORTANTE
Numa primeira análise dos dados, observa-se que existem algumas vias
importantes do bairro Manaíra, onde há espaços atratores de crime, ou estes
já são considerados pontos de referência estratégicos para localização do
CIOP ou da pessoa que denuncia, como: a Avenida Flávio Ribeiro Coutinho,
a Avenida Edson Ramalho e a Avenida João Câncio. Observam-se
pouquíssimos registros na Avenida Senador Rui Carneiro, o que não
corresponde aos boletins de ocorrência da 10° Delegacia Distrital. Como essa
é uma avenida de divisa entre dois bairros, conclui-se que, provavelmente, os
registros do CIOP para essa avenida foram alocados no bairro vizinho,
Tambaú.
Foram mapeados os crimes no bairro, com o intuito de identificar onde são os pontos
mais comuns de ocorrências e como esses pontos se comportam com relação à
acessibilidade e visibilidade do bairro.
3.2 Análise sobre Espaço
As informações obtidas da Secretaria de Segurança da Paraíba, a princípio
permitiram desenvolver gráficos que expõem quantitativamente a criminalidade em João
Pessoa, podendo-se fazer análises comparativas entre bairros e descobrir quais os crimes
com maior incidência. Tais informações são importantes e relevantes, porém elas não
revelam onde os crimes ocorrem; e, muito menos, se existem fatores ligados à morfologia
do bairro que favorecem a criminalidade; se os magnetos do bairro coincidem ou não com a
existência de delitos; e se os atributos físicos da forma edificada e espacial interferem nos
eventos de violência e criminalidade. Também não esclarecem, especificamente, a tipologia
das barreiras físicas dos lotes e se existe algum fator espacial em comum que facilite atos
criminosos. Com base nesses questionamentos, amplia-se a pesquisa com o intuito de
localizar tais informações em mapas, podendo-se, assim, fornecer maiores esclarecimentos
quanto ao padrão criminal do bairro.
Dessa maneira, os mapas expostos foram desenvolvidos a partir de observações in
loco, através da identificação morfológica dos padrões de uso, tipos de muro e artifícios de
segurança adotados pelos moradores do bairro.
Os dados tipológicos e morfológicos do bairro foram acrescentados diretamente
sobre um mapa georreferenciado, onde cada lote corresponde a uma célula que reúne os
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 87
seguintes atributos: nome da rua, classificação e codificação do uso do solo (estabelecida
pela Prefeitura Municipal de João Pessoa), o uso, o tipo de uso, a caracterização das
barreiras (o muro) e os tipos de segurança visível. Tais dados estão explicados e
exemplificados no item a seguir
3.2.1 Levantamento Físico-Espacial do Bairro
O Bairro Manaíra tem cerca de 2,4 km² de área distribuídos em 208 quadras, com
traçado regular e plano que se adequam entre duas barreiras naturais, o Oceano Atlântico a
leste e o Rio Jaguaribe com a falésia a oeste. Manaíra tem limites ao sul com o bairro
Tambaú, delimitado pela Avenida Senador Rui Carneiro; ao norte, com o bairro Aeroclube e
Jardim Oceania (antigo bairro Bessa), demarcado pela Avenida Governador Flávio Ribeiro
Coutinho; e a oeste, pelo bairro São José, que margeia o Rio Jaguaribe. (Figura 3.5)
Figura 3.5 - O bairro Manaíra e seu entorno. (FONTE: Google Earth, 2010, editado pela autora.)
A estrutura urbana das ruas é definida por duas vias arteriais que dão acesso e
limitam o bairro. São elas: Avenida Senador Rui Carneiro (1) ao sul, e Avenida Governador
Flávio Ribeiro Coutinho (2) ao norte. São vias de tráfego intenso, com duas mãos de
cruzamento e canteiro central, com sentido de movimento oeste para o centro e leste para a
praia. As vias coletoras definem os corredores de movimento principal do bairro, cruzando-o
no sentido norte-sul. Dentre tais ruas, temos: Avenida João Câncio da Silva (3), com tráfego
N
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 88
sentido norte; Avenida General Edson Ramalho (4) com movimento único sentido sul,
Avenida João Maurício (5) que margeia a orla marítima com movimento sentido norte,
Avenida Esperança (6) sentido sul; e Avenida Monteiro da Franca (7) com sentido norte e
sul. Recentemente o STTRANS18 acrescentou algumas ruas como vias coletoras, com o
intuito de distribuir mais o trânsito dentro do bairro, são elas: Avenida Guarabira (8) com
movimento sentido norte; Avenida Maria Rosa Sales (9) com tráfego sentido sul; e as Ruas
Euzely Fabrício de Souza (10) e Juvenal Mário da Silva (11) que cruzam o bairro
perpendicularmente sentido leste/oeste. Tais vias dão acesso às ruas locais ou a áreas
restritas do bairro. As vias arteriais e coletoras estão pavimentadas com manta asfáltica, as
vias locais têm como pavimento paralelepípedos, tais ruas estão identificadas pelos seus
respectivos números, na figura 3.6.
Figura 3.6 - Vista das principais vias do bairro Manaíra. (FONTE: Google Earth, 2010, editado pela autora.)
18
Superintendência de Transportes e Trânsito
(9)
(7)
(3)
(10)
(6)
(8) (4)
(5)
(1)
(2)
(11)
N
1) Av. Sen. Rui Carneiro
2) Av. Gov. Flávio Ribeiro Coutinho
3) Av. João Câncio
4) Av. Gen. Edson Ramalho
5) Av. João Maurício
Via Arterial
Via Coletora
Via Coletora
(nova)
6) Av. Esperança
7) Av. Monteiro da França
8) Av. Guarabira
9) Av. Maria Rosa Sales
10) Av. Euzely Fabrício de Souza
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 89
Buscou-se, em sequência, definir as características morfológicas do bairro, o que se
iniciou com a aquisição de um conjunto de cartas geográficas de João Pessoa, com
coordenadas georreferenciadas já representados por uma base CAD.
O armazenamento das informações morfológicas do bairro Manaíra, no SIG –
procedeu-se na seguinte ordem:
I. OBTENÇÃO E LIMPEZA DO MAPA
Organizou-se o mapa existente da Prefeitura Municipal de João Pessoa no
software AutoCAD, com a criação de camadas individuais para se trabalhar
em um software SIG. Cada camada, então, passou a ter um único tipo de
entidade (ponto, linha ou polígono), que seria composto ou não por um
conjunto de atributos. Cada entidade passaria a armazenar dados não
espaciais em uma planilha de modelo “georrelacional”.
II. DEFINIÇÃO DE CAMADAS (ATRIBUTOS)
Barreiras – indicam os acidentes geográficos que delimitam o bairro, como o
Oceano Atlântico (a leste) e o Rio Jaguaribe, conjuntamente com a falésia (a
oeste);
Entorno – linhas que definem as imediações dos bairros vizinhos, utilizadas
apenas como referência de proximidade ao objeto de estudo;
Bairro – polígono que demarca a área do bairro;
Quadra – polígonos fechados compostos por um conjunto de lotes que
delimitam as vias de circulação do bairro;
Lotes – polígonos fechados que representam uma unidade particular de
propriedade. Nessa camada foi acrescentado um conjunto de atributos, com o
intuito de identificar as características de uso e ocupação do solo e os tipos
de barreiras físicas.
III. USO E OCUPAÇÃO DO SOLO
Para definir as características de uso e ocupação do solo foram determinadas
algumas classificações gerais para uso, e específicas para o tipo de uso e
ocupação do solo, representadas no quadro 3.1.
USO RESIDÊNCIA COMÉRCIO SERVIÇOS INSTITUIÇÃO OUTROS
TIPO DE USO (ocupação)
Unifamiliar Loja Salão de beleza Colégio Terreno
Multifamiliar Farmácia Clínica Creche Praças
Hotelaria Padaria Laboratório Clube
Mercadinho Imobiliária Igreja
Alimentação/Lazer Academia Banco
Posto de combustível Cartório
Centro Comercial
Outros Outros Outros Outros Quadro 3.1 - Tabela de Uso e Ocupação do Solo. (FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 90
A figura 3.7 ilustra como a tipologia residencial se comporta no bairro Manaíra:
identifica-se que 1.870 lotes são ocupados por residências unifamiliares, que correspondem
a 84%, enquanto existem 345 lotes com residências multifamiliares. Há uma dispersão por
todo o bairro dessas duas tipologias, havendo uma rarefação em vias de maior movimento,
onde os lotes foram ocupados por comércio e serviços. Também deve-se salientar que em
algumas residências desenvolvem-se atividades comerciais ou de serviços informais, como
salões de beleza, costureiras, aulas particulares, dentre outros.
Figura 3.7 - Mapa de tipologia residencial. (Fonte: arquivo pessoal.)
No mapa de uso, na figura 3.8, identificam-se as atividades principais do bairro,
situadas principalmente nas duas vias arteriais, Avenida Senador Rui Carneiro, ao sul, e
Avenida Governador Flávio Ribeiro Coutinho, situada ao norte. Existem também vias
coletoras, antigas, de tráfico mais intenso, que cruzam o bairro no sentido norte e sul, onde
se fixaram pontos comerciais, de serviços e alimentação, que são: Avenida General Edson
Ramalho, via de grandes butiques e lojas de decoração; Avenida João Câncio, Avenida
Esperança, Avenida Monteiro da Franca, e Avenida João Maurício (orla marítima).
84%
16%
Gráfico
N
Figura 1 – Mapa Tipologia Residencial
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 91
Figura 3.8 - Mapa de uso do solo. (FONTE: arquivo pessoal.)
IV. CODIFICAÇÃO DOS USOS DO SOLO
Além desta classificação criou-se, também, um atributo referente ao tipo de
codificação utilizado no Código de Urbanismo da Prefeitura Municipal de
João Pessoa, essa codificação caracteriza melhor os tipos, além de se ter
como referência um documento oficial do município (ver Quadro 3.2). Essa
classificação é dividida em três categorias: (i) Uso Residencial, (ii) Usos
Comerciais, de Proteção de Serviços, Culturais e Recreacionais e (iii) Uso
Industrial. Nem todos os usos foram identificados no bairro Manaíra,
porém, achou-se conveniente explicitá-los.
72%2%
5%
5%2%
1%2%
11% Gráfico
N
N
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 92
Uso residencial
USO CARACTERÍSTICA TIPO
R1 1 unidade domiciliar por lote Unifamiliar
R2 2 unidades domiciliares por lote Unifamiliar
R3 3 ou mais unidades domiciliares por lote Unifamiliar
R4 Grupamento de edificações constituindo condomínio Unifamiliar
R5 Edificação ou Edificações até 4 pavimentos (com pilotis) Multifamiliar
R6 Edificação ou Edificações com mais de 4 pavimentos Multifamiliar
R7 Programa Habitacional de Relocalização de Populações de Habitações Subnormais, a ser desenvolvido pela prefeitura.
Unifamiliar
Usos comerciais, de proteção de serviços, culturais e recreacionais
Atividades compatíveis com Uso Residencial e de atendimento direto e cotidiano a essas áreas
USO CARACTERÍSTICA TIPO
C1 ATIVIDADES DE VIZINHANÇA Padaria, Mercearia ou Mercadinho, Farmácia e Drogarias, Posto Telefônico; Telégrafo ou Postal, Escola Primária ou Maternal, Edificações para fins religiosos,
* Salão de beleza, Academia, Lava-Jato, Clínica Veterinária
Atividades compatíveis com uso residencial e de atendimento esporádico a essas áreas, podendo causar incômodos, sendo desejável a sua implantação em áreas especificamente zoneadas para os fins:
USO CARACTERÍSTICA TIPO
C2 EQUIPAMENTOS DE ATENDIMENTO AO VEÍCULO
C3 EQUIPAMENTOS PARA ATENDIMENTO Lanchonete, bares, restaurantes, sorveterias * salão de festas
C4 EDUCACIONAIS
Escolas secundárias, escolas especializadas, cursos pré-vestibulares, escolas superiores* curso de línguas
C5
EQUIPAMENTOS DE SAÚDE (E ASSISTÊNCIAIS)
Postos médicos, clínicas e consultórios, laboratórios de análise, ambulatórios.
C6 EQUIPAMENTOS DE LAZER E CULTURA
Biblioteca, museu, galerias, auditórios, cinemas, teatros, clubes sociais e esportivos, boates * shopping center, centro comercial
C7 EQUIPAMENTOS INSTITUCIONAIS (inclusive sindicatos e associações de classes)
C8 COMÉRCIO E SERVIÇOS
Comércio varejista, serviços financeiros, (bancários, creditícios, seguradoras), prestação de serviços, comerciais, pessoais,
profissionais, pequenos reparos. * lavanderia, pescados cartório
C9 SERVIÇOS DE GRANDE PORTE Grandes reparos e manutenção
C10 HABITAÇÃO DE ALUGUEL E TURISMO Alojamentos, pensões e casas de cômodos, pensionatos, motéis, hotéis
Atividades de utilização excepcional, incompatíveis com uso residencial devendo ser nucleados tais equipamentos
USO CARACTERÍSTICA TIPO
C11 COMÉRCIO E SERVIÇOS ESPECIAIS Garagens de táxis, ônibus e veículos de carga; terminais de veículos de cargas; serviços de embalagens e despachos de carga pesada; serviços de armazenagem; comércio atacadista.
C12 EQUIPAMENTOS ESPECIAIS Casa de saúde e hospital, maternidades, asilos e orfanatos, templos religiosos, cemitérios, circos e parques de diversão, edifícios garagem.
Grandes equipamentos urbanos que, pelo porte e influência na vida urbana, têm sua localização em zona predeterminada.
USO CARACTERÍSTICA TIPO
C13 GRANDES EQUIPAMENTOS Hospitais e/ou maternidades distritais; centros de saúde; centros educacionais e culturais; centros administrativos; centros de abastecimentos; centros de convenções; centros esportivos; parques de exposição; estádios; autódromos; estações de telecomunicações; terminais rodoviários.
Uso industrial
USO CARACTERÍSTICA TIPO
I1 Indústria de porte mínimo, com produção para consumo direto e cotidiano no atendimento às áreas residenciais
I2 Indústria de pequeno porte e/ou nível artesanal que devem ser implantados em áreas zoneadas para o fim, mas não especificadas, podendo estar em zonas
comerciais:
Fabricação de móveis de madeira, junco e similares; fabricação de móveis de metal; fabricação de artefatos e estofados; fabricação de artefatos de madeira; fabricação de artefatos de papel; fabricação de
artefatos de couro; fabricação de artefatos de acrílico e plástico; confecção de roupas e calçados; artesanato em geral; fábrica de gesso
I3 Indústrias que, pelas características do processo produtivo não desprendem qualquer tipo de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, cujos efeitos, por menores que sejam, possam ser sentidos fora do ambiente da própria empresa
I4 Indústrias que, pelas características do processo produtivo desprendem certos tipos de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, cujos efeitos no meio ambiente possam ser controlados.
I5 Indústrias perigosas ou nocivas, que necessitam de estudos específicos para cada caso.
* Tipologias acrescentadas pela autora
Quadro 3.2 - Classificação e codificação dos usos do solo. (FONTE: Código de Urbanismo PMJP, 2007.)
Seguindo a classificação do Código de Urbanismo de João Pessoa de 2001, já
referido neste estudo, o uso residencial no bairro Manaíra foi mapeado em uso residencial
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 93
unifamiliar R1, que corresponde a 58% dos lotes existentes; os usos residenciais
unifamiliares R2 e R3 identificam duas, três ou mais unidades familiares por lote, que
correspondem a apenas 2% dos lotes; os usos residenciais R5 e R6 são considerados
multifamiliares, com edificações até quatro pavimentos, no primeiro, e edificações acima de
quatro pavimentos, no segundo, correspondendo, respectivamente, a 4% e 8% dos lotes do
bairro. No total, o bairro possui 72% de seus lotes com moradia. Verificar na figura 3.9.
Figura 3.9 - Mapa de classificação e codificação dos usos do solo. (FONTE: arquivo pessoal.)
As atividades compatíveis com o uso residencial e que proporcionam um
atendimento direto e cotidiano às atividades de vizinhança são definidas por C1. São elas:
padaria, mercearia ou mercadinho, farmácia, posto telégrafo ou postal, escola primária ou
maternal, academia, salão de beleza e lava-jato. Tal categoria corresponde a 3% dos lotes.
58%
1%1%
4%8%
3%2%1%1%
8%2%
11%
Gráfico
N
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 94
As atividades compatíveis com uso residencial e de atendimento esporádico estão
definidas pela classificação C3 com equipamentos relacionados à alimentação, que
correspondem a 2%; C4 identifica atividades educacionais, que correspondem a 1%; C5 são
equipamentos de saúde assistencial, como laboratórios e clínicas, com 1%; as atividades de
comércio varejista e prestação de serviços estão inseridas na categoria C8 e correspondem
a 8%.
Identifica-se na figura 3.9, que existem 2% de outros tipos de classificações, que
estão nas seguintes categorias: C2, equipamentos de atendimento ao veículo - existem
quatro postos de combustível e poucas oficinas; C6, equipamentos de Lazer e Cultura - há
um pequeno teatro e algumas salas de cinema dentro dos centros comerciais; C7, somente
a ASSES (Associação dos Servidores da Secretaria Estadual da Saúde); C9, serviços de
grande porte - alguns lotes são depósitos de construtoras que constroem no próprio bairro;
C10, habitação de aluguel e turismo - foram identificados 19 tipos de hotelaria, entre hotéis,
albergues e flats; C12, equipamentos especiais - 2 cartórios e 17 templos religiosos; I2
existem duas fábricas pequenas de placas de gesso; também estão inseridos, nos 2%, 142
lotes de terrenos vazios. No bairro Manaíra, 11% dos lotes são definidos como área de
favela, localizados próximo ao Bairro São José, local desconhecido e necessário o
acompanhamento de algum morador.
V. DEFINIÇÃO DE BARREIRAS
Observando os trabalhos de FERRAZ (2003) e CALDEIRA (2008) buscou-se
identificar os padrões de proteção individual no bairro Manaíra, tendo como
intuito apresentar as características dessa „nova coletividade‟, mostrando
quais os artifícios disponíveis pelo mercado de segurança que estão sendo
consumidos pelos moradores do bairro e que chegam a simbolizar não só o
sentimento de medo, mas, também, definem uma “estética da segurança”, um
status social, um tipo de beleza, que na verdade são instrumentos de
exclusão e distanciamento das pessoas dos espaços urbanos, como
argumenta Caldeira. Assim, as barreiras físicas e de proteção foram
mapeadas e cada informação foi acrescentada na própria entidade do lote,
através de atributos referentes ao tipo de muro – baixo, médio ou alto. As
informações adicionadas também caracterizam o muro quanto a sua
transparência, pois esse atributo é importante para a capacidade de se
observar a rua, que define a variável de constitutividade, que agrega
sentimento de copresença e possibilita a existência de „olhos da rua‟, ou
negá-los por inviabilizar a observação do espaço cercado. Através desses
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Procedimentos Metodológicos de Investigação 95
dados poderá se identificar, se existe ou não, a correlação entre fechamentos
murais e incidência criminal.
As imagens a seguir definem as tipologias murais observadas nesse trabalho:
Muro Baixo
Baixo Translúcido
R. Umbuzeiro
Av. Sapé
Muro Médio Médio Translúcido
R. Francisco Brandão
Av. Umbuzeiro
Muro Alto Alto Translúcido
R. Manoel Bezerra Cavalcanti Quadra do Manaíra
(FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
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Procedimentos Metodológicos de Investigação 96
Há também casos especiais:
Cercaduras translúcidas
R. Umbuzeiro
R. Manoel Arruda Câmara
R. Silvino Chaves
Vitrines
Av. Monteiro da Franca
Av. Esperança
Av. Rui Carneiro
Sem Muros
R. Umbuzeiro
Av. Monteiro da Franca
Av. Esperança
(FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
Cada lote do bairro Manaíra foi caracterizado de acordo com suas barreiras físicas e
visuais, conforme a altura dos muros, baseado pelo percentil 50 masculino (ALVIN, 2005),
que são: baixo, com altura até 0,70m, demarcação apenas de limite, entre lote e rua,
possibilidade fácil de transpor; médio, com altura de 0,70m até 1,70m, demarca um limite,
porém reduz o ângulo de visão para a rua; alto, acima de 1,70m, redução total do ângulo de
visão, interno e externo ao lote; translúcido, muro com grade, transparente, é uma barreira
de limites, que permite a visualização; vitrine, vidros em ambientes comerciais; e sem
muro.
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Procedimentos Metodológicos de Investigação 97
A figura 3.10 mostra no mapa, a delimitação mural dos lotes representada em cores:
a cor vermelha define os muros altos, a cor laranja muros médios, e a cor amarela muros
baixos; a cor verde demarca muros translúcidos e a cor azul, vitrines; onde há cinza claro ou
apenas o contorno preto, ou não tem muro ou não se tem informação do lote.
Figura 3.10 - Tipologia mural dos lotes do bairro Manaíra. (FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
Com relação aos muros, observa-se que a maioria dos lotes do bairro Manaíra é
composto por muros altos (41%) e médios (35%), enquanto o restante dos lotes se
apresenta com muro baixo, limites translúcidos, sem muro e lotes que não se tem
informação. Os gráficos 3.1 e 3.2 detalham estas proporções.
N
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Procedimentos Metodológicos de Investigação 98
VI. DEFINIÇÃO DE ARTIFÍCIOS DE PROTEÇÃO MURAL
Outro atributo acrescentado ao lote foi o tipo de proteção utilizado nos
fechamentos murais, os artifícios de segurança particulares. Dentre tais
artifícios foram identificados e mapeados no bairro Manaíra os seguintes
tipos: o estrepe (prego, ferro ou vidro incrustado no topo do muro), a grade, a
cerca elétrica, o sensor de presença, a filmadora, entre outros. Ilustrados a
seguir:
Estrepe Grade Cerca Elétrica
Sensor de Presença Filmadora Outros artifícios
(FONTE: arquivo pessoal, 2010.)
Devido à quantidade de artifícios de segurança e a possibilidade de se utilizar mais
de uma proteção em um mesmo tipo mural, adotou-se a classificação de níveis de proteção
de segurança de acordo com a dificuldade proporcionada, o que revela, também, o nível de
sensação de insegurança de quem reside ou trabalha em tais lotes. Primeiramente foram
estipulados níveis de zero a sete, onde zero expressa situação sem nenhum tipo de
proteção e chegando ao nível sete com até quatro artifícios de segurança em um mesmo
invólucro mural.
11931027
175300
66140
200
200
400
600
800
1000
1200
1400
41%
35%
6%
10%
2%5%
1%
Alto
Médio
Baixo
Vitrine
Translúcido
Sem muro
(Vazias)
Gráfico 3.2 - Altura dos Tipos Murais, Manaíra. Gráfico 3.1 - Porcentagem dos tipos murais em Manaíra
(FONTE: arquivo pessoal.)
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Procedimentos Metodológicos de Investigação 99
Para uma melhor compreensão foram estipuladas três categorias ou índices de
segurança: baixo, com nível de 0 a 2; médio, de 3 a 5; e alto, de 6 a 7 (quanto maior a
categoria mais artifícios de proteção em um mesmo invólucro mural) ver Quadro 3.3.
Quadro 3.3 - Níveis de dificuldade, artifícios de proteção utilizados em um invólucro mural.
(FONTE: arquivo pessoal.)
A figura 3.11 ilustra, no mapa de Manaíra, os lotes e seus respectivos níveis de
proteção mural, percebe-se que os lotes a oeste tendem a ter uma maior quantidade de
artifícios de segurança.
RECURSOS
ÍNDICES sem grade estrepe filmadora cerca elétrica sensor de presença
BA
IXO
0
1
2
MÉD
IO
3
4
5
ALT
O
6
7
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 100
Figura 3.11 - Tipos de nível de segurança por lote, no bairro Manaíra.
(FONTE: arquivo pessoal.)
O gráfico 3.4 mostra que 50% dos lotes não possuem nenhum tipo de artifício de
segurança e os outros 50% adotam um ou mais artifícios para o topo de seus muros.
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
7
6
5
4
3
2
1
0
50%
22%
1%
17%
9%
1% 0% 0%
N
Gráfico 3.4 - Porcentagem do nível de segurança (FONTE: arquivo pessoal.)
Gráfico 3.3 - Nível de segurança pelo tipo mural
BAIXO MÉDIO ALTO
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 101
VII. CAMADAS COMPLEMENTARES
Também foram acrescentados alguns atributos no próprio programa SIG, ou
de outros programas, como:
Ruas – representadas por linhas, passaram a compor atributos que
identificavam o nome da rua, o tipo de pavimento e o sentido de direção para
veículos automotores;
Parada de ônibus – indicada por pontos que representam a localização de
uma parada de ônibus;
Crime – como descrito anteriormente, no armazenamento de criminalidade,
os pontos marcam a localização do crime e possuem atributos com
informações do CIOP;
Linhas de Continuidade – obtidas no MindWalk, e transportadas para o SIG,
com suas propriedades espaciais, de integração global, local e conectividade.
Configuradas as informações morfológicas do bairro Manaíra, adotou-se padrões
para realizar as análises dos dados.
3.2.2 Análise Sintática do Espaço
Nesse trabalho foram utilizados instrumentos da Sintaxe Espacial visando identificar
a existência ou não de correlações entre as variáveis espaciais e as propriedades do crime.
Para isso, usou-se uma representação linear de João Pessoa, desenvolvida por Valério
Medeiros, com fonte cartográfica de Iana Alexandra Alves Rufino; nela acrescentaram-se,
atualizações de novas vias e áreas de viaduto.
As figuras 3.12 e 3.13 apresentam o processo de elaboração de um mapa axial a
partir da base CAD da malha viária de João Pessoa, com destaque para o bairro Manaíra.
As linhas axiais são desenhadas com segmentos retos, seguindo os eixos das ruas, “onde o
menor número de linhas mais longas cobre a malha das ruas”19 (HILLIER, 2007: 99); quando
há curva na malha viária, as linhas mais longas se cruzam com as linhas subsequentes,
sendo assim, as vias são simuladas por uma linha ou pelo conjunto do menor número
possível dessas retas. As linhas vermelhas, figura 3.13, correspondem à representação
linear de uma parte da malha viária urbana de João Pessoa, que, salva como extensão
„.dxf', torna-se base para a utilização em aplicativos computacionais, que calculam e
hierarquizam as variáveis sintáticas. Cada linha do mapa axial passa a ter uma identidade
numerada à qual se vinculam valores numéricos relativos às propriedades espaciais de
19 Do original em inglês: “the longest and fewest lines that cover the street grid”. Tradução livre da autora.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 102
acessibilidade e visibilidade, como: integração global, integração local, conectividade,
profundidade, dentre outros.
Figura 3.12 – Representação cartográfica, com definição linear, destaque Manaíra, João Pessoa.
Figura 3.13 - Representação linear, destaque Manaíra, João Pessoa. (FONTE: arquivo pessoal.)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 103
3.2.2.1 Mapa Axial ou Mapa de Continuidade?
Ao longo dos anos, foram produzidos aplicativos computacionais que facilitam o
processo de análise de um mapa axial; entre os aplicativos utilizados nesta pesquisa, temos
o software DepthMap, criado, em 1998, por Alasdair Turner e o software MindWalk,
desenvolvido por Lucas Figueiredo, em 2002.
Alguns pesquisadores e estudiosos da teoria da Sintaxe Espacial como: Turner,
2005, 2007; Figueiredo, 2004; Figueiredo e Amorim, 2005; Cavalcante, 2009, identificaram
que a definição de linhas axiais contém um grau de subjetividade que pode gerar distorções
ou diferentes modelos para um mesmo objeto descrito, gerando, assim, diferentes
simulações axiais, ocasionando medidas sintáticas distintas para um mesmo objeto de
pesquisa. (Exemplo identificado na figura 3.14).
Valério Medeiros argumenta que “a orla atlântica, para as cidades brasileiras como
um todo, a despeito de linhas mais ou menos convexas em suas praias, não interfere
fortemente na fragmentação urbana” (2006: 286). Ele afirma que a convexidade das linhas
não intervém nas propriedades axiais de continuidade ou descontinuidade com relação ao
todo de uma malha urbana; observa, também que, cognitivamente, tais espaços são
compreendidos pelos indivíduos que circulam por estes lugares como uma única linha de
eixo, sem haver percepções de fragmentações dessas vias.
Figura 3.14 - Três representações axiais de uma mesma curva. (FONTE: FIGUEIREDO e AMORIM, 2005.)
Com relação à representação axial de linhas retas em vias curvas e sinuosas,
o senso comum nos diz que esses caminhos são frequentemente
reconhecidos como uma linha contínua de movimento, apesar de ser
formado por uma sequência de linhas de visão. A representação padrão
axial quebra essas linhas contínuas em um conjunto de linhas axiais curtas
e sequenciais. (FIGUEIREDO e AMORIM, 2005)
Pautado nessas reflexões, Lucas Figueiredo propôs uma melhoria na representação
axial de tais espaços, com a criação das linhas de continuidade. Ele criou o software
MindWalk, que possibilitou o agrupamento de várias linhas axiais de um mesmo eixo em
uma única polilinha, dependendo do ângulo de visibilidade.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 104
Uma linha de continuidade agrega várias linhas axiais para representar um
caminho urbano em sua máxima extensão, respeitando uma sinuosidade
máxima pré-definida. Ela se baseia em dois argumentos principais: primeiro,
que a noção de continuidade já está presente no sistema axial; segundo,
que as linhas de continuidade reforçam a relação entre as medidas
configuracionais e a geometria oculta dos mapas axiais. (FIGUEIREDO e
AMORIM, 2005)
Apesar das peculiaridades da malha urbana do objeto de estudo analisado neste
trabalho, o bairro Manaíra, projetado na década de 1970, tem características de um
planejamento regular com vias paralelas e perpendiculares bem definidas pelas suas
distâncias; devido à localização e às características geográficas desse sítio - situado
próximo ao mar - há um recorte sinuoso a leste, na orla marítima, e uma contenção a oeste,
pelo Rio Jaguaribe, assim, as ruas projetadas desse bairro foram definidas com uma ligeira
curva.
Na representação linear da figura 3.13, convertendo para a variável de integração
global, figura 3.15, observa-se que cada via que cruza transversalmente o bairro é
subdividida em várias linhas; cada trecho possui uma identidade numérica diferente e,
consequentemente, variáveis distintas, o que torna difícil a compreensão das ruas do bairro
enquanto elemento único.
Dessa maneira, adotou-se o mapa de linhas contínuas, figura 3.16, possibilitando às
vias ligeiramente curvas uma sequência única, o que acarretou a redução de linhas curtas e
seccionadas para a representação de uma única via, que passou a apresentar uma única
identidade numérica. Esse tipo de mapa permitiu a identificação das propriedades axiais de
uma via por completo e sua relação com o todo, como por exemplo, a variável de
conectividade. Tomando-se como exemplo a Av. João Câncio (marcada em cinza, nas
figuras 3.15 e 3.16), que corta o bairro no sentido norte e sul, no mapa axial são
identificadas quatro linhas que definem tal via no mapa de continuidade, com angulação de
35° e 50°; essa mesma via é representada por uma única linha, que apresenta 19 conexões,
correspondentes às vias reais que cruzam perpendicularmente essa avenida. No mapa
axial, somando-se todas as conexões das quatro linhas que correspondem à Av. João
Câncio, têm-se 24 conexões, pois o cruzamento dessas linhas seccionadas é somado
mutuamente, havendo um excesso de conexões, o que não corresponde à realidade desta
avenida.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 105
Figura 3.15 – Representação linear no mapa axial - integração global
Figura 3.16 - Representação linear do mapa de continuidade - integração global (FONTE: arquivo pessoal.)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 106
A diferença entre o mapa axial e o mapa de continuidade fica bem evidente quando
se comparam tais mapas pela variável de integração global de João Pessoa, onde o núcleo
de integração com maior concentração de linhas vermelhas está no bairro do Cristo
Redentor, figura 3.17, o que não condiz com a realidade vivida da cidade, pois o núcleo de
integração, ou seja, o conjunto de linhas mais acessíveis tende a se correlacionar com as
vias de maior movimento e influenciam o surgimento de usos; por outro lado, identifica-se
que a maior concentração do comércio, serviços e circulação de transportes localiza-se no
núcleo antigo da cidade e segue sentido leste para a praia, como demarcado pela elipse na
figura 3.17. Já no mapa de continuidade, figura 3.18, não existe a definição de um núcleo
integrador, há uma dispersão de linhas mais integradas entre o Centro antigo e o bairro do
Cristo Redentor; visualiza-se com nitidez a BR-230, como um grande eixo de integração
global, essa linha inicia próximo ao bairro Cruz das Armas e segue até a entrada da Rua
Pedro II, próximo ao bairro Castelo Branco. Outro eixo de destaque como linha de
integração global é a Avenida Cruz das Armas, antiga via de entrada de acesso a João
Pessoa, que corta a região oeste da cidade, no sentido norte e sul. Observa-se que os dois
eixos com maior integração global representam vias de movimento rápido, sendo necessária
a utilização de automóvel para se locomover nesse percurso, além de serem acessos de
distribuição de fluxo de quem chega e sai da cidade.
Figura 3.17 - Mapa axial, integração global Figura 3.18 - Mapa de continuidade, integração global
(FONTE: arquivo pessoal.)
Para a análise sintática do mapa de João Pessoa, adotou-se as linhas de
continuidade, pois além da cidade apresentar muitas linhas sinuosas, devido à topografia do
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Procedimentos Metodológicos de Investigação 107
terreno, a inteligibilidade20 do mapa de continuidade apresenta melhor correlação do que o
mapa axial; o primeiro, com R²=0,095, considerado moderado e o segundo, com R²=0,055
que apresenta pequena correlação, como visto na tabela 3.1 de Cohen, adotada como
referência no trabalho, para os índices de covariância.
Categoria Correlação r-Pearson R²
Inexistente 0.0 a 0.09 0,0 a 0,0081
Pequena 0.1 a 0.29 0,0082 a 0,0841
Moderada 0.3 a 0.49 0,0842 a 0,2401
Grande 0.5 a 0.69 0,2402 a 0,4761
Muito grande 0.7 a 0.89 0,4762 a 0,7921
Quase perfeita 0.9 a 0.99 0,7922 a 0,9801
Perfeita 1 1
Tabela 3.1 - Relação entre Categoria e Correlação
(FONTE: COHEN, 1988 apud HOPKINS, 2002.)
Composto o referencial metodológico, buscou-se analisar as características da malha
urbana do bairro Manaíra, por serem essas as vias públicas onde se dá o maior número dos
crimes analisados neste trabalho.
20 Correlação entre Integração Global (Rn) e Conectividade
4.
Padrões Sintáticos e Morfológicos do objeto de estudo
A Malha Urbana de João Pessoa tem algumas singularidades relevantes, já
identificadas anteriormente. A região mais antiga da cidade foi planejada, seguindo as
regulamentações do urbanismo colonial português, com traçado regular e estreita relação
com a topografia, tornando-se uma grelha deformada (SOUSA E NOGUEIRA, 2008;
TRAJANO FILHO, 2006; AGUIAR E OCTÁVIO, 1989). A cidade, apesar de estar localizada
entre o rio e a colina, manteve a regularidade de seus arruamentos, o que serviu como fator
de referência para o seu crescimento. Ao longo do seu processo evolutivo, foram sendo
agregadas partes planejadas ou não ao todo da cidade, propostas desenvolvidas em
circunstâncias diferentes no tempo e no espaço, o que acarretou uma malha urbana sem
uma articulação global efetiva, definida como „colcha de retalhos‟21, que é composta por uma
diversidade de grelhas planejadas distintamente.
Esse capítulo tem por intenção mostrar características da malha urbana de João
Pessoa e do bairro Manaíra, quanto a variáveis sintáticas com relação à cidade, ao entorno
imediato do bairro (borda de 3 km) e somente à área do bairro.
21 Expressão utilizada por Medeiros, 2006.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Padrões Sintáticos e Morfológicos do objeto de estudo 109
Figura 4.1 - Pedaço da Malha Axial de João Pessoa Escala Aproximada 1:150.000 (FONTE: arquivo pessoal.)
Partindo das reflexões de MEDEIROS (2006) acerca da regularidade dos traçados, a
configuração da malha urbana de João Pessoa é caracterizada como: intermediária, pois
apesar das linhas do traçado urbano não apresentarem uma regularidade padrão, também
não são irregulares; orgânica, pois sua estrutura é definida por processos contínuos de
crescimento, sem que se identifique uma unidade de planejamento, havendo uma
agregação de partes com o todo; fragmentada e descontínua, por apresentar manchas
urbanas interrompidas, fator esse associado à geografia do sítio urbano e à inserção de uma
autoestrada que corta a cidade ao meio; e permeável, identificada pela existência de
cruzamentos ortogonais em “x” ou “+”, que intensificam a permeabilidade da malha. Tais
características podem ser observadas na figura 4.1, identificando-se a composição da
cidade a partir de projetos distintos ao longo de seu crescimento.
A área do bairro Manaíra é uma região que faz parte de um planejamento recente de
João Pessoa, com aproximadamente cinquenta anos. Assim como outras cidades
brasileiras, teve como referências as novas propostas de urbanismo do Rio de Janeiro, São
Paulo, Belo Horizonte e Brasília, o urbanismo moderno, pautado no zoneamento e no
funcionalismo de Le Corbusier e Lúcio Costa, onde a cidade era zoneada em espaços de
moradia, circulação, trabalho e lazer.
N
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Padrões Sintáticos e Morfológicos do objeto de estudo 110
Dessa maneira, Manaíra foi projetado com uma malha ortogonal, com
entroncamentos de eixos em “x” e “+”; e apesar da busca por uma regularidade, o bairro
apresenta ruas ligeiramente curvas devido à sua localização geográfica, fato percebido na
figura 4.1, ainda que tal característica não influencie o fluxo contínuo e permeável de suas
vias. A área foi subdivida em quadras e lotes com limites bem fracionados e regulares; a
maioria destinava-se à habitação, enquanto poucas quadras eram definidas para praças,
áreas verdes do bairro destinadas ao lazer. A princípio não se estipulou zonas de trabalho e
comércio para este setor da cidade, porém ao longo dos anos essas atividades passaram a
se inserir nas vias mais movimentadas não só do bairro, mas de outros setores novos da
cidade.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Padrões Sintáticos e Morfológicos do objeto de estudo 111
4.1 Cidade Global ou Cidade Local?
A teoria da Sintaxe Espacial, como já explicado anteriormente, aborda propriedades
que caracterizam uma estrutura urbana quanto a sua acessibilidade, em que busca mostrar
como a cidade está estruturada em relação a uma parte dela e com relação ao todo,
tornando possível a sua avaliação e compreensão da relação do todo com as partes (Hillier,
2007).
Figura 4.2 - Mapas de continuidade - integração global, de João Pessoa. (FONTE: arquivo pessoal.)
Utilizando esse paradigma buscou-se conhecer como João Pessoa se apresenta
com relação às propriedades sintáticas. As figuras 4.2 e 4.3 mostram dois mapas de
- integrado
+ integrado
N
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Padrões Sintáticos e Morfológicos do objeto de estudo 112
continuidade da cidade, um de integração global e o outro de integração local.
Observando-se o Mapa de Continuidade de Integração Global, figura 4.2, percebe-se uma
área com linhas axiais mais amarelas e laranjas, próximo à Mata do Buraquinho, com fator
de integração intermediário; e linhas mais integradas, em vermelho, definidas pela BR-230 e
Avenida Cruz das Armas.
Percebe-se que os mapas de integração global, analisados tanto pelas linhas axiais
quanto pelas linhas de continuidade, mostram um fato diferente da realidade da cidade,
pois, apesar da malha urbana favorecer uma maior integração na área próxima à Mata do
Buraquinho, tal fato não se demonstra em atividades de movimento e uso do solo. Esse
episódio se deve provavelmente à falta de infraestrutura urbana nesse local. Apesar dessa
área da cidade ter sido planejada na mesma época dos bairros litorâneos, tendo como
proposta inicial atender a população de classe média ao longo dos anos, principalmente a
partir da década de 1980, tal espaço foi progressivamente se desvalorizando, pessoas com
maior poder aquisitivo ali residentes se deslocaram para outros bairros, o que tornou essa
área mal aproveitada com relação às suas características sintáticas de integração global.
Além da utilização do mapa de continuidade, a variável que correspondeu melhor às
características da cidade foi a variável de integração local (R3), pois a definição dos
subcentros (bairros) é mais acentuada e condiz melhor com a realidade da cidade. Na figura
4.3, é possível identificar áreas de maior integração nos bairros, fato este identificado pela
variável R3. Esse mapa apresenta maior correlação na forma como os moradores de João
Pessoa apreendem a cidade, não só em nível local, mas com o todo.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Padrões Sintáticos e Morfológicos do objeto de estudo 113
Figura 4.3- Mapas de continuidade integração local, de João Pessoa. (FONTE: arquivo pessoal.)
Nessa variável, observa-se o destaque de linhas em cada núcleo de bairro ou
localidades, a existência de grandes eixos de circulação que funcionam como as artérias
principais de movimento, que atravessam amplas regiões da malha urbana, promovendo a
articulação entre as partes e o todo da cidade. Essas artérias são: a Avenida Presidente
Epitácio Pessoa e sua bifurcação, a Av. Senador Rui Carneiro, que ligam os bairros da orla
marítima ao centro antigo e comercial da cidade; a Rua Elias Cavalcanti Albuquerque, que
cruza diagonalmente todo o bairro Cristo Redentor, próximo à Reserva Florestal do
Buraquinho; a Rua Josefa Taveira, principal acesso ao bairro Mangabeira e sua continuação
com a Av. Walfredo M. Brandão, no bairro dos Bancários, todas delimitam o principal
movimento da zona sul de João Pessoa, assim como as avenidas Valdemar Galdino
Naziazeno e Cruz das Armas, com destaque para os bairros situados a oeste da cidade. Em
- integrado
+ integrado
N
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Padrões Sintáticos e Morfológicos do objeto de estudo 114
todas essas vias há pontos comerciais. Outro fator importante é a concentração de linhas de
movimento intermediário, amarelo e laranja, no centro da cidade, fator identificado
recentemente (ver área demarcada pela elipse na figura 4.3).
Considerando as variáveis da malha urbana de João Pessoa, conjuntamente com as
propriedades espaciais, identifica-se que essa cidade tem características primordialmente
locais, pois, apesar de apresentar formações pontuais, regulares e/ou artificiais, sua
estrutura é definida como uma “hierarquia em árvore”22, como as cidades de formação
orgânica e/ou naturais.
A irregularidade dos assentamentos orgânicos não deve ser vista como
indicativo de caos, desordem ou bagunça. E sim arcabouço para a criação
de um sistema de crescimento urbano extremamente flexível, que mais
facilmente responde às demandas sociais e funcionais de períodos
históricos específicos. (MEDEIROS, 2006: 196)
Para explicitar melhor as características citadas anteriormente, as tabelas 4.1 e 4.2
apontam as variáveis mínima, média e máxima de conectividade, integração global e local
com relação à cidade, a área do bairro e seu entorno próximo (raio de borda de 3 km a partir
do limite do bairro), e somente as linhas que correspondem ao bairro; com isso, foi possível
apontar o melhor tipo de escala e variável a ser utilizada no trabalho.
Na tabela 4.1 é possível perceber que o mapa de continuidade de João Pessoa
apresenta eixo com máximo de 80 conexões, e mínimo de 1, porém, a média é de 4,036, ou
seja, são poucos os eixos que possuem muitas conexões, a maioria está entre 5 e 1. Muitos
dos eixos com alta conectividade identificam-se grandes vias de circulação.
Conectividade Mínima Média Máxima Da cidade 1 4,036 80
Do entorno 1 4,443 54
Do bairro 1 6,831 19
Tabela 4.1 - Resultados Gerais da Conectividade, com relação à cidade, ao entorno e ao bairro.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Em Manaíra e seu entorno imediato verifica-se uma conectividade máxima de 54,
que corresponde à Av. Epitácio Pessoa; a média ficou em 4,443. Com relação apenas aos
eixos do bairro, a linha que corresponde à Av. General Edson Ramalho, tem 19 conexões,
22 Definição de MEDEIROS (2006)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Padrões Sintáticos e Morfológicos do objeto de estudo 115
essa mesma linha cruza outros bairros, e os mapas da cidade de João Pessoa e do entorno
apresentam 31 conexões.
Diante dessas informações, foi adotada como referência a escala do entorno ao
bairro, reduzindo eixos que não fazem parte das relações do bairro em estudo, porém
mantendo uma margem de segurança, de 3 Km de diâmetro a partir das bordas do objeto de
estudo.
Com relação às propriedades de integração global e local, tabela 4.2, a escala do
entorno apresenta médias maiores do que as da cidade, denotando que grandes tamanhos
levam à fragmentação, tornando as propriedades do entorno do bairro com uma correlação
melhor que a da cidade.
Integração Global Mínima Média Máxima Da cidade 0,436 0,954 1,524
Do entorno 0,602 1,264 2,191
Integração Local Mínima Média Máxima Da cidade 0,333 2,058 5,049
Do entorno 0,333 2,128 4,634
Tabela 4.2 - Resultados gerais de integração global e local, com relação à cidade e ao entorno.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Gráfico 4.1 - Relação entre integração global e local, variável de João Pessoa e do entorno do bairro.
Gráfico 4.2- Relação entre integração global e local, variável somente do bairro Manaíra.
(FONTE: arquivo pessoal.)
O gráfico 4.2 demonstra a correlação entre integração global (Rn) e integração local
(R3), apenas dos eixos do bairro Manaíra, a partir das variáveis tiradas do mapa de entorno.
Percebe-se, pela variância explicada que R² =0,8763 está na categoria muito grande, na
planilha de COHEN, as variáveis X e Y têm 87% de covariância (ver tabela 3.1), ou seja, o
R² = 0,4162
R² = 0,5721
0
0,5
1
1,5
2
2,5
0 2 4 6
Inte
gra
ção
Rn
Integração R3
Inteligibilidade Cidade Inteligibilidade Entorno
R² = 0,8763
0
0,5
1
1,5
2
2,5
0 1 2 3 4 5
Inte
gra
ção
Rn
Integração R3
Bairro Manaíra
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Padrões Sintáticos e Morfológicos do objeto de estudo 116
bairro sintaticamente proporciona uma boa compreensão de espaço, localmente e
globalmente, porém, identifica-se que quanto menor a malha urbana, ela tende a ser mais
compreensível.
Percebendo a relevância do fator de acessibilidade para a investigação de ações
antissociais, adotaram-se para todas as relações e correlações de análise do mapa de João
Pessoa as propriedades de integração local com relação ao entorno imediato do bairro
Manaíra, utilizando-se o mapa de continuidade.
5.
Padrões Espaciais de ocorrências criminais
Moradores reclamam de assaltos e furtos em Manaíra Com medo de represarias de criminosos, moradores do bairro que já foram vítimas de violência temem se
identificar. (CORREIO DA PARAÍBA, João Pessoa, 6 mar. 2006. Disponível em: <http://www.portalcorreio.com.br>.23
*)
Violência cresce e aterroriza Manaíra (CORREIO DA PARAÍBA, João Pessoa, 15 out. 2008. Disponível em: <http://www.portalcorreio.com.br>. *)
Criança é raptada em Manaíra (JORNAL DA PARAÍBA, João Pessoa, 2 mai 2009. Disponível em: <http://www.jornaldaparaíba.com.br>. *)
Bandidos realizam seis assaltos em três horas em Manaíra (JORNAL DA PARAÍBA, João Pessoa, 13 jun 2009. Disponível em: <http://www.jornaldaparaíba.com.br>. *)
Mais uma vez bandidos aterrorizam moradores do bairro Manaíra (PARAÍBA1, João Pessoa, 20 fev 2010. Disponível em: <http://www.paraíba1.com.br>. *)
Polícia prende acusado de vários assaltos em Manaíra (JORNAL DA PARAÍBA, João Pessoa, 02 mar 2010. Disponível em: <http://www.jornaldaparaíba.com.br>. *)
Ex-procuradora é assassinada em Manaíra (JORNAL DA PARAÍBA, João Pessoa, 10 mar 2010. Disponível em: <http://www.jornaldaparaíba.com.br>. *)
Levaram a pior: Ladrões são linchados em Manaíra; um morre e outro está internado (PBAGORA, João Pessoa, 21 mar 2010. Disponível em: <http://www.pbagora.com.br>. *)
Moradores de Manaíra colocam imóveis à venda (PARAÍBA.COM, João Pessoa, 22 mar 2010. Disponível em: <http://www.paraíba.com.br>. *)
Moradores entregam abaixo-assinado pedindo segurança no bairro de Manaíra 1,8 mil assinaram documento (PARAÍBA1, João Pessoa, 11 jun 2010. Disponível em: <http://www.paraíba1.com.br>. *)
Moradores pedem fim de violência em Manaíra (JORNAL DA PARAÍBA, João Pessoa, 12 jun 2010. Disponível em: <http://www.jornaldaparaíba.com.br>. *)
Violência e medo em Manaíra (O NORTE, João Pessoa, 27 jun 2010. Disponível em: <http://www.jornalonorte.com.br>. *)
Moradores do bairro de Manaíra em João Pessoa vivem com a insegurança no bairro (PBAGORA, João Pessoa, 14 set 2010. Disponível em: <http://www.pbagora.com.br>. *)
*Acesso em: 23 de março de 2010
Figura 5.1 - Manchete do Jornal O NORTE (O NORTE, João Pessoa, 27 jun 2010. Disponível em: <http://www.jornalonorte.com.br>. Acesso em: 11 de março de 2010.)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 118
Relatos de violência, roubos, assaltos, medo e insegurança no bairro Manaíra são
constantes pelos meios de comunicação, mídia e pela própria população. Introduzindo este
capítulo estão, em destaque, algumas manchetes de jornais que divulgam fatos ocorridos,
em Manaíra. Os moradores do bairro, sentindo-se acuados, começam a exigir das
autoridades governamentais algumas atitudes com relação à segurança e, em alguns casos
agem com violência contra agentes agressores, como foi o caso de dois jovens que foram
espancados dentro de uma residência.
[A divulgação destes fatos] gera insegurança, intranquilidade de circulação
pela própria rua em que se vive e amplia o medo de que a violência lida nos
jornais, revistas e noticiários de televisão, ou conhecida nas rodas de
conversa com parentes e amigos próximos sobre uma casa assaltada ou
um filho roubado ou ainda atropelado no trânsito, o atinja ou sua família.
(KOURY, 2008:72)
Koury (2008) salienta em seu estudo que existem bairros considerados perigosos no
imaginário da cidade, constatados nas estatísticas policiais e divulgados no noticiário pela
imprensa local, porém, na opinião de alguns moradores estes são locais considerados
tranquilos, onde moram pessoas honestas e trabalhadoras que, apesar dos fatos que
envergonham o bairro, são locais excelentes para se morar.
Manaíra é considerado, hoje, um bairro importante pela sua localização, comércio,
infraestrutura, atrativos de lazer e turísticos, sendo considerado no imaginário da cidade e
dos moradores, um lugar privilegiado, porém, é também identificado como um centro de
violência urbana.
Com o intuito de esclarecer tais evidências na cidade de João Pessoa, serão
apresentados, a seguir, por dados oficiais da Secretaria de Segurança Pública da Paraíba,
os padrões de criminalidade na cidade e no bairro em estudo.
5.1 O que os dados oficiais têm a dizer?
Nas planilhas criminais de João Pessoa os diversos tipos de crimes registrados, pelo
CIOP, foram selecionados e agrupados de acordo com as condutas estabelecidas
juridicamente no Código Penal, que são:
a) crimes contra a pessoa (A VIDA) - registros de homicídio e tentativa de homicídio, lesão
corporal, acidentes de trânsito e outros;
b) crimes contra o patrimônio foram subdivididos em (CIDADÃO, VEÍCULO e IMÓVEL) -
compreendendo roubo, furto, latrocínio, estelionato e outros;
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 119
c) crime contra os costumes (dignidade sexual) - com registros de estupros ou tentativas de
estupro, sedução, prostituição e outros;
d) crimes contra a incolumidade pública, tráfico de entorpecentes, uso de entorpecentes e
outros; além de,
e) outros crimes, como uso ilegal de arma de fogo, motim de presos, etc.
Na tabela 5.1 e 5.2 sintetizam-se os registros do CIOP, na cidade e no bairro específico.
Tabela 5.1 - Ocorrências criminais registradas, em João Pessoa, Paraíba. (FONTE: CIOP, 2010, adaptado pela autora.)
Tabela 5.2 - Ocorrências criminais registradas no bairro Manaíra.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 120
Como se observa na tabela 5.1, no ano de 2008, foram registradas 7.064 ocorrências
criminais, e no ano de 2009 foram registradas 10.102 ocorrências, em João Pessoa.
Identifica-se, portanto, um acréscimo nas ações criminais de um ano para o outro. Dentre
tais ocorrências criminais, a maior incidência, nesses dois anos, foi de crimes contra o
patrimônio (CIDADÃO), correspondendo a 3.127 casos, no ano de 2008; desses, foram
registrados 2.580 casos de roubos a pessoas. No ano de 2009, foram registrados 4.212
crimes contra o patrimônio (CIDADÃO), sendo 3.659 ocorrências apenas de roubo a
pessoas. Outro crime mais comum é o crime contra o patrimônio (IMÓVEL), que
correspondem a 2.132 ocorrências no ano de 2008 e 2.389 no ano de 2009, distribuídas
entre furtos e roubos a residências, estabelecimentos e instituições bancárias. O gráfico 5.1
configura as condutas criminais mais comuns nos anos de 2008 e 2009; nesse gráfico,
destaca-se a coluna laranja, crime contra o patrimônio (CIDADÃO), como o incidente mais
frequente dos dois anos específicos.
Gráfico 5.1 - Condutas Criminais em João Pessoa, 2008 e 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Além de configurar os tipos de ocorrências criminais nesses dois anos, também foi
possível identificar como o crime está distribuído nos bairros de João Pessoa. O gráfico 5.2
ilustra dois tipos de colunas para cada bairro: as colunas azuis correspondem às
ocorrências criminais de 2008, e as colunas vermelhas definem as ocorrências do ano de
2009. Fica evidente o aumento de ocorrências do ano de 2008 para o ano de 2009; apenas,
dois bairros registram o mesmo número de ocorrências, que são o Bairro das Indústrias e
dos Ipês. Pode-se analisar, também, por ordem crescente, da direita para a esquerda, que o
bairro com menor registro de criminalidade é o Roger, e o com maior incidência de registros
criminais é o centro de João Pessoa, nos dois anos, seguido do bairro Manaíra.
3127
4212
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
4000
4500
2008 2009
Crimes contra a pessoa (A VIDA)
Crimes contra o patrimônio (CIDADÃO)
Crimes contra o patrimônio (VEÍCULOS)
Crimes contra o patrimônio (IMÓVEL)
Crimes contra a dignidade sexual
Crime contra a incolumidade pública
Outros Crimes
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 121
Gráfico 5.2 - Comportamento da criminalidade nos bairros de João Pessoa, 2008 e 2009. (FONTE: arquivo pessoal.)
O gráfico 5.3 ilustra os quatro bairros com maior ocorrência criminal registrada pelo
CIOP, nos anos de 2008 e 2009. Observa-se que os três primeiros bairros, Centro, Manaíra
e Mangabeira, correspondem aos principais redutos de comércio da cidade de João Pessoa,
segundo estudo de Andrade, Ribeiro e Silveira (2009). O primeiro corresponde ao centro
antigo, local onde se iniciou a formação da cidade, onde hoje se concentra a maior parte das
atividades de serviço e comércio; o segundo bairro apresenta comércio e serviços mais
especializados voltados para uma classe média e alta, além de ser um setor turístico;
Mangabeira, o terceiro bairro mais violento, satisfaz uma nova centralidade urbana,
planejado como um grande conjunto habitacional na década de 1970, devido ao seu
afastamento e isolamento do centro abrigou, ao longo dos anos, atividades comerciais que
atendessem a população local (Andrade, Ribeiro e Silveira, 2009).
Gráfico 5.3 – Ocorrências Criminais nos 4 bairros mais violentos de João Pessoa, 2008 e 2009. (FONTE: arquivo pessoal.)
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
CE
NT
RO
MA
NA
IRA
MA
NG
AB
EIR
A
BE
SS
A
CR
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SE
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S
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NH
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AN
AT
OL
IA
AL
TO
DO
CE
U
ocorrências 2008 ocorrências 2009
696
476444
404
773
655 651
574
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
CENTRO MANAIRA MANGABEIRA BESSA
Ocorrências 2008
Ocorrências 2009
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 122
Apesar do bairro, Manaíra, ser considerado um lugar nobre de João Pessoa,
identifica-se nos gráficos 5.2 e 5.3 que ele se encontra em posição de destaque com relação
aos registros criminais da cidade, nos anos 2008 e 2009, conforme a tabela 5.2.
Nesse bairro, observa-se a tendência verificada com relação a João Pessoa, com
acréscimo de ocorrências criminais do ano de 2008 para 2009, bem como o fato de os
crimes de maior incidência nos dois anos terem sido contra o patrimônio (CIDADÃO) e
contra o patrimônio (IMÓVEL). Como se pode verificar na tabela 5.2 e no gráfico 5.4.
Gráfico 5.4 - Incidências criminais no bairro Manaíra, 2008 e 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
O crime com maior frequência no bairro é o roubo a pessoas, com 260 casos em
2008 e 395 em 2009, como visto na tabela 5.2. Esse tipo de crime está inserido na categoria
de crimes contra o patrimônio (CIDADÃO). Esse delito tende a ser o mais temido pela
sociedade, pois a sua ação é realizada através de atos de violência ou ameaça em um
espaço público, como ruas e praças, ou privado; ele se dá numa ação constrangedora
diretamente sobre o cidadão, ocasionando medo e pânico à comunidade que usufrui do
bairro. Outro crime também de destaque nesta categoria é o furto contra a pessoa, com 22
ocorrências em 2008 e 32 em 2009. Esse tipo de crime se diferencia do anterior por não
haver ato direto de violência, o meliante age perante o descuido e a falta de atenção da
vítima. A maioria dos casos de furto tende a acontecer, principalmente, em
estabelecimentos e residências; apesar desse crime causar maior prejuízo, como
identificado pela polícia, ele é menos assustador socialmente.
282
428
129155
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
2008 2009
Crimes contra a pessoa (A VIDA)
Crimes contra o patrimônio (CIDADÃO)
Crimes contra o patrimônio (VEÍCULOS)
Crimes contra o patrimônio (IMÓVEL)
Crime contra a incolumidade pública
Outros Crimes
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 123
Gráfico 5.5 - Crimes no bairro Manaíra, 2008 e 2009, respectivamente.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Dentre os demais crimes, três fazem parte dos crimes contra o patrimônio (IMÓVEL):
o roubo a estabelecimentos, com 18 casos em 2008 e 32 em 2009; furto a residências, com
52 e 46 ocorrências; e furto a estabelecimentos com 50 e 49 casos, nos anos respectivos.
Roubo de carro faz parte do crime contra o patrimônio (VEÍCULOS) e se destacou com 29
incidentes em 2008 e 25 em 2009.
Gráfico 5.6 – Principais crimes de furto e roubo no bairro Manaíra, 2008 e 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Os mapas ilustrados a seguir, figuras 5.2 e 5.3, evidenciam o nível de crimes em
cada bairro, que foi analisado conjuntamente com o rendimento mensal por domicílio
particular permanente, dados do IBGE ano 2000. Tal informação é relevante para se
0 50 100 150 200 250 300
DISPARO DE ARMA DE FOGO
FURTO A PESSOA
FURTO DE CARRO
FURTO DE MOTO
FURTO EM ESTABELECIMENTO
FURTO EM RESIDENCIA
HOMICIDIO
PORTE ILEGAL DE ARMA
ROUBO A PADARIA
ROUBO A PESSOA
ROUBO A POSTO DE COMBUSTIVEL
ROUBO A RESIDENCIA
ROUBO DE CARRO
ROUBO DE MOTO
ROUBO EM ESTABELECIMENTO
ROUBO EM VEICULO
TENTATIVA DE HOMICIDIO
TRAFICO DE ENTORPECENTES
Ocorrências 2008 0 50 100 150 200 250 300
DISPARO DE ARMA DE FOGO
FURTO A PESSOA
FURTO DE CARRO
FURTO DE MOTO
FURTO EM ESTABELECIMENTO
FURTO EM RESIDENCIA
HOMICIDIO
PORTE ILEGAL DE ARMA
ROUBO A PADARIA
ROUBO A PESSOA
ROUBO A POSTO DE COMBUSTIVEL
ROUBO A RESIDENCIA
ROUBO DE CARRO
ROUBO DE MOTO
ROUBO EM ESTABELECIMENTO
ROUBO EM VEICULO
TENTATIVA DE HOMICIDIO
TRAFICO DE ENTORPECENTES
Ocorrências 2009
260
395
50
49
52
46
0 50 100 150 200 250 300 350 400 450
2008
2009
Roubo em estabelecimento
Furto em residência
Furto em estabelecimento
Roubo de carro
Roubo a pessoa
Furto a pessoa
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 124
compreender visualmente como é distribuído a renda domiciliar na cidade de João Pessoa,
identificando conjuntamente como o crime atua nessa realidade.
No ano de 2008, foram identificados em João Pessoa, figura 5.2, quatro bairros com
registro de ocorrências acima de 401. São eles: Centro, Manaíra, Mangabeira e Bessa. Tais
bairros expressam 29% do total de crimes registrados em 2008. Por outro lado, 37 bairros
da cidade, ou seja, 20% correspondem às ocorrências registradas que atingem o máximo de
100 incidências. Observa-se que os dois bairros da orla, Manaíra e Bessa, apresentam uma
das maiores médias de rendimento mensal por domicílio particular, porém, também, fazem
parte dos bairros mais violentos; o centro da cidade e o bairro Mangabeira, apesar de
possuírem médias de rendimento mensal relativamente baixo, são setores que concentram
uma grande quantidade de comércio e serviços, tornando-se atrativos aos crimes de roubo e
furto.
Figura 5.2 - Mapa de Ocorrências criminais nos bairros de João Pessoa e a Média do rendimento nominal mensal das pessoas responsáveis por domicílios particulares permanentes (IBGE, 2000), 2008. (FONTE: arquivo pessoal.)
29%
18%33%
13%
7%
401-700
201-400
101-200
51-100
01-50
Quantidade Ocorrências
Quantidade Bairros
4
5
15
13
24
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 125
Figura 5.3 - Mapa de Ocorrências criminais nos bairros de João Pessoa e a Média do rendimento nominal mensal das pessoas responsáveis por domicílios particulares permanentes (IBGE, 2000), 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
No ano de 2009, percebe-se pela figura 5.3 um acréscimo de ocorrências nos bairros
mais violentos: Mangabeira e Bessa registraram 651 e 574 ocorrências, respectivamente;
todavia, o Centro e o Manaíra se destacam com o maior índice de ocorrências, 773 e 655.
Nesse ano surgem dois outros bairros com registros acima de 400 ocorrências: Bancários e
Cristo Redentor. Os seis bairros mais violentos correspondem a 38% das ocorrências
registradas pelo CIOP; em consequência, a quantidade de bairros com menores índices de
violência diminuiu para 3%. Como se pode observar, Centro e Manaíra ainda concentram os
maiores índices de criminalidade com relação ao restante da cidade.
A seguir serão apresentadas as modalidades de crime mais comuns no bairro
Manaíra - o roubo e o furto nos anos analisados.
38%
34%
14%
11%
3%
401-700
201-400
101-200
51-100
01-50
Quantidade Ocorrências
Quantidade Bairros
6
12
15
15
13
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 126
5.2 Roubo
Analisando as ocorrências criminais de roubo, pelas informações do CIOP, foram
registrados 8 tipos de ocorrências diferentes em 2008, e 11 em 2009. Tais roubos foram
subdivididos em quatro categorias, que são:
a) Roubo a pessoas;
b) Roubo a imóveis, composto por roubo a postos de combustível, roubo a
residências, roubo a estabelecimentos (comercial), roubo a farmácias e roubo a
padarias;
c) Roubo a transporte, sendo eles roubo de carros, roubo de motos, roubo a
transportes coletivos, roubo a veículos;
d) Tentativa de roubo
O tipo mais frequente de roubo, nesse período, foi a pessoas, sendo o crime mais
comum no bairro Manaíra.
No ano de 2008 foram registrados 300 tipos de ocorrências de roubo. No gráfico 5.7,
observa-se que há uma variação de roubo a pessoas de 10 a 31 ocorrências, sendo junho e
setembro os meses com maior incidência para esse tipo de crime, com 29 e 31 ocorrências,
respectivamente. Enquanto abril, agosto e novembro foram os meses com menos
ocorrências, com 10, 13 e 13.
Gráfico 5.7 - Ocorrência Anual de Criminalidade, Manaíra: Roubo 2008.
(FONTE: arquivo pessoal.)
As outras ocorrências chegam a um máximo de 5 casos em alguns meses (gráfico
5.8), que correspondem a 9% de roubo a imóveis; 9%, de roubo a transportes, e tentativas
de roubo, com 8% dos casos, enquanto roubo a pessoas corresponde a 74% dos casos. No
gráfico 5.9, identifica-se a frequência de roubo durante o dia, percebe-se que a tarde e a
0
5
10
15
20
25
30
35
Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro
ROUBO A PESSOA ROUBO IMÓVEL ROUBO TRANSPORTE TENTATIVA DE ROUBO
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 127
manhã são os períodos do dia com maior incidência de roubo a pessoas, mas a noite
também revela nível razoável de ocorrências.
No gráfico 5.10 é possível identificar a sequência das ocorrências criminais de
acordo com a sua priorização de incidência, o roubo a pessoas é o tipo de crime mais
comum no ano de 2008; os outros tipos de incidência correspondem a menos de 10%, cada.
A priorização de incidências inicia com roubo a pessoas; em seguida vem o roubo a
transportes, que foi dividido em roubo de veículo e roubo a veículos, o primeiro com maior
ocorrência advém da apropriação do veículo, o segundo deve-se à subtração de objetos que
se encontravam em veículos; foi identificada, em sequência, a tentativa de roubo, a análise
desse tipo de ocorrência apesar de ter relevância, torna-se complexa devido às
propriedades de natureza diversa implícitas nesse fenômeno (vários tipos de ações), porém
esse dado foi acrescentado em nível de informação geral; roubo a edificações não
residenciais; identificados com menor incidência estão o roubo a residências e o roubo a
veículos.
Gráfico 5.10 - Tipos de ocorrências mais freqüentes de roubo em 2008. (FONTE: arquivo pessoal.)
220
24 24 207 2
0
50
100
150
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250
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10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Roubo a pessoa Roubo de veículo Tentativa de Roubo Roubo a ñ-residência Roubo a residência Roubo em veículo
% d
e R
ou
bo
s
Tipo de Roubo Qtd Curva ABC
0 20 40 60 80 100
ROUBO A PESSOA
ROUBO IMÓVEL
ROUBO TRANSPORTE
TENTATIVA DE ROUBO
madrugada (00:00 - 6:00) manhã (6:00 - 12:00)
tarde (12:00 - 18:00) noite (18:00 - 24:00)
74%
9%
9%
8% ROUBO A PESSOA
ROUBO IMÓVEL
ROUBO TRANSPORTE
TENTATIVA DE ROUBO
Gráfico 5.9 - Categorias de roubo 2008
(FONTE: arquivo pessoal.)
Gráfico 5.8 - Horário: Roubo 2008
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 128
Já no ano de 2009, foram registrados um total de 393 ocorrências. Assim como no
ano de 2008, o roubo a pessoas continua, em 2009, sendo o crime mais comum nesse
bairro, sua incidência maior acontece entre os meses de maio a julho, e entre os meses de
outubro e novembro. Como no ano de 2008, o mês com maior incidência foi outubro, com
registro de 39 ocorrências, e os meses com menor incidência foram abril e setembro, com
13 cada, ver gráfico 5.11.
Gráfico 5.11 - Ocorrência Anual da Criminalidade: Roubo 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
No gráfico 5.11, também, identificam-se outros tipos de ocorrências de roubo, que
chegam a um máximo de sete casos em alguns meses. O gráfico 5.12 mostra que roubo a
pessoas corresponde a 70% das incidências, enquanto que a imóveis, a transportes e
tentativa de roubo, correspondem 12%, 8% e 10%, respectivamente. Com relação ao
horário do crime, o roubo a pessoas teve maiores incidências à noite e, em sequência, à
tarde; nos outros tipos de roubo observa-se o mesmo período, com uma ressalva ao roubo a
imóveis, que possui maiores registros à tarde e pela manhã, gráfico 5.13.
As principais ocorrências de roubo em 2009 estão identificadas no gráfico 5.14,
ordenadas pela priorização de incidências: o roubo a pessoas, assim como em 2008, é o
tipo de ocorrência mais comum, os outros tipos de crime permanecem com menos de 12%.
0
5
10
15
20
25
30
35
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45
Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro
ROUBO A PESSOA ROUBO IMÓVEL ROUBO TRANSPORTE TENTATIVA DE ROUBO
70%
12%
8%
10% ROUBO A PESSOA
ROUBO IMÓVEL
ROUBO TRANSPORTE
TENTATIVA DE ROUBO
0 20 40 60 80 100 120
ROUBO A PESSOA
ROUBO IMÓVEL
ROUBO TRANSPORTE
TENTATIVA DE ROUBO
madrugada (00:00 - 6:00) manhã (6:00 - 12:00)
tarde (12:00 - 18:00) noite (18:00 - 24:00)
Gráfico 5.12 - Categorias de roubo 2009
(FONTE: arquivo pessoal.)
Gráfico 5.13 - Horário: Roubo 2009
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 129
Identifica-se em seguida a ordem de priorização das baixas incidências: tentativa de roubo;
roubo a não residências (imóveis de estabelecimento comercial); roubo de veículo,
percebe-se uma redução deste tipo de incidência com relação ao ano de 2008; roubo a
residências; e roubo a veículos.
Gráfico 5.14 – Tipos de ocorrências mais freqüentes de roubo em 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Dentre os diversos incidentes de roubo ocorridos no bairro Manaíra ao longo desses
dois anos, o trabalho irá se aprofundar no roubo a pessoas, pois este é o tipo de ocorrência
criminal mais comum do bairro e atinge diretamente a população que nele reside.
274
38 3624
13 8
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30
60
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240
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10%
20%
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50%
60%
70%
80%
90%
100%
Roubo a pessoa Tentativa de roubo Roubo em ñ-residência Roubo de veículo Roubo a residência Roubo em veículo
Qu
an
tid
ad
e d
e O
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rrên
cia
s
% d
e R
ou
bo
s
Tipo de Roubo Qtd Curva ABC
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 130
5.3 Furto
Outro crime bastante presente no bairro Manaíra é o furto, no ano de 2008, foram
registradas 179 ocorrências e 161 casos foram registrados no ano de 2009, pelo CIOP. Tais
ocorrências foram agregadas em quatro categorias principais:
a) furto a pessoas;
b) furto a imóveis (edifício);
c) furto a transportes (automóvel, moto e bicicleta);
d) tentativa de furto.
No gráfico 5.15, observa-se que esse delito ocorre principalmente nos meses de
férias escolares (dezembro, janeiro e fevereiro; junho e julho), variando de 1 a 13
ocorrências por mês.
Gráfico 5.15 – Ocorrência Anual da Criminalidade: Furto 2008. (FONTE: arquivo pessoal.)
Quase sempre, o furto a imóveis é facilitado por descuido ou falta de atenção da
vítima, não havendo agressão física. Eles tendem a acontecer dentro de estabelecimentos
comerciais e residenciais (58% dos tipos de furto), enquanto ao furto a pessoas,
correspondem apenas 12%, dados referentes ao ano de 2008 (ver gráfico 5.16). A ação dos
criminosos, para a prática de furto a imóveis, tende a acontecer principalmente de
madrugada e à noite, enquanto os outros tipos de furto ocorrem mais durante o dia (gráfico
5.17).
0
2
4
6
8
10
12
14
FURTO A PESSOA FURTO A IMÓVEL FURTO TRANSPORTE TENTATIVA DE FURTO
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 131
No gráfico 5.18, identifica-se a sequência de priorização das ocorrências de furto em
2008. É factível de apreciação que este tende a acontecer com maior frequência a imóveis,
sendo eles residenciais ou não. Os dois tipos juntos representam mais de 50% das
incidências. O furto em não residência é o tipo de ocorrência mais frequente, acontecendo,
principalmente, em ambientes comerciais, como lojas, padaria, farmácia, postos de
combustível, estabelecimentos de ensino, ambientes de prestação de serviços, entre outros.
Logo em sequência vem o furto em residência. Em seguida, apresenta-se a tentativa de
furto, ato criminal não finalizado, porém, com alerta à polícia militar, esse tipo de registro não
será explorado na análise, devido às propriedades de natureza diversa. Furto a pessoas
corresponde a 12% das incidências desse tipo de crime, enquanto furto em transporte
totaliza 13%, e é subdividido em dois tipos: furto de veículo, com apropriação do mesmo; e
furto em veículo com a usurpação apenas de objetos que estavam internos a um veículo.
Gráfico 5.18 – Tipos de ocorrências mais freqüentes de furto em 2008. (FONTE: arquivo pessoal.)
0 10 20 30 40
FURTO A PESSOA
FURTO IMÓVEL
FURTO TRANSPORTE
TENTATIVA DE FURTO
madrugada (00:00 - 6:00) manhã (6:00 - 12:00)
tarde (12:00 - 18:00) noite (18:00 - 24:00)
52 51
3122
158
0
20
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80
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10%
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40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Furto em ñ-residência Furto em residência Tentativa de Furto Furto a pessoa Furto de veículo Furto em veículo
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os
Tipo de Furto
Qtd Curva ABC
12%
58%
13%
17%FURTO A PESSOA
FURTO A IMÓVEL
FURTO TRANSPORTE
TENTATIVA DE FURTO
Gráfico 5.16 - Categorias de furto 2008 (FONTE: arquivo pessoal.)
Gráfico 5.17 - Horário: Furto 2008
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 132
Observa-se que o ano de 2009 com relação ao ano de 2008 houve um decréscimo
de ocorrências de furto. O gráfico 5.19 mostra que em todo o ano de 2009, houve oscilações
de incidências entre os meses, porém ainda se identificam os maiores picos entre os meses
de final de ano e meio do ano.
Gráfico 5.19 – Ocorrência Anual da Criminalidade: Furto 2008.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Com relação aos outros tipos de furto, identifica-se que furto a pessoas e tentativa de
furto tem uma incidência maior no mês de fevereiro, havendo um decréscimo nos meses
seguintes; já furto de transporte tem um acréscimo no mês de março e outubro. Com
relação à porcentagem de incidências o furto a imóveis corresponde a 53% das ocorrências,
enquanto furto a pessoas corresponde a 14%; furto a transporte 16%; e tentativa de furto,
17%, ver gráfico 5.20. Os furtos no ano de 2009 aconteceram, principalmente, entre os
turnos da manhã e da tarde, somente no furto a pessoas as incidências se concentram entre
tarde e noite, gráfico 5.21.
Observando a priorização de incidências de furto no ano de 2009, é possível
identificar, gráfico 5.22, que a sequência permanece a mesma do ano anterior, porém, com
0
2
4
6
8
10
12
14
Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro
FURTO A PESSOA FURTO A IMÓVEL FURTO TRANSPORTE TENTATIVA DE FURTO
14%
53%
16%
17% FURTO A PESSOA
FURTO A IMÓVEL
FURTO TRANSPORTE
TENTATIVA DE FURTO
0 10 20 30 40
FURTO A PESSOA
FURTO IMÓVEL
FURTO TRANSPORTE
TENTATIVA DE FURTO
madrugada (00:00 - 6:00) manhã (6:00 - 12:00)
tarde (12:00 - 18:00) noite (18:00 - 24:00)
Gráfico 5.20 - Categorias de furto 2009
Fonte: arquivo pessoal.
Gráfico 5.21 - Horário: Furto 2009
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
/ Padrões Espaciais de ocorrências criminais 133
suas devidas reduções, havendo aumento apenas para furto de veículo e furto a veículo.
Primeiramente, tem-se o furto a não residências com incidências em escolas e
estabelecimentos comerciais; em sequência vem o furto a residências, tais ocorrências
encontram-se na categoria de imóveis, identificada com mais da metade das incidências;
em seguida procede a tentativa de furto. Depois surge o furto a pessoas com 14% das
incidências; furto a transporte 16%, porém subdivide-se em dois tipos, com 16 casos para
furto de veículo e 10 para furto a veículo.
Gráfico 5.22 – Tipos de ocorrências mais freqüentes de furto em 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
A seguir serão apontadas as características do furto em 2009, e suas principais
incidências, analisadas juntamente com as propriedades de uso e ocupação do solo,
barreiras visuais (muros) e nível de segurança.
Dentre os furtos do bairro Manaíra, o trabalho irá se aprofundar-se no furto a
imóveis, que compreende furto a não residência (comercial) e furto a residência.
45 40
28 22 1610
0
30
60
90
120
150
180
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Furto em ñ-residência Furto em residência Tentativa de furto Furto a pessoa Furto de veículo Furto em veículo
Qu
an
tid
ad
e d
e F
urt
os
% d
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urt
os
Tipos de Furto Qtd Curva ABC
6.
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento
O movimento urbano é um fator relevante que pode contribuir para a qualidade de
vida dos habitantes das cidades. Para Hillier (1996:3) o espaço bom é o espaço utilizado, e
o fator fundamental de correlação com a configuração espacial é o movimento, estando os
dois intrinsecamente relacionados. Enquanto o movimento dita a configuração do espaço na
cidade, esta, por sua vez, determina o movimento. Como argumentado por Hillier e Sahbaz
(2008) os potenciais de movimento apresentados pelas variáveis da sintaxe não são
informações reais, mas têm de 60 a 80% de correlação entre os potenciais de movimento
real.
Jacobs (2000) considera a permeabilidade do solo urbano um fator positivo, pois
intensifica o movimento de pedestres pelos espaços. Entre os benefícios da circulação
tem-se a noção de movimento natural e copresença. O movimento natural, gerado pela
configuração espacial da malha urbana, induz ao deslocamento nas diversas rotas de
acesso de acordo com as características de acessibilidade na escala global e local, Hillier
(1993, 1996/2007) considera tal fator positivo para a vitalidade urbana. A copresença é a
capacidade que as pessoas têm de visualizar o espaço urbano, perceber o outro. Tais
conceitos foram apresentados no capítulo 1.
Vias com maior acessibilidade tendem a atrair maior movimento, favorecem a fixação
de comércio e, consequentemente, atraem mais pessoas. Segundo as colocações de Hillier
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 135
e Hanson (1984), espaços com essas características permitem a capacidade de
copresença, proporcionando espaços com maior vitalidade e vigilância.
Com o intuito de compreender como o crime se comporta com relação às
propriedades espaciais da configuração viária do espaço urbano do bairro em estudo,
buscou-se identificar a existência (ou não) de alguma relação com o movimento e a
presença de pedestres, utilizando para isso a sintaxe espacial e a observação in loco.
As informações das variáveis axiais, obtidas pelo mapa de continuidade, foram
correlacionadas com as ocorrências criminais registradas pelo CIOP, o que possibilitou
gerar gráficos simples de regressão, setores e barras, em que a variável dependente é o
crime e as variáveis independentes são acessibilidade, comprimento linear da rua e turno
diário.
Foram analisados os dois crimes mais comuns do bairro Manaíra, o roubo a pessoas
e o furto a imóveis, considerado residencial e não residencial. Primeiramente buscou-se
identificar a validação da relação movimento e presença de pedestres nas vias com maior
número de ocorrências, através da observação in-loco do fluxo de pedestres. Também,
analisou-se a covariância entre a acessibilidade da malha em movimento e as vias com
maiores incidências de crime; em seguida, identificou-se a relação da classe criminal com a
frequência de ocorrência criminal pelo metro linear das vias do bairro, com relação ao turno
e às faixas de acessibilidade. Tais análises tiveram como intuito avaliar se a copresença e o
movimento natural são geradores de vigilância e vitalidade para o bairro em estudo.
Foi confirmado no estudo em questão que as vias mais acessíveis do bairro
apresentam maior movimento e compreendem grandes atrativos comerciais, como exposto
na teoria do movimento natural, porém a presença de movimento, e consequentemente a
copresença de pessoas, não foram um fator inibidor das ocorrências criminais; tais lugares
se mostraram mais suscetíveis às incidências tanto de roubo quanto de furto. A copresença
existe, porém não inibe, inibe pouco ou inibe em determinadas faixas de acessibilidade.
Esse fato também foi identificado nos estudos de Circe Monteiro e Anna Iannicelli sobre o
bairro de Boa Viagem, Recife, que apresenta as mesmas características físicas e sociais do
bairro Manaíra.
No caso do bairro de Boa Viagem, essa diversidade aumenta o índice de
crimes. Podemos perceber este fato ao ver que as ruas que possuem uma
maior intensidade comercial se apresentam com o maior índice de roubos e
furtos. (IANNICELLI, 2010)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 136
Tais dados serão mais detalhadamente explicitados nas análises a seguir.
A tabela 6.1 corresponde à escala de integração global e ao local dos eixos do bairro
Manaíra, tirados a partir do mapa de continuidade na escala do entorno, que corresponde a
um limite de borda de raio de 3 km a partir dos limites do bairro (objeto de estudo). Os
índices apresentados são: mínimo, médio e máximo, que serviram de referência para os
gráficos de dispersão, em que se analisam as variáveis de integração com as ocorrências
de crime: roubo e furto.
Integração Mínima Média Máxima Global 0,831 1,502 2,145
Local 0,566 2,545 4,239
Tabela 6.1 - Resultados gerais de integração global e local, com relação ao bairro.
(FONTE: arquivo pessoal.)
O gráfico 6.1 mostra a relação das variâncias de integração global e local (variável
independente) com os valores totais de incidências de roubo nos anos de 2008 e 2009,
(variável dependente).
Gráfico 6.1 – Valores de integração x Quantidade de Roubo. (FONTE: arquivo pessoal.)
Observa-se que as duas variáveis apresentam correlação positiva: a primeira,
integração global, com R(n)²= 0,275 24; e a segunda, integração local R(3)²= 0,2681. As duas
variáveis estão na categoria moderada, como mostra a planilha de COHEN(1988), ver
tabela 3.1 no capítulo 3. Quanto mais integradas às vias, local e globalmente, maior o
24 R(n)² ou R-quadrado = Coeficiente de determinação no qual a variância y (roubo) é explicada pela variância x (integração global radius n)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 137
registro de ocorrência de roubo nesses dois anos. Identifica-se que o roubo apresenta maior
correlação com a variável de integração global, que representa 27,5% da variância entre
roubos e integração global. A seguir, destacaremos os quatro eixos com maior covariância
de roubo com relação à integração global e local:
Av. Flávio Ribeiro Coutinho, com 116 casos de roubo: R(n)²= 2,027 e R(3)²= 3,971
Rua Manoel Arruda Cavalcanti, com 36 casos de roubo: R(n)²= 1,671 e R(3)²= 3,424
Av. Edson Ramalho, com 35 casos de roubo: R(n)²= 2,015 e R(3)²= 3,801
Av. João Câncio com 32 casos de roubo: R(n)²= 1,955 e R(3)²= 3,457
Observa-se que as ocorrências de roubo em geral estão nos eixos com maiores
integrações global e local, com exceção da Av. Rui Carneiro, fato já comentado
anteriormente. Tais vias possuem um nível de acessibilidade entre média e alta, com
relação aos outros eixos do bairro, que por incentivarem um tráfego maior de pessoas,
estimulam a fixação de comércio e consequentemente atraem o roubo.
O gráfico 6.2 mostra como as ocorrências de furto nos anos de 2008 e 2009 (variável
dependente) se comportam com relação às propriedades de integração global e local
(variável independente). As duas variáveis apresentam correlação positiva e valores bem
próximos, R(n)²= 0,2341, R(3)²=0,2358, estando as variâncias na categoria moderada,
segundo a planilha de COHEN (1988), ver tabela 3.1, e representando conjuntamente 23%
da variância entre furto e integração global ou local.
Gráfico 6.2 - Valores de integração x Quantidade de Furto.
(FONTE: arquivo pessoal.)
R² = 0,2341 R² = 0,2358
0
10
20
30
40
50
60
0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5
Qu
an
tid
ad
e d
e O
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cia
s d
e F
urt
o
Integração
Variáveis Axiais x Furto
Integração Global Integração Local
Av. Flávio Ribeiro Coutinho
Av. João Câncio
Av. João Maurício
Av. Edson Ramalho
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 138
Assim como nas ocorrências de roubo, o furto predomina no bairro Manaíra nas vias
mais acessíveis (ou mais integradas), com integração local entre 2,644 e 3,97, ver tabela
6.1, onde se situam as vias: Av. Flávio Ribeiro Coutinho, com 56 casos; Av. João Câncio,
com 21 casos, Av. João Maurício, com 19 casos e Av. Edson Ramalho com 15 casos.
Procurando validar a relação acessibilidade e movimento de pedestres, que tem a
ver com a teoria do movimento natural, computou-se a quantidade de pessoas que
transitavam a pé, em algumas vias do bairro, durante os três períodos do dia (manhã, tarde
e noite), em um dia de semana e um dia de fim de semana. Foram observados 13 pontos
com maior incidência de roubo e furto, nesses dois anos, em sete ruas.
Av. Edson Ramalho, com pontos na (1) Corretora Teixeira de Carvalho e (2)
Restaurante Mangai;
Av. Flávio Ribeiro Coutinho, com pontos (3) no restaurante Habib‟s e (4) Mag
Shopping;
Av. João Câncio, com pontos (5) no Mercadinho Manaíra e (6) Praça Alcides
Carneiro;
Av. João Maurício, com pontos (7) na sorveteria Freeberg e (8) Quadra do
Manaíra;
Rua Manuel Arruda Cavalcanti, com ponto (9) no Manaíra Shopping;
Av. Maria Rosa Sales, com pontos (10) no cruzamento da Av. Santos Coelho
Neto e (11) nas proximidades da Igreja Católica São Pedro Pescador;
Av. São Gonçalo, com pontos (12) no cruzamento da Av. Glaucia Maria dos
Santos e (13) nas proximidades do Colégio Alice Carneiro. Pontos definidos
na figura 6.1.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 139
Figura 6.1 – Pontos de observação no bairro Manaíra. (FONTE: arquivo pessoal.)
Foi observado que no final de semana a Av. João Maurício, rua da orla marítima
(pontos 5 e 7), apresenta uma maior quantidade de pedestres, principalmente no turno da
manhã; à tarde, no ponto 7 há uma maior intensidade de pessoas; observa-se uma maior
concentração de pessoas nas proximidades do Shopping Manaíra, ponto 9, nos turnos da
tarde e da noite. As vias de comércio apresentam, no final de semana, baixíssima presença
de pedestres, sendo os períodos da manhã e da noite os de menor frequência, como
observado nos pontos 1 e 2.
Gráfico 6.3 - Quantidade de Pedestres no final de semana, dia 20/11/2011.
(FONTE: arquivo pessoal.)
0102030405060708090
100
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Manhã
020406080
100120140160180200
1 3 5 7 9 11 13
Tarde
020406080
100120140160180200
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10111213
Noite
2
3
4
9
11 12
13
6
5
10
1
8
7
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 140
Nos dias da semana percebe-se um tráfego mais intenso de pedestres pela manhã,
na Avenida Flávio Ribeiro Coutinho, nas proximidades do Mag Shopping, ponto 4; durante
os outros turnos do dia, tarde e noite, destaca-se o ponto 9 do Shopping Manaíra, que abre
depois das dez horas da manhã. A partir dessa hora, torna-se frequente seu uso ao longo
do dia até o horário de seu fechamento. Os pontos que apresentam menores registros de
pessoas são as avenidas Maria Rosa Sales, pontos 10 e 11 e São Gonçalo, pontos 12 e 13.
A Avenida Edson Ramalho é uma das vias mais acessíveis do bairro, nela se concentram
muitos pontos comerciais, existe um grande fluxo de veículos, porém ao longo de todo o seu
percurso é pouca a frequência de pedestres, sendo muitos deles identificados nas
proximidades de restaurantes. Ver gráfico 6.4.
Gráfico 6.4 - Quantidade de Pedestres na semana, dia 21/11/2011.
(FONTE: arquivo pessoal.)
0102030405060708090
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10111213
Manhã
0
50
100
150
200
250
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13
Tarde
0
50
100
150
200
250
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10111213
Noite
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 141
6.1 Roubo
Os pontos de roubo, em 2008, estão assinalados no mapa de linhas de
continuidade, possibilitando correlacionar as incidências de crime aos seus valores de
integração local (acessibilidade) das vias do bairro (figura 6.2).
Figura 6.2 - Pontos de Roubo e Mapa de Continuidade (Integração Local) 2008.
(FONTE: arquivo pessoal.)
O gráfico 6.3 correlaciona integração local com os tipos de roubo em 2008. No plano
de fundo do gráfico, as cores expostas em dégradé mostram a variação de integração local
(R3): às cores mais frias (azuis e verdes) correspondem os eixos com baixa integração em
relação à malha do bairro Manaíra; as cores quentes (do amarelo ao vermelho) identificam
eixos mais acessíveis do bairro. Observa-se uma interdependência entre os eixos mais
integrados com relação ao tipo de roubo mais frequente, a pessoas, onde ocorrem
consequentemente nas vias mais movimentadas, como Av. Flávio Ribeiro Coutinho, Av.
Edson Ramalho, Av. João Maurício e Av. João Câncio. Também, é possível identificar a
existência desse tipo de crime com relação à proximidade do bairro São José, em vias com
baixa integração local e que apresentam um número significativo de ocorrências.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 142
Gráfico 6.5 - Integração Local x Ocorrências de roubo, 2008. (FONTE: arquivo pessoal.)
Enquanto o roubo a não residência predomina em vias mais acessíveis, o roubo a
residência tende a acontecer em eixos menos integrados, gráfico 6.6.
Gráfico 6.6, 6.7 e 6.8 – Combinações de Roubo, 2008 (FONTE: arquivo pessoal.)
A figura 6.3 ilustra o mapa de integração local, conjuntamente com os pontos de
roubo, em 2009. Observa-se nesta imagem uma dispersão do roubo dentro do bairro; muitas
incidências acontecem na Av. Gov. Flávio Ribeiro Coutinho.
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1 1,25 1,5 1,75 2 2,25 2,5 2,75 3 3,25 3,5 3,75 4 4,25
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Integração R3 (local)
Roubo a pessoa Roubo a residência Roubo a ñ-residência Roubo em veículo Roubo de veículo
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Integração R3 (local)
Roubo a pessoa Roubo a residência
1
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1,75 2,25 2,75 3,25 3,75 4,25
Integração R3 (local)
Roubo a pessoa Roubo a ñ-residência
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Integração R3 (local)
Roubo a residência Roubo a ñ-residência
Eixos próximo ao bairro São José
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 143
Figura 6.3 - Mapa de Continuidade (Integração Local) x roubo 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
O gráfico 6.9 correlaciona a propriedade de integração local e os tipos de roubo para
2009. Salienta-se nesse gráfico a maior quantidade de ocorrências para roubo a pessoas,
identificado pelos losangos amarelos; a segunda via mais integrada, a Av. Governador
Flávio Ribeiro Coutinho, continua apresentando o maior índice de ocorrências de roubo para
este ano, com 53 incidências; o segundo eixo com maior incidência é a Av. São Gonçalo,
com 27 casos e índice de integração local de 3,29; em terceiro lugar vem a Av. Edson
Ramalho e a Av. João Maurício, com índices de integração de 3,80 e 3,58, respectivamente,
e registros de 19 ocorrências cada. Ainda se identifica, como no ano de 2008, casos de
roubo a pessoas em vias menos integradas e próximas ao bairro São José, como as vias:
Av. Francisco Brandão, Rua Construtor Humberto Ruffo, Rua Glaucia Maria dos Santos
Gouveia e Rua Major Ciraulo. Com relação aos outros tipos de roubo, o roubo a não
residências destaca-se na Av. Flávio Ribeiro Coutinho e Av. João Câncio, vias com alto
índice de integração onde se localizam lojas e centros comerciais.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 144
Gráfico 6.9 - Integração Local x Ocorrências de roubo, 2009. (FONTE: arquivo pessoal.)
Com relação às propriedades específicas de roubo foram elaborados gráficos de
dispersão com o intuito de identificar, ou não, correlações entre este tipo de crime e a
propriedade espacial de integração local. Observando os gráficos 6.10, 6.11 e 6.12,
visualiza-se uma maior incidência de roubo a pessoas, com destaque para a via de alta
integração, Av. Flávio Ribeiro Coutinho. Identifica-se um segundo ponto de destaque, a Av.
São Gonçalo, juntamente com outros eixos de integração local média, com índice entre 3,26
e 3,80. Com relação à natureza do crime, em segundo lugar destaca-se o roubo a não
residências, ou seja, ocorrências em ambientes comerciais, que acontecem com maior
frequência na Av. Edson Ramalho e Av. João Câncio, com integração 3,97 e 3,45,
respectivamente, eixos mais integrados do bairro que concentram uma maior quantidade de
pontos de comércio.
O roubo a residências se apresenta em quantidades inferiores com relação aos
outros dois tipos de roubo, apenas 11 registros de casos com índice de integração local
variando entre 2,64 e 3,97.
Gráfico 6.10, 6.11 e 6.12 – Combinações de Roubo 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
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Integração R3 (local)
Roubo a pessoa Roubo a residência Roubo a ñ-residência Roubo de veículo Roubo em veículo
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Integração R3 (local)
Roubo a residência Roubo a pessoa
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Integração R3 (local)
Roubo a pessoa Roubo a ñ-residência
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Integração R3 (local)
Roubo a ñ-residência Roubo a residência
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 145
Os gráficos 6.13 e 6.14 mostram as incidências gerais de roubo, para os anos de
2008 e 2009, com relação à variável axial de integração local (R3), com índices gerais
definidos na tabela 6.1.
É possível identificar nos dois gráficos, padrões de ocorrências criminais entre as
barras verdes e amarelas, com índice intermediário entre 2,886 e 3,704, ou seja, muitas
incidências acontecem em vias que não são muito integradas ou acessíveis. Deve-se
observar que nestas duas faixas os eixos apresentam maior metragem linear, como
observado no gráfico 6.17.
Evidencia-se que os eventos de roubo se dão principalmente contra os indivíduos, e
ocorrem tanto em vias com maior concentração de comércio, quanto em vias com maior
característica residencial, que apresentam integração local intermediária e constituem a
maior metragem linear.
Também se observa uma frequência de ocorrências nos eixos mais integrados, que
é identificado pela Avenida Governador Flávio Ribeiro Coutinho (barra vermelha), nela estão
localizados pontos de comércio, além dos shoppings Manaíra e Mag Shopping; o nível
acessível, representado apenas pela Avenida General Edson Ramalho (barra laranja),
também se destaca por ser um corredor de movimento e, consequentemente, de comércio,
porém apresenta o índice mais baixo de ocorrências de roubo, conjectura-se que a diferença
entre as ocorrências da faixa vermelha e laranja (faixas mais acessíveis) deve-se ao tipo
diferenciado de percurso, enquanto os grandes magnetos comerciais atraem um grande
contingente de pessoas de toda a cidade de João Pessoa que se deslocam de carro, ônibus
e a pé; a Avenida General Edson Ramalho (faixa laranja), apresenta lojas individuais e
clientes exclusivos que transitam de um estacionamento próximo para dentro da loja,
dificilmente se identifica percurso entre lojas ao longo desta via.
Existe a evidência de um aumento de incidências do ano de 2008 para o ano de
2009, porém os padrões permanecem os mesmos.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 146
(FONTE: arquivo pessoal.)
Nos gráficos 6.15 e 6.16 salientam-se os níveis de acessibilidade com maiores
incidências de roubo, o nível pouco acessível (linha verde) apresenta 36% e 35% de
ocorrências nos anos de 2008 e 2009; o nível com média acessibilidade corresponde a 27%
de incidências; e o nível muito acessível corresponde a 18% dos incidentes nos dois anos.
Analisando cada nível de acessibilidade com relação ao total de metragem de
comprimento das vias, percebe-se pelo gráfico 6.17 que no nível muito acessível existem
duas vias que somam 2.875 metros lineares - a Av. Senador Rui Carneiro e a Av. Flávio
Ribeiro Coutinho; no nível acessível existe apenas uma via nesse intervalo, correspondendo
a um total de 1.912m, que é a Av. Edson Ramalho; no nível com média acessibilidade há 10
vias que somam 19.813m; com baixa acessibilidade existem 16 vias que somam 19.396m;
no nível com acessibilidade insuficiente (muito baixa) apresentam-se 63 vias que
correspondem a um total de 12.071m de comprimento. Percebe-se que o bairro Manaíra
tem em sua totalidade uma maior quantidade de vias com acessibilidade média e baixa,
correspondendo pelos gráficos anteriores 6.13 e 6.14 às vias com maior quantidade de
incidências.
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Acessibilidade baixa
Pouco Acessível Média Acessibilidade
Acessível Muito Acessível
Roubo 2008
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Acessibilidade baixa
Pouco Acessível
Média Acessibilidade
Acessível Muito Acessível
Roubo 2009
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Roubo 2008
Acessibilidade baixa
Pouco Acessível
Média Acessibilidade
Acessível
Muito Acessível
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6%
18%
Roubo 2009
Gráfico 6.15 – Quant. de roubos nos eixos, 2008. Gráfico 6.16 – Quant. de roubos nos eixos, 2009.
Gráfico 6.13 – Gráfico de barras – Integração Local(R3) Gráfico 6.14 – Gráfico de barras - Roubo 2009
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 147
Gráfico 6.17 – Comprimento Total dos Níveis de Acessibilidade.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Essa observação é necessária para identificar uma proporção entre o tamanho da
via, no seu nível de acessibilidade, e a quantidade de incidências criminais de roubo e furto
que ocorreram durante os dois anos de análise. Tendo como intuito calcular a proporção de
ocorrências por metro linear de vias, conforme seus níveis de acessibilidade.
Gráfico 6.18 - Comprimento do nível de acessibilidade pela quantidade de roubo, em 2008 e 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Identifica-se no gráfico 6.18, que a cada 25 m de comprimento existem incidências
de roubo nas vias mais acessíveis, enquanto nas vias de média acessibilidade essa relação
aumenta para 116m; as vias com acessibilidade baixa agregam a maior quantidade de ruas,
também têm a maior distância de roubos, ou seja, a cada 133m tende a acontecer um
incidente de roubo. Assim, reafirma-se que os níveis mais acessíveis tendem a apresentar
os maiores índices de criminalidade por metro linear.
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Acessibilidade baixa
Pouco Acessível
Média Acessibilidade
Acessível
Muito Acessível
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19813
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0 5000 10000 15000 20000 25000
Acessibilidade insuficiente
Pouco Acessível
Média Acessibilidade
Acessível
Muito Acessível
Comprimento
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 148
Gráfico 6.19 - Comprimento do nível de acessibilidade pela tipo de roubo específico, em 2008 e 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
O gráfico 6.19 apresenta o comprimento do nível de acessibilidade pelos tipos de
roubo mais comuns no bairro: o roubo a pessoas tende a acontecer com maior frequência,
nas vias muito acessíveis, ou seja, a cada 30m há um incidente; o roubo a residências
tende a acontecer com maior frequência em vias com acessibilidade baixa; e o roubo a não
residências, ocorre com maior frequência novamente nas vias com muita acessibilidade, ou
seja, a cada 221m há um incidente em algum ambiente comercial.
No gráfico 6.20, observa-se a relação entre roubo a pessoas, turno e acessibilidade.
Percebe-se que as vias pouco acessíveis apresentam as maiores incidências desse crime,
com sequência decrescente de casos nos turnos da manhã, tarde e noite. Em vias com
média acessibilidade e muito acessíveis destacam-se o roubo a pessoas no turno da tarde e
em seguida à noite. Já nas vias com acessibilidade baixa, o turno da manhã apresentou
maiores ocorrências do que os outros turnos nesse nível de acessibilidade.
Gráfico 6.20 – Acessibilidade, Turno e Roubo a pessoa, em 2008.
(FONTE: arquivo pessoal.)
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108
171
64
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3963
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Acessibilidade baixa
Pouco Acessível
Média Acessibilidade
Acessível
Muito Acessível
Comprimento/Roubo a pessoa Compr/Roubo a residência Compr/Roubo a ñ-residência
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Acessibilidade insuficiente Pouco Acessível Média Acessibilidade Acessível Muito Acessível
MADRUGADA MANHÃ TARDE NOITE
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 149
Avaliando os casos de roubo a pessoas no ano de 2009, com relação ao turno e à
acessibilidade, identifica-se em todos os padrões de acessibilidade que esse tipo de crime
tende a ocorrer com maior frequência à noite, no horário entre 18h00 e 00h00, apresentando
uma maior incidência em vias com pouca e média acessibilidade. Em sequência provêm os
turnos da tarde e da manhã, a tarde apresenta maior incidência em vias com média
acessibilidade, enquanto o turno da manhã se destaca, também, nas vias pouco acessíveis.
Vias com acessibilidade baixa possuem poucos casos nos quatro turnos. A madrugada,
entre 00h00 e 6h00, é o horário com os menores incidentes (ver gráfico 6.21).
Gráfico 6.21 – Acessibilidade, Turno e o Roubo a pessoa, em 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
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Acessibilidade insuficiente Pouco Acessível Média Acessibilidade Acessível Muito Acessível
MADRUGADA MANHÃ TARDE NOITE
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 150
6.2 Furto
No Mapa de Continuidade (integração local, figura 6.4), não se verifica, a princípio,
correlação entre acessibilidade e furto. Há uma dispersão de ocorrências em todo o bairro,
existem alguns eixos de comércio mais integrados, com incidências, assim como existem
eixos menos integrados, com bastante ou pouca ocorrência.
Figura 6.4 Mapa de Continuidade (Integração Local) x furto 2008 (FONTE: arquivo pessoal.)
Com relação às propriedades específicas do furto foram elaborados gráficos de
combinações com o intuito de identificar, ou não, correlações entre este tipo de crime e a
acessibilidade local. No gráfico 6.22, observa-se uma incidência maior de furto a
residências do que a pessoas e este acontece, principalmente, próximo a eixos de
integração local média, enquanto a quantidade de ocorrências de furto a pessoas tem uma
maior relação com eixos mais integrados, fato observado, também, nas ocorrências de furto
a não residências (gráfico 6.23 e 6.24). Isso indica que eixos mais integrados, tanto
favorecem a economia de movimento quanto, também, tornam-se atrativos aos delinquentes
praticantes de furto.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 151
Gráfico 6.22, 6.23 e 6.24 – Combinações de Furto2008 (FONTE: arquivo pessoal.)
A relação entre integração local e os tipo de furto em 2008, é apresentada no gráfico
6.25, no qual as maiores incidências referem-se a furto a não residências, como já
identificado anteriormente, e apresentam índices de integração local intermediário (2,294 e
3.972). Quanto à maior quantidade de incidências, destacam-se os dois eixos que
apresentam os maiores índices de integração local e global, a Av. Flávio Ribeiro Coutinho e
a Av. Edson Ramalho, os quais apresentam maior movimento no bairro e,
consequentemente, recebem o comércio, sendo tais espaços identificados como os maiores
atratores para ocorrência de furtos.
Gráfico 6.25 - Integração Local x Ocorrências de furto, 2008
(FONTE: arquivo pessoal.)
Identifica-se no Mapa Axial de Continuidade (integração local), figura 6.5, dois tipos
de ação do furto: a primeira ocorre nas vias mais integradas do bairro, linhas laranja e
vermelha, com incidências principalmente em estabelecimentos comerciais e de lazer; a
segunda refere-se às incidências nas linhas verdes, áreas menos movimentadas do bairro,
com predominância de tipologia residencial, situadas principalmente a oeste do bairro, nas
proximidades do bairro São José.
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Integração R3 (local)
Furto em residência Furto a pessoa
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Integração R3 (local)
Furto a pessoa Furto em ñ-residência
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Integração R3 (local)
Furto em residência Furto em ñ-residência
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Integração R3 (local)
Furto a pessoa Furto em residência Furto em ñ-residência Furto de veículo Furto em veículo
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 152
Figura 6.5 - Mapa de Continuidade (Integração Local) x furto 2009 (FONTE: arquivo pessoal.)
Com relação à propriedade axial dos eixos viários, desenvolveram-se gráficos de
dispersão da natureza do furto com o intuito de identificar, ou não, correlações entre este
tipo de crime e a propriedade espacial de integração local. No gráfico 6.27 observa-se um
ponto de destaque de incidência, o furto a pessoas, na Av. João Maurício, já identificada
anteriormente como eixo em evidência; o furto a não residências enfatiza-se com relação
aos outros tipos de furto, fato este notado no ano anterior. O eixo com maiores incidências
de furto a não residências (ou de estabelecimento comercial) é a Av. Flávio Ribeiro
Coutinho, que se sobressai em relação aos outros eixos (gráficos 6.27 e 6.28).
Observa-se que o furto a pessoas tende a acontecer em vias mais acessíveis, com
alguns registros em vias segregadas; no furto a residências ocorre o contrário, muitos casos
incidiram em vias mais segregadas, o furto a não residências, desconsiderando a Av. Flávio
Ribeiro Coutinho, mantém suas incidências nos eixos de acessibilidade intermediária do
bairro, entre 3,12 e 3,80 de integração local.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 153
Gráfico 6.26, 6.27 e 6.28 – Combinações de Furto2009. (FONTE: arquivo pessoal.)
Com o intuito de identificar a relação entre integração local e os tipo de furto para o
ano de 2009, observa-se no gráfico 6.29 que as maiores incidências são de furto a não
residências, com maior ocorrência na Av. Flávio Ribeiro Coutinho, com 20 casos ao longo
do ano; em seguida destaca-se o furto a pessoas com 6 casos somente na Av. João
Maurício (avenida da orla marítima), tais eixos apresentam índices de integração local, com
muita acessibilidade e média acessibilidade (3,971 e 3,581), respectivamente. No furto a
residências identificam-se dois eixos principais de ocorrências: a Rua Francisco Claudino
Pereira e a Av. Maria Rosa Sales, com níveis de integração pouco acessíveis, são ruas
menos integradas, porém próximas ao Bairro São José.
Gráfico 6.29 - Integração Local x Ocorrências de furto, 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Os gráficos 6.30 e 6.31 mostram as incidências gerais de furto para os anos de 2008
e 2009, com relação à variável axial de integração local (R3), com índices gerais definidos
na tabela 6.1.
Identificam-se, nos dois gráficos, padrões de ocorrências criminais entre as barras
verdes e amarelas, com índice intermediário, entre pouco acessível e média acessibilidade,
ou seja, muitos incidentes acontecem em vias que não são muito integradas ou acessíveis,
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Integração R3 (local)
Furto em residência Furto a pessoa
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Integração R3 (local)
Furto a pessoa Furto em ñ-residência
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Integração R3 (local)
Furto em ñ-residência Furto em residência
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Integração R3 (local)
Furto a pessoa Furto em residência Furto em ñ-residência Furto de veículo Furto em veículo
Av. Gov. Flávio Ribeiro Coutinho
Av. João Maurício
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 154
apesar de muitas vias amarelas não apresentarem ocorrências de furto, o pouco que
apresentam é suficiente para se destacar com relação às outras barras. Também se
observa uma frequência de ocorrências nos eixos mais integrados, que são identificados
pela Av. Edson Ramalho, que corresponde às incidências da barra laranja; e a Avenida
Flávio Ribeiro Coutinho, que corresponde à barra vermelha. Existe a evidência de um
aumento de incidências do ano de 2008 para o ano de 2009, neste eixo.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Nos gráficos 6.32 e 6.33 é possível identificar que proporcionalmente as barras com
maiores incidências de furto permanecem em vias com acessibilidade média e pouco
acessível, como observado, também, com relação ao roubo.
Os dados expostos demonstram que o crime de furto tem maior relação com o
espaço. Os registros identificados pelo CIOP caracterizam esse tipo de ocorrência em algum
imóvel, dentro de residências ou estabelecimentos comerciais e de serviços; são poucas as
incidências identificadas nos espaços urbanos, ruas, praças e orla.
Identifica-se que lugares de grandes comércios tendem a ser fortes atratores aos
ladrões, não só para o roubo, mas para o furto; há, porém, algumas diferenças na forma de
agir: após a compra de algum produto, e/ou retirada de dinheiro, ou mesmo um simples
passeio, as pessoas tendem a correr riscos, assim que saem destes estabelecimentos e se
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Acessibilidade insuficiente
Pouco Acessível
Média Acessibilidade
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Furto 2008
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Acessibilidade insuficiente
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Média Acessibilidade
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Furto 2009
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Furto 2008Acessibilidade insuficiente
Pouco Acessível
Média Acessibilidade
Acessível
Muito Acessível
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28%
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5%
25%
Furto 2009
Gráfico 6.30 – Gráfico de barras – Integração Local Gráfico 6.31 – Índice de Integração local x Furto 2009.
Gráfico 6.32 – Quant. de furtos nos eixos, 2008. Gráfico 6.33 – Quant. de furtos nos eixos, 2009.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 155
encontram em áreas urbanas abertas, como ruas, paradas de ônibus, praças até mesmo no
estacionamento; a abordagem deste tipo de crime se dá com atos de violência. É
interessante observar que, enquanto o roubo atinge diretamente o indivíduo, o furto age
indiretamente, não havendo confronto pessoal, as principais incidências de furto acontecem
no interior de lojas localizadas nestes estabelecimentos ou em eixos de comércio. O interior
das residências também é um atrator ao crime de furto.
Gráfico 6.34 - Comprimento do nível de acessibilidade dividido pela quantidade de furto, em 2008 e 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Identifica-se no gráfico 6.34, que a cada 51m de comprimento existem incidências de
furto nas vias mais acessíveis, enquanto nas vias de média acessibilidade essa relação
aumenta para 236m e 234m para pouca acessibilidade; as vias com acessibilidade baixa
apresentam a maior distância possível - 377m para cada incidente de furto. Assim, observa-
se que os níveis mais acessíveis, com maior movimento e que atendem à fixação de
comércio, tendem a apresentar o maior índice de criminalidade por metro linear.
377
234
236
127
51
0 100 200 300 400 500
Acessibilidade insuficiente
Pouco Acessível
Média Acessibilidade
Acessível
Muito Acessível
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 156
Gráfico 6.35 - Comprimento do nível de acessibilidade pela tipo de furto específico, em 2008 e 2009. (FONTE: arquivo pessoal.)
Com relação aos tipos de furto mais comuns, observou-se que a cada 74m de
distância ocorreu um furto a estabelecimento comercial, entre os dois anos analisados, nas
vias com maior acessibilidade; em sequência vem o mesmo tipo de incidência a cada 191m
em vias acessíveis. O furto a pessoas ocorreu a cada 319m de distância em vias muito
acessíveis (ver no gráfico 6.35 as outras relações).
Analisando o furto a imóveis no ano de 2008, no gráfico 6.36, compreende-se que o
turno da manhã é o horário mais frequente de incidências em vias com média
acessibilidade, esse fato merece uma observação importante, pois a incidência pode ter
ocorrido em um turno anterior, mas a vítima pode ter percebido somente pela manhã. Com
relação às vias muito acessíveis, observa-se que o horário de maior incidência é à tarde e à
noite.
Gráfico 6.36 - Acessibilidade, Turno e Furto em estabelecimento, em 2008.
(FONTE: arquivo pessoal.)
2414
1385
1238
1912
319
754
510
683
956
1437
3018
1021
991
191
74
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%
Acessibilidade insuficiente
Pouco Acessível
Média Acessibilidade
Acessível
Muito Acessível
Comprimento/Furto a pessoa Compr/Furto em residência Compr/Furto em ñ-residência
0
5
10
15
20
25
30
Acessibilidade insuficiente Pouco Acessível Média Acessibilidade Acessível Muito Acessível
MADRUGADA MANHÃ TARDE NOITE
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre Ocorrências, acessibilidade e movimento 157
Com relação ao ano de 2009, existem padrões bastante distintos entre as
ocorrências e os tipos de acessibilidade da via. Incidências no turno da manhã tendem a
acontecer em vias com acessibilidade baixa, eixos com pouca acessibilidade permanecem
como destaque no turno da manhã, seguidos dos turnos da tarde e noite. Linhas de
integração com média acessibilidade apresentam uma maior ocorrência no turno da tarde e
pela manhã; vias com muita acessibilidade apresentam maior incidência de furto a imóveis
no turno da tarde (verificar gráfico 6.37).
Gráfico 6.37 - Acessibilidade, Turno e Furto em estabelecimento, em 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
0
2
4
6
8
10
12
14
16
Acessibilidade insuficiente Pouco Acessível Média Acessibilidade Acessível Muito Acessível
MADRUGADA MANHÃ TARDE NOITE
7.
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas
Visibilidade, sentimento de copresença, vigilância natural, observação participante
para o trabalho em questão, são definições de um mesmo fato, referido por Jacobs (2009)
como „olhos da rua‟. Tais expressões denotam a capacidade que as pessoas têm de
naturalmente observarem um espaço privado e/ou público, sendo essa ação favorecida
pelas características físicas e morfológicas do ambiente construído.
Essa capacidade de apreender o espaço urbano, para Newman (1996) é tanto
responsabilidade das pessoas quanto da forma do conjunto edificado, pois esses
influenciam diretamente no comportamento de vigilância. Porém, identifica-se na maioria
das cidades brasileiras que os „olhos da rua‟, a capacidade de vigilância natural, estão
limitados pelos pontos cegos dos muros. Como coloca Caldeira (2008) artifícios de proteção
privada estabelecem diferenças, impõem divisões, restringem o movimento natural e tornam
a observação participativa inviável; seguindo este raciocínio, Sônia Ferraz (2003) argumenta
que a utilização desses e de outros artifícios, faz parte de uma nova coletividade que não
gera nenhuma sociabilidade e muito menos proporciona segurança.
Partindo desses argumentos, este capítulo tem por finalidade correlacionar os
aspectos físicos e morfológicos do bairro Manaíra com relação aos crimes identificados nos
anos de 2008 e 2009, tendo como objetivo esclarecer se há relação entre ocorrências
criminais e padrões de uso, ocupação e barreiras físicas do ambiente construído. Para isso,
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 159
primeiramente, foram identificados os pontos quentes e frios do crime, através de mapas de
hot-spot ou Kernell. Os pontos quentes são definidos pelo quantitativo de ocorrências
criminais registradas e mapeados em uma base georreferenciada; de acordo com a
quantidade de pontos registrados, vão se adensando e tornando-se manchas. Essas
manchas vão da coloração azul claro ao vermelho: quanto mais fria a cor menos registro de
incidências; quanto mais quente a cor, maior o registro de incidências criminais, sendo essa
área conhecida por hot-spot ou zona quente.
A princípio analisaram-se todas as informações de crime juntas, em sequência
dividiu-se o crime em roubo e furto e suas respectivas prioridades, roubo a pessoas e furto a
imóveis. Com relação à visibilidade, a capacidade de observação do ambiente, analisou-se
o crime juntamente com o mapa de barreiras físicas e de proteção dos lotes do bairro, tendo
como intuito identificar se tais elementos influenciam a capacidade de vigilância natural da
rua.
Como identificado no capítulo 6, existem alguns lugares que tendem a apresentar
maiores ocorrências de crime, como: nas proximidades de centros comerciais em vias bem
acessíveis, e em vias com acessibilidade intermediária, próximo a colégios e setores mais
residenciais, tais informações foram analisadas quanto às características sintáticas. Esse
capítulo irá abordar as características morfológicas do local do crime, identificando
especificamente como se define o local do crime com relação ao uso e ocupação do solo e
aos tipos de barreiras físicas de proteção mural, como altura de muro e artifícios de
segurança.
A princípio percebeu-se que muitos incidentes aconteceram próximo a ou em lugares
considerados seguros, com muros altos e protegidos com algum artifício de segurança. Os
itens a seguir iram explanar tais fatos.
7.1 Pontos Quentes e Frios do Crime
Os mapas de Kernell, ou hot-spot, são bons para dar uma estimativa dos lugares
que precisam de maior atenção quanto à criminalidade no geral, porém, tal artifício não
demonstra claramente quais são as características físico-espaciais do lugar, para isso
adotaram-se outros artifícios que podem caracterizar o local. De qualquer maneira, os
mapas de pontos quentes definem os lugares que mais chamam atenção, para serem
analisados. Para esses tipos de mapas adotou-se como padrão, nesse trabalho, a opção de
grade com número de colunas igual a 200.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 160
Figura 7.1 - Mapa de Kernell: crimes roubo e furto, 2008 e 2009. (FONTE: arquivo pessoal.)
A figura 7.1 mostra o mapa do bairro Manaíra com manchas que destacam todos os
crimes mapeados de roubo e furto, ocorridos nos anos de 2008 e 2009. Identifica-se uma
área bem avermelhada, ou ponto quente, a noroeste do bairro, onde há uma maior
concentração de delitos; também se observam áreas em segundo destaque a nordeste,
próximo à orla marítima e a centro-oeste, próximo ao bairro São José. No sul e centro-leste
do bairro, percebem-se áreas claras sem pontos de destaque - nessa região são poucas as
incidências criminais - aqui definidos como pontos frios.
Figura 7.2 - Mapa de Kernell: roubo, 2008 e 2009. Figura 7.3 - Mapa de Kernell: furto, 2008 e 2009.
(FONTE: arquivo pessoal.)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 161
Analisando os tipos de crime roubo e furto separadamente, percebe-se na figura
7.2, que o roubo destaca-se nos mesmos pontos do crime geral (figura 7.1), porém há um
espalhamento maior do delito de roubo por todo o oeste e norte do bairro, enquanto a
sudeste são poucas as incidências; essa área pode ser definida como ponto frio para o
roubo.
Na figura 7.3, o furto se destaca nos pontos ao norte do bairro. Também se
identifica uma nova área, próximo à Praça Silvio Porto. Há um espalhamento maior desse
tipo de crime por todo o bairro, com algumas áreas sem definição de furto no centro e ao sul
do bairro, aqui consideradas áreas ou pontos frios para o furto.
A seguir serão mostrados mapas de pontos quentes com os locais de destaque das
incidências criminais específicas de roubo e furto para cada ano, analisados
separadamente.
Nas quatro figuras, 7.4 a 7.7, como já
argumentado nos mapas anteriores observam-se
uma concentração de crimes, salientada pela
coloração vermelha, a noroeste do bairro Manaíra,
tanto para crimes de roubo quanto de furto.
Analisando o crime com relação ao roubo,
percebe-se outro ponto de concentração, de hot-
spot, no centro-oeste do bairro, no ano de 2008; no
ano de 2009, figura 7.5, houve uma dispersão
desses pontos para o norte do bairro, com outra
área de destaque nas proximidades da orla
marítima, porção nordeste do bairro.
Com relação ao furto, em 2008, figura 7.6,
tirando o ponto quente a noroeste do bairro, há
uma dispersão de furtos expressos em todo o
Figura 7.4 - Mapa de Kernell: roubo 2008
Figura 7.5 - Mapa de Kernell: roubo 2009
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 162
bairro, manchas verdes mais escuras a sudeste,
próximo ao setor hoteleiro; em sequência, mancha
amarelada, onde se evidenciam mais incidências
no centro-oeste e nordeste do bairro Manaíra.
No ano de 2009, figura 7.7, percebe-se na
ocorrência de furto algumas áreas de destaque
próximo à orla marítima, tanto a norte quanto a sul
do bairro, porém destaca-se um segundo ponto de
grandes incidências próximo ao ponto mais quente,
região a noroeste do bairro, este último ponto
diferencia-se com relação aos outros pontos que
se destacavam até então.
Figura 7.6 - Mapa de Kernell: Furto 2008
Figura 7.7 - Mapa de Kernell: Furto 2009
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 163
7.2 Crime versus uso e ocupação do solo
7.2.1 Lugares de destaque do Crime
Observando todas as ocorrências criminais
de roubo e furto, nos anos de 2008 e 2009,
identifica-se uma dispersão de pontos por todo o
bairro Manaíra, porém um adensamento maior na
parte oeste do bairro, após a Av. João Câncio,
sentido bairro São José (divisória indicada pela linha
vermelha tracejada na Figura 7.8).
Destacam-se como pontos atratores de
crimes os grandes empreendimentos comerciais,
como: Shopping Manaíra (A), local de ponto quente
indicado em todos os mapas de Kernell mostrados
anteriormente e Mag Shopping, localizados ao norte
do bairro, na Avenida Governador Flávio Ribeiro
Coutinho (identificados na figura 7.9 com círculos
vermelhos).
Destaca-se, também, o crime próximo ao
Colégio Colibris (particular) e ao Colégio Estadual
Alice Carneiro (público), nas ruas perpendiculares
às vias principais do bairro, e com acessos ao Bairro
São José, são elas: Rua Euzely Fabrício de Souza,
Rua São Gonçalo e Rua Eutiquiano Barreto (área
definida por um retângulo vermelho (B), figura 7.9).
Outros pontos de destaque são as
ocorrências observadas nas praças: Desembar-
gador Silvio Porto, entre as ruas Santos Coelho
Neto e Francisco Claudino Pereira - nessa área a
maioria da ocupação do solo é residencial; e a
Praça Alcides Carneiro, com pontos de destaque
próximos a padaria, lanchonetes e posto de
combustível (figura 7.10).
A figura 7.11 salienta os crimes nas
proximidades dos restaurantes Salute e Casa do
Bacalhau, logradouros mais próximos de setores
turísticos do bairro, área definida em vermelho.
Figura 7.8 - Ocorrências Criminais, 2008 e 2009.
Figura 7.9 - Principais atratores de crime: grandes empreendimentos comerciais
Figura 7.10 - Outros atratores de crime: praças.
Figura 7.11 - Outros atratores de crime: zona turística
A
B
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 164
7.2.2 Lugares de destaque sem crime
Os mapas também possibilitaram identificar
com clareza lugares ou logradouros onde foram
registradas pouquíssimas ocorrências de crime ou
nenhuma.
Apesar de uma grande incidência de crimes
na área do Shopping Manaíra, existem algumas
ruas próximas a essa área com poucos registros,
identificadas na figura 7.12 pelos polígonos laranja.
Isso acontece no triângulo entre as ruas Escritor
Sebastião de Azevedo Bastos, Santos Coelho Neto
e Monteiro Gomes de Oliveira. Nessa região, a
maioria dos lotes está ocupada por residências, uni
e multifamiliares.
Identifica-se, também, pouca ocorrência nos
seguintes locais:
Porção leste do bairro, próximo à Praça
Chateaubriant de Souza Arnaud, onde há uma
base da polícia militar ROTAN, ponto (C) (figura
7.13);
Na Av. Guarabira (ou Rua Nicolau Porto) e suas
paralelas: Av. Umbuzeiro (ou Rua Coronel
Severino Lucena) e Av. Pombal (figura 7.13);
Nas proximidades da Praça Gilvandro Carreira
de Almeida, com a Av. Esperança (figura 7.14);
Na Rua Carlos Alverga, paralela à Av. João
Maurício, onde há um mercado de peixe,
pequenos centros comerciais e os fundos de
muitos hotéis e restaurantes que dão para a
orla marítima (figura 7.14);
Na Av. Sapé, a oeste da Praça Alcides Carneiro, foi
um espaço revitalizado, tornando-se um lugar
atrativo para os habitantes do bairro (figura 7.15).
Figura 7.12 – Destaque: lugares com pouca ocorrência
Figura 7.13 – Destaque: lugares com pouca ocorrência: Praça Chateaubriant Souza Arnaud
Figura 7.14 – Destaque: lugares com pouca ocorrência: Praça Gilvandro Carreira de Almeida
Figura 7.15 – Destaque: lugares com pouca ocorrência, Av. Sapé, próximo a Praça Alcides Carneiro.
C
D
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 165
7.3 Roubo versus uso
O roubo foi um dos incidentes mais
expressivos identificados nos anos de 2008 e
2009; a seguir identificam-se as particularidades de
suas ocorrências em cada ano.
A maioria dos crimes de roubo ocorre da
Av. João Câncio a oeste do bairro Manaíra, esta
região como analisado no capítulo anterior, é
composta por vias com acessibilidade intermediária
ou pouca; nesse local predominam residências
multifamiliares, algumas residências unifamiliares e
poucos pontos de comércio.
Roubo 2008
Observa-se, nesse ano, muitas incidências
ao norte do bairro, próximo aos empreendimentos
comerciais, shopping Manaíra e Mag Shopping.
Identificam-se alguns roubos próximo ao Colégio
Estadual Alice Carneiro e ao Colégio Colibris, entre
as Ruas São Gonçalo e a Eutiquiano Barreto, área
em destaque na figura 7.17.
Roubo 2009
Percebe-se a permanência de muitos pontos
de roubo identificados no ano de 2008, incidindo
nos mesmos lugares do ano de 2009, como os
shopping centers, identificados na figura 7.9 e as
praças Desembargador Silvio Porto e Alcides
Carneiro, destacadas com círculo vermelho na
figura 7.18.
Ao norte do bairro destaca-se a área
delimitada pelo polígono verde, ilustrado na figura
7.19, área definida por residências uni e
multifamiliares com alguns pontos de comércio.
Figura 7.16 – Mapa: roubo e uso do solo, 2008
Figura 7.17 – Destaque: proximidade de colégios 2008
Figura 7.18 - Mapa: roubo x ocupação do solo 2009
Figura 7.19 – Destaque: roubos, 2009
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 166
Roubo a Pessoa 2008
Como argumentado anteriormente, o crime
de roubo é um dos mais comuns no bairro
Manaíra, sendo o roubo a pessoas correspondente
a 70% desse tipo de crime nos anos em estudo.
Foram registradas, somente no ano de 2008, 220
ocorrências.
Há correlação entre esse tipo de crime e
lugares atratores, como ruas e pontos comerciais,
colégios, praças, definidas nos lotes em azul, rosa
e verde, e em vias próximas ao bairro São José.
Com relação aos shoppings centers Manaíra e
Mag, esses crimes ocorrem no estacionamento ou
nas calçadas destes estabelecimentos. (ver figura
7.20)
Na figura 7.21 observa-se que a maioria
das incidências de roubo a pessoas ocorre nas
proximidades de lotes com fechamento mural alto
ou médio (identificado em vermelho e laranja,
respectivamente). Há em tais fechamentos murais
um alto nível de proteção, entre 3 e 7, definido na
figura 7.22. Também vale salientar a existência de
ocorrências, próximo à praia, em edifícios sem
muro e sem proteção.
O roubo a pessoas acontece principalmente
na rua. Na figura 7.23 identifica-se pouca
correlação entre esse tipo de incidência criminal e
a proximidade com paradas de ônibus,
demarcadas pelos pontos azuis, a não ser que
essas paradas se situem próximo aos magnetos.
Também existe uma correlação entre ruas mais
acessíveis e roubo a pessoas.
Figura 7.20 - Mapa: roubo a pessoa x ocupação do solo
Figura 7.21 - Mapa: roubo a pessoa x altura do muro, 2008.
Figura 7.22 - Mapa: roubo a pessoa x proteção mural
Figura 7.23 - Mapa Axial x ônibus x roubo a pessoa
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 167
Roubo à pessoa 2009
No ano de 2009 houve maior ocorrência de
roubo, porém, das 274 só foi possível localizar no
mapa 183 registros de roubo a pessoas, definidos
nas figuras 7.24 a 7.27. Ainda se percebe a
incidência em locais atratores, como os shoppings
centers e outros pontos de comércio.
É difícil definir neste ano se houve redução
ou aumento nos pontos de destaque do crime em
relação o ano anterior, porém, é possível identificar
as reincidências: na Av. São Gonçalo, próximo aos
colégios Alice Carneiro e Colibris; nas praças Silvio
Porto, Alcides Carneiro e quadra do Manaíra; além
de haver um aumento de ocorrências nas vias com
comércio.
Verifica-se que muitas incidências criminais
aconteceram próximo a vitrines de lojas, porém, a
maioria dos crimes de roubo a pessoas acontece
em ruas com características residenciais, próximo
principalmente a uma tipologia mural alta, com
existência de algum artifício de segurança, figuras
7.25 e 7.26.
Também se observa, assim como no ano
anterior, a coincidência de crimes de roubo a
pessoas em algumas paradas de ônibus do bairro,
principalmente nas que estão próximas dos
grandes empreendimentos comerciais e ao Bairro
São José.
Figura 7.24 – Roubo a pessoa x ocupação do solo 2009.
Figura 7.25 – Roubo a pessoa x altura do muro 2009.
Figura 7.26 – Roubo a pessoa x proteção mural 2009.
Figura 7.27 - Mapa de axial x ônibus x roubo a pessoa 2009.
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 168
7.4 Furto versus uso
Além do roubo, o furto foi um dos
incidentes mais expressivos identificados nos anos
de 2008 e 2009. A seguir identificam-se as
particularidades de suas ocorrências em cada ano.
A princípio percebe-se que as ocorrências
de furto acontecem em todo o bairro Manaíra,
porém identificam-se alguns pontos comuns que
serão explicitados a seguir:
Furto 2008
No mapa da figura 7.28 existem alguns
pontos de concentração de furtos: (1) próximo às
praças Silvio Porto e Alcides Carneiro (local onde
já foram sinalizadas ocorrências de roubo em
2008); (2) ao redor do Colégio Alcides Carneiro; (3)
nas proximidades do Clube dos Oficiais,
restaurante Habib‟s e Supermercado Pão de
Açúcar, na Av. Gov. Flávio Ribeiro Coutinho;
Também há incidentes em algumas lojas na Av.
Edson Ramalho e João Câncio (figura 7.29).
Furto 2009
Nas figuras 7.30, 7.31 e 7.32 são identificadas as
maiores concentrações de furto em 2009, são elas:
Av. Gov. Flávio Ribeiro Coutinho com destaque
nas proximidades do Clube dos Oficiais,
restaurante Habib‟s e Supermercado Pão de
Açúcar; Av. João Maurício (avenida da orla
marítima), com ocorrências principalmente em
estabelecimentos comerciais, de alimentação e de
atendimento, principalmente ao turista.
Porém, a maioria dos furtos ocorre nas residencias
uni ou multifamiliares, em vias com menor tráfego
veicular.
Figura 7.28 - Mapa: furto x ocupação do solo 2008.
Figura 7.29 – Destaque: furtos 2008.
Figura 7.30 - Furto 2009 x ocupação do solo
Figura 7.31 e 7.32 – Destaque: furtos
1
1
2
3
1
1
2
3
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 169
Furto a Imóvel (Edificação) 2008
Dentre os furtos o mais comum é o furto a
imóveis, sendo registradas 103 ocorrências, em
2008, com: 1 furto a igreja; 1 furto a
estabelecimentos de ensino; 51 a
estabelecimentos residenciais; e 50 a
estabelecimentos comerciais.
A figura 7.33 ilustra esse tipo de crime, no
mapa de uso e ocupação do solo. No furto ao bem
imóvel, identificam-se duas singularidades
distintas, uma no furto a residências e outra no
furto a estabelecimentos comerciais.
A maioria das ocorrências de furto acontece
dentro das edificações e entre seus procedimentos
sucedem-se invasão, arrombamento, usurpação de
material, e fuga, realizada principalmente através
dos muros da vizinhança.
Na figura 7.34, estão identificados os
pontos de furto a residências no ano de 2008, a
maioria das incidências está situada no lado oeste
da Av. João Câncio, sentido bairro São José, com
31 casos, enquanto do lado leste foram registrados
20 ocorrências, com incidências principalmente
em estabelecimentos comerciais, (figura 7.35).
A característica do furto é a discrição, o fato
do ladrão não ser visto ou identificado por outros é
fator relevante para o sucesso deste evento,
devido a isso se percebe na figura 7.36 que não
existe relação entre paradas de ônibus e esse tipo
de crime, nesses locais dificilmente ocorre furto,
provavelmente pela existência constante de
pessoas.
Figura 7.33 – Furto a imóvel 2008 x uso e ocupação do solo
Figura 7.34 – Furto estabelecimento x muro, 2008.
Figura 7.35 – Furto estabelecimento x proteção, 2008.
Figura 7.36 - Furto imóveis x mapa axial x parada de ônibus
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 170
Furto a Imóvel (Edificação) 2009
No furto a imóveis foram identificadas 85
ocorrências criminais, no ano de 2009, porém
foram pontuadas no mapa, apenas 66 incidências,
devido à falta de informações precisas de
localização. Dentre tais incidências têm-se: 1 furto
a escola (ponto cinza); 31 a residências (pontos
vermelhos); e 34 a estabelecimentos comerciais
(pontos pretos).
A figura 7.37, é um mapa de uso e
ocupação do solo, com os pontos referentes aos
crimes de furto ao bem imóvel. Neste mapa
identificam-se duas singularidades distintas: uma
no furto a residências, e outra no furto a
estabelecimentos comerciais. O primeiro tipo de
furto, representado pela cor verde (figura 7.40),
localiza-se em área basicamente residencial, nas
vias internas do bairro, com ruas de acesso
moderado. O segundo tipo de furto mais comum,
ao bem imóvel, localiza-se onde existe comércio,
principalmente nas vias mais movimentadas,
identificado, na figura 7.40, pela coloração
vermelha da via.
Com relação à caixa mural e ao nível de
segurança: o furto a residências tende a acontecer
próximo aos muros altos, com nível de segurança
intermediário, com utilização de um a dois tipos de
artifícios de segurança; já o furto a
estabelecimentos comerciais, acontece próximo a
lojas com vitrine, a princípio, sem proteção mural
externa.
Identifica-se na figura 7.40 pouquíssima
relação entre furto e paradas de ônibus, algumas
coincidências nas vias mais acessíveis.
Figura 7.37 – Furto a imóvel 2009 x uso e ocupação do solo
Figura 7.38 – Furto a imóvel x altura muro
Figura 7.39 – Furto a imóvel x proteção mural
Figura 7.40 – Furto a imóvel x mapa axial x parada de ônibus
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 171
7.5 Crime versus tipologia de barreiras fisicas
Como mostrado anteriormente, Manaíra é um bairro que apresenta lotes amplos com
edifícios escondidos por trás de muros altos e protegidos por algum artifício de segurança.
Como já identificado por Ferraz (2003) e Caldeira (2008), a maioria das residências ou
edificações do bairro em estudo apresentam uma nova coletividade definida pela estética da
segurança. Partindo dessa observação buscou-se esclarecer se a tipologia mural e as
barreiras físicas de proteção, medidas de segurança adotadas por particulares, são fatores
que influenciam ou não a incidência de atos delinquentes intra ou extramuros.
Dessa maneira, buscou-se compreender como o crime se comporta com relação às
propriedades espaciais da configuração física do espaço urbano do bairro e, portanto, com
relação à capacidade de visibilidade e segurança da rua.
7.5.1 Roubo a pessoa
Figura 7.41 - Roubo a pessoa x altura do muro. (FONTE: arquivo pessoal.)
Na figura 7.41, observa-se, a princípio, que a maioria das incidências de roubo a
pessoas ocorre próximo aos lotes com fechamento mural alto com 50% dos casos,
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 172
identificado em vermelho no gráfico 7.2; no gráfico 7.1 percebe-se que nos 1193 lotes com
muro alto sucederam 203 incidentes de roubo em ou nas proximidades desse tipo de
fechamento mural; em seguida apresenta-se o fechamento com altura média com 20%, a
que correspondem 80 casos; nos de muros baixos, ou seja, que não oferecem uma barreira
física e visual foram registrados 23 casos, que correspondem, 6%; lotes com a presença de
vitrine, destacam-se pelos pontos comerciais, apresentam 17% dos incidentes de roubo a
pessoas, com 67 casos; enquanto ao fechamento mural translúcido correspondem 7% das
ocorrências.
Nas figuras 7.42 e 7.43 é possível identificar que a tipologia mural alta é um fator
que prejudica a visibilidade da rua que, por sua vez, apresenta-se com pouca vitalidade,
suscetível a atos delinquentes em que a vizinhança não percebe o que ocorre extramuro.
Figura 7.42 e 7.43 - Ruas do bairro Manaíra, 2010.
(FONTE: arquivo pessoal.)
1193
1027
175
300
66
203
8023 67 30
Alto Médio Baixo Vitrine TranslúcidoQuantidade de Roubo
50%
20%
6%
17%
7%
Alto
Médio
Baixo
Vitrine
Translúcido
Gráfico 7.2 – Roubo x Caixa Mural Fonte: arquivo pessoal.
Gráfico 7.1 – Muro Total X Percentual de Roubo
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 173
Assim como existe uma maior quantidade de muros altos a oeste do bairro Manaíra,
há, também, uma presença maior de equipamentos de segurança nessa região. Na figura
7.44, percebe-se que a maioria dos artifícios é utilizada, principalmente, em muros altos e
médios.
Os gráficos 7.3 e 7.4 mostram o nível de segurança das proximidades de onde
aconteceram os crimes, que estão divididos nas seguintes categorias: sem proteção, baixo,
médio e alto, com aparatos de estrepe, grade, cerca elétrica, filmadora e sensor de
presença, ver definição das categorias no quadro 3.3, capítulo 3. Nota-se que, apesar da
utilização de aparatos de segurança, o roubo tende a acontecer próximo ou em lugares que
possuem esses artifícios. Percebe-se que não há evidências de que tais estratégias
adotadas sejam capazes de inibir de fato as ocorrências criminais. Dos roubos analisados
nesses dois anos, 38% aconteceram em locais sem proteção, enquanto 62% ocorreram
próximo de lotes que possuem algum tipo de proteção mural, principalmente entre os níveis
baixo e médio. Percebe-se que locais com alto nível de proteção apresentam apenas 1% de
ocorrências, porém este nível de proteção representa apenas 6% dos muros.
Figura 7.44 - Roubo a pessoa x Nível de Proteção Mural
(FONTE: arquivo pessoal.)
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 174
7.5.2 Furto a Imóvel
Figura 7.45 - Furto a imóvel x Altura do muro.
(FONTE: arquivo pessoal.)
155
100
142
6
0
20
40
60
80
100
120
140
160
180
SEM PROTEÇÃO
BAIXO MÉDIO ALTO
38%
25%
35%
1%
SEM PROTEÇÃO
BAIXO
MÉDIO
ALTO
Gráfico 7.3 – Roubo x Nível de Segurança (FONTE: arquivo pessoal.)
Gráfico 7.4 - Nível de segurança total e Roubo
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 175
Como já observado anteriormente, o furto mais comum no bairro Manaíra é o furto a
imóveis, que compreende furto a residências e não residências (ambientes comerciais).
Analisando as ocorrências de furto com relação aos muros, figura 7.45 e gráficos 7.5 e 7.6,
percebe-se que o maior número de incidências acontece em edificações com muro alto, e
correspondem a 43% do total, com 81 casos; seguidas pelo muro com altura média, com
20% de incidências, que corresponde a 37 incidentes; locais com vitrine, ou seja, lojas ou
estabelecimentos de serviço, com 21%, 40 casos; as incidências de muro baixo são apenas
7%. Tipologias com muros translúcidos (uso de grade) correspondem a 9% dos incidentes,
respectivamente. Dessa maneira, conclui-se que espaços que oferecem pouca visibilidade
para a rua tendem a favorecer uma maior probabilidade para a ocorrência de furtos.
As figuras 7.46 e 7.47 ilustram as ruas sem vitalidade do bairro Manaíra, com seus
muros adornados por algum equipamento de segurança.
Figura 7.46 e 7.47- Ruas do bairro Manaíra, 2010. (FONTE: arquivo pessoal.)
1193
1027
175
300
668137 14 40 16
Alto Médio Baixo Vitrine Translúcido
43%
20%
7%
21%
9% Alto
Médio
Baixo
Vitrine
Translúcido
Gráfico 7.5 – Furto x Tipo de Muro
(FONTE: arquivo pessoal.)
Gráfico 7.6 – Muro total x Percentual de Furto
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 176
Figura 7.48 – Furto em Estabelecimento x Nível de Proteção Mural.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Com relação ao nível de segurança das ocorrências de furto a imóveis registradas
nos anos de 2008 e 2009 (gráficos 7.7 e 7.8), identificou-se que 49% dos lotes sofreram
algum tipo de furto, o que corresponde a 92 casos; em seguida, os muros que apresentam
nível de segurança média, ou seja, com dois artifícios, houve 51 casos, o que corresponde a
27%; o nível baixo apresentou 41 casos, 22%, o nível alto apresentou, apenas, 4 incidentes.
92
41
51
4
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
SEM PROTEÇÃO
BAIXO MÉDIO ALTO
49%
22%
27%
2%
SEM PROTEÇÃO
BAIXO
MÉDIO
ALTO
Gráfico 7.8 – Furto 2008 x Nível de segurança
(FONTE: arquivo pessoal.)
Gráfico 7.7 – Nível de segurança total e Furto 2008
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 177
Percebe-se que a maioria dos furtos a imóveis tende a acontecer próximo de
lugares sem proteção mural, fato justificado pela facilidade de invasão e de fuga. Portanto
para este tipo de crime, pode-se concluir que barreiras físicas de proteção podem ser um
fator positivo para se evitar furtos, principalmente os que ocorrem em ambientes físicos,
como residências e estabelecimentos comerciais, porém não favorecem a segurança
urbana.
Analisando as ocorrências de crime: roubo a pessoas e furto a imóveis, com
relação aos dados dos fluxos de pedestre (gráficos 6.3 e 6.4), e os dados referentes aos
turnos de incidentes (gráficos 5.9, 5.13, 5.17 e 5.21), o roubo a pessoas tende a acontecer
com maior frequência no turno da tarde, principalmente nas proximidades do Shopping
Manaíra, onde se observa um movimento mais intenso de pedestres. Com relação ao furto,
ele tende a acontecer pela madrugada ou é identificado pela manhã; nos outros turnos,
tarde e noite, o furto ocorre em áreas menos acessíveis, que apresentam uma maior
quantidade de lotes residenciais e onde se identifica uma menor presença de pedestres
nesse local.
7.6 Síntese dos pontos quentes e frios do crime
Tendo como intuito realizar uma análise comparativa entre os pontos quentes, que
apresentam maiores registros de crimes, e frios com as menores incidências destes,
definiram-se quatro áreas que atendessem a tais requisitos: esses foram designados como
pontos: quentes definidos pelas letras A e B, indicados na figura 7.9, que são a área do
shopping Manaíra e as proximidades do Colégio Alice Carneiro; e os pontos frios, definidos
pelas letras C e D, marcados nas figuras 7.13 e 7.14, respectivamente, são as proximidades
das Praças Chateaubriant de Souza Arnaud e Gilvandro Carreira de Almeida.
ROUBO À PESSOA USO BARREIRA PROTEÇÃO
TOTAL 2008 2009 LOTE Residencial não-Residencial S B M A V T B M A
A 80 46 34 107 75 32 5 2 13 69 15 3 41 44 22
B 78 57 21 424 326 98 34 15 130 216 15 14 82 337 5
C 4 1 3 197 177 20 6 23 73 88 2 5 88 107 2
D 5 2 3 141 106 35 11 5 55 51 18 1 87 49 5
Quadro 7.1 - Pontos Quentes e Frios do crime da relação com uso, barreira e proteção. (FONTE: arquivo pessoal.)
Com relação às características morfológicas, os pontos quentes A e B apresentam
uma grande quantidade de muros altos, sendo que no ponto B, onde há mais incidência,
ARQUITETURA DA (IN)SEGURANÇA
Sobre ocorrências, uso, ocupação e barreiras físicas 178
corresponde 50% dos lotes, cujo nível de proteção mantém-se na faixa intermediária. Outro
fato é que nos dois casos há uma priorização de lotes residenciais.
Os pontos frios, C e D apresentam na sua vizinhança uma maior quantidade de lotes
residenciais, nestes tanto a barreira mural, quanto outros tipos de proteção, estão
distribuídos proporcionalmente na área.
ACESSIBILIDADE
Roubo à pessoas
TOTAL 2008 2009 Acessibilidade insuficiente
Pouco Acessível
Média Acessibilidade Acessível
Muito Acessível Total
A 80 46 34 1 4 12 0 29 46
B 78 57 21 0 44 13 0 0 57
C 4 1 3 0 4 0 0 0 4
D 5 2 3 0 2 3 0 0 5
Furto em Estabelecimento
TOTAL 2008 2009 Acessibilidade insuficiente
Pouco Acessível
Média Acessibilidade Acessível
Muito Acessível Total
A 29 15 14 2 1 4 0 22 29
B 20 12 8 0 11 9 0 0 20
C 5 4 1 0 4 1 0 0 5
D 4 2 2 0 1 3 0 0 4 Quadro 7.2 - Pontos Quentes e Frio do Crime e Acessibilidade.
(FONTE: arquivo pessoal.)
Observando a relação do crime com a acessibilidade das ruas, os pontos quentes
apresentam ocorrências tanto nas vias com pouca e com alta acessibilidade, como visto no
quadro 7.2. Já os pontos frios, ou seja, com baixa incidência de crimes apresentam raras
ocorrências em vias pouco acessíveis.
Considerações Finais
A Insegurança da Segurança
A dissertação, Arquitetura da (in)segurança, - estudando relações entre
configuração espacial, artifícios de segurança e violência urbana no bairro Manaíra,
João Pessoa, Paraíba, inicia-se com um questionamento sobre a perda da qualidade
arquitetônica e urbanística, em relação a uma arquitetura da estética da segurança, refletida
pela sensação de medo presente numa população. Identificou-se que atributos físico-
ambientais, indicativos de medo, geram soluções de segurança adotadas pela população
como uma forma de se protegerem dos perigos da rua, do estranho, do vizinho. Ressalta-se,
porém, que a violência vivenciada, principalmente, nos centros urbanos decorre, também,
da própria configuração espacial desses, principalmente pelas soluções usadas por
particulares, que tinham como intenção inicial equipar o espaço de dispositivos de
segurança, promovendo, com as medidas adotadas, o oposto do que havia sido pensado
anteriormente.
Observamos que o enclausuramento surge nos grandes centros urbanos brasileiros,
principalmente entre a população das classes média e alta, sendo, hoje, presente em várias
cidades, induzindo as pessoas a se fecharem para dentro de seus muros, de seus enclaves
fortificados, de muros residenciais, condomínios fechados, shopping centers, vivendo assim
em espaços extremamente segregados.
Os resultados encontrados neste estudo expressam as observações de outros
estudiosos que destacam a vida urbana cercada por significados simbólicos definidos por
grupos sociais, que habitam e se expressam nas moradias, nos hábitos de consumo, nos
comportamentos e nas relações sociais vivenciadas (KOURY, 2008).
Nas cidades brasileiras, o processo de segregação e exclusão social está presente
tanto nas características da forma do habitar, quanto pela infraestrutura e manutenção das
ruas e espaços públicos. As diferenças sociais exacerbadas não são compartilhadas sem
desconforto, sem gerar oposições, ressentimento e indignação, culminando em conflitos e
violência. Nessas circunstâncias, as pessoas de maior poder aquisitivo se sentem
ameaçadas e procuram se precaver de reações violentas, segregando-se dentro de muros,
grades e mecanismos de proteção sofisticados.
Essa realidade é identificada no bairro Manaíra, habitado pela população de classe
média e alta de João Pessoa, onde proliferam espaços definidos por cercas, muros,
alambrados, guaritas, onde a rua se resume à circulação veicular e de poucos pedestres.
Apesar de todo o arsenal de segurança, mostrou-se que Manaíra é hoje um dos bairros
mais violentos de João Pessoa e isso não se deve somente à sua proximidade à população
de menor poder aquisitivo, que vive no bairro São José, pois características como essas se
sucedem em outros bairros da cidade, que não possuem esses mesmos elementos.
Dentre os inúmeros estudos que têm focalizado a insegurança do habitante urbano,
vários são os enfoques: uns abordam o ladrão e seu modus operandi; outros se voltam para
questões sócio-espaciais; outros ainda se interessam pelas relações entre crime e ambiente
construído. Tais estudos geraram teorias de vários pesquisadores, e alguns serviram de
suporte ao desenvolvimento desta pesquisa, dentre eles, temos: Jane Jacobs, Oscar
Newman, Bill Hillier, Tereza Caldeira, Sônia Ferraz, Bondaruk, Circe Monteiro, entre outros.
O trabalho em questão focou, como seu objeto de estudo, o modo como o crime
induz mudanças em um ambiente construído, apreendidos através da observação do tipo de
uso do solo, da forma edificada, das barreiras e da permeabilidade urbana. Tais elementos
bases podem servir de artifício para identificar se um ambiente proporciona uma boa
vigilância natural do ambiente, fator relevante identificado por Jane Jacobs e Oscar
Newman, a partir da realidade norte-americana. Os dois estudiosos, porém, apontam alguns
encaminhamentos que chegam a serem opostos, quanto a medidas para diminuir a
incidência do crime: a primeira orienta espaços abertos e permeáveis, o segundo já
considera espaços fechados e impermeáveis mais seguros.
Analisando tais questões na realidade brasileira, identificou-se que as soluções
adotadas em nosso país partem dos princípios de Oscar Newman, com a adoção de
artifícios que fecham o espaço e o torna impermeável. O muro é empregado, no Brasil,
como elemento de segurança e definidor do espaço público e privado. Caldeira (2008) o
caracteriza como elemento que estabelece diferenças, impõe divisões, constrói separações,
multiplica regras de evitação e exclusão e restringe o movimento natural, além de não
proporcionar a vigilância natural do espaço privado e muito menos o público.
179
No Brasil, além do muro, ao longo dos anos, adotaram-se outros mecanismos de
segurança, que procuram dificultar a ação dos infratores, contudo verificou-se neste trabalho
que os incidentes ocorrem com maior frequência nas caixas murais que adotam algum tipo
de artifício de segurança.
Mediante as análises realizadas sobre os dados da pesquisa, identificaram-se fatos
relevantes com relação às configurações do crime nos dois anos registrados, em 2008 e
2009. Os dados mostram que existem dois crimes mais comuns no bairro Manaíra, o roubo
a pessoas, que corresponde a 55% do total de crimes, nos dois anos analisados; e, em
sequência, o furto a imóveis, com 22% de casos registrados em 2008 e 17% em 2009.
Os dados de roubo a pessoa e furto a imóveis foram analisados separadamente,
porém buscou-se caracterizá-los com as mesmas variáveis: tipo de uso, tipo de barreira, tipo
de proteção e acessibilidade. Apesar de Hillier e Sahbaz (2005) argumentarem que dados
com ocorrências de roubo a pessoas devem ser tratados com variáveis diferentes de furto a
imóveis, pois para eles não se pode comparar como idênticos os alvos, indivíduo e edifício.
Este trabalho identificou, contudo, que a morfologia do ambiente construído é um fator
relevante para a ocorrência de crimes, tanto a edifícios, quanto a pessoas. Apesar dos dois
incidentes ocorrerem de formas distintas, constatou-se que o ambiente urbano é um
elemento relevante na análise de ocorrências criminais para qualquer tipo de ação.
Dentre as ocorrências de crime observadas, o roubo a pessoas está disperso em
todo o bairro Manaíra, havendo maior concentração nas proximidades de grandes centros
comerciais, como o Shopping Manaíra e Mag Shopping, e próximo a estabelecimentos
comerciais, ou seja, o meliante vai à busca de vítimas que têm intenção de gastar dinheiro.
Nos estabelecimentos comerciais, pela necessidade de exposição dos produtos, as vitrines
substituem o fechamento mural, baixando o “nível de segurança”. Aliado a essas
circunstâncias, o comércio se situa em ruas mais integradas, ou seja, mais acessíveis e
movimentadas, porém identifica-se um movimento de passagem momentâneo, instantâneo,
não há a intenção de se usufruir o espaço, de observar o lugar. Mesmo com alta
acessibilidade, não existe a copresença das pessoas.
O roubo a pessoas ocorre também em áreas residenciais com eixos de
acessibilidade intermediária. Com relação às características de proteção, o roubo a pessoas
ocorre com maior incidência em ruas, cujos lotes têm fechamento mural alto ou médio e que
possuem barreiras de proteção com nível médio a alto, refletindo um alto grau de
insegurança dos moradores desses lotes. Nesses casos, percebe-se que as ruas são mais
desertas, não existe a copresença dos moradores e frequentadores do bairro, fator relevante
180
para Jacobs e outros estudiosos do crime, que identificam tal fato como facilitador da ação
de crimes dessa natureza.
Identificou-se que as ocorrências criminais, durante os meses do ano, ocorrem com
maior frequência no mês de outubro, sendo a maior quantidade de ocorrências de roubo a
pessoas, fato interessante a ser analisado em pesquisas posteriores. Durante os turnos do
dia, esse tipo de crime ocorre preferencialmente à noite, momento em que as ruas estão
escuras e mais inseguras, pois a iluminação pública de João Pessoa não prioriza a
segurança.
Com relação à integração das vias públicas e do tipo de roubo, observa-se que as
ruas mais integradas oferecem mais oportunidades ao roubo a pessoas, como a Av. Gov.
Flávio Ribeiro Coutinho e a Av. São Gonçalo. Como mostrado anteriormente, há, também,
registros em vias menos integradas, nas ruas próximas ao bairro São José e com
característica mais residencial. Os roubos a estabelecimentos se deram com maior
frequência nas Av. Gov. Flávio Ribeiro Coutinho e Av. João Câncio, vias que apresentam
alto nível de acessibilidade e consequentemente incorporam o comércio.
A proteção das edificações com muros altos atraem um maior número de delitos de
roubo a pessoas, seguido dos muros médios e das vitrines. Identifica-se que as medidas de
prevenção de roubos das edificações não atendem aos objetivos, pois os incidentes tendem
a ocorrer próximo a lugares com algum tipo de recurso de segurança privada.
O furto, segunda ocorrência mais comum no bairro, se caracteriza pela discrição e
ocorre em maior quantidade nas ocorrências a imóveis (residências e estabelecimentos
comerciais). Analisando a distribuição do furto, em relação às especificidades de ocupação
do solo no bairro Manaíra, é possível identificar que, embora o furto seja caracterizado pela
discrição, o Shopping Manaíra e o Mag Shopping demarcam, assim como no roubo, as
regiões de maior concentração desse crime em sequência vem às ocorrências próximas a
residências e a lojas.
O furto é mais comum no espaço interior de lojas, quer seja dentro de shopping
centers, ou não; o Shopping Manaíra é o ponto quente desse tipo de crime, o segundo ponto
evidencia-se nas proximidades da Praça Silvio Porto, espaço cercado por residências uni e
multifamiliares.
Com relação às propriedades espaciais do furto a imóveis, identificam-se dois
padrões: um nos eixos de maior acessibilidade, onde se localiza a maioria dos
estabelecimentos comerciais, nas avenidas Gov. Flávio Ribeiro Coutinho, Gen. Edson
181
Ramalho, João Maurício e João Câncio, onde há a maior concentração desses delitos; há,
contudo, um segundo padrão em vias menos acessíveis do bairro, onde se identificam ruas
com menor tráfego de pessoas e veículos, com predominância de residências uni e
multifamiliares. Os eixos com maiores ocorrências desse tipo de furto são, a Rua Francisco
Claudino Pereira e a Av. Maria Rosa Sales, ambas com índice de integração média. Com
isso, observam-se dois tipos de intenção de furto: um em vias com alta acessibilidade e
incidência de comércio; e outro em vias com pouca acessibilidade, que tem como alvo,
principalmente, residências.
Também identificou-se no trabalho que edificações com muros altos e médios nem
sempre evidenciam efeitos positivos quanto à prevenção de delitos, pois muitos casos de
furtos a residências foram registrados em edificações com esses muros. Observa-se que
este tipo de crime independe da quantidade de barreiras e artifícios de segurança como:
estrepe, cercas eletrificadas, filmadoras, sensores de presença, dentre outros, já que eles
ocorrem em todas as circunstâncias, pois se dão também em locais com pouco ou um só
artifício, já que apresentam muro alto. Os furtos a estabelecimentos comerciais predominam
em locais com existência de vitrines e ocorrem predominantemente à noite, fora do horário
comercial. Parece haver dois tipos de furto a não-residência: os que seguem a mesma
lógica dos residenciais, por discrição; e os que seguem a lógica do roubo a pessoa, com
ocorrências em ambientes altamente acessíveis e populosos, pela exposição. Isso requer
estudos específicos.
Contudo verificou-se que a correlação entre fechamento mural e furto a imóveis
mostra que as edificações com muros altos e médios concentram um maior número de
incidentes, em seguida, as vitrines, muros translúcidos e, por último, muros baixos. Assim
observa-se que as medidas de prevenção de segurança e fechamento mural, apesar de
serem adotadas como medidas de segurança principalmente do furto a imóveis, não
atendem aos objetivos de evitar que a edificação seja invadida e, quanto à incidência de
roubos, esses mecanismos não impedem suas ocorrências e ainda facilitam que aconteçam
em vias públicas, junto, principalmente, a lugares que possuem algum tipo de recurso de
segurança privada, que atrapalham a vigilância natural do espaço público. Muitos incidentes
também se dão próximo às paradas de ônibus, colégio público, praças, praia, mesmo em
vias de menor movimento (menos acessíveis), também em vias de maior movimento, devido
à proximidade de pontos comerciais. Portanto as áreas de concentração do comércio
oferecem condições propícias tanto ao roubo, quanto ao furto a pessoas, que tendem a
correr risco, logo que atingem as vias urbanas abertas próximas aos estabelecimentos
comerciais. O roubo, porém, é um crime mais agressivo e torna o cidadão que circula,
182
principalmente a pé, pelo bairro Manaíra, a principal vítima do crime de roubo, o que gera
nas pessoas o medo generalizado da violência urbana.
Nosso estudo confirma assim as pesquisas de Bondaruk (2007), que afirma serem
os imóveis que apresentam muros altos os mais escolhidos pelos meliantes de furto.
Com relação à configuração anual infere-se que o furto ocorre com mais frequência
nos meses de férias escolares (junho-julho e dezembro-janeiro) e tende a se realizar,
prioritariamente, em estabelecimentos comerciais. Observa-se que em tais períodos a
cidade apresenta uma maior quantidade de visitantes, o que proporciona uma circulação
maior de dinheiro, o que estimula o aumento de furtos a estabelecimentos comerciais; outro
ponto é a ausência de alguns moradores do bairro, que nesse período se ausentam para
tirar férias, facilitando a ação de delinquentes no furto em residências. Com relação ao
turno, os furtos a imóveis ocorrem, predominantemente, à noite, fora do horário comercial.
É factível observar que existem dois aspectos polarizadores e distintos das
concentrações de ocorrências de crime: o primeiro a segregação, a discrição do incidente e
espaços desertos; versus o segundo a alta acessibilidade das vias, a exposição da vítima e
a aglomeração de pessoas. De certo modo, pode-se especular que seriam reversos da
mesma moeda, porque mesmo nas áreas altamente acessíveis, com especialização de usos
e presença de grandes estabelecimentos comerciais, que ocupam toda a quadra, geram
descontinuidade física, como a própria vitrine e os muros cegos dos lotes residenciais.
Nessa parte da cidade, se perdeu a interação, a vitalidade, a urbanidade, pois com a
especialização de uso, causado pela descontinuidade física dos espaços, promoveu-se o
desestimulo à circulação de pedestres nas ruas e espaços de encontros.
Percebe-se que o bairro apresenta a formação de condições propicias à exposição
das pessoas a situações de violência, que tendem a acontecer, principalmente nas áreas de
concentração de comércio, considerados pontos de atração tanto para a prática de roubo,
como para a prática de furto. Os cidadãos pessoenses que usufruem do bairro Manaíra
correm mais riscos em vias urbanas mais acessíveis; mas também em vias sem vitalidade
urbana, com pouca acessibilidade; e próximo a edificações protegidas por muros altos e
com algum tipo de proteção. Ou seja, as soluções que moradores não só do bairro em
estudo, mas de muitas cidades brasileiras adotaram para se protegerem, podem prejudicar
a própria segurança e a da comunidade que usufrui dos espaços urbanos.
183
183
A partir do estudo, pareceu-nos que precisamos reconstruir o espaço da vizinhança,
conhecer o nosso próximo, usufruir os espaços públicos, onde moramos, trabalhamos,
circulamos. Assim, voltamos aos argumentos e sugestões de Jane Jacobs e agora reforçado
pelos “Novos Urbanistas”, que buscam apontar uma valorização maior dos espaços
públicos, através da presença de pessoas em horários diferentes nas ruas; a existência de
quadras curtas; a valorização de esquinas e percursos; a permeabilidade do ambiente
urbano, que permite o movimento circulatório de pedestres; o uso misto da ocupação dos
solos, além da oportunidade de que cada indivíduo se torne um olho da rua, sendo capaz de
identificar o espaço como de sua responsabilidade, sendo capaz de cuidar de si e dos seus,
esse é o verdadeiro espírito da vigilância natural. Será que nós brasileiros conseguiríamos
romper tais barreiras criadas pelos medos que criamos de conviver?
Talvez recuperar a calçada das edificações como espaço público de passeio, por
onde pessoas de todas as idades e condições possam circular a pé sem as dificuldades
impostas por diferenças de níveis de altura e de barreiras criadas seja um começo.
184
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