Centro Federal de Educação Tecnológica de Química de Nilópolis
Unidade Maracanã
Química Inorgânica
Professor Rodrigo
Apostila de Química Inorgânica
2008/1
CEFET Química Química Inorgânica
I
Sumário 1. O Modelo Atômico Moderno 1
2. Configuração Eletrônica e Tabela Periódica 9
3. Propriedades Periódicas 12
3.1 – Carga Nuclear Efetiva (Z* ou Zeff) 12
3.2 – Raio Atômico 16
3.3 – Energia de Ionização (EI) 17
3.4 – Afinidade Eletrônica (AE) 22
3.5 – Eletronegatividade (χ) 25
Exercícios 26
4. A Regra do Octeto 27
5. Ligação Iônica 30
5.1 – Sólidos Iônicos 30
5.2 – As Estruturas Cristalinas dos Sólidos Iônicos
5.2.1 – A Estrutura do Cloreto de Sódio 33
5.2.2 – Estrutura do Cloreto de Césio 33
5.2.3 – A Estrutura da Esfarelita 34
5.2.4 – Estrutura da Fluorita e da Antifluorita 35
5.2.5 – Outras Estruturas 35
5.3 – Energia do Retículo Cristalino (U0) 35
5.4 – Raio Iônico 40
5.5 – Regras de Fajans: Poder Polarizante e Polarizabilidade 41
5.6 – Hidrólise de Cátions 42
6. Ligação Covalente 45
6.1 – Estruturas de Lewis 45
6.2 – Teoria da Ligação de Valência 49
6.2.1 – Hibridação dos Orbitais Atômicos 51
6.2.1.1 – Hibridação do tipo sp3 51
6.2.1.2 – Ligações π: Hibridação do tipo sp2 e sp 52
6.2.1.3 – Expansão do Octeto 54
6.3 – Teoria da Repulsão dos Pares de Elétrons da Camada de Valência 59
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II
6.4 – Ressonância 62
Exercícios 64
7. Teoria dos Orbitais Moleculares 65
7.1 – A formação dos orbitais moleculares 65
7.2 – Diagrama dos orbitais moleculares e ordem de ligação 70
8. Conceitos Ácido-Base
8.1 – De Arrhenius a Brønsted-Lowry 80
8.2 – O Conceito ácido-base de Lewis 82
9. Compostos de Coordenação
9.1 – Um breve histórico sobre Compostos de Coordenação 84
9.2 – Classificação dos ligantes e nomenclatura de complexos 87
9.3 – Isomeria em compostos de coordenação 90
9.4 – Teoria do Campo Cristalino (TCC) 92
Exercícios 99
Bibliografia 101
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1
1. O Modelo Atômico Moderno Em 1911, Ernest Rutherford propusera um novo modelo para o átomo baseado em
seus resultados que contradiziam o modelo atômico proposto por J. J. Thomson. O
modelo proposto por Thomson, com os elétrons grudados na massa positiva, levava a
uma distribuição uniforme de cargas. Pensando nessa distribuição uniforme Rutherford
desenvolveu seu experimento. Para ele, ao lançar partículas alfa contra uma fina folha de
ouro, devido à natureza elétrica neutra do “átomo pudim de ameixas”, a partícula alfa,
positiva, não sofreria qualquer perturbação em sua trajetória. Rutherford realizou a
experiência com o polônio, um emissor de partículas alfa em uma caixa de chumbo com
uma fenda por onde sairiam as emissões. As partículas ao atravessarem a fina folha de
ouro se chocavam contra um anteparo fluorescente de sulfeto de zinco.
A experiência revelou que grande parte das partículas alfa atravessava sem
problemas a folha de ouro, mas algumas sofriam desvios e, de forma surpreendente,
algumas partículas voltavam direto para a fonte emissora.
Para justificar esses resultados Rutherford propôs um novo modelo atômico, onde
o átomo era formado por núcleos positivos de grande massa mas pequenos em relação
ao volume total do átomo e os elétrons ficariam orbitando ao redor do núcleo. No entanto,
o modelo para o átomo de Rutherford tinha um grande problema: não era estável.
Como podiam um núcleo positivo e uma carga negativa, o elétron, estarem tão
próximos e não se atraírem? O problema foi parcialmente resolvido com o movimento
circular exercido pelo elétron. Ao descrever uma trajetória em torno do núcleo, havia uma
força centrífuga que compensaria a força atrativa. Mas essa solução se mostrou
insuficiente, caindo numa outra armadilha da física clássica. Do eletromagnetismo,
qualquer carga acelerada, como o elétron neste caso, emitiria energia continuamente,
tendo como conseqüência uma diminuição do raio entre o núcleo e o elétron. Conforme o
elétron emitisse energia, mais próximo do núcleo ele ficaria, até o momento onde o
choque entre elétron e núcleo seria inevitável. E sobre essas condições o átomo não
poderia existir.
Entre o final do século XIX e o início do século XX, a física clássica já havia
demonstrado diversas limitações. A instabilidade do átomo de Rutherford era mais uma
dessas limitações, talvez a mais grave, afinal não se conseguia explicar porque um átomo
poderia existir. Este impasse tinha que ser resolvido de alguma forma: ou mudaria o
modelo ou mudaria a teoria. Em 1913, Niels Bohr mudou os dois.
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2
Em 1900, Max Planck havia proposto – fruto de seu desespero, segundo suas
próprias palavras – a hipótese quântica, para solucionar uma falha da física clássica. Esta
hipótese dizia que a energia era descontínua e que o processo de absorção e emissão
acontecia segundo a equação:
E = hυ (1) onde E é a energia envolvida, h é a constante de Planck (de valor de 6,63.10–34 J.s) e υ é
uma frequência de radiação eletromagnética. Então, só era permitido absorver e emitir
“pacotes” de energia múltiplos de hυ. A idéia desesperada de Planck foi usada por Albert
Einstein para, em 1905, explicar o efeito fotoelétrico – uma outra falha da física clássica.
Bohr, como Einstein, também usou a hipótese quântica de Planck para explicar
porque os átomos eram estáveis e revolucionou o pensamento sobre átomos. Bohr fez
dois postulados fundamentados nas idéias de Planck para o átomo de hidrogênio. O
primeiro postulado “resolvia” a estabilidade dos átomos frente à física clássica. Bohr
considerou que os elétrons nos átomos poderiam orbitar sem emitir radiações, mas nem
todas as órbitas eram permitidas aos elétrons. Apenas as orbitas de energia dada pela
equação abaixo eram permitidas:
2220
4
nh8m.eE∈
−= (2)
onde m é a massa do elétron, e é a carga do elétron, ∈0 é a constante de permissividade
do vácuo, h é a constante de Planck e n é um número que só pode assumir valores
inteiros 1, 2, 3 e assim por diante até infinito.
No segundo postulado, Bohr estabeleceu que um elétron deixa seu estado
fundamental (n = 1) se absorver uma quantidade de energia equivalente à diferença de
energia entre o estado fundamental e o estado excitado. Por exemplo, para o elétron
passar da órbita n = 1 para a órbita n = 3, a quantidade de energia fornecida será,
exatamente igual, à diferença de energia entre estas órbitas (Figura 1). Além disso, ao
retornar ao estado fundamental, o elétron emite a mesma quantidade de energia
absorvida antes para passar ao estado excitado. Com isso, Bohr deu um comportamento
quântico ao elétron e, consequentemente, ao átomo.
O modelo atômico de Bohr, além de resolver o problema da instabilidade que
surgiu no modelo atômico de Rutherford, também explicou os espectros que eram
observados para os átomos, em especial, para o átomo de hidrogênio (Figura 2).
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Figura 1. Transição entre o estado fundamental (n=1) e o estado excitado (n=3). A quantidade de energia absorvida e emitida é igual à diferença de energia entre as órbitas.
É importante entender que o modelo de Bohr não é totalmente quântico. Em sua
dedução, Bohr usou de elementos da física clássica para chegar até a quantização das
órbitas dos elétrons, de forma que este modelo acabou sendo reconhecido como um
modelo transitório, que apontava para a necessidade de se chegar numa teoria mais geral
para sistemas atômicos.
Figura 2. Espectro atômico do hidrogênio. Espectro de emissão (em cima) e de absorção (em baixo).
Por volta do ano de 1925, Werner Heisenberg e Erwin Schrödinger,
separadamente, desenvolveram duas versões diferentes (porém equivalentes) da parte
da física que trataria de maneira correta os átomos: a mecânica quântica. A versão de
Schrödinger, também conhecida como mecânica ondulatória se tornou mais popular por
uma série de facilidades em relação ao esquema de matrizes de Heisenberg e é por isso
que vamos nos focar no modelo desenvolvido por Schrödinger.
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4
Schrödinger começou a desenvolver sua teoria analisando as idéias do Príncipe
francês Louis-Victor Pierre Raymond de Broglie, que propôs que a matéria, assim como a
luz, apresentava um comportamento dual de onda-partícula. Para Schrödinger, o trabalho
de Louis de Broglie pecava por não apresentar um tratamento matemático adequado.
Para ele, se a matéria apresentava características ondulatórias, existiria uma função de
onda (ψ) que descreveria e representaria a matéria.
Através da equação que leva o seu nome, Schrödinger desenvolveu um método
para encontrar as funções de onda de diversos sistemas – em especial para a química, a
função de onda para o átomo de hidrogênio. As funções de onda para o átomo de
hidrogênio dependem de alguns parâmetros, chamados números quânticos – sendo o
mais importante deles o número quântico principal, n, que define a camada que o orbital
está localizado. Um dado conjunto de números quânticos, define um orbital atômico.a
Dessa forma, abandonava-se a idéia de Bohr de elétrons em movimento ao redor do
núcleo, substituindo-se pela idéia de densidade eletrônica em uma dada região no
espaço.
A interpretação das funções de onda foi introduzida por Max Born. Ele percebeu
que o quadrado da função de onda representava a probabilidade do evento representado
por aquela função de onda. Então, ao elevarmos as funções de onda dos elétrons ao
quadrado, temos a probabilidade de se encontrar um elétron na região do espaço definida
pelo orbital. Portanto:
ψ = Função de onda, orbitais atômicos;
ψ2 = Probabilidade de se encontrar o elétron na região do espaço definida pelo orbital.
Na Figura 3 podemos acompanhar o comportamento de algumas funções de onda
do tipo “s” de camadas diferentes em relação à distância r do núcleo. Pela Figura 3,
percebe-se que o orbital s de número quântico principal n = 1, o orbital 1s, não corta o
eixo x para nenhum ponto. Isto é, a função de onda não tem valor zero em nenhum ponto.
Já para os outros dois orbitais, o 2s e o 3s, existem alguns pontos onde o valor da função
é zero. Para o orbital 2s temos um só ponto onde a função de onda tem valor zero. Já
para o 3s, são dois os pontos onde a função passa pelo zero. Sempre que a função passa
pelo valor zero, dizemos que ela trocou de fase. A função de onda do orbital 2s estava em
valores positivos (fase positiva) e, ao passar no zero, foi para valores negativos (fase
a É preciso entender de forma clara a diferença entre órbitas de orbitais. Órbita é a trajetória do elétron ao redor do núcleo e tem interpretação determinística. Orbital é a representação visual da função de onda e tem interpretação probabilística.
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5
negativa). O orbital 3s, na primeira vez que passa no zero, muda da fase positiva para a
negativa e, na segunda passagem por este valor, vai da fase negativa para a positiva.
Figura 3. Comportamento dos orbitais atômicos do tipo s em função da distância r do núcleo.
Se pensarmos em probabilidade, ψ2, uma função de onda como a do orbital 2s
teria o comportamento semelhante ao mostrado na Figura 4. Como elevamos a função ao
quadrado, a fase negativa se torna positiva. No entanto, o ponto onde a função tem valor
zero, permanece no zero em ψ2. Portanto, o ponto onde a função de onda tem valor zero
equivale à probabilidade zero de se encontrar o elétron. A conclusão disto é que,
dependendo da função de onda, existirá uma região no espaço onde a probabilidade de
se encontrar o elétron é nula. Esta região é chamada de região nodal.
Figura 4. Uma função de onda (ψ) e o quadrado desta função (ψ2)
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Voltemos à Figura 3. Como foi dito antes, a função de onda do orbital 1s não
possui valor zero para nenhum ponto. Portanto, o orbital 1s não possui regiões nodais. Os
orbitais 2s e 3s têm, respectivamente, uma e duas regiões nodais. Como é possível
perceber, existe uma estreita relação entre o número quântico principal e o número de
regiões nodais de uma função de onda. O número de regiões nodais pode ser definido por
n – 1, onde n é o número quântico principal. Na Figura 5, as regiões nodais dos orbitais 2s
e 3s estão destacadas.
Figura 5. Orbitais atômicos 1s, 2s e 3s e suas regiões nodais.
Além de definir quantas regiões nodais um orbital tem, o número quântico principal
define também quantos subníveis uma camada (ou nível) tem. Ao primeiro nível, n = 1, só
é permitido um subnível. No segundo, n = 2, são permitidos dois subníveis, a terceira
camada tem três subníveis e assim por diante. Ou seja, o número de subníveis de cada
nível é igual ao número quântico principal da camada.
Cada subnível é formado por um conjunto de orbitais de mesmo tipo. Por exemplo,
o subnível s é formado por um orbital do tipo s. Já o subnível p é formado por 3 orbitais do
tipo p. O subnível d é formado por 5 orbitais do tipo d. A Tabela 1 resume a relação entre
alguns subníveis e os tipos de orbitais.
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Tabela 1. Relação entre subníveis e orbitais. Subnível Tipo de orbital Número de Orbitais
s s 1 p p 3 d d 5 f f 7 g g 9 h h 11 i i 13
O subnível s é formado por um orbital s e está presente em todas as camadas. O
orbital s é caracterizado por ter uma forma esférica, como mostra a Figura 6.
Figura 6. Forma espacial do orbital s.
O subnível p é formado por três orbitais do tipo p, que se localizam ao longo dos
eixos x, y e z (Figura 7). Por este motivo, são chamados de orbitais px, py e pz. Como é
possível ver na Figura 8, os orbitais p possuem planos nodais e, por isso, uma fase
positiva e outra negativa. Outra característica interessante é que estes três orbitais têm a
mesma energia. Orbitais de mesma energia são chamados de orbitais degenerados. O
subnível p é encontrado a partir da segunda camada.
Figura 7. Os três orbitais p e suas formas espaciais.
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8
Figura 8. Orbital p e seu plano nodal.
Subnível d é formado por cinco orbitais do tipo d (Figura 9) e é encontrado a partir
do terceiro nível. Assim como os orbitais p, os orbitais do tipo d são degenerados. No
entanto, sob algumas condições, a degenerescência destes orbitais pode ser quebrada.
O subnível f é permitido a partir do quarto nível energético. Ele é formado por sete
orbitais degenerados do tipo f, que podem ser vistos na Figura 10.
Os subnívels g, h, i, e outros, existem teoricamente. Na prática, são orbitais não
são observados no estado fundamental dos átomos que se conhece atualmente. No
entanto, experimentos de estados excitados podem detectar estes tipos de orbitais.
Conhecendo-se como variam os níveis, subníveis e orbitais, constrói-se a
configuração eletrônica dos átomos, assunto de grande importância para o entendimento
da reatividade dos compostos.
Figura 9. Os cinco orbitais d e suas posições no espaço.
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9
Figura 10. Os sete orbitais f e suas posições no espaço
2. Configuração Eletrônica e Tabela Periódica A configuração eletrônica de um átomo no estado fundamental, segue algumas
regras que são conhecidas como o princípio de Aufbau.
A primeira das regras está relacionada com a ordem de ocupação dos orbitais
pelos elétrons. A distribuição eletrônica começa no orbital de menor energia, o 1s, e os
elétrons restantes entram no próximo orbital vazio de menor energia – até que todos os
elétrons do átomo terminem. A ordem de energia pode ser acompanhada pelo diagrama
de Linus Pauling:
1s
2s
3s
2p
4s
3p
5s
4p
3d
6s
5p
4d
7s
6p
8s
7p
6d
7d
6f
5d
4f
5f 5g
7f
6g
7g
6h
7h 7i
(...)
(...)
A distribuição dos elétrons segue a ordem das
diagonais, indo de cima para baixo como indicam
as setas. Dessa forma, a ordem de energia dos
orbitais é:
1s<2s<2p<3s<3p<4s<3d<4p<5s<4d<5p<6s<...
Os orbitais marcados em azul são,
normalmente, omitidos no diagrama de Pauling,
pois os elementos conhecidos até então não têm
elétrons suficientes para ocupar estes orbitais
quando no estado fundamental. No entanto, com a
síntese de novos elementos artificiais, isto pode
mudar no futuro.
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10
A segunda regra está relacionada com o Princípio da Exclusão de Pauli e pode ser
enunciada de várias formas. A maneira mais fácil de entendê-lo é que o número máximo
de elétrons que podem ocupar um mesmo orbital são dois – e neste caso, os spins dos
elétrons devem ser necessariamente contrários.
A terceira regra é conhecida como Regra de Hund. Quando um subnível possui
orbitais degenerados, primeiro ocupa-se todos os orbitais com um elétron para, então,
entrar com segundo elétron. Um exemplo da Regra de Hund pode ser visto na Figura 11.
Viola a Regra de Hund
(a)
Segue a Regra de Hund
(b)
Figura 11. Duas possibilidades para a distribuição de 3 elétrons em um subnível p. (a) um exemplo
onde a Regra de Hund não está sendo respeitada e (b) a maneira correta, seguindo a Regra de Hund.
Seguindo estas regras, chega-se à configuração eletrônica do estado fundamental
dos átomos. Algumas exceções são observadas, como o cobre, prata, ouro, platina,
molibidênio e grande parte dos elementos da série dos lantanídeos e actnídeos. Quando
se determina a configuração eletrônica destes elementos se observa que um orbital de
maior energia está ocupado no lugar de um de menor energia (segundo a prioridade do
diagrama de Pauling). Alguns exemplos são mostrados na Tabela 2.
Tabela 2. Algumas exceções ao diagrama de Pauling. Configuração eletrônica
Elemento Diagrama de Pauling Experimental
29Cu [Ar] 4s2 3d9 [Ar] 4s1 3d10
42Mo [Kr] 5s2 4d4 [Kr] 5s1 4d5
78Pt [Xe] 6s2 4f14 5d8 [Xe] 6s1 4f14 5d9 A configuração eletrônica dos elementos e a maneira que a Tabela Periódica está
organizada têm grande relação. A Tabela Periódica moderna foi montada a partir da
tabela feita por Mendeleev em 1869. Mendeleev colocou os 63 elementos que eram
conhecidos naquela época em ordem crescente de massa atômica em linhas horizontais,
que chamou de período. Os elementos com propriedades semelhantes foram organizados
em linhas verticais, que foram chamadas de grupos ou famílias.
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As propriedades dos elementos, principalmente a reatividade, estão relacionadas
com a configuração eletrônica destes elementos. Portanto, nos grupos da Tabela
Periódica estão elementos com configuração eletrônica semelhante. Se fizermos a
distribuição eletrônica do lítio, sódio, potássio e rubídio – todos do grupo 1 (ou 1A) –
podemos perceber isso:
3Li 1s2 2s1
11Na 1s2 2s2 2p6 3s1
19K 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 4s1
37Rb 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 4s2 3d10 4p6 5s1
Todos os elementos do grupo 1 da tabela têm seu último elétron ocupando um
orbital s. A configuração eletrônica de todos termina com Xs1, onde X é o período da
tabela periódica que o elemento se encontra.
Fazendo o mesmo para os elementos do grupo 2 da tabela, como o berílio,
magnésio, cálcio e estrôncio, temos:
4Be 1s2 2s2
12Mg 1s2 2s2 2p6 3s2
20Ca 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 4s2
38Sr 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 4s2 3d10 4p6 5s2
A configuração eletrônica dos elementos do grupo 2 na tabela termina com Xs2,
onde X é o período da tabela periódica que o elemento se encontra.
Se fizermos isto para todos os grupos, iremos verificar que os elementos do
mesmo grupo sempre têm o mesmo número de elétrons no mesmo subnível. Apenas o
número da camada é que muda. Assim, podemos dividir a tabela periódica de acordo com
os subníveis e número de elétrons, como mostra a Figura 12.
Uma vez que conhecemos a configuração eletrônica dos elementos e sua relação
com a Tabela Periódica, podemos então avançar nossos estudos sobre as propriedades
periódicas dos elementos.
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12
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18s1 p6
s2
p1
p2
p3
p4
p5
d1
d2
d3
d4
d5
d6
d7
d8
d9
d10
Bloco “p” Bloco
“s” Bloco “d”
f1 f2 f3 f4 f5 f6 f7 f8 f9 f10 f11 f12 f13 f14
Bloco “f”
Figura 12. A Tabela Periódica e sua relação com a configuração eletrônica dos elementos.
3. Propriedades Periódicas 3.1 – Carga Nuclear Efetiva (Z* ou Zeff) Considere um átomo com dois elétrons, como o mostrado na Figura 13. O elétron
A está sobre influência direta do núcleo. Toda a carga nuclear irá atrair este elétron. Já o
elétron B, não estará sob influência de toda a carga nuclear. De certa forma, o elétron A
funciona como uma barreira da carga nuclear, atenuando-a. É como se uma parte da
carga nuclear se perdesse ao atrair o elétron A, sobrando apenas uma fração da carga
nuclear total para atrair o elétron B. Dizemos então que o elétron A blinda a carga nuclear
para o elétron B.
Figura 13. Um núcleo e dois elétrons A e B. A influência do núcleo é diferente para os elétrons.
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Dessa forma, define-se o termo carga nuclear efetiva (Z* ou Zeff) como sendo a
fração da carga nuclear que chega ao elétron. Podemos expressar a carga nuclear efetiva
como sendo:
Z* = Z – σ (3) onde Z é a carga nuclear e σ representa a blindagem.
Consideremos um átomo com cinco elétrons. Entre o último elétron e o núcleo
estão os quatro elétrons anteriores. Estes quatro elétrons estão blindando a carga nuclear
para o último elétron que, portanto, terá o menor valor de Z* dentre os cinco elétrons
deste átomo. Já o primeiro elétron não possui blindagem, logo Z* = Z. Portanto, um dado
elétron é blindado por todos os elétrons de camadas anteriores a sua.
A eficiência da blindagem depende basicamente do número de elétrons e do tipo
de orbitais que estão sendo ocupados. A influência do tipo dos orbitais na eficiência da
blindagem está relacionada com o número de planos nodais que o orbital possui.
Considere um orbital do tipo s, um do tipo p e um do tipo d. O orbital s, por ser esférico,
blinda a carga nuclear em todas as direções (Figura 14a). Já o orbital p possui um plano
nodal. Na posição do plano nodal, a probabilidade de se encontrar o elétron é nula. Dessa
forma, existe uma posição no espaço onde a carga nuclear pode passar sem ser
atenuada pelos elétrons. (Figura 14b). Da mesma forma, orbitais d possuem dois planos
nodais que permitem a passagem da carga nuclear sem ser atenuada pelos elétrons
(Figura 14c). Portanto, existe uma relação direta entre o número de planos nodais (e os
tipos de orbitais) e a eficiência da blindagem. Resumindo, a blindagem varia da seguinte
maneira: orbitais s > orbitais p > orbitais d > orbitais f > ...
O efeito do orbital na blindagem abordado em outras propriedades que veremos
adiante.
Embora a carga nuclear efetiva possa ser determinada (quantitativamente ou
qualitativamente) para todos os elétrons de um átomo, normalmente o interesse principal
está nos elétrons da camada de valência, pois são eles os maiores responsáveis pela
reatividade e propriedade de um elemento. Dessa forma, a partir de agora, quando a
carga nuclear efetiva for citada, esta se refere aos elétrons da camada de valência.
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Figura 14. Representação esquemática da blindagem em relação ao tipo de orbitais. (a) Orbital s, por ser esférico, consegue blindar a carga nuclear igualmente em todas as direções; (b) Na
posição do plano nodal do orbital p, a carga nuclear passa livremente (representada de vermelho na figura); (c) Em um orbital d tem-se dois planos nodais, onde a carga nuclear não é blindada (em
vermelho).
A carga nuclear efetiva varia nos períodos de maneira regular, aumentando da
esquerda para a direita. Para compreender esta tendência, tomemos o segundo período
da Tabela Periódica como referência. A carga nuclear, Z, aumenta do lítio (Z=3) para o
neônio (Z=10). Fazendo a distribuição eletrônica dos elementos deste período,
encontraremos:
3Li 1s2 2s1 4Be 1s2 2s2 5B 1s2 2s2 2p1 6C 1s2 2s2 2p2 7N 1s2 2s2 2p3 8O 1s2 2s2 2p4 9F 1s2 2s2 2p5
10Ne 1s2 2s2 2p6 Os orbitais sublinhados são os que devem ser considerados para o efeito de
blindagem do último elétron. O lítio e o berílio têm rigorosamente a mesma blindagem,
realizada pelos dois elétrons do orbital 1s. Como a carga nuclear do berílio (Z=4) é maior
que a do lítio (Z=3), pela equação (3) podemos verificar que a carga nuclear efetiva
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aumenta quando passamos do lítio para o berílio. Ao continuarmos caminhando para a
direita no período, a blindagem tem uma mudança: a partir do boro, os elétrons do orbital
2s se juntam aos do orbital 1s no termo de blindagem para o orbital 2p. Do boro ao flúor, a
blindagem é a mesma, enquanto a carga nuclear aumenta. Portanto, teremos um
aumento na carga nuclear efetiva ao seguirmos o aumento do número atômico em um
mesmo período da Tabela Periódica.
Mas como comparar as cargas nucleares efetivas de elementos com blindagens
diferentes, como, por exemplo, berílio e boro? Para isso, é necessário buscar
parâmentros quantitativos para que se possa calcular de fato o termo de blindagem de
cada elemento e, então, subtraí-lo da carga nuclear. Uma maneira de calcular o termo de
blindagem foi proposta por John Clarke Slater, mas não iremos nos aprofundar em seu
trabalho. Ao invés disso, analisaremos os valores calculados, apresentados na Tabela 3,
para tirarmos algumas conclusões.
Tabela 3. Valores de carga nuclear efetiva (Z*) para diferentes elementos.
Li Be B C N O F Ne Z 3 4 5 6 7 8 9 10
Z*(2s) 1,28 1,91 2,58 3,22 3,85 4,49 5,13 5,76 Z*(2p) – – 2,42 3,14 3,83 4,45 5,10 5,76
Pelos valores apresentados na Tabela 3, pode-se verificar dois pontos principais.
O primeiro é o da tendência de Z* aumentar ao longo do período. O segundo é que a
eficiência da blindagem do orbital 2s para o orbital 2p não é muito grande. Os valores de
Z*(2s) mostram que o orbital 1s blinda aproximadamente metade da carga nuclear. Ao
comparar os valores de Z*(2s) com os de Z*(2p) verifica-se que a adição do orbital 2s na
blindagem (presente no termo Z*(2p)) tem pouco peso. É por esta razão que é utilizada a
aproximação de que elétrons de uma mesma camada não blindam uns aos outros; de
forma que a blindagem é sempre exercida pelos elétrons das camadas anteriores, como
já foi exposto anteriormente.
Nos grupos, a situação é problemática. Adotando uma parte do grupo 1 da Tabela
Periódica como caso de estudo, teremos a seguinte situação:
3Li 1s2 2s1 11Na 1s2 2s2 2p6 3s1 19K 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 4s1
37Rb 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 4s2 3d10 4p6 5s1
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Como avaliar a tendência da variação de Z* se tanto a blindagem (orbitais
sublinhados) quanto a carga nuclear estão variando de maneira significativa? Aqui, a
análise só é possível em termos quantitativos. Para avaliar as propriedades periódicas
nos grupos é mais conveniente usar um outro parâmetro: o raio atômico.
3.2 – Raio Atômico O raio atômico descreve o tamanho do átomo. E desde o modelo atômico proposto
por Rutherford, o tamanho do átomo está relacionado com a posição dos elétrons em
relação ao núcleo. Então, será a distância entre o núcleo e o último elétron do átomo que
determinará o raio atômico.
Como sabermos se um elétron está mais ou menos afastado do núcleo?
Considere dois núcleos diferentes atraindo um elétron qualquer. O núcleo que atraí-lo
com mais força, terá o menor raio, pois a distância entre este núcleo e o elétron será
menor. Da mesma forma, o núcleo que atrai com uma força menor, terá um raio maior.
Portanto, o tamanho do átomo é função direta da capacidade do núcleo em atrair o seu
último elétron e, como foi visto no item anterior, essa força é representada pela carga
nuclear efetiva.
Na Figura 15 pode-se ver a relação entre o aumento da carga nuclear efetiva e a
diminuição do raio atômico para os elementos do segundo e terceiro período da tabela
periódica. Dentro dos períodos o raio atômico diminui da esquerda para a direita,
acompanhando o aumento de Z*.
Nos grupos, o raio atômico aumenta conforme o número de elétrons aumenta.
Novamente, usaremos o grupo 1 como exemplo. A distribuição eletrônica de alguns dos
elementos deste grupo é
3Li 1s2 2s1 11Na 1s2 2s2 2p6 3s1 19K 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 4s1
37Rb 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 4s2 3d10 4p6 5s1
Tem-se sempre o aumento de camadas de um elemento para o outro. Dessa
forma, o último elétron está sempre uma camada além do que o último elétron do
elemento anterior e, portanto, o raio atômico aumentará conforme o número de camadas
cresce.
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17
0
1
2
3
4
5
6
7
2 4 6 8 10 12 14 16 18
Número atômico
Raio Atômico (angstrons)Carga Nuclear Efetiva
Li C F Na Si Cl
Figura 15. Variação da carga nuclear efetiva e do raio atômico para o segundo e terceiro períodos
da Tabela Periódica.
Tanto o raio atômico como a carga nuclear efetiva são ótimos parâmetros para
entender a variação de duas propriedades importantes dos átomos: a energia de
ionização e a afinidade eletrônica.
3.3 – Energia de Ionização (EI) A energia de ionização é definida como a energia necessária para remover-se
1 mol de elétrons de 1 mol de átomos no estado gasoso, segundo a reação
M(g) → M+(g) + 1e–
Para remover um elétron de um átomo é preciso dar energia ao sistema, dessa
forma, a energia de ionização é sempre positiva. Como o raio atômico, a EI varia de
acordo com a força com que o núcleo atrai o elétron. Quanto maior essa força, mais difícil
é a saída do elétron. Existem várias energias de ionização, dependendo de quantos
elétrons o elemento já perdeu. Resumindo:
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18
M(g) → M+(g) + 1e– 1° EI
M+(g) → M2+
(g) + 1e– 2° EI
M2+(g) → M3+
(g) + 1e– 3° EI
M3+(g) → M4+
(g) + 1e– 4° EI
M(n–1)+(g) → Mn+
(g) + 1e– enésima EI
A EI sempre aumenta conforme mais elétrons são retirados, isto é 1° EI < 2° EI < <
3° EI < 4° EI < ...< enésima EI. A explicação para isto é simples. Quando retiramos um
elétron, fazendo do elemento um cátion, a atração do núcleo sobre os elétrons restantes
aumenta. Assim, a saída do próximo elétron necessitará de mais energia que a do elétron
anterior.
A variação da EI nos períodos segue uma tendência governada pela carga nuclear
efetiva. Quanto maior Z*, maior será a EI e por isso, são os gases nobres os elementos
com maiores valores de EIs. O mesmo raciocínio pode ser aplicado usando o raio atômico
como referência. Se o raio atômico diminui, considera-se que o elétron está sendo mais
atraído pelo núcleo. Então, para raios atômicos menores, teremos EIs maiores. Na Tabela
4 estão listadas as energias de ionização para alguns elementos da Tabela Periódica.
Observando os valores da Tabela 4, vemos que a variação da EI ao longo do período não
é constante. Quando passamos do grupo 15 para o 16, ao invés de observarmos o
aumento na EI, acompanhando o aumento de Z* (ver Tabela 3), tem-se uma diminuição
da EI. O mesmo ocorre entre os grupos 2 e 13. Precisa-se, então, compreender a
natureza dessas anomalias.
Tabela 4. Valores em eV da primeira energia de ionização de alguns elementos.
Grupos 1 2 13 14 15 16 17 18 H
13,60 He
24,59
Li 5,32
Be 9,32
B 8,30
C 11,26
N 14,53
O 13,62
F 17,42
Ne 21,56
Na
5,14 Mg
7,64 Al
5,98 Si
8,15 P
10,48 S
10,36 Cl
12,97 Ar
15,76
K 4,34
Ca 6,11
Ga 6,00
Ge 7,90
As 9,81
Se 9,75
Br 11,81
Kr 14,00
CEFET Química Química Inorgânica
19
Começaremos tentando compreender o problema entre o grupo 2 e o 13. Para
isso, precisamos da configuração eletrônica dos elementos. Para o berílio e o boro temos:
4Be 1s2 2s2 5B 1s2 2s2 2p1
O elétron que será removido no berílio está emparelhado no orbital 2s. Já no boro,
o elétron que sairá será o do orbital 2p1. Embora a blindagem de subníveis de uma
mesma camada seja tênue, este efeito, combinado com a diferença de energia entre os
subníveis 2s e 2p, ajudam a compreender a inversão entre os valores de EI nos grupos 2
e 13. A blindagem do boro é ligeiramente maior, o que diminuiria o valor de EI. Mas é
mais determinante o fato do subnível 2p ser mais energético que o 2s. Quanto maior é a
energia dos orbitais (ou do subnível) mais fácil é a retirada do elétron, pois a ação do
núcleo sobre estes elétrons mais energéticos será menor do que em orbitais mais
internos.
Um outro parâmetro que pode ser considerado nessa questão está relacionado
com a degenerescência dos orbitais do subnível 2p. No subnível 2p do boro, que possui
três orbitais p degenerados, tem apenas um elétron em um dos orbitais. Vamos pensar no
que isto pode influenciar na energia de ionização. Manter três orbitais com a mesma
energia tem um custo energético para o átomo. No entanto, este custo será menor se
todos os orbitais estiverem nas mesmas condições, isto é, ou todos desocupados ou
todos com um elétron ou todos com dois elétrons. Aqui se pode utilizar uma analogia com
uma balança de dois pratos. Se as massas nos dois pratos forem iguais, os pratos se
ficarão equilibrados naturalmente. Mas, se as massas forem diferentes, alguém terá que
intervir, puxando o lado com menos massa para baixo para manter os pratos equilibrados.
Ou seja, há um custo energético para a pessoa para manter os pratos no mesmo nível.
Tendo isto em mente, voltemos ao caso do berílio e do boro. O berílio irá perder um dos
elétrons do orbital 2s. Já o boro, irá perder seu último elétron, o do subnível 2p. Subnível
este que possui três orbitais p que devem ter a mesma energia. Como só um dos três
está ocupado, o custo para o átomo manter estes orbitais em um mesmo patamar
energético é muito grande. Com a saída deste elétron, todos os orbitais 2p estarão
desocupados, todos em uma mesma situação. Assim, o boro não terá um custo adicional
para manter a degenerescência dos orbitais do subnível 2p. Por conta disso, a saída do
elétron do boro demanda menos energia que a retirada do elétron do berílio, apesar da
carga nuclear efetiva ser maior para o boro. Da mesma forma, isto acontece em outros
períodos destes grupos.
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20
Este efeito do “equilíbrio dos orbitais” também é o responsável pela anomalia entre
o grupo 15 e o 16. Usemos como exemplo o nitrogênio e o oxigênio. As configurações
eletrônicas destes elementos são:
7N 1s2 2s2 2p3 8O 1s2 2s2 2p4
O nitrogênio tem três elétrons no subnível 2p, um elétron para cada um dos
orbitais. Então, estes orbitais estão equilibrados e não há um custo adicional para
mantê-los degenerados. Já o oxigênio, possui quatro elétrons no subnível 2p, o que
significa que um dos orbitais tem dois elétrons enquanto os outros dois têm um elétron
cada. Portanto, existe um desequilíbrio entre os orbitais p do oxigênio e, assim como o
boro no caso anterior, haverá um custo extra de energia para manter a degenerescência
destes orbitais. Temos então os orbitais do nitrogênio “equilibrados” e os do oxigênio
“desequilibrados” (Figura 16).
(a)
(b)
Figura 16. A distribuição dos elétrons no subnível 2p para: (a) nitrogênio e (b) oxigênio.
Se o nitrogênio perder um elétron, ele passará a uma situação de desequilíbrio.
Em contrapartida, o oxigênio ao perder um elétron cai exatamente na situação do
nitrogênio, com três elétrons para os três orbitais p. Portanto, a saída do elétron do
nitrogênio é altamente desfavorável (quebra o “equilíbrio”), enquanto a saída do elétron do
oxigênio torna os orbitais do subnível p “equilibrados”. Então, observa-se que as EIs para
os elementos do grupo do nitrogênio são maiores que as do grupo do oxigênio, apesar da
carga nuclear efetiva aumentar do grupo 15 para o 16.
A variação ao longo dos grupos acompanha o raio atômico. Quanto maior o raio do
átomo, menor a atração do núcleo ao último elétron. A conseqüência é que o elétron
estará menos preso ao átomo, sendo mais fácil retirá-lo. Por isso, a EI será menor quando
descemos nos grupos.
Um outro ponto interessante para se destacar sobre a variação da energia de
ionização vem dos grupos 1, 2 e 13. A Tabela 5 mostra as três primeiras energias de
ionização de alguns elementos destes grupos.
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21
Tabela 5. Os três primeiros potenciais de ionização em eV de alguns elementos dos grupos 1, 2 e 13.
Grupos 1 2 13 Li
5,32 75,63 122,4
Be 9,32
18,21 153,85
B 8,30
25,15 37,93
Na
5,14 47,28 71,63
Mg 7,64
15,03 80,14
Al 5,98
18,83 28,44
K
4,34 31,62 45,71
Ca 6,11
11,87 50,89
Ga 6,00
20,51 30,71
Nota-se que para a 1° EI, os menores valores no período são sempre dos
elementos do grupo 1. Se a 2° EI é levada em consideração, então os menores valores
são os do grupo 2. E, para a 3° EI, os menores valores observados são os do grupo 13.
Então, podemos dizer que os elementos do grupo 1 perdem, preferencialmente um
elétron. Enquanto os elementos do grupo 2 formam cátions do tipo M2+. Já os do grupo
13, são os que consomem menos energia para formar cátions M3+. Esta variação está
diretamente relacionada com a configuração eletrônica destes elementos. Tomando como
exemplo o terceiro período da tabela periódica (sódio, magnésio e alumínio) tem-se
11Na 1s2 2s2 2p6 3s1 12Mg 1s2 2s2 2p6 3s2 13Al 1s2 2s2 2p6 3s2 3p1
Como são do terceiro período, todos irão perder primeiramente os elétrons da terceira camada. Após a saída do primeiro elétron os elementos teriam a seguinte configuração:
11Na+ 1s2 2s2 2p6 12Mg+ 1s2 2s2 2p6 3s1 13Al+ 1s2 2s2 2p6 3s2
Na segunda energia de ionização, a saída do segundo elétron, tem-se uma
situação diferente da anterior. O cátion sódio perderia um elétron da segunda camada,
enquanto magnésio e alumínio ainda possuem elétrons na terceira camada. Isto significa
que o sódio perderá um elétron de uma camada mais interna que magnésio e alumínio.
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22
Portanto, a energia para retirar o segundo elétron do sódio é muito maior que para os
outros elementos aqui analisados. E isto irá se repetir para todos os elementos do grupo 1
quando comparados aos elementos do grupo 2 e 13. Da mesma forma, o magnésio, após
a 2° EI terá uma camada a menos, enquanto o alumínio continuará tendo um elétron na
terceira camada. Desta forma, a 3° EI será menor para o alumínio do que para o sódio e o
magnésio.
A Tabela 5 mostra ainda outro fato curioso. Avançando nos grupos, observa-se
uma diminuição nas EIs – menos entre o alumínio e o gálio. A diminuição dos valores de
EI dentro dos grupos é esperada, uma vez que o raio aumenta descendo nos grupos e,
portanto, a energia de ionização deve diminuir. Portanto, é preciso entender por que isto
não é observado entre os elementos Al e Ga. Assim como as outras variações não
esperadas, a razão para a anomalia reside na configuração eletrônica destes elementos:
13Al 1s2 2s2 2p6 3s2 3p1 31Ga 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6 3d10 4s24p1
O gálio possui elétrons em orbitais do tipo d. Como exposto anteriormente, orbitais
deste tipo têm pouca eficiência na blindagem dos próximos elétrons. Desta forma, dez dos
dezoito elétrons que o gálio tem a mais que o alumínio tem pouco efeito para a
blindagem. Portanto, a blindagem do gálio varia de maneira discreta quando confrontada
com o aumento do número de elétrons. Se a blindagem não varia de maneira significativa
devido a estes dez elétrons em orbitais d, o mesmo não pode ser dito sobre a carga
nuclear do gálio. Os dezoito prótons a mais fazem a força de atração do núcleo do gálio
ser muito maior do que a observada para o alumínio. Combinados, os dois fatores (grande
aumento na carga nuclear e um aumento relativamente pequeno da blindagem) fazem a
carga nuclear efetiva do gálio ser maior que a do alumínio. Dessa forma, a energia para
retirar um elétron do gálio é maior que no alumínio, apesar do gálio ter uma camada a
mais.
Alguns desses efeitos eletrônicos são observados também no ganho de elétrons,
como será visto adiante.
3.4 – Afinidade Eletrônica (AE) A energia de ionização representa o quão fácil (ou difícil) um átomo perde um
elétron. Já a afinidade eletrônica mede a tendência de um átomo se tornar um ânion.
A afinidade eletrônica pode ser definida como sendo a energia envolvida na
reação de 1 mol de átomos no estado gasoso com 1 mol de elétrons:
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23
M(g) + 1e–→ M–(g)
Ao contrário da EI, que é sempre positiva, a AE pode ter valores positivos (energia
absorvida) ou negativos (energia liberada). A afinidade eletrônica definida nestes termos
também é chamada de entalpia de ganho de elétron (ΔHge). Outra definição da afinidade
eletrônica é considerá-la o oposto da entalpia de ganho de elétrons, isto é
AE = – ΔHge
e será esta definição que usaremos aqui.
Quanto maior for a AE, maior é a tendência do átomo de ganhar um elétron. Esta
tendência seguirá, basicamente, três parâmetros: a configuração eletrônica, a carga
nuclear efetiva e o raio atômico. A configuração eletrônica dos elementos terá a mesma
influência que para o caso da EI. Para orbitais degenerados, como os do tipo p, haverá
um custo adicional de energia se a distribuição eletrônica não é simétrica. Já a carga
nuclear efetiva funciona como um parâmetro de atração ao elétron que irá entrar no
átomo. Quanto maior for Z*, mais fácil é a entrada do elétron, portanto, maiores serão os
valores de afinidade eletrônica. O raio atômico tem um papel importante para a afinidade
eletrônica. A entrada de um novo elétron em um subnível sofrerá repulsão dos elétrons
que já o ocupam. Quanto mais elétrons, maior a repulsão. Se o raio atômico for grande, a
repulsão será menor, pois os elétrons podem se dispersar em um volume maior. Para
átomos com raios menores, a repulsão será mais forte, dificultando a entrada do elétron.
A Tabela 6 mostra os valores de afinidades eletrônicas para alguns átomos.
Podemos perceber que a tendência seria a AE aumentar ao longo do período,
acompanhando o aumento de Z*. É possível verificar algumas exceções a esta tendência,
como o grupo 2 e o grupo 15, além do grupo 18. Recordando os valores de EIs (Tabela 4)
para estes dois grupos, observa-se valores. Como foi dito antes, a explicação para os
valores de EI mais altos que o esperado está relacionada com a distribuição simétrica dos
elétrons em orbitais degenerados. A saída de um elétron quebra este arranjo simétrico
(para o nitrogênio, Figura 16a). Da mesma forma, a entrada de um elétron também produz
um desequilíbrio na distribuição dos elétrons nestes orbitais. Portanto, a entrada de um
novo elétron será altamente desfavorável, o que leva aos valores negativos para alguns
dos elementos (como o nitrogênio, berílio e magnésio) ou valores próximos de zero para
alguns outros elementos.
A influência do raio atômico é mais sutil e menos constante. Pode-se usar o flúor e
o cloro como exemplos para ilustrar isto. O cloro é maior que o flúor e, por isso, o elétron
CEFET Química Química Inorgânica
24
que entrará no átomo será menos atraído pelo núcleo. A consequência é que a entrada
do elétron seria menos favorecida. Mas, com o aumento do raio atômico, ao mesmo
tempo em que o elétron fica mais distante do núcleo, ele fica distante dos outros elétrons
do cloro, diminuindo a repulsão. No caso do flúor, a atração do núcleo ao elétron que irá
entrar é grande, já quer o raio é pequeno. Mas, se o raio é pequeno, a repulsão dos
outros elétrons em relação ao novo elétron também é grande. Então, temos que o cloro
tem menor atração, mas também uma menor repulsão, enquanto o flúor tem maior
atração e repulsão. O resultado deste quebra-cabeça energético é que a entrada do
elétron para o átomo de cloro é mais favorecida que para o flúor. Portanto, entre flúor e
cloro, a repulsão é determinante. Mas, se continuarmos descendo no grupo, veremos a
atração passará a governar o valor da AE.
Tabela 6. Valores de afinidade eletrônica (em eV) para alguns elementos.
Grupos 1 2 13 14 15 16 17 18 H
0,754 He
– 0,5
Li 0,618
Be < 0
B 0,277
C 1,263
N – 0,07
O 1,461
F 3,399
Ne – 1,2
Na
0,548 Mg < 0
Al 0,441
Si 1,385
P 0,747
S 2,077
Cl 3,617
Ar – 1,0
K
0,502 Ca
0,02 Ga
0,30 Ge 1,2
As 0,81
Se 2,021
Br 3,365
Kr – 1,0
Rb
0,486 Sr
0,05 In 0,3
Sn 1,2
Sb 1,07
Te 1,971
I 3,059
Xe – 0,8
Por conta de todas essas variáveis, a afinidade eletrônica é uma propriedade de
difícil previsão quando comparada com a energia de ionização, a carga nuclear efetiva ou
o raio atômico.
Um outro ponto importante a ser destacado, são os valores negativos para as
afinidades eletrônicas dos gases nobres. Isto indica que é preciso dar energia aos
elementos do grupo 18 para que aceitem o elétron. Não custa lembrar que os elementos
deste mesmo grupo, apresentam os maiores valores de energia de ionização nos
períodos.
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25
3.5 – Eletronegatividade (χ)
Em uma ligação química com elementos diferentes, um atrai mais os elétrons que
o outro. A eletronegatividade é a propriedade que representa a força de atração de um
átomo pelos elétrons de uma ligação. Esta propriedade está diretamente relacionada com
as outras duas aqui apresentadas: a energia de ionização e a afinidade eletrônica.
Um elemento eletronegativo é aquele que: 1) não perde elétrons com facilidade –
ou seja, tem um valor elevado de EI; 2) aceita elétrons com facilidade – valores elevados
de AE. Ao contrário da EI e AE, não existe uma medida experimental para a
eletronegatividade; ao invés de uma definição experimental, têm-se diversas definições
teóricas para a eletronegatividade. Uma definição bastante usada é a proposta por
Mulliken, que é descrita por
( )
2AEEI
M+
=χ (4)
Uma outra escala de eletronegatividade, muito mais popular que a de Mulliken, foi
proposta por Pauling, que levou em consideração que a eletronegatividade não era uma
propriedade de um átomo isolado. Com isso, os valores da escala de Pauling são
ligeiramente mais coerentes que os de Mulliken. A Tabela 7 mostra alguns valores de
eletronegatividade para ambas as escalas.
Tabela 7. Eletronegatividades de Pauling (P) e Mulliken (M) de alguns átomos.
Grupos 1 2 13 14 15 16 17 18 Li
0,98 (P) 1,28 (M)
Be 1,57 (P) 1,99 (M)
B 2,04 (P) 1,83 (M)
C 2,55 (P) 2,67 (M)
N 3,04 (P) 3,08 (M)
O 3,44 (P) 3,22 (M)
F 3,98 (P) 4,43 (M)
He –
5,5 (M) Na
0,93 (P) 1,21 (M)
Mg 1,31 (P) 1,63 (M)
Al 1,61 (P) 1,37 (M)
Si 1,90 (P) 2,03 (M)
P 2,19 (P) 2,39 (M)
S 2,58 (P) 2,65 (M)
Cl 3,16 (P) 3,54 (M)
Ne –
4,60 (M)
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26
Exercícios
1 – O que é um orbital? 2 – Qual é a interpretação de Max Born para a função de onda? 3 – Defina o que é região nodal. Qual sua relação com o número quântico principal? 4 – Dê a definição da Regra de Hund e do Princípio da Exclusão de Pauli. 5 – Explique o que é blindagem e como esse parâmetro varia com o tipo dos orbitais. 6 – Defina carga nuclear efetiva. 7 – Explique como a carga nuclear efetiva varia ao longo de um período da tabela periódica. 8 – Qual a relação entre a carga nuclear efetiva e o raio atômico? 9 – Explique porque o raio atômico diminui do Boro para o Flúor. 10 – Explique porque a primeira energia de ionização do Lítio é menor que o do Berílio. 11 – Consulte a Tabela 4 e explique:
a) a variação da energia de ionização ao longo dos períodos;
b) a variação da energia de ionização ao longo dos grupos.
12 – Explique a variação da energia de ionização entre os grupos 15 e 16. 13 – Por que a afinidade eletrônica do nitrogênio é negativa? 14 – Sabe-se que os gases nobres, em sua grande maioria, são inertes. Relacione esse comportamento com a energia de ionização e a afinidade eletrônica destes elementos. 15 – Dê a definição de eletronegatividade. 16 – Por que não existem valores de eletronegatividade de Pauling para o hélio e o neônio?
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27
4. A Regra do Octeto Os gases nobres apresentam valores altos de EI e valores negativos de AE, o que
significa que não perdem ou ganham elétrons com facilidade. Some isto ao fato de serem
praticamente inertes (ainda hoje existem poucos compostos formados por gases nobres)
e têm-se alguns elementos com propriedades intrigantes para os cientistas da época. Tão
intrigantes que a inércia química dos gases nobres foi considerada um modelo de
estabilidade para qualquer átomo da Tabela Periódica. Átomos se combinavam com os
outros para atingirem a estabilidade de um gás nobre e, portanto, chegar a um estado de
menor energia. Esta foi a proposta de Gibert N. Lewis.
Gilbert Lewis foi um homem de idéias simples, porém extremamente úteis.
Primeiro propôs uma nova divisão para as substâncias como polares e não polares ao
invés de inorgânicas e orgânicas. Seguindo essa idéia de substâncias polares e não
polares, ele propôs certas coisas interessantes. As diferentes propriedades que estas
substâncias apresentavam estavam ligadas à mobilidade dos elétrons da molécula. Ele
escreveu:
“Se então considerarmos moléculas não polares como sendo aquelas onde os
elétrons pertencentes a um átomo em particular estão restritos de tal forma que eles não
podem se afastar muito de suas posições normais, enquanto nas moléculas polares os
elétrons, tendo mais mobilidade, se separam na molécula formando partes positivas e
negativas, então todas as propriedades diferentes entre os dois tipos de compostos
tornam-se dependentes dessa hipótese (...)” (Traduzido de LEWIS, 1916).
Hoje essa idéia é um conceito bem sólido para os químicos. No entanto, numa
época onde Niels Bohr tinha acabado de propor seu modelo atômico de órbitas
quantizadas, atribuir as propriedades de substâncias químicas à mobilidade dos elétrons
era algo revolucionário. No entanto, sua outra idéia, sobre o “átomo cúbico” teria um
impacto ainda maior na química, pois explicaria porque os elementos se ligam uns com os
outros da maneira que o fazem.
Era sabido na época que a diferença entre a valência máxima positiva e negativa
de um elemento era, frequentemente, oito (e nunca mais que oito). Lewis então propôs a
idéia do “Átomo Cúbico” (Figura 17), que sustenta que quando os átomos possuem oito
elétrons – um em cada vértice de um cubo – tem-se uma situação de grande estabilidade.
Por conta disso, o flúor (Figura 17g) recebe um elétron, apresentando uma carga negativa
em seus compostos. E é claro, todos os gases nobres possuem todos os vértices dos
cubos preenchidos com elétrons. É preciso lembrar que a mecânica quântica de
CEFET Química Química Inorgânica
28
Schrödinger, que traria os conceitos de orbitais e configuração eletrônica, só apareceria
dez anos depois das primeiras idéias de Lewis. No entanto, nem a introdução de uma
nova teoria do átomo mudou o foco central das idéias de Lewis. É claro que se
abandonou a idéia de elétrons localizados em vértices de cubos, completamente
incompatível com o caráter probabilístico da mecânica quântica, mas a estabilidade
através dos oito elétrons se manteve. Mudou-se também o nome de “Átomo Cúbico” para
a conhecida Regra do Octeto.
Li
(a) (b)
Be
(c) (d)
(e) (f) (g) (h)
B C
N O F NeFigura 17. Exemplos da idéia de Lewis sobre do “Átomo Cúbico.”
A Regra do Octeto está relacionada com o número de elétrons na camada de
valência. Um átomo qualquer estará mais estável quando ficar com oito elétrons em sua
camada de valência – que é o número de elétrons da camada de valência dos gases
nobres. A exceção feita a esta regra é o hélio, que só possui apenas dois elétrons. Os
átomos próximos a este gás nobre, como hidrogênio, lítio e berílio, seguirão a sua
configuração eletrônica. Ou seja, a Regra do Octeto pressupõe que um átomo alcança a
estabilidade máxima quando está com a configuração eletrônica do gás nobre mais
próximo a ele. Selecionando o segundo e terceiro períodos da Tabela Periódica:
2He 3Li 4Be 5B 6C 7N 8O 9F 10Ne
11Na 12Mg 13Al 14Si 15P 16S 17Cl 18Ar
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29
As configurações eletrônicas dos gases nobres He, Ne e Ar são:
2He 1s2 10Ne 1s2 2s2 2p6 18Ar 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6
Enquanto para os outros elementos mostrados acima:
3Li 1s2 2s1
4Be 1s2 2s2 5B 1s2 2s2 2p1 6C 1s2 2s2 2p2 7N 1s2 2s2 2p3 8O 1s2 2s2 2p4 9F 1s2 2s2 2p5
11Na 1s2 2s2 2p6 3s1 12Mg 1s2 2s2 2p6 3s2 13Al 1s2 2s2 2p6 3s2 3p1 14Si 1s2 2s2 2p6 3s2 3p2 15P 1s2 2s2 2p6 3s2 3p3 16S 1s2 2s2 2p6 3s2 3p4 17Cl 1s2 2s2 2p6 3s2 3p5
Pode-se acompanhar que os elementos Li, Be e B, irão, perder seus elétrons para
chegar à configuração eletrônica do He. Do carbono até o alumínio, tem-se elementos
que atingirão a configuração eletrônica do neônio. Do silício ao cloro, elétrons serão
ganhos para chegar-se até a configuração eletrônica do argônio.
Segundo a Regra do Octeto, o lítio, sódio e os outros elementos do grupo 1,
perderão um elétron, formando cátions de carga +1. Já os do grupo 2, perderão dois
elétrons, formando cátions de carga +2. Por sua vez, os elementos do grupo 3, perderão
três elétrons. Agora é possível entender os valores de energia de ionização apresentados
anteriormente na Tabela 5. Os elementos do grupo têm a menor 1° EI, pois perdendo
apenas um elétron, eles chegam à configuração de gás nobre. Da mesma forma, a 2° EI é
menor no grupo 2 porque os elementos deste grupo precisam perder dois elétrons e a 3°
EI é menor no grupo 3 já que é necessária a saída de três elétrons destes átomos para
que se chegue até a configuração estável dos gases nobres.
Então alguns elementos formarão cátions enquanto outros formarão ânions para
alcançar a estabilidade na configuração eletrônica. Uma consequência lógica disto é que,
se um elemento necessita perder elétrons e outro ganhar, a transferência de elétrons será
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altamente favorável, como no caso do sódio (que precisa perder um) e do cloro (que
precisa ganhar um). O sódio se tornará um cátion e o cloro um ânion, estabilizando a
ambos durante este processo. Mas, existem outros casos, como nos óxidos de nitrogênio,
NOx, onde ambos os elementos necessitam ganhar elétrons para chegar na configuração
eletrônica mais estável. Neste caso, não haverá a formação de cátions e ânions, pois isto
não traria a estabilidade para os átomos da molécula. Portanto, a ligação química terá
diferentes aspectos de acordo com os elementos envolvidos nela.
5. Ligação Iônica A ligação iônica é, fundamentalmente, a atração eletrostática entre um cátion e um
ânion de um dado composto. Um exemplo é o cloreto de sódio, onde há um cátion, Na+, e
o ânion, Cl–, que se atraem mutuamente.
Como foi dito anteriormente, ela se forma pela conveniência de um dado elemento
perder um elétron e outro ganhar. Dessa forma, tem-se:
11Na = 1s2 2s2 2p6 3s1 17Cl = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p5
Na Cl
que irão formar um par iônico:
11Na+ = 1s2 2s2 2p617Cl– = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6
Na Cl+
O NaCl, como se sabe, é um sólido na temperatura ambiente. Como é formado
ligações iônicas, o NaCl e diversos outros sólidos formados por íons, são chamado de
sólidos iônicos. Por exemplo, uma barra de ferro ou aço ou uma bolinha de naftalina estão
no estado sólido, mas têm características muito diferentes do NaCl. E as propriedades de
sólidos iônicos estão todas relacionadas com a natureza iônica de suas ligações.
5.1 – Sólidos Iônicos Algumas características são comuns a diversos sólidos iônicos, como a baixa
condutividade elétrica, o alto ponto de fusão, a solubilidade, a dureza e clivagem. Estas
características estão todas relacionadas ao modelo eletrostático da ligação iônica.
A baixa condutividade elétrica observada em compostos iônicos no estado sólido
se deve, principalmente, a falta de mobilidade existente no estado sólido, uma vez que a
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31
condutividade está ligada diretamente à presença e mobilidade de íons no sistema. Mas,
uma vez fundidos, os compostos iônicos conduzem eletricidade. No entanto, precisa-se
de muita energia para fundir um sólido iônico.
Os altos pontos de fusão dos sólidos iônicos se devem a dois fatores. O primeiro
deles está relacionado com a força da ligação iônica. Sendo uma ligação relativamente
forte, a energia necessária para separar os íons é grande. No entanto, o segundo fator,
que é o predominante, está no número de ligações que devem ser quebradas. A ligação
iônica em um sólido iônico é dita multidirecional, isto é, se propaga em todas as direções.
Portanto, um íon positivo está ligado a vários outros íons negativos que também estarão
ligados a alguns outros íons positivos e assim por diante, num grande arranjo
tridimensional. Portanto, para se fundir um sólido iônico, não basta quebrar a ligação de
um único par iônico.
Quando solúveis, os sólidos iônicos liberam íons em solução e, por este motivo,
são bons condutores uma vez dissolvidos. Uma outra característica é que a solubilidade
dos sólidos iônicos aumenta com o aumento da constante diéletrica (permissividade
elétrica) do solvente. Isto pode ser explicado utilizando o modelo da atração eletrostática
entre os íons. A energia de atração entre o cátion e o ânion é dada pela Lei de Coulomb:
rqq
E...4
.επ
−+
= (5)
onde E é a energia, q+ e q– são as cargas do cátion e do ânion respectivamente, ε é a
constante de permissividade do meio e r é a distância entre o cátion e o ânion.
A Tabela 8 mostra os valores da constante de permissividade elétrica para alguns
solventes normalmente utilizados. Como solubilizar é separar os íons do estado sólido,
quanto menor for a energia dada pela equação (5), mais solúvel será o sólido. Portanto,
ao aumentarmos o valor de ε do meio, estaremos diminuindo a atração entre os íons do
sólido iônico. Isto explica a solubilidade destes sólidos em água, que possui uma
constante de permissividade elétrica alta.
Uma outra maneira de entender este mesmo fenômeno é considerando os dipolos
existentes nos solventes. Quanto maior é a constante de permissividade elétrica, mais
intenso é o dipolo. Como os íons têm carga, a existência de pólos positivos e negativos no
solvente favorece a dissociação.
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32
Tabela 8. Constantes de permissividade elétrica de alguns meios.
Meio ε (C2/J.m) Vácuo 8,85.10–12
Água 7,25.10–10 Acetonitrila 2,90.10–10
Amônia 2,20.10–10
Os sólidos iônicos costumam ser duros, porém quebradiços. Estes sólidos
possuem cristais característicos e, também, planos de clivagem característicos. A
clivagem é um dos métodos preliminares de se identificar minerais. Os planos de
clivagem podem ser explicados utilizando o modelo mostrado na Figura 18. Um sólido
iônico (Figura 18a) é golpeado em um local de seu cristal (Figura 18b). Suas camadas se
modificarão de forma que íons de mesma carga têm suas distâncias diminuídas, o que
leva a grande repulsão dentro do sólido (Figura 18c). A repulsão é tanta que há a quebra
do sólido (Figura 18d).
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 18. O modelo de clivagem nos sólidos iônicos.
Embora tenham propriedades semelhantes, os sólidos iônicos apresentam
diversas estruturas cristalinas. Como o arranjo tridimensional dos elementos no cristal irá
influenciar diretamente algumas propriedades, é preciso se conhecer um pouco destas
estruturas cristalinas.
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33
5.2 – As Estruturas Cristalinas dos Sólidos Iônicos 5.2.1 – A Estrutura do Cloreto de Sódio O cloreto de sódio apresenta uma estrutura cristalina com célula unitária cúbica de
face centrada (cfc) (Figura 19). Cada átomo de sódio está ligado, diretamente, a seis
átomos de cloro; assim como cada átomo de cloro se liga a seis outros átomos de sódio,
em arranjo octaédrico, formando assim a estrutura tridimensional. Como existem seis
átomos de cloro ligado ao um de sódio, diz-se que o número de coordenação (NC) do
sódio é seis. Nesta estrutura, o NC do cloro também é seis.
Figura 19. A estrutura cristalina do cloreto de sódio em visão frontal e em perspectiva.
Um outro fator importante é a proporção entre sódio e cloro dentro da célula
unitária. Considere que os átomos de sódio sejam os vermelhos na Figura 19. Apenas 1/8
dos átomos localizados no vértice do cubo está do lado de dentro da célula unitária. Como
são oito os vértices, tem-se um átomo do lado dentro. Cada átomo na face do cubo está
com metade do átomo do lado de dentro e a outra metade do lado de fora. Então, como
são seis faces, a soma total dá três átomos. Assim, o total de átomos de sódio dentro da
célula unitária é de quatro átomos (um dos vértices e três dos átomos da face). Fazendo o
mesmo para os átomos de cloro, chegaremos à conclusão que existem os mesmos quatro
átomos. Portanto, a proporção é de 4:4, como deveríamos esperar, o número de átomos
de sódio é igual ao número de átomos de cloro.
Outros sólidos iônicos que possuem a mesma estrutura do cloreto de sódio são:
LiCl, KBr, KCl, KI, RbI, AgCl, AgBr, MgO, CaO, TiO, FeO, etc.
5.2.2 – Estrutura do Cloreto de Césio O cloreto de césio apresenta uma cristalização distinta da do cloreto de sódio
possivelmente pelo seu maior raio em relação ao sódio. Sua estrutura é cúbica e o
número de coordenação, tanto do cátion quanto do ânion, é oito para sólidos com este
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arranjo cristalino (Figura 20). A proporção cátion-ânion na célula unitária é de 1:1. São
exemplos de outros sólidos com esta estrutura o CsBr, CsI, CsCN, CaS, etc.
Figura 20. A estrutura cristalina do cloreto de césio em perspectiva.
5.2.3 – A Estrutura da Esfarelita A esfarelita, mineral do sulfeto de zinco, também conhecido como blenda possui
um empacotamento cfc com os átomos de enxofre ocupando os vértices e faces do cubo
e os de zinco formando um tetraedro dentro da célula unitária (Figura 21). O número de
coordenação de ambos é quatro, em arranjo tetraédrico. A proporção de átomos de zinco
e de enxofre na célula unitária é semelhante àquela observada para o cloreto de sódio:
4:4.
O cloreto de cobre (I), sulfeto de cádmio e sulfeto de mercúrio (II) são alguns
exemplos de sólidos iônicos que cristalizam desta forma.
O sulfeto de zinco também pode cristalizar de outra forma, conhecida como
wurtzita. Na wurtzita há um empacotamento hexagonal expandido, sendo muito diferente
da estrutura da blenda. Como este é um empacotamento menos comum, não se
detalhará seus aspectos.
Figura 21. A estrutura cristalina do ZnS em perspectiva, destacando o tetraedro dos átomos de
zinco e um dos tetraedros entre o zinco e átomos de enxofre.
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5.2.4 – Estrutura da Fluorita e da Antifluorita
A fluorita, CaF2, apresenta um cristal com empacotamento cfc, a célula unitária
contendo um cubo interno (Figura 22). Os átomos de cálcio ocupam o cubo externo e,
portanto, existe um total de quatro átomos de cálcio na célula unitária. Os átomos de flúor
formam o cubo interno e todos estão dentro da célula unitária e, portanto, a proporção
entre cálcio e flúor na célula unitária é de 4:8. O número de coordenação para cálcio e
flúor também são diferentes. Cada cálcio está ligado a oito átomos de flúor, enquanto o
NC observado para o flúor é quatro. São exemplos de sólidos iônicos com estrutura da
fluorita: UO2, BaCl2, CaCl2, HgF2, PbO2, etc.
Na estrutura da antifluorita tem-se a posição de cátions e ânions invertida. Os
seguintes sólidos iônicos são exemplos da estrutura da antifluorita: K2O, K2S, Li2O, Na2O,
Na2S, etc.
Figura 22. A estrutura cristalina do fluoreto de cálcio em visão frontal e em perspectiva.
5.2.5 – Outras Estruturas Apenas as estruturas mais comuns foram comentadas com detalhes, mas existem
diversas outras estruturas de sólidos iônicos, como a do rutilo, do arseneto de níquel ou
da wurtzita (Consulte livros de mineralogia para mais detalhes do assunto).
5.3 – Energia do Retículo Cristalino (U0) Define-se energia do retículo cristalino como a energia liberada quando os íons de
um composto iônico no estado gasoso formam um cristal, como mostra a equação abaixo.
M+
(g) + X–(g) → MX(s) (6)
Para calcular esta energia, precisam-se levar em conta todos os aspectos
envolvidos na equação (6). Como já foi discutido, o modelo de força eletrostática é
adequado para descrever a atração entre os íons. Portanto, começaremos a análise com
a equação (5), apenas trocando as cargas dos íons pelo número de carga dos mesmos
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36
(Z+ e Z–) multiplicado pela carga do elétron (e) e com o valor da constante de
permissividade elétrica no vácuo (ε0) uma vez que se está no estado gasoso. Com isso,
tem-se:
reZZEcoulomb ...4..
0
2
επ
−+
= (7)
A equação (7), da Energia de Coulomb, representa a atração de um par iônico.
Quanto maior é o número de carga dos íons, maior é a atração. Da mesma forma, quanto
maior é a distância r entre os íons, menor é a atração. Da mesma forma, quanto menor é
a distância, maior é a atração. Para distâncias muito pequenas, a Energia de Coulomb
torna-se cada vez menor (lembre-se que esta energia é negativa! Mais atração = energia
mais negativa). A Figura 23 mostra o perfil de energia obtido com a equação (7). O
mínimo de energia será para distâncias cada vez menores; e quando a distância tende a
zero, a energia é infinitamente negativa. Isto, claro, é impossível. O problema desta
análise é considerar somente a atração entre os íons. Mas tanto cátions como ânions têm
elétrons, que irão se repelir mutuamente se a distância entre o par iônico for muito
pequena. Portanto, é preciso levar em conta a repulsão dos íons no cálculo da energia do
retículo cristalino. Para grandes valores de r, a repulsão será mínima, próxima de zero. A
repulsão irá aumentando conforme os íons vão se aproximando. Para distâncias muito
pequenas, a repulsão tenderá ao infinito, como mostra a Figura 24. Além da distância
entre os íons, a repulsão dependerá também do número de elétrons do sistema. Quanto
maior o número de elétrons, maior será a repulsão. Na Tabela 9 estão resumidos os
fatores de repulsão em função do número de elétrons do sistema.
Então, para uma descrição correta da ligação iônica e para calcular a energia do
retículo cristalino, é preciso levar em consideração tanto a atração quanto a repulsão.
Rescrevendo a equação (7) com o termo de repulsão (n):
⎟⎠⎞
⎜⎝⎛ −=
−+
nreZZEtotal
11....4..
0
2
επ (8)
Mas a equação (8) ainda deixa de fora aspectos importantes, como por exemplo, a
estrutura cristalina dos sólidos iônicos. Como as estruturas são diferentes, desde o
arranjo espacial até o número de coordenação, as forças atuantes em cada átomo serão
diferentes. Portanto, é preciso considerar-se este fator geométrico nos cálculos. Isto se
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37
faz introduzindo a constante de Madelung (A), que terá um valor para cada estrutura
cristalina (Tabela 10).
Figura 23. Gráfico da energia de Coulomb para um par iônico em função da distância entre os íons
Figura 24. Energias de atração e repulsão em função da distância entre os íons.
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38
Tabela 9. Fatores de repulsão. Configuração eletrônica do íon Fator de Repulsão (n)
He 5 Ne 7
Ar, Cu+ 9 Kr, Ag+ 10 Xe, Au+ 12
Tabela 10. Constante de Madelung para algumas estruturas cristalinas.
Estrutura Cristalina Constante de Madelung (A) Cloreto de Sódio 1,74756 Cloreto de Césio 1,76267
Esfarelita 1,63806 Wurtzita 1,64132 Fluorita 2,51939
A equação (8) mostra a energia da ligação para um par de íons. No entanto um
par de íons não forma um cristal. O cloreto de sódio, para citar um exemplo, precisa de,
no mínimo, quatro pares de íons para formar uma célula unitária de seu cristal. Por isso,
precisa-se considerar um grande número de íons para se ter a energia do retículo
cristalino. Introduzindo a constante de Avogadro (N) na equação (8), obtém-se o valor
para um mol do sólido iônico. A equação (8) com as constantes de Madelung e de
Avogadro torna-se:
⎟⎠⎞
⎜⎝⎛ −=
−+
nreZZANU 11....4..
00
2
0 επ (9)
onde r0 é a distância de ligação entre o cátion e o ânion no retículo cristalino. A Figura 25
mostra o resultado da equação (9) de maneira gráfica. Através da equação (9), tendo o
valor da distância da ligação ou dos raios iônicos, pode-se calcular o valor da energia do
retículo cristalino para um sólido iônico.
Por exemplo, a energia do retículo cristalino do cloreto de sódio pode ser calculada
facilmente apenas sabendo os raios iônicos típicos dos íons sódio (114 pm) e cloreto (167
pm). A distância entre os íons, r0, será a soma entre os raios iônicos:
r0 = 114 pm + 167 pm = 281 pm (10)
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39
Figura 25. Perfil energético de uma ligação iônica em função da distância entre os íons. Há um
mínimo de energia, que corresponde à energia do retículo cristalino, quando se atinge o comprimento de ligação.
O fator de Madelung para a estrutura cloreto de sódio pode ser encontrado na
Tabela 10. Para usarmos o fator de repulsão, é preciso conhecer a configuração
eletrônica do íon e consultar a Tabela 9. O íon sódio, Na+, tem a seguinte configuração
eletrônica:
11Na+ = 1s2 2s2 2p6
que é a mesma configuração eletrônica do Ne. Portanto, o fator de repulsão para o sódio
é igual a sete. O cloreto, Cl–, tem a seguinte configuração eletrônica:
17Cl– = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p6
que é a configuração eletrônica do Ar. Segundo a Tabela 9, o fator de repulsão neste
caso é igual a nove. Então, o fator de repulsão (n) para o cloreto de sódio será a média
daqueles encontrados para seus íons:
82
97=
+=n (11)
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40
Reunindo todos os dados e constantes para o NaCl:
A = 174756 n = 8 r0 = 2,81.10-10 m Z+ = +1 Z– = –1 N = 6,02.1023 /mol e = 1,602.10–19 C ε0 = 8,85.10–12 C2/J.m e substituindo os valores na equação (9),
U0 = – 754 kJ/mol
O valor experimental para a energia do retículo cristalino do NaCl é – 770 kJ/mol.
Isto significa que se pode estimar a energia do retículo cristalino com erro muito pequeno
através da equação (9). A energia do retículo cristalino pode ser utilizada como uma medida da
estabilidade do agregado iônico. Quanto mais energia for liberada durante a formação do
retículo cristalino, mais forte é a ligação entre os íons. Isto implica que, para separá-los,
será preciso mais energia. Considere dois sólidos iônicos, MX e MZ. Imagine que o sólido
MX tenha U0 = – 500 kJ/mol enquanto o MZ libera 800 kJ/mol quando se forma. Se a
energia de hidratação dos íons X– e Z– é semelhante, pode-se supor que o sólido MZ
tenha uma solubilidade inferior ao MX, uma vez que para separar seus íons é necessária
uma quantidade muito maior de energia. Da mesma forma, MZ terá um ponto de fusão
maior que MX. Portanto, conhecendo-se a energia do retículo cristalino é possível estimar
o comportamento de sólidos iônicos para diferentes propriedades.
5.4 – Raio Iônico Quando um átomo perde ou ganha elétrons, seu tamanho varia em relação ao do
átomo neutro. Então, o raio atômico não serve como parâmetro para o tamanho dos íons.
Ao perder um ou mais elétrons, o tamanho do átomo diminui porque uma camada antes
ocupada pode ficar sem elétrons (casos dos grupo 1 e 2) e também por conta da maior
atração exercida pelo excesso de prótons em relação ao número de elétrons. Isto leva a
uma outra consequência: quanto maior for a carga do cátion, menor será seu raio.
No caso contrário, quando são formados ânions, o raio aumenta. A atração do
núcleo para cada elétron diminui, uma vez que existem mais elétrons para “dividir” a força
de atração do núcleo. Outro motivo é a repulsão entre os elétrons. Quanto maior for o
número de elétrons em excesso, maior será a repulsão. Portanto, quanto maior for a
carga do ânion, maior será o raio iônico.
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41
5.5 – Regras de Fajans: Poder Polarizante e Polarizabilidade O poder polarizante representa o quanto um íon pode distorcer (ou polarizar) a
nuvem eletrônica de um outro íon em sua direção. Ou seja, o quanto um núcleo de um
átomo atrai os elétrons de outro átomo. Tanto o cátion como o ânion polarizam um ao
outro. Normalmente costuma-se tratar de poder polarizante apenas para cátions, uma vez
que o efeito do poder polarizante dos ânions em cátions são muito mais fracos. O poder
polarizante depende de dois parâmetros principais: o raio iônico e a carga do cátion. Para
avaliar corretamente o efeito de cada parâmetro no poder polarizante, variaremos um de
cada vez (embora este seja um exercício puramente teórico).
Primeiramente, considere dois cátions de mesma carga, MN+, mas de raios iônicos
diferentes. Segundo a equação (7) a força (ou a energia de atração) é inversamente
proporcional à distância. Para o cátion de menor raio, a força do núcleo será mais atuante
na periferia do íon. Portanto, quanto menor for o raio iônico do cátion, maior será seu
poder polarizante.
Da mesma forma, considere dois cátions de cargas diferentes, mas com o mesmo
raio iônico. A variável da equação (7) agora é Z+. A força de atração aumentará sempre
que a carga aumentar. Portanto, o cátion de maior carga atrairá os elétrons do ânion de
forma mais efetiva.
Mas, é preciso que se lembre, carga e raio iônico estão intimamente ligados.
Portanto, quando a carga do cátion aumenta, diminui-se o seu raio. Assim, para melhor
descrever o poder polarizante, usa-se a razão carga-raio dos cátions. Cátions de elevada
razão carga-raio, são mais polarizantes que cátions de razão carga-raio pequena.
A polarizabilidade pode ser descrita como o inverso do poder polarizante. É quanto
um íon se permite polarizar na presença de outro íon. Novamente, esta medida é
dependente da carga e do raio do ânion. Ânions grandes, dos últimos períodos da Tabela
Periódica, são muito polarizáveis. Da mesma forma, ânions de carga elevada (em
módulo) tendem a ser mais polarizáveis, uma vez que seus elétrons não estão sofrendo
grande atração do próprio núcleo.
O que acontece quando temos um cátion com grande poder polarizante e um
ânion extremamente polarizável? Quando o ânion se deixa polarizar, seus elétrons vão à
direção ao cátion, dando um caráter covalente a esta ligação. Então, o poder polarizante e
a polarizabilidade são importantes parâmetros na análise de da ligação iônica. Sabe-se
que existe um grau de covalência nas ligações iônicas e isto é governado por estes dois
CEFET Química Química Inorgânica
42
parâmetros. Fajans resumiu estas idéias em quatro regras, que são conhecidas como
Regras de Fajans:
1) Um cátion pequeno favorece a covalência.
Em íons pequenos a carga positiva se concentra em um pequeno volume. Com
isto o íon se torna altamente polarizante e, por isso, tenderá a distorcer mais o ânion.
2) Um ânion grande favorece a covalência.
Íons grandes são altamente polarizáveis, já que os elétrons de periferia estão
afastados da influência próprio núcleo, ficando suscetíveis a influência de núcleos
vizinhos, como os do cátion.
3) Cargas elevadas(em módulo), em qualquer um dos íons, favorece a covalência.
Como foi visto, a carga elevada aumenta o poder polarizante do cátion e também a
polarizabilidade do ânion.
4) O poder polarizante de cátions sem a configuração de gases nobres favorece a
covalência.
Este é um aspecto interessante. Os cátions sem a configuração de gases nobres,
são, normalmente, elementos dos blocos d ou f da Tabela Periódica. Neste caso, a
péssima blindagem dos orbitais do tipo d e/ou f causa um grande aumento na carga
nuclear efetiva destes cátions. A consequência é que o poder polarizante é ainda maior
que de um cátion com configuração de gás nobre.
5.6 – Hidrólise de Cátions
Uma vez que grande parte da química é feita em meio aquoso, temos que
conhecer as propriedades dos compostos neste meio. O estudo da dissociação em meio
aquoso trouxe vários conceitos novos e muito importantes para o dia a dia da química. O
mais importante destes conceitos é, sem dúvida, o de ácidos e bases. O Sueco Svante
Arrhenius definiu um ácido como composto que, em água, liberava íons H+, enquanto uma
base liberaria íons OH–. Mais de 20 anos depois, o dinamarquês Johannes N. Brønsted e
o inglês Thomas M. Lowry, separadamente, formularam novas idéias sobre ácidos e
bases. O conceito de ácido é de uma substância capaz de doar um próton (comumente
tratado como o íon H+) enquanto a base é a substância que irá acomodar o próton. Como
as reações ácido-base de Brønsted-Lowry são reações em equilíbrio, pode-se determinar
as constantes de destes equilíbrios ácido-base e então montar uma escala, chamada de
pH, para classificar as substâncias como ácidas, neutras ou básicas. No meio aquoso, um
ácido segundo Brønsted e Lowry se comporta da seguinte forma:
CEFET Química Química Inorgânica
43
HA + H2O H3O+ + A– (12) enquanto uma base apresentaria a seguinte reação:
B + H2O HB+ + OH– (13) Considere o ânion A–, a base conjugada do ácido HA na reação (12). Ao
dissolvermos um sal MA em água, o ânion A– sofrerá um processo que chamamos de
hidrólise salina, representado na equação abaixo (considerando que M+ é um íon
espectador).
A– + H2O HA + OH– (14) Da mesma forma, o ácido conjugado HB+ sofrerá uma hidrólise se um sal HBX for
dissolvido em água (considerando X– um íon espectador):
HB+ + H2O H3O+ + B (15) Na reação (14) a hidrólise foi do tipo básica enquanto na reação (15) a hidrólise foi
ácida. Se, por exemplo, o sal fosse formado pelo cátion HB+ e o ânion A– teríamos os dois
tipos de hidrólise acontecendo. Mas, nem todos os cátions e ânions apresentam reações
de hidrólise. Por exemplo, as bases conjugadas de ácidos fortes não se comportam como
o ânion A–. O mesmo se aplica para cátions de bases fortes: não apresentam hidrólise. No
entanto, o processo de hidrólise para os cátions é mais sutil que para os ânions. A
questão vai além de ser derivado de uma base forte ou fraca. Por exemplo, como se
explica uma solução de cloreto férrico ou de alumínio ter pH ácido?
Quando um sólido iônico é dissolvido em um solvente, há a quebra da ligação
entre cátion e ânion, mas também há a formação de ligações entre soluto e solvente. Isto
é, os cátions e os ânions formam ligações (em grande parte intermoleculares) com o as
moléculas solvente, o que chamamos de solvatação. Quando o solvente é a água,
chamamos este processo de hidratação. A água é um solvente sabidamente polar, então,
sua parte positiva, os hidrogênios, se aproxima dos ânions enquanto a parte negativa, o
oxigênio, interage com os cátions. Para os cátions há a formação de compostos
chamados de complexos aquo-íons, normalmente na proporção de um cátion para seis
moléculas de água como mostra a Figura 26. É a partir desses aquo-íons que o fenômeno
de hidrólise acontece.
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44
MH2O
H2O OH2
OH2
OH2
OH2
n+
[M(H2O)6]n+
Figura 26. Um aquo-íon de um cátion de carga n, com número de coordenação igual a seis.
Dependendo das características do cátion Mn+, a interação com o oxigênio da água
pode ser intensa. Tão intensa a ponto de o oxigênio preferir uma ligação com o cátion do
que com um dos hidrogênios. O mecanismo do processo é muito simples. Quanto mais o
cátion atrair o par de elétrons, isto é, quanto maior for o poder polarizante do cátion, mais
intensa será a interação. Conforme a interação cátion-oxigênio se torna forte, a ligação
oxigênio-hidrogênio enfraquece, até que a ligação se rompe, liberando um íon H+ para o
meio. Isto faz do aquo-íon [M(H2O)6]n+ um ácido de Brønsted. Para uma solução de
cloreto férrico, existirão os seguintes equilíbrios em solução:
[Fe(H2O)6]3+
(aq) + H2O(l) [Fe(H2O)5(OH)]2+(aq) + H3O+
(aq)
[Fe(H2O)5(OH)]2+
(aq) + H2O(l) [Fe(H2O)4(OH)2]+(aq) + H3O+(aq)
[Fe(H2O)4(OH)2]+(aq) + H2O(l) [Fe(H2O)3(OH)3](s) + H3O+
(aq)
O hidróxido de férrico, [Fe(H2O)3(OH)3], é um precipitado cor ferrugem que,
normalmente, está presente nas soluções de ferro (III). Para evitar sua formação,
adiciona-se um pouco de ácido à solução, deslocando as reações de equilíbrio no sentido
inverso. De maneira contrária, a adição de base favorece a formação do hidróxido.
Dependendo do cátion, os hidróxidos podem apresentar comportamento anfótero.
Um composto é dito anfótero quando reage tanto com ácidos como com bases. O
hidróxido de alumínio, insolúvel, quando em presença de ácidos ou bases dissolve
segundo as reações abaixo:
Al(OH)3 + 3H3O+ Al3+ + 6H2O
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45
Al(OH)3 + OH– [Al(OH)4]–
um processo semelhante ao do hidróxido de zinco:
Zn(OH)2 + 2H3O+ Zn2+ + 4H2O
Zn(OH)2 + OH– [Zn(OH)3]–
O mesmo tipo de reação é observado para óxidos e/ou hidróxidos de berílio, gálio,
ferro (III) e outros.
6. Ligação Covalente Como foi discutido no final do item 4, a ligação entre sódio e cloro no cloreto de
sódio tem características diferentes de uma ligação num óxido de nitrogênio, NOx, uma
vez que nem o oxigênio nem o nitrogênio têm tendência a doar elétrons um ao outro.
Portanto, para este tipo de ligações, não é adequado tratar os átomos como íons e o
modelo eletrostático, tão útil para descrever as propriedades de compostos iônicos, não
pode ser utilizado. Para descrever as ligações covalentes – aquelas onde há o
compartilhamento de elétrons numa ligação – existem diversos modelos. Desde o mais
simples, proposto por Lewis até a moderna Teoria dos Orbitais Moleculares.
6.1 – Estruturas de Lewis
Lewis fez a proposta mais simples para descrever as ligações covalentes. Os
compostos dividem elétrons até que ambos respeitem a regra do octeto. Para isto,
poderiam fazer ligações simples (com dois elétrons), duplas (duas de dois elétrons) ou até
triplas (três de dois elétrons). Ele desenvolveu uma série de regras para construir as
“Estruturas de Lewis”, que nada mais são que as representações das ligações nas
moléculas. Para exemplificar estas regras, usaremos o CH4 e o NO2–.
1) Identifique o átomo central
Normalmente, o átomo central é aquele que fará o maior número de ligações
(maior valência) ou o átomo que está em menor quantidade na molécula ou o menos
eletronegativo.
Na molécula de CH4, estes dois critérios convergem para o átomo de carbono, que
precisa fazer quatro ligações para completar o octeto enquanto o hidrogênio só precisa de
uma ligação. No ânion NO2– os três critérios também convergem para o nitrogênio, que
precisa de três ligações ao invés de duas do oxigênio.
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46
2) Ligar os outros átomos ao átomo central até seu limite máximo (valência)
Uma vez que o átomo central esteja identificado, ligue-o aos outros átomos,
conforme mostra a Figura 27. Cuidado para não ultrapassar a valência do átomo central
(como colocar cinco ligações para o carbono).
3) Se a valência do átomo central esgotar e ainda restarem átomos, ligue-os aos átomos
ligados ao átomo central.
Nas moléculas exemplo, não existe este caso. Isto é necessário nas moléculas de
HClO4, H2SO4 ou H3PO4.
H C
H
H
H
O N O
Figura 27. Segunda regra para a construção da estrutura de Lewis.
4) Contagem do número de elétrons da molécula
O próximo passo é saber quantos elétrons existem na molécula. Para isso,
soma-se todos os elétrons da camada de valência de cada átomo. Para cada carga
positiva que a molécula tiver, um elétron é retirado do total. Em contrapartida, para cada
carga negativa, um elétron é somado ao total.
O CH4 é formado de um carbono (6C = 1s2 2s2 2p2) que possui quatro elétrons na
camada de valência e de quatro hidrogênios (1H = 1s1) cada um com um elétron na
camada de valência. Como é uma molécula neutra, o número total de elétrons será:
1 Carbono + 4 Hidrogênios = CH4 4 elétrons + 4 x 1 elétron = 8 elétrons
O NO2
– é formado por um nitrogênio (7N = 1s2 2s2 2p3), que tem cinco elétrons na
camada de valência e de dois oxigênios (8O = 1s2 2s2 2p4) cada um com seis elétrons na
última camada. Fora isso, a molécula tem uma carga negativa. O número total de elétrons
é, então:
1 Nitrogênio + 2 Oxigênios + 1 carga negativa = NO2–
5 elétrons + 2 x 6 elétrons + 1 elétron = 18 elétrons
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47
5) Complete os octetos e conte os elétrons da molécula
Uma vez com os átomos ligados ao átomo central, devem-se completar os octetos.
Cada ligação conta como dois elétrons. Então, um átomo com três ligações, precisará de
mais dois elétrons. Um átomo que só faz uma ligação precisará de mais seis elétrons
(com exceção dos átomos que só precisam de dois elétrons, como o hidrogênio). Uma
vez completo todos os octetos, deve-se contar o número de elétrons na molécula. Se o
número for igual ao encontrado no passo 4, a estrutura já está definida. Se o número for
diferente, é preciso fazer ligações múltiplas entre os átomos.
Na Figura 27, para o CH4, vemos que existem quatro ligações, num total de oito
elétrons para o átomo de carbono. Cada átomo de hidrogênio está participando de uma
ligação, de forma que todos têm dois elétrons. Então, estão todos respeitando a regra do
octeto. Logo, não é preciso adicionar nenhum elétron na estrutura, tampouco realizar
ligações múltiplas, já que o número e elétrons do passo 4 coincide com o da estrutura (4
ligações = 8 elétrons).
Já para o ânion NO2–, é preciso completar o octeto. Na Figura 27 vemos que o
nitrogênio faz duas ligações, num total de quatro elétrons. Portanto, é preciso se adicionar
mais quatro elétrons ao nitrogênio para que este fique com o octeto completo (Figura
28a). Os oxigênios precisam de mais seis elétrons cada um, já que estão com apenas
uma ligação simples (Figura 28b).
O N O(a)
O N O
(b)
Figura 28. (a) Os quatro elétrons para completar o octeto do nitrogênio e (b) os seis elétrons para
completar o octeto dos oxigênios. No entanto, existem vinte elétrons na estrutura da Figura 28b e no passo quatro
calculou-se que o ânion NO2– deveria ter apenas dezoito elétrons. Para reduzir o número
de elétrons em uma estrutura de Lewis, faz-se ligações duplas ou triplas. Fazendo uma
ligação dupla entre o átomo de nitrogênio e de oxigênio, chega-se a uma estrutura com
apenas dezoito elétrons (Figura 29).
O N O
Figura 29. Estrutura de Lewis para o NO2–.
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48
6) Determine as cargas formais
Com a estrutura montada, devem-se determinar as cargas formais. É preciso ter
em mente que as cargas formais não são os números de oxidação dos átomos. Para
determinar as cargas formais precisa-se da configuração eletrônica de um dado átomo e
do número de elétrons deste mesmo átomo na estrutura de Lewis. O número de elétrons
na estrutura de Lewis é feito da seguinte forma (procedimento apenas para determinar a
carga formal!): contam-se os elétrons não-ligantes normalmente enquanto que cada
ligação conta como um elétron para cada átomo.
A carga formal será a diferença entre o número de elétrons que o átomo tem em
sua camada de valência determinada por sua configuração eletrônica e o número de
elétrons presente na estrutura de Lewis. O somatório das cargas formais de todos os
átomos da estrutura de Lewis deve ser igual à carga apresentada pela molécula.
No CH4 o carbono faz quatro ligações (Figura 27). Portanto, o número de elétrons
na estrutura de Lewis, para o carbono, será de quatro elétrons. Como este é o número de
elétrons de sua camada de valência, a carga forma para o átomo de carbono nesta
molécula será igual a zero. Da mesma forma, os hidrogênios fazem uma só ligação.
Então, cada um possui um elétron na estrutura de Lewis. Como este também é o número
de elétrons em sua camada de valência, as cargas formais para os átomos de hidrogênio
têm valor igual a zero.
Avançando para o NO2–, o nitrogênio faz três ligações e tem dois elétrons não
ligantes (Figura 29), um total de cinco elétrons. Este também é o número de elétrons em
sua camada de valência, por isso, o nitrogênio tem carga forma igual a zero. Como os
oxigênios são diferentes na estrutura da Figura 29, precisam ser tratados de forma
diferente. Começando pelo oxigênio da dupla (duas ligações e quatro elétrons não
ligantes), tem-se um total de seis elétrons. O mesmo número de elétrons em sua camada
de valência – então a carga formal para este oxigênio é zero. O segundo oxigênio faz uma
ligação e tem mais seis elétrons não ligantes, um total de sete elétrons na estrutura de
Lewis. Como o oxigênio só possui seis na camada de valência, a carga formal para este
oxigênio é de –1 (carga formal: 6 – 7 = –1).
O somatório das cargas formais dos átomos que forma NO2– coincide com a carga
total do ânion (c.f. = 0 + 0 + (–1) = –1). Isto indica que a estrutura de Lewis está coerente.
Como as estruturas de Lewis para as moléculas derivam de um modelo muito
simples, elas têm diversos problemas. O primeiro deles é não prever a geometria espacial
da molécula, parâmetro fundamental em muitas propriedades. Outro fator é sua limitação
CEFET Química Química Inorgânica
49
a moléculas que respeitem a regra do octeto. Apenas com as idéias de Lewis não é
possível explicar porque alguns átomos conseguem ir além do octeto. Um outro problema
pode ser visto na estrutura do NO2–. Na estrutura da Figura 29, um dos oxigênios faz uma
ligação dupla e outro faz uma ligação simples. Como os dois oxigênios são iguais, as
ligações poderiam estar invertidas. Qual seria a estrutura certa? Nenhuma? As duas?
Cada uma estaria certa em 50%? A solução para alguns destes problemas veio com a
Teoria da Ligação de Valência.
6.2 – Teoria da Ligação de Valência
A Teoria da Ligação de Valência (TLV) cresceu diretamente das idéias de Lewis
sobre o emparelhamento de elétrons de dois diferentes átomos. Em 1927, W. Heitler e F.
London propuseram um modelo baseado na recém formulada mecânica quântica para
tratar a molécula de hidrogênio. Este tratamento quântico ficou conhecido como método
da ligação de valência e foi desenvolvido nos anos seguintes, principalmente por Linus
Pauling e John C. Slater. Não abordaremos aqui os aspectos matemáticos da TLV,
apenas suas consequências e os avanços que trouxe para o entendimento da ligação
química.
A idéia central da TLV vem do entrosamento dos orbitais atômicos de cada átomo
para formar ligações químicas. Se os orbitais se encontram de maneira frontal (Figura
30a), tem-se uma ligação do tipo sigma (σ). Se os orbitais estão paralelos (Figura 30b),
forma-se uma ligação do tipo π.
Figura 30. (a) Ligação σ entre um orbital do tipo s e um do tipo p e (b) Ligação π entre dois orbitais
do tipo p.
Usaremos a molécula do CH4 para compreender estas idéias. As configurações
eletrônicas dos átomos desta molécula são:
6C = 1s2 2s2 2p2 1H = 1s1 considerando apenas as camadas de valência de ambos os átomos, tem-se:
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50
2s 2p
Para o Carbono:
4 orbitais 1s
Para os 4 Hidrogênios:
Sabe-se que o carbono fará uma ligação com cada hidrogênio (Figura 27) e como
é preciso um elétron de cada um dos átomos para formar estas ligações, os elétrons
emparelhados no orbital 2s do carbono precisarão ser desemparelhados. Além disso, um
desses elétrons precisará ser excitado até o orbital p vazio. Isto é chamado de promoção
do elétron. Por conta da promoção do elétron, o carbono estará com quatro orbitais com
um elétron cada, podendo então ligar-se a quatro outros átomos. Então, as ligações do
CH4 se formam da seguinte maneira:
2s 2p
1s 1s 1s 1s
Carbono
Hidrogênios
Segundo a TLV, tem-se uma ligação entre dois orbitais do tipo s e três ligações
entre orbitais s do hidrogênio e os do tipo p do carbono (Figura 31). Uma conclusão disto
é que uma das ligações do metano será diferente das demais, já que os orbitais
envolvidos são diferentes. No entanto, resultados experimentais dizem o contrário: todas
as ligações entre carbono e hidrogênio na molécula de CH4 são iguais em comprimento e
em termos energéticos. Para justificar observações como esta, foi introduzido um novo
conceito dentro da TLV: o de hibridação dos orbitais atômicos.
Figura 31. Tipos diferentes de ligações: (a) entre dois orbitais s e (b) entre um orbital s e um p.
CEFET Química Química Inorgânica
51
6.2.1 – Hibridação dos Orbitais Atômicos
Voltemos à etapa de promoção de um dos elétrons do orbital 2s para o orbital
vazio do subnível 2p. Existe um gasto de energia para promover o elétron para um orbital
de maior energia, que será compensado depois com a formação da ligação. Este gasto de
energia seria inexistente se os orbitais dos subníveis 2s e 2p tivessem a mesma energia.
No entanto, só orbitais do mesmo tipo podem ser degenerados.
Aqui entra uma particularidade dos orbitais. Como são as representações
espaciais das funções de onda, estas podem ser combinadas de diversas maneiras, de
forma que a energia total da molécula seja minimizada. A combinação das funções de
onda dá origem a outras funções, que geram outros orbitais, que serão as combinações
dos orbitais iniciais. Este é o fundamento da hibridação dos orbitais atômicos. Eles se
combinam de forma a minimizar a energia da molécula e, por fim, justificar as
observações experimentais.
6.2.1.1 – Hibridação do tipo sp3 Na hibridação do tipo sp3 um orbital do tipo s irá se combinar com três orbitais do
tipo p que formarão quatro orbitais híbridos do tipo sp3. É este o tipo de hibridação com os
orbitais do carbono no metano, para citar um exemplo. No carbono do metano,
representa-se a hibridação da seguinte maneira:
2s 2p
4 orbitais híbridos do tipo sp3
São estes quatro orbitais híbridos do tipo sp3 do carbono que irão se ligar aos 4
hidrogênios. Com o modelo da hibridação, todos os orbitais do carbono envolvidos nas
ligações com os hidrogênios são iguais, explicando porque as quatro ligações no metano
são idênticas.
A hibridação dos orbitais também define a geometria da molécula. Como os
orbitais se combinam buscando minimizar a energia do sistema, eles se distribuem no
CEFET Química Química Inorgânica
52
espaço tentando minimizar as repulsões entre as ligações. Isto é, eles se afastarão o
máximo possível um do outro. Se houvessem duas ligações, o ângulo entre elas seria de
180°. Com quatro ligações (quatro orbitais do tipo sp3) a maior distância possível é
encontrada quando o ângulo entre as ligações é de 109,47°. Este arranjo espacial é
chamado de tetraedro (Figura 32). O tetraedro tem quatro faces triangulares e quatro
vértices. O átomo central, o carbono no CH4, se posiciona no centro do tetraedro
enquanto os outros átomos, os hidrogênios neste exemplo, ocupam os vértices do
tetraedro (Figura 33).
Figura 32. O tetraedro.
HH
H
H
C
H
C
H
H
H
109,47o
Figura 33. Algumas maneiras de visualizar a geometria tetraédrica do CH4.
6.2.1.2 – Ligações π: Hibridação do tipo sp2 e sp
As ligações π têm uma particularidade: os orbitais que formarão a ligação precisam
estar paralelos. Por esta razão, os orbitais que participarão de uma ligação do tipo π não
podem ser híbridos. Tomemos as móleculas de eteno (C2H4) e o dióxido de carbono (CO2)
como exemplos. Suas estruturas de Lewis são mostradas na Figura 34. Cada carbono na
molécula de eteno tem uma ligação do tipo π e três do tipo σ. No dióxido de carbono são
duas ligações π para um só carbono. Então, cada carbono no eteno terá que “reservar”
um dos orbitais p para fazer a ligação π. Da mesma forma, o carbono do CO2 terá de
“reservar” dois de seus orbitais do tipo p.
CEFET Química Química Inorgânica
53
C C
H
H
H
H
O C O
Figura 34. As estruturas de Lewis do eteno e do dióxido de carbono.
Então, a hibridação dos carbonos no eteno seria do tipo sp2, conforme o esquema abaixo:
2s 2p 2s 2p Ligação π
1 orbital s + 2 orbitais p = 3 orbitais híbridos sp2
São os três orbitais híbridos do tipo sp2 que farão as três ligações σ de cada
carbono na molécula de eteno. Estas ligações formam um plano e têm um ângulo de 120°
entre elas. Este arranjo é chamado de trigonal plano (ou trigonal planar) e a ligação π está
perpendicular ao plano das ligações σ (Figura 35).
C
C
HH
HH
120o
Orbitais p não hibridizados queformarão a ligação π
Figura 35. A geometria trigonal plana e a posição dos orbitais p não hibridizados.
Já para a molécula de dióxido de carbono, a hibridação será do tipo sp, uma vez
que apenas um dos orbitais p estará disponível para combinar-se com o orbital s:
CEFET Química Química Inorgânica
54
2s 2p 2s 2pPara duasligações π1 orbital s + 1 orbital p
= 2 orbitais híbridos sp
As duas ligações σ, formadas pelos orbitais híbridos sp, estarão separadas por um
ângulo de 180°, dando origem a uma geometria angular (Figura 36). As ligações π são
perpendiculares entre si (como os orbitais p não hibridizados). Na Figura 36, uma das
ligações π é formada ao longo do eixo z (orbitais p azuis) enquanto a outra é formada no
eixo x (orbitais p vermelhos).
O C O
180o
CO O
zzz
y
xx x
Figura 36. A geometria linear com os orbitais híbridos sp e as ligações π.
As hibridações do tipo sp3, sp2 e sp descrevem de maneira correta os compostos
onde o átomo central é um elemento que segue a regra do octeto. Moléculas que têm
como átomo central elementos do segundo período da Tabela Periódica apresentarão
uma destas hibridações citadas acima. No entanto, a formação de orbitais híbridos com
apenas orbitais do tipo s e p não conseguem explicar a existência de alguns compostos,
como o PCl5 ou o SF6.
6.2.1.3 – Expansão do Octeto
Tanto o PCl5 como o SF6 são exemplos de compostos onde o átomo central
ultrapassa o número de ligações esperado pela regra do octeto. Para formar um maior
número de ligações, os átomos centrais precisam de mais orbitais disponíveis que os do
CEFET Química Química Inorgânica
55
tipo s e p. E a partir do terceiro período da Tabela Periódica estes novos orbitais, do tipo
d, estão disponíveis. Para melhor entender este fenômeno, deve-se olhar em particular
cada caso.
O fósforo é o átomo central da molécula de PCl5. Situado no grupo 15, o mesmo
do nitrogênio, no bloco p da Tabela Periódica, o fósforo precisaria de três ligações para
completar o octeto. E isso é observado em alguns de seus compostos como nas
moléculas de PH3 ou PCl3. A configuração eletrônica do fósforo é:
15P = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p3
É a partir da terceira camada que o subnível d começa, estando disponível para
hibridizar com os orbitais do subnível 3s e 3p do fósforo. Aqui está a razão central da
expansão do octeto. Átomos que tenham orbitais d vazios em suas camadas de valência
podem usá-los para fazer um número maior de ligações. Como estes orbitais d vazios têm
energias próximas a dos outros orbitais preenchidos da camada de valência, a hibridação
com orbitais de um subnível vazio não tem um custo energético muito grande. No final, a
energia liberada com o maior número de ligações compensará o gasto na hibridação.
É por isso que os elementos do segundo período não expandem o octeto, pois em
suas camadas de valência, não existem subníveis com orbitais vazios de energia próxima
da dos ocupados.
Então, o fósforo apresentará o seguinte esquema para a hibridação:
CEFET Química Química Inorgânica
56
3s3p
3d
E
E
1 orbital s + 3 orbitais p + 1 orbital d
5 orbitais híbridos sp3d
4 orbitais do tipo d não hibridizados
Com cinco orbitais híbridos do tipo sp3d, o fósforo pode fazer as cinco ligações
observadas no composto PCl5. Na hibridação do tipo sp3d tem-se um arranjo espacial
bipiramidal triangular, pois a figura corresponde à duas pirâmides que dividem a mesma
base triangular (Figura 37). As ligações da base das pirâmides (ligações equatoriais)
estão separadas por ângulos de 120° entre si e por um ângulo de 90° com as ligações
axiais (Figura 38).
Cl
ClClP
Cl
ClCl
P
Cl
ClCl
Cl
Figura 37. A geometria bipiramidal triangular em diversas representações.
CEFET Química Química Inorgânica
57
Cl
ClCl
P
Cl
Cl
90o
120o
Figura 38. Ângulos da geometria bipiramidal triangular.
O caso do enxofre no SF6 será semelhante ao observado para o fósforo no PCl5. A
diferença está no número de ligações e no número de elétrons do enxofre em relação ao
fósforo. A configuração eletrônica do enxofre é
16S = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p4
Como precisa formar uma ligação a mais do que o fósforo no PCl5, o enxofre usará
um orbital d a mais, formando seis orbitais híbridos, do tipo sp3d2, segundo o esquema:
CEFET Química Química Inorgânica
58
3s3p
3d
E
E
1 orbital s + 3 orbitais p + 2orbitais d
6 orbitais híbridos sp3d2
3 orbitais do tipo d não hibridizados
A distribuição das ligações no espaço segue um arranjo octaédrico (Figura 39).
Um octaedro pode ser descrito como sendo duas pirâmides unidas por uma base
quadrada. Todas as ligações fazem ângulos de 90° entre elas.
FF
F
F
F
F
S FF
FF S
F
F
S
F
F F
F
F
F
Figura 39. Diferentes maneiras de se representar um octaedro.
Existem outros tipos de hibridação de orbitais, mas ou não são muito comuns ou
são pequenas variações dos tipos que foram apresentados, como a hibridação sd3 que
apresenta as mesmas características da sp3, mas usa orbitais d ao invés dos orbitais p.
CEFET Química Química Inorgânica
59
6.3 – Teoria da Repulsão dos Pares de Elétrons da Camada de Valência No início dos anos 40, N.V. Sidgwick e H.M. Powell fizeram um levantamento das
estruturas das moléculas até então conhecidas e perceberam que era possível prever
suas formas aproximadas a partir do número de pares de elétrons na camada de valência
do átomo central da molécula. Anos mais tarde, em 1957, R.J. Gillespie e R.S. Nyholm
aperfeiçoaram as idéias de Sidgwick e Powell e desenvolveram o que se chamou de
Teoria da Repulsão dos Pares Eletrônicos da Camada de Valência (ou teoria VSEPR,
sigla do inglês Valence Shell Electron Pair Repulsion).
A teoria da VSEPR é extremamente útil para se determinar a geometria das
moléculas partindo apenas da estrutura de Lewis. Além disso, é mais simples usar o
modelo VSEPR que a teoria da hibridação, sendo que ambos darão, obrigatoriamente, o
mesmo resultado para as estruturas moleculares. De certa maneira, é mais fácil usar a
teoria VSEPR para descobrir a hibridação a partir da geometria do que o contrário.
A teoria da VSEPR é bem simples e sustenta que o arranjo das moléculas no
espaço é determinado pelas repulsões entre os pares de elétrons presentes no nível de
valência, uma vez que qualquer par de elétrons, ligante ou não ligante, ocupa espaço e
repelem um ao outro.
Pares de elétrons isolados repelem mais que os que participam de uma ligação,
uma vez que só são atraídos por um núcleo, enquanto que os pares ligantes são atraídos
por dois núcleos. Por conta dessa maior repulsão, eles “ocupam mais espaço” que os
demais e, com isso, causam distorções no arranjo espacial da molécula.
As ligações duplas apresentam maior repulsão que as simples, pois a densidade
eletrônica entre os dois átomos envolvidos é maior quando há ligações multiplas. Pelo
mesmo motivo, a ligação tripla apresenta maior repulsão que a dupla. Embora sejam
consideradas em termos repulsivos, as ligações π não são consideradas como pares de
elétrons ligantes para a definição da geometria molecular. Isto é, se um átomo central tem
três ligações σ e uma do tipo π, para o modelo da VSEPR só devem-se contar apenas
três pares de elétrons, uma vez que o par que forma a ligação π estará restrito ao espaço
definido pela ligação σ. A repulsão aumenta conforme a seqüência: ligações simples <
ligações duplas < ligações triplas < pares isolados. O par de elétrons de maior repulsão
afasta os outros pares de elétrons de si.
Também é preciso definir a diferença entre o arranjo espacial de uma molécula e
sua geometria. O arranjo espacial leva em conta qualquer par de elétrons, ligante ou
isolado. Está diretamente ligado à hibridação do átomo central. Por outro lado, a
CEFET Química Química Inorgânica
60
geometria só leva em consideração as posições nucleares, isto é, só os átomos e
ligações são considerados. Os pares de elétrons que não participam de ligações são
ignorados na geometria molecular. No entanto, ambos os conceitos estão relacionados. A
geometria da molécula é dependente do arranjo espacial (e da hibridação).
A Tabela 11 mostra a relação entre o número de pares de elétrons, arranjos
espaciais, hibridação e a geometria das moléculas. A Figura 40 mostra alguns os
exemplos citados na Tabela 11.
Tabela 11. Relação entre número de pares de elétrons e parâmetros da geometria molecular. Legenda: M = átomo central, L = pares de elétrons de ligações σ e E = pares de elétrons não ligantes. Exemplos podem ser vistos na Figura 40. N° de pares de elétrons
Tipo de molécula
Arranjo espacial Hibridação Geometria Exemplo
2 ML2 Linear sp Linear BeH2
3 ML3 Trigonal Planar
sp2 Trigonal Planar BCl3
3 ML2E Trigonal Planar
sp2 Angular SO2
4 ML4 Tetraédrico sp3 Tetraédrica CH4
4 ML3E Tetraédrico sp3 Piramidal NH3
4 ML2E2 Tetraédrico sp3 Angular H2O
5 ML5 Bipiramidal Trigonal
sp3d Bipiramidal Trigonal
PCl5
5 ML4E Bipiramidal Trigonal
sp3d Tetraédro Distorcido
TeCl4
5 ML3E2 Bipiramidal Trigonal
sp3d Forma de “T” ClF3
5 ML2E3 Bipiramidal Trigonal
sp3d Linear I3–
6 ML6 Octaédrico sp3d2 Octaédrica SF6
6 ML5E Octaédrico sp3d2 Piramidal de Base Quadrada
BrF5
6 ML4E2 Octaédrico sp3d2 Quadrado Planar
XeF4
Uma forma simples de compreender como funciona a teoria VSEPR é analisando
o caso do CH4, NH3 e H2O. Na Figura 41 estão representadas as estruturas de Lewis para
estas moléculas. Em todas as moléculas citadas o átomo central tem quatro pares de
elétrons: no CH4 são quatro pares ligantes; no NH3 um não ligante e três ligantes e na
CEFET Química Química Inorgânica
61
molécula de H2O são dois de cada tipo. Então, nas três moléculas, o arranjo espacial será
tetraédrico. Este arranjo define a hibridação do tipo sp3 para todas as moléculas. A
geometria molecular, como já foi dito, depende apenas dos átomos (ou dos pares
ligantes), então o metano terá geometria tetraédrica, para a amônia a geometria é
piramidal e a água terá geometria angular.
Be HH
Cl
BCl Cl
H
C
H
H
H
N
H
H
H
SO O
O
H
H
Cl
P
Cl
ClCl
Cl
Cl
Te
Cl
Cl
Cl
I
I
I
F
Cl
F
F
S
F
F F
F
F
F
Br
F
F F
F
F
Xe
F
F F
F
Figura 40. Estruturas das moléculas citadas na Tabela 11. A outra diferença está nos ângulos das ligações. No metano, os ângulos serão
aqueles observados para o tetraedro: 109,47° (Figura 33). Na amônia há um par de
elétrons não ligante, o que causará uma distorção nos demais ângulos. Como a repulsão
do par de elétrons não ligante é maior, os demais ângulos serão menores, em torno de
107° entre as ligações, como mostra a Figura 42. Na água a repulsão será ainda maior,
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62
pois são dois os pares não ligantes. Por isso, o valor do ângulo entre as ligações da água
será o menor observado entre estas moléculas, por volta de 104° (Figura 43).
H C
H
H
H H N
H
H H O H
Figura 41. As estruturas de Lewis das moléculas de CH4, NH3 e H2O.
N
H
H
H
Maior Repulsão
107o
Figura 42. A geometria da amônia e seus ângulos.
O
HH
GrandeRepulsão
Repulsão
Figura 43. A geometria da água e seus ângulos.
Com uma teoria de argumentos simples como a TLV e a VSEPR pode-se prever,
partindo-se das estruturas de Lewis, a geometria molecular e a hibridação das moléculas.
Mas isto ainda não é suficiente para compreender o comportamento de todas as
moléculas que se conhece. O “problema” do íon nitrito, NO2–, de ter duas estruturas
equivalentes (comentado anteriormente na página 49) é muito comum e tem grande
importância nas propriedades destas moléculas. A Teoria da Ligação de Valência propôs
uma primeira explicação para este fenômeno, que hoje é conhecido por ressonância.
6.4 – Ressonância Na Figura 44 podem ser vistas algumas moléculas que possuem mais de uma
estrutura de Lewis equivalente. Uma só estrutura é insuficiente para descrever estas
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63
moléculas, de forma que a estrutura “real” da molécula seria uma mistura de todas estas
estruturas, uma média de todos os estados. A “média” dessas estruturas é chamada de
estrutura de ressonância (Figura 45). A ressonância é a explicação para interessantes
fenômenos nas moléculas. Moléculas que apresentam ressonância são mais estáveis do
que se esperaria. Alguns exemplos são os carboxilatos, ânions e cátions vinílicos e
substâncias aromáticas.
N O
O
N O
O
C O
O
O 2
C O
O
O 2
C O
O
O 2
S O
O
S O
O
Figura 44. Algumas moléculas com mais de uma estrutura de Lewis.
N O
OC O
O
O 2
S O
O
Figura 45. Estrutura de ressonância para o nitrito, carbonato e dióxido de enxofre.
Por conta deste efeito, tem-se uma última regra para a construção das estruturas
de Lewis: considerar todas as estruturas de ressonância de uma espécie.
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64
Exercícios 1 – A Regra do Octeto é baseada em algumas propriedades atípicas dos elementos do grupo 18. Quais são estas propriedades e que relação elas têm com oito elétrons? 2 – Por que os compostos iônicos não conduzem eletricidade no estado sólido, mas o fazem quando dissolvidos ou fundidos? 3 – Os haletos de potássio apresentam os seguintes valores de solubilidade em água à 10°C: KCl = 30g/100g de água; KBr = 60g/100g de água; KI = 135g/100g de água. Sabendo que todos têm a estrutura cristalina do cloreto de sódio, explique o aumento da solubilidade destes compostos utilizando para isso a energia do retículo cristalino. DADOS: Raios iônicos: K+ = 152 pm; Cl– = 167 pm; Br– = 182 pm e I– = 206 pm. 4 – Defina polarizabilidade e poder polarizante. 5 – Segundo as regras de Fajans, a ligação entre um cátion pequeno e um ânion grande será mais covalente que a ligação entre um cátion grande e um ânion grande. Explique este efeito. 6 – Em prédios antigos onde o encanamento é de ferro a água da torneira apresenta uma leve coloração amarela. Se um copo com essa água for deixado em repouso, passado um tempo se observará um precipitado alaranjado. Baseado nestas informações, responda: a) Como se forma este precipitado? b) A água que contém este precipitado tem pH neutro? 7 – Descreva como a Teoria da Ligação de Valência explica a formação de uma ligação covalente entre dois átomos. 8 – Escreva as estruturas de Lewis para as moléculas de NH4
+ e H3O+. Mostre como os orbitais dos átomos centrais serão hibridizados e explique que conseqüências isto trará para os parâmetros geométricos destes íons em relação às moléculas neutras (como comprimentos e ângulos de ligação). 9 – Por que os elementos a partir do terceiro período da tabela periódica podem expandir o octeto e os do segundo período não o fazem? 10 – Escreva as estruturas de Lewis para cada espécie abaixo. Escreva também as cargas formais para cada átomo, a hibridação do átomo central e a geometria de cada espécie. a) H2O b) SO2 c) PCl3 d) PCl5 e) BrF5 f) O3 g) NO2
– h) NO2+ i) NH3 j) CH2O k) CO2
l) I3–
m) SO3 n) CH3+ o) ClF3 p) BH3 q) SF6 r) XeF4
s) NO3– t) SO4
2– u) CO32– v) PO4
3– x) TeCl4 z) TeCl6 11 – Identifique as moléculas do exercício 10 que apresentam ressonância e escreva todas as estruturas possíveis para estas moléculas.
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65
7. Teoria dos Orbitais Moleculares Embora a Teoria da Ligação de Valência (TLV) seja simples de se tratar, atenda
grande parte dos compostos e explique muitas propriedades observadas para certas
moléculas, ela falha em alguns aspectos, principalmente em compostos envolvendo
átomos de metais. Deixando de lado os compostos de coordenação, uma falha mais
conhecida da TLV está na descrição da molécula de oxigênio.a Segundo a TLV, a
molécula de gás oxigênio tem todos os seus elétrons emparelhados, o que caracteriza
uma substância diamagnética. Isto entra em conflito com sua medida experimental, onde
se verifica que o O2 é uma molécula paramagnética. Mas, felizmente, a descrição da
ligação química não é restrita à TLV.
Enquanto Pauling, Slater e Wheland desenvolveram as bases matemáticas e
mostraram aplicações da TLV, Mülliken, Hund e Hückel buscaram uma descrição quântica
diferente da ligação química. O pensamento fundamental aqui é que os elétrons de uma
molécula estão sob ação de todos os núcleos dos átomos que formam tal molécula. Os
elétrons estariam deslocalizados por todo espaço molecular. Para isso os orbitais
atômicos também devem estar deslocalizados por toda a molécula. Uma descrição deste
tipo para a ligação química leva a uma combinação dos orbitais atômicos, visando à
formação de novos orbitais, os chamados orbitais moleculares. A Teoria dos Orbitais
Moleculares (TOM) é largamente utilizada na interpretação de diversos fenômenos
químicos, sendo usada também na previsão de novos compostos. Trata-se uma teoria
com teoremas fundamentais que não serão abordados aqui. Assim como na TLV,
trataremos principalmente dos aspectos qualitativos.
7.1 – A formação dos orbitais moleculares O primeiro passo a ser dado na TOM é compreender como se dá a formação dos
orbitais moleculares. Os orbitais moleculares são resultado da combinação linear de
orbitais atômicos, o que matematicamente significa que funções matemáticas (como são
os orbitais, funções de onda) foram combinadas resultando em outras funções, como
mostra a Figura 46. Pode-se, por exemplo, somar duas funções de onda – o que se
chama de interferência construtiva (Figura 46a), assim como se tem a outra combinação,
a Na página 50, foram apresentados apenas argumentos qualitativos da TLV. No entanto, a TLV é um modelo baseado na mecânica quântica e possui um formalismo matemático não trivial. A afirmação de que a descrição da molécula de oxigênio é uma falha da TLV não é aceita por muitos pesquisadores, uma vez que existe uma descrição para esta molécula onde os elétrons não estão emparelhados (HOFFMANN, 2003). O problema é que esta descrição não é de simples entendimento, de maneira que se pode afirmar que os argumentos qualitativos da TLV é que são falhos neste caso.
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66
a subtração, o que leva a uma interferência destrutiva (Figura 46b). Analisemos um
sistema contendo dois átomos A e B, e dois orbitais do tipo 1s, representados pelas
funções de onda As1φ e B
s1φ . Ao combinarmos estes dois orbitais teríamos as seguintes
possibilidades: Bs
As 111 φφψ += (16)
e Bs
As 112 φφψ −= (17)
onde ψ1 e ψ2 são as funções de onda dos orbitais moleculares formados. Podem-se
utilizar os orbitais atômicos para ilustrar o resultado das equações (16) e (17), como é
visto na Figura 47. A equação (16) representa a combinação construtiva, que nada mais é
que a combinação de fases iguais dos orbitais. Assim como a subtração na equação (17) é a combinação de fases diferentes dos orbitais. Também não é difícil relacionar estas
equações e os orbitais com as interferências construtivas e destrutivas (Figura 46).
Figura 46. Interferências entre duas funções de onda. (a) Construtiva e (b) destrutiva. A linha azul
é a resultante do somatório das duas funções. Percebe-se que a formação de orbitais moleculares a partir da combinação de
orbitais de mesma fase leva a um aumento da densidade eletrônica na região
internuclear. Já a combinação de orbitais de fase diferente, cria uma região nodal entre os
núcleos. Neste ponto é importante recuperar a interpretação física dos orbitais (atômicos
ou moleculares) de que definem uma região no espaço onde existe a probabilidade de
encontrar o elétron. E que em uma região nodal a probabilidade de encontrar o elétron é
nula. Uma região nodal entre dois núcleos atômicos significa, então, que estes dois
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67
núcleos estarão expostos um à ação do outro. Sem nenhum elétron entre eles para
minimizar a repulsão. Com os núcleos se repelindo, tenderão a se afastar, o que nada
mais é que o enfraquecimento da ligação química (ou em casos extremos, um
rompimento da ligação). Já nos orbitais moleculares onde há um aumento da densidade
eletrônica entre os núcleos, a repulsão é atenuada, e os núcleos tendem a se aproximar,
pois estão atraindo os mesmos elétrons. Desta forma, a ligação é fortalecida, a molécula
se mantém unida. Por este motivo, os orbitais moleculares onde há uma soma de fases
são conhecidos como orbitais moleculares ligantes, enquanto os que são resultado de
uma interferência destrutiva são os orbitais moleculares antiligantes. Os orbitais ligantes
estabilizam o sistema e, portanto, são orbitais de menor energia. Os orbitais antiligantes
possuem maior energia, pois ocupá-los enfraquece a ligação. Existem também os orbitais
não-ligantes, que são orbitais que não influenciam a ligação.
Bs
As 111 φφψ += B
sAs 112 φφψ −=
A B
A B
A B
A B
Plano Nodal
Figura 47. Orbitais atômicos 1s formando dois tipos de orbitais moleculares.
Ao se combinar dois orbitais atômicos, devem-se obter dois orbitais moleculares.
O número de orbitais moleculares será sempre igual ao número de orbitais atômicos
combinados. Para orbitais do tipo s, as combinações possíveis são vistas acima. Orbitais
atômicos do tipo p dão origem a outro tipo de orbitais moleculares. Um subnível p possui
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68
três orbitais do tipo p que estão orientados em cada um dos eixos cartesianos (Figura 7).
Dois orbitais do tipo p, um de cada átomo, podem fazer uma ligação em um mesmo eixo.
Novamente, forma-se um orbital molecular ligante (Figura 48) e um antiligante (Figura 49).
zz
y
XX
zz
y
XX
Orbitais py de mesma fase
Orbital molecular ligante de orbitais do tipo p Figura 48. Orbitais py formando um orbital molecular ligante.
Uma vez que os orbitais atômicos se combinam de forma frontal, o que na TLV
recebe o nome de ligação σ, os restantes só poderão se combinar paralelamente, o que
na TLV é uma ligação π. Ao invés de ligações σ e π, na TOM tem-se orbitais moleculares
σ e orbitais moleculares π. E existem os orbitais moleculares do tipo σ ligantes e
antiligantes (Figuras 48 e 49 respectivamente). Assim como existem os orbitais
moleculares π ligantes (Figura 50) e os orbitais moleculares π antiligantes (Figura 51).
Como são dois os orbitais p restantes de cada átomo, o número total de orbitais
moleculares π são quatro: dois ligantes e dois antiligantes. Como os orbitais atômicos do
tipo p são degenerados, os orbitais moleculares π também serão. Então, os dois orbitais
moleculares ligantes π têm a mesma energia, assim como os antiligantes que também
são duplamente degenerados.
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69
zz
y
XX
zz
y
XX
Orbitais py fora de fase
Orbital molecular antiligante de orbitais do tipo p Figura 49. Orbitais py formando um orbital molecular antiligante.
zz
y
XX
zz
y
XX
Orbitais pz em fase Orbital molecular π ligante Figura 50. Orbitais pz formando um orbital molecular π ligante.
zz
y
XX
zz
y
XX
Orbitais pz fora de fase Orbital molecular π antiligante Figura 51. Orbitais pz formando um orbital molecular π antiligante.
CEFET Química Química Inorgânica
70
Orbitais do tipo d também podem fazer combinações semelhantes embora sejam
mais complexas. Para orbitais atômicos do tipo d também há a possibilidade da formação
de orbitais moleculares do tipo δ (Figura 52), presentes em casos raros onde um átomo
está ligado a outro por quatro ligações, como no complexo [Re2Cl8]2–.
Figura 52. A formação de um orbital molecular δ ligante a partir de orbitais do tipo d.
Uma vez que já se conhece, qualitativamente, as diferentes maneiras que os
orbitais atômicos podem se combinar para formar os orbitais moleculares, pode-se
analisar como a TOM descreve certas moléculas e suas ligações.
7.2 – Diagrama dos orbitais moleculares e ordem de ligação Como foi dito anteriormente, a molécula de oxigênio, O2, não é descrita
corretamente pela TLV. Veremos então como a TOM descreve a molécula de O2. O
oxigênio tem a seguinte configuração eletrônica: 8O = 1s2 2s2 2p4. Estes elétrons estarão
distribuídos nos orbitais moleculares formados pela combinação dos orbitais atômicos dos
dois oxigênios. Serão, portanto dezesseis elétrons, que serão distribuídos em 10 orbitais
moleculares (cada oxigênio tem cinco orbitais atômicos até a camada de valência: um
orbital do subnível 1s, um orbital do subnível 2s e três orbitais atômicos no subnível 2p).
Por questões de simetria e energia, só serão permitidas combinações entre orbitais de um
mesmo subnível.b Isto é, o orbital do tipo s, do subnível 1s de um oxigênio, irá se
combinar com o mesmo orbital, do mesmo subnível do outro átomo de oxigênio. E assim
será com todos os outros orbitais, em combinações de dois orbitais, um orbital de cada
átomo, gerando sempre um orbital molecular ligante e um antilingante.
b Esta consideração é uma aproximação, mas é uma aproximação razoável para moléculas diatômicas. É sempre importante lembrar que aqui está sendo apresentada apenas uma versão qualitativa da TOM.
CEFET Química Química Inorgânica
71
Começando a combinação pelos níveis de menor energia, os orbitais do tipo s da
primeira camada, haverá a formação dos orbitais moleculares como os mostrados na
Figura 47. Como os orbitais s são esféricos, qualquer orientação na combinação levará a
formação de orbitais moleculares σ. Assim, a primeira parte do diagrama dos orbitais
moleculares seria representada da seguinte maneira:
1s 1s
σ1s
σ*1s
O O2 O
E O orbital molecular σ ligante (σ1s), como já foi
dito anteriormente, estabiliza o sistema e,
portanto, é um orbital de menor energia que os
atômicos. Para o orbital molecular antiligante
(σ*1s), tem-se um maior nível energético. Os dois
elétrons no subnível 1s de cada oxigênio se
distribuirão nos orbitais moleculares seguindo os
mesmos princípios da distribuição eletrônica dos
elementos. Primeiro se ocupa os níveis de menor
energia, o orbital molecular σ1s, para então ocupar
o orbital molecular antiligante σ*1s.
O princípio da exclusão de Pauli e a regra de Hund também se aplicam aqui.
Desta forma, a distribuição dos elétrons nesta primeira etapa da molécula ficaria:
1s 1s
σ1s
σ*1s
O O2 O
E Percebe-se que não há ganho energético na
formação e ocupação destes orbitais moleculares
oriundos de orbitais atômicos internos. Ao ocupar
com o mesmo número de elétrons tanto o orbital
molecular ligante quanto o antiligante de uma
mesma combinação, não se favorece a formação
da molécula, visto que todo o ganho energético
vindo da ocupação do orbital molecular ligante é
“cancelado” pela ocupação do orbital molecular
antiligante. E neste ponto, vale lembrar a TLV e o
uso apenas de elétrons de valência.
Como foi visto, orbitais atômicos internos não contribuem de maneira efetiva na
formação da ligação química, inclusive na TOM. Ao seguirmos a ordem de energia de
orbitais atômicos, chega-se nos orbitais do tipo s do subnível 2s. A situação é muito
parecida com a anterior. A principal diferença são as energias dos orbitais atômicos
CEFET Química Química Inorgânica
72
envolvidos e dos orbitais moleculares formandos. O diagrama de orbitais moleculares
ficaria:
2s 2s
σ2s
σ*2s
O O2 O
E
O subnível 2p, com três orbitais degenerados, apresenta diferentes situações já
que há a possibilidade de formação de dois tipos diferentes de orbitais moleculares.
Assim, um dos orbitais p de um oxigênio combinado com um orbital p do outro átomo,
formará os orbitais moleculares σ. Os dois orbitais p restantes em cada átomo, formarão
os orbitais moleculares π. O diagrama dos orbitais moleculares para este subnível teria a
seguinte forma:
E
2p2p
σ2p
σ∗2p
π2p
π*2p
O OO2
CEFET Química Química Inorgânica
73
Cada oxigênio possui quatro elétrons no subnível 2p. A ordem de distribuição dos
elétrons nos orbitais moleculares seguirá a ordem de energia começando pelo orbital σ2p e
terminando (se houverem elétrons) no orbital σ*2p.Como os orbitais moleculares π são
degenerados, a regra de Hund é aplicada. Dessa forma, o diagrama com elétrons seria:
E
2p2p
σ2p
σ∗2p
π2p
π*2p
O OO2
Juntando todos os níveis apresentados, tem-se o diagrama dos orbitais
moleculares para a molécula de oxigênio (Figura 53). Percebe-se que nos orbitais
moleculares π antiligantes existem elétrons desemparelhados, o que seria a origem do
paramagnetismo desta molécula. A TOM mostra de um modo muito simples porque
existem elétrons desemparelhados nesta molécula. Mas a TLV tem a vantagem de ser
mais intuitiva para um químico, já que trata diretamente de ligações entre os átomos. Na
TOM, onde o conceito de ligação é um pouco mais difuso, tem-se o que se chama de
ordem de ligação (OL). A ordem de ligação é definida como:
2
)esantiligant (e ligantes) (eOL ∑∑ −− −
= (18)
A ordem de ligação aproxima a TOM do conceito de ligação, como visto na TLV.
Para a molécula de oxigênio, teríamos como ordem de ligação:
22
610=
−=OL (19)
CEFET Química Química Inorgânica
74
o que pode ser interpretado como uma dupla ligação entre os átomos de oxigênio, uma
descrição semelhante àquela obtida com a TLV. A diferença é que a TOM descreve
corretamente as propriedades magnéticas desta molécula.
E
2p2p
σ2p
σ∗2p
π2p
π*2p
O OO2
2s
σ2s
σ*2s
2s
1s 1s
σ1s
σ*1s
Figura 53. Diagrama dos orbitais moleculares para a molécula de oxigênio (O2).
CEFET Química Química Inorgânica
75
Embora não seja o procedimento correto, a ordem de ligação também pode ser
calculada apenas com elétrons do último nível energético ao invés de se contar todos.
Para o O2, considerando apenas os elétrons do subnível 2p:
22
26=
−=OL (20)
O diagrama para a molécula de F2 terá aspecto semelhante ao observado para o
oxigênio, com exceção que terá dois elétrons a mais, que ocupariam os orbitais
moleculares π*2p. As configurações eletrônicas destas moléculas podem ser escritas como
para os átomos, da seguinte forma:
O2 (16 e–) = 1σ1s2 1σ*1s
2 2σ2s2 2σ*2s
2 2σ2p2 1π2p
4 1π*2p2
F2 (18 e–) = 1σ1s2 1σ*1s
2 2σ2s2 2σ*2s
2 2σ2p2 1π2p
4 1π*2p4
A ordem de ligação para o F2 é igual a um, o que corresponde a uma ligação
simples, como é esperado para esta molécula.
A molécula de nitrogênio, N2, tem uma diferença no diagrama de orbitais
moleculares em relação à molécula de O2 e F2. A ordem energética dos orbitais
moleculares σ2p e π2p é invertida. Esta inversão pode ser detectada através de técnicas
experimentais, como a espectroscopia fotoeletrônica, ou através de métodos teóricos de
cálculo. Esta inversão entre os orbitais σ2p e π2p é observada em outras moléculas
diatômicas, como mostra a Figura 54. Pode-se ver que, a inversão não é exclusividade do
nitrogênio. De fato, no segundo período da tabela periódica a inversão é mais comum do
que o que a ordem esperada. Se a ordem de ligação fosse calculada para todas as
moléculas diatômicas vistas na Figura 54, o interessante valor de zero seria encontrado
para a molécula de Be2. Qual é o significado de uma ordem de ligação zero? Se a ordem
de ligação está relacionada com a idéia de ligação da TLV, então a ordem de ligação
zero, significa que não há ligação. Isto é, não há qualquer ganho energético quando esta
molécula é formada. Logo, nestes casos, não há a formação da molécula. O mesmo
acontece quando se calcula a ordem de ligação para moléculas diatômicas de gases
nobres, como He2 ou Ne2. Sabe-se que estes elementos não formam estas moléculas, o
que está de acordo com a TOM (e também com a TLV).
O diagrama dos orbitais moleculares completos e os orbitais moleculares
calculados para o N2 podem ser vistos nas Figuras 55 e 56, respectivamente. A ordem de
ligação para o N2 é igual a três.
CEFET Química Química Inorgânica
76
Figura 54. Diagrama dos orbitais moleculares para moléculas diatômicas de átomos do segundo
período da tabela periódica.
Até então, foram apresentados apenas diagramas de orbitais moleculares para
moléculas diatômicas homonucleares (formadas pelos mesmos átomos). A construção
dos orbitais moleculares para moléculas diatômicas heteronucleares também é simples e
pode ser feita sem grandes problemas, tendo em vista apenas alguns detalhes. O
primeiro é que os níveis energéticos dos orbitais não serão os mesmos, pois os átomos
são diferentes. Os átomos de maior carga nuclear efetiva terão orbitais de menor energia.
Um outro fator a ser considerado é que as contribuições dos orbitais atômicos para a
formação do orbital molecular serão diferentes, uma vez que são orbitais de átomos
diferentes. Estes fatores influenciam pouco numa abordagem qualitativa, mas são de
grande importância na descrição completa da TOM. A Figura 57 mostra o diagrama dos
orbitais moleculares para a molécula de CO. Pode-se ver que também existe a inversão
entre os orbitais σ2p e π2p. Isto irá acontecer sempre que a molécula for formada por ao
menos um dos átomos que apresenta tal inversão (Figura 54).
CEFET Química Química Inorgânica
77
E
2p2p
σ2p
σ∗2p
π2p
π*2p
N NN2
2s
σ2s
σ*2s
2s
1s 1s
σ1s
σ*1s
Figura 55. Diagrama dos orbitais moleculares para o N2.
CEFET Química Química Inorgânica
78
Figura 56. Superfície dos orbitais moleculares do N2. Método de Cálculo Hartree-Fock, base de
cálculo STO-4G, GAMESS US (SCHMIDT, 1993).
CEFET Química Química Inorgânica
79
E
2p
2p
σ2p
σ∗2p
π2p
π*2p
C OCO
2s
σ2s
σ*2s
2s
1s
1s
σ1s
σ*1s
Figura 57. Diagrama dos orbitais moleculares para o CO.
A TOM e a TLV são as principais teorias aceitas hoje em dia para a descrição da
ligação química dos compostos. Ambas têm seus pontos fortes e seus pontos fracos. Ao
se explicar certo fenômeno deve-se ter em mente que não existe uma mais certa que a
outra, mas sim qual é mais adequada para tratar certo problema.
CEFET Química Química Inorgânica
80
8. Conceitos Ácido-Base 8.1 – De Arrhenius a Brønsted-Lowry
A primeira teoria ácido-base foi proposta pelo sueco Svante Arrhenius. Em seus
estudos de condutividade em solução aquosa, dentre outras coisas, ele convencionou que
uma substância seria considerada um ácido se originasse íons H+. Por outro lado, uma
base daria origem a íons OH–. Foi o primeiro sentido químico para ácidos e bases. O
modelo de Arrhenius carregava o “problema” de apenas tratar de sistemas aquosos. No
entanto, suas idéias sobre os íons H+ e OH– foram o início da caracterização de ácidos e
bases. A história diz que as idéias de Arrhenius não foram bem aceitas no início, e em
seu exame de doutorado sua nota foi a menor possível para a aprovação. Como a ciência
nunca está parada, a situação se modificou e, por seu trabalho sobre de dissociação de
eletrólitos, Arrhenius foi laureado com o Prêmio Nobel de Química de 1903.
Em 1923, o dinamarquês Johannes N. Brønsted e o inglês Thomas M. Lowry
apresentaram suas idéias sobre ácidos e bases. A particularidade deste modelo é que
eles trabalharam de maneira independente e chegaram numa mesma formulação, numa
mesma época. O conceito ácido-base de Brønsted-Lowry pode ser considerado uma
extensão das idéias de Arrhenius. A primeira vantagem da teoria de Brønsted-Lowry é
que ela não é restrita ao meio aquoso. Além disto, uma nova definição de ácido e base é
proposta. É chamada de ácido uma espécie capaz de doar um próton (o íon H+),
enquanto a base é a espécie que irá receber o próton. A partir desta definição,
chegava-se a novos conceitos, como o de ácidos e bases conjugados. Numa reação
ácido-base, teríamos dois pares de ácidos e bases conjugadas. Na equação
ácido1 + base2 base conjugada1 + ácido conjugado2 (21) o ácido1 transfere um próton para a base2 e assim origina a base conjugada1. Da mesma
forma, a base2 ao ser protonada, origina o ácido conjugado2. A equação (21) mostra o
equilíbrio entre duas reações ácido-base.
O parâmetro termodinâmico energia livre de Gibbs, ΔG, indica o sentido
preferencial da reação num equilíbrio. Além de ΔG, também é muito utilizada a constante
de equilíbrio do sistema. Para simplificar a notação, a equação (21) será escrita da forma
HA + B A + HB+ (22)
A constante de equilíbrio, Kc, para esta reação é
CEFET Química Química Inorgânica
81
[B][HA]][HB][AK c ⋅
⋅=
+−
(23)
Para o estado gasoso, a constante de equilíbrioc e o parâmetro ΔG se relacionam por
ΔG = –RT.ln Kc (24) onde R é a constante dos gases ideais e T a temperatura. Para uma melhor análise,
extraindo-se o logaritmo em (24), encontra-se
Kc = e–ΔG/RT (25) Dessa forma é mais simples entender a dependência entre ΔG e Kc. Se o valor de ΔG é
negativo, o valor de Kc será sempre maior que um. Neste caso, o sentido direto é o
favorecido. Por outro lado, se ΔG é positivo, Kc terá valores menores que um, ou seja, a
reação mais favorecida é a do sentido inverso. Dessa forma estabeleceu-se o conceito de
força de ácidos e bases. O ácido HA será mais forte que HB+ se o Kc da reação (22) for
maior que 1. Da mesma forma que B será uma base mais forte que A–. Portanto, um ácido
forte terá uma base conjugada fraca e vice e versa.
Em solução, por exemplo, em meio aquoso, as constantes de equilíbrio dos ácidos
e bases foram medidas em relação ao solvente. A forma de dedução para a constante é a
mesma feita para o Kc. Considerando um sistema aquoso e um ácido HA, tem-se
HA + H2O A + H3O+ (26)
Como a água é o solvente, sua concentração é muito maior que as das outras
espécies envolvidas no equilíbrio. Desta forma, convencionou-se que a concentração da
água é constante em relação às outras espécies do equilíbrio. A expressão da constante
de equilíbrio para esta reação será:
O][H[HA]]O[H][A
K2
3c ⋅
⋅=
+−
⇒ [HA]
]O[H][AO][HK 3
2c
+− ⋅=⋅ ⇒
[HA]]O[H][A
K 3a
+− ⋅= (27)
Uma outra forma de se expressar estas constantes é usar o valor de pKa e pKb, que são
definidos como
pKa = –log Ka (28) c Normalmente para o estado gasoso a constante de equilíbrio é denotada Kp.
CEFET Química Química Inorgânica
82
pKb = – log Kb (29) Neste caso, quanto menor o valor de pKa (ou pKb) mais forte é o ácido (ou base).
8.2 – O Conceito ácido-base de Lewis
O modelo ácido-base de Brønsted-Lowry demonstrou uma grande evolução em
relação ao de Arrhenius. Um outro conceito ácido-base, proposto por Gilbert Lewis, é
ainda mais completo. Segundo Brønsted-Lowry ácidos eram as espécies que transferiam
íons H+ para as bases que, por sua vez, nada mais eram que ânions ou espécies neutras
com alguma característica especial. Foi Lewis quem percebeu essa característica, de que
a base só poderia receber o íon hidrogênio do ácido se tivesse ao menos um par de
elétrons para uma nova ligação. Ademais, ter um par de elétrons disponível era o requisito
para formar ligações com cátions. A visão de Lewis para a situação era muito clara: não
era a transferência do íon hidrogênio que era importante e sim a disponibilidade dos
elétrons na base. Portanto, era preciso uma nova definição para ácidos e bases. E foi
assim que Lewis definiu uma base como sendo uma espécie doadora de par de elétrons
enquanto o ácido é a espécie que receberia o par de elétrons. Embora Lewis tenha
introduzido seu conceito no mesmo ano de que Brønsted e Lowry, suas idéias só tiveram
a devida atenção a partir da década de 30.
O modelo de Lewis pode ser aplicado a uma série inimaginável de reações
químicas. Como por exemplo, em reações orgânicas. As reações de substituição
eletrofílica ou nucleofílica são simplesmente reações entre um ácido e uma base de
Lewis. Também as de eliminação e adição. Um exemplo clássico disto são as reações de
alquilação de Friedel-Crafts (Figura 58). Neste tipo de reação há uma grande seqüência
de reações do tipo ácido-base de Lewis.
Para o estudo de química inorgânica as idéias de Lewis são fundamentais. Os
metais são facilmente identificados como ácidos de Lewis. Nas reações de formação de
complexos, os ligantes são as bases de Lewis que irão doar o par eletrônico para o metal.
Reações deste tipo também são vistas com ametais e semi-metais, como por exemplo,
em compostos de enxofre, silício e boro. Estes são apenas alguns exemplos de reações
envolvendo ácidos e bases de Lewis, mas qualquer reação que envolva doação de par de
elétrons pode ser interpretada como sendo uma reação ácido-base de Lewis.
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83
C2H5 Cl AlCl3 C2H5Cl AlCl3+
+ C2H5 Cl AlCl3 H
C2H5
+ Cl AlCl3
C2H5
++ AlCl3 HCl
Figura 58. Uma alquilação de Friedel-Crafts. Na primeira etapa, o cloroetano (C2H5Cl), faz o papel da base de Lewis através do átomo de cloro. O cloreto de alumínio (AlCl3) é o ácido de Lewis, e
tem papel de catalisador nesta reação. Na segunda etapa, o benzeno atua como base de Lewis, enquanto que o composto C2H5ClAlCl3, através do carbono, é o ácido. Na terceira etapa, temos novamente o cloro, ou mais precisamente o AlCl4– como base de Lewis e o
hidrogênio como ácido de Lewis.
O exemplo da formação do oleum é muito importante na discussão de ácidos e
bases. Nesta reação, o anidrido sulfúrico, SO3, é o ácido de Lewis que receberá o par de
elétrons do ácido sulfúrico, a base de Lewis nesta reação (Figura 59). Vemos aqui o ácido
sulfúrico, um ácido forte em meio aquoso segundo Brønsted-Lowry, atuando como uma
base segundo Lewis. Este comportamento é, talvez, o mais ilustrativo do que realmente
são os conceitos ácido-base.
S
O
O O
O
S
OH
OHO
Figura 59. A formação do Oleum, que envolve a dissolução de SO3 em ácido sulfúrico é um
exemplo interessante de reação ácido-base de Lewis. Aqui o ácido sulfúrico é a base de Lewis, enquanto o SO3 é o ácido.
Sistematizar o estudo de força de ácidos e bases de Lewis é uma tarefa mais
complicada do que para o conceito de Brønsted-Lowry. Isto se deve ao fato de que no
conceito de Brønsted-Lowry o ácido é sempre fixo (o íon H+) e quanto maior afinidade da
base em relação a este íon, mais forte ela é. No conceito ácido-base de Lewis, o ácido
pode ser uma infinidade de compostos ou íons. E a particularidade de cada sistema
CEFET Química Química Inorgânica
84
influenciaria na construção de uma “escala de força” para ácidos ou bases de Lewis. De
maneira geral, pode-se dizer que quanto mais fácil é para uma espécie a doação de
elétrons, mais forte é a base de Lewis. Enquanto que, para um ácido, o inverso é
verdadeiro. Quanto mais ávido por elétrons for a espécie, mais forte será o ácido de
Lewis.
Existem alguns outros conceitos ácido-base, uns com aplicação restrita, outros
com aplicação mais ampla. Assim como no caso da TLV e da TOM, não há um conceito
certo e o outro errado. Não existe um ácido absoluto; dependendo do modelo escolhido, o
comportamento pode variar. Vale citar uma frase encontrada no início do capítulo sobre
ácidos e bases do livro de James E. Huheey:
“Podemos fazer um ácido ser o que quisermos – a diferença ente os vários
conceitos ácido-base não está em qual é o certo, mas qual é o mais conveniente para o
uso em uma situação particular.”
9. Compostos de Coordenação 9.1 – Um breve histórico sobre Compostos de Coordenação
Atribui-se a Alfred Werner o início do estudo com compostos de coordenação.
Werner estudava o comportamento de sais que possuíam seis moléculas de amônia (ou o
grupo amina). Antes dele, C.W. Blomstrand e P.T. Cleve além de S.M. Jørgensen
tentavam desvendar o arranjo de uma molécula como o CoCl2.6NH3. A sugestão inicial
era de que as moléculas de amônia estariam ligadas como numa corrente (Figura 60a).
Sabia-se que em compostos como esse, que alguns dos ânions (como o cloreto no
caso do CoCl2.6NH3) possuíam características distintas. Algumas das ligações destes
íons eram mais intensas que outras. Nessa disposição em corrente (Figura 60a) não há
como se explicar tal fato. Uma outra proposta, feita por Blomstrand, tentaria corrigir este
problema. Nesta nova proposta, alguns dos ânions apareciam ligados diretamente ao
metal. Portanto, se o ânion está ligado ao metal, sua ligação é mais forte; enquanto que
se o ânion está no final da “corrente” de amônia, sua ligação é mais fraca. Mas Jørgensen
demonstrou que este novo modelo, proposto por Blomstrand, também possuía falhas,
uma vez que não admitia mais de um ânion ligado ao metal. Jørgensen propôs então um
outro modelo para as ligações em compostos deste tipo (Figura 60b).
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85
a)
CoNH3 NH3 NH3 Cl
NH3 NH3 NH3 Cl
b)
Co NH3 NH3 NH3 XNH3H3NX
H3NX
Figura 60. a) Proposta de representação da molécula de CoCl2.6NH3 por Blomstrand. A amônia e
cloreto numa disposição em corrente. b)Modelo proposto por Jorgensen para um composto com
cobalto III. Em negrito estão as moléculas que podem trocar de posição.
O modelo proposto por Jørgensen permitia entender a característica dos ânions
presentes nestes compostos. Pois às vezes só havia um deles ligado diretamente ao
metal, às vezes dois e às vezes nenhum. Neste modelo admitira-se a troca de posição
entre os ânions e as moléculas de amônia (em negrito na Figura 60b). No entanto, este
modelo ainda seria abalado pela constatação de Werner, que mais de dois ânions
poderiam estar ligados diretamente ao metal. Desta forma, ele concluiu que as moléculas
de amônia não poderiam estar ligadas numa corrente. O arranjo que possibilitava isso era
um com as seis moléculas de amônia ligadas diretamente ao metal (Figura 61). Com este
arranjo os ânions teriam apenas uma molécula de amônia entre eles e o metal.
NH3NH3NH3
H3NH3NH3N
MXXX
Figura 61. Proposta de Werner para a estrutura de hexamino sais. M representa um metal de
carga +3 e X um ânion de carga –1.
Ainda assim, não era muito claro porque um metal faria tantas ligações. Nesta
época Lewis ainda não havia proposto seu modelo de ligações químicas e a valência era
tratada como uma capacidade dos átomos de se combinarem. Segundo esta definição de
valência, um metal com carga positiva de três, deveria se combinar três vezes com um
outro composto que fosse monovalente. É aqui que se percebe como a idéia de Werner
foi revolucionária na época. Ele percebeu que para explicar o comportamento destes
compostos precisava romper com o conceito de valência da época (ao observar os outros
dois modelos propostos, nas Figuras 60a e 60b, vê-se claramente o acordo com o
conceito de valência da época).
CEFET Química Química Inorgânica
86
Com sais de hexaminocromo(III), Werner observou a troca de moléculas de
amônia por moléculas de água. Logo, os sais hidratados também eram complexos, nome
que foi dado a compostos desse tipo. O trabalho com o cloreto de cromo (III) também
produziu interessantes resultados. Este composto apresenta duas cores: verde-escuro e
azul violáceo. Werner conseguiu demonstrar que o cloreto de cromo (III) azul era um
composto com formula [Cr(H2O)6]Cl3 (seis moléculas de água estavam ligadas
diretamente ao cromo). Já no verde, a fórmula poderia ser escrita como
[Cr(H2O)4Cl2]Cl.2H2O (dois cloretos estão ligados diretamente ao metal).
Além de propor que os metais possuíam uma “valência secundária”, Werner
também deduziu, a partir de simples argumentos, que a geometria de complexos com seis
ligantes coordenados ao metal deveria ser octaédrica. Werner postulou que os seis
ligantes iriam se distribuir de maneira simétrica ao redor do metal. Desta forma, ele
chegou a três estruturas básicas: um hexágono planar, uma forma prismática e de um
octaedro (Figura 62). Em um complexo com todos os seis ligantes iguais, não haveria
como diferenciar as estruturas, visto que todas as posições seriam equivalentes. No
entanto, com ligantes diferentes, em proporções diferentes, isto poderia ser feito. Um
complexo formado por um metal (M) e dois ligantes diferentes (A e B), de fórmula MA4B2
tem um número diferente de isômeros para cada uma das estruturas. Um hexágono
planar apresentaria três os isômeros. O mesmo número de isômeros seria encontrado
para a forma prismática. Já na estrutura octaédrica, um complexo de fórmula MA4B2 teria
apenas dois isômeros. Em um complexo de fórmula MA3B3 se observaria exatamente o
mesmo número de isômeros para cada uma das diferentes estruturas. Bastaria Werner
investigar quantos isômeros eram formados em complexos do tipo MA4B2 e MA3B3. O
resultado observado foi que o número de isômeros era sempre dois, independente de
metais e ligantes. Desta forma, Werner mostrou que os complexos formados por seis
ligantes tinham geometria octaédrica.
Em 1917, Werner ganhou o prêmio Nobel de química “pelo seu trabalho na ligação
de átomos em moléculas, o qual trouxe uma nova luz nas recentes investigações e abriu
um novo campo de pesquisa especialmente em química inorgânica”. Embora brilhante, o
trabalho de Werner ainda deixava perguntas, como sobre a origem das cores dos
complexos ou da estabilidade dos mesmos.
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87
A
A
AA
A
AA
A
A
AA
AA
A
AA
A
A
(i) (ii) (iii)
Figura 62. As estruturas propostas por Werner para um complexo MA6. (i) Um hexágono plano, (ii) em forma de prisma e (iii) o octaedro. O metal (omitido nas figuras) se posiciona no centro das
estruturas.
9.2 – Classificação dos ligantes e nomenclatura de complexos Os ligantes são classificados, principalmente, de acordo com o número de ligações
que podem fazer com o metal. Existem ligantes monodentados, que são aqueles que
fazem somente uma ligação e ligantes ditos quelantes, onde há mais de um ponto de
coordenação com o metal. Os ligantes quelantes também são chamados de ligantes
polidentados. Existem diversos tipos, como os bidentados (dois pontos de coordenação),
tridentados (três pontos de coordenação) ou tetradentados (quatro pontos de
coordenação) e assim por diante. Existem também ligantes do tipo ambidentados. São
ligantes que possuem dois pontos de coordenação, mas não é possível usá-los juntos
com o mesmo metal. Isto é, ou se ligam por um dos pontos ou pelo outro. São, portanto,
ligantes monodentados, mas com mais de uma opção de coordenação. São clássicos
ligantes ambidentados o SCN–, que pode se ligar pelo enxofre ou pelo nitrogênio e,
também, o NO2– que pode se ligar tanto pelo nitrogênio como pelo oxigênio. A Figura 63
mostra a estrutura de alguns ligantes comuns em compostos de coordenação.
A nomenclatura de complexos segue uma sistemática própria definida pela IUPAC.
As regras básicas são:
a) O nome do ânion antecede ao do cátion.
b) Quando há vários ligantes iguais são usados os prefixos di, tri, tetra, penta, etc para
indicar a quantidade de cada ligante. A exceção desta regra se dá quando o nome do
ligante já contém a indicação de um número, como por exemplo, etilenodiamina ou
bipiridina. Nestes casos usam-se outros prefixos para indicar o número de ligantes: bis,
tris e tetraquis, como nome do ligante sendo colocado entre parênteses. O uso destes
prefixos está resumido na tabela abaixo.
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88
Tabela 12. Prefixos para indicar o número de ligantes. Prefixos Número de ligantes Prefixos Número de ligantes
Mono (opicional) 1 Hepta 7
Di, bis 2 Octa 8
Tri, tris 3 Nona 9
Tetra, tetraquis 4 Deca 10
Penta, pentaquis 5 Undeca 11
Hexa 6 Dodeca 12
OO
Acetilacetonato (acac)
N N
Bipiridina (bipy)
H2NO
O
Glicinato (gly)
H2N NH2
Etilenodiamina (en)O
O
O
O
(CH3COCHCOCH3) (NC5H4)2
Oxalato (ox)
NH2CH2CO2
NH2CH2CH2NH2 C2O42
N
Piridina (py)
NC5H5
NO O
NO O
ou
Nitrito ou NitroNO2
N N
O
O
O
OO
O
O
O
Etilenodiaminotetraacetato (edta ou Y)
S C N
S C N
ou
Tiocianato SCN ou Isotiocianato NCS
Figura 63. Alguns ligantes importantes para os compostos de coordenação. Em vermelho os
átomos que se coordenam ao metal e entre parênteses as abreviações para alguns dos ligantes.
CEFET Química Química Inorgânica
89
c) Ao escrever o nome do complexo, os ligantes são citados em ordem alfabética,
qualquer que seja a sua carga e não levando o prefixo em consideração. O nome do
metal deve seguir os dos ligantes, com a indicação de seu estado de oxidação entre
parênteses, utilizando algarismos romanos. Não há espaço entre nenhum dos nomes,
prefixos ou parênteses.
Os ligantes e seus nomes para o uso em nomenclatura de compostos de
coordenação, bem como abreviações, estão listados na Tabela 13.
d) Ao escrever a fórmula química de um composto de coordenação, deve-se agrupar o
metal e ligantes com colchetes. O metal é escrito primeiro, seguido dos ligantes em ordem
de carga. Primeiro os negativos, seguido dos neutros e, então, os positivos. No caso de
dois ou mais ligantes de cada tipo, considera-se a ordem alfabética de acordo com o
símbolo do elemento coordenado ao metal.
e) O nome de íons complexos positivos ou de complexos neutros não sofre qualquer
alteração.
f) Ao nome de íons complexos negativos deve ser adicionado o sufixo “ato”.
Existem outras regras, para complexos com mais de um centro metálico ou para
ligantes em ponte, mas estas regras ou complexos deste tipo não serão abordados.
Por exemplo, os complexos [Co(NO2)3(NH3)3] e K4[Fe(CN)6] são nomeados,
segundo as regras citadas, como triaminotrinitrocobalto(III) e hexacianoferrato(II) de
potássio, respectivamente. Analisando cada caso separadamente, começando pela
fórmula química do [Co(NO2)3(NH3)3], como o NO2– é um ânion e a amônia é uma
molécula neutra, o primeiro aparece antes na fórmula química. O NO2– é um ligante
ambidentado e, portanto, tem duas opções de coordenação. Da maneira que a fórmula
está escrita, nota-se que é o nitrogênio que está ligado ao metal – o que leva ao nome
nitro. A amônia, NH3, quando coordenada recebe o nome de amino e, portanto, vem antes
no nome do complexo. Como são três espécies NO2– e NH3, usa-se o prefixo “tri”. Por fim,
o estado de oxidação do cobalto é descoberto pelo somatório das cargas. O complexo
como um todo é neutro e cada íon nitrito possui carga –1, dando um total de três cargas
negativas. Portanto, o cobalto no complexo citado acima deverá ser +3. O outro
composto, normalmente chamado de ferrocianeto de potássio, possui um cátion (K+) que
não faz parte do íon complexo, que é a parte abrigada entre os colchetes: [Fe(CN)6]4–.
Cada íon cianeto tem carga –1, o que leva ao estado de oxidação +2 para o ferro. Sendo
seis o número de ligantes, usa-se o prefixo “hexa” antes de “ciano”, que é a nomenclatura
CEFET Química Química Inorgânica
90
para o íon cianeto quando coordenado. Por se tratar de um ânion, é preciso adicionar o
sufixo “ato” ao final do nome.
Tabela 13. Nome de alguns ligantes para nomenclatura dos complexos.1
Espécie Nome no complexo Espécie Nome no complexo
Fluoreto (F–) Fluoro Piridina (py) Piridino
Cloreto (Cl–) Cloro Bipiridina (bipy) Bipiridino
Brometo (Br–) Bromo Etilenodiamina (en) Etilenodiamino
Iodeto (I–) Iodo
Cianeto (CN–) Ciano Trifenilfosfina
(P(C6H5)3)2 Trifenilfosfino
Amideto (NH2–) Amido Água (H2O) Aquo
Hidroxido (OH–) Hidroxo Amônia (NH3) Amino3
Óxido (O2–) Oxo
Peróxido (O22–) Peroxo
Monóxido de carbono (CO)
Carbonil
Acetato (CH3COO–) Acetato Óxido Nítrico (NO) Nitrosil
Acetilacetonato (acac) Acetilacetonato Gás oxigênio (O2) Dioxigênio
Carbonato (CO32–) Carbonato Gás nitrogênio (N2) Dinitrogênio
Glicinato (gly) Glicinato Hidreto (H-) Hidrido
Nitrato (NO3–) Nitrato Tiocianato (SCN–) Tiocianato4
Sulfato (SO42–) Sulfato Tiocianato (NCS–) Isotiocianato5
Oxalato (ox) Oxalato Nitrito (ONO–) Nitrito6
Fenil (C6H5*, Ph ou φ) Fenil Nitrito (NO2–) Nitro7
1 O ligante etilenodiaminotetraacético, edta, permanece com o mesmo nome. 2 P(C6H5)3, PPh3 ou Pφ3. 3 Também se encontra o uso de “amin”. 4 Quando ligado pelo enxofre. 5 Quando ligado pelo nitrogênio. 6 Quando ligado pelo oxigênio. 7 Quando ligado pelo nitrogênio.
9.3 – Isomeria em compostos de coordenação Existem diversas formas de isomeria em compostos de coordenação, mas o foco
aqui será apenas em dois tipos de isomeria: a geométrica e a de ligação.
A isomeria geométrica vem de diferentes arranjos com os mesmos ligantes em um
complexo octaédrico ou quadrado planar. O primeiro caso de isomeria em geometria
octaédrica vem de complexos com fórmula química MA4B2. Como pode-se ver na Figura
64, existem dois arranjos para esta fórmula. Este arranjo faz lembrar o caso de isomeria
cis- e trans- de compostos orgânicos cíclicos. E este é da mesma forma que chamamos
estes isômeros. O isômero trans- apresenta os mesmos ligantes (B) em lados opostos em
relação a um plano contendo os outros ligantes. No isômero cis-, os ligantes iguais estão
CEFET Química Química Inorgânica
91
em posições adjacentes no octaedro. Complexos com geometria quadrado planar
também apresentarão este tipo de isomeria, mas para complexos do tipo MA2B2. A
denominação cis- ou trans- para o complexo deve vir antes do nome do mesmo.
B
A
A
A M
B
A
A
A
A
A M
B
B
Isômero cis Isômero trans Figura 64. Isomeria geométrica em complexos do tipo MA4B2.
Nos complexos octaédricos ainda existe outro tipo de isomeria, para compostos
com dois tipos de ligantes, de fórmula MA3B3. A Figura 65 mostra os dois isômeros,
nomeados de mer- e fac-. No isômero mer-, que deriva de meridional, os três ligantes
iguais estão contidos em um mesmo plano que passa pelo centro do octaedro, ou seja,
um plano que contém o metal. No isômero fac-, que significa facial, os três ligantes iguais
estão contidos em uma das faces do octaedro. Assim como no caso para os isômeros cis-
e trans-, o caso de isomeria mer- e fac- deve ser escrita no nome do complexo.
B
A
B
A
B
A
M B
B
B
A
A
A
M
Isômero mer Isômero fac Figura 65. Isomeria geométrica em complexos do tipo MA3B3. Em vermelho a face do octaedro
com três ligantes do mesmo tipo.
A isomeria de ligação ocorre quando o complexo tem um ligante que é
ambidentado. Por conta disto, existirão complexos com a mesma fórmula, mas estrutura
diferente, como mostra a Figura 66. Neste caso de isomeria não é preciso acrescentar
CEFET Química Química Inorgânica
92
nada ao nome dos compostos de coordenação, já que o nome do ligante muda
dependendo do ponto de coordenação.
O
NH3
H3N
H3N Co
NH3
NH3
N O
2+
N
NH3
H3N
H3N Co
NH3
NH3
O
2+
O
(I) (II)
Figura 66. Isomeria com o ligante NO2
– em um complexo [Co(ONO)(NH3)5]2+ (I) (pentaaminonitritocobalto(III)) e [Co(NO2)(NH3)5]2+ (II) (pentaaminonitrocobalto(III)).
9.4 – Teoria do Campo Cristalino (TCC) Quando Bohr teve sucesso na descrição do espectro atômico do hidrogênio
através de sua teoria das órbitas quantizadas, ficou claro que espectroscopia e a
configuração eletrônica das espécies estavam intimamente ligadas. Para entender, por
exemplo, as cores dos compostos de coordenação, era preciso uma teoria que
envolvesse a configuração eletrônica destes. A Teoria do Campo Cristalino (TCC) foi uma
das teorias que surgiram para explicar o comportamento eletrônico dos compostos de
coordenação. Com argumentos bastante simples, a TCC explicava diversas propriedades
dos compostos de coordenação e, por isso, passou a ser utilizada para prever e explicar o
comportamento desses compostos.
Segundo a TCC cada ligante é tratado como um ponto esférico de densidade
negativa que, ao se aproximar do metal, entra em repulsão com os elétrons que ocupam
orbitais do tipo d dos metais. A repulsão causada pelos ligantes irá depender do arranjo
destes em relação ao metal (e seus orbitais d). Quando são seis os ligantes, a geometria
é octaédrica (o que se chama na TCC de campo octaédrico). Para quatro ligantes, o
campo é tetraédrico (se a geometria for tetraédrica).
No campo octaédrico, os ligantes se aproximam na direção dos eixos espaciais x,
y e z. Os orbitais do tipo d, posicionados nos eixos, experimentarão uma maior repulsão
do que os posicionados na região entre os eixos (Figura 67). Quando analisamos os cinco
orbitais d, os dois que estão posicionados nos eixos ( 2y2xd
− e 2z
d ) aumentarão de
CEFET Química Química Inorgânica
93
energia, enquanto os três entre os eixos (dXY, dXZ e dYZ) terão uma energia menor
(Figura 68). Há, portanto, uma quebra na degenerescência dos cinco orbitais d, dando
origem ao desdobramento dos orbitais d, onde os orbitais 2y2xd
− e 2z
d são chamados de
orbitais eg e os orbitais dXY, dXZ e dYZ são chamados de t2g. A diferença de energia entre os
orbitais eg e t2g é chamada de parâmetro de desdobramento do campo cristalino,
simbolizado por Δo (Dq ou 10Dq também são usados para expressar esta diferença de
energia).
A estabilidade dos complexos (e algumas outras propriedades) dependerá de
como os elétrons estarão distribuídos. Define-se a energia de estabilização do campo
cristalino, EECC, como sendo
Oge2gt )Δ0,6n0,4n(EECC +−= (30)
onde n é o número de elétrons que ocupa os orbitais. Quanto mais negativa for EECC,
maior é o ganho em estabilidade causado pelo desdobramento. Por exemplo, o íon Cr3+
tem configuração d3. Portanto seus três elétrons irão ocupar os orbitais t2g. Então a
energia de estabilização para um complexo deste íon seria:
OOCr 1,2Δ0)Δ0,630,4(EECC −=⋅+⋅−= (31)
A partir de íons com configuração d4 existem duas possibilidades: ou ocupar os
orbitais de maior energia (eg) ou ter elétrons emparelhados nos orbitais de menor energia.
Sempre que a energia de desdobramento (ΔO) for maior que a energia gasta para o
emparelhamento de elétrons (P) o sistema terá elétrons emparelhados. Estes complexos
são chamados de complexos de campo alto ou de spin baixo. Entretanto, se o
desdobramento for menor que a energia de emparelhamento, o elétron ocupa um orbital
de maior energia. Os complexos com configuração eletrônica deste tipo são chamados de
complexos de campo fraco ou de spin alto. Por tais motivos torna-se de fundamental
importância saber que fatores influenciam na magnitude de ΔO. E são dois os mais
importantes: o metal (quanto ao número de oxidação e a série de transição a que
pertence) e o ligante.
CEFET Química Química Inorgânica
94
Figura 67. Orbitais d do metal em um campo octaédrico.
Δo
-2/5 Δoorbitais d
eg
t2g
+3/5 Δo
Figura 68. Desdobramento dos orbitais d em um campo octaédrico.
O metal exerce forte influência no desdobramento. Ao aumentarmos a carga do
metal o desdobramento aumenta, pois quanto maior é a carga, maior é a atração entre o
metal e o ligante. Ademais, séries de transição mais elevadas geram maiores
desdobramentos. Tal comportamento é explicado, pois orbitais mais volumosos
necessitam de menor energia para o emparelhamento de elétrons e, por serem mais
difusos (maior polarizabilidade), geram maiores interações com os ligantes. Como
exemplo deste efeito podemos citar o [Fe(H2O)6]3+ que possui ΔO = 14000 cm-1 (1,74 eV)
enquanto o [Ru(H2O)6]3+ tem ΔO = 28600 cm-1 (3,55 eV).
A natureza do ligante também é responsável pela magnitude do desdobramento.
Os ligantes que forçam o emparelhamento ou, em outras palavras, causam um grande
CEFET Química Química Inorgânica
95
desdobramento, são chamados de ligantes de campo forte. Já os ligantes que irão formar
um complexo de spin alto são chamados de ligantes de campo fraco. A determinação dos
valores de ΔO se dá por espectroscopia. Analisando-se as transições e energias
envolvidas podem-se calcular os valores de ΔO. Com base nesses dados, construiu-se a
série espectroquímicaa:
I–<Br–<S2–<SCN–<Cl–<NO2
–<<F–<OH–<C2O42– (ox)<O2–<H2O
<NCS–<CH3CN<NC5H5 (py)<NH3<NH2CH2CH2NH2 (en)
<2,2´-NC5H5C5H5N (bipy)<NO2–<P(C6H5)3<CH3
–<CN–<CO
Os ligantes do início da série são considerados de campo fraco e os do final os de
campo forte. A TCC não consegue explicar a ordem dos ligantes na série
espectroquímica. Levando-se em conta a força da interação eletrostática era de se
esperar que um ligante carregado causasse uma ligação mais intensa do que ligantes
neutros (e, portanto, um maior desdobramento). Outro exemplo da imprecisão da TCC na
série espectroquímica é que a água é um ligante mais fraco que a amônia, mesmo tendo
um momento de dipolo maior. A série espectroquímica foi explicada mais tarde por uma
outra teoria, baseada nos orbitais moleculares.
A abordagem feita para o campo octaédrico também foi feita para o tetraédrico. A
diferença é a posição dos ligantes em relação aos orbitais d. Em um complexo octaédrico,
os ligantes estão posicionados nos eixos (Figura 67), enquanto no campo tetraédrico, os
ligantes estão posicionados fora dos eixos. Portanto, os ligantes de um complexo com
geometria tetraédrica irão afetar os orbitais d do metal de forma diferente da observada
em um campo octaédrico. Os orbitais d fora do eixo (dXY, dXZ e dYZ) serão mais afetados
pela presença dos ligantes e, por isso, serão os de maior energia no diagrama dos
orbitais – onde são identificados como orbitais t2. Já os dois orbitais que ficam nos eixos
serão os de menor energia, chamados de orbitais e. A Figura 69 mostra o desdobramento
dos orbitais d para um campo tetraédrico.
A magnitude do parâmetro de desdobramento do campo cristalino para complexos
tetraédricos (Δtd) é menor que para os complexos do mesmo metal em um campo
octaédrico. Normalmente, os complexos tetraédricos são de campo fraco: Δtd é menor que
a energia de emparelhamento dos elétrons.
a Em negrito está o átomo que fará a ligação em ligantes ambidentados. As abreviações são: oxalato (ox); piridina (py), etilenodiamina (en) e bipiridina (bipy). Esta série é resultado de uma média de parâmetros, podendo haver inversões em alguns casos.
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Δtd
+2/5 Δtd
orbitais d
e
t2
-3/5 Δtd
Figura 69. Desdobramento dos orbitais d em um campo octaédrico.
A geometria tetraédrica não é a única possível para o número de coordenação 4.
Há também a geometria quadrado planar. A geometria quadrado planar pode ser vista
como um caso extremo do efeito de Jahn-teller. O efeito de Jahn-Teller causa uma
distorção geométrica em complexos octaédricos, principalmente em complexos onde os
metais possuem configuração eletrônica d8 e d9. A distorção causada pelo efeito de
Jahn-Teller pode ou alongar ou encurtar as ligações de alguns dos ligantes e isto leva a
uma mudança no diagrama de orbitais. A Figura 70 mostra as distorções que levará até
um complexo com geometria quadrado planar.
L
LL
LL M
L
L
LL
LL M
L
LL
LL M
a) b) c)
Figura 70. Uma distorção causada pelo efeito de Jahn-Teller. a) Um complexo octaédrico regular;
b) os ligantes no eixo z se afastam; e c) um complexo com geometria quadrado planar.
Ao considerar que os ligantes do eixo z irão se distanciar, até que não haja mais
ligação entre eles e o metal, admite-se que a repulsão nos orbitais localizados no eixo z
irá diminuir. Assim, um novo desdobramento irá ser observado, onde os orbitais com
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componentes no eixo z terão energia menor do que no campo octaédrico, enquanto os
outros orbitais sofrem um acréscimo energético em relação à situação anterior (Figura
71). Os complexos quadrado planar são, tipicamente, de campo forte. Desta forma, os
elétrons são emparelhados antes de se ocupar um orbital de maior energia.
orbitais d
eg
t2g
dxz dyz
dxy
dz2
dx2-y2
Quadrado Planar
Octaédrico
dxz dyz
dxy
dz2
dx2-y2
Figura 71. Desdobramento em um complexo com geometria quadrado planar.
Após entender todos os diagramas de orbitais para as geometrias mais comuns
dos complexos, voltemos à questão das cores dos complexos. Segundo a TCC, as cores
observadas nos complexos se devem a transições eletrônicas entre os orbitais d do metal,
portanto, um reflexo do desdobramento destes orbitais. Quanto maior for desdobramento,
mais energia será necessária para as transições eletrônicas acontecerem. Dessa forma, o
comprimento de onda absorvido será menor.b Quando a luz branca (luz visível) atravessa
o composto, este absorve um dado comprimento de onda com energia idêntica ao da
magnitude do desdobramento dos orbitais d, e os outros comprimentos de onda presentes
passam sem serem absorvidos. Portanto, enxergamos uma mistura de cores de todos os
comprimentos de onda – menos o que foi absorvido! É o que chamamos de cores
complementares. A Tabela 14 mostra as cores e suas cores complementares.
b Lembre-se: pela relação de Planck, E = h.c/λ. Então, quanto menor o comprimento de onda (λ) maior é a energia (E).
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Voltando ao caso descrito por Werner para os isômeros CrCl3.6H2O. Quando se
tinha o complexo [Cr(H2O)6]3+, era observada uma cor azul para violácea. Isto significa
que a absorção se dá numa faixa entre 560 e 595 nm. Já o complexo [Cr(H2O)4Cl2]+ exibe
uma cor verde escura, sinal de que absorve o comprimento de onda característico da cor
vermelha, na faixa de 650 à 750 nm. Isto está de acordo com a série espectroquímica. O
cloreto é um ligante mais fraco que a água e, portanto, a troca de moléculas de água por
íons cloreto causa uma diminuição na magnitude do desdobramento dos orbitais.
Portanto, observa-se que o íon-complexo [Cr(H2O)4Cl2]+ tem seu máximo de absorvância
num comprimento de onda maior (de menor energia) que o do íon-complexo [Cr(H2O)6]3+. Tabela 14. Cores e suas cores complementares.
Comprimento de onda (nm) Cor Cor Complementar.
400 – 435 Violeta Amarelo esverdeado
435 – 480 Azul Amarelo
480 – 490 Azul esverdeado Laranja
490 – 500 Verde azulado Vermelho
500 – 560 Verde Roxo
560 – 580 Amarelo esverdeado Violeta
580 – 595 Amarelo Azul
595 – 650 Laranja Azul esverdeado
650 – 750 Vermelho Verde azulado
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Exercícios 1 – Explique porque a ocupação de orbitais moleculares do tipo ligante favorece a formação da molécula enquanto ocupar os orbitais moleculares do tipo antiligante favorece a dissociação da molécula. 2 – Desenhe o diagrama de orbitais moleculares para as espécies NO, NO+ e NO–. Preveja que espécie terá a maior energia de ligação entre nitrogênio e oxigênio.
3 – A energia de ionização do N2 é 1503 kJ/mol, do O2 é 1164 kJ/mol e do NO é de 894 kJ/mol. Explique porque a energia de ionização varia deste modo para estas moléculas. 4 – Explique, usando a TOM e a TLV, porque a molécula de Ne2 não existe. 5 – A molécula de HeH+ pode ser estável? Explique. 6 – Nas reações abaixo, identifique o ácido e a base de Lewis: a) HCl(aq) + NaOH(aq) → NaCl(aq) + H2O(l) b) BH3 + NaH → NaBH4 c) CsF + SF4 → Cs[SF5] d) CoCl3 + 4NH3 → [CoCl2(NH3)4]Cl 7 – Em reações de substituição nucleofílica de primeira ordem há a formação de carbocátions. A estabilidade dos carbocátions segue a seguinte ordem:
C(CH3)3+ > CH(CH3)2
+ > CH2CH3+ > CH3
+ Explique porque a estabilidade diminui – ou seja, a reatividade aumenta – quando o número de grupos alquila ligados ao carbono positivo diminui. 8 – Use argumentos da Teoria da Ligação de Valência para mostrar que os compostos de boro do tipo BX3 (X = H, Cl, Br e I) são ácidos de Lewis. 9 – Dentre os compostos possíveis citados na questão anterior, qual seria o mais forte? Justifique sua resposta. 10 – Nomeie os compostos abaixo:
a) Ni(CO)4 e) Fe(CO)5 i) [Co(H2O)6]Cl2
b) Fe[CoF6] f) K3[Fe(CN)6] j) Na2[Zn(OH)4]
c) [RuCl2(NH3)4]Cl g) [Cr(NH3)3(H2O)3]Cl3 l) [Fe(acac)(NH3)4]Br
d) [Co(NH3)6][NiCl4] h) [AgCl2]– m) Na[Fe(EDTA)]
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11 – Considere o íon-complexo com a fórmula [Co(SCN)2(NH3)4]+:
a) Quantos são os isômeros para este complexo?
b) Escreva a fórmula estrutural de todos os isômeros.
c) Nomeie todos os isômeros.
12 – Explique porque o complexo [Ru(ox)3]3– é um complexo de spin baixo enquanto o [Fe(ox)3]3– é de spin alto. Mostre também o diagrama dos orbitais mostrando a distribuição de cada um dos complexos.
13 – O complexo [Cr(H2O)4Cl2]+ tem seu máximo de absorvância num comprimento de onda maior que o do íon-complexo [Cr(H2O)6]3+. Explique porque isto é observado. 14 – Por que os orbitais 2z
d e 22 yxd
−são de maior energia quando a geometria é
octaédrica e de menor energia quando a geometria é tetraédrica? 15 – Por que a TCC não pode ser usada para explicar a ordem de força dos ligantes? Por exemplo, F– e OH– são ligantes mais fracos que P(C6H5)3 e CO. 16 – Preveja qual dos compostos apresentará o maior Δo e justifique sua escolha:
a) [CoF6]3– ou [Co(CN)6]3–
b) [Ru(CN)6]3– ou [Fe(CN)6]3–
c) [Fe(CN)6]3– ou [Fe(CN)6]4–
17 – Preveja, com base nas informações dadas, se os complexos são de campo forte ou fraco. Justifique suas escolhas. a) O complexo [Mn(H2O)6]2+ é incolor.
b) O complexo [Ru(NH3)6]2+ é diamagnético.
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Bibliografia ATKINS, P. W. e FRIEDMAN, R. S. Molecular Quantum Mechanics. 3a edição. Oxford: Oxford University Press, 1997. ATKINS, P. W. e SHRIVER, D. F. Inorganic Chemistry. 3a edição. Oxford: Oxford University Press, 1999. HUHEEY, J. E. Inorganic Chemistry: Principles of structure and reactivity. 3a edição. New York: Harper Collins Publishers, 1983. JONES, C.J. A Química dos Elementos do Bloco d e f. Porto Alegre: Bookman, 2002. LEE, J. D. Química Inorgânica Não Tão Concisa. 4a edição. São Paulo: Editora Edgard Blücher Ltda, 1996. LEWIS, G. N. “Valence and tautomerism.” J. Am. Chem. Soc., 35, 1448 – 1455, 1913.
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