A sujeição da renda da terra e as repercussões no campo: o contraste entre
Petrolina-PE e Capela-SE
Leandro Cavalcanti Reis
Universidade Federal de Sergipe (UFS)
Mestrando do Núcleo de Pós-Graduação em Geografia- UFS
O campo Brasileiro é palco de uma profunda conflitualidade entre classes com interesses antagônicos, de um lado a família camponesa tem a terra como objeto de reprodução familiar, do outro o agronegócio tem a terra como objeto ampliação, expansão e reprodução do capital. O presente texto busca discutir as formas de sujeição da renda da terra, comparado dois territórios distintos do agronegócio Nordestino; a produção de cana-de- açúcar no município de Capela-SE e a produção da fruticultura irrigada no município de Petrolina-PE. Para o capital não é mais fundamental para a sua reprodução a posse da terra, tendo em vista que ele pode sujeitar a renda da terra da produção camponesa. Palavras-chave: Campo, Renda da terra, Agronegócio, produção camponesa, território.
Introdução
A Questão agrária se torna complexa pelas próprias contradições do
desenvolvimento do capitalismo, e a sua compreensão está entre um dos maiores
desafios para pesquisadores das Ciências Humanas, sobretudo para estudiosos da
Geografia Agraria.
No desenvolvimento do modo de produção capitalista tem se notado diferentes
aspectos, no espaço geográfico, com a mesclagem de formas primitivas de acumulação
(escravidão, colonização, expropriação camponesa), formas complexas de apropriação de
mais-valor, e também na sua mais nova forma do capital financeiro.
Para se reproduzir o capital aumenta as desigualdades sociais e espaciais
promovendo alterações catastróficas na subordinação do trabalho, agravado pela
destruição da natureza e, contraditoriamente, do próprio ser humano.
Com a necessidade incessante da busca da extração incessante de lucro vem
promovendo uma intensa barbarização, que atinge, sobretudo, os trabalhadores, com a
apropriação pelo capital do mais-valor.
Nessa lógica contraditória, do desenvolvimento do capitalismo no campo, resulta
em dois processos distintos: a territorialização do capital, e a monopolização do território,
na territorialização o capital precisa se apropriar, expropriar, principalmente com a
instalação de empresas da agroindústria, na monopilização sem territorialização,
caracteriza pela subordinação da produção camponesa ou da pequena produção aos
interesses do capital monopolista.
Com o processo de monopolização do território as empresas instaladas em áreas
de acordo com os seus interesses e monopolizam o território, determinando o que será
produzido, estabelecendo contratos com os pequenos camponeses e pequenos
produtores e até capitalistas que passam a produzir e entregar sua produção ao
interesses do capital, é nesse processo de monopolização que as empresas extraem a
renda da terra, sem contudo precisar expropriar as relações não capitalistas, sobretudo a
partir da ação do Estado.
É nesse contexto da subordinação da pequena produção ao agronegócio que se
encontram os pequenos produtores do Vale do São Francisco, que a partir apoio do
Estado que as empresas do agronegócio da fruticultura irrigada extraem a renda de
monopólio a partir do selo de indicação geográfica e também empresas do agronegócio
do setor sucroalcooleiro subordinam a produção de camponeses assentados de reforma
agraria no município de Capela no Estado de Sergipe.
Este artigo é fruto de discursões da disciplina Teorias e Técnicas de Geografia
Agrária e do trabalho de campo realizado no Estado de Sergipe, tendo como centro os
processos de disputa territorial entre campesinato e agronegócio, e da nossa pesquisa de
mestrado em andamento, isso nos possibilitou inúmeras reflexões teóricas a partir da
analises das conjunturas estudadas.
Tem por objetivo analisar as diferentes formas de extração da renda da terra
fazendo um comparativo entre o assentamento José Emídio dos Santos no Município de
Capela no Estado de Sergipe e no Perímetro irrigado Senador Nilo Coelho no Munícipio
de Petrolina Estado de Pernambuco e os rebatimentos para os pequenos produtores.
A pesquisa está embasada no método materialismo histórico dialético, por
possibilitar reflexões capazes de compreender o fato histórico na sua totalidade (inserido
num sistema mais amplo de relações) e, dessa forma, se negar a permanecer na
superfície aparente dos fenômenos. Destaca-se ainda, pelo fato de compreender a
realidade atual nas múltiplas determinações na sua dimensão histórica concreta em
movimento.
Desenredando a renda capitalista da terra
Compreender a realidade social atual predispõe de uma compreensão do
funcionamento do sistema sociometabólico do capital e seus elementos constitutivos –
capital, trabalho (assalariado) e Estado, sobretudo porque o capital se expande tanto na
cidade como no campo, como destaca Martins, 1983, p.152 “ A tendência do capital é de
tomar conta progressivamente de todos os ramos e setores da produção, no campo e na
cidade, na agricultura e na indústria”.
Após o final do século XIX e início do século XX, com a nova fase do capital
monopolista, ampliava-se e redefinia-se o processo de sujeição da renda da terra
camponesa ao capital, em que o capital transforma a renda da terra em renda
capitalizada, sem, contudo expropriar o camponês da terra.
De acordo com Oliveira (2007) nesse momento os camponeses seguem os
ditames do capital, sujeitando a renda da terra a este. Destarte a renda é extraída do
produto produzido pelo camponês e seu trabalho familiar, transformando-se em capital.
No momento em que o capital se apropria da renda sem, contudo, precisar ter a posse da
terra, esta produção de capital, neste caso, é feita por uma via não especificamente
capitalista.
Remetendo-se à história socioeconômica e comparando com o presente, um ponto
que distinguir a renda da terra das sociedades pré-capitalista para a sociedade capitalista
é que na primeira o próprio produtor entrega diretamente nas mãos do proprietário da
terra o excedente que esse exige pelo uso da terra ao trabalhador; na segunda é a forma
mais desenvolvida, a apropriação ocorre na circulação, ou seja, no momento da troca de
mercadoria e não na produção direta. Entretanto, apesar da diferenciação, a forma antiga
não desaparece com a forma mais desenvolvida.
A renda da terra é uma categoria característica da Economia Politica, usada para
demonstrar o lucro extraordinário, suplementar, permanente, a renda da terra pode ser
auferida tanto na cidade como no campo.
O lucro extraordinário é a fração apropriada pelo capitalista acima do lucro médio,
um lucro suplementar. Na indústria ele é circunstancial, devido ao avanço tecnológico,
pelo fato desse avanço nas técnicas poder ser apropriado pelos demais capitalistas no
decorrer tempo, não tendo uma maior vantagem sobre os demais capitalistas. Porém, na
agricultura, ele é permanente, pelo fato de existirem diferenças nos instrumentos de
produção - a terra - que não é equivalente para todos os proprietários, por exemplo, as
diferenças entre a fertilidade natural dos diversos tipos de solos.
Há outras denominações para a renda da terra, como renda territorial ou renda
fundiária. Sendo ela um lucro extraordinário permanente, ela é, portanto, produto do
trabalho excedente. Marx define o trabalho excedente, como a parcela do processo de
trabalho que o capitalista subtrai do trabalhador, deixando com o trabalhador apenas uma
pequena parcela para adquirir os meios necessários para a reprodução do seu existir.
A renda da terra na sociedade capitalista pode ser resultante da concorrência,
renda da terra diferencial; do monopólio, renda da terra absoluta; e existe a renda de
monopólio, que é também lucro adicional, derivado, de um preço de monopólio de certa
mercadoria produzida em uma parte da terra “dotada de qualidades especiais”.
A renda da terra diferencial se expressa sob duas formas: a renda diferencial I e a
renda diferencial II. A renda diferencial I não depende de aplicação de capital
especificamente na produção, enquanto que a renda diferencial II resulta diretamente da
aplicação de capitais para melhorar a fertilidade natural do solo.
A renda diferencial I é apropriada por aqueles que detêm a posse das terras
mais férteis. Como a produtividade natural do solo não é equivalente em todos lugares, e
o preço de produção do solo com baixa fertilidade é aquele que determina o preço de
mercado, aqueles que produzem em um solo mais fértil conseguem auferir a renda da
terra diferencial I de forma permanente, desde que esse solo esteja produzindo. Por
exemplo, no caso do Estado de Sergipe, um produtor de cana-de-açúcar, que possui
extensões territoriais em solos do tipo massapê, tem uma produtividade natural, por
hectare, superior àquelas que têm solos argilosos.
Na renda da terra diferencial I, leva-se em conta também a localização das terras
em relação aos mercados consumidores, por exemplo, considerando duas propriedades
com extensões iguais – A e B - mas em localizações diferentes: a propriedade A, a
poucos quilômetros de distância do centro consumidor; e a propriedade B a dezenas ou
centenas de quilômetros do centro consumidor, obviamente a propriedade A vai auferir a
renda diferencial I, pois os custos com transportes serão menores que a da propriedade
B.
Por isso há uma tendência para o capital de apropriar das áreas com melhor
fertilidade natural do solo e ao mesmo tempo em que estejam próximas dos centros de
consumo, entretanto essa tendência pode ser anulada, ao passo que o capital passe a
investir no aumento da fertilidade do solo utilizando-se fertilizantes e corretivos agrícolas,
etc. Quando a renda da terra aparecem decorrente de investimentos ela é denominada de
renda da terra diferencial II.
[...] quando provém do aumento da fertilidade decorrente de investimento de capitais para melhorar a fertilidade natural, é renda da terra diferencial II. Trata-se, pois, de uma terceira causa da renda da terra diferencial, mas ao contrário das outras, é uma causa eminentemente capitalista, pois se trata do efeito do investimento de capital. (OLIVEIRA, 2007, p. 52)
Entretanto, a constituição da renda da terra diferencial II, não se dá apenas por
melhoria nas condições de fertilidade do solo, mas, concomitantemente, pela melhoria
das condições naturais das sementes empregadas. Exemplo claro são as sementes
geneticamente modificadas. Pode também, decorrer da adequação genética das
sementes ou das mudas às condições ambientais gerais das diferentes parcelas do globo
terrestre, em cultivos para o mercado pelos capitalistas. Um protótipo é quando temos
investimentos em irrigações para produzir em regiões semiáridas, ou quando um
determinado cultivo passa a se reproduzir em condições diferentes da sua aptidão natural.
Segue esta lógica a produção de Maçãs em regiões de clima quente em virtude das
mudanças genéticas.
Como define Oliveira, a renda da terra diferencial II é típica do próprio do sistema
de produção capitalista na agricultura - processo típico do agronegócio “[...] a renda da
terra diferencial II, tem sua origem na intensificação dos investimentos de capitais no
processo de produção, lógica básica do próprio processo de produção capitalista na
agricultura” (2007, p. 52).
A renda da terra absoluta resulta da posse privada do solo e da contradição
existente entre o interesse do proprietário da terra e o interesse da sociedade. É originária
do distanciamento entre os preços de mercado e os preços de produção, isto é, provém
da alta do preço de mercado acima do preço de produção.
Como define Oliveira a renda da terra absoluta é o controle da terra por uma classe
social, e a cobrança de uma taxa para que ela produza.
É dessa forma que o exercício do monopólio de uma classe ou fração de classe sobre a terra pode só colocá-la para produzir mediante a cobrança de um tributo, permitindo assim que mesmo o "pior solo" (que não deveria pagar renda) possa também auferir a renda da terra absoluta. A renda da terra absoluta é, pois, obtida mediante a elevação (artificial, pois ao contrário as terras não são colocadas para produzir pelos capitalistas) dos preços dos produtos agrícolas acima do preço de produção geral (que sempre deveria ser o preço do "pior" solo). (2007, p. 52)
A renda da terra absoluta só será extinta com o fim da propriedade privada da
terra, pondo fim a este tipo de renda da terra, pois do contrário, a sociedade inteira terá
que pagar essa tarifa, aos proprietários de terras, para que as terras sejam postas para
produzir.
A renda da terra de monopólio é, também, lucro adicional oriundo do preço do
monopólio de uma mercadoria produzida em um determinado espaço, dotado de
“qualidades especiais”. Este preço de monopólio é, por sua vez, determinado apenas pela
vontade e pela capacidade de pagamento dos consumidores, não dependendo, portanto,
do valor dos produtos (quantidade de trabalho socialmente necessário para produzir) ou
mesmo do preço geral de produção.
O excedente entre o preço de monopólio e o preço de produção particular do
produto é um lucro suplementar, acima do lucro médio, que permite a quem produz uma
mercadoria especial auferir a renda da terra de monopólio.
Enquanto a renda da terra absoluta englobar toda a sociedade a renda de
monopólio seleciona os que podem pagar uma fração maior pela qualidade “especial”
conseguindo então auferir a renda de monopólio, como nos explica Oliveira:
Ao contrário, pois, da renda da terra absoluta que de certo modo acaba por ser regulada no mercado em função das pressões sociais, a renda da terra
de monopólio não está praticamente sujeita a estas pressões, pois, não depende do consumo necessário da população. Ou seja, ela não é o produto alimentar básico, apenas depende do desejo e da capacidade de compra daqueles que a querem consumir (OLIVEIRA, 2007, p. 58).
Um exemplo que podemos utilizar para exemplificar renda da terra de monopólio é
o vinho do Porto em Portugal. O vinho é produzido em uma região que permite obter este
tipo singular de qualidade ímpar, tendo produção reduzida, e assim, acaba por
proporcionar um preço de monopólio. Este preço de monopólio só pode ser conseguido
exclusivamente pela capacidade de compra dos refinados compradores, pois os produtos
são vendidos a preço de monopólio. Este gera, portanto, a renda da terra de monopólio,
que, por sua vez, é obtida pelos possuidores dessas terras dotadas destas “qualidades
especiais”.
O entendimento da categoria renda da terra é essencial, tanto para a percepção da
realidade agrária como também do contexto urbano, mas sobretudo para desvendar as
novas estratégias de controle do capital no campo, que não mais precisa ser o
proprietário titular da terra, para que se aproprie da riqueza produzida pelo produtor.
O selo de indicação geográfica: uma nova forma de extração renda da terra no Vale
No processo de constituição dos Perímetros Irrigados no Vale do São Francisco o
Estado teve e continua tendo papel fundamental, sobretudo privilegiando o “novo”, o
agronegócio, em detrimento da pequena produção, principalmente a campesina,
considerada “atrasada”.
Na consolidação desses Perímetros, o Estado agiu diretamente para viabilizar o
capital, redefinindo relações sociais de trabalho, especialmente no campo, logo após a
segunda guerra mundial, com um discurso de melhoria na qualidade de vida da
população.
Isso se torna bastante evidente, à medida que incentivaram, atraíram ou
concederam - aos grandes empresas do agronegócio - terras da própria União, bem como
a expropriação de camponeses. Deste modo exploram força de trabalho dos
trabalhadores expropriados, por vezes simultaneamente, sujeitando a renda da terra dos
pequenos produtores que vivem em meio ao circuito do agronegócio. Entretanto, estes
processos não ocorrem sem gerar conflitos. A conflitualidade está na essência destes
processos, como destaca Fernandes:
A conflitualidade é inerente ao processo de formação do capitalismo e do campesinato. Ela acontece por causa da contradição criada pela destruição, criação e recriação simultâneas dessas relações sociais. A conflitualidade é inerente ao processo de formação do capitalismo e do campesinato por causa do paradoxo gerado pela contradição estrutural. A conflitualidade e o desenvolvimento acontecem simultâneos e consequentemente, promovendo a transformação de territórios, modificando paisagens, criando comunidades, empresas, municípios, mudando sistemas agrários e bases técnicas, complementando mercados, refazendo costumes e culturas, reinventando modos de vida, reeditando permanentemente o mapa da geografia agrária, reelaborado por diferentes modelos de desenvolvimento (FERNANDES, 2006, p.6)
O capital com o apoio do Estado sempre cria mecanismos de manter sob controle
as relações não capitalistas, subordinado aos interesses, ao passo que monopolizam o
território e determinam o que será produzido, sujeitando a renda ao capital.
Marx já chamava atenção quando analisou a renda da terra que o capital extraia a
renda de monopólio quando produzia em determinadas áreas, produto com condições
inigualáveis, e tinham consumidores dispostas a pagar o preço por essa “qualidade
especial” conseguindo então um valor adicional no produto, a renda de monopólio.
No caso do Vale do São Francisco, a extração da renda da terra se sobrepõe, pois
o capital não está interessado apenas no lucro médio e sim na possibilidade de conseguir
um lucro acima da média, no primeiro momento o capital se beneficiou com a extração da
renda diferencial II, em detrimento de um excessivo investimento, sobretudo do Estado,
para produzir em uma região que não possui regularidade pluviométrica. Coube, então, ao
Estado a criação de Hidroelétricas para contenção do fluxo da água do rio São Francisco
e ao mesmo tempo geração de energia, criação de canais, estações de bombeamentos,
criação de empresas públicas para desenvolvimento de pesquisa, caso da EMBRAPA
(Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), e Universidades para formar mão de
obra especializada.
Todas essas ações do Estado fizeram do Vale do São Francisco uma região capaz
de propiciar altos ganhos para o agronegócio, destacando o perímetro em nosso estudo
se propõe analisar, o Senador Nilo Coelho que está em funcionamento desde 1984 com
área total de 18.563 ha entre lotes familiares e empresariais, dos quais são (12.520 ha –
lotes familiares; 6.043 ha lotes empresariais) com predominância da fruticultura, com
destaque para manga, seguida da produção de uva e goiaba. Ver Mapa 01.
MAPA 01:
LOCALIZAÇÂO DO PERRÍMETRO SENADOR NILO COELHO
Fonte: Execução: SILVA FILHO, P.P apud SOUSA, 2013.
Em 1997 o polo do Vale do São Francisco já se consolida um importante produtor
de frutas, com destaque para a exportação, segundo dados do IBGE 2010 , a região
contribui com cerca de 90% da exportação de uva e manga do Brasil.
A qualidade das furtas produzidas no Vale do São Francisco passam a ser
consideradas; em virtude do clima e solo, e manejo, tendo qualidade inigualável com
características únicas no mundo.
Ao mesmo tempo os produtores devem também cumprir exigências dos mercados,
principalmente Europeu. Tais normas estão expostas nos selos, e para consegui-los,
demanda do cumprimento de uma série de requisitos, bem como o pagamento para
adquiri-lo.
As exigências são impostas, no discurso, como se fosse dos consumidores, mas o
próprio capital cria esse discurso para extrair a renda da terra, e manter um domínio sob a
pequena produção, subordinando. Entre os selos criados como estratégia de extração da
renda, um deles elaborado pelo próprio Estado - o selo de Indicação Geográfica-IG.
Para compreender a essência do selo de indicação geográfica – IG deve-se fazer
uma retrospectiva. Criado em 1996 pelo Projeto de Lei1, surge para garantir a proteção e
diferenciação de produtos no mercado, com dois tipos de indicação Geográfica:
“indicação de procedência (IP)” e “denominação de origem (DO)”, sendo competência do
INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) o estabelecimento de condições de
registro das indicações geográficas.
A indicação de procedência (IP) refere-se ao nome do local que se tornou
conhecido por produzir, extrair ou fabricar determinado produto ou prestar determinado
serviço.
A denominação de origem (DO) refere-se ao nome do local, que passou a designar
produtos ou serviços, cujas qualidades ou características podem ser atribuídas a sua
origem geográfica.
O INPI que é vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior (MDIC), foi criado em 1970 com a missão de aperfeiçoamento, disseminação e
gestão do sistema brasileiro de concessão e garantia de direitos de propriedade
intelectual para a indústria.
Ao longo dos anos, algumas cidades ou regiões ganham fama por causa de seus produtos ou serviços. Quando certa qualidade e/ou tradição de determinado produto ou serviço podem ser atribuídos a sua origem, a
1 No Brasil, a Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996), define o conceito de indicações geográficas e a Resolução INPI nº 75/2000 estabelece as condições para seu registro.
Indicação Geográfica - IG surge como fator decisivo para garantir sua proteção e diferenciação no mercado. Isso porque a IG delimita a área de produção, restringindo seu uso aos produtores da região (em geral, reunidos em entidades representativas) e onde, mantendo os padrões locais, impede que outras pessoas utilizem o nome da região em produtos ou serviços indevidamente. A IG não tem prazo de validade. Com isso, o interesse nacional por esta certificação é cada vez maior. (INPI 2013, p.1)
O pedido de registro de reconhecimento de indicação de procedência é custa o
valor de 590,00 R$ e 2.135,00 para o Pedido de registro de reconhecimento de
denominação de origem.
O discurso de garantir proteção e diferenciação no mercado, dos produtos e
serviços de certa “qualidade especial” é um discurso que efetiva uma busca do capital do
agronegócio para auferir a renda de monopólio, e subordinar a pequena produção que
não pode pagar pelo custo para adquirir o selo.
O selo entra como forma selecionar para que nem todos os produtores dessas
regiões que produzem produtos “especiais” possam auferir a renda da terra de monopólio,
pois os custos e as exigências selecionam apenas uma classe para a obtenção, cabendo
ao Estado o encargo de representar os interesses da classe dominante.
O selo de Indicação de Procedência do Vale do Sub-médio São Francisco, foi
adquirido em 2009, abrange os Municípios do Oeste de Pernambuco e Norte da Bahia,
como se observa na figura 01.
FIGURA 01: DESCRIÇÃO DO SELO DE PROCEDÊNCIA DO VALE DO SUBMÉDIO SÃO
FRANCISCO
Fonte: INPI, 2013. Disponível em: http://www.inpi.gov.br/images/docs/lista_com_as_indicacoes_geograficas_concedidas_13-06-2013.pdf
Somente as empresas e agricultores filiados à União das Associações e
Cooperativas dos Produtores de Uvas Finas de Mesa e Mangas (UNIVALE),
especialmente, as do Polo Juazeiro/Petrolina, podem utilizar em seus produtos o selo, ver
figura 02.
FIGURA 02: SELO UTILIZADO PELA IG DO POLO JUAZEIRO/PETROLINA
Fonte: INPI, 2013. Disponível em:
http://www.agricultura.gov.br/desenvolvimento-sustentavel/indicacao-geografica/selos-no-brasil
A função do selo de indicação Geográfica não é apenas rotular nas uvas e magas,
seu caráter “especial”, que ao serem lançadas no mercado se mostram singular até
mesmo em relação as frutas produzidos na mesma região, garantindo aos capitalistas
(empresários) que possam extrair a renda da terra de monopólio.
No caso do vale os pequenos produtores de magas e uvas, que não detém os
selos vendem sua produção, por um preço inferior aos que podem pagar pelas
certificações, e em muitos casos, grandes produtores compram a produção dos pequenos
para poderem extrair a renda.
A renda camponesa e o processo de monopolização do território: uma análise do
Assentamento José Emídio dos Santos em Capela-SE
Como na sua essência o campesinato se diferencia das relações de produção
capitalista, há uma dificuldade de entendimento, sobre a existência de uma renda da terra
na unidade de produção camponesa. Esse debate sobre a possibilidade do camponês
extrair ou não renda da terra permeou uma profunda discussão entre os clássicos da
Questão Agrária.
Para iniciar o debate retomamos ao conceito de renda capitalista da terra, que é
fundamental para a compreensão do desenvolvimento e expansão do capitalismo no
campo. Em epítome observou-se que a renda da terra é um lucro acima da média, um
lucro extraordinário, que isso só é possível porque um grupo de pessoas, em detrimento
do restante da sociedade, cobram um tributo para produzir.
De acordo com Chayanov (1981) na produção agrícola familiar, enquanto detentora
dos meios de produção usa sua força de trabalho no cultivo da terra, e recebe como
resultado certa quantidade bens. Observando essa estrutura interna da unidade de
trabalho familiar, é suficiente para entender que é impossível sem a categoria salários,
impor a está estrutura o lucro, a renda e o juro. O autor usa essa afirmativa para negar a
intencionalidade do camponês em objetivar o lucro. Conforme segue argumentando o
autor:
Uma análise mais profunda indica o seguinte: o produto do trabalho indivisível de uma família, e, por conseguinte, a prosperidade da exploração familiar, não aumenta de maneira tão marcante quanto o rendimento de uma unidade econômica capitalista influenciada pelos mesmos fatores, porque o camponês trabalhador, ao perceber o aumento da produtividade do trabalho, inevitavelmente equilibrará os fatores econômicos internos de sua granja, ou seja, com menor exploração de sua capacidade de trabalho. Ele satisfaz melhor as necessidades de sua família, com menor dispêndio de trabalho, e reduz assim a intensidade técnica do conjunto de sua atividade econômica (CHAYANOV, 1981, p. 141).
O que Chayanov nos explica é que o aumento na quantidade rendimento por
unidade de trabalho é revertida em aumento na qualidade de vida da família camponesa,
diminuindo a penosidade do trabalho familiar na unidade de trabalho, e apesar dee gerar
uma renda fundiária no balanço trabalho/consumo, em virtude de uma renda diferencial I,
não determinam um ganho extraordinário, ao contrario de uma relação capitalista.
Em uma unidade familiar a apropriação da renda aparece convertida em bem-estar
e diminuição do uso da força de trabalho, já para um empresário capitalista, investe essa
renda em setores que possibilite um maior retorno possível, explorando o trabalhador.
Para analisar um caso empírico de renda da terra camponesa, sobretudo a renda
diferencial I, examinou-se um caso de uma assentada da reforma agrária do
Assentamento José Emídio dos Santos, no Município de Capela-SE, Mapa 01.
MAPA 02:
LOCALIZAÇÃO DO ASSENTAMENTO JOSÉ EMÍDIO DOS SANTOS
Fonte: REIS, MARCIO, 2013.
O assentamento - onde reside o caso da família aqui analisada - foi concretizado
após mais de 10 anos de ocupação das terras da antiga Usina Santa Clara. Em meio ao
processo de falência da usina, os trabalhadores ocupam as terras em 1995, sobrevivendo
e resistindo em meio a uma intensa conflitualidade marcada inclusive pela morte de um
trabalhador, em 2005 ele se torna PA.
O projeto de assentamento está localizado na microrregião do Vale do Rio
Cotinguiba, onde possuem terras com alta fertilidade, propícias para a produção da cana-
de-açúcar, em meio às usinas do setor sucroalcooleiros.
Inseridos nesta conflitualidade entre agronegócio e o campesinato, com um
avançado processo de resistência e subordinação, vivem cerca de 280 famílias de
trabalhadores rurais. Entre essas famílias, o núcleo familiar da assentada que atribuímos
o pseudônimo de Maria, no seu lote (com cerca de 5,4 hectares) produz cana-de-açúcar,
para vender diretamente para a Agroindustrial Campo Lindo, que monopoliza o território
mesmo sem a posse formal das terras.
Inicialmente, as análises e reflexões buscaram tentar compreender como se dá o
processo de resistência-subordinação, e como a Usina e conseguia mantê-los
subordinados a logica de mercado. Para tanto, aplicou-se a categoria renda da terra, do
tipo diferencial I, em virtude dos índices de fertilidade do solo.
A partir da entrevista com a assentada Maria, análise do discurso, e ulteriormente,
de dados dos órgãos oficiais de pesquisa elaboraramos a Tabela 012.
2 A tabela foi elaborada utilizando os dados do ano de 2012;
O custo operacional foi obtido a partir de dados do custo da Mão-de-Obra e Insumos, para região Nordeste ano 2012, Fonte: Pecege/ESALQ, 2012 Disponível em: http://www.custoseagronegocioonline.com.br/numero2v8/cana.pdf. A produtividade média do Estado de Sergipe, obtido de dados do IBGE, 2012. Fonte: IBGE, 2012, Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/agropecuaria/lspa/estProdAgr_201203.pdf Os demais dados foram obtidos mediante entrevista com Maria.
TABELA 01
Fonte: REIS, Leandro, 2013.
Chegamos aqui no que Marx chamava de situações excepcionais, onde o
camponês consegue auferir a renda da terra, caso esse em virtude de uma super-
produtividade do solo dessa região. Posto isto, pode-se verificar que o preço de produção
do “pior” terreno, o "B" (R$3.100,00), é que determinou o preço de produção geral. Então,
o terreno de "Maria" embora tivesse um preço de produção particular igual ao "B", possui
uma fertilidade natural superior a este, pois produziu 75 toneladas de cana-de-açucar por
hectare, enquanto que o terreno "B" produziu 50 toneladas por hectare, levando em conta
que os dados são da média da produção de Sergipe e não do menos fértil que é o que
regula o preço.
Assim, o terreno de “Maria” pode auferir através do preço de produção geral
determinado pelo “pior” terreno (R$62,00 a tonelada), um preço de produção total de R$
4.650,00. A diferença existente entre o preço de produção geral obtido pelo terreno de
"Maria" e o seu preço de produção particular, R$1.550,00 é a renda da terra diferencial I -
lucro extraordinário, suplementar, que se formou acima do lucro médio que. Essa renda
da terra diferencial I foi possível, em decorrência da diferença da fertilidade natural
existente entre os solos.
Apesar de nossas considerações de que Maria consegue extrair renda da terra,
contudo não, nos leva a pensar que a renda da terra extraída por um produtor que do
trabalho familiar, tem a mesma conotação de um produtor capitalista, enquanto o
camponês não objetiva o lucro, para o capitalista a sua finalidade é justamente o lucro.
A chave para essa questão em debate está na leitura por meio do conceito de
monopolização do território sem a territorialização do capital, Oliveira (1981, 1994), para
ele o capital não mais precisar se territorializar(expropriar, ser dono formal da terra), para
Natureza do
Terreno
Cana produzido
(t)/ha
Custo Operacional R$/há
Taxa de Lucro Médio
50%/R$
Preço de Produção Particular
Preço de Produção
Geral
Renda da Terra
Diferencial I R$/ha
Total R$/há
(t) R$
Total R$/ha
(t) R$
Maria 75 1550 1550 3100 42,00 4650 62,00 1.550
B 50 1550 1550 3100 62,00 3100 62,00 0
se apropriar da riqueza, isso acontece via monopolização do território pelo capital, criando
condições para sujeitar a renda da terra.
Nesse caso o provavelmente acontece é que a empresa do setor sucroalcooleiro
apropria de parte da renda da terra, mas em virtude da boa fertilidade do solo da unidade
de produção familiar essa renda da terra não é totalmente apropriada, de forma que
resultaria em um estimulo para que a produção familiar continue a ser subordinada pela
do agronegócio do setor sucroalcooleiro.
Sobretudo por certas “vantagens” para a família camponesa, como por exemplo; a
liberação da força de trabalho familiar por longo período do ano, pelo fato da produção de
cana-de-açúcar necessitar de pouca força de trabalho durante o ano, e pelo embolso pela
produção anual da cana-de-açúcar, garantir a essa familiar condições básicas de
reprodução.
Mas essas “vantagens” coloca a unidade de produção familiar em extrema
vulnerabilidade da logica de mercado, pois se não houver a compra da produção, não há
como garantir a reprodução da familiar; libera ao mesmo tempo sua a força de trabalho
para proletarização tanto no campo como na cidade.
Portanto o camponês subordinado ao setor sucroalcooleiro, ao passo que garante
sua permanência e reprodução familiar estão extremamente sujeito a ordem do capital,
apropriando-se de parte do trabalho familiar, para promover a concentração de riqueza.
Conclusão
O campo no capitalismo é marcado por um antagonismo, de um lado uma classe
que tem na terra um instrumento de trabalho para reprodução familiar a outra classe a
terra como negocio para a geração riqueza e concentração de riqueza, marcado por uma
realidade em movimento.
O conceito de renda capitalista da terra é fundamental para a compreensão do
desenvolvimento do capitalismo no campo, mesmo depois de séculos da sua formulação,
a partir dela podemos entender processos atuais de extração da renda, sobretudo pelo
agronegócio, o lucro extraordinário, que só é possível porque um grupo de pessoas em
detrimento do restante da sociedade possui a propriedade fundiária.
Para o capital não basta a obtenção do lucro médio ele busca o lucro
extraordinário, acima da média. Este busca sempre a extração da renda da terra, e para
isso, cria condições de subordinar a renda, sobretudo a partir de mecanismos para
apropriação da renda. É notável, então que o Estado é agente fundamental para garantir
a extração da renda.
Dessa forma o Estado cria diretamente a certificação que dá direito ao agronegócio
da fruticultura irrigada de se apropriar da riqueza produzida pelos pequenos produtores,
com o discurso que esta ação proporcionará a todos uma valorização da produção. Aqui,
o Estado é o agente idealizador e fiscalizador das IGs, atendendo majoritariamente os
interesses da classe dominante - a burguesia do agronegócio Nacional e Internacional.
No caso do assentamento José Emídio dos Santos, o capital consegue apropriar-
se da renda da terra daqueles que lutam diretamente contra o capital – os assentados do
MST – via a alta produtividade do solo do Vale Cotinguiba, no município de Capela-SE.
Nesta situação, o agronegócio do setor sucroalcooleiro, consegue apropriar-se da renda
da terra, e ao mesmo tempo liberar força de trabalho para se proletarizar em grande parte
nas próprias indústrias da cana-de-açúcar.
A renda da terra, enquanto objeto de nosso estudo, associa antigas formas de
extração com novas formas, havendo uma concomitância, que tem no cerne da questão a
apropriação da riqueza produzida pelo trabalhador do campo, sobretudo aqueles que têm
a terra com intuito de garantir a reprodução familiar, os camponeses.
Por isso a conflitualidade existente entre o campesinato e o agronegócio não cessa
com a conquista da terra, pois o capital cria mecanismo de se apropriar da riqueza
produzida trabalho da família camponesa, mesmo sem deter a posse direta da terra. Essa
conflitualidade só terá termino com o fim da sociedade de classes, ou seja, com a
emancipação da classe trabalhadora do campo e da cidade.
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