ISSN 2176-1396
A FORMAÇÃO CONTINUADA EM ESCALA: UMA PROPOSTA COM
CENTRALIDADE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DOS EDUCADORES
DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Ângela Imaculada Loureiro de Freitas Dalben1
Grupo de trabalho: Didática: Teorias, Metodologias e Práticas
Resumo
O cenário do mundo contemporâneo evidencia a importância dos processos de formação
continuada em todas as áreas profissionais. No caso da formação de professores, o
enfrentamento dessa questão no Brasil é algo fundamental que envolve a capacidade de
promover políticas articuladoras entre os diferentes níveis, redes de ensino e entre os entes
federados, no sentido de provocar mudanças e delinear propostas com ações em escala, haja
vista o tamanho continental do Brasil. Entretanto, a formação continuada de professores não
pode ser concebida apenas como um meio de acumulação de cursos, palestras, seminários, de
conhecimentos ou técnicas, mas deve ser, realmente, um trabalho centrado na reflexão crítica
das práticas pedagógicas vividas pelos sujeitos profissionais em formação porque envolve,
antes de tudo a construção permanente da identidade pessoal e profissional desses educadores
em exercício. Parte-se do pressuposto que a formação continuada é um processo cumulativo
de construção de sentidos e significados durante o exercício profissional. Os conhecimentos
são construídos durante as interações nas ações em processo, na relação entre os sujeitos e os
consequentes sentidos dessas ações. Diante disso, apresentamos a seguir algumas reflexões
sobre a experiência vivida de construção de uma proposta de formação continuada em escala
para a rede estadual de Minas Gerais. A experiência realizada apontou alternativas para o
aprimoramento do trabalho nas escolas por meio do diálogo, da troca de experiências, da
reflexão das contradições próprias dos processos educativos e da construção coletiva, com
intenso diálogo entre os pesquisadores das IES e os relatos de experiência dos docentes da
escola de Educação Básica.
Palavras-chave: Formação Continuada de professores. Didática. Magistra.
1 Professora aposentada da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais e Diretora da
MAGISTRA – Escola de Formação e Desenvolvimento Profissional de Educadores de Minas Gerais – gestão
2012-2014.
30379
Introdução
No Brasil a perspectiva de uma educação pública de qualidade que incorpore a
articulação entre os diferentes níveis e modalidades de ensino sempre foi pauta dos
movimentos pela qualidade da educação e da escola. Apesar dos avanços consolidados nos
últimos anos, existe ainda uma enorme demanda por cursos e programas de formação inicial e
continuada de professores, provocada pelas carências históricas de atendimento massivo com
qualidade para todo o contingente de professores inseridos nos sistemas públicos de educação
básica do país. Assim, convivemos com uma realidade contraditória; os grandes centros no
entorno das grandes capitais possuem, potencialmente, um corpo docente qualificado em
instituições de ensino superior de renome e muitos educadores com mestrados e doutorados.
Existe, ainda, dificuldades de permanência desse grupo no interior da carreira docente, pela
baixa atratividade dos salários e das perspectivas profissionais delineadas nas carreiras
propostas pelas redes públicas de educação. Os professores mais qualificados procuram as
escolas da rede privada, enxergando nelas melhores condições de trabalho e remuneração e
outros se encaminham para a docência do Ensino Superior em busca de um novo percurso
profissional. Assim, convive-se com a ausência de professores bem formados nas escolas das
redes públicas, especialmente, aqueles das disciplinas básicas. A consequência dessa situação
é a presença de profissionais com formação precária em termos de fundamentos das
disciplinas que lecionam e até sem formação inicial em cursos de nível superior. 2
Importantes ações do Governo Federal nos últimos tempos foram apresentadas como
alternativas para a construção de um quadro mais promissor, como é o caso do Decreto
6.755/2009 que institui a Política Nacional de Formação de Profissionais da Educação que
apresentou, dentre as suas metas, a colaboração entre instituições e com o poder público para
o desenvolvimento de programas e projetos de formação continuada e o desenvolvimento
profissional dos professores; a articulação orgânica entre as Universidades e sistemas de
ensino, no desenvolvimento de ações, projetos e políticas de formação com vistas ao
aprimoramento da educação básica; a articulação entre graduação, pós graduação e extensão,
estreitando os vínculos entre ensino, pesquisa e extensão e entre estudantes licenciandos e
docentes da educação básica, como constitutivos do trabalho docente na educação superior; a
superação da distância atualmente existentes entre as condições do exercício do trabalho
docente na educação básica e aquelas existentes na educação superior, pela valorização da
22 Para maiores informações, vide GATTI et al, 2011.
30380
carreira docente e aproximação dos profissionais da educação básica com pós graduação, dos
processos formativos de formação continuada (BRASIL, 2009).
Para cumprir tais responsabilidades o decreto estimula a criação de novas propostas,
objetivando enfrentar desafios que envolvam a formação em escala, formação com
características capazes de atuar enfrentando as diversidades próprias do campo e de enfrentar
as precárias condições materiais e de infra estrutura existentes em múltiplas regiões do país.
Reforça, ainda, a esse decreto as ideias discutidas por ocasião da Conferência Nacional de
Educação – CONAE em 2010.
De acordo com a Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da
Educação Básica, a formação continuada é entendida como componente essencial da
profissionalização docente, devendo integrar-se ao cotidiano da escola e considerar os
diferentes saberes e a experiência docente. Assim, a formação continuada se constitui no
conjunto das atividades de formação desenvolvidas após a formação inicial e que se realizam
ao longo de toda a carreira docente, buscando a melhoria da qualidade do ensino e o
aperfeiçoamento profissional. A necessidade dessas ações formadoras decorre do
reconhecimento de que as mudanças sociais, econômicas e culturais, colocam novas questões
para a escola. Por meio da formação continuada os profissionais da educação se atualizam,
conhecem novas técnicas de ensino, trocam informações com outros colegas, confrontam
conhecimentos, refletem sobre suas práticas, dividem problemas, encontram soluções. Ainda
neste contexto de discussão, tanto o PDE quanto o PNE (2010)3 mobilizaram um movimento
a favor de ações concretas com o incentivo à criação de Centros de Formação Continuada de
Professores nos estados brasileiros, na perspectiva de reafirmar a importância de uma política
orgânica para essa formação com a definição concreta de instâncias capazes de promover a
reflexão dos problemas da escola e a indução na produção de conhecimentos específicos sobre
como realmente formar professores para a escola da contemporaneidade.
É importante salientar que a importância política desta temática não se vincula,
especificamente, a todo esse aparato de legalidade que a envolve, mas a própria realidade tem
evidenciado que o investimento em formação continuada e desenvolvimento profissional dos
profissionais da educação nos tempos atuais é uma questão de exigência para o exercício da
cidadania e para a revitalização da instituição escolar como espaço social de formação das
gerações futuras. O enfrentamento dessa questão no Brasil é algo fundamental e envolve a
333 Um novo PNE foi elaborado em 2014 e tem mobilizado as redes públicas do país na construção das metas
específicas por município e estados.
30381
capacidade de promover políticas articuladoras das diferentes redes de ensino, públicas e
privadas, federal, estadual e municipal e mais, envolver as Instituições de Ensino Superior
num amplo debate em que os tradicionais temas e posicionamentos sobre as questões, assim
como as metodologias de produção de conhecimento sejam também debatidas.
Nessa perspectiva a formação continuada de professores não pode ser concebida
apenas como um meio de acumulação de cursos, palestras, seminários, de conhecimentos ou
técnicas, mas deve ser, realmente, um trabalho centrado na reflexão crítica das práticas
pedagógicas vividas pelos sujeitos profissionais em formação porque envolve, antes de tudo a
construção permanente da identidade pessoal e profissional desses educadores em exercício.
Neste texto, estaremos discutindo esta temática a partir da experiência vivida de criação da
MAGISTRA4, a escola da escola, uma proposta de formação continuada em escala para a rede
estadual de Minas Gerais. A experiência realizada apontou alternativas para o aprimoramento
do trabalho nas escolas por meio do diálogo, da troca de experiências, da reflexão das
contradições próprias dos processos educativos e da construção coletiva, com intenso diálogo
entre os pesquisadores das IES e os relatos de experiência dos docentes da escola de Educação
Básica.
Modelos de formação continuada de educadores: como enfrentar o problema?
Muito se tem discutido sobre formatos e metodologias de formação continuada de
educadores. A maioria dos autores, quando se referem às concepções de formação continuada
de professores, apoia-se em Demailly (1992) e Nóvoa (1992) que classificam projetos em
modelos ou em Gatti (2003) que aborda a multiplicidade de dimensões que a formação
envolve e outros. Phillippe Perrenoud (1993, p.157), por exemplo, afirma que “formar
professores significa prepará-los para observar, decidir e agir em situação tendo em conta o
conjunto dos objetivos e dos constrangimentos que caracterizam a ação pedagógica numa sala
de aula”.
Entretanto, em seu comentário, uma pergunta torna-se fundamental: em qual contexto
ou de qual sistema estamos falando quando nos referimos à formação de professores? A
proposição do autor refere-se a uma ação pedagógica no interior de um sistema tal como ele é,
ou a concepção de formação de professores se preocupa com a transformação das práticas
pedagógicas em sala de aula? Ao se formar um profissional, deseja-se prepará-lo para um
4 Disponível em: magistra.educacao.mg.gov.br/
30382
trabalho eficaz numa determinada perspectiva prática. E, nesse sentido, o próprio autor afirma
categoricamente que, conforme a resposta dada a essas questões estar-se-á definindo
distintamente a concepção de formação (PERRENOUD, 1993, p.157), e, concomitantemente,
o olhar pedagógico a ser privilegiado nessa prática.
Segundo Marcelo Garcia (1992, p. 59) “[...] a reflexão é, na atualidade o conceito mais
utilizado por investigadores, formadores de professores e educadores diversos, para se
referirem às novas tendências da formação de professores”.
Vários autores têm utilizado termos como: prática reflexiva, ensino como arte,
professor reflexivo, professor como investigador na sala de aula, para caracterizar o novo
professor nessa perspectiva. Todos esses termos pretendem traduzir a necessidade de se
formar professores que agem em função de processos importantes de análise do seu trabalho
cotidiano, que sabem resolver os problemas do dia a dia, através do diálogo com o
conhecimento e com a técnica, na expectativa de que essa reflexão seja um instrumento de
desenvolvimento da ação e do pensamento.
Essa abordagem implica grande esforço pessoal e profissional, trabalho livre e criativo
na construção desse professor-pessoa. Assim sendo, o êxito do profissional dependeria das
condições de interação com o ambiente de trabalho e os tempos de reflexão sobre as ações no
cotidiano, além da dinâmica de elaboração e re-elaboração da sua própria ação. Nesse prisma,
os conceitos de processo reflexivo, reflexão na ação, reflexão sobre a ação, utilizados por
Shön (1992), Perez Gomez (1992), Marcelo Garcia (1992) e outros, são apropriados e
pertinentes para a análise dos processos de formação docente, mas ficam dependentes das
condições de trabalho dos próprios educadores.
Também Perez Gomez (1992, p.103) pesquisa a natureza do processo de reflexão e
frisa o fato desse processo não ser apenas biológico e individual, mas “implica a imersão
consciente do homem no mundo da sua experiência, um mundo carregado de conotações,
valores, intercâmbios simbólicos, correspondências afetivas, interesses sociais e cenários
políticos”.
O processo reflexivo, nessas circunstâncias, integra significativamente o conhecimento
acadêmico, teórico, científico, técnico, mas também o conhecimento de senso comum,
popular e cotidiano, num referencial amplo capaz de avaliar e interpretar a realidade concreta
na qual se vive a fim de organizar a própria atividade prática. Aliás, os autores têm se
preocupado em distinguir conceitos presentes no pensamento prático para que o processo de
reflexão se torne claro, assim como os níveis de conhecimentos que são produzidos. São três
30383
os níveis de conhecimento apontados por estes autores: 1 - “conhecimento na ação” - que se
manifesta no saber fazer. É o conhecimento da ação inteligente, implícito na atividade prática,
fruto da experiência e da reflexão passada; 2- “reflexão na ação”- que se produz a partir da
reflexão sobre o que fazemos ao mesmo tempo em que agimos. Essa atividade é o que SHÖN
(1992, p.82-85) chama de “reflexão na ação”, isto é, um diálogo com a situação problemática
e sobre uma interação particular que exige uma intervenção concreta. Este conhecimento se
sobrepõe ao primeiro sem a necessária sistematização e distanciamento requeridos numa
análise racional, mas tem a riqueza da captação viva, imediata e múltipla do envolvimento
com a situação problemática. 3- “reflexão sobre a ação e sobre a reflexão na ação” - um
conhecimento de terceira ordem que se dá na análise efetuada posteriormente à ação do
sujeito que a utiliza para descrever, analisar e avaliar. Na reflexão sobre a ação, o professor
avalia a ação na perspectiva da compreensão e reconstrução de sua prática levando em
consideração os instrumentos utilizados e os esquemas de pensamento.
Marcelo Garcia (1992, p.104) considera a “reflexão na ação” o melhor instrumento de
aprendizagem e de formação, que permite ao profissional se colocar perante a realidade de
maneira flexível e aberta. No contato com a situação prática, o professor adquire novas
teorias, esquemas e conceitos assim como vivencia o processo dialético da aprendizagem.
Em suma, percebe-se que essas três ordens de conhecimento são fundamentais no
processo de desenvolvimento profissional e auxiliam o professor no entendimento do seu
contexto de práticas docentes em que a sala de aula passa a ser o grande foco de reflexão.
Nesse contexto, a observação curiosa, a análise e a avaliação crítica da própria experiência
prática transforma o educador no direcionador do seu trabalho, com possibilidade de maior
autonomia em suas decisões, não dependente de técnicas, regras, receitas ou normas e
prescrições curriculares impostas externamente por órgãos de administração escolar ou
manuais de orientação curriculares. É um processo que auxilia a aquisição da autonomia
profissional.
Isso significa que os processos de formação de professores devem considerar a
importância dos processos de reflexão da prática porque seriam eles que permitiriam ao
professor criar novas possibilidades de práticas, abrindo horizontes, criando elos de ligação
com outros conhecimentos já produzidos, as teorias disponíveis e outras perspectivas para
novos conhecimentos sobre elas. As relações sociais teriam chances de se redefinirem porque
a reflexão coletiva passa a ser um elo fundamental. Em decorrência, relações mais solidárias,
30384
cooperativas e coletivas seriam buscadas, exigindo uma reorganização do trabalho da escola e
da sala de aula.
No entanto, torna-se procedente perguntar: as condições concretas existentes no
cotidiano das escolas de educação básica têm permitido aos educadores realizarem processos
de reflexão sistemáticos sobre suas ações práticas? Existem espaços e tempos definidos para
que estes processos de reflexão aconteçam? Se estes espaços e tempos existem, que tipo de
orientação tem chegado às escolas para que os educadores consigam realizar sistematizações
sobre os seus trabalhos, favorecendo saltos de qualidade para o desenvolvimento de ações
pedagógicas mais qualificadas? Que rotinas de trabalho existem nas escolas que favorecem a
construção de uma prática coletiva? Existem tempos de sistematização dos conhecimentos
sobre as experiências realizadas?
Formação continuada de educadores – uma opção política
Na verdade, realizar a formação continuada de educadores é algo bastante complexo e
os pesquisadores sabem disso, já que qualquer escolha de um modelo específico ficará
condicionada à conjunção de forças desse campo. Isso significa que um bom modelo para um
grupo pode não o ser para outro, dependendo das expectativas e desejos dos participantes. Os
contextos institucionais e sociais que enquadram as práticas dos professores da educação
básica são diversos e as demandas por educação se constroem em bases bastante diferentes
em cada região do país ou pequenas comunidades.
Marin (2002) afirma que a formação continuada de professores deveria transformar a
escola em espaço de troca e de reconstrução de novos conhecimentos. Deveria partir, também,
do pressuposto da educabilidade do ser humano, numa formação que se dá num continuum,
em que existe um ponto que formaliza a dimensão inicial, mas não existe um ponto que possa
finalizar o processo. Assim, a formação continuada torna-se, em si, um espaço de interação
entre as dimensões pessoais e profissionais em que aos professores é permitido apropriarem-
se dos próprios processos de formação, dando-lhes um sentido no quadro de suas histórias de
vida.
Analisando-se o posicionamento dessa autora e de outros renomados pesquisadores da
área da educação citados anteriormente, justifica-se a ideia de que não adianta organizar
propostas de formação que atinjam grupos representativos de docentes para a participação em
ações formativas, na esperança de que estes se transformem em multiplicadores em suas
escolas de atuação, isto é, um curso ou programa de formação é algo único para o
30385
participante, sendo impossível sugerir a quem realizou a formação replica-lo para os demais
colegas, porque é impossível garantir-se as mesmas condições da experiência original.
Diante dessas considerações, como resolver a oferta em escala da formação de
educadores da educação básica no Brasil? Se desejarmos garantir democraticamente as
mesmas oportunidades a todos os educadores das escolas do país, qual seria o grande salto a
ser dado pelas políticas públicas?
Como afirmamos anteriormente, a formação continuada não pode ser concebida
apenas como um meio de acumulação de cursos, palestras, seminários, de conhecimentos ou
técnicas, mas deve ser, realmente, um trabalho centrado na reflexão crítica de seu trabalho
cotidiano e em suas demandas imediatas. Não se pode esquecer que uma formação em
exercício deve considerar, antes de tudo, que os sujeitos em formação já possuem uma
identidade pessoal e profissional, sendo na verdade mais um período cumulativo de
construção de sentidos e significados para o exercício profissional. Os conhecimentos são
construídos durante as interações nas ações em processo, na relação entre os sujeitos e os
consequentes sentidos dessas interações. Assim, mesmo que exista algo, definidamente,
objetivo a ser aprendido durante um curso ou seminário ou outra ação de formação proposta
por qualquer instituição, sabe-se que outros conhecimentos não tangíveis estarão envolvendo
o campo de formação ou novos conhecimentos estarão emergindo dessa relação em razão das
experiências anteriores dos profissionais envolvidos, suas necessidades e demandas
específicas, seus dramas pessoais e seus interesses imediatos. Trabalhar com a formação
continuada é conviver com a imprevisibilidade e o inusitado, já que as experiências de cada
profissional são infinitamente diferentes em razão dos seus contextos de práticas. Essa
perspectiva amplia as noções de formação e desenvolvimento profissional pela incorporação,
além da dimensão cognitiva, dos aspectos pessoais, éticos e atitudinais.
Essa circunstância exige o conhecimento de aspectos da realidade em que os
profissionais atuam que podem interferir ou auxiliar na construção das ações de formação. Se
se espera que dialoguem com suas próprias práticas, torna-se coerente oferecer condições para
que aprendam a dialogar profissionalmente, aprendam a dialogar com os pares, com o
ambiente e com os possíveis formadores.
Ainda nesse mesmo sentido, existe outro ponto a salientar que envolve o próprio
diálogo dos gestores das redes com a própria escola e os educadores. Um problema detectado
nos últimos tempos é o tratamento que tem sido dado aos educadores em momentos de
alternância dos gestores da política. As escolas das redes públicas têm enfrentado o grave
30386
problema da dispersão de propostas educacionais compradas pelos gestores públicos,
implementadas sem a devida análise das demandas e necessidades das práticas pedagógicas
escolares, alguns projetos apresentados de maneira fragmentada e em descontinuidade,
formulados por governos que entram e saem sem o tempo devido de finalização e avaliação
de seus produtos e sem o devido respeito ao que foi implementado nos governos anteriores.
Essa dispersão desmotiva os profissionais, impede a reflexão e a busca pela efetividade a
partir da avaliação da experiência concreta. Isso acaba por construir o desprestígio para quem
formula e para quem executa, desânimo para os profissionais da escola e descrédito da
sociedade civil. É o grave problema de quem considera a educação como um projeto de
governo e não um projeto de estado.
Dito isso, advogamos a importância de uma opção política clara quando se propõe
uma proposta de formação de educadores, sabendo que a concepção adotada construirá o
alicerce do cenário das relações pedagógicas a serem estabelecidas entre os proponentes do
projeto e os sujeitos em processos de formação, sejam eles os educadores em sala de aula ou
os educandos em processo de escolarização.
Apresentamos a seguir algumas reflexões sobre a experiência vivida de construção de
uma proposta de formação continuada em escala para a rede estadual de Minas Gerais. A
formulação do projeto se pautou pelas pesquisas e pressupostos discutidos anteriormente
pelos autores da área e pretendeu colocar em prática os seguintes aspectos: a prática
pedagógica dos educadores como centro de toda a formação e os processos de reflexão nos
três níveis de conhecimento discutidos anteriormente para a construção da profissionalidade
docente; valorização do profissional da educação pelo que ele faz e cria e o reconhecimento
desse trabalho por meio de critérios semelhantes àqueles utilizados pelo ensino superior como
o registro e produção de relatos de experiência em forma de trabalhos acadêmicos, divulgação
e publicação desses relatos em eventos e periódicos; vínculos estreitos com os pares docentes
do ensino superior por meio do diálogo e participação direta em minicursos e palestras;
ampliação da experiência cultural.
A experiência de formulação da proposta de formação continuada
A MAGISTRA - Escola de Formação e Desenvolvimento Profissional dos Educadores
de Minas Gerais foi criada pelo governo de Minas Gerais pela Lei Delegada n. 180, de 20 de
janeiro de 2011, como um órgão responsável por realizar ações de formação continuada
objetivando a melhoria da oferta pública de educação do estado. A elaboração do seu projeto
30387
foi entregue a um grupo de pesquisadores da educação convidados pela representante da
Secretaria de Educação de Minas Gerais na época5.
A MAGISTRA não pretendeu se limitar à organização de propostas de formação
segundo modelos tradicionais cuja oferta de curso acontece independente da demanda dos
educadores. Sua concepção pedagógica procurou se diferenciar a partir da premissa de que os
processos de aprendizagem são mais relevantes do que conteúdos previamente selecionados a
serem apreendidos. Nesse contexto, optava por centrar-se em ações e percursos de formação.
Sabia-se que a desmotivação e a ausência de incentivos na carreira docente eram, ainda,
empecilhos aos processos de adesão dos educadores a qualquer ação de formação apresentada
oficialmente na rede, naquela ocasião. Assim, depois de uma ampla pesquisa exploratória do
contexto educacional mineiro e de grande processo de problematização sobre as questões que
envolvem a formação de educadores, definiu-se por um projeto desenvolvido de forma
integrada ao cotidiano da escola, considerando os diferentes saberes construídos nesse
trabalho com os estudantes pelos docentes, proporcionando-lhes, concomitantemente, o
acesso permanente a informações, vivências e atualizações culturais, incorporando, para isso,
as tecnologias digitais. Complementarmente, os princípios norteadores da escola pública,
democrática e gratuita brasileira seriam os fundamentos do projeto, isto é: I. Igualdade de
condições de acesso à escola e ao conhecimento. Traduzidos à MAGISTRA como: desejo
de abrigar o educador de todas as maneiras em propostas diversas, atende-lo em formatos e
temas diversos, responder às suas dúvidas e questões e permitir-lhe participar das ações e
propostas sempre que desejar; II. Qualidade do ensino. Articulada às dimensões técnica e
política, assumida como as possibilidades de oferecer instrumentos e métodos, técnicas e
procedimentos, além de propostas viáveis de serem implementadas em escala em todo o
Estado de Minas Gerais. A garantia de adesão das escolas e dos educadores às propostas se
daria pelo seu valor intrínseco e pela flexibilidade de acesso em função das diversidades
regionais; III. Qualidade política. Traduzida pela participação de todos aos fins, valores e
conteúdos das propostas de ação do projeto. A MAGISTRA privilegiaria a qualidade política
da inclusão e o desejo de acolher todos os educadores mineiros em comunidades de prática;
5 Em janeiro de 2011, a professora Ana Lúcia Almeida Gazzola, Secretária de Estado de Educação convidou a
autora deste texto para elaborar o projeto e deu-lhe liberdade para convidar outros colegas para participarem
desse trabalho. Assim, participaram da formulação do PPP da Magistra: Ângela Imaculada Loureiro de Freitas
Dalben, Paula Cambraia de Mendonça Vianna, Tânia Margarida Lima Costa e Selma de Moura, professoras
pesquisadoras da UFMG.
30388
IV. Gestão democrática. Traduzida pela compreensão, em profundidade, do significado da
prática pedagógica, em que o amálgama entre concepção e execução, entre o pensar e o fazer,
entre a teoria e a prática são formas éticas de vivenciar o compromisso social com a
escolarização das gerações futuras. Princípio complexo de ser assimilado, pois requer a
participação crítica e permanente dos educadores na construção permanente do projeto de
educação da rede e de sua gestão cotidiana. V. Educação como um processo contínuo.
Traduzido pela valorização do profissional do magistério em diferentes sentidos,
vislumbrando a qualidade do ensino ministrado nas escolas e o sucesso na tarefa de formar
cidadãos responsáveis pelo bem comum.
As práticas de formação da escola deveriam tomar como referência as dimensões
coletivas do fazer pedagógico e suas rotinas na escola, isto é, as equipes e os processos
educativos presentes no produzir essa escola e suas instâncias específicas. E nesse contexto,
dever-se-ia pensar em como uma escola se transforma em um ambiente educativo por
natureza, em que trabalhar e formar são atividades integradas que constroem um cotidiano
formador.
Assim, mergulhadas neste oceano de possibilidades, a equipe de criação do PPP da
escola de formação se viu diante de questões bastante desafiadoras, como: quais são as
habilidades, atitudes e informações as pessoas necessitam para desenvolverem processos de
reflexão que lhes permitam tomar consciência do que fazem e do seu potencial profissional
para fazer mais e melhor? Quando inseridas em ambientes dinâmicos e repletos de
informações o que fazer para trazer à tona os conhecimentos latentes que as rodeiam e como
favorecer o estímulo ao estudo e à pesquisa para que novas práticas emerjam para um fazer
mais qualificado e de melhoria das aprendizagens dos discentes? Como transformar as
informação sobre as pesquisas acadêmicas sobre a escola e o fazer docente da educação
básica em conhecimentos importantes para serem incorporados às práticas dos educadores da
escola básica ? Como forjar experiências capazes de transformar os saberes da prática, os
conteúdos curriculares, os saberes profissionais em conhecimentos para a construção de uma
escola de educação básica mais dinâmica, mais próxima das demandas e necessidades do
mundo contemporâneo e mais adequadas ao exercício de uma cidadania plena?
Partia-se do pressuposto de que uma escola é o espaço do público, lugar do debate, do
diálogo fundado na reflexão coletiva. Nutre-se da vivência cotidiana de cada um de seus
membros, coparticipantes na sua construção e pertencentes a um projeto de educação. Com
este pressuposto, a MAGISTRA definiu que toda ação por ela empreendida teria, como foco,
30389
o educador/pessoa em suas dimensões pessoal, profissional, cultural e ética e, ainda, o
cotidiano da escola e sua dinâmica, envolvendo as interações dos educadores e a experiência
de fazer a escola. Com esta opção, a Magistra apoiaria os conhecimentos e produtos que
afloram desse convívio entre esses pares e a comunidade, assim como as diferentes nuances
dos saberes que são mobilizados nessa construção: acadêmico, científico, prático, do senso
comum, do povo. Este mosaico de práticas entrecortadas pelos argumentos cognitivos que as
justificam e lhe dão sentido e significado seria a base de trabalho da escola de formação.
O espaço de formação, no caso a MAGISTRA , deveria ser identificado com a ideia
de um espaço de acolhimento do profissional da educação e das escolas, capaz de oferecer-
lhes um conjunto de oportunidades de formação que lhes atendessem plenamente, acreditando
na mobilização intensiva dos educadores em torno de uma cultura colaborativa. Para isso,
consideraria cada unidade escolar em um centro formador por excelência, constituído pelos
inúmeros desafios presentes no cotidiano escolar, mas um lugar da troca de experiências e do
aprendizado coletivo sobre o que é ser um educador e uma escola educadora. Desejava-se
romper o isolamento que existe no interior das escolas pela ausência de diálogo entre pares e
entre as escolas, construindo uma ampla rede de comunicação para que a troca de
experiências se transformasse numa realidade e num processo metodológico que induzisse a
melhoria da qualidade da educação em Minas Gerais. Construía-se com esse norte a ideia da
Magistra - a escola da escola - e a noção de pertencimento dos educadores a uma rede de
interações profissionais a seu favor.
A partir dessas premissas, o projeto passou a se delinear tendo como missão:
potencializar processos de formação aos profissionais da educação, por meio da criação,
pesquisa, divulgação, avaliação, reflexão e experimentação de boas práticas de gestão e
interação pedagógica. A relação pedagógica, considerada como um processo amplo de
aprendizagens, seria o conteúdo central de toda ação formadora e o projeto da escola tentaria
sair do modelo usual de uma instância formuladora de cursos específicos. Com esta ideia, a
Escola da Escola pertenceria, pois, ao coletivo, à rede de escolas públicas e o seu formato e as
ações por ela promovidas seriam propostas e realizadas com base nas demandas, interesses e
avaliações de necessidades específicas. Nessa perspeciva, pretendia-se traçar um novo
caminho no delineamento do processo de desenvolvimento profissional do educador por meio
da proposta de construção de percursos de formação articulados, tendo como base o interesse
e a motivação dos educadores pela sua própria formação. A ideia central apostava no
exercício da autonomia do profissional na definição de seu percurso de formação a partir de
30390
orientações abrangentes propostas pela escola de formação e, por outro lado, a própria escola
de formação estaria aberta à esttuturação permanente de novas ações e propostas, a partir das
avaliações dos educadores e dos resultados obtidos nas ações realizadas.
Para isso as ações criadas pela Magistra estariam elaboradas em sintonia com as
necessidades de aprendizagem requeridas pelos novos tempos e a efetividade da escola de
Educação Básica, articuladas com as demandas, desejos e necessidades de formação
apresentadas pelos educadores. Buscaria atender a diversidade regional e cultural presente no
estado de Minas Gerais e focalizaria, antes de tudo, as possibilidades e riquezas que essa
diversidade assimila e incorpora como dimensões educativas de um povo.
Como garantir as finalidades de formação atendendo em escala a um público tão
diverso?
Assim, delineado este cenário, o maior desafio da escola seria criar alternativas
metodológicas para promover e realizar ações de formação em escala para atingir o máximo
de profissionais da educação envolvendo o máximo de escolas da rede, motivando para a
adesão às ações e criando o sentimento de pertencimento à comunidade de aprendizagem da
rede pública de educadores. Como dito anteriormente, a estrutura de formação delineada pela
MAGISTRA deveria contemplar a complexidade existente num universo de 160 mil
educadores e mais de 3600 escolas com formatos de atendimento diversificado numa rede que
atende dos anos iniciais ao ensino médio, com mais de 300 escolas localizadas na zona rural,
além de escolas Quilombolas e Indígenas.
E foi diante de tal complexidade que decidiu pela consolidação do projeto da
MAGISTRA a partir da criação de um conjunto de programas estruturantes, variados em seus
objetivos, cada um visando atingir finalidades específicas, que, em seu conjunto, pudesse
atender à globalidade do desejado.
O conjunto dessas finalidades comporia o campo da formação. Os eixos da
flexibilidade, liberdade e autonomia no processo de adesão às ações da escola, deveriam
garantir a sua legitimidade frente aos educadores e escolas e o somatório de ações
estruturantes construiria a base de um percurso formativo de qualidade.
A oferta dessas ações estaria vinculada aos recursos disponibilizados pelo Estado e
caberia aos educadores darem a adesão ao projeto e realizarem as ações propostas. Para
atingir ao máximo o contingente de 160 mil educadores, seriam priorizadas as tecnologias em
EAD para que todos sem exceção tivessem acesso e possibilidades de vincularem às ações
30391
sempre que desejado. Para garantir um processo democrático às ações presenciais, haja vista
que a população era muito grande, as ações presenciais seriam disponibilizadas por meio
vagas nos eventos e seleção a partir de critérios de representatividade geográfica para as 47
Superintendências Regionais, distribuídas nos diferentes territórios e regiões de Minas Gerais.
A inscrição para a participação estaria, também, vinculada à apresentação de registros de
práticas pedagógicas, conforme os temas em questão, que selecionadas pelas regionais,
comporiam a programação do seminário. Por meio dessas comunicações orais, a centralidade
da prática pedagógica estaria garantida em qualquer ação formadora da escola.
Para que a proposta delineada ficasse mais clara para os educadores, procurou-se
encontrar uma representação gráfica que fosse capaz de facilitar o entendimento de sua
concepção e interfaces. Para tal, escolheu-se a figura do ÁTOMO. Essa unidade da matéria
nos oferece alguns aspectos importantes que ilustram a perspectiva adotada. Ele é composto
por um núcleo central e um conjunto de orbitais que, dinamicamente, giram em torno dele. O
núcleo não vive sem os seus orbitais e vice versa, porque são complementares na formação do
elemento que o representa, embora sejam independentes.
Assim, o núcleo do projeto da escola contempla os eixos centrais de formação que
identificam as características e valores fundamentais presentes na constituição do que seria
um bom profissional da educação pela MAGISTRA; os orbitais seriam compostos pelos
projetos estruturadores criados como propostas para a operacionalização dos processos de
formação. Esses projetos estruturadores possuem objetos e objetivos diferentes e específicos e
visam a proporcionar experiências formativas aos educadores para que, tangencialmente,
atinjam os objetivos do núcleo do átomo que são os eixos centrais de formação, isto é,
adquiram os conhecimentos, habilidades, competências e atitudes representativas de um
profissional do século XXI. Esses orbitais são dinâmicos, flexíveis e móveis e articulam-se
complementarmente. Podem ser alterados, ampliados, repetidos e suprimidos pela equipe
gestora da MAGISTRA, em função das orientações emanadas do órgão central, dos recursos
disponíveis, da adesão e avaliação dos educadores ou a outros determinantes que surgirem no
decorrer dos tempos, mas sempre vislumbrando os objetivos, habilidades, as características e
valores fundamentais identificados como núcleo centrais da formação do educador, assim
representados6:
6 A definição do núcleo do átomo teve como referência prioritária Novoa ( 2009), embora outros educadores, já
citados neste trabalho também discutam estes eixos.
30392
O CONHECIMENTO: o domínio do conhecimento de uma determinada área é
absolutamente imprescindível a qualquer profissional, especialmente, ao profissional da
educação que é o mediador do conhecimento sistematizado aos estudantes da escola básica.
Existem, ainda, tipos de conhecimentos, formas de produção de conhecimentos, abordagens
diversas do conhecimento que precisam ser conhecidas pelos profissionais para que entendam
o papel social que representam como produtores de sentidos e significados sócio-políticos e
educativos7.
A IDENTIDADE PROFISSIONAL: ser um profissional da educação é integrar-se
na profissão; compreender os sentidos da instituição escolar e de seu local de trabalho; ter
disposição para aprender com outros profissionais, em especial, com seus pares; sentir-se
membro de uma comunidade de aprendizagem, incluindo aqui o entorno das escolas; é desejar
desenvolver um trabalho cada vez melhor; sentir orgulho de ser um educador, sabendo que
essa identidade o acompanhará permanentemente.
A DIDÁTICA ou o COMO EDUCAR: trata-se da capacidade de estabelecer
relações de comunicação efetivas, presenciais e virtuais, sem a qual não se cumpre o ato de
educar. Envolve o saber ensinar, utilizar procedimentos de ensino, técnicas e tecnologias para
ensinar e aprender cada vez mais e melhor num mundo rodeado de tecnologias de
comunicação e informação.
O TRABALHO EM EQUIPE: o trabalho educativo é essencialmente coletivo. Aliás,
os novos tempos exigem formas de constituição da identidade profissional que implicam o
reforço das dimensões coletivas e colaborativas de um trabalho em redes sociais. Ser um
profissional da educação é estar permanentemente em relação seja na sala de aula, na escola,
ou nos ambientes sociais.
O COMPROMISSO SOCIAL: refere-se aos princípios e valores que fazem parte do
ethos profissional do educador: ser um profissional responsável pela formação de gerações,
ser um profissional que influencia, que induz comportamentos, que forma crianças e jovens
para se integrarem no mundo social. Significa entender que sua profissão vai além da escola,
devendo o educador assumir compromissos com a realidade social. Exige que ele comunique
com o público, intervenha no espaço público da educação e da sociedade e responsabilize-se
pela formação cidadã.
7 Este componente é essencial em qualquer proposta de formação. No entanto, existe uma tendência a coloca-lo
como o único aspecto a ser considerado. Acreditamos que o êxito de um processo formador exija outros eixos,
como argumentado neste texto.
30393
Como explicado anteriormente, esses 5 eixos centrais são concretizados por meio dos
programas estruturadores, organizados em torno de objetos, objetivos e formas de realização
específicas que, também, seriam criados pretendendo desenvolver concretamente as seguintes
habilidades nos participantes: (1) Saber comunicar, dialogar e escutar; (2) Saber registrar
experiências conforme normas acadêmicas; (3) Saber aprender com os pares e com a
experiência; (4) Saber lidar com a autonomia; (5) Ter o desejo pelo conhecimento e pelo fazer
cada vez mais e melhor.
Isso significa que, em todas as ações empreendidas, os cinco eixos e as 5 habilidades
estariam presentes como nortes ou finalidades da formação, tangenciando cada programa
estruturador em seus objetivos e finalidades
Diante destas bases a MAGISTRA, de posse dos recursos advindos do governo criou
um conjunto de programas na perspectiva de atender às necessidades do educador. Foram
eles:
- Seminários de imersão – encontro de educadores com temas específicos.
Possibilidades de participação intensa e convívio entre pares, educar-se por meio da troca de
experiências e pela vivência coletiva em ambiente de interação profissional. Formação
pessoal, profissional, estética, de participação em eventos e solidariedade na organização
coletivas. Apresentação de relatos de experiências com o objetivo registrar conforme normas
acadêmcias e responsabilizar-se pelo fazer pedagógico e profissional. Prestar contas do
trabalho produzido.
- Congresso Anual de Práticas Educacionais – evento anual com apresentação de
experiências próprias dos participantes. Como objetivo específico definia-se ter contato com
pesquisadores palestrantes, realizar minicursos variados. Dar visibilidade e divulgar as boas
práticas das escolas estaduais, por meio da publicação dos anais e em revista com tiragem
especial8. Trocar experiências entre pares. Registrar conforme normas acadêmicas.
Responsabilizar-se pelo fazer pedagógico. Prestar contas do trabalho produzido.
- Roda de Conversa – programas de TV com a participação de pesquisadores de
renome em debate sobre assuntos de interesse da escola de educação básica. Como objetivo
específico, definia-se a importância de que os educadores conhecessem o que dizem as
pesquisas, os pesquisadores e aqueles que fazem as políticas públicas em educação, assim
8 A Magistra firmou parceria com a revista AMAE Educando para uma tiragem especial com a publicação de
trabalhos dos Congressos. De 2012 a 2014 foram publicadas 3 revistas especiais.
30394
como qualificar os debates das reuniões pedagógicas na escola e fundamentar as práticas
teoricamente.
- Mobilidade do Profissional da Educação – programa que financiava o deslocamento
e a hospedagem do educador, pelo período de uma semana, para outra região do Estado de
Minas Gerais, para que pudesse conhecer outras experiências, outras regiões, suas
características, dificuldades, dialogar e aprender com os próprios pares para trocar
experiências.
- Programa Oferta Livre de Cursos – ter acesso a um catálogo de titulos e,
gratuitamente, realizar cursos de 30h a distância na plataforma virtual de aprendizagem da
Magistra, com tutoria. Reconhecer as próprias necessidades de formação teórica e construir
livremente o seu percurso de formação com chances de ter interlocução com professores das
IES parceiras que oferecem os cursos.
- Rede de Biblioteca constituição de uma Rede Social de Professores em Uso de
Biblioteca para o compartilhamento de um novo conceito para o espaço das bibliotecas
escolares, articulado com os laboratórios de informática existentes na escola, apoiando as
atividades de ensino, a capacitação dos professores no uso das tecnologias de informação,
criando um repertório de práticas pedagógicas inovadoras para darem suporte às atividades
cotidianas da escola.
- Circuito Ciência - vivências formadoras em diferentes formatos (mini cursos,
oficinas e visitas guiadas) com diferentes perspectivas de contato com a produção de
conhecimentos científicos e metodologias do ensinar e aprender. Foram firmadas várias
parcerias com Instituições de Ensino Superior e seus, respectivos, espaços de ciências e
museus, para visitas guiadas e processos de formação.
A diversidade de ações atenderia à complexidade do público a ser atendido. Assim, se
um programa permitia ao educador a construção individual de percursos de formação por livre
escolha no ambiente virtual, outros lhe possibilitariam dialogar com os pares e suas práticas
diversas e, ao mesmo tempo, usufruir de um conjunto de atividades propostas em eventos
presenciais. Para isso, ficou definido que a senha de entrada para participar das ações de
formação presencial seria a inscrição de relatos de experiência prática vividos pelos
educadores. Por meio desses relatos os educadores seriam selecionados em suas regiões para
as apresentarem, trocarem experiências e participarem da programação do evento. Esses
seminários de imersão foram organizados, especialmente, para o professor vivenciar
processos intensos de formação, tendo contato com uma cartela múltipla de minicursos com o
30395
uso das diferentes mídias e tecnologias de informação e comunicação e ao mesmo tempo
contato com pesquisadores de renome e vivências de crescimento cultural e profissional. No
caso das ações não presenciais, os educadores estariam livres para se inscreverem, também,
diante de um catálogo de alternativas. Dentre elas, minicursos de 30 horas na plataforma
virtual de aprendizagem e as Rodas de Conversa gravadas com especialistas sobre temas
específicos do cotidiano da escola básica. O percurso formativo seria composto pelo conjunto
das ações finalizadas, sendo que, a cada uma, o educador receberia o seu certificado de
conclusão para compor o seu currículo.
Para o enfrentamento do desafio da motivação pelo trabalho e do envolvimento do
profissional às ações de formação, definiu-se que a troca de experiências seria efetivada por
meio do registro e apresentação oral dessas práticas em tempos previstos especialmente para
tal. Assim, em todas as ações de imersão propostas, o educador deveria se inscrever
apresentando o que faz, como faz e porque faz, isto é, deveria saber informar sobre a sua
prática, registrando-a em formato de um pequeno texto de, no mínimo, 4 páginas. Essa
condição era o cartão de entrada para a participação nos eventos. Ao apresentá-la, o educador
teria a chance de fazê-la conhecida e abrir-se para que fosse discutida pelos pares, ali
presentes e que também trouxeram suas práticas para serem apresentadas. Desta forma, os
processos de reflexão seriam incentivados, assim como a sistematização dessas práticas em
formatos acadêmicos, abrindo-se, aí, um outro processo de formação mais formal e
acadêmico, para aqueles que há muito fizeram sua formação inicial. A Magistra, a partir
desses relatos, organizaria anais dos diferentes eventos em CDs para serem distribuídos para
todos os educadores e para a comunidade interessada e selecionaria alguns dos relatos para
serem publicados em edições especiais em periódico que tem entrada em todas as escolas das
redes públicas de ensino. Essa prática viria reforçar a dimensão da autoria para que todo
educador tivesse consciência da importância e amplitude de suas ações, assim como das
consequências de sua prática como um processo sistemático capaz de interferir e fortelecer as
políticas educacionais de um estado. Acreditava-se que, dessa forma, a dimensão do
desenvolvimento profissional e compromisso social estivessem presentes na vida dos
educadores como fundamentos de suas ações pessoais.
30396
Considerações Finais
Uma escola de formação continuada de profissionais da educação é um espaço que
proporciona diferentes oportunidades ao educador de estar em contato com o conhecimento,
por meio de programas, eventos, cursos, seminários e experiências variadas relacionadas ao
seu campo de atuação. Mas as estratégias para efetivamente realizar um trabalho que
modifique a prática pedagógica nas escolas e promova a qualidade da oferta pública em
educação no Brasil é o grande desafio, especialmente, quando se depara com o tamanho
continental do território nacional.
A experiência de formação continuada da MAGISTRA, apesar de recente, evidenciou
que suas premissas se constituíam em boas alternativas para o aprimoramento das escolas e da
educação ofertadas às crianças, jovens e adultos. A centralidade no diálogo e na troca de
experiências dada pela metodologia de trabalho delineada permitiu a reflexão coletiva de
produtos e processos educativos, estimulou os educadores a participarem das ações de
formação proposta, haja vista o número de inscrições para a participação nos eventos.
Acredita-se que esse interesse esteja vinculado a dois fatores fundamentais: a criação de
estratégias didáticas estimulantes, inovadoras, contemporâneas pelo uso de tecnologias atuais
e, ainda, a qualidade do que foi apresentado como programação dos eventos, isto é, os
palestrantes convidados, os espaços físicos escolhidos, o capricho estético com a produção de
materiais, o cuidado e o acolhimento de todos, e a qualidade do catálogo de minicursos e de
temas escolhidos.
Desejava-se que o educador vivenciasse momentos muito agradáveis de interação com
o conhecimento e que tivesse em mãos materiais bonitos, com qualidade visual, incentivando
o uso dos tempos livres para estudo e novos debates. Da mesma forma, os convidados para as
conversas foram escolhidos com muito cuidado, dentre os inúmeros pesquisadores brasileiros.
Ficou muito clara a noção de que os educadores sabem quando a proposta é boa. Isso favorece
o respeito e a adesão às ações de formação. Nos seminários de imersão, as rodas de conversa
presenciais tiveram um público atento de 600 a 1000 pessoas, cada um. E em momento algum
a equipe da MAGISTRA teve problemas com conversas paralelas, ausência de plateia,
confusão provocada por qualquer tipo de desrespeito ou desinteresse pelos assuntos. Dentre as
ações estruturantes realizadas ao longo dos seus dois anos e meio de existência salientam-se
as 36 Rodas de Conversa gravadas e transmitidas para as 3600 escolas, todas elas também
divulgadas pelo You Tube, 18 Seminários de imersão sobre temas diversos com a
30397
participação de 1000 participantes cada, a realização de 3 Congressos de Práticas
Educacionais com a participação de 600 trabalhos, a lista de 139 turmas em cursos sobre
temas diversos no Programa Oferta Livre de Cursos com o objetivo de oferecer atendimento a
todos os educadores por meio da educação a distância. Ainda nessa linha de atendimento, a
MAGISTRA manteve vivo e atualizado o CRV – Centro de Referência Virtual , ambiente
capaz de dialogar permanentemente on line com toda a comunidade escolar do Estado de
Minas e de outros interessados. Os números gerais de participação de educadores nas ações da
Escola de Formação no seu curto espaço de tempo de existência de 1000 Dias comemorados
em dezembro de 2014, chegaram a mais de 70 mil educadores participantes nessas ações,
resultado considerado bastante significativo, haja vista os desafios operacionais enfrentados
por um órgão em processo de constituição.
O desafio posto para a equipe de criação da escola de formação era bastante grande,
em razão da consciência que se tinha da complexidade de tal empreendimento. Muitos
pesquisadores têm se debruçado sobre estas questões, mas tínhamos o privilégio de ter nas
mãos o enfrentamento concreto da formação em escala. A MAGISTRA, como a escola da
escola, procurou ser coerente com o conjunto das premissas delineadas em seu PPP,
apresentando-se em cada detalhe como um espaço formador, que desejava influenciar e
interferir nos rumos traçados pelos profissionais, apresentando-lhes alternativas viáveis.
Nesse sentido, as avaliações solicitadas aos educadores sobre as ações realizadas foram
instrumentos valiosos para o repensar e refazer permanente, em busca de acertos e novidades.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto no 6.755, de 29 de janeiro de 2009. Institui a Política Nacional de Formação
de Profissionais do Magistério da Educação Básica, disciplina a atuação da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES no fomento a programas de
formação inicial e continuada, e dá outras providências. ). Diário Oficial da União, Brasília,
DF, 30 jan. 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6755.htm. Acesso em 03/07/2014. Acesso em: 07 ago. 2015.
CAVACO, M.H. Oficio do Professor: o tempo e as mudanças. In: NÓVOA, Antônio (Org.).
Profissão Professor. Porto: Porto Editora. 1995
DEMAILLY, Lise Chantraine. Modelos de formação contínua e estratégias de mudança. In:
NÓVOA, Antônio (Org.). Os professores e sua formação. Lisboa: Instituto de Inovação
Educacional, 1992.p.139-158.
FULLAN, M. O significado da mudança educacional. Porto Alegre: Artmed, 2009
30398
GATTI, Bernadete Angelina. Formação de professores e carreira: problemas e movimentos de
renovação. Campinas, autores associados, 1997.______. Formação continuada de professores: a questão psicossocial Cadernos de Pesquisa – Fundação Carlos Chagas. Julho 2003. n.119.
GATTI, Bernadete Angelina; BARRETO, Elba Siqueira de Sá; ANDRÉ, Marli Dalmazo de
Afonso. Políticas Docentes no Brasil: um estado da arte. Brasília. Unesco, 2011.
MARCELO GARCIA, Carlos. A formação de professores: novas perspectivas baseadas na
investigação sobre o pensamento do professor. In: NÓVOA, Antônio (Org.). Os professores
e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.
MARIN, Alda Junqueira. Formação de professores: novas identidades, consciência e
subjetividade. In: TIBALLI, Elianda F. Arantes, CHAVES, Sandramara Matias (Orgs.)
Concepções e práticas de formação de professores: diferentes olhares. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. p.57-73 (Trabalhos apresentados no XI ENDIPE – Goiânia – Goiás, 2002).
MEC – CONAE - Doc Base Documento Final – 05/27/2010
MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Educação. Projeto Político Pedagógico da Escola
de Formação e Desenvolvimento Profissional de Educadores de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2011.
MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Educação. MAGISTRA: a escola da escola.
Disponível em: magistra.educacao.mg.gov.br/. Acesso em: 3 ago. 2015.
NOVOA, António. Formação de professores e profissão docente. In: NÓVOA, António. Os
professores e sua formação. Lisboa: Instituto de Inovação Educacional, 1992.p.139-158.
NOVOA, António. Professores: imagens do futuro presente. Educa: Lisboa, 2009.
PÉREZ GOMEZ, Angel. O pensamento prático do professor: a formação do professor como
profissional reflexivo. In: NÓVOA, Antônio (Org.). Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.
PERRENOUD, Philippe. Práticas pedagógicas, profissão docente e formação: perspectivas
sociológicas. Lisboa: Dom Quixote, 1993.
PERRENOUD, Philippe. Escola e cidadania: o papel da escola na formação para a democracia. Porto Alegre: Artmed, 2005
SHÖN, Donald A. Formar Professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, Antônio
(Org.). Os professores e sua formação. Dom Quixote, Lisboa, 1992.
Top Related