O ÍON LANTANÍDEO EM UM AMBIENTE QUÍMICO
Podemos encontrar na literatura diferentes maneiras de se referir à chamada teoria
do campo ligante. Alguns autores consideram essa teoria como um intermediário entre a
teoria do campo cristalino, que teve suas bases lançadas com o conhecido modelo das
cargas pontuais introduzido por Bethe (1929), e a teoria dos orbitais moleculares. Outros
autores chegam a considerá-la como uma aplicação da teoria dos orbitais moleculares aos
compostos com elementos d e f.
A teoria dos orbitais moleculares nos permite compreender, pelo menos
qualitativamente, a formação de ligações químicas e de estados moleculares que
justifiquem, do ponto de vista energético, a existência de compostos de íons lantanídeos
com números de coordenação que podem variar entre 6 e 9, geralmente. Por outro lado, tem
sido constatado que cálculos detalhados de orbitais moleculares envolvendo orbitais 4f são
de enorme complexidade. Por essa razão, e também pelo fato da interação dos orbitais 4f
com o ambiente químico ser muito fraca, a teoria do campo cristalino e a teoria do campo
ligante têm sido adotadas na descrição das propriedades espectroscópicas desses
compostos. A mistura de orbitais dos ligantes com orbitais do íon lantanídeo é muito
pequena. A figura X abaixo mostra um diagrama simplificado de orbitais moleculares que
esquematiza este fato.
Fig. X
4f
5d
6s
ligantes
Os orbitais moleculares M são praticamente orbitais 4f puros, localizados no íon
lantanídeo, enquanto que os orbitais moleculares L são essencialmente orbitais das
espécies ligantes. Propositadamente indicamos na Fig. X a participação (pequena) dos
orbitais 5d e 6s na composição dos orbitais moleculares M . Em particular a participação
dos orbitais 5d, que só é permitida quando a simetria em torno do íon lantanídeo não
apresenta centro de inversão, corresponde a uma mistura do tipo f-d, a qual faz com que os
orbitais M deixem de ter uma paridade bem definida. Como veremos mais adiante, este é
um dos pontos essenciais na teoria das intensidades espectrais 4f - 4f. Contudo, pelas razões
mencionadas acima, essa mistura não será tratada do ponto de vista da teoria dos orbitais
moleculares, mas à luz da teoria do campo ligante.
O campo cristalino: o modelo eletrostático
A teoria do campo cristalino, baseada no modelo eletrostático, tem sido utilizada há
bastante tempo por ser mais simples, mais prática e, apenas sob certos aspectos, bem
sucedida. Ela consiste em considerar os ligantes como fonte de um potencial eletrostático
produzido por cargas ou dipolos que modificam (distorcem) os orbitais do íon central.
Neste modelo ignora-se a existência de ligação química, no sentido de considerá-la como
sendo 100% iônica. As cargas, ou dipolos, são colocados nas posições dos átomos nas
vizinhanças do íon central.
Podemos esquematizar a formação de um composto do tipo [MLn]z-nq
, onde Mz+
é o
íon central e L-q
são os ligantes, da seguinte maneira:
Fig X
O esquema acima, que pode ser qualitativamente descrito através do modelo
eletrostático, indica dois aspectos relevantes. O primeiro é que a entalpia de formação do
composto [MLn]z-nq
, ∆Hf, é largamente dominada pelas componentes esféricas do campo
cristalino. O segundo é que apenas as componentes não esféricas do campo cristalino
produzem desdobramentos de níveis de energia na estrutura eletrônica do íon central Mz+
(no modelo eletrostático os ligantes são cargas ou dipolos, e, portanto, não possuem
estrutura eletrônica). Do ponto de vista termoquímico, as componentes esféricas do campo
cristalino são as mais importantes. Por outro lado, do ponto de vista espectroscópico, as
componentes não esféricas é que interessam. São elas que podem ser medidas
espectroscopicamente, pois na espectroscopia medimos diferenças entre níveis de energia, e
como as componentes esféricas mudam os níveis de energia igualmente não podem ser
medidas por este caminho. Podem ser medidas, entretanto, termoquimicamente. Como as
Mz+
+ nL-q
abaixamento
energético
devido à
atração
coulombiana
entre Mz+
e
nL-q
repulsão entre as
nuvens eletrônicas
de Mz+
e nL-q
[MLn]z-nq
desdobramentos de
níveis de energia
E
N
E
R
G
I
A
componentes
esféricas do
campo
cristalino
componentes
não esféricas
do campo
cristalino
∆Hf
componentes (esféricas e não esféricas) do campo cristalino são independentes entre si,
desdobramentos grandes de níveis de energia não implicam necessariamente em compostos
quimicamente muito estáveis, e vice-versa.
No modelo eletrostático das cargas pontuais o hamiltoniano de interação entre os
ligantes e o íon central é dado por
j,i ji
j
j j
j
CC
Rr
eq
R
zqH (1)
onde os vetores posição dos elétrons do íon central, ir
, e das cargas pontuais que
representam os ligantes, jR
, são mostrados na figura X1 abaixo
Fig. X1
O primeiro termo no lado direito da Eq.(1) corresponde à parcela atrativa (componente
esférica) do hamiltoniano, enquanto que o segundo termo corresponde à parcela repulsiva, a
qual possui uma componente também esférica e componentes não esféricas. As
componentes esféricas e não esféricas da parcela repulsiva tornam-se explícitas quando
utilizamos o teorema da adição para os harmônicos esféricos apresentado na Eq. ( ) da
seção .....do capítulo 1, isto é,
)(Y)(Yr
r
1k2
4
Rr
1iq,kjq,k1k
k
q,kji
(2)
A componente esférica corresponde ao termo com k = 0 que é simplesmente r1 , visto que
41)(Y 0,0 . A componente não esférica corresponde à soma dos termos com k > 0.
No caso dos compostos com íons lantanídeos, dado o fato de que os orbitais 4f são
contraídos e têm uma extensão radial da ordem de 1Ǻ, justifica-se considerar irr .
Colocando-se o harmônico esférico )(Y iq,k em termos do operador tensorial irredutível
)(C i
)k(
q , definido na Eq........, o hamiltoniano HCC pode ser escrito na seguinte forma
i,q,k
i
)k(
q
k
i
k
qCC )(CrH (3)
onde
1k
j
jq,k
j
j
22
1
k
qR
)(Yge
1k2
4
(4)
Na Eq.(4) as cargas qj da Eq.(1) foram substituídas por múltiplos, ou frações, da
carga eletrônica (módulo), gje . Embora tenha sido obtida a partir de um modelo
extremamente simplificado (o modelo das cargas pontuais), como veremos mais adiante, a
forma da Eq.(3) tem um caráter muito mais geral. É interessante notar que cada termo nesta
equação é um produto de uma quantidade que depende só da vizinhança química, k
q , por
uma função (operador) que depende só do íon central, )(Cr i
)k(
q
k
i . Todas as informações
sobre a simetria em torno do íon central estão devidamente contidas na soma sobre j na
Eq.(4). Conhecendo-se a estrutura cristalográfica do composto, donde se obtém as
coordenadas angulares ),( jjj e as distâncias Rj, as quantidades k
q podem ser
calculadas.
A matriz que representa o hamiltoniano HCC com relação a uma dada base de
estados, { A }, de uma configuração eletrônica 4fN(indicada por A) é constituída por
elementos de matriz dados por:
AUAfCff4rf4A))(Cr(AAHA )k(
q
)k(k
q,k
k
qi
)k(
q
i
k
i
q,k
k
qCC
(5)
onde o operador tensorial irredutível unitário )k(
qU foi definido na Eq. ..... do capítulo....e o
elemento de matriz reduzido fCf )k( foi definido na Eq. ... do capítulo 1. Na Eq.(5) é
considerado que a parte radial dos estados A é a mesma para os N elétrons da
configuração 4fN, e a quantidade f4rf4 k (= kr ) representa o valor esperado radial 4f
de rk; o asterisco em A no lado direito da Eq.(5) indica que a parte radial 4f foi extraída.
Examinando-se as regras de triangularidade contidas no elemento de matriz
reduzido fCf )k( conclui-se que o posto k deve ser um número par e menor ou igual a 6,
visto que f = 3. O valor k = 0, como vimos mais acima, corresponde a uma componente
esférica do hamiltoniano HCC e, portanto, não contribui para desdobramentos de níveis de
energia. Assim, do ponto de vista de quebra de degenerescência (desdobramento de níveis),
só os valores k = 2, 4 e 6 interessam. Neste caso HCC é comumente escrito na seguinte
forma
)(CBH i
)k(
q
i,q,k
k
qCC (6)
onde
k
q
kk
q rB (7)
Para um dado valor do posto k, nem todos os valores de q ( = -k, -k+1, ..., 0, ..., k-1,
k) são permitidos. A simetria em torno do íon central, expressa na soma sobre j na Eq.(4), é
que vai definir os seus possíveis valores. Em outras palavras, de acordo com a simetria,
para alguns valores de q a soma sobre j na Eq.(4) se anula. As restrições impostas pela
simetria podem também atuar sobre os valores do posto k. Assim, por exemplo, numa
simetria octaédrica regular o valor k = 2 não é permitido; a soma sobre j se anula para os
cinco valores de q (-2, -1, 0, 1 e 2). A Tabela X, originalmente formulada por Prather
(Prather 19...), mostra os k
q permitidos em diversos grupos pontuais de simetria, incluindo-
se valores ímpares de k. Note que apenas os valores de q ≥ 0 são indicados, tendo em vista
a relação
k
q
qk
q )1( que vem das propriedades dos harmônicos esféricos.
Tabela X
A tabela (XX) mostra a forma da Eq.(6) para vários grupos pontuais.
A Eq.(6) é conhecida como a formulação de Wybourne (Wybourne, 1963) para o
hamiltoniano do campo cristalino. As quantidades k
qB , conhecidas como parâmetros do
campo cristalino, podem ser obtidas experimentalmente ajustando-se os seus valores a fim
de reproduzir, da melhor forma possível, desdobramentos de níveis de energia observados
espectroscopicamente. Neste caso elas são também conhecidas como parâmetros
fenomenológicos do campo cristalino.,, Cálculos teóricos dos sBk
q através do modelo das
cargas pontuais levam sistematicamente a discrepâncias consideráveis com relação aos
respectivos valores fenomenológicos, o que, na realidade, é esperado, tendo em vista as
premissas extremamente simplificadoras do modelo, nas quais se ignora a existência de
ligação química. Uma análise sistemática dessas discrepâncias mostra que, em geral, os
)pontuaisasargc(sBk
q são superestimados por um fator próximo de 2, para k = 2, e
subestimados por um fator que varia entre 5 e 10 para k = 6. A título de exemplo, a Tabela
X abaixo mostra os valores dos sBk
q para o composto X.
Tabela X
Correções eletrostáticas ao modelo das cargas pontuais
No modelo das cargas pontuais a soma em j na Eq.(4) pode ser estendida aos assim
chamados segundos vizinhos (segunda esfera de coordenação), terceiros vizinhos (terceira
esfera de coordenação), etc. Entretanto, cálculos em sistemas cristalinos inorgânicos
levando em consideração cargas pontuais num raio de até 100Å (Faucher, Morrison) não se
mostraram eficazes em resolver as discrepâncias entre os sBk
q (cargas pontuais) e os
sBk
q determinados experimentalmente (fenomenológicos).
Outras contribuições eletrostáticas do tipo dipolos pontuais, quadrupolos pontuais,
etc, foram examinadas detalhadamente a partir de estruturas cristalográficas (Faucher,
Morrison). Para o caso de dipolos pontuais a contribuição para os sBk
q tem a seguinte
forma:
)j(R
)(Y
q
1k
1k)]1k2)(1k(4[)1(reB
2
1
21
2
q2k
j
jq,1k
q,q,j 12
21
qkkk
q
(8)
onde )j(2q é uma componente esférica ( 2q = -1, 0, 1 ) do dipolo pontual, situado na
posição jR
, o qual é dado por jj E)j(
, onde jE
é o campo elétrico produzido pelas
cargas e dipolos pontuais vizinhos ao sítio j e j é a polarizabilidade dipolar do íon situado
neste sítio. A tabela X abaixo mostra valores das contribuições eletrostáticas para fins
comparativos com valores experimentais. Esses valores ilustram o fato de que as
contribuições adicionais devido a dipolos pontuais, quadrupolos pontuais, etc., também não
resolvem as discrepâncias acima mencionadas. Há inclusive situações em que a série
multipolar elétrica parece não ser convergente (Morrison). O cálculo dessas contribuições é
de considerável complexidade computacional.
Tabela X
Efeitos de blindagem e de expansão radial no modelo eletrostático
Com base em argumentos nos quais as integrais radiais kr do íon livre se
modificam na presença de um ambiente químico e, como mencionado na seção X do
capítulo X, os orbitais 4f sofrem um forte efeito de blindagem provocado pelas subcamadas
5s e 5p mais externas preenchidas, Karayanis e Morrison ( ) propuseram uma abordagem
empírica na qual os sBk
q são expressos da seguinte maneira:
k
qk
kk
q B)1(
B
(cargas pontuais) (9)
onde as quantidades k são os fatores de blindagem produzida pelas subcamadas 5s e 5p
preenchidas e τ é um parâmetro ajustável, com a finalidade de simular a modificação das
integrais radiais do íon livre num ambiente químico, tal que:
livreíon
k
k
k r1
r
(10)
Além disso, Karayanis e Morrison consideram dois parâmetros adicionais. Um deles é a
carga, q , sobre os íons (de mesma natureza) na primeira vizinhança do íon central, e o
outro é um parâmetro, η , que mede um ligeiro deslocamento dessa carga com relação à sua
posição cristalográfica original. Com esta abordagem empírica é possível reproduzir de
modo satisfatório os sBk
q fenomenológicos, embora o seu embasamento físico não seja
muito claro.
Vale notar que, quanto aos efeitos de blindagem, a forma )1( k ocorre somente do
ponto de vista do modelo puramente eletrostático (valores de k serão discutidos mais
adiante). Quando efeitos de ligação química são levados em consideração, incorpora-se
naturalmente o fato das subcamadas 5s e 5p serem mais externas que a subcamada 4f. Isto,
obviamente, está diretamente relacionado com os valores pequenos de integrais de
recobrimento entre orbitais 4f e orbitais das camadas de valência dos átomos (íons)
ligantes.
A teoria do campo ligante: efeitos de ligação química
Os primeiros trabalhos com uma abordagem mais voltada para a teoria dos orbitais
moleculares em compostos com íons lantanídeos surgiram na década de 1950 ( Burns, Axe
et al). De modo geral, essa abordagem tem como ponto de partida as premissas básicas da
teoria dos orbitais moleculares:
1) O hamiltoniano efetivo monoeletrônico corresponde a um campo médio visto por cada
elétron, devido aos outros elétrons e aos núcleos no complexo íon lantanídeo + ligantes.
2) Dada a simetria do complexo, os orbitais do íon central e dos ligantes se transformam
segundo as representações irredutíveis do grupo pontual do complexo de modo bem
definido.
3) Combinam-se orbitais do íon central e dos ligantes que pertencem à mesma
representação irredutível. Esses orbitais são representados por:
M , que é um orbital do íon central dado por uma combinação linear apropriada de
funções hidrogenóides )(Y)r(R m,,n da camada de valência, tal que 1MM , e
L , que é uma combinação linear apropriada de orbitais das camadas de valência
dos ligantes, tal que 1LL .
O hamiltoniano do sistema é separado em três parcelas:
)ML(H)L(H)M(HH (11)
A primeira delas é localizada no íon central, a segunda nos ligantes e a terceira corresponde
à interação entre eles. Considerando interação de apenas um tipo (, , etc) as autofunções
do sistema íon lantanídeo + ligantes são escritas na seguinte forma:
LbMa
(12)
o que leva ao determinante secular
0)EH()ESH(
)ESH()EH(
LLLMLM
MLMLMM
(13)
cujas raízes são
)S1(2/
/)]HHH)(S1(4)SH2HH[()SH2HH(E
2
ML
2/12
MLLLMM
2
ML
2
MLMLLLMMMLMLLLMM
(14)
onde LMSML é a integral de recobrimento, na qual, como já mencionado acima, a
autofunção L é dada por uma combinação linear apropriada, isto é, adaptada à simetria,
de orbitais de valência dos ligantes. Em geral, para interações do tipo a energia média que
corresponde à autofunção L é mais baixa que a energia da subcamada 4f, de modo que,
em termos de um diagrama simples de orbitais moleculares, essas duas raízes podem ser
mostradas esquematicamente como na figura abaixo.
Qualitativamente, este diagrama mostra que, para interação do tipo , os orbitais 4f
adquirem uma característica ligeiramente antiligante .
M
L
E+
E-
Fig. X
HMM - HLL
A chamada aproximação de Wolfsberg-Helmholz [X], originalmente utilizada no
caso de compostos com metais de transição, consiste em expressar o elemento de matriz
não diagonal, HML, da seguinte forma:
MLLLMMML S)HH(2
kH (15)
onde a constante k tem valor próximo de 2. Esta aproximação, embora deva ser considerada
com certo cuidado, tem se mostrado muito útil, principalmente quanto aos aspectos
qualitativos da teoria dos orbitais moleculares aplicada aos compostos com íons dos blocos
d e f. Quando utilizada na Eq.(14), com a constante k = 2, ela leva à seguinte expressão
aproximada para a quantidade mostrada na Figura X :
2
ML
LLMM
2
LLMM S
)HH(
HHE
(16)
O aspecto qualitativo mais relevante na Eq.(16) acima é mostrar que o caráter ligeiramente
antiligante (), adquirido pelos orbitais 4f, é, de modo aproximado, diretamente
proporcional ao quadrado da integral de recobrimento.
O modelo do recobrimento angular
As considerações acima constituem o ponto de partida do modelo do recobrimento
angular (AOM, do acrônimo em inglês “Angular Overlap Model”) desenvolvido por
Jørgensen, Pappalardo e Schmidtke, em 1962, para efeitos de campo ligante em compostos
com íons lantanídeos. No AOM a autofunção m
m mf4cM é colocada como um
produto de uma função angular por uma função radial, da seguinte forma:
)r(R)(ANMM (17)
onde NM é o fator de normalização. A autofunção L é, em geral, escrita como
i
N
1i
iL b
(18)
onde N é o número de átomos, ou íons, que constituem a primeira esfera de coordenação e
os ’s são os seus orbitais de valência. Os coeficientes na combinação linear na Eq.(18) são
tais que a função L é adaptada à simetria (J.C. Eisenstein, 1956). No AOM considera-se
que
)r,r(F)(b ii
N
1i
iL
(19)
A função delta na Eq.(19) implica em considerar a densidade eletrônica de cada átomo ou
íon ligante apenas na direção da ligação íon lantanídeo-átomo ligante. Assim, a integral de
recobrimento SML tem a seguinte forma:
drr)r,r(F)r(R)(AbNS 2
ii
N
1i
iMML
(20)
Se for possível considerar que as distribuições radiais das espécies ligantes são
aproximadamente iguais ( ))r,r(F)r,r(F ji , pode-se colocar o recobrimento SML na
seguinte forma:
MLML SS (21)
onde
N
1i
iiM )(AbN (22)
e
drr)r(F)r(RS 2
ML (23)
O caráter antiligante adquirido pelos orbitais 4f é então expresso da seguinte
maneira:
2 (24)
onde
2
ML
LLMM
2
LL )S()HH(
H
(25)
Considerando-se a função angular A() como a parte angular hidrogenóide das
funções 4f, a quantidade na Eq.(22) pode ser calculada sem maiores problemas. O
mesmo, porém, não é verdade no caso da quantidade dada pela Eq.(22), principalmente
devido aos erros inerentes à aproximação de Wolfsberg-Helmholz, assim como devido à
dificuldade na obtenção de valores aceitáveis dos elementos de matriz diagonais HMM e
HLL. Por essa razão, tem sido comum se tratar no AOM a quantidade como um
parâmetro ajustável a dados experimentais. Por exemplo, no caso do desdobramento de
orbitais d em uma simetria octaédrica (Oh) obtém-se a relação direta 2Dq10 , como
ilustra a figura abaixo. Conhecendo-se o 10Dq experimental, pode-se determinar .
A forma do hamiltoniano do campo cristalino dada pela Eq.(6) não é restrita ao
modelo das cargas pontuais. Como veremos mais , qualquer descrição dos efeitos da
vizinhança química sobre a subcamada 4f pode ser colocada na forma da Eq.(6). Sendo
esta uma forma mais geral, os parâmetros k
qB neste hamiltoniano podem ser expressos
como função do dado pela Eq.(24). Quando efeitos de ligação química são levados em
consideração, é comum referir-se aos k
qB ’s como parâmetros do campo ligante, e ao
hamiltoniano como hamiltoniano do campo ligante, HCL.
Parametrização do campo ligante no AOM
Tem sido comum no AOM se utilizar o parâmetro eo definido pela relação
eo = )12( (26)
onde é o momento angular orbital monoeletrônico ( 3 para os íons lantanídeos).
Pode-se também incluir efeitos de ligação , etc, através dos seguintes parâmetros
(JØrgensen 1970):
Ee )1()12(2 (27)
d
t2g
eg
2Dq10
Figura XX
para o caso de interações do tipo , e
Ee )2)(1()1)(12(2
1 (28)
para o caso de interações do tipo . As quantidades
E e
E são os equivalentes da
quantidade .
A partir do fato de que a forma da Eq.(6) é uma forma geral e impondo-se certas
relações entre a dependência radial dos sBk
q e os parâmetros definidos nas equações (26-
28), pode-se mostrar que os parâmetros de campo ligante k
qB (AOM) são dados por (Kibler,
):
)j(I)(Y1k2
4B kjq,k
21
j
k
q
(29)
onde
Ik(j) = )()(, jeak
(30)
sendo o coeficiente )(, ka dado por:
000
)12/(0
)12()1()(,
kkkak (31)
Nas equações (30) e (31) o índice 2,1,0 para interações do tipo , e ,
respectivamente, com os parâmetros ee 1 e ee 2 para cada par íon lantanídeo-átomo
ligante. Desta forma se estabelece uma relação biunívoca entre os sBk
q e os parâmetros e .
Esta relação, embora seja imposta, é interessante na medida em que o caráter antiligante
adquirido pelos orbitais 4f não pode ser determinado experimentalmente de modo direto,
devido ao fato de que os desdobramentos de níveis de energia observados numa
configuração 4fN, na presença de um ambiente químico, são desdobramentos dos estados
2S+1LJ (mesmo para N = 1), levando-se em conta a interação spin-órbita no íon livre, e não
desdobramentos dos orbitais 4f diretamente. Quando os ligantes são de mesma natureza e
as distâncias íon central-átomo ligante não são muito diferentes, é comum considerar
)()( jeje , o que reduz consideravelmente o número de parâmetros a serem tratados
fenomenologicamente.
O modelo da superposição
A forma da Eq.(29), na realidade, já havia sido utilizada por Newman (1971) no
chamado modelo da superposição, no qual o campoconsiderado uma soma (superposição)
de potenciais 32 (os )R(B jk estão relacionados com os )R(A jk , definidos originalmente
por Newman e X (1971), através de fatores numéricos (Newman e Ng (1999), Linares ( ))
3Para efeito comparativo d,
O modelo simples de recobrimento
O modelo simples de recobrimento (SOM, do acrônimo em inglês "Simple Overlap
Model"), introduzido em 1982 (Malta, ), tem como ponto de partida as seguintes
premissas:
1) A energia potencial dos elétrons 4f, devido à presença de um ambiente químico, é
produzida por cargas uniformemente distribuídas em pequenas regiões centradas em torno
da meia distância entre o íon central e cada ligante.
2) A carga em cada região é dada por jjeg , onde ρj é a integral de recobrimento entre os
orbitais 4f e a camada de valência do átomo (íon) ligante j, e gj é um fator de carga
(análogo do gj na Eq.(4)).
A figura (X) abaixo esquematiza essas premissas.
Fig. (X)
Dessa forma, o hamiltoniano do campo ligante é dado por:
j,i jji
j
2
j
CL)2/R(r
egH (34)
Usando-se o teorema da adição para harmônicos esféricos, a Eq.(34) é colocada na
seguinte forma:
)(C)(Yr
rg
1k2
4eH i
)k(
qjq,k1k
k
jj
21
j,i,q,k
2
CL
(35)
M
ligante
L
L
L
íon
central
ir
-ge
jj 2/R
onde rer representam, respectivamente, o menor e o maior entre jji 2/Rer . A fração
j leva em conta as situações em que o baricentro da região de recobrimento está mais
deslocado para o lado do átomo (íon) ligante ou para o lado do íon central, e é
aproximadamente dada por (Malta,1982):
j
j1
1
(36)
onde o sinal (+) se aplica quando o raio do íon central é maior que o raio do átomo (íon)
ligante, e o sinal (-) se aplica no caso contrário. A definição desses raios é um tanto
arbitrária. Como se trata do recobrimento entre camadas de valência é razoável considera-
los como sendo os raios dados pelo mapeamento de densidade eletrônica. Porém, para
efeito de se considerar o sinal (+) ou (-) na Eq.(36) a definição de raio iônico pode
perfeitamente ser aplicada. Como o recobrimento j para íons lantanídeos é muito pequeno,
a fração j tem valor próximo de 1.
O valor esperado da parte radial do hamiltoniano HCL é dado por:
drrr
1rdrrr
r
1f4
r
rf4 22
f4
r
1k
k
0
2
r
0
2
f4
k
1k
0
1k
k
0
0
(37)
onde jj0 2/Rr e f4 é a função de onda radial dos elétrons 4f. Como a densidade
eletrônica 2
f4 tem valores significativos só para r < 0r , pode-se considerar que:
k
0
1k
0
22
f4
k
1k
0
1k
k
rr
1drrr
r
1f4
r
rf4
(38)
Assim, os parâmetros do campo ligante são dados por:
1k
j
jq,k1k
jj
j
j
21
k2k
qR
)(Y)2(g
1k2
4reB
(39)
Comparando a Eq.(39) acima com a Eq.(29), a função )j(Ik dada pelo SOM tem a
seguinte forma:
1k
j
1k
j
jj
k2
kR
)2(gre)j(I
(40)
Essa equação vale também para os parâmetros intrínsecos, )R(B jk , do modelo da
superposição (Eq.(32)).
Diferentes formas analíticas podem ser consideradas para as integrais de
recobrimento j . Faucher e Garcia ( ), por exemplo, consideram formas exponenciais
ajustadas a valores calculados de integrais de recobrimento entre orbitais 4f e subcamadas
ns e np dos átomos (íons) ligantes. A forma que tem sido comumente utilizada no SOM é
(Malta, Couto):
5.3
j
min0j
R
R
(41)
onde 05.00 e minR é a menor das distâncias jR . Valores de j dados pela Eq.(41)
encontram-se em bom acordo com valores calculados por Faucher e Garcia ( ).
Um aspecto interessante na Eq.(39) pode ser analisado considerando-se que as
distâncias jR são aproximadamente iguais. Neste caso tem-se que:
k
q
1kk
q B)2()SOM(B (cargas pontuais) (42)
Considerando-se 05.0 e 1 , o fator 1k)2( tem os seguintes valores típicos: 0.4 (k =
2), 1.6 (k = 4) e 6.4 (k = 6). Esses valores evoluem exatamente no sentido requerido para
corrigir as discrepâncias entre valores de sBk
q dados pelo modelo das cargas pontuais e
valores experimentais, como mencionado mais acima. Dessa forma, pode-se relacionar, de
modo aproximado, os sBk
q dados pelo SOM com aqueles dados pela abordagem de
Karayanis e Morrison (Eq.(X)) desde que a seguinte relação seja estabelecida:
1k
k
k )2()1(
(43)
As premissas do modelo simples de recobrimento equivalem a considerar o campo
ligante como um potencial de contato na região de recobrimento entre os orbitais 4f e as
camadas de valência dos átomos (íons) ligantes. Neste modelo os fatores de carga gj não
são necessariamente iguais às respectivas valências dos átomos (íons) ligantes, como
mostraremos um pouco mais adiante. Um outro aspecto a ser notado é que, em princípio, o
SOM não é um modelo paramétrico; os sBk
q podem ser calculados de forma não empírica, a
partir da Eq.(39), com baixíssimo custo computacional e resultados satisfatórios.
Cálculos CLOA
Como mencionado no início deste capítulo, a realização de cálculos de orbitais
moleculares envolvendo íons lantanídeos é de grande complexidade computacional. Um
outro aspecto a ser considerado é que num cálculo deste tipo, em princípio, as energias e
funções de onda que se obtém são monoeletrônicas e, portanto, não representam
desdobramentos dos estados 2S+1
LJ desses íons. Contudo, uma correlação entre as energias
monoeletrônicas e os desdobramentos dos estados 2S+1
LJ pode ser obtida através do
hamiltoniano na Eq.(6) impondo-se certas relações envolvendo a parte radial dos
parâmetros sBk
q , tal como foi feito nas Eqs.(29-31) para o AOM, por exemplo.
Cálculos extensos e detalhados de parâmetros do campo ligante ( sBk
q ) utilizando
uma metodologia baseada na combinação linear de orbitais atômicos (CLOA) foram
realizados por Newman et al, no final da década de 1960 ( ), e por Faucher e Garcia ( )
em meados da década de 1980. Nessa metodologia, esses autores identificam diversas
contribuições aos sBk
q , nas quais são consideradas a contribuição do modelo eletrostático e
contribuições devido a efeitos de ligação química. Os resultados são considerados
satisfatórios, especialmente quando comparados com os resultados dados pelo modelo
puramente eletrostático, porém, à custa de um nível de complexidade computacional
elevado, mesmo com os recursos computacionais disponíveis hoje em dia. Possivelmente, o
aspecto mais interessante desses cálculos é mostrar, de forma quantitativa, a importância
dos efeitos de ligação química. Alguns cálculos mais recentes de desdobramentos dos
estados 2S+1
LJ a partir de métodos químico-quânticos bem mais sofisticados foram
realizados em sistemas moleculares mais simples com íons lantanídeos (Zerner, Dolg,
Longo). Contudo, não se pode concluir que esses cálculos levem a resultados visivelmente
melhores que os resultados obtidos a partir da teoria do campo ligante; sem contar com a
alta relação custo computacional/benefício inerentes a tais cálculos.
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