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YOGA VASISHTA SARA
(A ESSENCIA DO YOGA VASISHTA)
INTRODUÇÃO
O Brihat (O Grande) Yoga Vasishta, ou Yoga Vasistha Maha Ramayana, como
também é chamado, é uma obra de cerca de 32.000 versos sânscritos,
tradicionalmente atribuída a Valmiki, o autor do Ramayana. Trata-se de um
diálogo entre o sábio Vasishta e Sri Rama, no qual é exposta a Advaita (ou
doutrina da não-dualidade) em sua pura forma de ajatavada (teoria da não
origem) com a ajuda de histórias ilustrativas intercaladas. Esta grande obra foi
abreviada há alguns séculos atrás por Abhinanda Pandita, um mestre de
Kachemira, quem a condensou em cerca de 6000 versos, recebendo, então, o
nome de Laghu Yoga Vasishta. Esta é uma obra magistral, da mesma forma que o
original Brihat.
Bhagavan Sri Ramana Maharshi costumeiramente se referia com frequência ao
Yoga Vasishta e inclusive incorporou seis versículos do mesmo ao “Suplemento aos
Quarenta Versos” (versos 21 a 27).
Posteriormente foi feita uma condensação, há bastante tempo atrás, por autor
desconhecido, quem a reduziu para 230 versículos, divididos em dez capítulos e
a intitulou Yoga Vasishta Sara (A Essência do Yoga Vasishta), esta traduçãoe foi
apresentada pela primeira vez em inglês e agora para o português.
Ao fazer esta condensação o autor prestou um grande serviço a todos os sadhaks
[buscadores da verdade]. Esta é realmente um acesso a uma mina de ouro para
repetida leitura e meditação.
EDITOR
Sumário
DESAPEGO ...................................................................................................................... 4
IRREALIDADE DO MUNDO ......................................................................................... 7
OS SINAIS QUE IDENTIFICAM UMA PESSOA LIBERTA ...................................... 10
A DISSOLUÇÃO DA MENTE ...................................................................................... 13
A DESTRUIÇÃO DAS IMPRESSÕES LATENTES ..................................................... 15
A MEDITAÇÃO SOBRE O SER .................................................................................... 17
O MÉTODO DE PURIFICAÇÃO .................................................................................. 18
A ADORAÇÃO DO SER ............................................................................................... 20
EXPOSIÇÃO SOBRE O SER ......................................................................................... 21
NIRVANA ...................................................................................................................... 24
YOGA VASISHTA SARA
PRIMEIRO CAPÍTULO
DESAPEGO
1 – Saudações a essa calma efulgência que é infindável e não limitada pelo espaço,
tempo, etc., a pura Consciência que somente pode ser conhecida pela experiência.
2 – Nem aquele que é totalmente ignorante, nem aquele que a conhece (i.e. a
Verdade), é qualificado ao estudo deste livro. Somente aquele que pensa “Estou
aprisionado, devo tornar-me livre” está habilitado a estudá-lo.
3 – Até que o indivíduo não seja claramente abençoado pelo Senhor Supremo,
não achará um Guru adequado ou a escritura correta.
4 – Da mesma forma que um barqueiro consegue um barco estável, Oh Rama!,
assim também se aprende o método para cruzar o oceano do Samsara
associando-se com as grandes almas.
5 – O grande remédio para a enfermidade do Samsara longo tempo mantida é a
investigação “Quem sou eu? A quem pertence este Samsara?”, que a cura
totalmente.
6 – Não se deveria passar um só dia num local que não possua a árvore de um
sábio conhecedor da verdade, com seu bom fruto e sua sombra fresca.
7 – Deve-se aproximar dos sábios, inclusive dos que não ensinam. Até sua fala
corriqueira contém sabedoria.
8 – A companhia dos sábio converte o vazio em plenitude, a morte em
imortalidade, a adversidade em prosperidade.
9 – Se os Sábios somente se preocupassem com sua própria felicidade, aonde
poderiam buscar refúgio os que estão atormentados pelos pesares do Samsara?
10 – O que se transmite a um discípulo digno, que se tornou desapegado, ó alma
bondosa, é a sabedoria real, é o verdadeiro significado dos textos sagrados, assim
como a sabedoria inteligível.
11 – Seguir o método de ensinamento que se está acostumado só se faz para
conservar a tradição. Convencer-se da realidade depende somente da clareza de
entendimento do discípulo.
12 – O Senhor não pode ser visto com auxílio dos textos sagrados ou do Guru. O
Ser é visto somente pelo Ser, com o intelecto purificado.
13 – Todas as artes adquiridas pelos homens se perdem com a falta de prática,
porém esta arte da sabedoria cresce persistentemente uma vez que surja.
14 – Da mesma forma que um adorno ao redor do pescoço se considera perdido
quando esquecemos dele e se recupera quando percebemos o erro, assim também
o Ser se alcança (quando a ilusão é eliminada) pelas palavras do Guru.
15 – É desafortunada a pessoa que, não conhecendo seu próprio Ser, se compraz
com os objetos sensoriais, como aquele que tardiamente descobre ter ingerido
alimentos envenenados.
16 – O homem perverso que, sabendo serem enganosos os objetos mundanos,
pensa entretanto neles, é um asno, não um homem.
17 – Até o mais leve pensamento submerge o homem no sofrimento, quando está
vazio de todos os pensamentos goza de uma beatitude imorredoura.
18 – Da mesma maneira que experimentamos a ilusão de centenas de anos num
sonho que dura apenas uma hora, assim também experimentamos a burla de
Maya em nosso estado desperto.
19 – Feliz é o homem cuja mente é interiormente fria e livre de apego e do ódio,
e que contempla (este mundo) como um mero espectador.
20 – Aquele que bem compreendeu como abandonar todas as idéias de aceitação
ou recusa e que realizou a Consciência que se abre dentro do coração mais
interno, sua vida é ilustre.
21 – Quando da dissolução do corpo somente o éter (a Consciência) limitada pelo
coração (hrdayam) deixa de existir. O povo lamenta desnecessariamente que o
Ser se extinga.
22 – Quando os vasos se rompem, o espaço em seu interior torna-se ilimitado.
Assim também quando os corpos deixam de existir, o Ser permanece eterno e
desapegado.
23 – Nada nasce ou morre em nenhuma parte, em nenhum momento. É somente
Brahman que aparece ilusoriamente sob a forma do mundo.
24 – O Ser é mais extenso que o espaço, é puro, sutil, incorruptível e benigno.
Assim sendo, como poderia nascer e como poderia morrer?
25 – Tudo isso é tranqüilo, o Uno sem começo, meio ou fim, sobre quem não se
pode dizer que seja existente ou não existente. Saiba isso e seja feliz.
26 – Oh Rama! , em verdade é mais nobre vagar pelas ruas dos párias (Chandalas)
mendigando com uma caneca de barro na mão, do que viver uma vida
impregnada de ignorância.
27 – Nem a enfermidade, nem o veneno, nem a adversidade, nem qualquer outra
coisa do mundo causa mais sofrimento aos homens que a estupidez engendrada
em seus corpos.
SEGUNDO CAPÍTULO
IRREALIDADE DO MUNDO
1 – Da mesma forma como o oceano de leite se acalmou quando a Montanha
Mandara (que foi agitada pelos Devas e Assuras) se acalmou, assim também a
ilusão do Samsara chega ao fim quando a mente se acalma.
2 – O Samsara surge quando a mente se torna ativa e cessa quando esta se acalma.
Acalmai a mente, controlando a respiração e os desejos latentes. (Vasanas)
3 – O Samsara sem valor (literalmente: queimado) nasce de nossa imaginação, e
se desvanece na ausência da imaginação. A verdade é que é absolutamente sem
fundamento.
4 – A idéia de que uma serpente pintada num quadro seja viva deixa de existir
quando se conhece a verdade. Similarmente o Samsara deixa de existir (quando
se compreende a Verdade) mesmo quando continue surgindo.
5 – Este fantasma de um Samsara, de longa duração, que é a criação da mente
iludida do homem e a causa de seus sofrimentos, desaparece quando se reflete
sobre ele.
6 – Oh Rama!, Maya é de tal sorte que encerra o deleite junto com sua própria
destruição, inclusive deixa de existir ao ser observada.
7 – Caro rapaz, maravilhosa é, na verdade, esta Maya que engana ao mundo
inteiro. É por sua causa que o Ser não é percebido, ainda que permeie todos os
membros do corpo.
8 – Tudo o que se vê, não existe verdadeiramente. É como a cidade mítica dos
Gandharvas (Fada Morgana) ou como uma miragem.
9 – Aquilo que não é visto, embora se ache dentro de nós, é chamado o Ser eterno
e indestrutível.
10 – Tal como as árvores da beira de um lago se refletem nágua, assim também
todos estes variados objetos se refletem no vasto espelho de nossa consciência.
11 – Esta criação que é um mero jogo da consciência, surge tal como a ilusão de
uma corda que se toma por uma serpente (quando existe ignorância) e termina
quando existe o conhecimento correto.
12 – Ainda que a escravidão não exista realmente, ela se fortalece pelo desejo de
gozos mundanos, quando este desejo diminui, a escravidão se debilita.
13 – Como as ondas que surgem no oceano, a mente instável surge da vasta e
estável extensão do Ser Supremo.
14 – É por causa daquele (Ser Supremo) que, por conta própria, imagina tudo
rápida e livremente, que este espetáculo mágico do mundo é projetado no estado
de vigília.
15 – Este mundo, embora irreal, parece existir e é a causa do sofrimento de toda
uma vida para a pessoa ignorante, igual a um fantasma (inexistente) é causa de
temor para uma criança.
16 – Quem não entende de ouro vê somente a pulseira. Não tem idéia que é
unicamente ouro.
17 – Da mesma maneira cidades, casas, montanhas, serpentes, etc. são todos, aos
olhos do homem ignorante, objetos separados. Do ponto de vista absoluto este
mundo (Objetivo) é o próprio sujeito (o Ser), não está separado dele.
18 – O mundo está cheio de miséria para um homem ignorante e cheio de
felicidade para um homem sábio. O mundo é escuro para um cego e brilhante
para o que possui olhos.
19 – A felicidade de um homem de discriminação, que rechaçou o Samsara e
descartou todos os conceitos mentais, aumenta constantemente.
20 – Como nuvens que de repente aparecem no céu claro e prontamente se
dissolvem, o universo inteiro surge no Ser e se dissolve nele.
21 – Aquele que reconhece os raios de sol como diferentes dele e entende que são
o próprio sol, se diz que é Nirvikalpa (o homem que não vê diferenças).
22 – Da mesma maneira que a tela quando a investigamos, se percebe que é
apenas tecido trançado, assim também o mundo, quando é investigado se vê que
é meramente o Ser.
23 – Este mundo fascinante surge como uma onda no oceano Ambrosíaco da
Consciência e nele se dissolve. Como, pois, pode ser diferente dela (isto é, da
Consciência) em seu interior quando aparece?
24 – Tal como a espuma, as ondas, a bruma e as borbulhas não são diferentes da
água, assim este mundo que surgiu do Ser não é diferente do Ser.
25 – Da mesma maneira que uma árvore que apresenta frutos, folhas, gavinhas,
flores, ramos, botões e raízes existe na sua semente, assim o mundo manifestado
existe em Brahman.
26 – Tal como uma moringa finalmente retorna ao barro, as ondas à água e as
jóias ao ouro, assim também este mundo que surgiu do Ser finalmente torna ao
Ser.
27 – A idéia da serpente aparece quando a pessoa não reconhece a corda,
desaparece quando a percebe. Igualmente o mundo aparece quando o Ser não é
reconhecido e desaparece quando o Ser é percebido.
28 – É somente por nosso esquecimento do Ser invisível que surge o mundo, da
mesma maneira que a ignorância da corda faz aparecer a serpente.
29 – Tal como o sonho torna-se irreal no estado de vigília e o estado vigília no
sonho, assim também a morte torna-se irreal no nascimento e o nascimento na
morte.
30 – Todos estes fenômenos, portanto, não são nem reais nem irreais. São efeito
do engano, mera impressão que surge de algumas experiências passadas.
TERCEIRO CAPÍTULO
OS SINAIS QUE IDENTIFICAM UMA PESSOA
LIBERTA
(JIVAN MUKTA)
1 – O conhecimento do Ser é o fogo que queima a erva seca do desejo. Isto em
verdade é o que se chama Samadhi, não a mera abstenção da fala.
2 – Aquele que compreende que todo o universo é na realidade apenas
Consciência e permanece calmo, é protegido pela armadura de Brahman, é feliz.
3 – O yogui que conseguir o estado que jaz mais além de tudo e permanece
sempre frio como a lua cheia, é verdadeiramente o Senhor Supremo.
4 – Aquele que reflete em seu coração interno sobre o sentido dos Upanishads
que tratam sobre Brahman e não se comove pelo gozo ou pesar, não é
atormentado pelo Samsara.
5 – Tal como os pássaros e animais que não buscam guarida numa montanha em
chamas, também ao conhecedor de Brahman nunca ocorrem maus pensamentos.
6 – Os sábios semelhantemente aos ignorantes, ocasionalmente encolerizam a
outras pessoas, porém só o fazem afim de provar sua capacidade para controlar
seus sentimentos inatos, quer dizer, para ver até aonde a cólera de outras pessoas
lhes podem afetar.
7 – Tal como o tremor do corpo causado pela serpente (imaginária) persiste por
algum tempo até que se compreenda que não há serpente, assim também o efeito
do engano perdura por algum tempo até que se liberte de todos os enganos.
8 – Da mesma forma que um cristal não fica manchado pelo que se reflete nele,
assim um conhecedor da verdade não é realmente afetado pelo resultado de seus
atos.
9 – Inclusive quando o conhecedor da verdade se ocupa de ações exteriores
permanece sempre introvertido e extremamente calmo, como quem está
dormindo.
10 – Firmemente convencidos da não dualidade e gozando de uma perfeita paz
mental, os ioguis fazem seu trabalho vendo o mundo como se fosse um sonho.
11 – Que a morte chegue ao conhecedor da verdade hoje ou ao final de eons, ele
permanece sem oxidar-se como o ouro enterrado no lodo.
12 – Ele pode deitar seu corpo em Kashi ou na casa de um pária (literalmente
aquele que cozinha carne de cachorro). Aquele que carece de desejos está liberado
no mesmo instante em que consegue o conhecimento de Brahman.
13 – Para quem carece dos desejos da terra, Oh Rama! é tão insignificante como a
marca deixada pela pata de uma vaca, o próprio Monte Meru é um montículo,
todo o espaço é tão insignificante como o contido nem cesto, e os três mundos
como um punhado de erva.
14 – Tal como um recipiente vazio no espaço, o conhecedor da verdade está vazio
tanto por dentro como por fora, e ao mesmo tempo está cheio por dentro e por
fora, como um vaso imenso no oceano.
15 – Aquele a quem os objetos que vê não agradam nem desagradam, e que atua
no mundo como quem está adormecido, se diz que é uma pessoa liberada.
16 – Aquele que está livre dos nós dos desejos e cujas dúvidas foram postas de
lado, está liberado inclusive enquanto se acha no corpo (Jivan Mukta). Ainda que
pareça estar atado, é livre. Permanece como uma lâmpada pintada num quadro.
17 – Aquele que eliminou facilmente, tal como num jogo, todas suas tendências
egoístas e abandonou inclusive o objeto da meditação, diz-se estar livre mesmo
que habitando um corpo físico.
18 – Aquele que, como um cego, não reconhece ou deixa para trás a seus
familiares, que teme o apego como a uma serpente, que considera como iguais o
prazer dos sentidos e as enfermidades, que valoriza a companhia das mulheres
como se fosse um feixe de erva e que não vê distinção entre amigo e inimigo,
experimenta a felicidade neste mundo e no próximo.
19 – Aquele que lança para fora de sua mente todos os objetos de percepção e,
uma vez adquirida a perfeita serenidade, permanece quieto como o espaço, sem
se ver afetado pelo pesar, é um homem liberto, não importa se pratica ou não a
meditação ou se executa ou não uma ação.
20 – A idéia do Ser no não-Ser é uma escravidão. O abandono dela é libertação.
Não há escravidão nem libertação para o sempre livre.
21 – Ao perceber que os objetos de percepção não existem realmente, a mente se
liberta completamente deles, e a conseqüência é a felicidade suprema da
libertação.
22 – O abandono de todas as tendências latentes diz-se ser a melhor ou real
libertação para o sábio, é também o método sem erro para obter a liberdade.
23 – A liberdade não se encontra no outro lado do céu nem no inferno, nem sobre
a terra; a extinção da mente que resulta da erradicação de todos os desejos é
considerada como libertação.
24 – Oh Rama!, não existe intelecto, não há ignorância, não há mente e não há
alma individual (Jiva). Tudo isso é imaginado no Brahman.
25 – Para aquele que está estabelecido no que é infinito, consciência pura,
beatitude e não dualismo sem ver qualidades, aonde está o dilema de escravidão
ou liberdade, visto que não existe uma Segunda entidade?
26 – Oh Rama!, a mente, por sua própria atividade se escravizou a si própria, mas
quando se acalma é livre.
QUARTO CAPÍTULO
A DISSOLUÇÃO DA MENTE
1 – A consciência, que por natureza não é dividida, imagina objetos desejáveis e
corre atrás deles. É então conhecida como mente.
2 – Do Senhor Supremo onipresente e onipotente surgiu como ondulações na
água, o poder de imaginar objetos separados.
3 – Do mesmo modo que o fogo que surge pela ação do vento e cuja chama é
agitado por este também pode ser extinto por esse mesmo vento; assim também
aquilo que nasce da imaginação é destruído pela própria imaginação.
4 – A mente teve existência através desta (imaginação) em virtude do
esquecimento. Do mesmo modo a experiência de nossa morte durante o sonho
deixa de existir quando a investigamos.
5 – A idéia do Ser no que não é o Ser se deve a uma compreensão errônea. A idéia
da realidade com relação aquilo que é irreal, Oh Rama! É que é a mente (Chittam).
6 – “Isto é ele”, “Eu sou isto”, “Isto é meu”, tais idéias constituem a mente, esta
desaparece quando se reflete sobre estas falsas idéias.
7 – É da natureza da mente aceitar certas coisas e rechaçar outras, isto é
escravidão, nada mais.
8 – A mente é o criador; a mente é o indivíduo (Purusha); somente aquilo que é
feito pela mente se considera como realizado, não o que é feito pelo corpo. O
braço com que abraçamos a esposa é o mesmo com o qual abraçamos a filha.
9 – A mente é a causa (quer dizer produz) os objetos da percepção. Os três
mundos dependem dela. Quando se dissolve, o mundo também se dissolve. Há
de ser curada (isto é, purificada) com esforço.
10 – A mente é escravizada pelas impressões latentes (Vasanas). Quando não
existem impressões é livre. Por conseguinte, Oh Rama!, leva à cabo rapidamente,
através da discriminação, o estado no qual não existem impressões.
11 – Tal como uma nuvem suja (quer dizer, parece sujar) a lua, ou uma mancha
de tinta parece sujar uma parede de gesso, assim o mau espírito do desejo macula
o homem interior.
12 – Oh Rama!, aquele que, com mente introvertida, oferece os três mundos, como
erva seca, em oblação ao fogo do conhecimento, torna-se livre das ilusões da
mente.
13 – Quando uma pessoa conhece a verdade sobre a aceitação e a recusa, e não
pensa em coisa alguma senão que mora em si mesmo, abandonando tudo, sua
mente não surge à existência.
14 – A mente é terrível (Ghoram) no estado de vigília, gentil (Santam) no estado
de sonho, embotada (Mudham) no estado de sono profundo e morta quando não
está em nenhum destes três estados.
15 – Tal como o pó da semente Kataka, quando precipita suas impurezas na água,
se mistura com ela; assim a mente (após eliminar todas as impressões) se mescla
no ser.
16 – A mente é o Samsara; também se diz que ela é a escravidão; o corpo é ativado
pela mente do mesmo modo que uma árvore é agitada pelo vento.
17 – Conquista primeiro tua mente, pressionando uma palma contra outra,
mordendo um dente contra outro dente e torcendo os membros com os próprios
membros.
18 – Não se envergonha o néscio de vagar pelo mundo a seu bel prazer e falar da
meditação, quando não é sequer capaz de conquistar a mente?
19 – O único Deus que deve ser conquistado é a mente. Sua conquista conduz à
obtenção de tudo. Sem sua conquista todos os outros esforços são estéreis.
20 – Carecer de perturbação é o fundamento do bendito (Sri). Assim se consegue
a libertação. Para os seres humanos, incluindo a conquista dos três mundos, sem
a conquista da mente é tão insignificante como um punhado de mato.
21 – A associação com os sábios, o abandono das impressões latentes, a
investigação de si próprio, o controle da respiração, eis os meios de conquistar a
mente.
22 – Para aquele que se acha calçado com sapato de couro, a terra é como se
estivesse coberta de couro. De igual modo para a mente plena (isto é, não
dividida) o mundo transborda de néctar.
23 – A mente se escraviza ao pensar “Não sou Brahman”; liberta-se
completamente pensando “Sou Brahman”.
24 – Quando se abandona (isto é se dissolve) a mente, tudo quanto é dual, ou
único, se dissolve, o que resta depois disso e o supremo Brahman, pacífico, eterno
e livre da miséria.
25 – Não existe coisa alguma que iguale o gozo supremo sentido por uma pessoa
de mente pura que alcançou o estado de consciência pura e que superou a morte.
QUINTO CAPÍTULO
A DESTRUIÇÃO DAS IMPRESSÕES LATENTES
1 – Oh Rama!, esta investigação do Ser, do tipo “Quem sou eu?” é o fogo que
queima as sementes da árvore do mal que é a mente.
2 – Do mesmo modo que o vento não balança os galhos pintados num quadro,
assim as aflições não afetam aqueles cujo entendimento acha-se fortalecido pela
firmeza e sempre se reflete no espelho da investigação.
3 – Aqueles que conhecem a verdade declaram que a investigação sobre a
verdade do Ser é conhecimento. O que deve ser conhecido está no conteúdo, tal
como a doçura no leite.
4 – Para aquele que realizou o Ser através da investigação, Brahma, Vishnu e
Shiva são objetos de compaixão.
5 – Para quem gosta de perguntar-se (constantemente) “Que é este vasto
universo?” e “Quem sou eu?” este mundo torna-se muito irreal.
6 – Da mesma forma que numa miragem a idéia da água não ocorre a quem sabe
que é uma miragem, assim as impressões latentes não surgem na pessoa cuja
ignorância foi destruída por compreender que tudo é Brahman.
7 – Pelo abandono das impressões latentes ou pelo controle da respiração, a
mente deixa de ser a mente. Pratica o que queiras.
8 – Oh alma pura!, ama a associação com os sábios e as verdadeiras escrituras,
conseguirás o estado de Consciência Suprema não no período de meses, mas em
dias.
9 – As impressões latentes deixam de ser ativas quando a pessoa se associa aos
sábios, descarta todos os pensamentos do Samsara e recorda que o corpo tem que
morrer.
10 – Oh Ragava!, até mesmo as pessoas ignorantes convertem, pela firmeza de
sua convicção, o veneno em néctar e o néctar em veneno.
11 – Quando se considera real este corpo, ele serve ao propósito de um corpo,
porém, quando se considera irreal, torna-se como o espaço (isto é, sem
substância).
12 – Oh Rama!, quando deitas numa cama macia vagas em todas as direções com
um corpo de sonhos; porém agora (neste estado de vigília); aonde está esse corpo
de sonhos?
13 – Tal como um homem respeitável evita o contato com uma mulher pária que
transporta carne de cachorro, a pessoa deveria rechaçar o pensamento “sou o
corpo”, inclusive se perdesse tudo.
14 – Quando o aspirante (Sadhu) pensa somente em Brahman e permanece calmo
e livre de lamentações, seu egoísmo morre por si mesmo.
15 – Se a pessoa compreende a unidade das coisas em toda parte, sempre
permanecerá tranqüilo, interiormente frio, e puro como o espaço, sem o
sentimento do “eu”.
16 – Se uma pessoa estiver interiormente fria, o mundo inteiro estará frio,
entretanto se interiormente estiver quente (isto é, agitada) o mundo inteiro será
uma massa ardente.
SEXTO CAPÍTULO
A MEDITAÇÃO SOBRE O SER
1 - Eu, a consciência pura, sem mácula e infinita, mais além de Maya (ilusão), vejo
este corpo em atividade como se fosse o corpo de outra pessoa.
2 – A mente, o intelecto, os sentidos, etc. são todos um jogo da consciência. São
irreais e parecem existir somente devido à falta de discernimento.
3 – Sem que me comova a adversidade, amigo de toda a prosperidade do mundo,
sem noções de existência ou não existência, vivo livre da miséria.
4 – Sou inativo, carente de desejos, claro como o céu, livre de ansiedades,
tranqüilo, sem forma eterno e imutável.
5 – Entendi claramente agora que os cinco elementos, os três mundo e eu mesmo
somos pura Consciência.
6 – Estou acima de qualquer coisa, estou presente em toda parte, sou como o
espaço; sou aquilo que realmente existe; sou incapaz de acrescentar nada mais do
que isso.
7 – Que as imaginárias ondas do universo se elevem ou caiam sobre mim que sou
o oceano de consciência infinita; não existe em mim aumento ou diminuição.
8 – Como é maravilhoso que surjam em mim, o oceano da consciência, ondas de
Jivas (almas individuais) e que se levantem por algum tempo e desapareçam de
acordo com sua natureza.
9 – O mundo que veio à existência por causa de minha ignorância dissolveu-se
em mim. Agora percebo diretamente o mundo como a beatitude suprema da
consciência.
10 – Prostro-me ante mim que estou no interior de todo ser, o Ser sempre livre
que habita como Consciência interna.
SÉTIMO CAPÍTULO
O MÉTODO DE PURIFICAÇÃO
1 – Oh Raghava!, sê externamente ativo, porém internamente inativo,
exteriormente um fazedor, porém interiormente um não-fazedor, e assim
representa teu papel no mundo.
2 – Oh Raghava!, abandona interiormente todos os desejos, liberta-te dos apegos
e impressões latentes, faz tudo exteriormente e representa assim teu papel no
mundo.
3 – Oh Raghava!, adota um ponto de vista compreensivo, caracterizado pelo
abandono de todos os objetos de contemplação, vive em teu ser inato, liberto
inclusive enquanto permanecer vivo(Jivan-Mukta), e assim representa teu papel
no mundo.
4 – Queima o bosque da dualidade com o fogo da convicção, “Eu sou a
Consciência pura e única”, e permanece feliz.
5 – Está atado firmemente por todas as partes com a idéia de “Eu sou o corpo”.
Corta a atadura com a espada do conhecimento: “Sou Consciência” e sê feliz.
6 – Rechaçando o apego ao não-ser, considerando o mundo como total, como
carente de partes, concentrado e com a atenção dirigida para o interior
permanece como Consciência pura.
7 – Permanece sempre como Consciência pura, que é tua natureza constante (isto
é, verdadeira) mais além dos estados de vigília, sonho e sono profundo.
8 – Oh Poderoso!, sê sempre livre dos conceitos mentais, como o coração de uma
rocha, ainda que não insensível como ela.
9 – Não sejas aquele que é entendido nem aquele que entende. Abandona todos
os conceitos e permanece sendo o que és.
10 – Elimina um conceito por outro e a mente pela mente, e mora no Ser. “Isto é
tão difícil, oh homem santo?”
11 – Corta a mente, que por suas preocupações se tornou rubra, com a própria
mente, que é como ferro aguçado pelo estudo das escrituras.
12 – Oh Ragava!, que hás de fazer com este corpo inerte e mudo? Porque te sentes
desvalido e miserável por gozos e pesares provocados por ele?
13 – Que enorme diferença entre a carne, o sangue, etc. (que compõem o corpo)
e tu, a encarnação da Consciência! Porque, ainda que sabedor disso, não
abandonas a idéia do Ser neste corpo?
14 – O mero conhecimento de que este corpo é como se fosse um pedaço de
madeira ou um punhado de terra, permite à pessoa realizar o Ser Supremo.
15 – Como é estranho que, enquanto o Brahman real é esquecido pelos homens,
o irreal, chamado Avidya (ignorância) é firmemente conservado por eles (lit. os
ata com força).
16 – Quando faças teu trabalho executa-o sem apego, tal como um cristal reflete
os objetos que se acham diante dele, porém não é afetado por eles.
17 – A convicção de que tudo é Brahman conduz a pessoa à libertação. Rechaça
portanto a idéia de dualidade que é ignorância. Rechaça-a inteiramente.
OITAVO CAPÍTULO
A ADORAÇÃO DO SER
1 – Se te separas do corpo e moras com facilidade na Consciência, tornar-te-ás
uno ( a única realidade), tudo mais aparecendo insignificante como a erva.
2 – Ao conhecer aquele por meio do qual conheces este mundo, volta a mente
para dentro e então verás claramente (isto é realizarás) a efulgência do Ser.
3 – Oh Raghava!, aquele por meio do qual percebes som, sabor, forma e cor, sabe
que é teu Ser, o Brahman Supremo, o Senhor dos senhores.
4 – Oh Raghava!, aquele por meio do qual vibram os seres, aquele que os cria,
sabe que este Ser é teu Ser real.
5 – Após rechaçar, por meio do raciocínio, tudo o que possa ser conhecido como
“nãoverdade”, o que resta como Consciência pura considera-o como teu Ser real.
6 – O conhecimento não está separado de ti, e aquele que é conhecido não está
separado do conhecimento. Daí que somente existe o Ser, e nada acha-se
separado dele.
7 – “Tudo o que Brahma, Vishnu, Shiva, Indra e outros fazem sempre, é feito por
mim a encarnação da consciência”. Pensa desta maneira.
8 – “Sou todo o universo. Sou o incorruptível Ser Supremo. Não existe passado
nem futuro à parte de mim mesmo”. Reflete desta maneira.
9 – “Tudo é o Brahman único, a Consciência pura, o Ser de tudo, indivisível e
imutável”. Reflete deste modo.
10 – Não existe eu, nem qualquer outra coisa. Somente Brahman existe, sempre
cheio de beatitude por todas as partes. Medita calmamente sobre isto.
11 – O sentido de perceptor e percebido é comum a todos os seres encarnados,
porém o yogui adora o Ser Único.
NONO CAPÍTULO
EXPOSIÇÃO SOBRE O SER
1 – Quando este conjunto de corpo, sentidos, etc., atua por conta própria, surge a
idéia de “Eu sou isto”. Este é o Jiva (ego) maculado pela imundice da ignorância.
2 – Quando torna-se firme a convicção de que tudo é a Consciência semelhante
ao espaço (quer dizer que tudo permeia), o Jiva (ego) chega a seu fim como uma
lamparina sem óleo.
3 – Tal como um Brahmin se desvia e abandona sua própria nobreza e adora a
vida de um Sudra (pária), assim o Senhor assume o papel do Jiva.
4 – Do mesmo modo que um menino vê uma aparição (criada por sua própria
fantasia), também o estúpido Jiva cria, em conseqüência do engano, este corpo
irreal e o vê como separado de si mesmo.
5 – Um menino sobrepõe um elefante (real) sobre um elefante de barro e brinca
com ele; de igual modo um homem ignorante superpõe o corpo, etc. sobre o Ser
e leva a cabo suas atividades.
6 – Uma serpente pintada num quadro não faz com que a temamos quando se
compreende que é somente um quadro. Semelhantemente quando a serpente do
Jiva é claramente compreendida não existe nem miséria, nem causa para miséria.
7 – A serpente superposta a uma grinalda se mescla com ela; de igual modo o
sentido de separação que surge do Ser se mistura com o Ser.
8 – Ainda que vários braceletes, etc. pareçam ser coisas separadas como ouro são
uma só coisa. Igualmente ainda que os derivados sejam muitos, o Ser permanece
uno.
9 – Tal como os órgãos do corpo e as modificações da Argka (isto é, as vasilhas
de argila), a não-dualidade aparece como dualidade (quer dizer, multiplicidade)
sob a forma de objetos móveis e imóveis.
10 – Da mesma forma que apenas um rosto é refletido como muitos num cristal,
na água ou no espelho; assim também o Ser único se reflete em muitos intelectos
(ou mentes).
11 – Do mesmo modo que o céu parece manchado pela poeira, pela fumaça ou
pelas nuvens, assim também o Ser puro em contato com as qualidades de Maya
parece ser maculado por elas.
12 – Da mesma maneira que o metal em contato com o fogo adquire as qualidades
do fogo (a saber, o calor) assim também os sentidos etc., em contato com o Ser
adquirem as qualidades do Ser.
13 – Tal como o Rahu invisível torna-se visível quando é captado pela lua (isto é,
quando entra em contato com a lua), assim o Ser é conhecido experimentando os
objetos de percepção.
14 – Quando a água e o fogo se juntam cada um adquire as qualidades do outro.
Igualmente quando o Ser e o corpo inerte se juntam o Ser parece o não-ser e o
não-ser parece o Ser.
15 – Tal como o fogo quando jogado sobre uma grande lâmina d’água perde sua
qualidade, assim também a Consciência em contato com o irreal e inerte parece
perder sua natureza real e torna-se inerte.
16 – O Ser é realizado no corpo somente com esforço, igual a se obter açúcar de
uma cana, óleo das sementes de sésamo, fogo da madeira, manteiga do leite de
vaca e ferro das pedras (isto é, de um mineral).
17 – De igual modo que um céu é visto num cristal que não se rompeu, o Senhor
Supremo da natureza da Consciência é visto (quer dizer, existe) em todos os
objetos.
18 – Tal como uma grande lanterna guardada dentro de um vaso feito de pedras
preciosas ilumina por sua luz tanto dentro como fora, assim também o Ser único
ilumina tudo.
19 – Da mesma maneira que o reflexo do sol sobre um espelho ilumina outras
coisas, o reflexo do Ser nos intelectos puros ilumina outras coisas.
20 – Aquele que neste maravilhoso universo aparece como se fosse uma serpente
em lugar de uma corda, é o Ser Eterno e luminoso.
21 – O Ser carece de início ou de fim. É Existência e Consciência imutáveis.
Manifesta o espaço, é a fonte dos Jivas e é mais elevado do que tudo.
22 – O Ser é Consciência pura, eterna, onipresente, imutável e auto efulgente
como a luz do sol.
23 – O Ser onipresente, o substrato de tudo não é diferente da Consciência
efulgente, como o calor não é distinto do fogo. Pode ser somente experimentado
(não pode ser conhecido).
24 – A Consciência pura, sem intelecto, o Ser Supremo, o iluminador de tudo, o
indivisível, que tudo permeia, por dentro e por fora, é o firme suporte de tudo.
25 – O Ser é Consciência absoluta. É puro auto consciente, incorruptível, livre de
todos os conceitos de aceitação ou recusa, e não é limitado por espaço, tempo ou
gênero.
26 – Tal como o ar do universo que tudo permeia também o Ser, o Senhor, mora
sem forma em todas as coisas.
27 – A Consciência que existe na extensão da terra, nos ornamentos, no céu e no
sol, existe também no interior dos vermes que jazem debaixo da terra.
28 – Não existe nem escravidão nem liberdade, nem dualidade nem não-
dualidade. Existe somente um Brahman, sempre brilhando como Consciência.
29 – Auto conhecer-se é Brahman; o mundo é Brahman; os diversos elementos
são Brahman; eu sou Brahman; meu inimigo é Brahman; meus amigos e
familiares são Brahman.
30 – A idéia de uma Consciência e de um objeto de consciência é escravidão;
livrar-se dela é liberdade. A Consciência, o objeto da consciência e tudo mais, é o
Ser; esta é a essência de todos os sistemas de filosofia.
31 – Aqui só existe Consciência; este universo é apenas Consciência; tu és
Consciência; eu sou Consciência; os mundos são Consciência; esta é a conclusão.
32 – Tudo o que existe e que brilha (isto é que se sabe que existe) é o Ser; tudo
mais que parece brilhar não existe realmente. Somente a Consciência brilha por
si mesma. As idéias de conhecedor e conhecido são postulados vazios.
DÉCIMO CAPÍTULO
NIRVANA
1 – A beatitude suprema não pode ser experimentada através do contato dos
sentidos com seus objetos. O estado supremo é aquele no qual a mente é
aniquilada através da investigação numa só direção.
2 – A beatitude que surge do contato dos sentidos com seus objetos é inferior. O
contato com os objetos dos sentidos é escravidão; livrar-se dele é liberdade.
3 – Alcança o estado puro entre a existência e a não existência e mantente nele;
não aceites ou rejeites o mundo interior ou o mundo exterior.
4 – Depende sempre dessa verdadeira realidade que se acha entre o que sente e
o inerte, que é o Coração infinito como o espaço.
5 – A crença num conhecedor e num conhecido é chamada escravidão. O
conhecedor é escravizado pelo conhecido; é libertado quando não existe nada
para conhecer.
6 – Abandonando as idéias daquele que vê, o que é visto e a visão, juntamente
com os desejos latentes (Vasanas) do passado, meditemos neste Ser, luz
primordial que é a base da visão.
7 – Meditemos no Ser eterno, a luz das luzes que se acha entre as duas idéias de
existência e não existência.
8 – Meditemos no Ser de Consciência, aquele que outorga os frutos de todos os
nossos pensamentos, o iluminador de todos os objetos radiantes e o limite mais
distante de todos os objetos aceitados.
9 – Meditemos no Ser imutável, nossa realidade, cuja beatitude surge na mente
por causa do íntimo contato entre o que vê e o que é visto.
10 – Se medita-se neste estado que advém no final do estado ( de vigília) e no
início do sonho, experimentar-se-á diretamente a beatitude incorruptível.
11 – O estado semelhante a uma rocha no qual todos os pensamentos estão em
calma, e que é diferente dos estados de vigília e de sonho, é nosso estado
supremo.
12 – Tal como o barro encerrado numa vasilha de barro, o Senhor Supremo que
é Existência e Consciência semelhante ao espaço e beatitude, existe por todas as
partes não separado das coisas.
13 – O Ser brilha por si mesmo como o oceano único da Consciência, carente de
limites e nem agitado pelas ondas do pensamento.
14 – Da mesma forma que o oceano não é se não água, o mundo inteiro das coisas
não é se não Consciência que enche todos os pontos cardeais como o espaço
infinito.
15 – Brahman e o espaço são semelhantes no que se refere a sua invisibilidade e
pelo fato de serem onipenetrantes e indestrutíveis, porém Brahman é também
Consciência.
16 – Existe apenas um único oceano sem ondas e profundo, de puro néctar, doce
(isto é, beatífico) em todas as partes.
17 – Tudo é verdadeiramente Brahman; tudo é este Atmã. Não dividas Brahman
ao declara “Eu sou uma coisa” e “Isto é outra”.
18 – Tão logo se compreenda que Brahman é Onipresente e indivisível, descobre-
se que este imenso Samsara é o Senhor Supremo.
19 – Quem dá-se conta que tudo é Brahman, verdadeiramente torna-se Brahman.
Quem não se tornaria imortal após beber o néctar?
20 – Se és sábio tornar-te-ás este Brahman em virtude desta convicção; mas se não
tiveres esta convicção de nada adianta repetires esta verdade várias vezes pois
seria tão inútil como lançar oferendas às cinzas.
21 – Inclusive se conheces a verdade real terás sempre que praticar. A água não
se torna clara simplesmente por pronunciar “fruto de Kataka”.
22 – Se tem-se a firme convicção “Eu sou o Ser Supremo, o incorruptível
Vasudeva”, nos libertamos, caso contrário, permaneceremos escravizados.
23 – Após eliminar tudo afirmando “isto não”, “isto não”, o que resta ou
permanece é a entidade suprema (literalmente o estado) que não pode ser
eliminado. Pensa “eu sou Ele” e sê feliz.
24 – Sabe sempre que o Ser é Brahman, uno e total. Como pode aquele que é
indivisível ser dividido em “eu sou o meditador” e “outro é objeto de
meditação”?
25 – Quando uma pessoa pensa “sou consciência pura” , a isto se chama
meditação, quando inclusive se perde a idéia de meditação, é o Samadhi.
26 – O constante fluxo de conceitos mentais relativos a Brahman sem o sentido
do eu (ego) adquirido através de intensa prática de auto investigação (Jnana) é o
que se chama Samprajnhata Samadhi (meditação sem conceitos).
27 - Que os violentos ventos que caracterizam o fim dos eons (Kalpas) soprem,
que todos os oceanos se unam, que os doze sóis ardam simultaneamente, ainda
assim nenhum mal recairá sobre aquele cuja mente está extinta.
28 – Essa Consciência que é o testemunho da elevação e queda dos seres, sabe
que é o estado imortal da beatitude suprema.
29 – Aquele que é imutável, propício e tranqüilo, aquele que permeia este mundo,
aquele que se manifesta como objetos mutáveis e imutáveis é a Consciência única.
30 – Antes de mudar a pele, a serpente a considera como sendo ela mesma, porém
uma vez que a abandonou em sua toca já não a considera como sendo ela própria.
31 – Aquele que transcendeu tanto o bem como o mal, quando se abstêm de
praticar atos proibidos age como uma criança ou seja sem qualquer sentimento
de que sejam pecados, e nem faz o que está prescrito por qualquer sentimento de
mérito.
32 – De igual modo que uma estátua acha-se contida num bloco de mármore
inclusive se na realidade não foi ainda esculpida, também o mundo existe em
Brahman. Por conseguinte, o estado supremo não é o vácuo.
33 – Da mesma maneira que se diz que um bloco não encerra uma estátua quando
ainda não foi esculpida nele, assim também se diz que Brahman está vazio
quando se lhe priva das impressões do mundo.
34 – Do mesmo modo que podemos afirmar que uma água parada contém ou não
ondas, assim a respeito de Brahman pode-se dizer que contém ou não o mundo.
Não é nem vazio nem existência.