Xique Xique #1 Chita

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volume 1 | número 1 | ano 2014

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Primeira edição da Revista de Cultura de Moda Xique Xique - especial Chita.

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volume 1 | número 1 | ano 2014

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Historia,06

,Sumario

Ensaio08

Cultura18

Ensaio20

Moda28

Dicas29

Artesanato30

Moda34

Cronica32 ,,

O tecido que cruzou oceanos e encantou o Brasil

O vibrante mundo das cores fortes

A representacao cultural nordestina nas bonecas de panos

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sA forca colorida quem vem dos detalhes

Chita sofisticada

Cabritas das chitas

O pano do povo e seu espaco em nossos coracoes

Fashion chita

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ExpedienteUniversidade Estadual da ParaíbaCentro de Ciências Sociais AplicadasCurso de Comunicação Social - Jornalismo

Xique XiqueRevista de Cultura de ModaAno I, Número 1, 2014 Professora Orientadora/Agda Aquino

Produção Executiva/Mikaely Batista

Produção de Moda/Káio Lenno Araújo

Assistentes de Moda/Emanuelle Chagas/Henriette Valéria/Jaqueline Oliveira/Jenifer Pachú/Necivalda Santos

Assistente de Produção/Edna Farias

Fotos/Agda Aquino/Antônio Andrade/Ivan Andrey/Jaime Neto

Assistentes de Fotografia/Everton David/Marcicleide Pereira/Thais Mendonça/Victor Posse

Modelos/Kamila Tenório/Synthia Bivar/Mariana Castro

Maquiagem/Cíntia de Oliveira/Jéssika Carvalho

Textos/Deise Ribeiro/Carla Cordeiro de Oliveira/Edna Farias/Emanuelle Chagas/Jaqueline Oliveira/Karla Stalschus/Lidiana Barbosa/Luana Morais/Renata Portela/Mikaely Batista Ranayana Almeida

Projeto Gráfico/Diagramação/Ilustração/Gêniton Coutinho Sarmento

ISSN 2357-9579

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Editorial Em uma definição simplista, o jornalista mostra para uma parte da sociedade o que outra está fazendo. Sendo

assim, se torna impossível excluir a moda, um dos setores que mais cresceu no Brasil na última década. Na área in-dustrial, o vestuário possui mais de 30 mil empresas que representam 17,5% do PIB da Indústria de Transformação e cerca de 3,5% do PIB total brasileiro. Segundo a ABIT (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção), o faturamento da moda por ano é maior que 35 bilhões de dólares. Falando em empregos, são aproximadamente 2 milhões, 75% de mão de obra feminina. Isso sem incluir o setor de beleza e de serviços, que somam um verdadeiro turbilhão de pessoas e investimentos.

Pensando a moda através de outra vertente, mais sociológica do que mercadológica, optamos por compreendê-la aqui enquanto cultura, como fez em 2010 o Ministério da Cultura ao reconhecê-la como linguagem artística, como expressão de cultura. Esta discussão estava sendo amadurecida em âmbito governamental desde 2003 e culminou com um incentivo histórico ao setor, que só tende a crescer ainda mais. Surge nesse contexto várias oportunidades de traba-lho para o profissional de Jornalismo, que envolvem desde as assessorias, passando pelas mídias sociais e culminando no trabalho em redação de diversos veículos de comunicação. E os profissionais precisam ser capacitados para ocupar esses espaços, um papel que as Universidades ajudam a cumprir em experiências como esta publicação.

A ideia da revista surgiu como parte das atividades do componente curricular Comunicação e Moda, do curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo da UEPB. Ela nasce com o objetivo de exercitar um jornalismo de moda engajado, consciente e antenado com o que há de mais atual na discussão do setor, sem perder a responsabilidade de promover a cultura de moda e a cultura nordestina. A revista, que se propõe semestral, traz em seu nome toda carga cultural da nossa região, numa alusão àquilo que defende: que a moda é cultura e que o povo nordestino expressa atra-vés de seus símbolos de vestimenta toda sua história. O tema escolhido para essa edição de estreia não poderia ser mais marcante: a chita, que tem uma relação imagética simbiótica com o povo colorido do Nordeste brasileiro, patrimônio imaterial da nação.

É muito importante destacar aqui o vital apoio que recebemos de parceiros para a execução da revista. Todos os entrevitados e aqueles que cederam informações e seu precioso tempo para que pudéssemos fazer uma revista in-formativa e engajada são figuras a quem devemos agradecer. Mais ainda àqueles que emprestaram sem nenhum custo suas peças, como lojas, grifes e estilistas, devidamente creditados ao longo das páginas: sem a confiança de vocês esse trabalho não teria sido possível. Muito obrigada!

Todos os textos desta primeira edição da Xique-Xique, assim como seus ensaios fotográficos, foram desenvol-vivos pelos alunos. Na aventura de transformar esse dossiê em realidade, viajamos até a cidade de Areia, município da região do Brejo paraibano, patrimônio histórico e cultural do Brasil. As cores de seus casarões centenários serviram de cenário para a história das mulheres que contamos aqui. E por falar em história, trazemos também na revista os passos que a chita deu ao longo do tempo para chegar por aqui e virar sinônimo do povo nordestino. Também fazem parte desta edição textos sobre as bonecas de pano, uma crônica afetuosa, dicas sobre como se aprofundar no universo da chita e ainda um panorama da chita na moda brasileira. Afinal, se é para falar de uma parte da população, escolhemos mergulhar nesta, que produz, pensa, sonha, investe e fomenta a cultura e a economia do país.

Boa leitura,

Agda AquinoJornalista e Professora da UEPB

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A estampa floral que embeleza os vestidos das fes-tas juninas, que compõe a decoração de altares, que foi apresentada em criações do São Paulo Fashion Week e em festas regionais brasileiras cruzou oceanos marcando várias gerações na história.

Chita, palavra derivada de Chintz - vocábulo da língua híndi, nomeia o tecido que vestiu escravas e rece-beu o nome de alcoçaba pela elite. A estampa teve origem na Índia marcando os séculos XI ao XV pelo grande de-senvolvimento do tecido. Na sua fabricação, os indianos usavam pigmentos naturais como o índigo (planta da fa-mília das leguminosas que produz a cor azul) e o dióxido de ferro (ferrugem). Para fixar a cor ao tecido era adicio-nada no processo a substância mordente. Tintureiros que pertenciam às classes inferiores eram considerados im-puros por acrescentar urina para acelerar a fermentação. Como as representações figurativas eram proibidas pelo hinduísmo e islamismo, os tecidos tinham flores simples e padrões listrados.

Em 1498, após quase um ano de viagem, Vasco da Gama, que comandava três caravelas, aportou no sul da Índia no principado de Calcute. Gama passou três meses na companhia do monarca daquele principado e retornou para Lisboa com especiarias, pedras preciosas e tecidos es-tampados.

Na Europa, o processo de estamparia da chita era a de tinturaria, caracterizado pela modificação da cor ori-

O tecido que cruzou oceanos e encantou o BrasilTexto: Lidiana Barbosa

Historia,06

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ginal de um tecido liso. Uma modificação do original já que os indianos elaboravam desenhos nos tecidos sem que houvesse mistura ao serem tingidos, causando fascínio nos europeus.

A Inglaterra foi um dos países que teve a visão co-mercial de fabricar a chita industrialmente, no padrão próximo ao indiano. Países como Suíça, Alemanha, Ho-landa e Itália também desenvolveram ateliês de indienna-ge onde os tecidos eram feitos com melhor qualidade do que os do Oriente.

A chita no Brasil

Portugal que trouxe a chita e a difundiu na Europa, mas foi a Inglaterra, através de acordos comerciais, que forneceu o tecido em larga escala para o continente. Isso porque culturalmente os lusitanos rejeitavam o trabalho manual e consideravam terrível o trabalho em tecelagem.

Não foi diferente para colônia da metrópole lusita-na que só teve acesso ao tecido após a abertura dos portos brasileiros às nações amigas, por Dom João VI. No século XIX a chita era uma estampa de elite. Mas aos poucos o tecido foi ganhando o gosto popular e surgiram as produ-ções caseiras.

No início do século XX no Brasil, 40% de todo capital no país circulava através da manufatura têxtil do algodão, empregando 23% da população. No período da Primeira Guerra Mundial o Brasil produziu com mais in-tensidade a chita já que países europeus se dedicaram a produção de armamento bélico abandonando a manufa-tura têxtil.

Fábricas como a Companhia Fabril Mascarenhas, que surgiu em 1912, produziu chita até os anos 80. Uma das maiores produtoras do tecido no país, a Fábrica de Tecidos Bangu com sede no Rio de Janeiro, tinha deixado de produzir a chita nos anos 50. A Fiação e Tecelagem São José nesse período começou a fazer testes em que fabrica-vam tecidos com larguras maiores. Desses testes surgiu o chitão (com estampas maiores), que foi divulgado nos anos 60 e estimulou outros fabricantes a fazerem o tecido no país.

Hoje a chita conquistou vários espaços, sendo ma-téria prima na confecção de brincos, pulseiras, colares, bolsas e artefatos de decoração como flores, almofadas, guirlandas, quadros e paredes, dentre outros. Um tecido que carrega consigo história, viagens, técnicas, diferenças sociais e se tornou referência da alegria do povo nordestino brasileiro.

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Editorial08

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Ela está de férias. Sua única preocupação é aproveitar a cidade. Esperou por isso o ano todo. O seu mundo moderno é completamente diferente da cidade do interior. Sua rotina de trabalho caótica não lhe permite desfrutar a calma atmosfera de uma cidade pequena. Ela está encantada. A mulher moderna e independente apreciando a simplici-dade, o cinza da cidade grande se perdeu em meio às cores. Elas estão por toda parte: as casas coloridas refletem a alegria de quem as habita. Essa nova cultura a surpreende e a tira do mundo metódico, suas roupas agora são outras. Nada de terno, nada neutro, é o mundo das cores. Vestida de chita, se mostra ainda mais elegante. A chita, com suas cores e estampas ressalta a beleza de uma mulher independente, segura e totalmente feminina. Saindo do seu mundo imediato, onde se valorizam objetos importados, conheceu a essência do regionalismo em um tecido pouco valorizado por mui-tos, mas que dá um toque especial ao guarda-roupa da mulher antenada com o mundo mas que valoriza suas origens.

Texto: Emanuelle Chagas

O vibrante mundo das cores fortes

Bolsa: Karmélia Blazer: Romero SousaSaia e tiara: Acervo

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Blusa: Alunos do curso de Produção de Moda Funetec/PBSaia: Romenro SousaSandália: Sonho dos PésColar: Acervo

Vestido: Romero Sousa Lenço e cinto: AcervoSandália: Gato e Sapato

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Vestido: Haendel MeloSapato: Gato e Sapato

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Blusa: Alunos do curso de Produção de Moda da Funetec/PBCinto: AcervoShort: Romero SousaSapato: KarméliaLenço: Acervo

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Chapéu: AlbaluMacaquito: Romero SousaSandália: EvaÓculos: Acervo

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Blusa: Alunos do curso de Produção de Moda da Funetec/PBCinto, saia e blazer: AcervoSapato: Karmélia Bolsa: Sonho dos pés

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Blusa e Calça: Romero SousaCinto e Ôculos: AcervoSandália: Gato e Sapato Bolsa: Gato e Sapato

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Macacão: Romero SousaLenço e cinto: AcervoBolsa: Sonho dos pés

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Vestido: Romero SousaLenço e cinto: AcervoSandália: Gato e Sapato

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Cultura

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A chita está presente na cultura nordestina de di-versas formas como na decoração, em acessório, e claro, como vestimenta - um dos primeiros objetivos em sua utilização. Mas o interessante é que, além disso, a chita foi vestir também as bonecas de pano feitas para as meninas brincarem à vontade. Foi assim que Socorro da Concei-ção, hoje aos 73 anos, iniciou sua jornada na arte de brincar de boneca. Só que, mais do que isso, ela foi uma criança curiosa e observava sua tia costurando e produzin-do, fugia com sua irmã dos afazeres de casa para aprender também a fazer suas próprias bonecas. E com tudo que tem direito: laços, fitas, tiaras, brincos, colares, pulseiras, sapatos e vestido. Recolhia-se todo o material disponível em casa para usar a criatividade e se divertir desde a pro-dução do brinquedo.

No começo, realmente, era apenas para diversão, até que, certo dia, um sobrinho que acompanhava seu pai às feiras da região sugeriu que Socorro fizesse algumas bo-necas a fim de vendê-las. Dessa forma foi dado o pontapé para que esse elemento da cultura popular paraibana ga-nhasse um novo destino. Os caminhos levaram as bonecas tão longe que chegaram à TV, fazendo parte hoje do ce-nário do programa Encontro com Fátima Bernardes, da Rede Globo. São as bonecas produzidas pela comunidade de Socorro que compõem a poltrona principal do cená-rio, assinada pelos famosos designers Irmãos Campana.

O Sebrae tem sido importante nesse processo. A partir do apoio da instituição, por exemplo, surgiu a ideia de montar uma escolinha para ensinar as pessoas da comunidade o processo de fabricação para produção em maior escala das bonecas de pano. A associação Casa da Boneca Esperança reunia, inicialmente, 45 integran-tes, inclusive alguns homens. Foi nesse ponto que a brin-cadeira de criança se tornou negócio de adulto: quando o trabalho prazeroso e divertido se convertia em renda, ajudando os moradores do Sítio Riacho Fundo não só em suas economias como também contribuindo para a melhoria da qualidade de vida.

A representacao cultural nordestina nas bonecas de pano

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Atualmente, a associação conta com 20 artesãos, que confeccionam em suas próprias casas e exibem as pe-ças, quando têm oportunidade, em feiras e exposições de artesanato não só na Paraíba, como em outros estados do Brasil. Porém, hoje a dificuldade encontrada, segundo os artesãos, diz respeito ao baixo incentivo fornecido pela prefeitura do município de Esperança/PB, já que a asso-ciação não tem dado conta da demanda de custos para seu mantimento e, consequentemente, ocorre a diminui-ção das participações nos eventos. Isso tem diminuído a divulgação e repercussão do trabalho, já que a associação não pode arcar com despesas como alimentação e hospe-dagem.

Ao procurarmos a posição da Prefeitura Municipal de Esperança sobre a situação, o coordenador de cultura da cidade, Evaldo Pedro da Costa disse que “houve uma quebra de continuidade. Nas origens do projeto, demos todo apoio com ajuda de profissionais”. Afirma terem consciência de que a comunidade de artesãos do Riacho Fundo está passando por dificuldades, mas não soube passar mais informações, mas afirmou que quando os ar-tesãos precisam fazer uma viagem em caráter de urgência, eles recebem o apoio.

Núbia Alírio, presidente da Casa da Boneca, e par-ticipante junto com seu marido desde a fundação, relata que, recentemente, a equipe perdeu a oportunidade de participar de feiras em Brasília, Belo Horizonte e Recife. Fato esse que afeta diretamente as vendas, a valorização do artesanato, da cultura local e da renda dessa popula-ção. Devido à atual situação da comunidade, hoje, para os artesãos do Riacho Fundo e os admiradores dessa arte, o que resta está explícito no próprio nome da cidade: Es-perança. E é o que se deve ter em boa dose, pois há ainda muito caminho pela frente para se conquistar.

Reportagem: Jaqueline Oliveira

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Peças: Alunos de Procução de Moda da Funetec/PB - Maria do Carmo Pereira Stalschus (Vila do Artesão) - AcervoRoupas: Alba Lu e Luanny

Editorial20

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Moça faceira, formosa e cheia de vida. A menina nascida no interior do Nordeste vai tentar a sorte na cidade grande. Saudosa de sua terra natal, volta em busca de suas raízes, suas memórias. Agora ela é outra: aquela criança humilde do interior foi em busca de seus sonhos e se renovou, forte e decidida, é feliz com suas conquistas. O glamour não modifica a essência, sua força está além da roupa, do brilho que agora faz parte do seu mundo.

O branco - conhecido como uma cor pura, pode significar muitas coisas como luz, bondade, inocência, pureza. O poder dessa cor deve ir além de simples conceitos intimistas. O que antes era um símbolo de paz e pureza vem ganhando cada vez mais força no mundo da moda e agora é tendência nas passarelas.

Ideal para criar visuais elegantes, o branco tem seu poder reforçado pelos assessó-rios de chita que, feitos com estampas e cores fortes, é um tecido que dá alegria ao look e se destaca em contraste com a cor clara. Regionalismo contrastando com o poder do branco sem perder a essência do chique, do glamuoroso.

Assessórios em chita como anéis, colares, cintos, bolsas e chapéus, dão alegria ao visual, acrescentam estilo e personalidade à vestimenta. A chita nasceu do pano popular vestindo escravos e pessoas carentes, mas agora ressurge como um elemento capaz de fazer moda.

Cabelos ao vento, sorriso no rosto, essa mistura de regionalidade e estilo dando vida às tendências de moda. De Gabriela (personagem do romance de Jorge Amado), à mulher contemporânea, aliar o colorido da chita ao requinte proporcionado pelo branco é uma representação da ousadia da mulher brasileira, capaz de inventar e se reinventar sem perder sua beleza, suas raízes, reforçando através da vestimenta sua personalidade e seu poder na sociedade.

Texto: Deise Ribeiro Carvalho e Carla Cordeiro de Oliveira

A forca colorida que vem dos detalhes

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A chita é um tecido de algodão com estampas de cores fortes, normalmente flores e tramas simples. Um tecido popular, sendo caracterizado como chita apenas quando é impressa no morim. Como a qualidade do mo-rim é fraca, não permite que ela tenha uma maior reper-cussão para ser industrializada, uma vez que não pode ser fabricada em grandes peças já que o tecido não aguenta muitas estruturações. As cores intensas servem para em-belezar o tecido e disfarçar irregularidades, como eventu-ais aberturas e imperfeições.

Apesar dessa qualidade precária, marcas de gran-de nome no Brasil e no mundo, como a Forum, que faz referências à cultura brasileira, já lançaram coleções com alusão à chita. Porém quando a impressão da chita é feita em outro tecido ela passa a ser considerada estampa de chitão, com desenhos em proporção maior, como explica o estilista e produtor de moda paraibano Haendel Melo. Outro exemplo que podemos ter como base é de cerca de três estações atrás, quando a marca também colocou a estampa de chitão na popelina e em outros tecidos. Mais uma vez essa aplicação deixa de ser chamada de chita, mesmo assim, a referência não se perde e a homenagem permanece.

A chita veio se desenvolvendo em vários setores e sendo idealizada em feiras de artesanato até se tonar algo mais sofisticado. Haendel diz que produziu algumas peças com a chita e também convidou outros estilistas para pro-duzirem peças mais elaboradas com adaptações de rendas e trançados como de renascença, labirinto e macramê. A partir daí foi feito um desfile para a abertura do Salão de

Chita sofisticadaArtesanato do Governo do Estado da Paraíba em 2010, onde a chita foi homenageada. Na época, com o tema central do evento era a chita, desde as peças até as paredes do salão foram desenvolvidas com essa estamparia. No desfile, havia duas peças criadas pelo estilista (uma delas está presente no primeiro editorial desta edição - ver pági-na 11).

Na Paraíba, a cooperativa ‘As cabritas’, do muni-cípio de Boa Vista, desenvolvem um trabalho com chita muito enriquecedor para o Estado. Pelo grupo, são pro-duzidas bolsas, capas para notebooks, echarpes, lenços e algumas peças de roupas com adaptações em algodão co-lorido (como pode ser conferido em detalhes na página 30). No mundo fashion, a chita vem atuando desde peças de roupas simples ou elegantes até roupas de cama.

Para falar no fashion, não podemos deixar de ci-tar a mulher nordestina antenada e sofisticada, e dentre elas, elencar o nome da cantora paraibana Elba Ramalho, que em vários de seus figurinos usa a chita rebordada para abrilhantar seus shows.

A chita predomina no período junino, onde ve-mos as cores primárias exuberantes em toda parte, conta-giando quem está pronto para admirá-la. Hoje, a chita está presente em vários ambientes e mesmo em altos e baixos ela consegue sobreviver por estar enraizada na cultura. “Ter es-tilo, ser chique, combina com a chita. Nada é mais brasilei-ro do que a chita. Com nossa variedade de estampas e arte-sanato é extremamente chique você utilizar esses elementos na moda atual e dependendo da forma como é utilizada, qualquer visual elaborado com a chita pode ser considera-do de requinte e bom gosto”, finaliza Haendel Melo.

Reportagem: Mikaely Batista

Moda28

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Se você gosta de chita, saiba que é fácil encontrar peças em lojas, páginas da Internet e com pessoas que se apaixonaram pelas cores e estampas vibrantes do tecido. Quer mergulhar no assunto? Então confira nossas dicas.

Para navegar

Bolsas, colares, brincos anéis e peças de decoração são alguns exemplos do que pode ser encontrado na loja virtual da Babel das Artes.

Especializado em arte popular, o site traz também informaçõesde cultura, arte e comporta-mento. Vale o clique. www.babeldasartes.com.br

Para visitar

Está na Paraíba e quer ver de perto peças produzi-das com chita? Então basta procurar o Mercado de Arte-sanato da Paraíba, na capital João Pessoa. Com dois an-dares e dezenas de lojas, o prédio reúne diversos tipos de peças produzidas com chita, couro, cabaça, osso, fibras, rendas e diversos tipos de artes manuais típicas da região. Se estiver visitando Campina Grande, vá também à Vila do Artesão. Para mais informações confira as páginas na Internet:

http://www.mercadoartesanatopb.com.br/paraiba.phphttp://viladoartesao.blogspot.com.br/

Para ler

Para quem quer se aprofundar nesse universo colori-do a dica é mergulhar no livro “Que chita bacana!”, projeto idealizado por Renata Mellão e Renato Imbroisi, lançado em 2005 e editado pela A Casa – Museu do Objeto Brasi-leiro. Ele traz um estudo profundo sobre o tecido e aborda toda a cultura e a história que envolve a chita e como ela passou de chique a brega e de brega a chique nos seus mais de 500 anos de história. Pena que a tiragem tenha sido pe-quena e hoje é difícil encontrar exemplares para comprar.

Dicas

Imagens: Reprodução

Texto: Agda Aquino e Ranayana Almeida

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A padronagem floral bem tropical da chita, com desenhos destacados de cores contrastantes e in-tensas, já figurou tanto nos mulambos dos escravos quantos nos requintados looks das passarelas inter-nacionais, foi dos lenços de Alcobaça da nobreza ao pano de forrar as mesas. Sempre colorindo os extre-mos, a chita consegue transitar em diversas circuns-tâncias e mostra o valor e a influência do vestuário na construção da imagem e das relações estabelecidas no convívio social.

O morim estampado de flor, tecido típico da Índia Medieval trazido ao Brasil pelos portugueses há mais de 500 anos, começou a ser produzido no país após um demorado processo burocrático, finan-ceiro e cultural. Só com a transferência da Casa Real portuguesa para solos tupiniquins, a indústria têxtil teve início no país e a montagem das primeiras fábri-cas de estamparia foi realizada.

Ao longo dos anos, a chita foi ganhando seu espaço na cultura brasileira não apenas em época junina ou nos cortejos folclóricos. Da decoração de eventos às vitrines de lojas, nunca se usou tanta chi-ta. O tecido barato de padrões muito coloridos, que já foi sinônimo de coisa “vulgar”, deu lugar à malhas

Reportagem: Luana Morais e Renata Portela

mais modernas de tramas enriquecidas com poliéster e outros fios sintéticos. No entanto, mesmo com a predominância industrial nas práticas de fabricação, a chita ainda sobrevive nos pequenos teares que es-banjam a riqueza da produção artesanal.

Um bom exemplo dessa relutância no uso de aparatos tecnológicos é a cooperativa As Cabritas de Boa Vista, município paraibano à 160 km da capital João Pessoa. Desde a criação do grupo, que recebeu o nome do animal símbolo de resistência à seca da região, as artesãs triplicaram a produção e aumenta-ram em 80% as vendas aqui no Brasil e no exterior.

A produção das Cabritas atualmente está cen-trada na confecção de roupas, acessórios e artigos or-namentais. Cerca de 20 mulheres dividem o trabalho na preparação de conjuntos para cozinha, almofadas, bolsas e carteiras que são moldadas com o tecido que é a cara da zona rural do Nordeste. O pano floral é cuidadosamente customizado e vai aos poucos trans-formando o colorido da região em peças artesanais sofisticadas e atraentes ao consumidor.

Em 2009, a associação de artesãs recebeu a visita do designer carioca Renato Imbroisi, idealiza-

Grupo de artesãs do agreste paraibano usa o tecido como fonte de renda e no resgate às tradições

Cabritas da chita

Artesanato30

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dor do livro Que Chita Bacana (ver Dicas - página 29), que trouxe para o grupo técnicas diferentes de preparar o produto. Com a ajuda do designer, as vo-luntárias aprenderam o tratamento do tecido com tingimento de amarração, o shibori e o tie-dye, a aplicação de crochê e de rechiliês, a prática do mate-lassê, o uso de pregas e plissados combinados com a técnica do tear manual de prego e o macramê. Para a artesã Maria do Socorro, 55, as orientações do espe-cialista foram importantes, visto que essa experiência ajudou o grupo a vislumbrar a conquista de novos mercados.

Anteriormente, em 2004, o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e a Rede Paraíba Design, com o apoio da Prefeitura Municipal e do Governo Estadual, já haviam levado a arquiteta Taís Antunes para prestar consultoria jun-to ao grupo, na época ainda chamado de “Bordadei-ras de Boa Vista”. A meta era evidenciar o potencial que essas donas de casa receberam como herança de suas mães e avós e, com isso, reforçar os objetivos mercadológicos da associação. A investida solidificou o sentimento de empreendedorismo presente entre essas mulheres e auxiliou na difusão do trabalho do agreste paraibano mundo afora.

Mas a consagração só viria em 2010. Por meio do Programa do Artesanato da Paraíba, uma ação do Governo do Estado através da Secretaria do Turismo e Desenvolvimento Econômico (SETDE), a coope-rativa foi homenageada pelo XII Salão de Artesanato Paraibano. Tal mérito só foi possível graças à inicia-tiva da presidente de Honra do PAP, Sandra Moura, que ornamentou o espaço aliando a vivacidade co-lorida da chita com o tradicionalismo do trabalho artesanal.

Criadora de símbolos e identidades, sinônimo de brasilidade e de nossa diversidade cultural, a tra-ma de fios com padrões intricados e vistosos ainda movimenta um mercado sutil. Profissionais do mun-do têxtil reclamam da baixa qualidade do algodão com a qual a chita é confeccionada no país, resultan-do em um paninho ralo e pouco resistente. Mesmo com tantas limitações, o tecido encontra espaço no mercado através de trabalhos devotados e cheios de qualidade como esses criados pelas Cabritas de Boa Vista. A dedicação dessas mulheres resgata a memó-ria da chita que, apesar de economicamente barata, é rica em informação e dá volume as peças que ga-nham passarelas, galerias de arte, vitrines e palcos.

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Passeando pelas ruas de Campina Grande, na Para-íba, ficamos perplexas com tamanha diversidade de cores, estampas e tecidos encontrados ao longo da caminhada. Chitas com cores que parecem ter vida própria, pois con-seguem alegrar não apenas o dia, mas o gosto e os desejos daqueles que as apreciam. Um tecido que traz consigo uma sinestesia com embalos de festa, de comemoração e de lembranças. Que nordestino nunca viu ou usou uma peça de chita numa festa junina, num restaurante típico ou em uma mesa da cozinha da avó ou daquela querida tia? Com suas flores, pequeninas, médias ou grandes, não importa. A chita transmite alegria e vida!

De um pano do Brasil colonial usado principal-mente por escravos, para as lojas de decoração e de grifes, a chita (que até alguns anos atrás era conhecida como o pano do povo) deixou de colorir apenas as festas popula-res para estar presente, também, em ambientes considera-dos modernos e sofisticados. Nesse passeio imagético pe-las ruas o que nos entristeceu foi perceber que este tecido repleto de encantos e lembranças não é valorizado pelo seu próprio povo, que o usa de maneira já bitolada, ape-nas para festejos juninos ou festas com temas regionais.

Texto: Karla Stalschus e Edna Farias

O pano do povo e seu espaco em nossos coracoes

Não conformadas com o que nossos olhos viam e ouvi-dos ouviam, fomos indagar aos proprietários de algumas lojas de venda de tecidos sobre a opinião deles a respeito da importância da chita e mais uma vez a tristeza tomou conta. Os relatos trouxeram à tona a ideia geral de que o tecido de chita para a maioria das pessoas alegra apenas os períodos juninos. É duro perceber que não há na cultura do povo paraibano espaço para ele em momentos que não sejam o de comemoração do bom e velho São João.

Caracterizada pelas suas estampas e cores, o teci-do já foi usado como forma de segmentar a população brasileira, entre pessoas de posses – aquelas que usavam tecidos pesados com cores sóbrias, de pessoas com pouca ou nenhuma posse – aquelas que usavam a chita.

A procura pelo status que poderia ser adquirido com os cuidados para exibir uma boa aparência física no século XIX, bem como as satisfações que o uso de uma ornamentação poderia dar, foram grandes parceiras para a popularização da chita no Brasil. Muito similar às verda-deiras chitas inglesas importadas, nobres, refinadas e usa-das pelas classes dominantes, o povo conseguiu encontrar, na “prima pobre”, uma aliada para atingir este objetivo.

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Através dos adornos e das cores era possível à população o sentimento de riqueza e de inclusão, mesmo que esta não fosse a realidade financeira e social de quem a usava.

Mas nem só de pessimismo vive a chita, renascida pelas mãos da estilista Mirian Freitas, que fez brotar sor-risos dos nossos rostos quando afirmou que era possível utilizar a chita para fazer um vestido de gala. E por que não? Por que não sermos ousados o bastante para fazer-mos moda, valorizar o tecido que é cara do povo nordes-tino? E não apenas isso, em busca de conhecer mais sobre a história da chita no Brasil, pudemos descobrir que de-pois de séculos vestindo trabalhadores braçais e escravos, moradores de zonas rurais, meninas das festas de interior, entre outros lugares mais simples e de menor poder aqui-sitivo, a chita fez parte do movimento hippie e foi parar nas passarelas internacionais. Zuzu Angel, estilista brasi-leira vítima da ditadura militar que assolou o país nos anos 60/70/80 do século passado, foi pioneira no uso do tecido em suas ousadas coleções, feito que a levou a uma viagem de volta à Europa, completando assim um círculo de evolução e um retorno às suas origens.

Das senzalas e dos modelos usados pelos escravos,

a chita marcada por ser o pano do povo passa por um renascimento e ganha espaço de destaque nos artigos, ves-timentas e objetos usados pelas altas classes sociais. De pano de pobre para pano “de quem pode”, no sentido denotativo, financeiramente falando.

Embora tenha sido descaracterizada, a chita faz par-te da nossa história. Com suas cores e estampas alegres, não consegue passar despercebida. Sua presença é marcan-te e ela está viva no inconsciente coletivo, na memória das festas juninas, nas viagens da infância, na cultura popular, com seus ritmos e cores que marcam, retratam e expressam a mistura de raças e costumes do povo brasileiro.

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A chita consegue transitar em várias circunstâncias, vai do brega ao chique em apenas uma tem-porada. Detentora do status de roupa de baixo custo durante os meses de junho e julho nas festas po-pulares, porém nas primeiras apresentações das coleções de primavera-verão no segundo semestre do ano consegue rapidamente ser a menina dos olhos dos que acompanham o trabalho de grandes estilistas brasileiros, principalmente os que procuram sempre valorizar matérias-primas e características culturais do Brasil.

A criação com a presença deste tecido de algodão com estampas florais de cores vibrantes torna-se ainda mais valorizada quando carrega a assinatura de ícones do mundo fashion, como Ronaldo Fraga, Gloria Coelho, Reinaldo Lourenço, Amapô, André Lima, Karlla Girotto, Lino Villaventura e tantos ou-tros. Esses grandes nomes conseguem com muita criatividade retirar o estigma negativo da chita e valo-rizar o tecido que é a cara do Brasil.

Fashion Chita

· Festchita: No segundo semestre do ano, a cidade mineira de Alvinópolis sedia o Festchita, evento que homenageia o valor que o tecido exerce para a cul-tura brasileira, principalmente na história da cidade.

· Anualmente, a cidade portuguesa de Santa Com-ba Dão realiza o Concurso de Vestidos de Chita. O evento tem como objetivo mostrar como era a moda nos anos 40 através de desfiles, nos quais os participantes são divididos por faixa etária. A festa celebra o resgate de uma tradição que marcou épo-ca e que representa gerações.

· Em Portugal, as estampas de chita vindas da Índia seriam conhecidas com o nome de pintado. Na Ho-landa, recebe o nome de sites. E na Inglaterra, tecido estampado de flores é chamado de chintz até hoje.

· Por ser fabricada com materiais baratos e de bai-xa qualidade, a chita disponível no mercado hoje é delicada e pouco resistente. Portanto, alguns cui-dados devem ser tomados no uso do tecido: o pano ralinho da chita pode desbotar facilmente, por isso deve evitar longa exposição ao sol; também não é recomendável seu uso na cobertura de móveis grandes e na ornamentação de ambientes externos.

Reportagem: Luana Morais e Renata Portela

Curiosidades

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