Wilma Count - Questões do Coração - CH Nº 285

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QUESTÕES DO CORAÇÃO (The Viscount´s Bride) Wilma Counts CH 285 Londres, 1817 Ele era um adversário à altura... Mas o amor sempre encontra uma saída! Theodore foi desmascarado diante de todos os trabalhadores da tecelagem por Hannah: ele era filho de um dos homens de maior fortuna do país. Acusado de traição, ele tem de provar que estava ali para verificar as condições de trabalho dos empregados. Ela, porém, não acredita nele, mas não quer que os agitadores ponham a vida dele em perigo. Por alguma razão, aquele homem faz seu coração bater mais forte... Comovido com a coragem da bela Hannah e certo de que a jovem estava nadando em águas perigosas, Theodore tornou-se seu protetor. Apesar de querer dizer um ao outro palavras de amor, continuam lutando por suas causas, até descobrirem que adversários não precisam ser inimigos... sobretudo no que diz respeito às questões do coração. Digitalização: Alice Akeru Revisão e Formatação: Cynthia

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QUESTÕES DO

CORAÇÃO(The Viscount´s Bride)

Wilma Counts

CH 285

Londres, 1817

Ele era um adversário à altura... Mas o amor sempre encontra uma saída!

Theodore foi desmascarado diante de todos os trabalhadores da tecelagem por 

Hannah: ele era filho de um dos homens de maior fortuna do país. Acusado de traição, eletem de provar que estava ali para verificar as condições de trabalho dos empregados. Ela,porém, não acredita nele, mas não quer que os agitadores ponham a vida dele em perigo.Por alguma razão, aquele homem faz seu coração bater mais forte...

Comovido com a coragem da bela Hannah e certo de que a jovem estavanadando em águas perigosas, Theodore tornou-se seu protetor. Apesar de querer dizer um ao outro palavras de amor, continuam lutando por suas causas, até descobrirem queadversários não precisam ser inimigos... sobretudo no que diz respeito às questões docoração.

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Wilma Counts adora cozinhar e cuidar do jardim. Também adora viajar e gosta muito de política e de relações internacionais. Na década de 1990, na Alemanha,lecionou estudos sociais e inglês para crianças americanas. Wilma colabora ainda em um jornal de Nevada chamado RWA escrevendo uma coluna sobre gramática.

Theo ficara atônito ao encontrar Hannah em meio àqueles acontecimentosfatídicos. Diante da voz entrecortada por lágrimas contidas, teve ímpetos de tomá-la

nos braços e confortá-la. Por outro lado, sentia vontade de aplicar-lhe umas boaspalmadas.

— O que você tem na cabeça? Não tinha nada a fazer aqui. — Eu precisava ver...saber...

— Não poderia esperar alguém lhe contar o que aconteceu? Onde já se viu viraqui sozinha?

— Não podia ficar sentada esperando, milorde. E além do mais, eu não vimsozinha.

Querida leitora,

Entregue-se as aventuras deste romance. Leia e apaixone-se. Você vai ver que de

uma grande amizade pode surgir um grande amor!

E que o destino sempre nos surpreende! 

Fernanda Cardoso Editora

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

Copyright © 2003 by J. Wilma Counts

Originalmente publicado em 2003 pela Kensington Publishing Corp.

PUBLICADO SOB ACORDO COM KENSINGTON PUBLISHING CORP.NY, NY - USA

Todos os direitos reservados.

Todos os personagens desta obra são fictícios.Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas

terá sido mera coincidência.

Título original: The Viscount´s Bride

Tradução: Gracinda VasconcelosEditora e Publisher: Janice Florido

Editora: Fernanda CardosoEditoras de Arte: Ana Suely S. Dobón, Mônica Maldonado

Paginação: Dany Editora Ltda.Ilustração de Capa: Hankins + Tegenborg, Ltd.

Não compre livros usados, pois você estará contribuindopara o aumento do mercado paralelo e a diminuição de empregos.

EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.Rua Paes Leme, 524 – 10º andar 

CEP 05424-010 - São Paulo - Brasil

Copyright para a língua portuguesa: 2004EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.

Impressão e acabamento:RR DONNELLEY Tel.: (55 11) 4166-3500

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Prólogo

Londres, 1817 

O mordomo acompanhou até a biblioteca o último dos quatro convidados queestavam sendo aguardados.

— Seja bem-vindo, Dickie — o anfitrião saudou o recém-chegado, com aintimidade de um velho colega de escola, o que não deixava de ser verdade. — Só faltavavocê — continuou, entregando-lhe um cálice de vinho do Porto.

Dickie sentou-se na poltrona que lhe foi indicada.

— Devo admitir que não foi fácil chegar a esta fortaleza. Fico contente em vê-lo

aqui, Stubs. — Brindou, dirigindo-se a um dos convivas em particular. — Os partidários darevolução devem permanecer juntos.

— Certo. — Stubs ergueu seu cálice, e os demais riram, pois os cinco sabiam quesua aliança como velhos amigos superava quaisquer rótulos políticos.

Outro, conhecido como Homem-do-Mar, manifestou-se: — Agora que estamostodos aqui, qual o motivo deste encontro, Piloto?

— Na verdade foi idéia de Whitey — respondeu o anfitrião. — Portanto, ele mesmodeve responder.

Os cinco compartilhavam uma grande familiaridade e confiança que só os homensque permanecem juntos desde a juventude possuem. Aqueles que jogaram, estudaram,riram e choraram lado a lado. Que superaram brigas inevitáveis e aturaram professoresque pareciam odiar os alunos. Chamavam-nos de Os Cinco Audazes. Outros osapelidaram de Os Cinco Terríveis. Mesmo agora, passados quase cinqüenta anos,formavam um grupo formidável.

Todos se destacaram de alguma forma e gozavam de grande prestígio. Possuíamriqueza e poder individual e coletivo. Em seu grupinho fechado, gostavam de se tratar 

pelos apelidos do tempo de escola. Dickie era o diminutivo de seu verdadeiro nome, Ri-chard. Stubs, que agora era o mais alto e magro, outrora fora baixo e volumoso. Whitey,que odiava seus cabelos loiros, passara a ostentar uma bela cabeleira branca. Piloto eHomem-do-Mar receberam suas alcunhas devido a suas respectivas habilidades atléticas:corrida de carros e natação.

Whitey pigarreou, sorveu sua bebida e pousou-a, estalando os dedos.

— Sabem muito bem que a Inglaterra atualmente não passa por bons momentos.

— Até que enfim! — exclamou Dickie. — Um membro do partido conservador que

admite esse fato.— Não que vocês, partidários da revolução, tenham oferecido algo melhor —

retrucou Homem-do-Mar.

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— Ouça o que ele tem a dizer — Piloto aparteou, impaciente.

— Partidário do governo ou da oposição, é sempre difícil saber que rumo tomar.

Todos assentiram para Whitey.

— Há um grande número de opositores que gritam a plenos pulmões por 

mudanças que mantenham a ordem e coíbam os excessos, como Spa Fields.

Um mês atrás um grupo de trabalhadores de Londres detonara o que os jornaisclassificaram como greve em um lugar chamado Spa Fields.

— Muitos estão convencidos de que estamos apenas a um passo da revolução eda anarquia neste país. Outros dizem que não devemos tomar medidas drásticas pararestringir os direitos do povo. Afinal, somos ingleses civilizados, e não um bando devisionários quixotescos.

— Escute! — O Homem-do-Mar ergueu a mão.

— Sim, Whitey — interrompeu-o Dickie —, todos nós temos conhecimento disso,mas aonde quer chegar com esse discurso.

—Com freqüência somos cegos liderando cegos, companheiro.

— E por quê? — Stubs se mostrava agressivo. — Afinal, o governo não estápagando a seus espiões infiltrados em nossos clubes?

—Está—interveio Piloto.—Porém, nem sempre a informação que chega até ele éconfiável. Além disso, é comum que chegue até nós após ter sido filtrada de acordo com

interesses especiais.— Tem razão. — Dickie meneou a cabeça. — E nosso próprio povo não confia em

nós apenas por termos títulos políticos. Pessoas que conheci durante a vida toda evitamconversar comigo.

— Entendo. — Whitey suspirou. — O que precisamos é que alguns ou um de nósse infiltre entre eles, a fim de descobrirmos quais são seus reais problemas e quemedidas devemos tomar para aliviar sua situação.

— Está sugerindo infiltrar espiões entre o povo?

— Não exatamente, Stubs. Apenas alguém para observar e reportar-nos o que viu.

— Isso é perigoso — opinou Homem-do-Mar. — Donos de fábricas e tecelagensforam mortos por muito menos.

— Seria muito difícil encontrar alguém que pudesse manter tal disfarce. Seu modode falar o trairia. Pensem no que poderia acontecer caso fosse descoberto. — Stubsfranziu o cenho.

— E teria de ser alguém que fosse um ilustre desconhecido, tanto em nosso meioquanto entre a classe trabalhadora. Não conheço ninguém que se enquadre nessesrequisitos.

— Pois eu conheço, Dickie — retrucou Piloto.

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Capítulo I

A sita. Hannah Elizabeth Whitmore não se mostrava muito entusiasmada com apossibilidade de comparecer ao Baile Rollente.

O duque e duquesa de Rollente patrocinavam esse baile que se seguiria àcomemoração de um importante evento cívico. Hannah sabia que se divertiria com acerimônia de inauguração da nova ponte sobre o rio Tâmisa. Admirava as maravilhasarquitetônicas da obra e aprovava a escolha do nome: Waterloo. Parecia-lhe uma justahomenagem aos homens cujas vidas haviam sido ceifadas naquela dispendiosa refrega.

Por um lado gostaria de assistir à cerimônia. Haveria banda de música e belos

discursos, bem como comerciantes oferecendo souvenirs, drinques e comida em váriosquiosques. Imaginava encontrar uma atmosfera de feiras provincianas, às quais semprecomparecia em sua cidade. Adorava eventos que reunissem bastante gente com umobjetivo comum.

Entretanto, o baile era outra questão bem diferente. A duquesa de Rollente eraconhecida como uma grande esnobe e muito consciente de sua posição de árbitro dosque pertenciam ou não ao círculo fechado da nobreza.

— Tem certeza de que devo comparecer à festa? — perguntou Hannah durante o

desjejum, duas semanas antes da data marcada para o evento.— Mas é claro que sim — respondeu Cláudia, baronesa de Folkenston, rindo. —

Você está me saindo uma verdadeira reclusa, e não vou permitir isso! Além do mais,como pretende encontrar um cavalheiro qualificado? Jamais achará um marido trancadaem Derbyshire.

Hannah ofereceu um sorriso genuíno à amiga.

— Minha querida Cláudia, nunca desistirá, não é mesmo? Já passei do estágio decaçar um cônjuge. Esqueceu-se do desastre que foram minhas últimas duas temporadas?

Os cachos dourados de Cláudia balançavam, quando meneou a cabeça em sinalde protesto.

— Ainda não estava preparada, Hannah. E aquela sua tia a vestiu como umanoviça. Além disso, ficou enchendo seus ouvidos com tantas recomendações sobre ocomportamento esperado de uma filha de pastor que você tinha medo até de sorrir!

— Não foi culpa de tia Hermione. Ela fez o possível, e sou-lhe muito grata.

— Bem, esse é o pensamento que se espera de uma dama. Tudo isso, porém, faz

parte do passado, e você continua solteira. Temos de remediar essa situação.Hannah soltou uma gargalhada ante a persistência de Cláudia.

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— Não lhe ocorreu que, ao contrário do que dizem as más línguas, estou muitobem assim?

— Querida, como pode afirmar algo assim? As pessoas têm de enfrentar a vidacomo casais, não como avulsos. Não deseja ter filhos?

Tocada pela sinceridade da amiga, Hannah pegou-lhe ambas as mãos.— Não deve se preocupar comigo. Tente entender que nem todas as pessoas têm

a mesma sina. Estou muito contente por ter encontrado seu par ideal, Cláudia, mas nãofoi isso que o destino reservou para mim.

— E quanto aos filhos? Sei que adora crianças. Noto quando está com as minhas.

— Tenho todos aqueles garotos de minha escola.

— São filhos de outras pessoas, e algumas são trabalhadores de tecelagens, quenem sequer podem tirar proveito de seus ensinamentos.

— Elas tiram. Um pouco de educação é melhor que nada.

— Sério? Nunca lhe ocorreu que pode fazê-las ficar descontentes com a situaçãoque a vida lhes reservou?

— Esse é o pensamento de muitos donos de indústrias — retrucou Hannah em tomseco. — Mas meus alunos devem ficar descontentes. Quero que tenham o direito deprocurar novas oportunidades, de crescer.

Cláudia deu um longo suspiro.

— Ora, não vamos discutir política a esta hora da manhã. Que vestido usará noBaile Rollente?

— Acho que o lilás pode servir.

— Temos tempo suficiente para providenciar um novo.

— Imagina quantos livros para minha escola posso comprar com o dinheiro de umvestido novo?

— Oh, pelo amor de Deus! Deixe-me pelo menos comprar-lhe um.

— Não. De maneira nenhuma. Vou usar o lilás, e se não for adequado...— Está bem, está bem. Será o lilás. Isso significa que decidiu ir, afinal?

Hannah fez que sim e mudou de assunto antes que a amiga continuasse seu temafavorito: arranjar-lhe um marido.

Adorava Cláudia. Sua amizade datava de quando ainda eram meninas. Costumavareservar um mês todos os anos para passar com ela. Quase sempre durante o verão, noSolar dos Folkenston. Naquele ano, porém, Cláudia insistira em ficar na cidade.

Hannah gostara de voltar aos ares de Londres. Ninguém conseguia cansar-sedaquela cidade, mesmo considerando longe de serem fascinantes as pessoas que aliviviam. Odiava a hipocrisia da maioria dos integrantes da sociedade londrina, a qual

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conheceu em suas duas temporadas. Dessa vez, no entanto, divertia-se assistindo amusicais e visitando museus. Contudo, se o baile era tão importante para Cláudia,compareceria, para satisfazê-la.

Theo Ruskin, ou Theodore Eurípides Ruskin, visconde Amesbury e até poucotempo atrás, major do Exército de Sua Majestade, passeava pelo saguão do restrito clubeconhecido como White com a autoconfiança que seu traje um tanto fora de moda lhepermitia.

"Nada mudou em três anos", pensava. "As mesmas cadeiras de couro, o mesmoburburinho, o mesmo odor de cigarro e barulho de copos".

Esperara encontrar um ou dois conhecidos naquele estabelecimento, mas não trêsamigos. Trevor Jeffries, Samuel Jenkins e David Moore estavam confortavelmentesentados a uma mesa de canto, próxima à janela.

— Theo! Será que meus olhos estão me enganando? É mesmo o intrépido major?— Trevor acenou-lhe.

Ele atravessou o salão consciente de que a expansividade de Trevor atraíram aatenção de muitas pessoas presentes.

— Então. Conseguiu voltar ileso!

— Assim parece, David — respondeu Theo, apertando a mão de cada um deles.

— Jenkins contou-me que você conseguiu uma bala francesa em Quatre Brás.Meu Deus, homem! Waterloo foi há dois anos!

—Wellington pediu-me que ficasse com as tropas de ocupação. Os trêsassentiram, e Theo sabia que o entendiam mesmo. Nenhum deles teria recusado umconvite do duque.

— Mesmo ferido?

— O ferimento sarou rápido, Trevor. Ainda tenho a cicatriz. Sempre a terei. E,como vocês sabem, os oficiais passam a maior parte do tempo no comando dasoperações, e não no campo de batalha. Não foi muito grave.

— Aposto que isso vai atrapalhar sua incursão nas pistas de dança — brincouJenkins, oferecendo-lhe uma taça de vinho.

— Não aposte tanto. Ainda consigo dançar uma valsa. Trevor levantou seu copo.

— A seu retorno!

— E aos amigos — respondeu Theo. Todos brindaram com satisfação.

— Quais são seus planos? — Trevor quis saber.

— Planos? Não tenho nenhum. E acreditem-me, é assim que quero continuar.

Notou os olhares desconfiados que os amigos trocaram.— Esse é o herói conquistador que voltou à península? — indagou Moore.

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— Não. E o ex-soldado que perdeu centenas de homens em Waterloo. Essahistória de heróis é para os estudantes. — Theo tinha consciência de que seu tom de vozsaíra mais áspero do que pretendera.

— Ei, Moore e eu estávamos lá também, lembra? Não foi sua culpa. A ordem veiode cima. Nós todos obedecemos.

—Mas nós... eu deveria ter contrariado tal ordem. Ou ao menos ter feito algumacoisa.

— Ora, major, todos sabemos o caos que é uma guerra — argumentou Jenkins.

— Sem mencionar as conseqüências de desobedecer uma ordem. — Moorearqueou as sobrancelhas.

—Bem, tudo isso está acabado agora. — Trevor encheu o copo. — E estou muitocontente que tenhamos sobrevivido.

Trevor Jeffries servira na península, porém interesses comerciais e outrosproblemas familiares o afastaram, contra sua vontade, do fiasco final de Napoleão doisanos atrás.

— Theo, se não tem nada em mente, deve juntar-se ao clã dos homens solteirospor opção. Trevor, como você sabe, há muito é uma causa perdida, e nosso Jenkinsaliou-se a ele há seis meses.

O visconde fixou o olhar nos cabelos ruivos e no rosto sardento de Jenkins, queestava corado como um tomate maduro.

— Você caiu na armadilha do cupido, Samuel?

— Caí. E devo dizer-lhe que estou muito feliz.

— Na verdade, ele se tornou um lunático como Trevor. —Moore deu risada.

— Parabéns! — Theo cumprimentou-o. —Apesar das pressões contrárias, acreditoque permanecerei no clã de Moore.

— Excelente! Já estava me sentindo em desvantagem. Agora seremos dois contradois.

— Vai ser difícil. — Jenkins abanou a mão. — Com sua aparência e sua fama deherói... E herdeiro de um condado. Qualquer mãe ambiciosa vai querer tê-lo como genro.

— Deve é freqüentar as cerimônias que atraem a maior parte das beldadescasadoiras — aconselhou-o Trevor.

— Até você! Não basta minha mãe, que já planejou apresentar-me a uma dezenade moças, e cheguei há apenas uma semana!

Continuaram a conversar e rir animados. Theo sentiu-se agradecido pela amizadedeles e por terem todos sobrevivido às agruras da guerra. Admirava-se da facilidade comque retomaram a antiga camaradagem a despeito da prolongada distância.

Em dado momento, os quatro notaram uma acalorada discussão entre cinco

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cavalheiros vinda do outro lado do salão. Um deles aparentava ser octogenário. Doisestavam na casa dos cinqüenta e dois eram jovens, talvez perto dos trinta.

Um dos rapazes dizia:

— Sidmouth está indo longe demais. O homem vê uma revolução num simples

murmúrio de desejo de mudança.— E tem bons motivos — retrucou um dos homens de meia-idade, autoritário. —

Vejam o que aconteceu na França. Isso pode nos mostrar aonde as reivindicações doscamponeses podem levar-nos. Ao caos. É isso que quer para a Inglaterra?

— Lógico que não! Mas o caos se instalará aqui, caso o governo continue a agir dessa forma repressiva.

— Em meu tempo, sabíamos como lidar com revolucionários.

— Em seu tempo... — retrucou o outro jovem — perdemos as colônias americanas.

— O que significa tudo isso? — inquiriu Theo aos amigos.

— O mais velho é lorde Parkington — afirmou Jenkins. — Os outros são Stremple,Marchand, e um dos rapazes é Wilkes. Creio que o outro é Ferguson. Os três mais velhospertencem ao Parlamento. Parkington é um dos mais acirrados membros do partidoconservador.

— Mas por que discutem tanto?

— Quem vai saber. — Moore respirou fundo. — Emancipação católica, talvez. Ou

vão lançar mais um imposto contra revolucionários. Bem-vindo ao outro campo debatalha.

— Não, não. Não pretendo engajar-me em nenhum partido. Quero pescar e caçar,participar de algumas conferências, ir ao teatro. Nada de refregas.

O pequeno grupo dispersou-se em seguida.

Não estava com sorte. O sonho tinha pequenas variações, mas se repetia noiteapós noite. Via-se caído em um campo de batalha, preso embaixo de seu cavalo morto. Asua volta, apenas lama e sangue. Virava a cabeça num esforço de ter uma visão mais

clara e deparava com o soldado mais novo de seu regimento, apenas treze anos, jazendoa seu lado. A pata do cavalo em seu peito não o deixava respirar. Depois, sentia umaespécie de alívio e flutuava ao encontro de seus soldados, que perderam a vida. Estavamtodos lá, com o olhar acusador. Então, ouvia suas vozes: "Por que major?", "Deveria ter feito alguma coisa", "O senhor matou meu amigo", "Matou todos".

— Não!

Alguém balançou seu ombro. Levantou-se e passou a mão no rosto úmido de suor.

— Obrigado, Burton. Eu...

— O mesmo sonho, senhor?

— Sim. Volte para a cama. Ficarei bem. O sonho só vem uma vez a cada noite.

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Às vezes Theo imaginava se algum dia ficaria livre dele.

A partir dali, Theo se preparou para a vida que descrevera aos amigos no White.Os anos em que esteve no Exército, quase dez, forçavam-no a ver sua incursão nasociedade como se ingressasse em uma campanha militar. Primeiro, fazer oreconhecimento do território, observar a situação e planejar a estratégia. Só aí entrar emação.

O primeiro passo era renovar seu guarda-roupa e aposentar os uniformes. Optoupor peças não muito ostensivas.

— Você está muito bonito, meu filho — comentou a mãe, uma noite após o jantar.

Theo usava um paletó que havia sido entregue naquela tarde.

— Não acha, Edward? — a condessa Glosson perguntou ao marido, quepreparava alguns drinques.

— Claro, querida. Para que me casei como uma beldade? Para dar-me lindosfilhos.

— É mesmo? E todos esses anos pensei que se casou comigo por meu dote!

— Ah, isso também...

Theo observava os pais, sorvendo um cálice de sherry. Todos sabiam que ohonorável Edward Ruskin, cujos aparência e status o recomendariam aos melhorespartidos, preferiu unir-se a uma linda moça de bem, que estava longe de pertencer afamília rica.

— E então, filho, como foi hoje em Westminster? Qual o tema atual noParlamento?

— Muita conversa, como sempre. As coisas não andam nada bem. Mas não vamosfalar sobre isso durante a refeição.

A conversa transcorreu sobre assuntos familiares e sobre sua irmã, Cassandra.

A condessa pegou a mão do filho.

— Estou tão feliz em tê-lo de volta! A morte de Francis nos deixou arrasados. E

ficamos muito sentidos por você receber a triste notícia da morte de seu irmão na França.Sozinho, sem o apoio da família.

— Foi muito doloroso, mamãe, mas a rotina do regimento ajudou-me a superar.

— Acho que todos nós lidamos com essa perda a nossa maneira. Seu pai, por exemplo, enterrou-se nas questões do Parlamento. Eu retornei à música. Francis sempreadorou a música... Estou tendo lições de harpa.

— Que bom, mãe! Deveria tocar para mim.

— Tocarei, mas não esta noite. Agora que já tem um guarda-roupa novo, devemosapresentá-lo, ou melhor, reapresentá-lo às jovens moças da sociedade londrina.

Theo suspirou. Sua mãe, tão adorada, não iria desistir.

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Capítulo II

Quando a mãe se retirou, Theo e o pai permaneceram cada qual em suaconfortável poltrona na sala de estar. O conde demonstrava grande interesse pelasexperiências bélicas do filho e fazia-lhe várias perguntas a esse respeito.

— Este país não é justo com seus soldados, filho. Theo apenas ergueu o sobrolhoem sinal de admiração.

— Quando não servem mais para defender a nação, são jogados na zona rural àprópria sorte, onde aumentam as estatísticas de desempregados, ou são forçados aaceitar trabalhos mal-remunerados, via de regra realizados por mulheres ou crianças.

— Sei disso, papai. Visitei alguns de meus homens no hospital de Chelsea. O quemais os aflige é a falta de emprego, sobretudo para aqueles que ficaram com algumadeficiência física.

— Pobres-coitados... É tudo muito injusto, e isso gera insatisfação e provocamanifestações, problemas nas minas, fábricas e... tecelagens.

— Nossas tecelagens?

— Por enquanto apenas tivemos algumas questões isoladas, pois Taggert tem

mão de ferro, mas outras tecelagens têm sofrido com máquinas avariadas e produtosarruinados.

— Esse ainda é o homem que o meu avô nomeou como administrador?

— O próprio. E acredite-me, Taggert conhece mais nossos negócios do que eu.Isso me deixa mais tempo para dedicar-me a outros interesses.

— Como os assuntos do Parlamento?

— Isso mesmo.

— Então o senhor ingressou mesmo na política?— Minha cadeira na Câmara veio junto com o condado. Você sabe que não era

bem o que eu esperava.

Theo sabia, sim. Cinco anos atrás, com a morte do tio e do avô, seu pai passou aser o honorável conde Amesbury, herdeiro do condado de Glosson, enquanto elerecebera o título de visconde Amesbury. O conde mal havia se recuperado, quandoperdeu seu filho mais velho, o brilhante Francis, e duvidava que algum dia conseguissesuperar essa perda. Ele mesmo não se conformava com a morte do irmão.

— Contudo, acho o trabalho no Parlamento bastante interessante — comentouEdward, tirando o filho de seus devaneios.

— Quer dizer que se juntou aos Cinco Audazes no Parlamento. O que pretende?

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— Talvez apenas ser ouvido. Alguns acham que o governo tem medo darevolução, mas eu não sei...

— Ouvi dizer que lorde Sidmouth plantou espiões em determinados grupos paramantê-lo informado.

— O secretário de Estado está fazendo o que acha necessário. Mas, para ser franco, o povo que escolheu para esse serviço é questionável.

— Como assim?

— Sidmouth arregimentou homens da prisão de Newgate e os enviou a campopara obter informações.

— Prisioneiros? Ele está utilizando criminosos?!

— E o que é pior, quanto mais escabrosos são os relatórios, maior é arecompensa. Alguns deles tomaram-se verdadeiros instigadores. Não admira que o povo

da Inglaterra esteja tão desconfiado.

— Parece-me um dilema.

— Os homens no Parlamento, muitos dos quais proprietários de indústrias, estãotentando conseguir novas leis. Os poucos grupos de trabalhadores que conseguem fazer-se ouvir insistem em que sua paciência está no fim.

— E você papai, o que acha?

— Não sei. Estamos desesperados por conseguir notícias confiáveis — o velho

senhor respondeu.— E acha que eu poderia ajudar de alguma forma? — Theo notara aonde o pai

queria chegar.

O conde sorriu.

— Você sempre foi um rapaz inteligente.

— Papai, não tenho o mínimo interesse por política. Não quero me envolver nasmaquinações de Sidmouth ou de quem quer que seja.

— Sei disso. Mas você será o conde Glosson um dia.— Não tão cedo, espero.

Edward se manteve calado por vários minutos. Quando tornou a falar, foi sobreoutra coisa:

— Sabia que Francis estava em Derbyshire quando morreu?

— Sim. Você me escreveu contando.

— Ele foi lá em meu lugar. — Aquele comentário carregava um enorme pesar. —Francis sempre teve muito interesse em gerenciar os negócios.

— E sempre gostou de organizar tudo. Adorava bancar o chefe comigo eCassandra.

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

O conde esboçou um sorriso triste.

— Fiquei contente quando ele assumiu a tecelagem. Sua mãe e eu ficamossatisfeitos em dividir nosso tempo entre o Solar Ruskin e esta casa em Londres.

— Tenho certeza de que Francis ficou feliz com esse arranjo. Meu irmão sempre

gostou desse trabalho. Não entendo nada de tecelagens. Talvez um dia, quem sabe...— Seu tempo é agora, filho. Não apenas pela família ou por nosso povo, mas por 

um interesse maior.

— A que se refere?

— Necessitamos de alguém em quem possamos confiar entre os trabalhadores,para reportar o grau de insatisfação neste país. Alguns são revolucionários que não estãode acordo com as medidas propostas pelo governo.

— Os Cinco Audazes?

O conde fez um gesto afirmativo de cabeça.

— E outros.

— Por que eu?

— Porque sempre se deu bem com os operários e fazendeiros, além dessa suanatural habilidade de aprender os dialetos. Não consigo imaginar ninguém melhor. E omais importante: confio em você.

— Obrigado pelo voto de confiança.

— Quer dizer que aceita?

— Nunca gostei da idéia de espionar o inimigo.

— O povo inglês não é um inimigo.

— Eu sei, pai. E respeitava muito os soldados nas trincheiras para acreditar queseus irmãos nas fábricas e no campo são algum tipo de gente inferior, mas...

— Existe um elemento de perigo, Theo. Não lhe pediria isso se julgasse haver alguém mais bem qualificado para essa tarefa.

— Prometo pensar no assunto. Mesmo porque não deve ser muito difícil paraquem já se fez passar por um camponês espanhol e um soldado francês.

— Existe algo que deve saber. A morte de seu irmão não foi acidental.

— O quê?!

— A polícia trabalha nisso há meses, mas até agora não descobriram nada.

— Mamãe sabe disso?

— Não. Só chegou a meu conhecimento uma semana após a morte de Francis.

Não vi razão para dar-lhe mais esse desgosto.

Theo assentiu, ainda tentando digerir notícias tão chocantes.

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— Não existem pistas de quem teria sido o responsável?

— Muitas conjecturas, mas nada concreto. A teoria mais provável é de que o queaconteceu a Francis teria sido uma espécie de aviso.

— De quê?

— Talvez para aterrorizar os donos de tecelagens. Para que tomassemconhecimento das reivindicações dos operários. Ou quem sabe Francis tivesse uminimigo pessoal. A verdade é que não sabemos.

— E quer que eu descubra?

— Isso também.

— Meu Deus! — Theo não conseguia ocultar seu desespero.

— Filho, se quiser recusar, saiba que não o condenarei por sua decisão. — O

conde deu palmadinhas em seu ombro e se retirou para seus aposentos.Nos dias que se seguiram, Margareth, a condessa Glosson, insistiu que seu filho a

acompanhasse a bailes e teatros. Muitas vezes Edward também participava dessasatividades. A Sra. Ruskin costumava brincar dizendo que era escoltada pelos doishomens mais lindos de todo o império. E sempre uma, duas ou três possíveis sucessorasa seu título estavam presentes a tais eventos.

A maior frustração da condessa, entretanto, era que Theo não fazia a menor distinção entre elas. Ao contrário, era educado e gentil com todas. Em seu íntimo, elenutria certa inclinação por lady Olívia Sanders, mas apenas por suspeitar que seria aparceira mais satisfatória na cama. Por outro lado, sabia que se demonstrasse o mínimosinal de preferência Margareth daria início aos preparativos de casamento.

Naquela ocasião, comprometera-se a participar de um último evento social antesde aceitar o desafio proposto pelo pai. A ocasião seria um baile oferecido pelo duque epela duquesa de Rol-lente. Horas antes, assistira, junto com os pais e lady Olívia, àcerimônia de inauguração na nova ponte Waterloo. Lá encontrara o duque de Wellington,que figurava entre os convidados de honra.

— Segundo ouvi dizer, sua contribuição a nosso país ainda não terminou —

comentou o duque, apertando com efusividade a mão de Theo.

— Tudo indica que não, Vossa Graça.

Espantou-o o fato de Wellington estar a par do possível "serviço" que lhe foraconfiado.

Horas mais tarde, o visconde encontrava-se, com os pais, na lateral do imensosalão, observando os casais na pista. Dançara apenas uma vez com lady Olívia, e pôdecomprovar que não perdera seu título de pé-de-valsa. Deveria acompanhá-la mais tardeno jantar.

Aquilo deveria fornecer comentários suficientes para alimentar os mexericos nasduas próximas semanas, refletiu, analisando um jovem casal acompanhado de uma moça

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aproximarem-se.

— Ah, os Folkenston! — exclamou Edward, estendendo a mão para cumprimentá-los.

— Lorde e lady Glosson, permitam-me apresentar-lhes minha esposa, Cláudia,

baronesa Folkenston, e acho que já conhecem nossa amiga, sita. Hannah Whitmore.— Claro que sim. A filha do pastor. — A condessa dirigiu um olhar cúmplice ao seu

marido.

— E eu gostaria de apresentar meu filho — disse o conde Glosson. — O viscondeAmesbury.

Theo tomou a mão de Hannah e, ao se inclinar, seus olhares se cruzaram. Elesentiu algo indefinível passar entre ambos. Uma expressão desconcertada apareceu norosto dela, e retirou a mão, apressada.

Margareth entabulou uma conversa sobre uma nova escola em uma vila, enquantoTheo estudava a filha do reverendo de cima a baixo.

Poderia ser uma beldade, cogitou, se dedicasse algum de seu tempo a cuidar desi. Quem sabe um vestido mais elegante ajudasse a fazer justiça àqueles maravilhososolhos azul-acinzentados. Ao examiná-la, escutava parte do que Hannah e Margarethdiziam.

Em seguida, descartou-a como mais uma das amigas literatas da condessa.

Naquele momento, lady Olívia apareceu, pegando-lhe a mão de forma possessivae pedindo que fosse buscar-lhe algo para beber, pois a dança a deixara ofegante. Quandoretornou, os Folkenston e sua convidada tinham partido, e experimentou um certodesapontamento.

Mais tarde, avistou-a dançando com desenvoltura e elegância. Notou também quepassou à sala de jantar acompanhada do insípido Walter Montgomery. Naquele momento,lady Olívia chamou mais uma vez a atenção para si.

Theo se virou mais uma vez em sua cama. Entretanto, não era a risada de ladyOlívia, nem seus olhos verdes, que povoava seus pensamentos naqueles instantes em

que se fica à espera do sono, e sim as íris azuladas e a mãozinha enluvada soltandodepressa da sua.

Bem mais tarde, todavia, o pesadelo sangrento apagou todos os traços daquelaagradável visão.

Capítulo III

Trevor Jeffries foi encaminhado à biblioteca, na mansão Glosson, para aguardar 

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por seu amigo. Quando Theo adentrou o recinto, Jeffries exclamou:

— Santo Deus! Esses são os últimos ditames da moda? — Fitava-o de cima abaixo, admirado.

Theo sabia a que Trevor se referia. Cabelos castanhos desalinhados, barba

malfeita, trajes rudes e um par de botas capaz de levar seus criados à beira das lágrimas.— Acha que Brummell aprovaria? — Alisou o tórax num gesto de orgulho.

— Deixe de brincadeira, Theo. Por que o homem conhecido por seu extremorefinamento está trajado como um estivador?

— Talvez seja isso mesmo o que queira aparentar. Trevor balançou a cabeça.

— O que é isso? O que está acontecendo?

— Vou me transformar em um operário comum por uns tempos.

—Por quê? Conheço muitas pessoas que estão se sentindo pressionadasfinanceiramente devido ao resultado de nossas rixas com Napoleão, mas daí a um nobreganhar o sustento com seu próprio suor... Bem, isso é demais!

Theo resolveu acabar com o mistério:

— Aceitei participar de uma espécie de missão. Deverei testar o pulso doproletariado.

— Para quem?

— Certos membros do Parlamento, em sua maioria. Meu pai geriu. Será umdesafio.

— Sim, sem dúvida. Não ficou satisfeito em bancar o espião para Wellington.

— Não serei um espião entre inimigos.

— Não. Será entre seus compatriotas, e isso é muito pior. Ouvi falar que lordeSidmouth está recrutando espreitadores a fim de obter informações para usar contraagitadores. Você não se prestaria a tal empreitada.

— De modo algum! — Theo não tentou esconder sua irritação. Confidenciou a

situação a Trevor, inclusive o que soube sobre o assassinato de seu irmão, certo de quepodia confiar a vida a seu amigo.

— Assassinado? Francis foi assassinado?!

— Parece que sim.

— Por quê? E... quem o matou?

Theo explicou o que Edward lhe contara.

— O que esperam que você faça, Theo?

— Como já disse, apenas testar o pulso da nação. Conhece tão bem quanto eu omedo do espectro de uma revolução neste país, Trevor. Embora espere tambémdescobrir o que de fato houve com Francis.

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Trevor assentiu.

— Ridículo, não? Já faz quase trinta anos desde a queda da Bastilha. Se aRevolução Francesa ainda não foi exportada para esta ilha imperial, é pouco provável quevenha a ser.

— E verdade. Em suma, pretendo tentar descobrir a gravidade da situação.— Por que você? Jesus! Já não fez o suficiente?!

— Não sou muito conhecido, Trevor. Tendo servido na península todos essesanos, mantive-me ausente da Inglaterra, exceto, lógico, durante aqueles poucos meses,em , quando todos pensavam que tudo havia acabado.

Trevor permaneceu em silêncio por alguns momentos.

— Isso é muito arriscado, você sabe. Alguns desses denomina dos ClubesHampden, que defendem a reforma, são bem sigilosos Terá de se infiltrar com juramentos

secretos... E se desconfiarem que alguém os traiu, podem ser bem vingativos.

— Não vou trair ninguém.

— Se vierem a saber quem você é, considerarão como uma traição.

— Mas duvido que isso aconteça.

— Não pode ter tanta certeza.

— Ouça, amigo, fui capaz de passar por um parisiense em Paris, por britânico naGrã-Bretanha e nativo do sul da França em Toulouse. Decerto ficarei bem como um

trabalhador de Lancashire, com a vantagem de falar em meu idioma de origem.

— Ambos sabemos de sua facilidade prodigiosa com idiomas, mas tenha cuidado.Lá não terá o Exército para defendê-lo.

— Serei cauteloso. Na verdade, não teria aceitado essa missão se não pudesseme fingir de operário inglês. Vou constatar isso esta noite.

— Já?

— Sim. Vou fazer uma visita à Broken Achor, uma taverna nos fundos das docas.

— Sozinho, não!— Bem, com quem mais? É evidente que não poderia levar comigo um cavalheiro

elegante como você.

— Posso dar um jeito em minha aparência arrumando um traje semelhante ao seu.Eu o acompanharei.

— Não posso permitir isso, Trevor. Como você mesmo disse, existe um elementode risco. Tem de pensar em Caithlyn e nas crianças. Além do mais, se eu não for capazde me arranjar sozinho aqui em Londres, que dirá em outro lugar?

Jeffries continuou protestando, mas acabou por concordar.

Theo encolheu os ombros nas peças de seu traje roto, dispensando a ajuda de

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Burton. No último instante, comprimiu uma faca no cano da bota.

Deixou a mansão pela porta dos fundos e transpôs alguns quilômetros até uma ruabem movimentada. Acenou para um cochei-r mandando que o levasse a uma das áreasmais mal freqüentadas da cidade. Observando as vestes do passageiro e ouvindo seudestino, o cocheiro o fez mostrar uma moeda antes de dar partida no veículo.

Ao se aproximarem dos arredores da área designada, Theo pediu-lhe para parar.Caminhou durante algum tempo, explorando os sons, cheiros e escutando o linguajar.Quando se deu conta, a escuridão da noite havia envolvido por completo os becosimundos, antes que se sentisse familiarizado com tudo aquilo.

Ao entrar na taverna escolhida, observou que a maioria dos homens bebiaquartilhos de cerveja inglesa. Pediu um para si e sentou-se a uma mesa vazia. Sabia quegente como aquela não daria boas-vindas a um estranho.

Uma mulher de seios fartos e cabelos loiros aproximou-se.

— Procurando companhia, doçura?

Assim que ela se debruçou, Theo notou que lhe faltava um dente da frente, e pôdesentir o hálito de álcool misturado ao odor de perfume barato.

— Não esta noite.

A mulher encolheu os ombros e se afastou.

— Não sabe o que está perdendo...

Theo bebeu gole de cerveja e observou os detalhes a seu redor. Havia seis outrossujeitos no salão, além do taverneiro entediado e da mulher, que se refugiara atrásdaquele que parecia ser seu canto habitual.

Um dos outros fregueses aparentava ser um peixeiro, a se julgar pelo cheiro quesentira ao passar por ele. Outro usava um avental de couro, na certa, um sapateiro. Osdemais trajavam roupas de estivadores. Por fim, um deles veio até a mesa de Theo.

— Nunca o vi por aqui antes.

— Jamais estive neste lugar — respondeu, sucinto. O camarada cocou a nuca.

— De onde é?

— Para lá do norte.

— Não é escocês?

— Não. Não tão ao norte.

— Não seria um daqueles espiões do governo, não é? — indagou, jocoso.

Theo emitiu um som abafado.

— Pode apostar que não.

— Ótimo. O povo daqui não tem muita condescendência com espiões.

— Já lhe disse, não sou um espião. Agora, junte-se a mim com seu quartilho... ou

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deixe-me beber em paz.

— Seria rude de minha parte recusar um convite tão gentil, não é? Ei, Spence! —chamou pelo taverneiro.

Logo os amigos dele se juntaram a Theo e seu mais novo amigo, Chester. No

início, a conversa versou sobre temas gerais. Os homens contaram as últimas novidadessobre os problemas matrimoniais do príncipe regente e do futuro casamento de sua filha,a princesa Charlotte.

— Não sei por que a realeza sempre se casa com estrangeiros — lamentou umdeles.

A princesa escolhera se casar com príncipe Leopold, de Coburg, um principadoalemão.

— Acho que um homem inglês seria o ideal para uma princesa inglesa — opinou

outro deles.Theo sabia que a princesa Charlotte, segunda na linha sucessória, sempre fora

benquista. Suas núpcias tinham sido a causa de muita especulação e apostas nasclasses mais altas.

Enquanto a conversa fluía, Theo sorvia sua cerveja com parcimônia, esperandonão se exceder naquele ambiente estranho. Notou que seus companheiros nãocompartilhavam da mesma intenção. À medida que bebiam, todos se tornavam maisanimados.

— Onde trabalha? — um deles quis saber.— Estou procurando emprego — Theo afirmou. — Não tenho dado muita sorte.

— É, a situação está muito difícil.

— Se não conseguir nada em breve, voltarei para casa.

— Hoje em dia não há muitas oportunidades em lugar algum — disse o mais velhodos trabalhadores das docas. Era um homem grisalho, chamado Willis, que devia estar nacasa dos quarenta.

— Em tempos difíceis, os operários são sempre os mais prejudicados. Odeio ir para casa no fim do dia, ver as crianças chorando de fome e ouvir minha mulher reclamando.

— E digo mais: se as coisas continuarem como estão, eles vão ter sériosproblemas nesta terra — acrescentou Chester, com a profundidade de um ébrio.

Theo resolveu falar de outra coisa, perguntando se algum deles sabia de algumaoferta de trabalho.

— Nada, companheiro.

Assim, agradeceu a todos pelos bons momentos e ergueu-se para partir.

Ao se levantar percebeu que o peixeiro não estava mais lá. O sapateiro o ignorara.

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Theo de imediato ficou em alerta, sobretudo quando o sapateiro transpôs a porta antesdele.

Não desejava um confronto. Não era seu propósito, aquela noite.

Deteve-se do lado de fora por um momento, atento aos sons. A única luz existente

provinha do brilho tênue de várias janelas ao longo da rua. Onde quer que o sapateiroestivesse, não podia ser visto.

Theo permaneceu parado junto à entrada da taverna, acostumando a vista àescuridão reinante, e então resolveu dar alguns passos. De repente, notou um ligeiromovimento a sua esquerda e sentiu cheiro de peixe. De imediato, ergueu o pé direito ealcançou a faca na bota. Virou-se para a esquerda no exato momento em que o peixeiroelevava um bastão de madeira para golpeá-lo.

Com um movimento ágil, Theo empunhou a faca e ouviu um grito agudo de dor.Derrubara seu alvo com um só golpe na cabeça. Em seguida, ouviu gente vindo em suadireção. Ao se virar, deparou com o sapateiro, que, ao ver o companheiro ferido eobservar a arma e a posição de luta de um homem perito na arte do combate, ergueu asmãos num gesto de rendição.

— Alto lá, não represento perigo algum.

— Não agora. — Theo afastou-se com cautela. — Fique onde está!

O peixeiro começou a resmungar frases incoerentes, deitado no solo.

— Pegue seu amigo e dê o fora daqui.

O sapateiro ajudou o outro, e Theo ouviu-os murmurem sobre a necessidade dedinheiro extra enquanto batiam em retirada.

Retornou para uma rua mais movimentada, onde chamou outro cocheiro. Acaminho de casa, reclinou-se no assento e sorriu, satisfeito. Havia se passado por umoperário e não perdera nenhum de seus instintos ou habilidades de lutador.

Duas semanas após o Baile Rollente, Hannah retornara para Derbyshire. O breveencontro com o visconde Amesbury era agora uma agradável e distante lembrança. Umavez mais se via envolvida em sua rotina de professora e a vida na igreja de seu pai,

embora sempre encontrasse espaço em seus pensamentos para lorde Amesbury.

Como seria ter dançado com ele? Com freqüência se recriminava por taisdevaneios tolos, mas eles voltavam a atormentá-la.

Tentou se concentrar na Crofton Parish Day School. Aquela instituição era o centrode seu mundo, porém lembrava-se bem da reação da família quando propôs aquela idéia.

Três anos atrás, ela e os pais haviam se sentado na sala do pastor.

— Não pode estar falando sério! — exclamou a mãe. — Dar aulas para os filhos

dos operários da tecelagem, também?!— Sim, mamãe. As pessoas desta paróquia precisam de uma escola de verdade.

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— Bem, talvez para as crianças dos comerciantes da vila e de alguns fazendeiros...

 _— Para todas as crianças — insistiu Hannah.

O pai se manifestou, escolhendo as palavras com cuidado:

— Acho que esse seria um esforço no mínimo ambicioso.

— Quer dizer impossível? — desafiou-o Hannah.

— Talvez. Lembre-se de que essa gente conta com a renda que os filhos ajudam aganhar.

— Mas se permitissem que assistissem às aulas, mesmo poucas horas por dia oualguns dias na semana...

— Pode tentar, filha. — O reverendo Charles Whitmore não estava convencido. —Mas onde pretende ministrar essas aulas?

— Na igreja, apenas para iniciar.— De algum modo achei que essa seria sua resposta. — Esboçou um sorriso

astuto.

— Isso não é algo apropriado para uma mulher fazer — protestou a mãe.

— Outras mulheres dirigem escolas para moças em toda a Inglaterra — Hannahargumentou.

— Mas são mais velhas. Viúvas e casadas. Não jovens como você.

— O que pode haver de errado na filha do pastor, e não sua esposa, dirigir umaescola?

—Não tenho certeza, mas não é adequado. — Sem argumentos, Lucy dirigiu umolhar de súplica ao marido. — Charles querido, não pode aprovar essa loucura!

O reverendo saiu de trás da escrivaninha e veio sentar-se ao lado da mulher.

— Calma, meu bem. Não se aflija tanto. Lembro que me propôs algo parecidoantes de nossas meninas nascerem.

— Sim, mas era uma mulher casada. Como pode esperar que uma moça solteira

faça isso?

— Sou uma mulher solteira, mamãe. Aos vinte e três anos, estou longe de ser umamoça solteira. Vai dar tudo certo. Tenho certeza disso.

—Ora, ora, você já deveria ter se casado! Aquele Sr. Robinson — ...era umapessoa enfadonha.

— Você gostou do belo Sr. Smythe-Jones, não foi?

— No início, sim. Mas ele não se vestia bem.

Horatio Smythe-Jones era herdeiro do barão Castlemaine, que possuía algumaspropriedades próximas a Barnsley. O rapaz era belíssimo. Sua simples presença eracapaz de impressionar qualquer mulher.

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O interesse de Hannah diminuiu, contudo, quando percebeu que o namoro ardenteapenas começara depois que o moço descobriu que um dia ela seria herdeira de umapequena propriedade vizinha à que ele também herdaria um dia. Além disso, não podiaagüentar uma pessoa cujas palavras favoritas eram: eu, meu e minha.

— Bem, o Sr. Pettigrew, talvez? Ele estava estudando para ser advogado.

— A idéia do Sr. Pettigrew de esposa perfeita é uma mulher cuja expressão vocalmais freqüente é "sim, querido".

— Ela está certa, Lucy. Hannah seria infeliz ao lado de um sujeito desses.

— Você sempre a mimou, Charles. Dorothea e Katherine são mais obedientes.

— Mamãe, você sabe que eu e minhas irmãs não compartilhamos das mesmasopiniões.

Quando as irmãs ficaram sabendo de sua proposta, nenhuma mostrou o menor 

interesse em auxiliá-la. Agora, quase três anos após a ousada idéia de Hannah, Dorotheatinha dado à luz e não se cansava de ostentar essa realização singular para a irmã maisvelha, ainda solteira. Katherine retornara do internato e se transformara numa linda jovem,que freqüentaria os eventos sociais dos adultos na próxima temporada.

Tendo falhado em achar uma aliada entre as mulheres da própria família, Hannahachou essa pessoa em Jane Thomas, filha de um amigo de seu pai, Nathan Thomas,editor do The Crofton Chronicle- Tendo crescido juntas, Hannah e Jane eraminseparáveis, embora a vida as tivesse levado por caminhos diferentes, quando foram

estudar em instituições diferentes.Quando Hannah lutou para transformar em realidade o sonho de ter uma escola na

paróquia, Jane ofereceu-lhe ajuda, tornando-se a segunda professora.

No início, Hannah e Jane se contentaram em trabalhar com apenas poucascrianças dos comerciantes e fazendeiros locais. Mas aos poucos se tornou uma marca dedistinção ser aluno da Srta. Whitmore. Ao final do primeiro ano, a escola tinha crescidomais do que as instalações da igreja podiam suportar, embora o grupo de alunos aindanão incluísse filhos de tecelões. A questão passara a ser: onde estabelecer a escola?

— Pode entrar em contato com os Mayfield ou os Glosson — sugeriu-lhe oreverendo. — Embora não sejam os únicos senhores de terras nesta região, também sãodonos de grandes tecelagens. É bem possível que sejam capazes de providenciar umespaço para você.

— O conde Glosson não costuma passar temporadas aqui, papai.

— E verdade. Os Glosson sempre preferiram a vida na cidade. Mas pelo que sei oadministrador responde pela maioria dos negócios deles.

— O Sr. Taggert?

— Sim.

Acompanhada do pai, Hannah foi ao encontro do Sr. Taggert em seu escritório na

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Tecelagem Glosson. O secretário conduziu-os até o interior de uma sala decorada comextremo requinte. Taggert os cumprimentou com esmerada formalidade. Em seguida,convidou-os a sentarem-se.

— Em que posso ajudá-los?

— Viemos aqui em nome da escola de minha filha, Sr. Taggert. E melhor que elamesma explique.

— Escola? — Taggert parecia desinteressado e aborrecido.

— Sim.

Hannah explicou sobre seu desejo de oferecer benefícios educacionais a todas ascrianças da paróquia, a falta de espaço das instalações atuais e sua esperança de que oconde Glosson pudesse fazer algo por seu projeto.

— Para todas as crianças — repetiu Taggert no mesmo tom.

— Sim.

— Filhos de operários e tecelões autônomos, também?

— Todas as crianças — Hannah repetiu, tentando ignorar a desaprovação dele.

— Absurdo! — zombou Taggert. — Toda educação de que esses fedelhosnecessitam recebem aqui na tecelagem. Por que eu seria tolo em ajudar, desfalcandominha mão-de-obra?

— A mão-de-obra do conde.

— Sim. Da Tecelagem Glosson, que eu dirijo.

— E o conde compartilha de sua opinião sobre educar os garotos? — eleperguntou.

— Mas é óbvio que sim. Como já disse, estou encarregado da indústria e dosempregados da propriedade dos Glosson. É melhor restringir sua escolinha às criançasdo vilarejo.

— Ainda assim apreciaria se reportasse meu pedido ao conde — disse Hannah,

enquanto ela e o pai se erguiam das cadeiras.— Ah, claro... Tenha um bom dia, sita. Whitmore. Do lado de fora, Hannah bradou,

furiosa:

— Aquele, arrogante! Duvido muito que vá falar com o conde.

— Ainda podemos conversar com o barão Mayfield. Ele se mostraria maissensibilizado, filha.

— Espero que sim.

Fora uma esperança condenada ao fracasso.

O barão Mayfield os recebeu com cordialidade na sala de estar de sua mansão.Era jovem, mais ou menos bonito, com cabelos muito pretos, olhos castanhos e trajando-

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se com elegância. Parecia imaginar-se uma espécie de senhor das mulheres, e logoflertou com Hannah, segurando-lhe a mão por mais tempo que o necessário.

Ouviu-os com educação e sorriu sem cessar, mas no fim provou ser menos útil doque Taggert.

— Uma linda jovem como você deveria ter outras coisas com que se preocupar, nolugar de ensinar ignorantes a ler e escrever. Talvez algum dia permita-me buscá-la paraum passeio.

—Talvez... — respondeu sem interesse, mas sem querer fechar a porta por completo.

Uma semana mais tarde, o reverendo a encontrou quando Hannah retornava dasaulas.

— Vá até minha sala quando tiver guardado seus pertences. Há uma pessoa aqui

que eu gostaria de lhe apresentar.Apressada, livrou-se do gorro, da capa e arrumou os cabelos. Ao entrar na sala,

um senhor digno, de meia-idade, ergueu-se para a cumprimentá-la.

— Este é o Sr. Andrew Bellenham, minha querida, de perto de Doncaster. Minhafilha, Srta. Whitmore, senhor.

Após trocarem cumprimentos e sentarem-se, Hannah pronunciou o nome dovisitante algumas vezes:

— Bellenham. Bellenham. Tenho a impressão que já ouvi...

— De fato deve ter ouvido, filha — interrompeu-a o pai. — O Sr. Bellenham é donodo prédio que outrora abrigou as instalações da Bell & Hammer.

— Ah, sim! — Hannah ainda não compreendia o motivo daquela visita.

— Ele está oferecendo a ocupação do prédio para sua escola.

— Ele está... Oh, senhor! Que maravilha!

— Bem, não estou tão seguro de que pensará da mesma forma quandoinspecionar o imóvel mais de perto, senhorita. Parece mais um celeiro do que um edifício,

e esteve abandonado nos últimos cinco anos. Não estou em condições de reformá-lo,nem pretendo vendê-lo, mas se quiser utilizá-lo, talvez possamos fazer um acordo.

Hannah sentiu as lágrimas escorrem-lhe por suas faces.

— O Senhor enviou as respostas a minhas preces.

— Recebi uma carta de seu pai me pondo a par de seu dilema, Srta. Whitmore.Ficarei feliz se o prédio for utilizado para bons propósitos. Odeio vê-lo deteriorando.

Após discutirem sobre alguns pormenores, Bellenham despediu-se e partiu.

— Papai! Você conseguiu um lugar para minha escola! E é perfeito... bem no meiodas indústrias dos Mayfield e dos Glosson Eles terão de permitir que as criançasfreqüentem as aulas.

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— Calma, calma, querida. Não sonhe tão alto. O povo das tecelagens pode ser teimoso. E me refiro tanto aos proprietários quanto aos trabalhadores.

Na primeira inspeção ao imóvel, dois anos atrás, Hannah quase desanimou devidoao trabalho que daria transformar aquela monstruosidade abandonada em uma instituiçãode ensino. Entretanto, três meses mais tarde, a Crofton Parish Day School tornou-se umarealidade.

No início, foram os pais dos alunos existentes que despenderam tempo e benspara a reforma do local. Logo, "a escola" passou a ser "nossa escola", um projeto de todaa paróquia e motivo de orgulho para toda comunidade.

Todavia, Hannah e Jane tinham consciência de que esse orgulho não eracompartilhado por todos os paroquianos. Havia aqueles que achavam a Crofton Parishtotalmente desnecessária.

Francis, lorde Amesbury, o filho mais velho do conde Glosson, estivera emDerbyshire pelo curto período de alguns meses, logo após a escola ter sido estabelecida.Hannah não o viu, mas seu pai o considerou um cavalheiro muito gentil. Então, aconteceuo terrível acidente com a carruagem. Depois disso, o próprio conde Glosson passara umapequena temporada ali. Diziam que a família, abalada com a morte do filho mais velho,concentrava toda a atenção no outro filho, que servia no Exército de Ocupação.

O conde declarou que enquanto o novo visconde não se sentisse apto a assumir ocontrole dos negócios em Derbyshire, tudo ficaria a cargo do eficiente Sr. Taggert.

— Em outras palavras, o conde não parece disposto a se preocupar com os

assuntos daqui, enquanto seus empreendimentos estiverem dando lucro — disseraHannah ao pai.

— Talvez.

Bem, o sonho se realizara... Quase.

O prédio estava lá. Os materiais eram escassos, mas suficientes, em parte graçasao auxílio da condessa Glosson. Contudo, três anos após Hannah ter posto a idéia emprática, os alunos ainda eram em sua maioria filhos de comerciantes e fazendeiros.Pouquíssimos filhos de tecelões freqüentavam a Crofton Parish.

No caminho de volta da visita que fizera aos Folkenston, Hannah vinha mais doque determinada a mudar aquela situação.

Capítulo IV

Theo chegou a Derbyshire nos meados de julho, decidido a ser a pessoa que sepropôs ser. Percorrera a maior parte do trajeto de Londres até ali a pé, embora vez ououtra pegasse carona com fazendeiros e mercadores. Uma semana após sua chegada,

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conseguira um emprego na Tecelagem Mayfield. Também encontrou um lugar para ficar em um estabelecimento para homens solteiros dirigido por uma mulher chamada PegThornton. O marido de Peg e seis de seus sete filhos também trabalhavam na tecelagem.

Peg e Doreen, sua filha de dezesseis anos, cuidavam dos hóspedes em uma casaalugada pelo proprietário da tecelagem, o barão Mayfield.

Doreen era graciosa. Tinha cabelos loiros e olhos azuis que misturavam inocênciae sedução. E logo passou a ver Theo como um provável parceiro para sua diversão,embora ele a evitasse ao máximo.

No período que passou no Exército, acostumou-se a viver em condições adversas,portanto, não teve problemas em se adaptar às longas e árduas horas operando umamáquina. Embora não encontrasse dificuldades, no entanto, considerava a jornada detrabalho extenuante, e repugnava-o a idéia de ter de pedir permissão até para ir aobanheiro. O serviço em si era monótono, no ritmo determinado pelo maquinário.

A tecelagem era uma construção com cinco pavimentes. Cada andar possuíafileiras de máquinas, todas voltadas para a mesma direção. Durante o dia, a luz seinfiltrava pelos vidros das janelas empoeiradas que mal permitiam avistar o céu. Quandoanoitecia, eram usadas lamparinas de querosene.

A conversa entre os operários era proibida. Theo tomara conhecimento daspenalidades para quem se atrasasse apenas por meros cinco minutos. No final dasemana, fora descontado em seu salário por tal infração.

Não obstante estivesse em boa forma antes de partir para aquela missão e ter 

melhorado ainda mais seu condicionamento físico caminhando até Derbyshire, achouseus primeiros dias como operário deveras exaustivos. Sempre retornava ao alojamentocansado até para jantar. Deitava-se na cama que dividia com outro operário, exaustodemais para se preocupar com a possibilidade de ter o sono perturbado por pesadelos.

Certa noite, ao voltar à hospedaria, decidiu que estava muito debilitado para comer a comida pouco variada. Iria direto para a cama, esperando que seu corpo estivesse maiscooperativo no dia seguinte. Ao abrir a porta do quarto que dividia com outros cincotecelões, encontrou Doreen Thornton curvada sobre o leito, alisando o lençol branco. Ao

fazer isso, ela expôs as curvas generosas do vale entre os seios.— Deixe isso — disse ele, e começou a se livrar da jaqueta. Doreen ergueu o rosto

bonito e contornou a cama, apressada.

— Deixe-me ajudá-lo. — A menina aproximou-se, e Theo se afastou.

— Não é necessário.

— Ora, não seja tão puritano! Podemos ser bons amigos.

— Sita. Thornton, sinto-me lisonjeado pelo que está sugerindo, mas isso não vai

acontecer.— Por que não?

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— Não deveria estar neste quarto, sozinha comigo. Se sua mãe souber, irá nos dar uma surra.

— Quem acha que sugeriu que talvez estivesse precisando de companhia?

Theo ficou perplexo com aquela informação, mas de alguma forma sabia que a

garota dissera a verdade.— Mesmo assim, não é certo.

Doreen se virou em direção à porta entreaberta, mas em vez de sair fechou-a eveio até ele. Com um movimento sensual, ergueu os braços e rodeou-lhe o pescoço,pressionando o corpo de encontro ao dele.

— Você me deseja, Léo. Eu sei disso — sussurrou, utilizando o nome que Theo lhedera ao chegar.

Ele estava bastante preocupado, não por si, mas por causa de Doreen. O que

aconteceria se os outros homens chegassem de repente. Num impulso, tomou-lhe osbraços e afastou-a.

— Srta. Thornton, por favor...

— Doreen. Pode me chamar de Doreen — murmurou, umedecendo os lábios.

— Senhorita... — Theo alcançou a maçaneta e a girou. — Seja razoável.

— Qual o problema? Não sou boa o suficiente para você?

— É uma menina adorável, mas tem metade de minha idade. E para ser honesto

estou morrendo de cansaço. Agora, se me der licença... — Gesticulou para que saísse.

— Está bem. Fica para uma outra vez.

Quando, por fim, viu-se sozinho, Theo retirou a jaqueta e deitou-se. Mal teve tempode se parabenizar por aquela atitude, pois adormeceu de imediato.

Aos poucos seu corpo foi se acostumando às agruras que vinha sofrendo. Theo,que se apresentara como Léo Reston, não se misturava com seus companheiros. Não erahostil, mas também não queria muita intimidade.

No entanto, com o passar do tempo, começaram a convidá-lo para beber em umataverna local, a Silver Shield.

Alguns dos homens eram antigos soldados, mas Theo não revelou sua própriasituação de veterano, nem tomava parte nas discussões envolvendo experiências deguerra.

Ouvia as discussões, prestando atenção, em especial, aos sinais dedescontentamento. Todos reclamavam das longas jornadas de trabalho e dos baixossalários. As conversas variavam, mas no fundo sempre versavam sobre os mesmostópicos.

Certa noite, um grupo, incluindo Theo, estava sentado ao redor de uma mesa naSilver Shield. Outros rapazes permaneciam de pé próximos à mesa, ouvindo Henry

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Franklin ler para eles um artigo de um jornal londrino.

— O problema é que não podemos fazer nada. — Henshaw meneou a cabeça.

— Eu não diria isso — um jovem de nome Jack respondeu. — Precisamos nosunir.

— Isso é conversa de sindicato — avisou um senhor de cabelos grisalhos.

Vários outros assentiram.

— Continuo dizendo que precisamos estar unidos por nossa causa.

— E eu continuo dizendo que isso é conversa de sindicato e sindicatos são ilegais,Jack. Não estou certo, Sr. Franklin?

— Sim, está. As leis que os proíbem ainda estão em vigor. Theo observou Franklin,com discrição. Era um advogado local, muito respeitado pelos operários de Crofton. Ficou

sabendo que atualmente estagiava na Lincoln's Inn, uma das antigas escolas de direito deLondres, mas retornara a Crofton para oferecer seus serviços aos vizinhos.

— Claro! — disse o grisalho. — Essas leis pretendiam impor limites tanto aospatrões quanto aos empregados, não é?

O advogado arqueou uma sobrancelha, surpreso.

— Sim, é isso mesmo.

O velhinho soltou uma gargalhada.

— Ora! O fato de um homem não saber ler não o impede de se lembrar das coisas.

— Bem, essa lei parece beneficiar apenas um lado — escarneceu Jack. — Comoexplica o fato de os salários serem os mesmos na maioria das tecelagens? Os operáriosda Tecelagem Glosson recebem o mesmo salário que eu: uma miséria! Não se pode dizer que os Mayfield e os Glosson não estão juntos nisso!

— Está certo — vários dos presentes murmuraram. Encorajado, Jack continuou:

— Temos de tomar o controle de nossas próprias vidas... como os americanos e osfranceses fizeram.

— Ei, rapaz! Não devia falar dessa maneira — Henshaw advertiu-o. — Nunca sesabe quem pode estar nos ouvindo.

— Revolução — alguém sussurrou.

— Bem, talvez seja necessário uma revolta.

Theo não se manifestava, preferindo apenas ouvir. O que ficou sabendo não eranenhuma novidade. O que o surpreendeu foi Henshaw convidá-lo para uma reunião naCrofton Corresponding Society. Sabia muito bem da existência desses grupos em umgrande número de cidades e em Londres, onde tiveram início. Tais grupos com freqüência

defendiam a reforma democrática e os direitos dos cidadãos. E por essa única razãopassaram a ser considerados suspeitos pelo governo.

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Concordou em participar da próxima reunião.

Ainda estava claro quando Theo e seus companheiros deixaram a tecelagem.Duas moças, em trajes melhores do que aquelas que as rodeavam, despontavam nocentro de uma roda de mulheres e crianças que trabalhavam. Nas extremidades do grupo,vários homens, alguns deles maridos das operárias.

Theo se espantou ao reconhecer uma delas. Não levou mais do que um segundopara se lembrar do nome: Hannah Whitmore.

Estacou, embora estivesse fora do ângulo de visão dela. Imaginou que apossibilidade de Hannah associar um trabalhador maltrapilho ao cavalheiro bem trajadoque conhecera em um salão de baile na capital era mínima, porém, era arriscado.

O que estaria acontecendo? O que fazia a filha do pastor entre os tecelões?Hannah usava um vestido cinza-claro de mangas compridas e gola alta, que não erasuficiente para ocultar a bela silhueta.

— Não desejam que seus filhos tenham uma vida melhor que as suas? — Hannahperguntava.

— Lógico que queremos — respondeu uma das operárias, que segurava uma dascrianças pela mão.

— Então, por favor, permitam que eles assistam às aulas. Educação é a chavepara uma vida melhor.

— Eu... nós... não podemos! Temos muitas bocas para alimentar. Precisamos do

salário deles.— Não poderiam deixá-los vir à escola por apenas algumas horas? Ou pelo menos

uma criança da família?

— Bem... — Aquela que parecia ser a líder ponderava. Naquele instante, umaelegante carruagem puxada por quatro cavalos pretos aproximou-se. O passageiro eraum homem jovem, com sobrancelhas e cabelos pretos.

— Mayfield — alguém falou próximo a Theo.

— O que está havendo aqui? — O tom alto e autoritário do barão e o chicote quesegurava de imediato surtiu efeito na maioria dos expectadores.

Porém, não na sita. Whitmore, que fez um gesto indicando sua companheira.

— A Sra. Thomas e eu viemos conversar sobre nossa escola com estas crianças eseus pais.

— Srta. Whitmore, creio que já deixei clara minha posição a esse respeito, temposatrás.

— De fato, sim, milorde. Contudo, não estou pedindo sua opinião. Estamos apenas

oferecendo nossos serviços a todas as crianças da comunidade.— Meus empregados não necessitam de seus serviços.

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— Não concordo — interpôs-se um dos operários, ao lado de Theo. — Não meimportaria de aceitar os serviços de tão bela dama.

— Essa é uma decisão que cabe aos pais das crianças, milorde — argumentou aSrta. Whitmore.

— Não, se quiserem manter seus empregos. Agora, sugiro que vocês duas vãocuidar de suas vidas.

Hannah falou mais alto:

— Sr. Mayfield, não sei se tem conhecimento, mas estamos numa via pública.

O barão caminhou em direção a ela.

— Srta. Whitmore, eu lhe agradeceria se não arrumasse mais confusão.

Quando o barão chegou perto de Hannah, agitando o chicote com rispidez, Theo

ultrapassou a massa de operários que lhe bloqueava o caminho, pronto para sacar aarma, se necessário. Só mais tarde lhe ocorreu que tal atitude significaria o fim prematurode sua missão.

Todavia, antes que pudesse agir, outro alguém se fez ouvir, quando Franklin seposicionou diante de todos.

— Srta. Whitmore? Srta. Thomas? Posso ajudá-las?

— Leve-as embora daqui! — bradou Mayfield.

— Sem dúvida. Se elas quiserem ir — respondeu o advogado, oferecendo os

braços para as duas damas.

— Não! Temos todo o direito de estar aqui. — Hannah encarou o barão.

— Ótimo! Podem ficar — afirmou o dono da tecelagem. Caminhou alguns passosao redor do grupo, com o chicote no ar. — Mas aqueles que trabalham para mim devempartir... agora! Caso contrário, serão despedidos. Entenderam?

A aglomeração se dissipou, apressada. Theo foi um dos últimos a ir. Mas primeirocertificou-se de que não haveria mais nenhum entrevero entre o barão e a Srta. Whitmore.

— Que atitude mais vil, senhor — desafiou-o Hannah.— Mas eficaz — redargüiu Mayfield.

— Senhoritas... — Franklin tentava conduzi-las.

— Quero que saiba que não me dei por vencida, barão Mayfield.

— Porém, eu acredito que esteja. Pelo menos aqui em minha tecelagem.

Naquela noite, a imagem de uma professora de olhos cinzentos, resistindo a umdos homens mais poderosos da comunidade, não saía da cabeça de Theo. Conhecerapoucas mulheres... e poucos homens... que teriam enfrentado alguém como Mayfield.Pelo visto, a Srta. Hannah Whitmore não era uma criatura fácil de se intimidar.

— Ouvi rumores de que ontem houve um tumulto próximo à tecelagem do barão

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Mayfield — dizia o reverendo, após o jantar.

— Também fiquei sabendo. A Sra. Grimes veio me contar.

— Sinto muito se ela a aborreceu com isso, mamãe.

— O que estava fazendo sozinha no meio daquela gentalha, Hannah? Poderia ser 

perigoso.

— Eu não estava só, mamãe. Jane foi comigo, e ainda não havia escurecido.Tínhamos todo o direito de estar em público.

— Direito e prudência nem sempre andam de mãos dadas.

— Está certo, mas não aconteceu nada. Eu me dou bem com os tecelões e suasfamílias. Jane também.

— É verdade, você sabe disso, Lucy.

— Não ficou assustada quando o barão Mayfield ordenou-lhe que fosse embora?— Katherine quis saber.

— Assustada? De maneira alguma. Admito que fiquei um pouco apreensiva. —Sorriu e mudou o rumo da conversação para um tema que sabia que interessaria tanto àmãe quanto à irmã: a presença de Katherine nos acontecimentos sociais.

Hannah não contara à família que sua apreensão na véspera se dissipara quandoum dos operários emergiu da multidão e se postou ao lado do barão Mayfield. Deveria ter se assustado com tal demonstração de força para com o dono da tecelagem, mas por 

alguma estranha razão, sentiu-se segura. A intenção do homem era protegê-la."Ridículo!", pensou, mais tarde. Mas aquilo não lhe saía da cabeça.

Alguma coisa naquele desconhecido que a intrigou. Tinha a impressão de já tê-lovisto. Conhecia muitas mulheres que trabalhavam na tecelagem e a seus maridos, masaquele rapaz não pertencia àquele grupo. Era mais alto do que os demais. Usava umchapéu encobrindo parte dos olhos e calça comprida surrada própria do proletariado. Acamisa, entreaberta, revelava um pescoço forte emergindo de ombros poderosos.

Quando foi embora, Hannah notou que mancava um pouco. Teria sido umsoldado? "Ah, que tolice romântica! Talvez ele estivesse bêbado e cambaleante!"

Todavia, não conseguia tirá-lo da memória.

Capítulo V

O reverendo Whitmore era um homem mais bem-sucedido do que a maioria de

seus antecessores no cargo. Ambos, ele e a esposa, eram provenientes de famílias bem-nascidas. O pastor de Crofton poderia ter sido fazendeiro, mas preferiu atender aochamado do sacerdócio.

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A residência dos Whitmore consistia agora do reverendo, sua esposa, duas desuas três filhas e um serviçal que trabalhava como jardineiro, cavalariço e faz-tudo. Umadas criadas, Elsie Britton, uma jovem de idade entre vinte e vinte cinco anos, era filha deum arrendatário dos Glosson e só vinha durante o dia. Em geral era alegre e otimista,com um sorriso franco e um repertório de anedotas divertidas sobre seus dez irmãos e

irmãs.

Como primogênita dos Britton, Elsie sempre tinha muitas histórias para contar.Certa manhã, alguns dias após o confronto com o barão Mayfield, Hannah achou a moçaquieta demais.

— Algo errado, Elsie?

— Oh, não, senhorita...

— Parece distraída e acabou de colocar a roupa limpa no cesto de roupas sujas.

— Não! Eu fiz isso?—A criada rumou até o cesto e o destampou. Céus, é verdade!Sinto muito, Srta. Hannah. Não pretendia...

— Não vou puni-la por um erro tão banal. Deixarei para fazê-lo por algo maisgrave, como lavar meus lenços junto com a toalha de mesa vermelha.

A brincadeira fez surgir um sorriso nos lábios da moça.

— Muito bem. Sente-se aqui. — Hannah apontou uma cadeira. — Agora, diga-meo que está acontecendo. Talvez posso ajudá-la.

— Não, senhorita. Não tenho direito de aborrecê-la com meus problemas.

—Elsie, nós nos conhecemos o suficiente para ficar com esse tipo deconstrangimento. Tem alguém doente em sua família?

— Não. Antes fosse...

— Bem, o que é então? Por Deus, Elsie, você não está... não está... — Hannahnão tinha coragem de dizer o que imaginava.

— De modo algum, senhorita. Sou uma moça direita. Hannah suspirou de alívio.

— É meu irmão Bennie. Digo, Benjamin.

— O que está acontecendo com ele? Meteu-se em alguma encrenca?

Hannah conhecia Benjamin muito bem. Fora seu aluno, mas deixou a escola parase empregar na Tecelagem Glosson.

— Eu não... não tenho certeza. Bennie anda em companhia de rapazes maisvelhos. No início pareciam inofensivos, mas agora saem à noite, andando com bastões, efalam sobre adquirir armas.

— Como ficou sabendo?

— Eu o segui na noite passada.

— Elsie! Não deveria sair por aí sozinha depois que anoitece!

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— Sei disso. Mas precisava descobrir. E não aconteceu nada.

— Você teve sorte. Quem são esses jovens que andam com Benjamin?

— Papai falou que são um bando de descontentes, e alertou Bennie para manter-se afastado deles.

— Mas seu irmão não obedeceu, e está aflita com isso.

— Sim, senhorita. Eles vão realizar uma espécie de reunião amanhã. Benjaminestá se sentindo muito importante porque Jack Slater o convidou.

— Está falando da Crofton Corresponding Society?

— Isso mesmo. Nunca pensei que Benjamin tivesse algum interesse nisso.

— Não se trata de uma reunião secreta. Haverá um grande número de pessoaspresentes.

— Mulheres também?— Não acredito que mulheres sejam proibidas de participar. Talvez eu possa saber 

do que se trata essa reunião e tranqüilizar sua cabecinha.

— A senhorita faria isso? Eu lhe serei eternamente grata!

— Você terá de me acompanhar, meu bem. Não posso ir sozinha, sem umaacompanhante ou uma criada.

— Sim, lógico!

Pensando sobre o assunto durante o dia, Hannah achou que seria uma boa idéia ir Crofton Corresponding Society. Afinal, seriam discutidos temas que ela consideravarelevantes, tais como a suspensão de habeas corpus pelo Parlamento. Mais de seismeses depois, os legisladores ainda não haviam restabelecido tal importante proteçãoaos direitos humanos.

Em conseqüência disso, os magistrados locais poderiam prender quem quisessemsem nenhuma evidência sólida de culpa. Essa era uma questão que interessava aHannah, pois George Kinney, o pai de um de seus alunos, fora acusado de furto e,embora não houvesse testemunhas ou provas concretas contra ele, fora encarcerado

durante dois meses. Enquanto isso, a esposa de Kinney e as crianças sofreram terríveisprovações.

A Crofton Corresponding Society se reunia dentro de duas das maiores salas daCrofton Parish School. Hannah achava que permitir que a comunidade usasse a escolaera um modo de retribuir ao povo dali por transformar seu sonho em realidade.

Quando ela e Elsie chegaram, na noite seguinte, encontraram Henry Franklin e oirmão de Elsie. O jovem tinha cabelos ruivos, olhos castanhos e sardas no nariz e nasfaces.

— O que está fazendo aqui, Elsie? Não preciso mais de ama-seca.

— Tenho tanto direito de estar nesta reunião quanto você, Bennie — ela

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respondeu.

Franklin as guiou até duas cadeiras e sentou-se ao lado delas.

— Não sabia que planejava vir, hoje, Hannah.

— Resolvi ontem.

— Por quê? — perguntou, curioso.

— Por dois motivos. Talvez três. Primeiro, gostaria de ouvir o que estava sendodiscutido e, pelo fato de muitas destas pessoas serem parentes das crianças datecelagem, imaginei que após a reunião pudesse continuar o que o barão Mayfieldinterrompeu outro dia.

O advogado deu um sorriso.

— Você não desiste fácil, não é?

— Não.— Ainda resta outro motivo.

— Também vim por que Elsie ficou preocupada com o irmão.

— O jovem Benjamin. Eu o conheço. É um pouco exaltado.

— Não passa de um menino, Henry. Os jovens são entusiastas por natureza.

— Embora fale como uma vovó, seu próprio entusiasmo é bem conhecido, minhaamiga.

— E o seu, não?

— Creio que somos dois revolucionários de coração.

— Reformistas. Prefiro o termo reforma.

— Como queira.

Os membros do diretório ocupavam seus lugares para dar início à assembléia.

Theo, acompanhado de Henshaw, chegou tarde e teve de permanecer na parte detrás da sala abarrotada. Apoiou um ombro contra a parede e ouviu os vários oradores

buscando apoio para esta ou aquela causa.

— Direito universal de voto.

— Fazer representantes no Parlamento.

— Melhores condições de vida. — Salários maiores.

— Restringir o trabalho infantil.

— Restringir a imigração irlandesa.

Por fim, o presidente saudou um homem bem-vestido que se apresentou como sir 

Richardson, o magistrado local. Ele discursou durante vários minutos num tom monótono,como se concordasse sobretudo com muitas das idéias que foram apresentadas.

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— Porém — advertiu —, eu recomendaria esperar para ver. Dando tempo aotempo, tenho certeza de que muitas dessas questões irão se solucionar sem interferênciado governo.

Uma mulher sentada à frente ergueu o braço.

O presidente concedeu a palavra a sita. Whitmore.Theo se distraíra, enquanto o homem falava, mas agora voltava a se concentrar na

filha do pastor. Santo Deus! O que ela estaria fazendo ali?!

—Gostaria de lembrar ao Sr. Richardson que estas pessoas já estão esperando hámuito tempo e ainda não constataram progresso algum nas questões aqui discutidas.Portanto, sugiro ação imediata.

Theo ficou surpreso consigo mesmo ao se levantar com a mão erguida. Pretendiapassar despercebido, sem exercer um papel ativo.

O presidente assentiu para o cavalheiro no fundo da sala.

— Léo Reston, Sr. presidente — disse Theo, lembrando-se de manter um sotaquecanhestro. — Gostaria de saber o que a gentil senhorita aí na frente quis dizer com açãoimediata. Trata-se de uma proposta?

O presidente olhou na direção de Hannah.

— Bem, eu... é... — ela gaguejou.

— Quebrem os teares! — alguém, interrompendo-a.

— Queimem as tecelagens!

— Tirem Kinney da prisão! Henshaw parecia preocupado.

— Isso está ficando fora de controle — murmurou para Theo. Vários dos queestavam sentados levantaram-se para unir suas vozes ao fluxo colérico. O presidentebateu o martelo e pediu ordem, sem, no entanto, obter sucesso.

Havia mais ou menos cinqüenta pessoas no ambiente, não o bastante para setransformar numa verdadeira mobilização, mas Theo sabia que cinqüenta pessoas comos ânimos exaltados poderiam causar muitos estragos.

De repente, um homem alto berrou:

— Cavalheiros! Cavalheiros e senhoras também — acrescentou, com um sorrisonos lábios, atraindo a atenção da multidão.

Era o advogado, Franklin. Estava sentado ao lado da Srta. Whitmore, e Theorecordou o desagradável episódio com Mayfield, quando o advogado se oferecera paraajudá-la. Seriam namorados?

A dúvida fervilhou em seu íntimo durante algum tempo. Todavia, recusava-se a

admitir qualquer insinuação que fosse, de pesar ou inveja, àquele pensamento.Ficou satisfeito ao observar que as palavras do advogado surtiram efeito nos

presentes. Pelo visto, não haveria nenhum ato de violência naquela ocasião. Theo e

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Henshaw aproveitaram para escapulir.

Hannah ficou atordoada com o que acontecera. Irritara-se com o pedido decomplacência de sir Richardson em face a atual situação. Embora a resposta abrupta eveemente à sugestão de quebrarem os teares a tivesse pego desprevenida, fazendo-atremer até os ossos.

Aceitou de pronto que Franklin as trouxesse de volta para casa em sua charrete.

— Eu não sei... não sei.

—Não sabe o que, Hannah?—indagou Franklin. — Eu mesmo a ouvi concordar com a maioria dos assuntos apresentados.

— Sim, mas esperava que fossem discutidos com racionalidade. Não imaginavaque os ânimos pudessem ficar exaltados, beirando à violência. Deveria ter ficado calada.

— Ou... o tal Léo Reston não devesse ter feito aquela pergunta. A culpa não foi

sua.

— Graças a Deus que estava lá, Henry. Não sei o que teria acontecido se você nãoestivesse.

— Qualquer um teria agido da mesma forma.

Ela permaneceu em silêncio por alguns instantes, e sua mente se focalizou nafigura do homem que levantara aquela questão.

— Henry, você conhece esse Léo Reston?

— Para ser franco, não. Vejo-o vez ou outra na taverna. E novo por aqui. Não falamuito, mas tenho a impressão de que esconde algo.

— Concordo. Ele estava entre os tecelões quando me aborreci com Mayfield,naquele dia.

—Lembro-me de tê-lo visto com Henshaw, e Henshaw trabalha na TecelagemMayfield. — Seguiu-se uma breve pausa, e Franklin dirigiu-se a Elsie. — Então, Srta.Britton, seu irmão está imiscuído com uma turma de desordeiros, não é?

— Sim, senhor. Estamos muito aflitos por ele. Papai teme que Benjamin acabe

como tio Stephen em Luddite, alguns anos atrás.

Hannah encontrou dificuldade para conciliar o sono. Os acontecimentos daquelareunião não lhe saíam da cabeça. Todos que estavam lá eram seus vizinhos, muitosdeles amigos, mas o nível de frustração daquele povo era maior do que podia supor.

Se fosse uma moça esperta, deixaria tais assuntos nas mãos dos homens quedetinham mais poder e autoridade. Ora, bolas! E desde quando a sabedoria regia HannahWhitmore em tais questões?

Por fim, adormeceu, com a imagem de Léo Reston bem nítida. Não se lembrava deter visto um homem assim... tão... excitante.

Sentiu um arrepio na espinha. Sua obsessão por aquele desconhecido começava a

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ficar ridícula! Ele usava os mesmos trajes de tantos outros naquela sala. Os cabelos erammais longos do que os do reverendo e os de Henry Franklin. O sotaque era de umcamponês. Mas ainda havia algo nele... que a perturbava.

Hannah ficaria surpresa se soubesse que fora a causa da insônia do homem queconhecia como Léo Reston. Theo também rememorava os últimos acontecimentos.Repassou os principais assuntos que descontentavam o povo em geral. Em seguida,passou a considerar determinados cidadãos.

A filha do reverendo não devia estar em seu juízo perfeito. Tentar angariar alunospara sua escola era uma coisa. Intrometer-se nos problemas de trabalhadores era outrabem diferente.

Todavia, admirava sua coragem. Theo Ruskin vivenciara muitas demonstrações debravura em seus dias de Exército, mas aquele era um tipo diferente de valentia. Naopinião do herdeiro do conde Glosson, a presença da filha do pastor àquela assembléia

era inadmissível. Aquele não era lugar para uma dama.

Quando, enfim, adormeceu, o pesadelo voltou.

De repente, acordou com uma cotovelada brusca em suas costas.

— Cale-se, Reston! Vai acordar os mortos com esses gemidos! Na luz do alvorecer que se infiltrava pela janela, Theo piscou para o homem próximo dele.

— Obrigado, Tim. Sinto muito por tê-lo acordado.

Naquela manhã, caminhando para o trabalho, Tim Hessler mencionou o sonho.

— Parecia que estava num campo de batalha, Reston. Não sabia que tinha sidosoldado.

— Aprendendo algo novo todos os dias, não é? — disse Theo.

— Sim... sim...

Capítulo VI

Theo se acostumara a sua rotina como operário da Tecelagem Mayfield. Era umavida difícil, mas também tinha bons momentos, em especial aqueles compartilhados aolado de seus companheiros, homens e mulheres, engajados num objetivo comum.

Sentia-se satisfeito por estar adquirindo uma visão mais apurada da realidadevivenciada por um grande segmento da população inglesa. Contudo, gostava de saber que aquilo tudo seria temporário. Jurara para si mesmo que, no futuro, faria tudo o queestivesse a seu alcance para melhorar as condições daqueles sob sua responsabilidade.

Doreen continuava lhe lançando olhares sedutores durante o jantar. Porém, umasemana atrás chegara um novo hospede, um jovem com vinte e poucos anos chamado

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lan Cochran, e a volúvel mocinha transferiu sua afeição para o recém-chegado.

Dentre as dezenas e dezenas de pessoas que trabalhavam na tecelagem, haviaum jovem casal, Molly e Tobias Tettle. Molly trabalhava no terceiro pavimento junto comTheo, e seu marido, no quinto.

Embora tivesse dado à luz três crianças e trabalhasse demais, Molly Tettle era umamulher atraente. Com um sorriso franco e palavras gentis, sua simples presençailuminava o ambiente.

Os atrativos de Molly não passaram despercebidos aos olhos do supervisor daquele andar, um brutamontes chamado Logan, que tinha o péssimo hábito de bolinar asmulheres e ameaçar crianças com um chicote. Com os homens, parecia mais cauteloso.

Theo estava certo de que Molly tentara evitá-lo ao máximo, mas Logan começou arodeá-la. Quanto mais se aproximava, mais nervosa ela ficava. Após alguns dias, notouque a moça tinha o semblante aflito.

Em todos os andares, no final das enormes salas onde as máquinas eramoperadas, existiam pequenos escritórios para os supervisores. Uma janela de vidro,guarnecida com uma pesada cortina, permitia-lhes uma visão do extenso maquinário edos operários em seus postos. A cortina do terceiro andar mantinha-se cerrada mais deuma hora a maioria das tardes.

Certa manhã, alguns dias após a reunião na Corresponding Society, Logan pareciamais agitado que o habitual. Então, estacou próximo à maquina de Molly Tettle.

— Venha até meu escritório.— Mas... mas... minha máquina...

— Não se preocupe.

Molly o seguiu, mas Theo pôde notar seu ar de apreensão e repulsa. Logan fechoua porta e cerrou a cortina.

— Parece que Logan vai ficar ocupado durante algum tempo — comentou um doshomens, num tom malicioso.

"Santo Deus! Isso não pode estar acontecendo", pensou Theo.

Mas estava.

Precisava fazer alguma coisa.

Mas o quê?

Hesitou por um instante e em seguida arrancou um dos fusos de sua máquina, quelogo parou de funcionar. Caminhou até a porta do escritório e ergueu a mão para bater.Naquele momento, ouviu a voz de Molly.

— Sr. Logan, não posso fazer isso.

— Pode, sim. Se quiser manter seu emprego e o de seu marido.

— Por favor, não me obrigue — ela implorava.

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Theo bateu com força na madeira.

— O que é? — Após um breve momento, Logan foi atender. — O que quer aqui?Não sabe que a cortina cerrada significa "privacidade"?

— Sim, senhor. Porém, aconteceu algo errado com minha máquina. Não consigo

consertar.— Tolo incompetente!

Mas Theo sabia que Logan temia por seu próprio emprego, caso a produção fosseafetada.

— Se tiver causado algum dano à máquina será descontado. — Logan dirigiu oolhar para Molly, que estava se recompondo. — Volte para seu serviço.

O supervisor começou a inspecionar o equipamento.

— Céus, a coisa é séria. O que houve aqui?— Não sei, senhor. Apenas ouvi um ruído seco e depois uma série de outros

estalidos, e parou de funcionar.

— Isso está me parecendo ter sido feito de propósito. E, como já disse, serádescontado. Bem, demorará um pouco para repararmos isto. Utilize a máquina de Baxter.Daqui a pouco ele seria substituído mesmo.

Baxter era um senhor idoso, cujo medo de perder o emprego era sabido por todos.

— Mas preciso trabalhar — lamuriou-se o pobre velhinho. — Eu e minha mulher...

—Podem ir para um asilo — interrompeu-o Logan, sem desviar os olhos damáquina.

Theo não contava que seu gesto tivesse conseqüências tão drásticas. Decidiu queprecisava fazer alguma coisa.

Bem, não poderia fazer nada por aqueles que assombravam seus sonhos, mashavia uma situação que podia remediar. A questão era: como agir sem revelar suaidentidade? Era um estranho naquele lugar. Não tinha a mínima noção de em quem podiaou não confiar. Todavia, não deixaria Baxter sofrer os efeitos de um ato Praticado por um

homem chamado Léo Reston.

Naquela mesma noite, escreveu duas mensagens. Uma ao administrador dosGlosson, Taggert, e outra ao mordomo, o Sr. Knowlton. A do mordomo o instruía aentregar a carta a Taggert sem lhe dizer quem era o remetente. As duas missivascontinham o selo do conde Glosson e encontravam-se no interior de um envelopeendereçado apenas a Knowlton.

Após terminar as missivas, Theo deparou com um problema.

Como enviá-las?

A solução apresentou-se dias mais tarde, quando um jovem lacaio apareceu naSilver Shield, com o uniforme dos Glosson.

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— Você trabalha na mansão dos Glosson?

— Sim. Meu nome é James. — O rapaz estendeu a mão para cumprimentar Theo.

— Léo Reston. Conhece um senhor chamado Knowlton?

— Claro. É o mordomo.

— Parece que esse tal Knowlton tem algum parentesco com meu pai, que mepediu para lhe entregar esta carta. Pensei que talvez pudesse me poupar a viagem até amansão.

Retirou o envelope do bolso do casaco e olhou para os lados, para certificar-se deque não seria visto.

O jovem lacaio fitou Theo com maior interesse.

— Lógico! Com o maior prazer. Isso me fará ganhar alguns pontos com o velhote.

James era um tipo amigável, que respondia de pronto às questões de seu maisnovo amigo. Theo ficou sabendo que o pai do garoto era operário da Tecelagem Glosson.

— Não havia vaga para mim na tecelagem, então meu pai me mandou para aescolada Srta. Whitmore. Ela me ajudou a conseguir o emprego na mansão.

— É mesmo?

— Sim. E também ajudou outros rapazes a conseguir colocação. É uma excelentemoça.—James deu um sorriso maroto.—Talvez seja por isso que a maioria dos rapazesna escola se apaixone por ela. Mas também sabe ser durona.

Theo assimilou aquelas informações sobre a intrigante Srta. Whitmore e desviou orumo da conversa:

— É verdade que não tem ninguém da família na mansão dos Glosson?

— Apenas a Sra. Stimson.

Theo lembrava-se de ter encontrado essa tia-avó uma ou duas vezes, e ficou felizpor saber que havia poucas chances de ser reconhecido no vilarejo.

— O herdeiro do conde passou uma temporada aqui, mais ou menos um ano atrás,

mas morreu em um acidente de charrete.— Sério?

James fez que sim.

—Era uma ótima pessoa. Pelo menos com o pessoal da mansão. Ouvi dizer queprovocou algumas confusões na tecelagem.

— Não diga.

— Mas foi tudo esquecido quando morreu.

— Acidente de charrete, não é? A maioria desses grã-finos não são bonscondutores.

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— Contudo, lorde Amesbury era excelente na direção. Um dos cavalariços mecontou que havia algo errado com o eixo de uma das rodas. Amesbury gostava develocidade.

— Entendo.

Theo desejou que James continuasse falando mais sobre Francis, mas o jovemlacaio despediu-se e partiu.

Dois dias mais tarde, Molly e Tobias alcançaram Theo, quando se dirigiam aotrabalho.

— Soube o que aconteceu com o Sr. Baxter?

— Não, Molly.

— Arrumou emprego!

— É?! — Theo fingiu surpresa.— Parece que o administrador dos Glosson contratou-o como assistente de

 jardinagem da mansão.

— Isso é ótimo!

— Vai receber o mesmo salário que ganhava. A vida é estranha, não? Nunca ouvifalar bem do Sr. Taggert antes.

Theo desejou saber o que ela teria ouvido de ruim, mas não ousou questionar oudemonstrar curiosidade, para não levantar suspeitas sobre sua pessoa.

Certa noite Theo foi à Silver Shield, atendendo ao convite de Henshaw e Hessler.

— Foram contratados novos empregados na Tecelagem Glosson — comentouHenshaw. — Farley soube que um deles serviu no Exército. Eles virão aqui hoje.

Theo pensou em deixar o local, mas Tim Hessler uniu-se aos esforços deHenshaw, e convenceram-no a ficar. Afinal de contas, estava ali para se entrosar com ostrabalhadores.

Bebiam os primeiros quartilhos de cerveja, quando Farley e os recém-chegados

entraram. Henshaw estendeu a mão e acenou.Um deles, pouco atrás do corpulento Farley, atravessava o salão quando de súbito

estacou.

— Major Ruskin! — exclamou o homem, com um largo sorriso nos lábios. — Céus!Jamais imaginei vê-lo outra vez, senhor. Ouvi dizer que se deu mal na Quatre Brás —disse usando o termo que os soldados usavam para a pior das batalhas de Waterloo.

Henshaw, Hessler, Farley e metade dos clientes olhavam desconfiados para Theo,que permanecia sentando em total silêncio.

— Léo? — Tim Hessler o encarava, espantado.

Por fim, Theo ergueu-se e estendeu a mão ao bravo sargento que salvara a vida e

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a reputação de um tenente muito jovem e recém-comissionado na península.

— Sargento Yardley. Fico feliz em revê-lo.

O choque e a animosidade estampados nas faces ao redor do sargento chamaramsua atenção.

— Algo errado?

—Eu não diria errado, mas algo estranho está acontecendo aqui — respondeuHenshaw. — Poderia nos explicar, Reston? Ou será Ruskin?

Theo relanceou um olhar ao redor. Aqueles eram homens com s quais trabalhara etivera uma convivência mais próxima do que com quaisquer outros na península. Eramgente que compartilhara seus sonhos e suas confidencias.

Suas expressões estavam carregadas. Sabia que, em um lugar menosfreqüentado, estaria correndo sério risco, e ali também não se encontrava a salvo. Medo e

perigo potencial poderiam inspirá-los a se voltar contra ele de uma hora para a outra.

Sendo assim, sentou-se e gesticulou para que fizessem o mesmo. Em seguida,acenou para que o garçom trouxesse bebida para todos.

—Deus! Major, eu não pretendia... Digo... bem...—balbuciava Dick Yardley.

— Estamos esperando, Reston. Ruskin. Ou seja lá o que for — disse Henshaw,num tom quase ameaçador.

— Ruskin. Não é o nome dos Glosson? — alguém indagou.

— Sim... — afirmou alguém.

— Maldito nobre! Fingindo ser algo que não é!

Theo reconheceu quem falava: Ian Cochran, sentado a outra mesa.

— De fato, chamo-me Ruskin — disse Theo, com toda a calma, não mais lançandomão do sotaque interiorano.

— Esteve nos espionando todo esse tempo... — acusou-o Henshaw irritado, mastambém magoado.

— Por quê? — Tim quis saber. — Nós confiamos em você.—E espero que continuem confiando. Posso jurar que não houve má-fé. Apenas

queria descobrir o grau de insatisfação da classe trabalhadora. Não queria que mecontassem, desejava ver com meus próprios olhos.

—Então, mentiu para obter a verdade? Isso me parece estranho. — Henshawmeneou a cabeça.

— Concordo — acrescentou Farley.

— Por quê? — Tim não continha a curiosidade. — Por que um nobre faria isso?

Theo manteve-se calado por um momento.

— De que outra maneira saberia dos fatos? Henshaw, você convidaria o visconde

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Amesbury para ir à reunião da Corresponding Society?

— De jeito nenhum!

— Mas aprendi muito nessa reunião. No convívio com vocês, trabalhando comtodos vocês.

— Espionando, você quer dizer. Assim poderá nos delatar ao magistrado, comoaconteceu àqueles pobres companheiros em Pentrich.

— Juro que não mencionei nada ao magistrado.

— Mas... ele é um dos seus. — Henshaw cocou a orelha. -— O que quer dizer comum dos meus?

— Ele age em nome do conde Glosson. Yardley veio em defesa de Theo:

— O major não é o conde.

— Dá no mesmo. É herdeiro — provocou Farley.Theo entendia a indignação daquele povo, e tentou imaginar o que poderia fazer 

para se salvar daquele fiasco. Assim, decidiu ser o mais sincero possível.

—Em minha opinião, é como se tivéssemos espiões do governo infiltrados entrenós.

Uma vez mais Theo reconheceu a voz do jovem Cochran.

— Nada disso. Embora existam membros do Parlamento, incluindo meu pai, quese interessam em melhorar as condições de vida do proletariado.

— Isso é o que eles dizem — redargüiu Cochran, mais uma vez. — Mas lembrem-se de que ações valem muito mais que palavras. Deles ou nossas.

— Sim... Sinto muito por tê-los enganado. Mas lamento ainda mais por nãoconseguirem confiar em mim. — Dizendo isso, Theo se levantou e tocou o ombro do ex-sargento. — Não se preocupe, Yardley. Isso iria acontecer mais cedo ou mais tarde.Gostaria muito de ter sido Léo Reston por mais tempo... Enfim...

Ao caminhar em direção à porta, estava ciente de que todos os olhares recaíam

sobre ele. Assim que a porta de vaivém se fechou, ouviu um burburinho zangado eameaçador. Imaginou que algum deles poderia segui-lo ou lhe preparar uma emboscada.A única arma de que dispunha era a faca em sua bota. Muitos daqueles homens eram ex-soldados como ele. Não teria chance se resolvessem atacá-lo em massa. Apreensivo,caminhou apressado em direção à hospedaria.

Desolado pelo que acontecera, Theo recolheu os escassos pertences e partiu.

Era tarde quando chegou à mansão dos Glosson. Preparava-se agora para umnovo confronto. Seu único contanto com a mansão fora aquela carta que enviara aomordomo, na qual não informava que estava na região. A última vez que estivera ali tinhapouco mais de dez anos de idade.

Um lacaio respondeu a seu chamado.

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— Sim?

— Gostaria de falar com o Sr. Knowlton, por favor.

— Sinto muito. O Sr. Knowlton já se recolheu. — E o empregado teria fechado aporta se Theo não o impedisse, colocando um pé no caminho.

— Pois então vá acordá-lo. Já!

Algo na entonação de Theo fez o jovem hesitar. Contudo, não abriu mão do tomarrogante ao perguntar:

— A quem devo anunciar?

— Visconde Amesbury.

— Visconde... Um momento, por favor. — Dizendo isso, deu passagem a Theo ese afastou, apressado.

Não tardou a reaparecer, acompanhado de um senhor idoso.— Senhor?

— Sou o visconde Amesbury. Desejo um banho e uma cama confortável.

O mordomo olhou para Theo por um longo minuto.

— Sim, milorde. O senhor se parece com o jovem Theo, mas

não se importaria se eu pedisse que me fornecesse alguma prova de suaidentidade?

Theo sorriu. Ia gostar de Knowlton.

— Isto o convenceria? — E exibiu o sinete de seu pai. Knowlton o examinou comcuidado.

— Claro! Seja bem-vindo, milorde. Theo soltou um suspiro de alívio.

Capítulo VII

A indústria do mexerico em Crofton era produtiva e incessante. Contudo, dois diasapós o incidente na Silver Shield, Hannah ainda não sabia do acontecido.

Estivera em Manchester, com Jane, em uma reunião com outros pedagogos, quevinham alcançando excelentes resultados com os alunos. As duas professoras retornaramda viagem exaustas, mas cheias de entusiasmo para pôr as novas idéias em prática.

Primeiro, entretanto, como prometera a Henry Franklin, uniria-se a ele e a outrosdois homens, um tecelão autônomo chamado Cranston e um operário da tecelagem,Melton, ambos empregados dos Glosson, para irem falar com o Sr. Taggert. Um dospontos a serem discutidos seria a freqüência das crianças da tecelagem na escola.

Hannah atrasou-se, e chegou justo na hora em que os três homens caminhavam

para o interior do escritório do administrador.— Tenho uma novidade para lhe contar... — disse Franklin, mas foi interrompido

pela voz de Taggert.

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O administrador fitou a recém-chegada com um sorriso dissimulado nos lábios.

— Srta. Whitmore. Veio propalar sua escola outra vez, não é mesmo?

— Entre outras coisas.

Após todos se acomodarem, Taggert perguntou:

— Bem, sobre o que gostariam de conversar? Cranston foi o primeiro a semanifestar:

— Estamos recebendo fios de baixa qualidade, senhor. Desse modo, não podemosproduzir bons tecidos.

— Vocês recebem o que temos disponível.

— O material da tecelagem parece melhor.

— Então por que não vem trabalhar na tecelagem.

— Sr. Taggert, isso não seria um meio de pressionar os tecelões autônomos a setornarem empregados da tecelagem? — Hannah sabia o quanto aqueles tecelões seorgulhavam da qualidade superior de seus trabalhos artesanais.

— Por que está insinuando uma coisa dessas? — O administrador soou ofendido.

— Porque isso vem se repetindo em outros lugares. Taggert tornou-lhe outro deseus pérfidos sorrisos.

— Talvez, sita. Whitmore, esta reunião possa fluir melhor se nos poupar de seuscomentários.

Antes que a professora pudesse responder, ele se virou para o outro operário.

— Qual é sua queixa, Melton?

— É sobre as horas de trabalho.

— O que têm elas?

— São muito longas.

— Não diga! — Taggert escarneceu. — A jornada é de doze horas, como em todos

os lugares. Duvido que encontre um serviço com menos horas. Porém, fique à vontadepara tentar.

— Suponho que o Sr. Melton não esteja se referindo às doze horas de trabalhodiárias, mas sim às horas excedentes. De fato, muitos trabalham de catorze a quinzehoras diárias — rematou Franklin.

Melton assentiu.

— Isso mesmo. E não recebemos nenhum extra por isso.

— Ora, as demandas da produção devem ser cumpridas. Se os operários não

conseguem produzir em doze horas, têm trabalhar mais tempo.

— Mas estamos cada vez produzindo mais — argumentou Melton.

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—Não de acordo com meus registros. Porém, como já lhe disse, fique à vontadepara procurar outro emprego. Franklin voltou a falar:

— Sr. Taggert, alguns operários fizeram um registro das horas trabalhadas e doque foi produzido. Estaria disposto a comparar suas anotações com as deles?

O administrador enrubesceu.— O quê? De jeito nenhum! Quem está mantendo esses registros? Aposto que são

falsos. Os que tenho são os únicos que importam! — Bateu forte no tampo da mesa.

O sentimento de derrota era visível na fisionomia dos homens, e a tristeza deambos deixou Hannah furiosa. Foi quando resolveu dar outro rumo à conversação:

— Sr. Taggert, gostaria de saber se comunicou meu pedido ao conde Glosson.

— Como já lhe falei antes, essas crianças não precisam de sua escola, Srta.Whitmore.

— Elas não precisam de educação e os pais podem ficar horas trabalhando nessasmáquinas infernais, enquanto o patrão ausente tem pouco ou nenhum interesse pelasituação dessas famílias. Enquanto isso, os patrões vão vivendo suas vidas fúteis,fazendo pouco-caso de pessoas pelas quais são responsáveis. É deplorável! Deplorável!Eles e suas famílias não passam de parasitas alimentando-se do trabalho dos outros!

Franklin tocou-lhe o braço.

— Já chega, Hannah.

— O quê? Sei que concorda comigo, Henry.Antes que o advogado pudesse responder, o som de aplausos ecoou no recinto.

— Bravo, Srta. Whitmore!

Ela se virou no assento e viu o elegante visconde Amesbury, que se achava de pé junto ao batente.

— Que bela performance! Deveria repeti-la para meu pai, algum dia. — O olhar deTheo desviou-se para o administrador. — Taggert, desconfio ter chegado cedo demaispara nossa reunião.

—Claro que não, milorde. Já terminamos.—Taggert ergueu-se para conduzir aSrta. Whitmore e seus companheiros para fora da sala.

Hannah nunca se sentira tão humilhada. Será que jamais aprenderia a controlar alíngua?

Engolindo o constrangimento, parou diante do visconde. E de repente lhe ocorreu alembrança de que se encantara por ele naquele salão de baile de Londres. Mas tambémhavia algo mais...

— Peço que me perdoe, milorde.— Pelo ponto de vista ou por eu ter ouvido?

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— Pelos dois motivos. Não vou negar minha opinião de que muitas pessoas sofremdevido ao luxo de que poucos desfrutam. Contudo, preferia que não tivesse escutado meudesabafo. Queria ter sido menos... impulsiva.

— Compreendo. — Quando o visconde caminhou para o interior do ambiente, elapôde notar um ligeiro coxear. — Costuma moldar suas opiniões de acordo com quem asouve? Isso não é uma hipocrisia?

Hannah sentiu as faces corarem de raiva.

— Está deturpando minhas palavras, mi... — Calou-se abruptamente, ao fitá-lomelhor.

A coxeadura! A mandíbula forte! Aquele era o homem que se destacara dosdemais quando ela confrontara Mayfield... O mesmo da reunião da CorrespondingSociety!

Visconde Amesbury. Limpo. Corte de cabelo elegante. Traje requintado. Nenhumvestígio de pó ou graxa, nem uma sílaba do sotaque interiorano. Um nobre da cabeça aospés, mas ainda o mesmo homem! Qual foi o nome que ele dera? Léo Reston. Queespécie de jogo era aquele? Que tipo de dificuldades poderia causar a Cranston eMelton?

Precisava sair dali. Tinha de contar-lhes... alertá-los.

— Bem, acho melhor irmos embora, Henry.

— Sim.

— Um momento, Franklin — interveio o visconde. — Gostaria de me encontrar comvocê amanhã à tarde, se possível.

Para surpresa de Hannah aquilo soou mais como um convite do que uma ordem.

— Claro, milorde. — Henry passou às mãos de Theo um cartão de visitas.

Ao aguardarem os respectivos veículos, Hannah perguntou a Franklin:

— Você sabia que o visconde e Léo Reston são a mesma pessoa?

— Sim.

— E não me contou?

— Estava começando a lhe dizer quando Taggert nos interrompeu.

— Jamais me senti tão embaraçada...

— Como poderia imaginar que ele fosse aparecer justo naquele momento?

— Se eu soubesse, teria freado minha língua. Só espero que o fidalgo e Taggertnão descontem meu acesso de raiva contra vocês.

— O visconde não me parece ser desse tipo, Hannah.

— Pois sim! Alguém que se presta a espionar, fingindo ser o que não é!

— Estou imaginando por que ele quer me encontrar.

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— Talvez esteja envolvido em algum litígio sórdido e precise de um advogado.

— Não creio que um nobre, com acesso às mentes brilhantes dos melhoresadvogados do país, necessite de meus serviços.

— Sua mente também é brilhante! Mas... grave bem o que digo: há algo muito

estranho envolvendo o visconde. Em seu lugar, eu não confiaria nele.Theo não tivera a intenção de espreitar a reunião de Taggert mas chegara mais

cedo, e como o secretário não se encontrava em seu posto e a porta estava entreaberta...

— O que ouviu de nossa conversa, milorde?

— O suficiente para saber que a Srta. Whitmore tem uma péssima opinião arespeito da aristocracia.

— Mulher intrometida... É uma dessas literatas que não têm mais o que fazer.

— Ela parece gozar de ótimo prestígio entre a classe operária.— Oh, sim! Eles a têm como uma espécie de heroína.

— Bem, suponho que precisem de alguém para lutar pela causa deles.

Theo julgava que essa causa seria mais bem servida se Hannah controlasse o queparecia ser uma tendência desenfreada a tirar conclusões precipitadas. Entretanto,aqueles comentários o atingiram, ainda mais porque existia um fundo de verdade neles.Estava aborrecido, mas queria esquecer o episódio e... em particular sua reação à figuradaquela jovem. Não era hora de desviar sua atenção para uma beldade de olhos

flamejantes.— Talvez. Mas a Srta. Whitmore é muito entusiasta. Uma verdadeira uma

encrenqueira!

— Em que sentido, Taggert?

— Está sempre nos perturbando com sua escola infernal.

— Suponho que o tenha procurado antes.

— Várias vezes. Eu lhe disse que não havia necessidade de enviar os pirralhos da

tecelagem para ter aulas.— E meu pai e meu avô concordam com esse ponto de vista?

— Para ser franco, não vejo motivo para perturbá-los com esses pormenores. — Oadministrador dirigiu-se à escrivaninha, abriu uma gaveta e pegou um molho de chaves.— Deseja visitar a tecelagem, milorde?

— Sim. E gostaria de ver a contabilidade, também. Geral, não só a da tecelagem.

— Mas é claro, milorde.

Taggert falou com o secretário em particular por alguns minutos, e depois saíram.

O trabalho na tecelagem transcorria com muita eficiência, mas Theo não gostou doque viu nas faces dos trabalhadores. Tinham as expressões mal-humoradas e distantes.

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Eram pessoas que, sem dúvida, tinha pouco a desfrutar da vida.

Na véspera, acompanhado de um lacaio, fizera uma visita aos fazendeirosarrendatários e aos tecelões autônomos. Fora um dia exaustivo, mas conseguira visitar mais de trinta famílias.

Achou as condições atuais de trabalho parecidas com as que vivenciara naTecelagem Mayfield. O cheiro de lã impregnava o ar. O silêncio prevalecia nas salas dosteares. Theo imaginou que aquela atmosfera não seria diferente da suportada por outrosmilhares de operários na Inglaterra.

Os funcionários não o receberam de braços abertos, mas fitavam-no com intensacuriosidade. Afinal, aquele homem detinha grande poder sobre seus destinos. Theo sabiaque no fundo aquelas pessoas não engoliam a história de ele ter posado de trabalhador comum.

A medida que caminhava, recordou-se da visita que o barão Mayfield lhe fizera nodia seguinte ao contratempo na Silver Shield. Naquela manhã, ao entrar na biblioteca,encontrou seu convidado andando de um lado para o outro, com a fisionomia austera. Odiálogo todo veio-lhe à memória:

— Bom dia. — Theo estendeu-lhe a mão.

— Bom dia.

— Não gostaria de sentar-se, barão?

— Não, obrigado. Meu assunto é breve. Gostaria de saber o que pretendia com

aquela brincadeirinha de mau gosto em minha tecelagem. Queria descobrir algunssegredos de produção? Algum modo de arruinar meus negócios?

 

— Por que imagina uma coisa dessas? Você trabalha com algodão. Meu povoproduz artigos de lã.

— Por que me espionava?

Theo dirigiu-se a uma bandeja sobre a mesa.

— Aceita um café?— Não. Agradeceria se respondesse a minha pergunta.

— Por favor, sente-se e tentarei lhe explicar. Quis testar o temperamento da classeoperária — Theo revelou apenas o que julgou necessário.

— Por quê?

— Porque alguém a quem devo muito respeito pediu-me para fazê-lo, e porque mepareceu sensato.

— E por que em minha tecelagem e não na sua?— Estava interessado em tecnologia de ponta, e creio que seu estabelecimento é

mais moderno que o meu.

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— Então, estava me espionando!

— Não. Apenas tentando aprender.

— Poderia ter feito isso em sua própria tecelagem.

— Não como um trabalhador comum.

— Não faz sentido. Um nobre pretendendo ser um rústico! E lamento o modo comoprocedeu. Deveria ter vindo a mim como um homem honrado e revelar-me os fatos.

— Sim, deveria. Mas você receberia um operário comum chamado Léo Reston?

— Essa não é a questão.

— Evidente que é. Eu tentava saber o que pensam e sentem os trabalhadores.Entretanto, minha missão terminou mal havia começado.

— Missão! Em minha opinião, você estava agindo como aqueles radicais, Cobbett

e Hunt. Não me surpreenderia se soubesse que está de conluio com eles e com aquelaprofessora.

— Eu não poderia estar aliado ao Sr. Cobbett. O homem refugiou-se na América.

— Mas ainda publica seu lixo aqui.

— Pode ser. Porém, lhe dou minha palavra de que não estou mancomunado comninguém.

— Bem... Todavia, exijo que no futuro fique longe de minha tecelagem e de meusoperários.

— Apenas posso lhe prometer que não transgredirei sua propriedade.

Theo entrou na ante-sala de um escritório e se identificou para um jovem que liaum grosso livro de Direito.

— Sou Amesbury. Gostaria de falar com o Sr. Franklin.

— Sim, milorde. Ele está a sua espera. O rapaz o conduziu pelo corredor.

— Sr. Franklin, lorde Amesbury veio vê-lo.

— Obrigado, Larkin. — Henry contornou a escrivaninha e estendeu a mão paracumprimentar Theo. Em seguida, indicou-lhe uma cadeira. — Em que posso servi-lo,milorde? Presumo que isto não seja uma visita social.

— Não, não é. Confesso que ouvi boa parte de sua reunião com o Sr. Taggert.

— E?

— Posso dizer que a achei... digamos... interessante.

— Creio que reclamações sobre jornadas de trabalho extenuantes e materialinferior não seja novidade, considerando o que vivenciou nas últimas semanas.

— Eu não disse "surpreendente", mas "interessante". Talvez "intrigante" fosse otermo certo.

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— Entendo... Incomoda-se se lhe perguntar o que exatamente considera intrigante,milorde?

— O fato de falar em nome da classe operária. Em geral eles não confiam emhomens como você.

— Um homem como eu?— Educado. De boa família. Fico imaginando qual seria seu interesse para se

envolver em tais assuntos.

— Isso soa estranho vindo de um homem que há algumas semanas se passou por operário. Diga-me, milorde, considera meu envolvimento ultrajante?

— Não. Pelo menos até agora.

— Muito bem.

— Você parece estar em alta estima entre os meus empregados e os de Mayfield.— Creio que sim. Mas, afinal, cresci em Crofton. Theo decidiu colocar as cartas na

mesa.

— Eu, ao contrário, pareço ter caído em descrédito. -— Depois do que fez, nãopode reclamar.

— Não. Mas gostaria que eles confiassem em mim.

— Não será fácil. A confiança vem com o tempo, e receio que senhor tenhacomeçado mal.

— Em parte é por este motivo que vim. Suponho que possa me ajudar a recuperar a amizade deles.

— Por que se importa com isso? A lei lhe confere o direito de fazer o que bementender. Exceto matar ou usurpar a propriedade alheia.

— Grandes poderes sempre acarretam grandes responsabilidades. —É um bomponto de vista, milorde. Poderia explicá-lo melhor?

— Parece-me que a Tecelagem Glosson vem há tempos sendo negligenciada.

— Como bem deve saber, seu avô esteve doente nos últimos dez anos. Os últimoscinco foram ainda mais difíceis devido à perda de seu primogênito.

— Tio Matthew. Meu avô era louco por ele.

— Depois disso, o antigo conde entregou tudo nas mãos de Taggert.

— Que parece ter carta branca para tomar a atitude que melhor lhe aprouver.

— Imaginamos que quando seu pai herdasse... — O advogado se calou.

— Meu pai é um estudioso. Uma espécie de político. E por esse motivo que

deixava tais assuntos a cargo de meu irmão, e agora comigo.— Seu irmão estava no caminho certo, milorde. Fez as indagações certas e obteve

as respostas que queria. Mas depois aconteceu o acidente...

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— Você mencionou a existência de um livro de registros feito pelos operários daTecelagem Glosson.

— Sim.

— Gostaria de vê-lo. Se é que existe mesmo.

— Por quê? Devo lhe dizer que se sua intenção for punir os homens que ofizeram...

— Posso lhe assegurar que não se trata disso. O que pretendo, assim que tiver uma visão geral da situação, é realizar algumas mudanças.

— E achaque...

— ...me pouparia um bom tempo e esforços se me permitisse comparar essesregistros.

— Certo.— Bem, vai me deixar vê-los ou não?

O advogado ponderou por alguns minutos, para responder: — Por mim, lheentregaria esses registros agora mesmo. Porém, não disponho deles. Entrarei em contatocom os operários e verei se estão dispostos a cooperar.

— Poderia aconselhá-los a fazê-lo?

— Sim. Creio que posso.

— Muito obrigado. — Ergueu-se e estendeu-lhe a mão. — Aguardo uma respostasua. A propósito, Sr. Franklin, peço-lhe que não comente esta conversa com ninguém, amenos que julgue imprescindível.

— Compreendo, milorde.

Capítulo VIII

— Que estupidez! Que desastre!

— Pare de se martirizar por isso, Hannah! — Jane tentava confortá-la.

— Depois que lorde Amesbury contar ao pai dele o que eu disse, não teremos maisnenhuma chance de convencê-lo a deixar as crianças da tecelagem estudar!

— Não pode afirmar isso com tanta certeza.

— Oh, Jane, deveria ter visto o olhar que ele me lançou!

— Quem? Lorde Amesbury? Ele ficou muito furioso?

— Para ser franca, não sei decifrar o que sentia. Apenas me fitou de um jeitoenigmático e depois me ignorou.

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— Duvido. Você é uma mulher difícil de ser ignorada, minha amiga.

— Acredite no que digo.

— Sabe, fico pensando se o conde ou seu filho, algum dia, tomaram ciência denossa proposta.

— O Sr. Taggert disse que transmitiu minha mensagem. E por certo o conde temconhecimento de nossa escola. A esposa dele vem nos ajudando com os materiais.

— Mas tem certeza que o conde está a par de nossa proposta?

— Acha que o Sr. Taggert mentiu?

— Seria capaz de jurar.

— Tem razão.

— Henry concorda comigo.

— Henry, é? — caçoou Hannah. O rubor de Jane alcançou as raízes de seuscabelos dourados.

— Eu... ah... foi um deslize. O Sr. Franklin e eu somos apenas bons amigos. Assimcomo você e ele o são.

— Nada disso. Henry não me olha como olha para você. Nem fico vermelha ecomeço a tremer quando ele se aproxima... como alguém que eu conheço.

— Decerto não sou essa tola de que está falando.

— Apenas para alguém que conhece vocês dois tão bem quanto eu.— Prometa que não dirá nada a ele sobre meus sentimentos. Ficaria tão

embaraçada!

— E crê que Henry reconhece os dele? Mas fique tranqüila, prometo!

Jane tornou-lhe um ligeiro sorriso e retomou o assunto anterior:

— O que acha que devemos fazer para convencer o conde de que as crianças datecelagem precisam estudar?

— Ouvi rumores de que o conde e esposa deverão chegar em breve para umalonga temporada. Talvez possamos persuadir a condessa.

— Excelente! Ela sempre aprovou nossa escola.

— Contudo, a palavra final é a do marido dela... ou quem sabe de seu filho. E eu oofendi, lembra?

— Oh, querida!

Hannah esforçou-se para disfarçar sua aflição e parecer mais alegre.

Ao chegar em casa, o som do riso afetado da irmã misturado à gargalhadadivertida do pai a surpreendeu. Entrando na sala de estar, ficou estarrecida ao encontrar ovisconde Amesbury sentado no sofá.

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— Ah, olhe quem está aqui! — disse o reverendo.

O pastor e o visconde ergueram-se, enquanto Hannah se aproximava. Ali, naqueleambiente, notou que o visconde parecia mais alto e mais belo. A silhueta máscula epoderosa, trajada com elegância e requinte, conferia-lhe o porte de um herói.

A Sra. Whitmore verteu limonada em mais um copo e estendeu-o à filha.— Milorde estava nos contando sobre uma travessura que fez na época em que

estudava em Eton.

— Sim... — Hannah ainda se mostrava atônita. Theo curvou-se numa mesurarespeitosa.

— Boa tarde, Srta. Whitmore.

Hannah sorveu um gole da bebida e acomodou-se no sofá ao lado da mãe.

—- Boa tarde, milorde.Sentia-se embaraçada por ter de confrontá-lo sem ter sido avisada. Teria vindo

com o propósito de aborrecê-la? Seu desconforto e sua irritação aumentaram ao perceber que o visconde estava muito à vontade.

Seguiu-se um silêncio incômodo, o qual a mãe de Hannah buscou preencher comum comentário sobre o clima. Após alguns minutos de trivialidades, em que Hannahpouco participara da conversa, Theo voltou-se para a filha mais velha do reverendo.

— Gostaria de convidá-la, Srta. Whitmore, para dar um passeio no jardim.

Hannah arqueou as sobrancelhas e fitou o pai. O reverendo dirigiu-lhe um sorriso eassentiu. Ela havia lhe contado sua experiência pavorosa com o visconde.

— Como queira, milorde.

A apreensão aumentava, enquanto Amesbury a conduzia pelo jardim até ficaremfora do alcance da vista dos demais.

— A Sra. Knowlton estava certa. É um belo jardim! — elogiou Theo, dando umaolhada ao redor.

— É verdade. Contudo, duvido que tenha vindo até aqui apenas para admirar o jardim de minha mãe.

— Não, não foi por isso.

— Se veio me recriminar sobre minhas imprudentes observações naquele dia,devo lembrá-lo de que já me desculpei.

— Meu Deus! Você é bem irritadiça, não?

— Agora sou irritadiça, bem como hipócrita. Por acaso tem outros adjetivos paraatribuir a minha pessoa?

Hannah notou um quê de aborrecimento nos vividos olhos azuis. Como o viscondea observava calado, Hannah empinou o queixo e desviou-se.

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— Srta. Whitmore, parece que tivemos um péssimo começo. Mas, na realidade,sou eu que lhe devo um pedido de desculpas pelo que aconteceu naquele dia.

— Por quê?

— Poderia ter me anunciado antes, mas preferi ficar ouvindo.

— Estava espionando, então? Do mesmo modo como fez com os operários?

O visconde retesou-se e contraiu as mandíbulas, aborrecido. Suas pupilasfalsearam, mas a voz era tranqüila:

— Não estava espionando, senhorita.

— Ora! E que nome se dá a isso, milorde?

— Vim aqui para coletar informações.

— Não é o que os espiões fazem? Deveria saber que o povo daqui não os vê com

parcimônia, ainda mais depois do ocorrido em Pentrich.— Não vim a sua casa para discutir sobre temas nos quais não tive participação ou

responsabilidade.

— Veio fazer o que, então?

— Falar sobre sua escola.

— Mi... minha escola? O que tem ela?

O olhar se suavizou e um leve sorriso brincou nos lábios de Amesbury. Parecia se

divertir por tê-la pego desprevenida. Como isso poderia acontecer logo com ela, sempretão... bem... tão descontrolada quando aquele homem lindo estava por perto?

— Podemos nos sentar ali?

Theo indicou um banco de pedra sob um enorme olmo. Acomodaram-se.

— Uma das coisas que ouvi naquela ocasião foi sua pergunta a Taggert sobre ascrianças da tecelagem freqüentarem sua escola.

—Ele respondeu que os trabalhadores mirins não têm de estudar.

— Esse é o ponto de vista dele. Taggert me falou um pouco sobre sua proposta,mas gostaria de ouvir o que tem em mente.

— Está me dizendo que o conde não tem conhecimento da Crofton Parish DaySchool?

— Até onde sei, não. Nunca mencionou nada comigo. Entretanto, sei que minhamãe tem interesse nos alunos locais.

— A condessa Glosson tem nos dado muito apoio. Hannah queria confiar nele.Afinal, que razão teria para mentir sobre aquilo tudo?

— E?

— E o quê?

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— Vai me falar ou não sobre sua escola?

— Tem certeza de que nunca ouviu comentários a respeito?

— Tenho. E por esse motivo que vim. Para obter a informação direto da boca docavalo.

— Céus! Que maneira nada galante de colocar a questão! Theo deslizou a mãopelos cabelos.

— Deus! Expressei-me mal. Eu quis dizer... Essa é uma expressão usada noExército. Peço que me perdoe, Srta. Whitmore.

Hannah sorriu. O fato de desconcertar o elegante visconde a fez sentir-se melhor.

— O que deseja saber?

— Tudo.

Assim, Hannah o colocou a par de todos os fatos que envolveram oestabelecimento de ensino e de seu desejo de lecionar para as crianças da tecelagem.

— Temos apenas alguns filhos de tecelões matriculados — ela concluiu.

— Mas nenhum deles é filho dos operários da tecelagem?

— Apenas uma menina chamada Patsy Tettle. Seus pais trabalham na TecelagemMayfield.

— Eu os conheço.

— São excelentes pessoas.— Sim.

Theo mergulhou em conjecturas.

— Milorde? Vai considerar minha proposta ou concorda com o Sr. Taggert, que dizque as crianças não precisam estudar?

Os profundos olhos azuis fixaram-se no rosto dela, fazendo-a sentir um arrepio.

— Não. Não concordo com esse ponto de vista.

— Quer dizer que permitirá que elas freqüentem a escola?

— Não disse isso. Hannah levantou-se.

— Ah! Também acha que essas crianças não devem usufruir de tais benefícios!

Theo também ficou de pé.

— Não tire conclusões precipitadas a meu respeito, senhorita. Vou estudar suaproposta e discuti-la com meu pai e outros que possam se interessar. Mais do que isso,não posso lhe adiantar.

— Creio que devo presumir o que me responderá.— Se é assim, sabe mais do que eu. De qualquer modo, lhe agradeço por ter me

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dado tantos esclarecimentos. Agora, se me der licença, devo ir.

Hannah o acompanhou de volta a casa, onde o visconde se despediu de seus pais,pegou o chapéu, as luvas e partiu.

Quando, por fim, a porta se fechou, o reverendo quis saber:

— Como foi sua conversa com o visconde?

— Não sei, papai. Esse homem é tão...

— Maravilhoso! — Katherine interveio, sonhadora.

— Arrogante era o que eu ia dizer.

— Por que está dizendo isso, filha? — a Sra. Whitmore estranhou. — Nós oachamos muito agradável.

— É uma lástima, mas nem sempre temos as mesmas opiniões sobre coisas... ou

as pessoas, mamãe.Ao voltar de seu encontro com Hannah, Theo contou à tia-avó a conversa que

tivera com ela. Na entanto, não mencionou que a sita. Whitmore possuía intrigantes olhosazul-acinzentados que o fizeram sentir vontade de chegar mais perto para certificar-se deque cor eram mesmo.

— A filha mais velha do reverendo tem feito muito por esta paróquia, titia. Bemmais do que a mãe ou as irmãs.

— Quer dizer que aprova o trabalho da Srta. Whitmore?

— Como poderia desaprovar? Exceto, talvez, o fato de ela não fazer o que asociedade espera que uma moça de boa família faça. Todavia, sou o último ser humanoque deveria atirar pedras nesse teto de vidro. — Theo sorriu. — A Srta. Whitmore pareceser original.

— Concordo. Espero que não tenham discutido por causa da escola dela.

— Por que diz isso?

— Posso ser um tanto reclusa, mas isso não significa que sou surda ou cega,

querido. Além do mais, Hannah tem o hábito de me visitar, e não tem vindo aqui desdeque você chegou.

— Humm... — Não apreciava a idéia de que a intrépida Srta. Whitmore o evitava.

Terminado o jantar, Theo retirou-se para a biblioteca e examinou os livros deregistros da tecelagem.

Escrevera uma carta ao pai, falando da reviravolta que os acontecimentos tiveramem Derbyshire. Também reafirmara seu desejo de permanecer na mansão para obter omáximo possível de informações sobre os negócios familiares.

Junto com resposta de seus pais viera um pedido para que instruísse osempregados a fim de prepararem a residência para chegada de vários hóspedes. Oconde e a condessa pretendiam ficar algumas semanas... Talvez até o Natal e a abertura

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do Parlamento, no início do ano seguinte.

Theo respirou fundo. Embora amasse a companhia dos pais, sabia muito bem oque motivara sua mãe a hospedar alguns convidados.

As primeiras palavras da condessa ao chegar e a presença de lady Olívia não

deixavam margem para dúvidas.A condessa informou ao filho que a Srta. Bridges e a Srta. Wentworth em breve

também chegariam, junto com outros vinte convidados.

— Ah, claro! — Theo suspirou, frustrado.

Após a condessa e lady Olívia se recolherem, naquela primeira noite, Theo e o paiforam para a biblioteca.

— Sinto muito, papai. Gostaria de ter ficado mais entre os operários da tecelagem.Sei que havia uma possibilidade de ser descoberto. Apenas não imaginei que fosse tão

cedo.

—Diga-me o que descobriu, filho. Muitos membros do governo temem umarevolução da classe trabalhadora, sabia?

— Sim. Mas estão fazendo uma tempestade num copo d'água. O suposto líder éum homem simples chamado Brandeth. Seu discurso não inclui uma palavra sequer sobresufrágio ou reforma parlamentar.

— Uma revolta de trabalhadores não tem de ser uma revolução.

— Exato.— Está de acordo com a visão de que essas rixas se devem em grande parte ao

trabalho de um espião do governo?

— Claro. A conversa na taverna local girava em torno disso.

— Foi capaz de descobrir algo sobre a morte de Francis?

— Não muito. Houve uma espécie de discussão, contudo, não pude explorar muitoo tema. No geral, parece que meu irmão era bem-quisto.

— Francis era sempre querido por todos.— Pelo visto, não por um certo alguém.

Capítulo IX

O reverendo, acompanhado de Lucy e duas de suas filhas, atendeu ao gentil

convite do recém-chegado conde Glosson. Isso significou uma reestruturação nocalendário escolar, mas Hannah deu boas-vindas à visita como uma circunstânciaconveniente para requisitar um pouco mais a ajuda da condessa. Jamais admitiria para si

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mesma que também seria uma ótima oportunidade para rever lorde Amesbury.

Entrando no salão de visitas, passou os olhos ao redor e ficou impressionada como número de convivas. Seu olhar foi de imediato capturado pela figura máscula dovisconde, que uniu-se aos pais a fim de receber a família do reverendo.

Entre os presentes, Hannah reconheceu a maioria que veio de Londres, mas foramfeitas algumas apresentações para familiarizar os demais membros de sua família com aSrta. Bridges, a Srta. Wentworth e o Sr. Moore, bem como, o capitão Phillips, da MarinhaReal.

Alguns minutos depois, Hannah se deteve a observar as pessoas no salão. Aelegante Srta. Olívia e a exibida Emily Wentworth pareciam estar engajadas num esforço,próprio das damas elegantes, para atrair a atenção do visconde Amesbury. A certa altura,ele se virou em sua direção, e um sorriso discreto brincou em seus lábios. Bem, pelomenos não se mostrava hostil com a filha irritadiça do reverendo.

A Sra. Mathilda Stimson aproximou-se e sentou-se a seu lado.

—Aposto em lady Olívia — sussurrou-lhe.—Tem mais classe. Não creio que opobre Theo pudesse agüentar essa risadinha por muito tempo.

— Sra. Stimson! — A repreensão de Hannah foi interrompida por uma explosão derisadinhas estridentes da Srta. Wentworth a algo que o visconde tinha dito.

"Duvido que tenha sido tão engraçado assim", pensou. Então, percebeu que estavacom ciúme da atenção que ele dispensava a mulheres? "Deus! De onde tirei essa

bobagem?!"Logo, cedo demais para os propósitos de Hannah, estava na hora da família do

reverendo partir. Ao se despedirem, a condessa puxou-a de leve à parte.

— Srta. Whitmore, sinto por não dispor de mais condições para conversarmos.Gostaria de fazer uma visita a sua escola, se for possível.

— Sem dúvida, milady. Eu e a Srta. Thomas teremos imenso prazer em recebê-la.

— Meu filho disse que vou achar muito interessante.

— Espero que sim.

O que significava aquilo?, Hannah se perguntava. Ficara evidente que CroftonParish fora um tópico de conversação entre o visconde e a mãe. E por certo isso era bomsinal. Não era?

Theo passou a semana se esforçando ao máximo para descobrir alguma pistasobre o que houvera com seu irmão. Conversou com os cavalariços, e algumasinformações muito interessantes reforçaram suas fortes suspeitas de que alguém estiveramuito interessado em tirar Francis de seu caminho.

Assim, decidiu enviar o jovem lacaio James ao encontro de Tim Hessler e do ex-sargento Yardley. Vestiu as roupas que usara quando se passara por trabalhador e osesperou no estábulo atrás da Silver Shield.

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

— Deixaram a taverna separados? — perguntou, quando os homens seaproximaram.

— Sim, major... digo... milorde. Do jeito que o rapaz falou — afirmou Yardley.

— Preciso que me ajudem.

— Que tipo de ajuda? — inquiriu Tim.

— Qualquer coisa que precisar, milorde. É só pedir — prontificou-se Yardley.

— Estou tentando descobrir por que meu irmão morreu e quem poderia ter sido oresponsável por sua morte.

— Então os rumores de que não teria sido um acidente são verdadeiros?

— Isso mesmo, Tim.

Theo explicou-lhes sobre o eixo quebrado da carruagem. Alguém que entendia

bastante do mecanismo desses veículos tivera um grande trabalho em sabotar aqueleque Francis costumava usar.

— De que maneira podemos ser úteis? — Yardley quis saber.

— Quero que mantenham seus olhos e ouvidos bem atentos, já que não tenhomais a mesma liberdade entre os operários como tinha antes.

— Sinto muito por ter sido o responsável — lamentou o ex-sargento.

— Não se preocupe. Isso aconteceria mais cedo ou mais tarde. Tim, entretanto,continuava desconfiado.

— Não está pedindo que espionemos nossos colegas, não é, visconde?

Lorde Amesbury suspirou, exasperado.

— Gostaria que parassem de uma vez por todas de me tratar como espião. Nãoestou pedindo para espionar ninguém. Apenas tento descobrir quem matou meu irmão,entendeu?

— Sinto muito por ter perguntado. Mas trabalho para Mayfield... O que podereifazer?

Após refletir um instante, Theo ponderou sobre o quanto poderia lhes revelar.Confiava em Yardley. O homem lhe salvara a vida repetidas vezes. E o instinto lhe diziaque Tim também era de boa índole. Portanto, contou-lhes sobre suas suspeitas a respeitoda morte de Francis.

— Seja lá quem esteja por trás disso, o autor ou os autores do crime devemtrabalhar nesta área. Se foi por ressentimento pessoal, o criminoso talvez seja umoperário da Glosson. Se um Francis morto significasse um aviso para os proprietários dasindústrias têxteis em geral, poderia ter sido qualquer um. Mas alguém em Crofton sabe

quem foi... e o porquê. Então, posso contar com vocês?— Sim — disse Tim.

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— Claro! — Yardley sorriu. — Estou em dívida... Aquelas tropas por certo teriamme liquidado em Vitória.

— Se formos discutir quem deve a quem, companheiro, sairei perdendo. Porém,lhe agradeço. Agradeço a ambos.

Apertou a mão dos dois, acrescentando:— Mas lembrem-se: não se coloquem em risco. Se descobrirem algo, me

informem, e eu mesmo vou verificar.

Eles assentiram e deixaram o local separados. Theo esperou alguns minutos etambém se foi.

No dia seguinte, acompanhou a mãe e lady Olívia em uma visita à Crofton ParishDay School.

A condessa chegou no meio da tarde, acompanhada do filho e de lady Olívia

Sanders, que trajava um vestido de passeio estampado e um chapéu branco amarradopor baixo do queixo.

Hannah aproveitara a ocasião daquela visita para vestir seu traje típico deprofessora, um vestido de casimira azulada com babados e laços brancos na cintura, nopescoço e nos pulsos. A tonalidade combinava à perfeição com seus olhos.

Assim que viu lady Olívia descer da carruagem, ocorreu-lhe que a Sra. Stimsontinha razão. Ao que tudo indicava, a condessa estava treinando sua sucessora. Porém,não conseguia entender por que achava aquela possibilidade tão abominável. Afinal, não

era de sua conta julgar as escolhas pessoais feitas pela família do conde.Mesmo não apreciando a presença de lady Olívia, cumprimentou a protegida da

Sra. Glosson com toda a gentileza.

A condessa insistiu em visitar ambas as salas de aula, o grupo de Jane de alunosmais jovens e dos mais velhos, de Hannah. Lady Olívia e lorde Amesbury caminhavamum pouco atrás, permitindo à condessa fixar o passo e o tom.

A Sra. Glosson percorria a sala de aula, fazendo perguntas aos alunos eelogiando-lhes as respostas. Hannah ficou surpresa ao ver como a nobre parecia à

vontade ali.

Pouco depois, Hannah encerrou as atividades e se despediu dos alunos,extasiados por serem liberados mais cedo. Em seguida, conduziu os convidados até oescritório, onde Jane preparara uma mesa com chá e biscoitos.

Lady Olívia pouco falara. Ao contrário da condessa e seu filho, a jovem pareciaindiferente às crianças.

— Não se interessa por escolas, milady? — Hannah puxou o assunto.

— Para ser franca, acho que meus interesses recaem sobre outras coisas. Nuncafui o que se pode chamar de uma boa aluna. — Esboçou um ligeiro sorriso.

— Todos nós possuímos interesses e talentos diferentes.

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— Cara Srta. Whitmore, devo lhe confessar que estou impressionada com o quetem alcançado por aqui. — A condessa tomou-lhe a mão.

— Obrigada, milady.

— Agora, diga-me como deseja expandir a escola. Hannah dirigiu um olhar 

apreensivo ao visconde, mas notou que a expressão dele era encorajadora. Mais umavez, explicou a um membro da família Ruskin o que pretendia.

— Isso significa trazer os filhos dos tecelões para cá? Mas onde os acomodaria?— a condessa indagou. — As duas salas de aula não dispõem de mais lugares paraalunos adicionais.

— É certo, milady. Entretanto, a senhora deve ter reparado que utilizamos menosda metade do espaço disponível deste prédio. Tenho certeza de que os mesmos pais eparoquianos que nos ajudaram antes nos ajudarão outra vez. Tudo de que necessitamosé matricular as crianças.

— E de mobília, livros, materiais e... — interveio o visconde. Hannah mordeu olábio, aborrecida com a praticidade dele, e virou-se para encará-lo.

— Estamos acostumados a compartilhar, e sobrevivemos assim, milorde.Esperamos que os donos das tecelagens percebam a vantagem de ter uma mão-de-obrabem-educada e nos ofereçam seu apoio.

— Vou falar com meu marido sobre isso, querida.

—Contudo, há vários fatores a serem considerados, minha mãe. Não podemos lhe

assegurar nada por enquanto, senhorita.— Sim, milorde... — Hannah ficou desapontada.

Lady Olívia deixou escapar um suspiro de alívio e os acompanhou. Despediram-se,cordiais.

— Não nutra muitas esperanças, ainda — Theo murmurou, a seu ouvido.

Ela o fitou, surpresa. Não havia coerência naquele homem. Quando os trêsvisitantes se foram, Jane começou a tirar a mesa.

— Acho que foi uma visita proveitosa.— A condessa pareceu animada. Mas não posso dizer o mesmo quanto a seu filho.

— Ele vai pensar melhor sobre tudo, Hannah. Você verá.

— Espero que sim...

A caminho de casa, Theo acomodou-se no assento de madeira da carruagem, defrente para a mãe e lady Olívia.

Não conseguia esquecer Hannah Whitmore. Aquela mulher o confundia. Por um

lado, achava incomum uma moça ter habilidades para levar a cabo um plano daqueles, enão estava certo se aprovava tal virtude em uma dama. Por outro, admirava a belaprofessora. Seus olhos eram um misto de sinceridade, diversão e bondade. Caminhava

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com graça e determinação naturais. Os cabelos pareciam captar a luz do sol, que serefletia nos sedosos fios castanhos.

— O que achou, mamãe?

— A Srta. Whitmore conseguiu realizar mais do que julguei ser possível, filho.

Olívia querida, você ficou tão quietinha durante toda a visita... Não gostou da escola?A jovem dirigiu um rápido olhar para Theo, e em seguida destilou seu veneno:

— Não posso julgar como deve ou não ser uma escola. Mas suponho que devahaver algo para se admirar nessa, em particular.

— Como assim?

— Não posso admirar uma mulher que desempenha papéis impróprios a nossosexo, milady.

— E que papéis são esses?Theo reconheceu o tom perigosamente suave que a mãe usou, entretanto, duvidou

que Olívia também tivesse percebido. Mas o que na verdade o espantou foi sua vontadede defender a Srta. Whitmore. Afinal de contas, lady Olívia estava apenas manifestandosua opinião sobre uma mulher que optara por falar em nome dos trabalhadores, que nãopensava duas vezes antes de desafiar um cavalheiro em público e que não fazia nadaalém da simples tarefa feminina de ensinar crianças a ler e escrever.

— Acredito que o lugar de uma mulher é em casa, confortando e apoiando omarido. Administrando as tarefas do lar, os criados... e providenciando um herdeiro.

— Entendo. — A condessa meneou a cabeça. — Não vê nenhuma razão para umamulher querer exercer seus próprios direitos?

— Para quê? Não há necessidade.

— Oh, você será a esposa perfeita de algum homem afortunado, meu bem.

Margareth Ruskin bateu de leve na mão da jovem e fitou o filho com um olhar oblíquo. Lady Olívia pareceu contente, e Theo constatou que a beldade não entendera aironia da condessa.

A esposa perfeita... Bem, talvez fosse. Como sua mãe lhe dissera, Theo estavacom trinta e um anos, por isso deveria se decidir a casar e ter filhos. Que importância teriase sua união não tivesse a paixão e o amor que envolviam as de Jenkins e Jeffries e deseus próprios pais?

Duvidava da probabilidade de o amor se tornar um fator em sua vida. Conveniênciatalvez, mas não amor. Esse tipo de casamento era comum entre famílias aristocráticas, elady Olívia parecia uma provável candidata a se tornar viscondessa de Amesbury.

Todavia, quando suas reflexões migraram para a cama, não eram madeixas loiro-

prateadas que imaginava espalhadas pelo travesseiro. Não. Era uma cascata de cabeloscastanhos com fios avermelhados e...

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Sacudiu a cabeça com força, recusando-se a permitir que aquela imageminadequada fosse mais além.

Hannah Whitmore se vestiu para o baile dos Glosson com a mesma relutância comque se vestira meses antes para o Baile Rollente. Katherine estava exultante defelicidade, pois aquele seria seu primeiro baile adulto, e Hannah não queria dizer nemfazer nada que estragasse o prazer da irmã.

Vários dias se passaram desde a visita da condessa à escola, durante os quaisnenhum membro dos Glosson se manifestou sobre sua proposta. De fato, tinham a casacheia de convidados para entreter, mas poderiam ter dito um simples sim ou não. Hannahprometeu a si mesma que não demonstraria nem ansiedade, nem aborrecimento aquelaocasião.

A fila que recepcionava os convidados consistia apenas do conde e sua família,incluindo a filha Cassandra e seu marido, que haviam chegado dois dias antes. Hannah

passou de um em um exibindo um sorriso firme nos lábios. Mais uma vez, sentiu ocoração bater em descompasso quando o visconde a cumprimentou.

Instantes depois, sua atenção foi capturada pela figura de lady Olívia, trajada commuito requinte e cercada por vários admiradores. Ninguém deixaria de notar aquelamulher em uma festa. Ouvira rumores de que lorde Amesbury estava tendo um romancecom a bela dama.

Por ter aprendido a lição em Londres, Hannah mandou confeccionar um vestidonovo para aquela ocasião. Era de seda perolada com flores azuis, que lhe delineava as

curvas e fluía livre à medida que se movimentava. A única jóia que ostentava era ummedalhão de ouro.

Quando os primeiros acordes soaram no salão, o lorde convidou lady Olívia para aprimeira dança, e Hannah permaneceu sentada, observando-os.

Notou que o visconde era exímio bailarino, apesar da leve coxeadura. Ambosformavam um par muito atraente. O traje preto de gala de Theo complementava oadorável vestido de Olívia. Então, avistou outro dançarino: lorde Mayfield.

Evidente que a família Ruskin deveria ter memória curta, visto que o convidaram. O

confronto entre lorde Mayfield e lorde Amesbury era do conhecimento de todos.

Momentos mais tarde, espantou-se ao ver o barão se juntar ao grupo masculinoque rodeava lady Olívia. Sentou-se perto o suficiente para ouvir o que conversavam eficou intrigada com o modo como a jovem dama agia para manipular seus vários fãs.Naquele instante, a Sra. Stimson a distraiu:

—Ela pensa que provocará ciúme em Amesbury, flertando com Mayfield. Isso nãoirá funcionar.

— O que a faz pensar assim? Por certo, lady Olívia sabe que os dois homens

andaram se confrontando.

— Claro que sabe. Talvez ache que Theo é do tipo que cai nessa armadilha.

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— Os homens não costumam ser possessivos com as mulheres pelas quais estãointeressados?

— Alguns mais do que outros, eu diria. E, além do mais, não acredito que Theotenha algum interesse nela.

— Ah, é? Tinha a impressão de que estavam comprometidos.— Bem, talvez. Por certo Olívia e seu pai desejam isso, mas, se quer saber minha

opinião, duvido que seja um compromisso por amor.

Naquele momento, Hannah decidiu que bastava de especulação sobre a vidaíntima do visconde e mudou o tópico da conversa. Entretanto, não pôde deixar de notar que, assim que o barão Mayfield se aproximou de lady Olívia, lorde Amesbury se afastou.

Bem atento às maquinações de Olívia, Theo mostrou-se indiferente. Considerandomelhor, ela e o barão Mayfield formavam um ótimo par.

Ao passar os olhos ao redor do salão avistou David Moore conversando animadocom a Srta. Bridges. Já os tinha visto dançando momentos antes. Sorriu. Minutos depois,quando a Srta. Bridges foi dançar com outro, David aproximou-se do visconde.

— O que o faz achar tanta graça, milorde? — Moore quis saber.

— Pare de se referir a mim desse modo, David.

— É de mim?

— Olhe, se não tomar cuidado, será vítima da mesma ratoeira na qual acusou

Jenkins e Jeffries de caírem.— Ah, deixe disso! Trata-se apenas de um pequeno flerte. Não é o que se espera

numa ocasião como esta?

— Pequenos flertes com mulheres casadas ou de reputação duvidosa, não moçascomo a Srta. Bridges.

— Por acaso transgredi seus domínios? Eu... ahn... acreditei que você e ladyOlívia...

— Não. De modo algum! Não tenho compromisso algum com as damas aqui

presentes. Embora fosse o desejo de minha mãe ver-me casado com uma delas.

— Nesse caso, não se importa se eu e Anne...

Theo arqueou uma sobrancelha ao ouvi-lo chamar a moça pelo primeiro nome.

— Está enamorado, não é mesmo? Logo você que me fez advertências medonhassobre a flecha do cupido há algumas semanas!

Moore enrubesceu.

— Suponho que sim. Não sei... Isso... Bem, isso acontece. O visconde deu uma

pancadinha no ombro de David.

— Sendo assim, vá em frente, amigo.

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— Obrigado, Theo. Mas creio que o pai dela pretende vê-la casada com umvisconde ou futuro conde.

— Sendo assim, sofrerá uma grande decepção. A sita. Bridges e eu não passamosde bons amigos. E pelo que sei o caminho está livre. Embora não invejasse tal sogro. —Amesbury sorriu.

Eles riram e foram juntar-se a Jenkins e Jeffries. Theo permaneceu minutosouvindo os três homens falarem sobre cavalos e carruagens.

De repente, sua atenção foi capturada pela agradável visão da sita. Whitmore nosalão, acompanhada por Henry Franklin.

A filha do reverendo resplandecia num belo vestido que ondulava ao mais levemovimento. Parecia perfeitamente à vontade com seu par, sorridente e falando animada.Sentiu uma pontada de inveja do advogado.

Havia várias damas naquele baile a quem Theo não se sentia obrigado, comomembro da família anfitriã, a tirar para dançar. Porém, apresentou-se à sita. Whitmore.

— Se não estiver comprometida, gostaria que me concedesse a honra da próximadança.

Confusa e ofegante, Hannah demorou um pouco para responder:

— Mas... Mas é lógico, milorde.

O visconde ficou admirado com o olhar de surpresa e apreensão que viu no rostodelicado quando a orquestra iniciou os primeiros acordes.

Era uma valsa. Theo abriu os braços e a envolveu pela cintura.

De repente, havia apenas a música e aquela mulher junto dele. Foi como se tudo asua volta desaparecesse.

Não se lembrava de ter sentido deleite tão inebriante em toda sua vida numasimples dança. "Ora, seja honesto!", disse a si mesmo. Não era a dança, mas o par.

Inclinando a cabeça para baixo, fitou-a, maravilhado. Notou que Hannahexperimentava as mesmas sensações. Seus belos olhos cinzentos revelavam o espanto e

o enlevo que a dominavam.Dançaram em silêncio. Theo estava hesitante. Não queria quebrar aquele

momento mágico. Mas afinal deveriam versar sobre alguma coisa. Não era isso oesperado?

— Dança muito bem, sita. Whitmore.

— Transmitirei seu elogio a meu pai.

— A seu pai?

— Foi ele quem me ensinou.— Vejo que nosso reverendo é um homem de muitas virtudes. Mais alguns

momentos de quietude, e então o lorde sussurrou ao ouvido dela:

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— Agora é sua vez.

— De quê?

— De propor um tópico fútil para falarmos. É o que casais costumam fazer quandodançam, sabia?

— É uma regra rígida, não?

— Oh, sim! Passa de pai para filho e de mãe para filha desde que estávamos noútero materno.

Rindo daquele comentário, mais uma vez Hannah sustentou o olhar dele. Era umsorriso amável, feminino, genuíno e livre. Theo retribuiu.

Foi quando a alegria se transformou em algo mais profundo. Theo disfarçou seuembaraço, rodopiando em uma série de círculos graciosos. Assim que a música terminou,Hannah estava ofegante. Desconcertado, ele a conduziu de volta para junto da mãe dela

e da Sra. Stimson. Agradeceu e se retirou tão depressa quanto a educação lhe permitiafazer.

Hannah acomodou-se em uma cadeira, assustada com a intensidade de suasemoções. Jamais vivenciara algo semelhante. O que existia naquele homem que otornava diferente de qualquer outro que já conhecera? O que a fez reagir daquele modo?Afinal, não era uma jovem escravizada pela idéia de encontrar um príncipe encantado.

Príncipe encantando, de fato! Mas o visconde, antes de mais nada, representavaum negócio. Deveria se agarrar àquele pensamento e esquecer a música, a fragrância

máscula e o calor daqueles braços, nos quais flutuara num estado quase hipnótico.Fora um momento tão maravilhoso e tão perfeito que a fez sentir como se tivessem

sido feitos um para o outro. Isso não era ridículo? Só uma tola alimentaria taisesperanças. Um rapaz que poderia ter as mais belas mulheres não se interessaria pelafilha solteirona de um reverendo.

Suas divagações foram interrompidas quando Lucy falou:

— Minha filha, você parecia radiante durante aquela valsa.

— Obrigada, mamãe.

— Isso só vem a comprovar o que um belo e adorável par pode fazer pelo outro.

— Suponho que esteja certa. — Hannah não tinha disposição para discutir sobreaquilo com ninguém. Queria guardar a lembrança para si.

Pelo resto da noite, tentou tirar o interlúdio com lorde Amesbury da cabeça.

Tomou parte na maioria das danças, entretanto, não tanto quanto as damaslondrinas. Sentiu imensa euforia em ver o contentamento de Katherine. Sua bela irmãcaçula por certo seria um sucesso quando fosse a Londres, no começo do ano seguinte.

Acomodou-se ao lado do capitão Phillips para jantar. Além deles, estavampróximos o Sr. Moore e a Srta. Bridges, e para sua aflição, o visconde e lady Olívia.

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— Hannah é seu primeiro nome, Srta. Whitmore? — perguntou o capitão.

— Sim.

— É lindo. Bíblico, não é mesmo? Significa dignidade ou benevolência.

Ela o fitou, surpresa.

— Tem razão. O senhor é um homem bem erudito, capitão. Phillips sorriu.

— Não temos espaço a bordo para uma vasta biblioteca, mas sempre temos umexemplar da Bíblia.

— Parece um nome bem apropriado para a filha de um reverendo — comentoulady Olívia, num tom de desdém.

— Existe alguma regra que obrigue os clérigos a dar nomes bíblicos a seus filhos?—A Srta. Bridges arqueou uma sobrancelha.

Hannah sorriu.— Se existe, duvido que meus pais tenham conhecimento disso. Papai queria que

eu me chamasse Helen. Mamãe preferia me dar o nome de minha avó Anna. Então,chegaram a um acordo, me batizando com o nome de Hannah.

— E por sinal foi uma feliz solução — falou capitão Phillips.

— Imagino que nome a princesa Charlotte e o príncipe Leopold vão escolher parao filho deles — disse a Srta. Bridges.

— Se for menina, duvido que terá o mesmo nome da avó — escarneceu ladyOlívia.

— A atual princesa de Gales não provou ser um modelo de virtudes e decoro. —Hannah ajeitou os cabelos, com graça. — Mas ninguém pode deixar de sentir piedadedela do mesmo jeito.

— Se for um menino, poderia ser outro George — opinou a Srta. Moore. — Issopor certo agradaria o príncipe regente.

— Talvez se for um menino possa se chamar Leopold, como o pai — sugeriu o

visconde.Lady Olívia gargalhou.

— Já imaginou... rei Leopold? Ou talvez rei Léo? É inadmissível para um rei inglês.

Os demais acharam graça, e a conversa versou sobre outros temas. A noiteterminou feliz para Hannah, que ouvia Katherine rememorar todos detalhes de seuprimeiro baile.

Dez dias depois, a nação inteira mergulhou em profunda tristeza com a notícia damorte da princesa Charlotte após dar à luz um natimorto.

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Capítulo X

Com toda a Inglaterra mergulhada num mar de aflição e incerteza sobre o futuro, opovo do interior sofreu em dobro. A tentativa dos revolucionários de Pentrich terminou

como muitos haviam predito: com prisões e enforcamentos. Dos quarenta e cinco ou maispresos, só alguns poucos escaparam do castigo.

A medida que o inverno avançava, o descontentamento entre os trabalhadores,furiosos com a severidade de tais sentenças, tornou-se mais pronunciado. Ouviam-serumores do ressurgimento do general Ludd e a violência de alguns anos anteriores.

Os proprietários de minas, indústrias têxteis e outras fábricas estavam bastanteapreensivos. Como conseqüência, eles próprios, seus administradores e supervisorestornaram-se ainda mais opressivos e com total aprovação dos agentes dos governoslocais e nacionais.

— É como se uma carga de pólvora estivesse prestes a explodir — dizia o condeGlosson ao filho.

O conde e a esposa tinham viagem marcada para a capital no dia seguinte. Umavez mais, pai e filho desfrutavam de uma agradável conversa na biblioteca.

—O Parlamento tem o poder de neutralizar essa situação, papai. Mas acredita quevai lançar mão disso?

— Não. Como um grupo legislativo, sentamos, cruzamos nossas mãos e fazemos

proclamações. — O conde suspirou.— É como se o governo andasse às voltas colocando bandagens nos membros

feridos do corpo político, enquanto um câncer insidioso o devora por dentro.

— Esse é um ponto de vista. Enquanto não houver uma verdadeira reforma noParlamento, é provável que tudo fique como está. E uma reforma não é feita de um diapara o outro.

— Cuidado, papai, poderá ser acusado de revolucionário — caçoou Theo. — Vocêcontrola vários assentos na Casa dos Comuns. Pretende abrir mão desse controle?

—Com prazer, quando for implantado um sistema que assegure a realrepresentação.

— E até lá?

— Minha obrigação é ver aqueles homens responsáveis e honrados ocupandoesses lugares.

— Pena que sua visão ainda é minoritária entre esses poderes dominantes. Há umvasto exército de pessoas trabalhando lá fora, esperando cada vez mais impacientes por 

mudanças.— E parece que ninguém sabe como lidar com as modificações que já estão

acontecendo a nossa volta. Os operários das fábricas não são como os camponeses.

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Aquelas máquinas infernais mudaram o caráter inteiro da Inglaterra!

Theo sorriu.

— Ah, agora sim estou ouvindo o velho conservador falando outra vez!

O conde soltou um grunhido.

— Ainda não conseguiu descobrir mais nada sobre a morte de Francis, Theo?

— Conjecturas... Conversa fiada... Mas nada de substancial da parte das pessoasque tiveram maior contato com ele.

— Nossos próprios operários, você quer dizer?

— E tecelões autônomos. Francis estava indo visitar alguns aquele dia, lembra?

— Alguém deve saber algo. Santo Deus, no próximo mês fará dois anos da mortedele!

— É verdade.

— Conte-me o que Yardley lhe relatou.

— Disse que as pessoas estão assustadas e não querem falar a respeito.

— Se eu descobrisse o responsável, ele... ou eles... teria verdadeiros motivos paraficar terrificado.

— Parece que houve uma espécie de discussão entre Francis e um dossupervisores, um homem chamado O’Reilly.

— Por que motivo?

— Não sei. Ao que tudo indica, foi durante uma conversa que aconteceu noescritório do supervisor, no terceiro andar. Os trabalhadores daquele pavimentoassistiram, mas não puderam ouvir nada.

— Interrogou o tal supervisor ou Taggert sobre isso?

— O sujeito e outro irlandês chamado Duggan partiram mais ou menos dois mesesapós o acidente. Taggert garantiu não saber nada sobre o ocorrido e que os dois homensestavam com saudade da Irlanda.

— Se ao menos soubéssemos o motivo desse desentendimento...

— Continuarei tentando descobrir.

— Faça isso. E eu vou contratar um detetive e o mandarei para a Irlanda noencalço desses sujeitos. — O conde sorveu o último gole de conhaque. — Vou merecolher. Sua mãe quer se levantar bem cedo amanhã. Confio em você, filho. Sei que nãovai me decepcionar.

— Obrigado, pai.

— Está me agradecendo por ter jogado quase o condado inteiro sobre suascostas?

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

— Não. Agradeço por depositar sua confiança em mim.

— Bem, boa noite.

— Boa noite, pai.

Quando o conde se retirou, Theo serviu-se de outra dose de conhaque, acendeu a

lamparina da escrivaninha e retirou os livros contábeis da gaveta. Sua intuição lhe diziaque aquelas colunas de números continham respostas a suas indagações. Mas onde?Tudo parecia em ordem. A produção era fixa, e os lucros, tão bons quanto se poderiaesperar naqueles tempos econômicos difíceis.

Recordou-se de uma recente conversa que tivera com Henry Franklin e os últimosacontecimentos relacionados a descobertas sobre a tecelagem, e deixou-se rememorar os fatos:

— Vim saber daqueles livros, Franklin. Já faz três meses que estou esperando.

Eles existem ou não?— Sim. Mas o pessoal está apreensivo. Agora mais do que nunca, após aqueles

enforcamentos em Pentrich.

— Não tenho a menor intenção de matar o mensageiro, caso me traga másnotícias.

O comentário bem-humorado provocou o riso de Franklin.

— Você, não... Mas seu administrador, talvez.

— Taggert? Por quê?— Ele controla tudo há bastante tempo. E, para ser franco, exerce esse poder com

mão de ferro.

— Como assim?

Theo não simpatizava muito com Taggert, mas o homem era um empregado, nãoum amigo. E enquanto desempenhasse bem seu serviço...

—É de conhecimento geral que os funcionários são despedidos, multados oucastigados com severidade sem necessidade.

— E a carga horária? Lembro-me de que ouvi alguma queixa nesse sentido.

— Pelo que sei, nada mudou.

Theo imaginou ter havido uma redução na jornada, desde que fora, em pessoa,falar com Taggert sobre uma possível mudança. Ficou embaraçado. Como oficial doExército, jamais dera uma ordem que não fosse cumprida. Tinha de admitir que andaraum pouco distraído com os convidados da temporada de outono. Passeios, expedições deturismo e até mesmo, para sua surpresa, um convite para jantar feito por lorde Mayfield.

Após a visita à escola de Srta. Whitmore, ficara um tanto confuso, e se divertiamuito ao ver o entusiasmo de sua mãe por lady Olívia minguar.

Theo não se importara muito com a idéia de Mayfield, também, estar cortejando

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Olívia. Sabia muito bem que se quisesse levaria vantagem sobre o adversário. Oproblema era saber se queria ou não.

A temporada chegara ao fim, e os convidados partiram. Em seguida, veio a épocade Natal, com suas festividades e obrigações. A irmã e sua jovem família permanecerampara os feriados, e Theo passara longas horas brincando com os sobrinhos.

Mas também havia a investigação sobre a morte do irmão. Nenhum dessesmotivos deveria tê-lo distraído de suas tarefas. Mas fora o que acontecera.

Remexeu-se com desconforto na cadeira e fitou o advogado.

—Consiga-me esses livros, Franklin. Se provarem as alegações feitas pelosoperários, prometo que haverá mudanças. Mas não posso e não vou agir sem ter sólidasrazões para tal.

Dois dias mais tarde, Henry apareceu na tecelagem.

— Passei por maus bocados para encontrá-lo, milorde. Tem algo que preciso...ahn... lhe falar.

— Está bem. Quer conversar aqui mesmo? Podemos utilizar o escritório dosupervisor.

— Acho que não seria uma boa estratégia.

Theo dirigiu um rápido olhar ao advogado, que assentiu com discrição.

— Bem, estou indo tomar uma xícara de chá. Gostaria de me acompanhar?

Os dois desceram as escadas, trocando comentários sobre o clima até deixarem oprédio.

— Vamos até minha casa — sugeriu Theo. — Receio que teremos de usar suacarruagem, pois a minha só chegará daqui a uma hora.

Uma vez acomodados nos assentos de madeira, o advogado retirou um pequenopacote do bolso do casaco e o entregou ao visconde.

— Suponho que sejam os livros.

— Sim.— Até que enfim. Obrigado, Franklin.

Quando o veículo parou diante da mansão, Henry desculpou-se:

— Sinto não poder acompanhá-lo, milorde. Tenho um compromisso inadiável.Apenas queria ter certeza de que isso chegaria a suas mãos.

— Claro!

Momentos depois, Theo entrou na mansão muito agitado, ansioso para ler aquelesregistros. Mas primeiro tomaria um bom banho.

Passou o resto da tarde e noite comparando os dois livros. O que Franklin lhe deranão fora feito por ninguém com experiência contábil. Mas as discrepâncias eram

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evidentes. As contas que Taggert lhe fornecera mostravam uma produção fixa e um bom,embora modesto, lucro. As dos operários indicavam uma produção bem maior, o quedeveria significar um lucro maior.

No dia seguinte, Theo confrontou Taggert.

—Considerando o número de horas que os operários trabalham, gostaria de saber por que a produção parece tão baixa.

— São todos um bando de preguiçosos, milorde. Hoje em dia é difícil encontrar boamão-de-obra.

— Compreendo... — Theo fitou a requintada mobília a sua volta, concluindo ondefora gasto o lucro não reportado naqueles livros.

Taggert percebeu o ceticismo de Amesbury.

— Ouvi rumores de que Franklin teria lhe feito uma visita ontem, milorde. Espero

que não se deixe influenciar por sua concepção errônea sobre o que acontece nestatecelagem.

— Como assim?

— Ele ouve apenas um lado e acha que tudo é verdade. Tem nos causadoinúmeros aborrecimentos.

— Poderia me dar um exemplo?

— Esteve aqui há alguns meses nos acusando de extenuar os trabalhadores com

excessiva jornada. Mas estávamos com falta de mão-de-obra até o verão passado.— Estranho. Isso não está anotado aqui. — Theo bateu com a mão sobre os

registros.

— Foi um descuido. Vou falar com meu secretário para atualizar esses livros.

— Faça isso. — Ao sair, teve a impressão de ouvir um suspiro de alívio doadministrador.

O próximo passo foi organizar outro encontro secreto com Yardley.

— De algum modo, não estou surpreso — explicou o ex-sargento, irônico.— Por quê?

— Bem, o supervisor de meu andar é pior que uma cobra com relação à produção,milorde.

— Ele maltrata os subordinados?

— Alguns. Em particular aqueles que não têm condições de se defender. Masaposto que não me chamou aqui esta noite para falar desse canalha.

—Tem razão. Gostaria que falasse com os operários dos demais andares parasaber se concordam com você.

— Claro que concordam!

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— Parece que Taggert e Dawson escondem algo.

Theo explicou-lhe o que ficou sabendo e o que concluiu. O administrador e outrossonegavam os lucros da tecelagem à custa dos trabalhadores, lesando a família Ruskin.

— Pelo que deduzi, Taggert não poderia agir sem a conivência dos supervisores

de cada andar. Preciso saber quantos e quem está envolvido nisso. Mas seja cuidadoso.Tenho uma forte suspeita de que meu irmão desvendou toda essa sujeira, e isso lhecustou a vida.

— Serei cuidadoso. Não acontecerá nenhum acidente comigo.

Os meses de inverno eram sempre difíceis para Hannah. Muitos de seus alunos,mal nutridos, adoeciam. Várias vezes enchia a mesa do salão paroquial com sobras decomida para alimentar os garotos famintos. Tentava evitar que eles percebessem o mar de lágrimas que saltavam de seus olhos ao constatar tamanha miséria.

Era grata aos vizinhos e comerciantes que se mostravam dispostos a auxiliá-la.Todavia, a maior parte da ajuda às necessidades físicas dos pequenos vinha da parte dacondessa Glosson, que providenciara material da tecelagem para a confecção deagasalhos para as crianças da paróquia.

— Devo lhe confessar que Taggert não ficou nada satisfeito com isso. Preciseilembrá-lo de que era dona daquela tecelagem — lhe confidenciara a condessa, com umsorriso triunfante.

Em meados de novembro, a família do reverendo fora convidada para outro evento

social patrocinado por uma das mais importantes famílias da região. Dessa vez, foram osMayfield que ofereceram um jantar.

— Tem certeza de que esse convite me inclui, papai?

— Sim, querida. Seu nome está aqui. E por que não estaria?

— Acho que lorde Mayfield não simpatiza muito comigo.

— Pode ser. Mas ele não convidaria o restante de nossa família e a excluiria.

— Talvez o convite tenha partido de lady Mayfield, e não do filho — argumentouLucy, sem tirar os olhos de seu bordado.

— Suponho que eu deveria recusar esse convite, mas até que seria divertidobeliscar os bigodes do barão.

— Hannah! — advertiu a mãe, chocada. — Prometa que não fará nenhumaprovocação. Prometa!

— Está bem, mamãe. Prometo me comportar. Talvez minha simples presença jábaste para desagradá-lo.

— Gostaria de lembrá-la de que você deve servir de exemplo para Katherine e

outras jovens paroquiana.Mais divertida do que apreensiva sobre o jantar no solar dos Mayfield, Hannah

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aguardou ansiosa pelo evento. Sempre considerava tais situações oportunidades infinitaspara seu passatempo predileto: observar as pessoas atuando na comédia da vidahumana.

Procurou afastar de si toda e qualquer nota de importância ligada ao fato de quetodas os membros da família Glosson estariam presentes, inclusive um certo visconde.

Quando lady Mayfield recepcionou seus convidados antes de se dirigirem à sala de jantar, Hannah ficou surpresa e maravilhada ao saber que seria acompanhada por lordeAmesbury.

— Seus alunos terminaram o estudo sobre Henrique V? — indagou o visconde,fazendo alusão à matéria que estava sendo ministrada durante a visita que ele e a mãefizeram à escola.

— Oh, sim! Faz bastante tempo. Estou surpresa por ainda se recordar disso.

— Por quê? Considera-me um bronco que não consegue sequer lembrar o título deuma peça?

— Não. Não foi isso que quis dizer, milorde. Como pode pensar uma coisa dessas.

— Ah, agora a professora está me recriminando por comportamento impróprio... —Sorrindo, continuou: —Henrique V deveria ser uma de minhas leituras favoritas, emboraeu o prefira como príncipe Hal, em Henrique IV.

Continuaram conversando, animados, sobre os méritos das duas peças, emboravez ou outra a etiqueta os forçasse a dar atenção a outras pessoas.

Também estava atenta ao cavalheiro sentado a seu lado. Quando o ombro delevez ou outra roçava o seu, sentia aquele calor familiar. Não havia como negar que ovisconde era bastante atraente.

Em dado momento, Hannah estranhou quando lady Mayfield sinalizou para asdamas se retirarem.

Quando os cavalheiros se juntaram às damas, não era o barão Mayfield quedominava a atenção de lady Olívia, mas sim o visconde. Ao sutil convite da beldade, elese aproximou.

Hannah percebeu que a pontada forte que sentira no peito era ciúme. Contudo,tentou se convencer de que apenas queria continuar aquela conversa interessante deminutos atrás. No caminho para casa, a Sra. Whitmore comentou:

— Você e lorde Amesbury pareciam estar se entendendo bem, Hannah.

— Sim. O visconde estava até amável, para minha surpresa. —O que a faz achar tão surpreendente?—Katherine quis saber.

— Sempre o achei um cavalheiro muito amável.

— Sim, suponho que para você tenha sido assim. Porém, meus encontros commilorde não foram iguais.

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Não imaginava por que, mas não estava disposta a falar sobre o visconde com suafamília. Queria guardar as lembranças daquela noite durante algum tempo apenas para si.

Capítulo XI

No início de março, em uma tarde de sábado, quando Hannah deixava à CroftonParish Day School avistou uma menininha sentada nos degraus da escada,choramingando. Ao se aproximar percebeu que se tratava da pequena Patsy Tettle, umadas alunas de Jane.

— Patsy? O que houve, querida?

A criança levou as mãozinhas ao rosto, rompendo em soluços.— Conte-me o que aconteceu. Quem sabe não posso ajudá-la.

— Não... ninguém pode... É... minha mãe.

— Ela está doente?

— Está morrendo, Srta. Whitmore.

— Tem certeza? Pessoas doentes também ficam boas.

— Havia muito sangue. Vovó não queria que eu visse, mas vi. Mamãe está

morrendo.Hannah sentou-se ao lado dela e a puxou para si.

— Não sabemos, Patsy. Só Deus pode saber.

— Mas havia sangue! E estou assustada, Srta. Whitmore. Muito assustada...

— Isso é normal. Eu também estaria.

— Sério? — Aquela idéia bizarra pareceu distrair a criança por um momento.

— Sim. Agora, gostaria que a levasse para casa? Parece que logo, logo vai chover.

— Sim, por favor.

— Espere apenas um instante. — Hannah voltou para pedir a Jane que informasseao reverendo onde estaria e que lhe enviasse uma carruagem mais tarde.

Meia hora depois, chegaram à residência dos Tettle. A residência consistia de umgrande compartimento que servia de cozinha, sala de jantar, sala de estar e dormitóriopara alguns membros da família, e outro menor nos fundos, de onde surgiu uma mulher de cabelos grisalhos.

— Patsy? Oh, desculpe-me — disse a senhora, diante de Hannah. — Você é aprofessora, não é?

— Uma delas. Acompanhei Patsy até aqui, pois estava muito aflita por sua mãe.

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— Pobre querida... — A avó abraçou a menina.

— Mamãe está bem? Posso vê-la?

— No momento ela está repousando, Patsy.

Mas Hannah percebeu que aquilo se tratava de um subterfúgio.

— Você já é uma mocinha, não é mesmo? Quero que vá ficar com a Sra.Thompson e ajudá-la a tomar conta de seus irmãozinhos.

Está bem?

Patsy assentiu. Quando a criança se foi, a avó virou-se para

Hannah.

— Muito obrigada, senhorita...

— Whitmore. Há algo que eu possa fazer? Patsy está assustada, achando que a

mãe vai morrer.

A senhora idosa deixou-se cair sobre uma cadeira, desesperada.

— Receio que minha filha não passe desta noite.

— Nesse caso, precisamos chamar um médico.

— Ele já esteve aqui. Disse-me apenas aquilo que eu já sabia.

— E o marido dela?

— Assim que ouviu o médico, ficou um pouco lá dentro com Molly e depois saiucom um brilho colérico no olhar.

— Sabe para onde foi?

— Não. Mas pude ver que tinha idéias terríveis em mente.

Hannah puxou uma cadeira e sentou-se ao lado dela.

— Ouça, senhora...

— Hacket. Sou a mãe de Molly.

— Deixe-me fazer algo por favor.— Não há o que fazer, meu bem. Está tudo nas mãos de Deus. E parece que ele

não está disposto a se esforçar.

— O que houve? Ela apenas adoeceu... ou...

— Molly esteve na casa da viúva Stanton anteontem.

— Ah, não!

Hannah sabia que a Sra. Stanton tinha uma pequena cabana algumas milhas além

de Crofton. Mexia com raízes e ervas e oferecia poções para todos os males, desdeverrugas até doenças mais graves. Também era conhecida por ajudar mulheres jovensque se achavam engravidavam fora do casamento.

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— Mas por quê? A Sra. Tettle é casada e...

— Tobias Tettle não era o pai.

— Não! Não pode ser verdade. Eu os via juntos e... Jamais poderia imaginar que...

— Mas é isso mesmo. Molly contou-me tudo ontem, quando começou a sangrar 

outra vez. Aconselhei-a a não dizer nada a Tobias, mas acho que ele a fez falar.

— E por quê?

— Minha filha me falou que não poderia ter um bebê que não fosse de Tobias, ecom certeza não desejava ter um filho daquele patife, Mike Logan.

— Molly tinha certeza de que a criança era de Mike Logan?

— Sim. Ela e Tobias não tinham... bem., você sabe... — A Sra. Hacket fez umapausa, um pouco embaraçada. — Não estiveram juntos, entendeu? Céus, não deveria

estar falando essas coisas com uma moça solteira.— Não se preocupe. Não sou tão inocente assim. Sei muito bem de onde vêm os

bebês. Mas ainda não entendi uma coisa: a Sra. Tettle e o Sr. Logan não eram...

— Não! O desgraçado a forçou.

— Céus! Quer dizer que ele a estuprou?

— Quase isso. Ameaçou-a, dizendo que ela e Tobias perderiam os empregos,caso não cedesse.

— Sinto muito, Sra. Hacket.

Hannah ficou calada por um instante, tentando imaginar a dor que aquela senhoraestava sentindo. Em seguida, perguntou:

— Tem idéia de para onde Tobias foi?

— Não estou certa. Mas suponho que tenha ido atrás daquele verme.

Naquele instante, ouviu-se um gemido vindo do outro ambiente e quase ao mesmotempo uma batida na porta. Era o cocheiro do reverendo que viera buscar Hannah. Ela sedespediu da Sra. Hacket, prometendo voltar logo.

No caminho para casa, o cérebro de Hannah fervilhava, tentando achar o quepoderia fazer para evitar que Tobias Tettle desgraçasse ainda mais sua jovem família. Averdade era que não tinha a menor noção de por onde começar. Talvez seu pai...

Então, de súbito, lhe ocorreu que lorde Amesbury havia lhe dito certa vez quetrabalhara com os Tettle. Com certeza também conhecia o tal Logan. Decidida, instruiu ococheiro a rumar para a mansão dos Glosson.

Knowlton fitou-a surpreso ao vê-la parada à soleira àquele horário.

— Srta. Whitmore!

— Preciso falar com lorde Amesbury.

— Ele e Sra. Stimson estão jantando, senhorita.

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— Diga-lhe que é uma emergência. Peça-lhe que venha falar comigo agora, por favor.

— Sim, senhorita.

Theo olhou para a porta da sala de jantar aberta.

— O que está acontecendo, Knowlton?

— A Srta. Whitmore está aqui, milorde. Deseja lhe falar com urgência.

— Encaminhe-a à biblioteca. Queira me desculpar, titia. — Pousando oguardanapo, levantou-se e foi ao encontro da filha do reverendo. — Boa noite, Srta.Whitmore.

— Sinto muito por perturbá-lo na hora do jantar, milorde, mas isto não podiaesperar.

— Por favor, sente-se e me explique como posso ajudá-la.— Não sei como ou mesmo se poderá, mas precisava tentar. Theo se acomodou m

frente a ela e cruzou as pernas, com toda a calma.

— Bem, até que a senhorita me esclareça melhor, nenhum de nós dois saberá, nãoé?

— Sinto muito. É que... um dia me falou que conhecia os Tettle, não é mesmo?

— Molly e Tobias. Sim, sem dúvida. Aconteceu algo a um deles?

— Algo muito, muito terrível.

Theo dirigiu-se até um aparador e apreciou encontrar uma jarra com água ao ladodas várias garrafas de licor. Verteu um copo e o ofereceu a ela.

— Obrigada. — Hannah sorveu o líquido cristalino com avidez.

— Agora, suponho que deva me contar tudo desde o início.

Quando ela terminou, Theo estava atordoado. Deveria ter previsto algo assim.Apoiou os cotovelos nos braços da poltrona e esfregou o rosto.

— Devia ter imaginado. Inferno! Eu sabia o que estava acontecendo e deixei

escapar de minha mente... sabia que tipo de homem Logan era. Pobre Molly!

— Acho que não podemos fazer mais nada por Molly. Mas talvez possamos evitar que o Sr. Tettle prejudique ainda mais a família dele.

— Certo. Vou procurar Tobias. Talvez seja melhor a senhorita voltar para a casados Tettle e esperar por ele... por nós. Eu a levarei para sua residência depois.

— Primeiro, preciso passar em casa.

Theo não imaginava por onde devia começar a procurar Tettle, porém sabia onde

poderia encontrar Logan. O homem era um tipo desprezível, mas devia avisá-lo do perigoque corria. Iria à Wild Boar, uma taverna conhecida por atender a uma clientelaturbulenta.

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A chegada do lorde ao estabelecimento provocou um silêncio profundo. Usandoum avental sujo sobre a enorme barriga, o proprietário se aproximou.

— Em que posso ajudá-lo, milorde?

— Estou procurando por Michael Logan.

Naquele instante percebeu uma intensa troca de olhares entre os presentes.

— Parece que ele não está aqui — disse o taverneiro, fitando ao redor.

— É muito importante para mim encontrá-lo. É para o próprio bem dele.

— Ahn... ele esteve aqui há alguns minutos — um homem comentou.

— Acho que foi dar uma voltinha lá atrás — acrescentou outro. Theo supôs que"dar uma voltinha lá atrás" significava satisfazer uma certa necessidade biológica.

— Mostre-me o caminho — ordenou Theo ao taverneiro, que de pronto

providenciou uma lamparina.Vários clientes seguiram os dois. Não havia nenhum sinal de Logan e, para alívio

de Theo, nenhum sinal de Tobias Tettle também.

— Aqui! — gritou alguém, alarmado.

A luz da lamparina revelou o horrível achado. A alguns metros de distância dataverna, enrolado em uma posição fetal, jazia o corpo de Michael Logan. Próximo aomorto encontrava-se um bastão de madeira sujo de sangue.

— Deus, cheguei muito tarde... — afirmou Theo, percebendo que Logan foraassassinado com extrema brutalidade. Aquilo era o resultado de uma raiva insaciável.

Um dos homens desvirou o corpo inerte.

— Alguém fez um serviço e tanto com ele.

— Quem poderia ter feito isso?

—Conheço pelo menos vinte que iriam gostar de fazê-lo. Logan era um mau-caráter.

— Sim, mas um assassinato... — observou o taverneiro.

— Bem, conheço alguém que teria motivos suficientes para cometer tal ato —disse um outro cliente.

Todos pararam, e o taverneiro levantou a lamparina para iluminar a face dointerlocutor.

— E de quem se trata?

— Tobias Tettle. Logan estava assediando a mulher dele.

— Não diga — murmurou um dos presentes.

Não ter conseguido evitar aquela tragédia fez brotar um sentimento doloroso nopeito de Theo. Não que se importasse com Logan. Era Tobias e Molly que o

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preocupavam.

Dirigiu-se ao taverneiro:

— Notifique o xerife e o magistrado. Deverá ser feita uma investigação.

Mais tarde, ao entrar no apartamento dos Tettle, encontrou Hannah sentada à

mesa, acompanhada de uma senhora que ela apresentou como Sra. Hacket, a mãe deMolly.

Lorde Amesbury lembrou-se de tê-la conhecido em tempos mais felizes, quandopasseava ao lado da filha e do genro num domingo à tarde. A empregada da professoratambém estava sentada ao lado delas, com um olhar um pouco aturdido. As três bebiamchá. A Sra. Hacket tinha uma menina de uns oito ou nove anos aninhada nos braços, eHannah segurava no colo um menino cinco.

— Ele está aqui? — Theo indagou.

— Sim. — Hannah entregou o menino para a empregada. — Chegou aqui umpouco desgrenhado, mas parecia calmo e determinado. Não pronunciou uma únicapalavra. Acho que nem sequer nos enxergou. Seguiu direto para o quarto, para ficar aolado da esposa, e não saiu mais de lá.

— Ela está...

— Faleceu há mais ou menos meia hora.

— Não! — Theo sentiu um desejo enorme de tomar aquela mulher em seus braçose enterrar a própria dor naquela massa de cabelos perfumados. Mas um cavalheiro jamaisfaria algo semelhante.

Hannah tocou-lhe o braço e falou num tom suave:

— Milorde? Acho que deveria saber que há... manchas de sangue no casaco dele.

— Isso não me surpreende. — Theo a puxou para um canto afastado e explicou-lhe tudo que ocorreu na Wild Boar.

— Era isso que eu temia.

— Eu poderia ter evitado...

— Está se culpando? Não me lembro de ouvir seu nome como o perpetrador dessas ações odiosas.

Ele achou graça.

— O que é preciso fazer? O xerife e o chefe de polícia logo estarão aqui.

Nem bem terminara de falar e ouviu-se uma batida na porta. Theo abriu-a edeparou com os dois oficiais da lei. O xerife aparentava estar espantadíssimo.

— Boa noite, lorde Amesbury. Não esperava encontrá-lo aqui.

— Pelo bem dessas crianças, xerife, vamos tratar deste caso com discrição.Aguarde aqui fora — disse Theo num tom que mais se assemelhava a uma ordem do que

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a um pedido.

— Bem, isto não é certo... mas está bem.

Lorde Amesbury entrou no quarto escuro, iluminado apenas por uma única vela. Ocheiro de sebo incandescente misturava-se ao cheiro de morte que impregnava o

ambiente. Tobias Tettle encontrava-se ajoelhado ao lado do corpo inerte de Molly, aindasegurando sua mão. Pareceu sentir a presença de Theo. Ergueu o rosto banhado emlágrimas. Tinha a barba por fazer e parecia pelo menos vinte anos mais velho desde aúltima vez que o vira.

— Minha Molly se foi...

— Eu sei. — Theo colocou uma mão no ombro do rapaz.

— Mas fiz o cretino pagar pelo que fez. Lamento tanto, Molly! Sei que não gostadesse linguajar. Mas juro, querida, ele nunca mais fará aquilo a ninguém.

— Venha, Tobias. Está na hora de se despedir de Molly. Você tem de vir comigo.

— Ir com você... Suponho que o xerife já esteja aqui, não é?

— Sim. Espera lá fora. Você pode se despedir de sua família, se quiser.

— Adeus, minha querida.—E Tettle se debruçou sobre o corpo da mulher.

Na sala, a menininha correu ao encontro do pai e passou os braços magros aoredor da cintura dele.

— Papai!

O irmão se uniu a eles depressa. Tettle ajoelhou-se junto aos filhos. Lágrimasescorriam-lhe dos olhos, enquanto os beijava na testa.

— Patsy, agora você precisa tomar conta de Toby e Jem para mim. Ouviu?

— Sim, papai.

— Terei de ficar fora por algum tempo. Mas lembre-se sempre de que te amo. Amotodos vocês. — Em seguida, foi até o berço e beijou o bebê. Despediu-se dos demais,ergueu a cabeça e encarou Theo.

— Estou pronto.Em minutos, o visconde estava de volta. Olhou para as três crianças. Hannah

podia ver o dilema estampado no belo rosto.

— A Sra. Hacket e eu já acertamos tudo, milorde. Levarei as crianças para aparóquia por alguns dias.

— Muito bem.

A Sra. Hacket juntou alguns escassos pertences dos netos e os colocou numasacola de pano. Para surpresa de Hannah, lorde Amesbury apanhou o bebê do berço e oentregou a Elsie. Depois, segurou o outro menino pelo braço e apanhou a bolsa.

— Pronta? — perguntou a Hannah, que segurava Patsy pela mão.

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

De súbito, a menina se soltou e correu para a avó.

— Vovó? Eu preciso ir? Não posso ficar com você? A Sra. Hacket abraçou agarotinha.

— Não, querida. Vá agora com a Srta. Whitmore. Eu os verei amanhã.

— Promete?

— Prometo.

As crianças, emocional e fisicamente exaustas, dormiram quase de imediato.Hannah, sentada ao lado do visconde Amesbury, sentia a todo instante sua presença viril,quando os solavancos da carruagem os aproximavam ainda mais.

— Quero lhe agradecer, milorde.

— Não há necessidade. Para ser franco, eu é que lhe agradeço por ter tornado as

coisas mais fáceis para mim e para a família de Tettle.— O que vai acontecer com eles agora? Quero dizer, as crianças e a Sra. Hacket.

— Não sei.

— Seria uma tristeza separá-los, milorde.

— Sem dúvida.

Ao deixar Hannah com seus pais, Theo se despediu.

Ocorreu-lhe que a maioria dos homens de sua posição social lavaria as mãos em

relação à família Tettle, mas estava longe se ser alguém assim.

Capítulo XII

Tobias Tettle ficaria preso na cadeia de Crofton até a próxima reunião do tribunal,quando o juiz itinerante viesse à cidade para resolver seus assuntos. Após uma conversa

com a Sra. Hacket, o reverendo havia solucionado o problema da avó e das crianças.— A Sra. Hacket foi casada e enviuvou duas vezes. Liam Barclay é o filho mais

velho do primeiro casamento dela.

— E Barclay está disposto a ficar com eles? — Hannah ficou surpresa e feliz aomesmo tempo.

— Sim. Após perder seu único filho alguns anos atrás, Liam pareceu gostar daidéia de ter crianças por perto outra vez.

— E sobre Patsy freqüentar a escola?

— Concordou. Disse que seria interessante ter alguém na família que saiba ler eescrever.

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

— Bem, parece que essa história teve um final feliz.

— Estranho como uma desgraça, às vezes, pode trazer alguns benefícios...

Nos dias que se seguiram, Hannah não viu o visconde Amesbury. Ouvia falar dele,claro. Aquele cavalheiro parecia ser o tópico favorito dos comentários onde quer que ela

estivesse. A aparência impecável, a figura gloriosa sobre uma bela montaria, os modoscorteses, a facilidade de se comunicar com as pessoas agradavam a todos. Os cidadãoso elogiavam e o julgavam um verdadeiro representante de sua classe.

"Pois sim!", Hannah pensou, descrente. Até o momento não dera um passo parasatisfazer as legítimas reivindicações dos operários de sua indústria. E até onde ficarasabendo virará as costas para a família Tettle sem ao menos olhar para trás.

Porém, era forçada a admitir que o lorde a ajudara no pior momento daquela crise,e se tratava de empregados de Mayfield, não dos Glosson.

O falatório local também a informou de que o Sr. Moore retornara à mansão.Imaginou que os dois cavalheiros elegantes deveriam estar deveras envolvidos comeventos esportivos para se preocupar com temas tão banais. Também soubera que ladyOlívia Sanders e a Srta. Anne Bridges estavam visitando alguns parentes em Manchester.

A questão era que o atraente dono da tecelagem era um enigma. Pareciainteressado em fazer algo para melhorar a vida dos trabalhadores, entretanto, nassemanas e nos meses que se sucederam desde sua chegada a Crofton, houve poucasmodificações nesse sentido. Por outro lado, quatro crianças novas se matricularam naCrofton Parish Day School. Os pais de três delas trabalhavam na indústria têxtil dos

Glosson, e o outro era filho de um tecelão autônomo que também trabalhava para ovisconde. Hannah desejou saber se lorde Amesbury tinha alguma participação nisso.

— É um começo, Jane.

— Mas não imagina por que eles apareceram agora, justo quando faltam poucassemanas para terminar o ano letivo, Hannah?

— Não. Mas isso não importa.

— Arrisco-me a dizer que lorde Amesbury está por trás disso.

— Acredito que milorde não tenha feito objeção, mas também não deve ter movidouma palha. Para ser sincera, acho que o visconde não se envolveu nem de uma forma,nem de outra.

— Está sendo severa demais em seu julgamento.

Durante o inverno e começo da primavera, Hannah freqüentou, vez ou outra, asreuniões da Crofton Corresponding Society. A maioria das ocasiões ia com Henry Franklinou acompanhada da empregada.

Certo dia, ao chegar em companhia de Elsie para a sessão daquela noite, sentiu o

clima um pouco tenso.

O presidente pediu ordem e começou pela pauta habitual. De repente, um homem

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

ergueu-se no meio do salão, falando:

— Sr. presidente, sugiro que suspendamos a ordem costumeira para ouvir aversão de Jason Osborn sobre o que aconteceu a sua filha hoje na Tecelagem Glosson.

— Muito bem! Muito bem! — vários outros concordaram. Logo um senhor um

pouco nervoso, trajando uniforme de operário, postou-se diante deles.— Minha pequena Bess... ficou com a mão presa nas engrenagens de um tear.

— Diga o porquê — gritou uma mulher.

—Já era tarde. Bess tem só sete anos. Estava limpando os teares desde as seis damanhã. Ficou cansada e dormiu. Benson, o supervisor do segundo andar, aplicou-lheumas chicotadas... Ela se assustou, tropeçou e aconteceu a desgraça. As engrenagensesmagaram sua mãozinha. Então, chamaram o médico. Eu e minha mulher tambémfomos chamados.

— E o que aconteceu? — quis saber uma mulher sentada à frente.

— O médico... amputou a mão dela! Hannah ofegou, horrorizada.

A voz de Jason ficou embargada, e os olhos, vermelhos. Em seguida, recuperandoo controle, continuou:

—Foi necessário. Pude constatar. Mas minha pobre Bess... Que tipo de vida levaráagora? Que homem irá querer desposá-la, quando crescer? — Seu desespero geroumurmúrios gerais de condolência e indignação.

Hannah estava perplexa e furiosa com o que acabara de ouvir. Ergueu-se quasepor impulso e falou:

— Sr. presidente! Antes de mais nada, gostaria de expressar meus sentimentospara com a família Osborn. Porém, devo salientar que foi uma estupidez, um acidentedesnecessário. Não precisava ter acontecido. A raiz desse problema reside no fato de osproprietários das indústrias têxteis e seus administradores não pensarem em nada alémde seus lucros. São os principais responsáveis pelo que acontece a inocentes como essapobre menina. Sem aprovação tácita de seus superiores, supervisores como Logan eBenson jamais ousariam maltratar uma mulher ou uma criança!

— Ela está certa!

Com mais palavras de aprovação, várias pessoas agradeceram a Hannah por ter falado. Todavia, após se acalmar um pouco, sentiu-se um pouco constrangida por suaintrepidez. Seus argumentos eram verdadeiros, mas a intuição lhe dizia que se excederade novo.

No dia seguinte, Henry Franklin foi esperá-la na saída da escola. Jane ocumprimentou, calorosa:

— Sr. Franklin! Que surpresa agradável!Hannah sentiu uma pontada de inveja da felicidade óbvia da amiga diante dele. Já

teria se sentido assim em relação ao sexo oposto? E por que, em nome de Deus, a

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

imagem do visconde lhe surgiu de repente? Meneou a cabeça, aborrecida.

— Vim acompanhar essas duas beldades até em casa — disse o advogado,guiando-as em direção à carruagem. — E também porque preciso falar com a Srta.Whitmore.

— Ah... Bem, posso ir embora sozinha. — Jane parecia desanimada.— Nada disso! — disse Franklin. Jane protestou:

— Estamos em Crofton, não em Londres, Manchester ou...

— Não me faça essa desfeita, Srta. Thomas. — Henry estendeu-lhe a mão,reforçando o convite.

Hannah subiu no veículo e se acomodou no assento oposto. Quando Franklin sesentou ao lado de Jane, pôde perceber o brilho de prazer nas faces da amiga.

— Bem, pode começar, Henry.— Ouvi falar sobre a reunião de ontem à noite, Hannah.

— Sendo assim, já está a par do que aconteceu àquela pobre criança. E apenasporque algumas pessoas querem ficar cada vez mais ricas, sem se importar com amiséria dos outros.

— Hannah, está exagerando.

— Tem certas coisas que não se pode engolir.

— Sim, sei disso. Contudo, estou vindo da Tecelagem Glosson, e aconteceramcoisas que você precisa saber.

— Tais como?

— O visconde Amesbury demitiu o administrador, o secretário e todos ossupervisores da tecelagem esta manhã.

— Ele o quê?!

— O incidente com a filha dos Osborn foi o principal motivo, mas milorde já vinhainvestigando esses homens há bastante tempo.

— É mesmo? — A entonação era um misto de surpresa e curiosidade.

— Para falar a verdade, acho que a investigação sobre a morte do irmão dele foiprejudicada pela atitude que o visconde tomou esta manhã, mas Theo acha que já eratempo de agir em relação a outros temas.

Hannah percebeu que Franklin referia-se ao visconde pelo primeiro nome. Quandofoi que aqueles dois se tornaram tão íntimos?

— Ah, é?

— Sim. Conversamos bastante, e creio que você devia saber que o visconde estáde fato interessado em fazer algo pelos operários.

— Então o que ele está esperando?

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— Você sempre quer tudo para ontem. Tenho certeza de que, logo que o lordeadquirir as informações de que precisa, agirá com justiça e firmeza.

— Estou vendo...

— Levando em conta suas críticas na reunião da noite passada, achei que deveria

ficar sabendo o que aconteceu hoje, Hannah.— Obrigada, Henry.

Os três permaneceram calados pelo resto do trajeto até a paróquia. Hannah sedespediu deles e entrou, imersa em conjecturas.

Mais tarde, após o jantar, sentou-se na sala de estar ao lado dos familiares. Oreverendo mencionara com aprovação as atitudes tomadas pelo visconde naquelamanhã. De repente, a Sra. Warren, a empregada, entrou silenciosa e se aproximou deHannah:

— O jovem Britton está na porta da cozinha, senhorita. Ele insiste em falar-lhe.

— Benjamim?

— Sim. Quer que eu o mande embora?

— Não, não. Vou atendê-lo.

Hannah encontrou o irmão de Elsie bastante agitado.

— O que aconteceu, Benjamin?

— Srta. Whitmore! Os Osborn e outros companheiros... estão indo... pegar lordeAmesbury.

A tensão se apoderou dela.

— O que significa "pegar"?

— Estão pretendendo lhe dar uma surra. Fazê-lo pagar pelo que aconteceu com apequena Bess.

— Santo Deus! Temos de fazer algo. Onde? Quando? — Percebeu que estavabalbuciando de pânico e medo. Respirando fundo, tentou ordenar o raciocínio.

— Os Osborn e os outros não foram trabalhar esta manhã. Ficaram bebendo. Meupai ouviu a conversa deles e me mandou avisar o visconde, mas ele não estava em casa.

— Talvez os Osborn não o encontrem também.

— Papai ouviu-os dizer que iriam esperá-lo na estrada para Horton.

— Horton? — Tratava-se de um vilarejo a cinco milhas de Crofton. — Será que oSr. Moore está com ele? Se estiver, o visconde pode escapar ileso.

— Não. Ele foi para Manchester. Soube pelo cavalariço, já que o mordomo não

quis me dizer nada.— Compreendo. Você é um rapaz bem diligente, não é, Benjamin?

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— Sim, senhorita. Mas temos de impedi-los.

— Precisamos pelo menos tentar. Mas teremos de agir com discrição. Não temcabimento deixar os Osborn fazer justiça com as próprias mãos. Acho que possodissuadi-los dessa idéia maluca, se você me ajudar.

— Conte comigo, Srta. Whitmore.Hannah mandou Benjamim ao estábulo ordenar três cavalos selados, explicar a

situação a Noel, o cavalariço do reverendo, e pedir que os acompanhasse. Voltou até asala de estar e chamou a atenção do pai. Em poucas palavras, explicou-lhe o queacontecera.

— Por Deus, Hannah! Não pode sair por esses matos à noite sozinha. É muitoperigoso.

— Papai, eu preciso. A culpa foi minha, não vê? Sei que o Sr. Osborn ouvirá meus

argumentos. São pessoas boas. E Benjamim Britton irá comigo.— Bennie é apenas um menino!

—Benjamin tem quase um metro e oitenta de altura e já trabalha como um homem.Além do mais, levarei Noel também.

O pai anuiu, relutante, e Hannah subiu para vestir um traje de montaria. Medo eansiedade se misturavam em seu íntimo. Imaginou cenas horríveis do viscondedesamparado e vulnerável.

Uma vez a caminho, Noel disse:

— O lugar mais provável para uma emboscada na estrada para Horton é aquelaregião íngreme além da Fazenda Newland.

Hannah assentiu e acelerou o trote. Até mesmo bravo e transtornado como estava,duvidava que o Sr. Osborn pretendesse matar o visconde, mas fatalidades acontecem.Uma imagem de lorde Amesbury inanimado no chão flamejou em sua mente, eexperimentou uma horrível sensação de perda.

— Por favor, vamos mais depressa!

— Não podemos forçar muito os cavalos, senhorita. Temos sorte de a noite estar enluarada.

Naquele instante, algumas nuvens encobriram a lua, lançando sombras por todoslugares. Mas foi só por alguns momentos. Logo a estrada se iluminou outra vez.

Cavalgaram o mais rápido que puderam, mas os minutos pareciam intermináveispara Hannah. Sabia que ainda levaria uma meia hora ou mais até alcançarem o lugar queNoel mencionara.

De repente, ao contornarem uma curva, um de seus maiores temores se tornou

realidade. As sombras dificultavam a perfeita visualização da cena, porém, Hannahdistinguiu a figura de um homem no solo e três outros estavam sobre ele. Um delesempunhava um bastão de madeira no ar.

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— Não! — gritou, horrorizada.

Cravando os calcanhares nos flancos do cavalo, galopou direto para cima daqueleque segurava o bastão.

Capítulo XIII

As duas semanas anteriores foram extenuantes para Theo. Sabia que osenvolvidos no desvio de fundos da tecelagem deviam ser demitidos, em especial, Taggert,que parecia ser o mentor de tudo. Entretanto, desejava fazer uma transição tranqüila, o

que significava encontrar pessoas certas para substituir os supervisores. E afinal vinhamroubando havia anos que alguns dias a mais ou mesmo semanas não fariam diferença.

Pelo menos essa era sua intenção até o incidente com a criança dos Osborn.Naquela ocasião estivera fora até tarde tratando de algumas melhorias que já deveriamter sido feitas nas fazendas dos arrendatários e, ao voltar para casa, encontrou oadministrador da Tecelagem Glosson um tanto agitado, esperando por ele.

— O que aconteceu, Taggert?

— Uma de nossas jovens trabalhadoras sofreu um pequeno ferimento, milorde.

— Um pequeno ferimento?

— E... Parece que dormiu e tropeçou sobre a máquina. Uma das mãos precisouser amputada.

— Chama isso de "pequeno ferimento"? Por Deus, Taggert! Que idade tem essa jovem?

— Sete... ou oito.

Uma criança! E trabalhando perto de máquinas perigosas!

 — Ainda há mais novos do que ela. Tanto na tecelagem quanto nos campos.

— O fato de haver não significa que seja certo. Você disse que a menina dormiu?

— Sim, milorde.

— Fazia quantas horas que estava trabalhando? Taggert cocou a nuca.

— Ahn... Não estou certo. Suponho que desde as seis da manhã. Se chegaremdepois disso, são punidos.

Theo não respondeu de imediato. Àquele horário dormiria a sono solto, e umacriança tão pequena estava preparada para mais uma dura jornada de trabalho.

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— O problema, milorde, é que Osborn é... um pouco exaltado. Não sei o que serácapaz de fazer.

— Conversou com ele?

— Não. Osborn e a esposa levaram a filha direto para casa.

— Muito bem. Você irá procurá-lo, oferecer seus préstimos e lhe assegurar que amenina terá toda a assistência.

— Quer que eu vá visitar um tecelão em uma choupana qualquer? — inquiriu.

— Isso mesmo.

— Mas não tenho muito contato com os empregados. Os supervisores cuidamdessa parte... E quanto acha que isso irá custar? Não preciso lhe dizer que o médico vaiquerer os honorários adiantados antes de cuidar de uma fedelha da tecelagem.

— Tenho certeza de que nossos lucros podem bancar o tratamento da menina.O administrador encarou Theo.

— Bem, suponho que sim...

— Posso lhe assegurar que sim. Mas o que importa agora é falar com os pais dapequena. Eu iria, mas tenho um negócio inadiável para resolver agora. Informe-os de queirei vê-los amanhã.

— Sim, milorde.

Taggert não ficou nada satisfeito com aquela missão, mas não ousaria objetar umaordem do patrão.

Naquela noite, não muito distante de Crofton, em uma hospedaria respeitável,Theo reuniu-se com outros proprietários de indústrias têxteis em Derbyshire e Lancashire.Dez a doze cavalheiros lotavam a saleta de estar. Kitchener, Mayfield, o Sr. Bridewell e oSr. Childress deram início à reunião.

— No sentido exato da palavra, este encontro seria chamado de ilegal — diziaChildress, um homem baixo, de meia-idade, corpo roliço, face redonda e olhos escuros.— Mas vários dos que aqui se encontram são magistrados. Quem poderia fazer algo

contra nós?

— Certo! — concordou lorde Kitchener. Ele também era de meia-idade, comcabelos grisalhos que lhe conferia um certo ar de confiabilidade.

— Bem, vamos aos negócios — disse Bridewell. — Temos de apresentar um front 

unido, sobretudo após o episódio em Pentrich.

Naquele momento, Mayfield dirigiu um olhar cético a Theo, que manteve umapostura interessada, mas recusou-se a concordar de imediato.

— Sim. Não devemos nos submeter às demandas irracionais de agitadores —disse Childress.

Os demais presentes concordaram.

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— E o que me diz das reivindicações de nossos empregados? — perguntou Theo.

Lorde Kitchener assumiu o tom condescendente de um professor em relação a umaluno ignorante.

— Suponho que as achará absurdas.

— Instigadas por salafrários que gostam de agitar multidões — acrescentouBridewell.

— Não me parece.

— Você é muito novo neste ramo, Amesbury. — Kitchener usava o mesmo tom deminutos atrás.

— É verdade. Entretanto, não sou novato na arte de dirigir gente para alcançaremum objetivo comum.

— Não estamos no Exército, Amesbury. — Mayfield meneou a mão.— Certo. Porém, muitas dessas pessoas com quem trabalhamos foram soldados

no campo de batalha.

— Ex-soldados! — escarneceu Bridewell. — Corja da pior espécie.

— E não trabalhamos com eles. — Mayfield fez um esgar. — Eles trabalham paranós. Coloque isso na cabeça.

Sabendo que dificilmente concordariam com seu ponto de vista, Theo se calou,limitando-se a ouvir, entediado, os apelos para que fossem tomadas medidas mais

enérgicas a fim de conter a revolta dos operários.

— Bem, cavalheiros, estamos todos de acordo? — Childress indagou, por fim.

Um burburinho coletivo de aprovação percorreu o recinto.

— Amesbury? — incitou-o Childress.

— Necessito de algum tempo para pensar, cavalheiros.

— Ou fica conosco ou contra nós.

— O que quer dizer com isso, Mayfield? — Theo não disfarçou o aborrecimento.

Childress tentou conter os ânimos:

— Lorde Mayfield está apenas sugerindo que devemos permanecer unidos emnossa posição. Como representante do maior empreendimento têxtil da região, você, emparticular, apreciará a necessidade de, digamos assim, colocar um freio nessa situação.

Theo falou tranqüilidade e firmeza:

— Com o devido respeito, cavalheiros, também vejo como é necessário impormosalgumas mudanças. O mundo está mudando. E acredito que pessoas como nós devam

dar o primeiro passo nesse sentido, da mesma maneira como fizemos ao adotar técnicase maquinado novos em nossas indústrias.

Kitchener deixou escapar um suspiro de exasperação.

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— Não tenho a menor intenção de permitir que um grupo de agitadores me digacomo dirigir meus negócios. A tecelagem é minha. Será administrada a meu modo.

— Certo! — concordaram Mayfield, Bridewell e os demais em uníssono.

Theo tentou outra tática:

— Os antigos gregos nos ensinaram que a única coisa constante na vida é amudança.

—Isso é conversa de revolucionário! — interrompeu-o Bridewell.

O visconde o ignorou.

— Em minha opinião, os líderes de uma nação podem dirigir as modificações parao bem ou para o mal. E essas direções começam com homens como nós.

— O que quer dizer com "homens como nós"? — Childress ficou curioso.

— Não permitirei que ninguém me diga o que tenho de fazer — repetiu Kitchener,teimoso.

— Deixem-no falar — insistia Childress.

De repente, Theo percebeu que se encontrava numa espécie de encruzilhada.Aquela altura dos acontecimentos, era de suma importância convencer aqueles nobres aficar de seu lado.

— Quero dizer poderosos que controlam a vida de seus empregados. Podemosusar esse controle para criar um mundo melhor... ou cruzar os braços e sofrer as

conseqüências.

—O que está propondo?—Mayfield não escondia a hostilidade.

— A maioria dos trabalhadores quer apenas o que nós queremos: viver comdignidade.

— Eles querem o que é nosso. E não estou disposto a ceder nada! — Kitchener vociferou.

Theo olhou ao redor. A maioria dos presentes parecia concordar com seu opositor,

embora alguns ainda esperassem por sua resposta. Respirou fundo e prosseguiu:— Nenhum de nós perderia tanto assim, e sem dúvida seria melhor para todos ter 

empregados morando bem, bem vestidos e bem-educados.

— Ah! Está mancomunado com a filha do reverendo! — Mayfield apontou-lhe odedo.

— Considerei o ponto de vista da Srta. Whitmore, admito. Embora não compartilhecom seu grau de entusiasmo, mas suas sugestões têm fundamento.

— E trata-se de uma bela mulher! — alguém comentou, em tom de galhofa.

Surpreso com a própria irritação diante daquela simples brincadeira, Theoesforçou-se para manter fleuma.

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— Também andei visitando um certo número de cidadãos em toda a Inglaterra quepossuem fábricas... como os Owen, Whitbread e Wedgewood.

— Um bando de incompetentes.

— Vamos lá, cavalheiros! Não podemos chegar a um consenso? — interveio

Childress.— Vou perguntar mais uma vez — desafiou-o Mayfield. — Está de nosso lado ou

contra nós?

— Nem contra, nem a favor. Pretendo realizar algumas mudanças por minha contaprópria, mas não peço a ninguém para me seguir.

— Santo Deus, visconde! Precisamos ficar unidos! — Kitchener quase gritou.

— Não quer ser um traidor para sua classe, não é, filho? — interveio Bridewell.

— Não imaginei que minha lealdade estivesse em questão.— Não, não... De modo algum. — Childress, mais uma vez, tentava conter os

ânimos.

Pressionado, Theo concordou em considerar o que fora discutido, mas sua decisãofinal seria em prol dos interesses de seu povo. Forçados a aceitar a ambígua resposta dorepresentante da maior indústria têxtil da região, os demais deixaram a reuniãoaborrecidos.

No bar, Theo se encontrou David Moore, que insistira em acompanhá-lo. Ao

retornar à mansão dos Glosson, alguns dias antes, Moore lhe dissera que depois do queaconteceu a Francis, não o deixaria mais andar sozinho à noite.

— Parece que seus companheiros não ficaram muito satisfeitos com o resultado dareunião — Moore falava, no trajeto para casa.

— Tem razão. — E Theo o colocou a par do que acontecera.

—Tome cuidado, amigo. Acho que Mayfield não gosta de você.

Na manhã seguinte, Theo foi visitar os Osborn, mas só encontrou a mãe damenina.

— O Sr. Taggert não os informou de que não precisavam ir trabalhar pelo resto dasemana?

— Sim. Mas meu Jason... como vê, ainda não chegou. — A mulher pareciaapreensiva e assustada. — Não costuma fazer isso, mas está muito transtornado peloque aconteceu com Bess.

Theo expressou seu pesar a Sra. Osborn e assegurou-lhe de que não só seusempregos estavam garantidos como também providenciaria para que a menina tivesse omelhor tratamento.

Antes de sair para a residência dos Osborn, o visconde enviara uma mensagem aTaggert solicitando uma reunião com a presença de seu secretário e todos os

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

supervisores.

Na hora aprazada, acompanhado de Moore e Yardley, dirigiu-se ao escritório doadministrador. Pediu aos companheiros que o aguardassem do lado de fora e, ao entrar,encontrou os sete com uma expressão tensa.

— Permaneçam sentados, cavalheiros. Serei breve.— Gostaria de perguntar o motivo desta reunião inesperada, milorde.

— Suponho que já saiba do que se trata, Sr. Taggert. Estou demitindo todos vocês.Têm uma hora para juntar seus pertences pessoais e deixar a propriedade dos Glosson.

O quê?! O que está querendo dizer?! — Benson o encarava.

— Isso mesmo que ouviu. Não roubarão nem mais um centavo de minha família. Etampouco mutilarão outras crianças.

— Está nos demitindo... assim? Só porque Benson não pôde conter o chicote? —indagou outro supervisor.

— Isso mesmo, e sem referências. E não é apenas por Benson chicotear criançasdesamparadas. Todos vocês estão envolvidos no desvio de fundos. Não vou tolerar maisisso.

— Suponho que precise de provas para essa alegação ridícula — disse Taggert,arrogante.

— Tenho provas suficientes. — Theo olhou para o administrador e o secretário, e

nenhum dos dois foi capaz de encará-lo. — E várias testemunhas que podem confirmar adiferença existente entre a produção atual e a que é relatada nos registros da tecelagem.

— Não queria me envolver em nada disso... eles me obrigaram — lamuriou-se umdeles.

— Cale-se, Trask! Não vê que está tudo acabado?

— Pensei que tudo ficaria bem depois da morte daquele outro.

— Se tem tanta certeza disso, por que não nos entrega à polícia?

— Taggert continuava tranqüilo.— Ainda posso fazer isso — afirmou Theo. — As investigações não estão

concluídas. Quando estiverem, tenha certeza de que tomarei as providências cabíveis.

— Se conseguir nos encontrar — escarneceu um deles.

— Os únicos que não deixarei escapar são os responsáveis pela morte de meuirmão. Eles... ou ele... serão perseguidos até o fim do mundo. Agora, peguem suas coisase desapareçam daqui.

— E o que nos impede de acabar com você agora mesmo? — Benson o desafiou.

— Nós, quem sabe... — disse alguém atrás de Theo, que se virou e deparou comMoore e Yardley, cada um empunhando uma pistola.

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

A discussão acabou, e os sete foram escoltados para fora da propriedade dosGlosson.

Theo ordenou que o maquinário fosse parado e pediu a Yardley e reunisse todosos operários. Homens e mulheres pareciam nervosos e amedrontados. Sabiam que ossupervisores tinham sido demitidos e temiam pelos próprios empregos.

O lorde ponderara sobre suas idéias durante algumas semanas, mas apenasplanejara o que dizer aos empregados na noite anterior.

Começou dizendo que não teriam mais de fazer horas extras e que a jornada detrabalho não excederia os padrões de outras tecelagens. Entretanto, esperava que aprodução continuasse no mesmo nível reportado por Taggert. Em seguida, espantou-osanunciando que a Tecelagem Glosson não empregaria mais nenhuma criança com idadeinferior a doze anos. Porém, as que já estavam empregadas continuariam ganhando meiosalário, desde que fossem para a escola. As que estivessem acima de doze poderiam

optar por trabalhar meio período e estudar o restante do dia. Seriam nomeados novossupervisores. Já ponderava sobre alguns nomes para ocupar algumas posições, mas nãotodas. Convidou os que estivessem interessados nas vagas a se candidatarem. Por fim,mandou-os para casa pelo resto do dia para pensarem e discutirem suas propostas.

Na hora do almoço, na mansão, Theo e Moore comentaram os últimosacontecimentos.

— Quem está pensando em contratar como administrador, Theo? Não deve estar considerando a possibilidade de exercer tal tarefa, não é? Sei o quanto ama trabalhar 

com contabilidade.Theo sorriu.

— Terei de dirigir a tecelagem, pelo menos até encontrar alguém de confiança.Pena que você não está disponível.

— Humm... Mas posso encontrar uma solução. E óbvio que, se der certo, ficará emdívida comigo.

— E se não der?

— Não me responsabilizará por isso.— Muito justo. Vamos ouvir a brilhante solução.

— Meu irmão caçula, Andrew.

— O jovem Andy? Está brincando...

— Era jovem quando fomos para a Espanha, dez anos atrás. Agora está com vintee cinco anos. Trabalha em Londres, na Whitehall, e odeia o serviço burocrático. Quer viver no interior.

— Acha que Andy poderia administrar a tecelagem?— Garanto que sim.

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— Nesse caso, por que não o deixa administrar as propriedades da família?

— Há um administrador trabalhando conosco há quinze anos. Não temos intençãode demiti-lo. Nem Andrew aprovaria uma coisa dessas.

— Bem, se acha que ele estaria interessado...

— Vou lhe escrever uma carta ainda hoje, quando voltarmos de Manchester.

— Santo Deus! Esqueci que iríamos a Manchester! Preciso ir a Horton. Prometiaos tecelões autônomos que lhes faria uma visita hoje.

Moore ficou desapontado.

— Bem, não tem importância. As senhoritas ainda estarão lá amanhã.

— Não, não, David. Você irá. E expresse minhas desculpas a lady Olívia.

— Tem certeza? Pode acontecer algo...

— Pare de se preocupar. Estarei armado, e prefiro ir a cavalo. Quando vocêchegar, já estarei aqui saboreando um conhaque.

— Bem... se insiste...

A viagem para Horton foi monótona. Theo visitou três tecelões e os encorajou aenviar seus filhos para a escola. Eles prometeram considerar a possibilidade.

As visitas tomaram mais tempo do que imaginou, e a lua já estava alta no céuquando voltou para a mansão.

Capítulo XIV

— Não! — Hannah soltou mais um grito de pavor quando seu olhar detectou umhomem com um taco de golfe na mão.

Ele jogou o taco no chão e, junto com os outros dois homens, bateu em retirada.

— Vá atrás deles, Noel — ela ordenou. — Benjamin, você fica comigo. Possoprecisar de ajuda com lorde Amesbury.

Hannah desmontou e correu em direção ao vulto do visconde. Ele estava inerte, eHannah pegou-lhe o pulso para sentir o batimento. Em seguida colou o ouvido em seupeito e descobriu o vigoroso ritmo cardíaco.

— Graças a Deus!

Começou então a avaliar a extensão dos ferimentos. Havia sangue proveniente dabase da testa. Apanhou um lenço e pressionou-o contra o corte que encontrara. Quando oretirou, constatou que não era profundo. Tornou a pressionar a ferida e, com a mão livre,

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ergueu-lhe a nuca, apoiando-a em seu colo. Procurou outros ferimentos na cabeça, maspara seu alívio achou apenas um calombo começando a inchar e tomando a forma de umovo.

Respirou fundo.

— Acho que ele ficará bem. Chegamos a tempo de evitar o pior.— Ótimo. Mas o que faremos agora?

— O cavalo do visconde deve ter disparado. Vá procurá-lo enquanto tento reanimá-lo, Benjamin.

— Sim, senhorita.

Assim que o rapazote partiu, o silêncio envolveu-a de imediato. Instantes depois,tomou consciência do barulho do vento entre as folhagens e do ruído dos animaisnoturnos.

Examinou mais uma vez a testa do visconde. O sangue estancara. Limpou-lhe astêmporas, rezando em pensamento, agradecendo a Deus por os ferimentos serem leves.Então, começou a dar-lhe palmadinhas na face até vê-lo tornar a si.

— Srta. Whitmore? É você?

— Sim, milorde. Eu não queria que isso lhe acontecesse. Theo tentou se levantar.Porém, foi pressionado para baixo.

— Não, por favor, milorde. Deve ficar deitado até que venham ajudar-nos. Noel e

Benjamin devem estar voltando. Fique como está.— Não. — Ergueu-se até conseguir ficar de joelhos. Em seguida, passou a mão

pela testa. — Ai... Estou um pouco tonto.

Permaneceu ajoelhado. Hannah se pôs de pé.

— Venha. Apóie-se em mim.

— Eles assustaram meu cavalo. — Theo soltou um gemido quando seus dedostocaram o calombo que se formara na nuca. — Acho que terei uma grande dor de cabeça.

— Perdoe-me, milorde. Foi tudo culpa minha. Eu nunca deveria ter...— Fico contente que tenha aparecido aqui a tempo de salvar-me a pele.

Enquanto o visconde recuperava o autocontrole, Hannah sentia que perdia o seu.

— Fui eu a culpada. Lamento.

— A senhorita espantou meu cavalo?

— Não. Nada disso. Eu não tinha intenção. Oh, estou contente que tenhaescapado!

— Srta. Whitmore! — Theo colocou as mãos em seus ombros. — Está tudo bem.— Não! Não compreende, eu...

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Theo a fez silenciar, puxando-a de encontro a si e colando os lábios nos dela. Osusto de Hannah foi tão grande que nem sequer respirava.

— Está tudo bem — ele repetiu. — Pare de chorar.

Em seguida, iniciou uma série de beijinhos nas pálpebras, nas faces e voltou a

procurar-lhe os lábios. Dessa vez, foi um beijo profundo e ardente. A resposta de Hannahfoi imediata e intensa. Quando por fim se separaram, ela custou a conseguir articular afala.

— Eu... eu... Ah! — Sentia as faces em chamas. — Deve estar fazendo umapéssima idéia de mim.

— Nada disso. Bem... me pareceu uma idéia melhor do que esbofeteá-la. Asenhorita estava à beira de um ataque de nervos.

— Compreendo — disse, um tanto decepcionada.

— Suponho que lhe devo desculpas por algum embaraço ou desconforto que lhetenha causado.

— Não. Nada disso. Sou eu quem precisa se desculpar.

— Por quê?

— Porque esse ataque... foi culpa minha. Se tivesse mantido a boca fechadanaquela reunião, Osborn e o irmão não teriam feito isso.

— Então foi Osborn? Bem que desconfiei.

— Sim. E a culpa é toda minha. Espero que possa perdoar-me.

— Srta. Whitmore, por favor...

— Henry contou-me sobre a demissão de Taggert e dos outros. E... eu me sentidesolada com tudo isso.

— Pare. Seu entusiasmo pode ter encorajado esses homens, mas eles sãoresponsáveis por seus atos.

— O senhor é muito generoso, milorde. Naquele instante, Noel retornou.

Eu os perdi — informou.— Não se preocupe. Não devem estar muito longe.

— Você fez o melhor que pôde — confortou-o Hannah.

Um minuto mais tarde, chegou Benjamin, trazendo o cavalo do visconde.

Theo ajudou-a a montar, e os quatro iniciaram a viagem de volta, que transcorreusem incidentes.

A mente de Hannah não conseguia deixar de pensar naquele inesperado beijo.

Suas faces enrubesceram na escuridão ao rememorar a própria reação. Desejara quenunca tivesse acabado.

Bem mais tarde naquela noite, quando rolava na cama, a filha do reverendo ainda

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revivia cada instante do encontro com lorde Amesbury. Estava envergonhada por seucomportamento, porém agradecida pela compreensão que ele demonstrara. Tinha dearrancar aquele incidente da cabeça. Afinal, havia os rumores sobre lady Olívia Sandersvir a tornar-se em breve a condessa Glosson.

Os feriados de verão começaram antes da data marcada para o julgamento deTobias Tettle. Hannah, acompanhada pelo pai, fazia parte da lotada audiência no tribunal.Ao olhar ao redor, notou que dois cavalheiros se encontravam sentados em lados opostosdo salão: lorde Mayfield e lorde Amesbury.

Antes de Tobias, George Kinney foi levado à presença do juiz. O austero oficialencarou o homem a sua frente e em seguida leu a sentença: "O prisioneiro GeorgeKinney foi condenado por crime de invasão de propriedade. A sentença é de sete anos deexílio".

Houve uma agitação coletiva no tribunal. George Kinney era benquisto em Crofton,

e muitos o consideravam vítima de uma lei muito dura e de um homem vingativo.

O juiz continuou a leitura:

— O crime foi cometido na propriedade do conde Glosson. O filho de lordeGlosson, como seu representante legal no tribunal, informou que o conde não teminteresse em levar a acusação adiante e, portanto, o prisioneiro está livre para partir.

Sorrisos e murmúrios de aprovação seguiram-se a esse anúncio, apesar de outroslatifundiários que estavam sentados ao lado de lorde Mayfield terem olhado para ovisconde Amesbury com ares de censura. O Sr. Kinney tinha o olhar atordoado. Sua

mulher correu para abraçá-lo, em prantos.

— Aqueles cavalheiros não ficaram nada contentes — sussurrou Hannah aoouvido do pai, indicando os nobres.

— Eles acham que esta sentença, de alguma forma, vai minar seu poder, filha.Crimes contra a propriedade são vistos como uma ameaça ao status quo.

— Ora, papai, o Sr. Kinley já passou vários meses na cadeia pelo roubo de umcoelho.

— E teria sido deportado, não fosse lorde Amesbury.Por fim, chegou o tão esperado momento do julgamento de Tobias Tettle. Um

burburinho instalou-se no salão, enquanto o prisioneiro era trazido ao banco dos réus. Opromotor, seguro de si, chamou para testemunhar o homem que achara o corpo de Logane arrancou dele os detalhes mais sensacionalistas e sangrentos possíveis. Em seguida,chamou outras testemunhas que declararam ter ouvido Tettle fazer ameaças de morte àvítima.

Mayfield também testemunhou a favor da honra e do caráter ilibado de seu

empregado e comentou o quanto estava triste por perder auxiliar tão confiável. Disseainda que se sentia também uma vítima de crime tão hediondo.

Tettle, conforme era de costume, não teve oportunidade de contestar a informação

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das testemunhas de acusação. E tampouco seu advogado pôde fazê-lo. O pobre homempermanecia sentado apático e cabisbaixo. O coração de Hannah sofria pelas vidasarruinadas do que outrora formara uma família feliz.

Quando o promotor terminou, o juiz dirigiu-se aos jurados: Bem, senhores, estecaso parece já estar por si mesmo resolvido, concordam?

O júri, composto de pessoas da comunidade, dominadas pela magnitude eautoridade do promotor, aquiesceram.

Desse modo, só nos resta impor a sentença. Em um crime como este, agravadopela brutalidade extrema, a lei é bastante clara. O réu deve ser enforcado e esquartejado.

Hannah levou a mão à boca para evitar um grito de pavor. Viu que Tettlecontinuava impassível e de cabeça baixa.

Naquele momento, o advogado, que estava sentado ao lado do réu, levantou-se.

Dias antes do julgamento, Hannah fora pedir a Franklin algum tipo de defesa paraTettle e ficara surpresa ao saber que lorde Amesbury já havia feito um acerto com ele ecom outro advogado para defender o réu. Só lhe restava agora cruzar os dedos para que,pelo menos, a sentença fosse aliviada.

— A corte permitiria que eu oferecesse algum tipo de evidência que poderiaminimizar as circunstâncias que nos foram impostas hoje?

Começaram todos a falar ao mesmo tempo no tribunal. O juiz foi obrigado a bater várias vezes o martelo na mesa, pedindo ordem e silêncio.

— Não consigo imaginar como minimizar as circunstâncias de um crime tãoviolento, de um corpo estraçalhado, mas a justiça requer que a defesa seja ouvida —informou o juiz.

— Excelência, existem de fato circunstâncias atenuantes neste caso que não nosforam apresentadas. — O advogado, então, chamou vários trabalhadores da TecelagemMayfield para testemunharem que Logan molestava não apenas Molly como muitasoutras mulheres que trabalhavam sob sua direção. Em seguida acrescentou: — Estoucerto, Sr. juiz, de que lorde Mayfield não tinha conhecimento de que as operárias

supervisionadas pelo Sr. Logan eram, na verdade, usadas por ele.— Sr. juiz! — protestou o promotor. Houve um tumulto no salão.

— Ordem! Ordem!

— Peço desculpas à corte — disse o advogado.

Hannah pôde notar, porém, que os comentários surtiram efeito nos jurados e talvezno próprio juiz.

 

— O senhor terminou?— Não, excelência. Gostaria de chamar mais uma testemunha.

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— Muito bem. Prossiga.

— A defesa chama Theodore Eurípides Ruskin, o visconde Amesbury.

O tumulto aumentou. Os comentários eram generalizados. Ninguém conseguiaentender como um nobre se levantava em defesa de um joão-ninguém como Tobias

Tettle.— Milorde conhecia tanto o acusado quanto sua falecida mulher?

— Sim, senhor. Eu convivi com as duas pessoas falecidas, ou seja, a Sra. Molly eo Sr. Logan.

— Por favor, conte ao júri as circunstâncias em que isso aconteceu. —A voz dolorde Amesbury era firme e cheia de autoridade. O salão se encontrava agora emabsoluto silêncio.

— Presenciei fatos vergonhosos de perseguição do Sr. Logan a uma mulher 

indefesa, e para ser sincero consigo entender as razões que levaram o réu a tomar umaatitude tão drástica em relação a seu algoz. Logan era um canalha da pior espécie emerecia castigo.

— Quer dizer que milorde tolera tão hediondo crime?! — bradou o promotor, dandoum salto de sua cadeira e apontando para Tettle. — Este homem não conseguiu manter sua mulher em sua própria cama e resolveu matar um cidadão honrado da maneira maissórdida possível!

—Excelência...—falou o advogado, com um tom de exagerada paciência. — ...nós

não estamos aqui para denegrir o caráter de uma mulher morta, que, ao que tudo indica,era uma boa mãe e esposa.

Hannah temeu que a verdadeira causa da morte de Molly fosse ali revelada, mastudo o que foi dito foi que sofreu um aborto.

— Continue, lorde Amesbury — pediu o juiz.

O visconde então descreveu o incidente em que ele teve de interromper Logandurante um assédio a Molly Tettle.

— Pensei que aquele abuso teria um fim, mas para meu pesar estava enganado.— Fez uma pausa e prosseguiu: — Lorde Mayfield testemunhou que sua indústria sofreuuma grande perda com a morte do Sr. Logan. Mas gostaria de chamar a atenção do júripara o fato de que esse homem roubou uma propriedade de valor inestimável do réu: osserviços de sua esposa. Um direito de todo cidadão inglês livre é remediar uma ofensaquando uma propriedade sua é roubada. Se o Sr. Logan roubasse uma vaca ou umcavalo do Sr. Tettle, este mesmo júri sem dúvida lhe daria uma sentença deenforcamento.

Hannah sentiu-se ultrajada com os comentários do visconde. Como podia

comparar uma mulher, sobretudo uma boa esposa e mãe, a um animal? Uma merapropriedade do marido?

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— O senhor apresentou um forte argumento, lorde Amesbury. Porém, permanece ofato de o réu ter matado com requintes de crueldade um semelhante. Portanto, a cortesentencia seu exílio para New South Wales, onde ficará vinte anos na prisão, fazendotrabalhos forçados.

Hannah cogitou que aquilo seria talvez pior do que a sentença de morte. Por outrolado, havia a possibilidade de Tobias Tettle sobreviver. Outros prisioneiros já haviamretornado à Inglaterra e se reintegrado à sociedade.

Quando deixou o tribunal, Theo estava contente consigo mesmo. Contribuíra paraque um homem voltasse ao seio da família e evitara que outro fosse condenado à morte.

Capítulo XV

Hannah sempre considerou os feriados de verão muito curtos, pois tinha duasvezes mais projetos para a estação do que tempo para realizá-los. Naquele ano, encurtoua costumeira visita aos Folkenston para apenas duas semanas. Encontravam-se certamanhã, ela e a baronesa, saboreando um tardio desjejum.

— Tenho de voltar mais cedo — respondeu aos protestos de Cláudia. — LordeAmesbury encorajou seus operários a enviar os filhos a nossa escola, e espero queoutros proprietários de tecelagens façam o mesmo.

— Sua vida inteira se resume a essa escola?—O tom de Cláudia era gentil, mas aomesmo tempo de desaprovação.

— É verdade que toma boa parte de meu tempo.

— Será que Crofton não tem nada a oferecer a uma dama da sociedade? Bailes?Cavalheiros casadoiros?

Meu Deus! Julguei que esse assunto tivesse se encerrado na temporada do anopassado.

Nunca! Jamais desistirei de encontrar-lhe um marido adequado. E não se esqueçade que você possui um dote satisfatório com a herança de sua madrinha.

— Sim. A propriedade de Winslette perto de Barnsley me será bastante útil. Talvezum dia venha a viver lá, com alguma outra parente solteirona.

— Hannah! Não pode estar falando sério!

— Por que não? Olhe, não sou avessa ao casamento, mas apenas se meucoração estivesse envolvido. Porém, ao que parece esse órgão é insensível.

Bem, talvez nem tanto quando se tratava de um certo visconde, pensou ela.

— Pois saiba que tenho encontrado vários cavalheiros de Crofton nestatemporada. Sabia que Horatio Smythe-Jones recebeu o título de barão, além de ser o

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homem mais bonito da região?

— Sem mencionar que é a pessoa mais egoísta talvez de todo o país. Mas meregozijo por ele. Seu ego deve estar radiante. Acredito que tenha visto também minhairmã caçula em sua primeira temporada.

— Claro. Estava maravilhosa. E devo informá-la que usava uns vestidos bem maiselegantes do que a irmã mais velha.

— Ela sempre teve bom gosto, Cláudia.

— Lorde Rutledge anda lhe devotando bastante atenção — informou a baronesa.

— Ouvi falar. Pobre Dorothea... Seu queixo cairia se a irmã caçula conquistasse oherdeiro de um condado.

— E sairia rolando se a mais velha se casasse com o herdeiro de outro condado,não é?

Hannah tentou manter a compostura.

— Não faço a mínima idéia do que está falando.

— Ah, não? Ainda não houve nenhum anúncio de bodas entre o viscondeAmesbury e lady Olívia Sanders, apesar de ela ter ficado toda temporada em Manchester tentando agarrá-lo.

— Mas a condessa acabará por conseguir seu intento de vê-los casados.

— Não sei, não. O visconde não parece homem de se deixar influenciar por 

ninguém. Não vê como está desafiando o consenso geral no caso dos operários dastecelagens?

—Talvez esteja certa. — E desejou muito que a amiga estivesse.

Quando retornou a Crofton, o primeiro passo de Hannah foi visitar outros donos deindústrias têxteis, a fim de persuadi-los a seguir o exemplo de lorde Amesbury. Seusesforços, porém, não surtiram efeito. Nenhum deles estava disposto ao menos a ouvir seus argumentos. As respostas variavam, mas no fundo eram sempre as mesmas: "meustrabalhadores não precisam de estudo para manejar as máquinas". Tentava em vão abrir 

a mentalidade daquela gente obtusa, argumentando que suas indústrias lucrariam comuma força de trabalho mais bem educada.

Afinal, foi reencontrar lorde Mayfield, acompanhada pelo pai. O barão os recebeuna biblioteca. Hannah admirou a imensa coleção de livros e imaginou que a maioria jamais tivera suas folhas viradas.

Mayfield estava frio, mas educado, pelo menos no início.

— Suponho que nossa conversa girará em torno de sua escola, senhorita. Soubeque já foi visitar outros donos de indústrias.

— Sim, entretanto, não foram muito cooperativos.

— Pois minha opinião não mudou desde que tivemos a última conversa.

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— Lorde Amesbury acredita que operários educados seriam vantajosos em suastecelagens. — Hannah notou de imediato que aquele comentário fora um erro, poisMayfield a fulminou com o olhar.

— Amesbury toma atitudes sem se importar com como isso pode afetar os outros.E um forasteiro e um encrenqueiro.

Não sabendo como responder a tal ataque de ira, Hannah lançou um olhar desúplica ao pai.

— Eu... não fazia idéia de que pensava dessa forma, milorde.

— Pois essa é minha opinião. Amesbury está criando toda sorte de problemas paraa comunidade, e não vou corroborar com essas idéias estúpidas.

Como, por exemplo, educar as crianças?

Dentre outras coisas. E saiba de uma vez por todas. Os filhos dos trabalhadores da

Tecelagem Mayfield não freqüentarão sua escola.

— Não estou certa de ter compreendido bem, milorde.

— Sendo assim, vou esclarecer tudo para a senhorita. Se algum de meusempregados tiver a audácia de matricular um filho em sua escola, ele e toda a famíliaserão demitidos. E o mesmo se aplica a essas classes para adultos.

Hannah estava espantada com tamanha maldade.

— Lamento informá-lo, milorde, que tal atitude acabará por espantar os melhores

operários de sua tecelagem.— Amesbury não poderá contratar todos os tecelões da região.

— Vamos, papai, acho que não temos mais nada o que fazer aqui.

— Espero que não venha desperdiçar meu tempo e o seu outra vez com essasbaboseiras.

—Pode ficar descansado, milorde. Não voltarei a importuná-lo. Todavia, nãodesistirei de persuadir as pessoas sobre as vantagens de educarem seus filhos.

Nos dias que se seguiram, Hannah empenhou-se em levar sua mensagem a todaplatéia que estivesse disposta a escutá-la, durante as reuniões da Corresponding Society,na paróquia e até mesmo nas ruas.

Semanas mais tarde, teve início o novo período escolar, e notou que o entusiasmodos operários em enviar os filhos à escola havia esfriado. Até mesmo os empregados daTecelagem Glosson e os tecelões autônomos pareciam reticentes. Alguns pais atémesmo retiraram as crianças da Crofton Parish. Hannah estava estupefata, e ninguémparecia querer discutir o assunto com ela.

Foi quando os eventos se aceleraram, e suas aflições lhe pareceram minúsculasem vista do que estava acontecendo a outras pessoas.

Theo se esforçou no final do verão e início do outono para ler tudo sobre o

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condado que um dia herdaria e cuja maioria, questões já estava sobre suaresponsabilidade.

Seu recém-contratado administrador, Andrew Moore, estava retido em Londres, e ovisconde foi forçado a desempenhar as funções que eram de Taggert. Conseguirasubstituir todos os supervisores demitidos, admitindo o sargento reformado Yardley e TimHessler, que trabalhava na Tecelagem Mayfield. Outro deles era Melton, o homem quefora levar suas reivindicações a Taggert, os outros dois, operários benquistos na classetrabalhadora.

Em pouco tempo, tudo parecia estar se ajustando a contento. A produção retomaraníveis melhores do que os constantes no livro de registros sem que os operáriosprecisassem fazer horas extras. A oferta de Theo em pagar para que as criançasfreqüentassem a escola evitava que as famílias sofressem com a falta dos salários que ospequenos produziam.

Enfim, Andrew Moore assumiu seu posto como administrador, e demonstrou ser bastante competente.

David Moore dividia seu tempo entre ajudar o visconde em Crofton e cuidar deseus interesses em Londres. Theo sabia que o amigo agora cortejava abertamente a sita.Bridges, apesar de o pai da moça estar procurando um título de nobreza para a filha.

Quando David estava ausente, Jenkins e Jeffries vinham sempre visitar Theo, equando nenhum deles se achava por perto, podia-se contar com Hessler e Yardley nasproximidades da propriedade dos Glosson.

Theo reconhecia e era grato pela preocupação dos amigos. Até que a morte doirmão se esclarecesse, nenhum cuidado era pouco.

O visconde tivera uma longa conversa com os irmãos Osborn e, no final, os três semostraram arrependidíssimos e foram mantidos em seus postos, tornando-se os maisleais e produtivos operários.

No início de outubro, Theo recebeu a visita de Yardley, que tinha um assuntoimportante a tratar com o patrão. Segundo ele, duas coisas o preocupavam. Primeiro, osrumores de um levante de trabalhadores, que ameaçavam incendiar as máquinas da

Tecelagem Mayfield.

— Mas por quê?

— Parece que o barão está passando por dificuldades financeiras e ossupervisores estão arrancando o couro dos empregados. Estão exigindo quase o dobrodas horas de trabalho e que um homem faça o serviço de dois. Ninguém está gostandonada disso, milorde, ainda mais quando vêem a felicidade de nossos operários. E temaquele sujeito chamado Cochran...

— Ian Cochran?

— É. Não confio nele. São apenas rumores, mas parece que alguém estáinstigando os trabalhadores contra Mayfield.

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

— Apenas contra o barão?

— Até onde soube, sim. Mas muita gente pode sair ferida.

— Tem razão, Yardley. Fico grato por ter vindo me pôr a par dessa situação.

— Bem, milorde, o outro assunto era... — Fez uma pausa, sem saber como

continuar. — ...a srta. Whitmore.

— O que tem ela? — Theo sentiu um intenso senso de proteção invadi-lo.

Durante todo esse tempo poucas vezes vira a filha do reverendo. Na realidade,apenas uma vez, quando ela e o pai fizeram questão de vir agradecer-lhe pela iniciativade incentivar o ingresso das crianças de sua tecelagem à escola.

-— Alguns dizem que é má influência para as crianças...

— Ela é o quê?!

— É o que se está dizendo, milorde. Outros afirmam que tem um amante e quenão deveria estar associada a crianças e jovens.

— A Srta. Whitmore está sendo acusada de corruptora de menores? Nunca ouvitamanho absurdo! Isso é ridículo! Quem está despejando tal lixo?

— Ninguém sabe ao certo como isso começou, mas parece que existem pessoasempenhadas em manter os boatos acesos.

Seria possível ter havido um amante no passado de Hannah? Theo afugentou talpensamento, porém reconheceu uma angústia apertar-lhe o peito. Essa sensação

chamava-se ciúme.

 

Após a partida de Yardley, o visconde permaneceu quieto, sendo rememorandoaquela conversa. Queria muito proteger a filha do  reverendo. Além disso, achava quedeveria avisar Mayfield, sabia que o barão ainda estava furioso com ele por não ter sealiado às idéias da maioria dos industriais da região.

No final daquela tarde, recebeu a inesperada visita da Srta. Whitmore,acompanhada de sua criada, Elsie. Theo se encontrava em companhia da tia e do amigo

David.

— Se a senhorita veio conversar com minha tia, eu e David as deixaremos a sós —disse Theo, após os devidos cumprimentos.

— É muita gentileza, milorde, mas vim mesmo falar com o senhor.

— Bem, o que posso fazer pela senhorita?

— Não sou eu quem precisa de ajuda. Na verdade, ouvi certos rumores de que osatos de vandalismo cometidos pelo infame general Ludd no passado serão reiniciados.

— Era justo sobre o que estávamos discutindo — informou Theo apontando seusacompanhantes.

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— Acho que estão tramando algo para esta noite.

— Como é? Oh, meu Deus! — a Sra. Stimson verbalizou os temores de Theo.

— Por que acredita que será tão cedo? — o visconde quis saber.

— Ouvi dois de meus alunos conversando. As pessoas continuam achando que as

crianças não prestam atenção à conversa dos adultos...

— E por que acha que esses falatórios são confiáveis?

— Milorde, meu pai foi avisar lorde Mayfield, e o barão não pareceu nem um poucosurpreso com as notícias. Assegurou que estava tudo sob controle.

Mesmo assim continua preocupada? — perguntou a Sra. Stimson.

Acho que é intuição feminina. Mas não consigo deixar de imaginar que lordeMayfield está tramando alguma coisa. E os membros da Corresponding Society predizem

o mesmo.— Nunca subestime a intuição feminina — declarou a senhora idosa, enfática.

— Evidente que a Corresponding Society não está incentivando umcomportamento violento, não é?

— Claro que não, milorde, mas... os seres humanos podem se tornar incontroláveisquando instigados e...

— Em sua opinião os operários estão sendo provocados de propósito eincentivados a destruir as máquinas? — indagou a tia do visconde, aturdida. — Céus,

mas por quê?

Theo, que não pensara em outra coisa nas últimas horas, declarou:

— Pelo mesmo motivo que aqueles pobres tolos foram levados a iniciar arevolução em Pentrich.

— Acha que existe um espião do governo envolvido nisso, Theo?

— Não sei, David, mas alguém os está direcionando para esse caminho.

— Concordo, milorde. — Hannah meneava a cabeça.

— Podemos evitar isso?

— Podemos tentar, David — respondeu Theo. — Temos de tentar.

Hannah deixou escapar um suspiro de alívio.

Capítulo XVI

Hannah havia debatido a situação com o pai antes de consultar o viscondeAmesbury. O reverendo, após seu encontro com lorde Mayfield, revelou à filha suas

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preocupações:

— Tenho a nítida impressão de que Mayfield já sabia de tudo antes que eu lhedissesse.

— Ele está tomando providências para contê-los, papai.

— Não creio.

— Isso tudo é muito estranho!

— Nem tanto, querida. Suponha que você tomasse conhecimento de que alguémpretendia fazer algo nefasto. Não seria mais lógico deixá-lo prosseguir e pegá-lo no ato?

Hannah arregalou os olhos.

— Deixar uma pessoa cometer um crime para depois ser enforcada? Isso édiabólico!

— Não é mesmo? Entretanto, creio que é o que está prestes a acontecer.— Papai! Tenho de fazer algo para impedir essa calamidade! Não podemos deixar 

pessoas serem exiladas ou enforcadas.

Eu sei, Hannah. Tentei falar com outros proprietários de tecelagens que tambémsão membros da igreja, mas não quiseram ouvir meus argumentos.

Discutirei este assunto com o Sr. Franklin amanhã. Talvez ele consiga chamar ostrabalhadores à razão.

— Espero que consiga.

Mais tarde, considerando o assunto, Hannah negava-se a crer que todos os donosde indústrias têxteis tivessem a mesma opinião de lorde Mayfield. Lorde Amesbury, por exemplo, fizera muitas mudanças em sua tecelagem. Era certo que tinha uma visãoarrogante no que se referia às mulheres, mas incentivou os filhos dos operários afreqüentar a escola. Além disso, parou de empregar crianças muito novas. Parecia sepreocupar com os outros, pelo menos os que dependiam dele.

Claro que tais cuidados revertiam em seu próprio benefício, mas e daí?

Hannah não foi convidada a participar das discussões de Henry Franklin com ostrabalhadores. Nem lorde Amesbury e o Sr. Moore lhe contaram o que planejavam.Odiava a arrogância dos homens. Contudo, estava determinada a não ficar de fora dosacontecimentos daquela noite.

Mas não era tão inconseqüente a ponto de ir sozinha. Por isso, chamou Noel, que,a princípio, se mostrara relutante em acompanhá-la, porém, ante a veemência deHannah, acabou cedendo.

Cavalgaram até os limites de Crofton, onde estava localizada a TecelagemMayfield.

— Vamos esperar atrás destas árvores, Noel. Daqui podemos ver o prédio.

— Por quanto tempo, senhorita?

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— Não faço idéia. Não mais de uma ou duas horas, creio.

Desmontaram e sentaram-se no tronco de uma árvore derrubada. Fazia frio e,apesar de não estar chovendo, o ar era úmido. Ambos aconchegaram as golas doscasacos e aguardaram na escuridão.

— Ouviu algo?— Não escutei nada, senhorita. Ou... talvez... o barulho de pés arrastados.

Logo em seguida, Hannah divisou vultos aproximando-se de diferentes direções.Pensou em gritar para contê-los quando ouviu o barulho alto de uma porta sendo forçada.Segundos depois, apareceu uma luz no primeiro andar do prédio e ouviu-se o barulho devários martelos contra metal. De repente, armou-se um pandemônio e tudo aconteceumuito rápido. Só bem mais tarde Hannah conseguiu pôr em ordem o que viu.

Um cavaleiro solitário apareceu de repente, desmontou e entrar no edifício.

Ouviram-se gritos de surpresa, dor e triunfo. Um pequeno grupo de cavaleiros aproximou-se ao mesmo tempo que várias pessoas saíam da tecelagem, perseguidas por outros.Uma dessas pessoas correu na direção de Hannah. Era Benjamin Britton. Antes quepudesse chamá-lo, entretanto, um dos cavaleiros interpôs-se entre ela e o rapaz.

— Britton! O que faz aqui?

— Eu... não sei. — O menino parecia assustado.

— Não importa. — Lorde Amesbury desmontou rápido. — Segure meu cavalo efinja que chegou comigo.

— Sim, milorde.

Os outros dois cavaleiros também desmontaram.

— Droga! Chegamos tarde demais — disse Theo. — Mayfield devia ter capangasesperando lá dentro.

— Eles estavam lá, milorde — informou-o Benjamin.

— E agora? O que faremos, major?

Hannah não conseguia identificar quem fez a pergunta.

— Controlar o estrago... se pudermos — respondeu Amesbury. Decidindo fazer-senotada, a filha do reverendo deu dois passos à frente.

— Posso fazer algo para ajudar, milorde?

— Santo Deus! Você não tem um pingo de bom senso, mulher? Não devia estar aqui!

Hannah empinou o queixo, com altivez. Mas, já que estou, o que posso fazer?Ficar fora do caminho já ajudará bastante. Britton, tome conta dela e de meu cavalo.

— Sim, milorde.

Hannah enfureceu-se por ter sido dispensada, além de comparada a um cavalo.

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Mas não havia tempo para responder à altura, pois naquele momento reconheceu várioscativos que eram membros da Corresponding Society, dentre eles o Sr. Henshaw. E,sendo empurrado com os operários, vinha Henry Franklin.

— Oh, Henry, não! — Desesperada, Hannah correu para seu amigo.

No mesmo instante, sentiu dois braços fortes impedindo-a de prosseguir.— Eu disse para ficar fora do caminho! — bradou o visconde, colérico.

— Chegou tarde demais, Amesbury. — Mayfield parecia inebriado com seu triunfo.— Já capturamos os invasores, inclusive esse maldito advogado. Sempre soube que eleestava por trás de todas as arruaças.

— Não! — gritou Hannah. — Henry só estava tentando impedir uma tragédia!

— O quê? — Mayfield parecia surpreso. — A professora também? Essa é boa!

— Alto lá, Mayfield. A sita. Whitmore veio comigo, e lamento muito que tenhamoschegado tarde demais para evitar essa catástrofe.

— Pode ser que tenha vindo com você, Amesbury. De qualquer forma, amboschegaram tarde demais. E pretendo ver esses baderneiros enforcados um a um. —Levantou uma mão e disse a seu pequeno exército, que incluída o xerife: — Levem-nospara a prisão.

A estrada ficou silenciosa, exceto pelo barulho dos cavalos.

— Lamento, Theo — disse David Moore. — Chegamos apenas alguns momentos

atrasados, mas...Hannah tentou controlar a emoção ao indagar:

— O que vai acontecer a eles?

Amesbury apenas expressou o que ela já sabia... e temia:

— Haverá um julgamento e serão enforcados.

— Até Henry ? Ele só queria impedi-los de quebrar as máquinas!

— Nós sabemos disso, mas estou certo de que Mayfield pensa que capturou um

peixe grande. E o barão tem amigos nos altos escalões.— Meu Deus! — Hannah sentiu lágrimas quentes rolarem por suas faces.

Virou-se de costas. Não daria sinais de fraqueza na frente de lorde Amesbury.

Theo ficara atônito ao encontrar Hannah em meio àqueles acontecimentosfatídicos. Diante da voz entrecortada por lágrimas contidas, teve ímpetos de tomá-la nosbraços e confortá-la. Por outro lado, sentia vontade de aplicar-lhe umas boas palmadas.

— O que você tem na cabeça? Não tinha nada a fazer aqui.

— Eu precisava ver... saber...— Não poderia esperar alguém lhe contar o que aconteceu? Onde já se viu vir aqui

sozinha?

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— Não podia ficar sentada esperando, milorde. E não vim sozinha. Noel veiocomigo.

Theo reconheceu o homem que a acompanhava na estrada para Horton quandofora atacado.

— Ora, então não é tão desmiolada quanto pensei... Hannah resolveu nãoresponder à altura da provocação.

— Fico-lhe grata por ter dito a lorde Mayfield que cheguei com o senhor. Temcerteza que não podemos fazer nada por Henry Franklin?

Será que estava tão preocupada com o advogado que arriscara sua reputação por aquele homem?, indagava-se Theo, desolado.

— Não sei o que possa ser feito de imediato. Tentarei analisar a situação e ver oque posso fazer. Afinal, também tenho conhecimentos em altos escalões. E você, Britton,

o que estava fazendo aqui, afinal?Eu falei para meu amigo Jack Slater que não faria uma coisa dessas, mas ele me

argumentou que era para reivindicar melhores condições de trabalho.

— O quê?! Mas você trabalha para mim!

— Claro, milorde...

— Está descontente com o que tem?

— Não, milorde. Só estava tentando ajudar Jack.

— Olhe, é melhor dizer a todos que estava comigo esta noite — instruiu-oAmesbury.

Theo, Yardley e Hessler levaram Hannah e Benjamin Britton para suas respectivascasas e em seguida encaminharam-se à mansão dos Glosson.

Ao chegarem, os três homens dirigiram-se à biblioteca.

— E agora, Theo?

— Para ser franco, David, não sei. Acho que Mayfield apresentará um caso muito

forte perante o juiz.— Quando?

— Os julgamentos costumam acontecer duas vezes por ano. próximo estámarcado para a primavera.

— Isso nos dá bastante tempo.

— Para fazer o quê? — Theo, desanimado, passava a mão pelos cabelos.

David lançou-lhe um olhar de soslaio. Terminaram o drinque em silêncio.

Na tarde seguinte, Theo foi visitar Franklin na prisão. Descobriu que o advogado játinha visitantes. A senhoritas Whitmore e Thomas. Ambas cumprimentaram-no e emseguida partiram.

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—Como está, Henry ?—Theo perguntou, assim que elas saíram.

— Não tão mal, considerando-se as circunstâncias.

— Você suspeitou de uma armadilha, ontem?

— Lógico. Esse foi o motivo que me levou lá. É uma pena, mas cheguei tarde

demais.

— Todos nós chegamos muito tarde.

— A Srta. Whitmore contou-me de suas intenções e sua benevolência para com o jovem Britton e ela. Fico-lhe muito grato por isso.

Então agora Franklin achava-se no direito de agradecer-lhe por proteger Hannah!Theo estava certo em pensar que havia algo entre eles. Não sabia por que aquelepensamento o entristecia tanto. Afinal, o que tinha a ver com isso? Todavia, houve aqueleinesquecível beijo...

— Pretendo ver o que posso fazer para tirá-lo daqui. Por sorte, ainda temosalgumas semanas.

— Obrigado, Theo. Talvez pudesse entrar em contato com Samuelson para mim.Ele foi o advogado de Tettle.

— Eu lembro. Vou falar com ele amanhã mesmo.

— Isso ajudará bastante, amigo.

Antes de partir, Theo ainda lhe disse algumas palavras de encorajamento:

— Mantenha a esperança. Isto ainda não acabou.

— Muito obrigado.

— E não creia que me esquecerei de você, Henry. Mesmo que tenha de meausentar por algum tempo.

Theo passou todo mês de dezembro e os feriados de Natal em companhia dospais, que também recebiam com alegria a visita da filha. Estava feliz por aquelaconvivência em família, porém não conseguia esquecer um par de olhos azul-

acinzentados acusando-o de não fazer algo mais concreto para ajudar seu... seu o quê?Amigo? Namorado? Amante? Futuro marido?

Logo em seguida às festividades de ano-novo, seus pais retornaram a Londres, eTheo os acompanhou. Os membros da sociedade pouco a pouco retomaram seusafazeres para a abertura do Parlamento e a nova temporada de acontecimentos sociais.

Theo, que se mantinha em constante comunicação com o advogado Samuelson,viera à cidade com o intuito de ver o que podia fazer sobre o incidente de Crofton. Visitouvários homens da lei proeminentes, deixando sua posição bem clara e ouvindo comatenção seus conflitantes conselhos.

Certa tarde, ao voltar para casa, foi recebido por seu criado à porta.

— O conde tem um convidado na biblioteca, milorde, e pediu para o senhor juntar-

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se a eles assim que chegasse.

Ao se dirigir ao cômodo, tentava adivinhar quem seria a tal pessoa. Era Hansen, odetetive que seu pai havia contratado e estava à testa das investigações sobre a morte deFrancis, que acabara de retornar da Irlanda, aonde fora em busca de pistas.

— Você achou o tal homem? — perguntou Theo, após os cumprimentos formais.— Não exatamente, milorde. Parece que ele partiu para a América do Norte logo

que voltou para a Irlanda. Um de seus colegas disse-me que estava fugindo, pois haviamatado um lorde inglês.

— Quer dizer que está nos Estados Unidos? Ou no Canadá?

— Nem uma coisa, nem outra, milorde. O homem foi morto por um bando deíndios.

— Isso foi comprovado?

— Bem, milorde... — Hansen se pôs na defensiva. — ...na medida do possível. Amãe dele mostrou-me um recorte de jornal americano da época em que foi assassinado.

Theo fitou o pai, desanimando.

— Outro fim de linha.

— Ao que parece, filho. Acho que nunca saberemos ao certo por que motivoFrancis morreu.

— Em minha opinião, sabemos o porquê, pai. Só não temos absoluta certeza de

quem. Estou convencido de que meu irmão foi morto porque também descobriu sobreTaggert e sua corja de ladrões. Essa foi a razão. Pelo visto, esse irlandês foi oinstrumento de sua morte, mas existem os mandantes, que são tão culpados quanto.

— Mas talvez jamais consigamos provar, filho.

— Quem sabe?

A condessa Glosson continuava em sua luta para encontrar uma esposa para ofilho. Agora que ele voltara à cidade, fosse por que motivo fosse, estava determinada ainduzi-lo ao matrimônio em breve.

Theo não era contrário às maquinações da mãe. Sentia-se pronto para abdicar davida de solteiro. Era óbvio que um grande amor como o de seus pais não estavareservado para ele nessa vida. E sempre que tal pensamento o assaltava, vinha-lhe àmemória a imagem de Hannah Whitmore.

Imaginava o que teria acontecido, entre eles caso o advogado Franklin não tivessechegado primeiro. Entretanto, ninguém podia passar a existência conjeturando o que teriaacontecido se...

Para alegria da condessa, o visconde Amesbury decidiu deixar que lheencontrassem uma futura esposa. Era visto com freqüência nos acontecimentos sociaisao lado de lady Olívia. Os boatos favoreciam-na, porém, também o viam ao lado de outras

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moças casadoiras.

— Acha que está agindo certo em relação a lady Olívia? — perguntou-lhe acondessa, certa vez.

— O que quer dizer com isso, mamãe?

— Há quatro temporadas ela espera que você se decida. Mas não pode aguardar para sempre que se declare.

— Ora essa! Olívia tem vários outros pretendentes.

— É provável, mas tratam-se de segundas opções.

— Isso me lisonjeia, mamãe.

—Não. Você sabe que é um dos melhores partidos da sociedade atual, e já estápassando da hora de casar, em minha opinião.

—Acreditei que seu entusiasmo por lady Olívia tivesse esfriado após a visita aDerbyshire.

— Talvez. Mas você parece atraído por ela. Além disso, não sou eu quem vai viver em companhia da moça.

— Certo.

Sente-se ou não atraído por ela? Claro. E uma jovem adorável.

— E vem de uma ótima família. E tem boas maneiras. Será, sem dúvida, umaexcelente condessa. Não é uma companhia agradável?

— Suponho que sim.

"Para alguém cujo tema de conversa seja o último mexerico da corte..."

— Então o que está esperando, filho?

— Não sei dizer.

— Alguma outra moça, talvez?

— De forma alguma. — Mas sabia que estava mentindo.

— Theo?

Ele meneou a cabeça.

— Prometo, mamãe, que antes do final do ano escolherei sua sucessora.

Os acontecimentos que se seguiram, no entanto, fugiram a seu controle.

Capítulo XVII

Para Hannah, as semanas de inverno se arrastavam. Quando Katherine partiu para

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sua segunda temporada, cogitou a possibilidade de acompanhá-la, porém acabouoptando por ficar ao lado de Jane, nesse momento de provação.

As duas amigas encontravam-se certa tarde uma de cada lado da grande mesa noescritório da escola, colocando em dia a interminável pilha de papéis, quando Hannahnotou lágrimas escorrendo pelo rosto da jovem professora.

— Jane... — Levantou-se e abraçou-a. — Não se deixe levar pelo desespero. Tudoacabará bem. Estou certa disso.

Na realidade, não tinha tanta certeza, mas não podia deixar que a amiga perdessepor completo a fé. Ela mesma estava quase perdendo a confiança no fio de esperançaque tivera quando Henry lhe contara que lorde Amesbury o ajudaria. Logo em seguida, ovisconde partira de Crofton e não se ouviu falar em nenhum esforço por parte dele parareverter aquela terrível situação. Ao contrário, os rumores eram de que um certo lordeacompanhava lady Olívia a todos os eventos sociais. Por certo já se esquecera dos

pobres infelizes que amargavam na prisão.

Jane enxugou o pranto.

Desculpe-me amiga. É que esta espera é tão difícil! Às vezes acordo no meio danoite assustada. Eu o amo tanto! Não suportaria a vida sem Henry!

— Psiu — admoestou-a Hannah. — Quem disse que vai perdê-lo? O próprio Henryestá esperançoso, e você deve ficar também.

— Ele finge estar alegre quando o visitamos na prisão, Hannah, mas sei que

também teme o julgamento.Hannah sabia que aquilo era fato, pois um dia, quando o visitara sozinha, Henry lhe

pedira que tomasse conta de Jane para ele.

— Não a deixe ficar de luto para sempre.

— Henry, não fale assim! — respondera Hannah, consternada.

— Você crê que terei alguma chance?

— Evidente que sim!

Porém, naquela tarde fria de janeiro, tentava consolar a amiga.—Não pode ceder ao desespero, Jane. Nunca. Precisamos manter o pensamento

positivo. A pior coisa que existe é sofrer por antecipação. Henry necessita de seu apoiomais do que nunca.

Jane sorriu por entre as lágrimas.

— Eu prometo, minha corajosa amiga.

— Prática. Considero-me uma pessoa muito prática — retrucou Hannah.

Será que uma pessoa prática depositaria todas as esperanças em um homem quese divertia bem longe dali?

No mês seguinte houve várias cenas como aquela entre Hannah e Jane. Os jornais

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publicavam sem cessar notícias sobre o julgamento. Viviam à caça de matériassensacionalistas. Referiam-se aos acusados como "os sete amotinados de Crofton". Oseditoriais clamavam pelas mais severas punições. O único jornal que tratava o assuntocom imparcialidade era o The Crofton Chronicle, do qual o pai de Jane era editor. Um deseus artigos dizia que o público deveria aguardar as evidências a serem apresentadas ao

  júri antes de condenar os acusados. Aquilo, contou Jane a Hannah, fizera com que o jornal recebesse a visita do irado lorde Mayfield.

— O barão acusou papai de estar ao lado dos revolucionários, Hannah. E exigiuque uma retratação imediata fosse publicada Chronicle. Achou que meu pai se intimidariapor seu prestígio!

Num esforço para não ficar pensando apenas nos sete acusados, Hannahredobrava os esforços para arregimentar cada vez mais alunos para sua escola. Quasetodos os dias batia às portas dos trabalhadores de indústrias quando voltava do trabalho.

Conseguira matricular cinco novos alunos, e isso a deixara muito satisfeita.Sabia, no entanto, que lorde Mayfield estava pressionando os outros proprietários

de tecelagens para que impusessem restrições aos pais que deixassem seus filhosestudarem. O reverendo até recebera a visita de um certo barão, pedindo-lhe quecontrolasse a filha.

— Acho que você deveria se conter um pouco mais, Hannah. Espere até o julgamento. Mayfield está cada dia mais colérico.

— Mas não estou fazendo nada de errado, papai.

— Eu sei, mas o homem se acha sob muita pressão e temo por sua integridade,querida. Não quero que nenhum mal lhe aconteça.

Hannah sorriu, abraçando o pai.

— Serei cuidadosa. — E beijou-lhe a face.

O tão esperado julgamento, enfim, chegou. O promotor apresentou o caso combastante eficiência. Havia muitas evidências e inúmeras testemunhas de acusação.

O júri retirou-se por uma hora. Os sete homens foram considerados culpados de

uma série de crimes e cada um dos acusados sem dúvida seria punido com a morte.Hannah ficou sentada o tempo todo ao lado de Jane. Ambas tinham também a

companhia de seus pais. A maior parte do tempo as moças mantiveram-se em silêncio,de mãos dadas, aguardando o desenrolar dos acontecimentos. O desespero e umsentimento de impotência dominavam o coração de Hannah.

Quando foi lido o veredicto, Hannah e Jane, junto com outras mulheres presentesno tribunal, desataram em prantos. Muitos homens mostravam fisionomias consternadas,aguardando o inevitável.

Foi quando algo de inusitado aconteceu. Em vez de pronunciar de imediato asentença, como era o costume, o juiz anunciou que analisaria o veredicto e que daria asentença no dia seguinte.

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— Mas, honorável juiz... — protestou o promotor.

— A corte está em recesso até amanhã às dez horas — cortou o juiz, levantando-se e deixando o recinto.

Os espectadores permaneceram sentados em total atordoamento por alguns

momentos. Em seguida, formou-se um burburinho, de frustração por parte dosacusadores e de ansiedade por parte da defesa. O xerife retirou depressa os réus dosalão. Ao sair, Franklin acenou em direção a Hannah e Jane, e deu-lhes um breve sorriso.

— Não creio que consiga suportar isso. — Jane se apoiou em Hannah.

— Esse atraso na sentença só pode ser um bom sinal, filha — confortou-a NathanThomas.

— Eu concordo — disse o reverendo.

— Viu?—Hannah apertou-lhe os dedos.—Ainda há esperança. Durante todo o

tempo, Hannah esteve consciente da presença de lorde Amesbury. Viu-o sentado logoatrás da defesa, e várias vezes o vira falar ao ouvido do advogado. Nesse momento,observava-o conversando com o Sr. Samuelson, que o ouvia com atenção.

Em seguida, o advogado se aproximou do promotor. Houve uma curta reunião queincluiu lorde Mayfield. Hannah não conseguia ouvir nada do que diziam, porém, podiadepreender que Mayfield fazia veementes objeções ao que estava sendo discutido. Emseguida, deu um passo à frente em direção a lorde Amesbury, mas foi detido pelopromotor, que lhe segurou o braço. Pouco depois, o barão deixou o tribunal pisando duro,

contrariadíssimo.Quando Hannah e seus acompanhantes saíram do salão, lorde Amesbury acercou-

se deles. Cumprimentou as duas damas e o reverendo, e foi apresentado ao editor.

— Ainda não está terminado — Theo afirmou. — E tenho motivos para crer que oresultado não será tão ruim quanto temíamos.

— Obrigado pelas palavras de encorajamento, milorde — disse o reverendo, poisHannah sentia sua língua travada.

— Preciso ir agora. — Amesbury olhou fixo para Hannah. — Mas, se conseguir, irei

visitá-los ainda hoje.

Era bem tarde quando lorde Amesbury chegou à casa dos Whitmore. Lucy já haviase recolhido, e Hannah e o pai permaneciam na biblioteca.

— Tem boas notícias, milorde?

— Boas e más, senhorita.

— Poderia nos explicar melhor?

— Fiquei reunido horas a fio com o juiz Atkins, junto com o Sr. Samuelson, o

promotor e também com Mayfield, Kitchener e Childress. Mayfield e Kitchener, comopoderíamos imaginar, querem todos enforcados.

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— E a opinião deles prevaleceu? — inquiriu o reverendo.

— Não. Apenas Henshaw e Slater receberão a pena de morte.

— Não... — murmurou Hannah.

— Sei que não são mais culpados que os outros — consolou-a o visconde. — E o

verdadeiro instigador foi o tolo Ian Cochran.

— E quanto aos demais? — Hannah estava amargurada.

— Todos, com exceção de Franklin, serão exilados.

— Então Henry ficará livre? Isso é maravilhoso!

— Não é bem assim.

— Como? Henry ficará na prisão aqui na Inglaterra?

— Não. Mesmo sendo fraca a evidência contra ele, estava presente na cena do

crime, e isso depôs contra Franklin. Terá permissão para deixar o país por vontadeprópria. Mayfield e seu bando não ficaram nada satisfeitos com isso.

— Deixar a Inglaterra? Para sempre?! — Hannah parecia desolada.

— Não estou certo quanto a esse "para sempre", mas decerto será por váriosanos.

— Pobre Henry! Ele ama tanto Crofton! Escolheu montar seu escritório aqui,quando tinha chances de se estabelecer em Londres.

— Eu sei, senhorita. Franklin me contou.— Ao menos ficará vivo, filha — confortou-a o reverendo.

— Mas... para onde for... ficará livre, não é, milorde?

— Sim, isso mesmo. Já tomei providências para que ele e... um acompanhantepartam no próximo barco que sairá de Liverpool para os Estados Unidos.

— As colônias? — O tom de voz de Hannah sugeria que aquilo seria pior do que oPólo Norte ou os desertos da África.

— As antigas colônias, senhorita. Franklin poderá praticar advocacia lá. Tenho umcontato em Filadélfia que terá prazer em ajudá-lo.

— Quando?

— O navio parte em três dias.

— Três dias?

— Sim.

— Meu Deus! Há tanto para fazer!

— Diga-me, milorde, como conseguiu todos esses arranjos em apenas uma tarde?— A verdade é que não consegui, reverendo. Discuti o possível resultado do

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 julgamento com os homens da lei quando estava na capital. Quando ficou claro que essefiasco, como ocorreu em Pentrich, foi pelo menos em parte trabalho de um espião dogoverno, muitos cavalheiros dos altos escalões pensaram duas vezes sobre o caso.

— Henry acha que lorde Mayfield tem seu próprio espião no grupo, milorde.

— E tem, senhorita. Ele mesmo admitiu isso na noite em que discutimos, emLondres.

— O barão estava a par das conversas em Londres?

— Estava, reverendo. Mas o homem ficou irredutível. E a lei estava a seu lado.

— Mas acabou por ser persuadido? — indagou Hannah.

— Digamos que foi forçado a concordar. Já ouviram falar em Os Cinco Audazes?

— Não.

— Eu já. São cinco homens muito importantes nos círculos do Parlamento, filha.Seu pai é um dos cinco, não é. milorde?

— Sim, e quando eles se propõem a fazer alguma coisa, é difícil demovê-los.

— Foram bastante persuasivos — disse o reverendo.

— Digamos que sabiam onde e quem pressionar.

Hannah, que permanecera calada por alguns minutos, cogitando sobre o que foradito, comentou:

— Isso parece uma distorção da lei. O juiz terá de fechar os olhos a certospormenores.

— Essa era a preocupação de todos os envolvidos — explicou Theo. — Mas aalternativa de enforcar sete homens que foram capturados fazendo o que fizeram nãoagradava ao governo. O caso teria muita repercussão, e o tiro poderia sair pela culatra.

— Mas e o juiz?

— Ele é um homem prático, senhorita... e ambicioso. Tem intenção de concorrer aosenado.

— E por isso dois homens devem morrer. Por razões políticas. — Hannah searrependeu do que falou logo em seguida, ao ver o genuíno pesar no semblante dovisconde.

— E um ponto de vista. Mas, se virmos por outro ângulo, são dois e não sete. Eambos são culpados pelo crime que cometeram.

— Eu sei, sinto muito, milorde. Devo parecer tão mal agradecida!

— E tarde, preciso ir.

— Vou acompanhá-lo até a porta, milorde.Theo se despediu do reverendo e seguiu Hannah pelo corredor. Á soleira, ela

procurou as palavras certas para dizer-lhe.

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— Eu... gostaria de...

— Não diga nada, senhorita.

Estava muito próximo. Janto que Hannah podia sentir a fragrância da loção após abarba e algo mais. Um aroma selvagem, Masculino e atraente. Sob a luz fraca do

lampião, tentou decifrar a expressão de Theo. O abatimento que vira antes aindapermanecia lá, porém havia também uma espécie de... tristeza? Pesar?

Theo pousou ambas as mãos no rosto dela e deu-lhe um beijo na testa. Foi apenasum roçar de lábios, como as asas de uma borboleta, mas o suficiente para acelerar opulso da filha do reverendo e disparar seu coração.

— Tente ser feliz, Hannah Whitmore — sussurrou-lhe ao ouvido. — Tudo valeu apena se você for feliz.

Em seguida, deu meia-volta e desejou-lhe boa noite, deixando-a pensativa e

perturbada.No dia seguinte, pela manhã, Hannah foi à casa de Jane levar-lhe as notícias do

visconde. Estavam tomando o desjejum e convidaram-na para juntar-se a eles. Aprincípio, todos ficaram contentes por a vida de Franklin ter sido poupada.

— Mas sair do país? Deixar a Inglaterra?! — Jane ficou tão espantada quantoHannah quando soube.—Nunca mais vou poder vê-lo?!

—Lorde Amesbury já fez arranjos para que você vá com Henry.

— Eu? O lorde sabe sobre mim e Henry? Apenas há pouco contei a meu pai eminha mãe!

— O que foi uma grande surpresa para mim e a Sra. Thomas — disse Nathan.

— Talvez Henry tenha dito ao visconde — Hannah sugeriu. — De qualquer maneira, ele me garantiu que as passagens foram compradas para ele e um"acompanhante". Deduzi que fosse você.

— Mas deixar Crofton? Ficar longe de minha família? Meus amigos? A escola?Como posso fazer isso?!

A mãe de Jane também chorava.— Oh, Nathan, não! Não poderei viver sem minha filhinha, sabendo que está longe,

nas colônias.

— A Filadélfia não é uma terra selvagem, querida — explicou-lhe o marido. — Efica distante apenas algumas semanas de viagem. Siga sua vida, filha. Faça que seucoração mandar.

— Mas, papai, tudo isso é tão difícil!

— Seu pai tem razão, querida. — A Sra. Thomas soluçava.— Jamais seria felizaqui, com o Sr. Franklin do outro lado do mundo.

Jane tentou sorrir entre as lágrimas. Abraçou ao mesmo tempo o pai e a mãe. Em

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seguida, atirou-se nos braços de Hannah.

Minutos mais tarde, todos saíram em direção ao tribunal.

No salão, o ar era solene. As pessoas aguardavam em silêncio o juiz proferir asentença, conforme informara lorde Amesbury, na véspera.

Hannah ficou dividida entre o júbilo de seu amigo Henry e o desespero dos doisacusados que foram condenados à morte. E tudo isso para quê? Apenas para satisfazer oorgulho arrogante de uns poucos e os temores ignorantes de muitos.

Capítulo XVIII

Theo foi visitar Franklin na prisão logo após a sentença ter sido proferida, e os doishomens puseram-se a discutir os detalhes da próxima jornada do advogado, quepermaneceria encarcerado até o último instante.

— O último golpe de Mayfield contra mim...

— Ele não gosta de perder, Henry.

— Meu empregado, Larkin, ofereceu-se para juntar meus arquivos e livros eempacotá-los para mim. A Srta. Whitmore e a Srta. Thomas cuidarão de meus pertencespessoais.

Lorde Amesbury não gostou da imagem de Hannah cuidando das coisas deFranklin, e resolveu mudar de assunto:

— Esse seu empregado, Larkin... você lhe daria uma boa recomendação?

— Claro! É meu braço direito.

— Meu novo administrador é muito competente, mas precisa de um ajudante.

Pensei em contratar Larkin.

— Isso será ótimo, Theo. Agradeço muito pelo que tem feito por todos nós.

Os dois enforcamentos foram programados para a próxima quarta-feira. E amaioria dos operários seria forçada a testemunhar esse espetáculo bizarro.

Theo também estaria presente. Não por sua vontade, porém sentia que devia dar seu apoio àqueles homens, sobretudo a Henshaw, que fora colega de trabalho de alguémchamado Léo Reston.

Antes de sair, foi falar com Henshaw e Slater. Henshaw já se resignara com suasorte, e isso parecia surtir um efeito calmante nos temores do jovem Jack Slater, cujomedo era visível.

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Após deixar a prisão, o visconde se dirigiu a Manchester para ter uma audiênciacom sir Dennison Stewart, lorde tenente do distrito. Como representante de SuaMajestade, sua decisão se sobrepunha às autoridades locais. O tenente, no entanto,mostrou-se irredutível. Disse-lhe que tecnicamente poderia evitar os enforcamentos, masnão iria fazê-lo, pois não seria prudente usurpar o poder das autoridades locais em uma

ocasião de greves, levantes e violência como aquela.

A última esperança de Theo em ajudar aqueles pobres infelizes desvaneceu-se.Notou que Stewart gostava do poder e do prestígio, contudo, esquivava-se dasresponsabilidades.

Naquela noite, dois novos rostos juntaram-se à galeria de fantasmas acusadores.Mais uma vez, seus próprios gritos angustiados acordaram Theo, afastando-o daquelepesadelo.

Tentou analisar o porquê de aqueles estranhos sonhos o atormentarem quase

todas as noites. Podia entender os protestos e as lamúrias daqueles que morreram nocampo de batalha. Tinham direito de fazê-lo, pois de alguma forma era responsável pelasvidas deles. Mas seu irmão? Molly Tettle? E agora Henshaw e Slater? Por que oresponsabilizavam por suas desditas?

Balançou a cabeça para afugentar as imagens, porém o sono não voltou mais.

Na manhã seguinte, Theo se manteve ocupado com assuntos da tecelagem. Haviamuito trabalho a fazer. Temia a chegada daquela tarde e do duplo enforcamento. Jáassistira a outras execuções, mas nunca com satisfação. A morte no campo de batalha

era uma coisa. Executar um homem como forma de castigo era outra muito diferente.Era contra a morte institucionalizada. Não importava como fosse justificada.

Julgava que nenhum homem tinha o direito de tirar a vida de um semelhante, fosse qualfosse o crime que tivesse cometido.

Quando chegou a hora temida, tanto Henshaw quanto Slater morreram comdignidade. Em geral a multidão nesse tipo de acontecimento costumava transformar amorte em um espetáculo carnavalesco, com bastante excitação e até ambulantesvendendo bugigangas. Naquela ocasião, no entanto, todos mantinham um ar lúgubre e

sombrio.Os donos de tecelagens tinham obrigado seus operários a assistir à execução para

dar-lhes uma lição. Theo julgou que, em vez de instigar temor e obediência, aquelesenforcamentos intensificaram o ressentimento e a determinação.

Theo acordou cedo, pois chegara o dia da viagem de Franklin e da sita. Whitmore.Não estava ansioso por aquilo, mas oferecera seus préstimos e sua ajuda ao advogado, enão podia retroceder.

Quando chegou à casa de Franklin, encontrou-o do lado de fora com uma pilha de

bagagem, junto com Hannah, uma moça e um casal mais velho. Logo reconheceu que setratava da Srta. Thomas e seus pais. Estranhou o fato de os pais de Hannah não teremvindo para se despedir da filha.

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— Parece que já está tudo pronto.

— Sim, Theo — informou o advogado. — Logo que a bagagem for carregada,poderemos partir.

O cocheiro iniciou essa tarefa, enquanto Theo se aproximava de Hannah.

— Srta. Whitmore? — Lorde Amesbury mantinha a porta do veículo aberta paraela.

— Sim, milorde?

— Gostaria de se acomodar para iniciarem a viagem?

— Como disse?

— Já pode entrar, se desejar.

Todos o fitavam, confusos. Após um momento de indecisão, Hannah começou a

rir. Um olhar de entendimento perpassou entre ela e o advogado, e ambos caíram nagargalhada.

.— Qual o motivo de tanta graça? — Jane quis saber.

.— Acho que lorde Amesbury tem a impressão de que eu seria a "acompanhante"de Henry nesta viagem.

Franklin aproximou-se de Jane e a enlaçou pelos ombros.

— Acho que minha esposa se oporia a isso — brincou. .— Sua esposa? — Theoarregalou os olhos, espantado.

— Henry e Jane se casaram há cerca duas horas — informou-o Hannah.

— Compreendo. — Theo tentava digerir aquela informação. Por fim, um largosorriso apareceu em seus lábios. — Bem, então, meus parabéns ao novo casal. E meussinceros votos de felicidade.

A noiva corou, e em seguida começaram os abraços de despedida. Por fim, o novocasal se acomodou na carruagem, junto com Theo, e partiu acenando, entre promessasde escrever em breve.

Naquele momento, no silêncio que se seguiu, tinha oportunidade de analisar asituação. Sua euforia inicial dera lugar à incerteza. Até alguns instantes atrás, ele próprioestava disposto a tudo para que a Srta. Whitmore fosse feliz. Será que ela fazia o mesmoem relação a Franklin?

Recostou-se no assento e agradeceu a Deus por não precisar empreender aquelaviagem em companhia da mulher que amava e de seu marido.

De repente, aprumou-se.

Mulher que amava? De onde tirara semelhante idéia?!

Bem, não havia tempo para atentar a seus incongruentes pensamentos, pois tinhade concentrar-se nos vários detalhes daquela jornada.

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Após uma parada para o almoço e troca de cavalos, os Franklin mostravam poucossinais de fadiga, e tinham substituído a tristeza das despedidas pela especulação dofuturo que os aguardava, e a apreensão por um certo grau de expectativa.

— Acho que vocês se sairão muito bem — disse Theo.

— Pelo menos lá se fala a mesma língua.— Claro. Estou certo de que não terão dificuldade em se adaptar, Sra. Franklin.

— Ah, eu adoro meu novo nome de casada, milorde, mas gostaria que mechamasse apenas de Jane.

Theo fez um gesto afirmativo com a cabeça.

— Não tivemos oportunidade de conversar muito, mas acho que os primeirosnomes são mais apropriados. Já me sinto seu amigo, Jane.

Os três se sentiram muito gratos por aquela amizade.— É amiga da Srta. Whitmore há anos, suponho.

— Nós três crescemos em Crofton — respondeu Jane. — E estávamos sempre juntos.

— Exceto quando fomos todos para escolas diferentes — informou Henry. — Nósdois sempre tentando controlar o excesso de entusiasmo de Hannah...

— Meu Deus! Quem controlará seus ímpetos agora? Hannah sempre levou amelhor com suas irmãs e a mãe, e o pai faz tudo o que ela quer.

— Não tenho a menor idéia... — O advogado fitou o teto. .— Talvez você, Theo.

— Eu? Da forma como vocês a descrevem, parece-me um verdadeiro comandante.

— Não. — Franklin sorriu. — Hannah é uma moça forte, mas bastante vulnerável.

Chegaram a Liverpool à tardinha, e os Franklin foram postos a bordo do navio. Ocapitão explicou que a maré permitiria que partissem antes da meia-noite. Theo despediu-se do jovem casal e desejou-lhe felicidades. Eles agradeceram, com efusividade, por todaa ajuda recebida do amigo, e mais uma vez havia lágrimas nos olhos de Jane.

— Adeus, Theo, e, por favor, tome conta de nossa Hannah.—Prometo, Jane. — E de alguma forma ele sabia que cumpriria a promessa.

Lorde Amesbury pernoitou em uma hospedaria em Liverpool no dia seguinte foidireto para casa. Sua tia Mathilda recebeu-o com alegria.

— Já foi à vila, querido?

— Não, titia, vim direto para cá.

— Quer dizer que ainda não soube do incêndio?

— Que incêndio?

— Hoje atearam fogo na Crofton Parish.

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— Alguém se machucou?

—Não. Aconteceu após a meia-noite. Parece que foi proposital.

— Mas quem, tia? Qual foi a extensão dos estragos? "Hannah deve estar desesperada."

— Ninguém sabe quem foi o autor, mas é certo que não foi um acidente. Hannahdisse que as aulas terão de ser suspensas.

— A senhora falou com ela? Como está a Srta. Whitmore?

— Veio aqui esta tarde. Está desorientada, claro. Pobre moça! Mas recebeu muitasofertas de auxílio, e muitas pessoas já se ofereceram para começar os reparos.

— Mas Hannah está bem?

— Sim. É uma jovem obstinada. Já está fazendo planos para reiniciar as aulas na

próxima semana, na igreja do pai.Assim que amanheceu, Theo dirigiu-se à escola. Lá chegando, concluiu que uma

parte do prédio fora destruída. Em seguida, dirigiu-se à residência do reverendo.Encontrou Hannah sentada perto da lareira, com a expressão triste. Convidou-a para umpasseio Pelo jardim.

— O fogo pode significar um aviso, senhorita.

— Tenho certeza de que sim. Mas não ficarei intimidada pelos atos de algunscovardes na calada da noite.

— Sita. Whitmore, insiste em subestimar o perigo que a ronda. Na verdade, pareceatraída por ele.

— O que está sugerindo? — Hannah o encarou.

Por um momento, ficou perdida na profundidade daqueles olhos, que pareciam océu em numa manhã clara de verão.

— Eu... bem... a senhorita deve tomar cuidado. Desta vez atingiram sua escola. Dapróxima, poderão atingi-la.

— Não acredito que esteja correndo perigo.— Você mediu forças com homens poderosos.

— Quer dizer, lorde Mayfield. Sei que o barão está zangado comigo. Ele veio aquiontem falar com meu pai.

— E o que queria? Hannah deu de ombros.

— Além das reclamações de sempre sobre minha escola, pretendeu esclarecer que não teve nada a ver com o incêndio. Mas esperava que isso me servisse de lição.

— E o que lhe respondeu?

— Eu não estava presente. Caso contrário, teria posto aquele verme daqui parafora. Esse homem precisa entender que o país inteiro não irá se curvar a sua vontade.

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Queria convencer meu pai a ordenar-me que me limitasse a ensinar os filhos defazendeiros e gente da cidade, e que deixasse em paz as crianças dos operários detecelagens.

— E o que o reverendo respondeu?

— Que eu já era bastante grandinha para tomar minhas próprias decisões. — Osorriso dela era genuíno e cativante.

Caminharam em silêncio por alguns momentos, em seguida Hannah continuou:

— E quanto a Henry e Jane? Estão seguros a caminho dos Estados Unidos?

— Partiram no mesmo dia em que saímos daqui.

— Sentirei muito a falta deles.

— Garanto que irão se adaptar com facilidade à nova vida.

— Estou certa disso. Afinal, ambos são otimistas incuráveis.— Creio que estavam um tanto preocupados com a senhorita.

— Comigo? Por quê?

— Eles parecem pensar que você tem uma tendência a ser... digamos...impetuosa.

— Ora! Henry sempre me acusou de tender ao excesso de entusiasmo.

— Pois deveria levar em consideração as aflições de seus amigos. Pelo menos até

sabermos mais sobre esse incidente.— Gostaria de saber quem foi o responsável. Mas se alguém acredita que isso

será o fim de minha escola, está muito enganado.

— Não poderia ponderar sobre reabrir a escola daqui a algumas semanas? Talvezum mês? Se deixasse a poeira baixar...

— De jeito nenhum! Assim, vão achar que estou derrotada.

— A opinião alheia significa tanto assim para você? Um pouco de prudência nãolhe faria mal algum.

— A Crofton Parish será reaberta na próxima segunda-feira, milorde. Já estádecidido.

— É sempre tão teimosa?

— Prefiro considerar-me positiva e perseverante.

— Que dizer que esse incêndio não lhe ensinou nada?!

— Agora milorde está me fazendo lembrar aquele odioso barão. —Escute, estouapenas sugerindo um pouco de precaução. Não sabemos se o fogo era destinado à

escola ou a sua pessoa. Da próxima vez, Deus me perdoe, poderá sair ferida!

— Evidente que a intenção era destruir o estabelecimento.

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— Não pode garantir isso.

— Pois saiba que sempre vivi em Crofton e jamais alguém ameaçou minhaintegridade.

— Sempre existe uma primeira vez. Destacarei alguém para tomar conta da

senhorita.— O senhor não fará nada disso! Não tem esse direito.

— Srta. Whitmore... Hannah, seja razoável! Isso é para seu Próprio bem.

—Não. Milorde supõe que seja para meu bem. E não me lembro de ter dadopermissão para chamar-me pelo primeiro nome.

— Minhas sinceras desculpas, Srta. Whitmore. Isso não voltará a acontecer.

— Esta discussão está encerrada, milorde.

— Suponho que sim. Adeus. — Girando nos calcanhares, Theo se foi."De qualquer maneira, tolinha, colocarei alguém em seu encalço", pensava ele, ao

se afastar.

Capítulo XIX

Srta. Hannah, uma visita a espera na biblioteca. — Obrigada, Sra. Warren.Descerei em alguns instantes. Ah! Então lorde Amesbury também chegara à conclusão deque estava errado e viera pedir-lhe desculpas. Arrumou algumas mechas que insistiamem cair-lhe na testa e apertou as faces, para dar-lhes um colorido.

Quando chegou à biblioteca, constatou que não se tratava de lorde Amesbury.

— Sr. Smythe-Jones! Ou melhor, lorde Castlemaine. Não esperava por sua visita.

— Desculpe-me, Srta. Whitmore, deveria ter mandado um bilhete, mas fiquei commedo de que não me recebesse.

Hannah sentou-se em uma cadeira em frente a ele, observando-o. Cláudia tinharazão. Era um homem muito bonito, com a espessa cabeleira loira, sobrancelhascastanhas e olhos verdes.

— E qual o motivo de sua visita?

— Gostaria de dizer-lhe o quanto lamento o que ocorreu com sua escola.

— Ora! As notícias voam. Já sabem disso em Barnsley?

— Não. — Sorriu. — Cheguei ontem para visitar Mayfield, e fiquei sabendo.

— Ah... Obrigada por seu interesse.

Horatio lançou-lhe um sorriso significativo.

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— Na realidade, meu interesse vai além da escola. Está mais ligado à professora.

Hannah levantou-se.

— Lorde Castlemaine...

— Não. Não fuja. Escute o que tenho a dizer-lhe. Hannah sentou-se, relutante.

—Talvez o que aconteceu tenha sido uma sorte para a senhorita.

— Como pode achar que um incêndio que destruiu parte de minha escola foi algobom?!

— Lógico que nesse aspecto foi terrível, mas parece-me que esse incidente deu-lhe a oportunidade de reavaliar seus... objetivos e tomar algumas decisões.

— Nesse ponto, tem razão. Às vezes as calamidades nos fazem refletir.

— Imaginei que talvez a senhorita pudesse considerar o ocorrido como um aviso

celeste.— Aonde que chegar, milorde?

— Seria um sinal de que a senhorita deveria abandonar tudo isso e tornar-seesposa e mãe. Que está na hora de assumir o papel para o qual todas as mulheres foramcriadas por Deus. A sublime responsabilidade à qual todas as mulheres estão destinadas.

— Compreendo. E milorde crê que o Senhor também criou os homens para seremapenas maridos e pais?

— De modo algum! Os homens são diferentes.

— Sim! São muito diferentes. — Hannah tentava controlar a vontade de rir.

De súbito, Horatio postou-se de joelhos a seus pés, segurando-lhe ambas asmãos.

— Srta. Whitmore, devoto-lhe uma imensa consideração. Por favor, diga que medará a honra de ser minha esposa.

— Milorde, eu...

— Não. Não recuse minha oferta como da última vez. Isso foi há... dois anos?

Agora você teve tempo de refletir sobre as vantagens que essa união traria para ambos.— Com relutância, permitiu que ela retirasse as mãos.

— Lorde Castlemaine, eu não sei o que dizer. Para ser sincera, não acho quefomos feitos um para o outro.

— Formaríamos um belo par, querida Hannah. Nós nos complementaríamos emtodos os sentidos. Arrisco-me a afirmar que como um casal assumiríamos um papel dedestaque na sociedade.

— Mas...

— E nossas propriedades juntas nos tornariam um dos maiores proprietários deterras de Barnsley.

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

Hannah levantou-se, afastando-se dele.

— Sinto muito... Acho que não daria certo.

— Lógico que daria, meu anjo! Sei que tudo o que aconteceu a deixou perturbada.Uma mulher delicada como você...

Mulher delicada? Horatio não a conhecia, mesmo!

—Lorde Castlemaine, eu... fico muito honrada com seu pedido, mas não possoaceitá-lo. Não me casarei com o senhor nem agora, nem nunca.

A expressão dele tornou-se sombria, e Hannah podia sentir que fazia um esforçosupremo para conter a raiva.

— Talvez venha a mudar de idéia. Ficarei hospedado na casa de Mayfield por maisou menos um mês.

— Não conte com isso, milorde. — E o conduziu até a porta.— Não desistirei tão fácil. — Com uma exagerada reverência, Horatio se despediu.

Quando se viu sozinha outra vez, Hannah sentou-se na cadeira, pondo-se ameditar. Cláudia estava certa. Talvez aquela fosse sua última chance de tornar-se esposae mãe. Contudo, de alguma forma não se arrependia de ter recusado de novo a oferta deSmythe-Jones.

Hannah retomou sua rotina. As aulas continuaram a ser ministradas na igreja e, nofinal de cada dia, ela fazia questão de visitar a escola para verificar o andamento das

obras.Notara Benjamin Britton perambulando nos arredores da igreja sempre que estava

dando aula, e certa vez convidou-o a juntar-se à classe. O rapaz recusara, dizendo comorgulho que agora trabalhava para lorde Amesbury, e não teria tempo.

— Na tecelagem?

— Não, senhorita. Adoro cavalos, e milorde contratou-me para cuidar dosestábulos.

— Que bom, Benjamin! Fico contente que goste do que faz. Costumava ficar até

tarde após as aulas, corrigindo trabalhos.

E mesmo em maio, quando os dias começavam a ficar mais curtos, davacontinuidade a essa prática. Certa ocasião, quando saía da igreja, um homem abordou-a.

— Srta. Whitmore?

— Sim.

— Venha por aqui, por favor.

Hannah seguiu na direção indicada. Bem mais tarde se deu conta de que aquele

indivíduo, vestido como um operário de tecelagem, era-lhe desconhecido. Deu algunspassos e sentiu uma mão em sua face. Lutou para desvencilhar-se, porém, em instantes,tudo ficou escuro.

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

Não tinha a mínima idéia de quanto tempo ficara inconsciente. Sabia que estavaem uma carruagem que rodava muito rápido. Decidiu fingir que permanecia sem sentidos.

— Ela já não devia ter acordado? Não estou gostando nada disso.

— Não se preocupe. Estamos sendo bem pagos para isso. Temos apenas de levá-

la ao chalé e desaparecer no dia seguinte.Hannah não reconhecia nenhuma das vozes. Nem tinha idéia de onde se

encontravam.

O chalé? Para onde a levavam? Então compreendeu a que se referiam. Umaconstrução rústica que ficava bem afastada, dentro do bosque, costumava ser usada por caçadores durante as temporadas de caça.

Entretanto, não estavam na temporada.

Continuou muito quieta, tentando pensar em um plano de ação. Naquele momento

a carruagem parou. O sol havia muito dera lugar à noite.

— Chegamos. — O homem pegou-a no colo e carregou-a até a entrada.

Hannah gemeu e fingiu estar voltando a si.

— Onde... estou? O que... está acontecendo?

— Não se preocupe, senhorita. — O estranho a colocou no chão, guiou-a até asescadas e em seguida entraram em um imenso quarto.

Hannah foi empurrada para dentro e ouviu o estalido da porta sendo trancada.

"Não entre em pânico. Tente manter a calma." Avistou uma lamparina sobre umamesa, e a cama encontrava-se impecável. A fraca luz do luar entrava por uma fresta da janela, que examinou como uma possibilidade de fuga, porém verificou que havia gradesnela. Era evidente que se tornara uma prisioneira, mas de quem? Bateu com força naporta.

— Deixem-me sair!

— Acalme-se, senhorita.

Voltou até o leito. Sentou-se e examinou em volta com mais cuidado. Havia umabandeja sobre a mesa. Nela, uma garrafa de vinho, um jarro de água, alguns pedaços depão, queijo e três maçãs. Então seus raptores não pretendiam deixá-la morrer de fome.

Revolveu a memória em busca de alguma explicação para aquela situação bizarra.Decidiu que devia manter a fleuma. Tudo se esclareceria no final, prometeu a si mesma.

Sorveu alguns goles de vinho e comeu um pedaço de pão e queijo. Em seguida,recostou-se na cama e, cedendo ao cansaço, cochilou. Foi acordada pela tranca sendoaberta.

Theo aguardava sua tia na biblioteca para jantarem, quando ouviu uma comoçãona entrada.

— E melhor deixar-me entrar!

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— Milorde, desculpe-me, mas esta pessoa insiste em falar-lhe — informouKnowlton frustrado, quando vislumbrou o patrão aproximar-se.

— Está bem, deixe-o entrar. Britton! O que está fazendo aqui, meu rapaz?

— Milorde disse para vigiá-la... quer dizer... a Srta. Whitmore...

— Fale logo, menino. O que houve?

—Dois homens agarraram-na e levaram-na em uma carruagem.

— O quê?! Quando?!

— Uma hora atrás. Talvez duas.

— E só agora você vem me dizer! — Theo tinha ímpetos de estrangulá-lo.

— Eu estava tentando matar dois coelhos com uma só cajadada, milorde.

— O que quer dizer?

— Que eu os segui, milorde, para saber aonde levavam a moça.

— E conseguiu descobrir?

— Consegui. Foram em direção ao norte até o chalé Hays, depois viraram àesquerda, e a única coisa que existe no final daquela estrada é o chalé de caça.

— Dois homens?

— E um cocheiro.

— Portanto, são pelo menos três, mais os que porventura estiverem esperando nochalé. Aquele lugar costuma ficar vazio, exceto durante um mês, no outono — conjeturavalorde Amesbury. — Obrigado, Britton. Você foi de grande ajuda.

O rapaz não perdeu tempo com os elogios que recebia.

— Posso acompanhá-lo, milorde, quando for resgatá-la?

Theo desejava muito que alguém o acompanhasse naquela missão. Só Deus sabiao que o esperava. Porém, um rapaz tão jovem! Gostaria que David Moore estivesse ali,mas o amigo fora para Londres fazer a corte à Srta. Bridges.

— Não, Britton. Prefiro que faça outra coisa para mim.

— Sim, milorde.

— Primeiro, vá à casa do reverendo e informe-o do ocorrido. Apenas o reverendo,entendeu? E diga-lhe que não se aflija, que trarei a filha dele sã e salva.

Benjamin assentiu.

— Em seguida, vá encontrar Tim Hessler e Dick Yardley e guie-os aquele chalé omais depressa que puder.

— Sim, senhor! — exclamou Benjamin, entusiasmado por ter sido, por fim, incluídona ação.

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— E, Britton, nem uma palavra a quem quer que seja, ouviu?

— Certo, milorde.

Theo foi buscar sua pistola e uma faca e partiu na direção indicada por Benjamin.Cavalgava o mais rápido que o luar, encoberto por um céu nublado, permitia.

Começava a chover, o que dificultava ainda mais encontrar o tal chalé. Começavaa ficar preocupado, julgando ter errado o caminho, quando vislumbrou uma sombra nofinal da estrada. Conforme se aproximava, podia notar uma luz que vinha da janela dosegundo andar.

Deixou seu cavalo a uma distância segura, rezando para que nenhum mal tivesseacontecido a Hannah. Caminhou ao redor do chalé e conseguiu ver através das janelasdo andar inferior. Dois homens jogavam cartas em um dos quartos, enquanto um terceirohomem parecia cochilar em uma cadeira no que parecia ser a sala de estar. Uma escadalevava ao pavimento superior. Theo conjeturou que era lá que Hannah deveria estar.

Decidiu que o fator surpresa seria a melhor estratégia, e subiu os degrausexteriores que levavam entrada. De arma em punho, deu um chute na porta,escancarando-a.

— Onde está ela?!

Aquele que dormia acordou de repente.

— Ei, não há necessidade disso! A moça está lá em cima, conforme planejado.Cyros, o nobre chegou.

Um dos camaradas que jogava entrou na sala. Ainda tinha as cartas na mão.

— Ora, leve-o até ela, então, conforme combinado.

Perplexo, Theo baixou a arma, mas continuou alerta, segurando-a. Estranhou ofato de terem mencionado "o nobre", porém decidiu entrar no jogo.

Ao subir as escadas, repôs a pistola no coldre. Notou que havia quatro dormitórios.O homem retirou a trave de um deles e abriu a porta.

Theo entrou, mas não visualizou Hannah de imediato. Deu mais alguns passos e,

quando se virava para olhar em volta, algo pesado atingiu-lhe a cabeça. Sentiu o quartorodar e ouviu a porta fechar-se atrás dele, e o barulho da tranca sendo recolocada.

Capítulo XX

Hannah despertou assustada e experimentou um momento de puro terror ao ouvir 

o movimento na porta. Saltou da cama, procurando por algum objeto que pudesse servir como arma.

Calculou que a bandeja de prata poderia ser adequada a seu intento. Segurando-a

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firme, escondeu-se atrás da porta. Quando foi aberta, a primeira coisa que viu foi um par de ombros largos, e sabia que só teria uma chance. Sem ao menos pestanejar, levantou abandeja o mais alto que pôde e arremessou-a contra a cabeça contra o intruso.

Sua vítima não chegou a cair. Ficou apenas um pouco tonta. Virou-se, e elareconheceu lorde Amesbury. Seu alívio foi encoberto pelo horror do que acabara de fazer.

— Lorde Amesbury! Oh! Sinto muito!

— Santo Deus, mulher, isso é maneira de cumprimentar alguém que veio salvá-la?!

Hannah deixou a bandeja cair e deu um passo em direção a ele. Ergueu uma mão,para avaliar seu ferimento.

— Já pedi desculpas, milorde. E, além do mais, como poderia saber que eraalguém que viria me salvar?

Theo não respondeu de imediato. Em vez disso, pegou-lhe o pulso e puxou-a para

si. E, durante algum tempo, permaneceram assim abraçados. Parecia a coisa maisnatural do mundo.

— Maldição! — murmurou ele contra os cabelos sedosos de Hannah.

— O... quê? O senhor está bem? Eu o machuquei muito?

— Estou bem. Apesar de você ter a mão bem pesada. Mas vim aqui com aintenção de libertá-la, e tudo que consegui foi ficar preso também. Eles a machucaram?

— Não. Apenas me assustaram.

— Ficará segura, agora. Tem alguma idéia de quem mandou seqüestrá-la?

— Nem sequer imagino. Por quê? O senhor guarda alguma suspeita de Mayfield?

— Exatamente. Pelo menos essa foi minha primeira suposição. Quando chegueiaqui, referiram-se a um nobre que estavam aguardando. Isso não faz muito sentido.

Hannah sentou-se na beira do colchão.

— Lamento que milorde esteja envolvido nisto, apesar de ter ficado contente por sua presença. O senhor tinha razão.

— Sobre o quê?— Sobre eu correr perigo.

— Suponho que já tenha examinado as possibilidades de fuga desta prisão, estoucerto?

— A chaminé... se fôssemos duas crianças de seis anos de idade. Há grades na janela, e aquela porta é muito grossa e pesada, sem contar com a trave que a cerra por fora.

— Compreendo. Pelo menos não pretendem nos deixar à míngua.

— Quanto tempo acha que nos manterão prisioneiros?

— Isso depende apenas do motivo pelo qual estamos aqui. De qualquer forma, não

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será muito, pois tenho homens vindo para cá.

— Como soube onde me encontrava?

— Benjamin Britton me informou. Ele a estava vigiando.

—Ora essa! Como ousou colocar esse garoto para me espionar?

— Para tomar conta de você, já que não consegui incutir um pingo de juízo nessacabeça dura após nossa última conversa.

— Pois eu não gosto nada disso!

Theo se aproximou e a pôs de pé. Em seguida, tocou-lhe o queixo, fazendo-aencará-lo.

— Do que a senhorita não gosta? Do fato de eu estar aqui? — Seus lábios roçaramos dela, que de imediato correspondeu. — Não, vejo que não se trata disso.

Os braços de Hannah circundaram-lhe o pescoço, e ela se aconchegou a ele,correspondendo ao próximo beijo com renovado entusiasmo.

Theo sorriu, satisfeito.

— Então, minha impulsiva sita. Whitmore, não vai me dizer do que não gosta?

— De o senhor ter ignorado meus desejos e posto alguém para seguir-me —afirmou, amuada, a despeito de admitir para si mesma que estava grata pelo que elefizera.

— Não está por ventura me admoestando, como faz com seus alunos? — Dizendoisso, puxou-a outra vez para si e beijou-a com sofreguidão.

Hannah compensava a pouca experiência nesse campo com um arrebatamentonatural. Sentiu-se descobrindo um mundo novo de emoções, que até então desconheciapor completo.

O visconde afastou a cabeça e fitou-a bem fundo nos olhos.

— Sita. Whitmore, acho que deveríamos...

— Hannah.

— Como?

— Trate-me por Hannah. Quero ouvi-lo dizer meu nome. O visconde abriu um largosorriso.

— Ei! A sita. Whitmore está me concedendo a honra de chamá-la pelo primeironome?!

— Devia esperar que o senhor dissesse isso. Contudo, considerando ascircunstâncias...

— E que circunstâncias são essas, minha querida Hannah? — E procurou peloslábios dela outra vez. — Estas? Tem razão. Os Primeiros nomes são mais adequadosnestas... circunstâncias.

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— Theo...

— Ótimo. — O visconde a conduziu até o leito, e ambos se sentaram na beirada.— Por mais que eu quisesse continuar a beijá-la, creio que será melhor adiar momentostão ditosos para uma ocasião mais adequada.

Hannah sentiu a face queimar de vergonha. Mas tinha de concordar que ele estavacerto.

— Acha mesmo que Mayfield está envolvido nisso?

— Seria capaz de jurar. Mas existem mais coisas por trás disso. Imagino que nãose trata apenas de assustar uma professora teimosa.

— O que mais poderia ser? — Hannah empalideceu. — Não. Não poderia ser...

— O quê?

— Lorde Castlemaine está hospedado na mansão de lorde Mayfield.— Ouvi dizer, mas o que tem isso a ver?

— Ele foi visitar-me e me propôs casamento outra vez.

— Castlemaine está apaixonado por você?

— E o que haveria de tão estranho nisso? — desafio-o. Theo sorriu e enlaçou-lheos ombros.

— Nada, doçura. É que Horatio sempre me passou a impressão de amar apenas asi mesmo.

— Bem... suponho que esteja certo. E, para dizer a verdade, seu interesse estámais voltado para a propriedade que herdarei de minha madrinha.

— Duvido que esse seja o único motivo.

— Não precisa bancar o galanteador comigo.

— Não estou fazendo isso. Por outro lado, se é um plano bizarro de Castlemaine,acho que o derrotamos. — Assim dizendo, estalou-lhe um beijo na face. — Deite-se ecubra-se. Está ficando frio aqui.

O visconde foi até a mesa, trouxe a bandeja com queijo, maçãs, vinho e algunspedaços de pão e deitou-se ao lado dela. Pegando a faca que trouxera, pôs-se adescascar uma fruta.

— Na certa, teremos uma longa espera.

— Quanto você acha? — Hannah verteu um pouco de vinho no copo.

— Vejamos. Em minha opinião, Benjamin deve ter levado uma hora entre avisar oreverendo e localizar Hessler e Yardley. E eles não chegarão tão rápido quanto eu, poiscomeçou a chover forte. Deve ser quase meia-noite. Portanto, coma e descanse umpouco.

Existia algo de muito íntimo no fato de estarem recostados em uma cama, dividindo

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uma refeição. Apesar de seus sentidos estarem todos alerta, Hannah cedeu ao cansaço eadormeceu.

Theo ficou satisfeito ao vê-la relaxar e adormecer. A encantadora filha doreverendo ainda não sabia, mas seria sua esposa. Cogitou o fato de abordar logo oassunto, mas pensou melhor e resolveu adiar tal informação.

Colocou a bandeja no chão e abraçou Hannah, aconchegando a cabeça delicadaem seu ombro. E, mesmo contra a vontade, também acabou por adormecer.

Despertou com um barulho no andar inferior.

— Hannah, acorde. Algo está acontecendo lá embaixo.

— O quê?

Ambos apuraram a audição. Soavam passos escada acima. Theo se levantou.Podiam ouvir um homem muito irritado:

— Vocês, seus idiotas, fizeram uma confusão de uma tarefa bem simples. Tenhocerteza de que Taggert lhes deu as ordens corretas!

Theo olhou para Hannah, que sussurrou o nome de Castlemaine. Ele assentiu.

— Como poderíamos saber? Achamos que ele era o senhor. Estava vestido comoum lorde.

— Vocês são uns estúpidos! Agora abram essa maldita porta! E assim, Horatioentrou, seguido de dois outros homens.

— Minha querida Hannah, minha adorável menina! Você está bem? Estes imbecisa machucaram? Eu teria chegado mais cedo, mas a estrada está terrível. — O lorde sevoltou para os que o acompanhavam. — Onde está o nobre a que se referiram?

— Bem aqui — anunciou Theo.

Castlemaine correu em direção a Hannah e puxou-a da cama, abraçando-a.

— Está tudo bem, querida. Você está segura agora. Eu a salvei. Tudo ficará bem.Iremos nos casar e não haverá falatório algum.

Antes que Theo pudesse protestar, Hannah deu uma sonora bofetada em Horatioque o fez perder o equilíbrio.

— Seu cretino arrogante! Orquestrou isso tudo só por uns acres de terra!

— Sei que está aborrecida, querida... — Antes que pudesse terminar a frase, umavoz ouviu-se no andar de baixo.

— Castlemaine! Você está aqui? A Sra. Grimes veio comigo. — Era Mayfield, quese aproximava.

Sra. Grimes? Theo recordou-se de sua tia dizendo que era a maior faladeira da

região. A última peça do quebra-cabeça fora posta no lugar. O visconde sorriu, comdiscrição.

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Mayfield parecia bastante satisfeito, até seu olhar detectar Theo.

— Amesbury? O que faz aqui?

— Posso fazer a mesma pergunta, milorde. Como um cavalheiro de sua posição sepresta ao papel de comprometer uma donzela?

— Ora essa, Castlemaine e eu ouvimos falar sobre o que aconteceu e viemossalvar esta moça. Apenas trouxe a Sra. Grimes...

—.. .para certificar-se de que sua história seria do conhecimento de todos.

— Eu... eu lhe asseguro que... Mais uma vez Theo o interrompeu:

— Pare com isso, Mayfield. Ambos sabemos quais eram suas intenções. Além domais, ouvimos quem deu as instruções a esses homens. Taggert, que agora trabalha paravocê. — E dirigindo-se a Hannah: — Não se preocupe. Tudo ficará bem.

Em seguida, fez com que os presentes vissem sua pistola.— Todos para baixo.

Quando chegaram à sala no andar inferior, encontraram Britton, Hessler, Yardley eo reverendo, que chegara momentos antes.

— Papai! — Hannah correu para os braços dele.

— Bem, major — disse Yardley. — Não creio que precise de nós.

— De qualquer forma, fico contente por vê-los aqui.

Os primeiros sinais do alvorecer já se faziam visíveis. Theo mandou BenjaminBritton levar Hannah e o reverendo em casa. Mayfield e Castlemaine, ainda clamandoinocência, partiram juntos na mesma carruagem, levando a Sra. Grimes consigo.

Por fim, Tim Hessler fez a indagação que pairava na mente de todos que ficaramno chalé:

— O que vai fazer com eles, milorde?

— Podemos matá-los e enterrá-los no bosque — sugeriu Yardley.

— Não podem fazer isso! Só estávamos cumprindo ordens!

— Então, mande-os para a prisão. Alguns meses de trabalhos forçados não lhesfaria mal. — Hessler deu risada.

— Reviste-os para ver se têm armas — ordenou Theo. — Em seguida, prenda-osno quarto onde estava a sita. Whitmore. Amanhã cuidarei deles. Esses idiotas nãopassam de paus-mandados.

— Sim. Mandados por Taggert — lembrou-o Yardley. — Ele também merececastigo.

— Acredito que Mayfield a esta altura já deve ter providenciado o desaparecimentodele — afirmou Theo, com certo pesar.

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Capítulo XXI

Na tarde do dia seguinte, Hannah ouviu batidas na porta de seu quarto.

— Por favor, filha, você não pode se esconder aí desse jeito! Hannah girou amaçaneta e notou pela expressão da mãe que sua aparência deveria estar pior do queimaginava.

— Só hoje. Não estou preparada para encarar nenhuma visita ainda.

— Lorde Amesbury esteve aqui e queria vê-la. Disse-lhe que estava dormindo, masque o receberia amanhã.

"Ótimo. Isso me dará vinte e quatro horas para me recuperar."

— Obrigada, mamãe.— Milorde ficou um longo tempo na biblioteca conversando com seu pai.

"Sobre o que será que falaram?" Teria de esperar até o dia seguinte paradescobrir.

Conforme prometera, Hannah desceu para o desjejum. Em seguida, ofereceu-separa ajudar o pai com o trabalho de arquivo. Encontrava-se concentrada nessa tarefa,quando lorde Amesbury chegou.

O visconde cumprimentou-a e convidou-a para um passeio pelo jardim. Hannaholhou para o pai, como a pedir consentimento, e ele abriu-lhe um largo sorriso.

Caminharam um pouco e sentaram-se em um banco embaixo de um elmo, quefornecia uma bela sombra.

— Acho que sabe por que estou aqui, Hannah. — Tocou-lhe o queixo com a pontados dedos, obrigando-a a encará-lo. — Você terá de se casar comigo agora, sabe disso?Falei com o reverendo ontem, e chegamos à conclusão de que é o melhor a fazer.

— Não!

— Não?— Não. Não serei forçada a um casamento e muito menos aceitarei um marido que

se sente obrigado a pedir minha mão.

—Talvez tenha tido pouco tato ao fazer o pedido. Mas, Hannah, seja razoável.Precisamos tomar essa atitude. Após o que houve, não acredito que nutra algum tipo deaversão a mim.

Hannah sentiu-se enrubescer.

— Aquilo foi... devido às circunstâncias. Estávamos em uma situação inusitada e...bem... aconteceram coisas que não deveriam ter acontecido.

— Está arrependida de ter me beijado? Achou a experiência tão repulsiva?

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— Claro que não. Contudo, isso não é base para um casamento. —Pois eudiscordo. Trata-se de um elemento muito importante.

— Sinto muito, lorde Amesbury, mas acho que não daria certo uma união entrenós.

— E por que não?— Ora, isso deveria ser resposta suficiente para um cavalheiro! —Talvez minha

parte soldado supere a de cavalheiro. Portanto, retornarei amanhã para continuarmosesta batalha.

— Por favor, milor... Theo. Não faça isso comigo. Ele acariciou-lhe a face.

—É meu dever, doçura. Nesse meio tempo, deve discutir minha oferta com seusfamiliares. Estou certo de que concordarão que esse é o melhor caminho.

Mais tarde, ao jantar, Hannah conversou com os pais sobre a oferta do visconde.

— Filha, você recusou o pedido de um homem decente que um dia será conde?Não pode estar falando sério!

— Não estou à procura de títulos, mamãe.

— Evidente. E também não pensou em sua família quando resolveu se precipitar.

— Está me chamando de egoísta?!

— É isso mesmo o que está sendo. Egoísta e orgulhosa. Lorde Amesbury estásendo honrado, e você recusa?!

Hannah controlou a vontade de chorar.

— Não quero que ele se sinta obrigado a casar-se comigo!

— Hannah, não está em condições de agir como uma adolescente tola. Foiflagrada sozinha com o visconde no quarto de um chalé no meio do bosque, e napresença da maior mexeriqueira de Crofton. Todos a esta altura já devem ter conhecimento disso.

— Mas não aconteceu nada que justifique um casamento.

— Isso não interessa. As aparências é que contam em uma situação assim. Deusdo céu! Sei que está inocente, filha, mas deve pensar em suas irmãs, sobretudoKatherine. Um escândalo como esse arruinaria as chances de ela arranjar um maridoadequado. Fale alguma coisa, Charles. Você é o único a quem essa menina ouve.

— Temo que sua mãe esteja certa, querida. Lorde Amesbury fez-lhe uma ofertahonrada, e não creio que sintam aversão um pelo outro.

— Papai, acha mesmo que devo fazer isso?

— É o melhor para você. A família sobreviveria ao escândalo, mas ele a seguiria

pela vida inteira, filha. Não lhe aconselharia a casar-se se a oferta tivesse partido deCastlemaine, mas Amesbury é um bom homem.

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Hannah sentiu as lágrimas correrem-lhe pela face.

— Está bem. Concordo. Eu aceito. Lucy se levantou e abraçou a filha.

Mediante uma licença especial, lorde Amesbury e Hannah se casaram dez diasdepois. Os pertences dela haviam sido transferidos para a mansão dos Glosson três dias

antes.Após a festa, à qual compareceu quase toda a alta sociedade londrina, bem como

os cidadãos de Crofton, dirigiram-se a seu novo lar.

Theo abriu a porta de seu quarto e convidou-a a entrar, com uma reverência. Ofogo crepitava na lareira, e uma única lamparina estava acesa, conferindo ao ambienteuma elegância aconchegante. Na mesa, uma garrafa de champanhe em um balde degelo.

— Vejo que minha mãe cuidou de todos os detalhes.

— Muito gentil da parte da condessa.

Ele parou no meio do aposento e pôs ambas as mãos no rosto delicado deHannah.

— Tive vontade de fazer isto o dia todo. — Seu beijo lento, gentil e terno despertouuma vontade incontida dentro dela. — Quero que divida este quarto comigo. Contudo, sequiser ficar em seu próprio aposento, respeitarei sua vontade.

— Não divido uma cama com ninguém desde que minha irmã Dorothea se casou.Mas... gosto da idéia de dividi-la com você.

— Ah, Hannah!

Theo a tomou nos braços e cobriu-lhe os lábios com a boca ávida. O beijo seprolongou até ambos ficarem sem ar. Ele começou a retirar-lhe os grampos dos cabelos,correndo os dedos pelas mechas macias.

— Tenho sonhado tanto com isto.

—Eu também—ela admitiu.—Mas você leva vantagem sobre mim.

— O que quer dizer?

— Sabe aonde ir a partir daqui, eu não. Sou inexperiente nesses assuntos.

— Um problema de fácil solução, querida.

Os dedos ágeis estavam ocupados, desabotoando as dezenas de botões quecompunham a parte de trás do vestido de noiva. Enquanto isso, ia dando beijos sensuaisno pescoço alvo e nos ombros delicados.

Hannah também mantinha as mãos ocupadas, desabotoando-lhe o casaco.

— Espere um momento. — Em seguida, Theo descalçou os sapatos e livrou-se do

restante dos aparatos.

Ela imitou-o e despiu o vestido, livrando-se também dos sapatos. Ficou diante do

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marido, tremendo de antecipação.

Em instantes, Theo e Hannah estavam completamente nus. Ela, apesar de umtanto envergonhada, admirava os vigorosos músculos masculinos. Ele se admirava detamanha formosura perante seus olhos.

— Meu Deus! Você é maravilhosa!Em seguida iniciou uma seção de beijos e carícias por toda extensão do corpo da

mulher amada. Com a ponta da língua, lambia-lhe um mamilo e depois o outro, até elapensar que explodiria de prazer e desejo.

Hannah jamais sonhou que pudessem existir sensações tão surpreendentes. Umsentimento de entrega total a um homem e, em seu devaneio, queria mais, muito mais.Tudo o que Theo pudesse lhe dar.

Ele a pegou no colo e a deitou na cama. Em seguida, seus dedos tocaram a parte

mais íntima de Hannah, que ficou paralisada durante alguns segundos, pois temia mexer-se e derreter por inteiro, qual a lava de um vulcão. Abaixando-se, Theo acariciou com alíngua o lugar onde os dedos haviam estado até então.

Ela sentiu o mundo parar e achou que desmaiaria. Ouviu um gemido rouco eassustou-se quando notou que saía de sua própria garganta.

Theo afastou-se por um momento, mas foi impedido por ela.

— Não, Theo, por favor...

— Por favor o quê, meu bem? — provocou-a.

— Por favor, não pare!

— Nem que disso dependesse minha vida, meu amor.

Com apetite voraz, reiniciou as carícias até encontrar-lhe a boca faminta. Passou apenetrá-la com imensa suavidade, beijando-a ao mesmo tempo.

A princípio as investidas eram lentas, mas pouco a pouco se intensificaram, àmedida que Hannah correspondia, até que os movimentos se unificaram em um só desejopara alcançarem juntos o ápice da paixão.

Theo se deixou cair sobre ela, exaurido e feliz.

— Theo?

— Humm?

— É sempre assim?

— O quê?

— E sempre assim entre os casais?

— Não. Vai ficando cada dia melhor, querida.

— Oh... Eu achei... que... foi... maravilhoso! Rindo, ele a puxou para si.

— Eu também, doçura.

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Capítulo XXII

Theo respirava com dificuldade. O cavalo se contraía a cada movimento de suaspernas. Os mortos acusavam... acusavam... acusavam...

— Não! Agora não! — Levantou-se da cama de um pulo e deparou com dois olhosmuito abertos encarando-o.

— Theo? O que é isso? Ele piscou várias vezes.

— Nada. Apenas um pesadelo. Volte a dormir, querida.

— Como nada? Não vai me dispensar com duas palavras. Conte-me.

— É apenas... um sonho. Não é real. Mas se repete quase todas as noites.

— Conte-me, Theo. — Acomodou o travesseiro embaixo do cotovelo, segurando anuca com uma das mãos, e aguardou.

Theo obedeceu. Revelou-lhe o pesadelo sem omitir um só detalhe.

— E tem vivido com esse horror por quase dois anos? Você se culpa por essasmortes. — Não era uma pergunta, e sim uma afirmação com uma ponta de ceticismo.

— Creio que sim.

— Até Molly Tettle e Francis? E também Henshaw e Slater?

— Sei que não faz sentido, mas é assim! — Ele tentou controlar a fraqueza que ofazia tremer. Eu deveria...

— O quê? Ter morrido junto com eles? Mas não morreu. Graças a Deus!

— Eu não...

— Theo pense bem. O que teria acontecido se tivesse desobedecido as ordens deseu superior? Isso não teria uma repercussão negativa no campo de batalha? Pode

imaginar o resultado dessa atitude?Ele a encarou, espantado. Era uma questão tão simples e ao mesmo tempo nunca

tinha visto por esse prisma.

— A morte daqueles homens não foi culpa sua. E tampouco a morte de Molly. Elasabia como Logan era, mas achou que deveria fazer o que fez. Todos nós fazemosnossas escolhas até quando nos omitimos. E não vale a pena revivê-las a cada momento,mesmo que tenham sido erradas.

— Você não entende...

— E suas escolhas não foram todas erradas. Você salvou a vida de cinco homensalgumas semanas atrás. Deu a Henry e Jane uma chance de viver e serem felizes.

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O visconde exalou um longo suspiro e sentou-se no colchão. Abraçou-a, e ficaramassim por um longo tempo.

— Theo?

— Humm?

— Você está bem?

— Acho que sim. — Pressionando os lábios contra os cabelos dela, inalou a suavefragrância de lavanda. — Não sabia que tinha me casado com tamanha fonte desabedoria.

Hannah sorriu e o beijou.

— Uma fonte de sabedoria faminta.

— Pobrezinha! Só agora me dei conta de que não jantamos. Fique aqui, madame.

Vou preparar uma suculenta refeição.Sem demora, Theo estava de volta com uma bandeja cheia de queijos, frutas e

diversos tipos de pães, duas taças e uma garrafa de champanhe. E de novo dividiramuma refeição na cama. Mas dessa vez com a cumplicidade existente entre marido emulher.

— Adoro piqueniques — disse ela, feliz.

— É mesmo, minha adorável esposa? Pois espere até ver a sobremesa.

E a sobremesa levou-a outra vez às alturas.

Era quase meio-dia quando Theo e sua mulher resolveram deixar o paraíso.

— Bom dia! — cumprimentou a condessa, que se encontrava em companhia dafilha e dos netos. — Os homens saíram. Disseram que iam caçar alguns coelhos, masacho que estavam fartos das conversas femininas.

Cassandra também sorriu e deu as boas-vindas ao casal.

— Nós partiremos amanhã — informou ela. — Dwight não gosta de ficar longe dacidade por muito tempo.

— Nós também — a condessa disse. — Glosson tem negócios com Os CincoAudazes.

Quando conseguiu ficar a sós com o filho, a condessa externou suas dúvidas.

— Não precisa se preocupar, mamãe.

— Mas eu me preocupo. Esse é o papel das mães. Afinal, tudo aconteceu tão derepente, e as circunstâncias... bem em apenas nove dias você foi obrigado a pedir a mãoda moça, mas agora...

— Está tudo em ordem, querida. Hannah e eu nos damos bem. — Beijou a testa deMargareth. — Talvez melhor do que esperava.

— Meu Deus! Você está apaixonado por ela! De verdade!

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— Creio que sim. Ou melhor, sim, estou. Mas acho que Hannah ainda não estápreparada para ouvir isso.

— Não subestime as mulheres, meu filho. Ela é mais forte do que imagina.

— Talvez, mas não quero assustá-la.

— Pois eu o aconselho a dizer-lhe o mais breve possível. Foram interrompidos pelobarulho das crianças, que se aproximavam, felizes.

Nas semanas que se seguiram, a vida na mansão dos Glosson tornara-se quaseidílica. Porém, nem Hannah nem Theo se esqueceram dos compromissos que oscercavam.

Theo fazia planos para construir edifícios de apartamentos para melhor acomodar os empregados de sua tecelagem.

— É muito generoso de sua parte — disse Hannah certa ocasião em que discutiam

o tema.

— Não há nada de generoso nisso, meu amor.

— Como assim?

— As pessoas precisam de um lugar decente para viver e criar seus filhos, e alongo prazo serão muito mais produtivos na tecelagem.

— E esse é seu único objetivo, lógico...

— Evidente. — E Theo encerrou a discussão ao dar-lhe uma mordidinha no lóbulo

da orelha.

Hannah descobriu que seu novo título de lady Amesbury trouxe-lhe muito maisatribuições do que supusera. O comitê para reconstrução da escola insistiu para quefosse a presidente, e choviam convites para que o novo casal participasse de diversoseventos. Hannah aproveitava todas as ocasiões para propalar suas idéia de educar crianças menos afortunadas. Foi uma conquista quando conseguiu arrebanhar duasaliadas de peso para sua causa: lady Kitchener e a Sra. Childress.

David Moore sempre os visitava, e Hannah suspeitava que havia mais que uma

simples amizade para aquelas freqüentes vindas à mansão dos Glosson. De qualquer forma, gostava bastante dele e divertia-se com sua presença.

As refeições noturnas sempre contavam com a presença de tia Mathilda Stimson eDavid, como dessa vez.

— Vocês ouviram os rumores de problemas na Tecelagem Mayfield? — Mathildaquis saber.

— O barão tem tido vários entraves — respondeu David.

— Tais como? — Hannah arqueou as sobrancelhas.

— Bem, ele pensou que tinha se livrado de uma certa professorinha incômoda,mas descobriu que ela voltou mais fortalecida do que nunca, agora que o marido dela

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apóia todos os seus atos. — Lançou um olhar significativo para Theo.

— Ouvi dizer também que está fazendo a corte a lady Olívia -— comentou a tia.

Hannah ficou muito quieta, aguardando a reação do marido.

— Sim. Também ouvi isso. Mas na realidade estou mais interessado no progresso

de um outro namoro. — Piscou para o amigo.

— Creio que em breve terei boas notícias, meu amigo. Anne está conseguindoconvencer o pai. Mas, voltando a Mayfield, ele o culpa por todos os seus problemas,Theo. Se eu fosse você, cuidava da retaguarda.

— Está se referindo ao incêndio no celeiro da Tecelagem Mayfield? — perguntou.

—Certo, Hannah. Uma boa parte de algodão que seria utilizado ficou destruída.

— O barão não pode culpar Theo por isso! — protestou ela.

— Ele sabe muito bem que eu não tenho nada com isso. — O visconde ficouirritado.

— Sim, mas sabe também que os operários dele estão cada dia mais insatisfeitos,enquanto os seus lhe são leais. Olhe, eu não gostaria que nada de mal acontecesse avocê ou a lady Amesbury.

A Sra. Stimson decidiu indagar a David sobre a recente viagem que fizera aBrighton.

Uma hora depois, em seu quarto, Hannah perguntou a Theo:

— Acredita mesmo que lorde Mayfield seria capaz de fazer algo perigoso?

— Além de seqüestrar uma dama?

— Nesse caso, ele pensava estar ajudando um amigo.

— Mas o resultado poderia ter sido desastroso, Hannah. Venha cá. EsqueçaMayfield. Quero levar minha adorável esposa para a cama.

Hannah obedeceu de pronto.

Bem mais tarde, Theo continuava acordado, pensando na conversa que tiveram

durante o jantar. Também estava ciente da crescente insatisfação entre os trabalhadoresdas indústrias têxteis. Sabia que muitos proprietários de tecelagens se ressentiam dasmudanças instituídas por ele em seus negócios. Porém, não tentava mais convencê-losdas vantagens de seu ponto de vista. Sabia, entretanto, que os rumores diziam que,apesar de o horário de trabalho ter sido reduzido na Tecelagem Glosson e de não haver mais crianças muito novas trabalhando lá, os lucros aumentaram bastante. Aquilo irritavaos que esperavam vê-lo afundar.

Informaram-no também de dois atentados contra Mayfield. Uma balsa que

transportava matéria prima para a tecelagem afundou em circunstâncias misteriosas. Ealguns dias mais tarde a mãe de Mayfield, ao viajar para Londres, teve sua elegantecarruagem atacada por bandoleiros, que lhe levaram as jóias e aterrorizaram a pobre

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senhora.

Na verdade, Theo achava que Mayfield merecia sua má sorte, mas aquilo já estavaindo longe demais.

No dia seguinte, o visconde resolveu convocar os operários, junto com David

Moore e Larkin.— Tenho certeza de que nenhum de meus homens está envolvido nesses

lamentáveis incidentes que têm ocorrido a Mayfield. Contudo, esses atos podem ter conseqüências catastróficas e até tirar a vida de gente inocente.

— E o que quer que façamos, milorde?

— Em primeiro lugar, Cranston peço que nenhum de vocês encoraje esse tipo deação. Além do mais, quero que espalhem por aí que eu, pessoalmente, cuidarei para queos autores do próximo incidente semelhante sejam punidos na forma da lei.

Ao anoitecer, Yardley reportou-lhe os comentários de que "todos industriais sãofarinha do mesmo saco". Os ataques a Mayfield, contudo, terminaram.

Estando em suas férias de verão, Hannah dedicava-se com afinco à reconstruçãoda escola. Mantinha também seu interesse na Corresponding Society.

A princípio hesitara em continuar freqüentando as reuniões, pois temia que osmembros a rechaçassem, agora que virará lady Amesbury. Afinal, casara-se com umproprietário de tecelagem. Todavia, para sua surpresa, continuavam a tratá-la como umdeles, mesmo sendo a maioria dos membros composta de operários, além de

comerciantes e profissionais liberais.Theo se afligia pelas atividades de Hannah, temendo que se envolvesse em

alguma confusão que pudesse colocá-la em perigo. Por isso, quando ela lhe disse quequeria ir a Setpoint para assistir à palestra do Sr. Hunt, os dois se desentenderam edisseram coisas de que viriam a se arrepender.

Capítulo XXIII

Knowlton estendeu um bilhete a Theo, que o leu e em seguida entregou-o a David.

— É de Yardley. Estranho...

— O que é tão estranho? Diz aqui que tem algo a lhe dizer. Não será a primeiravez que lhe traz informação, não é mesmo?

— Sim, David, mas Dick pede que o encontre na Wild Boar. Ele costuma vir atéaqui ou nos encontramos na Silver Shield. Mas talvez tenha um motivo para escolher esse local. Tenho de ir. Se não voltar até a hora do jantar, apresente minhas desculpas aHannah, por favor.

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David assentiu, preocupado.

Ao se encaminhar para o local de encontro, Theo recordou-se da última vez emque estivera naquele estabelecimento e encontrara o corpo de Logan. Ao entrar nataverna, não viu Yardley. O taverneiro encarou-o e fez um gesto com a cabeça emdireção ao corredor, que levava a uma sala privativa nos fundos.

— O pessoal o aguarda.

Os sentidos de Theo puseram-se logo em alerta, e ficou satisfeito por ter trazido apistola no coldre. Abriu a porta da sala, mas não reconheceu de imediato o homemsentado à mesa. A luz era fraca, e ele se mantinha de costas. Foi quando sentiu, sem ver,que havia outra pessoa na sala.

— Bem-vindo, lorde Amesbury.

— Taggert! O que você quer? O que fez com Yardley? A risada do homem era um

grunhido assustador.— Ora, não vejo seu menino de recados há algum tempo.

— O bilhete foi forjado?

— Bom trabalho, não é mesmo? Tenho esse talento.

— O que quer, afinal?

— Está tentando destruir minha vida desde que aqui chegou, milorde. Primeiro,demitiu-me. Depois, interveio em meus negócios com Mayfield. Foi culpa sua ele ter me

dispensado. Mas isso não vai ficar assim. Talvez o senhor tenha o mesmo destinodaquele seu irmão metido.

Taggert fez um gesto, e dois homens surgiram das sombras, agarrando Theo pelosbraços. Um deles retirou-lhe a pistola do cinto.

— Agora, milorde, vamos fazer um belo passeio pelo bosque. É uma lástima,porém, mas um de nós não vai voltar.

— Você não escapará impune, Taggert!

— Todos pensarão que lorde Amesbury teve um acidente fatal. Afinal, é sabido que

a família tem uma queda pela velocidade. Além do mais, quando seu corpo for encontrado, já estaremos longe.

— Deveria ter desaparecido há muito tempo. Ainda o verei enforcado pela morte demeu irmão, miserável!

Taggert ignorou as palavras do visconde.

— Carl, amarre as mãos dele. Sam, verifique o corredor e a taverna. Nãoqueremos visitantes inesperados.

Os quatro homens saíram para a escuridão noturna.— Pegue os cavalos, Sam. Acho que vai se divertir muito neste seu último passeio,

milorde.

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—Eu não diria que este será seu último passeio — disse alguém, atrás deles.

Taggert e os outros se viraram de súbito. Sam sacou a pistola e atirou em direçãoà voz. Theo perdeu o equilíbrio, quando o cavalo que montava de mãos amarradasagitou-se. Tentando guiar o animal com as pernas, conseguiu derrubar Carl com umgolpe.

— Não vai escapar tão fácil! — Taggert apontava a arma para a cabeça de Theo.

Naquele momento, ouviu-se um estampido, e Taggert caiu morto antes que odisparo que fazer encontrasse seu alvo.

David Moore e Dick Yardley correram no encalço dos outros dois homens,dominaram-nos e desamarram Theo. Os tiros atraíram os fregueses da taverna para fora.

Quando o xerife chegou e os ânimos foram acalmados, Theo agradeceu pela ajudados amigos.

— Estou contente por termos vindo a tempo. — Yardley sorria.

Chegaram bastante atrasados para o jantar. Hannah esperava, nervosa. TiaMathilda levara uma bandeja e fora fazer uma refeição em seu quarto.

Apesar de a primeira intenção ter sido esconder o ocorrido da esposa, Theo eDavid concordaram que seria mais aconselhável dar-lhe uma versão resumida dos fatos.Afinal, os rumores não demorariam a alcançá-la.

Mais tarde, já em seus aposentos, sentado muito à vontade em uma poltrona emfrente à lareira, Theo fingia ler, enquanto aguardava, ansioso, pela chegada da esposa.

—Você poderia ter morrido—disse ela, ao entrar no dormitório.

— Também posso quebrar meu pescoço ao cair de uma escada.

— Poderia ao menos ter me contado antes de sair correndo para tal encontro.

— Não havia tempo, meu bem. O bilhete dizia que era urgente.

— Mesmo assim. A única explicação que tive foi um recado enigmático domordomo dizendo que chegaria tarde. Pensei que... bem... pensei...

— Pensou o quê? — Theo ficou de pé e se postou diante dela.— Sei lá. Que estava aborrecido comigo e que... Ah, não sei! Theo pegou-lhe as

mãos.

— Achou que saí para espairecer minha raiva?

— Isso mesmo.

— Eu fiz isso, mas mais cedo. Fui fazer uma vigorosa cavalgada. — E começou adistribuir beijinhos na testa e no nariz dela, desenhando com a língua uma trilha até a pelesensível dos ombros.

— Não pense que me distrairá com tanta facilidade. Poderia estar morto!

— Mas não estou. Na realidade, sinto-me mais vivo que nunca. Deixe-me mostrar-

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lhe.

Theo soube que a distraíra assim que sentiu os braços delicados envolverem-lhe opescoço. Mas sabia também que teriam de voltar a discutir aquele assunto. Porém, nãonaquela noite.

O amor que fizeram não perdeu o arrebatamento, no entanto Hannah sentia quealgo se perdera na briga daquela tarde. Era como se cada um deles temesse revelar oque se passava em seu interior. Pensaria nisso depois. Naquela noite, sentia-seagradecida apenas por tê-lo em segurança junto a si.

Assim, desenrolaram-se as semanas, com cada um deles ocupando o tempodurante o dia. À noite, satisfaziam seu mútuo desejo. E nenhum dos dois mencionava apalestra do Sr. Hunt em Setpoint.

No dia do evento, Hannah ouviu uma batida na porta do quarto de vestir.

— Entre.— Quer dizer que pretende mesmo participar desse encontro? Ela empinou o

queixo.

— Claro. Dei minha palavra. Irei com os Melton e os Sturgese.

— Sendo assim, nos veremos lá.

— Você também vai?

— Não perderia isso por nada. Essa ocasião promete entrar para a história.

Hannah não respondeu, e continuou se vestindo. Escolheu um traje vermelho ebranco de algodão, pois fazia calor naqueles meados de agosto. Usava também umchapéu com aba larga e flores vermelhas.

Hannah e seus amigos viajavam em carruagem aberta. Passaram por váriosgrupos de pessoas que se encaminhavam para o local do encontro a pé. Homens,mulheres e crianças, todos vestidos com suas melhores roupas de domingo.

Conforme se aproximavam de Manchester, mais aglomerações eram vistas, porémnão havia nenhum sinal de desordem. E, acima de tudo, notava-se uma sensação de

expectativa. Hannah sentia orgulho de seus vizinhos, e ficou satisfeita por estar ali paraouvir um dos melhores oradores do país.

Henry Hunt era um homem de estatura alta e trajava roupas sóbrias.

Uma vez na plataforma, Hannah foi engolfada pela magnitude daquele evento.Theo estava certo. Aquilo era histórico, talvez épico em suas proporções. Váriasbandeiras se agitavam no campo, identificando diferentes grupos que queriam dar asboas-vindas ao orador. Viam-se várias faixas com diferentes dizeres: "União e Força","Liberdade e Fraternidade", "Sufrágio Universal". A multidão ovacionava com fervor,

enquanto Hunt se dirigia em direção ao palanque. Só depois de várias investidas, elepôde começar seu discurso.

Mal pronunciara algumas palavras, contudo, e um pandemônio instaurou-se. A

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multidão tentava chegar-se à frente para ouvi-lo melhor. Os guardas que cercavam opalanque tinham dificuldade em conter a todos.

Hannah ouviu um dos policiais próximos dizer: "Esse é o sinal, prendam o safado".Segundos depois, viu uma fileira de homens uniformizados vindo naquela direção. Era aGuarda Montada de Manchester.

— Oh, não! — exclamou.

Era aquilo o que Theo tanto temia, apesar de ter ficado impressionado com aordem e a disciplina que encontrara no local. Assim que chegou à cidade, foi logoconvidado a juntar-se aos magistrados que assistiam ao evento da sacada do edifício queladeava a praça.

Cerca de vinte homens bem-vestidos externavam sua crescente preocupação.Além de oficiais do governo, viam-se vários proprietários de tecelagens. Theocumprimentou com um gesto de cabeça Kitchener e Childress, e avistou Mayfield.

— Meu Deus! As pessoas não param de chegar — um dos magistrados comentou

— Quantos estarão aqui reunidos? — perguntou outro.

— Por volta de sessenta mil, imagino.

— Quem diria que tamanha aglomeração pudesse estar tão organizada?

— Bom Deus! Se são capazes de se organizar assim para um encontro pacífico,imagine o que não fariam com armas nas mãos. Seriam capazes de fazer a mobilizaçãode Paris parecer um bando de cordeirinhos. — Lorde Kitchener meneou a cabeça.

— Tem razão. — Childress imitou seu gesto.

—Hulton, você deve pôr um fim nisso — resmungou Mayfield, dirigindo-se ao chefedos magistrados.

— O encontro é legal, barão. E os guardas estão prontos para prender o homemno momento em que a situação fugir de controle.

— As coisas já fugiram de controle! Veja. Eles estão acuando os guardas! Essespobres-coitados precisam de ajuda imediata.

Theo odiava ter de concordar com Mayfield, mas os guardas estavam mesmotendo dificuldade em conter o povo. O problema era que enviar a Guarda Montada seriaexacerbar a situação. Todos sabiam que eles eram um bando de oficiais mal treinados.Muitas vezes serviam de chacota para a população.

— Está bem — concordou Hulton, irritado.

Em seguida, deu sinal para que os guardas prendessem Hunt e ao mesmo tempopara que a Guarda Montada de Manchester entrasse em ação.

Theo via, horrorizado, a Guarda Montada jogar os cavalos em cima das pessoas,para que se dispersassem. Todavia, o efeito foi contrário e, como suas ordens não foramatendidas, e vendo-se cercados, os guardas começaram a desferir golpes de espada a

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torto e a direito. Gritos de mulheres e crianças que caíam feridos eram ouvidos por todaparte. Cidadãos eram pisoteados pelos cavalos, assustados com a gritaria generalizada.

— Meu Deus! — Theo gritou. — É um massacre! Os demais magistrados tambémestavam terrificados.

— Que desastre!— É pior do que Waterloo!

Theo se dirigiu a um senhor que até então falara muito pouco. Tratava-se de sir Dennison Stewart, tenente do distrito e representante oficial de Sua Majestade, cujaautoridade superava a dos magistrados.

—Milorde — implorou Theo —, o senhor deve liberar o Exército!

— Claro. Tem razão, Amesbury.

Theo esperou apenas para ver que o tenente dava as ordens necessárias e saiu doedifício em direção à multidão, determinado a retirar Hannah daquela carnificina. Naúltima vez que a vira, sua expressão estava transfigurada pelo horror.

O caos reinava na praça. Os guardas conseguiram prender Hunt, e a multidãocorria em todas as direções. Por um momento, o visconde quase entrou em pânico aoconstatar que perdera Hannah de vista. Onde estaria ela? Será que algo de mal lheacontecera? Se a perdesse, sua vida não teria mais sentido.

Pouco a pouco, o Exército bem treinado conseguia restaurar um pouco de ordem.Utilizando as espadas embainhadas, empurravam as pessoas para fora da praça.

Uma nuvem de poeira levantava-se das patas dos cavalos. Os que permaneciamna praça estavam feridos ou mortos.

Por fim, Theo avistou Hannah ajoelhada, segurando a cabeça de uma mulher ferida.

— Hannah!

Ela ergueu o rosto, e seus olhos brilharam de alívio e alegria ao ver o marido.

— Graças a Deus você está aqui! — Virou-se para a mulher. — Ficará bem, minha

amiga. Vamos buscar ajuda, e prometo que encontraremos sua filhinha.

Theo a abraçou.

— Hannah! Se a perdesse, não sei o que faria...

— Calma, eu estou bem. Precisamos ajudar esta pobre gente.

Trabalharam juntos durante toda a tarde e noite adentro, tratando dos feridos,ajudando a procurar crianças perdidas, devolvendo-as aos pais e confortando aquelesque perderam os parentes.

Quando já não havia mais ninguém na praça, fizeram uma inspeção pelo local.Onde tudo começara como um alegre dia de feriado, agora havia apenas desolação.Restos de lanches, cartazes rasgados, roupas, chapéus, sapatos e outros objetos. Alguns

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Questões do Coração (The Viscount´s Bride) – Wilma Counts (CH 285)

deles ensangüentados. Tudo isso envolto em um mar de poeira e lama.

Hannah apanhou uma boneca quebrada, e Theo viu lágrimas escorrerem pelorosto de sua amada. Abraçou-a com ternura e ficaram assim por um longo tempo.

— Vamos para casa, meu amor — disse o visconde. Ela apenas assentiu.

Na carruagem, a caminho de seu lar, continuaram abraçados. Theo não parou deafagá-la até que a sentiu relaxar. Por fim, cedendo à exaustão, Hannah adormeceu emseus braços.

Ela despertou com o veículo parando diante da mansão dos Glosson.

— Milorde! Milady! Estávamos tão preocupados! Após todos os rumores do queaconteceu em Manchester! — saudou-os o mordomo.

— Estamos bem, Knowlton, apenas exaustos. Um banho e uma sopa é tudo quede precisamos — Theo afirmou.

Momentos mais tarde, Hannah agradecia em silêncio ao avô de Theo, quemandara construir um imenso reservatório de água ao lado da cozinha que ficava sempremorna.

Theo massageava-lhe as costas, e ela podia sentir o corpo voltando à vida sob otoque das mãos experientes. Ele passou a lhe jogar água nos seios e ao mesmo tempoacariciava os mamilos enrijecidos. Em seguida, deslizou os dedos até o centro das coxasmacias, fazendo-a estremecer.

— Devemos tomar nossa sopa primeiro ou prefere começar pela sobremesa? — avoz dele era rouca.

— Sobremesa! — Ela o encarou, sem hesitar.

Theo obedeceu de imediato e, enxugando-a com extrema gentileza, colocou-asobre a cama, onde conseguiram livrar-se de todo o horror daquele dia fatídico. Era opoder da criação expurgando os resquícios da destruição.

Quando terminaram, Hannah queria apenas ficar ali para sempre, abraçada àquelehomem maravilhoso, sentindo-se segura e amada. Entretanto, sentia também umanecessidade de conversar com o marido.

— Theo?

— Sim?

— Sinto muito.

— Por quê? Eu achei muito bom.

— E foi, bobinho. Sinto muito pela briga que tivemos. Não devia tê-lo acusado deinsensível às necessidades de nosso povo.

-— Bem, tento ser sensível a suas necessidades, meu bem.— Theo, estou tentando ter uma conversa séria, e tudo em que consegue pensar é

nisso?

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— Tudo bem. — Ele se sentou no colchão, fitando-a. — Não precisa se desculpar.Todos dizemos coisas no auge da irritação e depois nos arrependemos. Eu tambémestava tentando dissuadi-la de fazer algo que era importante para você.

— Mas não levei em conta tudo de bom que você fez. As mudanças na TecelagemGlosson, os prédios que está construindo para seus empregados... Enfim, tudo issomudou para melhor esta região.

— Admito que às vezes sou meio lento. Devia ter realizado tudo isso bem antes.

— Não, querido. Não importa quando fez, e sim o que fez e pretende continuar fazendo.

— Hannah, onze pessoas morreram e centenas ficaram feridos naquilo que vaientrar para a história como um choque entre as classes.

— Talvez ambas as partes estivessem exaltadas demais.

— Pode ser. De qualquer maneira, não quero que seu entusiasmo diminua.

— Sério?

— Sério. — E voltou a explorar-lhe um seio. Hannah segurou-lhe as mãos entre assuas.

— Eu te amo por não me dizer: "Viu? Eu avisei".

— Só por isso? E eu que me esforcei tanto! Hannah soltou uma gargalhada.

—- Não, meu querido. Eu te amo por tudo o que fez por mim, pelos operários da

tecelagem, pelos feridos de hoje. Por tudo. Eu te amo, Theo!

— E eu te amo, Hannah. Mais do que consigo dizer.

— Então não me diga. Mostre-me... E assim ele o fez.

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