Visconde de Cairu

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Visconde de Cairu Vida e Obra

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Visconde de Cairu

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Viscondede CairuVida eObra

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Visconde de CairuVida e Obra

R i o d e J a n e i r o 2 0 0 0

E l y s i o d e Ol i v e i r a B e l c h i o r

2a edição

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CNC Brasília

SBN Quadra 01 Bloco B - no 14,15o ao 18o andar

Edifício Confederação Nacionaldo Comércio

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W e b s i t e : w w w . c n c . c o m . b r

Elaboração: Secretaria Geral/Departamento Econômico

Projeto Gráfico: SG - DAD - CAA - SDI/UPV

Belchior, Elysio de Oliveira

Visconde de Cairu; vida e obra/Elysio de OliveiraBelchior. 2. ed. Rio de Janeiro : Confederação Nacionaldo Comércio, 2000.

160 p.

Inclui bibliografia e ÍndiceI. Lisboa, José da Silva. II. Visconde de Cairu. 1. Título.

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S U M Á R I O

I. Apresentação 5

II. Prefácio 7

Introdução

I. Tendências liberais de França e Inglaterra 11

II. Adam Smith e Edmund Burke 13

III. José da Silva Lisboa 15

1a Parte

I. As bases de uma grande cultura 18

II. Ouvidor em Ilhéus 21

III. Advocacia e Magistério 24

IV. O cobre de Cachoeira 26

V. De re rústica 29

VI. A Mesa de Inspeção da Bahia 31

VII. Cairu revolucionário? 35

2a Parte

I. A Economia Política e o Direito Comercial 40

II. O Liberalismo Econômico 45

III. A Abertura dos Portos do Brasil 47

IV. O Ensino da Economia Política 55

V. Esboço de uma Política Econômica 58

VI. Cairu e a exegese moderna 68

VII. O fim de uma época 84

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Adenda à 2a edição 88

3a Parte

I. A revolução Constitucionalista do Porto 97

II. O juramento da Constituição pelo Rei 99

III. A volta de D. João VI 104

IV. O “Fico” 108

V. Em defesa da Independência 111

VI. Na Assembléia Constituinte 115

VII. Cairu, Senador do Império 119

VIII. O fim da jornada 125

IX. Bibliografia de José da Silva Lisboa 126

Anexos

I. Cronologia 134

II. Bibliografia 138

III. Índice onomástico 148

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A P R E S E N T A Ç Ã O

Em 16 de julho comemora-se oficialmente, desde 1953, o DIADO COMERCIANTE. Dia que assinala o nascimento de

José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu, patrono do Comérciobrasileiro. Cairu não foi um homem de negócios, mas colocou suaimensa cultura jurídica, histórica, econômica e humanística a ser-viço da construção de uma economia liberal no Brasil, onde nãotivessem espaço os monopólios, as proibições contra determina-das atividades da indústria humana, garantidas as condições in-dispensáveis para os empreendedores exercerem suas atividadespromovendo o Bem Comum.

Desde seus primeiros livros combateu o grande monopólio, omonopólio colonial que mantinha os portos do Brasil fechados aocomércio mundial, atrelada sua economia aos interesses exclusi-vos da Metrópole. As idéias que disseminou e a participação queteve na Abertura dos Portos, em 1808, contribuíram para a inser-ção efetiva do País nos mercados mundiais, sopro inovador queteceu relações econômicas mais complexas e, ao longo do tempoconsolidou a consciência nacional de que o Brasil não poderia maisregredir à condição de Colônia.

Em 1956, a Confederação Nacional do Comércio e a Adminis-tração Nacional do SENAC instituíram concurso para premiarmonografias sobre a vida e a obra de José da Silva Lisboa, obten-do o primeiro lugar o trabalho de Elysio de Oliveira Belchior. Oautor, que desde então participa como economista da vida destaEntidade, conjugando economia e história procurou traçar o per-fil do Visconde de Cairu, ressaltando que embora seja ele até hoje,ao sabor de ideologias, figura polêmica no mundo das idéias e daação política, não se lhe poderá jamais negar o caráter de defensorde um liberalismo econômico que reconhece a ação do Governo,a exemplo das realizadas para estimular iniciativas, reprimir abu-

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sos quando a ação dos indivíduos atenta contra a lei ou a moralpública, e promover a defesa, ocupação e subsistência do povo.

No ano em que se completam cinco séculos da abertura deum porto seguro para o primeiro encontro de civilizações na Ter-ra de Vera Cruz, vale ressaltar a vida de quem concorreu para aabertura dos portos do Brasil não apenas ao comércio, mas tam-bém a novos encontros de civilizações e idéias. A ConfederaçãoNacional do Comércio, por isso, reedita a monografia, que apesarde seus quarenta anos não perdeu a oportunidade, nesta aurora doTerceiro Milênio, época de globalização e de redução dos limitesda intervenção do Estado na economia, tendências que suscitamas mesmas discussões e problemas para os quais o Visconde deCairu procurou soluções há quase duzentos anos.

Antônio de Oliveira SantosPresidente da CNC

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P R E F Á C I O À 1ª E D I Ç Ã O

C om a edição do presente trabalho traz a Confederação Nacio-nal do Comércio a contribuição da classe que nela se congre-

ga às comemorações do sesquicentenário da abertura dos portosdo Brasil, exaltando a figura do artífice máximo desse memorávelacontecimento José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu.

Levou-nos a esta empresa uma sugestão da Federação do Co-mércio da Bahia, desde logo acolhida com entusiasmo. Através deconcurso público aberto pela Administração Nacional do SENAC,em todo o País, conclamamos os estudiosos à tarefa de elaborarde modo condensado e acessível a biografia do patrono do Co-mércio, destinada a intensa divulgação entre o povo e nas escolas.

Pareceu-nos que nenhuma outra homenagem seria tão oportu-na e proveitosa como essa, de mostrar às novas gerações de nossaterra, através da vida exemplar de Cairu a importância do papeldo economista e do homem de empresa na vida nacional.

A iniciativa foi coroada de êxito. No certame, que teve entre osseus julgadores, além do representante do SENAC, professor RobertN. Dannemann, as figuras ilustres de Augusto Meyer e José HonórioRodrigues, sagrou-se vencedor o jovem economista Elysio Custó-dio de Oliveira Belchior.

No estudo substancioso que elaborou, conjugando com erudi-ção, simplicidade e elegância de forma, a figura de Cairu ressalta,nítida, nos seus múltiplos contornos. Nele encontramos os aspec-tos essenciais da vida do homem que foi bacharel em Cânones,professor de grego e hebraico, advogado e magistrado, economis-ta, panfletário, parlamentar, homem de Estado, pioneiro dos estu-dos econômicos e da formulação da política econômica no País,jornalista e tribuno, em que se aliavam a cultura imensa, o espíri-to prático, o patriotismo e a antevisão quase profética dos desti-nos futuros da sua terra.

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O trabalho de Elysio Custódio de Oliveira Belchior inicia ago-ra longa trajetória, sob os auspícios do SENAC, para mostrar aosbrasileiros que as páginas da história pátria não se enobrecem ape-nas com os feitos dos heróis. Nelas têm também o direito de bri-lhar com destaque as vidas muitas vezes sem espetaculosidade,mas densas de esforço e de conteúdo, dos homens de pensamentoe também dos homens práticos.

Desejamos que esta biografia do nume tutelar do Comércio te-nha o condão de despertar o interesse dos nossos escritores pelavida dos homens de empresa.

O assunto não tem parecido até hoje tentador em nosso meioliterário, aparentemente mais propenso a cuidar dos dramas e co-médias do cotidiano humano ou social do que da vida, paixão emorte dos grandes empreendedores do comércio, da indústria ouagropecuária. Aponta-se a exceção de Mauá, que mereceu estu-dos de fôlego por parte de escritores eminentes. Mas ainda aí res-salta a preocupação com a obra ou época, ficando o herói relega-do a plano secundário no seu aspecto familiar ou de criatura hu-mana.

Constitui o homem de negócios espécie de cabeça-de-turco naliteratura, responsável por tudo que de ruim ocorre dentro do en-redo. Quando não é o vilão declarado, monstro de egoísmo e decupidez, surge como o “novo-rico” ridículo a dizer parvoíces ou acometer cincadas. Sua figura jamais é apresentada com simpatia.Mesmo quando lhe mencionam a filantropia é para insinuar a es-perteza.

Talvez o tema seja realmente difícil. Mário de Andrade já assi-nalava como mais atraente o romance do “pobre diabo”, ofere-cendo aos nossos escritores com facilidade frustrações, fracasso erevolta, do que a ação realizadora, otimista, onde os personagensdeixam algo de útil e duradouro atrás de si.

O fenômeno não é peculiar ao Brasil. Coisa idêntica ocorriaaté bem pouco na literatura americana. Ali, certos livros como“The Octopus”, de Frank Norris, “Babbitt” de Sinclair Lewis e “The

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Big Money”, de John Dos Passos, apresentavam o homem de em-presa sob o pior aspecto materialista. Mas, tenham mudado ostempos ou os escritores, o fato é que o “businessman” nos Esta-dos Unidos passou a constituir tema de interesse literário e, so-bretudo, tema simpático. Até quando é tratado com humorismo,como em “The solid gold Cadillac”, ou na comédia musical “TilAbner”, os arranhões são antes engraçados do que cortantes.

Assinala-se que nas novas gerações de escritores americanosmuitos deles estiveram ligados a empresas. Por seu conhecimentomais próximo ficaram em condições de melhor julgar os homensde negócios, através de livros como “The great world and TimothyColt”, de Louis Auchincloss; “7 1/2 cents”, de Richard Bissell;“Nine to Five” de W. H. Prosser; “The quick brown fox”, de LawrenceSchoonover; “Executive suíte”, de Cameron Hawley, também au-tor de “Cash McCall”. Neste último o herói exprime este pensa-mento, típico: “Sustentamos que o fundamento básico do nossosistema de vida é a livre iniciativa – que é o sistema do lucro.Quando, porém, um concidadão mostra espírito de iniciativa ca-paz de permitir-lhe acumular um pouco desse lucro, todos nosesforçamos a fazê-lo sentir-se envergonhado de si mesmo”...

Será que os novos tempos e as novas concepções não altera-ram nos escritores brasileiros sua antiga aversão aos homens deempresa, ainda quando estes legam ao país obras meritórias ? Nãofornecerão os mortos, antigos ou recentes, ou mesmo os que ain-da por aí mourejam nas fábricas, nos escritórios, ou nos campos,mais do que simples “vidas secas”, cheias de algarismos e máqui-nas, sem qualquer substância humana ou cívica?

Eis o desafio, que talvez este trabalho de Elysio Custódio deOliveira Belchior tenha o mérito de ver respondido pelos homensde letras de nossa terra.

Brasílio Machado Neto

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I N T R O D U Ç Ã O

I

Tendências Liberais de França e Inglaterra

Quando o século XVIII extinguiu-se, o mundo sofria o impactode duas revoluções de caráter individualista. Se idênticas eram

as tendências, suas manifestações, pelo contrário, divergiram pro-fundamente.

Na França, o sistema político aluiu através de comoção violen-ta e o sangue que a guilhotina vertera de Luiz XVI espalhou-seentre monarcas temerosos. A economia francesa abalada em seusfundamentos, depauperada e vacilante, procurava novas condi-ções de equilíbrio, somente encontradas quando germinaram so-bre o campo preparado por Quesnay e seus sectários, as sementeslançadas pela revolução que se processava do outro lado da Man-cha. Ali, as inovações de Roebuck, Arkwright, Watt e outros,produziam tantas transformações na economia inglesa que se im-puseram modificações profundas na política consuetudinária demolde a permitir o livre curso da Revolução Industrial. Mas, aopasso que a Revolução Francesa provocara a destruição do antigoregime, na Inglaterra as idéias revolucionárias que acompanharamo alvorecer do capitalismo inglês deixaram incólume o sistemamonárquico vigorante.

Esta dualidade entre a evolução do pensamento liberal na Fran-ça e na Inglaterra parece-nos preciosa para a compreensão das ati-tudes dos homens que se evidenciaram na época da transferênciada família real portuguesa para o Brasil, porquanto as idéias des-tas revoluções desbordando seus países de origem atingiram Por-tugal e filtrando-se para a colônia americana aqui chegaram, umas,com o prestígio do mundo oficial, outras, medrosamente, nos “Mer-

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cúrios e mais papéis vindos de França e vendidos nos cais de de-sembarque, às escondidas, por marinheiros ingleses’’1.

As doutrinas francesas, de caráter republicano, conseguiram pe-netrar, por vezes, em todas as camadas sociais. Encontrando am-biente no florescente sentimento nativista faziam eclodir, de es-paço a espaço, movimentos revolucionários durante período quepartindo da Colônia entrou pelo Império. Sofrendo repressão sis-temática por parte da Corte, vigilante contra a adoção da “Consti-tuição Francesa que varia cada seis meses”, no dizer do Conde deLinhares2, não conseguiram empolgar o País em um movimentogeral. Movimentos localizados, restritos a determinadas cidades,apresentavam segundo Capistrano de Abreu, “o caso repetidotantas vezes em nossa história: depois do triunfo, obtido antes pordesídia ou pusilanimidade do atacado que por habilidade ou forta-leza do atacante, e só depois do triunfo comprado tão barato,compreende-se que o fato importa conseqüências, e começa-se aindagação de quais poderão ser.”3

Com o decorrer dos anos, este sentimento de nacionalidade deque, entre outras, as revoluções de 1789, 1798, 1817 foram indí-cios, a consciência de que o Brasil atingia paulatinamente um graude desenvolvimento econômico superior ao da Metrópole,tornando-a dependente da Colônia, por certo provocariam a in-dependência e vitória imediata das idéias francesas. Em contras-te, porém, com o “Jacobinismo”, o pensamento liberal inglês comsuas promessas de prosperidade pela franqueza de comércio e deindústria, provindo de país monárquico não inspirava temor à no-breza dirigente. Daí adveio sua preponderância pois, não obstantea sistematização da Economia Política pela Escola Clássica tor-nar o liberalismo econômico objeto de reflexão científica, mais

1. Otávio Tarquínio de Souza – “História das Idéias Políticas’’ – Digesto Econômico –março de 1950.

2. Carta de D. Rodrigo de Souza Coutinho a D. Fernando José de Portugal transcrita nolivro de Affonso Ruy, “A primeira Revolução Social Brasileira”, 1942, p. 79.

3. Capistrano de Abreu – “Capítulos de História Colonial”, 1954, p. 208/209.

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uma questão de raciocínio do que de sentimento, dificultando asua difusão entre o povo, as idéias inglesas gozavam do apoio ofi-cial e este bastou para implantá-las no Brasil, quando em circuns-tâncias especiais aqui chegou D. João garantido pela esquadrabritânica.Vencedora na Europa, a França fazia recuar no Brasil oêxito das idéias que espalhava pelo mundo.

II

Adam Smith e Edmund Burke

O liberalismo econômico inglês encontrou seu melhor expositorem Adam Smith, por muitos considerado o verdadeiro fundadorda Economia Política, tal a repercussão que obteve sua obra AnInquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations publicadano ano de 1776. Muito embora conhecesse desde os primeiros anosde sua formação os princípios da ciência econômica, Smith dedi-cou grande parte de sua vida ao estudo e ensino da Filosofia.Somente depois da viagem que realizou em França, onde sofreuforte influência dos Fisiocratas, pois foi aluno do próprioQuesnay, sua atenção voltou-se definitivamente para a ciênciaque o consagraria.

A expansão de suas idéias foi rápida. Ainda em vida do autorsurgiram cinco edições da “Riqueza das Nações” que, célere, foitraduzida na Alemanha (1776), França (1779), Dinamarca (1779),Espanha (1794), Holanda (1796), Rússia (1802), Polônia (1812)e no Brasil sua influência reporta-se ao poeta Cláudio Manoel daCosta que em 1780, segundo Joaquim Manoel de Macedo4 “co-mentou o Tratado da origem das riquezas das Nações de Adão Smith”.Em 1779, Antônio de Moraes Silva conheceu o livro em Londrese dele empreendeu uma tradução apenas conhecida por seus ami-gos da Bahia, mas que teve o mérito de provocar a partir de 1796

4. Joaquim Manoel de Macedo – “Ano Biográfico Brasileiro”, 1876, 2o vol., p. 158.

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verdadeira revolução no pensamento da elite da cidade de Salva-dor. Por fim, em 1821, veio à luz uma tradução resumida feita porBento da Silva Lisboa, 2o Barão de Cairu.

Para os adeptos das idéias inglesas, ao lado de Adam Smith, eno campo da política, Edmund Burke representou o mesmo papelque para os simpatizantes dos princípios franceses desempenha-ram Rousseau, Volney, Raynal e outros. Contemporâneo às altera-ções que se processavam no ambiente europeu, liberal à maneirade Smith, temia o perigo do desmoronamento da ordem social pelodesprestígio da autoridade, de que a Revolução Francesa era terrí-vel exemplo ainda em marcha. Inimigo pertinaz deste movimento,desejava assegurar o bem comum pelo respeito às tradições, peloculto do passado, que no caso inglês refletia-se de forma categóri-ca no sistema monárquico. A liberdade apregoada pelo “segundomal francês” não poderia ser erguida sobre os alicerces derruídosda hierarquia social. Pelo contrário, “não há mais certo expedien-te de perpetuar a nossa liberdade, senão guardando de modo maissagrado, o direito de sucessão hereditária na Coroa e nas proprie-dades da Nação... nossa liberdade vem a ser uma nobre franquezae traz consigo um aspecto majestoso, dando lustre à prosápia denossos antepassados. Ela apresenta os seus timbres e brasões; elatem sua galeria de retratos; suas inscrições de monumentos; seusdepósitos de títulos de nobreza.”5. É ainda na religião que Burkeencontra firme sustentáculo da vida social, tanto mais digna derespeito, quanto em sua concepção, no processo histórico é mani-festa a ação da Providência Divina.

Não obstante as objurgatórias que seus inimigos lhe dedica-ram, com sua concepção orgânica dos Estados estruturados eminstituições sujeitas à natural evolução, mas prontas a desmoro-nar se falseadas por princípios alheios à sua cultura, Burke aindahoje é considerado uma das grandes individualidades do pensa-

5. José da Silva Lisboa – “Extratos das Obras Políticas e Econômicas de EdmundBurke, 1812, Parte I, pp. 17 e 22

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mento político inglês. “Nenhum escritor sentiu e experimentoucom maior plenitude que Burke a vida deste país – assegura-nosum autor inglês coevo –, em sua controvérsia com Payne já pode-mos ver a luta entre a democracia política e os hábitos sociais queperduram ainda na vida inglesa. Para ele a maioria era um concei-to fictício e pernicioso já que negava este sistema complexo de“status” e classes sociais dentro do qual encontravam os cidadãosseu verdadeiro bem-estar”.6

Emigradas para país exótico, estas idéias teriam que forçosa-mente sentir o influxo da experiência brasileira, enfrentar novosproblemas, afirmar-se em atitudes que muitas vezes pareciam con-traditórias, se para justificá-las não houvesse a clarividência doestadista, capaz de encontrar na trama dos acontecimentos o sen-tido da evolução histórica.

III

José da Silva Lisboa

Entre aqueles que no Brasil mais se destacaram na aceitaçãodas idéias inglesas, encontra-se sem dúvida José da Silva Lisboa,visconde de Cairu. Expositor lúcido das teorias de Adam Smith,foi também vulgarizador da obra política e econômica do famosoautor das “Reflexões sobre a Revolução Francesa”, mediante traduçãodedicada a Percy Clinton Sydney, Lord Strangford e feita a pedi-do de D. Rodrigo de Souza Coutinho, Conde de Linhares, que tam-bém tinha “a mais entusiástica paixão por Burke, considerando-oentre os salvadores da Grã-Bretanha e da Sociedade”.7 Cairu emsua admiração ao político de Dublin não poupa encômios, contrá-rios ao bom gosto do leitor hodierno: “Príncipe dos OradoresBritânicos... nobre padrão da Literatura Britânica mui próprio a

6. R.H.S. Crossmann – “El Pensamiento Politico Inglés en la tradición Europea”, in J.P. Meyer – “Trayetoria del Pensamiento Politico”, 1941, p.178.

7. José da Silva Lisboa, op. cit., Parte I, p. IX.

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exaltar os sentimentos de Lealdade e Honra Nacional e expelirpor toda a parte os falsos princípios da Anarquia e Tirania da Fran-ça... gênio tão feliz, que doura tudo que toca, e que parece terconcentrado a Sabedoria das Idades”8. Por sua vez, o economistaclássico é o “Grande Benfeitor da Terra... Sacerdote da JustiçaCivil”9.

É pois dentro da penetrante influência de Adam Smith, no se-tor econômico, e de Edmund Burke, no terreno da política, quedevemos situar a vida e a obra de José da Silva Lisboa.

Na imensidade de sua cultura, na importância dos problemas aque foi solicitado apreciar, na celeridade do desenrolar dos acon-tecimentos que exigiram sua capacidade de político, Cairu revela-se uma personalidade multiforme, esquiva à síntese.

Cairu é o economista sereno no estudo da ciência nascente,persuasivo e seguro nas asserções, “um dos lutadores mais repre-sentativos da emancipação econômica da América”10, mas é tam-bém o panfletário violento “fração de gente, charlatão idoso”11, areclamar mordaz para Manuel de Carvalho “bordoada de cego aeito alçando, trás, zás, pum, tum, bá, bu, porrete em lombo”12.Cairu é o liberal aludindo “aos séculos da tirania e barbaria queoprimiram e escureceram a Europa até com a perseguição e quei-ma das livrarias públicas e particulares e hórrida intolerância dasseitas e opiniões religiosas e políticas”13, mas é também o consti-

8. Idem, idem – Parte I, p. II, V/VI, XIV.

9. José da Silva Lisboa – “Princípios de Economia Política”, 1804, pp. 8/9.

10. Ricardo Levene – “Ensayo Histórico sobre la Revolución de Mayo y MarianoMoreno”, 1925, vol. I, p. 244.

11. José Bonifácio de Andrade e Silva – in “Anais da Biblioteca Nacional”, vol. XIII, p.115.

12. José da Silva Lisboa – “História Curiosa do mau fim de Carvalho & Cia. à bordoadade pau-brasil”, 1824.

13. José da Silva Lisboa – “Sabatina Familiar de Amigos do Bem Comum”, apud HélioViana, “Contribuição à História da Imprensa Brasileira”, 1945, p. 377

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tuinte de 1823 declarando que “achava a expressão liberdade reli-giosa muito malsoante, escandalizando os ouvidos pios”14.

Em suas atitudes e tendências, José da Silva Lisboa é como odiamante lapidado: brilha mais quanto mais facetas possui.

14. José da Silva Lisboa – Discurso pronunciado na Assembléia Legislativa, 1823.

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1a P A R T E

I

As bases de uma grande cultura

Salvador em meados do século XVIII constituía o centro eco-nômico e administrativo de vasta possessão portuguesa. Seus

habitantes, alegres e ordeiros, dependentes em grande parte daexclusiva exportação para o Reino dos produtos que as atividadesrurais da Capitania lhes proporcionavam, sentiam de ano para anoaumentar as férreas ordens sob as quais o Brasil vivia em rígidosistema colonial, que não só impedia o surto das atividades eco-nômicas, como tolhia o florescimento de uma cultura superior.

O estudo universitário era uma aventura que tinha o Atlânticode permeio. Para a instrução primária, única notada ainda em 1764,por Mrs. Kindersley1, lá estavam os religiosos em seus conventossalvando almas e distribuindo educação: lá estavam os carmelitanosque anos depois receberam em seu colégio, para ensinar-lhe filo-sofia e primeiras letras, o pequeno José da Silva Lisboa, nascidoem 16 de julho de 1756.

Procurando concluir seus estudos, o jovem baiano demandou aMetrópole em 1772, onde Pedro José da Fonseca ministrou-lheaulas de retórica. Logo depois seguiu para a vetusta UniversidadeConimbricense, centro de convergência da mocidade brasileiradesejosa de se libertar dos entraves impostos à cultura pelo mes-quinho ambiente colonial.

Em 10 de outubro de 1774 ingressou no Curso de Direito, con-cluído em 8 de junho de 1779, sendo-lhe outorgada a carta deformatura no dia dez do mesmo mês2. Durante os cinco anos que

1. Pedro Calmon – “História da Literatura Baiana”, 1949, p. 74.

2. Francisco Morais – “Estudantes Brasileiros na Universidade de Coimbra”, in Anaisda Biblioteca Nacional, vol. 62.

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freqüentou Coimbra, o futuro Visconde de Cairu não descansouum só momento em sua luta pela sabedoria. Aperfeiçoou Mate-mática em 1775; sua paixão pelas línguas, que o tornaria mais tar-de renomado poliglota, concretizou-se no estudo de dois idiomasclássicos: em um deles Homero cantou as façanhas de Ulisses;noutro, os hebreus, junto aos salgueiros dos rios da Babilônia,choraram as desgraças de Sion. Se os Anais não proclamam o nomede seu professor de grego, sabemos entretanto que no hebraicofoi aluno do clérigo da Síria, João Paulo Odar, cujas lições jamaisolvidou, tanto assim que meio século depois, na Assembléia Cons-tituinte (1823), relembrava com respeito seus ensinamentos, in-vocando a autoridade do antigo mestre para defesa dos escravos.

Rezam as crônicas, e seus biógrafos não cessam de recordar,que seus pais, Henrique da Silva Lisboa e D. Helena Nunes deJesus, esperavam que um de seus filhos seguisse a carreira eclesiás-tica. Falecendo o que a ela se destinava, sentiram as esperançasrenascerem pela lembrança da invulgar afeição que José da SilvaLisboa dedicava aos livros: aos oito anos de idade não aprendia olatim, tão útil aos estudos religiosos ? Em seus devaneios viam ofilho nos púlpitos das velhas igrejas da Bahia a proclamar a fé eadmoestar os espíritos. Mal sabiam, porém, que o Brasil perdia umnovo Vieira, mas em compensação, realizar-se-ia o “milagre deerudição, honestidade e equilíbrio do Brasil Colonial”3.

De fato, Silva Lisboa não acedeu às instâncias paternas. E foicastigado da forma que a história guardou: não mais recebeu acostumeira ajuda financeira. Premido pelas circunstâncias recor-reu ao Monte Socorro para empenhar justamente aquilo que cons-tituía um de seus motivos de ufania: a Carta Régia de SubstitutoOrdinário Interino das cadeiras de Grego e Hebraico da Universi-dade de Coimbra, conquistada em concurso, quando ainda estu-dante, e concedida em 23 de novembro de 1778.

Formado em junho, não demoraria o jovem professor muito tem-

3. José Soares Dutra – “Cairu”, 1943, p. 14.

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po em terras de Portugal. Fizera sólidas amizades, uma das quaisD. Martinho de Mello e Castro, de quem gozaria proteção duranteos primeiros anos de sua carreira nas plagas baianas. Efetivamen-te, em 1o de outubro de 1779, muniu-se José da Silva Lisboa decarta de apresentação dirigida pelo Ministro da Marinha e Ultra-mar a D. Afonso Miguel de Portugal e Castro, Marquês de Valença,que pouco antes, nomeado governador da Bahia deixara o Reinoem busca da Colônia para substituir D. Manuel da Cunha Menezes,Conde de Lumiar, que se encontrava em Salvador desde 1774.

Esta carta, divulgada pelo historiador Rodolfo Garcia em suasnotas à História Geral do Brasil de Varnhagen4, é deveras singu-lar: apresentava no portador o “Bacharel José da Silva Lisboa, quetendo acabado os seus estudos em Coimbra se recolhe a essa capi-tania, donde é natural. Os seus desígnios de se aplicar à agricultu-ra o farão sem dúvida recomendável, para que V. Exa. o protejaem tudo quanto for vantajoso para um objeto de tanta utilidade: eespero que ele pela sua útil aplicação, e pelo seu comportamentose mostre digno de todo o favor, com que V. Exa. o tratar”.

Era o bacharel em Cânones, o professor de grego e hebraicodirigindo-se ao Brasil para dedicar-se à agricultura!

Qual seria a origem deste interesse de José da Silva Lisboa?Observador arguto que era, não deixara de certo passar desaper-cebida a situação decadente da agricultura em Portugal, informa-ra-se por constantes leituras do progresso deste ramo das ativida-des humanas em outros países, sentira, enfim, as imensas possibi-lidades da terra quase virgem que iria encontrar no Brasil. Ade-mais, quando cursava a Universidade, era professor o renomadobotânico paduano Domingos Vandelli, chamado à Lusitânia peloMarquês de Pombal. É impossível que Silva Lisboa não freqüen-tasse suas aulas, conversasse longamente sobre assuntos atinentesà agricultura, travando com isto amizade que se traduziria maistarde em troca de correspondência sobre economia rural.

4. Rodolfo Garcia – Notas à “História Geral do Brasil” de F. A. Varnhagen, 1953,vol. V, p. 15.

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Durante muitos anos os biógrafos do Visconde de Cairu ape-nas citavam de suas atividades no Brasil – logo após a sua chega-da da Metrópole – o cargo que desempenhara como professor e aadvocacia que exercera em Salvador. Os abundantes documentosexistentes em arquivos de Portugal contribuíram para revelar ou-tros aspectos interessantes, inclusive esta atenção tributada à agri-cultura, melhor diríamos, à economia agrícola, porquanto daquelaatividade, ironizaria ao Dr. Vandelli: “Este nosso século é o sécu-lo da agricultura; todo o mundo escreveu sobre isso formando-seplanos de gabinetes, talvez sem ter uma só vez remexido a terra.A agricultura porém é mais fácil, é mais bonita de escrever, do quede executar”5. É possível que por isso nunca a tivesse exercido.

II

Ouvidor em Ilhéus

Chegando ao Brasil em fins de 1779 ou início de 1780, pelaproteção do Marquês de Valença pouco tempo permaneceu Joséda Silva Lisboa na cidade de Salvador. Em 10 de março de 1780,o Governador comunicou ao Ministro Martinho de Mello e Castroque “atendendo às repetidas queixas dos povos da Capitania deIlhéus contra a má administração da Justiça dos Juízes Ordináriosque interinamente exerciam os lugares de Ouvidores, demitiradeste lugar o Juiz Ordinário da Capitania de Ilhéus e nomeara parao desempenhar o bacharel formado José da Silva Lisboa, que reu-nia todas as qualidades necessárias para um bom magistrado”6.

Dias antes para lá seguira o novel Ouvidor levando a ciênciajurídica adquirida em Coimbra e a experiência de apenas 24 anos.

5. Eduardo de Castro e Almeida – “Inventário dos Documentos relativos ao Brasil,existentes nos Arquivos de Marinha e Ultramar” – in Anais da Biblioteca Nacional,vols. 31, 32, 34, 36, 37, 39, 46, 50, 71, Doc. 10.907.

6. Idem, idem, idem, Doc. 10.517.

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Foi rápida sua estada em Ilhéus e dela o Dr. Francisco Borgesde Barros registrou as seguintes ocorrências:

1) “Em 6 de fevereiro de 1780: Devido a grandes escândalosno foro de Ilhéus, o Governador da Bahia determinou a José daSilva Lisboa uma averiguação secreta. Houve denúncias de quevários autos haviam desaparecido dos cartórios de resíduos, cape-las e ausentes e vários processos referentes a terras da Coroa sehaviam feito falsa fé, dando em resultado grandes usurpações.Nesta data a devassa não havia sido iniciada, porque algumas tes-temunhas estavam ausentes devido ao tempo festivo. A eleiçãodos pelouros foi feita com toda a desordem, havendo suborno dasautoridades.

2) Em 7 de fevereiro de 1780: O Vigário da Freguesia foi alvode grande vaia dada por uns cadetes, por querer o mesmo em ser-viço da religião corrigir um abuso público das “danças de Gonça-lo”.

3) Em 24 de fevereiro de 1780: Em quatro editais dessa data omesmo Ouvidor exige o pagamento de fintas atrasadas, principal-mente dos bens que foram seqüestrados aos Jesuítas e obriga opovo a plantar mandioca, por isso que havia abandonado o seucultivo pelo da cana e arroz.

4) Em 3 de março de 1780: José da Silva Lisboa, ouvidor dacomarca de Ilhéus, a requerimento do Senado da Câmara, provi-dencia sobre a crise de farinhas e sobre a expulsão dos malfeitoresque infestavam as matas.

5) Em 14 de março de 1780: Nesta data Silva Lisboa represen-ta ao Governador Geral contra o procedimento dos cadetes, che-fiados pelo de nome Antônio Rodrigues de Figueiredo, que des-respeitavam a todos. Foi instaurado processo contra os mesmos,sendo dali expulsos e presos no Morro de S. Paulo.

6) Em 28 de abril de 1780: O ouvidor comunica ao Governo onaufrágio do capitão-mor de Ilhéus na barra do Rio das Contas.

7) Em 25 de agosto de 1780: O ouvidor José da Silva Lisboa

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comunica o mau procedimento do cadete Antônio Rodrigues e astraições do capitão-mor à sua pessoa, apesar dos protestos deamizade que fazia”7.

Como se vê, a ação de José da Silva Lisboa foi enérgica, procu-rando acima de tudo defender os interesses da Coroa e a tranqüi-lidade pública. Não é estranhável que encontrasse resistência porparte dos moradores da Capitania que, prestes, demonstraram de-sejos de afastá-lo do cargo, embora o exercesse em caráter interi-no. No dia 12 de agosto de 1780, em Lisboa, o ex-governadorManuel da Cunha Menezes dirigiu-se ao Ministro da Marinha eUltramar sobre vários assuntos daquela Capitania, entre os quaiso desenvolvimento da agricultura e após notícias de relevânciapassa a considerar o cultivo do algodão. Declara então com malí-cia que “os povos: da Capitania de Ilhéus, objeto deste escritofizeram as suas plantações, mas não se lograram delas, segundome informaram na já expressa arribada (sic), porque provendo oMarquês Governador no lugar de Ouvidor dela (que estava ser-vindo o Juiz pela lei e eu me dei melhor sempre com juízes leigosdo que formados), um advogado rapaz, este logo que chegou aolugar mandou arrancar todos os algodoeiros, como planta inútil,assim como outras produções, que eu não posso dizer, por não tervisto os editais o que ainda espero, pela promessa, que me fizeramde os mandarem a esta Corte”8.

Por mais estranho que se afigure a atitude de Cairu, hoje, du-zentos anos depois, não podemos julgar atos explicáveis somentepelas circunstâncias do momento. Não temos dúvidas, porém, deque os editais do Ouvidor prendiam-se a um julgamento sobre ovalor relativo das diversas culturas praticáveis (vide editais de 24de fevereiro de 1780), sendo mesmo verossímil que decorressemde instruções superiores. Reforça esta idéia o fato de ter Francis-co Nunes da Costa, que o substituiu na ouvidoria de Ilhéus mesesdepois, recebido de D. Maria I instruções para desenvolver a plan-

7. F. Borges Barros – “Anais da Capitania de Ilhéus”, 1917, pp. 36/38.

8. Eduardo de Castro e Almeida, op. cit., Doc. 10.653.

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tação do cacau, garantindo até o preço mínimo. Mas a maior partedos habitantes “tratou de bagatela esta proposta, outros opuse-ram ao Ministro frívolas razões que os obrigava a não cultivaremeste gênero”9.

Deixemos, porém, que novos documentos nos ajudem a escla-recer ainda mais os famosos editais de Cairu. E antes que apare-çam, não deploremos os incidentes de Ilhéus. Sílvio Romero, emsua História da Literatura Brasileira, viu com a finura que lhe é ca-racterística a influência que sobre José da Silva Lisboa desempe-nhou a escolha de Salvador como base fundamental de sua forma-ção: “não ficou junto à Corte, o que seria um mal, nem foi inutili-zar-se nalguma aldeia dos sertões, o que seria mais deplorável”.Ficou num “meio termo útil aos estudiosos”10. A Cairu, uma dasgrandes cerebrações da Colônia, um espírito formado no que ha-via de mais refinado na cultura da época, não ficava bem o cargoque desempenhara: não lhe era destinado proibir que o gado pas-tasse nas ruas de qualquer lugarejo11.

III

Advocacia e Magistério

Voltando a Salvador. Cairu advoga. Advoga sentindo profundaantipatia pela profissão.

É desse tempo (1781) a carta endereçada ao prof. DomingosVandelli, de quem recebera um pedido de informações sobre ascondições econômico-sociais da Bahia. No preâmbulo de sua res-posta, Cairu deixa escapar ao antigo colega de Coimbra sentido

9. Manoel Ferreira Câmara – “Ensaio de Descrição Física e Econômica da Comarca deIlhéus na América”, in Memórias Econômicas da Academia Real de Ciências de Lisboa,1789, p. 316, I vol.

10. Silvio Romero – “História da Literatura Brasileira”, 1943, vol. 2o, p. 322.

11. Cf. Edital de 25 de fevereiro de 1780, citado por João da Silva Campos – “Crônicada Capitania de S. Jorge de Ilhéus”, 1947, p. 188.

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desabafo que provinha do âmago do seu ser e revelava a profundainsatisfação em que vivia: “Eu tenho já mais de uma vez repre-sentado V. S. a situação oprimida a que me reduziu nestas terras adureza minha sorte. Obrigado a ganhar minha subsistência damendiga advocacia, vida pouco análoga à constituição do meugênio, era preciso que desamparasse inteiramente os estudos filo-sóficos para me ir nos profundos abismos das minúcias e formulá-rios das intrigas forenses, e que demandava muitas aplicações eprática dos negócios deste gênero que faziam incompatíveis me-ditações sobre coisas outro porte.”12

A frustração que empolgou Cairu e da qual nos deu conta oprof. Amoroso Lima em um belo escorço biográfico de José daSilva Lisboa, pensamos que não foi solucionada com a nomeaçãoem 4 de junho de 1783 para o cargo de professor substituto degrego nem tampouco para a cátedra de filosofia, em 29 de novem-bro de 1782. Em 16 de março de 1786 o professor baiano escre-veu a D. Martinho de Mello e Castro agradecendo-lhe esta nomea-ção e remetendo-lhe a oração proferida em homenagem ao aniver-sário de D. Maria I13.

O eminente historiador e jurista Cândido Mendes de Almeida,em sua notícia biográfica de Silva Lisboa, apensa à edição de 1874dos “Princípios de Direito Mercantil”, pede a atenção para o fatode não ter aquele professor de grego, hebraico e filosofia deixadoà posteridade qualquer obra sobre estes estudos. E acrescenta queeram “singularidades na direção dos estudos desta culminante in-teligência cuja origem não podem hoje ser explicadas”14.

Não estaria neste sentimento de vocação frustada a explicaçãodestas singularidades? Se na advocacia seu gênio repelia o ritoprocessual, no magistério Cairu forçosamente deveria sentir um

12. Eduardo de Castro e Almeida – op. cit., Doc. 10.907.

13. Idem, idem, Doc. 12.107/8 – É provável que ocorresse engano na cópia da datacerta.

14. Cândido Mendes de Almeida – in “Princípios de Direito Mercantil e Leis de Mari-nha”, de José da Silva Lisboa, 1874, 1o vol., p. VII.

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hiato profundo entre o ambiente reinante na Universidade em quese diplomou e o meio acanhado da Colônia, acentuado pela faltade interesse da mocidade de Salvador pelos estudos que, ultrapas-sando os bancos escolares, ia estratificar-se em maneiras de pen-sar da sociedade: “Indizível é, meu caro Amigo, a aversão quenesta cidade há à corporação de Professores, gente de nenhumaentidade na Bahia, membros da sociedade para quem se olha coma maior displicência e indiferença suma”15. Dizia isto Luiz dosSantos Vilhena em 1802. E pesaroso relatava o fato de um estu-dante ter, certa ocasião, disparado para dentro da sala de aula umacarga de chumbo! Se isto ocorria ao raiar do novo século, que di-zer do tempo em que Cairu lecionava, cadeiras recentementecriadas?

Desencantado, José da Silva Lisboa redobrou sua atenção à eco-nomia rural. Tornou-se, no dizer de Pedro Calmon, um “naturalis-ta amador”.

IV

O cobre de Cachoeira

No dia 11 de março de 1782, Marcelino da Silva Pereira, Juizde Fora de Cachoeira, enviou ao Governador da Bahia um ofíciosobre acontecimento que por muitos anos despertou a diligênciadas autoridades portuguesas. Dizia que “a não faltarem indícios,grande abundância promete este lugar, que é chamado Mamocabo,na freguesia de S. Tiago, termo desta vila e dela distante duasléguas e meia, mais ou menos, em terras cheias de mata que agoraprincipiam-se a cortar, não tendo sido cultivadas; entre um tam-bém novo roçado do Padre João Gonçalves, da parte do Sul, e doNorte nas cabeceiras de um sítio de Manoel Lopes Falcão, emterras do Capitão Antônio Gonçalves de Aguiar e Souza, na baixa

15. Luiz dos Santos Vilhena – “Recopilação de Notícias Soteropolitanas e Brasílicas,1921, Tomo 1º, p. 287.

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das quais há um riacho, que do alto corre a meter-se no rio Paraassú(sic), que a esta vila banha, foi achada a porção de cobre queremeto”16.

Que surpresa teve o Governador Marquês de Valença, que re-buliço causou na cidade a chegada do bloco de cobre de Cachoei-ra: pesava cerca de 1.300 quilos!

Zeloso, o Governador não demorou a enviá-lo à Metrópole: nodia 4 de junho de 1782, anuncia ao Ministro de Marinha e Ultra-mar, o aparecimento “duma grande porção de cobre nuns terre-nos pertencentes ao termo da Vila de Cachoeira, que remete, jun-tamente com algumas pedras e terra do lugar em que fora encon-trado para serem devidamente examinados e analisados, pois seriada maior utilidade a exploração da mina que porventura se desco-brisse”17.

Chegando a Lisboa o cobre continua a impressionar e é Do-mingos Vandelli quem o examina, analisa e descreve em Memóriaapresentada à Academia Real de Ciências, asseverando que “atéagora não se descobriu em parte alguma massa tão grande comoesta da Bahia a qual serviria para enriquecer o mais rico museu daEuropa”18. Convicto da importância do achado, Vandelli recomen-da Antônio Barros da Silva Nogueira a Martinho de Mello e Cas-tro para proceder às pesquisas das minas de cobre “que se supu-nha existir na serra de Cachoeira”19.

Mas quem seguiu para a localidade, quem explorou a região egalgou as grimpas da serrania, foi o professor de grego e filosofia,José da Silva Lisboa!

Em junho de 1783, Cairu apenas investiga as faldas da serra deCachoeira. Em circunstâncias adversas nada consegue: “Desejeisubir e penetrar uma alta montanha primigênia, em cuja raiz seachou a massa de cobre, porém tinha um declive tão precipitado e

16. Eduardo de Castro e Almeida, op. cit., Doc. 11.024.

17. Idem, idem, Doc. 11.023.

18. Idem, idem, Doc. 11.463.

19. Idem, idem, Doc. 11.460.

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inacessível, que só em tempo de verão poderia dar passagem al-gum lugar, que se procurasse mais cômodo. Na referida baixa nãose acha vestígio algum de mina, mas o novo pedaço de cobre mis-turado com maior porção de ferro e do qual o Dr. Galvão tiroucobre admirável, nos tem quase decididamente anunciado a exis-tência da mesma mina ou que ela se possa descobrir na referidamontanha ou que esteja escondida na plaina debaixo da terra, fa-zendo-se escavação mais profunda...”20.

De fato no verão voltou José da Silva Lisboa a estudar os arre-dores de Cachoeira com maiores possibilidades de êxito. Em 19de janeiro de 1784, dá conta a Martinho de Mello e Castro “daspesquisas que procedeu nas serras de Cachoeira para a descobertada suposta mina de cobre, cuja existência as suas investigaçõesdeixaram muito duvidosa”21.

Se a Cairu as explorações levaram-no a renunciar a posterioresbuscas, pois considerava as minas inexistentes, para os governan-tes de Portugal era impossível não se encontrar no local os sonha-dos veios de cobre. Não é destarte surpreendente que três anosdepois das averiguações de Cairu chegasse a Salvador AntônioAmorim e Castro e solícito participasse à Metrópole que brevetomaria posse do seu lugar de Juiz de Fora da Vila de Cachoeira“onde desde logo se ocuparia diligentemente da exploração da minade cobre”22.

Os anos passaram-se e o cobre das propaladas minas não apa-receu. A razão estava com José da Silva Lisboa. Não existia nolocal qualquer jazida. Todavia, ficou famosa a descoberta ocorri-da na vila de Cachoeira. Anos depois, visitantes i lustresperlustrando a Bahia ainda aludem ao fato.

O inglês John Mawe, comerciante, referindo-se às riquezas daBahia afirma que “sobre a mineralogia desta Capitania, poucoposso dizer. Sabe-se ter produzido a maior peça de cobre nativo

20. Idem, idem, Doc. 11.247.

21. Idem, idem, Doc. 11.472.

22. Idem, idem, Doc. 12.489.

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que jamais se viu, pesando mais de 2.000 libras. O bloco foi desco-berto, há muitos anos, por alguns mineiros que procuravam ouro,mas, em contraposição às leis gerais da natureza, acharam-no in-teiramente isolado, e não se descobriu o menor vestígio, nem omais ligeiro indício de um veio daquele metal”23.

Se o comerciante nada poderia adiantar sobre a origem do me-tal, outros viajantes, Spix e Martius, com a autoridade de reno-mados naturalistas escreveriam que “cerca de uma hora a leste davila, foi descoberto o grande bloco de puro cobre pesando 2.666libras, que se acha guardado, desde 1782, no Real Gabinete deHistória Natural de Lisboa. Visitamos o lugar e encontramos mui-to perto do Rio Paraguaçu, uma baixada coberta de capim e capoei-ra, onde jazem grandes blocos soltos de granito e contornada, aonorte, de um banco da mesma rocha. Apesar de todas as pesqui-sas, nada encontramos na formação atual que permitisse a hipóte-se de uma relação genética daquela colossal massa de metal com aformação da montanha. Notamos tão pouco vestígios de uma for-mação de veeiro ou de depósito metálico, que a origem telúrica dobloco nos pareceu muito duvidosa”24.

Estavam, pois, confirmadas as investigações de Cairu: em lu-gar da mina o que existia era um imenso meteorólito.

V

De re rústica

Silva Lisboa não deixava escapar oportunidade alguma de es-tudar os mais diversos aspectos da economia agrícola das terrasbaianas. Agora mesmo, quando perdera seus esforços na desco-berta das pretensas minas de Cachoeira, observou o plantio dofumo no Recôncavo baiano. “Por ocasião da viagem que nesteverão, fiz à Cachoeira – escreve Cairu em 11 de fevereiro de 1784

23. John Mawe – “Viagens no Interior do Brasil”, 1944, p. 271.

24. Von Spix e von Martius – “Através da Bahia’’, 1938, pp. 231/2.

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– a respeito da mina de cobre (de que em outra carta dei conta: àV. Exa.), tive meios para me instruir sobre o modo de cultura dotabaco e seu preparo e me pareceu que este artigo era suscetívelde muito maior perfeição a respeito do estado atual, que sem dú-vida é muito defeituoso, sobre o modo de amanhar as terras e ne-gligência e pouca limpeza, quer já nos laboratórios de enro-lamento e imprensa do tabaco. Até observei que de três espéciesde tabaco que aqui achei, não se cultiva aquela de que se faz usona Virgínia, Habana etc., e perguntando-se aos Colonos a razãodesta prática e porque não tentam a cultura do chamado tabacode língua (que eles reconhecem ter maior folha e mais grossa),respondem que não está em uso. Achei um fenômeno singular”25.

Nota-se por este trecho que José da Silva Lisboa não era ape-nas um curioso. Mais do que isto, revelava-se um observador atento,sentindo a importância que o desenvolvimento da agricultura re-presentava para o progresso da Colônia. Se não dedicasse atençãoacurada à economia agrícola, como poderia saber, de imediato,que nas variedades de fumo cultivadas em Cachoeira faltava otabaco de língua?

Exatamente para evitar que por ignorância ou incúria perma-necesse retardada a evolução agrícola do Brasil, Cairu na mesmacarta propõe ainda o “estabelecimento de uma sociedade literária,em que fossem membros todos os proprietários de terras destepaís, os mais inteligentes, e além disto todas as pessoas curiosas eamantes do bem público; cujo objeto fosse a melhoração de todaa cultura das terras, principalmente para que o tabaco, açúcar, eanil (que já aqui se começa a cultivar) pudessem receber toda aperfeição possível; depois a amplificação do comércio e boa or-dem da economia interior do país, descobrimento de todas as plan-tas, seus usos para o comércio e artes, sua virtude já conhecida para amedicina. O Exmo Governador aprovou minhas intenções...”26.

Não sabemos se esta sociedade literária foi fundada; temos notí-

25. Eduardo de Castro e Almeida, op. cit., Doc. 11.475.

26. Idem, idem, Doc. 11.475.

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cias porém, de que José da Silva Lisboa por conta própria procu-rou atingir os objetivos enunciados. Disso dá-nos informação amissiva que o prof. Francisco Ferreira Paes da Silveira dirigiu em4 de agosto de 1789 a D. Martinho de Mello e Castro: “Tenho ahonra de oferecer à curiosidade de V. Exa., nesta pasta, o verda-deiro ‘arapobaca’, erva tão útil como recomendada por Lineo aonosso Domingos Vandelli e por este a todos, os seus ouvintes porser muito necessária aos Reinos e por isso de grande, vantagem aocomércio a sua descoberta, o que até o presente se não tinha con-seguido; como me asseverou o Exmo Visconde de Barbacena compesar quando por aqui passou, oferecendo-lhe eu alguns produ-tos, que conservava. Vindo-me depois à mão uma rara edição donaturalista Jorge Macgrave, holandês, que acompanhou ao Brasilo Conde Maurício de Nassau, o qual a traz bem descrita, edebuxada, com o mesmo nome índico, pude certificar ser esta aprópria, o que me ..... (confirmou?) ..... meu companheiro o prof.José da Silva Lisboa, que há muito tempo a procurava....”27.

Não foi em vão o desvelo de Cairu pelas coisas agrícolas. Noexercício do cargo de Secretário e Deputado da Mesa de Inspeçãoda Bahia teve oportunidade de dar plena expansão aos conheci-mentos que adquirira.

VI

A Mesa de Inspeção da Bahia

Os documentos da época parecem indicar que José da SilvaLisboa, depois de seu regresso ao Brasil em 1779, por três vezesabraçou seus velhos amigos em Portugal.

De uma primeira viagem não conhecemos maiores indícios doque o ofício de 14 de agosto de 1787 expedido pelo GovernadorD. Rodrigo José de Menezes e no qual se refere “ao professor da

27. Idem, idem, Doc. 13.321. Já na carta ao Dr. Vandelli, dizia Cairu: “Tive porém aomesmo tempo o grande desprazer com o aviso de não ter recebido o caixote de ervas,que com tanto desvelo eu tinha colegiado’’.

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cadeira de filosofia e grego, José da Silva Lisboa, a quem deralicença para ir ao Reino tratar de seus negócios particulares28. Afalta de maiores detalhes nos leva considerar problemática estaviagem, o que não acontece com as outras duas, confirmadas pornotícias mais positivas. A última delas realizou-se em 1802, anoem que o Governador Francisco da Cunha e Menezes concedeuao bacharel José da Silva Lisboa passaporte para seguir com desti-no ao Reino em gozo de licença. O prof. Pedro Calmon alude aum manuscrito existente em arquivos coloniais, no qual Cairu “emPortugal e em 1802 queixava-se de seus achaques e comunicavaestar a concluir os Princípios de Direito Mercantil“29.

Mais importante para o futuro de José da Silva Lisboa consti-tuiu a viagem empreendida em 1797, pois no decorrer desta esta-da em Portugal obteve em 20 de fevereiro o decreto de jubilaçãodo cargo de professor régio da cadeira de filosofia, a única que nomomento lecionava, desde que Luiz dos Santos Vilhena o substi-tuiu em 1787 no exercício da cátedra de língua grega. Rezava odiploma que lhe seria concedido o ordenado inteiro enquanto nãoobtivesse emprego em outro lugar de letras ou ocupações que aRainha o destinasse. Em 4 de setembro de 1797, D. Maria I onomeou Deputado e Secretário da Mesa de Inspeção da Bahia, naqual perceberia o ordenado correspondente ao de inspetor30.

As Mesas de Inspeção, existentes na Bahia, Rio de Janeiro,Pernambuco e Maranhão, tinham por objetivo imediato examinare classificar os açúcares e tabacos, procurando com isso não sófacilitar as relações de compra e venda entre Lavradores e Comer-ciantes, como também evitar a burla das determinações metropo-litanas que em relação ao fumo o dividia em três categorias: as deprimeira e segunda qualidades, destinadas ao consumo do Reino eao comércio internacional e a de terceira qualidade, artigo infe-rior, usado no Brasil e utilizado na compra de escravos na África.

28. Idem, idem, Doc. 12.614.

29. Pedro Calmon, op. cit., p. 84.

30. Idem, idem, p. 82.

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Estabelecia preços para as diversas produções e tomava todas asmedidas necessárias para evitar o contrabando e exportação doproduto de uma capitania através dos portos de outra, como senesta fosse produzido. Ademais, as Mesas de Inspeção procura-vam incentivar a produção e defender o comércio.

Dos propósitos que lhes eram peculiares e das atividades deJosé da Silva Lisboa dispomos do testemunho de vários documen-tos existentes nos antigos arquivos do Conselho Ultramarino, emPortugal.

Um deles nos revela que por essa época Cairu já esposava asidéias acerca da outorga de prêmios aos inventores e introdutoresde novas máquinas e fábricas, que mais tarde desenvolveria emuma de suas principais obras31. Neste sentido, no ofício datado de28 de março de 1799 em que informa sobre os engenhos de açú-car e seus maquinismos, propõe seja premiado Joaquim Ignácio daSequeira Bulcão, mais tarde Barão de São Francisco, por ter sido“o primeiro proprietário que adotara novos processos de moagemde cana”32. A proposta de Cairu foi aceita pelas autoridades por-tuguesas, tanto assim que em 14 de novembro de 1799, no mesmoofício em que José da Silva Lisboa foi louvado pelo zelo que dedi-cava ao cargo, D. Rodrigo de Souza Coutinho comunicou-lhe aconcessão do Hábito de Cristo ao inovador da indústria do açú-car. Mais tarde, Cairu foi de novo elogiado porque promoveu, jun-tamente com o presidente e demais membros da Mesa de Inspe-ção, uma subscrição voluntária de 24.000 cruzados “destinada aopagamento de um prêmio pela construção de uma máquina de moercana de açúcar”33.

Em fevereiro José da Silva Lisboa já se dirigira ao futuro Con-de de Linhares dando-lhe diversas notícias sobre a Mesa de Inspe-ção; em 29 de março volta à presença de D. Rodrigo de Souza

31. Observações sobre a Franqueza da Indústria e o Estabelecimento de Fábricas noBrasil, 1810.

32. Eduardo de Castro e Almeida, op. cit., Doc. 19.693.

33. Idem, idem, Doc. 26.054.

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Coutinho propondo a compra pela Real Fazenda dos prédios ondeestavam estabelecidos os trapiches da repartição e, continuandoem suas informações, no dia seguinte a Mesa de Inspeção respon-de uma Carta Régia que lhe solicitara informações sobre “a cultu-ra e manipulação dos gêneros que se exportavam e os diferentesmaquinismos que se usavam para limpar e descascar o algodão, oarroz e o café e os que se empregavam no “fabrico do tabaco eaçúcar”34.

Maior dificuldade apresentou a satisfação das pretensões docomércio e lavoura da Bahia, ansiosos de que os navios emprega-dos no comércio com a Costa d’África não fizessem escala obriga-tória na ilha de S. Tomé, conforme determinava a Provisão doReal Erário de 18 de outubro de 1773. Este desejo, manifestadopela Mesa de Inspeção em 30 de maio de 1800, baseava-se, se-gundo se depreende dos argumentos de João Rodrigues de Brito,na periculosidade que a navegação apresentava para os navios,sujeitos a serem levados pelas correntes marítimas para a Costado Gabão, onde as tripulações talvez fossem devoradas pelos bár-baros. Além do mais, a demora na viagem aumentava o vulto dasdespesas e o risco das perdas, elevando em conseqüência o preçodos escravos de que a lavoura necessitava35. Somente quando D.João já se encontrava no Brasil, essa obrigatoriedade foi revogadapela Carta Régia de 13 de abril de 1808.

O cargo de Secretário e Deputado da Mesa de Inspeção da Bahiafoi exercido por Silva Lisboa até 1808. Embora a ele tivesse em-prestado “o ardor extremo que sempre, em toda a sua vida dedi-cou a todas as tarefas que empreendeu”36, é de se presumir que nofinal de sua carreira na Bahia, quando já esposava os princípios doliberalismo econômico, não mais depositasse confiança nas van-

34. Idem, idem, Docs. 19.684 e 19.692.

35. J. Rodrigues de Brito – “A Economia Brasileira no Alvorecer do Século XIX”,s/data, p. 72.

36. Alceu de Amoroso Lima – “Época, Vida e Obra de Cairu’’, in Princípios de Econo-mia Política, de José da Silva Lisboa, 1956, p. 22.

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tagens e justiça das atividades daquelas repartições, pois na ses-são do Senado de 10 de maio de 1827, declarou que a situaçãodesoladora em que outrora decaíra a agricultura no, Brasil, “indu-ziu El-Rei Dom José, no Ministério do célebre Carvalho, a criarMesas de Inspeção nos portos principais deste Estado, cuidandoque assim repararia os danos, impondo taxas e sancionando abusos”.

VII

Cairu revolucionário?

Episódio controvertido na vida de José da Silva Lisboa pren-de-se à sua possível participação na “conjura dos alfaiates”, ocor-rida na cidade de Salvador no ano de 1798.

Segundo a portaria que ordenou a devassa37, subscrita porD. Fernando José de Portugal, Governador da Bahia na ocasião, asprimeiras manifestações concretas da trama revolucionária surgi-ram no dia 12 de agosto, com a fixação em diversos locais, inclu-sive igrejas, de boletins subversivos. Em dias posteriores, novasproclamações ao Povo Bahiense davam ciência dos objetivos dapretendida revolução, ameaçavam de morte os padres que dos púl-pitos e confessionários se opusessem à conjura, aludiam, por fim,aos lineamentos da nova organização republicana a ser instalada.

A fúria da Justiça portuguesa não tardou cair sobre “os indiví-duos malévolos”, que procuraram atrair “alguns desgraçados (sic)pela permitida licença de costumes; outros pela elevação das fu-turas dignidades; e outros finalmente pelos ricos despojos do pro-jetado saque da cidade; adotando indistintamente os mais bárba-ros e perniciosos expedientes de incendiar a Cidade, assassinar oGoverno, e mais Autoridades, revoltar a tropa e conseguir assim apermanência e estabilidade de tão abominável trama”38. Quatro

37. Biblioteca Nacional – “A Inconfidência da Bahia”, 1931, p. 5.

38. Idem, idem, p. 167.

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dos conjurados, os soldados Lucas Dantas de Amorim Torres eLuiz Gonzaga das Virgens, os alfaiates João de Deus do Nasci-mento e Manuel Faustino dos Santos foram condenados à morte,enforcados e, segundo a execrável tradição estabelecida em taiscasos, esquartejados para que a exposição de seus despojos emlogradouros públicos servisse de exemplo aos colonos recalcitrantes.

F. Borges de Barros afirma incisivamente que “na Bahia chega-mos à conclusão de que três homens dirigiram o movimento: Joséda Silva Lisboa, Cipriano Barata de Almeida e Agostinho Gomesatribuindo ao futuro Visconde de Cairu o papel de “organizadorcalmo, meditado e prudente”39, encarnando “na agitação do mo-mento um daqueles líderes da Revolução Francesa, pondo sua fi-losofia e os seus altos conhecimentos econômicos ao serviço dademocracia que anelava”40. Fazendo alarde de sua índole revolu-cionária, pois por onde andava uma revolução surgia, CiprianoBarata de Almeida era o agitador das ruas.

Em defesa de sua tese, o historiador aduz o depoimento, pres-tado pelo soldado Ignácio Pimentel, o qual afirma que João deDeus lhe dissera estarem a favor da conjura o “Padre AgostinhoGomes e Silva Lisboa, que ambos como ricos os poderosos seriamos que haviam de sustentar a força do levantamento”41. Acres-centa ainda F. Borges de Barros uma carta escrita por Silva Lisboaa Cipriano Barata participando diversas providência atinentes àconspiração42.

Na transcrição feita por Afonso Ruy43 do depoimento do sol-dado Ignácio nota-se que o Silva Lisboa mencionado não se trata-va de Cairu e sim de Antônio da Silva Lisboa, ficando portantotais declarações sem qualquer validade como prova da participa-ção do Visconde de Cairu no movimento, tanto mais que não nos

39. F. Borges Barros – “Os Confederados do Partido da Liberdade”, 1922, p. 21.

40. Idem, idem, p. 11.

41. Idem, idem, p. 25.

42. Idem, idem, p. 22.

43. Afonso Ruy – “A Primeira Revolução Social Brasileira”, 1942, p. 118.

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consta fosse ele rico e poderoso, o que é certo, aliás, em relaçãoao comerciante implicado no movimento. Outrossim, Hélio Vianadeclara que o Silva Lisboa, autor da carta ao “Dr. Baratinha” cha-mava-se Domingos da Silva Lisboa44.

Contrário à alegada atitude de Cairu manifesta-se OtávioTarquínio de Souza, argumentando com a incerteza de sua pre-sença em Salvador na época do levante e sua reconhecida aversãoaos “revolucionários de França, novos canibais e parricidas”...horrorizado sempre com a “desenfreada libertinagem e sanguiná-ria carreira da nação francesa”45. Se a presença na cidade de Sal-vador é-nos certificada pela data de sua posse no cargo de Secre-tário e Deputado da Mesa de Inspeção da Bahia, 27 de julho de1798 – seja, dezesseis dias antes dos primeiros boletins subversi-vos – as tendências francófobas de Cairu são de certo forte argu-mento contra sua pretendida adesão à inconfidência, se bem que,importa notar, em seus trabalhos da época ainda não se percebe aaquele ódio à França, patenteado nos escritos publicados depoisda chegada ao Brasil de D. João.

É ainda com este fundamento que Pedro Calmon mostra que“absurdamente se tem escrito que um dos indiciados foi José daSilva Lisboa (Cairu), que, não somente se ausentou da ‘francesia’,aliás em desacordo com os seus princípios: de liberal à inglesa,reacionário como os economistas da City, eleitor de Burke, comopor esse tempo, vivia em intimidade com o governo colonial delerespeitado e ouvido. O futuro visconde de Cairu, não figurou nainconfidência dos alfaiates”46.

Outro argumento contra a intervenção de José da Silva Lisboadecorre do caráter geral do movimento, quer em seus aspectosdoutrinários, quer na parte referente à ação, revolucionária pro-priamente dita.

44. Hélio Viana – “Contribuição à História da Imprensa Brasileira”, 1942, p. 452.

45. Otávio Tarquínio de Souza – “Franceses na Bahia” – Digesto Econômico – outubrode 1949.

46. Pedro Calmon – “A Bala de Ouro”, 1947, p. 35 (nota).

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Os papéis sediciosos revelavam apenas um conhecimento su-perficial das doutrinas da Revolução Francesa, de que é exemploa definição de Liberdade: – “Estado feliz, estado livre de abati-mento; a Liberdade é a doçura da vida, o descanso do homemcom igual paralelo de uns para outros, finalmente a Liberdade é orepouso, a bem-aventurança do mundo”47. Conceito estranho,alheio por completo ao pensamento enunciado na Declaração dosDireitos do Homem, mais parecendo um convite à mandriice.

A reunião dos conspiradores no campo do dique do Desterro,para a qual João de Deus contava com duzentos e oitenta adep-tos, fracassou e somente apareceram alguns conjurados que, naimpossibilidade de iniciar o levante, ficaram “a beber, a fazer saú-des no botequim que fica por detrás do muro das Freiras”, o queindica uma ausência de plano preconcebido e ajustado, nãoobstante uma testemunha fizesse alusão ao fato de que “estes ajun-tamentos já os havia de tempos antes, com muita repetição e fre-qüência, havendo muitos comes e bebes, saúdes, recíprocas e con-gratulações”48.

A sedição assemelha-se, a nosso ver, ao fruto de reuniões en-tusiasmadas pelos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade,mas sem aquela organização calma e meditada que F. Borges Bar-ros atribuiu ao Visconde de Cairu. O seu aspecto de uma explo-são momentânea e irrefletida do sentimento nativista, fermenta-do por desigualdades de raça e de posição econômica, indica in-compatibilidade entre a desorganização do movimento e o nívelcultural de José da Silva Lisboa e corrobora para encarar com ce-ticismo a participação na conjura do Secretário da Mesa de Inspe-ção da Bahia, conquanto, se, verídica, não representasse desdouroalgum ao grande baiano, antes o integraria em uma das manifesta-ções do sentimento nativista que se ia formando na Colônia. Sealguma influência houve, foi simplesmente episódica e indireta,

47. Afonso Ruy, op. cit., pp. 81/82.

48. Biblioteca Nacional, op. cit., pp. 20/21.

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como, por exemplo, naquela alusão de um dos boletins revolucio-nários à abertura dos portos aos Estrangeiros, principalmente ànação francesa.

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2a

P A R T E

I

A Economia Política e o Direito Comercial

O ano de 1796 constituiu um dos marcos mais importantes na formação intelectual de José da Silva Lisboa. Foi neste ano

que seu antigo colega de Coimbra, Antônio de Morais Silva, aovisitá-lo em Salvador dispunha da tradução que fizera da obra deAdam Smith publicada em 1776. O futuro senhor de engenho emMuribeca, quando residia temporariamente em Londres, leu nooriginal o mencionado livro e desde então continuou dedicando-se à Economia Política. Anos mais tarde (1813), escreveria ao pró-prio Cairu anunciando que no seu “mato apareceu um Smithinglês, um Say, seu bom discípulo e comentador, o Canard e ou-tros da mesma seita, que é desgraça não haja feito mais fortunaentre gente que trata de legislação”1. Prevendo a importância queo futuro reservaria à nova ciência, sentiu-se obrigado a exibir aoseu amigo a tradução do livro do genial escocês. Não se enganou.A impressão que a leitura da obra deixou em Cairu foi dura-doura provocou verdadeira metamorfose no curso de seus estu-dos e atividades.

O primeiro resultado da nova orientação, observa-se no livro“Princípios de Direito Mercantil, e Leis de Marinha”, editado emLisboa, no ano de 1798.

Que o trabalho foi produzido depois do conhecimento de AdamSmith, e não antes segundo afirmam alguns autores, assegura-nosa alusão que na página 79, tomo I, Cairu faz “às teorias do célebreautor das Riquezas das Nações” e mais adiante, na página 221, às

1. A. J. Mello Moraes, “História da Transladação da Corte Portuguesa para o Brasil”,1872, pp. 67/71. Também F. A. Pereira da Costa – “Noticia Biográfica do Dr. Antôniode Morais e Silva, 1910, pp. 111/115.

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observações judiciosas do “célebre Adam Smith em sua Econo-mia Política”. Que é posterior a 1796, garante-nos ainda a legisla-ção comentada na obra, máxime as palavras do autor citando oalvará de 12 de agosto promulgado no “presente ano de 1797”2, quan-do, aliás, já se encontrava em Portugal. O conhecimento amplodos usos e costumes da praça de Lisboa, a ausência de qualquermenção ao Brasil, o que não se verifica na segunda parte do livro,e os dizeres textuais de Cairu, no opúsculo “Regras da Praça”: –“comecei a dar à luz a parte 1 dos Seguros Marítimos em Lisboano ano de 1798 e fui sucessivamente publicando as mais partesque arranjei na Bahia”3, sugere-nos a hipótese de que José da Sil-va Lisboa escreveu na capital de Portugal, e não em Salvador, aprimeira parte do seu primeiro livro.

Na edição inicial, o autor anunciou a obra dividida em oitotratados: 1o do Seguro Marítimo; 2o do Câmbio Marítimo; 3o dasAvarias; 4o das Letras, de Câmbio; 5o dos Contratos; 6o da Políciados Portos e Alfândegas; 7o dos Juízes e Tribunais do Comércio;8o da Economia Política. Este último, porém, não chegou, a serpublicado, muito embora Cairu houvesse em seu livro combatido“a legislação feita no Ministério do célebre Marquês de Pombal,que estava imbuído dos erros do Sistema Mercantil de Colbert eoutros Corifeus de Panegiristas das restrições do comércio”, au-gurando que a mesma “não pode ter lugar depois das luzes econô-micas que, tanto se espalham na obra do grande Mestre Smithsobre as Riquezas das Nações e que exponho no meu Tratado 8,parte 4”4. Não obstante estruturado em suas linhas fundamen-tais, José da Silva Lisboa, aprofundando seus estudos, verificou aimpossibilidade de oferecer uma perfeita exposição da Ciência Eco-nômica nos moldes em que delineara, daí ter publicado os “Princí-pios de Economia Política” em substituição ao oitavo tratado.

2. José da Silva Lisboa – “Princípios de Direito Mercantil e Leis de Marinha”, 1798,Tomo II, pp. 20/21.

3. Idem – “Reflexões sobre o Comércio de Seguros”, 1874, p. 951.

4. Idem – “Princípios de Direito Mercantil etc.”, 1874, p. 236.

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Não pretendeu Cairu fazer obra de profunda Ciência do Direi-to. A preocupação, que o incitou escrever o livro, era de carátereconômico. Convicto da necessidade de provocar o desenvolvi-mento do comércio português, tencionou apenas oferecer à “Mo-cidade que se habilita à profissão do comércio”, um “sistema deJurisprudência marítima, própria para engrandecer a esfera dasespeculações de tão útil classe de Cidadãos”. Não é destarte umtrabalho “destinados sábios, que consultam as fontes originais; ésó dirigido à generosa Mocidade Portuguesa que cultiva o comér-cio”. Pretendia com isto propiciar aos capitalistas garantias ne-cessárias à aplicação de capitais, evitando que os mesmos perma-necessem inativos, quando podiam empregá-los em frutíferas es-peculações. Somente na medida em que o conhecimento das re-gras, jurisprudência, usos e costumes contribuísse para cercar degarantias as operações dos indivíduos que se dedicavam ao co-mércio é que se deve encarar o objetivo do livro de Cairu5.

Uma obra com estes propósitos e publicada há tantos anos de-veria sofrer, como sofreu, o embate da evolução econômica dospovos. Essencialmente dinâmico, o direito mercantil amiúdetransforma-se incorporando em seus dispositivos aspectos ines-perados da vida comercial e relegando outros ao natural esqueci-mento. A discussão da conveniência ou não do seguro de vidaestá alheia às cogitações do legislador moderno; os seguros sobreescravos e bestas, sobre a liberdade (resgate dos piratas), são fa-tos do passado. As operações de câmbio marítimo desapareceram.Porém, o que o tempo não lhe tirou foi o merecimento de ser “pro-le criada sem mãe: não teve protótipo, nem modelo e auxílio”6.

Elogiado na opinião de seus contemporâneos, na interpretaçãodos maiores juristas atuais o livro de Cairu, em seus aspectos funda-mentais, permanece de valor inalterável: grande como foi, maiorserá o transcurso do tempo, por isso que os anos se encarregam deconceder às obras pioneiras aquela preeminência que, imediata-

5. Idem – idem – Introdução.

6. Idem – “Reflexões sobre o Comércio de Seguros”, 1874, p. 946.

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mente surge quando comparamos os conhecimentos científicos deque hoje dispomos com os limitados recursos da época em queforam concebidas.

Dentre os autores modernos que abordaram a obra de SilvaLisboa, o peso da autoridade de Clóvis Beviláqua é suficiente paraoferecer-nos a medida exata da importância dos “Princípios deDireito Mercantil e Leis de Marinha. Diz o notável jurista que“José da Silva Lisboa é o vulto que pode servir de ponto de parti-da a quem procura acompanhar o desenvolvimento da nossa lite-ratura jurídica. Blindado com os princípios da Economia Política,que ainda era quase uma novidade em seu tempo, e que fora tãoamorosamente cultivada pelo bispo Azeredo Coutinho; influencia-do pelas idéias de Burke e Bentham, estimulado pelo sentimentode que internava por terrenos mal explorados, conseguiu Lisboafundar, em Portugal e na sua colônia brasileira, o direito mercan-til, dando-lhe sistematização e cunho científico, muito paraadmirar-se em época tão pouco propícia a semelhante orientação.Porém se foi um jurista que compreendeu o proveito a tirar dasciências sociais, ou, mais exatamente da economia política, paraelucidação do direito, não possuía o seu engenho essa nobre saliên-cia que conduz às abstrações da filosofia e as construções quesintetizam as idéias”7.

José da Silva Lisboa, já notamos, não procurou em sua obranada mais fazer do que oferecer regras de utilidade imediata nodesempenho das funções comerciais. Assim, parece-nos não serlícito procurar dentro da obra jurídica de Cairu, as abstrações filo-sóficas a que alude o eminente Beviláqua.

Mais tarde, no Congresso Internacional de História da Améri-ca, o mesmo jurisconsulto voltou a se referir ao Visconde de Cairu,acentuando sobremaneira seus reconhecidos méritos: “Colocadohá mais de um século de distância, podemos, desassombradamenteconfirmar todos os encarecimentos feitos a esse livro, que, apoian-do-se na economia política, na história e na legislação comparada,

7. Clovis Beviláqua – “Juristas Filósofos” – Revista Brasileira, 1897, vol. 9, p. 145.

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nos dá a impressão de se ter antecipado, muitos anos, ao pensa-mento jurídico do mundo; e na essência de suas idéias capitais,como pelo caráter científico de que se revestiu, é, ainda um livromoderno”8.

As atividades de Cairu neste setor continuaram fecundas pormuitos anos: em 1809 apresentou a D. João um plano do CódigoComercial, do qual principiou a redigir um projeto em 1826. Taisdocumentos que por mais de um século permaneceram no Arqui-vo Nacional, recentemente vieram à luz graças ao historiador E.Vilhena de Morais e ao Jornal do Commercio, que abriu suas páginaspara publicá-los.

Não caberia, porém, a Cairu libertar “a Nação Brasileira danecessidade e indecência de mendigar a Lei de Viver, e a decisãode seus pleitos de Códigos Estrangeiros”9. Conta-nos DjalmaForjaz10 que por considerações de ordem política, Silva Lisboanão foi convidado para integrar a comissão de doutos no assuntoincumbida em 1832 de organizar o projeto do Código Comercial.A omissão cometida pelo Governo deu margem a protestos pelaimprensa, aparecendo no periódico A Verdade de 31 de março de1832, veementes críticas à atitude da Regência. Esta, premidapelos protestos, viu-se, embora sem êxito, na contingência de con-vidar o valetudinário comercialista para colaborar nos trabalhosda comissão.

Era redigido nos seguintes termos o elogioso ofício que lhe foienviado:

“Ilmo. Sr. A Regência em nome do Imperador há por bem signi-ficar a V. Exa. que, tendo sido criada uma comissão de homensprobos e inteligentes para organizar o Projeto de um Código Mer-cantil, de que tanto se precisa, deixou V. Exa. de ser convidado

8. Idem – “A Cultura Jurídica no Brasil” – Rev. Inst. Hist. Geog. Bras. 1922 – TomoEsp., vol. 9, pp. 320/321.

9. José da Silva Lisboa – “Projeto do Código Comercial’ – apud E. Vilhena de Morais“No Bicentenário de José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu – Jornal do Commercio,15/7/1956.

10. Djalma Forjaz – “Origem do Código Comercial” – O Estado de São Paulo, 15/4/1927.

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para ela, não por quebra de consideração devida à sua grande re-putação literária, principalmente em semelhantes matérias comoo Mundo sabe, mas porque oprimido de suas habituais enfermida-des receasse a mesma Regência incomodar ainda V. Exa. com aacréscimo de novos trabalhos, além dos de sua ordinária obriga-ção. Hoje, porém, certo de que V. Exa. gozando de melhor saúdee tendo mesmo já preparado alguns trabalhos sobre semelhantecódigo se não esquivará de concorrer com suas luzes para obra detão geral utilidade e da qual muito dependerá a prosperidade doBrasil, me Ordena que convide V. Exa. para que, unido a ditacomissão a coadjuve como bem permitirem suas forças físicas, noreferido serviço, de que se acha encarregada. Deus guarde V. Exa.Paço, 11 de abril de 1832 a) José Lino Coutinho”.

José da Silva Lisboa, ainda sobre Direito Mercantil, publicouem 1832 um opúsculo intitulado Regra da Praça ou Bases do re-gulamento comercial, conforme os novos códigos do comércio daFrança e Espanha e legislação pátria, e, relator da Junta de Co-mércio, auxiliou a elaboração do Regimento dos Cônsules.

I I

O Liberalismo Econômico

O primeiro dos livros que José da Silva Lisboa dedicou à Ciên-cia Econômica, os Princípios de Economia Política, publicado emLisboa no ano de 1804 constitui uma exposição da doutrina deAdam Smith, o “sacerdote da justiça civil” que lhe desvendounovos horizontes científicos.

No tratamento dispensado à novel ciência, Cairu imprimiu ocaráter pragmático que em geral se nota nos trabalhos dos primei-ros: economistas. Não existia ainda a concepção de uma econo-mia pura, de uma ciência exclusivamente teórica, idêntica à quese observa no Manuel d’Economie Politique de Vilfredo Pareto, ondeo autor propôs “unicamente procurar às uniformidades que apre-

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sentam os fenômenos, isto é, suas leis, sem ter em vista qualquerutilidade prática direta, sem preocupar-se de qualquer maneira emdar receitas ou preceitos, sem procurar mesmo a felicidade, a uti-lidade ou bem-estar da humanidade ou de uma de suas partes”11.A Economia Matemática, dotada do rigor que possibilitou as cria-ções abstratas de Pareto, Walras, Jevons, ou mais recentemente, aconstrução dos modelos dinâmicos de Tinbergen, Klein, Koopmanse tantos outros, ainda estava em sua infância e de suas obras pre-cursoras, Cairu certamente só conheceu os Principes d’EconomiePolitique de Nicolau Canard (citado por seu filho Bento da SilvaLisboa na tradução resumida da obra de Smith), mas que não era demolde a criar entusiasmo pelo emprego da matemática na Economia.

Exemplo do espírito prático de que se revestiam os estudoseconômicos de Cairu, constituem, conforme dissemos, os Princí-pios de Direito Mercantil e Leis de Marinha, fruto da simbiosefecunda que o autor soube fazer entre a Economia e o Direito, eque o levou a considerar, de início, a ciência das riquezas umaseção da jurisprudência.

Não obstante esta afirmativa, a nosso economista jamais ne-gou a existência de uma ciência econômica contando, com umcampo de pesquisas perfeitamente delimitado e ocupando-se dosfenômenos que surgem das ações e reações provocadas pelos in-divíduos em suas atividades tendentes à satisfação das necessida-des econômicas: “o mundo físico rege-se por leis simples e fecun-das, que lhe dão ordem, harmonia, beleza e perpetuidade. Algumadaquelas leis são conhecidas pelos homens e segundo as mesmaseles regulam suas ações, previnem danos e adquirem muitos bensde vida. Reunidos em sociedades constituem um mundo moral,que parece também dever ser regido por leis de igual simplicidadee fecundidade, para viverem em paz e abastança”12.

Cairu não concebia, porém, que a determinação das leis natu-rais não servisse para o promoção do bem-estar da sociedade;

11. Vilfredo Pareto – “Manuel d´Economie Politique”, 1927, pp. 2/3

12. José da Silva Lisboa – “Princípios de Economia Política”, 1956, p. 111.

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constatadas pela ciência, serviriam de paradigma às leis civis pro-mulgadas pelo Soberano, que em suas funções era de mister usarde “perfeita imparcialidade e justiça”, utilizando-se dos conse-lhos dos economistas ortodoxos, cujo “patriotismo e sagacidade...deve consistir em bem ver e indicar quais sejam as leis econômi-cas opressivas, inúteis, antiquadas e inexeqüíveis”13.

O critério adequado à determinação das leis econômicas inde-sejáveis à sociedade – lei no sentido jurídico – encontra-se nolivre jogo da oferta e procura, pois, fazendo suas as idéias de AdamSmith, Cairu considera “evidente e óbvio a todos os espíritos ainiqüidade e insolência de pôr taxa no alheio, quando todo o mun-do justamente reclama isenção ao que lhe é próprio e quaisquertransações da vida se conformam por livre ajuste às circunstân-cias da demanda e concorrência”14.

Adepto estrênuo da livre iniciativa, sempre manifestou atravésde suas obras um ódio constante e entranhado aos monopólioscriados pelos indivíduos dentro de um país. Se lhe desgostavamestes entraves à concorrência, que não dizer do grande monopó-lio, daquele monopólio único, ferrenho e vexatório que empolga-va há tantos anos, uma nação inteira?

Foi precisamente o combate ao sistema colonial o fim precípuodos Princípios de Economia Política de José da Silva Lisboa. Quatroanos depois da publicação do livro, seu autor teve a grande opor-tunidade de contribuir para a efetivação das idéias econômicasque propugnava.

III

A abertura dos portos do Brasil

Relembrando o processo histórico do qual decorreram osponderáveis eventos causadores da desintegração do sistema do

13. Idem, idem, p 289.

14. Idem, idem, p. 222.

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monopólio colonial e que mais tarde constituiriam o fundamentoda própria independência brasileira, constatamos que o Brasil nãofoi para Portugal apenas uma colônia de onde provinham o ouro, eos diamantes que a corte portuguesa espalhava com mãos pródi-gas pela Europa. Não era apenas um Estado imenso, estuante deenergias, pleno de riquezas, no qual a Metrópole encontrava o san-gue novo capaz de sustentar uma economia em constante deca-dência. O Brasil era também uma esperança, uma nova Canaã paraonde a nobreza volvia os olhos quando, através das vicissitudesda política européia, sentia perigar a segurança da dinastia reinante.

A História registra diversas oportunidades em que foi cogitadaa transferência do Rei de Portugal para o Brasil, a primeira dasquais se perde nos primórdios da colonização, visto que, em 1550,Martim Afonso de Souza recomendou a D. João III situar a sededo seu governo nas terras recém-descobertas. A mesma medidafoi alvitrada ainda, e por diferentes motivos, nos reinados de D.João IV, D. José I e, finalmente, tomou incremento, a ponto deconcretizar-se, na época em que o futuro D. João VI exercia opoder em nome de D. Maria I.

Dentre as opiniões que prepararam o 29 de novembro de 1807,destaca-se a do Marquês de Alorna que, seis anos antes e comvisão profética, encarava o futuro sombrio da monarquia portu-guesa, sujeita a ter nas mãos de Napoleão o destino “de todas ascoroas de Segunda ordem na Europa”15. Foi Silvestre PinheiroFerreira que em 1803, por sua vez, abalançou-se “ a representarperante o régio trono, em competente ofício pela respectiva repar-tição, que à Lusitana monarquia nenhum outro recurso restava,senão o de procurar quanto antes na sua colônia um asilo contra ahidra então nascente”16. O próprio D. Rodrigo de Souza Coutinho,a quem José da Silva Lisboa atribuiu o “conselho em ocasião opor-tuna de salvar a casa e a dinastia de Bragança, transportando-se a

15. Luiz Norton – “A Corte de Portugal no Brasil”, 1938, p. 15.

16. Idem, idem, p. 21.

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real família para os Estados Ultramarinos”17, também, em 1803,dizia que Portugal “não é a melhor, a mais essencial parte da Mo-narquia” e no caso de uma guerra restava ao “soberano e aos seusPovos o irem criar um poderoso Império no Brasil”18.

A idéia da transladação da corte, face às ameaças francesas,não era esposada e defendida apenas em Portugal: encontramo-laencarecida na Inglaterra onde Pitt, em célebre e contestado dis-curso, propôs a instalação da monarquia portuguesa na Américapara formar um novo Império, indestrutível devido à íntima cola-boração inglesa. Para não faltar o elemento tradicional, a capitaldenominar-se-ia Nova Lisboa e o rio que dela mais próximo cor-resse, chamar-se-ia Novo Tejo. Mas se Portugal não acedesse àsinstâncias britânicas, tropas desembarcariam na vasta possessãoportuguesa...

Mesmo diante destas claras manifestações da política inglesa,com sombrios prognósticos para suas colônias, Portugal durantecerto tempo conseguiu tergiversar perante as cortes de França eInglaterra. Finalmente ficou diante de fatos concretos e irre-movíveis: no momento em que medidas contrárias à Grã-Bretanhaforam postas em execução, no momento preciso em que alienavaa simpatia de sua antiga aliada, a França, por seu turno, riscava domapa europeu aquela nação diminuta que outrora encontrara nomar o complemento exato de sua grandeza. E mais uma vez Por-tugal seguiu o rumo do Oceano que lhe dera imorredouras glórias.Voltando à amizade da Inglaterra, aceitaria implicitamente sua tu-tela e seus ministros teriam que ouvir à bordo da nau Medusa asimpertinências de Lord Strangford exigindo a abertura dos portosdo Brasil ao comércio inglês, mas que, repelidas com hombridadepor Antônio de Araújo terminaram sem que fosse alterado oantigo projeto de abrir um porto, o da ilha de Santa Catarina, confor-me ficara estabelecido caso para o Brasil viesse o futuro D. Pedro I.

17. José da Silva Lisboa – “Elogio do Conde de Linhares” – publicado segundo A. J.Melo Moraes – “História do Brasil Reino e Brasil Império”, 1871, pp.134/135, no“Investigador Português (Londres).18. Oliveira Lima – “D. João VI no Brasil”, 1945, p.54.

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Sob a proteção da bandeira inglesa, o Príncipe Regente e suacomitiva deixaram Portugal para enfrentar os azares do Oceano,aturando os vermes que pululavam na água de beber, o odor dascarnes que apodreciam nos depósitos, o incômodo dos insetos queenxameavam nos próprios camarotes reais.

Depois de quase dois meses de viagem, as naus que transporta-vam a parte mais luzidia da nobreza aportaram em Salvador e so-mente então os espíritos serenaram-se das amarguras da travessiaingrata, os ânimos envaideceram-se pelas homenagens tributadasna antiga Capital da Colônia, e mais do que isto, no ambiente fes-tivo de uma população exultante em conhecer Suas Majestades,receberam consagração definitiva as idéias inglesas que Adam Smithe Edmundo Burke compendiaram e espalharam pelo mundo.

* * *

Quais os sucessos ocorridos nos dias que mediaram entre a che-gada de D. João à Bahia e a promulgação da Carta Régia de 28 dejaneiro de 1808, que abriu os portos do Brasil às nações amigas? J.M. Pereira da Silva assegura-nos que, imediatamente à chegada, oPríncipe Regente reuniu um conselho composto de várias pessoasgradas, inclusive José da Silva Lisboa, para discutir a importantemedida; F. M. Góes, por sua vez, diz-nos que o Conde da Ponteenviou ao príncipe a obra que José da Silva Lisboa lhe oferecera eintitulada “Observações sobre a abertura dos portos do Brasil”.Heitor Moniz, afirma porém, que o futuro Visconde de Cairu foiuma das pessoas encarregadas de saudar Suas Majestades e o fezcom tanta eloqüência que conseguiu inspirar o ato primordial dalibertação econômica do Brasil19. Diante deste desacordo genera-lizado, sublinhemos a exposição de Alexandre José de Melo Mo-raes, que tem a seu crédito a particularidade de representar umatradição de família, porquanto lhe foi transmitida em conversas

19. J. M. Pereira da Silva – “História da Fundação do Império Brasileiro”, 1877,p. 10; F. M. Góes Calmon – prefácio de Rodrigues de Brito “A Economia Brasileira noAlvorecer do Século XIX” – p. 10; Heitor Moniz – “Episódios da História do Brasil”,p. 36.

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por Bento da Silva Lisboa, filho do Visconde de Cairu. Conta-noso historiador alagoano, que José da Silva Lisboa tomou conheci-mento dos desejos inglêses de comerciar diretamente com o Bra-sil, através de um dos opositores da partida do Príncipe Regentepara o Brasil, o Marquês de Bellas. Ciente dos sucessos que prece-deram a saída precipitada de D. João, Cairu percebeu que em fa-vor das teorias econômicas que desde muito proclamava na cida-de de Salvador, surgia uma série de acontecimentos que torna-vam o liberalismo econômico um imperativo inadiável para o Bra-sil. Procurou por isso influir no ânimo de D. João, não diretamen-te, mas por intermédio de D. Fernando José de Portugal, e, se con-seguiu convencer o Marquês de Aguiar dos benefícios da medida,não o persuadiu da urgência que julgava indispensável, desde queD. Fernando pretendia, por compreensíveis escrúpulos, fosse ou-vido com antecedência o Conselho de Estado. Neste transe, “Joséda Silva Lisboa vendo quase baldados seus esforços, recorreu àlisonja e disse: “V. Exa. que é tão ilustrado, sabe que os grandeshomens, não podem fazer grandes benefícios ao seu país, pornão lhe serem favoráveis as circunstâncias. Ora parece, quepresentemente Deus quer proporcionar a V. Exa. o ensejo de fazerum assinalado serviço, não só à sua pátria, mas aumentar aindamais o esplendor de sua ilustre família. Não deixe esta glória paraoutro” 20.

Ao lado desta variedade de narrativa, o excepcional concursode circunstâncias que tomou realidade os reclamos coloniais deliberdade de comércio, permitiu no julgamento da atuação quenele desempenhou José da Silva Lisboa opiniões extremas muitodivergentes: umas, admitiram sua preponderante e exclusiva in-fluência, imputando o decreto de D. João à força de seus argumen-tos; outras, pelo contrário, fazendo ênfase na política inglesa, re-sumiram o papel do Secretário da Mesa de Inspeção da Bahia àredação de um simples parecer burocrático ou apenas à formula-ção jurídica de um pensamento que o regente esposava desde suaretirada de Portugal.

20. A. J. Melo Moraes – “História da Transladação etc.”, p. 71.

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O próprio Visconde de Cairu declarou que o “liberal Sistemade Comércio e Indústria... se havia adotado no Brasil, desde oprincípio do ano de 1808, pela inevitável força das coisas”21. Talasserção, pelo seu cunho de sinceridade leva-nos supor que mes-mo se a fortuna do mar não conspirasse para que D. João antes deatingir o Rio de Janeiro aportasse à Bahia, o liberalismo seria im-plantado independentemente das instâncias de José da Silva Lis-boa. Aceitando-se a hipótese da viagem direta ao Rio, resta-nosperguntar se o merecimento do ilustre baiano ficaria de algumaforma diminuído. Devemos ter em conta que as grandes ações queenobreceram a humanidade, nem sempre foram executadas pelosque mais sentiram, preconizaram e muitas vezes até morreram pelosideais que os norteavam. Tiradentes não viu realizados os ideaisque sublimou e nem por isso seu valor diminuiu: continuará sem-pre com a glória de intimorato precursor da autonomia brasileira.Assim, Cairu também sobressairia sempre pelas idéias sustenta-das, tivesse ou não participação no decreto que libertou o Brasildo jugo econômico de Portugal. Basta-nos acentuar que desde1804, quando na Europa, Portugal ainda podia oscilar entre astendências políticas de Rodrigo de Souza Coutinho e Antônio deAraújo, favoráveis à Inglaterra e França, respectivamente; quandoeram remotos os acontecimentos que determinaram a mudançaurgente da corte para o Brasil, conclamava o economista brasilei-ro ao Príncipe do Brasil: “Será de eterna Glória ao Augusto JoãoVI dar primeiro exemplo de um Império, em que a Razão e a Justi-ça triunfem dos prejuízos e atentados com que até o presente seacham manietados a Indústria e Comércio do Gênero Humano. Ese eu, que mal sou um átomo do Universo, entrar para a imensida-de desse benefício, ajuntando, algum grão à seara social, não al-mejo mais, fortuna que o ser útil. . .”22.

Mas os fatos não quiseram que este átomo do Universo, que nagrandiosidade de sua cultura cresceu até atingir as dimensões imen-

21. José da Silva Lisboa – “Reflexões sobre o Comércio de Seguros”, 1874, p. 946.

22. Idem, idem, “Princípios de Economia Política’’, 1804, pp. 32/33.

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sas de um planeta permanecesse alheio à realização de suas idéiaseconômicas. Corroborando com a narrativa de A. J. Melo Moraes,que nos adianta uma participação ativa de José da Silva Lisboa,dispomos de um documento da época, de autoria de Tomaz Antô-nio Vilanova Portugal, transcrito no Jornal do Commercio de 28 dejaneiro de 1908, em artigo anônimo comemorativo do centenárioda grande efeméride nacional, posteriormente identificado comode autoria de Capistrano de Abreu. Disse o Ministro: “Neste anochegou Sua Majestade à Bahia a 22 de janeiro; esteve servindo deMinistro de Estado D. Fernando José de Portugal, porque este e oMarquês de Bellas, José de Vasconcelos e Souza e o Marquês deAngeja, D. José de Noronha que tinham impugnado a jornada, éque foram com Sua Majestade na nau Príncipe Real; e os doisMinistros que havia Antônio de Araújo e Visconde de Anadia,João Rodrigues de Sá, aquele foi na nau Medusa e este na fraga-ta... e os mais conselheiros de Estado Marquês de Pombal, D.Rodrigo de Souza Coutinho e o Mordomo Mor, o Duque deCadaval foram nas mais e como se dispersou a esquadra com atormenta, na altura da Madeira, foram a diversos portos.”

Neste intervalo, até que Sua Majestade chegasse ao porto doRio de Janeiro, a 7 de março, D. Fernando foi capacitado por Joséda Silva Lisboa, a quem o Marquês fez nomear lente de economiapolítica e por Antônio da Silva Lisboa, que aí estava adminis-trando o contrato de João Ferreira, o Solla, para fazer assinar porEl Rei o decreto para abrir todos os portos do Brasil às naçõesestrangeiras.

Antônio de Araújo “tinha falado com o Ministro inglês, LordStrangford, que se havia de abrir algum porto; mas, em conseqüên-cia disto, não houve ocasião nem de negociar, nem de compensa-ção inglesa e ficava aberta a porta. Parece que o Marquês de Bellasse capacitou também e conveio; porque ele é que tinha sido in-cumbido de redigir o decreto e instruções que El Rei deixou emLisboa para os governadores do Reino”23.

23. Reproduzido em “Ensaios e Estudos” – 2ª Série, 1932, p. 73.

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Confirmada a participação de Cairu nas ocorrências de Salva-dor, cabe-nos determinar a natureza de sua intervenção.

D. João ao sair de Portugal conhecia sobejamente os desejosingleses; durante a viagem, refletiu com os conselheiros presentesnas vantagens e inconvenientes da pretenção britânica e, segundoacabamos de ver, concluiu pensando usar o privilégio a ser outor-gado como base de futuras negociações. Mesmo se estas negocia-ções fossem possíveis, o que aliás não se afigura plausível, mercêda posição difícil em que se encontrava Portugal perante a Ingla-terra, a medida possuiria um cunho nitidamente político, uma con-cessão feita diante de forças superiores, sendo as consideraçõesde ordem econômica de caráter secundário. Parece-nos que umadas virtudes de José da Silva Lisboa foi, de início, transformaraquele ato político em uma decisão de natureza econômica, mos-trando que a abertura dos portos não era apenas de interesse daInglaterra, mas que, antes de tudo, representava um ato detranscendental importância para o futuro do novo Império queia ser fundado na América. Cairu, portanto, deu a D. FernandoJosé de Portugal e, posteriormente, a D. João convicção das bené-ficas conseqüências da atitude que seria tomada pelos dirigentesportugueses.

Mais do que isto, porém, Cairu no desempenho das funçõesespecíficas do economista, conseguiu modificar os próprios pla-nos do Príncipe Regente. Foi Tobias Monteiro quem, utilizando-se do manuscrito apresentado por Capistrano de Abreu, indicou overdadeiro resultado dos raciocínios desenvolvidos por José daSilva Lisboa junto ao Marquês de Aguiar para convencê-lo da uti-lidade da medida proposta. Sublinhou o autor de “A Elaboraçãoda Independência” aquela parte do texto na qual Tomás AntônioVilanova Portugal deixou consignado que, muito embora pelasconversações mantidas na Europa, “se havia de abrir algum por-to”, o regente foi por fim “capacitado” para “abrir todos os portosdo Brasil”.24

24. Tobias Monteiro – “A Elaboração da Independência”, 1927, pp. 63 e segs.

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Pelo papel desempenhado na abertura dos portos do Brasil, nãose afigura demasiado considerar Cairu o economista profissionalque, na qualidade de conselheiro econômico, maior influência tevesobre os destinos do Brasil, tornando-o digno de ser respeitadocomo o inconteste patrono desta profissão liberal.

I V

O Ensino da Economia Política

Nos “Princípios de Economia Política”, Silva Lisboa manifestoudois grandes desejos: ansiava pelo sistema: de franquia do comér-cio e não menos anelava implantação do ensino da Economia.Confiante nos benefícios que adviriam da vulgarização dos pre-ceitos estabelecidos pela ciência de Adam Smith, Cairu lamenta-va que “erigindo-se todas as nações iluminadas tantas cadeiras deinstrução do povo e ainda estabelecimentos de mero luxo literá-rio; distinguindo-se, além disto, várias escolas em desperdício detempo, cabedal, e trabalho, para doutrinarem inépcias, futilida-des, erros, coisas dignas de se ignorar e até o que todo o mundosabe, ou que facilmente se aprende e não se tenha com tudo aindaafamado, algum protetor das Ciências para honrar e universalizaro ensino da Economia Política, fazendo-o entrar na Educação Na-cional”25.

O economista brasileiro, no entretanto, percebia com júbilo quenão estava, apregoando em vão as idéias econômicas que encon-trava nos mais recentes livros saídos dos prelos do velho mundo:conseguia aos poucos criar um clima de curiosidade pela ciênciaque se constituía. Dos livros, as idéias passavam para as discus-sões públicas, para os debates em tertúlias que reuniam os ele-mentos mais progressistas da cidade. Exemplo marcante encon-tra-se no inquérito sobre a situação econômica da Capitania, pro-cedido em 1807 pela Câmara da Cidade de Salvador no qual com-

25. José da Silva Lisboa – “Princípios de Economia Política”, 1804, p. 18.

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pareceram com suas respostas João Rodrigues de Brito, ManoelFerreira da Câmara, José Diogo Ferraz de Castelo Branco e Joa-quim Inácio de Sequeira Bulcão, aquele senhor de engenho queanos antes, por iniciativa de José da Silva Lisboa, recebera o Há-bito de Cristo. Neste clima de renovação intelectual J. Rodriguesde Brito reuniu sua voz à do futuro Visconde de Cairu, deploran-do que “a ciência econômica sendo a mais importante, é a maisignorada. Deviam criar-se Cadeiras para ela em todas as partes,onde houvesse suficiente número de alunos para freqüentá-las;sem este preparatório ninguém devera matricular-se na Universi-dade, nem ser admitido a servir empregos públicos de qualquernatureza que fosse”26.

Um ano após o inquérito, à satisfação de ver realizado o sonhodo liberalismo econômico, juntou-se em Cairu a alegria de conhe-cer o decreto de 23 de fevereiro, que não só criava na cidade doRio de Janeiro a cadeira de Economia Política, como também onomeava para regê-la.

Diz o decreto, verdadeira síntese do apreço que já naquele tempogozavam os estudos econômicos: “Sendo absolutamente necessá-rio o estudo da ciência econômica na presente conjuntura, em queo Brasil oferece a melhor ocasião de se pôr em prática muitos dosseus princípios, para que os meus vassalos, sendo melhor instruí-dos neles, me possam servir com mais vantagem; e por me constarque José da Silva Lisboa, Deputado e Secretário da Mesa de Ins-peção da Agricultura e Comércio da Cidade da Bahia, tem dadotodas as provas de ser muito hábil para o ensino daquela ciência,sem a qual se caminha às cegas e com passos muito lentos e àsvezes contrários na matéria de Governo, lhe faço mercê da proprie-dade e regência de uma cadeira e Aula Pública que por este mes-mo decreto sou servido criar no Rio de Janeiro.”

Dias depois da nomeação, Cairu, acompanhado de sua família,

26. J. Rodrigues de Brito, op. cit., p. 132.

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embarcou em um dos navios que em 26 de fevereiro de 1808 sus-pendiam âncoras com destino ao Rio de Janeiro, onde chegaramem 7 de março.

Não teve início venturoso, a moradia de José da Silva Lisboana Capital do Brasil. Acometido de grave doença foi obrigado aguardar o leito por muito tempo. Os parcos vencimentos que per-cebia eram insuficientes para manter uma família numerosa;valeu-se então da amizade de D. Rodrigo de Souza Coutinho paraobter que seu filho Bento da Silva Lisboa, mais tarde renomadomembro do nosso Corpo Diplomático, fosse nomeado em 22 deagosto de 1809, oficial da Secretaria de Estado dos Negócios daGuerra e Estrangeiros. Pouco depois, em 1811, perdeu o convívioda filha de D. Isabel Antônia de Figueiredo e do advogado Antô-nio Alvares de Figueiredo, D. Ana Francisca Benedita de Figueiredo,com quem se consorciara em 19 de abril de 1784.

A todas estas preocupações somou-se a decepção que lhe pro-porcionou o ensino da Economia Política, seu ideal acalentadopor tantos anos. Adianta-nos I. A. F. Benevides, em 1821, que noRio de Janeiro, “tal parede lhe fizeram os inimigos da luz, que indanão deu a primeira lição”27. Por fim, em 1830, foram desvaneci-das suas últimas esperanças, pois deixou de figurar no orçamentoa dotação correspondente aos vencimentos do prof. José da SilvaLisboa, por não haver alunos na cadeira de Economia Política.28

Terminava de forma melancólica a experiência brasileira pre-cursora do ensino da Ciência Econômica. Implantado, segundonos afirma o mesmo I. A. F. Benevides, pelos passos que nesteparticular empreendeu João Rodrigues de Brito, representava ver-dadeira glória para o ensino no Brasil, pois fora obtido com notá-vel antecedência sobre a criação de cátedras da mesma disciplinaem outros centros do mundo civilizado.

27. Idem, idem, p. 126.

28. A. J. Melo Moraes – “História da Transladação etc.”, p. 72, nota.

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V

Esboço de uma Política Econômica

A despeito de todas as adversidades que o afligiram, Silva Lis-boa manteve seu espírito imune ao desânimo. Avolumando-se con-tra a abertura dos portos às nações amigas a “notória indecenteoposição”29 dos que viram seus interesses postergados e dos reinóisque sentiram o profundo significado que ela representava para asfuturas relações entre a Metrópole e a Colônia, Cairu ainda doen-te foi obrigado a entrar em liça defendendo a medida de D. João e,para não perder a oportunidade do debate, ditava da cama ao seufilho Bento as páginas do livro “Observações sobre o Comércio Francodo Brasil”, no dizer de Moses Bensabat Amzalak30 “um dos maiscuriosos e interessantes da extensa e valiosa bibliografia de Joséda Silva Lisboa”, devido principalmente “à grande cópia de argu-mentos de ordem teórica e prática, às referências a fatos seus con-temporâneos, de política nacional e internacional, ao profundoconhecimento das necessidades econômicas e financeiras do Bra-sil e à coragem, firmeza e desassombro da opinião do Autor”. Nãoera apenas contra os interesses feridos a luta de Cairu; a inveja, aincompetência, a mediocridade eram tantos outros obstáculos di-fíceis de vencer: “Deus abençoe os seus trabalhos e lhe dê a con-solação de os ver aproveitados – foram os votos de seu fiel amigoAntônio de Morais Silva31 – apesar das contrariedades da ignorân-cia e da emulação, porque ouvi dizer dessa um caso que me amar-gurou, tanto por quem figura nela, quanto me enchi de prazer pelaenergia da repulsão, com que Vmc. confundiu a temeridade domal iniciado nestas coisas.”

E assim, na defesa do liberalismo econômico, incompatibili-zando-se com uns, convencendo outros; prejudicando alguns, mas

29. José da Silva Lisboa – “Espírito de Vieira”, 1821, p. IX.

30. Moses Bensabat Amzalak – “José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu” em Brasília,1943, vol. II, p. 318.

31. F. A. Pereira da Costa, op. cit., pp. 111/115.

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beneficiando a imensidade dos habitantes do Brasil, Cairu, com amodéstia de opinião que caracteriza o verdadeiro cientista, masao mesmo tempo certificando a firmeza de suas convicções, pro-testava não intentar “deprimir o patriotismo e mérito dos que dis-cordam de mim em tal assunto. Respeito o juízo de todos – nãopresumo que o meu seja a medida da verdade: só desejo que pre-valeça o que for realmente útil ao Estado”. Não obstante, estavaconvencido “que a franqueza de comércio regulada pela moral,retidão e bem comum é o princípio vivificante da ordem social e omais natural e seguro meio de prosperidade das nações”32.

Se não bastassem as celeumas provocadas pelo “FilantrópicoDiploma, e, se é permitido dizer o Mandado Novo e Civil Evan-gelho de Paz, e Boa Vontade a todos os homens, que respeitam oDireito das Gentes” concedido por D. João, “cuja Glória há desobressair no Templo da Memória, ereto pela Verdade e Filantropia,quando nele reluzir em Tábua Diamantina, a Nova Legislação,que aboliu o velho Sistema Mercantil para substituir-lhe o da LealCorrespondência, Livre Ajuste e Imparcial Proteção a toda Indús-tria honesta”33, em 1810, foram concluídos por intermédio dosplenipotenciários Conde de Linhares e Lord Strangford os fami-gerados tratados de Amizade e Comércio e Navegação, passíveisde tantas críticas e que, em 1820, na cidade de Lisboa, eram ta-chados de desastrosos “pela conseqüente, decadência das fábri-cas e manufaturas nacionais”34.

Os favores concedidos à Inglaterra estimularam um fluxo con-siderável de mercadorias de produção britânica e a imediata insta-lação nas principais cidades do País de casas comerciais de súdi-tos ingleses que, não se limitando a negociar nos centros de maioratividades de negócios, aos poucos estenderam através de todo o

32. José da Silva Lisboa – “Observações sobre o Comércio Franco do Brasil”, 1808,Introdução.

33. Idem, “Observações sobre a Prosperidade do Estado pelos Liberais Princípios daNova Legislação do Brasil”, 1810, pp. 4/6.

34. Manifesto à Nação Portuguesa, de 15/12/1820 – em A. J. Melo Moraes – “Históriado Brasil-Reino etc.”, p. 82.

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território brasileiro uma poderosa rede de agentes, capaz de que-brar para sempre o monopólio dos antigos comerciantes portu-gueses. Cairu, amigo impertérrito do príncipe real e panegiristados atos econômicos promulgados, não poderia, deixar de defen-der a repudiada interferência do comércio inglês, de vez que suapaixão pelas idéias de Edmund Burke levaram-no também a umaadmiração incontrolável por tudo quanto era inglês: “Ser intima-mente unido com o Governo Britânico é entrar em companhiacom a Verdade, Honra, Independência, Sabedoria, Riqueza eInvencibilidade, isto é, com tudo que dá força, grandeza e dura-ção aos Impérios”35. Porque rejeitar então a colaboração daquelesque ajudaram a construir o Império Britânico? Porque reclamarcontra atividades que se prenunciavam tão benéficas ao país?“Consta replicou Cairu – que várias pessoas estranharam muitoaos ingleses o mandarem seus agentes pelas Fazendas aos Lavra-dores a comprar Tabaco, Café e outros gêneros da terra, pagandobem com dinheiro na mão e por isso alguns apelidavamatravessadores, que faziam encarecer os gêneros e não deixavamaos comerciantes Nacionais a facilidade de comprá-los para osremeterem por sua conta, ou para encherem de comissões os Co-merciantes do Reino. Tanto podem erros e prejuízos inveterados.Inveja-se aos Lavradores o benefício da extração e boa venda dosfrutos de seus suores? Não se quer concorrência que force aosinertes à indústria, atividade e moderação?”36.

Nesta viril virtude da concorrência encontrava Silva Lisboa overdadeiro fundamento da abertura dos portos e sua grande utili-dade para o desenvolvimento econômico do país. A implantaçãodo sistema de comércio franco, possibilitando a entrada de capi-tais, técnica e empresários provenientes de países com evoluçãoeconômica mais acentuada, era de molde a provocar um daquelescasos típicos de inovação, descritos pelo economista austríacoSchumpeter e decorrente da anulação de uma posição de mono-

35. José da Silva Lisboa – “Observações sobre a prosperidade etc”, pp. 9/10.

36. Idem, idem, p. 23, nota.

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pólio. Exatamente como acentua o autor da “Teoria do Desenvolvi-mento Econômico”, os novos capitais trazidos pelos ingleses paraemprego no comércio e na incipiente indústria forçavam a eleva-ção dos preços dos escassos fatores de produção pelos quais luta-vam: “as terras não têm descido de valor; a notória alta de preçosdos braços necessários à lavoura é evidente sintoma da demandade trabalho e conseqüentemente do racionável proveito no em-prego dos fundos. Já vários artigos novos começam a ser objeto deexportação. Os Comerciantes Nacionais, a custo e com estímuloda atividade dos comerciantes estrangeiros, vão deixando a velharotina e tirando-se do torpor e letargo, em que a tibieza e o aca-nhamento do anterior Sistema Colonial os tinham paralisado eadormecido”37. Foi esta perfeita compreensão da eficácia revolu-cionária do empresário inovador que induziu Cairu comparar “afranqueza do Comércio com a virtude do Sol: pois mal se abreuma porta em vasta casa, de muito tempo fechada, entrando qual-quer raio de luz logo tudo de repente se ilumina, descobrindo-secoisas antes não vistas em estado de confusão, que depois se põena devida ordem”38.

Não apenas nas atividades mercantis fazia-se sentir a necessi-dade de contar o país com um número crescente de empresáriosaptos para promover o seu progresso: a Indústria nacional, já li-berta, em 1o de abril de 1808, do Alvará de 5 de janeiro de 1785,que proibia na América qualquer fábrica, exceto as de tecido gros-seiro, constituía um campo aberto à introdução de novas combi-nações de fatores da produção. Retomando as idéias que outroracolocara em prática, quando exercendo o cargo de Secretário daMesa de Inspeção da Bahia conseguira recompensa não só para oautor do aperfeiçoamento das máquinas de moer cana, como tam-bém para o inovador dos engenhos de açúcar, Cairu no livro pu-blicado em 1810, sobre a “Franqueza de Indústria e Estabelecimentode Fábricas no Brasil”, considerou um dos requisitos essenciais para

37. Idem, idem, p. 21.

38. Idem, idem, p. 21.

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que fossem instaladas “grandes máquinas e manufaturas de muitodispêndio”39, a concessão de privilégios, honras e benefícios aosseus introdutores, desde que os privilégios concedidos não impor-tassem em virtual monopólio. Permanecendo dentro da linha dou-trinária fundamental que defendia, detestando os estancos e cren-do com firmeza nas vantagens do liberalismo econômico, o pro-fessor baiano dizia que “o Princípio da Franqueza de Indústriasendo conseqüente ao da Franqueza de Comércio, é o meio maiseficaz de fazer introduzir e aperfeiçoar os mais úteis Estabeleci-mentos, com maior rapidez e incessantemente progressiva energiapública para opulência e população do Brasil”40.

O acolhimento destes princípios implicava na imediata recusade qualquer tentativa do governo visando programar a implanta-ção de fábricas pois José da Silva Lisboa, baseando-se em Lauder-dale, admitia que somente a demanda efetiva era capaz de indicaras indústrias que se tornassem necessárias à população do Brasil.A procura efetiva, segundo nos adianta Cairu, “supõe não um de-sejo vago e ainda real carência de quaisquer indivíduos a respeitode uma coisa, mas a faculdade de pagar o seu preço natural; e sefalta esta faculdade, ninguém trabalhará, nem empregará fundopara satisfazer de mero obséquio, os gostos, os desejos e ainda asprecisões dos que demandam qualquer produção da Natureza eArte”41. Por isso, mal saído do Sistema Colonial, o Brasil não po-dia contar com “as Fábricas refinadas e de luxo que distinguem aEuropa”42, por muitos desejadas, mas que teriam, se introduzidas,existência precária por não atender à maior parte de uma popula-ção dotada de renda “per capita” insignificante e sem possibilida-des de propiciar uma apreciável demanda efetiva aos bens produ-zidos. Era forçoso, desta forma, que certas necessidades continuas-sem a ser satisfeitas recorrendo-se à importação de artigos manu-

39. José da Silva Lisboa – “Observações sobre a Franqueza de Indústria e Estabeleci-mento de Fábricas no Brasil”, 1810, pp. VI/VII.

40. Idem, idem, p. VIL

41. Idem, idem, pp. 40/41.42. Idem, idem, p. VI.

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faturados. Chegava Silva Lisboa a outro ponto diversas vezes sali-entado e para o qual encontrava justificativa no exemplo da polí-tica norte-americana, exposta mediante longas citações das obrasde Benjamin Franklin: apenas eram vantajosas as indústrias capa-zes de produzir incorrendo em custos inferiores aos das mercado-rias, estrangeiras. Tornava-se preciso, nesta conformidade, repelira idéia de se estabelecer fábricas “por espírito de rivalidade eaçambarcamento, no desígnio de diminuir a importação de fazen-das estrangeiras”43 desde que as conseqüências seriam desastro-sas, diminuindo inclusive as próprias exportações: afigurava-se,pois, “pernicioso precipitar as épocas dos possíveis melhoramen-tos do Brasil no que respeita a fábricas e é evidentemente absurdopretendermos rivalizar e já competir com os países populosos eadiantados em estabelecimentos desta natureza e até com o riscode distrair braços e fundos dos mais convenientes canais de Ri-queza”44.

Acentuava ainda José da Silva Lisboa como requisitos à intro-dução de Fábricas, a existência de capitais disponíveis, a presençade população numerosa, a abundância de matérias-primas e pro-dutos de subsistência e por fim, a difusão da inteligência.

No parecer de Cairu, não possuindo o Brasil, Nação que aindase encontrava “de machado e enxada na mão, lutando contra de-sertos e matos”45, uma estrutura, econômica que facilitasse nomomento o estabelecimento de certas fábricas, ficava mais restri-ta do que se poderia supor à primeira vista, a ação dos empresá-rios que, nestas condições, precisavam voltar-se para a agricultu-ra, única indústria em situação de concorrer, com as similares doestrangeiro, tanto mais que não são as fábricas as únicas fontes,de riqueza46. Portanto “por ora no Brasil e ainda por longo tempo

43. Idem, idem, p. VII.

44. Idem, idem, p. V.45. Idem, idem, p. 10.

46. “Que a agricultura não se associa necessariamente à pobreza, é óbvio quando seconsidera os casos, da Austrália, Nova Zelândia, da Dinamarca, de Iowa ou de Nebraska”– J. Viner – Rev. Bras. de Economia – ano 5, n. 2, p. 83.

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a agricultura deve ser a nossa Grande e Principal Manufatura”47.Tais considerações, porém, não eliminavam a possibilidade da cria-ção de indústrias fabris diretamente relacionadas, com as ativida-des agrícolas. Dez anos mais tarde, o panorama geral da economiabrasileira não sofrera modificações de relevo e Cairu, ainda queperfeito conhecedor das vantagens da organização de fábricas, nos“Estudos do Bem Comum e Economia Política”, apenas ampliou a ma-neira de exprimir seu pensamento, asseverando que “por ora noBrasil são prematuros os projetos de ativos especuladores, até in-tentando, alguns, aliás bons servidores do Estado, fazer, por as-sim dizer, invasão de fábricas neste Continente, ainda tão despo-voado e fértil. Só podem prosperar as Fábricas auxiliares da Agri-cultura e Marinha, que por ora devem ser (e não podem deixar deser) os nossos principais Laboratórios, e Oficinas de Trabalho pro-dutivos, sendo sem efeito (e só desvio de capital) todas as tentati-vas de precipitar com força as épocas de ulteriores melhoramen-tos convindo ainda por longo tempo, contentar-nos com as preci-osas plantações nas margens das grandes costas, e rios, e com asMinerações e Pastarias no Interior”48.

A predominância da agricultura no Brasil não decorria de qual-quer julgamento sobre um maior valor deste ramo das indústrias:anos mais tarde Cairu afirmaria no Senado do Império: “Não in-culquei a preferência da agricultura no Brasil aos mais ramos deindústria. Não considero a agricultura como uma divindade caídado Céu, solitária”49. Era tão-somente “uma necessidade das coi-sas”, decorrente em grande parte de motivo que constituiu perpé-tuo objeto de repúdio de José da Silva Lisboa: a escravidão.

Sempre que possível, não deixava Cairu de profligar com ardora infamante nódoa do cativeiro. A repugnância que lhe causava otrabalho servil nota-se no seu excessivo e talvez injusto comentá-

47. José da Silva Lisboa – “Observações sobre a prosperidade etc.” p. 60.

48. Idem – Estudos do Bem Comum e Economia Política, 1819/20, p. 271.

49. Idem – Anais do Senado do Império – sessão de 14/5/1827.

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rio de um trecho do “Traité d’Economie Politique” de J. B. Say50,explicável em seus termos, porque escrito em livro de combate àsidéias francesas e exaltação do pensamento britânico. Estudandoqual seria o trabalho mais lucrativo nas colônias, se o trabalholivre ou servil, Say conclui a favor do último, sem contudo apro-var a escravidão, julgada contrária à moral. Refutando, esta opi-nião, lança o economista brasileiro a seguinte diatribe: “Já ele[Napoleão] está preparando a opinião pública pela diabólica dou-trina de seu mais acreditado Escritor de Economia Política, Mr.Say, o qual, sem vergonha, nem reverência à Humanidade esfor-ça-se ainda que ridiculamente, em provar contra Turgot, Stewart eSmith, que o trabalho do escravo é mais produtivo que o do ho-mem livre. Se isso for convencido no juízo dos violentos, serásimples o expediente para haver maior riqueza na sociedade, istoé, fazer de toda a terra uma universal cafraria”51.

O desagrado que lhe causava a escravidão fizeram-no emitirpalavras tão candentes contra a utilização dos escravos, que mui-tas vezes nelas procuram surpreender resquícios de racismo. Po-rém, em 1823, tornando claras suas idéias sobre o tema, conside-rava que as cores da pele eram apenas “fenômenos físicos quevariam segundo os graus do Equador, influxos de sol e disposi-ções geológicas”52. O que o preocupava e, em conseqüência, nãopodia admitir que os escravos vindos da África, onde mantinhamcivilização rudimentar, pudessem substituir os imigrantes bran-cos, provenientes de países civilizados e que, portanto, estavamem melhores condições de empregar a inteligência na indústria.Tratava-se apenas de uma questão de grau de cultura: os negros

50. J. B. Say – Traité d’Economie Politique”, 1876, p. 240.

51. José da Silva Lisboa – “Extratos da Obra Política e Econômica de Edmund Burke”,1812, p. 10.

52. José da Silva Lisboa – Anais da Assembléia Legislativa e Constituinte – 1823 –sessão de 30/9/1823. “Boas Instituições com a reta educação são as que firmam oshomens para terem à dignidade de sua espécie quaisquer que sejam as suas cores. Odoutor Botado em Lisboa foi clérigo e letrado, que (perdoe-se-me dizer) valia por cembrancos”, idem, idem.

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aqui chegavam “bárbaros, de entendimentos broncos e braçosrepugnantes aos trabalhos necessários”53, sem que estas caracte-rísticas constituíssem um atributo racial dos africanos, porquantoexistiam casos como o daquele clérigo negro, que outrora Cairuconhecera em Lisboa e que, na sua opinião, valia por cem brancos.No caso inverso, acentuemos por curiosidade, “mais valem milindustriosos das Nações civis do que dez mil Africanos”54.

Era precisamente a qualidade da mão-de-obra existente no mo-mento que fazia Cairu duvidar da possibilidade de introduzir asgrandes indústrias no Brasil: “convém-lhe pois, pela necessidadedas coisas, o trabalho dos campos e das artes comuns, visto que aóbvia e fácil colheita dos produtos rudes da terra, e o simplesfabrico e transporte de obras grosseiras ou ordinárias, está maisna possibilidade e esfera da parte principal do povo”55. Este peri-go que corria o Brasil de ver “diminuída à atividade da IndústriaInteligente, pela má qualidade da povoação, que resulta da inces-sante importação da cafraria”56, implicava em urgentes providên-cias que pudessem impedir que o Brasil naufragasse nos escolhosque a escravidão escondia, tanto mais que o Tratado de Amizadeconcluído com a Inglaterra em 1810, ficara expressamente estipu-lada a supressão do tráfico negreiro. Para tanto, Cairu acenavaoutra vez com o exemplo dos ingleses que procuraram na Ásia,entre os chineses, os povoadores de suas Colônias do Cabo daBoa Esperança, mostrando assim “quanto mais sensato e filan-trópico este projeto do que foi o do piedoso Espanhol, Bispo delas Casas, que, por compaixão pelos índios da América, aconse-lhou a introdução de escravos d´África, fazendo arraigar o terrívelcancro do Cativeiro no Corpo Político e que tende a impedir ocrescimento da raça dos brancos e por assim dizer, africanizar oNovo Mundo”57. Por facilitar a imigração do Velho Mundo, rece-

53. Idem, Estudos do Bem Comum e Economia Política”, 1819, p. 329.

54. Idem, idem, p. 329.

55. Idem, Observações sobre a franqueza etc.”, 1808, p. 10

56. Idem, Estudos do Bem Comum e Economia Política”, 1819, p. 330.

57. Idem, “Observações sobre a prosperidade etc.”, pp. 15/16.

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beu de Cairu os maiores elogios o decreto de D. João que permitiua concessão de sesmarias aos estrangeiros, porque lhe dava espe-rança de ver cessada ou diminuída a entrada de escravos.

Mas, se no comércio, indústria manufatureira e agricultura, Cairuera propagandista ardente da liberdade econômica, certa ativida-de produtiva existia na qual julgou indispensável uma política decontrole governamental: não que fosse extinta por completo a li-vre iniciativa, mas, neste ramo, as atividades dependeriam de li-cença das autoridades públicas. Tratava-se da mineração.

Em 1827, quando Senador do Império, ao discutir a proposi-ção de Manoel Ferreira Câmara, de que era “patrimônio da Naçãotudo quanto a terra encerra de precioso e ninguém o poderá ex-trair sem seu expresso assentimento e debaixo das condições quea lei determinar”, Cairu teve ocasião de defendê-la encarniçada-mente, mostrando as impropriedades da preconizada livre explo-ração de metais preciosos, a fim de que o Brasil não ficasse “redu-zido a montões de cascalho, quais se acham e horrorizam os Dis-tritos Mineiros”. Se as demais indústrias exigem trabalho perseve-rante, aplicação continuada de energia e inteligência na direçãodos negócios, a mineração, pelo contrário, constitui uma ativida-de aleatória, suscetível de transformar a mentalidade dos indiví-duos, imprimindo-lhes a “execrável sede de ouro, dando-lhes ilu-sões de boa fortuna, que na maior parte não conseguem”. Falandoaos baixos instintos do jogo, pelas promessas de fortuna rápida efácil, a mineração apresenta o grande defeito de prejudicar as de-mais atividades econômicas, principalmente a agricultura, o quealiás já ocorrera em épocas passadas, quando “muito povo do lito-ral correu ao centro; abandonara-se muito as lavouras das canas-de-açúcar e este precioso ramo da agricultura e do tabaco decaiupor extremos. O mal depois se agravou pela concorrência de ou-tras nações, que estabeleceram iguais culturas em suas colôniasda América”.

José da Silva Lisboa, que sempre colocou a liberdade econômi-ca sob a égide da “moral, retidão e bem comum” quando chegou a

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ocasião de mostrar os pontos que o “espírito de liberdade extremaé não menos nocivo que o da restrição extrema”, soube valer-sede sua habitual convicção. Se os estudos revelaram-lhe que a “na-ção onde predomina a indústria da mineração de metais preciososé necessariamente, pobre, escrava e fraca”, preciso era impedirchegasse o Brasil a este extremo. Por isso recebeu altivo as iro-nias e sarcasmos dos partidários da absoluta liberdade de minera-ção e, sentindo os seus cabelos brancos desrespeitados, procla-mou com dignidade da tribuna do Senado: “Quase não me consi-dero entre os vivos, mas não quero com o meu voto ser cúmplicedos crimes que hão de resultar verossimilhante da indefinida li-berdade proposta”58.

O Senado, porém, não lhe deu razão.

VI

Cairu e a exegese moderna

A análise dos trabalhos jurídicos de José da Silva Lisboa e osesclarecimentos de sua verdadeira contribuição para a aberturados portos do Brasil às nações amigas, constituíram, por muitosanos, os pontos de atenção dos que procuravam salientar sua figu-ra na História Pátria. A sólida cultura demostrada nos “Princípiosde Direito Mercantil e Leis de Marinha”, e o oportunismo do decretode 28 de janeiro, davam, de fato, importantes razões para enobrecê-lo e recomendá-lo à gratidão de seus compatriotas. Mas esta exal-tação não lhe fez inteira justiça: paradoxalmente concorreu paradeixar no olvido as idéias do economista. As meditações científi-cas, as teorias defendidas, os conceitos estabelecidos, os pontosde contato com o pensamento alienígena, a confiança no valorsocial dos princípios da Economia Política, tudo, enfim, que vivi-ficou a obra de Cairu, caiu em imerecido esquecimento.

Tomemos, por exemplo, o célebre artigo, de Eunápio Deiró,

58. Idem, “Anais do Senado do Império”, sessões de 10 a 14 14/5/1827.

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publicado no “Jornal do Brasil”, no qual o autor transforma emlenda a atuação de Cairu junto a D. João VI. Diz o escritor emcerta passagem, que a idéia da abertura portos “todo o mundo atinha; não é criação privilegiada de ninguém. Já D. João IV falavanela, já os economistas do século XVIII a ensinavam e entre elesAdam Smith”59. Resulta desta afirmativa a convicção de que Dei-ró discutiu a ação de José da Silva Lisboa sem amplos conheci-mentos de seus escritos de economia, porque, do contrário, jamaisteria insinuado estivessem todos os que admitiram uma influênciade Cairu no decreto do Príncipe Regente atribuindo-lhe umaconcepção teórica original, tanto mais que ele sempre confirmoua inconteste influência do grande economista britânico em seupensamento.

Outro ponto que convém ser mencionado, em relação ao de-sinteresse que cercou os estudos econômicos de Cairu, prende-seàs reedições mais recentes de suas obras.

O Senador Cândido Mendes de Almeida, reconhecendo o valorde parte jurídica dos trabalhos de José da Silva Lisboa, ausentedos prelos desde 1828, publicou em 1874 a sexta edição dos “Prin-cípios de Direito Mercantil e Leis de Marinha”, na qual incluiu os opús-culos “Regras da Praça” e “Reflexões sobre o comércio de seguro”. Ficouassim a cultura brasileira habilitada a julgar estes escritos e namesma ocasião, teve o ensejo de apreciar uma “obra admirável,sem igual na língua portuguesa e das melhores na literatura jurídi-ca mundial”, constituída, no dizer de Manoel Álvares de Souza SáViana60, pela introdução acrescentada pelo ilustre maranhense àedição que promoveu.

Sessenta e seis anos foram necessários, depois, para que apare-cesse outro livro, de Cairu. Desta feita foi o historiador que ficouacessível aos estudiosos, graças à edição “fac-símile” da “Memóriados benefícios políticos do governo d´El Rei, Nosso Senhor, D. João VI”prefaciada e comentada pelo historiador Eugênio Vilhena de Morais.

59. Eunápio Deiró – “Há Cem anos” – Jornal do Brasil, 28/1/1908.

60. Manuel Alvares de Souza Sá Viana – Rev. I. H. G. B. – Tomo 83, 1918, p. 524.

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Mas o desconhecimento do Cairu economista ainda perduroupor muitos anos. Quando Cândido Mendes de Almeida apresen-tou a bibliografia do Visconde de Cairu, referindo-se aos “Princí-pios de Economia Política”, anotou que se tratava de uma obra muitorara e da qual não tivera oportunidade de ver sequer um exemplar.

Este compêndio, escrito em colônia dotada de limitados recur-sos materiais e científicos e de instrução geral praticamente nula,antecedeu em vários anos muitos dos mais conhecidos tratadosexpositivos da ciência econômica, assegurando-lhe com isto, con-sagradora primazia. Não obstante, a repercussão dos trabalhos deCairu fora dos limites da língua materna foi muito reduzida e, dei-xando-se em suspenso até ulterior confirmação a argüida influên-cia sobre David Ricardo não conhecemos outra referência à suaobra, senão em Ricardo Levene e Luigi Cossa, este em sua “Histoiredes Doctrines Économiques”61, onde refere-se que “o excelentejurisconsulto e economista José da Silva Lisboa (1756-1835), teveo mérito de tornar conhecidas em Portugal e no Brasil as teoriasde Smith; ele resumiu suas idéias nos “Estudos do Bem Comum eEconomia Política”. Até mesmo a desenvolvida e moderna “En-cyclopaedia of Social Science” é muda neste particular, muito emborase refira a outros economistas portugueses de menor nomeada.

Que a obra de José da Silva Lisboa ficasse sepulta na línguaportuguesa é compreensível. Mas que seus patrícios tivessem queesperar cento e cinqüenta e dois anos pela reedição de um deseus livros de economia, é fato inconcebível e para que não dizer,lamentável.

Face ao adiantamento prodigioso com que se tem beneficiadoa ciência econômica, e à guiza de explicação, poder-se-ia argu-mentar, consoante conhecido dito, que, é preciso sejam abando-nados para sempre os erros e deficiências que marcaram as teoriaseconômicas do passado. Mas, mesmo sem aceitar o conceitospenceriano de que existe sempre uma alma de verdade nas coisaserrôneas, importa salientar que o estudo minucioso da obra de

61. Luigi Cossa – Histoire des Doctrines Économiques, 1899, p. 443.

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Cairu, ainda que lhe faltassem outros merecimentos, justificar se-ria plenamente devido a preponderante influência do autor na po-lítica econômica de D. João VI, servindo destarte para esclarecermuitos fatos daquela época, inclusive a penetração dos inglesesna vida econômica do Brasil.

Estimando, precisamente, que “Cairu é o economista brasilei-ro mais citado, mais discutido, e mais comentado, porém, é o me-nos lido e o menos compreendido, pela simples razão de que assuas obras são inacessíveis ao grande público”62, o prof. Luiz No-gueira de Paula acrescentou à sua já grande soma de serviços pres-tados Ciência Econômica no Brasil, o mérito de uma primorosaedição os “Princípios de Economia Política”.

Perdidos os contatos com as obras de José da Silva Lisboa, seupensamento econômico tornou-se difícil de ser apreendido, e, hoje,quando se voltando para o grande vulto do passado procura-seinventariar suas antecipações científicas; situar suas idéias em re-lação às condições socioeconômicas da época em que viveu; esta-belecer a orientação da política econômica preconizada, suas opi-niões e conceitos parecem rebeldes a um esforço de interpretaçãoautêntica.

Recente e interessante contribuição deu-nos o prof. Nogueirade Paula no prefácio aos “Princípios de Economia Política” salientan-do novos aspectos importantes da obra de Cairu, além dos que jáhavia exposto em estudo dedicado à síntese do pensamento eco-nômico no Brasil. São ao todo assinaladas quarenta e duas contri-buições à teoria econômica, embora não tenham recebido desen-volvimento que as fizessem assemelhar-se ao tratamento que hojelhes é dispensado. Seria, aliás, impossível vê-las em toda sua ple-nitude, de vez que as grandes, concepções científicas nunca são ofruto espontâneo de algum cérebro privilegiado, mas sim o resul-tado de um desenvolvimento lento, em que diversos precursoresdurante anos colocam suas parcelas de esforços e que, por fim,são sintetizadas por alguém que lhes empresta em definitivo o

62. Em José da Silva Lisboa – Princípios de Economia Política, 1956., p. 11.

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nome. Portanto, não se pode pretender que José da Silva Lisboaimprimisse à noção da mútua dependência o aperfeiçoamento quelhe deu Pareto, nem tão pouco, em uma obra do início do séculopassado, será lícito procurar todas as inferências que do conceitodo pleno emprego tirou Keynes. Apenas em esboço podemos en-contrar a idéia do equilíbrio econômico, muito diferente da queWalras concebeu cem anos depois e não encontraremos na idéiado ciclo econômico o tratamento de um Hicks, Hayek ou Aftalion.Além destas antecipações, Cairu agrega outras, que não se refe-rindo exclusivamente a determinada ciência, indicam noçõesmetodológicas aplicáveis ao estudo dos fenômenos econômicos:tais as noções de lei natural, do emprego dos métodos indutivos ededutivos etc.

O ponto capital do trabalho do prof. Nogueira de Paula pren-de-se, porém, à relação que o autor estabeleceu entre os pensa-mentos de Cairu e de David Ricardo, levando-o “a crer que, defato, Ricardo se inspirou também na obra de Cairu”. Esta idéia,por sua originalidade e transcendência, constitui um verdadeiro,desafio aos economistas e, em particular, aos cultores da Históriadas Doutrinas Econômicas. O prof. Djacir Menezes, pronuncian-do-se sobre a questão, acentua não ter encontrado “nas citações etranscrições de documentos feitos por Dobb e Sraffa, qualquerpista que denunciasse contato com fontes portuguesas’’ pelo que,não acredita “que Ricardo tenha tido conhecimento da existênciade Cairu”63. Afirmou, entretanto, com inteira propriedade, a im-portância que para vitalizar a obra de Cairu representam estas in-dagações, estas tentativas de interpretações que exigem discus-sões e, o que é mais importante, pesquisas às fontes originais, re-presentadas pelos documentos da época e pela enorme bibliogra-fia que nos deixou o ilustre baiano.

Dos benefícios que surgem de tais discussões, temos o exem-plo daquela que se estabeleceu em torno da afirmativa de queJosé da Silva Lisboa considerava a inteligência um fator da produ-

63. Djacir Menezes – “Cairu” – O Jornal 22/7/1956.

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ção. Autorizou esta opinião, compartilhada pelos profs. Nogueirade PauIa e Amoroso Lima, o conhecido trecho do prefácio dos“Estudos do Bem Comum e Economia Política” no qual o autor, anali-sando a obra de Smith, dispõe-se a determinar “se para a riquezae prosperidade das nações mais contribui e em que proporções, aquantidade de trabalho, ou a quantidade de inteligência na anima-ção e direção geral da indústria”... “Intento mostrar – continuaCairu – que o ofício do economista deve ser, não o carregar asociedade de trabalhos mecânicos, braçais e penosos; mas inquiriros eficazes meios de aliviar indefinidamente pelo estudo das leis eobras do Criador, substituindo o trabalho da natureza ao trabalhoda humanidade... a fim de terem os homens a maior riqueza possí-vel com o menor trabalho possível”64.

Criticando estas idéias, o prof. Sérgio Buarque de Holanda65

procurou integrar o vulto de José da Silva Lisboa dentro da reali-dade do seu tempo, apresentando-o como expressão típica das novasformas sociais que se constituíam no início do século XIX. Assim“a importância de Cairu parece relacionar-se com o surto pela pri-meira vez no Brasil, ao tempo em que redigiu sua obra, de umaclasse média, de formação puramente urbana” o que, na falta devalores decorrentes do seu próprio status, adotava certos modosde pensar da classe agrícola, inclusive aquela relevância concedi-da ao talento, ao anel de grau, símbolo da superioridade social quedesfrutava. Cairu, expressão lídima da classe citadina, não, pode-ria deixar de atribuir papel de primazia na produção à inteligência,isto é, àquele “tipo de talento ornamental e declamatório que Cairuparecia admirar entre os brasileiros” caracterizado pelo “amor àfrase sonora, ao verbo espontâneo e fácil, à erudição ostentosa, àexpressão rara... ornato e prenda e não instrumento de conheci-mento e ação”. O sociólogo brasileiro, nas idéias de Cairu sobre anecessidade de o economista promover a diminuição das ativida-

64. José da Silva Lisboa – Estudos do Bem Comum e Economia Polít ica – Intro-dução.

65. Sérgio Buarque de Holanda – “Inatualidade de Cairu” – Correio da Manhã ,17/3/1946.

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des corporais, encontra motivos para reforço de sua tese, pois asconsidera derivadas das condições econômicas vigorantes na épo-ca, ou seja, uma economia escravocrata onde os senhores; de en-genho tinham por degradantes os trabalhos manuais e concediamextraordinária importância às profissões de cunho nitidamente in-telectual.

Estas críticas, porém, parecem-nos injustas, pois nada maisalheio ao pensamento de José da Silva Lisboa do que imputar àinteligência qualidades vazias de conteúdo: muito ao contrário,nela destacava atributos que a tornavam “instrumento de conhe-cimento e ação”.

No livro “Observações sobre a Franqueza da Indústria e o Estabeleci-mento de Fábricas no Brasil”, Cairu colocou, já verificamos, entre osrequisitos indispensáveis à instalação de fábricas, a difusão da in-teligência. Mas seria esta inteligência caracterizada pelas qualida-des puramente literárias que o prof. Sérgio Buarque de Holandaacentua? Certamente não. “A difusão da inteligência em Artes eCiências – proclama Cairu – é que multiplica as facilidades para aintrodução e prosperidade de todos os Estabelecimentos úteis emgeral, com especialidade das Fábricas... A Física e Química têmneste século prestado os maiores socorros e serviços ao melhora-mento de todas as Artes e Manufaturas... Portanto é insensato esta-belecer Fábricas, refinadas em país não iluminado pelas Ciências”66.

O economista baiano, retomava idéias já expostas nos “Princí-pios de Economia Política” e mais tarde desenvolvidas, seja nos “Es-tudos do Bem Comum e Economia Política” seja no “Ensaio Econômicosobre o influxo da inteligência humana na riqueza e prosperidade das na-ções”. No seu primeiro livro de economia, diz que “convém que seprotejam e se facilitem as Ciências e Artes que versam sobre osobjetos do interesse comum da vida social; premeie-se com espe-cialidade as invenções das máquinas, que, abreviando e aperfei-çoando os trabalhos não só aliviam todos os operários das mano-bras rudes e molestas, com a necessária conservação e prolonga-

66. José da Silva Lisboa – “Observações sobre a franqueza etc., p. 43.

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ção de sua existência”67. Em 1851, no importante ensaio póstu-mo a que nos referimos, o autor reforça suas idéias, estimandoque “se os governos se convencessem, que da superioridade dainteligência é que vem a progressiva riqueza e prosperidade dasnações... reconheceriam que era do seu interesse promover, pelosmais eficazes meios, a instrução todas as classes em artes e ciên-cias”68.

Em qualquer escrito de Cairu, é constante a ênfase na expan-são das Artes e Ciências, consideradas indispensáveis à promoçãoda riqueza e prosperidade das Nações. Os dicionários modernos,registram o vocábulo “técnico” referindo-se a tudo que é própriode uma Arte ou Ciência. Nestas condições, é importante ser ave-riguado se na época em que José da Silva Lisboa escreveu, já eracorrente ou não no Brasil o emprego daquele adjetivo. Pode-seponderar, em favor da negativa, que o dicionário de Antônio deMorais Silva, cuja segunda edição é de 1813, não registra a pala-vra. Julgamos, pois, que na falta de termo correntio, Cairu empre-gou a expressão inteligência no sentido de conhecimento essencial-mente técnico.

Não foi outra a intenção de Cairu sublinhando o papel da inte-ligência na diminuição do trabalho corporal mediante o estudodas obras do Criador, ou seja, o estudo da Natureza, através desuas leis, para colocá-la ao serviço do bem-estar humano. “Pre-tendo provar – disse Cairu – que o trabalho corpóreo será usado omenos possível, como de pouco efeito e valor, e para obras depouca importância e fadiga; empregando-se para as grandes coi-sas, sempre com preferência o trabalho da natureza, isto é, os agen-tes físicos, animais e materiais”69. Portanto, era preciso contar-secom “o progresso da inteligência (que provém principalmente do

67. Idem – “Princípios de Economia Política’’, 1956, p. 128.

68. Idem – “Ensaio Econômico sobre o Influxo da Inteligência Humana na riqueza eprosperidade das Nações” – Rev. Guanabara, 1851, Tomo I, pp. 41/51.

69. Idem, idem.

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Pai das Luzes – assinalou piedosamente Cairu) donde resulta ainvenção de máquinas”70.

Estas idéias, não cremos fossem conseqüentes das condiçõesda sociedade brasileira, aludidas pelo prof. Sérgio Buarque deHolanda, e reconhecidas também por José da Silva Lisboa quandoprescreve o trabalho livre: “O homem livre jamais se põe a par doescravo; e a infinita distância dos Estados os repulsa de toda aracionável aliança e parceria. Por isso, onde se acha estabelecidaa escravidão, o trabalho da agricultura e artes fica desonrado, comosendo a única e principal ocupação dos cativos”71.

Cairu, em seu estilo muito ao gosto da época, enunciou duasidéias que no século XX, isto é, cem anos depois, em estruturaeconômica diversa, André Fourgeaud colocaria na base de todo oprogresso econômico e que, utilizando-se de termos sem dúvidamais elegantes as apresentaria sob a denominação de “Lei do Me-nor Esforço” e “Lei da Intelectualização do Esforço ou Lei daInvenção Técnica”.

De acordo com estas leis, “todo, esforço físico do homem ten-de a obrigar o cérebro à transformação do esforço físico em esfor-ço intelectual. Por esta operação, o cérebro inventa um utensílioque multiplica a força do homem, ou, o que vem a ser o mesmo,procura utilizar uma energia tomada na natureza animada ouinanimada... Devido a este mecanismo, o progresso técnico avan-ça sem cessar porque o organismo, procurando poupar sua penano trabalho, exige sempre do cérebro a intelectualização doesforço. . . “72.

É mais uma vez o sentido técnico que se vislumbra nas consi-derações de José da Silva Lisboa sobre a inteligência, quer promo-vendo a invenção de novas máquinas, quer propiciando a introdu-ção de novos métodos de organização e administração pública ouprivada73.

70. Idem, “Constituição Moral e Deveres dos Cidadãos” – Tomo III, 1825, p. 73.71. Idem, “Da Liberdade do Trabalho” – Rev. Guanabara, Tomo I, 1851. pp. 91/98.72. André Fourgeaud – “L’Homme devant le Capitalisme” – 1936, pp. 227 e 228.73. José da Silva Lisboa – “Ensaio Econômico etc.”.

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O artigo que analisamos, teve o mérito de chamar a atençãopara a confusão que se estabeleceu colocando a inteligência comofator da produção. Ao estudar seu influxo sobre a riqueza e pros-peridade das nações, Cairu, a nosso ver, o fez sob o ponto de vistadinâmico, porquanto aqueles termos implicam na comparação entrediferentes níveis de renda nacional. Colocando qualquer teoria docrescimento econômico como variável fundamental a técnica,parece-nos que é justamente sob este aspecto que se deve consi-derar o importante papel que José da Silva Lisboa atribuiu à inte-ligência na produção, tornando suas idéias de grande atualidade,pois considera um dos elementos que caracterizam as modernasteorias do crescimento econômico: “O crescimento, de uma eco-nomia desenvolvida é ... principalmente um problema de acumu-lação de novos conhecimentos científicos e de progressos na apli-cação desses conhecimentos. O crescimento das economias sub-desenvolvidas é, sobretudo, um processo de assimilação da técni-ca prevalecente na época”74.

Se ao espírito inventivo, Cairu concedeu importância capitalcomo elemento do progresso econômico das nações, não menosconsiderável foi, conforme tivemos ocasião de mostrar, a relevân-cia atribuída à franqueza do comércio. Por isso torna-se tambémvaliosa para o esclarecimento das idéias econômicas de José daSilva Lisboa, a interpretação do seu liberalismo oferecida pela prof.D. Zênith Mendes da Silveira75, que, após salientar as concordân-cias existentes entre o pensamento do economista brasileiro e doseu mestre escocês, inquire quais as diferenças que marcaram apassagem do liberalismo econômico para o Brasil. A conclusão aque chega a autora é inédita e estimulante, porque encontra o ca-ráter distintivo exatamente no fato de ter Cairu, antecipado idéiasque anos depois seriam defendidas pelo corifeu de uma das esco-las que se opuseram às doutrinas de Adam Smith: Frederico List,o renomado autor do Sistema Nacional de Economia Política.

74. Celso Furtado – “A Economia Brasileira”, 1954, p. 194,

75. Zênith Mendes da Silveira – “Originalidade do Liberalismo Econômico Brasileiro”O Estado de São Paulo, 8/7/1950.

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Um dos pontos criticados pelo economista alemão, constituíao “cosmopolitismo” das teorias de Smith, isto é, a hipótese implí-cita de que a humanidade era um todo coerente, entabolando-serelações econômicas exclusivamente entre indivíduos, e por isso,os clássicos de tradição smithiana, “à força de exaltar a iniciativados indivíduos, terminaram por negligenciar um dos caracteres daeconomia contemporânea: a divisão do mundo em nações inde-pendentes”76. As doutrinas de List, como se sabe, surgiram na Ale-manha, na época fracionada por barreiras alfandegárias interiores,verdadeiros entraves à formação de uma unidade econômica na-cional, fim a que se propunha o citado autor. Acentua a professo-ra paulista, que a necessidade de integração econômica não se apre-sentava ao liberalismo inglês, porquanto a Grã-Bretanha já era umpaís há muito unificado, apenas desejando libertar-se do inter-vencionismo estatal. O problema, patente na Alemanha e resolvi-do na Inglaterra, surgiu também para o Brasil, quando conseguiulivrar-se do sistema colonial que o abatera por trezentos anos.Cairu, sentindo a questão, ao preconizar o liberalismo de Smith,nele introduziu feição peculiar: “O caráter mais original desse li-beralismo é ser nacional e não cosmopolita, como o liberalismoinglês. A reação liberal no Brasil lutava, antes de tudo, contra oregime colonial do sistema mercantilista... A Nação deve tornar-seum organismo econômico unificado, no qual as diversas formasde atividades econômicas se desenvolvam de maneira harmonio-sa e solidária. Esse é o cuidado constante de Cairu. Em todas assuas obras seu pensamento liberal acha-se estritamente ligado coma preocupação da economia Nacional.”

Segundo a autora, não era apenas esta idéia que, aproximandoCairu de List, o afastava de Smith. As considerações sobre o valorrelativo das diferentes atividades econômicas sendo o brasileiroadverso à agricultura, simpático à indústria e extremamente favo-rável ao comércio destoavam por completo de Smith e refletiam apreponderância que o comércio possuía na economia portuguesa.

76. Emile James – “Histoire des Theories Économiques”, 1950, p. 115.

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Semelhante a List para Cairu, o desenvolvimento econômico dospaíses efetuava-se através de várias etapas, até atingir a fase da“economia complexa”, na qual “a agricultura, a indústria e o co-mércio, foram desenvolvidos de modo harmonioso”.

Conclui D. Zênith Mendes da Silveira acentuando “que Cairurealizou a síntese entre o nacionalismo mercantilista e o liberalis-mo econômico. Completando Smith dele se separa, prolonga omercantilismo e anuncia List”.

A esta conclusão, poder-se-á contrapor a ausência de elemen-tos que possam autorizar incluir o pensamento de Cairu dentro dequalquer uma das formas que, segundo Renê Gonnard, diferencia-ram o mercantilismo. Falta em Cairu, de início, a preocupaçãoconstante com o metal precioso, que levada ao extremo constituiuo ponto capital da fase bulionista, característica do mercantilismoespanhol. O próprio José da Silva Lisboa, combatendo a necessi-dade de circulação metálica, concluiu que “a real riqueza do País,essencialmente consiste na abundância de todas as coisas neces-sárias, úteis e deliciosas à vida, e que para as mútuas transações,trespasses, compras e vendas, basta que haja alguma quantidadede ouro, prata ou cobre”77. Carece ainda na política preconizadapelo economista brasileiro o complexo de regulamentação das in-dústrias que assinalou o mercantilismo francês, dito industrial: opróprio Cairu prescreveu a liberdade de indústria e o afastamentoda idéia de competir com nações industriais mais adiantadas. Deigual forma, o mercantilismo comercial inglês, baseado no empre-go do comércio exterior para promover o afluxo de ouro, está foradas cogitações de Cairu que em sua defesa da liberdade do comér-cio, deseja apenas que o Brasil goze das vantagens da divisão in-ternacional de trabalho.

Acresce salientar que Cairu diverge profundamente de Listquanto aos meios apropriados para conseguir o ideal da economiacomplexa, porque, se o autor alemão preconiza o emprego de umsistema protecionista educativo para que as nações ultrapassem a

77. José da Silva Lisboa – “Anais do Senado do Império”, sessão de 16/6/1827.

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fase agrícola e atinjam a industrial, Cairu, pelo contrário, não fa-zia distinção entre a política necessária às diversas etapas, perma-necendo fiel aos princípios do liberalismo econômico que sempreensinou.

Esta doutrina, integrada por José da Silva Lisboa em um pro-grama de política nacional, no fim de sua vida, assinalam algunsautores, não se apresentava em toda a sua plenitude, uma vez queem conceitos por ele emitidos, encontraram motivos para colocá-lo entre os adeptos do dirigismo econômico. A vitória de Rooseveltnas eleições americanas de 1936, por exemplo, foi saudada peloprof. Amoroso Lima, que salienta ser “grato aos brasileiros, lem-brar, na hora em que a economia dirigida se beneficia de tão gran-dioso plebiscito popular, após uma experiência de 4 anos, que te-mos em nossa história cultural um precursor na pessoa desse vul-to extraordinário da nossa história que foi José da Silva Lisboa”78.Deu margem a esta interpretação79, o trecho do livro ConstituiçãoMoral e Deveres dos Cidadãos, no qual, entre outros, Cairu estabele-ce como objetivo do Estado: “Dirigir com circunspeção a indús-tria Nacional para aqueles ramos que são evidentemente de maiore constante interesse do Estado, com especialidade para o quemais contribuir à sua Segurança, a fim de que o interesse egoísticoou imoral dos indivíduos não prevaleça à causa pública”.

Igual tendência manifestou o biógrafo de Cairu, José SoaresDutra que, baseando-se na definição de propriedade dada no Se-nado em 1826 coloca Cairu, numa “posição, razoável entre o ca-pitalismo e o socialismo, entre o individualismo e o coletivismoextremados”. A definição de propriedade dada por Cairu “é tãovisceralmente cristã e ortodoxa, que, se a conhecera, Leão XIII,te-la-ia quem sabe? citado na Rerum Novarum. É tão fundamen-talmente humana, que Marx e Engels te-la-iam, possivelmente,acatado, se não tivesse esquecida nos velhos “anais do senado”80.

78. Alceu Amoroso Lima – “Cairu e Roosevelt” – O Jornal, 8/11/1936.79. Idem, em José da Silva Lisboa – “Princípios de Economia Política”, 1956, p. 28.80. José Soares Dutra – “Cairu”, 1943, p. 75.

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Teria havido, é lícito perguntar, um rompimento flagrante como liberalismo econômico de Adam, Smith? Não nos parece que talocorresse, porque, no “Suplemento à Constituição Moral e Deve-res dos Cidadãos”, Cairu continua a proclamar a eficiência da po-lítica liberal para promover a prosperidade nacional e, até mesmo,a mais justa distribuição da riqueza: – “Sem perfeita Imunidadede Indústria, e completa Abolição dos Estancos da Coroa, e Mo-nopólios de qualquer sorte, não pode haver a possível animaçãodo Povo e energia do Geral Trabalho, nem a maior produção emelhor distribuição dos bens, para todos os indivíduos terem ajusta partida dos necessários e cômodos da existência, proporcionalà quota de sua cooperação no Monte Mor da Riqueza Nacional”81.

A modificação notada nas idéias de Cairu, porém, longe de in-dicar uma fuga, revela maior aproximação com aspectos menoslembrados do pensamento de seu mestre escocês. De fato, José daSilva Lisboa nos primeiros livros demonstrava ingênua confiançano valor educativo da liberdade econômica. Nos “Princípios de Eco-nomia Política” podemos observar quais seriam os resultados dareforma moral que nos indivíduos causaria a adoção do liberalis-mo econômico: – “A moralidade e sabedoria com que se dirigirá otrabalho e a disposição dos seus produtos farão que os dons celes-tes circulem, as fortunas se aproximem, os incentivos da invejacessem, as causas das misérias e das tentações para os crimes seremovam, a facilidade de mútuos socorros se aumentam e os estí-mulos para fraudes, rapacidades e desatinos não existam. Nessahipótese, será a preguiça impossível e a emulação remunerada, ofavor impertinente, a má-fé rara, os privilégios odiosos, a sinceri-dade necessária, a justiça infalível, a coação deslocada, os delitospoucos, as sanções brandas, as censuras úteis, o rigor supérfluo,as penas corretórias, a filantropia comum, a verdade o geral cará-ter, o polimento trivial e a opulência a mais universal e acumula-damente esparzida”82. Estas loas ao liberalismo, explicam-se per-

81. José da Silva Lisboa – “Suplemento à Constituição Moral e Deveres dos Cidadãos”,1825, p. 83.

82. Idem, idem, “Princípios de Economia Política”, 1956, p. 174.

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feitamente se levarmos em consideração os objetivos imediatosdo trabalho de Cairu: o rompimento do sistema de monopólio co-lonial e a instauração do regime liberal. Não é de se estranhar queatravés de suas páginas amiúde se encontre panegíricos à políticapreconizada, e, portanto, fossem relegadas a plano secundário cer-tas passagens do livro de Adam Smith, curiosamente em contradi-ção com a intervenção benéfica da Mão Invisível.

Se José da Silva Lisboa não perdeu toda a confiança no valor oliberalismo para aprimoramento dos costumes da sociedade, poisnão deixa de assegurar que “o liberal Economista (depois dos Mi-nistros da Religião é o melhor auxiliar do Moralista)”83, porque“impossível que no Corpo dos povos haja reforma de costumesque os Governos estudem e admitam o liberal Sistema Econômi-co”84, não é menos verdade que, passada a primeira hora de entu-siasmo, verificasse que nem todos os indivíduos faziam da liber-dade econômica, uso adequado. Por isso, da mesma forma queSmith notou que “as pessoas do mesmo negócio, raramente se reú-nem, mesmo para alegria e divertimento, sem que a conversa ter-mine em uma conspiração contra o público ou algum conluio paraaumentar os preços”85, Cairu passou a considerar com mais cui-dado o “lado escuro” da profissão de Homem de Negócios. É,então, contra as conseqüências do “espírito de Monopólio; do Trá-fico de sangue Humano d’África; das Bancarrotas de má-fé; dasfaturas falsificadas”; da perversidade dos Taverneiros “cuja regraé faltar à minha palavra por amor à minha conveniência – e fazertoda espécie de adulteração e fraudes das mercadorias”86; da in-trodução de “quadros e livros corruptores dos costumes e até co-leções de estampas as mais impúdicas”87, que os interesses daReligião, Humanidade e Moral pública reclamam a Inspeção, Di-reção e Proteção do Governo”88.

83. Idem, “Suplemento à Constituição Moral etc.”, p. 42.84. Idem, idem, p. 41.85. Adam Smith – “The Wealth of Nations”, Ed. 1937, p. 128.86. José da Silva Lisboa – “Constituição Moral etc.”, Tomo III, p. 125.87. Idem, “Suplemento à Constituição Moral etc.”, p. 66.88. Idem, “Constituição Moral etc.”, Tomo III, p. 30.

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Não se pode, entretanto, considerar intervenções do governocontra estes fatos quebra dos princípios da liberdade econômica,pois nada mais são do que, medidas contra aquela liberdade dia-bólica de que nos fala Voltaire, isto é, a liberdade de acabar com aprópria liberdade, ou medidas corriqueiras de polícia ou higiene,segundo Smith, possíveis em qualquer Estado, “desde o mais libe-ral até o mais despótico”89.

Foi ainda em Smith, no capítulo 11 do livro IV das Riquezas dasNações, onde, ao nosso ver, encontrou José da Silva Lisboa o fun-damento das restrições ao liberalismo econômico que “plausívelem teoria, é ilusório na prática, sendo levado ao excesso”90. Na-quele capítulo, o autor acentua o caráter teórico do liberalismoquando declara que a introdução de um completo sistema de li-berdade no comércio internacional na Grã-Bretanha, é “tão ab-surdo quanto pretender que uma Oceana ou Utopia nela pudes-sem ser estabelecidas”91. Igualmente, Smith mostrando as exce-ções à liberdade econômica, afirma que elas são justificáveis quan-do “algum ramo particular da indústria é necessário à defesa dopaís”, como foi o caso do Ato de Navegação, ou quando sua ado-ção priva “milhares de pessoas de sua ocupação ordinária e meiosde subsistência”92. Cairu, por seu turno, reclamou a “Superin-tendência e Direção do Governo...’’ para os “Grandes Ramos daIndústria, que se entrelaçam com muitos outros subalternos, deque sobremaneira depende a segurança da subsistência, defesa eocupação do povo”93. Outrossim, não é de se desprezar a seme-lhança de expressões entre Cairu, que impôs ao Estado o dever dedirigir a indústria com circunspeção, e Smith que alude àqueles, casosem que a introdução do liberalismo exige “reserva e circunspeção”94.

Assim, é pela aceitação do pensamento de Smith em todos os

89. Adam Smith, op. cit., p. 308.

90. José da Silva Lisboa – “Constituição Moral etc.”, Tomo III, p. 29.

91. Adam Smith, op. cit., p. 437,

92. Idem, idem, pp. 429 e 435.

93. José da Silva Lisboa – “Constituição Moral etc.”, p. 30.

94. Idem, idem, p. 24 – Adam Smith, op. cit., p. 438.

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seus matizes, que José da Silva Lisboa surgiu paradoxalmente comoprecursor do intervencionismo estatal e isto ocorreu somente por-que “o liberalismo de Smith é acomodatício e realista; marca maisuma orientação do que se afirma como princípio absoluto. Smithnada definiu rigorosamente, mas tudo sugeriu, inclusive o rigor doraciocínio econômico. Sem dúvida confundia, de alguma forma, oponto de vista normativo e o ponto de vista especulativo, a dou-trina e a teoria; e na sua teoria pode-se encontrar o anúncio deteses que mais tarde mutuamente opor-se-iam”95.

Deste bosquejo feito através da exegese moderna do pensa-mento econômico de Cairu, que nos aparece como precursor deKeynes, Pareto, Roosevelt, List, Marx, Engels e muitos outros,resta-nos a convicção de que suas obras constituem e por muitosanos continuarão a ser uma inesgotável fonte de pesquisas e deba-tes, sem que o economista brasileiro possa perder jamais o cará-ter, tão próprio de Smith, de “defensor da libertação econômicado indivíduo”96.

V I I

O fim de uma época

Ao terminar o segundo decênio do século XIX, o Império queD. João VI veio criar na América parecia definitivamente consoli-dado. O surto de progresso cultural que modificou a fisionomia dacidade do Rio de Janeiro, com a fundação do Jardim Botânico, daBiblioteca Real, das Escolas de Medicina e Belas Artes, da Aca-demia de Marinha etc., reuniu-se à prosperidade econômica de-corrente de uma legislação liberal que, no dizer de Cairu, com-pensava “os danos da Administração, de que o povo se queixavacom motivos justificados ou não”97. Talvez por isso os fluminenses

95. Daniel Villey – “Petit Histoire des Grandes Doctrines Économiques”, 1946, p. 65

96. Ch. Gide e Ch. Rist – “História das Doutrinas Econômicas”, 1941, p. 122.

97. José da Silva Lisboa – “História dos Principais Sucessos Políticos do Império doBrasil”, Tomo X, p. 7.

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não se mostrassem rebeldes e preferissem glosar os deslizes admi-nistrativos em versos facetos:

Furta Azevedo no Paço Quem furta pouco é ladrãoTargini rouba no Erário Quem furta muito é barãoE o Povo aflito carrega Quem mais furta e escondePesada cruz ao Calvário...98 Passa de barão a visconde...99

A elevação do Brasil à categoria de Reino extinguiu os últimoslampejos do sistema colonial e nenhum brasileiro, de sã consciên-cia, admitiria que o Brasil pudesse voltar algum dia à sua antigacondição de colônia. O próprio D. João VI, depois de doze anosde estada, já se identificara com a terra que tão bem o acolhera, e,não obstante Portugal já se encontrar livre das tropas invasoras,parecia disposto a não mais deixar o País, para isto concorrendoas opiniões de seus ministros e conselheiros, entre os quais se en-contrava José da Silva Lisboa.

A confiança que desde a Bahia o professor de Economia Políti-ca inspirou ao Rei, propiciou-lhe sucessivas nomeações para oscargos de Desembargador da Mesa do Desembargo do Paço e daConsciência e Ordens, em 22 de abril de 1808; Membro da JuntaDiretora da Impressão Régia, em 13 de maio de 1808; Deputado àJunta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegações, do Esta-do do Brasil, em 23 de julho de 1808; Desembargador da Relaçãoda Bahia, com exercício de Deputado da Real Junta do Comércio,em 16 de novembro de 1808; Censor Régio, em 10 de outubro de1814; Desembargador da Casa de Suplicação, em 6 de agosto de1818, obtendo o título do Conselho de Sua Majestade Fidelíssimaem 3 de maio de 1819.

As funções exercidas tiravam-lhe grande parte do tempo quepodia reservar ao estudo de sua querida Economia Política e tal-vez disto até se lamentasse a Antônio de Morais Silva, pois este oconsolaria mostrando-lhe que “o nosso aleijão é ainda sobrecarre-

98. Luiz Joaquim dos Santos Marrocos – “Cartas”, 1939, p. 64.

99. Tobias Monteiro – “A Elaboração da Independência”, 1927, p. 282.

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gar os homens de raro merecimento, para com muitos abanicos(sic) (que o desviam do seu grande alvo e cortam ou afracam asasas do seu gênio) lhe darem algum vintém, de que vivam sem senausearem das coisas, e isto quando já as cãs, e as penas da velhi-ce deixam mal respirar desafogado um ânimo liberal, mas agui-lhoado às coisas, para que bem pode servir um desembargadorenjeitado e vomitado para criminalista ou fazendista”100.

De 1812 a 1819, José da Silva Lisboa interrompeu a série delivros dedicados à defesa da política econômica de D. João VI, emfavor de obras de cunho político. Uma delas, os, Extratos das ObrasPolíticas e Econômicas de Edmund Burke, serviu de livro de instruçãoao herdeiro do trono português. A vitória das tropas aliadas con-tra os invasores de Portugal, deu margem às Memórias da Vida Pú-blica do Lord Wellington e finalmente comemorando a ascenção aotrono de D. João, publicou a Memória dos Benefícios Políticos do Go-verno d’El Rei, Nosso Senhor, D. João VI e a Sinopse da LegislaçãoPrincipal do Sr. D. João VI, pela ordem dos Ramos da Economia do Estado.

Somente em 1819, retomou Cairu a publicação de obras deCiência Econômica, certamente porque julgava bastante atenua-da a oposição ao sistema liberal estabelecido no Brasil, tanto as-sim que já não se nota nos Estudos do Bem Comum e Economia Políti-ca o sentido panegirista dos Princípios de Economia Política. Não sa-bia, porém, o que a evolução longínqua dos acontecimentos esta-va reservando-lhe para um futuro muito próximo. A hostilidadeque tanto contribuiria para afastar voltaria com ímpeto avassalador.Ímpeto tão grande que José da Silva Lisboa logo compreendeuque as armas que outrora usara não mais teriam eficiência. O es-tudo sereno era precário em ambiente convulsionado pelas pai-xões. Os livros doutrinários não mais poderiam suster o sistemaliberal. Cairu então saiu às ruas levando como armas os panfle-tos, e periódicos; como ideal a manutenção da Independência eco-

100. F. A. Pereira da Costa – “Notícia Biográfica do Dr. Antônio de Morais e Silva”,pp. 111/115.

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nômica do Brasil. Seu bálsamo no aceso da luta seria a certeza deque “quem bem serve ao público expõe-se a juízo temerário, acalúnias e às inventivas dos maus e néscios, mas quem tem a cons-ciência da própria integridade, consola-se com o desempenho doseu dever”101.

101. José da Silva Lisboa – “Anais do Senado do Império”, sessão de 15/5/1829.

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A D E N D A À 2a E D I Ç Ã O

Nesta segunda edição da monografia sobre a vida e a obra deJosé da Silva Lisboa, Visconde de Cairu, pareceu-nos corre-

to respeitar o texto original julgado em concurso instituído em1956, exceto no que se refere às habituais e tópicas revisões, en-tre elas atualização ortográfica, decorrente da Lei no 5.765, de1971, e inclusão de outras fontes de consulta. Todavia é impossí-vel desconsiderar o fato de que mais de quarenta anos já se passa-ram desde sua elaboração, condicionada pelos limites máximos detempo e dimensão estabelecidos no regulamento do concurso. Areleitura dos trabalhos econômicos de quem, no dizer de San TiagoDantas, foi “o espírito mais consciente dos problemas de seu tem-po”, sugere sempre novas reflexões, sobre matéria contida nestaparte da monografia. Não cessou, também, a publicação de obras,segmentos de livros e artigos que enriquecem e estimulam o co-nhecimento do biografado em sua época, através de interpreta-ções, documentos e debates sobre as atitudes assumidas e tendên-cias políticas evidenciadas.

Com a vinda de D. João para o Brasil, o País atravessou perío-do em que os responsáveis pela coisa pública, nativos ou reinóistransplantados para terras americanas, em meio à efervescênciade idéias sócio-políticas e de pressões internacionais, enfrenta-ram em apenas 14 anos todos os problemas da transformação desecular Colônia em Metrópole, depois, Império Constitucional. Éindiscutível que as vicissitudes econômicas e políticas sofridas peloPaís refletiram-se no pensamento de Cairu e, por vezes, condicio-naram-lhe a ação.

José da Silva Lisboa viveu crucial época da História do Brasilescudado nas doutrinas de Adam Smith, mas o contato com a rea-lidade mutante o levou a admitir que “o Teórico Economista faz oseu ofício formando as suas regras gerais, que se aplicam à maiori-dade dos casos, deixando à sagacidade do Administrador o modificá-

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las, segundo convenha aos casos individuais”1. Deve entender-seaceitar o autor, e até preconizar, que a prática possa diferir dateoria, por força de circunstâncias, apesar de nela alicerçada. Re-pudia, porém, a ação que resulta exclusivamente da prática, hajavista que a “verdadeira teoria supõe a coleção de princípios dedu-zidos de fatos gerais, longamente experimentados por Sábiosindagadores; e a nua prática freqüentemente é deduzida de fatosparticulares malvistos em limitadas experiências de empíricos e inte-resseiros”2. Esta dualidade teoria x prática, outrossim explica arazão de ser de muitas recomendações de política econômica nãoconciliáveis com ensinamentos recebidos de Smith, sem que, to-davia, isto signifique abandono dos fundamentos do liberal siste-ma proposto para o Brasil. Além do mais, reconhecia Cairu, que“entre as muitas excelências” de seu mestre “se acham imperfei-ções e erros, e até notórias incoerências difíceis de se concilia-rem”3, não sendo assim um seguidor acrítico de Smith.

O conhecimento da Adam Smith foi marcante na vida de Cairu.Sabe-se que ao regressar de Portugal, veio disposto a dedicar-se àagricultura, propósito não condizente com sua formação acadê-mica em cânones e docência de línguas. Esta decisão tem causadoestranheza a seus biógrafos. Percebe-se, todavia, na raiz de seudesejo de promover o desenvolvimento da agricultura, tão flores-cente em outros países, tão decadente em Portugal, mas com pro-missoras perspectivas em terras virgens do Brasil, a adesão aosprincípios da Escola Fisiocrata, de François Quesnay, para a qualteria concorrido, ainda em Coimbra, a influência de seu amigoDomingos Vandelli. A vinda de Portugal de um José da Silva Lis-boa fisiocrata, ajusta-se à sua posterior declaração de que AdamSmith o fizera abandonar as idéias dos economistas de França.

A mudança de orientação do pensamento econômico de Cairu,por ele mesmo reconhecida, confirma que já se dedicara à Econo-mia Política antes do encontro com a Riqueza das Nações de Smith,

1. José da Silva Lisboa, Leituras de Economia Política, p. 138.

2. José da Silva Lisboa, Estudos do Bem Comum e Economia Política, p. 123.

3. José da Silva Lisboa, idem, idem, p. 71.

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em 1796. Embora o notável Princípios de Direito Mercantil e Leis deMarinha (1798), contenha referências e elogios ao economista es-cocês, deve admitir-se não tivesse ainda seu autor estudado emdetalhes todas as idéias de Smith, tal como já se nota, no Princí-pios de Economia Política (1804).

A doutrina de Quesnay adotava como máxima básica para con-dução da política econômica, o “laissez faire, laissez aller, laissezpasser”, que Silva Lisboa transforma em “deixai fazer, deixai pas-sar, deixai comprar, deixai vender”. Ao mesmo tempo, para osfisiocratas era a agricultura o único setor produtivo da economiade onde provinha toda a renda nacional, ao contrário do comér-cio e a indústria, estéreis por natureza. José da Silva Lisboa aceitaem teoria a liberdade recomendada no lema fisiocrático, mas dis-corda da última tese, impugnando, com ásperas palavras, a supe-rioridade intrínseca da Agricultura sobre os demais setores econô-micos da sociedade, e defendendo Smith da crítica de ter “come-tido o sacrilégio de comunicar às manufaturas e ao comércio essahonra”, isto é, a mesma capacidade que tinha a agricultura. E acres-centou que um dos autores que mais se sobressaíram entre osfisiocratas, “teve a simplicidade de aconselhar aos Anglo-Ameri-canos que não estabelecessem fábricas no seu país, para não searruinarem e enfraquecerem”4. Disse mais, sublinhando a impor-tância da indústria manufatureira: “o Sistema Colonial (felizmen-te cessado no Brasil) |....| obriga os colonos a dirigirem seus ca-pitais e braços para o cultivo das terras, impedindo o estabeleci-mento de manufaturas superiores, mal permitindo as outras infe-riores, sem o que não pode existir povoação civil. Naturalmente aagricultura é o principal emprego de Colônias em países férteis edespovoados, mas é injusto obstar nelas ao natural progresso daindústria fabril”5.

A discordância acerca da concepção fisiocrática da esterilida-de do comércio e da indústria, e da crítica à aludida prática doSistema Colonial, não se coadunam com as freqüentes críticas fei-

4. José da Silva Lisboa, Princípios de Economia Política, 2. ed., p. 236.

5. José da Silva Lisboa, Estudos do Bem Comum e Economia Política, p. 15.

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tas a um Cairu entranhadamente inimigo da indústria fabril, ouque seu pensamento sobre a matéria demonstrasse movimentopendular entre os setores primário e secundário. Cairu tão-somen-te condicionou o processo de desenvolvimento industrial manu-fatureiro à necessidade da existência de pré-requisitos indispensá-veis para o sucesso de qualquer investimento fabril, especialmen-te os de grande escala, tal como os economistas, historiadores eempresários ainda hoje procuram determinar em nível macro oumicroeconômico.

Neste particular as idéias e as recomendações de José da SilvaLisboa costumam ser desfavoravelmente cotejadas com as deAlexander Hamilton, Secretário do Tesouro norte-americano, quepor determinação da Câmara de Representantes elaborou e apre-sentou em 1791 o célebre Report on the subject of Manufactures, noqual propõe elenco de medidas para estimular as manufaturas emseu país, de modo a torná-lo independente das importações deprodutos para uso militar e outros fins essenciais.

Hamilton no Relatório, tal como José da Silva Lisboa fizera emseus livros, aceita idéias contidas na Riqueza das Nações, e defen-dendo a indústria manufatureira, também refuta as idéias dosfisiocratas sobre a produtividade dos setores da economia. Valenotar que seu país já tinha um setor agrícola, altamente desenvol-vido, capaz de não só atender o mercado interno, como propiciarexcedentes exportáveis, como no caso do algodão, cujo suprimen-to à indústria inglesa, segundo Celso Furtado, foi fator dinâmicofundamental para o desenvolvimento da economia norte-ame-ricana6.

Quando D. Maria I baixou o Alvará de 5 de janeiro de 1785determinando a supressão das manufaturas já existentes no Brasile a proibição da instalação de outras, exceto as de produto gros-seiros, de uso comum e de escravos, as antigas colônias britâni-cas, independentes havia nove anos, experimentavam forte pro-cesso de expansão industrial, mais por força de subsídios, conces-são de terrenos, empréstimos estaduais e municipais, do que em

6. Celso Furtado, A Formação Econômica do Brasil, p. 127.

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resposta à proteção aduaneira7. Kirkland aduz neste sentido, quea primeira tarifa alfandegária dos Estados Unidos, em 1789, fixa-ra impostos de importação excessivamente moderados que a tor-naram ineficaz8.

Contando já com economia dotada de setores agrícola e manu-fatureiro em expansão, Hamilton propôs medidas de protecionis-mo abrangendo direitos aduaneiros sobre produtos rivais estran-geiros nos setores que interessavam ao país encorajar; proibição(ou direitos proibitivos) de importações de determinados produ-tos similares; proibição de exportação de matérias-primas de inte-resse das indústrias locais; subsídios pecuniários; prêmios; isen-ção de direitos para insumos; drawbacks; estímulo às invenções;regulamentação judiciosa para a inspeção de bens manufaturados;facilidades para transferência bancária de fundos entre os Esta-dos, e melhoria dos transportes. Vê-se que a proteção aduaneiranão seria por si mesma suficiente, se não acompanhada de medi-das estruturais capazes de permitir a formação de externalidadesque facilitassem o crescimento das manufaturas. Apesar da argu-mentação de Hamilton em favor da política aduaneira protecio-nista, esta só foi realmente adotada em 18169, isto é, 25 anos de-pois de expostas suas idéias (1791) e 40 anos depois da indepen-dência norte-americana. Para Schumpeter, “o progresso já se ti-nha espalhado sobre extensa variedade de indústrias e estava emplena força no tempo em que Hamilton apresentou o seu famosoRelatório”10 .

O secretário do Tesouro dos Estados Unidos não era, contudo,infenso à liberdade do comércio internacional, tanto assim queafirmou: “se o sistema da perfeita liberdade de indústria e comér-cio prevalecesse entre as nações, os argumentos que procuramdissuadir uma nação do porte dos Estados Unidos de realizar en-tusiásticos esforços em favor das manufaturas, teriam sem dúvi-

7. Joseph A. Schumpeter, Business Cycles, 1o v., p. 287.

8. Edward C. Kirkland, História Económica de Estados Unidos, p. 297.

9. E.C. Kirkland, op. cit., p. 297.

10. J. A. Schumpeter, op. cit., p. 287.

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da grande força |....| Com poucas exceções, poderia ele servir deregra para a indústria nacional”11, mas nem todas as nações secomportavam segundo estas normas; portanto, os Estados Uni-dos deveriam seguir o exemplo.

Quando os portos do Brasil foram abertos às nações amigas, aindústria manufatureira estagnara depois do alvará de 1785. Mes-mo reconhecendo as precárias condições prévias para o desenvol-vimento industrial, mas certo de que a liberdade de comércio eindústria estimularia a implantação de manufaturas, José da SilvaLisboa propôs, tal como Hamilton para os Estados Unidos, as li-nhas de uma política em favor das manufaturas no Brasil, de modoa estimular empreendimentos que objetivassem entre outros be-nefícios, impedir o “prejuízo de vender os nossos produtos rudespor pouco preço, para depois os tornar a receber importados emfazendas de incomparavelmente superior valor”12. Não se deveriarecorrer ao “miserável expediente de dar monopólios”, mas po-der-se-ia atingir o fim proposto “proibindo-se a importação deiguais artigos estrangeiros que se fabricassem no país, para teremos fabricantes a certeza da venda dentro da Nação, removidos oscompetidores estranhos, como é do patriotismo, e da prática detodas as Nações iluminadas da Europa, e em que a Inglaterraconstantemente insiste. Deviam-se também conceder extraordi-nários favores, e donativos do Governo, e ainda adiantamentospor empréstimo de fundos, aos industriais que os não tivessem eintentassem estabelecer fábricas as mais necessárias ou úteis|...|Não é necessário estabelecer já Fábricas em grande. Com tentati-vas moderadas, e principalmente por meio de sociedades livres,segundo o estilo da Inglaterra, se podem introduzir neste Estadomanufaturas as mais convinháveis”13.

Quem recomenda tais diretrizes de fomento não deve ser cen-surado como inimigo da indústria manufatureira. Nem tampouco

11. Alexander Hamilton, Industrial and Commercial Correspondence, p. 264.

12. José da Silva Lisboa, apud Prefeitura do Distrito Federal, Notícia sobre o desenvolvimen-to da indústria fabril no Distrito Federal e sua situação atual, p. 12.

13. Prefeitura do Distrito Federal, op. cit., p. 11.

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por afirmar que o Brasil, experimentando ainda os primeiros efei-tos inovadores da abertura dos portos, não tivesse ainda condi-ções para a instalação de empreendimentos fabris em grande. Naverdade desde seus primeiros trabalhos, realizou José da Silva Lis-boa uma obra engajada, comprometida com o fim do Sistema Co-lonial, com o fim dos monopólios que cerceavam a liberdade detrabalhar e empreender. O marquês de Pombal sintetizou em pou-cas palavras o que significava este Sistema, quando disse, em 1772,ao embaixador inglês em Lisboa, referindo-se a fato ocorrido noBrasil, que “o comércio e a agricultura da colônia deviam reger-seexclusivamente pelas necessidades da Metrópole” e que “o pro-duto da agricultura, comércio e navegação da colônia constituíapropriedade exclusiva da Metrópole”14. Todavia, Cairu tinha cons-ciência de que mesmo extintos o direito e o poder de explorar acolônia, perduraria ainda a estrutura socioeconômica formada aolongo dos séculos, espólio deixado pelo colonialismo, de transfor-mação lenta no tempo e no espaço. Em suas obras registra entreoutras dificuldades para a expansão da indústria manufatureira noBrasil: arraigados costumes alheios à razão; interesses consolida-dos; carência de mão-de-obra qualificada e livre, com predomi-nância do improdutivo trabalho escravo; reduzida demanda efeti-va; insuficiente formação de capitais; falta de aplicação da inteli-gência nas artes e ciências, indispensável para surgimento de in-venções e inovações; grupos populacionais rarefeitos em vasta ex-tensão geográfica, precariamente ligados por vias e meios de trans-porte primitivos: ausência de espírito empresarial, maneiras de pen-sar próprias de um Estado patrimonial, e muitas outras desvanta-gens. Toda esta constelação de fatores fundamentavam a idéia deque as manufaturas viriam através de “tentativas moderadas”, pormeio de “sociedades livres”. Aliás, nos Estados Unidos, a grandeSociety for Establishing Useful Manufactures, fundada em 1791por iniciativa do próprio Hamilton, com o capital de um milhãode dólares, fracassou cinco anos depois15.

14. Fritz Hoppe, A África Oriental Portuguesa no tempo do Marquês de Pombal, p. 281.

15. E. C. Kirkland, op. cit., pp. 295-6.

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Todo o debate em torno da política econômica preconizada porJosé da Silva Lisboa, decorre da decisão de o Príncipe Regenteabrir os portos do Brasil às nações amigas. Quanto ao ato em si,não há, por parte dos historiadores e economistas quem discordede seu transcendental alcance para o futuro da antiga colônia. Di-vergências de todos os matizes surgem quanto à participação deCairu no ato. A opinião mais radical nega qualquer interferência,certamente por não admitir pudesse ter o ato que pôs fim ao pac-to colonial e abriu caminho para a independência, a participaçãode um economista liberal. Segundo o próprio Cairu, a Carta Régiade 28 de janeiro de 1808 foi de exclusiva iniciativa de D. João, oque seria auto-reconhecimento de que não participara da elabora-ção do ato. Mas esta declaração feita em livro escrito para perpe-tuar a memória da presença de D. João VI no Brasil, revela apenasa opinião do súdito, defensor sistemático da monarquia constitu-cional, que não impedira na Inglaterra o sucesso do liberalismoeconômico. Cairu, procurou dizer exatamente o que antes já afir-mara: o Príncipe Regente tomara a decisão sobre assunto que“ainda a bons estadistas, parecia quase impossível ou de muitoproblemático e impolítico efeito”. A intervenção de Cairu, qual-quer que fosse, é indubitável, pois em seu tempo poderia ser des-mentido por adversários a qualquer momento, quando afirmouter “participado da honra de concorrer para a dita resolução so-berana, sendo ouvido na qualidade de meu emprego.....”. Empre-go de membro e secretário da Mesa de Inspeção da Bahia. Cairusabia muito bem que a abertura dos portos do Brasil, diante daconjuntura política européia e a vinda de D. João, resultara da “ine-vitável força das coisas”, isto é, impossibilidade de manter fecha-do o Brasil tanto à importação quanto à exportação, o que facili-tou conseguir o fim do monopólio colonial.

Wanderley Pinho em estudo sobre a abertura dos portos do Bra-sil16, tendo entre as fontes de informação documentos da chance-laria britânica, deixa evidente que o ato de D. João desgostou a

16. Wanderley Pinto, A Abertura dos Portos na Bahia.

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Inglaterra, porque esta não queria a abertura dos portos às naçõesamigas, mas a abertura dos portos à nação mais amiga, ou seja, aque-la que estava protegendo Portugal na guerra contra a França, eque desejava em cláusula do Tratado secreto de 22 de outubro de1807, não ratificada, lhe fosse concedido um porto franco na ilhade Santa Catarina (eventualmente Cabo Frio), de onde poderiainternar suas mercadorias no território brasileiro, ou contrabandeá-las para Buenos Aires, vedado o acesso a outros países. Diantedeste quadro e da comprovada intervenção de Cairu no caso, écerto ter sido ele quem com suas idéias de fim do monopólio colo-nial pelo livre comércio exterior, justificou as vantagens da modi-ficação que não agradou os ingleses. Na impossibilidade de conse-guir este intento, logo depois a diplomacia inglesa alcançou, peloTratado de 1810 tratamento aduaneiro mais favorável, sem cláu-sula da nação mais favorecida, além do porto franco na Ilha deSanta Catarina.

Por isso, Wanderley Pinho, conclui que na universalidade e am-plitude de países e mercadorias previstas da Carta Régia da aber-tura dos portos, e no liberalismo que a motivou sente-se “a garrado brasileiro Cairu; do economista e do político, do cientista eestudioso da economia política – a aplicar e realizar suas largasidéias antigas”17.

17. Wanderley Pinho, op. cit., p. 39.

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P A R T E

I

A revolução Constitucionalista do Porto

Quando defendia das críticas formuladas, a resposta à Fala doTrono, com a qual D. Pedro I abriu a sessão legislativa extra-

ordinária de 1829, José da Silva Lisboa pronunciou uma fraseque constitui perfeita definição das tendências políticas quedemonstrou no agitado período que, a partir da Revolução Por-tuense de 1820, caracterizou a vida pública do Brasil. Disse ovelho senador: “Na Universidade aprendi a não argumentar para acadeira, e por educação conservo o ditame de que, em via de re-gra, o filho, discípulo e súdito, nunca tem razão contra o pai, mes-tre e soberano”1.

É no respeito quase religioso às figuras de D. João VI e de seufilho, que depois foi imperador, no acatamento irrestrito às prer-rogativas inerentes ao trono, que se deve procurar à origem dasatitudes que lhe valeram os apodos de seus adversários da época eo severo julgamento dos pósteros, que o colocaram dentro dosquadros de um reacionarismo político, em flagrante, contraste comas idéias do liberalismo econômico que sempre defendeu. Contraaqueles que o combatiam, Cairu replicava indiferente às censu-ras: “Sendo velho, só adotarei inovações e mudanças, cedendo àevidência, experiência e força das coisas”2. E uma das evidênciasque encontrou, como resultado das idéias políticas que lhe repug-navam, foi a Revolução Francesa, com o seu cortejo de ultrajes ànobreza até mesmo com a morte dos soberanos. Por isso, Cairuidentificava no mesmo ódio, princípios franceses, federalismo,jacobinismo, Democracia, e neles vendo os gérmens da revolução

1. José da Silva Lisboa – Anais do Senado do Império, sessão de 7.4.1829.

2. Idem, idem, sessão de 15.6.1829.

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e anarquia, alertava temeroso que “o espírito da Democracia, fo-ragido da Europa, cerca este Império e avança com passos de Gi-gante”3.

Não é, pois, de se admirar que ao atingirem o Rio de Janeiro asprimeiras notícias da Revolução de 24 de agosto de 1820, Cairufremisse de indignação ao ver vilipendiados os privilégios reais esubvertida a hierarquia social pela “terrível metamorfose e mons-truosidade política de se transformar a Tropa em Corpo Delibe-rativo, devendo ser essencialmente Corpo Obediente ao GovernoEstabelecido”4.

Mas nos meandros da Revolução, algo mais havia do que asaspirações constitucionais e disto Cairu, mais tarde confessou, nãose apercebeu na ocasião. De fato, se antes da partida de D. Joãopara a América, a Metrópole vivia praticamente às expensas doBrasil, depois da abertura dos portos a situação econômica decli-nou de ano para ano, causando mal-estar, agravado pela prolonga-da ausência do Rei que, ferindo o amor próprio dos portugueses,colocava a antiga sede da Monarquia em situação de inferiorida-de perante a colônia que outrora tanto martirizara. Diante destasituação, em que os habitantes de Portugal sentiam-se “reduzidosao mísero e triste estado de Colônia do Brasil”5, qualquer mercêdo Rei em favor de seus vassalos da América, inclusive a outorgade condecorações, motivava ressentimentos, tanto assim que setornou voz corrente em Portugal “que a maior parte dos habitan-tes do Rio de Janeiro eram tabuletas de medalhas”6.

Seja no manifesto dirigido em 24 de agosto de 1820 aos portu-gueses, onde já se vislumbra profundas queixas, sob a alegação deque “estancadas as fontes, da prosperidade nacional, devia ser, efoi, uma conseqüência necessária a perdição de nossos mais caros

3. José da Silva Lisboa, idem, sessão de 7.8.1827.

4. Idem, “História dos Principais Sucessos Políticos do Brasil”, 1827, p. 15.

5. José Antônio Miranda – “Memória Constitucional e Política sobre o Estado Presentede Portugal e do Brasil”, 1821, p. 38.

6. Idem, idem, p. 32.

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interesses, e, por cúmulo da desventura deixou de viver entre nóso nosso adorado soberano”7, seja no manifesto de 15 de dezem-bro de 1820, no qual as reclamações são mais definidas, com odesabafo de que “o comércio e a indústria que nunca podem devi-damente prosperar senão à sombra benéfica da paz, da segurançae da tranqüilidade pública, tinham sido não só desprezadas, masaté parece que de todo destruídas pela franqueza concedida aosvasos estrangeiros em todos os portos do Brasil”8, observa-se demaneira evidente o profundo choque de interesses econômicosexistente dentro do Reino Unido. Esta antinomia, amortecida pormuito tempo, finalmente apareceu em toda a sua evidência e dadaa natureza dela, não era possível ser resolvida de forma diferenteda que realmente o foi: pela decomposição da unidade estabelecidaem 1815.

Sintetizando o sentido econômico do movimento, Oliveira Limanos apresenta uma revolução com seus adeptos “apregoando aConstituição como panacéia para todos os males e dela fazendomanto para restabelecerem seu monopólio, representando o seuconstitucionalismo bom emprego de capital, pois se baseava narecolonização”9.

A influência de uma revolução com este objetivo, como nãopodia deixar de ser, foi profunda para os destinos do Brasil, deladecorrendo importantes acontecimentos que aceleraram o processoda independência brasileira e dos quais participou José da SilvaLisboa.

I I

O juramento da Constituição pelo Rei

Pará e Bahia foram os primeiros pontos do território brasileiroatingidos pela onda revolucionária que se extravasara de Portugal.

7. José da Silva Lisboa, op. cit., p. 17.

8. A. J. Melo Moraes – “História do Brasil Reino e Brasil Império”, 1871, p. 82.

9. Oliveira Lima – “O Movimento da Independência”, 1922, p. 13.

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Depostas as autoridades constituídas, logo foram criadas juntasgovernativas que, protestando obediência às Cortes de Portugal,juraram a Constituição que nelas fosse aprovada.

No Rio de Janeiro, as notícias procedentes de Lisboa e as infor-mações chegadas das Capitanias revoltadas, terminaram com oambiente tranquilo até então reinante e motivaram o decreto de18 de fevereiro de 1821, no qual D. João VI procurando atender,pelo menos em parte, as reivindicações portuguesas, estabelecia apartida de D. Pedro para a Europa; convocava procuradores dascidades e principais vilas do Brasil, ilhas da Madeira, Açores eCabo Verde e criava uma comissão para preparar a reunião destesprocuradores. Ilustres servidores e conselheiros da Coroa foramnomeados por decreto de 23 de fevereiro para integrar esta comis-são da qual, salientando o prestígio que desfrutava, fazia parteJosé da Silva Lisboa.

Muito embora o último decreto indicasse o Marquês de Alegre-te para presidente da Junta, foi sob a direção do Conde de Palmelae em sua residência na atual rua Frei Caneca que se efetuou das11 às 18 horas do dia 25 de fevereiro a única reunião da comissãoe dela Silvestre Pinheiro Ferreira deixou consignado que “foramtais e tão disparatados os discursos e pareceres remetidos pelosdiferentes Conselheiros que todos saíram plenamente convenci-dos da inutilidade de semelhantes conferências”, não obstante aJunta reunisse “homens pela maior parte na verdade doutos e ani-mados de patrióticos sentimentos”10.

O decreto de 18 de fevereiro, porém, demorou a ser publicadoe quando o foi, o fermento revolucionário já atingira o Rio deJaneiro preconizando medidas de força para obrigar o Rei a jurar afutura Constituição portuguesa. Motivaram esta dilação as mar-chas e contra-marchas dos pareceres dos ministros e conselheiros,as opiniões sempre opostas de Tomaz Pompeu Vilanova Portugale do Conde de Palmela, acrescidas da indecisão de D. João VI,

10. Biblioteca Nacional – “Documentos para a História da Independência”, 1923,p. 232.

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parecendo até que já se tornara vezo na corte de Portugal as inter-mináveis divergências entre os ministros, cantadas outrora nos co-nhecidos versos do Marquês de Penalva:

O negócio se propõe,Duvida el-rei nosso senhor,Atrapalha o confessor,Angeja a pagar se opõe,Nada a Rainha dispõe,Martinho narra esturrado,Alves não passa de honradoE o Visconde, em conclusãoPede nova informação,Fica o negócio empatado.11

No Brasil, porém, D. Pedro desempatou a questão.Efetivamente, no dia 26 de fevereiro, as tropas portuguesas

saíram às ruas e o príncipe herdeiro tomando parte saliente nosacontecimentos, porque, segundo nos diz Cairu, cedo compreen-deu o espírito do século, conseguiu depois de várias viagens entreo Rocio e a Quinta da Boa Vista que D. João VI jurasse a Consti-tuição tal qual viesse de Lisboa, isto é, sem qualquer modificaçãoque a tornasse adaptável ao Brasil. Mais do que isto, as tropasexigiram fosse modificado o Ministério com as nomeações de pes-soas cujos nomes foram enviados ao Rei por intermédio de seufilho. Quando apresentados ao monarca, na presença do ministroTomaz Pompeu Vilanova Portugal, este, no primeiro impulso, in-sinuou mandar prender todos os indicados como coniventes coma revolução, mas depois, retomando o sangue frio, concordou coma exigência e foi mostrando ao Rei os nomes daqueles que pos-suíam aptidões para o desempenho de cada um dos cargos: – Quin-tela, para o Ministério do Reino; Monteiro Torres, da Marinha;Silvestre Pinheiro, da Guerra e do Exterior, e, por fim, “faltando

11. F. A. Varnhagen – “História Geral do Brasil”, vol. V, 1954, p. 4.

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com que contemplar a José da Silva Lisboa improvisou ele o em-prego de diretor dos estudos e museus para este varão, que o entu-siasmo pelo aperfeiçoamento e pela novidade ali o havia posto”12.

O decreto de nomeação indicava que a Cairu cabia o cargo deInspetor Geral dos Estabelecimentos Literários e ele próprio refe-re-se indiferentemente a qualquer uma destas designações quan-do se reporta à principal atribuição que lhe foi imposta pelo de-creto de 2 de março de 1821, isto é, a censura dos livros e escri-tos, no desempenho da qual incorreu “no ódio popular por terobstado quanto lhe foi possível na qualidade de Diretor dos Estu-dos a Impressão de escritos incendiários”13.

Este cargo e as idéias que em torno dele desenvolveu, consti-tuem uma das pechas que freqüentemente lhe são atiradas, nistosalientando-se Manuel Bomfim, quando afirmou que José da Sil-va Lisboa “vivia na carapaça de idéias atrasadas de um século,isto é, num absolutismo irritante e violento. Combateu a liberda-de de imprensa, contra Bernardo de Vasconcelos, e afirmava nasua veemência de decrépito – a imprensa faz mais mal do quebem...”14. Trata-se, porém, de um daqueles casos em que é “inútile indecente fazer-se agora a censura do passado”15, pois as idéiasde Cairu neste particular não deixam dúvidas de que não só admi-rava as vantagens da liberdade de comunicação de pensamento,como também evoluíram no sentido de apenas responsabilizaraqueles que dela abusassem. Das vantagens desta liberdade, diriaCairu, referindo-se à Grã-Bretanha, que “nenhum Estado podecontender com ela em estudos da Dinâmica Civil, em que, pelaLiberdade de Imprensa (ainda que cheia de abusos) se tem aí de-senvolvido prodigiosamente as forças da inteligência a um graudesconhecido nos antigos e modernos tempos”16. Deve-se, por-tanto, ponderar que o Diretor dos Estudos discutiu o assunto em

12. Biblioteca Nacional, op. cit., p. 255.

13. Idem, idem, p. 290.

14. Manuel Bomfim – “O Brasil”, p. 215, 1938.

15. José da Silva Lisboa – Anais do Senado do Império, sessão de 28.9.1830.

16. Idem, “Roteiro Brasílico”, 1822, p. 5.

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época na qual a Inglaterra, de velhas tradições liberais, segundosuas próprias informações17, castigava com desterro para a NovaHolanda os que fossem julgados culpados de abusos de imprensa,e em país onde este meio de comunicação do pensamento consti-tuía uma novidade e que, até hoje, discute a matéria. Isto revelaquão sábias eram as palavras de Cairu, ao dizer que “pela discre-pância de opiniões que têm aparecido no Senado, cada vez maisajuízo ser racionável a tese do celebrado Conselheiro PrussianoQuintus, na sua obra sobre a Liberdade de Imprensa, que “acharo exato expediente de reprimir os seus abusos, sem prejudicar odireito do homem em comunicar seus pensamentos é problemainsolúvel. Por isso a prática do Governo Inglês parece-meconsentânea à mais boa razão, por deixar à religião e consciência dojurado o decidir quando haja ou não criminalidade nos impressos”18.

José da Silva Lisboa encontrou-se diante de uma daquelas evi-dências que o faziam aceitar ou repelir idéias e acreditamos quenenhum liberal, mesmo dos nossos dias, deixaria de subscrevera proposição de Cairu, segundo a qual, “tem-se dito que a liber-dade de imprensa é como a lança de Aquiles, a que os antigosatribuíam a virtude de curar as feridas que fazia. O mal dos folhe-tos incendiários ou licenciosos quase sempre se aniquila por ou-tros escritos que os refutam, de sorte que no fim do ano o balançode contas, o saldo é mais em benefício do que em malefício doEstado”19.

Portanto, embora idoso, não era um decrépito, pois tornou-sepermeável às novas idéias, nem tão absolutista, que não deixassede proclamar, quase às vésperas de morrer: – “A Árvore da Liber-dade assemelha-se à Árvore do Bem e do Mal que existiu no ParaísoTerrestre. A melhor instituição humana é suscetível de abusos. Osmais liberais do Universo conhecem que a Liberdade tem causadograndes males, mas que o seu destino é de bens imensos”20.

17. Idem, “Anais do Senado do Império”, sessão de 8.5.1829.18. Idem, idem, sessão de 9.5.1829.19. Idem, idem, idem.20. Idem, idem, sessão de 9.8.1833.

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I I I

A volta de D. João VI

Depois dos sucessos de 26 de fevereiro ficou assentada a parti-da para Portugal de D. João VI, conforme foi anunciado ao povopelo decreto de 7 de março de 1821, data em que foram convocadaseleições para escolha dos futuros representantes do Brasil nas Cortesde Portugal.

A deliberação régia veio contrapor-se aos anseios de muitosbrasileiros, entre os quais o próprio José da Silva Lisboa, partidá-rio da permanência do Rei no Brasil, nova sede da monarquia,para onde os deputados portugueses deveriam vir, querendo. Osmoradores do Rio de Janeiro logo opuseram embargos àquela de-cisão, procurando destruir as alegações lusitanas contidas no ma-nifesto de 15 de dezembro de 1820, inclusive mostrando que “sen-do uma das queixas dos portugueses da Europa no seu manifestoo abrirem-se os portos do Brasil aos estrangeiros... parece que que-riam que os portugueses do Brasil andassem nus até que eles pu-dessem para aqui mandar o que lhes sobrasse, não se lembrandoque os seus maiores pecuniários tais como Quintela, Bandeira,Branchamp, e outros, depois da saída dos franceses, em lugar deprestarem os seus cabedais para encorajarem e reedificarem as fá-bricas demolidas, entraram a comprar propriedades de casas, quin-tas etc.”21.

As instâncias de seus súditos não conseguiram, porém, impedira viagem do Rei, e assim no término do mês seguinte rumou D.João para Lisboa, ficando sua partida tragicamente marcada pelosacontecimentos da Praça do Comércio, local onde se reuniram oseleitores paroquiais, sufragados na forma estatuída pelo decretode 7 de março: os cidadãos elegiam os compromissários, estes es-colhiam os eleitores das paróquias, que, por sua vez, indicavamos das comarcas que, finalmente, apresentavam os nomes dosDeputados às Cortes Portuguesas.

21. A. J. Melo Moraes, op. cit., pp. 42/43.

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A inexperiência constitucional do Brasil, e o exíguo lapso de-corrido entre o decreto e a realização das eleições, 7 de março a 8de abril, provocaram o desinteresse do povo, pelo que, afiança-nosMelo de Moraes, as eleições “foram feitas nesta corte com a maiorindiferença da parte da população brasileira, e que nelas só toma-ram parte ativa meia dúzia de brasileiros que depois se distingui-ram pelas suas turbulências”22. Apurados os votos, verificou-seter sido eleito 12o compromissário da freguesia de S. José do Rio,o novo desembargador dos agravos da Casa da Suplicação, Joséda Silva Lisboa, cargo para o qual havia sido nomeado no dia4 de abril.

Pouco depois, o Ouvidor Joaquim José de Queiroz convocoua Junta Eleitoral para no dia 21 de abril, às 16 horas, escolheros eleitores das comarcas, de vez que já se tinham realizado aseleições paroquiais. Ingenuamente foi estipulado na convocaçãoque “toda a pessoa que quiser assistir pode ali concorrer nos diase horas indicados, esperando-se de todos que observem o silêncioe o respeito devidos a um ato de tanta seriedade, e importâncianacional; e quando tenham a fazer algumas reflexões as reduzama escrito e mas presentem para eu como presidente as propor àjunta”23.

Não era possível, diante do estranho convite à intervenção daassistência, esperar que a mesma se mantivesse dentro da discipli-na requerida pelo presidente, principalmente se levarmos em con-sideração o ambiente carregado dos dias que transcorriam. De fato,o povo comparecendo em massa, e tendo como principais lídereso padre Macamboa e Luís Duprat, passou a influir diretamentenos trabalhos eleitorais e mediante coação aos componentes daJunta Eleitoral, desviaram-na dos objetivos para os quais haviasido convocada, transformando-a em verdadeira assembléia revo-lucionária, tal a natureza das proposições aprovadas pelos eleito-res reunidos: a aprovação da Constituição da Espanha, até que

22. Biblioteca Nacional, op. cit., p. 256.

23. Biancardi, Theodoro José – “Reflexões sobre alguns sucessos do Brasil”, 1821, p. 38.

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chegasse a que estava sendo feita em Lisboa; a proibição da saídade D. João VI, mediante ordem expedida às fortalezas da barra e asubstituição do ministério por outro indicado pela tumultuosa reu-nião. Surpreendido pelo inesperado dos acontecimentos, D. Joãoacedeu às pretensões revolucionárias, jurando respeitar a Consti-tuição espanhola. Horas depois, porém, a assembléia foi dissolvi-da a ferro e fogo, resultando mortes em número que jamais ficouconhecido. Anulado no dia seguinte o decreto de aprovação daConstituição de Espanha, foi instaurado inquérito do qual resul-tou a condenação de Luís Duprat, Nogueira Soares, Pereira Ra-mos e Macamboa, figuras salientes na sedição.

Muito interessante torna-se a leitura dos depoimentos presta-dos pelos componentes da Junta Eleitoral, que são unânimes emafirmar a ilegalidade dos atos praticados, aos quais deram confor-midade premidos pelas ameaças populares. Assim, José da SilvaLisboa24 declarou que apuzera sua assinatura na aprovação damencionada constituição “debaixo de terror e manifesta força pú-blica por ele reconhecida e pelos mais assinantes que o precede-ram porque a ninguém se deixou falar nem protestar”. Quanto ànomeação de um novo ministério, Cairu não só disse que a listados membros deste governo por ele depositada na urna era “meracópia que pediu a um Eleitor próximo que a tinha na mesa doPresidente, e ignorando ele testemunha quais eram essas pessoas”,como também reafirmou que procedera desta forma “a fim só deevadir-se à declarada força pública e ao iminente perigo de vida”.Logo depois, “receando maior insulto, sendo impossibilitado desair pela porta por onde entrara visto o cerco impenetrável damultidão procurou e obteve com dificuldade o sair pela porta domar e se retirou para sua casa” – debaixo do impropério da popu-laça, não deixou de assinalar outro eleitor, João Bandeira deGouvêa25.

A validade destes depoimentos foi posta em dúvida pelo es-

24. Biblioteca Nacional, op. cit., p. 290.

25. Idem, idem, p. 319.

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pectador anônimo que em maio daquele ano escreveu que “algunseleitores, tendo depois a fraqueza de se quererem justificar dosatos a que procederam, desculpam-se com estes clamores de ho-mens do povo, mas porventura estes homens obscuros e inermes,ainda que tivessem a voz de Stentor e a eloqüência ciceronianapoderiam obrigar 160 eleitores a faltarem ao seu dever, se elespróprios não pensassem que obravam com legalidade?”26. Opi-nião infundada de algum partidário das medidas tomadas pela JuntaEleitoral, acreditamos, pois não é crível tivesse Cairu, jurista delongo tirocínio, desembargador de reconhecidos méritos, políticointransigente na defesa dos princípios esposados por Burke, pro-curado igualar-se aos agitadores que sempre profligou, afastan-do-se, de moto próprio, dos propósitos da reunião.

Embora rejeitando os resultados da trágica assembléia e os mé-todos empregados pelos agitadores, Cairu não compactuou com aatitude dos que transformaram a Praça do Comércio no “Açouguedos Braganças”, denominação dada pelo público ao local da reu-nião e onde, hoje em dia, funciona a Casa França-Brasil.

“Exercício Militar em dia da Ressurreição! – increparia Cairu.– O fato por si só fala. O Ressentimento Público foi o mais dolo-roso. Basta dizer, que nunca mais Negociante algum, Nacional ouEstrangeiro, entrou na Praça do Comércio, que pouco antes haviasido aberta com grande pompa, e honrada com a Presença de El-Reie da Real Família... Não se tendo procedido a legal ato de achadadas armas na Praça, nem a Conselho de Guerra contra os que fize-ram a matança sem ordem, mal determinando-se devassa da Justi-ça, que não teve resultado, o mistério da iniqüidade ficará sempreincógnito, verificando-se o que diz o Pai da História Portuguesa –assim acontece em casos de ignomínia do Governo, onde tudofica entre Reis e Ministros”27.

No dia 26 de abril de 1821, retomava a Lisboa o “Ínclito Argo-

26. Memória sobre os acontecimentos dos dias 21 e 22 de abril de 1821 na Praça doComércio do Rio de Janeiro – Rev. I.H.G.B. – Tomo XXVII, 1864, p. 278.

27. José da Silva Lisboa – “História dos Principais etc.”, parte X, p. 63.

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nauta”, que há treze anos passados chegara ao Brasil. Em seu lu-gar deixou o “Príncipe Imortal, Mártir da Honra Brasileira”, quepassou a receber a veneração de José da Silva Lisboa.

I V

O “Fico”

Cairu, embora contrário à partida do Rei, conformou-se comos fatos consumados, na esperança de que seria ao menos respei-tada a liberdade econômica que lhe custara tantos estudos e tan-tos aborrecimentos. Nesta vã ilusão, procurou promover a uniãoentre os portugueses da América e da Europa, através de umasérie de escritos, entre os quais o “Conciliador do Reino Unido”, quelhe deu a glória de ter sido, conforme nos assegura Hélio Viana, oprimeiro jornalista brasileiro que dirigiu um periódico no Brasil28.

Além deste jornal, José da Silva Lisboa, logo nó início de 1821,vendo “iminente a Tormenta Revolucionária” diligenciou “preve-nir a desordem popular”29 publicando um opúsculo em quecompendiou preceitos do grande Vieira, fazendo ver, em conclu-são, que “tinha assaz, e de sobra apresentado várias amostras doespírito de Vieira, para conciliar a benevolência dos compatriotasd’aquém e d’além mar, amantes do Reino Unido e da LegítimaDinastia da Augusta Casa de Bragança”30. Cairu continuaria de-sejando a união estabelecida por D. João VI se aos poucos nãopercebesse a formação nas Cortes de Portugal da inqualificávelCabala Anti-Brasílica, símbolo dos desejos de recolonização eperante estes propósitos, só lhe restou legar ao passado a primiti-va confiança nas intenções lusitanas e tomar posição inquebran-tável junto ao Brasil e ao seu príncipe regente. “Cordialmente aneleia União do Brasil com Portugal, e, quanto em mim esteve, fiz esfor-

28. Hélio Viana – “Contribuição à História da Imprensa Brasileira”, 1945, p. 367.

29. José da Silva Lisboa – “História dos Principais etc.”, p. 173.

30. Idem, “Espírito de Vieira”, 1821, p. XLVI.

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ços literários para os trazer à concórdia – escreveu Cairu quinzedias antes da Independência –, mas ora vejo que em vão trabalhei:todas as ilusões estão dissipadas e quase as esperanças de recon-ciliação desvanecidas...”31. E quando no ano seguinte defendia osdireitos do Brasil à independência, humildemente confessava,referindo-se ao Manifesto das Cortes ao Brasil: – “Eu também(tão simples fui) não pude suspeitar que desígnios insidiosos seocultavam em tal Ato... Agora só me resta reconhecer e retratar omeu erro sobre o juízo da época e dos homens”32.

O desfecho da crise de confiança nos deputados de Lisboa ocor-reu com a chegada em fins do ano de 1821 do decreto ordenandoa partida de D. Pedro para a Europa, a fim de viajar incógnito.

Nos acontecimentos que sobrevieram a esta notícia, não ve-mos Cairu procurando persuadir pessoalmente o príncipe regentepara proclamar a independência política do Brasil, como outroracapacitara outro príncipe regente para decretar a independênciaeconômica de sua Pátria. Desta feita preferiu manter-se nas trin-cheiras da imprensa e o “Despertador Brasiliense” e a “Reclamação doBrasil” foram os meios de que se utilizou para arrebatar a opiniãopública em favor da permanência do jovem príncipe, o que repre-sentava, pelo caráter de insubordinação, a virtual separação polí-tica do Brasil.

O primeiro, panfleto cuja autoria foi definitivamente atribuídaa José da Silva Lisboa por Rodolfo Garcia e Hélio Viana33, segun-do A. J. Melo Morais, “produziu o efeito que desejava, animou atodos e decidiu a oposição à saída do Senhor D. Pedro e o aprestopara a magnânima empresa da independência do Brasil”34. Nãomenor influência desempenhou no desenrolar dos eventos o perió-dico “Reclamação do Brasil”, cujo primeiro número veio à luz no dia9 de janeiro. Nesta ocasião, Cairu, revelou que não era apenas umhomem de gabinete. De acordo com a narrativa de Vale Cabral, no

31. Idem, “Roteiro Brasílico”, 1822, p. 3/4.32. Idem, “Causa do Brasil no juízo dos governos e estadistas da Europa, 1822/3, p. 7.33. Hélio Viana, op. cit., p. 406.34. Idem, idem, p. 407.

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auge do entusiasmo “das janelas de sua casa distribuía ele ao povoexemplares de sua “Reclamação do Brasil”35. A repercussão desteescrito foi tão acentuada que uma vez “atendido pelo príncipe D.Pedro o pedido do povo, tendo os componentes da Câmara Muni-cipal voltado a seu paço, subiu a um monte de pedras existenteperto do consistório da Igreja do Rosário, à rua da Vala (hojeUruguaiana) o jovem Inocêncio da Rocha Maciel, filho do líderpolítico e maçônico José Joaquim da Rocha, e em voz alta leu àmultidão entusiasmada o conteúdo do referido exemplar”36.

A partir desta data, o precipitar dos acontecimentos não maispermitiu a Cairu afastar-se de seus periódicos e folhetos,mantendo-o em constantes polêmicas, muitas delas repletas depesadas ofensas pessoais. Vemos então Cipriano Barata de Almeidaalegando que conhecia “um Visconde que até a idade de 22 anosandou com casaca de cotovelos rotos, botões caídos e chapéucasquete”37; José Bonifácio de Andrada e Silva apelidando-o de“Sílvio – o corcunda, fração de gente, charlatão idoso”38. Evaristoda Veiga alcunhando-o de “poço de literatura”39; o autor anônimode “O Burro Magro”, chamando-o de “chafariz das ciências”40,vemos enfim, seus adversários procurando ultrajá-lo de todas asformas possíveis, como se pobreza, cultura e doença fossem des-douros, velhice e verdade, deméritos41. Aliás, de um dos seus ad-versários, o Pe. Diogo Antônio Feijó, disse José da Silva Lisboaque “recorreu a injúrias em lugar de razões, pela manha dos presu-midos, que só tem facilidade de falar, mas impotência de exami-nar, e até atacando a pessoa, e não o discurso”42.

35. A. Vale Cabral – “Vida e Escritos de José da Silva Lisboa” – Rev. Brasileira, 1881,Tomos 9/10.36. Hélio Viana, op. cit., p. 381.37. Idem, idem, p. 442/3.38. Idem, idem, p. 402.39. Otávio Tarquínio de Souza – “Evaristo da Veiga”, 1939, p. 226.40. Hélio Viana, op. cit., p. 261.41. Idem, idem, p. 415.42. José da Silva Lisboa – “Defesa contra o ataque do Pe. Feijó ao Velho Canonista”,1828, p. 2.

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A separação do Brasil de Portugal, encontrou-o publicando o“Roteiro Brasílico”, coletânea de idéias políticas de conhecidos es-critores, inclusive do seu mestre Burke, de quem, fazendo seus,apresentou pensamentos sobre o problema das reformas das insti-tuições, que nos ajudam compreender sua posição cautelosa faceàs pretendidas modificações políticas: “Raiva e frenesi podemderribar em uma hora mais do que prudência, deliberação e perí-cia podem edificar em cem anos. Em geral é uma verdade que oshabituados a não verem senão faltas dos outros, são incapazes daobra de reforma; pois que os seus espíritos não estão bastantementesupridos com padrões do bom e belo, e só se deleitam na contem-plação da malícia e por isso odeiam os homens. – Reformar não éinovar linha por linha. Os Revolucionários Franceses queixaram-se de tudo, e nada reformam : quiseram mudar tudo e as tristesconseqüências de suas fantasias estão ante nós e sobre nós”43.

Com estas idéias, Cairu, consagrou-se à tarefa de estruturar onovo regime político do Brasil, base de futuras reformas que aexperiência dos tempos porventura demonstrasse imprescindíveis.Então, o reconhecimento da independência pelas nações estran-geiras; o combate às revoluções locais, que punham em perigo aintegridade do território nacional; a sustentação dos princípiosmonárquicos encarnados na pessoa de D. Pedro; a elaboração deuma constituição que mais se aproximasse da realidade social, fo-ram os objetivos imediatos em prol dos quais Cairu reuniu à suainfatigável atividade jornalística, a eloqüência e erudição demons-trada nas tribunas da Assembléia Constituinte, em 1823, e do Se-nado do Império, de 1826 até sua morte.

V

Em defesa da Independência

De todos os opúsculos de autoria de José da Silva Lisboa ededicados à defesa da independência brasileira avulta, sobretudo,

43. Idem, “Roteiro Brasílico”, pp. 21/23.

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a “Causa do Brasil no Juízo dos Governos e Estadistas da Europa”, nãosó por se tratar do primeiro periódico com esta finalidade, comotambém porque nele vemos patenteada de forma inconfundível oconflito econômico que motivou o processo da nossa indepen-dência. Em suas violentas censuras à Cabala Antibrasílica, refle-te-se o ardor com que se empenhou no patrocínio da causa daliberdade política do Brasil e a revolta que lhe provocou a mortede seu irmão Daniel da Silva Lisboa, inerme capelão do Conventode N. S. da Conceição da Lapa, assassinado a coices de espingardano assalto das tropas do General Madeira àquele estabelecimentoreligioso; por isso exclamava: – “o coração me salta e rebenta nopeito, e não posso a sangue frio escrever com serenidade nesteassunto”44.

Girando todos os argumentos expostos neste periódico em tor-no da liberdade econômica, Cairu com ela acenava às potênciasestrangeiras e aos habitantes do Brasil, mostrando-lhes o profun-do interesse em conservá-la e neste sentido lançava apelos à hon-ra da Dinastia dos Braganças, da Inglaterra, da Europa, do Brasil,do Rio de Janeiro e da América. Dizia Cairu em resumo, que osbenefícios advindos ao país pelo sistema liberal, implantado porum Bragança, precisavam ser preservados contra as maquinaçõesdas Cortes Portuguesas: “é portanto da Honra Bragantina, que tãomagníficas Obras Régias sejam sustentadas pelo Senhor PríncipeReal”. Por outro lado, tendo D. João viajado para o Brasil sob pro-teção da Inglaterra e ajustado com a velha aliada tratados comer-ciais que permitiram a criação de importantes interesses inglesesno Brasil, “o Governo Britânico considera a Honra da Nação em-penhada em que a Augusta Casa de Bragança aumente em força eesplendor no Brasil” para que o Império do Equador não volvessea ser “simples Feitoria Comercial, estreita Ilha de Sota-Vento ouagreste Sesmaria dos Trópicos”. A legislação liberal, não sendoexclusiva dos ingleses, induziu que indivíduos de outras naciona-lidades também se estabelecessem no Brasil; portanto, “é da Hon-

44. Idem, “Causa do Brasil”, parte IV, p. 20.

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ra Européia, que as Potências ora cooperem, em amigável acordo,a bem da Causa do Brasil, para a manutenção da posse em que seacham os respectivos súditos de gozarem do Indulto da CoroaFidelíssima, e a fim de que não fiquem submetidos ao Jugo doSistema Colonial”. Mas, e neste ponto Cairu fala ao coração dosBrasileiros, desde que as Cortes de Lisboa “tentam firmar no Bra-sil o Sistema de Morte, que fez odioso na Sociedade o Nome Por-tuguês, aniquilou o seu Império da Índia, exterminou da China eJapão o Culto Católico, e reduziu os seus Portos da Ásia, ainda naCapital da outrora Goa Torreada a pestíferos cemitérios; é forçaque a Honra Brasileira clame por Auxílio aos Céus e à Terra edefenda a Causa da Justiça Própria e da Civilização do Mundo noTribunal da Sociedade...”. Dos habitantes do Rio de Janeiro, quedesde a chegada de D. João vinham gozando das vantagens que ainstalação da corte lhes proporcionou, Cairu procurava ferir o amorpróprio, mostrando-lhes que embora “a Honra Brasileira imperio-samente dite, desde o Amazonas até o Prata, o sustentar da in-dependência do Brasil, proclamada pelo seu Imperador Consti-tucional e Defensor Perpétuo, parece com especialidade interes-sar esta Empresa Política à Honra Fluminense; por ter sido a ime-diatamente atacada pelos ditadores de Portugal, com insultos in-toleráveis e destinados a deprimir a Dignidade da Capital do Im-pério do Equador, e onde se achavam os mais importantes Esta-belecimentos da Nova Corte, que viu surgir como Aurora, a RomaAmericana”.

Finalmente, acentuemos com destaque, que José da Silva Lis-boa depois de se referir ao reconhecimento pelo governo de BuenosAires assinala que o “Império do Brasil pode contar com este Amigonas fronteiras do Sul”, da mesma forma que os “Estados Unidosao Norte da América devem ser outro especial Amigo deste NovoImpério”. Proclama então o autor da “Causa do Brasil”, que a“Honra Americana se tem mostrado acrisolada no Teatro da Civi-lização, tendo-se mostrado à Humanidade ser a Magna virum Mater,e, por assim dizer, a Matriarca da Independência do Mundo. O seuprolífico exemplo tem ocasionado a Nova Constelação de Gover-

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nos Constitucionais desde o Golfo do México à Terra do Fogo: e éfácil ver que a Liga Transatlântica muito excederá em força e es-plendor a Anfictiônica e Hanseática, que aterrou em antigos tem-pos o Barbarismo Asiático e Europeu”45.

A consciência da solidariedade continental, que o fazia preco-nizar uma cooperação amistosa entre todas as nações da Américapara a conservação da independência contra possíveis ataqueseuropeus, coloca Cairu sob o aspecto menos conhecido de umdos precursores do pan-americanismo, antecipando-se à formula-ção da doutrina de Monroe, e mostrando-nos a fonte inesgotávelde estudos que ainda representam suas esquecidas obras.

Além destes apelos, Cairu no mesmo periódico examina outrasquestões relativas à separação do Brasil de Portugal, destacando-seas objeções levantadas por Mr. Balbi contra a excelência do Brasile do Rio de Janeiro, em particular, para sede da monarquia portu-guesa, inclusive sob a alegação de que “o Brasil teria sempre umapopulação relativa muito inferior em número e em qualidade à dePortugal”46. Repelindo o argumento e face às ameaças de invasãodo Brasil, Cairu, confiante nos sentimentos patrióticos dos habi-tantes do novo Império, não temia dizer que “se somos muitos oupoucos, os nossos inimigos o dirão, quando assaltarem as nossaspraias e se internarem nas matarias”47, prenúncio do desafio quemais tarde formulou em plena Assembléia Constituinte: – “Venhatodo o Portugal: basta o nosso pau-ferro para desancar e desqueixaros invasores”48.

Publicando a “Causa do Brasil” e o “Império do Equador”, José daSilva Lisboa penetrou no ano de 1823, ano de rumorosos aconte-cimentos, destacando-se a instalação e posterior dissolução daAssembléia Constituinte, a cuja convocação se opusera, procu-rando mostrar a inconveniência da assembléia enquanto as Pro-víncias do Pará e Maranhão não aderissem à causa pátria.

45. Idem, idem, pp. 16, 18, 24, 29, (parte IV), 26 e 36.

46. Idem, idem, p. 53.

47. Idem, idem, p. 75.

48. Idem, “Anais da Assembléia Constituinte”, sessão de 30.8.1823.

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V I

Na Assembléia Constituinte

Para a nossa primeira Constituinte, convocada em 3 de junhode 1822, Cairu integrou a representação de seu torrão natal, como4o suplente. Não tendo o deputado efetivo Cipriano Barata deAlmeida assumido o mandato, em 5 de agosto de 1823 ingressouna carreira legislativa para uma curta experiência de cerca de trêsmeses49.

Na tribuna parlamentar, pedra de toque onde melhor se provao caráter dos homens públicos; cadinho da nacionalidade, onde sefundem no mesmo anseio do bem comum, o idealismo que empol-ga a juventude e a prudência que a idade traz, Cairu soube, nodizer do Marquês de Abrantes, “aliar o saber de Cícero à constân-cia de Sócrates, e o talento de Sêneca à virtude de Catão”50.

Por isso, foi no recesso das Câmaras que os historiadores aotraçarem seu retrato moral, encontraram a coragem que o faziadizer: “A fortaleza deve ser uma das virtudes cardiais dos repre-sentantes do povo. Quem não tem coragem para arrostar a facedos ministros, não se assente na assembléia dos legisladores”51;notaram a firmeza em sustentar suas opiniões, colocando mesmoo bem da pátria acima dos prazeres da amizade: – “Sr. Presidente,a matéria é tão grave que declaro nesta assembléia estar resolvidoa inimizar-se com os melhores amigos, que se obstinarem na ditatese, e congraçar-me com os meus maiores inimigos (que só tereigratuitos) se me ajudarem a combater tal opinião, que entendocausaria se fosse adotada com generalidade a ruína do Império doBrasil”52. Esta constância que o impeliu repetidas vezes de votarcontra a assembléia inteira, não representava, contudo, uma atitu-de rebelde ao exame da evolução dos problemas: – “Quanto à argüi-

49. Passou a deputado efetivo em 8.10.1823.

50. Marquês de Abrantes – Discurso na Soc. Agricultura, Comércio e Indústria daBahia em 31.1.1838.51. José da Silva Lisboa – “Anais da Assembléia Constituinte”, sessão de 6.8.1823.52. Idem, idem, sessão de 18.9.1823.

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ção que um dos Srs. Deputados me fez de ser inconseqüente nosmeus escritos... aqui só direi: não pode qualquer emendar o passa-do erro com o seu posterior acerto?’’53. No ardor dos debates, osbiógrafos apontaram um caráter pugnaz, ora exclamando resoluto,quase com setenta anos: “Tenho peito triplicado para resistir àrapaziada”54; ora dizendo o que desejava para muitas vezes ouviracres respostas, que não era de seu hábito deixar sem adequadacontestação. Certa vez, chamando Costa Barros de carbonário, estereplicou-lhe: “Se bem que à maneira de Sparta estejamos dispos-tos a respeitar as suas cãs pela suposição de que elas trazem con-sigo a idéia de maior saber e de ajustada experiência; contudo co-nhecemos também que este direito dos velhos cessa todas as ve-zes que êles não conservam o respeito devido aos outros homense então a mocidade deixa de lhe prestar aquela veneração devi-da”55. Infelizmente, seguiu-se tal tumulto que o taquígrafo nãoconseguiu registrar a resposta de Cairu: foi pena, pois dada a na-tureza do reproche, qual não teria sido a contestação de um ora-dor que fazia até Mont’Alverne calar?

Em todos os assuntos debatidos, Cairu oferecia uma pondera-ção serena, um parecer fundamentado, um esclarecimento sábio,frutos de vastíssima cultura, nascida do estudo ininterrupto e doconvívio com os grandes vultos das artes e ciências, nos quaissempre buscava reforço para suas idéias: Bacon, Smith, Vattel,Camões, Lucrécio, Lavater, Tácito, Jarrold, B. Constant, Plínio,Montesquieu, Burke, J. P. Odar, Aristóteles, Zeuxis, Apeles,Blackston, Virgílio, Gibbon, St. Hilaire, João de Barros, autoresclássicos e contemporâneos, sagrados e profanos, épicos da lín-gua, portuguesa, antigos e venerandos mestres de Coimbra, corifeusdas ciências políticas e econômicas, escritores que se perderamatravés do progresso da cultura, autores que a evolução dos tem-pos redobrou a fama, artistas, historiadores, naturalistas, filóso-

53. Idem, idem, sessão de 29.8.1823.

54. Idem, idem, sessão de 29.8.1823.

55. Costa Barros, idem, sessão de 15.9.1823.

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fos, poetas e políticos, todos perpassavam através de seus elo-qüentes discursos, numa erudição que no dizer de Araújo Lima,esmagava seus adversários.

Assim foi a figura moral e intelectual de Cairu, assim foi Joséda Silva Lisboa no recinto da Constituinte, discutindo não só osprojetos de lei nela apresentados, como também os 24 artigos daConstituição que a Assembléia conseguiu examinar antes de serdissolvida por D. Pedro I.

Daqueles projetos, poucos proporcionaram melhor oportuni-dade para Silva Lisboa demonstrar seu acendrado amor ao estudodo que o da criação de uma Universidade no Brasil cuja sede de-via ser, em sua opinião, no Rio de Janeiro. Por mais de uma vez,Cairu teve ensejo de expender considerações que ainda hoje po-demos admirar pelo descortino dos problemas brasileiros e perfei-ta compreensão do verdadeiro sentido da formação universitária.“É experimentado, que os que não fizeram estudos regulares nasUniversidades, ainda que sejam muito estudiosos e provectos emqualquer ramo literário, sempre em toda vida sentem um vazio,que nada supre; salvas as honoríficas e raras exceções de pessoasde extraordinário talento, que são como estrelas de primeira gran-deza”56. Cairu não desejava uma Universidade repleta de estudosinúteis, antes preferia o estudo das artes que ajudam o desenvol-vimento das indústrias; dos direitos mercantil, marítimo, interna-cional, contra o exagero do ensino do direito romano. Se destadiscussão não resultou verdadeiramente a Universidade, pelo me-nos dela nasceram os cursos jurídicos instalados em São Paulo eOlinda.

Além do saber enciclopédico, na ocasião em que foram exami-nados os artigos constitucionais que estabeleciam os lineamentosda formação territorial do Brasil e fixavam os direitos dos cida-dãos, Cairu exibiu em toda plenitude a orientação política que lheera peculiar.

De início, ao discutir a introdução à Constituição, Silva Lisboa

56. José da Silva Lisboa, idem, sessão de 27.8.1823.

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ajoelhou-se em pleno recinto da Assembléia, mostrando que nãodesejava que a invocação à Santíssima Trindade incluída no intróitoda malograda Carta Magna, ficasse restrita a simples palavras, nãoacompanhadas de “atos de adoração em culto externo”57. E a dis-puta acesa que se estabeleceu em torno do preâmbulo, foi oantelóquio das infindáveis discussões que, embora demonstrandopor sua elevação e sapiência o nível intelectual dos homens daConstituinte, exigiriam, se considerarmos o mesmo andamento,mais de 600 dias para a aprovação de todo o projeto constitucional.

Nestes debates Cairu fulmina o estabelecimento do federalis-mo no Brasil, procurando provar que a “palavra federal inserta naConstituição teria pior efeito que uma bala pestífera do Levantepara dissolução do Império”58; defende com intransigência os es-cravos e seus descendentes, pedindo aos seus colegas: “Deixemosde olhar para a África com maus olhos. Lembremo-nos que Moisésfoi africano, criado como se diz no Ato dos Apóstolos na Sabedo-ria do Egito e foi casado com mulher Etíope. A Igreja Africana foifamosa nos primeiros séculos do cristianismo: ela produziu osCiprianos e Agostinhos. Todas as nações que ora são mais civili-zadas, foram antigamente bárbaras”59; procura restringir, sem êxi-to, pois votou sozinho, a competência do júri somente às causascíveis, sob a alegação de que o povo em sua generalidade aindanão possuía suficiente instrução para se constituir em corpo dejurados destinado a apreciar também as causas criminais onde es-tava em jogo até a vida dos cidadãos. Silva Lisboa impugna aindaa liberdade religiosa, contra diversos sacerdotes, membros da Cons-tituinte, dizendo que esta liberdade “considerando as circunstân-cias atuais do Brasil eqüivalia à liberdade de perjúrio e liberdadede apostasia, pois havendo todos os cidadãos brasileiros juradoguardar a religião católica, o declarar-se em Constituição que eraseu direito individual ter liberdade religiosa, era o mesmo quedeclarar-se que podia perjurar, e prescindir do seu juramento, sen-

57. Idem, idem, sessão de 15.9.1823.58. Idem, idem, sessão de 17.9.1823.59. Idem, idem, sessão de 30.9.1823.

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do apóstata da religião”60; e, surpreendentemente, defende as cor-porações de ofício, ele que tão liberal era em matéria de econo-mia, argumentando que sendo elas em pequeno número, restritainfluência teriam na vida econômica do País, além de propiciar oaprimoramento das artes.

Quando a Assembléia atingia o artigo 24 da Constituição, asdivergências entre os partidários dos Andradas e D. Pedro I ti-nham chegado ao auge, prenunciando os sombrios acontecimen-tos que de fato ocorreram.

A agressão sofrida por David Pamplona Corte Real e praticadapor oficiais portugueses, inflamou os espíritos e provocou vivosataques ao Imperador, entrando a Assembléia no dia 11, às 10horas, em sessão permanente que se prolongou até o dia 12 às 13horas. Cairu, se bem que idoso, manteve-se nesta sessão até osúltimos minutos, apenas com ligeira interrupção por sentir-sedoente, na defesa de D. Pedro I. Já no dia anterior, Andrada Ma-chado permitira a entrada do povo no recinto, sob protesto deCairu, porque certamente vieram-lhe à mente tristes recordaçõesdo trágico desfecho da reunião da Praça do Comércio. Neste am-biente conturbado, com as tropas em movimento, a Constituintecerceada em sua liberdade nada mais poderia fazer: rodeada desoldados, recebeu com indiferença, no dia 12, o decreto imperialque a dissolvia.

Estava cumprida a experiência parlamentar de José da SilvaLisboa. Menos de três anos depois, novamente o encontraremosimpávido na tribuna do Senado do Império, onde se reuniu a mui-tos de seus antigos colegas da Assembléia Constituinte.

VII

Cairu, Senador do Império

A época em que se deu a interrupção das atividades parlamen-tares de José da Silva Lisboa, nomeado, em 20 de outubro de 1823,

60. Idem, idem, sessão de 8.10.1823.

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Desembargador Graduado do Paço e Chanceler da Relação daBahia, ficou assinalada nos fastos pátrios, em 1824, pela Confe-deração do Equador e, em 1825, pela beligerância no sul do país,da qual resultou mais tarde a independência da Província Cis-platina. Estes acontecimentos proporcionaram ao futuro senadormotivos para aumentar sua imensa bagagem literária, com novosperiódicos e panfletos destinados à defesa de seus pontos de vistapolíticos.

Contra Manuel de Carvalho e, demais revolucionários dePernambuco, utilizando-se dos condenáveis processos de seusadversários, Cairu publicou uma série de opúsculos aos quais im-primiu invulgar e por todos os motivos lamentável virulência, paraa qual somente podemos encontrar explicação no seu ódio acérri-mo ao federalismo. A “História Curiosa do mau fim de Carvalho &Cia. à bordoada de pau brasil”, por exemplo, em que os adeptos darevolução de 1824 são chamados de “tolos, castas ruins, quadrú-pedes marcados, asneirões da República do Crato”, foi taxada porHélio Viana de “abjeto folheto indigno de ter saído da pena doVisconde de Cairu”61. Além deste e dos outros habitualmente ci-tados (Rebate Brasileiro contra o Typhis Pernambucano, Apelo à HonraBrasileira contra a facção federalista de Pernambuco, e Pesca de Tubarõesdo Recife em três revoluções dos anarquistas de Pernambuco), Basílio deMagalhães admite ser de autoria de José da Silva Lisboa, a, “Aná-lise do manifesto publicado no Diário de 30 de julho”62.

Se o federalismo era combatido sob o temor de uma possíveldesagregação do imenso território nacional, não menor atençãorecebeu de Cairu as atividades do General Artigas, no Rio da Pra-ta. Por isso, com o objetivo de reprovar as ações do libertador doUruguai, vieram à luz o “Triunfo da Legitimidade, contra a facção dosAnarquistas”, a “Desafronta do Brasil contra Buenos Aires Desmascara-do” e “Recordações dos Direitos do Brasil à Província Cisplatina”.

Sublinhando sua personalidade multiforme, nos anos em que

61. Hélio Viana, op. cit., p. 423.

62. Basilio de Magalhães – in Rev. do Inst. H. G. do Brasil – Tomo 83, 1918, p. 406.

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escreveu estas diatribes, Cairu iniciou a publicação do modelo deserenidade e meditação que é a “Constituição Moral e Deveres dosCidadãos” obra de fôlego em três volumes, destinada a elucidar overdadeiro espírito de certas normas constitucionais, mediante aexposição dos princípios da Moral Pública. Ainda em 1825, anun-ciou a futura edição da “História dos Principais Sucessos Políticos doImpério do Brasil”, escrita atendendo ao convite que lhe fora for-mulado pelo Marquês de Valença, confirmado pelo Imperador,segundo Aviso de 12 de janeiro e Portaria de 1o de fevereiro de1825. Para desincumbir-se desta tarefa, Cairu, foi licenciado desuas atividades no Tribunal e recebeu dois auxiliares de reconhe-cidos méritos, o Frei Francisco de Santa Teresa de Jesus Sampaioe o Brigadeiro Domingos Alves Branco Moniz Barreto, que, pordiferentes motivos, não chegaram a oferecer-lhe efetiva colabora-ção. Não obstante as providências do governo, a obra não chegoua ser concluída, muito contribuindo para isto a demora de sua im-pressão na Tipografia Nacional, onde permaneceu sem andamen-to por mais de seis meses, e o corte dos Rs. 365$000, atribuídospelo orçamento ao autor para pagamento dos serviços prestadospelo escrevente Estanislau de Souza Caldas, auxiliar de inestimá-vel valia, porque, segundo o próprio Cairu, suas obras lhe davambastante trabalho pelo hábito de repetidas correções. Foi depoisda publicação deste livro, adianta-nos José Honório Rodrigues,“que se passou a considerar o dia 7 de setembro de 1822 como aprimeira máxima época dos Anais do Brasil”63.

Em 22 de janeiro de 1826, José da Silva Lisboa, já agraciadoem 12 de outubro do ano anterior com o título de Barão de Cairu,foi escolhido por D. Pedro I, Senador pela Bahia. No desempenhode seu mandato, jamais desmereceu o conceito que o tornara umdos maiores nomes da Assembléia Constituinte. Não abandonoua coragem em sustentar suas opiniões, fazendo ver que “as câma-ras são escolas de fortaleza e magnanimidade, não entre nelas quemnão tem força de espírito para desprezar injúrias que lhe fizerem

63. José Honório Rodrigues – “Teoria da História do Brasil”, 1949, p. 160.

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por causa de suas opiniões neste recinto”64. Continuou demons-trando a firmeza que o tornou imune aos conluios contrários aosinteresses de sua Pátria: – “Não pertenço a partido algum, soupuramente do partido dos brasileiros genuínos”65. Manteve o amorà discussão, travando acirrados debates com seus pares, dos quaisrecebeu censuras injustificáveis, semelhantes àquela que Barba-cena lhe dirigiu: – “Homem velho, doente e recolhido em sua casa,poucas vezes conhece a opinião pública, mas sim aquela do pe-queno círculo em que vive”66. Dias depois Cairu respondeu-lheque “triunfara com barata vitória” e que por isso prescindia “depersonalidade que não me acobertou uma amizade de 35 anos”67.Acendrado sentimento de honra, demonstrou também na ocasiãoem que a Câmara dos Deputados procurou reformar a Constitui-ção sem a participação do Senado. Desejando alguns de seus cole-gas uma intervenção imediata do Senado, contestou-lhes: – “Quan-do, pois, senhores, vierem as reformas, nós nos ocuparemos delas,mas não vindo para o Senado tomar nelas a parte que deve, entãonós deliberaremos a tal respeito, embora o Senado sucumba, como sediz, mas sucumbirá com honra”68.

E são outrossim seus autores favoritos, Smith, Rocha Pita,Montesquieu, Solon, Catão, Pitt, Burke, Fox, Canning, Roscoe alhe fazerem companhia nos momentos críticos dos debates, a lhefornecerem os alicerces das opiniões contrárias às de seusopositores que se mantinham, do mesmo modo que na Assem-bléia Constituinte, admirados de sua vasta cultura, como, aliás,nos deixou consignado o Senador Borges ao afirmar que o Vis-conde de Cairu, jamais se levantava “sem que no desenvolvimen-to de sua vasta erudição deixe de revolver os Anais da Rússia, daGrécia, da China etc., e ainda agora mesmo acabou de citar-nos

64. José da Silva Lisboa – “Anais do Senado do Império”, sessão de 15.5.1829.

65. Idem, idem, sessão de 7.6.1832.

66. Marquês de Barbacena – idem, sessão de 30.5.1832.

67. José da Silva Lisboa – idem, sessão de 5.7.1832.

68. Idem, idem, sessão de 6.8.1834.

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Inglaterra, França, Estados Unidos da América, Cidades Han-seáticas e até Bonaparte”69.

Nove anos de atividades na mais alta Câmara Legislativa doImpério, permitiram-lhe a discussão de dezenas de, projetos, en-tre os quais o da criação de um Banco de Circulação e Depósitos,em defesa do qual procurou mostrar no desenvolvimento da argu-mentação que nenhum bom patriota devia se opor a que se substi-tua “no giro mercantil e comércio o papel de crédito ao sempreraro e dispendioso meio circulante de moeda metálica”, tanto maisque seus admirados ingleses “honram-se de (como dizem) come-rem e viverem do papel de crédito, especialmente das notas deBanco”70. Também por isto, já tivemos, oportunidade de mencio-nar, votou contra a liberdade de mineração dos metais preciosos,pois preferindo a circulação de notas de Banco, era até motivo deglória que o Brasil, em lugar da moeda metálica introduzisse “ummelhoramento comercial a que a Inglaterra chegou depois de maisde século”71.

Ao tratar da extinção das Mesas de Inspeção, as saudades deseus velhos tempos da Bahia deram-lhe forças para defender suaantiga repartição naquilo em que estimava útil. Dizia então a seuspares: “Não sou propenso à abolição de instituições, ainda quedefeituosas, que se podem reformar para o bem comum. “Des-truir não custa nada, edificar é mais difícil e nisto é que se vê ojuízo do legislador”72.

Outros projetos de lei, de caráter eminentemente político, muitosdeles derivados dos sucessos que determinaram e seguiram a ab-dicação de D. Pedro I em 7 de abril de 1831, ofereceram-lhe ense-jo para discutir a liberdade de imprensa, com idéias já expostasem capítulo anterior, e lançar-se a uma ferrenha defesa da Consti-tuição promulgada pelo seu soberano em 1824, afirmando com a

69. Borges, idem, sessão de 30.5.1832.

70. José da Silva Lisboa, idem, sessão de 16.6.1827.

71. Idem, idem, sessão de 12.5.1827.

72. Idem, idem, sessão de 2. a. 1827.

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convicção que lhe era muito própria: “Qualquer que seja a sorteque nos espera, eu sempre direi: quero antes errar com Catão, pug-nando pela Constituição da Pátria, do que acertar com amantes denovidades perigosas e que menosprezam a estabilidade de uma leiFundamental”73... “Nós devemos andar e não ser fixos e retrógra-dos; para isso é necessário que se não esteja a fazer e desfazertodos os dias”74. A substituição do tutor do futuro D. Pedro II foicombatida com a mesma tenacidade e aquele que lhe chamara char-latão idoso foi apresentado no Senado como “insigne homem deEstado”. Vale Cabral, nos adianta que nessa época as relaçõesoutrora tensas entre os dois Patriarcas da Independência75 tor-naram-se mais cordiais, pela concórdia de ideais que esta defesapressupõe.

Uma das críticas geralmente feitas pelos adversários de Vis-conde de Cairu prendia-se a sua pretensa adesão ao partido quedesejava a restauração de D. Pedro I. Contra esta invectiva, diziao senador baiano que não podia conceber estivesse “a espécie hu-mana tão depravada” que pudesse acreditar fosse o primeiro Im-perador “capaz da baixeza de arrancar a coroa da cabeça de seufilho”76.

A defesa intransigente dos princípios que lhe eram caros, cadavez mais o impopularizava, e não obstante as ameaças da multi-dão, alquebrado pela moléstia, jamais deixou de comparecer àssessões do Senado, até mesmo naqueles agitados dias em que,opondo-se a todo o cenáculo, votava sozinho. Quando faltou àcontenda parlamentar, foi para que “na fria lousa” que cobria asua campa, a juventude encontrasse “representadas, como emlímpido espelho, as imagens do saber, da lealdade e da honra”77.

73. Idem, idem, sessão de 18.6.1832.74. Idem, idem, sessão de 12.7.1833.75. “É portanto Silva Lisboa o verdadeiro Patriarca de nossa independência” – CândidoMendes de Almeida – “Ao Leitor” – in “Princípios de Direito Mercantil”, VI, ed. 1874.Por isso, seu lema seria sempre.: “Constituição e D. Pedro II”.76. José da Silva Lisboa, op. cit., sessão de 26.6.1833.77. Marquês de Abrantes, op. cit. – apud José Soares Dutra, “Cairu”.

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VIII

O fim da jornada

A doença que afligiu os últimos anos de sua vida, por fimquebrantou-lhe a resistência. Cairu não veria o amanhecer de 20de agosto de 1835.

Em sua casa, à rua da Ajuda, cerca de 5 horas da manhã, re-pousava de setenta e nove anos de vida intensa. Visões de umaexistência fecunda atravessavam-lhe a mente em tropel: a despe-dida de seus humildes pais, no velho cais de Salvador; as acolhe-doras salas de aula de Coimbra; os numes ilustres de seus antigosmestres; as contendas de Ilhéus; o cobre de Cachoeira; o velhoSmith que lhe fizera abandonar as idéias dos “miseráveis econo-mistas de França”; a figura hesitante de D. João VI; o estrépito dapopulaça vaiando aquele que só queria o bem público... Sentia aíntima satisfação de ter sido o único brasileiro que participara detodos os atos da independência da Pátria, desde 28 de janeiro de1808 até 7 de setembro de 1822... Em seus ouvidos ressoava ain-da a voz do Marquês de Paranaguá, recitando a Ode que lhe dedi-cara e que de estrofe em estrofe esmaecia...

...............................................................Desta forma caminhas

Denodado Cairu, ao Templo AugustoCom ânimo tranqüilo,

A planta firme, os olhos sempre fitosNo facho luminoso

Da portentosa Torre, que entre nuvensEsconde a excelsa grimpa

E descobre os sem-fins da Eternidade.78

As últimas palavras confundiram-se com o maior silêncio queexiste.

78. Marquês de Paranaguá – “Ode” – Rev. do Inst. H. G. do Brasil, Tomo I, 1839.

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IX

Bibliografia de José da Silva Lisboa

Bastante razão tinha Antônio de Morais Silva ao garantir a Cairuque “as obras, que o prelo perpetua e o tempo não gasta...asseguram-lhe uma duração de glória e até de reconhecimento dosânimos bem formados”79. De fato, o acervo literário do Viscondede Cairu é imenso, em quantidade e valor, e vem repetidas vezessofrendo alterações a partir da primeira lista de suas obras apre-sentadas pelo 2o Barão de Cairu, em 1839, até às preciosas retifi-cações que às bibliografias mais completas de Inocêncio, ValeCabral e Blake, impôs o prof. Hélio Viana, depois de pacientespesquisas em nossas Bibliotecas. Temos a convicção que outrasobras ainda virão juntar-se à seguinte lista, por nós copilada:

AGRADECIMENTO do povo ao Salvador da Pátria, o Sr.Príncipe Regente do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional,1822.

ÁGUA vai – Calmante às “Malaguetas” no 3 e 4. Rio de Janeiro:Tip. Nacional, 1824.

APELO à honra brasileira contra a facção federalista dePernambuco. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824.

APÊNDICE à Memória da vida de Lord Wellington. Rio deJaneiro: Impressão Régia, 1815.

ARTIGOS no Diário do Rio, sob o pseudônimo de “Jurista”.

ATALAIA. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1823.

CARTILHA da escola brasileira para instrução elementar dareligião do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1831.

____. 2.ed. Pará: Justino Henriques da Silva, 1840.

79. F. A. Pereira da Costa – “Apontamentos Bibliográficos do Dr. Antônio de Morais eSilva”, 1910, pp. 111/115.

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127

CATECISMO da Doutrina Cristã. Rio de Janeiro: Tip. Nacional,1832.

____. 2.ed. Pará: Justino Henriques da Silva, 1840.

CAUSA da religião e disciplina eclesiástica do Celibato Clerical.Rio de Janeiro: Tip. Plancher-Seignot, 1828.

CAUSA do Brasil no juízo dos governos e estadistas da Europa.Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1822.

CAUTELA Patriótica. Rio de Janeiro: Tip. Plancher-Seignot, 1828.

CONCILIADOR do Reino Unido. Rio de Janeiro: ImpressãoRégia, 1821.

CONSIDERAÇÕES sobre a doutrina econômica de J. B. Say.Minerva Brasiliense, Rio de Janeiro, 1844. T. II.

____. Minerva Brasiliense, Rio de Janeiro, 1845. T. III.

CONTESTAÇÃO à história e censura de Mr. de Pradt sobre ossucessos do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1825.

CONTRADITA a Mr. Chapuis. Rio de Janeiro: [Tip. PlancherSeignot], 1826.

CONSTITUIÇÃO moral e deveres dos cidadãos. Rio de Janeiro:Tip. Nacional, 1824.

CRÔNICA autêntica da Regência do Brasil do Príncipe Real o Sr.D. Pedro de Alcântara. Rio de Janeiro: [s.n.], 1829.

DA LIBERDADE de trabalho. Guanabara, Rio de Janeiro, 1851.T. I.

DEFESA contra o ataque, do Pe. Feijó ao Velho Canonista. Riode Janeiro: Tip. Plancher- Seignot, 1828.

DEFESA da “Reclamação do Brasil”. Rio de Janeiro: Tip.Nacional, 1822.

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128

DESAFRONTA do Brasil a Buenos Aires desmascarado. Rio deJaneiro: Tip. Nacional, 1825.

DESFORÇO patriótico contra o libelo do português anônimo deLondres, inimigo da independência do Brasil. Rio deJaneiro: Tip. Nacional, 1825.

DESPERTADOR brasiliense. Rio de Janeiro: Impressão Régia,1821.

DIÁLOGO entre filósofo e pastor. Rio de Janeiro: ImpressãoRégia, 1821.

DISCURSO pronunciado na sessão de 18 de junho. Rio deJaneiro: Tip. Plancher-Seignot, 1832.

EDITAL de José da Silva Lisboa, Diretor de Estudos. Rio deJaneiro: Impressão Régia, 1821.

EDITAL dos mestres e professores de aulas públicas. Rio deJaneiro: Impressão Régia, 1821.

ELOGIO do Conde de Linhares. In: Investigador Português.Londres: [s.n.], 1812.

ENSAIO econômico sobre o influxo da inteligência humana nariqueza e prosperidade das nações. Guanabara, Rio deJaneiro, 1851. T. I.

ENSAIO sobre o estabelecimento de bancos. Rio de Janeiro:Impressão Régia, 1812.

ESCOLA brasileira ou instrução útil a todas as classes. Rio deJaneiro: Tip. Plancher-Seignot, 1827.

ESPÍRITO da Proclamação do Sr. D. Pedro à nação portuguesa.Rio de Janeiro: Tip. de P.Plancher-Seignot, 1828.

ESPÍRITO de Vieira. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1821.

ESTUDOS do Bem Comum e Economia Política. Rio de Janeiro:Impressão Régia, 1819.

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129

____. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1820.____. 2.ed. Rio de Janeiro: IPEA, 1976.

EXORTAÇÃO aos baianos sobre as conseqüências do hórridoatentado da sedição militar cometido na Bahia em 25 deoutubro de 1824. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824.

EXTRATOS das obras políticas e econômicas de Edmundo Burke.Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1812.

____. 2.ed. Lisboa: Viúva Neves & Filho, 1822.

FALSIDADE do correio e reverbero contra o escritor dasReclamações do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1822.

GLOSA à Ordem do Dia e manifesto de 14 de janeiro de 1822 doex-General das Armas Jorge de Avilez. Rio de Janeiro: Tip.Nacional, 1822.

GUERRA de pena contra os demagogos de Portugal e do Brasil.Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824.

HEROICIDADE brasileira. Rio de Janeiro, 1822 – (apreendidopela censura).

HISTÓRIA curiosa do mau fim de Carvalho & Companhia àbordoada de pau-brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824.

HISTÓRIA dos principais sucessos políticos do Império doBrasil. Rio de Janeiro: Tip. Imperial, Nacional eConstitucional, 1827.

____. Rio de Janeiro: Tip. Imperial, Nacional e Constitucional,1830.

HONRA do Brasil desafrontada de insultos: de Astréa espadachina.Rio de Janeiro: Tip. Plancher-Seignot, 1828.

IMPÉRIO do Equador na Terra de Santa Cruz. Rio de Janeiro:[s.n.], 1822.

____. Rio de Janeiro: [s.n.], 1823.

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130

INDEPENDÊNCIA do Império do Brasil, apresentadaaos Monarcas Europeus por Mr. Beauchamp. Rio de Janeiro:Tip. Nacional, 1824.

INTRODUÇÃO à história dos principais sucessos políticos doImpério do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1825.

INVIOLABILIDADE da Independência e Glória do Império doBrasil. Rio de Janeiro: Tip. Plancher-Seignot, 1826.

LEITURAS de Economia Política ou Direito Econômico. Rio deJaneiro: Tip. Plancher-Seignot, 1827.

MANIFESTO da Espanha, circulando confidencialmente emMadri, sobre os negócios do Sul da América. Rio de Janeiro:Tip. Nacional, 1822.

MANUAL de política ortodoxa. Rio de Janeiro: Tip. Nacional,1832.

MEMÓRIA da Revolução de 1828. [S.l.]: Arquivo Nacional, [s.d.].(Inédito).

MEMÓRIA da vida e virtudes da Arquiduquesa d‘Áustria, D.Mariana. Rio de Janeiro, 1821 (A impressão não terminou).

MEMÓRIA da vida pública de Lord Wellington. Rio de Janeiro:Impressão Régia, 1815.

MEMÓRIA dos benefícios políticos do governo d’El Rei, NossoSenhor, D. João VI. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1818.

____. 2.ed. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1940.

MEMÓRIA econômica sobre a franqueza do comércio dos vinhosdo Porto. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1812.

MEMORIAL apologético das Reclamações do Brasil. Rio deJaneiro: Tip. Nacional, 1822.

NOTAS, continuação das notas e fim das notas ao despachocircular do Congresso de Laybach. Rio de Janeiro: ImpressãoRégia, 1821.

Page 132: Visconde de Cairu

131

OBSERVAÇÕES sobre a franqueza de indústria e estabelecimentode fábricas no Brasil. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1810.

____. 2.ed. Bahia: Manuel Antônio da Silva Serva, 1811.

OBSERVAÇÕES sobre a prosperidade do Estado pelos liberaisprincípios da nova legislação do Brasil. Rio de Janeiro:Impressão Régia, 1810.

____. 2.ed. Bahia: Manuel Antônio da Silva Serva, 1811.

OBSERVAÇÕES sobre o comércio franco do Brasil. Rio deJaneiro: Impressão Régia, 1808.

____. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1809.

O HOMEM. [S.l.:s.n, s.d.]. (Inédito).

PARECER acerca de vários quesitos relativos às moedas dePortugal e do Brasil (1816). Rio de Janeiro: ArquivoNacional, 1958.

PESCA de tubarões do Recife em três revoluções dos anarquistasde Pernambuco. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824.

PLANO do Código do Comércio (1809). Rio de Janeiro: ArquivoNacional, 1958.

POEMA à Economia Política. [S.l.:s.n, s.d.]. (Perdido, segundo J.M. Macedo).

PRECEITOS da vida humana; ou obrigações do homem e damulher. Rio de Janeiro: Eduardo & Henrique Laemmert,[18—].

PRINCÍPIOS da Arte de Reinar do Príncipe Católico. Rio deJaneiro: Tip. Nacional, 1832.

PRINCÍPIOS de Direito Mercantil e Leis de Marinha. Lisboa: RégiaOficina Tipográfica, 1798.

____. 6.ed. Rio de Janeiro: Tip. Acadêmica, 1874.____. 7.ed. Rio de Janeiro: Ministério da Justiça e Negócios

Interiores, 1963.

Page 133: Visconde de Cairu

132

PRINCÍPIOS de Economia Política. Lisboa: Impressão Régia,1804.

____. 2. ed. Rio de Janeiro: Pongetti, 1956.

PROJETO do Código Comercial pelo Senador Barão de Cairu(1826). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1958.

PROSPECTO do novo periódico “Sabatina Familiar aos Amigosdo Bem Comum”. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1821.

PROTESTO do Diretor dos Estudos contra o acordo da JuntaEleitoral da paróquia de S. José. Rio de Janeiro: Tip.Nacional, 1822.

QUARTEL das Marrecas. Rio de Janeiro: [Tip. Nacional], 1823.

RAZÕES dos lavradores do Vice-Reinado de Buenos Aires. Riode Janeiro: Impressão Régia, 1810.

REBATE brasileiro contra o Typhis Pernambucano. Rio de Janeiro:Tip. Nacional, 1824.

RECLAMAÇÃO do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1822.

RECORDAÇÃO dos direitos do Império do Brasil à ProvínciaCisplatina. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1826.

REFLEXÕES sobre o comércio de seguros. Rio de Janeiro:Impressão Régia, 1810.

____. 2. ed. Rio de Janeiro: Tip. Americana , 1874.

REFUTAÇÃO das declamações contra o comércio inglês. Rio deJaneiro: Impressão Régia, 1810.

REGIMENTO dos Cônsules. [S.l.:s.n], [18—]. (Inédito).

REGRAS da praça ou bases do regulamento comercial. Rio deJaneiro: Tip. Nacional, 1832.

____. 2.ed. Rio de Janeiro: Tip. Acadêmica, 1874.

ROTEIRO Brasílico. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1822.

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133

SABATINA Familiar aos Amigos do Bem Comum. Rio deJaneiro: Impressão Régia, 1821/1822.

SINOPSE da legislação principal do Sr. D. João VI. Rio deJaneiro, 1818.

____. 2.ed. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1940.

STAPLETON, A. G. Vida política de Mr. Jorge Canning. Cap.IX. [S.l.:s.n., s.d.]. (Anotações à tradução feita Miguel MariaLisboa).

SUA MAJESTADE Imperial o Sr. D. Pedro é soberano pelo seumesmo título de Imperador Constitucional do Brasil. Rio deJaneiro: [s. n.], 1828.

SUBSTÂNCIA da fala do Visconde de Cairu ao Senado sobre areforma da Constituição em 30 de maio de 1832. Rio deJaneiro: Tip. Imp. e Const. De Seignot-Plancher & Cia., 1832.

SUBSTÂNCIA das falas etc., sobre a 3a proposição do projetode reforma da Constituição a 8 e 14 de junho. Rio de Janeiro:Tip. Imp. e Const. De Seignot-Plancher & Cia., 1832.

SUPLEMENTO à Constituição Moral. Rio de Janeiro: Tip.Nacional, 1825.

SUSTENTAÇÃO jurídica do tratamento de Soberano quecompete à Sua Majestade Imperial. Rio de Janeiro: DiárioFluminense, 1828.

TRAMÓIA dos Tamoios. Rio de Janeiro: [Tip. Nacional], [18-].

TRIUNFO da legitimidade contra a facção dos anarquistas. Riode Janeiro: Tip. Nacional, 1825.

____. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1826.

VIGIA da Gávea. Rio de Janeiro: [Tip. Nacional], 1823.

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134

C R O N O L O G I A

16-07-1756 Nascimento em Salvador.

1772 Viagem de estudos para Portugal.

10-10-1774 Ingresso no Curso de Direito da Universidade deCoimbra.

23-11-1778 Obtenção por provas da Carta Régia deSubstituto Ordinário de Grego e Hebraico daUniversidade de Coimbra.

08-06-1779 Conclusão do curso na Universidade.

10-06-1779 Outorga da Carta de Formatura.

01-10-1779 Carta de D. Martinho de Mello e Castroapresentando José da Silva Lisboa ao Marquêsde Valença, Governador do Brasil.

Início de 1780 Nomeação para o cargo de Ouvidor de Ilhéus.

02-02-1780 Ordem para abertura de inquérito sobreescândalos ocorridos no foro de Ilhéus emadministrações anteriores.

24-02-1780 Edital exigindo o pagamento de fintas eobrigando o plantio de mandioca.

03-03-1780 Providências sobre a crise de farinha e expulsãode malfeitores.

14-03-1780 Representação contra o cadete AntônioRodrigues de Figueiredo.

28-04-1780 Comunicação do naufrágio do capitão Mor.

25-08-1780 Nova representação contra o cadete AntônioR. de Figueiredo e contra o Capitão-Mor.

18-10-1781 Importante carta dirigida ao Dr. Vandelli, deLisboa.

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135

29-11-1782 Provimento na cátedra de Filosofia, de Salvador.

04-06-1783 Idem, idem, de língua grega na mesma cidade.

junho 1783 Exploração da Serra de Cachoeira paradescoberta de mina de cobre.

11-01-1784 Novas explorações na mesma serra.

19-01-1784 Carta a Martinho de Melo e Castro considerandoduvidosa a existência da mina de cobre emCachoeira.

11-02-1784 Carta a D. Martinho de Melo e Castro sobre acultura de tabaco e fundação de uma sociedadepara desenvolvimento da agricultura.

19-04-1784 Casamento com D. Ana Francisca Benedita deFigueiredo.

1787 Substituição na cadeira de grego por Luiz dosSantos Vilhena.

14-08-1787 Carta de D. Rodrigo José Menezes comunicando,ao Ministro da Marinha e Ultramar a concessãode licença para que José da Silva Lisboa fosseao Reino.Viagem a Portugal.

1796 Conhecimento das teorias de Adam Smith porintermédio de Antônio de Moraes Silva.

início de 1797 Viagem a Portugal.

20-02-1797 Jubilação no cargo de prof. de Filosofia.

04-09-1797 Nomeação para o cargo de Deputado e Secretárioda Mesa de Inspeção da Bahia.

27-07-1798 Posse neste cargo.28-03-1799 Ofício propondo um prêmio para Joaquim

Sequeira Bulcão.

29-03-1799 Proposta para compra dos trapiches em que seencontrava a Mesa de Inspeção da Bahia.

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136

1802 Viagem a Lisboa.

28-01-1808 Abertura dos portos do Brasil às nações amigas.

23-02-1808 Nomeação para prof. de Economia Política, no Riode Janeiro.

26-02-1808 Viagem para o Rio de Janeiro.

07-03-1808 Chegada ao Rio de Janeiro.

22-04-1808 Nomeação para o cargo de Desembargador daMesa do Desembargo do Paço e da Consciênciae Ordens.

13-05-1808 Nomeação para membro da Junta Diretora daImprensa Régia.

23-07-1808 Nomeação para Deputado à Junta do Comércioe Agricultura, Fábricas e Navegação do Estadodo Brasil.

16-11-1808 Nomeação para Desembargador da Relação daBahia, com exercício e Deputado da Real Juntade Comércio.

31-08-1811 Morte da esposa.

14-10-1814 Nomeação para o cargo de Censor Régio.

06-08-1818 Nomeação para Desembargador da Casa deSuplicação.

03-05-1819 Obtenção do título do Conselho de S. M.Fidelíssima.

23-02-1821 Nomeação para membro da Comissãopreparatória da reunião dos procuradores dascidades e vilas do Brasil e ilhas do Atlântico.

26-02-1821 Nomeação para o cargo de Inspetor dosEstabelecimentos Literários ou Diretor dosEstudos e Museus.

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137

04-04-1821 Nomeação para Desembargador dos Agravos daCasa de Suplicação.

08-04-1821 Eleito 12o compromissário da freguesia de SãoJosé do Rio.

21-04-1821 Reunião dos eleitores paroquiais na Praça doComércio.

08-10-1823 Ingresso na Assembléia Constituinte para a qualfora eleito suplente de deputado.

20-10-1823 Deputado efetivo pela Bahia.

20-10-1823 Nomeado Desembargador Graduado do Paço.

12-10-1825 Nomeação para Chanceler da Relação da Bahia.

22-01-1826 Agraciado com o título de Barão de Cairu.

12-10-1826 Escolhido Senador do Império pela Província daBahia.

19-10-1828 Agraciado com o título de Visconde de Cairu.

05-08-1823 Aposentadoria no cargo de Desembargador doPaço.

20-08-1835 Morte no Rio de Janeiro.

Page 139: Visconde de Cairu

138

B I B L I O G R A F I A

ABRANTES, Marquês de. Discurso na Sociedade de Agricultura,Comércio e Indústria da Bahia. Bahia, 31 jan. 1839.

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Page 149: Visconde de Cairu

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Í N D I C E O N O M Á S T I C O

Abrantes, Marquês de 115, 124

Abreu, João Capistrano de 12, 53, 54

Aftalion, Albert 72

Agostinho, Santo 118

Aguiar, Marquês de – vide Portugal, Fernando José de

Aguiar e Souza, Antônio 26

Alegrete, Marquês de 100

Almeida, Cândido Mendes de 25, 69, 70, 124

Almeida, Cipriano Barata de 36, 37, 110, 115

Alorna, Marquês de 48

Amorim e Castro, Antônio 28

Amzalak, Moses Bensabat 58

Anadia, Visconde de – vide Sá, João Rodrigues de

Andrada Machado e Silva, Antônio Carlos Ribeiro de 119

Andrada e Silva, José Bonifácio de 16,110

Andrade, Mário de 8

Angeja, Marquês de – vide Noronha, José

Apeles 116

Araújo, Antônio de 49, 52, 53

Aristóteles 116

Arkwright, Richard 11

Artigas, José 120

Auchincloss, Louis 9

Avilez, Jorge 129

Bacon, Francis 116

Balbi, Adriano 114

Page 150: Visconde de Cairu

149

Bandeira, (Jacinto Fernandes da Costa?) 104

Barbacena, Marquês de 122

Barbacena, Visconde de 31

Barreto, Domingos Alves Moniz 121

Barros, Pedro José da Costa 116

Barros, Francisco Borges de 22, 23, 36, 38

Barros, João de 116

Beauchamp, Alphons de 130

Bellas, Marquês de – vide Vasconcelos e Souza, José de

Benevides, Inácio Antônio da Fonseca 57, 58

Bentham, Jeremy 43

Beviláqua, Clóvis 43, 44

Biancardi, Theodoro José 105

Bissell, Richard 9

Blackston, William 116

Blake, Augusto V. A. Sacramento 126

Bomfim, Manuel 102

Borges, Senador 122

Botado, Dr. 65

Branchamp 104

Brito, João Rodrigues de 34, 50, 56, 57

Bulcão, Joaquim Inácio da Siqueira 33, 56, 135

Burke, Edmund 13, 14, 15, 16, 37, 43, 50, 60,68, 86, 107, 111, 116, 122, 129

Cabral, Alfredo Vale 109, 110, 124, 126

Cadaval, Duque de 53

Cairu, Barão de – vide Lisboa, Bento da Silva

Caldas, Estanislau de Souza 121

Page 151: Visconde de Cairu

150

Calmon, F. M. de Góes 50, 51

Calmon, Pedro 18, 26, 32, 37,

Câmara, Manoel Ferreira 24, 56, 67

Camões, Luís de 116

Campos, João Silva 24

Canard, Nicolau 40,46

Canning, George 122, 133

Carvalho, Manuel de 16, 120

Carvalho, Sebastião José de 20, 34, 41, 93

Casas, Bispo Bartolomeo de las 66

Castelo Branco, José Diogo Ferraz 56

Castro e Almeida, Eduardo 21, 23, 25, 27, 28, 30, 31, 32, 33

Catão 115, 122, 124

Chapuis, Pierre 127

Cícero 115

Cipriano – vide Cipriano Barata de Almeida

Colbert, Jean Baptiste 41

Constant, Benjamin 116

Corte Real, David Pamplona 119

Cossa, Luigi 70

Costa, Cláudio Manoel da 13

Costa, F. A. Pereira da 40, 58, 86, 126

Costa, Francisco Nunes da 23

Coutinho, José Joaquim da Cunha de Azeredo 43

Coutinho, José Lino 45

Coutinho, Rodrigo de Souza 12, 15, 33, 48, 52, 53, 57, 59, 128

Crossmann, R. H. S 15

Cunha e Menezes, Francisco da 32

Page 152: Visconde de Cairu

151

Cunha e Menezes, Manuel da 20, 23

Dannemann, Robert N. 7

Dantas, Francisco Clementino San Tiago 88

Deiró, Eunápio 69

Dobb, Maurice 72

Duprat, Luís 105, 106

Dutra, José Soares 19, 80, 124

Engels, Friedrich 80, 84

Falcão, Manoel Lopes 26

Feijó, Diogo Antônio 110, 127

Ferreira, João 53

Ferreira, Silvestre Pinheiro 48, 100, 101

Figueiredo, Ana Francisca Benedita de 57, 135

Figueiredo, Antônio Alvares de 57

Figueiredo, Antônio Rodrigues de 22, 23, 134

Figueiredo, Izabel Antônia de 57

Fonseca, Pedro José 18

Forjaz, Djalma 44

Fourgeaud, A. F. 76

Fox, Charles James 122

Franklin, Benjamin 63

Furtado, Celso 77, 91

Galvão, Dr. 28

Garcia, Rodolfo 20, 109

Gibbon, Edmond 116

Gide, Charles 84

Gomes, Agostinho 36

Gonçalves, Pe. João 26

Page 153: Visconde de Cairu

152

Gonnard, Renê 79

Gouvêa, João Bandeira 106

Hamilton, Alexander 91, 92, 93, 94

Hawley, Cameron 9

Hayek, Friedrich A. von 72

Hicks, John R. 72

Holanda, Sérgio Buarque de 73, 74, 76

Homero 19

Hoppe, Fritz 94

James, Émile 78

Jarrold, Thomas 116

Jesus, Helena Nunes de 19

Jevons, William Stanley 46

João III (D.) 48

João IV (D.) 48, 69

João VI (D.) 13, 34, 37, 44, 48, 50, 51, 52, 54, 58, 59, 67,69, 71, 84, 85, 86, 88, 95, 97, 98, 100, 101,

104, 106, 108, 112, 113, 125, 133

José I (D.) 35, 48

Keynes, John Maynard 72, 84

Kindersley, Mrs. Nathaniel 18

Kirkland, Edward C. 92, 94

Klein, Lawrence 46

Koopmans, Tjelling 46

Lauderdale, James Maitland 62

Lavater, John Gaspar 116

Leão XIII, Papa 80

Levene, Rícardo 16, 70

Page 154: Visconde de Cairu

153

Lewis, Sinclair 8

Lima, Pedro de Araújo 117

Lima, Alceu Amoroso 25, 34, 73, 80

Lineo (Line), Carl von 31

Linhares, Conde de – vide Coutinho, Rodrigo de Souza

Lisboa, Antônio da Silva 36, 53

Lisboa, Bento da Silva 14, 46, 51, 57, 58, 126

Lisboa, Daniel da Silva 112

Lisboa, Domingos da Silva 37

Lisboa, Henrique da Silva 19

Lisboa, Míguel Maria 133

List, Frederico 77, 78, 79, 84

Lucrécio 116

Luiz XVI 11

Lumiar, Conde de – vide Cunha Menezes, Manuel da

Macamboa, Pe. Marcelino José Alves 104, 106

Macedo, Joaquim Manuel de 13

Macgrave, Jorge 31

Machado Neto, Brasílio 9

Maciel, Inocêncio da Rocha 110

Madeira, General Joaquim Pinto 112

Magalhães, Basílio de 120

Maria 1, (Da.) 23, 25, 32, 48, 91

Mariana d’Austria(Da.) 130

Marrocos, Luiz Joaquim dos Santos 85

Martius, Carl Friedrich Phillip 29

Marx, Karl 80, 84

Mauá, Visconde de 8

Page 155: Visconde de Cairu

154

Mawe, John 28, 29

Melo e Castro, Martinho de 20, 21, 25, 27, 28, 31, 134, 135

Menezes, Djacir 72

Menezes, Rodrigo José de 31, 135

Meyer, Augusto 7

Meyer, J. P . 15

Miranda, José Antônio 98

Moisés 118

Moniz, Heitor 50

Monroe, James 114

Mont’Alverne, Frei Francisco de 116

Monteiro, Tobias 54, 85

Montesquieu, Charles Secondant, Barão de 116, 122

Moraes, Alexandre José Mello 40, 50, 51, 53, 57, 59,99, 104, 105, 109

Morais, Eugenio Vilhena de 44, 69

Morais, Francisco 18

Napoleão Bonaparte 48, 65, 123

Nascimento, João de Deus 36, 38

Nassau, Maurício de 31

Nogueira, Antônio Barros da Silva 27

Noronha, José 53

Norris, Frank 8

Norton, Luiz 48

Odar, João Paulo 19, 116

Oliveira Lima, Manuel 49, 99

Palmela, Conde de 100

Paranaguá, Marquês de 125

Page 156: Visconde de Cairu

155

Pareto,Vilfredo 45, 46, 72, 84

Passos, John Dos 8

Paula, Luiz Nogueira de 71,72, 73

Payne, Thomas 15

Pedro I (D.) 49, 97, 100, 101, 109, 110, 111, 117,119, 121, 123, 124, 127, 128, 133

Pedro II (D.) 124

Penalva, Marquês de 101

Pereira, Marcelino da Silva 26

Pimentel, Inácio 36

Pinho, Wanderley 95, 96

Pitt, William 49, 122

Plínio 116

Pombal, Marquês de – vide Carvalho, Sebastião José de

Pombal (2o Marquês de) 53

Ponte, Conde da 50

Portugal, Fernando José de 12, 35, 51, 53, 54

Portugal, Tomaz Pompeu Vilanova 53, 54, 100

Portugal e Castro, Afonso Miguel 20, 21, 27, 134

Pradt, Dominique Dufour du 127

Prosser, W. H 9

Queirós, José Joaquim de 105

Quesnay, François 11, 13, 89, 90

Quintela, Joaquim Pedro 104

Quintela, Inácio Costa 101

Quintus 103

Ramos, João Pereira 106

Raynal, Guillaume Thomas François 14

Page 157: Visconde de Cairu

156

Ricardo, Davíd 70, 72Rist, Charles 84Rocha, José Joaquim 110Rocha Pitta, Sebastião da 122Rodrigues, José Honório 7, 121Roebuck, John 11Romero, Silvio 24Roosevelt, Franklin Delano 80, 81, 84Roscoe, William 122Rousseau, Jean Jacques 14Ruy, Afonso 12, 36, 38Sá, João Rodrigues de 53Saint Hilaire, Auguste de 116Sampaio, Frei Francisco de Santa Teresa Jesus 121Santos, Antonio Oliveira 6Santos, Manoel Faustino dos 36São Francisco, Barão de – vide Bulcão, Joaquim Inácio de SiqueiraSay, Jean Baptiste 40, 65, 127Schoonover, Lawrence 9Schumpeter, Joseph Alois 60, 92Sêneca 115Silva, Antonio de Moraes 13, 40, 58, 75, 85, 86, 126, 135Silva, Inocêncio F. da 126Silva, João Manuel Pereira da 50Silveira, Francisco Ferreira Paes da 31Silveira, Zenith Mendes da 77, 79Smith, Adam 13, 14, 15, 16, 40, 41, 45, 46, 47,

50, 54, 65, 69, 70, 73, 77, 78, 79, 81, 82,83, 84, 88, 89, 90, 114, 122, 125, 135

Page 158: Visconde de Cairu

157

Soares, José Nogueira. 106

Sócrates 115

Solon 122

Souza, Martim Afonso de 48

Souza, Otávio Tarquinio de 12, 37, 110

Spix, Johann Baptiste von 29

Sraffa, Peter 72

Stappelton, Auguste Granville 133

Stewart, Douglas 65

Strangford, Lord – vide Sydney, Percy Clinton.

Sydney, Percy Clinton 15, 49, 53, 59

Tácito 116

Tinbergen, Jan 46

Tiradentes 52

Torres, Lucas Dantas de Amorim 36

Torres, Joaquim José Monteiro 101

Turgot, Anne Robert Jacques 65

Ulisses 19

Valença, Marquês de – vide Portugal e Castro, Afonso Miguel

Vandellí, Domingos 20, 21, 24, 27, 31, 89, 134

Varnhagen, Francisco Adolfo 20, 101

Vasconcelos, Bernardo 102

Vasconcelos e Souza, José 51, 53, 54

Vattel, Emmerich 116

Veiga, Evaristo da 110

Viana, Hélio 16, 37, 108, 109, 110, 120, 126

Viana, Manoel Álvaro Souza Sá 69

Vieira, Antônio 19, 108, 128

Page 159: Visconde de Cairu

158

Vilhena, Luiz dos Santos 26, 32, 135

Villey, Daníel 84

Viner, Jacob 63

Virgens, Luiz Gonzaga das 36

Virgílio 116

Volney, Constantin François Chasseboeuf 14

Voltaire, François Marie Arouet de 83

Walras, Léon 46, 72

Watt, James 11

Wellington, Lord 86, 126, 130

Zeuxis 116

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