VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E A APLICAÇÃO DA LEI 11.340/2006...
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UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO
Curso de Direito
PAULO APARECIDO DIAS FERNANDES
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E A APLICAÇÃO DA LEI
11.340/2006 – “LEI MARIA DA PENHA”
Itatiba
2016
PAULO APARECIDO DIAS FERNANDES
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E A APLICAÇÃO DA LEI
11.340/2006 – “LEI MARIA DA PENHA”
Monografia apresentada ao Curso de
Direito da Universidade São Francisco,
Campus de Itatiba, como requisito
parcial para a obtenção do título de
Bacharel em Direito, sob orientação da
Profª. MS. Márcia Cáceres Dias
Yokoyama.
Itatiba
2016
PAULO APARECIDO DIAS FERNANDES
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E A APLICAÇÃO DA LEI
11.340/2006 – “LEI MARIA DA PENHA”
Monografia aprovada pelo Curso de Direito da Universidade São Francisco, como requisito
parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.
Data de aprovação: ___/___/____
Banca Examinadora:
______________________________________________________
Profª. MS. Márcia Cáceres Dias Yokoyama (Orientadora)
Universidade São Francisco
______________________________________________________
Prof.º Dr...................................................................... (Examinador)
Universidade São Francisco
Dedico aos amores da minha vida que
fazem que eu lute sempre, para minha
esposa Kátia Fernandes e aos meus
queridos filhos Ana Claudia, Diego
Vinicius e Caio Juliano. Todo esse esforço
foi para vocês que de uma maneira ou de
outra estiveram presentes na minha
jornada, seja me incentivando ou me
orientando nas dificuldades enfrentadas ao
longo do curso e em especial à minha
esposa Kátia Fernandes que foi a pessoa
que mais acreditou em mim e quando por
muitas vezes eu queria desistir, lá estava
ela me incentivando e me apoiando. Muito
obrigado à todos vocês pela paciência que
tiveram comigo.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Universidade São Francisco, em especial ao Campus de Itatiba, que
acreditando na capacidade e no diferencial dos alunos, investiu no curso de Direito em nossa
cidade, nos proporcionando uma qualidade de ensino fantástica, com professores dedicados e
compromissados com a Instituição.
Agradeço à minha Orientadora Professora Márcia Cáceres, que com toda sua serenidade
e dedicação me instruiu para a elaboração deste trabalho, mesmo sabendo de toda minha
dificuldade em desenvolver o tema, acreditou que eu era capaz.
Agradeço professora Roberta Cardoso, que esteve a todo o momento orientando e
torcendo por grandes resultados, afinal é evidente sua dedicação extrema e seu prazer em
ministrar as aulas de orientação da monografia.
Agradeço a atual Coordenadora do Curso de Direito Doutora Vanessa Cristina Moretti,
que sempre nos depositou confiança e serenidade, nos acalmando nos períodos mais complexos
do curso. Fica aqui registrada sua célebre frase de que “tudo vai dar certo, meus queridos
alunos”. Com toda essa serenidade, era impossível de não acreditar em suas sábias palavras.
Agradeço a todos meus professores e colegas de turma que de um modo ou de outro me
estimularam a continuar nessa empreitada e chegar até aqui, principalmente nos momentos de
maior dificuldade.
Agradeço também aqueles que mesmo indiretamente me incentivaram, me ajudaram e
me deram força e coragem para concluir mais um sonho de minha vida.
Agradeço, ainda, a todos que sempre estiverem comigo nessa caminhada, principalmente
aos meus filhos, Ana Claudia, Diego Vinicius e Caio Juliano que de certa forma me apoiaram
direta ou indiretamente na realização desse sonho.
No mais, não poderia deixar de fazer um agradecimento especial à minha querida esposa
Kátia Fernandes que acreditou no meu potencial e me deu toda a força necessária para
prosseguir. Vale aqui traçar algumas palavras sobre nossa vida. “Descobrimos juntos ao
longo da nossa caminhada que o casamento não é somente uma benção na igreja ou o
papel assinado em cartório! Trata-se de algo muito maior: é permanecermos juntos e se
apoiando o tempo todo, seja nos bons como nos momentos mais difíceis, mas vale
lembrar que foram nesses momentos é que nos fortalecemos muito mais para
continuarmos, com as graças de DEUS. Agradeço a você Kátia, por tudo que já fez por
mim, pelos momentos maravilhosos, pelos momentos ruins que passamos, mas foram
essenciais para nos amarmos sempre mais, enfim, que DEUS sempre nos ilumine e nos
dê força para continuarmos a vencer sempre nossos obstáculos”. Te amo”.
“A violência contra as mulheres é, talvez,
a mais vergonhosa entre todas as violações
dos direitos humanos. Enquanto ela
prosseguir, não poderemos dizer que
progredimos efetivamente em direção à
igualdade, ao desenvolvimento e à paz”.
Kofi Annam
RESUMO
O objetivo deste estudo é tentar compreender os motivos pelos quais certas mulheres se
conformam em conviver com seus parceiros numa relação violenta, visto que essa violência vem se
apresentando como um dos maiores problemas de saúde pública e precisa ser sanado com urgência,
posto que em muitos dos casos os danos são irreparáveis para essas mulheres. Trataremos das
medidas protetivas de urgência em relação à ofendida bem como as medidas impostas aos agressores,
e, ainda as outras inovações seja no âmbito, civil, penal e no cumprimento da pena pelo agressor,
trazidas pela lei 11.340/2006, analisando sua aplicação e sua eficácia. Analisaremos a violência de
gênero, trazendo um apanhado geral da violência doméstica contra a mulher, esclarecendo os tipos de
violência doméstica que estão descritos na lei. Depois dessa análise, abordaremos a
constitucionalidade de seus dispositivos e as mudanças na legislação, as quais visam aprimorar o
combate à violência, detalhando as medidas protetivas de urgência e sua disposição na lei. Apesar de
todos os avanços no combate a essa violência, muito ainda terá que se fazer principalmente no que se
refere ao preparo dos profissionais do poder público para lidar adequadamente com esses casos, além
de uma estrutura adequada e de equipe multidisciplinar que deveria acompanhar os casos mais
complexos, visando sempre à reestruturação do convívio conjugal. Traremos ainda dados estatísticos
que demonstram o grande número de desistências dos processos, onde se observa que os pedidos de
medidas protetivas requeridas é bastante grande, muito embora não prossigam com os processos até o
final da deslinde seja pela morosidade na apuração dos casos pela autoridade policial, pela vergonha
de expor mais ainda seus problemas de relacionamento, pelo grau de dependência financeira em
relação aos agressores, ou ainda pela intenção da vítima de não continuar com o caso, pois só queria
“dar um susto”. Observa-se que o Estado deve ter uma atuação mais efetiva no combate à violência
doméstica contra a mulher, seja no âmbito da sua proteção ou no âmbito da instrução social, onde o
poder público deverá ser mais atuante por se tratar de um problema social, seja com aprimoramento e
acompanhamento da educação, saúde, emprego, e assistência social.
Palavras-chave: Agressão, aplicabilidade, eficácia, Lei Maria da Penha, medidas protetivas, violência
doméstica.
ABSTRACT
The target of this study is try to understand the reasons why some women conform to live with
their partners in a violent relationship, since this violence has been presented as one of the greatest
public health problems and needs to be resolved urgently, since in many cases the damage is
irreparable for these women. We will address the urgent protective measures in relation to the offense
and the measures imposed on perpetrators, and also the other innovations is under civil, criminal and
enforcement of the sentence by the aggressor, brought by Law 11.340/2006, analyzing its application
and their effectiveness. We analyze gender violence, bringing an overview of domestic violence
against women, clarifying the types of domestic violence that are described in the law. After this
analysis, we discuss the constitutionality of its provisions and changes in legislation, which seek to
improve the fight against violence, detailing the urgent protective measures and its provision in the
law. Despite all the advances in combating this violence, much still has to be done, especially with
regard to the preparation of professionals in the government to properly deal with such cases, as well
as an appropriate structure and multidisciplinary team that should follow more complex cases, always
aiming at the restructuring of conjugal living. We will bring further statistical data showing the
number of dropouts processes, which shows that requests for required protective measures is quite
large, although not continue with the process until the end of disentangling is the delay in investigation
of cases by the authority police, the shame of exposing further their relationship problems, the degree
of financial dependence on the perpetrators, or the intention of the victims not to continue with the
case, as only wanted "to scare". It is observed that the state should have a more effective action in
combating domestic violence against women, whether under its protection or in social education
where the government should be more active because it is a social problem, be with improvement and
monitoring of education, health, employment, and social assistance.
Key - words: Aggression, applicability, effectiveness, Maria da Penha Law, protective measures,
domestic violence.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................. 11
CAPÍTULO I - ASPECTOS CULTURAIS E SOCIAIS DA VIOLÊNCIA CONTRA A
MULHER ....................................................................................................................................... 13
1.1 - CARACTERIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA .............................................................................. 13
1.2 - CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE VIOLÊNCIA .............................................................. 15
1.3 - DOS TIPOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA .......................................................................... 17
1.3.1 Formas de Violência Contra a Mulher ............................................................................... 20
1.3.2 Da Violência Doméstica Contra a Mulher ......................................................................... 22
1.4 - FATORES DE RISCO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER ....................................... 23
CAPÍTULO II - ASPÉCTOS GERAIS DA LEI 11.340/06 – “LEI MARIA DA PENHA” .... 25
2.1. - ORIGEM HISTÓRICA DA CRIAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA .............................. 25
2.2. - FORMAS TÍPICAS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER CONTIDAS NA LEI ........ 29
2.3. - PORQUE ESSAS MULHERES SE SUJEITAM À VIOLÊNCIA ........................................ 32
2.4. - CONSEQUÊNCIAS DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ........................................................ 34
CAPÍTULO III – ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DA LEI MARIA DA PENHA ........... 37
3.1. - DA CONSTITUCIONALIDADE DA LEI MARIA DA PENHA ........................................ 37
3.2. - ALTERAÇÕES TRAZIDAS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA PELA LEI 11.340/2006 41
CAPÍTULO IV – DAS MEDIDAS PROTETIVAS TRAZIDAS PELA LEI 11.340/2006 .... 45
4.1. - DAS PRINCIPAIS FORMAS DE PROTEÇÃO ................................................................... 45
4.2. - DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA EM RELAÇÃO À OFENDIDA ........... 49
4.3 - DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA QUE OBRIGAM O AGRESSOR.......... 54
4.3.1 Suspensão da posse ou restrição ao porte de armas .......................................................... 55
4.3.2 Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida .......................... 55
4.3.3 Vedação de condutas em relação ao agressor .................................................................... 56
4.3.4 Restrição ou suspensão de visitas aos dependentes ........................................................... 58
4.3.5 Fixação de alimentos provisionais ou provisórios ............................................................. 58
CAPÍTULO V – DA EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA E SUAS
CONSEQUÊNCIAS ...................................................................................................................... 60
5.1 - APLICABILIDADES DA LEI MARIA DA PENHA ............................................................ 60
5.2 - DA EFICÁCIA / INEFICÁCIA DA APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA .............. 63
5.3 - DADOS ESTATÍSTICOS DAS VARAS ESPECIALIZADAS E ANEXOS DA
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER (CAPITAL E INTERIOR) ........................ 68
CONCLUSÃO ................................................................................................................................ 74
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................ 75
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ADC - Ação Direta de Constitucionalidade
CAPS - Centros de Atendimento Psicossocial
CC – Código Civil
CEJIL - Centro pela Justiça e o Direito Internacional
CEP – Código de Endereçamento Postal
CLADEM - Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher
COMESP - Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e
Familiar do Poder Judiciário do Estado de São Paulo
CP – Código Penal
DEAM – Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher
LEP – Lei de Execuções Penais
OEA – Organização dos Estados Americanos
OMS - Organização Mundial da Saúde
ONG - Organização Não Governamental
ONGs - Organizações Não Governamentais
SINARM - Sistema Nacional de Armas
STF – Supremo Tribunal Federal
TJ – Tribunal de Justiça
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INTRODUÇÃO
O objetivo da presente monografia tem por escopo uma análise da violência de gênero
principalmente aquela ocorrida no âmbito familiar, bem como os motivos que levam os
agressores a agredirem suas companheiras, quando muitas vezes é a própria a mãe de seus
filhos, sendo que se questiona o porquê que na maioria dos casos esses agressores não são
denunciados para as autoridades judiciais.
Abordaremos os fatos mais corriqueiros que levam essas mulheres agredidas a não
denunciar seus agressores, seja por medo de maiores represálias, por vergonha de exporem
sua situação perante outras pessoas ou ainda o fato de acharem “que tudo pelo que passou não
vai dar em nada” e ainda estão amparadas nas desculpas de que irá ser criticada pela nossa
sociedade um tanto conservadora.
Demonstraremos ainda, que o problema da violência doméstica deve ser encarado
pelas autoridades com mais respeito e dignidade, visto que causam danos irreparáveis nessas
mulheres, causando-lhes problemas de saúde e psicológicos pelo resto de suas vidas.
Traremos as providências que foram adotadas pelas autoridades na tentativa de
combater esse tipo de violência, dentre eles os motivos que levaram a criação da Lei da Maria
da Penha – Lei 11.340/2006, que traz em seu texto a aplicação de medidas protetivas e
afastamento do agressor do convívio familiar, onde analisaremos algumas das medidas
protetivas de urgência, bem como uma análise de sua eficácia e/ou ineficácia da Lei.
No que se refere ao problema, faremos uma análise do por que os homens subjugam
suas mulheres como se fossem donos de suas vidas, podendo controlá-las como bem
entendesse. Também o porquê de muitas mulheres carregarem consigo a culpa por serem
vítimas dessa violência por muitos anos e permaneceram em silêncio para tentar manter o
relacionamento ou por não quererem se separar, inclusive, por proteção aos filhos que
ficariam totalmente desamparados.
Questionaremos o porquê de tanta violência, sendo constantemente defendida nos
tribunais pela justificativa da “defesa da honra” masculina. Infelizmente ainda existem várias
pessoas que insistem em dizer que em problema de casal dever ser resolvido entre quatro
paredes, ou seja, não devemos nos meter em briga de marido e mulher, entre outras desculpas.
Também, o fato de que algumas mulheres utilizam inadvertidamente os mecanismos
da Lei para tentar cessar a violência que sofrem em suas casas, visto que somente querem
aplicar um susto nesses agressores, achando que com isso resolveriam seus problemas.
Embora sejam orientadas pela Autoridade Policial que deverão dar continuidade aos
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processos judiciais, infelizmente não fazem isso, pois, passados alguns dias ou até mesmo
horas, estão juntos novamente, já se reconciliaram com falsas promessas de seus agressores.
Por isso, para que haja uma melhor aplicabilidade da Lei Maria da Penha no que tange
às mulheres vítimas de violência doméstica, deverá haver uma melhor conscientização na sua
aplicação, bem como será preciso que, conjuntamente a lei, ocorra aplicação de políticas
públicas em todos os segmentos sociais e institucionais, no sentido de transformar novas
relações entre as pessoas e de modo a melhorar o seu convívio.
Deverá, ainda, identificar as medidas de assistência, proteção e amparo às vítimas de
agressão doméstica; reconhecer as providências preventivas que garantiriam a segurança da
mulher no lar e conhecer a aplicabilidade das medidas protetivas da lei “Maria da Penha”, sua
eficácia e validade social, tanto no que tange seu caráter preventivo quanto sancionador.
Demostraremos que com a vigência da Lei 11.340/2006, existem vários mecanismos
para que a autoridade policial, detectando a natureza do problema, possa intervir de imediato
para que se providenciem medida de proteção àquela vítima através do Judiciário, entre outras
cautelas, garantir proteção policial quando necessário e encaminhamento da ofendida ao
hospital, posto de saúde, ou ao Instituto Médico Legal, fornecendo-lhe transporte a ela e a
seus dependentes, para abrigo ou local seguro quando houver risco de vida, também,
acompanhar se necessário à retirada de seus objetos pessoais do local do fato ou do domicílio
familiar, e ainda informar à ofendida os direitos a ela conferidos na Lei.
Vale lembrar que em caso de desobediência do agressor dê-se manter afastado, poderá
ser decretada sua prisão preventiva. É nesse ponto que pretendo enfatizar meu trabalho, pois
somos sabedores da ineficiência do Estado em proporcionar tal proteção.
Destarte, a lei “Maria da Penha” seria um mecanismo de prevenção, proteção e
punição aos crimes domésticos atentados contra a mulher, porém, nota-se pouca eficácia na
aplicação das medidas protetivas prevista na referida Lei, pela falta de estrutura
disponibilizada pelo poder público o que podemos ver nos dados estatísticos apresentados no
presente trabalho.
Enquanto isso, nossas valorosas mulheres, vítimas dessas agressões, infelizmente são
assassinadas, agredidas por seus companheiros, mesmo, em tese, protegidas e sobre o manto
da Lei Maria da Penha.
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CAPÍTULO I
ASPECTOS CULTURAIS E SOCIAIS DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER
1.1. CARACTERIZAÇÃO DE VIOLÊNCIA.
Para começarmos a falar sobre o tema “Violência Doméstica contra a Mulher”, ou
violência do gênero, como também é conhecida, primeiramente devemos conhecer o conceito
da palavra violência.
Em nosso vocabulário, o termo violência se define como sendo o comportamento ou
conjunto de comportamentos que visem causar dano a qualquer pessoa, ser vivo ou objeto.
Trata-se de um vocábulo que deriva do latim, “violentia”, que deriva do prefixo “vis”, que por
sua vez quer dizer força, vigor, potência ou impulso.
Muito embora possamos obter muitos significados, muitas razões e ainda diversas
consequências, seja das manifestações mais sutis e despercebidas pela sociedade, visto tratar-
se de um comportamento cada vez mais agressivo. Infelizmente, estão fazendo parte do nosso
cotidiano até às mais cruéis formas de tortura, pois, essa violência se trata de um
comportamento deliberado e consciente de seus agressores, cujas consequências podem
provocar graves lesões corporais ou mentais à vítima.
Para considerarmos como violência de gênero, podemos dizer que é aquela exercida
por uma pessoa sobre a outra e do sexo oposto. Em se tratado de violência doméstica o sujeito
passivo é do gênero feminino. Alguns entendem como violência machista ocorrida no âmbito
familiar.
Teremos no caso do presente tema, primeiramente abordar a chamada violência de
gênero, distinguindo suas origens, características, manifestações e possíveis causadores dessa
violência.
Segundo artigo publicado por Miguel (2008) define:
“A violência baseada no gênero é aquela decorrente das relações entre
mulheres e homens, e geralmente é praticada pelo homem contra a mulher,
mas pode ser também da mulher contra mulher ou do homem contra homem.
Sua característica fundamental está nas relações de gênero onde o masculino
e o feminino, são culturalmente construídos e determinam genericamente a
violência”.
Ainda, conforme publicação em uma revista feminina de circulação nacional, Almeida
(1994) descreve que:
14
”Violência, seria o uso de meios capazes de imprimir sofrimento ou
destruição do corpo humano, bem como meio que podem degradar ou
causar transtorno à integridade psíquica do ser humano”.
Esse tipo de violência atua contra a integridade física, psíquica e moral do ser humano,
neste caso, em específico, a da mulher, não havendo, portanto, qualquer distinção de classe,
cor, nível social, etnia ou faixa etária.
Muito embora possamos descrever muitos casos de violência ao longo da história,
observamos que nos últimos anos a violência se tornou um problema grave e um tema central
para ser discutido por toda sociedade, devendo ser amplamente discutida e estudada por várias
áreas do conhecimento, passando a se tornar um grande desafio a ser enfrentado pela
sociedade contemporânea.
Na análise de Cavalcanti (2007), a violência se constitui como:
“Um ato de brutalidade, abuso, constrangimento, desrespeito, discriminação,
impedimento, imposição, invasão, ofensa, proibição, sevícia, agressão física,
psíquica, moral ou patrimonial contra alguém e caracteriza relações
intersubjetivas e sociais definidas pela ofensa e intimidação pelo medo e
terror”.
Como podemos observar se caracteriza principalmente como sendo uma questão social
grave e delicada, estando presente tanto nos países desenvolvidos, como nos países
subdesenvolvidos.
Para Teles e Melo (2003),
“Violência se caracteriza pelo uso da força, psicológica ou intelectual para
obrigar outra pessoa a fazer algo que não está com vontade; é constranger, e
tolher a liberdade, é incomodar, é impedir a outra pessoa de manifestar seu
desejo a sua vontade, sob pena de viver gravemente ameaçada ou até mesmo
ser espancada, lesionada ou morta. É um meio de coagir, de submeter outrem
ao seu domínio, é uma violação dos direitos essenciais do ser humano. A
Violência muitas vezes é utilizada de forma sutil, ou seja, aquele que agredi
toma certo cuidado para dominar o estado emocional do outro, deixando o
mesmo sempre em alerta, com medo do que possa acontecer se tiver alguma
reação contrariando o agressor”.
Além do mais, essa violência esteve presente em todos os períodos de nossa história, e
como já dissemos, podendo se caracterizar como física, psicológica, sexual, urbana,
institucional, intrafamiliar, de trânsito, enfim, pode ser desencadeada de diversas maneiras em
nossa sociedade.
Trata-se de uma das formas de tentativa de dominação de uma classe social sobre a
outra, ou ainda, de uma pessoa sobre a outra, seja simplesmente pela tentativa de impedir
alguém de se expressar e de tomar suas próprias decisões.
15
Deste modo trata seus desafetos como sendo inferiores intelectualmente ou
socialmente, caracterizando-se também como sendo violência.
1.2. CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE VIOLÊNCIA.
Segundo estudos e definição da Organização Mundial da Saúde – OMS, as violências
podem ser caracterizadas pelo:
“O uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si
próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou comunidade que possa
resultar em ou tenha alta probabilidade de resultar em morte, lesão, dano
psicológico, problemas de desenvolvimento ou privação”. (OMS, 2002).
Podendo, ainda, ser classificada, em três tipos de categorias: a violência interpessoal, a
violência auto infligida, ou seja, dirigida contra si mesmo e, ainda, a violência coletiva, que se
destaca pelos atos violentos que acontecem no âmbito macrossocial, político e econômico,
visto se caracterizar pela dominação de grupos e do estado.
Segundo relatório da OMS 2002, podem ser descriminadas como:
a) Violência interpessoal: que pode ser física ou psicológica. Podendo
ocorrer em espaços públicos ou privados. Podem, ainda, ser classificadas em
dois âmbitos: seja no âmbito da violência intrafamiliar ou doméstica, seja
entre parceiros íntimos ou membros da família, e, no âmbito da violência
comunitária ou da violência que ocorre no ambiente social em geral,
podendo ocorrer entre conhecidos e desconhecidos. Destacam-se, ainda a
violência entre jovens, contra crianças e adolescentes e a violência sexual.
b) Violência contra si mesmo: também denominada violência auto infligida,
que é muito comum em todo o mundo. Destacam-se nesses casos, os
suicídios, as tentativas de suicídios, as ideações de se matar e de se
automutilar; e,
c) Violência coletiva: que em sua classificação podemos incluir ainda duas
outras subespécies: violência social (que ocorre em razão das desigualdades
socioeconômicas em países desenvolvidos e subdesenvolvidos) e a violência
urbana (que ocorrem nas cidades seja em forma de crimes eventuais ou em
razão do crime organizado).
Ainda, no que se refere à sua natureza, classificam como atos violentos aqueles em
que haja: abuso físico, psicológico, sexual, envolvendo ainda o abandono, negligência e
privação de cuidados.
Baseando nas definições supramencionadas, não estariam incluídos nesse tipo de
violência, os incidentes não intencionais, tais como as lesões ocasionadas por quedas,
queimaduras ou por acidentes de trânsito, dentre outras.
Para Odália (1983), a violência se apresenta de várias formas:
16
Violência Social – “certos atos violentos que: ou atingem, seletiva e
preferencialmente, certos segmentos da população – os mais desprotegidos,
evidentemente – ou, se possuem um alcance mais geral, são apresentados e
justificados como condições necessárias para o futuro da sociedade”, por
exemplo, quando os governantes dão prioridades ao desenvolvimento
econômico e desprezam as medidas, ou essas se apresentam de forma
incipiente em relação à fome, ao analfabetismo, ao trabalho infantil, à
violência intrafamiliar e outros ”.
Violência Política – “não é somente a ação de terroristas: podem ser um
assassinato político, a invasão de um país por outro, o desaparecimento de
dissidentes, legislação eleitoral que frauda a opinião pública, leis que não
permitem às classes sociais, especialmente operariado, organizar seus
sindicatos”.
Violência Revolucionária – “pode expressar-se tanto pelo atentado político
individualizado, pelo terrorismo contra grupos, por lutas armadas, greves,
quanto por ações de grupos ou indivíduos que antes expressam suas
frustações e confusões ideológicas e mentais do que propriamente suas
convicções políticas de transformação social”.
A autora ainda nos mostra o aspecto da classificação da violência conforme a seguir
demonstrado:
A violência estrutural – “que se refere às estruturas organizadas e
institucionalizadas como, por exemplo, à família, bem como os sistemas
econômicos, culturais e políticos que lavam a opressão de grupos, classes,
nações e indivíduos, sendo-lhes negados direitos sociais tornando esses mais
vulneráveis que os outros em relação ao sofrimento e à morte”.
A violência de resistência: “entendida como uma resposta dos grupos,
classes, nações e indivíduos oprimidos à violência estrutural, sendo
contestada e reprimida pelos "eus", detêm o poder político, econômico
e/cultural e mobiliza controvérsias por se responder à violência com
violência”.
A violência da delinquência – “constitui-se como aquela que se expressa nas
ações fora das leis legitimadas pela sociedade e que não podem ser
compreendidas, isoladas da violência estrutural, que dentro traz aspectos que
contribuem para sua expansão, dentre eles, desigualdade, comunismo,
machismo, alienação, menosprezo de valores e normas”. (ODÁLIA 1983)
Como podemos observar, o fenômeno da violência tem como característica principal a
pluralidade de interpretações, por isso, torna-se difícil uma explicação plausível, visto que de
um lado estão os que sustentam a violência como sendo um resultado de necessidades
biológicas, psicológicas ou sociais. Por outro lado, observamos que existem pessoas definindo
a violência, como sendo somente uma causa do social.
Vimos então, certas dificuldades para uma definição e classificação precisa sobre a
violência, posto que seja objeto de muitas interpretações e explicações das suas causas.
Devemos, então, ao tentar uma explicação para esse fenômeno chamado violência,
levar em conta tudo que nos é apresentado, principalmente os aspectos envolvidos, somente
17
então nos possibilitará uma compreensão mais abrangente, sejam elas no aspecto cultural,
psicológico, político, jurídico ou biológico. Necessário, então, analisarmos seus diversos
contextos e significados, visto que não nos possibilita uma generalização em relação a seus
conceitos, classificação, causas e consequências.
1.3. DOS TIPOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA.
Segundo estudos apresentados pelo CNJ - Conselho Nacional de Justiça, destacaremos
a seguir, em linhas gerais os tipos de violência a que nossa sociedade está sujeita, seja ela de
classe intermediária, média ou alta:
a) Violência física: trata-se da ação ou omissão de alguém que coloque em risco
ou cause danos à integridade física de outra pessoa;
b) Violência institucional: é tipo de violência motivada por desigualdades, sejam
elas de gênero, étnico-raciais ou econômicas, pois se formalizam e institucionalizam nas
diferentes organizações privadas e aparelhos estatais, como também nos diferentes grupos que
constituem essas sociedades;
c) Violência psicológica: seja ela por ação ou omissão. É destinada a degradar ou
controlar as ações, comportamentos, crenças e decisões de outra pessoa por meio de
intimidação, manipulação, ameaça direta ou indireta, humilhação, isolamento ou qualquer
outra conduta que implique prejuízo à saúde psicológica, à autodeterminação ou ao
desenvolvimento pessoal;
d) Violência sexual: é o tipo de ação que obriga uma pessoa a manter contato
sexual, físico ou verbal, ou a participar de outras relações sexuais com uso da força,
intimidação, coerção, chantagem, suborno, manipulação, ameaçar ou utilização qualquer
outro mecanismo que possa anular ou limita a vontade pessoal, considerando ainda os casos
em que o agressor obriga a vítima a realizar alguns desses atos com terceiros;
e) na legislação penal brasileira, considera ainda como violência sexual, aquela
que pode ser realizada de forma física, psicológica ou com ameaça, compreendendo o estupro,
a tentativa de estupro, o atentado violento ao pudor e o ato obsceno;
f) Violência de gênero: trata-se daquela violência sofrida pelo fato de se ser
mulher, sem distinção de raça, classe social, religião, idade ou qualquer outra condição,
vítima de um sistema social que subordina o sexo feminino;
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g) Violência moral: é aquela ação que se destina a caluniar, difamar ou injuriar a
honra ou a reputação da mulher;
h) Violência patrimonial: é o ato de violência que pode implicar em danos, perda,
subtração, destruição ou retenção de objetos, documentos pessoais, bens e valores;
i) Violência doméstica: pode ocorrer no ambiente doméstico, casa, apartamento,
ou em qualquer lugar que haja uma relação de familiaridade, afetividade ou coabitação:
j) Violência contra a mulher: é qualquer conduta - ação ou omissão - de
discriminação, agressão ou coerção, ocasionada pelo simples fato de a vítima ser mulher e que
cause danos, morte, constrangimento, limitação, sofrimento físico, sexual, moral, psicológico,
social, político ou econômico ou perda patrimonial. Essa violência pode acontecer tanto em
espaços públicos como privados.
k) Violência familiar: é aquela que acontece dentro da família, ou seja, nas
relações entre os membros da comunidade familiar, formada por vínculos de parentesco
natural (pai, mãe, filha etc.) ou civil (marido, sogra, padrasto ou outros), por afinidade (por
exemplo, o primo ou tio do marido) ou afetividade (amigo ou amiga que more na mesma
casa);
l) Violência intrafamiliar/violência doméstica: acontece dentro de casa ou
unidade doméstica e geralmente é praticada por um membro da família que viva com a
vítima. As agressões domésticas incluem: abuso físico, sexual e psicológico, a negligência e o
abandono.
Segundo Cavalcanti (2007):
“A violência doméstica constitui-se num problema global e que atinge não
só a mulher, mas crianças, adolescentes e idosos, sendo este decorrente da
desigualdade nas relações entre homens e mulheres, assim como da
discriminação nas relações de gênero, existente de modo geral na sociedade
e na família”.
A violência contra a mulher já existe desde muito tempo, visto que desde a época das
cavernas ela era humilhada por seu companheiro, sendo que desde aquela época até os dias
atuais, a mulher tem passado por gravíssimas violações em seus direitos primordiais,
inclusive, como o direito à vida e à liberdade.
Nossa sociedade tem um histórico machista, onde os homens podiam tudo e as
mulheres não podiam nada, ou seja, eram deliberadamente limitadas para manifestar suas
ideias, fato esse que vem mudando como o passar dos anos, pois, estão conseguindo
19
demonstrar suas capacidades e estão mais independentes, porém ainda sofrem com certas
atitudes machistas.
Essa violência foi construída histórica e culturalmente, sejam por atitudes que visam
demonstrar o poder sobre as mulheres, mantendo, assim, as desigualdades existentes entre os
dois sexos, perpetuando-se na desvalorização do feminino e sua subordinação ao
companheiro.
Segundo Silva (1992):
“Há muito tempo as mulheres denunciam sua condição de vítima da
violência doméstica, tendo o fenômeno do espancamento de esposas e de
agressões praticadas por companheiros, adquirindo maior visibilidade ao
cenário público a partir da criação e instalação dos Conselhos dos direitos da
mulher e das Delegacias de Defesa da Mulher”.
Desde os anos de 1970 a violência de gênero vem tomando importância no Brasil
graças especialmente aos movimentos de mulheres. Esses grupos feministas têm cumprido um
papel fundamental por dar maior visibilidade a esse problema, até então, considerado um
assunto privado, devendo, segundo alguns, ser resolvido na esfera do lar.
Havendo, portanto, uma luta constante por uma maior igualdade de direitos entre
homens e mulheres, defendendo qualquer forma de discriminação nas práticas sociais,
inclusive no âmbito legal.
Nesse sentido, houve a edição pelas Nações Unidas dos Estados Americanos de
diversas convenções e pactos de direitos humanos, que compeliram os países signatários a
criarem medidas legais e administrativas de “promoção da igualdade de gênero e combate à
violência contra a mulher” (CAVALCANTI, 2007).
Infelizmente, estudos mostram que a violência doméstica contra a mulher vem
aumentando a cada minuto em todo o mundo. Normalmente esse tipo de violência está sendo
praticada por pessoas muito próximas, ou seja, com quem as vítimas mantêm relações de
afeto, podendo ser caracterizadas desde ofensas verbais, estupros, espancamentos, chegando,
muitas vezes aos assassinatos brutais.
Conforme publicação no Diário de São Paulo referente ao tema ora estudado de que:
“Violência no lar mata mais mulher do que câncer e doença cardíaca” (ANDRADE 2001)
observamos que desde aquela época já se tinha preocupação muito grande sobre violência
doméstica.
Pela notícia trazida e pelo que vemos nos dias atuais, podemos ter uma noção da
proporcionalidade que a violência contra a mulher tem tomado, mesmo sabendo que a maioria
20
das agressões nem chegam a ser denunciadas, seja por medo de seus agressores ou por
vergonha de exporem suas vidas às demais pessoas.
Assim sendo, a violência doméstica praticada contra a mulher passou a representar um
dos principais obstáculos para o impedimento da igualdade acolhida pela Constituição Federal
e por tratados internacionais ratificados pelo Brasil, como por exemplo, da Convenção Sobre
a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher que foi aprovada pelas
Nações Unidas em 1979 e ratificada pelo Brasil em 1984; a Declaração sobre a Eliminação da
Violência contra a Mulher então denominada Convenção de Belém do Pará foi aprovada pela
Assembleia Geral da OEA - Organização dos Estados Americanos em 1994 e ratificada pelo
Brasil em 1995.
Já no âmbito da Organização dos Estados Americanos, documentos importantes
precederam a Convenção de Belém do Pará como a Consulta Interamericana sobre a Mulher e
a Violência de 1990, a Declaração sobre a Erradicação da Violência contra a Mulher de 1991
e a Proteção da Mulher contra a violência.
Para que haja sucesso nos planos de combate contra a violência doméstica contra a
mulher, necessário se faz sensibilizar a população através de amplas campanhas a serem
divulgadas pela mídia para que se mude a cultura da violência contra a mulher, deixando de
acharem que é um fato natural, devendo passar a caracterizá-la como ação criminosa.
1.3.1 Formas de Violência contra a Mulher.
Dentre algumas formas de agressão que são consideradas como violências domésticas
no Brasil podem destacar:
Os atos de humilhar, xingar, diminuir a autoestima da ofendida, trata-se de agressões
como humilhação, desvalorização moral ou deboche público em relação à mulher, trata-se da
chamada violência emocional;
A violência psicológica que se constitui em tirar a liberdade da mulher, restringindo
suas ações, decisões ou a liberdade de crença ou ainda fazer com que se sinta que está ficando
louca, tratando-se de uma forma de abuso mental que consiste em distorcer os fatos e omitir
situações para deixar a vítima em dúvida sobre a sua memória e sanidade;
Controlar e oprimir a mulher, aqui o que conta é o comportamento obsessivo do
homem sobre a mulher, como querer controlar o que ela faz, não a deixar sair, isolar sua
família e amigos ou procurar mensagens no celular ou e-mail;
21
Falar sobre a vida do casal para os outros também pode ser considerado uma forma de
violência moral, como por exemplo, vazar fotos íntimas nas redes sociais como forma de
vingança;
Atirar objetos, sacudir e apertar os braços também são considerados como abuso físico
a tentativa de arremessar objetos, com a intenção de machucar, sacudir e segurar com força
uma mulher, embora nem toda violência física seja considerada como espancamento.
Forçar atos sexuais desconfortáveis, não é só forçar o sexo que consta como violência
sexual, o fato de obrigar a mulher a fazer atos sexuais que causam desconforto ou repulsa
como a realização de fetiches, também é violência.
Impedir a mulher de prevenir a gravidez ou obrigá-la a abortar - o ato de impedir uma
mulher de usar métodos contraceptivos, como a pílula do dia seguinte ou o anticoncepcional,
é considerado uma prática da violência sexual. Da mesma forma, obrigar uma mulher a
abortar também é outra forma de abuso;
Controlar o dinheiro ou reter documentos - se o homem tenta controlar, guardar ou
tirar o dinheiro de uma mulher contra a sua vontade, assim como guardar documentos
pessoais da mulher, isso é considerado uma forma de violência patrimonial;
Quebrar objetos da mulher – é outra forma de violência ao patrimônio da mulher é
causar danos de propósito a objetos dela, ou objetos que ela goste.
Vale ressaltar, ainda, dentre muitos outros casos de violência, certos episódios de
violência doméstica que tiveram uma atenção especial da mídia, não apenas pela brutalidade,
mas por uma relação de classe social da qual provinham os acusados, visto que, em tese,
estariam protegidos pelas paredes dos grandes prédios e das grandes muralhas que cercavam
suas casas.
Com a divulgação desses casos, a população pôde acompanhar todas as investigações
e ações das autoridades judiciais na tentativa de uma solução, dentre eles podemos destacar: o
“Caso do Maníaco do Parque”, “Caso da Eloá”, “Caso da Mércia Nakashima” Caso Eliza
Samudio”, e outros amplamente divulgados em redes sociais, em telejornais e revistas.
Muito embora, casos como estes, na maioria das vezes não sejam muitos divulgados,
visto se tratar de crimes brutais e covardes, infelizmente se tornaram rotina na nossa
sociedade.
Essa violência também está muito presente nas classes mais populares, como nas
favelas, nos guetos, que muitas vezes estão incomunicáveis com o restante da sociedade, pois,
vivem à margem da lei e de qualquer política de assistência social ou forma de repressão
estatal.
22
1.3.2 Da Violência Doméstica Contra A Mulher.
Falar em violência doméstica como já mencionado, é falar de um problema que atinge
muitas mulheres, crianças, adolescentes e idosos em qualquer lugar do mundo, visto que
segundo alguns estudiosos, decorrem principalmente da desigualdade existente nas relações
de poder entre os homens e as mulheres, bem como por discriminação de gênero, ainda
presente tanto na sociedade como no seio familiar.
Atualmente, a violência doméstica contra a mulher, tema muito em alta na sociedade
brasileira, constitui uma ameaça que acompanha centenas de milhares de mulheres por toda a
vida. Sejam elas de todas as idades, graus de instrução, classes sociais, raças, etnias ou
orientação sexual, pois, trata-se de um fenômeno que vem abreviando e prejudicando a vida
de muitas pessoas em todo o mundo.
Essa violência não conhece fronteiras geográficas, raça, idade ou renda, visto ser uma
realidade experimentada em várias partes do mundo, seja em países desenvolvidos ou nos
países subdesenvolvidos, seja no meio urbano ou rural ou ainda, em grandes e pequenas
cidades.
Portanto, existem casos de violência doméstica contra a mulher em todos os grupos
sociais, entretanto, a maioria desses casos, quando chegam ao conhecimento das autoridades
judiciais, percebe-se que as maiores dessas ocorrências acontecem nas camadas sociais mais
baixas, muito embora todos nós estejamos expostos à violência.
Outro fator predominante no caso, é que as mulheres mais humildades não escondem
os seus problemas e nem tem receio de expor sua vida e seus problemas conjugais, daí
buscam apoio e a proteção do Estado na tentativa de uma solução viável para o caso.
Não obstante, como se observa, nas classes sociais mais altas, as vítimas não querem
divulgar seus problemas pessoais, permanecendo num ambiente de ofensas e em silêncio, para
não exporem suas vidas íntimas somente com o intuito de preservar seus nomes no ambiente
social, bem como na manutenção do seu patrimônio.
Muito embora não possa generalizar a questão, já que essa violência, segundo alguns
autores, trata-se de um fenômeno social está presente em todos os extratos sociais, não sendo,
portanto, prerrogativa das classes populares.
Todavia, em virtude da própria estrutura das classes sociais, pautada na situação
econômica dos sujeitos, este fenômeno é mais evidente e corriqueiro nas classes
economicamente mais desfavorecida, em virtude da sua própria condição social e da
desestruturação familiar operada pela má distribuição de renda.
23
1.4 FATORES DE RISCO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER.
Historicamente, a violência contra a mulher constitui numa manifestação de poder
desigual entre homens e mulheres. Essa manifestação é que os levam à dominação e à
discriminação machista, impedindo com que a mulher se desenvolva e cresça perante a
sociedade, visto que os homens têm-lhes atribuindo um papel secundário, nascendo assim, a
superioridade imposta por um sexo ao outro, ou seja, dos homens sobre as mulheres.
Convencionou-se, então, de chamar violência de gênero, a violência sofrida mulher,
pelo fato de ser mulher, não, havendo, portanto, qualquer distinção de raça, classe social,
religião, idade ou qualquer outra condição.
Contudo, analisando mais a fundo os fatores que levam a violência contra a mulher, o
que nos chama a atenção é o fato da mulher guardar para si essa agressão, contribuindo assim,
para que suas estruturas que as transformem em vítima.
Nesse cenário, destacam-se os casos de mães que descontam ativamente nos filhos,
contribuindo com “endurecimento” de seus filhos, transformando-os em machos agressivos,
pois, a mesma mulher que apanha do seu marido, é a mesma que se responsabiliza pela
educação dos próprios filhos.
Neste caso, essas vítimas de agressão exercem sobre seus filhos o seu poder de mãe, e,
sendo ela agredida, haverá uma forte tendência em transferir a violência sofrida para os filhos
menores visto que não têm qualquer meio de defesa.
Por isso, podemos destacar que é em casa e em família que se aprende a justiça e o
respeito pelos direitos humanos, dentre outros valores sociais. Esse problema de ser encarado
com seriedade, havendo necessidade de combater esse mal que assola nossa sociedade.
Constata-se, ainda, entre outras coisas, que os filhos que veem os pais espancarem as
suas mães e que às vezes também são espancados, serão aqueles que futuramente irão
espancar suas esposas e seus filhos, tendo assim, um círculo vicioso e contínuo da violência.
Vale lembrar que a violência contra a mulher é toda e qualquer conduta de
discriminação, agressão ou coerção, ocasionada pelo simples fato de ser a vítima mulher e que
lhe cause danos, morte, constrangimento, limitação, sofrimento físico, sexual, moral,
psicológico, político, econômico ou perda patrimonial.
Cunha (2007) define a violência contra a mulher como sendo:
“Qualquer ato, omissão ou conduta que serve para infligir sofrimentos
físicos, sexuais ou mentais, direta ou indiretamente, por meios de enganos,
ameaças, coações ou qualquer outro meio, a qualquer mulher e tendo por
objetivo e como efeito intimidá-la, puni-la ou humilhá-la, ou mantê-la nos
24
papeis estereotipados ligados ao seu sexo, ou recusar-lhe a dignidade
humana, a autonomia sexual, a integridade física, moral, ou abalar a sua
segurança pessoal, o seu amor próprio ou a sua personalidade, ou diminuir as
suas capacidades físicas ou intelectuais”.
Normalmente esse tipo de violência é praticado por maridos, namorados,
companheiros, e pelos seus “ex”, chegando até mesmo ser praticada pelos próprios filhos ou
por pessoas que vivam na mesma casa e que compartilham do mesmo teto habitacional.
Por tratar-se de uma violência explícita ou velada, pode ser praticada dentro ou fora da
habitação, ocorrendo, inclusive, mesmo entre parentes que ali residam. Destacamos ainda
nessas situações, os casos constantes de abuso sexual contra a própria parceira, contra as
crianças e adolescentes e os maus-tratos contra idosos e contra a própria mulher.
Neste contexto, podemos ressaltar que a violência doméstica contra a mulher, pode ser
uma agressão específica, independente do ambiente, seja ele, doméstico, familiar ou de
intimidade, visto que tem por finalidade o de lhe retirar seus direitos aproveitando de toda a
sua vulnerabilidade.
Na análise sobre a violência doméstica familiar, ou seja, aquela que formada por
outros membros de uma mesma família e que se consideram parentes, sejam unidos pelos
laços naturais como pai, mãe, filho, seja por laços civis como marido, padrasto ou outros, por
afinidade que são os primos ou tios do marido ou ainda aqueles que moram na mesmo casa,
unidos por lados de afetividade. Ressalte-se que pode haver violência em qualquer relação
íntima de afeto, como por exemplo, o caso dos namorados.
Como podemos observar, a violência é a forma mais inadequada de se resolver
conflitos, visto que representa um abuso de poder, uma superioridade exacerbada de um sobre
o outro, prevalecendo-se a lei do mais forte sobre o mais fraco.
Essa violência pode trazer consequências como a potencialização do medo, da
insegurança e da revolta, levando a ofendida a um isolamento e redução da sua autoestima,
reduzindo sua capacidade produtiva, causando-lhe doenças psicossomáticas como a depressão
e diminuição do seu sistema de defesa.
Por fim, podemos resumir que a violência contra a mulher é fruto de um sistema que
subordina o sexo feminino ao sexo masculino, pois, trata-se de um problema de grande
intensidade, visto que nosso sistema social e cultural é bastante influenciado no sentido de
que o homem é ser superior à mulher e que esta deve assumir uma postura de subordinação
em respeito ao homem.
25
CAPÍTULO II
ASPECTOS GERAIS DA LEI 11.340/2006 “LEI MARIA DA PENHA”
2.1. ORIGEM HISTÓRICA DA CRIAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA.
É possível observar que ao longo desse estudo venho trazendo vários casos de violência.
Nesse interim percebemos que a violência doméstica e familiar veio crescendo, surgindo,
assim, a necessidade de se criar novos mecanismos e normas específicas para coibir e punir
essa forma de violência.
No Brasil, até setembro de 2006, a violência doméstica contra a mulher era julgada
como crime de “menor potencial ofensivo”, onde a pena era de dois anos podendo ser
substituída por multa, prestação de serviços à comunidade ou na entrega de cestas básicas
para entidades assistenciais.
Muito embora já tivéssemos a Convenção de Belém do Pará (OEA), e da Convenção
para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (ONU), o Brasil por
muito tempo não se posicionava quanto a propostas de criação de leis específicas que
tratassem com mais rigor esse tipo de violência.
Somente após o processo da OEA - Organização dos Estados Americanos que
condenou o Brasil por negligência e omissão em relação à criação de normas próprias que
tratassem do tema violência doméstica, cuja recomendação consistiu para que fosse criada
uma legislação mais adequada a esse tipo de violência, devendo ser tratada como maior
seriedade, dando assim, o start que se precisava para a criação de uma lei própria, a qual
visava à punição mais severa para esses tipos de casos.
Foi então que um conjunto de entidades se reuniu para definir um anteprojeto de lei no
qual definiria as formas de violência doméstica e familiar contra as mulheres e estabeleceriam
mecanismos para prevenir e reduzir este tipo de violência, como também para prestar
assistência às essas vítimas.
Somente em setembro de 2006 a lei 11.340 finalmente entra em vigor em nosso
ordenamento jurídico, fazendo com que a violência contra a mulher deixe de ser tratada com
um crime de menor potencial ofensivo dentre muitas inovações.
A lei também acaba com as penas que eram substituídas por cestas básicas ou multas à
entidade assistenciais, acabando com aquela sensação de impunidade, englobando, ainda,
além da violência física e sexual, também a violência psicológica, a violência patrimonial e o
assédio moral a que se submetem tais vítimas.
26
A então Lei 11.340/06 foi batizada e ficou muito conhecida como “Lei Maria da
Penha”, sendo que ganhou este nome em homenagem à Maria da Penha Maia Fernandes, uma
biofarmacêutica, natural de Fortaleza, capital cearense, que foi vítima de agressões físicas e
psicológicas por parte do então marido, u professor universitário colombiano que se chamava
Marco Antonio Heredia Viveros.
A senhora Maria da Penha até então, tinha sobrevivido a duas tentativas de homicídio
intentadas pelo seu marido. A primeira vez ocorreu em 1983, que culminou com sua
paraplegia em decorrência de um tiro levado nas costas enquanto dormia disparado pelo então
chamado “marido”.
Na época, o acusado Viveros, foi encontrado na cozinha, gritando por socorro,
alegando que tinham sido atacados por assaltantes e que sua esposa tinha sido baleada nas
costas em um suposto assalto em seu domicílio.
Meses depois, após a segunda tentativa de eliminá-la, Maria tomou coragem para
denunciá-lo às autoridades. Nessa oportunidade, Viveros empurrou-a da cadeira de rodas e
tentou eletrocutar e afogá-la no chuveiro.
Apesar das investigações terem começado em junho daquele mesmo ano, a denúncia
só foi apresentada pelo Ministério Público Estadual, somente em setembro do ano seguinte.
No dia 31 de outubro de 1986 o réu foi pronunciado e seria levado a julgamento pelo
Tribunal do Júri e condenado em 1991.
A defesa do réu apelou pedindo a nulidade do julgamento, alegando falha na
elaboração dos quesitos, cujo recurso foi acolhido em análise da Segunda Instância.
Marco Antônio, no dia 15 de março de 1996, novamente se submeteu a um novo
julgamento pelo Tribunal do Júri, sendo então ação penal julgada procedente e impondo ao
réu, o cumprimento da pena de dez anos e seis meses de prisão.
Novamente a sentença foi alvo de apelação e o réu permaneceu solto, pois foi lhe dado
o direito de recorrer em liberdade.
Enfim, passados mais de dezenove anos da data dos fatos, o réu foi devidamente preso
e recolhido ao cárcere para cumprimento de sua pena em face das agressões em que fora
vítima a senhora Maria da Penha Maia Fernandes, cumprindo apenas dois anos de prisão no
regime fechado, sendo, então, beneficiado pela progressão de pena.
Vale ressaltar que a repercussão do caso de violência doméstica sofrida por Maria da
Penha foi além do âmbito nacional, que inconformada com a omissão da Justiça Brasileira,
por não ter sido aplicada medidas de investigações e nem mesmo punição ao agressor dentro
de um prazo razoável de duração do processo.
27
Maria da Penha juntamente com o Centro pela Justiça e o Direito Internacional
(CEJIL) e o comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM),
formalizaram denúncia contra o Estado brasileiro junto à Comissão Interamericana de
Direitos Humanos, órgão da OEA - Organização dos Estados Americanos.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos tem como principal tarefa a de
analisar as petições apresentadas que denunciam violações aos direitos humanos, pois,
qualquer vítima, indivíduo, grupo ou Organização Não Governamental – ONG, legalmente
conhecida por pelo menos um Estado-membro da OEA - Organização dos Estados
Americanos possui legitimidade para formular tais petições junto à Comissão.
Diante dos fatos então apresentados foi publicado relatório em 16 de abril de 2001
pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos que levou o nº 54/2001, onde é realizada
uma profunda análise da denúncia e também as falhas cometidas pelo Governo brasileiro.
O Brasil, que é signatário da Convenção Americana e Convenção de Belém do Pará,
têm como o compromisso perante a comunidade internacional, de cumprir e implantar todos
os dispositivos constantes desses tratados, no que tange ao combate à violência doméstica.
Concluiu-se, então, a ineficácia judicial no que tange a impunidade, bem como sobre a
impossibilidade da ofendida de obter qualquer tipo de reparação, seja ela moral, psicológica
ou patrimonial, mostrando, ainda, a falta de cumprimento do compromisso do Governo
brasileiro de reagir adequadamente a combater à violência doméstica, desde o crime até a
elaboração do relatório nº 54/2001.
A impunidade verificada nos casos deve-se ao problema crônico da lentidão da justiça
e da impetração desenfreada de vários recursos, revelando, assim, que de fato o Brasil não
aplicou internamente as normas constantes das convenções por ele então ratificadas.
Assim, foi imposto ao governo brasileiro o pagamento de uma indenização no valor de
vinte mil dólares em favor de Maria da Penha Maia Fernandes, bem como foi
responsabilizado por negligencia e omissão em relação à violência doméstica, recomendando-
se a adoção de várias medidas, entre elas a simplificação dos procedimentos judiciais penais a
fim de que possa ser reduzido o tempo do processo.
Diante da pressão que o Governo brasileiro sofreu dos órgãos internacionais, passou-
se a cumprir os tratados e convenções dos quais o Brasil é signatário.
No que se refere ao projeto inicial da Lei Maria da Penha, vale lembrar que este se
iniciou por volta de 2002, sendo então elaborado com a participação de 15 ONGs, as quais
trabalhavam diretamente como casos de violência doméstica.
28
O Decreto 5.030/2004 criou o Grupo de Trabalho Interministerial que elaborou o
respectivo projeto e tinha como coordenadora, a Deputada Jandira Feghali da Secretaria
Especial de Políticas para as Mulheres, que foi a relatora do projeto da lei contra a violência
doméstica, sendo realizadas diversas audiências públicas em vários Estados do País.
Foram feitas diversas alterações e o Senado Federal substituiu o projeto original (PLC
37/2006), sendo finalmente sancionada a Lei nº 11.340 em 07 de agosto de 2006 pelo então
Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, a qual visava em aumentar o rigor nas
punições dos agressores, passando a vigorar a partir de 22 de setembro de 2006.
Mas este episódio se tornou mais do que um caso para a Justiça brasileira, tomou-se
uma proporção de conhecimento internacional. Como já expomos anteriormente, houve uma
grande pressão no País para que se fosse tomada uma medida urgente em favor dessa luta,
pois, passou a ser a causa de milhões de mulheres representadas pela mesma indignação que
passou a biofarmacêutica Maria da Penha.
Maria da Penha Maia comemorou a aprovação da lei:
“Hoje a mulher acredita na justiça e o mais importante é que tem a quem
recorrer o que não era possível na minha época, quando nem delegacia da
mulher existia. Depois desta lei específica o número de denúncias teve um
aumento relevante, e esse dado é constatado em todo o país”. Recomendando
que a mulher denuncie a partir da primeira agressão. "Não adianta conviver.
Porque a cada dia essa agressão vai aumentar e terminar em assassinato”.
“Denuncie a partir da primeira agressão”, diz Maria da Penha.
Portanto, essa lei representa a ratificação dos direitos das mulheres enquanto seres
humanos, garantidos pela Constituição Federal Brasileira de 1988, conferindo-lhes o direito à
vida, à integridade física e moral, à liberdade, ao patrimônio, e, dentre tantos outros, o direito
à dignidade e à busca pela felicidade, colocando-as em igualdade com os homens, como
cidadãs.
Podemos observar que essa garantia constitucional está elencada no artigo 1º da Lei
11.340/2006: a seguir descrito:
“Art. 1º: Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência
doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do §8º do art. 226 da
Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas
de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir,
Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados
internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a
criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e
estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de
violência doméstica e familiar”.
29
Dada à complexidade do problema e as repercussões que a causa trouxe, a eficácia das
ações de prevenção e redução da violência doméstica depende muito da reunião de recursos
de diversas áreas, visto que o Estado deve agir juntamente com a sociedade civil, contando
com as mulheres, fomentando fatores estimulantes e informações de que buscam a solução
dos problemas justamente com programas de prevenção.
Vale ressaltar a existência de outro dispositivo jurídico que visa a prevenir, punir e
erradicar a violência contra a mulher trata-se da Convenção Interamericana do Pará de 1994
“Convenções de Belém do Pará”, a qual traz em seu bojo, uma série de direitos a favor da
mulher, dentre eles: o respeito à vida; respeito à integridade física, mental e moral; direito à
liberdade e à segurança; direito a que se respeite a dignidade inerente à sua pessoa e a que se
proteja sua família; direito a ter igualdade de acesso às funções públicas de seu país e a
participar nos assuntos públicos, inclusive na tomada de decisões, entre outros.
2.2. FORMAS TÍPICAS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER CONTIDAS NA LEI.
Vale lembrar que nem todas as formas de violência doméstica se caracterizam como
um crime. Na lei 11.340/2006, se descrevem cinco tipos de violência, ou seja, a violência
física, a psicológica, a sexual, a patrimonial e a moral, conforme destacada em seu Artigo 5º e
seus incisos a seguir descritos:
“Art. 5º. Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar
contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
patrimonial”:
I – “No âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de
convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as
esporadicamente agregadas”;
II – “No âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por
indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais,
por afinidade ou por vontade expressa”;
III – “Em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou
tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação”.
A violência psicológica, por exemplo, é uma agressão emocional, visto que o agressor
não tem por objetivo, o de levá-la à morte, mas sim de desmoralizá-la, seja com ameaças,
rejeição, humilhação ou descriminação, sentindo prazer com o sofrimento da vítima. O
adultério, por exemplo, é uma forma de violência doméstica manifestada de forma
psicológica. Destacam-se entres os fatores de risco que contribuem para a concorrência da
violência, destacamos os fatores individuais como os de relacionamento, os comunitários, os
sociais, os econômicos e os culturais.
30
Segundo o Relatório Mundial sobre Violência e Saúde da Organização Mundial de
Saúde (2002), dentre os fatores de história pessoal, a violência doméstica na família aparece
como sendo cometida pelos homens em relação à sua parceira, portanto, se caracteriza como
importante elemento de risco. Os papéis sociais impostos a homens e a mulher, reforçados por
culturas patriarcais, é que determinam a violência contra a mulher, estabelecidas nas relações
de violência entre os sexos, ou seja, não são as diferenças biológicas, mas sim o que se tenta
demonstra perante a sociedade.
Dias (2007) em seu livro, nos traz dados estatísticos dessa violência no Brasil:
“Os resultados são perversos. Segundo a Organização Mundial da Saúde –
OMS, 30% das mulheres foram forçadas nas primeiras experiências sexuais;
52% são alvos de assédio sexual; 69% já foram agredidas ou violadas. Isso
tudo, sem contar o número de homicídios praticados pelo marido ou
companheiro sob a alegação de legitima defesa da honra”.
As formas típicas de violência doméstica contra a mulher, sejam elas adultas ou
jovens, se classificam em violência física, sexual, psicológica, econômica e moral, e, estão
elencadas no art. 7º e seus incisos da Lei 11.340/06 a seguir:
Art. 7º: “São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre
outras”:
I – “A violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou saúde corporal”;
II – “A violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe
cause danos emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
ações comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância
constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização,
exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuízo à saúde psicológica e a autodeterminação”;
III –“A violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja
a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada,
mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que o force ao
matrimônio, a gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação,
chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de
seus direitos sexuais e reprodutivos”;
IV – “A violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que
configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos,
instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou
recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas
necessidades”;
V – “A violência moral, entendida como qualquer conduta configure calúnia,
difamação e injúria”.
31
Portanto, o legislador inseriu no art. 7º e seus incisos as modalidades de violência mais
comuns praticada contra as mulheres no âmbito familiar e doméstico, sendo essas as que mais
aparecem nos relatórios e pesquisas nacionais e internacionais sobre a violência de gênero.
Podemos ainda verificar que a violência doméstica contra a mulher foi dividida em
várias formas, sendo conceituada da seguinte maneira:
a) Violência física: como sendo o uso da força, mediante socos, pontapés, empurrões,
arremesso de objetos, queimaduras com líquidos ou objetos quentes, ferimentos com
instrumentos pontiagudos ou cortantes que tenham por objetivo agredir a vítima, ferindo sua
integridade e saúde corporal, podendo deixar ou não marcas aparentes.
b) Violência psicológica: é aquele tipo de agressão emocional, sendo tão grave quanto
à agressão física, pois as marcas deixadas nas ofendidas são invisíveis e podem comprometer
o bem-estar emocional da mulher, causando danos irreparáveis.
c) Violência sexual: como uma conduta que visa provocar na vítima, uma limitação a
sua autodeterminação sexual, tendo como propósito o constrangimento, tanto pode ocorrer
mediante violência física como através de grave ameaça, ou seja, com o uso da violência
psicológica.
d) Violência patrimonial: que ocorre quando a violência implica qualquer conduta que
configure retenção, subtração, destruição de seus objetos (total ou parcial), instrumentos de
trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, inclusive os
destinados a suas necessidades.
e) Violência moral: aqui entendida como qualquer conduta que configure em calúnia
(imputar falsamente fato definido como crime), difamação (imputar fato ofensivo a sua
reputação) ou injúria (ofender a dignidade ou decoro de alguém). São tipos que ocorrem
concomitantes à violência psicológica.
Observa-se assim, que a violência contra a mulher pode ocorrer de várias maneiras,
deixando sempre em suas vítimas algum tipo de consequência. Infelizmente essa problemática
cresce assustadoramente no Brasil e no mundo e apresenta atualmente números bastante
significativos que necessitam urgentemente serem reduzidos.
Para que a redução deste problema social possa ocorrer é preciso que a sociedade
exerça seus direitos e se posicionem contra essa violência exagerada, reivindicando dos
políticos medidas concretas para a erradicação de todo e qualquer tipo de violência cometida
contra a mulher. O que se observa na maioria dos casos de violência é que as medidas só são
adotadas quando a violência atinge índices extremos, onde essas vítimas se tornam
32
prisioneiras do medo e do preconceito, relutando no máximo em procurar ajuda a justiça,
sejam nas delegacias ou nos centros de apoio, gerando, assim, a sensação de impunidade.
Sobre o tema da impunidade, Polido (2009):
“A impunidade agrava os casos, principalmente de violência doméstica. A
desqualificação do delito de tentativa de homicídio para lesão corporal
dolosa ou desta para ameaça, sempre com penas mais suaves a serem
cumpridas, é fator frequente e perpetuante do ciclo violento. A lentidão da
justiça e o tratamento discriminatório sofrido pelas mulheres vítimas de
violência nas delegacias distritais ou, até mesmo, nas DEAM, também são
motivos para perpetuação da violência”.
Com a entrada em vigor da Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher -
Lei nº 11.340/2006, esse cenário está mudando, visto que esta lei veio para punir com maior
rigor os agressores e veio para proteger as vítimas dessas agressões, contando com o apoio
primordial do Estado, levando, assim, uma vida digna com sua família e seus filhos.
Por isso, o Estado dispõe de vários canais de comunicação para que sejam
denunciados os casos de violência doméstica, ou seja, dispositivos tem, falta que a população
se conscientize de que temos que intervir nesses casos. Deixando de lado aquela história “de
que em briga de marido e mulher não se mete a colher”. Temos que denunciar.
2.3. PORQUE ESSAS MULHERES SE SUJEITAM À VIOLÊNCIA.
Como salientado, são várias as causas que levam esses homens a agredirem suas
mulheres, que na maioria das vezes são suas próprias esposas, mãe de seus filhos. Dentre
alguns fatores que contribuem para essa violência, estão os fatores individuais, os de
relacionamento, os comunitários, os sociais, os econômicos, os culturais bem como os fatores
de história pessoal de cada indivíduo.
Acredita-se que o álcool funciona como um fator desencadeador da prática dessa
violência, sendo considerado um elemento primordial, para o aumento da violência.
Argumentam que o vínculo entre violência e álcool e outras drogas dependem da
cultura, e que, o nível intelectual e econômico, não é causa determinante para sua ocorrência,
não sendo a violência doméstica privativa de determinadas famílias ou classes sociais.
Cavalcanti (2007), em seus estudos sobre violência doméstica conclui que:
“Embora o álcool, as drogas ilegais e o ciúme sejam apontados como
principais fatores que desencadeiam a violência doméstica, a raiz do
problema está na maneira como a sociedade valoriza o papel masculino nas
relações de gênero. Isso se reflete na forma de educar meninos e meninas.
Enquanto os meninos são incentivados a valorizar a agressividade, a força
física, a ação, a dominação e a satisfazer seus desejos, inclusive os sexuais,
33
as meninas são valorizadas pela beleza, delicadeza, sedução, submissão,
dependência, sentimentalismo, passividade e o cuidado com os outros”.
Outro fator preponderante no que se refere à violência doméstica contra a mulher é o
distúrbio de personalidade, visto que a probabilidade de que homens que agridem suas
esposas sejam emocionalmente dependentes, inseguros e de autoestima baixa, dificultando,
assim, o controle de seus impulsos.
A discórdia também está presente nesses relacionamentos, pois, o casal,
primeiramente se agride verbalmente de forma moderada e depois se torna mais grave,
culminando com a agressão física devido ao nível de estresse a que se expõe o
relacionamento.
No campo da violência doméstica estudos demostram que dentre as principais causas
estão o álcool; a dependência toxicológica; o desemprego; a pobreza e a exclusão social e,
finalmente, o histórico familiar dos agressores que sofreram violência.
Além desses citados, coexistem outros aspectos ligados ao desgaste da união, como a
falta do companheirismo, estabilidade emocional, imaturidade e a total incapacidade de
resolução dos problemas, culminando, assim nas agressões físicas.
Estudos realizados em diversos cenários mostram que, mesmo que a violência física
contra os parceiros esteja presente em todos os grupos socioeconômicos, as mulheres pobres
são mais afetadas, posto que a situação econômica quando atinge o agressor, causando-lhe
estresse, frustração e sensação de inadequação, pois não conseguindo cumprir seu papel de
provedor, como é culturalmente esperado, revolta-se contra todos.
São vários os motivos que levam a mulher a manter-se num relacionamento conjugal
violento, dentre eles está o fato do agressor manipular mentalmente a vítima, pois a ilude com
falsas promessas de que vai melhorar, convencendo-a, assim a não o denunciar,
permanecendo naquela relação abusiva.
Outro forte preponderante para que a mulher ainda permaneça nessa relação violenta,
é o descaso com que o assunto da violência contra a mulher ainda é encarado pela sociedade.
Essa visão distorcida minimiza as agressões por meio de um entendimento dos
acontecimentos impostos à mulher, entendida como um ser frágil e sujeito a expectativas
sociais que nunca ultrapassam certos papéis predeterminados como inferiores. Nessa
concepção a violência contra a mulher torna-se um fato visto como impossível de não existir
na sociedade (SOUZA 2006). A compreensão desse fenômeno é o entendimento das razões
pelas quais muitas mulheres ficam presas a esse relacionamento conturbado e não conseguem
se livrar da relação violenta.
34
2.4. CONSEQUÊNCIAS DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA.
A questão da violência doméstica sempre foi abordada pelos estudiosos como um
fenômeno social que exige ações públicas mais atuantes do Poder Público, visto que é
enfrentada por diversas resistências. Atualmente com o advento da Lei Maria da Penha, esse
quadro teve uma considerável melhora.
Em recente pesquisa realizada por especialistas constatou-se que a maioria das
mulheres que buscam os serviços de saúde com reclamações de enxaquecas, gastrites, dores e
outros problemas de saúde, na realidade vivem sofrendo as mais variadas formas de violência
em seus próprios lares e quando buscam socorro médico é sinal de que o problema já está
estabelecimento há muito tempo.
Assim, o elo entre violência e saúde é cada vez mais evidente em nossos dias, muito
embora as maiorias dessas mulheres agredidas não relatem com firmeza se vivem ou se já
viveram situações de violência doméstica ou familiar.
Por esta razão necessário se faz que os profissionais da área da saúde sejam
capacitados para identificar, atender e melhor tratar as pacientes vítimas desses abusos e
agressões.
As consequências trazidas por essas vítimas e seus filhos são inúmeras, pois vivem em
uma situação de sofrimento crônico diante de tanta violência. Já os filhos que costumam
presenciar os pais brigando tendem a desenvolverem vários distúrbios, com maior incidência
de urinar na cama, desenvolverem mais a timidez, se apresentarem retraídos ao extremo e de
serem crianças extremamente agressivas, chegando, inclusive, a abandonar o lar e a escola.
Visto que em suas cabeças passam todo o tipo de besteiras, e o motivo principal é o de sair
daquela zona de confronto, preferindo, muitas vezes, a viver pelas ruas praticando a
mendicância ou pequenos delitos.
Ressaltamos que as possíveis consequências da violência contra a mulher são muitas
vezes fatais, físicas e mentais. As fatais e mais comuns são o suicídio e o homicídio. As
consequências para a saúde física da mulher são as lesões de natureza grave ou leve, cicatrizes
deformantes, mutilações, doenças crônicas, doenças sexualmente transmissíveis, ferimentos,
escoriações, hematomas, fraturas recorrentes, problemas ginecológicos, infecções, gravidez
indesejada, abortamento, etc. Já as consequências para a saúde mental se apresentam como
estresse pós-traumático caracterizado pela destruição da autoestima, apatia, depressão,
ansiedade, isolamento, rejeição familiar e/ou social, disfunção sexual, distúrbios do sono,
35
pânico, desordem alimentar, comportamentos obsessivos compulsivos, incapacidade
permanente ou temporária para o trabalho, etc.
Não obstante o problema da violência contra a mulher seja muito antigo, nos dias
atuais parece ter-se encontrado um mecanismo mais eficaz na tentativa de solucioná-lo. Em
verdade todos os meios existentes no ordenamento jurídico brasileiro, visam minimizar a
violência doméstica, visto que são impostas certas condutas aos agressores no combate a esse
tipo de violência.
Destacamos, ainda, as variadas consequências que se submetem essas vítimas de
violência, tais como:
a) Perturbações intelectuais e da memória das vítimas e seus filhos como:
pesadelos, confusão, dificuldades de concentração e de memorização, imagem negativa de si
(de incapaz, de fraca, de dependente, de inferior aos outros);
b) Perturbações relacionais: vêm nas outras pessoas como potenciais agressores
em quem não podem confiar, ou como pessoas superiores que não têm interesse em conhecê-
las;
c) Sintomatologia depressiva: a depressão, a vergonha, o isolamento (mesmo de
seus familiares e amigos mais próximos), a autoculpabilização, a desvalorização de si, a falta
de confiança e sentimento de impotência;
d) Distúrbios de ansiedade como: hipervigilância, medo, fobias e ataques de
pânico, perturbações do sono, desordens da alimentação e disfunções sexuais.
Já no âmbito profissional é frequente uma vítima de violência doméstica ser impedida
de trabalhar, ou, se trabalha é explorada financeiramente pelo agressor.
Habitualmente tem maior dificuldade em se integrar profissionalmente e de manter o
posto de trabalho por diversos motivos, dentre eles as lesões sofridas pelos agressores; pela
falta de apoio na gestão da vida dos filhos; pelos baixos vencimentos pela falta de
assiduidade, indisponibilidade e inflexibilidade de horários, pelo menor rendimento e menor
ascensão na carreira; pelo despedimento, motivado pelos desacatos feitos pelos agressores no
local de trabalho e pelas faltas ao trabalho; pelo abandono da profissão, seja por imposição do
agressor, por fragilidade ou por faltas continuadas, dificultando sua integração; pela
necessidade de proteção, perante as perseguições feitas pelo agressor junto ao local de
trabalho e nos deslocamentos deste até a residência.
Com o ingresso da mulher no mercado de trabalho, provoca no homem o medo de
perder o controle e o poder como autoridade e provedor da família, além do receio de que a
parceira conquiste uma independência que a leve a se relacionar com outras pessoas.
36
Em certos momentos de maior tensão no relacionamento, quando se sente a perda da
relação, o homem parte para o ataque à honra da companheira, na tentativa de constrangê-la
perante a sociedade e mostrar-se vítima da situação, e, não raro essas agressões ocorrem no
ambiente de trabalho da mulher, expondo-a diante dos colegas. Em alguns casos, mesmo
separada e morando em outro lugar, a mulher continua sendo importunada pelo ex-parceiro
(DINIZ 2005).
Em alguns casos, a agressão física, pode acontecer somente uma vez ou
esporadicamente, mas, na maioria desses relacionamentos, o que realmente ocorre é a
reprodução de ciclos de violência como os já narrados anteriormente.
Segundo Marques 2005, para certas mulheres, o pior da violência psicológica não é
simplesmente a violência, mas a tortura mental que sofrem, sendo obrigadas a conviver com o
terror imposto pelo agressor. Por isso, este tipo de violência deve ser analisado com mais
afinco, pois é um problema de saúde pública e, como tal, merece espaço de discussão,
ampliação da prevenção e criação de políticas públicas específicas para ser combatido.
Infelizmente, de tanto se repetir no relacionamento conjugal, esse tipo de violência
acaba sendo encarado como “natural” entre os cônjuges, o que os leva a desgastar cada vez
mais a relação e o respeito mútuo simplesmente deixam de existir, passando a se tornar uma
relação insustentável.
37
CAPÍTULO III
ASPÉCTOS CONSTITUCIONAIS DA LEI MARIA DA PENHA
3.1 DA CONSTITUCIONALIDADE DA LEI MARIA DA PENHA.
Logo no início de nossa pesquisa, pudemos observar uma constante crítica acerca
da constitucionalidade da Lei 11.340/2006, visto se tratar de um tema muito polêmico no
ordenamento jurídico brasileiro, traz muitas inovações nas áreas do Direito, tanto civil como
criminal, portanto, será necessário se aprofundar o conhecimento acerca deste tema.
Inicialmente, na análise de seu preâmbulo, a Lei Maria da Penha trouxe
mecanismos que visam a prevenir e coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Muito embora exista grande preocupação social em solucionar o problema da
violência, corroborada pela boa-vontade do legislador em fortalecer certos direitos das
mulheres. Certas disposições do referido diploma normativo não estão imunes a
questionamentos e críticas, especialmente no que diz respeito à sua constitucionalidade, o que
poderia comprometer sua correta aplicação e sua efetividade. (MOREIRA, 2008).
Neste passo Dias, (2007) se posiciona:
“Para as diferenciações normativas serem consideradas não discriminatórias,
é indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoável. E
justificativas não faltam para que as mulheres recebam atenção diferenciada.
O modelo conservador da sociedade coloca a mulher em situação de
inferioridade e submissão tornando-a vítima da violência doméstica
masculina. Ainda que os homens possam ser vítimas da violência doméstica,
tais fatos não decorrem de razões de ordem social e cultural. Por isso se
fazem necessárias equalizações por meio de discriminações positivas,
medidas compensatórias que visam remediar as desvantagens históricas,
consequências de um passado discriminatório. Daí o significado da lei:
assegurar à mulher o direito à sua integridade física, psíquica, sexual, moral
e patrimonial”.
Nesse mesmo sentido a jurisprudência pátria do Tribunal de Justiça de São Paulo
nos autos da Correição Parcial, nº 11.189.013.000, esclarece:
“A Lei "Maria da Penha” - como consta de seu preâmbulo - tem por objetivo
prevenir, punir e erradicar a secular violência, física e moral, praticada pelo
homem contra a mulher. Cuida, portanto, de estatuto protetivo, que leva em
consideração as condições peculiares das mulheres em situação de violência
doméstica e familiar. Logo, não se pode ver no seu artigo 41, pelo simples
fato de impedir a aplicação das normas da Lei n° 9.099/95, lesão aos
princípios constitucionais da igualdade e da isonomia entre pessoas de sexos
diferentes e de cônjuges, bem como afronta aos princípios da razoabilidade e
da proporcionalidade, como alegado na impetração”. A Constituição Federal,
ao estabelecer no seu art. 5º, que "todos são iguais perante a lei, sem
38
distinção de qualquer natureza, não impediu que se estabelecessem, nas leis
infraconstitucionais, diferenciações normativas. Nisso, pois, reside a
justificativa do tratamento desigual imposto na nova lei. Daí porque não se
pode ver, no art. 41, da Lei 11.340/2006, ofensa aos princípios
constitucionais da igualdade e da isonomia. Por igual, também não se
identifica a alegada afronta ao princípio constitucional da razoabilidade ou
proporcionalidade. Afinal, a Lei 11.340/06 - nem seria preciso dizê-lo - é
resultante da condenação imposta ao Brasil pela Comissão lnteramericana de
Direitos Humanos, que determinou, entre outras medidas, "prosseguir e
intensificar o processo de reforma, a fim de romper com a tolerância estatal e
o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica contra as
mulheres no Brasil" (Caso Maria da Penha, Informe 54/01, de 16 de abril de
2001). Existe, portanto, justificativa objetiva e razoável, fundada em valores
universalmente aceitos, para retirar do rol dos crimes de menor potencial
ofensivo àqueles cometidos contra as mulheres em situação de violência
doméstica e familiar, sem ferir os direitos e garantias protegidos pela
Constituição Federal. Assim, presente se encontra a compatibilidade,
traduzida na relação de proporcionalidade entre a vedação da aplicação da lei
do Juizado Especial Criminal nos crimes de gênero e o fim pretendido pela
norma para a sua consecução, uma vez que esta finalidade dificilmente será
alcançada sem aquela restrição, sabido que a multa ou cesta básica, quase
sempre aplicada nos casos submetidos à Lei 9.099/95, revelam-se
insuficientes para reprovação e prevenção do crime. Referida restrição, em
última análise, presta-se à preservação do próprio direito protegido pela nova
lei, que é de conteúdo valor ativamente superior ao restringido. Daí porque
absolutamente constitucional a vedação por ela imposta”. (CUNHA 2008).
Vimos, portanto, que se trata de um dos temas mais recorrentes entre os
doutrinadores, ou seja, a constitucionalidade da Lei 11.340/06, visto que está particularmente
baseada na discriminação positiva em favor das mulheres.
As correntes que proclamavam a inconstitucionalidade da Lei se contrariavam,
pois, uma se baseava no princípio isonômico formal e a outra defendia a constitucionalidade
fundada no princípio isonômico material. Para resolver essa problemática a doutrina e a
jurisprudência passaram a ser usadas como fonte mediata do direito
Alguns dos principais Tribunais do Brasil, até mesmo o Supremo Tribunal Federal
e Superior Tribunal de Justiça, emitiram pareceres favoráveis através de jurisprudências sob o
argumento que a discriminação constituía ação afirmativa, ou seja, de forma a cumprir os
preceitos elencados no preâmbulo constitucional, ou seja, o princípio da fraternidade.
No entanto, alguns Tribunais Estaduais criavam resistências sob o argumento de
ferir princípios constitucionais, visto que contrariamente a tantos avanços históricos, foi
proferida decisão pela 2ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, que,
em um retrocesso, declarou inconstitucional a Lei Maria da Penha logo após sua entrada em
vigência, utilizando-se do argumento de que a lei desrespeitava os objetivos da República
39
Federativa do Brasil, pois fere o princípio da igualdade, violando "o direito fundamental à
igualdade entre homens e mulheres".
Para a solução do conflito causado por alguns Tribunais de Justiça, o então
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, visando resguardar a ordem jurídica
nacional da incerteza que pairava em torno do tema, ajuizou na Suprema Corte a Ação Direta
de Constitucionalidade número 19 que teve por objeto o reconhecimento dos artigos 1°, 33 e
41 da “Lei Maria da Penha”, a seguir descritos:
“Art. 1º. Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência
doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da
Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas
de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir,
Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados
internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a
criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e
estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de
violência doméstica e familiar”.
“Art. 33. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e
Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências
cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de
violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do
Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente.
Parágrafo único. Será garantido o direito de preferência, nas varas criminais,
para o processo e o julgamento das causas referidas no caput. 50”.
“Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a
mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099,
de 26 de setembro de 1995”.
No preâmbulo da petição inicial foram argumentados alguns pontos relevantes, dentre
eles o de que a lei 11.340 foi criada visando cumprir preceito da Carta Política e de que
também atendia à Convenção de Belém do Pará, na qual o Brasil se comprometeu a criar
mecanismos para melhor regular a questão da violência contra a mulher.
No seu bojo e visando corroborar como a tese trazida, citados alguns pensamentos de
juristas renomados que são a favor da igualdade material, que dentre eles destacam-se,
Alexandre de Moraes, Pontes de Miranda e Celso Antônio Bandeira de Mello, citando-se
ainda, dados estatísticos sobre a violência doméstica e a situação da mulher na sociedade
atual.
A inicial apontava, ainda, a existência de conflitos na interpretação da lei, pois havia
diversos pronunciamentos judiciais que declaravam a constitucionalidade das normas e foram
objetos da Ação Declaratória de Constitucionalidade, bem como o de outras decisões que a
reputavam inconstitucionais.
40
Por isso, em 09 de fevereiro de 2012, a Ação Declaratória de Constitucionalidade 19
foi submetida ao Plenário do Supremo Tribunal Federal, Corte Maior do Estado Brasileiro e
guardião da Constituição Federal, e, por votação unânime foi declarada sua
constitucionalidade principalmente no que tange aos artigos 1º, 33 e 41 da Lei 11.340/2006,
que criavam mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Com essa decisão, o Supremo Tribunal Federal, declarou procedente a Ação
Declaratória de Constitucionalidade sob o nº 19, ajuizada pela Presidência da República com
o objetivo de propiciar uma melhor interpretação judicial e uniforme dos dispositivos contidos
na Lei Maria da Penha.
Vale trazer algumas das palavras do Ministro Mello (2012) em sede de julgamento da
ADC 19:
“A mulher é vulnerável quando se trata de constrangimentos físicos, morais
e psicológicos sofridos no âmbito privado. Não há dúvida sobre o histórico
de discriminação por ela enfrentado na esfera afetiva. As agressões sofridas
são significativamente maiores que as que acontecem – se é que acontecem –
contra homens em situação similar. A Lei Maria da Penha retirou da
invisibilidade e do silêncio a vítima de hostilidades ocorridas na privacidade
do lar e representou um movimento legislativo claro no sentido de assegurar
às mulheres agredidas o acesso efetivo a reparação, a proteção e a justiça”.
Destarte, o Ministro Relator Marco Aurélio de Mello proferiu seu votou pela
procedência da ADC 19, sendo acompanhados pelos demais Ministros daquela Corte.
Resolveu-se então, através do julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade número 19 –
ADC 19 e por unanimidade de votos, declarar a constitucionalidade da Lei 11.340/2006,
acabando, assim, com toda a polêmica que foi criada em torno da edição da referida lei.
A lei 11.340/06 mesmo não sendo perfeita, apresentou-se como um marco na história
do combate a violência doméstica no Brasil, pois, traz em seu bojo uma estrutura adequada e
específica para bem atender a complexidade do da violência doméstica, trazendo mecanismos
de prevenção, assistência às vítimas, políticas públicas e punição mais rigorosa para os
agressores.
Na análise do conteúdo da lei, podemos observar que se trata de uma lei que tem um
cunho educacional e de promoção de políticas públicas e assistenciais, tanto para a ofendida,
quanto para o seu agressor. Não é unicamente punitiva, mas sim, de proporcionar meios de
proteção e promoção de assistência mais eficiente às mulheres.
Em seu aspecto objetivo, a referida lei direciona-se especialmente para combater os
atos de violência ocorridos no âmbito doméstico, familiar ou intrafamiliar. Ao passo que no
contexto subjetivo, a preocupação maior da lei visa dar proteção à mulher contra os atos de
41
violência praticados por homens ou mesmo mulheres com os quais ela tenha ou haja tido uma
relação conjugal ou mesmo de afetividade, ou ainda por qualquer pessoa com as quais
conviva no âmbito doméstico e familiar.
Sousa (2008) em seus comentários à Lei Maria da Penha afirma que:
“A questão da hipossuficiência quando vista em distintos cenários de um
mesmo caso, precisa ser analisado com redobrada cautela, haja vista que na
relação vítima-suposto (a) agressor (a), aquela se presume a parte
hipossuficiente e merecedora de ações positivas para equilibrá-la em relação
ao seu (a) suposto (a) agressor (a).Contudo, quando a questão deixa a esfera
privada e chega a posterior, decorrente da persecução penal (extrajudicial ou
judicial) há uma inversão, pois a relação passa a ser entre o (a) suposto (a)
agressor (a) de um lado, e o Estado, do outro (suposto (a) agressor (a) x
Estado)”.
Com a entrada em vigor da Lei 11.340/2006, então batizada como “Lei Maria da
Penha”, marcou um novo tempo, onde a mulher torna-se dona de si, e busca insaciavelmente
sua independência, não aceitando ser objeto do sexo oposto. Muito embora ainda existam
aquelas mulheres consideradas como “Amélias”, visto que demonstram tamanha submissão e
limitação ao ambiente doméstico e verdadeiramente domesticadas por seus maridos.
Muito embora esses fatos sejam resquícios de um tempo passado, pois com a entrada
em vigor da Lei 11.340/06, foram criadas medidas que visam à proteção imediata dessas
mulheres, tanto na esfera do direito cível, como no âmbito do direito de família,
administrativo e penal, que veremos adiante.
As medidas judiciais objetivam acelerar a solução do problema da mulher agredida,
em sendo requeridas, devem ser analisadas num prazo mínimo possível, principalmente em
casos de situação de risco ou na ocorrência da prática da violência propriamente dita.
Havendo a concessão da medida judicial, o seu cumprimento é de total responsabilidade da
justiça através seus agentes.
3.2. ALTERAÇÕES TRAZIDAS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA PELA LEI 11.340/2006
Vale lembrar que a criação dos Juizados Especiais Criminais foi com o intuito de
desafogar a justiça brasileira, muito embora na prática isto não ocorresse, visto que a cada dia
se aumentavam os casos distribuídos àqueles juizados, pois na Lei 9.099/95 também previa a
possibilidade de conciliação entre a vítima e o agressor, e, quando a conciliação acontecia, os
procedimentos judiciais se encerravam sem qualquer punição efetiva.
Com isso a Lei 9.099/95 que ao mesmo tempo em que trazia o cidadão comum da
justiça de uma forma rápida e gratuita, criou um grande abismo nos casos de violência de
42
gênero, pois estimulou as mulheres a deixarem de processar o seu agressor, criando-se assim,
a sensação de impunidade, fenômeno muito presente na prática de violência de homens contra
mulheres no país.
Faisting 2009 observou em seus estudos sobre a atuação dos Juizados Especiais
Criminais, que a conciliação era “o principal objetivo dos advogados, juízes e promotores nas
audiências preliminares de conciliação”. Isto ocasionou um enorme problema, levando-se em
conta que os crimes cometidos no âmbito doméstico são diferentes dos outros crimes como,
por exemplo, as brigas de trânsito.
Campos (2007) assim relata esta problemática:
“A Lei nº 9.099/1995 foi construída sob o paradigma masculino para regular
comportamento de natureza individual e eventual como o de Tício contra
Caio e não para responder a comportamentos que violam sistematicamente
direitos individuais. A incapacidade do sistema jurídico e dos doutrinadores
do direito de entenderem a singular natureza da violência doméstica
obnubila toda e qualquer resposta jurídica não fundada nos tradicionais
parâmetros legais. A maior parte dos operadores do direito não consegue
romper com a visão patriarcal do sistema legal, reproduzindo,
inadequadamente, as respostas de Tício contra Caio às violações de direitos
cometidos de Caio contra Maria ou por Tício contra Joana”.
Uma das principais inovações da lei 11.340/2006 foi à retirada dos Juizados Especiais
Criminais a competência para julgar e processar os crimes de violência doméstica contra a
mulher, vedando assim, a aplicação das penas culminadas aos crimes de menor potencial
ofensivo, ou seja, não há mais como cumprir a pena simplesmente pagando cestas básicas às
entidades beneficentes ou a prestação de serviços comunitários.
Com isso o Estado Brasileiro dava início ao cumprimento de compromissos
internacionais assumidos em diversas convenções e pactos de direitos humanos, além do fato
de ser um dos maiores anseios da população brasileira, visto que nos casos de violência
doméstica onde as penas aplicadas aos agressores eram multas, prestação de serviços à
comunidade e doação de cestas básicas, representando para as vítimas uma sensação de
impunidade, porque não previa nenhuma medida de proteção à vítima.
Portanto, a Lei 9.099/95, muito embora imbuída das melhores intenções do legislador
naquele momento, tinha como princípio o de acelerar a atuação judicial, reduzindo os
conflitos judiciais, estimulando as composições amigáveis e aliviar o sistema penitenciário.
No entanto, se revelou um instrumento de impunidade nos casos de violência
doméstica, tornando, desta forma, inevitável as mudanças trazidas pela Lei 11.340/06.
43
Com isso, apesar de não criar novos tipos penais, a lei introduziu em seus artigos 42,
43, 44 e 45 alterações no Código Penal, Código de Processo Penal e na Lei de Execuções
Penais, onde foram criadas circunstâncias agravantes e aumentando a pena para os crimes
relacionados à violência doméstica.
No Art. 42 que acrescentou inciso IV ao Art. 313 do Código de Processo Penal, foi
criada uma nova hipótese de prisão preventiva para os casos envolvendo violência doméstica
contra a mulher:
“IV - Se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher,
nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas
de urgência”.
Com isso, criou-se a possibilidade de prisão preventiva não somente para os crimes
punidos com reclusão, mas também para os casos que envolvem violência doméstica contra a
mulher.
Nesse caso, a prisão pode ser decretada por iniciativa do Juiz, de ofício, ou por
requerimento do Ministério Público ou ainda mediante representação da autoridade policial,
conforme previsão expressa no artigo 20 da referida lei:
“Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal,
caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a
requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade
policial”.
“Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do
processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo
decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”.
Portanto, mesmo os crimes punidos com detenção, como ameaça e a lesão corporal,
inserida no parágrafo 9º da Lei 11.340, encontra-se presente o pressuposto para a decretação
da prisão preventiva do agressor, desde que seja para garantir a execução das medidas
protetivas de urgência.
Embora este instituto “prisão preventiva” deva ser analisado de forma criteriosa pelas
autoridades judiciais, visto que em muitos casos a ofendida não deseja a prisão de seu
companheiro e sim tem a intenção de que Justiça lhe um “susto”, achando que com isso
poderá resolver seu problema conjugal.
Percebe-se que, mesmo nesta nova hipótese, a decretação está atrelada à demonstração
da necessidade da medida de exceção, ou seja, é preciso demonstrar que a prisão está sendo
decretada para dar efetividade às medidas protetivas que visam garantir a integridade da
vítima, seus familiares ou das testemunhas.
44
Ainda em seu Art. 43, acrescentou no art. 61, alínea “f”, inciso II do Código Penal que
se trata se uma nova hipótese de agravante quando o crime for praticado com violência contra
a mulher, passando a ter a seguinte redação:
“Art. 61 – são circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não
constituem ou qualificam o crime”:
[...]
“f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de
coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma
da lei específica”.
Já no artigo 44, acrescentou os parágrafos 9º e 11º ao Art. 129 do Código Penal, que
passou a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 129 – Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem”:
[...]
§ 9º - Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão,
cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou
ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou
de hospitalidade:
Pena – detenção de 3 (três) meses a 3 (três) anos.
[...]
“§ 11º - Na hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço
se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência”.
Também nos casos de violência doméstica contra a mulher, a Lei 11.340/2006 em seu
Art. 45, houve mudanças para a Lei de Execuções Penais, onde o Juiz poderá determinar a
frequência obrigatória do suporto agressor nos programas de recuperação e reeducação.
Portanto, o Art. 152 da lei nº. 7.210/84 passou a ter a seguinte redação:
Art. 152 [...]
“Parágrafo único - Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz
poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de
recuperação e reeducação”.
Ressalta-se, portanto, que a lei criou circunstâncias agravantes aos agressores,
aumentando a pena imposta e piorando a situação desses agressores. Muito embora, essas
mudanças não atingiram os fatos acontecidos antes da entrada em vigor da lei, pois o art. 5º,
XL, da Constituição Federal veda a retroatividade da lei penal para prejudicar o réu.
Assim, fica evidente, que a referida lei quando modificou diversos artigos da
legislação brasileira, tinha como principal finalidade a melhor proteção às vítimas da
violência doméstica, dando-lhes um melhor respaldo jurídico ao trazer inovações mais
intimidativas.
45
CAPÍTULO IV
DAS MEDIDAS PROTETIVAS TRAZIDAS PELA LEI 11.340/2006
4.1 DAS PRINCIPAIS FORMAS DE PROTEÇÃO
Numa análise do Capítulo II da Lei 11.340/2006 que engloba os artigos 10, 11 e 12,
podemos observar as principais providências legais cabíveis a serem tomadas pela autoridade
policial nos casos de violência doméstica contra a mulher.
Essas providências são de grande importância para o combate à violência doméstica,
pois, proporcionam às vítimas maior proteção, o que não era observado antes da vigência da
Lei Maria da Penha, pois tudo se resumia na simples lavratura dos Boletins de Ocorrência ou
dos Termos Circunstanciados de Ocorrência, deixando, assim, as vítimas sem qualquer
providência satisfatória.
A mulher que eventualmente tenha sido vítima de violência doméstica ou que tenha
risco potencial de sofrê-la tem direito a atendimento preferencial pela Autoridade Policial, que
de imediato deverá tomar as medidas cabíveis e previstas nos artigos 10, 11 e 12 da respectiva
lei, bem como o procedimento que a autoridade policial deve seguir ao identificar prática
efetiva ou eminência de violência doméstica contra a mulher.
Dentre as principais providências iniciais previstas na lei, estão os procedimentos que
as autoridades deverão tomar visando a garantir a proteção da vítima, comunicar o fato ao
Ministério Público, encaminhar a vítima ao hospital, posto de saúde, ou Instituto Médico
Legal (IML), bem como o de fornecer transporte e abrigo à vítima e seus dependentes.
Como ensina Dias (2007):
“A autoridade policial deve tomar as providências legais cabíveis (art. 10) no
momento em que tiver conhecimento de episódio que configura violência
doméstica. Igual compromisso tem o Ministério Público de requerer a
aplicação de medidas protetivas ou a revisão das que já foram concedidas,
para assegurar proteção à vítima (art. 18, III, art. 19 e § 3º). Para agir o juiz
necessita ser provocado. A adoção de providência de natureza cautelar está
condicionada à vontade da vítima”.
Ou seja, mesmo com o registro de ocorrência junto à autoridade policial, é a vítima
quem detém legitimidade para o requerimento das medidas protetivas de urgência, não
podendo a autoridade policial ou o juiz, de ofício, antes dela se manifestar, requerer, no caso
do primeiro, ou determinar, no caso do último, a concessão de medidas protetivas de urgência.
Portanto, é no momento do registro da ocorrência junto à autoridade policial é que a
vítima poderá solicitar, dentre outras, as medidas protetivas de urgência previstas nos artigos
46
23 e 24 da Lei 11.340/2006 que veremos no próximo capítulo. A lei ainda traz as formas de
atendimento e procedimentos que deverão ser observados pela Autoridade Policial quando nas
hipóteses de prática de violência doméstica previstas nos artigos 10, 11 e 12 como a seguir
descritos:
“Art. 10. Na hipótese da iminência ou da prática de violência doméstica e
familiar contra a mulher, a autoridade policial que tomar conhecimento da
ocorrência adotará, de imediato, as providências legais cabíveis.
“Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao
descumprimento de medida protetiva de urgência deferida”.
Visando, ainda, dar um melhor atendimento à mulher vítima de violência, o Artigo 11
e seus incisos dispõem que:
“Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e
familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências”:
I - Garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato
ao Ministério Público e ao Poder Judiciário;
II - Encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto
Médico Legal;
III - Fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou
local seguro, quando houver risco de vida;
IV - Se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus
pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar;
V – “Informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços
disponíveis”.
Tomadas as providências iniciais no tocante a garantir a proteção da ofendida,
iniciam-se os procedimentos previstos na Lei em seu artigo 12 e seus incisos, conforme a
seguir:
“Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a
mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de
imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no
Código de Processo Penal”:
I - Ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a
termo, se apresentada;
II - Colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de
suas circunstâncias;
III - Remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao
juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de
urgência;
IV - Determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e
requisitar outros exames periciais necessários;
V - Ouvir o agressor e as testemunhas;
47
VI - Ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de
antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou
registro de outras ocorrências policiais contra ele;
VII – “Remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao
Ministério Público”.
Vale ressaltar que a violência que surge no âmbito privado, são maiores do que
realmente aparentam, visto que os dados das pesquisas não conseguem abarcar todas as
vítimas da violência, além de não conseguir mensurá-las, já que por muitas vezes se
encontram acobertadas.
Por isso, a Lei não tem só a urgência de punir os agressores, mas também de
conscientizar as pessoas que a vida mantida sob forma de dominação, não trará a dignidade de
que elas necessitam, não importando sua condição social, visto que todos precisam estar
cientes da necessidade de uma vida sem violência.
Na essência principal da Lei podemos observar que não só se resume em acabar com a
violência contra as mulheres, pois, muitas vezes, ocorrem outros tipos de violência na
sociedade, dentre as situações em que um filho ou uma filha que presencia a agressão de sua
mãe dentro de casa, esse fato, poderá repercutir de várias maneiras fora de suas casas.
Na citação de Dias (2007) nos faz refletir sobre isto:
“Ainda que se esteja a falar em violência doméstica e familiar contra a
mulher, há um dado que parece de todos esquecido: a violência doméstica é
o germe que está a assustar a todos. Quem vivencia a violência, muitas vezes
até antes de nascer e durante toda a infância, só pode achar natural o uso da
força física, também a constatação da impunidade da vítima, que não
consegue ver o agressor punido, gera a consciência de que a violência é um
fato normal”.
O foco principal da Lei Maria da Penha não foi unicamente o de redução dos índices
de violência, mas sim o de assegurar em igualdade outros pontos positivos com o intuito de
proteção e defesa das mulheres agredidas, destacando-se entre eles:
a) tipificar e definir a violência doméstica e familiar contra a mulher;
b) estabelecer as formas da violência doméstica contra a mulher tanto física,
psicológica, sexual, patrimonial e moral;
c) determinar que a violência doméstica contra a mulher independesse de sua
orientação sexual;
d) determinar que a mulher somente pudesse renunciar em processar o agressor
perante o Juiz;
48
e) estabelecer que ficassem proibidas as penas de pagamento de multas ou cestas
básicas;
f) a vedação expressa em lei sobre a entrega da intimação pela mulher ao agressor;
g) a mulher vítima de violência doméstica será notificada dos atos processuais, em
especial, quando do ingresso e da saída do agressor da prisão;
h) a mulher deverá estar acompanhada de advogado ou defensor em todos os atos
processuais;
i) a retirada dos Juizados Especiais previstos na lei 9.099/95 sobre a competência para
julgar os crimes de violência doméstica contra a Mulher;
j) alterar o Código de Processo Penal para possibilitar ao Juiz a decretação da prisão
preventiva quando houver riscos à integridade da mulher, seja física ou psicológica;
k) alterar a Lei de Execuções Penais para permitir ao Juiz que determine o
comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação;
l) determinar a criação de Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar
Contra a Mulher com competência cível e criminal para abranger as questões de família
decorrentes da violência contra a mulher;
m) casos em que a violência doméstica seja cometida contra mulher com deficiência, a
pena será aumentada em um terço (1/3).
Como podemos observar a Lei 11.340/2006, além de proporcionar que as mulheres
tenham seus direitos restituídos, tenta com as medidas acima elencadas, minimizar a
deficiência que a legislação brasileira possuía para com as mulheres, e, agora a Lei visa
diminuir estas diferenças.
Ressalte-se ainda, que a Lei 11.340/2006 é inovadora em quase todos os seus
dispositivos, trazendo uma verdadeira revolução na forma de coibir a violência doméstica, ao
mesmo tempo em que estabelece ações para assistência às vítimas, adotando pesadas medidas
de repressão em relação ao agressor.
Para uma melhor análise, podemos destacar, dentre as outras contidas na lei, as
medidas em relação à ofendida, ao agressor e a estrutura:
a) ofendida – atendimento em programas assistenciais do Governo federal, estadual e
municipal; manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de
trabalho; proteção policial ou garantia de ser abrigada em local seguro; assistência judiciária
gratuita;
b) agressor – detenção de três meses a três anos; encaminhamento a programa de
recuperação e reeducação; possibilidade de ter a prisão preventiva decretada a qualquer
49
momento; possibilidade de ser afastado do lar, não haverá substituição da condenação por
cestas básicas ou multas;
c) estrutura – Criação dos Juizados de Violência Doméstica contra a Mulher; criação
de Delegacias de Atendimento à mulher; integração entre Poder Judiciário, Ministério
Público, Defensor Público e outras áreas de segurança e assistência.
Ressalte-se a importância da ideologia inovadora presente no artigo 5º da Lei Maria da
Penha, ao ampliar o conceito de família e reconhecer como família, as uniões homo afetivas.
Nesse cenário o legislador ao reconhecer a família advinda da união homo afetiva,
considerando a realidade social em que vivemos, bem como sua evolução, não ficando alheio
às relações que envolvem pessoas de diferentes gêneros, das quais também derivam violência
doméstica e familiar.
4.2. DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA EM RELAÇÃO À OFENDIDA
Preceituam em seus artigos 18 e 19 da respectiva lei, as medidas de urgência que
poderão ser tomadas pelas autoridades judiciais no tocante à proteção de urgência da
ofendida, destacando-se:
”Art. 18. Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz,
no prazo de 48 (quarenta e oito) horas”:
I - Conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas
de urgência;
II - Determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência
judiciária, quando for o caso;
III – “comunicar ao Ministério Público para que adote as providências
cabíveis”.
“Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo
juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida”.
§ 1º As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato,
independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério
Público, devendo este ser prontamente comunicado.
§ 2º As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou
cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de
maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem
ameaçados ou violados.
§ 3º “Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da
ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já
concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares
e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público”.
Nesse diapasão podemos observar que todas as manifestações e requerimentos são de
total responsabilidade da parte ofendida, que deverá ser manifestada na lavratura do boletim
de ocorrência ou então em eventual eminência de agressão.
50
De posse de tal pedido o Juiz terá o prazo de 48 horas para decidir sobre a concessão
de medidas protetivas de urgência, consistentes em afastar do lar do agressor, proibir a
aproximação do agressor em relação à ofendida, dentre outras medidas previstas em lei.
As medidas protetivas de urgência ligadas à ofendida estão elencadas nos artigos 23 e 24 da
Lei nº 11.340/2006 – Maria da Penha:
“Art. 23 - Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou
comunitário de proteção ou de atendimento;
II - Determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao
respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
III - Determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos
relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;
IV – “Determinar a separação de corpos”.
Desta forma o legislador estabeleceu nos incisos do artigo 23 as medidas iniciais que
poderão ser tomadas pelas autoridades judiciais no sentido de proteção à ofendida. Nesses
programas de proteção deverá haver estrutura para atendimento multidisciplinar, além de
possuir a devida segurança, vez que as vítimas se encontram vulneráveis e em situação de
risco.
Nesse sentido, um exemplo é dado por Porto (2009):
“A Secretaria Municipal de Assistência Social pode ter programas de auxílio
habitacional ou alimentar para pessoas necessitadas. A Secretaria de Saúde
pode atender a vítima ou seus dependentes se necessitarem algum tratamento
médico ou mesmo acompanhamento psicossocial através dos Centros de
Atendimento Psicossocial (CAPS)”.
Numa análise do inciso II do artigo 22, onde há previsão para a recondução da vítima
e de seus dependentes ao domicílio, pressupondo nesse caso que houve o seu afastamento do
lar em face do medo e em relação à violência que sofrera ou que a vítima poderia vir a sofrer.
Essa recondução é possível quando não houve o recolhimento da vítima em outros
programas oficiais ou centros comunitários de proteção, ou então nos casos, em que foi
requerido pela vítima ou pelo Ministério Público o afastamento do agressor. Caso seja
deferido o pedido, a vítima poderá retornar.
Já no inciso III do artigo 23, o legislador teve a intenção de sustentar a ideia que, a
vítima pode ser afastada do lar, pelo juiz, sem prejuízo de seus direitos relativos aos bens,
guarda dos filhos e até mesmo de pedir alimentos.
Porto (2009) sustenta:
51
“Onde se lê, ‘determinar’ deve-se entender ‘autorizar’, isto porque o juiz não
pode obrigar a vítima a afastar-se do lar; só o agressor pode ser compelido a
tanto, caso contrário, estar-se-ia vitimizando-a duplamente. ‘Autorizar’
significa aqui legitimar o famigerado ‘abandono do lar’, tido,
tradicionalmente, como atitude que atentava contra os deveres matrimoniais.
Na realidade, a mulher que abandona o lar, especialmente levando os filhos,
tendo depois como provar que o fez por razões de segurança, não pode por
isso mesmo ser acusada de haver desentendido obrigações inerentes ao
matrimonio, porque o fez em situação de necessidade, sendo-lhe inexigível
conduta diversa, sequer a de que aguardasse uma autorização judicial para
sair de casa”.
No inciso IV do artigo 23, há a previsão da separação de corpos que poderá ser
deferida, tanto nos casos em que as partes sejam casadas, quanto na possibilidade de viveram
em união estável.
Caso a vítima pretenda tornar efetiva essa medida protetiva, deverá requer autorização
judicial para se afastar do marido ou companheiro, durante o processo de separação. Com a
separação de corpos, os deveres de coabitação e convivência, ficam suspensos.
Já na análise do artigo 24 e seus incisos o Legislador estabeleceu a proteção do
patrimônio do casal e ainda outros bens particulares da ofendida.
“Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou
daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar,
liminarmente, as seguintes medidas, entre outras”:
I - Restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
II - Proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra e
venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização
judicial;
III - Suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
IV – “Prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas
e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar
contra a ofendida”.
Nesse caso a lei prevê a possibilidade da aplicação de medidas protetivas no âmbito
patrimonial, e visam à proteção dos bens do casal ou também dos bens particulares da mulher,
determináveis com base na lei civil.
Assim demonstra Souza (2009):
“O art. 24 prevê a possibilidade de o juiz do Juizado de Violência Doméstica
e Familiar contra a Mulher conceder em favor da vítima, medidas protetivas
de natureza eminente patrimonial, voltadas a impedir a pratica comum de o
cônjuge, companheiro ou convivente, dilapidar o patrimônio comum ou
simular transferências de bens, em prejuízo da vítima. O legislador valeu-se
do método empírico e normatizou medidas que já vinham sendo
diuturnamente requeridas, principalmente nos juízos de família, mas que,
agora, poderão ser aplicadas no mesmo juízo detentos da competência
52
criminal, pois os novos juizados são órgãos detentores de uma competência
ampliada, com vistas a possibilitar a almejada proteção integral para a
vítima, que agora poderá resolver praticamente todas as questões vinculadas
com a agressão doméstica e familiar sofrida, em um único lugar”.
A primeira dessas medidas impõe ao agressor, que restitua os bens que tenha subtraído
do patrimônio da ofendida, essa situação configura o furto, sendo considerada como violência
patrimonial pela Lei Maria da Penha.
Neste caso, estão afastadas as hipóteses previstas nos artigos 181 e 182 do Código
Penal, já que, a mulher é a vítima e o autor do delito de furto é a pessoa com quem possui um
vínculo de natureza familiar.
Já no inciso II do artigo 24, estão previstas as medidas que visam a proibição de
celebrar negócios jurídicos, que para sua eficácia é necessário que a ofendida indique os bens
que quer que fiquem interditados da alienação ou ainda de eventual locação por parte do
agressor.
Nos casos de união estável, não é possível fazer o controle do patrimônio que seja
comum e que não estiver no nome dos cônjuges e caso um imóvel tenha sido adquirido
apenas por um dos companheiros durante a união, e seja utilizado pelos dois, não há como
saber que o bem é dividido.
Nesse sentido, Dias (2010) ainda afirma:
“Não vendo o magistrado justificativa suficiente para conceder a restituição
reclamada pela vítima, o juiz tem faculdade (art. 22, § 1º) de determinar tão
só o arrolamento dos bens ou o protesto contra alienação de bens, como
forma de assegurar a higidez do patrimônio. Desta forma evita a
probabilidade de dano irreparável”.
Por outro lado, a vítima, além de ter a possibilidade de impedir a venda, poderá
também se manifestar contra aquisição de bens, mesmo sendo o bem adquirido por um dos
cônjuges ou companheiros, seja comum no patrimônio do casal, visto que esse negócio
poderá ser prejudicial aos seus interesses ou da própria família, podendo nesses casos ser
realizado o pedido de medidas protetivas.
Podem ocorrer situações em que determinadas mulheres depositam imensa confiança
em seu cônjuge ou companheiros que até mesmo fazem autorizações para que estes possam
cuidar de seus “negócios”, assim concedem a eles, procurações com plenos poderes, ficando
assim dependentes da vontade do cônjuge ou companheiro. Nesses casos podem surgir
discussões e aflorar o sentimento de vingança do homem, podendo ser usadas essas
procurações, para o desvio de patrimônio.
53
Nesse sentido, Dias (2010) observa:
“Ainda que a Lei fale em suspensão, a hipótese é de revogação do mandato,
até porque ‘suspensão da procuração’ é figura estranha no ordenamento
jurídico. De qualquer modo, seja suspensão, seja revogação, o fato é que o
agressor não mais poderá representar a vítima”.
O Magistrado poderá, nesses casos, suspender as procurações que foram outorgadas
pela vítima ao seu agressor, no prazo de 48 horas da comunicação feita perante a Autoridade
Policial.
Nesse sentido Dias (2010) esclarece:
“A proibição de celebração de contrato de compra, venda ou locação do
patrimônio comum deve ser comunicada ao Cartório de Registro de Imóveis.
Já a suspensão da procuração precisa ser informada ao Cartório de Notas.
Em todas as hipóteses, para que a decisão possa ser oponível a terceiros, é
aconselhável também a comunicação ao Cartório de Registro de Títulos e
Documentos”.
Por tratar-se de uma medida acautelatória, poderá ser exigida caução, a qual visará à
garantia de um direito que o juiz possa vir a reconhecer. Assim a caução consiste em colocar à
disposição do juízo bens ou um fiador que possa assegurar tal finalidade.
“Todas estas são medidas com natureza extrapenal, que podem ser
formuladas perante a autoridade policial quando do registro da ocorrência.
Desencadeiam o procedimento de medida protetiva de urgência a ser
enviado a juízo (art.12, III). Essas mesmas pretensões podem ser veiculadas
por meio das ações cautelares de sequestro, busca e apreensão, arrolamento
de bens, ou mediante outras medidas provisionais. Ainda que se trate de
ações cíveis, como a causa de pedir é a ocorrência de violência doméstica,
devem ser propostas perante os juizados de violência doméstica. Nas
comarcas em que esses juizados não estiverem instalados essas ações devem
ser propostas pela vítima no juízo cível ou de família e não na Vara
Criminal”. (DIAS 2010).
Ainda, visando demonstrar toda a proteção da lei em relação à mulher vítima de
violência, cumpre trazer os preceitos dos artigos 27 e 28 da referida lei, onde a vítima sempre
deverá estar amparada e orientada por advogados ou defensores públicos:
Art. 27. “Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em
situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de
advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei”.
Art. 28. “É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e
familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência
Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante
atendimento específico e humanizado”.
54
Desse modo, podemos observar que essas medidas protetivas de urgência se
caracterizam como inovadoras e contribuem de forma determinante para o sistema, o qual
visa garantir uma proteção de urgência às mulheres em situação de violência, visto que foram
introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro para dar mais eficácia ao combate à violência
doméstica e familiar contra a mulher.
4.3 DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA QUE OBRIGAM O AGRESSOR
No artigo 22 e seus incisos da lei 11.340/2006 – Maria da Penha preceitua as medidas
de urgência que obrigam o agressor:
“Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a
mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor,
em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência,
entre outras”:
I - Suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao
órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - Proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) Aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o
limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) Contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio
de comunicação;
c) Frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade
física e psicológica da ofendida;
IV - Restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a
equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - Prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
§ 1º As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras
previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as
circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao
Ministério Público.
§ 2º Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas
condições mencionadas no caput e incisos do art. 6º da Lei no 10.826, de 22
de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou
instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a
restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor
responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de
incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.
§ 3º Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o
juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.
§ 4º Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto
no caput e nos §§ 5º e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de
1973 (Código de Processo Civil) ”.
55
Diante disso, podemos observar que se trata de medidas voltadas a quem pratica a
violência doméstica, portanto, estarão sujeitos as seguintes obrigações e restrições:
4.3.1 Suspensão da posse ou restrição ao porte de armas.
Nesse caso a lei demonstra preocupação em deixar sem qualquer tipo arma quem faz
uso delas e as utiliza para praticar a violência doméstica. Como sabemos o Estatuto do
Desarmamento proíbe qualquer cidadão de possuir arma, sendo necessário o registro na
Polícia Federal quando de sua posse. O Juiz pode suspender ou restringir o porte dessa arma,
caso o agressor seja devidamente autorizado pela polícia federal, caso haja pedido feito pela
vítima, e, se o porte ou posse sejam ilegais e haja violações dos dispositivos legais, quem
ficará responsável pelas providências cabíveis será a autoridade policial.
Como descreve Dias (2010):
“Sendo legal a posse e o uso da arma de fogo pelo agressor, denunciando a
vítima à autoridade policial a violência e justificando a necessidade de
desarmá-lo, por temer pela própria vida, será instalado expediente a ser
remetido ao juízo. Deferido o pedido e excluído o direito do ofensor de
manter a posse da arma, ou sendo limitado o seu uso, deve-se comunicar a
quem procedeu ao registro e concedeu a licença: o Sistema Nacional de
Armas (SINARM) e a Polícia Federal. Caso o agressor tenha direito ao uso
de arma de fogo, segundo o rol legal, o juiz comunicará ao respectivo órgão,
corporação ou instituição que impôs. O superior imediato do agressor fica
responsável pelo cumprimento da determinação judicial sob pena de incorrer
nos crimes de prevaricação ou desobediência. A restrição é válida para evitar
tragédia maior. Se o marido agride a esposa, de modo a causar lesão
corporal, se possuir arma de fogo, é possível que, no futuro progrida para o
homicídio”.
4.3.2 Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida.
No inciso II do mesmo artigo está prevista a medida protetiva onde expressa que o
agressor poderá ser afastado do lugar onde reside ou convive com a ofendida, não importando
qual o tipo de moradia, podendo ser uma casa, um apartamento, um sitio, um quarto de hotel,
uma barraca, entre outros.
Atualmente essa medida é requerida pela maioria das mulheres ofendidas na tentativa
de minimizar eventuais riscos do agressor da prática de algum crime que possa acontecer,
trata-se de uma das medidas mais eficazes para cessar a violência.
Havendo desobediência dessas ordens judiciais, esse sujeito passivo estará sujeito as
penas do artigo 359 do Código Penal, ou seja:
56
“Desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito. Art.
359 - Exercer função, atividade, direito, autoridade ou múnus, de que foi
suspenso ou privado por decisão judicial:
“Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa”.
Vale ressaltar que nos casos onde o vínculo familiar já foi cessado, ou seja, não haja
mais nenhuma relação familiar entre agressor e ofendida, caso haja alguma outra perturbação
no lar da ofendida, esse agressor estará sujeito as penas previstas no artigo 150 do Código
Penal, ou seja, invasão de domicílio.
No mesmo sentido, Porto 2009 esclarece:
“Tratando-se de crime de menor potencial ofensivo, conforme determina o
art. 69, parágrafo único, primeira parte, da Lei 9.099/95, não se imporá
prisão em flagrante, ao autor do fato que assumir o compromisso de
comparecer em juízo. Todavia, tal regramento não pode ser aplicado quando
a desobediência recair sobre uma medida de proteção à mulher, vítima da
violência doméstica ou familiar contra a mulher. Frise-se que esta
desobediência a uma imposição judicial de medida protetiva, sempre, de um
modo ou outro, caracterizará uma das formas de violência contra a mulher de
que trata o art. 7º da Lei Maria da Penha”.
Havendo descumprimento dessa medida, o agressor estará sujeito a prisão em
flagrante por ter cometido a desobediência de ordem judicial, sempre que essa ação ou
omissão infrinja um dos elementos contidos nas medidas protetivas contidas na Lei nº
11.340/06.
4.3.3 Vedação de condutas em relação ao agressor.
Ainda é possível que haja proibição do sujeito agressor, para a prática de certas
condutas, levando em consideração que essa medida visa à prevenção de crimes e
consequentemente proteger as reais vítimas da violência.
Porém, como menciona Porto 2009:
“Há dificuldades estruturais do Estado em implementá-las. E, nesse ponto, é
bom ter presente que impor medidas que não poderão ser fiscalizadas ou
implementadas com um mínimo de eficácia é sempre um contributo para o
desprestigio da Justiça. De nada adianta o juiz justificar-se intimamente com
escusas do tipo: ‘isso é problema da polícia, do poder executivo, etc.’, pois,
na visão social, todos os órgãos – polícia, Poder Judiciário, advogados,
Ministério Público – estão entre as imbricadas e compreendem o grande
sistema de justiça, de modo que as falhas em quaisquer dessas engrenagens
depõem contra o todo sistêmico”.
Muito embora essas medidas protetivas sejam de difícil fiscalização, elas podem ser
deferidas, no entanto, essa imposição deverá ser bem analisada, afirma Porto 2009:
57
“Por exemplo, a fixação de distância entre agressor e agredida é uma dessas
medidas de escassa praticidade e difícil fiscalização. Já se viu pedidos em
que, a deferir-se a distância de afastamento pleiteada pela ofendida, o
suposto agressor teria que se mudar para o meio rural, pois o perímetro
urbano da pequena cidade onde ambos moravam, não lhe permitiria
continuar habitando a sede do município. Esta medida parece, todavia, ter
sentido naquelas hipóteses em que o agressor, obstinado em acercar-se da
vítima, segue-a teimosamente por todos os lugares, especialmente, para o
trabalho, causando apreensão e risco. Mas nesse caso em que o agressor
insiste em aproximar-se ou mesmo adentrar o local de trabalho da vítima, é
possível aplicar-lhe a proibição de frequência nesse local, conforme letra
‘c’”.
Ainda poderá ser deferida a proibição de comunicação, seja por qualquer meio, entre
agressor e vítima, incluindo seus familiares e testemunhas, quando continuam a prática dessas
ameaças, ofensas ou perturbação do sossego.
Com o avanço da tecnologia e com o grande número de aparelhos celulares, a vida
social tornou-se mais prática e por outro mais conturbado, visto que é notável a existência e o
aumento de criminalidade utilizando essas tecnologias, sejam pela prática de golpes,
extorsões, ameaças, crimes contra a honra, perturbação do sossego, que são muito comuns no
âmbito de violência doméstica.
Nesses casos é nítida que a aplicação da lei fica de difícil fiscalização, nesse sentido
Porto 2009, nos ensina como obter a prova dessas conversas telefônicas:
“Com efeito, na maioria das vezes a ocorrência ou não de crimes, bem como
se foi extrapolado o limite entre uma acalorada discussão recíproca e a
prática de ameaça ou ofensas refletidas e sérias é um tema de árdua
elucidação. Em primeiro lugar, em razão de à maioria desses delitos –
ameaça, crimes contra a honra, perturbação do sossego – ser aplicada penas
de detenção ou prisão simples, já não se admite a intercepção das
comunicações telefônicas ou telemáticas (art. 2º, III, da Lei 9.296/96). Tem-
se, contudo, possam ser requisitados os dados cadastrais dos titulares de
telefones utilizados para a prática de tais infrações, quando a vítima, através
de recurso disponível em seu aparelho receptor, tiver identificado a origem
das chamadas. Assim, será possível conhecer o autor da ligação, embora não
se tenha acesso ao seu conteúdo. Porém, quanto a este, é possível que a
vítima grave a conversa por conta própria, utilizando a gravação como prova
do delito contra si praticado – ameaça, constrangimento ilegal, ofensas –
pois tal proceder não constitui interceptação telefônica de uma conversa
entre terceiros, mas simples, meio de prova de uma dada comunicação
efetuada por um dos interlocutores”.
Destacamos, ainda, que além do contato com a vítima que pode constituir direito de
ameaça, constrangimento ilegal, crime contra a honra, ou perturbação do sossego, pode
constituir crime de extorsão, havendo a possibilidade de se constatar por meio de
interceptação telefônica, além do delito de coação, quando o sujeito ativo, entra em contato
58
com vítima, familiares da vítima ou até mesmo para intimidar as testemunhas, constrangendo-
as mediante ameaças para que alterem seus depoimentos ou renunciem a representação.
4.3.4 Restrição ou suspensão de visitas aos dependentes.
No que se refere à medida da restrição ou suspensão de visitas aos dependentes
menores, deve ser aplicada quando a violência estiver direcionada a eles, principalmente
quando são vítimas de violência sexual, tentativa de homicídio, tortura, além de maus-tratos.
Se apenas um dos dependentes for vítima da violência doméstica, as medidas podem ser
estendidas aos outros, pois também estão sujeitos ao risco. Caso haja apenas violência contra
a mãe, entende-se que não há razões para que as visitas sejam suspensas, portanto podem ser
restringidas quanto ao local e horário das visitas, além de ser proibida visitação, quando o
agressor se encontra em estado de alcoolismo ou após uso de entorpecentes, além de
frequentar determinados lugares não recomendados.
Se a mulher e seus filhos forem transferidos para um abrigo ou até mesmo para a casa
de seus familiares, essa restrição será mais rígida, pois este lugar deve ser mantido em sigilo,
e até mesmo não deve ser mencionado no processo, justamente para que o agressor não tome
conhecimento. Em relação às visitas aos dependentes, não serão proibidas, porém para que
isto ocorra deverá ter um local previamente indicado pela autoridade.
4.3.5 Fixação de alimentos provisionais ou provisórios.
Outra inovação trazida pela Lei 11.340/2006 foi a prestação de alimentos provisórios
ou provisionais, na qual determina que os alimentos poderão ser fixados pelo Juiz da Vara
Criminal ou ainda pelo Juiz da Vara do Juizado de Violência Doméstica e Familiar.
Quanto os alimentos provisionais ou provisórios, Porto 2009 esclarece que:
“O legislador usou as duas expressões para eliminar as discussões
semânticas sobre a suposta diferenciação entre alimentos provisionais ou
provisórios, visto que ambas significam, em linhas gerais, a fixação de
alimentos antes de uma decisão faz coisa julgada, de modo que, demonstrada
alteração no célere binômio necessidade- possibilidade pode o quantum ser
revisto a qualquer momento”.
[...]”Como regra, entende-se que alimentos provisórios são aqueles fixados
imediatamente pelo juiz, a título precário, ao receber a inicial, na ação de
alimentos do rito especial disciplinada pela Lei 5.478/68, ao passo que,
provisionais, são aqueles reclamados pela mulher ao propor ou antes de
propor, a ação de separação judicial ou de nulidade de casamento, ou de
divórcio direto, para fazer face ao seu sustento durante a demanda. Chamam-
se também provisionais os alimentos fixados na sentença de primeira
59
instancia, na ação de investigação de paternidade, de acordo com o artigo 5º
da Lei nº 883/49”.
A fixação desses alimentos torna-se imprescindível, visto que a dependência
econômica é o ponto que determina a submissão da própria mulher e de seus filhos, ao
patriarca agressivo.
No entanto, caso a ofendida tenha condições próprias de sobrevivência essa medida
não se torna necessária a ela, porém, é fundamental para os filhos, por se tratar de um direito
indisponível.
Tal medida cautelar se baseia na necessidade dos requerentes e também na
possibilidade que o requerido possui, desta maneira serão colhidas informações a respeito de
ambos, e também dos filhos, buscando obter as respostas sobre as necessidades básicas da
mulher e dos dependentes, ou seja, deve buscar informações como, de saber se os alimentados
estão em casa ou em abrigo. O Juiz também pode se informar a respeito do requerido através
de requisição a seu estabelecimento de trabalho, sua declaração de renda, informações da
previdência social.
Desta maneira o mesmo autor ainda afirma:
“Conforme já assinalado ao introduzir o tema das medidas cautelares, o
deferimento dos alimentos provisionais pressupõe o ingresso, por parte da
ofendida, por si ou em representação de seus dependentes, da competente
ação principal no prazo de trinta dias, na Vara de Família ou cível, visto que
não compete ao Juiz Criminal e nem mesmo ao Juizado de Violência
Doméstica e Familiar Contra a Mulher examinar ação de alimentos que,
notoriamente, não tem a violência doméstica por causa de pedir. No seio da
ação principal, ou até mesmo em seu exame liminar, poderá o juiz cível ou
de família, à vista de melhores elementos, rever os alimentos provisionais
fixados pelo juiz criminal, corrigindo eventual excesso ou insuficiência”.
(PORTO 2009)
Vale ressaltar a possibilidade dos alimentos gravídicos, que não são aqueles destinados
a cobrir despesas adicionais durante a gravidez desde a concepção até o parto. Esses alimentos
visam cobrir despesas referentes à alimentação da mãe, assistência médica e psicologia,
exames, internações, parto, medicamentos, etc.
As despesas devem ser custeadas pelo suposto pai em sendo ele o agressor, e após o
nascimento da criança, os alimentos gravídicos poderão ser convertidos em pensão
alimentícia, cabendo provar a paternidade somente baseada em indícios.
60
CAPÍTULO V
DA EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA E SUAS CONSEQUÊNCIAS
5.1 APLICABILIDADES DA LEI MARIA DA PENHA
A Lei Maria da Penha certamente trouxe um grande avanço na tentativa de minimizar
o problema da violência doméstica, mas talvez devido ao fato de ser muito recente, seu texto
ainda não passa de um conjunto de boas intenções.
Mesmo com tudo que trouxemos no presente trabalho, explicando detalhadamente
todas as formas de prevenção e combate à essa violência, devemos, ainda, observar que sua
aplicação e efetiva utilização esbarra na incerteza e insegurança que algumas mulheres têm
em relação a autoridades públicas e no despreparo de órgãos públicos para acolher e orientar
as vítimas.
Muito embora exista uma boa intenção do legislador em dar maior proteção às
mulheres vítimas de violência doméstica, a sua aplicabilidade está relacionada a dois
elementos primordiais que ocorrem constantemente nas delegacias de polícia e outros órgãos
do estado que tratam do assunto.
De um lado, está a postura da vítima bem como sua hesitação na possibilidade acusar
seu parceiro, isso é reforçado pela constatação de que muitas mulheres somente vão até as
Delegacias para denunciar as agressões e quando efetivamente precisam prestar seu
depoimento, trazer testemunhas, elas não aparecem mais, outras simplesmente aparecem
alegando que tudo se resolveu e que deseja retirar a queixa, que o agressor estava bêbado e
por isso fez aquilo, esquecendo no seu íntimo que “ele vai beber de novo” e aí poderá ser
agredida novamente, enfim, em muitos dos casos não dão prosseguimento ao inquérito
policial e consequentemente a ação penal ficará totalmente prejudicada.
Em outros casos, está a sensação da impunidade dos acusados, onde sempre se houve
que tudo aquilo “não vai dar em nada” que o agressor não será punido pelo que fez, que ele
agressor é amigo dos policiais e assim por diante.
Na realidade as vítimas de agressão querem uma ação mais severa do Estado em
relação a isso. No momento da discussão querem mesmo que seu agressor fique preso e
padeça juntamente com outros presidiários, “que ele morra na cadeia” e assim por diante.
Felizmente ou infelizmente isso realmente não ocorre, pois, a chance desse indivíduo
permanecer preso como querem essas ofendidas, é muito remota, visto que na maioria das
vezes os crimes por eles cometidos não são puníveis como pena de prisão. Somente mesmo
nos casos mais graves é que permanecem presos para garantir a eficácia das medidas
61
protetivas. Mas não se enganem, dificilmente esse agressor, que podemos chamar de
“agressor de fim de semana”, ficará preso mesmo sendo preso em flagrante cometendo o
delito, visto que pela nova sistemática e aplicação das prisões em flagrante, os delitos
cometidos com pena inferiores a quatro anos, estarão sujeitos à aplicação de medidas
cautelares com imposição de restrições e com previsão legal na Lei 12.403/2011, pois tem o
intuito de evitar um abuso de prisões preventivas, encarcerando o acusado primeiro para
depois se apurar os fatos.
Nesses casos temos outra agravante que podemos observar, caso seja determinada a
prisão desse indivíduo, provavelmente ele perderá seu emprego ou suas atividades laborativas.
É aí que a coisa começa a complicar. Porque como já vimos em capítulos anteriores, na
maioria dos casos, a Lei Maria da Penha é utilizada como recurso para tentar cessar uma
suposta agressão ocorrida naquele dia, ou seja, quando o agressor tomou umas a mais e a
esposa chamou-lhe a atenção e ele não gostou. Começa-se então aquela discussão banal e
chegando até a se agredirem. Lembrando que estou falando dos casos mais corriqueiros, não
àqueles casos que a mulher está sendo constantemente humilhada e agredida, seja física ou
psicologicamente.
Como já vimos no presente estudo, muitas somente querem darem “um susto” no seu
companheiro, esquecendo que com isso estará mobilizando todo o aparato do Estado, seja,
investigador, Delegado de Polícia, Ministério Público, Magistrados, servidores da Justiça,
Oficiais de Justiça, para no final das contas simplesmente queria que alguém advertisse seu
companheiro de que não pode fazer àquilo.
Então, entendo que os casos que possam ser mais complexos, acabam por não sendo
tratados com a devida seriedade a que deveria, porque na maioria das vezes essas pequenas
agressões nunca são presenciadas por testemunhas e quando são essas testemunhas
dificilmente querem testemunhar sobre o caso, ou então elas acontecem somente entre
agressor e ofendida, permanecendo, assim, a palavra de um contra o outro.
Outra situação que merece atenção são os casos de afastamento do agressor do lar
conjugal. Essa medida tem despertado uma atenção impar dos operadores do direito, visto que
em muito dos casos se trata de união estável, não se sabendo, portanto, de quem é o imóvel,
podendo nesses casos, ser determinada a retirada do lar do seu legítimo proprietário e
mantendo na residência àquela que sequer contribuiu para a aquisição daquele imóvel.
Também nos deparamos com aquelas medidas que determinam que o agressor não
deva se aproximar da ofendida, de seus filhos ou de seus familiares, seja por qualquer tipo de
62
contato, fixando-se uma distância dessa aproximação. Certamente essa medida não será
cumprida, pois, como exigir uma situação que não se possa controlar ou fiscalizar.
Vejamos uma situação em que agressor e ofendida moram num condomínio edilício,
por exemplo. Nesse caso, pode muito bem esse indivíduo ter outro imóvel no mesmo prédio e
daí privá-lo de acessar seu imóvel, fica um tanto complicado.
Por isso, as autoridades judiciais ao analisar cada caso em concreto, devem observar o
que realmente está por traz disso. Se for mesmo um caso de agressões contínuas ou
simplesmente foi uma atitude causada como o calor da discussão.
Relembrando que os motivos que levam muitas mulheres a se manterem num
relacionamento conjugal conturbado e violento são vários, dentre eles estão os casos de
manipulação mental em que o agressor envolve a vítima. Se nesse caso a ofendida querer
mesmo a separação, por não aguentar mais àquela situação, certamente àquele agressor
tentará convencê-la de que isso nunca mais acontecerá, e essas faltas promessas tem somente
uma intenção, ou seja, de que a vítima não o denuncie às autoridades. (SOUZA 2006).
Nesse sentido Souza 2006 diz;
“Outro forte motivador para que a mulher permaneça na relação violenta é a
banalidade com que o assunto da violência contra a mulher ainda é encarado
pela sociedade. Essa visão distorcida minimiza as agressões por meio de um
entendimento dos acontecimentos como oriundos de estereótipos impostos à
mulher, entendida como um ser frágil e sujeito a expectativas sociais que
nunca ultrapassam certos papéis predeterminados como inferiores. Nessa
concepção a violência contra a mulher torna-se um fato visto como
impossível de não existir na sociedade”.
Segundo Lucas 2006, outro foco importantíssimo é:
“A brandura com que as sanções são aplicadas aos agressores também é
vista como algo que desmotiva a mulher a sair de uma relação violenta.
Principalmente na classe trabalhadora, o respeito (ou medo) do marido é um
valor cultural sedimentado. Questionar essa realidade parece ir contra uma
estrutura de pensamento de conteúdo religioso, moral, econômico,
psicológico e social. Discutir sobre a submissão da mulher em relação ao
homem significa desarticular uma estrutura que embasa crenças e conceitos
antigos de dominação”.
Nesse sentido, observamos que a relação conjugal está esculpida num contexto social
e familiar de afinidades determinados pela nossa cultura respeitando os padrões sociais, os
quais definem a mulher como sendo submissa e a que é responsabilizada pelo conflito, ou
seja, a mulher vítima, na maioria das vezes acaba por assumir parte da responsabilidade pelo
fato ocorrido.
63
Portanto, essa situação faz com que a mulher continue no relacionamento violento,
visto que em muitas situações o abandono do lar conjugal acarretaria sentimentos de vergonha
pelo fracasso da sua relação e a percepção de falha na missão mais relevante das suas vidas,
ou seja, a de cuidar da própria família. Dessa forma, outro pretexto bastante frequente
utilizado pela vítima para não denunciar os maus tratos sofridos é o temor pela dificuldade de
criação dos filhos menores.
Enfim, são muitos e muitos fatores que levam as mulheres vítimas de violência
doméstica e familiar a não denunciarem as agressões sofridas, mantendo-se nesse
relacionamento conturbado até as últimas consequências.
5.2 – DA EFICÁCIA / INEFICÁCIA DA APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA.
Como vimos no desenrolar do presente estudo, muitas mulheres têm seus direitos
cerceados a todo instante no Brasil. Em muitos casos são agredidas, violentadas e muitos
casos não são denunciados por medo ou por qualquer outro motivo, as quais se escondem ou
se omitem na triste realidade em que vivem, pois constantemente são amedrontadas diante das
ameaças de seus parceiros.
Foi por esse motivo que graças a luta de várias mulheres e movimentos feministas que
surgiu a Lei Maria da Penha que as deu coragem para pedir socorro e dar um fim a essa
realidade vivida em seus lares, destruindo sonhos e famílias.
É perceptível que toda violência doméstica e familiar, embora haja proteção à essas
vítimas, não podemos deixar que essas situações fiquem a cargo somente do direito penal e do
Poder Judiciário, cabendo também ao Poder Executivo o dever de implantar programas
sociais com auxílios de equipe multidisciplinar com assistentes sociais e psicólogos para que
essas famílias sejam atendidas e encaminhadas, visto se tratar de um problema social.
Cabendo, no entanto, aos órgãos do Estado, a união de forças na tentativa de acabar com esse
tipo de agressão nos lares brasileiros.
Em artigo publicado no site do Tribunal de Justiça de São Paulo 2016, a Juíza Teresa
Cristina Rodrigues dos Santos, integrante da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação
de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário do Estado de São Paulo (COMESP),
esclarece que as medidas protetivas é uma das formas mais precisas de coibir a violência e
proteger a vítima:
“Tenho percebido no relato das vítimas que, na maior parte das vezes, a
simples intimação/cientificação do agressor resolve o problema. Nos casos
em que o ciclo de violência se encontra instalado e a possibilidade de defesa
64
e proteção são mais complicadas, é muito importante que haja atenção
específica. Quando concedo medidas de proteção em situações mais graves,
informo à vítima alguns procedimentos que entendo pertinentes, como ter
uma cópia do mandado sempre em mãos, não ficar sozinha com o agressor
no mesmo espaço físico e, em caso de suspeita de agressão, ligar apara a
polícia e procurar a companhia de terceiros que possam ajudar. Conhecer a
violência, saber valorá-la e classificá-la, saber quando agir e de que forma
agir é essencial se queremos ter uma sociedade onde a violência não mais
exista”.
Esclarece ainda, que:
“Só em 2015, foram concedidas 10.711 medidas protetivas nos mais de 70
mil processos em andamento na Capital. No interior, a realidade não foi
diferente, dos 11.700 feitos em curso, foram expedidas 4.100 medidas, entre
elas a restrição de visitas do agressor aos dependentes, proibição de
frequentar determinados lugares, de aproximação com a vítima e
afastamento do lar. Nada perto das 15.322 audiências realizadas e das 12.490
sentenças proferidas em todo o Estado”. (SANTOS, 2016).
Em matéria penal já vimos quais as medidas que podem ser tomadas pelo Judiciário
para tentar coibir esses acontecimentos, que infelizmente ocorrem constantemente nos lares
de nosso país, mas daí nos vem à pergunta: “será que somente isso basta”?
A legislação penal trouxe algumas penas restritivas de direito, que podem ser
impostas os agressores que praticam a violência doméstica e familiar contra a mulher. Entre
elas podemos listar a limitação de fim semana prevista no artigo 43, VI do Código Penal que
consiste na obrigação do agressor em permanecer por no mínimo 5 horas, aos sábados e
domingos e feriados, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado ao
cumprimento da medida (CP, art. 48).
No período em que estiver nesse estabelecimento adequado, poderão ser ministrados
cursos ou palestras ou ainda atribuídas atividades educativas. (CP, art. 48, parágrafo único;
LEP, art. 152).
Além disso, o Juiz da Execução penal poderá determinar que o sentenciado frequente e
comparece a programas de recuperação e reeducação, sendo que o seu comparecimento é
obrigatório, sob pena de ser cassado o benefício.
Poderá, ainda, determinar a aplicação de outras medidas como a “prestação de serviço
à comunidade ou a entidades públicas, além da interdição temporária de direitos e perda de
bens e valores” (CP, art. 43, II, IV, V e VI).
Essas medidas são tomadas visando que o agressor se conscientize da gravidade de
seus atos e que não deverá mais praticá-los, pois não são donos das mulheres, acabando com
esse tipo de crime cometido de forma abusiva e contínua.
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Aí vem a questão da eficácia ou ineficácia da aplicação das medidas impostas. Então
vejamos. Todos nós sabemos que o Estado não dispõe de todo o aparato necessário para que
as medidas sejam aplicadas, em muitas cidades não temos mesmo Casa do Albergado e muito
mesmo profissionais capacitados na área de assistência social e psicologia. Nem ao menos as
entidades assistenciais querem a prestação dos serviços comunitários desses sentenciados,
visto o seu histórico de agressividade.
Muita embora seja obrigação do Estado de garantir a capacitação permanente dos
profissionais que lidam com a atenção da vítima e aos agressores, isso nem vem ocorrendo na
maioria dos municípios do nosso Estado.
Neste sentido Dias, 2010, destaca as ações que Estado deveria implantar para coibir as
essas agressões:
a) “Fomentar o conhecimento e a observância do direito da mulher a uma
vida livre de violência e o direito da mulher a que se respeitem e protejam
seus direitos humanos”;
b) Modificar os padrões socioculturais de conduta de homens e mulheres,
incluindo a construção de programas de educação formais e não-formais
apropriados a todo nível do processo educativo;
c) Fomentar a educação e capacitação do pessoal na administração da
justiça, policial e demais funcionários encarregados da aplicação da lei assim
como o pessoal encarregado das políticas de prevenção, sanção e eliminação
da violência contra a mulher;
d) Aplicar os serviços especializados apropriados para o atendimento
necessário à mulher, por meio de entidades dos setores público e privado,
inclusive abrigos, serviços de orientação para toda família;
e) Fomentar e apoiar programas de educação [...]
f) “Oferecer à mulher, acesso a programas eficazes de reabilitação e
capacitação que lhe permitam participar plenamente da vida pública, privada
e social”.
Tais medidas dariam suporte às mulheres ofendidas de buscar ajuda das autoridades
competentes, visando coibir certas agressões e consequentemente a sua segurança.
As medidas protetivas constantes da lei Maria da Penha são justamente para proteger a
vítima e visa reprimir a ação do agressor. Muito embora, vemos que não tem sido isso a
realidade do dia a dia, visto que as mulheres ficam à mercê do seu companheiro violento.
Em seu texto a Lei 11.340/2006 traz que:
“A Lei Maria da Penha estabelece que a autoridade policial deverá adotar
providências legais cabíveis, assim que tiver conhecimento da prática de
violência doméstica. Deve ainda: garantir à mulher a proteção policial;
encaminhá-la ao hospital, posto de saúde ou ao Instituto Médico Legal;
fornecer abrigo ou local seguro quando ficar configurado o risco de vida;
acompanhá-la ao local da ocorrência, a fim de assegurar a retirada dos seus
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pertences; e informar os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços
disponíveis “. (BRASIL, 2006).
Como podemos ver a intenção maior da criação da lei foi o de proteger a vítima do seu
agressor. Se por um lado for aplicada com eficiência, certamente trará seus resultados
frutíferos, mas, por outro, diante da falta de estrutura dos órgãos competentes, ainda existem
falhas para executá-las.
É perceptível que em muitos casos, as mulheres que são vítimas de agressão, têm
reclamado e denunciado seus agressores, porém, as medidas de proteção não estão sendo
aplicadas adequadamente conforme a lei determina, deixando sempre uma lacuna, uma dúvida
na denúncia trazida por essas mulheres.
Muito embora em alguns estados brasileiros houvesse avanço na criação de
instituições destinadas a inibir essa violência machista contra as mulheres, principalmente
com a criação de diversas Delegacias de Defesa da Mulher, inclusive com o surgimento de
algumas casas-abrigo para essas vítimas, ainda carece de se fazer muito, pois não são todos os
municípios que foram contemplados com esses órgãos especializados para lidar com o
combate a violência contra a mulher. Lembrando que há muito constrangimento por parte das
vítimas em serem atendidas por investigadores, delegados de polícia do sexo masculino. Seja
pelo deboche ou pelo constrangimento de revelar suas necessidades.
Portanto, mesmo com todo o esforço estatal de se criar mecanismos necessários a se
combater esses casos, ainda não está sendo suficiente para aplicar a legislação com eficiência
e que os órgãos criados para executar sejam operados adequadamente.
Neste sentido, em artigo publicado sobre o tema, Alves 2010 nos traz que a própria
vítima que desencadeou toda a criação da lei desabafa num ato desesperador “deveria ter uma
lei para prender imediatamente esses agressores em virtude de ameaça. Só assim seriam
diminuídos os ataques contra as mulheres”. (Alves 2010).
Segundo o autor Alves 2010 ainda esclarece que:
“Diante dessa colocação, ela incita que a lei que leva o seu nome demonstra
ineficácia. É lamentável quando a própria inspiradora da Lei faz esse
desabafo, uma vez que, a Lei dá diretrizes à proteção da vítima e a punição
do agressor, observando assim que não há ineficácia na lei e sim na sua
aplicabilidade. Mediante a forma de como a Lei “.
A Lei Maria da Penha pode ser eficaz e competente, porém, há muitas falhas na sua
aplicabilidade, isso ocorre tanto nas esferas do Poder Executivo, no Poder do Judiciário e
ainda no órgão do Ministério Público, o que gera aquela sensação de impunidade, visto a
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dificuldade na apuração do fato concreto, conforme afirmou o jurista Miguel Reale Júnior em
entrevista realizada ao Jornal Recomeço, com a Tribuna do Direito, 2010:
“Não adianta reformar a lei se não ocorrer uma mudança de mentalidade. Há
uma resistência, especialmente na Magistratura, na adoção de novas
medidas. Não é um fenômeno que ocorre só no Brasil, mas também em
vários outros países, onde foram criadas as penas restritivas, que são fáceis
de serem aplicadas, de ser controladas e cujo resultado no plano preventivo e
também como punição é extraordinário. E se não se aplica gera-se a
impunidade”.
O Estado se torna negligente em face da ausência de providências públicas em coibir e
prevenir atos violentos contra a mulher, já que, a lei 11.340/06 se mostra eficiente quando
disciplina a sua aplicação, visto que determina punição a quem comete violência doméstica e
proteção a parte violentada.
O poder público nesse caso é falho, pois se agisse com responsabilidade e possibilitar
ações corretas na criação de projetos, que deem segurança as mulheres que são agredidas por
seus companheiros.
Em entrevista ao site O Globo, o Ministro Gilmar Mendes (2009) afirmou que a
ampliação da lei envolve "uma série de aprendizados sendo preciso subsídios
multidisciplinares" e em casos de violência doméstica contra mulheres, a Justiça deve "calçar
as sandálias da humildade" e consultar pessoas que são vítimas e profissionais de outras áreas.
“Nossas decisões, muitas vezes, têm eficácia limitada”. (MENDES 2009).
Mendes (2009) afirmou ainda que:
“O juiz tem que entender esse lado e evitar que a mulher seja assassinada.
Uma mulher, quando chega à delegacia, é vítima de violência há muito
tempo e já chegou ao limite. A falha não é da lei, é na estrutura”.
Nesse caso o Ministro reforça o que já dissemos, que em muitos municípios brasileiros
não têm delegacias especializadas, centros de referência ou mesmo casas de abrigo.
Destacou ainda Mendes (2009) que:
“É dever da administração pública, criar mecanismos para proteger as
vítimas de violência. Enquanto a lei garante direitos às mulheres violentadas,
o papel do governo é promover condições favoráveis na proteção da vítima,
construindo abrigos dignos com profissionais competentes para
ressocialização do ser humano que sofreu traumas psicológico, físico e
moral. Se a administração pública não cria as casas de albergados, o
Judiciário acaba sendo obrigado a transformar a prisão albergue em prisão
domiciliar, apesar de a lei de execução proibir terminantemente isso”. O que
é a prisão domiciliar? É nada, é a impunidade. Você tem uma impunidade
que decorre do fato de a administração pública não criar os meios
necessários de a magistratura aplicar a lei, de o Ministério Público controlar.
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De outro lado, a inoperância policial. “Porque a impunidade não está na
fragilidade da lei, está na fragilidade da apuração do fato”.
Logo, se faz necessário à celeridade na aplicabilidade da lei Maria da Penha em punir
com rigor àqueles que promovem a violência, buscando condições e agilidade no
cumprimento dessas leis contra os possíveis agressores no âmbito familiar.
Por isso, observamos que a ineficácia não está na Lei Maria da Penha, vez que nela
está disciplinado e muito bem claro todas as situações prováveis nos casos de violência contra
a mulher, no entanto, vimos óbice no cumprimento e na execução dessas medidas, pois o
Estado ainda não disponibilizou o suporte necessário, montando uma estrutura adequada para
acolher essas situações, seja preparando os agentes policiais, equipando viaturas, construindo
abrigos dignos com profissionais habilitados e competentes na área de psicologia e assistência
social, entre outras, para que possam amparar essas vítimas para que possam levar uma vida
livre da violência e do desespero.
Todas as questões levantadas no tocante à eficácia ou ineficácia na aplicação da Lei
11.340/2006, podem ser observadas nos gráficos e levantamentos apresentados no site do
Tribunal de Justiça do Estado São Paulo conforme abaixo demonstraremos no que diz
respeito às medidas protetivas solicitadas pelas ofendidas nas Varas Especializadas de
Violência Doméstica e Familiar.
5.3 – DADOS ESTATÍSTICOS DAS VARAS ESPECIALIZADAS E ANEXOS DA
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER (CAPITAL E INTERIOR)
Enquanto em todas as cidades do Estado não forem instalados os Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as Varas Criminais acumularão as
competências Cível e Criminal, conforme disposto no art. 33 da Lei 11.340/06, que por
enquanto, terão o dever de conhecer e julgar as causas decorrentes desse tipo prática de
violência doméstica, estabelecendo ademais, que esses processos têm preferência, no que diz
respeito ao seu andamento e julgamento em relação aos demais protocolados na Vara
Criminal.
Nas cidades polos, o Estado tem fornecido toda a estrutura e meios necessários para
que as mulheres vítimas da violência doméstica sejam atendidas com mais dignidade o que
corrobora com o encorajamento para denunciar seus agressores. Nesses polos são oferecidas
equipes multidisciplinares e equipe adequada para que essas mulheres se sintam à vontade e
sejam assistidas e acompanhadas em toda a fase do processo.
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No Estado de São Paulo ainda são poucas as Varas Especializadas no que tange a
Violência Doméstica contra a Mulher, e atualmente estão distribuídas da seguinte maneira:
Na Capital:
Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher Central - Endereço: Foro
Ministro Mário Guimarães - Avenida Abrahão Ribeiro, nº 313 - 1º andar - Rua 6, sala
518 - CEP: 01133-020. Telefones: 2127-9668 e 2127-9669;
Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Região Norte -
Endereço: Foro Regional de Santana. Av. Dr. Engº Caetano Alvares nº 594 - CEP:
02546-000. Telefones: 3951-2525 ramal 265;
Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Região Sul 1 -
Endereço: Foro Regional de Vila Prudente - Avenida Sapopemba nº 3740 - CEP:
03345-000. Telefone: 2211-0179;
Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Região Sul 2 -
Endereço: Foro Regional Santo Amaro - Avenida Adolfo Pinheiro, 1992, 4º andar -
CEP 04734-003. Telefones: 5522-8833 ramal 222;
Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Região Leste 1 -
Endereço: Foro Regional Penha de França - Rua Doutor João Ribeiro nº 433 - CEP:
03634-010. Telefones: 2093-6612, ramais 6243, 6244 e 6245;
Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Região Leste 2 -
Endereço: Foro Regional de São Miguel Paulista - Rua Afonso Lopes de Baião nº
1736 - CEP: 08040-000. Telefones: 2052-8098 - ramal 245;
Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Região Oeste -
Endereço: Foro Regional do Butantã – Av. Corifeu de Azevedo Marques, nº 148/150 -
1º andar - sala 117 - CEP: 05582-000. Telefones: 3721-3201 e 3721-6615 (gabinete).
No Interior:
Guarulhos: Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
Endereço: Foro de Guarulhos - Rua Ipê nº 171 - Centro - Guarulhos. Cep: 07090-130.
Telefones: 2408-5861;
Ribeirão Preto: Anexo de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
Endereço: Foro de Ribeirão Preto - Rua Alice Alem Saad, nº 1010, 2º andar - Nova
Ribeirânia - CEP 14096-570, Telefone: (16)3629-0004, ramal 6062;
São José dos Campos: Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
Foro de São José dos Campos - Av. Salmão, 678 - Parque Residencial Aquárius. Cep:
12246-260. Telefone: (12) 3878-7121;
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Sorocaba: Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
Endereço: Foro de Sorocaba. - Rua 28 de Outubro, 691 - Alto da Boa Vista. Cep:
18087-080. Telefone: (15) 3228-5148;
Suzano: Anexo de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
Endereço: Foro de Suzano - Rua Francisco Quadra Castro, nº 48 - Vila Costa - CEP
08675-170, Telefone: (11) 4742-4856.
MAPA ESTATÍSTICO – 1º GRAU – VARAS ESPECIALIZADAS DA CAPITAL –
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER – ANO 2015.
Fonte: Serviço de controle do Movimento Judiciário de 1º Grau – Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
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MAPA ESTATÍSTICO – 1º GRAU – VARAS ESPECIALIZADAS E ANEXOS DO INTERIOR
– VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER – ANO 2015.
Fonte: Serviço de controle do Movimento Judiciário de 1º Grau – Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
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Somente numa análise superficial das planilhas apresentadas das Varas Especializadas
de Violência Doméstica em 2015, tanto nos Foros da Capital como nas do Interior, podemos
observar a grande quantidade de medidas protetivas concedidas nessas Varas.
Também, observa-se a quantidade de medidas protetivas arquivadas, certamente
porque não trouxeram condições mínimas para que fossem concedidas.
É possível, ainda, observar pelos dados apresentados a quantidade de inquéritos
policiais arquivados e consequentemente essas medidas protetivas também perderam sua
eficácia, posto que não foram trazidos para os autos, elementos suficientes e convincentes
para oferecimento de denúncia por parte do Ministério Público.
No mais, as planilhas apresentadas confirmam que quando os fatos são narrados com
coerência ou devidamente constatados pela Autoridade Policial, de imediato são tomadas as
providencias necessárias no sentido de vislumbrar uma proteção mais célere para esses casos,
visto que merecem um atendimento especial e preferencial.
Essas providências são realizadas no âmbito das autoridades judiciárias, tanto na
Capital como nas Varas Especializadas do Interior do Estado de São Paulo.
Ademais, vale observar que em muitos dos casos são de pequenas discussões, ou seja,
desentendimentos de momento, que culminam com xingamentos e ameaças, mas as ofendidas
acabam por não denunciar seus agressores, como já mencionado no presente trabalho.
Muitas vezes, essas mulheres, acabam por se dirigir até as Delegacias ou mesmo ao
Ministério Público ou ao Judiciário para “retirar a queixa”, dizendo que “foi coisa de
momento”, “ele estava sob os efeitos do álcool ou drogas” e assim por diante.
Também ressaltamos os casos em que os processos são arquivados pelo órgão do
Ministério Público, seja pelo fato da vítima não dar prosseguimento na representação
processual, operando, nesse caso o prazo decadencial, ou porque os elementos de convicção
colhidos nos autos são frágeis e não revelam certeza no diz respeito à materialidade e até
mesmo quanto à autoria do delito.
Às vezes diante da ausência de justa causa para dar prosseguimento ao feito, esses
inquéritos acabam por serem arquivados, vez que os elementos trazidos no bojo dos autos são
insuficientes para oferecimento de denúncia.
Temos, ainda, os casos onde o processo tem o seu seguimento natural com
oferecimento de denúncia, apresentação de defesa, oitiva de testemunhas e produção de
provas, mas quando a vítima vai ser ouvida em audiência, acaba por relatar em seu
depoimento que o casal reatou a convivência conjugal, mesmo havendo possibilidade de
haver qualquer outro tipo de violência.
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Nesses casos as ações penais acabam sendo julgadas improcedentes e consequente é
julgada extinta a punibilidade do agente, visto que a própria vítima praticou ato que não
condiz com a situação anteriormente relatada, não havendo porque o Estado intervir nessa
situação, onde a própria vítima aceita e quer, mesmo assim, manter o relacionamento
conjugal.
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CONCLUSÃO
Neste trabalho falamos acerca da Lei 11.340/2006, onde demonstramos que existem
vários tipos de violência doméstica contra a mulher e que estas ocorrem muito mais do que o
imaginamos.
Infelizmente ainda existem muitas mulheres que não denunciam seus agressores por
vários motivos, seja por vergonha de exporem suas vidas matrimoniais ou seja pelo principal
motivo, deixam de denunciar ou não querer que a ação prossiga em face da dependência
financeira. Outro fator muito importante que trouxemos neste trabalho, foi o fato do Estado
ainda não se encontrar preparado para acolher as mulheres vítimas de violência doméstica.
Em sendo assim, a agredida faz o boletim de ocorrência e depois fica à mercê dos
agressores, visto que não tem para onde ir e consequentemente acabam voltando para suas
casas e muitas vezes são agredidas novamente, por ter ido até a delegacia.
Ressalte-se, ainda, que outro fato da impunidade dos agressores, é quando na
audiência designada para oitiva da vítima, com previsão legal no artigo 16 da referida Lei, a
agredida diz que não quer prosseguir com o processo para não prejudicar seu marido ou
companheiro, apenas queria lhe “dar um susto”. Além da agravante que essa mulher não
trabalha e juntamente com seus filhos menores dependem financeiramente daquele que a
agrediu, e que ele só faz isso quando bebe ou está nervoso, mas que é o provedor da família.
Na maioria das cidades com exceção de algumas capitais, não existe programa de
proteção a essas mulheres que sofrem violência doméstica, ficando, portanto, à mercê de seu
agressor.
Conclui-se, portanto, que muito embora na Lei 11.340/2006 tragam mecanismos para
coibir essas agressões, o Estado deve desenvolver políticas públicas, disponibilizando
infraestrutura e equipe multidisciplinar para acompanhar essas mulheres, desenvolver
campanhas em sistemas de rádio e televisão para conscientizar a população que devem
denunciar os casos de abusos contra a mulher.
Enfim, para que haja uma melhor aplicabilidade da Lei Maria da Penha no que tange
as mulheres vítimas de violência doméstica, será preciso que conjuntamente a lei ocorra uma
ação em todos os segmentos sociais e institucionais no sentido de transformar novas relações
entre as pessoas e de modo a melhorar o seu convívio. Somente assim, teríamos melhores
mecanismos de prevenção, de proteção e de punição aos crimes domésticos atentados contra a
mulher diminuindo consideravelmente os dados estatísticos apresentados no presente
trabalho.
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