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Versão corrigida e melhorada após defesa pública

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Relatório de estágio apresentado para a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da

Universidade Nova de Lisboa, para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção

do grau de Mestre em Artes Musicais realizado sob a orientação científica de Professora

Doutora Isabel Maria Pires.

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“(...) efeitos especiais não são mais do que a electrizante

diferença entre a imaginação do demiurgo que é o realizador e a

apatia das coisas filmadas quando são só filmadas.”

(António de Macedo, 2007, 4)

“We gestate in Sound and are born into Sight.

Cinema gestated in Sight and was born into Sound.”

(Walter Murch, 1994, vii)

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Agradecimentos

Agradeço antes de mais, à minha família, principalmente aos meus pais Bela e

Zé e à minha irmã Catarina (Lil Pi), pelo apoio incondicional. Á Vanessa pela presença

e força inspiradora. Ao meu colega de casa Carlos por todo o apoio, orientação,

conselhos e paciência. Ao Fernandinho pela ajuda, companheirismo e longas conversas.

A todos os meus meninos do estúdio, o João Azevedo, o Carlos Ferreira, o Tiago e o

Elvis Veiguinha, pela ajuda, partilha de conhecimentos e experiências e pelo carinho

com que me receberam. Fizeram com que me sentisse em casa.

Aos meus colegas de mestrado e parceiros de luta. A todos os meus amigos,

familiares e conhecidos que ao longo dos anos sempre alinharam nos meus projectos e

experiências, e me ajudaram sem questionamento. Ao Ricardo Mascarenhas, ao Liam, à

minha prima Xana e ao menino Henrique, e à minha tia Elsa.

Agradeço à minha orientadora, a Professora Doutora Isabel Maria Pires.

A todos os grandes técnicos de som, foley arstists, misturadores, sonoplastas e

sound designers, os mágicos escondidos, que desde sempre me inspiraram.

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Resumo

A banda sonora de um filme faz-nos acreditar que tudo é real. Ela é capaz de nos

provocar um diverso conjunto de emoções e de nos transportar através do tempo e do

espaço para os locais mais improváveis. Com o passar do tempo e de acordo com o

contexto e realidade cultural, a forma como o som é trabalhado para o cinema tem vindo

a alterar-se. Este estágio culmina na actual pesquisa que analisa o quanto algumas

dessas alterações são importantes; enquanto outras podem ser entraves e limitações à

essência dos sons. A presente investigação tem como objecto de estudo o som na

narrativa audiovisual e a percepção dessa narrativa por parte do espectador. Com o

estágio pretende-se compreender os processos e as escolhas durante o desenvolvimento

da componente sonora para o cinema, em Portugal, e analisar o porquê destas mesmas

práticas e selecções. No desenvolvimento deste relatório serão descritas as práticas

diárias no estúdio, bem como a importância de vídeos de apoio e experiências

audiovisuais. A pouca exploração das potencialidades sonoras para enaltecer a narrativa,

faz o som parecer apenas um acessório, um apêndice à imagem. Conclui-se que o

espectador manifesta não ser muito exigente com a qualidade sonora das peças. A

questão parece estender-se além das audiências, atingindo também os responsáveis pela

produção do conteúdo audiovisual. Estas últimas observações são consequência uma da

outra.

Palvras-chave: Audiovisual, Percepção, Som no Cinema, Narrativa,

Workflow.

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Abstract

The soundtrack makes us believe that everything is real, it induces a multiplicity

amount of emotions and take us throughout the timeline and space to the most unlikely

places. Over time, according to the context and cultural reality, the way how sound is

worked for cinema has been changing. This internship culminates in this research that

analyze how much some of that differences are relevant, while others may be a barrier

and a limitation for the sound substance. This investigation explores the sound in the

audiovisual narrative, and the perception of that narrative by the receiver. Through this

internship it is intended to understand the process and choices made in the development

of the sound component, in Portugal, and to analyze why these methods and

preferences. In the development of this report will be described the daily studio

practices, as well as the importance of the back up videos and audiovisual experiences.

The faculties of sound to enhance the narrative are still unexploited, most of the time

appearing that sound is just an accessory, an appendix for the image. In conclusion, the

audience seems to be undemanding with the sound quality of the objects. This issue

seems to go extend beyond the spectator, reaching also those responsible for audiovisual

content production. These last observations are consequences one of the other.

Keywords: Audiovisual, Perception, Sound in Cinema, Narrative,

Workflow.

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Lista de Abreviaturas

ADR: Automated Dialogue Replacement.

DAW: Digital Audio Workstation.

LFE: Low Frequency Effects.

RTP: Rádio e Televisão de Portugal.

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Índice

1. Introdução 1 ..................................................................................................................

1.1. Problemática 2 ........................................................................................................

1.2. Hipóteses 3 .............................................................................................................

1.3. Objectivos 4 ............................................................................................................

1.4. Breve Introdução à Metodologia 5 .........................................................................

1.5. Limitações da Pesquisa 6 ........................................................................................

2. Apresentação da Empresa 8 ..........................................................................................

2.1. O Estúdio 8 .............................................................................................................

3. Estado da Arte 11 ..........................................................................................................

4. Metodologia 15 .............................................................................................................

4.1. Os Vídeos de Apoio 15 ...........................................................................................

4.2. Experiência Contact 16 ...........................................................................................

4.3. Trabalhos Desenvolvidos no Estúdio 18 ................................................................

4.3.1. Contacto com o Software 18 ............................................................................

4.3.2. Mistura 5.1 Longa-Metragem Carga 19 ...........................................................

4.3.3. Locuções 20 .....................................................................................................

4.3.4. Série Teorias da Conspiração 20 ......................................................................

4.3.5. Documentário Até Que o Porno nos Separe 22 ................................................

4.3.6. Foley 23 ............................................................................................................

4.3.7. ADR 24 .............................................................................................................

4.3.8. Mistura Para Publicidade 25 .............................................................................

5. Resultados e Análise 26 ................................................................................................

5.1. O Uso abusivo das Bibliotecas de Sons 27 .............................................................

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5.2. Análise dos Vídeos de Apoio 28 ............................................................................

5.3. Análise da Experiência Contact 30 .........................................................................

5.4. ADR, o que acontece em Portugal 33 .....................................................................

6. Conclusão 36 .................................................................................................................

Bibliografia 39 .....................................................................................................................

Lista de Software 43.............................................................................................................

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1. Introdução

A audição é o sentido que nunca desliga e o ouvido é o órgão sensorial que

nunca descansa, aquele que nos mantém em estado de alerta. Nós começamos a ouvir

mesmo antes de nascermos. Ouvimos a voz da nossa mãe, os seus batimentos cardíacos,

os ruídos dos seus órgãos e as pessoas ao seu redor, aponta Walter Murch no prefácio de

Audio-Vision de Chion (1994, vii). Murch regista também que durante o período de

gestação a audição é o sentido dominante, uma vez que a escuridão e a componente

líquida do interior do útero tornam a visão e o cheiro impossíveis, o gosto limitado e o

tacto apenas uma suposição generalizada das sensações.

Os seres humanos, desde o momento em que nascem, desenvolvem os seus

sentidos, e cada vez mais nos deparamos com uma sociedade contemporânea que

demonstra ser muito mais visual do que auditiva. O uso de expressões como “dá aqui

um olhinho”, “dar uma vista de olhos” ou “ponto de vista” que muitas vezes são usadas

para situações maioritariamente sonoras, evoca a observação de um público cada vez

mais dominado pelo impacto visual em detrimento do som, veja-se o exemplo: “dá um

olhinho ao telefone, caso ele toque”, ou, “já vais ver” (acerca de uma alteração ao nível

sonoro). Laurent Julier (2007) aponta um evento curioso que suporta também a

observação anterior, o autor comenta o facto de fazer parte dos nossos hábitos

regressarmos de férias com vídeos e fotografias para mostrarmos aos amigos, mas seria

invulgar se fizéssemos gravações de som, e particularmente fora do habitual, se as

mostrássemos aos nossos amigos.

Devido ao seu caracter subtil e de constante presença, tomamos o som como

garantido no sentido em que não lhe damos o seu valor merecido. Consequentemente,

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existe uma dificuldade de expressão sobre os sons por parte do comum espectador. Esta

última observação constitui a motivação para a investigação actual.

Hearing, in other words, is the telepathic sense that we

take for granted (until we lose it) and the sounds in our

environment are highly informative, very rich, and not rarely

enjoyable. (…) If you have read other introductory texts on

hearing, they will probably have told you, most likely right at

the outset, that “sound is a pressure wave, which propagates

through the air.” That is, of course, entirely correct (...)

Fascinating as it may be to try to visualize all these wave

patterns, these sound waves certainly do not describe what we

“hear” in the subjective sense. (Schnupp, Nelken e King, 2011, 1

- 2)

1.1. Problemática

No cinema, o som pode ser explorado por forma a sugerir elementos ou

sensações não presentes de forma directa na imagem, ou seja, a sua origem não é

visível. A nível emocional e de percepção, inquieta-nos mais aquilo que não vemos, mas

que é sugerido. Frequentemente essa sugestão é preparada auditivamente. “So the cause

is heard on the soundtrack while its consequences shimmer in the image. But in the

spectator's mind is a synch point all the more disturbing for being postulated but not

actualized (…) ” (Chion, traduzido por Gorbman, 1994, 60)

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Algumas questões referentes à manipulação sonora na construção da narrativa

cinematográfica, como as questões de pontuação, gestão de expectativas e ritmo não

estão a ser consideradas em muito do trabalho que é feito em Portugal. Esta inércia e

condescendência por parte dos criativos e técnicos é consequência da falta de interesse

por parte da audiência? A perda de interesse do espectador é consequência da aparente

negligência por parte dos criativos? Esta falta de interesse está a ser confundida com

uma dificuldade de expressão e comunicação relativamente à banda sonora ? Existe um 1

empenho em encontrar novas expressões para dialogarmos acerca de sons, ou estamos

cada vez mais afastados deste objectivo?

Why say “a sound”, when we can say “crackling” or

“rumbling” or “tremolo”? Using more exact words allows us to

confront and compare perceptions and to make progress in

pinpointing and defining them. The simple fact of having to seek

in language what you already have before your ears incites you

to be more finely attuned to sounds. (Chion, traduzido por

Gorbman, 1994, 186 - 187)

1.2. Hipóteses

No desenvolver da pesquisa de campo, verifica-se que o espectador, esteja ou

não relacionado com o meio dos audiovisuais e das artes, possuí grande dificuldade em

discutir o som e expressar o que ele ouve, sente ou interpreta após a audio-visualização.

De acordo com vídeos de apoio realizados , parece haver uma dificuldade por parte dos 2

espectadores em relação à expressão verbal daquilo que ouvem ou que gostariam de

Por banda sonora entende-se tudo o que compõe a parte sonora do objecto audiovisual: diálogos, 1

ambientes, efeitos sonoros, música, etc. Sempre que esta expressão for referida será com esta definição.

Ver página 15.2

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ouvir. Este aspecto pode estar de certa forma a influenciar o produto artístico que está a

ser criado, como é o caso específico do cinema. A possibilidade da problemática aqui

apresentada não constituir uma preocupação para a população geral, pode justificar a

falta de esforço em falarmos sobre o que ouvimos. Ainda sobre a escuta, Chion (1994,

traduzido por Gorbman) refere o quanto somos passivos relativamente a esta actividade:

In other words, in order to describe perceptual

phenomena, we must take into account that conscious and active

perception is only one part of a wider perceptual field in

operation. (...) But listening, for its part, explores in a field of

audition that is given or even imposed on the ear; this aural field

is much less limited or confined, its contours uncertain and

changing.

Due to natural factors of which we are all aware – the

absence of anything like eyelids for the ears, the

omnidirectionality of hearing, and the physical nature of sound –

but also owing to a lack of any real aural training in our culture,

this “imposed-to-hear” makes it exceedingly difficult for us to

select or cut things out. There is always something about sound

that overwhelms and surprises us no matter what (...) (Chion,

traduzido por Gorbman, 1994, 33)

1.3. Objectivos

O objectivo desta pesquisa recai sobre a problemática da expressão verbal

relativamente aos sons, e na hipótese de a falta de exigência por parte do espectador

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influenciar o desenvolvimento da banda sonora do filme por parte dos criadores de

conteúdo cinematográfico.

Pretende-se analisar o porquê desta falta de detalhe na comunicação oral sobre o

que se ouve, percebendo os seus motivos e consequências. A tentativa é a de progredir

na direcção do aperfeiçoamento de técnicas e termos para uma consciencialização,

educação e diálogo fácil acerca dos sons. Ao compreender como escutamos, sentimos e

processamos a informação auditiva, podemos desenvolver técnicas próprias de

avaliação e descrição dos sons, que nos permitem adquirir novas informações sobre o

que cada um de nós ouve e percepciona.

1.4. Breve Introdução à Metodologia

Ao aproveitar a oportunidade do contexto prático de estágio, diversos trabalhos

foram acompanhados, e foram desenvolvidos projectos de carácter exploratório e de

cunho pessoal. Examinou-se o processo criativo e de produção, estabelecendo um fio

condutor entre aquilo que se pretende quando se manipula o produto audiovisual (filme,

série, spot publicitário, documentário, etc), e aquilo que é depois apreendido quando o

produto final chega ao receptor, e como é que cada etapa pode contribuir para o

propósito final. A metodologia desta investigação inclui também a visualização de

excertos de filmes onde o som assume um papel principal, sendo mesmo em muitos

casos a personagem principal da narrativa, e a tentativa de perceber se estes podem ser

usados para encaminhar o espectador a pensar e a questionar a forma como contempla o

som.

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Complementando o método de observação e experimentação em estúdio,

desenvolveram-se vídeos de apoio que abrangem espectadores cuja actividade

profissional está relacionada com a área do audiovisual, e espectadores sem nenhuma

ligação profissional à mesma. Estes vídeos constituíram o apoio à criação da

experiência Contact explicada posteriormente neste relatório. Eles dão pistas e

sugestões acerca das reacções dos receptores, e se as mesmas estão relacionadas à

proximidade do receptor à área dos audiovisuais. Com o mínimo de influência sobre a

opinião dos sujeitos, é proposta a gravação de um breve vídeo onde eles próprios devem

expressar-se acerca do som no cinema. Estes vídeos conduzem-nos a um parecer

espontâneo onde temos acesso aos primeiros pensamentos. Eles apontam-nos para o que

é mais relevante para o espectador e o que lhe passa despercebido.

Foi desenvolvido também um vídeo de cerca de três minutos, cuja imagem,

tendencialmente abstracta, foi sonorizada em duas versões diferentes. Em seguida foram

mostradas por ordem distinta a diferentes pessoas, com o objectivo de confirmar que

diferentes sonorizações influenciam a percepção da narrativa, e perceber de que forma o

fazem.

No final da pesquisa fez-se uma reflexão sobre as interacções entre o espectador,

o produto final audiovisual e o todo o trabalho técnico de estúdio, percebendo o quanto

se influenciam uns aos outros.

1.5. Limitações da Pesquisa

Como limitações desta pesquisa apontamos o tempo proposto para o seu

desenvolvimento; mesmo existindo um esforço para conjugar a situação profissional, o

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cumprimento das 400 horas de estágio, a investigação e a escrita do relatório. Este

factor teve implicações directas nas experiências mencionadas na metodologia, no

sentido em que, as amostras de sujeitos às experiências são inferiores ao pretendido. O

impacto é também sentido na exploração de bibliografia: conceitos ao nível da

percepção e interpretação poderiam ter sido mais investigados e desenvolvidos. Existe a

intenção de prosseguir a pesquisa nesse sentido, após entrega oficial deste relatório.

Por último, apontamos também a dificuldade inicial em encontrar um estágio

curricular que fez com que o mesmo iniciasse cerca de um mês depois do início do

período lectivo.

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2. Apresentação da Empresa

O estágio foi realizado na Digital Mix Música e Imagem – Produções

Audiovisuais e Multimedia, Lda, daqui para a frente apenas denominada por DMix,

situada na Avenida da República em Lisboa. Este é maioritariamente um estúdio de pós-

produção de som para imagem. É composto por uma sala de estar, uma sala de

produção, um escritório, uma sala de gravação e dois estúdios de mistura (um stereo e

outro multicanal, de momento a funcionar como 5.1). O ambiente é receptivo e de

partilha de conhecimentos e experiências. Não só transmite a sensação de conforto e

acolhimento, mas permite também adquirir novas competências e desenvolver a prática

em estúdio absorvendo ideias úteis para a elaboração do presente relatório.

2.1. O Estúdio

O estúdio de mistura multicanal foi construído de forma a simular as condições

acústicas de uma sala de cinema. Ele contem um subwoofer de 1000 watts que imprime 3

uma pressão acústica muito elevada, por isso a área é especialmente tratada ao nível do

isolamento acústico. O espaço está equipado com software para finalização audiovisual,

ou seja, pós-produção e masterização . Esta sala também está preparada para trabalhos 4

de captação e gravação.

Altifalante de grandes dimensões dedicado à reprodução de frequências baixas que correspondem a sons 3

mais graves.

“A fase de pós-produção áudio, habitualmente designada por masterização, é considerada como o último 4

momento de arte entre o autor e o público, permitindo que o produto final reproduza de forma fidedigna o contexto estético (...) A masterização é imprescindível, na medida em que dela depende a unidade estética do produto final (...)” (Henrique, 2007, 921).

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Os três espaços; estúdio de mistura multicanal, estúdio de mistura stereo e a sala

de gravação; foram construídos sobre o princípio de conchas acústicas, ou seja, são

salas dentro de salas com um espaço de 50 cm entre as divisões e devido isolamento

acústico. O estúdio de mistura multicanal tem visibilidade directa para a sala de

gravação através de uma janela, enquanto a ligação do estúdio de mistura stereo à sala

de gravação é feita por circuito interno de televisão. O facto de envolver vários ramos

do audiovisual como cinema e publicidade, desenvolveu um conjunto de ferramentas e

conhecimentos diversos fundamentais para esta pesquisa. A interacção com os

diferentes tipos de clientes fortalece a componente humana crucial ao sucesso criativo e

comunicativo e ao propósito do trabalho.

Algo que é transversal a todas as produções e que acabou por influenciar o

presente trabalho é a importância do workflow, a organização e coerência nas sessões e

nos projectos. Desta forma evitam-se situações caóticas e permite-se que os projectos

sejam prosseguidos por outra pessoa de modo prático e instantâneo. O projecto é criado

na DAW e gravado em local específico para o mesmo na memória do computador. 5

Sempre que há alterações, o projecto é gravado com uma nova data. Caso seja

necessário voltar atrás com alguma alteração sabemos exactamente onde ela está. A

organização da própria sessão está relacionada com a forma como se vão adicionando

os vários componentes sonoros ao projecto. Existem as pistas sonoras, cada uma

correspondente a determinado clip inserido no projecto, estas pistas são de início

reunidas em grupos pela sua função ou natureza, isto é, caso se refiram a diálogos, sons

ambiente, efeitos sonoros ou música. Desta forma podemos ter processamento digital

sonoro específico para cada tipo de sons aplicado a cada grupo, ou seja, os diálogos por

exemplo, para além do tratamento específico individual, terão também processamento

geral.

A DAW, Digital Audio Workstation, é a definição genérica do software principal utilizado em estúdio 5

para gravação, edição, mistura, composição e masterização. Existem vários softwares desenvolvidos por várias marcas, cada um com as suas particularidades.

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A importância deste planeamento pode ser demonstrada com o exemplo de uma

longa-metragem cujo objectivo é ser dobrada em outros idiomas, para vários países.

Como os diálogos estão separados do resto e associados no mesmo grupo, a tarefa

torna-se tão fácil como exportar uma versão sem o grupo dos diálogos.

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3. Estado da Arte

Após recepção de informação sonora, o nosso cérebro não procura a

interpretação exacta. Na verdade, ele está condicionado a abraçar a mentira, defende

Tasos Fratzolas, na sua conferência The Beautiful Lies of Sound Design do TEDx

(2016). O autor cita Oscar Wilde “Lying, the telling of beautiful untrue things, is the

proper aim of Art.”.

Entre os autores estudados, é pertinente destacar Michel Chion como principal

precursor e motivador desta investigação. O autor dedica grande parte da obra Audio-

Vision – Sound On Screen (1990, traduzido por Gorbman, 1994) ao estudo das

interacções entre som e imagem e do som em si, e a forma como o percepcionamos e

interpretamos. É também devido a ele que hoje temos alguns termos relativos ao tema:

added value , audiovisual contract , synchresis , vococentrism , são exemplos. 6 7 8 9

A obra de Chion, Audio-vision (1990, traduzido por Gorbman, 1994) interessa

não só pelo estudo das interacções entre som e imagem, mas também pela forma como

as analisa, e como põe em causa e repensa a maneira como as escutamos.

Nicholas Cook (2000) desenvolve as interacções entre música, diferentes

plataformas multimédia e o receptor:

Valor acrescentado pelo som á imagem, dando a impressão de que sempre existiu na imagem. 6

Pacto simbólico onde o espectador esquece o facto de que a imagem e o som não estão a surgir do 7

mesmo suporte. Falsa noção de identidade única.

Fusão mental entre o que se vê e o que se ouve quando acontecem exactamente ao mesmo tempo. 8

O privilegiar da voz sobre todos os outros elementos sonoros. 9

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To analyzing something as multimedia is to be

committed to the idea that there is some kind of perceptual

interaction between its various individual components, such as

music, speech, moving images, and so on; for without such

interaction there is nothing to analyse. (Cook, 2000, 24)

Na obra Analysing Musical Multimedia (2000), Cook diz-nos que a música

usada em peças audiovisuais inspira determinados tipos de efeitos no espectador, de

acordo com códigos sociais e culturais pré-estabelecidos, efeitos esses que podem ser

identificados por qualquer pessoa, porém o significado de determinada música é algo

muito ambíguo e de difícil resolução. Esta pesquisa não recaí de todo sobre o estudo do

sentido da música no cinema, mas nos efeitos que determinadas escolhas podem ter e/ou

potenciar.

Entre a análise das interacções do som e da imagem e a percepção por parte do

espectador, encontra-se Laurent Julier e a sua obra El Sonido en el Cine, (2007) onde o

autor explica que o nosso corpo percepciona de forma diferente o som e a imagem. Não

nos é possível suspender o fluxo de informação sonora tapando os ouvidos. Na prática

existe uma ligeira atenuação de agudos devido ao seu comprimento de onda, mas não

deixamos de ouvir. O autor acrescenta que, nós escutamos 360 º, enquanto a visão é

direcionada, desta forma não existe um fora-de-campo sonoro. Outro factor importante

é que um corte na imagem nos parece natural porque estamos habituados a fechar as

pálpebras, no entanto, se houver um corte no som vai soar estranho à nossa percepção.

No livro Unheard Melodies (1987), Gorbman mostra-nos que a música, mesmo

quando é não diegética , não é interpretada pelo espectador como um intruso, como 10

Não diegético significa que não pertence à acção que está a decorrer na imagem.10

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acontece com a voz off. A autora refere-se à música como hipnotizadora, levando-nos

para longe da ideia de que o filme é um processo tecnológico. Apesar de a música não

pertencer directamente à acção, ela acaba por nos condicionar, de acordo com códigos

de valores sociais, educacionais e culturais que atribuímos ao ambiente musical

específico, e direccionar a nossa percepção e atenção para determinado ponto decidido

pelo realizador.

Albert Bregman, bem como Luís Henrique, foram selecionados devido às suas

obras Auditory Scene Analysis (1994), e Acústica Musical (2007), respectivamente, por

deterem conteúdo específico relativo ao fenómeno da percepção, questões técnicas de

propagação sonora e aspectos fisiológicos do funcionamento do ouvido. Tanto o Ric

Viers com o seu livro The Sound Effects Bible (2008), como David Sonnenschein com

Sound Design – The Expressive Power of Music, Voice, and Sound Effects in Cinema

(2001) têm uma aproximação mais prática que oferece outra perspectiva para esta

pesquisa. Ambas as obras exploram o universo da composição sonora para filmes, 11

desde a componente criativa até à componente mais técnica fazendo depois o encontro

entre ambas.

Fazem também parte do capítulo Bibliografia, quatro filmes que demostram,

cada um da sua forma, a importância que o som adquire na percepção da narrativa. Em

Blow Out de Brian De Palma (1981), a história gira em torno de um técnico de som que

regista através do seu sistema de gravação audio, a prova de um assassinato. Este filme

é um remake do clássico de Michelangelo Antonioni, Blow up (1966) em que uma

história semelhante acontece com um fotógrafo. Comparando os dois filmes assiste-se a

um caminho que vai do visual/estático para o sonoro/movimento. It´s All Gone Pete

Tong de Michael Dowse (2004), é um filme biográfico da lenda dj/produtor Frankie

Wild que ensurdeceu no topo da sua carreira. Este filme está repleto de sequências em

Importante definir aqui que composição sonora é o composto de todos os sons que fazem parte da 11

componente sonora de um filme: sonoplastia, efeitos, ambientes, vozes, etc.

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que o espectador é transportado para o ponto de escuta da personagem. Minuscule de

Thomas Szabo (2006), é uma série de curtas de animação que representam pequenos

episódios da vida dos insectos, toda a sua comunicação apesar de não-verbal é

extremamente sonora.

Em Irréversible de Gaspar Noé (2002), assistimos à história do fim para o seu

início, devido à montagem do filme. É um forte exemplo que representa o quanto o som

pode influenciar o espectador. Sentimos uma imersão total e agonizante na sequência

que inicia aos 12 minutos e 15 segundos. A música que a acompanha é perturbadora e o

som transporta-nos por uma viagem através da mente da personagem principal e do seu

comportamento obsessivo e doentio. Existe um travelling com uma handycam, a

imagem é em tons de vermelho e sombras e é tudo filmado de perto. Um dos factos

curiosos apontados no site IMDB (2002) é: ao nível sonoro há uma frequência 12

constante de 28Hz que se aproxima à frequência provocada por um tremor de terra, e

que, nos seres humanos provoca náuseas e vertigens. É de facto uma sequência

extremamente violenta ao nível visual e de conteúdo, mas é espantoso notar que é

maioritariamente a nível sonoro que o impacto toma lugar, é o som que altera o nosso

sistema nervoso e nos causa ansiedade e stress [experiência vivenciada pela autora].

Os autores e filmes estudados contribuíram para fundamentar e contextualizar

teoricamente as práticas desenvolvidas em estúdio tais como: gravação, edição e

mistura. Estes também desenvolveram a criatividade para elaborar ferramentas usadas

na metodologia, como é o caso dos vídeos da experiência Contact (detalhados no

próximo capítulo), bem como o sentido crítico para desenvolver esta pesquisa.

https://www.imdb.com/title/tt0290673/trivia.12

! 14

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4. Metodologia

A análise dos vídeos de apoio, bem como a experiência Contact e todas as

actividades desenvolvidas em estúdio, fazem parte da metodologia da presente pesquisa.

4.1. Os Vídeos de Apoio

Ainda antes da realização do estágio, foi antecipada a recolha de informação que

se tornou importante como ponto de partida da pesquisa. Essa recolha foi feita através

de vídeos de apoio onde o objectivo é saber, da forma mais imparcial possível, aquilo

que ocorre à consciência dos sujeitos a esta experiência, quando se fala de som no

cinema. Foi solicitado a várias pessoas, que gravassem um pequeno vídeo

completamente livre, da forma que quisessem, onde falassem acerca do som no cinema.

Assim conseguimos recolher o que é mais assinalável e o que passa despercebido ao

receptor. As pessoas selecionadas para estes vídeos têm idades e contextos culturais

diferentes, umas estão relacionadas com a área do cinema e outras não. Com a

informação fornecida pelos sujeitos (a mesma é detalhada no capítulo “Análise dos

Vídeos de Apoio”) desenvolveram-se ideias para a construção da experiência Contact

que foi desenvolvida em estágio e posta em prática após o mesmo.

O objectivo dos vídeos de apoio é aceder à espontaneidade do espectador, não só

ao nível do conteúdo, mas também da forma como decidem comunicar esse conteúdo.

Isto conduziu ao surgimento de vídeos totalmente diferentes. Um grupo de quatro

pessoas decidiu filmar-se enquanto jantavam, ignorando o facto de haver ali uma

câmara e conversando despretensiosamente sobre som e cinema. Duas pessoas

decidiram falar abertamente para a câmara quase em formato podcast enquanto

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partilhavam uma com a outra exemplos que teriam sido marcantes na sua jornada

cinematográfica. Outro colaborador fez uma montagem de várias imagens e vários clips

de filmes que decidiu mencionar, comentado em voz off.

4.2. Experiência Contact

Foi também elaborada uma experiência que consiste em dois vídeos de cerca de

três minutos onde o conteúdo visual é o mesmo, mas o som é diferente. Aproveitando o

facto de estar no estúdio, foi desenvolvida a banda sonora utilizando processamento e

manipulação de qualidade e alguns bancos de sons. O excerto audiovisual tem cerca de

três minutos e foi extraído da introdução do filme Contact de 1997, baseado num

romance de Carl Sagan e realizado por Robert Zemeckis. O clip foi eleito pelo facto de

as imagens serem abstractas. Trata-se de uma animação digital, um zoom out no espaço

que percorre vários componentes, como se uma câmara explorasse o espaço a grande

velocidade, atravessando planetas, luas, meteoritos, estrelas, galáxias, etc; terminando

num olho humano (como se a câmara saísse de dentro do olho). Tornou-se um desafio

imaginar sons para situações ou objectos que não sabemos ao certo ao que soam. Após

elaboração desses dois vídeos, criou-se uma lista de pessoas, onde se estabeleceu a

ordem de audio-visionamento, ou a versão única a ser áudio-visualizada.

Relativamente às diferenças entre os vídeos, a primeira versão , daqui para a 13

frente denominada por Contact1, é desenvolvida ao nível dos graves para induzir mais

suspense, ansiedade e desconforto no espectador, tem bastantes impactos fortes e

inesperados. A segunda versão , Contact2, é mais musical, contém acordes maiores 14

“Teste Contact 1 Mariana Silva”, Video YouTube, 3:07, postado por “Mary Jane”, Junho 25, 2018, 13

https://www.youtube.com/watch?v=KwZSKCoAWsQ.

“Teste Contact 2 Mariana Silva”, Video YouTube, 3:13, postado por “Mary Jane”, Junho 25, 2018, 14

https://www.youtube.com/watch?v=HrnMnIjw14Q.

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Page 31: Versão corrigida e melhorada após defesa pública · conselhos e paciência. Ao Fernandinho pela ajuda, companheirismo e longas conversas. A todos os meus meninos do estúdio, o

que, pelo seu carácter mais brilhante, induzem bem-estar e sensação de esperança. É

sustentada por médios e agudos e os impactos que surgem contêm mais frequências

médias e agudas que a versão anterior.

Fratzolas (2016), afirma que o som precisa do silêncio para poder ser notado e

vice-versa, o cérebro precisa sempre de nova informação sonora diferente para poder

comparar e classificar. O silêncio antes de qualquer som solicita sempre a nossa

atenção. Os efeitos sonoros conseguem desencadear coisas na nossa memória

emocional. Nós atribuímos conotações positivas ou negativas a determinados sons,

devido ao contexto cultural ou da nossa experiência pessoal. Os sons fora-de-campo,

aqueles que ouvimos sem vermos directamente a sua causa na imagem, criam uma

sensação de omnipresença e logo de autoridade.

Aplicando estas características sonoras e contando com os efeitos das mesmas

sobre os seres humanos, produziram-se as duas versões diferentes do Contact.

A lista de visualizações é a seguinte:

Contact versão 1 Contact versão 2

Sujeito 1 Visualização 1 Visualização 2

Sujeito 2 Visualização única

Sujeito 3 Visualização 1 Visualização 2

Sujeito 4 Visualização 2 Visualização 1

Sujeito 5 Visualização única

Sujeito 6 Visualização única

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A experiência descrita foi inspirada nos testes sugeridos por Chion, no seu livro

Audio-vision, (1990, traduzido por Gorbman, 1994), onde o autor propõe a visualização

de determinada cena, a interpretação da mesma e finalmente nova visualização sem

som. O sujeito percebe que a noção de plano, corte e ritmo narrativo se altera com a

ausência sonora. O Contact não é exactamente a mesma experiência, mas é inspirada

nos métodos de comparação sugeridos por Chion.

4.3. Trabalhos Desenvolvidos no Estúdio

Os vários trabalhos acompanhados no estúdio durante o período de estágio

curricular serão descritos com base nas anotações diárias efectuadas, apontando aquilo

que foi mais relevante para a presente investigação.

4.3.1. Contacto com o Software 15

O software principal usado em ambos os estúdios de mistura (stereo e

multicanal) é o Nuendo da Steinberg. No início do estágio trabalhava-se ainda com a

versão 7, tendo sido actualizado para a versão 8. O Nuendo é uma DAW, desenvolvida

especialmente para pós-produção de som para imagem. Para além do software base,

ambos os estúdios estão munidos de plugins para pós-produção de som para imagem e 16

bibliotecas de sons. É notória a celeridade do desenvolvimento e a importância que

estas ferramentas assumem para o dia-a-dia de um técnico de som. O tempo entre

actualizações e surgimento de novos plugins é progressivamente mais curto, e estas

Ver anexo lista de software.15

Plugin é um complemento ou um módulo de extensão de determinado software, que acresce uma 16

funcionalidade adicional.

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ferramentas são cada vez mais precisas e eficazes contribuindo para o encurtamento do

tempo de cada projecto.

Por vezes, durante as gravações de um filme, a captação do som directo fica com

ruídos eléctricos, como por exemplo: o ruído emitido pelos projectores e outros tipos de

materiais. Ferramentas digitais como o Izotope RX são úteis para minimizar estes 17

danos. Este plugin é composto por vários algoritmos de correcção tímbrica e redução de

ruído.

4.3.2. Mistura 5.1 Longa-Metragem Carga

O estúdio DMix recebe vários projectos cinematográficos, tanto curtas-

metragens e longas-metragens, documentários e séries para mistura e pós-produção de

som. Uma das longas-metragens desenvolvidas durante o período de estágio foi a

Carga, filme de Bruno Gascon que contem bastantes LFEs: Low Frequency Effects,

sinal áudio enviado para um subwoofer quando se usa sistema multicanal, dedicado aos

efeitos subsónicos, a sua gama de frequências costuma rondar entre os 10 Hz e 120 Hz.

Este filme debate o tema do tráfico humano e retrata a história de Viktoriya que após

rapto, e sujeita a exploração e maus tratos, luta pela sua fuga e sobrevivência.

Uma das dificuldades encontrada durante a mistura desta longa-metragem foi

encontrar bons foleys de todos os sons provenientes de uma arma. Torna-se 18

complicado obter o nosso próprio som porque a maioria dos indivíduos não possuí uma

Ver em anexo lista de software.17

Foleys são todos os efeitos sonoros criados em pós-rodagem e que complementam a banda sonora do 18

objecto audiovisual. “Foley, named after the sound pioneer Jack Foley, is the process of performing sounds in sync with picture.” (Viers, 2008, 5).

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arma e tão pouco a respectiva licença para a disparar; e mesmo que os tenha, não é fácil

encontrar um local para a usar. As bibliotecas de sons específicas para disparos de

armas, tendem a ser mais caras que as outras pela sua dificuldade de captação e a sua

índole singular. Durante a mistura deste filme os sons dos disparos foram substituídos

pelo menos duas vezes, por não serem exactamente os pretendidos. Foi dada especial

atenção e cuidado na equalização dos mesmos e na utilização de alguns efeitos

sobretudo de reverberação, tendo em conta que o espaço em que a arma é disparada é

responsável por grande parte da assinatura específica deste som.

4.3.3. Locuções

No estúdio DMix, a maior parte do trabalho é direcionada à locução televisiva,

radiofónica e web. Durante o decorrer do estágio existiu a oportunidade de conviver

com diferentes tipos de locutores e clientes. Ao nível técnico da manipulação sonora, as

práticas exploradas foram a equalização e compressão: a equalização de vozes para

publicidade de suporte televisivo deve ser feita por forma a dar destaque à gama dos

2000 Hz e 6000 Hz, para propagar mais a voz. Esta é comprimida por forma a linearizar

e aumentar o volume geral.

4.3.4. Série Teorias da Conspiração

Durante o período de estágio, uma das peças para pós-produção de som que

passou pelo estúdio foi a série Teorias da Conspiração, da Stopline para a RTP. Esta

série retrata os jogos de poder e a corrupção de esquemas financeiros da banca

portuguesa, inspirada em factos reais. Os ficheiros de som chegaram em bruto para

edição e mistura, com bastantes problemas de captação, sobretudo nos diálogos onde a

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perceptibilidade é fundamental. Também nesta série foram usados alguns efeitos

sonoros e foley de bibliotecas. Outros foram gravados para a situação e foi também feito

bastante ADR, cujo conceito será desenvolvido posteriormente neste relatório. A

componente musical também foi tratada no estúdio, assim como o underscore . Elas 19

assumem um papel importantíssimo na criação de emoções e gestão de expectativas. No

estágio foi apreendida a noção de underscore como a música subtil que se encontra por

detrás do diálogo ou da cena que está a acontecer, a preencher esse espaço, para

estabelecer um estado de espírito, induzir uma emoção ou pontuar uma situação.

Observemos que, underscore è um símbolo usado em transmissões como substituição

do espaço.

O facto da série ser rodada em Portugal e por técnicos de som portugueses, de

certa forma agilizou o processo de identificação quer de problemas e imprevistos que

tendem a acontecer, quer de formas de trabalhar que imprimem sempre hábitos

identificáveis. Como os técnicos acabam por se conhecer minimamente, já sabem o que

esperar de cada um e em cada situação. Na gravação desta série foram frequentemente

utilizados em todas as cenas com diálogos, um microfone de lapela em cada

personagem e pelo menos dois microfones direcionais com perche, os boom. Quando 20

o projecto chegou ao estúdio, as pistas dos microfones não estavam identificadas, o que

conduziu a um trabalho exaustivo de identificação das mesmas, mas ao mesmo tempo

enriquecedor, e de escuta atenta para distinguir os diferentes microfones. O boom

identifica-se pela presença maior de som ambiente , enquanto que o microfone de 21

lapela tem mais graves devido ao efeito de proximidade . É importante mencionar que 22

essa distinção em nada está relacionada à sensação de volume de cada um, mas sim com

as suas características sonoras específicas.

“(...) el underscoring subraya y comenta lo que ocurre, más discretamente (...)” (Julier, 2007, 59).19

Microfone direccional é um microfone especialmente desenhado para captar os sons que chegam até 20

ele pela frente, atenuando interferências que possam surgir em outras direcções.

Som ambiente ou room tone corresponde ao som do próprio espaço sem mais fontes sonoras.21

Efeito de proximidade é uma característica da maioria dos microfones direcionais em que os graves são 22

acentuados com a proximidade do mesmo à fonte.

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Um segundo aspecto que auxilia na identificação das pistas são os pequenos

ruídos captados. No boom podem ouvir-se impactos na própria perche, enquanto nos

microfones de lapela podem evidenciar-se os sons do atrito da roupa com outros

materiais conforme os movimentos das personagens, ou os sons que habitualmente não

são captados, mas que os microfones de lapela tornam muito óbvios: sons internos do

corpo como respirações, deglutições ou batimentos cardíacos. Outro momento

interessante para esta pesquisa, foi a manipulação sonora de uma cena em particular,

que assenta num atropelamento filmado em slow motion. O som foi manipulado por

forma a parecer slow motion também. Foi usado o Plugin da Waves, LoAir (que é um

gerador de sub-harmónicos), reverb e alguns sons de impacto. 23

4.3.5. Documentário Até Que o Porno nos Separe

O documentário de Jorge Pelicano, Até Que o Porno nos Separe, permitiu

desenvolver a capacidade de escuta activa perante as indicações e as intenções do

realizador que tinha em mente algo muito específico e pretendia passar ao espectador

através da manipulação do som. As expectativas pretendidas pelo realizador foram

concebidas pelos técnicos de som e tornaram a áudio-visualização uma tarefa dinâmica

através da sugestão de ideias ou emoções. Jorge Pelicano desejava que os espaços

fossem sentidos; tanto os espaços físicos, quanto o espaço interno de cada personagem.

Efeito de reverberação. Este efeito simula o som de determinado espaço, a sua capacidade física de 23

reflectir o som. “Reverb Plugins add the characteristics of a particular environment, such as a hall, a church, or a sewer.” (Viers, 2008, 152).

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Uma das técnicas usadas foi um filtro passa alto a partir dos 80Hz nos 24

ambientes (room tones ) com a intenção de abrir espaço na mistura para outros sons 25

mais graves se destacarem. A intensidade do som, ou seja, a gestão da sensação de

volume, também foi explorada com o propósito de criar expectativas, por exemplo, o

uso de silêncios para anteceder grandes revelações. Este é um documentário acerca da

relação complexa entre uma mãe que descobre que o filho, Foster Riviera, é uma estrela

do cinema pornográfico homossexual. É uma viagem até à aceitação e constatação de

um amor incondicional.

4.3.6. Foley

Tanto na longa-metragem Carga, quanto no documentário Até Que o Porno nos

Separe foram gravados alguns sons de foley, nomeadamente sons de mãos a passar

pelos cabelos, e sons de talheres num prato. É importante destacar que as bibliotecas de

sons, por mais práticas que sejam, muitas vezes não possuem o material desejado. Se

queremos algo à nossa medida, o melhor é gravá-lo. Foi assim usada a sala de gravação

com contacto directo com o estúdio de mistura multicanal e o vídeo em repetição da

situação cujo som se pretendia criar, para ficar o mais síncrono possível com a imagem.

Um filtro passa alto, ou high pass filter é um filtro que só deixa passar frequências acima de 24

determinada frequência de corte, portanto mais agudas.

Room tone é o som ambiente próprio de cada espaço, sem qualquer outro tipo de som, que provém das 25

reflexões da sua própria estrutura e dimensão física. O dito silêncio na verdade não o é, porque cada espaço tem sempre o seu próprio som.

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4.3.7. ADR

O ADR é uma técnica usada em cinema para substituição de diálogos, cuja

captação original dos sons ficou aquém do desejado ou continha algum problema.

Segundo David Neumeyer (2015), a prioridade da construção da banda sonora assenta

na eloquência narrativa, ou seja, na perceptibilidade de diálogos, mais que na sua

fidelidade acústica.

Existem duas formas de realizar ADR: o visual ADR, onde o actor é sujeito ao

clip em repetição, mas sem acesso ao som, desta forma a correspondência faz-se através

da leitura dos lábios tentando corresponder ao tempo de fala; e, a segunda forma

habitualmente mais usada é a técnica do looping, onde o intérprete é sujeito à

visualização da cena em questão em repetição. Ele possui uns auscultadores nos quais

consegue ouvir a captação original e também os cue beeps. Esta técnica é estabelecida

por meio da gravação de três beeps com um espaço de um segundo entre cada um deles

e o último é exactamente um segundo antes do início do áudio a ser substituído. Desta

forma o intérprete tem uma contagem precisa e sabe onde começa a linha do diálogo.

Ao ser feita a substituição do diálogo original pelo dobrado, é necessário considerar a

reverberação natural do espaço em que decorre a acção para que tanto o clip a ser

substituído quanto o clip novo tenham o mesmo tipo de ambiente. Essa actividade tende

a ser bastante extenuante dado o seu carácter repetitivo e dificuldade em atingir bons

resultados, mas não deixa de ser muito importante; possui grande dificuldade de

execução e necessita enorme precisão.

Em estúdio foi feita substituição de diálogos para a série Teorias da

Conspiração por novos diálogos captados na sala de gravação: cenas que continham

ruído no som captado directamente, por existir demasiados sons em simultâneo no

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espaço onde a mesma estava a ser filmada, acabando por interferir com a

inteligibilidade da mensagem. Outras foram substituídas por conterem ruídos do

contacto do microfone de lapela com as roupas do actor. Diferentes aspectos foram tidos

em conta ao longo deste trabalho de substituição: sincronismo, intenção ou tom do

actor, ritmo e tempo. O uso desta técnica em Portugal é ligeiramente diferente, não são

usados os cue beeps, é algo que ainda gera desconforto à maioria dos actores

portugueses.

4.3.8. Mistura Para Publicidade

A principal função da publicidade é cativar a atenção do espectador e na maioria

das vezes incentivar ou criar a necessidade de adquirir determinado serviço ou produto.

Existem várias técnicas de persuasão usadas em publicidade e a componente sonora é

uma parte fulcral nesse sentido. Segundo Nicholas Cook (2000, 20 e 21), muitas vezes a

publicidade recorre às composições musicais de género específico com determinada

associação ou interpretação cultural, para ir directo ao assunto, uma vez que os spots

publicitários têm pouco tempo para passar a mensagem. Uma das áreas de trabalho

presentes na DMix, é a edição e mistura de som para publicidade. Ao longo do estágio

foram desenvolvidos vários trabalhos de publicidade promocional dos vários canais

FOX, onde o equilíbrio das componentes sonoras e a transmissão da mensagem são o

mais importante.

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5. Resultados e Análise

Não podemos esquecer que lidamos com pessoas, com técnicos e criativos onde

muitas vezes a linguagem que é usada não é de todo objectiva, uma vez que o seu

objecto também não é. Ter o bom senso e a capacidade de compreender o que é

pretendido e executá-lo da melhor maneira possível, conduz a resultados de sucesso. É

crucial saber gerir esta interacção entre técnico, cliente e/ou artista.

É comum dizer-se entre técnicos de som que não existe uma forma certa ou

errada de manipular o som, cada um cria à sua maneira de acordo com a sua estética e

ideias, ou na grande maioria das vezes, a estética e ideia do realizador ou produtor.

Quando se trabalha numa mistura multicanal com as diversas hipóteses ao nível da

espacialização, é necessário ter as ideias base em conta. Durante o estágio foram

incutidas as regras básicas, que devem ser seguidas independentemente da estética

exigida pelo cliente. Estas normas garantem a inteligibilidade da mensagem por parte do

receptor, elas têm que ver com: a arquitectura real do espaço da cena, e o ponto de vista/

escuta que se pretende passar. Quando se ajustam panorâmicas ou se definem as

espacializações de determinada cena, é necessário conhecer o plano e considerar o

ponto de vista/escuta. Habitualmente o ponto de vista/escuta considerado é o do

espectador, mas há excepções.

Em casos específicos de filmes onde o realizador pretende mostrar o ponto de

vista/escuta do personagem principal, estas regras são alteradas. A história cuja

personagem perde a sua audição gradualmente durante o desenrolar da narrativa, como

é o caso do filme It’s All Gone Pete Tong (Michael Dowse, 2004), dá a conhecer o ponto

de vista/escuta do personagem e, naturalmente, a mistura será muito diferente. O mesmo

acontece com a imagem, como é o caso do videoclip musical dos The Prodigy, Smack

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My Bitch Up , onde vemos o desenrolar dos acontecimentos como se fossemos a 26

personagem principal. A câmara encontra-se sobre o ponto de vista/escuta da

personagem. No caso específico do ponto de escuta, conseguimos ter esta percepção aos

onze segundos de filme quando a personagem veste uma camisola e o som fica abafado

quando a peça de roupa passa nas orelhas. Aos dois minutos e vinte segundos a imagem

e o som distorcem para demonstrar o entorpecimento da personagem devido ao

consumo excessivo de álcool e estupefacientes.

5.1. O Uso abusivo das Bibliotecas de Sons

A proliferação das bibliotecas e bancos de sons, alguns deles gratuitos, apesar de

ser uma opção rápida e prática, está a limitar a criatividade e descoberta por parte do

técnico. Manifestam-se aqui dois grandes problemas:

1 - O perigo de usar sons facilmente identificáveis, muito usados. Mesmo que

seja algo muito específico como o bater de uma porta, cada som tem a sua assinatura e

identidade própria e cada um deve soar a si mesmo. Deve ser único e sempre que

possível relativo ou exclusivo à sua imagem. Ao gravar os próprios sons temos a

segurança de serem únicos e originais;

2 - Os sons provenientes de bibliotecas nunca são perfeitos para o que

precisamos porque não foram desenhados ou captados para o nosso próprio trabalho. O

som captado ou desenvolvido para o seu efeito é muito mais eficaz e credível.

“Prodigy - Smack My Bitch Up (Explicit)”, Video YouTube, 4:33, postado por “Good Videos Forever”, 26

Junho 14, 2017, https://vimeo.com/31482159.

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Ao optar pelo uso de sons já gravados ou sintetizados, o técnico perde a

oportunidade de explorar, conhecer mais os sons, expandir o seu universo criativo e

experimentar novas abordagens que poderia impor em trabalhos futuros.

5.2. Análise dos Vídeos de Apoio

Os vídeos resultantes do pedido aberto feito aos participantes resultaram num

conjunto de objectos muito diferentes, dos quais posteriormente foi feita uma mistura

com os melhores momentos de cada um, que representa o seu resumo . Detalhando um 27

pouco mais cada um deles, temos:

Vídeo 1 - Quatro pessoas (sem nenhuma ligação profissional à área do

audiovisual) decidiram conversar sobre o tema à mesa, durante a refeição, ignorando o

facto de estarem a ser filmadas. Os aspectos que mais foram destacados foram: o

surround; segundo os envolvidos, a evolução para multicanal imprime uma noção mais

realista e envolvente do filme. Foi referida também a lembrança que ainda têm do

cinema mudo, onde a música despoletava as emoções que o filme pretendia transmitir.

Um dos indivíduos partilhou a experiência de sensações sinestésicas afirmando:

“quando o filme tem um bom som até consigo também sentir cheiros”. Foi referido o

filme O Senhor dos Anéis como exemplo do som que marcou um dos espectadores: o

som do anel ao cair em cima de uma mesa, representativo do peso e importância do

mesmo.

“Vídeos de Apoio Mariana Silva Abril2017”, Video vimeo, 5:03, postado por “Mariana Silva”, Junho 27

25, 2018, https://vimeo.com/276908705.

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Vídeo 2 – Dois sujeitos (estudantes da área audiovisual) filmaram o seu diálogo

enquanto falavam para a câmara quase em formato de podcast. Referem que o som é

importante em qualquer tipo de formato ou estilo, na medida em que gere as emoções e

conduz o espectador. Um dos indivíduos diz mesmo que quando fala de filmes com

alguém a primeira coisa que lhe vem à cabeça é a banda sonora dos mesmos. Apontou

como referência Jaws e Man Of Steel. Referiram também o tema do cinema mudo e

como a música tinha um papel importante para a criação de ambientes e emoções. Um

dos sujeitos refere também a experiência a que foi sujeito numa das disciplinas de

licenciatura, onde a noção daquilo que vemos é completamente alterada quando vemos

com ou sem som. Outro relata que tem usado um método inverso ao que usava para

criar storyboards, ao invés de partir das imagens como fonte de inspiração, usa música

para o sugestionar e de certa forma criar o mood para a criação do storyboard. Ambos

chegam à constatação da normalidade de se iniciar uma peça pela imagem, cuidar desta

e deixar o som de parte para só mais tarde pegar nele quando, provavelmente, tentando

o inverso criar-se-ia algo de novo e refrescante.

Vídeo 3 – Este indivíduo (também da área do audiovisual), decidiu compor um

vídeo com exemplos de filmes, comentando em voz off. Refere que o som no cinema é

tão importante quanto a sua ausência, exemplificando com o filme No Country for Old

Men onde a ausência de música aumenta a tensão e o realismo da cena. Refere também

o exagero dos sons de impacto presentes nos trailers com a intenção de captar a atenção

do espectador.

Vídeo 4 – Este sujeito foi filmado enquanto falava de cinema e de som, é uma

criança de sete anos, e afirma que “ir ao cinema é muita fixe, mas está bué da alto”.

Considera também o som no cinema como o som das pessoas a comer pipocas e a beber

coca-cola.

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Todos os participantes falam de som sem encontrarem muitas palavras com as

quais se exprimirem. Tendencialmente foram usados termos como: emoções,

sentimentos, realismo, envolvência, alto, baixo, agradável, incomodativo. Mesmo os

indivíduos relacionados com o meio audiovisual têm essa dificuldade, o que suporta a

hipótese desta investigação de não existir um esforço por parte do receptor para falar

sobre o tema. No entanto são apenas pistas que não poderão ainda constituir dados

estatísticos gerais pelo facto de abordarem uma amostra pequena. Estes vídeos servem

apenas de apoio, não têm qualquer pretensão de serem usados como factos

representativos do universo geral do espectador. Tendo isto em conta não foi possível a

validação da hipótese proposta na introdução deste relatório.

5.3. Análise da Experiência Contact

Relativamente ao projecto Contact, várias técnicas foram usadas para diferenciar

as duas versões para depois analisar as expectativas e interpretação do espectador:

distinguir os sons grandes dos sons pequenos através de processamento dinâmico e de

equalização, criar espaço através de efeitos panorâmicos, trabalhar texturas sonoras para

induzir emoções. Os resultados das áudio-visualizações dos sujeitos a esta experiência,

descrevem-se abaixo, seguidas da análise geral:

Sujeito 1 – Após áudio-visualização da versão 1, o sujeito aponta que prevê

tratar-se de um filme de suspense, relacionado com invasões alienígenas ou catástrofes

naturais. Declara que o excerto lhe transmitiu muita tensão e sensação de peso. Após

áudio-visualização da versão 2, o sujeito começa por dizer que esta versão lhe agrada

mais que a anterior, e lhe dá uma sensação diferente de progressão de filme, este será

um pouco confuso com uma narrativa pouco linear e estará relacionado com a parte não

física do ser humano, com a nossa dimensão não terrena.

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Sujeito 2 – Após áudio-visualização da versão 2, o sujeito afirma que

inicialmente o trecho lhe sugere contactos extraterrestres, e com o avançar do vídeo

surge uma sensação de colapso. Está tudo a desaparecer sugerindo o fim do mundo.

Induz também que o que está a acabar de um lado pode começar noutro, ou que poderá

estar a acabar exactamente para dar lugar a algo novo.

Sujeito 3 – Após áudio-visualização da versão 1, o sujeito descreve-a como uma

versão realista que nos conduz pela imensidão do espaço com todos os detalhes,

“mesmo sabendo que no vácuo não há som” afirma. Relata também a sensação de ser

engolido pelo som e pela imensidão de tudo. Expressa o desejo de ter “visto” num

cinema para sentir tudo a tremer. Afirma também que no final quase perde o fôlego,

apesar do “gritinho” o ter feito abstrair e deixado incomodado. Após áudio-visualização

da versão 2, o sujeito afirma inicialmente não ter gostado porque lhe recordava outros

filmes de ficção científica onde “não havia grande noção de como "pintar" o espaço e

aqueles sintetizadores faziam-me muito lembrar filmes antigos” afirma. No entanto,

com o avançar do clip começou a gostar bastante e cada vez mais. Este sujeito fez

questão também de comparar as duas versões apontando como o primeiro lhe dá a

sensação de realismo e o segundo o faz viajar: o modo como o som abraça o vídeo faz

sentir “não a ser engolido, mas sim expelido para pensamentos”.

Sujeito 4 – Após áudio-visualização da versão 2, o sujeito indica a previsão de

um filme de suspense que envolve o espaço, com pequenos apontamentos de comédia

induzidos pelo som dos risos. Com a áudio-visualização da versão 1, o sujeito aponta

tratar-se também de um filme de suspense, e identifica esta versão com menos sons

agudos que a outra e, devido a isso, considera mais agradável. Reconhece também que

os sons agudos embelezam mais um filme e que são mais facilmente associados a

suspense de ficção científica. Conclui que a versão 2 é mais óbvia de se tratar de um

filme de suspense do que a versão 1, considerando esta última mais abstracta.

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Sujeito 5 – Após áudio-visualização da versão 2, o sujeito faz primeiramente

referência a série de ficção científica dos anos 70, Espaço 1999, afirmando o quanto o

som escutado o remeteu para esta série. Sugere mistério e declara:“o som que ouvi aqui

faz lembrar o som de quando alguém está a ter visões de algo de outra dimensão”.

Termina concluindo que o excerto remete para uma narrativa envolta em mistério, mas

passada noutra dimensão que não a nossa.

Sujeito 6 – Após áudio-visualização da versão 1, o sujeito refere a sensação do

ser humano que aparece no final ter algo alienígena, ou alguma capacidade sensitiva de

comunicar com outros seres espaciais, ou prever coisas através do cosmos. Sente que

será um filme de suspense baseado em seres que têm a capacidade de comunicar com

algo para além do que temos aqui na terra, ou com a capacidade de pressentir. Exprime

ter esta sensação como consequência de alguns sons que ouviu e que identifica como

“sons de alguém que está a pressentir algo. Sons das ligações dos sentidos”.

Notou-se uma grande dificuldade por parte das pessoas envolvidas, quando

queriam referir algum som específico que tinham escutado. Ao invés de procurarem

forma de se expressar por palavras, ficavam detidas a tentar encontrar o termo certo

acabando por se renderem à simples tentativa de reprodução do som com a sua própria

voz. Relativamente à comparação entre as duas versões confere-se que, a primeira

versão é algo que sugere aos receptores a sensação de opressão e desconforto, enquanto

a segunda sugere mais uma expansão emocional e de estado de espírito, levando através

de caminhos para além do palpável e do humano. A experiência confirma, apesar da

imagem ser a mesma, quando a banda sonora é diferente são despoletadas diferentes

emoções e expectativas no receptor. Comprova-se a importância e o poder que o som

tem na compreensão da narrativa, e que apesar dos espectadores não conseguirem

expressar verbalmente muito do que ouvem e sentem, é algo que os domina e

impressiona. Produtores de conteúdo audiovisual poderão explorar mais a componente

sonora das peças pois grande parte da interpretação narrativa é induzida pelo som.

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5.4. ADR, o que acontece em Portugal

Enquanto decorriam no estúdio as gravações de ADR para a série Teorias da

Conspiração, foi possível confirmar a disparidade que existe entre esta técnica em

Portugal e, por exemplo, nos Estados Unidos da América. Quase em formato Técnica

versus Sentimento, observa-se que, nos Estados Unidos da América, os actores tem

bases de formação e são desde início preparados para fazer ADR. Sabemos que a

maioria dos filmes americanos tem substituição de diálogos (alguns na sua totalidade),

enquanto no cinema Português a preferência é (ou deveria ser) a de um bom som

captado directamente no take, para a emoção e intenção do actor serem genuínas e

coerentes com o acting. Isto é a perspectiva ideal, mas na hora da rodagem e do aperto

do tempo, quando se sacrifica alguma coisa, acaba por ser o som.

The way ADR is treated and approached is symptomatic

of how little respect sound gets in the movies. You march the

actor into a cold sterile room and usually give them no time to

get into the character or rehearse. They are expected to just start

performing a few minutes after they walk into the room. The

emphasis is almost always on getting the dialogue in sync

instead of getting the right performance. Of course the majority

of the actor's brain is then occupied with whether his lips are

flapping at exactly the same rate as they were on the day that the

camera was rolling. It is no wonder that most ADR is not very

good. In the final mix, directors almost always prefer

the production sound, even if it is noisy and distorted. (Thom,

s.d.)

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A maior parte dos actores portugueses, tem dificuldade nas sessões de ADR, por

não terem formação de base, nem estarem tão habituados: grande parte dos intérpretes

portugueses tem formação de base de teatro e muitos deles começaram a sua carreira

através desse meio. Para o técnico de som torna-se uma tarefa exaustiva. As técnicas

usadas como o visual ADR ou o looping, deixam os actores portugueses

desconfortáveis, sentem-se pressionados pelo beep, e o facto de estarem demasiado

focados no lip sync atrapalha bastante a interpretação e a intenção. Estas técnicas

acabam por não ser utilizadas.

As preocupações tanto ao nível do sincronismo como da intenção são válidas e

ambas importantes para o sucesso do ADR mas, por vezes, atrapalham-se uma à outra.

O facto do actor estar habitualmente mais próximo do microfone do que na realidade da

cena, afecta também a coerência. Somente o ajuste do volume de entrada não nos dá a

noção correcta da distância. Quando o microfone está muito perto da fonte surge

também um fenómeno chamado de efeito de proximidade, que tem implicações directas

na percepção de distâncias por parte do espectador.

Volume adjustments alone will not replicate the sense of

distance, since the acoustics modify in terms of frequency range,

audible voice components, and secondary sound waves. When

the voice is close, we hear effects of breathing, lip and thong

movements, and enhanced high frequencies that give greater

presence. At a distance, these close-up effects lessen and an

increase may appear in reverb that can identify the type of

space. Filtering can accentuate these parameters, but the

microphone placement remains the most essential element in

recreating the original reality. (Sonnenschein, 2001, 33)

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Durante a sessão de ADR que decorreu no período de estágio, foi observado que

estes cuidados não foram considerados. A aproximação tímbrica e espacial foi feita em

pós-produção através de filtros, efeitos e equalização. A escolha de um microfone torna-

se também crucial quando se quer substituir parte do diálogo e não a totalidade do

mesmo. Convém, neste caso, que: o microfone seja o mesmo usado nas filmagens,

esteja à mesma distância que estava em cena, e o actor esteja na mesma postura ou a

executar os mesmos movimentos. No caso da substituição de diálogo feita para a série

Teorias da Conspiração, um dos diálogos que foi substituído faz parte de uma cena em

que a personagem desce uma escadaria enquanto fala. Sente-se falta da interferência que

deveria existir na voz pelo facto de o corpo estar em movimento, e não existiu essa

preocupação na sessão.

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6. Conclusão

O fio condutor que permitiu o desenvolvimento da pesquisa, foi o contexto

prático de estágio em contacto com a realidade de um estúdio. Foram acompanhados

trabalhos de pós-produção de áudio para imagem para longas-metragens, documentário,

série e publicidade, para várias plataformas como cinema, televisão e web, em stereo e

em 5.1. A observação e participação no desenvolvimento destes trabalhos fez parte da

metodologia pois permitiu a compreensão do meio real, a forma como as coisas são

feitas e porquê, e as principais diferenças que podem influenciar e distinguir o produto

final.

Ao fazer a conexão entre as motivações da pesquisa e aquilo que foi observado e

apreendido durante o estágio, conclui-se que nos rendemos ao uso frequente de

ferramentas digitais promotoras da practicidade e celeridade, como é o caso de

ferramentas de correcção automática de som (não tirando o mérito que estas têm na

função que desempenham). As preocupações actuais dos produtores de conteúdos

audiovisuais estão orientadas para o sentido monetário, onde o mais importante é

poupar tempo de estúdio e dinheiro, e onde o exemplo de um bom profissional tende a

ser o indivíduo que faz o trabalho mais rápido.

Observada a realidade do panorama cinematográfico português, aponta-se o

facto de não existir a função de production sound mixer. Quando ela existe nem sempre

está presente ao longo de todos os processos, desde a fase de rodagem até à pós-

produção e finalização. Esta ausência gera incoerências, equívocos e problemas de

comunicação. O production sound mixer deve coordenar toda a equipa de som, decidir

que microfones usar e como os usar, e contactar com o realizador para que ambos

troquem ideias, desde a fase de pré-produção até à fase final. Como é comum existir

uma equipa diferente para a fase de gravação e para a de mistura, muitas vezes conduz a

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erros por falta de contexto, ou por dificuldade em transmitir-se aquilo que se pretende.

Exemplo claro desta lacuna sentiu-se no documentário Até que o Porno nos Separe, na

fase de mistura. Existem cenas de interior em várias divisões da casa, onde o técnico

que faz a mistura não sabe à partida como espacializar corretamente o som. O referido

aconteceu porque o técnico não esteve presente na fase de gravações, e não foi

transmitida informação acerca da arquitectura do apartamento. Esta questão agrava-se

quando a mistura é multicanal, como é o caso do documentário: existe uma dificuldade

em entender o espaço e as divisões reais quando não se está presente nas filmagens.

De salvaguardar que, na DMix, observou-se um cuidado com o sentido estético e

técnico do som nas peças audiovisuais, e um esforço valioso para compreender a

intenção do criador e pôr em prática da melhor forma o pretendido.

Apesar da existência de novas ferramentas de tratamento de áudio, e a evolução

cada vez mais rápida do software ajudarem bastante no workflow e redução de tempo,

ao longo desta pesquisa tornou-se clara uma nova preocupação: deixarmos de saber

ouvir. Cada vez dedicamos menos tempo a corrigir determinado clip de som, por

consequência menos tempo a escutar e menos tempo a analisar. Outras consequências

começam a surgir, e a um nível mais pessoal apontam-se as implicações ao nível da

auto-estima e da sensação de concretização e realização pessoal e profissional, onde

pensamentos como “o objecto acústico está a soar bem, mas não é mérito pessoal,

praticamente tudo é elaborado por um algoritmo” podem começar a surgir.

É possível que, o desenvolvimento e a divulgação de termos que possam

classificar e facilitar o diálogo acerca dos sons, seja uma batalha desnecessária. O som,

já é por si só, uma forma de comunicação. Após esta pesquisa observa-se que todas as

questões referidas na problemática, acabam por se tornar consequências umas das outras

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e por se influenciarem. Somos humanos e dependemos sempre das interacções com os

outros e com o meio, se uns não são demasiado exigentes relativamente a determinado

objecto, então outros não têm necessidade de melhorar esse objecto. Da mesma forma

não serão feitos esforços para melhorar a comunicação a respeito dos sons entre os

espectadores comuns, uma vez que, para a maioria dos indivíduos o assunto não é

pensado como um problema, ou uma questão a resolver.

Os sons existem, em todo a parte e momento. Não existe um som igual ao outro.

A questão da dificuldade de comunicação verbal acerca de sons, apontada como um

problema nesta pesquisa talvez não deve ser encarada como tal. Possivelmente o

caminho a seguir será explorarmos os sons e aceitá-los como independentes e livres,

sem necessidade de qualquer tipo de explicação e palavra, por se tratar já de si uma

forma de comunicação.

Devemos no entanto, valorizar e explorar mais a componente sonora ao nível

artístico, por forma a aproveitarmos ao máximo as suas capacidades perante a

audiência. Enquanto profissionais da área, temos também o dever de cumprir a nossa

tarefa da melhor forma possível, caminhando sempre no sentido de superar os padrões

existentes, só assim poderemos ascender e dar a conhecer ao público um cinema

português mais cuidado e criativo.

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Bibliografia

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Lista de Software

IZOTOPE OZONE: Conjunto de ferramentas digitais para masterização áudio.

Funciona como Plugin e inclui processamento de sinal, modelação de espectro e

equilíbrio de equalização, contém já alguns presets correspondentes a vários tipos de

plataformas finais, como CD, Televisão, Cinema ou Web.

IZOTOPE RX: Ferramenta complexa para reparar o áudio e reduzir ruídos.

Foram desenvolvidos poderosos algoritmos para este Plugin que ajudam a melhorar a

qualidade sonora e minimizar erros de captação, nomeadamente de-clickers, de-essers,

ambience match, de-rustle, dialogue isolation, etc. É uma ferramenta muito eficaz que

foi largamente explorada durante o estágio em praticamente todos os trabalhos.

IZOTOPE NECTAR: Plugin para processamento de voz, com algumas

ferramentas de correcção e redução de ruídos e efeitos criativos.

ANYMIX: Plugin de espacialização sonora para mistura de som. Este

espacializador foi usado tanto na longa-metragem Carga como no documentário Até

Que o Porno nos Separe.

WAVES M360 MIXDOWN: Plugin que gere sessões multicanal.

NEUTRON2: Plugin da iZotope que reúne um conjunto de ferramentas para

trabalhar em fase final de mistura. ! 43

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SSL COMP MONO: Plugin desenvolvido pela Waves que emula o compressor

de saída da mítica mesa de mistura SSL. É usado para masterização.

ML4000: Plugin para masterização que contem um limitador, um gate, um

expander e compressor multi-banda.

FABFILTER PRO MB: Processador dinâmico multibanda em forma de plugin.

SOUNDCODE STEREO LTRT: (Left Total Right Total), é um plugin que

converte um ficheiro multicanal em stereo, o algoritmo mistura os canais laterais,

frontais, traseiros e até o LFE (low frequency effects) num stereo.

WAVES NS1: Plugin, Noise Supressor, especialmente desenvolvido para tratar

diálogo uma vez que a sua função inteligente diferencia o que é diálogo do que é ruído.

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