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  • 7/21/2019 Verger Ewe

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    Ew

    O USO DAS PLANTAS NASOCIEDADE IORUB

    PlERRE FATUMBI VERGER

    ODEBRECHT

    __ as

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    Ainda h poucos dias algum me perguntou, muito a srio, se PierreVerger realmente existia ou se era mais uma inveno baiana. Quem sabe,talvez, a tentativa de explicar o sincretismo de nossa cultura, de repente re-presentada no mais por uma divindade e, sim, por um ser humano.

    Nascido na Frana e, segundo consta, de famlia aristocrtica,cidado do mundo, fotgrafo dos confins do mundo, de Pequim a LaHabana, jovem aventureiro nos caminhos do conhecimento e dasemoes. Depois doutor em cincias no Centre de RecherchesScientifiques da Frana ao lado de Roger Bastide, um sbio.

    Na frica, quem quiser saber dele deve perguntar por Fatumbi,ttulo que lhe deram ialorixs e babalas e que ele incorporou a seunome, pois a personalidade do professor e do pesquisador, homem daUniversidade e do livro, se fizera mais rica de humanismo, e ele tornou-se homem igualmente, ou sobretudo, do peji, da camarinha, da roda-de-feita. Na frica, ensinou e aprendeu no apenas a rota completa dosnavios negreiros, ainda mais a trajetria do mistrio. Fez-se feiticeiro:Pierre Fatumbi Verger.

    No terreiro do Ax Op Afonj, Me Senhora, a inesquecvel,sentada em seu trono de rainha, proclamou-o Ojuob, os olhos de Xang,aquele que tudo enxerga e tudo sabe. Nas casas de santo da Bahia fez-sefigura familiar, o mestre de todos ns, o igual de cada um no respeito ena cordialidade da vibrao dos atabaques. Professor, pesquisador, fot-grafo, escritor, na Bahia ele Pierre Fatumbi Verger Ojuob.

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    Na Bahia se completou o sincretismo do conhecimento e davida. A mistura do francs da rua Cardinal Lemoine, em Paris, com oafricano de Dakar, Porto Novo, Oy, resultou no baiano definitivo enico, aquele que de to extraordinrio mais parece uma inveno.

    No uma inveno a mais pois ele existe, trabalha, escreve,corre mundo. Feiticeiro, decerto. No h como esconder, como negar.

    Me Senhora costumava dizer Zlia, com um sorriso de amizade:

    "Cuidado com Verger, ele feiticeiro, tem poderes." Tem poderes, sabe

    das coisas.

    Jorge Amado

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    NDICE

    Nota introdutria........................................................................................... 9Agradecimentos ........................................................................................... ^Prefacio ...................................................................................................... Introduo ....................................................................................................

    A AO DAS PLANTAS E A PALAVRA ATUANTE

    Captulo 1 - A eficcia da palavra ............................................................... 29Sistema iorub de classificao das plantas ...................................... 29O verbo atuante nos of ...................................................................... *~>Os signos odus de If ......................................................................... 4oSignificado mltiplo das palavras ..................................................... 54Ligaes entre os nomes..................................................................... -1'Nomes medicinais e mgicos ............................................................. "3

    Captulo 2 - Oposies ................................................................................. 69

    Trabalhos malficos e benficos ....................................................... 69

    Estimulantes e tranqilizantes ........................................................... 78

    Captulo 3 - Os trabalhos mais desejados 87

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    RECEITAS MEDICINAIS E MGICAS

    Ogn, receitas de uso medicinal .................................................... 100Ibmo, receitas relativas gravidez e ao nascimento ....................... 270Ors, trabalhos relativos s divindades ..........................................290

    Awre, trabalhos de uso benfico .................................................... 324Abili, trabalhos de uso malfico ..................................................... 402Idbb, trabalhos de proteo contra trabalhos malficos ........... 432

    ANEXOS

    Ilustraes..........................................................................................465Glossrio de plantas: nomes iorubs cientficos ......................... 509

    Glossrio de plantas: nomes cientficos iorubs .........................623Notas .................................................................................................739ndice das receitas .............................................................................747ndice das ilustraes .......................................................................759Bibliografia ......................................................................................761

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    NOTA INTRODUTRIA

    Para aqueles que entram em contato com o iorub pela primeira vez,

    talvez seja interessante saber que este idioma originrio da frica ocidental,

    de regies que hoje fazem parte das repblicas da Nigria e do Benin, uma

    lngua milenar, com relatos de muitos sculos de histria antes da chegada dos

    europeus capital de seu reino, Il-If. Ao lado do hassa, o iorub uma das

    mais importantes lnguas da Nigria, sendo falado por aproximadamente 25

    milhes de pessoas naquele pas e por milhes de descendentes de escravos

    africanos em pases onde houve algum espao para a cultura iorub

    sobreviver, como no Brasil, na forma conhecida como nag, e em Cuba.

    Alm de antiga, a lngua iorub oral tendo sido grafada no papel

    pela primeira vez apenas no sculo XIX, pelos etnlogos britnicos que

    chegavam frica para estud-la e tonai, sendo necessrio "cantar" suas

    palavras corretamente para se expressar por meio dela. Tais caractersticas

    abrem um formidvel campo de estudos e algumas dificuldades.

    O fascinante de uma lngua oral to antiga so seus mecanismos para a

    transmisso de conhecimentos, estruturados na forma de cantos, fr--mulas e

    narrativas repetidas de uma gerao para outra. O professor Fatumbi Pierre

    Verger conseguiu registrar um desses tipos de mecanismos, as frmulas eencantaes usadas para a cura de males fsicos e espirituais pelos babalas

    iorubs, penetrando em uma rea da cultura pouqussimo acessvel a europeus

    e at hoje fechada para os no iniciados. Seu trabalho

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    10 - PIERRE FATUMBI VERGER

    fornece uma preciosa base para futuras pesquisas tanto das plantas medici-nais iorubs como daquela cultura em um sentido mais amplo.

    As dificuldades em lidar-se com uma lngua to diferente daseuropias so chegar-se a um acordo quanto aos smbolos que melhorpossam transmitir suas caractersticas em um alfabeto latino e levar osrelatos calcados na oralidade ao meio escrito, uma transcrio que maisse assemelha a uma traduo. O professor Fatumbi Pierre Verger cole-tou as fichas que deram origem presente obra por mais de quarentaanos, o que significa que alteraes de estilo so inevitveis. No entan-to, importante perceber que os jogos de palavras to bem descritospelo autor so essenciais s frmulas e que as metforas e variaes

    sutis de sentido fazem parte da lngua, convidando o leitor a uma inter-pretao imaginativa de seu significado.Para que seja possvel uma leitura dos sons dessa lngua de certa

    forma to presente em nosso cotidiano, damos a seguir um guiaresumido de pronncia do iorub.

    Grafia Pronncia Grafia Pronncia

    A A M Mi

    B Bi N NiD Di 0 0

    E E 0E E P PiF Fi R Ri (R brando)G Gui S Si

    GB Gbhi XiH Hi (aspirado) T TiI I U UJ Ji Wi (como emK Ki ingls)L Li Y li

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    NOTA INTRODUTRIA - 11

    Em combinao com o "n" temos ainda as vogais nasais, que sepronunciam:

    AN NEN ININ IN

    ON NUN UM

    Os sinais de acentuao, por outro lado, so uma indicao dotom daquela slaba, um dado to importante quanto a pronncia para a

    compreenso da palavra. O acento agudo (') representa a subida de umtom musical quase inteiro em relao ao "neutro" e o grave ) umadescida equivalente. Se a pessoa fala em r, por exemplo, as slabas semacento devem ser ditas em r, as com acento agudo em mi e as comacento grave em d. Vogais longas so grafadas duplamente, como napalavra rin, e a ondulao de tom que por vezes ocorre durante a suapronncia aparece como dois acentos diferentes, como na palavra er.

    As palavras a seguir, por exemplo, dependem unicamente do

    tom para se distinguirem:

    ok - carro, espadaoko - marido ok -enxada

    O ttulo Ew (folha), portanto, deve ser lido como "eu" com

    uma subida de tom ao final.

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    AGRADECIMENTOS

    Um sem nmero de pessoas colaboraram para que esta obrafosse publicada, cito aqui apenas as que posso neste espao: os serviosbotnicos do Departamento de Ref lorestamento de Ibadan e do InstitutoFrancs da frica Negra (IFAN), de Dakar, que fizeram as primeirasidentificaes; o professor Portre do Museu de Paris que as confirmou;o doutor Burkill e todo o pessoal do jardim botnico de Kew Garden, deLondres, pela identificao das plantas e as ilustraes cedidas; UlliBeier, por ter publicado meu primeiro livrinho sobre as plantas iorubsna Nigria, apresentado na poca pelo professor Akinjogbin; ThodoreMonod que me convidou a pesquisar na frica; os amigos Caryb eJorge Amado; a saudosa Maria Bibiana do Esprito Santo, Me Senhora,ialorix do Il Ax Op Afonj; Balbino Daniel de Paula, babalorix doIl Ax Op Aganju; o finado professor Alexandre Leal Costa; Arabade If, chefe supremo do culto de Orumil na frica; Oluwe Ojo Awo,meu mestre; o babala Iroko, meu serfa; os babalas Babalol,Aworinde e Adesokan, que me contaram tantas histrias de If;Adefolalu Adeyanju, que me ajudou a recolher e transcrever os

    primeiros dados recolhidos em campo; Solange Bernab, que traduziuminhas fichas de campo do ingls para o portugus; Fbio Arajo, quefez a reviso da nomenclatura cientfica; Eliana Miranda, pelasinmeras leituras de meu texto; Ayodele Fasoyin, pela reviso doiorub; Dione Arajo; Olga Regis do Alaketo; Jos Flvio Pessoa deBarros; Jean Marc Bonneau; o doutor Decanio e Isabel pela carinhosa

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    cura realizada base de "ew brasileiras"; a professora LetciaScarolino Scott Faria e ao professor Luciano Paganucci Queiroz por suaajuda na obteno dos nomes vulgares e cientficos das plantas.

    AGRADECIMENTO ESPECIAL

    A Organizao Odebrecht, sem o patrocnio da qual no teriasido possvel a publicao deste livro.

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    PREFCIO

    Aprendi muito rapidamente a no fazer perguntas inteis, talvezpor timidez ou por falta de curiosidade ou, ainda, em razo de uma certadificuldade em compreender o sentido das explicaes que me eram dadas.

    Eu tinha tambm uma tendncia a no me interessar por coisasque, durante minha infncia, pareciam apaixonar meu crculo familiar:o roubo da Mona Lisa, a inundao de Paris em 1910, o naufrgio doTitanic, fatos tidos como sensacionais que figuravam entre as questesda Europa.

    Esta diferena congenial no era precisamente a qualidade maisrequerida de um pesquisador, mas a sorte fez de mim um diretor depesquisas no Centre de Ia Recherche Scientifique de Paris!

    Parece paradoxal que esta falta de curiosidade possa ter contribu-do para a publicao de uma obra sobre a utilizao medicinal e mgicadas plantas entre os iorubs. De fato, minha indiferena no fingida a res-peito do saber guardado pelos adivinhos babalas e curandeiros onisegunfoi o fator no premeditado que me trouxe o sucesso neste campo.

    Tive a chance de, a partir de 1948, poder fazer numerosas via-

    gens alternadas ao Brasil e frica. Isso me proporcionou uma acolhi-da favorvel em certos terreiros de candombl da Bahia e minha inte-grao entre os praticantes das religies tradicionais da frica. Que eufreqentasse esses ambientes sem fazer perguntas indiscretas e dessenotcias sobre o que se passava no outro lado do Atlntico interessavade uma parte e de outra.

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    Pude tambm mostrar na frica pranchas com amostras deplantas brasileiras conhecidas no ambiente do candombl por denomi-naes nag-iorub, o que facilitava a constituio de pranchas de her-brio dessas mesmas plantas na frica, assim como de numerosas ou-tras utilizadas para trabalhos medicinais e mgicos por meus amigosiorubs.

    Minha iniciao como babala na cidade de Keto, hoje naRepblica do Benin, frica Ocidental, em 1953 facilitou e oficializouminhas pesquisas, mesmo porque tomar conhecimento do uso das plan-tas para a preparao de receitas, remdios e "trabalhos" tradicionaisconstituram para mim no somente um direito, mas uma obrigao. As

    plantas eram-me entregues por meus confrades babalas acompanhadasde seus nomes iorubs e de frases curtas chamadas of, as quais enun-ciam, em termos muitas vezes poticos, suas qualidades.

    No princpio foi o aspecto literrio do conjunto desses of quechamou a minha ateno. Em 1967 eu j havia recolhidos vrios mi-lhares dessas frmulas e, graas iniciativa de Ulli Beier e do professorAkinjogbin, o Tnstitute of African Stories da Universidade, de Ifpublicou oitenta desses curtos poemas em uma brochura, Awon ewsanyin (As folhas medicinais dos iorubs).

    No decorrer da coleta de plantas pensei, durante certo tempo,que meus colegas babalas estivessem troando de mim, pois em diver-sas ocasies recebi amostras de uma mesma planta com nomes iorubsdiferentes. Mas houve um momento em que me dei conta de que as cur-tas frase of que definiam a ao esperada da planta em questo com-portavam um verbo geralmente monossilbico que figurava no nome daplanta, servindo assim para auxiliar sua memorizao, e que este "verboatuante" da encantao pronunciada tambm era uma das slabas donome da planta utilizada.

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    PREFACIO- 17

    Desse modo, caso a slaba necessria para que um trabalho ouuma ao se cumprisse no figurasse no nome da planta, este era subs-titudo por outro nome onde a slaba (verbo atuante) estivesse presentee, por conseqncia, outro nome era dado mesma planta.

    Descobrir a existncia do verbo atuante no nome das plantas enos of foi para mim semelhante Eureka de Arquimedes. O presentelivro um extrato do que meus mestres e confrades babalas tiveram aboa vontade de me ensinar durante os numerosos anos em que vivi nafrica.

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    INTRODUO

    Esta pesquisa foi realizada na frica, num universo cultural baseado

    na oralidade, onde a importncia dos valores de transmisso oral diferente

    da dos de uma civilizao baseada em documentos escritos.

    O estudo foi feito principalmente entre babalas, que na comunidade

    iorub fazem a adivinhao segundo um sistema denominado If, baseado em

    256 signos chamados odus, sob os quais esto classificados os remdios

    tradicionais e os "trabalhos" tratados na presente publicao.

    Estes 256 odu If so signos duplos derivados de dezesseis signos

    simples1, que fazem par tanto consigo prprios para formar os dezesseis odus

    primrios2, quanto com cada um dos outros dezesseis signos simples para

    formar os 240 secundrios1.

    O primeiro desses odus secundrios, resultado da associao dos dois

    primeiros signos simples ogb e yk, chama-se ogb alml, "ogi>-

    dono-da-variedade" ou "ogb-dono-da-diversidade".

    Durante a preparao de uma frmula, o babala estabelece uma

    ligao entre o remdio e o signo de If, sendo esse ltimo desenhado por ele

    no p, iyrsim4. A ligao feita atravs de elos verbais entre o nome da

    planta, o nome da ao medicinal ou mgica dela esperada e o odu, signo de

    If no qual classificada.

    Tais elos verbais so essenciais para ajudar o babala a memorizar as

    noes e conhecimentos transmitidos por tradies orais, tendo assim um

    carter coletivo e no individual.

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    A transmisso oral do conhecimento considerada na tradioiorub como o veculo do ax, o poder, a fora das palavras, que per-manece sem efeito em um texto escrito. As palavras, para que possamagir, precisam ser pronunciadas. O conhecimento transmitido oralmentetem o valor de uma iniciao pelo verbo atuante, uma iniciao que noest no nvel mental da compreenso, porm na dinmica do

    comportamento. baseada mais em reflexos que no raciocnio, reflexosestes induzidos por impulsos oriundos do fundamento cultural dasociedade.

    O conhecimento transmitido do babala ao omo awo, domestre ao discpulo, atravs de sentenas curtas baseadas no ritmo darespirao5. Sendo repetidas constantemente, tornam-se esteretiposverbais que se transformam em definies aceitas com facilidade.

    Segundo Jean Pierre Vernant6, o mesmo se dava entre os anti-gos gregos, cujas regras de composio potica requeriam o conheci-

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    INTRODUO- 21

    mento prvio de uma tcnica de dico que empregava expressestradicionais, compostas de esquemas de palavras j estabelecidos.Tambm os antigos chineses, segundo Mareei Granet7, possuam umaliteratura que se baseava em expresses convencionais. Mesmo artistasmais originais, quando queriam provar ou explicar, narrar ou descrever,usavam histrias estereotipadas emprestadas da sabedoria popular.

    O uso de expresses estereotipadas no significava que pen-sassem de forma primria, mas que a forma correta de expressar asidias era inseri-las em frmulas conhecidas das quais elas tomavamtoda a fora de influncia.

    Mais adiante veremos a importncia do elemento meldico dos

    tons da lngua iorub nas sentenas mgicas, onde assonncias e alite-raes tm um papel destacado.

    CLASSIFICAO

    Fazia-se indispensvel tambm conhecer os nomes cientficosdas plantas, razo pela qual recolhemos espcimes e os submetemos avrias entidades, tais como o departamento de botnica do IFAN em

    Dakar, o herbrio do Departamento Florestal de Ibadan, o professorPortre do laboratrio etnobotnico do Museu de Histria Natural deParis e, finalmente, o professor H. M. Burkill do Royal BotanicalGardens de Kew, Londres. Este ltimo, sentindo-se atrado pelo humorde algumas das frmulas de emprego de plantas publicadas na brochura

    Awon ew Osanyin, incluiu-as na obra Useful plants of West Tropicalfrica, da qual dois dos cinco volumes previstos j foram publicados.

    Levantamos que os 3.529 nomes iorubs correspondem a 1.086

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    22 PIlikRli IATUMBI VliRC.lR

    nomes cientficos. As razes desta discrepncia se devem diferena de

    critrios de classificao utilizados pelos iorubs e pelos botnicos ocidentais

    e sero melhor explicadas mais adiante. Mas conhecer os nomes cientficos

    das plantas utilizadas pelos iorubs no suficiente para avaliar sua riqueza.

    No fizemos experimentos para comprovar sua eficincia, mas temos certeza

    de que uma pesquisa sobre seus efeitos medicinais daria indicaes teis de

    seu valor farmacolgico.

    No esta a meta dessa publicao, que tem um enfoque etnolgico e

    no mdico. Aqui apontamos somente quais so as plantas usadas na

    farmacopia iorub e para que tipo de trabalho medicinal (ou mgico) so

    empregadas. Suas virtudes e valor medicinal no so fceis de descobrir, uma

    vez que raramente uma receita faz uso de apenas uma planta. Em geral, cadaprescrio comporta de trs a seis plantas diferentes. Uma s planta talvez

    possa ser comparada letra de uma palavra: sozinha no tem significao,

    associada a outras contribui para o significado da palavra .

    Ao coletar alguns milhares de receitas, selecionamos 447, as quais

    foram distribudas em seis categorias:

    a) 219 receitas de uso medicinal (ogun), no conceito da medicina

    ocidental.

    b) 31 receitas relativas gravidez e ao nascimento (ibmo).c) 33 receitas relativas adorao das divindades iorubs (orix).

    d) 91 receitas de uso benfico (wre).

    e) 32 receitas de uso malfico (bil).

    f) 41 receitas de proteo contra as de uso malfico (idbb).

    Entretanto no fcil classificar todas as receitas por categoria. Por

    exemplo, um afrn para fazer com que as pessoas esqueam um

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    INTRODUO - 23

    caso no tribunal um wre para uma das partes, mas ao mesmo tempoum bilu para a outra.

    E tambm difcil traar uma linha de demarcao entre os assimchamados conhecimento cientfico e prtica "mgica". Isso ocorre de-vido importncia dada, em uma cultura tradicionalmente oral como aiorub, encantao, of, pronunciada no momento de preparao ouaplicao das diversas receitas medicinais, ogn.

    Se para a medicina ocidental o conhecimento do nome cientficodas plantas usadas e suas caractersticas farmacolgicas o principal,em sociedades tradicionais o conhecimento dos of, encantaes trans-mitidas oralmente, o que essencial. Neles encontramos a definio

    da ao esperada de cada uma das plantas que entram na receita.Existem vrias plantas cuja presena, primeira vista, parece

    ter somente um carter simblico mas que, na realidade, tm valor tera-putico. Este o caso de duas plantas aquticas, oj or (PISTIA STRA-TIOTES, Araceae, a alface d'gua) e sbt (NYMPHEA LOTUS,Nymphaceae, o ltus), que em seus of evocam a idia de superioridadee dominao nas frases que seguem:

    Oj or ni lk om. Oj

    or est sobre a gua.

    sbt ni lk od. sbt

    est sobre o rio.

    Seguidas da prazerosa meno:

    Fila ni lk or.

    O bon est sobre a cabea.

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    I IMERKEEATUMHI VERGER

    E uma ainda mais lisonjeira:

    Ti Oba ni lk or.O rei est acima de todos.

    Durante muito tempo acreditamos que essas duas plantas fos-sem usadas apenas por razes simblicas, mas recentemente lemos emum artigo escrito pelo professor Jean Marie Peite8 que no sbtencontram-se elementos sedativos.

    A primeira vista difcil perceber nas receitas qual a partemgica (que mais respeitosamente deveremos chamar de ax, poder), e

    quais as virtudes testveis experimentalmente dessas plantas. Devemoster em mente que, na lngua iorub, freqentemente existe uma relaodireta entre os nomes das plantas e suas qualidades, e seria importantesaber se receberam tais nomes devido s suas virtudes ou se devido aseus nomes determinadas caractersticas foram a elas atribudas, comoum tipo de jogo de palavras (ou, mais respeitosamente, p/o).

    Essas encantaes-jogos de palavras tm uma grande importn-cia nas civilizaes de tradio oral. Sendo pronunciadas em oraessolenes, podem ser consideradas como definies e com freqncia so

    as bases sobre as quais o raciocnio construdo. Servem tambm comoconcluso e prova final nas histrias transmitidas de gerao a geraopelos babalas, e expressam ao mesmo tempo o ponto de vista da cul-tura iorub e o senso comum de seu povo.

    No caso de nosso estudo, o importante saber se a interpretaocorresponde realidade e se as qualidades atribudas s plantasbaseiam-se em suas verdadeiras virtudes. Como dissemos antes, deixa-mos aos especialistas o estudo da validade de nossas suposies, fican-

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    do nossa parte restrita enumerao das folhas usadas pelos babalas e

    curandeiros e a dar alguns detalhes sobre a preparao dos vrios ingredientes,

    assim como sobre o texto das encantaoes pronunciadas por eles durante esta

    tarefa.

    Nessas encantaoes, os nomes de folhas so acompanhados de duas

    ou trs linhas descrevendo suas qualidades naquele caso em particular. A uma

    certa folha podem ser atribudas virtudes diferentes segundo sua associao

    com um ou outro conjunto de folhas, pois elas entram na composio de

    diferentes preparaes medicinais.

    A despeito da diversidade de qualidades relacionadas s folhas

    segundo suas vrias associaes, existe uma certa constncia em seu

    simbolismo.Sabemos, por exemplo, que entre as folhas h quatro conhecidas como

    won ako ew mrin, as quatro folhas masculinas (por seu trabalho malfico):

    ew in (URERA MANII, Urticaceae), ew rgb (BRIDELIA ATROVIRIDIS,

    Euphorbiaceae), ew sis funfun (TRAGIA BENTHAMII, Euphorbiaceae), ew

    olyin (STRIGA ASITICA, Scro-phulariaceae); e quatro outras tidas como

    antdotos, bondade: ew dndn (KALANCHOE CRENATA, Crassulaceae, a

    folha-da-costa), ew tt (AMARANTHUS HIBRIDUS subsp. INCURVATUS,

    Amaranthaceae, a cauda-de-raposa), ew rinrin (PEPEROMIA PELLUCIDA,

    Piperaceae, o jabuti-membeca) e ew ikpr (DICHROCEPHALAINTEGRIFOLIA, Compositae).

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    A AO DAS PLANTAS EA PALAVRA ATUANTE

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    CAPITULO 1

    A EFICCIA DA PALAVRA

    SISTEMA IORUB DE CLASSIFICAO DAS PLANTAS

    O sistema iorub de classificao botnica, por ser diverso do

    elaborado por Lineu, usa diferentes caractersticas para a identificao e

    classificao das plantas. Na terra iorub, a nomeao das plantas leva em

    conta seu cheiro, sua cor, a textura de suas folhas, sua reao ao toque e a

    sensao provocada por seu contato, entre outras.

    Pluralidade de nomes cientficos para um s nome iorub

    E comum que um s nome iorub corresponda a vrios nomes

    cientficos. Aqui esto alguns exemplos:

    Ahn ekn, "lngua-de-leopardo", o nome dado a folhas cuja

    superfcie se mostra spera, apesar de sua forma ser diferente. De acordo com

    a classificao cientfica, elas so a HIBISCUS SURATTENSIS, Malvaceae; aHIBISCUS ASPER, Malvaceae (o cnhamo-brasileiro); a TETRACERA sp.,

    Dilleniaceae; e a ACANTHUS MONTANUS, Acanthaceae (o falso-cardo).

    Amij, "estanca-sangue", chamada amj nl, "estanca-sangue

    grande", no caso da HARUNGANA MADAGASCARIENSIS, Rhizophoraceae, e

    amuj ww, "estanca-sangue pequena", no caso da BYRSOCARPUS

    COCCINEUS e da CNESTIS LONGIFLORA, ambas Connaraceae, so plantas com

    propriedades coagulantes.

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    M) l'li;kR lil'A'l 'l]M HI VERGER

    Bob wdi o nome dado tanto SOLANUM DASYPHYLLUM,

    Solanaceae, quanto CAPPARIS THONNINGII, Capparaceae, devido

    semelhana da forma de seus frutos, que se parecem com a berinjela.

    Bj o nome dado a plantas que so usadas na preparao de

    tatuagens e de tintura preta para cabelo, classificando-se como MORELIA

    SENEGALENSIS, Rubiaceae; ROTHMANIA WHIFFIELDII, Rubiaceae;

    ROTHMANIA LONGIFLORA, Rubiaceae; KEETIA LEUCANTHA, Rubiaceae; e

    SORINDEIA WARNECKEI, Anacardiaceae.

    Dgunr, "pra-guerra", o nome dado a plantas espinhosas de trs

    famlias diferentes: dgunr gogoro, "alta", para a ACANTHOSPERMUM

    HISPIDUM, Compositae (carrapicho-rasteiro); dgunr kker, "pequena", para

    a ALTERNANTHERA PUNGENS, Amaranthaceae (erva-de-pinto); e dgunr nl,"grande", para a TRIBULUS TERRESTRIS, Zygophyllaceae.

    knn, "garra", o nome dado a plantas que possuem espinhos,

    como knn adiye, "garra-de-galinha", para a PORTULACA QUADRIFIDA,

    Portulacaceae; knn ekn, "garra-de-leopardo", para a ARGEMONE

    MEXICANA, Papaveraceae (o cardo-santo); knn magbo para a SMILAX

    KRAUSSIANA, Smilacaceae; e knns adiye tanto para a STRYCHNOS

    SPINOSA, Loganiaceae quanto para a ZIZIPHUS MUCRONATA, Rhamnaceae.

    m um nome composto a partir do verbo m, "grudar", e as vrias

    plantas assim designadas possuem frutos aderentes, que grudam no plo dosanimais e nas roupas. So elas a DESMODIUM CANUM, Leguminosae

    Papilionoideae; a CENCHRUS BIFLORUS, Gramineae; a SETARIA

    VERTICILLATA, Gramineae (capim-de-cabra); a PUPALIA LAPPACEA,

    Amaranthaceae; e a POUZOLZIA GUINEENSIS, Urticaceae.

    sisi a denominao dada a plantas cujas folhas e frutos so

    cobertos por plos urti-cantes, como a CNESTIS CORNICULATA, Connaraceae;

    a CNESTIS FERRUGINEA, Connaraceae; a MUCUNA

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    EFICCIA DA PALAVRA - 31

    PRURIENS, Leguminosae Papilionoideae (p-de-mico); a TRAGIA BEN-THAMII,

    Euphorbiaceae (urtiga-branca); a URERA MANII, Urticaceae; e a SIDA URENS,

    Malvaceae (guaxima). O mesmo nome dado tambm LAPORTEA

    AESTUANS (cansao) e LAPORTEA OVALIFOLIA, ambas Urticaceae, plantas

    no urticantes mas cujas folhas tm forma semelhante das folhas de urtiga.

    Ewro, "folha amarga", o nome das folhas de sabor amargo

    pertencentes a vrias famlias, como a VERNONIA AMYGDALINA (alum), a

    VERNONIA ADOENSIS, a VERNONIA COLORATA e a STRUCHIUM

    SPARGANOPHORA, todas Compositae; a SOLANUM WRIGHTII e a SOLANUM

    ERIANTHUM (fruta-de-lobo), ambas Solaneae; e a LUDWIGIA OCTOVALVIS,

    Onagraceae (cruz-de-malta).

    Uasa o nome dado a plantas que possuem em comum carac-tersticas mucilaginosas, como a ABELMOSCHUS ESCULENTUS, Malvaceae

    (quiabo), por seus frutos; a URENA LOBATA, Malvaceae (guaxima-roxa), por

    suas sementes; e a TRIUMFETTA RHOMBOIDEA, Tiliaceae (carrapicho-da-

    calada), por suas folhas.

    Orbja, "veneno-pega-peixe", como so conhecidas a TEPHROSIA

    VOGELII, Leguminosae Papilionoideae, e a DIOSPYROS PHYSOCALYCINA,

    Ebenaceae, plantas cujas folhas e vagens so usadas para deixar lentos os

    peixes de rios e lagos.

    dndn o nome dado KALANCHOE CRENATA, Crassulaceae(folha-da-costa) e EMILIA COCCINIEA, Compositae (pincel), sendo esta

    ltima tambm chamada de dndn etidf, dndn olkun e dndn od.

    A bmod ou BRYOPHYLLUM PINNATUM, Crassulaceae (milagre-de-so-

    joaquim) tambm conhecida como er dndn, "escravo-de-odundun".

    Patonm, "mantm-as-coxas-fechadas", o nome dado a plantas

    cujos fololos se fecham ao menor contato. aplicado MIMOSA PUDICA,

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    M IMIiRRIi FATUMBI VERGER

    Leguminosae Mimosoideae (dormideira); MIMOSA PIORA, Leguminosae

    Mimosoideae (unha-de-gato); e BIOPHYTUM PETERSIANUM, Oxalidaceae.

    Saworo, "sininho", o nome dado TRILEPISIUM MADAGAS-CARIENSE,

    Moraceae; s CARDIOSPERMUM GRANDIFLORUM (ensacadinha) e

    CARDIOSPERMUM HALICACABUM, Sapindaceae; e CROTALARIA sp.,

    Leguminosae Papilionoideae, todas plantas com frutos cujas sementes ficam

    soltas na vagem e chocalham quando sacudidas.

    Pluralidade de nomes iorubs para um s nome cientfico

    Se h vrios nomes cientficos para um s nome iorub, o inversotambm verdadeiro. Seguem alguns exemplos:

    A BRIDELIA MICRANTHA, Euphorbiaceae, corresponde a trs nomes

    em iorub: s, usada numa proteo contra os inimigos (idbb lw t)

    com o ofo As l' n k'bi k' ma s fn mi, "As diz que o mal deve fugir [s]

    de mim"; ira, cuja casca, em casos de gravidez que supostamente se

    prolongam de um a trs anos (oyn rr), usada com o of Epo ira k' r

    orno n w, "Casca de ir, faa a criana se arrastar para fora" (frmula

    249); e fon fon, usada numa receita para eliminar vermes (ogn ejonu),

    com o of Fon fon b wa fo ejonu, "Fon fon, leve [expulse] os vermespara fora".

    A FLABELLARIA PANICULATA, Malpighiaceae, tambm tem trs

    nomes em iorub: jdr, "acordando-segura-fortuna", usada para obter

    honradas e glria (wre ol nn) com o of Ew jdr di ire gbogbo w,

    "Folha de jdr, despache todas as coisas boas para c" (frmula 319);

    pnklo, usada em trabalhos para obter virilidade (aremo) com o of

    Apnklo k orno wy, "Apnklo, traga crianas ao mundo"; e lagblagb,

    usada em trabalhos para alcanar boa sorte

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    EFICCIA DA PALAVRA - 33

    (wre orire) com o of Lagblagb Ia n're fn mi, "Lagblagb, abra a

    estrada da boa sorte para mim".

    A IPOMOEA HEDERIFOLIA, Convolvulaceae (jitirana), tem dois nomes

    em iorub: et olgb e kaw kaw. Et olgb, "orelha-de-gato", (por causa

    de sua forma) usada para obter dinheiro (wre ow) com o of Et olgb, 1

    ' n ma gb 'w w, "Et olgb disse que voc traz dinheiro [para mim]";

    para proteger contra a morte (idbb Vw ik) com o of Et olgb l' n

    k' gb, "Et olgb disse que ele dever chegar velhice"; e ainda para atrair

    a simpatia das pessoas (wre frn niyr) com o of Et olgb '

    ngbogbo yn frn mi, "Et olgb diz que todos vocs devem me amar"

    (frmula 350). A kaw kaw, "conta-dinheiro", usada em duas preparaes

    para conseguir dinheiro (wre ow) com seus respectivos of Kaw kaw n jk m kaw, "Kaw kaw diz que eu realmente deverei contar dinheiro",

    e Kaw kaw ki j k' m kaw, "Kaw kaw nunca acorda sem contar

    dinheiro".

    A JATEORHIZA MACRANTHA, Menispernaceae, tem cinco nomes em

    iorub: l elw onka meta, "folha-dona-de-trs-dedos", (devido sua

    forma), usada para encontrar trabalho (wre im'ni rs) com o of Al elw

    onka meta ni p k won fi ire temi l mi, "Al elw onka meta disse que

    eles sugerem sucesso para mim"; al elw nl, "dono-da-grande-folha",

    usada para conseguir um ttulo de chefe tribal (im'ni joy) com o of Alelw nl 1 ' n e fire ila temi l mi, "Al elw nl disse que voc sugere

    grande honra para mim"; lfohn, "moer-e-no-falar", usada para se obter

    vitria contra um inimigo (wre isgun t) com o of lfohn m j k

    t mi fohn, "lfohn, no deixe meu inimigo falar"; nmnm,

    "completamente", usada para se ganhar um processo na justia (wre afrn)

    com o of Nmnm mo m rn yije, "Eu pego este processo e o como

    completamente"; e br, "vindo-facilmente", usada para que as mulheres

    grvidas tenham

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    34 - PIERRE PATUMBI VERGER

    um parto suave (awb) com o "ofBr Vnk'ya ma b br, "Br disse

    que a minha mulher ter criana facilmente".

    A CAMPYLOSPERMUM FLAVUM, Ochnaceae, corresponde a trs

    nomes em iorub: ajbpo, "acordando-procura-o-azeite-de-dend", usada para

    obter proteo contra as feiticeiras (dbb Vw ymi snrng)'com o

    of Ajbpo ni b aj, "Ajbpo implora s feiticeiras";fsosj, "fazer-sangue-

    com-uma-fruta", usada para ajudar a mulher a engravidar (mbnrin lyn),

    com o of Fsosj k' s'j d'orno, "Fsosj faz o sangue se tornar uma

    criana" (frmula 235); e fj shin, "com-sangue-faz-as-costas", usada para

    tratar dores nas costas (ogun hin ddun), com o of Fj shin b mi w hin

    sn, "Fj shin, ajude-me a curar as minhas costas" (frmula 12).

    A PLEIOCERAS BARTERI, Apocynaceae, tambm corresponde a pelomenos trs nomes iorubs: f, usada para proteger as pessoas contra aci-

    dentes, particularmente motoristas que, ao us-la, supostamente so levados de

    volta para casa sos e salvos (idbb Vw ijhba) com o of f gb mi f

    nn ibi, "f, afaste-me do mal [acidente]" (frmula 433); dgb, "para-ficar-

    velho", ou seja, continuar vivo, tambm usada para agradar as feiticeiras

    (ww iyn iymi) com o of Ew dgb n dor iymi /e, "A folha de dgb

    sempre guia as feiticeiras [para proteger-mej" (frmula 274); e olgbkyn,

    "o-gato-sada-as-pessoas", usada para obter dinheiro (wre ow nn) com o

    of Olgbkyn gbw w, "Olgbkyn, traga dinheiro para c" (frmula297).

    A RAULWOLFIA VOMITORIA, Apocynaceae, corresponde a pelo menos

    sete nomes em iorub. A maioria dos trabalhos que se espera desta planta

    destina-se a acalmar a loucura (ogn wr). Os of dos quatro primeiros

    nomes tem este propsito: Apawr pa wr yi sn, "Apawr, mate [e cure]

    esta loucura";Awowr b mi w wr mi yi sn, "Awowr, ajude-me a sarar

    de minha loucura";Dd [dd] V n

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    li. PIKKKR PATUMBI VERGER

    agir, devem ser pronunciadas. Entre os iorubs, os of so frases curtas nas

    quais muito freqentemente o verbo que define a ao esperada, o verbo

    atuante, uma das slabas do nome da planta ou do ingrediente empregado.

    Tal o caso de uma receita para tratar de dor nos f lanos (ogn lha ddr)

    (frmula 15), na qual se usam folhas de oy j(CORCHORUS AESTUANS,

    Tiliaceae, o caruru-da-bahia) e aws (PLUKE-NETIA CONOPHORA,

    Euphorbiaceae), penas de agbe (galinhola azul africana) e de lk (galinhola

    vermelha africana). Durante a preparao desse remdio, deve-se pronunciar o

    seguinte of:

    Oy j w yo riin kr n 'h

    aws sa rim h Io aghe gbrim ih kr lk k rim ih Io

    Oy j, ajude-me a remover a doena do flanco.

    Aws, pegue a doena do flanco e a leve embora.

    Agbe, carregue a doena do flanco.Alk, leve a

    doena do flanco.

    Em cada verso, o verbo atuante repetido em uma das slabas do

    nome da planta ou do objeto empregado. Se nesse exemplo alguns dos tons

    no parecem corretos, devemos lembrar que os iorubs por vezes usamtrocadilhos e jogos de palavras, uma questo sobre a qual falaremos mais

    adiante. Veremos abaixo mais alguns exemplos de of em que os tons so

    mais respeitados.

    Em seu livro sobre If, William Bascom3 nos d um exemplo do

    mesmo gnero e faz as seguintes observaes: "um tipo particular de tro-

    cadilho contribui para dar uma conexo interna [a essas palavras]. Esses

    trocadilhos so de natureza mgica e neles o nome do objeto sacrificado

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    EFICCIA DA PALAVRA - 37

    lembra palavras que exprimem o resultado desejado". O autor mencionaum trabalho feito para encontrar onde ficar, tedo (iwr mji). Ele indicaa oferenda a ser feita e a encantao apropriada: um pilo (od) usadopara encontrar onde acampar (d); folhas de tt para encontrar ondedescansar (te); folhas gbgbpara encontrar onde morar (gb).

    Tais tipos de of so muito numerosos. Aqui seguem maisalguns exemplos. Numa receita para acabar com a tosse (ogun ik),devem-se pilar folhas de j (QUASSIA UNDULATA, Simaroubaceae),mistur-las com suco de rorhb ww (ClTRUS AURANTIFOLIA,Rutaceae, a lima-da-prsia), tomar trs colheres dessa preparao todasas manhs e pronunciar o of:

    j j ik kr I 'rn.Orrnbo b ik kr Vrn.

    j, arranque [j] a tosse da garganta. rmbo,descasque [b] a tosse da garganta.

    Freqentemente, o verbo atuante de uma preparao o mesmopara todas as folhas nela empregadas, e a mesma slaba encontrada emcada um dos nomes. E o caso, por exemplo, de uma receita para tratar

    lepra (ogun t) (frmula 202), em que a slaba pa encontrada nosnomes das folhas ikpupa, oparun e rpa, e na encantao, que tambm a mesma para as trs: b mi pa rn t, "ajude-me a matar a lepra".

    O mesmo acontece com uma receita para tratar convulses(ogun giri) (frmula 204). A encantao se baseia na slaba ,s dasdiferentes plantas invocadas para fazer a doena "correr" (.si).

    Em um trabalho para se chamar a boa sorte (wre orre) deve-seusar ajif b l (IPOMOEA CAIRICA, Convolvulaceae) e folhas de f (noidentificada), s quais se adicionam afar oyin (favos de mel), queiman-

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    HX - IMIiRRIi 1'ATUMBI VERGER

    do-se tudo at se obter um p preto, que misturado com azeite de dend e

    lambido por aquele que deseja a boa sorte. O verbo atuante f (rer), "para

    trazer boa sorte", uma slaba includa em todos os nomes dados.

    J em um trabalho para se conquistar o corao de uma mulher

    (wre ifrn obinrn) (frmula 337), o verbo atuante nos diferentes versos

    m, "capturar", uma slaba includa nos nomes das plantas usadas mas

    acentuada de forma diferente.

    Essas diferenas de tons s vezes aparecem nas encantaes

    pronunciadas durante os trabalhos em que a folha ir (HOLARRHENA

    FLORIBUNDA, Apocynaceae) intervm. Assim, para curar algum da varola

    (ogn ilgbn), deve-se desejar ire m j k r mi, "Ir, no deixe a

    varola me encontrar fraco [r]". Mas caso se deseje obter os favores de umamulher, o of ser Ir n k e b mi r, "Ir diz que voc faz amizade [re]

    comigo". O tom do verbo atuante baixo no primeiro caso (r) e alto no

    segundo (re).

    O nome da folha lml (CSSIA AREREH, Leguminosae

    Caesalpinioideae) relaciona-se tanto com a idia de manter algum em casa,

    ml (w), quanto com a de pegar um ladro, m ol. Assim, usada para

    fazer com que uma mulher infiel fique em casa (iid obinrin dr s'l) com o

    of Lml b mi m obinrin temi wl, "Lml traz a minha esposa para

    casa", e tambm para a proteo contra ladres (idbb Vw ol) com oof Lml ba mi m ol s'l, "Lml, prenda o ladro para mim".

    O elo entre o nome da folha e a ao esperada, invocada atravs do

    of, no se limita apenas ao verbo, mas pode aparecer em uma frase curta ou

    longa. Em um trabalho feito para se ter sangue vigoroso, que se expressa em

    iorub por im j p Vara, "para ter muito sangue no corpo", devem-se

    empregar as folhas de apj (no identificada) e amj (HARUNGANA

    MADAGASCARIENSIS, Rhizophoraceae), torr-las at

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    EFICCIA DA PALAVRA - 39

    se obter um p preto, adicion-lo a um aca e misturar com gua. Deve-se ento tomar o preparado aps dizer:

    Ew apj p j pp w si ara mi.Ew amuj m j wa si ara mi.

    Folha apj, chame muito sangue para dentro do meu corpo. Folhaamuj, traga sangue para o meu corpo.

    Trata-se, alis, de um caso de falsa etimologia, pois amuj podetambm ser traduzido como "estanca-sangue", "bebe-sangue" ou "traz-virtude", e a planta est provavelmente sendo usada de forma equivoca-

    da em uma receita para "melhorar o sangue" em caso de anemia. Em um trabalho de proteo contra os inimigos (idbb lw

    t) (frmula 446), pronuncia-se o of Amw (que significa "tire-a-mo-do-corpo") ay kr w mw t kr Vara mi, "Amw aykr, venha e tire as mos do inimigo de meu corpo".

    Para deixar leve o corpo de uma grvida, esta deve lavar-se coma preparao dada na frmula 231, pronunciando a encantao Ewamara fy ["faa-o-corpo-leve"] b w m ara fy, "Folha de amara

    fy, ajude-nos a deixar o corpo leve".

    O verbo atuante da frmula encantatria tambm pode serencontrado em mais de uma slaba do nome da planta. Um exemplo:quando prgn (DRACAENA FRAGRANS, Agavaceae, o coqueiro-de-vnus-nativo) usada em trabalhos para se obter boa sorte (wreorre), o elo criado a partir de pr, com o of Prgn pe rere w,"Prgn, chame a sorte [rere] para c" (frmula 333); mas quando usada em trabalhos para agradar as feiticeiras (ww iyn iymi), o elose baseia em gn, com o of Prgn n k ay mi gn, "Prgnmanda que a minha vida seja reta [gn]"(frmula 275).

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    40 - PIERRE FATUMBI VERGER

    Plantas e nomes de origem estrangeira

    O sistema de elos entre o nome de uma planta e o verbo atuante

    baseado em uma slaba de seu nome aplica-se tambm a algumas plantas que

    foram introduzidas mais ou menos recentemente na frica e cuja

    denominao deriva de palavras estrangeiras.

    Ilm (CITRUS AURANTIFOLIA, Rutaceae, a lima-da-prsia), derivada

    de lime em ingls ou de lima em portugus, usada em um trabalho para

    obter dinheiro (wre ow) com o of Ilm m ow w, "Ilm, traga

    dinheiro".

    O fumo, tb, cujo nome deriva da palavra inglesa tobacco

    (NICOTIANA TABACUM, Solanaceae), usado como remdio contra o inchaodo corpo (ogn ara ww) ou contra convulses (ogn giri), com o of

    Tb ta run dnii, "Tb, empurre [ta\a doena para fora" (frmula 205).

    Para rwy (COCHLOSPERMUM TINCTORIUM, Cochlospermaceae),

    derivada de rawaya em hassa, os elos se baseiam em diferentes slabas de

    seu nome. Em um trabalho para obter dinheiro (wre ow nn) deve-se

    pronunciar o of Rwy b mi w ow temi fn mi, "Rwy, ajude-me a

    conseguir o meu dinheiro" (frmula 298). J em um trabalho feito para se

    permanecer no mundo (ip 1 'y), o of Rwy gbogbo wa l'a y,

    "Rwy, todos ns [wa] devemos ficar vivos [y]".O nome gb deriva do portugus goiaba (PsiDlUM GUAJAVA,

    Myrtaceae), fruta levada do Brasil. Suas folhas so usadas para tratar

    irritaes da garganta e da boca (ogn igbld) e seu of aparece com uma

    leve nasalizao da primeira vogai: Gb ikok m m guri ab, "Gb,

    que a hiena no possa subir na minha cabana [gun ab]'\

    A ojsj (PETIVERIA ALLIACEAE, Phytolacaceae) tambm

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    EFICCIA DA PALAVRA - 41

    foi levada para a Nigria do Brasil, sendo aqui conhecida como erva-de-alho, erva-da-guin, raiz-da-guin ou simplesmente guin, nomedado antigamente a toda a costa ocidental da frica. Em iorub,ojsj significa favoritismo, parcialidade, respeito por uma pessoa.Seus of podem basear-se tanto em isj, "favor", quanto em isaj,"que-precede". Devemos lembrar que em certas partes da Nigria, comoOshogbo, a pronncia do s assoviado quase no se diferencia do schiado. Outros of derivam da sentena s oj, "curar os olhos".Vejamos trs exemplos de of baseados nesse elos possveis.

    Em um trabalho para obter a compaixo das feiticeiras (iyniymi), o of Ojsj 1 ' n k e fire gbogbo se isj mi, "Ojsj

    diz que voc me far um favor [isj] ou me trar boa sorte". J em umtrabalho para se ter boa sorte (wre orre), o of Ojsj m rere seisj mi, "Ojsj, favorea-me [isj] com a sorte" (frmula 332).Em uma receita para tratar a dor nos olhos (ogn oj ddn), o of Ojsj b mi s oj jo, "Ojsj, cure os meus olhos [s oj]"(frmula 163).

    Um caso interessante o da gbdo, nome iorub do milho(ZEA MAYS, Gramineae), planta originria da Amrica e introduzida nafrica em tempos recentes. As vrias partes do milho entram na com-

    posio de trabalhos pertencente sobretudo ao campo mgico. As folhas(ew gbdo) so usadas em um trabalho para trazer boa sorte (wreorre), que se classifica no od iwri fn, tambm chamado iwrigbdo. Seu of deriva do seguinte provrbio:

    Orire ni f gbdo.gbdo rin hh d'ko.O k re b w 'l.

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    42 - PIERRE FATUMBI VERGER

    O milho tem boa sorte.

    O milho vai nu para o campo.

    Ele pega a boa sorte e volta para casa com ela.

    Um outro provrbio :

    Kni gbdo m b? igba orno

    kni gbdo m b? igba aso.

    O que o milho traz para casa? Duzentas crianas. O

    que o milho traz para casa? Duzentas roupas.

    So aluses semente de milho plantada no solo, que mais tardeproduz pesadas espigas, envoltas em palha, trazendo opulncia e riqueza.

    Tambm as folhas do milho so usadas em um trabalho para se obter

    favores de feiticeiras (iyn iymi), sendo queimadas com ew ata krurko

    (CAPSICUM ANNUUM, Solanaceae, o pimento), ew sinknrnmini (BARLERIA

    sp., Acanthaceae) e eyel(um pombo) at se obter um p preto a ser tomado

    com aca frio todos os dias. O of dessa preparao :

    -rin-y ma ni t 'gbdo Ata

    krurko 'ki bni j j ki

    bn sinknrnmini Eyel ki

    b onl nn.

    O milho caminha com alegria.

    Ata krurko no odeia a feiticeira.

    A feiticeira no odeia sinknrnmini.

    O pombo no provoca o dio do dono da casa.

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    EFICCIA DA PALAVRA - 43

    A espiga de milho inteira, odidi gbdo, usada em uma receitapara ajudar a mulher a ter um bom parto (awb), classificada no oduque trata do nascimento de crianas, conforme j foi mencionado, ogbtrpn ou ogb tn orno pn, "ela-coloca-uma-criana-nas-costas-novamente". A espiga moda com ew ahr (MOMORDICA CABRAEI,Cucurbitaceae), iyr (PIPER GUINEENSE, Piperaceae) e kn-n bll(potssio concentrado) numa preparao que a mulher deve tomar comaca quente todas as manhs, pronunciando o seguinte of:

    gbdo b wa gb orno w lEw ahr mj k oyn h

    Kn-n bll Ia n fmo.

    Milho, ajude-me a fazer a criana descer.A folha de ahr no deixa que a gravidez atrase.Potssio concentrado, abra o caminho para a criana.

    O sabugo de milho (ppr gbdo) usado em trabalhos parase sair vitorioso de uma luta (isgun ijkad), classificado no odu smji ou s onj, "se-que-gosta-de-briga", cuja modo de preparo descrito na frmula 312. O of desse trabalho :

    A rsr n kan b mi gb t sub.Ppr gbdo k b olko dimj.

    Atat ni ti gbgi.

    O sabugo de milho nunca briga com o fazendeiro.[Que o inimigo seja to fraco nas mos do lutador quanto osabugo nas mos do fazendeiro.]Gbgi no pode ser derrubado.

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    44 - PIERRE FATUMBI VERGER

    A expresso rsr n kan o incio do seguinte provrbio:

    A rsr n kan k i sasn b niyn k l rkan, rkan r l olwarni.

    Ns no corremos no capinzal cortante em vo; se corremos atrs de

    alguma coisa [ porque] alguma coisa [perigosa] est correndo atrs

    de ns.

    O milho gerou provrbios tambm em outras lnguas. Os hassas o

    chamam de tofa e os fulanis de soyo4. Seus respectivos provrbios so: "Voc

    deve andar ao redor e no atravs de um campo de tofa", e "Um homem

    precisa de sapatos para andar no soyo", enfatizando a urgncia do que possalevar algum a correr (descalo) por um milharal.

    A palha (hrh) que envolve a espiga de milho usada em uma

    receita para ajudar a mulher grvida a sentir o corpo leve (im ara fyou im

    ara gg) (frmula 230), classificada no odu ogb tr ou ogb also funfun,

    "ogb-dono-da-roupa-branca", em aluso palha que envolve o milho. Seu of

    :

    Ahr 1 ' ni k ara fy. Ara

    gg ni ti hrh. Er Io ruara fy.

    Ahr diz que o corpo deve ficar leve.

    Hrh tem o corpo leve. Er, v e deixe o

    corpo leve.

    E por fim os gros de milho torrados (gbdo snsur) so usados cm

    trabalhos para fazer um processo judicial cair no esquecimento (wrc afrn

    ou idbb Vw e/o), pertencendo ao odu ogb tr

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    EFICCIA DA PALAVRA - 45

    ou ogb klj, "o^-no-tem-processo-na-justia". Para obter-se tal

    resultado, queimam-se diversos ingredientes, colocando-os dentro de um sr,

    um tipo de chocalho, juntamente com vinte gros de milho, trinta de feijo e

    outras sementes. Este srdeve ser sacudido todas as manhs, acompanhado

    do of:

    Ase-mr 1 ' n k gbogbo ej mi yi r.

    K won o m bi mi m.

    K'rn n m h m.

    Agbdo ti a b sim ki h.

    Er ti a b sun ki h.

    Ok bb ti a b sun ki h m.

    Ataare sisun ki i h.

    Jnjk l' nk'rn n jk.

    K won m rnti r m.

    O-poder-do-desaparecimento disse que todos os meus processos

    [na justia] desaparecero.

    Que o caso [na justia] no aparea mais.O milho torrado no cresce.

    O feijo torrado no cresce.

    O milho-da-guin torrado no cresce

    Jnjk ["deixa-me-sentar"] disse que o caso vai assentar.

    Eles no vo mais lembrar dele.

    Ou seja, o processo na justia no ir progredir, da mesma forma

    como os gros no podem germinar depois de torrados.

    Este of pode estar relacionado maneira pela qual o milho

    importado da Amrica do Sul se disseminou na terra iorub. Conta-se que oproprietrio do primeiro campo onde as sementes foram plan-

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    46 - PIERRE FATUMBI VERGER

    tadas vendeu o produto de sua colheita apenas depois de torrado, paraque ningum mais pudesse cultiv-lo. Um de seus empregados, porm,conseguiu engan-lo: alimentou algumas galinhas com milho cru e asenviou a fazendeiros de outros lugares. Estes imediatamente as destri-param e plantaram as sementes contrabandeadas. Dessa maneira, o cul-tivo do milho pde se espalhar por toda a terra iorub.

    OS SIGNOS ODUS DE IF

    Todas as receitas e trabalhos mgicos feitos com plantas soclassificadas pelos babalas em 256 signos (odus) de If, o que comfreqncia estabelece elos entre ps nomes das receitas, os nomes dasplantas e os nomes dos odus de If, sobretudo com o segundo nomedado a cada odu.

    Um babala raramente emprega os nomes dos odus em suaforma original, dando preferncia aos nomes derivados dele fonetica-mente, s vezes por acrscimo de um prefixo e um sufixo, que lhe con-ferem uma significao particular. Dessa maneira o babala tem maior

    facilidade para encontrar o simbolismo e o contexto das histrias (itn)e remdios classificados naquele odu. Eis alguns exemplos:

    Ogb dpode tambm ser chamado de ogb dn dn, logb-bloqueia-o-caminho", ou ogb dimdim, "ogb-agarrou".Irosin gnd pode ser chamado de irosun gd, "irosn-casa-de-rato" (gn ed).Ownrn spode ser chamado de wnrn wes, "wnrn-lava-ps".

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    EFICCIA DA PALAVRA - 47

    Obr irosn pode tornar-se br kosun, "r-esfrega-

    osim"ou "bra-no-dorme".

    gnd dtambm pode ser denominado gnd gdi igbn,

    "gi/nc/-corta-o-fundo-do-caracol", em aluso tranqilidade,

    uma vez que o lquido que flui da concha do .caracol usado na

    preparao de um tranqilizante.

    gnd s tambm chamado de gnd ms, "gnd-

    no-corre, ele--corajoso", sendo tambm chamado gnd m

    s 'ojo, "gnc/-no--covarde".

    fn s chamado tambm de fn slsn, "ofi/n-esfrega-

    com-giz" ou "fn-esfrega-com-p-vermelho-de-camwoocf';

    pode ser chamado ainda de fn sawo, "fi/n-aplica-um-remdio".

    yk wnrn pode ser chamado de y wn rin mi, "y-se-

    quebra-em-pequenos-pedaos-de-ferro-e-os-engole".

    Ik c/pode ser denominado nkl nkdi, "colhendo-o-quiabo-

    colhendo-as-ndegas", em aluso anedota de um campons

    que, colhendo quiabos no campo e sentindo-se incomodado por

    comiches, coca as ndegas e provoca o comentrio irnico do

    vizinho: "em lugar de colher os quiabos, ele colhe as ndegas".

    Nos trabalhos para se obter favores de feiticeiras (iyn iymi), o odu

    s mji torna-se s ly, "s-dono-do-pssaro", e ogb gnd torna-se

    ogb iymi.

    Entre as 69 frmulas que nos foram dadas para obter favores de

    feiticeiras ou agrad-las, dezessete se classificam no odu s mji, tambm

    chamado s ly por ser ly outro nome dado s feiticeiras e o odu sob o

    qual elas, iymi srhg, vieram ao mundo. Onze das frmulas classificam-

    se no odu ogb gnd, tambm chamado ogb

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    4X - PIERRE FATUMBl VERGER

    iyn, "ele-ajuda-[algum a ser]-agradado", ambos tendo elos com iyn

    iymi. Vejamos trs destes trabalhos:

    Pertencendo ao odu s lye, temos um trabalho cujo modo de

    preparo dado na frmula 271, acompanhado do of:

    Aj n k kra kra.

    Wn n y r l wl.

    kr os ki j k j k pa os.

    Aj kbl n k eye m b mi.

    Feiticeiras gritam alto.

    Elas dizem que o pssaro do mal j entrou na cidade.

    O acar do feiticeiro no deixa as feiticeiras matarem o feiticeiro. Feiticeira-no-se-empoleira-em-mim diz que aquele pssaro [da

    feiticeira] no se empoleirar em mim.

    Pertencendo ao odu ogb iyn temos uma receita que manda moer as

    folhas ew igbgb (SOLANUM sp., Solanaceae), ew oy (CORCHORUS

    OLITORIUS, Tiliaceae, a juta) e ew kk (CYNOMETRA MANNII,

    Leguminosae Caesalpinioideae), mistur-las com r (BUTYROSPERMUM

    PARADOXUM, subsp. PARKii, Sapotaceae, o limo-da-costa) e esfregar a

    preparao no corpo, pronunciando o of:

    Ogb iyn j k in j y si mi.

    Igbgb gb mi 1 'w j. Oy n k

    won yn si mi. Ekk n k ibi won

    k dn.

    Ogb iyn, permita que as feiticeiras fiquem satisfeitas comigo.

    Igbgb, tire-me das mos da feiticeira. Oy disse que elas ficaro

    satisfeitas comigo. Ekk disse que a maldade delas vai sumir.

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    EFICCIA DA PALAVRA - 49

    Por fim, pertencendo ao mesmo odu ogb iyn, temos uma receita

    que manda colocar em um prato as folhas ew ojsj (PETIVERIA ALLIACEA,

    Phytolacaceae, a erva-de-alho), ew oyy (CORCHORUS OLITORIUS,

    Tiliaceae, a juta), ew n (VITEX THYRSI-FLORA, Verbenaceae) e ew

    agog gn (HELIOTROPIUM INDICUM, Boraginaceae, a crista-de-galo),

    adicionar odidi ataare (AFRAMO-MUM MELEGUETA, Zingiberaceae, o amorno)

    e dois ovos (eyin adiye), despejar mel (oyir) por cima e fazer a adivinhao

    com obi ifin e obi pupa (COLA ACUMINATA, Sterculiaceae, a coleira) para

    saber onde o trabalho deve ser deixado. Devem-se ento colocar as nozes de

    coleira em uma rodilha (sk) feita de uma jarda de tecido branco (aso ids

    funfun). Durante a preparao, pronuncia-se o p/o:

    Ew oj sj I ' n k ' ma fi ohun rere se sj mi.

    Oyy 1 ' n k ' yn si mi.

    Ew n 1 ' n k ' sn mi.

    Ew agog gn 1 'o n k' e ma da 're t 'mi si mi.

    A ki ma l'yin k' roj.

    Ofn n k e ma fn n rere.

    Osn n k e ma fi rere sn mi b.

    A folha de oj sj disse que voc trar coisas boas para mim.

    Oyy disse que voc tem boa disposio para comigo.A folha de n disse que voc est contente comigo.

    A folha de agog gn disse que voc lanou minha fortuna

    para mim.

    No ficaremos tristes se lambermos mel!

    Ofn disse que voc me dar fortuna.

    Osn disse que voc chegar com fortuna para mim.

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    50 - PIERRE FATUMBI VERGER

    Ir ekun, "cauda-de-leopardo", ao mesmo tempo o nome de uma

    planta (DRACAENA LAXISSIMA, Agavaceae) e um circunlquio usado a fim de

    indicar determinado odu de If demasiado perigoso para ser pronunciado.

    Respeitando essa proibio, diremos apenas que formado pelos dcimo-

    quarto e dcimo-quinto signos simples5. Uma pessoa nascida sob tal signo

    deve esperar m sorte na vida6.

    Outros nomes dados a este odu so: ret ekun fir nal, "iret-

    leopardo-que-bate-com-a-cauda-no-cho", aludindo a um temperamento

    nervoso e perigoso; ret dd, "/Y-preto", e ret ia tutu t ynyn, "/ref-

    traz-vida-fria-como-granizo", nomes no muito encorajadores. Em

    contrapartida, tambm chamado de ret alj, "/re-dono-da-riqueza", pois

    tudo ambivalente e mesmo os mais terrveis signos de Tf contam com umlado benfico.

    A planta ir ekun, mencionada acima, uma "rvore da floresta que

    mede at doze metros de altura, com um tronco macio e poroso, cuja seiva

    dizem cegar as pessoas. As folhas so usadas medicinal-mente"7. Quatro de

    seus usos foram-nos passados pelos babalas, incluindo trs receitas de

    trabalhos mgicos. Todas as receitas que empregam ew ir ekn so

    classificadas no odu ir ekun. Assim, para envolver algum em um processo

    judicial (ifi niyn sj, frmula 384), deve-se pronunciar o seguinte of:

    Ir ekn w Io r m lgbja. Bomubm w Io

    r b lj. Knkn Vew injmo. Oj omqd

    b w ynrn ay ni r t'run. Adi w l r di

    lgbj.

    Ir ekn, agora v e pegue fulano.

    Bomubm ["tira-tampa"], agora v e cubra o rosto dele.

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    EFICCIA DA PALAVRA - 51

    A folha in ["folha-de-fogo"] queima a criana na hora.No dia em que a criana procura ynrn ["problema"] na Terra,ela acha o do alm.

    Adi ["azeite de caroo de dend"], v e amarre fulano.

    Em um trabalho para se conseguir muito dinheiro (wre ownn) (frmula 299), a influncia benfica do outro nome deste mesmoodu, iret alj, "/Yer-dono-da-riqueza", chamada a atuar com o of:

    Gbogbo ara 1 'asfun fi saj.Ahn ekun l n k ire mi k m wn.

    Ir ekun l n k won d'er ire w fn mi.

    Asfun sempre faz fortuna com o corpo todo.Ahn ekun ["lngua-de-leopardo"] disse que a minha fortunano ser pequena.Ir ekun disse que trar montes de riqueza para mim.

    Para que uma parturiente d luz facilmente (im obinrin bmo)(frmula 234), o of a ser pronunciado :

    Iru ekun wr wr ki gb in ekiin mj.Aglt 1 ' n k orno n ma sr tete b w.

    Wr wr ["rpido-leopardo"] nunca fica dentro do leopardoat a madrugada.

    Agltdiz que a criana deve correr para c rpido.

    A quarta dessas receitas diz que, para se proteger uma casa contra0 mal (idbb il 1'w ibi), devem-se colocar em uma panela de barro(ikk) folhas ew ir ek, ew rgb (ECLIPTA ALBA, Compositae, a

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    52 - PIERRE FATUMBI VERGER

    erva-boto), e ew itkun (no identificada), despejando sobre elas guafresca e o lquido extrado do caracol (igbr). Depois enterra-se tudo emalgum ponto do cho dentro da casa e marca-se o local com onze bziosdispostos na forma do odu iru ekun, pronunciando-se o of:

    Iru ekun a p o, w ti I 'ekun ibi. Itkun1 ' n k ibi m kn in il yi. Argbma gb ibi d s 'de. Il omi ki gbna.

    Il igbn ki gbna.

    Iru ekun, ns chamamos voc para que venha fechar a porta[contra] o mal.Fecha-porta disse que o mal no encher esta casa.Ns-compramos-para-varrer, varra o mal, coloque-o para fora.A casa da gua nunca quente.A casa do caracol nunca quente.

    Notem-se as assonncias entre ekun ("leopardo"), ilkn("porta") e itkun ("a folha").

    O nome iru ekun explica-se por algumas histrias (itn) classifi-cadas no signo de mesmo nome. Em uma dessas histrias8, feiticeiras

    (iymi aj) vm morar na barriga da esposa de Orumil. Consultado, If prescreve uma oferenda de caranguejos (akn), um rato (kt,CRICETOMYS GAMBIANUS) e folhas de alugbinrin (TRICLISIA SUBCORDATA,Menispermaceae), que aparentemente so bem aceitas pelas iymi, umavez que so usadas nas oferendas para se obter favores de feiticeiras(iynu iymi). As oferendas ento se transformaram em um leopardo(ekun) e as iymi ficam com medo e fogem da barriga da esposa deOrumil. Quando esta ltima adormece, tem um sonho com isto e v um

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    EFICCIA DA PALAVRA - 53

    leopardo sair de sua barriga balanando a cauda (ekun fi r y), frase que

    talvez seja a etimologia do nome r ekn. Esta histria parece completar o

    of da primeira receita dada na pgina anterior.

    Em outra histria9, caadores preparam um medicamento composto

    de rabo de leopardo modo com sabo. Esta preparao pode ser considerada

    um jogo de palavras materializado, em que a ao dos caadores expressa o

    nome impronuncivel, uma vez que pilar exprimido pelo verbo te, a ltima

    slaba de /Vete, o primeiro signo do odu, e sabo, ose, , com tons diferentes,

    a segunda parte do odu impronuncivel. Graas a este preparado, o caador

    mata muitos animais e torna-se rico, alj, o que estabelece uma relao com

    o outro nome do mesmo odu, iret alj.

    Isto nos leva questo das "encantaoes mudas" e das "palavrasmaterializadas" sobre as quais Mareei Mauss"' falou, mencionando certos

    ingredientes que aparecem em composies mgicas investidos de um certo

    poder em virtude simplesmente de seus nomes. Percebemos que, nestes casos,

    os ingredientes agem mais como encantaoes do que como objetos materiais,

    visto serem "palavras materializadas".

    Sobre o assunto W. Bascom" observa que, na preparao de um

    medicamento classificado no odu irsn se, o p irsn misturado com

    sabo ose. Pesquisas feitas nesse campo por Henri Lavonds12 entre os

    habitantes de Madagascar e a concluso a que ele chegou podem ser aplicadasaos iorubs:

    Vale a pena tentar explicar com preciso o uso, nos rituais mgicos,

    de um conjunto de artigos e ingredientes que parecem desafiar o bom

    senso. A significao de certas receitas mgicas torna-se clara a partir

    do momento em que percebemos que so um discurso feito com o

    auxlio de objetos, atravs de um procedimento em ntima relao

    com a linguagem.

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    54 - PIERRE FATUMBI VERGER

    H uma conexo entre a encantao realmente pronunciada pelomestre-de-cerimnia e os objetos usados durante a cerimnia.Estes objetos so a encantao representada simbolicamente, daqual a encantao falada apenas a expresso da realidade verbal.Uma composio mgica parece ser considerada como umacoleo de coisas materiais, s quais dado um valor simblico;

    juntas constituem uma mensagem que pode ser exprimida poruma linguagem articulada.

    SIGNIFICADO MLTIPLO DAS PALAVRAS

    Os nomes com vrios significados possveis nos remetem questo do significado mltiplo das palavras. Em seu livro sobre apoesia iorub13, Ulli Beier oferece uma definio das sutilezas dessalngua:

    Os iorubs no apenas so altamente conscientes do significadodos nomes, mas gostam tambm de interpretar cada palavra que

    usam. Eles acreditam que cada nome , na verdade, uma sen-tena que foi contrada atravs de uma srie de elises a uma spalavra. Naturalmente, na tentativa de reconstruir a frase origi-nal, podem chegar a vrios significados.

    J vimos o exemplo de br ksun, com seu duplo sentido.Veremos adiante o caso de ogb whin, que pode significar ao mesmotempo "ogfa-lava-costas", "ogb-cura-costas" e "ogb-olha-para-trs";e da folha amj, que pode significar "bebe-sangue" e, com uma

    mudana de tom, "cstanca-sangue" ou "traz-sangue".

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    EFICCIA DA PALAVRA - 55

    O significado mltiplo das palavras uma noo definida entre os

    polinsios malaios, segundo afirma Paul Ottino14:

    Contrariamente lgica ocidental, que requer uma relao direta entre

    o significante e o significado, a forma de expresso pode ser entendida

    de diferentes formas. A compreenso se d em funo do grau de

    conhecimento da pessoa. Para o desinforma-do, a frase alusiva a um

    provrbio, conto ou tema permanece incompreensvel ou fora de

    propsito. O encobrimento do significado real sob uma imagem

    simblica, o uso extensivo da metfora, torna o significado obscuro

    enquanto o sistema de correspondncias simblicas da cultura

    permanecer desconhecido.

    Segundo L. Renou'\ tambm os hinos do Rigveda, os mais

    importantes documentos da religio vdica e os mais antigos textos da ndia,

    que na aparncia nada mais so que a expresso de uma adorao direta e

    ingnua das foras da natureza, demonstram ser espcimes de uma poesia

    muito sagaz. O autor coloca em evidncia as correlaes feitas entre o mundo

    humano e o supra-humano, que em alguns hinos aparecem na forma de

    enigmas apresentados em um torneio de oratria. Os enigmas traduzem as

    correlaes por meio de imagens e convidam o poeta que teoricamenteparticipa do torneio a entend-las e interpret-las, assim como exprimir as

    suas prprias.

    Gilbert Rouget16, escrevendo sobre a msica interpretada na corte do

    rei de Porto Novo, aponta para o estilo fortemente alusivo das canes ajogan,

    compostas de palavras de elogio ao rei local e de desafios abusivos a seus

    inimigos. Elas se exprimem por meio de sugestes convencionais s

    compreendidas por aqueles que dominam o tema. "Quanto mais as palavras

    tm um sentido oculto, mais so apreciadas pelos seus

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    56 - PIERRE FATUMBI VEKGER

    conhecedores." Os melhores jogos de palavras so aqueles cantados napresena da pessoa a quem aludem, sem que ela os perceba.

    O mesmo costume existe na Bahia entre os descendentes deiorubs, que durante as cerimnias para os orixs cantam as chamadas"cantigas de sotaque". So canes nas quais uma ligeira mudana depronncia transforma elogios em palavras irnicas ou abusivas contraum visitante, que, se for capaz, deve responder com outra cano paramostrar que no foi enganado.

    O significado mltiplo de palavras foi observada pelo padreHuc17 tambm na Monglia, por onde viajou em 1844:

    Um mar subterrneo impediu o erguimento de um templo. Umlama encontrou um velho que lhe explicou a razo desse fracas-so. Mais tarde, arrependido de ter contado seu segredo, mandouseu filho atrs do lama para mat-lo. O filho, no entanto, con-tentou-se em trazer de volta uma tira de couro dada ao lama pelovelho, julgando que ela no valia a morte. O filho havia entendi-do "tira de couro" e no "segredo". A mesma palavra mongoltem os dois significados. O velho pedira a seu filho que matasseo estranho que lhe roubara o "segredo" e no sua "tira de couro".

    Em alguns casos, o significado mltiplo de uma mesma palavrapode contribuir para acentuar a coeso existente entre seus diferentes sen-tidos, a despeito de, primeira vista, parecerem distantes um do outro.

    A palavra fm significa "doena contagiosa", e "planta para-sita ou epfita" (visco, orqudea etc), noes aparentemente remotasque, no entanto, apresentam um vnculo: as folhas mais usadas em tra-balhos dedicados a Spnn, o deus da varola e das doenas conta-giosas, so as de plantas parasitas ou epfitas.

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    EFICCIA DA PALAVRA - 57

    LIGAES ENTRE OS NOMES

    Como j foi visto, os nomes das plantas, das receitas e dos odus deIf encontram-se relacionados e refletem o efeito que deles se espera. A seguir

    sero discutidos alguns exemplos mais detalhadamente.

    1.Irosn mji

    Irosn ao mesmo tempo o nome do quinto odu, consta de vrios

    odus, o nome das plantas BAPHIA NTIDA e PTEROCARPUS OSUN, ambas

    Leguminosae Papilionoideae, e do pssaro cardeal (EUPLECTIS FRANCIS-CANA). Este conjunto caracteriza-se pela cor vermelha do pssaro e do p de

    camwood(madeira de tintura). Muitos trabalhos classificados no odu irosn

    esto portanto ligados cor vermelha e noo de sangue (j).

    Os medicamentos usados para regular a menstruao (ogn s

    obinrir) classificam-se nos odus irosn mji, br irosn e ognd irosn,

    este ltimo tambm aludindo a sangue: Ognd fj kunl irosn, "Ognd-

    esfrega-a-casa-de-Yosun-com-sangue" e Ognd j ta sr, "Ogund-faz-o-

    sangue-fluir-copiosamente". Neste remdio utiliza-se tambm ew sjsr

    (BASELLA ALBA, Basellaceae, a bertalha), cujo nome significa "faz-o-sangue-fluir-copiosamente".

    Em um trabalho para conceder maior virilidade (aremo), classificado

    no odu s irosn, tambm chamado s elj, "si-dono-do-sangue", devem-

    se usar folhas de oldd, "dono-da-flor-escarlate" (HEISTERIA PARVIFOLIA,

    Olacaceae), pronunciando o of Oldd elj ti w'w j, "Dono-da-flor-

    escarlate que usa um traje de sangue".

    O mesmo odu s irosn tambm chamado de s elpo, "s-

    dono-do-leo-vermelho", enquanto irosn mji pode ser chamado de

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    58 - PIERRE FATUMB1 VERGER

    irosun odder, "irosun-papagaio", em aluso s penas muito vermelhas da

    cauda deste animal. O odu irosun s, tambm deno-minado irosun j,

    relaciona-se aos nomes de osun e sangue, ambos vermelhos.

    Numerosos trabalhos classificados nos odus irosun se associam

    idia de sonho (sim) e insnia (isur). A seguir citamos os mais re-

    presentativos.

    a) Para dormir

    Existem oito receitas para ajudar algum a dormir (ogun im ni

    rorun sim), das quais apresentaremos duas. Pertencendo ao odu irosun mji(frmula 207), temos o of:

    Irosun mji j kl lgbj l sim. Ak

    od ni m oorun w. sn d ragbada

    l b igi ak od. Ata 1 ' ni k ' ta

    isim jade. lbs b wa sisim yi

    da. ly yo isim jade.

    Irosun mji, deixe fulano dormir.

    Ak od sempre traz o sono.

    Sono profundo o que encontramos na rvore ak od.

    Ata diz que a insnia deve ser empurrada para fora.

    Alubs, ajude-nos a colher esta insnia.

    Sal, expulse a insnia.

    Pertencendo ao odu/Vn irosun, "/Vn-dono-do-sono" (frmula 208),

    temos o of:

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    EFICCIA DA PALAVRA - 59

    Aj ki b orno r j j.Erw ni t gbingbin. Ojor ni lk omi.

    Aj nunca luta contra seu prprio filho.Gbingbin sempre fresca e calma. Oj orsempre flutua sobre a gua.

    No dita nenhuma palavra sobre o sono propriamente dito, masa encantao fala de calma e paz.

    b) Para causar insnia

    Existem trabalhos para deixar as pessoas insones, classificadosnos signos yk irosn, chamado tambm de yk alisn, "yk-dono-do-sem-sono"; e no d irosn, tambm chamado idin isn,"larva-que-no-dorme". A seguinte receita destina-se a mandar insniapara algum (irn isn si niyr) com o of:

    Mj k lgbjk' l sn.Idin isn ni k fi fn un I 'j k ' m 1 'oj oorun.Efun ni k e fi fn Vj k ' m oj orun.Osn mj k ' l sn.Obi ifin ni k e fi fn Vj k' m l sn. Obi ipa ni kefi pa oj r d si d lgbj.

    No permita que fulano consiga dormir.Larva-que-no-dorme, no o deixe dormir.Giz, no o deixe dormir.

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    60 - PIERRE FATUMBI VERGER

    Osn, no deixe que ele seja capaz de dormir.Noz da coleira-branca, borrife o rosto dele que assim nopoder dormir.Noz de coleira-vermelha, vire o rosto dele para o lugar sem sono.

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    c) Para causar e evitar pesadelos

    No campo mgico, o babala pode enviar pesadelos (lkl) spessoas ou proteg-las deles. Apenas duas receitas agressivas foram-

    nos passadas, sendo as outras 24 dedicadas proteo contra os pesade-los. A seguir daremos uma receita de cada tipo.Pertencendo ao odu ogb fn, temos a receita para mandar

    pesadelos para algum {blu im ni 1'lkl) (frmula 390). A encan-tao invoca uma entidade poderosa chamada Sigidi, especializada emtrabalhos noturnos como golpear as pessoas durante o sono. Estes traba-lhos so classificados sob o odu irosn ou idin isiin, sendo o of Idinisiin m j kl l sim, "Larva-que-no-dorme, no o deixe dormir". Deacordo com a tradio18, Sigidi, pesadelo divinizado e representadomaterialmente por uma espcie de cone de barro de forma vagamentehumana, vai sob as ordens de seu proprietrio sentar-se sobre o peito doinimigo apontado, para sufoc-lo. Sigidi no pode agir seno durante osono das pessoas, mas aquele que o envia deve permanecer acordado(isur) at o seu retorno, porque, se adormecer, Sigidi voltar imediata-mente sem ter cumprido sua misso e sufocar seu proprietrio.

    Para preparar um remdio contra pesadelos (ogn lkl), per-tencendo ao odu iwri fn, queimam-se juntos ew kl dsm (MALA-CANTHA ALN1FOLIA, Sapolaceac), jkbl, 'Teiticeira no-sc-empoleira-0m mim", (CROTON ZAMBESlcus, Hupliorbiaceae), cwc abrkolo, "virar-

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    imediatamente", (HAUMANIASTRUM LILACINUM, Labiatae) e a cabea de umcachorro (or aj) at obter-se um p preto, parte do qual deve ser esfrega-do em cortes sob os olhos e o restante comido com aca frio. Seu of :

    Al rere ni t'akl dn.Ajkbl e m b l mi. Ajma gb won. Isink run

    phind. Ow te ewabrkolo. Isink run

    phinda.

    Akl dn sempre tem bons sonhos.

    Ajkbl, no se empoleire em mim.Cachorro, ladre para eles.Mortos, retrocedam.A folha abrkolo foi presa.Mortos, retrocedam.

    2. Ogb iwri

    O odu ogb iwri tem tambm outro nome, ogb whin, "ogb-cura-costas" ou "o^b-lava-costas" ou "o^-olha-para-trs" e est rela-cionado com remdios contra dor nas costas (ogn hin ddn). Dasdezenove receitas que temos para esse ogn, doze classificam-se emogb whin. A seguir so dadas trs receitas para curar dores nas costas,todas classificadas no odu ogb whin:

    Devem-se moer juntas ew igbhin (RAPHIOSTYLIS BENINENSIS,Icacinaceae), egb pe (a raiz de ELAEIS GUINEENSIS, Palmae, o den-dezeiro), iyr(PIPER GUINEENSE, Piperaceae), cozinhando-as com um

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    caracol (igbn), leo e sal e depois comendo-se a mistura. Durante apreparao deve-se dizer o of:

    Igbhin gb 'hin Io.Ehin ki dun pe. hinni iyr fi ti igi. Ehinki dun igbn.

    Igbhin, leve a dor das costas embora. Ascostas de pe nunca doem.Iyrseencosta na rvore. O caracol nunca sente

    dor nas costas.

    Uma segunda receita manda moer ew fj shin, "com-sangue-faz-as-costas", (CAMPYLOSPERMUM FLAVUM, Ochnaceae) e dezesseissementes de ataare (AFRAMOMUM MELEGUETA, Zingiberaceae, oamorno), esfregando-se a mistura em dezesseis cortes feitos nas costasde quem sofre, dizendo o of:

    Fj shin b mi wo hin sn.

    Ataare ti mi1 'hin.

    Com-sangue-faz-as-costas, ajude-me a curar minhas costas.Amorno, ampare-me.

    Podem-se ainda ferver em gua as folhas ew jomo ruke(CROTON LOBATUS, Euphorbiaceae), ew opon atakun (UAPACA HEUDE-LOTri, Euphorbiaceae) e rit (XYLOPIA AETHIOPICA, Annonaceae, apimenta-da-guin) e dar de' beber ao paciente todas as manhs, pronun-ciando o of:

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    Jomo ruke ni wo hin sn.Opon ba mi pon orno yi dgb.ru k' mjk'hin dun mi.

    Jomo ruke, cure [a dor das] costas.Opon, ajude-me a carregar esta criana at ela crescer.ru, no deixe que [minhas] costas doam.

    NOMES MEDICINAIS E MGICOS

    Os nomes das plantas iorubs parecem apresentar umaambivalncia quanto sua origem mgica ou medicinal, assim como osnomes dados aos signos e trabalhos. Perceba-se a seguir como o nomedado s plantas refora o efeito delas esperado, sendo possvel que sejaincluda apenas por esta razo. Em um trabalho para se obter boa sorte(wre orire), classificado no odu gnd sorire, "gnd-tem-boa-sorte", deve-se moer ew awrr(COLA MILLENII, Sterculiaceae); ewrr (TRICHILIA MONADELPHA, Meliaceae); ew ori (VITEX DONIANA,Verbenaceae), misturar o p com sabo (ose) e lavar-se a cabea com opreparado, pronunciando-se seu of rico em assonncias:

    Awrr, je k n se orire. Ew rr, jk n se orire. Ognd sorire 1 ' n k nse orire. Orrere ni frni.

    Folha de awrr, deixe-me ter boa sorte.Folha rr, deixe-me ter boa sorte.

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    gind-tem-boa-sorte diz que eu devo ter boa sorte. A boa

    sorte minha.

    O odu gnd ogb tambm chamado gnd egb, "gnd-

    ferida-de-faca", e nele est classificado o remdio para curar feridas de faca

    (ogin egb ogb), em que se emprega ew pogb pogb, "folha-matadora-

    [da-dor]-do-ferimento-de-faca", (CYATHULA PROSTRATA, Amaranthaceae). A

    mesma folha, segundo indica Burkill1'', usada para curar a lcera fagednica

    (nrun) (frmula 78).

    Essas folhas devem ser moidas e misturadas com ltex (q/e) de igi

    ahn (ALSTONIA CONGENSIS, Apocynaceae), sendo a preparao ento

    colocada sobre o ferimento de faca, que enfaixado. Seu of :

    Pogb pogb b wa wo egb ogb sn. Ahn

    b wa hun ara p.

    Matador-do-ferimento-de-faca, ajude-nos a curar o ferimento

    de faca.

    Ahn, ajude-nos a fechar [curar] o corpo.

    O ltex de igi ahn citado por Burkill20 como usado tambm em

    bandagens sobre inchaes causadas por filariose. O mesmo igi ahn usadoem uma receita pertencente ao odu fn br, misturado com casca de

    caracol moda (ikarahun igbr) e folhas moidas de tann jgb, "luz-do-fogo-

    queima-o-ferimento" (HOSLUNDIA OPPOSITA, Labiatae). Daziel21 confirma que

    o suco e as folhas frescas desta planta so aplicados em ferimentos. Dessa

    maneira, podemos verificar que os nomes das plantas e seu uso parecem estar

    de acordo com as prescries mdicas ocidentais, dando a impresso de que os

    nomes dados a elas so o resultado da observao das suas qualidades e

    virtudes.

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    Ainda assim, algumas vezes essas ligaes verbais parecembasear-se mais no campo mgico do que no mdico.

    As folhas de ikjnj (DALBERGIA LCTEA, LeguminosaePapilionoideae), cujo nome significa "morte-deixa-me-danar", sousadas em um trabalho de proteo contra a morte (idbb rw iki),sendo classificado no odu yk trpn, conhecido tambm comoyk b trpn e yk ikjnj, usando-se o of:

    Ikjnj, yk b trpn.Ofjnj, yk b trpn.

    Morte-deixa-me-danar, yk encontra trpn.Perda-deixa-me-danar, yk encontra trpn.

    A folha de myndr, "faa-a-gravidez-ficar" (no identifica-da), usada em receitas para fazer a gravidez prosseguir normalmente(im oyn dr) com o of:

    Myndr tt b mi m oyn dr. Faa-a-gravidez-

    ficar, ajude-me a fazer a gravidez ficar.

    Como esta folha ainda no foi identificada, difcil saber seestamos no campo mgico ou no medicinal.

    A folha rru, "a-noite-chegou", (SPATHODEA CAMPANULATA,Bignoceae, a tulipeira-da-frica), usada para curar a cegueira (ognoj ffo), moda com ew ynyun (ASPILIA AFRICANA, Compositae) eew dd kun, "folha-flor-do-mar", (COMBRETUM PLATYPTERUM,Combretaceae), sendo a mistura lambida com leo enquanto se pronun-cia o of:

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    Gbgbni rru ri'na.Ari'na d'ale ni ti ynyun.Ew dd kun b mi mu oj ri.

    A-noite-chegou v a luz claramente.Ynyun v a luz at o anoitecer.Folha-f lor-do-mar, ajude meus olhos a verem a luz.

    A folha wfn, "lava-branco", (OLAX SUBSCORPIOIDEA, Ola-naceae) usada para lavar o orix (ww Oris), trabalho classificadono odu wnrn fn ou ownrn wfn, "lava-branco", com o of:

    wfn we funfun, wfn Oris. Lava-limpo-

    lava-branco, lave limpo o orix.

    A folha jmo ruke, "deixe-a-criana-crescer-bem", (CROTONLOBATUS, Euphorbiaceae) usada para pedir que a criana cresa bem(ogun im orno d'gb) (frmula 180) na receita classificada no oduogb yk, pronunci ando-se o of:

    Jmo ruke j k orno mi ruke22

    Orru mj k orno mi ru. Ownk orno mi w d'gb.

    Deixe-a-criana-crescer-bem, deixe a minha criana crescer. A-noite-chegou, no deixe minha criana crescer fraca. O algododiz que minha criana deve crescer bem.

    A folhajmo ruke usada ainda contra dores nas costas em cri-anas (ogun hin ddn omod) (frmula 179). O of desta infuso :

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    Jmo ruke ni wo hn sn.pn b mi pon orno yi d 'gbEr k ' mj k hin dn n.

    Deixe-a-criana-crescer-bem sempre cura a doena das costas.pn, ajude-me a respaldar esta criana at que ela cresa. Erno deve deix-la sofrer de dor nas costas.

    Esta mesma folha conhecida tambm sob o nome dermgl, "ele-que-faz-a-criana-crescer". E usada em receitas quetratam de questes da gravidez, como as mencionadas a seguir.

    Para conseguir que uma criana nasa (irmob), trabalho clas-sificado no odu ogb trpn ou ogb tmopnn, "ogb-carrega-a-criana-nas-costas", rmgl fervido em gua com ew egungungun (CEIBA PENTANDRA, Bombacaceae, a mafumeira) e dado de beber mulher grvida. Seu of :

    Egungun gun b mi b orno mi.rmgl b mi b orno mi.

    Egungun gun, ajude-me a parir meu filho. Ele-que-faz-a-criana-

    crescer, ajude-me a parir meu filho.

    O mesmo trabalho rmob utilizado na frmula 225 com oof:

    Arakbal ni tn orno se.rmgl j'mo ru gl.Erj k orno ru.

    Corpo-no-descansa, restaure a sade da criana.

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    Gbgbni rru r'na.Ari'na d'ale ni ti ynyun.Ew dd kun b mi m oj ri.

    A-noite-chegou v a luz claramente.Ynyun v a luz at o anoitecer.Folha-f lor-do-mar, ajude meus olhos a verem a luz.

    A folha wfin, "lava-branco", (OLAX SUBSCORPIOIDEA, Ola-naceae) usada para lavar o orix (ww Oris), trabalho classificadono odu wnrn fn ou ownrn wfn, "lava-branco", com o of:

    Awfn we funfun, wfin Oris. Lava-limpo-

    lava-branco, lave limpo o orix.

    A folha jmo ruke, "deixe-a-criana-crescer-bem", (CROTONLOBATUS, Euphorbiaceae) usada para pedir que a criana cresa bem(ogn im mo d'gb) (frmula 180) na receita classificada no oduogb yk, pronunciando-se o of:

    Jmo ruke j k orno mi ruke22

    rru mj k orno mi r. wnk orno mi w d'gb.

    Deixe-a-criana-crescer-bem, deixe a minha criana crescer. A-noite-chegou, no deixe minha criana crescer fraca. O algododiz que minha criana deve crescer bem.

    A folhajmo ruke usada ainda contra dores nas costas em cri-anas (ogn hin ddn omod) (frmula 179). O of desta infuso :

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    Jmo ruke ni wo hin sn.pn b mi pon orno yi d'gbEr k ' mj k hin dn n.

    Deixe-a-criana-crescer-bem sempre cura a doena das costas.pn, ajude-me a respaldar esta criana at que ela cresa. Erno deve deix-la sofrer de dor nas costas.

    Esta mesma folha conhecida tambm sob o nome dermgl, "ele-que-faz-a-criana-crescer". usada em receitas quetratam de questes da gravidez, como as mencionadas a seguir.

    Para conseguir que uma criana nasa (irmob), trabalho clas-sificado no odu ogb trpn ou ogb tmopnn, "o^b-carrega-a-criana-nas-costas", rmgl fervido em gua com ew gungungun (CEIBA PENTANDRA, Bombacaceae, a mafumeira) e dado de beber mulher grvida. Seu of :

    gungun gun b mi b orno mi.rmgl b mi b orno mi.

    gungun gun, ajude-me a parir meu filho. Ele-que-faz-a-criana-

    crescer, ajude-me a parir meu filho.

    O mesmo trabalho rmob utilizado na frmula 225 com oof:

    Arakbal ni tn orno se.rmgl j'mo o ru gl.Er j k orno ru.

    Corpo-no-descansa, restaure a sade da criana.

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    Ele-que-faz-a-criana-crescer, deixe a criana crescer rpido.Er, deixe a criana crescer.

    Para ajudar a manter a gravidez (im oyn dr), classificada noodu wnrn iwri ou wnrn b iwr, wnrn-panu-iwor\ a ewrmgl pilada com r e misturada com sabo (ose dd), com oqual a mulher grvida lava o corpo. Seu of :

    rmgl b mi m oyn r s 'k.Er b mi m oyn yi d'gb.

    Ele-que-faz-a-criana-crescer, ajude-me a levar a cabo esta

    gravidez.Er, ajude-me a deixar esta gravidez crescer.

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    CAPITULO 2

    OPOSIES

    TRABALHOS MALFICOS E BENFICOS

    As diferentes preparaes usadas por babalas e curandeiroscobrem uma grande gama de receitas medicinais e trabalhos mgicos,podendo ser malficas (bil) ou de proteo (idbb).

    E difcil separar quais dentre elas pertencem ao campo medicinale quais ao mgico, pois, como veremos, eles esto profundamente interli-gados. A seguir cito exemplos de trabalhos ofensivos e seus antdotos.

    Doenas e acidentes

    Para mandar diarria e vmito a algum (bll irn ongb mjisi nyr) (frmula 399), usa-se so apkn, o fruto de DATURA METEL,

    Solanaceae, pilado com ninhos de vespa provenientes de uma casa (ilagbn il) e do campo (il agbn oko), uma vagem de odidi ataare(AFRAMOMUM MELEGUETA, Zingibiraceae, o amorno), e uma centopia(kr). Os ingredientes devem ser pilados, secos e colocados na comi-da ou na gua a ser consumida pela pessoa que se quer atingir e, paracompletar-se o efeito, um pouco dessa preparao deve ser despejadona soleira da porta do inimigo.

    Para curar a doena citada acima (ogun ongb mji), temos duasreceitas muito parecidas. Usam-se ew gnmn, "trepar-para-conhecer-

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    o-caminho" (CULCASIA SCANDENS, Araceae) e odidi ataare (AFRAMOMUM

    MELEGUETA, Zingibiraceae, o amorno), ao que, em uma das receitas, adi-ciona-se ew agbado (ZEA MAYS, folha do milho) (frmula 111) e na outra

    uma pena de perdiz (iy aparo). Queima-se at obter-se um p preto, que

    ento colocado em uma pequena cabaa, furada no alto e na base, arrolhan-do-

    se os dois lados. Muito simbolicamente, o p deve ser extrado do lado

    superior para combater o vmito e do lado inferior para combater a diarria.

    Em ambos os casos, o paciente deve comer a preparao com aca (ko) frio.

    Durante a preparao, deve-se pronunciar o of:

    gnmn mj k rn gun mi.

    Agbado k gb mi 1 'w rn.

    Trepar-para-conhecer-o-caminho, no deixe a doena trepar em

    mim.

    Milho, resgate-me da mo da doena.

    Para mandar uma lcera fagednica a algum (bil ifi nrun si

    niyr), trabalho classificado no odu ogb irsn, preciso uma preparao

    complicada (frmula 385). A doena nrun tida como a primeira a aparecer

    na terra, conforme uma histria classificada no perigoso odu fn knrn ou

    frn ekn, "provocar-o-leopardo".

    Devo dizer, para crdito dos babalas e curandeiros, que nos foi dado

    apenas um "trabalho agressivo" {bil) para provocar a lcera fagednica,

    enquanto forneceram-nos 26 receitas do remdio usado para cur-la (ogn

    nrun). Dois deles pertencem ao odu wnrn mji (frmula 68) e ao odu ogb

    s (frmula 69). Pertencendo ao odu tr iwr, temos ainda a receita que

    diz para moerem-se juntas as folhas ew itkn rn (FLABELLARIA

    PANICULATA, Malpighiaceae), ew oj olgb (ABRUS PRECATORIUS,

    Leguminosae Papilionoideae),

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    OPOSIOES- 71

    ew fun il (EVOLVULUS ALSINOIDES, Convolvulaceae, a corre-corre) e

    ingerir-se a preparao com aca frio. Seu of :

    Itkn rn k' bani rn an kr.Oj lgb ki j k ib ri ni.Efun il mj k le fn mi.

    Itkn rn, mande a doena para fora de ns.Oj lgb, no deixe que o mal nos veja.Efun il, no deixe a doena ser capaz de me pressionar [para baixo].

    Pertencendo ao odu ik s, temos a receita que manda pilarjuntas ew okn ep (IPOMOEA OBSCURA, Convolvulaceae), epo,"casca", de pndr (KIGELIA AFRICANA, Bignoniaceae), uma boa quan-tidade de orgb (GARCINIA KOLA, Guttiferae), ata gidi (ZANTHOXYLUMSENEGALENSE, Rutaceae) e kn-n bll (potssio concentrado). Deve-se comer o preparado com aca quente, pronunciando o of:

    Ew okn ep pa nrun k' k.Pndr pa nrun k ' k. Orgb

    gb nrun kr. Kn-n bll knan dn.

    Folha okn ep, mate nrum [a doena], que ela morra.Pndr, mate nrun, que ela morra. Orgb, carreguenrun para fora. Potssio concentrado, nocauteie-a.

    Para fazer com que algum quebre o brao ou a perna (bil idnils), existe a receita pertencente ao odu irsn gnd ou irsn gd,

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    OPOSIOES - 73

    naceae) e uma r