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Varizes dos Membros InferioresAspetos Práticos
Editores C. Pereira Alves, C. Costa Almeida, A. Pratas Balhau
2018
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Sociedade Portuguesa de Cirurgia
Capítulo de Cirurgia Vascular
Varizes dos Membros Inferiores
Aspetos Práticos
Editores
C. Pereira Alves, C. Costa Almeida, A. Pratas Balhau
2018
22
Esta publicação faz parte da atividade educacional do Capítulo de Cirurgia Vascular da
Sociedade Portuguesa da Cirurgia.
As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores, assim como seguir
ou não o Acordo Ortográfico de 1996.
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AUTORES
Aida Paulino Assistente Graduado, Serviço de Cirurgia Geral, ULS Castelo Branco, Hospital Amato Lusitano, Castelo Branco Vogal da Coordenação do Capítulo de Cirurgia Vascular da Sociedade Portuguesa de Cirurgia
Álvaro Pratas Balhau Assistente Graduado Sénior em Cirurgia Geral, Hospital de Santa Maria Maior, Barcelos Assistente Hospitalar de Cirurgia Vascular Mestre em Patologia Experimental Diretor do Serviço de Cirurgia Geral do Hospital de Santa Maria Maior, Barcelos Coordenador do Capítulo de Cirurgia Vascular da Sociedade Portuguesa de Cirurgia
Ana Formiga Assistente Graduado, Serviço de Cirurgia Geral, Centro Hospitalar Lisboa Central, Lisboa
Ana Lourenço Interna do 3º ano da Formação Específica de Radiologia no Centro Hospitalar Lisboa Central, Lisboa
Ângela Marques Assistente Graduada de Radiologia do Centro Hospitalar Lisboa Central, Lisboa
Beatriz Mourato Assistente Hospitalar, Serviço de Cirurgia Geral, ULS Norte Alentejano, Hospital Dr. José Maria Grande, Portalegre
Carlos Pereira Alves Professor de Cirurgia Cirurgião Vascular Clínica de Veias, Hospital da Ordem Terceira-‐Chiado, Lisboa
Carlos Costa Almeida Cirurgião Geral e Vascular Assistente Graduado Sénior de Cirurgia Geral Diretor do Serviço de Cirurgia C do Centro Hospitalar e Universitário de CoimbraHospital Geral (Covões), Coimbra Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra Regente da Cadeira de Cirurgia Vascular
Carlos Eduardo Costa Almeida Assistente Hospitalar de Cirurgia Geral, Serviço de Cirurgia C, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra - Hospital Geral (Covões), CoimbraAssistente da Faculdade de Medicina de Coimbra
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Autores
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Diogo Casal Assistente Hospitalar de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva e Unidade de Queimados no Centro Hospitalar Lisboa Central, Lisboa Professor Auxiliar do Departamento de Anatomia da Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Nova de Lisboa
Élia Coimbra Assistente Graduada Sénior de Radiologia Diretora da Unidade de Radiologia de Intervenção do Centro Hospitalar de Lisboa Central, Hospital Curry Cabral, e da Unidade de Radiologia de Intervenção do Hospital da Cruz Vermelha, Lisboa Membro do Conselho Diretivo da Sociedade Portuguesa de Radiologia e Medicina Nuclear.
Filipe Veloso Gomes
Médico Radiologista de Intervenção Assistente de Radiologia, Unidade de Radiologia de Intervenção do Centro Hospitalar de Lisboa Central, Hospital Curry Cabral, e da Unidade de Radiologia de Intervenção do Hospital da Cruz Vermelha, Lisboa Membro da Secção de Radiologia de Intervenção da Sociedade Portuguesa de Radiologia e Medicina Nuclear Assistente Convidado da Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Nova de Lisboa.
João Magro Assistente Graduado Sénior, Serviço de Cirurgia Geral, ULS Norte Alentejano, Hospital Dr. José Maria Grande, Portalegre
Luís Filipe Pinheiro Assistente Graduado Sénior, Serviço de Cirurgia Geral, Hospital de São Teotónio, Viseu
Luís Silveira Assistente Graduado Sénior de Cirurgia Geral, aposentado Doutorado em Cirurgia pela Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra Professor Associado Convidado da Faculdade de Ciências da Saúde da UBI, Covilhã Diretor do Laboratório de Gestos Cirúrgicos da FCS da UBI, Covilhã
Mariana Lima Interna do 5º ano da Formação Específica de Radiologia no Centro Hospitalar Lisboa Central, Lisboa
Nuno Pratas Interno do 4º ano da Formação Específica em Cirurgia Geral, ULS Norte Alentejano, Hospital Dr. José Maria Grande, Portalegre Representante dos Internos na ULSNA
Autores
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Pedro Vaz Assistente Hospitalar, Serviço de Cirurgia Geral, ULS Castelo Branco, Hospital Amato Lusitano, Castelo Branco Diretor-‐Executivo do Laboratório de Gestos Cirúrgicos da FCS da UBI, Covilhã
Sara Correia Assistente Hospitalar, Serviço de Cirurgia Geral, ULS Castelo Branco, Hospital Amato Lusitano, Castelo Branco
Tiago Bilhin European Board of Interventional Radiology Radiologista de Intervenção, Centro Hepato-‐bílio-‐pancreático, Hospital Curry Cabral, Centro Hospitalar Lisboa Central e Hospital de Saint Louis, Lisboa Professor Auxiliar Convidado da NOVA Medical School, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa Editor Associado do Journal of Vascular and Interventional Radiology e da Acta Radiológica Portuguesa Membro editorial do Cardiovascular and Interventional Radiology Corresponding Fellow Society of Interventional Radiology (SIR); Fellow Cardiovascular and Interventional Radiological Society of Europe (CIRSE)
Autores
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ÍNDICE
Pág. -‐ Introdução
Carlos Pereira Alves .............................................................. -‐ Aspetos históricos das veias e das varizes
Luís Silveira ............................................................................ -‐ Anatomia das veias dos membros inferiores
Tiago Bilhim e Diogo Casal .................................................... -‐ Fisiopatologia da insuficiência venosa crónica
Carlos M Costa Almeida ......................................................... -‐ Epidemiologia e fatores de risco
Sara Correia, Aida Paulino e Luís Silveira ............................... -‐ Classificação CEAP –
Luís Filipe Pinheiro .................................................................. -‐ Clínica: sintomas e sinais
Beatriz Mourato, Nuno Pratas e João Magro ......................... -‐ EcoDoppler na avaliação da doença venosa crónica
Ana Lourenço, Mariana Lima e Ângela Marques ................... -‐ Medicamentos venoativos
Carlos Pereira Alves ................................................................ -‐ Terapêutica compressiva
Carlos Pereira Alves ................................................................ -‐ Cirurgia das Varizes dos membros inferiores
Carlos Pereira Alves ................................................................ -‐ Tratamento endovascular
Filipe Veloso Gomes e Élia Coimbra ........................................ -‐ Tratamento das perfurantes
Carlos Eduardo Costa Almeida ................................................ -‐ Escleroterapia química
Pratas Balhau ......................................................................... -‐ Tratamento das complicações:
. Tromboflebite superficial (varicoflebite) Pedro Vaz ................................................................................
. Hemorragia varicosa (varicorragia) Sara Correia, Aida Paulino e Luís Silveira ................................
-‐ Varizes e gravidez Ana Formiga ............................................................................
-‐ Anexo 1 – Folheto informativo ao doente Pereira Alves ............................................................................
Indíce
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195
201
222
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INTRODUÇÃO
As varizes dos membros inferiores, são extremamente frequentes, com grande
impacto no SNS em termos de custos e grande impacto na qualidade de vida do
cidadão.
Se se incluírem todas as classes clínicas da classificação CEAP, a prevalência geral é
cerca de 50 % da população, com 20 a 25 % a terem varizes (C2), 6 % com
insuficiência venosa crónica (C3, 4), 2 % com úlcera venosa cicatrizada (C5) e 0,5 %
com úlcera aberta (C6).
A prevalência aumenta com a idade.
A maior prevalência no sexo feminino parece não ser real, mas resultante de uma
maior preocupação com aspetos estéticos.
Apesar de frequentes e as suas referências históricas serem mais antigas que as das
doenças arteriais, as varizes continuam a ser olhadas como situação banal e a não
terem a valorização necessária, nem conhecimentos atualizados.
No plano anatómico as duas veias tronculares dos membros inferiores são a veia
safena interna, hoje designada de grande veia safena, e a veia safena externa, hoje
designada de pequena veia safena, com colaterais a nível da coxa e da perna
designadas colaterais safenianas, para as distinguir de colaterais sem relação com a
safena, designadas colaterais não safenianas.
O ecoDoppler veio mostrar que a grande veia safena e a pequena veia safena, não são
veias superficiais, mas sim veias interfasciais, com um compartimento próprio, o
compartimento safeniano.
As colaterais, safenianas ou não safenianas, estas sim, são veias superficiais, que
quando dilatadas constituem as varizes, que por definição são veias superficiais
dilatadas e tortuosas.
As veias safenas podem ou não estar dilatadas e com refluxo de extensão variável,
axial ou segmentar.
A causa das varizes e do seu desenvolvimento, continuam por estabelecer,
continuando a discussão se na etiologia das varizes a dilatação venosa é secundária a
Introdução
10 8
um problema primário da parede venosa (teoria parietal) ou a um problema primário
de uma ou mais válvulas venosas (teoria valvular) sendo que qualquer dos casos leva a
uma dilatação venosa segmentar com consequente incompetência valvular, já que as
válvulas estão inseridas na parede venosa.
Continuam, também, mal compreendidos os mecanismos da insuficiência venosa
crónica (IVC), ganhando influência crescente o facto da hipertensão venosa, ao
sobrecarregar a microcirculação, resultar em extravasamento de macromoléculas e
eritrócitos, que vão provocar uma ativação e migração leucocitárias e iniciar uma
reação inflamatória com libertação de fatores inflamatórios e síntese aumentada de
MMP-‐2, que favorecem a evolução desta doença.
Medicamentos com ação sobre a ativação leucocitária, como verificado com o MPFF
(Micronized Purified Flavonoid Fraction – Fracção Flavonóica Purificada Micronizada),
podem, assim, ser úteis no tratamento da IVC.
Nos aspetos clínicos a classificação CEAP tem vindo a ter uso crescente, com
atualização constante e permitindo melhor definição dos sintomas e sinais da doença
venosa crónica.
As últimas décadas, têm sido marcadas por uma melhor compreensão da anatomia e
fisiopatologia, sobretudo devido ao exame do ecoDoppler com cor.
O tratamento dos doentes com varizes deve cada vez mais seguir o conceito de “one
stop clinic”, no qual, de maneira sequencial e rápida, a avaliação clinica e o exame
físico, estabelecem a classe clínica, seguindo-‐se, com a menor demora, a realização de
exame ecoDoppler, se indicado, para complementar a classificação CEAP e
subsequente decisão de tratamento.
Esta metodologia, exige conhecimentos e prática clínica atualizados, impondo cada vez
mais a flebologia como especialização.
O ecoDoppler com cor ou ultrassonografia duplex, é, hoje, o método de escolha na
avaliação da doença venosa, permitindo detetar refluxo e/ou obstrução nas veias em
estudo. A realização do ecoDoppler venoso dos membros inferiores tem hoje
metodologia própria.
O seu objetivo é, não só determinar a presença de refluxo e ou obstrução, mas definir
os padrões de refluxo, se axial ou segmentar, o que obriga a estudar a grande veia
Introdução
11 9
safena em todo o seu trajeto, desde a região inguinal ao maléolo interno, bem como
determinar o seu calibre abaixo da crossa, hoje designada junção safeno-‐femoral.
O exame ecoDoppler, se não realizado pelo próprio cirurgião, deverá ter sempre
informação clínica da razão do pedido do exame e realizado por imagiologista com
conhecimento e prática de imagiologia venosa.
Em função da classe clínica CEAP e dos padrões de refluxo, será tomada a decisão
terapêutica.
O tratamento poderá ser conservador, com prescrição de medicamentos venoativos
ou de meias elásticas, para as classes C0s e C1s) ou incluir cirurgia para as classes C2
Na classe C1, poderá ser considerada a escleroterapia.
O tratamento com medicamentos venoativos tem hoje efeito bem estabelecido no
alívio sintomático e no alívio/resolução do edema. O MPFF mostrou ainda efeito
benéfico nas úlceras venosas. Estudos recentes sugerem que o MPFF possa ter efeito
preventivo na evolução da doença venosa crónica, exigindo e estimulando futura
investigação.
O tratamento com meias elásticas, ao reduzir o volume venoso, contribui para
restaurar o normal retorno venoso, tendo assim efeito no alívio dos sintomas e do
edema.
As meias elásticas são tratamento de escolha nas úlceras venosas (kit ulcera) e a sua
manutenção após a cicatrização da úlcera, parece prevenir/diminuir a recorrência.
As meias elásticas devem ser usadas diariamente e substituídas regularmente.
A cirurgia de desconexão da junção safenofemural ou poplítea, “stripping” de
invaginação da grande safena até abaixo do joelho e excisão das colaterais varicosas
com múltiplas incisões cutâneas, continua a ser o método que permite, com a mesma
técnica e no mesmo tempo operatório, tratar as colaterais varicosas e o tronco das
safenas, quando indicado.
A oclusão endovascular do tronco das safenas, em alternativa ao “stripping” tem tido
excelentes taxas de oclusão, mas não trata as colaterais varicosas.
A escleroterapia, útil no tratamento de telangiectasias e varizes reticulares e residuais,
continua a mostrar, no tratamento das varizes tronculares, maior recorrência a longo
termo.
Introdução
12 10
A necessidade de tratamento das perfurantes incompetentes da perna com SEPS,
técnicas endovasculares ou escleroterapia eco guiada, continua assunto controverso,
surgindo a SEPS como técnica preferencial.
A varicoflebite (trombose venosa superficial de veia varicosa) nem sempre é benigna
podendo associar-‐se a trombose venosa profunda. O ecoDoppler permite confirmar o
diagnóstico e definir a extensão. O tratamento é feito com anti-‐inflamatórios e
anticoagulantes, não tendo indicação prescrever antibióticos.
Outra complicação a hemorragia varicosa ou varicorragia, pode ser provocada por
traumatismo ou expontânea e deve ser tratada com urgência. A elevação do membro
e compressão do ponto hemorrágico, pára a hemorragia.
É bem conhecido que durante a gravidez, as veias se dilatam por fatores hormonais e
pela compressão do útero gravídico. Em regra, as varizes da gravidez regridem após o
parto, regressão que vai diminuindo com futuras gravidezes.
A indicação de tratamento das varizes a seguir à gravidez, deve, assim, ser protelada
entre seis meses a um ano.
Estes diferentes aspetos das varizes dos membros inferiores, são consideradas pelos
autores da presente publicação.
Esta publicação, pelo Capítulo Vascular da Sociedade Portuguesa de Cirurgia, destina-‐
se essencialmente aos médicos de Medicina Geral e Familiar e aos Cirurgiões com
interesse na Doença Venosa Crónica.
Aos especialistas em Medicina Geral e Familiar, porque são muitas vezes o primeiro
contato do doente com varizes e poderão ter a seu cargo o tratamento conservador,
com medicamentos venoativos e meias elásticas dos doentes das classes clínicas CEAP,
C0s e C1s e referenciar para o cirurgião as classes clínicas C2 a C6.
Aos cirurgiões com interesse pela doença venosa crónica, porque esse interesse exige
conhecimentos atualizados e prática clínica frequente.
Introdução
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ASPETOS HISTÓRICOS DAS VEIAS E VARIZES
Luís Silveira
As varizes são um problema de saúde pública tão importante, que justificam a
elaboração deste livro, para orientação dos Cirurgiões Gerais e consulta dos colegas de
Medicina Geral e Familiar. É nosso dever lembrar, agradecendo, os que contribuíram
para o que atualmente sabemos sobre anatomia do sistema venoso, etiopatogenia,
diagnóstico e tratamento da insuficiência venosa crónica (IVC) e das varizes. Como é
difícil separar a história destas doenças da evolução do conhecimento sobre as veias, a
este nos referiremos pontualmente.
Esperamos que vos seja útil na prática clínica.
Quando Huang Ti (2697-‐2597 aC), o Imperador Amarelo, cerca de 2600 aC, perguntou
“Como ocorrem os edemas? Quais são as origens?”, Qi Bo disse: "O qi (energia vital)
protetor no corpo circula junto com as veias e canais para seguir as divisões da carne...
Quando há edema, é preciso investigar os canais, as veias e os lábios.” e preconiza o
seu tratamento com acupuntura. Não refere, especificamente, varizes, mas atribui o
edema ao mau funcionamento das veias.1
Encontrámos a primeira referência, escrita, a varizes, no Papiro de Ebers, datado de
cerca de 1550 aC 1, no governo do faraó Amenhotep I, “Quando encontra um Tumor do
Metu no lado interno de qualquer Membro, ele cresce e vê que serpenteia como cobras
enquanto forma muitas proeminências e estas são como coisas movidas pelo vento... “,
aconselha a não lhe tocar (talvez sugerindo que o tratamento não é cirúrgico)
apresentando, em seguida, uma Fórmula Mágica que deve ser repetida por quatro
manhãs, mas que é incompreensível e de impossível tradução, por deterioração do
papiro.2
Sushruta (séc. VI aC), cirurgião indiano, também se referiu a varizes, e foi o primeiro a
referir-‐se à ETIOPATOGENIA, quando no seu tratado Sushruta Samhita, Cap. XL -‐ Sirá-‐
Granthi (aneurisma ou veias varicosas), diz “O corpo Vàyu em pessoas fracas e
1 Tem trechos datados de cerca de 3400 aC, data em que, provavelmente, começou a ser escrito.
Aspetos históricos das veias e varizes
14 12
debilitadas, cansado por exercícios físicos excessivos, por esforço ou por pressão,
contrai, seca ou desenha as ramificações de veias (Sirà) ou artérias (do local afetado)
(aneurisma) e rapidamente dá origem a uma formação nodosa em relevo que se
chama Sirà-‐Granthi... ”3
Em Agrigento, Empedócles (490-‐430 aC), defendia a Teoria dos Elementos – ar, água,
fogo e terra – que foi a base da Escola Pneumática de Medicina, baseada nos conceitos
“o sangue é a vida” e “o coração é o centro do sistema vascular e o pneuma é
transportado pelos vasos sanguíneos”. Esta teoria foi seguida por Diogenes (499-‐428
aC), de Apolónia, um dos primeiros a estudar a circulação sanguínea e a descrever um
sistema vascular4a.
Segundo Caggiati e Allegra5, foi Hippocrates (460-‐375 aC), de Cós, quem, pela primeira
vez se referiu à patogénese e à epidemiologia da doença varicosa, quando afirmou que
as varizes eram mais frequentes nos Citas (antigo povo iraniano de pastores nómadas
equestres), devido ao tempo prolongado que passavam no dorso do cavalo, com as
pernas penduradas. Hippocrates era defensor da Teoria dos Humores “O corpo
humano contém sangue, fleuma, bílis amarela e bílis negra... A saúde é principalmente
o estado em que estas substâncias constituintes estão em proporção correta entre si,
tanto em força como em quantidade, e estão bem misturadas.”6 Um desequilíbrio
entre os humores, originaria uma doença.
Deixem-‐nos juntar duas opiniões interessantes, que, a propósito de varizes,
Hippocrates referiu nos seus Aforismas: 21. “Nas afeções maníacas, se aparecem
varizes ou hemorróidas, estas curam a mania.”7a; e 34. “Pessoas que ficaram carecas
não sofrem de grandes varizes; mas se varizes aparecerem em alguém que é calvo,
então o seu cabelo cresce de novo espesso.”7b Talvez a vossa experiência clínica,
confirme estas afirmações.
Aristóteles (384-‐322 aC), de Atenas, frequentemente citado quando se fala da história
das varizes, não se pronunciou, especificamente, sobre esta patologia. Tinha opiniões
erradas acerca da circulação, quando afirmava que “O coração apresenta três
cavidades;... ”8a, “Há dois vasos no tórax... O maior fica mais à frente, o mais pequeno,
atrás dele;... há quem chame a este último aorta... Estes vasos têm origem no
coração.”8b Só se refere a varizes, quando diz “Mas as mulheres estão menos sujeitas a
doenças do que os homens. São raras as que sofrem de varizes, de hemorróidas ou de
Aspetos históricos das veias e varizes
15 13
hemorragias nasais. Se lhes acontecer algum destes percalços, a menstruação não se
faz normalmente.”8c, mas não as define. Embora faça a distinção entre aorta e grande
veia (cava), fale nas artéria e veia pulmonares e outras ramificações daquelas, não faz
a distinção entre artérias e veias. Dá-‐lhes o mesmo nome, phlebs -‐ vaso sanguíneo.
Esta distinção só foi feita por Praxagoras (340-‐séc. III? aC), de Cós, que, também,
descreveu as diferentes funções delas. Chamou veias (phlebes), aos vasos que saem do
ventrículo direito do coração, e artérias (artēriai), aos que emergem do esquerdo9a.
Uma sua teoria central, a Teoria Pneumática, era a noção que as artérias
transportavam pneuma (alma, vida, ar e respiração) e as veias sangue, porque no
cadáver as primeiras estavam vazias (já não havia alma, vida, ar, nem respiração) e as
segundas continham sangue9b.
Um seu pupilo, Herophilus (335-‐280 aC), de Alexandria, considerado o Pai da
Anatomia, foi o primeiro a chamar artéria pulmonar (artéria tipo-‐veia), ao vaso que sai
do ventrículo direito e a distinguir anatómica e funcionalmente as artérias das veias.
Não concordando com o seu mestre, defendia que as artérias não só transportavam
pneuma, mas também sangue9c. Erasistratus (304-‐250 aC), de Alexandria, aprofundou
o conceito da existência de dois sistemas diferentes, o arterial e o venoso, mas, quanto
aos vasos pulmonares, porque “... as veias pertencem ao sistema pneumático, são
consideradas artérias... “ e chamou-‐lhe veia arteriosa, e porque “... a artéria pulmonar
é suposto existir para levar nutrientes (sangue formado dos alimentos digestivos) para
os pulmões, pertence ao sistema venoso.”, pelo que seria artéria venosa10. Percebeu
que o sangue passava das artérias para as veias através de intercomunicações muito
finas entre os dois tipos de vasos, ou seja, a existência do sistema capilar4b, embora
não o tivesse afirmado. Nenhum destes autores se pronunciou sobre varizes dos
membros inferiores.
No museu de Atenas, na Grécia, encontra-‐se uma peça que é uma imagem esculpida
em pedra que, de maneira muito clara, mostra uma veia varicosa numa perna
masculina. Esta imagem, que foi encontrada no templo de Amynos, próximo da
Acrópole de Atenas, é datada de 350 aC. Foi uma oferenda votiva a Asclepius levada ao
templo por motivos religiosos, como agradecimento pela cura de varizes (Fig. 1).
A Teoria Pneumática, continuou a ser defendida por Rufus D’Éphèse (70-‐120), mas
Galeno (129-‐200), de Pergamo, embora não discordasse desta, concordava com
Aspetos históricos das veias e varizes
16 14
Hippocrates, pois era adepto da Teoria dos quatro Humores11, que se manteve até ao
séc. XVI. Também defendia que o sangue era gerado no fígado, por transformação dos
alimentos, era distribuído pelas veias e renovado no coração pela mistura com o ar. As
cavidades direitas do coração recebiam o sangue das veias, enquanto que as
esquerdas recebiam a mistura. O fígado, considerado o centro da circulação, impelia o
sangue suavemente pelas veias, ao passo que a metade esquerda do coração insuflava
o ar cheio de “espíritos vitais” para todo o organismo, através da “fonte da vida”, as
artérias12. Mas haveria uma comunicação entre estas duas partes cardíacas. Esta teoria
foi adotada pela Igreja e quem se lhe opunha, ou apresentasse outra diferente, corria
o risco de excomunhão101a.
Fig. 1 -‐ Oferenda votiva a Asclepius, em mármore, agradecendo a cura de varizes. 350 aC. Museu Nacional, Atenas.
A Teoria dos quatro Humores também foi defendida na Escola de Salerno, famosa
pelos mestres que nela lecionavam, como Constantino, O Africano (1020-‐1087),
Mestre Nicolau (1150-‐1200) e o anatomista Copho (séc. XIV). O segundo autor, na
Anatomia Magistri Nicolai Physici, também defendia que todas as veias nascem do
fígado e refere-‐se a varizes, mas com outra conotação, quando diz “Duas veias
Aspetos históricos das veias e varizes
17 15
chamadas varicæ também surgem da veia cava; elas vão até à parte de trás dos
joelhos e quando são cortadas obliquamente, fazem homens varicosos, isto é,
fechados... ”13 Seguem-‐se várias indicações de flebotomias para tratamento de
múltiplas doenças.
Para Guy de Chauliac (1298-‐1368), de Avignon, ainda adepto daquela teoria, “As
causas destas doenças são... sangue muito melancólico e fleumático e cálido...“14a
Dos médicos portugueses, Pedro Hispano (1215-‐1277) não se pronunciou,
especificamente, sobre varizes, mas Amato Lusitano (1511-‐1568), porque lecionou em
Ferrara, com Giambattista Canano (1515-‐1579), defendia que este foi o primeiro a
descrever as válvulas venosas, em 1957. Amato, em dois locais das suas Centúrias
(Primeira Centúria, Cura LII15a e V Centúria, Cura LXX15b), se refere às válvulas da veia
ázigos e comprova a sua função, quando diz “Mas se abrirmos a veia sem par na parte
mais baixa e com um canudo, ou caninha, metido dentro, soprarmos para a parte
superior, não há dúvida que a veia cava não inchará, não ficará entumescida, visto que
o ar, contido na veia sem par, não pode sair, por causa dos ostíolos ou opérculos que
tem no seu orifício junto da veia cava. Donde é certo que se o ar não pode derivar da
veia sem par para a veia cava, com mais razão (a fortiori) o sangue, mais encorpado
que o ar, não refluirá.”15a, logo impedem o refluxo sanguíneo. Esta verificação foi feita
“... no ano de 1547, em Ferrara, fizemos dissecar doze corpos humanos e de animais, e
vimos, que em todos assim sucedera... “15a
Leonardo da Vinci (1452-‐1519), fez grandes descrições e desenhos do sistema
circulatório, mas, em alguns casos, não são do homem, provavelmente do boi16.
Berengarius da Carpi (1460-‐1530), anatomista de Bolonha, o primeiro a publicar
desenhos anatómicos em livros de medicina, em 1522, também fez desenhos e relatos
da anatomia circulatória17, nomeadamente das veias safenas, mas não tão perfeitos
como os realizados por Andreas Vesalius (1514-‐1564), no seu tratado De Humani
Corporis Fabrica, publicado em 1543. Baseado em disseções cadavéricas, no Terceiro
Livro, desenhou todas as ramificações das veia porta, veia cava, aorta e do cérebro18, e
toda a circulação, com exceção das válvulas e das perfurantes. Os seus desenhos têm
uma característica singular, são anatomicamente artísticos, mas têm falhas, como a de,
ainda, julgar que existia uma comunicação interventricular.
Aspetos históricos das veias e varizes
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Também Bartolommeo Eustachi (1500/1513-‐1574), de Roma, desenhou sistemas
arteriais19a, e venosos19b, 19c, com alguma precisão, no compêndio publicado em 1552,
Tabulӕ Anatomicӕ.
Embora só tenha sido traduzido em 1527, por Andréa de Belluno, no séc. XVI, o árabe
Ibn Al-‐Nafis (1213-‐1288), a lecionar no Cairo, no seu livro Comentário à Anatomia do
Canon de Avicenna, faz a primeira descrição da circulação pulmonar ou pequena
circulação, “... passa na veia arteriosa para o pulmão para permear sua substância e
misturar-‐se ao ar, a sua parte fina é purificada; e depois passa na artéria venosa para
alcançar a cavidade esquerda das duas cavidades do coração; tendo-‐se misturado com
o ar e tornado apto para a criação do espírito.”20 Porque não era conhecido este
documento, aquela descrição foi atribuída a Miguel Servet (1509-‐1553), espanhol de
Saragoça que lecionou em Genebra e Viena, no livro Christianismi Restitutio21,
publicado em 1553, “Da mesma forma, não apenas ar, mas ar misturado com sangue,
é enviado dos pulmões para o coração através da veia pulmonar; Portanto, a mistura
ocorre nos pulmões. Essa cor amarela avermelhada é dada ao sangue espirituoso pelos
pulmões; não é do coração.”, referência à oxigenação do sangue nos pulmões. É uma
descrição anatómica (diferente da de Galeno) e religiosa, que o levaria à morte pelo
fogo, sentenciada pela Inquisição. Este documento foi escondido pela Igreja e
esquecido, tendo ressurgido com Harvey, como se referirá mais à frente. Também
Realdo Colombo (1516-‐1559), sucessor de Vesalius na cadeira de Anatomia, em Pádua,
descreveu a circulação pulmonar, no livro De Re Anatomica, publicado em 1559,
depois da sua morte101b. As teorias destes três autores, por vários motivos, não foram
conhecidas na sua época, pelo que as descobertas de Harvey tiveram mais impacto.
Embora, na área anatómica, as opiniões de Galeno tenham sido contraditas pelas de
Vesalius, a Teoria dos Humores só o foi no séc. XVIII, por Benjamin Bell. Assim,
Ambroise Paré (1509-‐1590), o primeiro Mestre Cirurgião-‐barbeiro, afirmava “As
varizes desenvolvem-‐se nas pessoas que são melancólicas, e que se alimentam de
carnes melancólicas. As mulheres grávidas são frequentemente afetadas, por causa do
sangue melancólico que, retido durante a gravidez, faz com que as veias se dilatem e
se tornem varicosas... “22a, foi o primeiro a considerar a gravidez como causa de
varizes, e, também que varizes são causas do aparecimento de úlceras e fatores de
atraso da sua cicatrização22b.
Aspetos históricos das veias e varizes
19 17
Em Pádua, Hieronymus Fabricius Ab Aquapendente (1533-‐1619), professor (talvez o
primeiro Professor de Medicina digno desse nome) e diretor dos teatros anatómicos,
descreveu, pela primeira vez, as válvulas das veias com algum pormenor, no seu livro
De venarum ostiolis, publicado em 1603. Alguns autores, como Riju Ramachandron
Menon23 e Amato Lusitano (como já dissemos), afirmam que Giovanni Battista Canano,
em 1540, terá descrito as válvulas nas veias renal, ázigos e ilíacas externas, que
Ludovicus Vassaeus, em 1544, descreveu algumas válvulas, e, um ano depois, também
o terá feito Charles d’Estiènne (ou Carolo Stefano) (1504-‐1564)24, tendo as primeiras
ilustrações sido apresentadas por Salomon Alberti, em De valvulis membraneis
vasorum, publicado em 1585. Fabricius Ab Aquapendente, embora não tivesse tido
conhecimento cabal da função das válvulas, foi o primeiro a considerar a insuficiência
valvular como causa das varizes, quando referiu “Em algumas pessoas, de facto, como
porteiros e camponeses, parecem inchar (as veias) como varizes: mas aqui devo
corrigir-‐me. Deve ser claramente indicado que as varizes reais são devidas inteiramente
à dilatação das válvulas e veias por uma retenção muito longa e espessamento do
sangue nas válvulas; uma vez que, na ausência de válvulas, as veias deveriam inchar e
dilatar uniformemente ao longo do seu comprimento, diferindo assim das varizes.”25a
Também as representou em desenho (Fig. 2)25b, mostrando dilatações venosas,
correspondentes a válvulas, no antebraço quando se coloca um garrote no braço.
Fig. 2 – De venarum ostiolis, pp. 80 e 81. Tabula ii: A Figura i mostra as veias cefálica (AB), basílica (CD) e mediana (EF) e dilatações (o, o, o) correspondentes às válvulas, quando se
coloca um garrote no braço; A Figura ii representa duas veias da perna, AB e CD e válvulas (o, o, o) por fora das veias, estando na primeira vazias e em CD cheias de sangue.
William Harvey (1578-‐1657), aluno de Fabricius, em 1628, no livro Exercitatio
anatómica de MOTU CORDIS et sanguinis in animalibus (Estudos anatómicos sobre o
Aspetos históricos das veias e varizes
20 18
movimento do coração e do sangue em animais), veio mostrar, cientificamente, a
circulação sanguínea e o papel das válvulas das veias26a. “As válvulas estão presentes
para que o sangue não possa mover-‐se das veias maiores para as mais pequenas, a
não ser em caso de rotura ou de varizes, e para que não avance do centro do corpo
para a periferia através delas, mas sim das extremidades até ao centro. Este último
movimento é facilitado por estas válvulas delicadas, o contrário é completamente
impedido.”26b
Fig. 3 – A Figura 1 mostra dilatações venosas correspondentes às válvulas (igual à de Fabricius, mas invertida na horizontal); as seguintes figuras mostram a eficácia das válvulas.
Muito influente foi Richard Wiseman (1621-‐1676), de Londres, que em 1676, no
tratado Severall Chirurgicall Treatises, foi o primeiro a sugerir que a incompetência
valvular resultava da dilatação de uma veia27 e que a compressão e/ou a trombose
podem ser causas de varizes, quando diz “Mas, também, ocorre de forma não natural,
tanto nos Tumores da Mama e noutras Partes: em todos os que podem (mas mais
visivelmente em Cancros) os Vasos alargam, e as Veias tornam-‐se varicosas. A causa
disto pode ser referida à coagulação do Soro, ou à espessura do Sangue, ou à
obstrução da Veia em algum lugar em sua passagem por alguma angulação provocada
pelo Tumor; de onde acontecerá, muitas vezes, que a Veia para trás dela tenha parado,
Aspetos históricos das veias e varizes
21 19
e é forçada a inchar. Não, não só a contração dos Vasos pelo não natural Tumor faz
isso, mas também por qualquer outra Pressão. Como na Mulher com Criança, o peso
deitado sobre o Ramus iliacus em qualquer lado do corpo, torna varicosos a Coxa e a
Perna em todo esse lado.”27
Richard Lower (1631-‐1691), em 1670, descreveu o vis a tergo, o tónus venoso e o
efeito da bomba muscular no retorno venoso, grande avanço no conhecimento da
fisiologia da circulação5 e Antonio Valsalva (1666-‐1723), em 1710, descreveu o vis a
fronte, devido às alterações rítmicas respiratórias da pressão tóraco-‐abdominal5.
Pierre Dionis (1643-‐1718), de Paris, em 1708, concordou plenamente com Wiseman
quanto às causas das varizes, mas explicou-‐as melhor: uma causa interna “... quando o
sangue se torna espesso... não podendo correr nas veias, e pára em qualquer dos seus
ramos, ou coagula... obriga a veia a dilatar-‐se.“; e outra externa, um traumatismo,
grandes esforços, ou a gravidez28a.
Em 1794, John Hunter (1728-‐1793), de Londres, descreveu no seu tratado A treatise
on the blood, inflammation and gun-‐shot wounds, a contribuição das artérias para o
retorno venoso, “Nessas veias que são acompanhadas por artérias, a pulsação da
artéria auxilia na propulsão do sangue para o coração.”29a e confirmou, no cão, as
observações de Valsalva “Mesmo a respiração produz uma estagnação perto do tórax;
pois durante a inspiração as veias esvaziam-‐se rapidamente; mas na expiração há um
certo grau de estagnação.”29b
Justus Loder (1753-‐1832), em 1803, publica as Tabulæ anatomicæ, e na Tab. CXXVII
um desenho, muito pormenorizado, das perfurantes do membro inferior30.
Em 1806, Tommaso Rima (1775-‐1843), foi o primeiro a considerar o refluxo como
causa de varizes quando diz “os argumentos que sustentam nossa teoria do
movimento inverso do sangue como a causa próxima das varizes... “31a e descreveu
uma manobra para o demonstrar, da qual falaremos mais à frente.
Em 1824, Paul Briquet (17XX-‐18YY), de Paris, verificou que a hipertensão do sistema
venoso profundo podia provocar varizes “No lugar onde a flebectasia é mais
pronunciada, há comunicações muito grandes com as veias profundas, que são amplas
no local de onde parte o ramo anastomótico,... ”32a, sugeriu uma doença da parede da
veia, como causa da dilatação venosa “Seria demais dizer que está estabelecido nos
vasos que deve se tornar uma espécie de inflamação lenta que começa a suavizar o
Aspetos históricos das veias e varizes
22 20
tecido e prepara a dilatação?”32b introduzindo o conceito de “inflamação” da parede
da veia como causa das varizes, que só mais de 150 anos depois começou a ser
investigado. Por fim, a propósito do tipo de sangue presente nas veias, refere “O que
acabei de dizer leva-‐me a inserir algumas palavras sobre o estado do sangue nas
varizes. Encontra-‐se em massas, rutilantes, quase análogas à cor do sangue arterial.
Quando se incisa uma variz, muitas vezes o jacto é muito forte; Eu vi-‐o entrecortado; a
hemorragia é muito considerável; Esta força do jacto, que atingiu J. L. Petit, parece-‐me
ser um indício de desenvolvimento dos capilares e de uma comunicação livre entre os
sistemas arterial e venoso por este intermediário dilatado.”32c, sugerindo a existência
de fístulas artério-‐venosas em algumas varizes.
Benjamin Brodie (1783-‐1862), em 1846, embora já tenhamos demonstrado que assim
não aconteceu, foi apontado como o primeiro a considerar o refluxo como causa de
varizes, quando disse, no seu livro Lectures illustrative of varius subjects in pathology
and surgery, capítulo sobre Veias varicosas e úlceras das pernas, “As veias profundas
nunca se tornam varicosas, porque há a pressão de outros órgãos sobre elas por todos
os lados, o que impede sua dilatação. São apenas as veias superficiais que são
afetadas; especialmente os ramos da veia safena major, mas às vezes da veia safena
posterior. Mas as válvulas não aumentam com a dilatação da veia, permanecem do
tamanho original. A consequência é que as válvulas não protegem os ramos venosos
abaixo da pressão da coluna de sangue acima; que deixam de responder ao propósito
das válvulas; e a ausência de ação das válvulas tende, naturalmente, a agravar a
doença.”33a
John Gay (1813-‐1885), de Londres, no seu tratado On varicose disease of the lower
extremities, publicado em 1867, faz um apanhado dos fatores etiológicos das
varizes34a. Refere as causas que provocam excesso de sangue, no sentido do fluxo
(hábitos, idade, sexo, fístulas artério-‐venosas, por exemplo), como no sentido
contrário (ação da gravidade, insuficiência valvular, tumores abdominais, etc.), para
além da hereditariedade, obesidade e lesões traumáticas. Lista bastante completa,
mas que, apesar de incluir a tromboflebite, não menciona a trombose venosa
profunda (TVP), embora tenha sido objeto do seu estudo, pois em cinco dos 24 casos
clínicos que descreveu, estavam presentes “... coágulos nos troncos venosos
profundos.”34b
Aspetos históricos das veias e varizes
23 21
Continuando com a pesquisa sobre fístulas artério-‐venosas (FAV) como causa de
varizes, em 1949, Pratt, descreveu uma síndrome Varizes arteriais, que, afirma,
ocorrem muito mais comumente do que se supõe, 24 % na sua casuística. Refere “Esta
situação deve ser suspeitada se as veias aparecerem rapidamente nas porções lateral
ou posterior das pernas, se o paciente for relativamente jovem, se houver aumento de
calor local e se as veias voltarem após a cirurgia da veia competente anterior... A
tendência destas varizes arteriais a recorrer parece inerente.”35
Piulachs, em 1953, afirmou depois de estudar de 157 casos “... chegámos à conclusão
que todas as veias varicosas, tanto idiopáticas quanto pós-‐flebíticas, são devidas a
uma patogenia inicial comum e começam em ambos os casos através da existência de
múltiplos canais artério-‐venosos congénitos de pequeno tamanho que estão presentes
em todas as pessoas, embora variando em número e tamanho... ”36.
Schalin, em 1953, publicou um estudo de varicosidades, localizou as FAVs por
termografia detetando o aumento do calor da pele sobre as varicosidades e fez a
dissecção microcirúrgica das varizes (n = 14) com conexão, tributárias venosas e
anastomoses artério-‐venosas, que foram observadas em microscopia de luz. Concluiu
que “1) FAVs para veias varicosas, comprovadas em cortes morfológicos, apresentam
uma via anatómica para explicar 2) a manutenção arterial de veias varicosas com
sangue quente, explicando o aumento do calor da pele sobre as varicosidades, 3) apoia
a teoria sugerida de enrolamento varicoso. 4) Não há explicação alternativa para
alterações endoteliais opostas ao orifício da comunicação artério-‐venosa.”37
Por fim, Kimura, em 1991, num estudo de 56 indivíduos, concluiu que “... houve
diferenças significativas entre as tensões oxidativas dos pontos quentes e das veias
femoral ou safena nos pacientes com varizes (p <0,01, p <0,05). Na operação, os
pontos quentes foram investigados por disseção operatória e microscopia. Foram
observadas pequenas artérias pulsantes nos locais que correspondiam aos pontos
quentes.”38 e todos nos fazem refletir sobre a causa das varizes.
No nosso país, António Coito (1921-‐2005), de Lisboa, em 1957, na tese de
Doutoramento, pronunciou-‐se sobre a etiopatogenia das varizes, referindo “As
válvulas são os elementos anatómicos que dão individualidade fisiopatológica ao
sistema venoso dos membros inferiores; as válvulas podem deixar de ser suficientes por
dilatação da parede da veia ou por destruição durante a recanalização do trombo, mas
Aspetos históricos das veias e varizes
24 22
as consequências fisiopatológicas são as mesmas;... “, conhecimentos estes baseados
na sua experiência39a.
O conceito de que era sempre a insuficiência das crossas que dava origem às varizes,
começou a ser posto em causa, por alguns autores. Destacamos Pereira Alves, de
Lisboa, que na tese de Doutoramento apresentada em 2001, mostra que “Na
insuficiência venosa superficial primária tudo começaria por um segmento venoso
superficial com refluxo: ponto inicial de refluxo... não sendo obrigatório haver refluxo
nas crossas... Estes segmentos venosos com refluxo seriam devidos a alterações
constitucionais da veia... Com o tempo e em função da sobrecarga... esta dilatação
progressiva ascendente e descendente, progrediria até pontos de comunicação com o
sistema venoso profundo: pontos distais de refluxo... ”40a e se estes não forem
corrigidos, dilatam-‐se outros segmentos venosos superficiais e perfurantes, que ficarão
insuficientes. “A hipertensão venosa iniciar-‐se-‐ia no sistema venoso superficial e seria,
a partir daí, transmitida às veias perfurantes e profundas, levando com o tempo à
insuficiência destes dois sistemas. O processo seria assim de fora para dentro, ou seja,
das veias superficiais para as profundas, e não o inverso, como considerado até
hoje.”40b Pereira Alves considera, fruto da sua experiência, que há refluxos (R) axiais e
segmentares e, dentro destes, três subtipos: R limitados aos ramos superficiais, Rs1; R
que envolve os ramos superficiais e igualmente segmentos venosos da safena, Rs2; R
41
Russell Mellor, de Londres, introduziu a genética na etiologia das varizes, quando, em
2007, mostrou que o funcionamento do gene FOXC2 é necessário para uma função
venosa normal, e mais especificamente para o desenvolvimento das válvulas e/ou a
sua manutenção em humanos. FOXC2 desempenha um papel importante no
desenvolvimento dos sistemas linfático e venoso, causando as mutações disfunção
daqueles sistemas. As vias e mecanismos pelos quais o FOXC2 atua no
desenvolvimento e manutenção das válvulas venosas, requerem futura elucidação42.
Em 2010, Ying Xiao, de Cantão, chegou à conclusão que a expressão do gene da
desmuslina é necessária para a manutenção do fenótipo das células musculares lisas
dos vasos (CMLV). A diminuição da expressão da desmuslina pode afetar a
diferenciação das CMLV e contribuir para o desenvolvimento de veias varicosas.
Aspetos históricos das veias e varizes
25 23
Também descobriu que a expressão da metaloproteinase (MMP)-‐2 se encontrava
significativamente aumentada em CMLV transfetadas com desmuslina43. Segundo
Krysa, de Dunedin, em artigo publicado em 2011, refere que “Deve ser considerado um
amplo estudo de associação genómica para ajudar a aprofundar a nossa compreensão
da base genética da doença venosa. Devido aos grandes tamanhos de amostra
necessários para a descoberta e validação, usando as novas gerações de tecnologias
moleculares, será importante formar grupos de colaboração para avançar com sucesso
no campo da genética das doenças venosas.”44.
Pratas Balhau (1952-‐), de Barcelos, em 2013, desenvolveu, na sua tese de Mestrado45,
um projeto experimental que teve como objetivo provocar varizes num modelo
animal, produzindo hipertensão numa veia em ortostatismo. Foi laqueada a veia
auricular intermediária da orelha esquerda de 18 coelhos gigantes Belier-‐francês,
servindo a direita de controlo. Verificou: dilatação da veia com espessamento da
parede, bem como áreas de atrofia da parede da mesma veia, para o mesmo corte
histológico; com alterações do endotélio; alterações na espessura da média da veia,
para a mesma secção transversal, bem como lúmens muito diferentes, muitas vezes
assimétrico e colapsado; a média exibia áreas de hipertrofia e áreas de atrofia;
algumas áreas revelaram redução de fibras musculares e alteração da orientação das
fibras, alterações idênticas às encontradas nas varizes humanas46.
Estavam colocados os problemas principais, as doenças da parede venosa e das
válvulas das veias. Nos últimos anos do séc. XX e nos primeiros do séc. XXI, estas
questões começaram a ser estudadas “à lupa”, ou seja, a pesquisa sobre a constituição
molecular das válvulas e da parede venosas detetou várias alterações nestas
estruturas, que CS Lim muito bem resumiu no artigo “Pathogenesis of primary varicose
veins”47. É, também, uma boa introdução ao papel das MMPs e dos seus inibidores
tissulares (TIMP), relacionadas com a adesão e ativação dos leucócitos e a atividade do
transforming growth factor beta one (TGF-‐β1), na parede venosa que levam à sua
fragilização, com consequente dilatação e formação de varizes. A estas questões
dedicou-‐se Pedro Serralheiro (1981-‐), pois sabendo que o TGF-‐β1 influencia
diretamente MMPs e TIMPs na parede venosa e, mais concretamente, na doença
venosa crónica, e que MMPs e TIMPs têm um papel importante na evolução desta,
resolveu aprofundar o conhecimento da sua fisiopatologia, fazendo o estudo genético
Aspetos históricos das veias e varizes
26 24
e imunohistoquímico das MMPs, TIMPs e dos recetores de TGF-‐β1, ao longo da
evolução da DVC. Concluiu que: “... as MMP9, MMP12, TIMP1 e TIMP2 são
influenciadas diretamente pelo TGF-‐β1, na parede venosa da veia grande safena.”48 e
foi o primeiro a demonstrá-‐lo; “... existem aparentemente duas fases de ação das
MMPs e TIMPs, ao longo da evolução da DVC, que o TGF-‐β1 parece não influenciar em
estádios avançados, ao contrario do que acontece em estádios mais precoces.”49, 50
Quanto ao DIAGNÓSTICO, se definimos varizes como veias dilatadas e tortuosas, o
primeiro é feito pela observação clínica. Podemos então dizer que o primeiro a fazer o
diagnóstico foi Sushruta, pelo séc. VI aC, quando refere no seu tratado a passagem já
referida “... uma formação nodosa em relevo que se chama Sirà-‐Granthi... ”3
A primeira manobra para demonstrar o refluxo foi descrita por Tommaso Rima, em
1806, “... em todos os indivíduos afetados por escassas varizes em suas pernas
mostravam-‐se evidentes que na mudança de posição do corpo de horizontal para
vertical, o sangue poderia ser visto a partir do crural na grande safena de cima para
baixo preenchendo os vários ramos menores do membro... O sangue comprimido da
coluna que gravita acima dela na parte superior está sempre pronto para descer, assim
que for removida a obstrução temporária, ou seja, a ligadura... ”31b, ou seja, percursora
da prova, mais tarde chamada de Brodie / Trendelenburg.
Em 1824, Paul Briquet, de Paris, fez uma tese de Doutoramento Dissertation sur la
phlébectasie, onde aponta uma manobra para diagnóstico “Outras vezes, dando com o
dedo, numa veia safena grande e varicosa ao longo do comprimento do membro, um
golpe seco na parte superior da coxa, vemos a ondulação propagar-‐se até ao meio da
perna, e o fluxo ser percetível ao toque.”32a, em tudo idêntica à sugerida por Schwartz,
em finais do séc. XIX.
Benjamin Brodie, em 1846, relatou um teste para confirmação de variz por refluxo de
válvulas incompetentes “Descobri, ao retirar o curativo, o paciente estava na postura
erecta, que o conjunto de veias abaixo preenchia muito devagar e apenas dos vasos
capilares. Mas se, com o paciente na postura ereta, remover a pressão na veia, as
válvulas sendo inúteis, o sangue precipita-‐se para baixo pelo seu próprio peso, ao
contrário do curso da circulação, e enche o aglomerado varicoso abaixo quase
instantaneamente.”33b, que ficou com o seu nome e de Trendelenbourg, que o
Aspetos históricos das veias e varizes
27 25
vulgarizou. Só em 1896, Georg Perthes (1869-‐1927), descreveu a manobra para estudo
da permeabilidade do sistema venoso profundo51.
John Homans (1877-‐1954), de Boston, em 1916-‐17, descreveu o sinal, que ficou com o
seu nome, para diagnóstico da TVP “Os músculos da barriga da perna, entre os quais a
trombose começa, muitas vezes resistem à dorsiflexão do pé, com ou sem desconforto
por trás do joelho – sinal da dorsiflexão.”52a
Só no séc. XX começaram a surgir outros meios complementares de diagnóstico: em
1923, Berberich e Hirsch, relataram a primeira flebografia com brometo de
estrôncio53; um ano depois, Sicard e Forestier, pela primeira vez utilizaram Lipiodol
para fazer a flebografia5, muito útil para diagnóstico da trombose venosa profunda
assintomática (pós-‐operatória); em 1929, McPheeters e Rice realizaram a primeira
varicografia5; Ratschow, em 1930, introduziu a angiografia com contraste solúvel em
água5. Merece referência especial João Cid dos Santos (1907-‐1975), de Lisboa, que em
1937, num extenso artigo A flebografia (Lisboa: Centro Tipográfico Colonial, que não
conseguimos consultar), traduzido para francês em 1938, La flebographie directe,
sugeriu realizar a flebografia, não só ascendente, mas também descendente, com o
doente em pé, por via retrógrada, aproveitando a gravidade, para melhor detetar as
insuficiências valvulares. Nas suas conclusões, descreve as patologias onde esta técnica
poderá dar indicações, como “... origem das varizes; extensão da rede varicosa;
circulação venosa nas extremidades varicosas; estudo das afeções venosas
congénitas.”54, para só mencionar as que se referem a varizes. Com este autor
concorda um seu discípulo, António Coito, quando, em 1957, considera que “... a
flebografia vertical permite um melhor estudo das válvulas e para apreciar o seu
estado funcional deve empregar-‐se a técnica descendente com a manobra de Valsalva,
durante a injeção do contraste;...“39a, apesar de ter dado importante contributo para a
flebografia ascendente, quando sugeriu a aplicação do garrote inframaleolar, que
permitiu melhor visualização dos sistemas tibial posterior e peroneal39b. Aproveitando
estes estudos de Cid dos Santos, Gunnar Bauer, em 1941, demonstrou por flebografia
a relação entre trombose e úlcera e o local da trombose, o efeito da anticoagulação na
TVP e, em 1942, a importância do estudo flebográfico na síndrome pós-‐trombótica55.
Não podemos deixar de referir que J Salvador Marques, de Lisboa, outro pupilo de
João Cid dos Santos, foi o primeiro que demonstrou, através de estudo
Aspetos históricos das veias e varizes
28 26
esteroflebográfico, que em cerca de 20 % dos casos que estudou “As varizes essenciais
da safena interna não são sempre originadas pela insuficiência valvular da
crossa.”102 Isto quer dizer que não se justifica fazer a laqueação da junção
safenofemoral, se esta não é refluxiva. Este conceito, pioneiro na altura, foi pouco
valorizado e, por rotina, na operação às varizes era efetuada a laqueação alta da veia
grande safena. Só mais tarde, com a utilização do ecoDoppler, alguns autores, entre os
quais Pereira Alves, fizeram demonstração daquela variação e sugeriram alteração do
procedimento, como referiremos mais à frente.
Em 1842, o matemático e físico Christian Doppler (1803-‐1853), em Praga, apresentou
um trabalho Über das farbige Licht der Doppelsterne und einiger anderer Gestirne des
Himmels56 (Sobre a luz colorida das estrelas duplas e outras estrelas do céu) sobre um
método de determinação das ondas de frequência, que determinado corpo emite, e a
sua tradução em cores quando se aproximam ou afastam do observador, que ficou
conhecido como Efeito Doppler. Foi um grande avanço qualitativo no estudo das
doenças venosas e, porque se trata de um método de estudo venoso não invasivo,
rapidamente foi utilizado, “destronando” a flebografia. Polly Feigl, de Minnesota, em
1968, publicou o primeiro artigo sobre a utilidade do ecoDoppler no diagnóstico das
doenças venosas dos membros inferiores57, Claude Franceschi de Paris, em 1977,
vulgarizou o ecoDoppler para estudo da patologia venosa58, e, como veremos mais à
frente, utilizou-‐o para tratar varizes, e Alfred Persson, de Boston, com Edward R
Jewell, de Burlington, demonstraram as vantagens deste método em relação à
venografia59.
Pereira Alves considera que o ecoDoppler deve ser um exame obrigatório para estudo
pré-‐operatório dos doentes com IVC e os dados por ele fornecidos “... podem vir a
permitir uma cirurgia das varizes adaptada ao tipo dos refluxos.”40c, sendo,
atualmente, imprescindível para estudo e tratamento da insuficiência venosa crónica,
nomeadamente, das varizes.
A partir de 1980 foram introduzidas a TAC e a RM para avaliação dos vasos profundos
dos membros inferiores, mas também para diagnóstico da tromboembolia pulmonar, a
TAC 3D para avaliação pré-‐operatória de varizes e a RM com venografia5.
Aspetos históricos das veias e varizes
2927
Quanto ao TRATAMENTO das varizes, foi ainda, o indiano Sushruta o primeiro a
pronunciar-‐se, quando refere “No caso de ser desigual e ligeiramente doloroso, pode
ser curado apenas com grande dificuldade. Considerando que um caso em que a
formação nodular é indolor, fixa, grande e situada em qualquer das partes vitais do
corpo (Marmas), deve ser considerada incurável.”3
Só quase 300 anos depois, Hippocrates, o primeiro a pronunciar-‐se quanto ao
tratamento cirúrgico das varizes, preconizava múltiplas pequenas incisões nas veias
varicosas “Mas a variz, propriamente dita, deve ser perfurada em muitos locais, como
as circunstâncias indicarem.”7c e aplicação de ligadura firme no membro, procurando,
assim, gerar uma lesão venosa, que promovesse a oclusão da veia varicosa.
Vários autores consideram que o primeiro relato de uma operação às varizes, realizada
por cirurgião desconhecido cerca de 105 aC, foi feito por Plutarco, na Vida de Caius
Marius (157-‐86 aC), general e cônsul romano. Conta Plutarco “Marius elogiado tanto
pela temperança quanto pela resistência, dos quais ele deu um exemplo decidido em
uma operação de cirurgia. Por ter, como parece, ambas as pernas cheias de grandes
varizes (tumores), e não gostando da deformidade, determinou colocar-‐se nas mãos de
um operador; quando, sem ficar amarrado, esticou uma das pernas, e silenciosamente,
sem mudar de semblante, sofreu os maiores tormentos no corte, nunca vacilando ou
reclamando; mas quando o cirurgião foi à outra, ele recusou-‐se a fazê-‐lo, dizendo:
“Vejo que a cura não vale a dor.””60
Mas, Celsus (25 aC-‐50), de Roma, no início do séc. I, embora não tenhamos a certeza
de que tivesse sido médico, foi um dos primeiros a operar veias varicosas,
aconselhando a cauterização, para as veias doentes, mas ainda pouco tortuosas, e o
corte, para as varicosas, sugerindo “A pele subjacente é incisada, depois a veia exposta.
As margens da pele são mantidas afastadas por ganchos; com um bisturi a veia é
separada do tecido circundante, evitando um corte na própria veia; por baixo da veia é
passado um gancho rombo; o mesmo procedimento é repetido a intervalos de quatro
dedos travessos, ao longo do curso da veia que é facilmente delineado puxando o
gancho.”61, técnica, em muito, semelhante à flebectomia em ambulatório que hoje se
executa.
Galeno, foi um dos primeiros a defender a necessidade de tratar a causa da afeção
para lograr a sua cura, nomeadamente no caso de úlceras da perna62. Vários autores
Aspetos históricos das veias e varizes
30 28
relatam que Galeno usava um gancho rombo63a entre duas ligaduras para extirpar
veias dilatadas, mas nenhum indica onde colheu esta informação.
Oribasius (320-‐403), de Pergamo, para além da tática cirúrgica, foi o primeiro a referir-‐
se à preparação pré-‐operatória, quando disse “1. A resseção de veias é preferível à
ligadura, o que pode causar novas varizes; 2. Tricomize e lave o membro (com água
quente) antes de operar; 3. Enquanto o membro ainda estiver quente, marque as
varizes na pele com o doente em pé; 4. Excise as veias da perna, antes das da coxa; 5.
Remova os coágulos sanguíneos (hematomas) por pressão no membro operado.”64
Segundo Friedman65a, os santos Cosme e Damião foram os primeiros a tentar uma
anastomose vascular, para “reimplantar” a perna de um etíope que tinha morrido, e a
fim de substituir a que tinham amputado a um servo da igreja, porque tinha um tumor.
Este autor é o único que o refere, pois em toda a bibliografia e relatos históricos
conhecidos, aquele ato é considerado um milagre. Uniram o membro do “dador” ao
coto do “recetor” e ficou feita a “transplantação”.
Ainda segundo Friedman65b, Aetius (502-‐575), de Amida, na Mesopotâmia, foi o
primeiro a aconselhar a laqueação das veias varicosas, para tratamento.
No Período Negro da história, Trevas da Idade Média, Dark Ages, -‐ do séc. V, com a
queda do Império Romano, até ao séc. XV, com o Renascimento, genericamente
correspondente à Idade Média -‐ pouca progressão do conhecimento se verificou, tanto
na arte como na literatura. Na medicina, as opiniões de Galeno, nomeadamente
quanto à etiologia das doenças e da anatomia, mantiveram-‐se até Vesalius ter
começado a sua contestação. A cirurgia, teve algumas exceções. Foram os três autores
que se seguem.
Paulus Ægineta (625-‐690), grego de Egina, aluno de Alexandria, era adepto da Teoria
dos Humores, e sobre as varizes dizia “Na maior parte das vezes a sua origem deriva de
um humor melancólico.” Foi o primeiro a descrever a marcação prévia das veias a
excisar, com o doente em pé, e a sugerir a laqueação “alta” da grande safena. Depois
de lavar o membro e aplicar ligadura na região superior da coxa, pedia ao doente para
caminhar e “... onde a veia está distendida, fazemos uma incisão sobre a marca com
um bisturi... ; e separando os lábios da ferida com ganchos e dissecando as membranas
com dissetor curvo63b,... e desnudamos a veia e libertamo-‐la a toda a volta, tiramos a
ligadura da coxa e tendo levantado o vaso com um gancho cego e introduzido debaixo
Aspetos históricos das veias e varizes
3129
dela uma agulha com fio duplo, cortamos o duplo e, abrindo a veia, no meio com uma
lanceta, evacue tanto sangue quanto seja necessário...”66, ou seja, defendia a
laqueação com ou sem excisão da veia e a sangria ou flebotomia.
Para Albucassis (936-‐1013), de Córdova, as “Varizes são veias grossas cheias com
excesso de melancolia...” e sugeria, no ano 1000, após a preparação do membro,
esquematicamente: desde o tornozelo à virilha, incisão da pele por cima da veia,
passar sonda por baixo, levantar a veia com gancho, outra incisão três dedos acima,
isolamento e secção da veia, disseção para excisão pela incisão inferior e assim
sucessivamente, até tirar toda a safena. Mostrava, ainda, imagens dos dissetores que,
sugeria, deviam ser utilizados67. Esta técnica não difere muito da safenectomia
parcelar sequencial, que, ainda hoje, alguns cirurgiões praticam.
O terceiro autor do Período Negro foi Guy de Chauliac (1298-‐1368), de Avignon, que,
em 1363, preconizava a cura das varizes para tratar a úlcera e, para extirpar a grande
safena, como Albucassis, sugeria dois métodos. O primeiro, “A incisão é assim feita:
tendo ligado a coxa até ao joelho, a veia é cortada e aberta em dois ou três lugares,
depois pressionando e conduzindo o sangue para os lugares abertos, tanto quanto for
possível, será extraído” e o segundo “... ligando a coxa até ao joelho,... incisando a pele
nos locais das varizes... que se apanha a veia com crochets, sem que seja aberta: e
puxa-‐se de modo a que seja arrancada de alto a baixo.”14b Preferia a primeira técnica,
mas Franceschi bem se pode ter baseado na segunda, para, com ajuda do ecoDoppler,
descrever o método que ficou conhecido por CHIVA68, só publicado, cerca de 600 anos
depois, em 1985.
Assim, Ambroise Paré preconizou dois tipos de tratamento das varizes; por isolamento
e laqueação da veia (mas não a sua secção, por receio de hemorragias22c), fazendo, se
necessário, sangria da “quantidade indicada”; e utilizando a cauterização em cima
(junto à junção safeno-‐femoral?) e em baixo (junto ao maléolo?), “... que rói e corta a
veia: então retira-‐se para cima e para baixo: e por este meio permanece um espaço
vazio, onde depois nasce a carne; e depois a cicatriz que será dura e espessa, impedirá
o fluxo bloqueando a passagem da referida veia.”22c, completando, sempre, com
ligadura compressiva, que abranja toda a perna (do pé ao joelho). Parece um tipo de
safenectomia, por stripping parcelar, mas nenhum autor o apresentou como pioneiro
desta técnica.
Aspetos históricos das veias e varizes
32 30
O parisiense Pierre Dionis, preconizou “Entendemos pela palavra varizes veias
dilatadas que exigem uma operação para as curar , que se chama kirsotomie , que
deriva de kirsos, que significa variz , & de tomnin , que quer dizer cortar porque
consiste numa abertura que se faz nessas varizes ou veias dilatadas & engurgitadas.”,
No seu tratado Cours d’opérations de Chirurgie, publicado em 1708, apresenta três
métodos de tratamento: aplicação de remédios adstringentes, para fortalecer as
paredes da veia; aplicação de ligadura no membro ou botina de gros linge ou pele de
cão (como a preconizada por Wiseman); e o terceiro, a abertura da veia para a
esvaziar. Prefere o segundo método, mas teve muito bons resultados com a aplicação
de adstringentes e ligadura, que considerava ter um papel importante na cura28a, pois
já era conhecida e aceite a teoria da gravitação universal, revelada por Newton, nos
finais do século XVII.
Everard Home (1756-‐1832), em 1797, descreve nove casos de tratamento de úlceras
venosas com laqueação da safena acima daquela, conseguindo a sua cura69a. Também
tratou safenas doentes sem úlcera, conseguindo em três casos que apresenta, redução
das dores e do edema do membro69b.
Tommaso Rima, ainda em 1806, defendeu a laqueação alta da grande safena “O
sangue que desceu da grande safena encontrou na ligação um obstáculo que não
podia ser superado.”31c
Segundo Loudon, Brodie propunha, em 1816, introduzir uma lâmina de bisturi
perpendicularmente à pele, junto à veia a tratar, e rodá-‐la para seccionar a veia69, e a
ferida geralmente cicatrizava após alguns dias. No entanto, às vezes seguia-‐se uma
flebite grave e Sir Benjamin dizia que “embora as veias geralmente curem sem ficarem
obliteradas; e no caso do ramo ficar obstruído, outros tomaram seu lugar e não se
obteve nenhum benefício."33c, estranhando que não se verificassem flebites, quando se
laqueavam veias, em amputações.
Alfred Velpeau (1795-‐1867) em 1838, por via percutânea, com uma agulha curva,
introduzia um fio rodeando (entrava por baixo e saía por cima), por dentro da pele, a
veia a laquear e dava o nó fora (nó em ∞)70 ou “... introduzir um estilete ou agulha
através da pele, que é passada por baixo da veia e em ângulo reto. Aplica-‐se uma
sutura em volta das duas extremidades do estilete, de modo a comprimir a veia o
suficiente para produzir obliteração... “5
Aspetos históricos das veias e varizes
3331
Max Schede (1844-‐1902), de Hamburgo, pioneiro da antissepsia na Alemanha, em
1877, sugeriu múltiplas laqueações percutânea das varizes71 e Otto Madelung (1846-‐
1926), de Strasbourg, em 1885, a excisão total da grande safena e colaterais varicosas,
“a céu aberto”, com grandes incisões sobre todo o comprimento da grande safena,
técnica que foi abandonada, pois o próprio Madelung teve mortes por hemorragia, no
pós-‐operatório71.
Friedrich Trendelenburg (1844-‐1924), de Leipzig, em 1890, 11 séculos e mais de 80
anos depois, “reanimou” as operações sugeridas por Paulus Ægineta e Tommaso Rima,
respetivamente, propondo a laqueação “alta” da grande safena. Mas para
Trendelenburg, este “alta”, era na união do terço médio com o terço inferior da coxa,
pois tinha medo das hemorragias se a abordasse na virilha72. Também utilizou o
método de laqueação e excisão da safena, aconselhado por Albucassis, no séc. XI, e
aplicou-‐o às colaterais. Vulgarizou o teste, já descrito por Benjamin Brodie, para o
diagnóstico de varizes.
Em 1896, Jerry Moore (1859-‐1927)72, de Melbourne, e, segundo António Coito, Pierre
Delbet (1861-‐1957)39c (bibliografia que não conseguimos consultar), de Paris, em 1897,
alteraram o método de Trendelenburg, e propuseram, realmente, a laqueação alta da
grande safena, junto à junção safeno-‐femoral, com anestesia local, reconhecendo o
papel do refluxo na patogénese das varizes. Se, como se pensava na época, a
insuficiência valvular começa pela válvula junto à junção safenofemoral, o tratamento
mais eficaz será laquear a grande safena, o mais alto possível, excisando esta e as veias
doentes.
Começaram a surgir técnicas de safenectomia: por stripping invaginante (interno),
introduzida em 1905, por William Keller (1874-‐1959), de Chicago, no que foi seguido
por Charles Mayo (1865-‐1939), de Rochester, em 1906, com um fleboextrator em anel
(externo), e, em 1907, por William Babcock (1872-‐1963), de Philadelphia, com um
dispositivo mais maleável, endoluminal73.
Segundo Caggiati e Allegra5, em 1920, Cole sugeriu limitar a safenectomia à coxa,
método, que quando indicado, ainda hoje é recomendado.
Em 1908, surgiu a operação de Rindfleisch-‐Friedel, tentativa para tratar, para além da
grande safena, as colaterais varicosas74, mas os graves problemas de cicatrização, com
Aspetos históricos das veias e varizes
34 32
pós-‐operatórios complicados e o terrível resultado estético, rapidamente a eliminaram
das alternativas a considerar no tratamento das varizes.
John Homans, no Tratado de Cirurgia, que publicou em 1931, refere que, embora a
tendência para cura das varizes seja a “... injeção de esclerosante químico... ”
(referindo-‐se, muito provavelmente, à sugestão que Unger apresentou em 1927 e foi
abandonada pelas complicações que causava) o tratamento deve ser “Secção da
grande safena na virilha, de preferência, sob infiltração anestésica local,... que deve
ser laqueada e seccionada onde se junta à femoral... Alguns cirurgiões preferem fazer
uma laqueação preliminar da safena na região do joelho... e uma injeção retrógrada
dum esclerosante químico pode ser efetuada pela incisão superior... “52b, apontou as
varizes como causa de úlcera da perna (“varicose” ulcer)52c, assim como a TVP52d, logo
a causa da úlcera será a trombose.
João Cid dos Santos, em 1937, aponta como vantagens da flebografia direta as suas
consequências terapêuticas “... controlo das terapêuticas esclerosantes; emprego das
soluções de contraste como agentes de esclerose; finalmente, utilização da injeção
retrógrada com estase como método terapêutico não esclerosante no tratamento das
consequências das flebites – eczemas e úlceras.”54
Para o seu discípulo António Coito, em 1957, “... ao efectuar a laqueação da crossa da
safena interna, da crossa da safena externa e das veias comunicantes, é fundamental
obter uma boa exposição da veia profunda correspondente, de modo a interromper
todas as ligações entre o sistema venoso profundo e o sistema venoso superficial, em
cada um desses níveis.”39d
Thomas Myers, em 1955, aperfeiçoou o stripper endoluminal flexível74 e Robert
Muller (1919-‐2012), dermatologista de Berna, em 1966, descreveu a sua técnica
cirúrgica de tratamento das varizes por pequenas incisões com flebectomias
segmentares -‐ técnica chamada de "flebectomia de Muller" ou miniflebectomia75. Em
ambulatório e com bons resultados estéticos, foi adotada por todos os cirurgiões.
Teixeira Diniz (1926-‐)76, em 1979, é perentório quando afirma que devem ser
laqueadas todas as colaterais da grande veia safena, aquando da sua laqueação alta,
pois “Um desses afluentes, por pequeno que seja, deixado, inadvertidamente,
submetido às hiperpressões, dilatar-‐se-‐á e será a causa de uma recidiva da situação
varicosa através de veias colaterais que irão estabelecer a comunicação do coto da
Aspetos históricos das veias e varizes
35 33
crossa com o tronco da safena no terço superior da coxa. No caso de ter sido feita uma
safenectomia (stripping) a recidiva far-‐se-‐á através da rede superficial da coxa.”. Esta
opinião foi seguida por todos os cirurgiões, até aparecerem os meios de tratamento
endovasculares que fazem a destruição da grande safena a partir de cerca de 2 cm da
junção safenofemoral.
Claude Franceschi (1942-‐), cientista francês, em 1985 descreveu pela primeira vez a
Cura CHIVA68, já atrás mencionada, publicando quatro anos depois o seu trabalho.
Consiste em marcar, pré-‐operatoriamente, os segmentos refluxivos com ajuda do
ecoDoppler, e laqueá-‐los com anestesia local.
Em 1993, Andreas Oesch (1945-‐), de Berna, descreveu o pin-‐stripping -‐ invertido e
retrógrado77.
Para tratamento dos troncos venosos surgiram métodos endovasculares, a ablação
termal por radiofrequência (RF)78 e laser, que receberam a aprovação da FDA,
respetivamente em 1999 e em 200279.
Com a ajuda do ecoDoppler, entre outros autores, Pereira Alves, em 2012, após
classificar os refluxos em axial e segmentar, propõe, nestes, flebectomias de colaterais
varicosas, preservando a grande safena, reservando a cirurgia clássica para as varizes
com refluxo axial41. Em 2016, confirmou este conceito, após seguimento de doentes
operados durante 12 meses, respondendo com um Sim. Podemos! à pergunta
Podemos preservar a GVS quando o refluxo é segmentar?80, concordando com
Salvador Marques, atrás referido.
Se as perfurantes podem ser causa de varizes e úlceras, é porque são insuficientes,
logo devem ser laqueadas. Foi a ideia inicial quando, em 1938, Robert Linton (1900-‐
1979), depois de um excelente trabalho de disseção anatómica dirigida, propôs a
técnica que ficou conhecida com o seu nome, para laquear as perfurantes insuficientes
dos grupos medial, anterior e lateral da perna. Mas a incisão proposta é muito extensa
“... do nível do limite inferior do maléolo medial,... até logo abaixo da extremidade
superior da tíbia... “81, com problemas de cicatrização e estéticos, embora eficaz na
resolução dos problemas.
Também depois de excelente trabalho de disseção de membros de cadáver e estudos
venográficos, Frank Cockett (1916-‐2014), de Londres, fez a proposta seguinte para
tratamento das perfurantes, por incisão mais curta que a sugerida por Linton. Em
Aspetos históricos das veias e varizes
36 34
artigo publicado em 1955, refere “A tese de que as úlceras venosas e a induração da
perna são geralmente devidas à destruição das válvulas nas veias perfurantes do
tornozelo é apresentada e apoiada por evidências clínicas, venográficas, anatómicas e
experimentais. Com base nesta tese, é descrita uma operação para a laqueação
extrafascial dessas perfurantes insuficientes e excisão da úlcera (se presente).”82
Obteve bons resultados, nos 201 membros que operou. Algumas vezes tentou
melhorar o aporte arterial ao membro, fazendo simpaticectomia lombar. Harold Dodd
(1899-‐1987), de Londres, em 1964, pouco alterou a técnica proposta por Cockett, que
termina dizendo “A laqueação das veias perfurantes deficientes no tornozelo é o
remédio mais efetivo que requer precisão anatómica (ou seja, exposição clara da tíbia
e peróneo), assepsia, hemostasia e gentileza.”83
De Pereira Alves, já referimos atrás, o conceito que a hipertensão venosa pode
começar no sistema superficial e só depois passar ao profundo, pelo que sugeriu, em
2001, “A confirmar-‐se como correto, este conceito iria ter como importante implicação
a possibilidade de uma cirurgia precoce sobre a insuficiência superficial evitar a
insuficiência nos sistemas perfurante e profundo.”40c, mas, até agora, ainda não foi
demonstrado. Nesta opinião, estava acompanhado por Sidney Rose (1917-‐2014), de
Manchester84.
A laqueação subfascial das perfurantes, atrás referida, para obviar as complicações da
cicatrização das feridas, que aumentam o, já por si grande, tempo de internamento,
evoluiu para a endoscopia (SEPS). É um procedimento minimamente invasivo,
introduzido por Hauer, em 19855, depois desenvolvido por Fisher e Mozes, que no
artigo publicado em 199685, fazem uma boa revisão da anatomia e objetivos da
técnica. Entre nós tem sido CE Costa Almeida (1980-‐), de Coimbra, um grande
divulgador deste método, que, para além de um curso anual promovido pelo seu
serviço (Serviço de Cirurgia C dos CHUC, Diretor: Prof. Doutor Costa Almeida), onde
ensina a técnica, tem artigos publicados sobre o tema86, 87, nos quais mostra a sua
casuística e as vantagens desta técnica.
A cirurgia da disfunção venosa foi evoluindo e, para só citar alguns autores, em 1953,
Eisemann e Malette propuseram a primeira tentativa para restauração da função
valvular, produzindo estruturas tipo-‐válvulas juntando pregas em dois locais da parede
venosa à frente um do outro5. Palma, de Montevideo, em 1958, descreveu, para
Aspetos históricos das veias e varizes
37 35
tratamento da síndrome pós-‐flebítica, a técnica de anastomose safenofemoral
contralateral88 e Palma e Esperon o enxerto femorofemoral cruzado para a oclusão da
veia ilíaca89. Robert Kistner, em 1968, foi o primeiro a reconstruir válvulas (Vs) do
sistema venoso profundo90, tendo sugerido várias técnicas, nomeadamente a
valvuloplastia externa91. Em 1982, Taheri descreveu a transferência de um segmento
de veia axilar para corrigir Vs insuficientes, aplicável na síndrome pós-‐trombótica92. A
evolução foi muito grande até Corcos, que, em 1997, propôs reconstruir uma válvula
monocúspide a partir de um retalho de íntima93 e Raju, em 1999, a valvuloplastia
transcomissural94. Em 2006, Oscar Maleti, cirurgião em Modena, ensaiou também Vs
bicúspides e considerou os resultados animadores, porque, embora não tivesse
conseguido abolir todo o refluxo, foi possível diminuí-‐lo o suficiente para obter um
alívio acentuado nos sintomas95.
Em medicina e, nomeadamente, em cirurgia, uma técnica só dá bons resultados se for
aplicada nas indicações corretas e por quem tem experiência em a executar. Foi o caso
da que acabámos de referir e é o da escleroterapia para tratar as varizes e perfurantes
insuficientes. O relato da evolução histórica deste método, neste caso é exceção, pois
foi escrita por quem vos vai falar, nesta monografia, sobre esta técnica, Pratas Balhau.
Aconselhamos, aos colegas que queiram iniciar-‐se nesta técnica, a leitura da
monografia Esclerose química das varizes, coordenada por este autor, editada em
2006, pelo Capítulo de Cirurgia Vascular da Sociedade Portuguesa de Cirurgia.
O primeiro exemplo que se conhece é o de Elsholtz que, em 1667, na obra Clysmatica
Nova, relata o caso de um soldado portador de úlcera da perna muito antiga e rebelde,
curada, quase milagrosamente, após uma “infusão” de tanchagem praticada numa
veia da perna, vizinha da úlcera. Na época, não foi encontrada uma explicação
minimamente correta para esse facto.
No século XVII, após a descrição da circulação sanguínea feita por William Harvey em
1628, dois homens excecionais, Sir Christopher Wren, artista, arquiteto e astrónomo,
e Robert Boyle, químico bem conhecido, juntaram a sua inteligência e imaginação
para, não sendo médicos, contribuírem decisivamente para dotar a medicina dum dos
seus instrumentos mais notáveis: a agulha oca. Num cão imobilizado sobre uma mesa,
isolaram uma das veias superficiais da pata e com uma lanceta praticaram nela uma
pequena abertura, por onde introduziram um tubo ligado a uma seringa para clisteres,
Aspetos históricos das veias e varizes
38 36
fixando tudo com uma ligadura. Injetaram então uma solução quente de ópio, e o
animal evidenciou os efeitos da droga – primeiro indivíduo na História drogado por via
intravenosa!
Ainda no século XVII, há notícia de “infusões” venosas com a ajuda de uma bexiga de
porco ligada a um osso de galinha oco talhado em bisel. Essas infusões consistiam em
introduzir numa veia (geralmente do braço, mas por vezes também da perna) soluções
destinadas a agir sobre o estado geral do indivíduo e que provocavam muitas vezes um
“choque” devido à causticidade do produto, à sua toxicidade ou à sua não-‐esterilidade.
E por essa altura, e por esse mesmo método, um ajudante de caça de um nobre
alemão entretinha-‐se a embriagar cães com vinho e aguardente infundidos
diretamente na circulação...
Monteggia, cirurgião italiano, em 1813, sugeriu a ideia de “coagular o sangue” dum
aneurisma, introduzindo no saco um coagulante: álcool, acetato de chumbo ou tanino.
O cirurgião de Lyon, Charles Gabriel Pravaz resolveu também, em 1841, “trombosar”
os aneurismas arteriais. Para tal efeito aperfeiçoou a seringa de injeção e inventou
uma agulha em aço. Os seus ensaios saldaram-‐se por insucessos; contudo, no mesmo
ano, os seus alunos aplicaram o método às varizes, com injeções de uma solução de
percloreto de ferro, obtendo alguns resultados, embora pobres. Tentaram outros
esclerosantes, como o iodo tânico, mas os resultados melhoraram muito pouco.
A explicação destes insucessos foi encontrada por Delore, que afirmou, em 1894, no
Congresso de Cirurgia de Lyon, que o efeito durável do esclerosante não residia
unicamente na formação do trombo, mas também na lesão do endotélio varicoso
conseguida.
O reaparecimento do interesse pela esclerose de varizes remonta à primeira guerra
mundial. A mistura das populações favoreceu a propagação das doenças venéreas
como a sífilis. Tratava-‐se esta, nesse tempo, com numerosas injeções intravenosas de
Novarsénobenzol, as quais tinham o inconveniente de levar a uma esclerose das veias
dos braços. Na falta destas, o médico alemão Karl Linser recorria às injeções nas veias
varicosas dos membros inferiores. E obtinha, casualmente, a sua esclerose. Daí nasceu-‐
lhe a ideia de utilizar sistematicamente este efeito para o tratamento de varizes. Com
esse objetivo, a partir de 1916 injetou sublimado, a 0,5 e a 1 %, e, mais tarde, uma
solução hipertónica de cloreto de sódio.
Aspetos históricos das veias e varizes
39 37
Ao mesmo tempo e por motivos idênticos, Jean Sicard, em 1919, fazia as mesmas
constatações e aplicava o mesmo princípio no tratamento das varizes. Utilizou,
inicialmente, uma solução de carbonato de sódio, mas como os seus resultados não o
satisfaziam, mudou para uma solução hipertónica de salisilato de sódio. Linser e Sicard
tornaram-‐se, assim, os pais do tratamento esclerosante atual.
Os discípulos destes dois pioneiros, desenvolveram este procedimento terapêutico.
Depois de 1920, o sucesso da esclerose de varizes foi tal que, entre as duas guerras
mundiais, a cirugia venosa foi completamente apagada. Raymond Tournay, o aluno
mais conhecido de Sicard, afinou cada vez mais esta técnica e as suas indicações.
Efetuou a primeira expressão das retenções hemáticas intravaricosas. Formou uma
verdadeira escola, cuja experiência foi narrada no livro “La sclerose des varices”
publicado em 1972 e reeditado numerosas vezes.
Nos países germanófonos, a esclerose foi lançada por numerosas publicações e várias
edições do livro “Varizen, ulcus cruris und thrombose”, a primeira em 1976, de Karl
Sigg, e foi assim conhecida por muitos médicos. Mas, contrariamente a Raymond
Tornay, Sigg recusava toda a indicação cirúrgica, e tratava por conseguinte, mesmo as
varizes de grande calibre, por uma técnica própria que não se impôs fora dos países de
língua alemã.
William George Fegan, irlandês, deixou o seu nome indelevelmente ligado à esclerose
com compressão elástica, tal como hoje se pratica.
A bibliografia encontra-‐se no capítulo correspondente.
Quanto à contenção nos membros inferiores, encontrámos figuras humanas com
ligaduras nos membros inferiores, do período Neolítico, 10000-‐3000 aC (Fig. 4)96, em
gravuras nas grutas de Tassili, na Argélia, provavelmente com fins rituais, mas também
terapêuticos.
Hippocrates (395 aC) sugeria efetuar contenção com dupla ligadura de linho para fazer
uma compressão firme, após aplicar um penso com várias ervas e vinagre7, Celsus após
a excisão das varizes preconizava “Depois que a perna foi assim liberada por todo o
lado, as margens das incisões são juntas e um gesso aglutinante é colocado sobre
elas.”61 e Galeno, descreveu ligaduras de lã, linho e couro. Para Henry de Mondeville
(1260-‐1316), em 1312, era importante aplicar ligaduras na perna, para tratar as úlceras
“... porque ela repele e ostiliza os humores nocivos em que a perna e a úlcera estão
Aspetos históricos das veias e varizes
40 38
embebidas;... ”97. Guy de Chauliac, em 1363, depois de tratar as varizes, sugeria
“Depois a ferida deve tratar-‐se com lã encharcada em óleo e vinho, até à cura.” ou
ligaduras de linho, com aplicação dum esparadrapo de óxido de chumbo, sulfato de
alumínio e potássio, azeite e água14b, semelhante à ligadura que Unna apresentou mais
de 500 anos depois.
Fig. 4 -‐ Gravura rupestre das grutas de Tassili, Sahara, Argélia, onde se veem ligaduras nas
pernas do guerreiro(?). Foi Wiseman, em 1676, que idealizou e construiu o primeiro dispositivo para
contenção venosa da perna, feito em pele, que podia exercer vários graus de
compressão, porque tinha atacadores, precursor das atuais meias elásticas72 (Fig. 5).
Fig. 5 -‐ Dispositivo para contenção dos membros inferiores, em pele -‐ Wiseman, 1676.
Aspetos históricos das veias e varizes
41 39
Em 1708, Pierre Dionis (1643-‐1718), no seu tratado Cours d’Operations de Chirurgie, já
atrás referenciado, dedica o Capítulo VII às ligaduras, descrevendo, com pormenor, o
material de que devem ser feitas e a maneira de as colocar. Na pág. 48, refere “... &
quando se aplica na perna, começa por uma atadura (volta) passando em primeiro
lugar debaixo do pé, & subindo rastejando para a parte superior da coxa... ”28b, técnica
que ainda hoje é aplicada.
Lorenz Heister (1683-‐1758), de Helmstedt, no tratado A general system of surgery,
depois de apresentar o procedimento de Celsus, a cauterização das varizes, refere
“Mas o nosso procedimento neste momento é muito mais suave. Em grandes Varizes,
nós esforçamo-‐nos para contrair e fortalecer as Paredes das Veias dilatadas, pela
Aplicação da referida Bandagem expulsiva com Fomentações de Vinho tinto, e
Medicamentos adstringentes, especialmente Vinagre e Allom, e ligando uma Chapa de
Chumbo fina sobre o distendido Vaso.”98
John Hull (1761-‐1843), o primeiro a apelidar a TVP de plegmasia dolens, sugeriu “Em
casos recentes de algodão, ou rolo de flanela corretamente aplicada pode ser
encontrado suficiente; mas quando a intumescência é de longa data e obstinada, eu
preferiria longas tiras de linho, ou algodão,... para a cura das pernas ulceradas.”99
Em 1839, Charles Goodyear (1800-‐1860), descobriu a vulcanização da borracha e, nos
100 anos seguintes desenvolveram-‐se materiais mais elásticos resultantes do
entrelaçamento dos fios de borracha com os de algodão, seda ou linho.
Em 1884, o dermatologista alemão Paul Unna (1859-‐1929), no livro Histologischer
atlas zur pathologie der haut, descreveu uma bota de contenção composta de óxido de
zinco, glicerina, gelatina e água estéril, para tratar edemas de estase e outras
dermatoses, que ainda hoje é utilizada, e um seu discípulo Heinrich Fischer, em 1910,
indicou a utilização bota Unna para tratamento da trombose venosa profunda (TVP).
Conrad Jobst (1889-‐1957), engenheiro alemão que trabalhava em Toledo, Ohio,
inventou as meias de contenção, em 1930, que sequencialmente foram melhorando
em conforto e aspeto, ampliando as indicações de utilização, tanto na profilaxia e
tratamento da TVP e das suas complicações, nomeadamente a síndrome pós-‐
trombótica, como no tratamento das úlceras venosas, na profilaxia das varizes,
particularmente na gravidez, nos pré e pós-‐operatórios imediato e tardio de varizes, ou
Aspetos históricos das veias e varizes
42 40
no tratamento das suas complicações, como tromboflebites e hemorragias, na
profilaxia da TEP, e adjuvante essencial para a escleroterapia, para além do papel
fundamental no controlo do linfedema. Estas indicações são muito bem expostas por
H. Partsch e o comité que o acompanhou, em publicação sob o auspício da
International Union of Phlebology, Evidence based compression therapy100.
Nas últimas décadas do séc. XX e primeira do atual, as meias elásticas foram sendo
aperfeiçoadas tendo em vista a compressão, o tamanho e a estética, tornando-‐se
fundamentais no tratamento da doença venosa crónica, em quase todos os seus graus.
Mais uma vez a história tem avanços e recuos, e em 2016, 340 anos depois de
Wiseman ter apresentado a sua bota de contenção (Fig. 3), a Juzo comercializou o
sistema Compression Wrap e a Medi o Circaid juxtalite, que têm por base o mesmo
conceito, muito útil nos membros muito edemaciados, porque pode ser ajustado à
medida que o edema diminui.
Vai longa a História das veias e das varizes, mas muito ficou por relatar. A História
sempre nos ensina. Repararam que muitos conhecimentos não foram valorizados na
sua época e só passadas centenas ou milhares de anos foram redescobertos. A História
ensina-‐nos que é preciso questionar o saber “dogmático”, não nos conformando com o
que sabemos. É esta maneira de estar que estimula a investigação.
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ANATOMIA DAS VEIAS DOS MEMBROS INFERIORES
Tiago Bilhim, Diogo Casal
A complexa rede venosa dos membros inferiores é composta por dois sistemas. Um
profundo, composto pelas veias profundas, situadas por baixo da aponevrose
muscular, e, outro superficial, em que as veias se dispõem na gordura localizada entre
a pele e a aponevrose muscular1, 2. Ambos os sistemas têm origem no pé e possuem
válvulas, sendo mais numerosas no sistema profundo3, 4, 5. O sistema venoso
profundo, no pé, compreende duas veias dorsais e quatro veias plantares (duas
mediais e duas laterais). Continua-‐se na perna, com duas veias tibiais posteriores, duas
veias fibulares, duas veias tibiais anteriores e dois troncos venosos tibio-‐fibulares. As
veias da perna continuam-‐se ao nível do escavado popliteu pela veia popliteia que se
estende desde o hiato tendinoso do solear ao hiato tendinoso do grande adutor, onde
se continua pela veia femoral. A veia popliteia localiza-‐se postero-‐lateralmente à
artéria popliteia e ântero-‐medialmente ao nervo tibial e recebe como colaterais as
veias surais, as veias articulares e a pequena veia safena. A veia femoral acompanha a
artéria femoral até ao anel femoral, invertendo a relação anatómica ao longo do
trajeto na coxa. Distalmente, a veia está localizada lateralmente à artéria, tornando-‐se
medial proximalmente1. Geralmente, observam-‐se duas veias acompanhando a
respetiva artéria até ao nível da veia popliteia, onde, frequentemente, as duas veias se
fundem numa só que acompanha a respetiva artéria.
O sistema venoso superficial, no pé, compreende as veias dorsais e as veias plantares
que constituem a palmilha venosa. As veias dorsais e plantares comunicam com a veia
marginal lateral, que segue a margem lateral do pé para se continuar com a pequena
veia safena e com a veia marginal medial, que segue a margem medial do pé para se
continuar com a grande veia safena.
A pequena veia safena (Fig. 1) passa atrás do maléolo lateral, ascendendo na face
posterior da perna num sulco entre as duas partes do músculo gastrocnémio,
alcançando a fossa popliteia onde se inflete anteriormente para drenar na veia
popliteia – crossa da pequena veia safena -‐ junção safeno-‐popliteia (termo de
Anatomia das veias dos membros inferiores
54 52
consenso atual)6. A junção safeno-‐popliteia está localizada num perímetro de 5 cm da
prega popliteia. No seu trajeto, a pequena veia safena é acompanhada pelo nervo
cutâneo sural medial (ramo do nervo tibial) que se anastomosa com o nervo cutâneo
sural lateral (ramo do nervo fibular) a uma altura variável para formar o nervo sural
que é responsável pela inervação cutânea da vertente póstero-‐lateral da perna e o
bordo lateral do pé. Uma vez que apenas o nervo cutâneo sural medial acompanha a
pequena veia safena, a lesão iatrogénica pós-‐cirúrgica geralmente não tem graves
consequências clínicas, uma vez que o nervo nervo cutâneo sural lateral compensa a
função do nervo sural. A pequena veia safena caminha num compartimento
interfascial entre as fascias superficial e muscular profunda e possui 10-‐12 válvulas.
Fig. 1 -‐ Trajeto da pequena veia safena no flanco posterior e lateral da perna (setas).
Relação próxima com o nervo sural (setas tracejadas). Pode ser duplicada e podem existir três pequenas veias safenas paralelas. No local de
drenagem para a veia popliteia, é frequente emergir um ramo venoso que ascende na
face posterior da coxa na goteira entre o bicípete femoral e o semimembranoso (veia
femoro-‐popliteia) extensão na coxa da pequena veia safena (termo de consenso
atual)6. A extensão na coxa da pequena veia safena termina em ramos superficiais ou
perfurantes da coxa e região glútea. Esta extensão cranial da pequena veia safena ou
extensão na coxa da pequena veia safena, quando comunica com a grande veia safena
Anatomia das veias dos membros inferiores
55 53
pela face posterior da coxa (através da veia circunflexa posterior da coxa) denomina-‐se
veia de Giacomini6. A extensão na coxa da pequena veia safena ou a veia de
Giacomini podem transmitir refluxo de veias perineais, perfurantes da coxa ou da
grande veia safena para a pequena veia safena e vice-‐versa (refluxo ascendente). A
morfologia da junção safeno-‐popliteia apresenta variações desde a descrição clássica
com drenagem para a veia popliteia, passando por uma junção safeno-‐popliteia
filiforme ou mesmo ausente. Quando a junção safeno-‐popliteia está ausente, a
principal drenagem da pequena veia safena faz-‐se pela extensão na coxa da pequena
veia safena ou pela veia de Giacomini. A junção safeno-‐popliteia apresenta uma
válvula terminal nas proximidades da veia popliteia e uma válvula preterminal,
distalmente à origem da extensão na coxa da pequena veia safena ou da veia de
Giacomini. As veias gastrocnémicas podem drenar diretamente para a pequena veia
safena, para a junção safeno-‐femoral ou mais frequentemente para a veia popliteia.
Pode existir uma veia tributária subcutânea com trajeto semelhante à pequena veia
safena, mas que não caminha no compartimento fascial -‐ veia perfurante da fossa
popliteia (Dodd). Esta veia perfurante tem um trajeto na face posterior da perna,
drenando de forma independente para a veia popliteia no escavado popliteu, paralela
e lateralmente à pequena veia safena.
Fig. 2 -‐ Trajeto subcutâneo da grande veia safena na face medial da perna (seta). Ramos perfurantes (setas curvas). Relação próxima com o nervo safeno (seta tracejada).
A grande veia safena (Fig.s 2, 3 e 4) passa anteriormente ao maléolo medial
ascendendo na face medial da perna onde tem relação íntima com o nervo safeno
(ramo do nervo femoral) responsável pela inervação cutânea da vertente medial da
Anatomia das veias dos membros inferiores
56 54
perna e pé2, 3. A lesão iatrogénica do nervo safeno após cirurgia da grande veia safena
na perna, pode dar origem a parestesias na vertente medial da perna e pé.
A grande veia safena passa posteriormente ao joelho e continua-‐se na face medial da
coxa até ao trígono femoral (ex-‐Scarpa). Aproximadamente 5 cm abaixo do ligamento
inguinal perfura a fascia femoral para drenar no flanco ântero-‐medial da veia femoral -‐
arco ou crossa da grande veia safena -‐ junção safeno-‐femoral (termo de consenso
atual)6. A grande veia safena caminha na perna e coxa num compartimento próprio
denominado hiato safeno. O hiato safeno é delimitado por uma prega aponevrótica
em forma de meia-‐lua chamada margem falciforme (Allan Burns)1. Quando avaliada
ecograficamente em corte axial, a grande veia safena no interior do hiato safeno
apresenta um sinal imagiológico denominado de "olho egípcio" uma vez que a fascia
superficial é ecogénica e facilmente visualizável por ecografia. O tronco venoso
representa o olho e as fascias superficial e profunda as pálpebras. Este sinal
imagiológico é importante uma vez que permite diferenciar a grande veia safena de
outros ramos tributários subcutâneos6. A grande veia safena possui 10-‐12 válvulas,
sendo mais numerosas na perna que na coxa e estão, geralmente, localizadas
imediatamente abaixo das veias perfurantes. Existe uma válvula terminal constante,
localizada 1-‐2 mm distalmente à junção safeno-‐femoral facilmente identificada por
ecografia. Existe outra válvula pré-‐terminal, localizada 2 cm distalmente à válvula
terminal, que determina o limite da junção safeno-‐femoral.
Fig. 3 -‐ Trajeto da grande veia safena na face medial da perna (setas).
Entre estas duas válvulas, a junção safeno-‐femoral recebe as veias circunflexa ilíaca
superficial, epigástrica superficial e pudenda externa superficial2. Esta característica
Anatomia das veias dos membros inferiores
5755
anatómica é importante, uma vez que estas veias podem transmitir fluxo retrógrado
para a grande veia safena, sendo responsáveis por doença refluxiva troncular mesmo
quando a válvula terminal é competente (28 % -‐ 59 % dos casos). A veia safena
acessória anterior, a veia safena acessória posterior e a veia de Giacomini podem
também drenar na junção safeno-‐femoral. A veia safena acessória anterior é um
tronco venoso que ascende paralelamente à grande veia safena na face anterior da
coxa, anterior e lateralmente à grande veia safena que se situa na vertente medial da
coxa. Tem um compartimento fascial próprio, o que leva a que frequentemente
existam dois "olhos safenos" em corte axial por ecografia do terço superior da coxa.
Fig. 4 -‐ Crossa da grande veia safena na face medial da coxa onde drena para a veia femoral (seta). Artéria femoral (seta curva). Nervo femoral (seta tracejada).
Geralmente, existe um gânglio linfático constante a separar a grande veia safena da
veia safena acessória anterior no local onde convergem. A incompetência da veia
safena acessória anterior pode ser uma fonte de refluxo e varizes na coxa e perna, em
aproximadamente 14 % dos doentes com doença venosa crónica dos membros
Anatomia das veias dos membros inferiores
58
Anatomia das veias dos membros inferiores
inferiores. Nestes casos pode ser a única fonte de refluxo, mantendo--se a grande veia
safena competente. Todavia, também pode haver doença refluxiva de ambos os
troncos venosos. A veia safena acessória posterior é um segmento venoso que
ascende paralelamente à grande veia safena, em topografia posterior, no interior de um
compartimento fascial. Não é tão frequente como a veia safena acessória anterior e a sua
drenagem para a grande veia safena não é constante. Representa a porção terminal
de veia de Giacomini quando esta variante anatómica está presente, fazendo comunicar
a pequena veia safena com a grande veia safena. A veia circunflexa anterior da
coxa é tributária da grande veia safena ou da veia safena acessória anterior. A
veia circunflexa posterior da coxa é tributária da grande veia safena ou da veia safena
acessória posterior. As veias intersafenas estão presentes em número variável na
perna, possuem um trajeto oblíquo e fazem comunicar a grande veia safena com a
pequena veia safena6. Existem algumas variantes anatómicas frequentes como as veias
tributárias na perna de grandes dimensões - uma destas veias mais frequentes é
denominada veia do arco posterior ou de Leonardo, que caminha na vertente medial
e posterior da perna, drenando para a grande veia safena, geralmente no terço superior da
perna. Podem existir veias tributárias subcutâneas maiores que a grande veia safena na
coxa, que por vezes podem ser responsáveis por varizes. A grande veia safena pode
estar ausente ou ser hipoplásica e não identificável no compartimento fascial entre o
terço médio da perna e o terço superior da perna ou entre o terço médio da perna e o terço
inferior da coxa (em até 56 % dos casos) sendo substituída por uma tributária subcutânea6.
As veias superficiais e profundas comunicam por veias perfurantes valvulares que,
como seu nome indica, perfuram as aponevroses dos diferentes compartimentos
do membro inferior. Estas veias, atravessam as aponevroses com uma angulação
que, conjuntamente com o sistema valvular, permite que o sangue venoso
circule na direção superficial para profundo durante a contração muscular (bomba
músculo- -venosa). A presença do sistema valvular e a dinâmica músculo- -venosa
permitem que o retorno venoso seja mais acentuado durante a contração
muscular e previnem o refluxo sanguíneo na fase de relaxamento muscular e ainda
durante o ortostatismo, sempre que o sistema valvular for competente2. A
terminologia das perfurantes deve assentar na topografia e não em nomes de autores,
5957
frequentemente incorretos numa perspetiva histórica. Desta forma, servirão como
elemento orientador no momento de fazer a sua marcação pré-‐operatória. Tendo em
consideração este ponto de vista, a sua referenciação topográfica deve ser rigorosa e
orientada por referências anatómicas descritivas muito precisas. Foram descritas mais
de 40 veias perfurantes constantes no pé (dorsal, medial, lateral e plantar), tornozelo
(medial, anterior e lateral), perna e coxa. As perfurantes da perna dividem-‐se em
quatro grupos: 1) perfurantes das veias tibiais posteriores (mediais); 2) perfurantes das
veias tibiais anteriores (anteriores), que comunicam com a grande veia safena; 3)
perfurantes das veias fibulares (laterais); 4) perfurantes posteriores. As perfurantes
das veias tibiais posteriores localizam-‐se na face medial da perna e comunicam a
grande veia safena e tributárias com as veias tibiais posteriores, devendo ser
denominadas de perfurantes mediais inferiores (Sherman), médias e superiores
(Boyd). Existe uma perfurante que comunica a veia do arco posterior (Leonardo) com
as veias tibiais posteriores (Cockett). As perfurantes da face posterior da perna
englobam as perfurantes gastrocnémicas localizadas no terço médio da perna. São
denominadas de lateral, medial, e perfurante intergemelar (solear ou de May),
fazendo comunicar a pequena veia safena com as veias soleares. Existe uma
perfurante para-‐Aquiliana lateral comunicando a pequena veia safena com as veias
fibulares (Bassi). As perfurantes ao nível do joelho são denominadas de mediais,
laterais, supra e infra patelares e da fossa popliteia. Na coxa, existem perfurantes
mediais localizadas no canal femoral (Dodd) e canal inguinal, comunicando a grande
veia safena e tributárias com a veia femoral. Existem, também, perfurantes da coxa
anteriores que perfuram o quadricípete femoral, perfurantes da coxa laterais que
perfuram os músculos laterais da coxa. Na face posterior da coxa, as perfurantes são
denominadas póstero-‐mediais quando perfuram os músculos adutores, perfurantes
medianas (ciáticas) e perfurantes póstero-‐laterais quando perfuram o bicípete femoral
e semitendinoso (Hach). Estão descritas ainda as perfurantes pudendas e glúteas
(superiores, médias e inferiores)6.
A anatomia das veias dos membros inferiores é complexa, com inúmeras variações
anatómicas com potencial relevância clínica. O conhecimento anatómico dos padrões
mais frequentes de drenagem venosa dos membros inferiores, é essencial para uma
correta abordagem clínica e cirúrgica da patologia venosa dos membros inferiores.
Anatomia das veias dos membros inferiores
60 58
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Anatomia das veias dos membros inferiores
61
59
FISIOPATOLOGIA DA INSUFICIÊNCIA VENOSA CRÓNICA
Carlos M. Costa Almeida
Introdução -‐ Significado de insuficiência venosa
Fisiologia da circulação de retorno
A espécie humana é a única que, tendo quatro membros, se desloca e permanece
habitualmente sobre dois, os posteriores, que por isso se passaram a chamar
inferiores. Fê-‐lo, obviamente, para libertar os anteriores, agora superiores, para os
quais o desenvolvimento particular do seu cérebro arranjou ocupação, neles, também,
e igualmente por isso, tornando-‐se o polegar oponível aos outros quatro dedos das
mãos. Pode-‐se, pois, dizer que foi o cérebro que fez o homem erguer-‐se nos membros
posteriores e assim permanecer.
Fisiopatologia da insuficiência venosa crónica
62 60
Mas isso criou-‐lhe duas dificuldades que não teria se, em vez de adoptar o
bipedalismo, se deslocasse a quatro: as vértebras passaram a fazer pressão umas
sobre as outras, com a coluna perpendicular ao chão, em vez de paralela, e a maior
parte do sangue passou a circular abaixo do nível da bomba cardíaca, e bem abaixo, já
que os membros inferiores, para suportar sozinhos o peso do corpo, se tornaram
maiores e mais musculosos, por isso deslocando maior quantidade de sangue, cujo
peso é uma força que lhe dificulta o retorno ao coração, quando na posição
ortostática.
Como ajudar o sangue a subir dos membros inferiores para o coração? Dois
mecanismos, relacionados entre si, estão instituídos. Um, as válvulas venosas, outro, a
bomba venosa da perna. As válvulas venosas, existentes em todas as veias dos
membros inferiores, orientam o fluxo de sangue em sentido cardiópeto e contrariam o
seu refluxo, em sentido contrário; e, nessas condições, dividem a corrente sanguínea
em secções, escalonadamente, não permitindo a existência duma coluna única de
sangue, fazendo pressão, pelo seu peso, na parte mais distal do membro. A bomba
venosa da perna, ou bomba dos gémeos, é constituída pelos músculos da perna com a
aponevrose inextensível que os rodeia, e as veias profundas e as veias perfurantes,
com as válvulas respectivas.
O sangue venoso dos membros inferiores circula das veias superficiais, através das
veias perfurantes, para as mais profundas, e daí retorna ao coração. A bomba venosa
ajuda ao retorno desse sangue, quando em funcionamento, que é quando os músculos
da perna, alternadamente, se contraem e relaxam, mantendo a articulação do
tornozelo em movimento. Quando os músculos se contraem e aumentam de volume,
dentro da loca inextensível onde estão as veias profundas, comprimem essas veias.
Nestas, sendo compressíveis, o sangue seria empurrado num sentido e noutro, não
fossem as válvulas que, dentro delas, orientam o movimento do sangue no sentido do
coração, impedindo o seu refluxo, em sentido distal; do mesmo modo, o sangue não
regressa ao sistema superficial, porque as válvulas existentes nas veias perfurantes
movimente o tornozelo em direcção contrária, há uma redução da pressão dentro da
loca, com uma “aspiração” do sangue para dentro dela, quer da parte mais distal do
Fisiopatologia da insuficiência venosa crónica
63 61
A bomba venosa da perna funciona como uma verdadeira bomba aspirante-‐premente,
com os mesmos princípios fisiológicos da bomba cardíaca, e é fundamental para o
nosso bipedalismo. Bastará notar que são os músculos da perna que nos fazem
deslocar e mantermo-‐nos em equilíbrio, apoiados apenas em dois pontos, quando
todos os outros animais, como nós com quatro membros, se apoiam e se deslocam
sobre quatro. E veja-‐se, se confirmação fosse necessária, que nesses animais os
músculos na perna nem sequer existem; são uma particularidade da nossa espécie,
pelos motivos expostos.
Fisiopatologia da insuficiência venosa
A insuficiência venosa primária assenta, basicamente, numa debilidade da parede das
veias, de causa não esclarecida. Continuam a ser feitos estudos no sentido desse
esclarecimento, procurando determinar o que a provoca, muito provavelmente a nível
bioquímico e biomolecular, apontando-‐se no momento, por exemplo, uma possível
desregulação de metaloproteinases e seus inibidores na parede venosa. É uma
situação que parece ser constitucional, ou congénita, com incidência familiar, não se
tendo, por enquanto, definido nenhum gene por ela responsável.
A debilidade da parede venosa faz com que nos membros inferiores, na sequência do
bipedalismo que nos caracteriza, com ortostatismo prolongado ao longo da nossa vida,
as veias não resistam ao peso do sangue dentro delas e se dilatem. Tal acontece nas
veias superficiais, extra-‐aponevróticas, sem suporte exterior para além da pele e do
tecido celular subcutâneo, e das veias perfurantes, que passam através da aponevrose
levando o sangue para as veias profundas, ao contrário do que se passa nestas, dentro
das locas aponevróticas e no meio dos músculos, com as paredes apoiadas pelas
estruturas circundantes. A insuficiência venosa primária é, assim, epifascial, podendo
ser também transfascial. Algumas veias vão-‐se dilatando, e as valvas das suas válvulas
deixam de chegar ao contacto umas com as outras, tornando-‐se insuficientes. Pelo
refluxo e dilatação, mais sangue se acumula nessas veias, com mais dilatação e mais
insuficiência valvular, no que é, como se percebe, um processo evolutivo: “avalvulação
gera avalvulação”. É às veias superficiais dos membros inferiores, cronicamente
Fisiopatologia da insuficiência venosa crónica
64 62
Fisiopatologia da insuficiência venosa crónica
Por causa da estase, os elementos figurados têm tendência a afastar-se do centro
da corrente sanguínea e aproximar-se das paredes venosas, e, como a pressão de
arrastamento (pressão tangencial, ou “shear stress”, directamente proporcional
à velocidade do fluxo sanguíneo) também diminui, isso permite o seu maior e mais
demorado contacto com elas, podendo mesmo interagir. Desse modo as hemácias
podem passar através delas e as plaquetas podem desencadear uma trombose local.
Quanto aos leucócitos, a hipótese mais aceite é que, quer lhes adiram quer transmigrem
através delas, para o tecido perivascular (à volta dos capilares e das vénulas pós-
capilares), activam- se, o que provoca a libertação de enzimas proteolíticos e
moléculas inflamatórias, como citoquinas e radicais livres, com efeito destrutivo nas
membranas celulares lipídicas, em estruturas proteicas e em vários componentes do
tecido conjuntivo. Daqui resulta um processo com características de inflamação crónica
e que conduz primeiro a remodelação fibrosclerótica da pele (lipodermatoesclerose)
e depois à sua ulceração. Também nas próprias valvas das válvulas pode haver
reacções desse tipo, que anatomo- patologicamente têm aspecto de “inflamação”, e
que contribuem para que as válvulas se tornem insuficientes.
6563
Fisiopatologia venosa na clínica
A designação “doença venosa crónica” inclui todos os que sofrem da circulação de
retorno dos membros inferiores, com dificuldade evidente na posição ortostática e no
bipedalismo. O quadro clínico pode variar, com sinais e sintomas que podem ser mais
ou menos exuberantes, e é, por isso, importante a utilização duma classificação como
a CEAP, focando os vários aspectos da doença (Clinic, Etiology, Anatomy,
Physiopathology), e que exige o estudo dos doentes por ecodoppler. Assim, para
avaliar a doença venosa crónica é importante saber que ela pode existir com varizes
tronculares e sem varizes tronculares, e que as telangiectasias e varículas, tão
prevalentes na nossa população adulta, sobretudo do sexo feminino, também dela
fazem parte. Isto apesar de haver autores que as excluem, como os há que consideram
a existência de insuficiência venosa crónica só nos doentes que apresentam edema e
alterações cutâneas – pigmentação ocre, lipodermatoesclerose, eczema (no seu
conjunto formando o que alguns apelidam de dermatite varicosa ou de estase) e
úlceras.
A doença venosa crónica manifesta-‐se mais cedo ou mais tarde na vida, agravando-‐se
ao longo dela, com possível aparecimento progressivo das complicações da
insuficiência venosa. Esse agravamento, com o avançar da idade, não tem que ver com
o envelhecimento propriamente dito, mas sim com o passar do tempo e maior
exposição ao efeito de vários factores de risco, nomeadamente mais tempo
acumulado em posição ortostática e redução de funcionamento da bomba venosa da
perna. Esta última acontece, na idade avançada, por simples maior sedentarismo ou
por reumatismo ou artroses dos membros inferiores, que diminuem a capacidade de
deambulação dos pacientes. Em particular a artrose do tornozelo que, com mobilidade
reduzida ou ausente, limita a contracção dos músculos da perna (“bomba dos
gémeos”), o que também acontece em situações de parésia ou paralisia dos membros
inferiores, inclusivamente com a decorrente atrofia muscular.
Para quem tem a referida debilidade da parede venosa, e por isso varizes ou tendência
para as ter, ser do sexo feminino também é um factor de agravamento, sobretudo por
razões hormonais (pelas hormonas femininas próprias ou administradas em
suplementos). Relacionada com essas, a gravidez é outro factor de agravamento, quer
pelo aumento da produção hormonal quer pelo período com aumento de pressão
Fisiopatologia da insuficiência venosa crónica
66 64
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Fisiopatologia da insuficiência venosa crónica
intra- abdominal, dificultando o retorno venoso ao coração e aumentando a
pressão venosa distal. E, também, são as mulheres que usam sapatos de salto alto,
com limitação marcada do movimento das articulações dos tornozelos na marcha, o
que limita a função da bomba dos gémeos.
Finalmente, uma chamada de atenção para o calor como factor de agravamento.
O calor local nos membros inferiores ajuda a dilatar as veias, se já dilatadas ou
com tendência para isso. Por isso há que o evitar, sobretudo o calor no Inverno, altura
em que se procura aquecer, precisamente, os pés e as pernas, prolongadamente,
nas lareiras, braseiras, escalfetas, botijas de água quente, etc. Muito mais que no Verão,
onde, pelo contrário, há a tendência de fugir para o fresco. Mas muito tempo com as
pernas ao sol quente também é prejudicial, naturalmente.
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6967
EPIDEMIOLOGIA E FATORES DE RISCO
Sara Correia, Aida Paulino, Luís Silveira
EPIDEMIOLOGIA
As varizes dos membros inferiores, são uma patologia muito frequente em todo o
mundo, que têm um grande impacto nos custos aos serviços de saúde, tanto diretos,
que resultam do diagnóstico e do tratamento, como indiretos, maioritariamente os
ligados ao absentismo profissional. Os recursos humanos, técnicos e orçamentais
necessários para permitir o tratamento de uma patologia tão prevalente, são enormes.
Sendo a doença venosa crónica (DVC) uma patologia historicamente considerada
ligeira e benigna, numa altura de contenção orçamental generalizada, existem países
que não estão a oferecer tratamento a todos os doentes diagnosticados1.
A doença venosa crónica é muitas vezes desvalorizada, enquanto problema importante
de saúde pública, apesar da evidência científica indicar que esta atinge uma parte
significativa da população, provoca morbilidade considerável e afeta negativamente a
qualidade de vida dos doentes. Tanto as varizes como as suas complicações,
nomeadamente as úlceras venosas e tromboflebites, têm grande interferência na
qualidade de vida dos doentes2.
Pela literatura consultada, verificamos que cerca de metade dos adultos têm alguns
estigmas de doença venosa, 50-‐55 % das mulheres e 40-‐50 % dos homens, mas só
cerca de metade apresentam varizes visíveis (20-‐33 % das mulheres e 10-‐40 % dos
homens)3, 4.
A DVC é uma patologia progressiva onde, aproximadamente, 30% dos doentes têm um
agravamento de duas ou mais classes CEAP após cinco anos sem tratamento5. Mas
Labropoulos verificou que 1/3 dos doentes tinham progressão do refluxo, em um ou
dois escalões de CEAP, e em 95 % começava ou evoluía pelos seis meses, o que quer
dizer que doentes que esperam pela intervenção cirúrgica há sete meses ou mais,
devem ser novamente estudados6.
Mota Capitão combinou as estimativas de prevalência de IVC na população, obtidas
num estudo prévio em 45 mil indivíduos, com os dados do recenseamento
Epidemiologia e fatores de risco
70 68
populacional de 1991, para obter estimativas de prevalência na população ajustadas
por idade e sexo. Os resultados mostraram que a prevalência de IVC, varizes
reticulares e tronculares e de varizes tronculares é de 20, 12 e 6 % nos homens e de
40, 22 e 10 % nas mulheres. A prevalência dos graus 0, 1, 2 e 3 de IVC é de 2, 10, 6 e
3 % nos homens e de 4, 22, 12 e 4 % nas mulheres. Os antecedentes de tromboflebite
e trombose venosa profunda têm uma prevalência de 4,5 e 1,3 % nos homens e de 8,9
e 1,5 % nas mulheres7.
Um estudo coordenado por Fernandes e Fernandes, em 2017, mostra que em
Portugal, cerca de 8 % dos doentes se reformam antecipadamente devido à DVC. Este
facto é ainda mais preocupante, na medida em que a DVC está presente em cerca de
1/3 da população. Cerca de sete em cada dez mulheres com mais de 30 anos sofre de
problemas de circulação venosa e metade não está tratada. Os dados apontam para
dois milhões de portuguesas daquelas idades, que sofrem desta doença4.
O estudo prospetivo San Diego Population Study, recolheu informação de uma
população com diversidade étnica de 2211 mulheres e homens. Determinou que a
incidência da DVC superficial era mais prevalente em doentes hispânicos (3,6 %),
seguida de doentes caucasianos (2,6 %), asiáticos (1,5 %) e afro americanos (0,9 %) . 8
A doença venosa crónica dos membros inferiores é uma das patologias que maior
número de indivíduos afeta e, embora não se associe a mortalidade ou incapacidade
significativa, a sua repercussão médico-‐social é relevante. Em Portugal, estima-‐se que
cerca de 1,5 % das consultas de clínica geral são devidas a doença venosa dos
membros inferiores, com uma média anual de 2,3 consultas por doente e uma média
de 32 tratamentos por doente com úlcera venosa crónica7.
As estimativas dos custos anuais totais de doença venosa crónica (DVC), variam entre
600 a 900 milhões de euros nos países da Europa Ocidental (representando cerca de 1-‐
2% do orçamento total de saúde). Nos EUA calcula-‐se que esse valor atinja os 2,5 mil
milhões de US dólares2.
A prevalência de edema e alterações cutâneas, tais como hiperpigmentação e eczema,
devido a DVC, varia entre 3 % a 11 % da população.
Quanto às úlceras venosas, alguns autores referem uma ocorrência de 0,3 % nos
adultos, em países ocidentais. A prevalência de úlceras ativas e cicatrizadas
combinadas é de cerca de 1%. A cicatrização pode ser mais demorada nos doentes de
Epidemiologia e fatores de risco
7169
classe social mais baixa e nos indivíduos solteiros. Mais de 50% das úlceras venosas
necessitam de tratamento por um período superior a um ano3.
O prognóstico de um doente com úlcera venosa é desanimador, sendo esta uma
condição de difícil tratamento e sucessivas recorrências4. Também o seu impacto sócio
económico é dramático, com estimativas a apontar para a perda de 2 milhões de dias
de trabalho por ano, só em Portugal, e reforma antecipada em mais de 12% dos
doentes9.
Os medicamentos venoativos prescritos representam, também, um custo considerável,
estimando-‐se valores de 63,2 milhões € em Espanha; 25 milhões € na Bélgica e 457
milhões de € na França. Duas análises semelhantes realizadas na Alemanha e na França
mostraram que quase 50 % da população com idade superior aos 15 anos referiam
problemas venosos e destes, 90,3 % compraram um medicamento venoativo2.
A dimensão em que a DVC afeta a qualidade de vida dos doentes ganhou uma nova
visibilidade com o recente trabalho de Sritharan at al, que descreveram que os
doentes com varizes sintomáticas, têm risco de depressão muito aumentado,
comparado com a população em geral10.
Existe uma disparidade acentuada em toda a Europa entre o número previsto de
doentes com veias varicosas que necessitam de tratamento e os cuidados atualmente
oferecidos, com o Reino Unido, a Finlândia e a Suécia, possivelmente, “sobretratando”
as varizes. No entanto, pode ser mais rentável, a longo prazo, tratar todos os doentes
com varizes, para prevenir a progressão da doença1, opinião com a qual concordamos,
em absoluto. Segundo Ratcliffe11 “Para doentes com varizes não complicadas e
evidência de refluxo safeno-‐femoral ou safeno-‐popliteo, o tratamento cirúrgico para
varizes oferece um benefício de saúde modesto, para relativamente pouco custo
adicional ao NHS, em relação ao tratamento conservador.”
FATORES DE RISCO
Quanto aos fatores de risco para o aparecimento de varizes, variam consoante os
países e com os artigos, com exceção da idade, gravidez e história familiar.
Idade
Vários estudos vieram demonstrar que a prevalência da doença venosa crónica
Epidemiologia e fatores de risco
72 70
aumenta com a idade. As varizes são muito raras em crianças até 14 anos. A partir da
puberdade existe um aumento progressivo da frequência das varizes com a idade,
chegando a atingir mais de 70% das pessoas acima de 70 anos. A prevalência de varizes
em homens com idades entre 30 a 40 anos é de cerca de 3 %, enquanto que na faixa
etária acima de 70 anos pode registar valores próximos de 40 %. Foram encontrados
resultados semelhantes em mulheres, uma prevalência de 20 % na idade de 30 a 40
anos, que aumenta gradualmente para valores superiores a 50 % na faixa etária dos 70
anos2. Tanto a doença venosa severa como a moderada aumentam com a idade12, 13.
Sexo
As varizes atingem consideravelmente mais as mulheres do que os homens, chegando
a uma proporção de duas a quatro mulheres para cada homem14. No entanto,
Shafiuddin15, na série que estudou, a maioria dos doentes eram homens, Carpentier16
não encontrou diferenças entre os sexos, e Fowkes17, no estudo de Edinburgh, chegou
à mesma conclusão, mas nas mulheres era mais frequente refluxo nas veias
superficiais e nos homens nas veias profundas. Tanto Criqui12 como Fiebig14 chegaram
à conclusão que os homens têm taxas mais elevadas de doença grave.
História familiar
A hereditariedade tem forte relação com a presença de varizes12, 13. Cornu18, em
trabalho publicado em 1994, verificou que o risco das crianças desenvolverem varizes,
foi de 90% quando ambos os pais sofriam desta doença, 25% para os homens e 62%
para as mulheres quando um dos pais era afetado, e 20% quando nenhum dos pais
tinha varizes.
Obesidade
A obesidade foi considerada um fator, independente, para o desenvolvimento de
varizes pela maior compressão abdominal, dificultando o retorno do sangue dos
membros para o coração, dilatando assim as veias daqueles5. Fowkes17 encontrou
associação do aumento de peso com aumento do refluxo, nos homens, e Criqui12 entre
a medida do perímetro da cintura e a existência de doença venosa grave. Fiebig14
verificou que analisando dois fatores de variância, sexo e grau CEAP, ambos tiveram
Epidemiologia e fatores de risco
7371
um efeito significativo sobre o IMC. No entanto, vários autores chegaram à conclusão
que a prevalência de varizes é semelhante nos obesos e não obesos3, 19.
Gravidez
As varizes surgem com grande frequência já no início da gravidez, devido aos fatores
hormonais e posteriormente devido a compressão pelo aumento do útero. Num certo
número de mulheres, especialmente na primeira gestação, essas varizes tendem a
desaparecer após o parto. Entretanto, em outras mulheres, possivelmente devido a
uma predisposição genética, as varizes não desaparecem ou voltam após o parto,
aumentando em gestações subsequentes. Alguns autores, nomeadamente Maffei20,
encontraram correlação positiva entre prevalência de varizes e número de
gravidezes13, 21. Este tema é objeto de um capítulo deste livro.
Anticoncecionais orais
O uso de hormonas parece aumentar o desenvolvimento das varizes e aumenta o risco
de trombose venosa. Noutros estudos, os autores encontraram menor tendência para
DVC17.
Hábitos de vida
A falta de exercício físico é um dos fatores de risco, é preconizada a prática de
desporto adequado, sendo a marcha a pé a atividade mais benéfica, e alguns autores
valorizam a marcha após várias horas de trabalho sentado12.
A maior parte dos trabalhos não encontrou relação entre o risco de varizes e a
ingestão de alimentos com fibras12, 17.
Tabagismo
Entre os homens, com DVC era mais provável que fumassem e tivessem menor
atividade física que os doentes sem DVC. Foi sugerido que o controlo dos fatores de
risco cardiovascular não só preveniam doença cardíaca, como também potencialmente
reduziam a incidência de DVC, mas não é opinião da maioria dos autores17. Em outros
artigos, verificou-‐se relação direta entre o número de cigarros fumados por dia e a
existência de doença venosa grave12.
Epidemiologia e fatores de risco
74
72
Postura no trabalho e anos de profissão
O papel da postura durante o trabalho no aparecimento das varizes é ainda muito
controverso. Alguns estudos sugerem uma maior predisposição para varizes, naqueles
que trabalham a maior parte do tempo em pé ou sentados do que naqueles que
trabalham andando13, 15, 16. Outros não encontram diferenças relacionáveis com o tipo
de profissão17, 20, quer em mulheres ou homens. Em profissões que habitualmente
trabalham em pé, o número de anos de trabalho é fator de risco para varizes13 e
Carpentier encontrou associação com alto risco de varizes nos homens com trabalho
não qualificado16.
Sentados com a perna cruzada
Segundo Erding13, as pessoas que, muito frequentemente, “descansam” com as pernas
cruzadas, têm risco acrescido de vir a ter varizes.
A maior parte dos autores não encontrou relação significativa entre a ingestão de
fibras, hábitos intestinais ou problemas gastrointestinais, exercício físico regular e
roupa apertada e a existência de varizes12 ou quanto ao tipo de profissão, manual ou
não17, mas Criqui12 verificou que a doença moderada, nos homens, se relacionava com
operação prévia a hérnia inguinal, pé chato e hipertensão arterial, e, na mulher, com
número de horas em pé, lesão prévia da perna e história de doença cardiovascular.
Outros verificaram que o exercício físico e o uso de meias elásticas, bem como o
descanso com as pernas elevadas, são fatores protetores de doença venosa5, 13.
Epidemiologia e fatores de risco
7573
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Epidemiologia e fatores de risco
7775
A CLASSIFICAÇÃO CEAP
Luís Filipe Pinheiro
A doença venosa crónica (DVC) é uma entidade patológica comum, relacionada com
alterações anatómicas e funcionais do sistema venoso dos membros inferiores, e que
inclui a presença de varizes, alterações cutâneas, edema, úlcera cutânea e sintomas
físicos relacionados como a fadiga, cãibra, prurido e dor.
A falta de uniformização quanto à sua classificação e estadiamento, no que respeita às
suas formas de apresentação, levou a que um grupo de especialistas há muito
interessados por esta doença, criassem um método inspirado no TNM, usado para a
classificação dos tumores malignos, que permitisse utilizar uma linguagem comum e
perceptível, e protocolar o seu estudo e tratamento. Esta metodologia permite,
naturalmente, um intercâmbio de conceitos e dados, utilizando uma linguagem
comum, o que antes se encontrava dificultado pela diversidade de designações
diferentes e esparsas utilizadas para caracterizar a mesma entidade.
A origem da classificação CEAP
Durante a quinta reunião do American Venous Forum, em 1993, John Porter sugeriu a
criação de um sistema de classificação de doenças venosas. Na sexta reunião, em
Fevereiro de 1994, foi então efectuada uma reunião de consenso, na qual um comité
ad hoc internacional, presidido por Andrew Nicolaides e com representantes da
Austrália, Europa e Estados Unidos, desenvolveu o primeiro documento sobre a
classificação CEAP. Nesta altura, esta integrava duas partes: uma classificação de DVC e
um sistema de pontuação de gravidade. A classificação baseava-‐se em manifestações
clínicas (C), a factores etiológicos (E), a distribuição anatómica da doença (A) e a
fisiopatologia subjacente (P), ou CEAP. O sistema de pontuação da gravidade baseou-‐
se em três elementos: número de segmentos anatómicos afectados, severidade dos
sintomas e incapacidade. Esta declaração de consenso do CEAP foi publicada em 26
revistas e livros, em nove línguas, incluindo o português, tornando-‐se,
verdadeiramente, um documento universal para a caracterização e classificação da
A classificação CEAP
78 76
doença venosa crónica.
Após esta primeira abordagem, este método de classificação foi alvo de várias revisões
e actualizações, sendo que a primeira teve lugar em Paris, cinco anos mais tarde
(1998), promovida por Perrin, e a última em 2004 onde se definiram mais
discriminadores nas várias categorias. Foi também acordada a necessidade de
estabelecer uma classificação CEAP básica e avançada.
Assim, definiram-‐se os aspectos a considerar em C, procurando utilizar a terminologia
que vinha sendo usada nas manifestações locais da DVC:
Atrofia branca – Manchas esbranquiçadas na pele das extremidades inferiores,
rodeadas por dilatações capilares venosas por vezes hiperpigmentadas;
Corona flebectásica (“ankle flair”) – “Aranhas” vasculares venosas na face interna do
tornozelo e bordo do pé, com alguma coloração azulada da pele, normalmente
conotadas como um sinal de insuficiência venosa;
Eczema – Lesões de dermatite na vizinhança de trajectos venosos, que podem
acompanhar-‐se de bolhas com prurido e irritação cutânea, por vezes relacionada com
a utilização inadequada de agentes terapêuticos locais;
Edema – Deposição de líquido no tecido celular subcutâneo por hipertensão venosa;
Lipodermatoesclerose – Inflamação crónica da pele e do tecido celular subcutâneo,
associada a retracções cicatriciais por episódios inflamatórios recorrentes, conferindo
ao membro afectado o aspecto de uma garrafa de champanhe invertida;
Pigmentação – Depósitos cutâneos de óxido ferroso, resultantes do extravasamento
de sangue por hipertensão capilar, normalmente localizados no terço inferior da
perna;
Variz reticular – Veia dilatadas e tortuosas sub-‐dérmicas, de calibre inferior a 3 mm;
Telangiectasia – Veias intradérmicas confluentes de coloração azulada ou
avermelhada, de calibre menor que 1 mm e por vezes designadas popularmente por
“derrames” ou aranhas”;
Veia varicosa ou variz – Dilatação de veia subcutânea superior a 3 mm quando medida
em ortostatismo, podendo ou não ser tortuosa;
Úlcera venosa – Ferida crónica em toda a espessura cutânea sem cicatrização
espontânea, normalmente localizada à região supra-‐maleolar interna, sem outra
etiologia identificada para além da doença venosa crónica.
A classificação CEAP
7977
Classificação clínica
C0 – Sem sinais visíveis ou palpáveis de doença venosa
C1 – Telangiectasias ou veias reticulares
C2 – Varizes (superiores a 3mm)
C3 – Edema
C4 – Alterações cutâneas
C4a -‐ Pigmentação ou eczema
C4b -‐ Lipodermatoesclerose ou atrofia branca
C5 – Úlcera cicatrizada
C6 – Úlcera activa
Cada classe clínica é depois caracterizada pela presença (S) ou ausência (A) de
sintomas. Por exemplo C3A ou C5S.
Nesta última revisão de 2004 foram também definidos os discriminadores para as
restantes classificações (E, A e P), refinando assim a classificação, objectivando os
aspectos relevantes na apresentação da doença:
Classificação Etiológica:
Ec – Congénita
Ep – Primária
Es – Secundária (pós-‐trombótica)
En – Sem causa identificada
Classificação Anatómica:
As – Veias superficiais
Ap – Veias perfurantes
Ad – Veias profundas (deep)
An – Sem identificação precisa
Classificação Fisiopatológica:
Pr – Refluxo
Po – Obstrução
Pr,o – Refluxo e Obstrução
Pn – Fisiopatologia não determinada
A classificação CEAP
80 78
CEAP avançado
À classificação básica CEAP pode adicionar-‐se a designação avançada quando
pretendemos caracterizar ainda melhor a doença venosa, referindo com precisão os
segmentos venosos envolvidos, e estudados com recurso a ecoDoppler a cores.
Veias Superficiais
1. Telangiectasia/veias reticulares
2. Grande veia safena supra-‐genicular
3. Grande veia safena infra-‐genicular
4. Pequena veia safena
5. Outras veias
Veias Profundas
6. Veia cava inferior
7. Veia ilíaca comum
8. Veia ilíaca interna
9. Veia ilíaca externa
10. Veias pélvicas
11. Veia femoral comum
12. Veia femoral profunda
13. Veia femoral superficial
14. Veia popliteia
15. Crural: tibial anterior, tibial posterior, peroneal
16. Veias musculares: perfurantes dos gémeos, veias soleares
Veias Perfurantes
17. Coxa
18. Perna
Este método de estadiamento da doença permitiu também definir melhor os
requisitos para o seu diagnóstico preciso, e recomendações para a sua terapêutica.
Assim foram definidos três níveis de requisitos diagnósticos consoante a
complexidade, passando a integrar a designação na classificação final, o nível (L) de
requisito diagnóstico (LI, LII,LIII):
. Nível I -‐ Apenas consulta médica contemplando história clínica, exame físico e
A classificação CEAP
8179
eventualmente doppler contínuo ou ecoDoppler (C0 e C1)
. Nível II -‐ Exames vasculares não invasivos. Ecodoppler obrigatório (C2 e C3)
. Nível III -‐ Exames mais complexos, que podem compreender a pressão venosa em
ambulatório, flebografia, varicografia, TAC e RMN (C4, C5, C6)
CEAP -‐ Um processo dinâmico
Dado que a DVC é um processo dinâmico, não faria sentido efectuar uma classificação
inicial do doente na primeira observação, sem rever essa mesma classificação nas
observações subsequentes, e após instituição da terapêutica julgada necessária.
Portanto, a doença deverá ser sempre re-‐classificada após cada visita médica,
referindo a data do exame na classificação.
CEAP – Resumo
Em resumo, e a título de exemplo, apresenta-‐se um doente que no dia 25 de Maio de
2017 se apresenta para consulta com:
. Varizes, dor e edema da perna, lipodermatoesclerose, úlcera activa;
. EcoDoppler em 25/5/2017-‐ refluxo na GS acima e abaixo do joelho, perfurante da
perna insuficiente, refluxo na femoral e popliteia;
. Sem sinais de obstrução.
CEAP básico: C6s,Ep,As,p,d,Pr
CEAP avançado: C2,3,4b,6s,Ep,As,p,d,Pr 2,3,18,13,14 (25/5/2017), LII
A classificação CEAP
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A classificação CEAP
8381
CLÍNICA: SINTOMAS E SINAIS
Beatriz Mourato, Nuno Pratas, João Magro
Introdução
A doença venosa crónica dos membros inferiores é a patologia vascular mais comum
na atualidade, referindo-‐se à presença de alterações morfológicas ou funcionais de
longa duração dos sistemas venosos dos membros inferiores. As varizes dizem respeito
à dilatação, ingurgitamento ou tortuosidade das veias superficiais dos membros
inferiores1.
Para o seu correto diagnóstico é fundamental proceder a uma história clínica completa
e um exame objetivo cuidado, podendo ser auxiliado por testes funcionais e pela
realização do ecoDoppler venoso dos membros inferiores.
Deste modo, existe todo um espectro de sinais e sintomas que podem estar associados
a esta patologia e que irão ser explanados neste capítulo.
História clínica e exame objetivo
A realização da história clínica do doente com patologia venosa crónica, deve ser
cuidada e minuciosa, devendo o médico apurar além dos sinais e sintomas que
motivam a consulta, os antecedentes médicos e cirúrgicos do doente, a sua medicação
habitual, a história familiar, os fatores de risco para existência de doença venosa
crónica e o impacto que a mesma tem na qualidade de vida do doente2.
Antecedentes pessoais
Assim, em relação aos antecedentes pessoais, é importante apurar a existência de
complicações da doença venosa, como eventos tromboembólicos, flebites, síndrome
pós-‐trombótica, bem como a presença de doença cardiovascular, doença arterial
periférica, diabetes mellitus, artrite, doença hepática, doença renal, doenças
endócrinas, doenças autoimunes, doenças inflamatórias sistémicas ou neoplasias, que
possam fazer diagnóstico diferencial com alguns dos sinais e sintomas da doença
venosa crónica.1, 3
Clínica: sintomas e sinais
84 82
O doente deve, também, ser questionado relativamente aos seus antecedentes
cirúrgicos, nomeadamente intervenções cirúrgicas vasculares e ortopédicas sobre os
membros inferiores.
Medicação habitual
A medicação habitual do doente deve ser registada, com particular interesse para os
fármacos anticoagulantes, contracetivos orais, medicação, anti-‐inflamatórios não
esteroides, antidiabéticos orais ou bloqueadores dos canais de cálcio.4
Antecedentes familiares
Na história familiar, importa questionar o doente acerca de outros membros da família
com doença venosa crónica ou complicações desta. Deve também ser esclarecida a
presença de trombofílias4.
Sintomas frequentes
As queixas mais frequentes associadas à existência de varizes dos membros inferiores
são a dor, em resultado da distensão venosa, e que pode ser generalizada ou
circunscrita a uma área de varicosidades, lipodermatoesclerose ou ulceração, a
sensação de cansaço ou peso agravada pelo ortostatismo prolongado ou pela posição
de sentado com pernas pendentes e que alivia com a elevação dos membros inferiores
e com a marcha.
O edema dos membros inferiores também é um dos sinais e sintomas mais frequentes
desta patologia, presente em 25 a 75 % dos doentes. Agrava em ortostatismo ao longo
do dia e diminui com a elevação do membro. O edema, geralmente, inicia-‐se ao nível
do tornozelo e pé e estende-‐se, progressivamente, para a perna à medida que se
agrava, devido à acumulação de fluido extravascular nos membros inferiores. Quando
unilateral, é sugestivo da etiologia venosa, contudo a presença de edema bilateral não
exclui esta patologia.
Outras queixas referidas são a sensação de picada, fadiga generalizada, cãibras,
parestesias, prurido ou varicorragia, geralmente controlada pela aplicação de terapia
compressiva5.
Clínica: sintomas e sinais
8583
Exame objetivo -‐ Sinais
O exame objetivo é essencial para o diagnóstico e para a abordagem da doença
varicosa dos membros inferiores. Assim o doente deve ser submetido a um exame
objetivo completo, embora o maior enfoque seja na avaliação do estado venoso dos
membros inferiores. O doente deve ser avaliado em decúbito e em ortostatismo, onde
se pretende obter maior distensão venosa6.
Deve ser feita a inspeção, palpação e percussão dos membros inferiores, de forma a
identificar6:
-‐ Telangiectasias: correspondem a uma confluência de vénulas intradérmicas
dilatadas, mas com <1 mm de diâmetro (Fig. 1). O matting corresponde normalmente
a vasos finos e avermelhados com <0,2 mm que se podem desenvolver após qualquer
tratamento venoso (p.e. laser, escleroterapia, stripping);
Fig. 1 – Telangiectasias.
-‐ Veias reticulares: são veias subdérmicas dilatadas, de 1 a 3 mm de diâmetro,
geralmente tortuosas (Fig. 2);
Fig. 2 – Veias reticulares.
Clínica: sintomas e sinais
86 84
-‐ Veias varicosas. São veias dilatadas subcutâneas com >3 mm de diâmetro. Podem
envolver veias safenas, tributárias, ou outras veias superficiais (Fig. 3);
Fig. 3-‐ Veias varicosas.
-‐ Tromboflebite: Existência de sinais inflamatórios num determinado território venoso
superficial, doloroso à palpação (Fig. 4);
Fig. 4 – Tromboflebite.
-‐ Edema: Deve-‐se ao aumento no volume de líquido intersticial na pele e no tecido
celular subcutâneo;
-‐ Corona phlebectatica: Corresponde à presença de inúmeras veias intradérmicas na
região medial ou lateral do pé ou do tornozelo (Fig. 5)7;
Fig. 5 – Corona phlebectatica.
-‐ Hiperpigmentação: Coloração acastanhada ou acinzentada que se deve à deposição
de hemossiderina proveniente da degradação dos eritrócitos que extravasam para o
Clínica: sintomas e sinais
8785
espaço extravascular. Ocorre geralmente na região peri-‐maleolar, podendo estender-‐
se proximal ou distalmente (Fig. 6);
Fig. 6 – Hiperpigmentação.
-‐ Lipodermatoesclerose: Corresponde a uma inflamação crónica com fibrose e
“engrossamento” da pele e tecidos subcutâneos. Pode também associar-‐se à
contractura do tendão de Aquiles. Por vezes é precedido por edema inflamatório
difuso da pele que pode ser doloroso (Fig. 7);
Fig. 7 – Lipodermatoesclerose.
-‐ Atrofia branca (Atrophie blanche): É uma zona circular ou estrelada de cor de marfim
localizada cercada por capilares dilatados ou hiperpigmentação. É um sinal de doença
venosa crónica grave, que surge espontaneamente e não deve ser confundida com
uma cicatriz de úlcera cicatrizada (Fig. 8);
Fig. 8 – Atrofia branca.
Clínica: sintomas e sinais
88 86
-‐ Úlcera venosa: As úlceras venosas são defeitos de espessura total da pele,
localizando-‐se, frequentemente, na região maleolar interna. Podem ocorrer, também,
ao nível do maléolo externo e proximalmente ao tornozelo ou tornar-‐se
circunferenciais, mas não ocorrem na região plantar nem acima do joelho. Podem ser
múltiplas ou únicas e geralmente são exsudativas, planas, com bordos irregulares, mas
bem delimitados (Fig. 9).
Fig. 9 – Úlcera venosa.
Testes funcionais
A facilidade de acesso ao ecoDoppler venoso tem vindo a tornar menos frequente a
realização de testes funcionais durante o estudo do doente. Contudo, a realização
destes testes pode auxiliar o diagnóstico e determinação do segmento afetado.
O teste clássico de Brodie-‐Trendelenburg permite distinguir entre refluxo do sistema
superficial ou profundo. Para o executar, o doente deve estar em decúbito dorsal, é
feita a elevação do membro inferior e aplicado um garrote ou pressão manual sobre as
veias do sistema superficial, a 5 cm da virilha. Posteriormente, o doente assume a
posição ortostática e, na presença de refluxo do sistema superficial, as veias deste
sistema irão levar mais de 20 segundos para ficar ingurgitadas, progredindo esta de
baixo para cima, caso a compressão esteja a ser feita proximalmente ao ponto de
refluxo. A libertação do garrote ou da compressão manual irá levar a um
preenchimento venoso rápido, mas o sentido é de cima para baixo. Na presença de
refluxo do sistema profundo (ou combinado) existirá um preenchimento venoso rápido
apesar da aplicação do garrote ou da compressão manual8, no(s) local(is) daquele
refluxo.
O teste de Perthes avalia a insuficiência das veias perfurantes. À semelhança do teste
anterior, é aplicado um garrote quando o doente eleva o membro na posição de
Clínica: sintomas e sinais
8987
decúbito, mas posteriormente o doente deve deambular durante cinco minutos. O
ingurgitamento venoso abaixo do nível de aplicação do garrote traduz a existência de
uma veia perfurante insuficiente8. Pode ser repetido colocando o garrote a vários
níveis.
Diagnóstico diferencial
A lista de diagnósticos diferenciais da doença venosa crónica é extensa, pois como
vimos a sua forma de apresentação é bastante variável. Contudo, existem diagnósticos
que pela sua gravidade devem ser ressaltados como é o caso da trombose venosa
profunda e das causas sistémicas de edema, como insuficiência cardíaca, síndrome
nefrótica, doença hepática, doenças endócrino-‐metabólicas, doenças autoimunes e
inflamatórias sistémicas, neoplasias e metastização. Devemos ainda ter em
consideração os efeitos secundários da medicação habitual do doente.
Outros diagnósticos diferenciais incluem a rotura de quisto popliteo, hematomas ou
massas de tecidos moles e o linfedema. A hiperpigmentação cutânea e a
dermatoesclerose poderão ser secundarias a doenças como dermatite, mixedema,
necrobiosis diabeticorum. A ulceração crónica pode dever-‐se a doença arterial
periférica, fistulas artério-‐venosas, neuropatia periférica, vasculite, artrite reumatoide,
discrasias hemorrágicas, infeções, pioderma gangrenosoum, neoplasia, trauma ou
múltiplas outras etiologias5.
Qualidade de vida
A avaliação da qualidade de vida nos doentes com doença venosa crónica é um ponto
fundamental, pois a maioria dos estudos realizados acerca deste tema, revela que os
doentes apresentam uma diminuição da qualidade de vida, que se traduz não apenas
em limitações na atividade diária, mas também na afeção psicológica causada pela
patologia e pelas suas complicações10, 11. Para esta avaliação existem instrumentos
como a escala 36-‐item Short Form Health Survey (SF-‐36), Aberdeen Varicose Vein
Questionnaire (AVVQ), CIVIQ 2 – Venous Quality of Life Questionnaire, Venous
Insufficiency Epidemiologic and Economic Study (VEINES-‐QoL), Venous Clinical Severity
Score (VCSS) e o Venous Disability Score (VDS)12, 13.
Clínica: sintomas e sinais
90 88
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Clínica: sintomas e sinais
91 89
ECODOPPLER NA AVALIAÇÃO DA DOENÇA VENOSA CRÓNICA
Ana Lourenço, Mariana Lima e Ângela Marques
Considerações práticas
A doença venosa crónica é uma patologia muito frequente nos países ocidentais,
inclusivamente em Portugal, condicionando incapacidade laboral e consequente
consumo elevado dos recursos de saúde. Apesar do avanço crescente da Radiologia, o
avaliação da morfologia e padrão hemodinâmico das veias dos membros inferiores,
sendo, atualmente, o exame de eleição no diagnóstico e seguimento da doença
vascular crónica.
Indicações
O principal objetivo do estudo ecoDoppler dos membros inferiores é orientar a decisão
terapêutica. Para tal, é necessária a correta deteção e caracterização da(s) causa(s) da
insuficiência venosa, pois a sua incorreta identificação associa-‐se a uma taxa de
recorrência pós-‐terapêutica mais elevada e mais precoce, quer nas abordagens
cirúrgicas quer nas técnicas não cirúrgicas minimamente invasivas. O exame
ecoDoppler venoso dos membros inferiores deve ser efetuado no contexto de doença
venosa crónica (DVC) para localização dos pontos de refluxo nas varizes primárias,
estudo de recidiva pós-‐terapêutica e em doentes com complicações (ex. úlceras
cutâneas).
Equipamento
É necessário um ecógrafo com Modo-‐B, Doppler a cores e pulsado, sonda linear de alta
frequência (7,5-‐12 MHz), sonda convexa (3,5-‐5 MHz) (para avaliação do sistema
venoso profundo, especialmente em doentes com edema significativo dos membros
ou obesos) e um sistema de registo de imagens.
ecoDoppler continua a ser um método complementar de diagnóstico fundamental na
EcoDoppler na avaliação da doença venosa crónica
92 90
No modo-‐B o foco deverá ser direcionado para o vaso a estudar e os ganhos
otimizados de forma a manter o lúmen anecogénico (na ausência de trombose ou
fluxo muito lento).
No estudo Doppler pulsado e colorido, deve manter-‐se um ângulo de insonação entre
45-‐60° entre a sonda e o lúmen do vaso e devem-‐se usar velocidades baixas
(normalmente entre os 5-‐10 cm/s).
Exame objetivo
Para que o estudo seja o mais dirigido possível, é fundamental avaliar as queixas do
examinado, o padrão de distribuição cutânea das varizes e os antecedentes cirúrgicos.
A DVC compreende um conjunto de sinais e sintomas que abrange desde as
telangiectasias às úlceras cutâneas. Em 1994, foi apresentado um sistema de consenso
internacional – CEAP (Clinical-‐Etiology-‐Anatomy-‐Pathophysiology) com o objetivo de
aumentar a consistência na descrição e classificação da DVC. Este sistema baseia-‐se na
criação de um score individual através da avaliação de quatro parâmetros:
manifestações clínicas, fatores etiológicos, padrão de distribuição anatómica e
patofisiologia. Em 2004, este sistema sofreu algumas modificações passando a incluir,
nomeadamente, a referência à realização de estudo ecoDoppler.
Protocolo técnico
Inicialmente o procedimento deve ser explicado ao doente.
O examinado deverá posicionar-‐se em ortostatismo, idealmente apoiando o peso do
corpo no membro contralateral, embora mantendo ambos os calcanhares apoiados no
chão (para assegurar o máximo de distensão venosa), com a perna a avaliar em
rotação externa e joelho ligeiramente fletido. Para uma correta avaliação da
competência venosa são essenciais as manobras de compressão muscular distal que
aumentam o retorno venoso, seguidas de descompressão que acentuam o refluxo
venoso na presença de válvulas incompetentes. Caso não seja possível realizar estas
manobras, poderá recorrer-‐se à manobra de Valsalva.
O exame é iniciado com o estudo em modo-‐B, que permite localizar os vasos a estudar.
Os cortes axiais (menor eixo do vaso) facilitam a identificação da anatomia e
morfologia venosas e a identificação de possíveis trombos endoluminais, sendo os
EcoDoppler na avaliação da doença venosa crónica
93 91
cortes longitudinais (maior eixo do vaso) essenciais para a avaliação de refluxo. O
estudo com Doppler colorido permite uma análise rápida do sentido do fluxo venoso,
sendo que, por convenção no estudo da DVC, a cor azul traduz fluxo que se afasta da
sonda e o encarnado fluxo que se aproxima da sonda. Contudo, para quantificação do
refluxo é essencial o recurso ao Doppler pulsado. O cursor da amostra de volume a
analisar pode ser posicionado em qualquer ponto ao longo do eixo do vaso e a escala
de velocidade/frequência deve ser ajustada (geralmente para 5–10 cm/s).
O refluxo venoso corresponde a fluxo com sentido inverso ao fisiológico, geralmente
considerado com duração superior a 0,5 segundos, na avaliação do sistema superficial
e perfurantes, e superior a um segundo na avaliação do sistema venoso profundo,
embora não exista consenso na literatura no que respeita a um intervalo de tempo
definitivo para todos os territórios venosos. O refluxo pode ser superficial se confinado
ao sistema venoso superficial, profundo se afetar o sistema venoso profundo, ou
combinado. No território da grande veia safena (GVS), o refluxo venoso patológico
pode ser classificado como Refluxo Axial (RA), quando se trata de refluxo contínuo
desde a junção safeno femoral (JSF) ao longo da GVS até abaixo do joelho, ou Refluxo
Segmentar (RS), se envolve um segmento venoso sem continuidade do refluxo desde
da virilha até à perna. O RS é subdividido em: tipo 1, se envolve só uma colateral; tipo
2, se envolve uma colateral e o segmento da GVS adjacente; ou tipo 3, se envolve a
colateral, um segmento da GVS e a JSF. A avaliação da intensidade do refluxo e a
medição do diâmetro venoso são igualmente importantes para a decisão terapêutica.
O estudo da junção safeno-‐femoral (JSF) é iniciado ao nível da prega da virilha, em
cortes transversais, procurando a veia femoral comum (VF) ladeada internamente pela
GVS e externamente pela artéria femoral (sinal do “Mickey Mouse”). Em cortes
longitudinais, devem identificar-‐se as válvulas terminal (constante 1-‐2 mm distal à JSF)
e pré-‐terminal (cerca de 2 cm abaixo, que marca o limite distal da JSF), uma vez que as
tributárias mais importantes se lançam na JSF entre as duas válvulas. A este nível,
devem ser procuradas outras possíveis causas de refluxo para além da incompetência
valvular da JSF, nomeadamente, veias proximais incompetentes (inguino-‐abdominais)
que podem transmitir refluxo retrógrado para a GVS mesmo com a válvula terminal
competente e veias colaterais incompetentes, como a veia safena anterior acessória
ou as veias linfo-‐ganglionares.
EcoDoppler na avaliação da doença venosa crónica
94 92
A grande veia safena (GVS) tem um compartimento intrafascial próprio, facilmente
identificado em modo B, que em corte transversal assume uma configuração
conhecida como “olho egípcio” (o lúmen da safena é a íris, a fáscia safena é a pálpebra
superior, e a fáscia aponevrótica profunda a pálpebra inferior). Este sinal facilita a
identificação da safena e a sua distinção de colaterais com trajeto supra-‐aponevrótico.
Na presença de refluxo deve proceder-‐se à medição do diâmetro da GVS abaixo da JSF,
pois esta medida pode condicionar a abordagem terapêutica. A GVS deve ser avaliada
em todo o seu trajeto até ao tornozelo. Ao nível do joelho pode ser identificada pela
sua localização, num compartimento triangular delimitado pela tíbia, músculo gémeo
interno e aponevrose (sinal do ângulo tibio-‐gemelar). Nos dois terços inferiores da
perna, a GVS raramente é refluxiva, pois o seu compartimento torna-‐se muito estreito
entre os grupos musculares da perna. Se não for visualizada veia no compartimento na
coxa ou perna, isso significa que está ausente ou hipoplásica. Por vezes, a GVS pode
“abandonar” o seu compartimento, designando-‐se por colateral todo o trajeto venoso
extracompartimental, pois mesmo que seja evidente continuidade com a veia axial
principal não deve ser descrita como safena troncular uma vez que não se encontra no
respetivo compartimento safeniano.
A Veia Safena Anterior Acessória (VSAA) é identificada em 40 % dos indivíduos na face
anterior da coxa, num “segundo compartimento safeniano”, anterior e externo
relativamente à GVS, reconhecido pelo alinhamento com os vasos femorais (sinal do
alinhamento). A sua terminação é variável, podendo terminar conjuntamente com a
grande veia safena a 1 cm da JSF ou de forma isolada na VF.
As veias linfo-‐ganglionares são identificadas entre a GVS e a VSAA. Comunicam
superiormente com veias inguino-‐abdominais ou com a VF e podem ser causa de
varizes primárias ou comunicar inferiormente com a GVS sendo a causa da sua
incompetência.
As veias colaterais, identificadas na coxa e perna, são obrigatoriamente superficiais à
fáscia, tendo de a perfurar para se lançarem na GVS. Existem múltiplas variantes
anatómicas possíveis, sendo alguns vasos mais constantes, nomeadamente o sistema
venoso lateral (na face externa da coxa e perna); a veia circunflexa anterior da coxa
(tributária da GVS ou da VSAA e ascende obliquamente na face anterior da coxa); a
veia circunflexa posterior da coxa também tributária da GVS ou da veia safena
EcoDoppler na avaliação da doença venosa crónica
95 93
posterior acessória (VSPA) que ascende obliquamente na face posterior da coxa,
podendo originar-‐se na pequena veia safena (PVS), na sua extensão para a coxa ou no
sistema venoso lateral; as veias intersafenianas que têm trajeto oblíquo na perna e
ligam a PVS e GVS; e na perna as veias do arco anterior e posterior (veia de Leonardo).
Para efeitos de otimização terapêutica devem ser corretamente localizadas e
referenciadas, nomeadamente a sua topografia em relação à prega cutânea popliteia
(para colaterais da coxa) ou ao plano do chão (para colaterais da perna). É
fundamental que se faça o estudo do tronco safeniano abaixo do colateral para
classificação do refluxo, pois condiciona a abordagem cirúrgica.
As veias perfurantes são numerosas ao longo do membro inferior, com distribuição
variável. Estas veias estabelecem a ligação entre o sistema venoso superficial e
profundo, perfurando a aponevrose. Para serem consideradas patológicas devem ter
um calibre superior a 3 mm e permitir fluxo bidirecional, com tempo de refluxo
superior a 0,5 segundos, sendo referenciada a sua topografia pela distância à prega do
escavado popliteu ou ao plano do chão.
A pequena veia safena (PVS) origina-‐se atrás do maléolo tibial externo, localiza-‐se no
sulco intergemelar ao nível da perna, terminando frequentemente na veia popliteia ao
nível do escavado popliteu. A PVS ocupa uma posição intrafascial em todo o seu
trajeto (entre a aponevrose e a fáscia muscular profunda), podendo por vezes ser
dupla ou mesmo tripla. Deve avaliar-‐se a presença de refluxo na PVS, após manobras
de compressão muscular distal e no caso da veia ser refluxiva deve medir-‐se o seu
diâmetro 3 cm abaixo da JSP (se presente) ou ao nível do escavado popliteu. O refluxo
venoso pode ter origem primária no território da GVS e estender-‐se inferiormente à
PVS (através da veia de Giacomini (VG)) com insuficiência valvular secundária desta, ou
ser primário da PVS com progressão superior pela face posterior da coxa e ser causa de
refluxo secundário da GVS.
A junção safeno-‐popliteia (JSP) corresponde à terminação da PVS na veia popliteia (VP)
e geralmente localiza-‐se 2 a 4 cm acima da prega cutânea popliteia, embora com
grande variabilidade, podendo em alguns casos a terminação ser mais alta (5 a 10 cm
acima da prega). A PVS possui também duas válvulas: a válvula terminal proxima da VP
e a válvula pré-‐terminal que, geralmente, se encontra abaixo da origem da extensão
para a coxa da PVS (EC). O padrão da junção safeno-‐popliteia é bastante variável,
EcoDoppler na avaliação da doença venosa crónica
96 94
podendo ser verdadeira, parcial ou mesmo inexistente. Quando não existe uma junção
safeno-‐popliteia verdadeira a PVS pode ter trajeto curto e drenar numa perfurante do
escavado popliteu ou numa perfurante gemelar ou então apresentar um trajeto longo
comunicando superiormente com a GVS através da EC, com a VG, veias perineais ou
perfurantes da coxa (póstero-‐externas).
A EC cursa na goteira entre os músculos bicípite femoral e semimembranoso,
delimitada superficialmente pela fáscia superficial, tendo portanto também um trajeto
intracompartimental, estando presente em 95% dos casos. No seu trajeto ascendente
pode ter várias terminações: continuar-‐se com os vasos perineais, comunicar com uma
veia perfurante posterior da coxa que se une à femoral profunda, dividir-‐se em ramos
musculares e subcutâneos para a coxa ou comunicar com a GVS através da veia
circunflexa posterior da coxa.
A VG surge quando a EC da PVS comunica com a GVS através da veia circunflexa
posterior da coxa, que pode transmitir refluxo do território da GVS para a PVS ou
inversamente, refluxo da PVS para a GVS.
A veia femoral comum (VF) e a veia popliteia (VP) integram o sistema venoso profundo
do membro inferior e são inicialmente avaliadas na posição de decúbito para deteção
de trombose venosa profunda com avaliação do lúmen em modo B e da
compressibilidade do vaso (exercendo uma ligeira pressão com a sonda) em cortes
axiais, e posteriormente é feita a avaliação do padrão de preenchimento dos vasos
com o Doppler colorido e avaliação espectral da VF em cortes longitudinais. De seguida
deverá ser realizada a avaliação em ortostatismo, com realização de manobras de
compressão muscular distal e pesquisa de refluxo, que deve ser avaliado acima e
abaixo da JSF e JSP, respetivamente, para distinguir incompetência das crossas de
refluxo do sistema venoso profundo.
Vantagens
O estudo ecográfico em modo-‐B complementado com o doppler colorido e pulsado é
uma modalidade sensível e específica para o diagnóstico de trombose venosa
profunda e superficial, assim como para deteção de refluxo patológico. Permite ainda
a realização de relatórios pormenorizados e rigorosos com o correto mapeamento dos
vasos refluxivos, de forma a otimizar a intervenção cirúrgica.
EcoDoppler na avaliação da doença venosa crónica
97 95
Tabela 1 – Protocolo de ecoDoppler utilizado no Hospital dos Capuchos -‐ CHLC para avaliação da insuficiência venosa crónica dos membros inferiores
Desvantagens
A principal desvantagem relaciona-‐se com o facto de não existirem valores
estandardizados para o grau de compressão muscular, que muitas vezes pode ser
insuficiente para desencadear refluxo. Devido a esta variabilidade interoperador não é
EcoDoppler na avaliação da doença venosa crónica
98 96
possível quantificar a severidade de insuficiência venosa apenas com base nas
características do refluxo.
Conclusão
O estudo dos doentes com patologia venosa, classicamente conseguido pela clínica e
pela flebografia, foi modificado desde de há mais de duas décadas pelo advento dos
métodos não invasivos de diagnóstico vascular. Com efeito, estas técnicas vieram a
mostrar-‐se rigorosas na avaliação do sistema venoso e eliminaram as desvantagens da
flebografia. Assim, para o estudo da patologia venosa dos membros inferiores, o
exame que na atualidade constitui a primeira linha do diagnóstico é o ecoDoppler
venoso, sendo fundamental o conhecimento da anatomia venosa do membro inferior
e as suas variações anatómicas.
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EcoDoppler na avaliação da doença venosa crónica
100
101 99
MEDICAMENTOS VENOATIVOS
Carlos Pereira Alves
O que são os Medicamentos Venoativos?
Os medicamentos venoativos (MVA), também designados por venotrópicos ou
flebotónicos, constituem um grupo heterogéneo de medicamentos usados no
tratamento da doença venosa crónica (DVC) e insuficiência venosa crónica (IVC) ou
seja, em todas as classes da classificação CEAP (C0s a C6).
A maioria dos MVA são derivados de plantas e poucos têm origem na síntese química.
Os principais MVA derivados de plantas são:
-‐ Os bioflavonoides incluem: a fração flavonóica purificada e micronizada (Micronized
Purified Flavonoid Fraction/MPFF na designação internacional), a diosmina e os
rutosideos, incluindo a rutina e hidroxirutosideos;
-‐ As saponinas: castanha da índia/escina e o extrato de ruscus;
-‐ Outros extratos de plantas e associações: os antocianósidos, as proantocianidinas.
Os principais MVA de origem sintética são o dobesilato de cálcio, a benzarona e a
naftazona.
No grupo dos bioflavonoides, o MPFF é o mais prescrito e está disponível em Portugal
com o nome comercial de Daflon 500®. É constituído por 90 % de diosmina e 10 % de
outros bioflavonoides expressos em hesperidina: a hesperidina, a isoroifolina, a
linarina e a diosmetina.
O MPFF parece ser mais potente que a simples diosmina, dado todos os seus
componentes contribuírem para o seu efeito terapêutico. A micronização, ao reduzir
as partículas do produto de 20 para 2 µ, aumenta a absorção intestinal e a
biodisponibilidade versus a diosmina não micronizada1.
Daflon 500® é apresentado em comprimidos de 500 mg, revestidos por película, de
forma oval, com uma posologia de 1000 mg/dia, a prescrever numa dose única de 2
comp id, ao pequeno-‐almoço.
As diosminas disponíveis incluem: Venex®, Venex Forte® e Venex 900®, que contêm
diosmina nas doses de 300 mg, 450 mg e 900 mg, respetivamente, apresentadas em
Medicamentos venoativos
102 100
cápsulas ou comprimidos, com recomendação de uma dose diária de 900 mg em dose
fracionada ou única; Veno V®, diosmina, apresentada em capsulas de 300 mg, com
posologia de 3 cáp id.
Nos rutosideos disponíveis encontra-‐se o Venoruton®, saquetas com 1000 mg de
oxirrutinas, em pó granulado para solução oral, e com uma posologia recomendada de
1 saqueta (saq) id.
No grupo das saponinas, encontram-‐se disponíveis: o Venotop®, que tem na sua
composição 263,2 mg de extrato seco de castanha da índia, apresentado em
comprimidos de libertação modificada com posologia de 2 comp id;
o Cyclo 3®, que é composto por extrato seco de ruscus, hesperidina e ácido ascórbico,
apresentado em cápsulas, com posologia de 3 cáp id.
No grupo de outros extratos de plantas encontra-‐se o Difrarel®, que tem como
substância ativa 100 mg de antocianósidos, na forma de comprimidos, com posologia
média recomendada de 6 comp id.
O Venosmil®, composto por hidrosmina, apresentado em cápsulas de 200 mg,
com posologia de 1 cáp 3 id às principais refeições; nos produtos sintéticos,
o Doxi-Om®, que tem como substância ativa o dobesilato de cálcio, apresentado
em cápsulas de 500 mg e com a posologia de 1 a 2 cáp id. (Tabela 1)
Tabela 1 – Classificação dos principais fármacos venoativos2
Poucos estudos têm comparado os diferentes venoativos, podendo considerar-‐se que
a maioria são quase equivalentes no alívio dos sintomas3.
Medicamentos venoativos
103 101
Numa meta-‐análise recente, onde se avaliou o impacto dos principais venoativos no
edema maleolar de origem venosa, concluiu-‐se que a redução do perímetro maleolar
com o MPFF é significativamente superior à observada com os restantes venoactivos4.
Adicionalmente, poucos venoativos, com exceção do MPFF, têm sido estudados no
tratamento da IVC (Classes C4, 5, 6 da classificação CEAP). Na úlcera venosa, o MPFF,
associado à compressão elástica, revela, numa meta análise de cinco ensaios clínicos,
acelerar a cicatrização da úlcera5. Outros venoativos estudados levaram à redução do
edema e sintomas da IVC, mas não demonstraram resultados superiores aos obtidos
com compressão elástica na evolução e recorrência da úlcera6, talvez por, ao contrário
do MPFF, não terem efeito sobre a interação leucócito-‐endotélio, que tem surgido
como mecanismo importante de desenvolvimento da IVC e da úlcera.
A segurança dos MVA é em geral boa, com reações adversas pouco frequentes,
raramente severas e constituídas essencialmente por distúrbios gastrointestinais
minor, tipo enfartamento, flatulência e raras vezes náuseas e vómitos ou diarreia.
Também as erupções cutâneas são muito raras.
Para mais informações sobre os MVA, consultar os respetivos Resumos de
Características dos Medicamentos (RCM).
O diagnóstico da doença venosa crónica deve ser o mais precoce possível e a duração
do tratamento deve começar por ser de um a três meses, com análise dos resultados
no fim deste período. Quando resurgem sintomas, deve pensar-‐se em prevenir a
evolução da patologia, apostando num tratamento continuado.
Deve ter-‐se, também, presente que, apesar da doença venosa ser crónica e evolutiva,
os sintomas que a caracterizam e que levam às maiores queixas dos doentes são mais
frequentes e severos no verão.
Fisiopatologia da DVC/IVC e sua relação com a ação dos MVA
As varizes são dilatações das veias, muitas vezes tortuosas.
Continua por estabelecer a causa inicial das varizes e do seu caráter de doença crónica
progressiva, sendo múltiplas as causas, desde fatores genéticos, história familiar,
fatores hormonais, gravidez, profissões com longos períodos de pé ou sentado, estilo
de vida sedentária, sexo, idade, obesidade, raça.
Medicamentos venoativos
104 102
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para o tecido subendotelial. Esta migração tem como consequência a libertação de
fatores inflamatórios e o início de uma cascata inflamatória, que altera o normal
processo de remodelação parieto-‐valvular, amplia a DVC e a sua progressão para IVC13.
São vários os estudos que têm demonstrado a capacidade do MPFF proteger as
válvulas venosas da ação nociva da inflamação14. Inibindo a ativação leucocitária, o
MPFF limita a adesão e subsequente infiltração dos leucócitos para o tecido
subendotelial, limitando a reação inflamatória. Esta sequência poderá ser fator chave
na patogenia da IVC, com reflexos no tratamento e prevenção evolutiva da doença.
Figura 1 – Fisiopatologia da DVC / IVC
Dilatação, refluxo, hipertensão e reação inflamatória levam, com o tempo, a alterações
de microcirculação com alterações da filtração capilar e aumento da permeabilidade,
estando criadas as condições que levam ao edema, à pigmentação, à
lipodermatoesclerose e à úlcera venosa (sinais de IVC). Esta dilatação/inflamação leva
também à ativação de recetores nociceptivos C, responsáveis pelos sintomas mais
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Medicamentos venoativos
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Medicamentos venoativos
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frequentes de DVC: sintomas de dor, sensação de pernas pesadas, desconforto das
pernas, etc. (Fig. 1).
Modo de ação dos MVA
Os principais modos de ação estudados e estabelecidos para os MVA são:
-‐ Aumento da tonicidade venosa;
-‐ Aumento da resistência capilar, reduzindo a filtração capilar da IVC;
-‐ Melhoria da drenagem linfática;
-‐ Diminuição da agregação e da deformação dos eritrócitos, bem como a viscosidade
do sangue;
Tabela 2 – Modo de ação dos principais fármacos venoativos15.
-‐ Inibição da interação entre os leucócitos e o endotélio, inibindo a adesão e migração
dos leucócitos circulantes e, consequentemente, inibindo a libertação de fatores
inflamatórios presentes na insuficiência venosa crónica e que tem sido,
particularmente, estudada com o MPFF (Tabela 2).
107 105
Estes modos de ação explicam o efeito benéfico dos MVA, no alívio sintomático, ação
antiedema, e melhoria da qualidade de vida, bem como o efeito benéfico do MPFF nas
úlceras venosas5.
MVA e ensaios clínicos
Os venoativos não eliminam a doença venosa crónica, mas beneficiam o alívio dos
sintomas (dor, sensação de peso e desconforto das pernas, pernas inchadas, prurido,
caibras, pernas inquietas “restless legs” e edema).
Esta eficácia dos MVA, apesar de avaliada em numerosos ensaios extensos e
randomizados, continua a ser objeto de discussão, devido ao facto dos estudos terem
diferenças de dimensão, qualidade, metodologia e possibilidade de “significativos
viéses” “major bias”, o que explica a variação de uso nos vários países.
De facto, analisar a resposta de sintomas da DVC não é fácil. Dado o seu caráter
subjetivo, os sintomas de DVC não são específicos e são muito menos
patognomónicos, mesmo que se tente a sua quantificação com uso de escalas de
pontuação.
Acresce ainda, que os sintomas clínicos das varizes e edema têm variações. Não só
variações individuais no decorrer do dia, mas também variações com a época do ano
(calor ou frio), variações com a atividade mais sedentária ou mais ativa, além de não
haver relação linear dos sintomas com a severidade da doença venosa ou padrão de
refluxo.
Estas variações têm estado presentes no desenho dos novos ensaios clínicos, tentando
minimizar a sua influência com medições do edema efetuadas na mesma altura do dia,
e o mais objetivamente possível, com medição exata do diâmetro maleolar ou o uso do
teste de deslocação de água. Adicionalmente, a análise de qualidade de vida com
escalas próprias tenta dar credibilidade aos resultados.
clinico dos MVA resultam na sua bem estabelecida eficácia no alívio dos sintomas, ação
antiedema e melhoria da qualidade de vida.
Já na IVC poucos venoativos têm sido estudados, com exceção do MPFF na úlcera
venosa5.
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108 106
Indicações dos MVA
As indicações dos venoativos resultam, como já referido, do seu mecanismo de ação
com atuação em alvos do processo fisiopatológico (Figura 1 e Tabela 2), de ensaios
clínicos e da extensa experiência de uso clínico, estando bem estabelecido o seu efeito
benéfico no alívio sintomático e ação antiedema.
Nos mais recentes guidelines, os MVA têm recebido diferentes graus de
recomendação. O MPFF recebeu o maior grau de recomendação, o grau 1A, pela sua
ação sobre os sintomas venosos, o dobesilato de cálcio o grau 2A e a escina o grau
2B16, 17.
O American Venous Forum (AVF) refere (recomendação 4-‐4-‐1 de 2017) “sugerimos o
uso de venoativos em adição à compressão elástica nos doentes com dor e edema
devidos à doença venosa crónica, em países onde esses medicamentos estão
disponíveis”18.
Já o uso de venoativos na IVC é de prescrição mais controversa sendo a compressão
elástica considerada a 1ª linha de tratamento conservador.
No entanto, na úlcera venosa, o MPFF associado ao tratamento local e ao uso de
compressão elástica, foi objeto de meta análise de cinco ensaios clínicos randomizados
e controlados, envolvendo 723 doentes5. Em três dos ensaios, o tratamento local com
compressão elástica foi comparado com o mesmo tratamento local com compressão
elástica + MPFF, e em dois ensaios, o tratamento local com compressão elástica +
MPFF foi comparado com tratamento local com compressão elástica + placebo. Aos
seis meses, a possibilidade de cicatrização era 32 % melhor nos doentes tratados com
MPFF.
As diferenças verificaram-‐se a partir do segundo mês de tratamento com MPFF, com
tempo de cicatrização mais rápido. Os melhores resultados diziam respeito a úlceras
com dimensões entre 5-‐10 cm e com duração de 6-‐12 meses.
Com base nestes resultados, o AVF considera o uso do MPFF nas úlceras venosas
recomendado com grau 1B (recomendação 4-‐4-‐2 de 2017) “úlceras de longa duração e
grandes dimensões podem beneficiar do tratamento com MPFF, usado em associação
à compressão elástica”18.
Medicamentos venoativos
109107
Os MVA podem ser usados em conjunto com a compressão elástica, cirurgia,
tratamento endovascular e escleroterapia.
Prevenção das varizes e MVA
-‐ Exercício regular;
-‐ Vida ativa;
-‐ Cuidados com a pele;
-‐ Controle de peso;
-‐ Vestuário não apertado e sapatos de salto não superior a 4 cm.
Nos doentes com IVC (C3 a C6) e com refluxo, deve recomendar-‐se a utilização de
compressão elástica com uso de meias AD ou AG, classe I-‐II (recomendações do AVF
7,4-‐24-‐6-‐5 de 2017).
Foram, no entanto, publicados em 201519 e 201720 dois interessantes estudos.
No primeiro, Tsukanov YT et al avaliaram doentes com sintomas, mas sem sinais de
DVC (C0s, En, An, Pn). A metodologia deste estudo incluía a realização de ecoDoppler,
com medição do diâmetro da grande veia safena (GVS), avaliação dos sintomas e da
qualidade de vida dos doentes. Os sintomas foram avaliados usando a escala visual
análoga de 10 cm e a qualidade de vida avaliada com o CIVIQ 20. O exame ecoDoppler
foi realizado duas vezes por dia: de manhã (antes das 10:00) e de tarde (depois das
18:00). O exame ecoDoppler incluiu: (1) a duração do refluxo; (2) o diâmetro da GVS na
região inguinal; (3) a diferença de diâmetro entre as medições da manhã e da tarde.
Foram avaliados 41 doentes: 15 não tinham refluxo venoso transitório (RVT) nem de
manhã nem à tarde, os restantes 26 não tinham RVT de manhã, mas tinham RVT ao
final do dia, sendo que em dois o refluxo era axial e nos restantes 24 era segmentar. O
diâmetro da GVS encontrava-‐se significativamente aumentado nos doentes com RVT.
Os doentes que apresentavam RVT ao final do dia, foram tratados com MPFF (1000 mg
de manhã) durante dois meses, após os quais a investigação ecoDoppler foi repetida.
Nesta altura, com MPFF, o RVT foi eliminado em 22 dos 26 doentes que inicialmente o
apresentavam. Em paralelo, verificou-‐se uma diminuição significativa do diâmetro da
Medicamentos venoativos
110 108
GVS e, também, diminuição significativa da intensidade dos sintomas e melhoria
significativa da qualidade de vida dos doentes.
Os autores concluíram que o MPFF, na dose de 1000 mg/dia, durante dois meses,
resultou na eliminação do RVT do fim do dia na maioria dos doentes, diminuição
significativa do diâmetro da GVS, com efeito benéfico sobre os sintomas e qualidade
de vida.
O estudo publicado em 2017, também por Tsukanov YT, incidiu sobre doentes com
telangiectasias ou varizes reticulares sintomáticas (C1s). A metodologia foi semelhante
à do primeiro estudo. Nenhum dos 96 doentes incluídos apresentava RVT matinal e
55,2 % apresentavam RVT ao fim do dia, bem como sintomas. Estes sintomas apenas
se verificavam em 16,3 % dos doentes sem RVT. Adicionalmente, o diâmetro da GVS
mostrou aumento significativo nos doentes com RVT.
Os doentes que apresentavam RVT foram tratados com MPFF na dose de 1000 mg
uma vez por dia, durante três meses e nesta altura, com MPFF, o RVT tinha sido
eliminado em 92,5 % dos doentes, o diâmetro da grande veia safena reduzido para
valores base, os sintomas venosos resolvidos na grande maioria dos doentes e a
qualidade de vida melhorada.
Em conclusão, neste estudo, a medicação com MPFF, na dose de 1000 mg/dia, durante
três meses, eliminou o RVT, com melhoria significativa dos sintomas venosos e
melhoria da qualidade de vida dos doentes. Este efeito positivo do MPFF poderá
dever-‐se a uma melhoria da viscoelasticidade da parede venosa das veias e poderá
ajudar a prevenir a evolução dos estádios CEAP C1 para C2, ou seja, aponta para a
possibilidade do MPFF poder retardar a progressão da doença venosa crónica20.
Tornam-‐se necessários mais estudos, bem como estabelecer se este efeito positivo do
MPFF se mantém após a interrupção do tratamento, ou se é transitório, sendo
necessário efetuar medicação a longo-‐termo.
MPFF em associação com tratamento cirúrgico, técnicas endovasculares e
escleroterapia
No pressuposto que o efeito analgésico e antiedema do MPFF possa reduzir a dor, bem
como a melhoria da tonicidade venosa possa diminuir a hemorragia, no pós-‐operatório
Medicamentos venoativos
111 109
de cirurgia, técnicas endovasculares ou escleroterapia, foram realizados estudos com o
uso do MPFF associado a estas várias formas de tratamento.
O MPFF em associação com “stripping” da safena, foi estudado em dois ensaios, que
mostraram alívio da dor na 1ª semana pós-‐operatório bem como redução da área de
hematoma e sua reabsorção mais rápida21, 22.
O uso do MPFF em associações às técnicas endovasculares, mostrou redução dos
sintomas pós-‐operatórios como a dor nas pernas e o edema, avaliados pela escala
VCSS (Venous Clinical Safety Scores)23.
Num outro estudo, o MPFF foi avaliado em combinação com a escleroterapia, com o
fim de investigar as alterações locais e sistémicas de citoquinas pró-‐inflamatórias e
fatores endoteliais. O uso do MPFF reduziu significativamente a atividade pró-‐
inflamatória das citoquinas e alguns fatores endoteliais24.
Estes resultados reforçam as ações anti-‐inflamatória, antiedema e analgésica do MPFF
e são um estímulo a futuras investigações que possam justificar um alargar das suas
indicações de uso.
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Medicamentos venoativos
113 111
TERAPÊUTICA COMPRESSIVA NA DOENÇA VENOSA CRÓNICA
E INSUFICIÊNCIA VENOSA CRÓNICA
Carlos Pereira Alves
A compressão elástica (CE) é elemento essencial de tratamento conservador da
doença venosa, em todas as classes da classificação CEAP de C0s a C6, e com benefício
evidente no alívio dos sintomas e do edema venosos.
Na úlcera venosa (C6), a compressão elástica é o tratamento mais eficaz para a sua
cicatrização, sendo a combinação da compressão elástica com a cirurgia do sistema
superficial o melhor tratamento de prevenção da úlcera venosa.1, 2
A CE a longo termo deve ser considerada na presença da IVC (C3 a C6)3, 4, 5.
A compressão elástica é ainda recomendada no pós-‐operatório de cirurgia (Mediven
struva 23) e após esclerose de varizes.
Apesar destas evidências o seu uso é subestimado, a prescrição incompleta e em regra
mal explicada ao doente a ação das meias elásticas, bem como necessidade do seu uso
diário, já que a sua eficácia é dependente da adesão ao tratamento.
A compressão elástica é uma compressão ativa que se exerce de maneira contínua
durante o exercício e o repouso. Durante o exercício o aumento de volume do
membro acentua o efeito compressivo. No repouso a pressão exercida é constante.
Não confundir esta compressão ativa, com a compressão passiva ou contenção que é
exercida pelas ligaduras não compressivas ou cola de zinco, que é apenas uma
compressão de suporte, que se exerce de maneira fraca ou nula no repouso e provoca
contenção/suporte no exercício, opondo-‐se ao aumento de volume do membro, e que
é, especialmente, eficaz na reabsorção de edema de causa venosa em doentes
ambulatórios.
Mecanismo da compressão elástica
A compressão elástica ao aplicar uma pressão exterior sobre o tecido celular
subcutâneo e sobre as veias, facilita a função de retorno venoso dos membros
inferiores ao coração.
Terapêutica compressiva na doença venosa crónica e insuficiência venosa crónica
114 112
Nas veias superficiais, a compressão leva a uma redução do seu calibre levando a
coaptação das válvulas venosas opondo-‐se assim ao refluxo venoso (Fig. 1).
Fig. 1 – Com e sem meia de compressão.
Também a compressão elástica previne a distensão venosa e minimiza a tensão
parietal responsáveis pelos sintomas de dor, sensação de peso e desconforto e prurido
dos membros inferiores.
O efeito compressivo sobre as veias profundas, com redução do calibre das mesmas,
só se observa com pressões acima de 40 mmHg e na posição de decúbito.
Durante a marcha, o uso de meias elásticas leva a uma passagem do sangue das veias
superficiais para as profundas através das veias perfurantes, melhorando o retorno
venoso.
A compressão elástica aumenta a pressão intersticial do tecido celular subcutâneo,
prevenindo ou reduzindo o edema e melhorando a drenagem linfática.
O uso a longo termo da CE mostrou melhorar a elasticidade venosa6, contudo o efeito
benéfico das meias elásticas só se manifesta durante o uso das mesmas,
desaparecendo um dia depois da sua remoção, daí a importância do seu uso diário7.
É consensual reconhecer, ser a compressão elástica um tratamento essencial da
doença venosa, o que é confirmado pelo notável documento de consenso, elaborado
em 2003, em San Diego, e revisto em 20178. O uso diário das meias elásticas é
fundamental, apesar disto, não é respeitado em 20 a 25 % dos doentes, por razões
económicas ou insuficiente explicação do médico prescritor.
Terapêutica compressiva na doença venosa crónica e insuficiência venosa crónica
115 113
Um estudo observacional Mediven, publicado em 20169, demonstrou que a prescrição
de meias de compressão elásticas (MCE) não tem em suficiente atenção as indicações
corretas de prescrição, nomeadamente, não tendo em consideração a classe clínica da
classificação CEAP de C1s a C6, e características do doente, como idade, obesidade,
circunferência maleolar e doenças concomitantes, inclusive osteoarticulares.
Foram analisados 531 doentes em 47 centros de estudo na Alemanha, incluindo
doentes das classes CEAP de C1s a C6. O período de observação foi de 18 meses com
cinco consultas e realizado entre 2011 e 2015. O diagnóstico e prescrição das MCE
Mediven, foram exclusivamente dos médicos envolvidos no estudo e incluíram meias
de compressão leve (Mediven elegance, comfort e Mediven for men), compressão
média (Mediven plus) e compressão forte (Mediven forte), bem como o kit para úlcera
Mediven.
No seguimento dos doentes, foram analisadas a frequência de prescrição das MCE,
tendo em conta a classe clínica, a obesidade dos doentes e da prescrição de auxiliar
para calçar as meias. Cerca de 1/3 dos doentes não receberam, no início do estudo,
prescrição para um segundo par de meias, ou logo de início, uma nova prescrição para
adquirir novas meias passado seis meses. Os auxiliares para calçar as meias foram
raramente prescritos.
Estes fatores tem influência na adesão dos doentes ao uso regular e a longo termo das
meias. A maioria das prescrições foram de meias de compressão leve, não tendo em
consideração a classe clínica.
Verificou-‐se que os doentes com edema (classe C3), a melhoria ocorreu em maior
número com meias de compressão média ou forte, e que nos doentes obesos a
possibilidade de as meias poderem provocar constrição, era menos frequente com as
meias de compressão média ou forte.
O estudo conclui, assim, que existe necessidade da melhoria da prescrição das MCE,
quer em relação ao tipo de meias, às suas medidas e classe de compressão, bem como
à prescrição das meias subsequentes, e no uso a longo-‐termo, conclusões que se
aplicam para qualquer marca de meias e não apenas às Mediven do estudo.
Para maximizar os benefícios das MCE, é importante uma prescrição correta e
completa, bem como ter em conta a classe clínica, de C0s a C6, as características do
doente, bem como prescrições subsequentes no uso a longo-‐termo.
Terapêutica compressiva na doença venosa crónica e insuficiência venosa crónica
116 114
Doentes com IVC ou com síndrome pós-‐trombótica parecem beneficiar com o uso de
meias elásticas vitaliciamente. A utilização de meias elásticas a longo-‐termo, após
cicatrização de úlceras, induziu drástica redução de custos ao sistema de saúde10.
Meias elásticas, como prescrever
As meias elásticas hoje disponíveis nas farmácias são confortáveis, elegantes, em
várias cores, bem toleradas e com baixo risco de alergia, dado ter sido abandonado o
uso de borracha na sua composição.
Estão disponíveis em vários tipos, medidas, comprimentos e classes de compressão e
em várias marcas comerciais e cada uma destas com vários modelos de meias.
A receita das meias elásticas deve ser uma receita médica com obrigação de
mencionar o tipo de meia (em função da indicação), as medidas (em função dos
perímetros maleolares, região mais larga da perna e coxa), o comprimento (em função
da altura chão/1 cm abaixo do joelho, ou chão/região inguinal), a classe de
compressão (em função da indicação) e a respetiva marca.
Para facilitar esta prescrição, as diferentes marcas criaram modelos próprios que a
facilitam.
Os principais tipos de meia são as meias até abaixo dos joelhos (AD), até ao meio da
coxa (AG) ou até a coxa (AF) ou collants (masculino, feminino ou de gravidez).
As meias poderão ser com biqueira aberta ou sem biqueira.
As classes de compressão são quatro, de acordo com normas europeias a classe I tem
uma compressão a nível maleolar de 15 a 21 mm Hg, a classe II uma compressão de 23
a 32 mm Hg, a classe III uma compressão de 34 a 46 mm Hg e a classe IV uma
compressão .
A larga seleção de meias disponíveis, permite a escolha certa adequada a cada doente.
Para tratamento das úlceras venosas está disponível, no mercado, um “kit ulcer” que é
constituído por três meias, duas interiores iguais e uma meia exterior. Cada meia tem
uma compressão de 20 mm Hg. A meia interior é para manter nas 24 horas (o doente
dorme com ela, dado a compressão de 20 mm Hg ser bem tolerada no decúbito),
destinando-‐se a segunda meia interior, a substituir a primeira quando esta se
apresenta suja com o exsudado da úlcera (em regra passado uma semana de uso) e
que o doente leva para lavar. Esta meia é calçada pelo médico quando da consulta e a
Terapêutica compressiva na doença venosa crónica e insuficiência venosa crónica
117 115
meia exterior é calçada pelo doente ao levantar, por cima da meia interior e retirada
ao deitar.
O doente durante o dia deambula, assim, com as duas meias, e com uma compressão
de 40 mm Hg, que é considerada adequada e tolerada para a cicatrização da úlcera.
As meias do “kit ulcer” têm uma duração de seis meses. O uso deste kit é muito mais
elegante que o uso de ligaduras elásticas.
Em casos de anomalias anatómicas dos membros inferiores poderá ter que se recorrer
a meias feitas por medida para aquele doente especifico.
Uma receita correta deverá, assim, mencionar:
-‐ Classe de compressão (p.e. Classe II)
-‐ Tipo de meia (AD, AG, Collant)
-‐ Medida de acordo com o perímetro maleolar (existem medidas de I a VI)
-‐ Comprimento (existem dois tipos de comprimento: curto e normal)
-‐ Marca (p.e. Mediven, Juzo, Sigvaris, Venosan)
Exemplo de uma prescrição:
R/
Meias elásticas
Contraindicação de uso de meias elásticas
Para determinar eventuais contraindicações ao uso de meias elásticas deve sempre
proceder-‐se a:
-‐ Determinação de pulsos periféricos (tibial posterior e pedioso) de preferência com
Doppler portátil, com determinação do índice de pressão braço-‐perna se os pulsos se
apresentarem diminuídos. Um índice de pressão inferior a 0,6 é, em regra,
contraindicação para uso de meias elásticas;
-‐ Presença de infeção, dermatose;
-‐ Neuropatia periférica;
-‐ Estado geral do doente;
-‐ Limitação de calçar meias, poderá ser reduzida com a prescrição de calçadores, hoje
disponíveis no mercado.
Terapêutica compressiva na doença venosa crónica e insuficiência venosa crónica
118 116
Indicações de prescrição das MCE
As meias elásticas tem indicação de prescrição nas seguintes situações:
-‐ Doentes com doença venosa classes CEAP (C0s a C1s), para alívio sintomático;
-‐ Doentes com DVC classe C2 para tratamento dos sintomas e prevenção de
complicações como varicorragia, varicoflebite ou alterações tróficas;
-‐ No pós-‐operatório de cirurgia de varizes e após esclerose
-‐ Doentes com IVC classe C3, para reduzir ou eliminar o desenvolvimento do edema
venoso ortostático;
-‐ Doentes com IVC classes C4, 5 ou 6;
-‐ Prevenção do tromboembolismo venoso (meias tromboembólicas com 18 mm Hg);
-‐ Tratamento da trombose venosa superficial e profunda;
-‐ Prevenção e tratamento da síndrome pós-‐trombótica;
-‐ Na gravidez (em regra collants de gravidez);
-‐ Prevenção de trombose venosa durante viagens longas (avião, autocarro, etc.);
-‐ Tratamento do linfedema.
De notar a existência no mercado de meias denominadas “meias de descanso” que
não tem regulada a sua classe de compressão, sendo a mesma classificada em “deniers
ou decitex”, que apenas definem o peso em gramas de 9 ou 10 Km de fio,
respetivamente. As meias com maior número de deniers, 140-‐280 são mais espessas
que as de 40-‐70, mas não necessariamente com maior compressão. As meias de
descanso não tem, em regra, mais do que uma compressão de 6-‐14 mm Hg.
De recordar que as meias elásticas de compressão mais baixa, destinadas a prevenção
tromboembólica, têm, em média, uma compressão de 18 mm Hg no tornozelo e 8 mm
Hg na coxa e foram desenhadas para este uso com o objetivo de acelerar o retorno
venoso, apenas na situação de decúbito, pelo que não devem ser consideradas como
alternativa às outras meias elásticas.
Terapêutica compressiva na doença venosa crónica e insuficiência venosa crónica
(Mediven Struva 23);
119117
Normas de aplicação
As meias elásticas devem ser colocadas de manhã, após o banho, e devem ser
kit ulcera.
Para facilitar o calçar das meias sem biqueira, pode utilizar-‐se uma meia de seda, que
acompanha a embalagem das meias e facilita o seu deslizamento. O uso de luvas de
borracha também facilita o calçar das meias, bem como evita a sua danificação pelas
unhas. Existem também, como já referido, calçadores próprios para as meias (calçador
para uso hospitalar e domiciliário).
É essencial respeitar as recomendações do médico, em relação ao uso das meias
elásticas. Há situações em que a prescrição de meias elásticas é para uso esporádico
das mesmas, p. ex. viagens longas (avião, autocarro, automóvel), ou no desempenho
de profissões que obriguem a posição de sentado ou de pé por períodos longos
(cabeleireiros, empregados de restauração, hospedeiras, cirurgiões, etc.).
As meias devem ser lavadas diariamente de acordo com as indicações de utilização
que as acompanhem, não devendo ser torcidas, nem secadas nos secadores ou ao sol.
As meias elásticas tratadas de acordo com as recomendações tem uma duração de
quatro a seis meses.
Conclusões
-‐ Evidência robusta na prevenção e tratamento das úlceras venosas (kit ulcer);
-‐ Evidência moderadamente robusta para uso das meias elásticas em doentes com
sintomas venosos e na prevenção e tratamento do edema venoso (classes de
compressão I e II);
-‐ Recomendação para uso de meia elástica depois do tratamento cirúrgico de varizes
durante a 1ª semana (Mediven struva 23 mm Hg);
-‐ Não há ensaios randomizados que documentem efeito preventivo na progressão da
doença venosa;
-‐ Na trombose venosa, as meias de compressão elástica são recomendadas para
reduzir o edema e a tumefação iniciais;
Terapêutica compressiva na doença venosa crónica e insuficiência venosa crónica
120 118
-‐ Na prevenção da síndrome pós-‐trombótica, apesar de resultados contraditórios, as
meias elásticas continuam a ser recomendadas;
-‐ Na prevenção do tromboembolismo venoso as meias elásticas têm lugar limitado, e,
em regra, associado aos anticoagulantes.
Referências bibliográficas
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compression alone in chronic venous ulceration (ESCHAR study): Randomized
controlled trial. Lancet 2004; 363: 1854-‐1859.
2. Goehl MS, Barwell JR, Taylor M et al. Long term results of compression alone versus
compression plus surgery in chronic venous ulceration (ESCHAR): Randomized
controlled trial. BMJ 2007; 335: 83-‐89.
3. Brandges DPM, Buller HR et al. Randomized trial of effect of compression stockings
in patients with symptomatic proximal vein thrombosis. Lancet 1997; 349: 759-‐762.
4. Prandoni P, Lensing AWA. Bellow-‐knee elastic compression stockings. A randomized
controlled trial. Ann Intern Med 2004; 141: 249-‐256.
5. Khan S, Shapiro S Wells P. Compression stockings to prevent post-‐thrombotic
syndrome. A randomized placebo controlled trial. Lancet 2014; 383: 880-‐888.
6. Leon M. Volteas N, Labropoulos N, et al. The effect of elastic stockings on the
elasticity of varicose veins. Int. Angiol 1993; 12: 173-‐177.
7. Labropoulos N, Leon M, Volteas N, Nicolaides NA. Acute and long term effect of
elastic stockings in patients with varicose veins. Int. Angiol 1994; 13: 119-‐123.
8. Eberhard Rabe, Hugo Partsch et al. Indications for medical compression stockings in
venous and lymphatic disorders: An evidence-‐based consensus statement. Phlebology
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9. C Schwahn-‐Schreiber et al. Reality of outpatient care with medical compression
stockings. Follow-‐up analysis of the mediven observational study. Phlebologie 2016; 4:
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10. Korn P, Patel ST, Hellen JH et al. Why ensurers should reimburse for compression
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Terapêutica compressiva na doença venosa crónica e insuficiência venosa crónica
121 119
CIRURGIA DAS VARIZES DOS MEMBROS INFERIORES
Carlos Pereira Alves
Razões da cirurgia
Os doentes com doença venosa crónica (DVC), classe C2 da classificação CEAP, têm
como indicação para cirurgia:
. Cosmética;
. Resolução/ alívio de sintomas;
. Retirar as veias varicosas;
. Prevenir a evolução para insuficiência venosa crónica (IVC) classes C3, 4, 5, 6 da
classificação CEAP.
. Evitar complicações de varicorragia (espontânea ou traumática) ou de varicoflebite
(trombose venosa em veia varicosa).
Na ausência de contraindicações e com consentimento informado, todos os doentes
com varizes têm indicação para cirurgia.
A insuficiência venosa crónica reforça a indicação para cirurgia.
Nas úlceras venosas, o ensaio ESCHAR randomizou 500 doentes que, para além da
úlcera, tinham refluxo superficial isolado ou refluxo superficial e profundo,
comparando a compressão elástica com a cirurgia de laqueação e stripping associados
a compressão elástica. Aos quatro meses a percentagem de cicatrização era igual (65
%), mas aos 12 meses a recorrência era de 28 % no grupo só com compressão e 12 %
no grupo com cirurgia associada, diferença que se mantinha aos quatro anos1, 2.
A cirurgia das varizes mostrou ser custo-‐efetiva3.
Moderna abordagem na cirurgia das varizes
Na sequência de um conceito clássico, com mais de 100 anos, de que as varizes eram
consequência de uma insuficiência valvular descendente progressiva, iniciada na
insuficiência da válvula terminal das crossas das safenas, a cirurgia das varizes tem sido
igual para todos os doentes, consistindo na laqueação das crossas das safenas, hoje
designadas junção safenofemoral (JSF) e junção safenopoplítea (JSP), “stripping” do
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
122 120
tronco das safenas e excisão/laqueação das veias varicosas com incisões cutâneas
múltiplas.
O “stripping” da grande veia safena (GVS), inicialmente da região inguinal até ao
maléolo interno, deu lugar a “stripping” limitado ao joelho, para evitar lesão do nervo
safeno, dada a proximidade deste com a GVS no terço médio da perna.
Esta abordagem estandardizada e radical, mudou na sequência de observações
anatómicas e funcionais com o exame ecoDoppler com cor.
De facto este exame, hoje essencial no estudo e tratamento das varizes, ao permitir a
visualização ecográfica das veias, veio, no plano anatómico, mostrar que as veias
safenas são veias interfasciais e não superficiais. O tronco das safenas é revestido na
sua face anterior, por uma fascia (a fascia safeniana) e na face posterior pela
aponevrose muscular, estando assim localizado num compartimento próprio (o
compartimento safeniano). Ao contrário, da anatomia clássica que considerava apenas
dois compartimentos para as veias dos membros inferiores, o compartimento das
veias profundas e o das veias superficiais, a anatomia ecoDoppler considera três
compartimentos: o profundo com as veias profundas, inter e intramusculares; o
interfascial, com os troncos das veias safenas; e o superficial com as colaterais
superficiais, safenianas ou não safenianas4, 5 (Fig. 1).
Compartimento
superficial
Compartimento safeniano
Compartimento profundo
Fig. 1 -‐ Compartimentos venosos da ecoanatomia.
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
123 121
A existência desta fascia safeniana torna as veias safenas mais resistentes à dilatação
na posição de pé, em relação às veias superficiais mais vulneráveis. No plano
hemodinâmico o exame ecoDoppler veio mostrar que a válvula terminal da GVS é
competente em cerca de 50 % dos doentes com varizes6, 7 e que o refluxo pode
envolver apenas colaterais superficiais, safenianas ou não, colaterais superficiais e
tronco das safenas ou apenas o tronco das safenas. O envolvimento do tronco das
safenas pode ser contínuo da junção safenofemoral até ao maléolo ou apenas de
segmentos da GVS que podem envolver ou não a JSF.
Com base neste padrão, os refluxos são classificados de refluxo axial (Ra) quando o
refluxo da GVS é contínuo da JSF até ao maléolo (Fig. 2) e refluxo segmentar (Rs) nos
restantes casos, com as variantes de Rs1 (Fig. 3), que apenas envolve colaterais, Rs2
(Fig. 4), quando envolve colaterais e segmentos da safena e Rs3 (Fig. 5), quando
envolve colaterais e a JSF8, 9, 10, 11, 12, 13, 14.
Fig. 2 -‐ Refluxo axial da GVS (Ra) Fig. 3 -‐ Refluxo segmentar Rs1
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
124 122
Fig. 4 – Refluxo segmentar Rs2 Fig. 5 – Refluxo segmentar Rs3
Estes achados do ecoDoppler vieram questionar a teoria valvular clássica, da
insuficiência descendente progressiva a partir da válvula terminal da safena (Fig. 6), e
são a favor de uma teoria parietal em que o processo inicial das varizes se pode iniciar
em qualquer segmento venoso (veias superficiais ou tronco das safenas), com
progressão ascendente (Fig. 7), como referido por Labropoulos “... the parietal venous
modifications may appear in any venous segment whatever its localization and quality
of its valves.”15
Fig. 6 – A. Fluxo normal; B. Início de reflu-‐ Fig. 7 – A. Fluxo normal; B. Início do re-‐ xo na junção; C. Progressão descendente fluxo na colateral superficial; C. Progres-‐ do refluxo ao longo da GVS; D. Progres-‐ são ascendente do refluxo ao longo da são envolvendo colateral superficial. GVS; D. Progressão envolvendo a junção.
(amabilidade de A. Caggiati)
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
125 123
As veias varicosas superficiais, de extensão e dimensões variáveis representam um
reservatório varicoso superficial que tem vindo a ganhar relevo de papel central na
evolução das varizes papel até aqui atribuído as safenas tronculares16, 17.
A excisão destas veias superficiais varicosas pode reduzir ou suprimir o refluxo nas
veias safenas18, 19, 20.
Estudos com o ecoDoppler têm também mostrado que pontos de refluxo entre as
veias profundas e as veias superficiais ou interfasciais (safenas) e considerados até
aqui como responsáveis do início do processo de dilatação varicoso ao permitir através
das crossas das safenas ou de veias perfurantes transmissão da maior pressão venosa
das veias profundas às superficiais podem ser corrigidos pela ablação das veias
varicosas superficiais.
A correção de refluxos da GVS, com a excisão das colaterais varicosas poderá ter como
explicação plausível, a diminuição da sobrecarga do volume de sangue venoso
(overload) exercido pelo reservatório varicoso superficial ou do efeito aspirativo (efeito
sifão) das próprias varizes sobre a safena troncular.
Também as perfurantes têm mostrado recuperar a sua competência uma vez feito o
tratamento das colaterais varicosas, questionando o papel das perfurantes e a
necessidade a sua laqueação21, 22, 23, 24, 25.
Nas técnicas endovasculares em que a oclusão da GVS se inicia 2 cm abaixo da JSF,
preservando assim colaterais da crossa, estas têm mostrado no estudo ecoDoppler
manterem fluxo fisiológico para a veia femoral, não se verificando como se pensava,
ser esta preservação de colaterais da crossa um fator de recorrência.
Esta não necessidade de laqueação da JSF juxta femoral reduz a disseção cirúrgica da
região inguinal, reduzindo o potencial risco de neovascularização, hemorragia ou
linforragia.
A sua não realização não é fator de recorrência26, 27.
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
126 124
Várias técnicas estão hoje disponíveis para atingir este objetivo desde a cirurgia
clássica convencional, a moderna cirurgia adaptada ao padrão de refluxo, a técnica
CHIVA, as técnicas endovasculares de radiofrequência, laser ou vapor, à escleroterapia
com espuma guiada por ecoDoppler, para mencionar as mais utilizadas.
Perante estas varias opções, não há consenso sobre qual o melhor tratamento, o qual
deve ter em consideração a extensão e dimensão das varizes e os padrões de refluxo,
axial ou segmentar.
As “guidelines” não são inclusivas do tratamento integral, p. ex. consideram
de escolha as técnicas endovasculares no tratamento do tronco das safenas, mas estas
técnicas não tratam as colaterais varicosas, sendo que, para estas o tratamento de
escolha é a fleboextração com incisões cutâneas múltiplas ou esclerose. Dado que, a
grande maioria de doentes com varizes tem colaterais varicosas, com envolvimento
axial ou segmentar do tronco das safenas, a cirurgia é a única técnica que trata, no
mesmo tempo operatório, as colaterais e o tronco.
Não havendo consenso sobre o tratamento de escolha, este deve ser baseado na
interpretação dos dados ecoDoppler, na experiência pessoal e resultados obtidos com
determinada técnica pelo cirurgião, a par da possibilidade de escolha informada e
esclarecida do doente.
Recente meta-‐análise realizada pela SVS e AVF, mostrou estar a cirurgia, em
comparação com outras modalidades de tratamento, associada a uma redução não
significativa de recorrência de varizes e as técnicas menos invasivas associadas a
menor morbilidade pós-‐operatória (dor e retorno da atividade28).
No European Venous Forum (EVF; 29 de junho -‐ 1 julho -‐ 2017, Porto, Portugal), Lars
Rasmusssen apresentou um estudo comparando os resultados a cinco anos de quatro
diferentes métodos de tratamento das varizes, radiofrequência (closure fast), laser,
laqueação da JSF e stripping e escleroterapia guiada por ultrassonografia. 0s autores
concluem, que houve mais recanalizações da GVS com a escleroterapia e que não
houve diferenças na eficácia clínica entre as outras modalidades.
Devemos ainda ter presente que as técnicas endovasculares tem limitações
anatómicas a saber, GVS com diâmetro superior a 10-‐12 mm, de trajeto superficial,
tortuoso ou com dilatações saculares, verdadeiros aneurismas venosos superficiais,
nomeadamente na JSF (Fig. 8).
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
Várias técnicas estão hoje disponíveis para atingir este objetivo desde a cirurgia
clássica convencional, a moderna cirurgia adaptada ao padrão de refluxo, a técnica
CHIVA, as técnicas endovasculares de radiofrequência, laser ou vapor, à escleroterapia
com espuma guiada por ecoDoppler, para mencionar as mais utilizadas.
Perante estas varias opções, não há consenso sobre qual o melhor tratamento, o qual
deve ter em consideração a extensão e dimensão das varizes e os padrões de refluxo,
axial ou segmentar.
As “guidelines” não são inclusivas do tratamento integral, p. ex. consideram de escolha
as técnicas endovasculares no tratamento do tronco das safenas, mas estas técnicas
não tratam as colaterais varicosas, sendo que, para estas o tratamento de escolha
é a fleboextração com incisões cutâneas múltiplas ou esclerose. Dado que, a grande
maioria de doentes com varizes tem colaterais varicosas, com envolvimento axial
ou segmentar do tronco das safenas, a cirurgia é a única técnica que trata, no
mesmo tempo operatório, as colaterais e o tronco.
Não havendo consenso sobre o tratamento de escolha, este deve ser baseado na
interpretação dos dados ecoDoppler, na experiência pessoal e resultados obtidos com
determinada técnica pelo cirurgião, a par da possibilidade de escolha informada
e esclarecida do doente.
127125
Fig. 8 -‐ Aneurisma venoso da JSF Fig. 8a -‐ Imagem ecográfica
Fig. 8b -‐ Imagem intra operatória
A percentagem de recorrência com a cirurgia, é similar ou ligeiramente inferior à das
restantes técnicas28.
A nossa opção de escolha no tratamento das varizes é, assim, de cirurgia adaptada ao
padrão de refluxos do exame ecoDoppler, porque permite excisão das safenas e
colaterais varicosas com a mesma técnica e no mesmo tempo operatório, não tem
limitações anatómicas, é feita em ambulatório, com retoma de atividade no dia
seguinte, e sem complicações significativas.
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
A percentagem de recorrência com a cirurgia, é similar ou ligeiramente inferior à das
restantes técnicas28.
A nossa opção de escolha no tratamento das varizes é, assim, de cirurgia adaptada ao
padrão de refluxos do exame ecoDoppler, porque permite excisão das safenas e
colaterais varicosas com a mesma técnica e no mesmo tempo operatório, não
tem limitações anatómicas, é feita em ambulatório, com retoma de atividade no
dia seguinte, e sem complicações significativas.
128
126
As considerações que se seguem são resultantes dos doentes tratados no período de
2012 a 2017, a saber 1111 doentes, sendo as varizes bilaterais em 514, o que perfaz um
total de 1625 membros inferiores operados, dos quais 270 com varizes recorrentes
(16,6 %).
Cuidada e completa história e observação clínica, que nos permitam
a classe de classificação CEAP, C0s a C6, registar os sintomas e sua severidade,
antecedentes de complicações de varicorragia, varicoflebite ou tromboembolismo
venoso bem como comorbilidades.
Exame ecoDoppler venoso, que permita completar a classificação CEAP, e estabelecer
o padrão de refluxo axial ou segmentar das safenas, bem como o estudo das veias
perfurantes e profundas femoral e poplítea.
O estudo ecoDoppler venoso com cor permite proceder a um verdadeiro mapeamento
pré-‐operatório das varizes e padrões de refluxo.
Na nossa experiencia os padrões de refluxo mais frequentes são:
-‐ Refluxo da JSF e de todo o tronco da GVS, envolvendo quase sempre colaterais
varicosas na coxa e/ou perna (refluxo axial da GVS);
-‐ Refluxo da JSF com refluxo da GVS só até ao terço superior ou medio da coxa, onde
se verifica zona de confluência com colateral varicosa (frequente a colateral antero-‐
externa da coxa), com competência da GVS abaixo desta confluência (refluxo
segmentar, Rs3);
-‐ Refluxo na safena acessória anterior com JSF competente ou incompetente, mas com
tronco da GVS competente (refluxo segmentar, Rs3);
-‐ Refluxo em colaterais e segmentos adjacentes da GVS (refluxo segmentar Rs2);
-‐ Refluxo só em colaterais, safenianas ou não safenianas, com safenas competentes
(refluxo segmentar, Rs1);
-‐ Refluxo na JSP e PVS mais colaterais varicosas na perna (refluxo axial da PVS);
-‐ Refluxo na PVS que não se lança na veia poplítea, mas se prolonga pela face posterior
da coxa, perdendo-‐se em veias na direção abdómino-‐pélvica, ou conectando-‐se com a
GVS (veia Giacomini);
-‐ O ecoDoppler é igualmente útil na visualização de dilatações saculares da GVS, por
vezes na região da JSF.
Como fazemos?
estabelecer
-‐
-‐
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
129
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
127
Estes diferentes padrões de refluxo vão condicionar a estratégia cirúrgica, que deixa de
ser igual para todos os doentes, com a possibilidade de conservação da GVS, quando
do seu envolvimento segmentar.
Estudo dos pulsos distais (tibial posterior e pedioso), com Doppler contínuo e pedido
de ecoDoppler arterial se os mesmos estiverem diminuídos.
No final da consulta é explicado ao doente o tratamento, este assina consentimento
informado e recebe um folheto informativo (Anexo1).
A cirurgia é realizada em ambulatório na quase totalidade dos doentes, com
internamento esporádico de um dia, por razões de preferência do doente (raríssimo)
ou distância do domicílio.
Os doentes são admitidos de manhã, 08:00 horas, e têm alta pelas 20:00 horas.
No próprio dia, antes da ida para o bloco operatório, o cirurgião procede, com o
doente de pé, a marcação com caneta dermográfica de todas as colaterais varicosas,
(Fig. 9) bem como uma marcação precisa da JSF ou JSP (esta já referenciada no exame
ecoDoppler), com o Doppler portátil, para facilitar a abordagem cirúrgicas das
mesmas.
Fig. 9 -‐ Marcação pré operatória
A anestesia é locorregional, epidural ou raquianestesia, ou anestesia geral com
máscara laríngea.
A nossa prática cirúrgica tem mostrado, com estas técnicas anestésicas, bons
resultados, sem complicações e recuperação em 2-‐4 horas.
A cirurgia tem como passos principais:
-‐
-‐
-‐
130 128
-‐ Desinfeção da pele com Octenidina;
-‐ Abordagem da GVS com uma incisão transversal de 4-‐6 cm, paralela à prega inguinal
e centrada na JSF de acordo com a marcação pré-‐operatória do Doppler contínuo;
-‐ Exposta na região inguinal a GVS, esta é seccionada entre duas pinças hemostáticas,
laqueado o topo proximal com seda 2/0 e referenciado o topo distal, com duas pinças
de Halstead, através do qual é introduzido um “stripper” flexível, de cima para baixo,
até abaixo do joelho (em regra), onde é recuperado através de uma pequena incisão
cutânea vertical com exposição do tronco da safena, laqueação do topo distal e
exteriorização do “stripper” através do topo proximal. O “stripper” exteriorizado é
puxado de cima para baixo até a sua extremidade superior ficar envolvida no lúmen da
GVS, sendo depois laqueado circularmente com seda 2/0, abaixo da extremidade mais
larga do “stripper”. Uma vez laqueada a GVS em volta do “stripper” este é agora
retirado de cima para baixo, com gestos suaves arrastando por invaginação a GVS;
-‐ As veias superficiais varicosas, previamente marcadas, são retiradas com incisões
cutâneas múltiplas, verticais na coxa e perna e transversais no joelho, respeitando as
linhas de tração cutânea de Langer;
-‐ Na cirurgia da PVS, a abordagem da JSP é feita com incisão transversal centrada na
marcação pré-‐operatória e laqueação da mesma. Não procedemos a stripping da PVS;
-‐ Não procedemos à laqueação das perfurantes incompetentes da perna, nos doentes
classe clínica C2 e nas classes C5 e C6 só consideramos a sua laqueação para doentes
que, após o tratamento do sistema superficial, venham a ter recorrência da úlcera
venosa, com persistência de perfurantes incompetentes na região da úlcera e que não
tenham insuficiência associada das veias profundas. Apesar de um ensaio clínico ser
favorável ao tratamento inicial das perfurantes nos doentes com úlcera para prevenir a
sua recorrência29, esta posição não é consensual, dada a não existência de ensaios
randomizados e controlados, que comparem a cirurgia, só do sistema superficial, com
a cirurgia do sistema superficial mais laqueação das perfurantes, e se ter verificado
perfurantes incompetentes tornarem-‐se competentes, depois do tratamento do
sistema superficial21, 22, 23, 24, 25. Uma revisão da cirurgia das perfurantes conclui não
haver evidências de benefício da sua laqueação, pelo contrário, as evidências apontam
no sentido da sua não necessidade30.
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
131129
Em 2017 as guidelines do AVF no tratamento da úlcera venosa (recomendação 4-‐24-‐4-‐
5)sugerem a laqueação das veias perfurantes em adição ao tratamento da insuficiência
superficial e à terapêutica compressiva, sendo a sugestão de grau 2C, fraca e baseada
em evidências de qualidade baixa ou muito baixa31.
Na cirurgia de varizes recorrentes, procedemos apenas à excisão das novas colaterais
varicosas, sem reexploração da região da JSF (redo-‐surgery)32.
As varizes recorrentes refletem o caráter crónico progressivo da doença, mesmo com a
abordagem radical de excisão dos segmentos venosos patológicos, a recorrência está
sempre presente, não havendo marcadores que permitam prever essa possibilidade
(em que casos) nem a sua rapidez.
O doente tem alta, como já referido pelas 20:00 h, deslocando-‐se pelos seus próprios
meios, retomando a sua atividade diária normal no dia seguinte, com a meia elástica.
O regresso ao trabalho é função do tipo deste e do próprio doente, sendo de dois a dez
dias (altura em que retira os pontos e a meia elástica).
Não tivemos qualquer complicação peri-‐operatória relacionada com a cirurgia ou
anestesia.
A cirurgia dura de 30 minutos a duas horas, conforme a extensão e magnitude das
varizes e serem uni ou bilaterais.
Não fazemos profilaxia antibiótica e só fazemos prevenção do TEV nos doentes com
antecedentes de episódios tromboembólicos.
Além da analgesia no pós-‐operatório imediato, não prescrevemos analgésicos e/ou
anti-‐inflamatórios para o pós-‐operatório, e os doentes tem confirmado a sua não
necessidade, referindo apenas, por vezes no 1º dia, uma ou duas tomas de analgésico,
tipo Paracetamol ou Aspirina, mais por prevenção que por necessidade.
A manutenção da meia elástica Struva no pós-‐operatório, poderá ser fator explicativo
desta não necessidade de analgesia/anti-‐inflamatórios no pós-‐operatório, dado o seu
-‐
efeito compressivo poder limitar a dor e inflamação.
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
Na página seguinte exemplos de doentes operados (Fig. 10 a 17).
132
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
Fig. 10 - Varizes exuberantes em doente com antecedentes de cirurgia da obesidade
Fig. 12 - Seis meses depois
Fig. 17Três anos depois
Fig. 15Três anos depois
Fig. 13 - Um ano depois
Fig. 16Varizes da perna
Fig. 14Varizes dacoxa esquerda
Fig. 11 - Varizes retiradas
133130
As complicações pós-‐operatórias tem sido clinicamente não significativas, traduzidas
essencialmente, na nossa série de 1111 doentes operados entre 2012-‐2017, por
ligeiras equimoses da coxa, que resolvem em dias ou semanas (as equimoses extensas
do passado passaram a ser pouco frequentes com a técnica “stripping”de invaginação).
Deiscência das incisões cutâneas são muito raras, tivemos três casos com necessidade
de ressutura em um caso, e um de necrose dos bordos de incisão de doente diabético,
como infeção tivemos um caso de abcesso inguinal necessitando de drenagem, raros
hematomas (três casos), linfatomas (um caso na região inguinal), linforragia (dois
casos: um inguinal e um em incisão da perna), neurite do nervo safeno (dois casos de
parestesias temporárias do tornozelo), e pensamos que o stripping de invaginação, de
cima para baixo e limitado ao joelho, reduz a possibilidade da lesão do nervo. Não
tivemos casos de TEV.
Dado serem as varizes uma doença crónica progressiva, pretendemos um seguimento
contínuo numa base anual.
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Como conclusão da nossa série de 1625 membros operados entre 2012 e 2017,
a cirurgia das varizes adaptada ao padrão de refluxos teve excelentes resultados
com morbilidade mínima, rápido regresso as atividades diárias (um dia) e ao trabalho
(dois a dez dias), e elevado grau de satisfação dos doentes, manifestado na
consulta pós-operatória.
Cirurgia das varizes dos membros inferiores
134 131
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Cirurgia das varizes dos membros inferiores
136
137133
TRATAMENTO ENDOVASCULAR
Élia Coimbra e Filipe Veloso Gomes
Introdução às técnicas endovasculares
O tratamento do refluxo das veias safenas evoluiu da abordagem cirúrgica clássica de
laqueação alta da Veia Grande Safena (VGS) e stripping da mesma, para uma
abordagem minimamente invasiva através de diversas técnicas endovasculares, que
permitem o tratamento das varizes dos membros inferiores, em regime ambulatório,
apenas com recurso a anestesia local e com a possibilidade de realizá-‐lo em contexto
de consultório, fora do bloco operatório. As primeiras técnicas endovasculares foram
desenvolvidas nos anos 90 e as primeiras publicações de estudos observacionais e
experimentais surgiram no início dos anos 2000, demonstrando a equivalência no
sucesso técnico imediato e menores complicações, em comparação com a abordagem
cirúrgica clássica1, 2, 3, 4. As primeiras técnicas endovasculares para o tratamento do
refluxo das veias safenas foram a termoablação com laser ou radiofrequência e a
escleroterapia com espuma, todas elas requerendo a utilização de ecografia para guiar
o acesso, injeção e posicionamento dos cateteres/fibras, de forma segura.
Evidência e recomendações no tratamento das veias safenas
Em 2012 surgiu a primeira revisão sistemática e metanálise de estudos randomizados e
controlados, comparando o insucesso no tratamento do refluxo da veia tratada entre a
ablação endovenosa e o tratamento cirúrgico no tratamento de varizes. Nesta
metanálise, a termoablação com laser ou radiofrequência (RFA), mas não a ablação
com espuma, teve eficácia equivalente à cirurgia, sem diferenças estatisticamente
significativas. Em relação à comparação da ocorrência de complicações, a
termoablação (laser ou RFA) teve uma taxa de infeção inferior em 70 % (NNT 80),
redução do risco de hematoma em 50-‐60 % (NNT 4 a 10), menor dor pós-‐tratamento e
permitiu um retorno mais rápido às atividades normais em três a cinco dias, em
relação à cirurgia5. Mais recentemente, duas revisões sistemáticas publicadas pela
Cochrane Database of Systematic Reviews analisaram os resultados provenientes de
Tratamento endovascular
138 134
estudos randomizados e controlados, que compararam o tratamento cirúrgico com a
termoablação e a ablação com espuma de veias grandes e pequenas safenas refluxivas.
Em relação ao tratamento do refluxo da VGS, os dados analisados demonstraram
eficácia semelhante do tratamento cirúrgico em comparação com a termoablação ou
com a ablação com espuma, tendo os autores alertado para a falta de robustez da
evidência clínica previamente publicada e que serviu de base a este estudo6. Em
relação ao tratamento da Veia Pequena Safena (VPS), os autores concluem que existe
evidência que demonstra que a taxa de recanalização ou persistência de refluxo às seis
semanas, bem como a recorrência de refluxo após um ano, são menores no
tratamento com termoablação com laser, quando comparado com a cirurgia
convencional7. Relativamente a outros indicadores, não foram encontrados estudos
suficientes que permitissem tirar conclusões. Por último, em relação à análise de
custo-‐efetividade, existe alguma evidência que favorece a termoablação e em
particular o tratamento com laser, como o tratamento que apresenta a maior custo-‐
eficácia, quando comparado com a cirurgia ou a ablação com espuma8, 9. O aumento
do número de publicações e, em particular, os resultados das principais metanálises
estão, pelo menos em parte, na base das recomendações atuais das principais
sociedades científicas generalistas e de cirurgia vascular. De acordo com as Clinical
Practice Guidelines da European Society for Vascular Surgery (ESVS) de 2015, o
tratamento do refluxo da VGS deve ser realizado, preferencialmente, com
termoablação endovenosa, em detrimento da cirurgia ou da ablação com espuma10.
Em relação ao tratamento do refluxo da VPS, a recomendação é apenas de
consideração da abordagem endovenosa no tratamento da mesma. O National
Institute for Health and Care Excellence (NICE) do Reino Unido, recomendou a partir de
2013 a utilização da termoablação endovenosa do refluxo das veias safenas com
varizes dos membros inferiores, como a abordagem de primeira linha, seguida da
ablação com espuma e da cirurgia, quando a primeira estiver contraindicada11. Do
outro lado do Atlântico, a Society for Vascular Surgery (SVS), em conjunto com o
American Venous Forum (AVF), recomendam a termoablação endovenosa em
detrimento da cirurgia, devido à redução da dor e da morbilidade associada e ao
menor período de convalescença12. As técnicas endovasculares são habitualmente
Tratamento endovascular
139 135
complementadas com a realização de flebectomias ou escleroterapia com espuma das
varizes, na mesma sessão ou num segundo tempo10.
Termoablação das veias safenas
A termoablação das veias safenas consiste na aplicação de energia térmica através de
cateteres, EVLT, RFA ou vapor. Em todas as técnicas de termoablação, está
recomendada a terapêutica com meias de compressão durante cerca de uma semana
(embora não seja consensual uma duração exata). Estas técnicas podem ser realizadas
em ambulatório, sem recurso a anestesia geral, permitindo a alta, imediatamente após
a realização do tratamento. O procedimento de termoablação, consiste na canulação
ecoguiada da VGS, habitualmente logo abaixo do joelho, progredindo-‐se um cateter e
um fio guia até à junção safenofemoral (JSF). De seguida retira-‐se parcialmente o
cateter e posiciona-‐se entre 2 a 5 cm da JSF e substitui-‐se o fio guia pela fibra de laser
ou cateter de radiofrequência, de acordo com as recomendações de cada fabricante.
Todas as técnicas de termoablação incluem a administração de elevada energia sob a
forma de calor, motivo pelo qual o passo seguinte é a administração da anestesia de
tumescência. A anestesia de tumescência consiste na injeção no compartimento da
VGS, entre a faixa muscular e a faixa hipodérmica, de volumes generosos de soro
fisiológico contendo lidocaína (0,05 % a 0,1 %) e adrenalina (1:1.000.000), com o
objetivo de anestesiar localmente, comprimir a veia safena contra o cateter de ablação
e criar uma “manga” de isolamento térmico, que evita a lesão de estruturas
envolventes (Fig. 1).
Fig. 1 – Imagem de ecografia no eixo longitudinal da veia grande safena, onde se observa a
administração da anestesia de tumescência.
Tratamento endovascular
140 136
Após a administração do líquido de tumescência ao longo de toda a extensão da veia a
tratar, inicia-‐se então a termoablação, mantendo-‐se um recuo segmentar ou contínuo
do cateter, ao ritmo recomendado pelo fabricante (Fig. 2). No tratamento da VGS
abaixo do joelho, existe o risco de lesão do nervo safeno, o qual tem um trajeto
próximo da veia13. No tratamento da VPS, abaixo da margem inferior da porção
muscular do gastrocnémio, no 1/3 médio da perna, existe o risco de lesão do nervo
sural14, pelo que o acesso à veia não deve ser realizado inferiormente a esse ponto,
quando se utiliza termoablação.
Fig. 2 – Imagem de ecografia de termoablação da veia grande safena, onde se observa a
extremidade ativa do cateter de termoablação emitindo calor e gás ecogénico, no interior da veia.
Existe uma outra técnica mais recente, que é o tratamento com vapor de água,
embora a sua utilização não esteja implementada na prática clínica.
As principais complicações das técnicas de termoablação incluem tromboflebite (7 %),
queimadura cutânea (<1 %), hematoma (0-‐7 %), hiperpigmentação (5 %) e parestesias
(1-‐2 %)10.
Ablação não térmica das veias safenas
A ablação não térmica tem como principais vantagens a diminuição do risco de
queimaduras, bem como de lesão quer do nervo safeno, no tratamento da VGS, quer
do nervo sural, no tratamento da VPS, permitindo o tratamento de ambas as veias, em
toda a sua extensão. As técnicas não térmicas incluem a escleroterapia, a ablação
mecânico-‐química e a ablação adesiva.
Tratamento endovascular
141137
Escleroterapia com espuma das veias safenas
A escleroterapia com espuma consiste na canulação ecoguiada da veia grande safena,
seguida da injeção de um agente esclerosante (tetradecil sulfato de sódio ou
polidocanol) preparado sob a forma de espuma, a qual ocupa o espaço do sangue no
lúmen da veia, obliterando-‐o, promovendo inflamação das camadas endotelial e
subendotelial da veia, que resulta em oclusão e fibrose. As taxas de sucesso desta
técnica variam entre 88 % a 93 %, com complicações próximas das observadas na
escleroterapia com agente líquido. Após o tratamento está recomendada a utilização
de meias de compressão, com duração não consensual.
Ablação mecânico-‐química
Este método combina a lesão mecânica endotelial com a infusão de agente
esclerosante líquido, através de um dispositivo (Clarivein®), tendo já demonstrado uma
eficácia a curto prazo de cerca de 90 %, avaliada ecograficamente pelo encerramento
da VGS entre seis a 12 semanas após o tratamento, e taxas de complicações que lhe
conferem um perfil seguro15. Está recomendada a utilização de meias de compressão
com duração não consensual.
Ablação adesiva com cianoacrilato (cola)
O método de encerramento da VGS e da VPS tem sido alvo de grande atenção, pelo
facto de não requerer a administração de anestesia de tumescência, ao contrário das
técnicas de termoablação, nem a utilização de meias de compressão após o
tratamento, o que é único nas técnicas endovasculares. O acesso à VGS é feito com o
auxílio da ecografia, seguindo-‐se a colocação do cateter a 5 cm da JSF. A partir daí,
comprime-‐se a VGS abaixo da JSF para evitar a passagem de cola para a circulação
profunda, e inicia-‐se a administração de pequenas quantidades de cola, de acordo com
o protocolo definido pelo fabricante. No caso do VenaSeal®, que foi utilizado no
estudo VeClose16, o cianoacrilato é administrado através de um dispositivo de entrega
que se liga ao hub do cateter, seguindo-‐se um período de compressão de três minutos,
na primeira aplicação junto à JSF e de 30 segundos inferiormente, intercalados por um
recuo de 3 cm do cateter. Os resultados do estudo VeClose aos 12 meses, um estudo
multicêntrico americano, randomizado e controlado, comparando a ablação com cola,
com a termoablação utilizando radiofrequência, demonstrou uma eficácia no
encerramento da VGS de 96 % em ambos os grupos, com taxas de complicações
Tratamento endovascular
142 138
semelhantes e melhorias idênticas nos questionários de qualidade de vida aplicados16.
A complicação que a literatura, e também a experiência dos autores no tratamento de
15 doentes, impõe referir, é a ocorrência de flebite da veia tratada, atingindo até 20 %
dos doentes17, com necessidade de tratamento anti-‐inflamatório, por vezes de forma
prolongada. Adicionalmente, uma publicação recente, que relata uma experiência
desta técnica em 55 doentes, refere que o diâmetro da veia safena, quando maior que
6 mm, é preditor de recanalização da veia, aspeto a ter em conta na seleção do
tratamento endovenoso a utilizar18.
Conclusão
O tratamento endovascular do refluxo das veias safenas, no contexto de varizes dos
membros inferiores, é, atualmente, a escolha de primeira linha e deve ser baseado
num estudo de ecoDoppler detalhado, que identifique as causas mais frequentes e
exclua causas menos frequentes de varizes, de acordo com as recomendações atuais
das principais sociedades científicas de cirurgia vascular. O tratamento deve ser
individualizado a cada doente, nomeadamente tendo em conta a causa das varizes dos
membros inferiores, a adequação das diferentes técnicas às áreas a tratar e as
expetativas de cada doente.
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Tratamento endovascular
145141
TRATAMENTO DAS PERFURANTES INSUFICIENTES DOS MEMBROS INFERIORES
PORQUÊ, QUANDO E COMO?
Carlos Eduardo Costa Almeida
Da importância das perfurantes ao porquê do seu tratamento
Ao longo dos últimos anos, muita discussão tem surgido, sobre o tratamento de varizes
dos membros inferiores. Quais os melhores métodos e quais as varizes a tratar, têm
sido perguntas cujas respostas não parecem ser unânimes. No entanto parece ser
globalmente aceite, e é também a opinião do autor, que dado o facto de a etiologia
não ser totalmente compreendida, todas as varizes devem ser tratadas, uma vez que
se trata de veias dilatadas, tortuosas e mal funcionantes, responsáveis pela
hipertensão venosa que caracteriza a insuficiência venosa dos membros inferiores, e
cujos tratamentos visam baixar ou mesmo eliminar1, 2. Relativamente às perfurantes
várias questões têm sido colocadas quanto à necessidade de as tratar, pois para alguns
são de reentrada, a sua dilatação não é causa de doença mas consequência, e não têm
impacto na doença varicosa3. Ora isto não parece ser totalmente verdade!
Por aumentarem a hipertensão venosa as perfurantes insuficientes estão implicadas
na génese das úlceras varicosas e na recidiva de varizes, sendo apontado o seu não
tratamento (por erro táctico ou técnico) responsável pela recidiva precoce1-‐4. Segundo
um estudo de Rutherford e Mark Whiteley publicado em 20015, 44 % dos doentes com
primeiras varizes têm perfurantes insuficientes, enquanto 63 % dos doentes com
varizes recidivadas têm perfurantes incompetentes. Da análise dos dados colhidos por
estes autores, doentes com varizes recidivadas têm maior prevalência e maior número
de perfurantes insuficientes por perna, comparando com os casos de primeiras varizes.
Estes achados apoiam a ligação das perfurantes insuficientes com a recidiva de varizes.
Em 2014, Kiguchi6 comprovou a importância hemodinâmica das perfurantes
insuficientes na génese da doença varicosa, ao tratar por esclerose perfurantes em
doentes sem refluxo axial, conseguindo obter melhores resultados na cicatrização de
úlceras venosas. Também Tenbrook7 em 2004 concluiu pela importância da laqueação
subfascial endoscópica de perfurantes (SEPS) na cicatrização de úlceras (e assim da
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
146 142
importância destas veias na doença varicosa), conseguindo uma taxa de cicatrização de
88 % quando juntava a SEPS à safenectomia da grande veia safena (GVS), contra 65 %
no grupo onde apenas realizava o stripping da GVS. Em 2015, Van Gent8 publica uma
análise da influência da cirurgia das perfurantes em doentes com úlcera varicosa,
chegando à conclusão que a SEPS bem realizada, diminui significativamente a recidiva
da úlcera, indicando assim a importância clínica das perfurantes insuficientes em
doentes com úlcera venosa activa. Refere ainda que o não tratamento de todas as
perfurantes poderá não influenciar significativamente a cicatrização, mas tem um
impacto negativo importante na recidiva (p=0,007). De salientar ainda, que Van Gent
concluiu também que o tratamento da insuficiência venosa superficial não teve
influência significativa na cicatrização ou recidiva da úlcera venosa nos casos em que a
SEPS foi realizada8.
O refluxo nas perfurantes dos membros inferiores na doença varicosa, ocorre
essencialmente nas veias de Cockett, sendo estas o principal objectivo do tratamento1,
3, 9
imediatamente abaixo do joelho, o stripping da GVS não vai influenciar o fluxo através
das perfurantes de Cockett1, 3. Sendo assim, o tratamento do sistema venoso
superficial pouco irá influenciar o refluxo nas perfurantes, pelo que são necessárias
técnicas dirigidas para o seu tratamento.
Por todas estas razões o tratamento das perfurantes insuficientes é essencial, se
pretendermos oferecer ao doente um tratamento eficaz e duradouro para a sua
doença venosa.
Quando tratar as perfurantes dos membros inferiores?
Apesar da oclusão de todas as perfurantes insuficientes ser o único factor preditivo da
cicatrização de uma úlcera, existe alguma controvérsia quanto aos casos onde há
indicação para as tratar. De acordo com o American Venous Forum e a Society for
Vascular Surgery (Orientações clinicas de 2011)10, as perfurantes insuficientes (refluxo
superior a 0,5 s ou diâmetro superior a 3,5 mm) devem ser tratadas em doentes com
insuficiência venosa crónica (IVC) avançada CEAP classes C5 e C6. Da leitura do
documento fica dúvida quanto à indicação nas restantes classes de IVC (C3 e C4). Os
estudos apresentados nas “guidelines” referem o tratamento nestas classes, ficando
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
147 143
assim em aberto a indicação do tratamento das perfurantes nas classes C3 e C4.
Quanto à doença C2 as orientações do American Venous Forum e da Society for
Vascular Surgery10 são claras, não recomendam o tratamento no caso de doença C2.
No entanto, e segundo autores como Rhodes e O’Donnell, as perfurantes
incompetentes devem ser tratadas em doentes com doença C2 no caso de recidiva de
varizes1-‐3, 11.
Em 2014 a Society for Vascular Surgery e o American Venous Forum publicaram as
“guidelines” para o tratamento da úlcera venosa12. Neste documento, as indicações
são claras e semelhantes no que diz respeito ao tratamento das perfurantes. Indicação
de tratamento das perfurantes insuficientes (refluxo superior a 0,5 s ou diâmetro
superior a 3,5 mm) em combinação com a insuficiência venosa superficial nas classes
CEAP C4b, C5 e C6, com os objectivos de evitar o aparecimento de uma úlcera, evitar a
recidiva, e ajudar na cicatrização da úlcera. Acrescentam ainda que em doentes C5 e
C6 com insuficiência isolada das perfurantes (sem refluxo superficial), o tratamento
das perfurantes deve ser oferecido. Importa referir que as indicações são colocadas
independentemente da presença/ausência de refluxo do sistema venoso profundo, e
que são indicações com grau 2C de evidência.
Estas duas sociedades referem que não há indicação, ou pelo menos indicação apoiada
por estudos, para medidas interventivas profiláticas da progressão da doença venosa
crónica (C1-‐2) para IVC avançada na figura da doença C6. A prova da progressão da
doença parece ser circunstancial, devendo os tratamentos objectivar o alívio
sintomático da doença venosa12. Esta orientação deixa em aberto a eventual
possibilidade de usar medidas interventivas para alívio sintomático mesmo nos casos
de doença venosa crónica precoce.
Continuando esta ideia, como as perfurantes insuficientes estão implicadas na génese
da úlcera varicosa, na recidiva de úlceras e de varizes, e têm um papel hemodinâmico
na hipertensão venosa que caracteriza a doença venosa crónica e que causa sintomas,
o autor tem incluído os casos C2 nas indicações para tratamento de perfurantes
insuficientes. Na análise dos primeiros 50 doentes tratados pelo autor1 e publicada no
Journal of Vascular Medicine & Surgery em 2015, cinco doentes tinham doença C2
(http://dx.doi.org/10.4172/2329-‐6925.1000221).
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
148 144
Como tratar as perfurantes insuficientes?
Para tratar (ocluir/laquear) as perfurantes insuficientes dos membros inferiores
existem diversas técnicas, e, nos últimos anos, alguns avanços e novidades têm
surgido. Entre 1992 e 2008 a laqueação subfascial endoscópica de perfurantes tornou-‐
se a técnica de escolha1, 3. No entanto esta posição tem sido posta em causa pela
emergência das técnicas ecoguiadas de ablação percutânea de perfurantes (PAP), seja
térmica (laser ou radiofrequência) ou química (esclerose). As técnicas de PAP têm sido
atrativas para médicos e doentes, mas a pergunta que se coloca é se oferecem os
mesmos ou melhores resultados que a SEPS1, 13. Para responder a tal pergunta é
necessário proceder a uma revisão de resultados, correlacionando a avaliação da
eficácia com a taxa de cicatrização de úlcera, uma vez que é nos casos C5 e C6 que o
tratamento das perfurantes insuficientes está consensualmente indicado.
Cirurgia aberta
Em 1938, Linton sugeriu pela primeira vez a interrupção das perfurantes para tratar e
prevenir úlceras varicosas. Para tal, era realizada uma incisão longitudinal na face
medial da perna, e através da mesma todas as perfurantes eram laqueadas e
seccionadas. Devido à elevada taxa de complicações da ferida operatória (25 %)2, e
após o aparecimento de técnicas minimamente invasivas, a operação de Linton tem
hoje apenas valor histórico.
Pequenas incisões sobre as perfurantes e sua laqueação, é outra opção de cirurgia
aberta. No entanto, esta técnica depende da informação do ecoDoppler venoso,
podendo algumas perfurantes não serem encontradas e ficando por tratar. Por outro
lado, em alguns casos há perfurantes sob pele doente (lipodermatoesclerose, úlcera
cicatrizada ou úlcera activa) significando que uma incisão que for feita nesse local terá
risco elevado de complicações, nomeadamente uma nova úlcera2. Com o
aparecimento de técnicas minimamente invasivas este método tem caído em desuso.
Laqueação subfascial endoscópica de perfurantes
Em 1985, Hauer14 descreveu pela primeira vez a abordagem endoscópica
minimamente invasiva para tratar as perfurantes insuficientes dos membros inferiores.
Com a SEPS, a taxa de complicações foi substancialmente reduzida, passando dos 25 %
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
149 145
de complicações da ferida operatória na operação de Linton (obsoleta), para 3-‐5 %2, 3,
13.
Inicialmente, o autor realizava a SEPS por porta única utilizando um endoscópio
específico, actualmente descontinuado. No entanto, O’Donnell15, nos Estados Unidos,
descreveu a técnica de duas portas utilizando material cirúrgico comum de
laparoscopia, sendo hoje a técnica preferida pelo autor. Um trocarte de 10 mm para
óptica de 0º e um outro de 5 mm para trabalho, é tudo o que é necessário para em
cerca de 15-‐20 minutos tratar todas as perfurantes mediais (incluindo as de Cockett) e
posteriores da perna. Dado que as duas portas são colocadas no terço superior da face
medial da perna, podem ser tratadas perfurantes sob pele doente (úlcera activa ou
cicatrizada, lipodermatoesclerose), mantendo a integridade da pele supradjacente, e
eliminando os riscos de uma incisão (Fig. 1).
Fig. 1 -‐ Colocação das duas portas (10 mm e 5 mm) no terço proximal da perna,
longe de pele doente. Um dissector, um aplicador de clips e uma tesoura de laparoscopia é tudo o que é
necessário. O autor prefere substituir todos estes instrumentos por uma pinça de
energia LigaSure® Maryland 5 mm (não tem perigo de lesão térmica pelo que é
adequada ao pequeno espaço de trabalho da técnica) evitando as constantes
mudanças de instrumento, encurtando a operação, e reduzindo a possibilidade de
hemorragia (Fig. 2). Por vezes pode haver conflito entre o instrumento e a câmara,
“sword fighting”, podendo dificultar, mas não impedir o procedimento. A SEPS é
realizada com raquianestesia ou anestesia geral, e em regime de ambulatório.
Actualmente, é a técnica mais utilizada na Europa3.
A indicação para realizar a SEPS é colocada pela presença de perfurantes insuficientes
no ecoDoppler venoso pré-‐operatório. Neste caso apenas é necessário saber se há
uma perfurante insuficiente, não sendo necessário saber quantas existem nem onde
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
150 146
exatamente se localizam pois com a ajuda da óptica todas as perfurantes, mediais e
posteriores, serão intraoperatoriamente encontradas e tratadas. A dependência do
ecoDoppler venoso é por isso reduzida (comparativamente às outras técnicas) na
cirurgia endoscópica de perfurantes.
Os resultados da SEPS têm sido avaliados em diversos estudos. Tenbrook7 apresentou
em 2004 uma taxa de cicatrização de úlcera venosa de 88 % se a SEPS for usada em
conjunto com o stripping da GVS. Também Gloviczki16 relata 88 % de taxa de
cicatrização aos 12 meses, com uma recidiva a um ano e três anos de 16 % e 39 %,
respectivamente. Kalira et al.(17) apresentam dados semelhantes ao aplicar a SEPS, com
89% de taxa de cicatrização e recidivas de 4 % e 20 % aos um ano e três anos de
seguimento. Em 2009 Gloviczki3 compilou diversos trabalhos avaliando a taxa de
cicatrização da úlcera venosa após a SEPS, apresentando uma taxa de cicatrização
global de 90 % e recidiva de 11 %. Os dados publicados pelo autor em 2015 vão ao
encontro destes resultados, com uma taxa de cicatrização da úlcera venosa de 92 %
aos seis meses, e recidiva de 9 % com a aplicação da SEPS1. Vashist et al.18 apresentam
0 % de infecção do local cirúrgico num estudo prospectivo aleatório publicado em
2014. O autor relata em 2015 uma taxa de infecção da ferida operatória de 4 % (2/50)
após a cirurgia endoscópica de perfurantes1.
Alguns autores apontam um erro a estes estudos. Uma vez que a SEPS foi realizada em
conjunto com o stripping da GVS na maioria dos casos, isso põe em causa a
importância das perfurantes e da SEPS. Em 1999, Gloviczki relata melhores resultados
com SEPS combinada com o stripping da GVS comparando com SEPS isoladamente,
mas todos os doentes que apenas foram tratados com SEPS tinham úlcera persistente
ou recidivante após stripping19. Van Gent, nos seus trabalhos de 2015, conclui pela
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
151 147
importância da SEPS bem realizada na redução da recidiva da úlcera, e da
insignificância do tratamento do sistema venoso superficial na cicatrização e recidiva
da úlcera, em doentes submetidos ao tratamento endoscópico de perfurantes8.
Fig. 3. QRcode para vídeo demonstrativo da SEPS por duas portas.
Ablação Percutânea de Perfurantes (PAP)
As técnicas de ablação percutânea de perfurantes (térmica ou química) trouxeram
algumas vantagens, como redução da infecção da ferida operatória para perto de 0 %,
menos dor, necessidade apenas de sedação e anestesia local, possibilidade de
realização no consultório (a SEPS é realizada em ambulatório), e uma recuperação
mais rápida, o que torna a PAP atractiva e indicada para doentes de alto risco
cirúrgico2, 3, 13, 20. A realização das técnicas de PAP assenta da detecção pré-‐operatória
das perfurantes no ecoDoppler venoso, o que torna o procedimento altamente
dependente do operador. Em média 2-‐3 perfurantes a mais são encontradas durante a
SEPS comparativamente ao ecoDoppler pré-‐operatório, o que significa que as mesmas
ficarão por tratar ao aplicar as técnicas de PAP, com impacto negativo no resultado
final1-‐3, 13.
Todas estas técnicas implicam a punção com agulha da veia perfurante sob controlo
ecográfico, posição de Trendelenburg invertida para dilatar a veia e facilitar a punção,
posição de Trendelenburg após correta posição da agulha (estilete de radiofrequência
ou fibra laser), a instilação de uma fonte de energia ablativa (química ou térmica),
confirmação imediata do sucesso do tratamento, e seguimento2, 10.
Técnicas endovasculares: Ablação com Laser Endovascular (EVLA)
e Radiofrequência (RF)
Em posição de Trendelenburg invertida o acesso intravascular na perfurante é ganho
com uma agulha, e a correta posição é confirmada pelo refluxo de sangue e pelo
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
152 148
controlo ecográfico. É introduzida uma sonda especifica de radiofrequência (estilete
apropriado ao tratamento das perfurantes) ou uma fibra de laser, e a sua posição na
perfurante controlada por ecografia. É administrada anestesia tumescente em torno
da perfurante e o doente colocado em posição de Trendelenburg, que em conjunto
com compressão local irão exsanguinar a veia e aumentar o contacto sonda/parede da
veia. Energia é administrada a esse segmento. A RF tem uma temperatura alvo de 85°,
tratando cada quadrante de um segmento da veia em separado durante um minuto10,
o que torna o tratamento tecnicamente difícil. Na EVLA têm sido usadas fibras laser de
940 nm, 1320 nm e 1470 nm, administrando 250-‐290 J de energia por perfurante,
todos com resultados semelhantes21, 22. Steve Elias usa técnica pulsada entregando 120
J a cada segmento13. Após o tratamento do primeiro segmento da veia perfurante, a
sonda é removida cerca de 1-‐2 mm e um novo segmento é tratado. Um total de 2-‐3
segmentos devem ser tratados, e cada um por duas vezes. É aplicada pressão com a
sonda ecográfica durante um minuto, e imediatamente após o procedimento o
ecoDoppler deve mostrar ausência de fluxo na perfurante, e um fluxo na veia profunda
normal13.
A confirmação ecográfica da correta posição do estilete de RF ou da fibra laser dentro
da perfurante, nem sempre é tão fácil comparativamente à ablação percutânea das
safenas. Steve Elias considera, por isso, a RF vantajosa em relação à EVLA, uma vez que
é capaz de medir a impedância dos tecidos. Desta forma, leituras entre 150 e 350
ohms confirmam a posição extraluminal10, 13.
A ablação percutânea usando laser endovascular (EVLA) ou radiofrequência (RF)
apresentam resultados semelhantes no que diz respeito à taxa de oclusão imediata das
perfurantes, situando-‐se nos 90-‐100 %2-‐11, 13. No entanto, com o aumento do tempo de
seguimento essa percentagem de perfurantes ocluídas vai diminuindo2. Zerweck et
al.23 apresentam uma descida dos 100 % para 95 % de perfurantes ocluídas com EVLA
ao fim do primeiro mês, enquanto Chang et al.24 relatam uma taxa de oclusão de
85,7% ao fim de três semanas usando a RF. Após tratar 100 perfurantes com EVLA e
100 perfurantes com RF, Murphy25 concluiu que os resultados são semelhantes entre
as duas técnicas, e que as taxas de oclusão vão caindo com o aumento do tempo de
seguimento. Segundo as orientações do American Venous Forum e da Society for
Vascular Surgery de 2011, apesar das técnicas de ablação térmica terem algumas
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
153 149
vantagens (menos dor e recuperação mais rápida), os estudos a médio-‐prazo mostram
resultados clínicos e hemodinâmicos semelhantes à cirurgia10. As complicações do
tratamento com EVLA e RF são mínimas, mas incluem casos de TVP, parestesias,
queimadura e eritema. Uma desvantagem actual e importante destas técnicas
endovasculares, é o facto de não existirem dados das taxas de cicatrização e de
recidiva da úlcera venosa, e a ausência de estudos a longo-‐prazo1, 2.
Esclerose ecoguiada
O acesso intraluminal é confirmado por ecografia e pela aspiração de sangue. Neste
procedimento o uso de espuma é preferível ao líquido, pois ajuda a exsanguinar a veia
a tratar, e prolonga o contacto entre o esclerosante e a parede da veia. Após a injeção
do produto esclerosante, são aplicadas meias de compressão elástica com pressão
direta sobre a perfurante tratada, usando uma pequena compressa sob a meia.
As taxas de cicatrização de úlcera publicadas são bastante inferiores às demais
técnicas. Em 2014 Kiguchi6 relata uma taxa de cicatrização de 59 % aos 30 meses,
conseguindo uma taxa de trombose de 64 % com espuma de polidocanol. Este autor
apresenta ainda complicações por trombose venosa profunda (TVP) da perna em 3 %
das injeções. Já Masuda et al. ao tratarem, com morruato de sódio a 5 %, 80 pernas 20
com perfurantes insuficientes, sem refluxo axial ou com safenectomia prévia,
conseguiram uma taxa de oclusão imediata de 98 %. No entanto, dos 37 membros com
Um caso de necrose cutânea com úlcera de 5x4 cm ocorreu após a esclerose.
Embolização com coils
Em 2012 Garcarek et al.26 descreveram a embolização de veias perfurantes
insuficientes com coils de Gianturco-‐Wallace e Tornado (Cook). Relatam uma taxa de
cicatrização de úlcera de 85 %. No entanto, mais estudos são necessários para
comparar esta técnica com as restantes.
Resumindo e comparando as várias técnicas
A operação de Linton está atualmente obsoleta devido à elevada taxa de complicações
da ferida operatória (25 %), longo período de recuperação e alta taxa de recidiva de
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
154 150
úlcera (55 %)2. Se insistirmos em realizar cirurgia aberta através de mini-‐incisões é
preciso saber o número exato de perfurantes e a sua localização precisa, através do
ecoDoppler venoso pré-‐operatório. Aqui reside uma das desvantagens desta técnica, é
altamente dependente do operador. Por este motivo, nem todas as perfurantes
potencialmente insuficientes são identificadas, ficando assim por tratar. A segunda
desvantagem é o facto de por vezes a perfurante se situar sob pele doente
(lipodermatoesclerose, úlcera cicatrizada ou activa), o que implica uma incisão nessa
mesma pele com risco elevado de complicações.
As técnicas minimamente invasivas vieram ultrapassar estas desvantagens, e são
actualmente as técnicas de escolha segundo o American Venous Forum e a Society for
Vascular Surgery10, não favorecendo uma sobre a outra. A SEPS tem a vantagem de
depender minimamente do ecoDoppler, pois apenas é preciso saber se há uma
perfurante insuficiente. Através do endoscópio todas as perfurantes serão visualizadas,
encontrando em média mais 2-‐3 perfurantes que o ecoDoppler pré-‐operatório1-‐3, 13.
Uma segunda vantagem é o poder tratar perfurantes sob pele doente. A SEPS executa-‐
se em cerca de 15 minutos, e pode ser realizada em ambulatório com rápida
recuperação. Utiliza material comum de laparoscopia, e qualquer cirurgião com
experiencia em laparoscopia será capaz de realizar esta técnica. Entre 1992 e 2008 a
SEPS foi a técnica gold standard1, 2, 10. Actualmente esse papel é disputado com as
técnicas de ablação percutânea de perfurantes (PAP), que são atrativas para médicos e
doentes pois podem ser facilmente repetidas em ambiente de consultório, seja
ablação térmica ou química, com recuperação imediata e dor mínima. Apesar da SEPS
ter reduzido a taxa de complicação da ferida operatória para até 5 %, as técnicas PAP
apresentam 0 % de complicação da ferida2, 13. No entanto, outras complicações
importantes estão associadas às técnicas percutâneas: trombose venosa profunda
(TVP), lesão nervosa, queimadura (EVLA e RF), úlcera2, 3, 13.
A decisão entre a SEPS ou as técnicas PAP assenta nos resultados publicados na
literatura mundial. Para avaliar a eficácia das técnicas tem sido usada a taxa de
cicatrização de úlcera após o tratamento de perfurantes. Glovicski compilou diversos
trabalhos sobre a eficácia da SEPS e relata uma taxa de cicatrização de 90 %3. Já o
autor apresenta uma taxa de cicatrização de 92 %1. A esclerose ecoguiada apresenta
uma taxa de cicatrização de 59 % a 67,6 %, segundo dados de Kiguchi e Masuda6, 20. Em
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
155 151
relação aos resultados após o tratamento com EVLA ou RF, não existem dados
consistentes publicados sobre a taxa de cicatrização.
Notas finais
As perfurantes insuficientes aumentam a hipertensão venosa dos membros inferiores
e estão implicadas na úlcera de perna e na recidiva de varizes. Essa importância tem
sido referida e demonstrada em diversos trabalhos, pelo que o seu tratamento deve
ser equacionado em diversos casos. Doentes com alterações cutâneas com risco de
úlcera (C4b), úlcera cicatrizada (C5) e úlcera activa (C6) são aqueles onde a indicação é
consensual. Em relação às restantes classes as opiniões dividem-‐se. De 1992 a 2008 a
SEPS foi, indiscutivelmente, a técnica “gold standard”, mas, actualmente, essa posição
é desafiada por técnicas endovasculares de ablação percutânea, seja por laser ou
radiofrequência. A esclerose ecoguiada demonstrou piores resultados que a SEPS.
As técnicas endovasculares por EVLA ou RF são atrativas pela possibilidade de
realização apenas com anestesia local, com recuperação imediata, facilmente
repetidas e óptimas para doentes de alto risco cirúrgico. No entanto não são livres de
complicações graves como TVP e queimaduras. Além disso, resultados a longo prazo
ainda estão por surgir. Uma grande vantagem prática da SEPS é a possibilidade de ser
realizada com duas portas utilizando material comum de laparoscopia, estando por
isso acessível em qualquer hospital público ou privado de Portugal. Quanto à tão
falada curva de aprendizagem, nesta técnica ela é pequena, sendo ainda mais reduzida
caso o cirurgião esteja familiarizado com os procedimentos laparoscópicos rotineiros,
realizados atualmente na prática clínica comum.
Não havendo consenso sobre qual técnica usar, é unânime a importância das
perfurantes insuficientes na IVC, o que implica que o cirurgião que trate esta patologia,
tenha obrigatoriamente de conhecer e saber executar uma técnica que promova o
tratamento das perfurantes incompetentes, quando indicado. Só assim os doentes
terão acesso ao melhor tratamento que culmine nos melhores resultados funcionais e
estéticos.
Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
156 152
Para divulgação da laqueação subfascial endoscópica de perfurantes (SEPS) a todos os
cirurgiões interessados no tratamento de varizes, a 14 de Outubro de 2014 no Serviço
de Cirurgia C do Hospital Geral (Covões) do Centro Hospitalar e Universitário de
Coimbra (CHUC-‐HG), decorreu a primeira edição do “Dia da SEPS”, um curso teórico-‐
prático onde os participantes têm hipótese de participarem activamente em operações
cirúrgicas. Outras quatro edições decorreram em Coimbra com boa aceitação e
procura por parte dos cirurgiões. A terceira edição trouxe uma importante novidade, a
realização das duas técnicas e sua comparação, dado que nas duas primeiras apenas
foi abordada a porta única. Os participantes têm assim a oportunidade de
experimentarem ambas as técnicas, tirando as suas próprias conclusões. Desde então
que outros serviços de cirurgia iniciaram o tratamento de perfurantes insuficientes dos
membros inferiores por SEPS, sendo o retorno muito positivo.
Próximas edições irão decorrer no Serviço de Cirurgia C do CHUC-‐HG, pelo que se
aconselha a consulta periódica da página do facebook do “Dia da SEPS”, e do blog
“Surgical Thoughts – A blog about surgery” da autoria do autor.
Referências bibliográficas
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of the first 50 patients. J Vasc Med Surg 2015; 3: 5. Doi: 10.4172/2329-‐6925.1000221
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“Dia da SEPS” (curso teórico-‐prático de SEPS)
Serviço de Cirurgia C do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra – Hospital
Geral (Covões)
152
Para divulgação da laqueação subfascial endoscópica de perfurantes (SEPS) a todos os
cirurgiões interessados no tratamento de varizes, a 14 de Outubro de 2014 no Serviço
de Cirurgia C do Hospital Geral (Covões) do Centro Hospitalar e Universitário de
Coimbra (CHUC-‐HG), decorreu a primeira edição do “Dia da SEPS”, um curso teórico-‐
prático onde os participantes têm hipótese de participarem activamente em operações
cirúrgicas. Outras quatro edições decorreram em Coimbra com boa aceitação e
procura por parte dos cirurgiões. A terceira edição trouxe uma importante novidade, a
realização das duas técnicas e sua comparação, dado que nas duas primeiras apenas
foi abordada a porta única. Os participantes têm assim a oportunidade de
experimentarem ambas as técnicas, tirando as suas próprias conclusões. Desde então
que outros serviços de cirurgia iniciaram o tratamento de perfurantes insuficientes dos
membros inferiores por SEPS, sendo o retorno muito positivo.
Próximas edições irão decorrer no Serviço de Cirurgia C do CHUC-‐HG, pelo que se
aconselha a consulta periódica da página do facebook do “Dia da SEPS”, e do blog
“Surgical Thoughts – A blog about surgery” da autoria do autor.
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Serviço de Cirurgia C do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra – Hospital
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Tratamento das perfurantes insuficientes dos membros inferiores
159 155
ESCLEROTERAPIA QUÍMICA NO
TRATAMENTO DAS VARIZES DOS MEMBROS INFERIORES
Pratas Balhau
INTRODUÇÃO
A escleroterapia química é uma das opções terapêuticas válidas no tratamento das
varizes dos membros inferiores.
A escleroterapia, como tratamento para as varizes, foi introduzida pela primeira vez
em França por Tournay, na década de 1920. Este autor, e depois outros como Sigg e
Fegan, defendendo técnicas diferentes de esclerose, todas com bons resultados,
tiveram o mérito de introduzir a estandardização e o rigor necessários ao
reconhecimento desta técnica.
A curto prazo, os resultados são muito bons; contudo, a médio e a longo prazo, os
resultados são ainda pobres. Mas, atualmente, surgiu a escleroterapia ecoguiada, isto
é, a escleroterapia associada ao ecoDoppler, ou seja, a escleroterapia realizada sob a
visualização ecográfica. Acreditamos que este método, pouco invasivo, de baixo custo
e de excelente aceitação pelo doente, possa vir a ser, no futuro, uma alternativa válida
à cirurgia.
Definição
Scleros, do grego, quer dizer endurecimento. A escleroterapia representa uma forma
de tratamento destinado a endurecer tecidos, fibrosando-‐os. A fibrose terapêutica
pode ser conseguida por meios térmicos (que incluem o laser), mecânicos
(escarificações), elétricos (eletrocoagulação, eletrofulguração), químicos (substâncias
“esclerosantes”), por radiações, etc.
São muitas as indicações para a escleroterapia. Na área vascular, que nos interessa
agora, o objetivo do tratamento é produzir inflamação de canais circulatórios,
conduzindo à sua destruição enquanto tal. Pode ser, e já foi, usada para tratar
estruturas arteriais (aneurismas), linfáticas (higromas quísticos) e venosas (varizes).
Interessa-‐nos, no momento, objetivamente, a escleroterapia química das varizes.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
160 156
Princípio da escleroterapia
A finalidade do tratamento é a oclusão do tronco varicoso visado. A oclusão ocorre
secundariamente à destruição do endotélio venoso com formação do trombo que
progride para a organização fibrótica, e posterior reabsorção. A injeção do agente
esclerosante provoca uma lesão endotelial, da qual resulta uma reação inflamatória,
um espasmo vascular e a formação dum trombo aderente à parede (sem perigo, por
isso, de embolização). A partir da lesão endotelial, o coágulo formado serve de
infraestrutura para a proliferação de fibrócitos. O cordão fibroso originado acaba por
ser totalmente reabsorvido pelo organismo.
O ideal seria obter o máximo de reação endotelial com trombose mínima. Ocorrendo
coágulos volumosos, além da inflamação exagerada, há retrações da massa coagulada,
formando-‐se bolsas de sangue retido. Isto atrasa a cura fibrótica, exacerba a
recanalização, requer procedimentos suplementares e gera riscos.
Tipos de esclerosantes químicos
É difícil classificar todas as substâncias capazes de esclerosar veias. A maior parte das
flebites químicas é de origem iatrogénica. A “flebosclerose” iatrogénica acontece,
frequentemente, com injeção endovenosa de soro glicosado, salicilatos, antibióticos,
quimioterápicos, tranquilizantes, anestésicos, etc.
Alguns esclerosantes clássicos foram descobertos por acaso. Muitos foram sendo
experimentados, muitos foram esquecidos, outros melhorados. As razões da carreira
efémera de alguns esclerosantes são várias. Uns, como o morruato de sódio, davam
frequentes choques anafiláticos, outros, como o cloreto de sódio hipertónico, eram
muito dolorosos. O sublimado originou algumas intoxicações pelo mercúrio. Outros
esclerosantes só provocavam trombose sanguínea sem lesão endotelial, aumentando
o risco real da mobilização do trombo não fixado à parede. Para provocar a lesão
endotelial inicial, partida para o processo trombofibrótico, basta alterar uma ou várias
das constantes físico-‐químicas do sangue circulante a esse nível:
-‐ inversão da polarização endotelial (negativa) após lesão grave do endotélio;
-‐ o pH (ácido) do plasma venoso (7,27-‐7,43) é modificado pela injeção duma
solução alcalina;
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
161 157
-‐ diminuir a tensão superficial do endotélio (a 37º é de 47 dyn/cm), com
solução detergente;
-‐ alterando a osmolaridade circulatória (301,4 miliosmoles), com solução
hipertónica.
De acordo com a densidade específica do esclerosante injetado, em relação à do
sangue (média = 1050), o esclerosante estagna a nível das dilatações venosas, a
montante ou a jusante, na razão inversa da sua densidade.
Sinapius e Dietrich publicaram em 1968 um estudo experimental da ação dos
esclerosantes sobre o endotélio. Colocaram in vitro esclerosantes em contacto com
preparações frescas de endotélio de aorta de porcos, depois injetaram in vivo
esclerosantes na veia jugular externa de coelhos.
Esclerosantes Composição química Inventor
Soluções
Hipertónicas
ClNa Linser 1916
Glicose Kausch 1917
Salicilato de Na Sicard 1919
Soluções
Detergentes
Ácidos gordos Higgins
Kittel 1930
Tetradecilsulfato de sódio Reinert 1946
Oxipolidoxidodecanol Henschel 1966
Eichberg
Produtos
Corrosivos
Iodeto de K Schiassi 1908
Iodeto de Na Gerson 1933
Iodo + álcool benzílico Imhoff
Sigg 1959
Glicerina + Cr Jausion 1933
Quadro I -‐ Esclerosantes disponíveis.
As suas verificações histológicas assentavam na superfície média dos núcleos (valor
normal 45 µ2), na conformação protoplasmática e no estado dos limites intercelulares.
Assim, as soluções hipotónicas (água destilada) davam lesões no endotélio que eram
reversíveis. As soluções hipertónicas (NaCl a 22 % e glicose a 66 %), em três minutos
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
162 158
são capazes de diminuir a superfície nuclear das células endoteliais e causar
desorganização dos limites celulares.
As soluções iodadas, em três segundos reproduzem, exacerbadamente, os efeitos das
soluções hipertónicas.
As soluções detergentes (tensiolíticas) maceram o endotélio em menos de um
segundo, dissolvem o cimento intercelular, causam a descamação em placas do
endotélio e os núcleos restantes entram em picnose.
As soluções ácidas são praticamente inócuas para o endotélio e as soluções alcalinas a
partir de pH 8 agem como os detergentes.
No domínio dos esclerosantes, nenhum novo produto foi lançado recentemente no
mercado, como mostra o Quadro I. Os esclerosantes disponíveis podem ser
classificados em diferentes grupos, tendo a mesma ação do ponto de vista histológico,
mas tendo indicações específicas.
INDICAÇÕES
Da Reunião de 7 a 10 de junho de 2012, em Mainz, Alemanha, saíram as European
Guidelines for Sclerotherapy in Chronic Venous Disorders, estabelecendo o consenso,
ainda atual, que a escleroterapia pode ter várias indicações:
. Safenas incompetentes (Hamel-‐Desnos 2003 e 2007, Alos 2006, Ouvry 2008, Rabe 2008,
Rasmussen 2011, Shadid 2012) – Grau 1A;
. Varizes tributárias (Myers 2007) – Grau 1B;
. Perfurantes insuficientes (Guex 2000, van Neer 2006, Myers 2007) – Grau 1B;
. Varizes reticulares (Kahle 2004, Norris 1989, Rabe 2010, Uncu 2010, Alos 2006,
Peterson 2012) – Grau 1A;
. Telangiectasias (Kahle 2004, Norris 1989, Rabe 2010, Uncu 2010, Alos 2006,
Peterson 2012) – Grau 1A;
. Varizes residuais ou recidiva pós-‐cirurgia (Kakkos 2006, McDonagh 2003, Coleridge
Smith 2006 e 2009, Myers 2007, Bradbury 2010) – Grau 1B;
. Varizes de origem pélvica (Sukovatykh 2008, Kakkos 2006, Paraskevas 2011) – Grau 1C;
. Varizes próximas de úlcera de perna (Stücker 2006, De Waard 2005, Hertzman 2007,
Pang 2010) – Grau 1B;
. Malformações venosas (Yamaki 2000 e 2008, Blaise 2011) – Grau 1B.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
163159
O calibre e a extensão das varizes condicionam a escolha do tratamento. É uma
questão de bom senso. Assim, a cirurgia é preferível a numerosas injeções de varizes
de grande calibre, com volumosos pontos de refluxo e o risco de recanalização rápida.
Em nossa opinião, a escleroterapia pode ser indicada no tratamento de varizes que
ainda não necessitam de cirurgia, nas varizes residuais após cirurgia, ou nas
recidivas, à medida que vão surgindo.
Indicamos a escleroterapia nas pequenas varizes e telangiectasias não dependentes de
insuficiência osteal, com o propósito de aliviar sintomas e corrigir a aparência. Como
em varizes volumosas do território da safena externa, ou sem ligação incompetente
marcada ao sistema profundo, ou a uma safena interna incompetente. Na presença de
varizes, volumosas ou não, secundárias a refluxo por deterioração valvular de safenas
e/ou perfurantes, impõe-‐se a cirurgia.
Quando ocorrem os dois tipos de varizes simultaneamente, varizes cirúrgicas e varizes
esclerosáveis, a precedência é da cirurgia e só depois, oportunamente, a
escleroterapia.
As varizes residuais após cirurgia são uma boa indicação para esclerose por vezes com
a ajuda do ecoDoppler quando não são visualizadas. Nas recidivas volumosas
preferimos, frequentemente, resolvê-‐las a nível de pequenas intervenções cirúrgicas,
sob anestesia local, com a técnica do microgancho, de indiscutíveis resultados
cosméticos e esclerose de varizes residuais.
Fazemos esclerose ainda em alguns casos particulares:
-‐ após a rotura de variz. A compressão bem executada é suficiente para parar a
hemorragia. A esclerose suplementar da variz responsável evita a recidiva hemorrágica
a curto prazo;
-‐ nas varizes peri-‐úlcera ou varizes “alimentadoras” da úlcera venosa. A sua
esclerose acelera a cura da úlcera;
-‐ nas varizes “alimentadoras” do eczema venoso e da atrofia branca, a
escleroterapia pode acelerar a sua cura;
-‐ em malformações venosas.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
O calibre e a extensão das varizes condicionam a escolha do tratamento. É uma
questão de bom senso. Assim, a cirurgia é preferível a numerosas injeções de esclerose
em varizes de grande calibre, com volumosos pontos de refluxo e o risco de recanalização
rápida. Em nossa opinião, a escleroterapia pode ser indicada no tratamento de varizes
que ainda não necessitam de cirurgia, nas varizes residuais após cirurgia, ou nas
recidivas, à medida que vão surgindo.
164160
Embora não seja a nossa opção, há quem estenda as indicações da escleroterapia
varicosa muito para além destas, pretendendo mesmo substituir o tratamento
cirúrgico ou complementá-‐lo duma maneira muito mais direta, até per-‐operatória.
CONTRAINDICAÇÕES
A escleroterapia está contraindicada na presença de alergia ao esclerosante, infeções,
trombose venosa profunda, insuficiência arterial periférica, diabetes descompensada,
insuficiência cardíaca, foramen ovale sintomático, neoplasias, caquexia, acamados e
idade avançada.
É preferível evitar a escleroterapia durante a gestação, principalmente no primeiro
trimestre e nas últimas seis semanas. Não vemos problema em realizar a esclerose
durante o período menstrual e durante o uso de contracetivos orais.
São contraindicação relativa o edema da perna descompensado, estados de
trombofilia ou hipercoagulabilidade com ou sem história de trombose e foramen ovale
conhecido assintomático.
Durante a amamentação a escleroterapia tem contraindicação absoluta.
MATERIAL
Seringas
Usando-‐se pouco volume de solução esclerosante em cada picada, dispensam-‐se as
grandes seringas. As melhores são as de 2 cc ou de 5 cc, dependendo sobretudo do
tamanho da mão do médico que faz a escleroterapia. As seringas de vidro simplificam
o ato de injetar suavemente, sem solavancos perigosos, e tornam-‐se mais fáceis de
manobrar na medida em que o desgaste natural alisa as paredes do êmbolo.
O ideal seria usar seringas descartáveis, da mesma forma que fazemos com as agulhas.
Nas seringas descartáveis, os êmbolos são mais duros e se não deslizarem com
suavidade, mas sim aos solavancos, são capazes de fazerem explodir as paredes de
telangiectasias a serem tratadas. Com as seringas de vidro, reutilizáveis, torna-‐se
obrigatória a esterilização em estufa, a seco, ou a esterilização a gás.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
165 161
Agulhas descartáveis
Aconselham-‐se três calibres de agulhas. A mais fina, 0,3 x 13 (equivalente à americana
30 GA1/2) para as micro varizes mais delicadas, a 0,4 x 13 (equivalente à 27 G1/2) para
as telangiectasias e a 0,5 x 16 (equivalente à 25 G5/8 ) para as restantes varizes.
A ESCOLHA DO ESCLEROSANTE
A escolha do esclerosante a utilizar é um dos problemas para quem começa a fazer
esclerose de varizes. Infelizmente são muitos os fatores que entram na escolha, nem
sempre relacionados só com o esclerosante, mas também com o tipo de variz e a
resposta do doente ao líquido usado.
Para se fazer corretamente a escolha, deve-‐se começar por estudar os esclerosantes, o
seu tipo, vantagens e inconvenientes.
Os três esclerosantes mais difundidos em França são o iodo, o tetradecil sulfato de
sódio e o polidocanol, que têm as vantagens e inconvenientes, e que mostramos no
Quadro II.
Iodo TSS Polidocanol
Cor Sombra Incolor Incolor
Ação Local Difusa Difusa
Dor injeção paravenosa
Forte Mínima Débil
Alergia Rara Rara Rara
Necrose Sim Sim Mínima
Quadro II -‐ Características de três esclerosantes Aprender com os colegas que já têm experiência. Ver e executar o método, aprender
as regras, tomar conhecimento dos casos particulares e das modalidades de atuação.
Depois, na prática, trabalha-‐se com dois ou três produtos que mais gostamos e que
conhecemos melhor.
Não falando dos esclerosantes históricos, mas só dos mais utilizados, podemos dizer
que há esclerosantes fortes: o salicilato de sódio, o polidocanol, o iodo, sob a forma de
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
166 162
Lugol sódico, o tretradecil sulfato de sódio (TSS), o oleato de monoetolamina, e o
moruato de sódio.
Há esclerosantes suaves como a glicerina crómica e a glicose hipertónica.
Há quem faça associações de dois esclerosantes na mesma seringa ou injeções em dois
pontos diferentes de dois produtos diferentes.
Em Portugal, atualmente, só há o Polidocanol, sob o nome de Etoxisclerol®
(Lauromacrogol 400) a 0,5 %, 1 %, 2 % e a 3 %, em ampolas de 2 ml. É fabricado pelo
Laboratório Kreussler (Wiesbaden), Alemanha, e distribuído em Portugal pela
Rubeaspharma.
O polidocanol é muito ativo, constante na sua ação, com bom efeito esclerosante, fácil
de manipular, fácil de dividir em doses e com um efeito espástico imediato, o que
permite controlar o efeito provável da injeção. É incolor, muito fluido e totalmente
indolor à injeção, salvo para altas concentrações (4 %). A injeção do produto a 4 %
provoca uma dor viva, ao longo da variz, mas que é muito efémera. Sem efeitos
secundários, boa tolerância e com raros fenómenos alérgicos observados.
É importante conhecer as características específicas de cada substância esclerosante,
embora haja quem insista em não ter em conta as diferenças entre elas e as considere
a todas por igual.
AS DOSES
O facto de se conhecerem bem os esclerosantes não resolve o problema prático da
esclerose. A determinação da dose é um problema maior. Saber qual a concentração a
utilizar e a quantidade a injetar são problemas constantes que devem estar presentes
a cada sessão de esclerose, e para cada injeção. A incerteza quanto ao resultado da
nossa decisão deve-‐nos obrigar a ser sempre, mas sempre, prudentes. Porque há
diferenças de um indivíduo para outro, e há diferenças no mesmo indivíduo de sessão
para sessão. Não é possível calcular à primeira vista o produto que dará o melhor
resultado, e muito menos qual a dose a utilizar. Esta dificuldade estará presente
durante todo o tratamento. Assim, é obrigatório ser prudente.
Deve-‐se iniciar empiricamente com uma dose fraca, para não ter uma reação
catastrófica. Se a dose inicial não produziu efeito, aumenta-‐se; se a reação foi
satisfatória, repete-‐se a dose; se ela foi demasiado forte, deve-‐se diminuir. É esta
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
167 163
atitude, baseada na observação, que nos dará os melhores resultados. A melhor
progressão de sessão para sessão é poder aumentar metade ou um terço da dose
anterior.
Peso dos doentes
Polidocanol 50 kg 60 kg 70 kg 80 kg 90kg
0,5% 20 ml 24 ml 28 ml 32 ml 36 ml
1% 10 ml 12 ml 14 ml 16 ml 18 ml
2% 5 ml 6 ml 7 ml 8 ml 9 ml
3% 3,3 ml 4 ml 4,6 ml 5,3 ml 6 ml
4% 2,5 ml 3 ml 3,5 ml 4 ml 4,5 ml
Quadro III -‐ Doses máximas por sessão
A dose máxima do polidocanol não deve ultrapassar 2 mgr/kg/dia. Por razões técnicas
não se deve injetar mais de 2 ml por picada. A quantidade máxima por sessão de
polidocanol indicada pelo fabricante está referida nos Quadro III a VII.
Com o polidocanol pode-‐se fazer espuma e usá-‐la para esclerosar varizes com eficácia
superior à do líquido; como se utiliza uma quantidade de produto muito reduzida, fica
mais económico e o risco de lesão por injeção extra vascular é mínimo.
POLIDOCANOL -‐ líquido
Indicações Volume da
injeção
Concentração
Telangiectasias 0,1-‐0,2 ml 0,25-‐0,5 %
Veia central de telangiectasias 0,1-‐0,2 ml 0,25-‐1 %
Varizes reticulares 0,1-‐0,3 ml 1 %
Varizes pequenas 0,1-‐0,3 ml 1 %
Varizes médias 0,5-‐2,0 ml 2-‐3 %
Varizes grandes 1,0-‐2,0 ml 3-‐4 %
Quadro IV -‐ Valores médios por concentração usados na escleroterapia com polidocanol líquido.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
168 164
Líquido 0,25% 0,5% 1% 2% 3%
Safena interna + ++ ++
Safena externa + ++ +
Variz colateral ++
Variz recidivada (+) ++ ++ +
Veia perfurante (+) ++ + (+)
Varizes reticulares (+) (+) ++ +
Telangiectasias ++ (+)* (+)
Malformações venosas + ++ +
Quadro V -‐ Indicação das concentrações usadas na escleroterapia com polidocanol líquido que pode ser transformado em espuma.
Legenda ++ Indica que é o mais usado por especialistas + Indica que é menos usado por especialistas (+) Indica que é usado por alguns ou poucos especialistas (+)* Se for utilizada a escleroterapia com espuma é a concentração preferida
Diâmetro Líquido 0,25 % 0,5 % 1 % 2 % 3 % 4 %
< 1 mm ++* (+)*
1-‐3 mm (+) + ++ (+)
3-‐4 mm (+) ++ ++
5-‐6 mm + ++ +
7-‐8 mm + ++ ++
9-‐10 mm (+) + ++
>10 mm + ++ (+)
Quadro VI -‐ Concentração de polidocanol por diâmetro das veias Legenda: ++ Indica que é o mais usado por especialistas + Indica que é menos usado por especialistas (+) Indica que é usado por alguns ou poucos especialistas ++* A esclerotearapia com espuma não é recomendada como primeira opção (+)* Se for utilizada a escleroterapia com espuma é a concentração preferida
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
169 165
Volume médio de
espuma por injeção Volume máximo de espuma por injeção
Safena interna 2 -‐ 4 ml Até 6 ml
Safena externa 2 – 4 ml Até 4 ml
Variz colateral Até 4 ml Até 6 ml
Variz recidivada Até 4 ml Até 8 ml
Veia perfurante Até 2 ml Até 4 ml
Varizes reticulares < 0,5 ml < 1 ml
Telangiectasias < 0,5 ml < 0,5 ml
Malformações venosas 2 até 6 ml < 8 ml
Quadro VII -‐ Valores de volumes médios de espuma por injeção
Com os esclerosantes detergentes pode fazer-‐se espuma esclerosante compacta que
não se mistura com o sangue. Tessari, em 1999, apresentou o seu método (Fig. 1) -‐
técnica do turbilhão -‐ produzindo espuma muito rapidamente, simples e barata,
mantendo as características dos esclerosantes: adesividade, coesão, estabilidade e
mais ecovisibilidade.
Fig. 1 -‐ Método de Tessari para fazer espuma.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
170 166
Produziu espuma com duas seringas de plástico e uma torneira de três vias. Juntou
esclerosante e ar, numa proporção de 1 para 3 ou de 1 para 4. A espuma obtida tem
bolhas cujo diâmetro varia de 40 a 80 micra. O espasmo venoso é súbito e mais
intenso quando se utiliza a espuma. Outra propriedade da espuma é a redução da
quantidade de droga utilizada: 0,3-‐0,5 ml de líquido pode ser transformado em 2-‐3 ml
de espuma. Podem-‐se obter maiores quantidades de espuma a partir da mesma
quantidade de líquido de acordo com a quantidade de ar utilizado (Fig. 2 e 3).
Fig. 2 -‐ Injeção de líquido esclerosante numa veia, diminui a sua concentração.
Fig. 3 -‐ Injeção de espuma esclerosante numa veia, mantêm a concentração.
Muitos autores têm utilizado a ecoescleroterapia, a escleroterapia associada ao
ecoDoppler, ou seja, a escleroterapia realizada sob a visualização ecográfica, e
asseguram que é uma técnica segura, eficaz, precisa, sendo também reprodutível.
Aceitamos que seja uma boa técnica, mas é por certo muito dependente de quem
opera o ecoDoppler (Fig. 4 e 5).
Fig. 4 -‐ Escleroterapia guiada por ecoDoppler.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
171167
Fig. 5 -‐ Imagens ecográficas longitudinais de punção da veia e depois de injeção de espuma esclerosante que ocupa todo o lúmen da veia à frente do bisel da agulha.
O volume máximo de espuma recomendado por sessão e por membro é 10 ml, dada
numa única injeção ou em várias injeções.
TÉCNICA
A técnica de esclerose começa por um exame clínico completo, com especial atenção
para a palpação. De todos os meios de investigação clínica é a palpação que nos dá
mais informações. A palpação de uma variz dá uma dupla sensação de cúpula, linear
ou ampular, e de uma certa resistência com renitência. Mesmo com varizes bem
visíveis, estas devem ser exploradas pelos dedos; quando invisíveis, são os dedos que
as descobrirão e que as vão definir.
Fig. 6 -‐ Mapa para registo das varizes Fig. 7 -‐ Mapa para registo das varizes e escleroses e escleroses
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
172168
Após o exame clínico, deve fazer-‐se um mapa das varizes a tratar pela esclerose (Fig. 6
e 7). Assim poder-‐se-‐á definir melhor a estratégia terapêutica. Também se devem
registar no processo do doente o produto utilizado, as concentrações, as doses, os
locais das picadas, bem como todas as reações observadas.
O exame clínico deve ser repetido em todas as sessões.
Método
Orbach, em 1944, simplificou a escleroterapia das pequenas varizes pela introdução da
sua técnica de bloqueio de ar (air block method). Consiste em aspirar para a seringa,
além da solução esclerosante, uma proporção igual de ar e outra de espuma. Formam-‐
se, então, três fases no interior da seringa. Para tal, após introduzir o esclerosante na
seringa, volta-‐se esta, já com a agulha instalada, para baixo e aspira-‐se ar. O ar,
passando da fina agulha para o interior da seringa contendo a substância detergente,
borbulha em profusão e, após conseguir-‐se espuma suficiente, volta-‐se a seringa para
cima e aspira-‐se mais ar. Ficam, pois, na seringa, três fases. Respetivamente, a partir
de baixo: esclerosante, espuma e ar (Fig. 8 e 9).
Fig. 8 -‐ Método de Orbach. Fig. 9 -‐ Método de Orbach, pormenor com adesivo na mão esquerda e usar agulha 25 G.
No momento da injeção, esta é realizada com a agulha voltada para cima sem alterar a
posição das camadas. Ao injetar, ocorrerão duas possibilidades: a agulha está no
interior da veia ou não está. No caso negativo, o ar penetra na pele formando uma
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
173169
inócua bolha enfisematosa. Sinal para retirar a agulha e fazer nova tentativa. Se a
agulha estiver no interior da veia, injeta-‐se lentamente o ar e este espalha-‐se pelos
ramos da varicosidade produzindo como que o seu desaparecimento imediato, já que
o esclerosante incolor substitui a coloração do sangue. Neste caso, injeta-‐se,
lentamente (enfatiza-‐se e insiste-‐se no advérbio), uma quantidade razoável de
espuma, e eventualmente, se o vaso tiver paredes algo mais espessas do que as
telangiectasias vermelhas, alguns poucos decimililitros de esclerosante.
É aconselhável não injetar solução esclerosante para trajetos telangiectásicos
vermelhos. A pobre espessura das suas paredes altamente vulneráveis ao esclerosante
poderão quebrar o equilíbrio de permeabilidade parietal com passagem de
esclerosante para os tecidos circunjacentes, produzindo algum grau de irritação e
posterior mancha hiperpigmentada na pele.
O pequeno volume de ar lentamente injetado na veia é praticamente inócuo.
A técnica de Tournay caracteriza-‐se pela punção e injeção de varizes quase vazias de
sangue em posição horizontal. O efeito da esclerose não depende só da concentração
do esclerosante na variz, mas também do tempo de contacto com o endotélio venoso.
Numa perna na horizontal, o débito venoso superficial é muito débil ou quase ausente,
e assim a ação do esclerosante (= concentração x tempo de contacto) vai ser forte.
Na técnica de Sigg, o doente está de pé em cima de um banco para a punção com uma
agulha de 1,2 cm de bisel curto. O sangue sai para uma taça reniforme segurada por
um ajudante. O doente deita-‐se em seguida e a perna puncionada é elevada até 30º.
Fig. 10 -‐ Técnica de Sigg
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
174 170
Durante a mudança de posição o sangue continua a sair para a taça. A seringa é então
adaptada à agulha e com air-‐block injeta-‐se inicialmente ar. A injeção paravenosa não
originará senão um enfisema subcutâneo sem riscos de necrose. A injeção
intravaricosa é realizada com 0,5 ml de esclerosante (Fig. 10).
As técnicas descritas têm vantagens e inconvenientes. O método francês parece-‐nos o
mais simples, ele deverá constituir a técnica base à qual cada escleroterapeuta dará o
seu cunho pessoal.
Escleroterapia intravascular e extra vascular
O uso de esclerosante suave permite injetar dentro e fora da veia. Com os
esclerosantes ditos fortes, utilizados para escleroterapia de grandes varizes, injetar
fora do lúmen da veia é sinónimo de necrose e posteriormente escara.
Usando-‐se esclerosantes em concentrações diluídas ou sob a forma de espuma, se
houver extravasamento a reação do tecido celular circunjacente será mínima e a
escara de ocorrência remota. A fibrose provocada em torno do vaso complementa a
inflamação do endotélio vascular, meta da escleroterapia.
Posição do doente e do escleroterapeuta
A melhor posição para a realização da escleroterapia é aquela que permite otimizar a
equação envolvendo os vários fatores: eficácia do procedimento, segurança e conforto
do doente, conforto do escleroterapeuta. A posição ideal do doente seria reclinada “à
romana” (Fig. 11), com um ligeiro declive dos membros inferiores, obtendo-‐se um
discreto enchimento venoso, mas sem o grande refluxo da postura ortostática. O
relevo das veias fica mais visível e mais recetivo à injeção.
Fig. 11 -‐ De acordo com a visualização Fig. 12 -‐ Se as varizes a esclerosar forem visíveis das varizes
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
175171
Fig. 13 -‐ Se for necessário para visualizar Fig. 14 -‐ Para esclerose na região as varizes posterior da perna
Desaconselhamos manter o doente em pé. Muitos fazem-‐no para intensificar o relevo
venoso ou para ocupar menos espaço do que seria ocupado por uma marquesa. O
resultado de trabalhar com o doente em pé costuma ser uma alta incidência em
lipotímias, onde o menos que poderá acontecer, será a perda de confiança do doente
e o seu abandono do tratamento. Isto quando ele não cai mesmo, com risco para si e
para o escleroterapeuta. As Fig. 12 a 14 sugerem outros posicionamentos.
Iluminação
A iluminação deve ser abundante, de preferência difusa. Isto pode ser conseguido por
um teto rebaixado a 2,5 metros de altura com quatro ou seis tubos fluorescentes de 40
watts correndo sobre a cama e no mesmo sentido que esta.
Eventualmente pode ser utilizado um foco suplementar.
Acrescente-‐se que a pele molhada pelo álcool da antissepsia torna-‐se mais
transparente e permite melhorar a observação das veias.
A técnica do quinto dedo
A dificuldade da esclerose de varizes é essencialmente de ordem prática. É o que mais
tempo leva a adquirir, não é a teoria.
A técnica do quinto dedo foi muito preconizada pelo Dr. Amélio Pinto Ribeiro. Referia
que a maneira mais espontânea de se comprimir um êmbolo de seringa é com o
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
176 172
polegar. O sistema de alavancas em que o polegar comprime o êmbolo é
extremamente forte, e qualquer atrito mais marcado entre a seringa e o seu êmbolo
pode levar a inapropriado aumento da ação do polegar, desfazendo o obstáculo e
injetando ar, espuma, esclerosante ou tudo isso junto sob forte pressão, explodindo
veia e invadindo os tecidos circunjacentes. Comprimindo o êmbolo com o quinto dedo,
evita-‐se o problema e aprimora-‐se o manuseio da seringa, libertando a outra mão para
manobras complementares. O treino é cansativo para o médico que, de início, poderá
até ter cãibras na musculatura do antebraço.
A sessão de escleroterapia
Numa sessão de escleroterapia, habitualmente, aplicamos injeções só num membro
inferior. Aplicamos em ambos os membros se o problema for de pouca monta e a
quantidade de esclerosante a injetar não ultrapassar a dose terapêutica recomendada.
Fig. 15 -‐ Devem-‐se tirar sempre todos os coágulos.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
177 173
Excesso de espetadelas e de injeções pode representar dano para a pele. O número de
injeções numa sessão depende também, obviamente, do volume de esclerosante
injetado em cada uma, de acordo com o calibre da veias a tratar.
É muito importante a excisão dos coágulos produzidos pela escleroterapia. O
procedimento é simples e consiste na abertura da veia com agulha 19G biselada ou
lâmina de bisturi nº 11 ou 15, espremer o conteúdo coagulado ou semicoagulado (Fig.
15), e aplicar um penso com contenção elástica.
Compressão elástica
A ideia da escleroterapia varicosa consiste em introduzir na veia uma substância
irritante que produza a colagem das suas paredes num processo inflamatório. Quanto
mais aproximadas estiverem estas paredes, maior será o grau de fibrose, e o que
restar da veia perderá o caráter cilíndrico e assumirá a condição plana, não visível, sem
fazer saliência na pele. Como se quiséssemos transformar em fita um tubo de
borracha. O mesmo que despejar cola no interior do tubo de borracha e o comprimir
em seguida. A fita fibrosa acabará depois, espera-‐se, por ser reabsorvida e
desaparecer.
Para que a escleroterapia tenha êxito é necessário que a compressão seja correta e
eficaz. Se a compressão não for mantida enquanto “a cola não secar” (a reação
inflamatória parietal não conseguir manter as paredes venosas juntas), as paredes logo
voltarão à forma original e o sangue tornará a circular nos tubos, como antes e, como
antes, as varizes continuarão intactas. Mantendo-‐se a compressão por tempo
suficiente para a “cola” agir, o achatamento venoso fibrosará com um mínimo de
reação. Para isso é importante não ficar com sangue trombosado no seu interior.
Sem a compressão elástica, torna-‐se quase ineficaz o processo de fibrose e a
frustração, não raro, induz o terapeuta ao uso de substâncias esclerosantes mais
ativas. Com isto, um método terapêutico praticamente inócuo passa a adquirir riscos
respeitáveis. A compressão elástica por ligaduras e/ou meias elásticas deve ser
aplicada por algum tempo. Dependendo do calibre das varizes, da extensão a
esclerosar e da concentração do produto esclerosante, o doente pode ter de usar a
compressão elástica desde oito dias até seis semanas após a última sessão de
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
178 174
esclerose. As meias receitadas deverão ser de classe de compressão II, tipo a-‐g ou
collant se a/o doente preferir, com tamanho adequado ao membro inferior tratado.
Alguns escleroterapeutas não comprimem os locais injetados, ou fazem-‐no com
ligaduras por poucas horas. Preferem cobri-‐los com pensos rápidos, ou com uma
pulverização de “spray” adesivo, a fim de impedir o sangramento. Este método não é
vantajoso por exigir soluções esclerosantes mais concentradas e em maior volume.
Corolariamente, cresce o risco de hiperpigmentação cutânea e escarificação.
Estratégia terapêutica
O princípio estratégico de cada tratamento eficaz das varizes consiste, primeiramente,
em eliminar os pontos de refluxo, depois tratar as varizes de maior calibre e,
finalmente, as de menor calibre.
A escola francesa fundada por Tournay preconizava a esclerose dos refluxos de cima
para baixo, ao inverso da escola suíça de Sigg. Fegan, irlandês, só esclerosava as
perfurantes, e o tronco e a junção safenianos não eram geralmente tratados.
No “tratamento de cima para baixo”, da escola francesa, o ponto de refluxo mais alto
será eliminado em primeiro lugar, e as varizes subjacentes involuem então
rapidamente, de tal forma que doses mínimas de esclerosante bastarão. Isto é
igualmente válido para as veias perfurantes. Esta estratégia apresenta a dupla
vantagem da sua eficácia e do seu resultado estético (Fig. 16). Mas a resistência à
esclerose das veias perfurantes insuficientes pode originar um desaire.
Fig. 16 -‐ A escolha dos diferentes locais de injeção depende da localização e do calibre das varizes. É possível injetar uma colateral todos os oito a dez centímetros.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
179 175
No “tratamento de baixo para cima”, da escola Suíça, o lúmen varicoso vai-‐se obliterar
a partir da periferia. A esclerose inicia-‐se nas varizes de pequeno calibre e desenvolve-‐
se progressivamente para cima. Exige numerosas injeções. Este procedimento muitas
vezes esquece a croça, o que faz com que apareçam recidivas rapidamente.
Como cada refluxo se produz a partir duma variz importante para uma mais pequena,
consideramos que é preciso tratar sempre as grandes antes das pequenas. Com esta
estratégia “da maior para a mais pequena”, o número de injeções e a concentração do
esclerosante diminuem, e com eles a percentagem de complicações.
Frequência das sessões
Somos a favor de uma dose de prova inicial para pesquisar a sensibilidade do doente
ao esclerosante.
Normalmente os tecidos reagem muito bem, a sessões semanais, mesmo para grandes
varizes e altas doses de esclerosante e esclerosantes fortes. Recomendamos aos
doentes que não se afastem por mais de uma semana entre duas sessões, para
podermos controlar os resultados e detetar eventual efeito colateral. Para
telangiectasias e esclerosantes suaves espaçamos as sessões de 15 em 15 dias.
Somos contra as longas sessões e os tratamentos “intensivos” diários, por serem
incómodas e pelo risco de irritação da pele.
Por ser imprevisível o número de sessões necessário para erradicar as varizes
aparentes, o tratamento eclerosante pode ser oneroso. É impossível precisar a data da
alta, assim como nada se pode prever sobre o inexorável aparecimento de novas
microvarizes. Com o passar do tempo, novas séries de tratamento poderão ser
necessárias, já que não realizamos uma cura etiológica da doença, mas apenas a
terapêutica paliativa duma das suas manifestações.
Avaliação dos resultados
Os resultados não devem ser avaliados imediatamente. Como se trata de um processo
complexo e lento, pouco se pode esperar antes de duas a três semanas após o início
do tratamento. Alguns doentes, se não avisados, neste interregno podem perder a
motivação para prosseguir.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
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TRATAMENTO COMPLEMENTAR
Medidas gerais
Na primeira consulta, o doente deve ser avaliado e orientado quanto aos fatores que
possam ter alguma relação com a evolução da sua doença varicosa:
-‐ Manter o peso equilibrado;
-‐ Corrigir o trânsito intestinal;
-‐ Evitar sobrecarga para os membros inferiores;
-‐ Corrigir e/ou compensar defeitos ortopédicos que interajam com a doença
venosa;
-‐ Usar calçado apropriado; estimular uso de calçado com saltos em torno de 4
cm de altura e com boa base;
-‐ Advertir contra o uso de calçado raso que deforma os pés e prejudica o
retorno venoso;
-‐ Evitar o ortostatismo prolongado;
-‐ Evitar as longas permanências na posição sentada;
-‐ Compensar o ortostatismo e o repouso sentado prolongado com generosas
caminhadas e exercícios articulares adequados;
-‐ Evitar o abuso de exposição ao calor do sol ou a fontes de calor como lareiras
e braseiras, botijas de água quente, soalhos aquecidos, saunas e fisioterapia com calor;
-‐ Procurar não tomar hormonas anticoncecionais nem de substituição;
-‐ Controlar o lipidema (“celulite”) indicando exercícios e massagem manual e
mecânica adequada.
Medicamentoso
A escleroterapia de varizes pode ser precedida e acompanhada por tratamento
venotrópico visando aliviar os sintomas da doença venosa. Ter em consideração, no
entanto, que os venotrópicos não interferem com a evolução do tratamento, mesmo
aqueles cuja eficácia no campo varicoso foi demonstrada.
Tomar atenção para o facto de que os anti-‐inflamatórios, esteroides ou não, podem,
pelo menos potencialmente, antagonizar a escleroterapia.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
181 177
Após a aplicação do esclerosante, além do álcool usado para antissepsia e da
contenção elástica, desaconselha-‐se o uso de qualquer outro fármaco tópico ou
procedimento. As pomadas anti-‐inflamatórias podem retardar o tratamento opondo-‐
se á ação do esclerosante, pelo menos nas camadas mais superficiais. O mesmo de
pode dizer para os heparinóides, embora ajudem eventualmente a reabsorver as
equimoses e os trombos formados nas pequenas varizes cutâneas.
COMPLICAÇÕES
Os resultados da escleroterapia são muito bons, nos aspetos funcional e estético. O
sucesso do método é dado pela satisfação do doente, a qual pode não coincidir com a
do médico. O tratamento pode ter algumas desistências e os fatores variam da
intolerância físicas às injeções, a limitações financeiras, passando pela desilusão com
As complicações devem ser consideradas desde o início do tratamento e alertar o
doente para essa possibilidade, informando-‐o dos riscos e efeitos adversos que,
eventualmente, podem acontecer, com a escleroterapia com esclerosante líquido e
com a espuma. Apesar de todo o cuidado, do material ideal e da técnica mais
adequada as complicações estão sempre presentes e podem comprometer o
tratamento proposto.
Acerca das complicações o Dr. Amélio Pinto-‐Ribeiro dizia: “Somente dois grupos de
profissionais não as têm: os que não executam a terapêutica e os mentirosos. Os
problemas ocorrem no seu consultório e os pacientes vão tratá-‐los no consultório do
seu concorrente. E você continua dizendo que nunca fez nenhuma.”
Sabemos que a boa relação médico-‐doente, com base na sinceridade e na
disponibilidade permanente, ainda é o melhor meio de que o médico dispõe diante
das complicações.
COMPLICAÇÕES GERAIS
Anafilaxia
Trata-‐se de um problema agudo para o qual se deve estar sempre atento, embora raro
na bibliografia especializada e irrelevante na nossa experiência pessoal e institucional.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
182 178
Assim, é preciso ter sempre corticoide injetável ao alcance da mão para eventuais
emergências.
O “Doente alérgico”
O doente alérgico é sempre um risco insuspeitado. Mesmo após anamnese cuidadosa
e interrogatório orientado, pode haver reação alérgica ao esclerosante, à contenção
elástica, ao creme local e até, eventualmente, ao anti-‐histamínico e mesmo corticoide.
É sempre mais seguro enviar o doente a especialista em Alergologia para avaliação.
Contudo insiste-‐se na recomendação: ter sempre à mão ampolas de corticoide,
adrenalina, anti-‐histamínicos, etc… Embora a probabilidade de acidente seja menor
com a técnica e indicações que preconizamos, a medida é válida.
Por outro lado, manifestações pseudo-‐alérgicas e lipotímias não são raras em certos
tipos de doentes, mesmo quando nada se injeta. Pessoalmente temo esses doentes.
Urticária
A urticária é pouco frequente, mas ocorre eventualmente. Manifestação sistémica
imediata ou tardia, localizada ou difusa. A injeção de anti-‐histamínicos raramente é
necessária, embora na forma oral tenham sido empregados com sucesso, no
tratamento e na profilaxia dos casos que referem histórias compatíveis com a suspeita.
Lipotimias
São bastante frequentes em doentes com instabilidade emocional. A simples
referência a sofrer de “tensão baixa” ou uso de tranquilizantes faz-‐nos prever a
hipótese de lipotímia. Como atrás foi referido, deve evitar-‐se a posição em pé (Fig. 17).
Fig. 17 -‐ Posição a evitar
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
183179
Alterações neurológicas transitórias
Menos frequentes que as lipotímias estão os casos de cegueira fugaz, escotomas
cintilantes e parestesias exóticas. Surgem mais em doentes com queixas de
enxaquecas e portadores de disritmias. Em uma ou duas horas os sintomas costumam
desaparecer deixando, quase sempre, cefaleia residual até 24 horas. Estão descritas
crises convulsivas após sessão de escleroterapia.
Embolia gasosa
Menos frequente do que as lipotímias, pode ocorrer eventualmente produzindo
desconforto precordial e mesmo tosse ou escotomas. O fenómeno costuma ser
passageiro e o seu alívio é quase imediato com tosse forçada.
Trombose venosa superficial
Frequente quando se trabalha nas proximidades de vaso volumoso mesmo não-‐
varicoso. Tal condição é risco permanente para os médicos que se dedicam ao
tratamento das grandes varizes, onde a propagação para o sistema venoso profundo e
a migração embólica não estão fora de cogitação.
Não raro, temos observado intensas reações flebíticas e periflebíticas de troncos
venosos sadios, acidentalmente produzidas por injeções regionais. Nem sempre tem
sido possível reverter tais flebites não-‐intencionais. A prática diminui a ocorrência de
forma drástica.
É muito comum o aparecimento de trombos dolorosos e localizados, especialmente no
dorso do pé e pregas de flexão, quase sempre por contenção insuficiente. Além da dor
causada pelo estiramento das fibras nervosas resultantes do processo inflamatório, a
permanência da lesão conduz ao aparecimento de novas varizes e à formação de
manchas hipercrómicas persistentes. O tratamento é simples e consiste na excisão do
conteúdo semicoagulado e contenção elástica.
Trombose venosa profunda
Achamos ser a trombose venosa profunda secundária à escleroterapia de varizes mais
frequente do que relata a literatura.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
184 180
Quase sempre decorre de injeção de substância esclerosante aplicada no dorso do pé
por profissional pouco experiente (e por curiosos), é dolorosa, tem tendência
ascendente e o doente só costuma procurar tratamento especializado, quando o
edema já atinge grande parte do membro.
Para o tratamento deverá ser utilizada inicialmente heparina na dose correta, seguida
de hipocoagulação com dicumarínicos, e fazer contenção elástica adequada.
Embolia pulmonar
Relatada na literatura como complicação em casos de tratamento esclerosante como
alternativa para varizes cirúrgicas. Nunca presenciámos ou tivemos conhecimento
desta ocorrência no decorrer de escleroterapia de pequenas varizes e telangiectasias.
COMPLICAÇÕES LOCAIS
Dor
A dor provocada pela escleroterapia química, embora bastante tolerada pela maioria
das pessoas, constitui importante fator negativo do tratamento. É provocada
principalmente por:
-‐ Punção -‐ às vezes quase impercetível, a dor é mais intensa nas injeções muito
superficiais, e nalgumas zonas, como a face interna das coxas e dos joelhos e os
cavados poplíteos;
-‐ Injeção -‐ o ardor é habitualmente causado pela ação irritante da substância
esclerosante sobre o vaso. Quando o esclerosante atinge os vasos profundos, produz
sensação de cãibra;
-‐ Extravasamento -‐ responsável por dor intensa, principalmente quando
utilizada a glicose. De fácil constatação em vasos superficiais, o extravasamento torna-‐
se mais difícil de ser identificado em vasos profundos. Embora a dor incomode muito,
é rara a ocorrência de necrose por esse processo. Caso aconteça, é sempre de
pequena monta (Fig. 18 e 19).
O limiar doloroso é extremamente variável e individual. Alguns doentes toleram
sessões prolongadas com facilidade, enquanto outros não suportam nem uma meia
dúzia de picadas.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
185181
Fig. 18 -‐ Extravasamento de esclerosante ao longo da agulha e quando o bisel da agulha fica dentro e fora da veia
Fig. 19 -‐ Extravasamento de esclerosante quando a agulha sai da veia, quando há múltiplas punções feitas pela agulha e quando há demasiada destruição da parede da veia.
Na nossa experiência, aconselhamos os seguintes cuidados para diminuir a dor às
punções:
-‐ Trocar frequentemente a agulha (a cada 4-‐5 punções, em média);
-‐ Apoiar a mão, evitando mobilização da agulha;
-‐ Interromper a injeção assim que identificado o extravasamento e não insistir
em repuncionar a veia;
-‐ Associação de anestésico local ao esclerosante. Lidocaína a 0,5 % ou 0,25 %
sem adrenalina. Nas telangiectasias, em quantidades de 0,1 a 0,2 ml para 2 cc de
esclerosante, provoca anestesia instantânea da rede local permitindo o tratamento.
Prurido e irritação cutânea
Frequente. O prurido local é, quase sempre, evitável pelo uso de compressão elástica
adequada com ou sem coxim entreposto para aumentar compressão localizada. O uso
tópico de creme de corticoide costuma resolver a crise.
Hipodermite química
Alguns autores referem que se trata de periflebite e induração. Embora ocorra com
relativa frequência, trata-‐se com êxito com antiinflamatórios não esteroides e
compressão.
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
186182
Injeção intra-‐arterial
Uma artéria (em particular a pediosa ou a tibial posterior) pode ser puncionada por um
escleroterapeuta inexperiente. O produto funciona com um êmbolo, e nas artérias de
algum calibre não provoca espasmo. Pode ocluir ramos arteriais levando a zonas de
necrose e, nos músculos da perna, a uma síndrome de loca, a qual, se não
diagnosticada a tempo, pode condicionar lesões nervosas irreversíveis, com parésia e
paralisia.
É muito importante o reconhecimento imediato da situação, interrompendo logo a
injeção. O efeito deletério depende obviamente do esclerosante utilizado e da sua
concentração, bem como da quantidade já administrada. Deve aspirar-‐se o máximo
pela mesma seringa, e, sem retirar a agulha, injetar imediatamente 10 000 unidades de
heparina. A administração endovenosa de dextrano a 10% também pode ajudar, mas
na experiência de Frank Cockett qualquer tratamento deve ser instituído na primeira
hora após a injeção.
Nas arteríolas superficiais, muitas vezes em relação com telangiectasias, o risco de
complicações sérias é pequeno, até pelas doses e concentrações usadas. Mas ele
existe, principalmente se houver vasoconstrição acentuada
Escara
A escara como efeito colateral da escleroterapia é quase sempre uma “fatalidade
estatística” derivada da falta de cuidado do médico, se eliminarmos as escarificações
produzidas pelos esclerosantes fortes e concentrados usados por alguns autores para o
tratamento alternativo das grandes varizes.
Em geral, a escara decorre de injeção excessiva de esclerosante, com forte pressão,
levando ao refluxo da circulação para uma arteríola em conexão com os vasos venosos
dilatados, ou duma injeção extravenosa, ou dum espasmo reativo demasiado intenso.
Por vezes, ocorre injetar-‐se numa veia que faz evacuar o sangue de uma grande área
resultando em verdadeiro “espetáculo pirotécnico” muito apreciado pelo doente. A
continuidade da injeção leva ao eritema intenso, cujo centro logo empalidece e
cianosa, demonstrando a vasoconstrição definitiva, e vai escarear 48 a 72 horas
depois. Para se evitarem lesões, a área de isquemia (área da pele em que o sangue foi
Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
187183
substituído pelo líquido injetado) não deve ultrapassar a de uma moeda de 2 €, ou seja
2,5 cm.
A escara consiste numa lesão isquémica, com necrose cutânea, dolorosa e de difícil
resolução espontânea. O seu tratamento é sempre sintomático, devendo ser
conduzido no sentido de deixar a mínima cicatriz residual. Nestes casos a cirurgia
reparadora é pouco feliz, piorando na razão direta da distância da lesão. Os anti-‐
inflamatórios enzimáticos são adequados, e a dor deve ser controlada, de preferência
por via sistémica para impedir o uso de pomadas anestésicas que atrasarão a
cicatrização. Uma escara de 0,5 cm de diâmetro poderá levar mais de três meses para
curar, apesar de todos os cuidados adequados.
Manchas hipercrómicas
Representam os problemas antiestéticos mais frequentes da escleroterapia, mormente
quando esta é procurada com finalidade cosmética. Resultam, via de regra, do uso de
esclerosantes de ação intensa agindo sobre as finas paredes dos vasos tratados e
causando processo perivenoso com aumento da permeabilidade capilar e diapedese
de hemácias para o tecido celular. Mesmo com esclerosantes suaves, quando é
demorado o ato de injetar, a dilatação pós-‐constrição da parede venular também
aumenta anormalmente a sua permeabilidade, gerando manchas escuras.
Nos segmentos venosos mal comprimidos, em que permanecem pequenos trombos, e
nas equimoses em regiões de estase venosa, também vemos maior incidência de
manchas. A hemoglobina sequestrada conduz à deposição de hemosiderina na camada
basal da pele e oxidação posterior com agravamento pelo aporte de melanina ao local,
formando uma mancha evidente e de tratamento rebelde. Por isso a grande
importância da drenagem e/ou aspiração desses trombos pós-‐escleroterapia.
Com o método que utilizamos para o tratamento esclerosante de varicosidades
associado a uma boa contenção elástica por tempo adequado, o fenómeno torna-‐se
inexpressivo quanto à ocorrência e intensidade.
RECIDIVAS
As micro varizes não recidivam necessariamente. Apenas se sucedem, continuada e
irregularmente, em obediência à determinação da sua etiologia desconhecida, mas de
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188 184
caráter genético, a que se somam predisposições pessoais e fatores desencadeantes e
agravantes. Há períodos em que se esperam exacerbações, como na gestação e em
alterações hormonais como na menopausa.
Há doentes que têm menos necessidade de injeções que outros, e com o passar da
idade é costume diminuir a motivação estética para o tratamento. Já verificámos, no
entanto, em doentes acompanhados por mais de vinte anos, que, com o passar do
tempo, as microvarizes tornam-‐se mais resistentes e carecem de maior volume e/ou
concentração de esclerosante do que anteriormente.
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Escleroterapia química no tratamento das varizes dos membros inferiores
191 187
TRATAMENTO DAS COMPLICAÇÕES DAS VARIZES
TROMBOSE VENOSA SUPERFICIAL
Pedro Vaz
Introdução
A trombose venosa superficial (TVS) é um processo inflamatório que envolve a
formação de trombos nas veias superficiais, predominantemente, dos membros
inferiores. Considerada durante muito tempo uma entidade de limitada relevância
clínica, estudos recentes reconhecem a sua importância em relação às possíveis
complicações: trombose venosa profunda e embolia pulmonar. O trombo forma-‐se
pelo processo inflamatório da parede venosa, que tipicamente ocorre nas veias
varicosas, mas também pode ocorrer nas veias não varicosas onde a trombose e a
inflamação desempenham um importante papel. Embora o trombo adira melhor à
parede das veias superficiais quando comparado à trombose venosa profunda, num
terço dos casos, a TVS pode complicar-‐se de tromboembolismo pulmonar.
Em regra, a TVS é um processo inflamatório estéril, no entanto, na presença de
manifestações sistémicas de inflamação, podemos estar perante uma flebite sética,
situação relacionada, habitualmente, com o uso de cateteres periféricos.
Os fatores de risco para TVS incluem as veias varicosas, imobilização prolongada,
trauma, gravidez, doença maligna, uso de anticoncecionais orais e hormonas de
substituição, idade, obesidade, trombofilias, quimioterapia e cateteres e injeções
endovenosas.
Clinicamente apresenta-‐se como uma situação aguda, sintomática, caracterizada por
dor, calor, eritema cutâneo e cordão subcutâneo fibroso no segmento venoso
envolvido.
Epidemiologia
A incidência exata é desconhecida, variando entre os 125.000 casos/ano nos EUA e os
253.000 casos/ano em França, com maior incidência no sexo feminino e com
predomínio dos membros inferiores. É uma entidade pouco estudada, com poucas
referências em Portugal, sendo controversa a sua abordagem terapêutica. Cerca de 20-‐
Tratamento das complicações das varizes - Trombose venosa superficial
192 188
30 % dos casos de TVS complicam-‐se de tromboembolismo pulmonar assintomático,
enquanto 2-‐13 % estão associados a tromboembolismo pulmonar sintomático. Estes
dados demonstram que a TVS está longe de ser uma condição benigna.
Diagnóstico
O diagnóstico baseia-‐se na clínica pelo eritema, dor e cordão palpável no local afetado
da veia superficial. Na maioria dos casos existe edema dos tecidos circundantes.
Quando não se encontra o edema generalizado do membro, o sistema venoso
profundo não está envolvido. Durante o período de recuperação, verifica-‐se a
resolução, na maioria das vezes, do processo inflamatório e trombótico. A
recanalização, normalmente, ocorre passado alguns meses, ficando uma pigmentação
residual e endurecimento dos tecidos.
O ecoDoppler é o exame preconizado, pois permite não só visualizar o segmento
inicial, mas precisar a sua extensão e relação com a junção safenofemoral de modo a
delinear a terapêutica adequada.
Tratamento
Uma avaliação clínica geral é fundamental, em doentes com veias não varicosas. A
trombofilia e as neoplasias malignas, constatando-‐se uma relação de 12.9 % destas
últimas com a TVS, devem ser excluídas. Na fase aguda de TVS, existem as seguintes
modalidades terapêuticas: compressão, mobilização e tratamento farmacológico.
Compressão
A compressão alivia os sintomas e contribui para a resolução do processo trombótico,
sendo recomendado que a ligadura exceda o segmento de veia trombosada em cerca
de 10 cm. A compressão deve ser aplicada pelo menos durante duas semanas,
optando-‐se por ligadura/meia elástica de grau II. Os doentes com veias varicosas
devem ser aconselhados a usar este método de forma continuada.
Mobilização
Recomenda-‐se marcha regular e evitar longos períodos de imobilização quer deitado,
sentado ou simplesmente em pé.
Tratamento das complicações das varizes - Trombose venosa superficial
193 189
Tratamento farmacológico
A anticoagulação permanece o tratamento de escolha e depende da extensão
ecográfica da trombose.
Se TVS com extensão inferior a 5 cm, o tratamento de escolha é o uso de anti-‐
sistemicamente; os AINEs não devem ser administrados conjuntamente com os
anticoagulantes; o uso de antiagregantes plaquetários não está indicado.
Se TVS com extensão entre os 5 e os 10 cm, a terapia anticoagulante é recomendada
(HBPM, HNF e os antagonistas da vitamina K); as HBPM podem ser administradas quer
em doses profiláticas ou terapêuticas; o Cochrane Database Review Group sugere o
uso de doses intermédias durante pelo menos um mês.
Se a extensão for maior que 10 cm, especialmente quando associado a outros fatores
de risco, é recomendação, grau B e evidencia nível 2, para iniciar fondaparinux,
segundo o estudo Calisto.
Os antibióticos não devem ser administrados uma vez que a infeção está raramente
envolvida.
Existe uma grande expetativa nas novas classes de anticoagulantes, que se encontram
a ser testadas para esta indicação específica.
Tratamento cirúrgico
Raramente a cirurgia se encontra preconizada para o tratamento da TVS na fase aguda.
A excisão do segmento afetado e a trombectomia estão indicadas quando os sintomas
persistem após duas semanas de tratamento médico intensivo. Por sua a vez, a
laqueação justafemoral está indicada quando existe progressão proximal da TVS.
Na fase crónica, a compressão e a mobilização mantêm-‐se como opções terapêuticas e
deve ser considerado o posterior tratamento das varizes.
Conclusões
A TVS nem sempre é uma condição benigna e recentes estudos associam-‐na a uma alta
prevalência de tromboembolismo pulmonar.
A TVS pode causar vários graus de insuficiência venosa, bem como potenciar estase,
novos episódios de trombose e alterações cutâneas, incluindo as úlceras venosas.
Tratamento das complicações das varizes - Trombose venosa superficial
194 190
A base do tratamento consiste na compressão, mobilização e anticoagulação.
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Tratamento das complicações das varizes - Trombose venosa superficial
195 191
HEMORRAGIA VARICOSA
Sara Correia, Aida Paulino, Luís Silveira
Apesar de as varizes serem consideradas benignas, podem levar a complicações major
como seja o edema, dermatite, ulceração e a hemorragia varicosa grave1. A
hemorragia varicosa representa uma emergência e pode ser fatal se não tratada
atempadamente2.
As veias varicosas raramente sofrem rotura, e mesmo que tal aconteça, habitualmente
param, devido à sua natureza de hemorragia venosa3. Pode ser traumática, mais
frequente nos adultos jovens, que trabalham4, ou espontânea, verificando-‐se que esta
é mais frequente entre nós. Geralmente são hemorragias noturnas e autolimitadas,
recorrendo, alguns doentes, a hemostase com moeda de 1 € (Fig. 1) (antigamente era
com moeda de um escudo), mas há casos descritos de grandes hemorragias que
provocam choque e mesmo a morte.
Fig. 1 -‐ Hemóstase de varicorragia com moeda de um euro.
São descritos dois tipos de varicorragia:
Hemorragia varicosa
196 192
. o tipo agudo1, 2, em que a lesão é menor que 5 mm, sem quase envolvimento da pele,
mais frequentes em idosos com pele muito fina sobre grandes varizes e, normalmente,
afeta uma tributária venosa superficial em redor do maléolo medial5. Jelev5 estudou,
microscopicamente alguns locais de úlcera sangrante e concluiu que “A possível
patogénese do processo pode ser resumida com base nas nossas observações
histológicas. O primeiro estágio é a trombose venosa local, predominantemente no
lado da pele, seguida de espessamento e incorporação do trombo. Na pele oposta,
aparece uma hiperplasia epidérmica. Tanto a trombose venosa como a inflamação da
pele criam um "ponto fraco" para posterior rotura externa. Provavelmente, o aumento
da pressão intravenosa nas veias superficiais da perna devido a disfunção cardíaca ou
trombose venosa profunda tem um papel importante.”
. o tipo crónico, com uma lesão com 10-‐100 mm, associada a hiperpigmentação da
pele, induração e erosão para uma veia superficial ou profunda da perna2, geralmente,
uma úlcera venosa crónica5 e ocorre sobretudo na 6ª à 9ª década de vida1, 5 e segundo
Jelev5 “... este tipo de hemorragia abundante é precedida por ulceração crónica da pele
seguida por erosão de uma veia maior subjacente.” Não há diferença significativa na
distribuição por sexo ou lateralidade das lesões.
A hemorragia é das complicações menos frequentes das varizes e ainda são mais raras
as que conduzem à morte4, 6. Byard, em dez anos, encontrou oito casos, de morte por
varicorragia, em 10686 autópsias1. Encontrámos descrições de morte por hipovolemia,
por rotura de varizes no banho, podendo a temperatura quente da água6, 7, ter
contribuído para a persistência de vasodilatação periférica e a manutenção da
hemorragia.
Caracteristicamente, a hemorragia varicosa fatal verifica-‐se em indivíduos de idade
avançada, de baixo índice cultural8, em isolamento social6, 7, 8, 9 com comorbilidades
como demência, uso de anticoagulantes ou álcool1, ou doenças que alterem a
coagulação10. Adicionalmente outro fator predisponente, são as alterações escleróticas
das veias que podem levar à hemorragia espontânea2.
Byard10 relata dois casos em que a hemorragia foi abundante, em esguicho, pois
salpicou à distância, simulando uma hemorragia arterial, pois o sangue está em
hipertensão na variz e a úlcera é muito pequena (2 a 5 mm). No entanto, na autópsia
não foi detetada nenhuma comunicação com artéria. Também cita comentários de
Hemorragia varicosa
197193
criminologistas, porque a cena em que aqueles doentes são encontrados, parecem ser
de crimes violentos, tal a dispersão do sangue pelo local. Em doentes com varizes,
Komai11, demonstrou fístulas artério-‐venosas (FAV) por arteriografia e tratou-‐as por
embolização seletiva, antes do tratamento definitivo da causa, e Gius12, em 13 de 14
doentes estudados com arteriografia, encontrou FAV que eram a causa das varizes.
Encontrámos testemunhos idênticos em artigos de Haimovici13 e Schalin14, tendo este
confirmado a sua existência com microscópio operatório e pela observação de
hemorragia pulsátil, e Piulachs15, em 1953, afirmou, depois de estudar de 157 casos, o
que relatámos no Capítulo 1 deste livro, na pág. 21.
Perante o que descrevemos, podemos sugerir que, se a grande maioria das
varicorragias deixa de sangrar espontaneamente, talvez as fatais tenham FAV a
alimentá-‐las e, por isso, a hemóstase é mais difícil.
Tratamento
A hemorragia varicosa trata-‐se de uma emergência médica e requer tratamento
atempado. Contudo, a falta de recursos, de comunicação atempada (se o doente vive
só ou longe de socorro8) e de reconhecimento da importância desta patologia, pode
conduzir a uma falsa avaliação da sua importância e subestimá-‐la2, 8.
No tratamento da varicorragia, a primeira etapa é deitar o doente e elevar a perna
afetada, o que ajuda na diminuição da pressão intravenosa e na hemorragia5. A ajuda
urgente inclui a compressão direta ou por torniquete, que deve ser escolhido
criteriosamente. Muitas vezes, pode ser confundida com hemorragia arterial
colocando a compressão proximalmente, com consequências nefastas, pois aumenta e
mantém a hemorragia que pode conduzir à morte 8, 16.
Labas17, na urgência, propõe tratamento com esclerose com TetraDecyl sulfato de
sódio, pois em estudo retrospetivo comparou este método (E = 72 doentes) com a
sutura, ponto em X (S = 52 doentes) dos locais sangrantes, em ambos os métodos
seguiu-‐se compressão durante seis meses, e verificou que a cicatrização da ferida era
mais rápida (média: E – 7 dias; S – 14 dias) e só no grupo os suturados houve recidivas
hemorrágicas, 12 (23%). Mas Cocker7 relata um caso em que o doente faleceu, por
recidiva hemorrágica, dez semanas após tratamento urgente por escleroterapia, com o
mesmo produto.
Hemorragia varicosa
198 194
Finalmente, Cocker7 propõe que seja efetuado ensino, elevar o membro e pressionar
o local da hemorragia, a todos os doentes portadores de úlceras venosas,
especialmente os que estão em risco.
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Hemorragia varicosa
200
201 197
VARIZES NA GRÁVIDA
Ana Formiga
INTRODUÇÃO
Ao estudar a fisiopatologia da doença venosa crónica, verifica-‐se que a causa das
varizes primárias é multifactorial, havendo predisposição genética ou adquirida, e
intervindo como factores etiológicos as alterações da parede venosa e a
incompetência valvular, sob influência da hereditariedade.
Constatamos que a gravidez é considerada como factor de risco para o início e
desenvolvimento da insuficiência venosa e, nomeadamente, das varizes.
Na grávida os estudos escasseiam e há muitos viés: poucos casos incluídos; análise de
diferentes parâmetros e diferentes séries; avaliação de parâmetros em diferentes
posições; início dos estudos só quando a gravidez foi diagnosticada e por vezes já no 2º
ou 3º mês, com as alterações hormonais consequentes, dificultando a comparação
com os valores de base.
Também é pouco viável a quantificação da clínica e do efeito das medidas médicas, e
sua repercussão nos parâmetros avaliados.
Tudo isto torna difícil comparar estudos, havendo por vezes resultados controversos.
Podemos falar de varizes na gravidez em três sectores anatómicos diferentes: varizes
dos membros inferiores; varizes vulvares e perineais; varizes pélvicas.
VARIZES DOS MEMBROS INFERIORES
Epidemiologia
Cerca de 15 % das grávidas surgem com varizes de novo (as séries variam: 5-‐10-‐20 %).
Aparecem mais frequentemente no início do 2º trimestre.
Há progressão durante a gravidez, e regressão no pós-‐parto.
A prevalência é semelhante comparando os homens e as mulheres que nunca
engravidaram.
Varizes na grávida
202 198
O risco de desenvolvimento de varizes na gravidez aumenta com a idade (quatro vezes
acima dos 35 anos), com uma história familiar de doença venosa (seis vezes se factores
hereditários), e com a multiparidade (duas vezes nas multíparas em relação às
nulíparas).
Nas mulheres acima dos 40 anos está relacionada com o número de gravidezes: 20 %
nas nulíparas; 40 % se multíparas com 1-‐4 gravidezes; 65 % se multíparas com cinco ou
mais gravidezes.
Fisiopatologia
Durante a gravidez observam-‐se múltiplas adaptações do sistema circulatório.
As alterações desencadeadas pela gravidez a nível do sistema venoso, conduzem a
modificações da pressão e do fluxo venosos e da distensibilidade das veias,
dependendo, nomeadamente, de dois factores (mecânico e hormonal), mas sendo
difícil definir o efeito relativo de cada um:
Efeito mecânico
A compressão da veia cava inferior e das veias ilíacas pelo aumento de volume do
útero grávido, leva ao aumento da pressão venosa nos membros inferiores.
Há uma elevação linear da pressão venosa dos membros inferiores desde o início até
ao final da gravidez, altura em que a pressão venosa na veia femoral, em decúbito
dorsal, é três vezes superior ao habitual.
Efeito hormonal
As alterações hormonais verificadas durante a gravidez têm repercussão sobre as
veias. Há um aumento da distensibilidade das veias, por efeito dos mediadores
hormonais, desde os primeiros meses da gravidez, nos membros inferiores e, também,
nos superiores.
A placenta segrega grande quantidade de hormonas esteroides, desde a 6ª semana.
O estradiol e a progesterona têm efeito vasodilatador, com perda do tónus da parede
venosa.
Há um aumento do volume circulatório e da vascularização, com proliferação e
dilatação de vasos cutâneos. A alta concentração de estrogénios aumenta o
aparecimento de telangiectasias.
Varizes na grávida
203 199
Outras alterações, a nível do endotélio e das proteínas da coagulação, são factores
contributivos para a elevada incidência de tromboembolismo na gravidez.
Estudos
Da análise de vários estudos, embora que como já atrás referido, sejam por vezes
controversos, chegamos a algumas conclusões.
Estudos da parede venosa
Sabe-‐se que a dilatação das veias leva à libertação de factor activador do
plasminogénio tecidular para o lúmen venoso. A distensão prolongada no tempo, ao
espoliar a parede venosa deste importante factor fibrinolítico, será, eventualmente,
uma razão pela qual aumenta o risco de trombose venosa na gravidez.
Alguns estudos mostram também que as veias do sistema superficial da perna,
varicosas ou não, têm um nível de factor activador do plasminogénio tecidular inferior
ao das veias profundas. Isto, associado à dilatação dessas veias na gravidez, e
consequente diminuição do factor na parede venosa, predispõe à maior incidência de
tromboflebite na gravidez.
Estudos com ecoDoppler
Vários estudos revelaram resultados, por vezes, contraditórios:
1. Aumento do diâmetro das veias entre o 1º e o 3º trimestre da gravidez. Este
aumento de diâmetro ocorre nas veias safenas (tanto nas competentes como nas já
insuficientes), nas veias profundas e nas varizes. No entanto, em todas elas há
diminuição do diâmetro no pós-‐parto, para valores do 1º trimestre (embora neste já
haja o efeito hormonal).
2. Aumento de diâmetro das veias durante toda a gravidez, sendo maior nas veias
varicosas. O diâmetro diminui no pós-‐parto, frequentemente com retorno aos valores
de base. Isso nem sempre ocorre, nomeadamente nas varizes.
3. Maior dilatação nas veias insuficientes durante a gravidez e sem retorno completo
ao diâmetro prévio após o parto, justificando aparecimento e agravamento das varizes
na gravidez e com as gravidezes seguintes.
4. Diminuição da velocidade do fluxo venoso nas veias femorais e popliteias, no 1º
trimestre, diminuindo mais à medida que aumenta o tempo de gestação, e voltando ao
normal imediatamente após o parto. Esta diminuição de velocidade mantem as
Varizes na grávida
204 200
oscilações normais com a manobra de Valsalva, e pode estar relacionada com a
diminuição da velocidade média e sistólica nas artérias femorais, na gravidez.
5. Aparecimento de refluxo, no 3º trimestre, em veias inicialmente competentes, em
algumas grávidas. Este refluxo, por vezes, volta ao normal no pós-‐parto, outras vezes
não, o que explica o desenvolvimento de varizes em mulheres com predisposição para
tal.
6. Noutro estudo, nenhuma grávida desenvolveu refluxo de novo em veias
previamente normais. Isto desafia o conceito de que a distensão venosa progressiva,
na gravidez, esteja associada com o desenvolvimento de refluxo.
7. Nas veias previamente refluxivas há aumento da velocidade do refluxo à medida que
avança a gestação, até à 26ª semana, diminuindo depois. A duração do refluxo diminui
durante a gravidez aumentando, de novo, no pós-‐parto.
8. Quando há varizes previamente, estas tendem a agravar com a gravidez: dilatam e
por vezes há aumento do refluxo, podendo não haver retorno aos valores prévios
depois do parto.
Estudos com pletismografia
Revelam alterações durante a gravidez, com retorno da hemodinâmica venosa ao
normal no pós-‐parto.
O retorno venoso das pernas está, significativamente, diminuído no 3º trimestre.
Sintomas subjectivos de insuficiência venosa aumentam ao longo da gravidez, mas
desaparecem virtualmente depois do parto, correspondendo à normalização da
bomba muscular no pós-‐parto.
Estudos clínicos
Feita avaliação com clínica (sintomatologia, registo de imagem, gráficos) e ecoDoppler.
Avaliada a evolução ao longo da gravidez. Reavaliação aos três meses pós-‐parto ou
após parar aleitamento.
Constata-‐se que, no pós-‐parto, as alterações verificadas durante a gravidez nas classes
C1 e C2, diminuem rapidamente, embora por vezes não completamente, enquanto nos
estádios mais avançados, classes C3-‐C6, a melhoria é mais lenta e gradual.
Conclusões após análise dos estudos
1. O aparecimento e desenvolvimento de alterações venosas verificadas na gravidez é
multifactorial.
Varizes na grávida
205 201
2. Se a gravidez actua como efeito primário ou como acelerador do processo, em
mulheres já susceptíveis, não se sabe.
3. A diminuição da velocidade do fluxo venoso, o aumento da pressão venosa, a
diminuição do tónus venoso e vasodilatação, a estase, o refluxo, são, provavelmente,
factores etiológicos que explicam o aparecimento e desenvolvimento de doença
venosa crónica durante a gravidez e, também, a eficácia terapêutica do efeito
compressivo das meias elásticas.
4. Mesmo sem refluxo, pode haver queixas a nível dos membros inferiores (edema,
dor, etc.), devido à hipertensão venosa secundária ao aumento do volume sanguíneo,
à obstrução ao fluxo pelo útero grávido, ou às alterações da bomba muscular. Surgem
alterações de capilaridade que resultam em edema.
5. Muitas alterações verificadas na gravidez regridem no pós-‐parto.
6. Quando há varizes prévias, estas tendem a agravar com a gravidez.
7. Uma maior dilatação nas veias insuficientes durante a gravidez e sem retorno
completo ao diâmetro prévio após o parto, justifica o agravamento na gravidez e com
as gravidezes seguintes.
8. A maior dilatação das veias superficiais na gravidez e a consequente diminuição do
factor activador do plasminogénio tecidular na parede venosa (factor fibrinolítico),
será eventualmente uma das razões que explicam aumento do risco de tromboflebite
ou varicoflebite na gravidez.
Avaliação da insuficiência venosa
A grávida recorre à consulta por motivos estéticos, preventivos ou terapêuticos e é
necessário, para além da avaliação e seguimento, dar informação sobre riscos,
complicações e tratamentos.
A avaliação segue as regras habituais, com uma boa história clínica e exame objectivo,
seguida dos exames complementares adequados.
História clínica e exame objectivo
. Avaliação dos antecedentes pessoais e familiares e pesquisa de doenças associadas e
factores (hábitos e sócio-‐profissionais) que predisponham a maior risco de
aparecimento de varizes e também de tromboembolismo.
. Avaliação e caracterização de sinais e sintomas.
Varizes na grávida
206 202
Os sintomas são variáveis, desde assintomáticas até dor, peso nas pernas ou sensação
de edema. Como é clássico na insuficiência venosa, os sintomas são mais evidentes ao
final do dia, com tempo ou ambiente quente, com actividade profissional
predisponente (posição de pé, sentada de perna pendente, inactiva). Aumentam
também com a progressão da gravidez.
Os sinais variam, de acordo com o grau de insuficiência venosa crónica (consoante os
graus da classificação CEAP): telangiectasias, ectasia de vénulas, varizes, edema,
alterações tróficas da pele, úlcera venosa.
As telangiectasias e vénulas dilatadas são normalmente mais exuberantes na grávida,
sendo frequente o aparecimento da “corona phlebectatica” (telangiectasias
intradérmicas aglomeradas na zona do tornozelo e extensão ao pé).
A corona phlebectatica é composta por telangiectasias vermelhas e azuis, manchas de
estase (capilares subepiteliais em forma de moeda vermelho ou púrpura) e «taças»
azuis (dilatação da convergência com o arco plantar de forma triangular). Não tem o
mesmo significado que as telangiectasias noutras localizações, sendo indicador de
estase venosa severa, com hipertensão venosa. Está correlacionada com refluxo distal
e presença de perfurantes incompetentes e, nomeadamente as telangiectasias azuis e
as manchas de estase, são de alto valor predictivo para o aparecimento de lesões
cutâneas.
As varizes variam, consoante o grau de insuficiência e têm a habitual distribuição por
todos os sectores, uni ou bilateralmente, dependendo do território lesado.
Devemos averiguar a existência de sintomas e sinais de insuficiência venosa ou varizes,
previamente à gravidez, observar a evolução durante a gravidez (com eventual registo
de imagem para facilitar comparações) e reavaliar após o parto ou o aleitamento,
verificando se houve regressão, persistência ou agravamento.
Exames complementares
O exame de eleição, é o ecoDoppler colorido venoso dos membros inferiores, que,
além de ser inócuo, permite estudar a circulação venosa superficial e a profunda, e dá
um mapa das lesões.
Se houver antecedentes de doença venosa profunda, pode ser necessária a avaliação
das veias pélvicas (ováricas, uterinas), ou abdominais, também com ecoDoppler, e
fazer análises específicas para detecção de trombofilias.
Varizes na grávida
207 203
Complicações
As complicações são as mesmas que na doença varicosa habitual: alterações tróficas
da pele, ulceração, varicorragia, varicoflebite.
Alterações cutâneas
As alterações da pele ou tecido celular subcutâneo são raras, porque, para além das
mulheres serem jovens, as alterações venosas existem durante um curto período, pois
há reversibilidade após a gravidez e, frequentemente, o tratamento é atempado e
preventivo.
Úlcera venosa
O traumatismo de uma perna edemaciada e com insuficiência venosa pode levar a
lesões inflamatórias e mesmo a úlcera crónica.
Estas úlceras são mais frequentes se há uma alteração percussora prévia, (alterações
cutâneas e telangiectasias, como a corona phlebectatica).
Trombóticas
O risco de tromboembolismo venoso na grávida é quatro vezes maior que na mulher
não grávida com a mesma idade, com os consequentes riscos para a mãe e para o feto,
resultantes de uma trombose no sistema venoso profundo (TVP = trombose venosa
profunda), ou eventual tromboembolismo pulmonar.
A trombose venosa superficial ocorre em cerca de 10 % das grávidas, sob a forma de
tromboflebite (em veia normal) ou varicoflebite (em veia varicosa).
Este risco aumentado, para além ter como factor a existência de estase provocada pela
dilatação venosa e diminuição da velocidade do fluxo e do retorno venosos, resulta
também do estado de hipercoagulabilidade próprio da gravidez e que é devido a:
. Produção pela placenta de inibidores da activação do plasminogénio, levando a
diminuição da actividade fibrinolítica;
. Aumento da agregação plaquetária. Os estrogénios além de diminuírem o tónus
venoso, e aumentarem a viscosidade sanguínea, diminuem a antitrombina III e
aumentam os factores VII e X, aumentando a resposta da agregação plaquetária à
trombina;
. A dilatação das veias superficiais na gravidez, e consequente diminuição do factor
activador do plasminogénio tecidular na parede venosa (factor fibrinolítico), pode
Varizes na grávida
208 204
eventualmente ser uma das razões pela qual aumenta o risco de tromboflebite e de
varicoflebite na gravidez.
Deve ser avaliado o risco individual e feita prevenção adaptada a cada situação,
nomeadamente, se há factores predisponentes (tromboembolismo prévio, obesidade,
trombofilias, etc.).
A prevenção, para além das habituais medidas de posicionamento, exercício físico e
meias elásticas, é feita também com heparina de baixo peso molecular (HBPM) em
dose profiláctica, se os factores de risco o indicarem.
No tratamento utiliza-‐se HBPM em doses terapêuticas, atendendo a que os
anticoagulantes orais estão contraindicados na gravidez.
Tratamento
Há que investir sobretudo na prevenção, para que não se manifeste a insuficiência
venosa, e caso esta surja, iniciar logo tratamento para prevenir uma evolução
desfavorável.
Os fundamentos do tratamento são: acalmar a doente; aliviar os sintomas; diminuir ou
parar a progressão da doença; prevenir as complicações.
O tratamento é conservador, e as medidas utilizadas actuam igualmente como
prevenção.
Inclui medidas essencialmente higiénicas com alteração do estilo de vida, o uso de
compressão elástica e eventualmente em alguns casos a prescrição de medicamentos
venoactivos.
A cirurgia e a esclerose das varizes e telangiectasias devem ser proteladas para depois
do parto.
Nunca operar ou fazer escleroterapia apenas por razões estéticas, durante a gravidez.
Aconselhamento sobre alteração do estilo de vida e medidas posturais
Deve explicar-‐se à grávida que muitas alterações resultantes da insuficiência venosa e
as varizes que surgem de novo, melhoram ou desaparecem após o parto, e que as
complicações são raras, nomeadamente se seguir as medidas preventivas e
terapêuticas adequadas, que levam à diminuição da estase venosa e aumento do
retorno venoso.
Quanto a estas medidas, é benéfico:
Varizes na grávida
209 205
. Períodos de repouso ao longo do dia (15 minutos por cada hora que passar em pé
durante o dia), com elevação das pernas acima do nível do coração. Esta posição pode
não ser tolerada no final da gravidez, porque o grande aumento do útero pode
provocar dispneia;
. Elevação dos pés da cama durante a noite (altura colocada debaixo dos pés da cama e
não com almofadas debaixo das pernas ou altura debaixo do colchão) – 1 cm por cada
hora que passar em pé durante o dia;
. Repouso em decúbito lateral para diminuir a compressão da veia cava e veias ilíacas
pelo útero grávido (Fig. 1);
. Exercício físico – que active a musculatura da perna e seja compatível com a gravidez:
andar, nadar, yoga, ginástica adequada;
. Evitar longos períodos em pé, parada, ou sentada de perna pendente, inactiva.
. Não usar elásticos circulares nas pernas;
. Controlar o aumento de peso e no caso de obesidade encorajar a perda de peso.
A B
Fig. 1 -‐ Compressão da veia cava e veias ilíacas: A -‐ decúbito dorsal e B -‐ decúbito lateral
Terapêutica compressiva
Há estudos que evidenciam que as meias elásticas melhoram o fluxo venoso nos
membros inferiores e diminuem o diâmetro das veias femorais durante a gravidez e no
pós-‐parto.
Varizes na grávida
210 206
As meias elásticas devem ser prescritas como profilaxia ou como terapêutica. Neste
caso, quando do aparecimento dos primeiros sinais de insuficiência venosa, ou logo
desde o início da gravidez se já houver insuficiência venosa prévia.
Devem ser usadas durante toda a gravidez e no pós-‐parto até à 6ª semana, ou mais
tempo, caso a clínica o justifique ou se houver persistência de insuficiência venosa.
O grau de compressão deverá ser de acordo com o grau de insuficiência venosa. Maior
com insuficiência venosa mais acentuada e para o final da gravidez.
Normalmente usam-‐se pressões entre os 20 e os 40 mm de Hg, grau I ou II de
compressão (embora haja trabalhos que mostram que uma meia com pressão de 40-‐
45 mmHg reduz o diâmetro de uma veia varicosa para metade e que é necessário um
mínimo de 90 mmHg para que o refluxo desapareça e que o diâmetro da veia retorne
ao normal).
Em algumas situações, se houver necessidade de pressões mais elevadas, e para
conforto da doente (mais fácil de calçar, e permitindo variar a pressão com o tipo de
actividade), poderá usar-‐se sobreposição de meias (por exemplo uma meia até ao
joelho sobre uma meia até à raiz da coxa), sendo a pressão final igual ao somatório da
pressão das duas meias.
O tipo de meia (meia até ao joelho, meia até à raiz da coxa, collant) não é importante e
dependerá, essencialmente, do gosto/conforto da doente, sendo o fundamental a
compressão a nível da perna. A excepção existe apenas em alguns casos de
necessidade de compressão de varizes na raiz da coxa, quando dependem das veias
pélvicas e perineais.
Agentes venoactivos
Está reconhecida a eficácia das drogas venoactivas na insuficiência venosa, com forte
recomendação nas guidelines para os bioflavonoides de fracção flavonóica purificada
micronizada.
Não têm efeito teratogénico e por isso podem ser usados na gravidez, quando há
sintomatologia que o justifique.
A duração do tratamento é de um a três meses, repetível em caso de recorrência de
sintomas após a descontinuação.
Não é recomendado o uso durante a amamentação, por falta de estudos.
Varizes na grávida
211 207
Escleroterapia
É possível na gravidez? Embora não se encontre relação causal entre escleroterapia e
efeito adverso na mãe ou na criança, e haja trabalhos que referem inexistência de
complicações, não há dados clínicos suficientes sobre o uso da escleroterapia na
gravidez e na lactação. Assim, não deve ser usada durante estes períodos.
As guidelines europeias consideram a gravidez como uma contraindicação relativa para
a escleroterapia. Tem que ser muito bem ponderado o risco/benefício, em situações
específicas.
Cirurgia
Embora a cirurgia das varizes seja segura durante a gravidez, não é recomendada,
porque, além da persistência do factor de agravamento das varizes, a própria gravidez,
há reversão e melhoria de algumas alterações após o parto.
Devemos esperar, e reavaliar após a máxima regressão das lesões, que ocorre depois
do 3º mês pós-‐parto, e operar posteriormente.
Só em situações extremas deve ser colocada a hipótese de cirurgia das varizes durante
a gravidez. Quando os sintomas (sensação de peso ou de edema ou dor severos) ou
sinais de estase (dermatite, hiperpigmentação ou úlcera) forem muitos severos e não
respondam às medidas médicas conservadoras.
No caso de uma tromboflebite ascendente, poderá fazer-‐se a laqueação do vaso
afectado para prevenir a propagação do trombo ao sistema profundo. Isto em
combinação com HBPM.
É possível, eventualmente, fazer-‐se uma cirurgia minor paliativa, só de laqueação do
tronco incompetente e colaterais, com anestesia local, entre o 3º e 6º meses de
gravidez, na tentativa de diminuir a pressão na safena interna ou externa. Isto,
combinado com as medidas médicas pode melhorar muito os sintomas.
Tratamento das complicações
Para além de todas as medidas já descritas, o tratamento das complicações deve ser
dirigido especificamente á situação:
. Na úlcera de perna, é importante o tratamento local habitualmente usado na não
grávida, com períodos de repouso com elevação dos membros inferiores (mantendo a
deambulação e o exercício), e a compressão elástica.
Varizes na grávida
212 208
. Na trombose venosa profunda tratar com HBPM em doses terapêuticas, atendendo a
que os anticoagulantes orais, mesmo os novos, são contraindicados na gravidez. O
tratamento deverá manter-‐se ao longo de toda a gravidez e nos três meses após o
parto, (pela persistência do elevado risco de trombose nestes períodos), para evitar a
progressão do trombo, o trombo-‐embolismo pulmonar, ou a recidiva da trombose.
. Na varicoflebite, a vigilância e anti-‐inflamatórios, eventualmente locais, podem ser
suficientes quando em pequenas zonas limitadas, mais distais.
Na varicoflebite mais extensa ou na tromboflebite, embora controversa, há tendência
para fazer heparina de baixo peso molecular em dose terapêutica ou dose profiláctica
alta, durante pelo menos cinco dias. A HBPM tem acção terapêutica (diminuição da dor
e evolução para lise do trombo) e é também profiláctica de TVP. Se estiverem
presentes mais factores de risco, dever-‐se-‐á manter uma dose profiláctica.
Também numa varicoflebite que provoque muitas dores, poderá ser útil executar
pequenas flebectomias com excisão do trombo, quando ainda não aderente. A
anestesia local, desde que pontual e com baixas doses de lidocaína não tem
contraindicação significativa durante a gravidez.
. No caso de uma tromboflebite ascendente, poderá fazer-‐se a laqueação do vaso
afectado, para prevenir a propagação do trombo ao sistema profundo, em simultâneo
com HBPM.
É fundamental o uso de meias elásticas, mesmo depois do parto, para prevenir as
lesões habituais da síndrome pós-‐trombótica (edema, alterações cutâneas, úlcera de
perna).
VARIZES VULVARES E PERINEAIS
Recordando a anatomia, as veias vulvares ou vulvovaginais drenam pelas seguintes
vias:
. anteriormente, para as pudendas externas, que se lançam na junção safeno-‐femoral e
por esta via para o sistema da veia ilíaca externa.
. abaixo, para as veias perineais, e destas para a safena interna.
. posteriormente, para as pudendas internas e destas para a veia ilíaca interna.
Varizes na grávida
213 209
. acima, há anastomoses com o plexo venoso uterovaginal e ovárico.
. há conecções com veias pélvicas via veia obturadora, a veia circunflexa ilíaca
superficial e com a região inguinal e perfurantes perineais.
Assim, as veias vulvares têm comunicações com veias da parede pélvica e órgãos
internos (vagina, útero, ovário), com as veias ilíacas internas e externas e através das
veias perineais, também com a face interna da coxa.
As veias vulvares têm uma parede fina, com muitas fibras elásticas, receptores
hormonais, e poucas fibras musculares.
As varizes vulvares não têm a ver com dilatação provocada pelo aumento do volume
circulatório observado na gravidez, mas sim com alterações condicionadas pelo
aumento de estrogénios e progesterona, dos quais são órgão alvo pela existência de
receptores na sua parede.
Por passarem despercebidas, a sua incidência é eventualmente subestimada. A grávida
não se queixa, por ausência de sintomas ou por pudor. O médico também não as
procura.
Surgem em 10 % das grávidas, raramente na 1ª gravidez, e geralmente só no 5º mês de
uma segunda gravidez. O risco aumenta com o número de gravidezes.
Tendem a desaparecer espontaneamente ou diminuir significativamente após o parto
(raramente visíveis logo após um mês). O tempo de persistência é tanto maior quanto
mais longo for o período de amamentação (revelando a influência hormonal).
Para além dos pequenos e grandes lábios podem estender-‐se à vagina, região inguinal,
perineal e perianal e à face interna da coxa.
Frequentemente assintomáticas, mas podendo dar sintomas de flebopatia hormono-‐
induzida (edema, sensação de peso, fadiga, queimadura, prurido, maceração cutânea),
desconforto com a marcha, dispareunia, ou ser dolorosas sobretudo se muito
dilatadas.
Por vezes estão associadas telangiectasias e veias reticulares.
A trombose e a hemorragia são raras.
As varizes vulvares não são contraindicação para parto vaginal. A hemorragia é rara e
resolvida com compressão ou laqueação do vaso sangrante. As varizes vaginais
poderão no entanto ser indicação indirecta para cesariana.
Varizes na grávida
214 210
Se existem fora da gravidez há que averiguar outras causas: síndroma (S) de congestão
pélvica; S. de compressão da veia ilíaca; S. pós-‐trombótica com obstrução da veia
ilíaca.
O estudo é feito, preferencialmente, com ecoDoppler, deixando para depois do parto
exames mais agressivos (angioTAC, RM, venografia selectiva).
O ecoDoppler está indicado também quando as varizes vulvares aparecem
precocemente no início da gravidez ou na 1ª gravidez, quando são unilaterais ou se há
trombose.
Tratamento das varizes vulvares
Atendendo a que são muitas vezes assintomáticas e melhoraram ou desaparecem após
o parto, o tratamento é considerado só se houver sintomas que o justifiquem. Deve ser
um tratamento sintomático durante a gravidez, deixando para depois do parto,
quando persistirem varizes sintomáticas, o tratamento curativo, preferencialmente por
escleroterapia, ou eventual cirurgia (flebectomia/laqueação de perfurantes).
O tratamento durante a gravidez é conservador, sintomático, recorrendo a:
. Gel refrescante;
. Arrefecimento -‐ “compressa” térmica;
. Penso compressivo;
. Dipositivo/Cinto de suporte compressivo;
. No prurido -‐ solução espuma sem sabão; pomada de óxido de zinco de base aquosa;
anti-‐histamínicos;
. Na dor e sensação de peso -‐ agentes flebotónicos em altas doses -‐ bioflavonoides de
fracção flavonóica purificada micronizada;
. Na hemorragia -‐ terapêutica compressiva; laqueação;
. Na trombose das varizes vulvares, tal como na tromboflebite superficial dos membros
inferiores, a tendência é fazer heparina de baixo peso molecular, dose profiláctica alta,
durante pelo menos cinco dias: Tem acção terapêutica (diminuição da dor e evolução
para lise do trombo) e é também profiláctica de TVP.
Tratamento cirúrgico só em casos especiais – por exemplo, laqueação na crossa na
trombose da pudenda externa.
Varizes na grávida
215 211
A escleroterapia, o tratamento de eleição nas varizes vulvares, embora seja possível na
gravidez, é raramente efectuada, pois os benefícios são incertos no contexto hormonal
desfavorável existente.
VARIZES PÉLVICAS
A Insuficiência Venosa Pélvica (IVP), definida como incompetência da veia ovárica, da
veia ilíaca interna ou de ambas, é causa de Síndroma de Congestão Pélvica, por sua vez
responsável por dor pélvica crónica.
A veia ovárica esquerda lança-‐se na renal esquerda e a ovárica direita na cava infra ou
justa renal, onde, frequentemente, têm válvulas (Fig. 2).
Fig. 2 -‐ Circulação venosa: Colaterais na junção safeno-‐femoral à direita;
Varizes pélvicas e vulvares à esquerda.
As veias ováricas muitas vezes não são veias únicas, mas uma rede multicanalicular, e
têm conecções com as veias lombares ascendentes e retroperitoneais, o que pode
condicionar a persistência de refluxo retroperitoneal e a recorrência de sintomas após
Varizes na grávida
216 212
tratamento. Há também conecções com as veias uterinas, vulvares, rectais e da porção
superior da coxa.
A veia ilíaca interna recebe fluxo das veias útero-‐ováricas, hemorroidárias e plexo
venoso sagrado. Quando incompetente, provoca hipertensão venosa, produz varizes
pélvicas, e poderá também explicar a exacerbação das hemorróidas na gravidez.
Os estudos sobre a fisiopatologia da insuficiência venosa pélvica, são ainda
incompletos e com muitos viés.
A IVP, tal como a insuficiência venosa dos membros inferiores, é de etiologia
multifactorial, sendo factores importantes a predisposição genética, o efeito
hormonal, e nomeadamente a gravidez. Nesta, os estrogénios e a progesterona ao
actuarem na parede venosa e aparelho valvular, têm efeito vasodilatador.
As veias ováricas, de parede fina, ficam normalmente dilatadas durante a gravidez. O
estradiol provoca dilatação selectiva das veias ováricas e uterinas.
Além disso, na gravidez, as veias ováricas e pélvicas estão sujeitas ao esforço do
habitual aumento de volume e de fluxo circulatório existentes na gravidez, e à
compressão pelo útero grávido. Também a angulação da veia ovárica pelo aumento de
peso e alterações posicionais, pode condicionar congestão venosa.
Após a gravidez, o diâmetro da veia ovárica pode não voltar aos valores basais e o
efeito repetido de múltiplas gravidezes tornar a dilatação irreversível, implicando
afastamento das valvas e insuficiência valvular, condicionando refluxo venoso pélvico e
consequentes varizes pélvicas, e hipertensão venosa crónica. Esta leva a estase capilar
com retensão de leucócitos e resposta inflamatória provocando a sensação de mal-‐
estar (dorido) ou mesmo dor na zona afectada.
Os sintomas melhoram com o decúbito, por esvaziamento das veias pélvicas e
diminuição do seu diâmetro.
As varizes pélvicas, podem surgir durante ou após a gravidez, mas também em
mulheres que nunca engravidaram, e por vezes são achados assintomáticos.
A incompetência é bilateral ou frequentemente unilateral, mais na ovárica esquerda e
na ilíaca interna direita.
As varizes pélvicas classificam-‐se em primárias, por insuficiência venosa valvular
primária, ou secundárias, por refluxo secundário a processos de obstrução venosa
central, funcional ou orgânica, dos quais se destacam:
Varizes na grávida
217 213
. S. May Turner ou S. de compressão da veia ilíaca -‐ compressão da veia ilíaca comum
esquerda pela artéria ilíaca comum direita, com fluxo retrógrado para a veia ilíaca
interna e colaterais pélvicas;
. Malformações vasculares congénitas: malformações venosas ou arteriovenosas;
. S. pós trombóticas (trombose venosa profunda);
. Compressão extrínseca (por exemplo tumores) ou angulações (processos
aderenciais).
O refluxo venoso pélvico é por vezes condicionante de insuficiência venosa dos
membros inferiores, mesmo sem insuficiência da junção safeno-‐femoral, ou quando
esta já foi laqueada, e é causa de recorrência varicosa, após cirurgia de varizes dos
membros inferiores.
A veia ilíaca interna está conectada pelas colaterais, à junção safeno-‐femoral, e ao
membro inferior, via pudenda e perineais, transmitindo deste modo a hipertensão
existente a montante até ao membro inferior, com aparecimento de varizes na raiz da
coxa e face posterior da coxa ou mesmo até à perna, via veia de Giacomini.
Há vários trabalhos que revelam existência de refluxo venoso pélvico em recidivas de
varizes.
O refluxo venoso e as varizes pélvicas nem sempre dão sintomas, mas podem ser a
causa da síndroma de congestão pélvica.
Tal como acontece com a etiopatogenia, há semelhança entre os sintomas de
insuficiência venosa nos membros inferiores e os da insuficiência venosa pélvica ou
Síndrome de Congestão Pélvica (SCP), só que localizados à região pélvica. Estes
sintomas são típicos (permitindo diagnóstico diferencial com outras causas de dor
pélvica): sensação de peso ou dor pélvica, crónica, posicional, que agrava na posição
de pé ou sentada, com agravamento ao longo do dia, e que alivia com o decúbito. Fora
da gravidez, não são cíclicos, nem relaccionados com as menstruações.
Esta síndroma contribui como causa em cerca de 30 % das dores pélvicas crónicas.
A Dor Pélvica Crónica, que afecta potencialmente 40 % das mulheres, é definida como
dor pélvica ou abdominal inferior, crónica, que persiste intermitente ou contínua, por
mais de seis meses, não associada ao ciclo menstrual, nem apenas no coito ou na
Varizes na grávida
218 214
gravidez. Não é uma doença, mas sim um sintoma secundário a várias outras
patologias (ginecológica, útero-‐ovárica, endometriose, urinária, gastrointestinal,
aderências, ortopédica etc.).
A SCP está associada a varizes pélvicas ou vulvares, e frequentemente a insuficiência
da veia ovárica. Entre as mulheres estudadas, a insuficiência da veia ovárica existe em
10 % dos casos, e nestes cerca de 60 % desenvolvem SCP. Isto quer dizer que a
síndrome é, provavelmente, sub-‐diagnosticada.
Excluídas as várias patologias atrás referidas como causa de dor pélvica, muitas
mulheres são indevidamente rotuladas de patologia do foro psiquiátrico, e não são
devidamente estudadas. As alterações psicológicas (ansiedade, depressão) são
resultado e não causa do problema.
A avaliação e determinação da insuficiência venosa como causa da dor pélvica crónica
pode ser difícil. São úteis a clínica e exames complementares.
Clínica
. Características típicas da dor.
. Multiparidade.
. História ou presença de varizes glúteas, vulvares ou perineais.
. A exacerbação pós-‐coito pode persistir horas.
. Tende a melhorar após a menopausa.
. Existência de varizes proximais, face interna da coxa (território da veia pudenda),
sobretudo se a junção safeno-‐femoral está competente ou em recidiva de varizes pós-‐
safenectomia.
Exames complementares
Os exames ainda são controversos quanto aos resultados, continuando em
investigação a definição de parâmetros e estudos comparativos, entre ecoDoppler
transvaginal e transabdominal, angioTAC, angioRM, venografia selectiva ovárica e
ilíaca.
Além da ecografia, todos os outros exames vão ser diferidos para depois do parto,
pelos riscos durante a gravidez.
Varizes na grávida
219 215
Tratamento
No tratamento da síndrome de congestão pélvica têm sido feitos tratamentos médicos
com supressão ovárica (medroxiprogesterona, análogos de hormona libertadora de
gonadotrofina, etc.), outras drogas (di-‐hidroergotamina, anti-‐inflamatórios,
gabapentina, amitriptilina, etc.) e cirúrgicos (laqueação laparoscópica, histerectomia,
ooforectomia).
Mais recentemente são recomendadas as técnicas endovasculares oclusivas:
escleroterapia por cateter ou embolização com “coils”. A cirurgia de laqueação ou
excisão da veia ovárica fica reservada só para os casos resistentes aos métodos menos
invasivos.
Claro que todos estes tratamentos terão que ser diferidos para depois do parto.
Durante a gravidez utilizam-‐se apenas as medidas higiénico-‐posicionais e compressão
venosa (já referidas anteriormente), que darão alívio sintomático e bioflavonoides de
fracção flavonóica purificada micronizada, se a clínica o justificar.
CONCLUSÕES
A gravidez é um factor de desencadeamento ou agravamento da insuficiência venosa.
Muitas das alterações desencadeadas pela gravidez revertem ou melhoram após o
parto ou quando termina o aleitamento.
Deve fazer-‐se profilaxia da insuficiência venosa na gravidez, para contrariar os seus
efeitos deletérios sobre as veias.
O tratamento das varizes na gravidez é conservador, com medidas higiénico-‐
posicionais e meias elásticas, tratamentos locais e eventualmente o uso de
bioflavonoides de fracção flavonóica purificada micronizada.
A cirurgia e a esclerose das varizes e telangiectasias devem ser proteladas para depois
do parto, após reavaliação das lesões que não regrediram, só então efectuando as
terapêuticas mais agressivas, já sem risco para a grávida e o feto.
Varizes na grávida
220 216
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Varizes na grávida
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Anexo 1 – Folheto informativo ao doente
Caro doente:
Ao ser operado às varizes dos membros inferiores, achamos útil prestar-‐lhe algumas
informações:
A sua doença
O sangue que chega do coração aos membros inferiores através das artérias, regressa
depois de novo ao coração através das veias. Há dois sistemas principais de veias dos
membros inferiores, as veias profundas e as superficiais.
As veias profundas são as mais importantes e as principais responsáveis pelo regresso
do sangue ao coração. As veias superficiais têm um papel acessório e quando com
varizes perdem esse papel e devem ser retiradas.
Há duas principais veias superficiais nos membros inferiores, a grande safena
(antigamente chamada a veia safena interna) e a pequena safena (antigamente
chamada veia safena externa).
A grande safena corre na face anterior interna do membro inferior, desde o tornozelo
até a virilha, onde se lança em veia profunda, a veia femoral. A pequena safena corre
na face externa e posterior da perna, desde o tornozelo até ao cavado do joelho, onde
se lança em veia profunda, a veia poplítea. Estas duas veias recebem vários ramos
superficiais nos seus trajetos.
As varizes são uma doença das veias superficiais em que estas ficam dilatadas e
tortuosas. Não é conhecida a causa exata desta dilatação. Conhecem-‐se no entanto
algumas situações de risco para o seu aparecimento tais como: familiares com varizes,
gravidez, obesidade, vida sedentária e profissões em que se esta muito tempo de pé
ou sentado.
As varizes são uma doença progressiva que, além de inestéticas, podem causar queixas
tais como: sensação de peso nas pernas ao fim do dia e, principalmente no verão ou
durante a menstruação, dor surda nas próprias varizes, sensação de picadas ou
comichão e caibras frequentes. Estas queixas melhoram com o descanso e elevação
dos membros inferiores, bem como o uso das meias elásticas e medicamentos
venoativos.
Anexo 1
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As varizes podem ter complicações agudas, tais como romperem e provocarem
hemorragia. Esta rutura pode ser devida a um traumatismo ou ser espontânea, ou
sofrerem uma trombose (varicoflebite), ficando as varizes transformadas num cordão
duro, vermelho e doloroso.
Na ausência de tratamento, as varizes podem, com o tempo, complicar-‐se de
pigmentação acastanhada da pele no terço inferior da perna, ficando a pele
endurecida e fibrosada, com dermatite ou eczema podendo mesmo evoluir para uma
ulcera venosa.
O tratamento das varizes dos membros inferiores
Os objetivos do tratamento são melhoria estética, alívio das queixas e evitar
complicações.
Para alívio das queixas o médico pode prescrever medicamentos venoativos e uso de
meias elásticas.
A cirurgia é um dos tratamentos fundamentais para as varizes.
A cirurgia irá retirar, com pequenas incisões cutâneas, as varizes e, se indicado,
interromper a ligação das veias superficiais com as profundas a nível da virilha ou do
cavado do joelho.
Quando a veia grande safena está afetada, poderá ser retirada com uma técnica
cirúrgica chamada de “stripping” ou com outras técnicas, que o cirurgião poderá
explicar.
A retirada das veias superficiais com varizes não afeta a sua circulação venosa, já que
estas já se encontravam com mau funcionamento e a circulação continua a fazer-‐se
pelas veias superficiais sem varizes e, essencialmente, pelas veias profundas.
Para escolher a cirurgia apropriada o cirurgião pediu-‐lhe antes da operação um exame
de ecoDoppler.
A cirurgia é feita no bloco operatório com anestesia geral ou epidural/raquianestesia,
conforme será explicado pelo anestesista.
A cirurgia é feita em regra como cirurgia ambulatória, ou seja, é internado de manhã
(08:00 h) e terá alta para o domicílio pelas 20:00 h.
Anexo 1
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Cuidados a ter após a cirurgia
Em regra inicia o levante duas a quatro horas após a cirurgia e irá retomar a sua vida
diária, progressivamente, a partir do dia seguinte. O regresso ao trabalho depende do
tipo de trabalho, sendo em regra de dois a oito dias.
Apos a cirurgia irá usar uma meia elástica especial (Medi Struva 23mmHg) que lhe foi
colocada pelo cirurgião e que irá manter até à consulta a seguir a cirurgia.
Na consulta após a operação, o cirurgião retira-‐lhe esta meia e decide da necessidade
de manter meias elásticas adequadas durante mais tempo. Para evitar as dores são
administrados medicamentos próprios nas primeiras horas.
Cuidados a ter quando voltar para casa
Quando chegar a casa poderá retomar a sua alimentação habitual, mas a primeira
refeição deverá ser ligeira.
Se tiver dores poderá tomar Paracetamol ou Aspirina®. Se tomava medicamentos
antes de ser operado deverá retomar essa medicação. Deve retomar a sua atividade
diária e evitar ficar de pé parado ou sentado por períodos longos. Ao tomar banho terá
que evitar molhar a meia elástica.
Nenhuma cirurgia é isenta de riscos e a cirurgia das varizes também não é, no entanto,
os seus riscos e complicações são muito reduzidos e poderá discutí-‐los com o cirurgião
quando da decisão de operar. Na sequência da cirurgia podem surgir pequenas nódoas
negras nas coxas que resultam de extravasamento de sangue por baixo da pele.
Desaparecem em duas a três semanas e não representam problema grave.
Sendo as varizes uma doença progressiva, é recomendado ser observada pelo cirurgião
uma vez por ano, para prevenir ou tratar precocemente o eventual aparecimento de
novas varizes.
Anexo 1
Rua Xavier Cordeiro, 30 . 1000-296 LISBOA . [email protected]