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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ MÁRCIA REGINA MOCELIN ADOLESCÊNCIA EM CONFLITO COM A LEI: Socioeducação no Paraná CURITIBA 2014

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

MÁRCIA REGINA MOCELIN

ADOLESCÊNCIA EM CONFLITO COM A LEI:

Socioeducação no Paraná

CURITIBA 2014

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ADOLESCÊNCIA EM CONFLITO COM A LEI:

Socioeducação no Paraná

CURITIBA 2014

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MÁRCIA REGINA MOCELIN

ADOLESCÊNCIA EM CONFLITO COM A LEI:

Socioeducação no Paraná

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Faculdade de Ciências Humanas, Letras e Artes, da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito necessário à obtenção do título de Doutora em Educação. Orientadora: Profª. Drª. Naura Syria Carapeto Ferreira

CURITIBA 2014

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TERMO DE APROVAÇÃO

Márcia Regina Mocelin

ADOLESCÊNCIA EM CONFLITO COM A LEI:

Socioeducação no Paraná

Esta Tese foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Doutora em Educação no Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, 24 de setembro de 2014.

Doutorado em Educação / PPGEd - Programa de Pós-graduação em Educação - Mestrado e Doutorado em Educação

Universidade Tuiuti do Paraná.

Profª. Dra. Maria Antônia de Souza Coordenadora do PPGEd - Mestrado e Doutorado em Educação

Profª. Drª. Naura Syria Carapeto Ferreira Presidente da Banca – UTP

Prof. Dr. Miguel Gonzalez Arroyo Membro Titular - UFMG

Profª. Drª. Dircéia Moreira Membro Titular - UEPG

Prof. Dr. Pedro Leão da Costa Neto Membro Titular - UTP

Prof. Dr. Fausto dos Santos Amaral Filho Membro Titular - UTP

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DEDICATÓRIA

Dedico esta Tese a todos os meninos e meninas em conflito com a lei

que fazem parte de minha vida de forma inquietante.

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AGRADECIMENTOS

Ao finalizar uma caminhada, sempre temos muitos agradecimentos

a fazer, por isso deixo aqui registrado para sempre meu respeito e

admiração por todos que me acompanharam nessa travessia durante

esses anos, estando perto ou longe, mas sempre desejando meu êxito.

Em primeiro lugar agradeço a DEUS, que me concede o dom mais

precioso, a VIDA.

Minha FAMÍLIA, meu suporte, minha alegria, minha força, meu tudo,

que se fez presente sempre em todos os momentos das mais diversas

formas. Se cheguei onde estou, é por poder contar com uma legião de

anjos torcendo por mim, especialmente meu Pai Ernesto Mocelin e minha

mãe Nilda Lúcia Mocelin.

Meu agradecimento especial a minha estimada ORIENTADORA, Drª

Naura Syria Carapeto Ferreira, que assumiu comigo esse compromisso

de humanização através da pesquisa séria e comprometida, não

fraquejando um só minuto diante dos percalços, com profissionalismo e

dignidade.

Aos PROFESSORES do Programa de Mestrado e Doutorado em

Educação da Universidade Tuiuti do Paraná, muito obrigada pelo

entusiasmo e dedicação com que fazem que nossa profissão de

professores seja cada vez mais digna.

Aos PROFESSORES DA BANCA, Drº Miguel Gonzalez Arroyo, Drª

Dircéia Moreira, Drº Pedro Leão da Costa Neto, Drº Fausto dos Santos

Amaral Filho, pelas contribuições inestimáveis na Banca de Qualificação

e por sua imensa generosidade acadêmica.

Aos COLEGAS de trabalho da Educação, Cultura e Música que

propiciaram condições para que a pesquisa seguisse seu curso meu

eterno reconhecimento.

E aos AMIGOS que foram privados de minha presença por longos

períodos, por estar mergulhada no exercício da produção científica, meu

mais sincero obrigado pela paciência e compreensão.

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Enfim a todos que estiveram comigo nesse período maravilhoso da

jornada científica chamada DOUTORADO, anônimos ou não, que

possamos continuar em busca de uma vida mais digna, igualitária e mais

humana para todos.

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EPÍGRAFE

Um cenário comum das cidades: meninos perambulando pelas ruas. Antes,

apenas nas grandes cidades; agora, em qualquer lugarejo.

Ontem, cheirando cola; hoje, fumando crack. Destruindo seus neurônios e seus

destinos. Enfrentando os perigos da vida desprotegida. Aproximando-se de

fatos e atos criminosos. Sofrendo a dor do abandono, do fracasso escolar, da

exclusão social, da falta de perspectiva. Vivendo riscos de vida, de uma vida de

pouco valor, para si e para os outros.

Ontem, vítimas; hoje, autores de violência.

Um cenário que já se tornou habitual. E, de tanto ser repetido, amortece os

olhos, endurece corações, gera a indiferença dos acostumados. E, de tanto

avolumar-se, continua incomodando os inquietos, indignando os bons e

mobilizando os lutadores.

Uma mescla de adrenalina e inferno, a passagem rápida da invisibilidade social

para as primeiras páginas do noticiário, do nada para a conquista de um lugar.

Um triste lugar, um caminho torto; o “ccc” do crack, da cadeia e da cova.

Assim, grande parte de nossa juventude brasileira, por falta de oportunidade,

se perde num caminho quase sem volta. Reverter essa trajetória é o maior

desafio da atualidade.

Enquanto houver um garoto necessitando de apoio e de limite, não deve haver

descanso.

Com a responsabilidade da família, com a presença do Estado, desenvolvendo

políticas públicas consequentes, e com o apoio da sociedade, será possível

criar um novo tecido social capaz de conter oportunidades de cidadania para os

nossos meninos e meninas.

A esperança é um dever cívico para com os nossos filhos e para com os filhos

dos outros.

(Thelma Alves de Oliveira - Caderno da Socioeducação, vol. 1, p. 12 e 13).

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LISTA DE TABELAS e GRÁFICOS

Tabela 1 – Proporção entre População de Adolescentes x Adolescentes Restritos e Privados de liberdade Gráfico 1 – Tipificação de Delito Tabela 2 – Número de Dissertações sobre a Doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011 Tabela 3 – Número de Dissertações por Estado sobre a doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011 Gráfico 2 – Número de Dissertações por Estado sobre a doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011 Tabela 4 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre a doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011 Gráfico 3 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre a doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011 Tabela 5 – Palavras Chave das Dissertações sobre a doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011 Tabela 6 – Número de Dissertações sobre o ECA entre 1987 a 2011 Gráfico 4 – Número de Dissertações sobre o ECA a cada 5 anos de 1987 a 2011. Tabela 7 – Número de Dissertações por Estado sobre o ECA entre 1987 a 2011 Gráfico 5 – Número de Dissertações por Estado sobre o ECA entre 1987 a 2011 Tabela 8 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre o ECA entre 1987 a 2011 Gráfico 6 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre o ECA entre 1987 a 2011 Tabela 9 – Palavras Chave das Dissertações sobre o ECA entre 1987 a 2011 Tabela 10 – Número de Teses sobre o ECA entre 1987 a 2011

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Tabela 11 – Número de Dissertações sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011 Tabela 12 – Número de Dissertações sobre o Adolescente em conflito com a lei por estado entre 1987 a 2011 Gráfico 7 – Número de Dissertações por Estado sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011 Tabela 13 – Área do Conhecimento sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011 Gráfico 8 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011 Tabela 14 – Palavras Chave das Dissertações sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011 Tabela 15 – Palavras Chave das Teses sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011 Tabela 16 – Número de Dissertações sobre a Socioeducação entre 1987 a 2011 Gráfico 9 – Categorias de análise estudadas do banco de Dissertações e Teses da Capes Gráfico 10 – Distribuição das Dissertações e Teses por ano de 1987 a 2011 Gráfico 11 – Distribuição das Dissertações e Teses por estado de 1987 a 2011 Gráfico 12 – Distribuição das Dissertações e Teses por área de conhecimento de 1987 a 2011 Gráfico 13 – Palavras Chave das Dissertações e Teses de 1987 a 2011 Tabela 17 – Publicações da Revista Educação e Sociedade de 1978 a 2011 sobre temas ligados a Doutrina da proteção Integral e afins. Tabela 18 – Publicações do Caderno Cedes de 1980 a 2011 sobre temas ligados aos Direitos Humanos. Tabela 19 – Publicações da Revista Brasileira de Educação da ANPED de 1995 a 2011 sobre temas ligados as categorias de análise. Tabela 20 – Centros de Socioeducação no Paraná Tabela 21 – Casas de Semiliberdade no Paraná

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LISTA DE SIGLAS

ANPED: Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação

APPEAL: Programa de Educação para Todos na Ásia e no Pacífico

ARABUPEAL: Programa Regional para a Universalização e Renovação da

Educação Primária e a Erradicação do Analfabetismo nos Estados Árabes

BM: Banco Mundial

BNH: Banco Nacional de Habitação

CAPES: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CDC: Convenção sobre os Direitos das Crianças

CEDCA-PR: Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente

CEEBJA: Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos

CNBB: Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

CONANDA: Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente

ECA: Estatuto da Criança e do Adolescente

EJA: Educação de jovens e Adultos

FEBEM: Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor

FUNABEM: Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor

FUNDEF: Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e

Valorização do Magistério

IAM: Instituto de Assistência do Menor

IASP: Instituto de Ação Social do Paraná

IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INAMPS: Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social

L. A.: Liberdade Assistida

LBA: Legião Brasileira de Assistência

LDB: Lei de Diretrizes e Bases da Educação

LEP: Lei de Execução Penal

MNMMR: Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua

OAB: Ordem dos Advogados do Brasil

ONG: Organização Não Governamental

ONU: Organização das Nações Unidas

PIA: Plano Individual de Atendimento

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PLIMEC: Plano de Integração Menor-Comunidade

PMPR: Policia Militar do Paraná

PNBEM: Política Nacional do Bem-Estar do Menor

PNUD: Programa das nações Unidas para o Desenvolvimento

PROEDUSE: Programa Educacional das Unidades Sócioeducativas

PROSINASE: Programa de Implementação do Sistema Nacional de

Atendimento Socioeducativo

SAM: Serviço de Assistência do Menor

SECJ: Secretaria da Criança e da Juventude

SEDS: Secretaria da Família e Desenvolvimento Social

SEED: Secretaria de Estado da Educação

SETP: Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e Previdência Social

SINASE: Sistema Nacional de Socioeducação

UNESCO: Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e a

Cultura

UNFPA: Fundo de População das Nações Unidas

UNICEF: Fundo das Nações Unidas para a Infância

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RESUMO

Esta tese tem como tema o adolescente em conflito com a lei e as políticas que

o regem, objetivando assim, analisar as instituições intituladas centros de

socioeducação do Paraná no que se refere à coerência entre o que está

proposto pelas políticas públicas, a realidade educacional da instituição e as

necessidades concretas de formação destes sujeitos para sua reinserção na

sociedade. Os objetivos específicos propostos são: definir as políticas

educacionais nos centros de socioeducação; entender a organização da

doutrina da proteção integral; caracterizar as instituições de socioeducação

historicamente e compreender as reais múltiplas determinações do adolescente

em conflito com a lei. O caminho metodológico perquirido permite compreender

o adolescente em conflito com a lei com suas contradições na totalidade em

que vive, e ao mesmo tempo em que se contradiz, constrói a sua historia na

sociedade. Para isso foram analisadas duas categorias que são fundamentais:

o Adolescente em Conflito com a Lei e as Políticas Públicas Socioeducacionais

à luz da teoria histórico-crítica, identificando os efeitos dessa teoria nos

pressupostos socioeducativos. No polo teórico, o exame minucioso de

documentos, leis, políticas de atendimento e todo o arcabouço teórico

disponibilizado em livros, sites, artigos, entrevistas enquanto no polo prático

todas as reflexões desta tese se sustentam também e prioritariamente a partir

da vivência e observação participante da autora neste campo de estudo.

Dentro dessa concepção teórico metodológica - o materialismo histórico – a

metodologia utilizada pautada na teoria histórico crítica propõe a superação

dos problemas possibilitando a formação de um cidadão crítico, histórico e

transformador. Para compreender o objeto proposto a tese fundamenta-se

principalmente nas ricas sínteses formuladas por Karl Marx, Dermeval Saviani,

Adolfo Sanchez Vazquez, Octavio Ianni, Karel Kosik, Alvaro Vieira Pinto,

Antonio Carlos Gomes da Costa, Pável Vasílievich Kopnin, Mario Alighiero

Manacorda, Miguel Arroyo, Naura Syria Carapeto Ferreira. A tese está

sistematizada em Introdução e mais 4 capítulos. O Capitulo 2

ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI traz a análise de como se

passa de adolescente a adolescente em conflito com a lei. Quem é? De onde

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vem? Quais os números no Brasil e no Paraná. No Capitulo 3 POLÍTICAS

PÚBLICAS EDUCACIONAIS PARA A INFÂNCIA E ADOLESCENCIA, trata

da história das políticas públicas educacionais a partir da década de 90, a

trajetória histórica do adolescente em conflito com a lei outrora denominado

menor e uma primeira abordagem sobre o ECA e a política de proteção dos

direitos e deveres do adolescente em conflito com a lei. No Capitulo 4

DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL, é tratado todo o sistema de garantia

de direitos humanos e do adolescente em conflito com a lei analisando a

Doutrina da proteção Integral que substitui a Doutrina da Situação Irregular. No

Capitulo 5 SOCIOEDUCAÇÃO, apresentamos o sistema nacional SINASE e

as políticas que vigem a socioeducação, as medidas socioeducativas, as

políticas paranaenses através da análise dos Cadernos do IASP, os programas

socioeducativos e os Espaços Socioeducativos no Paraná. Em ALGUMAS

CONSIDERAÇÕES ACERCA DA HUMANIZAÇÃO NA SOCIOEDUCAÇÃO o

diálogo sobre a possibilidade da humanização pela convivência para a possível

emancipação e não estigmatização do jovem que em algum momento de sua

vida tornou-se adolescente em conflito com a lei, pois, como a realidade tem

demonstrado a política pública denominada de Sistema de Socioeducação não

consegue resolver as questões da delinquência infanto juvenil prevista nas

medidas socioeducativas V e VI do Estatuto da Criança e do Adolescente que

tratam da Semiliberdade e da Privação da Liberdade, porque não garantem a

não reincidência criminal. Em outras palavras não atendem à realidade

concreta a que se destinam, ou seja, reafirmando essa tese, a socioeducação

não garante por si só, a recuperação do adolescente infrator.

Palavras-chave: Adolescente em conflito com a lei; Estatuto da Criança e do

Adolescente; Doutrina da proteção Integral; Socioeducação.

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ABSTRACT

The main topic of this thesis is the law conflict adolescents has and their

policies. The focus is to analyze the institutions entitled Paraná Socioeducation

Centers in regard to the coherence proposed by public policy between the

educational reality of the institution and the real needs of these individuals for

their reintegration into society. The proposed specific objectives are: define the

educational policies in the socio-educational centers; understand the

organization of the integral protection doctrine; the multiple determinations of

the adolescents in law conflict and characterize socioeducation institutions

historically. The established criterious methodology allows realize the

adolescents in law conflict with all the contradictions which they live in. At the

same time it contradicts itself, rising their history in to society. For this proposal,

two fundamental categories were analyzed: Adolescents in Law Conflict and

Socio-educational Public Policies in the light of historical-critical theory,

identifying the theory effects in socio-educational assumptions. The scrutiny of

documents, laws, service policy and the framework On the other side the

practical part of this thesis reflections are also supported mainly by the author

experience, participation and observation in this study field. Within this

theoretical and methodological perception – the historical materialism - the

methodology based in the historical critical theory proposes the problems

overcoming, enabling the formation of a critical citizen, historic and transformer.

The thesis is based mainly on the syntheses formulated by Karl Marx, Dermeval

Saviani, Adolfo Sanchez Vazquez, Octavio Ianni, Karel Kosik, Alvaro Vieira

Pinto, Antonio Carlos Gomes da Costa, Pavel Vasilievich Kopnin, Mario

Alighiero Manacorda, Miguel Arroyo, Naura Syria Carapeto Ferreira. The thesis

is systematized in the Introduction and four more chapters. The Chapter 2

ADOLESCENCES IN LAW CONFLICT analyzes how law conflict passes from

teenager to teenager. Who is she/he? Where she/he comes from? What are the

numbers in Brazil and in Paraná. In Chapter 3 CHILDHOOD AND

ADOLESCENCE PUBLIC POLICY EDUCATION, deals with the educational

policies history from the 90s, the historical adolescents in law conflict trajectory

once called minor and a first approach to the ECA and the protection policy of

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the rights and duties of adolescents in law conflict. In Chapter 4 INTEGRAL

PROTECTION DOCTRINE, the whole system of guaranteeing human rights

and the teens in law conflict are treated analyzing the Integral Protection

Doctrine which replaces the Doctrine of Irregular Situation. In Chapter 5

SOCIOEDUCATION, it presents the national system SINASE and its

socioeducational policies. The social and educational measures, the Paraná

policies by examining the IASP notebooks, the socio-educational programs and

the Socioeducational Areas in Paraná are also presented. In SOME

CONSIDERATIONS ABOUT HUMANIZATION SOCIOEDUCATION, dialogue

on the humanization possibility by companionship for the possible emancipation

and not young people stigmatization who at some point in their life became

adolescents in law conflict. As reality has shown the public policy called

Socioeducation System do not solve the juvenile delinquencies predicted on

children educational rules V and VI of the Children and Adolescents Statute.

Children and Adolescents Statute deals with the Semifreedom and the

Deprivation of Liberty, once do not ensure the no criminal reincidence. In other

words do not apply to reality which is intended. Furthermore the socioeducation

do not guarantee the recovery of the adolescent offender.

Keywords: Adolescents in law conflict; Children and Adolescents Statute;

Integral Protection Doctrine; Socioeducation.

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SUMÁRIO

TERMO DE APROVAÇÃO

DEDICATÓRIA

AGRADECIMENTOS

EPÍGRAFE

LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS

LISTA DE SIGLAS

RESUMO

ABSTRACT

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 19

2 ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI 45

2.1 O Adolescente 54

2.2 Estado da Arte 57

3 POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS PARA A INFÂNCIA E

ADOLESCÊNCIA

90

3.1 Políticas Educacionais na década de 90 99

3.2 De “menor” a “adolescente em conflito com a lei” 113

3.2.1 Histórico 114

3.3 Política pública federal - ECA e a política de proteção: os

direitos e deveres da criança e dos adolescentes.

120

4 DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL 130

4.1 Sistema de Garantia de direitos humanos e o adolescente em

conflito com a lei

143

5 SOCIOEDUCAÇÃO 148

5.1 Política Pública Federal – SINASE e as políticas para a

Socioeducação

148

5.2 As Medidas socioeducativas 149

5.3 Política Pública Estadual - Cadernos da Socioeducação no

Paraná

155

5.4 Educação nos Centros de Socioeducação no Paraná 161

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5.5 Política Pública Municipal – Conselho Tutelar 166

5.6 Espaços Socioeducativos no Paraná 169

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ACERCA DA HUMANIZAÇÃO

NA SOCIOEDUCAÇÃO

177

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 183

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19

1 INTRODUÇÃO

Esta tese tem como tema o adolescente em conflito com a lei e as

políticas que o regem no sentido de contribuir da forma mais significativa

possível com os estudos da área e seus responsáveis para que todos possam

promover que a garantia dos direitos aconteça de fato, comprometidos e com a

certeza de que é necessário construir uma sociedade mais justa, igualitária e

verdadeiramente humana.

Para isto necessita-se examinar o índice de delinquência infanto juvenil

no Brasil, o porquê do seu acelerado aumento – se realmente ele existe, ou se

simplesmente está se fazendo um uso maior e talvez abusivo das medidas de

internação - em quantidade e qualidade e por que não se consegue atender,

com dignidade, esta faixa da população que é produzida pelo capitalismo no

seu estágio bárbaro não lhe garantindo cidadania com dignidade. Necessário

se faz, também, explicitar a importância da educação dentro de seus limites na

formação humana de todos os cidadãos, das crianças, dos jovens e dos

adultos, tema tão “falado” e exarado nas leis, mas que, na realidade, constata-

se que é insuficiente, precário e pauperizado.

Necessário se faz atentar para o fato de que, a delinquência infanto-

juvenil produzida pelas disparidades econômicas, políticas e sociais em conflito

permanente de espoliação e exclusão acaba se tornando numa cultura

específica que se desenvolve pelos “princípios neoliberais”, defendendo estes

princípios de forma “sutil” sob o repúdio da própria sociedade capitalista que

contraditoriamente ao mesmo tempo em que a produz não lhe abre a

possibilidade de superação. Tal não ocorre pela própria evolução e ganância

do capitalismo que secundariza a vida humana dos menos favorecidos, não

lhes oportunizando os recursos necessários à cidadania, às oportunidades de

trabalho digno e à participação na sociedade como sujeitos históricos de suas

vidas e de seu tempo.

É preciso, pois, para esse segmento da sociedade, políticas públicas

pertinentes e realmente comprometidas com a educação de qualidade para

todos em todos os recantos do país desde a educação infantil até a fase adulta,

a fim de solidificar a formação necessária ao exercício da cidadania. Por esta

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fundamental razão, no agudizado contraste do contexto econômico, político e

social do Brasil, faz-se necessárias políticas públicas que efetivem e garantam

a superação desta marginalização e a consequente inclusão no seio da

sociedade em que se vive.

No entanto, a bibliografia referente a essa área específica de estudos é

muito escassa, o que dificultou o caminho de nossa investigação. Existe uma

bibliografia, mas que, se resume as questões prioritariamente jurídicas, e

embora, seja de grande ajuda para entender todas as questões do adolescente

em conflito com a lei é sob o prisma da educação que o nosso trabalho se faz.

Ao mesmo tempo em que a educação pode estabelecer um caminho

para a libertação humana, quando associada às agudas diferenças econômicas

e sociais pode reproduzir e produzir esses sujeitos, como o seu oposto. Se a

educação omnilateral fosse forte e assimilada pelas crianças, jovens e adultos,

certamente haveria uma formação de consciência moral e social que os

libertaria de seguirem os percalços de caminhos alternativos como o do crime.

Conceber a educação, dessa maneira, sob os princípios da concepção de

omnilateralidade, que significa possibilitar a formação total do homem, isto é:

em todas as dimensões. Segundo Marx e Engels,

El hombre se apropria su essência omnilateral de um modo omnilateral, es decir, como um hombre total. Cada uno de sus comportamientos humanos ante el mundo, la vista, el ódio, el olfato, el gusto, el tacto, el pensar, el intuir, el percibir, el querer, el atuar, el amor, em uma palabra, todos los órganos de sua individualidad, como órganos que son inmediatamente em su forma em cuanto órganos cumunes, representam, em su comportamiento objetivo o em su comportamiento hacia el objeto, la apropriación de este. La apropriación de la realidad humana, su comportamiento hacia el objeto, es el ejercicio de la realidad humana. (MARX e ENGELS, 1987, p. 620)

É possível, conforme verificamos em Marx e Engels formar seres

humanos em todas as dimensões da vida humana para poder exercer sua

plena cidadania, e em sua totalidade a partir do exercício da apropriação dos

conteúdos da cultura erudita e dos avanços da ciência e tecnologia e da

realidade humana. Nesse sentido acreditamos que a educação de qualidade

permite ao homem transcender a si mesmo, as suas raízes e as situações de

vida que lhe são impostas através de uma “comunicação que é estabelecida

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entre pessoas livres em graus diferentes de maturação humana. Nessa

formulação o valor da educação expressa-se como promoção do homem”.

(SAVIANI e DUARTE, 2010, p. 423). Assim sendo há uma preocupação latente

em tornar o delinquente um novo cidadão, um cidadão livre e liberto, e para

que isso ocorra, a educação tem papel fundamental no auxílio a essa libertação

e precisa começar na própria educação a transformação. Como afirma

ARROYO, (2014, p. 18), “os ideais de justiça social pela educação somente

serão realidade se se avançar na justiça cognitiva ou se forem superadas as

concepções inferiorizantes dos Outros que ainda prevalecem no pensamento

educacional”. Na socioeducação não pode ser diferente.

Como a realidade tem demonstrado, a política pública denominada de

Sistema de Socioeducação1 não consegue resolver as questões da

delinquência infanto juvenil prevista nas medidas socioeducativas2 V3 e VI4 do

Estatuto da Criança e do Adolescente que tratam da Semiliberdade e da

Privação da Liberdade, porque não garantem a não reincidência criminal. Em

outras palavras não atendem à realidade concreta a que se destinam, ou seja,

reafirmando essa tese, a socioeducação não garante a recuperação do

adolescente infrator. No Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, não está

explícita a forma como a reincidência é tratada visto que sua menção se faz

indelevelmente no Art. 122, II: “A medida de internação só poderá ser aplicada

quando: II por reiteração no cometimento de outras infrações graves” (SECJ,

2010, p. 74). Sujeito direto deste apontamento, o adolescente em conflito com

a lei está submetido a um sistema de políticas que gestam a sua futura

possibilidade de exclusão, gerando a capacidade de não envolver-se mais em

nenhum tipo de delito após passagem por centro de Socioeducação.

1O Sistema de Socioeducação é uma política pública instituída através da lei nº 12.594 de 18

de janeiro de 2012, que institui o Sistema nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) no território brasileiro e regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique o ato infracional. 2Medidas Socioeducativas constituem o conjunto de ações previstas no Estatuto da Criança e

do Adolescente (ECA) para serem aplicadas pelo juiz aos adolescentes em conflito com a lei. Podem ser de advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação em estabelecimento educacional. 3Capítulo IV – Das Medidas Socioeducativas – Seção I – Disposições Gerais – Art. 112 –

Verificada a prática de ato infracional, a autoridade poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: V- Inserção em regime de semiliberdade. 4Capítulo IV – Das Medidas Socioeducativas – Seção I – Disposições Gerais – Art. 112 –

Verificada a prática de ato infracional, a autoridade poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: VI – Internação em estabelecimento educacional.

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Sendo as políticas vigentes minadas pela ideologia neoliberal que dá

sustentação ao capitalismo no estado avassalador em que se encontra,

excludente e cruel, não existem condições econômicas, sociais, políticas e

culturais de uma existência livre da prática de delito5. Cabe a toda a sociedade

e também a educação, portanto, o processo de uma formação humana para

uma tentativa de emancipação6 para a liberdade7.

Emancipação e Liberdade são duas categorias fundamentais, quando se

trata de formação humana, que necessitam ser estudados e examinados a

partir dos conceitos fundamentais para se entender a humanização.

Emancipar-se supõe o apreender as formas de atuar como sujeitos históricos

no exercício da cidadania que a sociedade exige, portanto, implica diretamente

em compreender as mudanças que ocorrem no mundo do trabalho e na

sociedade, a partir dos movimentos hegemônicos e contra-hegemônicos que

são coletivos e alteram a atividade humana. A partir do momento em que

começam a ocorrer às transformações da sociedade através de atitudes de

responsabilização por si e pelo outro em benefício do coletivo é possível

5Delito: Derivado do latim delictum, de delinquere, é, em sentido geral, aplicado para significar

ou indicar todo fato ilícito, ou seja, todo fato voluntário, que possa resultar numa reparação, sujeitando aquele que lhe deu causa às sanções previstas na lei penal. Nesta razão, compreendido o delito em civil e em penal, assinala-se a justa diferença entre os sentidos revelados por um e por outro. O ilícito civil, que dá caráter ao delito civil, advém quando a ação ou a omissão culposa ou dolosa traz prejuízo ao patrimônio do ofendido ou dano físico à sua pessoa, em virtude do qual se funda a justa reparação civil. E, em regra, independe da natureza penal do fato. De igual modo, nem sempre o ato criminoso ou o fato ilícito dá motivo a esta reparação, pois que ela se funda em prejuízo realmente causado. O delito civil, em regra, é de caráter material. No entanto, pelo princípio penal, o delito, como tal qualificado em lei, tanto se pune pela consumação como pela tentativa, pois que para ela não se atenta como fundamental a evidência do prejuízo ao ofendido mas a transgressão ao preceito imposto em bem da coletividade. É, assim, o crime, especificamente definido. Nesta razão, o sentido de delito tem um âmbito genérico, de que o crime e a contravenção se dizem espécies. E, nestas condições, costuma assinalar os delitos em delito civil, delito penal, delito correcional, delito fiscal, delito funcional etc., sendo compreendidos e definidos segundo o próprio sentido que lhes emprestam os qualificativos adotados. Dessa forma, o delito, em amplo sentido, mostra ser o ato que transgride ou ofende as leis ou os preceitos instituídos pelo Direito. Traz, por isso, significação mais ampla que a do crime, que mais propriamente se diz a ação ou omissão, que viola a lei penal, desde que imputável à alguém, e se mostre dolosa ou culposa. Silva, De Plácido e. Vocabulário Jurídico/atualizadores: Nagib Slaibi e Gláucia Carvalho – Rio de Janeiro, 2010. 28.ª Edição, Editora Forense. Páginas 430/431. 6 Segundo Naura Syria Carapeto Ferreira, na obra Supervisão Educacional para uma Escola de

Qualidade. São Paulo: Cortez, 2002, p. 240, “O pilar da emancipação é constituído por três lógicas de racionalidade: a racionalidade estético-expressiva da arte e da literatura, a racionalidade moral-prática da ética e do direito, e a racionalidade cognitivo-instrumental da ciência e da técnica”. 7 Para o conceito de liberdade aportaremos nossa base na definição de Marx: "... a liberdade é,

em resumo, a espécie essencial de toda a existência intelectual... (...), portanto, o que é bom para o humano só pode ser uma realização da liberdade." (Marx, 1980, p.37) MARX, Karl. A liberdade de imprensa. Porto Alegre: L&PM Editores Ltda., 1980.

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vislumbrar a emancipação para a libertação. Segundo Ferreira, (2002, p. 248)

“mais do que nunca se percebe a importância do conhecimento como mote

propulsor da emancipação humana”. Concorda-se plenamente com Ferreira

quando aponta o conhecimento como fator primordial para a emancipação

humana, pois esta proporciona romper com os modelos vigentes do capitalismo

e em contrapartida oferece por meio da participação de todos à construção de

uma vida social comprometida com a emancipação para a libertação. A

participação de todos os envolvidos em um sistema de socioeducação, por

exemplo, gerindo de forma democrática e horizontalizada com

comprometimento em proporcionar a apreensão do conhecimento levará

seguramente a uma autonomia, ou seja, a uma emancipação.

Emancipação supõe libertação, e proporcionar a liberdade significa

promover possibilidades para que todo ser humano possa exercê-la. Quando

se possibilita a participação do coletivo na construção de um projeto de

sociedade melhor e livre da barbárie possibilita-se ao mesmo tempo a

formação de seres humanos com o maior numero de possibilidades de

liberdade. O conhecimento adquirido então, através da escola, proporcionará

ao homem, adquirir a prática da crítica e autocrítica e nesse exercício estimular

e estipular novos subsídios para construção de novas políticas que emancipem

e libertem. Dentro desse contexto uma pausa para se lançar um olhar sobre a

delinquência juvenil e suas consequências se fazem necessária.

A delinquência juvenil, entendida como a juventude que comete o ato

infracional, a partir da década de 1990, vem sendo amplamente analisada e

estudada sob pontos de vista jurídico, sociológico, psicológico, educacional e

político. No intuito de promover o debate em torno do assunto, muitos autores,

têm se dedicado a estudos e pesquisas na busca de respostas à situação do

adolescente em conflito com a lei no Brasil.

Um dos estudiosos foi o pesquisador Antonio Carlos Gomes da Costa

(1949-2011) pedagogo e autor de uma vasta literatura sobre a juventude, o

adolescente, a socioeducação, os direitos humanos e principalmente um dos

idealizadores da lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990, o ECA. Foi um

combatente irrefutável na luta pela defesa dos direitos e deveres das crianças e

dos adolescentes e acreditava que para que os direitos humanos fossem

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respeitados na íntegra por todos deveria iniciar com a defesa de todos os

direitos para todas as crianças e todos os adolescentes para se fazer cumprir a

doutrina da proteção integral.

O ordenamento jurídico brasileiro estabelece que o tratamento estatal dos adolescentes em conflito com a lei deve ser orientado pela doutrina da proteção integral, que entende as crianças e os adolescentes como sujeitos de direitos e as reconhece como pessoas em estado peculiar de desenvolvimento. O princípio da prioridade absoluta, ao considerar dever da família, do Estado e da sociedade o cumprimento dos direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes, imputa a responsabilidade da proteção aos entes federativos e a agentes públicos. (CNJ, 2012, p.7)

Gomes da Costa acreditava que deveria existir alguma coisa que

pudesse ser capaz de colocar limites nas lutas pela conquista dos direitos e

ampliar assim a condução dos assuntos que dizem respeito ao bem comum.

Seus estudos e sua luta foram permanentes no sentido de extinguir a divisão

entre cidadãos e subcidadãos e, portanto, caminhar para o direito de ter

direitos. Nessa compreensão de que a infância e a adolescência em

permanente transformação necessitam de um novo olhar não é possível

reservar-se apenas a função de trocas de nomenclatura como outrora “menor”

e hoje “adolescente em conflito com a lei”, (ou segundo termo oficial do ECA,

autor de ato infracional) mas, fundamentalmente necessita se ocupar também

das alterações científicas que se impõe. Não pode ser considerado como mais

um sujeito de objeto de análises jurídicas e assistenciais somente, mas agora

como sujeito de direitos e deveres construído e constituído numa perspectiva

sócio-historico-educacional.

Convém esclarecer a evolução das compreensões e conceituações de

cidadania, pois, de acordo com as concepções que a geram apresentam

conotações diversificadas através das legislações, até chegar-se as regras

específicas para a proteção da infância e adolescência pela Doutrina da

proteção Integral.

Para as questões de responsabilização penal, até o século XIX o caráter

que perdurava era o da indiferença, “desconhecimento”, desinteresse pelas

especificidades, comodismo. Ou, ainda, a compreensão de que o ser humano

deve ser tratado a partir das exigências de cidadania adulta, sem considerar as

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etapas de desenvolvimento bio-psico-social que se efetuam no seu

crescimento até a fase adulta. Crianças, adolescentes e adultos eram regidos

e tratados pelo mesmo sistema legal, fazendo com que a partir do momento

que cometessem um delito fossem julgados da mesma forma, ou submetidos à

mesma aplicabilidade da lei. No século XX, os delitos cometidos pela juventude

passaram a ter um caráter tutelar. E, a partir da Declaração Universal dos

Direitos Humanos, adotada, proclamada e exarada pela resolução 217 A (III)

da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948

percebe-se que muitos dos direitos e liberdades estabelecidos na referida

declaração não podem ser aplicados a todas as faixas etárias sem o devido

cuidado das especificidades. Compreendendo estes limites e as possibilidades

fora proclamada a Declaração dos Direitos da Criança pela Resolução da

Assembleia Geral 1386 (XIV), de 20 de Novembro de 1959, tendo como base e

fundamento os direitos à liberdade, estudar, brincar e convívio social das

crianças que devem ser respeitadas, preconizadas em dez princípios. Foi

criada com o fim de integrar as crianças na sociedade e zelar pelo seu convívio

e interação social, cultural e até financeiro conforme o caso, dando-lhes

condições de sobrevivência até a sua adolescência, sendo integralmente

fiscalizada pela UNICEF como Organismo unicelular da ONU.

Mas, um novo cenário vem se configurando no mundo, na primeira

metade do século XX, aliado ao desenvolvimento dos estudos e pesquisas

realizados no mundo sobre a criança e o adolescente. Vale mencionar que

todo este movimento que culmina com as duas declarações não se dá por

acaso, nem por outra razão a não ser como reflexo, conscientização e

consequência do movimento que se opera na sociedade a partir de estudos e

pesquisas realizadas por intelectuais e estudiosos da infância e da

adolescência em todos os ramos do conhecimento, bem como da criança

desnutrida e abandonada, e a exploração do trabalho infantil que, infelizmente,

ainda permanece no mundo,

Vale destacar os estudos e investigações realizadas naquele momento

histórico como: o relevante trabalho da médica e educadora italiana, Maria

Montessori; o epistemólogo suíço, Jean William Piaget que estudou a gênese

psicológica do pensamento humano; o psicólogo Lev Vygotsky na Rússia,

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pioneiro na noção de que o desenvolvimento intelectual das crianças ocorre em

função das interações sociais e condições de vida; Alexander Romanovich

Luria, neuropsicólogo soviético especialista em psicologia do desenvolvimento;

o psicólogo russo Alexei Nikolaevich Leontiev, que depois de uma trajetória de

pesquisa, passa a desenvolver seus estudos com Luria que foi o psicólogo

especialista em Psicologia Educacional, pesquisador do conhecimento prévio

do aluno como a chave para a aprendizagem significativa; o psiquiatra alemão

Erik Homburger Erikson que pesquisou e escreveu sobre a Teoria do

Desenvolvimento Psicossocial na Psicologia e tornou-se um dos teóricos da

Psicologia do desenvolvimento; o francês Henri Paul Hyacinthe Wallon

conhecido como grande pesquisador e pelo seu relevante trabalho científico

sobre Psicologia do Desenvolvimento, devotado principalmente à infância e

adolescência em que assume uma postura notadamente interacionista, isto é,

para Wallon, o processo de aprendizagem é dialético onde não é adequado

postular verdades absolutas, mas, sim, revitalizar direções e possibilidades.

Muito importante foi a grande contribuição da reformadora social

britânica Eglantyne Jebb, fundadora da Save the Children, fundo de auxílio à

criança criado em 15 de abril de1919. O sucesso dela permitiu que Eglantyne

pudesse organizar um fundo mundial, e então o Union International de Secours

a L’ Enfant foi fundado em Genebra em 1920. De todo o trabalho realizado no

Fundo, o elemento de maior importância foi o planejamento com abordagem de

pesquisa, pensado por Eglantyne.

Em 1923, Eglantyne dirigiu-se para Genebra, para uma reunião da União

Internacional, com um plano para uma Carta das Crianças. O resultado foi um

documento curto e claro - elaborado por esta intelectual social, que afirma os

direitos das crianças e o dever da comunidade internacional para colocar os

direitos das crianças na vanguarda do planejamento. A Declaração dos

Direitos da Criança ou a Declaração de Genebra, como veio a ser conhecida,

foi adotado um ano depois, pela Liga das Nações.

Com a paz voltando para a Europa, e os esforços de socorro em

declínio, o foco da Save the Children deslocou-se para promover a declaração.

Em 1925, o primeiro Congresso Internacional de Bem-Estar Infantil foi realizado

em Genebra. A declaração foi amplamente discutida e apoiada por

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organizações e governos. Uma versão expandida seria adotada pela

Organização das Nações Unidas em 1959, e foi uma das principais inspirações

por trás da ONU de 1989 – Convenção sobre os Direitos da Criança. Começa a

acontecer a grande diferença do sistema, existindo a responsabilidade juvenil.

Portanto o texto da primeira declaração de direitos da criança redigido por

Eglantyne Jebb consistia dos seguintes princípios que defendia:

À criança devem ser concedidos os meios necessários para o seu desenvolvimento normal, tanto material como espiritual. À criança que tem fome deve ser alimentada, a criança que está doente deve receber os cuidados de saúde necessários, a criança que está atrasada deve ser ajudada, a criança delinquente deve ser recuperada, e o órfão e a criança abandonada devem ser protegidos e abrigados. A criança deve ser a primeira a receber o socorro em tempos de crise ou emergência. À criança devem ser dadas todas as ferramentas para que ela se torne capaz de sustentar-se, e deve ser protegida contra toda forma de exploração. A criança deve ser criada na consciência de que seus talentos devem ser colocados a serviço de seus semelhantes. (ALMANAQUE, 2011, p. 97)

As normativas internacionais são de extrema significância para o

entendimento do caráter de responsabilidade juvenil, já que o Brasil é

fortemente influenciado em seu ordenamento jurídico pelas normas

internacionais. Nem poderia deixar de ser, visto ser um país em

desenvolvimento, agora considerado emergente.

Marx (1978, p. 120) afirma que a “a anatomia do homem é a chave da

anatomia do macaco”, para explicar que é a partir dos modelos mais

desenvolvidos que se norteia a construção dos menos desenvolvidos, isto é, é

a referência a ser seguida, não de forma mecânica, simplista, mas de forma

histórica e crítica, isto é nas e a partir das circunstâncias que configuram um

contexto a ser tratado. Assim, verifica-se a normativa no contexto em que foi

gerada com os avanços contidos e, a partir daí, examina-se a possível

construção de uma nova medida onde está o problema.

A primeira Normativa que previa que as crianças e os adolescentes

necessitavam de uma legislação específica foi a Declaração de Genebra de

1924, que salientava a necessidade de proporcionar a proteção integral à

criança. Constituída de uma enumeração de direitos e liberdades que segundo

a comunidade internacional fazia jus a toda e qualquer criança. Essa mesma

Declaração de Genebra de 1924 foi aprovada pela segunda vez em 1934 pela

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Sociedade das Nações. Logo após a II Guerra Mundial, em 1946, foi criado o

Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância

(UNICEF) que passou a designar-se Fundo das Nações Unidas para a Infância

a partir de 1950, com a finalidade de promover a defesa dos direitos das

crianças e ajudar a dar respostas às suas necessidades além de contribuir para

o seu desenvolvimento.

O primeiro Tribunal de Menores que se tem conhecimento foi criado em

Ilinois/EUA, em 1899. Vale relembrar que em 1830 no Brasil travava-se a luta

abolicionista e nos EUA em contrapartida o que tomava volume era à força do

movimento feminista que tem seu marco no dia 8 de março de 1857 com uma

de suas primeiras manifestações. Enquanto centenas de mulheres das fábricas

de vestuário de nova Iorque começaram uma marcha de protesto contra os

baixos salários e o período de 12 horas diárias além das péssimas condições

de trabalho, que resultou num incêndio causando a morte de 130 mulheres, no

Brasil o movimento abolicionista na sua luta pelos direitos humanos comemora

a aprovação da lei nº 2.040, a Lei do Ventre livre. No ano de 1889 no Brasil

República, o antigo Código Criminal do Império DE 1830 foi substituído pelo

Código Penal dos Estados Unidos do Brazil (Decreto 847, de 11/10/1889) que

previa a imputabilidade penal fixada para os maiores de quatorze anos.

Paralelamente nos EUA em 1896 um grande marco histórico que envolve os

direitos da Criança tem inicio a partir do “Caso Marie Anne”:

A menina de nove anos sofria intensos maus-tratos impostos pelos pais, fato que chegou ao conhecimento público de Nova Iorque daquela época. O certo é que os pais julgavam-se donos dos filhos e que poderiam educá-los como lhes aprouvesse. O castigo físico- até hoje utilizado por alguns- era visto como método educativo e sendo as crianças- como animais- propriedade de seus donos, no caso dos pais, poderiam ser educadas da forma que entendessem. O fato é que a situação degradante, de tão notória que ficou, chegou aos Tribunais. Daí é que se encontra o ponto crucial e chocante: a entidade que ingressou em juízo para pleitear os direitos de Marie Anne e elidi-la dos seus agressores foi a Sociedade Protetora dos Animais de Nova Iorque. A ironia do caso é que não existia uma sociedade que protegesse a criança, mas já havia uma entidade protetora de animais. Com o fito de defender os direitos da criança, a fim de demonstrar legitimidade para agir, a Sociedade alegou que se Marie Anne fosse um cavalo, um cachorro ou um gato não deveria ser submetida a tratamento tão brutal, imagine sendo uma pessoa. De qualquer forma, a ação foi vencida pela entidade; teve início uma nova era no Direito. Antes tratada como "coisa", a criança passou a condição pelo menos de protegida do Estado. (SARAIVA, 2005, p. 33, 34)

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Esse caso inaugura a era dos Direitos da Criança e cria então o primeiro

Tribunal de Menores em Ilinois/EUA, em 1899 no intuito de defender os direitos

das crianças de forma legítima.

Depois dessa experiência americana, outros países aderiram à criação

de Tribunais de Menores, instituindo seus próprios juízos especiais: Inglaterra

em 1905, Alemanha em 1908, Argentina em 1921, Japão em 1922, Brasil em

1923, Espanha em 1924, México em 1927 e o Chile em 1928. Sob essa

influencia surge o primeiro código de Menores em 1927 no Brasil.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas de

1948 pode ser considerada como outro grande marco da história na busca pela

reafirmação dos direitos do indivíduo. A observância das Liberdades é

fundamental para compreender a declaração dos Direitos humanos, pois o

mundo estava vivendo o pós-guerra e se recuperava das atrocidades de uma

Alemanha nazista. Os aliados adotaram as Quatro liberdades: liberdade da

palavra e da livre expressão, liberdade de religião, liberdade por necessidades

e liberdade de viver livre do medo. Para as crianças e adolescentes também a

Declaração Universal dos Direitos Humanos que reafirma as questões

dispostas na Declaração de Genebra começa por estabelecer o direito a

cuidados especiais.

O mundo refaz sua história a cada momento, pois necessita entre outras

questões, refazer sua dignidade trucidada pelas guerras e principalmente de

recuperar a sua humanização. Assim os governos se comprometem, com seus

povos a cumprirem medidas que proporcionem o cumprimento da garantia dos

direitos humanos.

A Declaração dos Direitos da Criança de 1959 reitera em seu artigo 40

que mesmo no caso de violação às leis penais a criança e o adolescente

merecem ser tratados com diferenças específicas de forma que seu fim seja o

de promover a sua dignidade com o objetivo de reintegrá-lo a sociedade. Nos

termos da Declaração, a criança tem o direito de gozar de proteção especial e

ter oportunidades e facilidades para se desenvolver de forma normal em

condições de liberdade e dignidade. É proclamado o direito a alimentação a

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alojamento, a cuidados médicos e as crianças com necessidades de cuidados

mentais e físicos especiais deve receber os tratamentos adequados a sua

condição. A criança acima de tudo tem direito a educação que deve ser gratuita

e obrigatória e deve contribuir para sua cultura geral lhe permitindo em

condições iguais se tornarem um membro da sociedade e para a sociedade.

Ainda se tratando das normativas internacionais até chegarmos ao

Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990 no Brasil, vale relembrar o

Sétimo Congresso das Nações Unidas sobre prevenção de delito e tratamento

do delinquente ou como é mais conhecido, as Regras de Beijing de 1985, que

estabelecem a necessidade de promover o bem estar da criança.

Em 1988 acontece o Oitavo Congresso das Nações Unidas sobre

Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente que estabelece as Diretrizes

de Riad8. Essas Diretrizes reconhecem a necessidade de estabelecer

estratégias diferenciadas para prevenir a delinquência juvenil.

Concomitantemente no Brasil em 1988 celebramos a Promulgação da

Constituição da República Federativa do Brasil, que foi logo cognominada e

conhecida como a Constituição Cidadã. A partir de então, os municípios se

elevaram à condição de entes federados e também se viram fortalecidos em

seus poderes de decisão e de participação política.

Na área da educação esta Constituição reconhece, pela primeira vez no

Brasil, os sistemas municipais de ensino, atribuindo-lhes competências

específicas na manutenção dos serviços educacionais. Sob a égide do

princípio da descentralização, esse diploma legal vai introduzir alterações

significativas no quadro da distribuição de poderes, atribuições e recursos entre

as esferas de governo, delimitando para cada uma delas, no caso da

educação, os níveis de ensino sob sua responsabilidade e o percentual de

recursos provenientes de impostos que devem ser aplicados à educação

(Artigos 211 e 212), destacando os municípios em todas essas determinações.

A década de 90 vai experimentar mudanças substantivas nas políticas

educacionais, sobretudo a partir de 1995, com o primeiro mandato de Fernando

8 Centro Árabe de Capacitação e de Estudos de Segurança de Riad que recebeu a Reunião

Internacional de Especialistas sobre o estabelecimento do Projeto de Normas das Nações Unidas para a prevenção da delinquência juvenil na cidade de Riad, de 28 de fevereiro a 1º de março de 1988, com a colaboração do escritório das Nações Unidas em Viena. (O Brasil assinou, porem não ratificou as diretrizes)

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Henrique Cardoso. Tais mudanças foram fortemente condicionadas pelos

pressupostos da descentralização e da municipalização do ensino. A Emenda

Constitucional nº14/969 vai redirecionar os recursos para o ensino através da

criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e

Valorização do Magistério – o FUNDEF, reordenando a alocação de recursos

para o ensino fundamental entre Estados e Municípios. Determina, também,

ações do município para oportunizar matrículas às crianças, jovens e adultos

no ensino fundamental, realizar programas de capacitação de professores em

exercício e promover a integração dos seus estabelecimentos de ensino ao

sistema nacional de avaliação do rendimento escolar. A partir dessas reformas

educativas, empreendidas no país nos últimos anos, verifica-se, de fato

mudanças na gestão dos sistemas e das unidades escolares, assim como no

próprio processo de ensino.

O Brasil acometido por essa evolução nas políticas educacionais e

legislativas adianta-se na prevenção da delinquência juvenil. A legislação

9 EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 14/96 - Modifica os art. 34, 208, 211 e 212 da Constituição

Federal e dá nova redação ao art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do §3º do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda ao texto constitucional: Art. 1º É acrescentada no inciso VII do art. 34, da Constituição Federal, a alínea e, com a seguinte redação: “e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.” Art. 2º É dada nova redação aos incisos I e II do art. 208 da Constituição Federal nos seguintes termos: “I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria; II – progressiva universalização do ensino médio gratuito;” Art. 3º É dada nova redação aos §1º e 2º do art. 211 da Constituição Federal e nele são inseridos mais dois parágrafos, passando a ter a seguinte redação: Art. 211. § 1º A União organizará o sistema federal de ensino e dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. § 2º Os municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. § 6º A União aplicará na erradicação do analfabetismo e na manutenção e no desenvolvimento do ensino fundamental, inclusive na complementação a que se refere o §3º, nunca menos que o equivalente a trinta por cento dos recursos a que se refere o caput do art. 212 da Constituição Federal. § 7º A lei disporá sobre a organização dos Fundos, a distribuição proporcional de seus recursos, sua fiscalização e controle, bem como sobre a forma de cálculo do valor mínimo nacional por aluno. Art. 6º Esta Emenda entra em vigor a primeiro de janeiro do ano subsequente ao de sua promulgação. Brasília, 12 de setembro de 1996. Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

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brasileira incorporou em seu texto às regras de proteção de garantia dos

direitos do adolescente infrator e também as de proteção à criança vítima de

abandono ou contra a violência.

Analisando a evolução das normativas internacionais e nacionais no que

diz respeito aos direitos e deveres da criança e do adolescente; a

imputabilidade da lei; a educação formal e informal; as instituições de

socioeducação; o adolescente em conflito com a lei; percebe-se que embora

tenham sido criadas normas especificas, estas não alcançaram e não

alcançam os objetivos propostos em sua realidade histórica.

No que diz respeito ao objeto especifico deste estudo – o adolescente

em conflito com a lei – as entidades de internação apresentam graves

problemas desde sua criação como a promiscuidade, a ausência de

profissionais especializados, superlotação, reinserção na sociedade do trabalho

livre de estigmatização entre outros, deixando assim de garantir a proteção

integral tão bem escrita no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990.

As questões acerca da criança e do adolescente não deixaram de ser

construídas historicamente e contempladas em leis, no entanto sua execução

raramente foi efetivada com propriedade, principalmente quando o Estado dá

prioridade a políticas excludentes e assistencialistas, perdendo a capacidade

de colocar em prática políticas capazes de promover a cidadania plena e

consequentemente à verdadeira humanização.

Com a Constituição Federal de 1988 e com base nas discussões

internacionais em Congressos, Declarações e Diretrizes o ECA rompe com a

situação da Doutrina da situação irregular e passa a normatizar a Doutrina da

Proteção Integral. Como já dito anteriormente em Mocelin 2009 (pp.38-61) os

menores em situação irregular eram os meninos e meninas abandonados ou

desajustados. Geralmente assim eram deixados a toda sorte de intempéries

pelas ruas por serem filhos de mães solteiras, ou com algum problema de

saúde mental ou física. Por estarem nas ruas começam a praticar pequenos

delitos, que mais tarde tomaram proporções que fugiram aos controles de

segurança, e assim passou-se da Doutrina da Situação Irregular para a

Doutrina da Proteção Integral, ou seja, de menor sem direitos a sujeito de

direitos.

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Examinando o ECA, pode se perceber que o mesmo trata do assunto

em etapas ou estruturas específicas de garantia de direitos. Trata das políticas

públicas para o atendimento a crianças e adolescentes de uma maneira geral;

aborda as questões de proteção para as crianças e adolescentes em situação

de risco pessoal e social e trata da aplicação das medidas socioeducativas ao

adolescente autor de ato infracional. No entanto, “a efetividade das medidas

socioeducativas depende de articulação entre os sistemas estatais, a quem

compete a garantia dos direitos relacionados à dignidade humana, como

educação, saúde, segurança e o devido processo legal” (CNJ, 2012, p.7).

Quando o adolescente não estiver operando de acordo com o sistema

das políticas públicas que o regem em seus direitos à vida, à alimentação, à

saúde, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à

dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, há a

intervenção do Conselho Tutelar, o maior agente cumpridor das políticas

violadas. No entanto se o adolescente não estiver sendo contemplado com as

políticas públicas e também não estiver sob proteção por risco pessoal o que

entra em cena é o sistema jurídico, quando ocorre ato infracional o que implica

em responder pelo ato judicialmente e dependendo da medida aplicada poderá

cumprir em regime de internação, ou seja, em regime de privação de liberdade.

“A execução das medidas socioeducativas deve observar os princípios

dispensados aos adolescentes em geral, garantindo que o período de

cumprimento da restrição de liberdade não viole os direitos fundamentais e

sociais previstos pela legislação” (CNJ, 2012, p.7).

O ECA é a normativa que faz cumprir a Doutrina da Proteção Integral.

Citado anteriormente a Doutrina da Proteção Integral tem como base a

Declaração dos Direitos da Criança de 1959 e posteriormente outros quatro

documentos que tecem a teia da proteção infanto juvenil. São estes

documentos a Convenção Sobre os Direitos da Criança de 1959; as Regras

Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça, da Infância e da

Juventude conhecida como Regras de Beijing de 1985; as Regras Mínimas das

Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade de 1990 e

as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil ou

Diretrizes de Riad também de 1990.

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A partir do momento que o ECA foi implementado, surge com ele o

reconhecimento do adolescente como um ser humano em desenvolvimento

que merece respeito, escola, saúde, condições de sobrevivência e que por

distorção política econômica e social se encontra em condições especiais de

desenvolvimento. Passa-se a denominar criança e adolescente no lugar do

termo pejorativo “menor”, e, o crime para o adulto corresponde agora ao ato

infracional para o adolescente, no entanto somente sua implementação não

garante a execução dos direitos em sua plenitude.

Conhecer o ato infracional, as medidas socioeducativas, o adolescente

em conflito com a lei significa aprofundar-se e apropriar-se teoricamente da

Doutrina da Proteção Integral e das políticas da Socioeducação, bem como da

realidade da qual emerge e para a qual se destina.

Pode-se afirmar que, para que haja socioeducação é necessário que

existam adolescentes em conflito com a lei. O ideal é não ter que existir a

“socioeducação”, pois ela se constitui numa educação compensatória

resultante do não compromisso do Estado com a população na sua totalidade

no que concerne à políticas preventivas e na criação de política “compensatória

que tenta reverter ou compensar o que não foi atendido devidamente no tempo

certo. Afinal, “entendendo a administração como uma prática social de apoio à

prática educativa, a política como fixação de valores constituindo declarações

intencionais e operacionais” (FERREIRA, 2011, p.98), a formação para a

cidadania e para o exercício da prática competente e crítica de todos os

brasileiros é da responsabilização do Estado pelo direito à educação de

qualidade.

Para que o adolescente em conflito com a lei retorne a sociedade ele

precisa ressocializar-se, isto é, tornar-se mais humano, o que Álvaro Vieira

Pinto (1989) explica como processo de humanização. Para humanizar-se no

sentido pleno da palavra, já que está afastado da convivência societária ele

precisa conviver no sistema de socioeducação. Essa humanização nos

espaços de socioeducação está subentendida no processo de reeducação

possível do adolescente em conflito com a lei. Não deixa de ser, portanto, por

mais eficiente que seja um remendo no que não foi atendido e se tornou uma

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lacuna na formação de cada um dos sujeitos que se encontram nesta condição,

por omissão do Estado e não comprometimento com as políticas públicas.

Concorda-se com Álvaro Vieira Pinto, (1989, p.29) quando ele define

que “a educação é o processo pelo qual a sociedade forma seus membros à

sua imagem e em função dos seus interesses”, e mais do que nunca se

concorda com Saviani, (2012, p. 125, 126) quando diz que “os termos

“educação” e “formação humana” são sinônimos” e ainda em Newton Duarte se

vê acrescentada a importância do caráter histórico na formação humana pela

essência ontológica que possui:

Mas como o ser da sociedade é histórico, a essência ontológica da educação só pode ser apreendida numa perspectiva historicista. Numa primeira aproximação, portanto, é cabível afirmar-se que uma ontologia da educação busca compreender a essência historicamente constituída do processo de formação dos indivíduos humanos como seres sociais. Não se trata de uma essência independente do processo histórico, das formas concretas de educação em cada sociedade. Trata-se da análise dos processos historicamente concretos de formação dos indivíduos e de como, por meio desses processos vai se definindo, no interior da vida social, um campo específico de atividade humana, o campo da atividade educativa. (DUARTE, 2012, p. 38).

A educação é um processo permanente na história das civilizações,

sendo diferente em tempos e lugares de acordo com o modelo de homem e

sociedade desenvolvido, determinado ou imposto pelo grupo que detém a

hegemonia. Enquanto o adolescente em conflito com a lei está inserido no

espaço de socioeducação está em continua produção de sua existência e

consequente humanização. (...) ”tornar próprio do humano”, a “humanização”.

(PINTO, 1969, p. 229). Álvaro Vieira Pinto ao se referir ao homem não trata o

mesmo como um ser individual como o liberalismo faz, mas na esteira de Marx

entende o homem na condição de ser social. Em outras palavras, “é a síntese

das relações sociais”. Desta síntese das relações sociais que cada um vive

desde o seu nascimento, forma-se a sua identidade que, esta sim, é individual,

específica, particular. Por este motivo, só se pode estudar e compreender o

homem no seu contexto e a partir dele. Daí o papel fundamental da educação

na humanização desses meninos e meninas em conflito com a lei, que pode e

deve extrapolar as fronteiras de mercado na sociedade estando atenta ao seu

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sentido ético de compromissar-se com prioridade com a humanização das

pessoas e com o destino de cada ser na construção da sua história.

Concordamos com Miguel Arroyo, 2014, p. 28, quando afirma que:

Para a revitalização da teoria pedagógica esse é o caminho mais fecundo, refletir sobre a condição humana, suas dimensões e virtualidades formadoras e deformadoras, humanizadoras ou desumanizadoras presentes nos processos sociais e, sobretudo, nos movimentos de humanização e libertação dos oprimidos.

Exatamente esse fator que permite à educação a promoção do homem.

Pensar em como humanizar exige pensar, porque não esta humanizado e

pensar em como libertar da opressão exige pensar porque não é liberto.

Segundo Saviani, (2011a, p.2) “Se educar é promover o homem, se

promover o homem é ampliar a sua esfera de liberdade e de consciência, então

quanto mais consciente for o homem, tanto mais humano ele será”. E é

exatamente essa a concepção que norteia a socioeducação para através da

educação formal, promover o homem a cidadão, livre, consciente e construtor

de sua história.

As ações no atendimento sócio-educativo devem, obrigatoriamente, ser direcionadas para fins pedagógicos, possibilitando que os adolescentes construam seus projetos de vida distanciados das alternativas ilegais. Desta forma, a finalidade maior do processo educacional deve ser a formação para a cidadania, não esquecendo que o adolescente em cumprimento de medida sócio-educativa e internação provisória encontra-se sob restrições legais. O atendimento sócio-educativo dos educandos em conflito com a lei deve oferecer condições que favoreçam o protagonismo juvenil, garantam o acesso dos adolescentes às oportunidades de superação de sua situação de exclusão, bem como o acesso à formação de valores para a participação na vida social. (PROEDUSE, 2005, p. 4)

Assim, algumas questões se fazem necessárias de serem tratadas para

elucidar o objeto deste estudo: O que é a doutrina da proteção integral? Porque

tem que existir Doutrina da Proteção Integral numa sociedade que se diz

democrática? Qual o funcionamento da privação de liberdade para o

adolescente em conflito com a lei? Seria a Socioeducação uma garantia para a

ressocialização do adolescente em conflito com a lei?

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Estas questões irão nortear o trabalho demonstrando todas as

contradições existentes e encontradas no objeto de investigação, evidenciando

como os agentes educacionais, a equipe técnica, o corpo docente não

conseguem sair dos limites de uma função que se restringe ao controle, a

contenção e a segurança. A educação e a profissionalização assumem nesses

espaços educativos denominados socioeducação uma função de justificativa

para sua existência. Esses espaços de convivência tem como foco o retorno do

adolescente para a sociedade de forma regenerada, ressocializada. Esse

reconstruir e desenvolver do ser humano acontecem nos centros de

socioeducação através da educação e do trabalho.

Objetiva-se, assim, analisar as instituições intituladas centros de

socioeducação do Paraná no que se refere à coerência entre o que está

proposto pelas políticas públicas, a realidade educacional da instituição e as

necessidades concretas de formação destes sujeitos para sua reinserção na

sociedade.

Para isso alguns objetivos específicos se fazem presentes:

1) Definir as políticas educacionais nos centros de socioeducação;

2) Entender a organização da doutrina da proteção integral;

3) Caracterizar as instituições de socioeducação historicamente;

4) Compreender as reais múltiplas determinações do adolescente em

conflito com a lei.

Considera-se relevante entender quais os objetivos a serem alcançados

pelas políticas públicas da socioeducação e as concepções de educação nos

centros de socioeducação paranaense. Compreender, também, a infância e a

adolescência nas três dimensões propostas pelo ECA, ou seja, as políticas

para a infância e adolescência; as políticas públicas para a infância e

adolescência em risco e sob proteção que tiveram seus direitos violados por

ações e também omissões do Estado, da sociedade e da família e as políticas

públicas para a infância e adolescência infratora para prepará-los ao retorno

do convívio social são relevantes para entender as contradições existentes no

sistema de socioeducação.

A infância e adolescência submetida às políticas públicas e a

socioeducação compreendem que a ação socioeducativa supõe o

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conhecimento total de seu objeto. Mesmo sendo resultante do conflito entre

capital e trabalho e se materializando na desigualdade social, na pobreza e na

exclusão social perpetuado na história o adolescente infrator em sua

especificidade necessita ter o atendimento adequado e seus direitos garantidos

na instituição que ora se encontra. “A desaprovação social da conduta

praticada pelo adolescente com idade entre 12 e 18 anos não possui caráter

eminentemente punitivo, mas busca responsabilizá-lo pelas consequências

lesivas do ato infracional tendo como objetivo primordial sua ressocialização e

a reparação do ato quando possível” (CNJ, 2012, p. 7).

O caminho metodológico perquirido permite compreender o adolescente

em conflito com a lei com suas contradições na totalidade em que vive, e ao

mesmo tempo em que se contradiz, constrói a sua historia na sociedade. Para

isso busca-se analisar duas categorias que são fundamentais: O Adolescente

em conflito com a Lei e as Políticas Públicas Socioeducacionais à luz da teoria

histórico-crítica, identificando os efeitos dessa teoria nos pressupostos

socioeducativos. Logo, será descrito, no pólo teórico, o exame minucioso de

documentos, leis, políticas de atendimento e todo o arcabouço teórico

disponibilizado em livros, sites, artigos, entrevistas enquanto no pólo prático

todas as reflexões desta tese se sustentam também e prioritariamente a partir

da vivência e observação participante da autora neste campo de estudo.

A prática na investigação científica, possui elementos fundamentais para

a compreensão do caráter histórico-social nas relações humanas. Dentro dessa

concepção teórico metodológica - o materialismo histórico – a teoria histórico

crítica, fundamenta a “compreensão da prática educativa na produção da

existência humana pelos próprios homens agindo sobre a realidade natural e

cultural e transformando-a em função de suas necessidades”. (SAVIANI,

2011a, p. 232). Assim podemos compreender que na perspectiva histórico-

crítica a pesquisa se dá pela prática concreta, posto que a humanidade se

constrói por meio da interação entre os recursos de que dispõem os homens e

que podem ser reproduzidos, adaptados, reconstruídos. O ser humano então,

submete-se as relações de produção, distribuição e exclusão, justificando

assim, o processo sócio-produtivo.

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A metodologia utilizada pautada na teoria histórico crítica propõe a

superação dos problemas possibilitando a formação de um cidadão crítico,

histórico e transformador. Segundo Saviani (2011b) “Pedagogia histórico critica

é o empenho em compreender a questão educacional com base no

desenvolvimento histórico objetivo” (p. 88)

Sendo o trabalho uma produção intencional, o trabalho torna-se

educativo. O trabalho educativo é capaz de produzir nos indivíduos a

humanidade, e a partir dessa humanização é possível libertar-se da alienação

a que está submetido o adolescente em conflito com a lei. Libertar-se da

alienação significa emancipar-se. Segundo Saviani (2012, p. 132), “tendo em

vista que é o trabalho que define a essência humana, podemos considerar que

está aí a referencia ontológica para se compreender e reconhecer a educação

como formação humana”.

Nesse sentido, organizar a educação nos espaços de socioeducação em

beneficio da emancipação humana é estar de acordo com o trabalho como

princípio educativo e lutar a favor do conhecimento como arma poderosa contra

a alienação. Assim a teoria histórico-crítica acredita na superação do domínio

burguês através da socialização dos conteúdos e do trabalho educativo

escolar.

A dialética e o pensamento crítico que se propõe a compreender a coisa

em si sistematicamente se pergunta como é possível chegar a compreensão da

realidade. Para o materialismo a realidade social pode ser conhecida na sua

concreticidade quando se descobre à natureza da realidade social, se elimina a

pseudoconcreticidade, se conhece a realidade social como unidade dialética de

base e de superestrutura, e o homem como sujeito objetivo, histórico social.

Esta realidade que revela o conteúdo objetivo e o significado dos fatos é o

método cientifico, ele é capaz de descobrir, mostrar e motivar.

O método dialético concebe o mundo sempre em movimento e

desenvolvimento ininterrupto analisando as contradições no movimento

histórico da realidade e que determinam a razão de ser de um objeto

investigado.

As ações humanas não são por si só dotadas de sentido e razão, elas

recebem um sentido. Marx afirma que a história é um produto humano.

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“Consequentemente a história se cria como processo dialético, mas os homens

são apenas instrumentos da dialética histórica”. (KOSIK, 2002, p. 215). Ao

pensar na formação humana, é imediato pensarmos em educação. A educação

é uma prática social que nos constitui humanos. A finalidade maior da

pedagogia histórico crítica é a emancipação humana. Para essa emancipação

humana acontecer é preciso instrumentalizar, ou seja, entender o

conhecimento na sua dimensão histórica para que se torne um instrumento de

luta.

Adolescente em conflito com a lei, ato infracional, socioeducação que se

transforma em estereótipo são objetos ou categorias que se perdem diante do

preconceito, do estigma que a sociedade impõe. Para eliminar esse descaso o

debate proposto se concentra principalmente em relação à modificação da

estrutura da lei e sua aplicabilidade a partir do ECA, ou seja a perspectiva da

garantia de direitos independente da situação em que se encontra o

adolescente.

No Paraná a Socioeducação está sob a responsabilidade da Secretaria

da Família e do Desenvolvimento Social em parceria com a Secretaria da

Educação.

Considerando essa infância com dignidade, respeito e direitos a principal

proposta que a SEDS10 apresenta tem uma abordagem interdimensional,

envolvendo o adolescente em sua plenitude. Essa abordagem supera a

interdisciplinaridade e assenta-se na importância da manifestação das

diferentes dimensões que constituem o ser, como a sensibilidade, a

10

SEDS – Secretaria da família e do Desenvolvimento Social - a partir de 2010, anteriormente denominada SECJ – Secretaria da Criança e da Juventude de 2007 até 2010, anteriormente denominado IASP – Instituto de Ação Social do Paraná que era uma autarquia estadual dotada de personalidade jurídica, com patrimônio e receita própria e com autonomia administrativa, financeira e técnica. Estava vinculado à Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e Promoção Social - SETP. Do IASP restam hoje os cadernos do IASP que norteiam a gestão dos centros de socioeducação que atende a crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social, cujos direitos reconhecidos pela lei foram ameaçados ou violados; por ação, omissão da sociedade ou do Estado; por omissão, falta ou abuso dos pais ou responsáveis ou em razão da sua conduta. Em 1962 pela Lei nº. 4.167 de 16/07/1962 foi criado o Instituto de Assistência ao Menor no Paraná, dois anos antes da criação da FUNABEM. Em 1974 torna-se subordinado a Secretaria de Estado da Saúde e do Bem Estar Social. Em 1987 é extinto, nascendo em seu lugar a Fundação de Ação Social do Paraná – FASPAR, e se torna o IASP em 1985 pelo Decreto nº. 959 de 28/06/1985. Em 2007 torna-se a SECJ - Secretaria da Criança e da Juventude do Paraná e em 2010 torna-se SEDS – Secretaria da Família e do Desenvolvimento Social.

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corporeidade, a transcendentalidade, a criatividade, a subjetividade, a

afetividade, a sociabilidade, isto é numa dimensão omnilateral, ou seja, em

todas as dimensões. A educação é a comunicação intergeracional do ser

humano, envolvendo conhecimentos, sentimentos, crenças, valores, atitudes e

habilidades na constante troca entre educador e educando, pois, a educação

sempre é um processo histórico.

Com esta filosofia e política educacional, a Secretaria da Família e do

Desenvolvimento Social (SEDS), anteriormente denominada Secretaria da

Criança e da Juventude (SECJ), e a Secretaria de Estado da Educação

(SEED), por meio do Departamento de Educação de Jovens e Adultos (EJA),

mantêm uma parceria cujo objetivo pauta-se na garantia da escolarização

Básica, no nível Fundamental e/ou Médio a adolescentes e jovens infratores ou

em situação de risco social e pessoal, atendidos nos Centros de

Socioeducação mantidos pela SEDS por meio de ações descentralizadas nos

Centros Estaduais de Educação Básica para jovens e Adultos (CEEBJAS)

semipresenciais.

Para compreender o objeto proposto de forma rigorosa a autora

fundamenta-se nas ricas sínteses formuladas por Karl Marx, Dermeval Saviani,

Adolfo Sanchez Vazquez, Octavio Ianni, Karel Kosik, Alvaro Vieira Pinto,

Antonio Carlos Gomes da Costa, Pável Vasílievich Kopnin, Mario Alighiero

Manacorda, Miguel Arroyo, Naura Syria Carapeto Ferreira, entre outros, que

fazem incursões em elementos e categorias que aqui serão tratados por serem

necessários.

As pesquisas sobre o adolescente em conflito com a lei perfazem

numero insatisfatório quando analisadas na realidade brasileira. Há uma ênfase

nos meios de comunicação quando um crime é cometido por um adolescente,

e principalmente quando aos olhos da sociedade o crime é praticado com certo

grau de “barbarismo”, no entanto a verdadeira dimensão do problema é posta

de lado ou pouco investigada. Os noticiários abundam sobre estas notícias que

não passam de notícias comuns como todas as demais catástrofes sem,

sequer, um comentário de um intelectual respeitado que se pronuncie sobre o

acontecido;

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Quando comparados os números da população e os números de

adolescentes em cumprimento de medida socioeducacional, percebe-se que

embora em crescimento são números não muito significativos. No entanto, se

eles existem necessitam de um olhar mais atento para que possam, se não

estagnar, pelo menos diminuir.

Segundo os dados nacionais do último censo do IBGE de 2010 (Fonte:

Projeto IBGE/Fundo de População das Nações Unidas – UNFPA/BRASIL

(BRA/98/P08), Sistema Integrado de Projeções e Estimativas Populacionais e

Indicadores Sociodemográficos) em relação à população o Brasil tem

190.977,109 habitantes. Destes, 93.393,810 são homens e 97.583,299 são

mulheres e 60.849,269 possuem entre 0 e 17 anos de idade. Da população

total 3.317,516 tem 12 anos de idade, 6.567,178 tem 13 e 14 anos de idade,

3.255,298 tem 15 anos de idade, 3.243,696 tem 16 anos de idade e 3.237,002

tem 17 anos de idade. Sendo assim a população que nos interessa nesse

estudo é a população que esta submetida às medidas socioeducativas prevista

no Estatuto da Criança e do Adolescente por praticar ato infracional. Ou seja,

do total da população brasileira apenas 19.620.690 tem entre 12 e 17 anos de

idade.

Da população entre 12 e 17 anos de idade 9.936.637 são homens,

sendo 1.681.407 de 12 anos de idade; 3.327.650 com 13 e 14 anos de idade;

1.648.698 com 15 anos de idade; 1.641.708 com 16 anos de idade e 1.637.174

com 17 anos de idade.

Da população ainda entre 12 e 17 anos de idade 9.684.053 são

mulheres, sendo 1.636.109 de 12 anos de idade; 3.239.528 com 13 e 14 anos

de idade; 1.606.600 com 15 anos de idade; 1.601.988 com 16 anos de idade e

1.599.828 com 17 anos de idade.

A região sul, segundo ainda os dados do IBGE do Censo 2010, conta

com 23.620.896 pessoas na zona urbana e 4.125.995 na zona rural, somando

um total de 27.746.891.

No Paraná a população total é de 10.439.601, sendo 8.906.442 na zona

urbana e 1.533.159 na zona rural; e ainda, 5.128.053 são homens e 5.311.098

são mulheres. Na faixa entre 12 e 17 anos de idade no Paraná se aproxima de

2 milhões de pessoas.

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Em relação ao tema objeto de estudo desta tese o adolescente em

conflito com a lei segundo o Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito

com a Lei em junho de 2011 contava com o registro de 91.321 adolescentes

em algum tipo de delito ou contravenção, sendo 29.506 cumprindo medida

socioeducativa no Brasil.

No Paraná, segundo o relatório de gestão 2003 – 2010 da Secretaria de

Estado da Criança e da Juventude, hoje Secretaria do Desenvolvimento

Familiar, houve um significativo crescimento do número de adolescentes

autores de ato infracional atendidos nos centros de socioeducação

paranaenses. Em 2009 o Paraná contava com 1710 adolescentes em regime

de internação e 3.119 adolescentes em internação provisória.

Os atos infracionais mais cometidos para a internação são Roubo

seguido de Tráfico de Drogas, Furto, Roubo com Morte, Homicídio e Porte de

Arma. Na medida de internação provisória o ato mais cometido também é o

roubo seguido de tráfico de drogas, furto, roubo com morte, homicídio, Porte de

arma e descumprimento de medida.

O Estado do Paraná figura como um dos mais modernos modelos de

atendimento ao adolescente em conflito com a Lei de todo o país. Se

analisarmos numericamente os dados explanados ate aqui podemos chegar a

um denominador de baixo índice de autores de ato infracional.

Resumidamente, o Brasil tem aproximadamente 191 milhões de

habitantes conforme os dados do IBGE do Censo 2010, sendo a população

entre 12 e 17 anos de idade de 20 milhões; destes, 10 milhões são homens e

10 milhões mulheres. A região sul é composta de aproximadamente 28 milhões

de habitantes e destes, 11 milhões estão no Paraná. Dos 11 milhões, 2 milhões

estão na faixa etária de 12 a 17 anos de idade e dos 2 milhões de adolescentes

1 milhão e duzentos mil são meninos e 800 mil são meninas e apenas

aproximadamente 5 mil se encontram na situação de autores de ato infracional.

Há que se fazer uma reflexão sobre um novo olhar para a adolescência

e para toda essa realidade em que se “formam e cultivam crianças tendentes a

se tornarem adolescentes em conflito com a lei”. Deixar de ver a adolescência

como incômoda e percebê-la como antes de tudo sujeitos de direitos e sujeitos

em desenvolvimento implica em proporcionar o resgate do maior direito que

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existe: o direito de ser, de existir, de viver como cidadão pleno com todos os

direitos e deveres. Segundo Suchodolski (1976), esse direito de ser, de existir,

plenamente pode ser e deve ser adquirido pela educação, e esta educação

adquirida trabalha com princípios voltados para a superação de todas as

formas de alienação e consequentemente como forma de transformação social.

Esse direito de ser deve existir também na Socioeducação. Na especificidade

de cada adolescente incluído nesse espaço de reconstrução de sua cidadania.

A tese está sistematizada em Introdução e mais 4 capítulos.

O Capitulo 2 ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI que focará

a análise de como se passa de adolescente a adolescente em conflito com a

lei. Quem é? De onde vem? Quais os números no Brasil e no Paraná.

No Capitulo 3 POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS PARA A

INFÂNCIA E ADOLESCENCIA, trata da história das políticas públicas

educacionais a partir da década de 90, a trajetória histórica do adolescente em

conflito com a lei outrora denominado menor e uma primeira abordagem sobre

o ECA e a política de proteção dos direitos e deveres do adolescente em

conflito com a lei.

No Capitulo 4 DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL, quando é

tratado todo o sistema de garantia de direitos humanos e do adolescente em

conflito com a lei analisando a Doutrina da proteção Integral que substitui a

Doutrina da Situação Irregular.

No Capitulo 5 SOCIOEDUCAÇÃO, discutir-se-á o sistema nacional

SINASE e as políticas que vigem a socioeducação, as medidas

socioeducativas, as políticas paranaenses através da analise dos Cadernos do

IASP, os programas socioeducativos e os Espaços Socioeducativos no Paraná.

Em ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ACERCA DA HUMANIZAÇÃO NA

SOCIOEDUCAÇÃO trata-se do diálogo sobre a possibilidade da humanização

pela convivência para a possível emancipação e não estigmatização do jovem

que em algum momento de sua vida tornou-se adolescente em conflito com a

lei.

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2 ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI

Nas últimas três décadas (1980 a 2010), verificou-se no cenário político

brasileiro uma busca por mudança na forma como se vê os direitos e os

deveres das crianças e adolescentes. A partir do momento que as crianças e

adolescentes deixam de ser vistos como pequenos adultos e são

contextualizadas no seu próprio tempo e espaço como cidadãos e como sujeito

de direitos tornam-se privilegiados pela doutrina da proteção integral. Sabemos

que um dos marcos histórico para que esses sujeitos se concretizassem foi a

Constituição Federal de 1988 em seus Art. 22711 e Art. 22812 contemplando

essa doutrina da proteção integral.

O Brasil consolidou os direitos e deveres das crianças e adolescentes

previstos nos artigos 227 e 228 da Constituição de 1988 quando da aprovação

da Lei 8.069 conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente. Apesar de

essa lei ser a única no cenário latino-americano, constatamos que a situação

da infância e da adolescência brasileira não progrediu deixando o ECA muito

aquém do seu esperado.

Segundo o Levantamento Nacional de 2011 da Secretaria de Direitos

Humanos acerca do Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito

com a Lei foi sancionada em janeiro de 2012 a lei nº 12.594, que institui o

Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) que regulamenta a

execução das medidas socioeducativas para os adolescentes que praticarem o

ato infracional. A legislação traz desafios a serem conquistados em relação a

melhoria nas unidades e nos programas de atendimento socioeducativo, e

entre eles, a unificação dos procedimentos de execução das medidas

socioeducativas pelo sistema Judiciário e atribui a esse poder o papel de

homologar o Plano Individual de Atendimento (PIA). Através da legislação

unificada se propõe introduzir uma série de direitos dos adolescentes como

11

Art. 227- É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 12

Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.

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atendimento individualizado, atenção integral a saúde, visita íntima,

participação familiar, entre outros.

Segundo esse levantamento a prática do ato infracional aumentou nos

últimos anos, pois em 2010 o sistema tinha 17.703 adolescentes, aumentando

em 2011 em 1.892 adolescentes, representando uma elevação de 10,69% no

que diz respeito à medida de restrição e privação de liberdade. Entre os anos

de 2006 a 2009 constatou-se uma queda de 7,18 % de autores de ato

infracional para 0,43%, e de 2009 para 2011 o número voltou a crescer

chegando a 10,69%. Tendo o Brasil uma população de aproximadamente 20

milhões de adolescentes na faixa etária entre 12 e 18 anos incompletos

segundo dados do IBGE de 2010, esses números representam cerca de 0,09%

em cumprimento de medida socioeducativa em meio fechado.

O Levantamento Nacional não traz em si a intenção de uma análise

quantitativa, mas sim de apontar elementos que contribuíram para o

conhecimento desses números. Entre esses elementos aponta-se:

a oferta de novas vagas de internação em decorrência da construção de unidades socioeducativas (seja na capital ou em comarcas do interior do estado); indícios de uma cultura de institucionalização presente no Judiciário que se sustenta principalmente em fundamentações extrajurídicas que, via de regra, se contrapõem ao próprio ordenamento legal; a exposição da população adolescente a territórios que concentram indicadores de violência; o fenômeno da expansão do crack e outras drogas junto à população adolescente. (SDH, 2012, p. 9/10)

Dos adolescentes em restrição e privação de liberdade a constatação é

de que 95% são do sexo masculino e 5% do sexo feminino, com exceção de 5

estados brasileiros onde o sexo feminino ultrapassa os 8%.

O ECA procura em toda a sua lei transparecer a necessidade de evitar

que ocorra a internação ou privação de liberdade do adolescente infrator,

portanto, é interessante constatar as razões da internação no sentido de que se

utilizando da medida de socioeducação de internação a trajetória de infrações

cessem ou diminuam.

Através da tabela abaixo (que provém dos dados do IBGE, 2010) pode-

se inferir a proporcionalidade entre a população de adolescentes no Brasil e a

população de adolescentes cumprindo Medida socioeducativa. É possível

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perceber também os estados com maior número de internados, bem como a

região do Brasil com maior e menor número de adolescentes infratores,

guardando a proporcionalidade de cada estado ou região.

Tabela 1 – Proporção entre População de Adolescentes x Adolescentes Restritos e Privados de liberdade

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Verifica-se também através dos dados levantados que em cada 10.000

adolescentes no país, 9,5 estão passando pela medida de socioeducação de

internação.

Ao que se refere aos números por região podemos perceber que a maior

concentração de adolescentes está na região sudeste, seguida pela nordeste,

a sul, a norte e a centro oeste, respectivamente. Ao inferirmos a quantidade de

adolescentes que cometeram atos infracionais por região temos em primeiro

lugar a região sudeste, seguida da nordeste, a sul, a norte e por último a centro

oeste. Ou seja, à proporção de adolescentes em cada região corresponde o

número de adolescentes em acometimento de ato infracional.

No que diz respeito a tipificação de delito cometido, os dados do

Levantamento Nacional apontam que em 2011, os números e atos infracionais,

cometidos por adolescentes que cumprem medida de socioeducação em

privação de liberdade são o Roubo com 38%, o tráfico com 26,6%, o Homicídio

com 8,4% e o Furto com 5,6%. Portanto, o roubo ainda é o maior causador da

privação de liberdade da juventude brasileira.

Gráfico 1 – Tipificação de Delito

Fonte de dados: SDH – Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei: Levantamento Nacional 2011. Brasília, SDH, 2012. Gráfico: A autora

Tipificação de delito

roubo

trafico

homicidio

furto

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Cabe aqui uma reflexão: Seria a inacessibilidade aos bens de consumo

pela via legal e em geral de adolescentes com baixo poder aquisitivo e sem

muita expectativa de um futuro diferenciado o causador de tantos delitos

praticados por adolescentes? O poder de consumo, o marketing, a propaganda

do mercado, o apelo para o consumo, a valorização do capitalismo

exacerbado, a posse de bens materiais que geram o empoderamento social e

simbólico, também geram em contrapartida o adolescente infrator? Ou seria

ainda uma forma velada de apontar para o roubo como a principal causa

mascarando a fonte maior que poderia ser o tráfico e uso de entorpecentes?

A vulnerabilidade social aproxima o sujeito de um outro tipo de vulnerabilidade, a penal, ou seja, o jovem pobre, muitas vezes negro, com baixa escolaridade, morador da periferia das grandes cidades, torna-se o alvo do Sistema de Justiça. Ele corresponde ao estereótipo e, sem encontrar outras possibilidades de ressignificação de sua própria identidade, torna-se reincidente, passando a se utilizar da violência como forma de se impor e relacionar-se com o mundo social. (TEJADAS, 2008, p. 18,19)

Nesse sentido quando se pensa em direitos humanos, seria honesto

dizer que todos têm os mesmos direitos? Que realmente eles são universais e

indivisíveis? Os jovens adolescentes infratores ou não, conhecem e usufruem

todos os seus direitos, sejam eles civis, políticos ou sociais que tem como

finalidade maior assegurar-lhes a cidadania?

Evidentemente, assegurar direitos implica ir além da legislação. As leis são as ferramentas de exigibilidade e, ao mesmo tempo, resultam da articulação e lutas sociais. Os direitos humanos não são categorias abstratas, eles se referem a homens e são produzidos em circunstâncias históricas específicas. E mais: para torná-los realidade, muitas vezes são necessárias novas lutas que alavanquem mudanças, em alguns casos, paradigmáticas. (Id. Ibid, p. 19)

É possível que vivendo em plena era dos direitos ainda possamos

pensar em meninos e meninas, adolescentes e jovens que tem suas vidas

limitadas as condições de seu nascimento? Ser menino ou menina, branco ou

negro, do sertão ou do centro urbano, ter deficiência ou não, não podem ser

determinantes de vulnerabilidades sofridas por esses jovens e muito menos da

negação de seus direitos mais básicos como educação, alimentação e saúde

contidos dentro da rede de proteção integral. Uma condição fundamental para

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eliminar essas vulnerabilidades é a realização do direito de ser adolescente, ou

seja, o direito a ser cidadão, o direito a exercer a cidadania.

Em um documento do Conselho Nacional de Justiça (Panorama

Nacional: A Execução das Medidas Socioeducativas de Internação, programa

Justiça Jovem) de 2012, resultado de uma pesquisa, realizada por uma equipe

multidisciplinar que fez visitas em todo o Brasil de julho de 2010 a outubro de

2011, são apontados alguns elementos acerca da caracterização do

adolescente cometedor de ato infracional. Traremos aqui alguns dados desse

documento, por ser o mais atual até o momento publicado em termos de

estatísticas, no intuito de podermos perceber quem é o adolescente em conflito

com a lei do nosso país.

“A pesquisa foi realizada nos 320 estabelecimentos de internação

existentes no Brasil, a fim de analisar as condições de internação a que os

17.502 adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de restrição

de liberdade estão sujeitos” (CNJ, 2012, p.7).

Alguns cuidados são necessários para analisar os números que esse

documento traz em relação a quem é esse adolescente em conflito com a lei.

Quem os produziu? De que classes são? De que gênero? Trabalham?

Estudam? Como suas famílias estão estruturadas? Quem são esses

adolescentes na realidade desnuda, e desinteressada politicamente? Onde

moram? Porque estão em conflito com a lei? De onde vem? Essas estatísticas

mascaram a realidade destacando aspectos e ocultando outros de maior

importância? Esses meninos e meninas deixam de ser cidadãos e passam a

estar do outro lado? Do lado contrário a lei e a ordem? A sociedade realmente

os protege quando os decreta sob a Doutrina da Proteção Integral? Os

adolescentes são culpados ou são vítimas desse sistema imposto ao

nascerem?

Este relatório apresentou um panorama geral sobre a aplicação das medidas socioeducativas no Brasil, a fim de conhecer melhor o perfil social dos adolescentes, dos processos de execução de medida em tramitação e as condições de atendimento aos jovens infratores nas estruturas de internação. Além disso, o estudo pretendeu, de um lado, analisar o ordenamento territorial dos estabelecimentos, observando-se a distribuição das unidades pelos critérios demográfico, social, econômico e geográfico e, de outro, buscou

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conhecer as instituições de internação brasileiras por meio da análise dos questionários, os quais forneceram informações valiosas sobre as estruturas física e humana existentes. (CNJ, 2012, p. 139)

Foram entrevistados 1.898 adolescentes que cumprem medida

socioeducativa de privação de liberdade em todo o país. O primeiro dado

apresentado pelo documento é em relação a idade apresentada como média

dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa que gira em

torno dos 16 anos. Em relação a estrutura das famílias o dado que se

apresenta é de que a maioria foi criada apenas pela mãe e que grande parte

desses adolescentes (em torno de 75%) faz uso de substâncias psicoativas.

Já a escolaridade dos internos apresentou variações regionais. No Centro-Oeste e no Sul os jovens apresentaram percentuais mais altos de educação do que nas Regiões Norte e Nordeste, considerando-se que o mais baixo índice de alfabetização está na Região Nordeste quando comparado, por exemplo, com a Região Sul (20% e 1%, respectivamente). No cômputo nacional, houve parcela significativa de analfabetos (8%), não obstante a obrigação dos estabelecimentos em promover a escolarização do jovem privado de liberdade. Os adolescentes, em sua maioria, interromperam seus estudos aos 14 anos, entre a quinta e a sexta série, e não mais frequentavam a escola à época da internação. Verificou-se, portanto, que parcela substantiva não concluiu a formação básica compreendida entre a primeira e a oitava série (89%). (CNJ, 2012, p. 139)

Nesse documento que é seguido como base para entender o

atendimento ao adolescente em conflito com a lei e também para melhorar as

políticas que são usadas no intuito maior da ressocialização há um

apontamento de que as possíveis causas para que exista a infração reside em

questões como “famílias desestruturadas, defasagem escolar e relação estreita

com substancias psicoativas” (CNJ, 2012, p. 20). No entanto, não é possível

aceitar que filhos que são criados só por mães em sua maioria, e que não

estão em tempo correto de escolarização e fazem uso de algum tipo de

entorpecente, possam ser rotulados como adolescentes infratores ou com alto

grau de probabilidade de infringir a lei. Até mesmo pela mostra de entrevistas

realizadas. São mais de 17.000 adolescentes em cumprimento de medida

socioeducativa no Brasil. Será que entrevistar pouco menos de 2.000

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adolescentes é suficiente para traçar um perfil real que aponte o motivo que os

fez cometer ato infracional? Seria mesmo de interesse das políticas vigentes

traçar o perfil real dos adolescentes em conflito com a lei?

Além do perfil social dos adolescentes esse documento como já dito

anteriormente buscou também trazer dados do ordenamento territorial com

elementos sociais, econômicos e geográficos. Para isso também analisou

14.613 processos de execução de medida socioeducativa, lembrando ainda

que um mesmo processo pode analisar mais de um ato infracional.

Os aspectos estudados no perfil processual compreendem as seguintes informações dos adolescentes: faixa etária, histórico de evasões, tipos de internação, tipos de ato infracional, reincidência, tipos de internação por sentença, reavaliação da medida judicial, Plano Individual de Atendimento (PIA) e acesso aos direitos processuais. (CNJ, 2012, p. 21)

Um dos fatores de relevância nesse estudo é o apontamento das

Unidades Socioeducativas (em torno de 12%) que não possuem nenhum tipo

de oportunidade de aprendizagem ao adolescente, seja ela escolar ou

profissional.

A reinserção social do adolescente em conflito com a lei constitui o principal objetivo da medida socioeducativa de privação de liberdade, visto que da avaliação negativa da conduta não resulta uma pena e sim uma medida profilática, que deverá preparar os jovens para o restabelecimento da vida livre. Este período de internação deverá, assim, garantir as condições necessárias para a reintegração. Neste ínterim, o princípio da proteção integral à criança e ao adolescente, prevista no art. 1º do ECA, deverá ser observado por meio da implementação de programas educacionais e profissionalizantes, bem como por meio da preservação dos vínculos familiares que, potencialmente, permitirá o acolhimento do adolescente após o término do período de privação de liberdade. (CNJ, 2012, p.133)

É possível perceber, após a leitura, o imenso abismo existente entre o

que as políticas específicas aos adolescentes e aos adolescentes em conflito

com a lei preconizam e com o que realmente acontece. A falta de cadastro das

famílias dos adolescentes; situações de desrespeito a integridade física dos

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adolescentes; homicídios nos estabelecimentos; suicídios; agressão física por

parte dos funcionários; superlotação; mortes por doenças preexistentes;

inadequação das dependências físicas; carência de recursos humanos entre

outros.

Especificamente quanto à estrutura de atendimento profissional especializado, há preponderância de assistentes sociais e psicólogos, porém notou-se a reduzida presença de advogados e médicos. Complemente-se a esse dado que um terço das unidades de internação não dispõe de enfermaria, e mais da metade não possui gabinete odontológico. Em relação às medidas de reinserção social do adolescente, tomando-se por parâmetro as ações de formação educativa, constatou-se que metade dos jovens não frequenta a escola diariamente no Nordeste, contra 10% no Sul. Quanto à existência de estrutura de atendimento, os dados mostraram que 13% dos estabelecimentos não dispõem de sala de aula, tampouco de espaço para prática desportiva. Ainda falta espaço para realização de oficinas e em pouco mais de 20% dos estabelecimentos não há sequer refeitório. (CNJ, 2012, p. 140)

Depois desse breve relato, podemos pensar em que processos sociais

de um justo e digno viver esses adolescentes estão submetidos para que

realmente ocorra a ressocialização? Como será possível humanizar-se em

condições indignas de vida, seja ela em cumprimento de medida

socioeducativa ou não? A escrita das leis e das normas não constitui a prática

da realidade. A realidade do adolescente em conflito com a lei é diversa

dependendo de sua classe, seu gênero e sua localização.

Importa lembrar ainda que estar na privação de liberdade, é o último

recurso. Precisa-se pensar não só em como punir esse adolescente que

cometeu ato infracional, mas necessita-se muito entender o que aconteceu,

como aconteceu, qual o dano causado e como pode-se reparar esse dano.

Qual o sofrimento que ambas as partes estão passando? Em que sentido as

vidas dessas partes foram prejudicadas? Como as necessidades de ambos,

tanto vítima quanto autor de infracional podem ser solucionadas? E quem tem

a obrigação de sanar essas necessidades? É importante não perder o foco de

que é preciso restaurar essas vidas de maneira a não sofrer rotulações e

tentando da melhor maneira possível resolver os conflitos.

Caso contrário apenas se continuará repetindo e continuando com

práticas de situações extremas e bárbaras contra os adolescentes e os

adolescentes em conflito com a lei.

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2.1 O Adolescente

A adolescência é um período complexo da vida do ser humano, pois

ocorrem transformações significativas em todos os níveis, sejam eles, físico,

emocional, ou intelectual e estas transformações estão permeadas pelos

contextos culturais aos quais fazem parte e que constroem a sua adolescência,

por isso, a adolescência se configura antes de qualquer coisa, como um

processo de construção da identidade sociocultural do ser humano.

Certamente essas mudanças que ocorrem influenciam no

comportamento do adolescente, pois trazem expectativas relacionadas à sua

necessidade extrema de liberdade. A partir da vivência do adolescente a

sociabilidade ocupa papel central, no entanto, as peculiaridades desse

momento na vida do adolescente são em geral ignoradas, começando pela

família, dentro de seu lar e acentuando-se na sociedade e nas instituições

como a escola e a igreja que frequentam. Se agudiza o fator quando tratado

em estratos de população onde a renda é menor, pois o que mais importa é

acelerar o processo de preparação para o mercado de trabalho e transformar o

adolescente não mais em um peso as finanças da família, e sim, um braço a

mais para manter as necessidades familiares supridas.

Existe assim, uma troca de valores que podem resultar em problemas

futuros para o adolescente, sua família e toda a sociedade. Acelerando esse

processo de entrada do adolescente no mercado de trabalho e

consequentemente para a vida adulta, pouco se pergunta sobre a sua real

necessidade em termos de valores que deverão ser prioridades em sua

formação.

Quando o adolescente não é respeitado no seu tempo real de vida e

suas peculiaridades o primeiro impacto negativo causado é a ausência do

diálogo, lembrando que a construção da identidade na adolescência é um

processo muito mais amplo e crítico do que a identidade adulta.

Com a entrada da adolescência uma das questões mais importantes é a

ampliação da autonomia, e a circulação pelos espaços que pertencem a vida

pública dos adultos que começam a incorporar a vida do adolescente, fazendo

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com que sua capacidade de refletir e compreender o mundo se alterem e

ganhem novas perspectivas.

Nessa fase se agudiza as interrogações e os questionamentos sobre o

seu lugar e função no mundo gerando uma tensão permanente. As

informações são mais acessíveis e fazem com que o seu contato com o mundo

interfiram nos seus processos de criação de identidade.

A adolescência é um momento muito específico na construção do

homem futuro. A adolescência é definida por (OSÓRIO, 1989, p.10) como uma

(...) etapa evolutiva peculiar ao ser humano. Nela culmina todo o processo maturativo biopsicossocial do indivíduo (...) não podemos compreender a adolescência estudando separadamente os aspectos biológicos, psicológicos, sociais e culturais. Eles são indissociáveis e é justamente um conjunto de suas características que confere unidade ao fenômeno da adolescência.

Um dos primeiros sinais da adolescência se dá no próprio corpo do

adolescente. Normalmente as alterações físicas e biológicas são intensas e

podem fazer com que existam alterações radicais de comportamento e de

relacionamentos, que abalam demasiadamente o estado emocional dos

adolescentes. Ultrapassar o limite de uma fase significa perder o estado

anterior, delegá-lo a um local de memórias, e é isso que ocorre com o

adolescente; ele deixa de ser criança e com as responsabilidades que assume

pela idade que chega perde de forma definitiva a condição de criança e tudo

em seu entorno será ressignificado.

Com essas mudanças o adolescente automaticamente procura seu lugar

no espaço. Procura definir qual agora será seu papel na sociedade em que

está inserido. E os elementos que o definem em um local ou espaço são o que

fazem dele um ser humano em desenvolvimento e ao mesmo tempo completo.

Em desenvolvimento porque a cada dia vivido suas experiências se

multiplicam, e completo porque ocupa uma significação em relação aos seus

estudos, a sua profissão, aos seus relacionamentos sociais, pessoais e

familiares.

Não são raros os casos onde o adolescente busca soluções rápidas

para seus conflitos internos e problemas externos e em algumas vezes se

utiliza da criminalidade para essas soluções fazendo com que passe de

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adolescente em constante mutação para adolescente em conflito com a lei em

constante mutação.

A adolescência é uma fase de metamorfose. Época de grandes transformações, de descobertas, de rupturas e de aprendizados. É, por isso mesmo, uma fase da vida que envolve riscos, medos, amadurecimento e instabilidades. As mudanças orgânicas e hormonais, típicas dessa faixa etária, podem deixar os jovens agitados, agressivos, cheios de energia e de disposição em um determinado momento. Mas, no momento seguinte, eles podem acometidos de sonolência, de tédio e de uma profunda insatisfação com seu próprio corpo, com a escola, com a família, com o mundo e com a própria vida. (PINSKY e BESSA, 2004, p. 11).

A adolescência é uma fase de evolução com muitos conflitos e com

muita reorganização constante de ideias o que pode levar com frequência a

crise de identidade. Um adolescente em estado de crise apresenta um grau de

vulnerabilidade superior com potencialidade para a desestruturação do

pensamento do que é correto e do que não é correto praticar em se tratando de

atos lícitos ou ilícitos. A crise de identidade surge quando o adolescente

necessita fazer algum tipo de escolha. Que roupas usar? Que músicas ouvir?

Que profissão seguir? Que relacionamentos o atraem? E outros milhares do

seu dia a dia.

A adolescência é a nova fase do porquê, pois os questionamentos são

constantes, e as incertezas são as mais diversas gerando atitudes de rebeldia.

Na realidade, diversos elementos internos como os emocionais e elementos

externos como família, escola, amigos passam a ser os determinantes na

formação do adolescente. Se esse processo de formação for falho

provavelmente as consequências produziram danos em primeiro plano ao

indivíduo e em segundo plano a sociedade em que está inserido. Obviamente

que o adolescente nesse período busca reafirmar-se através do convívio com

grupos distintos em diversos espaços sociais.

Ao mesmo tempo, uma das características principais do adolescente é a

quebra de regras. Se durante sua infância as regras eram claras e os adultos

eram os que tinham a razão, agora não são mais, e tudo que os adultos

impõem como regra é motivo para discussão e contraditoriedade.

Outra regra da adolescência é o imediatismo proveniente do

consumismo exacerbado e da necessidade de possuir em detrimento de

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buscar o ser. Esse incentivo ao possuir cada vez mais bens de consumo

material em um curto espaço de tempo gera ansiedade nos adolescentes, e

quando em sua maioria não é possível ter, por ausência de condição financeira

por parte dos adultos acontece a frustração, pois ocorre sua exclusão social.

O adolescente proveniente de classes sociais menos abastadas é

levado a pular alguns momentos da etapa da adolescência, pois necessita

assumir trabalho e responsabilidade que na maioria das vezes deve resultar no

seu sustento e em alguns casos na contribuição imediata com a família.

As relações sociais, históricas, culturais e econômicas, portanto,

constituem a adolescência, e isso é mais um determinante para que todos os

direitos das crianças, dos adolescentes e dos jovens sejam cumpridos.

2.2 Estado da Arte

Para pensar com maior clareza sobre o objeto de estudo dessa Tese de

Doutorado é necessário, antes de qualquer coisa, entender, interpretar,

quantificar e qualificar o que o conhecimento elaborado até o presente acerca

do tema apresenta sobre a Doutrina da Proteção Integral e as políticas em

análise nela inseridas, como a Adolescência em Conflito com a Lei, o Estatuto

da Criança e do Adolescente e a Socioeducação.

Foram analisados elementos de quatro bancos de dados da maior

relevância no cenário da educação brasileira: o Banco de Dissertações e Teses

da Capes no período de 1987 a 2011, que reúne as informações defendidas

em programas de pós-graduação de todo país e que até o período investigado

contava com 458.657 resumos de trabalhos de pós-graduação. Foram

analisados 219 estudos entre dissertações e teses. As informações deste

banco são fornecidas diretamente à Capes pelos programas que são

responsáveis pela veracidade dos dados.

A Revista Educação & Sociedade desde o seu primeiro número

publicado em 1978, e que até 2011 disponibiliza 117 exemplares é um dos

mais importantes periódicos editados na área da educação no país. Como um

instrumento de excelência no que diz respeito ao incentivo a pesquisa

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acadêmica, a revista possui um grande acúmulo de informações, fontes

teóricas e relatos de grande interesse aos que atuam nas ciências humanas. A

revista é indexada internacionalmente e recebe a contribuição não só do nosso

país, mas também de autores de diversos países.

Foram examinados os Cadernos Cedes, que somam desde 1980, ano

de sua primeira publicação até 2011, 85 volumes, com inúmeros artigos e

resenhas que formatam um excelente subsídio para as pesquisas.

E publicações quadrimestrais da Revista Brasileira de Educação da

ANPED – Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Educação

em coedição com a Editora Autores Associados. Publicou seu primeiro número

em 1995 e até 2011 contam com 48 números repletos de artigos científicos que

visam o fomento a pesquisa no âmbito nacional e internacional.

Portanto, ao fazermos o levantamento dos dados do Banco de

Dissertações e Teses da Capes pudemos observar o significativo aumento da

preocupação com a formação humana embasada nos direitos em relação a se

fazer cumprir a doutrina da proteção integral para nossas crianças e

adolescentes, nos âmbitos municipais, estaduais e federais.

Foram escolhidas quatro categorias diferentes que se interligam e

interage o tempo todo: a “Doutrina da Proteção Integral”, o “Estatuto da Criança

e do Adolescente”, o “Adolescente em Conflito com a Lei” e a “Socioeducação”.

Sobre a Doutrina da Proteção Integral foram analisadas 38 dissertações

de mestrado, no período de 1987 a 2011.

Tabela 2 – Número de Dissertações sobre a Doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

É possível perceber que o tema só começa a ser debatido a partir de

1995, e ainda assim com muita timidez. Somente em 2003 é que as pesquisas

1995

01

1996

01

1997

01

1998

02

2001

02

2003

05

2004

01

2005

03

2006

02

2007

02

2008

05

2009

03

2010

07

2011

03

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59

começam a tornarem-se mais intensas culminando em 2010 com sete

dissertações. No que diz respeito a incidência por Estados verifica-se uma

concentração maior de estudos na região sul e sudeste.

Tabela 3 – Número de Dissertações por Estado sobre a doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011

RS

02

SC

08

PR

01

SP

14

RJ

03

MG

01

ES

01

MA

01

PB

01

AM

03

GO

01

AP

01

CE

01

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Gráfico 2 – Número de Dissertações por Estado sobre a doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011

Fonte: A autora

A região Sul e a região Sudeste concentram 30 das 38 dissertações

analisadas, restando apenas 8 dissertações para as outras 3 regiões do Brasil.

Observando esses dados podemos refletir as prioridades de cada região

e estado. O Brasil é muito mais desenvolvido cientificamente nas menores

dissertações por estado

RS

SC

PR

SP

RJ

MG

ES

MA

PB

AM

GO

AP

CE

Page 60: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ MÁRCIA REGINA MOCELIN EM.pdf · TERMO DE APROVAÇÃO Márcia Regina Mocelin ADOLESCÊNCIA EM CONFLITO COM A LEI: Socioeducação no Paraná Esta Tese

60

regiões em extensão territorial; e seu desenvolvimento causa uma relevante

preocupação com a dignidade e formação humana através da garantia de seus

direitos.

Outro fator de importância para nossa reflexão é a abrangência das

áreas do conhecimento destas dissertações de mestrado.

Tabela 4 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre a doutrina da

Proteção Integral entre 1987 a 2011

Sociologia

03

Serviço

social

05

Direito

23

Educação

04

Políticas

Públicas

01

Psicologia

02

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Gráfico 3 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre a doutrina da Proteção Integral entre 1987 a 2011

Fonte: A autora

Novamente fica evidente a incidência da área de concentração maior do

Direito, seguida pela Assistência Social e depois Educação, não restando

dúvidas que o que se procura não é conhecer os seus direitos e educar-se para

garanti-los, mas, simplesmente cumprir a Lei.

área do conhecimento

sociologia

serviço social

direito

educação

politicas

psicologia

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61

Tabela 5 – Palavras Chave das Dissertações sobre a doutrina da Proteção

Integral entre 1987 a 2011

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Adoção

01

Abrigo

01

Adolescentes

01

Atos

infracionais

02

Bioética

01

Contrato

trabalho de

adolescente

01

Criança e

adolescente

09

Conselhos

02

Direitos

humanos

01

Direito penal juvenil

01

Dano moral

01

Direito da

Criança

02

Educação

02

Evasão

01

ECA

05

Família

03

Guarda

03

Gestão

02

Infância

01

Infrator

01

Legislação

03

Liberdade

01

Liberdade

assistida

01

MST

01

Medidas

socioeducativas

04

Privação

01

Proteção

integral

06

Punição

02

Participação

01

Risco social e

pessoal

01

Conselho

tutelar

01

Direitos

04

Escola

01

Leis

01

Pena privada

01

Educação

infantil

01

Infância e

juventude

01

Poder

familiar

01

Trabalho

infantil

02

Ressocialização

01

Dignidade

01

Cidadania

01

xxxxxxxx Xxxxxxxx Xxxxxxxx

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62

São reafirmadas nas palavras-chave o que acima é dito, quando

verificamos que, “criança e adolescente”, “medidas socioeducativas”, “proteção

Integral”, “ECA” e “direitos” aparecem com maior incidência.

As dissertações apresentadas nesse bloco sob a categoria maior da

Doutrina da Proteção Integral tem um atendimento específico sobre as

legislações que regem a criança e o adolescente. Traz em suas dissertações

uma forma de comparação entre Leis, pareceres e declarações, assim como

sínteses históricas. Poucas delas trazem o estudo de caso em evidência e

ainda em sua maioria apontam a quantificação de dados. Portanto, a maioria

pode ser apontada como descritiva documental enquanto o apoio bibliográfico

reúne obras com maior incidência de cunho jurídico.

Ainda sobre a Doutrina da Proteção Integral foram analisadas 04 teses

de doutorado, no período de 1987 a 2011. Dessas quatro teses uma é do ano

de 2000, duas do ano de 2006 e uma do ano de 2009. Observa-se com muito

interesse que um assunto de tamanha relevância e destaque no cenário

nacional, só tenha o olhar atento dos pesquisadores dez anos depois de

promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente e ainda com uma pesquisa

muito pequena. Também é de importante análise o fato de concentrarem-se em

São Paulo três das quatro teses sendo a outra do Rio Grande do Sul. O estado

mais populoso e com maior índice de violação de direitos humanos do Brasil

traz também a maior preocupação com as questões da proteção da criança e

do adolescente.

Sobre a incidência da área do conhecimento tendo somente quatro teses

para análise fica complexo emitir um parecer concreto. No entanto dos dados

que temos, aponta-se o equilíbrio entre a área da educação e a área jurídica

sendo duas teses com ênfase no Ensino Profissionalizante e duas em Direito.

Nas palavras chave ou nas subcategorias de análise, mesmo havendo

uma equidade entre as áreas de conhecimento percebe-se que a tendência

dos estudos inclina-se pela área do Direito e não pela área da Educação. As

palavras com maior frequência citadas são Adolescentes e ECA. As demais

aparecem apenas uma vez: Criança, Direito a imagem, Personalidade,

Desigualdade Social, Ética, Infração, Trabalho Educativo e Trabalho Infantil.

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63

Os autores anunciam apenas em duas teses a metodologia empregada

denominando de: “aportes etnográficos da história de vida” e “o Materialismo

histórico dialético”. Assim como nas dissertações dessa categoria analisada as

teses trazem uma forma de comparação entre Leis, pareceres e declarações,

assim como sínteses históricas. Em uma das teses também é apontado o

estudo de caso de uma escola. Também nas teses de doutorado o apoio

bibliográfico reúne obras, sobretudo de cunho jurídico, no entanto são

apontados Paulo Freire e Kant em uma das teses.

Sobre o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) foram analisadas

82 dissertações de mestrado, no período de 1987 a 2011.

Tabela 6 – Número de Dissertações sobre o ECA entre 1987 a 2011

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

O tema Estatuto da Criança e do Adolescente é o mais debatido das

categorias de análises propostas. Há uma regularidade entre os anos de 1996

e 1998 em torno de 7 e 8 dissertações, e uma permanência de preocupação

em todos os anos em abordar esse assunto tão polêmico e erroneamente

interpretado.

1990

01

1993

04

1994

08

1995

03

1996

07

1997

07

1998

08

1999

02

2000

02

2001

05

2002

03

2003

03

2004

03

2005

02

2006

03

2007

05

2008

03

2009

05

2010

04

2011

03

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64

Gráfico 4 – Número de Dissertações sobre o ECA a cada 5 anos de 1987 a 2011.

Fonte: A autora

Como podemos observar o debate maior concentra-se na primeira

década de sua publicação, voltando a ter significativa relevância dez anos

depois.

Tabela 7 – Número de Dissertações por Estado sobre o ECA entre 1987 a 2011

RS

04

SC

13

PR

08

SP

30

RJ

12

MG

01

DF

01

PE

02

PB

02

AM

02

GO

01

RN

01

CE

03

PA

02

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

0

5

10

15

20

25

30

1990 a 1995 (16) 1996 a 2000 (26) 2001 a2005 (16) 2006 a 2010 (20)

número de dissertações a cada 5 anos

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65

Gráfico 5 – Número de Dissertações por Estado sobre o ECA entre 1987 a 2011

Fonte: A autora

A região Sul e a região Sudeste concentram 68 das 82 dissertações

analisadas, restando apenas 14 dissertações para as outras 3 regiões do

Brasil. Se ainda subdividirmos as regiões sul e sudeste percebemos que a

região sudeste fica com 43 das 68 dissertações, ou seja, com o dobro da

região Sul. E ainda numa análise micro podemos perceber o estado de São

Paulo quase três vezes a frente do segundo colocado que é o estado de Santa

Catarina.

Analisando a área do conhecimento que as dissertações se enquadram,

notamos que a área de concentração do Direito é a maior em nossa pesquisa,

no entanto, se observarmos por outro ângulo perceberemos que as áreas de

Ciências Sociais (sociologia, ciência política), Serviço Social e Educação

ultrapassam a área supracitada, o que abre uma nova visão acerca dos

estudos sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, fazendo com que as

leis não sejam mais o foco principal mas um suporte para a análise das outras

ciências.

dissertações por estado RS

SC

PR

SP

RJ

DF

PE

PB

AM

GO

RN

CE

PA

MG

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66

Tabela 8 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre o ECA entre 1987 a

2011

Sociologia

05

Serviço

social

19

Direito

30

Educação

15

Políticas

públicas

01

Psicologia

02

História

01

Ciência

Política

02

Filosofia

02

Ciências

sociais

05

Administração

01

Enfermagem

01

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Gráfico 6 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre o ECA entre 1987 a 2011

Fonte: A autora

Começam a aparecer aqui nas palavras chave a relação com a

modificação do objeto de estudo destas dissertações. O Estatuto aparece aqui

como categoria maior de análise, seguida de palavras que modificam o olhar

área do conhecimento

sociologia

serviço social

direito

educação

politicas

psicologia

historia

ciencia politica

filosofia

ciencias sociais

administração

enfermagem

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67

do leitor. Pois agora a Lei dá vez à observação da Criança e do Adolescente

em toda a sua simbologia, através das Políticas Sociais e da Educação.

Tabela 9 – Palavras Chave das Dissertações sobre o ECA entre 1987 a 2011

Adoção

02

Adolescente

11

Adolescência

03

Abrigo

01

Ato

infracional

01

Crianças

12

Criança e

adolescente

12

Conselho

tutelar

07

Cidadania

01

Castigo

01

Direitos da

criança e do

adolescente

05

Direito do

menor

01

Direitos

04

Escola

01

Ética

01

Estado

01

ECA

19

Educação

06

Evasão

01

Emancip

ação

humana

01

Filiação

adotiva

01

Família

03

Genocídio

01

Garantia de

direitos

01

Governo

01

Justiça

01

Legislação

03

Liberdade

01

Infância

02

Infração

03

Movimento

nacional

01

Meninos de

rua

02

Menor

03

Movimentos

sociais

02

Medidas

socioedu

cativas

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68

05

Proteção

01

Políticas

sociais

01

Regime

fechado

01

Rua

01

Sinase

01

Trabalho

infanto juvenil

06

Tutela

04

Violência

03

Saúde

01

Dignidad

e

01

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Nas dissertações ora analisadas, quando se trata de metodologia

utilizada, existem grandes equívocos relacionados ao que realmente é uma

metodologia de pesquisa. Confundem-se metodologia, com método na maioria

das análises. Pudemos encontrar algumas anotações como “análise coletiva

dos direitos”, ”análise documental”, “estudo qualitativo de caráter exploratório”,

“quadro comparativo” “pesquisa quali-quantitativa”, “pesquisa de campo”,

“método dedutivo” e “ontologia marxiana”, para definir a metodologia utilizada.

Em geral as dissertações apresentadas nesse bloco sob a categoria

maior do Estatuto da Criança e do Adolescente tem uma grande preocupação

em como estão sendo tratados os direitos das crianças e dos adolescentes sob

um enfoque bem mais sociológico do que o tratado na categoria Doutrina da

proteção Integral. Tem um atendimento específico sobre as legislações que

regem a criança e o adolescente.

Raras são as dissertações que identificam os seus aportes teóricos, que

dão sustentação as análises formuladas. Em algumas das dissertações (mais

especificamente 6 das 82) aparecem citados sob qual luz teórica se escreve e

se direcionam os textos. Nestas encontramos: Aristóteles, Oswaldo Ferreira de

Melo, Marx, Lukacs, Meszaros, Tonet, Lessa, Jimenez, Paniago, Costa,

Foucault, Deleuze, Guatari, Rolnik, Pages, Bonetti, Gaulajac. No entanto a

maioria ainda das citações são referentes as duas leis principais: a

Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente.

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69

Ainda sobre o ECA foram analisadas 12 teses de doutorado, no período

de 1987 a 2011.

Tabela 10 – Número de Teses sobre o ECA entre 1987 a 2011

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Em comparação ao número de dissertações desenvolvidas sobre o

tema, as teses tem uma quantidade não tão expressiva, no entanto se

comparada ao numero de teses em relação a categoria da Doutrina da

Proteção Integral é um número três vezes maior. Mantém uma linearidade de

no máximo duas ou três teses anuais, porém com um espaçamento de tempo

maior. Todas as teses dessa categoria de estudo centram-se nas regiões sul e

sudeste. São Paulo é o estado que traz 50% das teses analisadas com um total

de seis (6), seguido do Rio de Janeiro com três teses (3), Rio Grande do Sul

com duas teses (2) e Paraná com apenas uma tese.

Sobre a área do conhecimento das teses desenvolvidas é mais evidente

o avanço e o interesse no estudo dessa área sob o enfoque da Educação e das

Ciências Sociais, fazendo agora com que a área do direito não esteja mais em

primeiro lugar. Na área do Direito estão quatro teses; Ciências Sociais uma

tese; Serviço Social três teses; Educação três teses e na área da psicologia

uma tese.

Nas palavras chave a categoria de análise Estatuto da Criança e do

Adolescente acompanha a área de concentração maior que são as Ciências

Sociais e a Educação, dando maior sentido na busca de esclarecimentos e

pesquisas no que diz respeito formação do ser humano e da não violação dos

seus direitos para o exercício pleno da cidadania.

Diferentemente das dissertações, e de fácil compreensão, nas teses, os

autores definem com mais clareza as suas metodologias. Nesse bloco de

análise identificou-se: “Estudo de caso”, “Analise documental”, “Entrevistas”,

1995

01

1996

02

2000

01

2001

02

2006

03

2007

01

2008

01

2009

01

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70

“Reconstrução histórica”, “Analogia”, “Perspectiva qualitativa”, “Viés dialético

crítico”, “Materialismo histórico e dialético”.

No entanto, sobre a referência bibliográfica nesses 12 estudos apenas

houve a referência a “Pressupostos marxianos” e “Bardin”.

Sobre o Adolescente em Conflito com a Lei foram analisadas 52

dissertações de mestrado, no período de 1987 a 2011. Em comparação com os

dois temas já analisados, a Doutrina da Proteção Integral com 38 dissertações

e o Estatuto da Criança e do Adolescente com 82 dissertações podemos

detectar um certo equilíbrio entre os estudos no que diz respeito a sua

evolução ano a ano,ou seja, mesmo tendo uma maior numero em relação ao

primeiro tema e um menor numero em relação ao segundo mantêm em

equidade na distribuição anual de estudos não deixando de ser interesse

cientifico a partir da década de 1990.

Tabela 11 – Número de Dissertações sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Entretanto, essa categoria de análise é uma categoria em evidencia a

partir dos anos 2000, pois entende-se que a sociedade passa por um período

de evolução e intensificação da violência e da criminalidade infanto juvenil,

consequentemente seu campo de estudo também fica em evidencia. Em 2010

é apontado seu auge com 10 estudos significativos.

Analisando os programas de pós graduação constatou-se a seguinte

classificação:

1996

01

1997

01

1999

01

2000

01

2002

03

2003

05

2004

01

2005

03

2006

06

2007

05

2008

04

2009

04

2010

10

2011

07

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71

Tabela 12 – Número de Dissertações sobre o Adolescente em conflito com a lei por estado entre 1987 a 2011

RS

07

SC

01

PR

05

SP

11

RJ

04

MG

04

ES

01

DF

05

RO

01

BA

02

GO

01

PA

01

CE

02

PB

02

RN

02

PE

03

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Gráfico 7 – Número de Dissertações por Estado sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011

Fonte: A autora

dissertações por estado RS

SC

PR

SP

RJ

MG

ES

DF

RO

BA

GO

PA

CE

PB

RN

PE

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72

A região Sul e a região Sudeste concentram 33 das 52 dissertações

analisadas, restando 19 dissertações para as outras 3 regiões do Brasil. Em

comparação com as outras categorias analisadas até aqui podemos observar

um aumento significativo dos estudos nessas regiões. É possível interpretar

que houve um incremento ou um fomento nos cursos de pós graduação mas

que ainda mesmo unindo as regiões não ultrapassam os estudos da Sul e

Sudeste.

A mudança é também muito significativa no que diz respeito a área do

conhecimento abordada nas dissertações. Surpreendentemente, o foco sai da

área jurídica e vai para a área da psicologia aliada a educação. Surpreendente

pelo fato dessa categoria entre as 4 estudadas, ser a mais ligada as questões

jurídicas. Percebe-se a preocupação na formação desses indivíduos em

detrimento do simples cumprir da lei.

Tabela 13 – Area do Conhecimento sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011

Sociologia

2

Serviço social

2

Direito

5

Educação

10

Saúde

1

Enfermagem

1

Desenvolvimento

social

4

Ciências exatas

1

Geografia

1

Ciências sociais

1

Teologia

1

Odontologia

1

Psicologia

17

Ciência política

1

Políticas públicas

2

Multidisciplinar

2

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

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73

Gráfico 8 – Área do Conhecimento das Dissertações sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011

Fonte: A autora

Nas palavras - chave a preocupação com a categoria adolescente fica

em evidencia, até mesmo porque acompanha a questão da mudança de foco

da área jurídica para a área da psicologia.

Tabela 14 – Palavras Chave das Dissertações sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011

Adolescente

infrator

5

Adolescente

14

Ato infracional

10

Criança

2

Criminalidade

urbana

1

Direito

4

Delito

1

Direitos

humanos

2

área do conhecimento sociologia

serviço social

direito

educação

politicas

psicologia

saude

enfermagem

desenvolvimento social

ciencias exatas

multidisciplinar

ciencia politica

geografia

ciencias sociais

teologia

odontologia

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74

ECA

4

Ética

1

Adolescente em

conflito com a lei

17

Escola

2

Educação

3

Educador

1

Família

3

Intervenção

1

Justiça

1

Liberdade

1

Lei

2

Menor

1

Medidas

socioeducativas

6

Meninas em

conflito com a lei

1

Psicologia

2

Perdas

dentarias

1

Problemas com

adolescente

1

Políticas sociais

2

Personalidade

1

Práticas

pedagógicas

1

Qualidade de

vida

1

Representações

sociais

1

Saberes

docentes

1

Socialização

1

Trabalho

1

Violência

3

Proteção integral

2

Privação

1

Delinquente

5

Exclusão escolar

1

Identidade

3

Morte

1

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

As dissertações apresentadas nesse bloco sob a categoria maior do

Adolescente em Conflito com a Lei apresentam como metodologias utilizadas

as mais variadas denominações: “o estudo de caso”; “a pesquisa documental”;

“o estudo comparativo”; “entrevistas”; “caráter exploratório”; “pressupostos

teóricos da psicologia sócio histórica”; “abordagem sistêmica, psicossociológica

e psicanalítica”; “análise fenomenológica”; “observação participante,

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75

quantitativa, transversal, descritiva e correlacional”; ” método indutivo” e

“cartesiano”.

Em se tratando dos aportes utilizados nas pesquisas, aparecem mais

especificamente os nomes dos teóricos. Os mais citados nas dissertações

analisadas foram Vygotsky, Freire e Arroyo. Também foram citados outros

estudiosos como: Trindade, Lauren, Azevedo, Bonetti, Bernardo, Bourdieu,

Castel, Souza, Carvalho, Eyng, Raposo, Winnicott, Lévinas, Piaget, Lawrence

Kohlberg, Bakhtin, Rosseti, Pinto e Cordié. Citaram também a utilização de

aportes embasados na pedagogia histórico critica e a psicologia histórico

cultural. E para finalizar acompanham em 100% as dissertações as leis

maiores: ECA e Constituição Federal de 1988.

Ainda sobre o Adolescente em Conflito com a Lei foram analisadas 06

teses de doutorado, no período de 1987 a 2011. O tema adolescente em

conflito com a lei nas teses de doutorado só entra em questão a partir do ano

de 2005. Portanto, 15 anos depois do Estatuto da Criança e do Adolescente

entrar em vigor. E se olharmos atentamente é tão recente e tão pouco

explorado que só consta no cenário nacional há menos de uma década.

Dessas seis teses, três são do Rio de Janeiro, uma do Rio Grande do

Sul, uma de São Paulo e uma Da Bahia. Novamente as regiões sul e sudeste

se destacam nos programas de pós-graduação em relação ao tema estudado.

O Rio de Janeiro concentra 50% dos estudos em relação a essa categoria de

análise.

As teses trazem seus estudos dentro da área da Educação (2), Saúde

Coletiva (1), Economia (1), Psicologia (1) e Direito (1). O foco é diverso,

demonstrando que a problemática do adolescente em conflito com a lei é

passível de considerações e aprofundamentos científicos em todas as áreas do

conhecimento. No que se refere ao levantamento das palavras chave,

podemos observar na tabela a seguir:

Tabela 15 – Palavras Chave das Teses sobre o Adolescente em conflito com a lei entre 1987 a 2011

Criança em Adolescente Saúde Cidadania Juventude

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76

situação de

risco

01

01 01 01 02

Criminalidade

01

Subjetividade

01

Representações

sociais

01

Alienação

parental

01

Conflitos

conjugais

01

Mãe solteira

01

Políticas

públicas

01

Governo

01

Vida nua

01

Memória

social

01

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Assim como na área de concentração, nas palavras chave também há

uma grande variedade de termos e, apenas nas duas teses da área da

educação uma palavra se repete.

A metodologia centrada no trabalho em grupo, perspectiva crítica,

análise dialética, pesquisa qualitativa, técnicas de microeconometria são as

metodologias apontadas pelos autores das teses aqui analisadas. Nesse bloco

de análise chama à atenção a forma da metodologia da tese com área de

conhecimento em economia, por ser de uma área não comum a educação. Já

o aporte teórico observado nas teses pesquisadas apresenta-se numa

perspectiva sócio construtivista, na teoria das representações sociais de Michel

Foucault e Giorgio Agamben, além das Leis que demonstram até aqui ser o

parâmetro inicial para todos os estudos de todas as categorias.

Sobre a Socioeducação foram analisadas 23 dissertações de mestrado,

no período de 1987 a 2011. Sendo um tema mais recente e um grande campo

de investigação, a Socioeducação somente aparece a partir de 2003 tendo

completado apenas dez anos de estudos.

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77

Tabela 16 – Número de Dissertações sobre a Socioeducação entre 1987 a 2011

2003

01

2004

01

2006

01

2007

05

2009

02

2010

06

2011

07

Fonte: A autora (Banco de Dissertações e Teses da Capes)

Percebeu-se por meio desta investigação, o aumento dos estudos sobre

a temática Socioeducação nos anos finais da década de 90 (noventa) e início

dessa década. Interpreta-se que a evidência de tal aumento se deu em vista da

preocupação dos órgãos públicos responsáveis pelo bem estar social,

“pressionados” pela opinião pública, nos âmbitos: federal, estadual e municipal,

em implantarem políticas públicas que incluam, por definitivo, nos seus debates

e direcionamento político educacional, a questão da Socioeducação, bem como

incentivo à pesquisa científica como parte dos estudos da diversidade cultural.

Das 23 (vinte e três) dissertações de mestrado analisadas, a incidência

por estados está distribuída da seguinte forma: 3 (três) dissertações em São

Paulo, 5 (cinco) no Rio Grande do Sul, 11 (onze) no Paraná, 2 (duas) no Rio de

Janeiro, 1 (uma) em Santa Catarina e 1 (uma) no Distrito Federal. De todas as

dissertações analisadas somente uma não faz parte da região sul ou sudeste.

E a incidência maior do tema nessa categoria se dá no estado do Paraná e em

diferentes cidades, como Curitiba, Maringá, Ponta Grossa e Londrina.

Considerando as informações investigadas, pergunta-se: Existiria um

aumento significativo de adolescentes em conflito com a Lei nesse estado

(Paraná) para tornar a preocupação tão evidente, a ponto de proporcionar a

pesquisa cientifica?

Martini (2010) [et.al] Kersting (2003) ao discutir sobre o “Estado como

garantia de direitos e deveres”, propõe:

[...] o conceito de direito humano procurado numa esfera pré-cultural e enfatiza residir o caráter revolucionário de direito humano no fato de erigir uma ordem normativa de pura interpessoalidade, prioritárias sobre ordens jurídicas estatais, sobre todos os círculos culturais históricos e todas as interpretações morais religiosas ou metafísicas do ser humano e da conduta humana (MARTINI, 2010, p. 243).

Portanto, segundo a autora, baseada nos estudos de Kersting (2003), no

que se refere à questão dos direitos humanos, afirma que o único ser humano

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é um ser finito, mortal, vulnerável, capaz de sofrer, resultando por isso, num

estado de ausência de assassinato e homicídio, dor, violência, fome, miséria,

opressão, tortura e exploração. Assim, tal proteção só pode ser concedida via

Estado.

O Estado e o Direito produzem um respeito fundamentado no poder, um respeito à liberdade dos outros que é, sobretudo, um respeito à privacidade dos outros; dentro dessa zona de privacidade individual a ser respeitada, pode florescer a diferença. Tal respeito mútuo que mantém a devida distância torna-se suficiente e não requer que haja necessidade de uma especial familiaridade coletivo-cultural para restabelecer a ordem (MARTINI, 2010, p.243).

Nessa linha de raciocínio, a autora destaca que Kersting (2003) faz uma

classificação aos direitos humanos: condicionais e programáticos. Coloca que

os direitos humanos condicionais abrangem o direito à vida, à incolumidade

física e à segurança básica. Isto significa condições de vida sem violência,

dentro de uma organização política previsível e confiável. Tais direitos

condicionais asseguram a melhoria da vida política, mas a extensão deles

depende da efetividade dos direitos programáticos (direito à liberdade, à

igualdade política, à democracia) do ponto de vista de uma ética cidadã.

Certamente, a resposta para a questão formulada acima, nos remete a

uma resposta necessária em pesquisar o tema na sua profundidade e

complexidade social e econômica.

No contexto das dissertações analisadas 4 (quatro) são da área da

Psicologia, 5 (cinco) da área da educação, 6 no campo do Serviço Social, 2

(duas) da área do Direito, 1 (uma) dissertação nas áreas de Linguística,

Ciências Sociais, Teologia, Interdisciplinaridade e Saúde Coletiva,

respectivamente.

O reordenamento institucional, e as modificações nos programas

educacionais e da assistência social por parte do governo transparecem no

estudo das dissertações sobre a Socioeducação. Iniciamos as nossas análises

com uma total ênfase nas ciências jurídicas que lentamente vão dando lugar

aos estudos de sociologia e educação.

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Nas palavras chaves a ligação entre políticas públicas e Socioeducação

demonstra como o foco agora não é aplicar a sanção, mas sim propor políticas

que realmente possam sanar o problema da infração juvenil.

As dissertações de mestrado aqui analisadas apresentam metodologias

similares às apresentadas nas demais categorias de análise, como por

exemplo, o estudo de caso e a pesquisa bibliográfica, Os referenciais em

destaque são principalmente Foucault, e Vygotsky além de outros como

Saviani, Thompson, Piaget, Monteiro Lobato, Nelly Novaes, Bakhtin, Volpi entre

outros autores de cunho dialético.

Finalmente sobre a última análise do banco de dados da CAPES estão

as teses que falam sobre a Socioeducação. Sobre este tema foram

investigadas 02 teses no período de 1987 a 2011, sendo uma do ano de 2006

e outra do ano de 2011. Uma da Universidade de São Paulo e outra da

Universidade do Estado do Rio de Janeiro. A de São Paulo é da área da

Educação e a do Rio de janeiro da área interdisciplinar. Nas palavras chave o

que temos são: adolescente; direito a educação e ambivalências; contradições;

controle e crime.

De forma clara uma das teses propõe a reorganização dos programas

de socioeducação através dos estudos de convenções, recomendações,

diretrizes e regras, enquanto a outra propõe a observação em relação a

mudança do controle dos discursos dos atos infracionais. Nenhuma delas traz

um aporte específico. Ambas pautam-se nas leis.

As 195 dissertações de mestrado e 24 teses de doutorado analisadas

para compor esta tese “Políticas Públicas Educacionais para a Infância e

Adolescência em conflito com a lei: Socioeducação no Paraná” somam 219

estudos de relevância, sendo 42 (38 dissertações e 04 teses) na categoria

Doutrina da Proteção Integral; 94 (82 dissertações e 12 teses) na categoria

Estatuto da Criança e do Adolescente; 58 (52 dissertações e 06 teses) na

categoria Adolescente em Conflito com a Lei e 25 (23 dissertações e 02 teses)

na categoria Socioeducação, ficando o mapa da seguinte forma:

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80

Gráfico 9 – Categorias de análise estudadas do banco de Dissertações e Teses da Capes

Fonte: A autora

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

doutrina da proteção integral

estauto da criança e do adolescente

adolescente em conflito com a lei

socioeducação

categorias de análise

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81

Gráfico 10 – Distribuição das Dissertações e Teses por ano de 1987 a 2011

Fonte: A autora

0

5

10

15

20

25

30

incidência de estudos por ano

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82

Na Incidência por estados os estudos revelam a região sul e sudeste

com o domínio da produção científica do país.

Gráfico 11 – Distribuição das Dissertações e Teses por estado de 1987 a 2011

Fonte: A autora

0

10

20

30

40

50

60

70

80

incidência por estados

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83

Gráfico 12 – Distribuição das Dissertações e Teses por área de conhecimento de 1987 a 2011

Na área de concentração maior das pesquisas verificamos que a área

jurídica com 67 estudos se destaca das demais. No entanto, é seguida de

muito perto pela Educação (40), e Serviço Social (35).

Fonte: A autora

0

10

20

30

40

50

60

70

80

áreas do conhecimento

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Nas palavras chave as quatro categorias maiores de análise são as que

se destacam, seguidas de categorias que estão diretamente ligadas a elas. Por

exemplo: Doutrina da Proteção Integral/Direitos; Adolescente em conflito com a

Lei/Criança e Adolescente; Socioeducação/Medidas Socioeducativas /Ato

Infracional e todas elas podem vir somadas a categoria ECA.

Gráfico 13 – Palavras Chave das Dissertações e Teses de 1987 a 2011

Fonte: A autora

Por fim quando nos debruçamos sobre a análise da metodologia

utilizada e do aporte teórico principal das dissertações e teses concluímos a

carência em identificar com propriedade a metodologia denominada

corretamente, sem ser confundida com método de estudo. Os referenciais

mais citados são sempre a legislação acompanhada de alguns referenciais

mais citados como Marx, Foucault e Vigotsky.

palavras chave

doutrina da proteção integral

adolescentes em conflito com a lei

socioeducação

ECA

criança e adolescente

medidas socioeducativas

direitos

criança

adolescente

ato infracional

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Ao fazer a análise da produção bibliográfica da Revista Educação &

Sociedade que teve seu primeiro número em 1978, somando até 2011, 117

exemplares, o que significa mais de uma milhar de artigos e resenhas,

confirmamos uma ausência muito significativa do debate em torno das

questões ligadas a Doutrina da Proteção Integral.

Verifica-se apenas 6 trabalhos de pesquisa abaixo listados:

Tabela 17 – Publicações da Revista Educação e Sociedade de 1978 a 2011 sobre temas ligados a Doutrina da proteção Integral e afins.

Uma Pedagogia para o

Menor ”Marginalizado”

Angel Pino Sirgado

Nº 04

1979

O reino do crime

José Manoel de Aguiar Barros

Nº 20

1985

A questão do menor e o

significado da infância na

sociedade burguesa

Angel Pino Sirgado

Nº 28

1987

Quando a violência infanto-

juvenil indaga a pedagogia

Miguel González Arroyo

Nº 100

2007

Trabalho pedagógico com

adolescentes em conflito

com a lei: feições da

exclusão/inclusão.

Silvana Machado Cella & Dulce Maria Pompêo de Camargo

Nº 106

2009

Cidadania, educação e

responsabilidade social:

percursos biográficos de

jovens grávidas em

Laura Fonseca

Sofia Santos

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contextos de proteção

social.

&

José Manuel Peixoto

Nº 117 2011

Fonte: A Autora (Revista Educação e Sociedade)

Todos os estudos apontam para caminhos e perspectivas que levam a

perceber a ausência ou quase estagnação de uma possível transformação. O

principal item entendido como facilitador para a não transformação é a falta de

investimentos e políticas públicas específicas e adequadas a cada espaço e

suas condicionantes.

A urgência em unir os polos família, escola e sociedade é sugerido em

todos os estudos como um possível indicador de transformação social.

Abandonar em todas as instâncias o velho paradigma da punição e repressão e

dar lugar a prática da aquisição dos direitos e deveres, para uma cidadania

plena é outro item de relevância em todos os estudos na construção da história

destas políticas.

Os Cadernos Cedes, outro instrumento de investigação, são publicações

de caráter temático publicados desde 1980 e até 2011, somam 85 volumes. O

Caderno temático número 81 de maio a agosto de 2010, intitulado Educação e

Direitos Humanos: Contribuições para o Debate se aproxima de nosso objeto

de investigação e é o referencial dessa análise.

Nesse caderno temos 7 artigos com temas variados como podemos

observar na tabela a seguir:

Tabela 18 – Publicações do Caderno Cedes de 1980 a 2011 sobre temas ligados aos Direitos Humanos.

Derechos humanos y género

Rita Radl Philipp

Ressocialização: o desafio da educação no

sistema prisional feminino

Elisangela Lélis Cunha

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87

O idoso na contemporaneidade:

a necessidade de se educar a sociedade para as

exigências desse novo ator social, titular de

direitos.

Dulce C. Andretta Whitaker

Convivencia familiar e comunitária é direito da

criança e do adolescente e uma realidade a ser

repensada pela escola.

Maria Aparecida Nery

A prevenção as drogas como garantia do direito

à vida e à saúde: uma interface com a educação

Luci Mara Bertoni e Dulcinéia da Silva Adorni

Preparação para o trabalho na fundação CASA:

as oficinas profissionalizantes

Camilla Marcondes

Massaro

Educação e direitos Humanos: desafios para a

escola contemporânea

Angela Viana

Machado Fernandes

e Melina Casari

Paludeto

Fonte: A Autora (Caderno Cedes)

Na sua apresentação este caderno propõe “abrir espaços para que a

educação voltada para os direitos em diferentes contextos faça parte do

diálogo com outras áreas do conhecimento”.

Os estudos trazem variadas análises sobre direitos e discutem sobre

sexo-gênero com ênfase na dignidade humana; o idoso e as mudanças sociais

que implicam em sua perda de poder; o direito a convivência familiar e

comunitária da criança; prevenção de drogas como direito a vida; oficinas de

trabalho em centro de socioeducação;educação voltada aos direitos humanos e

a exclusão de mulheres reeducandas em processo de ressocialização.

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88

Hoje os educadores atuam em diversas frentes e tem que ter em vista

sempre dentro da ideia de Estado democrático os seus cidadãos como

cidadãos portadores de direitos.

O último referencial analisado neste Estado da Arte são as publicações

quadrimestrais da Revista Brasileira de Educação da ANPED – Associação

Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Educação em coedição com a

Editora Autores Associados.

São 48 números publicados de 1995 a 2011.

Nestes 49 números publicados encontramos 5 artigos e duas resenhas

(citando o primeiro número do ano de 2012) que estão ligados ao nosso objeto

de investigação, a saber:

Tabela 19 – Publicações da Revista Brasileira de Educação da ANPED de 1995 a 2011 sobre temas ligados as categorias de análise.

A normatização da pobreza:

crianças abandonadas e

crianças infratoras

Carmen Sylvia

Vidigal Moraes

Nº 15 2000

Prisão especial e diploma

de ensino superior: uma

aproximação crítica

Carlos Roberto Jamil

Cury

Maria Alice Nogueira

Nº 16 2001

Estratégias sociais e

educação prisional na

Europa: visão de conjunto e

reflexões

Hugo Rangel

Nº 34 2007

A pedagogia social e as racionalidades do campo socioeducativo

Resenha

Zucchetti, Dinora Tereza

Nº 38 2008

Adolescência - violência: desperdícios de vidas

Resenha

Guralh, Soeli Andrea;

Migliorini, Silvia Regina Ott

Martins, Laudeci

Nº 38 2008

O impacto da educação e do Julião, Elionaldo Nº 45 2010

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trabalho como programas

de reinserção social na

política de execução penal

do Rio de Janeiro

Fernandes.

As escritas de si na

privação de liberdade:

jovens em conflito com a lei

arquivando a própria vida

Nilda Stecanela e

Evaldo Antonio

Kuiava

Nº 39 2012

Fonte: A Autora (Revista Brasileira de Educação – ANPED)

Nestes estudos apresentados na Revista a variedade de assuntos é tão

complexa quanto a sociedade que se organiza de tempos em tempos. O

resgate da trajetória de meninos e meninas que não tiveram infância; a

liberdade de ir e vir, o mais sagrado dos direitos civis; o aspecto cada vez

maior de segregação da escola numa comparação explanada a partir do fator

de que cada um deve ocupar na sociedade o lugar que lhe cabe; comparações

sobre estado de prisão fora do Brasil; a punição ainda como meio de

ressocializar os detentos; a análise pelo próprio jovem em privação de

liberdade de sua condição de existência, entre tantos outros subtemas que os

artigos apresentam, compõe a mescla de informações e a complexidade do

objeto abordado nessa tese.

Essas foram as publicações relativas ao objeto de estudo através do

BANCO DE DISSERTAÇÕES E TESES DA CAPES de 1987 a 2011 (195

dissertações e 24 teses) no CADERNOS CEDES (07 artigos) de 1980 a 2011,

na REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO – ANPED (05 artigos e duas

resenhas) de 1995 A 2012 e na REVISTA EDUCAÇÃO E SOCIEDADE (06

artigos) de 1978 a 2011.

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3 POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS PARA A INFÂNCIA E

ADOLESCÊNCIA

A política, condição da existência social e que na concepção de Bobbio

(2008, p. 954) é entendida como “forma de atividade ou de práxis humana está

estritamente ligada à de poder”, repousa num ato que institui o Estado, ato que

é o de um legislador que define de uma vez por todas, o que é injusto e o que é

justo, e o pleno exercício do poder.

Na forma simples de Hannah Arendt definir a política, no entanto de

muita magnificência, a política baseia-se na pluralidade dos homens, na

convivência entre os diferentes. Portanto se a pluralidade implica na existência

de diferenças e sua convivência, o alcance da igualdade para atingir a

liberdade no convívio entre os homens é fundamental.

A política trata da convivência entre diferentes. Os homens se organizam politicamente para certas coisas em comum, essenciais num caos absoluto, ou a partir do caos absoluto das diferenças. Enquanto os homens organizam corpos políticos sobre a família, em cujo quadro familiar se entendem, o parentesco significa, em diversos graus, por um lado aquilo que pode ligar os mais diferentes e por outro aquilo pelo qual formas individuais semelhantes podem separar-se de novo umas das outras e umas contra as outras. Nessa forma de organização, a diversidade original tanto é extinta de maneira efetiva como também destruída a igualdade essencial de todos os homens. A ruína da política em ambos os lados surge do desenvolvimento de corpos políticos a partir da família. (ARENDT, 1999, p. 21/22)

Para Arendt (1999), a política não se limita a convenções e seus

espaços, mas busca uma ampliação desses espaços a horizontes ilimitados da

imaginação do homem, sendo assim a política é mesmo vital para todos os

indivíduos e a sociedade.

Maquiavel adiantadamente em sua época fez-se cercado de mitos por

analisar o homem a partir do seu egoísmo, a partir de sua tendência a afirmar a

desintegração da vida em sociedade contrariamente ao tão bem colocado

pensamento Aristotélico do viver como algo natural.

O pensador italiano tentou em sua época renascentista desvendar os

limites do poder político. Para compreender o pensamento de Maquiavel, no

entanto, não podemos deixar de observar as suas análises a partir da sua

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realidade. A realidade de uma Itália partida em vários principados e ducados

com uma luta incessante pelo poder.

Ele acreditava em um Estado italiano com um governante grandioso

para um governo comprometido. Maquiavel, na realidade busca uma solução

para Itália. Essa solução ele define em sua obra mais conhecida: O Príncipe,

que fora dirigido a Lorenzo, que era filho dos Médicis de Florença. Na sua obra

Maquiavel escreve as normativas para que se concretize a boa política de um

bom governante italiano. Define então as relações que considera interessantes

entre ética e política.

De onde se deve observar que, ao tomar um Estado, o conquistador deve praticar todas as necessárias crueldades ao mesmo tempo, evitando ter de repetí-las a cada dia; assim tranqüilizará o povo, sem fazer inovações, seduzindo-o depois com benefícios. Quem agir diferentemente, por timidez ou maus conselhos, estará obrigado a estar sempre de arma em punho, e nunca poderá confiar em seus súditos que, devido às contínuas injúrias, não terão confiança no governante. (MAQUIAVEL, 1996, p. 69)

É possível encontrar no Príncipe uma conceituação de virtude

direcionada a política. Há uma diferença entre os espaços de moral e de

política. Quando se fala em governo, governantes e governados, portanto,

Estado e povo, os princípios são os mais diversos. Platão por exemplo defende

a ideia de que o poder político deve pertencer aos sábios, ou seja, somente os

sábios podem governar. E o povo em virtude do seu não conhecimento não

poderia participar da vida política. Portanto, o poder político deveria ser dado

aos filósofos, pois somente eles poderiam agir de acordo com a justiça para

promover o bem comum.

Aristóteles (1999, p. 223 a 228) acreditava no método indutivo, e

observando o movimento dos fenômenos em geral, ele conclui que todo

movimento tem como objetivo um fim a ser conquistado. No caso do homem o

que importa é a busca do estado de felicidade. É viver bem. Essa verdade,

essa felicidade e por entender o homem como um ser político e social é o

pensamento político de Aristóteles. Aristóteles elaborou o método da indução e

dedução.

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Hobbes, seguidor de Aristóteles defendia a tese de que os homens

lutam uns contra os outros única e exclusivamente para defender seus

interesses particulares. Esse é o fio condutor do pensamento de Hobbes em

seus estudos sobre política. A partir do momento em que os homens

abandonam o “estado de guerra de todos contra todos” adentram a sociedade

civil, e isso acontece mediante um pacto. Esse pacto é denominado por

Hobbes de Pacto Social.

Ao transferirem seus direitos ilimitados a um só homem ou a um conselho de homens, os homens não só construíram o Estado, mas, ao mesmo tempo, concederam-lhe um poder soberano absoluto, isto é, um poder com a prerrogativa suprema de fazer e revogar as leis, de determinar a guerra e a paz, de julgar todas as controvérsias que surgirem entre os homens, de nomear juízes, magistrados e ministros e até mesmo praticar “ação que não seja lícita” (HOBBES, 1992, p. 133).

A partir disso Hobbes (1992) é considerado defensor da ideia de um

governo eficaz através da monarquia. É a melhor forma porque somente uma

pessoa detém o poder soberano, evitando que interesses escusos possam

mover as suas decisões.

Na principal obra de Rousseau, “O contrato social”, de 1762 ele aponta o

homem como sendo naturalmente bom, e, portanto a sociedade que é regida

pela política seria a culpada pela degeneração do homem. Rousseau, (1978),

no entanto, descarta o método indutivo dos naturalistas. Na análise da teoria

política de Rousseau onde há Estado, há a desigualdade entre os homens,

pois para ele o verdadeiro estado de natureza proporciona a igualdade e a

liberdade aos homens. Para Rousseau a desigualdade tem inicio a partir do

estabelecimento da propriedade privada. Contrariamente a Hobbes que

acredita que é nas suas próprias origens que os homens entram em “estado de

guerra de todos contra todos”, Rousseau vê na propriedade privada a

acentuação dos desiguais.

Enquanto os filósofos clássicos Platão e Aristóteles e os modernos

Hobbes e Rousseau partiam de princípios generalizados através da razão ou

da indução para fazerem suas análises da vida política e social apontando

como estas deveriam ser, Tocqueville manteve-se atento em apenas descrever

a vida política e social e demonstrar os condicionantes da história, ou seja, o

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fenômeno político e suas evoluções. A maior diferença entre esses é que

Tocqueville busca um situar do pacto social entre os homens no tempo, ou

seja, busca situar historicamente todos os fatos.

Tocqueville faz em uma de suas obras mais conhecida A Democracia na

América (1969) uma defesa imprescindível da democracia, onde o poder de

tomadas de decisões cabe a todos os cidadãos. Centrando-se a vida política

dos americanos, Tocqueville construiu um tipo ideal de democracia, onde

permanece afirmando os referenciais de igualdade e liberdade como principais

características de um povo e no caso dos seus estudos, do povo americano.

As relações Estado e sociedade irão constituir o tema principal do

pensamento político do séc. XIX. Existem várias definições e diversos

pensadores políticos. Alguns como Hobbes que entende a política em uma

concepção individualista e realista do homem recusando previamente qualquer

pressuposto moral, ou seja, acreditando que a monarquia é a melhor forma de

governo. Outros como Rousseau que atribuíam o poder de governo ao povo.

Outros ainda vão mais além como Locke que considerava também que o direito

natural da propriedade não deveria ser apenas adquirido, mas poderia ser

também herdado.

Política deriva da palavra grega “politikós”. Diz-se de tudo que se refere

às coisas que são da cidade, da “pólis”. Com o tempo a palavra política passou

a referir-se á maneira como se trabalha com as coisas da cidade, da

sociedade. Pode-se fazer uma leitura, então, de que Política passou a significar

a administração do Estado.

Para Bobbio, falar em política significa falar em poder. Falar em poder

remete a pensar em formas de vantagem de um cidadão sobre o outro. Poder

político consequentemente seria o poder que um homem exerce sobre outro.

Esse poder pode ser legítimo ou não.

Para Bobbio, (2000 p. 167) “(...) os fins da política são tantos quantos

forem às metas a que um grupo organizado se propõe, segundo os tempos e

as circunstâncias”. Bobbio fará também uma singular diferenciação entre

política e moral, pois segundo ele política e moral estão ligadas a ação

humana, mas nem tudo tem o mesmo significado para política e moral. Para

Bobbio (2000, p. 174) pode haver “ações morais que são impolíticas e ações

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políticas que são imorais”. A política seria dentro dessa visão a razão do

Estado e a moral seria a razão do homem.

Lênin (1977) se opõe a redução do político ao social, mas demonstra

como por meio da distinção dessas classes se torna viável pensar na relação

entre o político e o social. Lênin acredita que é através dos partidos que a luta

de classes se inscreve no campo político. O partido torna-se assim um

organizador da política, um constituinte das correlações de força. A política

deixa de ser uma luta no campo da economia, mas uma combinação de forças.

Lênin sugere ao proletariado a organização de sua classe para conquistar o

poder político e dominar a nação, mesmo que depois se constate que a

concorrência entre esses partidos faz com que a organização do proletariado

se desvaneça.

No decorrer desta incursão sobre o termo Política, percebe-se que a

mesma é vista sob diferentes maneiras, revelando um quadro complexo por

conta da variedade das perspectivas analisadas.

Anteriormente a Lênin, quando pensamos em Marx e suas conjecturas,

verificamos o quão atual são suas ponderações. Marx pede uma revolução.

Não uma revolução armada, não uma revolução violenta, mas uma revolução

enquanto doutrina política. Uma revolução que conduza ao socialismo. Uma

revolução que traga a classe trabalhadora ao poder. Esse poder alcançado

pela classe dos trabalhadores geraria a abolição de todas as classes, porque

se todos os meios de produção de capital coletivos fossem possuídos e

controlados pelos trabalhadores as classes não existiriam mais.

Deve ser formada uma classe com cadeias radicais, uma classe na sociedade civil que não é uma classe da sociedade civil, uma classe que é a dissolução de todas as classes, uma esfera da sociedade que possui um caráter universal porque seus sofrimentos são universais, e que não reivindica uma compensação particular, porque a injustiça que lhe foi feita não é uma injustiça particular, mas a injustiça em geral. Deve ser formada uma esfera da sociedade que não reivindica um status tradicional, mas apenas um status humano (...) Esta dissolução da sociedade, como uma classe particular, é o proletariado (EAGLETON, 1999, p. 47 in Contribuição à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel)

Marx (1985) entendia como sendo o proletariado a última classe

histórica, porque se essa classe chega ao poder, se os trabalhadores assumem

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uma sociedade onde todos são trabalhadores, então não se faz mais parte de

uma classe particular, mas sim todos de comum acordo construindo e

produzindo a vida social. Marx aponta ainda como ápice dessa vida social o

estágio mais desenvolvido da sociedade denominado comunismo, onde a

produção será feita em abundância para ser usufruída por todos, como num

fundo comum de recursos. Retira-se somente para sua necessidade

promovendo assim a igualdade.

Antonio Gramsci (1954) na sua reflexão sobre o político permeia a ideia

do principio da totalidade. O político e o social para Gramsci não são

desvinculados das questões econômicas, ou seja, da relação entre a infra e a

superestrutura. No entanto Gramsci não entende a política como sendo um

reflexo da economia, mas como mediação entre a produção material e a

reprodução da vida humana.

As políticas públicas que medeiam à divisão do trabalho têm por fim

libertar o homem das necessidades e assegurar-lhe uma vida feliz em sua

existência na terra: a boa organização da existência própria considerada

fundamental é o objetivo da política. As políticas são um estabelecimento de

prioridades que dão o norte as políticas societárias. As políticas públicas são

princípios constitutivos que constituem um país e sua organização societária.

A articulação entre Estado e nação tem sido cada vez mais difundida

pela Expressão Estado-Nação. E é neste contexto que o papel da escola

pública foi decisivo nos dois últimos séculos. A escola e as políticas educativas

nacionais foram muitas vezes instrumentos para ajudar a nivelar ou a unificar

os indivíduos enquanto sujeitos jurídicos criando uma igualdade meramente

formal que serviu para ocultar e legitimar a permanência de outras

desigualdades.

Saviani (1983) demonstra, na área da teoria educacional, as relações

existentes entre a educação e a política. Afirma que a interferência que ocorre

de uma com a outra e sua inversão (política na educação e educação na

política), só é percebível quando se concebem as suas distinções e

especificidades.

No entanto, alerta para o fato de que a dimensão política da educação

não se separa da especificidade da prática pedagógica. Em resumo poderia se

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afirmar que na atividade docente convergem duas dimensões que mantém a

estrutura social: o saber educacional e o saber político.

A partir dessa análise de Dermeval Saviani (1983, p.92): “as relações

entre educação e política se dão na forma de autonomia relativa e dependência

recíproca” é possível entender que com a educação estando subordinada à

política, e por sua vez a política exercendo uma função educativa, essa acaba

por reduzir a autonomia da educação.

Pensando a política como texto e discurso Stephen Ball parte do

pressuposto de que as políticas estão em movimento permanente e são

compreendidas e caracterizadas por sua complexidade e elementos instáveis

contraditórios. Ball (1993) faz uma diferença entre os conceitos de “política

como texto” e “política como discurso”. Segundo ele, a política como texto

baseia-se na teoria literária, e esses textos apontaram uma pluralidade de

leituras se levarem em consideração que todo leitor é também plural. Já no que

diz respeito a política como discurso Ball (1993) explicita que os mesmos

incorporam os significados e estabelecem limites sobre o que se pode pensar e

com isso tem o efeito de distribuir vozes que poderão ser ouvidas ou não,

dependendo de sua legitimidade e autoridade.

Pode-se refletir que neste cenário de interesses e poder alguns

discursos serão dominantes e haverá possibilidades de ideias e conceitos

sendo construídos e excluídos, ou seja, ideias e conceitos de políticas põem-se

em movimento sendo aprovadas e reprovadas por quem as escreve, executa e

sofre sua imputabilidade, então a análise de uma política seja ela qual for não

pode prescindir do jogo político em que ela foi concebida.

Para analisar uma política pública é preciso identificar os diversos

grupos societários envolvidos no processo político das políticas e considerar as

formas de relação existente. Assim estabelece-se um contexto onde as

políticas se movem e as divergências acontecem. Mainardes, (2009) supõe que

os textos políticos guardam em si a contradição e precisam ser lidos

historicamente, pois não findam no momento legislativo.

Faz-se importante a partir dessa reflexão entender a política em como se

move dentro dos mais variados contextos e as transformações que sofre

enquanto se move.

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Mais importante ainda, se faz, a forma como o recorte é feito na hora em

que os pesquisadores propõem-se a incursionar em alguma reflexão acerca

das políticas que movem os espaços da sociedade. Como fazer esse recorte

no tempo e no espaço? Entendemos que a limitação pode ser feita de acordo

com o que se pretende avançar em termos de aprofundamento de pesquisa.

O Estado Capitalista não tem interesse em acabar por definitivo com as

mazelas que geram a desigualdade, mas tão somente administrar esses

conflitos gerados por ela mesma. O que por si só, constitui-se uma contradição.

As políticas Sociais são os elementos que o Estado utiliza para mascarar os

interesses capitalistas de mero acumulo de capital e mantenedor da classe que

trabalha submissa.

Quando incursionamos nas políticas educacionais, podemos perceber

que as mesmas até certo tempo atrás expressavam uma determinada

autonomia mesmo que essa autonomia fosse reflexo das relações com as

classes dominantes.

Ressignificar o humano em sua dimensão de cidadania é o grande

desafio das políticas públicas educacionais. A expansão dos direitos sociais,

econômicos e culturais são possibilitadores para a cidadania através das

políticas educacionais, no entanto, ainda muito dessas políticas educacionais e

públicas estão somente escritas e as leis não se cumprem.

As políticas educacionais de descentralização implantados nos

diferentes países nas últimas duas décadas constituem-se em elementos

fundamentais do processo de reforma global do Estado na América latina, que

redefine as funções do Estado e privatiza as relações sociais no interior do

sistema público de ensino, tornando mais complexo o quadro de

institucionalização de estruturas pública e privada no âmbito de educação.

Possibilitar a sociedade autodominar o seu desenvolvimento é um dos

grandes papéis da educação. Sempre as políticas educacionais são públicas.

São públicas antes de serem educacionais.

Um dos marcos institucionalizadamente histórico das políticas públicas

brasileiras na busca do resgate de valores democráticos é o advento da

Constituição Federal de 1988, especificamente em seu artigo 227, estruturado

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posteriormente pela lei 8069/90 tornando-se o Estatuto da Criança e do

Adolescente.

As políticas voltadas ao criminoso no século XIX e início do século XX

prescreviam rapidamente e a sua segregação da sociedade era um meio de

garantir a segurança social. Avaliava-se a eficiência por seu grau de punição e

o rigor da vigilância, porém hoje se procura a harmonia e a integração social.

Da mesma forma as políticas que permeavam a questão do menor eram

códigos que visavam somente suprir a ausência da família ou a correção, cria-

se uma lei que lança um olhar específico e diferente. O olhar do

reconhecimento protetivo dos direitos da criança e do adolescente.

Como ser humano inacabado, em desenvolvimento pleno social o

adolescente em conflito com a lei é um indivíduo que rompe com normas e

regras, ou seja, rompe com o pacto social. Para tanto protagonizar ações

jurídicas e políticas de responsabilidade do Estado pela vitimização dos

adolescentes em cumprimento de medidas sócio-educativas se torna

fundamental, para a melhoria das condições de vida a que estão submetidos os

adolescentes em seu cotidiano.

A primeira lei que surge para regularizar as políticas para o menor foi o

Código Mello Mattos de 1927, ou Código de Menores. Este foi inovador em sua

época, pois trazia a transformação de um código voltado para as questões da

culpabilidade para a análise sob uma perspectiva educacional. Começa nesse

código a responsabilidade do Estado para com os menores que não possuíam

condições através de suas famílias de ter uma vida digna.

A partir de 1964 vive-se uma fase em que se instrumentaliza de fato a

intervenção pública sobre os menores (em situação irregular) através de uma

política nacional articulada de institucionalização a partir da PNBEM (Política

Nacional do Bem-Estar do Menor) de 1964 aplicada pela FUNABEM (Fundação

Nacional do Bem-Estar do Menor) através da FEBEM em que se consolida a

Doutrina do Código de Menores de 1979.

Durante a década de 80 houve grandes debates em torno da

permanência das questões sobre situação irregular e a nova forma de política

social denominada Doutrina da Proteção Integral. Como o Brasil passava por

um momento de redemocratização a sociedade se mobilizou em torno da nova

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ideologia que já vinha sendo disseminada através da Constituição de 1988.

Trata-se de um período onde se ganha o reconhecimento da condição

de sujeitos de direitos através da Constituição de 1988, que irá se efetivar

principalmente no ECA – (Estatuto da criança e do Adolescente).

Forte mobilização social, redefinições e atribuições de responsabilidade

entre o público e o privado marcam também esse novo período. Desvincula-se

o estado da totalidade da obrigação social. Estabelece-se uma nova dinâmica

de intervenção onde não mais o poder público é o único responsável, mas

também a sociedade com a incorporação dos artigos 227 e 204 da constituição

federal.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) surge diante de uma

conjuntura no tocante a normativa e mobilização em torno da infância. Criam-

se duas divisões para a aplicação das medidas distinguindo os adolescentes

até 12 anos incompletos e de 12 a 18 anos de idade. Passa-se a focalizar o

atendimento aos menores pelas políticas públicas que atendam ao Estatuto em

vigência (ECA).

Importante ressaltar que quando falamos em direitos das crianças e

adolescentes estamos automaticamente falando dos direitos simples de

cidadão, ou seja, os direitos de vida, os direitos humanos. Quando falamos em

direitos humanos, falamos de todos os direitos que constituem o ser humano

em todas as suas dimensões. Sem o acesso a todos os direitos, não é possível

uma vida plena. Como afirmam SILVA e FERREIRA, (2010, p. 73) “todos

nascem com iguais direitos fundamentais, independentemente de qualquer

característica diferencial ou origem social”.

3.1 Políticas educacionais na década de 90.

Durante a investigação sobre políticas, e em específico as declarações

de 1990 – JOMTIEN – TAILANDIA (Educação Para Todos), 1993 – NOVA

DEHLI (EPT), 2000 – RECIFE (EPT), 2000 - DAKAR (EPT) e as Regras e

Diretrizes das Nações Unidas em matéria de adolescentes em conflito com a

lei, percebeu-se que não era possível deixar de analisar também outros

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movimentos e outras Declarações que compunham o cenário das Políticas

Públicas Educacionais que antecedem a Declaração de Jomtien, aqui

considerada como marco principal, e as que seguem após esta Declaração.

Permeia essa discussão a DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS

HUMANOS, as CONFERÊNCIAS REGIONAIS REALIZADAS PELA UNESCO

em 1960, a Lei de Diretrizes e Bases de 1961, o PROJETO PRINCIPAL DA

EDUCAÇÃO PARA AMÉRICA LATINA E CARIBE de 1980, o PROGRAMA

REGIONAL PARA ERRADICAÇÃO DO ANALFABETISMO NA AFRICA de

1980, o PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PARA TODOS NA ASIA E NO

PACIFICO (APPEAL), 1980, o PROGRAMA REGIONAL PARA A

UNIVERSALIZAÇÃO E RENOVAÇÃO DA EDUCAÇÃO PRIMÁRIA E A

ERRADICAÇÃO DO ANALFABETISMO NOS ESTADOS ARABES NO ANO

2000 (ARABUPEAL) de 1980, a CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA de 1988, o

Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990, o PLANO DECENAL DA

EDUCAÇÃO – BRASIL de 1993, a Declaração de SALAMANCA

(NECESSIDADES ESPECIAIS) de 1994, a LDB de 1996, as REGRAS DE

BEIJING, as REGRAS DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A PROTEÇÃO DE

JOVENS PRIVADOS DE LIBERDADE, as DIRETRIZES DE RIAD, bem como

as regras previstas na Convenção sobre os Direitos da Criança.

O ideário da Educação para Todos tem seu ponto de partida muito antes

de sua Declaração em 1990. Podemos situar como marco das renovações das

políticas públicas internacionais a Declaração Universal dos Direitos Humanos

em 1948. Dentre seus 30 artigos o artigo que aqui se faz necessário para a

compreensão das questões a serem abordadas é:

Art. XXVI 1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. 2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz. 3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos. (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, 1948)

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Verifica-se através da análise dos documentos citados que esses três

incisos estão neles refletidos. Em um rápido incurso histórico vamos entender

de que tratavam essas políticas especificamente.

A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a

Cultura (UNESCO) fundou-se oficialmente em 1946 e seu objetivo maior é o de

contribuir para a construção da paz e da segurança no mundo através da

educação, da ciência e da cultura. As Conferências Regionais realizadas pela

UNESCO em 1960 são um marco no sentido de preservação do patrimônio

cultural da humanidade e na conferência geral realizada na Etiópia nesse ano a

proposta era a relocação de 22 monumentos e conjuntos arquitetônicos que

estavam no caminho do Rio Nilo.

No Brasil no governo de João Goulart foi criada a lei de Diretrizes e

Bases de 1961 que regularizava o sistema de educação com base na

Constituição Federativa. Nesse período dois grupos dividiam o cenário nacional

a respeito da filosofia a ser seguida na elaboração da LDB, sendo um os

estadistas, que seguiam os partidos de esquerda e o outro os liberalistas. Os

estadistas defendiam que somente ao Estado caberia o dever de educar,

enquanto os liberalistas reclamavam que não cabia ao estado garantir os

direitos ou negá-los, mas apenas respeitá-los, entendendo como um dever da

família a educação.

O Projeto Principal da Educação para América Latina e Caribe; O

Programa Regional para a Erradicação do Analfabetismo na África; O

Programa de Educação para Todos na Ásia e no Pacífico (APPEAL) e O

Programa Regional para a Universalização e Renovação da Educação Primária

e a Erradicação do Analfabetismo nos Estados Árabes no ano de 2000

(ARABUPEAL) de 1980 apresentavam um planejamento que previa seu

desenvolvimento em 20 anos com o objetivo principal de oferecer nesse

período uma educação mínima de 8 a 10 anos pra qualquer criança em idade

escolar e consequentemente eliminar o analfabetismo incentivando e

ampliando os serviços da educação para os adultos.

As Regras mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça

de Menores ou Regras de Beijing de 1985 é um dos documentos internacionais

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internalizados nos debates que levam a constituição do ECA. Seu principal

objeto é a prevenção a delinquência.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 foi

imensamente divulgada e conhecida como a Constituição cidadã, sendo a

sétima constituição do Brasil e elaborada em quase dois anos, a partir de

projetos oriundos da sociedade civil. Nessa constituição os direitos a cidadania

do povo brasileiro são inteiramente contemplados, como por exemplo, o

restabelecimento das eleições diretas, o direito ao voto pelos analfabetos, o fim

a censura que havia aos meios de comunicação e obras de arte entre outros.

Em 1988 as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da

Delinquência Juvenil ou Diretrizes de Riad reconhece a necessidade de

estabelecer estratégias e critérios nos âmbitos nacionais, regionais e

internacionais para a prevenção da delinquência juvenil e posteriormente

fundamenta as normas presentes no ECA.

Importante relembrar que a Convenção dos Direitos da Criança e o

Estatuto da Criança e do Adolescente de 1989 e 1990, como ditos em outro

local (MOCELIN, 2009, p. 49) tem uma história específica. O Estatuto vem para

“assegurar à criança o direito de ser criança, imprimindo uma conotação de

proteção desta criança na sua íntegra”. E ainda, “passa-se de objeto para

sujeito de direitos”. O que antecede o Estatuto é a Convenção que “repercute

um novo paradigma a ser incorporado pelas legislações internas dos países”.

As Regras das Nações Unidas para a Proteção de Jovens Privados de

Liberdade que foram promulgadas logo após o ECA em dezembro de 1990 tem

sua preocupação nas condições em que se encontram os jovens que são

privados de sua liberdade tendo em vista que os mesmos são muito

vulneráveis aos maus tratos e a violação de seus direitos. E ainda uma grande

preocupação com o fato de respeitar as diferenças entre um preso adulto de

um adolescente em cumprimento de medida socioeducativa.

Todavia existem muitas diferenças entre o preso adulto e o preso

adolescente que está, ainda, em formação, considerado em seu sentido amplo.

Ambos, o preso adulto e o preso adolescente, passam a fazer parte do sistema

por terem cometido algum delito e então a partir deste terem decretadas suas

penalidades a ser cumprida.

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O preso adulto passa a cumprir em regime de cárcere medidas punitivas

e de reclusão, enquanto o adolescente em conflito com a lei passa a cumprir

medida socioeducativa.

No que diz respeito ao sistema educacional, nosso foco de estudo,

dentro dos espaços de socioeducação e dos espaços de prisão podemos citar

suas formas diferenciadas, mesmo sendo ambas coordenadas pela EJA –

Educação de Jovens e Adultos.

Todo preso tem direito à educação, isso já é sabido, e as Leis ou planos

que garantem esse direito são a Constituição Federal, a Lei de Execução Penal

- LEP, o Plano Nacional de Educação e logicamente a Lei de Diretrizes e

Bases da Educação nacional (Lei 9394). No espaço penitenciário a partir de

2011 com a Lei nº 12.43313, (que altera a LEP) um novo incentivo ao estudo foi

13

LEI Nº 12.433, DE 29 DE JUNHO DE 2011. Altera a Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984

(Lei de Execução Penal), para dispor sobre a remição de parte do tempo de execução da pena por estudo ou por trabalho. A PRESIDENTA DA REPÚBLICA. Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1

o Os arts. 126, 127, 128 e 129 da Lei

no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passam a vigorar com a seguinte

redação: “Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena. § 1

o A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:

I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar - atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo, em 3 (três) dias; II - 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho. § 2

o As atividades de estudo a que se refere o § 1

o deste artigo poderão ser desenvolvidas de

forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados. § 3

o Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo

serão definidas de forma a se compatibilizarem. § 4

o O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos

continuará a beneficiar-se com a remição. § 5

o O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso

de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação. § 6

o O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade

condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1

o deste artigo.

§ 7o O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar.

§ 8o A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.”

“Art. 127. Em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar.” (NR) “Art. 128. O tempo remido será computado como pena cumprida, para todos os efeitos.” (NR) “Art. 129. A autoridade administrativa encaminhará mensalmente ao juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam trabalhando ou estudando, com informação dos dias de trabalho ou das horas de frequência escolar ou de atividades de ensino de cada um deles.

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dado. Essa Lei prevê a redução da pena, o que já ocorria com relação a dias

trabalhados. Segundo essa lei a cada 12 horas de frequência escolar o preso

tem um dia a menos de pena a cumprir. Essa lei inclui o Ensino Fundamental,

Médio, Profissionalizante, Superior e também cursos de Requalificação

Profissional. Em relação ao trabalho, a cada três dias de trabalho o preso tem o

desconto de um dia. Assim um preso que trabalhe e estude pode a cada três

dias de detenção adquirir a remição de dois.

No sistema de socioeducação estudar não funciona como remição de

pena. Estudar é um direito do adolescente (ECA, art. 124, XI – Receber

escolarização e profissionalização), portanto automaticamente ao fazer parte

do sistema o adolescente estará frequentando as classes escolares no sistema

de EJA. No que diz respeito a trabalho o adolescente estará fazendo oficinas e

cursos para profissionalizar-se para quando sair estar qualificado para algum

trabalho.

No entanto, alguns centros de socioeducação no Paraná não trabalham

conforme a letra da Lei. E é possível encontrar locais de socioeducação que

não deixam por vezes que a escola cumpra seu papel de escolarização dentro

dos espaços socioeducativos. Pode-se perceber que pela ausência de

formação específica dos profissionais da socioeducação, no que diz respeito a

função específica dos educadores sociais as regras são feitas não de acordo

com a lei e com os padrões do SINASE, e sim de acordo com “achismos

correcionais” guiados pelo ideal de moralização impostos pela sociedade do

que é certo ou errado. Esses “achismos correcionais” tem funcionamento

específico de acordo com a idade de quem está aplicando o atendimento ao

jovem, seu tempo de casa e entre tantos outros, principalmente com a sua

ideologia particular de vida. Isso ocorrendo pode levar os educadores a

decidirem deixar os meninos e as meninas sem escolarização, ou seja,

§ 1

o O condenado autorizado a estudar fora do estabelecimento penal deverá comprovar

mensalmente, por meio de declaração da respectiva unidade de ensino, a frequência e o aproveitamento escolar. § 2

o Ao condenado dar-se-á a relação de seus dias remidos.” (NR)

Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 29 de junho de 2011; 190o da Independência e 123

o da República.

DILMA ROUSSEFF/ José Eduardo Cardozo/Fernando Haddad

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trancados em seus “quartos-celas” como forma de punição para alguma

disciplina que tenha aos seus olhos, sofrido uma infração.

No que diz respeito às diferenças entre os jovens em conflito com a lei e

o adulto preso, é correto afirmar que são homéricas, pelo menos, no que diz

respeito à redação das normas, das leis e das funções que devem ser

exercidas, no entanto, na prática assim como o ECA está longe de ser

efetivado em sua íntegra, a escolarização no sistema de socioeducação deixa

de ser exercida em suas mais profundas peculiaridades, dando lugar ao que os

que prestam atendimento a esses jovens acreditam ser correto.

Os sistemas deveriam respeitar as especificidades de cada um, no

entanto sabemos que muitos sistemas não fazem essa diferença nos mais

variados estágios da administração da justiça quando, por exemplo, mantém o

jovem detido em uma prisão ou outros estabelecimentos junto com adultos. As

regras das Nações Unidas para a Proteção de Jovens Privados de Liberdade

preveem que um adolescente receber a medida de privação de liberdade deve

ser uma medida de último recurso e também que essa restrição de liberdade

seja por um período mínimo necessário. Diferentemente do preso adulto o

adolescente em conflito com a lei e privado de liberdade pode ter sua libertação

antecipada, no intuito de combater os efeitos nocivos que sua detenção possa

causar e contrariamente promover a sua integração na sociedade.

O Plano Decenal da Educação – Brasil de 1993 foi elaborado com a

intenção de ser um guia na recuperação da educação básica brasileira,

inspirado nos ideais da Educação para Todos de 1990. O Plano propõe metas

a serem atingidas no sentido de reconhecer e valorizar o trabalho do magistério

e a responsabilidade de todos os agentes do processo educativo da União, dos

Estados e Municípios.

A Declaração de Salamanca (Necessidades Especiais) de 1994

considerando também o ideal de Educação para Todos, propõe regras padrões

sobre equalização de oportunidades para pessoas com deficiências, tornando o

Estado o assegurador da educação de pessoas com deficiência como parte

integrante do sistema nacional.

Obviamente que todas essas transformações que vinham ocorrendo

nacional e internacionalmente acabam por influenciar o debate e a elaboração

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do que culminou em uma reestruturação da LDB em 1996. A LDB de 1996

frente a nova realidade educacional brasileira traz como principal questão a

ampliação dos recursos para a educação pública e de qualidade.

Após esse incurso identificando os principais apontamentos das políticas

educacionais da década de 90 é necessário retomar a Conferência de Jomtien.

A Declaração de Jomtien é um documento elaborado na Conferência

Mundial sobre Educação para Todos, na Tailândia, em 1990. A Declaração

fornece definições e novas abordagens sobre as necessidades básicas de

aprendizagem, tendo em vista estabelecer compromissos mundiais para

garantir a todas as pessoas os conhecimentos básicos necessários a uma vida

digna, visando uma sociedade mais humana e mais justa. A Declaração de

Jomtien é considerada um dos principais documentos mundiais sobre

educação, ao lado da Convenção de Direitos da Criança (1989) e da

Declaração de Salamanca de 1994. De acordo com a Declaração:

Cada pessoa - criança, jovem ou adulto - deve estar em condições de aproveitar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de aprendizagem. Essas necessidades compreendem tanto os instrumentos essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de problemas), quanto os conteúdos básicos da aprendizagem (como conhecimentos, habilidades, valores e atitudes), necessários para que os seres humanos possam sobreviver desenvolver plenamente suas potencialidades, viver e trabalhar com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de vida, tomar decisões fundamentadas e continuar aprendendo. (DECLARAÇÃO DE JOMTIEN, 1990.).

A ascensão da visão de cidadania universal proclamada pela burguesia

em contraposição aos privilégios feudais da Idade Média representou também

a ascensão da ideia de educação universal. Com isso as Conferências tinham

como objetivo a promoção da expansão da educação e a promoção da

qualificação profissional dos trabalhadores para que pudessem estar aptos a

serem incorporados ao setor produtivo. Com esse pensamento percebem-se

claramente as questões do ideário neoliberal. O neoliberalismo sugere uma

retomada de aspectos do liberalismo clássico (sec. XVIII-XIX) que teve como

principais teóricos: Adam Smith e David Ricardo na dimensão econômica e,

John Locke e outros na dimensão filosófica e política. A característica geral do

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liberalismo é acentuar que a sociedade civil é o espaço do livre

desenvolvimento da individualidade na perspectiva do individualismo como

categoria central de onde todas as demais se originam e das ações

econômicas enquanto o Estado representa a vontade comum e garante as

liberdades individuais.

Opondo-se também as ideias neoclássicas, Keynes faz ressurgir o

liberalismo, sob a denominação de neoliberalismo ameaçado com as

revoluções do oriente a partir do inicio do século XX defendendo que os

mercados livres ofereceriam emprego de forma automática aos trabalhadores

desde que eles fossem flexíveis na procura salarial.

A ideologia liberal, segundo HORTA, (1983, p. 198) “estabelece uma

série de princípios e categorias, que configuram a ideologia que expressa e

justifica o domínio das classes burguesas na sociedade moderna”. São esses

princípios “o individualismo, a liberdade, a igualdade, a propriedade, a

segurança e uma nova concepção de justiça”. Todavia todos esses princípios

partem da primeira categoria que é o individualismo da qual e para a qual se

destinam todas as demais.

O individualismo atua contrariamente ao homem na sua totalidade. Isso

significa estar contrário a uma educação omnilateral ao qual acreditamos ser o

melhor modelo para a construção de uma sociedade com cidadãos

emancipados e livres. Nos Manuscritos de 1844 de Marx mesmo não tendo

uma definição mais precisa sobre o conceito de ominilateralidade, podemos

perceber que ele sempre se refere ao omnilateral como a ruptura dessa

formação do ser social unilateral, egoísta, mesquinho e perpetuador dos

preceitos da vida social burguesa. “La más grande de las riquezas, (es) el outro

hombre”. (MARX e ENGELS, 1987, p. 624).

Concordando com FERREIRA, (2000, p. 168) entende-se que “o

individualismo, cujas coordenadas filosóficas podem ser encontradas na

Renascença, pulveriza as necessidades políticas e sociais e condiciona, em

função do indivíduo, a transformação das instituições e das finalidades

coletivas”. Faz-se necessário colocar a educação a favor da construção do

homem pleno e gozando de sua cidadania para a partir de seu benefício

individual proporcionar o altruísmo, as ações coletivas para o bem, e construir

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uma sociedade mais justa, mais humana, mais comprometida com o outro.

Através de uma educação omnilateral possibilitar a vivência um pouco melhor

entre cada um, e entre todos, partindo do princípio de que a complexidade da

sociedade pode ser incorporada e modificada para uma constante evolução.

Conforme FERREIRA, (2002, p.252),

A luta pela humanização reclama por um novo internacionalismo, não o velho internacionalismo de classe, mas antes um novo internacionalismo de cidadania, de solidariedade, de participação, assentado nos princípios da democracia de base, de autogestão, do direito à diversidade e à individualidade, da autonomia, da emancipação.

Da individualidade ao Individualismo; do individualismo ao altruísmo; do

altruísmo à autonomia; da autonomia à liberdade, e, da liberdade a

humanização.

Às ideias de Keynes vem corroborar, em 1947 na Suíça, Hayek e

Friedman com suas teorias de estado mínimo e livre concorrência, formando o

grupo responsável pela Ideologia Neoliberal que invade o mundo na tentativa

de recuperar os danos da depressão de 1929, ficando, assim conhecidos como

os principais formuladores desta ideologia. A ideia principal ou fundante é a de

que a única ação reguladora possível para as políticas seriam as leis do

mercado.

A primeira experiência neoliberal sistematizada no mundo, além da

influência que disseminou em todo globo terrestre e desenvolvimento acelerado

os países chamados desenvolvidos, foi no Chile nos anos 70 sob a ditadura de

Pinochet, o que causou de imediato a desregulação do mercado, o

desemprego em massa, a repressão sindical por parte do governo, a

redistribuição de renda em favor dos ricos, a privatização de bens públicos

entre outros elementos. No entanto o primeiro país de regime capitalista

avançado, publicamente empenhado em pôr em prática o programa neoliberal

foi à Inglaterra com o governo Thatcher, no final da década de 70. As principais

medidas do governo Thatcher foram: diminuir a emissão monetária; baixar os

impostos sobre os altos rendimentos; aumentar as taxas de juros como medida

contra a inflação; abolir o controle sobre os fluxos financeiros; criar uma nova

legislação sindical e medidas anti-greve, que acompanhou o aumento dos

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níveis de desemprego e privatizar indústrias básicas: aço, energia elétrica,

água e petróleo. A Inglaterra fora seguida pelos EUA com Reagan em 1980,

por Kohl na Alemanha em 1982 e todos os demais países na sequência.

As características principais que identificam as políticas neoliberais são

inúmeras, no entanto entre elas podemos destacar a mínima participação

estatal nos rumos da economia do país com pouca intervenção do governo no

mercado de trabalho; livre circulação de capitais internacionais; abertura para

multinacionais; aumento da produção para atingir o desenvolvimento

econômico e principalmente defesa dos princípios básicos do capitalismo.

Esses princípios básicos do neoliberalismo regem as tendências educacionais

das últimas décadas que estabelecem como metas para o desenvolvimento

dos sistemas educacionais a escolarização mínima de quatro anos; a

erradicação do analfabetismo; a eliminação da pobreza; a redução da

disparidade entre os gêneros; as minorias étnicas; a atenção especial na

Educação Infantil e outras.

Com a globalização da economia, caem às barreiras a investimentos

externos, amplia-se a livre concorrência, o individualismo se torna mais

exacerbado, os sindicatos modificam suas práticas e se programa a

desregulamentação do trabalho que amplia o desemprego e instaura o

emprego precário e flexível, o maior sucesso da política neoliberal.

Outra questão fundamental é a influência das Agências Internacionais

em todo o mundo, mas principalmente nos países subdesenvolvidos e em

países como o Brasil o impacto das agências internacionais sobre as políticas

educacionais também se mostra de suma importância para a análise da

educação. Segundo a UNESCO, o panorama educacional no mundo, em 1990,

é o seguinte:

Mais de 100 milhões de crianças, das quais, pelo menos, 60 milhões são meninas, não têm acesso ao ensaio primário; Mais de 960 milhões de adultos, dois terços dos quais mulheres, são analfabetas, e o analfabetismo funcional é um problema significativo em todos os países industrializados ou em desenvolvimento; Mais de um terço dos adultos do mundo não têm acesso ao conhecimento impresso, às novas habilidades e tecnologias, que poderiam melhorar a qualidade de vida e ajudá-los a perceber e a adaptar- se às mudanças sociais e culturais; Mais de 100 milhões de crianças e incontáveis adultos não conseguem concluir o ciclo básico, e outros milhões, apesar de

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concluí-lo, não conseguem adquirir conhecimentos e habilidades essenciais. (DECLARAÇÃO DE JOMTIEN, 1990).

Este contexto de fracasso do sistema educacional, cujo documento foi

publicado a partir da Conferência Mundial de Educação para Todos, expressa a

centralidade desses organismos internacionais na influência sobre as políticas

governamentais para educação mundial. Este evento constitui um marco

importante no panorama mundial sobre o direito de educação para todos, pois

as nações signatárias comprometeram-se a promover a universalização da

Educação Básica, aumentar o impacto das diretrizes internacionais nas

políticas públicas educacionais brasileiras e a erradicação do analfabetismo

como componentes estratégicos para o combate à pobreza e à exclusão social.

É importante entender o papel que certos organismos internacionais têm no

desenvolvimento nos países pobres e sua influência sobre suas políticas

públicas. Entre os organismos internacionais ligados à ONU, merece maior

destaque no desenvolvimento das diretrizes ou no incentivo ao

desenvolvimento da Educação a participação da UNESCO, do UNICEF, do BM

e do PNUD.

A Conferência Mundial de Educação para Todos, realizada em 1990 na

Tailândia, contou com o patrocínio do Banco Mundial, da UNESCO, da

UNICEF e PNUD e teve como objetivo oferecer diretrizes à redefinição das

políticas públicas dos países membros da ONU no âmbito da Educação na

última década. Deste evento mundial, resultaram posições consensuais,

principalmente dos nove países com maior taxa de analfabetismo e maior

contingente populacional do mundo: o “E9”, isto é, os nove países que

assinaram a Declaração de Nova Délhi, que são: Indonésia, China,

Bangladesh, Brasil, Egito, México, Nigéria, Paquistão e Índia.

A grande preocupação dos Organismos Internacionais ligados à ONU,

formuladores de políticas sociais, vem se estabelecendo em termos da redução

das desigualdades sociais, através de uma melhor distribuição de renda. Nesse

sentido, o investimento na educação básica é primordial para que esse objetivo

seja alcançado. A partir da década de 1990, as discussões sobre o papel das

Agências Internacionais na educação brasileira têm concentrado a sua análise

sobre a ação do Banco Mundial, pelo fato de este ser o maior patrocinador de

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investimentos financeiros nas políticas públicas educacionais, no entanto,

outras agências não menos importantes, como o UNICEF e o PNUD, com

características, objetivos e organizações diferentes do Banco Mundial têm

contribuído na valorização da educação básica dos países emergentes.

Outro órgão internacional, que vem provocando impacto nas políticas

educacionais dos países em desenvolvimento, é o Fundo das Nações Unidas

para Infância (UNICEF), que tem como maior foco de sua ação, a erradicação

da pobreza mundial. Este órgão da ONU foi fundado em 1946, logo após a

criação da ONU, para atender às necessidades urgentes de crianças da

Europa e da China no Pós-guerra e, em 1950, tornou-se o órgão permanente

do Sistema das Nações Unidas. Em 1990, a sua ação internacional foi

ampliada para atender às crianças de todo o mundo em desenvolvimento.

É importante entender o papel que certos organismos internacionais,

principalmente aqueles promotores da “Conferência Mundial de Educação para

Todos”, exercem nas políticas educativas dos países latinos americanos. Entre

os organismos internacionais ligados à ONU, merece maior destaque a

participação do Banco Mundial. O BM é uma instituição que financia e maneja

operações de créditos, financiamentos e investimentos, envolvendo dinheiro

público e privado. O Banco Mundial, com sua estrutura de agência financeira

multilateral, comportando cerca de 180 países sócios, desempenha as funções

técnicas de financiador de projetos específicos, tanto para o setor público,

quanto para o setor privado.

A partir da década de 70, com a preocupação de erradicar a pobreza, o

BM começou a investir em educação básica e a incentivar os países em

desenvolvimento a concentrar os recursos públicos nos serviços sociais, pois

os mesmos são responsáveis por maiores benefícios sociais e econômicos

como forma de promover a diminuição da desigualdade social e aliviar a

pobreza. O Banco Mundial passou a partir desse período a produzir um

discurso convincente de caráter humanitário e que segundo FONSECA, (1998,

p. 47-48) era respaldado por princípios de sustentabilidade, de justiça e de

igualdade social, que podem ser assim resumidos:

a)O combate à situação de pobreza, mediante a promoção da equidade na distribuição na renda e nos benefícios sociais, entre os

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quais se destacam a saúde e a educação; b) a busca da eficiência na condução das políticas públicas, mediante o incremento da competência operacional dos agentes, cuja medida de qualidade seria a relação econômica de custo-benefício, em nível individual, institucional e social; c) a busca da modernização administrativa dos diferentes setores sociais e econômicos por meio de políticas descentralizantes, que ensejem maior autonomia da comunidade na condução dos serviços sociais; d) o diálogo como estratégia de interação interdependente entre o Banco e os mutuários.

Dessa forma o BM definiu as políticas para a liberação de créditos ao

setor. E começa a substituição gradativa do termo igualdade, pelo termo

equidade.

O Programa das Nações Unidas para Desenvolvimento (PNUD), outra

agência internacional, tem como objetivo medir os índices de desenvolvimento

humano na realidade de cada país em todo o mundo. Os relatórios da PNUD

oferecem importantes benefícios para a formulação de programas nas áreas

sociais, porque apresentam o panorama do desenvolvimento econômico

mundial através de diagnósticos da realidade dos diversos países.

A forte influência desses organismos, sendo mais influente o BM, que

funciona como instituição técnica e financiadora, tem sido o principal articulador

dos pacotes “educacionais”. As principais críticas a esses pacotes são em nível

de participação, resumindo-se, quase sempre, o poder de influência a um

grupo de especialistas que, na maioria das vezes, não são pedagogos e, sim,

técnicos, e caracterizando, por parte do Governo, ações autoritárias e

pseudodemocráticas por transparecer e constituir discurso de solução mágica e

de urgência para resolução de problemas que vêm se arrastando há décadas

nos países emergentes. Outro problema reside no fato de os pacotes serem

homogêneo, isto é, não atentarem para as desigualdades sociais, econômicas

e culturais, não respeitando, sobretudo as diversidades regionais de um país

como o Brasil.

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3.2 De “menor” a “adolescente em conflito com a lei”

O Brasil foi um dos grandes representantes, a partir da década de 1980,

de uma série de transformações em relação a busca de um atendimento a

crianças e adolescentes que contemplassem com maior propriedade a

promoção e a defesa dos direitos da infância e da juventude. Todavia a esse

movimento político não acompanhou investimentos de qualquer ordem na

educação e na formação para a cidadania da infância e da adolescência que

seria a melhor medida preventiva, pois conforme afirma Gramsci, referindo-se à

necessidade da formação intelectual e moral:

O critério metodológico sobre o qual se deve basear o próprio exame é este: a supremacia de um grupo social se manifesta de dois modos: como ‘domínio’ e como ‘direção intelectual e moral’. Um grupo social domina os grupos adversários, que visa a ‘liquidar’ ou a submeter inclusive com a força armada, e dirige os grupos afins e aliados. Um grupo social pode e, aliás, deve ser dirigente já antes de conquistar o poder governamental (esta é uma das condições para a própria conquista do poder); depois, quando exerce o poder e mesmo se o mantém fortemente em suas mãos, torna-se dominante, mas, deve continuar a ser também dirigente (GRAMSCI, 1978, p.275-276).

Assim, coloca a questão das relações entre poder e direção para que se

imprima uma nova concepção de Estado democrático onde a exclusão não

seja mais produzida conforme os dias atuais.

Todo o movimento gerado pelas entidades sociais e pela sociedade civil

culminou com a aprovação pelo Congresso Nacional e pela sanção do então

presidente da república Fernando Collor de Melo do Estatuto da Criança e do

Adolescente. Esse estatuto representava em 1990 uma lei a frente do seu

tempo que incorporava as normativas internacionais e a convenção

internacional dos direitos da criança aprovado pela ONU em 1989.

Trata-se definitivamente de compreender todas as mudanças de real

significância que aconteceram no panorama brasileiro acerca dos direitos e

deveres das crianças e dos adolescentes. A sociedade brasileira nos anos

finais da década de 1980 está mais atuante do que nunca em favor da

ampliação e defesa dos direitos e deveres das crianças e adolescentes, sendo

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capazes de produzir efetivamente alterações no processo de elaboração das

leis de todo o Brasil.

A primeira intervenção que ocorre é a criação de um capítulo

significativo sobre a criança e o adolescente, na Constituição Federal,

aprovada em 1988. Em seguida esses direitos foram aos poucos e de forma

mais detalhada ocupando espaço nas constituições dos Estados e nas leis

orgânicas dos municípios brasileiros. Com 22 artigos a mais do que na

Constituição, e escrita em seus mais profusos detalhes, surge a lei com 267

artigos que passou a denominar-se Estatuto da Criança e do Adolescente.

Esse movimento social dos brasileiros em suas mais diversas categorias

inaugurou a era do diálogo das políticas públicas para as crianças e os

adolescentes, inaugurou um tempo onde o que alimenta as esperanças de

melhoria da sociedade é o direito a ter direitos.

Pelo acima exposto percebe-se que as iniciativas de ordem legal foram

intensas quer em nível nacional, quer em nível internacional, não havendo

correspondência de ordem prática, isto é, as necessárias medidas que

efetivassem a política exarada em política em ação. Pouco se adiantou em

termos reais na execução destas políticas.

3.2.1 Histórico

Até o início do século XX na História das Políticas Sociais no Brasil não

existem ações que possam ser determinadas como políticas sociais. A

sociedade brasileira antes de 1900 tinha suas necessidades supridas pela

Igreja católica através das Santas Casas de Misericórdia que prestavam

atendimento aos pobres, aos idosos, aos abandonados e todo tipo de auxílio

aos menos favorecidos ajudados pelas irmandades e ordens de caráter

religioso que nesse período eram muito intensas. Em termos de respeito aos

direitos, é um momento onde o Brasil está começando a adaptar-se ao fim da

escravidão tornando mais dignos os cidadãos de sua nação.

No período que vai de 1900 a 1927 inaugura-se no Brasil um período de

lutas sociais, se assim pode-se definir. Em 1923 foi criada a Caixa de

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Aposentadoria e Pensões para os empregados das empresas ferroviárias

brasileiras, considerado o inicio da implantação da previdência Social no Brasil,

sendo criado no mesmo ano pelo governo o Conselho Nacional do Trabalho

que responderia diretamente pelas questões relativas a Previdência Social. Um

ano antes da crise dos Ferroviários em 1922 inaugura-se o primeiro local

público para o atendimento de “menores” do Distrito Federal que se localizava

no Rio de Janeiro. Em 1927 o Brasil destaca-se no cenário nacional e

internacional por criar o seu primeiro Código de Menores, pelo Juiz de menores

da capital da República Mello Mattos. Esse Código é o inicio da legislação

brasileira específica para menores de idade que tinha a intenção de

proporcionar à atenção devida as crianças e adolescentes em alguma situação

contrária a ordem nacional.

Nas duas décadas que se seguem até aproximadamente 1945 o Brasil

deixa de ser dominado pelo setor agrário derrubando suas oligarquias e

criando o chamado Estado Novo, um Estado autoritário que se utiliza das

políticas sociais para incorporar a classe trabalhadora aos projetos de uma

nova nação. Neste momento muitas reivindicações da sociedade foram

contempladas como a legislação trabalhista, a obrigatoriedade do ensino

básico e no que se refere ao atendimento das crianças e jovens em situações

contrárias a ordem nacional ou contravenção surge o SAM (Serviço de

Assistência ao Menor) em 1942, que funcionava como um sistema

penitenciário aos menores de idade. O SAM aplicava a política de repressão e

correção através de seus reformatórios e casas de correção denominados

internatos que atendia essa faixa da população autores de atos infracionais.

Outras entidades surgem neste período ligadas a Primeira Dama do Brasil

como a LBA (Legião Brasileira de Assistência). Entre tantos outros esses

programas tinham como objetivo oferecer a educação básica e o trabalho como

uma forma de geração de renda.

Nos 20 anos que seguem de 1945 a 1965 outras mudanças são

fundamentais no que diz respeito às políticas brasileiras. Inicia-se com o fim da

ditadura do Estado Novo e a promulgação da Carta Constitucional de 1946 de

inspiração liberal. Passam a existir duas formas de ver a administração pública.

Uma que quer aprofundar as conquistas sociais adquiridas até o momento em

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relação à população de baixa renda e de trabalhadores e a outra que não abre

mão do controle da burocracia estatal. Entre essas duas vertentes de

conservadores e reformistas o país sofre com a lentidão na resolução dos

processos de mudança. O melhor exemplo dessa burocracia é o tempo que

leva a reforma do Ensino através da Lei de Diretrizes e Bases que tramitou

pelo Congresso Nacional de 1948 a 1961. A luta entre o estado que era

corporativo e a sociedade que começa a organizar-se e participar politicamente

através dos segmentos populares terminam com a entrada da Ditadura Militar

em 1964, no entanto as manifestações populares e a consciência política

popular faz identificar nesse momento o SAM como um local desumanizante e

repressivo tornando-o condenado pela população.

A partir da ditadura militar até os anos de 1980 o Estado Nacional passa

por transformações significativas onde às políticas sociais não são mais um fim

em si mesmas, mas um meio para atingir os objetivos do atendimento às

necessidades da sociedade. Duas entidades nascem com muita força nesse

período. O BNH – Banco Nacional de Habitação que se une aos empresários

da construção civil e o INAMPS – Instituto Nacional de Assistência Médica da

Previdência Social que passa a manter as questões da saúde.

Para os direitos das crianças e dos jovens em situações irregulares o

Estado cria a Lei nº 4513/64 que estabelece a Política Nacional de Bem Estar

do Menor e a Lei nº 6697/79 – o Código de Menores reformulado de 1927 que

agora tratava da proteção e da vigilância dos menores em situação irregular.

Essas duas leis não só tratavam dos problemas que as crianças e os jovens

tinham com contravenções14, mas também com as crianças e jovens em

14

CONTRAVENÇÃO: Derivado do verbo latino contravenire (transgredir, infringir), numa

acepção geral, como contravenção se entende toda transgressão a preceito de lei, de um regulamento ou de um julgado ou toda infração às cláusulas de um contrato. Desse modo, a contravenção se mostra ato direto de desprezo ou de desrespeito ao que está instituído regularmente, com a intenção de não ser acatada, seja a regra legal, seja a cláusula estabelecida no contrato. Contravenção, assim, é sempre fundada na voluntariedade do agente, resulte de ação ou de omissão, pois que a transgressão tanto pode provir de uma como de outra. Silva, De Plácido e. Vocabulário Jurídico/atualizadores: Nagib Slaibi e Gláucia Carvalho – Rio de Janeiro, 2010. 28.ª Edição, Editora Forense. Páginas 380/381. CONTRAVENÇÃO PENAL: No sentido penal, a contravenção não se trata do significado fundamental do vocábulo: é a violação consciente e voluntariosa a preceito de lei ou direito de outrem, resulte de ação ou de omissão. O dano potencial indeterminado e a possibilidade de uma ação prejudicial ao direito alheio, mesmo sem a presença do dolo ou da culpa, são seus elementos constitutivos. A culpabilidade, em quaisquer de suas formas, dolo ou culpa. Somente é levada em consideração quando a lei faça depender de uma ou de outra algum efeito jurídico (Lei das Contravenções Penais, art. 3.º). Silva, De Plácido e. Vocabulário

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estado de necessidade quando os pais não tinham condições para mantê-los.

Assim as crianças e os adolescentes pobres passam a ser objeto da justiça dos

menores.

O que merece destaque em nossa análise é o fato de que nesse período

existia apenas uma única forma de tratar o menor carente, o abandonado e o

infrator. Todos se submetiam ao mesmo conjunto de medidas através da

PNBEM, a Política Nacional de Bem-Estar do Menor que estabelecia para toda

a nação uma gestão vertical e uniforme com mesmo conteúdo método e gestão

sem levar em consideração as regiões brasileiras e os tipos de incidência para

aplicação das políticas. O Órgão Nacional que controlava essa política era a

FUNABEM – Fundação Nacional de Bem-Estar do Menor e quem executava

nos estados eram as FEBEM(s) – Fundações Estaduais do Bem-Estar do

Menor.

As práticas de correção do SAM dão lugar a política de atendimento da

FUNABEM que não deu conta de não incorporar as práticas repressivas,

mesmo assim as crianças e adolescentes deixam de ser vistas como ameaça

social e passam a ser tratados sob o enfoque assistencialista percebendo-os

como carentes e necessitados. A ideia principal passa a ser a de restituir a

criança tudo que ele não havia tido condições de conseguir em sua vida e

relações sociais. A grande questão é que ao criar a FUNABEM, esta herdou

além dos materiais, prédios e equipamentos também o quadro de pessoal e

com eles a cultura organizacional repressiva.

Com a abertura democrática nos anos finais da década de 1970 e com o

movimento de educação progressista, que se desencadearam no Brasil, as

crianças deixam de ser vistas como carentes e surgem agora como sujeitos,

sujeitos que fazem parte da história e que são a própria história do seu povo.

Acontece, porém, que à medida que uma nova fase é suplantada por outra

seus resquícios não morrem por completo, assim a fase repressiva (SAM), a

fase assistencialista (FUNABEM) e a fase educacional (Educação

Progressista), passam a conviver e misturar-se num caleidoscópio de

sentimentos e ações que não conseguem se definir por uma linha única de

condução. Em contrapartida inicia-se um repúdio ético e político dos setores da

Jurídico/atualizadores: Nagib Slaibi e Gláucia Carvalho – Rio de Janeiro, 2010. 28.ª Edição, Editora Forense. Páginas 381.

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sociedade que simpatizam com as questões dos direitos humanos. Cada vez

mais os direitos humanos são colocados em evidência e aos poucos a

sociedade vai compreendendo que os direitos estão garantidos por normas

jurídicas ou por entenderem que tais direitos são inerentes ao indivíduo. São

inerentes não por serem concedidos pela norma jurídica, mais sim porque já

nascem com o homem, fazem parte da sua natureza e compõe a sua

dignidade.

Esse ciclo ao qual a criança e o adolescente se submetiam que passava

pela apreensão, triagem e confinamento passa a ser denominado como

perverso e ineficaz. Por ser inadequada a proposta, a FUNABEM inicia por

atender as crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social no

seu próprio local de origem, na sua comunidade, através de um programa

chamado PLIMEC – Plano de Integração Menor-Comunidade. Esse programa

primava por atender as crianças e adolescentes em sua própria comunidade no

intuito de não retirar alguma forma de participação desses jovens no sustento

da família. Mais uma vez a padronização do Plano fez com que não se

mantivesse, e seu insucesso conduziu a reflexões de que havia a necessidade

de mudanças mais efetivas, de legitimidade política e de participação social. No

final da década de 1970 o Brasil caminha para uma série de organizações

internas e independentes do Estado que de forma crescente vão se legitimando

perante a população, através das associações de bairro, grupos sindicais de

oposição, professores, funcionários públicos, mães, movimentos culturais com

grupos de teatro e música popular nas periferias, imprensa de bairro e a

participação efetiva da igreja através das pastorais conferem participação ativa

nos acontecimentos dos anos de 1980.

Em contraposição, a década considerada em processo de degradação

econômica, encontra-se nos anos de 1980 alguns avanços reais nas questões

políticas em direção ao estado democrático de direito. Mesmo com a crise

econômica assolando o país houve a eleição de um presidente civil e a

elaboração de uma nova Carta Magna com participação democrática de vários

segmentos da sociedade. Em todo país mudanças significativas vinham

ocorrendo e consequentemente na área do atendimento as crianças e

adolescentes não poderia ser diferente, e o que mais incomodava era a

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visibilidade dessas crianças e jovens ocupando as ruas e fazendo dessa seu

espaço para sobreviver. O menino de rua passa a figurar como símbolo da

infância e da adolescência, e não é só isso, por trás de cada menino de rua

figurava também a situação real dos milhares de brasileiros moradores das

periferias pauperizadas sem condições dignas de vida.

Nesse período da década de 1980 as lideranças aparecem como forte

aliadas no cenário nacional, representando a seriedade dos compromissos

políticos junto às crianças e adolescentes e formando um movimento social até

então inexistente. O fruto desse percalço político foi à criação da Coordenação

Nacional do Movimento Meninos e Meninas de Rua em 1985. Em 1986 em

Brasília aconteceu o I Encontro Nacional de Meninos e Meninas de Rua onde

os adolescentes e as crianças preparadas em suas Conferências municipais e

estaduais discutiram sobre saúde, trabalho, educação, direitos entre outros

temas. O I Encontro ficou marcado por ver em seus debates emergir a

denúncia constante da violação dos direitos do ser humano.

A criação desse movimento (MNMMR) tinha a intenção maior de levar a

ruptura dos paradigmas e a forma de atendimento prestada a criança e ao

adolescente de rua que era ofertado pela FEBEM. Após o I Encontro essa luta

pelos direitos da criança e do adolescente demonstrou que havia muitas

ideologias e composições da sociedade que entendiam que a única forma de

melhorar essa situação era fazendo com que houvesse um maior

comprometimento político por parte dos parlamentares. A partir de então com a

união de entidades políticas em prol da criança e do adolescente surge um

trabalho conjunto de alguns Ministérios do setor público federal como a

Educação, Previdência, Saúde e justiça, e a partir dessa união fora criada a

Comissão Nacional Criança e Constituinte, que tinha o objetivo de sensibilizar e

conscientizar a sociedade e os constituintes.

Desse movimento surgem duas emendas de iniciativa popular assinada

por mais de duzentos mil brasileiros que foram apresentadas à Assembléia

Nacional. No entanto, seus textos se uniram e entraram na íntegra do texto da

Constituição Federal no artigo 227, que dará origem ao estatuto da Criança e

do Adolescente, Lei 8069, aprovada e sancionada em 13 de julho de 1990.

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120

3.3 Política pública federal - ECA e a política de proteção: os direitos e

deveres da criança e dos adolescentes.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) está dividido em dois

livros que por sua vez é subdividido em Títulos e Capítulos.

O Livro I trata da Parte Geral com os Títulos I (Das Disposições

Preliminares), Título II (Dos Direitos Fundamentais) e Título III (Da Prevenção).

No Título II há ainda os capítulos I a V e no Título III os capítulos I e II.

O Livro II trata da Parte Especial com os Títulos I (Da Política de

Atendimento com dois capítulos), Título II (Das Medidas de Proteção com dois

capítulos), Título III (Da Prática de Ato Infracional com cinco capítulos), Título

IV (Das Medidas Pertinentes aos Pais ou Responsável), Título V (Do Conselho

Tutelar com cinco capítulos), Título VI (Do Acesso à Justiça com sete capítulos)

e o Título VII (Dos Crimes e das Infrações Administrativas com dois capítulos)

Além do ECA, existem outros instrumentos normativos de garantia de

direitos da criança e legislação complementar para a proteção integral. O

primeiro deles é a Constituição Federal de 1988, seguido da Resolução nº 113,

de 19 de abril de 2006 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do

Adolescente (CONANDA), que dispõe sobre os parâmetros para a

institucionalização e fortalecimento do Sistema de Garantia dos Direitos da

Criança e do Adolescente. Existem também os Dispositivos da Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9394, de 20 de dezembro de

1996; os Dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho – Decreto-Lei n º

5.452, de 01 de maio de 1943; o Decreto nº 6.481, de 12 de junho de 2008 –

trata da proibição das piores formas de trabalho infantil e ação imediata para a

sua eliminação; os Dispositivos do Código Penal – Decreto – Lei nº 2.848, de 7

de dezembro de 1940 e suas atualizações e o Dispositivo da Lei nº 9.455/97 –

Lei da Tortura que define os crimes de tortura e dá outras providências.

No Paraná os instrumentos normativos de Garantia de direitos da

criança e do adolescente são a Lei nº 9.579, de 22 de março de 1991 do

Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Paraná que

dispõe sobre a criação, organização e competência do Conselho Estadual dos

Direitos da Criança e do Adolescente (Cedca-Pr); a Secretaria de Estado da

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Criança e da Juventude que passou a ser a Secretaria da família e do

Desenvolvimento social com a Lei nº 15.347 de 22 de dezembro de 2006 que

dispõe sobre sua criação, a Lei nº 15.604 de 15 de agosto de 2007 que altera a

nomenclatura da secretaria e extingue o IASP – Instituto de Ação Social do

Paraná e o Pacto pela Infância e Juventude que dispõe sobre a proteção às

crianças e a oportunidade aos jovens.

Todas as leis e normativas são importantes para estabelecer a visão

completa sobre a política de proteção, ou seja, os direitos e os deveres das

crianças e adolescentes.

Uma lei representa um consenso social sobre uma determinada questão. Uma lei garantista de direitos existe, acima de tudo, para assegurar os preceitos de igualdade e justiça social. No caso do ECA expressa um projeto societário que considera a criança e o adolescente como sujeito social de direito e consequentemente de deveres pelo exercício desses direitos. Um conceito aparentemente simples, mas que reúne uma grande complexidade e responsabilidade em sua aplicação. Quanto mais perto se chega do previsto nesta lei, mais perto do cuidado e do respeito para com nossas crianças, e, sobretudo, mais perto da construção de sua cidadania. (SECJ, 2010, p.9)

No entanto é preciso lembrar que para a efetivação da proteção integral

não basta aplicação única de uma lei, no caso o ECA, mas sim da atuação

conjunta de professores, universitários, atores do sistema de garantia de

direitos, advogados, família, comunidade, poder público e sociedade em geral.

O Estatuto revogou o Código de menores estabelecendo a doutrina da

proteção integral, no entanto, além de prever a proteção integral, o ECA elevou

o adolescente a uma categoria de responsabilização pelos seus atos

considerados infracionais e determinou a aplicação das medidas

socioeducativas. Esse período que se iniciou em 1959 inaugura um processo

de responsabilidade juvenil e com ele os termos de participação, separação e

responsabilidade ganham força e poder.

O ECA vem para abranger toda criança e adolescente em todas as

situações de sua vida, totalmente contrário aos códigos específicos para

menores que somente previam a aplicação aos menores que era sinônimo de

carente, abandonado, delinquente, infrator, trombadinha ou pivete. Essa lei

assegura que cada criança a partir de seu nascimento tenha direito ao seu

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pleno desenvolvimento, mesmo que cometa um ato ilícito. A partir do ECA

aboliu-se o termo “menor” e passou-se a utilizar o termo criança ou

adolescente infrator. O ECA em seu artigo primeiro inicia dizendo “Esta lei

dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente”, o que demonstra

que a partir dessa lei em vigor existem diretrizes para uma política pública que

reconhece imediatamente a criança e o adolescente como pessoa em condição

especial de desenvolvimento.

Associo-me a Paulo Lúcio Nogueira, quando este defende que o ECA é

regido por vários princípios, que servem como orientação para o seu intérprete,

sendo os principais em seu entendimento:

Prevenção Geral, Prevenção Especial, Atendimento Integral, Garantia Prioritária, Proteção Estatal, Prevalência dos Interesses, Indisponibilidade, da Escolarização Fundamental e Profissionalização, Reeducação e Reintegração, Sigilosidade, Respeitabilidade, Gratuidade, Contraditório e Compromisso. (NOGUEIRA, 1996, p. 15)

Para descrever algumas das normas que regulamentam esses princípios

Nogueira (1996) explicita que sobre o Princípio da prevenção Geral o Estado

tem o dever de assegurar à criança e ao adolescente o ensino fundamental

obrigatório e gratuito enquanto prevenir a ocorrência de ameaça ou violação

desses direitos é obrigação de todos. (art. 54 incisos I e VII e art. 70). Pelo

Princípio da Prevenção Especial, é obrigação do poder público através de seus

órgãos competentes, regular os espetáculos públicos quanto a sua natureza e

as faixas etárias de recomendação adequada ou não. (art.74). O Princípio da

Garantia Prioritária trata da prioridade à criança e ao adolescente no

atendimento quanto aos serviços públicos e no atendimento das políticas

sociais (art. 4, alíneas a, b, c e d).

Para tornar a escolarização obrigatória pode-se consultar os artigos 120

e 124 considerando os Princípios de Escolarização Fundamental e

profissionalização. O Principio da Prevalência dos Interesses dos Menores

previsto no Art. 6º orienta que para a interpretação da lei se levará em

consideração os fins sociais para que o Estatuto se direciona, principalmente

levando em consideração a condição peculiar do adolescente infrator de

pessoa em desenvolvimento.

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O Princípio da Reeducação e Reintegração do adolescente que comete

uma infração segundo o ECA ocorre através das medidas sócio-educativas e

também através das medidas de proteção que promovem socialmente a sua

família através de orientação e os insere em programa oficial comunitário de

auxílio e assistência e os supervisiona em seu aproveitamento escolar. (art.

119, incisos I a IV).

É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente,

livrando-os de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, ou

constrangedor (art. 18, 124 inciso V e art. 178) se aplicando aqui o Princípio da

Respeitabilidade e do Compromisso. O Princípio Contraditório (art. 171 a 190)

que está previsto antes do ECA na Constituição Federal no artigo 5º, garante a

todos os adolescentes que cometeram ato infracional defesa e igualdade de

tratamento durante o processo de apuração do ato infracional. A Constituição

Federal tem nesse princípio um dos direitos indisponíveis do individuo, pois não

pode ser condenado antes de ser ouvido.

O ECA estrutura-se assim em três sistemas de garantia. A garantia das

políticas públicas de atendimento a criança e adolescentes contidas nos artigos

4 e 87; a garantia das medidas de proteção direcionadas as crianças e

adolescentes que estiverem em situação de risco pessoal ou social contidas

nos artigos 98 e 101 e por fim a garantia da responsabilização penal do

adolescente infrator através das medidas sócio-educativas previstas no Art.

112. Esse sistema de prevenção através das políticas públicas, medidas de

proteção e medidas sócio-educativas atuam de forma coerente e com

movimento gradual de cada um desses sistemas. O maior responsável pelo

primeiro sistema é o Estado e a sociedade de forma conjunta atuando na

prevenção. O segundo sistema está diretamente relacionado ao trabalho dos

Conselhos Tutelares e o terceiro sistema estará submetido ao sistema de

justiça com os operadores naturais como a Policia, o Ministério Público, a

Defensoria, o Judiciário e os Órgãos executores das medidas sócio-educativas

Se o ECA é concebido como uma lei, também é um instrumento de

garantia de cidadania plena, pois ele nasceu da luta de movimentos sociais, de

profissionais e de cidadãos preocupados com os direitos e deveres da

população infanto-juvenil. Isso é possível perceber através da leitura do seu

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Art. 3º que traduz esse desejo de cidadania quando propõe a proteção integral

a criança e ao adolescente dando-lhes oportunidades e facilitando “a fim de

lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em

condições de liberdade e dignidade”.

No entanto, não se pode pensar que o ECA vem apenas para proteger a

criança e o adolescente, mas que uma vez suas regras e leis aplicadas,

também o adulto estará sujeito a sua proteção, para tanto é preciso desmitificar

a ideia de que crianças e adolescentes somente possuem direitos e não

deveres. Na realidade esse binômio direito/deveres, funciona de forma

complementar, portanto, todo direito se complementa a um dever e vice versa.

O primeiro exemplo está na dialética entendida como arte do diálogo. Este é um ponto de vista frequente em nosso tempo; há autores que preconizam mesmo que se deva voltar a Platão e redescobrir com ele a arte do diálogo. É claro que tal arte não depende simplesmente do talento pessoal, de algum grau de inteligência ou de uma destreza pacientemente adquirida; o autêntico diálogo pauta-se também por certas exigências objetivas, por determinados cânones. Assim, por exemplo, não se busca destruir através do diálogo o ponto de vista defendido pelo opositor à maneira do político que persegue a vitória contra o adversário. Na dialética não se trata de demolir a tese adversária; pois, como já ensinava Platão, se há diversas teses sobre um mesmo problema, todas elas devem ter algo de verdadeiro. Isso significa que em relação a uma determinada tese as demais funcionam como antíteses, e através desse jogo de teses e antíteses deve-se procurar uma síntese que seja a expressão mais perfeita da verdade do problema proposto. (BORNHEIM, 1977, p. 155)

Por isso através do diálogo, é possível estabelecer o elo entre direitos e

deveres e desmitificar as questões sobre imputabilidade e inimputabilidade15 do

adolescente infrator, fazendo-se respeitar a vida da outra pessoa em sua

plenitude.

A necessidade de diálogo requer disposição generosa de cada pessoa; requer, substancialmente, acolhimento e generosidade. Assim, solicita que quem dialoga possa despir-se de vaidades e prepotências, tão comuns na sociedade em geral, nas instituições, na academia, pela contaminação de um mundo competitivo e individualista. (FERREIRA, 2009, p. 38)

15

O art. 27 do Código Penal (Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940) assim dispõe: “Menores de dezoito anos. Art. 27 - Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente

inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.” (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

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Sendo o diálogo essa fonte de inesgotável caminho que possibilita

construir novos caminhos e novas políticas afirma-se que ter o direito a ter sua

vida protegida é um pré-requisito à existência e ao exercício dos direitos e

deveres enquanto cidadão. Da mesma maneira que é garantido o direito ao

acesso de uma criança ou adolescente à Defensoria pública e ao Poder

Judiciário para ser ouvidos quando acusados de alguma infração é direito do

acusado reportar-se ao órgão competente falando a verdade e a realidade dos

fatos ocorridos conforme previsto nas Regras de Beijing no item 7.1 (As

garantias fundamentais do processo, tais como a presunção de inocência, o

direito de ser notificado das acusações, o direito de não responder, o direito à

assistência judiciária, o direito à presença dos pais ou tutor, o direito de

interrogar e confrontar as testemunhas e o direito ao recurso serão

asseguradas em todas as fases do processo. É um dever dos pais

matricularem seus filhos na escola e é um direito dos filhos receberem um bom

nível de educação. É dever do estado ofertar vagas nas escolas públicas, é um

dever todos zelarem pela escola não vandalizando o patrimônio físico escolar e

também é um direito que o profissional possa exercer um bom nível de

educação no seu trabalho como educador.

Essa teia de relações esta nesse movimento entre direitos e deveres,

esta nesse diálogo sem fim, em busca de uma humanização desses

adolescentes em desenvolvimento, pois o ser humano é entendido como:

“conjunto das relações sociais”, como sujeito histórico, cuja atividade é criar, por seus atos, a história, criando consequentemente, a história da humanidade. Isso importa em tomar como ponto de partida os indivíduos reais, concretos, que produzem dentro da sociedade em condições concretas, com direito de poder fruir de suas produções, de toda a produção da cultura. (SILVA E FERREIRA, 2010, p.71)

É importante clarificar que o ECA traduz essas relações garantindo que

para cada direito garantido por ele há um dever correspondente. Os direitos à

vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à

profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à

convivência familiar e comunitária, devem ser garantidos pela família, a

comunidade, a sociedade e o Poder Público de onde vivem.

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Para os deveres desrespeitados pelas crianças e adolescentes a Vara

da Infância é uma área em que a autoridade fará exercer seu poder para

cumprir as leis estabelecidas no ECA e punir a quem cometer a infração.

Quando a criança estiver entre 0 e 12 anos incompletos e comete um ato

infracional ela será submetida as Medidas de Proteção conforme o Art. 10116

do ECA através do Conselho Tutelar. Quando o adolescente estiver entre 12

anos completos e 18 anos incompletos ele responderá pelo seu ato infracional

através das Medidas sócio-educativas conforme o Art. 11217 do ECA através da

Vara da Infância e Juventude e quando o jovem estiver com 18 anos completos

em diante responderá pelo seu crime cumprindo pena através da Vara criminal.

Percebe-se nessa definição de idades e termos o quanto é precisa a legislação

do ECA e que se aplicada com fidedignidade pode trabalhar em favor de todos.

O ECA estabelece uma diferença clara entre crianças infratoras e adolescentes

infratores, pois as crianças estão sujeitas as medidas de proteção e os

adolescentes as medidas sócio-educativas e o adulto a cumprir a pena.

16

Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente

poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII - abrigo em entidade; VIII - colocação em família substituta. Parágrafo único. O abrigo é medida provisória e excepcional, utilizável como forma de transição para a colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade. VII - acolhimento institucional; (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009). VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar; (Redação dada pela Lei nº 12.010, de

2009). IX - colocação em família substituta. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009). 17

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semi-liberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI (ECA)

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As crianças cumprindo os artigos 10118 e 10519 do ECA se sujeitam as

medidas de proteção e naturalmente não passam pelo processo de internação.

Dentre as medidas de proteção sinalizadas pelo ECA encontra-se as de

encaminhamento aos pais, matrícula e frequência obrigatórias em escolas da

rede pública, inclusão em programas da comunidade em que vivem,

tratamentos médico, psicológico ou psiquiátrico, abrigos em entidades, inclusão

em tratamento para toxicômanos e alcoólatras e se necessário for colocação

em família substituta.

Os adolescentes infratores estão sujeitos ao cumprimento do Art. 11220

do Livro II do Titulo II do Capítulo IV das Medidas socioeducativas do ECA. A

advertência (art. 115)21 consiste na repreensão verbal do adolescente infrator e

na assinatura de um termo. A Obrigação de reparar o dano (art. 116)22 será

aplicada ao adolescente que tenha condições e havendo impossibilidade outra

medida será aplicada. A prestação de serviços à comunidade (art. 117)23 se

restringirá a tarefas gratuitas de interesse em geral principalmente em

entidades como escolas, hospitais e outros, pelo tempo máximo de seis meses

e até oito horas por semana. A Liberdade Assistida (art. 118 e 119)24 é o

18

Ver nota de rodapé 16 19

Art. 105. Ao ato infracional praticado por criança corresponderão as medidas previstas no art. 101 20

Ver nota de rodapé 17 21

Art. 115. A advertência consistirá em admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada. 22

Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima. Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada. 23

Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais. Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a freqüência à escola ou à jornada normal de trabalho. 24

Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente. § 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento. § 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor. Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros:

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acompanhamento do adolescente infrator por um orientador com um período

de no mínimo seis meses, onde será efetuada a promoção social do

adolescente e de sua família e também seu acompanhamento escolar e

inserção no mercado de trabalho. A inserção em regime de semiliberdade (art.

120)25 prevê sua liberação compulsória aos 21 anos, e sua escolarização e

profissionalização são obrigatórias.

Por fim, a medida de internação (art. 121)26 constitui medida de privação

de liberdade onde não tem tempo determinado devendo ser sua manutenção

revalidada a cada seis meses atingindo no máximo três anos. A aplicação de

todas as medidas é uma decisão judicial tomada no âmbito do processo ao

qual esse adolescente responde.

Após esse incurso sobre como o ECA está dividido e quais são as

formas de sua aplicação, vale ressaltar que a maioria da população brasileira e

também a maioria dos profissionais da educação que estão trabalhando

efetivamente nas escolas com crianças e adolescentes que vivem e

sobrevivem em situações políticas, econômicas, sociais e culturais

degradantes, acredita que o ECA é ineficiente e que ao invés de ajudar a

I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social; II - supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula; III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho; IV - apresentar relatório do caso. 25

Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial. § 1º São obrigatórias a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade. § 2º A medida não comporta prazo determinado aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação. 26

Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. § 1º Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário. § 2º A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses. § 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos. § 4º Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida. § 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade. § 6º Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público. § 7o A determinação judicial mencionada no § 1o poderá ser revista a qualquer tempo pela autoridade judiciária. (Incluído pela Lei nº 12.594, de 2012)

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melhorar traz mais problemas no que diz respeito ao cometimento de atos

infracionais por adolescentes em conflito com a lei. A maioria acredita que o

adolescente infrator tem consciência do seu ato e que conhece todas as

implicações de suas ações, bem como do que pode ser feito e o que não pode

ser feito.

Esse debate da sociedade brasileira está cada vez mais em alta

recaindo sobre o favoritismo em reduzir a maioridade penal para dezesseis

anos. Argumentos como os fatos de o adolescente poder votar aos dezesseis,

poder pleitear com a autorização dos pais a permissão para dirigir aos

dezesseis e em alguns casos emancipar-se torna o debate mais severo e

acirrado. Qual a consciência do jovem infrator em relação ao seu ato ilícito

cometido? Naturalmente não será possível favorecer uma mudança sobre as

questões da criminalização do adolescente infrator, sem antes ocorrer um

profícuo exame e posterior debate com as devidas estruturas responsáveis do

sistema judiciário no sentido de examinar as noções de mente e consciência.

Ter consciência do seu ato, saber o que essa consciência demanda, ter

a clarificação, a lucidez, sobre o conhecimento e como utilizá-lo em suas ações

e sobre o que o mesmo pensa, sobre o ato ilícito e seu fim, são elementos que

precisam de um estudo mais acentuado. Por isso em vez da penalidade teria

que reforçar a educação desses jovens na concepção omnilateral.

A educação centrada no conceito de omnilateralidade produz um sujeito

mais humano, mais fraterno, mais solidário, mais altruísta e focado no coletivo.

O sujeito deixa de ter uma formação individualista, unilateral que o trabalho

alienado provoca e passa a ter uma formação mais completa, mais humana, de

homens que se afirmam e se reconhecem na construção da sua história para a

liberdade. Romper com a formação unilateral é um exercício diário das

relações humanas, nesse sentido a omnilateralidade só se realiza como práxis

social.

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4 DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL

A Constituição da República Federativa do Brasil que está em vigor data

de 1988 e é a 7ª Constituição Brasileira. A Constituição de 1988, conhecida

como Constituição Cidadã, foi promulgada durante o governo do presidente

José Sarney e um dos seus maiores fundamentos é dar maior liberdade e

direitos aos cidadãos brasileiros. Antes desta tivemos as Constituições de

1824, 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967.

A Constituição de 1824 (Brasil Império) foi outorgada e considerada uma

imposição de Dom Pedro I, pois dentre tantos artigos destaca-se o fato de que

cria-se o poder Moderador, que estava acima dos Poderes Executivo,

Legislativo e Judiciário. Após a Proclamação da República em 1889 e a

abolição do trabalho escravo, a Constituição de 1891 (Brasil República), sob o

governo provisório de Marechal Deodoro da Fonseca e seu vice Rui Barbosa,

traz como elementos principais as questões de independência dos poderes

Legislativo, Judiciário e Executivo e institui o habeas corpus, que institui o

direito de ir, vir.

A Constituição de 1934 (Segunda República), com o Brasil comandado

por Getúlio Vargas é responsável por diretrizes que dão maior valor as

questões sociais, trazendo o direito de voto às mulheres, voto secreto, criação

da justiça eleitoral e a justiça do trabalho e naturalmente a criação das leis

trabalhistas. A Constituição de 1937 (Estado Novo) ainda com Getúlio Vargas

ocorreu após a dissolução do Congresso e ficou conhecida como a

Constituição de inspiração fascista, que instituía entre outras questões a pena

de morte e a supressão da liberdade partidária.

Em 1946 surgiu a quinta constituição brasileira retomando a linha

democrática e sendo promulgada de forma legal pelo Congresso,

restabelecendo os direitos individuais, o fim da censura e também o fim da

pena de morte. Outras medidas de muita relevância foram à eleição direta para

presidente e o direito a greve. Em 1967 (Regime Militar) o contexto que

predominava era o autoritarismo e a política de segurança nacional usada para

combater a quem se mostrasse subversivo ao regime. Fora adotada a eleição

indireta para presidente e essa constituição ficou conhecida pelos inúmeros

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atos institucionais que serviram para legitimar as ações militares, como o mais

conhecido deles o AI-5. Por fim a Constituição atual de 1988 (Constituição

Cidadã) com um texto que expressava a realidade social pela qual o Brasil

estava passando. Dentre tantos direitos concedidos constata-se o direito a

votar para os jovens de 16 e 17 anos, novos direitos trabalhistas, seguro

desemprego, direito a greve, proteção ao meio ambiente, fim da censura entre

outros.

Depois de duas décadas de regime militar, e após muitos debates

chega-se a um documento nacional que trará mudanças profundas na forma de

pensar as políticas públicas nacionais. Com essa constituição torna-se latente

a ideia de reconstrução da democracia brasileira.

Concomitante ao nascimento da constituição nacional conhecida como

constituição cidadã, outras instituições como o UNICEF (Fundo das Nações

Unidas para a Infância), o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua,

a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), a CNBB (Conferencia Nacional dos

Bispos do Brasil) e a Pastoral do Menor trabalharam e continuam contribuindo

para a melhoria das condições das crianças e adolescentes no Brasil.

Ressalta-se a importância destas instituições para a apresentação duas

emendas à Constituinte (Emenda Criança Prioridade Nacional e Emenda

Criança Constituinte) que tornaram-se depois de aprovadas no mais conhecido

e repetido Artigo da Constituição Brasileira, o Art. 227.

O conteúdo dessas emendas é o resultado de uma discussão muito

maior oriunda do projeto de Convenção Internacional dos Direitos da Criança

debatidos intensamente pela Assembléia Geral da Organização das Nações

Unidas – ONU desde 1979. Esse ano, 1979, foi considerado o ano

Internacional da Criança. Dessa convenção resultaram 54 artigos aprovados

em 20 de novembro de 1989. Antes da Convenção esses 54 artigos com

exceção da introdução foram transformados em 40 artigos e depois resumidos

no artigo 227 da Constituição, já citado na nota de rodapé 11 e reiterado aqui:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,

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discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (CONSTITUIÇÂO, Art. 227)

Entende-se que o Art. 227, legitima uma nova visão de sujeito de

direitos, sujeito em transformação e para a transformação e propõe uma clara

subdivisão de princípios que sustentam a Doutrina da Proteção Integral.

Em primeiro, o princípio da “Sobrevivência” que pressupõe o direito à

vida, à saúde e à alimentação. Em segundo o princípio do “Desenvolvimento

Pessoal e Social”, que diz respeito ao direito à educação, à cultura, ao lazer e à

profissionalização. E em terceiro o princípio do “Respeito e Integridade Física,

Psicológica e Moral” que visam o direito à liberdade a dignidade, a convivência

familiar e comunitária. Isso é conceber o homem em suas mais diversas

relações.

Es preciso concebir al hombre como una serie de relaciones activas (un proceso) en el cual, si bien la individualidad tiene la máxima importancia, no es, sin embargo, el único elemento digno de consideración. La humanidad que se refleja en cada individualidad está compuesta de diversos elementos: 1) el individuo; 2) los otros hombres; 3) la naturaleza. GRAMSCI, 1971, p. 34

Considerando a reflexão de Gramsci e estabelecendo a relação com o

Art. 227 da Constituição é possível determiná-lo, portanto, como o cerne de

todas as mudanças que ocorreram e não ocorreram em relação às Crianças e

Adolescentes no Brasil.

Todos os direitos e também os deveres, pois um não pode estar sem o

outro, da Criança e do Adolescente estão no Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA) de 1990 que também pode ser nominada de Constituição

Infantil.

A lei que antecedeu o ECA foi o Código de Menores. Ao analisarmos as

diferenças do Código de Menores e o Estatuto da Criança e do Adolescente

pode-se perceber já na sua introdução a diferença radical ao que se propõe.

No primeiro artigo do Código de menores lê-se: “esta lei trata da proteção e

vigilância dos menores em situação irregular”. Quem eram esses menores em

situação irregular? Eram os abandonados, os carentes, os inadaptados e os

infratores.

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Neste contexto dos anos 90, a Declaração de Jomtien - Declaração da

Educação para Todos, clama a atenção do mundo para o respeito a dignidade

humana. A principal forma de manter a dignidade humana é respeitar o ser

humano em todos os seus direitos. “Na medida em que vai produzindo o

mundo – o tornado humano pela presença do homem e pela organização social

que o trabalho lhe impõe -, produz a si mesmo, individualmente, reproduzindo-

se na espécie e na ampla sociedade” (SILVA e FERREIRA, 2010, p. 74). A

violação dos direitos humanos em qualquer instância é a porta aberta para a

não humanização e total ausência de cidadania.

Ao contrário do Código de menores o ECA trata da proteção integral.

Essa rede de proteção ou o conjunto de direitos: o direito à sobrevivência, ao

desenvolvimento pessoal e social e o direito à liberdade, respeito e dignidade,

convivência familiar e comunitária, formam a doutrina da proteção integral.

A palavra integral se refere à garantia de ver executados todos os

direitos para todas as crianças e adolescentes. Nesse mesmo sentido podemos

pensar a doutrina da proteção integral através da educação integral, ou seja,

através da educação omnilateral. Como já dito na introdução desta tese,

segundo Marx e Engels, (1987, p.620), “o homem apropria sua essência

omnilateral de um modo omnilateral, ou seja, como um homem total”.

No entanto, estamos tão acostumados a que a criança só tenha deveres,

que essa política, essa constituição da criança e do adolescente com ênfase

nos direitos causou e causa muita rejeição, principalmente no meio educacional

onde deveria ser exatamente o contrário. Isso se dá principalmente pela leitura

errônea do documento. O ECA deve ser lido sempre a luz do artigo sexto, que

diz:

Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais e a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento. (ECA Art. 6)

Toda a articulação dos capítulos, incisos, parágrafos e a divisão dos

livros do ECA estão sustentadas nesse artigo, e a ausência dele para a leitura

do documento torna-o inexato no trato a sua aplicação. A criança e o

adolescente são tratados pelo ECA como prioridade absoluta. A questão da

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prioridade absoluta se dá em primeiro lugar porque eles não têm conhecimento

dos seus direitos e depois por não terem meios de autossatisfazerem, ou seja,

não possuem meios para satisfazerem por si mesmo suas próprias

necessidades básicas, e em terceiro lugar porque a criança representa o futuro

da humanidade. Ainda, fundamentalmente, porque cada criança ou

adolescente é um ser humano completo em qualquer uma das suas fases

enquanto criança, adolescente ou jovem, isto é: o adolescente é um grupo em

si e em sua complexidade possui todos os elementos que compõe o ser

humano na sua totalidade assim como a criança e o jovem também o são.

Outro aspecto relevante do ECA é definir a relação entre o Sujeito de

Direitos e o Sujeito em Condição Peculiar de Desenvolvimento. Isso significa

que para cada fase de desenvolvimento (criança, adolescente, jovem) os

direitos e deveres se aplicam de forma diferente.

É de fácil compreensão quando analisamos as questões do trabalho e

da educação nas diferentes fases de desenvolvimento da criança e do

adolescente. Por exemplo: a criança não pode trabalhar, mas deve brincar e

estudar; o adolescente deve estudar e pode trabalhar, desde que esteja de

acordo com a lei que diz que dos 14 aos 16 anos o adolescente pode trabalhar

na condição de aprendiz e a partir dos 16 anos no trabalho regular e

remunerado, não esquecendo que primeiro ele deve estudar e depois pode

trabalhar e não ao contrário. O adulto deve trabalhar e pode estudar. Então

como se pode perceber, para cada fase peculiar de seu desenvolvimento o

trabalho e a educação se aplicam de forma específica, ou seja, para cada

condição peculiar de desenvolvimento os direitos e deveres assumem uma

determinada configuração.

Outra leitura feita de forma equivocada é a de que a criança e o

adolescente não respondem por seus atos infracionais. No ECA essa confusão

é esclarecida em seu capítulo sobre os atos infracionais. Novamente aqui é

preciso fazer a análise segundo o sujeito em condição peculiar de

desenvolvimento. No ato infracional, a criança é irresponsável e inimputável

penalmente, e o adolescente autor de ato infracional cumpre medidas

socioeducativas, porque a ele não são aplicáveis as penas do Código penal e

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sim as Medidas Socioeducativas contidas no ECA e finalmente o adulto é

responsável e imputável penalmente.

Percebe-se através destas duas análises feitas até aqui que a

conceituação de condição peculiar de desenvolvimento é um parâmetro do qual

não se pode abrir mão para analisar qualquer situação que diga respeito ao

conceito de sujeito de direitos.

Retomando as diferenças entre o Código de Menores e o ECA,

apontamos como um dos grandes avanços do ECA o fato de que ele não se

restringe mais a uma infância de menores abandonados ou desprovidos

socialmente. O ECA passa a ser uma lei universal, uma lei que rege todas as

crianças e adolescentes brasileiros, portanto, para se ter acesso aos direitos da

criança e do adolescente, basta apenas ser uma criança ou um adolescente

independente de sua classe social, sem nenhuma restrição, contrariamente ao

Código menores que servia apenas para uma infância menorizada.

Outro aspecto relevante a ser analisado refere-se a diferença entre as

doutrinas pregadas no Código de Menores e no ECA. No código de Menores

havia a Doutrina da Situação Irregular, que no ECA passa a ser a Doutrina da

Proteção Integral. Na Doutrina da Situação Irregular o objetivo era a proteção e

vigilância dos meninos em situação irregular, ou seja, proteção para os

abandonados e carentes e vigilância para os infratores ou inadaptados. Era

uma lei de controle social da infância e da adolescência. O ECA contrariamente

ao Código de menores é uma lei que preserva o desenvolvimento pessoal e

social das crianças e dos adolescentes brasileiros. E nesse sentido, o Eca tem

papel fundamental no que diz respeito aos adolescentes em conflito com a lei,

pois,

A segurança é entendida como a fórmula mágica de proteger a sociedade (entenda-se as pessoas e o seu patrimônio) da violência produzida por “desajustados sociais” que precisam ser afastados do convívio social para serem recuperados. É difícil para o senso comum juntar a ideia de segurança e cidadania. Reconhecer no agressor um cidadão parece-nos ser um exercício difícil e, para alguns, inapropriado. Os adolescentes em conflito com alei, embora façam parte do mesmo quadro acima citado, não encontram eco para a defesa dos seus direitos, pois pelo fato de terem praticado um ato infracional, são desqualificados como adolescentes e rotulados como infratores, predadores, delinquentes, perigosos e outros adjetivos estigmatizantes que constituem uma face da violência simbólica. (VOLPI, 2001, p. 14)

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Em se tratando de definir as Políticas de Atendimento, o Código de

menores previa um modelo assistencialista para carentes e abandonados em

contrapartida de um modelo correcional para infratores. O ECA é a política de

articulação dos direitos e deveres. Um não pode ser sem o outro, por isso é um

grande engodo pensar que o ECA só trata dos direitos da criança e do

adolescente e não trata dos deveres. Mais uma vez é preciso retomar o já

referido Art. 6º, no qual estão claramente explicitados os direitos e deveres

individuais e coletivos da criança e do adolescente. Entende-se que os 267

artigos do ECA devem ser analisados sempre sob a ótica do Art. 6º. Atingir a

cidadania é atingir a idéia de direitos de ter direito e dever de ter deveres.

O ECA no Art. 86º traz orientações para as políticas públicas, quando

define como política de atendimento:

A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações governamentais e não governamentais, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. ECA, art. 86)

Na sequência trata das linhas de ação dessa política de atendimento,

colocando-as numa espécie de hierarquia ou subdivisão.

Na base dessa hierarquia estão as Políticas Sociais, aquelas que são

direitos de todos e dever do Estado, que dão uma cobertura universal para

todas as crianças e adolescentes, como educação e saúde.

Num patamar superior estão as Políticas de Assistência Social que não

são universais. No Art. 203 e 204 da Constituição afirma-se que as políticas de

Assistência Social são para aqueles que delas necessitam, ou seja, que

estejam em estado de necessidade permanente ou temporário. Sendo estas

políticas de caráter supletivo, para aqueles que delas se fizerem necessários,

podem delas usufruir, por exemplo, crianças que perderem suas habitações

depois de uma forte tempestade (em caráter provisório) ou crianças com

necessidades especiais (caráter permanente).

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Para as crianças que tem violados os seus direitos a Integridade

psicológica, física e moral, se encaixam as políticas de atendimento como às

Políticas de Proteção Especial ou Medidas de Proteção Especial. São medidas

contra o abuso e a exploração sexual que podem ser sofridas em qualquer

classe social. Essas medidas de proteção encontram-se num terceiro andar

dessa hierarquia.

Por fim, no alto dessa hierarquia ou pirâmide, temos a luta pelos direitos

da criança no campo dos direitos. Pode-se lutar pelos direitos da criança nas

políticas públicas, através da solidariedade social, no campo do direito e

através das políticas de promoção, proteção e defesa dos direitos.

Nas políticas públicas estão os governos federal, estadual e municipal.

Esse é o primeiro e principal campo da luta pelos direitos da criança. A

solidariedade social se faz muito presente principalmente em nosso século XXI

por meio de ONGs, Institutos e Fundações, entre tantas outras formas similares

a estas. No campo do direito, quando se coloca a lei para funcionar em prol das

crianças e adolescentes e em relação as políticas de promoção, proteção e

defesa dos direitos se fazem presentes o Ministério Público, a Defensoria

Pública, as Comissões de Direitos Humanos, a igreja e qualquer outro

movimento que trabalhe lutando pela defesa dos direitos da criança. Colocar a

democracia em funcionamento. “Ou seja, o Estado passa a organizar-se no

intuito de garantir o respeito às regras do direito então constituído” (VIEIRA,

2006, P. 43).

O ECA é uma das leis mais bem desenvolvidas de nosso país, que

inclusive serve como modelo para outros países. No entanto, as contradições

que se aceleram em nossa sociedade fazem com que o ECA não seja mais do

que um amontoado de letras em mais um amontoado de papéis. Importa

salientar que conforme Vieira, (2006, p. 52), o estado de direito não é o mesmo

que o estado de justiça. Ter os direitos escritos em lei não faz com que a

justiça aconteça.

O Estado de direito carrega, dessa maneira, no seu âmago, uma ambiguidade pela qual a sua existência depende permanentemente de evitar que o elemento político, inerente a qualquer forma de Estado, jamais venha a se manifestar, reduzindo este último a um mero ordenamento jurídico. (VIEIRA, 2006, P. 54)

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Apontam-se alguns desafios para transformar o ECA num sucesso de

política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente. Em primeiro

lugar está a questão ética. Entendida como “a teoria ou ciência do

comportamento moral dos homens em sociedade. Ou seja, é ciência de uma

forma específica de comportamento” (VAZQUEZ, 1969, p. 12). A ética pode ser

entendida ainda como “atos conscientes e voluntários dos indivíduos que

afetam outros indivíduos, determinados grupos sociais ou a sociedade em seu

conjunto” (VAZQUEZ, 1969, p. 14). A partir dessa definição de ética questiona-

se: Como é possível falar em ética com crianças fora da escola? Como é

possível falar em compromisso ético da sociedade se temos crianças

trabalhando para garantir a subsistência de suas famílias pauperizadas e a

margem da sociedade? Como é possível falar em ética com crianças sendo

exploradas sexualmente por adultos detentores de esclarecimento dos seus

direitos e deveres de cidadão e orientador do desenvolvimento infantil? Como é

possível falar em ética com tantas crianças que morrem de fome? Como é

possível falar ou tratar de ética para crianças e adolescentes que não foram

formados nem educados, não conhece nada da sociedade que vivem a não ser

sua discriminação e pauperização sentida na pele todos os dias.

Em segundo lugar como transformar esse compromisso ético em

vontade política? O Brasil é um país riquíssimo em condições de fazer com que

a criança e o adolescente tenham seus direitos de ser criança (estudar, brincar

e conviver em família) respeitados. O Brasil pode fazer com que cada criança e

adolescente tenha um futuro digno pela educação e quando adulto pelo

trabalho, mas é preciso vontade de política, vontade de administrar com

democracia para a liberdade.

Em terceiro lugar é necessário capacitação profissional. É preciso dar

competência técnica aos Conselheiros Municipais aos Conselheiros Tutelares e

aos responsáveis pelas políticas sociais básicas como a saúde, a educação e a

segurança.

A complexidade das políticas públicas em que os Conselheiros devem

atuar exige uma permanente formação. Não é possível tornar-se conselheiro

como adorno de cargo ou status. Esse é um trabalho que exige conhecimento

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e técnicas para a aplicação desse conhecimento. A exemplo disso vejamos o

que diz Gramsci no mesmo sentido em relação aos intelectuais:

A complexidade da função intelectual nos vários Estados pode ser objetivamente medida pela quantidade das escolas especializadas e pela sua hierarquização: quanto mais extensa for a "área" escolar e quanto mais numerosos forem os "graus" "verticais" da escola, tão mais complexo será o mundo cultural, a civilização, de um determinado Estado. (GRAMSCI, 1982, p. 9).

A ética, a vontade política e a competência técnica se farão presentes se

as pessoas que trabalham com as políticas sociais básicas compreenderem,

aceitarem e colocarem em prática esse novo direito de ter direitos e deveres da

criança e do adolescente.

Assim como a família a escola tem uma função social importante nesse

novo olhar sobre a criança como sujeito de direitos e ser humano em condição

peculiar de desenvolvimento. Não podemos esquecer que a escola e

principalmente a escola pública é um local dentro da sociedade de democracia,

de debates, de reflexões e de desenvolvimento do pensamento crítico. È

também um lugar de socialização entre crianças, adolescentes, jovens e

adultos.

(...) a educação visa o homem; na verdade, que sentido terá a educação se ela não estiver voltada para a promoção do homem? (...) uma visão histórica da educação mostra como esta esteve sempre preocupada em formar determinado tipo de homem. Os tipos variam de acordo com as diferentes exigências das diferentes épocas. Mas a preocupação com o homem é uma constante. (SAVIANI, 2000, p.35)

Na realidade, constata-se que quanto mais se fala em direitos humanos

mais eles são negados. Se reconhecemos a infância como produção histórica

se impõe a pergunta: em que contextos se produz a infância e com o que a

escola (pedagogos, professores, funcionários e comunidade em geral) trabalha

e como são exercidos seus direitos de cidadão?

A escola é uma instituição básica para o atendimento à criança e ao

adolescente. É o primeiro lugar que a criança vai quando deixa a sua casa,

quando sai da convivência familiar. A segunda convivência mais importante na

vida de todos é a convivência na escola.

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Se a sociedade tivesse uma estrutura social razoável não haveria a

necessidade de ter esta imensa diversidade de instituições que atendem a

criança. Uma escola funcionando bem, uma família cumprindo o seu papel e o

sistema de saúde funcionando, a doutrina de proteção integral agindo com

eficácia e eficiência manteria em perfeita harmonia os pilares de sustentação

dos direitos da criança e do adolescente.

A escola é uma instituição fundamental. A LDB, a Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional, afirma a educação de uma maneira muito ampla,

que abrange todas as ações de direitos da criança e do adolescente como

ações educativas.

O artigo primeiro da LDB diz que:

A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais. (LDB, art. 1)

A relação entre a LDB e o ECA é fundamental. Ou seja, as relações

entre a escola a família e os direitos da criança e do adolescente fundem-se

em prol da emancipação humana. Enquanto a LDB trata a educação pelo

ângulo da oferta do serviço educacional o ECA trata do cumprimento dos

direitos e deveres da criança. A união da escola e da família está transcrita no

Art. 14 da LDB que fala sobre a gestão democrática da escola através da

participação de pais, de educandos e da comunidade em geral. A Soma do Art.

14 com o Art. 12 que fala sobre os deveres do estabelecimento de ensino e do

Art. 13 que fala sobre os deveres dos educadores pode ser colocada em

prática através dos Conselhos Tutelares, pois é um forte aliado dos pais e das

escolas no cumprimento a determinação de uma das políticas básicas que é o

direito a Educação.

Os Conselhos Tutelares devem ser comunicados sempre que a escola

ou a família perceberem os casos de abuso e maus tratos. Porém não se pode

confundir Conselho Tutelar como polícia para criança indisciplinada. A

indisciplina deve ser tratada no âmbito pedagógico, não é papel do Conselho

Tutelar. E o ato infracional deve ser tratado no âmbito do ECA.

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O Conselho Tutelar abrange medidas de proteção, por isso é importante

quebrar o tabu em relação ao ECA e conhecer suas normativas de quando se

encaminha uma criança ou um adolescente para suas medidas.

O ECA é bastante claro quando diz que devem ser encaminhadas aos

cuidados do Conselho Tutelar as crianças com suspeita ou evidencia de abuso

ou exploração e maus tratos; em casos de evasão escolar e ainda nos casos

de baixo rendimento escolar ou não aproveitamento. Nesses casos o Conselho

Tutelar vai agir como um auxiliar da instituição escolar para maximizar o direito

da criança e do adolescente à educação.

A escola, os professores, a equipe pedagógica, são vitais para a criação

da cultura de cidadania de crianças e de adolescentes. Sendo a cultura

dependente do cotidiano, de diariamente viver os direitos o Conselho Nacional

dos Direitos da Criança e do Adolescente, o movimento de defesa dos direitos

da criança, e mesmo os setores de governo viram a Lei nº 11.525/07 como

uma forte aliada, e determinante para o ensino dos direitos da criança no

ensino fundamental. Dessa maneira, nessa nova forma e, aproveitando o

ensejo de colocar esta lei em vigor, tem-se a oportunidade de recriar esse

movimento que vai de encontro a defesa dos direitos e deveres da criança e do

adolescente, incluindo dois agentes que são fundamentais e que estão

presentes constantemente na comunidade escolar: os professores e os pais.

É um avanço entender as trajetórias sociais dos alunos (as) e entender

suas lutas pela sobrevivência. É um avanço repensar nossa docência

em função dessa infância, adolescência e juventude reais (ARROYO,

2005, p. 79)

Sem os professores, sem os pais entendendo a importância de a criança

ter direitos e que ter direitos significa ter responsabilidades sociais, e que pela

primeira vez na história da humanidade as crianças não só têm

responsabilidades, mas também têm direitos cria-se uma sociedade muito mais

democrática, numa relação mais igualitária entre adultos e crianças.

A escola poderia contribuir muito se transformasse o estudo do ECA em

um dos seus conteúdos. Se a escola propusesse transformar o ECA na

Constituição da Criança e do Adolescente fazendo com que o ECA fosse a

base para a construção da cidadania infanto-juvenil. Tendo em vista que a

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escola deve ser protetiva em relação as crianças e aos adolescentes, poderia

tornar o Conselho Tutelar em um forte aliado para a emancipação humana

acionando-o sempre que percebesse que uma criança ou um adolescente na

família ou fora dela esteja sendo violentada em seus direitos, principalmente

em relação à educação e a integridade física, psicológica e moral.

A escola também necessita estruturar o seu regimento escolar com base

nos artigos 12 a 14 da LDB aliados aos artigos 54 a 59 do ECA, pois ambas as

legislações nesses capítulos específicos tratam da Educação. Essa ação

proporcionaria a instauração de um estado democrático de direito para dentro

da escola e para resolver conflitos com base numa visão de direitos humanos,

numa visão constitucional, legalista, alinhada com o que existe de melhor no

campo dos direitos humanos e na normativa internacional.

É importante pensar que essa reestruturação dos regimentos escolares,

assim como instaurar um estado democrático de direito nas escolas perpassa

os caminhos da gestão democrática da educação.

A gestão democrática que se destina à educação para todos prioriza a

participação dos alunos, da família e das organizações que trabalham com

adolescentes num espírito de coparticipação e corresponsabilidade pelos

direitos e deveres das crianças e adolescentes, pela não exclusão e

discriminação. “A gestão democrática assenta-se na participação efetiva de

sujeitos cônscios, fortes de caráter e ajustados emocionalmente, capazes de

deliberar e tomar decisões”. (FERREIRA, 2009, 114-115). Se a gestão

democrática centra-se principalmente na participação de todos, então, o grande

fazer da educação está centrado na relação das três grandes forças: a família,

a escola e a comunidade. Colocá-las lado a lado com o único intuito de

promover para as novas gerações das crianças, adolescentes e jovens o

conhecimento no sistema da garantia dos direitos para o cumprimento da

Doutrina da Proteção Integral.

O direito a educação é fundamental sim entre os direitos humanos, mas

ele está intrinsecamente ligado à garantia do conjunto dos direitos humanos.

Se não valorizarmos a apreensão dos direitos humanos para uma formação

cidadã através da escola, a educação como plenitude humana se torna uma

utopia. Este é um ponto fundamental. A função da escola é garantir a

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humanização dos sujeitos, ou seja, dar mais dignidade para as crianças e

adolescentes reconhecendo-os como sujeitos de direitos e não só de deveres.

4.1 Sistema de garantia de direitos humanos e o adolescente em conflito

com a lei.

Analisando as diretrizes e normativas educacionais até aqui e a

implicação dessas políticas neoliberais abrimos um novo debate sobre a

importância de compreender a construção do SINASE (sistema nacional de

socioeducação) através das Regras e Diretrizes das Nações Unidas em

matéria de adolescentes em conflito com a lei. É importante compreender como

estas regras e diretrizes foram construídas e assimiladas pelo Brasil, e a sua

influência na atuação dos operadores do SINASE para a garantia dos direitos

humanos das/os adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas.

A proteção à população infanto-adolescente está amparada não

somente em normas nacionais, mas num significativo conjunto de documentos

internacionais. A normativa internacional é importante para assegurar às

medidas socioeducativas uma implantação orientada pelo respeito aos direitos

humanos de crianças e adolescentes. Isso vale para as medidas que serão

cumpridas tanto em meio aberto, quanto em meio fechado. No plano

internacional, há um conjunto normativo composto por regras e diretrizes

voltadas especialmente à proteção das crianças e adolescentes em conflito

com a lei. Nesse caso, vale destacar aquelas criadas no âmbito da

Organização das Nações Unidas (ONU): as Regras de Beijing, as Regras das

Nações Unidas para a Proteção de Jovens Privados de Liberdade, as Diretrizes

de Riad, bem como as regras previstas na Convenção sobre os Direitos da

Criança. Tais documentos também compõem a Doutrina das Nações Unidas

para a proteção dos direitos da infância, conhecida como Doutrina da Proteção

Integral, e orientam o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo

(SINASE). Além desses instrumentos específicos para crianças e adolescentes

que cometem um ato infracional, tem-se, ainda no âmbito da ONU, o Conjunto

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de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma

de Detenção ou Prisão e as Regras de Tóquio.

Inicialmente, devemos destacar a Convenção sobre os Direitos da

Criança de 1989 (CDC) na administração da Justiça Juvenil, pois esta prevê

uma série de medidas que devem ser adotadas para proteger os direitos da

criança e do adolescente e buscam, ainda, evitar que estes entrem em conflito

com a lei. Tal Convenção estabelece nos artigos 34 a 36 que os Estados-

Partes adotem medidas que combatam a violência, a negligência e a

exploração contra crianças e adolescentes. No que diz respeito às crianças e

adolescentes que cometem ato infracional, a CDC traz regras específicas,

como é o caso das disposições previstas no seu artigo 37:

Os Estados Partes zelarão para que a) nenhuma criança seja submetida a tortura nem a outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes. Não será imposta a pena de morte nem a prisão perpétua sem possibilidade de livramento por delitos cometidos por menores de dezoito anos de idade; b) nenhuma criança seja privada de sua liberdade de forma ilegal ou arbitrária. A detenção, a reclusão ou a prisão de uma criança será efetuada em conformidade com a lei e apenas como último recurso, e durante o mais breve período de tempo que for apropriado; c) toda criança privada da liberdade seja tratada com a humanidade e o respeito que merece a dignidade inerente à pessoa humana, e levando-se em consideração as necessidades de uma pessoa de sua idade. Em especial, toda criança privada de sua liberdade ficará separada dos adultos, a não ser que tal fato seja considerado contrário aos melhores interesses da criança, e terá direito a manter contato com sua família por meio de correspondência ou de visitas, salvo em circunstâncias excepcionais; d) toda criança privada de sua liberdade tenha direito a rápido acesso a assistência jurídica e a qualquer outra assistência adequada, bem como direito a impugnar a legalidade da privação de sua liberdade perante um tribunal ou outra autoridade competente, independente e imparcial e a uma rápida decisão a respeito de tal ação. (CDC, 1990)

A Organização das Nações Unidas editou as “Regras Mínimas da ONU

para Administração da Justiça da Infância e Juventude”, também conhecidas

como “Regras de Beijing”, através da Resolução nº 40/33 da Assembléia Geral

de 29 de novembro de 1985, as quais têm como objetivo garantir atendimento

digno aos jovens que praticaram ato infracional. As Regras de Beijing tratam de

questões como a detenção, a custódia, a investigação, o processo, a sentença

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e o tratamento institucional e não institucional de adolescentes em conflito com

a lei. Destacam-se como princípios gerais: A promoção de medidas concretas

que permitam a mobilização de todos os recursos disponíveis com a inclusão

da família, de voluntários e outros grupos da comunidade, com o fim de

promover o bem-estar da criança e do adolescente, reduzindo a necessidade

de intervenção legal e tratando de modo efetivo, equitativo e humano a

situação de conflito com a lei. A justiça da infância e da juventude deve

contribuir para a manutenção da paz e da ordem na sociedade.

As Regras Mínimas das Nações Unidas para a proteção dos Jovens

Privados de Liberdade editadas em 14 de dezembro de 1990 constituem um

instrumento para assegurar que as crianças e adolescentes privados de sua

liberdade sejam mantidos em instituições somente quando houver uma grande

necessidade dessa medida, considerando a sua condição e com respeito aos

seus direitos humanos, conforme pode ser observado em dois de seus

parágrafos:

1. Declara que a colocação de um jovem numa instituição deve ser sempre uma decisão do último recurso e pelo mínimo período de tempo necessário; 2. Reconhece que, dada a sua alta vulnerabilidade, os jovens privados de liberdade requerem uma atenção e proteção especiais e que os seus direitos e bem-estar devem ser garantidos durante e depois do período em que estão privados de liberdade. (PJPL 1990)

Já nas Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência

Juvenil, também conhecidas como “Diretrizes de Riad”, o objetivo central é

estabelecer regras para que cada Estado Membro possa construir estratégias

para prevenção da delinquência juvenil.

Tais diretrizes, publicadas em 14 de dezembro de 1990, através da

Resolução nº 45/112, concentram-se na prevenção da delinquência juvenil

mediante a participação da sociedade e a adoção de uma abordagem voltada à

criança. Elas baseiam-se na crença de que a prevenção da delinquência juvenil

é uma parte importante da prevenção do crime na sociedade. Para tanto, o

instrumento define o papel da família, da educação, da comunidade e dos

meios de comunicação, e, ainda, estabelece o papel e a responsabilidade da

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política social, da legislação, da administração da justiça juvenil, da pesquisa,

desenvolvimento e coordenação de políticas.

Uma vez descrito rapidamente alguns itens importantes destas

normativas é necessário que se reconheça a importância da aplicação de

políticas e medidas progressistas de prevenção da delinquência que evitem

criminalizar e penalizar a criança, adotando para isso uma conduta que não

cause grandes prejuízos ao seu desenvolvimento.

Sobre os processos de socialização, é importante ressaltar que deverá

ser prestada uma atenção especial às políticas de prevenção que favoreçam a

socialização e a integração eficazes de todas as crianças e jovens,

particularmente por meio da família, da comunidade, dos grupos de jovens nas

mesmas condições, da escola, da formação profissional e do meio trabalhista.

Deverá ser respeitado, devidamente, o desenvolvimento pessoal das crianças

e dos jovens, que deverão ser aceitos, em pé de igualdade, como

coparticipantes nos processos de socialização e integração;

Os sistemas escolares necessitam tratar de promover e alcançar os

mais elevados níveis profissionais e educativos no que diz respeito a

programas de estudo, métodos e critérios didáticos e de aprendizagem,

contratação e capacitação de pessoal docente.

Apesar de tais regras não terem a mesma força normativa dos Tratados,

pode-se afirmar que elas já se encontram assimiladas pelo ordenamento

jurídico brasileiro, tendo em vista o dever ético e moral do Brasil por ser

membro da ONU e ter incorporado as regras no seu ordenamento.

As crianças que não têm acesso à Educação ou que fracassam

precocemente no processo de escolarização e, acabam sendo excluídos, são

exatamente os filhos dos grupos socialmente vulneráveis, isto é, as crianças de

raça negra, meninas e meninos de rua, crianças portadoras de deficiência e

minorias étnicas e linguísticas, que não deveriam sofrer nenhum tipo de

discriminação no acesso às oportunidades educacionais. Em outras palavras,

as metas e diretrizes internacionais são elaboradas com base nas

necessidades sociais, educacionais e outras das populações vulneráveis, mas,

paradoxalmente, são exatamente estas as que não estão sendo contempladas

pelas mudanças pretendidas.

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O Governo Brasileiro tem sido um fiel subordinado dos pacotes

importados, os quais estabelecem diretrizes para a educação que na sua

maioria respondem de forma precária as metas estabelecidas, causando a

exclusão social em nosso país. Os pacotes educativos que propõem as

agências internacionais constituem-se num modelo essencialmente escolar

com duas grandes ausências: os professores e a Pedagogia. No entanto, a

virtual ausência do docente na definição, discussão e tomada de decisões de

política educativa termina por eleger, selar estes pacotes formulados,

desenhados pelas agências internacionais para serem executados e

materializados por esses mesmos educadores em países emergentes. Tanto

na esfera nacional como internacional, a política educativa encontra-se em

geral e, principalmente, nas mãos de economistas, ou profissionais vinculados

à Educação, mais a partir da Economia ou da Sociologia do que relacionados

aos currículos ou à Pedagogia.

A atual crise econômica mostra que a política neoliberal não foi capaz de

recuperar e de desenvolver o capitalismo acentuando as desigualdades sociais

e a concentração das riquezas. Até quando as massas irão aceitar

passivamente a degradação e a miséria? As medidas não foram eficazes e a

recessão atual se caracteriza ainda mais com o aumento do endividamento

público em dimensões antes desconhecidas, somados ao aumento do

endividamento privado das famílias e das empresas, com riscos alarmantes ao

processo produtivo. Mesmo assim, o neoliberalismo prevalece e continua a

articular o grande emblema da sociedade burguesa: garantir a consolidação de

direitos escritos que não se concretizam verdadeiramente, por isso é preciso

lutar para combater essa situação educacional.

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5. SOCIOEDUCAÇÃO

5.1 Política Pública Federal – SINASE e as políticas para a

Socioeducação

Antes de entendermos o que é o SINASE e como se dá seu

funcionamento é preciso compreender que essa lei vem de uma construção

anterior que como tudo nas questões do adolescente em conflito com a lei

inicia com a Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990, o Estatuto da Criança e do

Adolescente.

Depois entra em vigor a Lei nº 10.933, de 11 de agosto de 2004 que

disporá sobre o Plano Plurianual no período de 2004 a 2007, esse plano trata

do atendimento ao adolescente em conflito com a lei. Na sequência a

aprovação da Lei nº 11.653, de 7 de abril de 2006 que dispõe sobre o Plano

Plurianual para o período de 2008 a 2011 e que trata do Sistema Nacional de

Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei –

PROSINASE. A Resolução nº 119/2006 do CONANDA é a próxima política a

entrar em vigor e dispõe sobre o Sistema Nacional de Atendimento

Socioeducativo – SINASE; e finalmente a lei nº 12.594, de 18 de janeiro de

2012, instituirá o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, com a

função de regulamentar a execução das medidas socioeducativas que estão no

ECA e que se destinam ao adolescente acometedor de ato infracional e

portanto denominado adolescente em conflito com a lei.

É importante entender o que significa SINASE, posto que essa seja a lei

mais recente que temos no Brasil no que diz respeito ao trato ao adolescente

em conflito com a lei. O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo

(Sinase) foi um projeto de lei que obteve sua aprovação através de resolução

do Conanda - Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. O

Sinase em seu ordenamento prevê normas que atuam para uma padronização

dos procedimentos jurídicos que envolvem os adolescentes que cometeram

algum tipo de ato infracional.

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Entre as mudanças ocorridas está a do número de adolescentes que

podem ser atendidos em cada unidade de atendimento em regime fechado.

Cada unidade que trabalha com o regime fechado e aplica as medidas

socioeducativas de privação de liberdade deverá atender no máximo 90

adolescentes por vez, evitando assim a superlotação dos estabelecimentos, e

também prevê que cada quarto só pode ser ocupado por três adolescentes por

vez.

Segundo as normas do Sinase, também há uma previsão de mudanças

no que diz respeito à arquitetura dessas unidades onde se priorizam as

construções horizontais com espaços abundantes para atividades físicas.

Também nesse novo ordenamento os serviços de saúde, educação, cultura,

esporte, lazer e profissionalização são tratados com máxima prioridade.

No que diz respeito às políticas e as responsabilizações dos governos,

fica muito claro que as intervenções devem ocorrer em âmbito federal, estadual

e municipal em relação à aplicação das medidas e após seu cumprimento, na

reinserção social desses adolescentes em conflito com a lei. O plano prevê

também que municípios com mais de 100 mil habitantes possam elaborar

planos individualizados para o cumprimento das medidas socioeducativas em

meio aberto como a medida de “prestação de serviços comunitários”, enquanto

municípios menores poderão elaborar planos a nível regional.

5.2 As Medidas socioeducativas

Aos adolescentes em conflito com a lei é imputado a responsabilização

por seus atos infracionais não de acordo com a legislação comum penal, mas

sim de acordo com as normas do Estatuto da Criança e do Adolescente, onde

passam a responder por seus atos se submetendo as medidas de

socioeducação que matem um caráter estritamente pedagógico e não penal.

O Sistema Infanto Juvenil necessita adequar-se à realidade e a

necessidade social dos adolescentes tendo como objetivo principal garantir os

direitos dos adolescentes e também garantir que qualquer circunstância

aplicada ao autor do ato infracional seja proporcional à pessoa em

desenvolvimento.

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O processo de socioeducação tem como momento de início a apreensão

do adolescente infrator pela Polícia seguido pelo momento de apuração do ato

infracional e promulgação da sentença decretada pelo juiz e a partir de então a

passagem pelo cumprimento da medida de socioeducação e a execução de

todos os serviços de atendimento ao adolescente em conflito com a lei.

No entanto a apreensão do adolescente pode ocorrer apenas segundo

as disposições legais. Segundo o Capítulo II “Dos Direitos Individuais” do

Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente. Parágrafo único. O adolescente tem direito à identificação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo ser informado acerca de seus direitos. Art. 107. A apreensão de qualquer adolescente e o local onde se encontra recolhido serão incontinenti comunicados à autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa por ele indicada. Parágrafo único. Examinar-se-á, desde logo e sob pena de responsabilidade, a possibilidade de liberação imediata. Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias. Parágrafo único. A decisão deverá ser fundamentada e basear-se em indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida.

Como percebe-se a internação provisória está prevista no art. 108 do

Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo o juiz que determinará a

internação antes da promulgação da sentença e pelo prazo máximo de

quarenta e cinco dias. Nesse sentido o adolescente só poderá ser

encaminhado para a unidade em regime de internação provisória quando o ato

infracional que ele tenha cometido seja considerado de natureza grave e para

isso deve ser acusada a ameaça ou violência contra a pessoa. Durante esse

período de internação provisória, são instaurados os procedimentos que farão

a apuração do ato infracional, sendo para isso ouvidas as testemunhas que

darão subsídios para a aplicação da sentença judicial que poderá resultar em

uma medida socioeducativa ou não.

Compreender o cometimento do ato infracional não é simples, pois sua

produção é complexa e por ele perpassam diversos fatores. Entre esses

fatores, podemos entender que esse delito é cometido a partir das

circunstâncias da produção da vida do indivíduo, a produção social de sua vida.

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(...) na produção social da própria vida, os homens contraem relações determinadas, necessárias e independentes de sua vontade, relações de produção essas que correspondem a uma etapa determinada do desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. (...) O modo de produção da vida material condiciona o processo em geral de vida social, política e espiritual. (MARX, 1982, p. 24)

Na perspectiva de Marx poderíamos entender o cometimento de um ato

infracional por um adolescente como uma forma de produção social, ou como

entende Volpi, (2001, p. 57) “o que define o que é delito ou não é a

superestrutura jurídica e política baseada na totalidade das relações de

produção”.

Na maioria das vezes quando é feita análise do cometimento do ato

infracional pelo adolescente leva-se em consideração as concepções de

injustiça social e a má índole do adolescente. Sob a ótica da primeira o

adolescente em conflito com a lei é nada mais do que uma vítima produzida

pelo sistema capitalista, sob a ótica da segunda o adolescente infrator deve ser

recuperado e punido. Seguindo essas duas formas de pensamento as medidas

de socioeducação devem ser aplicadas.

Conforme já apontado na nota 17 desta tese, e cabendo aqui sua

repetição por ser de reiterada importância, no Estatuto da Criança e do

Adolescente no Capítulo IV “Das Medidas Sócio-educativas”, seção I, em seu

Art. 112, está previsto as seguintes medidas:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semiliberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

Todavia estas medidas são para serem aplicadas e trabalhadas

conforme as características de cada infração e de cada sujeito que a cometeu

em suas peculiaridades afim de que as medidas aplicadas sejam educadoras e

não coibidoras. É necessário cultivar o sentido construtivo de vida da

participação, do saber, de cultivar a bondade e todos os sentimentos bons em

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relação à mudança de atitude perante o extrato de sua própria conduta de vida.

É preciso também respeitar o adolescente independente do delito que

este tenha cometido o que realmente torna-se difícil ao ser humano, pois

significa tratar com respeito e dignidade quem feriu o respeito e a dignidade de

outrem. No entanto, não podemos desprover o outro de seus direitos e

possibilidades, por isso ao tratar das medidas socioeducativas se faz

necessário ir além do que a medida propriamente dita suscita em seu bojo. È

preciso prestar atenção além do fato de aplicar uma medida socioeducativa e

esperar que ela por si só faça todo o trabalho de recondução dessa vida, desse

ser humano para que usufrua dos seus direitos de cidadão e não interfira mais

na vida de outros de forma bárbara ou de forma que possa podar-lhe a própria

vida.

Observemos um breve relato da lei e do significado de cada uma das

medidas que são aplicadas aos jovens em conflito com a lei e estão inseridos

no sistema da doutrina da proteção integral ou da socioeducação para

compreendermos com maior propriedade as possibilidades de trabalho.

Embora já citados anteriormente em nota de rodapé alguns dos artigos abaixo

listados, acredito que trazendo-os novamente em evidência e de forma mais

completa, possa tornar mais fácil a leitura e o entendimento, além de reforçar

sua importância.

A Advertência,27 (medida I), tem a intenção de fazer com que o

adolescente acometedor de ato infracional perceba o equívoco praticado e

como suas consequências podem ser negativas em sua trajetória de vida o

prevenindo de não estabelecer práticas semelhantes.

A Obrigação de reparar o dano,28 (medida II), pressupõe ao

adolescente uma forma de reparar, quando possível, e, através de seu

trabalho, o dano causado, sendo que nem sempre uma infração deixa um dano

a reparar.

27

Art. 115. A advertência consistirá em admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada. 28

Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima. Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada.

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A Prestação de serviços a comunidade,29 (medida III), prevê ao

adolescente uma forma de trabalho comunitário levando em consideração a

sua condição peculiar de adolescente para considerar o período e a quantidade

de horas a serem trabalhados sem causar prejuízo a educação.

A Liberdade Assistida,30 (medida IV) é aplicada geralmente quando

uma medida mais branda não traria um resultado eficaz e quando uma medida

mais severa como a internação não seria recomendada. E sua execução tem

que estar em conformidade com o artigo 119 do Estatuto.

Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros: I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social; II - supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula; III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho; IV - apresentar relatório do caso.

A Semiliberdade,31 (medida V) é uma medida de transição aplicada

geralmente após a medida de internação onde a escolarização e a

profissionalização do adolescente são obrigatórias.

A Internação,32 (medida VI) é uma medida aplicada pela orientação da

excepcionalidade e brevidade, respeitando os artigos 122, 123 e 124 do

Estatuto da Criança e do Adolescente.

29

Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais. Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a frequência à escola ou à jornada normal de trabalho. 30

Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente. § 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento. § 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvida o orientador, o Ministério Público e o defensor. 31

Art. 120. O regime de semi-liberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial. § 1º São obrigatórias a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade. § 2º A medida não comporta prazo determinado aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação. 32

Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. §

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Todas as medidas socioeducativas são percebidas através de sua dupla

função: natureza sancionatória e conteúdo pedagógico. Para que sua aplicação

seja realmente efetivada com sucesso é preciso que os educadores que atuam

no trabalho socioeducativo estejam preparados para exercer essa dupla

dimensão. É necessária uma formação legalista, conhecendo todos os

dispositivos da lei e suas aplicações e uma formação pedagógica, no sentido

de proporcionar ao adolescente autor de ato infracional a garantia da execução

dos seus direitos e deveres fundamentais de cidadão.

As medidas socioeducativas que são aplicadas aos adolescentes em

conflito com a lei; infratores; cometedores de delito precisam contemplar

sempre os objetivos dentro da perspectiva socioeducativa. Esses objetivos

nada mais são, do que, a garantia de ter acesso aos seus direitos e deveres

1º Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário. § 2º A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses. § 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos. § 4º Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semi-liberdade ou de liberdade assistida. § 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade. § 6º Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público. Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando: I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa; II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves; III - por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta. § 1º O prazo de internação na hipótese do inciso III deste artigo não poderá ser superior a três meses. § 2º. Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada. Art. 123. A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração. Parágrafo único. Durante o período de internação, inclusive provisória, serão obrigatórias atividades pedagógicas. Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes: I - entrevistar-se pessoalmente com o representante do Ministério Público; II - peticionar diretamente a qualquer autoridade; III - avistar-se reservadamente com seu defensor; IV - ser informado de sua situação processual, sempre que solicitada; V - ser tratado com respeito e dignidade; VI - permanecer internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável; VII - receber visitas, ao menos, semanalmente; VIII - corresponder-se com seus familiares e amigos; IX - ter acesso aos objetos necessários à higiene e asseio pessoal; X - habitar alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade; XI - receber escolarização e profissionalização; XII - realizar atividades culturais, esportivas e de lazer: XIII - ter acesso aos meios de comunicação social; XIV - receber assistência religiosa, segundo a sua crença, e desde que assim o deseje; XV - manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local seguro para guardá-los, recebendo comprovante daqueles porventura depositados em poder da entidade; XVI - receber, quando de sua desinternação, os documentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade. § 1º Em nenhum caso haverá incomunicabilidade. § 2º A autoridade judiciária poderá suspender temporariamente a visita, inclusive de pais ou responsável, se existirem motivos sérios e fundados de sua prejudicialidade aos interesses do adolescente. Art. 125. É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhe adotar as medidas adequadas de contenção e segurança.

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para superar essa situação de exclusão, e a partir dessa superação incorporar

valores bons, positivos e acima de tudo de participação na vida em sociedade.

Aplicar uma medida socioeducativa é colocar em curso a doutrina da

proteção integral. Nesse sentido a busca de práticas que possam alterar a sua

caminhada ou trajetória de vida, para um curso de construção e reconstrução

de sua cidadania se faz de fundamental importância.

Nesse tempo em que vivemos, podemos perceber um cenário de

grandes problemáticas sociais, econômicas e políticas a serem resolvidas.

Essas problemáticas são decorrentes da própria desumanização que as

transformações propõem. Questões como a fome, a corrupção, a miséria entre

tantas outras, assolam nosso país e exigem mudanças radicais. Esse

narcisismo exacerbado apresenta uma mudança nos valores que os homens

destinam aos outros homens e as coisas. No que tange ao adolescente em

conflito com a lei, o imediatismo e a superficialidade de conhecimento deixam

muitas arestas Na socioeducação algumas dessas arestas podem ser

superadas e podem vir a proporcionar transformações na maneira de ser, ver e

viver em sociedade.

Essa é a função de uma medida socioeducativa, reorientar os valores e

as formas de convivência social, não somente dos adolescentes em conflito

com a lei, mas também de todo o meio que o circunda, ou seja, existe uma

rede de interações entre escola, família, trabalho, sistema socioeducativo,

comunidade e rede de serviços de atendimento que se colocam a disposição e

ao mesmo tempo enredados para a construção de um novo adolescente.

5.3 Política Pública Estadual - Cadernos da Socioeducação no Paraná

Os Cadernos de Socioeducação que foram lançados em 2006

primeiramente sob o nome de Cadernos do IASP contavam com 5 volumes,

sendo eles; Compreendendo o Adolescente, Práticas de Socioeducação,

Gestão de Centros de Socioeducação, Rotinas de Segurança e

Gerenciamento de Crises. Passando por reelaboração e inovação foi

relançado em 2010 com mais 4 volumes: Programa Aprendiz,

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Semiliberdade; Internação e Suicídio e Protocolo de Atenção aos Sinais e

informações sobre Drogadição. A mudança que ocorreu em relação ao

nome da coleção também expressa o avanço que ocorreu nos cinco anos entre

a nova reedição em relação ao atendimento do adolescente que está em

conflito com a lei. Além dos Cadernos, também ocorreu a criação da Secretaria

de estado da Criança e Juventude – SECJ, substituindo o IASP, que a partir de

2010 tornou-se a Secretaria do Desenvolvimento Familiar – SEDS.

Essa foi a primeira secretaria de estado que foi criada no Brasil para

executar e articular as políticas públicas contidas no Sistema de garantia de

Direitos das Crianças e Adolescentes.

Os cadernos nasceram de um diagnóstico que o Governo do estado do

Paraná realizou no ano de 2004 sobre a situação do adolescente em conflito

com a lei que cumpre as medidas V e VI da socioeducação, que são a

Restrição e a Privação de Liberdade.

Nesse diagnóstico levantado, as problemáticas surgidas foram entre

tantas outras, o déficit de vagas, a permanência de adolescentes nas

delegacias, a superlotação, trabalhadores sem vínculos efetivos e

desalinhamento metodológico entre os Centros de socioeducação – Censes.

Essa realidade tinha a necessidade de uma resposta urgente e que fosse

capaz de proporcionar uma ruptura entre velhos paradigmas e estigmas e

pudesse conceber um sistema estruturado, organizado, qualificado e articulado

a todos os serviços das políticas sociais básicas seguindo as determinações

das normas e leis vigentes: o ECA, o SINASE e o CONANDA.

Um dos objetivos da socioeducação é intentar na colaboração para a

emancipação humana com um novo projeto de vida ao adolescente, diferente

do qual o trouxe até aqui. Os Cadernos tem a intenção maior de estabelecer

um padrão de referência para as ações educacionais da socioeducação das

medidas de restrição e privação de liberdade. Todos os Cadernos passaram

pelo mesmo processo de elaboração e são resultados de estudo e reflexão

sobre a prática e o registro de aprendizagem na socioeducação e o material

produzido, acima de tudo está a serviço da garantia de direitos de execução

correta das medidas socioeducativas.

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O caderno 1 – Compreendendo o Adolescente traz em 6 capítulos

alguns aspectos relevantes a cerca da compreensão do mundo da

adolescência. A definição de adolescência, os aspectos físicos, sociais

psicológicos, os fatores de risco e fatores de proteção para a conduta

infracional e as características dos adolescentes em cumprimento de medida

socioeducativa são temas abordados nesse volume. Nesse caderno procura-se

acima de tudo “identificar o sujeito a quem se destina a ação socioeducativa”.

(Caderno 1, p.19)

O caderno 2 – Práticas de Socioeducação em 5 capítulos apresenta

elementos sobre as bases da socioeducação, as formas da ação

socioeducativa e suas fases, os instrumentos pedagógicos e a integração dos

instrumentos no processo socioeducativo. O objetivo maior deste caderno é

evidenciar as bases teóricas e apresentar os aspectos metodológicos e operacionais que constituem a proposta político-pedagógica da instituição dirigida aos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de privação e restrição de liberdade no Estado do Paraná. (Caderno 2, p. 19)

O caderno 3 – Gestão de Centros de Socioeducação em 3 capítulos

resume o contexto da gestão socioeducativa, a gestão dos centros de

socioeducação e o trabalho na comunidade socioeducativa. Dessa maneira,

esse caderno,

trata da gestão dos Centros de Socioeducação, contextualizada no sistema socioeducativo do Paraná, caracterizado como gestor público do poder executivo estadual, que está integrado ao Sistema nacional de Atendimento de Socioeducação – SINASE. (Caderno 3, p. 18)

O caderno 4 – Rotinas de Segurança em 7 capítulos trata das bases

para o desenvolvimento das atividades de segurança, os procedimentos

básicos da segurança, as operações básicas de segurança, o uso de rádio

comunicadores e vigias eletrônicas, as normas de conduta dos servidores e os

direitos e deveres dos adolescentes. Nesse volume destacam-se as

normas e procedimentos básicos de segurança dos Centros de Socioeducação, que visam propiciar condições favoráveis ao desenvolvimento das atividades escolares, profissionalizantes, sociais, culturais, esportivas, recreativas, bem como das demais

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atividades, incluindo as refeições, a higiene pessoal e ambiental, o descanso, o atendimento psicológico, médico e sócio-familiar. (Caderno 4, p.20)

O caderno 5 – Gerenciamento de Crises em 14 capítulos faz um

apanhado sobre as possibilidades de como gerenciar as mais diversas crises

nos espaços socioeducativos, entre eles, o Uso da Força com os adolescentes

em conflito com a lei, questões de ameaça a segurança, como tomar

providencias em momento de crise, quais as medidas a serem adotadas nas

fases de avaliação, organização, intervenção, e gerenciamento de eventos.

Este caderno foi extraído do Protocolo Interinstitucional, que teve como objetivo estabelecer diretrizes e normatizar os procedimentos de gerenciamento de crise nas unidades de privação de liberdade para adolescentes em conflito com a lei no Estado do Paraná. O Protocolo Interinstitucional foi concebido pela Secretaria de Estado da Criança e da Juventude – SECJ, em conjunto com a Polícia Militar do Paraná – PMPR, e com a participação e colaboração do Poder Judiciário e Ministério público, instituições que acompanham a execução de medida socioeducativa. (Caderno 5, p.22)

O caderno 6 – Programa Aprendiz em 5 capítulos, apresenta os

direitos do adolescente ao trabalho como aprendiz, através da abordagem

conceitual, organizacional e educacional, além de trazer também os aspectos

legais da Aprendizagem nos níveis federal e estadual.

Este caderno trata, centralmente, da temática a respeito da importância do desenvolvimento de políticas públicas que garantam o direito fundamental do adolescente à profissionalização e a contribuição que o Estado do Paraná vem dando nesse sentido, através do Programa Estadual de Aprendizagem para o Adolescente em Conflito com a Lei – Programa Aprendiz. Esse Programa teve início em 2005 e sua finalidade é oferecer a oportunidade de profissionalização a adolescentes entre 14 e 18 anos, criando oportunidade de inclusão social e educacional, aliando o estímulo ao estudo à prática profissional, ampliando a sua perspectiva de futuro. (Caderno 6, p. 18)

O caderno 7 – Semiliberdade em 11 capítulos, demonstra todas as

especificidades dessa medida socioeducativa e suas implicações como seu

projeto político pedagógico esta estruturado, como funcionam os princípios

básicos da ação socioeducativa, as progressões e regressões no cumprimento

dessa medida, entre outros.

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A Semiliberdade é uma medida socioeducativa prevista no art. 120 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, que prevê que esta não comporta prazo determinado, devendo ser revista no máximo a cada seis meses. A duração da medida, conforme estabelecido, não deverá ultrapassar três anos, entendendo-se que esta pode ser aplicada como medida inicial ou como forma de transição para o meio aberto. Dessa forma, subentende-se que a Semiliberdade pode ser determinada como forma de evitar a internação do adolescente em uma instituição, ou como progressão de regime, para aqueles que já se encontram privados de liberdade, em cumprimento da medida de internação. (Caderno 7, p. 18)

O caderno 8 – Internação e Suicídio traz 26 capítulos que discutem

desde os principais aspectos da adolescência, os principais fatores de risco, os

transtornos mentais, os possíveis perfis dos adolescentes com risco de

suicídio, até o ambiente físico, os tratamentos à saúde mental, as melhores

práticas e como ajudar o adolescente em risco de cometer o suicídio.

O caderno foi criado visando atender a uma demanda advinda dos profissionais dos Centros de Socioeducação que se deparam com a difícil tarefa de lidar com a questão do suicídio. No material apresentado buscamos abordar, de forma prática, os possíveis sinais precursores do suicídio e suas respectivas condutas de ajuda, ilustrados com situações relacionadas à rotina dos Censes. A ameaça de suicídio, decorrente da ambivalência de sentimentos e a hesitação em atentar contra a própria vida, está presente até o último momento e pode ser interrompida a qualquer hora, devendo ser considerada um importante pedido de ajuda. (Caderno 8, p. 18)

E por fim o caderno 9 – Protocolo de Atenção aos Sinais e

informações sobre Drogadição com 12 capítulos sobre o uso e abuso das

drogas, o tipo de drogas existentes como depressoras, estimulantes,

perturbadoras, alucinógenas e também o que se pode fazer em relação a

prevenção ao abuso de drogas e as formas de tratamento.

Nos Centros de Socioeducação do Paraná encontramos um alto índice de uso das substâncias psicoativas entre os adolescentes que cumprem medida socioeducativa de privação e restrição de liberdade, o que nos permite inferir a existência de uma relação estreita entre a criminalidade na adolescência e o uso de drogas. (Caderno 9, p. 18)

Após essa incursão descritiva sobre o conteúdo que está nos Cadernos

da Socioeducação entendemos que as questões que circundam o adolescente

em conflito com a lei são as mais variadas e exigem graus distintos de

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conhecimento e de atuação por parte dos profissionais inseridos nessa frente

de trabalho. Para uma maior compreensão é preciso então, buscar reunir

olhares lançados sob as mais diversas perspectivas com o objetivo de

aproximar-se o mais possível da complexidade que esse tema exige. Ainda

assim, se faz necessário compreender também, que os Cadernos não esgotam

todos os assuntos que se referem ao adolescente em conflito com a lei, e que

estão em constante modificação, aperfeiçoando e aprofundando as suas

metodologias de abordagem para a socioeducação.

Garantir a defesa dos direitos e deveres do adolescente em conflito com

a lei e promover o desenvolvimento do adolescente para a realização e

construção de um novo projeto de vida é condição para o trabalho da

socioeducação.

Os cadernos da socioeducação, são excelentes textos que auxiliam os

trabalhadores da socioeducação a entender as políticas que regem o sistema e

também, auxiliam a realizar as ações socioeducativas. Os cadernos somados

as normativas podem interferir em um percentual alto no auxilio ao trabalho dos

educadores, professores, diretores e toda equipe a frente do trabalho

socioeducativo, mas ainda é preciso mais, é preciso entender o contexto em

que estão inseridos e o que os trouxe até o sistema, pois, serão enfrentados

muitos desafios no momento de realizar as ações propriamente ditas, a

começar pelo fator de tentar apresentar aos jovens infratores o valor da sua

vida e o valor da vida do seu semelhante. Na tentativa de orientar para um

futuro diferenciado auxiliando a estabelecer metas a serem superadas na

produção da sua própria existência, os trabalhadores necessitam acreditar e

pautar-se na formação de valores como o respeito, a solidariedade, respeito

aos direitos e deveres de cada cidadão e ainda mais a formação de um ser

humano crítico, com consciência crítica, e com amplo dimensionamento de sua

razão de ser e estar fazendo parte de uma comunidade, de uma população e

conhecendo os elementos que o cercam nas dimensões social, econômica,

política e cultural exercitem sua cidadania e adquiram a sua autonomia para a

humanização.

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5.4 Educação nos Centros de Socioeducação no Paraná

O Programa de Educação nas Unidades Sócioeducativas – PROEDUSE

trabalha dentro dos parâmetros curriculares nacionais e do Estado do Paraná

com a Educação de Jovens e Adultos. A Secretaria de Desenvolvimento

Familiar e a Secretaria de Educação mantêm uma parceria que tem como

objetivo principal ofertar e garantir a escolarização básica no nível fundamental

e/ou médio aos jovens privados de liberdade ou em situação de risco pessoal e

social que são atendidos nas Unidades de Socioeducação. Segundo o

PROEDUSE (2005, p. 2),

Com vistas ao atendimento das necessidades específicas desses educandos em privação de liberdade nas Unidades Sócio-Educativas de internação e de internação provisória, e em respeito a esses sujeitos aprendizes, as Secretarias de Estado parceiras entendem que o processo de construção da educação pressupõe o reconhecimento da História como tempo de possibilidade e não de determinismo, de um futuro problemático, mas não inexorável, como Paulo Freire dimensiona a prática educativa.

Através da prática de ensinar esses adolescentes que cometeram um

ato infracional, e ao mesmo tempo em que se ensina, se aprende socialmente

com eles, que as secretarias através do departamento de Educação de Jovens

e Adultos perceberam ser possível e ainda mais preciso trabalhar maneiras de

ensino diferenciados que pudessem ir de encontro à suas realidades.

Muito mais do que nas salas de aula comum, é preciso na

socioeducação experimentar formas de uma prática educativa criativa, pois

somados ao conhecimento formal estão também o compromisso com a

qualidade de atendimento e com a qualidade de vida proporcionada ao interno

com vistas a motivar a sua transformação o impulsionando para uma nova

visão de mundo onde possa ser sujeito de sua própria construção histórica.

Segundo Arroyo (2007) é necessária mudança por parte de todos que estão

trabalhando com esses adolescentes, para poder percebê-los como sujeitos de

seu processo histórico e proporcionar a humanização.

Como uma criança-adolescente ou um coletivo de crianças, adolescentes ou jovens elabora o fato de ser catalogados como violentos, infratores, bárbaros em seus processos de conformação de

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identidades? Como os profissionais desses delicados processos serão capazes de acompanhá-los? São questões trazidas pelas novas formas de segregação que indagam as pesquisas e a reflexão pedagógica (ARROYO, 2007, p. 790)

Paulo Freire dizia que para conscientizar os sujeitos para a sua

libertação e explorar as relações homem – mundo se faz primordial a

humanização.

A palavra viva é diálogo existencial. Expressa e elabora o mundo, em comunicação e colaboração. O diálogo autêntico – reconhecimento do outro e reconhecimento de si, no outro – é decisão e compromisso de elaborar na construção do mundo comum. Não há consciências vazias; por isso os homens não se humanizam, senão humanizando o mundo. (FREIRE, 2005, p.21)

Para esta humanização a prática educativa se depara com alguns

desafios muito importantes, tais como a universalização dos direitos de

escolaridade a ser ofertada aos jovens em privação de liberdade através da

EJA no PROEDUSE e o estabelecimento de uma pedagogia própria com uma

metodologia que corresponda ao atendimento direcionado aos adolescentes

em conflito com a lei. Nesse sentido, muito mais do que ser um professor e

ministrar aulas de conteúdo formal é necessário possibilitar ao educando uma

reconstrução da sua própria condição histórica, resgatando o respeito próprio e

coletivo e melhorando sua autoestima para que possa atingir um nível de

autonomia de pensamento e de vida. “É nesse sentido que reinsisto em que

formar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho de

destrezas” (FREIRE, 1996, p. 14)

Sendo assim o POEDUSE, tem o objetivo de trabalhar a escolarização

juntamente com o adolescente em conflito com a lei e não trabalhar a

escolarização para o adolescente em conflito com a lei, pois mesmo que

percebamos cada um dos indivíduos que cometeram atos infracionais como

iguais, existem muitas diferenças, e nesse processo de formação.

È preciso que, pelo contrário, desde os começos do processo, vá ficando cada vez mais claro que, embora diferentes entre si, quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado. É neste sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos nem formar é ação pela qual um sujeito

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criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. (FREIRE, 1996, p.23)

Para Freire (1996), a educação trabalha o educar como um construir.

Educar é libertar o homem do determinismo, passando a reconhecer o papel da

História e onde a questão da identidade cultural, tanto em sua dimensão

individual, como em relação à classe dos educandos, é essencial à prática

pedagógica proposta. Sem respeitar essa identidade, sem autonomia, sem

levar em conta as experiências vividas pelos educandos o processo será

inoperante, somente meras palavras, sem significação real. A educação é

ideológica, mas dialogante, pois só assim pode se estabelecer a verdadeira

comunicação da aprendizagem entre seres constituídos de almas, desejos e

sentimentos.

A Constituição Federal de 1988, afirma que a educação é um direito de

todos e também um dever do Estado e da família, que visa o desenvolvimento

da pessoa para que possa exercer seus direitos de cidadão e se qualifique

para o trabalho. A Constituição Federal prevê também que o ensino será

ministrado seguindo os princípios de igualdade nas condições que permitem o

acesso e a permanência na escola; liberdade de pesquisar e divulgar o

pensamento, bem como, aprender e ensinar. Paralelamente a Constituição

Federal, o ECA em substituição ao modelo da Situação Irregular vem trabalhar

com a inclusão social do adolescente em conflito com a lei.

Nesse sentido o atendimento socioeducativo necessita que suas ações

sejam direcionadas para fins pedagógicos e assim possibilitem a construção de

projetos de vida que não incluam atos ilícitos/ilegais.

Segundo Antonio Carlos Gomes da Costa (1998), o atendimento

socioeducativo dos adolescentes que cometeram um ato infracional necessita

oferecer condições que favoreçam o protagonismo juvenil. Nessa perspectiva

do protagonismo juvenil a participação do adolescente é fundamental, desde

que seja autêntica, ou seja, não pode ser manipulada ou apenas para

decoração. A participação efetiva do adolescente, e nesse caso do adolescente

em conflito com a lei é a atividade mais ontocriadora possível, pois, é

formadora do ser humano nos âmbitos pessoal e social.

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Torna-se primordial que através do protagonismo juvenil possa ocorrer a

superação das situações de exclusão, assim como também o acesso a

formação de valores para que ocorra a participação do adolescente infrator na

vida social de forma a ser o sujeito principal de ações que vão desde as

preventivas até as reeducativas que se realizam através das políticas de

proteção e políticas sociais.

Desse modo podemos entender que a função social da escola tem como

objetivo principal promover a escolarização em nível fundamental e/ou médio

desses adolescentes que cometeram atos ilícitos e consequentemente ficaram

marginalizados do processo educativo.

As Unidades de sócioeducação oferecem atendimento aos jovens

infratores da seguinte maneira;

Internação; desenvolve ações sócio-educativas para jovens autores de ato infracional e que se encontram em cumprimento de medida determinada pelos Juizados das varas da Infância e da Juventude. Esse atendimento é desenvolvido nas Unidades Sócio-Educativas, que acolhem jovens infratores em cumprimento de medidas sócio-educativas, com privação de liberdade, na faixa etária de 12 a 18 anos, podendo estender-se até os 21 anos, excepcionalmente, oriundos de todas as localidades do estado do Paraná. Internação provisória: caracteriza-se pelo atendimento aos jovens a quem se atribui autoria de ato infracional, no período máximo de 45 dias. Nesse período é elaborado estudo de caso, a fim de auxiliar a Vara da Infância e da juventude, na aplicação da Medida sócio-educativa ou de proteção ao jovem, e articular os recursos da comunidade para garantir uma intervenção futura que venha de encontro às necessidades nele observadas. (PROEDUSE, 2005, p. 5-6)

Quando um adolescente comete um ato infracional e ingressa em uma

dessas formas de atendimento, eles se submetem a escolarização, as

atividades de profissionalização, de lazer, de esportes, de arte, além de

participar como sujeito principal de uma nova forma de conviver com a família,

com a comunidade e com seus pares.

A escolarização em específico deve permitir que ocorra a avaliação do

momento que o adolescente se encontra, assim como, deve permitir também o

pleno aproveitamento dos estudos realizados em período de internamento

quando se desligar do sistema.

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O Departamento de Educação de Jovens e Adultos entende que é

necessário ofertar atendimento escolar a educandos com necessidades

específicas, como no caso dos adolescentes em conflito com a lei, em espaços

e com metodologia adequada a sua categoria. A EJA trabalha a escolarização

através da metodologia da problematização. Essa metodologia se dá através

de três eixos articuladores: cultura, trabalho e tempo.

De fato a Educação de Jovens e Adultos objetiva criar situações de ensino aprendizagem adequadas às necessidades educacionais de jovens e adultos, realizando suas funções reparadora, equalizadora e permanente, conforme determinado no Parecer 11/00-CEB/CNE. A restauração do direito negado, o direito a uma escola de qualidade e o reconhecimento da igualdade de todo e qualquer cidadão, a possibilidade de reentrada no sistema educacional e da atualização permanente de conhecimentos, norteiam o Programa. (PROEDUSE, 2005, p. 9)

Sendo assim, o tempo de aprendizagem é diferenciado e não um tempo

único para todos. A apropriação e a construção do conhecimento são voltados

ao mundo do trabalho, e a diversidade dos adolescentes com situações sociais

diferenciadas permitem a socialização da cultura e do conhecimento.

As unidades socioeducativas prospectam uma imagem segura, para permitir o cumprimento da medida socioeducativa num clima de tranquilidade e proteção dos adolescentes e funcionários; uma imagem que pretende despertar o potencial positivo dos adolescentes em relação a si mesmo, com o outro e com a natureza e uma imagem educativa, para garantir um processo educativo pleno, integral, transformador e emancipado, capaz de suscitar um novo projeto de vida junto aos adolescentes e apoiar sua reinserção social em outras bases. Porém não se pode deixar de admitir que as unidades são instituições, e como tal, tem um papel a cumprir, ou, mormente transmitir. (MOCELIN, 2009, p. 88)

Por fim a emancipação humana desses adolescentes em conflito com a

lei decorrerá de todo esse processo da construção da autonomia através dessa

nova forma de educação escolar, onde o exercício da cidadania e da

democracia refletirá em um processo de emancipação e libertação com valores

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de solidariedade, direitos e justiça, pois, como diz ARROYO, (2004, p. 224),

ensinar, aprender, socializar, desenvolver, enfim formar esse conjunto de

dimensões em cada criança, adolescente ou jovem tem sido ao longo dos

séculos as esperanças depositadas na educação e na docência.

5.5 Política Pública Municipal – Conselho Tutelar

O Estatuto da Criança e do Adolescente, que é a lei nº 8069 de 13 de

julho de 1990, traz no Título V, “Do Conselho Tutelar”, as normas específicas

para a atuação desse órgão em 5 capítulos e 10 artigos.

Em seu primeiro artigo, apresenta a definição do que é o Conselho:

Art. 131 - O Conselho Tutelar é um órgão permanente e autônomo, sem jurisdição, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta Lei. (SECJ, 2010, p. 77)

O Conselho Tutelar pode ter até 5 membros em sua composição e pode

também haver um em cada cidade, onde serão criados por lei municipal e

tronam-se parte do conjunto de instituições que se subordinam ao

ordenamento jurídico brasileiro.

Art. 132. Em cada Município e em cada Região Administrativa do Distrito Federal haverá, no mínimo, 1 (um) Conselho Tutelar como órgão integrante da administração pública local, composto de 5 (cinco) membros, escolhidos pela população local para mandato de 4 (quatro) anos, permitida 1 (uma) recondução, mediante novo processo de escolha. (LEI nº 12.696, de 2012)

Desde sua criação o ECA vem sofrendo várias alterações em sua

redação, como por exemplo anteriormente a Lei nº 12.696 de 201233, esse Art.

132 no que diz respeito ao tempo do mandato dos conselheiros era de três

33

LEI Nº 12.696, DE 25 DE JULHO DE 2012. Altera os arts. 132, 134, 135 e 139 da Lei

no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para dispor sobre os

Conselhos Tutelares.

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anos e depois dessa lei passou a ser de 4 anos, ou seja, trabalha junto com a

gestão municipal eleita para aquele período.

No que diz respeito aos requisitos básicos para preencher a vaga de

conselheiro diz o Art. 133:

Art. 133. Para a candidatura a membro do Conselho Tutelar, serão exigidos os seguintes requisitos: I - reconhecida idoneidade moral; II - idade superior a vinte e um anos; III - residir no município. (SECJ, 2010, p. 77,78)

O Art. 134 é um dos artigos que sofreu uma grande mudança, pois a

partir da lei 12.696, o conselheiro passou a ter direitos de trabalhador, e

consequentemente foram incluídos alguns incisos de regulamentação.

Art. 134. Lei municipal ou distrital disporá sobre o local, dia e horário de funcionamento do Conselho Tutelar, inclusive quanto à remuneração dos respectivos membros, aos quais é assegurado o direito a: I - cobertura previdenciária; II - gozo de férias anuais remuneradas, acrescidas de 1/3 (um terço) do valor da remuneração mensal; III - licença-maternidade; IV - licença-paternidade; V - gratificação natalina. Parágrafo único. Constará da lei orçamentária municipal e da do Distrito Federal previsão dos recursos necessários ao funcionamento do Conselho Tutelar e à remuneração e formação continuada dos

conselheiros tutelares. (LEI nº 12.696, de 2012)

No que diz respeito ao artigo 135, o item que previa a prisão especial em

caso de crime comum foi retirada ficando prevista apenas a presunção da

idoneidade moral. “Art. 135. O exercício efetivo da função de conselheiro

constituirá serviço público relevante e estabelecerá presunção de idoneidade

moral”.

O Capítulo II “Das Atribuições do Conselho” descreve em 11 incisos as

funções que são pertinentes ao Conselho estabelecer nas suas atividades,

diárias. Entre elas a que podemos entender como primordial, se encontra na

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168

questão de o Conselho poder solicitar os serviços públicos que são de direito

das crianças e adolescentes nas áreas de saúde, educação, serviço social,

previdência, trabalho e segurança. Lembrando que as decisões do Conselho

Tutelar somente poderão ser revistas por autoridade judiciária e ainda a pedido

da parte interessada conforme previsto no artigo 137.

O artigo 138 diz respeito a competência do Conselho e o artigo 139, que

também foi um dos mais modificados pela lei 12.696, diz respeito ao processo

de escolha dos Conselheiros.

Art. 139. O processo para a escolha dos membros do Conselho Tutelar será estabelecido em lei municipal e realizado sob a responsabilidade do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, e a fiscalização do Ministério Público. § 1

o O processo de escolha dos membros do Conselho Tutelar

ocorrerá em data unificada em todo o território nacional a cada 4 (quatro) anos, no primeiro domingo do mês de outubro do ano subsequente ao da eleição presidencial. § 2

o A posse dos conselheiros tutelares ocorrerá no dia 10 de janeiro

do ano subsequente ao processo de escolha. § 3

o No processo de escolha dos membros do Conselho Tutelar, é

vedado ao candidato doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive brindes de

pequeno valor. (LEI nº 12.696, de 2012)

O Conselho Tutelar é um órgão que ao contrário do que se pensa não

atua como “polícia” para crianças e adolescentes. O Conselho Tutelar tem a

função protetiva e garantidora dos direitos das crianças e adolescentes em

risco de vida pessoal e social. É um órgão de extrema importância e

necessidade para a sociedade na atual conjuntura, porém necessita estar

estruturado para que possa cumprir seu papel com efetividade.

Os conselhos Tutelares tem uma grande autonomia para atuar, no

entanto ainda existem muitos limites éticos, morais, sociais, administrativos e

legais que restringem sua atuação. Nesse sentido, os conselheiros necessitam

de uma capacitação primorosa e adequada para enfrentar esses limites. A

responsabilidade de um Conselho e consequentemente de um conselheiro é

imensa. Só o fato de serem responsáveis para atender as crianças e

adolescentes que tenham seus direitos ameaçados ou violados, em situação

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de risco, já faz dos conselheiros, pessoas com obrigações de humanização

para a libertação.

Quando vivemos a autenticidade exigida pela prática de ensinar-aprender participamos de uma experiência total, diretiva, política, ideológica, gnosiológica, pedagógica, estética e ética, em que a boniteza deve achar-se de mãos dadas com a decência e com a seriedade. (FREIRE, 1996, p. 24)

Os conselheiros tem também a responsabilidade de aplicar as medidas

de proteção, atender e aconselhar os pais ou responsáveis, encaminhar casos

ao Ministério público, entre tantas outras. Visando principalmente a garantia

dos direitos da criança e do adolescente o conselho tutelar é uma ferramenta

que a comunidade usufrui em beneficio da melhoria da vivencia e convivência

entre todos.

Do ponto de vista do atendimento especializado, acreditamos que a

defasagem da formação dos conselheiros e das exigências de formação dos

mesmos deixa muito a desejar. É muito comum termos conselheiros que não

tem um grau de estudos que o possibilitem sequer entender a letra da lei. Seria

necessário determinar que os conselheiros para ocuparem o cargo tivessem

uma formação adequada para as áreas que vão atuar, como pedagogia,

psicologia ou direito, pois estarão a frente de situações na maioria das vezes

de opressão e de superação de dificuldades materiais, morais e psicológicas.

5.6 Espaços Socioeducativos no Paraná

A socioeducação no Paraná hoje conta com muitos estabelecimentos

para operar as ações socioeducativas determinadas pela vara da infância e da

adolescência.

Os espaços de socioeducação obedecem a lei do SINASE, e cumprem

os requisitos mínimos para sua operacionalização. O SINASE tem como

objetivo o desenvolvimento de uma ação socioeducativa que se sustente no

respeito aos direitos humanos. Os espaços socioeducativos necessitam

possibilitar a continuidade da vida do adolescente em cumprimento de medida

socioeducativa.

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O adolescente deve ser alvo de um conjunto de ações socioeducativas que contribua na sua formação, de modo que venha a ser um cidadão autônomo e solidário, capaz de se relacionar melhor consigo mesmo, com os outros e com tudo que integra a sua circunstancia e sem reincidir na pratica de atos infracionais. Ele deve desenvolver a capacidade de tomar decisões fundamentadas, com critérios para avaliar situações relacionadas ao interesse próprio e ao bem-comum, aprendendo com a experiência acumulada individual e social, potencializando sua competência pessoal, relacional, cognitiva e produtiva. (SINASE, 2006, p. 51)

Esses espaços são um local de múltiplas determinações, portanto

prospectam a práxis educativa como movimento para compreensão da

atividade humana como mola propulsora e transformadora do ser humano e

nesse caso do adolescente cometedor de ato infracional, para que através de

sua transformação a sociedade possa também modificar-se. Nesse sentido o

trabalho socioeducativo possui consciência e intencionalidade. “Por isso,

inclinamo-nos pelo termo “práxis” para designar a atividade humana que

produz objetos, sem que por outro lado essa atividade seja concebida com o

caráter estritamente utilitário que se infere do significado do “prático” na

linguagem comum” (VAZQUEZ, 1977, p.4). E a nossa juventude em virtude da

miséria em que se encontra com facilidade troca o caminho do bem por outras

formas de reivindicar seus direitos adentrando na criminalidade. Os espaços de

socioeducação por sua vez para que possam atuar na direção de restituir

esses direitos e influir na convivência social precisam de políticas públicas que

atuem em beneficio da prática da práxis.

Para atingir os objetivos, as medidas socioeducativas necessitam prever

a gravidade do ato infracional cometido, além das circunstâncias em que foram

cometidos e principalmente quais as condições sociofamiliares de

acompanhamento de seu adolescente, por isso, a medida não pode ser

simplesmente aplicada de forma a ser percebida e recebida como punitiva, mas

sim de maneira a propor a incorporação do delito como algo que não é

pertinente a uma sociedade justa e igualitária e através desses programas e

medidas proporcionar a não reincidência.

Além de proporcionar esse caminho de reflexão e ação, no que diz

respeito a estrutura física das unidades de socioeducação elas são orientadas

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pelo projeto pedagógico e estruturadas de forma que possa assegurar a

capacidade física para o atendimento e garantia dos direitos fundamentais aos

adolescentes. No regime em meio aberto é necessário um local específico para

sua execução que contenham salas de atendimento individual e em grupo com

sala de técnicos e demais condições para garantir que a estrutura facilite o

acompanhamento por parte dos seus familiares.

Os espaços de socioeducação onde o adolescente em cumprimento de

medida socioeducativa de internação recebe como sanção a privação de sua

liberdade e consequentemente se afasta do convívio com os seus familiares e

a sua comunidade tem por obrigação assegurar o direito de exercer a sua

cidadania e assim reduzir os possíveis danos a sua formação como ansiedade

da separação, carência afetiva, baixa autoestima e dificuldades de perceber as

alterações de relação do seu cotidiano.

Mas apesar de ter delineado um Sistema de Socioeducação bem

estruturado e organizado em sua estrutura física, e também, as medidas

socioeducativas poderem atuar de forma não punitivas, e sim

pedagogicamente, não são suficientes para garantir um processo educativo

interessante e eficiente.

Se a privação de liberdade, medida socioeducativa aplicada em casos

extremos ocorre dentro dos espaços socioeducativos de forma que ocorra uma

práxis educativa, talvez proteger a sociedade de seus infratores possa vir a ser

uma solução, no entanto, apenas aplicar a medida de restrição de liberdade e

não produzir a educação com a intenção de humanização, nada mais fará do

que tornar o adolescente em conflito com a lei em um preso adulto com idade

não correspondente.

A educação nesses espaços socioeducativos se estabelece como um

direito fundamental do adolescente infrator e mais ainda como um

compromisso responsável por parte dos educadores sociais e professores,

além de toda a equipe pedagógica e direção. Nas escolas fora dos espaços

socioeducativos já existe um compromisso que muitas vezes não é cumprido

na sua íntegra, que é o de formar integralmente o aluno para a o exercício da

cidadania, dos seus direitos e deveres, e nos espaços de socioeducação onde

a responsabilidade é muito superior não pode ocorrer a ausência do pensar em

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disponibilizar todos os recursos possíveis para a humanização. Sob a ótica da

práxis é muito importante ter todos os pilares da socioeducação funcionando

perfeitamente.

No Paraná contamos com os seguintes Centros de Socioeducação e

casas de Semiliberdade:

Tabela 20 – Centros de Socioeducação no Paraná

Centro de

Socioeducação

(Cense)

Medida

Socioeducativa

Capacidade Direção

Curitiba Internação

Provisória

100 Luciano Aparecido

de Souza

Joana Miguel Richa Internação

30 Mariselni Vital Piva

São Francisco Internação 100 Lázaro de Almeida

Rosa

Fênix Internação

18 Esther Maurutto

Ponta Grossa

Internação e

Internação

Provisória

70 Glaucia Rennó

Cordeiro

Londrina I

Internação

Provisória

80 Márcio Schimidt

Londrina II

Internação 60 Júlio César Botelho

Cascavel I

Internação

Provisória

20 Ana Marcília Pinto

Cascavel II

Internação 70 Rafael Brugnerotto

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173

Fazenda Rio Grande Internação 30 Alex Sandro da

Silva

Pato Branco Internação e

Internação

Provisória

20 Sandro de Moraes

Toledo Internação e

Internação

Provisória

20 Ricardo José

Deves

Paranavaí Internação e

Internação

Provisória

20 Nilson Domingos

Laranjeiras do Sul Internação e

Internação

Provisória

70 Amarildo R. da

Silva

Campo Mourão Internação e

Internação

Provisória

20 Fausto Nunes

Foz do Iguaçu Internação e

Internação

Provisória

110 Vandir da Silva

Soares

Santo Antonio da

Platina

Internação e

Internação

Provisória

20 Sônia Sueli Alves

de Lima

Umuarama Internação e

Internação

Provisória

20 Adilson José dos

Santos

Fonte : Site da SEDS

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174

Tabela 21 – Casas de Semiliberdade no Paraná

CENSE

ATENDIMENTO COORDENAÇÃO

Curitiba

Masculino Heron Carlos Fontes

Joana Miguel Richa

Feminino Maria Aparecida da Silva

Londrina

Masculino Gilmar Bragantini

Ponta Grossa Masculino Teresinha Aparecida de Arruda

Fonte :Site da SEDS

Centros de Socioeducação

Cense Campo Mourão Diretor: Luciano Jorge Tel: (44) 3525-3645 [email protected] Cense Cascavel 1 Diretora: Ricardo José Deves Tel: (45) 3326-3450 / 3226-8534 [email protected] Cense Cascavel 2 Diretora: Olivia Crigognni Oliveira Tel: (45) 3328-1766 / 3227-5541 [email protected] Cense Curitiba Diretor: Vinicio Oscar Kirchner Tel: (41) 3266-5489 / 3366-3443 [email protected] Cense Fazenda Rio Grande Rua Manoel Claudino Barbosa, 1725 Diretor: Alex Sandro Da Silva Tel: (41) 3604-8763 / 3604-0595 [email protected] Cense Foz Do Iguaçu Diretor: Vandir Da Silva Soares Tel: (45) 3527-5529 [email protected]

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Cense Joana Miguel Richa Diretora: Mariselni V. Piva Tel: (41) 3335-4145 / 3335-0082 [email protected] Cense Laranjeiras Do Sul Diretora: Sonia Sueli Alves de Lima Tel: (42) 3635-6602 - Fax: 6601 [email protected] Cense Londrina 1 Diretor: Márcio Schimidt Tel: (43) 3336-6100 / 3337-1888 [email protected]. Cense Londrina 2 DIRETOR: Lázaro de Almeida Rosa Tel: (43) 3343-4687 / 3343-2418 / 3342-6902 [email protected] Cense Maringá Diretor: Ricardo Peres Da Costa Tel: (44) 3225-6761 / 3269-5807 [email protected] Cense Paranavaí Diretor: Nilson Domingos Tel: (44) 3424-7453 [email protected] Cense Pato Branco Diretor: Marcio Luis Soares da Silva Tel: (46) 3224-2130 [email protected] Cense Ponta Grossa Diretora: Gláucia R. Cordeiro Tel: (42) 3235-2441 / 3235-2668 [email protected] Cense Santo Antônio Da Platina Diretora: Vaneide de Souza Claro de Oliveira Tel: (43) 3534-5573 / 3534-5580 [email protected] Cense São Francisco Diretor: Heron Carlos Fontes Tel: (41) 3673-2505 / 3673-2377

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[email protected] Cense Toledo Rua Armando Luis Arosi, S/Nº Diretor: Sandro de Moraes Tel: (45) 3252-9210 - Fax: 8665 [email protected] Cense Umuarama Diretor: Adilson José Dos Santos Tel: (44) 3624-6714 Fax: 3623-1395 [email protected]

Casas de Semiliberdade

Semiliberdade Londrina

Coordenador: Gilmar Bragantine Ferreira

Tel: (43) 3321-9564

Semiliberdade Joana Richa

Coordenadora: Simoneide Fernandes

Tel: (41) 3339-0426

Semiliberdade Curitiba

Coordenador: Ronaldo Marafon

Tel: (41) 3266-3161

Semiliberdade Ponta Grossa

Coordenador: Helton Luis Carneiro

Tel: (42) 3223-9540 / 3222-9910

Semiliberdade Foz do Iguaçú

Coordenador: Rodrigo M. de Oliveira

Tel: (45) 3572-7817

Semiliberdade Cascavel

Coordenador: Lidyana Soares Kelin

Tel: (45) 3224-7377

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6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ACERCA DA HUMANIZAÇÃO NA

SOCIOEDUCAÇÃO

A desumanidade e a indignidade humana não perdem tempo a escolher entre as lutas para destruir a aspiração humana de humanidade e dignidade. O mesmo deve acontecer com todos os que lutam para que tal aconteça. (SANTOS, 2013, p. 125)

Muitas vezes em sala de aula, quase num momento de etereidade (de

etéreo), nos transportamos para uma visão futurista desse jovem que a nossa

frente está. Essa é a concepção e a prática idealista que muito longe está da

realidade concreta dos alunos. Ao mesmo tempo nos remetemos ao presente,

ou seja, as condições de vida dessas crianças, adolescentes, jovens e adultos

que ainda insistem no banco da classe escolar como um final feliz para um

futuro não muito promissor.

Quem são? De onde vem? Para onde irão? Quem serão? Perguntas

assim todos os dias brilham nos olhos dos profissionais da educação que

mesmo cansados da luta, porém nunca desistentes estão a procura de uma

resposta que seja mais eficiente, mais presente, mais verdadeira e que torne a

juventude mais humana e a sociedade menos desigual.

A Socioeducação é um programa de educação e aplicação das medidas

socioeducativas nas Unidades de Internação e Semiliberdade através das

secretarias de Educação e Desenvolvimento Familiar. O programa da

Socioeducação na íntegra com aplicação da lei do SINASE que opera todas as

estruturas, físicas e humanas é muito bem elaborado e se destaca no cenário

mundial, portanto, assim como o ECA é um programa muito bem escrito, no

entanto, os índices de reincidência e de infração infanto juvenil, mesmo sendo

muito pequenos, são crescentes. A socioeducação então recupera esse

adolescente em conflito com a lei? Acredita-se que não. Porque a realidade

que existe aquém das “quatro paredes” da socioeducação, não é a mesma

realidade que existe intraparedes do Sistema, ou seja, antes de pertencer ao

sistema o menino e a menina participam da sociedade na sua complexidade, e

ao cometer um ato infracional seu mundo se modifica. Existem muitas

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contradições no Sistema Socioeducativo e por isso a humanização torna-se

bem mais complexa. Se faz necessária uma reavaliação das políticas que

permeiam o sistema a fim de proporcionar a emancipação verdadeira.

Sob a perspectiva da emancipação, as contradições que perpassam os Direitos Humanos tornam-se evidentes, tanto porque o conceito de sujeito de direito tem servido, no plano da regulação, para o exercício legal da violência e da coação de indivíduos e coletividades, quanto porque, no plano da emancipação, exigem redefinição para muito além do quadro jurídico positivo estatal. (SANTOS, 2013, p. 31)

Depois de um tempo considerável de trabalho no sistema socioeducativo

e através do caminho que fizemos na pesquisa dessa tese e ainda mais tendo

o privilégio de ter o objeto de pesquisa analisado sob lentes muito próximas,

diga-se até vivendo intensamente esse sistema, já vi muitos rostos das mais

variadas expressões, de alegria à tristeza; da melancolia ao arrependimento;

da raiva momentânea ao ódio eterno. Seres humanos que por algum momento

cometeram um ato que os fez mudar o curso de suas vidas. E será que o

Sistema consegue fazer com que suas vidas possam voltar ao normal? O que

é normal? O que é o Sistema? O que são suas vidas, suas histórias e estórias?

Nessa mescla de sentimentos estudar é primordial, e mais ainda,

aperfeiçoar e pensar em uma utilidade filosófica prática, pois a vida continua,

as vidas se multiplicam. “Vivemos num tempo em que as mais chocantes

injustiças sociais parecem incapazes de gerar a indignação moral e a vontade

política necessárias para as combater eficazmente e criar uma sociedade mais

justa e mais digna” (SANTOS, 2014, P.11). As consequências dos atos; dos

atos “criminosos” para cada um desses meninos e meninas; para cada um de

suas famílias e também para cada uma das vítimas e das famílias das vítimas,

se processam de várias formas.

E quem é a vítima? Eu? Você? O menino ou a menina? As famílias? O

Sistema? Quem tem a culpa? Quem tem as respostas? Quem tem a cura para

esse vício que devasta a sociedade em que vivemos? Qual a solução?

As mais variadas respostas dos mais variados pensamentos ocorrem o

tempo todo. Todos nós, por todo o tempo em que estamos vivos nos

preocupamos com essa dura realidade. Impossível olhar a história de fora.

Impossível estar impassível diante deste drama.

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Como a educação vem colaborar com o amenizar de atos que

caminham para a historicidade concreta? Qual a função social da escola, e em

específico, da escola no sistema socioeducativo? E além do papel da escola,

qual o papel da educação, do professor, do educador, do pedagogo e de todos

os agentes que perpassam esse espaço? Como não se tornar um repetidor,

um afirmador das mazelas que permeiam a educação? Como evitar que o

sujeito de direitos não se torne apenas objeto de discursos que pregam seus

direitos? Que profissional sou eu, você e todos nós que estamos todos os dias

em frente ou defronte a esses meninos e meninas nas escolas, nas ruas, na

socioeducação?

Durante esses longos anos no sistema socioeducativo como professora

de Arte, por muitas vezes a música, o teatro, a dança, o desenho a pintura

deixam de ser simplesmente a arte pela arte. Os significantes e os significados

se movem em direção das histórias que contemplam. Azul mais amarelo não é

somente verde, mas tem o cheiro da liberdade de andar nos campos, de fruir

da companhia das pessoas que convivem. Vermelho não é só uma cor

primária, mas sim o vermelho do sangue que tingiu a mão de meninos e

meninas e de seus pais e de suas mães. E quem são os pais e as mães, a

família desses meninos e meninas? São diferentes dos meus? Será que pude

ter o privilégio de ser diferente? Porque eu sim e eles (meninos e meninas em

conflito com a lei) não?

Sigo inquieta, incomodada, persistente, confiante e inescrupulosamente

credora no Sistema, mesmo com todas as contradições apontadas ao longo

dessa tese. No entanto, depois do Sistema entrar na vida de meninos e

meninas, como será seu retorno aos seus lares, às suas famílias, e como será

viver esquivando-se de pertencer ao Sistema novamente? Como usufruir dos

direitos que lhe são tão severamente assegurados na lei? Como diria Santos,

2013, p.53, (...) “trata-se de questionar os direitos humanos e todos os que

recorrem a eles para interpretar e transformar o mundo, fazendo-lhes a

seguinte pergunta: De que lado estão eles? Do lado dos oprimidos ou do lado

dos opressores?”

Quando encontrá-los nas ruas, como cidadãos recuperados,

ressocializados, ressignificados, poderei reagir bem e feliz por ter contribuído

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para sua melhora, ou estarei com medo, desconfiada de sua mudança?

Quando encontrá-los repetindo seus atos ilícitos e passando de meninos e

meninas para homens e mulheres praticantes de atos criminosos sentirei

(sentiremos) medo, desconforto, horror, repulsa e frustração? Se por acaso

nesse encontro nossos olhares cruzarem e sua opressão se transformar na

minha em relação a violência que eles estarão prontos a cometer contra mim?

Incapacidade de mudança e colaboração com o que está posto.

Impotência X prepotência. Como tudo será?

Os números são crescentes e são negativos, mesmo que ainda

pequenos, pois a cada dia que passa as notícias não são as que queremos

ouvir. Precisamos de humanização urgente. Humanidade, humanização,

solidariedade, confiança. O que é tudo isto? Existe? É utopia? Que cidadãos

queremos ser? Qual cidadão queremos formar? Qual nossa contribuição?

A humanidade está repleta de exemplos que tentaram por sua própria

iniciativa de vida mostrar possibilidades de humanitarismo. Em sua grande

maioria o preço foi a própria vida. A escola é um bom começo para que

situações possam modificar e para que “tudo que é sólido e imutável se

desmanche no ar”.

Bertold Brech (2000) propõe que “não sejamos imutáveis”, que

possamos nos mover nos renovar constantemente, e que ao nos depararmos

com o horror não nos contentemos em achar que é normal. Nada pode ser

normal ou considerado estático, para que possa ser mudado, transformado,

pois, ao crermos que o horror e a iniquidade se tornaram parte do conviver e

viver de todos nós entregamos ao nada as possibilidades de humanizar-se.

Não podemos esquecer que ao mesmo tempo em que humanizamos somos

humanizados, visto que, enquanto seres humanos comuns ou trabalhando

como profissionais da educação construímos história além de também

modificarmos, colaborarmos para a história desses meninos e meninas em

conflito com a lei ou não e assim modificamos a nós mesmos.

Nesta tese, verifica-se claramente a linha divisória entre os adolescentes

em conflito com a lei e o desrespeito aos seus direitos enquanto sujeitos de

direitos e consequentemente cidadãos. É fato que estão em cumprimento de

medida socioeducativa por terem cometido ato infracional, no entanto, é fato

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também que o desejo de ressocializar através do Sistema de Socioeducação é

falho. As políticas vigentes são insuficientes para proporcionar essa

ressocialização tão desejada. Nos espaços de Socioeducação é muito comum

atitudes que privilegiam a segurança e a contenção “esvaziando os conteúdos

que preveem a cidadania e os direitos humanos, igualdade, justiça,

participação” (ARROYO, 2014, p. 304). É preciso ir além da escrita das leis e

das políticas vigentes, mesmo sabendo que “as transformações ocorrem

primeiro na lei e só muito lentamente vão influenciando as instituições e

conformando as mentalidades e subjetividades” (SANTOS, 2013, p.80), pois é

insistindo nas ações que a transformação pode ocorrer.

A elaboração desta tese proporcionou formular algumas questões

propositivas:

Faz-se necessário priorizar a aplicação da educação formal, informal e

do trabalho juntamente com as questões de segurança e não

primeiramente a segurança e depois a educação, como vem ocorrendo

nos espaços de Socioeducação. É preciso dar maior vivência aos

aspectos socioeducativos sobrepondo os aspectos sancionatários.

Faz-se necessário criar políticas de acompanhamento ao adolescente

autor de ato infracional após sua saída do Sistema de Socioeducação

para que não se torne um egresso. Sendo a criança absolutamente

inimputável dos 0 aos 12 anos de idade incompletos e o adolescente de

12 a 18 incompletos responsável e estando em desenvolvimento, devem

ser prioridade absoluta para as políticas de proteção integral pela

família, a sociedade e o estado, conforme preconiza o artigo 227 da

Constituição

Faz-se necessário, capacitação profissional e adequada aos

profissionais que trabalham como educadores sociais nos espaços de

socioeducação, pois a postura desses profissionais fazem a diferença na

vida de jovens que estão imersos em relações marcadas por ações

violentas e principalmente ao pouco valor que suas vidas tem.

Faz-se necessário a implantação de disciplinas nos cursos de formação

que tratem das questões da socioeducação com maior propriedade,

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principalmente nos cursos de graduação na área de educação

(pedagogia, psicopedagogia) e de psicologia.

Faz-se necessário ofertar estrutura física condizente com as

necessidades reais das políticas de atendimento da socioeducação,

eliminando a precariedade nos ambientes como ausência de salas de

aula, salas de atendimento de saúde, salas de atendimento psicológico,

salas de atendimento pedagógico, infraestrutura para prática de

esportes e trabalho criativo em artes, além de ofertar possibilidades de

profissionalização.

Tendo em vista que o Brasil é um país extremamente jovem onde quase

um terço dessa população tem entre 0 e 18 anos de idade é necessário

criar campanhas de não a maioridade penal aos 16 anos de idade, pois

o problema será apenas temporariamente resolvido, e com certeza na

sequência teremos adolescentes em conflito com a lei lotando as

cadeias brasileiras aos 12, 14 e 16 anos de idade, faz-se necessário

avançar nas conquistas obtidas até o momento em termos de direitos

humanos e não retroceder preferindo colocar adolescentes em

aprisionamento para que se recuperem.

Difundir a aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente nas

escolas, não somente com seus direitos, mas com todas as nuances da

lei em seus direitos e deveres, pois um não pode ser exercido sem o

outro.

Faz-se necessário ocorrer a quebra entre os paradigmas da Doutrina da

Situação Irregular e a Doutrina da Proteção Integral para além do que

está escrito.

Existe a conquista jurídica. O ECA e o SINASE.

Urge, no entanto, que todos os atores da socioeducação trabalhem para

sua efetivação em tempo integral. Importante em todas as questões propostas

é não estar movido a criar novas formas de socioeducação, ou novas políticas

socioeducativas, mas sim acolher o que já existe e tentar fazer com que

aconteça a socioeducação na íntegra, na realidade concreta priorizando as

vidas nas suas múltiplas existências na construção de um mundo mais humano

para todos.

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