UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO … · Nome do coorientador: Prof. Dr. Fabrício...
Transcript of UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO … · Nome do coorientador: Prof. Dr. Fabrício...
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
MESTRADO EM DIREITO CONSTITUCIONAL
LINHA 1 – CONSTITUIÇÃO, REGULAÇÃO ECONÔMICA E
DESENVOLVIMENTO
ZILIANE MARQUES DA SILVA
AS POLÍTICAS E PROGRAMAS NACIONAIS DE FOMENTO À PRODUÇÃO DE
BIOCOMBUSTÍVEIS EM FACE AO ESTADO CONSTITUCIONAL EM CRISE
NATAL/RN
2017
ZILIANE MARQUES DA SILVA
AS POLÍTICAS E PROGRAMAS NACIONAIS DE FOMENTO À PRODUÇÃO DE
BIOCOMBUSTÍVEIS EM FACE AO ESTADO CONSTITUCIONAL EM CRISE
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Direito da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Constituição e Garantia de Direitos.
Nome do orientador: Prof. Dr. Yanko
Marcius de Alencar Xavier.
Nome do coorientador: Prof. Dr. Fabrício
Germano Alves.
NATAL/RN
2017
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
MESTRADO EM DIREITO CONSTITUCIONAL
A dissertação “As políticas e programas nacionais de fomento à produção de
biocombustíveis em face ao Estado Constitucional em crise”, de autoria da mestranda
Ziliane Marques da Silva, foi avaliada e aprovada pela comissão examinadora formada pelos
seguintes professores:
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________
Prof. Doutor Yanko Marcius de Alencar Xavier
_______________________________________
Profª. Doutora Patrícia Borba Vilar Guimarães
_______________________________________
Profª. Doutora Hirdan Katarina de Medeiros Costa
Natal/RN, 25 de setembro de 2017.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por todas as bênçãos e desafios em minha trajetória.
Ao meu orientador, Professor Dr. Yanko Marcius de Alencar Xavier, por toda a
disponibilidade, a paciência, a atenção, pela humanidade e empatia, valores tão em escassez
hoje em dia, e pelo compartilhamento de suas experiências sobre a vida, sobre o Brasil e sobre
a UFRN.
Às professoras: Dra. Patrícia Borba Vilar Guimarães, pelo exemplo de educação e
cordialidade, bem como pelas aulas, debates e referências teóricas durante as disciplinas do
mestrado; e Profa. Dra. Cristina Foroni Consani, pela atenção, exemplo de dedicação e
ensinamentos jusfilosóficos, ricos em críticas fundamentadas e bom senso, que me fizeram
repensar diversos paradigmas abordados, ou não, neste trabalho. E também aos demais
professores do Programa de Pós-graduação em Direito da UFRN pelo conhecimento
compartilhado.
Ao Professor Dr. Deusimar Freire pela receptividade, pelo exemplo de humanidade e
engajamento, pelo compartilhamento da sua vasta e enriquecedora experiência com o PNPB,
e diversos outros projetos executados na região dos municípios do Mato Grande, bem como
todo material disponibilizado. À Livânia Frizon e demais moradores do assentamento de
Canudos, pelo conhecimento histórico e de uma vida de lutas repassado.
Aos meus pais, Serginaldo e Edileide, meu maior tesouro, e ao meu irmão, Zirlan,
por sempre acreditarem em meu potencial - inclusive nos momentos em que até eu mesma
duvidei, pelo apoio, pela dedicação à minha educação (formal e pessoal), pelo exemplo e
carinho diuturno e por toda a compreensão nos meus momentos ausentes. E a toda a minha
família.
Aos meus amigos, pela amizade e apoio, Daisy, Goreth, Ana, Manoel, Eduardo,
Cleciane, Amison, William, Douglas, Gardênia, Cinthia, Bruna, Amanda Lima, Peterson, José
Roberto, Saul e a todos aqueles não citados expressamente, mas igualmente queridos.
Aos colegas de mestrado pelos conhecimentos poéticos e jusfilosóficos
compartilhados, em especial aos da Linha de Pesquisa 1; e ao amigo Marcus, que me
acompanha na estrada dos estudos desde o PRH-36, por toda a força, toda a motivação e
também pelos conflitos internos e jurídicos compartilhados.
Às minhas companheiras de luta diária na Coordenadoria de Planejamento de
Planejamento de Gestão de Pessoas-CPGP: Karenine, Mariângela, Karla (e baby), Priscilla,
Francilene e Andrea, pela compreensão durante esses dois anos entre aulas e trabalhos. Aos
demais colegas da Diretoria de Desenvolvimento de Pessoas/PROGESP, em especial a
Raquel e Cristiano, e de toda a UFRN.
Agradeço, por fim, a todos os pesquisadores e professores, principalmente aos da
seara do Direito e Desenvolvimento, em especial aos brasileiros, que abraçaram o desafio de
estudar essa área apaixonante e desafiadora, ainda mais por vivermos num país
subdesenvolvido. A cada linha que escrevemos tenho a certeza de sermos movidos igualmente
pelo sonho de vivermos num Brasil juridicamente mais coerente, economicamente mais
estável, ambientalmente equilibrado e, principalmente, com todas as suas potencialidades
desenvolvidas para as presentes e as futuras gerações. Perseveremos como Gandhi, ao pontuar
que “a alegria está na luta, na tentativa, no sofrimento envolvido e não na vitória propriamente
dita”.
“É importante não deixar de se
questionar. A curiosidade tem
uma razão de existir”.
(Albert Einstein)
“Fracassei em tudo o que
tentei na vida. Tentei alfabetizar
as crianças brasileiras, não
consegui. Tentei salvar os índios,
não consegui. Tentei fazer uma
universidade séria e fracassei.
Mas os fracassos são minhas
vitórias. Eu detestaria estar no
lugar de quem me venceu”.
(Darcy Ribeiro)
“Eu insisto em cantar
Diferente do que ouvi
Seja como for, recomeçar
Nada há, mais há de vir
Me disseram que sonhar
Era ingênuo, e daí?
Nossa geração não quer sonhar
Pois que sonhe a que há de vir
Eu preciso é te provar
Que ainda sou o mesmo menino
Que não dorme a planejar travessuras
E fez do som da tua risada um hino”
(Travessuras – Oswaldo Montenegro)
RESUMO
SILVA, Ziliane Marques da. As políticas e programas nacionais de fomento à produção
de biocombustíveis em face ao estado constitucional em crise. 2017. 156f. Dissertação
(Direito), Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal.
O presente trabalho tem como objetivo analisar as políticas públicas e programas nacionais de
fomento à produção brasileira de biocombustíveis, principalmente do etanol e do biodiesel, e
suas inter-relações com o Direito Constitucional. A escolha da temática se deu em virtude da
produção brasileira ser considerada estratégica tanto nacional, quanto internacionalmente.
Partindo de uma pesquisa bibliográfica somada a um estudo de caso da produção do biodiesel
(um dos principais biocombustíveis da matriz energética brasileira) proveniente do plantio de
girassol no território do Mato Grande – Rio Grande do Norte, realizada via Programa
Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB). Inicia-se um estudo trazendo os pilares do
desenvolvimento econômico e do desenvolvimento sustentável afetos à temática da produção
nacional de biocombustíveis, abordando o seu marco regulatório. Aprofunda-se, ainda, na
correlação entre a produção de biocombustíveis e as justiças intra e intergeracional. As
políticas públicas na seara dos biocombustíveis são estudadas na perspectiva de um Estado
constitucional em crise, trazendo à reflexão os alicerces e resultados obtidos com o Programa
Nacional do Álcool - PROÁLCOOL - e o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel
- PNPB - em confronto com as políticas atuais, ainda projetos de lei em tramitação, a exemplo
da Política Nacional de Biocombustíveis Florestais (Projeto de Lei nº 1.291/2015, aprovado
pela Comissão de Minas e Energia da Câmara, em 25 de abril de 2017, e tramitando em
caráter conclusivo) e do Programa RENOVABIO (instaurando uma nova política nacional dos
biocombustíveis em geral); verifica-se um descompasso entre o desenvolvimento nos moldes
do texto constitucional de 1988 e as diretrizes das atuais políticas, além de um lapso entre o
vislumbrado pelas políticas públicas e o seu resultado prático, entre outros resultados e
conclusões. Finaliza-se o trabalho com sugestões de alterações ao texto das atuais políticas,
embasadas nas discussões proporcionadas.
Palavras-chave: Biocombustíveis. Desenvolvimento. Desenvolvimento Sustentável. Justiças
intra e intergeracional. Políticas Públicas.
ABSTRACT
SILVA, Ziliane Marques da. National policies and development programs for biofuel
production in the face of the constitucional state in crisis. 2017. 156f. Dissertação
(Direito), Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal.
The present work aims to analyze public policies and national programs to promote the
Brazilian production of biofuels, mostly ethanol and biodiesel, and their interrelations with
Constitutional Law. The theme choice occurred due to the Brazilian production was
considered strategic both nationally and internationally. Based on a bibliographical research
in addition to a case study of the biodiesel production (one of the main biofuels of the
Brazilian energy matrix) from the sunflower in the Mato Grande territory – Rio Grande do
Norte– performed by Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB), this study
is initiated bringing the pillars of economic development and sustainable development into the
theme of biofuels national production, addressing its regulatory framework. It also explores
the correlation between the biofuels production and the intra and intergenerational justice.
Public politics in the exto of biofuels are studied in the constitutional perspective of the crisis
state, bringing to results and foundations obtained with Programa Nacional do Álcool –
PROÁLCOOL and Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel – PNPB in relation
with Política Nacional de Biocombustíveis Florestais (Law n. 1.291/2015) and Programa
Renovabio (establishing a new national biofuels politicy, with expected approval for this
year); there is a mismatch between development along molds of the 1988 constitutional text
and the guidelines of current politics, as well as a gap between what is envisioned by public
politics and their practical results, among other results and conclusions. The paper ends with
suggestions for changes to the 8exto f current politics, based on the discussions provided.
Keywords: Biofuels. Development. Sustainable development. Intergenerational justice.
Publics Policies.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ANP – Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BP – British Petroleum
CAR – Cadastro Ambiental Rural
CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina
CF – Constituição Federal do Brasil
CIMA – Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool
CNPE – Conselho Nacional de Política Energética
CNUMAD – Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento
CO2 – Dióxido de Carbono
COFINS – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social
CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente
CONAB – Companhia Nacional de Abastecimento
COP21 – 21ª Conferência das Partes
COP22 – 22ª Conferência das Partes
COP23 – 23ª Conferência das Partes
EPE – Empresa de Pesquisa Energética
GT – Grupo de Trabalho
GTI – Grupo de Trabalho Interministerial
GEE – Gases do Efeito Estufa
IAA – Instituto do Açúcar e do Álcool
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
ICMS – Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços
IEA – International Energy Agency
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IRENA – International Renewable Energy Agency
MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário
MMA – Ministério do Meio Ambiente
OIA – Organização Internacional do Açúcar
ONG – Organização Não Governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
PIS/PASEP – Programa de Integração Social/ Programa de Formação do Patrimônio do
Servidor Público
PL – Projeto de Lei
PNA – Plano Nacional de Agroenergia
PNMA – Política Nacional do Meio Ambiente
PNMC – Política Nacional sobre Mudança do Clima
PNPB – Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel
PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PROÁLCOOL – Programa Nacional do Álcool
PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
Pró-óleo – Plano de Produção de Óleos Vegetais para Fins Energéticos
PSA – Pagamento por Serviços Ambientais
REDD – Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação
REDD+ – Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação +
RFS – Renewable Fuel Standard
RL – Reserva Legal
RVEs – Reduções Verificadas de Emissão
SICAR – Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural
SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente
UDOP – União dos Produtores de Bioenergia
UNESCO – United Nation Educational, Scientific and Cultural Organization
UNFCC – United Nations Framework on Climate Change
ÚNICA – União da Indústria de Cana-de-açúcar
ZAE – Zoneamento Agroecológico da Cana-de-Açúcar
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1. Emissões totais em MtCO2 no ano de 2016 ......................................................... 25
Gráfico 2. Emissões relativas, em kgCO2/US$ppp, em 2014 ............................................... 26
Gráfico 3. Crescimento da demanda de combustível fóssil por setor................................... 28
Gráfico 4. Participação das energias primárias....................................................................... 39
Gráfico 5. A centralidade da temática dos biocombustíveis e as questões circundantes.........38
Gráfico 6. Principais empresas e mercados da produção........................................................ 57
Gráfico 7. Pilares do PNPB..................................................................................................... 88
Gráfico 8 Área com florestas plantadas no Brasil .................................................................102
Gráfico 9. Esquema de funcionamento do RENOVABIO.................................................... 107
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 14
2 ASPECTOS CONCEITUAIS E JURÍDICOS DA PRODUÇÃO DE
BIOCOMBUSTÍVEIS NO BRASIL: OS FATORES DO DESENVOLVIMENTO E DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL .......................................................................... 20
2.1 AGENTES INTERNACIONAIS E DIRETRIZES AMBIENTAIS .................................. 20
2.2 A PRODUÇÃO DOS BIOCOMBUSTÍVEIS COMO FATOR DE
DESENVOLVIMENTO ........................................................................................................... 31
2.2.1 A juridicização do conceito de desenvolvimento ........................................................ 32
2.2.2 Biocombustíveis, desenvolvimento e a crise do Estado .............................................. 40
2.3 A PRODUÇÃO DOS BIOCOMBUSTÍVEIS COMO FATOR DE
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL............................................................................. 47
2.3.1 A juridicização do conceito de desenvolvimento sustentável..................................... 48
2.3.2 Biocombustíveis, desenvolvimento sustentável e a crise do Estado...........................54
3 BIOCOMBUSTÍVEIS: A IMPORTÂNCIA DA PRODUÇÃO NACIONAL SOB O
VIÉS CONSTITUCIONAL DA JUSTIÇA INTERGERACIONAL................................ 61
3.1 TEORIAS DA JUSTIÇA ENTRE GERAÇÕES..............................…...…….................. 63
3.2 JUSTIÇA INTERGERACIONAL DO MEIO AMBIENTE............................................. 70
3.3 A PRODUÇÃO DE BIOCOMBUSTÍVEIS E SEU POTENCIAL DE EFETIVAÇÃO DE
UMA JUSTIÇA INTERGERACIONAL................................................................................. 75
4 A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O
DESENVOLVIMENTO DOS BIOCOMBUSTÍVEIS E O ESTADO
CONSTITUCIONAL EM CRISE.........................................................................................79
4.1 AS PRIMEIRAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE BIOCOMBUSTÍVEIS NO
BRASIL....................................................................................................................................80
4.1.1 Programa Nacional do Álcool – PROÁLCOOL.........................................................81
4.1.2 Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel – PNPB...................................86
4.2 AS RECENTES POLÍTICAS PÚBLICAS DE FOMENTO À PRODUÇÃO DE
BIOCOMBUSTÍVEIS..............................................................................................................95
4.2.1 Política Nacional de Biocombustíveis Florestais........................................................96
4.2.2 Programa RENOVABIO 2030................................................................................... 102
4.3 ANÁLISE DAS DIFICULDADES DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS
PÚBLICAS PARA OS BIOCOMBUSTÍVEIS: ESTUDO DE CASO DO CULTIVO DE
GIRASSOL EM PARCERIA COM A PETROBRAS EM ASSENTAMENTOS NO RIO
GRANDE DO NORTE......................................................................................... 112
5 CONCLUSÕES................................................................................................................. 124
ANEXOS................................................................................................................................129
ANEXO I – Esquema simplificado do circuito produtivo do Biodiesel no RN –
girassol....................................................................................................................................129
ANEXO II - Fotografias da plantação de Girassóis em Canudos-RN.............................130
REFERÊNCIAS....................................................................................................................136
14
1 INTRODUÇÃO
O intuito deste trabalho é discorrer sobre aspectos da produção brasileira de
biocombustíveis, analisando-a por meio do prisma do Direito Constitucional, do Direito
Ambiental e do Direito ao Desenvolvimento, enfatizando as políticas públicas voltadas a essas
fontes energéticas, bem como a sua correlação com as justiças intra e intergeracional1 e seus
desdobramentos jurídicos e de governança, ressaltando, ainda, aspectos relativos à inclusão
social, também presentes em algumas políticas públicas brasileiras de fomento à produção de
biocombustíveis.
A escolha pela temática dos biocombustíveis se deu em virtude da produção
brasileira se destacar tanto local, quanto globalmente. Em um primeiro momento, seus
números vultosos chamam a atenção – números que serão explicitados no decorrer da
dissertação; posteriormente, percebe-se a importância da indústria nacional dos
biocombustíveis, que embora, por diversas vezes, tenha suas problemáticas enfatizadas (a
serem detalhadas adiante), tem-se mostrado novamente promissora em virtude dos rápidos
avanços tecnológicos, levando a propositura, inclusive, de novas políticas públicas nesta
seara, mesmo diante da atual crise política e econômica corrente no Brasil.
Outro ponto importante é que, por mais que seja uma temática nem sempre tão
divulgada e enfatizada na mídia convencional, existe um forte viés econômico que perpassa a
produção brasileira de biocombustíveis, uma vez que eles estão bem presentes na matriz
energética nacional, seja em um percentual obrigatoriamente adicionado ao óleo diesel
proveniente do petróleo, no caso do biodiesel, ou adicionado compulsoriamente à gasolina, no
caso do etanol. Os maiores ou menores percentuais de uso dos biocombustíveis, no Brasil,
estão historicamente associados às crises de produção ou abastecimento do petróleo, ou seja,
com maior ou menor ênfase, os biocombustíveis estão economicamente presentes.
Ademais, recentes estudos demonstram um intenso desenvolvimento da indústria
brasileira dos biocombustíveis para além de aspectos verificados em momentos anteriores da
economia nacional. Segundo o levantamento Renewable Energy and Jobs – Annual Review
2017, da International Renewable Energy Agency – Irena em parceria com a International
Energy Agency – IEA, o Brasil é o país que mais gera empregos na indústria mundial de
1 COSTA, Hirdan Katarina de Medeiros. O princípio da justiça intra e intergeracional como elemento na
destinação das rendas de hidrocarbonetos: temática energética crítica na análise institucional brasileira. 2012.
342 f. Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em Energia) EP/FEA/IEE/IF da Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/86/86131/tde-21092012-
181014/ptbr.php>. Acesso em: 10 jun. 2017.
15
biocombustíveis, com 783 mil vagas criadas no ano de 2016, seguido pelos Estados Unidos da
América – EUA (com a marca de 283 mil empregados na indústria dos biocombustíveis) e
pela União Europeia.
Conforme números acima apresentados, mostra-se nítida a importância do segmento
dos biocombustíveis na geração de empregos diretos e indiretos no Brasil.
Internacionalmente, o segundo lugar, apesar de ser ocupado pelos EUA, gera quase três vezes
menos empregos que o Brasil – de acordo com os dados da IRENA/IEA. Percebe-se, então,
que a produção nacional de biocombustíveis apresenta um forte papel inclusivo, no âmbito
interno, como geradora de um grande número de postos de trabalho num momento em que o
país se encontra em meio a uma crise política e econômica duradoura, com previsão de uma
lenta recuperação – segundo diversos analistas econômicos e de mercado.
Portanto, reforça-se a necessidade de encarar esse setor com a importância que lhe é
devida, uma vez que em detrimento disso, nos últimos anos, a exploração de petróleo
(principalmente do Pré-sal brasileiro) ocupou papel de destaque nas discussões e na mídia, em
virtude das problemáticas de gestão administrativa, política e financeira, enfrentada pela
Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras, e também pela pressão política e econômica das grandes
petrolíferas e governos estrangeiros. Os biocombustíveis são incontestavelmente importantes
para a economia brasileira, para o trabalhador e para o meio ambiente, ainda mais frente à
conjuntura de crises vivenciada.
É justamente no confronto com a conjuntura brasileira atual que residem as maiores
problemáticas abordadas nessa dissertação. Como fomentar adequadamente um ramo tão
importante da economia? Quais os riscos da ausência do fomento estatal adequado à atividade
produtiva dos biocombustíveis frente ao quadro do Estado constitucional brasileiro em crise?
A produção brasileira de biocombustíveis é dotada de sustentabilidade ao ponto de ser capaz
de concretizar uma justiça intergeracional aos moldes do art. 225 da Constituição Federal?
Existe viabilidade nos programas de fomento lançados em gestões governamentais anteriores
(a exemplo do Programa Nacional do Álcool – PROÁLCOOL e do Programa Nacional de
Produção e Uso do Biodiesel – PNPB) diante do quadro de crise? O novo marco regulatório
proposto para os biocombustíveis é viável? Qual o papel legislativo e jurídico diante desse
setor produtivo? Esses e outros questionamentos são norteadores desse trabalho, buscando-se
minimamente respondê-los, de forma reflexiva – no que se refere ao passado – e de forma
crítica – no que se refere ao presente.
16
Ao se analisarem os diversos trabalhos que tratam da temática dos biocombustíveis,
no Brasil, percebe-se a ênfase dada ao seu papel ambiental de atividade econômica promotora
do desenvolvimento sustentável; neste trabalho, opta-se por aliar o estudo do seu papel de
desenvolvimento a uma abordagem na perspectiva das justiças intra e intergeracional2, em
observância ao artigo 225 da Constituição da República Federativa do Brasil de 19883. Artigo
de suma importância na medida em que ressalta a necessidade (na realidade, grande desafio
do atual patamar de desenvolvimento da contemporaneidade) de se aliar o desenvolvimento
econômico ao ambiental, em prol da população vivente e das futuras gerações.
Outro viés bastante analisado em relação aos biocombustíveis é o da inclusão social,
posta a existência de políticas públicas de incentivo à participação das pequenas áreas
produtoras familiares no cultivo. A título de exemplo, na produção de biodiesel em solos
brasileiros, foi estabelecido por meio do Decreto nº 5.297, de 06 de Dezembro de 2004, o
Selo Combustível Social, dispondo, em seu artigo 2º e incisos, que será concedido ao produtor
de biodiesel que “promover a inclusão social dos agricultores familiares enquadrados no
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, que lhe forneça
matéria-prima”.
A questão da inclusão social no caso da produção dos biocombustíveis brasileiros,
acima mencionada, torna-se bastante polêmica, e diversos são aqueles que defendem que essa
não ocorre de fato, havendo meramente iniciativas pontuais, apesar dos esforços do governo e
da luta dos pequenos produtores. De certa forma, essa tentativa tímida de inclusão social para
um país com as dimensões do Brasil pode parecer inócua, entretanto, existe um longo
percurso ainda a ser percorrido e o presente avanço tecnológico talvez possa contribuir com o
aumento significativo da inclusão social proporcionada – na perspectiva de se alinhar
desenvolvimento tecnológico ao desenvolvimento social.
Adentrando na questão da produção de biodiesel, inicialmente houve um fomento à
produção de diversas oleaginosas em pequenas propriedades familiares, por meio do
Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel – PNPB (instituído em 2005). Todavia,
atualmente 90% da produção de biodiesel brasileiro são provenientes da agroindústria da soja,
2 COSTA, Hirdan Katarina de Medeiros. O princípio da justiça intra e intergeracional como elemento na
destinação das rendas de hidrocarbonetos: temática energética crítica na análise institucional brasileira. 2012.
342 f. Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em Energia) EP/FEA/IEE/IF da Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/86/86131/tde-21092012-
181014/ptbr.php>. Acesso em: 10 jun. 2017. 3 Art. 225, CF/1988: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do
povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações” [grifo]
17
tradicionalmente monocultora, mecanizada e latifundiária. Portanto, apenas 10% da
produtividade advêm da mão-de-obra familiar, o que pode ser encarado como insucesso ou
fator de desmotivação, entretanto esse será um dos paradigmas tratados no decorrer deste
trabalho, sob uma perspectiva divergente desse “pessimismo superficial”.
Quanto à seara constitucionalista, essa permeará toda a dissertação, ao serem
analisados dispositivos da Carta Magna brasileira, que com seus princípios dirigentes e suas
normas programáticas, ensejaram a criação e o fomento de diversas políticas públicas. Sendo
realizados diversos questionamentos quanto a sua eficácia e a sua efetividade. Perpassando,
ainda, pela tentativa de mitigação da máxima que afirma que o desenvolvimento econômico
vai à contramão da preservação ambiental e da inclusão social, aqui representada pela
descarbonização das matrizes energéticas e pelo estudo e valorização das políticas que
transitam entre o social e o ambiental.
Para o alcance dos objetivos mencionados será utilizada como metodologia a revisão
bibliográfica, o levantamento de dados de estudos e de relatórios de agências nacionais e
internacionais. Busca-se fazer uma abordagem cosmopolita – pelo menos em relação ao Brasil
entendido como um todo, um “macro”, sem esquecer que esse macro possui em si diversas
facetas “micros”, repletas de especificidades, que também serão, sempre que possível,
abordadas, exemplificadas, e visitadas na prática – numa tentativa de demonstrar
preocupações universais sem perder a perspectiva do local4.
Faz-se importante mencionar que uma análise jurídica pura e simples não é almejada
neste trabalho, sendo mais adequada uma abordagem multidisciplinar, para tanto o presente
trabalho recorre aos mais diversos campos do conhecimento humano, desde a doutrina
jurídica, a filosofia, a economia, política, ecologia, fazendo ainda referências à música, à
literatura, a reportagens, a entrevistas, dentre outros recursos, de forma a traçar uma
abordagem mais completa dos fenômenos estudados.
A presente dissertação se compõe de quatro capítulos. Para atingir os objetivos
supramencionados, no segundo capítulo serão tratados os agentes internacionais que
influenciam sobre a temática energética e, por consequência, na dos biocombustíveis; os
4 Cristovam Buarque ao prefaciar o livro “Caminhos para o desenvolvimento sustentável” afirma que
“diferentemente dos outros cosmopolitas, Sachs tinha e tem um apego radical aos exemplos e casos locais. Para
ele, falar como cosmopolita não é ser abstrato e universalista nos conceitos, mas citar articuladamente, em uma
mesma aula, detalhes de programas, costumes, fatos do Nordeste do Brasil, do Sudeste Indiano ou do Leste
Europeu”. Adota-se neste trabalho, visão similar a de Sachs, neste ponto, uma vez que serão colocados em pauta
diversos relatórios e acordos internacionais, várias leis e institutos jurídicos que serão analisados com base na
doutrina nacional e internacional, sem perder de vista a problemática localizada na produção nacional de
biocombustíveis e de algumas experiências práticas no nordeste brasileiro. [SACHS, Ignacy. Caminhos para o
desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2009. p. 22.]
18
fatores relativos ao desenvolvimento e ao desenvolvimento sustentável da produção nacional
de biocombustíveis, sua correlação com a ordem constitucional, sempre buscando fazer uma
argumentação jurídica entre o histórico, o legal e o necessário, fazendo o uso de referências
doutrinárias e de dados trazidos por instituições e órgãos governamentais. Será iniciada,
ainda, a abordagem acerca das políticas públicas desenvolvidas, a questão ambiental
(principalmente a climática), pensando sobre os indicadores de sustentabilidade, entre outros
aspectos.
O terceiro capítulo tratará exclusivamente da questão da justiça intergeracional,
trazendo o tratamento legal, a doutrina constitucional nacional e internacional relativa à
justiça intergeracional; aspectos conceituais também serão revisitados. Passando pelas teorias
da justiça, abordando a justiça intergeracional do meio ambiente, a justiça intergeracional
presente no orçamento público, na reserva previdenciária, e em outros campos da
Administração Pública que são necessariamente afetados num estado constitucional em crise.
Para, por fim, adentrar nos aspectos relativos aos biocombustíveis e suas questões
intergeracionais em um país de dimensões continentais e de tradição potencialmente agrícola
como o Brasil.
No quarto capítulo, serão estudadas especificamente as políticas e programas de
fomento à produção nacional de biocombustíveis em paralelo ao estado em crise. Será trazido
à reflexão o desenrolar do PROÁLCOOL e do PNPB; as iniciativas atuais terão suas
diretrizes revisitadas e analisadas, a exemplo da Política Nacional de Biocombustíveis
Florestais (Projeto de Lei nº 1.291/2015, aprovado na Comissão de Minas e Energia em 25 de
abril de 2017 e tramitando em caráter conclusivo no Congresso Nacional) e do Programa
RENOVABIO 2030 (programa do Governo Federal para expansão dos biocombustíveis,
vislumbrando atingir metas para o ano de 2030); serão abordadas, ainda, as dificuldades de
implementação de uma política pública unificada e consistente; e visto como funcionou, na
prática, a produção de biocombustíveis, no caso do biodiesel obtido da cultura do girassol em
municípios do estado do Rio Grande do Norte, na região do Mato Grande.
E, por fim, serão tecidas as considerações finais acerca da temática trazida à baila,
retomando-se os questionamentos motivadores e norteadores desta dissertação, e as respostas
encontradas pela pesquisa aqui procedida.
Desta feita, busca-se com este trabalho sanar uma lacuna no conhecimento acerca
dos biocombustíveis, visto que o potencial deles vai além do crédito de carbono, do latifúndio
monocultor, ou de uma commodity produtiva; os biocombustíveis podem ser concretizadores
19
de ações sociais, de políticas públicas voltadas ao bem-estar social e à política energética,
minimizando inclusive problemas sociais nos centros urbanos por serem potenciais fixadores
do homem no campo. Entretanto, este potencial necessita de políticas públicas sérias e
investimentos reais e contínuos para ter uma concretude fática.
20
2 ASPECTOS CONCEITUAIS E JURÍDICOS DA PRODUÇÃO DE
BIOCOMBUSTÍVEIS NO BRASIL: OS FATORES DO DESENVOLVIMENTO E DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
A globalização acelerada pelo desenvolvimento tecnológico gerou um aumento da
interdependência dos países. Nesse panorama global, a problemática ambiental extrapolou as
fronteiras territoriais, constituindo novos atores além do controle e da atuação dos Estados-
nações, tornando o sistema mundial mais complexo, interconectado e transnacional, causando
a constituição de uma esfera pública global, que negocia os mais diversos aspectos da vida,
desde a esfera ambiental, política, energética, entre outros5.
Figuram entre os atores dessa rede global, além dos Estados e da iniciativa privada,
as organizações não governamentais – ONG’s e as organizações internacionais
governamentais. No limiar das negociações entre esses atores, as ideias são pensadas
globalmente na perspectiva de influenciar as decisões tomadas localmente. Partindo dessa
premissa, avalia-se o panorama internacional na seara ambiental, diretamente afeto à matéria
da matriz energética e, por conseguinte, dos biocombustíveis.
2.1 AGENTES INTERNACIONAIS E DIRETRIZES AMBIENTAIS
Faz-se necessário delimitar o que é considerado biocombustível antes de se iniciar
um estudo jurídico sobre essa matriz energética. Neste trabalho se adota a mesma definição
utilizada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, que
infere que biocombustíveis são derivados de biomassa, tendo o potencial de substituir total ou
parcialmente, os combustíveis fósseis derivados do petróleo e do gás natural, seja em motores
à combustão, seja em outras formas de geração de energia6.
Ainda segundo a ANP, os dois principais biocombustíveis líquidos utilizados no
Brasil são o etanol proveniente da cana-de-açúcar e o biodiesel, produzido a partir de óleos
vegetais ou de gorduras animais e adicionado ao óleo diesel do petróleo7. Entre outros
5 Como bem explicou Boaventura de Sousa Santos, à medida que as ciências naturais se aproximam das ciências
sociais, ambas se aproximam das humanidades. Então, a transdisciplinariedade é necessária, uma vez que um
conhecimento exerce sobre o outro diferentes influências, que não podem ser ignoradas na construção do
conhecimento. [SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as Ciências. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2008.
p. 51-60]. 6 [ANP. Biocombustíveis. Disponível em: <http://www.anp.gov.br/wwwanp/biocombustiveis>. Acesso em: 4
abr. 2017]. Importante mencionar que a definição utilizada pela ANP é proveniente do art. 6º, inciso XXIV, da
Lei nº 9.478/97, a Lei do Petróleo. 7 ANP. Biocombustíveis. Disponível em: <http://www.anp.gov.br/wwwanp/biocombustiveis>. Acesso em: 4 abr.
2017.
21
biocombustíveis que compõem a matriz energética brasileira estão o biometano –
biocombustível obtido do biogás, esse proveniente da decomposição bacteriana de matéria
orgânica, podendo ser misturado ao gás natural derivado de combustíveis fósseis (porção
gasosa do petróleo) –, e os biocombustíveis de aviação – geralmente misturados em
percentuais específicos ao querosene e à gasolina de aviação.
Delimitado o conceito de biocombustível, para se ter uma ideia da dimensão de sua
utilização na matriz energética brasileira, apresentam-se dados do Balanço Energético Anual
– BEN 2017, fornecidos pela Empresa de Pesquisa Energética – EPE, segundo o qual
aproximadamente 45% da energia e 18% dos combustíveis consumidos no Brasil já são
renováveis. Desses 45%, 17,5% são provenientes da biomassa da cana, 12,6% da energia
hidráulica, 8,0% da lenha e carvão vegetal e 5,4% de outras energias renováveis, aqui incluso
o biodiesel8.
No restante do mundo, aproximadamente 75% da energia vem de fontes energéticas
não renováveis9, o que torna o Brasil um país pioneiro em nível mundial no uso de
biocombustíveis, diminuindo significativamente sua dependência energética dos combustíveis
fósseis. Embora um longo caminho ainda reste a ser percorrido, principalmente devido às
novas metas assumidas na 21ª Conferência das Partes – COP21 da Convenção-Quadro das
Nações Unidas sobre Mudança Climática – UNFCCC10
.
Para um melhor entendimento das questões que envolvem a produção brasileira de
biocombustíveis, serão explanados alguns aspectos do Acordo de Paris, das reuniões dos
organismos internacionais, e outras questões externas à política nacional e ao nosso
ordenamento jurídico. Objetiva-se, ao compreender o contexto internacional, ter subsídios
para entender mais profundamente as decisões internas acerca da temática dos
biocombustíveis – e também relativas à matriz energética brasileira; decisões que transitam
entre as searas do jurídico, da política, da economia, e, por conseguinte, recaem sobre
diversos outros aspectos da vida da população, incluindo meio ambiente, o desenvolvimento,
e as políticas públicas.
8 EPE. Balanço Energético Nacional – relatório síntese. Disponível em:
<https://ben.epe.gov.br/BENRelatorioSintese.aspx?anoColeta=2017&anoFimColeta=2016>. Acesso em: 16 jun.
2017. 9 Cf. OCDE, 2014.
10 As Conferências das Nações Unidas sobre Mudança Climática são realizadas anualmente, desde a Convenção
do Rio – ECO 92. A importância da 21ª Conferência se dá em virtude da ratificação do Acordo de Paris. As
demais diretrizes do texto final do Acordo de Paris estão disponíveis em:
<https://nacoesunidas.org/acordodeparis/>. Acesso em: 15 maio 2017.
22
Em 1988, a Assembleia Geral da ONU iniciou as discussões sobre os enfrentamentos
climáticos, criando, juntamente com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente –
PNUMA, o Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas – IPCC. O IPCC é responsável
por emitir relatórios avaliando as mudanças climáticas induzidas pela ação antrópica, bem
como os impactos por ela produzidos. Os relatórios fornecidos pelo IPCC norteiam as
Conferências das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento.
Entre as conferências que se destacam, seja por uma importância histórica, seja
política, a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento –
CNUMAD Cúpula da Terra ou ECO-92, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, importante
por lançar as bases de promoção ao desenvolvimento sustentável.
Outros acordos internacionais também ganharam relevo nos últimos anos, um dos
acordos de destaque foi o Protocolo de Kyoto, que protagonizou muitos debates em
momentos anteriores ao Acordo de Paris, e que em suma era um Protocolo segundo o qual os
países industrializados reduziriam suas emissões dos GEE em no mínimo 5%, em relação aos
níveis de 1990, até 2012. Esse compromisso pretendia reverter a tendência histórica do
crescimento das emissões11
.
Ganhou-se destaque, à época do lançamento do Protocolo de Kyoto, mecanismos de
transferência de “unidades de redução de emissões”. Esse comércio de emissões é regulado
pela Conferência das Partes, por meio de princípios, regras e diretrizes, bem como verificação
por meio de relatórios e prestação de contas12
.
Outro ponto é que no Protocolo de Kyoto o uso mais racional e sustentado dos
recursos energéticos adquire fortemente um valor tangível, na forma desses volumes
mensuráveis e negociáveis de redução de emissões de gases, que passam a constituir uma
nova commodity. Essas commodities deram origem aos Certificados de Emissões Reduzidas –
CERs, comercializáveis entre as empresas ou papéis colocados no mercado13
. Portanto, o
comércio de carbono remonta aos primórdios do Protocolo de Kyoto, sendo consolidado pelo
instrumento do Acordo de Paris.
11
O texto integral do Protocolo de Kyoto, ou Quioto, traduzido por órgãos oficiais do governo brasileiro –
Ministério da Ciência e Tecnologia e Ministério das Relações Exteriores – encontra-se disponível em:
<http://mudancasclimaticas.cptec.inpe.br/~rmclima/pdfs/Protocolo_Quioto.pdf>. Acesso em: 17 maio 2017. 12
Conforme redações do art. 6º e do art. 17 do Protocolo de Kyoto. 13
TETTI, Laura Maria Regina. Protocolo de Kyoto: Oportunidades para o Brasil com base em seu setor
sucroalcooleiro: um pouco da história da questão “mudanças” climáticas e efeito estufa. In: MORAES, Márcia
Azanha Ferraz Dias de; SHIKIDA, Pery Francisco Assis (org.). Agroindústria canavieira no Brasil: evolução,
desenvolvimento e desafios. São Paulo: Atlas, 2002. p. 199-213.
23
Durante a COP21, foi ratificado o Acordo de Paris, em 12 de dezembro de 2015,
pelas 195 partes da UNFCCC, sendo o Brasil uma dessas partes, com a finalidade de
combater os efeitos das mudanças climáticas e reduzir as emissões de gases do efeito estufa.
Algo anteriormente impensável, segundo o então secretário-geral da Organização das Nações
Unidas – ONU, Ban Ki-Moon, uma vez que os países desenvolvidos se comprometeram a
investir 100 bilhões de dólares por ano em medidas de combate à mudança climática nos
países em desenvolvimento14
.
Portanto, percebe-se que mais do que nunca, os países desenvolvidos estão cientes de
que se não atentarem para as medidas necessárias, a qualidade de vida no mundo inteiro
restará seriamente comprometida, e estão dispostos a conservar o meio ambiente, mesmo que
isso signifique investir nos países em desenvolvimento. Apesar dessa mobilização coletiva
das nações para ratificação do Acordo de Paris – inclusive pelo Brasil, que até então
apresentava bons resultados quanto à preservação ambiental –, tem sido difícil colocar em
prática as diversas metas ambientais acordadas.
No âmbito internacional, o Acordo de Paris foi reafirmado também na 22ª
Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima
(COP22) – realizada entre 07 e 18 de novembro de 2016, em Marrakesh –, porém, na
realidade, o Brasil espantou a comunidade internacional com números elevados do
desflorestamento, que aumentou em 24% no ano de 2015, demonstrando que não estão sendo
tomadas as medidas necessárias para reduzir a emissão de gases do efeito estufa e, assim,
cumprir com o acordado15
.
Sobre o desmatamento, José Eli da Veiga leciona que o maior desafio de mitigação
na redução de GEE é reduzir acentuadamente o desflorestamento. E a área mais estratégica do
Brasil em relação ao desmatamento é a Amazônia, sendo considerada pelo autor como o elo
na relação entre mudança climática e desenvolvimento.16
Para viabilizar essa preservação, o
autor enxerga um polo de desenvolvimento high tech na economia brasileira do século XXI,
numa espécie de sillicon valley da bioeconomia.
Já no âmbito do ordenamento jurídico interno, o Acordo de Paris foi ratificado pelo
Presidente da República em 12 de setembro de 2016, após aprovação nas duas casas
14
ONU-BRASIL. COP21. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/cop21/>. Acesso em: 15 maio 2017. 15
NOVACANA. Retrocesso ambiental deve pôr Temer em saia-justa em conferência da ONU. Disponível em:
<https://nacoesunidas.org/?post_type=post&s=COP22>. Acesso em: 17 ago. 2017. 16
VEIGA, José Eli da; VIANNA, Sérgio Besserman; ABRANCHES, Sérgio. A sustentabilidade do Brasil. In:
GIAMBIAGI, Fábio; BARROS, Octávio de. Brasil pós-crise: agenda para a próxima década. p. 305-323. Rio
de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 319.
24
legislativas do Congresso Nacional, em uma tramitação que durou menos de três meses, e por
meio dele o Governo Federal se compromete com a redução de gases de efeito estufa em 37%
até 2025 e 43% até 2030, reduzindo as emissões de gases causadores do efeito estufa a níveis
anteriores ao registrado em 2005.
Em virtude dessa situação de ampliação dos índices de desmatamento, contrariando
os termos supramencionados ratificados pelo Brasil no Acordo de Paris, a Noruega cortou em
200 milhões de reais o repasse ao Fundo da Amazônia – o equivalente à metade da
integralidade da doação prevista. Tal atitude mostra-se bastante coerente, tendo em vista que a
Noruega é o país que mais contribui para o Fundo de Preservação da Amazônia, e desde sua
criação, em 2005, concedeu mais de um bilhão de dólares – recursos aqui geridos pelo
BNDES. A Alemanha também condicionou, inicialmente, a liberação de suas contribuições
ao Brasil à comprovação da redução dos índices de desflorestamento17
.
As medidas mais austeras dos países desenvolvidos em limitarem ou condicionarem
as contribuições e as doações ao Brasil surtiram um efeito positivo, apesar da delicada
situação internacional instaurada, uma vez que em meados do corrente ano, o atual Ministro
do Meio Ambiente José Sarney Filho viajou até a Noruega, mostrando as novas atitudes
tomadas pelo ministério e entidades associadas para redução dos índices de desmatamento, os
programas locais de desenvolvimento das comunidades ribeirinhas na região da Amazônia
Legal, entre outras.
Após o encontro supramencionado, o Ministério do Clima e do Meio Ambiente da
Noruega divulgou nota na qual reafirma a parceria com o Brasil, mas ratifica que somente
repassará os valores quando o Brasil apresentar os índices de 201618
. Todavia, os números
que o país tem a apresentar não são animadores: o desflorestamento amazônico em 2016
subiu para quase 30% – não eram vistos índices assim desde 200819
.
Ainda nessa conjuntura de mitigação de responsabilidades ambientais, em 1 de junho
de 2017, os EUA anunciaram a possível saída do Acordo de Paris, tornando a sua execução
mais árdua, visto os EUA serem responsáveis por 15% das emissões de dióxido de carbono20
.
17
NOVACANA. Retrocesso ambiental deve pôr Temer em saia-justa em conferência da ONU. Disponível em:
<https://nacoesunidas.org/?post_type=post&s=COP22>. Acesso em: 17 ago. 2017. 18
GOVERNMENT NORWAY. Norway is committed to the partnership with Brazil on reducing deforestation.
Disponível em: <https://www.regjeringen.no/en/aktuelt/norway-brazil-cooperation/id2558980/>. Acesso em: 25
jun. 2017. 19
NOVACANA. Retrocesso ambiental deve pôr Temer em saia-justa em conferência da ONU. Disponível em:
<https://nacoesunidas.org/?post_type=post&s=COP22>. Acesso em: 17 ago. 2017. 20
BBC-BRASIL. Cinco efeitos globais da saída dos EUA do acordo de Paris. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/internacional-40114352>. Acesso em: 1 jun. 2017.
25
Na tentativa de manter os EUA como país signatário, algumas das diretrizes aplicadas aos
EUA podem ser flexibilizadas na COP23, a ser realizada em novembro, na Alemanha.
Quanto à emissão de gases causadores do efeito estufa, atualmente, segundo dados
do BEN 2017, o total de emissões antrópicas da matriz energética brasileira foi de 428,95
MtCO2 –eq21
(uma redução de 7,2% em relação ao ano de 2015), e desse inteiro, conforme o
gráfico que se segue, no ano de 2016, o setor de transporte foi responsável por 45,3% das
emissões de dióxido de carbono.
As elevadas taxas de emissão de dióxido de carbono e outros gases pelo setor de
transporte apontam para a necessidade de se repensar a matéria-prima utilizada nos motores à
combustão dos automóveis brasileiros, e nesse sentido, por exemplo, destacam-se a Lei nº
13.033/2014, que dispõe sobre a adição obrigatória do biodiesel ao óleo diesel do proveniente
do petróleo22
, e Lei nº 12.263/201623
, a qual alterou os percentuais obrigatórios dessa adição
(no momento em 8% – conhecido como biodiesel B8)24
.
Gráfico 1. Emissões totais em MtCO2 no ano de 2016 (BEN, 2017).
Entre os países participantes da UNFCCC, destacam-se as emissões da China, dos
EUA e da União Europeia. Consolidadas as informações da International Energy Agency no
gráfico seguinte, abordando as emissões de CO2 per capita, observa-se que tanto produzindo
21
A unidade de medida MtCO2 significa megatoneladas de CO2 equivalente e é utilizada para comparar as
emissões dos gases do efeito estufa tendo por base o potencial de aquecimento global, utilizando por parâmetro o
potencial de aquecimento do dióxido de carbono. Portanto, quando se utiliza MtCO2, salvo especificação ao
contrário, estão englobados o potencial de aquecimento do dióxido de carbono, do gás metano, do óxido nítrico,
entre outros cases do efeito estufa. 22
BRASIL. Lei Federal nº 13.033, de 24 de setembro de 2014. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13033.htm>. Acesso em: 15 maio 2017. 23
BRASIL. Lei Federal nº 12.263, de 23 de março de 2016. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13263.htm#art1>. Acesso em: 15 maio 2017. 24
Essas e outras iniciativas serão mais aprofundadamente estudadas no decorrer desta dissertação.
26
quanto consumindo energia, um brasileiro emite sete vezes menos CO2 que um norte-
americano e três vezes menos do que um chinês ou um europeu25
. Reforçando a
sustentabilidade das emissões de dióxido de carbono da matriz energética brasileira e seu
patamar avançado em relação aos demais países.
Gráfico 2. Emissões relativas, em kgCO2/US$ppp, em 2014 (BEN, 2017).
Em síntese, do exposto, percebe-se que no âmbito do COP e, por conseguinte, do
Acordo de Paris, há uma ênfase a chamada “economia do carbono” envolvendo as questões
climáticas, cobrando metas de emissão do dióxido de carbono na atmosfera. Além de uma
insistência para que os países detentores de reservas florestais, cujo grande exemplo é o
Brasil, preservem ao máximo essas reservas.
Analisando mais a fundo a questão ambiental, a economia do carbono é insuficiente.
Como apregoa Ignacy Sachs, é necessária uma verdadeira mudança no estilo de vida,
caminhando ao lado da revitalização dos sistemas tecnológicos, principalmente no Norte do
planeta, nos países ditos desenvolvidos. Não adianta apenas cobrar do Sul, em
desenvolvimento, que na grande maioria dos casos tem seus problemas agravados em virtude
da busca do patamar de desenvolvimento do Norte, causando uma apartheid social gigantesco
dentro do próprio Sul26
.
25
EPE. Balanço Energético Nacional: relatório síntese. Disponível em:
<https://ben.epe.gov.br/BENRelatorioSintese.aspx?anoColeta=2017&anoFimColeta=2016>. Acesso em: 16 jun.
2017. 26
Sachs ainda afirma que o Sul poderia ter evitado muito dos problemas se tivesse migrado, nos primórdios do
desenvolvimento, para a economia de recursos, com orientação para os serviços, menos materializados, com o
foco na preservação do meio ambiente e na elevação do padrão de pobreza. [SACHS, Ignacy. Caminhos para o
desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond: 2009. p. 58.]
27
Infelizmente, instrumentos como o Acordo de Paris, só deixam mais claro que não
há, por parte das nações desenvolvidas, uma preocupação mais intensa com a mudança do seu
estilo de vida, tenta-se, na verdade, neutralizar as emissões dos GEE27
com os projetos tidos
como “verdes” nos países em desenvolvimento.
O que, por fim, acaba tendo viés negativo, pois nem sempre os projetos que
conseguem incentivos ou subsídios são necessariamente ecológicos. E assim se segue
degradando indiscriminadamente o meio ambiente, sem modificação concreta dos moldes de
desenvolvimento adotados tanto pelos países do Norte quanto pelos países do Sul.
Possivelmente, um dos indicativos da insuficiência dessa preocupação ambiental
“superficial” seja a crescente demanda energética, principalmente de combustíveis fósseis
para o setor de transportes, como demonstram as projeções do Gráfico 3, extraído do estudo
BP Energy Outlook – 2017 edition da companhia exploradora de petróleo British Petroleum –
BP.
O estudo, conforme o Gráfico 3, afirma que: o setor industrial e o setor de “edifícios”
(nele inclusos agricultura e outros setores reduzidos) são os maiores mercados consumidores
finais de energia, também representando a maior demanda; no entanto, há uma diminuição
entre 1,2% e 1,5% ao ano, em cada um desses setores, em virtude de energia melhor
aproveitada e aumento da eficiência energética; o consumo nos transportes cai na medida em
que os ganhos na economia aumentam (cerca de 1,2% ao ano); entretanto a demanda por
combustível não queimado, principalmente na indústria petroquímica, permanece mais
elevado (2,1% ao ano), tornando-se, gradualmente, a maior demanda de combustíveis
fósseis28
.
27
Gases de efeito estufa são conhecidos pela sigla GEE, e são compostos, principalmente, o dióxido de carbono
(CO2), o metano (CH4), o óxido nítrico (N2O), entre outros. Segundo a IEA, o gás de efeito estufa mais
produzido no mundo é o dióxido de carbono. 28
A BP compôs o cartel das Sete Irmãs, formado pelas maiores empresas de petróleo e gás do mundo.
Atualmente, são apenas três empresas além da BP: Chevron, ExxonMobil e Shell. Anualmente, a BP publica o
dossiê Energy Outlook BP. [BP Energy Outlook: 2017 edition. Disponível em:
<https://www.bp.com/content/dam/bp/pdf/energy-economics/energy-outlook-2017/bp-energy-outlook-
2017.pdf>. Acesso em: 16 maio 2017.]
28
Gráfico 3. Crescimento da demanda de combustível fóssil por setor (BP Energy Outlook,
2017).
Ainda segundo o BP Energy Outlook 2017, o cenário de consumo de energia está se
modificando: anteriormente, a maior demanda era dos centros tradicionais, atualmente
superados pelo rápido crescimento dos mercados emergentes. Entretanto, há um esforço
global no sentido da melhoria da eficiência energética e do uso da energia de forma mais
sustentável, que implicarão uma redução das emissões de carbono da energia em relação aos
últimos 20 anos. Todavia, em um saldo final, as emissões de carbono continuarão a aumentar,
indicando a necessidade de uma política mais eficiente para a sua redução. A BP enquadra,
ainda, o período atual como um período de transição energética29
.
Destaque é dado, no relatório da BP, às energias renováveis, tidas como a fonte de
combustível que mais crescerá, aumentando a um percentual médio de 7,6% ao ano,
quadruplicando durante o período estudado, impulsionadas, principalmente, pelo aumento da
competitividade das energias solar e eólica. A China é apontada como país com o maior
potencial de crescimento para as energias renováveis nos próximos 20 anos, equivalente a
mais que a junção da União Europeia e dos EUA. A participação das energias renováveis na
energia primária aumentará para 10% em 2035, ante 3% em 2015 (conforme o Gráfico 4, a
seguir).
O relatório BP Outlook reforça, complementado pelo Gráfico 4, seguinte, que a
transição gradual na mistura de combustível está configurada para continuar, no que diz
respeito às energias renováveis30
, e em conjunto com energia nuclear e hidrelétrica,
29
BP Energy Outlook: 2017 edition. Disponível em: <https://www.bp.com/content/dam/bp/pdf/energy-
economics/energy-outlook-2017/bp-energy-outlook-2017.pdf>. Acesso em: 16 maio 2017. p. 4-5. 30
As energias renováveis dispostas no Gráfico 4 incluem energia eólica, solar, geotérmica, biomassa e
biocombustível.
29
representará metade do crescimento do fornecimento de energia nos próximos 20 anos. E que
mesmo diante desse panorama, o petróleo, o gás e o carvão permanecem as fontes dominantes
de energia que alimentam o mundo, representando mais de três quartos do total de
suprimentos de energia em 2035 (abaixo dos 85%, em 2015).
Fora isso, ainda se infere do Gráfico 4, que o gás é o combustível que cresce mais
rapidamente (1,6% ao ano), passando a ser a segunda maior fonte de combustível em 2035,
ultrapassando o carvão. O petróleo continua a crescer (0,7% ao ano), mas o seu ritmo de
crescimento diminui gradualmente. Já quanto ao carvão, seu crescimento diminui
acentuadamente: 2,7% ao ano (quando comparado aos 0,2% ao ano dos últimos 20 anos;
atinge seu pico de utilização, provavelmente, em torno do ano 2020).
Gráfico 4. Participação das energias primárias (BP Energy Outlook, 2017).
Algumas alternativas interessantes são colocadas pelo relatório BP Outlook, entre
elas o investimento em mobilidade utilizando como força motriz a eletricidade, tido ainda
como uma incerteza. No terreno das alternativas energéticas, estudo do BNDES aponta
justamente o aumento da eficiência energética como uma realidade já trabalhada inclusive em
nível nacional, por meio do programa Inovar-auto; além da eficiência energética, a
eletrificação veicular também é vista como uma realidade. Mas, ainda segundo estudo do
BNDES, a alternativa de mais rápida implementação é o maior desenvolvimento dos
biocombustíveis, em consonância com o estudo da BP31
.
31
O Inovar-Auto é um programa do Governo brasileiro que objetiva aumentar a competitividade do setor
automotivo, por meio de incentivos, tornando os veículos mais econômicos e seguros. [MILANEZ, Artur Yabe
et al. O Acordo de Paris e a transição para o setor de transportes de baixo carbono: o papel da Plataforma para
30
Acerca dos motores à combustão e da sua substituição por veículos elétricos ou
híbridos, a perspectiva é de “morte” dos motores à combustão em poucos anos, inclusive
alguns países, como a Inglaterra, já assumiram publicamente que até 2050 pretendem que toda
a sua frota de veículos seja elétrica32
. Mesmo diante dessa realidade, a “saída” mais rápida é
mesmo investimento em biocombustíveis, daí extrai-se a importância da temática discutida
nessa dissertação.
Todavia, a questão da busca por energias mais sustentáveis, remonta o Relatório
Brundtland, que já trazia a informação de que uma pessoa média em uma economia de
mercado industrial gasta 80 vezes mais energia que uma pessoa na África subsaariana, e que
para levar o desenvolvimento energético aos países menos industrializados, seriam
necessárias cinco vezes mais energia que o consumido, devendo ser utilizadas energias mais
limpas e renováveis possíveis, aumentando principalmente a eficiência energética. Não sendo,
portanto, um conhecimento propriamente novo, mas sim que não conseguiu ainda ser posto
em prática pelos países de forma plena33
.
Diante de todas as estatísticas e estudos apresentados, para que se atinjam as metas
acordadas em Paris e demais acordos internacionais, é necessário um esforço concreto de cada
país signatário para reduzir suas emissões, direcionando suas matrizes energéticas no sentido
de uma energia mais renovável, de uma produção e transmissão mais eficiente, diminuindo
também o desmatamento e práticas não sustentáveis. Em síntese, é necessário traçar um
amplo programa de desenvolvimento o mais sustentável possível em cada país, para além da
economia do carbono.
Entendido minimamente o contexto atual da política ambiental internacional de
redução das emissões dos gases potencialmente elevadores dos níveis do efeito estufa, fazem-
se alguns esclarecimentos pertinentes sobre a perspectiva da juridicização do conceito de
desenvolvimento e do conceito de desenvolvimento sustentável no ordenamento jurídico
interno; os fatores relativos ao desenvolvimento e ao desenvolvimento sustentável da
produção nacional de biocombustíveis, frente ao estado em crise; para posteriormente
adentrar na regulação e regime jurídico atuais aplicáveis aos biocombustíveis.
o Biofuturo. BNDES Setorial: biocombustíveis, Rio de Janeiro, n. 45, p. 285-340, mar. 2017. p. 300 et seq.
Disponível em: <https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/handle/1408/11756>. Acesso em: 20 maio 2017.] 32
THE ECONOMIST. The death of the internal combustion engine. Disponível em:
<https://www.economist.com/news/leaders/21726071-it-had-good-run-end-sight-machine-changed-world-
death>. Acesso em: 13 ago. 2017. 33
PORTO, Uelton Carlos; MELO FILHO, Renato Soares de; DUARTE NETO, José. O desenvolvimento
sustentável e as políticas públicas de sustentabilidade: uma análise do documento “our common future”. In:
MANÍGLIA, Elisabete (org.). Direito, Políticas públicas e sustentabilidade: temas atuais. São Paulo: UNESP,
2011. p. 29-50.
31
2.2 A PRODUÇÃO DOS BIOCOMBUSTÍVEIS COMO FATOR DE
DESENVOLVIMENTO
Em razão dos acordos internacionais, com repercussão no ordenamento jurídico
interno, e das estatísticas apresentadas anteriormente quanto à expansão da produção dos
biocombustíveis, e, por conseguinte, de suas matérias-primas, verifica-se a necessidade de se
desenvolver o setor energético vinculado à efetivação dos princípios dirigentes e normas
constitucionais programáticas, culminando em um desenvolvimento econômico social e
ambientalmente sustentável.
Caso não haja um desenvolvimento calcado na sustentabilidade, corre-se o risco de
se recair, na prática, em um crescimento, mas não em um desenvolvimento propriamente dito
do país. Fábio Nusdeo distingue bem o crescimento do desenvolvimento: esse é um progresso
capaz de alterar as estruturas de um sistema, possuindo, portanto, forças próprias; aquele é
induzido por fatores externos, não provoca o progresso, apenas infla a economia, a qual se
esvazia assim que cessado esse fator indutor externo; e o crescimento simples é caracterizado
por um processo de expansão da renda sem determinar mudanças estruturais34
.
Ao se vislumbrar o estudo das políticas públicas e dos programas de fomento à
produção de biocombustíveis sob a perspectiva constitucional brasileira, tem-se em mente um
horizonte de desenvolvimento e não meramente de crescimento35
. Mas o grande
questionamento, a ser respondido mais adiante, é se os setores produtivos e governamentais
envolvidos nas diversas cadeias produtivas dos biocombustíveis trabalham de fato nessa ótica
ou não e as respectivas motivações.
Nessa perspectiva, para melhor compreensão das inter-relações entre o direito e o
desenvolvimento, essas temáticas serão dissertadas nos subitens seguintes, para que, obtida a
compreensão do desenvolvimento como um direito constitucionalmente garantido, sejam
apresentados os fundamentos necessários para análise jurídica da política energética brasileira
no que cinge aos biocombustíveis, enfatizando o etanol e o biodiesel por sua maior
participação no mercado produtivo.
34
NUSDEO, Fábio. Curso de economia: introdução ao direito econômico. 3.ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2001. p. 300. 35
O desenvolvimento como sinônimo de crescimento econômico foi uma das vertentes clássicas dos teóricos
econômicos, num propósito de acúmulo de capital por meio de poupança interna e externa.
32
2.2.1 A juridicização do conceito de desenvolvimento
Segundo Habermas, a expressão “juridicização” refere-se ao fato de o direito escrito
ter tendência a aumentar, nas sociedades modernas; esse aumento desdobra-se em dois
fenômenos: a expansão do direito, ao regular juridicamente elementos da vida social antes
submetidos a normas sociais, como a moral, e a densificação do direito, ao se especializar
cada vez mais normas jurídicas antes globais36
.
O desenvolvimento constitui um fenômeno jurídico e para assim compreendê-lo é
necessário estudar o seu processo de juridicização. Como bem pontua Leonardo Alves Corrêa,
o desenvolvimento é uma categoria com status jurídico e não puramente econômico ou
sociológico37
. Existindo três caminhos que identificam o desenvolvimento como fenômeno
jurígeno38
: a admissibilidade do desenvolvimento como direito fundamental; a positivação do
direito ao desenvolvimento em diplomas internacionais; e o processo de constitucionalização
do desenvolvimento39
.
Há um consenso na doutrina constitucionalista ao considerar o direito ao
desenvolvimento como um direito fundamental – ocupando uma posição de centralidade no
ordenamento jurídico –, mais precisamente pertencente à categoria dos direitos de terceira
dimensão40
.
Segundo a doutrina do hispânico Pérez Luño, sob a ótica de Ingo Sarlet, os direitos
fundamentais possuem essa denominação em virtude do seu caráter fundamentador, de serem
as bases do sistema jurídico do Estado de Direito, ou seja, tais direitos são reconhecidos e
36
Habermas distingue quatro processos de juridicização, são eles: o primeiro gera o Estado burguês, na forma
dos Estados europeus absolutistas; o segundo leva ao Estado de direito monarca alemão do século XIX; o
terceiro leva ao Estado democrático de direito que se expandiu pela Europa e América do Norte após a
Revolução Francesa; o quarto leva ao Estado de direito social e democrático pós movimento operário do século
XX. [HABERMAS, Jünger. Tendências da juridicização (Trends in the extension of the scope of the Law).Trad.
Pierre Guibentif. Sociologia: Problemas e Práticas, Lisboa, v. 1, n. 2, p.185-204, maio 1987. Disponível em:
<http://hdl.handle.net/10071/1122>. Acesso em: 10 abr. 2017.] 37
Ainda, segundo o autor, o desenvolvimento é um fenômeno jurídico, constituindo um modelo de
desenvolvimento pluridimensional, isto é, formado pela interação indissociável de três dimensões normativas-
constitucionais: a socioeconômica, a ambiental e a cultural. Durante este trabalho serão analisadas a dimensão
socioeconômica e a dimensão ambiental, a dimensão cultural, apesar de igualmente importante, não se refere tão
diretamente à temática dos biocombustíveis quanto às outras duas. É importante ressaltar que o autor, em sua
obra, examina o estado da arte do tema desenvolvimento, sendo utilizado como um norte geral para essa
disciplina nesta dissertação. [CORRÊA, Leonardo Alves. Desenvolvimento econômico e desenvolvimento: uma
interpretação a partir da constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011. p. 41.] 38
Os três caminhos para explicação do desenvolvimento como fenômeno jurígeno são adotados nesta dissertação
para melhor explicar o desenvolvimento atrelado ao desenvolvimento energético dos biocombustíveis. Todavia o
enfoque dado a cada um dos três caminhos seguirá uma abordagem própria. 39
CORRÊA, Leonardo Alves. Desenvolvimento econômico e desenvolvimento: uma interpretação a partir da
constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011. p. 42. 40
Ibidem. p. 42.
33
garantidos institucionalmente; possuem ainda uma acepção mais precisa que a dos direitos
humanos, visto esses possuírem uma ambientação internacional41
.
Já quanto aos direitos de terceira dimensão, Paulo Bonavides fundamenta no sentido
de serem aqueles correspondentes aos direitos de fraternidade, cuja titularidade é coletiva, e
nessa categoria se enquadram: o direito ao desenvolvimento – objeto desta análise –, o direito
à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade42
.
Percebe-se, então, que tanto o direito ao desenvolvimento, quanto o direito ao meio
ambiente pertencem à mesma dimensão de direitos fundamentais, e por essa razão, ambos
serão trabalhados neste capítulo, sendo o direito ao meio ambiente trabalhado na perspectiva
do desenvolvimento sustentável.
Vários estudiosos apresentaram conceitos diversos para o “desenvolvimento” 43
,
entre os quais se destacam, na abordagem proposta por este trabalho, o conceito de Bresser-
Pereira, o de José Eduardo Faria, o de Amartya Sen, e o de Trubek – não necessariamente em
ordem cronológica do surgimento de suas correntes de pensamento44
.
De acordo com Bresser-Pereira, o desenvolvimento é um processo de transformação
econômica, política e social, de uma forma integrada tal que o padrão de vida da população
tenderia a crescer de modo automático e autônomo. É um processo social e global de
reestruturação econômica, política e social de um país45
. Ainda, infere que se o
desenvolvimento econômico não trouxer consigo transformações sociais e políticas, será
porque não houve um concreto desenvolvimento.
Entende-se a visão de Bresser-Pereira como uma visão multidimensional e
integradora do desenvolvimento, passível de ser aplicada sobremaneira na fundamentação das
diretrizes a serem tomadas nas políticas que envolvem os biocombustíveis. Mas há um
entrave: será que haverá sempre uma perspectiva de crescimento? Tendo em vista a Lei da
Escassez, na qual os recursos são finitos, a despeito das necessidades humanas infinitas, o
41
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais
na perspectiva constitucional. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 31. 42
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo: Melhoramentos, 2004. p. 569-570. 43
Aqui se almeja abordar o desenvolvimento numa dimensão sócio-econômica, pois essa é uma das pilastras do
desenvolvimento na Constituição Federal de 1988. 44
O conceito de desenvolvimento evolui ao longo da história democrática, possuindo, em cada fase, uma
acepção diferente e com distinções significativas. Partiu-se do desenvolvimento clássico como sinônimo de
crescimento econômico, nos primórdios; passando por uma vertente mais neoliberal; pelas ideias de Joseph
Schumpeter, ao afirmar que o desenvolvimento é dinâmico e depende das inovações tecnológicas introduzidas
por empreendedores; pelas duas correntes do desenvolvimento presentes na Comissão Econômica para América
Latina e Caribe – CEPAL, uma estruturalista e outra da dependência, econômica e sociológica; entre outras
vertentes do desenvolvimento surgidas posteriormente, como o desenvolvimento como liberdade, de Amartya
Sen. 45
BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Desenvolvimento e crise no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1982. p. 15.
34
conceito de Bresser-Pereira torna-se por demais utópico para ser aplicado aos
biocombustíveis.
Já José Eduardo Faria, ao analisar as consequências da reestruturação do capitalismo,
constrói uma base para o desenvolvimento em sua obra, por meio de ideias referentes à
expansão econômica e ao formato como é desenvolvida pelos investidores. Ocorrendo uma
expansão cíclica na duração do desenvolvimento histórico, iniciado devido à competição
industrial e, em consequência, acarretando buscas por menores custos para produção de suas
mercadorias, de forma a conseguir uma posição no mercado46
.
A visão de José Eduardo Faria aponta para um viés mais mercadológico e financeiro
do desenvolvimento, interessante ao se pensar a economia dos biocombustíveis inserida em
um mercado global, seja ele o de créditos de carbono provenientes da captura desse nas suas
plantações, ou na perspectiva dos fluxos do comércio internacional do próprio combustível
não fóssil. Ademais, pelo caráter cíclico, percebe-se sua coerência ao se considerar períodos
de maior fomento, menor fomento, em virtude de crises, quebras de safras (no caso dos
agrocombustíveis), entre outros processos que possam interferir na linearidade da produção e
da economia dos biocombustíveis. Mostrando-se um conceito plenamente aplicável na
prática.
Partindo para o panorama de Amartya Sen, em sua premiada obra Desenvolvimento
como Liberdade, como o próprio nome transmite, traz a ideia do desenvolvimento como
forma de se exercer as liberdades individuais. A desigualdade a ser combatida é a geradora de
privação na liberdade de escolha do indivíduo enquanto agente econômico47
.
No desenlace da sua ideia de desenvolvimento, Amartya Sen descortina que o mundo
é recheado de privações, destruição e opressão; são problemas antigos que se acumulam com
os novos problemas, a fome persiste – tanto a crônica quanto a coletiva, bem como a pobreza,
em uma perspectiva de violação de garantias e liberdades básicas. E o processo de
desenvolvimento consiste, em grande parte, na superação desses problemas48
. Transmitindo
uma ideia de desenvolvimento econômico pautada em um sutil liberalismo que será mais bem
analisada quando se abordar o paradigma dos biocombustíveis diante da segurança alimentar.
Sobre o trinômio estado, direito e desenvolvimento, Trubek traz uma de suas grandes
contribuições, ao afirmar que o Estado desenvolvimentista deve produzir também o progresso
46
FARIA, José Eduardo. Sociologia jurídica: direito e conjuntura. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. (Série
GVlaw). 47
SEN, Amartya. Desenvolvimento como Liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 10. 48
Ibid.,. p. 9.
35
econômico ou perderá o apoio da população, concomitantemente, deve estimular as
transformações sociais e culturais essenciais, de modo que haja a criação de um sistema
industrial capaz de satisfazer a demanda por um padrão de vida mais elevado49
.
Acerca da atualidade das discussões sobre o direito e o desenvolvimento, Trubek
afirma ainda que a discussão sobre Direito e Desenvolvimento no Brasil é contínua, sendo um
problema sempre recorrente no País. A discussão brasileira gira em torno da realização ou não
de mudanças no Direito e reformas nas instituições50
.
As ideias de Trubek são pertinentes na medida em que o Estado desenvolvimentista,
ao produzir progresso econômico, estimular transformações sociais e culturais, e, portanto, se
relaciona intimamente com o Estado constitucional brasileiro de bem-estar social. Qualquer
política pública aqui desenvolvida deveria, em tese, em maior ou menor grau, adotar tal
perspectiva constitucional, incluindo as políticas econômicas e as energéticas.
O desenvolvimento entendido como multidimensional51
– na medida em que abrange
aspectos sociais, ambientais, econômicos, de mercado, políticos, culturais, além do panorama
das organizações internacionais – mais se adéqua à temática dos biocombustíveis, tanto em
uma perspectiva da produção e do mercado brasileiro, quanto de outros países, posto haver
um forte caráter estratégico, em que não é possível dimensionar o peso de cada um desses
vieses isoladamente, nem é possível se ignorar a influência de cada uma dessas dimensões
sobre o desenvolvimento enquanto fenômeno transformador52
.
49
Dessa interrelação especificada por Trubek, extrai-se a ideia do que o desenvolvimento deve promover. A
atualidade da análise do crítico é inegável ao se pensar o momento político do Brasil: a então presidente Dilma
Rousseff sofreu um processo de impeachment, reacendendo debates sobre a legitimidade democrática do novo
governo, principalmente por proceder com uma série de reformas e medidas antipopulares, retirando
investimentos de áreas de cunho social, como a educação. Fazendo-se um paralelo com o pensamento de Trubek,
o progresso econômico deve estar aliado ao social e ao cultural, portanto, para ter uma continuidade e apoio
popular. A realidade atual das pesquisas de opinião demonstra índices crescentes de desaprovação do governo
nos moldes atuais. Fica a reflexão. [TRUBEK, David M. Para uma teoria social do direito: um ensaio sobre o
estudo de direito e desenvolvimento, in: José R. Rodriguez (org), O Novo Direito e Desenvolvimento: passado,
presente e futuro. São Paulo, 2008. p. 108.] 50
RODRIGUEZ, José Rodrigo Rodriguez et al. O novo direito e desenvolvimento: entrevista com David
Trubek. Revista Direitogv, São Paulo, v. 3, n. 2, p.305-330, set. jul-dez 2007. Disponível em:
<http://direitosp.fgv.br/sites/direitogv.fgv.br/files/rd-06_13_pp.305-330_o_novo_direito_e_desenvolvimento_-
_entrevista_com_david_trubek.pdf>. Acesso em: 10 abr. 2017. 51
Percebe-se que em grande parte das conceituações de desenvolvimento existe um núcleo comum, de múltiplos
fatores e que quanto maior a importância do objeto estudado, mais plural é o conceito de desenvolvimento a ele
passível de aplicação, ou seja, mais fatores da definição de desenvolvimento são abarcados. Esse é o norte
metodológico de todas as elaborações conceituais desta dissertação. 52
Na maioria das ciências humanas tende-se a construir conceitos que representam modelos ideais, devido à
influência do pensamento de Max Weber, que nem sempre se traduz, na prática, em características reais do
fenômeno. [OLIVEIRA, Carla Montefusco de. Método e sociologia em Weber: alguns conceitos
fundamentais. Revista Eletrônica Inter-legere, Natal, n. 3, p.1-10, jul./dez. 2008. Disponível em:
<http://www.cchla.ufrn.br/interlegere/revista/pdf/3/es02.pdf>. Acesso em: 16 abr. 2017.]
36
De onde surgiu a necessidade de se explanar as diversas perspectivas de abordagem
do desenvolvimento na literatura, posto que nenhuma delas, pelo menos durante a construção
deste trabalho, mostrou-se completamente suficiente. As facetas do estudo do
desenvolvimento aqui apresentadas afiguram-se em uma relação de complementaridade que
contribui para o entendimento do desenvolvimento aplicado aos biocombustíveis, bem como
aplicado a outras searas do conhecimento53
.
Apresentados alguns conceitos de desenvolvimento54
, discorre-se sobre o conceito de
subdesenvolvimento. Historicamente, o termo subdesenvolvimento foi mencionado pela
primeira vez para se referir aos países menos desenvolvidos do Hemisfério Sul pelo
Presidente norte-americano Harry Truman, em um discurso no ano de 1949, ao defender uma
intervenção dos Estados Unidos em outros países, com a finalidade de fomentar o progresso
industrial em áreas subdesenvolvidas.
Marcos Costa Lima afirma, em seus estudos homenageando Celso Furtado55
, grande
economista estudioso do subdesenvolvimento, que Celso Furtado o define como um processo
histórico independente, não sendo uma etapa para se atingir um grau superior de
desenvolvimento, reconhecendo, ainda, o subdesenvolvimento como um fenômeno de
dominação (por vezes de natureza política, por vezes de natureza cultural) 56
.
53
Ao se buscar um conceito de desenvolvimento aplicável aos biocombustíveis, além de se perceber um núcleo
comum, como explicado anteriormente, percebe-se que diversas características se somam, como quando se
menciona as múltiplas facetas do desenvolvimento, ou seja, há um núcleo comum e características justapostas,
por adição. Nesse sentido são as construções de Sartori, ao serem examinadas por Fonseca, mencionando que
existem três formas de formulações conceituais básicas, em resumo: as construções por acumulação (o conceito
possui um núcleo comum, intersecção de vários conceitos existentes), por adição (o conceito será formulado ao
se adicionar características, alguns casos práticos possuirão todas elas, sendo casos completos, e outros
possuíram apenas algumas, sendo subtipos reduzidos) e por redefinição (busca-se um núcleo comum com os
principais atributos, sem esgotá-los). [FONSECA, Pedro Cezar Dutra. Desenvolvimentismo: a construção do
conceito (paper). In: MALTA, Maria; SANTOS, Cleusa; ACOSTA, Luis. Seminário e debate UFRJ, em 25 set.
2013. p. 5-7. Disponível em:
<http://www.centrocelsofurtado.com.br/arquivos/image/201309121650480.Conceito%20Desenvolvimentismo%
20-%20Pedro%20Fonseca.pdf>. Acesso em: 16 abr. 2017.] 54
Diversos autores estudados, mas não abordados diretamente no corpo desta pesquisa são igualmente
importantes para o entendimento do desenvolvimento, vale a pena mencioná-los: Calixto Salomão e o
desenvolvimento como processo de conhecimento da sociedade; Eros Roberto Grau e o desenvolvimento
enquanto fator de elevação dos níveis sociais comunitários; Modesto Carvalhosa e a finalidade do
desenvolvimento nacional na ordem econômica constitucional; entre outros. 55
Celso Furtado era um economista extremamente inovador, estudou a fundo a temática do desenvolvimento e
do subdesenvolvimento, não se atendo ao campo da economia; defendia a adoção de um modelo keynesiano de
desenvolvimento econômico; foi membro da Comissão Econômica para a América Latina – CEPAL, um dos
grandes centros de debates sobre a teoria e a história do desenvolvimento; criou a Superintendência de
Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE; entre tantas outras contribuições por ele prestadas. 56
LIMA, Marcos Costa. Revisitando a teoria do subdesenvolvimento de Celso Furtado. In: FURTADO, Celso;
et al. O pensamento de Celso Furtado e o Nordeste. Rio de Janeiro: Contraponto, 2009. (Centro Internacional
Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento). p. 113 et seq.
37
Portanto, o subdesenvolvimento não pode ser compreendido como um fenômeno
simples, apenas afeto à economia dos países em seu âmbito interno; muito menos como mero
estágio até se atingir um desenvolvimento pleno; o subdesenvolvimento é, sobretudo, um
fenômeno induzido pela condição de dominação e exploração as quais os países ditos
subdesenvolvidos foram ou ainda estão submetidos, seja cultural, política ou econômica – ou
todas essas dominações conjuntas.
Construído o arcabouço teórico acerca do desenvolvimento como direito
fundamental e do desenvolvimento na doutrina jurídica, retoma-se a abordagem do
desenvolvimento como um fenômeno jurígeno, agora sua segunda vertente: a da positivação
nos diplomas internacionais.
Diversos são os diplomas internacionais que abordam o direito ao desenvolvimento
em uma perspectiva global, o principal e diploma inaugural é a Declaração Universal dos
Direitos Humanos, de 1948, da Assembleia Geral das Nações Unidas57
. Existindo também
uma declaração especialmente dedicada ao direito ao desenvolvimento, justamente a
Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, de 198658
.
Na Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, a Assembleia Geral das Nações
Unidas reconhece o desenvolvimento como um processo econômico, social, cultural e
político, cujo objetivo é o incremento do bem-estar de toda a população, podendo essa
participar ativamente do desenvolvimento e nos benefícios dele derivados.
Tal declaração traz, em seu texto, diretrizes importantes sobre o direito ao
desenvolvimento, destacando-se o reconhecimento do direito ao desenvolvimento como um
direito humano inalienável (art. 1º). Assumindo o compromisso dos países desenvolvidos
auxiliarem os países em desenvolvimento, em uma cooperação internacional efetiva (art. 4º).
A Declaração retromencionada ainda explana acertadamente que os Estados deverão
tomar medidas para assegurar o exercício e o fortalecimento progressivo do direito ao
desenvolvimento, para tanto, devem ser formuladas políticas, programas, medidas
legislativas, nas esferas nacionais e internacionais (art. 10).
No mesmo sentido da Declaração de 1986, Flávia Piovesan identifica na doutrina de
Allan Rosas, três pontos centrais acerca do direito ao desenvolvimento: a participação; a
57
O texto na íntegra da Declaração Universal dos Direitos Humanos encontra-se disponível em:
<http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Declara%C3%A7%C3%A3o-Universal-dos-Direitos-
Humanos/declaracao-universal-dos-direitos-humanos.html>. Acesso em: 13 abr. 2017. 58
ONU. Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento – 1986. Disponível em:
<http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/desenvolv.htm>. Acesso em: 15 abr.
2017.
38
justiça social, no sentido do atendimento às necessidades básicas; e, por último, a existência
de programas e políticas nacionais e também de cooperação internacional59
.
Cabe aqui a observação de que esta dissertação é conduzida de uma forma que, em se
fazendo um paralelo, aproxima-se das ideias desenvolvidas por Allan Rosas, na medida em
que se trabalha com os biocombustíveis enquanto uma centralidade temática e ao seu entorno
circundam diversas questões, que se interconectam, como o desenvolvimento, o
desenvolvimento sustentável, a inclusão social, os programas e as políticas públicas, que
devem fomentar, em última forma, uma construção mais democrática da sociedade (que não
se desenlaçam sozinhos carregando em si influências das agências e dos organismos
internacionais). Ilustra-se um a visão sistêmica acerca da temática da produção dos
biocombustíveis fundamentada neste trabalho no Gráfico 5.
Gráfico 5. A centralidade da temática dos biocombustíveis e as questões circundantes e
interconectadas (elaboração da autora).
Retornando aos diplomas internacionais, diversos foram os tratados e as declarações
a reforçar o entendimento do direito ao desenvolvimento como universal e inalienável,
59
A partir, principalmente, da Declaração de 1948, começa a se desenvolver o Direito Internacional dos Direitos
Humanos. [PIOVESAN, Flávia Cristina. Direito ao Desenvolvimento. Disponível em:
<http://dhnet.org.br/direitos/militantes/flaviapiovesan/piovesan_direito_ao_desenvolvimento.pdf>. Acesso em:
15 abr. 2017.]
BIOCOMBUSTÍVEIS
DESENVOLVIMENTO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
INCLUSÃO SOCIAL
PROGRAMAS E POLÍTICAS PÚBLICAS
JUSTIÇA INTRA
E
INTERGERACIO-NAL
39
entretanto, deteremo-nos a essa breve análise e partiremos para as críticas ao desenvolvimento
formuladas por alguns teóricos.
Apesar do caráter jurídico comprovado pela tríade de fatores explanados
anteriormente, diversas são as correntes contestadoras do desenvolvimento, entre elas se
destaca os seguidores do pensamento de Wolfgang Sachs e autores assemelhados60
, ao afirmar
que o desenvolvimento é um conceito sem conteúdo utilizado para justificar todo e qualquer
tipo de intervenção, apesar de geralmente os autores se referirem a ele dotados de boas
intenções61
.
Além de outras críticas, é interessante mencionar que Wolfgang Sachs esmiúça o
discurso do desenvolvimento em diversos conceitos-chave, quais sejam: pobreza, produção,
noção de estado e igualdade, inicialmente difundidos na história ocidental e mais tarde,
projetados para o mundo; cada um desses conceitos-chave cristaliza pressupostos tácitos
reforçando a visão de mundo ocidental, e à medida que se espalhavam, difundiam a percepção
ocidental da realidade enquanto reduziam ao esquecimento formas diferentes, ou seja, não
ocidentais, de se relacionar com o mundo ao redor; e, ao se sobrepor a essas culturas, exercia
uma relação de dominação62
.
Ao se propagar o discurso jurídico do desenvolvimento surge a necessidade da
reestruturação do estado, de modo que ele abarque essa sua nova função, assim surgiram,
portanto, alguns estados ditos como desenvolvimentistas. Por desenvolvimentismo, segundo
Pedro Cezar Dutra Fonseca, em estudo aprofundado e metodologicamente consistente,
entende-se a política econômica formulada ou executada, deliberadamente, por governos para,
por meio do crescimento da produção e da produtividade, sob a liderança do setor industrial,
transformar a sociedade com a finalidade de alcançar objetivos desejáveis, principalmente a
superação de problemas sociais e econômicos, nos moldes institucionais do sistema
capitalista63
.
60
Leonardo Alves Corrêa, em seu livro aqui analisado, traz diversos outros autores que tecem críticas pertinentes
e fundamentadas sobre o desenvolvimento, como o próprio Wolfgang Sachs, Gustavo Esteva, o filósofo
austríaco Ivan Illich, entre outros. [Cf. CORRÊA, Leonardo Alves. Desenvolvimento econômico e
desenvolvimento: uma interpretação a partir da constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011. p. 29 et seq.] 61
Na obra “Diccionario del desarrollo: uma guía del conocimiento como poder” (1996), vários autores trazem à
baila essa e outras críticas sobre o desenvolvimento enquanto fator de dominação. [SACHS, Wolfgang (org.).
Diccionario del desarrollo: una guía del conocimiento como poder. Perú: PRATEC, 1996.] 62
SACHS, Wolfgang (org.). Diccionario del desarrollo: una guía del conocimiento como poder. Perú:
PRATEC, 1996. p. 6. 63
FONSECA, Pedro Cezar Dutra. Desenvolvimentismo: a construção do conceito [paper]. In: MALTA, Maria;
SANTOS, Cleusa; ACOSTA, Luis. Seminário e debate UFRJ, em 25 set. 2013. Disponível em:
<http://www.centrocelsofurtado.com.br/arquivos/image/201309121650480.Conceito%20Desenvolvimentismo%
20-%20Pedro%20Fonseca.pdf>. Acesso em: 16 abr. 2017.
40
Portanto, diante do desenvolvimento como fenômeno jurígeno, esse traz consigo,
necessariamente, o viés de um Estado desenvolvimentista, e cabe a esses estados acionarem
processos legislativos capazes de positivarem o direito ao desenvolvimento e mecanismos
para o estado desenvolvimentista em suas ordens jurídicas constitucionais e
infraconstitucionais.
Ou seja, para o desenvolvimento de uma economia capitalista, é necessário um
sistema jurídico de forma a proporcionar segurança jurídica. Nesse contexto, as instituições
possuem papel central, como indutoras de desenvolvimento econômico, sendo assim
reconhecidas pelos programas de reformas estruturais das agências de desenvolvimento, a
exemplo do Banco Mundial64
. Daí advém, adicionalmente, a importância das políticas
públicas brasileiras, inclusive na seara nos biocombustíveis: são mecanismos dos órgãos
estatais para o desenvolvimento econômico (embora não devam se ater a apenas esse viés do
desenvolvimento, mas sim englobar os outros).
Diante dessa exposição, é possível ainda outra reflexão: se repensar qual o papel das
Faculdades de Direito no estudo do Direito e Desenvolvimento. Envolto nessa reflexão,
Trubek afirma que o direito não pode ser reduzido ao exame de normas jurídicas ou operações
formais, e nem deixar de incorporar a reflexão sobre o sistema jurídico sob a ótica do
legislador. Devendo incorporar ao debate qual o melhor desenho institucional para atingir
finalidades econômicas, sociais, políticas e outras65
.
Por fim, ao se abordar as diversas questões que envolvem a temática dos
biocombustíveis enquanto fator de desenvolvimento econômico tenta-se, minimamente,
incorporar esses diálogos de forma a enriquecer com reflexões, dados, conceitos, formando
um alicerce mais sólido para não se fazer uma análise meramente formal e jurídica, inclusive
das políticas públicas de fomento aos biocombustíveis no Brasil.
2.2.2 Biocombustíveis, desenvolvimento e a crise do Estado
Construído o arcabouço acerca do desenvolvimento como direito fundamental, do
desenvolvimento na doutrina jurídica, e dele enquanto fenômeno positivado nos diplomas
internacionais, prossegue-se com a análise do desenvolvimento como um fenômeno jurígeno,
64
DIMOULIS, Dimitri; VILHENA, Oscar Vieira (org.). Estado de Direito e o desafio do desenvolvimento. São
Paulo: Saraiva, 2011. (Coleção direito, desenvolvimento e justiça. Série produção científica). p. 10 65
RODRIGUEZ, José Rodrigo (org.). O novo direito e desenvolvimento: presente, passado e futuro: textos
selecionados de David M. Trubek. São Paulo: Saraiva, 2009. (Série direito em debate: direito, desenvolvimento e
justiça). p. 15-16.
41
agora com o processo de constitucionalização do desenvolvimento. Aproveitando o ensejo
para tratar do processo de constitucionalização já traçando um paralelo com o Estado em crise
e como essa situação deixa em um plano de insegurança os biocombustíveis.
O desenvolvimento começou a ser positivado em Constituições brasileiras a partir da
Constituição de 1934, passando pelas constituições de 1937, de 1946, de 1967/1969, até
chegar, por fim, na Constituição de 198866
.
São encontradas, na Constituição Federal de 1988, em torno de 50 (cinquenta)
passagens do termo desenvolvimento em suas diversas acepções, fixando diretrizes,
princípios, normas. Em seu preâmbulo67
, o desenvolvimento faz sua primeira aparição como
um dos preceitos assegurados pelo Estado Democrático. No art. 3º, um dos objetivos da
República Federativa é garantir o desenvolvimento nacional (inciso II). No parágrafo único do
art. 23, a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverá
prezar pelo equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar nacional.
Quanto à competência legislativa sobre o desenvolvimento, compete
concorrentemente à União, aos Estados e ao Distrito Federal (art. 24, inciso IX). Há ainda
grande parte de artigos da Carta Magna dedicados ao desenvolvimento regional (art. 43, por
exemplo). Ênfase pode ser dada ao artigo 174, que dispõe sobre as funções de fiscalizador,
incentivo e planejamento, ou seja, o Estado como agente normativo e regulador da atividade
econômica, inclusive voltada para o desenvolvimento nacional equilibrado.
O artigo 170 e seguintes tratam especificamente da ordem econômica e financeira
constitucional, estabelecendo os princípios gerais da atividade econômica, que tem por
fundamento a valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, tendo finalidade assegurar
a todos uma existência digna e pautada na justiça social. Entre os princípios mencionados
estão a livre concorrência, a defesa do meio ambiente, a redução das desigualdades regionais
e sociais e a busca pelo pleno emprego.
Portanto, do exposto, depreende-se que o desenvolvimento está amplamente
positivado na Constituição brasileira, entretanto não há uma definição do que seja o conceito
de desenvolvimento na norma constitucional68
. Alguns autores defendem que na constituição
66
Leonardo Alves Corrêa considera a Constituição de 1988 como um marco consolidador do discurso jurídico
constitucional desenvolvimentista. [CORRÊA, Leonardo Alves. Desenvolvimento econômico e desenvolvimento:
uma interpretação a partir da constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011. p. 67.] 67
Segundo José Afonso da Silva, o preâmbulo é a expressão solene de propósitos e, no caso das Constituições
Brasileiras, desde o império, exerce a função de cláusula de promulgação e ordem de obediência. [SILVA, José
Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 22] 68
Vale salientar que existem várias ideias sobre a natureza do desenvolvimento na constituição brasileira, mas
não é objetivo deste trabalho adentrar mais ainda nessa seara.
42
de 1988 não é possível compreender o desenvolvimento como uma categoria específica,
devendo ser entendido como uma categoria jurídica multifacetada, ou seja, não é
especificamente um direito fundamental, nem um princípio jurídico, nem uma diretriz
constitucional, mas uma junção dessas três proposituras, cada uma se destacando mais ou
menos a depender da passagem da Constituição69
.
Voltando ao disposto na ordem econômica e financeira, ao serem mencionadas a
valorização do trabalho humano, o asseguramento de uma existência digna e justiça social, e
também a busca pelo pleno emprego e pela redução das desigualdades sociais e regionais,
sendo também temáticas afetas à dignidade da pessoa humana, essa disciplina constitucional
correlaciona-se sobremaneira com os biocombustíveis e sua produção no Brasil.
Segundo o levantamento Renewable Energy and Jobs – Annual Review 2017, da
International Renewable Energy Agency – Irena em parceria com a International Energy
Agency – IEA, o Brasil é o país que mais gera empregos na indústria mundial de
biocombustíveis, com 783 mil vagas criadas no ano de 2016, seguido pelos Estados Unidos da
América – EUA (com a marca de 283 mil empregados na indústria dos biocombustíveis) e
pela União Europeia. Então há um forte viés de inclusão social, de persecução pela garantia
do pleno emprego, de existência digna e todos os valores constitucionais retromencionados70
.
Além disso, algumas políticas na seara dos biocombustíveis incentivaram a inclusão
social e o desenvolvimento sustentável, como o Programa Nacional de Produção e Uso do
Biodiesel – PNPB. O PNPB, em suas origens, no ano de 2004, firma como principais
objetivos a implantação de um programa sustentável de modo a fomentar: a inclusão social; a
garantia de preços competitivos, qualidade e suprimento necessário; e diversificação das
fontes de oleaginosas, com mecanismo de persecução do desenvolvimento regional.
Entre os métodos de inclusão do PNPB está o selo combustível social: as empresas
detentoras do selo recebem incentivos fiscais e tem participação de 80% assegurada nas
negociações do combustível nos leilões da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis, além de melhores condições de financiamento junto aos bancos que operam
no PNPB. Em troca, elas devem adquirir produtos da agricultura familiar, bem como prestar
69
CORRÊA, Leonardo Alves. Desenvolvimento econômico e desenvolvimento: uma interpretação a partir da
constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011. p. 68. 70
IRENA. Renewable Energy and Jobs – Annual Review 2017. Abu Dabhi: International Renewable Energy
Agency, 2017. Disponível em:
<https://www.irena.org/DocumentDownloads/Publications/IRENA_RE_Jobs_Annual_Review_2017.pdf>.
Acesso em: 1 maio. 2017.
43
assistência técnica aos agricultores. Surgindo justamente diante da necessidade de o Brasil
desenvolver a agricultura familiar e valorizar as pequenas propriedades rurais.
Entretanto, esse cenário de iniciativas (do qual o PNPB é um dos exemplos, entre
tantos outros, bem sucedidos ou não) na busca de um desenvolvimento integrado foi
prejudicado, entre outros fatores, pela crise que o Brasil enfrenta – primeiramente política,
associada a uma crise econômica e que tem gerado uma crise no Estado Democrático de
Direito brasileiro, tanto de representatividade, quanto das próprias instituições.
Em poucas palavras, Celso Furtado previu a crise econômica que assolaria o Brasil
ao mencionar, em discurso proferido na sede do Banco do Nordeste, no dia do
encaminhamento da lei de recriação da SUDENE ao Congresso Nacional, que o governo
anterior tirou proveito do aumento da liquidez internacional, aumentando-se a oferta nacional
de bens de consumo, mas havendo uma inversão da balança comercial, que se tornou
fortemente negativa, e expondo a economia brasileira a um risco gradualmente maior de
recessão, podendo comprometer os projetos de investimento a médio e longo prazos,
incluindo a SUDENE71
.
Sobre a crise também é interessante se voltar às ideias de José Eduardo Faria, para
quem as crises, independentemente de sua natureza, devem ser encaradas como momentos
desafiadores, e não desanimadores72
: desafiam a autossuficiência dos sistemas, põem em
xeque as prioridades, exigindo novas estratégias e novos planos de ações. Principalmente
quando as crises são internacionais, não é apenas voltando a um patamar de sobreposição de
interesses nacionais que essas são superadas, são necessários esforços multilaterais para além
dos acordos de cooperação intergovernamental, passando por novas estruturas institucionais e
regulações transnacionais, ou seja, do surgimento de novas relações de força73
.
Faz-se necessário entender alguns aspectos da “crise”. Inicialmente, em referência à
crise do Direito, Roberto Freitas Filho afirma que a crise se dá em três níveis distintos:
normativo, institucional e jurídico-cultural, e configura-se como um conjunto de condições
que apontam para uma possibilidade de mudança, revelando-se em anomalias de um modelo
71
A previsão de Furtado não apenas se concretizou como o próprio projeto de recriação da SUDENE demorou a
sair do papel. [ARAÚJO, Tânia Bacelar de. Desenvolvimento Regional no Brasil. In: FURTADO, Celso. O
pensamento de Celso Furtado e o Nordeste hoje. Rio de Janeiro: Contraponto: Centro Internacional Celso
Furtado de Políticas para o Desenvolvimento: Banco do Nordeste do Brasil, 2009. p. 42.] 72
A composição “Crise”, da banda carioca Pedro Luis e a Parede, ilustra a compreensão popular sobre a crise:
“A crise é o alimento da crise/ E quem não crê na crise do momento?/ A falta de combustível/ Crise/ Burrice
abaixo do nível/ Crise/ O império é destrutível/ Crise/ E o homem incompatível/ Pra onde ela vai,/ De onde ela
vem?/ Quem cria a crise diz que não tem”. 73
FARIA, José Eduardo. O Estado e o Direito Depois da Crise. São Paulo: Saraiva, 2011. (Série Direito,
Desenvolvimento e Justiça: direito em debate). p. 31.
44
incapaz de dar respostas satisfatórias a problemas contemporâneos no plano da concretude
fática. Atualmente, deve-se pensar o direito entre questões macroeconômicas, novos direitos,
globalização econômica, perda de capacidade normativa do Estado-nação, entre outros fatos74
.
Historicamente, entre a década de 1980 e início da década de 1990, houve uma
profunda mudança na configuração política mundial, com a quebra de barreiras ao comércio
internacional, revolução das comunicações, surgimento de novas questões jurídicas, como por
exemplo, questões jurídicas e éticas surgidas com o avançar da biotecnologia. Politicamente,
o Estado se reconfigura; e o Direito, instrumento de regulação estatal também se reconfigura.
O estado em crise gera também a crise no Direito75
. Já a atual crise pode ser dita como uma
nova crise tecnológica, que em virtude dos elevados níveis de interdependência globais, toma
uma maior proporção, afetando mais Estados concomitantemente.
Roberto Freitas Filho tem a percepção de que a crise é em nível econômico e dos
modelos de regulação social tradicionais, entre eles o Direito; em um claro indicativo de que
os mecanismos econômicos, sociais e jurídicos de regulação já não funcionam. Portanto, a
crise atual é uma crise de diversas esferas, não apenas uma crise jurídica ou econômica, acima
de tudo, envolve uma crise política e das próprias instituições.
É inegável que, em momentos de crise como o presente, reacendam-se debates sobre
o maior ou menor intervencionismo estatal, por meio de autarquias e controle normativo
direto; ou por uma menor intervenção, por meio de controles indiretos das agências
reguladoras, de modo a aumentar a eficiência da interação com o mercado financeiro76
.
Independente da vertente escolhida, a busca é sempre a de aumentar a eficácia de recursos
escassos frente às necessidades ilimitadas.
A perspectiva brasileira, por todo o contexto delimitado, parece tender ao
desinvestimento na seara dos biocombustíveis, principalmente do biodiesel, tendo como
justificativa a crise e a consequente política de desinvestimentos dela decorrente, no lugar de
anteriores políticas públicas que visavam ao desenvolvimento em sua vertente
multidimensional como explanada acima; e a priorização de alternativas rápidas que possam
74
FREITAS FILHO, Roberto. Crise do Direito e Juspositivismo: a exaustão de um paradigma. 2. Ed. Brasília:
Uniceub, 2013. Disponível em:
<http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/4067/1/Crise%20do%20Direito.pdf>. Acesso em: 2 maio 2017. 75
FREITAS FILHO, Roberto. Crise do Direito e Juspositivismo: a exaustão de um paradigma. 2. Ed. Brasília:
Uniceub, 2013. Disponível em:
<http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/4067/1/Crise%20do%20Direito.pdf>. Acesso em: 2 maio 2017. p.
24. 76
FARIA, José Eduardo. O Estado e o Direito Depois da Crise. São Paulo: Saraiva, 2011. (Série Direito,
Desenvolvimento e Justiça: direito em debate). p. 30.
45
gerar um crescimento, mas que tendem, no fim, ter um efeito contrário e acabar agravando a
própria crise, ao invés de saná-la.
Apesar de inúmeras vezes associarem e justificarem a política de desinvestimentos
em searas sociais, de políticas públicas inclusivas, entre outros projetos de justiça distributiva,
com o argumento da crise, percebe-se que a economia tem se encaminhado melhor que nos
anos anteriores. Mesmo quando situações agravam a vertente da crise política, a economia,
apesar de não estar em seu melhor momento, tem se mostrado resiliente77
.
Os bons índices da economia são apontados como frutos também da agenda
reformista implantada pela equipe econômica do Governo e pelo Congresso Nacional, reações
nacionais e internacionais positivas às propostas da reforma da Previdência Social e
trabalhista; a mudança do marco regulatório do petróleo e gás; da renegociação de dívidas
estaduais; dos cortes aos empréstimos com juros subsidiados do BNDES; do novo programa
de concessões, privatizações e parcerias público-privadas; da aprovação de emendas
constitucionais prevendo limites orçamentários para os gastos públicos; entre outras medidas.
Quando são observados os cortes orçamentários realizados em diversos setores ao
longo dos anos de 2013 a 2017, aponta-se para a uma reestruturação estatal mais acentuada
que nos anos imediatamente anteriores. Inicialmente, buscou-se uma economia regulada, em
um primeiro momento, adotando-se um modelo de Estado mais voltado ao bem-estar social,
tendo ênfase em uma justiça mais redistributiva e em programas de inclusão social, que
remontam ao Welfare State.
Contrapondo-se ao momento atual de reorganização das estruturas, de privatizações,
de reduções de custos que, embora ainda contenha elementos do modelo anterior, assemelha-
se mais ao Workfare State78
. Esse novo contexto afeta completamente as políticas públicas e
atividades produtivas de grande peso e visibilidade nacional, e seus impactos são difíceis de
serem dimensionados precocemente.
A título de exemplo, algumas propostas de alteração no PNPB já foram realizadas,
inclusive sobre os critérios de concessão do Selo Combustível Social, em comento acima,
77
VALOR ECONÔMICO. O Brasil além da crise. Disponível em:
<http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,o-brasil-alem-da-crise,70001846146>. Acesso em: 20 jun. 2017. 78
Nesse sentido, Raphael de Almeida Magalhães afirma que a opção brasileira foi pela economia de mercado,
nos últimos anos, justificada pela globalização, relegando a um plano secundário discussões mais consistentes
sobre um projeto nacional de desenvolvimento; com deslocamento da agenda política para temas como a
inflação, as privatizações, etc., com desmoralização dos governos e desconstrução das entidades – que, a
princípio, seriam as únicas capazes de lastrear as mudanças necessárias para que o país cresça ao nível de
proporcionar desenvolvimento e justiça social. [MAGALHÃES, Raphael de Almeida. Desenvolvimento
econômico: escolha política, e não técnica. In: CARDOSO JR., José Celso (org.). Desafios ao desenvolvimento
brasileiro: contribuições do conselho de orientação do Ipea. v.1. Brasília: IPEA, 2009. p. 253-262.]
46
bem como se propõe um novo marco regulatório para os biocombustíveis, em especial o
etanol, mas não deixando de incluir outros tipos de biocombustíveis produzidos no Brasil – o
Programa RENOVABIO, que será mais bem detalhado adiante, mas que deixa a desejar nos
aspectos relativos à sustentabilidade e à inclusão social (entre outros aspectos), fortes marcas
do PNPB.
Por toda essa agenda econômica implantada para recuperar economicamente o
Brasil, muito ainda se tem a pensar sobre as nascentes políticas e programas governamentais,
mas é certo que não pode haver um retrocesso social79
, nem a perda do papel de fomento ao
desenvolvimento regional80
. E é inegável a importância das políticas públicas para a
consolidação do desenvolvimento, como bem explana Fábio Konder Comparato, ao afirmar
que o desenvolvimento é processo de longo prazo, induzido por políticas públicas ou
programas governamentais interligando os campos econômico, social e político81
.
Cabe aqui a reflexão trazida por Leonardo Alves Corrêa, que o efeito jurídico da
apologia ao discurso de um modelo jurídico de desenvolvimento serve como parâmetro para
formulação de políticas públicas, principalmente a política econômica. Portanto, a ordem
econômica constitucional desenvolvimentista preenche ideologicamente a delimitação de
políticas econômicas82
. Sendo importante, no sentido de as políticas econômicas e de as
políticas públicas não deverem se desvincular do sentido ideológico norteado pela
Constituição.
Assim, se constatado que as políticas econômicas, aqui inclusas as políticas públicas,
se tornarem excessivamente agroexportadoras ou apenas gerarem isenções aos setores de forte
lobby político, mesmo sob o pretexto de progresso e desenvolvimento nacional, não há como
se harmonizar com o modelo jurídico constitucional no sentido delineado pelo poder
constituinte originário83
.
79
“Não há tecido que seja belo se ele causa fome e miséria” – Mahatma Gandhi. 80
ARAÚJO, Tânia Bacelar de. Desenvolvimento Regional no Brasil. In: FURTADO, Celso. O pensamento de
Celso Furtado e o Nordeste hoje. Rio de Janeiro: Contraponto: Centro Internacional Celso Furtado de Políticas
para o Desenvolvimento: Banco do Nordeste do Brasil, 2009. 81
Comparato delimita o elemento econômico como o crescimento endógeno sustentado na produção de bens e
serviços; o elemento social é a evolução para uma progressiva igualdade das condições básicas de vida; e o
elemento político, como a ferramenta crucial do processo: o povo assumindo o seu papel de sujeito político,
legitimador e destinatário do poder. [COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos Direitos
Humanos. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 300 et seq.] 82
CORRÊA, Leonardo Alves. Desenvolvimento econômico e desenvolvimento: uma interpretação a partir da
constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011. p. 129. 83
CORRÊA, Leonardo Alves. Desenvolvimento econômico e desenvolvimento: uma interpretação a partir da
constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011. p. 130.
47
Bercovici tece importante comentário acerca da discricionariedade das políticas do
Governo, afirmando que a discricionariedade é larga, entretanto não é absoluta, uma vez que
discricionariedade não pode ser sinônima de plena liberdade, nem de arbitrariedade; os
governos constitucionais devem atuar em conformidade com a Constituição; também não
podendo se utilizar apenas de juízos de conveniência e oportunidade em sua condução,
devendo ser vinculada a padrões jurídicos e constitucionais, em especial84
.
Percebe-se, diante das ideias propostas acima, que o fator “crise” influencia muito o
progresso das políticas públicas voltadas aos biocombustíveis, mas na realidade o fato que
mais as modifica é a gradual mudança de paradigma governamental de um Estado que
privilegia o desenvolvimento amplamente caracterizado ou de um Estado mais voltado ao
crescimento econômico, ou ainda de um Estado menos presente nos processos econômicos e
sociais vivenciados.
Até porque, como bem leciona Suzy Koury, apesar da ideologia constitucionalmente
adotada no Brasil indicar a opção pelo Estado Social, não foram cumpridos os compromissos
constitucionais dele decorrentes. Ao contrário, já se advoga pela adoção de um modelo pós-
moderno, neoliberal, argumentando que o modelo de Estado Social anterior não permitiu o
desenvolvimento do país; o que é uma inverdade na medida em que o estado do bem-estar
social não é o responsável pela crise do capitalismo brasileiro, uma vez que os compromissos
dele decorrentes não foram cumpridos, sendo então ilógico responsabilizá-lo por tal feito85
.
Vistos breves aspectos sobre o desenvolvimento na constituição brasileira, sobre
como os biocombustíveis podem concretizar diretrizes e normas constitucionais, e após
noções de como a crise do Estado e a mudança de paradigma de políticas de investimento
podem afetar o direcionamento da produção dos biocombustíveis, discorre-se sobre o
desenvolvimento sustentável e a sustentabilidade da produção dos biocombustíveis no Brasil.
2.3 A PRODUÇÃO DOS BIOCOMBUSTÍVEIS COMO FATOR DE
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Em razão dos acordos internacionais, com repercussão no ordenamento jurídico
interno, e das estatísticas apresentadas anteriormente quanto à expansão da produção dos
84
BERCOVICI, Gilberto. Desigualdades regionais, Estado e Constituição. São Paulo: Max Limonad, 2003. p.
289-290. 85
KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. A CRFB/1988 encontra Keynes: a viabilidade do Estado Social nos
momentos de crise. In: DIAS, Jean Carlos; GOMES, Marcus Alan de Melo (coord.). Direito e
Desenvolvimento. São Paulo: Método, 2014. p. 451-470.
48
biocombustíveis, e, por conseguinte, de suas matérias-primas, verifica-se a necessidade de se
desenvolver o setor energético vinculado à efetivação dos princípios dirigentes e normas
constitucionais programáticas, culminando em um desenvolvimento econômico social e
ambientalmente sustentável.
Finda a avaliação, no item 2.2, da convergência entre o desenvolvimento e a
produção de biocombustíveis, inicia-se agora a interpretação de outra face do
desenvolvimento inter-relacionada com a temática dos biocombustíveis: o desenvolvimento
sustentável. Nessa perspectiva, para melhor compreensão de suas correlações com o direito,
trabalha-se no entendimento da institucionalização do desenvolvimento sustentável – item
2.3.1, posteriormente, no item 2.3.2, será realizada um estudo sobre o potencial dos
biocombustíveis brasileiros serem concretizadores do ideal constitucional de desenvolvimento
sustentável, positivado principalmente no art. 225 da Constituição Federal de 1988.
2.3.1 A juridicização do conceito de desenvolvimento sustentável
O desenvolvimento sustentável também constitui um fenômeno jurídico, fazendo
parte do modelo jurídico do desenvolvimento. No item anterior explorou-se a dimensão
socioeconômica do desenvolvimento, agora se averigua a dimensão ambiental.
Historicamente, o desenvolvimento sustentável é tido como uma evolução da compreensão do
desenvolvimento similar ao crescimento econômico.
A temática do desenvolvimento sustentável destacou-se no cenário internacional a
partir da realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente em Estocolmo,
em 1972, em uma tentativa de se institucionalizar a problemática ambiental, frente ao
desenvolvimento econômico. Inicialmente o conceito exposto foi o de ecodesenvolvimento.
O secretário geral da ONU, Maurice Strong, à época da Conferência de Estocolmo,
introduziu o conceito de ecodesenvolvimento, posteriormente tratado mais a fundo por Ignacy
Sachs. Por ecodesenvolvimento pode se entender desenvolvimento endógeno, que tem por
objetivo ofertar respostas à problemática da harmonização dos objetivos sociais e econômicos
do desenvolvimento com uma gestão ecologicamente moderada dos recursos e do meio86
.
Os próprios princípios do ecodesenvolvimento foram formulados por Ignacy Sachs,
sendo eles: a satisfação das necessidades básicas; solidariedade com as futuras gerações;
participação da população; preservação das reservas naturais; sistema social de garantia ao
86
MONTIBELLER FILHO, Gilberto. Ecodesenvolvimento e desenvolvimento sustentável: conceitos e
princípios. Textos de Economia, vol.4, n.1, Florianópolis, 1993, p.131-142.
49
pleno emprego, seguridade social, respeito às outras culturas; desenvolvimento de programas
na área educacional87
. Sachs focalizou essa discussão nos países em desenvolvimento.
Posteriormente, essas se tornaram as dimensões da sustentabilidade, tratadas adiante.
No Relatório de Brundtland, fruto da Comissão Mundial Sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, definiu o conceito de desenvolvimento sustentável como um modelo de
desenvolvimento que atende às necessidades do presente, sem comprometer a viabilidade das
futuras gerações suprirem as suas próprias necessidades88
.
As conferências e reuniões internacionais sobre o meio ambiente e mudanças
climáticas se tornaram práxis após a Conferência de Estocolmo. Entre as diversas reuniões,
destacaram-se, seja pelo momento histórico ou pelas diretrizes tomadas, a Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente em 1992 – ECO-92, gerando como documento a
Agenda 21; a United Nations Framework on Climate Change - UNFCC, em 1994, a primeira
edição da Conferência das Partes.
Posteriormente, destacaram-se: o Protocolo de Kyoto, em 1997; a Cúpula Mundial
sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio +10, em 2002; a Conferência das Nações Unidas
sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio +20, em 2012; e, mais recentemente e igualmente
emblemática, o Acordo de Paris, na 21ª Conferência das Partes – COP21 da Convenção-
Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática – UNFCC.
Quanto ao conceito de desenvolvimento sustentável, inicialmente trazido pelo
Relatório de Brundtland, esse evoluiu ao longo do tempo, trazendo para o seu núcleo
múltiplas dimensões. Vejamos.
Segundo José Eli da Veiga, em seu recente livro “Para entender o desenvolvimento
sustentável”, a ideia de desenvolvimento sustentável remonta à possibilidade de a humanidade
atender às suas necessidades materiais sem comprometer a capacidades das próximas
87
Sachs descreve cinco dimensões da sustentabilidade dos sistemas econômicos para se alcançar o
desenvolvimento: cultural, ecológica, econômica, espacial e social. A sustentabilidade cultural refere-se à
necessidade de alteração nos modos de pensar e agir da sociedade no sentido do aumento da consciência
ambiental, em desfavor do consumo e diminuindo, assim, o impacto ambiental. Sustentabilidade ecológica tem
por finalidade a preservação do meio ambiente, sem comprometer a oferta dos recursos necessários à
sobrevivência. A dimensão econômica sustentabilidade está atrelada a aumentos na eficiência do sistema e na
alocação e gestão de recursos. A sustentabilidade espacial refere-se ao equilíbrio entre as ocupações rurais e
urbanas, uma distribuição territorial mais equitativa das atividades econômicas e dos assentamentos humanos. Já
a sustentabilidade social visa melhorar a distribuição de renda, diminuindo a exclusão social e a diferença
econômica entre as classes sociais. [SACHS, Ignacy. As cinco dimensões do ecodesenvolvimento. In:
Estratégias de transição para o século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. São Paulo: Studio Nobel, 1993,
p. 55.] 88
BRUNDTLAND, Gro Harlem. Nosso futuro comum: comissão mundial sobre meio ambiente e
desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1991, p. 10.
50
gerações terem a mesma oportunidade. Assemelhando-se ao conceito original lançado no
Relatório de Brundtland89
.
Édis Milaré menciona que o princípio do desenvolvimento sustentável infere-se da
necessidade de um duplo direito, com bases no Direito Natural e no Direito Positivo, o direito
do ser humano de desenvolver-se e realizar suas potencialidades, individual e socialmente, e o
direito de assegurar aos seus sucessores as mesmas condições favoráveis. Complementa,
ainda, mencionando que nesse princípio, mais fortemente que em outros, evidencia-se a
reciprocidade entre direito e dever, porquanto o desenvolver-se e usufruir de um planeta
plenamente habitável não é apenas um direito, é um dever precípuo tanto das pessoas quanto
da sociedade90
.
Entre os célebres conceitos de desenvolvimento sustentável, inclui-se o do próprio
Ignacy Sachs, no qual conceitua o termo desenvolvimento sustentável a partir de oito
dimensões da sustentabilidade na medida em que somente se considera desenvolvimento
sustentável o atingimento de todas as dimensões, quais sejam: ambiental, econômica, social,
cultural, espacial, psicológica, política nacional e internacional91
.
Traçar um conceito único de desenvolvimento sustentável é difícil, principalmente
um aplicável à seara dos biocombustíveis, pois, em maior ou menor proporção, todos tratam
de questões similares envolvendo um equilíbrio entre as necessidades humanas, o crescimento
econômico e os recursos ambientais escassos, devendo ainda ser preservados para as futuras
gerações, ou seja, tem o mesmo núcleo básico, elencando mais ou menos fatores definidores
não taxativos.
Adentrando na temática da juridicização do desenvolvimento sustentável, Juarez
Freitas conceitua o princípio do desenvolvimento sustentável de forma bastante analítica,
trazendo diversos mecanismos decorrentes de sua constitucionalização, afirmando que ele
introduz um novo paradigma na cultura e na sociedade, e deve reunir em seu núcleo uma série
de aspectos de modo a efetivá-lo como princípio constitucional, sendo, enquanto princípio,
uma determinação ético-jurídica.92
Quanto a esses aspectos do princípio do desenvolvimento sustentável, tem-se que é,
em primeiro lugar, uma determinação ética e jurídico-institucional de assegurar às presentes e
89
VEIGA, José Eli da. Para Entender o Desenvolvimento Sustentável. São Paulo: 34, 2015. 90
MILARÉ, Édis. Princípios fundamentais do direito do ambiente. Revista Justitia, São Paulo, n. 59, p.134-151,
jan-dez/1998. Disponível em: <http://www.revistajustitia.com.br/revistas/w71d84.pdf>. Acesso em: 23 jun.
2017. 91
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2009. 92
FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 31-35.
51
futuras gerações um ambiente favorável ao bem-estar, monitorado por indicadores, de modo a
não se ater a uma dimensão subjetiva. É também determinação ética e jurídico-institucional de
responsabilização objetiva do Estado pela sua prevenção e precaução frente aos eventos
danosos93
.
Ainda, é determinação ética e jurídico-institucional de sindicabilidade das escolhas
públicas, para afastar mitos comuns, falácias e o desalinhamento de políticas públicas, de
modo a se promover o desenvolvimento material e imaterial. E, por fim, pelo
desenvolvimento de atividades de baixa emissão de carbono, de modo que se atinja a premissa
do desenvolvimento como norteador da sustentabilidade e não o contrário94
.
A discussão da temática da sustentabilidade ambiental teve como consequência o
comprometimento jurídico das gerações atuais com as gerações futuras, em relação ao uso dos
recursos naturais nas atividades econômicas, principalmente. E para se alcançar o
desenvolvimento sustentável, a proteção do meio ambiente tem de ser considerada como
integrante do processo de desenvolvimento, não podendo ser considerada isoladamente ou
inconciliável com ele, como teorizado por alguns estudiosos.
Resumidamente, o desenvolvimento econômico e social deve estar pautado na
sustentabilidade ambiental. Mas como definir sustentabilidade? Entre os conceitos de
sustentabilidade, destaca-se o conceito de Sachs, segundo o qual sustentabilidade é um
conceito dinâmico, levando em conta as necessidades crescentes da população e tem como
base oito dimensões principais: ambiental, cultural, ecológica, econômica, espacial, social,
política nacional e internacional.
Já Leonardo Boff trilha o seguinte caminho: o desenvolvimento vem do campo da
economia, tendo por objetivo a acumulação de bens e serviços de forma crescente, à custa da
iniquidade social e depredação ecológica; a sustentabilidade vem da ecologia e da biologia,
ela afirma a inclusão de todos no processo de inter-relação (caracterizadora de todos os seres
do ecossistema); por conseguinte, a sustentabilidade afirma o equilíbrio dinâmico que permite
a todos participarem e se verem incluídos em um processo global95
.
José Eduardo Faria traz um conceito mais amplo ao tratar de desenvolvimento: a
sustentabilidade trata-se do princípio constitucional que determina, com eficácia direta e
imediata, a responsabilidade do Estado e da sociedade pela concretização solidária do
93
FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 32. 94
FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 32. 95
BOFF, Leonardo. Um ethos para salvar a terra. Disponível em:
<http://www.leonardoboff.eco.br/site/vista/outros/um-ethos.htm>. Acesso em: 23 jun. 2017.
52
desenvolvimento material e imaterial, socialmente inclusivo, durável e equânime,
ambientalmente limpo, inovador, ético e eficiente, no intuito de assegurar, preferencialmente
de modo preventivo e precavido, no presente e no futuro, o direito ao bem-estar96
.
Assim, infere-se que o desenvolvimento sustentável é um direito fundamental, que
deve ser tutelado pelo Estado. E, para que o desenvolvimento sustentável seja promovido pelo
Estado, esse deve proteger o meio ambiente, que, por sua vez, é um direito fundamental
intergeracional, e pauta-se na ideia de que a geração atual deve proteger o meio ambiente
levando em conta as gerações futuras97
.
No ordenamento jurídico pátrio, a relação entre a proteção do meio ambiente e o
direito ao desenvolvimento sustentável é a proposta principalmente do art. 225 da
Constituição Federal, posta na Constituição em virtude do amplo fomento proveniente do
campo internacional, que prevê que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
Vale lembrar que antes mesmo de a Constituição Brasileira de 1988 ser promulgada,
já havia no ordenamento jurídico pátrio legislação ambiental positivada: a Lei nº 6.938/1991,
dispondo sobre a Política Nacional do Meio Ambiente.
Não apenas o direito fundamental ao desenvolvimento sustentável é trazido pela
Constituição na forma de princípio, outros princípios são também positivados. Relativos ao
meio ambiente têm-se os seguintes princípios: o direito à propriedade privada (art. 5°, inciso
XXII); a função social da propriedade (artigo 5°, inciso XXIII, CF); o direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225, caput, CF), a defesa do meio ambiente como
princípio da ordem econômica (art. 170, VI, CF).
A proteção ao meio ambiente se justifica em razão de os recursos ambientais
desempenharem a função de desencadeadores das atividades econômicas. Vale aqui
mencionar outro princípio decorrente da proteção constitucional ao meio ambiente sadio ou
96
FARIA, José Eduardo. O Direito na Economia Globalizada. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 45. 97
CORREA, Ceres Fernanda; GOMES, Eduardo Biacchi. O direito fundamental ao desenvolvimento
sustentável: uma análise a partir do caso das papeleras. Revista de informação legislativa, Brasília a. 48, n. 189,
p. 177-187, jan./mar. 2011. Disponível em:
<https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/242869/000910802.pdf?sequence=1>. Acesso em: 24 jun.
2017.
53
ao desenvolvimento sustentável: o “princípio da consideração da variável ambiental no
processo decisório de políticas de desenvolvimento” 98
.
Segundo Édis Milaré, este princípio diz que com a elementar obrigação de se levar
em consideração a variável ambiental em qualquer ação ou decisão, pública ou privada, que
possa causar impacto negativo sobre o meio. Esse princípio foi consagrado após o surgimento
do Estudo de Impacto Ambiental, na década de 1960 (mecanismo de prevenção à poluição e
outras agressões à natureza)99
.
No Brasil, além da matéria de status constitucional, positivada principalmente no art.
225, parágrafo 1º, IV da Constituição Federal de 1988, como supramencionado, é regulada
também infraconstitucionalmente – assunto a ser tratado na sequência. Outros princípios, em
consonância com os constitucionais, estão positivados pelas normas infraconstitucionais,
serão tratados no decorrer desta dissertação. Nos subitens seguintes serão abordados alguns
dos célebres princípios basilares do Direito Ambiental, como o princípio da prevenção e o
princípio da precaução, por exemplo, indispensáveis no estudo de qualquer matéria ambiental.
Nesse panorama de proteção constitucional ambiental, destaca-se entre as atividades
econômicas dependentes do meio ambiente, a produção de energia e a decorrente procura por
alternativas energéticas sustentáveis, atualmente com foco na redução da emissão de gases de
efeito estufa, diminuindo o impacto da ação antrópica no aquecimento global.
Em reflexão, Juarez Freitas afirma que, entre as obrigações decorrentes do princípio
da sustentabilidade, o programa de biocombustíveis pode ser um ponto positivo, mas sob a
condição de que sua matéria-prima não seja obtida com mão de obra escrava, nem afetando a
produção global de alimentos, pois se assim o for, a sustentabilidade terá sido
comprometida100
.
Aproveitando a esteira do pensamento de Juarez Freitas, inicia-se a abordagem da
sustentabilidade dos biocombustíveis brasileiros, comentando questões como a segurança
alimentar, a problemática da expansão das fronteiras agrícolas, o uso de agrotóxicos, mão de
obra escrava, monocultura e modelos latifundiários de produção, na tentativa de verificar se o
balanço final dos biocombustíveis pende mais para o lado da sustentabilidade ou do
desenvolvimento predatório.
98
MILARÉ, Édis. Princípios fundamentais do direito do ambiente. Revista Justitia, São Paulo, n. 59, p.134-151,
jan-dez/1998. Disponível em: <http://www.revistajustitia.com.br/revistas/w71d84.pdf>. Acesso em: 23 jun.
2017. 99
MILARÉ, Édis. Princípios fundamentais do direito do ambiente. Revista Justitia, São Paulo, n. 59, p.134-151,
jan-dez/1998. Disponível em: <http://www.revistajustitia.com.br/revistas/w71d84.pdf>. Acesso em: 23 jun.
2017. 100
FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 33-34.
54
2.3.2 Biocombustíveis, Desenvolvimento Sustentável e a Crise do Estado
Na política energética brasileira é dado um grande enfoque aos agrocombustíveis de
primeira geração, dos quais se extrai o bio-óleo por meio do esmagamento das sementes
dessas plantas oleaginosas, contudo, o plantio para obtenção considerável de óleo demanda
grandes extensões de terra, causando um inegável impacto ambiental.
Diversos são os impactos causados pela ênfase nos agrocombustíveis, a exemplo da
dicotomia biocombustíveis versus segurança alimentar; da expansão das fronteiras agrícolas
elevando os índices de desmatamento; da grande utilização de insumos agrícolas e
agrotóxicos; da necessidade de grandes volumes de água para irrigação das plantações
somada à crise hídrica, visto que nem todas as espécies se adaptam ao regime de sequeiro101
;
da queima mecânica da colheita (no caso da cultura da cana-de-açúcar; da utilização de
sementes transgênicas (na cultura da soja, por exemplo) e da ausência de estudos que atestem
ou neguem o malefício de tais sementes para a dinâmica ambiental; etc102
. Alguns pontos
serão brevemente explanados aqui.
Entretanto, apesar do potencial impacto que os agrocombustíveis causam no meio
ambiente, são defendidos tanto nacional, quanto internacionalmente como combustíveis
verdes, alinhados com a lógica do mercado de captura e crédito do carbono e em pleno
fomento por meio de políticas públicas no Brasil. Existem, inclusive, novos projetos de
políticas públicas para aumentar sua participação na matriz energética nacional e instituir
oficialmente o mecanismo de compensação de carbono comercializado em bolsa de
valores103
.
101
Em regime de “sequeiro” é termo bastante utilizado na agricultura e quer dizer sem irrigação plena, sem
sistema de irrigação próprio. 102
Sobre a questão ambiental, o rapper Criolo, ícone da música atual, menciona e dá voz a preocupação popular
e de ambientalistas sobre a crise hídrica, a poluição, o problema das mutações genéticas e do impacto dos
alimentos transgênicos, entre outros, na composição intitulada “Chuva ácida”: “Nem água pra beber a gente não
tem/ Como que nós vamos viver?/ Num universo de horrores, tuberculose, câncer, tumores, chagas que a prata
não repara/ Vidas cujo respeito, não viram nada/ O homem sendo a imagem da besta/ Crack é fichinha, estão
destruindo o planeta/ Em breve nascerão vacas sem tetas/ Nos cafezais, milharais, a praga dominando a colheita/
A água que é pouca sumirá totalmente/ Suas sacolas de dinheiro não comprarão seu copo de aguardente/ Porque
destruíram a cana, que adoça os doces, que adoça o amargo da vida/ Olhar em volta e ver tanta burrice reunida”. 103
Detalhados no Capítulo 4 deste trabalho.
55
Na concepção de José Eli da Veiga, a agenda para uma economia de baixo teor de
carbono é, de fato, uma agenda para o desenvolvimento, acreditando o autor que seria a única
a assegurar ao Brasil uma inserção competitiva na economia mundial104
.
Quanto à questão da segurança alimentar, o Brasil ainda não conseguiu retirar toda a
sua população da faixa da fome, embora esforços governamentais tenham acontecido para
mitigar tal problemática, a exemplo do Programa Fome Zero (2010), entre outros. Além de
ainda haver faixa da população nessa situação, o cultivo de matéria-prima para obtenção de
biocombustíveis utiliza grande parte da terra mais produtiva do Brasil, localizada na zona da
mata litorânea e no cerrado. Tal questão é agravada porque as principais reservas de água
estão localizadas no Centro-Oeste brasileiro, correndo potencial risco de contaminação em
virtude dos insumos agrícolas utilizados105
.
Um grande exemplo que correlaciona a produção de biocombustíveis à precarização
da segurança alimentar é o da plantação de milho nos EUA para produção de etanol, que
afetou o preço do frango e da carne suína; além dos subsídios indiretos à produção de etanol
terem afetado a economia leiteira, provocando seu encarecimento e a adulteração de produtos
lácteos; encarecendo ainda a alimentação humana proveniente dele106
.
Contudo os biocombustíveis podem se tornar realmente mais independentes da
questão da segurança alimentar, desde que seja mudado o foco de agrocombustíveis107
para o
desenvolvimento de biocombustíveis provenientes de resíduos, por exemplo.
Segundo o Relatório de Atividades, do ano de 2016, da Comissão Mista Permanente
sobre Mudanças Climáticas, entende-se que não haveria conflito entre o uso de biodiesel e a
segurança alimentar, uma vez que no caso da soja, por exemplo, o subproduto do biodiesel é o
farelo, utilizado como ração animal. E usá-la para produzir biodiesel é uma forma de agregar
valor ao produto, em vez de exportar os grãos não processados108
.
Sobre a questão da fome, Amartya Sen argumenta que a fome tem mais a ver com a
falta de poder de acesso aos alimentos pelas populações mais vulneráveis economicamente do
que com as diversas fomes em si consideradas. Nos moldes de algumas políticas públicas
104
VEIGA, José Eli da; VIANNA, Sérgio Besserman; ABRANCHES, Sérgio. A sustentabilidade do Brasil. In:
GIAMBIAGI, Fábio; BARROS, Octávio de. Brasil pós-crise: agenda para a próxima década.p. 304-323. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2009. 105
Como exemplo tem-se o Aquífero Guarani. 106
PROCÓPIO, Argemiro. Subdesenvolvimento sustentável. 5. ed. Curitiba: Juruá, 2011. p. 74-75. 107
Talvez devam ser feitas ressalvas ao etanol proveniente da cana-de-açúcar, pois esse possui a maior eficiência
energética entre os agrocombustíveis. 108
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 47-48. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017.
56
brasileiras, é possível que os biocombustíveis se tornem mais aliados do que vilões na questão
da segurança alimentar109
.
Apesar do exposto no Relatório, algumas iniciativas, incluindo projetos de lei, já
foram propostas na tentativa de mitigar a competição entre cultivares alimentares e cultivares
voltados para a produção de biocombustíveis por terra agricultável, como o Projeto de Lei nº
3680/2008, de autoria de Pedro Eugênio – PT/PE, entretanto não prosperaram nas Casas
Legislativas, e desde 2008 estão na espera por uma análise110
.
Vale ressaltar que, no Brasil, devido à extensão de seu território, ainda não parece
haver nenhum confronto mais sério entre a cadeia produtiva dos biocombustíveis e a de
produção de alimentos, mas em países de menores dimensões territoriais, os embates podem
se tornar frequentes mais rapidamente.
Recentemente, a iniciativa que prosperou foi o Zoneamento Agroecológico da cana-
de-açúcar – ZAE, instaurado pelo Decreto Presidencial nº 6.961/2009111
, figurando como um
instrumento a ser utilizado em prol do desenvolvimento sustentável e da proteção da
biodiversidade, por meio dele serão realizadas a avaliação, indicação e espacialização do
potencial das terras para a expansão da produção da cultura da cana-de-açúcar em regime de
sequeiro para produzir etanol.
O ZAE objetiva fornecer subsídios técnicos para formulação de políticas públicas
com foco no ordenamento da expansão e da produção sustentável de cana-de-açúcar no
território brasileiro. Ele se configura uma medida que possibilita a concretização de um
desenvolvimento mais sustentável porque por meio dele, o Estado receberá contribuições
técnicas acerca da melhor forma de ampliação da geração de cana-de-açúcar, de modo a gerar
o menor impacto possível, tal situação não seria viável se não houvesse esse aparato técnico.
Outra pontuação que deve objeto de reflexão é a estrutura produtiva, pois grande
parte dos biocombustíveis brasileiros provém de latifúndios monocultores, que não são a
109
SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 189. 110
BRASIL. Projeto de Lei nº 3680/2008. Dispõe sobre o ordenamento do cultivo de cana-de-açúcar e dá outras
providências. Estabelece critérios para o gerenciamento do cultivo da cana-de-açúcar de modo a evitar que seu
cultivo prejudique o abastecimento de produtos alimentares. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=403585>. Acesso em: 24 jun.
2017. 111
Em conformidade com o Decreto nº 6961/2009, o ZAE compreende: oferecimento de alternativas
sustentáveis aos produtores rurais; disponibilização de base de dados espaciais para o planejamento do cultivo
sustentável das terras com cana-de-açúcar, respeitando-se a biodiversidade e a legislação em vigor; fornecimento
de subsídios para o planejamento de futuros polos de desenvolvimento no espaço rural; alinhamento do estudo
com as políticas governamentais sobre agroenergia; a indicação e das áreas aptas à expansão do cultivo de cana-
de-açúcar sob o regime de sequeiro; e o fornecimento de bases técnicas para a implantação e controle das
políticas públicas.
57
melhor unidade de produção quando se busca a sustentabilidade e a inclusão social. Aliada a
essa questão, tem-se que os cultivares fomentados, sob a ótica de Castro e Castro, tem íntima
relação com o capital internacional, elucidada no Gráfico 6, a seguir112
:
Gráfico 6. Principais empresas e mercados de produção (CASTRO, 2015) 113
.
Não que seja um fator completamente negativo a exportação de biodiesel, até porque
no momento atual, a recessão econômica fez o consumo cair, mas a dependência internacional
pode gerar agravante. A dependência dessas produções às condicionantes econômicas
internacionais se faz tão presente que a crise econômica iniciada em 2008 repercutiu
intensamente na redução da produção de toneladas de dendê, soja e de carvão de eucalipto.
112
CASTRO, Raifran Abidimar de; CASTRO, Edna Maria Ramos de. As Monoculturas e a Sustentabilidade:
Análises de três Regiões do Brasil. Sustentabilidade em Debate, [s.l.], v. 6, n. 2, p.228-248, 31 ago. 2015.
Editora de Livros IABS. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.18472/sustdeb.v6n2.2015.14975>. Acesso em: 24
jun. 2017. 113
CASTRO, Raifran Abidimar de; CASTRO, Edna Maria Ramos de. As Monoculturas e a Sustentabilidade:
Análises de três Regiões do Brasil. Sustentabilidade em Debate, [s.l.], v. 6, n. 2, p.228-248, 31 ago. 2015.
Editora de Livros IABS. p. 234. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.18472/sustdeb.v6n2.2015.14975>. Acesso
em: 24 jun. 2017.
58
Esse último sentiu ainda mais os efeitos da crise, por ser destinado à fabricação do ferro-gusa
nas siderúrgicas maranhenses, setor que sofreu de maneira mais concreta114
.
Ainda em conformidade com Castro e Castro, há quem defenda que todo o
investimento público nas três monoculturas traga um retorno social para as comunidades que
se localizam em seus entornos. Mas, como demonstrado no Gráfico 6, essas culturas refletem
os interesses diretos de grandes empresas internacionais, nem sempre gerando modificações
concretas ou positivas nas estruturas em seu entorno115
.
Paradoxalmente, entre as soluções apontadas para a crise econômica, está o reforço
do papel de fornecimento de produtos agrícolas pelo Brasil no mercado global, a exclusão de
direitos trabalhistas, previdenciários e de parte da assistência social, e a manutenção de
riquezas pela elite dominante em detrimento do empobrecimento da população. Soluções
essas que colocam a população e o meio ambiente brasileiro em situação de grade
vulnerabilidade. Fica a ponderação de que a recuperação de uma crise econômica talvez exija
soluções mais complexas.
Quanto à questão social, não se pode ignorar que grande parte das lavouras
monocultoras possui elevado grau de mecanização, não gerando tantos empregos ou gerando
empregos precários (são recorrentes denúncias sobre usinas e produtores que tratam
trabalhadores em verdadeiros regimes de escravidão moderna). Como pondera Gandhi, “não
há tecido que seja belo se ele causa fome e miséria”. Ou seja, sem causar o mínimo de
inclusão qual o custo social deste desenvolvimento que se propõe a ser sustentável?
Ignacy Sachs aponta como seria a melhor forma de inclusão social dos pequenos
agricultores: primordialmente disponibilizando a biotecnologia moderna aos pequenos
fazendeiros, capacitando-os a participarem da segunda Revolução Verde. Tal atitude não é em
si só suficiente, mas exige uma série de políticas complementares (acesso justo à terra, ao
conhecimento, ao crédito e ao mercado, e à educação rural). Ademais, são necessários
esforços direcionados em favor do desenvolvimento de uma química verde, como
complemento ou até como substituto pleno da petroquímica, trocando energia fóssil por
biocombustíveis116
.
114
CASTRO, Raifran Abidimar de; CASTRO, Edna Maria Ramos de. As Monoculturas e a Sustentabilidade:
Análises de três Regiões do Brasil. Sustentabilidade em Debate, [s.l.], v. 6, n. 2, p.228-248, 31 ago. 2015.
Editora de Livros IABS. p. 234. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.18472/sustdeb.v6n2.2015.14975>. Acesso
em: 24 jun. 2017. 115
Ibidem, p. 233. 116
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond: 2009. p. 34
59
Na esteira do que mencionou Sachs, alguns estudiosos argumentam que diversas
alternativas estão em desenvolvimento para incentivar a transição para um setor de transportes
de baixo carbono, os biocombustíveis avançados, tais como o etanol de cana-de-açúcar e o
etanol celulósico ou de segunda geração, representam uma solução de mais rápida
implementação por sua elevada compatibilidade com os veículos atuais (flex-fluels) e a
infraestrutura de distribuição e abastecimento energética. Artur Milanez também menciona a
superação definitiva da equivocada polêmica “biocombustíveis x alimentos” por meio da
utilização de resíduos agrícolas e urbanos como fonte de matéria-prima, entretanto tal
superação não é uma realidade no todo brasileiro117
.
Como visto, são muitos argumentos que põem em xeque a sustentabilidade dos
biocombustíveis. Entretanto, ainda há uma intensa defesa dos biocombustíveis, incluindo os
agrocombustíveis, como opção sustentável para compor nossa matriz energética em
percentual crescente. Mas quais os argumentos utilizados para tanto? Seguem, agora, breves
aspectos técnicos para melhor entendimento desta defesa.
No que concerne à produção de etanol, essa apresenta como fatores ambientalmente
positivos: a absorção de CO2 pelas plantações de cana-de-açúcar; a alta potencial energético
comparativamente a outros biocombustíveis, assim como uma energia mais eficiente118
.
Quanto à produção de biodiesel, figuram como fatores positivos: energia renovável,
constituída de carbono capturado por meio da fotossíntese vegetal, ou pelo anabolismo dos
animais, na produção de gorduras; alternativa econômica ao combustível de origem fóssil; na
sua combustão gera apenas água e gás carbônico; potencial poluente inferior ao óleo diesel
fóssil porque não possui em sua estrutura compostos sulfurados, não gerando, portanto,
compostos secundários sulfurados, altamente contaminantes da atmosfera terrestre119
.
117
MILANEZ, Artur Yabe et al. O Acordo de Paris e a transição para o setor de transportes de baixo carbono: o
papel da Plataforma para o Biofuturo. BNDES Setorial: biocombustíveis, Rio de Janeiro, n. 45 , p. 285-340, mar.
2017. Disponível em: <https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/handle/1408/11756>. Acesso em: 20 maio 2017. p.
289. 118
JANK, Marcos Sawaya; NAPPO, Marcio. Etanol da cana-de-açúcar: uma solução energética global sob
ataque. In: ABROMOVAY, Ricardo (Org.). Biocombustíveis: A energia da controvérsia. São Paulo: Editora
SENAC, 2009, p. 19-57. 119
Ainda a respeito do biodiesel: contribui para a geração de empregos no setor primário (agricultura familiar),
pode ser utilizado como óleo vegetal ou ser transformado em combustível; reduz de custos de produção agrícola,
já que o óleo vegetal não necessita de transporte por longas distâncias, nem recolhe impostos; é um excelente
lubrificante, aumentando consideravelmente a vida útil do motor; possui mais cetanos que o óleo diesel,
oferecendo maior torque ao motor a combustão; é um potencial gerador de trabalho e renda para o homem do
campo, e, por conseguinte, potencial minimizador do êxodo rural, pois agrega valor à cadeia agrícola.
[NODARI, Rubens Onofre. Sobre os biocombustíveis: impactos, benefícios e alternativas. In: FERREIRA,
Heline Sivini; LEITE, José Rubens Morato. Biocombustíveis: Fonte de energia sustentável? Considerações
jurídicas, técnicas e éticas. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 51-67.
60
Tecnicamente, portanto, há uma grande viabilidade dos biocombustíveis enquanto
fontes de energia limpa, mas devem ser observados os gargalos de sustentabilidade (os pontos
controversos mencionados acima), de forma que todas as fases das suas cadeias produtivas
obedeçam a critérios técnicos planejados ambientalmente e socialmente, para que o potencial
de sustentabilidade não se torne apenas mero discurso retórico de proteção ambiental, e que
no final utilizem-na para privilegiar alguns poucos em detrimento da maioria, via políticas
públicas distorcidas.
Conforme visto, a produção de biocombustíveis está intimamente ligada à questão
ambiental; por sua vez, o Direito ao meio ambiente positivado na Constituição Federal de
1988, em seu art. 225, carrega em sua essência o direito intergeracional. Por tal razão, o
capítulo 3 se debruçará sobre aspectos relativos à justiça intergeracional, correlacionando-a
com a produção de biocombustíveis.
61
3 BIOCOMBUSTÍVEIS: A IMPORTÂNCIA DA PRODUÇÃO NACIONAL SOB O
VIÉS CONSTITUCIONAL DA JUSTIÇA INTERGERACIONAL
O presente capítulo possui três subdivisões didáticas. Na primeira delas – item 3.1 –
discorre-se sobre conceitos pertinentes à temática da justiça intergeracional. Esses conceitos,
embora não pretendam esgotar termos que geram intensas e ricas reflexões ao longo da
história da humanidade, da filosofia e do direito, prestam-se como um norte para melhor
compreensão das teorias da justiça entre gerações.
Ademais, as teorias da justiça entre gerações são abordadas no item 3.1, na tentativa
de elaboração de referencial teórico que possa correlacionar elementos componentes das
próprias teorias com o direito constitucional e com os biocombustíveis produzidos no Brasil.
Da interação entre esses conhecimentos surgiu a necessidade de se aprofundar na
questão da justiça intergeracional do meio ambiente – trazida à baila no item 3.2 – por três
razões principais: as teorias da justiça abordam em seu corpo noções de equidade
intergeracional; o direito constitucional brasileiro trata explicitamente, no texto da Carta
Magna, da equidade entre gerações sob a perspectiva do direito ambiental, em seu artigo 225.
E, por último, da produção de biocombustíveis está intimamente relacionada à
questão ambiental, no contexto brasileiro, em virtude de grande parcela dos biocombustíveis
aqui produzidos serem agrocombustíveis de primeira geração, o que implica, por conseguinte,
na necessidade de expansão das fronteiras agrícolas, na realidade atual de fomento (ou
necessidade) de aumento da produção nacional120
.
A partir do conhecimento acima adquirido, questiona-se, no item 3.3: a produção
nacional de biocombustíveis realmente tem potencial de efetivar uma justiça intergeracional
(incluindo o aspecto ambiental)? Tal questionamento é um dos principais nortes deste
capítulo.
Dadas as respostas possíveis para questão em comento, por fim, propõe-se a
discussão de um dos eixos centrais desta dissertação: a crise atual no Brasil influencia uma
efetivação da justiça intergeracional? Para responder esse questionamento, buscou-se
conhecimento em uma área de conhecimento externa aos biocombustíveis, mas intimamente
relacionada à temática da política energética no contexto brasileiro: a fundamentação aqui
realizada retomou brevemente a discussão do Fundo Social do Pré-sal e da mudança do marco
120
Agrocombustíveis de primeira geração são aqueles provenientes de culturas agrícolas como a soja, a cana-de-
açúcar, o milho, o sorgo, o girassol, entre outros. E, de modo geral, necessitam de grandes extensões territoriais
para serem cultivados.
62
regulatório de partilha de produção para o modelo anterior baseado em concessões
administrativas de campos e jazidas petrolíferas.
Ainda no item 3.3, aborda-se paralelamente a questão do Fundo Social do Pré-sal, a
política de desinvestimentos em biocombustíveis pela Petrobras e as limitações dos
biocombustíveis, ao menos no formato em que estão dimensionados na política energética
brasileira, de concretizarem uma justiça ambiental intergeracional – apesar do grande
potencial observado.
Por último, percebe-se que o Brasil ainda engatinha em termos de justiça
intergeracional, mas em seu ordenamento jurídico já possui algumas ferramentas necessárias
para uma efetivação tanto da justiça intrageracional quanto da justiça intergeracional, entre
elas se destacam as políticas públicas socioambientais, principalmente o Programa Nacional
de Produção e Uso do Biodiesel – PNPB.
O PNPB, a despeito das falhas em sua execução, representou significativo avanço
na efetivação da justiça intergeracional no Brasil, principalmente quando somado ao Fundo
Social do Pré-sal, pois positivaram em diplomas infraconstitucionais instrumentos concretos
de responsabilidade tanto com a presente geração, quando de responsabilidade ou
solidariedade para com as futuras gerações.
Por reconhecer a importância estratégica das políticas públicas, tanto as
socioambientais quanto outras, após as discussões propostas no capítulo 3, passa-se no
capítulo 4 a estudar as políticas públicas, principalmente as voltadas ao fomento da produção
de biocombustíveis, com o introito de melhor compreender os seus mecanismos, avanços e
retrocessos.
Pensando-se numa dimensão mais geograficamente regionalizada, o estado
brasileiro do Rio Grande do Norte, foi o 19º estado brasileiro no ranking do PIB em 2019121
,
possuindo uma população bastante empobrecida, por isso, relata-se especificamente no
capítulo 4 a sua experiência com a produção de biodiesel a partir do girassol, que funcionou
no molde de uma redistribuição de renda, na medida em que houve investimento de uma
estatal – a Petrobras – em atividades produtivas numa região de assentamentos de reforma
agrária122
.
121
Segundo dados da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Disponível em:
<http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=240810>. Acesso em: 17 jun. 2017. 122
Aqui mencionado para enfatizar a possibilidade de fomento às justiças intra e intergeracional dos
biocombustíveis.
63
3.1 CONCEITOS E TEORIAS DA JUSTIÇA ENTRE GERAÇÕES
Para se compreender o surgimento das teorias da justiça entre gerações123
, faz-se
necessária a compreensão do surgimento dos direitos de terceira e de quarta dimensão ou
geração124
. O marco histórico que ocasionou o surgimento da terceira dimensão de direitos foi
a Segunda Guerra Mundial, tendo em vista que os direitos desta dimensão são direitos
baseados nos valores da solidariedade e da fraternidade, marcas do movimento humanista em
ascensão no pós-guerra.
Sobre essa geração de direitos, Paulo Bonavides ensina que é dotada de alto teor de
humanismo e de universalidade, tendo por primeiro destinatário o gênero humano, em um
momento internacionalmente expressivo de sua afirmação como valor supremo. Englobam,
efetivamente, o direito ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao
patrimônio comum da humanidade125
. São direitos da coletividade, também identificados pela
nomenclatura “direitos transindividuais”.
Já os direitos de quarta dimensão emergiram no contexto da derrocada da
bipolaridade comunismo versus capitalismo, com o final da Guerra Fria, e da ascensão da
globalização e da internacionalização da humanidade; são aqueles que versam sobre a
democracia, à informação e ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta
para o futuro, em uma dimensão de máxima universalidade126
.
Os três direitos supramencionados constituem os direitos de quarta dimensão,
mesmo sem trazerem nenhum valor específico. Esses são pertencentes ao gênero humano,
pois dependem de uma internacionalização desses direitos para se concretizarem. Surgiram
nas últimas décadas do século XX, a partir da mudança de paradigma gerada pelo
desenvolvimento tecnológico-científico e dos avanços no campo das comunicações.
No momento do surgimento dos direitos retromencionados, a dogmática do
positivismo jurídico127
já era incapaz de dar respostas suficientes à nova função do Direito,
123
Neste capítulo, a despeito de qualquer discussão teórica mais aprofundada, não utilizaremos o termo
“geração” em referência aos direitos fundamentais, nesse sentido utilizaremos “dimensões”, a fim de evitar
qualquer confusão quando tratarmos de “futuras gerações”. 124
Apenas a título de complemento, os direitos fundamentais de primeira e segunda dimensão são,
respectivamente, os direitos civis e políticos (direito à vida, à intimidade, à inviolabilidade de domicílio, à
propriedade, entre outros) referentes ao ideal da liberdade; e os últimos são direitos positivos, por reclamarem a
presença do Estado, para propiciar um bem estar social, são direitos sociais, econômicos e culturais, buscando
diminuir as desigualdades sociais. 125
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 563-569. 126
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 571. 127
O positivismo, em seu sentido amplo, é uma teoria monista sobre o direito, excluindo o direito natural da
definição de direito vigente. [DIMOULIS, Dimitri. Positivismo jurídico: significado e correntes. Enciclopédia
64
posto ter sido utilizada para cometer as mais diversas barbaridades do nazifascismo e das
guerras. Buscava-se uma teoria mais voltada ao sentido de promoção por parte do Estado,
uma necessidade prestacional que ultrapassava a esfera individual para alcançar todo o
planeta e as gerações futuras. Em um claro reflexo da preocupação em salvaguardar os seres
humanos de novas guerras e arbitrariedades.
Entra em cena, então, o pós-positivismo jurídico que, segundo Luis Roberto
Barroso, é o marco filosófico da nova etapa e objetiva a interpretação do direito fundamentada
em uma teoria da justiça, como forma de minimizar o qualquer potencial dano a ser por ele
fundamentado128
. Com esse novo marco na sociedade, e uma nova teoria representada pelo
pós-positivismo jurídico, surge no campo do Direito Constitucional o Neoconstitucionalismo.
Ainda segundo Luis Roberto Barroso, com o Neoconstitucionalismo continua em
voga a premissa da supremacia constitucional; agora agregando a prevalência da força
normativa e dirigente dos princípios constitucionais, esses passando a ser a síntese dos valores
recepcionados no ordenamento jurídico, sempre os aproximando da ética para evitar
distorções129
.
No que cinge aos princípios, Ronald Dworkin os define de forma célebre, e
bastante referenciada pela doutrina, como um padrão que deve ser observado, mesmo que não
assegure uma situação econômica, política ou social desejável, mas sim pelo fato de ser uma
exigência de justiça ou equidade ou outra dimensão da moralidade130
.
Foi nessa conjuntura de Neoconstitucionalismo e pós-positivismo jurídico somada
às mudanças na sociedade que, por volta da década de 1970, foram amplamente difundidas as
ideias de desenvolvimento sustentável, uma das vertentes da justiça intergeracional131
.
Na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente em Estocolmo, no ano de
1972, em uma tentativa de se institucionalizar a problemática ambiental frente ao
jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.).
Tomo: Teoria Geral e Filosofia do Direito. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga, André
Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível
em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/84/edicao-1/positivismo-juridico:-significado-e-correntes>.
Acesso em: 17 jun. 2017.] 128
BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: O triunfo tardio do
direito constitucional no Brasil. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 240, p.1-42, abr./jun. 2005.
Disponível em: <http://dx.doi.org/10.12660/rda.v240.2005>. Acesso em: 17 jun. 2017. 129
BARROSO, Luís Roberto Barroso. O novo direito constitucional brasileiro: contribuições para a construção
teórica e prática da jurisdição constitucional no Brasil. Belo Horizonte: Fórum, 2013. p. 122. 130
DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 36. 131
Remontando o contexto da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, tratada em capítulo
anterior.
65
desenvolvimento econômico, a temática do desenvolvimento sustentável ganhou força,
culminando em sua conceituação pelo Relatório Brundtland.
Contudo, o conceito de justiça intergeracional já havia sido introduzido em 1974
por James Tobin, ao escrever que os administradores ou curadores de instituições detentoras
de patrimônio (como exemplo Tobin menciona grandes universidades) exercem a função de
guardiões do futuro contra as reivindicações do presente, devendo administrar esse patrimônio
e preservá-lo entre gerações132
.
Na Declaração de Estocolmo percebe-se que o próprio conceito de
desenvolvimento sustentável se sobrepõe à ideia de justiça intergeracional: “o
desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das
gerações futuras de suprir suas próprias necessidades” 133
.
Para se compreender a expressão “justiça intergeracional” ou “justiça entre as
gerações” além do contexto do seu surgimento explanado supra, é necessário entender
conceitualmente a ideia de justiça, a definição da expressão “futuras gerações”, o objeto de
estudo da justiça intergeracional e a função do direito.
Antes de se apresentar os conceitos listados acima, cabe a reflexão trazida por
Leonardo Alves Corrêa: atualmente, a discussão sobre uma nova ética ambiental, pautada
inicialmente pelo desenvolvimento sustentável, influencia decisivamente o conceito de
justiça, destacando-se o conceito de justiça intergeracional. Essa vertente da justiça é
imprescindível, pois finda por corrigir racionalmente discursos céticos, utilitaristas e
hedonistas; significando ainda um aprimoramento sofisticado do Direito134
.
Dissecando a expressão “justiça intergeracional”, desdobram-se dois conceitos
intrinsecamente correlacionados: “justiça” e “intergeracional”, portanto intergeracional é
espécie do gênero justiça. Convém então entender o sentido mais amplo de justiça, para
posteriormente se abstrair o sentido resultante dessa interação linguística.
Historicamente, o conceito de “justiça” está inicialmente associado à igualdade135
.
Aristóteles já trazia a discussão desse conceito, acreditando ser a justiça uma disposição da
alma que leva as pessoas dela dotadas a fazer o que é justo, a agir justamente e a desejar o que
132
TOBIN, James. What Is Permanent Endowment Income? The American Economic Review, v. 64, n. 2, Papers
and Proceedings of the Eighty-sixth Annual Meeting of the American Economic Association, p. 427-432, maio,
1974. Disponível em: <http://www.jstor.org/stable/1816077>. Acesso em: 20 set. 2017. 133
BRUNDTLAND, Gro Harlem. Nosso futuro comum: comissão mundial sobre meio ambiente e
desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1991, p. 10. 134
CORRÊA, Leonardo Alves. Desenvolvimento econômico e desenvolvimento: uma interpretação a partir da
constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011. p. 133. 135
É consenso que “justiça” é um valor, indicando orientação à ação justa.
66
é justo, assumindo caráter de virtude moral, ao observar da lei e ao respeitar aquilo que é
legítimo e válido para o bem de toda comunidade. Trazendo duas perspectivas: a justiça
corretiva (para equilibrar as perdas e os ganhos entre os indivíduos) e a justiça distributiva
(divisão entre os cidadãos para que todos desfrutem dos benefícios coletivamente)136
.
Trazendo uma visão mais atual, Gustavo Jaccottet Freitas analisa a existência de
um conceito de justiça nas obras da filósofa Hannah Arendt, concluindo por encontrar um
conceito implícito em suas obras, de justiça equitativa que amolda o Direito (lei, Constituição,
jurisprudência e atos da administração pública) ao caso concreto, com identificação da justiça
com a legitimidade137
. A justiça como equidade é a teoria da justiça desenvolvida por John
Rawls, a ser estudada adiante.
Por fim, Hans Kelsen reforça a ideia de que a humanidade é subdividida em nações,
classes, religiões, por vezes divergentes entre si, e daí advém a grande quantidade de
conceitos de justiça tão plurais quanto a sociedade, não havendo como uniformizar um único
conceito de justiça138
.
Visto o conceito de justiça, é necessário entender o significado da expressão
intergeracional; intergeracional é tudo o que é relativo a gerações distintas. Sua tradução
literal é “entre gerações”. A justiça entre gerações é consequência do maior foco no
desenvolvimento de aspectos da justiça e da equidade139
.
Busca-se agora o conceito da expressão “futuras gerações”, já que a geração
presente é aquela temporalmente existente quando utilizado um parâmetro temporal
comparativo. Ramos Júnior faz uma construção interessante sobre o conceito jurídico de
futuras gerações, em suma, pode-se dizer que as futuras gerações são subjetividades coletivas
formadas por indivíduos com menos de 18 anos de idade, e por todos aqueles que ainda não
nasceram e que, sequer, foram concebidos. As referidas subjetividades coletivas são
136
SANTOS, Thiago Mendonça; SOARES, Josemar Sidinei. O conceito de justiça no pensamento filosófico de
Aristóteles. Disponível em:
<https://uspdigital.usp.br/siicusp/cdOnlineTrabalhoVisualizarResumo?numeroInscricaoTrabalho=5327&numero
Edicao=18>. Acesso em: 17 jun. 2017. 137
A justiça arendtiana é abordada a partir do totalitarismo alemão, que não alterou leis, mas retirou a
estabilidade que elas ofertam para a sociedade organizada, afastando-se, por tanto, da ética. [FREITAS, Gustavo
Jaccottet. Existe um conceito de justiça em Hannah Arendt? Saberes: filosofia e educação, Natal, v. 1, n. 10,
p.135-154, nov. 2014. Semestral. Disponível em: <https://periodicos.ufrn.br/saberes/article/view/4920/4918>.
Acesso em: 17 jun. 2017.] 138
KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 12. 139
A equidade intergeracional é o fundamento do direito das futuras gerações, sendo, portanto, um princípio
basilar da justiça intergeracional.
67
portadoras de direitos e interesses difusos fundamentais para a perpetuação da espécie
humana140
.
Mencionando, ainda, que o reconhecimento normativo dos direitos
supramencionados ocorre pela via tradicional personalidade jurídica atribuída a pessoas vivas,
conforme o artigo 2º do Código Civil brasileiro. Porém, considerando que uma parcela
considerável dos indivíduos que integram as futuras gerações ainda não foi concebida, não
detendo personalidade jurídica civil, essas futuras gerações se apresentam como
subjetividades coletivas141
cujos direitos e interesses são reconhecidos por meio da técnica
jurídica da presunção de nascimento antecipado, (a proteção jurídica ante natalem de pessoas
não-nascidas – direitos obtidos antes do nascimento). Presumem-se, então, já nascidos os
indivíduos das futuras gerações mais distantes142
.
Quanto ao objeto da justiça intergeracional, é justamente a geração futura, em
virtude de não possuir nenhum representante na atualidade. Já o papel do direito é criar
instrumentos jurídicos para regular as pretensas relações entre os indivíduos das gerações
presentes e os das gerações não nascidas. Por fim, vistos os conceitos básicos, inicia-se agora
um breve estudo das teorias da justiça e seus desdobramentos entre gerações.
Serão aqui abordadas resumidamente: a deontológica Teoria da Justiça como
Equidade, de John Rawls, e o Princípio da Responsabilidade, de Hans Jonas, lançado em seu
livro “Imperativo da Responsabilidade”, em 1979, assim como sua ética para uma civilização
tecnológica; expõe-se, em sucintos termos, o Libertarianismo de Robert Nozick. No item 3.2,
que trata especificamente da justiça intergeracional do meio ambiente, será explanada a
Teoria da Equidade Intergeracional, formulada por Edith Brown Weiss, e adicionalmente
algumas das ideias de François Ost sobre a dialética entre homem e natureza.
140
RAMOS JÚNIOR, Dempsey Pereira. Amplitude do conceito jurídico de futuras gerações e do respectivo
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 2011. 403 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Direito,
Universidade do Estado do Amazonas, Manaus, 2011. p. 134-135. Disponível em:
<http://tede.uea.edu.br/jspui/bitstream/tede/155/5/Amplitudedoconceitojurídicodefuturasgerações.pdf>. Acesso
em: 18 jun. 2017. 141
A preocupação com a justiça intergeracional ultrapassou as barreiras jurídicas e filosóficas e está presente no
conhecimento popular, como na música “Futura Geração”, da banda florianopolitana “Iriê”: “Pode dizer/ É nossa
obrigação/ Saber cuidar/ Pra quem vier/ Futura geração/ Vivendo em conflito/ Entre o que é escrito/ E o que
acontece de verdade”. E também nos versos musicalizados do cantor e compositor pernambucano Geraldo
Azevedo [“Eu quero um país/ Eu quero um país de futuro.../Eu quero a América/ Eu quero a Futura América.../
Eu quero a terra/ Quero o futuro da terra.../ Não quero a história dos crimes/ Eu quero Bolívar e San Martin/ Los
Hermanos de Zumbi/ Los Hijos de Tiradentes.../ A história de um índio/ Na Cordilheira dos Andes/ Dos Incas,
Ianomamis/ Eu quero um futuro grande.../ Quero o futuro como um cesto/ Multiplicando seus pães”]. 142
RAMOS JÚNIOR, Dempsey Pereira. Amplitude do conceito jurídico de futuras gerações e do respectivo
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 2011. 403 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Direito,
Universidade do Estado do Amazonas, Manaus, 2011. p. 130-136. Disponível em:
<http://tede.uea.edu.br/jspui/bitstream/tede/155/5/Amplitude do conceito jurídico de futuras gerações.pdf>.
Acesso em: 18 jun. 2017.
68
John Rawls em sua obra “A theory of justice”, de 1971, trata da justiça como
equidade, um marco na filosofia política contemporânea. Em breve síntese, Rawls tenta
responder o significado de uma “sociedade justa”, elucidando o conceito de “justice as
fairness”. Ainda, a possibilidade de uma sociedade democrática bem ordenada deriva de um
conceito de justiça como equidade (em um sistema equitativo de cooperação social). A
equidade, por sua vez, depende da escolha dos princípios da justiça que irão nortear as suas
bases estruturais143
.
Rawls define dois princípios: cada pessoa deve ter direito igual ao mais abrangente
sistema de liberdades básicas que seja compatível com um sistema assemelhado de liberdade
para outras (Rawls defende, portanto, uma teoria liberal); e que as desigualdades sociais e
econômicas devem ser ordenadas de forma que sejam razoavelmente consideradas vantajosas
(igualdade material) e estejam vinculadas a posições acessíveis a todos (igual oportunidade).
Essa teoria seria vantajosa para a sociedade em virtude do seu pluralismo144
.
Rawls define, no segundo princípio, o viés da poupança justa – cada geração deve
preservar determinada quantidade de capital, desde meios de produção ao investimento na
educação. A poupança é exigida como condição para a realização plena de instituições justas
e das iguais liberdades para todos, agindo também como limite à taxa de acumulação. Extrai-
se das ideias de Rawls que ele adota uma concepção contratualista da justiça entre gerações,
apesar da estranha ideia de se firmar um contrato entre pessoas que não possuem vidas
concomitantes145
.
Explicando as ideias de Rawls, Hirdan Costa menciona que tais princípios são
necessários para uma construção da justiça por intermédio de um véu da ignorância, para se
atingir a um elevado grau de racionalidade, de igualdade e de desinteresse, de forma que se
desenvolva um senso de justiça, visando se adotarem os meios mais eficazes para se atingir
determinado fim. Sendo assim, a melhor concepção de justiça será aquela cujas consequências
mais amplas são desejáveis146
.
143
BRESOLIN, Kleberson; CICHOWSKI, Vicente Cougo. Sobre o conceito de justiça em John Rawls e Robert
Nozick. Clareira: revista de filosofia da Região Amazônica, v.1, n. 2, p.123-138, ago./dez. 2014. Disponível em:
<http://www.revistaclareira.com.br/index.php/clareira/article/viewFile/31/24>. Acesso em: 19 jun. 2017. 144
BRESOLIN, Kleberson; CICHOWSKI, Vicente Cougo. Sobre o conceito de justiça em John Rawls e Robert
Nozick. Clareira: revista de filosofia da Região Amazônica, v.1, n. 2, p.123-138, ago./dez. 2014. Disponível em:
<http://www.revistaclareira.com.br/index.php/clareira/article/viewFile/31/24>. Acesso em: 19 jun. 2017. 145
SILVA, Ricardo Perlingeiro Mendes da Silva. Teoria da Justiça de John Rawls. Revista de Informação
Legislativa. Brasília a. 35, 193-212, n. 138, abr./jun.-1998. p. 201-202. Disponível em:
<http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/377/r138-16.pdf>. Acesso em: 19 jun. 2017. 146
COSTA, Hirdan Katarina de Medeiros. O princípio da justiça intra e intergeracional como elemento na
destinação das rendas de hidrocarbonetos: temática energética crítica na análise institucional brasileira. 2012.
342 f. Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em Energia) EP/FEA/IEE/IF da Universidade de São
69
Contrapondo-se à teoria da equidade de Rawls, Robert Nozick, em sua obra
“Anarchy, State and Utopia”, de 1974, lança uma teoria política libertária, propondo um
Estado mínimo – limitado a garantir a proteção contra a força, o roubo e a fraude. Enquanto
Rawls defende o “justice as fairness”, Nozick atribui aos direitos individuais caráter
fundamental e apenas um Estado mínimo seria compatível, de forma a não lesar tais direitos.
O ponto em comum entre as teorias de Rawls e Nozick: ambos criticam o utilitarismo147
como
forma de justiça e fundamentação do estado148
.
Hans Jonas, em 1979, em seu livro “Imperativo da Responsabilidade” abordou o os
impactos irreversíveis da moderna tecnologia sobre a natureza e sobre o futuro da
humanidade. Antes disso, o homem não possuía a capacidade técnica de modificar a natureza
em tão larga escala como atualmente. Baseado nisso, Hans Jonas propõe um imperativo novo,
baseado na responsabilidade para com o meio ambiente, a saber: o novo imperativo clama
pela coerência dos atos humanos com seus efeitos finais, de modo a haver a continuidade da
atividade humana no futuro; além disso, as ações subordinadas a esse novo imperativo, ou
seja, as ações do todo coletivo, assumem a característica de universalidade na medida real de
sua eficácia149
.
Entretanto, em seu Princípio da Responsabilidade, Hans Jonas ao definir o
imperativo ético de responsabilidade – o conhecido não por em risco ou em perigo as
condições da continuidade indefinida da humanidade na Terra –, afirma que o sacrifício do
futuro em prol do presente não é mais refutável do que o sacrifício do presente a favor do
futuro150
.
Logo, a conservação da vida é algo que se deve tanto às vidas atuais quanto às
novas gerações. E Jonas afirma que devemos agir de modo que os efeitos de nossas ações
sejam compatíveis com a permanência de uma autêntica vida humana sobre a Terra,
demonstrando a imensa preocupação e verdadeira responsabilidade com as futuras gerações.
Também afirma de forma negativa: devemos agir de modo a que os efeitos de nossas ações
não sejam destrutivos para a possibilidade futura da vida. Ou ainda, afirma para não por em
Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/86/86131/tde-21092012-
181014/ptbr.php>. Acesso em: 10 jun. 2017. p. 28. 147
Por utilitarismo entende-se uma doutrina filosófica que tem a utilidade como um princípio moral, ou seja, tem
por base os resultados. Jeremy Bentham foi um dos pioneiros representantes desta corrente filosófica. Tanto para
Rawls quanto para Nozick, o utilitarismo infringe direitos fundamentais individuais. 148
BRESOLIN, Kleberson; CICHOWSKI, Vicente Cougo. Sobre o conceito de justiça em John Rawls e Robert
Nozick. Clareira: revista de filosofia da Região Amazônica, v.1, n. 2, p.123-138, ago./dez. 2014. Disponível em:
<http://www.revistaclareira.com.br/index.php/clareira/article/viewFile/31/24>. Acesso em: 19 jun. 2017. 149
JONAS, Hans. O princípio da responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Marijane
Lisboa, Luiz Barros Montez (trad.). Rio de Janeiro: Contraponto, 2006. p. 48-49. 150
Ibidem. p. 47.
70
perigo as condições necessárias para a conservação indefinida da humanidade sobre a Terra.
Sempre no sentido de uma ética com a vida das presentes e das futuras gerações. Afirma ainda
que a responsabilidade com as futuras gerações é similar à responsabilidade entre pais e
filhos; e acima de tudo, de respeito e responsabilidade com as gerações vindouras151
.
Vistas brevemente as concepções de justiça que permeiam as três teorias, elas são
importantes para, em menor ou maior grau, tecer um paralelo com determinados aspectos
correlatos à produção de biocombustíveis no Brasil, como o seu viés ambiental e foco do
corrente capítulo, por exemplo. Inicia-se, agora, a exposição sobre a justiça intergeracional do
meio ambiente.
3.2 JUSTIÇA INTERGERACIONAL DO MEIO AMBIENTE
Como explanado no Capítulo 2 sobre desenvolvimento sustentável e
sustentabilidade, em meados do século XX, a problemática ambiental veio à tona e diante do
receio fundamentado de graves consequências ambientais que inviabilizassem a vida humana.
Diante desse contexto é que a tutela ambiental começou a ganhar contornos, principalmente
na instância internacional.
Os direitos de terceira dimensão, como dependem de uma visão mais
internacionalista e universalista para sua concretização, demandam que se lance um olhar para
o futuro, para que se melhor tutele os bens jurídicos do direito ao desenvolvimento, à paz, ao
meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade.
Nessa perspectiva, desde a emblemática Conferência de Estocolmo, o princípio da
equidade intergeracional se fez presente, positivando-se em diversas constituições por todo o
mundo, inclusive na Constituição brasileira. Eis o desafio: como preservar o meio ambiente
para as presentes e futuras gerações? Principalmente quando a lógica capitalista induz o
consumo desnecessário, a descartabilidade de tudo, e o mercado se vale de práticas como a
obsolescência programada.
No âmbito internacional, a responsabilidade das relações presentes para com as
futuras sempre está posta ou pressuposta nas Declarações Internacionais, com o destaque
merecido para a Declaração de Responsabilidades das Gerações Presentes para com as
151
Em suma, Hans Jonas afasta o equilíbrio contratual de Rawls, bem como sua justa partilha. Sua teoria busca o
fundamento na responsabilidade parental.
71
Gerações Futuras, da UNESCO, datada de 1997, e que, embora não se configure como uma
norma cogente traz ideais éticos a serem perquiridos por toda a coletividade e instituições.
A justiça intergeracional teve por base, desde o início de suas discussões
internacionais, a solidariedade intrageracional e a solidariedade intergeracional, também
nomeada equidade. Nesse sentido, é importante o estudo da Teoria da Equidade
Intergeracional desenvolvida por Edith Brown Weiss, na década de 1980. Para criá-la Weiss
inspirou-se no igualitarismo de Rawls.
Em síntese, a teoria da equidade intergeracional de Weiss baseia-se no pressuposto
que todas as gerações humanas, independente da época em que existam, têm direitos
igualmente garantidos ao meio ambiente, por essa razão as presentes gerações devem ter o
cuidado de conservá-lo, para repassá-lo as seguintes gerações em condições iguais as que o
receberam.
Weiss infere que os direitos intergeracionais podem ser considerados direitos da
coletividade em relação a outras gerações, passado, presente e futuro. Eles existem
independentemente do número e da identidade dos indivíduos que compõem cada geração.
Em algumas situações, os direitos intergeracionais detidos pelos membros da geração atual
adquirem atributos dos direitos individuais. Esses interesses, no entanto, derivam do fato de
que aqueles que vivem são agora membros da geração e têm direitos em relação a outras
gerações que usaram e se beneficiaram do planeta152
.
Os remédios para violações desses direitos beneficiarão outros membros da
geração, não apenas o indivíduo em si. A implementação dos direitos intergeracionais é
fundamental. A execução pode ser feita por um guardião ou representante das gerações
futuras. Embora os titulares de direitos possam não ter a capacidade de trazer queixas e,
portanto, dependem dos representantes para fazê-lo, essa incapacidade não afeta a existência
dos direitos e obrigações que lhes são associadas153
.
Alguns autores consideram os três princípios da equidade a maior contribuição de
Weiss. São eles: princípio intergeracional de conservação das opções (conservação da
diversidade dos recursos naturais e culturais, para garantir às gerações futuras o mesmo
152
WEISS, Edith Brown. In Fairness To Future Generations and Sustainable Development. American University
International Law. v. 8, n. 1,. p. 19-26, 1992. Disponível em:
<http://digitalcommons.wcl.american.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1498&context=auilr>. Acesso em: 21 jun.
2017. p. 24. 153
WEISS, Edith Brown. In Fairness To Future Generations and Sustainable Development. American University
International Law. v. 8, n. 1,. p. 19-26, 1992. Disponível em:
<http://digitalcommons.wcl.american.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1498&context=auilr>. Acesso em: 21 jun.
2017. p. 24.
72
acesso das gerações anteriores); princípio intergeracional da qualidade ou da conservação da
qualidade (condição comparável ao que foi recebido da geração anterior, mantendo a
qualidade do planeta); princípio intergeracional de acesso ou conservação de acesso (ao
recursos naturais, apesar de essas serem apenas diretrizes gerais para alcance de uma justiça
distributiva)154
.
Sobre o equilíbrio da poupança ambiental, Weiss menciona que são necessárias
medidas preventivas e de precaução, entre elas políticas públicas de controle de natalidade,
entretanto, tais políticas não seriam interessantes em relação à justiça intergeracional
previdenciária.
É necessário se analisar dois conceitos sob a perspectiva da justiça intergeracional
ambiental: o conceito de desenvolvimento sustentável e o conceito de sustentabilidade, que
são distintos.É importante ressaltar que desenvolvimento sustentável é um conceito mais
restrito e, como visto em capítulos anteriores, insere-se dentro do conceito de
sustentabilidade.
Édis Milaré menciona que o princípio do desenvolvimento sustentável infere-se da
necessidade de um duplo direito, com bases no Direito Natural e no Direito Positivo, o direito
do ser humano de desenvolver-se e realizar suas potencialidades, individual e socialmente, e o
direito de assegurar aos seus sucessores as mesmas condições favoráveis. Acrescenta, ainda,
mencionando que nesse princípio, mais fortemente que em outros, evidencia-se a
reciprocidade entre direito e dever, porquanto o desenvolver-se e usufruir de um planeta
plenamente habitável não é apenas um direito, é um dever tanto das pessoas quanto da
sociedade155
.
Já para a sustentabilidade, J. J. Gomes Canotilho apresenta três dimensões:
interestatal (equidade entre os países ricos e os pobres), geracional (equidade entre os grupos
etários diferentes na mesma geração) e intergeracional (gerações presentes e futuras). Ainda,
sustentabilidade em sentido restrito (proteção de recursos em longo prazo) e em sentido amplo
(visa atender três dimensões: sustentabilidade econômica, social e ecológica)156
.
154
BRANDÃO, Luiz Carlos Kopes; SOUZA, Carmo Antônio de. O princípio da equidade
intergeracional. Planeta Amazônia: Revista Internacional de Direito Ambiental e Políticas Públicas, Macapá, v.
1, n. 2, p.163-175, jan. 2012. 155
MILARÉ, Édis. Princípios fundamentais do direito do ambiente. Revista Justitia, São Paulo, n. 59, p.134-151,
jan-dez/1998. Disponível em: <http://www.revistajustitia.com.br/revistas/w71d84.pdf>. Acesso em: 23 jun.
2017. 156
LEITE, José Rubens Morato; CANOTILHO, José Joaquim Gomes (org.) Direito constitucional ambiental
brasileiro. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 8-9.
73
Juarez Freitas, com seu olhar mais administrativista e técnico, afirma que a
sustentabilidade é a determinação ética e jurídico-institucional de sindicabilidade das escolhas
públicas, para afastar mitos comuns, falácias e o desalinhamento de políticas públicas, de
modo a se promover o desenvolvimento material e imaterial. E, por fim, pelo
desenvolvimento de atividades de baixa emissão de carbono, de modo que se atinja a premissa
do desenvolvimento como norteador da sustentabilidade e não o contrário157
. Visão bastante
interessante, pois envolve o desenvolvimento imaterial no conceito de sustentabilidade.
Correlacionando o desenvolvimento com justiça intergeracional, Ignacy Sachs
menciona que o crescimento econômico vem tendo seu sentido modificado da procura cega
do crescimento por si mesmo, para uma expansão das forças produtivas da sociedade com o
objetivo de alcançar os plenos direitos de cidadania para toda a população158
.
Ademais, a justiça intergeracional ambiental possui alguns princípios interessantes,
a exemplo da Responsabilidade Ambiental Intergeracional que cumpre, no sistema jurídico de
proteção do meio ambiente, a função preventiva. E por conta dessa função preventiva oferta
condições necessárias para reprimir as condutas que ameaçam a integridade do meio
ambiente, impondo aos agentes responsáveis, obrigações de mitigar os riscos ou, a depender
do caso, fazer cessar a atividade que os gerou159
.
Outro princípio, talvez mais importante ainda em termos de justiça ambiental
intergeracional, é o princípio da precaução, uma tutela antecipada do bem jurídico ambiental
frente à ameaça ou risco de dano irreversível. A equidade geracional se equilibra entre a
prevenção e a precaução enquanto princípios com viés intergeracional, segundo Weiss é bem
melhor prevenir o dano do que compensá-lo.
O fundamento da justiça intergeracional ou dos conflitos intergeracionais estão
presentes no judiciário brasileiro, principalmente em matérias de ordem ambiental,
relacionadas ao artigo 225, da Constituição, e seus incisos. Uma das decisões emblemáticas
em matérias ambiental foi o arguido na ADI 3.540 MC, de relatoria do Ministro Celso de
Mello, contra o antigo Código Florestal Brasileiro – Lei nº 4.771, de 15/09/1965,
especialmente seu art. 4º, parágrafos 1º a 7º160
. A ação direta arguiu a inconstitucionalidade
157
FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 32. 158
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond: 2009. p. 66. 159
BOLSON, Simone Hegele. A dimensão filosófico-jurídica da equidade intergeracional: reflexões sobre as
obras de Hans Jonas e Edith Brown Weiss. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n.
3575, 15 abr. 2013. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/24189>. Acesso em: 12 ago. 2017. 160
“Art. 4o A supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá ser autorizada em
caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em procedimento
administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto
74
dos referidos parágrafos. Fundamentando que era temática afeta ao inciso III do art. 225161
,
cabendo então ao STF preservar a integridade do meio ambiente, devido à prerrogativa de
metaindividualidade (trabalhada nesta dissertação como transindividualidade), sendo um
direito de terceira geração, consagrando o postulado da solidariedade, não cabendo, portanto,
a administração pública, mesmo diante de certos parâmetros, relativizar áreas
constitucionalmente protegidas162
.
§ 1
o A supressão de que trata o caput deste artigo dependerá de autorização do órgão ambiental estadual
competente, com anuência prévia, quando couber, do órgão federal ou municipal de meio ambiente, ressalvado o
disposto no § 2o deste artigo.
§ 2o A supressão de vegetação em área de preservação permanente situada em área urbana, dependerá de
autorização do órgão ambiental competente, desde que o município possua conselho de meio ambiente com
caráter deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente
fundamentada em parecer técnico
§ 3o O órgão ambiental competente poderá autorizar a supressão eventual e de baixo impacto ambiental, assim
definido em regulamento, da vegetação em área de preservação permanente.
§ 4o O órgão ambiental competente indicará, previamente à emissão da autorização para a supressão de
vegetação em área de preservação permanente, as medidas mitigadoras e compensatórias que deverão ser
adotadas pelo empreendedor
§ 5o A supressão de vegetação nativa protetora de nascentes, ou de dunas e mangues, de que tratam,
respectivamente, as alíneas "c" e "f" do art. 2o deste Código, somente poderá ser autorizada em caso de utilidade
pública.
§ 6o Na implantação de reservatório artificial é obrigatória a desapropriação ou aquisição, pelo empreendedor,
das áreas de preservação permanente criadas no seu entorno, cujos parâmetros e regime de uso serão definidos
por resolução do CONAMA.
§ 7o É permitido o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente, para obtenção de água,
desde que não exija a supressão e não comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação
nativa.” 161
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações. [...]
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;” 162
“Meio ambiente – Direito à preservação de sua integridade (CF, art. 225) – Prerrogativa qualificada por seu
caráter de metaindividualidade – Direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o
postulado da solidariedade – Necessidade de impedir que a transgressão a esse direito faça irromper, no seio da
coletividade, conflitos intergeneracionais – Espaços territoriais especialmente protegidos (CF, art. 225, § 1º,
III) – Alteração e supressão do regime jurídico a eles pertinente – Medidas sujeitas ao princípio constitucional da
reserva de lei – Supressão de vegetação em área de preservação permanente – Possibilidade de a administração
pública, cumpridas as exigências legais, autorizar, licenciar ou permitir obras e/ou atividades nos espaços
territoriais protegidos, desde que respeitada, quanto a estes, a integridade dos atributos justificadores do regime
de proteção especial – Relações entre economia (CF, art. 3º, II, c/c o art. 170, VI) e ecologia (CF, art. 225) –
Colisão de direitos fundamentais – Critérios de superação desse estado de tensão entre valores constitucionais
relevantes – Os direitos básicos da pessoa humana e as sucessivas gerações (fases ou dimensões) de direitos
(RTJ 164/158, 160-161) – A questão da precedência do direito à preservação do meio ambiente: uma limitação
constitucional explícita à atividade econômica (CF, art. 170, VI) – Decisão não referendada – consequente
indeferimento do pedido de medida cautelar. A preservação da integridade do meio ambiente: expressão
constitucional de um direito fundamental que assiste à generalidade das pessoas. [BRASIL. STF. ADI nº 3.540
MC. Relator: Ministro Celso de Mello. DJ de 3-2-2006. Brasília, 2006. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=387260>. Acesso em: 12 ago. 2017.]
75
Visualizados alguns pontos referentes à teoria da justiça intergeracional ambiental e
decisão da Corte Constitucional brasileira, discorre-se sobre a produção de biocombustíveis e
seu potencial de efetivação de uma justiça intergeracional no Brasil.
3.3 A PRODUÇÃO DE BIOCOMBUSTÍVEIS E SEU POTENCIAL DE EFETIVAÇÃO DE
UMA JUSTIÇA INTERGERACIONAL
Compreendidas algumas das teorias da justiça entre gerações, a teoria
intergeracional do meio ambiente, tenta-se, agora, responder a inquietação motivadora deste
capítulo: “a produção nacional de biocombustíveis realmente tem potencial de efetivar uma
justiça intergeracional (incluindo o aspecto ambiental)?” Para responder tal questionamento,
lança-se mão de alguns referenciais teóricos.
Eduardo Giannetti, em seu excelente livro “O valor do amanhã: um ensaio sobre a
natureza dos juros” discorre sobre o que chama de anomalias intertemporais, abordando o que
chama de armadilhas e de ilusões de ótica no caminhar da ação intertemporal consequente, ou
seja, até que ponto é válido subordinar o presente ao futuro ou o futuro ao presente?163
Nesse sentido, existem dois problemas similares que controlam o valor delegado ao
presente e ao futuro: a falta de visão temporal, ou miopia, envolve a atribuição de um valor
mais elevado ao que está próximo de nós no tempo (e por vezes no espaço), e o que está longe
– nesses parâmetros – recebe, em consequência, menor valoração164
.
O outro problema, contrário ao primeiro, é a hipermetropia, e ocorre quando há a
atribuição de um valor excessivamente elevado ao amanhã, em prejuízo dos interesses
presentes. Enquanto na miopia temporal se subestima o futuro, a hipermetropia subestima o
presente. A grande questão é: será que existe um equilíbrio estável entre os extremos?
Ironicamente é preciso se ter boa visão e saber analisar os momentos, assim acertando ao se
investir no presente ou no futuro, a cada impasse momentaneamente surgido165
.
Mas qual a correlação das ideias de Eduardo Giannetti e a política energética
brasileira, principalmente no que se refere aos biocombustíveis? Na ótica aqui proposta, a
possível efetivação da justiça intergeracional.
163
GIANNETTI, Eduardo. O valor do amanhã: ensaio sobre a natureza dos juros. São Paulo: Companhia das
Letras, 2005. 164
GIANNETTI, Eduardo. O valor do amanhã: ensaio sobre a natureza dos juros. São Paulo: Companhia das
Letras, 2005. 165
GIANNETTI, Eduardo. O valor do amanhã: ensaio sobre a natureza dos juros. São Paulo: Companhia das
Letras, 2005.
76
Melhor explicando, no estado da arte atual, investir em agrocombustíveis é mais
simples, existe uma cadeia produtiva estruturada, veículos adaptados, produtores ávidos por
incentivos governamentais para aumentar a produção; caso a economia brasileira se recupere
e cresça a valores mais consideráveis que a taxa atual, a demanda por combustível e energia
aumentará. Existe um panorama favorável.
Mas... Sim, existe um porém. Corre-se o risco de estar recaindo na miopia pregada
por Giannetti. As políticas atuais na seara dos biocombustíveis, como bem será detalhado
tecnicamente no capítulo 4, não estão sendo bem sucedidas na execução de seus fundamentos
constitucionais e urgem por uma adequada reestruturação.
Existem, de fato, propostas para efetuar alterações, entretanto elas são altamente
passíveis de contestação frente aos princípios norteadores da ordem econômica constitucional.
E o governo parece indeciso, ora parece ser favorável, ora volta atrás quanto à celeridade da
implementação das mudanças.
Nesse ínterim, corre-se o risco de, focando-se nas novas propostas, focar por
consequência nos agrocombustíveis, o que se coaduna com a redução dos GEE prevista nos
acordos internacionais, mas não promove, de fato, uma sustentabilidade material. Nem, por
conseguinte, é capaz de promover, nos moldes propostos, justiça intergeracional.
Entretanto, há o receio de que, não se tomando uma medida urgente na seara dos
combustíveis em geral, tal inação estatal reflita em escassez energética num futuro breve. E
realmente, o risco da falta de combustíveis no Brasil tem sido debatido nos últimos anos,
inclusive objeto de audiência pública da Comissão de Minas e Energia da Câmara de Minas e
Energia em 10/12/2012, com a finalidade de debater a segurança do abastecimento nacional
de combustíveis. Tema tratado de forma recorrente em relatórios ministeriais.
É importante, também, ponderar que o abastecimento nacional de combustíveis é
considerado, nos termos do parágrafo 1º do art. 1º da Lei 9.847/99, de utilidade pública166
.
Então não se pode recair na hipermetropia de Giannetti, porque na prática, o tema é
166
MME. RENOVABIO – Nota explicativa. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis/programas/renovabio/documentos/apresentacoes/renovabio-detalhamento-da-proposta-
25/08/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-
1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_redirect=http%3A%2
F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Frenovabio-detalhamento-da-
proposta-
25%2F08%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26p_p_mode%3Dvie
w%26p_p_col_id%3Dcolumn-1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=32739680>. Acesso em: 29 ago.
2017.
77
excessivamente estratégico para se olhar apenas para o futuro e se colocar em risco o
presente.
Diante disso, também ganha relevo o fato de o princípio da equidade
intergeracional já foi regulamentado, no Brasil, em sede de normas infraconstitucionais, no
Estatuto do Idoso, na Lei da Política Nacional de Educação Ambiental, Lei n.º 9.795, de 27 de
abril de 1999, e na Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei n.º 12.305, de 2 de
agosto de 2010.
Vistos os fatores acima, percebe-se que a proteção jurídica das futuras gerações
ganha, aos poucos, espaço no ordenamento jurídico brasileiro. Então é possível, a depender
das diretrizes da nova política energética que aqui se desenha, que essa também se positive.
É pertinente, ainda, a reflexão sobre qual é a maior dificuldade atual? Primeiro, é
tarefa complicada convencer o governo a investir em desenvolvimento, soma-se a essa
resistência, aquela quanto à preservação ao meio ambiente. Em um momento de crise é mais
fácil se optar pelo “crescimento a qualquer custo” – geralmente um custo social e ambiental.
Segundo, há uma dificuldade atual em se equilibrar as finanças, e os esforços estão nessa
tarefa concentrados, como então pensar em fazer poupança para o futuro?
Vieira de Andrade afirma que os sociólogos descrevem a sociedade atual, pós-
industrial, como uma sociedade de risco ou até como uma sociedade do desaparecimento na
medida em que, por força do seu próprio movimento, para a destruição das condições de vida
naturais e sociais das pessoas, na medida em que corre o perigo de passar, ou transita
efetivamente, da autorreferência para a autodestruição167
.
A despeito da positivação de uma justiça intergeracional e das garantias em relação
à justiça intrageracional, o risco detectado por Vieira de Andrade é extremamente pertinente e
atual, pois as diretrizes dos próximos anos ainda estão sendo definidas e mudanças bruscas,
aos poucos, concretizando-se.
Nessa perspectiva, pensa-se que, em um curto intervalo de tempo, as políticas
propostas para os biocombustíveis podem se concretizar, retirando de cena políticas mais
coerentes constitucionalmente. E colocando em xeque até o próprio entendimento sobre as
políticas públicas, enquanto espécie de padrão de conduta que assinala uma meta a alcançar,
geralmente uma melhoria em alguma característica econômica, política ou social da
comunidade.
167
VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 5. ed.
Coimbra: Almedina, 2012.p. 62.
78
As políticas públicas configuram, então, como grande fomentadoras de
desenvolvimento e passíveis de concretizar desde o desenvolvimento econômico, até uma
justiça mais complexa como a intergeracional, caso fosse a proposta.
Questiona-se: por que a crise é um óbice? A crise implica a mudança de
paradigmas, tendo como um ponto positivo: aperfeiçoar as falhas dos Governos anteriores; e
como um ponto negativo: a tendência a desconstrução verificada atualmente no Brasil.
Para isso, é pertinente entender que há duas vertentes de interpretação das raízes da
crise: a primeira dá ênfase a uma deficiência do quadro regulatório, imperfeição que teria
levado aos excessos de alavancagem incorridos pelo sistema financeiro mundial. A segunda
vertente enfatiza os grandes desequilíbrios macroeconômicos internacionais. É evidente que
as duas correntes estão, ao menos parcialmente, corretas, mas são, sobretudo,
complementares. O desequilíbrio macroeconômico não teria sido tão profundo, nem teria se
sustentado por tanto tempo, sem o desenvolvimento extraordinário do mercado financeiro. O
endividamento e o grau de alavancagem mundial não teriam atingido os extremos a que
chegaram sem o desequilíbrio macroeconômico internacional. Enfim, qualquer que seja a
visão da crise, o pano de fundo é o panorama maior da governança global168
.
Mas sobre a crise mundial e os municípios do Norte e Nordeste, interessante é a
defesa do economista Francisco Nabuco, ao afirmar que a maioria dos municípios do Norte e
Nordeste do Brasil está em crise independente de qualquer problema do capitalismo em escala
mundial. De fato, esses municípios não estão integrados em níveis mínimos ao capitalismo169
.
Portanto, existiriam nuances regionais em qualquer justiça intergeracional
alcançada, mas para concretizá-la, é preciso ser pensado um mecanismo mais eficaz para se
efetivar a justiça intergeracional. No Brasil a poupança previdenciária, demonstra que não é
um mecanismo eficaz.
168
VEIGA, José Eli da; VIANNA, Sérgio Besserman; ABRANCHES, Sérgio. A sustentabilidade do Brasil. In:
GIAMBIAGI, Fábio; BARROS, Octávio de. Brasil pós-crise: agenda para a próxima década.p. 304-323. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2009. 169
BARRETO NETO, Francisco Nabuco de A. Bioenergia e exclusão regional: a não política nacional
agroenergética e os girassóis do RN. 2009. 362 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Regional; Cultura e
Representações) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2009. p. 256.
79
4 A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O
DESENVOLVIMENTO DOS BIOCOMBUSTÍVEIS E O ESTADO
CONSTITUCIONAL EM CRISE
Como se pretende adentrar na seara das políticas públicas, no presente capítulo, faz-
se necessário, primordialmente, conceituá-las. É válida a ressalva que múltiplos são os
conceitos de políticas públicas, e a maioria apresenta sobre elas uma visão coerente, que vão
desde um fenômeno de uma atividade administrativa a uma ação governamental, entre outros.
Diversos são os bons conceitos de “políticas públicas”, entretanto, é interessante a
definição de Fábio Konder Comparato: são programas de ação governamental, voltados à
concretização dos direito fundamentais, envolvendo atividades de planejamento, regulação de
comportamentos, organização da burocracia estatal, distribuição de benefícios e a tomada de
impostos, em um processo complexo170
.
E válida é a descrição de política pública a partir da articulação das dimensões
política e “operativa” da gestão pública, tendo por marco estruturante o direito, linguagem
constitutiva do aparelho estatal e do relacionamento do Estado com a sociedade171
.
Outro ponto interessante é que o marco regulatório de determinada política pública
não a esgota, sendo apenas uma expressão jurídica dessa política. A política pública necessita
de planos de ação bem mais complexos para se concretizar no plano fático172
.
Nos dois primeiros tópicos deste capítulo, serão abordados aspectos da estrutura das
políticas públicas voltadas para a produção nacional dos biocombustíveis no Brasil. No tópico
4.1 serão tratados o Programa Nacional do Álcool e o Programa Nacional de Produção e Uso
do Biodiesel, devido à sua expressão e força nacional.
Posteriormente, no tópico 4.2 serão estudados aspectos na Política Nacional de
Combustíveis Florestais, um projeto de lei inovador na seara dos biocombustíveis brasileiros,
e aspectos relativos ao Programa RENOVABIO, programa que pretende reacender a
importância dos biocombustíveis brasileiros em virtude do destaque internacional alcançado,
principalmente com o Acordo de Paris.
170
COMPARATO, Fábio Konder. Ensaio sobre o juízo de inconstitucionalidade de políticas públicas. Revista de
informação legislativa, v. 35, n. 138, p. 39-48, abr./jun. 1998. Disponível em:
<http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/364>. Acesso em: 11 jul. 2017. 171
Maria Paula Bucci afirma que o debate acerca das políticas públicas perturba o cenário jurídico uma vez que
as categorias tradicionais do direito público, principalmente o direito administrativo, por permanecerem presas a
um esquema positivado ignora os componentes do processo político; e o direito público tradicional carece de
uma sistematização jurídica que identifique as categorias e instrumentos mais aptos a funcionalizar as escolhas
políticas. [BUCCI, Maria Paula Dallari (org.). Políticas Públicas: reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo:
Saraiva, 2006. p. 9]. 172
BUCCI, Maria Paula Dallari (org.). Políticas Públicas: reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo:
Saraiva, 2006. p. 11.
80
No tópico 4.3 será tecida uma análise prática das políticas públicas dos
biocombustíveis no Brasil, serão ultrapassadas as barreiras dos dados, que apesar de
igualmente importantes e bastante utilizados nesta dissertação, por seu caráter mais analítico,
técnico e impessoal, não transpassam a emoção das visitas, das entrevistas, trazendo o fator
qualitativo para encerrar esta pesquisa – o ambiente explorado neste trabalho são os
assentamentos da região do Mato Grande, no estado brasileiro do Rio Grande do Norte.
Ainda no item 4.3 será buscado um referencial teórico mais voltado à seara das
políticas públicas, em uma busca de um fator multidisciplinar de análise, e não apenas
jurídico. Após o referido referencial, serão tecidas as conclusões e resultados pertinentes ao
estudo aqui realizado, buscando sintetizar os conhecimentos firmados durante esta
dissertação.
Há ainda alguns anexos, nos quais foram tecidos breves comentários aos projetos de
lei aqui abordados, em uma proposta de produto final material para esta dissertação; e
imagens do plantio de girassóis para a produção de biodiesel ocorrida na região do Mato
Grande.
4.1 AS PRIMEIRAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE BIOCOMBUSTÍVEIS NO BRASIL
A primeira política pública voltada especificamente para a produção de
biocombustíveis no Brasil foi o Programa Nacional do Álcool – PROÁLCOOL, em 1975,
seguido pelo Programa de Produção e Uso dos Biocombustíveis – PNPB, em 2005. Apesar de
ambas se caracterizarem como políticas públicas voltadas para o desenvolvimento dos
biocombustíveis no âmbito nacional, essas possuem muitas distinções.
O PROÁLCOOL, como será visto em sequência, foi inaugurado antes da
promulgação da Constituição Federal de 1988 e em função do momento histórico do seu
surgimento e das ideias políticas e, por consequência, das prioridades governamentais da
época, prosperou em um formato que se enquadra mais no modelo de crescimento econômico
– conceituado nos capítulos anteriores desta dissertação. Nota-se que o Programa é reflexo
das ideias desenvolvimentistas em vigência à época.
Já o PNPB tem suas diretrizes estabelecidas em 2005, bem após 1988, portanto, traz
em si aplicações práticas de ideias constitucionalistas positivadas pelo constituinte na Carta
Magna, mais voltadas ao desenvolvimento em seu sentido mais amplo – conceito também
trabalhado nos capítulos anteriores desta dissertação. Tais ideias se manifestam desde seus
81
estudos preparatórios até as normas infraconstitucionais que positivaram sua forma de atuação
e organização na cadeia produtiva do biodiesel nacional.
Destacam-se os objetivos do PNPB como expressões do desenvolvimento
multifacetado, ao afirmar que seu propósito é a implementação de forma sustentável, técnica e
economicamente, a produção e uso do Biodiesel, alicerçada na inclusão social e no
desenvolvimento regional, por meio da geração de emprego e renda173
. As demais diretrizes
desse Programa também serão abordadas adiante.
Após o estudo dessas políticas de fomento aos biocombustíveis que, mesmo não
sendo tão antigas, possuem um intervalo cronológico maior para avaliação, serão trazidas à
baila as políticas de fomento aos biocombustíveis mais modernas, com projetos de lei ainda
carentes de aprovação e, portanto, merecedores de atenção.
4.1.1 Programa Nacional do Álcool – PROÁLCOOL
Com o chamado primeiro choque do petróleo, em outubro de 1973, o cenário
energético internacional e mesmo o nacional mudou sensivelmente. O preço do barril de
petróleo se elevou de tal maneira, que a busca por outras fontes alternativas de energia foi
reiniciada.
Em 1974, foi concluído e entregue ao Conselho Nacional de Petróleo o estudo
nominado de “Fotossíntese como fonte de energia” 174
, com participação do Instituto do
Açúcar e do Álcool – IAA175
, e considerado uma das bases do Programa Nacional do Álcool –
PROÁLCOOL. Some-se esse ao relatório “Etanol como combustível”, em 1975, do
Ministério da Indústria e Comércio, e efetivamente se iniciou o Proálcool176
.
As bases legais do PROÁLCOOL foram determinadas por meio do Decreto nº
76.593, de 14 de novembro de 1975. Entre as finalidades da criação do Programa estão:
diminuir a dependência externa do petróleo e suas divisas, em virtude do contexto da crise
internacional do petróleo, quando da sua criação; produzir álcool anidro a partir do cultivo da
173
Para maiores informações: MME. PNPB – objetivos e diretrizes. Disponível em:
http://www.mme.gov.br/programas/biodiesel/menu/programa/objetivos_diretrizes.html>. Acesso em: 11 jul.
2017. 174
O estudo “Fotossíntese” teve papel crucial na ascensão do etanol como biocombustível fortemente presente
na matriz energética brasileira, pois elevou o álcool de subproduto do açúcar à fonte de combustível estratégica. 175
O Instituto do açúcar e do Álcool – IAA foi criado em 1933, no governo do Presidente Getúlio Vargas, e
desde a sua criação tentou desenvolver políticas de suporte ao etanol, entretanto após a fundação da Petróleo
Brasileiro S..A. – PETROBRAS, o governo volta seus olhos para esta nascente indústria. 176
BIODIESELBR. A verdadeira história do Proálcool. Disponível em:
<https://www.biodieselbr.com/proalcool/historia/proalcool-historia-verdadeira.htm>. Acesso em 11 jul. 2017.
82
cana-de-açúcar; e promover a geração de emprego e renda para o país, diminuindo suas
disparidades (nos termos do art. 3º, parágrafo único e suas alíneas, do Decreto nº
76.593/1975).
Fernando Lagares Távora afirma que durante toda a existência do PROÁLCOOL, o
Programa passou por muitas disputas. No nível burocrático estava o Ministério da Indústria e
Comércio, seu gerenciador inicial, a Petrobras enquanto sua operacionalizadora, o Ministério
das Minas e Energias no papel de planejador energético, e o Ministério da Agricultura como o
administrador das políticas da matéria-prima, revezaram-se em disputas pelo desenvolvimento
e pela condução das políticas para o álcool brasileiro (nos termos do art. 3º do Decreto nº
76.593/1975, alguns desses foram definidos como responsáveis pela implantação do
Programa) 177
.
O PROÁLCOOL se desenvolveu em cerca de cinco fases distintas. A primeira fase
corresponde ao período entre a sua criação, em 1975, e o ano de 1979, caracterizada como
fase de impulso, tendo o governo como mola propulsora por meio dos subsídios e
financiamentos reservados ao setor. A segunda fase, entre os anos de 1980 e 1986178
,
caracteriza-se pelo fomento à produção de álcool com a finalidade de substituir a gasolina em
razão da ocorrência do segundo choque do petróleo, essa fase foi marcada, sobretudo, pela
forte intervenção estatal, por meio de isenções de impostos, e passou a ser compulsória a
adição de 15% do álcool à gasolina.
A terceira fase do PROÁLCOOL ocorreu a partir de 1987, e foi marcada pelo
princípio da decadência do programa. O crescimento econômico desacelerou e o preço do
barril do petróleo diminuiu. Como no período o Brasil começou a aumentar sua produção
interna de óleo bruto, associada a uma queda do preço internacional do açúcar, o etanol
novamente retorna para um segundo plano.
177
TÁVORA, Fernando Lagares. Centro de estudos da Consultoria do Senado – História e Economia dos
Biocombustíveis no Brasil. Brasília: Centro de estudos/CONLEG/SENADO, abril/2011 (Texto para Discussão nº
89). p. 17. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-
estudos/textos-para-discussao/td-89-historia-e-economia-dos-biocombustiveis-no-brasil>. Acesso em: 12 jul.
2017. 178
Destaca-se entre as metas estabelecidas a produção de 10,7 bilhões de litros de álcool em 1985. Para
viabilizar o alcance dessa e de outras metas, o Governo apoiou a produção de álcool a partir de matérias-primas
diversificadas, como o babaçu, o sorgo sacarino e a mandioca, todavia não se firmaram. Dessa feita, as pesquisas
resultaram na primeira patente de biodiesel e de querosene vegetal de aviação, registrada pelo engenheiro e
cearense Expedito Parente. [TÁVORA, Fernando Lagares. Centro de estudos da Consultoria do Senado –
História e Economia dos Biocombustíveis no Brasil. Brasília: Centro de estudos/CONLEG/SENADO, abril/2011
(Texto para Discussão nº 89). p. 19. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-
legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-discussao/td-89-historia-e-economia-dos-biocombustiveis-no-brasil>.
Acesso em: 12 jul. 2017].
83
No aspecto ambiental, o PROÁLCOOL destaca-se pelos números consideráveis
quanto à diminuição das emissões de gás carbônico, estima-se que durante os anos de duração
do Programa, cerca de 110 milhões de toneladas de dióxido de carbono deixaram de ser
emitidas na atmosfera. Além da redução das emissões do monóxido de carbono e da
eliminação do chumbo – chumbo tetraetila, utilizado como aditivo para gasolina179
.
É interessante se ter a compreensão dos motivos do fomento à produção de cana-de-
açúcar em detrimento a outros cultivares, como a mandioca e o milho, por exemplo. A cana-
de-açúcar possui o retorno mais elevado para os agricultores por hectare plantado180
.
Outro ponto é que a maior produção de açúcar ou de álcool no país oscila conforme o
seu preço no mercado internacional, principalmente. Quando a produção de açúcar se torna
financeiramente menos atrativa, aumenta-se a produção do álcool e vice-versa. E pelo fato de
as etapas da produção do álcool e do açúcar diferirem apenas a partir da obtenção do suco,
que poderá ser fermentado para a produção de um produto ou do outro, a adaptação à
volatilidade do mercado é mais simples181
.
A alternância entre a produção do açúcar e do álcool pode ser considerada também
um dos fatores pelo qual o preço o etanol combustível não é muito acessível, mesmo no
Brasil, um dos maiores (senão o maior) produtor mundial de etanol a partir da cana-de-açúcar.
Após quatro décadas da sua criação, o PROÁLCOOL incentivou a geração de
aproximadamente um milhão de empregos diretos e mais do que esse número de empregos
indiretos, desses estima-se que 80% estão concentrados na área agrícola. A economia gerada
pela substituição da gasolina pelo álcool entre os anos de 1976 e 2004 fez o Brasil economizar
mais de 61 bilhões de dólares e 121 bilhões de dólares foram economizados se considerados
os juros da dívida externa182
.
Mas quais os motivos que levaram o Programa ao desaparecimento? Um conjugado
de fatores levou o Proálcool à extinção, entre eles se destacam: malsucedidos planos
econômicos, declaração de moratória da dívida externa, inflação, diversas greves; a
administração da Petrobras ao alegar prejuízos em decorrência do PROÁLCOOL; a baixa
179
BIODIESELBR. A verdadeira história do Proálcool. Disponível em:
<https://www.biodieselbr.com/proalcool/historia/proalcool-historia-verdadeira.htm>. Acesso em 11 jul. 2017. 180
BIODIESELBR. Pró-álcool – Programa Brasileiro de Álcool. Disponível em:
<https://www.biodieselbr.com/proalcool/pro-alcool/programa-etanol.htm>. Acesso em: 11 jul. 2017. 181
BIODIESELBR. Pró-álcool – Programa Brasileiro de Álcool. Disponível em:
<https://www.biodieselbr.com/proalcool/pro-alcool/programa-etanol.htm>. Acesso em: 11 jul. 2017. 182
BIODIESELBR. A verdadeira história do Proálcool. Disponível em:
<https://www.biodieselbr.com/proalcool/historia/proalcool-historia-verdadeira.htm>. Acesso em 11 jul. 2017.
84
tecnologia dos carros movidos a álcool quando comparados aos movidos à gasolina; a falta do
etanol em várias cidades ao mesmo tempo; a diminuição do preço do barril de petróleo183
.
Em 1988, iniciou-se o fim da intervenção estatal no setor sucroalcooleiro, em um
processo longo de saída do Estado da atividade, que apenas se findou por completo em 1999,
marcando uma desaceleração do Programa184
. Nesse contexto de retirada do Estado do setor,
o IAA foi extinto em 1990185
. Entretanto, eventos como a Eco-92 e o Protocolo de Kyoto,
assinado em 1997 e ratificado em 1999, lançaram novamente os olhares, agora mundiais,
sobre o etanol brasileiro.
A Lei nº 8.723, de 28 de outubro de 1993, tornou obrigatória a adição de 25% de
etanol à gasolina. E no período de 1994 a 1999, tanto os preços do álcool quanto os preços do
açúcar não sofreram mais intervenção estatal, após a extinção do IAA, sendo o período mais
crítico do Programa186
. Nos anos 2000, cresceu a números vistosos a produção de gás natural
veicular – GNV, impactando na redução da utilização do etanol nos veículos nacionais.
Inicia-se uma nova fase de renascimento do etanol, a quarta fase do PROÁLCOOL, a
partir do lançamento, em 2003, dos carros bicombustíveis ou flex-fuel; o fato de serem
movidos a álcool ou a gasolina causa um nova modificação no mercado dessa matriz
energética. Outro fator de fomento à cadeia produtiva do etanol foi a geração de
bioeletricidade com o bagaço da cana-de-açúcar.
Fernando Távora chega a uma conclusão importante acerca do fim do
PROÁLCOOL, afirmando que a extinção do Programa não foi uma decisão de nenhum
governo, configurando-se mais como insuficiência de organização e estratégia do Estado
brasileiro somada a uma conjuntura desfavorável dos preços do etanol. Entretanto, ainda
afirma o autor, o Estado não pode cometer o mesmo erro desse Programa em outros
momentos históricos187
.
Importante ainda ver que desde que o País adotou o programa do PROÁLCOOL,
conseguiu substituir 2,5 bilhões de barris de gasolina, correspondendo a cerca de 25% de
183
TÁVORA, Fernando Lagares. Centro de estudos da Consultoria do Senado – História e Economia dos
Biocombustíveis no Brasil. Brasília: Centro de estudos/CONLEG/SENADO, abril/2011 (Texto para Discussão nº
89). p. 21-30. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-
estudos/textos-para-discussao/td-89-historia-e-economia-dos-biocombustiveis-no-brasil>. Acesso em: 12 jul.
2017. 184
Ibidem. p. 22. 185
Por ação da Lei nº 8.029/1990 e do Decreto nº 99.288/1990. 186
Portaria do Ministério da Fazendo nº 189, de 5 de julho de 1995 e nº 275, de 16 de outubro de 1998. 187
TÁVORA, Fernando Lagares. Centro de estudos da Consultoria do Senado – História e Economia dos
Biocombustíveis no Brasil. Brasília: Centro de estudos/CONLEG/SENADO, abril/2011 (Texto para Discussão nº
89). Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-
para-discussao/td-89-historia-e-economia-dos-biocombustiveis-no-brasil>. Acesso em: 12 jul. 2017.
85
nossas reservas provadas de petróleo e condensados. No ritmo atual, 127 milhões de barris
serão substituídos a cada ano188
.
Segundo Emília Moreira, o PROÁLCOOL teve acentuado caráter não inclusivo e foi
responsável pela intensificação do processo de concentração da propriedade da terra, pelo
crescimento do trabalho assalariado de mulheres e crianças, pela retração da produção de
alimentos e aumento da fome, pela intensificação do processo de êxodo rural, pela adoção do
trabalho escravo e pela degradação ambiental relacionada à atividade monocultora da cana-
de-açúcar189
. Em um nítido exemplo de política que adota o modelo do desenvolvimento a
qualquer custo e, como se percebe, esse custo se mostrou muito alto.
Atualmente, em consequência das metas ambientais determinadas pelo Acordo de
Paris, o segmento sucroalcooleiro (principalmente) e setores do Governo têm demonstrado
interesse em reavivar o Programa, pois o etanol brasileiro, conhecimento internacionalmente,
possui grande apelo sustentável nesse contexto de cobrança por maiores reduções na emissão
dos GEEs – inaugurando uma nova fase.
Todavia, o setor de sucroalcooleiro tem enfrentado dificuldades em relação a
investimentos para aumento da produtividade, capacidade de armazenamento, renovação dos
canaviais e novas tecnologias. Aponta-se a necessidade de auxilio da Embrapa, para melhorar
esse ponto, por meio de pesquisas em tecnologia da produção – principalmente na
modificação genética das espécies de cultivares. Dados afirmam que a produção nacional de
etanol está em torno de 30 bilhões de litros e o consumo em torno dos 29 bilhões de litros,
sendo necessária a ampliação da oferta, pela proximidade do seu limiar190
.
Vistas a história e economia relacionadas ao PROÁLCOOL, bem como seus
aspectos controversos, seus pontos positivos, e o panorama atual da produção nacional, inicia-
se o estudo do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel, o segundo biocombustível
mais utilizado no país.
188
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 48. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017. 189
MOREIRA, Emília. Capítulos da Geografia Agrária da Paraíba. João Pessoa: Universitária-UFPB, 1997. p.
120. 190
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 48. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017.
86
4.1.2 Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel – PNPB
Em primeiro lugar, conceitua-se o que é o biodiesel, segundo a Lei nº 11.097, de 13
de janeiro de 2005 (conhecida por “Lei do Biodiesel”), em seu inciso XXV, do art. 6º: um
biocombustível derivado de biomassa renovável, para uso em motores a combustão interna
com ignição por compressão ou para geração de outro tipo de energia, que possa substituir
parcial ou totalmente combustível de origem fóssil191
.
Em 2004, o governo lançou o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel
(PNPB). Inicialmente, o arcabouço regulatório do PNPB conta com duas leis e diversos atos
normativos infralegais para inserir o biodiesel na matriz energética com mais segurança.
A primeira lei editada no contexto do PNPB foi a Lei nº 11.097/05 (a “Lei do
Biodiesel”), responsável por introduzir o biodiesel na matriz energética, alterando também a
Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997 (a “Lei do Petróleo”) e a Lei nº 9.847, de 26 de outubro
de 1999 (a “Lei de Política Energética Nacional”).
Entre as diversas disposições da Lei nº 11.097/05, estavam: estabelecer os prazos e
percentuais de biodiesel a serem adicionados ao óleo diesel comercial; os critérios para
modificação desses percentuais pelo Conselho Nacional de Política Energética – CNPE;
dispositivos sobre a prioridade de utilização do biodiesel proveniente da agricultura familiar;
instituir a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, como
reguladora da indústria dos biocombustíveis, entre outros. Percebe-se que os dispositivos
contidos nessa lei eram então cruciais para a concretização do PNPB, positivando as diretrizes
gerais do programa, em algumas linhas.
A outra lei do marco inicial do PNPB é a Lei nº 11.116, de 18 de maio de 2005192
,
tratando sobre a matéria do registro especial de produtores e importadores de biodiesel na
Secretaria da Receita Federal, e sobre a incidência do PIS/PASEP e da COFINS193
sobre as
receitas provenientes da venda do biodiesel. Inaugurando um regime tributário
complementado pelo Selo Combustível Social, a ser detalhado abaixo. Ainda sobre
191
BRASIL. Lei Federal nº 11.097, de 13 de janeiro de 2005. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11097.htm>. Acesso em: 13 jul. 2017. 192
BRASIL. Lei Federal nº 11.116, de 13 de maio de 2005. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/Lei/L11116.htm>. Acesso em: 13 jul. 2017. 193
Cobrados apenas uma vez do produtor industrial do biodiesel, este podendo optar por uma alíquota fixa (valor
por metro cúbico de biodiesel comercializado) ou por um percentual incidente sobre o preço do produto. Os
coeficientes de redução para a alíquota específica poderão ser diferenciados em função da matéria-prima
utilizada, da região onde foi produzida e do tipo de fornecedor. [BRASIL. Lei Federal nº 11.116, de 13 de maio
de 2005. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/Lei/L11116.htm>. Acesso
em: 13 jul. 2017.]
87
CONFINS, tem-se o Decreto nº 5.297, de 6 de dezembro de 2004194
, alterado pelos Decretos
nº 6.458, de 14 de maio de 2008195
, e nº 7.768, de 27 de junho de 2012196
, em virtude de
alterações nas alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e CONFINS incidentes na
produção de biodiesel.
Esse marco regulatório desenvolvido tem por princípios: desenvolver uma política de
inclusão social com o aproveitamento de oleaginosas de acordo com as diversidades
regionais, gerando concomitantemente segurança de abastecimento para o então novo
combustível brasileiro, e garantindo qualidade para o consumidor; buscando ainda ser
competitivo frente ao petrodiesel197
.
Os princípios constitucionais são claramente abarcados pelos princípios do PNPB,
entre eles o princípio do desenvolvimento regional, o princípio da função social da
propriedade, o princípio do desenvolvimento sustentável, o princípio do pleno emprego, da
dignidade da pessoa humana, entre outros.
Na pesquisa “A produção de biodiesel no assentamento de Canudos/RN:
perspectivas e limites da inclusão social”, Suzana Maia Girão tece algumas considerações
interessantes situadas no limiar entre o PROÁLCOOL e o PNPB: infelizmente o modelo
antecessor do biodiesel, o etanol, não agregou valores sociais capazes de gerar inclusão social
da mão de obra que laborava nas lavouras de cana-de-açúcar, hoje a busca por outras fontes
de energia renovável é guiada por valores que buscam incluir socialmente as pessoas que
estão na base do processo produtivo desse combustível, ou seja, os pequenos agricultores.
Anos depois o PNPB é instituído na tentativa de sanar essa lacuna, em virtude da elevada
exclusão social que assolava o Brasil198
.
Ainda nesse sentido, Suzana Girão afirma que o governo procurou evitar com o
biodiesel o que ocorreu com o etanol, no tocante aos desgastes sociais relacionados à
monocultura. Já quanto à diversificação da matéria-prima julga ser um desafio, mas permite a
194
BRASIL. Decreto nº 5.297, de 6 de dezembro de 2004. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5297.htm>. Acesso em: 13 jul. 2017. 195
BRASIL. Decreto nº 6.458, de 14 de maio de 2008. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Decreto/D6458.htm#art1>. Acesso em 13 jul. 2017. 196
BRASIL. Decreto nº 7.768, de 27 de junho de 2012. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7768.htm#art1>. Acesso em 13 jul. 2017. 197
MME. Biodiesel: o novo combustível do Brasil – Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel.
Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/programas/biodiesel/galerias/arquivos/biodiesel/Apres_MinistraME_06-12-04.pdf>.
Acesso em: 13 jul. 2017. 198
GIRÃO, Suzana Maia. A produção de biodiesel no assentamento Canudos RN: perspectivas e limites da
inclusão social. 2011. 90 f. Dissertação (Mestrado em Meio Ambiente, Cultura e Desenvolvimento) -
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2011. p. 22.
88
descentralização da cadeia produtiva, englobando os mais diversos agricultores. Quanto a ser
uma política pública, ela infere que serve para proteger os elos mais frágeis: agricultores de
regiões mais pobres e os consumidores.
Sobre o viés do desenvolvimento sustentável presente no PNPB, é importante traçar
um paralelo com o pensamento de Ignacy Sachs, mostrando como o PNPB possui uma base
constitucional fortemente atrelada à forma como foi pensada a sua estrutura. Sachs afirma que
uma das tarefas operacionais primordiais é disponibilização de biotecnologia moderna para os
pequenos fazendeiros, de modo a capacitá-los a participarem de uma segunda Revolução
Verde, entretanto – complementa ainda – que para se atingir esse patamar, uma série de
políticas complementares é necessária, de forma a proporcionar o justo acesso à terra, ao
conhecimento, ao crédito e ao mercado, perpassando ainda pela necessidade de uma melhor
educação rural199
.
Ainda nesse diapasão, são necessários esforços direcionados em favor do
desenvolvimento de uma química verde, como complemento ou até como substituto pleno da
petroquímica, trocando energia fóssil por biocombustíveis200
. Em apertada síntese, essa é uma
das ideias de Sachs sobre como deveria ser orientado um desenvolvimento sustentável, por
entender que ele passa necessariamente por novas estruturas produtivas, tanto no sentido de
priorizar a produção em pequenas propriedades cultivadas por pequenos agricultores, tanto no
sentido de modificação da matriz energética mundial.
Gráfico 7. Pilares do PNPB201
.
199
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond: 2009. p. 34. 200
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond: 2009. p. 34. 201
MME. Biodiesel: o novo combustível do Brasil – Programa Nacional de Produção e uso do Biodiesel.
Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/programas/biodiesel/galerias/arquivos/biodiesel/Apres_MinistraME_06-12-04.pdf>.
Acesso em: 13 jul. 2017.
89
Mas quais os propósitos do PNPB? Implantar um projeto energético
autossustentável, com preço competitivo, qualidade certificada, suprimento garantido,
gerando renda com inclusão social. Conforme o Gráfico 7, o Programa desenvolve uma base
tecnológica, aliando a seara agrícola, a industrial e o uso do combustível. Sobre três pilares: o
ambiental, o social e o mercado, para desenvolvimento do biodiesel como forma de energia.
Para fomentar a produção de biodiesel de forma a atingir os objetivos almejados pelo
PNPB, foram necessárias várias medidas indutoras por parte do Governo Federal, para além
do disposto na Lei nº 11.116/2005, a exemplo do regime tributário diferenciado. Uma das
medidas é a concessão do Selo combustível social que concede ao seu detentor o benefício de
menores cargas tributárias, vantagens na concessão de financiamentos pelo BNDES e
participação prioritária nos leilões de biodiesel realizados pela ANP202
.
Merece destaque um dos critérios do Selo combustível social: as aquisições de
matéria-prima do agricultor familiar feitas pelo produtor de biodiesel são de 50% para a
região Nordeste e Semiárido, 30% para as regiões Sudeste e Sul e 10% para as regiões Norte e
Centro-Oeste., conforme definido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário. Os maiores
percentuais de aquisição definidos para o Nordeste e o Semiárido refletem uma atenção
especial do Programa a essas regiões onde os trabalhadores rurais vivenciam uma situação de
maior vulnerabilidade203
.
Percebe-se que o PNPB é uma referência em termos de política pública ao
contemplar os princípios constitucionais em todo o seu desenvolvimento, ideias, estruturação
básica. Todavia, ocorreram diversos óbices no seu trajeto, que mitigaram grande parcela de
suas ideologias de base, a serem tratados com maior grau de profundidade no item 4.3.
Atualmente, as leis fundadoras do marco regulatório do biodiesel foram modificadas,
somando-se a elas o disposto na Lei nº 13.033, de 24 de setembro de 2014, e na Lei nº 13.263,
de 23 de março de 2016. Outra lei que influenciou o PNPB foi a Lei nº 12.651, de 2012, que
estabeleceu o Novo Código Florestal Brasileiro.
202
[MDA. Instrução Normativa n° 01, de 05 de julho de 2005. Disponível em:
<http://www.lex.com.br/doc_395583_INSTRUCAO_NORMATIVA_N_1_DE_5_DE_JULHO_DE_2005.aspx>
. Acesso em: 13 jul.] Merece destaque ainda a Instrução normativa nº 2, que dispôs sobre critérios e
procedimentos relativos ao enquadramento de projetos de produção de biodiesel ao selo combustível social.
Disponível em: <http://www.mda.gov.br/sitemda/sites/sitemda/files/user_arquivos_627/IN%2002%20-
%202005%20MDA.pdf>. Acesso em: 13 jul. 2017. 203
Vide art. 2º da Instrução normativa do MDA nº 01/2005. [MDA. Instrução Normativa n° 01, de 05 de julho
de 2005. Disponível em:
<http://www.lex.com.br/doc_395583_INSTRUCAO_NORMATIVA_N_1_DE_5_DE_JULHO_DE_2005.aspx>
. Acesso em: 13 jul.]
90
A Lei nº 13.033, de 2014 dispôs sobre a adição obrigatória de biodiesel ao óleo
diesel fóssil para 8%, em até doze meses após a data de promulgação desta Lei; 9%, em até
vinte e quatro meses após a data de promulgação desta Lei; 10%, em até trinta e seis meses
após a data de promulgação dessa Lei204
.
Já a Lei nº 13.623/2016 alterou o cronograma de aumento do teor de biodiesel
misturado ao óleo diesel proveniente do petróleo, disposto na Lei nº 13.033/2014, a partir de
2017: até março de 2017, a mistura se dá em 8%; até março de 2018, no percentual de 9%; e
até março de 2019, em 10%205
. Entretanto os produtores de biodiesel estão pressionando para
antecipar os percentuais do biodiesel adicionado ao diesel de 8% (atualmente) para 10%, já
que os patamares definidos legalmente podem ser flexibilizados.
Quanto às inovações trazidas pelo Novo Código Florestal Brasileiro aplicáveis ao
PNPB, estão entre elas a criação do Cadastro Ambiental Rural, estabelecendo que é
obrigatório o cadastramento de todos os imóveis rurais no Sistema Nacional de Cadastro
Ambiental Rural – SICAR, ou seja, é uma regulação ambiental rural.
Dessa forma, uma modificação foi realizada na Portaria do Selo Combustível Social
de modo a alertar sobre a necessidade de os imóveis rurais que participam do PNPB e do Selo
Combustível Social a regular o cadastro ambiental no CAR. Trazendo também, pela primeira
vez, regulamentação quanto aos procedimentos para concessão do selo quando houver
aquisição de material de origem animal (sebo bovino). Outras normas técnicas do Selo
Combustível social foram alteradas no texto da Portaria, mas não o modificam
significativamente206
.
Mais recentemente ainda, foram realizadas propostas de alteração nas regras da
concessão dos benefícios obtidos por meio do Selo Combustível Social, concretizando-se na
Portaria nº 512, da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento
Agrário – SEAD, de 5 de setembro de 2017207
. Segundo o próprio MDA, as medidas visam à
desburocratização e à modernização do Selo Social do Biodiesel.
204
BRASIL. Lei nº 13.033, de 24 de setembro de 2014. Disponível em:
<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2014/lei-13033-24-setembro-2014-779372-normaatualizada-pl.html>.
Acesso em: 13 jul. 2017. 205
BRASIL. Lei nº 13.263, de 23 de março de 2016. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/L13263.htm>. Acesso em: 13 jul. 2017. 206
MDA. Portaria MDA nº 337, de 18 de setembro de 2015. Disponível em:
<https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=303619>. Acesso em: 20 jul. 2017. 207
MDA-SEAD. Portaria nº 512, de 5 de setembro de 2017. Disponível em:
<http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/servlet/INPDFViewer?jornal=1&pagina=5&data=06/09/2017&captchafield
=firistAccess>. Acesso em: 8 set. 2017.
91
Entre as regras alteradas, têm-se os percentuais de aquisição de matéria-prima
proveniente do agricultor familiar para concessão e manutenção do Selo combustível social,
que passaram a ser de 15% para as aquisições provenientes das regiões Norte e Centro-Oeste;
30% para as aquisições provenientes das regiões Sudeste, Nordeste e Semiárido; e 40% para
as aquisições provenientes da região Sul. Percebe-se que os valores foram alterados para se
adequar melhor à realidade produtiva de cada região.
O Selo Combustível Social pode ser uma importante ferramenta para a agricultura
familiar e para a gestão estratégica do país, uma vez que não se trata apenas de viabilizar a
compra da produção de oleaginosas; em um pensamento macro, a produção dessas
oleaginosas nas pequenas propriedades devem estar integradas em sistemas produtivos,
proporcionando condições da família de produtores se fixarem no campo, ao garantir a
compra de sua produção.
Segundo dados do Censo Agropecuário de 2006, a agricultura familiar corresponde a
35% do produto interno bruto nacional, absorve 40% da população economicamente ativa do
país. Fixar essa população no campo é um desafio que segue diversas gestões governamentais,
pois cerca de dois milhões de pessoas migraram do campo para os centros urbanos nos
últimos anos. E como a agricultura familiar é responsável por grande parte do abastecimento
interno de alimentos, é importante, entre outros, para o controle da inflação dos alimentos
consumidos pela população brasileira208
.
Atualmente, o Selo Combustível Social beneficia mais de 70 mil famílias. São mais
de 40 empresas produtoras de biodiesel detentoras do Selo e mais de 100 cooperativas
habilitadas para comercialização no âmbito do PNPB, de acordo com dados do Ministério do
Desenvolvimento Agrário209
. E mesmo assim, ainda correm murmúrios de seu encerramento.
Apesar dos incentivos governamentais à diversificação das matérias-primas,
predomina no Brasil o biodiesel proveniente da soja, por ser a lavoura da soja a mais
mecanizada, produzida em latifúndios monocultores, em geral, acaba possuindo maior
competitividade e rentabilidade. Apenas a inovação tecnológica permitirá diversificar a matriz
de matérias-primas como almejado pelo PNPB, tornando mais competitivos os cultivares
208
MDA. O que é agricultura familiar. Disponível em: <http://www.mda.gov.br/sitemda/noticias/o-que-
%C3%A9-agricultura-familiar>. Acesso em: 20 jul. 2017. 209
MDA. Mudanças na portaria do Selo Combustível Social. Disponível em:
<http://www.mda.gov.br/sitemda/mudan%C3%A7as-na-portaria-do-selo-combust%C3%ADvel-social>. Acesso
em: 20 jul. 2017.
92
regionais. Nesse ponto, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA tem
papel fundamental ao pesquisar e desenvolver tecnologia produtiva210
.
Sobre a soja, interessante a exposição de Bruno Galveas Laviola, da Embrapa, no
mais recente Relatório de atividades da Comissão Permanente sobre Mudanças Climáticas, do
Congresso Nacional, do ano de 2016, ao afirmar que apesar de o Brasil possuir alto potencial
como país com vocação agrícola, havendo diversidade de matérias-primas em diversas
regiões, ao se analisar as matérias-primas oleaginosas, há que se analisar também a tríade do
domínio tecnológico, da escala de produção, e da boa logística de distribuição.
Nessas perspectivas, a soja é a que atende unicamente esses três critérios e é
cultivada em diferentes regiões do País. Apesar da hegemonia, há um prazo de validade.
Estudos da Embrapa apresentaram que em 2030 haverá que se utilizar de 35 a 50% da soja
produzida no Brasil, o que enseja a necessidade de uso de outras matérias-primas de agora,
para que se obtenha o domínio tecnológico e se organize a produção211
.
Segundo Paula Pedroti, a concentração do peso de uma única matéria-prima na
produção do biodiesel é um dos principais motivos do governo relutar em aumentar
rapidamente a porcentagem da mistura do biodiesel ao diesel, pois o primeiro se torna muito
vulnerável às variações que ocorrem no mercado da oleaginosa (como aumento de preços,
quebra de safra, etc.). O mais acertado é incentivar a diversificação para a mitigação dos
riscos produtivos212
.
Relembrando o acima estudado PROÁLCOOL, há uma coerência em se iniciar
atualmente a diversificação da matriz energética dos biocombustíveis, uma vez que se
demorará um tempo relativamente longo para se consolidar a produção, tanto em termos
econômicos, ambientais, de regulação jurídica e, principalmente, de desenvolvimento do
aparato tecnológico. Lembrando que o PROÁLCOOL, entre idas e vindas, completou 40 anos
em 2015. Como o PNPB data do biênio 2004/2005, é um Programa que muito tem a
amadurecer e a contribuir com o desenvolvimento do energético, ambiental, social e
econômico do Brasil.
210
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 47. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017. 211
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 56. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017 212
PEDROTI, Paula Maciel. Desenvolvimento e inclusão social: o caso do arranjo político-institucional do
Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel. In: GOMIDE, Alexandre de Ávila; PIRES, Roberto Rocha
C. (ed.). Capacidades estatais e democracia: arranjos institucionais de políticas públicas. Brasília: Ipea, 2014. p.
213-236.
93
Interessante, por fim, constatar o aspecto ambiental sob os moldes enfocados
internacionalmente nas Conferências sobre o meio ambiente: calcula-se que em função do
programa do biodiesel, segundo o mais recente Relatório de atividades da Comissão
Permanente sobre Mudanças Climáticas, do Congresso Nacional, do ano de 2016, o Brasil
deixou de emitir 43 MtCO2eq, correspondendo ao plantio de 312 milhões de árvores (esse
número em plantio de dendê ocuparia 2,2 milhões de hectares, área aproximada do estado de
Sergipe213
.
Apesar desses e de outros resultados, o PNPB é alvo de críticas. Segundo Paula
Pedroti, as críticas se concentram em virtude de umas das expectativas criadas em torno do
PNPB era a de que o programa gerasse oportunidades para os agricultores familiares,
principalmente do Nordeste, por meio da mamona, entretanto, apesar dos ajustes e dos
esforços, o programa foi incapaz de incluir significativamente essa parcela de agricultores
familiares. A inclusão se deu em maior parte quanto aos agricultores do Sul e do Centro-
Oeste214
.
Ainda, das matérias-primas adquiridas pelas empresas certificadas, é provável que
apenas a soja comprada dos agricultores familiares seja utilizada no fabrico de biodiesel.
Então, em virtude do Selo Combustível Social e suas vantagens, as empresas adquirem
quantidades mínimas de matérias-primas da agricultura familiar, porém, não necessariamente,
é preciso que se fabrique biodiesel com elas215
.
São apontados, em suma, três pontos críticos principais do PNPB: a necessidade de
fomento à organização produtiva (investindo no fortalecimento da capacidade de organização
dos agricultores via formação de cooperativas; reforçar e dar continuidade às ações do
Ministério de Desenvolvimento Agrário nos Projetos Polos do Biodiesel; facilitar o acesso
dos agricultores familiares ao crédito); investimentos em pesquisa e desenvolvimento de
oleaginosas (fornecendo também insumos e capacitação técnica aos agricultores, aumento dos
investimentos em pesquisa para promover a real diversificação de variedades de oleaginosas,
e a partir daí incentivar o cultivo mais economicamente viável); e por último investir em
infraestrutura e em capacitação (adotar políticas públicas destinadas à melhoria logística,
213
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 50. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017. 214
PEDROTI, Paula Maciel. Desenvolvimento e inclusão social: o caso do arranjo político-institucional do
Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel. In: GOMIDE, Alexandre de Ávila; PIRES, Roberto Rocha
C. (ed.). Capacidades estatais e democracia: arranjos institucionais de políticas públicas. Brasília: Ipea, 2014. p.
213-236. 215
Ibidem. p. 228.
94
facilitando o acesso das empresas aos agricultores e ao escoamento da produção; no Nordeste
e Semiárido, investir em irrigação e recuperação do solo juntamente com a capacitação dos
agricultores) 216
.
Interessante é a crítica tecida por Samuel Max Gabbay, ao mencionar que os
benefícios do programa energético brasileiro são incontestáveis, alavancando programas
assistencialistas como o Bolsa Família, de forma que a agricultura familiar fosse fomentada a
fim de fornecer a matéria-prima para a fabricação dos biocombustíveis; entretanto a pressa
por resultados foi prejudicial. Continuando a crítica ao afirmar que os problemas logísticos
demonstram o despreparo do governo e dos produtores privados em fornecer biodiesel
suficiente para acompanhar o consumo de combustíveis217
.
Será trazido ao estudo a situação da Petrobras Biocombustíveis – PBIO, por ter
possuído, desde sua constituição, uma grande receptora de incentivos e receitas do Governo
Federal, na época do Programa de Aceleração de Crescimento – PAC 2, destinados à
promoção dos biocombustíveis.
- A Petrobras Biocombustível – PBIO
Por motivos de gestão, entre outros, a Petrobras está deixando integralmente a
produção de biocombustíveis, vendendo ativos e participações nas produções tanto de etanol,
quanto de biodiesel, conforme previsto em seu Plano Estratégico (Plano Estratégico 2017-
2021). Já fechou, em 2015, a Planta de Biocombustíveis da Refinaria Clara Camarão, no Rio
Grande do Norte. Em dezembro de 2016, encerrou as atividades no município de Quixadá,
estado do Ceará. E não será parte integrante do Programa RENOVABIO, apesar de ter se
manifestado em consulta pública de forma contrária ao Programa.
Desde 2010, a companhia estatal começou a investir em biocombustíveis e apenas
registrou prejuízos, somando-os, a Petrobras perdeu mais de R$ 3,04 bilhões; e de janeiro a
dezembro de 2016, as perdas ultrapassaram R$ 1 bilhão. Segundo seu plano estratégico, a
estatal pretende vender todos os ativos de etanol e biodiesel até 2021.
216
PEDROTI, Paula Maciel. Desenvolvimento e inclusão social: o caso do arranjo político-institucional do
Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel. In: GOMIDE, Alexandre de Ávila; PIRES, Roberto Rocha
C. (ed.). Capacidades estatais e democracia: arranjos institucionais de políticas públicas. Brasília: Ipea, 2014. p.
213-236. 217
GABBAY, Samuel Max; MAIA, Vinicius Fernandes Costa. O paradigma da regulação do biodiesel. In:
XAVIER, Yanko Marcius de Alencar et al (Org.). Direito do petróleo, gás natural e biocombustíveis: estudo em
homenagem à professora Helenice Vital. Natal: Edufrn, 2013. p. 133-153. (Série direito dos recursos naturais e
da energia).
95
Já não havia uma massiva participação estatal na política e produção brasileira de
biocombustíveis, com a saída da Petrobras, clarifica-se ainda mais a situação do
abastecimento nacional dos biocombustíveis: renegada pelo Estado e deixada aos livres
interesses da iniciativa privada nacional e multinacional.
Vistos aspectos do PROÁLCOOL e do PNPB, serão iniciadas as discussões acerca
do que aqui denominamos de novas políticas públicas relativas aos biocombustíveis
brasileiros, traçando comentários sobre as suas diretrizes e as tendências verificadas no
momento peculiar vivenciado pelo Brasil.
4.2 AS RECENTES POLÍTICAS PÚBLICAS DE FOMENTO À PRODUÇÃO DE
BIOCOMBUSTÍVEIS
Aqui denominamos de novas políticas públicas de fomento à produção de
biocombustíveis, as políticas hodiernamente em processo de aprovação (ou desaprovação) e
que ainda não possuem dados suficientes para análise dos seus resultados iniciais.
Todavia, mesmo que não haja resultados, podem ser estudadas diretrizes das políticas
de fomento na seara dos biocombustíveis, principalmente no contexto constitucional e frente a
outras normas e políticas públicas infraconstitucionalmente ambientadas.
Propõe-se, em função do recorte temático desta dissertação, o estudo de apenas duas
políticas: a Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais, aprovada pela Comissão de
Minas e Energia em 25 de abril de 2017, e tramitando em caráter conclusivo, e do Programa
RENOVABIO, ainda não aprovado pelo atual Governo, mas alvo de intensos debates na
mídia.
Por que estudar as políticas ainda em fase de estruturação do marco regulatório?
Primeiro porque as metas do Acordo de Paris, ratificado pelo Brasil, são ambiciosas. E são
percebidos esforços dos órgãos do Governo em tentar viabilizar o cumprimento dos
compromissos nele firmados. Possivelmente, o marco regulatório das políticas aqui
mencionadas deve estar, por conseguinte, em consonância com o pactuado. Deve estar de
acordo, ainda, com o Programa Combustível Brasil. Faz-se necessário, portanto, iniciar a
análise, também voltada para a coerência com sistema jurídico218
.
218
No setor de energia, tem sido debatido intensamente como alcançar, até o ano de 2030, 45% de participação
de energias renováveis na matriz energética e 10% de ganhos de eficiência no setor elétrico. Ainda, a meta
nacional prevê o aumento da participação de bioenergia sustentável na matriz energética brasileira para 18%,
também até 2030, aumentando a parcela de biocombustíveis avançados e o uso biodiesel. [CONGRESSO
NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças Climáticas) p. 3.
Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso em: 20 jul. 2017.]
96
O segundo ponto é que, estando o projeto ainda em tramitação, é possível
encaminhar sugestões via Portal e-Democracia219
, da Câmara dos Deputados brasileira.
Concretizando a nova democracia digital, que utiliza da internet e de outras ferramentas
digitais de forma a ser um espaço de expressão da opinião popular, principalmente no que
cinge às políticas públicas. A ferramenta em comento é importante porque o povo não é
ouvido apenas no momento do voto, nem por meio dos instrumentos jurídicos determinados.
A população pode expressar em tempo real sua opinião, casos, relatos, opinar e sugerir
modificações, e precisa cada vez mais se apropriar desses instrumentos para uma aproximação
real com o poder que emana do próprio povo220
.
Quanto ao Plano Combustível Brasil, esse foi apresentado pela Petrobras em maio de
2017, e é um programa do Governo Federal para buscar um mercado de combustíveis com
oferta compatível com o crescimento da demanda. Deve ser capaz de atender o consumidor
brasileiro, com preço competitivo e qualidade atestada, devendo possuir um ambiente
regulatório objetivo. Tendo como valores a transparência, a excelência, a inovação, a
previsibilidade, a estabilidade do marco regulatório, a sustentabilidade e responsabilidade
socioambiental. Estimula ainda a entrada de novos atores no setor pautado na livre
concorrência221
.
4.2.1 Política Nacional de Biocombustíveis Florestais
O deputado Luiz Fernando Faria, do Partido Progressista de Minas Gerais– PP-MG,
propôs o Projeto de Lei nº 1.291, em 27 de abril de 2015222
, tendo por objetivo a ampliação da
participação dos biocombustíveis florestais na matriz energética brasileira, promovendo o
cultivo de florestas plantadas, com potencial energético para a produção de biocombustíveis
sustentáveis.
219
CAMARA DOS DEPUTADOS. Portal E-democracia. Disponível em:
<https://edemocracia.camara.leg.br/home>. Acesso em: 7 ago. 2017. 220
A população precisa se apropriar desses canais também para aperfeiçoá-los enquanto plataforma de
comunicação com o governo, e para cobrar um Estado mais transparente e eficiente. Uma das grandes conquistas
brasileiras foi a Lei de Acesso à informação e o portal da transparência. A Lei nº 12.527, de 18 de novembro de
2011, está disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm>. Acesso
em: 21 jul. 2017. 221
MME. Programa Combustível Brasil. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/documents/10584/24442563/2017+05+10+Combustivel+Brasil+vFinal.pdf/8e7d6447-
c2f3-47c0-8c15-f3f066a54c60>. Acesso em: 22 jul. 2017. 222
O Projeto de Lei em comento está disponível no site da Câmara dos Deputados. [CAMARA DOS
DEPUTADOS. Ficha de Tramitação do Projeto de Lei nº 1.291, de 24 de abril de 2015. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=1215701>. Acesso em: 8 ago.
2017.]
97
O art. 2º do referido PL traz alguns conceitos importantes, como o de
“biocombustíveis florestais”, considerados combustíveis sólidos, líquidos ou gasosos,
produzidos a partir da biomassa florestal, como lenha, carvão vegetal, briquetes, licor negro,
etanol celulósico, entre outros, tidos como fontes estratégicas e renováveis de bioenergia, em
rol meramente exemplificativo.
Em confronto com o art. 6º, inciso XXIV, da Lei nº 9.478/97, a Lei do Petróleo,
define um conceito mais generalista (“biocombustíveis” são derivados de biomassa, tendo o
potencial de substituir total ou parcialmente, os combustíveis fósseis derivados do petróleo e
do gás natural, seja em motores a combustão, seja em outras formas de geração de energia).
O inciso IV do art. 2º do PL em comento traz a definição de “florestas plantadas com
potencial energético”, como aquelas florestas plantadas, cuja matéria-prima, obtida do seu
manejo e colheita, bem como seus resíduos florestais possam, segundo vontade e critério do
empreendedor, ser processados como biomassa para fins de produção de energia, visando à
produção de biocombustíveis florestais.
Entre os objetivos da pretensa Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais (art.
3º) estão: ampliar a participação dos biocombustíveis florestais na matriz energética brasileira
e promover o cultivo de florestas plantadas com potencial energético e a produção sustentável
de biocombustíveis florestais. Constituindo parte da consecução do Plano Setorial de
Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de
Baixa Emissão de Carbono na Agricultura – Plano ABC (de Agricultura de Baixa Emissão de
Carbono) e do Plano Nacional de Mudança do Clima – PNMC.
Os princípios da Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais estão dispostos no
art. 4º e seus incisos, correspondendo a: livre exercício da atividade econômica, visando à
redução das desigualdades sociais e regionais; e o plantio florestal em áreas degradadas,
objetivando sua recuperação; assim, promovendo e desenvolvendo uma matriz energética
limpa e diversificada, ampliando as fontes renováveis de energia limpa, em especial dos
biocombustíveis florestais; a competitividade, inclusive em âmbito mundial, da cadeia
produtiva de florestas plantadas com potencial energético.
Nos termos da Constituição, a Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais se
propõe a garantir a preservação das florestas, da fauna e da flora, conforme inciso VIII do art.
23; compromete-se também com a proteção ao meio ambiente e combate à poluição, na
medida em que promove o reflorestamento, nos termos do inciso VI do art. 23; compromete-
98
se com o desenvolvimento sustentável, quando, ao aumentar a área de florestas, promoverá a
captura dos GEEs.
Propõem-se biocombustíveis florestais inseridos em uma ordem econômica e
financeira constitucional, conforme o art. 170, na medida em que se busca não somente o
disposto em seu inciso VI (da proteção ao meio ambiente), mas também diversos outros
princípios da ordem econômica constitucional, como a livre concorrência e a busca do pleno
emprego.
Ainda em termos constitucionais, a Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais
relaciona-se intimamente com o art. 187 da Constituição Federal, que trata da política
agrícola, percebe-se que inicialmente a lei em comento traz em seu escopo, em caráter
perfunctório, instrumentos creditícios e fiscais, incentivo à pesquisa e a tecnologia, seguro
agrícola, habilitação para o trabalhador rural.
Voltando à redação do PL, o art. 7º deu o mesmo tratamento das atividades agrícolas,
em termos de normas ambientais, às atividades da cadeia produtiva de florestas plantadas com
potencial energético (compreendendo a plantação, a recondução, o manejo, a colheita, a
reforma, o armazenamento, a transformação, o transporte e a comercialização de seus
produtos e derivados, incluindo os biocombustíveis florestais).
Complementando, a proposta expõe, em seu art. 13, que os recursos oriundos das
taxas de reposição florestal serão obrigatoriamente revertidos, a taxa mínima de 60%, para
programas de fomento florestal para projetos de até dois mil hectares por proprietário, o
objetivo é o de formação de florestas plantadas com potencial energético; e de 10% como
compensação mediante plantio de florestas com potencial energético para empreendimentos
sujeitos a recolhimento das taxas. Ainda, em seu parágrafo único, a taxa de reposição florestal
não incidirá sobre os produtos oriundos de florestas plantadas como potencial energético.
O texto também permite o cultivo de florestas com potencial energético em áreas de
preservação permanentes consolidadas (art. 9º), desde que sua reforma não resulte em
destoca, preservando-se a integridade do solo através de cultivo mínimo. Esse plantio, no
entanto, deverá ser informado no Programa de Regularização Ambiental (PRA) por meio de
declaração expedida pelo empreendedor, acompanhada de anotação de responsabilidade
técnica emitida por engenheiro florestal ou agrônomo.
Segundo o art. 11, a fiscalização da comercialização e do consumo dos
biocombustíveis florestais será feita pelos órgãos competentes do Poder Público e se dará nos
pontos de recepção das unidades consumidoras do produto.
99
Ainda segundo o projeto, a União, os estados e o Distrito Federal manterão
conjuntamente um sistema nacional de informações sobre florestas com potencial energético.
Tal sistema será constituído por um banco de dados sob gestão do Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento em articulação com o Sistema Nacional do Meio Ambiente –
SISNAMA.
Para o PL lograr êxito, falta apenas a análise e a aprovação do projeto pelas
comissões de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural; de Finanças e
Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, uma vez que tramita em caráter
conclusivo e que já obteve aprovação da Comissão de Minas e Energia.
Os motivos alegados para a proposição desse Projeto de Lei vão desde os acordos
firmados nas Conferências das Partes – COP, tema aqui já bastante retomado; passando pela
redução do rol de combustíveis verdes, pela Empresa de Pesquisa Energética – EPE (dando
ênfase ao papel negativo de poluente do carvão e das usinas termelétricas).
Portanto, visando a não dependência dos combustíveis fósseis pelo Brasil, em virtude
de serem excessivamente poluentes, não renováveis e de alto custo, a Política Nacional de
Biocombustíveis Florestais pretende se firmar, caminhando paralelamente aos outros
biocombustíveis. Ressaltando o exemplo da siderurgia nacional, movida energeticamente à
base de carvão vegetal, que figura no rol dos biocombustíveis florestais especificados nesse
Projeto de Lei.
Ressalta-se, ainda, o seu potencial papel de gerador de emprego e renda – papel
socioeconômico –, podendo esse tipo de floresta ser utilizada para fins industriais, de
construção civil, além do energético (biomassa florestal). No aspecto ambiental, as florestas
energéticas são potenciais redutores do aquecimento global, agindo na captura dos GEE’s,
potenciais conservadoras da fertilidade do solo e da manutenção dos recursos hídricos.
A Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais não está isolada no ordenamento
jurídico brasileiro. Ao observar o seu projeto de lei, infere-se que ele se coaduna com o
Decreto nº 8.375, de 11 de dezembro de 2014, que define a Política Agrícola para Florestas
Plantadas223
.
O Decreto em questão estabelece como princípios da Política Agrícola de Florestas
Plantadas a produção de bens e serviços florestais visando ao desenvolvimento social e
econômico do país e a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas (art. 3º), no mesmo
diapasão dos princípios disciplinados pelo Projeto de Lei nº 1.291/ 2015.
223
BRASIL. Decreto nº 8.375, de 11 de dezembro de 2014. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Decreto/D8375.htm>. Acesso em: 8 ago. 2017.
100
Os objetivos da Política Agrícola de Florestas Plantadas são aumentar a produção e a
produtividade; promover a utilização do potencial produtivo de bens e serviços econômicos
das florestas plantadas; contribuir para a diminuição da pressão sobre as florestas nativas;
melhorar a renda e a qualidade de vida no meio rural, notadamente em pequenas e médias
propriedades rurais; estimular a integração entre produtores rurais e agroindústrias que
utilizem madeira como matéria-prima.
Todavia, o Projeto de Lei em trabalho peca por apenas mencionar objetivos,
mecanismos, não trazendo em seu corpo textual formas de concretização do que se pretende.
Como ele faz parte de uma política pública ainda em fase de articulação, pode ser que
posteriormente ele precise ser modificado, ou que seja trazido em resoluções e portarias
regulamento mais técnico para viabilizar a sua implantação.
Ainda em termos infraconstitucionais, relaciona-se expressamente com a Lei nº
8.171, de 17 de janeiro de 1991, que dispõe sobre a Política Agrícola Nacional, bem mais
abrangente que os diplomas normativos aqui expostos, trazendo inúmeros princípios, ações e
instrumentos da política agrícola. E que a política de biocombustíveis florestais, por ser uma
proposta prática inserida em uma política maior, deve buscar atuar em consonância com os
preceitos por ela definidos224
.
Em uma análise estrutural, a Política Nacional de Biocombustíveis Florestais, apesar
de em um primeiro momento causar estranheza e soar como retrocesso ambiental devido à
utilização de carvão vegetal, lenha, entre outros biocombustíveis nessa linha; tem bases
coerentes, afinal é melhor a boa gestão energética do potencial de florestas plantadas do que,
por exemplo, ocorrer a inundação de milhares de hectares de florestas, como ocorreu com a
usina hidrelétrica de Belo Monte; ou o contínuo uso de termelétricas.
Outro aspecto importante é que o PL está inserido em um contexto de uma política
mais ampla, que lhe dará suporte, caso haja sua aprovação. No que concerne ao arcabouço
legislativo, está em consonância, como exposto, com os preceitos constitucionais.
Quanto às estatísticas, as florestas plantadas, no Brasil, têm aumentado
consideravelmente de número e de extensão, conforme Gráfico 8, a seguir, trazendo dados
obtidos por dois órgãos diferentes, mostrando ainda que as principais espécies plantadas são o
eucalipto e o pinus.
Os setores econômicos das florestas plantadas defendem os investimentos na área,
como é o caso da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA, que emitiu o
224
BRASIL. Lei nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8171.htm>. Acesso em: 8 ago. 2017.
101
relatório: “Plantio de Eucalipto no Brasil: mitos e verdades”, enfatizando diversos pontos
positivos do plantio dessa espécie (mesmo sob o formato da monocultura), dentre eles:
consumo de água menor que o da cana-de-açúcar e do café (p. 11), e perda de solo pela erosão
menor que em plantios de milho, pastagem e cana-de-açúcar (p. 13)225
.
Defendendo o plantio do eucalipto de forma a compor sistemas agroflorestais, em
que o uso da terra e dos recursos naturais combina a utilização de espécies florestais, agrícolas
e/ou a criação de animais, em uma mesma área, de maneira simultânea ou escalonada no
tempo. Ressaltando como vantagens para o produtor: aumento da renda, maior variedade de
produtos e serviços, melhoria da alimentação do homem do campo, redução do risco de
perdas totais, redução dos custos de plantio, melhoria da distribuição da mão de obra rural, e
redução da necessidade de capinas226
.
Já como vantagens biológicas, apontam-se: melhor ocupação da área; aumento da
matéria orgânica; melhoria das propriedades do solo; retenção e conservação de água no solo;
controle da erosão; aumento da produtividade por unidade de superfície; redução das
variáveis microclimáticas; diminuição dos riscos de perdas de produção; uso adequado do
sombreamento; e agregação de valores. Para o sistema como um todo, são vantagens:
ampliação da estação de pastejo; maior incremento no peso dos animais, na produção de leite
e lã; e aumento na taxa de reprodução227
.
225
CNA. Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil. Planto de eucalipto no Brasil: mitos e verdades.
Brasília: CNA, 2011. Disponível em: <http://www.canaldoprodutor.com.br/sites/default/files/mitos-e-verdades-
low.pdf>. Acesso em: 21 jul. 2017. 226
CNA. Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil. Planto de eucalipto no Brasil: mitos e verdades.
Brasília: CNA, 2011. Disponível em: <http://www.canaldoprodutor.com.br/sites/default/files/mitos-e-verdades-
low.pdf>. Acesso em: 21 jul. 2017. p. 17. 227
Ibid., p. 18.
102
Gráfico 8. Área com florestas plantadas no Brasil228
.
Entre os questionamentos de Ignacy Sachs está: “como conservar escolhendo-se
estratégias corretas de desenvolvimento em vez de simplesmente multiplicarem-se as reservas
supostamente invioláveis?” 229
Pode ser que, dependendo da forma que se conduza a Política
Nacional dos Biocombustíveis Florestais, esse tipo de ecossistema antrópico ajude-nos a
responder o questionamento acima.
Por fim, de fato os biocombustíveis florestais podem ser uma alternativa para o
desenvolvimento energético brasileiro, mas ainda são necessários projetos, estudos, testes,
para ver a viabilidade prática de tais ideias. Na seara dos biocombustíveis não existem
soluções milagrosas, para que se consiga visualizar a viabilizar de aparentes boas ideias, elas
têm de ser postas em prática sob a forma de testes, demanda tempo e muitos aportes de
recursos financeiros, os resultados podem ser razoáveis ou não. Afinal, quantos anos não se
levaram até a Petrobras desenvolver o know-how em tecnologia para exploração do petróleo
em águas ultraprofundas até atingir a camada do Pré-sal? Quanto não foi gasto!
Desenvolver uma política energética, principalmente em um país com as dimensões
do Brasil e com os problemas históricos que ele possui, apesar de parecer clichê e senso
228
Áreas com florestas plantadas no Brasil. Disponível em:
<http://sistemafamato.org.br/portal/famato/bioenergiamt/palestras/palestra-14-9-JOAO-ANTONIO.pdf >.
Acesso em: 21 jul. 2017. 229
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond: 2009. p. 32].
103
comum, é um terreno muito incerto, flutuante, vulnerável às influências externas, às pressões
internacionais. Mas inegavelmente é uma área estratégica para o desenvolvimento da
população, do futuro e do Estado, que precisa ser pensada e repensada com antecedência para
que sejam evitados colapsos.
4.2.2 Programa RENOVABIO 2030
Atualmente, como bem avaliado por Yanko Marcius de Alencar Xavier, as políticas
públicas voltadas para a produção do etanol são consideradas fracas frente ao crescimento do
mercado para os derivados da cana-de-açúcar e à possibilidade de substituição natural da
gasolina, especialmente com o advento dos carros flex. Não há incentivos suficientes para
plantar, produzir e comercializar etanol, o que resultaria em uma maior oferta desse produto
para o mercado, além de custos menores, ao contrário: atualmente, a gasolina ainda é o
combustível mais vantajoso para o consumidor final230
.
Nesse contexto de ausência de políticas públicas, o Governo Federal, em outubro de
2016, lançou a iniciativa RENOVABIO. O Ministério de Minas e Energia expõe o
RENOVABIO como uma política de Estado, possuindo como objetivos traçar uma estratégia
conjunta de reconhecimento do papel estratégico de todos os biocombustíveis na matriz
energética brasileira, de modo a favorecer a segurança energética nacional e diminuir as
emissões dos GEE’s231
.
No período de 15 de fevereiro e 20 de março de 2017, foi realizada consulta pública
sobre o RENOVABIO, seus objetivos, valores e diretrizes estratégicas, frisando a importância
e os desafios da pauta dos biocombustíveis. A consulta obteve a contribuição de várias
entidades e órgãos232
.
230
XAVIER, Yanko Marcius de Alencar et al. Biofuel Regulation in Brazil. In: XAVIER, Yanko Marcius de
Alencar et al. Energy Law in Brazil: oil, gas and biofuels. Switzerland: Springer, 2015. p. 133-154. 231
Para maiores informações fornecidas pelo Ministério de Minas e Energia, consultar a página oficial. [MME.
RENOVABIO. Disponível: <http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-
combustiveis-renovaveis/programas/renovabio/principal>. Acesso em: 22 jul. 2017.] 232
MME. RENOVABIO – Diretrizes estratégicas para biocombustíveis – consulta pública. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/web/guest/consultas-
publicas?p_p_id=consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p
_p_mode=view&p_p_col_id=column-
1&p_p_col_count=1&_consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet_consultaId=26&_consultapublicae
xterna_WAR_consultapublicaportlet_mvcPath=%2Fhtml%2Fpublico%2FdadosConsultaPublica.jsp>. Acesso
em: 22 jul. 2017.
104
Em 8 de junho de 2017, foi lançada a Resolução nº 14/2017 do Conselho Nacional de
Política Energética – CNPE233
, fixando as diretrizes dessa nova iniciativa que tem por
finalidade impulsionar a indústria dos biocombustíveis no Brasil. E criando os Comitês de
Abastecimento de Etanol – CMAE e de Biodiesel – CMAB234
.
Os referidos Comitês têm por objetivos: acompanhar a balança entre a oferta e a
demanda de etanol e do biodiesel; acompanhar o balanço entre a oferta e a demanda de
gasolina e de diesel; reduzir assimetrias de informação entre os agentes de mercado; discutir
estratégias para garantir o abastecimento para o ciclo-Otto (etanol) e para o Ciclo-Diesel; e
encaminhar propostas para aperfeiçoamento do mercado (art. 2º e art. 5º).
A Resolução CNPE nº 14/2017 criou também o Grupo de Trabalho RENOVABIO,
para apresentar no prazo de até noventa dias da publicação da resolução, medidas necessárias
para o aprimoramento do marco legal dos biocombustíveis (arts. 6º e 7º).
A título de objetivos, após a consulta pública, o RENOVABIO propõe fornecer uma
importante contribuição para o cumprimento dos Compromissos Nacionalmente
Determinados – NDC pelo Brasil no Acordo de Paris; promover a expansão dos
biocombustíveis na matriz energética, com regularidade do abastecimento de combustíveis; e
assegurar previsibilidade para o mercado de combustíveis, induzindo ganhos de eficiência
energética e de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa na produção,
comercialização e uso de biocombustíveis.
Percebe-se, dos seus objetivos, que o Programa foi lançado no intuito de aproveitar o
disposto no Acordo de Paris para fomentar a produção brasileira de biocombustíveis, pois se
visualizou o cenário internacional ideal para buscar apoio para o setor, e sendo uma
possibilidade para convencer ou pressionar o governo por uma eventual aprovação. Para se
alcançar esses objetivos, é necessária uma grande associação, quanto a políticas climáticas,
entre os setores agrícola, florestal, industrial e de transportes.
Em 6 de julho de 2017, o MME disponibilizou o documento intitulado: “Proposta de
Aprimoramento do Marco Legal de Biocombustíveis”235
. Lançando-o de forma coerente com
a regulação infraconstitucional dos biocombustíveis na medida em que afirma que deve estar
em consonância com a Política Energética Nacional tratada no art. 1º da Lei do Petróleo.
233
CNPE. Resolução nº 14 de 8 de junho de 2017. Disponível em:
<https://www.biodieselbr.com/pdf/ResolucaoCNPE_14_2017_30062017090623.pdf>. Acesso em: 22 jul. 2017.
235 NOVA CANA. Proposta de Aprimoramento do Marco Legal de Biocombustíveis. Disponível em:
<https://www.novacana.com/pdf/06072017090751_PROPOSTA_DE_APRIMORAMENTO__DO_MARCO_L
EGAL_DE_BIOCOMBUSTIVEIS.pdf>. Acesso em: 22 jul. 2017.
105
Na proposta, infere-se que o Programa RENOVABIO vai trabalhar em quatro
vertentes: enfatizando o papel dos biocombustíveis na matriz energética brasileira; buscando a
sustentabilidade, ambiental, econômica e financeira; estabelecendo regras de comercialização;
e desenvolvendo os novos biocombustíveis, sobretudo o bioquerosene de aviação e o etanol
de segunda geração.
Após o lançamento do documento referente ao Marco Legal dos Biocombustíveis, a
Portaria nº 272-MME, em 14 de julho de 2017, constituiu oficialmente o grupo de trabalho –
GT RENOVABIO236
, para aprimorar esse mesmo marco legal observando os seguintes
princípios: do mérito quanto ao uso dos biocombustíveis como instrumentos para a redução
das emissões da matriz de combustíveis, sendo reconhecidos na proporção do seu
desempenho ambiental e sustentabilidade. Em uma inversão lógica da ordem dos fatos um
pouco incoerente, uma vez que faria mais sentido primeiro lançar o GT e após suas reuniões,
a proposta de aprimoramento, pois dessa forma, o GT aparenta ter seu trabalho parcialmente
esvaziado.
Ainda deve observar o princípio da certificação individual, pois os biocombustíveis
produzidos e utilizados no Brasil terão seus desempenhos energético e ambiental mensurados
de acordo com padrões internacionais de certificação; da eficiência energética, por meio da
avaliação de desempenho energético e ambiental mensurados, individualmente, de forma a
buscar a indução pela eficiência energética; e da melhoria da matriz de combustíveis,
objetivando a descarbonização gradual da matriz, no curto, médio e longo prazo.
Nessa esteira, José Eli da Veiga em seu livro “Para entender o desenvolvimento
sustentável”, entende a descarbonização da economia planetária como o maior desafio do
século XXI, alertando sobre a urgência de se conciliar crescimento econômico, justa
distribuição de oportunidades sócias e a preservação dos recursos naturais. Dessa forma, a
ideia central do RENOVABIO está alinhada às discussões mais atuais no campo do
desenvolvimento sustentável contemporâneo237
.
Observa-se que o RENOVABIO deve propagar e concretizar valores como a
competitividade com equidade (efetivação da livre concorrência), credibilidade, diálogo,
eficiência, previsibilidade e sustentabilidade. E que estes valores em consonância com o
disposto na Constituição brasileira.
236
MME. Portaria nº 272, de 14 de julho de 2017. Disponível em:
<http://www.lex.com.br/legis_27471156_PORTARIA_N_272_DE_14_DE_JULHO_DE_2017.aspx>. Acesso
em 22 jul. 2017. 237
VEIGA, José Eli da. Para Entender o Desenvolvimento Sustentável. São Paulo: 34, 2015.
106
Na Proposta de aprimoramento a sugestão de órgão definidor das metas para a
redução de gases causadores do efeito estufa é o Conselho Nacional de Política Energética.
Um dos instrumentos principais são as metas nacionais de redução das emissões, a serem
definidas para um período mínimo de 10 anos, podendo ser revisadas anualmente.
Além das metas nacionais, são definidas metas individuais anuais, para distribuidores
de combustíveis fósseis, em conformidade com sua participação no mercado. A ideia de metas
anuais para utilização de biocombustíveis segue lógica semelhante ao programa federal
Renewable Fuel Standard – RFS, dos Estados Unidos.
O segundo principal instrumento é a certificação da produção de biocombustíveis,
quanto maior a quantidade de energia produzida, maior a nota. O objetivo da definição da
nota é refletir qual a contribuição individual para a mitigação da emissão de gases do efeito
estufa em relação aos combustíveis fósseis equivalentes. Simplificadamente, a certificação da
produção não se assemelha à regra de conteúdo local da indústria petrolífera, mas sim, à
etiquetagem de eficiência energética – selo PROCEL238
. A diferença é que a eficiência será
aferida em relação aos produtores de biocombustíveis, portanto, haverá aqueles de maior e
menor eficiência energética, segundo critérios objetivos.
Os dois instrumentos se conectam por meio do Crédito de descarbonização por
biocombustível – CBIO. Sendo esse um ativo financeiro, negociável em bolsa de valores,
emitido pelo produtor de biocombustível, mediante sua comercialização no mercado interno.
O direito ao CBIO surge com a efetiva produção e comercialização do biocombustível. Em
sua essência, o RENOVABIO e seus principais mecanismos podem ser explicados no Gráfico
9 a seguir:
238
Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica – PROCEL.
107
Gráfico 9. Esquema de funcionamento do RENOVABIO (MME, 2017)239
.
Quanto à segurança energética, o RENOVABIO objetiva promover a expansão da
produção e uso dos biocombustíveis. De forma que abarque a sustentabilidade, ao ser
compatibilizada com o crescimento do agronegócio brasileiro, priorizando-se um equilíbrio na
produção de matérias-primas e do mercado de coprodutos da indústria de biocombustíveis,
como o açúcar e o farelo de soja. Para se atingir isso, é necessário lançar mão do Estado como
indutor e regulador da atividade econômica, com ênfase no planejamento e nas políticas
públicas.
Durante consulta pública aberta pelo MME, interessante foi o posicionamento da
Petrobras sobre o Programa. Para tanto é necessário compreender um pouco o contexto atual
da empresa exploradora de petróleo: recentemente a Petrobras retirou-se do mercado de
biocombustíveis, antes participava por meio do seu “braço” Petrobras Biocombustíveis e teve
prejuízos gigantescos com a produção em usinas de biodiesel próprias. De forma geral, a
239
MME. RENOVABIO – nota explicativa. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis/programas/renovabio/documentos/apresentacoes/renovabio-detalhamento-da-proposta-
25/08/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-
1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_redirect=http%3A%2
F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Frenovabio-detalhamento-da-
proposta-
25%2F08%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26p_p_mode%3Dvie
w%26p_p_col_id%3Dcolumn-1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=32739680>. p. 6. Acesso em: 29
ago. 2017.
108
empresa criticou diversas diretrizes do RENOVABIO, afirmando que são necessários maiores
estudos e adequação do Programa ao Plano Combustível Brasil240
.
No final, percebe-se que, devido às experiências tidas pela Petrobras na seara dos
biocombustíveis, a gestão da empresa está desacreditada com os biocombustíveis de primeira
geração, visto que sugere o investimento em biocombustíveis de segunda e de terceira
geração, principalmente no desenvolvimento de suas tecnologias241
.
Entretanto, não apenas a Petrobras pensa de tal forma, José Eli da Veiga, em
consonância com o discurso da petroleira, afirma que embora os biocombustíveis figurem
como parte do portfólio de soluções como energia de baixo teor de carbono, não são uma
saída definitiva e comprovada para se chegar ao modelo almejado; isso se deve à primeira
geração de biocombustíveis possuir um balanço de carbono duvidoso, principalmente o
milho. A cana-de-açúcar é bem melhor, mas o excesso de fertilizantes ainda não foi
240
Principalmente porque são necessários mecanismos para assegurar a oferta contínua dos biocombustíveis, em
virtude dos históricos problemas das quebras de safras (lembrar do PROÁLCOOL) e da alternância com a
cultura do açúcar. Crítica também porque nos projetos de apresentação do Programa, as variações sazonais de
safra incorrem em altos custos que, inevitavelmente, serão repassados para o consumidor. Há riscos, ainda, de
desabastecimento, pois a produção do etanol, por exemplo, vive num limite e, talvez, aumentando-se a demanda,
elevem-se também os riscos. No Plano Combustível Brasil há ênfase na melhoria de infraestrutura como forma
de atratividade de novos agentes do cenário econômico, fator não enfocado pelo Programa RENOVABIO entre
outras questões de maior complexidade relativas à tributação. [MME. Contribuições a consulta pública:
PETROBRAS. Disponível em: <http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-
combustiveis-renovaveis/programas/renovabio/documentos/apresentacoes/contribuicoes-a-consulta-publica-
20/03/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-
1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_redirect=http%3A%2
F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Fcontribuicoes-a-consulta-
publica-
20%2F03%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26p_p_mode%3Dvie
w%26p_p_col_id%3Dcolumn-1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=9185097>. Acesso em: 22 jul.
2017.] 241
Os biocombustíveis de primeira geração são os agrocombustíveis, feitos de grãos como milho, canola, óleo de
palma, cana-de-açúcar. Os biocombustíveis de segunda geração são gerados por processos de bioconversão não
entram na dicotomia dos combustíveis versus segurança alimentar, pois eles podem ser produzidos de biomassa
lignocelulósica, como gramas, árvores, resíduos agrícolas e industriais, e organismos podem transformá-la em
biogás e biohidrogênio – estudos recentes da International Energy Agency afirmam que esta geração possui
potencial para repor 40% de todos os combustíveis de transporte até o ano de 2050. Os biocombustíveis de
terceira geração geram aumento de produtividade da fase de obtenção da biomassa, por meio de técnicas de
genômica, obtendo colheitas transgênicas. Finalizando, os biocombustíveis de quarta geração são aqueles que
modificam o teor da captura de carbono por meio da bioengenharia, por exemplo, recentemente ciências
modificaram árvores de eucalipto de forma a fazer com que elas capturassem mais gás carbônico da atmosfera
em sua fase de fotossíntese; durante os processos de conversão em biocombustíveis, o gás estufa capturado é
armazenado em campos de óleo e gás exauridos, onde permanecerá por centenas de anos – é uma forma de
diminuir mais eficientemente os índices de aquecimento global. A PETROBRAS, ao criticar o RENOVABIO,
critica a ênfase nos biocombustíveis de primeira e segunda geração, pois o Brasil não pode ficar para trás na
inovação da sua matriz energética, sob a pena de aumento de importações de energia no futuro, bem como de
colapso de abastecimento num momento de recuperação de recessão econômica.
109
oficialmente levado em conta no cálculo das emissões de carbono, que devem ser relativas a
todo o ciclo de produção242
.
Em relação aos principais biocombustíveis brasileiros, acerca do etanol, para atender
o proposto pelo RENOVABIO, será preciso encontrar soluções para a crise no setor, pois a
sua estagnação frente à política de controle de preços dos combustíveis fósseis realizadas pelo
Governo, resultou em paralisação de usinas, conjuntamente com alto endividamento do setor
sucroalcooleiro frente aos bancos de desenvolvimento.
Já em relação ao biodiesel, há uma capacidade ociosa para ser ocupada, o que enseja
uma maior atenção a sua produção. Outra questão é a dos testes do biodiesel, com recente
portaria do Ministro Fernando Coelho mudando as regras para que a Petrobras direcione
recursos arrecadados nos leilões de biodiesel para os testes de motores, ou seja, há um
fomento à inovação tecnológica mais presente em relação ao melhor aproveitamento do
biodiesel243
.
Em suma, o RENOVABIO parece ser a alternativa mais viável para tornar o
incentivo ao etanol uma realidade, fazendo com que este setor receba mais atenção e saia
desse longo período de estagnação histórico, afinal é bem melhor produzir o próprio etanol a
ser consumido aqui mesmo no Brasil, que importá-lo para completar a mistura à gasolina,
como hoje ocorre. No entanto, não se pode pensar em uma política direcionada a apenas um
biocombustível, dada a importância estratégica do setor energético.
Consultado sobre o RENOVABIO, o PNUD entende que o são necessários maiores
estudos, usando-se a avaliação dos resultados obtidos com o PNPB, principalmente no que
cinge ao aumento da produção de biodiesel para atender o mercado interno, bem como a
oferta de farelo para atender exportações e importações de carnes. O PNUD solicita ainda
estudo regionalizado do Selo Combustível Social, para que se possam realizar os ajustes
necessários frente ao PNPB e ao RENOVABIO, que em essência se interligam. Outro ponto
importante que necessita de melhorias é o regime tributário, pois com as exportações isentas
de ICMS, por exemplo, há que se pensar na compensação das perdas pelos estados244
.
242
VEIGA, José Eli da; VIANNA, Sérgio Besserman; ABRANCHES, Sérgio. A sustentabilidade do Brasil. In:
GIAMBIAGI, Fábio; BARROS, Octávio de. Brasil pós-crise: agenda para a próxima década.p. 304-323. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2009. 243
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 69-71. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017. 244
MME. Contribuições a consulta pública: PNUD. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-combustiveis-renovaveis/programas/r-
enovabio/documentos/apresentacoes/contribuicoes-a-consulta-publica-
20/03/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-
110
Ressalta-se, mais uma vez, o papel estratégico do CNPE, na medida em que a ele
cabe propor uma Política Energética Nacional de modo a fomentar os biocombustíveis, como
também promover uma regulação clara e simples para o RENOVABIO. Entretanto, uma
medida provisória para regular um setor tão complexo, além de ser um programa que introduz
modificações significativas em diversas matérias sensíveis, como a questão tributária, pode ter
efeito desastroso no sistema energético, caso não haja o devido cuidado. Há que se ter cautela
com as pressões que os produtores fazem no Congresso Brasileiro, e estudos mais detalhados
ainda são necessários.
Inserindo-se no contexto do RENOVABIO, surge a Plataforma Biofuturo, sendo
proposição do Brasil, uma coalização de múltiplos atores que têm interesse em desenvolver
soluções em bioeconomia, com ênfase no setor privado (países, empresas, universidades,
etc.), para viabilizar o diálogo e a cooperação e acelerar o desenvolvimento e o ganho em
alternativas menos intensivas em carbono para substituir o uso de combustíveis fósseis no
transporte, de matéria-prima fóssil no setor químico, na produção de plásticos e outros.
O objetivo principal da Plataforma é fomentar essas soluções para viabilizar o
atingimento das NDCs e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS,
prioritariamente os ODS números 7 (energia sustentável) e 13 (ações para enfrentar a
mudança do clima), mas também os ODS nº 8 (crescimento econômico e trabalho digno), 9
(indústria, inovação e infraestrutura), 2 (agricultura sustentável e fome zero) e 15 (florestas e
ecossistemas). O foco inicial é no setor de transportes, já que é responsável por cerca de 23%
da emissão mundial de GEE relacionadas à energia, de acordo com o IPCC.
A Plataforma é interessante na medida em que pretende coordenar políticas públicas
em biocombustíveis e trazendo essa pauta para a agenda global, considerando os avanços
industriais e tecnológicos para soluções de baixo carbono nos transportes, em bioprodutos
avançados e na química verde. Por exemplo, vários países já alcançaram ou estão próximos de
alcançar a escala comercial para os biocombustíveis de segunda geração, com estudos
1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_redirect=http%3A%2
F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Fcontribuicoes-a-consulta-
publica-
20%2F03%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26p_p_mode%3Dvie
w%26p_p_col_id%3Dcolumn-1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=9185001>. Acesso em: 23 jul.
2017.
111
apontando uma redução de 90% das emissões de dióxido de carbono para esses combustíveis
quando comparados à gasolina245
.
Outra vantagem dessa tecnologia é o possível aumento de produtividade da economia
rural sem necessidade de expansão da fronteira agrícola – o que é de muito interesse do
Brasil, que vem enfrentando recentes problemas e sanções internacionais em virtude do
aumento dos índices relativos ao desmatamento, como exposto em itens anteriores – já que se
aproveitam os resíduos da celulose como matéria-prima. São apontados como os maiores
desafios: a incerteza quanto ao marco regulatório e à futura demanda e política de preços.
As metas da Plataforma Biofuturo buscam superar tais desafios e incluem: promover
a colaboração e o diálogo internacional entre formuladores de políticas, indústria, academia e
outros atores; facilitar um ambiente de negócios para o desenvolvimento de biocombustíveis;
e promover pesquisa e desenvolvimento, compartilhando análises e soluções em políticas
públicas246
.
Os países que formam a Plataforma são: Argentina, Brasil, Canadá, China,
Dinamarca, Egito, Finlândia, França, Índia, Indonésia, Itália, Marrocos, Moçambique,
Holanda, Paraguai, Filipinas, Suécia, Reino Unido, Estados Unidos e Uruguai. E as
instituições e empresas: IEA, Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento
Industrial (UNIDO); Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura
(FAO); International Renewable Energy Agency (IRENA); Associação Brasileira de
Biotecnologia Industrial (ABBI); e União da Indústria de Cana de Açúcar (UNICA)247
.
Em virtude da positivação da pretensão inclusiva do PNPB, abriu-se precedente para
uma abordagem da nova legislação (tanto o RENOVABIO quanto a Política Nacional dos
Biocombustíveis Florestais) sob o viés social, devendo haver correspondência com os
objetivos da República Federativa do Brasil, a fim de garantir o desenvolvimento nacional e
reduzindo as desigualdades sociais e regionais.
No modelo atual proposto pelo Programa RENOVABIO, prioritariamente, os
objetivos da República não estão abarcados, e embora não haja violação direta aos princípios
245
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 69-71. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017. 246
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 69-71. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017. 247
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente sobre Mudanças
Climáticas) p. 69-71. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso
em: 20 jul. 2017.
112
fundamentais (dignidade da pessoa humana e valores sociais do trabalho), nenhum valor
social é trazido de forma mais profunda, então cabe um questionamento: qual a razão?
Qual a razão de se buscar a mitigação das emissões de carbono, uma energia mais
verde, a eficiência energética, a livre concorrência, entre outros valores constitucionais, mas
se deixa de lado o social. Se o RENOVABIO fosse uma alternativa isolada, talvez não
houvesse implicações práticas negativas. Mas como bem expôs o PNUD na consulta pública
realizada, ao se aprovar o Projeto no modelo em que se encontra, mitigam-se iniciativas
sociais importantes trazidas pelo PNPB a passo em que este pode cair em desuso.
Pode parecer um raciocínio fatalista e utópico, mas com o PROÁLCOOL aconteceu
problemática assemelhada em nível legislativo, que se adicionou ao fator geopolítico da
época, e o seu marco regulatório, apesar de não ter sido revogado, caiu em pleno desuso. Os
critérios utilizados no Programa estão não são harmônicos e podem abrir espaço para que
ocorram alguns danos ambientais ou sociais durante a expansão da matéria-prima dos
biocombustíveis brasileiros.
Em relação ao PNPB, percebe-se ainda que ele não venha conseguindo cumprir com
seus objetivos de promover a diversificação do uso de oleaginosas e incentivar a aquisição de
matéria-prima da agricultura familiar de regiões mais carentes do Brasil248
, as ações
governamentais deveriam se centrar em sanar tais lacunas e não em praticamente substituir
um programa por outro.
Em uma aproximação, é possível que o Programa aponte para o caminho do
retrocesso social, quando avaliada a conjuntura trabalhista, previdenciária e até mesmo
ambiental, há uma possibilidade de retorno ao caos que houve na época da Revolução
Industrial (só que agora um caos associado a uma nova revolução cibernética), somado ao
abandono do Estado do bem-estar social.
A livre iniciativa, segundo a Constituição Federal, deve ser compatibilizada com os
valores sociais do trabalho. Alterando-se a proposta do RENOVABIO, evita-se até mesmo um
possível controle de constitucionalidade e/ou de convencionalidade.
O objetivo é evitar a mitigação tácita do PNPB e a adequação do RENOVABIO aos
valores constitucionais. Segundo Bresser-Pereira, não há sentido em se falar de
248
PEDROTI, Paula Maciel. Desenvolvimento e inclusão social: o caso do arranjo político-institucional do
Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel. In: GOMIDE, Alexandre de Ávila; PIRES, Roberto Rocha
C. (ed.). Capacidades estatais e democracia: arranjos institucionais de políticas públicas. Brasília: Ipea, 2014. p.
213-236.
113
desenvolvimento restrito apenas ao viés econômico, ou apenas político ou ainda social, posto
não existir desenvolvimento parcelado, setorializado249
.
Finalizando, sem o objetivo de concluir as análises do RENOVABIO, esse se mostra
um projeto complexo, que necessita de atenção especial do Governo, pois a sua proposição
acelerada mais parece uma tentativa de mitigar sua discussão. O próprio Governo parece estar
atentando para esse viés ao repensar a forma de aprovação e ter sugerido, recentemente, o
envio do Programa sob a forma de um Projeto de Lei.
Mas caso não seja dada celeridade à tramitação do Projeto, há a possibilidade de ele
se mostrar realmente necessário, em um futuro próximo, e quando vier a ser posto em prática,
considerando-se o tempo de amadurecimento dos investimentos em combustíveis e
biocombustíveis, a inação do Estado representará risco para a sociedade, tanto em termos de
suprimento (regularidade do abastecimento), quanto em termos de preço (exposição externa e
ineficiências logísticas) 250
.
Inicia-se agora o estudo de caso, ambientado no estado do Rio Grande do Norte, na
perspectiva de aproximar a teoria da prática, de entender umas das principais experiências
ocorridas no estado com a produção de biodiesel com a agricultura família no âmbito do
PNPB.
4.3 ANÁLISE DAS DIFICULDADES DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS
PÚBLICAS PARA OS BIOCOMBUSTÍVEIS: ESTUDO DE CASO DO CULTIVO DE
GIRASSOL EM PARCERIA COM A PETROBRAS EM ASSENTAMENTOS DO RIO
GRANDE DO NORTE
No estado do Rio Grande do Norte, a Petrobras estabeleceu parceria com a
Cooperativa dos Ricinicultores de Apodi e Região – COOPERA e realizou um trabalho com
mais de 300 famílias – a maioria de assentados, em uma de área de mais de 1.500 hectares
plantados, ao longo de oito municípios: Caiçara do Norte, Ceará-Mirim, Jandaíra, João
249
BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Desenvolvimento e crise no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1982. p. 15. 250
MME. RENOVABIO – nota explicativa. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis/programas/renovabio/documentos/apresentacoes/renovabio-detalhamento-da-proposta-
25/08/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-
1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_redirect=http%3A%2
F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Frenovabio-detalhamento-da-
proposta-
25%2F08%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26p_p_mode%3Dvie
w%26p_p_col_id%3Dcolumn-1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=32739680>. Acesso em: 29 ago.
2017.
114
Câmara, Parazinho, Pedra Grande, São Bento do Norte e Touros. A parceria visava à
produção de óleo de girassol251
. Será remontada aqui a história dessa iniciativa tão
significativa com os biocombustíveis para o estado do Rio Grande do Norte.
Inicialmente, a Associação Regional e Comercial do Mato Grande – ARCO -
articulou a participação dos assentados no Programa Nacional de Produção e Uso do
Biodiesel desde o ano de 2006, nesse primeiro momento por meio do plantio de pinhão-
manso. Em 2007 foi realizado, com sucesso, um plantio piloto de girassol.
Em um segundo momento, a ARCO firmou parceria com a Petrobras: o girassol seria
plantado nos assentamentos, a Petrobras doaria o óleo diesel para os tratores. A Petrobras
ainda assumiu o compromisso de adquirir a semente de girassol por cinquenta centavos cada
quilo (R$ 0,50/kg), preço de mercado à época. Nesse momento, a ARCO tornou-se, inclusive,
símbolo de propaganda para o Governo Federal e Banco do Brasil e de campanha do então
presidente Luís Inácio Lula da Silva252
.
Entendida a importância da região do Mato Grande para a experiência com a
produção de agrocombustíveis no RN, entende-se o motivo da escolha de tal experiência para
ilustrar esta dissertação. Entre os questionamentos motivadores da escolha, estão: como se
iniciou o processo de plantio de girassol para produção de biocombustível no Rio Grande do
Norte? Ainda há essa produção de girassol ou foi interrompida? Caso tenha sido interrompida,
qual a causa? Qual o saldo da experiência? Entre outras tantas inquietações.
O objetivo maior era observar como funcionou, na prática, a experiência de um
programa governamental de fomento à produção de biocombustíveis. Mas vai além disso: é a
tentativa lançar o olhar sobre um local que foi alcançado por uma política pública tão
estratégica para o país, postas as políticas públicas serem consideradas fortes instrumentos
para cumprir o ideal de Estado Social, que por vezes, infelizmente, parece uma conjectura
utópica.
Passou-se então para a etapa mais prática: a coleta de informações, visitas e
entrevistas. Inicialmente, foi realizada entrevista com o Professor Doutor Deusimar Freire
Brasil, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e que atua em diversos projetos na
região do Mato Grande. Ele fez o relato da produção de girassol e de outros projetos que
251
BARRETO NETO, Francisco Nabuco de A. Bioenergia e exclusão regional: a não política nacional
agroenergética e os girassóis do RN. 2009. 362 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Regional; Cultura e
Representações) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2009. p. 10. 252
BARRETO NETO, Francisco Nabuco de A. Bioenergia e exclusão regional: a não política nacional
agroenergética e os girassóis do RN. 2009. 362 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Regional; Cultura e
Representações) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2009. p.16-17,
115
funcionaram de forma agregada ao do biodiesel, disponibilizou relatórios, dados, bem como
grade parte das imagens constantes no Anexo II deste trabalho – para mostrar e registrar
visualmente como ocorreu todo o processo de plantio da oleaginosa. Todas as conversas e
relatos agregaram imenso valor ao trabalho, principalmente por meio das indicações de
entrevistas com Livânia Frizon, e contatos com o Mestrado e Doutorado em Geografia e
EMBRAPA.
Posteriormente, foi entrevistada Livânia Frizon, à época presidente da ARCO-Mato
Grande, e líder do assentamento de Canudos – inclusive atuou junto a todo o processo de
reforma agrária da região, tendo vindo do Rio Grande do Sul, juntamente com o Movimento
dos Trabalhadores Sem Terra (MST), com esse objetivo e aqui fixando residência após o êxito
obtido na desapropriação de terras e concretização dos assentamentos com a fixação dos
assentados. Sendo escolhida pelo papel estratégico e pelo conhecimento que detém, além da
vivência prática de toda a situação. Além das entrevistas, dos relatórios e dados obtidos,
foram utilizados alguns poucos estudos já existentes sobre a região.
Foram buscadas, ainda, informações junto à Petrobras, voltadas principalmente para
a fundamentação do fechamento da planta de Biodiesel da Refinaria Clara Camarão, no
município de Guamaré/RN, unidade responsável pelo processamento do óleo de girassol
proveniente das plantações na Região do Mato Grande. Tentou-se também realizar uma visita
técnica, mas não se obteve sucesso no pleito. Contudo já era algo esperado, em virtude de
relatos de outras pesquisas (mesmo as voltadas a outros objetos): a dificuldade de conseguir
dados de órgãos e empresas ligadas ao Governo, ainda que considerados os avanços na
aplicação do princípio da transparência à Administração Pública.
Reunidas as informações possíveis, optou-se por não fazer o relato literal das
entrevistas, relatórios, entre outros, tendo em vista que se tornaria algo de leitura densa.
Proceder-se-á, então, com a junção de todas as informações coletadas e faremos suas
explanações divididas em quatro pontos: como se estruturou o projeto no RN; o início dos
investimentos e perspectivas; o desenrolar da experiência e as dificuldades encontradas; a
tentativa de retomada que fracassou e a situação atual.
- Como se estruturou o Projeto nos municípios do Rio Grande do Norte:
As atividades do “Projeto Biodiesel” se iniciaram em 25 de dezembro de 2007,
quando ocorreu o planejamento para o Plano Safra 2008, incluindo a cultura do girassol na
116
região do Mato Grande, com levantamento de produtores da safra 2007 e mais alguns
produtores com aceitação para a nova cultura e comprometimento com o programa. Foram
realizados dois seminários sobre a cultura de girassol nos municípios de Touros e Pedra
Grande. Além de reuniões nos assentamentos e comunidades rurais253
.
- Investimentos e perspectivas:
A Petrobras estabeleceu a meta para a Safra 2008 de implantação plantio em sequeiro
de 2.000 hectares. Estabeleceu, ainda, como meta mínima a implantação de 1.000 hectares.
Para o plantio foram escolhidas as variedades Catissol 01 e Iarama, mais sementes híbridas
da Heliantus e da Dow, como forma de verificar qual variedade é mais produtiva.
Foi realizado, ainda, o adiantamento em óleo, esperando as condições satisfatórias
para implantação da cultura, calculadas na base de 1.500 hectares plantados.
No ano de 2008, os municípios envolvidos foram: Ceará-Mirim, João Câmara,
Jandaíra, São Bento do Norte, Pedra Grande, Pureza, Parazinho e Touros.
Quanto ao número de famílias: 250 famílias de agricultores participaram do projeto,
20 polos de assentamentos e 15 comunidades254
.
- O desenrolar do Projeto: as dificuldades encontradas.
Quanto às principais dificuldades encontradas na execução do Projeto estavam: no
que cinge ao preparo de solo, a presença de solos encharcados e vegetação natural de alto
porte, as dificuldades no aluguel de máquinas e implementos adequados, dificuldade de áreas
extensas, áreas dispersas, aumentando o custo nos deslocamentos e atrasando operações; nos
tratos culturais, observou-se como entrave a relutância de alguns agricultores na capina e
pulverização; nas medições por georreferenciamento houve diferenças significativas entre
medidas métricas (manuais) e por GPS;
No plantio, as dificuldades principais foram: falta de plantadeiras adequadas (em
número e pertinência), falta de vias de acesso adequadas para plantadeiras de grande porte,
operadores locais não habilitados na operação e manutenção das plantadeiras255
.
253
COPEC (Cooperativa dos Produtores de Canudos). Relatório de Atividades do Projeto Biodiesel – Girassol,
2008. 254
Dados e demais informações obtidas junto à COPEC. [COPEC (Cooperativa dos Produtores de Canudos).
Relatório de Atividades do Projeto Biodiesel – Girassol, 2008.]
117
- A finalização do Projeto:
Não foram obtidos dados especificamente sobre essa parte do Projeto, entretanto,
segundo os relatos colhidos, acabado o prazo do desenvolvimento do Projeto previsto no
contrato, a Petrobras descontinuou a produção. Entre os prováveis fatores devem figurar:
elevado custo de produção; maquinário precário (conseguido muitas vezes mediante
empréstimos com as Prefeituras ligadas aos municípios dos assentamentos); necessidade de
capacitação dos agricultores envolvidos; somados aos fatores alistados no item anterior “as
dificuldades encontradas”.
Posteriormente, a Petrobras iniciou a operação comercial da Planta de Biodiesel da
Refinaria Clara Camarão, entretanto, os valores que pretendia repassar para os agricultores
pela compra da produção, inviabilizaram a retomada da parceria. A maior parte do óleo
comprado era proveniente do estado de Pernambuco, que conseguia produzir a menores
custos por meio da gordura e óleo animal256
.
- Outras considerações pertinentes.
Um dos aspectos que chamam a atenção no complexo de áreas produtivas do Mato
Grande é integração dos sistemas produtivos. Elucidando e exemplificando, durante a
execução do Programa do Biodiesel, segundo relatos, as sementes eram esmagadas e desse
processo de esmagamento obtinha-se o óleo de girassol, a ser recolhido pela Petrobras. Após
o esmagamento das sementes de girassol havia como resíduo uma massa predominantemente
proteica, chamada de “torta de girassol”.
Por conta do sucesso inicial dos plantios de girassol, a Petrobras adquiriu uma
extratora de óleo e a cedeu em comodato à parceria com a ARCO, que assumiu o
compromisso de esmagar os grãos produzidos no Mato Grande e em outras regiões do RN.
Essa máquina estava, à época, instalada no Assentamento Canudos257
, produzindo óleo e
255
Dados e demais informações obtidas junto à COPEC. [COPEC (Cooperativa dos Produtores de Canudos).
Relatório de Atividades do Projeto Biodiesel – Girassol, 2008.] 256
Infelizmente, a nova chance dada ao biodiesel produzido no Rio Grande do Norte foi novamente restrita. E
culminou no fechamento da Refinaria de biodiesel do estado. [FAERN. Biodiesel ganha nova chance no RN.
Disponível em: <http://www.faern.com.br/novosite/noticia/biodiesel-ganha-nova-chance-no-rn>. Acesso em: 1
nov. 2016]. 257
Canudos é o acampamento sede dos assentamentos da região do Mato Grande. Lá está instalada a COPEC,
também lá existem auditórios e salas de aulas – uma espécie de centro de treinamento, o Centro de Capacitação
118
tendo como subproduto a torta de girassol. Essa torta substitui o farelo de soja na confecção
de ração animal e sua produção em grande quantidade, juntamente com o sorgo, determinou
grande entusiasmo e perspectivas de ampliação da produção animal nos assentamentos do
Mato Grande258
.
Nesse contexto que foi apresentado o Projeto Mazaroio259
. A perspectiva foi
capacitar e preparar os agricultores assentados para realizar melhor aproveitamento da torta de
girassol. Assim, as ações foram focadas na implantação de criações pilotos de avicultura, de
galinha caipira e ovinocultura, com produção local de ração a partir do sorgo e da torta de
girassol. A produção de mel de abelha foi outro desdobramento do plantio de girassol, então
foi desenvolvida também a apicultura260
.
Entre as capacitações ministradas vinculadas ao Projeto Mazaroio261
e vinculadas ao
PNPB versavam sobre cidadania e comunidade; associativismo, cooperativismo e sindicatos,
movimentos sociais no campo; capacitação profissional em apicultura, avicultura caipira e
ovinocultura; a economia solidária, com noções de empreendimentos econômicos solidários,
redes de economia solidária262
.
Findas tais atividades, os agricultores tentaram, por iniciativa própria, uma
cooperativa de crédito, vontade expressa em muitas reuniões comunitárias. Organizaram
também um abatedouro de aves e comercialização na Feira de Ceará-Mirim e em pequenos
da Agricultura Familiar de Canudos – construídas na época do desenvolvimento do Projeto para capacitação dos
envolvidos. 258
ARCO MATO GRANDE. PROJETO MAZAROIO: Consolidação de cadeias de produção animal
interligadas ao Programa Biodiesel – girassol em assentamentos de reforma agrária no território do Mato
Grande/RN. Relatório Final. 2011. 259
O objetivo geral do Projeto Mazaroio era: “contribuir com a consolidação das cadeias produtivas de
apicultura, ovinocultura e avicultura de galinha caipira em assentamentos de reforma agrária da região do Mato
Grande/RN, a partir da capacitação profissional dos criadores envolvidos e do estabelecimento de manejos de
criação interligados ao plantio de girassol para produção de biodiesel; bem como, aprimorar metodologias de
estabelecimento de tecnologia social voltadas para práticas associativas e solidárias e reafirmar a
responsabilidade que cada indivíduo possui nas ações coletiva visando a melhoria da qualidade de vida
comunitária”. [ARCO-MATO GRANDE. Proposta do Projeto Mazaroio. Disponível em:
<http://www.ccet.ufrn.br/broffice/CursoBROFFICE%20-
%20ESTRUTURADO/ArquivosAulas/Microsoft%20Word%20-%20Projeto%20Mazaroio.pdf>. Acesso em: 1
nov. 2016.] 260
ARCO MATO GRANDE. PROJETO MAZAROIO: Consolidação de cadeias de produção animal
interligadas ao Programa Biodiesel – girassol em assentamentos de reforma agrária no território do Mato
Grande/RN. Relatório Final. 2011. 261
No Dicionário Eletrônico Aurélio, a palavra “Mazaroio” consta como substantivo masculino, gíria do Rio
Grande do Norte, e significa “Grande quantidade ou porção de trabalho”. 262
ARCO MATO GRANDE. PROJETO MAZAROIO: Consolidação de cadeias de produção animal
interligadas ao Programa Biodiesel – girassol em assentamentos de reforma agrária no território do Mato
Grande/RN. Relatório Final. 2011.
119
comércios varejistas da região; comercializaram mel e pólen em Natal, nas organizações
parceiras e academias de ginástica263
.
Diante do relatório disposto, percebe-se que para um Projeto na seara dos
agrocombustíveis prosperar, nos moldes do PNPB, é necessário, acima de tudo, integração da
cadeia produtiva com outras culturas, de modo a tornar a produção o mais sustentável possível
e garantir sua viabilidade e continuidade.
Nas entrevistas realizadas, ficou evidente na fala dos interlocutores que o período do
biodiesel foi muito próspero, de um otimismo, que gera saudosismo, pois a realidade do hoje
não é fácil para quem trabalha no início da cadeira produtiva agrícola. Evidenciou-se que no
período se havia esperança, e um esforço coletivo para se “fazer acontecer”. Melhorou-se a
renda, a educação, a moradia, “vários dos filhos do assentamento se formaram numa
universidade pública”. Foi transformador.
Na região do Mato Grande houve um esforço dos assentados junto às cooperativas de
crédito, como a Cooperativa de Crédito Mútuo – COOPERFORTE, à Fundação Banco do
Brasil, a instituições de ensino como a Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN
e o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte – IFRN.
Entretanto, mesmo diante dos esforços, o encerramento do Projeto pela Petrobras
inviabilizou as iniciativas que agregaram renda, educação, desenvolvimento interligado,
garantiu a fixação das famílias dos assentamentos nas propriedades.
A despeito da descontinuidade do Projeto Biodiesel, independente de todos os
motivos que nela culminaram, fica o legado, o conhecimento agregado, a articulação
proporcionada, as parcerias firmadas e, talvez o principal: uma postura articulada, proativa e
mais empreendedora, dentro das limitações existentes (que não são poucas) dos assentados
(na procura por novas parcerias, novos investimentos, mercados para o escoamento dos
produtos).
Atualmente, as famílias dos agricultores do território do Mato Grande comercializam
parte de sua produção em feiras livres de diversos municípios do Rio Grande do Norte, e
também na Central da Agricultura Familiar e Economia Solidária – CECAFES, inaugurada
em março de 2017, no cruzamento das avenidas Capitão Mor Gouveia e Jaguarari, em Natal.
A central é composta de 36 boxes, 50 barracas, e beneficia em torno de 1.200
agricultores familiares, ocupando uma área de cinco mil metros quadrados ao lado da
263
ARCO MATO GRANDE. PROJETO MAZAROIO: Consolidação de cadeias de produção animal
interligadas ao Programa Biodiesel – girassol em assentamentos de reforma agrária no território do Mato
Grande/RN. Relatório Final. 2011.
120
Ceasa/RN. É interessante na medida em que tira de cena a figura do atravessador, um dos
problemas enfrentados pela agricultura familiar, uma vez que diminui muito seu lucro e
dificulta a subsistência da população do campo264
.
Durante as entrevistas e conversas, percebeu-se que muitas mudanças são
necessárias, bem como muito investimento, e os retornos demandam tempo. Em um projeto
de apenas dois anos fica difícil mensurar a real viabilidade da produção em unidades de
agricultura familiar e assentamentos, pois toda uma mudança estrutural e prévia é necessária.
Conclui-se que hoje talvez a agricultura familiar, principalmente no Rio Grande do Norte,
ainda não conseguiu se estruturar de tal forma que conseguisse uma maior viabilidade
produtiva. Mesmo com essa observação, fica o questionamento se ajudar nesse
desenvolvimento não seria justamente uma das propostas do PNPB?
Em seu estudo “Bioenergia e exclusão regional”, Barreto Neto afirma que um dos
problemas com os biocombustíveis no Nordeste e também no Rio Grande do Norte, é a falta
de investimentos. Lança mão de dados disponíveis no site da Presidência da República, a
saber: no PAC, os investimentos fora de 17 bilhões para a área de biocombustíveis, desses, 30
milhões de reais no Rio Grande do Norte e 150 milhões para o Norte e Nordeste, em
confronto com 16 bilhões e 850 milhões de reais para o Centro-Sul. Afirmando que o
parâmetro da Petrobras é meramente lucratividade, não tendendo a atuar como integradora
agrícola265
.
Na pesquisa “A produção de biodiesel no assentamento de Canudos/RN”, Suzana
Maia Girão tece algumas considerações interessantes sobre o que foi verificado no
assentamento na época em que o programa foi desenvolvido: o PNPB é capaz de gerar renda
aos agricultores e familiares que nele estejam envolvidos; a população analisada obteve
melhorias a partir do cultivo do girassol; os lucros obtidos com o cultivo do girassol foram
anuais, mas esperava-se que fossem mais expressivos; a renda obtida possibilitou a aquisição
de bens de consumo ou tratamento de saúde; não foi verificada inclusão social via geração de
emprego266
.
264
CEASA. Governo inaugura Central da Agricultura Familiar nesta segunda. Disponível em:
<http://www.ceasa.rn.gov.br/Conteudo.asp?TRAN=ITEM&TARG=144113&ACT=&PAGE=&PARM=&LBL=
NOT%CDCIA>. Acesso em: 20 ago. 2017. 265
BARRETO NETO, Francisco Nabuco de A. Bioenergia e exclusão regional: a não política nacional
agroenergética e os girassóis do RN. 2009. 362 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Regional; Cultura e
Representações) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2009. 266
GIRÃO, Suzana Maia. A produção de biodiesel no assentamento Canudos RN: perspectivas e limites da
inclusão social. 2011. 90 f. Dissertação (Mestrado em Meio Ambiente, Cultura e Desenvolvimento) -
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2011.
121
Ao se falar em sistemas integrados de produção, como ocorreu no caso em comento
neste item 4.4, tem-se um discurso em consonância com as ideias desenvolvidas por Ignacy
Sachs sobre a otimização do uso da biomassa com a combinação certa dos “5-F”. Os “5-F”
são sistemas integrados de alimento-energia adaptados às diferentes condições agroclimáticas
e socioeconômicas; enfatizando o potencial dos sistemas produtivos artificiais, análogos a
ecossistemas naturais. O objetivo é tornar os sistemas cada vez mais produtivos por
intermédio da aplicação da ciência moderna. Os “5-F” (sigla em inglês) significam:
suprimentos, alimento, fertilizante, ração industrializada, combustível. Assim, o papel
primordial cabe às biotecnologias: aumento na produção de biomassa e expansão na faixa de
produtos dela derivados267
.
Outros dados interessantes é que o Nordeste possuía uma grande quantidade de
estabelecimentos produtivos, mas a contribuição em relação à quantidade de matéria-prima
comercializada era pequena: em 2011, correspondeu a 0,4% do volume comercializado.
Segundo Paula Pedroti, tal situação justifica-se, sobretudo, pela baixa produtividade, pela falta
de infraestrutura de transportes e logística, pelos prolongados períodos de estiagem, pela
dispersão geográfica dos agricultores, pela assistência técnica deficitária e pela pouca tradição
no cooperativismo, entre outros268
. Tais fatores correspondem, justamente, aos observados em
grande parte na prática produtiva dos assentamentos do Mato Grande.
Fazendo uma pertinente digressão temporal no pensamento de Celso Furtado, na
década de 1960, Celso Furtado propunha levar o estado desenvolvimentista para o Nordeste,
de modo a quebrar o estado oligárquico dominante, e por isso propôs a SUDENE. Entretanto,
do seu sonho de desenvolvimento para a região, restou um parque industrial formado por
filiais de grandes grupos nacionais e internacionais, concentradas em Salvador, Recife e
Fortaleza; na Zona da Mata nordestina, o PROÁLCOOL estimulou o avanço da cana-de-
açúcar, em vez de outras atividades agrícolas, abrindo espaço apenas para o turismo litorâneo;
no Maranhão a ocupação do fértil hinterland foi feita com base na soja para exportação; no
Semiárido houve o fim do algodão entre 1980 e 1990, devido à praga do bicudo, e seu
desaparecimento afetou a competitividade da pecuária regional, eliminando a principal fonte
de renda da grande massa de produtores rurais da região. Modernamente, abriu-se espaço para
267
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond: 2009. p. 33-34. 268
PEDROTI, Paula Maciel. Desenvolvimento e inclusão social: o caso do arranjo político-institucional do
Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel. In: GOMIDE, Alexandre de Ávila; PIRES, Roberto Rocha
C. (ed.). Capacidades estatais e democracia: arranjos institucionais de políticas públicas. Brasília: Ipea, 2014. p.
213-236.
122
a fruticultura irrigada direcionada à exportação, desenvolvendo-se na região de Petrolina e no
Vale do Assu (RN) 269
.
Esse quadro só não foi mais agravado porque a Constituição de 1988 estendeu a
Previdência aos produtores rurais, e mais recentemente o Programa Bolsa-Família, estendeu o
manto de proteção do Estado a essa região que concentra 40% da população do Nordeste.
Comprovando que, infelizmente, não foi o Estado desenvolvimentista furtadiano que chegou
ao Nordeste, mas sim o Estado da proteção social, tendo em vista a situação de
vulnerabilidade em todas as suas formas de expressão da população nordestina,
principalmente a do Semiárido270
.
Como se verifica, por esses e outros exemplos, o Nordeste mudou muito desde as
ideias desenvolvimentistas de Celso Furtado, mas continua a ser um desafio proporcionar o
desenvolvimento dessa região. Fazendo um paralelo desse contexto e aplicando o pensamento
furtadiano aos biocombustíveis produzidos não somente no estado do Rio Grande do Norte,
mas também no Ceará, onde a Petrobras Biocombustível encerrou as atividades da Usina de
Biodiesel de Quixadá e estuda ainda encerrar as atividades ou vender a Usina de Montes
Claros, em Minas Gerais, e a de Candeias, na Bahia, percebe-se que a tentativa de aliar
desenvolvimento sustentável, inclusão social e mercado, no Nordeste, mostrou-se complicada
nos moldes atuais.
Também pudera, uma empresa como a Petrobras tem de perseguir o lucro, apesar de,
em termos constitucionais, por ser uma empresa estatal, possuir o dever cumprir sua função
social; entretanto, não há como dissociar que a Petrobras opera em um dos ramos de máxima
expressão capitalista e isso se manifesta claramente no momento em que se investe apenas
150 milhões de reais no Norte e Nordeste e aproximadamente 17 bilhões no Centro-Sul.
A Petrobras almeja o lucro, o Governo Federal, por sua vez, tem uma balança
comercial a equilibrar, contas, salários a pagar... Talvez um dos grandes problemas tenha sido
esperar da Petrobras uma postura frente ao PNPB que não lhe cabia. Entretanto, como já havia
iniciado um processo, muitos investimentos, retirar-se foi estranho, causou danos, embora
seja economicamente e em termos de gestão compreensível: foi o preço que se pagou por uma
269
ARAÚJO, Tânia Bacelar de. Desenvolvimento Regional no Brasil. In: FURTADO, Celso. O pensamento de
Celso Furtado e o Nordeste hoje. Rio de Janeiro: Contraponto: Centro Internacional Celso Furtado de Políticas
para o Desenvolvimento: Banco do Nordeste do Brasil, 2009. p. 38. 270
ARAÚJO, Tânia Bacelar de. Desenvolvimento Regional no Brasil. In: FURTADO, Celso. O pensamento de
Celso Furtado e o Nordeste hoje. Rio de Janeiro: Contraponto: Centro Internacional Celso Furtado de Políticas
para o Desenvolvimento: Banco do Nordeste do Brasil, 2009. p. 39.
123
série de erros históricos de gestão, de Governo, e agora, como sabido, de desvios de dinheiro
e corrupção.
Finalmente, encerra-se este item 4.3, sem a pretensão de esgotar as discussões aqui
iniciadas. Por conseguinte, passam-se às conclusões e aos resultados finais dos debates
propostos durante esta dissertação.
124
CONCLUSÕES
Diante dos delineamentos desenvolvidos nos capítulos desta dissertação, observa-se
uma busca por alternativas energéticas mais sustentáveis, influenciada por uma dinâmica
global que se reflete no ordenamento jurídico, no plano econômico e no plano político
brasileiro contemporâneo.
Como consequência de uma tendência internacional inaugurada pelo Protocolo de
Kyoto e seguida pelo Acordo de Paris, discute-se cada vez mais a presença dos
biocombustíveis na matriz energética brasileira – em virtude de emitirem, durante sua cadeia
produtiva, menor quantidade de gases causadores do efeito estufa quando comparados aos
combustíveis fósseis –, sua presença já é bastante significativa, mas tende a ser reforçada nos
próximos anos, em virtude da plena atenção dos setores produtivos brasileiros, principalmente
do etanol e do biodiesel, e das pressões por eles realizadas sobre o Governo.
Ainda em decorrência dos acordos internacionais e das metas ambientais
estabelecidas, os produtores brasileiros e os órgãos governamentais voltam-se cada vez mais
para o mercado do carbono, com a pretensão de negociar o crédito em carbono da produção
brasileira de biocombustíveis em bolsas de valores. Tal alternativa parece ser financeiramente
lucrativa, mas seu potencial de efetiva tutela ambiental é consideravelmente questionável.
Em virtude das mudanças internacionais, dos interesses dos setores produtivos locais,
da situação da Petrobras, que lançou recentemente um plano intenso de desinvestimentos,
configura-se em um momento de instabilidade e de propensão a mudanças na política
energética brasileira. O que demanda cuidados e estudos, pois tais mudanças não podem
ocorrer dissociadas do ordenamento jurídico brasileiro, nem à revelia das normas e princípios
constitucionais, principalmente por ser setor estratégico nacional, acima de quaisquer outros
interesses produtivos envolvidos.
As movimentações dos atores acima elencados se coadunam com a crise política,
econômica e jurídica na qual o Brasil está envolvido, criando um cenário que pode ocasionar
perdas efetivas a direitos fundamentais conquistados a duras penas em nossa recente
democracia constitucional. E não podemos dissociar qualquer estudo na seara dos
biocombustíveis do seu contexto histórico, sob pena de, em virtude dessa negligência, obter
resultados que se tornem juridicamente vazios em um curto intervalo de tempo.
Em decorrência da conjuntura supramencionada, no segundo capítulo desta
dissertação foi esmiuçado o contexto internacional dos últimos anos afeto à seara energética
125
nacional, bem como foram apresentados dados e estatísticas para situar o presente estudo no
plano internacional e entender o porquê das mudanças no sentido da política energética
nacional.
Em um segundo momento foram comentadas as bases jurídicas e históricas do direito
ao desenvolvimento e do direito ao desenvolvimento sustentável. Em consequência do
momento de incertezas jurídicas vivenciado atualmente, fez-se indispensável revisitar a base
de tais construções teóricas com o nítido intuito de, ao revisitá-las, demonstrar sua
importância e compreender a necessidade de atenção ao que está ocorrendo hodiernamente no
setor. Por isso a insistência em expor conceitos e tentar aplicá-los aos biocombustíveis, ao
expor a juridicização do direito ao desenvolvimento e do direito ao meio ambiente, tratado
pelo viés do desenvolvimento sustentável.
Com as exposições da juridicização do desenvolvimento e do desenvolvimento
sustentável realizadas, respectivamente, nos itens 2.2.1 e 2.3.1, buscou-se responder o
primeiro questionamento deste trabalho (“Como fomentar adequadamente um ramo tão
importante da economia?”), obtendo como resposta, que o fomento deve seguir as bases de
um desenvolvimento socioeconômico ambientalmente sustentável.
Os itens 2.2.2 e 2.3.2 objetivaram responder o segundo questionamento (“Quais os
riscos da ausência do fomento estatal adequado à atividade produtiva dos biocombustíveis
frente ao quadro do Estado constitucional brasileiro em crise?”), obtendo como resposta que o
risco é um agravamento da própria crise da qual o país tenta sair, pois qualquer crescimento as
expensas de desmatamento e outras explorações podem causar um crescimento da economia,
mas não o pleno desenvolvimento duradouro e adequado ao conclamado constitucionalmente.
No Capítulo 3 foi realizada uma digressão, trazendo a transição do positivismo
jurídico para o pós-positivismo jurídico. No contexto do pós-positivismo jurídico, em geral,
os princípios e as normas constitucionais valem-se de variadas cláusulas gerais e abstratas,
mas nem por isso podemos entrar em uma era jurídica e política em que elas sejam ignoradas
à livre vontade do Legislativo brasileiro. São muitos anos de construções históricas, jurídicas,
morais, embutidas nas normas e princípios jurídicos constitucionais para que eles
simplesmente sejam ignorados, inclusive com o reforço de criação de leis ambientais, como
recentemente ocorrido na Amazônia brasileira, com a redução de reservas ambientais, no
Projeto de Lei nº 8.107/2017, o Projeto de Lei do Jamanxim.
Com o Capítulo 3 tentou-se responder ao terceiro questionamento desta dissertação:
“A produção brasileira de biocombustíveis é dotada de sustentabilidade ao ponto de ser capaz
126
de concretizar uma justiça intergeracional aos moldes do art. 225 da Constituição Federal?”.
Obtendo como resposta que ainda são necessárias muitas mudanças para que tal potencial seja
concretizado. Para responder tal inquietação, foram trazidas à baila algumas teorias da justiça
entre gerações, a explanação da justiça intergeracional ambiental e sua aplicação à produção
de biocombustíveis.
No quarto e último capítulo, buscou-se responder o quarto questionamento desta
dissertação, no item 4.1: “Existe viabilidade nos programas de fomento lançados em gestões
governamentais anteriores (a exemplo do Programa Nacional do Álcool – PROÁLCOOL e do
Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel – PNPB) diante do quadro de crise?”. A
resposta obtida para o quarto questionamento foi que o PROÁLCOOL obteve sucesso quando
da sua implantação, mas nos moldes do passado não é mais viável. Já o PNPB possuía bases
mais sólidas, no sentido de ser um programa constitucionalmente mais efetivo, entretanto, não
atingiu bem seus objetivos – a despeito disso, esta dissertação o julgou como o mais
constitucionalmente coerente dos programas governamentais aqui estudados.
Ainda no Capítulo 4, no item 4.2, tentou-se responder o quinto questionamento: “O
novo marco regulatório proposto para os biocombustíveis é viável?”. Obtendo como resposta
um impasse, uma vez que a Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais parece capaz de
se tornar viável, na prática, mas que pode se revelar algo completamente desastroso; e o
Programa RENOVABIO precisa primeiramente refletir os valores constitucionais, para
posteriormente ser capaz de se tornar viável no sentido constitucional das expressões
desenvolvimento e desenvolvimento sustentável.
Por fim, no item 4.3 (último item do Capítulo 4), tentou-se responder o sexto e
último questionamento deste trabalho: “Qual o papel legislativo e jurídico diante desse setor
produtivo?”. Ao se trazer a experiência prática do estado do Rio Grande do Norte com a
produção de biodiesel via PNPB, viu-se o descompasso entre o proposto por uma política
pública governamental, a sua forma de execução pelas empresas estatais e demais órgãos
governamentais, e a prática no dia a dia da produção, demonstrando que o papel do Direito e
do Poder Legislativo é conseguir diminuir o descompasso nas políticas públicas brasileiras.
Acerca do círculo tríade de análise proposto para este trabalho, qual seja: trabalhar
com os biocombustíveis enquanto uma centralidade temática e que possui em seu entorno
diversas questões circundantes, que se interconectam, como o desenvolvimento, o
desenvolvimento sustentável, a inclusão social (1), os programas e as políticas públicas (2),
que devem fomentar, em última forma, uma construção mais democrática da sociedade [pano
127
de fundo] (que não se desenlaçam sozinhos carregando em si influências das agências e dos
organismos internacionais), e promovendo a justiça intra e intergeracional (3).
Concluiu-se que ainda é um viés teórico, e no atual contexto, difícil de ser
concretizado, pois transpassa por um momento de transição complexo: uma verdadeira
mudança de paradigma estatal. O modelo almejado, portanto, equaliza-se melhor com o
modelo anterior de Estado, baseado no Welfare State.
Quanto à questão social, concluiu-se que não se pode ignorar que grande parte das
lavouras monocultoras possui elevado grau de mecanização, não gerando tantos empregos ou
gerando empregos precários (são recorrentes as denúncias sobre usinas e produtores que
tratam trabalhadores em verdadeiros regimes de escravidão moderna). Mas pelos dados de
relatórios de agências nacionais e internacionais, o Brasil ainda conseguiu resultados
consideráveis na geração de emprego.
Ainda em referência à questão social, conclui-se por defender a visão de Amartya
Sen, ao explicar que: “os fins e os meios do desenvolvimento exigem que a perspectiva da
liberdade seja colocada no centro do palco. Nesta perspectiva, as pessoas têm de ser vistas
como ativamente envolvidas – dada a oportunidade na conformação do seu próprio destino, e
não apenas como beneficiárias passivas dos frutos de engenhosos programas de
desenvolvimento. O Estado e a sociedade têm papéis de sustentação, e não apenas de entrega
sob encomenda” 271
.
Quanto ao desenvolvimento sustentável, concluiu-se que tem plenas condições de se
concretizar, mas não tanto pela lógica da captura de carbono e sim por ações integradas à
biotecnologia. Bem como, concluiu-se por corroborar com o pensamento de François Ost,
pois enquanto não se repensar a relação com a natureza, todos os esforços serão em vão, por
isso atualmente testemunha-se a relativa efetividade do direito ambiental e a modéstia eficácia
de políticas públicas nessa matéria272
.
Quanto ao desenvolvimento econômico em si, concluiu-se que deve ser visto de
forma integrada com o desenvolvimento sustentável e o aspecto social, atualmente assemelha-
se mais ao Workfare State, em consequência da mudança de paradigma de gestão
governamental.
Quanto à concretização das justiças intra e intergeracional, concluiu-se que há
potencial, mas são necessárias modificações nos aspectos do desenvolvimento, do
271
SEN, Amartya. Desenvolvimento como Liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 71. 272
OST, François. A natureza à margem da lei: a ecologia à prova do direito. Lisboa: Piaget, 1997. p. 9.
128
desenvolvimento sustentável e da inclusão social, para que elas sejam realizáveis de maneira
plena.
Por fim, resta o sonho de que os pilares fundamentais da dimensão socioeconômica
do modelo jurídico do desenvolvimento sejam efetivamente o Estado democrático como
promotor do desenvolvimento, do planejamento econômico-social participativo e de um
processo de mudança estrutural no âmbito social e econômico273
.
273
CORRÊA, Leonardo Alves. Desenvolvimento econômico e desenvolvimento: uma interpretação a partir da
constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011. p. 132.
129
ANEXO I
Esquema simplificado do circuito produtivo do Biodiesel no RN - girassol.
Esquema simplificado do circuito do biodiesel no RN a partir do girassol (SANTOS,
2013) 274
.
274
SANTOS, Lúcia Rosa dos. O circuito espacial de produção do biodiesel: configuração no território brasileiro
e uso do território norte-rio-grandense. 2013. 231 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, Natal, 2013. p. 30.
130
ANEXO II
Fotografias da plantação de Girassóis em Canudos-RN
Todas as fotografias foram registradas na região do Mato Grande – Ceará-Mirim/RN,
mostrando as diversas etapas do plantio do girassol275
.
Foto 1. Registro da preparação do solo.
Foto 2. Agricultores assentados preparando a terra para o plantio do girassol.
275
Cedidas pelo Professor Doutor Deusimar Brasil e disponíveis em: COPEC (Cooperativa dos Produtores de
Canudos). Relatório de Atividades do Projeto Biodiesel – Girassol, 2008.
131
Foto 3. Registro da agricultura ainda carente de mecanização na produção de girassol.
Foto 4. Semente de girassol germinando.
132
Foto 5. O crescimento da plantação de girassol em regime de sequeiro.
Foto 6. Agricultores manejando a plantação de girassol.
133
Foto 7. A plantação já crescida e pronta para extração do óleo.
Foto 8. A beleza e a dimensão da plantação de girassóis.
134
Foto 9. Assentamento de Canudos: A; Mini-usina de extração de óleo de girassol: B;
Residência de uma família de assentados: C; Plantio de mamão: D.276
276
GIRÃO, Suzana Maia. A produção de biodiesel no assentamento Canudos RN: perspectivas e limites da
inclusão social. 2011. 90 f. Dissertação (Mestrado em Meio Ambiente, Cultura e Desenvolvimento) -
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2011. p. 30.
135
Foto 10. Galpão alugado pela Petrobras para armazenagem de sementes em Apodi/RN.277
277
SANTOS, Lúcia Rosa dos. O circuito espacial de produção do biodiesel: configuração no território brasileiro
e uso do território norte-rio-grandense. 2013. 231 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, Natal, 2013. p. 176.
136
REFERÊNCIAS
ALENCASTRO, Mário Sérgio. Hans Jonas e a proposta de uma ética para a civilização
tecnológica. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 19, jan./jun. 2009, p. 13-27. Disponível
em: <http://revistas.ufpr.br/made/article/viewFile/14115/10882>. Acesso em: 20 jun. 2017.
ALMEIDA, Luciana Togeiro de. Política ambiental: Uma análise econômica. São Paulo:
UNESP, 1998.
ANP. Biocombustíveis. Disponível em: <http://www.anp.gov.br/wwwanp/biocombustiveis>.
Acesso em: 4 abr. 2017.
ARAÚJO, Tânia Bacelar de. Desenvolvimento Regional no Brasil. In: FURTADO, Celso. O
pensamento de Celso Furtado e o Nordeste hoje. Rio de Janeiro: Contraponto: Centro
Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento: Banco do Nordeste do
Brasil, 2009.
ARCO MATO GRANDE. Proposta do Projeto Mazaroio. Disponível em:
<http://www.ccet.ufrn.br/broffice/CursoBROFFICE%20-
%20ESTRUTURADO/ArquivosAulas/Microsoft%20Word%20-
%20Projeto%20Mazaroio.pdf>. Acesso em: 1 nov. 2016.
ARCO MATO GRANDE. PROJETO MAZAROIO: Consolidação de cadeias de produção
animal interligadas ao Programa Biodiesel – girassol em assentamentos de reforma agrária no
território do Mato Grande/RN. Relatório Final. 2011.
BARRAL, Welber (org). Direito e desenvolvimento: análise da ordem jurídica brasileira sob a
ótica do desenvolvimento. São Paulo: Singular, 2005.
BARRETO NETO, Francisco Nabuco de A. Bioenergia e exclusão regional: a não política
nacional agroenergética e os girassóis do RN. 2009. 362 f. Tese (Doutorado em
Desenvolvimento Regional; Cultura e Representações) - Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, Natal, 2009.
BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: O triunfo
tardio do direito constitucional no Brasil. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n.
240, p.1-42, abr./jun. 2005. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.12660/rda.v240.2005>.
Acesso em: 26 jun. 2017.
137
BARROSO, Luís Roberto Barroso. O novo direito constitucional brasileiro: contribuições
para a construção teórica e prática da jurisdição constitucional no Brasil. Belo Horizonte:
Fórum, 2013.
BBC-BRASIL. Cinco efeitos globais da saída dos EUA do acordo de Paris. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/internacional-40114352>. Acesso em: 1 jun. 2017.
BERCOVICI, Gilberto. Desigualdades regionais, Estado e Constituição. São Paulo: Max
Limonad, 2003.
BERCOVICI, Gilberto. Direito Econômico do Petróleo e dos Recursos Minerais. São Paulo:
Quartier Latin, 2011.
BIODIESELBR. A verdadeira história do Proálcool. Disponível em:
<https://www.biodieselbr.com/proalcool/historia/proalcool-historia-verdadeira.htm>. Acesso
em 11 jul. 2017.
BIODIESELBR. Pró-Alcool – Programa Brasileiro de Álcool. Disponível em:
<http://www.biodieselbr.com/proalcool/pro-alcool.htm>. Acesso em: 11 jul. 2017.
BIODIESELBR. Selo Social ganha novo conjunto de regras. Disponível em:
<https://www.biodieselbr.com/noticias/agricultura/selo/selo-social-ganha-novo-conjunto-
regras-060917.htm>. Acesso em: 7 set. 2017.
BNDES. Análise socioambiental de projetos. Disponível em:
<http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Areas_de_Atuacao/Meio_Ambiente/P
olitica_Socioambiental/analise_ambiental.html>. Acesso em: 13 maio 2017.
______. Diretrizes e Critérios Ambientais para apoio ao setor do Açúcar e do Álcool.
Disponível em:
<http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Areas_de_Atuacao/Meio_Ambiente/P
olitica_Socioambiental/diretrizes_acucar_alcool.html>. Acesso em: 13 maio de 2017.
______. Política Socioambiental. Disponível em:
<http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Areas_de_Atuacao/Meio_Ambiente/P
olitica_Socioambiental/>. Acesso em: 13 maio 2017.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
138
BOLSON, Simone Hegele. A dimensão filosófico-jurídica da equidade intergeracional:
reflexões sobre as obras de Hans Jonas e Edith Brown Weiss. Revista Jus Navigandi, ISSN
1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3575, 15 abr. 2013. Disponível
em: <https://jus.com.br/artigos/24189>. Acesso em: 28 jun. 2017.
BOSSELMANN, Klaus. The principle of sustainability: transforming Law and governance.
Aldershot: Ashgate, 2008.
BP. BP Energy Outlook: 2017 edition. Disponível em:
<https://www.bp.com/content/dam/bp/pdf/energy-economics/energy-outlook-2017/bp-
energy-outlook-2017.pdf>. Acesso em: 16 maio 2017.
BRANDÃO, Luiz Carlos Kopes; SOUZA, Carmo Antônio de. O princípio da equidade
intergeracional. Planeta Amazônia: Revista Internacional de Direito Ambiental e Políticas
Públicas, Macapá, v. 1, n. 2, p.163-175, jan. 2012.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
______. Decreto nº 5.297, de 6 de dezembro de 2004. Dispõe sobre os coeficientes de redução
das alíquotas da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes na produção e na
comercialização de biodiesel, sobre os termos e as condições para a utilização das alíquotas
diferenciadas, e dá outras providências.
______. Decreto nº 6.458, de 14 de maio de 2008. Altera o art. 4o do Decreto n
o 5.297, de 6 de
dezembro de 2004, que dispõe sobre os coeficientes de redução diferenciados das alíquotas da
Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes na produção e na comercialização de
biodiesel.
______. Decreto nº 7.768, de 27 de junho de 2012. Altera o Decreto nº 5.297, de 6 de
dezembro de 2004, que dispõe sobre os coeficientes de redução das alíquotas da Contribuição
para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes na produção e na comercialização de biodiesel, e
sobre os termos e as condições para a utilização das alíquotas diferenciadas.
______. Decreto nº 8.375, de 11 de dezembro de 2014. Define a Política Agrícola para
Florestas Plantadas.
______. Lei Federal nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política agrícola.
______. Lei Federal nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política agrícola.
139
BRASIL. Lei Federal nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações
previsto no inciso XXXIII do art. 5o, no inciso II do § 3
odo art. 37 e no § 2
o do art. 216 da
Constituição Federal; altera a Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei
no 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei n
o 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá
outras providências.
______. Lei Federal nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política agrícola.. Lei
Federal nº 13.033, de 24 de setembro de 2014. Dispõe sobre a adição obrigatória de biodiesel
ao óleo diesel comercializado com o consumidor final; altera as Leis nos
9.478, de 6 de agosto
de 1997, e 8.723, de 28 de outubro de 1993; revoga dispositivos da Lei no 11.097, de 13 de
janeiro de 2005; e dá outras providências.
______. Lei Federal nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política agrícola.. Lei
Federal nº 13.123, de 20 de maio de 2015. Regulamenta o inciso II do § 1o e o § 4
o do art.
225 da Constituição Federal, o Artigo 1, a alínea j do Artigo 8, a alínea c do Artigo 10, o
Artigo 15 e os §§ 3o e 4
o do Artigo 16 da Convenção sobre Diversidade Biológica,
promulgada pelo Decreto no 2.519, de 16 de março de 1998; dispõe sobre o acesso ao
patrimônio genético, sobre a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional associado e
sobre a repartição de benefícios para conservação e uso sustentável da biodiversidade; revoga
a Medida Provisória no 2.186-16, de 23 de agosto de 2001; e dá outras providências.
______. Lei Federal nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política agrícola.. Lei
Federal nº 13.263, de 23 de março de 2016. Altera a Lei nº 13.033, de 24 de setembro de
2014, para dispor sobre os percentuais de adição de biodiesel ao óleo diesel comercializado no
território nacional.
______. Lei Federal nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política agrícola..
Projeto de Lei nº 3680/2008. Dispõe sobre o ordenamento do cultivo de cana-de-açúcar e dá
outras providências. Estabelece critérios para o gerenciamento do cultivo da cana-de-açúcar
de modo a evitar que seu cultivo prejudique o abastecimento de produtos alimentares.
Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=403585>.
Acesso em 24 jun. 2017.
______. Lei Federal nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política agrícola..
STF. ADI nº 3.540 MC. Relator: Ministro Celso de Mello. DJ de 3-2-2006. Brasília, 2006.
Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=387260>. Acesso em:
12 ago. 2017.
BRESOLIN, Kleberson; CICHOWSKI, Vicente Cougo. Sobre o conceito de justiça em John
Rawls e Robert Nozick. Clareira: revista de filosofia da Região Amazônica, v.1, n. 2, p.123-
138, ago./dez. 2014. Disponível em: <
140
http://www.revistaclareira.com.br/index.php/clareira/article/viewFile/31/24>. Acesso em: 19
jul. 2017.
BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Desenvolvimento e crise no Brasil. São Paulo:
Brasiliense, 1982.
BRUNDTLAND, Gro Harlem. Nosso futuro comum: comissão mundial sobre meio ambiente
e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1991.
BUCCI, Maria Paula Dallari (org.). Políticas Públicas: reflexões sobre o conceito jurídico.
São Paulo: Saraiva, 2006.
CAMARA DOS DEPUTADOS. Ficha de Tramitação do Projeto de Lei nº 1.291, de 24 de
abril de 2015. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=1215701>.
Acesso em: 8 ago. 2017.
CAMARGO, Ricardo Antônio Lucas. “Custos dos Direitos” e reforma do estado. Porto
Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2008.
CÂNDIDO, Gesinaldo Ataíde. SILVA, Valdenildo Pedro da. (org.) Indicadores de
Sustentabilidade em Agrossistemas. Natal: IFRN, 2015.
CARDOSO JÚNIOR, José Celso; ACIOLY, Luciana; MATIJASCIC, Milko. Trajetórias
recentes de desenvolvimento: estudos de experiências internacionais selecionadas. Brasília:
IPEA, 2009.
______; PIRES, Roberto Rocha C. Gestão Pública e desenvolvimento. Brasília: Ipea, 2011.
CASTRO, Alexandre Vilela Jardim. Legística e Modelos de Avaliação Legislativa: uma
proposta para o aprimoramento da produção normativa municipal de Belo Horizonte.
Disponível em: <http://www.al.sp.gov.br/StaticFile/ilp/legistica_e_mod_avalia_legisl.pdf>.
Acesso em: 27 jul. 2017.
CASTRO, Raifran Abidimar de; CASTRO, Edna Maria Ramos de. As Monoculturas e a
Sustentabilidade: Análises de três Regiões do Brasil. Sustentabilidade em Debate, [s.l.], v. 6,
n. 2, p.228-248, 31 ago. 2015. Editora de Livros IABS. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.18472/sustdeb.v6n2.2015.14975>. Acesso em: 24 jun. 2017.
141
CEASA. Governo inaugura Central da Agricultura Familiar... Disponível em:
<http://www.ceasa.rn.gov.br/Conteudo.asp?TRAN=ITEM&TARG=144113&ACT=&PAGE=
&PARM=&LBL=NOT%CDCIA>. Acesso em: 20 ago. 2017.
CHANG, Ha-Joon. Chutando a escada: a estratégia do desenvolvimento em perspectiva
histórica. São Paulo: UNESP, 2004.
CNA. Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil. Planto de eucalipto no Brasil: mitos
e verdades. Brasília: CNA, 2011. Disponível em:
<http://www.canaldoprodutor.com.br/sites/default/files/mitos-e-verdades-low.pdf>. Acesso
em: 21 jul. 2017.
CNPE. Resolução nº 14 de 8 de junho de 2017. Estabelece diretrizes estratégicas para a
política de biocombustíveis a ser proposta pelo Poder Executivo, cria o Comitê de
Monitoramento do Abastecimento de Etanol e o Comitê de Monitoramento do Abastecimento
de Biodiesel, e dá outras providências.
COMPARATO, Fábio Konder. Ensaio sobre o juízo de inconstitucionalidade de políticas
públicas. Revista de informação legislativa, v. 35, n. 138, p. 39-48, abr./jun. 1998. Disponível
em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/364>. Acesso em: 11 jul. 2017.
CONGRESSO NACIONAL. Relatório de atividades – 2016. (Comissão Mista Permanente
sobre Mudanças Climáticas). p. 3. Disponível em:
<http://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?11&codcol=1450>. Acesso em: 20 jul. 2017.
CONSANI, Cristina Forani; XAVIER, Yanko Marcius de Alencar. Considerações a respeito
da relação entre justiça intergeracional, democracia e sustentabilidade. Nomos: Revista do
Programa de Pós-graduação em Direito da UFC, Fortaleza, v. 36.1, n. 1, p.145-164, jan./jun.
2016. Semestral. Disponível em: <http://www.periodicos.ufc.br/nomos/issue/view/473>.
Acesso em: 11 jun. 2017.
COP21, UNFCCC. Acordo de Paris. Disponível em:
<https://nacoesunidas.org/acordodeparis/>. Acesso em: 15 maio 2017.
CORREA, Ceres Fernanda; GOMES, Eduardo Biacchi. O direito fundamental ao
desenvolvimento sustentável: uma análise a partir do caso das papeleras. Revista de
informação legislativa, Brasília a. 48, n. 189, p. 177-187, jan./mar. 2011. Disponível em:
<https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/242869/000910802.pdf?sequence=1>.
Acesso em: 24 jun. 2017.
142
CORRÊA, Leonardo Alves. Direito Econômico e Desenvolvimento: uma interpretação a partir
da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Publit, 2011.
COSTA, Greiner Costa; DAGNINO, Renato (org.). Gestão estratégica em políticas públicas.
Campinas: Editora Alínea, 2013.
COSTA, Hirdan Katarina de Medeiros. O princípio da justiça intra e intergeracional como
elemento na destinação das rendas de hidrocarbonetos: temática energética crítica na análise
institucional brasileira. 2012. 342 f. Tese (Doutorado – Programa de Pós-Graduação em
Energia) EP/FEA/IEE/IF da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em:
<HTTP://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/86/86131/tde-21092012-181014/ptbr.php>.
Acesso em: 10 jun. 2017.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição.
Coimbra: Almedina, 2000.
DIAS, Jean Carlos; GOMES, Marcus Alan de Melo (org.). Direito e desenvolvimento. São
Paulo: Método, 2014.
DIMOULIS, Dimitri. Estado de direito e o desafio do desenvolvimento. São Paulo: Saraiva,
2011. (Coleção direito, desenvolvimento e justiça. Série Produção científica).
DIMOULIS, Dimitri. Positivismo jurídico: significado e correntes. Enciclopédia jurídica da
PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire
(coords.). Tomo: Teoria Geral e Filosofia do Direito. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro
de Azevedo Gonzaga, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em:
<https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/84/edicao-1/positivismo-juridico:-significado-
e-correntes>. Acesso em: 26 jun. 2017.
DUTRA, Carolina. Análise Jurídica de Políticas Públicas de Produção e Uso do Biodiesel no
Brasil: Impactos sobre o clima e a biodiversidade. 2009. 184 f. Dissertação (Mestrado) -
Curso de Direito, Universidade Católica de Santos, Santos, 2009. Disponível em:
<http://biblioteca.unisantos.br:8181/handle/tede/66>. Acesso em: 25 jul. 2017.
DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
EPE. Análise de conjuntura dos biocombustíveis – ano 2016. Disponível em:
<http://aprobio.com.br/wp-content/uploads/2017/06/EPE_An%C3%A1lise-de-Conjuntura-
dos-Biocombust%C3%ADveis-%E2%80%93-Ano-2016.pdf>. Acesso em: 25 jul. 2017.
143
EPE. Balanço Energético Nacional – relatório síntese. Disponível em:
<https://ben.epe.gov.br/BENRelatorioSintese.aspx?anoColeta=2017&anoFimColeta=2016>.
Acesso em: 16 jun. 2017.
EPE. Relatório de Análise de Conjuntura de Biocombustíveis 2016. Disponível em:
<http://www.epe.gov.br/Petroleo/Paginas/PaineldeBiocombust%C3%ADveis%E2%80%93B
oletinsdean%C3%A1lisedeconjuntura.aspx>. Acesso em: 05 jun. 2017.
FAERN. Biodiesel ganha nova chance no RN. Disponível em:
<http://www.faern.com.br/novosite/noticia/biodiesel-ganha-nova-chance-no-rn>. Acesso em:
1 nov. 2016.
FARIA, José Eduardo (org.). A Crise do Direito numa Sociedade em Mudança. Brasília:
UnB, 1988. (Coleção Roberto Lyra Filho: pensamento crítico no direito).
FARIA, José Eduardo. O Direito na Economia Globalizada. São Paulo: Malheiros, 2004.
______. O Estado e o Direito Depois da Crise. São Paulo: Saraiva, 2011. (Série Direito,
Desenvolvimento e Justiça: direito em debate).
______. Sociologia jurídica: direito e conjuntura. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. (Série
GVlaw).
______. (org.) Direito e globalização econômica: implicações e perspectivas. São Paulo:
Malheiros, 1996.
FGV e EPC. Propostas empresariais de políticas públicas para uma economia de baixo
carbono no Brasil. Disponível em:
<http://intranet.gvces.com.br/cms/arquivos/recomendacoes_epc.pdf>. Acesso em: 27 jul.
2017.
FONSECA, Pedro Cezar Dutra. Desenvolvimentismo: a construção do conceito [paper]. In:
MALTA, Maria; SANTOS, Cleusa; ACOSTA, Luis. Seminário e debate UFRJ, em 25 set.
2013. Disponível em:
<http://www.centrocelsofurtado.com.br/arquivos/image/201309121650480.Conceito%20Dese
nvolvimentismo%20-%20Pedro%20Fonseca.pdf>. Acesso em: 16 abr. 2017.
FREIRIA, Rafael Costa. Direito, gestão e políticas públicas ambientais. São Paulo: Senac SP,
2011.
144
FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
FREITAS FILHO, Roberto. Crise do Direito e Juspositivismo: a exaustão de um paradigma.
2. ed. Brasília: Uniceub, 2013. Disponível em:
<http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/4067/1/Crise%20do%20Direito.pdf>. Acesso em:
2 maio 2017.
FURTADO, Celso; et al. O pensamento de Celso Furtado e o Nordeste. Rio de Janeiro:
Contraponto, 2009. (Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o
Desenvolvimento).
GABBAY, Samuel Max; MAIA, Vinicius Fernandes Costa. O paradigma da regulação do
biodiesel. In: XAVIER, Yanko Marcius de Alencar et al (Org.). Direito do petróleo, gás
natural e biocombustíveis: estudo em homenagem à professora Helenice Vital. Natal: Edufrn,
2013. p. 133-153. (Série direito dos recursos naturais e da energia).
GIAMBIAGI, Fábio; BARROS, Octávio de. Brasil pós-crise: agenda para a próxima
década. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
GIANNETTI, Eduardo. O valor do amanhã: ensaio sobre a natureza dos juros. São Paulo:
Companhia das Letras, 2005.
GIRÃO, Suzana Maia. A produção de biodiesel no assentamento Canudos RN: perspectivas e
limites da inclusão social. 2011. 90 f. Dissertação (Mestrado em Meio Ambiente, Cultura e
Desenvolvimento) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2011. Disponível
em: <http://repositorio.ufrn.br:8080/jspui/handle/123456789/18219>.
GOIS, Francisco F. de; SANTOS, Arnaldo. Microcrédito e desenvolvimento regional.
Instituto para o desenvolvimento de estudos econômicos, sociais e políticas públicas.
Fundação Paulo Bonavides. Fortaleza: Premius, 2011.
GOMIDE, Alexandre de Ávila; PIRES, Roberto Rocha C. (ed.). Capacidades estatais e
democracia: arranjos institucionais de políticas públicas. Brasília: Ipea, 2014.
HABERMAS, Jünger. Tendências da juridicização [Trends in the extension of the scope of
the law].Trad. Pierre Guibentif. Sociologia: Problemas e Práticas, Lisboa, v. 1, n. 2, p.185-
204, maio 1987. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10071/1122>. Acesso em: 10 abr.
2017.
145
IBGE. Dados sobre o estado do Rio Grande do Norte – 2016. Disponível em:
<http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=240810>. Acesso em: 26 jun. 2017.
INPE. Protocolo de Kyoto (trad.). Disponível em:
<http://mudancasclimaticas.cptec.inpe.br/~rmclima/pdfs/Protocolo_Quioto.pdf>. Acesso em:
17 maio 2017.
IRENA. Renewable Energy and Jobs – Annual Review 2017. Abu Dabhi: International
Renewable Energy Agency, 2017. Disponível em:
<https://www.irena.org/DocumentDownloads/Publications/IRENA_RE_Jobs_Annual_Revie
w_2017.pdf>. Acesso em: 02 mar. 2017.
IPAM. Relação entre cultivo de soja e desmatamento: compreendendo a dinâmica.
Disponível em: <http://www.ipam.org.br/biblioteca/livro/Relacao-entre-cultivo-de-soja-e-
desmatamento-Compreendendo-a-dinamica/647>. Acesso em: 28 de jun. 2017.
IPEA. Comunicados IPEA. Disponível em:
<http://www.acirgurgacz.com.br/pdfs/codigoflorestal3.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2017.
INSTITUTO CARBONO BRASIL. Mercado Voluntário de Carbono. Disponível em:
<http://www.institutocarbonobrasil.org.br/mercado_de_carbono/mercado_voluntario>.
Acesso em: 27 maio 2017.
JANK, Marcos Sawaya; NAPPO, Marcio. Etanol da cana-de-açúcar: uma solução energética
global sob ataque. In: ABROMOVAY, Ricardo (Org.). Biocombustíveis: A energia da
controvérsia. São Paulo: SENAC, 2009, p. 19-57.
JONAS, Hans. O princípio da responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização
tecnológica. Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez (trad.). Rio de Janeiro: Contraponto, 2006.
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2009.
KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
p. 12.
KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. A CRFB/1988 encontra Keynes: a viabilidade do
Estado Social nos momentos de crise. In: DIAS, Jean Carlos; GOMES, Marcus Alan de Melo
(coord.). Direito e Desenvolvimento. São Paulo: Método, 2014. p. 451-470.
146
LADISLAU, Dowbor; SACHS, Ignacy; LOPES, Carlos (org.). Riscos e Oportunidades: em
tempos de mudanças. São Paulo: Instituto Paulo Freire, 2010.
LAMEIRA, Wanja Janayna de Miranda; VIEIRA, Ima Célia Guimarães; TOLEDO, Peter
Mann de. Panorama da Sustentabilidade na Fronteira Agrícola de Bioenergia na
Amazônia. Sustentabilidade em Debate, [s.l.], v. 6, n. 2, p.193-210, 31 ago. 2015. Editora de
Livros IABS. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.18472/sustdeb.v6n2.2015.12696.>.
Acesso em: 24 jun. 2017.
LANZOTTI, C. R. Uma análise energética de tendências do setor sucroalcooleiro. 2000. 96
f. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2000.
LEITE, José Rubens Morato; CANOTILHO, José Joaquim Gomes (org.) Direito
constitucional ambiental brasileiro. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
LIMA, Marcos Costa. Revisitando a teoria do subdesenvolvimento de Celso Furtado. In:
FURTADO, Celso; et al. O pensamento de Celso Furtado e o Nordeste. Rio de Janeiro:
Contraponto, 2009. (Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o
Desenvolvimento).
MACHADO, Carlos José Saldanha. Tecnologia, Meio Ambiente e Sociedade: uma introdução
aos modelos teóricos. Rio de Janeiro: E-Papers Serviços Editoriais, 2003.
______. Ciências, políticas públicas e sociedade sustentável. Rio de Janeiro: E-Papers
Serviços Editoriais, 2012.
MAGALHÃES, Raphael de Almeida. Desenvolvimento econômico: escolha política, e não
técnica. In: CARDOSO JR., José Celso (org.). Desafios ao desenvolvimento brasileiro:
contribuições do conselho de orientação do Ipea. v.1. Brasília: IPEA, 2009. p. 253-262.
MAPA. Produção integrada da cadeia agrícola. Disponível em:
<http://www.agricultura.gov.br/desenvolvimento-sustentavel/producao-integrada>. Acesso
em: 17 de maio 2017.
MDA. Instrução Normativa n° 01, de 05 de julho de 2005. Disponível em:
<http://www.lex.com.br/doc_395583_INSTRUCAO_NORMATIVA_N_1_DE_5_DE_JULH
O_DE_2005.aspx>. Acesso em: 13 jul.
147
______. Instrução Normativa nº 02, de 30 de setembro de 2005. Disponível em:
<http://www.mda.gov.br/sitemda/sites/sitemda/files/user_arquivos_627/IN%2002%20-
%202005%20MDA.pdf>. Acesso em: 13 jul. 2017.
MDA. Mudanças na portaria do Selo Combustível Social. Disponível em:
<http://www.mda.gov.br/sitemda/mudan%C3%A7as-na-portaria-do-selo-
combust%C3%ADvel-social>. Acesso em: 20 jul. 2017.
______. O que é agricultura familiar. Disponível em:
<http://www.mda.gov.br/sitemda/noticias/o-que-%C3%A9-agricultura-familiar>. Acesso em:
20 jul. 2017.
______. Portaria MDA nº 337, de 18 de setembro de 2015. Disponível em:
<https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=303619>. Acesso em: 20 jul. 2017.
MDA-SEAD. Portaria nº 512, de 5 de setembro de 2017. Disponível em:
<http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/servlet/INPDFViewer?jornal=1&pagina=5&data=06/09/2
017&captchafield=firistAccess>. Acesso em: 8 set. 2017.
MENDES, Judas Tadeu Grassi; SILVA, Christian Luiz da (orgs.). Reflexões sobre o
desenvolvimento sustentável: agentes e interações sob a ótica multidisciplinar. Petrópolis:
Vozes, 2005.
MILANEZ, Artur Yabe et al. O Acordo de Paris e a transição para o setor de transportes de
baixo carbono: o papel da Plataforma para o Biofuturo. BNDES Setorial: biocombustíveis,
Rio de Janeiro, n. 45, p. 285-340, mar. 2017. Disponível em:
<https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/handle/1408/11756>. Acesso em: 20 maio 2017.
MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: A gestão ambiental em foco: Doutrina. Jurisprudência.
Glossário. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2010.
______. Princípios fundamentais do direito do ambiente. Revista Justitia, São Paulo, n. 59,
p.134-151, jan-dez/1998. Disponível em:
<http://www.revistajustitia.com.br/revistas/w71d84.pdf>. Acesso em: 23 jun. 2017.
MILARÉ, Édis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. (COORD). Novo Código Florestal.
Revista dos Tribunais: São Paulo, 2013.
MME. Biodiesel: o novo combustível do Brasil – Programa Nacional de Produção e uso do
Biodiesel. Disponível em:
148
<http://www.mme.gov.br/programas/biodiesel/galerias/arquivos/biodiesel/Apres_MinistraME
_06-12-04.pdf>. Acesso em: 13 jul. 2017.
MME. Mais informações acerca das diretrizes do Programa Nacional de Produção e Uso do
Biodiesel. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/programas/biodiesel/menu/programa/objetivos_diretrizes.html>.
Acesso em: 21 maio 2017.
______. Portaria nº 272, de 14 de julho de 2017. Disponível em:
<http://www.lex.com.br/legis_27471156_PORTARIA_N_272_DE_14_DE_JULHO_DE_201
7.aspx>. Acesso em 22 jul. 2017.
MME. RENOVABIO. Disponível: <http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-
gas-natural-e-combustiveis-renovaveis/programas/renovabio/principal>. Acesso em: 22 jul.
2017.
______. RENOVABIO – Cenários e simulação de impacto. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis/programas/renovabio/documentos/apresentacoes/renovabio-detalhamento-da-
proposta-
25/08/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id
=column-
1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_re
direct=http%3A%2F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-
gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Frenovabio-
detalhamento-da-proposta-
25%2F08%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26
p_p_mode%3Dview%26p_p_col_id%3Dcolumn-
1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=32440695>. Acesso em: 22 jul. 2017.
______. RENOVABIO – Diretrizes estratégicas para biocombustíveis – consulta pública.
Disponível em: <http://www.mme.gov.br/web/guest/consultas-
publicas?p_p_id=consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet&p_p_lifecycle=0&p_
p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-
1&p_p_col_count=1&_consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet_consultaId=26
&_consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet_mvcPath=%2Fhtml%2Fpublico%2F
dadosConsultaPublica.jsp>. Acesso em: 22 jul. 2017.
______. Contribuições a consulta pública: PETROBRAS. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis/programas/renovabio/documentos/apresentacoes/contribuicoes-a-consulta-publica-
20/03/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id
=column-
149
1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_re
direct=http%3A%2F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-
gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Fcontribuicoes
-a-consulta-publica-
20%2F03%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26
p_p_mode%3Dview%26p_p_col_id%3Dcolumn-
1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=9185097>. Acesso em: 22 jul. 2017.
MME. Contribuições a consulta pública: PNUD. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis/programas/renovabio/documentos/apresentacoes/contribuicoes-a-consulta-publica-
20/03/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id
=column-
1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_re
direct=http%3A%2F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-
gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Fcontribuicoes
-a-consulta-publica-
20%2F03%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26
p_p_mode%3Dview%26p_p_col_id%3Dcolumn-
1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=9185001>. Acesso em: 23 jul. 2017.
______. RENOVABIO – Nota explicativa. Disponível em:
<http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis/programas/renovabio/documentos/apresentacoes/renovabio-detalhamento-da-
proposta-
25/08/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id
=column-
1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_re
direct=http%3A%2F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-
gas-natural-e-combustiveis-
renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Frenovabio-
detalhamento-da-proposta-
25%2F08%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26
p_p_mode%3Dview%26p_p_col_id%3Dcolumn-
1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=32739680>. p. 6. Acesso em: 29 ago. 2017.
MONTIBELLER FILHO, Gilberto. Ecodesenvolvimento e desenvolvimento sustentável:
conceitos e princípios. Textos de Economia, vol.4, n.1, Florianópolis, 1993, p.131-142.
MOREIRA, Emília. Capítulos da Geografia Agrária da Paraíba. João Pessoa: Universitária-
UFPB, 1997.
150
NEVES, Marcelo. Entre Hidra e Hércules: princípios e regras constitucionais como diferença
paradoxal do sistema jurídico. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013.
NODARI, Rubens Onofre. Sobre os biocombustíveis: impactos, benefícios e alternativas. In:
FERREIRA, Heline Sivini; LEITE, José Rubens Morato. Biocombustíveis: Fonte de energia
sustentável? Considerações jurídicas, técnicas e éticas. São Paulo: Saraiva, 2010.
NOVA CANA. Proposta de Aprimoramento do Marco Legal de Biocombustíveis. Disponível
em:
<https://www.novacana.com/pdf/06072017090751_PROPOSTA_DE_APRIMORAMENTO_
_DO_MARCO_LEGAL_DE_BIOCOMBUSTIVEIS.pdf>. Acesso em: 22 jul. 2017.
______. Retrocesso ambiental deve pôr Temer em saia-justa em conferência da ONU.
Disponível em: <https://nacoesunidas.org/?post_type=post&s=COP22>. Acesso em: 17 ago.
2017.
NUSDEO, Fábio. Curso de economia: introdução ao direito econômico. 3.ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001.
OLÍMPIO, Tiago César de Abrantes. Políticas Públicas e Bioenergia: do ecodesenvolvimento
à sustentabilidade. 2010. 109 f. Dissertação (Mestrado em ciências Juridicas) - Universidade
Federal da Paraíba, João Pessoa, 2010. Disponível em:
<http://tede.biblioteca.ufpb.br:8080/handle/tede/4432>.
OLIVEIRA, Carla Montefusco de. Método e sociologia em Weber: alguns conceitos
fundamentais. Revista Eletrônica Inter-legere, Natal, n. 3, p.1-10, jul./dez. 2008. Disponível
em: <http://www.cchla.ufrn.br/interlegere/revista/pdf/3/es02.pdf>. Acesso em: 16 abr. 2017.
ONG Repórter Brasil (Comp.). Ozoneamento agroecológico da cana-de-açúcar. Disponível
em: <http://reporterbrasil.org.br/documentos/zoneamento_cana_reporterbrasil_out09.pdf>.
Acesso em: 17 de maio 2017.
ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em:
<http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Declara%C3%A7%C3%A3o-Universal-dos-
Direitos-Humanos/declaracao-universal-dos-direitos-humanos.html>. Acesso em: 13 abr.
2017.
______. Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento. Disponível em:
<http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/desenvolv.htm>.
Acesso em: 13 abr. 2017.
151
ONU-BRASIL. COP21. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/cop21/>. Acesso em: 15
maio 2017.
ONU-BRASIL. COP22. Disponível em:
<https://nacoesunidas.org/?post_type=post&s=COP22>. Acesso em: 15 maio 2017.
PEDROTI, Paula Maciel. Desenvolvimento e inclusão social: o caso do arranjo político-
institucional do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel. In: GOMIDE,
Alexandre de Ávila; PIRES, Roberto Rocha C. (ed.). Capacidades estatais e democracia:
arranjos institucionais de políticas públicas. Brasília: Ipea, 2014. p. 213-236.
PEIXOTO, Marcus. Núcleo de estudos e pesquisas do Senado – Pagamento por serviços
ambientais – Aspectos teóricos e Proposições legislativas. Disponível em:
<http://www12.senado.gov.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-
discussao/td-105-pagamento-por-servicos-ambientais-aspectos-teoricos-e-proposicoes-
legislativas>. Acesso em: 12 de maio 2017.
PIOVESAN, Flávia Cristina. Direito ao Desenvolvimento. Disponível em:
<http://dhnet.org.br/direitos/militantes/flaviapiovesan/piovesan_direito_ao_desenvolvimento.
pdf>. Acesso em 14 abr. 2017.
______. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 9. ed. São Paulo: Saraiva,
2008.
PORTO, Uelton Carlos; MELO FILHO, Renato Soares de; DUARTE NETO, José. O
desenvolvimento sustentável e as políticas públicas de sustentabilidade: uma análise do
documento “our common future”. In: MANÍGLIA, Elisabete (org.). Direito, Políticas
públicas e sustentabilidade: temas atuais. São Paulo: UNESP, 2011.
PRADO, Luiz Carlos Delorme (org.) Desenvolvimento econômico e crise: ensaios em
comemoração aos 80 anos de Maria da Conceição Tavares. Rio de Janeiro: Contraponto,
2012.
PROCÓPIO, Argemiro. Subdesenvolvimento sustentável. 5. ed. Curitiba: Juruá, 2011.
RAMOS JÚNIOR, Dempsey Pereira. Amplitude do conceito jurídico de futuras gerações e do
respectivo direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 2011. 403 f. Dissertação
(Mestrado) - Curso de Direito, Universidade do Estado do Amazonas, Manaus, 2011.
Disponível em: <http://tede.uea.edu.br/jspui/bitstream/tede/155/5/Amplitude do conceito
jurídico de futuras gerações.pdf>. Acesso em: 18 jul. 2017.
152
REN21. Energias Renováveis 2016: relatório da situação mundial – resultados principais
2016. Paris: PNUMA, 2016. Disponível em: <http://www.ren21.net/wp-
content/uploads/2016/11/REN21_GSR2016_KeyFindings_port_02.pdf>. Acesso em: 20 abr.
2017.
RISTER, Carla Abrantkoski. Direito ao Desenvolvimento - antecedentes, significados e
conseqüências. Rio de Janeiro: Renovar, 2007.
RODRIGUEZ, Rodrigo (org.) et al. O novo direito e desenvolvimento: presente, passado e
futuro: textos selecionados de David M. Trubek. São Paulo: Saraiva, 2009. (Série direito em
debate: direito, desenvolvimento, justiça).
______. O novo direito e desenvolvimento: entrevista com David Trubek. Revista
Direitogv, São Paulo, v. 3, n. 2, p.305-330, set. jul-dez 2007. Disponível em:
<http://direitosp.fgv.br/sites/direitogv.fgv.br/files/rd-06_13_pp.305-
330_o_novo_direito_e_desenvolvimento_-_entrevista_com_david_trubek.pdf>. Acesso em:
10 abr. 2017
SACHS, Ignacy. A revolução energética do século XXI. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ea/v21n59/a03v2159.pdf>. Acesso em: 12 maio 2017.
______. As cinco dimensões do ecodesenvolvimento. In: Estratégias de transição para o
século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. São Paulo: Studio Nobel, 1993.
______. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2009.
SACHS, Wolfgang (org.). Diccionario del desarrollo: una guía del conocimiento como
poder. Perú: PRATEC, 1996.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as Ciências. 5. ed. São Paulo: Cortez,
2008.
SANTOS, Lúcia Rosa dos. O circuito espacial de produção do biodiesel: configuração no
território brasileiro e uso do território norte-rio-grandense. 2013. 231 f. Dissertação (Mestrado
em Geografia) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2013.
SANTOS, Thiago Mendonça; SOARES, Josemar Sidinei. O conceito de justiça no
pensamento filosófico de Aristóteles. Disponível em:
153
<https://uspdigital.usp.br/siicusp/cdOnlineTrabalhoVisualizarResumo?numeroInscricaoTrabal
ho=5327&numeroEdicao=18>. Acesso em: 26 jun. 2017.
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais: uma teoria geral dos
direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2009.
______ (org.). Estado socioambiental e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2010.
SCHAPIRO, Mário Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do estado na economia.
São Paulo: Saraiva, 2010. (Coleção direito, desenvolvimento e justiça: série produção
científica).
SEN, Amartya. Desenvolvimento como Liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 4. ed. São Paulo: Malheiros,
2007.
______. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2000.
______. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2002.
SILVA, Ricardo Perlingeiro Mendes da Silva. Teoria da Justiça de John Rawls. Revista de
Informação Legislativa. Brasília a. 35, 193-212, n. 138, abr./jun.-1998. p. 201-202.
Disponível em:
<http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/377/r138-16.pdf>. Acesso em: 19 jun.
2017.
SIQUEIRA, Carlos Henrique Romão; CARDOSO JÚNIOR, José Celso. Complexidade e
desenvolvimento. v. 3. Brasília: IPEA, 2011. (Diálogos para o Desenvolvimento).
SANTOS, Thiago Mendonça; SOARES, Josemar Sidinei. O conceito de justiça no
pensamento filosófico de Aristóteles. Disponível em:
<https://uspdigital.usp.br/siicusp/cdOnlineTrabalhoVisualizarResumo?numeroInscricaoTrabal
ho=5327&numeroEdicao=18>. Acesso em: 17 jun. 2017.
SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Econômico Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2008.
154
TÁVORA, Fernando Lagares et al. Comentários à Lei nº 13.123, de 20 de maio de 2015:
Novo Marco Regulatório do Uso da Biodiversidade. Brasília: Núcleo de Estudos e
Pesquisas/CONLEG/Senado, outubro/2015 (Texto para Discussão nº 184). Disponível em:
<www.senado.leg.br/estudos>. Acesso em: 20 maio 2017.
TÁVORA, Fernando Lagares et al. Centro de estudos da Consultoria do Senado – História e
Economia dos Biocombustíveis no Brasil. Brasília: Centro de estudos/CONLEG/SENADO,
abril/2011 (Texto para Discussão nº 89). Disponível em:
<https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-
discussao/td-89-historia-e-economia-dos-biocombustiveis-no-brasil>. Acesso em: 12 jul.
2017.
TETTI, Laura Maria Regina. Protocolo de Kyoto: Oportunidades para o Brasil com base em
seu setor sucroalcooleiro: um pouco da história da questão “mudanças” climáticas e efeito
estufa. In: MORAES, Márcia Azanha Ferraz Dias de; SHIKIDA, Pery Francisco Assis (org.).
Agroindústria canavieira no Brasil: evolução, desenvolvimento e desafios. São Paulo: Atlas,
2002. p. 199-213.
THE ECONOMIST. The death of the internal combustion engine. Disponível em:
<https://www.economist.com/news/leaders/21726071-it-had-good-run-end-sight-machine-
changed-world-death>. Acesso em: 13 ago. 2017.
TOBIN, James. What Is Permanent Endowment Income? The American Economic Review, v.
64, n. 2, Papers and Proceedings of the Eighty-sixth Annual Meeting of the American
Economic Association, p. 427-432, maio, 1974. Disponível em:
<http://www.jstor.org/stable/1816077>. Acesso em: 20 set. 2017.
TORRES, Danielle Alencar Parente; FILHO, Joaquim Raimundo de Lima; BELARMINO,
Luiz Clóvis (Ed. Téc.). Competitividade de cadeias agroindustriais brasileiras. Brasília:
Embrapa, 2013.
TRUBEK, David M. Para uma teoria social do direito: um ensaio sobre o estudo de direito e
desenvolvimento, in: José R. Rodriguez (org), O Novo Direito e Desenvolvimento: passado,
presente e futuro. São Paulo, 2008.
UNICA. Etanol brasileiro: Evolução da legislação e marco regulatório. Disponível em:
<http://www.senado.gov.br/comissoes/cae/ap/AP_20070514_Unica_PetroleoGasBiocombusti
veis.pdf>. Acesso em: 17 de maio 2017.
155
VALOR ECONÔMICO. O Brasil além da crise. Disponível em:
<http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,o-brasil-alem-da-crise,70001846146>. Acesso
em: 20 jun. 2017.
VEIGA, José Eli da. Para Entender o Desenvolvimento Sustentável. São Paulo: 34, 2015.
VEIGA, José Eli da; VIANNA, Sérgio Besserman; ABRANCHES, Sérgio. A sustentabilidade
do Brasil. In: GIAMBIAGI, Fábio; BARROS, Octávio de. Brasil pós-crise: agenda para a
próxima década.p. 304-323. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
VIANA, Maurício Boratto et al. Sustentabilidade e as principais fontes de energia. Brasília:
Consultora Legislativa da Câmara dos Deputados, 2015. Disponível em:
<http://www2.camara.leg.br/a-camara/documentos-e-pesquisa/estudos-e-notas-tecnicas/areas-
da-conle/tema14/sustentabilidade-e-as-fontes-de-energia_varios-autores_politicas-setoriais>.
Acesso em: 20 abr. 2017.
VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa
de 1976. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2012.p. 62.
WALD, Arnoldo. A crise brasileira e o momento político: visão de um advogado. Revista de
Informação Legislativa, v. 27, n. 106, p. 287-294, abr./jun. 1990. Disponível em:
<http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/175789>. Acesso em: 15 jul. 2017.
WATT NETO, Artur. Petróleo, gás natural e biocombustíveis. São Paulo: Saraiva, 2014.
(Coleção Direito Econômico).
WEISS, Edith Brown. In Fairness To Future Generations and Sustainable Development.
American University International Law. v. 8, n. 1,. p. 19-26, 1992. Disponível em:
<http://digitalcommons.wcl.american.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1498&context=auilr>.
Acesso em: 21 jun. 2017.
______. Intergenerational equity: a legal framework for global environmental change. In:
Environmental change and international law: New challenges and dimensions. Tokyo: United
Nations University Press, 1992. Disponível em: <http://intergenlaw.com/wp-
content/uploads/2015/02/Brown-Weiss-Intergenerational-equity-UN2.pdf>. Acesso em: 21
jun. 2017.
XAVIER, Yanko Marcius de Alencar et al. Biofuel Regulation in Brazil. In: XAVIER, Yanko
Marcius de Alencar et al. Energy Law in Brazil: oil, gas and biofuels. Switzerland: Springer,
2015. p. 133-154.
156
XAVIER, Yanko Marcius de Alencar et al (Org.). Direito ambiental aplicado à indústria do
petróleo e gás natural. Fortaleza: Fundação Konrad Adenauer, 2005.
______. Direito do petróleo, gás natural e biocombustíveis: estudo em homenagem à
professora Helenice Vital. Natal: Edufrn, 2013. (Série direito dos recursos naturais e da
energia).
______. Direito das energias renováveis e desenvolvimento. Natal: Edufrn, 2013. (Série
direito dos recursos naturais e da energia).
______. Energy Law in Brazil: oil, gas and biofuels. Switzerland: Springer, 2015.