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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CINCIAS DA SADE
DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENFERMAGEM
CURSO DE MESTRADO ACADMICO
HILDERJANE CARLA DA SILVA
Trauma em idosos atendidos pelo servio pr-hospitalar mvel
NATAL
2013
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HILDERJANE CARLA DA SILVA
Trauma em idosos atendidos pelo servio pr-hospitalar mvel
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte para obteno do ttulo de Mestre.
rea de Concentrao: Enfermagem na ateno sade. Linha de Pesquisa: Desenvolvimento Tecnolgico em Sade e Enfermagem Orientadora: Prof. Dr. Rejane Maria Paiva de Menezes
NATAL
2013
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HILDERJANE CARLA DA SILVA
Trauma em idosos atendidos pelo servio pr-hospitalar mvel
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Enfermagem, do Centro de
Cincias da Sade, Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, como requisito parcial para a
obteno do Ttulo de Mestre.
Aprovada em: ___ de dezembro de 2013, pela banca examinadora.
BANCA EXAMINADORA:
________________________________________________
Prof. Dr. Rejane Maria Paiva de Menezes - Orientadora
Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN
________________________________________________
Prof. Dr. Bertha Cruz Enders - Titular
Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN
________________________________________________
Prof. Dr. Francis Solange Vieira Tourinho - Titular
Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN
_______________________________________________
Prof. Dr. Maria do Rosrio Menezes - Titular
Universidade Federal da Bahia UFBA
________________________________________________
Prof. Dr. Maria do Socorro Costa Feitosa Alves - Suplente
Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN
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DEDICATRIA
A toda equipe do SAMU/Natal que est diariamente nas ruas em busca do melhor
atendimento s pessoas que se encontram em situaes de agravo sade frente
s mais adversas situaes.
Trabalho dedicado especialmente s enfermeiras Grayce Louyse Tinoco de Castro e
Renata de Lima Pessoa, que me ensinaram o passo a passo do atendimento pr-
hospitalar mvel, com nfase na reflexo das condutas a serem tomadas de forma
imediata e sempre humanizadas.
equipe que me conduziu nos diversos plantes nas unidades de suporte bsico e
avanado: enfermeiros, mdicos, tcnicos de enfermagem e condutores socorristas.
Aos que fazem parte do Ncleo de Educao Permanente, que me apoiaram de
diversas formas: Janana, Camila, Manoela, Nice, Renata Campos, Edilson Pinto,
Ivan, Kleiber, Rodrigo e todos os demais que apoiaram e colaboraram de forma
direta para a consolidao deste estudo.
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AGRADECIMENTOS
Incondicionalmente a Deus, por me fortalecer todos os dias e me conduzir pelo
melhor caminho com sua paz e luz!
minha famlia (me, pai, irmos, avs, tios e primos), por contribuir para a minha
formao como ser humano, antes do ser profissional.
Ao meu amor e companheiro Vieira Jnior, pela compreenso nos momentos
mais difceis, por lutar junto comigo na busca da realizao dos meus sonhos e na
construo de novas metas e, principalmente, por no me deixar desistir diante das
dificuldades.
minha orientadora Rejane Menezes, por ter me despertado o amor direcionado
s pessoas idosas e por ter aceitado o desafio de estudar as peculiaridades do
atendimento pr-hospitalar. Obrigada pelos ensinamentos e por acreditar neste
trabalho!
Aos professores Bertha Cruz Enders, Francis Solange Vieira Tourinho e
Marcos Antnio Ferreira Jnior, pelas valiosas contribuies no exame de
qualificao.
A todos os professores e amigos que fizeram parte da minha formao
acadmica.
s alunas Emily Mesquita, Heloza Talita e Tas pelo auxlio na fase de coleta de
dados e na organizao da apresentao.
A todos aqueles que contriburam at mesmo com o pensamento positivo,
transmitindo boas energias para que este trabalho pudesse ser realizado.
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O destino do traumatizado est
nas mos de quem faz o primeiro
curativo
Nicholas Senn
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RESUMO
SILVA, H. C. Trauma em idosos atendidos pelo servio pr-hospitalar mvel. 2013. 153 fls. Dissertao (Mestrado) Programa de Ps-Graduao em Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal-RN, 2013.
O objetivo deste estudo foi caracterizar a ocorrncia de traumas na populao idosa atendida pelo servio pr-hospitalar mvel, no municpio de Natal, Rio Grande do Norte. Trata-se de um estudo descritivo, de delineamento transversal e abordagem quantitativa, cuja populao foi constituda por 2.080 vtimas de trauma. A amostra, do tipo aleatria sistemtica, consistiu em 400 pessoas idosas, com idade a partir de 60 anos, assistidas pelo Servio de Atendimento Mvel de Urgncia de Natal/RN, entre janeiro de 2011 a dezembro de 2012. A coleta de dados teve incio aps consentimento da instituio e parecer favorvel de um Comit de tica em Pesquisa sob o n 309.505. Procedeu-se anlise documental retrospectiva das fichas de atendimento do servio atravs de um formulrio de elaborao prpria, validado por juzes especialistas, considerado como confivel (>0,75) e vlido (IVC=0,97) em sua clareza e relevncia. Os dados foram tabulados pelo software Statistical Package for Social Science, verso 20.0. Os resultados obtidos evidenciam que as vtimas idosas possuem idade mdia de 74,19 anos, com prevalncia do sexo feminino, acometimento por doenas crnicas, especialmente a hipertenso arterial, uso mdio de 2,2 medicamentos rotineiros, com sinais vitais dentro dos padres de normalidade. Os traumas prevaleceram no perodo diurno, na residncia das vtimas, zona norte da cidade e nos fins de semana. Entre os mecanismos de trauma destacaram-se as quedas, os acidentes de trnsito e as agresses fsicas, cujo tipo de trauma mais comum foi o cranioenceflico e principais consequncias os ferimentos passivos de sutura e as fraturas fechadas. As Unidades de Suporte Bsico estiveram como as mais acionadas para o atendimento pr-hospitalar (87,8%) e o principal local de destino consistiu no hospital de referncia em urgncia do Estado (57,5%). Entre os procedimentos mais realizados pela equipe de enfermagem destacaram-se a imobilizao com prancha rgida e colar cervical, bem como a puno venosa perifrica, e principal componente utilizado para reposio volmica a soluo fisiolgica. Houve relao significativa entre os bitos e o mecanismo de trauma; mecanismo de trauma e procedimentos realizados, exceto administrao de medicamentos; procedimentos realizados, exceto de imobilizao, e unidade destinada ao atendimento. Ressalta-se a prevalncia do trauma na populao idosa, o seguimento deficiente do protocolo Pre-Hospital Trauma Life Support e a incipincia dos registros de procedimentos de enfermagem realizados. H necessidade de um protocolo de atendimento ao trauma especfico s vtimas idosas e estratgias de educao para a preveno de eventos desta natureza.
Palavras-chave: Enfermagem. Idoso. Traumatismos. Assistncia pr-hospitalar.
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ABSTRACT
SILVA, H. C. Trauma in elderly patients by the mobile pre-hospital service. 2013. 153 fls. Dissertation (Master degree) Post-Graduation Program in Nursing, Federal University of Rio Grande do Norte, Natal-RN, 2013. O The aim of this study was to characterize the occurrence of trauma in the elderly population served by the mobile pre-hospital service, in Natal, Rio Grande do Norte. This is a descriptive, transversal and quantitative approach and whose population consisted of 2,080 trauma victims. The sample, of systematic random type, consisted of 400 elderly people, aged from 60 years old, assisted by the Office of Mobile Emergency in Natal / RN, between January 2011 and December 2012. Data collection began after consent and assent of the institution of a Research Ethics Committee under No. 309 505. It was proceeded to documentary retrospective analysis of records of this service through a form of self-development, validated by expert judges considered reliable (> 0.75) and valid (CVI = 0.97) in their clarity and relevance. Data were tabulated by the Statistical Package for Social Sciences, version 20.0. The results show that older victims have an average age of 74.19 years old, with a prevalence of female involvement by chronic diseases, especially hypertension, average usage of 2.2 routine medications with vital signs within normal limits. The trauma prevailed during the daytime, in the residence of the victims, north of the city and on weekends. Among the mechanisms of trauma were falls, traffic accidents and physical aggression, whose most common type was brain-cerebral trauma and the main consequences were suture wounds and closed fractures. Basic Support Units were as more driven to pre-hospital care (87.8%) and the main destination place consisted of a referral hospital for emergency of the state (57.5%). Among the most commonly performed procedures by nursing staff immobilization with rigid board and neck collar and the peripheral venipuncture, and the main component used for volume replacement to saline were highlighted. There was a significant relationship between the deaths and the mechanism of injury, mechanism of injury and procedures, except medication administration procedures carried out, except immobilization and unit for service. It is highlighted the prevalence of trauma in the elderly, poor follow-up Pre-Hospital Trauma Life Support protocol and the paucity of records and nursing procedures performed. There is need for a protocol of care specific to elderly trauma victims and education strategies for the prevention of such events. Key words: Nursing. Elderly. Injuries. Pre-hospital care.
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LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Escala de Coma de Glasgow............................................................ 34
Quadro 02 Distribuio das variveis de identificao das ocorrncias de
trauma atendidas pelo SAMU/Natal-RN. Natal, RN, 2013...................................
49
Quadro 03 Distribuio das variveis relativas ocorrncia e evoluo do
trauma. Natal, RN, 2013. .....................................................................................
50
Quadro 04 Distribuio das variveis relativas ao atendimento do trauma.
Natal, RN, 2013....................................................................................................
51
Quadro 05 Sugestes dos juzes para a incluso, modificao ou excluso de
itens/subitens do instrumento de coleta de dados. Natal, RN, 2013....................
55
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LISTA DE TABELAS
Tabela 01 Distribuio dos valores de de Cronbach quanto clareza e
relevncia dos itens do instrumento de coleta de dados. Natal, RN, 2013..........
54
ARTIGO 01
Tabela 01 Caracterizao das vtimas de trauma idosas atendidas pelo
SAMU/Natal-RN, conforme sexo e faixa etria. Natal, RN, 2013........................
66
Tabela 02 Caracterizao de idosos vtimas de trauma atendidos pelo
SAMU/Natal-RN, segundo antecedentes pessoais e faixa etria. Natal, RN,
2013.....................................................................................................................
67
Tabela 03 Caracterizao dos sinais vitais das pessoas idosas vtimas de
trauma (n=400). Natal, RN, 2013.........................................................................
68
Tabela 04 Caracterizao da avaliao neurolgica das pessoas idosas
vtimas de trauma atendidas pelo SAMU/Natal-RN. Natal, RN, 2013..................
69
ARTIGO 02
Tabela 01 Distribuio dos mecanismos de trauma em idosos. Natal, RN,
2013.....................................................................................................................
79
Tabela 02 Caracterizao das ocorrncias de trauma em idosos conforme tipo
de trauma. Natal, RN, 2013..................................................................................
80
Tabela 03 Distribuio das consequncias do trauma em idosos. Natal, RN,
2013.....................................................................................................................
80
Tabela 04 Distribuio das ocorrncias de trauma conforme turno do evento e
dia da semana. Natal, RN, 2013..........................................................................
81
Tabela 05 Distribuio das ocorrncias de trauma em idosos conforme local
do evento e zona da cidade. Natal, RN, 2013......................................................
82
ARTIGO 03
Tabela 01 Distribuio das ocorrncias de trauma em idosos atendidos pelo
SAMU/Natal, conforme a unidade destinada. Natal, RN, 2013............................
93
Tabela 02 Distribuio das ocorrncias de trauma em idosos atendidos pelo 93
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SAMU/Natal, conforme destino da vtima. Natal, RN, 2013.................................
Tabela 03 Distribuio dos procedimentos realizados pela equipe de
enfermagem ou com sua colaborao no atendimento pr-hospitalar mvel.
Natal, RN, 2013....................................................................................................
94
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LISTA DE FIGURAS
ARTIGO 01
Figura 01 Distribuio das ocorrncias de trauma em idosos atendidas pelo
SAMU/Natal-RN, conforme ms e ano. Natal, RN, 2013.....................................
65
Figura 02 Distribuio das ocorrncias de trauma em idosos atendidos pelo
SAMU/Natal-RN conforme sexo e faixa etria. Natal, RN, 2013.........................
66
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LISTA DE APNDICES
APNDICE A Instrumento de coleta de dados.................................................. 113
APNDICE B Carta aos especialistas............................................................... 117
APNDICE C Instrues para anlise e validao do instrumento................... 118
APNDICE D Termo de consentimento livre e esclarecido aos especialistas.. 119
APNDICE E Formulrio para validao do instrumento.................................. 121
APNDICE F Instrumento de coleta de dados final.......................................... 125
APNDICE G Carta de anuncia da instituio proponente............................. 129
APNDICE H Carta de anuncia da instituio emitente.................................. 131
APNDICE I Termo de concesso de informaes.......................................... 132
APNDICE J Termo de confidencialidade........................................................ 133
APNDICE K Termo de consentimento livre e esclarecido ao fiel guardio
das informaes.................................................................................................
134
APNDICE L Aprovao do Comit de tica em Pesquisa.............................. 136
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LISTA DE ANEXOS
ANEXO A Normas da Revista Eletrnica de Enfermagem................................ 138
ANEXO B Normas da Revista Cadernos de Sade Pblica............................. 146
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACLS Advanced Cardiac Life Support
APHM Atendimento pr-hospitalar mvel
APVP Anos Potenciais de Vida Perdidos
ATLS Advanced Trauma Life Support
BDV Boletim Dirio de Viatura
BLS Basic Life Support
CID Classificao Internacional de Doenas
CNS Conselho Nacional de Sade
COFEN Conselho Federal de Enfermagem
COREN Conselho Regional de Enfermagem
DCNT Doenas Crnicas No Transmissveis
ECGl Escala de Coma de Glasgow
EUA Estados Unidos da Amrica
GemRem. Sistema de Gerenciamento Modular de Regulao Mdica
GSE Grupo de Socorro de Emergncia
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
MAST Manobras Avanadas de Suporte ao Trauma
NEP Ncleo de Educao Permanente
OMS Organizao Mundial da Sade
OPAS Organizao Pan-Americana de Sade
PALS Pediatric Advanced Life Support
PHTLS Pre-Hospital Trauma Life Support
PNAU Poltica Nacional de Ateno s Urgncias
RN Rio Grande do Norte
SAMU Servio de Atendimento Mvel de Urgncia
SAV Suporte Avanado de Vida
SBGG Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
SBV Suporte Bsico de Vida
SES Secretaria Estadual de Sade
SIH Sistema de Informaes Hospitalares
SPSS Statistical Package for Social Science
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SSP Secretaria de Segurana Pblica
SUS Sistema nico de Sade
TARM Telefonista Auxiliar de Regulao Mdica
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
USA Unidade de Suporte Avanado
USB Unidade de Suporte Bsico
UTE Unidade Ttica de Emergncia
UTI Unidade de Terapia Intensiva
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SUMRIO
1 INTRODUO................................................................................................. 19
2 OBJETIVOS...................................................................................................... 23
2.1 OBJETIVO GERAL........................................................................................ 23
2.2 OBJETIVOS ESPECFICOS.......................................................................... 23
3 REVISO DA LITERATURA........................................................................... 24
3.1 O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO DA POPULAO ........................ 24
3.2 O TRAUMA COMO CAUSA EXTERNA......................................................... 26
3.3 O TRAUMA GERITRICO............................................................................. 29
3.4 O ATENDIMENTO PESSOA IDOSA VTIMA DE TRAUMA....................... 32
3.5 ASPECTOS DO ATENDIMENTO PR-HOSPITALAR MVEL.................... 36
3.6 A ENFERMAGEM NO ATENDIMENTO PR-HOSPITALAR MVEL........... 40
4. MATERIAL E MTODO.................................................................................. 45
4.1 TIPO DE ESTUDO......................................................................................... 45
4.2 LOCAL DO ESTUDO..................................................................................... 46
4.3 POPULAO E AMOSTRA........................................................................... 47
4.4 VARIVEIS DO ESTUDO.............................................................................. 49
4.5 INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS.................................................... 52
4.6 PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS................................................. 56
4.7 REGISTRO E ANLISE DOS DADOS.......................................................... 57
4.8 ASPECTOS TICOS..................................................................................... 58
5 RESULTADOS............................................................................................... 59
5.1 ARTIGO 01 INCIDNCIA DE TRAUMA EM PESSOAS IDOSAS
ATENDIDAS PELO SERVIO PR-HOSPITALAR MVEL...............................
60
5.2 ARTIGO 02 CARACTERSTICAS DO TRAUMA EM IDOSOS
ATENDIDOS PELO SERVIO PR-HOSPITALAR MVEL...............................
74
5.3 ARTIGO 03 ATENDIMENTO PR-HOSPITALAR MVEL S PESSOAS
IDOSAS VTIMAS DE TRAUMA..........................................................................
87
6 CONCLUSES................................................................................................. 102
REFERNCIAS............................................................................................... 103
APNDICES.................................................................................................... 113
ANEXOS ......................................................................................................... 138
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1 INTRODUO
No ranking de mortalidade mundial, o trauma ocupa o quinto lugar entre
as vtimas idosas e definido como doena da sociedade moderna, de causa
externa, que pode ser provocado por agresses mecnicas, qumicas, trmicas ou
eltricas, de forma violenta (intencional) ou acidental (no intencional) (LIMA;
CAMPOS, 2011; NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL
TECHNICIANS, 2007).
O envelhecimento, embora seja consequncia de conquistas nas reas
sociais e da sade, representa novas demandas por servios e atenes que se
constituem como desafios para a sociedade atual e futura, devido s especificidades
do idoso, que podem exacerbar as sequelas do trauma e as chances de morte.
Compreende-se que o processo de envelhecimento provoca diversas
alteraes, tais como a fragilidade fsica, lentido mental e dos reflexos, queda da
acuidade sensorial, prejuzo das funes psicolgicas e aumento do uso de
medicamentos, que tornam o idoso mais susceptvel ao trauma (NATIONAL
ASSOCIATION EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007; RAMOS, 2003).
As comorbidades e os declnios fisiopatolgicos que comumente
acometem os idosos podem mascarar os sinais precoces de deteriorao e
aumentar as chances de um trauma simples isolado se constituir como um fator
potencial de morte, alm de comprometer a avaliao da equipe de sade e a
prestao dos primeiros cuidados (CAMPOS, 2007; FLEISCHMAN et al, 2010a;
GAWRYSZEWSKI, 2010; LIMA; CAMPOS, 2011).
Quando o atendimento vtima de trauma realizado precocemente, as
chances de sequelas e de morte so reduzidas e, portanto, os primeiros cuidados
realizados ainda no local da ocorrncia pelo Atendimento Pr-Hospitalar Mvel
(APHM) so fundamentais (BRASIL, 2006a; NATIONAL ASSOCIATION OF
EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007).
O servio de APHM realiza assistncia a agravos clnicos, gineco-
obsttricos, psiquitricos e traumticos populao de qualquer faixa etria,
inclusive os idosos. A assistncia pr-hospitalar desenvolvida por uma equipe
multiprofissional, formada por mdicos, condutores-socorristas e pela categoria de
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enfermagem, composta por enfermeiros e tcnicos de enfermagem, que tem como
fator primordial o elemento tempo (BRASIL, 2006a; MINAYO; DESLANDES, 2008).
No APHM, enquanto o tcnico de enfermagem est presente na
prestao de cuidados bsicos s vtimas, o enfermeiro realiza o suporte avanado,
bem como o cuidado indireto, atravs de atividades burocrticas e educativas.
O APHM normatizado no Brasil por meio da Poltica Nacional de
Ateno s Urgncias (PNAU) e realiza a assistncia com base na regulao
mdica das ocorrncias e em protocolos institudos internacionalmente (VARGAS,
2006).
Os protocolos existentes so nomeados de acordo com sua finalidade e
faixa etria a qual se destinam. Dentre eles, podem ser citados: o Basic Life Support
(BLS), voltado para o atendimento de suporte bsico s vtimas que se encontram
com agravos clnicos; o Advanced Cardiac Life Support (ACLS), destinado ao
suporte avanado em agravos de natureza cardiolgica; o Pediatric Advanced Life
Support (PALS), direcionado para o suporte avanado em pediatria; o Advanced
Trauma Life Support (ATLS), voltado para o suporte avanado no trauma; e o Pre-
Hospital Trauma Life Support (PHTLS), destinado ao atendimento pr-hospitalar de
vtimas de trauma.
Percebe-se, ento, que no so encontrados protocolos especficos
destinados ao indivduo idoso, cujas particularidades exigem uma assistncia
individualizada, bem como so escassas tambm as polticas pblicas voltadas ao
trauma geritrico, fato que se traduz no elevado ndice desse tipo de ocorrncia na
populao.
De acordo com o Ministrio da Sade, a Poltica Nacional de Sade da
Pessoa Idosa (PNSPI) abrange em suas diretrizes a ateno integral sade dos
idosos e tem como foco a promoo, proteo e recuperao da sade. Esta poltica
ressalta, ainda, a realizao de aes de preveno incorporadas a todos os nveis
de complexidade (BRASIL, 2010a). Entretanto, o que se v na prtica que as
aes destinadas ateno sade do idoso se do prioritariamente de forma
curativista.
A nfase no curativismo ainda mais evidente no APHM, pois os
cuidados de sade voltados ao trauma se concentram no tratamento aps o evento
e pouca ateno atribuda ao entendimento das causas e sua preveno. Como
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21
resultado, as vtimas podem sofrer traumas novamente e aumentar os gastos
sade pblica, alm da maior chance de isolamento social (FRAGA, 2007).
Conforme a Agenda Nacional de Prioridades de Pesquisa em Sade
(BRASIL, 2008a), entre as necessidades de pesquisas relacionadas sade dos
idosos esto os estudos que englobam a magnitude, dinmica e compreenso dos
problemas de sade do idoso; a compreenso dos mecanismos das doenas
associadas ao processo de envelhecimento; e a avaliao das polticas, programas
e servios.
No que concerne violncia, acidentes e trauma, a referida Agenda
prope a realizao de pesquisas sobre a organizao e avaliao de polticas,
programas e servios; ensaios clnicos e estudos experimentais no atendimento pr,
intra e ps-hospitalar; estudos de base populacional e sobre a magnitude, dinmica
e compreenso do trauma (BRASIL, 2008a).
Em contraposio ao exposto pela Agenda, a Poltica Nacional de
Reduo da Morbimortalidade por Acidentes e Violncia salienta que so escassos
os sistemas de informao epidemiolgica relacionados aos atendimentos de
urgncia e emergncia, bem como os servios de atendimento pr-hospitalar no
possuem uma ficha de atendimento em comum, com informaes bsicas, o que
contribui para as graves distores nos dados referentes s causas externas. Nesta
poltica ressalva-se ainda que no h estudos apurados relativos s violncias e
acidentes (BRASIL, 2001).
Diversos estudos internacionais versam sobre o trauma em idosos, porm
a maioria tem como foco somente as quedas e leses relacionadas e so incipientes
as pesquisas acerca de outros tipos de trauma, especialmente no Brasil (MINAYO;
SOUZA; PAULA, 2010). O nmero de publicaes sobre a temtica ainda mais
restrito quando se trata da assistncia pr-hospitalar. As informaes estatsticas
sobre o trauma em idosos so tambm pouco consistentes e, portanto,
negligenciadas pelos rgos pblicos sociais e de sade, o que contradiz as
diretrizes propostas pelas polticas voltadas sade do idoso e reduo de
morbimortalidade por causas externas.
A partir da experincia prvia como acadmica de enfermagem durante
estgio extracurricular em um servio de APHM durante 15 meses e como monitora
de ensino de APHM, foi possvel perceber os frequentes acionamentos de
atendimentos a ocorrncias de natureza traumtica entre os idosos. Porm, so
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22
insuficientes as pesquisas voltadas para esta problemtica, o que dificulta o manejo
da ocorrncia, pois o perfil destas vtimas pouco conhecido.
Diante disto, surgiu o seguinte questionamento: quais as caractersticas
dos traumas, bem como sua prevalncia, em idosos atendidos pelo servio de
APHM no municpio de Natal/RN?
Este estudo tem, ento, como objetivo caracterizar a ocorrncia de
traumas na populao idosa atendida pelo servio pr-hospitalar mvel e entre as
implicaes para a enfermagem est a produo de conhecimento sobre a
ocorrncia de trauma em pessoas idosas assistidas pelo APHM.
Vale salientar ainda que os resultados podem contribuir para o
fortalecimento de polticas pblicas na rea, bem como a criao de estratgias e
projetos educacionais relacionados preveno de situaes traumticas nos
idosos, pois, comumente, os cuidados de sade ao trauma no APHM se concentram
apenas no tratamento aps o evento.
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23
2 OBJETIVOS
2.1 OBJETIVO GERAL
Caracterizar a ocorrncia de trauma na populao idosa atendida pelo
servio pr-hospitalar mvel.
2.2 OBJETIVOS ESPECFICOS
Identificar a prevalncia de traumas na populao idosa atendida pelo
servio pr-hospitalar mvel;
Identificar as caractersticas do trauma em idosos atendidos pelo
servio pr-hospitalar mvel;
Descrever o atendimento prestado ao idoso vtima de trauma no mbito
pr-hospitalar mvel.
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3 REVISO DA LITERATURA
Este item apresenta um conjunto de elementos que pretende aprofundar a
discusso a respeito do envelhecimento da populao e o consequente aumento
dos ndices de trauma em idosos, bem como o papel da equipe de enfermagem no
atendimento a estas vtimas no mbito pr-hospitalar a partir de pesquisas
publicadas na literatura.
Inicialmente, o captulo 3.1, intitulado como O processo de envelhecimento
da populao, aborda os aspectos inerentes s mudanas demogrficas e
epidemiolgicas da populao. O captulo subsequente, 3.2 O trauma como causa
externa, traz as definies do trauma, seus tipos e mecanismos. J os captulos 3.3
e 3.4, O trauma geritrico e O atendimento pessoa idosa vtima de trauma,
versam sobre as particularidades dos idosos acometidos por situaes de natureza
traumtica e o atendimento especfico para essas vtimas. Para finalizar, os
captulos 3.5 e 3.6, intitulados como Aspectos do atendimento pr-hospitalar mvel
e A enfermagem no atendimento pr-hospitalar mvel, so constitudos pela
histria do APHM, seu funcionamento no Brasil e a insero da enfermagem neste
mbito.
3.1 O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO DA POPULAO
A queda da mortalidade provocou aumento da expectativa de vida, porm
o fator decisivo para o envelhecimento da populao a queda da fecundidade,
devido diminuio do contingente de indivduos mais jovens e aumento da
populao da faixa etria mais idosa, j que as pessoas passam a viver mais tempo
(VERMELHO; MONTEIRO, 2002).
O envelhecimento da populao decorrente de transformaes
demogrficas e epidemiolgicas que, apesar de acometerem todo o mundo,
diferenciam-se entre os pases e mais evidente nos pases desenvolvidos
(CARVALHO; RODRGUEZ-WONG. 2008; VERAS, 2007, 2009).
No Brasil, considera-se como idoso o indivduo com idade a partir de 60
anos e estima-se que a populao total brasileira, correspondente a 189,6 milhes
de habitantes em 2008, com ndice de idosos de 9,5% (18 milhes de pessoas),
aumente para 215,3 milhes em 2050, com consequente aumento do nmero de
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25
pessoas com 60 anos ou mais de idade, cuja projeo de mais de 64 milhes
(28%) (BRASIL, 1994; INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATSTICA,
2008).
Em termos demogrficos, a regio brasileira com maior nmero de idosos
a Sudeste, onde residem 46,2% dos idosos brasileiros, e em segundo lugar
encontra-se o Nordeste, com 26,4% dos indivduos idosos. Entre os estados
nordestinos, o Rio Grande do Norte possui cerca de 340 mil pessoas idosas e ocupa
o sexto lugar na regio (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATSTICA, 2010).
Segundo o Censo Demogrfico 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatstica (IBGE), existem mais de 20 milhes de idosos no Brasil, dos quais a
maioria (55,5%) composta pelo sexo feminino, j que as mulheres vivem mais que
os homens, com a expectativa de vida de 76,7 anos (INSTITUTO BRASILEIRO DE
GEOGRAFIA E ESTATSTICA, 2002, 2010).
Os padres de sade e de doena esto diretamente relacionados aos
fatores sociais, econmicos e demogrficos e, portanto, tambm se modificam com a
populao, processo denominado de transio epidemiolgica (SHRAMM et al,
2004; VERMELHO; MONTEIRO, 2002).
Os autores Monteiro e Vermelho (2002) afirmam que a transio
epidemiolgica nos pases desenvolvidos teve como principais determinantes os
fatores ecobiolgicos e socioeconmicos, devido ao desenvolvimento da agricultura,
comrcio, transporte e industrializao, que ocorreu antes das grandes descobertas
da medicina. Diferentemente, os pases da Amrica Latina mostram a grande
influncia da introduo da tecnologia e da medicina na transio epidemiolgica.
Ao longo dos anos, houve diminuio dos nveis de morbidade e
mortalidade por doenas infecciosas e parasitrias, em detrimento da elevao de
doenas crnico-degenerativas, neoplasias e causas externas, j que o
envelhecimento provoca diversas alteraes e morbidades (RAMOS, 2003;
SHRAMM et al, 2004).
Define-se como processo de envelhecimento a deteriorao progressiva e
irreversvel do organismo, que pode ser compreendido de duas formas: senescncia
e senilidade (BRASIL, 2006b).
A senescncia um processo fisiolgico, no qual ocorre a diminuio da
reserva funcional e, segundo Papalo-Netto, Salles (2001), Moraes e Silva (2008),
-
26
est associada a alteraes na composio, estrutura e funcionamento dos sistemas
orgnicos, que sofrem influncia dos ambientes fsico e social.
J a senilidade descreve o envelhecimento do ponto de vista
patolgico, cujas caractersticas englobam as alteraes resultantes de doenas ou
traumas que podem acometer o idoso (MORAES; SILVA, 2008).
Entre as alteraes decorrentes do envelhecimento esto: o declnio da
funo respiratria, ausncia parcial ou completa dos dentes, comprometimento do
sistema cardiovascular, ressecamento da pele, hipotrofia muscular, deformidades da
coluna vertebral e osteoporose, as quais resultam na fragilidade fsica, lentido
mental e dos reflexos, queda da acuidade sensorial, prejuzo das funes
psicolgicas e aumento do uso de medicamentos (CARPENTER; STERN, 2010;
NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007;
RAMOS, 2003).
Tais modificaes trazem como consequncias a maior suscetibilidade ao
trauma, comprometimento dos mecanismos compensatrios exigidos em situaes
de trauma, dificuldade de diagnstico e manejo em decorrncia de alteraes
crnicas dos parmetros vitais e aumento considervel das taxas de
morbimortalidade, mesmo com leses de baixa e mdia gravidade (CARPENTER;
STERN, 2010; NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL
TECHNICIANS, 2007).
Carpenter e Stern (2010), bem como Fleischman et al (2010a), afirmam
que o trauma muitas vezes resultante de uma interao complexa e sinrgica entre
a doena coexistente e os declnios fisiolgicos do processo de envelhecimento.
Diante destes fatores, as taxas de internao e as despesas com
tratamentos complexos aumentam e trazem maiores gastos aos servios de sade,
alm de evidenciar que o crescimento da populao idosa exige assistncia e
cuidados contnuos, o que impe a necessidade de novos modelos de prestao de
servios sade e maior demanda de programas e recursos pblicos voltados ao
idoso (CHAIMOWICZ, 1997; GATTIS, 2008).
3.2 O TRAUMA COMO CAUSA EXTERNA
Desde os primrdios da histria da humanidade, o trauma est presente e
hoje se constitui como a doena mais significativa no que se refere aos anos
-
27
potenciais de vida perdidos (APVP), porm, s ganhou destaque como problema de
sade na dcada de 1980, sob o termo de mortes violentas (BATISTA-NETO;
GOMES, 2001).
Em 1966, a Academia Nacional de Cincias dos Estados Unidos, atravs
de estudo do Comit de Trauma, denominou o trauma como a doena
negligenciada da sociedade moderna, pois provoca mais mortes e incapacidades
do que as grandes guerras, mas no sensibiliza nem mobiliza a sociedade, bem
como as autoridades governamentais (BATISTA-NETO; GOMES, 2001).
A palavra trauma na medicina est ligada a eventos imprevistos e
indesejveis de origem externa, que produzem de alguma forma ferimento ou leso
de vrios tipos. Em outras palavras, pode-se definir o trauma como evento de causa
externa que pode ser desencadeado por fatores mecnicos, qumicos, trmicos ou
eltricos, denominados mecanismos de trauma (NATIONAL ASSOCIATION OF
EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007; TAMBELLINI; OSANAI, 2001,
2004).
No plano da sade, os eventos traumticos podem ser classificados de
duas maneiras: uma se refere s suas causas, a estrutura e a forma como se
apresenta o trauma, alm de suas consequncias; a outra se baseia na leso
propriamente dita, considera a etiologia, o quadro clnico, os antecedentes e o
prognstico da leso (TAMBELLINI; OSANAI, 2001).
A primeira classificao permite criar estratgias de preveno e controle
do evento traumtico, enquanto a segunda permite a identificao de intervenes
teraputicas eficazes para a cura ou tratamento da leso. Porm, ambas as
classificaes se complementam (TAMBELLINI; OSANAI, 2001).
A Organizao Mundial da Sade (OMS) instituiu desde 1994 a
Classificao Internacional de Doenas (CID), que atualmente se encontra em sua
dcima reviso (CID10) e adotada mundialmente. Neste sistema de classificao,
as causas externas so estabelecidas nos captulos XIX e XX (INTERNATIONAL
STATICAL CLASSIFICATION OF DISEASES AND RELATED HEALTH
PROBLEMS, 2010).
O captulo XIX, intitulado leses, envenenamento e algumas outras
consequncias das causas externas, possui uma codificao que inclui os
diferentes tipos de traumatismos, suas complicaes e sequelas. J o captulo XX,
intitulado causas externas de morbidade e de mortalidade, complementa o captulo
-
28
anterior e classifica os fatores ambientais que podem desencadear o trauma, como
acidentes de transporte, quedas, afogamentos, leses autoprovocadas, agresses,
operaes de guerra, entre outros (INTERNATIONAL STATICAL CLASSIFICATION
OF DISEASES AND RELATED HEALTH PROBLEMS, 2010).
Os processos que do origem ao trauma podem ser intencionais ou no.
Enquanto o trauma intencional est associado violncia interpessoal ou auto
direcionada, o no intencional aquele que ocorre de forma no desejvel, tambm
denominado de acidente (NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL
TECHNICIANS, 2007).
O Comit do Pre-hospital Trauma Life Support (PHTLS) descreve que a
etiologia do trauma pode classific-lo em contuso ou fechado, o qual inclui os
acidentes automobilsticos (atropelamento, coliso e capotagem), as quedas,
agresses fsicas, soterramentos e exploses; e penetrante, o qual mais
representado pelos ferimentos por arma de fogo e arma branca (BATISTA-NETO;
GOMES, 2001; NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL
TECHNICIANS, 2007).
Quanto ao tipo de trauma, este classificado conforme a regio corporal
atingida, tais como: cranioenceflico, quando atinge a regio da cabea; de
extremidades, quando atinge membros superiores ou inferiores; torcico, quando
atinge o trax; abdominal, acomete a regio do abdmen; e, ainda, politraumatismo,
nos casos em que mais de uma regio corporal acometida (NATIONAL
ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007).
No Brasil, as causas externas constituem importante ameaa ao processo
de desenvolvimento humano, pois alteram a sade, geram sequelas e podem levar
at mesmo a morte. Vale salientar ainda que as causas externas ocupam o terceiro
lugar entre as causas de mortalidade na populao brasileira e so precedidas
apenas pelas doenas cardiovasculares e neoplasias. Entre 1980 e 2006, a
frequncia de bitos por causas externas sofreu um aumento de 78%, com o registro
de 2.824.093 bitos (BRASIL, 2001; 2008b).
O perfil das vtimas de causas externas evidencia que o sexo masculino
o mais frequente entre os bitos (84%) e h o predomnio da faixa etria entre 20 e
29 anos. Entretanto, quando se consideram os acidentes, comparados com os
eventos violentos, percebe-se que h o predomnio da faixa etria entre 0 e 9 anos e
com 60 anos ou mais de idade. Em outras palavras, pode-se dizer que os adultos
-
29
jovens brasileiros so mais acometidos pelos eventos relacionados violncia,
enquanto as populaes peditrica e geritrica so as maiores vtimas dos acidentes
(BRASIL, 2008b).
Os acidentes e violncias so decorrentes de aes humanas e sofrem a
influncia de fatores tcnicos e sociais. A violncia definida como qualquer ao
realizada por indivduos ou grupos que provocam danos fsicos, emocionais, morais
e espirituais a si prprios ou a outras pessoas. J o acidente compreendido como
evento no intencional e evitvel, que ocasiona leses fsicas e emocionais, que
pode ocorrer em diversos ambientes (BRASIL, 2001).
Com a finalidade de reduzir a morbidade e a mortalidade decorrentes das
causas externas no Brasil, em 2001 foi implementada a Poltica Nacional de
Reduo da Morbimortalidade por Acidentes e Violncias. Esta poltica estabelece
em suas diretrizes: a promoo da adoo de comportamentos e de ambientes
seguros e saudveis; monitorizao da ocorrncia de acidentes e violncia;
sistematizao, ampliao e consolidao do atendimento pr-hospitalar; assistncia
interdisciplinar e intersetorial s vtimas de acidentes e violncias; estruturao e
consolidao do atendimento voltado recuperao e reabilitao; capacitao de
recursos humanos; e apoio ao desenvolvimento de estudos e pesquisas (BRASIL,
2001).
3.3 O TRAUMA GERITRICO
Com a expectativa de vida prolongada, o idoso est mais ativo no
mercado de trabalho, nas atividades fsicas e atividades da vida diria, mesmo
diante das mudanas previsveis do envelhecimento e comorbidades, o que o torna
mais susceptvel ao trauma, suas consequncias e maiores dimenses (CAMPOS,
2007; LIMA; CAMPOS, 2011).
Estudos demonstram que o trauma provoca a morte de 14 mil pessoas
diariamente em todo o mundo e se constitui como a quinta causa de mortalidade
entre os idosos e, quando no provoca a morte do indivduo, pode gerar leses,
incapacidades e internaes em instituies hospitalares ou lares, assim como o
isolamento social (DEGANI, 2011; DIVANI et al, 2009; LIMA; CAMPOS, 2011).
-
30
Em estudo de coorte realizado por Fleischman et al (2010b), evidenciou-
se que a demanda de atendimentos de emergncia a idosos vtimas de trauma
correspondeu a 75%, nmero mais elevado quando comparado aos jovens (49%).
Devido aos efeitos do envelhecimento, o idoso pode sofrer qualquer tipo
de trauma. Apesar de exigir as mesmas condutas, o atendimento ao trauma no idoso
torna-se diferente do adulto, pois se deve estar atento s alteraes nos sistemas
orgnicos e a uma gama maior de complicaes, j que o idoso pode ser acometido
por dficits auditivos, visuais e neurolgicos, que dificultam a comunicao e,
consequentemente, a avaliao (CAMPOS, 2007; GAWRYSZEWSKI, 2010; SOUZA;
IGLESIAS, 2002).
O trauma pode envolver outros rgos e sistemas alm daquele atingido
diretamente pelo mecanismo de leso, o que leva uma fratura a ocasionar
alteraes cardiovasculares, respiratrias ou neurolgicas, que so exacerbadas por
problemas de sade previamente existentes (CAMPOS, 2007).
No sistema cardiovascular, ocorrem alteraes, como aumento da
resistncia miocrdica, diminuio da conduo eletrofisiolgica, perda da massa
celular miocrdica e suprimento sanguneo diminudo, que podem ocasionar
arritmias, insuficincia cardaca e morte. Diante disto, o corao no suporta a perda
de volume, a hidratao rpida e o uso excessivo de medicamentos. So comuns,
ainda, as tromboses, embolias e isquemias, decorrentes da imobilizao no leito e
alteraes de volume (CARNEIRO, 2001).
O trauma em idosos pode desencadear um quadro de insuficincia
respiratria aguda e pneumonia devido s modificaes que acontecem com o
decorrer do envelhecimento no sistema respiratrio, tais como diminuio da caixa
torcica e da elasticidade pulmonar, alm de reduo dos alvolos, que resultam na
diminuio da capacidade vital e da superfcie de trocas gasosas (CARNEIRO,
2001).
Com o envelhecimento, a capacidade de filtrao dos rins tambm
reduzida, devido perda de massa e nfrons, o que leva o idoso a ter mais
dificuldade de compensar a perda de volume. Com o declnio do clearence da
creatinina, aumenta a reteno de sdio e, por conseguinte, as chances de
desenvolvimento de edema pulmonar. Diante disto, deve-se estar atento para a
administrao de soluo salina, eletrlitos e drogas nefrotxicas ao idoso vtima de
trauma (JUC, 2001).
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31
As alteraes neurolgicas no idoso envolvem a reduo do fluxo
sanguneo cerebral e perda de neurnios, com consequente atrofia do crebro. O
espao aumentado em volta do crebro, apesar de proteg-lo de contuso, causa
estiramento dos vasos sanguneos, os quais passam a ser mais susceptveis a
rompimentos diante de impactos (ADVANCED TRAUMA LIFE SUPPORT, 2008).
Alm das modificaes cardiovasculares, respiratrias e neurolgicas, o
sistema imunolgico do idoso tambm sofre alteraes, como a funo reduzida dos
linfcitos T, macrfagos e resposta imuno-humoral, o que compromete a produo
de anticorpos e torna o idoso mais vulnervel a infeces diante de um trauma
(CARNEIRO, 2001).
Vale salientar ainda que os indivduos idosos so comumente portadores
de doenas crnicas, tais como hipertenso, diabetes mellitus e incontinncia
urinria, que podem desencadear o trauma e influenciar diretamente suas
consequncias (CAMPOS, 2007; DIVANI et al, 2009).
A presena destas doenas leva o idoso a fazer o uso concomitante de
diversos medicamentos, que tambm podem torn-lo mais susceptvel ao trauma,
bem como dificultar a resposta compensatria ao mecanismo de trauma e o manejo
de uma reanimao (ASCHKENASY; ROTHENHAUS, 2006).
A morte imediata ocorre nos primeiros minutos at uma hora aps o
evento e provocada por leses cerebrais, seco alta da medula, leses cardacas
ou de vasos calibrosos e em 80% dos casos provocada por hipovolemia. A morte
precoce ocorre nas primeiras duas horas seguintes ao acidente, decorrente de
choque hemorrgico. J a morte tardia ocorre aps a primeira semana do trauma,
como consequncia, na maioria das vezes, de tromboembolismo pulmonar,
infeces, traumatismo cranioenceflico ou falncia de mltiplos rgos (NATIONAL
ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007; THOMAZ; LIMA,
2000).
O ndice de mortalidade em idosos decorrente de eventos traumticos
pode ser influenciado tambm pelo nvel do trauma, tratamento incompleto ou
cuidados inadequados realizados no ambiente domiciliar devido aos recursos
existentes e os primeiros cuidados realizados no local da ocorrncia (FLEISCHMAN
et al, 2010a; NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL
TECHNICIANS, 2007).
-
32
Malvestio (2005) afirma que a sobrevivncia das vtimas depende de
diversos fatores, como a gravidade do trauma, as condies do paciente e a
assistncia prestada nos mbitos pr e intra-hospitalar.
3.4 O ATENDIMENTO PESSOA IDOSA VTIMA DE TRAUMA
A prestao de primeiros cuidados imediatos, preferencialmente ainda no
local do evento, contribui para o melhor prognstico da pessoa idosa vtima de
trauma. Estudos demonstram que em vrios casos as vtimas com leses graves
morrem ainda no trajeto entre o local da ocorrncia e o hospital ou nas primeiras
horas do acidente, perodo denominado como hora de ouro do traumatizado
(THOMAZ; LIMA, 2000).
Assim como no adulto, a assistncia pr-hospitalar pessoa idosa vtima
de trauma na hora de ouro inicia-se com a avaliao primria da vtima de trauma,
que corresponde sequncia mnemnica A-B-C-D-E, onde: A (air way)
corresponde abertura de vias areas, com elevao do queixo e trao anterior da
mandbula, e proteo da coluna cervical; B (breathing), avaliao da respirao e
oxigenao adequadas; C (circulation), avaliao da circulao com controle de
hemorragias; D (disability), avaliao do estado neurolgico atravs da Escala de
Coma de Glasgow; E (exposure), exposio da vtima e proteo do ambiente
(NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007).
Na primeira etapa, as vias areas, quando comprometidas, devem ser
abertas enquanto se mantm a proteo da coluna cervical. Esta proteo consiste
em manter o pescoo da vtima em posio neutra durante a abertura das vias
areas para no ocasionar ou agravar leses neurolgicas a partir da medula
espinhal. A presena de cifose, artrite e osteoporose podem dificultar a proteo das
vias areas e da coluna cervical nas pessoas idosas (CALLAWAY; WOLFE, 2007;
NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007).
A avaliao da respirao e oxigenao deve ser realizada atravs da
exposio do trax e identificao da presena de prteses dentrias, as quais
devem ser removidas. Deve-se assegurar que as vias areas estejam prvias e,
caso a vtima no apresente respirao, iniciar imediatamente a ventilao assistida
com dispositivo de mscara facial acoplada a oxignio suplementar (CALLAWAY;
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33
WOLFE, 2007; NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL
TECHNICIANS, 2007).
O atendimento das vias areas pode envolver o uso de cnula
orofarngea ou intubao orotraqueal, que, por sua vez, podem ocasionar
hemorragias e complicaes nos idosos, j que estes apresentam as mucosas mais
delicadas.
O controle de hemorragias deve ser feito atravs da presso direta do
local do sangramento, elevao do membro (com cuidado nos casos de fratura ou
luxao) e, somente como ltima alternativa, o uso de torniquetes. Quando h
suspeita de hemorragia interna, necessria a rpida reposio de fluido
endovenoso. O controle de hemorragias uma prioridade para a manuteno da
circulao em uma vtima de trauma.
Em estudo realizado por Malvestio (2005), evidenciou-se que as vtimas
que necessitaram de procedimentos circulatrios bsicos, como realizao do
curativo compressivo, demonstraram menores chances de sobrevivncia aps
acidentes de trnsito quando comparadas s pessoas que necessitaram de outros
procedimentos.
Como muitas causas de hemorragia so difceis de controlar fora do
ambiente hospitalar, fundamental dar ateno e prioridade ao transporte rpido da
vtima por uma equipe devidamente preparada (NATIONAL ASSOCIATION OF
EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007).
A manuteno da circulao uma etapa difcil em vtimas idosas, pois
estes indivduos comumente so hipertensos, o que dificulta o diagnstico de
choque hipovolmico, j que a perda de volume pode levar falsa interpretao de
que a presso arterial encontra-se normal (YOUNG; AHMAD, 1999).
Depois de avaliar e corrigir as condies respiratrias e circulatrias da
vtima de trauma, segue-se com a avaliao neurolgica, que, ao analisar a funo
cerebral, permite identificar indiretamente se h oxigenao no crebro. Esta
avaliao se d atravs do uso da Escala de Coma de Glasgow (ECGl), que permite
determinar o nvel de conscincia do indivduo a partir de trs parmetros: abertura
ocular, melhor resposta verbal e melhor resposta motora, conforme o quadro abaixo.
-
34
Quadro 01 - Escala de Coma de Glasgow
Indicadores Resposta Pontos
Abertura Ocular (AO) Espontnea 4
Com estimulo verbal 3
Com estmulo doloroso 2
Nenhuma resposta 1
Melhor Resposta Verbal (MRV) Orientado 5
Confuso 4
Palavras imprprias 3
Sons incompreensveis 2
Nenhuma resposta 1
Melhor resposta motora (MRM) Obedece 6
Localiza e retira estmulos 5
Localiza o estmulo 4
Responde em flexo 3
Responde em extenso 2
Nenhuma resposta 1
Total = AO+MRV+MRM
Fonte: BARROS, A. B. L.; et al, 2002, p. 98.
A pontuao da ECGl atribuda de acordo com a melhor resposta para
cada parmetro. O escore mximo de 15 pontos, que indica ausncia de dano
neurolgico, e o mnimo de 3 pontos, sinal de dano grave. Uma pontuao menor
que 8 indica leso grave, entre 9 e 12, leso moderada, e de 13 a 15, leso mnima.
Durante a abertura ocular, as pupilas tambm so avaliadas quanto ao tamanho,
-
35
simetria e fotorreao, cujas alteraes podem indicar hemorragia cerebral
(NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007).
Nos idosos, a avaliao neurolgica pode ser comprometida pela
presena de doenas como glaucoma e catarata, que confundem o exame ocular.
Existem, ainda, estmulos auditivos e visuais que podem inibir a capacidade do idoso
compreender e responder s perguntas do exame neurolgico. Portanto, preciso
estar mais atento durante a avaliao neurolgica do idoso, pois sinais de mudanas
do estado mental identificados por profissionais despreparados so erroneamente
atribudos ao processo fisiolgico do envelhecimento (CALLAWAY; WOLFE, 2007;
STEVENSON, 2004).
A exposio da vtima fundamental para identificar todas as leses,
porm, depois que todo o corpo examinado no sentido cfalo-caudal, a vtima deve
ser coberta para proteg-la da hipotermia. Em idosos, somente a rea do corpo a
ser examinada deve ser descoberta, pois o risco de hipotermia maior devido aos
mecanismos regulatrios da temperatura estarem comprometidos com o processo
de envelhecimento (NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL
TECHNICIANS, 2004; THOMAZ; LIMA, 2007).
Aps a avalio primria no local do evento, ocorre a reanimao, onde
os problemas encontrados so solucionados conforme a prioridade, ao fornecer
tratamento para as vias areas e controle das hemorragias atravs da correo das
perdas de volume (CANETTI et al, 2001).
Segundo Malvestio (2005), as imobilizaes devem ser realizadas na fase
de APHM, pois consistem em procedimentos padronizados que foram realizados em
98,9% dos sujeitos de seu estudo.
O tempo mximo na cena do evento deve ser limitado a 10 minutos,
exceto em circunstncias excepcionais, j que o transporte de vtimas de trauma
deve ser iniciado rapidamente e para o local mais adequado e prximo. O tempo na
cena correspondente ao perodo em que ocorre a avaliao da vtima, realizao
de procedimentos e contato com a Central de Regulao (MALVESTIO, 2005;
NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007).
Quando a vtima est estvel, a avaliao secundria pode ser realizada
no local do evento. Entretanto, as vtimas mais graves recebem esta segunda
avaliao durante o transporte para o hospital (CANETTI et al, 2001).
-
36
A avaliao secundria realizada somente aps a reanimao e
consiste em identificar o histrico da vtima e na realizao de exame fsico
completo, com a finalidade de identificar leses no encontradas no exame primrio.
Nesta fase, so aferidos os sinais vitais e identificados sinais e sintomas especficos
de danos internos e doenas (NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY
MEDICAL TECHNICIANS, 2007; THOMAZ; LIMA, 2000).
O histrico da vtima de trauma deve ser obtido rapidamente e, para isso,
utiliza-se o cdigo mnemnico AMPLA: A corresponde s alergias, principalmente
a medicamentos; M, medicamentos em uso; P, passado mdico e antecedentes
cirrgicos; L, lquidos e alimentos ingeridos, pois muitas vtimas de trauma
necessitam ser submetidos a procedimentos cirrgicos e a ingesto recente de
bebidas e alimentos pode aumentar o risco de aspirao por vmito induzido durante
a anestesia; e A consiste no ambiente e eventos que desencadearam o evento de
trauma (NATIONAL ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS,
2007).
Os aspectos essenciais a serem considerados no trauma em idosos esto
relacionados identificao das mudanas fisiolgicas do envelhecimento,
conhecimento da biomecnica do trauma no idoso e dos princpios do tratamento,
identificao das peculiaridades do atendimento ao idoso e realizao do transporte
adequado at uma instituio hospitalar com os recursos apropriados (NATIONAL
ASSOCIATION OF EMERGENCY MEDICAL TECHNICIANS, 2007).
Diante de uma situao de trauma, a qualidade do atendimento est
diretamente relacionada competncia e ao preparo dos profissionais que
realizaram a assistncia. Os primeiros cuidados ainda na cena do evento e o
transporte rpido at uma unidade hospitalar com recursos apropriados para o
tratamento definitivo fazem do APHM um fator determinante na sobrevivncia das
vtimas.
3.5 ASPECTOS DO ATENDIMENTO PR-HOSPITALAR MVEL
O APHM consiste na assistncia realizada de maneira direta ou indireta
ao indivduo que se encontra em situao crtica fora do mbito hospitalar, como nas
ruas, residncias e locais de trabalho, com a finalidade principal de minimizar as
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37
sequelas ou agravos decorrentes da falta de socorro precoce, em situaes clnicas,
peditricas, gineco-obsttricas, psiquitricas e traumticas (BRASIL, 2006a).
Os primeiros relatos da assistncia pr-hospitalar advm do perodo
napolenico, durante a Revoluo Francesa, quando o baro Dominick Jean Larrey,
cirurgio e chefe militar, observou que os cuidados prestados precocemente aos
feridos em guerra evitavam complicaes. Tal fato contribuiu para a criao da Cruz
Vermelha Internacional, em 1863, e foi comprovado durante as grandes Guerras
Mundiais, em que os soldados recebiam atendimento rpido ainda nos campos de
batalha e eram transportados para locais onde recebiam tratamento adequado
definitivo (RAMOS; SANNA, 2005).
Romanzini (2007) ressalta que o Dr. J. D. Keke Farrington e
colaboradores do Colgio Americano de Cirurgies e do Comit em Trauma
instituram as bases para o APHM que prevalecem atualmente, por meio do
estabelecimento dos princpios fundamentais, assim como materiais e equipamentos
necessrios para esse tipo de assistncia. Tais estudiosos afirmaram que a chance
de sobrevivncia da vtima influenciada pelo tempo resposta rpido, o qual inclui a
proviso de ventilao e suporte de oxignio adequado e transporte imediato.
Ao longo dos sculos, as guerras foram fator contribuinte para a evoluo
da assistncia pr-hospitalar e transporte dos feridos, que inicialmente era realizado
por trao animal, no sculo XVIII, em seguida, pelo uso de bales de ar quente, no
sculo XIX, resgate com avies na I Guerra Mundial e helicpteros, em 1920, pelos
ingleses e franceses (ROMANZINI, 2007).
Somente em 1955, na Frana, foram criadas as primeiras equipes mveis
de assistncia, com a finalidade de atender s vtimas de acidentes de trnsito e
transferncias inter-hospitalares. Os mdicos viram a necessidade de aumentar as
chances de sobrevivncia dos pacientes a partir de cuidados bsicos e avanados,
centrados na respirao e circulao adequadas e, na dcada de 60, foi oficializado
o primeiro Service dAide Mdicale Urgente (Servio de Atendimento Mvel de
Urgncia - SAMU) (LOPES; FERNANDES, 1999).
No Brasil, o APHM teve incio a partir de 1808, com a chegada da Famlia
Real Portuguesa, porm restringia-se somente ao transporte de acidentados. A
assistncia s vtimas no local da ocorrncia passou a ser realizada em 1893,
quando o Senado da Repblica aprovou a lei que pretendia estabelecer o
-
38
atendimento mdico de urgncia em vias pblicas do Rio de Janeiro, at ento
capital do pas (SO PAULO, 2001; SILVA, 2010).
Na dcada de 80, por solicitao do Ministrio da Sade, o SAMU foi
institudo atravs de um acordo bilateral estabelecido entre o Brasil e a Frana. O
modelo francs foi adotado pelo Brasil por exigir a presena do mdico e do
enfermeiro no suporte avanado, diferente dos padres americanos, que exigem a
presena do paramdico na assistncia, profissional inexistente no Brasil (CUNHA;
SANTOS, 2003; LOPES; FERNANDES, 1999).
O Estado de So Paulo foi um dos primeiros do Brasil a utilizar o APHM,
que tomou impulso em 1989, aps ter sido oficializado o SAMU Resgate atravs
de acordo entre as Secretaria Estadual de Sade (SES) e a Secretaria de
Segurana Pblica (SSP) Corpo de Bombeiros. Ao longo da dcada de 90, vrios
Estados brasileiros implantaram o APHM em parceria com o Corpo de Bombeiros
(SO PAULO, 2001).
Ramos e Sanna (2005) afirmam que uma das maiores dificuldades que o
APHM enfrentou no Brasil foi a ausncia de legislao especfica, o que levou
criao e implantao de vrias estruturas de APHM em diferentes cidades.
Em 2002, o Ministrio da Sade implantou a Portaria n 2.048, que ao
considerar a necessidade de maior atendimento de urgncia e emergncia, devido
ao crescente ndice de violncia urbana, estabeleceu oficialmente a criao do
APHM. Este normatizado no Brasil pela Poltica Nacional de Ateno s Urgncias
(PNAU), implantada pela Portaria n 1.863 de 2003, que tem entre suas finalidades
organizar, estruturar e estabilizar o atendimento s urgncias (BRASIL, 2006a).
Dentro da PNAU, alm das Portarias n 2.048/2002 e n 1.863/2003,
existe a Portaria n 1.864/2003, que institui o componente pr-hospitalar mvel em
municpios e regies de todo o territrio brasileiro por meio do SAMU, o qual
constitui um importante avano nos sistemas de sade do Brasil, pois funciona
atravs de uma Central de Regulao (SILVA, 2010).
A Central de Regulao funciona 24 horas por dia e acionada por meio
de ligao gratuita ao nmero 192, na qual o mdico regulador identifica a
emergncia e, por sua vez, decide entre fornecer orientaes sobre as condutas a
serem tomadas ou destinar uma viatura com estrutura adequada para prestar o
atendimento vtima que se encontra em agravo (BRASIL, 2006a; ODWYER,
2010).
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39
Desta forma, a Central de Regulao permite a hierarquizao e
regionalizao dos servios na ateno s urgncias, bem como reduzir a lentido
do atendimento e a lotao dos hospitais e prontos-socorros com casos no
pertinentes (BRASIL, 2006a; ODWYER, 2010).
J o APHM, representado pelo SAMU, divide-se em Suporte Bsico de
Vida (SBV), que consiste em procedimentos no invasivos de manuteno das
condies vitais do indivduo, e Suporte Avanado de Vida (SAV), realizado por meio
de prticas invasivas de suporte ventilatrio e circulatrio, em casos de maior
gravidade e maior complexidade (BRASIL, 2006a).
O SAMU atua no atendimento primrio, quando acionado por um cidado,
e secundrio, quando solicitado por um servio de sade que j tenha realizado os
primeiros procedimentos necessrios estabilizao das vtimas, mas que a
situao exige tratamento de maior complexidade e, por isso, o transporte se faz
necessrio (BRASIL, 2011).
De acordo com a PNAU (BRASIL, 2006a), o transporte realizado pelo
APHM pode ser desenvolvido pelo uso de ambulncias, meio mais comum adotado
nas grandes zonas urbanas; aeronaves, mais indicadas quando preciso o
transporte imediato em locais que no dispem de instituio hospitalar com
recursos adequados para estabilizao da vtima; e embarcaes, indicadas para os
locais que no dispem de acesso por via terrestre (BRASIL, 2006a).
Conforme as circunstncias e o tipo de assistncia necessria, as
ambulncias podem ser classificadas em Unidades de Suporte Bsico (USB) e
Unidades de Suporte Avanado (USA). As USB so destinadas ao transporte de
pacientes com risco de vida conhecido ou atendimento pr-hospitalar em situaes
de risco de vida desconhecido. J as USA funcionam como Unidades de Terapia
Intensiva mveis (UTI mveis) e so direcionadas aos pacientes mais graves, que
necessitam de cuidados intensivos (BRASIL, 2006a).
Existem ainda os veculos de interveno rpida, tais como as motos,
denominadas motolncias, que oferecem os cuidados iniciais s vtimas at a
chegada da ambulncia adequada e prestam suporte s outras equipes (BRASIL,
2006a).
Para acionar as equipes adequadas, o nvel de complexidade definido
atravs do mdico regulador, por protocolos, que incluem situaes de emergncia,
situaes identificadas pelo telefonema ou pela equipe de suporte bsico durante o
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40
atendimento, ou situaes implcitas, como vtimas de desabamentos ou de grandes
acidentes (PEREIRA; LIMA, 2006).
O APHM realizado por uma equipe multiprofissional, j que a de SBV
composta por um condutor-socorrista e por um tcnico de enfermagem e a de SAV
formada por um condutor-socorrista, um mdico e um enfermeiro. Estes profissionais
lidam constantemente com as caractersticas peculiares do APHM, tais como espao
restrito das ambulncias, exposio a ambientes adversos, mal estado de
conservao das estradas e avenidas, alm do curto perodo de tempo com o
paciente, j que o atendimento deve ser realizado rapidamente (MINAYO;
DESLANDES, 2008; VIEIRA; MUSSI, 2008).
Pode-se, ento, resumir o funcionamento do SAMU da seguinte forma: o
servio pr-hospitalar acionado gratuitamente pelo nmero nacional 192; a ligao
atendida pelos Tcnicos Auxiliares de Regulao Mdica (TARM), na Central de
Regulao, que identificam a situao e passam a ligao para o mdico regulador.
Este avalia a situao, classifica o nvel de gravidade e define o recurso mais
adequado ao atendimento. A equipe destinada ao local realiza os cuidados pr-
hospitalares e entra em contato com a Central de Regulao, que define a instituio
hospitalar para a qual a vtima ser transportada.
O APHM se firmou no Brasil e em todo o mundo devido crescente
guerra moderna de morbidade e mortalidade por causas externas e violncia. Tal
circunstncia aumenta a necessidade de atendimento de urgncia e emergncia,
alm de provocar impacto no nmero de internaes hospitalares, gastos com
medicamentos, reduo do tempo de produtividade das vtimas e gerao de nus
sade pblica, que em nosso pas representada pelo Sistema nico de Sade
(SUS) (BRASIL, 2006a).
3.6 A ENFERMAGEM NO ATENDIMENTO PR-HOSPITALAR MVEL
A participao da enfermagem no APHM passou a ter maior destaque no
sculo XIX, atravs de Florence Nightingale, a qual prestou cuidados aos soldados
feridos na guerra da Crimia (1854-1856) e teve sua imagem imortalizada como a
Dama da Lmpada, e da enfermeira brasileira Anna Nery na guerra do Paraguai
(1864-1870) (ROMANZINI, 2007).
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A enfermagem tambm teve colaborao marcante nas duas Guerras
Mundiais, alm das guerras da Coria (1950) e do Vietn (1962-1973). Um grupo
formado por 67 enfermeiras voluntrias participou na prestao da assistncia aos
feridos na II Guerra Mundial, alm de enfermeiras treinadas pela marinha e pelo
exrcito americano para assistncia nos grandes avies cargueiros, as quais foram
ento denominadas como Flight Nurses (MERLO, 2009; RAMOS; SANNA, 2005).
A formao do enfermeiro para atuar no APHM distinta em diversos
pases e at mesmo em algumas regies. Nos EUA, essa formao se d por meio
de cursos extensos que variam em cada Estado, assim como a experincia de no
mnimo 1 a 3 anos de assistncia em emergncia ou a pacientes crticos. J na
Frana, o enfermeiro comea a adquirir as competncias para atuar no APHM ainda
na graduao, em unidades de cuidados intensivos e suporte avanado (MERLO,
2009).
No Brasil, o preparo profissional para o enfermeiro que pretende trabalhar
no mbito pr-hospitalar ainda recente e se restringe aos cursos de especializao
(latu sensu), conforme as diretrizes do Conselho Regional de Enfermagem (COREN)
e Ministrio da Educao. Por ser uma rea pouco abordada durante a graduao e
na qual ainda h pouco desenvolvimento cientfico, o enfermeiro sente-se muitas
vezes despreparado para prestar assistncia nesse nvel ou at mesmo desconhece
essa possibilidade de insero no mercado de trabalho (GENTIL; RAMOS;
WHITAKER, 2008; OLIVEIRA, 2010; ROMANZINI; BOCK, 2010).
Gentil, Ramos e Whitaker (2008) afirmam em seu estudo que os
enfermeiros no APHM lidam com situaes diferentes do mbito intra-hospitalar e
que exigem rpida tomada de deciso, destreza e habilidade para suportar o
estresse, o que exige o reforo na capacitao desses profissionais.
No entanto, estudo realizado por Vargas (2006) evidenciou que os
enfermeiros se sentem despreparados diante de algumas situaes no APHM que
no costumam ocorrer no hospital e no so contempladas nos cursos de
graduao. Para suprir suas deficincias, segundo Thomaz e Lima, Romanzini e
Bock (2010), esses profissionais buscam o aprofundamento terico na literatura e
em muitos casos a realizao de cursos bsicos e avanados, tais como o
Advanced Cardiac Life Support (ACLS), Advanced Trauma Life Support (ATLS), Pre-
hospital Trauma Life Support (PHTLS), Basic Life Support (BLS) e Manobras
Avanadas de Suporte ao Trauma (MAST) (VARGAS, 2006).
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Por ser um tipo de assistncia realizado em locais e circunstncias
adversas, o APHM impe ao enfermeiro situaes de estresse, desgaste fsico e
emocional, assim como a necessidade de possuir conhecimento cientfico e
habilidade tcnica para agir diante das ocorrncias (ROMANZINI, 2007).
Bernardes et al (2009) apontam, ainda, que o enfermeiro deve
acompanhar a equipe e identificar as possveis dificuldades, para, desta forma,
propor aes que possam se adequar s diversas situaes e promover melhorias.
Para Ramos e Sanna (2005), uma das maiores dificuldades enfrentadas no Brasil
pelo APHM foi a falta de legislao especfica.
Com o intuito de legalizar as atividades desempenhadas pela
enfermagem no APHM, o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) instituiu em
24 de maro de 2004, a Resoluo n 290, a qual fixa o APH como especialidade de
enfermagem e de competncia do enfermeiro, porm no especifica sua formao e
aes desenvolvidas. Esta resoluo foi revogada pela Resoluo n 389, de
outubro de 2011, que atualiza no mbito do sistema COFEN/COREN os
procedimentos para registro de ttulo de ps-graduao (CONSELHO FEDERAL DE
ENFERMAGEM, 2004; 2011).
Em 2011, o COFEN instituiu tambm a Resoluo n 375, que dispe
sobre a obrigatoriedade da presena do enfermeiro durante a assistncia de
enfermagem nas unidades de APHM e em situaes de risco.
O preparo profissional imprescindvel, pois a enfermagem tem destaque
no APHM, j que desenvolve suas atividades tanto nas USB, pelo tcnico/auxiliar de
enfermagem, quanto nas USA, pelo enfermeiro, e diferencia-se especialmente na
composio de sua equipe (CICONET; MARQUES; LIMA, 2008).
No APHM, alm de realizar a assistncia direta ao paciente, o enfermeiro
tem atribuies burocrticas e educativas, como a elaborao de protocolos,
capacitao e cursos de treinamento e reciclagem, administrao de recursos
materiais e humanos (CARVALHO et al, 2011). Thomaz e Lima (2000) destacam
que o enfermeiro realiza atividades em trs fases: antes, durante e depois do
atendimento.
A primeira fase engloba a checagem e reposio do material, verificao
do funcionamento de equipamentos e manuteno dos kits de atendimento. Na
segunda fase, durante o atendimento, prestada a assistncia direta s vtimas,
definio das prioridades, avaliao primria e secundria e transporte seguro da
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vitima at uma instituio hospitalar que prestar os cuidados definitivos. Na terceira
fase, o enfermeiro deve repor o material utilizado na ocorrncia, cuidar da limpeza e
desinfeco dos equipamentos e registrar os procedimentos realizados.
Para Pereira e Lima (2006), Mello e Brasileiro (2010), o enfermeiro no
APHM constitui um elo entre a assistncia e a gerncia, pois transita em quase
todos os espaos, j que atua junto equipe de SBV, atravs da superviso e
educao permanente, e com a equipe de SAV, na prestao de cuidados aos
pacientes mais graves.
Conforme Romanzini e Bock (2010), a presena do enfermeiro garante
maior segurana equipe na tomada de deciso, j que este profissional tem
iniciativa para a realizao de procedimentos que beneficiam o paciente.
Coutinho (2011) afirma que a presena do enfermeiro essencial no
APHM, pois atua em todas as etapas do atendimento, e Bernardes et al (2009)
salientam que o desenvolvimento de competncias tcnicas pelo enfermeiro no
suficiente, pois so necessrias tambm a coordenao e superviso de recursos
humanos.
De acordo com a Portaria n 2048/2002 do Ministrio da Sade, as
competncias e atribuies do enfermeiro incluem: supervisionar e avaliar as aes
de enfermagem da equipe no APHM; executar prescries mdicas por
telemedicina; prestar cuidados de enfermagem de maior complexidade tcnica a
pacientes graves e com risco de vida que exijam conhecimentos cientficos
adequados; realizar partos sem distcia; prestar assistncia gestante, parturiente
e ao recm-nato; conhecer equipamentos e realizar manobras para extrao de
vtimas (BRASIL, 2002).
Ao tcnico e auxiliar de enfermagem cabe auxiliar o enfermeiro na
assistncia ao paciente; prestar cuidados sob a superviso do enfermeiro;
administrar medicamentos conforme prescrio por telemedicina; fazer curativos;
garantir o conforto e a segurana do paciente; e realizar manobras de extrao
manual de vtimas (BRASIL, 2006a).
Durante as ocorrncias de trauma, a equipe de enfermagem deve seguir
os protocolos estabelecidos e tem como principais responsabilidades manter o
controle das vias areas, estabelecer acesso venoso ou intrasseo para
administrao de medicamentos conforme prescrio mdica, controle e
manuteno dos sinais vitais e garantir o transporte seguro e imediato do paciente
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at a unidade hospitalar definida pela Central de Regulao (BRASIL, 2006a;
RAMOS; SANNA, 2005).
A Lei n 7.498/1986 regulamenta o exerccio profissional da enfermagem
e impe entre suas tarefas privativas os cuidados diretos a pacientes graves e que
exijam assistncia mais complexa, baseada no conhecimento cientfico e tomada de
deciso imediata.
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4 MATERIAL E MTODO
4.1 TIPO DE ESTUDO
Trata-se de um estudo descritivo, de abordagem quantitativa e
delineamento transversal, caracterizado como documental retrospectivo a partir de
dados secundrios, cujo objetivo caracterizar a ocorrncia de traumas na
populao idosa atendida pelo servio pr-hospitalar mvel.
Considera-se como estudo descritivo aquele que delineia as
caractersticas existentes em um grupo investigado atravs da observao, registro
e anlise de fatos ou fenmenos sem manipul-los. Os dados obtidos so descritos
e sintetizados atravs de mdias e porcentagens (CERVO; BERVIAN; DA SILVA,
2007; GIL, 2001; POLIT; BECK; HUNGLER, 2004).
Entre as formas que a pesquisa descritiva pode assumir esto os estudos
que visam identificar o perfil de indivduos e grupos, a pesquisa de opinio, a
pesquisa de motivao, os estudos de caso e a pesquisa documental (CERVO;
BERVIAN; DA SILVA, 2007).
O uso da abordagem quantitativa frequente nos estudos descritivos,
pois garante a preciso dos resultados, evita distores de anlise e interpretao. A
quantificao adotada tanto na coleta de dados, como na anlise dos resultados
atravs de tcnicas estatsticas. A anlise estatstica dos resultados nos estudos
quantitativos o que garante o maior poder de generalizao dos achados
cientficos (GAUTHIER et al,1998; RICHARDSON et al, 1989).
O delineamento transversal tem sua coleta de dados realizada em um
dado ponto do tempo e aplicado na maioria dos estudos retrospectivos, pois
permite que as variveis dependente e independente sejam coletadas
simultaneamente e a varivel independente permite captar eventos ocorridos no
passado (POLIT; BECK, HUNGLER, 2004).
A pesquisa documental se caracteriza por ter sua coleta de dados
realizada a partir de documentos. Pode ser classificada em contempornea, quando
os dados so compilados pelo autor durante a ocasio, ou retrospectiva, na qual os
dados so compilados aps o evento, a partir de fontes secundrias (MARCONI;
LAKATOS, 2006),
A anlise de dados secundrios consiste no uso de dados existentes para
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investigar questes de pesquisa que se distinguem das finalidades para as quais as
informaes foram coletadas. Entre suas vantagens est a economia de tempo e de
recursos financeiros; como desvantagem est o fato de que a seleo da populao
a ser estudada, dados a serem coletados, a qualidade dos dados e a forma como as
variveis so aferidas e registradas so predeterminadas (GRADY; HEARST, 2008).
Os dados secundrios podem ser provenientes de estudos prvios,
registros hospitalares, arquivos de cobrana, certides de bito, entre outras fontes
(GRADY; HEARST, 2008).
Grady e Hearst (2008) descrevem como passos para a realizao de
pesquisas que envolvem dados secundrios: a escolha de um tpico de pesquisa; a
familiarizao com a literatura acerca da temtica; verificao das questes de
pesquisa elaboradas quanto possibilidade de serem investigadas com a base de
dados existente; e obteno da permisso para o uso dos dados. Tais passos
propostos foram seguidos pelo presente estudo.
4.2 LOCAL DO ESTUDO
A presente pesquisa foi realizada no SAMU/Natal-RN, cuja sede est
localizada no Bairro Dix-Sept Rosado, em Natal, Rio Grande do Norte. O SAMU foi
escolhido como local para a realizao do estudo devido maior cobertura de
APHM quando comparado a outros servios pr-hospitalares privados, j que atua
em todos os estados brasileiros, em 1.468 municpios, com atendimento a mais de
110,55 milhes de pessoas (BRASIL, 2010c).
O SAMU/Natal-RN faz parte da rede do SUS atravs da PNAU e
regulamentado pelas Portarias n 2.048/2002, n 1.863/2003 e n 1.864/2003, as
quais definem o APHM e trazem suas normas de funcionamento, como rea fsica,
nmero de viaturas e equipes destinadas ao atendimento pr-hospitalar de
qualidade.
Segundo Minayo e Deslandes (2008), o SAMU preconiza alguns
parmetros demogrficos para exercer suas atividades, tais como uma equipe de
SBV para cada 100/150 mil habitantes (um motorista, um auxiliar/tcnico de
enfermagem e uma ambulncia de SBV); uma equipe de SAV para cada 400/450 mil
habitantes (um motorista, um mdico, um enfermeiro e uma ambulncia de SAV);
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um mdico regulador para cada Central de Regulao e um Ncleo de Educao em
Urgncia em cada capital.
O SAMU/Natal-RN mantido pelo rgo municipal, funciona desde 17 de
setembro de 2002 e possui uma frota composta por trs USA, cada uma tripulada
por um mdico, um enfermeiro e um condutor-socorrista, e nove USB, cuja equipe
composta por um condutor-socorrista e um tcnico de enfermagem. Existem, ainda,
06 motolncias tripuladas por tcnicos de enfermagem, voltadas para o SBV. O
servio conta com equipe de 55 mdicos, 23 enfermeiros, 85 tcnicos de
enfermagem e 69 condutores-socorristas, que trabalham nas unidades mveis de
atendimento. Desta forma, o APHM escolhido atende aos parmetros determinados
pela PNAU para o atendimento populao.
4.3 POPULAO E AMOSTRA
A populao deste estudo foi composta pelos pacientes com idade a partir
de 60 anos, cujos registros correspondem s ocorrncias de trauma atendidas pelas
equipes de SBV e SAV do SAMU/Natal-RN, no perodo de Janeiro de 2011 a
Dezembro de 2012.
Escolheu-se o perodo de 2011 a 2012, devido disponibilidade das
informaes. Os registros relacionados s ocorrncias anteriores ao ano de 2011 no
so atualizados no sistema eletrnico do servio, o que dificultaria o levantamento dos
dados das vtimas de trauma da populao geral para comparao com a populao
idosa.
Os critrios de elegibilidade foram: pacientes com 60 anos ou mais de idade,
acometidos por trauma, atendidos entre os anos de 2011 a 2012 pelo SAMU/Natal-RN.
Como critrios de excluso foram adotados os registros incompletos, bem como
aqueles que dificultaram a leitura, devido ao preenchimento ilegvel.
Os registros analisados neste estudo encontram-se armazenados na sede
do SAMU/Natal-RN, na sala de arquivos, sob a responsabilidade da Coordenao
do Ncleo de Educao Permanente (NEP).
Para estimar o tamanho da amostra antes de conhecer a populao,
procedeu-se ao seguinte clculo:
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(Fonte: BARBETTA, 2001, p. 187)
Onde, Z2 o valor correspondente ao intervalo de confiana IC de 95%
(Z=1,96), 2 proporo que se espera encontrar (=1/2, ou seja, 0,5) e E20
equivalente ao erro amostral tolerado (E =0,05).
Assim, obteve-se o nmero mnimo amostral correspondente a 384 registros
de trauma necessrios para a realizao do estudo.
Aps conhecer a populao de pessoas idosas vtimas de trauma, a qual
correspondeu a 2.080 entre os anos de 2011 a 2012, substituiu-se a frmula anterior
por:
(BARBETTA, 2001, p. 187)
Onde, N corresponde populao total de idosos vtimas de trauma
atendidos pelo SAMU/Natal-RN no perodo de Janeiro de 2011 a Dezembro de 2012
(2.080) e n0 ao nmero mnimo amostral obtido atravs da frmula anterior (384).
Por meio deste ltimo clculo, cujo poder de preciso maior, devido ao
conhecimento da populao a ser estudada, obteve-se o nmero de 324 ocorrncias
necessrias para alcanar os objetivos deste estudo, arredondando-se este valor para
400, a fim de minimizar os riscos de erro amostral e de possveis perdas da amostra.
A seleo da amostra ocorreu por meio do processo de amostragem
aleatria sistemtica, a qual utiliza um intervalo de seleo preestabelecido (VIEIRA,
2008). O primeiro elemento da amostra foi sorteado e os demais obedeceram ao
intervalo:
(BARBETA, 2001)
Onde, N corresponde populao (2.080) e n amostra (400), obtendo-se a
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constante K=5.2, cujo valor foi arredondado para K=5. Desta forma, uma das cinco
primeiras ocorrncias foi sorteada e, a partir dessa, a cada cinco ocorrncias de trauma
em idosos, a quinta foi selecionada para a caracterizao.
4.4 VARIVEIS DO ESTUDO
Para Marconi e Lakatos (2006), as variveis podem ser consideradas
quantificaes ou medidas; uma quantidade que varia; um conceito operacional que
apresenta valores; um aspecto ou propriedade discernvel em um estudo e que
possvel ser mensurado. As variveis podem apresentar valores ou ser
representadas em categorias, com a finalidade de mensurar um fenmeno.
As variveis consideradas nesta pesquisa, segundo as informaes
presentes nas fichas de ocorrncia do SAMU/Natal-RN, conforme seu plano de
anlise, foram categorizadas de acordo com a identificao das ocorrncias de
trauma atendidas pelo SAMU/Natal-RN, a ocorrncia e evoluo do trauma, assim
como o atendimento do trauma, conforme os quadros 02, 03 e 04.
Quadro 02 - Distribuio das variveis de identificao das ocorrncias de trauma
atendidas pelo SAMU/Natal-RN. Natal, RN, 2013.
Variveis Critrios Plano de anlise
Idade da vtima Idade em anos Quantitativa numrica e
independente
Sexo da vtima Masculino ou Feminino Qualitativa nominal e
independente
Data do evento Dia, ms e ano Quantitativa numrica e
independente
Dia da semana do evento Domingo a sbado Qualitativa nominal e
independente
Turno do evento Turno Qualitativa nominal e
independente
Local do evento Via pblica, residncia,
instituio, local de
trabalho, outros
Qualitativa nominal e
independente
Bairro da ocorrncia Nome do bairro Qualitativa nominal e
independente
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Quadro 03 - Distribuio das variveis relativas ocorrncia e evoluo do trauma.
Natal, RN, 2013.
Variveis Critrios Plano de
anlise
Antecedentes
pessoais
Alergias, Hipertenso Arterial, Diabetes
Mellitus, Cardiopatias, Doena Neurolgica,
nenhuma doena de base, no registrado,
outra patologia (especificar), uso de
medicamentos (especificar)
Qualitativa
nominal e
independente
Mecanismo do
trauma
Queda (altura ou prpria altura), acidente de
trnsito (coliso, capotamento, atropelamento,
outros), queimadura (1, 2 e 3 grau; agente
etiolgico; superfcie corporal queimada),
ferimento por arma de fogo (transfixante,
projtil alojado), ferimento por arma branca
(superficial, profundo e empalamento),
afogamento (praia, rio/lagoa, piscina, outro),
envenenamento (agente etiolgico), outros
(especificar)
Qualitativa
nominal e
dependente
Tipo de trauma Cranioenceflico, cervical, raquimedular,
torcico, abdominal, de extremidades, femoral,
plvico, politraumatismo, outros
Qualitativa
nominal e
dependente
Consequncias
do trauma
Fratura fechada, fratura exposta, luxao,
escoriaes, amputao traumtica, outros
(especificar)
Qualitativa
nominal e
dependente
Sinais vitais Frequncia cardaca e respiratria, presso
arterial, temperatura,
Quantitativa
numrica e
dependente
dor, ausentes Qualitativa
nominal e
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dependente
Outros sinais ndice de saturao de oxignio; ndice de
glicemia capilar
Quantitativa
numrica e
dependente
Avaliao
neurolgica
ndice na Escala de Coma de Glasgow Quantitativa
numrica e
dependente
Conscincia (consciente, inconsciente);
orientao (orientado, desorientado)
Qualitativa
nominal e
dependente
Quadro 04 - Distribuio das variveis relativas ao atendimento do trauma. Natal,
RN, 2013.
Variveis Critrios Plano de anlise
Unidade
destinada ao
atendimento
Suporte bsico, suporte
avanado ou motolncia
Qualitativa nominal e
dependente
Procedimentos
realizados
Respiratrios (oxigenioterapia,
cnula orofarngea, aspirao,
intubao orotraqueal,
traqueostomia, outros);
circulatrios (curativ