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Revista Espaço para a Saúde, Londrina, v.1, n.2, p. 89-112 - , jun. 2000.
INTERNAÇÕES PEDIÁTRICAS NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO
REGIONAL NORTE DO PARANÁ, 19981
Bernadete Nardo Teodoro2
Selma Maffei de Andrade3
INTRODUÇÃO
O processo de Reforma Sanitária, desencadeado em meados dos
anos 70, acentuou algumas tendências relativas à organização do Sistema
de Saúde, culminando com o estabelecimento do Sistema Único de Saúde
(SUS) em 1988, através da promulgação da Constituição Federal,
garantindo à população o direito universal de assistência à saúde. Conforme
o artigo 198, o SUS tem como diretrizes a universalidade, a
descentralização, a integralidade, a eqüidade e a participação da
comunidade, que devem orientar e direcionar as políticas públicas no sentido
de constituir um modelo de atenção à saúde com enfoque para a melhoria
da qualidade de vida da população.
Segundo SILVA (1996), este modelo não se limita em definir a saúde
como ausência de doenças, cujas ações de saúde são estruturadas na cura
do enfermo e no controle das doenças. Ultrapassa esta concepção,
introduzindo o conceito de que o processo saúde-doença ocorre na medida
em que os seres humanos numa determinada sociedade produzem a vida, 1
? Artigo baseado em monografia de conclusão do Curso de Especialização em Saúde Coletiva em 1999, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Estadual de Londrina.2 Enfermeira da Unidade de Pediatria do Hospital Universitário Regional do Norte do Paraná/HURNP.3 Enfermeira, doutora em Saúde Pública, Professora Adjunta do Departamento Materno Infantil e Saúde Comunitária, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Estadual de Londrina.
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Revista Espaço para a Saúde, Londrina, v.1, n.2, p. 89-112 - , jun. 2000.
numa relação com outros seres humanos, com a natureza e com o processo
de trabalho.
Um dos pontos fundamentais para a construção deste novo modelo é
a informação em saúde que, segundo CARVALHO & EDUARDO (1998),
deve ser compreendida como um instrumento para conhecer a realidade
socio-econômica, demográfica e epidemiológica, para planejar, gerenciar,
organizar e avaliar os vários níveis que integram o SUS.
Através das informações podemos obter indicadores de saúde que
refletem o nível de vida da população, coeficientes de mortalidade e suas
causas determinantes, padrão de morbidade da população ou da demanda
atendida pelos serviços, grau de risco de um evento ou agravo em saúde,
conhecer a estrutura da população segundo características de sexo, idade,
estado civil, religião, estrutura socio-econômica da população, tipo e
qualidade das habitações, ambientes domiciliários, entre outros.
Por conseguinte, as informações são consideradas alicerces de um
sistema mais abrangente voltado às necessidades de saúde da população,
indo além dos tradicionais bancos de dados que são direcionados à doença
ou à oferta de serviços (MENDES, 1993).
Neste contexto, as informações em morbidade têm um papel
fundamental, pois permitem indicar a prevalência, incidência e letalidade
das doenças; em que dimensão as doenças estão incidindo em grupos
específicos da população, por exemplo, de acordo com sexo, idade, raça,
ocupação, procedência (LEBRÃO, 1997).
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Revista Espaço para a Saúde, Londrina, v.1, n.2, p. 89-112 - , jun. 2000.
Sobre as informações em morbidade CARVALHO & EDUARDO
(1998, p. 32 ) descrevem que:
“...fornecem dados importantes para o controle das doenças; para a investigação de etiologia e patogenia e da relação com fatores econômicos, sociais e culturais; para a investigação de eficácia das medidas preventivas e terapêuticas; para estudos nacionais e internacionais da distribuição das doenças e para o planejamento de serviços destinados a prevenção e a cura das doenças.”
Dentre as fontes de informações em morbidade estão as estatísticas
hospitalares que, apesar das restrições ao seu uso devido ao seu caráter
seletivo e parcial, é um dos únicos registros sistemáticos de informações em
morbidade. São consideradas seletivas pois fornecem informações de
doenças que exigiram hospitalização, e parciais porque apenas uma parte
delas chega ao hospital. Portanto, as estatísticas hospitalares não
representam a morbidade do coletivo (LEBRÃO, 1997).
O hospital é uma instância de assistência de nível terciário, ou seja,
de média ou alta complexidade, e também é considerado a parte mais
dispendiosa do Sistema de Saúde. Sobre o uso administrativo das
estatísticas hospitalares no planejamento dos serviços, LEBRÃO (1997, p.
63), afirma que:
“...as informações deveriam estar disponíveis a fim de permitir o acompanhamento de mudanças no padrão de demanda e utilização dos serviços hospitalares, a programação de determinados serviços de diagnóstico e tratamento ou, ainda, a verificação da eficiência e eficácia do hospital.”
Um dos exemplos de grande importância dessa fonte de informações
é o Centro de Processamento de Dados Hospitalares, do município de
Ribeirão Preto, Estado de São Paulo, que funciona desde 1970 no 91
Revista Espaço para a Saúde, Londrina, v.1, n.2, p. 89-112 - , jun. 2000.
Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo, onde são trabalhadas as informações de todos
os pacientes internados nos 12 hospitais da região. Através desse sistema
de informação foi possível realizar vários estudos, entre os quais podemos
destacar: Desigualdade entre pacientes hospitalizados por doenças
cardíacas e vasculares-cerebrais em localidade do Estado de São Paulo
(BRASIL), 1986 (YAZLLE ROCHA et al., 1989), Assistência hospitalar como
indicador da desigualdade social (YAZLLE ROCHA et al., 1997), Estudo da
assistência hospitalar pública e privada em bases populacionais, 1986-1996
(YAZLLE ROCHA & SIMÕES, 1999), entre outros.
Tendo em vista essas considerações, o presente trabalho objetivou
estudar as internações da Unidade de Pediatria do Hospital Universitário
Regional do Norte do Paraná (HURNP) de acordo com algumas
características ligadas às crianças e ao Serviço.
METODOLOGIA
O HURNP é um órgão suplementar da Universidade Estadual de
Londrina – PR, que iniciou seu funcionamento em 1971, sendo o único
hospital público de grande porte na região norte do Paraná. Constitui-se em
um centro de referência regional para o SUS e sua área de influência
alcança mais de 200 municípios dos estados do Paraná, São Paulo e Mato
Grosso do Sul.
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A Unidade de Pediatria/HURNP, em 1998, era composta de 36
leitos, sendo distribuídos entre as clínicas de cirurgia infantil (12 leitos),
pediatria geral (19 leitos) e outras especialidades (5 leitos).
A casuística foi composta pelas saídas registradas durante todo o ano
de 1998 no relatório de altas e óbitos produzido pelo Serviço de Arquivo
Médico e Estatística (SAME) e fornecido, para fins da presente pesquisa, em
formato impresso.
As variáveis estudadas foram: sexo, idade, clínica de internação,
procedência (residente em Londrina, outros municípios do Paraná e outros
estados), tempo de permanência, diagnóstico principal segundo os capítulos
I a XIX da Classificação Internacional de Doenças, décima revisão – CID-10
(Organização Mundial da Saúde, 1995), diagnóstico secundário (referente à
causa externa de lesões ou envenenamentos, segundo o capítulo XX da
CID-10) e tipo de saída hospitalar (alta ou óbito).
As variáveis clínica de internação, idade, sexo, tempo de
permanência, meses de internação e tipo de saída foram coletadas do
próprio relatório de altas e óbitos do SAME. Para as variáveis procedência,
diagnóstico principal e secundário, foi necessário coletar informações de
outra ficha disponível no Hospital (denominada “Setor de Classificação”)
para cada saída hospitalar observada.
Para processamento geral dos dados foi utilizado o processador de
texto, banco de dados e processador estatístico para saúde pública Epi Info
6.04.
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Os resultados foram apresentados em tabelas e figuras, em números
absolutos e percentuais, sendo ainda calculados os seguintes indicadores
(LEBRÃO, 1997):
Tempo médio de permanência: total de pacientes-dia no ano em
relação ao total de leitos-dia no mesmo período, multiplicado por
100;
Tempo mediano de permanência: valor central do conjunto dos
dias de internações ordenados forma crescente;
Taxa de mortalidade da Unidade: relação entre o número de óbitos
e o número de saídas no mesmo período, multiplicado por 100.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Em 1998, houve 1136 saídas da Unidade de Pediatria do HURNP,
sendo que 57,2% foram pacientes do sexo masculino e 42,8% do sexo
feminino (Figura 1).
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Figura 1 - Distribuição de internações segundo sexo. Unidade de Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
Quanto aos grupos de idade, percebemos que o mais freqüente foi o
de 0 a 4 anos, correspondendo a 782 internações (69,2% do total),
conforme demonstrado na Tabela 1.
Tabela 1 – Distribuição de internações segundo faixa etária. Unidade de Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
Faixa etária (anos) Número %
0 |-- 5 782 69,2
5 |-- 10 231 20,4
10 |-- 15 117 10,4
Total* 1130 100,0
* Excluídos 6 casos com idade ignorada.
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Resultados semelhantes foram constatados por MATHIAS &
SOBOLL (1996) que caracterizaram a morbidade hospitalar de 8 hospitais
gerais do município de Maringá – PR, onde as internações se concentraram
em crianças de até 4 anos.
Na Tabela 2 é apresentada a distribuição de internações segundo as
clínicas de internação.
Tabela 2 - Distribuição de internações segundo clínica. Unidade de Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
Clínica Número %
Pediatria geral 550 48,4
Cirurgia Infantil 436 38,4
Ortopedia 55 4,8
Neurologia 27 2,4
Hematologia 29 2,6
Oftalmologia 17 1,5
Otorrinolaringologia 22 1,9
Total 1136 100,0
Verifica-se que 48,4% das internações foram da clínica de pediatria
geral. Estes dados podem estar relacionados ao número de leitos ofertados
em cada clínica. Do total de leitos da Unidade, a pediatria geral dispõe de 19
leitos, que correspondem a 52,8%. A cirurgia infantil dispõe de 12 leitos
(33,3%) e as outras especialidades de 5 leitos (13,9%). Podemos verificar
que a cirurgia infantil realizou 435 internações (38,3%), com 33,3% do total
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de leitos, demonstrando que esta clínica tem uma maior rotatividade,
comparado à pediatria geral e demais clínicas. Segundo LEBRÃO apud
CARVALHO (2000), o tempo de permanência das internações,
principalmente das cirúrgicas, vem diminuindo nos últimos anos, em função
das inovações tecnológicas que vêm ocorrendo na assistência à saúde.
Conforme demonstra a Figura 2 a maioria das internações foram de
pacientes procedentes do município de Londrina (62,5%), seguidos de
outros municípios do estado do Paraná (35,7%) e de outros estados (1,8%).
Estes dados indicam realidade semelhante à do município de Maringá – PR,
relatada por MATHIAS & SOBOLL (1996), onde a maior parte das
internações foram de pacientes procedentes do próprio município de
Maringá (66,4%).
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Figura 2 - Distribuição de internações segundo procedência. Unidade de Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
Segundo dados levantados pela Seção de Estatística do HURNP, no
total de internações do Hospital, a procedência é semelhante aos dados da
Unidade de Pediatria, embora nesta a proporção de residentes em Londrina
seja um pouco menor. No ano de 1998, das 11510 internações, 8126
(70,6%) foram do município de Londrina, 3321 (28,8%) de outros municípios
do Estado do Paraná e 63 (0,5%) de outros Estados (BIAZIN et al., 1999).
A Tabela 3 apresenta a distribuição das internações segundo
procedência e clínicas de internação.
Tabela 3 - Distribuição de internações segundo procedência e clínicas de
internação. Unidade de Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
Procedência98
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Londrina Outros/Paraná Outros estados TotalNo % No % No % No %
Pediatria geral 407 57,3 142 35,1 1 5,0 550 48,4
Cirurgia infantil 216 30,4 200 49,4 19 95,0 435 38,3
Ortopedia 38 5,4 17 4,2 - - 55 4,8
Neurologia 11 1,6 16 3,9 - - 27 2,4
Hematologia 20 2,8 9 2,2 - - 29 2,6
Oftalmologia 8 1,1 9 2,2 - - 17 1,5
Otorrinolaringologia 10 1,4 12 3,0 - - 22 2,0
Total* 710 100,0 405 100,0 20 100,0 1135 100,0
* Excluído 1 caso com procedência ignorada.
Das internações procedentes do município de Londrina, 57,3% foram
na clínica de pediatria geral. Observamos que a clínica de cirurgia infantil
apresenta destaque com relação a procedentes de outros municípios do
Estado do Paraná, com um total de 49,4% das internações, além de 95%
das internações dos procedentes de outros Estados. Esse fato pode estar
associado ao HURNP ser considerado referência para tratamentos
especializados, principalmente nessa área de cirurgia.
As três causas mais importantes de internação, segundo capítulos da
CID-10 foram: doenças do aparelho respiratório (20,4%), seguidas das
anomalias congênitas (16,9%) e lesões e envenenamentos (10,5%),
conforme mostra a Tabela 4.
Os diagnósticos mais freqüentes do aparelho respiratório foram:
pneumonias (53,9%), broncopneumonia (18,1%) e asma (6,0%).
ABRANTES et al. (1998) também registraram que as infecções do
aparelho respiratório (broncopneumonia e pneumonia) representaram o 99
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grupo mais freqüente de doenças em estudo de internações de crianças e
adolescentes nos hospitais de Minas Gerais conveniados com o SUS, nos
anos de 1994 e 1995.
Em Londrina, CARVALHO (2000) demostrou que as doenças do
aparelho respiratório ocuparam o segundo lugar entre as causas de
internação hospitalar, em todas as idades, no ano de 1998.
Com relação às anomalias congênitas, os diagnósticos mais comuns
foram: criptorquidia unilateral (9,4%), hipospádia peniana (9,4%) ,
megacólon congênito (7,8%) e orelha em abano (5,7%).
Tabela 4 - Distribuição de internações segundo diagnósticos (Capítulos da
CID-10). Unidade de Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
Capítulos da CID-10 Número %
Doenças infecciosas e parasitárias 71 6,2
Neoplasias 73 6,4
Dças. sangue, órgãos hematop. e transt. imunitários 44 3,9
Dças. endócrinas, nutricionais e metabólicas 37 3,2
Dças. do sistema nervoso 13 1,1
Dças. do olho e anexos 6 0,5
Dças. do ouvido e da apófise mastóide 17 1,5
Dças. do aparelho circulatório 16 1,4
Dças. do aparelho respiratório 232 20,4
Dças. do aparelho digestivo 84 7,4
Dças. da pele e do tecido subcutâneo 29 2,6
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Dças. do sistema osteomuscular e tec. conjuntivo 23 2,0
Dças. do aparelho geniturinário 100 8,8
Afecções do período perinatal 2 0,2
Anomalias congênitas 192 16,9
Mal definidas 75 6,6
Lesões e envenenamentos 120 10,5
Contato com o serviço de saúde 2 0,2
Total 1136 100,0*
* Aproximado para 100,0 %
As lesões e envenenamentos vêm ocupando papel de destaque em
termos de internação hospitalar. Estudo realizado por LEBRÃO et al. (1997),
sobre morbidade hospitalar por lesões e envenenamentos, registra que, no
Brasil, no período de 1984 a 1994, as taxas de internações por essas causas
mostraram uma tendência de aumento (cerca de 60%).
Analisando a Figura 3, observa-se que 60,8% das internações por
lesões e envenenamentos, na Unidade de Pediatria do HURNP, foram por
causa externa ignorada, indicando que essa informação não tem sido
adequadamente registrada na ficha “Setor de Classificação”, a qual foi a
fonte desse dado no presente estudo. Duas hipóteses podem ser aventadas,
necessitando de estudos complementares para verificação: a primeira é de
que esse dado não é valorizado pelos profissionais que atendem o paciente
e que estes não o registram nos prontuários; e, a segunda é de que, apesar
de registrados em prontuários, estes dados não são transcritos para a ficha
“Setor de Classificação”, o que poderia ser facilmente corrigido, por meio de
treinamentos específicos aos funcionários responsáveis por essa
101
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transcrição. LEBRÃO et al. (1997) também referem sobre a inexistência de
informação de como ocorrem os acidentes, impedindo, desta forma, a
possibilidade de realizar propostas de ações de prevenção desses
acontecimentos.
Figura 3 – Distribuição de internações por lesões e envenenamentos
segundo a causa externa da lesão. Unidade de Pediatria do HURNP,
Londrina, 1998.
102
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Entre as causas externas, apesar da alta taxa de informação
ignorada, chama atenção as ocorrências por envenenamento acidental, que
foram responsáveis por 18,3% das internações por essas causas (Figura
3). Das 22 internações ocorridas por envenenamento acidental, 21 casos
foram por ingestão de soda cáustica e um caso de ingestão de querosene,
tendo como diagnósticos principais estenose cáustica de esôfago e
intoxicação por querosene, respectivamente. Esses dados reforçam a
necessidade de estabelecimento de programas específicos de prevenção de
acidentes na infância.
Segundo UNGLERT et al. (1987), a informação sobre os acidentes na
infância é importante para a elaboração do perfil de morbi-mortalidade, pois
a partir do conhecimento da realidade podemos estabelecer ações
programadas, através de medidas de promoção à saúde e prevenção de
agravos apropriadas às mesmas.
As doenças infecciosas e parasitárias (DIP), embora estejam
classificadas em oitavo lugar entre todas as causas, conforme demonstrado
na Tabela 4, revelam a persistência de internações de casos de doenças
que poderiam estar sendo resolvidas nos serviços ambulatoriais, por ações
de vigilância sanitária ou investimentos em saneamento básico. Entre as 71
DIP prevaleceram as diarréias (64,8%), seguidas por septicemia (14,1%),
ascaridíase (4,2%) e sífilis congênita (2,8%).
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Segundo ROUQUAYROL (1988), é fundamental conhecer as
circunstância sob as quais ocorrem as doenças, que referem-se a variantes
de tempo, lugar e pessoa. Em relação ao tempo, é importante observar a
relação existente entre a freqüência de determinadas doenças com alguma
época ou estação do ano (sazonalidade).
A Figura 4 apresenta essa relação, mostrando a distribuição das
internações por DIP e por doenças do aparelho respiratório segundo meses
de internação. Como esperado, as internações por doenças do aparelho
respiratório tiveram maior freqüência nos meses de maio a outubro,
correspondendo ao fim do outono, todo o inverno e início da primavera. Já
para as DIP, os meses predominantes de internação foram os dois primeiros
do ano, auge do verão, o que também é compatível com a maior
possibilidade de transmissão dessas doenças, principalmente as de
veiculação hídrica e por alimentos contaminados.
104
Revista Espaço para a Saúde, Londrina, v.1, n.2, p. 89-112 - , jun. 2000.
Figura 4 – Distribuição das internações por DIP e por doenças do
aparelho respiratório segundo meses de internação. Unidade de
Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
A Tabela 5 mostra a distribuição das internações segundo o tempo de
permanência. Verificamos que 37,8% permaneceram no Hospital de 2 a 6
dias, 31,2% ficaram de 7 a 14 dias e 12,7% tiveram somente 1 dia de
permanência.
Tabela 5 – Distribuição de internações segundo tempo de permanência (em
dias). Unidade de Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
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Revista Espaço para a Saúde, Londrina, v.1, n.2, p. 89-112 - , jun. 2000.
Tempo de permanência (dias) Número %
1 144 12,7
2 |-- 7 430 37,8
7 |-- 15 354 31,2
15 |-- 30 137 12,0
30 |-- 120 69 6,1
120 e mais 2 0,2
Total 1136 100,0
O tempo médio de permanência foi de 10,2 dias. Esse resultado foi
superior à média geral de permanência do HURNP que, no ano de 1998,
segundo CARVALHO (2000), foi de 8,3 dias. O valor da mediana encontrado
foi de 6,0 dias. Esta medida tem sido mais indicada para análise do tempo
de permanência das internações, por não ser tão afetada pelos valores
extremos como a média aritmética (LAURENTI et al., 1987).
Entre as clínicas de internação, as que apresentaram o menor tempo
de permanência (< 7 dias) foram as de otorrinolaringologia (77,3%), cirurgia
infantil (69,7%) e oftalmologia (64,7%) (Tabela 6). Esse resultado talvez se
deva em função de que as referidas clínicas tenham internações quase que
exclusivamente para procedimentos cirúrgicos, que necessitam, geralmente,
de menor permanência de internação (CARVALHO, 2000).
Tabela 6 - Distribuição de internações segundo clínicas e tempo de
permanência (em dias). Unidade de Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
Tempo de permanência (em dias)
< 7 7 |-- 30 30 |-- 120 120 e + Total
106
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Clínica No % No % No % No % No %
Pediatria geral 198 36,0 312 56,7 38 6,9 2 0,4 550 100,0
Cirurgia infantil 304 69,7 113 25,9 19 4,4 - - 436 100,0
Ortopedia 24 43,6 26 47,3 5 9,1 - - 55 100,0
Neurologia 10 37,0 12 44,4 5 18,5 - - 27 100,0*
Hematologia 10 34,5 18 62,1 1 3,4 - - 29 100,0
Oftalmologia 11 64,7 6 35,3 - - - - 17 100,0
Otorrinolaringologia 17 77,3 4 18,2 1 4,5 - - 22 100,0
Total 574 50,5 491 43,2 69 6,1 2 0,2 1136 100,0
* Aproximado para 100,0 %
Nas outras clínicas, o tempo de permanência predominante foi de 7 a
30 dias, sendo: hematologia 62,1%, pediatria geral 56,7%, ortopedia 47,3%
e neurologia 44,5%.
Maior tempo de permanência (120 e mais dias) aparece somente
para a clínica de pediatria geral, com 2 casos registrados.
A Tabela 7 apresenta a distribuição das internações segundo tipo de
alta.
Tabela 7 - Distribuição de internações segundo tipo de saída. Unidade de Pediatria do HURNP, Londrina, 1998.
Tipo de saída Número %
Alta hospitalar 1134 99,8
107
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Óbito na Unidade 2 0,2
Total 1136 100,0
Durante o ano de 1998 ocorreram apenas dois óbitos; portanto, a
taxa de mortalidade foi de 0,2 a cada 100 internações. Esta taxa pode ser
considerada baixa, pois a taxa de mortalidade geral do HURNP, neste
mesmo ano, foi de 4,6% (BIAZIN et al., 1999) e, no município de Londrina,
4,1% (CARVALHO, 2000).
Esta baixa taxa observada pode ser devida ao fato de que pacientes
em estado grave internam diretamente em outro setor, a Unidade de Terapia
Intensiva (UTI) Pediátrica, não fazendo parte, portanto, da população deste
estudo. Além disso, os casos transferidos da Unidade de Pediatria para a
UTI Pediátrica são considerados, pelo SAME, como “alta” da Unidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos resultados obtidos no presente trabalho, podemos
observar que as estatísticas hospitalares podem contribuir para melhorar o
conhecimento sobre os aspectos epidemiológico e administrativo desse
serviço (LEBRÃO, 1997).
As internações tiveram maior freqüência de crianças do sexo
masculino (57,3%), de 0 a 4 anos de idade (69,2%), procedentes do
município de Londrina (62,6%) e internados nas clínicas de pediatria geral
(48,4%) e cirurgia infantil (38,4%).
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Revista Espaço para a Saúde, Londrina, v.1, n.2, p. 89-112 - , jun. 2000.
As infecções do aparelho respiratório foram a principal causa das
internações. Esse perfil pode estar refletindo o padrão de morbidade de
residentes em Londrina, considerando que esses casos são internados,
geralmente, na clínica de pediatria geral, sendo que esta apresenta a maior
proporção (57,3%) de internações dos residentes no Município. A partir
dessas informações, podemos apontar para a necessidade de
desenvolvimento de ações de saúde mais eficazes no nível primário,
objetivando a prevenção das complicações, de forma a evitar ou reduzir as
internações hospitalares (ABRANTES et al., 1998).
As lesões e envenenamentos também se destacaram como causas
de internações. No entanto, as causas externas que determinam essas
lesões são pouco informadas. Outros estudos comentam sobre a qualidade
dos registros médicos, que precisa ser melhorada (LEBRÃO, 1997;
MATHIAS & SOBOLL, 1998). Dessa forma, o presente trabalho indica a
necessidade de investigar por que este fato está acontecendo na Unidade
de Pediatria do HURNP, com vistas à tomada de medidas que aprimorem
essa informação.
Das causas externas que foram possíveis identificar, destacam-se as
ocorridas por envenenamento acidental, em conseqüência da ingestão de
produtos de limpeza doméstica como soda cáustica e querosene. Portanto,
faz-se necessário implementar ações de prevenção de ingestão acidental
dessas substâncias, que apresentam graves conseqüências, como a
estenose cáustica de esôfago, exigindo tratamento de alto custo social e
financeiro.
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Este estudo também demonstrou certa variação sazonal no que se
refere às causas de internação por doenças do aparelho respiratório e
infecciosas/parasitárias, o que pode subsidiar o planejamento de ações da
Unidade de Pediatria quanto à aquisição de medicamentos e outros
materiais e de recursos humanos, bem como os serviços de atenção
primária à saúde sobre a necessidade de intervenções específicas, visando
reduzir as internações decorrentes.
A clínica de cirurgia infantil se destacou nas internações de
procedentes de outros municípios do Estado Paraná e de outros Estados, o
que pode estar relacionado ao fato do HURNP ser considerado referência
para tratamentos especializados, sendo o que se espera de um Sistema de
Saúde regionalizado e hierarquizado.
Finalmente, este estudo indica que as estatísticas hospitalares,
transformadas em informações, são ferramentas fundamentais, que podem
instrumentalizar a gerência para o planejamento de ações dos serviços de
saúde nos diversos níveis do sistema, para que estes tenham impacto,
adequação das ações individuais e coletivas e que atendam, de forma
apropriada, às necessidades de saúde da população.
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