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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO HOSPITAL DE REABILITAÇÃO DE ANOMALIAS CRANIOFACIAIS WALTER DA SILVA JÚNIOR Qualidade do sono de adultos jovens com fissura labiopalatina BAURU 2013

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  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    HOSPITAL DE REABILITAO DE ANOMALIAS CRANIOFACIAIS

    WALTER DA SILVA JNIOR

    Qualidade do sono de adultos jovens com fissura labiopalatina

    BAURU

    2013

  • WALTER DA SILVA JNIOR

    Qualidade do sono de adultos jovens com fissura labiopalatina

    Tese apresentada ao Hospital de Reabilitao de Anomalias Craniofaciais da Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Doutor em Cincias da Reabilitao. rea de concentrao: Fissuras Orofaciais e Anomalias Relacionadas Orientadora: Profa. Dra. Ivy Kiemle Trindade Suedam

    BAURU

    2013

  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    HOSPITAL DE REABILITAO DE ANOMALIAS CRANIOFACIAIS

    Rua Silvio Marchione, 3-20

    Caixa Postal: 1501

    17012-900 - Bauru SP Brasil

    Telefone: (14) 3235-8000

    Prof. Dr. Joo Grandino Rodas Reitor da USP

    Dra. Regina Clia Bortoleto Amantini Superintendente do HRAC /USP

    Autorizo, exclusivamente, para fins acadmicos e cientficos, a reproduo total ou parcial desta tese.

    Walter da Silva Jnior

    Bauru, ____ de _________ de ______.

    Silva Jnior, Walter

    S38q Qualidade do sono de adultos jovens com fissura labiopalatina / Walter da Silva Jnior. Bauru, 2013.

    113p.; il.; 30cm. Tese (Doutorado rea de Concentrao: Fissuras

    Orofaciais e Anomalias Relacionadas) Hospital de Reabilitao de Anomalias Craniofaciais, Universidade de So Paulo.

    Orientadora: Profa. Dra. Ivy Kiemle Trindade Suedam 1. Fissura palatina. 2. Distrbios do sono. 3.

    Questionrios. CDD 612.821

  • FOLHA DE APROVAO

    Walter da Silva Jnior

    Tese apresentada ao Hospital de Reabilitao de Anomalias Craniofaciais da Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Doutor em Cincias da Reabilitao. rea de concentrao: Fissuras Orofaciais e Anomalias Relacionadas

    Aprovado em: ____ / ____ / _____

    Banca Examinadora

    Prof. Dr. ____________________________________________________________

    Instituio ___________________________________________________________

    Prof. Dr. ____________________________________________________________

    Instituio ___________________________________________________________

    Prof. Dr. ____________________________________________________________

    Instituio ___________________________________________________________

    Prof. Dr. ____________________________________________________________

    Instituio __________________________________________________________

    Profa. Dra. Ivy Kiemle Trindade Suedam - Orientadora

    Faculdade de Odontologia de Bauru FOB-USP

    Hospital de Reabilitao de Anomalias Craniofaciais HRAC-USP

    Profa. Dra. Daniela Gamba Garib Carreira

    Presidente da Comisso de Ps-Graduao do HRAC-USP

    Data de depsito da Tese junto SPG: ___/___/____

  • WALTER DA SILVA JNIOR

    05 de outubro de 1965

    Lins-SP

    Nascimento

    1983-1986

    Graduao em Odontologia Faculdade de

    Odontologia de Araatuba (UNESP) - SP

    1988-1989

    Especializao em Prtese Dental pela PROFIS

    HRAC Bauru - SP

    1998-2000 Mestrado profissionalizante em Implantologia na

    Universidade do Sagrado Corao (USC) Bauru

    - SP

  • DEDICATRIA

    A DEUS, fora maior, divina e inspiradora que me fortaleceu em todos os

    momentos.

    minha esposa Magali, companheira de todas as horas pelo apoio

    incansvel em tudo e principalmente nesta etapa de minha vida.

    Aos meus filhos Leonardo, Henrique e Maria Clara pela compreenso da

    ausncia em alguns momentos.

    Aos meus pais Walter e Maria Neyde pelo exemplo, fidelidade e apoio

    dispensado sempre.

    Aos meus sogros Alaor e Neide pelo suporte dado sempre que

    necessrio.

  • AGRADECIMENTO ESPECIAL

    minha orientadora,

    Profa. Dra. Ivy Kiemle Trindade Suedam

    Meu muito obrigado pelas preciosas orientaes e dedicao dispensada em

    meu trabalho. Seu incentivo sempre positivo foi essencial para o desenvolvimento de

    minha pesquisa.

  • AGRADECIMENTOS

    Ao Hospital de Reabilitao de Anomalias Craniofaciais, pela

    oportunidade de desenvolver esta pesquisa.

    Comisso de Ps-Graduao do HRAC, na pessoa de sua presidente

    Profa. Dra. Daniela Gamba Garib Carreira.

    amiga Letcia Dominguez Campos pelo apoio, suporte, incentivo e

    dedicao imprescindveis concluso deste trabalho.

    Ao Prof. Dr. Alceu Srgio Trindade Jr. que com seu conhecimento,

    experincia e conselhos muito me ajudaram para seguir adiante em momentos

    difceis.

    Ao Prof. Dr. Jos Roberto Lauris pela sempre precisa orientao da

    estatstica deste trabalho.

    Flvia Cintra pela orientao dedicada e de apoio em momento

    importante.

    Aos Profs. Drs. Joo Henrique N. Pinto e Jos Fernando S. Lopes que

    muito me incentivaram para o incio desta jornada.

    Aos colegas e funcionrios do setor de Prtese do HRAC que muito

    contriburam para que eu fizesse a coleta dos dados.

    Ana Amlia pelo carinho na organizao e impresso do trabalho.

    Aos funcionrios do setor de Ps Graduao do HRAC Andreia, Zez e

    Rogrio pelo pronto atendimento de orientaes quando solicitadas.

    Agradeo ainda a todos que, de alguma maneira, contriburam para que

    fosse possvel a realizao deste trabalho.

  • RESUMO

    Silva Jnior W. Qualidade do sono de adultos jovens com fissura labiopalatina [tese].

    Bauru: Hospital de Reabilitao de Anomalias Craniofaciais, Universidade de So

    Paulo; 2013.

    Objetivo: Determinar a qualidade de sono de adultos jovens com fissura

    labiopalatina operada, aferida por meio de trs modalidades de questionrios

    validados na literatura, e sua correlao com as variveis: sexo, ndice de massa

    corprea (IMC), circunferncia abdominal (CA), circunferncia cervical (CC), tipo de

    ocluso (classificao de Angle), cirurgia ortogntica (CO), cirurgia nasal (CN),

    retalho farngeo (RF) e tipo de fissura (TF).

    Mtodo: Foram avaliados, prospectivamente, 90 pacientes, com fissura de

    palatolbio reparada, com idade mdia de 243 anos (20 a 29), sendo 49 do sexo

    masculino e 41 do sexo feminino. Dados como raa, peso e altura (IMC), tipo de

    fissura e cirurgias realizadas (cirurgia nasal, ortogntica e retalho farngeo) foram

    coletados dos pronturios. Todos pacientes realizaram exame fsico, com medidas

    de CA, CC e classificao de Angle. A qualidade do sono foi investigada pelos

    questionrios: ndice de Qualidade de Sono de Pittsburgh (IQSP), Escala de

    Sonolncia de Epworth (ESE) e Questionrio de Berlin (QB). A associao entre as

    variveis foi feita por meio do teste do qui-quadrado, sendo aceitos como

    significantes valores de p

  • ABSTRACT

    Silva Jnior W. Sleep quality assessment in young adults with repaired cleft lip and

    palate [thesis]. Bauru: Hospital de Reabilitao de Anomalias Craniofaciais,

    Universidade de So Paulo; 2013.

    Objectives: To investigate sleep quality in young adults with repaired cleft lip and

    palate, measured by three different types of validated questionnaires, and its

    correlation with gender, body mass index (BMI), waist circumference (WC), neck

    circumference (NC), type of occlusion (Angle classification), orthognathic surgery

    (OS), pharyngeal flap (PF), nasal surgery (NS) and cleft type (CT).

    Methods: Ninety patients were analyzed, aged 20-29 years, 49 male and 41 female.

    The assessment of sleep quality was performed by applying three questionnaires:

    Pittsburgh Sleep Quality Index (PSQI), Epworth Sleepiness Scale (ESS) and Berlin

    Questionnaire (BQ). Results were correlated with gender, BMI, WC, NC, previous

    OS, PF, NS, CT and type of occlusion (Angle classification). The association

    between variables was performed using the chi-square test and p

  • LISTA DE ILUSTRAES

    - FIGURAS

    Figura 1 - Diagrama representativo da classificao das fissuras ................. 31

    Figura 2 - Tipos de fissuras: pr-forame incisivo (2A e 2B); transforame

    incisivo unilateral (2C e 2D); transforame incisivo bilateral (2E e

    2F); ps-forame incisivo (2G); fissura rara da face (2H) ............... 32

    Figura 3 - Classificao oclusal de Angle. Classe I: cspide msio-

    vestibular do 1 molar superior oclui na direo do sulco central

    do primeiro molar inferior (Figura 3A); Classe ll: cspide msio-

    vestibular do 1 molar superior oclui mesialmente ao sulco

    central do 1 molar inferior (Figura 3B); Classe lll: cspide

    msio-vestibular do 1 molar superior oclui distalmente ao sulco

    central do 1 molar inferior (Figura 3C) ......................................... 56

    Figura 4 - Medidas antropomtricas. Tcnica de medida da circunferncia

    abdominal, aferida entre a crista ilaca e o rebordo costal inferior

    (Figura 4A), e, medida da circunferncia cervical, aferida

    aproximadamente 8cm abaixo da implantao inferior do

    pavilho auricular (Figura 4B) ....................................................... 57

    - QUADROS

    Quadro 1 - Classificao das fissuras, segundo Spina et al (1972) e

    modificada por Silva Filho et al (1992), e adotada no HRAC-

    USP ............................................................................................... 30

    Quadro 2 - Classificao Internacional dos Distrbios do Sono, ICSD-2,

    descrita pela American Academy of Sleep Medicine (2005) .......... 36

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 - Caractersticas gerais dos pacientes analisados no presente

    estudo. Os dados esto apresentados como mdiadp ou como

    nmero de casos (porcentagem) .................................................. 64

    Tabela 2 - Resultado obtido referente ao ndice de massa. Os valores so

    apresentados como mdiadp ou como nmero de casos

    (porcentagem) ............................................................................... 66

    Tabela 3 - Resultados encontrados na aplicao do ndice de Qualidade

    de Sono de Pittsburgh, Escala de Sonolncia de Epworth e

    Questionrio de Berlin. Os dados so apresentados como

    pontuao mdiadp ou como nmero de casos (porcentagem)

    com pontuao acima do limite de normalidade ........................... 68

    Tabela 4 - Resultados encontrados na aplicao do Questionrio de Berlin

    (alto e baixo risco para apneia) e sua relao com a varivel

    IMC (no obesos e obesos). Os dados so apresentados como

    nmero de casos (porcentagem) .................................................. 70

    Tabela 5 - Resultados encontrados na aplicao do Questionrio de Berlin

    (alto e baixo risco para apneia) e sua relao com a varivel

    retalho farngeo (com e sem retalho). Os dados so

    apresentados como nmero de casos (porcentagem) .................. 71

    Tabela 6 - Pacientes submetidos ao retalho farngeo e sua relao com a

    varivel ndice de massa corprea (IMC) e os resultados dos

    questionrios de Pittsburgh, Epworth e Berlin ............................... 72

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    AASM American Academy of Sleep Disorders

    AOS Apneia Obstrutiva do Sono

    CA Circunferncia Abdominal

    CC Circunferncia Cervical

    CN Cirurgia Nasal

    CO Cirurgia Ortogntica

    EEG Eletro Encefalograma

    EOA Enxerto sseo Alveolar

    ESE Escala de Sonolncia de Epworth

    HRAC-USP Hospital de Reabilitao de Anomalias Craniofaciais da Universidade

    de So Paulo

    IAH ndice de Apneia e Hipopneia

    IMC ndice de Massa Corprea

    IQSP ndice de Qualidade de Sono de Pittsburgh

    IVF Insuficincia Velofarngea

    PSG Polissonografia

    QB Questionrio de Berlin

    REM Rapid Eye Movement

    RF Retalho Farngeo

    SAOS Sndrome da Apneia Obstrutiva do Sono

    TF Tipo de Fissura

  • SUMRIO

    1 INTRODUO E REVISO DE LITERATURA ......................................... 25

    1.1 CONSIDERAES SOBRE AS FISSURAS .............................................. 27

    1.2 CONSIDERAES SOBRE A FISIOLOGIA DO SONO E SEUS

    DISTRBIOS ............................................................................................. 33

    1.3 MTODOS DE AFERIO DA QUALIDADE DO SONO ........................... 37

    1.4 FATORES DE RISCO PARA APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO ............... 40

    2 OBJETIVOS ............................................................................................... 47

    3 MATERIAL E MTODO ............................................................................. 51

    3.1 CASUSTICA .............................................................................................. 53

    3.2 PROCEDIMENTOS.................................................................................... 53

    3.2.1 Aplicao dos questionrios .................................................................. 58

    3.2.2 Anlise dos dados ................................................................................... 59

    4 RESULTADOS ........................................................................................... 61

    4.1 DADOS GERAIS DA POPULAO ESTUDADA ...................................... 63

    4.2 RESULTADOS REFERENTES AO EXAME FSICO .................................. 65

    4.3 RESULTADOS OBTIDOS APS APLICAO DOS QUESTIONRIOS ... 67

    5 DISCUSSO .............................................................................................. 73

    6 CONCLUSES .......................................................................................... 85

    REFERNCIAS ......................................................................................... 56

    APNDICES ............................................................................................ 101

    ANEXOS .................................................................................................. 105

  • 1 INTRODUO

    E REVISO DE LITERATURA

  • Introduo e Reviso de Literatura

    27

    1 INTRODUO E REVISO DE LITERATURA

    1.1 CONSIDERAES SOBRE AS FISSURAS

    Denomina-se fissura, em patologia, o quadro clnico no qual ocorre uma

    descontinuidade anatmica dos tecidos mole, duro ou de ambos. Quando acomete o

    complexo maxilofacial, a fissura pode envolver, individualmente ou em

    concomitncia, o lbio superior, o processo sseo alveolar superior e o palato.

    uma das malformaes congnitas de maior prevalncia na espcie humana. As

    fissuras de lbio, com o envolvimento ou no do processo alveolar e do palato,

    ocorrem em, aproximadamente, 2:1000 indivduos na raa amarela, 1:1000

    indivduos na raa branca e 0,3:1000 indivduos na raa negra. (Gorlin, Cohen e

    Levin 1990). No Brasil, a incidncia de fissuras labiopalatinas de 1:650

    nascimentos (Nagem-Filho, Morais e Rocha 1968).

    Levantamentos epidemiolgicos demonstram que as fissuras de lbio, com

    ou sem envolvimento do palato, so mais comuns no sexo masculino, enquanto as

    fissuras isoladas de palato, no sexo feminino, e que o tipo de fissura mais frequente

    a completa de lbio e palato unilateral e que o lado mais afetado o esquerdo

    (Silva Filho e Freitas 2007 e Trindade e Silva Filho 2007).

    O mecanismo embriolgico causador de uma fissura de lbio e de palato

    primrio se d entre a quinta (Cate 2001) e a oitava (Diewert 1983 e Sperber 1989)

    semana de vida intrauterina, quando ocorre uma falha na fuso da face lateral dos

    processos nasais mediais com a extenso anterior dos processos maxilares de cada

    lado e dos processos nasais mediais entre si. Uma alterao na direo do

    crescimento dos processos nasais pode ser uma explicao para o estabelecimento

  • Introduo e Reviso de Literatura

    28

    deste tipo de fissura (Cohen 2000). J, a formao de uma fissura de palato

    secundrio se d entre a stima (Cate 2001) e dcima segunda (Diewert 1983 e

    Sperber 1989) semana de vida do embrio e pode resultar de falha das cristas

    palatinas de se contatarem por uma deficincia de crescimento, falha das cristas em

    se fundirem aps o contato ter sido estabelecido ou ruptura aps ter ocorrido a fuso

    das cristas, ou, ainda, fuso e consolidao defeituosa das cristas palatinas (Cate

    2001).

    Segundo relatrio divulgado pela Organizao Mundial da Sade, em 2002

    (Shaw e Semb 2007), a etiologia das malformaes craniofaciais complexa e

    multifatorial. Entre os fatores que podem interferir no mecanismo de formao da

    face so os fatores genticos, os fatores ambientais e a interao de ambos.

    Estudos publicados por Kondo et al (2002) descrevem haver o envolvimento de

    genes como TGFB, MSX1 e IRF6 com a etiologia das fissuras orofaciais. Entre os

    fatores ambientais encontram-se o estado nutricional materno, o tabagismo e o

    consumo excessivo de lcool durante o perodo gestacional, exposies a

    substncias qumicas e a raios X, doenas maternas durante a gravidez e o uso de

    medicamentos como os benzodiazepnicos e os corticosterides que podem exercer

    efeitos desfavorveis evoluo embrionria.

    A manifestao clnica das fissuras variada, envolvendo lbio, palato ou

    ambos, com extenses e amplitudes diferentes. Segundo Spina et al (1972) e Silva

    Filho et al (1992), as fissuras so divididas em quatro grupos, sendo que os trs

    primeiros tomam como ponto de reparo anatmico o forame incisivo (Quadro 1)

    (Figura 1). As fissuras pr-forame incisivo (Figuras 2A e 2B) so assim chamadas

    por envolverem o lbio superior, o processo alveolar superior e o palato primrio

    estendendo-se at o forame incisivo.

  • Introduo e Reviso de Literatura

    29

    So classificadas como completas quando envolvem as trs estruturas

    anteriormente citadas, e incompletas quando envolvem apenas uma ou duas destas

    estruturas Quanto localizao em que se situam podem ser unilaterais, bilaterais e

    medianas. As fissuras transforame incisivo so aquelas que acometem o lbio

    superior, o processo alveolar superior, o palato primrio, passando pelo forame

    incisivo e, finalmente, chegando ao palato secundrio. Podem ainda ser

    classificadas como unilaterais (Figuras 2C e 2D), bilaterais (Figuras 2E e 2F) e

    medianas. J, as fissuras ps-forame incisivo (Figura 2G) so aquelas que

    acometem exclusivamente o palato secundrio. Podem ser divididas em completas,

    quando acometem toda a extenso do palato secundrio envolvendo inclusive a

    vula, e incompletas quando acometem parte da extenso do palato secundrio no

    chegando at o forame incisivo. As fissuras raras da face (Figura 2H) so fissuras

    desvinculadas do palato primrio e secundrio acometendo estruturas extrabucais.

    As fissuras orofaciais requerem tratamento altamente especializado

    multiprofissional e interdisciplinar. O envolvimento anatmico das fissuras define o

    protocolo de tratamento a ser institudo para a sua reabilitao, que se inicia com a

    equipe de cirurgia plstica, reconstituindo o lbio (queiloplastia), por volta dos 3

    meses de idade, e o palato (palatoplastia), realizada por volta de 12 meses (Silva

    Filho et al 1992).

  • Introduo e Reviso de Literatura

    30

    Grupo I Fissuras pr-forame incisivo

    Unilateral (direita ou esquerda)

    Incompleta

    Completa

    Bilateral

    Incompleta

    Completa

    Mediana

    Incompleta

    Completa

    Grupo II Fissuras transforame incisivo

    Unilateral (direita ou esquerda)

    Bilateral

    Mediana

    Grupo III Fissuras ps-forame incisivo

    Incompleta

    Completa

    Grupo IV Fissuras raras da face

    Fissuras desvinculadas do palato primrio e secundrio

    Quadro 1 - Classificao das fissuras, segundo Spina et al (1972) e modificada por Silva Filho et al (1992), e adotada no HRAC-USP.

  • Introduo e Reviso de Literatura

    31

    Fonte: Silva Filho OG, Freitas JAS. Caracterizao morfolgica e origem embriolgica. In: Trindade IEK, Silva Filho OG,

    organizadores. Fissuras labiopalatinas: uma abordagem interdisciplinar. So Paulo: Editora Santos; 2007. p. 20

    Figura 1 - Diagrama representativo da classificao das fissuras.

  • Introduo e Reviso de Literatura

    32

    2A

    2B

    2C

    2D

    2E

    2F

    2G

    2H

    Fonte: HRAC-USP

    Figura 2 - Tipos de fissuras: pr-forame incisivo (2A e 2B); transforame incisivo unilateral (2C e 2D); transforame incisivo bilateral (2E e 2F); ps-forame incisivo (2G); fissura rara da face (2H).

  • Introduo e Reviso de Literatura

    33

    As chamadas cirurgias plsticas primrias, queiloplastia e palatoplastia,

    reconstroem tecido mole. J, o defeito sseo alveolar presente nas fissuras pr-

    forame incisivo e transforame incisivo persiste at a dentadura mista, por volta dos

    10 anos de idade, quando necessita ser reparado. O tratamento cirrgico do defeito

    sseo alveolar realizado pelo cirurgio bucomaxilofacial e compreende o enxerto

    sseo alveolar. Esse procedimento , em geral, realizado durante a dentadura mista,

    imediatamente antes da irrupo do canino permanente adjacente rea da fissura

    alveolar (Silva Filho et al 1995 e Silva Filho et al 2000).

    O tratamento ortodntico de fundamental importncia para o prognstico

    do enxerto sseo alveolar e deve incluir, no perodo pr-operatrio, a correo de

    mordidas cruzadas anteriores e posteriores. A ortodontia ps-operatria visa o

    alinhamento e nivelamento dentrio com vistas ou no cirurgia ortogntica,

    especialmente nos casos diagnosticados com o ndice oclusal Goslon 4 e 5 (Mars et

    al 1987). A indicao da cirurgia ortogntica na maturidade esqueltica ocorre

    quando a discrepncia maxilomandibular ultrapassou a possibilidade de ao dos

    recursos ortodnticos e ortopdicos. Esta cirurgia tem por finalidade corrigir as

    desarmonias oclusais, em especial a classe III, provendo ao paciente uma relao

    interoclusal equilibrada (Silva Filho et al 2011). Com a relao interarcos refeita pela

    cirurgia ortogntica, o eventual planejamento prottico passa a ser possvel, visando

    a esttica e a reabilitao oclusal final (Silva Filho et al 2011).

    1.2 CONSIDERAES SOBRE A FISIOLOGIA DO SONO E SEUS DISTRBIOS

    A partir do advento do eletroencefalograma (EEG), descrito por Hans Berger

    (1924), o interesse cientfico pelo sono ganhou impulso, dando incio Medicina do

  • Introduo e Reviso de Literatura

    34

    Sono. Os registros da atividade eltrica cerebral permitiram a clara diferenciao

    entre o padro das ondas cerebrais observadas durante o sono e durante a viglia,

    acabando com o conceito vigente at ento de que o sono consistia em um estado

    passivo e homogneo do ponto de vista cerebral (Berger 1930).

    A Medicina do Sono ganhou ainda maior impulso a partir da publicao de

    Aserinsky e Kleitman (1953) sobre a ocorrncia de movimentos oculares rpidos

    durante o sono, o que permitiu a identificao da presena de ciclos de sono no

    EEG (Dement e Kleitman 1957). A partir de ento, observou-se que o sono consiste

    em um estado fisiolgico cclico, dividido basicamente em 2 fases: sono REM (Rapid

    Eye Movement) e sono no-REM (Jouvet e Michel 1959). Este ltimo subdividido,

    atualmente, em 3 fases: N1, N2 e N3, de acordo com as caractersticas

    eletroencefalogrficas (Iber et al 2007).

    De modo geral, observa-se uma reduo da atividade eltrica cerebral

    progressiva ao EEG, com o aprofundamento do sono no-REM, e atividade rpida

    dominante de baixa voltagem, semelhante da viglia, durante o sono REM. Um

    ciclo noturno previsvel de 90 minutos marca a variao entre os 3 estgios do sono

    no-REM para o sono REM, com propores definidas de cada estgio, que variam

    de acordo com a faixa etria. Um biorritmo neuroqumico acompanha as variaes

    circadianas do chamado ciclo viglia-sono, com mudanas especficas da

    temperatura corporal e da secreo de diversos hormnios e neurotransmissores,

    relacionados aos diferentes estgios do sono e da viglia (Dement 2005). Alm do

    descanso fsico, o sono tem importante papel em diversas funes do organismo.

    fundamental, por exemplo, para uma boa sade mental e emocional, na

    consolidao do aprendizado e da memria (Quan et al 2006).

  • Introduo e Reviso de Literatura

    35

    Os distrbios do sono podem ser agrupados e classificados de diversas

    formas. A mais recente, e atualmente seguida, a Classificao Internacional de

    Distrbios do Sono, ICSD-2, publicada em 2005 pela American Academy of Sleep

    Medicine (AASM), que contempla 8 principais categorias de distrbios. O Quadro 2

    resume estas categorias.

    Dentre os distrbios respiratrios do sono destaca-se a apneia, definida

    como a cessao total ou parcial da respirao por, no mnimo, 10 segundos. A

    apneia pode ter origem obstrutiva, central ou mista. A sndrome da apneia obstrutiva

    do sono (SAOS), em particular, caracterizada por episdios recorrentes de

    obstruo das vias areas superiores, resultantes do colapso da faringe, o que

    provoca mltiplos despertares e dessaturao da oxihemoglobina. O fluxo areo

    pode ser interrompido por completo (apneia) ou reduzido substancialmente

    (hipopneia), na presena de esforo respiratrio. A SAOS leva sonolncia

    excessiva diurna e considerada uma sndrome por reunir outros importantes

    sintomas tais como distrbios neurocognitivos e tambm doenas cardiovasculares

    (Eckert e Malhotra 2008, Genta et al 2008 e Drager et al 2009). Est relacionada

    ainda disfuno ertil (Teloken et al 2006) e alterao na regulao da glicose

    (Banarer e Cryer 2003 e Schmid et al 2007).

  • Introduo e Reviso de Literatura

    36

    Quadro 2 - Classificao Internacional dos Distrbios do Sono, ICSD-2, descrita pela American Academy of Sleep Medicine (2005).

    Principais categorias de distrbios do sono

    1. Insnias

    2. Distrbios respiratrios do sono

    3. Hiperssonias de origem central

    4. Distrbios do ritmo circadiano

    5. Parassonias

    6. Distrbios de movimento relacionados ao sono

    7. Sintomas isolados

    8. Outros distrbios do sono

  • Introduo e Reviso de Literatura

    37

    Por fim, estudos (Canani e Menna Barreto 2001 e Mulgrew et al 2007)

    apontam para um dado alarmante de que a sonolncia excessiva diurna, decorrente

    da SAOS, pode, ainda, levar ao aumento no nmero de acidentes automobilsticos e

    de trabalho, da a importncia do diagnstico e interveno precoce neste tipo de

    patologia.

    1.3 MTODOS DE AFERIO DA QUALIDADE DO SONO

    O diagnstico dos distrbios respiratrios do sono e, particularmente da

    SAOS, baseia-se, essencialmente, na anamnese clnica, no exame fsico e,

    principalmente na polissonografia. A polissonografia (PSG) o exame considerado

    padro-ouro para diagnstico da Sndrome da Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS)

    por fornecer informaes objetivas do sono do paciente, por meio de mltiplos

    registros fisiolgicos como, por exemplo, a durao e distribuio percentual dos

    estgios do sono, nmero de microdespertares e eventos respiratrios. Porm,

    apesar das suas claras vantagens, a PSG possui certas limitaes, como a

    complexidade da sua realizao, o que a torna um exame de difcil acesso, alm do

    seu alto custo (Kushida et al 2005).

    Neste contexto, torna-se importante a validao de mtodos de triagem para

    SAOS, no qual se inserem os achados ao exame fsico e a aplicao de

    questionrios validados na literatura. O uso de questionrios para avaliao

    subjetiva do sono bastante comum na prtica clnica diria. Esses questionrios

    fornecem informaes sobre os aspectos gerais do sono e sobre sinais e sintomas

    de distrbios do sono, como a sonolncia excessiva diurna. Trs modalidades de

    questionrios validados na literatura e, bastante utilizados so: o ndice de

  • Introduo e Reviso de Literatura

    38

    Qualidade de Sono de Pittsburgh (IQSP), a Escala de Sonolncia de Epworth (ESE)

    e o Questionrio de Berlin (QB).

    O ndice de Qualidade de Sono de Pittsburgh, publicado por Buysse et al

    (1989), utilizado para avaliar a qualidade do sono em relao ao ltimo ms.

    Apesar de no ser direcionado exclusivamente ao diagnstico de SAOS, fornece um

    indicador da gravidade e da natureza do distrbio. Por meio de questes a respeito

    da qualidade subjetiva do sono, latncia, durao e eficincia do sono, presena de

    situaes que comprometam as horas de sono, uso de medicao para dormir e

    sonolncia diurna, o questionrio capaz de identificar pacientes com padro de

    sono ruim.

    A Escala de Sonolncia de Epworth, por sua vez, publicada por Johns

    (1991), consiste em questes autoaplicveis de situaes cotidianas, nas quais o

    paciente refere qual a probabilidade de sonolncia durante o dia. A pontuao obtida

    pode variar de 0 a 24, sendo valores maiores que 10 considerados como indicativos

    de sonolncia excessiva diurna. Visto que este um sintoma comum em pacientes

    com SAOS, esta escala bastante utilizada para triagem de pacientes com o

    distrbio. Tanto o IQSP quanto a ESE foram validados para o portugus brasileiro

    por Bertolazi et al (2009) e Bertolazi et al (2011) respectivamente. Os autores

    relatam que as duas modalidades de questionrios so ferramentas confiveis para

    avaliao da qualidade de sono, podendo ser til na prtica clnica e em pesquisas.

    Uma terceira modalidade de questionrio, tambm bastante utilizada e com

    a vantagem de realizar uma triagem especificamente para SAOS, o Questionrio

    de Berlin, publicado por Netzer et al (1999). Este tem como objetivo indicar o risco

    (baixo ou alto) para SAOS por meio de questes relacionadas a ronco, pausas

  • Introduo e Reviso de Literatura

    39

    respiratrias durante o sono, cansao, sonolncia ao dirigir, obesidade e hipertenso

    arterial.

    Alm da utilizao de questionrios, alguns achados ao exame fsico

    tambm podem indicar risco substancial para SAOS. Como j descrito, a obesidade

    constitui fator de risco importante para a desordem. Assim, medidas antropomtricas

    indicativas de obesidade, tais como o ndice de massa corprea (IMC), a

    circunferncia abdominal (CA) e a circunferncia cervical (CC) so importantes para

    triagem do distrbio.

    Soylu et al (2012) em estudo envolvendo 499 indivduos sem fissura,

    demonstrou estreita relao entre o IMC, CC, CA e a SAOS. Quanto maiores as

    medidas, maior a prevalncia de SAOS. Neste estudo, os autores determinaram

    valores de corte para as medidas como preditivos de SAOS. Com relao ao IMC,

    observou-se que valores maiores que 28kg/m em homens e maiores que 29kg/m

    em mulheres aumentam o risco para SAOS. Para as medidas de CC e CA, estes

    valores correspondem a >40cm e >105 em homens e >36cm e >101cm em

    mulheres, respectivamente.

    Alm das medidas antropomtricas, evidncias cientficas tm demonstrado

    que deformidades maxilomandbulares aumentam o risco para SAOS (Hatcher 2012).

    Frente a isso, torna-se importante incluir no exame fsico, a avaliao do padro

    oclusal. No estudo de Claudino et al (2013), por meio de avaliao volumtrica das

    vias areas por tomografia computadorizada de feixe cnico, observaram que

    pacientes com ocluso tipo classe II (Angle 1899), ou seja, retrognatismo

    mandibular, apresentavam reas e volumes significantemente menores que

    pacientes classe I (ocluso normal) e classe III (prognatismo mandibular). J nos

    indivduos com fissura labiopalatina, a ocluso classe III, nestes casos causada, via

  • Introduo e Reviso de Literatura

    40

    de regra, pela retruso maxilar, parece levar a um estreitamento da via area

    superior j comprometida por outros fatores anatmicos (Smahel e Mllerov 1992 e

    Oosterkamp et al 2007). Assim, devido presena da fissura per se, e,

    consequentemente, da diminuio volumtrica das vias areas nestes pacientes

    (Garbino et al 2003, Gomes et al 2003 e Trindade et al 2010), esperado que

    pacientes com fissura labiopalatina apresentem maior risco para SAOS.

    1.4 FATORES DE RISCO PARA APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO

    A SAOS uma desordem obstrutiva com alta prevalncia na populao

    geral (Young, Peppard e Gottlieb 2002). Young et al (1993), em estudo realizado com

    602 indivduos com idade entre 30 e 60 anos, relataram uma prevalncia de 2%

    entre mulheres e 4% entre homens. No Brasil, admite-se uma prevalncia

    surpreendente maior, de 33%, segundo estudo epidemiolgico realizado

    recentemente por Tufik et al (2010), com 1042 indivduos da cidade de So Paulo.

    Isto porque, com os avanos na tecnologia e nos estudos da Medicina do Sono, os

    critrios para diagnstico da sndrome mudaram, acabando por diagnosticar

    pacientes no identificados com os critrios anteriores. Na mais recente

    classificao dos distrbios do sono da American Academy of Sleep Medicine

    (2005), por exemplo, passou-se a incluir no diagnstico da sndrome, alm da

    sonolncia diurna usada at ento, sintomas como ronco alto, relatos de pausas

    respiratrias durante o sono e cansao. Alm disso, a introduo do uso da cnula

    nasal, sensor capaz de detectar variaes de amplitude do fluxo areo, para

    classificao dos eventos respiratrios parece detectar 16% de eventos respiratrios

    a mais que o uso exclusivo do termstor, sensor que detecta variaes de

  • Introduo e Reviso de Literatura

    41

    temperatura do fluxo areo durante a inspirao e a expirao (Ballester et al 1998 e

    Bahammam 2004).

    Entre os principais fatores de risco para SAOS, destacam-se o sexo, a idade

    e presena de obesidade (Strobel e Rosen 1996). Com relao ao sexo, estudos

    mostram que a desordem mais comum entre homens. Young et al (1993), por

    exemplo, baseando-se exclusivamente nos resultados de polissonografia (ndice de

    apneia/hipopneia IAH maior que 5 eventos/h), relatam uma prevalncia de

    apneia de 9% em mulheres com idade entre 30 e 60 anos. J entre os homens, a

    prevalncia aumenta para 24%. Em estudo mais recente, Tufik et al (2010) relatam

    prevalncia de 26% e 41%, entre mulheres e homens da mesma faixa etria,

    respectivamente.

    O aumento da prevalncia de SAOS com o avano da idade, tanto em

    homens, quanto em mulheres, tambm j bem conhecido. Tufik et al (2010), em

    estudo epidemiolgico, encontraram aproximadamente 7% de indivduos adultos

    jovens (20-29 anos) com SAOS ao passo que, em idosos (70-80 anos), a

    prevalncia aumentou significantemente para 87%. Bixler et al (1998), em estudo

    realizado com 741 homens, observaram um aumento da prevalncia de SAOS de

    8%, entre indivduos com idade de 20 a 44 anos, para 20%, nos indivduos com

    idade entre 45 e 64 anos. Dados semelhantes j haviam sido relatados por Young et

    al (1993), que observaram IAH maior que 5 eventos por hora de sono em 7% das

    mulheres e 17% dos homens com idade entre 30 e 39 anos. Entre os pacientes com

    idade entre 50 e 60 anos, estes nmeros aumentaram para 16% e 31%,

    respectivamente.

    Outro fator importante a obesidade, que aumenta consideravelmente o

    risco para a apneia. Essa relao descrita h longa data, mesmo em relatos no-

  • Introduo e Reviso de Literatura

    42

    mdicos, como, por exemplo, no The posthumous papers of the Pickwick club, de

    Charles Dickens (Gastaut, Tassinari e Duron 1966). Segundo Schwartz et al (2008),

    enquanto na populao geral a prevalncia de SAOS de 2% para mulheres e 4%

    para homens (Young et al 1993), entre pacientes obesos, aumenta para 30%, e, para

    obesos mrbidos, para 50% a 98%.

    Contudo, as alteraes anatmicas decorrentes da presena da fissura

    labiopalatina tambm parecem aumentar o risco para SAOS. Como descreveram

    Muntz et al (2008), diversos fatores predispem os indivduos com fissura

    labiopalatina obstruo das vias areas. Estes fatores incluem as alteraes

    nasais, de observao frequente nesta populao (Fukushiro e Trindade 2005), as

    discrepncias maxilomandibulares (Trindade et al 2003), e as cirurgias secundrias

    realizadas para tratamento da insuficincia velofarngea (IVF), em especial o retalho

    farngeo, que tm um efeito obstrutivo potencial sobre as vias areas (MacLean et al

    2009a).

    Em estudo realizado por MacLean et al (2009b), com 248 crianas com

    fissura de lbio e/ou palato operada em idade pr-escolar (at 5 anos), observou-se

    que crianas com fissura labiopalatina tm 5 vezes mais chances de desenvolver

    SAOS, quando comparadas crianas sem fissura. Os autores descrevem que

    ronco alto, falta de concentrao e sonolncia excessiva diurna, avaliados por meio

    de questionrios enviados aos pais, foram os sinais e sintomas mais relatados.

    No estudo realizado por Robison e Otteson (2011), tambm foi observada

    uma alta prevalncia de distrbios respiratrios do sono em pacientes peditricos

    com fissura operada. Dos 459 pacientes avaliados, com idade entre 0 e 18 anos,

    172 (38%) apresentavam relatos de ronco e/ou paradas respiratrias durante o sono.

  • Introduo e Reviso de Literatura

    43

    Esta proporo maior que a observada em crianas sem fissura, de 3 a 12%

    (Gislason e Benediktsdttir 1995 e Hultcrantz et al 1995).

    Em estudo mais recente, MacLean et al (2012), ao avaliarem 50 recm-

    nascidos com fissura de lbio e/ou palato antes das cirurgias primrias, observaram,

    agora por meio de polissonografia, um alto risco de problemas respiratrios

    obstrutivos do sono em crianas com fissura de lbio e/ou palato, associada

    sndromes ou no. Os autores recomendam a realizao de PSG em todos os

    recm-nascidos portadores de fissura de lbio e/ou palato. Tambm evidenciam a

    importncia do conhecimento mdico pelos profissionais dos sintomas obstrutivos do

    sono.

    Em adultos de meia-idade com fissura, a prevalncia de SAOS tambm

    parece ser alta. Campos (2012), em recente estudo realizado na Unidade de

    Estudos do Sono do Laboratrio de Fisiologia do HRAC/USP, observou resultados

    de polissonografia sugestivos de SAOS em 60% dos 20 pacientes na faixa etria de

    40-49 anos, com fissura de lbio e palato operada avaliados. Vale ressaltar que

    apenas 2 destes pacientes eram obesos, e os valores mdios de IMC, CA e CC

    estavam dentro dos limites de normalidade para risco de AOS (264 kg/m2, 363cm

    e 9211cm, respectivamente). Estudos que avaliem a qualidade do sono e a

    prevalncia de SAOS em adultos jovens com fissura labiopalatina no foram

    encontrados.

    De fato, estudos utilizando cefalometria em norma lateral mostram

    alteraes nas dimenses da via area superior de indivduos com fissura

    labiopalatina semelhante quelas descritas em pacientes com SAOS. Estes achados

    so bem demonstrados no estudo de Oosterkamp et al (2007), que avaliaram, por

    meio de cefalometria, a morfologia craniofacial, craniocervical e farngea de homens

  • Introduo e Reviso de Literatura

    44

    com fissura bilateral completa operada, comparados a um grupo de homens com

    diagnstico de SAOS no tratada e a um grupo controle de homens sem fissura e

    sem SAOS. Os autores observaram que, quando comparados ao grupo controle, os

    pacientes com fissura bilateral e com SAOS apresentaram tanto morfologia

    craniofacial como craniocervical e farngea semelhantes entre si. Com exceo

    maxila, que foi significativamente mais retrusa nos pacientes com fissura, os

    pacientes com fissura e com SAOS, comparado ao grupo controle, apresentaram

    maiores angulaes craniocervicais, menor profundidade da orofaringe e osso hioide

    em posio mais inferior.

    Os achados de Rose et al (2003) tambm corroboram com estes achados.

    Ao comparar medidas cefalomtricas de indivduos com fissura labiopalatina,

    comparados de indivduos sem fissura, pareados por idade, sexo e IMC, os

    autores observaram diminuio das dimenses farngeas em pacientes com fissura.

    Ocorre que, alm das alteraes anatmicas inerentes prpria presena

    da fissura, outros fatores parecem aumentar substancialmente o risco para SAOS

    nos indivduos com fissura labiopalatina. Entre estes fatores destacam-se as

    cirurgias para tratamento da IVF. Isto porque, para que as estas cirurgias alcancem

    seu principal objetivo - o de proporcionar uma separao funcional entre a

    nasofaringe e a orofaringe durante a fala, muitas vezes acabam por resultar em

    comprometimento da permeabilidade da via area. O retalho farngeo, em especial,

    apesar de ser considerado a tcnica mais efetiva para correo da IVF (Collins et al

    2012), repetidamente relacionado SAOS na literatura. Em reviso de literatura

    realizada por Campos (2012) sobre o tema em questo, observou-se que o retalho

    farngeo levou a distrbios respiratrias do sono, confirmadas por polissonografia,

  • Introduo e Reviso de Literatura

    45

    em 10 a 90% dos casos no ps-operatrio imediato e em 1 a 93% dos casos no ps-

    operatrio tardio.

    Em suma, indivduos com fissura labiopalatina parecem apresentar

    alteraes anatmicas e funcionais que, somados ao efeito potencial obstrutivo das

    cirurgias realizadas ao longo do tratamento, predispem SAOS. No entanto,

    estudos sobre o tema em questo baseiam-se em populaes especficas, no

    sendo possvel estimar a prevalncia de distrbios respiratrias do sono nestes

    pacientes, de forma geral. Assim sendo, entendemos como relevante estudar

    indicadores de qualidade do sono e sinais e sintomas para SAOS em adultos jovens

    com fissura labiopalatina, o que, salvo melhor juzo, ainda no foi investigado na

    literatura.

    Neste contexto se insere o presente estudo, que tem por hiptese que

    adultos jovens com fissura labiopalatina operada apresentam alteraes na

    qualidade do sono e na prevalncia de sinais e sintomas da SAOS.

  • 2 OBJETIVOS

  • Objetivos

    49

    2 OBJETIVOS

    O presente estudo teve por objetivos:

    1) avaliar a qualidade do sono de adultos jovens com fissura

    labiopalatina previamente operada, utilizando os questionrios de

    Pittsburgh, Epworth e Berlin;

    2) avaliar se h correlao entre a qualidade do sono, aferida pelos

    questionrios, e as seguintes variveis: tipo de fissura, sexo,

    obesidade (aferida indiretamente pelo ndice de massa corprea,

    pela circunferncia abdominal e pela circunferncia cervical), padro

    oclusal e cirurgias reparadoras prvias (retalho farngeo, cirurgia

    ortogntica e/ou cirurgias nasais).

  • 3 MATERIAL E MTODO

  • Material e Mtodo

    53

    3 MATERIAL E MTODO

    3.1 CASUSTICA

    O estudo foi realizado no Laboratrio de Fisiologia do Hospital de

    Reabilitao de Anomalias Craniofaciais da Universidade de So Paulo (HRAC-

    USP), aps aprovao do Comit de tica em Pesquisa de Seres Humanos da

    instituio, conforme ofcio n 358/2011-SVAPEPE-CEP (Anexo 1).

    Considerando-se um erro de 10% e uma proporo esperada de 37% de

    indivduos na faixa etria de 20-29 anos com fissura e com SAOS, tomando como

    referncia dados normativos de Tufik et al (2010) e de Campos (2012), que aferiram

    a prevalncia de SAOS em indivduos com e sem fissura labiopalatina,

    respectivamente, estimou-se uma amostra de 90 indivduos para a realizao do

    presente estudo.

    Assim, no perodo de dezembro de 2011 a dezembro de 2012, foram

    avaliados 90 pacientes com fissura de lbio e/ou palato operada, com idade entre 20

    e 29 anos. Para respeitar a faixa etria de interesse, foram selecionados os

    pacientes agendados para atendimento no Setor de Prtese do HRAC-USP.

    3.2 PROCEDIMENTOS

    Aps explicao dos procedimentos a serem realizados, em caso de aceite,

    todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido

    (Anexo 2).

  • Material e Mtodo

    54

    O tempo total gasto na aplicao dos questionrios e no registro dos dados

    antropomtricos foi de aproximadamente 20 minutos. Ressalte-se que no foi

    necessria modificao da rotina de agendamento dos indivduos avaliados, pois os

    mesmos foram entrevistados e examinados nos intervalos de atendimento.

    Dados referentes ao tipo de fissura, cirurgias realizadas (retalho farngeo,

    cirurgia ortogntica e nasal), peso e altura atuais, foram coletados dos pronturios e,

    especificamente quanto aos valores de peso e altura, estas informaes foram

    confirmadas pelos pacientes.

    A partir das medidas do peso e altura, o ndice de massa corprea (IMC) foi

    calculado, pela frmula IMC=peso/altura2 (kg/m2). De acordo com o IMC, os

    indivduos foram classificados em: baixo peso (IMC30kg/m2)

    (Diretrizes Brasileiras de Obesidade 2009).

    No exame fsico, foram realizadas tambm medidas da circunferncia

    abdominal e circunferncia cervical, bem como a classificao oclusal, segundo

    Angle (1899), ou seja, a ocluso foi considerada classe l quando a cspide msio-

    vestibular do primeiro molar superior oclua na direo do sulco central do primeiro

    molar inferior (Figura 3A). A classe ll foi classificada nos casos do primeiro molar

    inferior estar mais distalizado em relao ao superior, ou seja, sua cspide msio-

    vestibular ocluia mesialmente em relao ao sulco central do 1 molar inferior (Figura

    3B). Por fim, a ocluso foi considerada classe lll, quando o primeiro molar inferior se

    encontrava mais para a mesial em relao ao superior, ou seja, a cspide msio-

    vestibular do primeiro molar superior ocluia distalmente em relao ao sulco central

    do 1 molar inferior (Figura 3C).

  • Material e Mtodo

    55

    A circunferncia abdominal (CA) foi aferida a partir do ponto mdio entre a

    crista ilaca e o rebordo costal inferior (Figura 4A). A medida da circunferncia

    cervical (CC) foi realizada a aproximadamente 8cm abaixo da implantao inferior do

    pavilho auricular (Figura 4B). Valores de circunferncia abdominal 94cm para

    homens e 80cm para mulheres, e de circunferncia cervical 40cm para homens e

    36cm para mulheres, foram considerados de risco para SAOS (Davidson e Patel

    2008 e Soylu et al 2012).

  • Material e Mtodo

    56

    A

    B

    C

    Fonte: Van der Linden FPGM. Ortodontia: desenvolvimento da dentio. So Paulo: Quintessense; 1986. p. 40, 86, 110.

    Figura 3 - Classificao oclusal de Angle. Classe I: cspide msio-vestibular do 1 molar superior oclui na direo do sulco central do primeiro molar inferior (Figura 3A); Classe ll: cspide msio-vestibular do 1 molar superior oclui mesialmente ao sulco central do 1 molar inferior (Figura 3B); Classe lll: cspide msio-vestibular do 1 molar superior oclui distalmente ao sulco central do 1 molar inferior (Figura 3C).

  • Material e Mtodo

    57

    A

    B

    Figura 4 - Medidas antropomtricas. Tcnica de medida da circunferncia cervical, aferida aproximadamente 8cm abaixo da implantao inferior do pavilho auricular (Figura 4A), e, medida da circunferncia abdominal, aferida entre a crista ilaca e o rebordo costal inferior (Figura 4B).

  • Material e Mtodo

    58

    3.2.1 Aplicao dos questionrios

    Para se investigar a qualidade subjetiva do sono e consequentemente os

    fatores de risco para a SAOS, foram utilizados trs modalidades de questionrios,

    todos validados na literatura, quais sejam, ndice de Qualidade de Sono de

    Pittsburgh (Anexo 3), Escala de Sonolncia de Epworth (Anexo 4) e Questionrio de

    Berlin (Anexo 5).

    O ndice de Qualidade de Sono de Pittsburgh avalia a qualidade do sono no

    ms anterior investigao, fornecendo um indicador da natureza e da gravidade do

    distrbio. O questionrio composto por sete domnios: 1) qualidade subjetiva do

    sono, 2) latncia do sono, 3) durao do sono, 4) eficincia habitual do sono (pela

    relao entre o nmero de horas dormidas e o nmero de horas em permanncia no

    leito), 5) distrbios do sono (presena de situaes que comprometam as horas de

    sono), 6) uso de medicao e, por ltimo, 7) sonolncia e distrbios relacionados

    diurnos. Cada domnio, tambm denominado componente, pontuado de acordo

    com as instrues que acompanham o questionrio e determina a pontuao global

    pela soma dos sete domnios sendo, no mximo, igual a 21 pontos. Escores

    superiores a cinco pontos so considerados como indicativos de qualidade ruim do

    padro de sono, como preconizado na verso original (Buysse et al 1989).

    A Escala de Sonolncia de Epworth analisa o grau subjetivo de sonolncia

    diurna. composta por oito questes, pontuando cada uma de 0 a 3, de acordo com

    a menor ou maior probabilidade de ficar sonolento em determinadas situaes do

    dia a dia. A pontuao pode totalizar de 0 a 24 pontos, com menor pontuao

  • Material e Mtodo

    59

    indicando menos sonolncia. Valores de 10, ou maiores que 10, foram considerados

    como casos de sonolncia excessiva, como preconizado na verso original (Johns

    1991).

    O Questionrio de Berlin, por sua vez, indica risco para apneia do sono em

    indivduos que atendam a 2 ou mais critrios em relao a ronco, cochilos ao dirigir,

    sonolncia diurna, obesidade e hipertenso arterial. Indivduos com sintomas

    persistentes (mais de 3-4 vezes por semana) em dois ou mais quesitos sero

    considerados como alto risco para SAOS (Netzer et al 1999).

    3.2.2 Anlise dos dados

    Para anlise da associao entre os resultados obtidos nos 3 questionrios

    aplicados e as variveis qualitativas tipo de fissura, sexo, IMC, circunferncia

    abdominal e cervical, tipo de ocluso e cirurgias realizadas, foi utilizado o teste do

    qui-quadrado. O nvel de significncia adotado foi de 5%.

  • 4 RESULTADOS

  • Resultados

    63

    4 RESULTADOS

    Os valores individuais das variveis idade, sexo, raa, tipo de fissura, ndice

    de massa corprea, circunferncia cervical, circunferncia abdominal, resultados dos

    questionrios (ndice de Qualidade de Sono de Pittsburgh, Escala de sonolncia de

    Epworth, Berlin), classificao oclusal, presena dos procedimentos cirrgicos:

    retalho farngeo, cirurgia nasal e cirurgia ortogntica, aferidas no presente estudo

    so mostrados no Apndice 1.

    4.1 DADOS GERAIS DA POPULAO ESTUDADA

    Foram avaliados 90 indivduos com fissura de lbio e/ou palato operada,

    com idade mdia de 243 anos (20 a 29 anos), sendo 41 (46%) do sexo feminino e

    49 (54%) do sexo masculino. Setenta e trs indivduos (81%) eram brancos, 5 (6%)

    negros, e, em 12 (13%) a raa no foi informada.

    Com relao ao tipo de fissura, 11 pacientes (12%) apresentavam fissura

    pr-forame incisivo unilateral e 5 (6%) bilateral. A fissura transforame incisivo

    ocorreu em 35 pacientes (39%) na forma unilateral e 28 (31%) na forma bilateral.

    Havia ainda 11 indivduos (12%) que apresentavam a fissura ps-forame incisivo. A

    presena de retalho farngeo foi identificada em 10 (11%) dos avaliados, 68 (76%)

    realizaram cirurgia nasal e 19 (21%) que se submeteram cirurgia ortogntica.

    Estes dados se encontram na Tabela 1.

  • Resultados

    64

    Tabela 1 - Caractersticas gerais dos pacientes analisados no presente estudo. Os dados esto apresentados como mdiadp ou como nmero de casos (porcentagem).

    Nmero de casos (%)

    (n=90)

    Idade (xdp ) 243

    Sexo Masculino 41 (46%)

    Feminino 49 (54%)

    Raa

    Branca 73 (81%)

    Negra 5 (6%)

    No informada 12 (13%)

    Tipo de fissura

    Pr-forame unilateral 11 (12%)

    Pr-forame bilateral 5 (6%)

    Transforame unilateral 35 (39%)

    Transforame bilateral 28 (31%)

    Ps-forame 11 (12%)

    Retalho farngeo 10 (11%)

    Cirurgia nasal 68 (76%)

    Cirurgia ortogntica 19 (21%)

  • Resultados

    65

    4.2 RESULTADOS REFERENTES AO EXAME FSICO

    A Tabela 2 apresenta os achados observados ao exame fsico. Os pacientes

    analisados apresentaram IMC mdio de 245kg/m2, sendo 9 (10%) classificados

    como obesos, 27 (30%) com sobrepeso e 54 (60%) como normais ou abaixo do

    peso.

    A circunferncia abdominal mdia do grupo foi de 8612cm e a

    circunferncia cervical de 374cm. Em 50 (56%) dos pacientes estudados a

    circunferncia abdominal apresentou-se dentro dos limites de normalidade para o

    sexo (94cm para homens e 80cm para mulheres), e em 60 (67%) pacientes,

    observou-se uma circunferncia cervical dentro dos valores normais (40cm para

    homens e 36cm para mulheres). Esses dados encontram-se na Tabela 2.

    Com relao classificao de Angle, observou-se que 67 (75%) foram

    classificados como classe l, 13 (14%) como classe ll e 10 (11%) como classe lll.

  • Resultados

    66

    Tabela 2 - Resultado obtido referente ao ndice de massa. Os valores so apresentados como mdiadp ou como nmero de casos (porcentagem).

    Nmero de casos (%)

    (n=90)

    ndice de massa corprea (xdp) 245

    Baixo peso 6 (7%)

    Normal 48 (53%)

    Sobrepeso 27 (30%)

    Obeso 9 (10%)

    Circunferncia abdominal (xdp) 8612cm

    No risco 50 (56%)

    Risco 21 (23%)

    Risco elevado 19 (21%)

    Circunferncia cervical (xdp) 374cm

    No risco 60 (67%)

    Risco 30 (33%)

  • Resultados

    67

    4.3 RESULTADOS OBTIDOS APS APLICAO DOS QUESTIONRIOS

    Os resultados obtidos aps aplicao dos questionrios de Pittsburgh,

    Epworth e Berlin encontram-se na Tabela 3. De acordo com o ndice de Qualidade

    de Sono de Pittsburgh, observou-se uma pontuao mdia de 52 e detectou-se

    resultados sugestivos de qualidade do sono ruim (pontuao > 5) em 56 (62%) dos

    pacientes avaliados. Dentre eles, 37 (66%) eram portadores de fissura transforame

    incisivo, 30 (54%) eram do sexo masculino, 22 (39%) eram obesos, 26 (46%)

    apresentavam circunferncia de abdominal de risco, 20 (36%) possuam

    circunferncia cervical de risco, 43 (77%) eram classe I de Angle e 7 (13%)

    apresentavam retalho farngeo. Nenhum destes valores foi considerado significante.

    J, na Escala de Sonolncia de Epworth, a pontuao mdia obtida foi de

    93. Pontuao indicativa de sonolncia excessiva diurna (10) foi observada em 23

    (26%) dos pacientes. Destes, 16 (70%) eram portadores de fissura transforame

    incisivo, 13 (57%) eram do sexo feminino, 11 (48%) eram obesos, 11 (48%)

    apresentavam circunferncia de abdominal de risco, 9 (39%) possuam

    circunferncia cervical de risco, 18 (78%) eram classe I de Angle e 4 (17%)

    apresentavam retalho farngeo. Mais uma vez, nenhum destes valores foi

    considerado significante.

  • Resultados

    68

    Tabela 3 - Resultados encontrados na aplicao do ndice de Qualidade de Sono de Pittsburgh, Escala de Sonolncia de Epworth e Questionrio de Berlin. Os dados so apresentados como pontuao mdiadp ou como nmero de casos (porcentagem) com pontuao acima do limite de normalidade.

    Nmero de casos (%)

    (n=90)

    ndice de Qualidade de Sono de Pittsburgh

    Pontuao mdia 52

    Pontuao >5 56 (62%)

    Escala de Sonolncia de Epworth

    Pontuao mdia 93

    Pontuao >10 23 (26%)

    Questionrio de Berlin

    Alto risco 30 (33%)

  • Resultados

    69

    Por fim, a aplicao do Questionrio de Berlin detectou 30 (33%) dos

    pacientes com alto risco para apneia obstrutiva do sono. Entre eles, 20 (67%) eram

    portadores de fissura transforame incisivo, 16 (53%) eram do sexo feminino, 17

    (57%) eram obesos, 14 (47%) apresentavam circunferncia abdominal de risco, 14

    (47%) possuam circunferncia cervical de risco, 23 (77%) eram classe I de Angle e

    7 (23%) apresentavam retalho farngeo.

    Diferentemente dos demais questionrios, no Questionrio de Berlin,

    detectou-se uma correlao positiva entre presena de risco para apneia e

    obesidade (p=0,04) e presena de risco para apneia e presena de retalho farngeo

    (p=0,02). Isto significa que, pacientes obesos e pacientes submetidos ao retalho

    farngeo tiveram risco significativamente maior para SAOS, aferido pelo questionrio

    de Berlin. As Tabelas 4 e 5 mostram, respectivamente, as variveis IMC e presena

    de retalho farngeo e os resultados obtidos no questionrio de Berlin.

    Ressalta-se aqui um resultado importante quanto ao retalho farngeo.

    Setenta por cento dos indivduos com fissura e com retalho farngeo apresentam alto

    risco para SAOS, ao passo que nos pacientes no submetidos ao retalho, o risco

    decresceu consideravelmente para 30%. Estes dados encontram-se na Tabela 5.

    Ademais, dos 10 pacientes com retalho farngeo, 4 (40%) apresentavam sonolncia

    excessiva diurna, 7 (70%) apresentavam qualidade ruim do sono e apenas 3 (30%)

    foram classificados como sobrepeso. No foram encontrados obesos neste

    subgrupo.

  • Resultados

    70

    Tabela 4 - Resultados encontrados na aplicao do Questionrio de Berlin (alto e baixo risco para apneia) e sua relao com a varivel IMC (no obesos e obesos). Os dados so apresentados como nmero de casos (porcentagem).

    Baixo risco para apneia

    (Berlin) Alto risco apneia

    (Berlin)

    No obesos (n=10)

    41 (76%) 13 (24%)

    Sobrepeso / Obesos (n=80)

    19 (53%) 17 (47%)

    TOTAL 60 (67%) 30 (33%)

  • Resultados

    71

    Tabela 5 - Resultados encontrados na aplicao do Questionrio de Berlin (alto e baixo risco para apneia) e sua relao com a varivel retalho farngeo (com e sem retalho). Os dados so apresentados como nmero de casos (porcentagem).

    Baixo risco para apneia

    (Berlin) Alto risco apneia

    (Berlin)

    Com retalho (n=10)

    3 (30%) 7 (70%)

    Sem retalho (n=80)

    57 (71%) 23 (29%)

    TOTAL 60 (67%) 30 (33%)

  • Resultados

    72

    Tabela 6 - Pacientes submetidos ao retalho farngeo e sua relao com a varivel ndice de massa corprea (IMC) e os resultados dos questionrios de Pittsburgh, Epworth e Berlin.

    Retalho farngeo

    Nmero de casos (%) (n=10)

    IMC

    Baixo peso 1 (10%)

    Normal 6 (60%)

    Sobrepeso 3 (30%)

    Obeso 0 (0%)

    ndice de Qualidade de Sono de Pittsburgh

    Qualidade boa 3 (30%)

    Qualidade ruim 7 (70%)

    Escala de Sonolncia de Epworth

    Normal 6 (60%)

    Sonolncia excessiva 4 (40%)

    Questionrio de Berlin

    Baixo risco 3 (30%)

    Alto risco 7 (70%)

    BP= baixo peso; N= peso normal; SP= sobrepeso; QB= qualidade boa; QR= qualidade ruim; N= no; SE= sonolncia excessiva diurna; BR= baixo risco para apneia do sono; AR= alto risco para apneia do sono; S= sim.

  • 5 DISCUSSO

  • Discusso

    75

    5 DISCUSSO

    Foi objetivo primrio deste estudo avaliar a qualidade do sono dos pacientes

    com fissura labiopalatina. Apesar de a polissonografia ser considerada o padro-

    ouro para o diagnstico das desordens do sono, os questionrios utilizados no

    presente estudo, so instrumentos de fcil aplicao e permitem aferir, de uma

    maneira geral, porm subjetiva, a qualidade de sono da populao de interesse.

    Neste sentido, utilizando os dados obtidos no ndice de Qualidade de Sono

    de Pittsburgh (IQSP), parcela considervel (62%) dos pacientes com fissura

    labiopalatina apresentou qualidade do sono ruim. Ademais, 26% dos indivduos

    apresentava sonolncia excessiva diurna, e, 33% alto risco para apneia do sono,

    fatores que indicam um padro de sono ruim ou impactam negativamente sobre a

    qualidade do sono. Estes dados so prximos aos de Campos (2012) que

    verificaram que 80% dos pacientes com fissura labiopalatina e sem retalho farngeo,

    em uma faixa etria mais elevada (40-58 anos), apresentavam qualidade do sono

    ruim. Neste mesmo estudo, desenvolvido no Laboratrio de Fisiologia do

    HRAC/USP, 30% dos pacientes apresentaram sonolncia excessiva diurna e 35%

    dos pacientes do grupo apresentavam-se com alto risco para apneia. Estes

    resultados confirmam a hiptese de que pacientes com fissura labiopalatina, podem

    ser considerados, via de regra, maus dormidores.

    Dentre os pacientes que apresentaram alto risco para apneia do sono,

    aferido pelo Questionrio de Berlin, quase a metade (47%) apresentava sobrepeso

    ou obesidade. Com base nestes dados, foi possvel detectar estatisticamente

    associao entre o ndice de massa corprea e o risco para apneia do sono. De fato,

    este um dado esperado haja visto que a correlao entre apneia do sono e

  • Discusso

    76

    obesidade reconhecida desde o sculo passado (Gastaut, Tassinari e Duron 1966

    e Young et al 1993).

    Tufik et al (2010) demonstraram que a associao com a SAOS foi 2,6 vezes

    maior entre pacientes com sobrepeso e 10,5 vezes mais para indivduos obesos. J,

    Martinho et al (2008) avaliaram se anormalidades anatmicas nas vias areas

    superiores de pacientes obesos padro classe III tm relao com a presena e

    severidade da SAOS. Concluram que anormalidades esquelticas encontradas em

    pacientes classe III no predispunham isoladamente apneia. Entretanto, quando

    associado obesidade, a prevalncia era maior. Isso, mais uma vez, confirma a

    correlao entre obesidade e SAOS. Frente aos resultados obtidos no IQSP, foi

    possvel inferir que, se por um lado o IMC elevado demonstrou ser fator de risco

    para SAOS, por outro lado, o IMC normal parece ser fator protetor para apneia. Isto

    porque, 76% dos pacientes no obesos apresentaram baixo risco para apneia, na

    amostra investigada.

    No mesmo estudo de Martinho et al (2008), os autores observaram que a

    circunferncia cervical (CC) aumentada um marcador importante para a presena

    e severidade da SAOS, o que no foi confirmado estatisticamente no presente

    trabalho, apesar dos altos ndices (47%) de pacientes com CC e com circunferncia

    abdominal elevadas e com risco para a SAOS, detectado no Questionrio de Berlin.

    A CC aumentada, de fato, uma medida importante para a presena da SAOS.

    Como dito anteriormente, em nossa pesquisa, utilizando a nota de corte de

    CC40cm para homens e 36cm para mulheres (Diretrizes Brasileiras de Obesidade

    2009), no foi possvel observar correlao positiva entre esta medida e o risco para

    a apneia. Soylu et al (2012) obtiveram dados diferentes dos nossos, avaliando 499

    pacientes com dados polissonogrficos e antropomtricos (IMC, CC e CA).

  • Discusso

    77

    Observaram que quando essas medidas esto aumentadas, o risco para a SAOS

    potencializado. Fica evidente, portanto, a necessidade de se avaliar a qualidade do

    sono em pacientes obesos, idealmente por meio de polissonografia, com o intuito

    maior de detectar alteraes orgnicas precocemente e prevenir futuras

    complicaes relacionadas baixa qualidade do sono.

    Utilizando ainda os dados do Questionrio de Berlin, foi possvel detectar

    associao entre a presena do retalho farngeo e risco para apneia do sono,

    mesmo frente a uma amostra reduzida (n=10). Isto porque, o retalho farngeo,

    procedimento cirrgico muito empregado para a correo da insuficincia

    velofarngea (Witt e DAntonio 1993 e Sloan 2000), consiste na elevao de um

    retalho de tecido da parede posterior da faringe que unido ao palato mole,

    formando uma ponte que delimita dois orifcios laterais para que ocorra a passagem

    do ar na respirao (Rocha 2007). Contudo, esta ponte de tecido na interface entre a

    naso e a orofaringe parece exercer potencial obstrutivo sobre as vias areas,

    levando SAOS.

    Na presente investigao, 70% dos pacientes com retalho farngeo

    apresentaram-se com alto risco para SAOS, determinada principalmente pelos

    relatos de ronco em 60% deles e de cansao diurno em 70%. Ainda neste grupo de

    pacientes, foram observadas queixas de obstruo nasal em 30%, apenas 20%

    apresentavam-se com sobrepeso e somente 10% relatavam paradas respiratrias.

    Analisando agora os pacientes sem retalho farngeo, o inverso ocorreu, i.e., 71% dos

    pacientes sem retalho apresentavam baixo risco para SAOS. Este dado parece ser

    um dos mais importantes deste estudo, pois, sugere que a presena do retalho

    farngeo, semelhana do ndice de massa corprea elevado, ambos associados s

    repercusses anatomofuncionais decorrentes da fissura labiopalatina per se,

  • Discusso

    78

    parecem ser fatores predisponentes para apneia obstrutiva do sono, nestes

    pacientes.

    Cardia (2011), em estudo desenvolvido no Laboratrio de Fisiologia do

    HRAC/USP, avaliou a ocorrncia da SAOS aps o tratamento cirrgico da

    insuficincia velofarngea (IVF). Pacientes de meia-idade (40-66 anos) foram

    divididos em trs grupos: 1) grupo controle composto por pacientes sem fissura, 2)

    grupo com fissura operada e sem retalho farngeo, e, 3) grupo com fissura operada e

    com retalho farngeo para correo da IVF. O resultado do IQSP mostrou que 60%

    dos indivduos que tinham fissura operada, porm sem retalho, relatavam queixa na

    qualidade do sono. Esse resultado semelhante ao encontrado no presente estudo,

    apesar da faixa etria avaliada ter sido entre 20 e 29 anos. Encontramos 62% dos

    indivduos com qualidade ruim de sono avaliado pelo ndice de Qualidade de Sono

    de Pittsburgh (IQSP), contudo sem significncia estatstica. Dentre aqueles que

    possuam retalho, a porcentagem de indivduos com baixa qualidade do sono subiu

    para 70%, dados estes discordantes dos de Cardia (2011), que observou uma

    porcentagem relativamente baixa de 40% de maus dormidores no grupo submetido

    ao retalho farngeo, o que fez o autor questionar a validade do questionrio.

    J no estudo realizado por Campos (2012), tambm no Laboratrio de

    Fisiologia do HRAC/USP, os valores referentes ao IQSP em indivduos com fissura

    submetidos ao retalho, tambm de meia-idade (40-58 anos), so mais concordantes

    com o do presente estudo. Nos pacientes com fissura e sem retalho, a proporo de

    maus dormidores era de 80%, e nos indivduos submetidos ao retalho, a proporo

    atingiu 91%. Isto, provavelmente, se deve ao fato de a amostra de Campos (2012)

    apresentar uma mdia de idade (49 anos) maior que a do presente estudo (24

  • Discusso

    79

    anos). Estes dados reforam o fato comprovado por Tufik et al (2010) de que com o

    aumento da idade, a qualidade do sono se torna pior.

    A sonolncia excessiva, avaliada pela Escala de Sonolncia de Epworth

    (ESE), foi observada em 26% dos indivduos de nossa amostra; ao se analisar

    exclusivamente os indivduos com retalho farngeo, o mesmo parmetro passou a

    ser observado em 40% dos pacientes. No trabalho de Cardia (2011), as propores

    foram de, respectivamente, 35% e 44% e no estudo de Campos (2012), os

    percentuais corresponderam a 30% e 45%. Apesar do maior percentual observado

    nos pacientes da presente amostra que possuam retalho, tambm aqui no se

    estabeleceu correlao positiva.

    Apesar de no utilizarmos a polissonografia em nosso estudo, ao analisar

    criticamente os resultados obtidos, foi possvel verificar que indivduos adultos com

    fissura labiopalatina apresentam, desde cedo, alteraes na qualidade do sono.

    Para se ter uma viso geral deste cenrio, ao reunir os dados das 3 modalidades de

    questionrio, demonstrou-se que 62% da amostra total de pacientes tinham

    qualidade de sono ruim, 26% indicavam ter sonolncia excessiva e 33%

    apresentavam alto risco para apneia. Isso demonstra uma maior prevalncia de

    problemas na qualidade do sono nos pacientes com fissura labiopalatina operada

    em relao populao sem fissura, como j constatado por outros autores (Muntz

    et al 2008, MacLean et al 2009b, Robison e Otteson 2011 e Muntz 2012).

    O presente trabalho tem como limitao o fato de no ter sido feito um grupo

    controle e, de fato, a literatura escassa neste tpico especfico. Ahrberg et al

    (2012) avaliaram a qualidade do sono de estudantes de medicina, utilizando o

    questionrio de Pittsburgh. Seus resultados mostram que apenas 29% dos adultos

    jovens investigados apresentam qualidade ruim do sono. Tendo em vista a

  • Discusso

    80

    importncia da aferio destes dados, um estudo avaliando a qualidade do sono em

    adultos jovens sem fissura foi recentemente iniciado pelo grupo de pesquisa do

    Laboratrio de Fisiologia do HRAC/USP.

    O sexo masculino est entre os principais fatores de risco para a SAOS.

    Segundo Young et al (1993), a SAOS atinge 24% dos homens e 9% das mulheres,

    na faixa etria de 30 a 60 anos. O motivo da diferena da qualidade de sono em

    relao ao sexo ainda desconhecido e pode estar relacionado influncia de

    hormnios e resposta do sexo quando submetido ao estresse (Krishnan e Collop

    2006). Teculescu et al (2005) tambm concluram ser a SAOS mais frequente nos

    homens. Em uma avaliao de 2.365 pacientes com alguma queixa em relao ao

    sono, Silva et al (2008) observaram diferenas no padro de sono entre os sexos.

    Os homens relatavam mais ronco e aumento das fases N1 e N2 do sono. J as

    mulheres, uma maior latncia do sono tanto na fase NREM como na REM.

    Contudo, apesar de a literatura estabelecer uma correlao positiva entre

    baixa qualidade do sono e o sexo masculino, este dado no pode ser comprovado

    estatisticamente em nosso estudo, uma vez que 61% dos homens e 63% das

    mulheres apresentaram qualidade ruim do sono no IQSP.

    Com relao raa como fator de risco para SAOS, Pranathiageswaran et al

    (2013) em um estudo prospectivo, avaliaram 512 pacientes sendo 340 da raa negra

    e 172 da raa branca. Concluram que homens negros, com menos de 39 anos, e

    entre 50 e 59 anos apresentaram ndice de Apneia e Hipopneia (IAH) estabelecer

    uma associao entre raa e qualidade do sono, sonolncia excessiva ou risco para

    apneia. Dos 90 pacientes, somente 5 eram da raa negra, 73 eram brancos e 12 no

    identificados/declarados.

  • Discusso

    81

    Outra varivel aqui investigada foi a relao oclusal como possvel fator de

    risco para a qualidade do sono, em especial, para apneia. crescente o interesse

    na investigao da correlao entre as dimenses das vias areas, a presena de

    discrepncias maxilomandibulares e a apneia obstrutiva do sono. Sabe-se que a m-

    ocluso do tipo classe II de Angle capaz de promover reduo significativa do

    espao areo posterior (Cheng et al 1988) e a literatura farta em demonstrar tal

    associao. Por exemplo, McNamara, j em 1981, associou o retrognatismo

    mandibular com padro de crescimento vertical s obstrues no espao areo

    farngeo. Freitas et al (2006) reiteraram esta afirmao demonstrando, inclusive, que

    pacientes classe ll com padro de crescimento facial vertical apresentavam um

    maior estreitamento das vias areas superiores que os classe ll normofaciais.

    O mesmo no vlido para os indivduos com relao oclusal do tipo classe

    III. Claudino et al (2013) mostraram que as vias areas de adultos com classe III se

    assemelham em volume s dos classe I. J, Abdelkarim (2012) afirmou que a via

    area do indivduo classe III maior em volume do que a de pacientes classe I.

    Contudo, opinio destes autores que, quando a classe III est associada no s ao

    prognatismo mandibular mas tambm ao retrognatismo maxilar, nestes casos, h

    uma real chance de se observar uma reduo do espao areo posterior. Planeja-se

    investigar, em futuro prximo, as diferenas nas vias areas dos diferentes subtipos

    de classe III no Laboratrio de Fisiologia do HRAC/USP.

    No presente estudo, 75% dos sujeitos analisados apresentava classe l, 14%

    classe ll e 11% classe lll. Estando na faixa etria de 20 a 29 anos, todos se

    encontravam com tratamento ortodntico finalizado e boa parte com cirurgia

    ortogntica j realizada, quando indicada. Portanto, o alto percentual de pacientes

    classe l pode ser explicado por isso. Em relao qualidade do sono avaliada pelo

  • Discusso

    82

    IQSP, 69% dos indivduos classe ll tinham qualidade ruim contra 64% dos classe l e

    40% dos classe lll. No que se refere sonolncia excessiva dada pelo ESE, esse

    percentual era de 27% nos pacientes classe lll, 30% nos classe ll e 15% nos classe l.

    O QB mostrou valores muito prximos quanto ao risco para apneia; indivduos

    classe l, ll e lll tiveram respectivamente 34%, 31% e 30%. As diferenas entre os

    percentuais no foram consideradas estatisticamente significantes, o que fez supor

    que a relao oclusal no inteferiu na qualidade do sono. O valor mais elevado

    encontrado no IQSP para os pacientes classe II e I, clinicamente pouco explicvel,

    pode estar relacionado com o baixo valor de corte recomendado.

    Sabe-se que a cirurgia ortogntica de avano maxilomandibular tem como

    consequncia indireta o aumento do espao areo farngeo (Turnbull e Battagel

    2000, Gokce et al 2012 e Ahn et al 2013). Evidncias mostram que esse aumento

    favorece o fluxo areo respiratrio, diminuindo ou eliminando a SAOS. Turnbull e

    Battagel (2000) observaram melhora nos pacientes que tinham queixa de ronco e

    apneia aps a cirurgia. Em nosso estudo, apenas 26% dos pacientes que se

    submeteram cirurgia ortogntica apresentavam alto risco para apneia, ao passo

    que quando no operados, independentemente do tipo de ocluso que

    apresentavam, esta porcentagem subia para 35%. As diferenas no foram

    consideradas significantes e, justamente por isso, devem ser interpretadas com

    cautela, pois, no grupo de pacientes submetidos cirurgia ortogntica, no foi

    possvel aferir o tipo de ocluso pr-operatria e o tipo de movimento cirrgico

    empregado.

    Outro tipo de cirurgia com potencial para diminuir a obstruo das vias

    areas, aumentando sua permeabilidade e, consequentemente, diminuindo o risco

    para apneia obstrutiva do sono, so as cirurgias corretoras nasais, comumente

  • Discusso

    83

    empregadas no tratamento reabilitador dos pacientes com fissura labiopalatina

    (Wetmore 1992 e Trindade, Bertier e Sampaio-Teixeira 2009). Entre elas, a

    rinosseptoplastia, visa reposio da cartilagem lateral inferior do lado fissurado, a

    fim de tornar as narinas simtricas, promovendo a correo esttica e funcional da

    cavidade nasal (Bertier e Trindade 2007).

    Na presente investigao, no foi possvel detectar correlao positiva entre

    a presena de cirurgias nasais e a qualidade do sono, sonolncia excessiva ou risco

    para apneia. Dos 90 pacientes analisados, 76% tinham sido submetidos cirurgia

    nasal. Destes 60% apresentavam qualidade ruim do sono e apenas 25% e 26%

    apresentavam sonolncia excessiva diurna e alto risco para apneia,

    respectivamente. Estes dados no foram considerados significativos. Portanto,

    possvel inferir que a realizao da cirurgia nasal, contrariamente ao esperado, no

    est associada melhora significativa na qualidade do sono, ao menos do que se

    constatou nos pacientes avaliados.

    A ltima varivel a ser analisada o tipo de fissura. De acordo com os

    resultados obtidos, apesar de as fissuras tranforame incisivo e ps-forame incisivo

    alterarem a forma e a funo da velofaringe, potencializando o risco para SAOS em

    60% (Muntz et al 2008 e MacLean et al 2009b), no se observou correlao positiva

    entre qualquer tipo de fissura e a qualidade do sono. Contudo, um dado nos chamou

    a ateno: 91% dos pacientes com fissura ps-forame incisivo apresentavam baixa

    qualidade do sono, aferida pelo IQSP, contra 59% e 56% dos pacientes com fissura

    transforame e pr-forame incisivo, respectivamente. Apesar do percentual

    expressivo, no foram detectadas diferenas estatsticas, devido ao n reduzido, de

    apenas 11 pacientes com este tipo de fissura. Ademais, no temos uma explicao

    plausvel para esta porcentagem to elevada quando comparada, por exemplo,

  • Discusso

    84

    fissura transforame que pode atingir o palato com a mesma magnitude que a

    primeira e que est associada a um maior grau de obstruo nasal (Fukushiro e

    Trindade 2005). Uma possvel justificativa para este resultado talvez seja um maior

    estreitamento da faringe nos pacientes com fissura ps-forame, dado este a ser

    investigado em futuro prximo, por meio de exame de tomografia volumtrica.

    Em suma, o desenvolvimento do presente estudo permitiu verificar, no

    aspecto metodolgico, que os questionrios se mostraram instrumentos de fcil

    aplicao, permitindo obter um panorama geral da qualidade de sono na populao

    estudada. Os resultados evidenciaram que parcela considervel (62%) da populao

    avaliada apresentou qualidade do sono ruim e que um tero apresentou alto risco

    para apneia do sono, dados estes principalmente relacionados a sobrepeso ou

    obesidade e presena de retalho farngeo. Apesar de no comprovada

    estatisticamente, os resultados fazem possam ser fatores predisponentes para

    apneia obstrutiva do sono, o que dever ser objeto de investigao em estudos

    subsequentes.

    Por fim, sugere-se ampliao do estudo para outras faixas etrias de modo a

    possibilitar uma caracterizao mais ampla da qualidade do sono nos indivduos

    com fissura labiopalatina, combinado com o exame de polissonografia nos casos

    indicativos de alterao na qualidade de sono, detectada pelos questionrios aqui

    empregados.

  • 6 CONCLUSES

  • Concluses

    87

    6 CONCLUSES

    Frente aos resultados obtidos, com o uso do ndice de Qualidade de Sono

    de Pittsburgh, da Escala de Sonolncia de Epworth e do Questionrio de Berlin,

    possvel concluir que:

    1) Parcela considervel dos pacientes com fissura de lbio e palato

    includos no estudo apresentou qualidade do sono ruim, alguns dos

    quais tambm apresentaram alto risco para apneia do sono;

    2) A presena do retalho farngeo e o ndice de massa corprea elevado,

    associados s repercusses anatomofuncionais decorrentes da fissura

    labiopalatina, parecem ter sido os fatores predisponentes para apneia

    obstrutiva do sono, na amostra analisada. Por outro lado, fatores como

    tipo de fissura, sexo, padro oclusal e cirurgias prvias

    ortogntica/nasal no demonstraram relao com os achados.

  • REFERNCIAS

  • Referncias

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