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I
EDUCAÇÃO FÍSICA E PSICOMOTRICIDADE
UM ELO NO DESENVOLVIMENTO CORPORAL DA CRIANÇA
RAQUEL FORNEIRO PEREIRA
ORIENTADOR: PROF. Ms. NILSON GUEDES DE FREITAS
RIO DE JANEIRO AGOSTO/2002
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
Trabalho monográfico apresentado comocondição prévia para a conclusão do Cursode Pós-Graduação “Lato Sensu” emPsicomotricidade.
RIO DE JANEIRO AGOSTO/2002
EDUCAÇÃO FÍSICA E PSICOMOTRICIDADE
UM ELO NO DESENVOLVIMENTO CORPORAL DA CRIANÇA
RAQUEL FORNEIRO PEREIRA
Agradeço a Deus por me abençoar a cada dia eme permitir vencer mais esta etapa, à minha avóEliete e ao meu filho Ruan pelo amor e dedicação;e ao meu professor Nilson por sua orientação eincentivo.
RESUMO
A realização deste trabalho possibilita uma reflexão sobre a
Educação física e sua relação com a Psicomotricidade no âmbito escolar; como
elas interagem e contribuem no desenvolvimento da criança, que lugar ocupam
hoje dentro do processo educativo, de que maneira são reconhecidas pelos
profissionais da área e por outros profissionais da educação e qual o seu real
valor. O desenvolvimento e aprendizagem somente se tornarão significativos,
quando o objetivo do trabalho estiver de acordo com as necessidades e
interesses das crianças, sendo respeitadas e valorizadas as diferenças
individuais, em um ambiente que oportune a experimentação, a livre expressão
e criação. Fazer um elo da Educação física com a psicomotricidade no âmbito
escolar, é garantir as crianças vivenciar as atividades com liberdade de poder
manifestar-se quanto aos seus desejos, interferindo no processo e não
simplesmente realizando movimentos mecanizados e, além disso, é investir na
criança e em todas as suas possibilidades de atuação, valorizando seus
aspectos: cognitivo, afetivo, social e motor.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 07
CAPÍTULO I
Educação Física e sua abordagem histórica (o preconceito
ainda existe) 11
1.1. Lúdico: considerando a importância do brincar e do
brinquedo 15
1.2. A criatividade e o desejo da criança 24
CAPÍTULO II
Psicomotricidade e algumas abordagens 29
2.1. Alguns elementos psicomotores e seus conceitos 33
2.2. Corpo e movimento 41
2.3. Educação Musical: contribuindo no desenvolvimento
psicomotor da criança, de sua personalidade e suas
formas de relação 46
2.4. A importância do relaxamento e da respiração no
desempenho das atividades 50
CAPÍTULO III
Breve visão geral do processo de desenvolvimento da
criança 52
3.1. Desenvolvimento e capacidades físico-motoras 54
3.2. Desenvolvimento e capacidades percepto-cognitivas 57
3.3. Desenvolvimento e capacidades sócioafetivas 61
3.4. Desenvolvimento psicossexual 64
CAPÍTULO IV
Educação Física e Psicomotricidade no cotidiano escolar 67
4.1. Ginástica 69
4.2. Dança 70
4.3. O jogo e o esporte: agentes socializadores 72
CONCLUSÃO 76
BIBLIOGRAFIA 77
ANEXOS 79
INTRODUÇÃO
O desenvolvimento corporal da criança se dá em conjunto com os
desenvolvimentos cognitivo e afetivo/emocional, sendo esta uma divisão
didática. Na prática, o indivíduo apresenta estes desenvolvimentos
entrelaçados. Por isso, as atividades psicomotoras ou de educação física são
sempre resultados de um planejamento em equipe, integrado as demais áreas.
A descoberta do corpo, de suas sensações, de seus limites e
movimentos é de fundamental importância para a criança da educação infantil,
pois, nesta fase, ela está construindo sua imagem corporal. Para isso, ela
precisa descobrir seu corpo e também o corpo do outro. As atividades
psicomotoras são essenciais nesta construção, porque, brincando e explorando
o espaço, ela se organiza, tanto nos aspectos motor e sensorial, como no
emocional, ampliando assim, seus conhecimentos de mundo. Neste momento,
a linguagem corporal é a forma de comunicação mais utilizada pela criança.
Na Educação Infantil começamos a exploração intensa do mundo,
das sensações, das emoções, ampliando estas vivências com movimentos
mais elaborados. A linguagem corporal começa, então, a ser substituída pela
fala e pelo desenho, no entanto, é essencial que continue sendo explorada. O
trabalho com movimentos e ritmos, de grande relevância para a organização
das descobertas feitas, torna-se mais sofisticado. Nesta etapa, a atenção é
voltada para o desenvolvimento do equilíbrio e de uma harmonia nos
movimentos.
Aprender a controlar a musculatura e também os pensamentos e
desejos, contendo-se num momento intenso ou mesmo se colocando em
movimentos em instantes de maior dificuldade, são atividades importantes para
que a criança entenda seu corpo e possa fazer o uso adequado dele.
Todos os dias, no trabalho de Educação Física, acontecem grandes
aventuras exploratórias como: percursos com diferentes objetivos, trabalhando
a movimentação, o equilíbrio estático ou dinâmico e a organização espacial, e
jogos que buscam trabalhar a lateralidade, a coordenação viso-motora e a
percepção.
Aos poucos, são introduzidos jogos que visam a melhorar as
relações sociais, podendo ser realizados, inicialmente, em duplas e,
gradativamente, acrescidos de um número maior de componentes, formando
então, um grupo. Também, neste momento, são executados jogos com regras
bem simples no início, buscando ampliar, ao máximo, as situações vividas.
Não menos importante é o trabalho de sensibilização e
discriminação visual, auditiva e tátil, que contribui, também, para a construção
da imagem corporal.
A partir dos seis anos de idade, as crianças são estimuladas a
construir regras e jogos em equipe, concomitantemente com um trabalho de
expressão corporal mais estruturado, e com um trabalho psicomotor que se
estende até a 4ª série.
Os jogos no Ensino Fundamental já são, em sua maioria, coletivos,
com o intuito de buscar a construção não apenas de duplas ou grupos, mas de
equipes. Inicialmente, esses jogos e suas regras são construídos junto com o
grupo, que, aos poucos, inicia um trabalho de pesquisa sobre jogos já
existentes dia-a-dia na prática como: futebol, queimado, vôlei etc. A
organização destas atividades, a gradação das regras que serão adotadas,
bem como o seu desenvolvimento, também exigido durante a atividade, são de
responsabilidade dos alunos que, assim, vão desenvolvendo autonomia e
valoras.
A partir da classe de alfabetização, as aulas de Educação Física
mesclam alunos de diferentes idades, permitindo que cada um participe de
acordo com sua característica, buscando o grupo mais adequado às suas
necessidades.
Neste segmento, dando continuidade a algo que já se inicia na
Educação Infantil, a Educação Física enfatiza junto com a psicomotricidade,
jogos e atividades que propiciem a construção de uma ação cidadã. Cada
esporte, cada modalidade, cada brincadeira e aspecto cultural abordado e
aplicado na prática, estará sempre levando em conta o aspecto social e o
desenvolvimento corporal da criança.
Torna-se necessário então, conhecer o que é psicomotricidade, o
que é educação física e como elas interagem no processo de desenvolvimento
da criança. Nesta busca do saber mais e aplicar este saber nas aulas de
educação física, sabemos que temos de tratar a criança de acordo com a sua
fase, faixa etária e suas necessidades reais. Conhecer as fases de
desenvolvimento da criança, que tipo de atividades devem ser aplicadas e o
que de fato é importante para a criança, é o primeiro degrau para a formação
de uma criança desenvolvida e bem mais feliz.
Por esta razão, o trabalho inicia-se falando sobre a educação física e
sua abordagem histórica, como ela era vista e a atual posição que se encontra
nas escolas, conquistando seu espaço e ainda enfrentando preconceitos.
Neste capítulo 2, também são considerados alguns fatores indispensáveis no
processo de desenvolvimento da criança, como: a importância do brincar e do
brinquedo ao proporcionar o lúdico e estimular a criatividade, assim como o
desejo da criança.
Num outro momento, é apresentado no capítulo 3, a abordagem da
psicomotricidade, como ela surgiu, os diferentes conceitos e elementos que
envolve em sua prática nas diferentes áreas de atuação e o seu objetivo de
estudo, enquanto área de conhecimento, voltado para sua unidade e
especificação de trabalho, que é o corpo e sua expressão dinâmica
fundamentado no movimento, no intelectivo e no afeto do ser humano, que
podem também contribuir na formação de sua personalidade e de suas formas
de relação.
Para tentar entender como acontece o processo de desenvolvimento
da criança, o trabalho apresentará detalhadamente no capítulo 4, as diferentes
fases da criança, o que ela precisa, deseja, quais são as suas possibilidades
na infância e como elas desenvolvem suas capacidades físico-motoras,
percepto-cognitivas, sócio-afetivas e psicossexual.
E por fim, no capítulo 5 mostrará a relação da educação física com a
psicomotricidade, como elas interagem e atuam no cotidiano escolar e algumas
das diferentes propostas de atividades que podem ser aplicadas nas aulas de
educação física como: ginástica, dança, jogos e esportes, contribuindo no
comunicar, no pensar, no sentir e no agir da criança.
CAPÍTULO I
EDUCAÇÃO FÍSICA E SUA ABORDAGEM HISTÓRICA
(O PRECONCEITO AINDA EXISTE)
O mundo em que vivemos sofre constantes transformações.
Sociedades se modificam à medida que os valores são alterados, de acordo
com a evolução dos tempos.
Com isso torna-se necessário que o ser humano esteja
constantemente se aperfeiçoando como indivíduo e como ser social, para
poder se inter-relacionar com este mundo transitório, em todos os aspectos de
caráter sócio/político/econômico/cultural, buscando dessa forma melhorar sua
qualidade de vida, fator mais essencial à sua humanização.
Através desta dinâmica evolutiva podemos considerar a Educação
Física, enquanto área do conhecimento, elemento fundamental no processo de
desenvolvimento do homem, influindo direta e favoravelmente na sua formação
integral.
O homem não nasceu pulando, saltando, jogando. Todas essas
atividades corporais foram construídas em determinadas épocas históricas,
como respostas a determinados estímulos, desafios ou necessidades
humanas. Para garantir sua subsistência e adaptar-se as condições do meio
ambiente, o homem primitivo possuía muitas qualidades físicas. Para poder
sobreviver estava constantemente exercitando-se, com isso aprendeu
naturalmente a caçar, pescar, nadar, construir, lutar, defender-se, exercícios
úteis que lhe permitiam satisfazer suas principais necessidades, impostas na
sua relação com a natureza e com os outros homens.
Assim, como os exercícios físicos, os jogos e as danças já faziam
parte da vida do homem e eram praticados de diferentes formas: jogos de
mímica, de lutas, danças guerreiras ou religiosas. Sem saber, o homem
descobria maneiras de exteriorizar seu estado de espírito, seus sentimentos.
Ao longo dos tempos, ele foi se agrupando, constituindo pequenos povos, que
por sua vez, foram se transformando em diferentes civilizações, cada qual
originando sua própria cultura. A utilização do corpo também modificou-se em
função de novas necessidades do seu meio de convivência.
No Brasil, os valores da sociedade são usualmente estabelecidos
por uma classe dominante minoria privilegiada que de certa forma controla e
domina as manifestações dos indivíduos, da massa popular. É esta forma de
dominação exercida por aqueles que detêm o poder, basicamente estruturada
em favor de seus próprios interesses e privilégios, que acaba influenciando a
consciência geral. Esse fato se verificou na década de 70, quando presenciou-
se a existência de um regime autoritário de poder: a Ditadura Militar.
Em função desta nova perspectiva política, o sistema educacional foi
totalmente reformulado, e a partir daí, as conseqüências desta reforma
desencadearam inúmeras mudanças em nossa sociedade. Se por um lado o
Regime Militar favoreceu a expansão da Educação Física, pois houve um
aumento significativo de suas escolas, por outro, a qualidade do ensino ficou
seriamente comprometida. Principalmente devido ao comportamento dos
professores e profissionais da área que, influenciados pelas características da
política educacional vigente, e com uma postura totalmente autoritária,
apresentavam uma forte tendência em valorizar o rendimento físico, a perfeição
e o domínio dos movimentos adquiridos através da aplicação de métodos
rígidos de automatização e adestramento, para se atingir uma melhor
performance nas atividades.
Nos tempos atuais, apesar de muitos progressos obtidos no setor
educacional, através de inúmeros movimentos, debates, discussões e
realizações, a Educação Física ainda necessita de mudanças. Sobretudo no
sentido de convencer a sociedade e até mesmo todo o corpo docente,
constituído por profissionais de outras áreas, quanto ao seu real valor,
contribuindo para a melhoria da qualidade de vida e do desenvolvimento do
indivíduo, por meio de uma educação relevante, responsável e realmente
comprometida com o momento histórico evolutivo.
O ato de aprender a Educação Física não se limita apenas à
execução mecânica do exercício motor, mas constitui-se em atividade
relacionada ao cotidiano da criança. à ludicidade e ao lazer. Considerando que
a criança se apropria de noções de conhecimento à medida que age
(cognição), observa e se relaciona com o mundo, é enfrentado desafios e na
troca constante de informações com outras crianças e com os adultos que ela
se desenvolve.
A Educação Física deve ajudar a criança a criar situações,
experimentar desafios e desequilíbrios, auxiliando-a na ação consciente,
verificando suas hipóteses, sem jamais pretender substituir a sua verdade pela
verdade do adulto. Além disso, deve garantir a afetividade do desenvolvimento
infantil, para a busca da autoconfiança, livre expressão e iniciativa, sendo um
coadjuvante nos prováveis medos existentes. Portanto, faz-se necessário
valorizar junto à criança, uma auto-imagem positiva, pelo trabalho de aceitação
e convivência com as inúmeras diferenças existentes entre os mais variados
grupos de suas relações sociais.
O lazer por suas características: a espontaneidade, a ludicidade, a
livre escolha e o caráter relativamente desinteressado, deve ser incorporado ao
cotidiano da criança tornando-se um espaço privilegiado para a aquisição de
informações e conhecimentos, para a vivência da cultura e para o seu
crescimento pessoal e social.
Voltando à Educação Física, considera-se um absurdo as
obrigatoriedades impostas pela escola muitas vezes desvinculadas da
realidade de vida da criança, pois a mesma passa seis ou sete anos brincando
e aproveitando em total harmonia, interagindo com os outros, com a natureza e
suas transformações. Hoje, a proposta é de fato, promover o lazer, através da
alegria e da brincadeira, considerando o vasto conhecimento da cultura infantil,
repleta de significados, historicamente elaborados e muitas vezes ignorados.
A educação, no aspecto global, exige de todos os seus profissionais
uma reflexão sobre os valores culturais, sobre a influência e a importância que
cada disciplina transmite para a construção do conhecimento, desenvolvimento
e formação do indivíduo na sociedade. Mesmo assim, observa-se que o
preconceito ainda existe dentro das escolas. A educação física muitas vezes
fica colocada de lado, quando não é aplicada apenas como momento de
recrear, momento livre, sem objetivo e onde nada acontece. O corpo docente
que envolve profissionais de outras áreas, ainda adota estratégias de punição
aos seus alunos, excluindo-os das aulas de Educação Física, caso eles não
cumpram com as propostas dadas. É preciso que se desenvolva nesses
profissionais a consciência do erro que estão cometendo.
Os currículos escolares deverão ter seus conteúdos compatíveis
com as experiências vividas pelo aluno, assim como a integração dos
professores ao incluir conscientemente a educação física em suas disciplinas,
pois a educação física é uma disciplina transformadora em potencial, onde a
atividade intelectual e a atividade corporal não se confrontam, mas se
harmonizam, de forma a melhor integrarem o ser humano (o aluno) no seu
relacionamento intrapessoal e interpessoal, na organização de suas emoções e
na descoberta do seu mundo.
Existem ainda hoje profissionais que ao desconhecer a importância
da educação física, evidenciam o autoritarismo, inibem e bloqueiam o
educando, enchendo de tarefas tradicionais, para que não sobre tempo nem na
escola e nem em casa de praticarem a atividade física, gerando neste, um
intenso sentimento de inadequação e comprometendo a construção da
personalidade, das opiniões e da sua relação com o mundo.
A escola é uma instituição social onde a criança passa a maior parte
do seu dia e, portanto, deve ser ela a proporcionar para seus alunos a
integração de todo conhecimento que eles receberem: a nível corporal, mental,
emocional e social, ou seja, trabalhando o aluno como um ser
multidimensional, onde a sua motricidade interage de forma complexa com as
capacidades cognitivas, sociais e afetivas, e é justamente nas aulas de
educação física, onde o lúdico prevalece, que são criadas oportunidades para a
criança se aperfeiçoar e desenvolver os movimentos naturais e aprendidos.
1.1. LÚDICO: CONSIDERANDO A IMPORTÂNCIA DO
BRINCAR E DO BRINQUEDO
É difícil tentar falar a sério sobre alguma coisa que é tão
desconsiderada desse ponto de vista. O que ocorre é que o lúdico vem sendo
negado, exatamente pelas suas características, em nome da produtividade da
sociedade moderna como um todo. Restrito à criança, até mesmo no âmbito
infantil começa a ser negado, cada vez, mais precocemente na sociedade
moderna, em nome da necessidade de preparação para o futuro, e o mesmo
acontece nas salas de aula.
Viver o lúdico é viver o momento, o presente, o agora. E esse não
representa o passado ou a preparação para o futuro.
Segundo Huizinga,
“a atividade lúdica, entre outras características, tem um poder muito grande
de fascinar aqueles que com ela se envolvem, sendo desligada de interesses e praticada
dentro de limites espaciais e temporais”.
(Huizinga, 1971, p. 110)
A partir do potencial lúdico, através de brincadeiras e jogos, a
criança vai estruturando e construindo seu mundo interior e exterior que,
apesar de se manterem individualizados deverão estar sempre
interrelacionados na busca de maior e mais harmônica interação com o
ambiente. Através de uma brincadeira de criança, podemos compreender como
ela vê e constrói o mundo, como ela gostava que fosse, quais as suas
preocupações e que problemas a estão assediando. Pela brincadeira, ela
expressa o que teria dificuldades de traduzir com palavras. É necessário
considerar sempre o brincar como um ato de grande importância, que
oportuniza à criança a escolha entre os múltiplos tipos de brinquedos e as
brincadeiras que ajudam a criança, estruturar a capacidade de raciocínio e
adquirir flexibilidade no contato com o mundo, dando asas à fantasia e à sua
criatividade.
Liberman afirma que,
“o lúdico é um traço da personalidade que persiste da infância até a juventude e idade adulta, com função muito importante no estilo cognitivo dos indivíduos”.
(Liberman, 1978, p. 5)
O lúdico parece, de fato, ser um traço da personalidade ou ter uma
influência marcante na sua construção. As manifestações lúdicas do indivíduo
sofrem bloqueios, com péssimas conseqüências na sua vida de relação, na sua
alegria, senso de humor e espontaneidade.
Esses componentes lúdicos ficam comprometidos quando a pessoa
sofre uma interferência negativa, desvios na personalidade, sendo necessárias,
em alguns casos, intervenções ludoterápicas, através das quais busca-se levar
a pessoa a entrar em harmonia consigo mesma e com o mundo.
A brincadeira pode ser considerada como um meio pelo qual a
criança efetua suas primeiras grandes realizações, que através do prazer, ela
expressa a si própria e as suas emoções e fantasias.
Há uma estreita ligação entre o brincar e a fantasia da criança. A
fantasia lúdica, aborda questões relativas à necessidade que a criança tem de
usar a brincadeira para entender o que acontece a sua volta.
São por vezes, sentimentos sobre os quais a própria criança
permaneceria ignorante, ou sob quais estaria esmagada se não lidasse com
eles exprimindo-os sob a forma de fantasia lúdica.
O brincar, numa perspectiva sociocultural, define-se por uma
maneira que as crianças tem para interpretar e assimilar o mundo, os objetos, a
cultura, as relações e o afeto das pessoas. Por causa disso, transformou-se no
espaço característico da infância para experimentar o mundo adulto sem
riscos, como participante responsável.
Nessa perspectiva, o brincar é, ao mesmo tempo, espaço de
constituição infantil e lugar de superação da infância, pela relação que
estabelece com a representação e o trabalho adulto. É uma forma de atividade
sócio infantil, cujo aspecto imaginativo e diverso do significado cotidiano da
vida, fornece uma oportunidade educativa única para as crianças. Na
brincadeira, as crianças podem pensar e experimentar situações novas ou
mesmo do seu cotidiano, isentas das pressões situacionais. No entanto, é
importante ressaltar que, a brincadeira também pode ser o espaço de
reiteração de valores retrógrados, conservadores, com as quais a maioria das
crianças se confronta diariamente. A contradição dessa atividade só pode ser
encontrada e resolvida a partir de uma decisão pedagógica e objetiva sobre os
caminhos que se quer ampliar para as crianças.
A brincadeira traz vantagens sociais, cognitivas e afetivas na medida
em que ela, junto com o brinquedo, forneça estrutura básica para as mudanças
das necessidades e da consciência. E a partir daí, a ação na esfera
imaginativa, numa situação imaginária, a criação das intenções voluntárias e
formação dos planos de vida real e motivações volitivas, tudo aparece no
brinquedo, que se constitui no mais alto nível do desenvolvimento.
Nenhuma criança brinca para passar o tempo como, muitas vezes, o
adulto imagina e, justamente por não saber interpretar o brincar da criança e
fazer uma leitura de suas manifestações lúdicas, o adulto perde a grande
oportunidade de penetrar no seu mundo e compreender o verdadeiro sentido
de brincar.
“O sonho é a entrada real para o inconsciente e isso se aplica tanto a adultos quanto às crianças. Mas a brincadeira é a estrada real para o mundo consciente e inconsciente da criança: se quisermos entender seu mundo interno e ajudá-lo, precisamos aprender a andar nessa estrada”.
(Bettelheim, 1987, p. 165)
A criação de uma situação imaginária na vida da criança, é a
primeira manifestação de sua emancipação em relação a restrições
situacionais. O primeiro paradoxo contido no brinquedo é que a criança opera
com um significado alienado numa situação real. O segundo é que, no
brinquedo, a criança segue o caminho do menor esforço, ela faz o que mais
gosta de fazer, porque o brinquedo está unido ao prazer e, ao mesmo tempo,
ela aprende a seguir os caminhos mais difíceis, subordinando-se a regras, e
por conseguinte, renunciando ao que ela quer, uma vez que a sujeição às
regras e a renúncia à ação impulsiva constitui o caminho para o prazer no
brinquedo.
Continuamente a situação do brinquedo exige que a criança aja
contra o impulso imediato. A cada passo a criança vê-se frente a um conflito
entre as regras do jogo e o que ela faria se pudesse, de repente, agir
espontaneamente. No jogo, ela age de maneira contrária à que gostaria de
agir.
Segundo Vygotsky,
“o maior alto controle da criança ocorre na situação de brinquedo. Ela mostra o máximo de força de vontade quando renuncia a uma atração imediata do jogo”.
(Vygotsky, 1989, p. 113)
Assim, o atributo essencial do brinquedo é que uma regra torna-se
um desejo e uma idéia que se tornou um desejo, um conceito que se
transformou numa paixão, encontram seu protótipo no brinquedo, que é o reino
da espontaneidade e liberdade. Satisfazer as regras é uma fonte de prazer. A
regra vence porque é o impulso mais forte. Tal regra é uma regra interna, uma
regra de autoconcentração e autodeterminação, e não uma regra que a criança
obedece à semelhança de uma lei física.
O brinquedo cria na criança uma forma de desejo. Ensinar a desejar,
relacionando seus desejos a um eu fictício, ao seu papel no jogo e suas regras.
Dessa maneira, são as maiores aquisições que no futuro tornarão seu nível
básico de ação de moralidade.
A brincadeira pode transformar-se, assim, em espaço privilegiado de
interação e confronto de diferentes pontos de vista. Nessas interações, elas
buscam resolver no nível simbólico, a contradição entre a liberdade e a
brincadeira e a submissão as regras por elas mesmas estabelecidas,
determinando os limites entre a realidade e os seus próprios desejos, além de
desenvolver o autocontrole.
Vygotsky diz que,
“a aprendizagem resulta no desenvolvimento das funções superiores, mediante a apropriação e internalização de signos e instrumentos num contexto de interação. A aprendizagem humana pressupõe uma natureza social específica e um processo mediante o qual as crianças tem acesso à vida intelectual e afetiva daqueles que o rodeiam”.
(Vygotsky, 1984, p. 115)
Portanto, a brincadeira é situação privilegiada de aprendizagem
infantil. Ao brincar, o desenvolvimento infantil pode alcançar níveis mais
complexos, por causa das possibilidades de interação entre os pares numa
situação imaginária, e pela negociação de regras de convivência e de
conteúdos temáticos. A experiência na brincadeira permite às crianças: decidir
incessantemente e assumir papéis a serem representados; atribuir significados
diferentes aos objetos transformando-os em brinquedos, levantar hipóteses,
resolver problemas e pensar/sentir sobre seu mundo mais amplo ao qual não
teriam acesso ao seu cotidiano. E, por essa razão, a brincadeira também cria
para as crianças uma “zona de desenvolvimento proximal”, que não é outra
coisa senão a distância entre o nível atual de desenvolvimento, determinado
pela capacidade de resolver independentemente um problema ou com a ajuda
de outrem sob a orientação de um adulto ou com a colaboração de um
companheiro mais eficaz. Além disso, ela possui três características: a
imaginação, a imitação e a regra. Essas características estão presentes em
todos os tipos de brincadeiras infantis, sejam elas tradicionais, de faz-de-conta,
de regras, e podem aparecer também no desenho, como atividade lúdica.
Cada uma dessas características pode aparecer de forma mais
evidente em um tipo ou outro de brincadeira, tendo em vista a idade e a função
específica que desempenha junto às brincadeiras, já que, estas, são
aprendidas pelas crianças de todas as idades, nas relações que estabelecem
com parceiros mais experientes da mesma idade, ou mais velhos, quando mais
crescidas.
O contato, manipulação e o uso dos brinquedos, por seu lado,
possibilita às crianças uma aprendizagem multidisciplinar das formas de se
pensar na sociedade. Os brinquedos são nesta perspectiva , objetos
socioculturais portadores de imagem, além das funções cognitivas e motoras.
Ao se apresentarem como uma produção do mundo adulto dirigido às crianças,
propõem a estas uma forma singular de ver e representar a realidade, assim
como, trazem em si uma concepção de infância.
Segundo Brougére,
“um brinquedo é a realidade e uma forma de representar. Entendidos dessa maneira, os brinquedos, sejam industrializados ou artesanais, constituem-se em mediadores das crianças, facilitando a construção dos papéis sociais e dos sistemas de representação, através de sua utilização nas brincadeiras”.
(Brougére, 1995, p. 15)
Dessa forma, a brincadeira poderá configurar-se como espaço de
diagnóstico dos interesses e necessidades, transformando-se em espaço de
experimentação e estabilização entre as crianças e adultos, possibilitando a
criação de um vínculo com o trabalho nas diferentes áreas do conhecimento.
O brincar, sob o ponto de vista pedagógico, pode ser ainda
entendido como atividade que proporciona um exercício, simbólico cultural com
objetos, pessoas e todo o meio que circunda a criança, num movimento de
significação e ressignificação da realidade.
Lima acrescenta,
“hoje há unanimidade em que brincar tem função essencial no processo de desenvolvimento da criança, principalmente nos primeiros anos de vida, nos quais ela tem de realizar a grande tarefa de compreender e de inserir em seu grupo, constituir a função simbólica, desenvolver a linguagem, explorar e conhecer o mundo físico”.
(Lima, 1991, p. 19)
A criança que brinca abre seu canal de possibilidades e
potencialidades através das relações que estabelece durante esta atividade.
Com isso, vai construindo as normas sociais que regem o comportamento
humano: vai adquirindo valores e crenças da sua cultura, vai desenvolvendo
sua capacidade de usar a linguagem e, fundamentalmente, vai reunindo todos
esses avanços para a construção, dentre outras coisas, do seu imaginário, que
é fruto das influências individuais e grupais. Além disso, a movimentação em
torno do brincar facilita a incorporação, por parte da criança, dos jogos e dos
papéis que regem as atividades humanas.
Gradativamente, a criança vai delineando que formas de
comportamento envolvem sentimentos, ações etc., e são elas que traçam o
perfil de cada ser humano no contexto social.
Tanto na prática, quanto na teoria, as manifestações lúdicas e o
potencial criativo do ser humano como brincar, aparecem relacionados à
grande criatividade é a fantasia da criança.
Para Winnicott, a relação entre a manifestação lúdica e o potencial
criativo, se vê sob o brincar como uma experiência criativa indispensável ao
desenvolvimento integral do ser humano. Para ele, a criança manifesta a sua
criatividade através do brincar e busca descobrir o seu eu, usando a
imaginação, a criatividade. Ele afirma que,
“é no brincar, que a criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral e, é somente sendo criativo, que o indivíduo descobre o seu eu”.
(Winnicott, 1975, p. 80)
A liberdade de criação e o brincar estão diretamente associados,
embora não ocupem o mesmo espaço. Pois o brincar localiza-se numa terceira
área que contrasta com a realidade psíquica e com o mundo real do indivíduo.
Ser criativo requer a capacidade de relacionar-se com a realidade externa,
rompendo com o preestabelecido, com o estereotipado, de maneira sadia, na
busca de novos caminhos, alternativas e soluções do dia-a-dia. E nesse
momento, é através das manifestações lúdicas que a criança deixa fluir sua
criatividade, sua capacidade de reinventar a realidade.
No desenvolvimento da criança, pode-se afirmar que não é possível
separar o lúdico da criatividade e vice-versa. Parece que uma criança com
dificuldade de brincar terá dificuldade também para criar. Sua liberdade de
criação estará comprometida na medida em que as manifestações lúdicas são
bloqueadas. É importante que o ambiente favoreça a manifestação lúdica na
criança, no sentido de não limitar, não castrar, não dominá-la evitando-se que
se torne um adulto frustrado e infeliz, sem garra para romper a mesmice, com
padrões preestabelecidos.
A criatividade, assim como a brincadeira e o jogo, é a manifestação
lúdica, a mais significativa talvez, justamente pelo compromisso direto com o
novo, com a ruptura de padrões e posturas racionarias ultrapassadas e
cristalizadas de mentes fechadas às mudanças, às transformações que
poderiam levar o ser humano a atingir seu grau máximo de educação. É
através da percepção criativa, mais do que qualquer outra coisa, que o
indivíduo sente que a vida é digna de ser vivida. Em contraste, existe um
relacionamento de submissão com a realidade externa, onde o mundo em
todos seus pormenores é reconhecido apenas como algo a ajustar-se ou a
exigir a adaptação.
São vários os autores que consideram os brinquedos muito
importantes, porque são facilitadores das brincadeiras e servem de estímulos
ao comportamento lúdico, sendo por isso, instrumento para a construção da
realidade infantil através da experimentação, proporcionando a aprendizagem
do desenvolvimento da criança. O brinquedo é a maneira correta de viabilizar a
passagem da criança do mundo imaginário para a vida prática, através do faz-
de-conta, colocando para fora suas emoções começando a desenvolver todo
um processo de organização mental e de estrutura, que lhe será útil no futuro
quando irá abstrair isso para a sua vida prática.
Quando se utiliza de brinquedos é porque a criança sente prazer em
brincar e, nesse sentido, o brincar é universal, facilita o crescimento e portanto
a saúde, conduz a relacionamentos grupais, é a forma de comunicação consigo
mesmo e com os outros, tem lugar e um tempo muito especial, não sendo algo
só de dentro, subjetivo, interno ou de fora, objetivo, externo mais se
constituindo justamente num espaço potencial entre o “Eu e não Eu”, entre o
mundo interno e externo, que justamente vão se formando a medida em que o
brincar se desenvolve de forma criativa, prazerosa e original.
Entende-se por fim, que os brinquedos são instrumentos através dos
quais, a criança vivencia sua natureza lúdica, dando-lhe significado, elaborando
e interpretando o mundo. Brincar para a criança é dar vazão a sua fantasia e a
todos os seus impulsos. É a sua própria vida.
1.2. A CRIATIVIDADE E O DESEJO DA CRIANÇA
O nosso sistema educacional está voltado ainda para a reprodução
de movimentos e conhecimentos, ao invés de preparar o aluno para a
produção de novas idéias e de conhecimentos. Mesmo sabendo que a
prioridade deve ser dada ao espaço para a fantasia, para a imaginação e
criatividade, isso não vem ocorrendo. Diante das pressões sociais, as crianças
vêm sendo trabalhadas e orientadas a aprender e repetir conteúdos
tradicionais.
Levando para o lado da atividade motora expontânea, a porta aberta
à uma criatividade sem fronteira, se caracteriza como sendo a expressão livre
das pulsões ao nível imaginário e simbólico, ao desenvolvimento livre da
comunicação e expressão corporal.
Colocar à disposição das crianças diferentes tipos de objetos e
observar a forma como elas os utilizam, ou estimular movimentos e observar
como eles se sentem e se descobrem até para produzir um novo movimento, é
uma contribuição muito rica e progressiva de ensinamentos para o
desenvolvimento da criança, porque as situações assim espontaneamente
criadas, ordenam-se freqüentemente em torno de um assunto, consciente ou
inconsciente, que é necessário perceber e explorar, penetrando assim nas
motivações e criatividade do grupo.
O desejo profundo da criança é de ser dona de seus atos,
verdadeiramente livre, não julgada e não submetida afetivamente ao desejo do
adulto. Vastos campos de atividade devem ser deixados para que ela aí crie e
exprima com toda a liberdade sem coação educativa. Deve ser permitida à
criança, explorar sozinha elementos (sons, materiais, objetos, temas) e os
movimentos Dom próprio corpo, desenvolvendo suas buscas, necessidades e
sua criatividade.
É somente nessas condições que a expressão, a emoção, o
movimento e o aprendizado se tornam autênticos, livres, espontâneos,
sincréticos; que as atitudes de inibição e de oposição às propostas
desaparecem e que a criança pode assumir seu desejo, buscar e fazer com
prazer, com dinamismo, alegria e criatividade.
A atividade motora espontânea é vivida no presente, um presente
que evolui a modificar-se sem cessar, colocando em questão o passado, e
preparando um futuro que é, ele próprio, evolução constante através de uma
seqüência de presentes. Por isso, a atividade espontânea é a base da
criatividade, dessa busca constante do novo e do diferente. Mas, percebe-se
que em certos momentos esse movimento perpétuo imobiliza-se na busca de
uma estrutura, de uma certa permanência. Essa permanência é uma tentativa
de projeção do presente no futuro, que com o passar Dom tempo irá solicitar o
novo, que para acontecer, necessita do desenvolver da criatividade. Criar é
portanto, de início, responder a esse desejo de sobrevivência. É criar pára si
mesmo; só secundariamente a criação torna-se meio de comunicação, de
movimentação, e só depois de socializar-se, que o desejo de criar torna-se
desejo de criar para o outro.
A criança começa aprender e se desenvolver quando adquire
conhecimentos. Situações de aprendizagem desafiadoras geram no indivíduo a
necessidade interna básica de talvez, romper com seus próprios limites,
enquanto movimentos em busca do novo. Por vezes, essa experiência vem
acompanhada de sensações, sentimentos e emoções, com alegria e prazer, ou
dor, incômodo e conflito.
O processo criativo possibilita a criança realizar uma nova
combinação daquilo que já existe, sem que esta seja apenas uma
reorganização do velho, mas que possibilite efetivamente a emergência de uma
nova estrutura mental favorecendo na elaboração das habilidades cognitivas de
forma mais completa, levando-a a adaptar-se e a ser criativo na vida,
desenvolvendo-se a cada dia.
A partir do momento em que a criança descobre seu poder de agir,
seu poder de ação sobre seu corpo e, por intermédio desse corpo, sobre os
objetos e sobre o outro, ela quer exercer este poder. Seu desejo, então, não é
mais ser reconhecida como objeto, mas também como sujeito; sujeito que age
e é dono de seus atos.
Mas ela vai logo encontrar obstáculos, resistências, oposições;
resistência e oposição dos objetos e dos outros. Nesse momento, a criança
reage com uma agressividade que é simplesmente afirmação de seu desejo de
existir, de sua pulsão de vida. Passa a ser cada vez mais agressiva na medida
em que se opõe a outras vidas às quais deve disputar seu espaço e seus
meios de existência.
Quando surge esta agressividade primária, parte integrante da
pulsão de vida e movimento, deve ser respeitada e não culpabilizada pelo
adulto. Trata-se, não de destruí-la, o que teria por efeito destruir todo o
dinamismo, afirmação e desejo da criança, mas de orientá-la quanto aos seus
desejos e investimentos aceitáveis pela sociedade.
É preciso que a criança encontre desde cedo, a resistência do
objeto e do outro em relação aos seus desejos. A partir daí, ela poderá fazer a
experiência da oposição do real à realização de seus projetos, desejos, para
que aceite quando preciso, a limitação de seu poder e até mesmo a frustração.
Se as primeiras reações freqüentemente são reações de revolta
contra o fracasso, com agressividade nas atitudes; pouco a pouco, sob
condição de que o adulto não interfira nem para julgar, nem para ajudar,
demonstrar ou explicar, a criança aprenderá ter paciência e perseverança que
asseguram a serenidade do desejo através das dificuldades de sua realização.
Tão rápido elas abandonam uma tarefa imposta, como são capazes de
perseverar e tentar várias vezes num projeto que é realmente o que quer, a
expressão de seu próprio desejo. Da mesma forma que a criança se confronta
com as dificuldades do espaço, das circunstâncias, ela se confronta com o
outro e com o grupo, o que faz com que ela aprenda pouco a pouco os limites
de sua liberdade e de seus desejos em oposição à dos outros.
Ao lidar com a criança na escola, o educador deve ter
disponibilidade, paciência e um pouco de imaginação, para poder seguir com
sua proposta e orientar a imaginação, criatividade e desejo da criança, sem
frustrá-la e decepcioná-la.
Criar é basicamente formar. É poder dar uma forma a algo. É uma
necessidade vital, pulsional de todo ser humano.
O ato criativo abrange a capacidade de compreender, e esta, por
sua vez, a de relacionar, ordenar, configurar, significar. Se basta por ele
mesmo. É o significante e o significado que está expressando algo das
experiências afetivas mais íntimas do ser.
A expressão criadora permite à criança estar em relação com o que
está no mais profundo dela mesma e que é manifestado pela liberação dos
fantasmas sensoriomotores originais do corpo, suas descargas de prazer ou
desprazer, da sua história afetiva inconsciente. Essa comunicação
desencadeia um bem-estar sensorial tônico e afetivo que evolui para o prazer
de dar e partilhar.
A criação como a expressão favorecem a descentração por permitir
à criança afastar-se da sua produção. Ela olha essa produção do lado de fora,
como espectador, numa tomada de consciência que lhe permite evoluir ao
pensamento operatório.
CAPÍTULO II
PSICOMOTRICIDADE E ALGUMAS ABORDAGENS
A sociedade atual caracteriza-se pela tendência à reabilitação dos
valores corporais, pela transformação de costumes e de idéias. A nova geração
procura restituir o valor do corpo e a sua significação.
Esta importância dada ao corpo, pela nossa sociedade, vem se
refletir por meios dos movimentos artísticos contemporâneo, de teatro, da
dança e, sobretudo, por realizações inspiradas pela psicanálise.
Na psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem, toda obra de
Henri Wallon e de Jean Piaget colocava em evidência o papel da atividade
corporal no desenvolvimento das funções cognitivas. Wallon (1942, p. 18)
afirmava que, “o pensamento nasce para retornar a ele”. Piaget (1936, p. 12)
sustentava que, ”mediante a atividade corporal a criança pensa, aprende, cria e
enfrenta os problemas”.
Dupré colocou em evidência a síndrome da debilidade motora, ao
tratar, nos hospitais, crianças com dificuldades de movimentos. Segundo ele,
“existem estreitas relações entre as anomalias psíquicas e as anomalias motoras, considerando-as como expressão de uma solidariedade original e profunda entre o movimento e o pensamento".
(Dupré, 1900, p. 20)
A partir daí, a atividade motora e a atividade mental passaram a ser
vistas como atividades que estão em constante inter-relação, podendo uma
influenciar a outra, por meio de seus dois componentes sócio afetivo e
cognitivo.
A psicomotricidade justifica a sua existência em qualquer troca
induzida psicologicamente repercutida no aspecto corporal de pacientes e vice-
versa, quanto na condição verdadeiramente psicomotora do ser humano,
sobretudo até a idade de sete anos. Efetivamente, até a idade em que a
criança adquire o pensamento operatório concreto, que lhe dá acesso a
aprendizagem escolar, existe uma absoluta unidade entre a motricidade e a
inteligência, entre a ação e o pensamento.
O objetivo da psicomotricidade é o desenvolvimento das
possibilidades motoras e criativas do ser humano em sua globalidade, partindo
do seu corpo, levando a centralizar sua atividade e a procura do movimento e
do ato, incluindo tudo o que deriva dela própria: disfunções, patologias,
educação, aprendizagem e outros.
A psicomotricidade deve ser compreendida em sua integridade,
partindo de fenômenos que envolvem o desejar e o querer, já que ela consiste
na unidade dinâmica das atividade, dos gestos, das atitudes e posturas,
enquanto sistema expressivo, realizador e representativo do ser em ação e da
coexistência com outrem.
O corpo está presente em todas as situações e é solicitado a agir
com destreza em todos o momentos. É através do movimento, que o homem
participa do mundo, e através dele manifesta a própria intencionalidade. O ato
motor não é somente uma sucessão de impulsos psicológicos, mas sim o modo
de o indivíduo colocar-se em relação com o mundo externo, possibilitando
assim a expressão de uma imagem mental.
Alguns conceitos vem sendo desenvolvidos sobre a
psicomotricidade:
6 Psicomotricidade é uma ciência da educação e da saúde destinada a estudar, analisar, orientar todas as condutas do indivíduo: motoras, neuromotoras, perceptomotoras. Estimula a percepção e a consciência do corpo como lugar de sensação, expressão e criação.
6 É a integração das funções motrizes e mentais, sob o efeito do desenvolvimento do
sistema nervoso. Destaca as relações existentes entre a motricidade, a mente e a
afetividade das pessoas.
6 É uma ciência cujo objetivo de estudo é o homem através do seu corpo em
movimento, nas suas relações com seus mundos interno e externo.
Sendo assim, a psicomotricidade, como toda ciência, corresponde a
um objetivo de estudo próprio, do qual retira sua unidade e especificação, isto
é, o corpo e a sua expressão dinâmica, fundamentado em três conhecimentos
básicos:
O movimento, que segundo os conhecimentos atuais, ultrapassa o
ato mecânico e o próprio indivíduo, sendo a base das posturas e
posicionamentos diante da vida;
O intelectivo, que encerra a gênese e todas as qualidades da
inteligência do pensamento humano, seu desenvolvimento depende do
movimento para se estabelecer, desenvolver e operar.
O afeto, que é a própria pulsão interna do indivíduo, que matiza a
motivação e envolve todas as relações do sujeito com os outros, com o meio e
consigo mesmo.
Se realmente a psicomotricidade e quem trabalha com ela,
estiverem fundamentados nesses três conhecimentos (o movimento, o
intelectivo e o afeto), o desenvolvimento do indivíduo dar-se-á através da
promoção, preservação e recuperação da movimentação corporal.
A aprendizagem da criança está diretamente ligada ao
desenvolvimento psicomotor. E este é um fator importantíssimo para unir a
Psicomotricidade com a Educação Física e desenvolver a criança
integramente.
A psicomotricidade entende que a aprendizagem é um processo
complexo que resulta da vivência, da experiência percebida por cada indivíduo.
Processo dinâmico e hierárquico que envolve: processos neurológicos,
atividades bioelétricas, reações químicas, eficiência sinóptica, desenvolvimento
da memória, metabolismo protéico e sistema nervoso íntegro de condições.
A criança vem ao mundo com o poder mental muito desorganizado.
Seus reflexos são subcorticais (ela não comanda). É a partir do
desenvolvimento do córtex cerebral que vai dominando seus gestos, suas
intenções corporais. Ao longo da vida vai formando circuitos neuroniais
específicos para cada atividade.
O amadurecimento da rede neuronial ocorre melhor através de
estímulos recebidos e isso por conseqüência do desenvolvimento do córtex
cerebral, responsável por todo o processo de comando corporal. Existem dois
parâmetros de amadurecimento: céfalo-caudal e próximo-distal, o que caminha
simultaneamente no decorrer do crescimento da criança.
A partir dessa colocação, cabe salientar a visão de alguns autores:
“Síndrome da debilidade motora e suas conseqüências na aprendizagem; com reações como sincinesias (movimentos involuntários biklaterais), ou paratonias (movimentos não necessários, impossibilidade de um relaxamento, ou ainda reflexo exacerbado)”.
(Dupré, 1900, p.21)
“Psicologia Genética. Desenvolveu o conceito das praxias (movimentos ajustados dentro de uma seqüência temporo-espacial para um
determinado fim) onde os movimentos automáticos são de nível subcortical. A córtex cerebral é que dá a consciência ao homem. A atividade mental começa a se intensificar quando o indivíduo desenvolve suas praxias, que são suas habilidades motoras. Do nível da sensação para o da percepção”.
(Piaget, 1978, p. 52)
“Tônus + afetividade. O desenvolvimento emocional da criança quando bem orientado permite uma melhor prontidão para a aprendizagem. Existe a valorização contudo do desenvolvimento da organização dos movimentos e da percepção a partir do crescimento cortical”.
(Wallon, 1973, p. 42)
“Há um permanente conflito no homem que é a questão básica de toda a sua relação com a sociedade. Ela reprime as suas pulsões, instintos ou aspirações com valores padronizados pela cultura adotada, o que recai em sérias conseqüências de comportamento”.
(Freud, 1948, p. 292)
A evolução da criança e o seu processo de desenvolvimento se faz
de forma não unitária, isto é, segmentar e diversificada. Não se realiza de um
modo regular e progressivo, mas um pouco com a evolução histórica de toda a
humanidade: por saltos qualitativos que se seguem a períodos de lenta
maturação e são sucedidos por rupturas, por revoluções. É preciso que a
criança possa integrar cada um de seus progressos, antes de adquirir um novo.
2.1. ALGUNS ELEMENTOS PSICOMOTORES E SEUS
CONCEITOS
O mundo psicomotor surge na escola. Nas aulas de educação Física
e até mesmo nas salas de aula, cria-se um espaço para o corpo: o movimento,
o dinamismo e a liberdade são vividos intensamente pelas crianças. A inibição
e o bloquei psicomotor podem levar ao isolamento, a criança se torna
observadora do mundo ativo e espontâneo dos companheiros.
Cada criança é única. O esquema do desenvolvimento é comum a
todas as crianças, mas as diferenças de caráter, as possibilidades físicas, o
meio e o ambiente familiar, colaboram para que crianças com a mesma idade
tenham comportamentos diferentes.
A harmonia do desenvolvimento com todos os seus componentes é
tão importante quanto a aquisição de tantas performances numa determinada
idade. Não se trata para a criança de realizar uma corrida de obstáculos, o
mais rapidamente possível, mas desenvolver seu corpo e sua mente de
maneira equilibrada.
O desenvolvimento é contínuo, a criança se desenvolve desde os
primeiros dias de vida. O movimento e o esforço muscular são fundamentos da
vida psíquica. Eles permitem que se afirme o sentimento do Eu, essa força
voluntária que supera os obstáculos que o mundo lhe opõe. É na ação que o
Eu toma consciência de si mesmo e do mundo. É na vontade que se determina
a vida psicológica. A vida emotiva e a Vida motora não são isoladas, elas
apenas se complementam orientadas pelos elementos psicomotores. Alguns
deles são:
• Esquema Corporal
A formação do eu, isto é, da personalidade, compreende o
desenvolvimento do esquema corporal, através da qual a criança toma
consciência de seu corpo e das possibilidades de expressar-se por seu
intermédio.
Segundo Wallon,
“o esquema corporal é um elemento básico e indispensável para a formação de personalidade da criança. É a representação, relativamente global, científica e diferenciada que a criança tem de seu próprio corpo.”
(Wallon, 1989, p. 9)
O indivíduo percebe os seres e as coisas que o cercam, em função
de sua própria pessoa. O desenvolvimento da personalidade, dentre outros
aspectos envolve, pelo indivíduo, progressiva tomada de consciência de seu
corpo, de seu ser, das possibilidades de agir e de transformar o mundo em sua
volta.
A criança se sente bem à medida que conhece seu corpo, que se dá
conta que ele lhe obedece, e que pode utilizá-lo, não somente para se
movimentar, como para agir, segundo seu desejo e controle.
Um aluno cujo esquema corporal não está adequadamente
construído em sua percepção, não coordena bem seus movimentos. É possível
constatar que se atrapalha quando se veste ou se despe, que as habilidades
manuais lhe são penosas e difíceis. Na escola, a caligrafia é feia e a leitura não
harmoniosa, não expressiva, o gesto vem após a palavra, lhe é difícil seguir i
ritmo da leitura, sendo comum parar no meio das palavras que fala ou lê.
Para o desenvolvimento do esquema corporal sugerem-se
atividades de identificação, reconhecimento, localização e conhecimento das
funções de todas as partes do corpo, assim como, aplicação de conceitos
espaciais e temporais, reprodução de movimentos e ritmos, equilíbrio estático,
expressão com o corpo de diversos sentimentos, realização de movimentos
complexos e diferenciados e a dissociação de movimentos, com vários
segmentos corporais e outros.
• Lateralidade
A lateralidade traduz-se por estabelecimento da dominância lateral
da mão, olho e pé, do mesmo lado do corpo.
Durante o crescimento, a dominância lateral da criança se define
naturalmente, mostrando-se mais forte e mais ágil do lado direito ou do lado
esquerdo. A lateralidade corresponde a dados neurológicos, sendo também
influenciada por certos hábitos sociais.
Quando existe dominância lateral da mão, olho e pé do mesmo lado
do corpo, diz-se que há homolateralidade. Quando, porém a criança é destra
no uso da mão, mas prefere chutar com o pé esquerdo, por exemplo, diz-se
que tem lateralidade cruzada.
Não devemos confundir lateralidade (dominância de um lado do
corpo em relação ao outro, nos níveis de força e precisão), com a noção de
lado esquerdo ou direito do corpo. Quando a lateralidade está bem definida, a
criança tem mais facilidade de saber o que está à sua direita ou à sua
esquerda, embora a educação da lateralidade não comece por essas
informações. Elas emergirão espontaneamente, como resultantes da
comparação da posição dos objetos em relação ao eixo corporal. Essa
comparação será tão mais facilmente aprendida quanto mais homogêneo for o
domínio lateral da criança (preferência do olho, pé e mão do mesmo lado do
corpo).
Quando a lateralidade não está bem definida, é comum ocorrerem
problemas na orientação espacial, dificuldades na discriminação e na
diferenciação entre o lado dominante e o outro lado, desconhecimento de
esquerda/direita, incapacidade de seguir a direção gráfica (leitura começando
pela esquerda , por exemplo).
Não se deve jamais forçar a criança a alterar sua dominância lateral.
Se ela apresentar lateralidade cruzada ou ambidestria e manifestar distúrbios,
convém submetê-la à avaliação mais acurada. Qualquer procedimento para
levá-la a reorganizar sua dominância homolateral deve ser clinicamente
orientado e cumprido na escola.
• Estruturação Espacial
É a organização do mundo exterior, a partir do Eu como referência,
depois com relação a outros objetos ou pessoas em posição estática ou em
movimento.
A estruturação espacial leva à tomada de consciência, pela criança,
da situação e das possibilidades motoras e de agir expressando seu próprio
corpo em um determinado meio ambiente, isto é, do lugar e da orientação quer
pode ter em relação às pessoas e coisas. Também favorece o estabelecimento
de relações dos objetos entre si, colocando-os em lugares determinados ou
movimentando-os.
O processo de estruturação espacial compreendem exercícios que
desenvolvam a posição e a relação no espaço de indivíduos, objetos e
situações e a compreensão das relações espaciais que envolvem noções como
acima, abaixo, no meio, maior, menor, igual, fora, dentro, longe, perto etc.
Portanto, a estruturação espacial é parte integrante de nossa vida. É
difícil dissociar os três elementos fundamentais da psicomotricidade:
corpo/espaço/tempo, e quando opera-se com toda essa dissociação, limita-se a
um aspecto bem preciso e restrito da realidade.
Quando se deseja que a criança adquira uma noção espacial, não
se pode deixar de levar em conta suas possibilidades e conhecimentos
corporais, sua emotividade (diante do educador e das outras crianças), o tempo
de que dispõe, e seu próprio ritmo.
• Orientação Temporal
É a capacidade da criança se situar em função da sucessão, da
duração e da periodicidade dos acontecimentos, bem como do caráter
irreversível do tempo, avaliar o movimento no tempo, distinguir o rápido do
lento, o sucessivo do simultâneo.
As noções temporais são muito abstratas, muitas vezes bem difíceis
de serem adquiridas pelas crianças. Dois tipos de tempo podem ser
considerados: o subjetivo e o objetivo.
O tempo subjetivo varia conforme as pessoas e a atividade do
momento (o momento do prazer passa mais depressa do que o momento de
aborrecimento).
A noção do tempo subjetivo deve ser desenvolvida por meio do
diálogo, levando a criança a se conscientizar dos próprios sentimentos, em
situações diferentes.
O tempo objetivo é o tempo matemático, idêntico e cronológico (uma
hora dura sempre sessenta minutos...).
A noção de tempo objetivo pode ser desenvolvida a partir de pontos
de referência, tais como: hora das refeições, hora de dormir, dias de atividades
especiais, como o lazer no Domingo, festas de natal, ano novo, datas de
aniversário etc.
Quando a criança tem problemas na orientação temporal,
geralmente apresenta, também dificuldades que envolvem a estruturação
espacial, manifestas por exemplo, na ordenação dos elementos de uma sílaba.
Do mesmo modo, sente dificuldades em reconstruir uma frase cujas palavras
estejam misturadas, sendo a estrutura da língua um difícil quebra-cabeça para
ela.
A desorganização espacial ou temporal pode acarretar sério
fracasso em matemática. Com efeito, para calcular a criança deve ter pontos
de referência, colocar os números corretamente, possuir noção de fileira, de
coluna, deve conseguir combinar as formas para fazer construções
geométricas, dentre outros.
Algumas atividades são sugeridas para desenvolver a orientação
temporal: a sucessão dos acontecimentos, a duração de intervalos, ritmo
regular e ritmo irregular, locomoção rápida e lenta, renovação cíclica de certos
períodos, o caráter irreversível do tempo etc.
• Tônus, Postura e Equilíbrio
O tônus, a postura e o equilíbrio constituem a capacidade da criança
de conquistar atitudes habituais cômodas e suscetíveis de serem mantidas com
o mínimo de fadiga e sem desequilíbrios ou vícios de postura. Permitem relaxar
e dinamizar articulações, bem como possibilitam o equilíbrio para os
deslocamentos em posição ereta, com regulação do tônus muscular
necessário. Crianças com problemas na tonicidade muscular, na postura,
apresentam, geralmente impressão de desleixo ou de cansaço. Não
conseguem ficar quietas e estão sempre como desengonçadas.
O desenvolvimento do tônus, da postura e do equilíbrio envolve,
dentre outros, exercícios para: fortalecimento da tonicidade dos músculos
posturais, equilíbrio estático, flexibilização da coluna vertebral, equilíbrio
dinâmico e força muscular.
Todo movimento humano, sob todas as suas formas, inclusive sua
ausência (relaxamento) elabora-se sobre o fundo tônico.
O tônus muscular é uma tensão dos músculos pela qual as posições
relativas das diversas partes do corpo são corretamente mantidas e que se
opõe às modificações passivas dessas posições.
Em condições normais o músculo esquelético só está em repouso
aparente, pois ele é sede de uma constante contração tônica. Esta contração é
controlada por centros nervosos localizados no cerebelo e nódulos estriados.
Verifica-se o estado do tônus muscular através da resistência de um músculo à
mobilização passiva de um segmento do corpo:
- grande resistência – hipertonia;
- pequena resistência – hipotonia;
- resistência normal – tônus normal.
O tônus prepara o guia gestos, expressa ao mesmo tempo a
satisfação ou mal-estar do sujeito, não é apenas o alcance do gesto mas o
próprio gesto vivido.
O equilíbrio corporal é o conjunto de reações do sujeito à gravidade,
isto é, suas adaptações às necessidades de bipedestação e dos
deslocamentos em posição ereta. Através de exercícios, a criança deve
encontrar por si só as posturas necessárias ao equilíbrio, como aumento das
alturas, deslocamentos com aumento do grau de dificuldade, equilíbrio de
objetos e do corpo em diferentes situações.
• Pré-escrita, Psicomotricidade Fina ou Coordenação
Dinâmica Manual
O domínio harmonioso e delicado do gesto, a estruturação espacial
e a orientação temporal são os três fundamentos da escrita, que supõe: uma
direção gráfica, as noções de em cima e embaixo, esquerda e direita, a noção
de antes e depois, para ordenação dos movimentos de escrever.
Crianças que têm transtornos na coordenação dinâmica manual
geralmente tem problemas visomotores, apresentando inúmeras dificuldades
em desenhar, recortar, escrever...e, em todos os movimentos que exijam
precisão na coordenação olho/mão.
Exercícios para o desenvolvimento da coordenação dinâmica
manual têm como finalidade fazer com que a criança atinja o domínio do gesto
e dos objetos que manipula, bem como a percepção e a compreensão da
imagem a reproduzir. Esses exercícios, quando orientados, se dividem em dois
grupos: os puramente motores e os de grafismo, preparatórios para a escrita
no plano vertical e no papel.
Os exercícios motores para a pré-escrita e leitura colaboram para a
educação de ambas as mãos e de todos os dedos, desenvolvendo movimentos
simultâneos ou dissociados, estes diferentes em cada membro do par.
Algumas sugestões para desenvolver estes movimentos: lançar e receber
bolas, picar, rasgar e recortar papel, decalcar, abrir e fechar as mãos etc.
Esquema corporal, lateralidade, estruturação espacial, orientação
temporal, tônus, postura, equilíbrio e a coordenação dinâmica manual devem
ser trabalhados na criança simultaneamente e não em seqüência. Entretanto,
os pré-requisitos próprios de determinados comportamentos precisam ser
respeitados. Por exemplo: não se pode exercitar a estruturação espacial, sem
que se tenha desenvolvido e dominado o esquema corporal que por sua vez é
trabalhado quando a criança tem a imagem corporal, que é a percepção e o
sentimento que ela tem de seu próprio corpo. Ligada a aspectos relacionais e
envolve experiências interiores, expectativas sociais e emoções. A imagem é
tudo aquilo que foi vivido pela criança com seu corpo.
2.2. CORPO E MOVIMENTO
A escola não pode negar como fato histórico a corporeidade
humana, a infinidade de gestos, expressões, movimentos, que os seres
humanos foram e são capazes de realizar, originando jogos, brincadeiras,
danças, esportes, lutas e diferentes formas de ginástica constituindo desta
forma, o verdadeiro patrimônio lúdico da humanidade.
O grande desafio da psicomotricidade nas aulas de educação física
é propiciar ao educando o conhecimento do seu corpo, usando-o como
instrumento de expressão e satisfação de suas necessidades, respeitando
suas experiências anteriores e dando-lhe condições de adquirir e criar novas
formas de movimento.
O movimento humano é aquele que nos diz respeito enquanto
especificidade de nossa ação profissional, por isso, temos que ter claro ser ele,
humano, social e culturalmente construído. Assim sendo, ao resgatarmos uma
visão antropológica de movimento humano, passamos a percebê-lo em sua
totalidade como resultante da interação de seus componentes biofisiológicos e
socioculturais.
O movimento corporal ou movimento humano que é tema da
Educação Física não é qualquer movimento, não é todo movimento. É o
movimento humano com determinado significado/sentido, que por sua vez lhe é
conferido pelo contexto histórico cultural.
No projeto educacional em relação ao corpo do aluno, o que está em
jogo são duas maneiras diferentes de se ver o corpo: num caso, corpo que é
simples meio e que é treinado para se transformar num instrumento de luta
contra o espaço. Uma corrida é luta contra o tempo. Num outro, é o corpo
reconciliado com o espaço e o tempo e que não deseja vencê-los mas apenas
usufruí-los.
Considerando que o movimento humano só se concretiza através do
corpo do homem, este movimento passa a integrar uma totalidade e não
somente o ato motor, mas toda e qualquer ação humana que vai, desde a
expressão até o gesto mecânico. Não é apenas o corpo que entra em
movimento, mas é o homem todo que age e se movimenta.
A educação física junto com a psicomotricidade, devem associar o
corpo, a emoção, a consciência, a busca do prazer, fazendo o aluno sentir-se
bem com o seu corpo no tempo e no espaço, onde este corpo conseguirá
interferir na ordem estabelecida a partir do momento em que se apresentar
como expressão de individualidade e ao mesmo tempo coletividade, em que se
relaciona com o outro, respeitando-o e sendo respeitado, com espaço de
liberdade e possibilidade de expressão.
O movimento corporal mostra a sua importância na emergência da
consciência e da constante reciprocidade dos aspectos cinéticos e tônicos da
motricidade, assim como as interações entre as atitudes, a sensibilidade e a
acomodação perceptiva e mental, no decurso do desenvolvimento da criança.
Wallon prioriza os aspectos afetivos afirmando que,
“estes são mais importantes do que qualquer tipo de outros comportamentos anteriores, pois em qualquer movimento existe uma condicionante afetiva que lhe insufla algo de intencional”.
(Wallon, 1973, p. 38)
Existe, portanto, uma evolução tônica e corporal que constitui o
prelúdico da comunicação verbal, que é chamada diálogo tônico.
O diálogo tônico, que ocupa uma grande importância na gênese
psicomotora, tem como instrumento operativo e relacional o corpo. Para Wallon
(1973, p. 41), “a ação desempenha o papel fundamental de estruturação
cortical e está na base da representação”.
O primeiro contato que a criança faz com o mundo é feito através
dos movimentos. É por um verdadeiro diálogo tônico que a criança se introduz
na cultura. Durante muito tempo a forma de contato que a criança estabelece
com o mundo é realizada, principalmente com a mão, por meio de um
verdadeiro diálogo corporal e gestual.
As primeiras relações vão ocasionar uma alteração na tonicidade do
indivíduo e vão se traduzir em esquemas de relação, uns hipertônicos e outros
hipotônicos. Estas impressões vão modificar a musculatura, constituindo assim
a história do indivíduo, refletida numa diferenciada disposição motora.
Os primeiros atos intencionais surgem na simbiose afetiva com o
meio. O meio já representa uma forma de possessão, sendo a partir desse
auto-reconhecimento que se iniciam as descobertas e o domínio do próprio
ambiente. Esta forma de aquisição só é possível através da seqüência das
aquisições motoras essenciais (posição de pé, marcha, preensão global etc.).
A evolução autônoma não é somente maturação, seguindo um
programa inscrito nas origens das estruturas da hereditariedade. Ela é também
assimilação das influências físicas e humanas. A evolução é, portanto, o
resultado do equipamento neurofisiológico básico e da assimilação dos
estímulos sociais e culturais (mundo humano).
Segundo Wallon,
“o movimento contém sempre potência psíquica. É deslocamento no espaço de uma carga afetiva e possui modulação tônica em reação ao meio. O tônus transforma o fisiológico em psicológico; o tônus é o suporte do movimento cuja expressão da afetividade e corticalização decorrente da experiência com o meio. Mais do que contração muscular ou deslocamento no espaço, tem significado de relação afetiva com o mundo e constrói uma história biossocial”.
(Wallon, 1973, p. 42)
A partir do movimento estrutura-se o pensamento ou seja, o
movimento transforma-se em ato social.
Ser Humano Meio Individualidade Coletividade Maturação Apropriação da Nervosa e Experiência Social Psicomotora Movimentos
Sendo o movimento uma resposta muscular à estimulação sensorial,
podemos relacioná-lo na unidade sensório-motora, isto é, levando em
consideração a informação motora. Esta informação motora pode ser
distinguida dentro da sensibilidade que traz ao corpo: uma sensibilidade
interoceptiva, que é a sensibilidade visceral; uma sensibilidade proprioceptiva,
que é ligada às posturas, movimentos e atitudes; e a sensibilidade
exteroceptiva, que é aquela que engloba as funções táteis, visuais e auditivas.
Quanto aos movimentos pode-se considerar:
Movimento reflexo: reação involuntária, esteriotipada e localizada
no organismo a um estímulo específico. Os reflexos podem se inatos ou
adquiridos por aprendizagem. Ex.: reflexo pupilar – reflexo de sucção.
Movimentos voluntários: são atos intencionais, que encerram dois
elementos importantes: motivação e antecipação. Tais características dão ao
movimento voluntário a conotação de atividade psicomotora por excelência, já
que o projeto motor é a intencionalidade convertida em ato, representa o ponto
onde se reúnem as faculdades intelectuais e psíquicas e as possibilidades
motrizes.
Movimentos automáticos: reações globais do organismo aos
estímulos do meio, sem possibilidades de decomposição e análise. São
reações aprendidas tornando-se involuntários, isto é, a partir de um estímulo,
surge uma cadeia de respostas que se sucedem com o controle consciente do
sujeito. Ex.: Na marcha, os primeiros movimentos são voluntários seguindo-se
uma ação automática.
O movimento é o resultado de uma computação de processos
cognitivos de imagens e de simbolizações que é simultaneamente: ação e
representação, onde o indivíduo descobre e edifica a linguagem, o corpo, as
emoções, assimilando o saber teórico e prático da própria sociedade.
2.3. EDUCAÇÃO MUSICAL: CONTRIBUINDO NO
DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR DA
CRIANÇA, DE SUA PERSONALIDADE E SUAS
FORMAS DE RELAÇÃO
A criança vivencia a música desde os primeiros meses de vida ainda
intra-uterina. As pesquisas recentes revelaram a capacidade do feto de
perceber os sons através das vibrações vindas do exterior do seu espaço
uterino. O som é sua primeira experiência musical. Desta forma, o bebê pode já
se reconfortar com a voz materna que logo identifica pela sua sonoridade. A
partir daí, outros sons também são apreciados.
A partir do nascimento, várias devem ser as experiências musicais
da criança, pois muito contribuirão para o desenvolvimento das suas
percepções, principalmente a rítmica e auditiva. Nos primeiros anos de vida, a
criança está mais receptiva para as propostas musicais, mesmo que a intenção
desta prática não seja de formar músicos e sim apenas auxiliar no
desenvolvimento das percepções do indivíduo, aumentar a sua capacidade de
concentração, de memória, desenvolver o raciocínio lógico além de serem um
forte agente desencadeador das emoções humanas.
Os benefícios trazidos pela prática da iniciação musical, estendem-
se para todas as áreas de aprendizagem. Por haver uma identificação natural
da criança com a linguagem musical, todo trabalho a ser desenvolvido na
Educação Infantil deve buscar ilustrar-se com atividades musicadas. Ao dançar
e cantar, a criança exercita ao mesmo tempo o equilíbrio, o ritmo, a noção
espacial, a expressão corporal, a afinação da voz, a relação com o grupo etc.
Além de auxiliar a psicomotricidade, a música dinamiza a integração da criança
com o grupo.
O tempo musical permite à criança ajustar seus movimentos,
buscando sincronia entre sua organização tônica e a música ouvida.
A expressão própria dos movimentos rítmicos da criança está
diretamente ligada ao seu equilíbrio emocional. Seus gestos devem estar
ajustados ao tempo e ao espaço exteriores sendo harmônicos ao que for
proposto.
Este processo deve traduzir espontaneidade e bem-estar. Todo
automatismo indicará o fracasso deste ajustamento. O objetivo da proposta
musical deve ser sempre colocar a criança frente a uma situação global de
ajustamento ao tema musical sem implicar num esforço maior de análise
perceptiva. Utilizando-se a dança ainda como referência na educação, quando
se trata dos aspectos psicomotores, o importante é a improvisação da
expressão e dos gestos, não se levando em conta a reprodução dos passos
ensinados.
Em determinadas atividades, existem algumas crianças que não
estão em condições de um desempenho razoável, dada à heterogeneidade que
a maioria dos grupos apresenta. Esta realidade leva a exaustivos e repetitivos
ensaios da atividade que só desestimulam a espontaneidade da criança que
precisa ainda de mais tempo.
A personalidade da criança é o resultado de um crescimento lento e
gradual. O sistema nervoso chega à maturidade por etapa sobreposta e
seqüências naturais. E este processo independe da interferência sistemática. A
atuação da escola pode sim aprimorar ou acelerar o processo da formação da
personalidade mas é o convívio da criança que estrutura a sua personalidade.
O atendimento que se dá a criança na sua trajetória educacional é que, amplia
a sua potencialidade e facilita a sua aprendizagem.
O corpo representa para o homem seu primeiro veículo de
comunicação com o mundo. É através dele que o homem demonstra sua
percepção mais íntima do mundo que o cerca. E ao mesmo tempo ele
expressa a sua leitura deste mundo.
Neste sentido, a educação favorece esse desenvolvimento a partir
de um diálogo igual e verdadeiro, compreendido por ambas as partes, do
adulto e da criança, com a orientação adequada para a solução das questões
levantadas.
Nesse momento, a psicomotricidade ganha espaço e age como
ciência que se dedica a compreender esse processo e auxilia a relação
homem/mundo, considerando os aspectos cognitivo, afetivo e motor da criança,
que caminham dentro de uma mesma expectativa. O exercício físico é
fundamental para o desenvolvimento corporal, mental e emocional da criança,
assim como, as sensações, as percepções e as ações constituem um ciclo que
se desenvolve, se enriquece e se organiza para constituir sua personalidade.
Todas as formas de relação advém de uma atitude corporal, que
sensibiliza o corpo, seus reflexos e suas posturas.
As atividades musicais se constituem numa das mais completas
propostas que visam o desenvolvimento dos aspectos básicos da formação da
personalidade da criança. Atuam na esfera emocional através do ritmo e da
melodia. As formas de relação podem ser:
Quanto ao aspecto motor: Nas danças, nos jogos cantados, na
execução dos instrumentos, o que estimula a sincronia rítmica permanente ou
em qualquer atividade de deslocamento que seja orientada pela música.
Quanto ao aspecto cognitivo: No desempenho das atividade há o
estímulo do conhecimento geral, da memória e do crescimento das
potencialidades da criança. O vocabulário também é muito enriquecido nas
peças cantadas, desenvolvendo-se assim o raciocínio.
Quanto ao aspecto afetivo: Na música, que tem uma singular
propriedade: lidar com a emoção do indivíduo. E neste aspecto pode-se utilizar
a música para a busca do equilíbrio psíquico desde a mais tenra idade. Basta
que seja bem orientada.
Os elementos naturais da música são o ponto de partida das
atividades: o ritmo, o som e a melodia.
Algumas atividades podem ser sugeridas, trabalhando os elementos
naturais da música: sensibilização rítmica, a primeira manifestação de
sensibilização rítmica é corporal; dancinhas simples e bem marcadas podem
facilitar o início do trabalho musical e corporal; representação de bichinhos e
dramatizações de histórias onde a expressão seja livre; acompanhamento de
músicas ouvidas em cds ou instrumento, com desempenho do próprio corpo. É
importante a liberdade dos gestos, o que desinibe e aprimora os movimentos.
Peças musicais também contribuem muito para a sincronia de gestos e
movimentos.
2.4. A IMPORTÂNCIA DO RELAXAMENTO E DA
RESPIRAÇÃO NO DESEMPENHO DAS
ATIVIDADES
O relaxamento, assim como o movimento, estão muito relacionados,
à medida que ambos requisitam o domínio do corpo. O relaxamento diário
ajuda a melhorar e equilibrar comportamentos, a ajustar o tônus muscular e
auxilia também na tomada de consciência do corpo.
Primeiramente deve-se exercitar o relaxamento global para a
obtenção dos descondicionamentos, depois parte-se para o relaxamento
segmentário, que é aquele que traz o controle das diferentes partes do corpo, a
eliminação de sincinesias alivia as tensões, diminuindo assim a rigidez.
Cada atividade agitada deve ser contrabalançada com uma calma e
o relaxamento deve fechar a proposta de uma atividade com criança. Este
procedimento equilibra a dinâmica de qualquer grupo. O relaxamento deve ser
anunciado pela música e conduzido por ela, quando não acompanhado de uma
atividade plástica.
Quanto à respiração, deve-se afirmar que é o fator dos mais
importantes no complexo organismo humano. Através da respiração
conseguimos o equilíbrio ideal das nossas funções menos cansativas e mais
produtivas com a educação respiratória, assim como nossa concentração é
exercitada.
A criança desempenha muito melhor as atividades se acostumada a
pensar na sua respiração, por isso deve-se sempre iniciar uma atividade
praticando a boa e correta respiração, sentindo o corpo, sua pulsação e
procurando, com o tempo, coordenar a respiração com as atividades físicas.
Alguns exercícios de respiração podem ser realizados durante as
atividades:
Deitado em decúbito dorsal em completo silêncio, sentir com
a ponta dos dedos o ar enchendo os pulmões ao entrar e esvaziando-os ao
sair.
O exercício citado acima com uma interrupção.
O exercício citado acima com duas ou mais interrupções.
A observação simultânea da respiração e da pulsação.
A mesma observação após um exercício físico.
Observação à queda rítmica da pulsação e da necessidade de
inspiração à medida que o corpo repousa.
Respiração com movimento:
- sou uma bola de encher que estica quando enche e encolhe
quando esvazia;
- estico meu corpo quando encho e vou esvaziando em lances,
à medida que intercepto a respiração;
- abro os olhos na inspiração de olhos fechados e solto o ar
para um lado de cada vez, de olhos abertos;
- procuro conscientizar-me de expirar nos movimentos que
comprimem o abdome e inspirar nos que liberam.
Obs.: A respiração deve acontecer no abdome e não nos ombros.
CAPÍTULO III
BREVE VISÃO GERAL DO PROCESSO DE
DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA
A criança é um ser que se move, que pensa, que sente e como tal
deve ser encarada. Compreendê-la de acordo com suas necessidades, falhas,
esforços, imaturidade, comportamentos, esquema de crescimento, entre outros
aspectos, é fundamental para o equilíbrio e efetividade do processo ensino-
aprendizagem e do desenvolvimento da criança. A criança é um ser ativo em
desenvolvimento, participando de várias situações em ambientes dinâmicos,
isto é, em constantes transformações. Ela é, ao mesmo tempo, um ser único e
um ser social, pois é um indivíduo que vive em sociedade. Essas
características têm de ser levadas em consideração durante todo o momento
em que se estiver trabalhando com a criança, jamais deixando de atender às
suas necessidades individuais e coletivas. Levando em conta também por meio
de estímulos internos, proporcionar uma relação da criança consigo mesma e,
por meio de estímulos externos, criar uma relação dela com as outras pessoas
e com o mundo.
Segundo o modelo do paradigma indivíduo/ambiente de Krebs,
“a individualidade e a socialização não estão separadas. Estas duas questões vão refletir-se na personalidade da criança, pois representam a indissociabilidade entre o “Eu social” e o “Eu indivíduo”. A individualidade está relacionada a estímulos internos, que dependem da natureza biológica e das experiências vivenciadas pela criança. A socialização relaciona-se com a capacidade de a criança lidar com estímulos externos, dependentes do contexto em que ela está inserida”.
(Krebs, 1994, p. 21)
A motricidade da criança de 3 a 6 anos, deve ser assinalada como a
fase do aperfeiçoamento de múltiplas formas de movimento e da aquisição das
primeiras combinações de movimento. Individualmente diferenciados, são
verificadas claros progressos especialmente nas formas de movimentos como:
andar, trepar e subir, correr e pular, lançar e pegar, pendurar e balançar, rodar
e rolar, carregar, bater e equilibrar.
Quanto ao desenvolvimento cognitivo, a criança em idade pré-
escolar encontra-se no estágio pré-operacional do desenvolvimento do
pensamento, fase em que adquire a função simbólica. Assim, os processos de
pensamentos da criança são usados a fim de encadearem ao real, ao presente,
ao concreto; para tanto, utiliza símbolos para representar objetos, lugares e
pessoas, e sua mente pode ir acima do aqui e agora.
Quanto ao seu comportamento sócio-emocional, a criança encontra-
se em idade pré-escolar, no estágio do personalismo. Ela chega a “consciência
do eu”, que só pode surgir quando a criança se torna capaz de ter uma imagem
de si mesmo, uma representação de si própria e que, uma vez estabelecida, se
afirmará claramente com o negativismo, a crise de oposição por volta dos 2
anos e meio aos 3 anos. Segundo Piaget,
“afirmar-se através da oposição ou fazendo tolices, unicamente para captar a atenção, é mais elementar das reações desta etapa. É muito importante entender que para a criança, esta reação significa que ela deixou de se confundir com o outro e que quer também que isto seja reconhecido pelo outro”.
(Piaget, 1964, p. 63)
Esta afirmação de personalidade vai crescendo até chegar ao final
do período pré-escolar, estabelecendo relacionamentos novos com seu meio,
ligações que não são estabelecidas definitivamente, mas que se fortalecem e
se enfraquecem segundo os interesses e as circunstâncias.
É por isso, que as aulas de educação física devem estar integradas
com a psicomotricidade e, nesse elo, proporcionar atividades motoras que
ajudem as crianças a conhecerem seu corpo eficientemente e dominar uma
ampla variedade de habilidades fundamentais. Isso contribui positivamente
para o desenvolvimento das capacidades físico-motoras, sócio-afetivas e
percepto-cognitivas. A capacidade físico-motora envolve todo o aspecto
fisiológico relacionado a aptidão física e às habilidades motoras, por exemplo,
velocidade, força, coordenação, equilíbrio etc. A capacidade percepto-cognitiva
prioriza, na percepção, o desenvolvimento dos sentidos (tato, visão e audição)
e, na cognição, a capacidade de o aluno solucionar problemas,
compreendendo a realidade em que está inserido, refletindo sobre ela e nela
interferindo. A capacidade socioafetiva estimula as relações interpessoais, a
cooperação e o respeito, cultivando valores e regras morais do contexto
sociocultural do aluno.
3.1. DESENVOLVIMENTO E CAPACIDADES FÍSICO-
MOTORAS
A capacidade do ser humano modificar o seu próprio ambiente, ou
seja, mostrar que é capaz de fazer, de agir, faz parte do seu desenvolvimento
psicomotor.
O domínio psicomotor envolve o processo de mudança e
estabilização na estrutura física e função neuromuscular. O crescimento físico
é bastante lento e uniforme, o ser humano, ao nascer, apresenta movimentos
amplos e desordenados. Com o passar do tempo, quando apresenta domínio
do próprio corpo e já é capaz de se locomover pelo ambiente, adquire um
grande número de movimentos característicos da espécie humana (saltar,
arremessar, chutar, receber, rebater etc.), que pouco a pouco, vão sendo
executados com maior facilidade. Posteriormente, estes movimentos são
combinados a movimentos mais complicados determinados pela própria
cultura. O processo e desenvolvimento motor vai dar condições ao ser humano,
por meio de uma série de mudanças na capacidade de se mover, para adaptar-
se ao meio ambiente. Nesse sentido, as aulas de educação física podem
contribuir para a aquisição de movimentos naturais por meio da seleção e
estruturação das tarefas motoras mais adequadas, para que as necessidades e
expectativas das crianças sejam atendidas.
Os diferentes tipos de movimento e suas características, são
classificados em movimentos naturais e movimentos aprendidos, que se
subdividem em:
MOVIMENTOS NATURAIS MOVIMENTOS APRENDIDOS
• Movimentos reflexos • Habilidade específica
• Movimentos rudimentares 6 do esporte;
• Movimentos fundamentais 6 da dança;
• Combinação de movimentos
fundamentais
6 do trabalho
Características: próprios da
espécie humana, sem a
necessidade de aprendizagem
Características: determinados
culturalmente pela necessidade de
aprendizagem
A primeira fase é a dos movimentos reflexos. São movimentos primordiais
para a sobrevivência e proteção do bebê e, exatamente por isso, são controlados
involuntariamente e são automáticos. Os movimentos reflexos de ajustamento postural
(controlar a cabeça, o tronco), de preensão (pegar com as mãos) e de natação, são
considerados como base para os movimentos voluntários (como manutenção da postura
ereta), da manipulação (pegar e receber) e de locomoção (andar e nadar). Os
movimentos reflexos possuem 2 estágios. O primeiro é a Informação Codificada, que é
a responsável das respostas involuntárias para suprir suas necessidades de nutrição e
proteção. E o segundo estágio é a Informação Decodificada, que inicia o controle dos
movimentos, trocando as atividades sensório-motoras pelo comportamento perceptivo-
motor.
A fase seguinte é a dos movimentos rudimentares que se
caracterizam pelos primeiros movimentos voluntários. Eles envolvem
basicamente controle do corpo desde a postura feral, até a capacidade de
manter a postura ereta e movimentos da manipulação (quando a criança tenta
alcançar objetos com as mãos e passa a manipulá-los). Também possui dois
estágios, a Inibição do reflexo, que está interligado ao último estágio da fase
anterior pois vai desde o nascimento até por volta de um ano de vida e se
desenvolve à medida que os movimentos vão ficando mais elaborados. E o
outro estágio é o Pré-controle, que aumenta o grau de precisão e controle dos
movimentos de manipulação, locomoção e estabilização (a criança está entre 1
e 2 anos de vida quando já acontece desenvolvimento nos processos
cognitivos).
A terceira fase, a do movimento fundamental, acontece quando os
meninos e meninas começam a desenvolver um crescimento das habilidades
motoras básicas. Na faixa etária de 2 a 7 anos, eles estão na época das
descobertas, na busca de como executar uma variedade de movimentos com
maior fluidez e controle. São conhecidos também como padrões fundamentais
de movimento: andar, correr, saltar, arremessar, rebater, chutar, rolar, receber
etc. são um aperfeiçoamento da fase dos movimentos rudimentares.
A quarta fase é a da combinação dos movimentos fundamentais,
onde os movimentos em vez de serem identificados como aprendizagem,
passam a ser uma ferramenta que se pode aplicar a várias habilidades, então
progressivamente refinadas, combinadas e elaboradas. Esta fase vai dos 7 aos
12 anos, onde há um aumento na capacidade de combinar os movimentos
fundamentais e uma melhora na execução dos mesmos. O nível que a criança
atingirá na execução e nas combinações dependerá das fases anteriores,
principalmente, a aquisição do padrão maduro de movimentos fundamentais.
Nesta fase, a criança vai selecionando, também, as formas de combinações
mais eficientes, o que irá facilitar a transposição para a fase seguinte, que se
refere a movimentos mais complexos e mais específicos. Nesta quarta fase, a
criança passa por três estágios: transição, aplicação e utilização para a vida.
A última fase é a dos movimentos especializados, ou seja, é a fase
dos movimentos culturalmente determinados. A partir do nível de
desenvolvimento atingido na fase anterior, haverá uma melhora relativa do
domínio de habilidades específicas em que haverá um contínuo refinamento
(melhoria na execução), combinação de movimentos de estabilidade
(manutenção e controle do corpo), locomoção e manipulação. Isto possibilita a
sua utilização em tarefas motoras mais complexas. Esta fase inicia-se por volta
dos 12/13 anos e não tem limite determinado. Acredita-se que três aspectos
podem influenciar este limite: a motivação para a prática de atividades motoras,
a oportunidade de poder praticá-las e o talento individual que estaria ligado às
capacidades e limitações de cada um.
3.2. DESENVOLVIMENTO E CAPACIDADES
PERCEPTO-COGNITIVAS
Para se entender o desenvolvimento percepto-cognitivo, é
necessário buscar fundamentação sobre a percepção em primeiro lugar e,
depois, sobre a cognição, em estudos realizados por Piaget. A percepção
direta, digamos, é o ato, efeito ou a faculdade de perceber e adquirir
conhecimentos através dos sentidos. O ser humano possui capacidade de
relacionar três níveis de percepção, de acordo com os estímulos que recebe:
MOVIMENTOS DETERMINADOS CULTURALMENTE
COMBINAÇÃO DOS MOVIMENTOS FUNDAMENTAIS
MOVIMENTOS FUNDAMENTAIS
MOVIMENTOS RUDIMENTARES
MOVIMENTOS REFLEXOS
A PARTIR DOS 12 ANOS
7 A 12 ANOS
2 A 7 ANOS
1 A 2 ANOS
VIDA INTRA-UTERINA A 4 MESES APÓS O
NASCIMENTO
Exterocepção – os estímulos são recebidos pelos
receptores externos do indivíduo, ou seja, os órgãos dos sentidos. São
sensações em nível tátil, auditivo, gustativo, olfativo ou visual que vão
fornecer informações a serem codificadas pelo organismo.
Interocepção – responde aos estímulos em níveis viscerais,
o organismo pode manifestar sensações de dor ou prazer, de acordo com a
resposta mais interna que o corpo pode oferecer.
Propriocepção – diz respeito à percepção dos estímulos em
nível de músculos, ligamentos e tendões. É o mais importante para a
educação física, pois refere-se à cinestesia; o corpo vai desenvolver
capacidades diferenciadas e hábeis para propósitos expressivos, assim
como para objetivos intencionalmente determinados. Desenvolve a memória
que permite a automatização de movimentos.
Piaget divide o processo cognitivo da criança em estágios. Por exemplo, de
7 a 11 anos, ela se encontra no 5º estágio, o das operações intelectuais concretas
(começo da lógica) e dos sentimentos morais e sociais de cooperação.
A idade médica de 7 anos, que coincide com o começo da
escolaridade propriamente dita, marca uma modificação decisiva no
desenvolvimento mental. Em cada um dos aspectos complexos da vida
psíquica, quer se trate da inteligência, quer da vida afetiva, das relações sociais
ou da atividade individual, observa-se o aparecimento de formas de
organização que completam as construções esboçadas no decorrer do período
precedente assegurando-lhe um equilíbrio mais estável, as quais também
inauguram uma série ininterrupta de novas construções.
A criança, nessa idade apresenta um duplo progresso, demonstra
concentração individual quando trabalha sozinha e colaboração afetiva quando
está em grupo. Tem início a construção lógica, que permite a coordenação dos
pontos de vista entre si. Ela consegue cooperar, porque não confunde mais seu
próprio ponto de vista com o dos outros. O essencial é que ela se torna
suscetível a um começo de reflexão, liberando-se do seu egocentrismo social e
intelectual e tornando-se capaz de novas coordenações, que serão de maior
importância tanto para a inteligência, quanto para a afetividade.
Segundo Piaget,
“o pensamento da criança em idade escolar (ensino fundamental) apresenta certas propriedades que salientam seus caracteres de reversibilidade e associativo”.
(Piaget, 1964, p. 18)
A reversibilidade quer dizer que a criança pode rever cadeia de
pensamentos, não mais se limitando a uma conclusão errada inflexível,
característica de estágios anteriores à evolução cognitiva. O caráter associativo
de pensamento significa que uma série de pensamentos ou elementos
cognitivos podem ser interpretados pela criança. Entretanto, ela ainda
encontra-se limitada, em termos cognitivos, ao seu mundo imediato e
concretamente real. Por um outro lado, adquire o conceito de orientação, pelo
qual realiza a integração dos vários fatores socioemocionais do processo de
desenvolvimento. Quanto menos idade possuir, maior será a sua dificuldade
em processar estímulos variados ao mesmo tempo. Precisa-se respeitar o
processo de construção em que as capacidades intelectuais se desenvolvem.
A teoria cognitiva de Jean Piaget exerce hoje relevante papel em
todas as áreas da Psicologia e nos campos aplicados à educação e a
psicoterapia. Abandonando a idéia de avaliar o nível de inteligência de um
indivíduo por meio de suas respostas a itens de determinados testes, procurou
acompanhar o processo do pensamento da criança para, então, chegar ao
conceito de inteligência como capacidade geral de adaptação do organismo. A
sua teoria descreve uma interação entre fatores biológicos e sociais. Segundo
Piaget,
“há um equilíbrio entre as ações inversas, que pode ser adquirido através das invariantes funcionais,
levando o indivíduo à aquisição do conhecimento”.
(Piaget, 1964, p. 19)
Para compreender a totalidade do organismo em sua organização e
equilíbrio, é preciso permitir ao indivíduo realizar uma atividade intelectual
contínua, enfatizando cinco conceitos fundamentais ou invariantes funcionais:
• Esquema – são padrões originais de pensamento que a
pessoa usa para lidar com situações específicas em seu ambiente (unidade
estrutural do desenvolvimento cognitivo);
• Acomodação – processo pelo qual o indivíduo ajusta seu
pensamento às condições ou situações existentes;
• Assimilação – aquisição de novas informações pelo uso
das estruturas cognitivas já existentes;
• Adaptação – ajuste de novas informações, criando outras
estruturas cognitivas;
• Equilíbrio – harmonia entre o esquema e a adaptação.
Nas aulas de educação física, pode-se perceber que a escolha e a
seleção das atividades são tão importantes quanto o encorajamento e a
oportunidade de participação de todas as crianças. O professor deve começar
com estruturas simples (esquema) e, progressivamente, chegar às mais
complexas, permitindo que as crianças vivenciem uma variedade de atividades
motoras (assimilação). Além disso, é necessário também que, se disponha de
um tempo suficiente para familiarizar-se com os movimentos e/ou aparelhos
(acomodação), dando oportunidade para que as crianças tomem suas próprias
decisões em relação à melhor forma de movimentar-se e manter o corpo sob o
controle (adaptação). A duração e a complexidade das atividades devem estar
de acordo com o nível de desenvolvimento da criança (equilíbrio).
A criança dos 7 aos 10 anos, se encontra na fase das operações
concretas. O termo operação se refere a esquemas internos eficazes quando a
criança já possui a capacidade de reversibilidade e, cognitivamente, evolui na
objetividade do pensamento, classificando, seriando e enumerando os objetos
e suas propriedades (peso e volume). Ela passa a ter interesse por jogos com
regras, interpretando-as e modificando-as de acordo com as situações
vivenciadas em aula.
Segundo Piaget, o desenvolvimento cognitivo da criança acontece
em 4 períodos:
⇒ Sensório-motor – caracterizado pelas atividades reflexas
(0-2 anos);
⇒ Pré-operacional – em que a criança pode lidar
simbolicamente com certos aspectos da realidade, mas seu pensamento
ainda se caracteriza pela irreversibilidade (2-7 anos);
⇒ Operações concretas – em que a criança adquire o
esquema de conservação (7-11 anos);
⇒ Operações formais – caracterizado pelo pensamento
proposicional, representa o ideal da evolução cognitiva do ser humano (11
anos em diante).1
3.3. DESENVOLVIMENTO E CAPACIDADES SÓCIO-
AFETIVAS
As emoções e os movimentos são condutas edificadas pela
tonicidade que, como plasma de maturação neuromuscular, vai permitindo a
edificação das posturas e atitudes. Atitudes que são consideradas como
estruturas intermediárias entre o real e a representação, que influenciam
1 Piaget, J., 1952, p. 8
dialeticamente o desenvolvimento da inteligência e da afetividade. Aquilo que
transforma o fisiológico em psicológico é a tonicidade, daí as suas relações
com as emoções, que são, ao mesmo tempo, condutas motoras e condutas
sociais nas primeiras modalidades de adaptação. Tanto no adulto, quanto na
criança, a emoção é um fator de desorganização de comportamentos e ao
mesmo tempo um fator de comunicação e expressão, com significado
interafetivo e intersocial.
A infância é a etapa mais importante em direção à maturidade, por
isso é o período em que deve-se proporcionar à criança condições adequadas
para sua evolução, lembrando que ela é um ser multidimensional e que sua
motricidade interage complexamente com as dimensões cognitiva, afetiva e
social. Assim, seu comportamento, seu envolvimento na sociedade, suas
relações interpessoais, seus papéis e suas atitudes, estão ligados diretamente
ao processo de crescimento e desenvolvimento, sob uma perspectiva
ecológica.
Bronfenbrenner2 diz que, “o ambiente importante para o
desenvolvimento não é somente aquele em que a criança está participando
diretamente, mas todo aquele no qual ela também participa indiretamente”. A
sua proposta teórica fundamenta-se no princípio de que “os maiores avanços
na compreensão científica da base intrapsíquica e os processos interpessoais
do desenvolvimento humano requerem uma investigação em ambientes reais,
tanto imediatos quanto remotos, nos quais os seres humanos vivem”.
A estrutura social do ser humano baseia-se em relações
interpessoais, formadas por um sistema de duas ou mais pessoas, sendo
obtidas sempre que uma presta atenção ao comportamento da outra ou
participa com ela em alguma atividade. Três características são fundamentais
para que essas relações aconteçam: reciprocidade, equilíbrio de poder e
afetividade.
2 Bronfenbrenner, 1979, p. 21
Ü Reciprocidade – está relacionada à maneira como os
participantes interagem entre si, buscando encorajamento e motivação. O
resultado dessa interação pode levá-los a participar de situações mais
complexas.
Ü Equilíbrio de poder – sugere uma igualdade em termos de
influência na atividade em que estão envolvidos. O ideal é que a dominância
não permaneça sempre com o mesmo indivíduo, pois para que a
aprendizagem realmente contribua com o processo cognitivo e social, faz-se
necessário que o ser em desenvolvimento tenha oportunidade de exercitar o
controle sobre a situação apresentada.
Ü Afetividade – sugere o desenvolvimento de sentimentos mais
pronunciados entre os indivíduos que se envolvem numa mesma situação.
Esses sentimentos podem variar quanto à qualidade, assumindo características
positivas, negativas, ambivalentes ou assimétricas.
Neste importante momento do desenvolvimento do ser humano,
ocorre o ajustamento psicossocial. Os grupos de parceria e a própria escola
desempenham relevante papel nesse ajustamento. Os grupos de amizade
oferecem à criança na fase de sete aos dez anos certo apoio social, modelos
humanos a imitar e a noção fundamental dos diferentes papéis que os
indivíduos exercem na sociedade. A escola oportuniza à criança conhecer
autoridades fora do ambiente familiar. Existem ligações sociais e cognitivos que
só podem ser aprendidas com a interação humana.
A socialização da criança é adquirida na fase da latência, porque o
interesse sexual parece estar submerso. Os amigos tornam-se muito
importantes, mas quase todos os grupos são de crianças do mesmo sexo. Elas
estão explorando e aprendendo seus papéis sexuais: os meninos parecem
centralizar-se mais nos modelos do que as meninas. Nesse momento, as
meninas se interessam mais por atividades de jogos e brincadeiras de
meninos, do que o inverso.
A ligação afetiva com os pais é menos visível, mas ainda existe. Em
relação aos amigos, a afetividade é especial. Formam-se amizades e
descobrem-se novos modelos de jogos e brincadeiras uns com os outros.
Também se estabelecem lideranças e a popularidade se torna importante bem
como a aprendizagem do papel sexual. Os padrões de relacionamento formam-
se aos 6 ou 7 anos, mas são praticados e refinados durante os anos escolares.
Além disso, a independência da criança evolui muito devido à sua maior
capacidade de ir a alguns lugares sozinha, de realizar novas tarefas por si
própria. Este é o período em que as alterações nela são menos perceptíveis.
3.4. DESENVOLVIMENTO PSICOSSEXUAL3
A cada nova fase que a criança enfrenta, representa-se em sua vida
mais uma experiência difícil, tanto no plano acadêmico, quanto no emocional.
Nesse momento, ela terá que elaborar um novo esquema corporal, lidar com
uma nova auto-imagem e novas sensações.
Todo ser humano tem de si uma imagem física estruturada. Aceitar
alterações da imagem corporal quase sempre causa tensões e aborrecimentos,
quando não verdadeiras penas. Além disso, tais modificações não lhe
asseguram uma melhoria de auto-imagem e, muitas vezes complicam as suas
relações com o meio ambiente, tornando-o desajustado, pouco agradável e
pouco amado.
Para que se entenda um pouco dessas transformações que ocorrem
com a criança, torna-se necessário conhecer os diferentes estágios do
desenvolvimento psicossexual, assim como as estruturas psicológicas que
organizam sua personalidade:
Estágio Oral (1º ano) – durante o primeiro ano a criança
estabelece relação com o mundo através da boca. A criança satisfaz
3 Estudo em Freud, S., 1948, p. 353-357
(gratifica) a sua fome, através da boca, por meio da qual também incorpora
os objetivos pela estimulação tátil agradável que tal exploração corporal
provoca. Mais tarde, a criança desenvolve os seus dentes com os quais
morde e mastiga, funções essas também importantes. A boca constitui
nesta fase o órgão privilegiado de relação com o objeto e com o próprio
corpo. O pôr a mão e o pé na boca traduzem necessariamente mais um
aspecto importante da incorporalização do seu ego.
Estágio Anal (2º e 3º anos) – surge a relação com o
controle do esfincter anal que implica uma sensação de desconforto. Surge
então, um aspecto de repressão social quando se exige da parte da criança
a regulação de um impulso instintivo. É a época dos primeiros conflitos e
das primeiras repressões que se exercem ao nível da constenção familiar.
Estágio Fálico (4º e 5º anos) – neste período o órgão
genital torna-se o principal órgão de satisfação para a criança. Nascem as
manifestações auto-eróticas próprias desta idade. É neste período que
desenvolve o complexo de Édipo. Este complexo envolve a atração sexual
pelo pai do sexo oposto e a hostilidade e a oposição com o pai do mesmo
sexo. O menino deseja a mãe e elimina o pai, a menina deseja o pai e
elimina a mãe. Este complexo desempenha um papel muito importante nas
atitudes adultas.
Estágio Genital (puberdade) – ao estágio fálico segue-se
um período de latência em que se desenrola a problemática de Édipo, que
vem a ser ativada no período de abordagem à adolescência. No estado pré-
genital, a criança começa a ser atraída por objetos reais iniciando-se a
verdadeira adaptação ao mundo real. É nisto que se traduz a passagem da
auto-orientação da criança para a aprendizagem social do adolescente.
Sendo assim, fica completada a organização da personalidade da
criança, que situa no corpo e na sua elaboração integrada um papel muito
importante no seu desenvolvimento psicossexual. Essa organização encontra-
se dependente de três estruturas psicológicas:
6 Id – princípio do prazer; área instintiva; substrato biológico
da personalidade; interior.
6 Ego – princípio da realidade; área de mediação entre o
instinto e a realidade; princípio de execução dependente da subjetividade e
da objetividade.
6 Superego – princípio da constância; área dos valores
morais aprendidos socialmente; valores; identificação; socialização; exterior.
As três estruturas representam potencialmente motivos de conflito e
objetivos de comportamento do indivíduo. A mediação realista do ego pretende
a superação dos conflitos, quer interiores, quer exteriores, quer mais uma vez
se vem a refletir numa imagem do corpo. No caso de uma gratificação realista,
trata-se de uma personalidade equilibrada, no caso de uma gratificação
impossível ou de uma repressão e opressão social, trata-se de uma
personalidade desintegrada.
CAPÍTULO IV
EDUCAÇÃO FÍSICA E PSICOMOTRICIDADE
NO COTIDIANO ESCOLAR
A criança desenvolve-se e matura-se no contato com o mundo
vivenciando e experimentando as relações com o corpo, que é no início o seu
único meio de comunicação. Todas as suas inaugurações são corporais e
estão intimamente ligadas à emoção e ao prazer. A corporeidade é a
linguagem mais primitiva desse indivíduo desde a sua fase uterina. A escola
pode utilizar o corpo como fonte primária: aquela na qual a criança pode
observar e engajar-se em padrões de atividades conjuntas, progressivamente
mais complexas, com ou sob a orientação direta de pessoa ou de pessoas que
já possuam conhecimentos e habilidades ainda não adquiridos pela criança e
com quem ela desenvolveu um relacionamento emocional positivo. O corpo
também pode ser utilizado como fonte secundária: aquela na qual são dadas
oportunidades, recursos e encorajamento para a criança engajar-se em
atividades que ela tenha aprendido no contexto de desenvolvimento primário,
mas então sem envolvimento ativo ou orientação direta de outra pessoa que
possua conhecimentos e habilidades além dos níveis adquiridos pela criança.
Mas o sistema educacional persiste em dissociar corpo-mente, em
fragmentar a criança em cognitivo, afetivo e motor esquecendo-se do psíquico.
Esquece que o movimento é a chave da vida e existe em todas as formas com
que esta se apresenta. Quando o homem desempenha movimentos
intencionais ele está coordenando os domínios cognitivo, psicomotor e afetivo.
O movimento está em ligação direta com a criança, pois é parte dela
que se comunica com o mundo e também é a parte dele que a criança irá
organizar-se enquanto sujeito pensante e atuante para dar conta da sua
participação na sociedade.
Neste sentido, fazer um elo da educação física com a
psicomotricidade no cotidiano escolar, atenderá às exigências de um corpo que
pertence a uma cultura, a um momento histórico, político e socioeconômico,
que está em constante desenvolvimento.
Na educação física o movimento livre, espontâneo, é o mais
importante para a construção da ação motora, pois é a partir dele que se pode,
mais tarde, criar movimentos direcionados para uma prática esportiva. Quanto
mais numerosas e mais ricas forem as situações vividas pela criança, maior
será o número de esquemas por ela adquirido. A Educação Física tem como
objetivo, estimular o desenvolvimento psicomotor e, como princípio
fundamental, despertar a criatividade, além de contribuir para a formação
integral do educando, utilizando-se das atividades físicas e da educação
psicomotora, que associadas aos potenciais intelectuais, afetivos e sociais,
garantirá a ele segurança e equilíbrio, permitindo-lhe desenvolver-se, e
organizar corretamente as suas relações com os diferentes meios nos quais
deve evoluir.
Desse modo, a educação física junto com a psicomotricidade no
cotidiano escolar, visam melhorar e oportunizar o sujeito ao movimento,
conscientizando-o do seu próprio corpo, da consciência do esquema corporal,
domínio do equilíbrio, construção e controle das coordenações global e parcial,
organização das estruturas espaço-temporal, melhoria das possibilidades de
adaptação ao mundo externo, estruturação das percepções. Os benefícios
serão notados ao longe da vida desse sujeito, pois será, seja na dança, na
ginástica, nos jogos, nos esportes, na família ou na escola, um ser bem
resolvido em suas questões internas, podendo a cada dia se libertar para as
questões externas.
4.1. GINÁSTICA
A ginástica está associada as aulas de educação física, pois pode
ser conceituada como a arte de exercitar o corpo, já que, traz em si uma
movimentação corporal cuja construção se deu a partir das relações sociais.
Hoje, na sociedade brasileira, encontramos diferentes focos de
valorização do corpo:
• Corpo-Máquina – força de trabalho e sua exercitação ainda
é via adestramento.
• Corpo-Atlético – busca a performance e o corpo belo
(sociedade de consumo).
• Corpo-Saudável – busca a atividade física, como uma
forma compensatória à vida sedentária.
Contudo, a ginástica como meio da educação física, tem como
objetivo principal, proporcionar a criança o conhecimento do seu próprio corpo,
dos movimentos e dos seus limites. Através de atividades que permitam a
expressão, a criação (ao invés de movimentos mecanizados e repetitivos),
enfim, o corpo em movimento agindo em todas as suas possibilidades de
expansão.
A ginástica pode ser aplicada nas aulas de Educação Física através
de várias opções, usando movimentos naturais ou elementos fundamentais em
suas variadas formas com e sem elementos. As variações da ginástica estão
dispostas nos seguintes tipos:
Ginástica natural.
Ginástica olímpica.
Ginástica rítmica desportiva.
Ginástica com elementos.
Todos esses tipos de ginástica podem ser organizados
separadamente, trabalhando fundamentos básicos de cada um, ou de forma
circuitada utilizando diferentes materiais. As atividades podem ser direcionadas
pelo professor, mas podem ser construídas pelas próprias crianças. Nesse
momento, elas tanto estão aprendendo atividades novas, quanto estão sendo
incentivadas a criação de novos movimentos, o que leva ter motivação,
segurança, criatividade e auto-estima a partir de sua própria idéia.
É importante ressaltar que durante os dinâmicos exercícios de
ginástica, a criança necessita de muita atenção, além de completo esforço
corporal, o que significa que, a todo instante ela estará precisando rever suas
atitudes, comportamentos e posturas. A ginástica é fundamental como prática
física, pois leva à criança a experimentação de várias emoções e sentimentos,
como o medo e o prazer de sua superação, a coragem de se lançar no espaço
contra os novos desafios, o risco de se aventurar em variadas e diferentes
posturas, se equilibrar sobre diversas posições, fortalecendo ainda mais sua
auto-estima e autoconfiança, além de orientá-la as ações e comportamentos
sociais.
4.2. DANÇA
A dança é uma atividade que utiliza o corpo em movimento como um
meio de expressão, comunicação e criação. Torna-se um potente canal para
sublimar a energia (pulsões evitando frustrações) gerando a produção da
atividade expressiva, comunicativa e artística, que estabelece as fronteiras
para o mundo, não só no contexto sócio-cultural como também na estruturação
da personalidade. A dança utiliza o corpo como instrumento de manifestação e
ao mesmo tempo como reflexo da estrutura social. As questões vitais de prazer
(sexualidade), energia (agressividade), alegria (lúdico) são tendências do
homem fomentada pela sociedade através de valores racionalizados. Os
movimentos portanto, são retirados das práticas racionais onde estas questões
ocorrem. As idéias, as concepções, as tendências, são manipuladas em função
de facilitar a possibilidade e a comunicação, tendo o corpo como instrumento.
Enquanto meio de comunicação, o corpo interfere nos padrões de
relações sociais: ele age, interage na sociedade, ao mesmo tempo que sofre
suas influências. Ele é um fator social de: cooperação humana, união,
expressão de vida, de movimento (individual e em grupo) e diversão, que
através da dança, enquanto atividade física, acompanha uma necessidade
orgânica como: impulso da fome, do sexo, da ludicidade e também o impulso
combativo.
Aplicar a dança nas aulas de Educação Física é também trabalhar
na criança a cinestesia corporal, que envolve componentes internos e externos.
Os aspectos internos envolvem as sensações dos músculos quando se faz
algum movimento proporcionando o retro-alinhamento, que permitirão
desenvolver as devidas adaptações para o desempenho motor. Os aspectos
externos envolvem conceitos pertinentes às relações espaço-temporais, ou
seja, relação do próprio corpo e deste em relação ao próprio ambiente que o
cerca.
A dança pelo seu nível de exigência em relação a postura corporal e
aperfeiçoamentos dos reflexos posturais dinâmicos, pelo retroalinhamento ou
relação à colocação do centro de gravidade, favorece a manutenção do
equilíbrio mais constante. O corpo dançante, ao executar movimentos
necessita de perceber aspectos ligados às estruturas de uma boa consciência
corporal e que sem um bom equilíbrio dividiria sua atenção disso resultaria
dificuldade da percepção dos aspectos bilateralidade, lateralidade e
dominância dos segmentos corporais exigidos pelos movimentos.
Ao se falar em ritmo, pode-se admitir que a dança se origina nele,
que é a pulsão ou ritmo próprio e característico de uma pessoa.
Os movimentos de uma pessoa se processam durante algum tempo
e podem ser medidos com exatidão através de três fatores: andamento,
duração e intensidade.
Assim, o ritmo das formas, dos movimentos, das linhas, das cores, é
que dão nascimento as variações de movimento potencial ou liberado pela
velocidade ou intensidade do movimento. É ele que dá colorido e expressão ao
movimento pelas suas várias nuances, intensidades com suave, forte e a
velocidade dos ritmos rápidos e lentos. É o ritmo que estabelece conexão
profunda com o eu interior proporcionando a expressão de forte e variadas
emoções expressas pela dimensão interior do ser ao comunicar-se como o
exterior em relação com o outro ou com o ambiente.
4.3. O JOGO E O ESPORTE: AGENTES
SOCIALIZADORES
O jogo faz parte da vida do ser humano. O ato de jogar é tão antigo
quanto à própria história do homem. Ele é caracterizado como uma atividade
livre, fundamentalmente lúdica, contendo regras não convencionais, de caráter
competitivo, que possui como característica principal a espontaneidade e
possibilita a expressão de vivências culturais de forma intensa e total.
Na infância o jogo é essencial. Brincando e jogando, a criança
reproduz suas vivências, transformando a realidade de acordo com seus
interesses e desejos, de forma dinâmica e criativa.
Os elementos do jogo, como o conjunto de regras, a competição, o
tempo e o espaço em que ele ocorre, colocam a criança em situações de
adaptação e readaptação, que provocam diferentes atitudes comportamentais
e, conseqüentemente, exigem que ela esteja constantemente desempenhando
seu papel social de criança.
Desta forma, o jogo não representa apenas as experiências vividas,
mas prepara o indivíduo para o que está por vir, exercitando habilidades e
principalmente estimulando o convívio social.
Ao analisar a evolução do jogo na criança, verifica-se que o jogo,
inicialmente egocêntrico e espontâneo, torna-se cada vez mais socializador.
A criança de 7 anos só consegue seguir regras simples. Muitas
vezes ela quebra as regras do jogo, mas não o faz intencionalmente, e sim
porque ainda não consegue se lembrar de todas as regras. Nesta fase, a
criança não dá muito valor à competição, pois tem uma idéia não muito definida
do que seja ganhar ou perder. Geralmente ela não joga para vencer ou superar
os outros, mas pelo simples prazer da atividade. O educador nesse momento,
deve procurar não despertar o sentimento de competição acirrada,
aproveitando essa disposição natural da criança para jogar pelo simples prazer
de jogar. Além disso, deve selecionar jogos simples, com poucas regras, para
serem praticados pelas crianças que estão nesta fase de desenvolvimento. A
interação social precisa ser incentivada, dando-se destaque às atividades de
linguagem.
No período de 8 a 12 anos, os jogos tornam-se cada vez mais
coletivos e menos individuais, uma vez que a criança já tem noção do que seja
cooperação e esforço grupal e exige regras definidas para regulamentar o jogo.
Ela observa e controla os outros membros do grupo para verificar se estão
seguindo adequadamente as regras. A violação das regras geram grandes
discussões; nesta fase, surge um forte sentimento de competição. O fato de
perder torna-se quase intolerável para algumas crianças, dando origem a
cenas de choro e até mesmo agressão. Nesse momento, o educador deve
procurar despertar o espírito de cooperação e de trabalho conjunto no sentido
de metas comuns. A criança precisa de ajuda para aprender a vencer, sem
ridicularizar uma atitude de compreensão e aceitação, e quando o clima da
aula é de cooperação e respeito mútuo, a criança sente-se segura
emocionalmente e tende a aceitar mais facilmente o fato de ganhar ou perder
como algo normal, decorrente do próprio jogo.
O papel do educador é fundamental, no sentido de preparar a
criança para a competição sadia, na qual impere o respeito e a consideração
pelo adversário.
O espírito de competição deve ter como tônica o desejo do jogador
de superar a si próprio, empenhando-se para aperfeiçoar, cada vez mais, suas
habilidades e destrezas. A situação de jogo deve constituir um estímulo
desencadeado do esforço pessoal tendo em vista o auto-aperfeiçoamento.
Jogo supõe relação social. Por isso, a participação em jogos
contribui para a formação de atitudes sociais: respeito mútuo, solidariedade,
cooperação, obediência às regras, senso de responsabilidade, iniciativa
pessoal e grupal. É jogando que a criança aprende o valor do grupo como força
integrada e o sentido da competição salutar e da colaboração espontânea e
consciente.
Através de jogos, a criança aplica seus esquemas mentais a
realidade que a cerca, aprendendo-a e assimilando-a. A criança, brincando,
produz as suas vivências, transformando o real de acordo com os seus
interesses. Ela aplica no jogo toda a sua sensibilidade de questionar aquilo que
é aparente, não aquilo que lhe é dado pelo adulto.
O verdadeiro jogo em si cria ordem e uma ordem muito eficaz,
porque é aceita pelo grupo e elaborada conjuntamente. E por ele ser livre de
pressões e avaliações, cria um clima de liberdade, propício à aprendizagem e
estimulando a moralidade, o interesse, a descoberta e a reflexão.
O esporte também é de grande importância no desenvolvimento da
criança. ele aparece da atração do homem pelo jogo, já que o lúdico também
se evidencia na sua prática, e surge principalmente quando existe a
possibilidade da livre escolha, de forma diversificada, que oportuniza um amplo
conhecimento das suas diferentes modalidades. Mesmo aquelas que não
fazem parte do seu cotidiano. Como conteúdo das aulas de educação física, o
esporte é supervalorizado por alunos no período escolar de 5ª a 8ª séries, que
na maioria das vezes nem se lembra de utilizar os demais conteúdos como:
ginástica e dança. Mesmo não sabendo, quando praticam esportes, os alunos
envolvem vários fatores que contribuem no seu desenvolvimento como:
aperfeiçoamento físico, meio de socialização, meio de desenvolver uma
consciência coletiva, meio de comunicação e unidade nacional, busca de
prazer, fim estético, atividade profissional, esporte pelo esporte com um fim em
si mesmo.
CONCLUSÃO
O objetivo desse trabalho foi ressaltar a importância da relação e
atuação da Educação Física com a Psicomotricidade no desenvolvimento
corporal da criança. Para isso, uma breve reflexão foi feita sobre a história da
educação física e da psicomotricidade e como elas vêm conquistando e
alcançando seu espaço no âmbito escolar.
Verifica-se hoje que há uma preocupação com o desenvolvimento
harmonioso da criança, onde atender às suas necessidades, garantir sua
autonomia e liberdade de expressão, tornam-se fundamentais para o seu
crescimento e amadurecimento.
Nesse sentido, a relação da Educação Física com a
psicomotricidade desponta como prática enriquecedora e que deve ser
reconhecida e valorizada por todos os profissionais da instituição escolar. Em
outras palavras, é necessário que todos participem conscientemente do
processo de desenvolvimento da criança, sabendo como se deve agir para
garantir à ela, um lugar com liberdade de expressão, escolha e criação, tendo
segurança e acolhimento necessários para vivenciar todas as possibilidades e
experiências oferecidas no dia-a-dia.
Este trabalho procurou mostrar que cada criança é única, com seus
limites, desejos e experiências, onde a consciência e a cultura corporal são
influenciadas pela sociedade e pelo momento histórico, que é inerente a cada
sujeito. Por fim, a pesquisa mostra aos profissionais envolvidos diretamente
com a criança, que as atividades corporais oferecidas nas aulas de Educação
Física são de extrema importância para o seu crescimento e desenvolvimento,
logo, para que isso aconteça, devemos dar-lhe a possibilidade de existir, de
tornar-se uma pessoa única, diferente dos outros em sua maneira de pensar,
se comunicar, agir e sentir.
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ANEXOS