UNESCO 2004 Edição publicada pelo Escritório da UNESCO no...

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  • UNESCO 2004 Edio publicada pelo Escritrio da UNESCO no Brasil

    Os autores so responsveis pela escolha e apresentao dos fatos contidos neste livro, bem como pelas opiniesnele expressas, que no so necessariamente as da UNESCO, nem comprometem a Organizao. As indicaesde nomes e a apresentao do material ao longo deste livro no implicam a manifestao de qualquer opinio porparte da UNESCO a respeito da condio jurdica de qualquer pas, territrio, cidade, regio ou de suas autoridades,nem tampouco a delimitao de suas fronteiras ou limites.

  • edies UNESCO

    Conselho Editorial da UNESCO no BrasilJorge WertheinCecilia BraslavskyJuan Carlos TedescoAdama OuaneClio da Cunha

    Comit para a rea de Desenvolvimento SocialJulio Jacobo WaiselfiszCarlos Alberto VieiraMarlova Jovchelovitch NoletoEdna Roland

    Assistente Editorial: Rachel Gontijo de ArajoReviso: Julieta Cortazzo, Reinaldo LimaDiagramao: Fernando BrandoProjeto Grfico: Edson FogaaApoio Tcnico: Maria Luiza Monteiro Bueno e Silva, Telma Maria Teixeira da Silva

    UNESCO, 2004

    Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a CulturaRepresentao no BrasilSAS, Quadra 5 Bloco H, Lote 6,Ed. CNPq/IBICT/UNESCO, 9 andar.70070-914 Braslia DF BrasilTel.: (55 61) 2106-3500Fax: (55 61) 322-4261E-mail: [email protected]

    Nos caminhos da incluso social: a rede de participao popular de PortoAlegre / por Julio Jacobo Waiselfisz et alii. Braslia : UNESCO,2004.

    132p.

    1. Mobilizao social Brasil 2. Integrao social Brasil3. Participao social Brasil I. Waiselfisz, Julio Jacobo II. UNESCO

    CDD 305

    BR/2004/PI/H/5

    mailto:[email protected]

  • EQUIPE DA PESQUISA

    Coordenao GeralMarlova Jovchelovitch Noleto

    Coordenao TcnicaJulio Jacobo Waiselfisz

    Coordenao LocalCntia Bonder

    ConsultoresMiriam Thais Guterres Dias

    Paulo Csar Chiechelsi

    Apoio TcnicoBeatriz Maria Godinho Barros Coelho

    AssistenteArlei Mrcia Weide

    EstagiriasJane Damasceno Oliveira

    Melissa de Carvalho Farias

    Coleta de dadosClaudia Correia Coelho

    Josiane Andrades

    Mara Regina da Silva Rodrigues

    Mrcia Chaves Moreira

    Pmela Caldart

    Sheila Silva de Oliveira

    Viviane Paliarini

    Tratamento de dados estatsticosUsiara Britto

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    SUMRIO

    Apresentao .......................................................................................................... 9Abstract .................................................................................................................. 11Introduo ............................................................................................................. 13

    I. ORAMENTO PARTICIPATIVO DE PORTO ALEGRE ........ 171.1 Caracterizao do Oramento Participativo ................................. 171.2 Gnese do Oramento Participativo ............................................... 191.3 A institucionalizao do Oramento Participativo ....................... 251.4 O Funcionamento Geral do Oramento Participativo ............... 291.5 Os Participantes no Oramento Participativo ............................... 321.6 A Expanso e Repercusso do Oramento Participativo .......... 401.7 A Participao e As Polticas Setoriais ............................................. 42

    II. REDE DE PROTEO SOCIAL ...................................................... 452.1 O Enfrentamento das Desigualdades Sociais ................................ 452.2 Rede de Assistncia Social: Estrutura e Principais Servios ........ 482.3 Programa Famlia: Apoio e Proteo ............................................. 52

    III. O ESCOPO DO TRABALHO ............................................................. 613.1 OBJETIVOS ....................................................................................... 61 3.1.1 Objetivo Geral: ........................................................................ 61 3.1.2 Objetivos Especficos: ............................................................ 613.2 ABORDAGEM METODOLGICA ......................................... 62 3.2.1 Etapa qualitativa ....................................................................... 63 3.2.2 Etapa quantitativa .................................................................... 68

    IV. RESULTADOS: REDE DE PARTICIPAO POPULAR.......... 714.1 ASSOCIATIVISMO .......................................................................... 714.2 CONSELHOS SETORIAIS ........................................................... 764.3 ORAMENTO PARTICIPATIVO .............................................. 83

    V. RESULTADOS: REDE DE PROTEO SOCIAL ...................... 97

    Consideraes Finais ........................................................................................ 105Siglas .................................................................................................................... 111Bibliografia ......................................................................................................... 113Nota sobre os autores ..................................................................................... 129

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    APRESENTAO

    A UNESCO, em sua histria, tem primado por encorajar asinovaes, assim como por avali-las, para melhor conhecer as suaspossibilidades e limites. A Constituio Federal de 1988, chamadade Constituio Cidad, abriu caminhos para novas iniciativas noseio do Estado democrtico de Direito. Uma delas foi a participaoda populao em mecanismos decisrios do poder pblico,aproximando e flexibilizando a relao povo-governo.

    Com esse fundamento na Lei Maior, o Municpio de PortoAlegre, Rio Grande do Sul, empreendeu, no perodo de 1989 a2003, uma srie de iniciativas consubstanciadas na participaoda populao, tendo grande destaque o oramento participativo.Foram tambm desenvolvidas polticas sociais destinadas aestruturar redes de participao popular e de proteo s famliasem situao de vulnerabilidade social.

    A experincia do oramento participativo, hoje j desenvolvidaem mais de 140 municpios, constitui um marco na construo dademocracia brasileira, ampliando as fronteiras da participao cidadnas decises de governo.

    A experincia pioneira de Porto Alegre, passados 16 anos,merece ser avaliada e disseminada.

    Foi o que empreendeu a presente pesquisa, publicada nestevolume, com a coordenao geral de Marlova JovchelovitchNoleto e a coordenao tcnica de Julio Jacobo Waiselfisz, doisprofissionais do Escritrio da UNESCO no Brasil.

    O trabalho, associando mtodos quantitativos e qualitativos,caracterizou a Rede de Proteo s Famlias em Situao deVulnerabilidade Social, identificou a percepo e a imagem dosdiversos pblicos usurios, as principais caractersticas,necessidades e expectativas desses pblicos e identificou, naconscincia da cidadania, a percepo da articulao dos diversosprojetos e programas entre si e entre os programas e a estrutura

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    da Prefeitura. Seus resultados ressaltam tanto a rica participaocidad em associaes de adeso voluntria, constituindo extensarede, como a ativa atuao nos diversos organismos decisrios depolticas setoriais existentes no Municpio, isto , os Conselhos.As diversas instncias esto ligadas entre si, enquanto a maioriados participantes nos conselhos no teve dificuldades no acesso.Alm disso, 87% da populao consideram esses colegiadosimportantes ou muito importantes. digno de salientar que aparticipao nos conselhos, em grande parte no depende da rendaou da escolaridade dos indivduos. Em outros termos, quanto slinhas gerais, os conselhos espelham a diviso da populaosegundo a renda e a escolaridade.

    Quanto rede de proteo social, altamente visvel para ospesquisados, alcanou uma avaliao positiva. No que tange percepo dos beneficirios do Programa Famlia: Apoio eProteo, foi observado que a transferncia de renda produziaefeito relevante sobre as condies materiais de vida dos gruposfamiliares. Assim, atendia mais imediatamente s necessidadesbsicas de alimentao, higiene e sade dos domiclios. Oprograma, por outro lado, se articula com outras polticas sociais,permitindo a incluso da populao-alvo nos demais programasde educao infantil, educao de jovens e adultos, ateno bsica sade, servios socioeducativos e cursos de capacitao.

    O painel traado pela pesquisa permite distinguir realizaes,limitaes e frentes para avanar. A UNESCO tem, portanto, oprazer de apresentar discusso pblica os resultados que serviro,certamente, para o aperfeioamento das polticas municipais e,tambm, para que novas iniciativas sejam tomadas, em outroslocais. Com a prudncia de reduzir as limitaes, a sabedoria demaximizar as vantagens e o cuidado de adequar idias e projetoss diferentes circunstncias, que combinam a sua singularidadecom a riqueza da pluralidade social.

    Jorge Werthein

    Representante da UNESCO no Brasil

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    ABSTRACT

    Participatory budget in Porto Alegre. This report presents theresults of an evaluation research on the experiences ofparticipatory budget and social policies directed to lower incomepopulation, developed by the municipality of Porto Alegre, a largecity in Southern Brazil, in 1989-2003. The project combinedquantitative and qualitative methods. The researchers conductedstructured, semi-structured, and non-structured interviews withdifferent groups, as well as 486 structured interviews in a surveysample. The results reveal high levels of participation of the civilsociety in associations and in the boards established by the localgovernment. Moreover, the participation in the board wasrelatively independent of income and level of schooling, reflectingthe diversities of the population. Concerning the social protectionnetwork, the researchers concluded that it is visible and wellevaluated by the subjects. Income transfer to sociallyunderprivileged families has immediate results on meeting basicneeds, such as food, hygiene, and health. This program was relatedto others, in the fields of early childhood education, health careetc. Possibilities and limits are pointed out, as well as suggestionsfor improving social programs and projects.

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    INTRODUO

    Desde alguns anos, precisamente 16 anos, um modelo polticoalternativo, centrado nas relaes entre o Estado e a sociedade civilbrasileira, comeou a ser implantado no Municpio de Porto Alegre. um modelo emergente de uma viso de democracia participativa,como forte indutor para que os movimentos sociais e a cidadaniaintervenham ativamente no s nas eleies, mas, funda-mentalmente, nas decises sobre os assuntos pblicos. Isto demandauma ativa rede de entidades e associaes da sociedade civil,multiplicidade de conselhos de deciso setorial, dentro de umamatriz organizativa centrada numa estratgia oramentriaparticipativa. Todo este conjunto, mediante audincias pblicas,plenrias, assemblias, consultas, etc., apontam para uma gestodos assuntos pblicos que passa pelas mos da sociedade civil.

    Por isso, a Rede de Participao Popular de Porto Alegre, emboraa sua centralidade, no pode ser reduzida apenas ao OramentoParticipativo (OP), nem este meramente um exerccio de divisoe atribuio das receitas e despesas do municpio pela prpriacidadania. Por causa de sua amplitude a cidade conta atualmentecom 1,4 milhes de habitantes no corao de uma regiometropolitana de 3,9 milhes e pelo seu mtodo, rigoroso eevolutivo, ele constitui uma experincia de democracia participativadireta sem equivalente no mundo, como aponta Bernard Cassen(1998), diretor do Le Monde Diplomatique.

    Para a UNESCO, a experincia de Porto Alegre constitui-se emreferncia mundial que deve ser analisada, estudada e disseminadas outras cidades do mundo. Trata-se de uma experincia quemudou a relao sociedade-Estado e flexibilizou a relao povo-governo, ampliando os canais de participao e permitindo que aprpria populao possa definir os investimentos prioritrios, almde opinar nos rumos da administrao da cidade.

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    Cabe lembrar tambm que a idia da rede de proteo social inovadora e permite traar uma perspectiva de incluso, cobrindoos diversos aspectos da dimenso cidad e humana.

    Trazer esta avaliao a pblico significa permitir que outrosmunicpios, gestores pblicos, agncias internacionais e interessadosno tema, possam aprender com ela e que a experincia inovadorade participao cidad possa ser disseminada e ampliada.

    A finalidade central do presente estudo contribuir para umamelhor compreenso das diversas dimenses envolvidas noenfrentamento da questo social, por parte da Prefeitura Municipalde Porto Alegre, e apresentar sugestes que proporcionemcondies para o aperfeioamento dos instrumentos empregadospara operacionalizao das polticas pblicas municipais. Pretendeu-se, dessa forma, realizar uma avaliao dos mecanismos deimplementao das polticas sociais do Municpio de Porto Alegredurante o perodo de 1989 a 2003, dentro do marco de refernciadefinido pelos interlocutores da prpria Prefeitura Municipal dePorto Alegre. A pesquisa bibliogrfica sobre o que j foi produzidoe publicado sobre o assunto, permite afirmar que o grandediferencial deste estudo mostrar qual a percepo que a populaodo municpio tem sobre as redes de participao implementadaspelo executivo local.

    Esse marco de referncia envolveu a anlise de duas linhas deao especficas e complementares desenvolvidas na conformaodas polticas sociais, caracterizadas como Rede de ParticipaoPopular e Rede de Proteo s Famlias em Situao deVulnerabilidade Social. A Rede de Participao Popular configura-se pelos mecanismos formais e institucionais desenvolvidos pelaPrefeitura Municipal de Porto Alegre, visando propiciar umamaior participao da populao na formulao e implementaodas polticas pblicas municipais. A Rede de Proteo s Famliasem Situao de Vulnerabilidade Social envolve um conjunto deaes e programas que so realizados por diferentes organismosda estrutura administrativa do municpio (administraocentralizada e fundacional), referente aos servios de assistncia

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    social em geral (educao, sade e trabalho) e s famlias emsituao de excluso social.

    Embora exista o reconhecimento dos avanos alcanados emcada uma dessas linhas de ao ao longo dos ltimos anos, acomplexidade dos problemas associados ao atendimento dademanda por servios sociais, o surgimento de novas formas deexcluso social e as limitaes impostas pela estrutura efuncionamento do aparato estatal justificam, segundo entendimentodos interlocutores da Administrao Municipal, um olhar maisacurado sobre a extenso dessas aes, os seus nveis de articulaoe os impactos produzidos junto comunidade em geral.

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    1.1 CARACTERIZAO DO ORAMENTOPARTICIPATIVO

    A experincia do Oramento Participativo de Porto Alegre seconstitui numa inovadora forma de estabelecer relaes entre oEstado e a sociedade civil, tendo como eixo central a participaopopular na administrao municipal,com o objetivo de enfrentaras histricas desigualdades sociais construdas no bojo das relaesprodutivas do capitalismo.

    O Oramento Participativo leva em conta as caractersticas dasociedade civil discutindo os seguintes elementos: o papel das pr-estruturas organizativas da sociedade civil no xito das polticasparticipativas; a capacidade do Estado de induzir formas deassociativismo e prticas deliberativas semelhantes quelasexistentes no campo da sociedade civil; a capacidade de as formasparticipativas distriburem recursos de modo generalista, evitando,assim, a transformao das associaes existentes em canaiscorporativos de acesso a recursos, e o debate acerca do papel datradio associativa na variao do xito das experincias deOramento Participativo (AVRITZER, 2003, p. 17-18).

    O contexto de redemocratizao vivido pelo Brasil a partir de1985 com a volta das eleies diretas para as capitais, e as tendnciasdescentralizadoras promovidas pela Carta de 1988 a qual definiuos municpios como entes autnomos da Federao -, abriu novaspotencialidades para a gesto local e trouxe novas complexidades ao dos agentes urbanos. As instncias municipais tornaram-selocus privilegiados para a emergncia da cidadania no pas,

    1. ORAMENTO PARTICIPATIVODE PORTO ALEGRE

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    indicando possibilidades de alteraes no profundo autoritarismosocial enraizado na sociedade brasileira (FEDOZZI, 2003).

    A base institucional do Oramento Participativo de Porto Alegre a prpria Constituio Federal, que autoriza os executivos municipaise estaduais a elaborarem seus oramentos, mas ao no especificar comofaz-lo (FARIAS, 2003) abre um elenco de possibilidades aos gestoresmunicipais de inovarem nas formas de relao com a sociedade.

    Deste modo, os processos de descentralizao e defortalecimento do poder local, advindos da Carta Constitucional,foram marcantes no desenho do Oramento Participativo. ParaBaierle (1992) tal descentralizao foi um dos avanos maisfecundos da democracia emergente entre ns. Na esteira desseprocesso, os municpios, fortalecidos no sistema federativo, vmelegendo lideranas vinculadas aos movimentos populares,possibilitando a estruturao de prticas democrtico-participativas.

    Com o Oramento Participativo, os movimentos comunitriosdas diferentes regies de Porto Alegre passam a ter acessodiretamente ao poder local, mas sem anular o espao da democraciarepresentativa. Tanto o executivo quanto o legislativo partilhamparte de seu poder e, assim, ampliam e complexificam suas relaescom a sociedade (CIDADE, 2003, p.12), no representando umaindevida interferncia nas prerrogativas da Cmara de Vereadores.Considerando a utilizao de critrios empricos na alocao derecursos, o modelo tem maior racionalidade que as formasconvencionais de oramentao (GIACOMONI, 1994).

    O Oramento Participativo consiste na incluso da participaopopular na elaborao do Oramento Municipal a ser executado noano seguinte, responsabilidade esta do executivo municipal, atravsde um amplo debate que acontece ao longo do ano. Nesses encontrosso definidos valores de receita e despesa onde sero feitos osinvestimentos, quais as prioridades e quais as obras e aes a seremdesenvolvidas pelo Governo. Todo o processo constitudo deelaborao da matriz oramentria deve ser concludo at 30 desetembro, prazo legal para o executivo municipal entreg-lo naCmara de Vereadores, conforme estabelece a Lei Orgnica doMunicpio de Porto Alegre.

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    1.2 GNESE DO ORAMENTO PARTICIPATIVO

    Para a abordagem da gnese do Oramento Participativo forambuscados estudos realizados que apontam a presena doassociativismo e da participao na formao social, poltica ecultural do Rio Grande do Sul e de sua capital como raiz explicativado reconhecimento do Oramento Participativo de Porto Alegre.Tambm foram colhidos depoimentos com informantesqualificados, que expuseram suas vivncias e conceitos sobre oOramento Participativo.

    Um primeiro registro de experincia associativista foi odesenvolvido nas redues jesuticas na regio norte do Estado, nombito de cooperao econmica e social que instituiu o princpiodo mutiro, originalmente denominado de potiro na lngua guarani,e que sobreviveu at os dias atuais (SCHNEIDER, 2003).

    No campo jurdico estatal, a Constituio do Estado de 1891reconhecia o direito de iniciativa popular nas propostas legislativas,apesar de no abrir mo do papel das Cmaras Municipais(MAGRONE, 2004).

    Ao mesmo tempo, nas regies do Estado que foram colonizadaspelos imigrantes alemes e italianos, havia a prtica de os prprioscolonos decidirem sobre o destino das parcelas excedentes de suarenda social muito antes de a regulamentao estatal passar a vigorarem seus territrios. Foi o incio do movimento cooperativista noRio Grande do Sul que possibilitou, em 1892, a criao da primeiracooperativa do setor primrio e, em 1902, a primeira cooperativade crdito rural.

    Dcadas depois, no perodo de grande mobilizao poltico-social da sociedade brasileira em incios da dcada de 1960, quepassou a empenhar-se em prol das reformas de base, entre asquais, as reformas agrria, educacional, da empresa e a reformaurbana (SCHNEIDER, 2003, p. 316), ocorre uma significativamobilizao comunitria entre a populao rural e urbana na regiode Iju (norte do Estado), que originou a reconhecida CooperativaRegional Tritcola Serrana COTRIJU. Estes registros revelam acapacidade de os coletivos se organizarem na busca de respostas

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    s suas necessidades de produo, com caractersticas participativase com alcance social.

    No caso da capital, os fortes traos associativistas urbanos souma das peculiaridades na gnese do Oramento Participativo(AVRITZER, 2003). Durante os anos 40 do sculo XX, odenominado movimento comunitrio foi se formando a partir dosdiversos movimentos das Associaes de Moradores de Porto Alegre.Este movimento foi constituindo-se, paulatinamente, como umespao pblico de organizao autnoma das classes populares paraa reivindicao de direitos relacionados ao acesso ao solo urbano,aos equipamentos e aos servios pblicos (FEDOZZI, 2003). Em1956 houve o reconhecimento desta mobilizao social na cidade,tanto que atravs de um Decreto Municipal foi estabelecido que asportas da Prefeitura deveriam ser abertas para os vrios conselhoslocais, por representarem diversas comunidades da cidade.

    A atuao forte destes movimentos culminou na criao, em1959, da FRACAB (Federao Rio-grandense de AssociaesComunitrias e Amigos de Bairro), entidade esta que alcanouimportante congregao de movimentos, chegando a ter 65associaes filiadas em 1979. At o ano de 1964 este processo foifortemente influenciado pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB),principalmente com a liderana de Leonel Brizola, mas com o golpemilitar e, por conseqncia, a instaurao de um regime de exceono pas, a FRACAB teve interveno federal e estes movimentosobrigatoriamente tiveram suas atividades de mobilizaoprejudicadas.

    No final dos anos 70, h um renascimento do movimentoassociativista em Porto Alegre, em especial o dos MovimentosPopulares Urbanos. Vrios movimentos surgiram e passaram adesenvolver aes reivindicatrias e/ou contestatrias, tendo poreixo a posse da terra e o acesso aos servios urbanos. Estas aestraduziam, principalmente, a afirmao de uma cultura de direitos(TELLES apud BAIERLE, 1998, p. 06).

    Fedozzi (2003) aprofunda a discusso apontando que estesmovimentos passam por um processo de mudana qualitativa, coma emergncia de representaes e prticas orientadas para a relao

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    de enfrentamento com o Estado e para a defesa de uma perspectivade transformao radical da realidade social. Estas mudanas esto,em grande medida, relacionadas ao de agentes scio-polticosque crescentemente passam a atuar junto s organizaescomunitrias, tais como: grupos polticos clandestinos, centros deeducao popular e igrejas.

    Em 1983 surge em Porto Alegre a Unio de Associaes deMoradores de Porto Alegre (UAMPA), que veio ampliar o coro porreivindicaes urbanas se envolvendo intensamente em diversosaspectos relacionados vida da cidade, como: habitao, educao,oferta de servios pblicos, direitos humanos, entre diversos outros.Quando realizou o seu primeiro congresso, em 1985, seus integrantesse vinculavam a 78 associaes de bairros e comunidades da cidade.

    O conjunto dos movimentos exigia tambm o reconhecimentodos direitos universais cidadania e se insurgia contra o estigma demarginal dos moradores da periferia. Fedozzi (2003, p. 9) expressaque o discurso em prol dos direitos assumidos por essa parcela dosmoradores pobres em Porto Alegre e a sua tematizao na esferapblica local representou um salto qualitativo em direo superaodas prticas de submisso paternalista e/ou clientelista,tradicionalmente presentes na relao entre as classes populares e ospoderes Executivo e Legislativo no Brasil, o que no significa queessas prticas tivessem sido eliminadas dos movimentos comunitrios.

    Muitas foram as estratgias de resistncia e de presso criadaspelos movimentos comunitrios, tais como: barricadas nas ruas,assemblias nos locais de moradia, abaixo-assinados, concentraesem frente Prefeitura, cartas-abertas populao, denncias na mdia,mutires dos moradores para realizar obras (FEDOZZI, 2003, p.9), no esforo pela obteno do reconhecimento dos seus direitos.Estas manifestaes eram patrocinadas tanto por populaes dasreas de subabitao em situao irregular e/ou clandestina, comotambm por moradores de reas estruturadas da cidade.

    Esta mobilizao criou as condies para a organizao deespaos de articulao entre os diversos movimentos e as instnciasj constitudas, como a FRACAB e a UAMPA, em algumas regiesmais mobilizadas da cidade. Assim, formaram-se os espaos de

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    Unio de Vilas e Conselhos Populares, com o propsito defortalecer o papel reivindicatrio dos movimentos, tendo sidoformadas, nos anos 80 de sculo XX, trs Unies de Vilas e doisConselhos Populares (DIEGO, 2004).

    Estas lideranas e seus respectivos movimentos deram apoiototal ao candidato Prefeitura de Porto Alegre, Sr. Alceu Colaresdo Partido Democrtico Brasileiro, que viria a ser vitorioso naseleies de 1985 com o lema O povo no governo (DIEGO, 2004).Foi durante esta gesto municipal que as lideranas popularescomearam a desenvolver as primeiras idias sobre o OramentoParticipativo, elevando o patamar de suas reivindicaes e, paratanto, pressionaram o prefeito eleito a realizar um amplo debatesobre as prioridades de investimento, exigindo a abertura da caixa-preta do oramento para revelar como a cidade alocava os seusinvestimentos (POZZOBON, 2000).

    Em reunio realizada pela UAMPA em 26 de maro de 1986,preparatria a um debate com o Prefeito sobre a participao dosmovimentos populares no governo, surge a primeira referncia aoOramento Participativo, conforme pesquisa de Avritzer. Odocumento da reunio expressa: o mais importante na Prefeitura a arrecadao e a definio de para onde vai o dinheiro pblico. a partir da que vamos ter ou no verbas para o atendimento dasreivindicaes das vilas e bairros populares. Por isso, queremosintervir diretamente na definio do oramento municipal equeremos controlar a sua aplicao (AVRITZER, 2002, p. 28).

    Posteriormente, em documento relativo ao segundo congressoda entidade, em 1987, novamente reafirmada esta reivindicao,conforme revela o texto: procurar ampliar a participao domovimento comunitrio na administrao municipal, na elaboraoe definio do oramento municipal o elemento que vai tornarpossvel as mudanas na estrutura poltica urbana (AVRITZER,2002, p. 28).

    Os estudos de Baierle (2000) demonstram a influncia dosmovimentos sociais comunitrios nos anos 80 do sculo XX nacriao do Oramento Participativo, com destaque para aconstituio da UAMPA, em 1983. Fedozzi credita a este processo

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    um novo estgio na articulao das classes populares, caracterizadopelo aumento do capital social acumulado por elas e revelado peloprocesso de ampliao qualitativa e quantitativa do associativismocomunitrio, assim como pela formao de uma cultura cvicacrtica (2003, p. 19).

    Esta marca de mobilizao poltica de Porto Alegre tambm seexpressa pela tradio de seu povo escolher partidos de esquerdapara serem seus representantes na cidade. No perodo de 1947 at1963, o Partido Trabalhista Brasileiro PTB, que originou o PDT,foi o mais votado nas eleies da Cmara Municipal, bem comonas eleies de 1988 dois partidos de esquerda, PT e PDT,disputaram as eleies, ambos com projetos de participao nassuas plataformas eleitorais (AVRITZER, 2002, p. 22).

    As expectativas de os movimentos organizados participaremmais incisivamente na administrao pblica municipal no foramcontempladas, apesar das promessas do prefeito, feitas tanto durantea campanha quanto ao longo de seu governo. nesse contexto defrustrao que a Frente Popular (PT e PCB) chega ao poder em1989, anunciando ao conjunto de agentes sociais com uma longaexperincia de organizao e ao coletiva, uma proposta departicipao popular na administrao municipal.

    Esta trajetria constitutiva do Oramento Participativo umadimenso de sua explicao, que complementada pelo campoconceitual. Dentre os informantes qualificados, h uma explanaodas razes tericas e de experincias de outras naes, que serviramcomo inspirao para a criao do Oramento Participativo.

    A primeira tradio terica a que est relacionado o OP a da discusso sobre democracia. O OP um processoque amplia os horizontes da prtica democrtica, resgatandoelementos de democracia direta - da escolha feitadiretamente pelo povo em assemblias - e os combinandocom elementos de democracia representativa. [...] O OP seconstitui tanto como um avano em relao tradioterica fundante da revoluo francesa Rosseau,

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    Montesquieu, entre outros como em relao aos ideaisclssicos gregos de democracia direta. Descende destatradio terico/filosfica, mas a supera ao combinardialeticamente seus elementos [...] {atravs do} conceitode democracia participativa. Por esta idia entende-se o OPcomo um processo de participao voluntria, onde ocidado que v a necessidade de ir alm de seus direitosdemocrticos bsicos geralmente relacionados democracia parlamentar tradicional pode interferirdiretamente na construo da prtica de governo.

    A segunda vertente terica do OP o movimentosocialista, que influi na esquerda do PT, especialmente noRGS. Esta tradio aporta, especialmente, o conceito deinverso de prioridades, de reorientar a ao do Estadoprincipal e fundamentalmente em favor dos mais pobres,dos trabalhadores. Esta uma das bases fundantes do OP.Seu mtodo construdo para que os recursos do Estadose comportem como um fator indutor de redistribuio derenda: dos mais ricos para os mais pobres.

    A terceira veia terica que contribuiu para a formataodo OP vem da tradio de esquerda contempornea, eaporta a idia de gesto por conselhos e de hegemonia social.Quanto ao primeiro, historicamente filia-se tradio tericado incio da revoluo russa, idia dos soviets, da gestodo Estado pelo povo, que define prioridades. Tambmpodemos relacion-la tradio da esquerda italiana, idiada possibilidade de gesto da unidade produtora atravs deconselhos de fbrica. Esta veia pode ser vista na organizaodo processo por fruns de delegados regionais e depois noCOP (Conselho do Oramento Participativo). A tradioterica da esquerda italiana, especialmente Gramsci,contribuiu com o conceito de hegemonia, e orienta o OP aincluir mecanismos abertos de participao que possamincorporar diferentes segmentos sociais. Neste sentido,

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    1.3 A INSTITUCIONALIZAO DO ORAMENTOPARTICIPATIVO

    A gesto municipal de Porto Alegre iniciada em 1989, formadapela reunio, na Frente Popular dos partidos: Partido dosTrabalhadores, Partido Comunista Brasileiro, Partido Verde ePartido Socialista Brasileiro, tinha como compromisso poltico ademocratizao do Estado com a participao ativa da populao,de modo a democratizar as relaes entre Estado e Sociedade Civil.Para tanto, criou em seu primeiro ano de governo uma nova maneirade formular e acompanhar o oramento. Esta nova dinmica foiuma importante ruptura com a lgica pblica histrica deelaborao exclusiva do oramento municipal pelos seus agentesinstitucionais.

    O diagnstico da situao encontrada feito pela novaadministrao revelou que as sucessivas administraespredecedentes construram relaes fisiolgicas, clientelistas e compouca transparncia pblica; que as decises sobre investimentosno contemplavam as reais necessidades da maioria da populao,excluda do acesso a bens e servios, e que 98% da receita municipalestava comprometida com o pagamento do quadro de pessoal(CORDEIRO, 2004).

    Vrios dos aspectos que compem o desenho atual doOramento Participativo foram se constituindo ao longo do seuprocesso de existncia (CIDADE, 2004). Um deles refere-se

    organiza-se o processo para incorporar e fazer dialogarmovimentos por corte de gnero, etnia, movimentossindicais e classes mdias. Isto aparece com mais clareza naorganizao do processo nas plenrias temticas.

    (CORDEIRO, Andr Passos.

    Depoimento prestado equipe da pesquisa UNESCO, 2004).

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    regional izao da c idade, que o Plano Diretor deDesenvolvimento Urbano dividia em quatro zonas. Esta divisono coincidia com o recorte desenvolvido pelos movimentospopulares urbanos, formada pelo total de cinco instncias entreUnio de Vilas e Conselhos Populares (BAIERLE, 1998,DIEGO, 2004). Por isto a primeira proposta de regionalizaodo Oramento Participativo ter sido de cinco regies de PortoAlegre, de modo a respeitar a organizao popular j existente.

    Foi do Executivo Municipal a iniciativa da discusso sobre ooramento, atravs de consulta populao em reuniesrealizadas nas cinco regies durante o ms de agosto de 1989(FEDOZZI, 2001). Depois de vrios encontros com lideranascomunitrias, a cidade foi dividida em dezesseis regies vigentesat hoje: Ilhas- Humait Navegantes, Noroeste, Leste, Lombado Pinheiro, Norte, Nordeste, Partenon, Restinga, Glria,Cruzeiro, Cristal, Centro-Sul, Extremo-Sul, Eixo-Baltazar, Sule Centro. Estas regies tm sofr ido div ises internas,denominadas micro-regies.

    Outras dificuldades do incio do processo foram relativas inexistncia de modelos pr-concebidos de como realizar umaco-gesto dos recursos pblicos, bem como falta de experinciadecor rente da novidade dessa proposta (DIEGO, 2004;FEDOZZI, 2004). Associada a estas estava o fato de o governomunicipal estar com uma receita comprometida, em 98%, como pagamento de pessoal.

    Essa situao catica das finanas municipais ocasionougrandes dificuldades administrao, deixando-a sem capacidadealguma de investimentos na cidade, impossibilitando, desta forma,o atendimento de qualquer demanda reivindicada pela populao.O governo municipal tomou a iniciativa de desencadear umaReforma Tributria, na lgica de potencializar os recursos prpriosarrecadados a partir de reformulaes do IPTU e ISSQN.

    Assim, ao longo de 1989 lderes comunitrios das diversas regiese o governo comearam a discutir as linhas bsicas de um processode Oramento Participativo e a traar um primeiro plano deinvestimentos.

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    Na primeira reunio do Oramento Participativo realizada naZona Norte no Sindicato dos Metalrgicos e nas assemblias abertasrealizadas em cada uma das 16 regies, os cidados puderamapresentar suas demandas por investimentos. Cerca de 400 pessoasparticiparam das 16 assemblias, elegendo os primeiros delegadosde oramento na proporo de 1 para cada 5 presentes. Formou-se uma comisso em conjunto com a Secretaria de PlanejamentoMunicipal responsvel pelo processo oramentrio para traar umplano de investimentos para o prximo ano. Essa comisso foi oembrio do que mais tarde se tornou o Conselho do OramentoParticipativo.

    Muitos dos que par ticiparam desse primeiro plano deinvestimentos o descrevem como uma colossal l ista dereivindicaes que evitou qualquer deciso polmica ou definiode prioridades. Quase todas as demandas que os participantesconsideravam como altamente prioritrias foram includas numesboo de oramento que comprometeria a receita de vrios anos.

    No entanto, s em 1990 as reformas fiscais e administrativascomearam a gerar recursos para investimentos. Sob presso dosmovimentos populares a administrao comeou a investir nasregies pobres da periferia. Mas como o plano de investimentono definiu prioridades, os rgos executores das obras de infra-estrutura que decidiam, a partir de seus critrios polticos etcnicos, quais demandas seriam atendidas.

    A definio de prioridades de forma criteriosa passou a serfundamental, o que levou a administrao a re-estruturar oOramento Participativo. Em 03.01.90 foi aprovada a Lei OrgnicaMunicipal, a qual cria a Coordenao de Relaes com a Comunidade CRC, que passa a coordenar o Oramento Participativo. Criadotambm um novo Gabinete de Planejamento, GAPLAN, compostopor uma equipe especializada em Planejamento Estratgico,comeou-se ento a redesenhar o processo de participao noOramento. Tanto o GAPLAN como o CRC esto vinculadosdiretamente ao Gabinete do Prefeito, sendo esse o grupo quedesenvolveu a arquitetura bsica do Oramento Participativo que,com algumas modificaes, existe at hoje (ABERS, 1998).

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    O Oramento Participativo conciliou propostas de desenhoinstitucional realizadas por diversos atores: as assemblias regionaisadvindas da prtica do movimento comunitrio; o conselho comoproposta do Partido dos Trabalhadores e, a Coordenadoria de Relaescom a Comunidade (CRC) e o Gabinete de Planejamento (Gaplan),construda pela administrao municipal (AVRITZER, 2003, p. 18).

    Ao longo do tempo de funcionamento do Oramento Participativo,alteraes foram sendo realizadas quanto aos critrios de escolha dedelegados, critrios de distribuio de recursos financeiros, denomenclatura dos temas para hierarquizao e na composio doConselho do Oramento Participativo. Algumas instncias na estruturaforam criadas, como o Frum Regional do Oramento Participativo(FROP) em 1991, para viabilizar e fiscalizar a execuo das obrassolicitadas e aprovadas, e foi criado o cargo de Coordenador Regionaldo Oramento Participativo (CROP) em 1992, com o intuito dereforar as relaes com a comunidade.

    Com o propsito de discutir as polticas globais e setoriais paraa cidade, no ano de 1994 ocorre a incluso das Plenrias Temticascomo uma nova instncia de participao no ciclo do OramentoParticipativo. Estas plenrias seguiram a dinmica das plenriasregionais, inclusive elegendo seus representantes ao Conselho doOramento Participativo, que desse modo, teve seu nmero demembros ampliado a partir de 1994 (FEDOZZI, 2001, p. 133).

    Em 1994 o Conselho do Oramento Participativo, sob outradenominao, passa a ter a Comisso Paritria para a coordenaodo colegiado, com 4 representantes do governo e 4 conselheiroseletivos. Esta proporcionalidade vai ser alterada em 1999, quandoa Coordenao do Conselho passa a ser formada por 4representantes do governo e 8 conselheiros eleitos.

    A temtica da Cultura, includa no ano de 2000 e o OramentoParticipativo Internet, criado em 2001,- que possibilita o enviode sugestes via on-line atravs do site www.portoalegre.rs.gov.br/op/default.htm , foram outras das inseres realizadas com anliseprvia do governo, sendo obrigatria a avaliao e deliberao nosFruns de Delegados do Oramento Participativo. Neste mesmoano criado um Grupo de Trabalho para realizar uma avaliao do

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    seu processo, e com a realizao de um Seminrio sobre aModernizao do Oramento Participativo, vrias instituiesforam consultadas visando o debate para propor melhorias.

    1.4 O FUNCIONAMENTO GERAL DOORAMENTO PARTICIPATIVO1

    O Oramento Participativo (OP) um processo pelo qual apopulao decide, de forma direta, a aplicao dos recursos emobras e servios que sero executados pela AdministraoMunicipal. O seu processo se desenvolve da seguinte forma:

    a) Reunies Preparatrias (Maro Abril). Quando a Prefeiturapresta contas do exerccio passado, apresenta o Plano deInvestimentos (publicao anual que contm todas as demandasde obras e servios definidos pela populao no OP aprovado nosFruns Regionais e Temticos); o Regimento Interno (conjuntode regras que determina o funcionamento do OP), e os CritriosGerais, Tcnicos e Regionais2 .

    1 CORDEIRO, Andr Passos. A experincia do Oramento Participativo em PortoAlegre, texto mimeografado, 2004. E do website www.portoalegre.rs.gov.br/Op/texto

    2 Critrios - So as regras aprovadas pelo COP, que se subdividem em critrios gerais (quedeterminam o procedimento da distribuio de recursos para o conjunto da cidade) etcnicos (utilizados pelos rgos da Prefeitura para analisar demandas e verificar aviabilidade das mesmas). Os trs critrios gerais: carncia do servio ou infra-estrutura(peso 4), populao total da regio (peso 2), prioridade temtica da regio (peso 4), seroaplicados para a distribuio de recursos nas trs primeiras prioridades temticas escolhidasglobalmente pelas 16 regies, com exceo do DMAE, que tm critrios prprios. Oclculo para definio das trs primeiras prioridades globais o seguinte: cada regioescolhe 4 prioridades dentro das 13 prioridades temticas (Saneamento Bsico, PolticaHabitacional, Pavimentao, Transporte e Circulao, Sade, Assistncia Social, Educao,reas de Lazer, Esporte e Lazer, Iluminao Pblica, Desenvolvimento Econmico,Cultura e Saneamento Ambiental). prioridade de cada regio so atribudas notas: 1prioridade - nota 04; 2 prioridade nota 03; 3 prioridade nota 02; 4 prioridade nota 01. Somando-se as notas de todas as prioridades escolhidas pelas 16 regies chega-se s trs prioridades, que sero aquelas que somaram maior pontuao. Em quatro reasexistem critrios tcnicos condicionantes na deciso de aes e/ou investimentos: DMAE(Departamento Municipal de gua e Esgoto), SMED (Secretaria Municipal de Educao),SMS (Secretaria Municipal de Sade), FASC (Fundao Assistncia Social e Cidadania).

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    b) Rodada nica de Assemblias Regionais e Temticas, (Abril Maio), com a eleio das prioridades temticas, eleio dosconselheiros e definio do nmero de delegados. So doisconselheiros titulares e dois suplentes para cada uma das 16 Regies(Ver regies do Oramento Participativo na figura 02), e 06 Temticasaqui h eleio de 88 conselheiros (-Circulao e Transporte; Sadee Assistncia Social; Educao, Esporte e Lazer; Cultura; Desenvolvimento Econmico, Tributao e Turismo; Organizaoda Cidade, Desenvolvimento Urbano e Ambiental).

    c) Fruns Regionais e Temticos (Maio Junho Julho), quandoocorre a eleio dos Delegados, na proporo de 1 para cada 10participantes na Rodada nica. Tambm definida a hierarquizaodas obras e servios, com o apoio das secretarias municipais e autarquiasque acompanham estas reunies, prestando esclarecimentos sobrecritrios que norteiam o processo e a viabilidade das demandas.

    d) Assemblia Municipal (Julho), quando os conselheiros eleitostomam posse e entregam ao governo a hierarquizao das obras eservios realizada pelos Fruns Regionais e Temticos. Na mesmaoportunidade, o GAPLAN e a Secretaria Municipal da Fazendaapresentam os grandes agregados da despesa e a estimativa da receitapara o ano seguinte. Toda a discusso registrada em atas eformulrios especficos.

    e) Anlise das Demandas (Julho Agosto Setembro) feitapelo governo, que faz a anlise tcnica e financeira das demandas ea montagem da matriz oramentria.

    f) Votao da Matriz Oramentria (Agosto Setembro) doConselho do Oramento Participativo3 , com a distribuio derecursos para as regies e temticas. Logo, a redao final feitano GAPLAN, que entrega a Proposta Oramentria na Cmara deVereadores, no dia 30 de setembro prazo legal estabelecido pelaLei Orgnica do Municpio de Porto Alegre.

    3 Conselho do Oramento Participativo (COP) - rgo mximo de deliberao doOramento Participativo formado por 96 conselheiros. Deste total, 88 so eleitosdiretamente pela populao nas Regies e Temticas; dois (um titular e um suplente)so indicados pela Unio das Associaes de Moradores de Porto Alegre (Uampa);

  • g) Detalhamento do Plano de Investimentos (Outubro - Dezembro) no Conselho do Oramento Participativo, a partir da Proposta Oramentria entregue na Cmara de Vereadores. So consideradas as demandas hierarquizadas pela comunidade e os critrios gerais de distribuio de recursos entre as regies.

    h) Discusso, nos Fruns Regionais e Temticos, (Novembro - Dezembro) das alteraes ao Regimento Interno, Ciclo e Critrios.

    i) Votao (Dezembro - Janeiro) das alteraes discutidas anteriormente, para serem adotadas na seguinte rodada do Oramento Participativo.

    A organizao destas diversas fases denominada Ciclo do Oramento Participativo, conforme est representado na figura:

    FIGURA I Ciclo do Oramento Participativo Fonte: www.portoalegre.rs.govbr/Op/

    dois (um titular e um suplente) so indicados pelo Sindicato dos Municiprios (Simpa) e quatro (dois titulares e dois suplentes) representam a Prefeitura no Conselho, embora sem direito a voto nas deliberaes. O COP planeja, prope, fiscaliza e delibera sobre o conjunto de receitas e despesas do oramento municipal. Tambm revisa anualmente o Regimento Interno do OP, nos seus critrios gerais e tcnicos.

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    http://www.portoalegre.rs.govbr/Op

  • As prioridades temticas do Oramento Participativo nos ltimos quatro anos (2001-2004) foram: habitao, em primeiro lugar desde 2002; pavimentao, em primeiro lugar no ano de 2001 e em terceiro lugar em 2002 - 2003; educao, segunda prioridade nos anos de 2002 e 2003, e terceira em 2004, e a temtica social (sade e assistncia social) a segunda prioridade no ano de 2004. FIGURA 2 - Mapa com as Regies do Oramento Participativo 1.5 OS PARTICIPANTES NO ORAMENTO PARTICIPATIVO

    A base da estratgia de gesto participativa adotada pelo governo municipal de Porto Alegre o princpio de que a populao se interessa no apenas pelas questes particulares, privadas, seno tambm pelas

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    questes pblicas e que capaz de tomar decises solidrias. Do mesmomodo, a populao conhece melhor as necessidades e a realidade desua cidade ou do seu bairro, do que os funcionrios municipais. Noincio, a administrao municipal teve de convencer as pessoas de quea sua presena nas assemblias teria um efeito na vida do dia-a-dia, ecom isto, as mobilizou nas decises, cujas resolues foramtransformadas em prticas (ZIMMERMANN, 2004).

    A escassa participao da populao, durante os dois primeirosanos de implantao do Oramento Participativo, foi reflexo diretoda conjuntura municipal. No ano de 1989, as expectativas dapopulao eram bem maiores que a capacidade de resposta daadministrao, o que ocasionou em 1990 um retraimento naparticipao. Esta participao se altera de forma crescente a partirdo momento em que o Municpio readquire sua capacidade deinvestimento, principalmente atravs da realizao da ReformaTributria.

    A partir de 1991, o Oramento Participativo se tornou umprocesso que mobilizou cada vez mais as comunidades de todas asregies, conforme se verifica no Quadro a seguir, que mostra osparticipantes no conjunto das rodadas.

    TABELAS 1.5 Participantes do Oramento Participativo por ano

    Fonte: CRC PMPA *Os dados da participao de 2003 correspondem at a rodada nica.

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    Na anlise sobre a participao no Oramento Participativode Por to Alegre, a pesquisadora Abers concluiu que aparticipao um processo em desenvolvimento: sua prtica poderesultar em um efeito cascata que melhora o prprio processoparticipativo e transforma a vida poltica de forma mais geral(ABERS, 1998, p. 18). Esta constatao se deu a partir dainvestigao realizada no ano de 1995, quando analisou que osprimeiros bairros a receberem investimentos do OramentoParticipativo foram, na maior parte, aqueles historicamenteconhecidos por sua maior capacidade de organizao. Mas ao longodo tempo, novos grupos de cidados comearam a se mobilizar,na medida em que os habitantes de outros bairros percebiam osresultados e se convenciam que sua participao no Programapoderia resultar em obras semelhantes em seus bairros.

    Outra constatao da pesquisadora de que, ao contrrio dasexpectativas de que os mais organizados manteriam controledesproporcional sobre o processo ao longo do tempo, no caso dePorto Alegre, novos participantes e novos bairros eram continuamentemobilizados atravs de um efeito demonstrao. Na medida emque se difunde a percepo de que os participantes so recompensadoscom investimentos pblicos em seus bairros, os cidados cticos seconvencem a agir da mesma forma (ABERS, 2000).

    Uma pesquisa de opinio realizada em setembro de 1994detectou que 8,4% da populao adulta de Porto Alegre haviaparticipado de pelo menos uma das plenrias de oramento noscinco anos desde a abertura do processo (META4 apud ABERS,1998, p. 05).

    Em 1996, na pesquisa realizada pela Coordenao de RelaesComunitrias PMPA, FASE/RS, ONG CIDADE e pelapesquisadora americana Rebecca Abers, foram coletados dadosrelativos participao, conforme se ver a seguir:

    4 META, 1994. Relatrio da pesquisa de avaliao da administrao municipal dePorto Alegre, Setembro de 1994. Manuscrito no publicado, META, Instituto dePesquisa de Opinio.

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    Na pergunta: Por que veio a reunio hoje?, foram obtidos osseguintes resultados: as demandas representam 33,9% das respostas,sendo que a demanda mais localizada no bairro/vila ocupa 17,6%.Porm, a ocorrncia maior deste tipo de resposta fica entre os quepossuem renda familiar e escolaridade mais baixas. Em segundolugar, as respostas falam de sua motivao em participar de formagenrica, inclusive para conseguir alguma coisa. Estas respostasrepresentam 18,7% do total. Outros dados significativos: votar13,5%; o fato de ser liderana ou pertencer a uma entidade 12,5%;conhecer, informar-se, esclarecer-se 9%, e referncias a cidadania,direitos, unio, luta 7% (POZZOBON, 1996, p. 01).

    As pesquisas j realizadas detectaram a relao entre faixas derenda dos participantes do Oramento Participativo. Na pesquisade 1996 (POZZOBON, 1996) foi elaborado o perfil scio-econmico da populao que participa do Oramento Participativo.Os dados mostraram uma grande diversidade: uma parcelasignificativa dos entrevistados com at 41 anos de idade (57,9%),cor branca (71,4%), possuem uma renda familiar at trs salriosmnimos (39,6%) e escolaridade at o primeiro grau completo(53,9%, incluindo 5,5% sem instruo). H uma paridade entrehomens e mulheres, com uma leve maioria de homens.

    H uma tendncia de os participantes das temticas apresentaremmelhores indicadores em termos de renda familiar e escolaridade,o que pode ser constatado atravs dos seguintes dados: nas regies,59,8% dos entrevistados recebem at cinco salrios mnimos,enquanto que 50,7% dos entrevistados nas temticas percebem maisde cinco salrios mnimos.

    No ano de 1998 (BAIERLE, 1999) a ONG CIDADE realizouuma pesquisa para detectar o grau de conhecimento, por partedos participantes presentes nas plenrias temticas e regionais, e oseu envolvimento com o processo do Oramento Participativo. Noque se refere s faixas de renda, foi verificado que o maior nmerode pesquisados encontra-se na faixa at 4 salrios mnimos (55,7%dos participantes; 42,6% dos delegados das plenrias regionais;43,2% dos delegados das plenrias temticas; e 38,6% dosconselheiros).

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    Constatada nas plenrias temticas uma proporo significativade pessoas com renda acima de 12 salrios, em funo sobretudoda presena de profissionais das reas de sade e educao, possvel explicar o relativo crescimento da renda dos participantesquando comparado renda dos participantes pesquisados no anode 1995.

    Comparando a renda dos participantes com a renda da cidadese verificou que os participantes do OP tm uma renda menor,pois conforme o IBGE (Censo 1991), 29% dos domicliosapresentavam renda at 3 salrios: no OP, 30,3% dos participantestem renda at 2 salrios.

    Quanto ao aspecto de escolaridade, a pesquisa constatou que amaioria dos participantes tem escolaridade at ensino fundamental(61,3%). Os maiores percentuais de pessoas com III Grau(completo ou no) encontram-se nas plenrias temticas deEducao, Cultura e Lazer (50% dos participantes) e de Sade eAssistncia Social (42,8% dos participantes). O nvel de escolaridaderevela-se muito importante para o exerccio do papel de conselheiro,onde mais da metade (56,5%) apresenta II Grau incompleto oumais (BAIERLE, 1999, p. 06-07).

    Outro ponto investigado nas pesquisas j realizadas foi o relativo participao em entidades associativistas dos sujeitos participantesdo Oramento Participativo. Na pesquisa de 1995, realizada comos participantes das grandes assemblias regionais, 76% dosentrevistados informaram que participavam de associaes civisde alguma natureza. Destes, 62% dedicavam a maior parte do seutempo de participao em associaes de bairro, e 14% a outrostipos de associaes regionais ou locais, tais como: ArticulaesRegionais, Comisses de Rua informais ou Centros Comunitrios(ABERS, 1998).

    Silva (2003) sistematizou resultados de pesquisas realizadas nosanos de 1993 (FEDOZZI, NUES, 1993), 1995 (FASE, CIDADE,CRC/PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE, 1995),e 1998 (CIDADE, CRC/PMPA, 1999), organizando o seguintequadro relativo participao em entidades de carter associativista,entre os sujeitos presentes nas plenrias.

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    Para BAIERLE (1999), as Associaes de Moradores (AMs)eram as entidades que agregavam o maior nmero de participantes(40,9%). Depois, vem a participao em grupos religiosos e culturais(9,0%), que tambm tem um carter basicamente comunitrio. Foiconsiderado significativo o crescimento do peso da vinculao apartidos polticos (6,0%), os quais ultrapassam as entidadesreligiosas e culturais entre delegados (14,5% vs. 11,3%) econselheiros (30,8% vs. 10,3%).

    Esta situao pode estar relacionada com a centralidade adquiridapelo OP no cenrio poltico municipal e pode indicar tambm umanova tenso entre politizao e aparelhismo no processo departicipao comunitria. Se as estruturas do OP fossem suficientespara proporcionar um novo aprendizado a partir deste maiorenvolvimento partidrio, s o futuro dir. De qualquer forma, ataqui, o fato de o OP contar com a participao de militantes (eno-militantes) dos mais variados partidos e correntes polticas temsido uma garantia de respeito s regras coletivamente estabelecidaspara o processamento das diferenas (BAIERLE, 1999, pg. 09).

    Quando esses dados so comparados com a pesquisa de 1995, constatada uma relativa diminuio do nmero de pessoas vinculadasaentidades, pois em 1995 havia uma participao maior (75,9%).

    TABELA 1.6 Participao em entidades entre os participantes

    das Plenrias do Oramento Participativo de Porto Alegre 1993,

    1995 e 1998

    * Para o ano de 1993 a pergunta refere-se especificamente participao em Associao de Moradores.

    (Fonte: SILVA, 2003, p.161)

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    A explicao pode ter a ver, em primeiro lugar, com o fato de a pesquisade 98 ter sido realizada durante a Primeira Rodada e a de 95 durante asegunda, sendo assim natural que o nmero de filiados a entidadesseja maior em funo do carter da Segunda Rodada (eleio deconselheiros) e, em segundo lugar, com o fato de que ela se d depoisde vrias reunies intermedirias (BAIERLE, 1999, pg. 10).

    Um dado que mereceu destaque do pesquisador foi o relativo queda no nmero de participantes em Conselhos Populares ouUnies de Vilas (4,0% em 98, contra 8,7% em 95). Uma explicaopode ser que o aumento do nmero de participantes no OP (aoredor de 40% entre 95 e 98), tenha sido pela adeso de setoressociais menos organizados. Mas o autor ressalva que no deve serdescartada a possibilidade de estar se desenvolvendo uma tendnciaa substituir os Conselhos Populares pelos Fruns Regionais doOramento Participativo. Sobre este ponto, a pesquisa constatouque, para 40% dos participantes em entidades, antes do OP, suaparticipao era menor ou nenhuma, sendo que para 39,9% aparticipao no se alterou, era a mesma. Apenas 15,1% dos queparticipam em entidades disseram que participavam mais antes(contra 9,1% em 1995). Foi significativo, contudo, que 22,2% dosconselheiros que participam em entidades, tambm afirmarem queantes participavam mais na sua entidade de origem. Apesar destasponderaes, no h dvida de que a participao em entidadesaumentou aps o OP, j que apenas 9,9% dos entrevistadosparticipavam de entidades antes de 1989. por isto que esta questofaz mais sentido quando a pesquisa dirigida aos delegados econselheiros, pois 21,4% dos primeiros e 25,8% dos segundos jparticipavam de entidades antes do OP (BAIERLE, 1999, pg. 10).

    Nas pesquisas anteriores tambm foi verificado o modo como osporto-alegrenses so informados sobre as reunies do OramentoParticipativo. A partir da sistematizao de Silva (2003), a Associaode Moradores foi a maior fonte de informao sobre as reunies doOP, ainda que tenha decrescido seu grau de freqncia entre 1993 e1998. Percebe-se que entre 1995 e 1998 a informao fornecida pelaa Associao de Moradores quase dobrou o grau de importnciados materiais informativos da Prefeitura.

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    Embora tenha crescido o peso da mdia do governo, so asentidades os principais instrumentos de convocao das pessoaspara a participao nas reunies do OP (BAIERLE, 1999, p. 10).Cartazes, jornais, rdio, televiso, carro de som e representantesda Prefeitura atingiram 35% dos participantes em 1998. 41,9% dosparticipantes da pesquisa foram convidados pelas Associaes deMoradores, sendo que 34,6% dos que no par ticipam deAssociaes de Moradores tambm vieram convocados por elas.

    A ONG CIDADE, no documento Os personagens principaisdo oramento participativo o que ser delegado e conselheirodo oramento participativo? (2004), expressa a expectativa sobrea qualidade da participao dos representantes da populao noOramento Participativo. Assim, no exerccio desta representao,os delegados e conselheiros tm que tornar presente o interessedo coletivo, a vontade de suas comunidades, o que nem sempre fcil num processo que envolve mltiplos interesses.

    Sua atuao requer dilogo constante com aqueles que oselegeram, capacidade de informar, responder e, acima de tudo,respeitar as decises soberanas da maioria. Os delegados econselheiros tm uma funo educativa; dependendo de suapostura, o processo pode ser democrtico, solidrio e educativo,

    TABELA 1.7 Modo como os participantes das Plenrias foram

    informados sobre as reunies do OP 1993, 1995 e 1998

    FONTE: SILVA, 2003, p. 162.

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    ou pode ser corporativo, clientelista, afastando e dividindo aoinvs de unir.

    Assim, quanto maior for o debate sobre as demandas e osprojetos das comunidades, quanto mais pessoas estiveremcontribuindo para as suas formulaes, mais estas demandas eprojetos representaro a vontade da maioria, garantindolegitimidade e representatividade aos conselheiros e delegadosquando forem discuti-las com o conjunto da cidade, representadosno Conselho do Oramento Participativo.

    1.6 A EXPANSO E REPERCUSSO DOORAMENTO PARTICIPATIVO

    A experincia do Oramento Participativo de Porto Alegre, aodesencadear um conjunto de debates e estudos sobre a gestopblica participativa, resultou em inspirao para outros municpiosbrasileiros e internacionais adotarem formas semelhantes de gestoe inspirou o governo municipal a expandi-lo a outros setores dasua administrao; do mesmo modo, o seu propsito inicial dedistribuio mais equnime dos recursos financeiros foi atingido.

    A repercusso no mbito internacional ocorreu quando asNaes Unidas selecionaram a experincia de Porto Alegre comouma das quarenta melhores intervenes urbanas (FEDOZZI,2003) a ser apresentada na Segunda Conferncia Mundial sobreHabitao Humana, realizada em Istambul, no ano de 1996. Comoconseqncia, a partir de 1997, o Programa de Gesto Urbana Coordenao Regional para a Amrica Latina das Naes Unidas Habitat passou a integrar o oramento participativo como umade suas linhas de estudo, bem como uma contribuio CampanhaMundial para uma boa Governabilidade (PMPA, 2004).

    O nmero de cidades brasileiras que adotaram o modelo deOramento Participativo, com variaes prprias a cada uma, de130, conforme Avritzer (2003) e PMPA (2004), e de 140, conformepesquisa em andamento do Frum Nacional de ParticipaoPopular (FEDOZZI, 2003). Segundo Cabannes (2004), do

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    Programa de Gesto urbana da Coordenao Regional das NaesUnidas para a Amrica Latina e o Caribe, existem 250 cidades comtipos de oramento participativo entre pases da Amrica Latina eEuropa, atingindo aproximadamente 24 milhes de habitantes.

    Em virtude deste reconhecimento, Porto Alegre foi escolhidapara sediar o primeiro Frum Social Mundial em 2001, esubseqentemente, a maioria das edies seguintes.

    A partir de 1998, no mbito da Administrao Municipal houvea expanso do Oramento Participativo para a Rede Municipal deEnsino, buscando instalar a democracia no espao escolar. Desdeento, professores, pais, alunos e funcionrios das escolas votam edefendem propostas sobre a instalao de bibliotecas e laboratrios,a realizao de oficinas e atividades culturais e a aquisio deequipamentos com a verba de projetos destinada a cada Escola. Acomunidade escolar tambm decide sobre as melhorias necessriasnos prdios escolares, reformas e ampliao de salas de aula.

    Outra iniciativa, criada em 1999, foi o Oramento Participativoda Juventude, o qual destina-se especificamente rea de assistnciasocial, no intuito de valorizar as iniciativas populares e a interfaceentre os Conselhos de Direitos da Criana e do Adolescente e daAssistncia Social, assim como tambm a divulgao o fortalecimentodos servios que perpassam a rede de ateno infncia e a juventude.

    Os efeitos redistributivos do Oramento Participativo forampossveis devido recuperao financeira da Prefeitura Municipal dePorto Alegre que criou condies objetivas para a eficcia do OP, namedida em que possibilitou ao governo uma relativa capacidade deresposta s deliberaes emanadas do processo (SILVA, 2003). Estemesmo autor consultou o GAPLAN no ano de 2002, quando obteveos seguintes resultados: das 3.956 demandas includas nos Planos deInvestimento entre 1989 e 2001, 3.282 (83%) esto concludas, 204(5%) esto com as obras em execuo, 441 (11%) esto em andamento(elaborao de projeto, licitao etc.) e, 29 (1%) esto pendentes (emprocesso judicial, espera por aquisio de rea etc.).

    A opinio dos participantes sobre o grau do cumprimento dasprioridades definidas foi pesquisada e seus resultados sistematizadospor Silva (2003), como se verifica no quadro a seguir.

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    Em estudo realizado, Marquetti (2003) concluiu que as regiesmais pobres foram as que receberam maior montante deinvestimento per capita no perodo de 1992-2000 e maior nmerode obras por mil habitantes no perodo de 1989-2000 [...] tambmse observou uma expanso significativa na oferta de bens e serviospblicos (2003, p. 154).

    1.7 A PARTICIPAO E AS POLTICAS SETORIAIS

    As polticas setoriais, desde a Constituio Federal de 1988 noBrasil, tm se constitudo como espaos institucionais departicipao e de canais de exerccio do controle social. Estaparticipao se realiza atravs de Conselhos e ConfernciasMunicipais, com caractersticas diversas. Tatagiba (2002) classificaem trs os tipos de Conselhos. Um deles o de Polticas, ligado spolticas pblicas organizadas em sistemas nacionais, como os daSade, Assistncia social, Educao, de Direitos da Criana e doAdolescente. Outro, os de Programas Governamentais relacionadosa aes emergenciais, como os de Habitao e DesenvolvimentoUrbano. E, por fim, os Conselhos Temticos, sem relao a umsistema ou legislao nacional, inspirados por demandas locais,como os dos Transportes e Esportes.

    TABELA 1.8 Obteno de benefcios (obras e servios) atravs do

    OP1995/1998

    FONTE: Silva, 2003, p. 169.

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    Em 1992 aprovada a Lei Complementar n. 267, queRegulamenta os Conselhos Municipais criados pelo artigo 101 daLei orgnica do Municpio de Porto Alegre. Conforme o seu Artigo1, Os Conselhos Municipais so rgos de participao direta dacomunidade na administrao pblica, tendo por finalidade propor,fiscalizar e deliberar matrias referentes a cada setor daadministrao.

    A cidade de Porto Alegre tem um conjunto expressivo deConselhos, que foram se constituindo ao longo do tempo, listadosa seguir:

    CMDUA Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano eAmbiental; COMATHAB Conselho Municipal de Acesso Terrae Habitao; COMAM Conselho Municipal do Meio Ambiente;COMPHAC Conselho Municipal do Patrimnio Histrico,Artstico e Cultural; CONCET Conselho Municipal de Cincia eTecnologia; CONCONT Conselho dos Contribuintes;COMCOM Conselho Municipal de Comunicao; COMTU Conselho Municipal de Transporte Urbano; CMS ConselhoMunicipal de Sade; CMAS Conselho Municipal de AssistnciaSocial; CMDCA Conselho Municipal dos Direitos da Criana edo Adolescente; CMDH Conselho Municipal de DireitosHumanos; CMAA Conselho Municipal de Agricultura eAbastecimento; CMD Conselho Municipal de Desporto;COMAE Conselho Municipal de Alimentao Escolar; CONTUR Conselho Municipal de Turismo; CONEN Conselho Municipalde Entorpecentes; CONDIM Conselho Municipal dos Direitosda Mulher; CME Conselho Municipal de Educao; CMC Conselho Municipal de Cultura; COMUI Conselho Municipaldo Idoso; Conselho de Segurana Comunitria; CMDC Criaodo Conselho Municipal dos Direitos da Cidadania contra asdiscriminaes e violncia; Conselho Tcnico da Vila Tecnolgicade Porto Alegre.

    Alm das Conferncias Municipais setoriais, que se realizamperiodicamente conforme definies em cada Conselho, foiinstituda a instncia de Congressos da Cidade, sendo que o primeirorealizou-se em 1993, com o tema: Cidade Constituinte Qual a

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    cidade que queremos no futuro?. Em 1995 acontece o segundoCongresso da Cidade, que iniciou a reformulao do Plano Diretorde Desenvolvimento Urbano Ambiental. O III Congresso daCidade (1999) definiu as diretrizes para o desenvolvimento urbano,econmico, social e cultural da cidade. O IV (2003) teve comotema a Democracia e a Gesto do Estado.

    Antecedente ao IV Congresso da Cidade, o Grupo de TrabalhoMecanismos da Democracia Participativa (com coordenao bipartite,integrada por rgos do Governo: SPM, CRC, GAPLAN e pelasociedade civil: representantes do COP, CMDUA e UAMPA)avaliou os vrios canais existentes no municpio de Porto Alegre,que visam permitir a participao da populao de forma diretaou atravs de entidades da sociedade civil no debate e tomada dedeciso sobre as polticas pblicas desenvolvidas pelo municpio.Neste processo foram entrevistados, de maro a maio de 2003,representantes de vinte conselhos municipais, representantes doConselho do Oramento Participativo e representantes dos FrunsRegionais de Planejamento.

    A discusso resultante da pesquisa realizada apontou que umdos problemas diagnosticado no cotidiano dos ConselhosMunicipais a fragmentao na definio das polticas pblicas[...] A articulao entre as polticas e rgos setoriais encontra-secomo um dos maiores desafios a serem enfrentados pelosprotagonistas na formulao de polticas pblicas, resgatando aviso de totalidade da ao humana (ALFONSIN, 2003, p. 04).

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    2.1 O ENFRENTAMENTO DAS DESIGUALDADESSOCIAIS

    A existncia de grandes desigualdades na sociedade brasileiratem ensejado um esforo bastante acentuado das diversas esferasde governo para dar respostas mais efetivas ao enfrentamento daquesto social. Neste sentido inmeras iniciativas foram e estosendo desenvolvidas no mbito nacional, estadual e municipal, coma finalidade de reduzir ou minimizar os problemas originados pelacondio de pobreza e de extrema pobreza em que se encontrasubmetido um contingente significativo da populao brasileira.Embora se tenha conscincia que a desigualdade de renda sejaapenas uma das manifestaes do quadro social do pas, ela tempermeado a discusso dos analistas e inspirado diversos modelosde interveno das polticas pblicas. Segundo Henriques(UNESCO, 2003, pag. 63) a pobreza a questo mais urgente queo pas necessita enfrentar neste novo milnio, uma vez que 55milhes de pessoas encontram-se na linha de pobreza. Ademais,cerca de 24 milhes de brasileiros esto na condio de extremapobreza, isto , sem a possibilidade de prover suas necessidadesmais elementares de alimentao.

    De outro lado, a evoluo dos sistemas de proteo social noBrasil esteve sempre atrelada regulao das relaes do trabalhoassalariado. Neste sentido, o arranjo institucional que foi construdoao longo de tempo, dirigiu-se configurao de um conjunto demedidas no campo da previdncia, sade, educao, com o fito deatender as categorias mais organizadas e que apresentavam maiorpoder de presso. Assim, uma parcela significativa da populao

    2. REDE DE PROTEO SOCIAL

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    brasileira, que no possua vnculos formais de trabalho ou quevivia em condies de pobreza, no tinha acesso aos mecanismosde proteo social institudos. Esse padro de evoluo originouum sistema complexo, centralizado, com baixa capacidaderedistributiva e gerador de ineficincias operacionais, sendo a gestodas polticas sociais caracterizada neste perodo por uma posturamarcadamente assistencialista.

    Diante dos limitados resultados alcanados com a poltica socialde cunho centralizador e assistencialista que vigorou at o incioda dcada de noventa, e vinculado s reformas preconizadas naNorma Constitucional de 1988 inovaes passaram a serimplementadas no arranjo institucional e nos sistemas de proteosocial, em relao descentralizao das polticas sociais, universalizao de servios e ampliao do impacto redistributivo.

    Acompanhando essas inovaes, programas de combate pobrezapassaram a ser desenvolvidos pelas diversas esferas de governo,fundamentados na transferncia direta de renda aos indivduos efamlias em situao de vulnerabilidade ou risco social. Estesprogramas se criaram com a finalidade de aumentar a efetividadedas polticas sociais. Algumas dessas iniciativas, de acordo com Rocha(UNESCO, 2003, pag. 70), representaram meras ampliaes deprogramas j existentes na dcada de setenta (amparo assistencialaos idosos e deficientes). Outras levaram em conta as prioridades deatendimento de pblicos alvos (Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentao ePrograma de Erradicao do Trabalho Infantil PETI), bem comoos objetivos de constituir mecanismos compensatrios decorrentesda elevao dos preos de determinados bens (Auxlio-Gs) ou delimitada renda per capita (Carto-Alimentao).

    Em realidade, as origens dos programas de renda mnima I, deconstituio de uma rede de proteo social para as populaesmais pobres, mediante a transferncia direta de renda esto ligadas concepo dos pensadores liberais do sculo XVII. Asexperincias internacionais com programas dessa natureza,remontam s dcadas de 30-40, sendo que atualmente a UnioEuropia e a OCDE recomendam a sua adoo por parte dosestados membros (LAVINAS, 1998).

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    No Brasil os programas de renda mnima ganharam destaquepelas caractersticas inovadoras que proporcionaram em termosinstitucionais. Embora tais programas tenham sido idealizados epropostos desde o final da dcada de oitenta, somente a partir de1995 que comeam a ser implementados em diversas cidades como:Campinas, Distrito Federal, Recife e Salvador. De acordo comDraibe (2000), apesar das diferentes circunstncias e procedimentosde operacionalizao, essas intervenes levadas a cabo pelasdiferentes prefeituras, apresentaram caractersticas em comum,quais sejam: (i) os recursos para financiar os programas eramcalculados como percentual das receitas correntes municipais; (ii)as transferncias de recursos estavam condicionadas a famliaspobres que apresentassem filhos de at 14 anos; (iii) exigncia defreqncia escolar e de comparecimento s unidades de sade.

    Adicionada aos processos de descentralizao e dos programasde transferncia de renda, foi introduzida paulatinamente naformulao e implementao das polticas sociais a concepo degesto atravs de redes. O emprego desse modelo organizacionalinspirou-se na prpria Lei Orgnica de Assistncia Social (LOAS),que estabelece que a assistncia social deve realizar-se de formaintegrada s polticas setoriais. Isto , no deixa de se constituir emuma tentativa de minimizar os problemas decorrentes dadesarticulao das intervenes entre as diversas esferas de governo,e entre os diferentes organismos pblicos e privados que atuam nocampo das polticas sociais. Em realidade, o modelo de rede umaresposta de natureza organizacional aos princpios da descentralizaoe da coordenao, com a finalidade de propiciar maior grau deeficincia das administraes de diferentes hierarquias e de assegurara tomada de deciso de forma compartilhada. Segundo Castells(1999), essa lgica institucional est se desenvolvendo em todas asreas a partir do triplo processo: de crise do Estado-Nao, dedesenvolvimento de instituies supra-nacionais e de transfernciade atribuies e iniciativas aos mbitos regionais e locais.

    Em decorrncia dessas transformaes, nas orientaes e noprocesso de gesto das polticas sociais, as diferentes esferas degoverno passaram a estruturar e operacionar suas intervenes

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    observando, de um lado, os marcos regulatrios e, de outro, ascircunstncias especficas dos problemas sociais locais. Nestesentido, o presente texto procura retratar a experincia da PrefeituraMunicipal de Porto Alegre com a implementao da Rede deProteo Social s Famlias em Situao de Vulnerabilidade Social,interveno esta que vem sendo realizada pela Fundao deAssistncia Social e Cidadania FASC, principalmente a partir doprograma denominado Famlia: Apoio e Proteo. Assim, coma finalidade de propiciar uma melhor caracterizao da inserodesse programa junto as demais aes da poltica de assistnciasocial e as suas relaes com o arranjo institucional, passa-se arealizar uma breve descrio da forma como est configurada arede de assistncia social do municpio de Porto Alegre.

    2.2 REDE DE ASSISTNCIA SOCIAL: ESTRUTURAE PRINCIPAIS SERVIOS

    Diante do contexto das polticas sociais no Brasil, a PrefeituraMunicipal de Porto Alegre (PMPA) vem desenvolvendo umconjunto de iniciativas e constituindo diferentes arranjosorganizacionais, na rea de assistncia social, com a finalidade depropiciar acesso aos servios bsicos e alterar as condies de vidade grupos carentes da populao municipal.

    Essas iniciativas e estruturas conformam a denominada Redede Assistncia Social de Porto Alegre e envolvem programas eservios realizados pela Fundao de Assistncia Social eCidadania (FASC), rgo responsvel pela execuo das polticassociais do municpio. Alm da implementao de programasespecficos e da prestao de servios diretos populao, a FASCdesenvolve a superviso de atividades executadas por entidadesno-governamentais conveniadas, assim como estabelecearticulaes com as demais estruturas setoriais da Prefeitura ecom aes de outras esferas de governo, com vistas a proporcionarum atendimento integral s demandas de grupos sociais emsituao de risco.

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    A atual Rede de Assistncia Social do Municpio est divididaem duas estruturas denominadas de Rede Bsica e de Rede deServios Especializados. A Rede Bsica abrange os programas eservios que necessitam estar disponveis em todas as comunidadese, por conseguinte, necessitam estar prximas aos locais de moradiada clientela atendida. Em termos de estrutura fsica, a Rede Bsicaest constituda de nove centros regionais de assistncia social e detreze mdulos responsveis pela realizao de atendimentosprioritrios a determinadas comunidades, sendo esses equipamentosempregados como suporte para proporcionar maior coberturageogrfica e para aprofundar o processo de descentralizao dosservios de assistncia social em nvel municipal. Os principaisarranjos organizacionais vinculados a essa estrutura so os Ncleosde Apoio Scio-Familiar (NASF), o Servio de Apoio Scio-Educativo (SASE), o Programa de Apoio Social ao Idoso (PAI), oServio de Atendimento Comunidade e o Programa de Execuode Medidas Scio-Educativas em Meio Aberto (PEMSE), quepassam a ser descritos de forma sinttica, como segue:

    Os NASFs se constituem em equipes tcnicasmultidisciplinares compostas por profissionais das reas deassistncia social, psicologia e pedagogia, que so responsveispelo atendimento das famlias e pela realizao do apoiotcnico. Os NASFs funcionam nas unidades operacionais,nos mdulos descentralizados e nas entidades no-governamentais conveniadas.

    O Servio de Apoio Scio-Educativo SASE efetua oatendimento s crianas e adolescentes, de 07 a 14 anos, noturno inverso escola. Durante esse perodo os usuriosrecebem alimentao, apoio pedaggico e psicossocial.Quando necessrio so encaminhados aos servios de sade,realizam oficinas culturais, de expresso e atividades ldicaspara estimular o desenvolvimento afetivo e social.

    O Programa de Apoio Social ao Idoso PAI um conjuntode atividades e estratgias de motivao e envolvimento,desenvolvido para o atendimento do idoso excludo de bense servios. Em cada unidade, tcnicos da FASC trabalham

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    com Grupos de Convivncia, onde so realizadas oficinasde artesanato, palestras e atividades fsicas com os integrantesdo programa. Estes encontros estimulam o exerccio dosdireitos, a participao e a reintegrao social dessas pessoas.

    O Servio de Atendimento Comunidade consiste ematividades de apoio social, orientao populao sobredireitos sociais e demais polticas sociais, bem como aconcesso de benefcios como vale transporte, vale foto ecestas bsicas, dentre outros.

    O Programa de Execuo de Medidas Scio-Educativas emMeio Aberto (PEMSE) coordena a execuo da medida deprestao de servios comunidade de adolescentes emunidades do municpio de Porto Alegre.

    A Rede de Servios Especializados consiste de programas eservios destinados a pblicos especficos, sendo o seu acessoefetivado, em sua maior parte, atravs de encaminhamentos. Osprogramas integrantes da Rede de Servios Especializados so osabrigos para crianas e adolescentes, casas de passagem para vtimasde violncia, casas lares, abrigos residenciais e albergues e serviospara idosos e portadores de deficincia prestados por instituiesconveniadas. Outros servios que compem a rede especializadaso a Casa de Convivncia, o Atendimento Social de Rua e o Serviode Educao Social de Rua, com funcionamento e atribuiesdeterminados, conforme segue:

    O Servio de Abrigagem temporria prestado a partir deabrigos municipais destinados a acolher moradores de rua.O servio mantm convnio com estruturas de albergue, quetambm atende populao adulta desabrigada. Nessesequipamentos, os usurios recebem atendimento social naexpectativa de reconstruir seu projeto de vida.

    A Casa de Convivncia um espao diurno para a populaoadulta de rua, onde podem satisfazer suas necessidades bsicas,como higiene e alimentao. No local, so realizadas atividadesem grupo que desenvolvem a auto-estima e promovem a auto-organizao dos usurios. Prev, ainda, o encaminhamento paraos servios pblicos de sade e de identificao.

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    O Atendimento Social de Rua um trabalho desenvolvidocom adultos excludos nas vias pblicas de Porto Alegre. Umaequipe tcnica se desloca at os locais, aborda, dacompanhamento e estabelece vnculos, a fim de identificaras necessidades essenciais desta populao. Fazencaminhamentos para servios sociais, como sade,identificao (documentos) e, se for o caso, para sua inseronos programas e unidades da Rede Especializada.

    A Educao Social de Rua consiste em trabalho direcionados crianas e adolescentes em situao de rua. Esse servioenvolve alm da FASC, as Secretarias Municipais de SadeEducao e de Esporte, Recreao e Lazer.

    Este trabalho se inicia pela abordagem nas vias pblicas,prossegue com jogos, atividades recreativas e outros encontros,at estabelecer uma relao de confiana, quando podem serincludos nos programas. O objetivo do servio despertar nestesjovens o desejo de construir um novo projeto de vida e, sempreque possvel, encaminh-los de volta famlia ou a um abrigo daRede Especializada.

    Como se pode verificar, os servios prestados pela Rede Bsicae pela Rede de Servios Especializados so bastante variados eapresentam diferentes nveis de complexidade gerencial e tcnica.No entanto, sem entrar na discusso da essencialidade de taisservios e de seus impactos sobre a clientela a que se destinam, oprograma que assume maior relevo no contexto da assistnciasocial do municpio de Porto Alegre o Programa Famlia: Apoioe Proteo. A importncia de tal programa no se resume aoalcance dos servios prestados e da abordagem diferenciada queapresenta (privilegiando o grupo familiar em contraste com asaes convencionais de ateno pontual e segmentada de clientelaespecfica), mas tambm pela coordenao que exige com osequipamentos de assistncia social existentes, com a infra-estrutura setorial dos diversos organismos vinculados rea socialdo municpio e com as demais esferas de governo. Em realidade,as diversas aes desenvolvidas pelo programa configuram asprincipais estruturas de sustentao da rede de proteo social s

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    famlias em situao de vulnerabilidade social. Dessa forma,passa-se a caracterizar sua evoluo e funcionamento, bem comosuas vinculaes com as demais polticas sociais do municpio.

    2.3 PROGRAMA FAMLIA: APOIO E PROTEO

    O Programa Famlia: Apoio e Proteo est vinculado RedeBsica de Assistncia Social e originou-se de inmeras iniciativas,desenvolvidas recentemente pela FASC, inspiradas na concepode programas de transferncia de renda e de focalizao no grupofamiliar em situao de risco social. Como exemplos dessasiniciativas podem ser citados os projetos: Sinal Verde (1994), queconsistia em atividades de atendimento integral s famlias comcrianas e adolescentes que mendigavam nas sinaleiras da capital,e o prprio projeto de implantao dos NASFs (1995), nas diversasunidades operacionais da FASC. Alm dessas iniciativas, em 1997,implantou-se o projeto Rede de Apoio e Proteo Famlia, emparceria com a iniciativa privada e com quatro entidades no-governamentais, tendo o mesmo escopo de atuao dos projetosanteriormente mencionados. A variante deste ltimo situava-sena diferenciao do benefcio, que previa a concesso de bolsa-auxlio por seis meses, renovveis por mais seis meses para asfamlias consideradas em situao de vulnerabilidade social. J apartir de 1998, atravs do Decreto Municipal n 11.997,unificaram-se os projetos de Rede de Apoio e Proteo e o deNcleo de Apoio Scio-Familiar, passando a sua denominaopara Programa Famlia: Apoio e Proteo.

    Os conceitos centrais do programa esto ancorados na noode famlia e de vulnerabilidade social. A famlia compreendidacomo ncleo natural e fundamental da sociedade e como lugar,por excelncia, de proteo social. Neste sentido, as aes doprograma devem buscar fortalecer os laos familiares, alm defomentar a articulao espontnea de solidariedade existente nascomunidades.

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    A noo de vulnerabilidade social supe uma poltica deproteo que se proponha a enfrentar as situaes decorrentes dapobreza e da excluso social que ameaam o desenvolvimentofsico, social, mental e moral das crianas, adolescentes e/ouidosos, tais como situao de rua e/ou mendicncia; violncia;uso de drogas; trabalho infantil; cumprimento de medida deproteo (abrigamento) ou medidas scio-educativas (em conflitocom a lei); desnutrio; pessoas portadoras do vrus HIV;adolescentes grvidas; pessoas portadoras de deficincia.

    Alm da noo de famlia e de vulnerabilidade social, outroaspecto que recebeu relevncia dos gestores na formatao doprograma, foi a concepo de construo da autonomia do conjuntodos usurios. Isto , de acordo com Martins (2002), no basta umapoltica social apenas distributiva de renda, mas propiciar condiesobjetivas para que todo aquele cidado ou cidad, em situao devulnerabilidade social, garanta o direito a se alimentar, manter suacasa, garantir o direito de suas filhas e filhos, enfim, fazer com quepais e mes possam proteger e manter seu lar.

    De outro lado, independente da origem das iniciativas, a FASCadotou a estratgia de concentrar todas as aes focalizadas naateno integral s famlias e na concesso de benefcios financeiros,junto ao Programa Famlia: Apoio e Proteo. Assim, as iniciativasda esfera federal, como o Programa de Erradicao do TrabalhoInfantil (PETI); os da esfera estadual, como o Programa FamliaCidad e o prprio Programa Ncleos de Apoio Scio-Familiar(NASF), do mbito municipal, passaram a ser gerenciados de umaforma integrada e unif icada, sendo preservadas as suascaractersticas especficas de operao.

    A articulao com o PETI se efetiva a partir de 2000 e contemplao repasse de recursos do governo federal no valor de R$ 40,00(quarenta reais) por criana/adolescente de 7 a 15 anos,identificada em situao de trabalho infantil , permanecendo obenefcio at o adolescente completar 15 anos ou pelo perodomximo 4 anos de permanncia da famlia. O municpio de PortoAlegre complementa a bolsa at atingir o patamar de R$ 150,00(cento e cinqenta reais) por famlia. A condio fundamental

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    para a participao no PETI est relacionada retirada efetivadas crianas/adolescentes do trabalho penoso, perigoso, insalubree degradante, assim como freqncia escolar e participaonas jornadas ampliadas onde se desenvolvem aes educativascomplementares.

    Em relao ao Programa Famlia Cidad (programa de rendamnima desenvolvido pelo Governo do Estado do Rio Grande doSul), o municpio desenvolve um trabalho de coordenao eassessoria tcnica do projeto na esfera local, competindo ao governoestadual a transferncia de recursos para o financiamento dosbenefcios, que variam de R$ 90,00 (noventa reais) a R$ 225,00(duzentos e vinte e cinco reais). As condies de ingresso noprograma esto vinculadas a situaes de risco para crianas eadolescentes, bem como de famlias com idosos, pessoas portadoresde deficincias (PPDs) e portadores do vrus HIV, que no possuamcapacidade de suprir suas necessidades bsicas. Esse programa foiimplementado em 2001 em parceria com a Secretaria de Trabalho,Cidadania e Assistncia Social STCAS, que disponibilizou recursosao municpio para o atendimento de 1.626 famlias.

    O Programa NASF, de origem municipal, conforma o trip deiniciativas de ateno integral a grupos familiares em situao devulnerabilidade social. O NASF foi concebido, a partir de 1995,com a finalidade de resgatar a importncia do papel da famlia nodesenvolvimento da criana e do adolescente. Em realidade, aconstituio do NASF foi uma decorrncia das proposiesconstantes da Primeira Conferncia Municipal de Assistncia Social,realizada em 1993, e da Primeira Conferncia Municipal para aInfncia e Adolescncia, em 1994. Nelas recomendaram ao PoderPblico a implantao de uma poltica de proteo social a famliasem situao de risco e que apresentassem grandes dificuldades parapromover a proteo de suas crianas e adolescentes. Aliado srecomendaes das instncias mximas de deliberao das polticasde assistncia social do municpio, o programa tinha por finalidadeatender ao disposto legal contemplado no Estatuto da Criana edo Adolescente ECA, mais especificamente em relao ao incisoI, do Artigo 90, que determina que as entidades de atendimento

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    so responsveis pelo planejamento e execuo de programasdestinados a crianas e adolescentes em regime de orientao eapoio scio-familiar.

    A concepo original do NASF preconizava a implantao dencleos de atendimento em todas as unidades operacionais da FASCe a concesso de benefcios (inicialmente definido como cestabsica), s famlias selecionadas. Para aderirem ao projeto, as famliasdeveriam se comprometer a comparecer aos atendimentos,participar de reunies em grupo, matricular e manter seus filhosna escola, alm de providenciar outros encaminhamentos avaliadoscomo necessrios. Gradualmente, o programa foi expandindo-se,exigindo o estabelecimento de parcerias interinstitucionais comorganizaes no-governamentais, ampliando o atendimento parafamlias com crianas e adolescentes em situao de rua, maus tratosfsicos e psicolgicos, violncia domstica, drogadio, exploraoe abuso sexual, e explorao do trabalho infantil.

    Ademais, com o passar do tempo as estruturas dos NASFspassaram a conduzir e operacionalizar todas as iniciativas queenvolvessem metodologias de interveno junto a grupos familiares.Neste sentido, alm de se constituir em um programa de concessode renda mnima mensal, de acompanhamento tcnico e de apoio,passou a dar sustentao operacional s demais iniciativasdesenvolvidas pelas diferentes esferas de governo, como oPrograma PETI e o Programa Famlia Cidad.

    Assim, o NASF, enquanto programa de ao, atende s famliasresidentes em Porto Alegre, com renda per capita de meio salriomnimo, que tenham filhos (crianas e adolescentes) em situaode risco pessoal (violncia familiar, mendicncia, uso de drogas nafamlia, explorao sexual e trabalho infantil). Tem por objetivo ofortalecimento dos vnculos familiares e desenvolvido a partir dainsero das pessoas na estrutura operacional de cada CentroRegional de Assistncia Social. As famlias, alm de assumirem ocompromisso de manter seus filhos na escola, participam dasdinmicas de grupo, so acompanhadas por assistentes sociais epsiclogos, assim como recebem bolsa-auxlio pelo perodo de seismeses a um ano.

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    Em dezembro de 2002, o Programa Famlia: Apoio e Proteototalizava 3.371 famlias atendidas na rede prpria e conveniada,sendo 1175 famlias vinculadas ao Programa Ncleos de ApoioScio-Familiar (NASF), 570 ao Programa de Erradicao doTrabalho Infantil (PETI) e 1.626 ao Programa Famlia Cidad, deacordo com relatrio da Rede de Coordenao Bsica (FASC, 2002).

    Os encaminhamentos das famlias para a realizao das triagensdo Programa Famlia: Apoio e Proteo so realizados pelosConselhos Tutelares, Coordenadorias das Promotorias da Infncia,e o Juizado da Infncia e Juventude. Estas entidades que atuamjunto a crianas e adolescentes, bem como decorrem da inscriodas famlias que buscam os servios nas unidades operacionais ouque se encontram vinculadas aos projetos desenvolvidos pela FASC.

    As triagens tm por finalidade identificar as dificuldadesenfrentadas pelo grupo familiar e as possibilidades de interveno.As entrevistas de seleo so feitas individualmente na residnciadas famlias, a partir de critrios para o ingresso em cada um dosprogramas que compem Famlia: Apoio e Proteo. A triagem buscaide