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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURS CURSO DE DIREITO
TRANSTORNOS DA PERSONALIDADE: ESTUDO SOBRE A INIMPUTABILIDADE
JULIANA ROSSI ARAGÃO
ITAJAÍ (SC), OUTUBRO DE 2007
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURS CURSO DE DIREITO
TRANSTORNOS DA PERSONALIDADE: ESTUDO SOBRE A INIMPUTABILIDADE
JULIANA ROSSI ARAGÃO
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Mestre Rogério Ristow
ITAJAÍ (SC), OUTUBRO DE 2007
AGRADECIMENTO
A Deus, por me iluminar e guiar meu caminho e
ter sido um amigo fiel em todas
as horas.
À minha mãe Márcia e ao meu pai Aníbal, minha
irmã Gabriella, ao meu irmão Rafael e ao meu
padrasto Sidnei, pelo amor, carinho, paciência e
tolerância nesses anos de faculdade.
Ao meu namorado Jean
que há anos está ao meu lado, trazendo muita
felicidade e alegria aos meus dias, e sem os
quais, nenhum sonho
seria possível.
As valiosas amizades que encontrei nestes cinco
anos de Universidade, em especial as minhas
grandes amigas Janaína, Taís e Nivana pela
compreensão, carinho e paciência nas horas que
mais precisei.
Ao Dr. Ronaldo Silva, ao Dr. Cláudio Gastão da
Rosa Filho pela gentileza e grande colaboração
para este trabalho.
Ao meu grande mestre Rogério Ristow pelo
profissionalismo, incentivo
e paciência.
E a todos os meus familiares e amigos que me
acompanharam nesses anos de faculdade.
DEDICATÓRIA
Este trabalho eu dedico ao meu pai Aníbal e minha mãe Márcia, pela compreensão,
companheirismos, amor e ajuda, não só nesta
fase tão importante da minha vida, mas em toda a
minha existência.
Ao meu grande Amor Jean, por seu amor,
coragem, paciência e dedicação.
Aos meus avós, que amo tanto Lourdes e Atílio
Rossi e aos avós que sempre estarão no meu coração e que sempre amarei Julieta e Agenor
Aragão (in memorian).
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
ITAJAÍ (SC), OUTUBRO DE 2007
JULIANA ROSSI ARAGÃO Graduanda
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda JULIANA ROSSI ARAGÃO, sob o
título TRANSTORNOS DA PERSONALIDADE: O ESTUDO DA
INIMPUTABILIDADE, , foi submetida em ____ de _____________ de 2007 à
banca examinadora composta pelos seguintes professores: Rogério Ristow
(Orientador e Presidente da Banca),
_________________________(Membro)__________________________(Membr
o), e aprovada com a nota _______(___________________).
Itajaí (SC), outubro de 2007
Msc. Rogério Ristow Orientador e Presidente da Banca
Professor Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AMPL. Ampliada
ART. Artigo
ATUAL. Atualizada
CP Código Penal
CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
ED. Edição
MSC. Mestre
N. Número
P. Página
REL. Relator
REV. Revista
V. Volume
ROL DE CATEGORIAS
Culpabilidade
A culpabilidade é a possibilidade de se considerar alguém culpado pela prática de
uma infração penal. Por essa razão, costuma ser definida como juízo de
censurabilidade e reprovação exercido sobre alguém que praticou um fato típico e
ilícito. Não se trata de elemento do crime, mas pressuposto para imposição de
pena, porque, sendo um juízo de valor sobre o autor de uma infração penal, não
se concebe possa, ao mesmo tempo, estar dentro do crime, como seu elemento,
e fora, como juízo externo de valor do agente. Para censurar quem cometeu um
crime, a culpabilidade deve estar necessariamente fora dele.1
Imputabilidade
É a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo
com esse entendimento. A imputabilidade se baseia na liberdade interna do
homem, e precisamente a essa liberdade, a esse poder de auto determinação, é
que o direito penal recorre, impondo ou proibindo condutas sob a ameaça de uma
sanção.2
Inimputabilidade
Inimputabilidade é a incapacidade para apreciar o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com essa apreciação. Se a imputabilidade consiste na
capacidade de entender e de querer, pode estar ausente porque o indivíduo, por
questão de idade, não alcançou determinado grau de desenvolvimento físico ou
psíquico, ou porque existe em concreto uma circunstância que a exclui. Fala-se,
então, em inimputabilidade. A imputabilidade é a regra; a inimputabilidade, a
exceção.3
Psicopatologia
1 http://www.grupoestudos.kit.net/material/capez/capez_culpabilidade.pdf, acesso em 14/10/07. 2 http://www.grupoestudos.kit.net/material/capez/capez_culpabilidade.pdf, acesso em 14/10/07. 3 http://www.grupoestudos.kit.net/material/capez/capez_culpabilidade.pdf, acesso em 14/10/07.
É um termo que se refere tanto ao estudo dos estados mentais patológicos,
quanto à manifestação de comportamentos e experiências que podem indicar um
estado mental ou psicológico anormal.4
Psiquiatria
A psiquiatria é o ramo da medicina que lida com a prevenção, atendimento,
diagnóstico, tratamento e reabilitação das doenças mentais, sejam elas de cunho
orgânico ou funcional.5
Transtornos da personalidade
Transtornos da personalidade são descritos como padrões de comportamentos
anormais ou mal adaptativos e desvios significativos da norma cultural do modo
de pensar, sentir, perceber e, particularmente, de relacionar-se com os outros.6
Vingança
A vingança consiste na retaliação contra uma pessoa ou grupo em resposta a
algo que foi percebido ou sentido como prejudicial. Embora muitos aspectos da
vingança possam lembrar o conceito de igualar as coisas, na verdade a vingança
em geral tem um objetivo mais destrutivo do que construtivo. Quem busca
vingança deseja forçar o outro lado a passar pelo que passou e/ou garantir que
não seja capaz de repetir a ação nunca mais.7
4 http://pt.wikipedia.org/wiki/Psicopatologia, acesso em 14/10/07. 5 http://pt.wikipedia.org/wiki/Psiquiatria, acesso em 14/10/07. 6 http://www.oboulo.com/transtornos-da-personalidade-37470.html, acesso em 14/10/07. 7 http://pt.wikipedia.org/wiki/Vingan%C3%A7a, acesso em 14/10/07.
SUMÁRIO
RESUMO ................................ ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.II
INTRODUÇÃO .................................................................................. 01
CAPÍTULO 1 ..................................................................................... 04
EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO PENAL ............................... 04 1.1 PERÍODO DA VINGANÇA ............................................................................. 04 1.1.1 VINGANÇA PRIVADA ....................................................................................... 05 1.1.2 VINGANÇA DIVINA ........................................................................................... 06 1.1.3 VINGANÇA PÚBLICA ........................................................................................ 07 1.2 PERÍODO HUMANITÁRIO. ........................................................................... 07 1.2.1 DIREITO PENAL E O ILUMINISMO ...................................................................... 08 1.2.2 BECCARIA ..................................................................................................... 09 1.2.3 O DIREITO NATURAL E SUA INFLUÊNCIA ........................................................... 10 1.2.4 A ESCOLA CLÁSSICA ..................................................................................... 10 1.3 PERÍODO CIENTÍFICO OU CRIMINOLÓGICO ............................................. 12 1.3.1 O DETERMINISMO .......................................................................................... 14 1.3.2 CESARE LOMBROSO ...................................................................................... 15 1.3.3 ENRICO FERRI ............................................................................................... 16 1.3.4 RAFAEL GARÓFALO ....................................................................................... 18 1.4 ESCOLAS MISTAS E TENDÊNCIAS CONTEMPORÂNEAS ....................... 20 1.5 EVOLUÇÃO DO DIRIETO PENAL NO BRASIL............................................ 21 1.5.1 PERÍODO COLONIAL ....................................................................................... 21 1.5.2 CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO ....................................................................... 22 1.5.3 PERÍODO REPUBLICANO ................................................................................. 23 1.5.4 REFORMAS CONTEMPORÂNEAS ...................................................................... 24
CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 27
CULPABILIDADE ............................................................................. 27 2.1 IMPUTABILIDADE ......................................................................................... 30 2.2 INIMPUTABILIDADE ..................................................................................... 31 2.2.1 DOENÇA MENTAL OU DESENVOLVIMENTO MENTAL INCOMPLETO ......................... 33 2.2.2 EMBRIAGUEZ ................................................................................................. 35 2.2.3 MENORIDADE PENAL ...................................................................................... 37 2.3 SEMI-IMPUTABILIDADE ............................................................................... 39 2.4 POTENCIAL CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE ................................................ 40 2.4.1 ERRO DE PROIBIÇÃO ...................................................................................... 41 2.5 EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA ................................................... 41 2.5.1 COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL ........................................................................ 42 2.5.2 OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA ............................................................................. 42
2.6 SANÇÕES PENAIS ....................................................................................... 42 2.6.1 MEDIDAS DE SEGURANÇA ............................................................................... 43 2.6.2 PENAS .......................................................................................................... 46
2.6.2.1 PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE ........................................................ 47 2.6.2.2 PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO .......................................................... 49 2.6.2.3 PENA DE MULTA ................................................................................. 51
CAPÍTULO 3 ..................................................................................... 53
PSICANÁLISE, PSICOPATOLOGIA E A PSICOLOGIA FORENSE 53 3.1 CONCEITO DE NORMALIDADE E ANORMALIDADE ................................. 54 3.2 A CONDUTA CRIMINOSA ............................................................................ 55 3.3 PERSONALIDADE TOTAL DO INDIVÍDUO .................................................. 56 3.3.1 PERSONALIDADE............................................................................................ 57 3.3.2 PERSONALIDADES PSICOPÁTICAS .................................................................... 59
3.3.2.1 PSICOPATAS HIPERTÍMICOS ................................................................. 61 3.3.2.2 PSICOPATAS DEPRESSIVOS ................................................................. 62 3.3.2.3 PSICOPATAS LÁBEIS DO ESTADO DE ÂNIMO ........................................... 62 3.3.2.4 PSICOPATAS IRRITÁVEIS ...................................................................... 63 3.3.2.5 PSICOPATAS DE INSTINTIVIDADE DÉBIL ................................................. 63 3.3.2.6 PSICOPATAS SEM SENTIMENTOS OU ANORMAIS ..................................... 64 3.3.2.7 PSICOPATAS CARENTES DE AFETO ....................................................... 65 3.3.2.8 PSICOPATAS FANÁTICOS ..................................................................... 66 3.3.2.9 PSICOPATAS INSEGUROS DE SI MESMO ................................................. 67 3.3.2.10 PSICOPATAS ASTÊNICOS ................................................................... 68
3.4 INTERFACE ENTRE PSIQUIATRIA E LEI ASPECTOS DESTACADOS ..... 69 3.4.1 Psicopatias e as Funções da Pena........................................................................69 3.4.2 Psicopatias e os Crimes Privilegiados por Violenta Emoção.................70 3.5 INIMPUTABILIDADE DE SEMI-INIMPUTABILIDADE DOS PSICOPATAS . 74
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................76 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................78 ANEXO................................................................................................81
RESUMO
A presente monografia, fora realizada com fulcro em
pesquisa científica, que propõe e estuda os portadores de transtornos da
personalidade. Inicialmente, explicita-se a evolução histórica do direito penal,
desde os primórdios da história em sociedade, esta pesquisa foi feita com a
intenção de analisar as peculiaridades da inimputabilidade, inserida na
culpabilidade e, após, apurar a personalidade psicopática. A presente pesquisa de
conclusão de curso é composta de três capítulos, que se destacam pelos
seguintes conteúdos e objetivos específicos: no primeiro capítulo foi realiza-se um
estudo sobre a evolução histórica do direito penal; no segundo capítulo, assevera-
se sobre a culpabilidade visando à inimputabilidade; e no terceiro capítulo,
aprofunda-se basicamente no estudo dos psicopatas e a sua personalidade
individual.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto aprofundar os
conhecimentos sobre as psicopatias e o estudo da inimputabilidade, visando à
realização de uma monografia para conclusão do curso de direito para a Univali, à
luz de doutrinas que explicitam em suas citações uma clara uma síntese sobre o
tema.
O seu objetivo é analisar os psicopatas no que se refere a
inimputabilidade, desde o início, na evolução do Código Penal, visando por final a
legislação brasileira, observando a personalidade e suas peculiaridades.
Para a investigação do objeto e como meio para se atingir os
objetivos propostos, adotaram-se o método indutivo8, operacionado com as
técnicas9 do referente10, da categoria11, dos conceitos operacionais12 e da
pesquisa bibliográfica, em conjunto com as técnicas propostas pelo professor
Colzani13, subdividido em relatório final e três capítulos.
Para tanto, ab initio, no Capítulo 1, tratando da compreensão
da evolução histórico-penal que é de extrema importância para uma avaliação
correta da mentalidade e dos princípios que nortearam o sistema punitivo
8 O método indutivo consiste em ‘pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral’. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. 6 ed. rev.atual.amp.Florianópolis: OAB/SC Editora, 2001, p.87. 9 “Técnica é um conjunto diferenciado de informações reunidas e acionadas em forma instrumental para realizar operações intelectuais ou físicas, sob o comando de uma ou mais bases lógicas investigatórias”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. 6 ed. rev.atual.amp.Florianópolis: OAB/SC Editora, 2001, p.88. 10 "explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitado o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa". PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. 6 ed. rev.atual.amp.Florianópolis: OAB/SC Editora, 2001, p.63. 11 “palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia". PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. 6 ed. rev.atual.amp.Florianópolis: OAB/SC Editora, 2001, p.37. 12 definição estabelecida ou proposta para uma palavra ou expressão, com o propósito de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. 6 ed. rev.atual.amp.Florianópolis: OAB/SC Editora, 2001, p.51.
2
contemporâneo, passando pelos períodos da vingança, pela Revolução Francesa,
com a cooperação de seus grandes intérpretes, ora Beccaria, Rafael Garófalo e
Ferri. Sobre o tema será estudado a evolução das escolas penais. Bem como
será abordado os pensamentos de Lombroso, e a evolução do direito penal na
legislação brasileira com as reformas contemporâneas.
No Capítulo 2, discorrer-se-á acerca da culpabilidade que
em suma se estudará que o sujeito deve ter consciência de que o ato que
cometera é o certo ou errado, será analisada a imputabilidade e a
inimputabilidade, neste contexto, com grande importância para o presente
trabalho as suas subdivisões: a doença mental, a embriaguez, a menoridade
penal, será tratada a semi-imputabilidade, a potencial consciência da ilicitude, o
erro de proibição, a exigibilidade da conduta diversa, coação moral irresistível e, a
obediência hierárquica. Logo, as sanções penais como a medida de segurança, e
as penas (multa, restritivas de direito, privativas de liberdade, estas se subdividem
em: reclusão, detenção e prisão simples).
No Capítulo 3, tratando de a Psicologia Jurídica, a
Psiquiatria Forense e a Psicanálise, tratará com distinção os conceitos de
normalidade e anormalidade, se estabelecerá ditames sobre a conduta criminosa,
será relacionada a personalidade total do agente, por fim, se estudará os tipos de
psicopatias abordando a interface da psiquiatria e a lei.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre os transtornos da personalidade estudando a inimputabilidade.
A pesquisa foi desenvolvida tendo como base os seguintes
problemas:
1ª Por que os psicopatas são considerados inimputáveis?
2ª Pode haver a reabilitação desses doentes junto à
sociedade?
13 COLZANI, Valdir Francisco. Guia para elaboração do trabalho científico.
3
3ª Existe um tratamento adequado para a devida punição
desses delinqüentes?
Diretamente relacionadas a cada problema formulado,
foram levantadas as seguintes hipóteses:
a) Os psicopatas são considerados inimputáveis, haja vista
seu estágio mental para a prática de delitos.
b) Como os psicopatas são julgados diferentemente dos
delinqüentes comuns, é certo afirmar que não há como
reabilitá-los.
c) Sim, a psiquiatria é um dos institutos utilizados para o
tratamento dos psicopatas.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados
o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
CAPÍTULO 1
Evolução Histórica do Direito Penal
A compreensão da evolução histórico-penal é de extrema
importância para uma avaliação correta da mentalidade e dos princípios que
nortearam o sistema punitivo contemporâneo.
De forma alguma pode ser desvinculada do direito penal a
história humana, pois desde o princípio o crime vem acontecendo. Em dado
momento, verificou-se a necessidade de um ordenamento coercitivo que
garantisse a paz e a tranqüilidade para a convivência harmoniosa nas
sociedades.
Nas palavras de Edgard Magalhães Noronha 14: “A história
do Direito Penal é a história da humanidade. Ela surge com o homem e o
acompanha através dos tempos, isso porque o crime, qual sombra sinistra, nunca
dele se afastou”.
Passamos assim ao estudo dos principais pontos da
evolução do direito penal.
1.1 Período da Vingança
Com origem nos tempos primitivos o Período da Vingança
estende-se até meados do século XVIII.
Dispõe Júlio Fabbrini Mirabete15: “A pena, em sua origem
remota, nada mais significava senão a vingança, reside à agressão sofrida,
desproporcionada com a ofensa e aplicada sem preocupação de justiça”.
Pesquisas antropológicas revelam que no período primitivo
também era usada à retribuição da magia, dos totens e dos tabus, René Ariel
Dotti explica em sua obra:
14 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva. 2003. p.20. 15 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal-parte geral. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.35.
5
Nas sociedades primitivas, o tabu era a proibição aos profanos de se relacionarem com pessoas, objetos ou lugares determinados, ou dele se aproximarem, em virtude do caráter sagrado dessas pessoas, objetos e lugares cuja violação acarretava ao culpado ou
a seu grupo o castigo da divindade.16
Acerca deste período, alguns estudiosos subdividem a
história do direito penal em algumas fases, as quais, não se sucederam de forma
linear ou totalmente rígida (os princípios e características de um período
penetravam em outro). São elas: vingança privada, vingança divina e vingança
pública.
1.1.1 Vingança Privada
Nesta fase, quando especificadamente ocorrera um crime,
ocorria a reação imediata por parte da própria vítima, por seus familiares ou por
sua tribo. Costumeiramente esta reação era superior à agressão, a inexistência
de limites distanciava qualquer idéia de proporcionalidade.
Destaca-se que a fase da vingança privada se hauria de
uma realidade sociológica e não de uma convenção jurídica. Pode-se conferir
nessa época o Talião, que surgiu para evitar a dizimação das tribos, limitando a
reação à ofensa a um mal idêntico praticado (olho por olho, dente por dente).
A pena de talião (do latim talis = tal, ral, qual) consistia em
impor ao delinqüente um sofrimento igual ao que produzira com a sua ação.
Assim consta na Bíblia: “Pagará a vida com vida; mão com mão, pé por pé, olho
por olho, queimadura por queimadura”17
Também fora adotado o Código de Hamurábi (Babilônia) que
em seu artigo 209 dizia: “se alguém bate numa mulher livre e a faz abortar,
deverá pagar dez siclos pelo feto”, bem como, no artigo 210: “se essa mulher
morre, então deverá matar o filho dele”. Colhe-se da Lei das XII Tábuas: “Tábua
VII, 11 – Se alguém fere a outrem, que sofra a pena de Talião, salvo de houver
acordo”.
16 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte gera. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.123. 17 Êxodo, XXI, versículos 23 a 25.
6
Para finalizar, Júlio Fabbrini Mirabete18 ensina:
Posteriormente, surge a composição, sistema pelo qual o ofensor se livra do castigo com a compra de sua liberdade (pagamento em moeda, gado, armas, etc.). Adotada, também pelo Código de Hamurábi, pelo Petateuco e pelo Código de Manú (Índia), foi a composição largamente aceita pelo Direito Germânico, sendo a origem remota das dormas modernas de indenização do Direito Civil e da multa no direito Penal.
Contudo, podemos observar uma pequena evolução, ao que
se refere no surgimento da composição, partindo pela premissa do abrandamento
das penas violentas que se dirigiam ao condenado.
1.1.2 Vingança Divina
O período da vingança divina, denomina-se também por
direito penal religioso, teocrático e sacerdotal. O princípio que domina a repressão
é a satisfação da divindade, ofendida pelo crime. Pune-se com rigor, antes com
notória crueldade, pois o castigo deve estar em relação com a grandeza do Deus
ofendido.
Sobre este período aduz Edgard Magalhães Noronha
Um dos principais Códigos é o da Índia, de Manu (Manava, Dharma, Sastra). Tinha por escopo a purificação da alma do criminoso, através do castigo, para que pudesse alcançar a bem-aventurança. Dividia a sociedade em castas: brâmanes, guerreiros, comerciantes e lavradores. Era a dos brâmanes a mais elevada; a última, a dos sudras, que nada valiam. Revestido de caráter religioso era também o de Hammurábi. Aliás, podemos dizer que esse era o espírito dominante nas leis dos povos do Oriente antigo. Além da Babilônia, Índia e Israel, o Egito, a Pérsia, a China etc. 19:
Ao lado da severidade do castigo, já apontada, assinalava
esse Direito Penal, dado o seu caráter teocrático, o ser interpretado e aplicado
pelos sacerdotes.
18 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal-parte geral. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.36. 19 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva. 2003. p.21.
7
1.1.3 Vingança Pública
Com uma maior organização social, especialmente com o
desenvolvimento do poder político, surge no seio das sociedades, a figura do
chefe ou da assembléia. A pena, portanto, perde a sua índole sacra para
transformar-se em uma sanção imposta em nome da autoridade pública,
representativa dos interesses da comunidade.
Neste sentido, obtempera René Ariel Dotti
Surge então a pena de natureza aflitiva e com caráter de expiração visando à exemplaridade. É o tempo em que o poder público assume a titularidade exclusiva da relação contra o delito e passa a exercer o chamado ius puniendi, o dire ito subjetivo de punir, com as mais variadas formas de sanção. 20
Período marcado pelas penas cruéis (morte na fogueira,
roda, esquartejamento, sepultamento em vida) para se alcançar o objetivo maior
que era a segurança do monarca. Com o poder do Estado cada vez mais
fortalecido, o caráter religioso foi sendo dissipado e as penas passaram a ter o
intuito de intimidar para que os crimes fossem prevenidos e reprimidos.
Os processos eram sigilosos, o réu não sabia qual era a
imputação feita contra ele, o entendimento era de que, sendo inocente, o acusado
não precisava de defesa; se fosse culpado, a ela não teria direito. Isso favorecia o
arbítrio dos governantes.
1.2 Período Humanitário
Passado o período do Renascimento intelectual da Europa,
das descobertas de Copérnico, Kepler e Galileu, entre outros, é que surge o
Iluminismo.
Este sendo corrente de pensamento que afirma que as leis
naturais regulam as relações sociais e considera os homens naturalmente bons e
iguais entre si quem os corrompe é a sociedade. Tem como principais
idealizadores John Locke, Montesquieu, Voltaire e Rosseau.
20 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte gera. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.126.
8
A obra mais importante daquele período histórico foi o
opúsculo Dei delitti e delle pene, escrito por Cesare Bonesana, o Marquês de
Beccaria (1738-1794) e publicado em 1764.
Outros pensadores importantes também surgiram neste
período, tais como: John Howard, em seu livro The State of Prision in England-
1770, relatou a situação das prisões européias, propondo um tratamento mais
digno aos presos, era considerado por muitos como o pai da Ciência
Penitenciária.
Jeremias Bentham, postulou que o castigo era um mal
necessário para se prevenir maiores danos à sociedade, embora admitisse o seu
fim correcional. Sua obra mais significativa foi a Teoria das Penas e das
Recompensas-1818.
1.2.1 O Direito Penal e o Iluminismo
Em fins do século XVII, e XVIII com a propagação dos ideais
iluministas, ocorreu uma conscientização quanto às barbaridades que vinham
acontecendo, era preciso romper com os convencionalismos e tradições vigentes.
Houve um imperativo para a proteção da liberdade individual
em face do arbítrio judiciário e para o banimento das torturas, com fundamento
em sentimentos de piedade, compaixão e respeito à pessoa humana.
Destacam-se os principais iluministas, que defendiam uma
ampla reforma do ensino, da intervenção do estado e da igreja, os enciclopedistas
franceses como Montesquieu (autor do Espirit des lais, de 1748), Jean Jacques
Rosseau, dando com o seu Contrato Social, de 1762, os fundamentos da
liberdade política e da igualdade dos cidadãos, obras que exerceram
extraordinárias influencias e independência do poder judiciário.
E, ainda Voltaire que em vários de seus escritos reclamava a
completa renovação dos costumes judiciários e da prática dos Tribunais,
especialmente com a famosa defesa de Jean Calas, protestante morto
injustamente em 1762. Nem mesmo Deus escapou às discussões da época. O
Deus iluminista, racional era “o grande relojoeiro” nas palavras de Voltaire.
9
1.2.2 Beccaria
Intérprete do anseio humanitário, foi Cesare Bonesana, o
Marquês de Beccaria. Nasceu em Milão, em 1738. Saiu em defesa dos
desafortunados e dos desfavorecidos em sua obra “Dos delitos e das penas” (Dei
delitti e delle pene-1764). Opôs-se às técnicas utilizadas até então pela justiça,
era contra a prática da tortura como meio de produção de prova e por fim
combateu o sistema presidiário das masmorras. Foi um verdadeiro grito contra o
individualismo.
Baseou-se na Teoria do Contrato Social, investiu contra a
pena capital, com o argumento de que, apesar do homem ceder parte de sua
liberdade ao Bem Comum, não poderia ser privado de todos os seus direitos e a
ninguém seria conferido o poder de matá-lo.
Júlio Fabbrini Mirabete relata os seguintes princípios básicos
pregados pelo filósofo. Beccaria, não sendo totalmente original, firmou em sua
obra os postulados básicos do direito penal moderno, muitos dos quais adotados
pela Declaração dos Direitos do homem, da Revolução Francesa:
1. os cidadãos, por viverem em sociedade cedem apenas uma parcela de sua liberdade e direitos. Por esta razão, não se podem aplicar penas que atinjam direitos não cedidos, como acontecem nos casos da pena de morte e das sanções cruéis. 2. só as leis
podem fixar as penas, não se permitindo ao juiz interpretá-las ou aplicar sanções arbitrariamente. 3. as leis devem ser conhecidas
pelo povo, redigida com clareza para que possam ser compreendidas e obedecidas por todos os cidadãos. 4. a prisão
preventiva só se justifica diante de prova da existência do crime e da sua autoria. 5. devem ser admitidas em juízo todas as provas, inclusive a palavra dos condenados (mortos civis). 6. não se
justifica as penas de confisco, que atingem os herdeiros do condenado, e as infamantes, que recaem sobre toda a família do criminoso. 7. não se deve permitir o testemunho secreto, a tortura para interrogatório e aos juízos de Deus, que não levam a descoberta da verdade. 8. a pena deve ser utilizada como
profilaxia social, não só para intimidar o cidadão mas também para recuperar o delinqüente21. (sem grifo no original)
21 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal-parte geral. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.38.
10
Defendia a conveniência de leis claras e precisas, não
permitindo se quer o juiz o poder de interpretá-las, opondo-se; dessa forma, ao
arbítrio que prevaleça na justiça penal.
Combateu a pena de morte, a tortura, o processo
inquisitório, defendendo a aplicação de penas certas, moderadas e
proporcionadas ao dano causado à sociedade. Opunha-se Beccaria à justiça
medieval que ainda vigorava em seu tempo.
1.2.3 O Direito Natural e sua influência
Com a obra dos filósofos Hobbes, Espinosa, e sobretudo
Locke que prescindiam da idéia de justiça absoluta e afirmaram ser o fim da pena
a manutenção a obediência dos súditos ou da segurança comum, visando impedir
que novos crimes sejam praticados pelo culpado ou pelos demais cidadãos.
As idéias políticas dominantes começaram a ser revistas
com a obra de Hugo Grotis sobre o direito natural (de iuri belli ac pacis, 1625),
como diz Von Liszt, deu início à luta sobre os fundamentos do direito penal do
Estado dando à pena um fundamento racional.
A evolução prossegue com as obras de Puffendorf,
Thomasius e Cristhian Wolff, jusnaturalistas que fundaram o direito do Estado na
razão, combatendo o direito romano e o canônico, bem como se opondo ao
princípio da retribuição reconhecendo o fim da pena na utilidade comum.
Surgindo assim a grande contribuição científica O Tratado
de Direto Penal comum vigente na Alemanha, de Feuerbach, a primeira obra
sistemática e moderna de Direito Penal.
1.2.4 A Escola Clássica
Os pensadores da Escola Clássica adotaram os ideais
iluministas e os instrumentaram no ramo das ciências jurídicas. Foi assim
denominada de modo pejorativo pelos positivistas. Vale-se do método dedutivo ou
lógico-abstrato e não experimental, próprios das ciências naturais. Para esta
escola, crime não é um ente de fato, mas entidade jurídica; não é uma ação, mas
infração. É a violação de um direito.
11
Tem origem na filosofia grega antiga, que sustentava ser o
Direito afirmação de justiça, no contratualismo e sobretudo no jusnaturalismo.
Assevera Giuseppe Bettiol22:
Os sistemas contratual e natural estão acordes na necessidade de considerar o Direito Penal não tanto em função do Estado, quanto em função do indivíduo, que deve ser garantido contra toda intervenção estatal não predisposta na lei e, consequentemente, contra toda limitação arbitrária da liberdade, exigência que hoje dispensa maiores comentários e explicações, mas que se apresentava como uma conquista capital em relação ao Estado absoluto até então dominante.
Luiz Régis Prado23 compõe os postulados basilares dessa
escola:
São eles: a) O Direito tem uma natureza transcendente, segue a ordem imutável da lei natural: O Direito é congênito ao homem, porque foi dado por Deus à humanidade desde o primeiro momento de sua criação, para que ela pudesse cumprir seus deveres na vida eterna. O Direito é a liberdade. Portanto, a ciência criminal é o supremo código da liberdade, que tem por objeto subtrair o homem da tirania dos demais, e ajuda-los a livrar-se da tirania de si mesmo e de suas paixões. O Direito Penal tem sua gênese e fundamento na lei eterna na harmonia universal; b) o delito é um ente jurídico, já que constitui a violação de um direito. É dizer: o delito é definido como infração. Nada mais é que a relação de contradição entre o fato humano e a lei; c) a responsabilidade penal é lastreada na imputabilidade moral e no livre arbítrio humano; d) a pena é vista como meio de tutela jurídica e como retribuição da culpa moral comprovada pelo crime. O fim primeiro da pena é restabelecimento da ordem externa da sociedade, alterada pelo delito. Em conseqüência, a sanção penal deve ser aflitiva, exemplar , pública, certa, proporcional ao crime, célere e justa; e) o método utilizado é o dedutivo ou lógico abstrato; f) o delinqüente é, em regra, um homem normal que se sente livre para optar entre o bem e o mal, e preferiu o último; g)
22 BETTIOL, Giuseppe. Direito Penal. Trad. Paulo José da Costa Jr. E Alberto Silva Franco. 2.ed.São Paulo: RT, 1977.v.1.p.18. 23 PRADO, Luiz Régis.Curso de Direito Penal Brasileiro - parte geral. 5.ed.rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. v.1.p.84.
12
os objetos de estudo do Direito Penal são o delito, a pena e o processo.
René Ariel Dotti24 transcreve os percussores da escola
clássica e suas obras:
Como precursores desta escola temos o inglês Jeremias Bentham (Theory or punishments and Rewards -1801 e Deontology or Science of Morality – 1834), influenciado pelas idéias oriundas da França Gaetano Filangieri (inacabada obra prima – Sceinza della legislazione-1785), o alemão Paul Johann Anselm von Feuerbach (redigiu o Código Penal da Baviera-1813), o italiano Giandomenico Romagnosi (Filosofia del diritto – 1843 e o clássico Genesi del diritto penale-1791), Giovani Carmignari (Elementi di diritto criminalle-1807 e Teoria delle leggi della sicurezza sociale-1831), Pellegrino Rossi (Traité de Droit penal-1829), Enrico Pessina (Ellementi di diritto penale-1882) e contudo o maior expoente foi, sem dúvida, o mestre de Pisa Francesco Carrara (Programma del corso di diritto criminale-1859).
Como explicita Edgard Magalhães Noronha25 “negar o
extraordinário valor da Escola Clássica seria vã arremetida de sectarismo cego.
Enorme foi sua influência na elaboração do Direito Penal, dando-lhe dignidade
científica”. O Autor supra citado se refere também a quase totalidade dos códigos
e das leis penais, elaborados naquele século.
1.3 Período Científico ou Criminológico
Esta fase caracteriza-se por um notável entusiasmo
científico, a começar do século XIX, por volta de 1850 e estendendo-se até a
atualidade. Nasce a preocupação acerca do motivo pelo qual o homem delinqüe.
Numa época de franco predomínio do pensamento
positivista no campo da filosofia (Augusto Comte), das teorias evolucionistas de
Darwin e Lamarck e das idéias de John Stuart Mill e Spencer, surgiu a chamada
Escola Positiva.
24 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.152. 25 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva. 1975. p.33.
13
Em sede doutrinária, em se tratando dos fatores que
explicam o surgimento da Escola positiva, assim discorre Cezar Roberto
Bitencourt:
a) ineficácia das concepções clássicas relativamente à diminuição da criminalidade; b) o descrédito das doutrinas espiritualistas e metafísicas e a difusão da filosofia positivista; c) a aplicação dos métodos de observação ao estudo do homem, especialmente em relação ao aspecto psíquico; d) os novos estudos estatísticos realizados pelas ciências sociais (Quetelet e Guerri) permitiram a comprovação de certa regularidade e uniformidade nos fenômenos sociais, incluída a criminalidade; e) as novas ideologias políticas que pretendiam que o Estado assumisse uma função positiva na realização nos fins sociais, mas, ao mesmo tempo, entendiam que o Estado tinha ido longe demais na proteção dos direitos individuais, sacrificando os direitos coletivos.26
E acrescenta:
A Escola Positiva apresenta três fases, distintas, predominando em cada uma determinado aspecto, tendo também um expoente máximo. São elas: a) fase antropológica: Cesare lombroso (LÚmo Delinqüente); b) fase sociológica: Enrico Ferri (Sociologia Criminale) e c) fase jurídica: Rafael Garófalo (Criminologia).27
A Escola Positiva teve enorme repercussão, Cezar Roberto
Bitencourt e Luiz Régis Prado assim explicitam:
Destaca-se algumas de suas contribuições: a) a descoberta de novos fatos e realização de experiências que ampliaram o conteúdo do direito; b) o nascimento de uma nova ciência causal-explicativa: a criminologia; c) a preocupação com o delinqüente e com a vítima; d) uma melhor individualização das penas (legal, judicial e executiva); e) o conceito de periculosidade; f) o desenvolvimento de institutos como a medida de segurança, a
26 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral.10.ed.São Paulo: Saraiva, 2006.p.69. 27 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral.10.ed.São Paulo: Saraiva, 2006.p.69
14
suspensão condicional da pena e o livramento condicional; e g) o tratamento tutelar ou assistencial do menor.28
Cabe salientar que aqui surgira a medida de segurança,
conforme ilustra Ronaldo Silva:
A sanção é encarada como medida de proteção da sociedade; surge a noção de medida de segurança de acordo com a periculosidade do agente; negação da validade da pena – idéia de castigo; medida de segurança tem finalidade: educação, correção e defesa.29
Para a Escola positiva, o crime longe está de ser o ente
jurídico da Clássica, mas é um fato humano, oriundo de fatores individuais, físicos
e morais.
1.3.1 O Determinismo
O determinismo nada mais é do que uma doutrina que
influenciou o pensamento durante o período científico, onde todos os fenômenos
do universo, abrangendo a natureza, a sociedade e a história estão subordinadas
a leis e causas necessárias.
O indivíduo faz exatamente aquilo que tinha de fazer e não
poderia fazer outra coisa; a determinação de seus atos pertence à força de certas
causas, externas e internas. É a principal base do conhecimento científico da
Natureza, porque afirma a existência de relações fixas e necessárias entre os
seres e fenômenos naturais: o que acontece não poderia deixar de acontecer
porque está ligado a causas anteriores.
Os mundos físico e biológico são, pois, regidos pelo
determinismo - no nível macroscópico. No nível mental também vigora o mesmo
princípio pois os pensamentos têm uma causa, assim como as ações deles
decorrentes; pensamentos e atos estão relacionados aos impulsos, traços de
caráter e experiências que caracterizam a personalidade.
28 PRADO, Luiz Régis & BITENCOURT, Cezar Roberto. Elementos de Direito Penal, Parte Geral. São Paulo, RT, 1995.v.1.p.33. 29 SILVA, Ronaldo. Direito Penal parte geral.Florianópolis, Momento Atual, 2002.p.15.
15
Destarte, a noção de determinismo é central na
conceituação do conhecimento científico.
No entanto, enquanto os clássicos pregavam a existência de
uma liberdade moral do homem, portanto, do livre arbítrio, os positivistas
sustentavam que o homem era condicionado pelos fatores individuais, físicos e
sociais e, portanto, sujeito ao tipo de determinismo.
1.3.2 Cesare Lombroso
Cesare lombroso (1835-1909) representou a diretriz
antropológica. Em sua obra Tratado Antropológico Experimental do Homem
Delinqüente, publicada em 1876, marca as origens da criminologia científica, e ele
é considerado o seu fundador.
Desde muito jovem, o médico revelou especial sensibilidade
para os trabalhos de pesquisa, psiquiatra, antropólogo, político, foi um homem
polifacético e genial. Totalizou mais de seiscentas publicações.
Luiz Flávio Gomes destaca:
A contribuição principal de Lombroso para a Criminologia não reside tanto em sua famosa tipologia (onde destaca a categoria do “delinqüente nato”) ou em sua teoria criminológica, senão no método que utilizou em suas investigações: o método empírico. Sua teoria do “delinqüente nato” foi formulada com base em resultados de mais de quatrocentas autópsias de delinqüentes e seis mil análises de delinqüentes vivos; e o atavismo que, conforme seu ponto de vista caracteriza o tipo criminoso – ao que parece- , contou com o estudo minucioso de vinte e cinco mil reclusos de prisões européias.30
Lombroso considerava o crime como manifestação de
personalidade humana, ele estudou cadáveres de diversos criminosos procurando
encontrar elementos que os distinguissem dos homens normais. Após anos de
pesquisa declarou que os criminosos já nasciam delinqüentes e que apresentam
deformações e anomalias anatômicas físicas e psicológicas.
30 MOLINA, Antonio García- Pablos de. Criminologia. Trad. Luiz Flávio Gomes. 2.ed. Rev. Atual. e ampl. – São Paulo: RT, 1997. p.150.
16
Do ponto de vista tipológico, Cesare Lombroso distinguia
seis grupos de delinqüentes: o “nato”(atávico), o louco moral (doente), o epilético,
o louco, o ocasional e o passional.
Basileu Garcia, em sua obra descreve as características
utilizadas por Cesare Lombroso:
O homem criminoso estaria assinalado por uma particular insensibilidade, não só física como psíquica, com profundo embotamento da receptividade dolorífica (analgesia) e do senso moral. Como anomalias fisiológicas, o mancinismo (uso preferente da mão esquerda) ou a ambidestria (uso indiferente das duas mãos), além da desvulnerabilidade. Ou seja, uma extraordinária resistência aos golpes e ferimentos graves ou mortais, de que os delinqüentes típicos pronta e facilmente se restabeleceriam. Seriam ainda comum, entre eles, certos distúrbios dos sentidos e mau funcionamento dos reflexos vasomotores, acarretando a ausência de enrubescimento da face. Tal fato não seria apenas resultante do déficit moral, mas de autêntica tendência orgânica.31
Destarte, é de extrema importância para o estudo:
Não é difícil encontrar em qualquer indivíduo alguns desses traços, sem que isso tenha uma explicação atávica e ancestral, nem muito menos criminógena. Pelo contrário, é uma evidência que nem todos os delinqüentes apresentam tais anomalias e, de outro lado, nem os não delinqüentes estão livres delas. Não existe pois o “tipo criminoso”.32
Ensina o autor que não é de correto examinar o crime sob a
ótica exclusiva do autor, menosprezando a relevância dos fatores exógenos,
sociais na gênese do delito, a que Enrico Ferri deu importância capital.
1.3.3 Enrico Ferri
Enrico Ferri (1856-1929). Nascido em Montanova, laureou-
se em 1877 em Bolonha com a tese “o delito é um fenômeno social, com uma
31 GARCIA, Basileu. Instituições de Direito Penal - vol. I - tomo I. 4 ed. 37 tiragem. São Paulo: Max Limonad, 1975. p.90. 32 MOLINA, Antonio García- Pablos de. Criminologia. Trad. Luiz Flávio Gomes. 2.ed. Rev. Atual. e ampl. – São Paulo: RT, 1997. p.153.
17
dinâmica própria e etiologia específica, na qual predominam os fatores
“sociais”33.Ferri consolidou o nascimento definitivo da Sociologia Criminal.
Neste contexto, Edgard Magalhães Noronha realça:
Incontestavelmente, é entretanto Ferri o maior vulto da Escola Positiva. Mais do que qualquer outro, deu expansão ao trinômio causal do delito- fatores antropológicos, sociais e físicos. Pregou a responsabilidade social em substituição à moral: o homem só é responsável porque vive em sociedade; isolado em uma ilha, não tem qualquer responsabilidade. Respondia assim à objeção dos Clássicos, de que, negado o livre-arbítrio, o determinismo levava à impunidade, pois iníquo seria punir quem fatalmente praticaria crimes, Acrescentava Ferri que, assim como o homem não é livre, também não é o Estado, na sua necessidade de reprimir o crime, para defesa do direito e da sociedade.34
Na lição de Luiz Régis Prado:
O homem, afirma Ferri, age como se sente, e não como pensa. Adotando uma postura mais realista, entende ele que as ações humanas “são sempre o produto se deu organismo fisiológico e psíquico e da atmosfera física e social onde nasceu e na qual vive”. – fatores antropológicos (constituição orgânica do criminoso), psíquicos (anomalias da inteligência), físicos (ambiente natural, clima, solo) e sociais (meio social – densidade deferente da população, estado da opinião pública e da religião, constituição da familiar, etc.).35
No entanto, Enrico Ferri também fez uma divisão quanto aos
criminosos, dispôs em cinco categorias: o nato, conforme propusera Lombroso; o
louco, portador de doença mental; o habitual, produto do meio social; o ocasional,
indivíduo sem firmeza de caráter e versátil na prática do crime; e o passional,
homem honesto, mas de temperamento nervoso e sensibilidade
33 MOLINA, Antonio García- Pablos de. Criminologia. Trad. Luiz Flávio Gomes. 2.ed. Rev. Atual. e ampl. – São Paulo: RT, 1997. p.196. 34 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva. 1975. p.36. 35 PRADO, Luiz Régis.Curso de Direito Penal Brasileiro - parte geral. 5.ed.rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. v.1.p.87.
18
Correlacionou também as paixões em sociais (amor piedade
etc.), que devem ser amparadas e incentivadas, e anti-sociais (ódio, inveja,
avareza etc.), que devem ser reprimidas severamente.
Ao discursar acerca das obras de Enrico Ferri, René Ariel
Dotti afirma:
As suas obras mais destacadas são: I nuovi orizzonti del dititto e della procedura penale (1880), na edições posteriores designada por Sociologia Criminal, e Principi di diritto criminale (1921), através dos quais reuniu a doutrina da Escola Positiva e suas idéias de legislador, condensadas em seu famoso Projeto de Código Penal italiano (1921). Os seus Discursos de defesa e de acusação retratam a performance do extraordinário e sensível tribuno, ora em defesa de acusados ora em favor das vítimas, revelando, assim, a sua imortal capacidade de compreender e interpretar aos mais variados estados da alma.36
Diversos são os trabalhos de Ferri, sendo o último os
“Princípios de Direito Criminal”, exposição doutrinária de um sistema jurídico-
penal, segundo as idéias fundamentais da Escola Positiva, com que ele encerrou
sua operosa e brilhante carreira científica.
1.3.4 Rafael Garófalo
Rafael Garófalo (1851-1934), foi o jurista da primeira fase da
Escola Positiva, sua obra foi Criminologia (1885). Sustentava que existem no
homem dois sentimentos básicos, a piedade e a probidade, e que o delito é
sempre uma lesão desses sentimentos.
Rafael Garófalo conseguiu na verdade, dar uma
sistematização jurídica à Escola Positiva, estabelecendo, basicamente, os
seguintes princípios:
a) a periculosidade como fundamento da responsabilidade do delinqüente; b) a prevenção especial como fim da pena, que, aliás, é uma característica comum da corrente positivista; c) fundamentou o direito de punir sobre a teoria da Defesa Social, deixando, por isso, em segundo plano os objetivos reabilitadores;
36 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.155.
19
d) formulou uma definição sociológica do crime natural, uma vez que pretendia superar a noção jurídica. A importância do conceito natural de delito residia em permitir ao cientista criminólogo a possibilidade de identificar a conduta que lhe interessasse mais.37
A maior característica da teoria de Rafael Garófalo é a
fundamentação do comportamento e do tipo criminoso em uma suposta anomalia
– não patológica – psíquica ou moral.
Luiz Flávio Gomes esclarece:
Trata-se de um déficit na esfera moral da personalidade do indivíduo, de base orgânica, endógena, de uma mutação psíquica (porém não de uma enfermidade mental), transmissível por via hereditária e com conotações atávicas e degenerativas. (A Referida “anomalia psíquica ou moral” consistia, conforme Garófalo, em um déficit de um adequado desenvolvimento da sensibilidade moral, de vivências altruístas, defeito organicamente condicionado e não mero produto de fatores ambientais. Mas não seria uma enfermidade mental, senão uma “variação psíquica”, transmissível por via hereditária, que se detecta mais frequentemente em membros “de certas raças inferiores que nas modernas sociedades civilizadas”).38
Insta salientar que Rafael Garófalo tipificou quatro
denominações de delinqüentes sendo: o assassino, o violento, o ladrão e o
lascivo, sendo este primeiro o mais simples de identificar, certamente pelas
características do próprio fato.
Entretanto, assim aduz novamente Luiz Flávio Gomes:
A principal contribuição da Criminologia de Garófalo foi sua filosofia do castigo, dos fins da pena e sua fundamentação, assim como das medidas de prevenção e repressão da criminalidade. (...) a pena deve estar em função das características concretas de cada delinqüente, sem que sejam válidos outros critérios convencionais como o da retribuição ou expiação , a correção ou inclusive a prevenção. Descartou, pois, a idéia de proporção como medida da pena, do mesmo modo que descartou a idéia de
37 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral.10.ed.São Paulo: Saraiva, 2006.p.71. 38 MOLINA, Antonio García- Pablos de. Criminologia. Trad. Luiz Flávio Gomes. 2.ed. Rev. Atual. e ampl. – São Paulo: RT, 1997. p.199.
20
responsabilidade moral e liberdade humana como fundamento daquela. Se opôs à suposta finalidade correlacional ou ressocializadora do castigo, por considerar que o impede o substrato orgânico e psíquico, inato, que existe personalidade criminosa. Tampouco estimou acertada a idéia de prevenção como fundamento da pena, porque, conforme seu juízo, esta não permite determinar o quantum do castigo.39
Enfim, insistiu na necessidade de individualizar o castigo,
fato que permitiu aproximar-se das idéias correcionalistas. A ênfase que dava à
defesa social que talvez justifique seu desinteresse pela ressocialização do
delinqüente.
1.4 Escolas mistas e tendência contemporânea
Um dos movimentos ecléticos entre os sistemas das duas
grandes escolas foi a chamada Terceira Escola (Alimena, Carnevale, Impalomeni)
e a Escola Moderna Alemã.
A respeito, na síntese de Júlio Fabrini Mirabbete:
Aproveitando as idéias de clássicos e positivistas, separava-se o Direito Penal das demais ciências penais, contribuindo de certa forma para a evolução dos dois estudos. Referiam-se os estudiosos à causalidade do crime e não a sua fatalidade, excluindo, portanto, o tipo criminal antropológico, e pregavam a reforma social como dever do Estado no combate ao crime. Da Escola Moderna Alemã resultou grande influência no terreno das realizações práticas, como a elaboração de leis, criando-se o instituto das medidas de segurança, o livramento condicional, o sursis etc..40
Atualmente, os penalistas preocupam-se com a pessoa do
condenado em uma vertente humanista, diferentemente do positivismo jurídico,
decorrendo disso a instituição da doutrina da Nova Defesa Social, que por sua
vez, defendia que a sociedade apenas é protegida a medida que se proporciona a
adaptação do condenado ao convívio social.
39 MOLINA, Antonio García- Pablos de. Criminologia. Trad. Luiz Flávio Gomes. 2.ed. ver. Atual. e ampl. – São Paulo: RT, 1997. p.200. 40 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal-parte geral. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.42.
21
1.5 Evolução do Direito Penal no Brasil
Divide-se a evolução histórica do pensamento jurídico penal
brasileiro em três fases principais: período colonial, Código Criminal do Império e
período republicano.
1.5.1 Período Colonial
Anteriormente ao domínio português, quando o Brasil foi
colonizado, a idéia que existia entre os indígenas eram a de vingança coletiva e
da lei de talião, cada uma regendo determinada tribo.
Narra Bernardino Gonzaga que “os nossos silvícolas não
desconheciam o talião, ainda que de modo empírico, a composição e a expulsão
da tribo. Relativamente às formas punitivas predominavam as sanções corporais,
sem tortura”.41
Entretanto, essas práticas punitivas das tribos não
influenciaram muito o nosso Direito Penal, que a princípio seguiu o Direito
Romano.
Foi a contar do descobrimento do Brasil, em 1500, com
agora domínio português, que passou a vigorar em nossas terras o Direito
Lusitano, com as chamadas Ordenações Afonsinas, promulgadas em 1446,
perdurando até 1512. Nesta data, foram instituídas as Ordenações Manuelinas,
por determinação de Dom Manuel I, consolidando o Direito de Portugal, aquele
diploma fora distribuído em cinco livros, no último deles constavam as matérias de
Direito Penal e Direito Processual Penal.
Por fim, com o Livro V das Ordenações do Rei Felipe II, o
nosso primeiro Código Penal. Chamadas também de Ordenações Filipinas.
Cezar Roberto Bitencourt ao discorrer sobre o assunto,
esclarece:
Orientava-se no sentido de uma ampla e generalizada criminalização, com severas punições. Além do predomínio da
41 GONZAGA, João Bernardino. O Direito Penal indígena. São Paulo, Max Limonad, s.d., p.120.
22
pena de morte, utilizava outras sanções cruéis, como açoite, amputação de membros, as galés, degredo etc. Não se adotava o princípio da legalidade, ficando ao arbítrio do julgador a escolha da sanção aplicável. Esta rigorosa legislação regeu a vida brasileira por mais de dois séculos.42
Foi o Código de mais longa vigência entre nós, regeu-se de
1603 a 1830; isto é, mais de duzentos anos. Como assevera Edgard Magalhães
Noronha:
Tentativas de modificar a legislação do Reino houve. As mais importantes consistiam nos projetos de Código Criminal, de autoria de Pascoal José de Melo Freire dos Reis, professor da universidade de Coimbra, homem culto, liberal, inspirando-se nos pensamentos dos enciclopedistas. Seus trabalhos jamais foram convertidos em lei, ou porque não resistiram as críticas das comissões revisoras, ou porque só eram lembrados com receio, diante dos fatos da Revolução Francesa.43
Posteriormente, nasce o Código Criminal do Império.
1.5.2 Código Criminal do Império
Com a proclamação da Independência a Constituição de
1824 previa a elaboração de uma nova legislação penal, este, projetado por
Bernardo Pereira de Vasconcelos, nas palavras de Luiz Régis Prado:
A Carta Magna brasileira, outorgada em 25 de março de 1824 por D. Pedro I, acolheu em seu artigo 179 princípios sobre direitos e liberdades individuais, alterando em parte, o sistema penal em vigor. O parágrafo 18 do citado dispositivo consignou a imperiosa necessidade de elaboração de “um Código Criminal, fundado nas sólidas bases da justiça e da eqüidade”.44
A propósito, Edgard Magalhães Noronha ensina:
Claro é que apresentava defeitos. Não definira a culpa, aludindo apenas o dolo (arts. 2º e 3º), embora no art. 6º a ela já se referisse, capitulando mais adiante crimes culposos (arts. 125 e
42 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral.10.ed.São Paulo: Saraiva, 2006.p.57. 43 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva. 1975. p.55. 44 PRADO, Luiz Régis.Curso de Direito Penal Brasileiro - parte geral. 5.ed.rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. v.1.p.125.
23
153), esquecendo-se, entretanto, do homicídio e das lesões corporais por culpa, omissão que veio a ser suprida pela Lei n.º 2.033, de 1871. Tal silêncio explicava-se pela época em que veio à luz do Código, na qual os meios de transportes, a indústria etc., não ofereciam os perigos que mais tarde se fizeram sentir.(...) Não separada a igreja do Estado, continha diversas figuras delituosas, representando ofensas à religião estatal.45
Destarte, pode-se observar conforme nossa história que em
16 de dezembro de 1830, o imperador D. Pedro I sancionava o Código Criminal
do Império do Brasil.
Composto de 313 artigos, distribuía a matéria em quatro
partes: I – dos crimes e das penas (parte geral); II – dos crimes públicos; III – dos
crimes particulares; e IV - dos crimes policiais. Entretanto, o código de Processo
Criminal somente surgiu em 1832.
1.5.3 Período Republicano
Com a Proclamação da República, foi editado em 11 de
outubro de 1890 o novo estatuto básico, agora com a denominação de Código
Penal. Fora elaborado por Batista Pereira.
Cezar Roberto Bitencout explicita em sua obra:
O Código Peal de 1890 apresentava graves defeitos de técnica, aparecendo atrasado em relação à ciência de seu tempo. As críticas não se fizeram esperar e vieram acompanhadas de novos estudos objetivando sua substituição. Os equívocos e deficiências do Código Republicano acabaram transformando-o em verdadeira colcha de retalhos, tamanha a quantidade de leis extravagantes que, finalmente, se concentraram na conhecida Consolidação das Leis Penais de Vicente Piragibe, promulgada em 1932.46
45 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva. 1975. p.56. 46 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral.10.ed.São Paulo: Saraiva, 2006.p.59.
24
Sobre o Código Penal de 1890, ensina Julio Fabbrini
Mirabete “aboliu-se a pena de morte e instalou-se o regime penitenciário de
caráter correcional, o que constituía um avanço na legislação penal”.47
No mesmo norte:
Finalmente, durante o Estado Novo, em 1937, Alcântara Machado apresentou um projeto de código criminal brasileiro, que, apreciado por uma Comissão Revisora, acabou sendo sancionado, por decreto de 1940, como Código Penal, passando a vigorar desde 1942 ate os dias atuais, embora parcialmente reformado.48
Esta comissão revisadora era composta de Nelson Hungria,
Vieira Braga, Narcélio de Queiroz e Roberto Lira. Podemos observar que os
princípios básicos do Código são: a adoção do dualismo culpabilidade-pena e
periculosidade-medida de segurança; a consideração a respeito da personalidade
do criminoso e a aceitação excepcional da responsabilidade objetiva.
Contudo, devemos destacar a Lei 6.416, de 24 de maio de
1977, e a Lei 7.209, de 11 de julho de 1984, que instituiu uma nova parte geral,
com tópicos de nítida influência finalista.
1.5.4 Reformas Contemporâneas
Como supra citado, a reforma da Parte Geral do Código
penal foi introduzida pela Lei 7.209, de 11 de julho de 1984, enquanto a Lei 7.210,
da mesma data, instituiu a Lei de Execução Penal (LEP).
Julio Fabbrini Mirabete assinala como principais inovações:
1. A reformulação do instituto de erro, adotando-se a distinção entre erro de tipo e erro de proibição como excludentes da culpabilidade. 2. A norma especial referente aos crimes qualificados pelo resultado para excluir-se a responsabilidade objetiva. 3. A reformulação do capítulo referente ao concurso de agentes para resolver o problema do desvio subjetivo entre os
47 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal-parte geral. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.43. 48 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral.10.ed.São Paulo: Saraiva, 2006.p.59.
25
participantes do crime. 4. A extinção da divisão entre penas principais e acessórias e a criação das penas alternativas (restritivas de direito) para os crimes de menor gravidade. 5. A criação da chamada multa reparatória. 6. O abandono do sistema duplo-binário das medidas de segurança e a exclusão da presunção de periculosidade.49
Após esta fase, surgiu uma nova alteração, que assim
ensina René Ariel Dotti:
Uma grande alteração no sistema das penas restritivas de direito foi determinada pela Lei 9.714/98. Além das hipóteses já previstas com a Reforma de 1984, foram cominadas as penas de prestação pecuniária e perda de bens e valores e admitida a prestação de serviço também em favor de entidades públicas (CP, art.43). São novas espécies da prestação social alternativa que alude a CF (art. 5º, XLVI, d) ao relacionar as penas admissíveis pelo sistema.50
Os principais autores da reforma do Código Penal de 1940
são: presididos por Francisco de Assis Toledo e constituída por Francisco Serrano
Neves, Miguel Reale Junior, René Ariel Dotti, Ricardo Antunes Andreucci, Rogério
Lauria Tucci e Helio Fonseca.
Finalmente, depois de alguns anos de “política criminal do
terror”, patrocinada pelo liberal Congresso Nacional, sob o império da democrática
Constituição de 1988, com a criação de crimes hediondos (Lei 8.072/90),
criminalidade organizada (Lei 9.034/95) e crimes de especial gravidade, veio a
lume a Lei 9.099/95, que disciplinou os Juizados Especiais Criminais,
recepcionando a transação penal, destacando a composição cível, com efeitos
penais, além de instituir a suspensão condicional do processo.
Destarte, observando toda a evolução histórica do direito
penal, a começar pelos períodos de vingança, fazendo passagem à época da
Revolução Francesa que foi um marco histórico para todo o mundo, conhecemos
a evolução do direito penal brasileiro, pois só assim, ou seja, somente com uma
49 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal-parte geral. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.44. 50 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.216.
26
base repleta de detalhes, torna-se possível obter uma clara noção da origem da
culpabilidade, da inimputabilidade e da medida de segurança, que no próximo
capítulo será exposto.
27
CAPÍTULO 2
CULPABILIDADE
Historicamente, a culpabilidade é caracterizada por uma
constante evolução, indo desde os tempos em que bastava o simples nexo causal
entre a conduta e o resultado (responsabilidade objetiva), até os tempos atuais,
em que a culpabilidade apresenta como elementos a imputabilidade, a potencial
consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa (responsabilidade
subjetiva).
Superando o período de responsabilidade objetiva, surgiram
teorias a respeito dos requisitos para a responsabilização do agente. Sendo elas
a teoria psicológica da culpabilidade, teoria psicológico-normativa ou normativa da
culpabilidade, teoria normativa pura da culpabilidade.
Todavia mister se faz distinguir as teorias. Rosa Filho,
apresenta as diferenças:
a) teoria psicológica, que tem como pressuposto a imputabilidade, ligando o agente ao fato criminoso, b) a teoria normativa conforme vários autores, surgiu a partir de obra publicada em 1907 por Frank, na Alemanha, em que a culpabilidade não se ampara somente no vínculo psíquico que liga o agente ao ato por ele praticado, seja a título de dolo ou culpa, incidindo também sobre o autor do fato punível, uma vez que ele agiu voluntariamente de forma contrária ao direito e c) a teoria finalista após a elaboração das teorias acima citadas, surge com Hans Welzel a teoria finalista da qual emerge a gênese do questionamento acima: a culpabilidade é elemento do crime ou pressuposto de pena? Para os seguidores desta corrente doutrinária o dolo e a culpa estrita são deslocados para o tipo penal.51
O Código Penal brasileiro adota a teoria limitada da
culpabilidade, que é uma modalidade da teoria normativa pura, como explica
Fernando Capez:
51 ROSA FILHO, Gastão da. Crime passional e o tribunal do júri.Florianópolis: Habitus, 2006, p.190
28
Para a teoria limitada da culpabilidade, o erro que recai sobre uma situação de fato (discriminante putativa fática) é erro de tipo, enquanto o que incide sobre a existência ou limites de uma causa de justificação é erro de proibição. Defendem-na no Brasil, ASSIS TOLEDO e DAMÁSIO E.DE JESUS.52
Voltando ao sentido da palavra culpabilidade, e com os
ensinamentos der Cezar Roberto Bitencourt:
Hodiernamente, a culpabilidade é vista como possibilidade de reprovar o autor de um fato punível porque, de acordo com os fatos concretos, podia e devia agir de modo diferente. Sem culpabilidade não pode haver pena e sem dolo ou culpa não pode existir crime. Pelo exposto, a responsabilidade objetiva (fundada na relação causa e efeito) é insustentável no sistema penal vigente, que, certamente, encampou as idéias da responsabilidade penal subjetiva.53
Nas palavras de Jorge de Figueiredo Dias
A verdadeira função da culpabilidade no sistema punitivo reside efetivamente numa incondicional proibição de excesso; a culpabilidade não é o fundamento da pena, mas constitui o seu limite inultrapassável: o limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas – sejam de prevenção geral positiva de integração ou antes negativa de intimidação, sejam de prevenção especial positivista de socialização ou antes negativa de segurança ou de neutralização. A função da culpabilidade, deste modo inscrita na vertente liberal do Estado de Direito, é, por outra palavras, a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos quadros próprios de um Estado de Direito democrático. 54
A adoção da idéia, de que a culpabilidade é pressuposto do
crime, usada pelo Código Penal Brasileiro é demonstrada quando o mesmo utiliza
52 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4ed. São Paulo: Saraiva, 2002 v.1.p.273 53 BITENCOURT, Cézar Roberto. Manual de direito penal. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2000, v.1. p.125. 54 DIAS, Jorge de Figueiredo. Questões Fundamentais do Direito Penal Revisitadas. São Paulo : RT, 1999.
29
determinadas expressões ao tratar de causas excludentes de antijuridicidade e
causas de exclusão de culpabilidade.
Neste norte, quando o Código Penal trata de causa
excludente de antijuridicidade, emprega expressões como "não há crime" (artigo
23, caput), "não se pune o aborto" (artigo 128, caput), "não constituem injúria ou
difamação punível"(artigo 142, caput), "não constitui crime"(artigo 150, §3º) etc.
Quando, porém, cuida de causa excludente de culpabilidade, emprega
expressões diferentes: "é isento de pena"(artigos 26, caput e 28, §1º), só é
punível o autor da coação ou da ordem"(artigo 22, pelo que se entende que "não
é punível o autor do fato").
Da leitura desses dispositivos, os penalistas filiados a essa
corrente afirmam que a razão dessa diferença é clara: o crime existe por si
mesmo com os requisitos "tipicidade" e "ilicitude". Mas o crime só será ligado ao
agente se este for culpável. É por isso que a legislação penal substantiva recorre
as expressões "não há crime" ou é "é isento de pena", quando trata das causas
de exclusão da antijuricidade e excludentes de imputabilidade, respectivamente,
uma vez que as primeiras excluem o crime e nas últimas o delito existe, havendo
apenas a exclusão da punibilidade.
Por conseguinte; alguns doutrinadores discordam desse
entendimento e asseveram que a culpabilidade é e sempre será característica do
crime, acredita-se, basicamente, que o crime possui três notas características,
quais sejam: a tipicidade, a antijuridicidade e a culpabilidade.
Também conhecida como teoria tripartida por alguns
doutrinadores como exemplo Guilherme de Souza Nucci55, “o entendimento de
que a culpabilidade funciona como característica do crime”, ainda hoje, é a mais
aceita, não só pela doutrina brasileira como também pela maioria dos juristas
internacionais.
Para estes doutrinadores, o verdadeiro pressuposto da pena
é o crime, em si, com todas as suas peculiaridades. Em verdade, a culpabilidade
55 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, 5.ed.rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005, p. 91.
30
incide sobre o comportamento do sujeito e não sobre ele isoladamente. O que o
direito pune são os fatos praticados pelos indivíduos e não estes propriamente
ditos.
Destarte, o direito penal de culpabilidade que sustenta que a
pena é uma retribuição pela reprovabilidade e para que possamos atribuir à culpa,
ou seja, a responsabilidade de um fato delituoso a um indivíduo se faz necessário
que ele tenha agido livremente e com consciência de autodeterminar-se, enfim, o
homem deve ter autonomia para discernir entre o bem e o mal. O sujeito deve ter
consciência de que o ato que cometera é o certo ou errado.
2.1 Imputabilidade
Podemos caracterizar a imputabilidade como um elemento
da culpabilidade, no qual o agente tem a capacidade de entender o caráter ilícito
do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. Deve o agente ter
condições físicas, psicológicas, morais e mentais para saber que está realizando
um ilícito penal. É a capacidade de ser culpável.
Representa a condição de quem tem a capacidade de
realizar um ato com pleno discernimento e com a vivência de direcionar suas
atitudes.
Segundo Fernando Capez:
O agente deve ter totais condições de controle sobre sua vontade. Em outras palavras, imputável é não apenas aquele que tem capacidade de intelecção sobre o significado de sua conduta, mas também de comando da própria vontade. 56
E acrescenta:
A imputabilidade apresenta, assim, um aspecto intelectivo, consistente na capacidade de entendimento, e outro volitivo, que é a faculdade de controlar e comandar a própria vontade. Faltando um desses elementos, o agente não será considerado responsável pelos seus atos.57
Já para Aníbal Bruno:
56 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4ed. São Paulo: Saraiva, 2002 v.1.p.273. 57 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4ed. São Paulo: Saraiva, 2002 v.1.p.273.
31
A imputabilidade é o conjunto de condições pessoais que dão ao agente capacidade para lhe ser juridicamente imputada a prática de um fato punível. Constitui como sabemos, um dos elementos da culpabilidade.58
Entretanto, a imputabilidade não se confunde com a
responsabilidade penal, que corresponde às conseqüências jurídicas oriundas da
prática de uma infração.
Neste norte, Magalhães Noronha, corrobora com o
entendimento:
Responsabilidade, é a obrigação que alguém tem que arcar com as conseqüências jurídicas do crime. É o dever que tem a pessoa de prestar contas com seu ato. Ele depende da imputabilidade do indivíduo, pois não pode sofrer as conseqüências do fato criminoso (ser responsabilizado) senão o que tem a consciência de sua antijuridicidade e quer executá-lo.59
Sobre os fundamentos da imputabilidade, leciona Damásio
E. de Jesus:
De acordo com a teoria da imputabilidade moral, o homem é ser inteligente e livre e por isso responsável pelos atos praticados. Inversamente, quem não tem esses atributos é inimputável. Sendo livre, tem condições de escolher entre o bem e o mal. Escolhendo um conduta que lesa interesses jurídicos alheios, deve sofrer as conseqüências de seu comportamento.60
Consubstanciando os entendimentos supra citados,
sabemos que todo o agente é imputável, a não ser que ocorra causa excludente
da imputabilidade. A capacidade penal é obtida através da exclusão, isto é,
sempre que não se verificar a existência de alguma causa que a afaste. Daí a
importância das causas excludentes.
2.2. Inimputabilidade
58 BRUNO, Aníbal. Direito penal – Parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 1978, t II, p.39. 59 MAGALHAES NORONHA, Edgard. Direito penal, São Paulo, Saraiva, 1980. v.1, p.172. 60 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p.470.
32
São causas que excluem a imputabilidade: a doença mental,
o desenvolvimento mental incompleto, desenvolvimento mental retardado, a
embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior e a menoridade.
Em sede doutrinária, em se tratando das causas da
inimputabilidade, assim discorre Damásio E. de Jesus:
Três são os sistemas sobre as causas de inimputabilidade:a) sistema biológico: leva-se em conta a causa e não o efeito. Condiciona a imputabilidade à inexistência de doença mental, de desenvolvimento mental deficiente e de transtornos psíquicos momentâneos (...); b) sistema psicológico: o que importa é o efeito e na a causa. Leva em conta se o sujeito, no momento da prática do fato, tinha condição de compreender o seu caráter ilícito e de determinar-se de acordo com essa compreensão ou não (...); c) sistema biopsicológico: é constituído dos dois primeiros. Toma em consideração a causa e o efeito. Só é imputável o sujeito que, em conseqüência da anomalia mental, não possui capacidade de compreender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com essa compreensão. A doença mental, p. ex., por si só não é causa de inimputabilidade. É preciso que, em decorrência dela, o sujeito não possua capacidade de entendimento ou de autodeterminação.61
O Código Penal, como se vê nos artigos 26, “caput” e 28,
parágrafo primeiro, adotou o critério biopsicológico.
Sobre a inimputabilidade, explica Damásio E. de Jesus que:
Não havendo a imputabilidade, primeiro elemento da culpabilidade, não há culpabilidade e, em conseqüência, na há pena. Assim, em caso de inimputabilidade, o agente que praticou o fato típico e antijurídico deve ser absolvido, aplicando-se medida de segurança.62
Assim sendo, a não imputabilidade ou a inimputabilidade,
estaria presente quando não se pode atribuir ao agente a culpa (e evidentemente,
o dolo). Normalmente essa situação diz respeito à pessoa que não tem condições
61 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p.500. 62 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p.499.
33
de discriminar a natureza ilícita da ação, não tem consciência plena do que está
fazendo ou não tem nenhum domínio sobre sua volição (vontade).
2.2.1 Doença mental ou desenvolvimento mental incompleto
O Artigo 26 do Código Penal caracteriza a inimputabilidade
adotando o método biopsicológico, isto é, levando-se em conta fatores biológicos
e fatores psicológicos.
É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.63
Nesse caso, os fatores biológicos seriam a Doença mental,
o Desenvolvimento Mental Incompleto e o Desenvolvimento Mental Retardado e,
os fatores psicológicos seriam a incapacidade de entender o caráter ilícito do fato
e de determinar-se de acordo com este entendimento (prejuízo das capacidades
intelectivas e volitivas). Através desse modelo bio-psicológico se exige efetiva
averiguação da existência de um nexo causal entre o eventual estado mental
anômalo e a perda das capacidades intelectivas e volitivas.
Conceituando o desenvolvimento mental incompleto ou
retardo, Nucci assevera:
Trata-se de uma limitada capacidade de compreensão do ilícito ou da falta de condições de se auto-determinar, conforme o precário entendimento, tendo em vista ainda não ter o agente atingido a maturidade intelectual e física, seja por conta da idade, seja porque apresenta alguma característica particular, como silvícola, não civilizado ou surdo sem capacidade de comunicação. 64
Classificam-se as doenças em Desenvolvimento Mental
Incompleto para os menores, levando-se em conta tão somente o fato biológico
da imaturidade, para os silvícolas, desde que não civilizados ou não aculturados,
já o Desenvolvimento Mental Retardado. Para os Oligofrênicos (Retardo Mental):
63 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, 5.ed.rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005, p. 235. 64 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, 5.ed.rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005, p. 237.
34
são as pessoas que por distúrbio na evolução cerebral, durante a gestação ou
nos primeiros anos de vida, apresentam um desenvolvimento mental
retardado.para os surdos-mudos que não puderem entender o caráter ilícito do
fato em virtude da excepcionalidade.
Nesses casos, apenas o último, Desenvolvimento Mental
Retardado, deve ser objeto da psicopatologia.
Segundo a descrição do DSM.IV (Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais):
a característica essencial do Retardo Mental é quando a pessoa tem um funcionamento intelectual significativamente inferior à média, acompanhado de limitações significativas no funcionamento adaptativo em pelo menos duas das seguintes áreas de habilidades: comunicação, autocuidados, vida doméstica, habilidades sociais, relacionamento interpessoal, uso de recursos comunitários, auto-suficiência, habilidades acadêmicas, trabalho, lazer, saúde e segurança 65
Essa é também a definição de Deficiência Mental adotada
pela AAMR (Associação Americana de Deficiência Mental).
Segundo critérios das classificações internacionais, o início
da Deficiência Mental deve ocorrer antes dos 18 anos, caracterizando assim um
transtorno do desenvolvimento e não uma alteração cognitiva adquirida, como é a
Demência.
De um modo geral, entretanto, costuma-se ter como
referência para avaliar o grau de deficiência, mais os prejuízos no funcionamento
adaptativo que a medida do QI. Por funcionamento adaptativo entende-se o modo
como a pessoa enfrenta efetivamente as exigências comuns da vida e o grau em
que experimenta uma independência pessoal para grupo etário, bagagem sócio-
cultural e contexto comunitário no qual se insere.
Outra generalidade, diz respeito à nomenclatura,
antigamente falava-se em Deficiência Mental, Imbecil e Idiota, para referir graus
35
crescentes de Deficiência Mental, da mais leve para a mais grave. Como sempre
e invariavelmente a população toma emprestados diagnósticos da psiquiatria para
denegrir muito pejorativamente seus semelhantes, depois que os termos idiota e
imbecil passarem a serem xingamentos, houve necessidade de se mudar esses
nomes para algo menos coloquial: Retardo Mental Leve, Moderado e Grave.
Em seguida a população se apossou também desses
diagnósticos para continuar xingando pessoas de “Retardadas”. Aí foi a vez de
substituir-se Retardo Mental por Oligofrenia, um termo mais elitista, portanto, mais
distante das chacotas habituais ao populacho; para se pronunciar oligofrenia são
necessários atributos mais refinados de articulação vocal, felizmente.
Então, até que a massa se aposse do termo, vamos
continuar chamando os retardados mentais de Oligofrênicos; leves, moderados,
graves e profundos.
2.2.2 Embriaguez
Embriaguez é uma intoxicação provocada no organismo pelo
álcool ou por substâncias de efeitos análogos.
Na lição de Di Tullio a respeito de embriaguez:
A consciência está fortemente obnubilada, produzem-se estados crepusculares com fenômenos de desorientação, perturbações humorais profundas, desordens psico-sensoriais sob a forma de fenômenos ilusórios e alucinatórios, alterações da forma e especialmente do conteúdo ideativo até o delírio. 66
Discorre o artigo 28, parágrafo 1º do Código Penal:
É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou de força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter
65 DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), disponível em: http://www. ime.usp.br/~mamorim/monoimgdef/cap21.htm Acesso em: 25.03.2007 66 apud ALTAVILLA, Enrico. Psicologia judiciária. Trad. Fernando de Miranda. 3.ed. Coimbra: Armênio Amado, 1981, v.1, p. 283.
36
ilícito de fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. 67
Quanto à embriaguez insta salientar que o agente somente é
inimputável se a embriaguez for completa decorrente de caso fortuito ou força
maior, ou seja, nos ditames de Fernando Capez:
Caso fortuito é o caso de alguém que ingere bebida na ignorância de que tem conteúdo alcoólico ou de efeitos psicotrópicos que provoca. É também o caso do agente que, após tomar antibiótico para tratamento de uma gripe, consome álcool sem saber que isso o fará perder completamente o poder da compreensão. Nessas hipóteses, o sujeito não se embriagou porque quis, nem porque agiu com culpa. 68
E acrescenta:
Embriaguez por força maior deriva de uma força externa ao agente, que o obriga a consumir a droga. É o caso do sujeito obrigado a ingerir álcool por coação física ou moral irresistível, perdendo, em seguida, o controle sobre suas ações. 69
Existe ainda, outro tipo, a embriaguez incompleta fortuita,
que não isenta a pena, ou seja, o agente é imputável, portanto, culpável, havendo
possibilidade de ser condenado, embora com redução da pena.
Guilherme de Souza Nucci70 discorre sobre esse tipo de
embriaguez, ao assim dizer:
na embriaguez incompleta fortuita não consta a exigência da embriaguez completa, podendo-se portanto, admitir a embriaguez incompleta que, no entanto, há de ser fortuita ou resultante de força maior, bem como suficiente para gerar, ao tempo da conduta, entendimento dificultado do caráter ilícito do fato ou determinação do comportamento de acordo com esse entendimento.
67 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, 5.ed.rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005, p. 240. 68 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4ed. São Paulo: Saraiva, 2002 v.1.p.280. 69 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4ed. São Paulo: Saraiva, 2002 v.1.p.280 . 70 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, 5.ed.rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005, p. 244.
37
Há também a exclusão da culpabilidade existente na lei de
tóxicos 11343/06, nos seus artigos:
Art. 45. É isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Parágrafo único. Quando absolver o agente, reconhecendo, por força pericial, que este apresentava, à época do fato previsto neste artigo, as condições referidas no caput deste artigo, poderá determinar o juiz, na sentença, o seu encaminhamento para tratamento médico adequado.
Art. 46. As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Certamente, a personalidade tem uma influência marcante
na forma da embriaguez e nem sempre é necessário que todos os indivíduos
apresentem esta mesma seqüência.
2.2.3 Menoridade Penal
Assim descreve o artigo 27 do Código Penal:
Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente
inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na
legislação especial. 71
Nas palavras de Guilherme de Souza Nucci:72
Menoridade: trata-se da adoção, nesse contexto, do critério puramente biológico, isto é, a lei penal criou uma presunção absoluta de que o menor de 18 anos, em face do desenvolvimento mental incompleto, não tem condições de compreender o caráter
71 Código Penal Brasileiro 72 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, 5.ed.rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005, p.239.
38
ilícito do que faz ou capacidade de determinar-se de acordo dom esse entendimento.
A Carta Magna de 1988, tem-se o assento constitucional, no
seu artigo 228:
Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de
dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial. 73
Porém, muito embora tenha esse acento constitucional,
ficam os menores de 18 anos sujeitos às disposições específicas do Estatuto da
Criança e do Adolescente, configurados nos artigos 104 da Lei 8.069/1990:
São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.
Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à data do fato.74
Neste sentido, ilustra Luiz Regis Prado:
Esse diploma legal prevê, no caso de ato infracional (crime ou contravenção penal) praticado por criança ou adolescente, medidas de proteção genéricas (art. 98, ECA) e específicas (art. 101, ECA) e, ainda, para o adolescente, medidas sócio-educativas (art. 112, ECA). 75
Insta salientar que se o menor já tem 18 anos completos,
mas ainda não atingiu os 21, faz jus à atenuação da pena, ou seja:
Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena:
I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato 76
Têm-se o início da maioridade penal aos 18 anos, a partir do
primeiro instante do dia do aniversário. É a posição predominante, conforme a
jurisprudência do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo:
73 Constituição Federal / 1988 74 Lei 8.069/1990 75 PRADO, Luiz Régis.Curso de Direito Penal Brasileiro - parte geral. 5.ed.rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. v.1.p.442. 76 Código Penal, artigo 65, I, primeira parte.
39
É a lei civil que determina a idade das pessoas. Impossível caber interpretação diversa na legislação penal e processual, uma vez não ter cabimento que alguém tenha 18 anos pela lei civil e ainda não os tenha pela lei penal, ou militar, ou eleitoral. Logo, considera-se penalmente responsável o agente que pratica a infração no preciso dia em que comemora seu 18º aniversário 77
Em que pese ter o agente o benefício da atenuante, resta
também a redução do prazo prescricional, que reza no artigo 115 do Código
Penal:
São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o
criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um)
anos(...). 78
2.3 Semi-imputabilidade
A semi-imputabilidade pode ser designada também como
responsabilidade diminuída ou imputabilidade diminuída.
Fernando Capez79, assim, conceitua o assunto:
é a perda de parte da capacidade de entendimento e autodeterminação, em razão de doença mental ou de desenvolvimento incompleto ou retardado. Alcança os indivíduos em que as perturbações psíquicas tornam menor o poder de autodeterminação e mais fraca a resistência interior em relação à prática do crime. Na verdade, o agente é imputável e responsável por ter alguma noção do que faz, mas sua responsabilidade é reduzida em virtude de ter agido com culpabilidade diminuída em conseqüência das suas condições pessoais.
No mesmo norte, Fernando Capez80 discorre sobre as
conseqüências da semi-imputabilidade:
não exclui a imputabilidade, de modo que o agente será condenado pelo fato típico e ilícito que cometeu. Constatada a redução na capacidade de compreensão ou vontade, o juiz terá duas opções: reduzir a pena 1/3 a 2/3, ou impor medida de
77 TACRIM, HC 286.966/4-SP, 13.ªC., rel. Juiz San Ruan França, 13.02.1996. 78 Código Penal, artigo 115, primeira parte. 79 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4ed. São Paulo: Saraiva, 2002 v.1.p.284. 80 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4ed. São Paulo: Saraiva, 2002 v.1.p.284.
40
segurança (mesmo aí a sentença continuará sendo condenatória). A escolha por medida de segurança somente poderá ser feita se o laudo de insanidade mental indicá-la como recomendável, não sendo arbitrária essa opção. Se for aplicada a pena, o juiz estará obrigado a diminuí-la de 1/3 a 2/3, conforme o grau de perturbação, tratando-se de direito público subjetivo do agente, o qual não pode ser subtraído pelo julgador.
A Lei 11.343/06 apresenta em seu capítulo das atividades de
atenção e de reinserção social assemelhados a semi-imputabilidade:
Art. 26. O usuário e o dependente de drogas que, em razão da prática de infração penal, estiverem cumprindo pena privativa de liberdade ou submetidos a medida de segurança, têm garantidos os serviços de atenção à sua saúde, definidos pelo respectivo sistema penitenciário.
Como também se observará a semi-imputabilidade no artigo
28 da Lei 11.343/06:
Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
§ 2o Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.
Portanto, em conformidade com os doutrinadores supra
mencionados, e também na legislação, a semi-imputabilidade não exclui a
capacidade de entendimento, porém, constatada a redução na capacidade de
compreensão ou vontade, poderá o juiz escolher reduzir a pena ou impor medida
de segurança.
2.4 Potencial consciência da Ilicitude
A potencial consciência da ilicitude é elemento da
culpabilidade, que não necessita ser efetiva. Basta que o agente, com algum
esforço ou cuidado, saiba que o fato é ilícito. Logo, eventual erro de proibição se
41
torna inescusável, quando o alegado atuar sem consciência resta elidido pela
possibilidade de o agente apreender a vedação legal com esforço próprio de
inteligência e com os conhecimentos hauridos da vida comunitária de seu próprio
meio.
O importante a lembrar é que, hodiernamente, a potencial
consciência da ilicitude é elemento aparte ao dolo, estando este no tipo penal e
aquela na culpabilidade.
2.4.1 Erro de Proibição
Para existir a culpabilidade, necessário se torna que haja no
sujeito ao menos a possibilidade de conhecimento da antijuridicidade do fato.
Quando o agente não tem ao não lhe é possível esse conhecimento, ocorre o
denominado erro de proibição.
Em outras palavras, Damásio E. de Jesus, assim expõe:
Há portanto, erro de proibição quando o autor supõe, por erro, que seu comportamento é lícito. Nessa hipótese, o agente atua voluntariamente e, portanto, dolosamente, porque seu erro não incide sobre os elementos do tipo; mas não há culpabilidade, já que pratica o fato por erro quanto à ilicitude de sua conduta.81
Ou seja, o agente, no erro de proibição, faz um juízo
equivocado sobre aquilo que lhe é permitido fazer perante a sociedade.
2.5 Exigibilidade de Conduta Diversa
O juízo de culpabilidade pelo fato típico e ilícito pressupõe
que o agente podia e devia agir de maneira diversa. Essa reprovabilidade deriva,
portanto, de uma concepção normativa.
Cabe ressaltar que a coação mencionada no citado art. 22 é
aquela de natureza moral (vis compulsiva), e não física (vis absoluto). Isso porque
a coação física afasta a própria conduta do agente, por ausência de dolo ou
culpa.
81 JESUS, Damásio E. de. Manual de Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 2006, v 1. p.197
42
2.5.1 Coação Moral Irresistível
Há na coação moral irresistível, uma ameaça, e não há
escolha a quem é coagido. É indispensável que a acompanhe um perigo sério e
atual de que ao coagido não é possível eximir, ou que lhe seja
extraordinariamente difícil de suportar.
Pode-se supor a hipótese de coação moral irresistível:
Suponha-se que um empregado receba um bilhete em que ameaça exterminar seu filho que foi seqüestrado, obrigando-o a colaborar num roubo contra a empresa; posteriormente, descobre-se que o bilhete era endereçado a um colega. Há coação moral irresistível porque o sujeito, por erro, estava submetido ao constrangimento e também não lhe podia exigir comportamento diverso.82
Trata-se de hipótese em que se exclui não a ação, mas a
culpabilidade, por não ser exigível comportamento diverso.
2.5.2 Obediência Hierárquica
O artigo 22 do Código Penal, refere-se à prática do crime
“em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior
hierárquico”, isto é, a suposição de obedecer a uma ordem legítima do superior, o
agente pratica o fato incriminado.
Para que ocorra a excludente, é necessário que o agente
pratique o fato em estrita obediência à ordem, sendo responsabilizado aquele que
excede na prática do ato.
2.6 Sanções Penais
Sanção é a conseqüência jurídica que deriva da violação do
preceito. Ela vem expressa logo em seguida ao enunciado do preceito, como
ocorre com as normas incriminadoras.
As penas e as medidas de segurança constituem as duas
formas de sanção penal.
43
Entretanto, Damásio E. de Jesus83 afirma que:
Enquanto a pena é retributiva-preventiva, tendendo hoje a readaptar à sociedade o delinqüente, a medida de segurança possui natureza essencialmente preventiva, no sentido de evitar que um sujeito que praticou o crime e se mostra perigoso venha a cometer novas infrações penais.
Insere-se a medida de segurança no gênero sanção penal,
no qual figura como espécie, ao lado da pena.
2.6.1 Medidas de Segurança
As medidas de segurança são conseqüências jurídicas do
delito, de caráter penal, orientadas por razões de prevenção especial.
Para um melhor entendimento, medida de segurança para
Luiz Regis Prado:
Consubstanciam-se na reação do ordenamento jurídico diante da periculosidade criminal revelada pelo delinqüente após a prática de um delito. O objetivo primeiro da medida de segurança imposta é impedir que a pessoa sobre a qual atue volte a delinqüir, a fim de que possa levar uma vida sem conflitos com a sociedade. 84
Em posição análoga ao conceito, está o posicionamento:
é providência dilatada pela defesa do bem comum e baseada no juízo de periculosidade, que, no tocante aos inimputáveis, substitui o juízo de reprovação consubstanciado na culpabilidade.85
Comparativamente, observam-se diferenças entre a pena e
medida de segurança, corroborando com o entendimento, Prado ensina:
Quanto ao fundamento, à pena baseia-se na culpabilidade do agente e a medida de segurança, na periculosidade; quanto ao limite, a pena é limitada pela gravidade do delito (injusto e culpabilidade), enquanto a medida de segurança, pela intensidade da periculosidade evidenciada pelo sujeito ativo e por sua
82 JESUS, Damásio E. de. Manual de Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 2006, v 1. p.205 83 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p.545 84 PRADO, Luiz Régis.Curso de Direito Penal Brasileiro - parte geral. 5.ed.rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. v.1.p.742.
44
persistência; quanto ao sujeito, a pena se aplica aos imputáveis e semi-imputáveis necessitados de especial tratamento curativo; quanto ao objetivo, a pena busca a reafirmação do ordenamento jurídico, bem como o atendimento de exigências vinculadas à prevenção geral e à prevenção especial; já a medida de segurança atende a fins preventivos especiais. 86
Cabe informar que são três os principais sistemas propostos
quanto à aplicação da medida de segurança: o sistema dualista, sistema monista
e o sistema vicariante.
Na lição de Guilherme de Souza Nucci87 o sistema dualista
assim descreve:
Ante da Reforma Penal de 1984, prevalecia o sistema duplo binário, vale dizer, o juiz podia aplicar pena mais medida de segurança. Quando o réu praticava delito grave e violento, sendo considerado perigoso, recebia pena e medida de segurança. Assim, terminada a pena privativa da liberdade, continuava detido até que houvesse o exame de cessação de periculosidade. Na prática, poderia ficar preso indefinidamente, o que se afigura profundamente injusto – afinal, na época do delito, fora considerado imputável, não havendo sentido para sofrer dupla penalidade. A designação – duplo binário – advém da expressão italiana doppio binário, que significa duplo trilho ou dupla via.
Já para Luiz R. Prado, ao que se refere o sistema monista
leciona:
conjugam-se três tendências, a saber: 1) absorção da penal pela medida de segurança; 2) absorção da medida de segurança pela pena; 3) unificação das penas e das medidas de segurança em outra sanção distinta, com duração mínima proporcional à gravidade do delito e máxima indeterminada, sendo a execução
85 MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. Atual. Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, Guilherme de Souza Nucci e Sérgio Eduardo Mendonça Alvarenga. Campinas: Bookseller, 1997. vol.1. p.252. 86 PRADO, Luiz Régis.Curso de Direito Penal Brasileiro - parte geral. 5.ed.rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. v.1.p.744. 87 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, 5.ed.rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005, p. 436.
45
ajustada à personalidade do delinqüente e fins de readaptação social.88
Para o mesmo doutrinador supra citado, têm-se como
conceito do sistema vicariante:
trata-se de uma variante do sistema dualista – abolido com a reforma da Parte Geral do Código Penal Brasileiro – pelo qual se impõe pena ou medida de segurança ao semi-imputável, vedada a aplicação cumulativa ou sucessiva. Assim, a pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardo não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento. 89
Com base nas obras doutrinárias, o Código Penal adotou o
sistema vicariante, sendo impossível a aplicação cumulativa de pena e medida de
segurança. Aos imputáveis, pena; aos inimputáveis, medida de segurança; aos
semi-imputáveis, uma ou outra, conforme recomendação do perito.
Quanto aos pressupostos de aplicação das medidas de
segurança, assim descreve Damásio E. de Jesus90:
A aplicação da medida de segurança pressupõe 1) a prática de fato descrito como crime e 2) a periculosidade do sujeito. Tratando-se de agente semi-responsável (CP, art. 26, parágrafo único), não é suficiente que tenha cometido um fato típico. É necessário que seja também antijurídico; e ele, culpado. Faltando os requisitos da tipicidade ou da ilicitude do fato ou da culpabilidade do sujeito, não se impõe medida de segurança.
O segundo pressuposto é a periculosidade do agente, temos
dois tipos de periculosidade, real e a presumida.
Comenta sobre isto, Damásio E. de Jesus:91
88 PRADO, Luiz Régis.Curso de Direito Penal Brasileiro - parte geral. 5.ed.rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. v.1.p.744. 89 PRADO, Luiz Régis.Curso de Direito Penal Brasileiro - parte geral. 5.ed.rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. v.1.p.744. 90 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p.547. 91 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p. 547.
46
Fala-se em periculosidade real quando ela deve ser verificada pelo juiz. Cuida-se de periculosidade presumida nos casos em que a lei presume, independentemente da periculosidade real do sujeito.
Registra-se, sob este enfoque que, hodiernamente, existem
duas espécies de medida de segurança, a detentiva e a restritiva.
Nesse sentido, Fernando Capez92 afirma que:
A medida de segurança detentiva, possui as seguintes características: a) é obrigatória quando a pena imposta for de reclusão, b)será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade; c) a cessação da periculosidade será averiguada após prazo mínimo, variável entre um e 3 anos; d) a averiguação pode ocorrer a qualquer tempo, mesmo antes do término do prazo mínimo, se o juiz da execução determinar (Lei de Execução Penal - LEP, art. 176).
Todavia, no que se refere à medida de segurança restritiva,
é entendimento do mesmo doutrinador:
A medida de segurança restritiva, tem como características a) se o fato é punido com detenção, o juiz pode submeter o agente a tratamento ambulatorial; b) o tratamento ambulatorial será por prazo indeterminado até a constatação da cessação de periculosidade; c) a constatação será feita por perícia médica após o decurso do prazo mínimo; d) o prazo mínimo varia entre um e 3 anos; e) a constatação pode ocorrer a qualquer momento, até antes do prazo mínimo, se o juiz da execução determinar (LEP, art. 176). 93
No que se refere à desinternação, informa-se que ela será
sempre condicional, devendo ser restabelecida a situação anterior se o agente,
antes do decurso de um ano, pratica fato indicativo de sua periculosidade.
2.6.2 Penas
92 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4ed. São Paulo: Saraiva, 2002 v.1.p.378. 93 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4ed. São Paulo: Saraiva, 2002 v.1.p.378.
47
Pena é sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação
penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito,
consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim é evitar novos delitos.
De acordo com o Código Penal94, no artigo 32:”As penas
são:I privativas de liberdade;II restritivas de direito;III de multa.”
Júlio Fabbrini Mirabete95 discorre sobre a classificação da
pena:
Na doutrina, as penas são classificadas como: corporais, privativas de liberdade, restritivas de liberdade, privativas e restritivas de direitos; pecuniárias. Por força da Lei nº 7.209. de 11-7-1984, que deu nova redação à Parte Geral, e da Lei nº 9.714, de 25-11-1998, que alterou o seu art. 43, abandonando-se a clássica distinção entre penas principais e penas acessórias, classificam-se elas em: privativas de liberdade (reclusão e detenção), restritivas de direito (prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, interdições temporárias de direito) e multa.
Neste norte, seguindo o raciocínio dessa corrente
doutrinária, somente com a observância do juízo de reprovação é que haverá a
imposição de uma pena, o que nos leva a concluir que esta está ligada ao crime
através da culpabilidade. A não observância desta enseja na não aplicação
daquela.
2.6.2.1 Penas Privativas de liberdade
Tem-se nas penas privativas de liberdade, as penas de
reclusão e detenção, as diferenças entre reclusão e detenção restringem-se
quase que exclusivamente ao regime de cumprimento da pena, que naquela deve
ser feito em regime fechado, semi-aberto ou aberto, e nesta somente em regime
semi-aberto ou aberto, segundo dispõe o artigo 33, caput, do Código Penal.
Contudo, é possível a transferência do condenado a pena de detenção para
regime fechado, demonstrando a necessidade da medida.
94 Código Penal, artigo 32. 95 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código penal interpretado. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2005. p.308.
48
Os regimes penais das penas privativas de liberdade são:
regime fechado (pena executada em estabelecimento de segurança máxima ou
média (artigo 33, parágrafo 1º, “a”, CP)); regime semi-aberto (execução da pena
em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar (artigo 33, parágrafo 1º,
“b”, CP)) e regime aberto (cumprimento da pena em casa de albergado ou
estabelecimento adequado (artigo 33, parágrafo 1º, “c”, CP)).
De acordo com o Código Penal, tem-se a determinação do
regime inicial, ou seja, se for o agente condenado a pena superior a oito anos,
inicia a pena em regime fechado (artigo 33, parágrafo 2º, “a”, CP); se o agente
condenado não reincidente a pena superior a quatro anos e não excedente a oito,
poderá cumpri-la desde o início em regime semi-aberto (artigo 33, parágrafo 2º,
“b”, CP); condenado não reincidente à pena igual ou inferior a quatro anos,
poderá desde o início cumpri-la em regime aberto (artigo 33, parágrafo 2º, “c”,
CP).
Cumpre ressaltar que os maiores de sessenta anos (art.82,
parágrafo1º, LEP) e mulheres são submetidos a regime especial para a execução
da pena. Nesse caso ela será cumprida em estabelecimento próprio, observados
os deveres e direitos inerentes à sua condição pessoal e regras concernentes às
penas privativas de liberdade (era. 37, CP; 88 e 89, LEP).
Insta informar que nos regimes penais estão inceridos a
progressão e a regressão.
Primeiramente, segundo Luiz Regis Prado96:
Progressão é a transferência do condenado para um regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, tendo o preso cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e sendo merecedor da progressão.
Quanto ao mérito, da progressão, salienta Tucci97:
96 PRADO, Luiz Régis.Curso de Direito Penal Brasileiro - parte geral. 5.ed.rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. v.1.p.583. 97 TUCCI, R.L. Progressão na execução das penas privativas de liberdade: breve estudo sistemático, RT, 630, 1988, p. 272.
49
traduz-se no merecimento, ou seja, in casu, na habilitação do condenado à progressão. E deve ser aferido em razão dos respectivos valores intrínsecos, morais e laborais, que o façam merecer o correspondente resultado, tal como na lei estabelecido – uma verdadeira recompensa, enfim pelo seu comportamento prisional.
Outro tipo é a regressão, que é a transferência do
condenado para regime mais rigoroso na ocorrência de quaisquer das hipóteses
descritas nos artigos 118, da LEP, e 36, parágrafo 2º, do CP.
O código penal98 disciplina a detração penal no artigo 42:
Computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior. (art. 41 hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, a outro estabelecimento adequado).
Nesse entendimento, admite-se detração em relação à
medida de segurança. Assim, o tempo de internação pode ser abatido do período
de seu cumprimento.
2.6.2.2 Penas restritivas de direito
De acordo com o artigo 13 do Código Penal, as penas
restritivas de direito são: prestação pecuniária, perda de bens e valores,
prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária
de direitos e limitação de fim de semana.
Guilherme de Souza Nucci99 ensina que:
Penas restritivas de direito são penas alternativas às privativas de liberdade, expressamente previstas em lei, tendo por fim evitar o encarceramento de determinados criminosos, autores de infrações penais consideradas mais leves, promovendo-lhes a recuperação através de restrições a certos direitos.
98 Código Penal, artigo 42. 99 NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, 5.ed.rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005, p. 300.
50
Damásio E. de Jesus100, acrescenta:
Alternativas penais, também chamadas substitutivos penais, são meios de que se vale o legislador visando impedir que ao autor de uma infração penal venha ser aplicada medida ou pena privativa de liberdade. Exs.:a fiança, o sursis, a suspensão condicional do processo e o perdão judicial. São também denominadas “medidas alternativas”e medidas não privativas de liberdade”. Podem atuar antes do julgamento, como, p.ex., a fiança, a liberdade provisória e a suspensão condicional do processo. Sua imposição é também possível na sentença condenatória (ex. sursis). Por último, podem atuar na fase da execução da pena (ex. indulto). Outro exemplo encontra-se no art. 180 da LEP, que permite que a pena privativa de liberdade, na fase da execução, seja convertida em restritiva de direitos.
Frisa-se que nem todas as penas previstas no artigo 43 do
Código Penal são restritivas de direitos, como é o caso da perda de bens e
valores, multa, prestação pecuniária e pena inominada.
De acordo com o artigo 44 do Código Penal, as penas
restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de direitos quando
preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos atribuídos neste.
Assim, em conformidade com o artigo 44, I, do Código
Penal, tendo como requisitos objetivos, colacionados neste sentido, com as
anotações de Júlio Fabbrini Mirabete101:
pressuposto objetivo, o juiz, como regra geral, só pode proceder à substituição se a pena privativa de liberdade aplicada inicialmente, por crime doloso, não for superior a quatro anos. Tratando-se porém de condenação igual ou inferior a um ano, permite-se a substituição por pena de multa. No caso de crime culposo, permite-se a substituição qualquer que seja a quantidade da pena aplicada. Havendo concurso de crimes, a substituição é possível quando o total das penas não ultrapassa os limites mencionados, com exceção dos crimes culposos em que é ela sempre admissível. Não se aplicam as regras de substituição de penas aos crimes militares, às quais são cominadas sanções divergentes daquelas impostas por crimes comuns. Um segundo requisito
100 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p.529.
51
objetivo, foi inserido pela nova lei ao proibir a substituição da pena quando se tratar de crime praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, qualquer que seja a quantidade da pena privativa de liberdade imposta.
Nos requisitos subjetivos, tem-se que observar a não
reincidência em crime doloso, e que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta
social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as
circunstâncias, indiquem que a substituição seja suficiente, disposto no artigo 44,
II e III do Código Penal.
No que se refere à conversão, ela pode ser obrigatória ou
facultativa.
2.6.2.3 Pena de Multa
Como outrora devidamente explicitado, a pena de multa é
uma sanção penal, submetida irrestritivamente aos princípios da legalidade, da
culpabilidade, da individualização, da pessoalidade e do devido processo judicial.
O Código penal vigente adota o sistema do dia-multa, ou
seja:”leva em conta o rendimento do condenado durante um mês ou um ano,
dividindo-se o montante por 30 ou 365 dias; o resultado equivale ao dia-multa”102
Pode-se afirmar que a pena de multa é o pagamento ao
fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa.
Neste diapasão, Damásio E. de Jesus103 comenta:
A quantidade dos dias-multa não é cominada pela norma penal incriminadora, que só faz referência a multa. Deve ser fixada pelo juiz, variando de, no mínimo, dez dia-multa a, no máximo, trezentos e sessenta dias-multa. O valor do dia multa deve ser também fixado pelo juiz na sentença, não podendo ser inferior a um trigésimo do salário mínimo mensal de referência vigente ao tempo do fato, nem superior a cinco vezes esse salário.
101 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código penal interpretado. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2005. p.382. 102 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p.541. 103 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p. 542.
52
Insta observar que em virtude da vigência da Lei 9.268/96, o
artigo 51, caput, teve seu teor modificado, e seus parágrafos 1º e 2º, foram
revogados pelo mencionado diploma.
O citado dispositivo disciplina a conversão da pena de multa
em pena privativa de liberdade quando o condenado solvente deixasse de efetuar
o pagamento ou frustrasse a sua execução e leciona que na sentença
condenatória, o valor da pena de multa deve ser inscrito como dívida ativa em
favor da Fazenda Pública.
Por fim, e de extrema relevância para o presente trabalho,
ressalta-se que a execução da multa é suspensa ao condenado por doença
mental, assim, como ao inimputável não se aplica pena, toda vez que depois do
transito em julgado da sentença o condenado vier a padecer de doença mental,
não será possível a execução da pena privativa de liberdade ou de multa.
Por conseguinte, passaremos a explorar no próximo
capítulo, os transtornos da personalidade examinando uma interface entre
psiquiatria e lei.
53
CAPÍTULO 3
Psicanálise, psicopatologia e a psicologia forense
Conceitualmente, pode-se analisar a Psicologia Jurídica,
também chamada de Psicologia Criminal ou Psicologia Judiciária, como o método
que consiste na aplicação dos conhecimentos psicológicos ao serviço do Direito.
Dedica-se à proteção da sociedade e à defesa dos direitos do cidadão, através da
perspectiva psicológica. Juntamente com a Psicologia Forense, constitui o campo
de atuação da Psicologia conjuntamente com o Direito.
Psiquiatria forense é uma subespecialidade da psiquiatria,
que lida com a interface entre lei e psiquiatria. Os psiquiatras forenses trabalham
com tribunais, onde, a pedido da justiça, avaliam a capacidade de um indivíduo de
enfrentar julgamento, a capacidade para redigir um testamento, etc., baseando-se
no estado mental do indivíduo avaliado e determinando recomendações. O
espanhol Emilio Mira y Lopez é considerado o pai da psicologia e da psiquiatria
forense.
Psicanálise é um método desenvolvido pelo médico
neurologista alemão Sigmund Freud de investigação e de tratamento psíquico do
inconsciente.
Luiz Flávio Gomes tece algumas considerações sobre a
distinção da psicanálise, psicopatologia e psiquiatria forense:
A Psicopatologia (Psiquiatria) é o ramo da medicina que se ocupa do fato psíquico patológico, do homem psiquicamente enfermo. Inclina-se pois, à adoção de uma perspectiva clínica, contemplando a conduta delitiva como expressão de um transtorno patológico da personalidade. A Psicologia, pelo contrário, estuda o comportamento humano, a conduta. Interessa-lhe o comportamento delitivo como qualquer outro comportamento. A moderna Psicologia “empírica” preocupa-se em explicar o processo de aquisição de certos modelos de conduta, identificando os fatores e as variáveis que o reforçam, tanto que se trata de um comportamento conformista como no caso
54
contrário; seus cultivadores são mais partidários do laboratório e da experimentação que da observação e da clínica. A Psicanálise, por sua vez, concebe o crime como um comportamento funcional simbólico, expressão de conflitos psíquicos profundos, pretéritos, de desequilíbrios da personalidade que só podem ser revelados introspectivamente, aprofundando-se no inconsciente do indivíduo. Unida em suas origens ao estudo de certas patologias (neurose e histeria), criou um emaranhado conceitual complexo, capaz de explicar o comportamento delitivo em termos muito semelhantes às enfermidades mentais. Serviu, desse modo, como ponte para a modera Psiquiatria e a Psicologia.104
Em relação ao Direito Penal, a Psiquiatria informa sobre a
sanidade mental do agente, sobre seu desenvolvimento mental retardado ou
tolhido, sobre sua periculosidade, estado de embriaguez, simulação de loucura,
medidas de segurança a lhe serem aplicadas , assistências aos doentes mentais
e criminosos e aos criminosos que enlouquecem.
No presente estudo, pretende-se elucidar um pouco mais
sobre a psicanálise, em virtude dela fazer um exame mais aprofundado da
estrutura psicodinâmica da personalidade, juntamente com seus conflitos e
frustrações, o processo de motivação do delinqüente e a própria interpretação da
conduta delitiva à luz do inconsciente dos seus atos e de uma análise mais
introspectiva. Bem como da psiquiatria em virtude desta estudar as
personalidades psicopáticas.
3.1 Conceito de normalidade e anormalidade
Inexiste um limite sólido de separação no que tange ao
conceito de normalidade e anormalidade em psiquiatria forense, deve-se analisar
as projeções biológicas, psicológicas, filosóficas, antropológicas ou sociais do
indivíduo e até metafísicas.
Deve-se usar prudência ao qualificar a normalidade psíquica
de outrem, conforme salienta Delton Crose em sua obra ilustra acerca da
normalidade:
104 MOLINA, Antonio García- Pablos de. Criminologia. Trad. Luiz Flávio Gomes. 2.ed. rev. Atual. e ampl. – São Paulo: RT, 1997. p.214.
55
Raitzin em (O homem normal, esse desconhecido, 1949) aduz que “é a normalidade mental, com efeito, considerada simplesmente qual um conceito primacial dos conhecimentos psicológicos, e como uma realidade virtual do psiquismo, quando nele não se nota nenhum dos estigmas mórbidos ou sinais patológicos por que se diferenciam e identificam as diversas constituições psicopáticas e as síndromes características das moléstias mentais conhecidas. Destarte, todo indivíduo cujo tipo de mentalidade e comportamento não esteja incluído na nosologia psiquiátrica, fica de fato categorizado, classificado como normal”.105
Anormal, portanto, é o que está desadaptado ao meio,
aquele que se afasta da norma; o desregrado. Verifica-se pela psicologia
profunda, o normal penetra no anormal e o anormal pode ser entendido, em
grande escala, em termos do que é normal. Cremos que entre o normal e o
patológico há apenas diferença de grau.
3.2 A conduta criminosa
Pode-se observar que a conduta criminosa vem muitas
vezes do inconsciente do agente, portanto, é necessário conhecer os
mecanismos e o significado do comportamento.
Dito isto, sob um enfoque mais detalhado, João Alfredo
Medeiros Vieira assevera acerca de uma análise genérica no que se refere ao
agente ainda criança:
A criança como tal, por não ter, ainda, constituído o Super-Ego – cuja influência age no sentido de adaptar o indivíduo ao mundo e à sociedade – possui dentro de si potencialidades para todos os crimes. Pelo fato de seus impulsos instintivos regerem-se pelos princípios do poder e do prazer, aquelas a levam, fatalmente, à agressão, ao incesto, à apropriação dos bens alheios, à falsidade. Afigura-se, destarte, num ser anti-social. Freud já afirmava: “A criança é um perverso polimofo”.106
Explicita o mesmo autor, porém, um pouco mais detalhado:
105 CROSE, Delton & JUNIOR, Delton Crose. Manual de medicina legal. 5.ed.rev. e ampl.São Paulo: Saraiva, 2004. p.599. 106 VIEIRA, João Alfredo Medeiros. Noções de Criminologia.São Paulo: LEDIX, 1997. p.75.
56
Não obstante, qualquer que seja o caso ou situação individual, no crime – em particular no crime violento – existe, via de regra, algo de suprema arrogância. Todos os seres humanos estão dispostos, de qualquer maneira, a se elevar. Quando o Super-Ego dita as ações, prevalecendo sobre o ID, o indivíduo resolve ascender pelo trabalho, pelo pensamento criador, palmilhando os caminhos da arte ou outra virtude. Quase sempre, porém, faz-se mister uma ação rápida contra outrem, alguma coisa que, a seus olhos, seja mais elevada. Na dinâmica desse comportamento está sedimentado o sentimento (plexo) de inferioridade. Pode não ser simplesmente produto da imaginação; geralmente a ação agressiva se baseia num sentido de passividade, e, por isso, o ato violento se acha ligado à incapacidade. De sua parte, a violência sexual significa incapacidade sexual, na maioria dos casos. O ato criminoso revestido de violência, quer cometido individualmente, quer em colaboração com outros, consegue quase sempre amenizar o sentimento de inferioridade, libertando o indivíduo de sua carga emocional decorrente da própria personalidade.107
A conduta criminosa pode ser ocasional (causal) (quando a
o ato delituoso se conduz em uma só vez e não constantemente), ou habitual
(quando traduz um estilo de vida), genérica ou específica (quando tanto a conduta
genérica quanto a específica no cometimento da infração podem ser
patologicamente graves).
Por fim, normalmente, as principais causas determinantes da
conduta criminosa são os sentimentos de culpa originados de desejos anti-sociais
reprimidos, sejam eles de inferioridade, rejeição, repulsa, marginalidade etc.
3.3 A personalidade total do indivíduo
Em decorrência das atitudes e dos pensamentos, podemos
observar que a personalidade total do indivíduo decorre de uma “simbiose de
fatores endógenos e exógenos, hereditários e ambientais, que configuram a
personalidade e plasmam o caráter”.108
Devemos destacar que existem também as influências do
meio de formação da personalidade delinqüente, não esquecendo das condições
107 VIEIRA, João Alfredo Medeiros. Noções de Criminologia.São Paulo: LEDIX, 1997. p.78. 108 VIEIRA, João Alfredo Medeiros. Noções de Criminologia.São Paulo: LEDIX, 1997. p.80.
57
da vida intra-uterina, as heranças morfo-biológico-mentais tornando-se o produto
da soma desses fatores.
3.3.1 Personalidade
O termo “personalidade” é sinônimo de pessoa, como
entendia São Tomaz de Aquino, umas são temperamentais, emocionalmente
incontroláveis, agressivos ou portadores de mau caráter; outros, são exemplos de
temperança e dignidade.
No que concerne à estrutura da personalidade, James
Fadiman explicita em sua obra algumas observações de Freud:
As observações de Freud a respeito de seus pacientes revelam uma série interminável de conflitos e acordos psíquicos. A um instituto opunha-se outro; proibições sociais bloqueavam pulsões biológicas e modos de enfrentar situações frequentemente chocavam-se uns com os outros. Ele tentou ordenar este caos aparente propondo três componentes básicos estruturais da psique: o id (“contém tudo que é herdado, que se acha presente no nascimento, que está presente na constituição – acima de tudo, portanto, os instintos que se originam na organização somática e que aqui (no id) encontram uma primeira expressão psíquica, sob formas que nos são conhecidas); o ego (“é a parte do aparelho psíquico que está em contato com a realidade externa (...)”) e o superego (esta estrutura desenvolve-se não a partir do id, mas a partir do ego. É o depósito de códigos morais, modelos de conduta e dos construtos que constituem as inibições da personalidade).109
Bem como, na mesma obra os ensinamentos de Carl Jung:
Nossa persona110 é a forma pela qual nos apresentamos ao mundo. É o caráter que assumimos; através dela nós nos relacionarmos com os outros. A persona inclui nossos papéis
109 FADIMAN, James & FRAGER, Robert.Teorias da personalidade.São Paulo:HARBRA, 1986.p.10. 110 “O termo “persona” é derivado da palavra latina equivalente a máscara, e que se refere às máscaras usadas pelos atores no drama grego para o significado aos papéis que estavam representando” FADIMAN, James & FRAGER, Robert.Teorias da personalidade.São Paulo:HARBRA, 1986.p.53.
58
sociais, o tipo de roupa que escolhemos para usar e nosso estilo de expressão pessoal.111
São as colocações de Willian James no que se refere à
personalidade na psicologia e consciência:
A personalidade, para James, emerge da interação entre as facetas instituais e habituais da consciência e os aspectos pessoais e volitivos. As patologias, as diferenças pessoais, os estágios de desenvolvimento, a tendência à auto-realização e todo o resto são redistribuições dos blocos de construção fundamentais fornecidos pela natureza e refinados pela evolução.112
Por fim, podemos citar a contribuição de B. F. Skinner, onde
aduziu com o seguinte:
Personalidade, no sentido separado, não tem lugar numa análise científica do comportamento. Personalidade é definida por Skinner como uma coleção de padrões de comportamento. Situações diferentes evocam diferentes padrões de respostas. Cada resposta individual é baseada apenas em experiências prévias e história genética.113
Em decorrência das várias denominações que tentam dar
sentido à palavra personalidade, uma forma mais simplificada para entendermos
seria o conceito de Newton Fernandes e Getúlio Chofard:
Partindo do pressuposto que a pessoa é o ser humano dotado de plenos recursos para desempenhar as funções psicológicas adequadas as suas finalidades vitais, atribuem à personalidade o significado de temperamento, atitudes, expressões e emoções aos quais se sujeita o homem.114
Como se vê, não existe um denominador comum na
descrição das características primárias da personalidade. E isto porque cada
pessoa tem um modo de ser que não se identifica com seu semelhante, visto
111 FADIMAN, James & FRAGER, Robert.Teorias da personalidade.São Paulo:HARBRA, 1986.p.53. 112 FADIMAN, James & FRAGER, Robert.Teorias da personalidade.São Paulo:HARBRA, 1986.p.152. 113 FADIMAN, James & FRAGER, Robert.Teorias da personalidade.São Paulo:HARBRA, 1986.p.193. 114 FERNANDES, Newton & CHOFARD, Getúlio. Sociologia geral – jurídica e criminal. São Paulo: Rumo, 1995. p. 137.
59
como as diferenças são medidas pelos índices comportamentais, imensuráveis do
homem.
3.3.2 Personalidades psicopáticas
Numerosos são, os conceitos e definições acerca da
personalidade psicopáticas. Insta esclarecer que a personalidade humana pode
mostrar-se, alguma vez, com uma constituição mental anormal no sentido do
modo de ser e de reagir. Neste norte, no estudo da delinqüência essencial,
Medeiros Vieira115 assim dispõe:
O indivíduo dotado de personalidade psicopática revela desequilíbrio efetivo-emocional quase permanente e impulsos anti-sociais que o fazem penar, levando-o a causar atritos com os demais. Transforma suas frustrações em descargas agressivas, às vezes contra si mesmo e às vezes contra a sociedade. Demonstra quase nula capacidade de adaptação, pois está sempre em conflito com os que o cercam. A personalidade psicopática situa-se entre a personalidade normal e a personalidade psicótica.
Já Luiz Flávio Gomes116 assevera que:
A Organização Mundial de Saúde substituiu o termo “personalidade psicopática” por “transtornos da personalidade” que é acolhido, definitivamente, nos atuais Manuais e classificações psiquiátricas, como o DSM IV e o CIE 10 (F602 e 301.7 respectivamente, “transtorno anti-social da personalidade”).
E assim acrescenta:
Um transtorno da personalidade é mais – e algo distinto – que o mero conjunto de traços da personalidade. O transtorno exige a constatação de um padrão permanente de experiência interna do comportamento que se afasta das expectativas da cultura do sujeito, manifestando-se nas áreas cognoscitiva, afetiva. Da atividade interpessoal, ou dos impulsos; referido padrão persistente é inflexível, desadaptativo, exibe longa duração de início precoce (adolescência ou início da idade adulta) e ocasiona
115 VIEIRA, João Alfredo Medeiros. Noções de Criminologia.São Paulo: LEDIX, 1997. p.87. 116 MOLINA, Antonio García- Pablos de. Criminologia. Trad. Luiz Flávio Gomes. 2.ed. rev. Atual. e ampl. – São Paulo: RT, 1997. p.324.
60
um mal estar ou deteriorização funcional em amplas gamas de situações pessoais e sociais do indivíduo.117
Segundo Kurt Schneider, entre as personalidades
psicopáticas estão os hipertímicos, depressivos, inseguros, fanáticos, explosivos,
inconstantes, ostentativos, insensíveis, abúlicos e astênicos. Cabe salientar
quanto às personalidades psicopáticas, que “Schneider as considerava
“personalidades anormais”, que sofrem por causa de sua anormalidade ou que,
impedidos por ela, fazem sofrer à sociedade”.118
Deixando de lado a descrição pormenorizada de cada “tipo”,
é preferível verificar-se quais os “sintomas comuns” a todos e que integram uma
“síndrome psicopática”. E, para corroborar com o entendimento, Odon Ramos
Maranhão119 nos ensina acerca dos “sintomas”
O “roteiro diagnóstico” proposto por Kleckley é muito elucidativo: 1. Encanto superficial e boa inteligência. 2.Ausência de delírios ou outros sinais de pensamento ilógico. 3.Ausência de manifestações psiconeuróticas. 4.Inconstância. 5.Infidelidade e insinceridade. 6.Falta de remorso ou vergonha. 7.Conduta anti-social inadequadamente motivada. 8.Falta de ponderação e fracasso em aprender pela experiência. 9.Egocentrismo patológico e incapacidade de amar. 10.Pobreza geral nas relações afetivas. 11.Falta específica de esclarecimento interior (insight). 12.Irresponsabilidade nas relações interpessoais. 13.Tendência à conduta fantástica com ou sem uso de álcool. 14.Raramente suicidas. 15.Vida sexual impessoal, trivial e pobremente integrada. 16.Incapacidade de seguir um plano de vida.
Ademais, na mesma linha de raciocínio, Delton Croce e
Delton Croce Júnior120 explicitam:
Chamamos personalidades psicopáticas a certos indivíduos que, sem perturbação da inteligência, inobstante não tenham sofrido sinais de deterioração, nem de degeneração dos elementos
117 MOLINA, Antonio García- Pablos de. Criminologia. Trad. Luiz Flávio Gomes. 2.ed. rev. Atual. e ampl. – São Paulo: RT, 1997. p.324. 118 MARANHÃO, Odon Ramos.Curso básico de medicina legal.8. ed. rev. e ampl. 4ª tiragem. Editores Malheiros.1999. p.363. 119 MARANHÃO, Odon Ramos.Curso básico de medicina legal.8. ed. rev. e ampl. 4ª tiragem. Editores Malheiros.1999. p.366.
61
integrantes da psique, exibem através de sua vida intensos transtornos dos institutos, da afetividade, do temperamento e do caráter mercê de uma anormalidade mental definitivamente preconstituída, sem, contudo, assumir a forma de verdadeira enfermidade mental.
Faz mister comentar que Kraepelin classificou as
personalidades psicopáticas em: irritáveis, instáveis, instintivas, tocadas,
mentirosas e fraudadoras, anti-sociais, disputadoras. Já Kurt Schneider
descreveu-os em conformidade com este trabalho.
Importante mencionar que na Idade Média, a insanidade
mental era tida como resultado do pecado e de uma existência libertina.
Passamos agora a desvendar o universo pessoal de cada “tipo” de personalidade.
3.3.2.1 Psicopatas hipertímicos
Lexicamente, hipertímico trata-se de um adjetivo de alguém
com emotividade excessiva.
Explicita Genival Veloso de França:
Seus traços característicos são alegria, despreocupação, euforia, impaciência, tendência à execução imediata, instabilidade de vida e de trabalho, prodigalidade. Inclinados às disputas, aos escândalos e às desarmonias familiares, conjugais e no trabalho. Às vezes, apresentam plácidos e tranqüilos e, repentinamente, explodem em fúria incontida desproporcional ao estímulo.121
Perante o entendimento de Delton Croce e Delton Croce
Júnior122, sobre os hipertímicos acrescenta:
(...) Há os equilibrados, mas inquietos, e os excitados, nos quais existe um eretismo hiperexcitabilidade que lhes confere instabilidades psíquicas a ponto de alterarem-se em fúria incontida, desproporcional ao estímulo.
120 CROSE, Delton & JUNIOR, Delton Crose. Manual de medicina legal. 5.ed.rev. e ampl.São Paulo: Saraiva, 2004. p.645. 121 FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A, 1977.p.400. 122 CROSE, Delton & JUNIOR, Delton Crose. Manual de medicina legal. 5.ed.rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004. p.645.
62
No caso em análise, podemos observar com a leitura supra
que os psicopatas hipertímicos tem como característica principal a grande
emotividade, com distúrbios que variam com picos de euforia, que se transformam
em fúria.
3.3.2.2 Psicopatas depressivos
Os psicopatas depressivos podem ser caracterizados
segundo o entendimento:
Indivíduos tranqüilos, melancólicos, permanentemente deprimidos e eternamente descontentes e ressentidos, ligados a uma consideração pessimista da vida, iniciada, às vezes, na juventude. Fadigados crônicos, dominados por sentimentos de inferioridade, refugiados em uma atitude crítica nas relações intercorrentes entre eles e o mundo exterior, dificilmente chegam a vencer na vida. Podem atentar contra si próprios.123
Já para Genival Veloso de França “Apresentam uma
depressão permanente do estado de ânimo vital, misantropismo, pessimismo,
mau humor, desconfiança. Pouca criminalidade. Podem chegar ao suicídio”124.
3.3.2.3 Psicopatas lábeis do estado de ânimo
Para Genival Veloso de França: “Seu estado de ânimo sofre
oscilações imotivadas e desproporcionais, com crises de irritação e depressão.
São perigosos na fase impulsiva”.125
No mesmo norte, Delton Croce e Delton Croce Júnior
asseveram “psicopatas lábeis do estado de ânimo: irritáveis, manifestam
episódios chamados borrascas depressivas, que surgem de desaparecem
inesperadamente”.126
123 CROSE, Delton & JUNIOR, Delton Crose. Manual de medicina legal. 5.ed.rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004. p.645. 124 FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A, 1977.p.400. 125 FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A, 1977.p.400. 126 CROSE, Delton & JUNIOR, Delton Crose. Manual de medicina legal. 5.ed.rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004. p.646.
63
Cabe acrescentar que estes psicopatas estão propensos à
prodigalidade.
3.3.2.4 Psicopatas irritáveis
Na CID-10 o Transtorno Explosivo da Personalidade
aparece como Transtorno de Personalidade Emocionalmente Instável. Aqui, a
característica mais marcante é uma tendência a agir impulsivamente,
desprezando as eventuais conseqüências do ato impulsivo, juntamente com
instabilidade afetiva.
Com extrema sensibilidade aos aborrecimentos causados
pelos pequenos estímulos ambientais produz, nos explosivos, respostas de súbita
violência e incontida agressividade, podendo cometer homicídio e lesões
corporais. Normalmente chamamos estas pessoas de pavio-curto.
Sustenta sobre este assunto Genival Veloso de França:
Predomina neles uma irritabilidade excessiva do humor e da afetividade, seguida de tensões motoras, violentas. Diferenciam-se dos hipertímicos e dos histéricos. Nestes, a irritabilidade mostra-se apenas como tipo de conduta, sem descargas. Os histéricos são de alta periculosidade, substancialmente quando no clímax da irritação ou da descarga motora, chegando aos crimes passionais. Muitas dessas manifestações explosivas surgem apenas na embriaguez. São instáveis no matrimônio e inadequados na educação dos filhos.127
Também pode-se chamar esse psicopata de explosivo, que
conforme esclarece Delton Croce “são chamados epileptóides em outras
classificações, afirmando Di Túlio trata-se de formas frustradas, não convulsivas,
da epilepsia”. 128
3.3.2.5 Psicopatas de instintividade débil
127 FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A, 1977.p.401 128 CROSE, Delton & JUNIOR, Delton Crose. Manual de medicina legal. 5.ed.rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004. p.646.
64
Também chamados de psicopatas anancásticos, se faz
oportuno mencionar, a título de esclarecimento, que há, neste Transtorno de
Personalidade, um padrão generalizado de perfeccionismo e inflexibilidade.
Em pesquisa realizada em sítio, se obtêm o seguinte:
Características de obsessão rigidamente voltadas para a perfeição, somadas ao medo de que algo pode não estar perfeito fazem com que estas pessoas tenham muita dificuldade para terminarem aquilo que começaram. Não importa quão boa esteja a realização em pauta mas sim a obsessiva impressão de que algo esteja faltando, algo não esteja correto ou imperfeito. Os obsessivos têm dificuldade em expressar sentimentos de ternura, compaixão e compreensão aos sentimentos e comportamentos dos outros. Quando eles se dão ao luxo do lazer e recreação, fazem isso com tanto planejamento e meticulosidade a ponto de sacrificarem o próprio prazer em benefício das regras e normas para que tenham prazer.129
No mesmo diapasão, ponderou Genival Veloso de França:
Estão marcados pela falta de iniciativa, prevalecendo uma abolia de conduta. Iniciam eles uma atividade e logo abandonam. Por vezes, são pessoas de inteligência apreciável, mas não se fixam numa coisa só, abandonando-a e começando novamente. Esse tipo de psicopata é frívolo, ligeiro e inquieto, não sabe o que quer. É superficial e intransigente. Pertence à vagabundagem, ao alcoolismo, aos tóxicos, à mendicidade e ao homossexualismo.130
Destarte, podemos analisar que este tipo de psicopatia
causa um intenso sofrimento ao indivíduo que a possui, pois tem seu
temperamento descontrolado, e dificuldade de compreender seus sentimentos.
3.3.2.6 Psicopatas sem sentimentos ou anormais
Conhecidos também por terem semelhanças com os
“delinqüentes por tendência”, devemos atribuir ao psicopata sem sentimento uma
grande ênfase em virtude da sua anormalidade.
129 Ballone GJ - Transtornos da Personalidade, PsiqWeb, internet, disponível em www.psiqweb.med.br, acessado em 25 de setembro de 2007. 130 FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A, 1977.p.401
65
Sobre isso, João Alfredo Medeiros Vieira assevera de forma
de forma detalhada:
Os insensíveis são indivíduos destituídos ou quase destituídos de compaixão, vergonha, sentimento de honra e arrependimento. “São freqüentemente indivíduos sóbrios introspectivos, rabugentos; nas suas ações mostram-se impulsivos, brutais e cruéis.131
Genival Veloso de França destaca:
Myra y Lopez denomina-os psicopatas perversos. Sua característica maior é impossibilidade de experimentar sentimentos de afeto, simpatia ou valorização de demais pessoas. São capazes de todas as ações anti-sociais: roubo, furto, fraude, estelionato, adultério, prostituição, escândalos públicos e homicídio. Não conhecem a bondade, a piedade, a vergonha, a misericórdia e a honra. Desde infância, demonstram anormalidades pelas manifestações de crueldade, mitomania, precocidade sexual e delinqüência. Seus crimes são desumanos, frios, impulsivos, bestiais. Não admitem ser fiscalizados. Realizam atos movidos pelas suas paixões, pelo domínio dos componentes instintivos de sua personalidade. Praticam o mal por necessidade mórbida. Sentem sua falta como o faminto o alimento, e, só assim, se acham equilibrados e serenos, recebendo tranqüilos e eufóricos a conseqüência dos seus efeitos. Todas as medidas de reeducação e de recuperação têm-se mostrado inúteis e os confinamentos carcerários vêm acelerando e requintando suas técnicas amorais e delituosas.132
É de suma importância analisarmos esta frase para maior
compreensão do perigo deste psicopata: “não se deve esquecer a existência de
insensíveis inteiramente sociáveis, natureza de aço, os quais são capazes de
marchar sobre cadáveres”.133
3.3.2.7 Psicopatas carentes de afeto
Não é novidade que dentre todos os psicopatas a ausência
de afeto, cuidado e carinho foram extremamente ceifados de sua vida, no entanto,
131 VIEIRA, João Alfredo Medeiros. Noções de Criminologia.São Paulo: LEDIX, 1997. p.186. 132 FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A, 1977.p.401 133 VIEIRA, João Alfredo Medeiros. Noções de Criminologia.São Paulo: LEDIX, 1997. p.186.
66
neste “tipo” de psicopata, podemos vislumbrar claras declarações de que esta
carência é de suma relevância, senão vejamos:
O registro fundamental desses anormais é revelar “mais do que são”. Fazem o grupo dos petulantes, fanfarrões, exagerados, histriônicos, hiperemotivos, exibicionistas e presunçosos, com extrema labilidade afetiva, teatrabilidade e exaltação. Tendem à mitomania e chegam a acreditar em suas próprias mentiras. São egocêntricos, de afetividade superficial e indiferente às outras pessoas.134
Insta esclarecer que o carinho materno e, depois o afeto dos
que nos rodeiam, são os estímulos mais eficazes para levar a criança ao amor
objetivo, caminho indispensável da socialização futura.
João Alfredo Medeiros Vieira diz que na falta desses
sentimentos, “a evolução psíquica pode ficar gravemente bloqueada, pois não se
formará nenhum vínculo socializador entre a criança e aqueles que o cercam”.135
Portanto, tornam-se esses indivíduos futuramente, seres
associais e “escravos” do princípio do prazer.
3.3.2.8 Psicopatas fanáticos
A característica essencial deste psicopata é uma tendência
global e injustificável para interpretar as ações das pessoas como
deliberadamente humilhantes ou ameaçadoras. Comenta Delton Croce e Delton
Croce Júnior:
Indivíduos dominados pelo elemento expansivo e criativo que, por certos aspectos, se aproximam da personalidade do paranóico. Caracterizam-se pela extrema importância que, às vezes, concedem a uma idéia filosófica, ou religiosa, ou política, ou esportiva, passando a defende-la com parcialidade, sem nenhum espírito de justiça, vigorosa e até violentamente, até tornarem-se sectários da mesma. São altamente periculosos quando assumem a liderança popular nos períodos de instabilidade político-social. Ao lado desses tipos combativos e eréticos, há pacíficos, que se
134 FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A, 1977.p.401 135 VIEIRA, João Alfredo Medeiros. Noções de Criminologia.São Paulo: LEDIX, 1997. p.89.
67
comportam como sectários extravagantes, vivendo um mundo irreal de fantasia.136
No entanto, supervalorizam sua própria importância, as suas
idéias são as únicas corretas e seus pontos de vistas não devem ser contestadas,
daí a facilidade em conquistar inimigos e a tendência em pensamentos auto-
referentes.
Enfatiza Genival Veloso de França:
São obcecados, expansivos, apaixonados e se expressam através de um misticismo ou de um conceito filosófico ou político. Sua alta periculosidade está em poder assumir liderança de grupos ou massas humanas em épocas de instabilidade político-social, mesmo sendo eles intelectualmente limitados e de idéias confusas. Jamais se colocam de maneira imparcial perante os fatos, tomam partido, exalando-se em torno de temas estranhos e insignificantes.137
Podemos concluir que este tipo de psicopata pelo
entusiasmo com que valoriza suas idéias, sempre as únicas corretas, podem ser
vistos como fanáticos nas várias áreas do pensamento; seja religioso, político,
ético ou profissional. Gostam de fantasiar mas tem dificuldades em distinguir a
fantasia da realidade.
3.3.2.9 Psicopatas inseguros de si mesmo
Conhecidos também por psicopatas abúlicos, entende-se,
que possuem a diminuição e a total incapacidade do potencial volitivo. Esse
enfraquecimento da vontade pode ocorrer, fugazmente em indivíduos normais,
em estados de fadiga ou em conseqüência de trauma emocional intenso.
São facilmente influenciáveis, absorvendo os bons e os
maus exemplos de seu meio. Como narra Genival Veloso de França:
Falta de confiança em si próprios, sentimentos de inferioridade, sensitivos e auto-referentes. São pessimistas, considerando-se
136 CROSE, Delton & JUNIOR, Delton Crose. Manual de medicina legal. 5.ed.rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004. p.646. 137 FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A, 1977.p.401
68
descuidados para uma ou outra coisa ou se responsabilizam por alguma omissão. Levados pela opinião alheia, sofrem do “delírio sensitivo de auto-referência”, chamado assim por Krestchner. São quase sempre honestos, escrupulosos e tendem a idéias obsessivas e a certas fobias. Sua repercussão médico-legal é muito discreta.138
O tipo mais característico de debilidade volitiva é encontrado
na depressão, na qual a vontade está inibida em todo o período de duração do
acesso. Em estados depressivos a abulia é duradoura, onde surge junto com a
baixa volição as típicas dificuldade de decisão.
3.3.2.10 Psicopatas astênicos
Nesta passagem, analisa-se os psicopatas astênicos, que,
conforme o ensinamento de João Alfredo Medeiros Vieira, assim aduz:
Os psicopatas astênicos estão compreendidos em três sub-grupos: astênicos sensitivos, astênicos com sentimento de incapacidade e astênicos com sentimento facilmente sujeitos a perturbações de suas funções orgânicas.139
Kurt Schneider ressalta a possível combinação de traços de
tipos diferentes e a possibilidade de surgirem tais sintomas em indivíduos
providos de personalidade normal.
O doutrinador Genival Veloso de França relata:
Sua característica mais visível é a fadigabilidade fácil, timidez, introversão, insegurança, sentimento de inferioridade, tendência à depressão, ao suicídio, ao alcoolismo e aos tóxicos. Há rápido esgotamento dos seus ciclos de atividade psíquica. São confundidos com os hipocondríacos e sofrem influência de outros, podendo agir por indução a determinados delitos.
Fazendo uma análise sintática acerca dos psicopatas
astênicos, observamos que são sensitivos, dominados pelos sentimentos de
incapacidade e de inferioridade.
138 FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A, 1977.p.401 139 VIEIRA, João Alfredo Medeiros. Noções de Criminologia.São Paulo: LEDIX, 1997. p.186.
69
3.4 Interface entre psiquiatria e lei: aspectos destacados
A seguir, serão destacados alguns aspectos relevantes no
que concerne a psiquiatria inserida na lei, será feita uma análise das funções da
pena, bem como do crime privilegiado por violenta emoção.
3.4.1 Psicopatias e as funções da pena
No que concerne a função da pena, em sua essência, é
retributiva. Tanto assim que a pena é proporcional ao mal praticado. Crime mais
grave, sanção maior. Conforme Flávio Augusto Monteiro de Barros140: “Para a
teoria retributiva basta que o injusto e a culpabilidade sejam retribuídos, justa,
eqüitativa e proporcionalmente e que o delinqüente expie o seu delito”.
Neste norte, o ideal seria que a pena, ao ser aplicada,
regenerasse o condenado, exercendo uma função emendativa sobre ele. A
grande função da pena é aquela de natureza intimidativa. Como, entretanto, a
ameaça abstrata da pena irá atingir os psicopatas, ora inimputáveis, que não
estão ao alcance da pena?
De acordo com os ensinamentos doutrinários, não há
ressocialização de um agente com transtornos mentais. Quando da elaboração do
Código Penal de 1940, estabeleceu-se uma ficção normativa, os psicopatas não
têm a capacidade para entender o caráter criminoso do fato. Ou, então, se
dispusessem dessa capacidade de entendimento, não teriam condições de se
determinar de acordo com esse entendimento, contendo e reprimindo o impulso
criminológico, mais forte que o agente.
Portanto, a função da pena não atinge o seu objetivo final,
pois não há compensação de culpa, visto que os psicopatas não possuem
sentimento de culpa, compaixão, vergonha e arrependimento.
Como também, não atinge a função preventiva, haja vista
que não há como prever um delito de alguém que possui transtornos mentais.
140 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral.v 1. São Paulo: Saraiva,1999.p.53.
70
Seguindo os ensinamentos de Flávio Augusto Monteiro de
Barros141:
Para a defesa social, a idéia de correção do indivíduo está ligada às idéias de enfermidade e periculosidade – ao membro da sociedade que representa perigo deve ser imposta um uma medida de segurança de tratamento com fins corretivos ou curativos.
Destarte, conforme o ensinamento supra mencionado, a
medida de segurança deve ser dirigida ao agente que possui enfermidade mental
e que represente perigo à sociedade.
3.4.2 Psicopatia e os crimes privilegiados por violenta emoção
Insta esclarecer também acerca do crime privilegiado por
violenta emoção. A psiquiatria forense pode se deparar com sérias dificuldades,
no que diz respeito à fiel interpretação daquilo que seria essa tal de "Violenta
Emoção".
Corrobora com o entendimento da violenta emoção, Nélson
Hungria142:
No texto do § 1.º do art. 121, onde está escrito “emoção”, pode ler-se “cólera” ou “ira”, pois esta é a emoção específica que em nós se produz quando sofremos ou assistimos uma injustiça. Emoção estênica ou reacionária, por excelência, a ira, se não é contida a tempo, pode conduzir aos maiores desatinos. Os antigos chamavam-na furor brevis. Sêneca assim descrevia o homem em estado colérico: “Como o louco furioso se revela pela face audaciosa e minaz, a fonte sombria, o aspecto terrível, o andar precipitado, as mãos que se crispam, a cor alterada, a respiração ofegante e entrecortada, também assim se apresenta o homem encolerizado. Seus olhos flamejam e faíscam; todo o seu rosto se enrubesce com sangue que ferve sobre o seu coração; seus lábios tremem, seus dentes se comprimem; seus cabelos se eriçam; sua respiração é opressa e sibilante; chega-se a ouvir o estalido de suas articulações que se torcem; geme e ruge
141 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral.v 1. São Paulo: Saraiva,1999.p.57. 142 HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. V. 5. 2 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1953.p.144.
71
surdamente; sua palavra é gaguejante; suas mãos se castigam mutuamente, a cada instante; seus pés percutem o chão; todo o seu corpo está abalado, e grave ameaça se estampa na sua terrífica figura”.
Cezar Roberto Bitencourt143 explicita acerca da intensidade
da emoção:
A intensidade da emoção deve ser de tal ordem que o sujeito seja dominado por ela, ou seja, o sujeito deve agir sob o ímpeto do choque emocional. Sob o domínio de violenta emoção significa agir sob o choque emocional próprio de quem é absorvido por um estado de ânimo caracterizado por extrema excitação sensorial e afetiva, que subjuga o sistema nervoso do indivíduo.
Destaca-se que devemos distinguir o psicopata dos agentes
digamos, “normais”, a fim de não atribuir a periculosidade de um a outro. Vejamos
então o que enuncia Ivair Nogueira Itagiba144 acerca das diferenças:
Cada ser humano, composto de células, tecidos, órgãos, líquidos e consciência, possui caracteres orgânicos e mentais diversos, segundo a origem, o modo de vida, a educação, o clima, o regime alimentar, a disciplina fisiológica e moral. Considerá-los num só nível, vê-los por um si prisma seria desatender à realidade. O Cosmorama das sociedades descerra-nos a vida nas suas paixões e misérias, fraquezas e hipocrisias, prepotências e invejas, ambições e indignidades, impulsos e caprichos, crimes e injustiças.
Acrescenta também:
O ser humano deve ser encarado objetiva e subjetivamente, através de sua força física e moral. Perquiri-se a atividade psicofísica do homem, para a fixação da punibilidade, ou a declaração da inimputabilidade. Verificado um fato delituoso, a figura central, que é seu autor, precisa ser estudada nos elementos integradores – psíquico e somático. Não basta analisar um desses elementos com desprezo do outro. Há indubitável interdependência da manifestação psíquica com a função orgânica. Seria contradizer a certeza científica negar que o somantismo se alia ao psiquismo, para a formação do todo
143 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal. v.1.6 ed. São Paulo: Saraiva, 2000. P.395.
72
humano. Que o físico influi no moral e este naquele, eis uma verdade palpável, evidente e clara como a luz solar.145
Observa-se que para um indivíduo com transtornos mentais,
nada significa esta excitação sensorial, visto que, esta excitação experimentada
por agentes desprovidos de enfermidade mental, torna-se insuportável a ponto de
praticar o homicídio privilegiado, portanto, não se aplica aos psicopatas
No parágrafo 1º do artigo 121, do Código Penal as
circunstâncias especialíssimas minoram a sanção aplicável ao homicídio,
tornando-o um privilégio, não se confundindo com a atenuante genérica do artigo
65, III, c, última parte do Código Penal.
Está referido no Art. 65 do Código Penal Brasileiro como
atenuante da pena.
A citação do texto da lei que fala “influência de violenta
emoção, provocada”, permite deduzir que esta é uma ocorrência temporal, com
início claramente definido a partir de um determinado momento, e reativa, ou seja,
em reação a algo acontecido.
Não basta qualquer emoção para ser considerada Violenta
Emoção e atenuar o delito, conforme realça bem o Art. 28, inciso 1º, ao dizer que
"A emoção e paixão não excluem a responsabilidade penal(...)". Portanto, é
necessário que essa emoção tenha certas características para ser considerada
Violenta Emoção.
Violenta Emoção, do ponto de vista jurídico, é uma situação
atenuante de alguns delitos e caracterizada por um estado emocional, de ânimo e
do sentimento muito excitado. De acordo com os atenuantes do delito, diz o
Código Penal:
Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena": I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença; II - o desconhecimento da lei; III - ter o agente: a) cometido o crime por motivo de relevante valor
144 ITAGIBA, Ivair Nogueira. Do Homicídio.Rio de Janeiro: Revista Forense, 1945. p.176. 145 ITAGIBA, Ivair Nogueira. Do Homicídio.Rio de Janeiro: Revista Forense, 1945. p.178.
73
social ou moral; b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano; c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima; d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime; e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou.
A psiquiatra forense, ao avaliar a existência de uma Violenta
Emoção estará, nessas alturas dos acontecimentos, já diante de uma pessoa que
tenha cometido algum delito, com dolo ou culpa, e que tenha evocado essa figura
jurídica a ser ou não confirmada.
Pela lógica e pela psicopatologia, não se concebe uma
Violenta Emoção, capaz de arrebatar a pessoa para um delito, sem que tenha
havido juntamente um prejuízo temporário da consciência.
Portanto, para se pensar na possibilidade de Violenta
Emoção, está deverá ser caracterizada pela falta de racionalidade atrelada ao
crime e deve ser excluída diante da presença de um plano ou de uma ação bem
elaborada para o delito.
A Violenta Emoção poderia ser suspeitada, por exemplo,
pela falta de planejamento, pela falta de premeditação, pela falta de
intencionalidade certeira, pela falta de crueldade, de revanchismo, de vingança e
assim por diante.
Porém, se tratando de uma pessoa patologicamente
insensível (sociopata ou psicopata), raro será o homicídio em que o agente do
crime não se mostre excitado ou perturbado. Por via de regra, ninguém mata a
sangue frio.
Possivelmente alguma alteração de personalidade, já que
não dispõe de outro diagnóstico (senão constaria nos autos do processo). Aí
então seríamos inclinados a pensar que essa Violenta Emoção foi própria de um
Transtorno de Personalidade. Como os Transtornos de Personalidade têm um
74
prognóstico bastante sombrio em termos de mudanças, essa periculosidade
poderá ser considerada definitiva.
3.5 Imputabilidade e semi-imputabilidade dos psicopatas
A não imputabilidade ou a inimputabilidade, estaria presente
quando não se pode atribuir ao agente à culpa, neste caso, aos psicopatas.
Explica Damásio E. de Jesus que:
Não havendo a imputabilidade, primeiro elemento da culpabilidade, não há culpabilidade e, em conseqüência, não há pena. Assim, em caso de inimputabilidade, o agente que praticou o fato típico e antijurídico deve ser absolvido, aplicando-se medida de segurança.146
Normalmente essa situação diz respeito à pessoa que não
tem condições de discriminar a natureza ilícita da ação, não tem consciência
plena do que está fazendo ou não tem nenhum domínio sobre sua volição
(vontade). Os psicopatas são isentos de pena, porém, sofrem a medida de
segurança.
Entretanto, como supra mencionado, o agente que recebeu
a medida de segurança nunca poderá devolver à sociedade coisa alguma, porque
sua liberdade foi extirpada por tempo indeterminado, em função da pena
retributiva.
Também, a semi-imputabilidade não exclui a capacidade de entendimento, porém, constatada a redução na capacidade de compreensão ou vontade, poderá o juiz escolher reduzir a pena ou impor medida de segurança ao psicopata.
Desta forma, para uma pessoa portadora de Transtorno
Mental que comete algo ilícito, depois de constatada a condição mórbida de sua
sanidade psíquica por perícia psiquiátrica, não será possível atribuir-lhe a
culpabilidade.
146 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, v 1. p.499.
75
Assim sendo, diante de uma situação indicativa de possível
Transtorno Mental, compete exclusivamente a autoridade judicial a solicitação da
perícia.
Nessas circunstâncias, reconhece-se que essa pessoa não
possui a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com este entendimento, conseqüentemente, não pode ser rotulado como
criminoso.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como objetivo investigar, à luz da
legislação e da doutrina, os transtornos da personalidade e o estudo da
inimputabilidade, de acordo com os dispositivos legais.
O interesse pelo tema deu-se em razão de sua diversidade e
amplitude e importância; do modo como o tema vem sendo abordado no contexto
nacional e, em decorrência do grande número de infratores.
Para seu desenvolvimento lógico o trabalho foi dividido em
três capítulos.
No primeiro, abordou-se a evolução histórica do direito
penal, passando por fases marcantes até o período contemporâneo, pois a
evolução deu-se com extrema importância, haja vista, que se tornou necessário
um ordenamento coercitivo que garantisse a paz e a tranqüilidade para a
convivência harmoniosa nas sociedades, por conseqüência, a vida passou a ser
tutelada.
No segundo capítulo, procurou-se explicar o como funciona
a culpabilidade, a imputabilidade, a inimputabilidade, as sanções e as penas no
ordenamento jurídico brasileiro, de forma abrangente e elucidativa, para tanto,
pesquisou-se a respeito desse instituto jurídico no Direito Brasileiro. Verificou-se
que a Pena no Direito Brasileiro tem como funções a busca pela justiça, o respeito
ao indivíduo a intimidação dos infratores.
Ainda, fez-se um estudo mais aprofundado sobre as
doenças metais, do desenvolvimento mental incompleto e em especial da medida
de segurança.
No terceiro e último capítulo, intensificou-se a pesquisa
sobre o estudo da psiquiatria forense, dando ênfase nos transtornos da
personalidade, bem delineados nos tipos de psicopatas, demonstrando as
inovações trazidas, pelas doutrinas. Comprovou-se que não há como ressocializar
77
um agente possuidor de psicopatia, visto que, uma vez psicopata, sempre
psicopata, uníssonos são os entendimentos doutrinários.
Desse modo constata-se que as penas têm caráter
retributivo-preventivo e se baseiam na culpabilidade, enquanto que as medidas de
segurança têm natureza preventiva e encontram fundamento na periculosidade do
sujeito. Contudo, a finalidade da pena é a retribuição, o agente que recebeu a
medida de segurança nunca poderá devolver à sociedade coisa alguma, porque
sua liberdade foi extirpada por tempo indeterminado.
No mais, retomam-se as hipóteses levantadas e que
impulsionaram a presente pesquisa:
a) Os psicopatas são considerados inimputáveis, haja vista seu estágio mental para a prática de delitos.
b) Como os psicopatas são julgados diferentemente dos delinqüentes comuns, é certo afirmar que não há como reabilitá-los.
c) Sim, a psiquiatria é um dos institutos utilizados para o tratamento dos psicopatas.
Como principais resultados da pesquisa, pode-se ressaltar
que as hipóteses básicas que nortearam o presente trabalho restaram,
integralmente, confirmadas, já que os psicopatas devidamente diagnosticados são
inimputáveis, conseqüentemente e que estão sujeitos à medida de segurança e
de forma alguma há ressocialização.
Por fim, fica o registro de que o presente trabalho não tem
caráter exaustivo, isto é, com o mesmo não se teve a pretensão de tratar de todas
as questões que norteiam os transtornos da personalidade, razão pela qual deve
servir apenas de ponto de partida para o necessário e contínuo acompanhamento
da evolução de entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca desta tão
relevante matéria do Direito Penal.
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS
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Saraiva,1999.
BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do
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BITENCOURT, Cézar Roberto. Manual de direito penal. v.1.6 ed. São Paulo:
Saraiva, 2000.
BRASIL.Código Penal Brasileiro: Decreto –Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de
1940. 10. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2004.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de
outubro de 1988. 35.ed.atual e ampl. São Paulo: Saraiva, 2005.
BRASIL. Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e
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81
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ANEXOS
A polícia precisou de 14 anos para resolver os misteriosos
assassinatos que o último maníaco da Rússia tramava em sua cabeça enferma.
Quando policiais invadiram o apartamento deteriorado em que Alexander
Pichushkin vivia com a mãe, em Moscou, no ano passado, as coisas logo se
tornaram claras. A polícia encontrou um tabuleiro de xadrez no qual Pichushkin,
33 anos, havia inscrito um número para cada vítima.
Esta semana, teve início o julgamento no qual ele é acusado
de 49 assassinatos, ainda que o total que lhe é atribuído seja de 62. Ao que
parece, o último maníaco da Rússia tinha dois objetivos. O primeiro era tirar a
vida de 64 pessoas, tantas quanto as casas de um tabuleiro de xadrez, como ele
mesmo disse. O segundo era competir com o assassino serial mais famoso do
país, Andrei Chikatilo, que em 12 anos matou 52 crianças e mulheres jovens.
A polícia presume que Pichushkin tenha matado a maioria
de suas vítimas com golpes de martelo ou garrafas de vodca contra a cabeça.
Esta última técnica foi utilizada contra os moradores de rua que ele atraía ao
parque Bittsa sob o pretexto de lhes oferecer um trago. "Para mim, uma vida sem
assassinato é como uma vida sem comida", ele declarou em confissão diante de
câmeras de TV.
"Sinto-me como um pai para essas pessoas, pois fui eu
quem lhes abriu as portas para o outro mundo". Na saída do primeiro dia de
julgamento, segunda-feira, os jornalistas perguntaram por que ele havia cometido
os crimes, e a resposta foi lacônica, sem emoção; "Era assim que eu me sentia".
Pichushkin não foi capaz de concluir seu plano macabro
porque a última de suas vítimas intuiu a cilada. O assassinato do tabuleiro
trabalhava como vendedor em uma loja de alimentos, e um dia convidou uma
colega de trabalho para um passeio no parque. Foi em 5 de junho de 2006. Ela
deixou um bilhete ao filho explicando aonde pretendia ir, e em companhia de
quem. A polícia encontrou o papel e, 10 dias mais tarde, deteve Pichushkin.
83
Ainda que inicialmente ele negasse os indícios, terminou
confessando depois que policiais mostraram uma gravação de câmeras de
segurança do metrô que o mostrava em companhia da mais recente vítima.
Alexander Pichushkin não parece humano, e sim um maníaco de cinema. Não lhe
custou muito começar a revelar todos os seus crimes, e até vangloriar-se deles.
Em 2005, quando a cidade viveu um pânico devido às suas numerosas ações, a
polícia deteve um homem erroneamente.
Pichushkin assassinou duas pessoas na mesma semana,
para demonstrar que não haviam conseguido detê-lo. Acompanhava com atenção
o que a imprensa publicava sobre seus crimes, e se irritava muito quando
detalhes que considerava essenciais estavam ausentes dos relatos. De acordo
com o suposto maníaco, seu truculento torneio de xadrez começou em 1992, com
o assassinato de um colega da escola onde estudava.
A polícia o interrogou, então, mas não foram movidas
acusações contra ele. Aquele foi exatamente o ano em que Chikatilo foi
condenado. Depois dessa primeira experiência, Pichushkin só voltou a atuar uma
década mais tarde. Em 2005 e 2006, seus ataques se tornaram mais freqüentes,
e talvez por isso tenha saído derrotado.
Tradução: Paulo Eduardo Migliacci ME - La Vanguardia 147
Serial killer diz que 1ª morte foi como 1º amor
O russo acusado do assassinato de 49 pessoas disse
hoje em Corte em Moscou para que mais onze vítimas fossem adicionadas
ao número. Alexander Pichushkin, 33 anos, ainda afirmou ao júri que a
primeira vez que estrangulou um homem foi como "se apaixonasse pela
primeira vez", segundo a Reuters.
"Uma primeira morte é como um primeiro amor. Você nunca
esquece", disse ele de sua jaula em Corte após explicar como começou a matar
aos 18 anos. Sua primeira vítima foi um colega. Pichushkin ficou conhecido como
147 http://noticias.terra.com.br/jornais/interna/0,,OI1833614-EI8253,00.html acessado em 09/10/2007
84
o "assassino do xadrez" ao dizer que queria completar um tabuleiro de xadrez
com suas vítimas.
Pichushkin contou que sugeriu ao seu colega de colégio que
eles matassem alguém, mas quando seu amigo se recusou, "eu enviei ele para o
céu". Após dizer isso, ele sorriu para o júri.
Redação Terra148
PM acha corpos de irmãos desaparecidos na mata
(25/09/2007)
Eles saíram de casa sábado para colher frutas em uma
chácara e não foram mais vistos. Os irmãos tinham 13 e 15 anos. Polícia
acredita que eles se perderam.
A polícia encontrou na manhã desta terça-feira (25) os
corpos dos irmãos Josenildo José de Oliveira, de 13 anos, e Francisco de Oliveira
Neto, de 14 anos, desaparecidos desde sábado (23).
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, baseada
em informações iniciais passadas pelas equipes que estão no local, os corpos,
localizados por volta das 11h30, estavam a aproximadamente 1 km do início das
buscas.
As equipes do Centro de Operações Especiais (COE) do 3º
Batalhão da Tropa de Choque da Polícia Militar retomaram na terça-feira (25) as
buscas pelos irmãos.
Eles estavam desaparecidos desde sábado em uma mata
perto da Serra da Cantareira, Zona Norte.
A polícia trabalhou na segunda-feira por 12 horas, inclusive
usando o helicóptero Águia, para encontrar os dois irmãos, que saíram de casa
no sábado (22) para colher frutas em uma chácara e não foram mais vistos.
148 http://noticias.terra.com.br/mundo/interna/0,,OI1976009-EI8142,00.html acessado em 09/10/2007
85
A hipótese mais provável, segundo os policiais, é de que os
adolescentes tenham se perdido ou sofrido um acidente. A possibilidade de que
os jovens tenham sido abordados por terceiros não está descartada.
Psiquiatra alertou que maníaco da Cantareira era um
psicopata149 ( 30/09/2007)
Diagnóstico foi feito quando Ademir Oliveira do Rosário
estava preso em Taubaté. "Eu disse que ele era perigoso", afirmou o médico.
O psiquiatra Charles Kiraly alertou para o fato de Ademir
Oliveira do Rosário, que ficou conhecido como o maníaco da Cantareira, ser
“tecnicamente um psicopata”. O diagnóstico foi feito quando Ademir esteve detido
na Casa de Custódia de Taubaté, a 130 km de São Paulo. Nesse presídio ficam
criminosos com doenças mentais.
Nos laudos feitos pelo psiquiatra, o primeiro a ter contato
com Ademir em Taubaté, havia uma certeza: o maníaco não poderia sair da
cadeia. “Têm juízes que levam em consideração muito o laudo. Tem juiz que não,
até porque a lei diz que o arbítrio do juiz não é permeado só pelo laudo, que é
acessório”, disse Charles Kiraly.
O alerta do psiquiatra, no entanto, não foi levado em conta
por quem tinha a responsabilidade de manter o preso sob vigilância. Para ficar
perto da família, Ademir foi transferido, em setembro de 2006, de Taubaté para o
Hospital Psiquiátrico de Franco da Rocha, na Grande São Paulo, mas com uma
condição, segundo o psiquiatra: continuar encarcerado.
“Dentro dos presídios, ele era tranqüilo. Fora, poderia se
transformar. Eu disse que ele era perigoso, que tinha periculosidade. A
possibilidade de ele reincidir era grande”, afirmou o psiquiatra.
Desinternação progressiva
149http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL139517-5605,00- zSIQUIATRA+ALERTOU+QUE+MANIACO+DA+CANTAREIRA+ERA+UM+PSICOPATA.html acesso em 09/10/2007.
86
Mesmo com todas as recomendações, em novembro do ano
passado Ademir conseguiu autorização da Justiça para passar os fins de semana
fora da cadeia. Para conceder a desinternação progressiva, um benefício que
existe em São Paulo há mais de 20 anos, a Justiça leva em conta também os
argumentos do Ministério Público (MP), do advogado e do médico do presidiário.
Graças ao benefício, Ademir podia ir para a casa da família,
na Serra da Cantareira. No meio da mata, atacava os adolescentes. Às segundas-
feiras, o maníaco voltava para o hospital, sem despertar suspeitas. Ao todo, ele
responderá por crime de atentado violento ao pudor de 19 jovens, além de ser o
assassino confesso dos irmãos Josenildo, de 13, e Francisco, de 15 anos.
Situação difícil
O Manicômio de Franco da Rocha, no entanto, não tem
médicos e técnicos suficientes para garantir que os internos que saem não voltem
a cometer novos crimes na ruas.
“Nós fizemos uma visita ao hospital e ele está numa situação
difícil. Não tem médico 24 horas, a equipe técnica não existe. Se tivesse uma
equipe completa, esse paciente tinha de ser analisado, teria de ser avaliado e
essa equipe é responsável por isso. Eu não o soltaria”, disse o psiquiatra Paulo
Sampaio, que já dirigiu a Casa de Custódia de Franco da Rocha, entre 1986 e
1992, e foi um dos criadores da desinternação progressiva.
Para Sampaio, no caso de Ademir, houve uma sucessão de
erros e omissões: “ele precisava de uma vigilância constante fora da cadeia.
Ademir sabe que pedofilia é um crime, mas não consegue se conter. Ele perdeu
os limites. Você tem que conter num limite, até para o bem dele e bem dos
outros”, completou.
Família pede justiça
A direção do hospital psiquiátrico e a juíza Regiane dos
Santos, que autorizou a saída do maníaco, não comentam o assunto. A
Corregedoria dos presídios promete investigar o programa de desinternação
progressiva.
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Para as famílias das vítimas, nada explica como um homem
tão perigoso estava fora da cadeia. “Eu peço justiça, porque meus filhos eram
muito bons. Eles não me davam trabalho. Eu quero justiça. Justiça”, brada Rita de
Cássia Oliveira, mãe dos jovens assassinados