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ALBERTO DUMONT PINTO FERREIRA Transporte Aquaviário: A intervenção do Estado Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia. Orientador: Profª Maria Leonor da Silva Teixeira. Rio de Janeiro 2015

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ALBERTO DUMONT PINTO FERREIRA

Transporte Aquaviário:

A intervenção do Estado

Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como

requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia.

Orientador: Profª Maria Leonor da Silva Teixeira.

Rio de Janeiro

2015

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C2015 ESG

Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA

SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitido a transcrição parcial de textos

do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a

referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos neste trabalho

são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG.

_________________________________

Alberto Dumont Pinto Ferreira

Engenheiro Naval

Biblioteca General Cordeiro de Farias

Ferreira, Alberto Dumont Pinto. Transporte Aquaviário: A intervenção do Estado / Engenheiro

Naval Alberto Dumont Pinto Ferreira. - Rio de Janeiro: RJ, 2015. 60 f.: il.

Orientador: Professora Maria Leonor da Silva Teixeira. Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao

Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), 2015.

1. Transportes. 2. Transporte aquaviário. 3. Marinha mercante.

I.Título.

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A Edgard e Helena.

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AGRADECIMENTOS

Aos meus professores de todas as épocas por terem sido responsáveis por

parte considerável da minha formação e do meu aprendizado.

Aos estagiários da Turma Destinos do Brasil pelo convívio harmonioso de

todas as horas.

Ao Corpo Permanente da ESG pelos ensinamentos e orientações que me

fizeram refletir, cada vez mais, sobre a importância de se estudar o Brasil com a

responsabilidade implícita de ter que melhorar.

A Silvana, minha esposa... por tudo.

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Brigam Espanha e Holanda

Pelos direitos do mar O mar é das gaivotas

Que nele sabem voar O mar é das gaivotas E de quem sabe navegar.

Brigam Espanha e Holanda Pelos direitos do mar

Brigam Espanha e Holanda Porque não sabem que o mar É de quem o sabe amar..

Leila Diniz

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RESUMO

Esta monografia aborda a ação do Estado na promoção da atividade do transporte

aquaviário, um serviço público fornecido por empresa pública ou por delegação à

iniciativa privada, nas suas cinco vertentes: longo curso, Cabotagem, Apoio

Marítimo, Apoio Portuário e navegação Interior, com ênfase nas duas primeiras.

Por meio de um roteiro histórico, revê-se a intervenção governamental ao longo dos

anos e, a seguir, é determinada a estrutura executiva da regulação do setor. A

atividade de transporte aquaviário é, então, caracterizada, bem como relatadas as

ordenações jurídicas nacional e internacional. Por fim, aborda-se a política atual

sobre a qual se tecem considerações e se propõem linhas de ação para o

aperfeiçoamento dessa política.

Palavras chave: Transportes. Transporte marítimo. Marinha mercante.

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ABSTRACT

This monograph deals with the role of the State in promoting activity of shipping, a

public service provided by public companies or by delegation to the private sector, in

its five areas: long-haul, Cabotage, Maritime Offshore Support, Port Support and

Inland navigation, with emphasis the first two.

Through a historical script, review whether government intervention over the years,

then, is determined the executive structure of the sector regulation. The maritime

transport activity is then characterized the national and international legal ordinances

and reported. Finally, it approaches the current policy on which to make comments

and propose courses of action for the improvement of this policy.

Keywords: Transport. Maritime transport. Shipping. Merchant marine.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1 Política Marítima Brasileira ............................................................ 06

FIGURA 2 Produção da Construção Naval ..................................................... 08

FIGURA 3 Fretes no Longo Curso ................................................................. 09

FIGURA 4 Estrutura do Estado ....................................................................... ... 15 FIGURA 5 Cargas Transportadas no Longo Curso ............................................ 17

FIGURA 6 Tráfego de Cargas – Acordos Bilaterais ........................................ ... 19

FIGURA 7 Evolução da Frota por Tipo de Navegação .................................... .. 24

FIGURA 8 Evolução da Idade Média da Frota ................................................ 26

FIGURA 9 Frota Brasileira por Tipo de Navio ................................................. 27

FIGURA 10 Evolução da Quantidade de EBN .................................................. 28

FIGURA 11 Estrutura do Estado – Setor de Navegação .......................... ............ 29

FIGURA 12 Déficit da Conta Transportes .......................................................... 41 FIGURA 13 Evolução na Quantidade de Afretamentos .................................... 45

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Idade Média da Frota ............................................................................25

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABEAM Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo

ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas

AFRMM Adicional de Frete para a Renovação da Marinha Mercante

AHTS Anchor Handling Tug Supply

ANTAQ Agência Nacional de Transportes Aquaviários

B/L Bill of Ladind

CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica

CBD Companhia Brasileira de Dragagem

CDFMM Conselho Diretor do Fundo de Marinha Mercante

CEMBRA Centro de Excelência para o Mar Brasileiro

CIF Cost, Insurance and Freight

CMM Comissão de Marinha Mercante

CONIT Conselho Nacioanl de Integração de Políticas de transportes

DOCENAVE Companhia de Navegação Vale do Rio Doce

EBN Empresa Brasileira de Navegação

FGCN Fundo de Garantia para a Construção Naval

FMM Fundo da Marinha Mercante

FOB Free on Board

FRONAPE Frota Nacional de Petroleiros

GATS Acordo Geral sobre Comércio de Serviços

GATT Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio

GEIPOT Empresa Brasileira de Planejamento dos Transportes

IMO International Maritime Organization

LESTA Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário

LH Line Handling

MERCOSUL Mercado Comum do Sul

NMF Nação Mais Favorecida

OMC Organização Mundial do Comércio

OTM Operador de Transporte Multimodal

PCN Plano de Construção Naval

P&I Protection and Indemnity

PSV Plataform Supply Vessel

PNLT Plano Nacional de Logística de Transporte

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REB Registro Especial Brasileiro

SDE Secretaria de Direito Econômico

SEAE Secretaria de Acompanhamento Econômico

SOLAS Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar (em inglês: Safety of Life at Sea - SOLAS)

SUNAMAM Superintendência Nacional da Marinha Mercante

SSTA Sistema de Segurança do Tráfego Aquaviário

SYNDARMA Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima

TEU Twenty-Foot Equivalent Unit

TRANSPETRO Petrobras Transporte S.A.

TRMM Taxa de Renovação da Marinha Mercante

UNCTAD Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO........................................................................................................ 11

2 METODOLOGIA E REFERENCIAL TEÓRICO................................................. 15

3 O TRANSPORTE AQUAVIÁRIO NOS ÚLTIMOS 60 ANOS .......................... 17

3.1 A SUNAMAM .......................................................................................................... 18

3.2 DÉCADA DE 1980: RECESSÃO NO MERCADO ............................................ 20

3.3 SÉCULO 21............................................................................................................. 21

3.4 SITUAÇÃO ATUAL ................................................................................................ 25

4 TRANSPORTE AQUAVIÁRIO ............................................................................. 26

4.1 A ESTRUTURA EXECUTIVA DA REGULAÇÃO DO SETOR........................ 27

4.2 CARACTERIZAÇÃO DA ATIVIDADE DE TRANSPORTE AQUAVIÁRIO.... 28

4.2.1 NAVEGAÇÃO DE LONGO CURSO ................................................................... 29

4.2.2 NAVEGAÇÃO DE CABOTAGEM ........................................................................ 32

4.2.3 NAVEGAÇÃO DE APOIO PORTUÁRIO ............................................................ 33

4.2.4 NAVEGAÇÃO DE APOIO MARÍTIMO................................................................ 34

4.2.5 NAVEGAÇÃO INTERIOR ..................................................................................... 35

4.2.6 A FROTA MERCANTE BRASILEIRA ................................................................. 36

4.2.7 A SITUAÇÃO ATUAL ............................................................................................ 40

5 A ORDENAÇÃO JURÍDICA ................................................................................. 42

5.1 A ORDENAÇÃO JURÍDICA NACIONAL ............................................................ 42

5.1.1 A REGULAÇÃO DO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO NO BRASIL.................. 43

5.1.2 O TRANSPORTE COMO SERVIÇO PÚBLICO................................................ 45

5.2 A ORDENAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL ................................................ 46

6 A POLÍTICA ATUAL............................................................................................... 47

7. ANÁLISE FINAL E CONCLUSÕES .................................................................... 51

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 61

APÊNDICE A - A formação de uma Nação Marítima: de 1500 à primeira metade do

século XX ............................................................................................................................... 63

APÊNDICE B - Características da navegação de longo curso ..................................... 71

APÊNDICE C - Características da navegação de Cabotagem ..................................... 76

APÊNDICE D – As diversas organizações envolvidas na regulação do transporte

aquaviário ............................................................................................................................... 80

APÊNDICE E - A ordenação jurídica nacional ................................................................. 99

APÊNDICE F – A ordenação jurídica Internacional ...................................................... 120

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1 INTRODUÇÃO

O Brasil é uma nação marítima, com uma enorme fronteira oceânica e um

território continental permeado de rios e lagos navegáveis, utilizados por uma ampla

gama de negócios e lazer, tais como turismo, pesca, exploração mineral, esportes

náuticos, o emprego militar e o transporte aquaviário.

O transporte aquaviário é serviço público e, portanto, cabe ao estado

promovê-lo por meio de empresa pública ou por delegação à iniciativa privada.

Apenas no âmbito Federal, são cerca de 400 empresas brasileiras de navegação,

meia centena de portos públicos e mais de cem terminais privativos. O Brasil possui

7.400 km de litoral e 22.000 km de hidrovias interiores que alcançam todo seu

imenso território.

O tema tem grande relevância para o desenvolvimento nacional brasileiro e

manutenção de sua soberania. É um importante elo da cadeia logística e garante o

exercício do direito de ir e vir da população nas vastas regiões do país.

O PIB brasileiro de 2015 foi de R$ 5,2 trilhões. A maior parte de toda essa

riqueza em algum momento se serviu do transporte aquaviário.

Subdivide-se o transporte aquaviário em cinco tipos de navegação (Lei nº

9.432/97): Longo Curso, Cabotagem, Apoio Portuário, Apoio Marítimo e Interior,

sobre as quais pode-se tecer as seguintes considerações iniciais:

a) Navegação de Longo Curso:

É a utilizada no transporte marítimo internacional. A corrente comercial

brasileira em 2014 foi de cerca de US$ 450 bilhões e cerca de 95% deste

valor (ou seja, mais de um quarto do PIB) foi movimentado por via marítima,

correspondendo a 714 milhões de toneladas transportadas na navegação de

longo curso.

Estima-se que o mercado de fretes no longo curso é de mais de US$ 13

bilhões/ano (apenas a Petrobras gasta quase metade desse valor) sendo

que a frota brasileira de longo curso praticamente inexiste. A conta serviços

do balanço de pagamentos, onde se contabiliza a despesa com fretes,

registra gastos superiores a US$ 20 bilhões anuais.

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Todos os anos, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ)

expede milhares de autorizações, registros ou liberação de transporte em

navios de bandeira estrangeira para suprir o excesso de demanda por

transporte de cargas restrito a embarcações de bandeira brasileira mas que

não pode ser atendido pela frota atual.

Há um efetivo mercado a explorar no mercado internacional de transporte de

cargas, que onera o Balanço de pagamentos brasileiro, enviando bilhões de

dólares para o exterior.

b) Navegação de Cabotagem

É a utilizada no transporte de cargas ao longo da costa. A participação da

cabotagem no total da produção de transportes no Brasil em 2014 (cerca de

211 milhões de toneladas) foi de apenas 8%, enquanto que o modal

rodoviário, por décadas priorizado no país, respondeu por 52%, o que

representa um enorme potencial de crescimento a explorar.

O transporte na Cabotagem é reservado a empresas brasileiras,

empregando navios de bandeira brasileira, de modo que, parte considerável

do que é transportado está associado à navegação de Longo Curso,

atendendo portos concentradores de carga de exportação/importação.

c) Navegação de Apoio Portuário

É o segmento da navegação que apresenta maior estabilidade. A atividade

de apoio nos portos é proporcional ao movimento de cabotagem e de longo

curso. Muito embora apresente uma concorrência acirrada no setor, o perfil

das empresas de navegação nesse segmento é de investimento constante,

de modo que o número de empresas dobra a cada cinco anos, perfazendo,

atualmente mais de 260.

d) Navegação de Apoio Marítimo

A navegação de apoio marítimo é fruto da exploração de petróleo na

plataforma continental, que está em franco crescimento.

A disponibilidade de embarcações de bandeira brasileira para operar no

segmento é insuficiente e o mercado é suprido, também, com embarcações

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estrangeiras afretadas, que estão sendo substituídas à medida que os

estaleiros nacionais concluem novas construções. Hoje, há 147 empresas

brasileiras de navegação operando no apoio marítimo (48 em 2005 e, em

2011, 109).

e) Navegação Interior

A navegação interior, em contraste com as outras modalidades de

navegação, difere consideravelmente de região para região do país, tanto

social quanto economicamente. Na bacia amazônica, a navegação é o

principal meio de transporte regional, tanto econômica quando socialmente,

carregando todo o tipo de carga e servindo de importante meio de transporte

de passageiros, em especial no rio Amazonas e seus afluentes. O tráfego de

cargas da zona franca de Manaus é de grande importância para a região

mas também para o país. Através da hidrovia do rio Madeira há um

significativo tráfego de escoamento da produção agrícola do norte do Mato

Grosso e nas hidrovias do Tocantins e do Solimões há um considerável

escoamento de minérios.

Apesar da diversidade do mercado e dos fatores regionais, há uma

expectativa de crescimento do transporte de granéis para o escoamento das

safras; na Amazônia onde esforços estão sendo feitos para a substituição

das embarcações de madeira construídas de forma artesanal por outras

mais seguras.

A hidrovia Tietê-Paraná está com um considerável crescimento no segmento

de cargas agrícolas e transporte de metanol, e na hidrovia de Paraguai

transporta-se mais e 20 milhões de toneladas de minério anualmente.

A proposta deste trabalho é de identificar como, porque e qual a atuação do

Estado na regulação do setor de transporte aquaviário. Também pretende-se

demonstrar que o Brasil é, essencialmente, uma nação marítima, considerando que

o País nasceu do mar, expandiu suas fronteiras a partir do mar, garantiu sua

integridade territorial pelo mar, transita suas riquezas através do mar e produz

considerável parte de sua energia do mar. Nesse sentido, tece-se considerações

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sobre os cinco segmentos da navegação; no entanto é dada ênfase à navegação

marítima (Longo Curso e Cabotagem), de maior expressão econômica.

Para tal, foi necessário descrever a política do País para a navegação

marítima e os agentes envolvidos no planejamento e execução dessa política,

analisar os efeitos da política implementada e, por fim, propor ações para melhoria

na ação política para o setor.

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2 METODOLOGIA E REFERENCIAL TEÓRICO

A discussão dá-se no plano da análise de políticas públicas; o marco teórico

é a Lei nº 10.233/01, que dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e

terrestre.

A pesquisa iniciou-se pela coleta de dados estatísticos sobre o transporte

aquaviário do Brasil nos últimos anos cuja melhor fonte foi a Agência Nacional de

Transportes Aquaviários – ANTAQ (2015).

Em passado recente, o transporte aquaviário passou por seu melhor período

nos anos 1970, sob a tutela do Estado por meio, principalmente, da SUNAMAM,

como bem demonstrado por SOUZA (1980) e CELIDÔNIO (1980). Após isso, nos

anos 1980 entrou em decadência e, após, ocorreu um período negro com a falência

de diversas empresas e a transferência do controle das sobreviventes para as mãos

de estrangeiros, como descrito no relatório da CEMBRA - Centro de Excelência para

o Mar Brasileiro (2014).

Na fase atual, o transporte aquaviário passa por um crescimento

significativo, alavancado pelo período de crescimento econômico da última década

mas muito dependente do escoamento das safras agrícolas e dos demais granéis

(petróleo e minerais), o que também é abordado pela CEMBRA (2014). Após ampla

desregulamentação nos anos 1990, surgiu novo arcabouço jurídico que suporta a

política que rege essa evolução na navegação, conforme reatado por CASTRO

JUNIOR (2014).

O transporte de bens no Longo Curso influencia fortemente o setor mas é

fragilizado por uma quase ausência de frota nacional. Um parâmetro que mostra

essa fragilização é o efeito negativo da atividade na conta serviços do Balanço de

Pagamentos, caracterizado por FADDA (1999) e CUNHA (2002).

Nesse trabalho, a partir de uma análise histórica e documental, pretende-se

desvendar a política, o arcabouço jurídico e a estrutura executiva que sustentam a

atividade de transporte aquaviário no País.

Por fim, analisar-se-á as consequências da política implementada, de

possível deficiência da legislação e da eficácia da estrutura executiva implantada

visando qualificar a atuação do governo da regulação do setor de transporte

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aquaviário e identificar propostas para melhoria dessa atuação junto ao setor em

lide.

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3 O TRANSPORTE AQUAVIÁRIO NOS ÚLTIMOS 60 ANOS

Por se tratar de uma nação essencialmente marítima, o Brasil sempre

dependeu de sua capacidade de transporte marítimo. Esse grau de compromisso

era (e é) tanto que o desenvolvimento do país andou, mais ou menos rápido, quanto

o setor de navegação evoluía, com maior ou menor sucesso dependendo da política

que era aplicava a cada momento. O Apêndice A relata os fatos mais relevantes

dessa trajetória até meados do século XX.

Existe o Estado regulador e o Estado desregulador. Os dois se alternam, ao

longo da história do país, conforme ciclos de crises sociais e econômicas, bem como

períodos de crescimento econômico e de estabilidade social. No passado recente,

quanto ao transporte aquaviário, o último grande ciclo iniciou-se com a estagnação

do mercado que o país viveu na década logo após a última Grande Guerra, quando

vivia-se um período desregulador.

O cenário, em 1957, era sombrio. Segundo a Comissão de Marinha

Mercante - CMM, o transporte no longo curso dependia exclusivamente de empresas

estatais (Lloyd Brasileiro e FRONAPE), enquanto que a idade média da frota

brasileira era de 40 anos.

O apoio e proteção governamental foram fundamentais para a implantação

de medidas de estímulo à navegação e à construção naval a partir do final da

década de 50. O Plano de Metas do governo Kubitschek vinculou esses dois setores

ao criar a taxa de renovação da Marinha Mercante e determinar a construção do

parque naval nacional.

O ponto de partida foi a criação do Fundo de Marinha Mercante (FMM)1,

destinado a prover recursos para a renovação, ampliação e recuperação da frota

mercante nacional, evitando a importação de embarcações e procurando diminuir as

despesas com afretamento de navios estrangeiros, que já então oneravam o balanço

de pagamentos do País, bem como assegurar a continuidade e regularidade das

encomendas à produção da indústria de construção naval e estimular a exportação

de embarcações.

1 Lei nº 3.381/58, conhecida como a Lei do Fundo de Marinha Mercante (FMM).

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Em 1967, tem início o governo Costa e Silva. Aproveitando o espaço criado

na administração anterior, em que a adoção de políticas de estabilização havia

conseguido reduzir o patamar inflacionário e disciplinar as despesas públicas para,

de uma forma geral, controlar os déficits das contas do governo, a nova equipe

passou a promover o crescimento econômico. O PIB brasileiro cresceu em média

10,5% entre os anos de 1968 e 1974 e 6,8% entre 1975 e 1980. É nesse quadro que

se deve analisar a instauração de políticas explícitas de desenvolvimento do setor

naval.

3.1 A SUNAMAM

O grande momento na política nacional, para a marinha mercante, foi a

criação, em 1969, da Superintendência Nacional da Marinha Mercante (SUNAMAM),

em substituição à CMM, através da qual o governo assumiu amplo controle do setor.

A SUNAMAM administrava o FMM e passou a exercer uma gestão quase tirânica,

baseada no tripé: proteção à navegação nacional, apoio aos armadores nacionais e

fomento à indústria da construção naval.

Figura 1 – Política Marítima Brasileira

Fonte: ANTAQ

A proteção do mercado à navegação nacional ocorreu com o

estabelecimento de acordos comerciais bilaterais para a divisão do transporte de

cargas conferenciadas entre as marinhas mercantes dos países signatários, na

proporção 40/40/202, e dividindo as cargas não-conferenciadas na proporção 50/503,

2 Resolução CMM nº 3.131/67.

3 Resolução CMM nº 2.995/67.

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assim como da reserva de mercado para a marinha mercante brasileira, que tinha

preferência no transporte das cargas de importação e de cargas de empresas

estatais ou ainda cargas financiadas com recursos públicos4. Como resultado dessa

política, observou-se a ampliação da participação dos navios com bandeira brasileira

(exportações e importações) de 34,6% em 1970 para 49,6% em 1980, maior

patamar alcançado no passado recente.

Já o apoio aos armadores nacionais se deu por meio do financiamento

subsidiado para a renovação e ampliação de suas frotas, da definição dos fretes e

da outorga das linhas a serem exploradas por cada empresa. Utilizando-se do poder

conferido por deter a gestão do FMM, promoveu a fusão de pequenas empresas de

navegação para formar outras maiores, capazes de participar do mercado de forma

mais agressiva e com ganhos de escala. Também determinava quais navios cada

empresa iria contratar junto aos estaleiros nacionais com recursos do FMM.

Quanto à construção naval, a SUNAMAM forneceu financiamento para a

implantação dos estaleiros, estabeleceu planos de construção de embarcações

garantindo uma demanda mínima de longo prazo, selecionou e determinou as séries

e tipo de navio que cada estaleiro deveria construir e estimulou a exportação

proporcionando a armadores estrangeiros financiamento da construção em

condições favoráveis de modo a garantir preços no nível dos praticados no mercado

internacional.

Com esse modelo de gestão, a SUNAMAM criou uma relação concreta entre

a marinha mercante, prestadora de serviços de transporte e de apoio, e construção

naval, produtora de bens industriais, grande geradora de empregos.

Ao longo da década de 1970, foram implementados dois grandes planos de

construção naval que atenderam tanto ao mercado interno quando ao de

exportação. O primeiro Plano de Construção Naval - PCN, orçado em US$ 1 bilhão,

envolveu a produção de cerca de 200 embarcações, enquanto o segundo (1975-

1979), com investimentos previstos de US$ 3,3 bilhões, esperava produzir o

significativo número de 765 navios.

Investidores japoneses, holandeses, alemães, ingleses trouxeram consigo

novas tecnologias e permitiram que brasileiros tivessem acesso aos modernos

4 Decretos-Lei nº 666 e 687/69.

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conceitos do setor. Grandes conglomerados e outros investiram alto em estaleiros -

Ishibras, Verolme, Emaq, Caneco, Mauá -, estabelecendo-se no Brasil.

Figura 2 – produção da Construção Naval

Fonte: UFRJ

O Gráfico mostra o grande aumento da produção naval a partir do início da

década de 1970 e o posterior desaquecimento da indústria. Em 1999, a produção da

construção naval encontrava-se em níveis próximos daqueles do final de década de

1960.

3.2 DÉCADA DE 1980: RECESSÃO NO MERCADO

Com o segundo choque do petróleo (1979), ocorre uma retração da

economia mundial e uma perda significativa de divisas no Brasil. Adotando uma

postura protecionista, o Governo estabeleceu uma política que agravou a situação

do setor5, propiciando a perda de competitividade da bandeira brasileira, redução da

participação no tráfego marítimo internacional e elevação do valor dos fretes, com

consequentes perdas no comércio exterior brasileiro. O ano de 1990 marca a

abertura do mercado de navegação, com a extinção das chamadas conferências de

fretes. Não havia mais espaço para o governo manter as medidas protecionistas. A

liberalização do transporte aquaviário de longo curso6 significou a exposição dos

armadores brasileiros à concorrência internacional.

5 Resolução SUNAMAM 8.364/84.

6 Portaria MT 07/91.

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Figura 3 – fretes no Longo Curso

Fonte: MT

Em pouco tempo, ficou claro que as desgastadas empresas domésticas não

tinham porte para enfrentar um mercado caracterizado pela presença de grandes

empresas de escala operacional mundial. Com isso, a maior parte das empresas

brasileiras de navegação, para sobreviver nesse mercado, adotou a participação de

sócios estrangeiros na sua composição.

3.3 SÉCULO 21

A virada do século trouxe um novo cenário. O transporte marítimo e,

principalmente, a construção naval entraram em recuperação. Os principais fatores

que determinaram essa nova conjuntura foram:

A. A ordenação do transporte aquaviário

Uma ampla legislação regulamenta a navegação, através de medidas tais

como:

a) Abertura do capital das empresas brasileiras de navegação a

investidores estrangeiros, sem qualquer restrição.

b) Prescrição de cargas a navios de bandeira brasileira no transporte

internacional provenientes de países que adotam mecanismos protecionistas para a

Marinha Mercante (reciprocidade).

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22

c) Navegação de cabotagem, de apoio portuário e marítimo restrita às

empresas brasileiras de navegação, com afretamento de embarcações estrangeiras

sujeito à prévia aprovação.

d) Liberação do afretamento de embarcações estrangeiras na navegação

internacional, com prévia aprovação apenas quando do transporte de cargas

prescritas à bandeira brasileira.

e) Criação de Registro Especial Brasileiro - REB (“segundo registro”) para

as embarcações de bandeira brasileira, com as seguintes vantagens:

Embarcações em construção de empresas brasileiras de navegação,

pré-registradas no REB, passam a contar com financiamento oficial

com as mesmas taxas de juros que são utilizadas na exportação.

Embarcações registradas no REB podem contratar cobertura de

seguro e resseguros de cascos, máquinas e responsabilidades civis no

exterior.

Receita dos fretes gerados em navios registrados no REB fica isenta

das contribuições do PIS e COFINS.

Isenção de contribuição para o Fundo de Desenvolvimento do

Ensino Profissional Marítimo.

Equiparação às operações de exportação na construção,

modernização, conservação e reparo de embarcações.

B. Abertura do mercado de exploração de petróleo7

A Lei do Petróleo abriu o mercado de produção e refino do hidrocarboneto a

novas empresas além da Petrobras, acelerando a expansão da exploração de

petróleo offshore, que já vinha sendo observada desde o princípio da década, pela

atenção dada internamente ao objetivo de equilibrar a conta petróleo. A crescente

demanda pela Petrobras cristalizou-se em maciça contratação dos serviços de

embarcações de apoio marítimo (especialmente PSV, AHTS e LH) no início dos

anos 2000, via licitações, originando, cada uma delas, encomendas nos estaleiros

nacionais.

Posteriormente, as descobertas de petróleo do pré-sal em 2006 e a

estabilidade de preços do mercado internacional do petróleo, em um patamar

7 Lei nº 9.478/97 “Lei do Petróleo”.

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23

superior a US$ 100 o barril, atraíram mais e mais capital estrangeiro e provocaram o

governo a estabelecer novas condições de exploração dessa nova fronteira. A

Petrobras foi instada a expandir sua atividade exploratória carregando consigo um

sem número de empresas e diversas instituições com correspondente crescimento

de investimento, incluído aí a navegação de apoio marítimo e a construção naval.

C. Os novos incentivos

O programa Navega Brasil, lançado pelo governo federal em novembro de

2000, trouxe modificações nas condições do crédito aos armadores e estaleiros. As

principais mudanças introduzidas envolvem o aumento da participação limite do

FMM nas operações da indústria naval de 85% para 90% do montante total a ser

aplicado nas obras e a dilatação do prazo máximo do empréstimo, de 15 para 20

anos.

O grande entrave era concretizar o mecanismo de garantia de execução por

parte dos estaleiros. Esse foi solucionado com a autorização da União a participar do

Fundo de Garantia para a Construção Naval (FGCN) 8, até o limite de R$ 5 bilhões.9

O mercado da construção naval encontrou um cenário muito propício para a

realização de investimentos nos estaleiros brasileiros, possibili tando a expansão da

indústria de navi-peças - máquinas, equipamentos e infraestrutura nos parques

industriais navais do País – mudando substancialmente o cenário prospectivo para o

setor.10

A publicação da Lei nº 8630/93, que dispõe sobre o regime jurídico da

exploração dos portos organizados e das instalações portuárias, possibilitou a

estabilidade necessária para que investimentos voltassem a ser realizados nos

8 Lei nº 11.786/2008.

9 Valor aumentado pela MP 462/2009.

10 Notícia, NetMarinha, 08/12/2009 - por Sérgio Barreto Motta Brasil terá mais seis estaleiros –

“Eufórico com a liberação de recursos pelo Governo Lula, o presidente do Sindicato da Construção Naval ( Sinaval), Ariovaldo Rocha, informa que, ainda este mês, possivelmente entre 14 e 18 de dezembro, será realizada a mais importante reunião da história do Fundo de Marinha Mercante

(FMM). Nela, deverão ser aprovados processos para construção de seis estaleiros, 23 navios da Transpetro e ainda diversos barcos de apoio, em valor aproximado de R$ 15 bilhões. Este ano, o Conselho Diretor do FMM não fez sequer uma reunião, pois seu caixa estava zerado. No entanto, o

presidente Lula acaba de aprovar R$ 15 bilhões para o FMM - o que irá garantir emprego para seus colegas metalúrgicos durante um bom tempo. Os novos estaleiros na bica, para serem aprovados, são: Eisa-Alagoas; Odebrecht-Bahia e OAS-Setal-Bahia; W. Torre-Rio Grande do Sul; Promar-Ceará

e ampliação do Corema-Bahia...”

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24

portos e terminais portuários. Após 20 anos, ela foi aperfeiçoada e substituída pela

Lei nº 12.815/13.

D. Aquecimento do mercado de exportação/importação

A corrente comercial (exportação mais importação), desde 2005, foi superior

a US$ 200 bilhões e manteve considerável crescimento (US$ 371 bilhões em 2008,

US$ 390 bilhões em 2010, US$ 450 bilhões em 2014), correspondendo a um

considerável crescimento no mercado de transporte marítimo, onde mais de 90%

dessa riqueza é transportado, no longo curso, na cabotagem e na navegação

interior, o que leva, também, a uma maior demanda de serviços de apoio portuário.

O aquecimento da economia, com a forte entrada da China como

importadora de minérios e alimentos, e o escoamento da safra agrícola do centro-

oeste e oeste paulista levou, também, a uma maior demanda na navegação interior.

E. Renovação da frota de petroleiros

Em 2010 a idade média da frota nacional de petroleiros era superior a 23

anos, para uma expectativa de vida de 25 anos. A isso se somou a entrada em vigor

da exigência de operação com navios de casco duplo. Assim, a PETROBRAS, por

meio da TRANSPETRO, contratou a construção de 24 novos navios petroleiros.

F. Crescimento da participação da bandeira brasileira na frota de

apoio marítimo

A participação da bandeira brasileira no mercado de apoio marítimo (serviço)

é inferior a 50% - e é restrito a empresas brasileiras de navegação. A PETROBRAS

licitou a construção de 24 novos navios de apoio marítimo. Anuncia que seu plano é

de obter 146 embarcações. Outras construções para Empresas Brasileiras de

Navegação (EBN) estão em andamento ou com financiamento pedido ao FMM.

G. O PNLT e a multimodalidade

O Plano Nacional de Logística de transporte – PNLT prevê investimentos em

uma janela temporal de 25 anos. Estimula a multimodalidade, projetando a

necessidade imediata de aumento da frota de cabotagem.

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25

H. Criação da Agência Nacional de Transportes Aquaviários

(ANTAQ)11

A instalação da ANTAQ, em 2002, trouxe maior confiança ao mercado para

a realização de investimentos nos setores de navegação e de terminais portuários,

por minimizar a interferência de interesses políticos e tratar de forma isônoma

as empresas.

3.4 SITUAÇÃO ATUAL

A conjuntura econômica favorável dos últimos quinze anos, caracterizada

pelo crescimento do PIB e incrementos proporcionais do Balanço de Pagamentos,

favoreceu a realização de investimentos na renovação e ampliação da frota

mercante e quase todas as modalidades de navegação.

A exceção está na navegação de longo curso, ainda dependente de

empresas estrangeiras, o que compromete a conta serviços que, em 2014, a parcela

referente a gastos com transportes atingiu o total de US$ 21,234 bilhões, dos quais

mais de 70% pagos ao exterior. Esses números são mera ilustração para o presente

trabalho, pois se referem a diversos tipos de serviços e não refletem,

necessariamente, todos os gastos com frete, uma vez que dependendo se a

operação foi realizada em base CIF ou FOB pode ter sido lançado no balanço de

pagamentos do país exportador ou do país importador.

11

Criada pela Lei nº 10.233/2001, A Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ é

entidade integrante da Administração Federal indireta, submetida ao regime autárquico especial, com personalidade jurídica de direito público, independência administrativa, autonomia financeira e funcional, mandato fixo de seus dirigentes, vinculada ao Ministério dos Transportes, com sede e foro

no Distrito Federal, podendo instalar unidades administrativas regionais.

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26

4 TRANSPORTE AQUAVIÁRIO

O transporte aquaviário é aquele realizado para a movimentação de cargas

e de passageiros por uma via navegável. Também se presta à execução de serviços

diversos, como rebocagem, apoio a outras embarcações e instalações em terra, bem

como o apoio a plataformas de petróleo. São operações de transporte e serviços de

apoio remunerados, que podem ser prestados em caráter nacional ou internacional,

e às empresas que prestam esses serviços chamamos de Marinha Mercante.

Marinha Mercante é um negócio do setor de transportes realizado com o

emprego de embarcações. O transporte aquaviário é um importante elo da cadeia

logística. Citando BRITO (2010), “logística é a administração de estoques em

movimento”.

A logística, no transporte aquaviário, é o conjunto de atividades necessárias

para levar uma carga (ou realizar um serviço) entre o ponto A e o ponto B, com

eficiência (qualidade, pontualidade). Assim, tem um custo considerável, agrega valor

significativo aos bens transportados sem agregar melhorias, diminuindo sua

atratividade ao mercado.

O transporte de pessoas e cargas é uma atividade vital para uma nação.

Sem ela não se preserva o direito de ir e vir, não se realizam as políticas sociais e

econômicas, não se promove o desenvolvimento. Por ser essencial, cabe ao estado

possibilitar sua existência. Assim, o transporte (em especial, o transporte aquaviário)

é um serviço público e, portanto, cabe ao estado promovê-lo por meio de empresa

pública ou por delegação à iniciativa privada.

Navegar sempre foi preciso... A rota marítima é uma via natural e, em um

país com tão vasto litoral e com milhares de quilômetros de rios e lagos navegáveis,

o transporte aquaviário promoveu a integração nacional, o abastecimento das

cidades, o serviço postal, o ir e vir da população, o escoamento da produção

agrícola e mineral, o contato com o resto do mundo. Finda a 2ª Grande Guerra, o

país carecia de uma política desenvolvimentista e, até a década de 1950, 90% da

população se concentrava na faixa de 100 quilômetros do litoral. Dependia-se

essencialmente do transporte aquaviário, as estradas de rodagem ainda eram

poucas e as ferrovias atendiam apenas áreas específicas do território.

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Com a execução do plano de metas do governo Kubitscheck, a matriz do

transporte mudou substancialmente, deu-se grande ênfase à abertura de estradas e

à produção automobilística mas, também, se desenvolveu a construção naval e se

promoveu a expansão da navegação.

A extinção da SUNAMAM, em 1983, e a recessão econômica decorrente das

crises do petróleo de 1973 e 1978, na década de 1990 o transporte aquaviário no

país estagnou mas, dessa vez, sofrendo uma significativa concorrência do transporte

rodoviário. No governo Collor, já sob a influência da política neoliberal e a

globalização, ocorreu uma forte desregulamentação e o setor sentiu a falta de

políticas próprias, deixando de fazer investimentos. Sem incentivos e sem recursos,

a frota nacional envelheceu, reduziu, passou a gerar altos custos de manutenção,

não acompanhou as evoluções tecnológicas e o correspondente aumento do custo

operacional levou ao aumento de fretes.

A estabilização da economia, coincidente com a virada do século, trouxe o

retorno da intervenção do Estado com a promoção de política pública específica e a

regulamentação do setor. Em 2001, promoveu-se a reestruturação dos transportes

aquaviários, com a criação do Conselho Nacional de Integração de Políticas de

Transporte (CONIT) e da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ),

entre outros órgãos12.

4.1 A ESTRUTURA EXECUTIVA DA REGULAÇÃO DO SETOR

A regulação das atividades do transporte aquaviário, em suas várias

disciplinas, é realizada por uma diversidade de órgãos.

Na figura 4, a seguir, está representada a estrutura executiva do Governo

Federal com atuação direta no setor. Identificam-se três vertentes:

Política – a cargo do Ministério dos Transportes e da Secretaria de Portos.

Regulatória – ação de outorga e fiscalização, a cargo da ANTAQ.

Executiva – nos portos públicos, realizada pelas Companhias Docas e, nos

terminais privativos e no transporte aquaviário, pela iniciativa privada.

12

Lei nº. 10.233/01 (com alterações posteriores), que dispõe sobre a reestruração dos transportes

aquaviário e terrestre.

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28

Figura 4 – Estrutura do Estado

Fonte: ANTAQ

Fora isso, diversas outras instituições atuam na regulação da exploração

econômica, na segurança e controle das embarcações empregadas, nas questões

ambiental e trabalhista, tanto no âmbito nacional quanto no internacional das quais

são apresentadas as características principais no Apêndice D.

4.2 CARACTERIZAÇÃO DA ATIVIDADE DE TRANSPORTE AQUAVIÁRIO

Aqui serão consideradas apenas as atividades reconhecidas na Lei nº

10233/01, que diz que, à ANTAQ cabe “celebrar atos de outorga de permissão ou

autorização de prestação de serviços de transporte pelas empresas de navegação

fluvial, lacustre, de travessia, de apoio marítimo, de apoio portuário, de cabotagem e

longo curso, gerindo os respectivos contratos e demais instrumentos

administrativos”.

Os “serviços de transporte” citados são aplicáveis13:

I - aos armadores14, às empresas de navegação e às embarcações

brasileiras;

13

Lei nº 9.432/97 (Regulamentada pelo Decreto nº 2.256/97), que dispõe sobre a ordenação do transporte aquaviário. 14

O Armador é aquele que apresta a embarcação, seja ele o seu proprietário ou o seu afretador. Já a Empresa Brasileira de Navegação (EBN) é necessariamente uma pessoa jurídica autorizada a operar no transporte aquaviário pela ANTAQ. Em suma:

Armador versus Empresa de Navegação

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II - às embarcações estrangeiras afretadas por armadores brasileiros;

III - aos armadores, às empresas de navegação e às embarcações

estrangeiras, quando amparados por acordos firmados pela União.

A legislação estabelece, também, que são cinco os tipos de navegação

comercial15, a saber: a navegação de Longo Curso, a Cabotagem, o Apoio Portuário,

o Apoio Marítimo e a navegação Interior, cujas características estão descritas a

seguir.

4.2.1 NAVEGAÇÃO DE LONGO CURSO

É a realizada entre portos brasileiros e estrangeiros. É essencialmente uma

operação de transporte de cargas, com embarcações SOLAS16, e aberta a

empresas de navegação estrangeiras.17

Existem três vertentes principais de rotas entre a costa atlântica da América

do Sul e os portos do resto do mundo: para a América do Norte, para a Europa e

para a Ásia.

As rotas para a América do Norte e para a Europa, partindo dos portos da

Argentina, do Uruguai e dos portos das regiões Sul e Sudeste do Brasil, seguem

paralelas até o Nordeste, enquanto as rotas para a Ásia seguem, em sua maioria,

pelo sul da África.

Hoje temos 19 empresas brasileiras de navegação autorizadas a operar na

navegação de longo curso18, com linhas para a América do Sul, Estados Unidos,

Europa, Caribe, África, Extremo Oriente, Oriente Médio e Oceania.

A distribuição de linhas depende das forças do mercado e varia

continuamente. Preocupante é que, tirando algum tráfego para a Argentina, Uruguai

Armador Empresa Brasileira de Navegação

Pode ser pessoa física ou jurídica Somente pessoa jurídica Tem registro no Tribunal Marítimo Precisa ser autorizada pela ANTAQ Só pode realizar a exploração do transporte

aquaviário se autorizado pela ANTAQ

Só pode ser autorizado a realizar a exploração do

transporte aquaviário se possuir embarcação Administra a embarcação Administra a operação de transporte aquaviário

15

Lei nº 9.432/97, que dispõe sobre a ordenação do transporte aquaviário. 16

Embarcação SOLAS (Safety of Life at Sea) é a que cumpre regras internacionais para a salvaguarda da vida humana no mar. 17

Lei nº 9.432/97, Art. 5º A operação ou exploração do transporte de mercadorias na navegação de longo curso é aberta aos armadores, às empresas de navegação e às embarcações de todos os países, observados os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade. 18

Consulta http://www.antaq.gov.br/Portal/Frota/ConsultarEmpresaAutorizada.aspx em 12/04/2015.

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30

e Venezuela (petróleo e derivados), não se empregam embarcações brasileiras nas

demais linhas.

Na figura 5, os dados empregados estão em milhões de toneladas. Vê-se a

tendência de crescimento do movimento de cargas no longo curso, seguindo a

tendência do Balanço de Pagamentos, como era de se esperar. Também, como era

de se esperar, o movimento de importação é consideravelmente menor do que o de

exportação, até porque a carga de exportação é preponderantemente de granéis

(commodities) que são cargas de muito volume e peso.

Figura 5 – Cargas Transportadas no Longo Curso

Fonte: ANTAQ

Na navegação de Longo Curso, é prescrito19 às embarcações de bandeira

brasileira, operadas por empresas brasileiras de navegação, o transporte de

mercadorias importadas pela administração pública e aquelas que gozem de

financiamentos oficiais, ressalvada a reciprocidade. Caso não exista navio de

19

Decreto-lei nº 666/69, Institui a obrigatoriedade de transporte em navio de bandeira brasileira, Art.

2º Será feito, obrigatoriamente, em navios de bandeira brasileira, respeitado o princípio da reciprocidade, o transporte de mercadorias importadas por qualquer órgão da administração pública federal, estadual e municipal, direta ou indireta, inclusive empresas públicas e sociedades de

economia mista, bem como as importadas com quaisquer favores governamentais e, ainda, as adquiridas com financiamento, total ou parcial, de estabelecimento oficial de crédito, assim também com financiamentos externos, concedidos a órgãos da administração pública federal, direta ou

indireta.

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bandeira brasileira disponível para realizar a operação, a ANTAQ pode liberar o

transporte em navio de bandeira estrangeira especificamente designado20.

Na prática, o procedimento da liberação do transporte de carga prescrita em

navio de bandeira estrangeira deveria ser eventual mas virou regra geral, uma vez

que o emprego de navios de bandeira brasileira na navegação de longo curso quase

não existe. De fato, trata-se de um mecanismo de incentivo à bandeira brasileira que

pouco efeito tem.

Como o Brasil não possui frota própria operando no longo curso em linhas

regulares (exceto para os países do MERCOSUL, que é um mercado protegido por

acordos bilaterais, e algum tráfego de produtos químicos), os donos das cargas

ficam suscetíveis ao serviço prestado por grandes empresas de navegação

transnacionais. Estas são fortemente influenciadas pelo mercado internacional, que

se caracteriza por ser sazonal, volátil, afetado por interesses outros.

A simples leitura das estatísticas da ANTAQ pode levar a uma interpretação

equivocada, pois aponta o registro de 67 embarcações aptas a operar no longo

curso, sendo 14 afretadas de empresas estrangeiras21. Isso se deve ao interesse

das empresas de manter junto à ANTAQ o registro de embarcações que podem ser

empregadas em operações para o MERCOSUL, bem como da TRANSPETRO, com

países do Caribe, sendo que as mesmas embarcações são, também, registradas

para a operação na Cabotagem, frequente e regular. Mas, observando a tabela a

seguir verifica-se que, mesmo no tráfego com países com os quais o Brasil tem

acordos bilaterais, os navios de bandeira brasileira respondem apenas com 5,1%

dos fretes.

Figura 6 – Tráfego de Cargas – Acordos Bilaterais

Fonte: ANTAQ

20

Resolução nº 2922 da ANTAQ. 21

Consulta em 12/04/2015 em http://www.antaq.gov.br/Portal/Frota/ConsultarFrotaGeral.aspx.

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32

Outras características da navegação de longo curso são mostradas no

Apêndice B.

4.2.2 NAVEGAÇÃO DE CABOTAGEM

É a realizada entre portos ou pontos do território brasileiro, utilizando a via

marítima ou esta e as vias navegáveis interiores. É essencialmente uma operação

de transporte de cargas, reservada a empresas brasileiras de navegação (EBN) e

embarcações de bandeira brasileira22. Hoje estão autorizadas 41 EBN na

cabotagem, operando 176 embarcações de registro brasileiro e diversas outras

estrangeiras afretadas, atendendo a todos os portos brasileiros.

A principal atividade econômica da navegação de cabotagem é o transporte

de cargas ao longo do litoral brasileiro e no percurso do rio Amazonas, ligando a

zona franca aos mercados consumidores domésticos, em linhas regulares. As

principais empresas que exploram esse segmento da cabotagem são as mesmas

autorizadas pela ANTAQ a operar no longo curso até porque algumas das linhas

exploradas possuem trechos que tocam portos no exterior.

Outra atividade de grande importância econômica é o serviço de

alimentação e alívio de portos concentradores de cargas (chamados de “hub ports”).

Esses portos concentram o recebimento de grandes quantidades de cargas, tanto

dos mercados produtores quanto dos consumidores, transportadas em navios de

grande porte, em geral, de linhas internacionais (de longo curso). Empresas

estrangeiras não podem operar na cabotagem e fazem operações de transbordo em

portos brasileiros, descarregando e recebendo cargas que serão obrigatoriamente

movimentadas entre os portos de destino/origem nacional por empresas brasileiras

de transporte.

Uma parte considerável da movimentação entre portos se refere a

contêineres vazios pois nos portos não há um balanço perfeito entre a quantidade de

contêineres cheios que entra e a quantidade que sai, de modo que sempre há

demanda de transporte de contêineres vazios dos portos onde eles estão sobrando

para os portos onde eles são solicitados. Segundo a ANTAQ o desbalanceamento

total de cofres cheios e vazios (em número de contêiner TEU – “Twenty Foot

22

Lei n° 9.432/97 Art. 7º As embarcações estrangeiras somente poderão participar do transporte de mercadorias na navegação de cabotagem... quando afretadas por empresas brasileiras de

navegação, observado o disposto nos arts. 9º e 10.”

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Equivalent Unit”) pode ser verificado pelo número de contêineres transportados, que

ocorreu na proporção de 71,4% de cheios para 28,6% de vazios (ANTAQ - 2014).

Existe, ainda, um sem número de atividades de transporte de cabotagem,

empregando uma variedade de embarcações com porte menor para atender casos

específicos como, por exemplo:

Comboio empurrador-barcaça no transporte de cargas de projeto

Transporte de sal em Areia Branca – RN

Abastecimento de Fernando de Noronha

Dos exemplos acima, o primeiro é amplamente aplicado no transporte de

cargas especiais devido ao seu volume, peso e forma geométrica, características de

grandes peças industriais – geradores, vasos de pressão, partes de plataformas, etc.

– ou em casos bem específicos de linhas regulares dedicadas como o de transporte

de celulose e de bobinas de aço executados pela empresa Norsul. Os dois exemplos

seguintes são representativos de soluções específicas para questões regionais, um

de grande importância comercial e o outro com profundo impacto social.

A regulação do transporte de cabotagem permite, sob condições, o

afretamento de embarcações estrangeiras23 para viabilizar atender o crescimento e

os picos de demanda por frete. A obrigatoriedade de o afretamento ser realizado por

EBN garante o mercado para empresas brasileiras mas não evita ou reduz a

remessa de divisas ao exterior, onerando a conta serviços da balança de

pagamentos.

Picos de demanda, sazonais, são supridos por meio de “compra” de espaços

(afretamento) em navios estrangeiros que tocam o litoral brasileiro na operação de

longo curso, muitos deles operados por megaempresas de navegação

transnacionais, controladoras de EBN, as quais não necessariamente praticam frete

de valor do mercado interno mas, sim, valores regidos por questão de oportunidade.

Outras características da navegação de cabotagem são mostradas no

Apêndice C.

4.2.3 NAVEGAÇÃO DE APOIO PORTUÁRIO

É aquela realizada exclusivamente nos portos e terminais aquaviários, para

atendimento a embarcações e instalações portuárias. É essencialmente uma

23

Lei nº 9.432/97 e Resolução nº 2920 – ANTAQ.

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operação de prestação de serviços de apoio, realizada por empresas brasileiras de

navegação utilizando embarcações de bandeira brasileira.

O mercado para as EBN de apoio portuário é crescente e cada vez mais

especializado. Há mais de 260 empresas espalhadas por todo o Brasil (eram cerca

de 80 em 2005 e 150 em 2011). Segundo a ANTAQ, elas operam cerca de 1.300

embarcações de registro brasileiro. Por regra, onde há porto organizado ou terminal

privativo, os serviços de apoio portuário são oferecidos, entre eles:

Reboque portuário (atracação, desatracação, assistência, auxílio à

manobra, etc.)

Transporte de tripulantes, passageiros e carga

Transporte de práticos

Manobra de espias

Coleta de lixo e resíduos de porão

Abastecimento de combustíveis, lubrificantes, sobressalentes, água

potável, víveres

Transbordo de carga

No apoio portuário, quando da necessidade de suprir picos de demanda,

pouco se emprega o afretamento de embarcações estrangeiras, pois este é

encarecido pelo custo da mobilização da embarcação (deslocamento e adaptação)

desde os portos de origem para portos no Brasil, e vice-versa, quando da reentrega

ao seu proprietário estrangeiro, e o mercado nacional possui uma ampla oferta de

embarcações (como relatado acima, são cerca de 1300). Se necessário, o

afretamento de embarcação estrangeira dependerá, sempre, da consulta de

disponibilidade de embarcações das demais EBN (processo chamado de

“circularização”) e posterior autorização do afretamento pela ANTAQ24.

O mercado, hoje, é de demanda crescente, proporcional ao incremento do

tráfego e do porte dos navios de longo curso e cabotagem. Com isso, o que se vê é

o crescimento e especialização do número de empresas, bem como de suas frotas.

4.2.4 NAVEGAÇÃO DE APOIO MARÍTIMO

É a modalidade de navegação realizada para o apoio logístico a

embarcações e instalações em águas territoriais nacionais e na Zona Econômica,

que atuem nas atividades de pesquisa e lavra de minerais e hidrocarbonetos. É

24

Lei nº 9.432/97 e Resolução nº 2921 – ANTAQ.

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essencialmente uma operação de prestação de serviços de apoio, reservada a

empresas brasileiras de navegação e embarcações de bandeira brasileira.

A navegação de apoio marítimo é fruto da exploração de petróleo na

plataforma continental. A Lei do Petróleo abriu o mercado de exploração a novas

empresas além da Petrobras, acelerando a expansão da exploração de petróleo

offshore. Com isso, hoje há 147 empresas brasileiras de navegação operando no

apoio marítimo (em 2005, 48, e, em 2011, 109). Os principais serviços oferecidos

são:

Reboque e posicionamento de plataformas

Suprimento de insumos para a exploração de petróleo

Abastecimento de combustíveis, lubrificantes, sobressalentes, água

potável, víveres

Transporte de passageiros (petroleiros)

Manobra de espias

Apoio a operações de socorro e salvamento (“Stand-by”)

A ANTAQ registra 558 embarcações operadas no Apoio Marítimo, entre elas

um número considerável de pequenos rebocadores e lanchas, bem como

embarcações não propulsadas (barcaças), quase todas de registro brasileiro. Para

operações mais complexas, são empregadas embarcações sofisticadas (cerca de

300), de alto custo de obtenção, onde cerca de 10% delas é estrangeira operada a

casco nu com suspensão de bandeira. Já a ABEAM – Associação Brasileira das

Empresas de Apoio Marítimo informa que há 469 embarcações operando, 224 de

bandeira brasileira e 245 estrangeiras. Provavelmente, a diferença decorre de a

ABEAM relacionar apenas embarcações operadas por empresas a ela associadas.

4.2.5 NAVEGAÇÃO INTERIOR

É a realizada em hidrovias interiores, em percurso nacional ou internacional.

A navegação interior, em contraste com as outras modalidades de navegação, difere

consideravelmente de região para região do país, tanto social quanto

economicamente. São adequadas as seguintes classificações:

1) Geograficamente, por bacia e por hidrovia

2) Por percurso (nacional ou internacional)

3) Por características técnicas:

Navegação longitudinal de carga (133 empresas)

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36

Transporte exclusivo de passageiros (5 empresas)

Transporte longitudinal misto - passageiros e carga (77 empresas)

Navegação de travessia (148 empresas)

O número de empresas foi obtido da ANTAQ25 e representa apenas as que

operam em área de jurisdição federal (internacional e interestadual).

A navegação interior transporta hoje, mais de 80 milhões de toneladas/ano

de carga, o que representa um crescimento de 4,3% no último ano, capacidade que

duplicou em 5 anos.

Ao contrário do que se observa nas principais regiões produtivas do país -

sul/sudeste - onde as hidrovias têm características técnicas que prejudicam sua

utilização econômica e a concorrência com outros modais, na região norte sua

importância é essencial, tanto econômica quanto socialmente, no transporte de

cargas e passageiros - em geral em rios de grande volume de água, bom calado,

pouca influência sazonal e quase nenhuma concorrência com outros modais.

4.2.6 A FROTA MERCANTE BRASILEIRA

A total desregulamentação do setor de transporte aquaviário na década de

1990 trouxe tal instabilidade ao mercado que os armadores pararam com qualquer

investimento na renovação de suas frotas.

Em especial, no longo curso e na cabotagem operava-se uma frota de idade

média avançada, sem perspectiva de substituição. Os navios deixaram de ser

competitivos por obsolescência, falta de equipamentos modernos de carga e

descarga, alto custo de manutenção, alto consumo de combustível, baixa

automação.

A partir de 2001, a frota remanescente utilizada no longo curso foi

integralmente transferida para a cabotagem onde encontrou uma sobrevida, uma

vez que, na cabotagem, não precisavam concorrer com a frota estrangeira, mais

moderna e eficaz.

A decisão dos armadores nacionais de não mais investir em suas frotas foi

terrível para o setor. Os efeitos adversos foram camuflados pela imediata ocupação

do mercado pelos operadores internacionais no longo curso e a reserva de mercado

25

http://www.antaq.gov.br/Portal/Frota/ConsultarEmpresaInteriorAutorizada.aspx , consultado em

12/04/2015.

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37

da cabotagem que permitiu a utilização da frota, mesmo obsoleta, por um longo

tempo.

Figura 7 – Evolução da frota por Tipo de Navegação

Fonte: ANTAQ

Como consequência imediata da migração da frota de longo curso para a

cabotagem, ocorreu a transferência de divisas para o exterior, correspondente ao

frete na importação/exportação, e o aumento dos custos de transporte na

cabotagem (figura 7).

Outra consequência foi a transferência do controle das empresas brasileiras

para o capital estrangeiro26, uma vez que o clima de insegurança para a navegação

brasileira decorrente da desregulamentação não pode ser suportado pelo

empresário nacional, enquanto que os armadores estrangeiros que já operavam no

longo curso vislumbraram a possibilidade de entrar no mercado da cabotagem

brasileira com pouco investimento pois estavam absorvendo empresas altamente

endividadas (cabe lembrar que o custo de obtenção da frota dessas empresas ainda

estava sendo ressarcido ao governo pois os financiamentos da construção, à época,

eram de 15 anos).

O cenário de incerteza do mercado começou a se alterar com a Emenda

Constitucional n° 7, de 1995, que deu nova redação ao art. 178 da Constituição

26

A Emenda Constitucional n° 6, de 1995, eliminou o conceito de empresa brasileira de capital

nacional.

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38

Federal, remetendo para a legislação ordinária a regulamentação do mercado de

navegação. Isso deu espaço ao retorno da regulação da navegação com a edição

da Lei n° 9.432/1997, sobre o ordenamento do transporte aquaviário, e da Lei nº

10.233/2001, que cria o CONIT e a ANTAQ.

Mesmo assim, protegidas pela reserva de mercado da cabotagem, que

garantia a sobrevida dos seus navios envelhecidos, as EBN relutaram em promover

a renovação de frota.

A tabela a seguir (frota de longo curso e cabotagem) mostra que apenas

recentemente essa renovação se iniciou.

Tabela 1 – Idade Média da Frota

Tipo de navio Idade Média

2011

Idade Média

2015

Carga Geral 12 11,6 Petroleiro 23 16,1 Graneleiro 24 18

Ro-Ro 18 - Porta-Contêiner 19 5,9

Multipropósito 09 - Químico 26 13,5

Fonte: ANTAQ

Pode-se ver que várias categorias de embarcações já ultrapassavam os

vinte anos de vida em 2011, fato muito relevante considerando que o parâmetro

técnico para a vida útil das embarcações é de 25~30 anos e que sua obsolescência,

em certos casos, pode chegar antes, com a evolução dos mercados, portos e

processos de transporte.

No quadro da figura 8 está apresentada a evolução da idade da frota por

segmento. Observa-se uma melhora tímida da idade média da frota de cabotagem,

como um todo, e uma maior obsolescência na frota de apoio portuário, que pouco

evolui. Nesse último caso, as embarcações empregadas tem menor sofisticação

tecnológica, o que explica, em parte, sua maior longevidade.

Há que se ter em mente que a definição dos requisitos operacionais da nova

embarcação, a seleção do seu projeto e a construção propriamente dita podem levar

alguns anos (2 a 5 anos, em média, dependendo da complexidade do

empreendimento). Os principais parâmetros técnicos considerados como indicadores

da necessidade de renovação da frota brasileira são:

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39

Idade

Regulamentos de segurança e antipoluição

Novos parâmetros de velocidade

Sistemas de propulsão mais eficientes

Capacidade de carga

Atendimento a exigências de autoridades nacionais e de outros países

Figura 8 – Evolução da Idade Média da Frota

Fonte: ANTAQ

Aos parâmetros listados acima, essencialmente técnicos, se juntam os

requisitos operacionais, que decorrem da evolução dos sistemas portuários de

manuseio e armazenamento de carga, que são critérios de logística. A evolução

desses parâmetros determinou a obsolescência dos navios ro-ro (roll on / roll of)

onde as cargas embarcam/desembarcam em carretas, e dos navios multipropósito,

que permitem o transporte de cargas em diferentes formas de embalagem e

manuseio, sistemas abandonados em favor dos contêineres.

De fato, as empresas de cabotagem somente promoveram a renovação

quando o mercado passou a demandar serviços em quantidade e qualidade superior

ao que elas podiam atender. A figura 9 mostra a evolução da frota brasileira nos

últimos anos, onde as EBN reagiram na virada do século XXI, com reflexos

observados a partir de meados da sua primeira década.

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40

Figura 9 – Frota Brasileira por Tipo de Navio

Fonte: ANTAQ

4.2.7 A SITUAÇÃO ATUAL

Figura 10 – Evolução da Quantidade de EBN

Fonte: ANTAQ

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41

O país vem de uma década de crescimento da economia e saldos positivos

do balanço de pagamentos, onde o transporte aquaviário teve uma participação

essencial com correspondente crescimento. Isso pode ser comprovado na figura 10

acima, onde o número de EBN cresce ano a ano.

Em cada segmento da navegação observamos indicadores específicos.

Vejamos:

a) Longo Curso - a participação da bandeira brasileira é muito pequena

(de 3 a 5%, dependendo da fonte e do critério utilizado). O segmento é dominado

por megaempresas transnacionais, não há um controle efetivo do valor de frete

cobrado, o que é um risco para o comércio externo e, consequentemente, para o

desenvolvimento do país, o Balanço de Pagamentos no quesito “fretes” é totalmente

desfavorável, representando uma perda de divisas superior a US$ 10 milhões, a

ausência de uma frota nacional atendendo ao setor é um risco para a soberania

nacional.

b) Cabotagem - a concorrência com o transporte rodoviário é grande

mas, para percursos superiores a 500 km, as vantagens do modal marítimo tem

levado a um crescimento constante do transporte de cabotagem. O crescimento

constante do comércio exterior brasileiro nos últimos anos tem puxado o crescimento

do setor na distribuição de cargas entre os portos concentradores e os demais

portos.

c) Apoio portuário - cresce proporcionalmente à cabotagem e o longo

curso; portos mais modernos exigem embarcações de apoio melhores e empresas

especializadas.

d) Apoio marítimo - é um mercado certo, em expansão, dominado por

embarcações de bandeira estrangeira; a própria PETROBRAS retornou ao mercado,

como EBN, promovendo a construção de quase meia centena de embarcações de

apoio a plataformas. No entanto, devido ao indelével vínculo com a exploração de

petróleo em mar aberto, sua evolução é fortemente influenciada pelo preço

internacional do petróleo e ao plano de investimentos da Petrobras.

e) Interior - apesar da diversidade do mercado e dos fatores regionais, há

uma expectativa de crescimento do transporte de granéis, para o escoamento das

safras; na Amazônia, esforços estão sendo feitos para a substituição das

embarcações de madeira construídas de forma artesanal, por outras mais seguras.

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42

5 A ORDENAÇÃO JURÍDICA27

O transporte aquaviário seu divide em uma multiplicidade de serviços a

serem prestados e explorados comercialmente, que tem, por paralelo, uma outra

multiplicidade de Leis, Decretos, Regulamentos, Convenções, que visam sua

ordenação nas mais diversas disciplinas. O tema se caracteriza por sua

multidisciplinaridade, abrangendo as áreas do Direito comercial, internacional,

administrativo, ambiental, processual e penal, que perfazem a política marítima.

5.1 A ORDENAÇÃO JURÍDICA NACIONAL

“Apesar de ocupar posição proeminente e ter seu

núcleo geohistórico assentado em torno do Atlântico

Sul, o Brasil não se constituiu em um Estado

marítimo, nem sequer desenvolveu uma política

sistemática para integrar o oceano na política

nacional brasileira, pelo menos até a década de 70.

Uma das razões foi a disposição de um imenso

espaço continental aberto à colonização de tal

forma, que as políticas nacionais não incluíram o

mar como elemento primordial ao desenvolvimento

da nação...”28

Em tempos de Brasil República, a regulamentação do setor de navegação

veio, inicialmente, por meio do Decreto-Lei nº 1.951/1939, onde estabelecia-se a

criação da Comissão de Marinha Mercante, ocorrida em 1941.29 Já nos anos 1980, o

27

Centro de Estudos, Pesquisa e Atualização em Direito, Curso de Direito Marítimo (2005) - Notas de aula. 28

Mendes, A Constituição das fronteiras Marítimas Brasileiras: do “Mar Territorial” à “Amazônia Azul” - Dissertação de Mestrado - ENCE (2006) - citando Penha, “Relações Brasil-África e Geopolítica do Atlântico Sul” - Tese de doutoramento, IG UFRJ (1998). 29

Botelho, ”Indústria de Construção Naval: Uma Necessidade Estratégica de Desenvolvimento”, Monografia apresentada à Escola de Guerra Naval (2007) – “No Brasil, as primeiras medidas por parte do governo brasileiro, com o objetivo de regulamentar, de maneira sistemática, o setor marítimo

são anteriores à década de 50. Por meio do Decreto-Lei no 1.951 de 30 de dezembro de 1939, a União assumiu a responsabilidade de explorar ou dar concessões autorizadas e licenças para a exploração do transporte marítimo. Nesse Decreto-Lei, previa-se a criação de um órgão regulador do

setor que viria a ser efetivado, em 1941, por meio da Comissão de Marinha Mercante (CMM),cujas principais atribuições eram: fixar os fretes, definindo as linhas de navegação para cada empresa; subvencionar, mediante autorização do Presidente da República, serviços deficitários de Marinha

Mercante; autorizar a compra, venda e afretamento de embarcações no exterior, e estipular salários

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setor era altamente regulado, sob rígido regime da SUNAMAM. Recentemente, essa

regulamentação se concretiza em uma série de Leis e Normas, mais flexíveis30(ver

Apêndice E).

5.1.1 A REGULAÇÃO DO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO NO BRASIL31

As agências reguladoras independentes constituem um modelo institucional

de Administração Pública a muito empregado nos EUA e que vem sendo adotado na

América Latina e na Europa, a partir da década de 80. A adoção dessa nova linha de

regulação não se deu por mera cópia do modelo americano mas em decorrência de

circunstâncias político-econômicas.

Na história recente da navegação mercante nacional, a partir de 1988

começa a desregulamentação do setor de navegação. Vimos o fim da SUNAMAM

(1988) e a extinção das chamadas conferências de fretes (1990).

A liberalização do transporte aquaviário de longo curso (governo Collor – 90

a 92) significou a exposição dos armadores brasileiros à concorrência internacional

(Portaria MT no 07/91). Em pouco tempo ficou claro que as incipientes empresas

domésticas não tinham porte para enfrentar um mercado caracterizado pela

presença de grandes empresas de escala operacional mundial. Com isso, a maior

parte das empresas brasileiras de navegação, para sobreviver nesse mercado,

adotou a participação de sócios estrangeiros na sua composição.

Veio o governo Fernando Henrique e a implantação de sua política

neoliberal, com a privatização de diversas empresas públicas e a busca pelo capital

estrangeiro. Entendeu-se que essa política somente teria sucesso com a

implantação de Agências Reguladoras independentes.

de estivadores e marítimos. A partir daí, houve uma sucessão de leis e decretos, associados à

criação e extinção de vários órgãos governamentais que visavam o estabelecimento de políticas e formas de incentivar e administrar o desenvolvimento da indústria naval e Marinha Mercante brasileiras.” 30

Nóbrega, Consultoria Legislativa do Senado Federal, Coordenação de Estudos – Evolução e Perspectivas de Desenvolvimento da Marinha Mercante Brasileira (2008) - “A liberalização do comércio de bens e serviços é uma meta mundial, acertada e discutida no âmbito da Organização

Mundial do Comércio (OMC), e diversos setores tiveram novas regras estabelecidas ao amparo do General Agreement on Tariffs and Trading (GATT). Outros, como a navegação marítima, estão com suas negociações paralisadas devido à alta complexidade do seu mercado e das suas relações

comerciais e estratégicas.” 31

Lei nº. 10.233/2001 -Dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre, cria ... a Agência Nacional de Transportes Aquaviários ...; Art. 27, V - Cabe à ANTAQ, em sua esfera de

atuação, celebrar atos de outorga de permissão ou autorização de prestação de serviços de transporte pelas empresas de navegação fluvial, lacustre, de travessia, de apoio marítimo, de apoio portuário, de cabotagem e longo curso, observado o disposto nos arts. 13 e 14, gerindo os

respectivos contratos e demais instrumentos administrativos.

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44

Mas, qual o modelo a seguir? Enquanto que, nos EUA em todo o último

século admitiu-se a prestação de serviços públicos com forte participação da

iniciativa privada, na América Latina/Europa o Estado optou por prestar ou explorar

diretamente a maior parte dos serviços públicos e atividades econômicas,

favorecendo que prevalecesse o interesse político sobre o interesse privado, muitas

vezes em prejuízo do interesse dos usuários.

Nos segmentos de prestação de serviços públicos onde tradicionalmente

participam empresas privadas (como o transporte aquaviário), a atuação do estado

interventor tinha uma vertente prejudicial. De fato, a intervenção estatal (por

exemplo, com o estabelecimento de uma política de preços) tendia a instabilizar

qualquer ação privada, quer por inviabilizar a prestação do serviço com um mínimo

de qualidade – preço abaixo do real de mercado – quer por desestímulo à melhoria

de produtividade – quando da política protecionista.

Na década de 90, o cenário brasileiro mudou radicalmente: a quebra de

monopólios do Estado, abertura de setores da economia à competição e o

movimento da desestatização, atrelados obrigatoriamente a uma busca de capital

para viabilizar as novas empresas concessionárias e seus planos de metas, obrigou

o Estado a adotar outra política regulatória.

Curiosamente, no hemisfério norte os EUA passavam por um momento

“desregulamentador”, com a extinção ou diminuição da regulação estatal em muitos

setores, que causou prejuízos tanto financeiros (por exemplo, por decorrência do

racionamento de energia elétrica no seu estado mais rico – a Califórnia) quanto

sociais (como o ocorrido na área de transportes para pequenas cidades e

propriedades rurais). Houve, por consequência, a necessária intervenção do Estado

– retorno à regulação - para possibilitar o restauro da situação de equilíbrio do

mercado.

O que constitui a essência do conceito das agências reguladoras, em

relação ao modelo tradicional da Administração Pública, é a independência em

relação ao Poder Executivo Central. Não por acaso, algumas Agências Reguladoras

adotam, em seu logotipo, a figura de um triângulo equilátero, símbolo do equilíbrio

que se pretende resguardar com sua atuação - equilíbrio entre o interesse político, o

interesse do usuário e o interesse privado – em suma, esse equilíbrio representa o

atendimento ao interesse público.

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45

Nesse sentido, se revestem de especial importância conceitos como da

administração da Agência por um colegiado de Diretores nomeados pelo Chefe do

Executivo, após a aprovação de sua indicação pelos membros do Senado, bem

como os mandatos fixos e a não coincidência de mandatos.

Regular a atividade do transporte aquaviário do Brasil32 decorre de sua

importância socioeconômica, ou seja:

O transporte de passageiros é essencial - garante o direito do cidadão de

ir-e-vir e o acesso ao seu local de trabalho – é parte inseparável da cadeia

produtiva; e

O transporte de mercadorias possibilita o desenvolvimento da economia

do país; também possibilita a geração de riqueza e de bem estar.

Para atender essas necessidades, o Estado, através da Lei nº 10.233, de

2001, criou a Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, visando não

somente implantar as políticas para o setor como, também, regular, supervisionar e

fiscalizar as atividades de prestação de serviços de transporte aquaviário e de

exploração da infraestrutura portuária e aquaviária, garantindo a movimentação de

pessoas e bens, em cumprimento a padrões de eficiência, segurança, conforto,

regularidade, pontualidade e modicidade nos fretes e tarifas, harmonizar os

interesses dos usuários com os das empresas prestadoras dos serviços, arbitrar

conflitos de interesse e impedir situações que configurem competição imperfeita ou

infração contra a ordem econômica.

5.1.2 O TRANSPORTE COMO SERVIÇO PÚBLICO

A Constituição Federal determina que cabe ao Estado explorar, diretamente

ou por outorga a terceiros, o serviço de transporte aquaviário e os portos, legislar

sobre o direito marítimo, o regime dos portos e da navegação e estabelecer a

política de transportes.33

32

Lei nº. 10.233/2001 -Dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre, cria ... a Agência Nacional de Transportes Aquaviários ...; Art. 27, V - Cabe à ANTAQ, em sua esfera de atuação, celebrar atos de outorga de permissão ou autorização de prestação de serviços de

transporte pelas empresas de navegação fluvial, lacustre, de travessia, de apoio marítimo, de apoio portuário, de cabotagem e longo curso, observado o disposto nos arts. 13 e 14, gerindo os respectivos contratos e demais instrumentos administrativos. 33

C. F. Art. 21 XI d) Compete à União explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território;

f) os portos marítimos, fluviais e lacustres; “

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46

São características do setor:

Infraestrutura portuária – grandes portos organizados administrados por

sociedades de economia mista (Companhias Docas) e Terminais

especializados, explorados pela iniciativa privada

Transporte aquaviário – Operação dominada por empresas privadas

Vê-se que o perfil do Setor sempre apresentou intensa participação da

iniciativa privada. Após a Crise do Petróleo, na década de 80, a navegação passou

por ampla desregulamentação e um “esvaziamento” da SUNAMAM, até sua extinção

em 1989. Nesse período ocorreu, também, a desmobilização de nossa indústria

naval.

5.2 A ORDENAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL

Vários fatores determinam a instituição de uma ordenação jurídica

internacional, entre eles os relativos ao direito do mar, à soberania dos Estados, a

facilitação as comunicações internacionais, a promoção do uso pacífico dos mares e

oceanos, a utilização equitativa e eficiente dos seus recursos, a conservação dos

recursos vivos e o estudo, a proteção e a preservação do meio marinho, a ordem

econômica internacional, esses relacionados na Convenção das Nações Unidas

sobre o direito do mar, e outros como os decorrentes da exploração do transporte

aquaviário, a segurança da navegação e a preservação da vida humana no mar, a

prática de mecanismos protecionistas com imposição de poder econômico.

Essa diversidade de fatores determinou a criação de organismos onde

ocorre o estabelecimento de fóruns de discussão e de arbitragem de conflitos, bem

como as regras que regem a atuação dos países. A matéria é melhor explanada no

Apêndice F.

XXI - estabelecer princípios e diretrizes para o sistema nacional de viação; Art. 21 Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do

trabalho; IX - diretrizes da política nacional de transportes; X - regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e aeroespacial;

XI - trânsito e transporte

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6 A POLÍTICA ATUAL

A política marítima é o conjunto de medidas diretas e indiretas, jurídicas,

econômicas e administrativas por meio das quais o Estado influi na situação de sua

frota nacional, na exploração da navegação e da infraestrutura portuária. Se situa

tanto no contexto internacional quanto no nacional e varia do liberalismo ao

protecionismo, de acordo com os interesses de cada nação. No Brasil é estabelecida

no âmbito da Casa Civil, Ministério dos Transportes, Comando da Marinha,

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Ministério das

Relações Exteriores e Secretaria de Portos.

A política atual do transporte aquaviário no Brasil decorre da política

praticada nos últimos 20 anos do último século (dita política neoliberal), fruto da

teoria econômica produzida em razão de uma crise mundial. Até então, vivia-se a

era moderna onde vigorava a política baseada em mecanismos regulatórios de

proteção do mercado interno.

O mundo pós-moderno, que surgiu em reação à crise de 1988, se submeteu

a regras rígidas de política econômica liberal, desregulamentadora, cujo modelo foi

delineado no Consenso de Washington em 1989, em função do que se considerou

uma excessiva presença do Estado na economia - com políticas de protecionismo,

substituição das importações, excesso de regulamentação e de empresas estatais –

em conjunto com uma política social paternalista, geradora de déficit público. Essa

nova política tem por diretrizes a disciplina fiscal, a estabilidade monetária, o controle

de gastos públicos, a ampliação da base tributária, a liberdade das taxas de juros e

de câmbio, a liberdade das importações com taxas aduaneiras reduzidas, a

captação de recursos externos, a redução da presença do Estado na economia com

a privatização de empresas públicas e a desregulamentação da economia.

Como nos ensina SANDOVAL (palestra proferida na ESG – CAEPE2015,

26/06/15), mais de 80% do comércio mundial é realizado por empresas panacionais

que lutam contra a regulação dos mercados periféricos – são chamadas forças

deslimitadoras. É a estratégia das grandes potências – aplicar forças deslimitadoras

para eliminar a regulação dos mercados consumidores da periferia que restringem a

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48

penetração das grandes empresas transnacionais nesses mercados – mundo pós-

moderno, política neoliberal.

A respeito da condição transnacional das megaempresas de navegação que

dominam o transporte de longo curso no Brasil, CASTRO JÚNIOR (2014), em sua

crítica ao emprego do estatuto da bandeira de conveniência34 para o registro das

embarcações, cita:

“A sociedade mercantil, cuja matriz é constituída

segundo as leis de determinado estado, na qual a

propriedade é distinta da gestão, que exerce

controle, acionário ou contratual, sob uma ou mais

organizações, todas atuando de forma concentrada,

sendo a finalidade de lucro perseguida mediante

atividade fabril e/ou comercial em dois ou mais

países, adotando estratégia de negócios

centralmente elaborada e supervisionada, voltada

para a otimização de oportunidades oferecidas pelos

respectivos mercados internos.”35

Quanto à política aplicada ao transporte aquaviário, as Emendas

Constitucionais 6 e 7 coadunam com a política neoliberal quando permitem o

controle de empresas brasileiras pelo capital estrangeiro, bem como liberam o

afretamento, por EBN, de embarcação de bandeira estrangeira no mercado interno

que, antes disso, era restrito à bandeira nacional.

Com isso, as megaempresas transnacionais aproveitaram para penetrar no

mercado interno, antes protegido, preservando seus interesses ao passar a controlar

as EBN de cabotagem e terminais de carga/descarga em portos públicos e/ou áreas

privadas, garantindo, com isso, a estabilidade necessária para a operação de seus

navios no longo curso, que passaram a ter prioridade de atracação nos terminais e

maior facilidade de afretamento na cabotagem.

O último ciclo de sucesso do transporte aquaviário, se caracterizava por:

Amplo controle do Estado exercido por meio da SUNAMAM

34

Bandeira de conveniência – é o registro do navio em país que oferece facilidades aos seus

armadores que resultam em redução de custos de operação, tais como no pagamento de tributos, taxas, custos de tripulação, segurança e manutenção. 35

CRETELLA NETO, José. Empresa Transnacional e Direito Internacional. Exame do Tema à luz

da Globalização. Rio de Janeiro: Forense, 2006. P.27.

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49

Existência de grandes empresas estatais com frotas significativas nos 3

segmentos mais importantes do longo curso: carga geral – Lloyd

Brasileiro; Granel sólido – DOCENAVE; Granel líquido - FRONAPE

Controle financeiro

Gestão da construção naval

Esse ciclo foi encerrado de forma abrupta com a ampla desregulamentação

empreendida no governo Collor, que determinou a falência da indústria de

construção naval ao restringir o acesso ao crédito e regalias fiscais, praticamente

zerando o fluxo de novas encomendas e o acesso ao mercado de exportação.

Quanto ao transporte aquaviário, uma vez que a vida útil de um navio é de pelo

menos 20 anos, os efeitos da ausência de política para o setor foram sentidos

lentamente, a começar pela desmobilização da frota de longo curso, paulatinamente

transferida para a navegação de cabotagem ou vendida para empresas estrangeiras.

De fato, com o advento da política neoliberal, diversos órgãos da

administração federal foram extintos, inclusive os diretamente responsáveis pelos

setores de construção naval e transporte aquaviário - SUNAMAM, GEIPOT -, as

grandes empresas estatais foram privatizadas (com exceção da FRONAPE, para a

qual permaneceu a reserva de mercado de transporte de petróleo - monopólio), a

intervenção do Estado sobre a gestão do frete foi extinta, prevalecendo as regras de

mercado livre, os recursos financeiros da construção naval e da reparação naval

foram contingenciados.

Hoje prevalecem as regras de mercado e, excepcionalmente, os acordos

bilaterais e multilaterais com a definição de cotas de transporte de cargas e

privilégios para o transporte de cargas estratégicas, simplificação da documentação

exigível, liberação e/ou redução de taxas alfandegárias, firmatura de acordos

operacionais entre empresas de navegação, liberdade de fretes e custos de

serviços, baixa participação do Estado no mercado.

Considerando as assimetrias das relações econômicas internacionais, o

cenário é muito desvantajoso para países com fraca participação no mercado de

fretes (pouca frota própria, de sua bandeira) com consequente evasão de divisas e

fortemente influenciados pela flutuação do valor do frete no mercado internacional,

com reflexos na competitividade de seus produtos na exportação e penalizados na

importação de insumos, o que é o caso do Brasil. São falhas de um mercado

desequilibrado que impõe a atuação regulatória do governo de modo a minimizar os

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efeitos adversos dessa situação. Cabe lembrar que o transporte aquaviário é um

serviço público e, embora proporcionado, em sua grande parte, por empresas

privadas, compete ao governo garantir a oferta desse serviço com qualidade e

eficiência compatíveis com o interesse público que visa atender.

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51

7. ANÁLISE FINAL E CONCLUSÕES

Há quinhentos anos, a conquista do Atlântico por Vasco da Gama abriu um

novo capítulo na história do transporte marítimo, trazendo o conceito da globalização

da troca de mercadorias, que passou a alcançar todos os continentes com o

emprego de embarcações cada vez maiores. É o modal que permite, com maior

flexibilidade, o transporte de grandes quantidades de produtos ao mesmo tempo,

numa única viagem. Um único navio passou a poder saturar o mercado de uma

cidade pela grande capacidade de carga que representa, modificando, inclusive, as

regras de comércio ou o interesse por mercadorias exóticas.

O início da ordenação jurídica do Direito Marítimo se deu com Hugo Grócio

mas o fato que determinou a necessidade dessa ordenação foi a assinatura do

Tratado de Tordesilhas, tanto que, para o seu reconhecimento internacional, buscou-

se a única autoridade universal ocidental – o Papa – pois não havia um fórum ou

tribunal especializado que o fizesse.

Ressalta-se a evolução tecnológica, decorrente do interesse comercial, que

para garantir o sucesso das grandes navegações exigiu o emprego de embarcações

maiores, que possibilitassem se aventurar em águas abertas com um mínimo de

risco (ou com um risco aceitável). Navios maiores também eram um interesse para o

comércio, pois permitiam o transporte de maiores cargas. A entrada de grandes

cargas no mercado determinou novas regras de relação comercial, permitindo

expandir as relações de exportação/importação já que o mercado interno estaria

facilmente abastecido e o excedente de produto obrigatoriamente seria dirigido ao

mercado externo.

Desde o descobrimento do Brasil, o Estado quase sempre foi interventor no

mercado de transportes marítimos. Nas poucas vezes em que adotou uma postura

liberalizante, desreguladora, isso teve consequências negativas para a economia

nacional como um todo, provocando, em reação, o retorno à política interventora

para possibilitar a estabilidade econômica.

De fato, a cada momento nos debatemos com perguntas tais como: Qual o

modelo de desenvolvimento adequado para o Brasil? Qual a política e estratégia

adotadas para o setor de transporte? Onde o transporte aquaviário se insere nesse

modelo?

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A atuação do Estado nos setores de navegação, portuário e de construção

naval é de regulamentador. Logo, não se tratam de mercados livres mas, sim,

regulados. A regulação deve, necessariamente, visar o interesse público e, nesse

contexto, se basear em planos que precisam ser implementados, reavaliados e

concluídos eficientemente. A ação do Estado tem sido e deve ser evolutiva.

Em contrapartida, os mercados em questão são explorados por empresas

privadas, com interesses privados, em parte conflitantes com o interesse público. Às

empresas estrangeiras que controlam empresas brasileiras, a renovação de sua

frota de registro brasileiro não é prioridade estratégica; elas se contentam em manter

a tonelagem para poder afretar navios estrangeiros e colocá-los no REB (Registro

Especial Brasileiro).

O vínculo da política para o desenvolvimento e o transporte aquaviário é

inegável e indiscutível. A falta de uma política eficaz para a formação de uma frota

significativa no longo curso tem um preço alto, que o país tem que pagar para

alcançar o grau de desenvolvimento socioeconômico compatível com suas

ambições.

Considerando que o prazo entre a decisão do armador de construir o navio e

a prontificação desse navio pelo estaleiro é longo (cerca de 5 anos, no Brasil) o

cenário econômico que levou à decisão de melhorar sua frota pode ter variado

significativamente; considerando também os consideráveis custos envolvidos, pode-

se dizer que o transporte aquaviário é uma operação de alto risco. Por outro lado,

como relatado, trata-se de um segmento com alto valor para o desenvolvimento

nacional, o que justifica a participação do governo promovendo medidas de fomento,

como também participando do risco do empreendimento.

No momento atual, onde o comércio exterior do país é sustentado pela

produção agrícola e mineral, característica de uma economia primário-exportadora, e

esses produtos, de baixo valor agregado, sofrem sensível influência do custo do

frete, sazonal e volátil, controlado em bolsas internacionais de acordo com a oferta

de navios que estão nas mãos de grandes corporações transnacionais, se torna

mais premente que o Brasil disponha de uma frota própria que permita um mínimo

de estabilidade de preços de frete. Há necessidade de se priorizar a composição de

uma frota de graneleiros, para suprir nossa demanda de exportação de commodities,

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e de navios de carga geral (em especial, conteneiros) para suprir a demanda do

mercado importador.

Na cabotagem, a situação é um pouco melhor, mas também carece de uma

política específica para incrementar a participação do segmento na matriz de

transporte brasileira.

O transporte aquaviário é propiciado, em sua maior parte, por empresas

privadas, sob regime de economia de mercado, onde prevalece a lei da oferta e da

procura mas, no transporte de petróleo e seus derivados há um monopólio da

PETROBRAS.

Os cinco tipos de navegação que caracterizam o transporte aquaviário –

Longo Curso, Cabotagem, Apoio Portuário, Apoio Marítimo e Interior - são os

previstos em Lei e refletem os cinco mercados distintos que existem por razão

econômica. No caso da navegação interior, também importa a característica

geográfica e social de cada região do país.

Na carga geral, importação/exportação, dominam grandes empresas de

navegação transnacionais, muitas vezes operando em “joint ventures”, o que

favorece a formação de cartéis. O transporte interno de cargas (cabotagem) é

restrito a empresas brasileiras operando navios de bandeira brasileira e a

concorrência se dá entre poucas empresas. A proteção que representa essa reserva

de mercado não favorece a concorrência, tendendo a diminuir a eficiência das

operações e propiciando uma extensão da vida útil dos navios, mesmo que isso

acarrete na operação com maior custo operacional devido à obsolescência de seus

equipamentos, menos automação e maior consumo de combustível.

No apoio portuário, embora haja uma grande quantidade de empresas

operando, há também uma maior diversidade de serviços prestados, cada qual com

suas características específicas, de modo que poucas empresas prestam o mesmo

serviço e isso favorece o cartel.

A navegação de apoio marítimo é relativamente recente. Nasceu com a

exploração de petróleo no mar, prestando serviços de apoio logístico às instalações.

É crescente e moderna, com navios especializados, muitos ainda oriundos de

centros de exploração estrangeiros (Golfo do México, Mar do Norte, Venezuela,

etc.). Apesar da reserva de mercado para embarcações de bandeira brasileira, a

demanda por navios de apoio é maior do que a frota disponível no país, de modo

que o segmento ainda é muito dependente de utilizar navios estrangeiros, operados

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por EBN no regime de afretamento. Aos poucos, esses estão sendo substituídos por

embarcações construídas no Brasil, mais modernas e de projeto melhor adequado à

navegação em mar aberto na nossa plataforma continental.

No longo curso não há reserva de mercado, exceto para petróleo e

derivados e em decorrência de acordos bilaterais no cone sul. O Balanço de

Pagamentos de 2014 foi de US$ 450 bilhões onde cerca de 95% dessa riqueza foi

transportada no longo curso (aproximadamente US$ 425 bilhões). Estima-se que o

frete pago nessa operação de transporte foi de US$ 13 bilhões, dependendo da

forma de cálculo (somente a PETROBRAS gasta US$ 2,5 bilhões/ano no

afretamento de embarcações de apoio marítimo e outro tanto no transporte de

petróleo e derivados).

Fonte: Banco Central

O gráfico mostra o crescimento do déficit da conta transportes (gastos com

fretes) nos últimos 15 anos. Observa-se que ele cresce quase que continuamente, o

que era de se esperar, uma vez que a frota de longo curso de bandeira nacional

apenas cresceu com a incorporação de uns poucos navios à frota da FRONAPE e o

PIB vem crescendo ano a ano. De fato, conforme publicado pelo Banco Central,

nesses últimos 15 anos, o déficit total da conta Transportes foi de US$ 72 bilhões

(somente em 2014, foi de US$ 8,94 bilhões).

A frota de embarcações brasileiras que participa desse segmento não

responde por mais de 5% do total de fretes, valor muito baixo, considerando que

essa participação já foi de mais de 50%. Mesmo na época em que prevalecia o

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sistema de conferência de fretes, cabia à frota nacional um mínimo de 40% de

participação nesse mercado. Com o tempo, isso se perdeu.

O Brasil primário-exportador gasta muito em fretes na colocação de suas

cargas no mercado consumidor externo. Em geral, o preço dessas “commodities” é

volátil, definido nas bolsas internacionais, e as empresas exportadoras dependem

essencialmente da contratação do frete de navios no mercado externo, muitas vezes

em situação desvantajosa quando do pico de procura por esse tipo de navio. A

distância dos mercados consumidores é grande e o custo do frete sobressai. Esse

cenário gera vulnerabilidade para o exportador e mostra a importância de o país

dispor de frota própria que possibilite o controle do custo do frete no preço final do

produto exportado.

O exportador brasileiro também depende do navio contratado no mercado

“spot”36, onde o frete é maior, quando a demanda pela “commodity” também é maior.

Afreta-se o navio por alto custo reduzindo, assim, a margem de lucro da operação

para poder manter um preço final competitivo no mercado.

De certa forma, quando do mercado aquecido, o fretador fatura com um frete

cujo valor, muitas vezes, ultrapassa o da própria carga e sendo a frota estrangeira,

onera-se sobremaneira a conta serviços do Balanço de Pagamentos. Caso o Brasil

dispusesse de uma frota própria, parte desses recursos ficaria interna no país

aquecendo a economia interna e promovendo o desenvolvimento. Ao contrário, hoje

se dá a perda dessas divisas o que fortalece a economia de países concorrentes no

mercado externo.

Hoje, praticamente, não há incentivos (fomento) à navegação de longo curso

– ou, os poucos que existem não são efetivos para alterar o quadro -, que atua, do

ponto de vista do governo, apenas como o provedor principal de receita do AFRMM

à taxa de 25% do valor do frete de importação (o governo se alimenta, também, de

outros impostos como PIS/COFINS, SIDE, ICMS, etc.), o que coaduna com a política

neoliberal praticada quando da formulação da política em vigor para a navegação

mercante. Vislumbra-se, para solucionar a questão da evasão de divisas e ausência

de empresas brasileiras no longo curso (bem como da frota nacional), a volta do

Estado Interventor, a exemplo da política de sucesso praticada nas décadas de

36

Mercado “spot” é o de cunho imediato, não regular, onde o afretador freta um navio por viagem ou por um curto período de tempo. Em geral, atende a demandas não previsíveis de frete decorrentes de

oportunidade, tais como necessidades emergenciais ou excesso de produção de safras.

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19870/80, conduzida pela SUNAMAM, com as necessárias correções de trajetória,

de modo a impedir a reincidência das medidas que levaram à falência do modelo à

época.

Poucas empresas dominam o transporte marítimo de longo curso no Brasil –

Maesrk, Hamburg Sud, CMA CGM e MSC são as principais do segmento de carga

geral conteinerizada. São, todas, megaempresas transnacionais que, atuando em

cartel ou mesmo individualmente, podem impactar sobremaneira o mercado de

fretes exercendo dumping, com claro prejuízo dos interesses nacionais. Nesse caso,

o país teria grande dificuldade em reagir prontamente, uma vez que não dispõe de

frota própria capaz de ofertar transporte concorrente para forçar o reequilíbrio do

mercado.

Quanto ao segmento de granéis, o escoamento da safra agrícola se faz

exclusivamente com navios de bandeira estrangeira, operando em rotas não

regulares, um mercado altamente vulnerável por ser sazonal. Na parte dos minérios,

com maior participação da empresa Vale, essa adquire seus navios no exterior,

utilizando-se de uma empresa subsidiária estrangeira que é a proprietária dos navios

e os mantém sob regime de bandeira de conveniência. Em suma, na operação de

exportação de minério a única parcela da venda que é internada no Brasil é a

referente à entrega da carga no porão do navio. Dali em diante, a remuneração

referente às demais atividades da cadeia produtiva fica no exterior.

Em ambos os casos (carga conteinerizada e granel), o fluxo de cargas é

primordialmente para o exterior, de modo que as operações pouco contribuem para

a receita do AFRMM. São parte significativa da perda de divisas decorrente de fretes

pagos. Assim, o país, nestes segmentos de transporte e no que diz respeito à conta

serviços do balanço de pagamentos, tem apenas ônus, não há qualquer bônus. As

empresas não constroem no Brasil, não utilizam materiais e equipamentos

nacionais, não realizam aqui a manutenção dos navios, não geram empregos, não

pagam taxas e impostos sobre o transporte, não internam no país suas receitas de

fretes.

O governo deve estabelecer mecanismos de fomento à formação de frota

brasileira de longo curso para melhorara o déficit da conta serviços do balanço de

pagamentos. Esses incentivos devem possibilitar às EBN concorrer com os grandes

players internacionais, com fretes semelhantes, sem que tenham risco de sofrer

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dumping dessas grandes empresas, donas de frotas enormes e capazes de fornecer

linhas frequentes por meio de acordos de troca de espaço entre elas.

Podem-se apresentar, ao menos, dois motivos fortes para a concessão de

privilégios no transporte de longo curso:

1 – Melhora do balanço de pagamentos – conta serviços; e

2 – Controle, estabilização e redução do valor do frete, desonerando o valor

dos bens transportados, em especial os das cargas de exportação.

Não há como prescindir dos investimentos privados no setor de transportes

aquaviários, assim como não há como prescindir da regulação desse setor pelo

Estado. A atual política para o setor, refletida nas Leis nº 9.432/97, que regula o

transporte aquaviário e a exploração da infraestrutura portuária, e a Lei nº 10.233/01,

que cria a ANTAQ e o CONIT, encontram-se ultrapassadas e carecem de

aperfeiçoamento, a exemplo do que ocorreu com a Lei nº 8630/93, que dispõe sobre

o regime jurídico da exploração dos portos organizados e das instalações portuárias

que, após 20 anos, foi aperfeiçoada e substituída pela Lei nº 12.815/13.

Os seguintes pontos carecem de revisão:

1) Abertura do capital das empresas brasileiras de navegação a investidores

estrangeiros, sem qualquer restrição: a inexistência de limite de participação do

capital estrangeiro já serviu a seu propósito, de garantir uma sobrevida às EBN;

atualmente, representa um risco elevado de essas empresas estrangeiras,

controladoras de EBN, megaempresas transnacionais, agirem exclusivamente em

defesa de seus interesses promovendo atos que podem vir a ser prejudiciais ao

projeto nacional de promoção do comércio exterior, de fruição de bens transportados

e de desenvolvimento industrial.

2) O afretamento de embarcações estrangeiras para operarem nas

navegações de cabotagem, de apoio portuário e marítimo, restrita às empresas

brasileiras de navegação, deve continuar sujeito à prévia aprovação, em especial

para suprir picos de demanda, mas carece de um mecanismo adicional que impeça

que essas empresas perpetuem os afretamentos.

A figura a seguir mostra que o mecanismo de afretamento de embarcações

estrangeiras continua sendo amplamente empregado pelas EBN, com tendência a

crescimento.

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Fonte: ANTAQ

Na situação atual, as empresas estrangeiras controlam as EBN e suprem

suas necessidades de mercado com o afretamento de navios oriundos de seus

pares no exterior, uma vez que o mercado interno de oferta de embarcações está

saturado e não há risco significativo de bloqueio de uma circularização. Por outro

lado, a facilidade de trazer navios do exterior por afretamento, mesmo com as

limitações regulatórias e o custo Brasil na construção naval, desestimulam a

renovação e modernização da frota nacional.

Uma solução que tem se mostrado eficaz é a adotada pela PETROBRAS

nos programas EBN e de contratação de serviços de apoio marítimo onde os

contratos de longa duração (de 4 a 8 anos) permitem às empresas contratadas a

iniciar a execução dos serviços com embarcações estrangeiras afretadas mas

determinam que essas sejam substituídas por outras nacionais, após um certo

prazo. Os contratos de longa duração tem sido eficientes como atrativo às empresas

que, dessa maneira, garantem uma receita que justifica a construção de novas

embarcações no Brasil. O governo pode adaptar tal solução para as licitações de

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dragagem e passar a licitar a exploração de linhas de navegação com obrigações

semelhantes, quebrando o paradigma atual de que as EBN atuem com outorga na

modalidade de autorização.

3) A liberação do afretamento de embarcações estrangeiras na navegação

internacional, cuja única restrição é a prévia aprovação quando do transporte de

cargas prescritas à bandeira brasileira, provocou a quase extinção das EBN de

transporte no longo curso, com a consequente perda de divisas e do controle

estratégico desse segmento.

Faz-se necessária a criação de novos mecanismos de fomento, como tornar

os recursos da conta vinculada do AFRMM não contingenciáveis, de modo a tornar

efetivo o efeito desonerador do frete que representa a liberação desses recursos

financeiros, e dispensar as EBN de Longo curso do recolhimento do AFRMM, até

mesmo por que a parcela de contribuição dessas empresas, hoje, é muito pequena,

pois pouco participam do transporte no Longo Curso e a perda de receita com o

crescimento da participação dessas EBN no mercado externo pode ser compensada

pela entrada de dólares na conta serviços do balanço de pagamentos. É possível,

também, que ocorra uma queda do valor do frete uma vez que haverá maior

concorrência e, assim, os bens nacionais exportados terão preço mais competitivo

no mercado exterior.

4) A obrigação do transporte de cargas prescritas em navios de bandeira é

inócua uma vez que não existem esses navios, obrigando a Agência Reguladora

(ANTAQ) a aprovar praticamente todas as solicitações de transporte em navios de

bandeira estrangeira que lhe são apresentadas. Por outro lado, a quantidade de

carga prescrita transportada no comércio de importação não é significante a ponto

de estimular as empresas a criar uma frota de bandeira brasileira para suprir essa

demanda.

A perda de divisas e a fragilidade estratégica de o país não possuir uma

frota nacional de longo curso, por si só justificam a revisão desse dispositivo de

fomento para propiciar a reforma desse cenário desolador.

5) Considerando que vários mecanismos de fomento ao segundo registro no

Brasil não se mostraram viáveis (como a redução do custo de combustível da

cabotagem e dos custos trabalhistas), a criação de Registro Especial Brasileiro -

REB para as embarcações de bandeira brasileira, não surtiu os efeitos desejados,

quais sejam:

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A realização do registro de novas embarcações no país, ao invés do

emprego de bandeiras de conveniência;

A transferência, para o país, do registro de embarcações que se

encontram sob regime de bandeira de conveniência; e

Secundariamente, o estímulo à cabotagem em comparação com o

transporte em outros modais.

É necessário que o Estado tenha a Marinha Mercante e a Indústria Naval

como necessidades estratégicas, bem como tenha vontade política para desenvolvê-

la37. De fato, há que se tratar ao transporte aquaviário como uma política de Estado.

No momento, falta ao país promover o caminho contrário ao que vem sendo

praticado, ou seja, estimular a existência de EBN com participação de capital

nacional tanto na cabotagem quanto no longo curso, com frota própria registrada no

Brasil, que possa atuar de modo a estabilizar o custo de fretes e estancar a perda de

divisas, atendendo aos anseios do interesse público acima daqueles do interesse

privado internacional.

Por fim, cabe ao governo reforçar a capacidade de atuação da ANTAQ,

garantindo que seus recursos sejam não contingenciáveis e ampliando seus poderes

de fiscalização da atuação de empresas de navegação estrangeiras.

37

CASTRO, Wellington. Os Navios Mercantes Brasileiros com potencial de Apoio nas

Operações Navais. Monografia. Rio de Janeiro: Escola de Guerra Naval, 2007. P.3.

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61

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63

APÊNDICE A - A formação de uma Nação Marítima: de 1500 à primeira metade

do século XX

Pode-se dizer que a história da navegação no Brasil começou em 9 de

março de 1500, quando a frota comandada por Cabral partiu de Portugal. Desde

então, Portugal controlou e explorou por várias décadas todo o transporte marítimo

do Atlântico ao sul do equador, garantindo interesses comerciais e a posse de novos

territórios.

Portugal tinha, como principal marco para assim proceder e resguardar seus

interesses, o tratado de Tordesilhas (assinado em 1494) que, como se sabe,

partilhava terras a partir da linha imaginária que passa a 370 léguas das ilhas de

Cabo Verde - as descobertas a leste dessa linha ficariam para Portugal e as

encontradas a oeste, para a Espanha.

Período pré-colonial – de 1500 a 1530

A viagem da frota de Cabral, segunda travessia portuguesa à fonte de

especiarias nas Índias, tinha caráter tanto comercial quanto político e militar. Após

uma escala de dez dias no lugar que chamou de Ilha de Vera cruz, seus navios

retomaram o rumo ao oriente em busca do comércio de especiarias, não sem antes

aproveitar para realizar alguma exploração visando identificar potenciais riquezas a

explorar.

Muito embora se vislumbrasse outra fronteira comercial, representada pelo

extrativismo na nova colônia, a sedução do rico tráfego com as índias e os altos

custos correspondentes, que endividaram a coroa portuguesa, restringiam a função

do Brasil a um simples ponto de apoio de manutenção e reabastecimento por cerca

de três décadas. Esse período ficou conhecido como pré-colonial onde,

esporadicamente, se extraía o pau-brasil, Item de boa atratividade no mercado

europeu.

Apenas em 1530, o rei de Portugal organizou uma expedição com objetivo

específico de iniciar a colonização do Brasil. Comandada por Martin Afonso de

Souza, visava, também, expulsar os invasores franceses e coibir as visitas de

ingleses e holandeses que questionavam a validade do Tratado de Tordesilhas, bem

como iniciar o cultivo de cana-de-açúcar.

Naquele momento, as expedições comerciais às Índias já não se mostravam

tão atrativas tendo-se em conta o considerável capital que era necessário para a

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aventura, o total controle do Estado monopolista, o risco envolvido e o período de

retorno do investimento (cada viagem durava, no mínimo, 15 meses). Por outro lado,

a exploração do pau-brasil trazia bem menos lucro mas o investimento necessário

era muito menor, podia ser dividido entre vários parceiros e as viagens eram bem

mais curtas (3 a 4 meses).

O Estado português atuava como regulador com o emprego de Cartas

Régias, instrumentos que legitimavam os atos que seriam necessariamente

praticados para viabilizar tal empreendimento.38

Nos dois casos observamos que todo o tráfego de cargas passava

obrigatoriamente por portos portugueses, ou seja, nenhuma mercadoria trazida tanto

das colônias quanto dos entrepostos da África e do oriente podia ser negociada e

transportada diretamente para algum mercado consumidor sem antes passar pelas

cidades do Porto ou Lisboa onde se fazia a internação das cargas e se cumpriam os

ritos alfandegários. Essa obrigação ficou conhecida, posteriormente, como “Pacto

Colonial”.

O governo participava diretamente do transporte de cargas originadas no

Oriente através da Companhia das Índias Orientais. Quanto às cargas oriundas do

Brasil, essas, por serem de baixo valor agregado (Pau Brasil, principalmente),

davam menor retorno financeiro e a Coroa Portuguesa não atuava diretamente na

empreitada, apenas usufruía da receita dos impostos.

Brasil-Colônia

A decadência do comércio com o Oriente, a partir de meados do século XVI

onde passou a sofrer de ampla concorrência, levou Portugal a se voltar para a

exploração da sua principal colônia. Buscando viabilizar o plano das Capitanias

Hereditárias (de fato, uma política de transferência dos encargos para o setor

privado), plano esse que havia sido aplicado com sucesso em outras colônias, foi

autorizado o tráfego aquaviário entre pontos do litoral brasileiro, o que classificamos,

hoje, como navegação de cabotagem. No entanto, a exportação de produtos

continuava a ser realizada apenas para portos portugueses.

Com a implantação do sistema de Capitanias, o tráfego marítimo

rapidamente cresceu, tanto na rota para Portugal, levando produtos extraídos da

mata brasileira e o açúcar que despontava como principal fonte de riqueza, quanto

38

Maria Leonor Freire Costa - A Rota do Cabo e a As rotas do Brasil - Seminário “O mundo que o

Português criou”.

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ao longo do litoral brasileiro, pois era a principal forma de locomoção entre as

feitorias instaladas. A colônia brasileira continuava a ser um importante ponto de

escala dos navios utilizados na rota das Índias mas, aos poucos, esses navios,

maiores, foram sendo utilizados na rota Brasil-Portugal no transporte de açúcar.

Em 1560, Portugal já não mais detinha o controle do tráfego marítimo no

Atlântico Sul. Outras nações passaram a disputar o mercado do oriente e também

nosso litoral. Aqui, enquanto a exploração do Pau Brasil, extrativista, se reduzia, as

plantações de tabaco e cana de açúcar floresciam. Na Ásia, ao contrário, Portugal

perdia espaço para a Inglaterra e a Holanda. Assim, o interesse comercial se

passou, aos poucos, para a colônia.

No Brasil não havia estradas e tanto o tráfego de pessoas quanto o de

cargas era essencialmente realizado por via marítima. Não por acaso as primeiras

povoações ao longo de tão vasto litoral surgiram em locais com facilidades de

fundeio e abrigo para as embarcações - baías, enseadas, foz de rios, angras...

Também a interiorização do continente dependeu fortemente da utilização de vias

navegáveis interiores, de modo que o espírito marítimo fazia parte da vida da

população. Toda a navegação era realizada exclusivamente por embarcações

portuguesas, uma vez que essa atividade era vedada a empresas estrangeiras.

Em todo o período colonial o Brasil continuou vivendo da produção agrícola,

oprimido pela proibição da instalação de manufaturas e com a economia sufocada

pela obrigação de escoar sua produção unicamente por portos portugueses.

Mesmo a descoberta do ouro em Minas Gerais, na virada do século XVII

para o século XVIII, não trouxe desenvolvimento para a colônia brasileira mas, sim,

financiou a nação portuguesa então empobrecida e cada vez mais dependente da

Inglaterra, e serviu, também, para possibilitar a reconstrução da cidade de Lisboa,

destruída pelo terremoto de 1755.

O grande passo para o progresso da colônia se deve à guerra continental

conduzida por Napoleão, que obrigava as demais nações europeias a se alinharem

à França ou Inglaterra. Portugal dependia economicamente da Inglaterra e, não

restando alternativa, em 1808 a corte portuguesa se mudou para o Brasil, onde

encontrou um ambiente de relativa tranquilidade, tendo sido reprimidas as invasões

francesa e holandesa e debelada a Inconfidência Mineira.

Naquele momento teve início uma nova era na História do Brasil. A colônia

foi a grande beneficiada com a transferência da Corte. A presença da administração

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real criou, pouco a pouco, condições para sua futura emancipação política que, em

pouco tempo, tornou-se irreversível. De imediato, ocorreu a revogação do ato que

proibia a instalação de manufaturas e, em seguida, a abertura dos portos às nações

amigas (em 28 de janeiro de 1808) o quê, na prática, extinguiu o pacto colonial.

A navegação teve forte alento em uma época na qual os grandes

proprietários locais havia muito reivindicavam o livre comércio com as nações

estrangeiras. Deve-se lembrar que estavam obrigados a escoar suas mercadorias

através por Portos Portugueses, o que encarecia o produto final devido aos custos

adicionais de transporte, diminuindo sua competitividade e, com isso, os prazos para

entrega de mercadorias aos mercados consumidores aumentavam

consideravelmente. Por outro lado, os preços das mercadorias eram regulados pela

Coroa, que cobrava taxas nas operações de importação/exportação e essas não

revertiam, necessariamente, na melhoria das condições do comércio exterior

brasileiras.

O quadro a seguir, que descreve o movimento de navios no Rio de Janeiro

entre 1805 e 1820, retrata uma nova posição da economia da colônia após as

medidas adotadas pela Coroa, com significativo crescimento a partir de 1808:39

Ano\navios Portugueses Estrangeiros

1805 810 -

1806 642 -

1807 777 1

1808 765 90

1809 822 83

1810-1815 (média/ano) 1214 422

1819 1313 350

1820 1311 354

Período Brasil Império

1822 - o Brasil se tornou independente de Portugal - o “status” de Reino se

manteve e, quanto à navegação marítima, o tráfego permaneceu aberto a outras

nações. O primeiro e principal esforço de D. Pedro I foi de manter a integridade

39

Paulo Roberto de Almeida, coletânea “A Abertura dos Portos”, pp 264, citando R. Simonsen.

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nacional40 e, nesse sentido, a navegação cumpriu um papel essencial, propiciando a

ligação dos centros produtivos e consumidores ao longo de todo o litoral brasileiro.

Não havia estradas, apenas trilhas de tropeiros. Os percursos, por terra,

eram arriscados, penosos, demorados. Nesse país, de dimensões continentais, o

melhor meio de transporte era o aquaviário, muito embora prestado por

embarcações pequenas e de propulsão à vela. De fato, a navegação possibilitou

manter a integridade da Nação e a ampliação dos territórios.

Em 1850, o governo de dom Pedro II extinguiu definitivamente o tráfico de

escravos. Aos poucos, os imigrantes europeus assalariados passaram a substituir os

escravos no mercado de trabalho, principalmente nas fazendas de café, em

expansão. O Brasil, ainda uma nação essencialmente agrícola, exportava açúcar,

café e tabaco, enquanto a produção de cacau se expandia. A extinção do tráfico de

escravos também coincidiu com a alta do café no mercado internacional. O País,

agora independente e passado o período de carência de recursos, promovia uma

política de expansão de manufaturas e crescimento agrícola. Essas riquezas

necessitavam ser escoadas, de modo que a navegação reagiu proporcionalmente.

A pesquisa em documentos históricos traz referências a grandes armadores,

investidores nesse segmento do transporte, setor de alto risco, dependente da

sazonalidade inerente à produção agrícola e que envolve grande aporte de recursos

financeiros para a obtenção e armação das embarcações. Em um mercado com

essas características, o governo estabelecido precisou se valer de recursos privados

para promover ações de estado, no caso em lide o estímulo à atividade de

transporte marítimo e, por associação, na promoção da construção e reparação

navais, na forma de concessão de incentivos fiscais e financiamentos à iniciativa

privada.

Nesse cenário, surgiram empresários de visão mais ampla, conhecedores

dos meandros da política e do sistema bancário, com estratégias empreendedoras.

Tanto na construção naval quanto na navegação, na segunda metade do século XIX

40

Laurentino Gomes – 1822 – Depois de 13 anos de permanência no Rio de Janeiro, o Rei D. João

VI havia raspado os cofres nacionais. O novo país nascia falido. Faltavam dinheiro, soldados, navios, armas e munição para sustentar a guerra contra os portugueses, que se prenunciava longa e sangrenta. As perspectivas de fracasso, portanto, pareciam bem maiores que as de sucesso. ..

“Quando se olha para trás, 1822 parece um milagre. É inacreditável como uma parte da elite brasileira conseguiu envolver o príncipe regente nos seus planos, separar-se de Portugal e, principalmente, manter o país unido quando tudo indicava que o caminho mais provável seria a

guerra civil e a fragmentação territorial.” (citando o VA(RRm-EN) Armando de Senna Bittencourt).

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destacou-se um nome: Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, patrono da

Marinha Mercante Brasileira.

Em 1845, Mauá criou e instalou os estaleiros da Companhia Ponta de Areia,

Niterói, com o que iniciou a indústria naval brasileira onde, em 11 anos, foram

construídos 72 navios, a vapor e/ou a vela. Suas instalações foram destruídas por

um incêndio, em 1857, e sua reconstrução se fez com considerável investimento.

Contudo, com a promulgação da Lei que, em 1860, isentou de impostos a

importação de navios, a empresa faliu.

Ainda no período no qual gozava das boas graças do governo, Irineu

Evangelista foi convidado a montar uma linha de navegação no Amazonas, para que

essa área fosse ocupada e, ao mesmo tempo, evitar “uma possível invasão norte-

americana”41. Como incentivo, recebia uma subvenção anual e direito de exploração

de extensas linhas. Quando o Império brasileiro retirou privilégios e liberou a

navegação do rio Amazonas a todas as nações (1870), Mauá vendeu seu negócio

de transportes a empresários ingleses.

A República

1889 – Proclamada a República. A política econômica do novo Governo,

conduzida pelo Ministro da Fazenda, Rui Barbosa, como não podia deixar de ser,

era profundamente nacionalista e favorecia a formação de empresas brasileiras de

navegação. As duas mais importantes foram o Lloyd Brasileiro (LB), empresa estatal

operadora no Longo Curso, e a Companhia Nacional de Navegação Costeira,

empresa privada operadora na Cabotagem e Longo Curso.

Criação do Lloyd Brasileiro

A empresa de navegação Lloyd Brasileiro foi criada em 1890, após a

Proclamação da República, quando o governo ordenou a fusão das empresas de

41

O Brasil e o mar no século XXI, Cembra, Pp xx-4 (www.cembra.org.br). Pode-se assinalar o ano de

1826 como o do primeiro conflito de interesses entre Brasil e Estados Unidos quanto ao Rio Amazonas. Naquele ano, o navio americano a vapor Amazon obteve autorização para descarregar no Pará e navegar a frete entre as povoações das margens do rio. Chegando ao destino, o vapor

pretendeu seguir rio acima com carga própria destinada a países estrangeiros, o que não lhe foi autorizado, uma vez que o rio era fechado à navegação, desde o tempo de Brasil Colônia. Tal foi o marco de amplo movimento político, orientado pelos Estados Unidos, tendente à abertura do Rio-Mar

à livre navegação, procurando envolver interesses preexistentes não só dos países ribeirinhos superiores (Peru, Equador, Venezuela, Nova Granada e Bolívia) como da Inglaterra e da França. Várias ações sucederam-se até a solução do assunto, em 1867 (mais de 40 anos após seu início,

portanto), quando decidiu o Brasil, por decreto, abrir o Rio Amazonas à navegação internacional, até Tabatinga; o Rio Madeira, até São Borja; o Rio Negro, até São João da Barra; e o Rio Tapajós, até Santarém.

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quatro armadores privados que recebiam subsídios estatais. A intenção do governo

foi de manter controle do transporte de cargas para o mercado externo,

principalmente garantir o escoamento da produção agrícola nacional. Empregando

navios mistos (carga geral/passageiros), o LB atuou em linhas regulares para a

América do Norte, Europa e Bacia do Prata. Em 1939 sua frota comportava o

expressivo número de 122 navios.

Companhia Nacional de Navegação Costeira

Na esteira da influência nacionalista, considerando que o artigo 13 da

Constituição Brasileira de 1891 estabelecia que “a navegação de cabotagem será

feita por navios nacionais”, o pai de Henrique Lage fundou, ainda em 1891, a

Companhia Nacional de Navegação Costeira, um dos alicerces de um “império” que

durou 50 anos.42 Com recursos próprios, iniciou sua frota com a aquisição de

embarcações de empresas brasileiras em dificuldades financeiras e a encomenda de

navios no exterior. Em menos de 2 anos, a companhia adquiriu 12 navios, todos com

nome começando por “Ita” tornando-se, em pouco tempo, uma das principais

empresas de navegação do Brasil.

A direção da Costeira, em 1915, realizou gestões junto ao governo e

conseguiu que fossem aprovadas leis de incentivo à construção naval, o que

compôs o denominado “Plano Naval Wenceslau Braz”. As bases do plano foram43 a

abolição de impostos, a instituição de prêmios por navios construídos e a concessão

de empréstimo para a modernização e o aparelhamento dos seus estaleiros na Ilha

do Vianna.

Henrique Lage foi obrigado a assumir o controle dos negócios da família em

1918, após a morte de seu pai e, pouco tempo depois, de seus dois irmãos. No ano

seguinte, Lage obteve uma outra medida de apoio à construção naval nas

instalações da Costeira44: a concessão à Companhia, pelo prazo de dez anos, de

isenção de impostos de importação e de taxas de expediente.

42

Carlos Alberto Campello Ribeiro - Rio de Janeiro: UFRJ/IFCS, 2007 - Henrique Lage e a

Companhia Nacional de Navegação Costeira: a história da empresa e sua inserção social (1891-1942) - “..., no início da República, aproveitando as facilidades previstas na primeira Constituição republicana, que estabelece o monopólio da cabotagem nacional por navios brasileiros, e nas

medidas econômicas adotadas pelo então ministro da Fazenda Rui Barbosa, que facilitam a formação de sociedades anônimas, Antonio Martins Lage Filho, neto do primeiro Antonio Lage, funda, em 7 de fevereiro de 1891, a Companhia Nacional de Navegação Costeira, empresa gerada a partir do capital

familiar dos Lages, acumulado, principalmente, pela comercialização do carvão importado. Assim, é dado início ao conjunto de aproximadamente 30 empresas formado, mais tarde, por Henrique Lage.” 43

Lei nº 3.454/1918. 44

Decreto nº 13.700/1919.

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Na tentativa de melhorar a condição das receitas provenientes dos fretes,

Henrique Lage fundou, em 1934, a Conferência de Navegação de Cabotagem,

formada pelas empresas Lloyd Brasileiro, Comércio e Navegação, Carbonífera

Riograndense e as controladas por Henrique Lage. Mais tarde, a Conferência deu

origem ao “Syndicato de Armadores Nacionais”, atual SYNDARMA.

Em julho de 1941, portanto, em plena guerra, morreu Henrique Lages cujo

único herdeiro era sua esposa, de nacionalidade italiana. A Itália estava em guerra

com o Brasil. Isso precipitou que, em 1942, as empresas do grupo fossem

incorporadas ao patrimônio nacional e seus navios transferidos para o LB.

A 2º Grande Guerra e o pós-guerra

O transporte aquaviário sempre foi reconhecido como uma atividade

estratégica. Durante a Guerra, a preocupação com essa atividade se tornou mais

premente, exigindo, do Governo, a definição de uma política própria para o setor.

Portanto, em 1941 foi criada a Comissão de Marinha Mercante – CMM, com a

obrigação de formular a política para os setores de navegação e construção naval.

O fim do conflito em 1945 desacelerou a ação governamental no setor sem

que se tivesse implantado uma solução concreta. A renovação da frota privada

continuou sendo realizada com a importação de navios e, no Governo Dutra, ocorreu

a encomenda, no Japão, de uma série de navios-tanques, que deu origem, em 1950,

à Frota Nacional de Petroleiros (Fronape).

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APÊNDICE B - Características da navegação de longo curso

Transporta-se todo tipo de carga no longo curso. Cada operação tem

características distintas e soluções logísticas específicas. Por exemplo, os granéis

são cargas de baixo valor agregado, em geral com preço determinado no mercado

internacional e alta volatilidade, onde o frete afeta consideravelmente o valor final do

produto; portanto, são empregadas embarcações de grande capacidade de carga e

que trafegam a baixa velocidade para economia de combustível e correspondente

redução do custo operacional. Já os navios conteneiros transportam carga de maior

valor agregado onde o prazo de entrega passa a ser preponderante, de modo que

as embarcações trafegam a maior velocidade e investe-se muito em mecanismos de

redução do tempo no porto, em operação de carga e descarga.

A seguir, apresentam-se as operações de maior incidência.

A) Transporte de petróleo e seus derivados

Trata-se de uma operação que é monopólio da União e que tem por

características:

Transporte de granéis líquidos em navios tanque

Carga de baixo valor agregado

Atendido pelo mercado industrial em linhas regulares - ou pelo

mercado “spot”, em situação de pico de demanda45

As embarcações empregadas são classificadas por seu porte:

1. Handysize (10.000 a 30.000 TPB) – para portos de calado reduzido

2. Handymax (30.000 a 50.000 TPB) – transporte de derivados

3. Panamax (50.000 a 79.000 TPB) – Limite do Canal do Panamá: navio

com boca até 32.2 m, calado até 12,0 m, comprimento até 228,5 m

4. Aframax (80.000 a 105.000 TPB) – Limite dos portos africanos:navio

com boca até 44,0 m, calado até 15,0 m, comprimento até 250,0 m

5. Suezmax (120.000 a 150.000 TPB) – Limite do Canal Suez: navio

com boca até 48,0 m, calado até 16,0 m, comprimento até 275,0 m

6. VLCC – sigla para very large crude carrier (200.000 a 350.000 TPB)

7. ULCC– sigla para ultra large crude carrier (Acima 350.000 TPB)

45O mercado “spot” é eventual, não regular, realizado em navios afretados por viagem.

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B) Transporte de Produtos Químicos (granel líquido)

Principais cargas:

GLP - em tanques não estruturais, pressurizados

Ácidos sulfúrico e fosfórico

Soda cáustica

Soluções de monopropilamina

Amônia

Dicloreto de etileno

Butil Glicol, etc.

C) Transporte de Granéis sólidos

Características da operação:

Transporte de Commodities

Rotas variáveis sob forte influência sazonal

Mercado por viagem (“spot”)

Navios negociados em Bolsas de Afretamento

Fretes negociados por tonelada com preços de frete de alta

volatilidade determinada por leis de mercado

Embarcações - classificação pelo tamanho:

1. Handysize – (10.000 a 30.000 TPB) – para portos de calado reduzido

2. Handymax - (30.000 a 50.000 TPB) – transporte de cargas reduzidas

3. Panamax – (50.000 a 80.000 TPB) - Limite do Canal do Panamá –

navio com boca até 32.2 m

4. Aframax– (80.000 a 105.000 TPB) – Limite determinado por portos

africanos

5. Cape Sized – (Acima de 120.000 TPB) - Rota do Cabo da Boa

Esperança

6. ULBC – (acima de 300.000 TPB) - rotas fixas no transporte de

minérios

7. Valemax – (até 400.000 TPB) – rota fixa Brasil/China, navios

utilizados pela empresa VALE

Principais rotas:

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Minério de ferro e outros minérios:

De: Brasil, Austrália, Índia, Canadá, Peru, Chile e Venezuela

Para: China, Japão, EUA e Europa

Produtos agrícolas (grãos e farelo):

De: EUA, Brasil, Argentina, Austrália e Canadá

Para: todo o mundo, principalmente China e Europa

D) Transporte de Neo Granéis:

Veículos

Produtos siderúrgicos

Produtos florestais

Em geral, nesse caso são realizados contratos de Longo Prazo

empregando rota fixa.

E) Transporte de Carga geral

Características da operação:

Rotas fixas (“liners”)

Navios conferenciados ou independentes

Transporte de produtos manufaturados

Uso intensivo de contêineres

Pouca influência sazonal

Serviço controlado por grandes corporações transnacionais

Fretes negociados por tonelada, volume ou quantidade com preços de

baixa “volatilidade” determinada por leis de mercado

Tendências no mundo:

Serviços “round-world” entre grandes portos concentradores de carga

(“hub ports”) atendidos por linhas de navegação dedicadas (serviço “feeder”)

atingindo destinos secundários de cabotagem

Emprego de Acordos Operacionais (“Joint Services”) entre empresas de

navegação substituindo as conferências de frete tradicionais (“cross slot

charters”, etc.)

Influência crescente dos NVOCC (ver item E abaixo)

Tendências no Brasil:

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Emprego de Terminais especializados (“portos concentradores”),

associado a serviços de cabotagem (“Feeder”)

Aumento do intermodalismo (operação conjunta com outros modais de

transporte, principalmente o ferroviário, o rodoviário e o de navegação

interior)

O operador NVOCC

A sigla NVOCC significa Non Vessel Operator Common Carrier ou, numa

tradução literal, transportador que não é operador de navio.

Os NVOCC são empresas consolidadoras de carga que foram criadas, nos

anos 80, pelos próprios armadores que preferiam não se dedicar a consolidar

pequenas cargas. A operação de consolidação de cargas é a de recolhimento de

cargas de clientes distintos, seu embalamento (em geral, em contêineres) e controle.

Os NVOCC, então, compravam espaço nos navios full-containers

(especializados para o transporte de contêineres) para embarcar seus contêineres

com cargas consolidadas de diversos clientes. Acontece que, com o tempo, os

NVOCC formaram carteiras de clientes próprios com grandes cargas tornando-se,

de certa forma, concorrentes dos próprios armadores.

Com o tempo, tornaram-se grandes operadores logísticos, operando com

contêineres em rotas determinadas, podendo compartilhar o espaço desse contêiner

com vários embarcadores e até mesmo com outros agentes NVOCC.

Essa atividade surgiu com a expansão dos navios porta-contêineres, que

criaram para os pequenos embarcadores o problema de ter que pagar por um

contêiner inteiro mesmo quando ocupava apenas pequena parte dele, ou senão se

sujeitar a aguardar novas cargas para que compensasse ao armador (proprietário de

navio) arcar com os custos da operação do contêiner e compartilhá-lo com dois ou

mais embarcadores. Um embarque em contêiner exige o trabalho de ovação

(carregamento) e, por se tratar de uma grande unidade de carga (um contêiner de 20

pés mede 2,20 x 2,20 x 6,00m e pode carregar até 24 toneladas) exige também

manuseio especializado e com equipamentos apropriados. Os contêineres são

geralmente alugados por viagem. Para o armador, o trabalho e os custos de

operação em terra do contêiner o obrigava a manter equipes especializadas em

logística e investimento de áreas de armazenagem e de equipamentos de manuseio

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que fugiam da sua especialização, a de operar os navios, daí surgindo a

necessidade de empresas que se encarregassem dessa operação, cuidando de

todos os detalhes até seu embarque no navio.

Para o NVOCC operar, ele precisa ter um correspondente no porto de

destino, que faz o desmembramento do embarque, descarrega o contêiner e o

devolve ao armador, além de outros trabalhos relativos aos controles aduaneiros

demandados nessa operação e alguns aspectos relativos aos controles das

autoridades marítimas dos países envolvidos, incluindo-se seguros e garantias

relativas às multas aplicáveis quando ocorrem erros nessa operação.

O NVOCC é emissor de seu próprio Conhecimento de Transporte (B/L) e a

Lei Brasileira somente admite a emissão de Conhecimento de Transporte por

Empresa Brasileira de Navegação ou, no Longo Curso, na carga de importação. A

alternativa é o emprego de empresa de transporte registrada na ANTT – Agência

Nacional de Transportes Terrestres como OTM - Operador Multimodal.

Acordos Operacionais

O Acordo Operacional é aquele celebrado entre empresas brasileiras e

estrangeiras de navegação, com o propósito de racionalizar o emprego da frota em

serviços regulares, através da troca de espaços, segundo os princípios da

equivalência e reciprocidade, no transporte marítimo internacional de contêineres,

entre embarcações operadas por empresas estrangeiras e embarcações, próprias

ou afretadas, operadas por empresas brasileiras de navegação.

Caso o Acordo Operacional seja homologado pela ANTAQ, os espaços

disponibilizados para as empresas brasileiras participantes de Acordo poderão ser

considerados para bloquear solicitações de afretamento por viagem para transporte

de carga prescrita em navios de bandeira estrangeira, uma vez que o espaço em

navio estrangeiro trocado com o navio é considerado com as prerrogativas de

bandeira brasileira pelo princípio da reciprocidade.

Os Acordos Operacionais são “Joint Services” entre empresas de navegação

e é comum serem firmados entre grandes operadores estrangeiros de tráfego

internacional de modo a sempre poder garantir a oferta, em datas fixas, de espaços

para contêineres a bordo, mantendo a regularidade das linhas.

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APÊNDICE C - Características da navegação de Cabotagem

A definição legal de navegação de cabotagem diz que é a realizada entre

portos ou pontos do território brasileiro, utilizando a via marítima ou esta e as vias

navegáveis interiores. Considerando uma classificação puramente geográfica, a

navegação de cabotagem pode ser definida como a que ocorre próximo à costa e

alcançando portos em vias interiores (rios, lagos, angras, baías, etc.). Nesse foco,

criou-se o conceito da “grande cabotagem” ou “cabotagem internacional”, realizada

na costa atlântica, indo da Venezuela aos países do MERCOSUL.

Historicamente, observa-se que o país sempre dependeu fortemente de sua

navegação de cabotagem para promover a circulação de mercadorias e de pessoas

ao longo de seu imenso território. Cita-se que, até meio século atrás, 90% da

população brasileira vivia a menos de cem quilômetros da costa. Tínhamos poucas

estradas e uma frota de veículos insipiente. Por outro lado, o país construiu mais de

meia centena de portos com movimentação considerável, o que é verificado nas

fotografias disponíveis onde impressiona a quantidade de navios, trapiches e

embarcações de carga e descarga.

Assim, em 1951, a navegação de cabotagem foi responsável por 27,5% da

produção de transportes no Brasil; a partir de então, com a política de investimentos

do governo em rodovias, a extinção da SUNAMAM (em 1988) e a

desregulamentação do setor de navegação (com a adoção dos conceitos

econômicos da política neoliberal), esse percentual veio caindo, alcançando seu

ponto mínimo em 1994, quando respondeu por apenas 10% da produção de

transportes.

Naquele momento, fatores como a degradação das estradas de rodagem, o

crescimento do roubo de cargas nobres, de alto valor agregado, transportadas por

rodovias, os aumentos de custos de transporte rodoviário em decorrência dos custos

de combustíveis, pedágio, manutenção, salários e seguros, em conjunto com a

defesa de interesses comerciais das empresas de navegação de cabotagem

associadas ao serviço “feeder” para a navegação de longo curso, em sua maior

parte suportadas com recursos estrangeiros aplicados em empresas de navegação

nacionais mas de capital externo, que forçaram o governo a estabelecer políticas de

estímulo ao setor da cabotagem e tornaram esse segmento mais competitivo.

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77

Em um primeiro momento, o governo acenou com a publicação da Lei nº

8630/93, alterando o regime jurídico da exploração dos portos terminais portuários.

Desde 1997, o transporte de carga geral na cabotagem tem apresentado

crescimento significativo.

Cabe ressaltar que essa reação do setor de navegação se deve muito mais

ao clamor das empresas envolvidas, tanto na prestação dos serviços de transporte

quanto das usuárias desses serviços, do que da política governamental de fomento

à atividade como fator de desenvolvimento nacional, uma vez que o crescimento

econômico provocou uma maior atividade de transporte no longo curso que levou, a

reboque, o crescimento proporcional da cabotagem. Por conta disso, o governo

voltou a regular o mercado, propiciando um ambiente estável para o investimento

que se fez necessário.

Transporte de contêineres na cabotagem comparado aos demais modais

Atrativos Problemas

Custo do frete Carência de linhas regulares

Segurança da carga Grande número de tarifas

Menor avaria das mercadorias Ineficiência portuária

Elevado custo da estiva

Excesso de burocracia

Fonte: Pesquisa CNT – 2006

A concorrência com o modal rodoviário ainda é muito acentuada mas tende

a decrescer, com a maior especialização das empresas de logística, incremento da

infraestrutura portuária, menores custos e maior segurança do transporte aquaviário.

Isso afeta o planejamento estratégico das empresas de navegação, por envolver

grandes investimentos a médio e curto prazos.

O movimento de cargas na cabotagem tem crescido cerca de 3,5% ao ano,

acompanhando o crescimento do longo curso. A carga de maior volume é de granéis

líquidos, preponderantemente petróleo e seus derivados. Também competem nesse

segmento produtos químicos diversos, GLP e álcool. Em segundo lugar aparecem

os granéis sólidos, principalmente soja (de transbordo), milho, trigo e sal. O gráfico a

seguir mostra a proporção entre os vários tipos de carga, sendo a mais nobre, de

maior valor agregado, os contêineres.

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Fonte: ANTAQ

A demanda pelo transporte de contêineres na cabotagem

Para a chamada “grande cabotagem”, há um considerável volume de

movimentação de contêineres na região do Caribe, por conta do tráfego com o maior

parceiro comercial do Brasil, os EUA, e o acesso ao canal do Panamá, onde também

se realiza um considerável volume de operações de transbordo.

A segunda maior movimentação de contêineres situa-se na costa leste da

América do Sul, na região compreendida entre os portos do Rio de Janeiro e de

Buenos Aires, onde há a maior concentração de atividade econômica.

No entanto, no ponto de vista da legislação brasileira, essas operações se

enquadram na navegação de longo curso, muito embora sejam complementares as

linhas regulares de cabotagem realizados pelas EBN. De fato, o Brasil é o principal

movimentador de contêineres na costa leste da América Latina, incluindo, aí, o

tráfego de cabotagem tanto de cargas locais quanto as cargas de transbordo das

operações “feeder” associadas à navegação de longo curso.

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79

Fatores para o desenvolvimento do transporte marítimo de cabotagem

Extensão do litoral brasileiro - 7.400 km (8.000 km, se considerada a hidrovia do rio Amazonas até o porto de Manaus)

Atividade econômica com grande concentração junto ao litoral

Principais centros consumidores distribuídos ao longo do litoral

Considerável rede de portos e terminais

Modais rodoviário e ferroviário atendem com deficiência os centros econômicos dos

estados

Hidrovia é um excelente meio de acesso aos portos (exige poucos investimentos na sua implantação, manutenção e modernização)

Transporte marítimo

versus demais Modais (distâncias superiores a 500 km)

Menor custo de obtenção/operação por capacidade de

carga Menor frete de tonelada transportada por quilômetro Maior segurança contra roubos (menor prêmio de seguro)

Menor índice de avarias das mercadorias.

A análise da demanda pelo transporte de contêineres na cabotagem

considera que esta se divide em carga local e carga de transbordo, onde:

Carga local - é a que é coletada e tem destino final em território brasileiro;

é atendida por Linhas regulares, com clientes pulverizados e datas certas de

saída e chegada dos navios, numa maior variedade de portos; e

Carga de transbordo - a destinada ou vinda do exterior, em tese

temporariamente estocada em portos concentradores (“hub ports”); são

operações “feeder”, relacionadas a rotas internacionais (longo curso), em

especial com empresas estrangeiras que não podem operar na cabotagem

e, por isso, atendem uma menor quantidade de portos, por viagem.

De 2001 a 2006, a movimentação de contêineres nos portos brasileiros

aumentou à taxa de 15,4% ao ano, enquanto que, de 2006 a 2008, o crescimento

médio foi 7,5%. Desde então, o crescimento médio tem sido de 3,5%.

Trata-se de um mercado de transporte regular, onde cada vez mais as

empresas tem que oferecer o serviço porta a porta (“door-to-door”).

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APÊNDICE D – As diversas organizações envolvidas na regulação do

transporte aquaviário

1 O Ministério dos Transportes46

Para realizar suas atribuições, o MT conta com a seguinte estrutura

organizacional:

Fonte: MT

São competências do MT, entre outras:

a) A formulação, coordenação e supervisão da política nacional de

transporte aquaviário (marinha mercante, portos e vias navegáveis);

46<www.transportes.gov.br>, acesso em 25/06/2015: “O Ministério dos Transportes é o órgão da administração pública federal direta que tem como áreas de atuação a política nacional de transportes dos modais ferroviário, rodoviário e aquaviário, além de realizar ações no âmbito da

marinha mercante, das vias navegáveis e dos portos fluviais e lacustres (excetuados os que estão sob a responsabilidade das companhias docas). O MT também possui competência para participar da coordenação dos transportes aeroviários e serviços portuários. ... Para que o órgão execute suas

competências e possa desenvolver programas e projetos, as ações e programas agem como ferramentas que auxiliam o ministério e os órgãos vinculados para as tomadas de decisão que definirão as ações do sistema de transportes do país.” 47

www.portosdobrasil.gov.br

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81

b) A participação no planejamento estratégico, o estabelecimento de

diretrizes para sua implementação e a definição das prioridades dos

programas de investimentos;

c) A aprovação dos planos de outorgas;

d) O estabelecimento de diretrizes para a representação do Brasil nos

organismos internacionais e em convenções, acordos e tratados referentes

aos meios de transportes;

e) A formulação e supervisão da execução da política referente ao Fundo

de Marinha Mercante, destinado à renovação, recuperação e ampliação da

frota mercante nacional, em articulação com os Ministérios da Fazenda, do

Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e do Planejamento,

Orçamento e Gestão; e

f) O estabelecimento de diretrizes para afretamento de embarcações

estrangeiras por empresas brasileiras de navegação e para liberação do

transporte de cargas prescritas.

Atuam diretamente no transporte aquaviário:

i) A Secretaria de Política Nacional de Transportes:

Departamento de Planejamento de Transportes; e

Departamento de Informações em Transportes.

ii) A Secretaria de Gestão dos Programas de Transportes:

Departamento de Programas de Transportes Aquaviários; e

Departamento de Avaliação e Desenvolvimento Estratégico.

iii) A Secretaria de Fomento para Ações de Transportes:

Departamento da Marinha Mercante.

iv) A entidade vinculada:

Companhia Docas do Maranhão - CODOMAR.

2 A Secretaria de Portos 47

47

www.portosdobrasil.gov.br 48

<http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/sistema-portuario-nacional>, acesso em 15/06/2015: portos com administração exercida pela União, no caso das Companhias Docas, ou delegada a

municípios, estados ou consórcios públicos.

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82

A Secretaria de Portos da Presidência da República (SEP/PR) é responsável

pela formulação de políticas e pela execução de medidas, programas e projetos de

apoio ao desenvolvimento da infra-estrutura dos portos marítimos. Compete, ainda,

à SEP, a participação no planejamento estratégico e a aprovação dos planos de

outorgas, tudo isso visando assegurar segurança e eficiência ao transporte marítimo

de cargas e de passageiros.

Dos 37 portos públicos marítimos sob gestão da SEP48, 18 encontram-se

delegados, concedidos ou tem sua operação autorizada aos governos estaduais e

municipais, aos quais se somam outros quatro portos fluviais delegados a estados e

municípios49. Os outros 19 portos públicos marítimos são administrados diretamente

pelas Companhias Docas, sociedades de economia mista, que tem como acionista

majoritário o Governo Federal e, portanto, estão diretamente vinculadas à Secretaria

Especial de Portos.

Ao todo, são sete Companhias Docas, assim distribuídas:

Companhia Docas do Pará (CDP) que administra os portos de

Belém, Santarém e Vila do Conde.

Companhia Docas do Ceará (CDC) que administra o Porto de

Fortaleza.

Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern) que

administra os portos de Natal e Maceió, além do Terminal Salineiro de

Areia Branca.

Companhia Docas do Estado da Bahia (Codeba) que administra

os portos de Salvador, Ilhéus e Aratu.

Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) que administra os

portos de Vitória e Barra do Riacho.

Companhia Docas do Rio de Janeiro (CDRJ) que administra os

portos do Rio de Janeiro, Niterói, Angra dos Reis e Itaguaí.

48

<http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/sistema-portuario-nacional>, acesso em 15/06/2015:

portos com administração exercida pela União, no caso das Companhias Docas, ou delegada a municípios, estados ou consórcios públicos. 49

<http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/sistema-portuario-nacional>, acesso em 15/06/2015: este levantamento não considera as Instalações Portuária Públicas de Pequeno Porte - IP4 - uma vez que a Lei 12.815 de 05/06/2013 passou estas instalações para a esfera de atuação do Ministério dos

Transportes... O anexo da Resolução 2969 da ANTAQ contem 235 instalações portuárias, públicas e privadas, tanto marítimas quanto fluviais... Excluindo-se dessa relação os portos públicos fluviais definidos na Portaria Interministerial 24 como sendo IP4, restam portanto 39 Portos Fluviais públicos

nas competências da SEP.

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Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) que

administra o Porto de Santos.

A SEP é estruturada conforme o organograma a seguir:

Programas e Projetos do governo nos quais participa a SEP:

Plano Nacional de Logística Portuária - PNLP50

Plano Mestre51

50

<http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/pnpl>, acesso em 15/06/2015: instrumento de Estado de planejamento estratégico do setor portuário nacional, que visa identificar vocações dos diversos portos, conforme o conjunto de suas respectivas áreas de influência, definindo cenários de curto,

médio e longo prazo com alternativas de intervenção na infraestrutura e nos sistemas de gestão, garantindo a eficiente alocação de recursos a partir da priorização de investimentos, evitando a superposição de esforços e considerando as disposições do Conselho Nacional de Integração de

Políticas de Transporte - CONIT...A partir do PNLP, a Secretaria elabora diagnósticos e prognósticos do setor para a avaliação de cenários e a proposição de ações de médio e longo prazo que permitem a tomada de decisões em seis principais áreas temáticas: infraestrutura; superestrutura e operações;

logística e hinterlândia; economia e finanças; gestão; e meio ambiente... No âmbito da primeira fase do PNLP também foram desenvolvidos planos diretores estratégicos (Master Plans) para 15 portos públicos considerados de importância estratégica nacional. Os Planos Mestres trazem elementos,

ferramentas e alternativas para melhoria da gestão e para a expansão dos portos, tendo como objetivos: (i) analisar as melhorias operacionais necessárias; (ii) identificar as necessidades de investimentos no porto, tanto em superestrutura quanto em infraes trutura; e (iii) analisar a

concorrência do porto frente ao setor portuário. 51

<http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/pnpl>, acesso em 15/06/2015: instrumento de planejamento de Estado voltado à unidade portuária, considerando as perspectivas do planejamento

estratégico do setor portuário nacional constante do Plano Nacional de Logística Portuária - PNLP,

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Plano de Desenvolvimento e Zoneamento – PDZ52

Plano Geral de Outorgas - PGO 53

Programa Nacional de Dragagem - PND54

Porto Sem Papel55

3 A Agência Nacional de Transportes Aquaviários- ANTAQ

A ANTAQ é uma agência federal criada para regular as atividades de

transporte aquaviário e exploração da infraestrutura portuária. Surge em sucessão,

quanto ao transporte aquaviário, ao Departamento de Marinha Mercante, órgão da

Administração Direta do Ministério dos Transportes. Surge, também, para possibilitar

o equilíbrio dos três núcleos que formam o mercado – governo, prestadores do

serviço e usuários.

A Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, criada pela Lei nº

10.233/2001, é entidade integrante da Administração Federal indireta, submetida ao

regime autárquico especial, com personalidade jurídica de direito público,

independência administrativa, autonomia financeira e funcional, e mandato fixo de

seus dirigentes. Inicialmente na esfera do Ministério dos Transportes, hoje está

vinculada à Secretaria de Portos da Presidência da República, com sede e foro no

Distrito Federal, podendo instalar unidades administrativas regionais.

que visa direcionar as ações, melhorias e investimentos de curto, médio e longo prazo no porto e em seus acessos. 52

<http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/pnpl>, acesso em 15/06/2015: instrumento de planejamento operacional da Administração Portuária, que compatibiliza as políticas de desenvolvimento urbano dos municípios, do estado e da região onde se localiza o porto, visando, no

horizonte temporal, o estabelecimento de ações e de metas para a expansão racional e a otimização do uso de áreas e instalações do porto, com aderência ao Plano Nacional de Logística Portuária - PNLP e respectivo Plano Mestre. 53

<http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/pnpl>, acesso em 15/06/2015: instrumento de planejamento de Estado que consiste em um plano de ação para a execução das outorgas de novos portos ou terminais públicos e privados, reunindo a relação de áreas a serem destinadas à exploração

portuária nas modalidades de arrendamento, concessão, autorização e delegação, com respectivos horizontes de implantação, tomando como base o planejamento do Poder Concedente, das Administrações Portuárias e da iniciativa privada. 54

<http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/pnpl>, acesso em 15/06/2015: foi criado para propor e desenvolver soluções para reduzir os gargalos que limitam os acessos marítimos aos portos

brasileiros. 55

< http://www.portosdobrasil.gov.br/assuntos-1/inteligencia-logistica/porto-sem-papel-psp>, acesso em 15/06/2015: O Porto sem Papel é um sistema de informação que tem como objetivo principal

reunir em um único meio de gestão as informações e a documentação necessárias para agilizar a análise e a liberação das mercadorias no âmbito dos portos brasileiros. A SEP/PR já implantou o projeto nos 34 portos públicos, eliminando mais de 140 formulários em papel que foram convertidos

para um único documento eletrônico.

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Estas três características – independência administrativa, autonomia

financeira e funcional, mandato fixo dos dirigentes – visam possibilitar a atuação da

Agência de forma autônoma, sem ter que se submeter pressão política ou dos

demais agentes do setor regulado.

Fonte: ANTAQ

A ANTAQ tem por finalidades:

I – Implementar, em sua esfera de atuação, as políticas formuladas pelo

Ministério dos Transportes e pelo Conselho Nacional de Integração de Políticas de

Transporte – CONIT, segundo os princípios e diretrizes estabelecidos na Lei nº

10.233, de 2001; e

II – Regular, supervisionar e fiscalizar as atividades de prestação de serviços

de transporte aquaviário e de exploração da infraestrutura portuária e aquaviária,

exercida por terceiros, com vistas a:

a) Garantir a movimentação de pessoas e bens, em cumprimento a

padrões de eficiência, segurança, conforto, regularidade, pontualidade e

modicidade nos fretes e tarifas;

b) Harmonizar os interesses dos usuários com os das empresas

concessionárias, permissionárias, autorizadas e arrendatárias, e de

entidades delegadas, preservando o interesse público; e arbitrar conflitos de

interesse e impedir situações que configurem competição imperfeita ou

infração contra a ordem econômica.

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86

Forma de atuação:

Regula o setor por meio de Normas

Outorga empresas prestadoras de serviços

Fiscaliza a atuação das empresas e de seus usuários

Arbitra conflitos

Autoriza afretamento de embarcações estrangeiras

Interage com outros agentes do setor

Possibilita a formulação de políticas públicas

3.1 A outorga de Empresa Brasileira de Navegação (EBN) 56

A norma tem por objeto a outorga de autorização a pessoa jurídica que

tenha por objeto realizar o transporte aquaviário nas modalidades de longo curso e

de cabotagem, ou para operar nas navegações de apoio marítimo e de apoio

portuário.

A autorização para operar tem por características:

Outorgada a pessoa jurídica brasileira, com sede e administração no

País

A empresa deve ter por objeto o transporte aquaviário

A empresa deve atender os requisitos técnicos, econômicos e jurídicos

A empresa deve atender aos Tratados, Convenções e Acordos

Internacionais

É de caráter precário, intransferível, por prazo indeterminado

A empresa deve atender a requisitos técnicos, que são:

a) ser proprietária de pelo menos uma embarcação de bandeira

brasileira adequada à navegação pretendida e em condição de

operação comercial; ou

b) apresentar contrato de afretamento de embarcação de bandeira

brasileira, a casco nu, adequada à navegação pretendida, por prazo

superior a um ano; ou

56 <http://www.antaq.gov.br/Portal/Legislacao_Normas.asp#ancora>, acesso em 17/07/2015: Norma

da Resolução no 2510.

57 www.mre.gov.br

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87

c) apresentar contrato e cronograma físico e financeiro da construção

de embarcação (ou reforma), adequada à navegação pretendida, em

estaleiro brasileiro, bem como comprovar que a obra está sendo

realizada como planejada.

A empresa candidata deve, também, atender a requisitos econômico-

financeiros e jurídicos-fiscais, que são:

I - patrimônio líquido mínimo de:

a) R$ 8.000.000,00 (oito milhões de reais), para a navegação de longo

curso;

b) R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais), para a navegação de

cabotagem; e

c) R$ 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais), para as

navegações de apoio portuário e de apoio marítimo.

II - índice de liquidez corrente igual ou superior a 1 (um).

III – prever, em seu objeto social, atividade adequada à modalidade de

navegação pretendida; e

VI – apresentar documentação comprobatória de sua regularidade fiscal e de

não possuir qualquer registro de ações ou execuções em que figure como réu, ou

ainda de processos de falência ou recuperação judicial e extrajudicial.

A continuidade da outorga para a empresa brasileira de navegação operar é

condicionada à verificação periódica das condições técnicas, econômicas,

financeiras, jurídico-fiscais ou administrativas indispensáveis para a exploração dos

serviços autorizados.

A operação pela empresa brasileira de navegação será exercida em regime

de liberdade de preços dos serviços, tarifas e fretes e em ambiente de livre e aberta

competição. A Agência, ao tomar conhecimento de fato que configure ou possa

configurar infração à ordem econômica, deverá comunicá-lo ao Conselho

Administrativo de Defesa Econômica – CADE, à Secretaria de Direito Econômico do

Ministério da Justiça ou à Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério

da Fazenda, conforme o caso.

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88

A empresa se obriga a operar na navegação autorizada de forma a

satisfazer os requisitos de regularidade, continuidade, eficiência, segurança,

atendimento ao interesse público e a preservação do meio ambiente.

Em 2005, eram 199 autorizações. Agora, já são 319 (21 no Longo Curso, 33

na Cabotagem, 93 no Apoio Marítimo, 21 no Apoio Portuário - dragagem e 151 no

Apoio Portuário).

4 O Ministério das Relações Exteriores57

O Ministério das Relações Exteriores é responsável por assessorar o

Presidente da República na formulação e execução da política externa brasileira. Em

sua atuação junto a Organismos Internacionais e na negociação de acordos bi e

multilaterais precisa recorrer a setores da administração do Estado ou mesmo a

representações da iniciativa privada, com emérito conhecimento de assuntos

específicos.

Os principais organismos internacionais cuja representação do País está a

cargo do MRE, são:

a) Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento -

UNCTAD

A UNCTAD é o fórum internacional para o debate de relações entre países a

respeito de acordos comerciais de divisão de cargas e de formação da consciência

marítima em países em desenvolvimento, através do seu Comitê de Transporte

Marítimo. Nos anos 1970 foi a principal arena de discussões das questões marítimas

internacionais, tendo tratado sobre:

Os invisíveis da Balança de Pagamentos

O Código de Conduta das Conferências de Frete (relação 40/40/20)

Operador de Transporte Multimodal

Propriedade e Hipotecas Marítimas

Criou o programa TRAIMAR que visa proporcionar apoio técnico a países

em desenvolvimento.

Atualmente, a União Européia defende que temas como as atividades sobre

transporte marítimo sejam deslocadas para outros Órgãos, como a OMC.

57

www.mre.gov.br

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89

b) Organização Mundial do Comércio - OMC

Negociações entre nações após a 2ª Grande Guerra determinaram a criação

do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), um Fórum de Negociações

Tarifárias no seio do qual, nos anos 1970, foram criados os Códigos:

“Anti-dumping”

De Subsídios e Direitos Compensatórios

Barreiras Técnicas ao Comércio, etc.

Na Rodada Uruguai do GATT(1986), foram criados:

A Organização Mundial do Comércio (OMC)

O Acordo Geral sobre o Comércio de Serviço (GATS)

c) Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços - GATS

Estabelece as bases para os países negociarem concessões nos setores e

subsetores de serviços financeiros, de telecomunicações e de transportes aéreos e

marítimos.

São Princípios básicos:

Conceito de Nação Mais Favorecida (NMF)

Transparência

Integração Econômica

Balanço de Pagamentos

Compromissos específicos de:

Acesso aos mercados

Tratamento nacional

Os Serviços de Transportes Marítimos são tratados no GATS por um Grupo

de Negociações específico sendo, a cabotagem, excluída das discussões desde o

início.

Os assuntos mais tratados são:

Nação Mais Favorecida (NMF)

Isenção aos acordos bilaterais

Acesso aos mercados

Instalação de empresas no país

Presença dos navios (acabar com as reservas de carga)

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90

Tratamento nacional

Acesso às instalações portuárias

d) Mercado Comum do Sul - MERCOSUL

Criado através do Tratado de Assunção (1991), inicialmente composto pelos

Estados-Parte Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Tem por objetivo:

Livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos (capital e mão-de-

obra)

Eliminação de direitos alfandegários, barreiras não tarifárias e

equivalentes

Estrutura Institucional

Órgão superior Conselho do Mercado Comum (CMC)

Presidentes e Ministros

Órgão Executivo Grupo Mercado Comum (GMC)

Chanceleres, Ministros da Área Econômica e

Presidentes dos Bancos Centrais

Órgãos Técnicos Subgrupos de Trabalho

(SGT)

Técnicos governamentais e

representantes da iniciativa privada

Transportes e Infraestrutura são tratados no Subgrupo de Trabalho SGT5.

Os principais temas tratados são:

Normas para o Transporte de Mercadorias Perigosas

Acordo para Facilitação do Transporte Multimodal

Acordo Internacional de Transporte Marítimo

Registro Comum de Embarcações

Quanto ao Acordo de Transporte Marítimo58, ainda não firmado, abrange o

transporte internacional intrazona e trata dos seguintes tópicos:

“Feeder service”

Reboque de mercadoria

Cargas excluídas

Cabotagem

58

<http://www.mercosul.gov.br/index.php/saiba-mais-sobre-o-MERCOSUL>, acesso em 17/07/2015:

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91

Tratado da hidrovia Paraná-Paraguai

Petróleo e derivados produzidos no Brasil

Exclusividade para armadores nacionais com embarcações

Embarcações nacionais: pelo menos uma própria

Limitação para o emprego de embarcações afretadas

Quanto aos acordos bilaterais de transporte marítimo, esses têm por

princípios:

Reciprocidade de Tratamento

Direito de tráfego e atracação mútua, documentos de tripulantes,

certificados de navios, salvamento, etc.

Arbitragem de conflito de Leis de Reserva de Carga

Estender benefício ao Parceiro (“Equal Access”)

Restringir/impedir terceiras Bandeiras

Regular os Acordos de “Pool” (estabelecimento de cotas em Conferências

de Frete)

Tráfego Fechado: Proibição a armadores não nacionais (no Cone Sul)

5 O tribunal Marítimo59

O Tribunal Marítimo (TB) é um órgão autônomo auxiliar do Poder Judiciário

que tem como atribuições julgar os acidentes e fatos da navegação mas também de

atuar com finalidade cartorial de manter o registro da propriedade marítima. Seu

vínculo com o Comando da Marinha/MD existe apenas para o provimento de meios

– pessoal e material – para seu funcionamento.

É composto por:

Um juiz Presidente, oficial General do Corpo da Armada

Dois juízes militares, um Engenheiro e outro da Armada (Hidrógrafo)

Quatro juízes civis especialistas em:

Armação de navios e navegação comercial

Direito Marítimo

59

< https://www.mar.mil.br/tm/>, acesso em 17/07/2015: O Tribunal Marítimo, com jurisdição em todo o território nacional, órgão autônomo, auxiliar do Poder Judiciário, vinculado ao Comando da Marinha,

tem como atribuições de julgar os incidentes da navegação aquaviária mas também de atuar com finalidade cartorial de manter o Registro da Propriedade Marítima, de armadores de navios brasileiros, do Registro Especial Brasileiro (REB) e dos ônus que incidem sobre as embarcações

nacionais.

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Direito Internacional Marítimo

Marinha Mercante (Capitão de Longo Curso)

O Tribunal Marítimo foi criado pela Lei nº 2.180/54; tem jurisdição sobre:

Embarcações mercantes de qualquer nacionalidade, em águas brasileiras

ou, quando em alto-mar, quando envolvidas em qualquer acidente marítimo

ou incidente de navegação, no qual tenha pessoa física, navios e instalações

brasileiras;

Embarcações mercantes brasileiras em alto-mar, ou em águas

estrangeiras;

Pessoal da Marinha Mercante brasileira e os marítimos estrangeiros, em

território ou águas territoriais brasileiras;

Proprietários de embarcações brasileiras e os agentes no Brasil de

empresa estrangeira de navegação; e

Proprietários de estaleiro.

Compete ao Tribunal Marítimo:

I – julgar os acidentes e fatos da navegação60:

a) Definindo-lhes a natureza e determinando-lhes as causas,

circunstâncias e extensão;

b) Indicando os responsáveis e aplicando-lhes as penas estabelecidas na

lei; e

c) Propondo medidas preventivas e de segurança da navegação.

II – manter o registro geral:

a) Da propriedade naval;

b) Da hipoteca naval e demais ônus sobre embarcações brasileiras; e

c) Dos armadores de navios brasileiros.

6 A Autoridade Marítima61

60

Fatos da navegação: Aqueles que, por falta de precaução, pode vir a ocasionar um acidente; por

exemplo, a embarcação ser operada sem estar devidamente aparelhada com equipamento de comunicação, de salvatagem, etc. 61

Lei Complementar nº 97/1999, Art. 17. Cabe à Marinha, como atribuições subsidiárias particulares:

I - orientar e controlar a Marinha Mercante e suas atividades correlatas, no que interessa à defesa nacional; II - prover a segurança da navegação aquaviária;

III - contribuir para a formulação e condução de políticas nacionais que digam respeito ao mar;

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93

Cabe à autoridade marítima promover a implementação e a execução das

normas da segurança do tráfego aquaviário em águas sob jurisdição nacional, com o

propósito de assegurar a salvaguarda da vida humana e a segurança da navegação,

no mar aberto e hidrovias interiores, e a prevenção da poluição ambiental por parte

de embarcações, plataformas ou suas instalações de apoio.

A autoridade marítima é exercida pelo Ministério da Marinha (hoje, Marinha

do Brasil - Ministério da Defesa).62

São atribuições da autoridade marítima, entre outras:

I - Elaborar normas para:

Tráfego e permanência das embarcações nas águas sob jurisdição

nacional, bem como sua entrada e saída de portos, atracadouros,

fundeadouros e marinas;

Realização de inspeções navais e vistorias;

Arqueação, determinação da borda livre, lotação, identificação e

classificação das embarcações;

Inscrição das embarcações e fiscalização do Registro de Propriedade; e

Cadastramento de empresas de navegação, peritos e sociedades

classificadoras.

II - Estabelecer os limites da navegação interior;

III - Executar a inspeção naval; e

IV - Executar vistorias, diretamente ou por intermédio de delegação a

entidades especializadas.

6.1 Autoridade Marítima – Estrutura Executiva63

IV - implementar e fiscalizar o cumprimento de leis e regulamentos, no mar e nas águas interiores,

em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo, federal ou estadual, quando se fizer

necessária, em razão de competências específicas. V – cooperar com os órgãos federais, quando se fizer necessário, na repressão aos delitos de repercussão nacional ou internacional, quanto ao uso do mar, águas interiores e de áreas portuárias,

na forma de apoio logístico, de inteligência, de comunicações e de instrução. Parágrafo único. Pela especificidade dessas atribuições, é da competência do Comandante da Marinha o trato dos assuntos dispostos neste artigo, ficando designado como "Autoridade Marítima",

para esse fim. 62

Art. 39 da Lei nº 9.537/97, que dispõe sobre a segurança do tráfego aquaviário em águas sob jurisdição nacional. 63

Portaria nº 156/MB.

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94

O Comandante da Marinha, no exercício da Autoridade Marítima, distribui

entre as organizações militares da estrutura administrativa do Comando da Marinha

atribuições conferidas pela LESTA.64

Utilizando-se do instrumento “delegação de competência” cria três figuras

distintas65:

Assessor – CEMA

Agente – DPC/DHN/ComDN/CNAO/SECIRM

Representante – DPC/DHN/ComDN/CNAO/SECIRM

6.1.1 A Diretoria de Portos e Costas

A Diretoria de Portos e Costas (DPC) é a principal organização militar a

regulamentar assuntos concernentes à Marinha Mercante, em especial quanto à:

Segurança da navegação

Salvaguarda da vida humana no mar

Prevenção da poluição por parte de embarcações

A ela compete:

Aprovar Normas da Autoridade Marítima – NORMAM

Promover a execução das atividades de vistorias de embarcações

Estabelecer os limites da navegação interior

Coordenar as ações decorrentes da aplicação da legislação ambiental

Certificados estatutários

Delegação da autoridade para as Sociedades Classificadoras

6.1.2 Os Comandos de Distritos Navais (ComDN/CNAO)

Os Distritos Navais (DN) e o Comando Naval da Amazônia Ocidental

(CNAO) são as principais organizações militares a promover as ações decorrentes

da ação da Autoridade Marítima quanto à Marinha Mercante, agindo por meio da

64

Lei no 9.537/97 que dispõe sobre a segurança do tráfego aquaviário em águas sob jurisdição

nacional, conhecida pela sigla LESTA (Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário). 65

CEMA – Chefe do Estado Maior da Armada DPC – Diretor de Portos e Costas

DHN – Diretor de Hidrografia e Navegação ComDN – Comandante de Distrito Naval CNAO – Comandante Naval da Amazônia Ocidental

SECIRM – Secretário da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar

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95

estrutura do Sistema de Segurança do Tráfego Aquaviário – SSTA, a rede de

Capitanias-dos-Portos, Delegacias e Agências.

A eles compete, por delegação da DPC:

Promover a inscrição das embarcações e a fiscalização do Registro de

Propriedade

Estabelecer os limites da navegação interior

Realizar o cadastramento de empresas de navegação

Por meio da rede da SSTA, a qual compete, também, agir como agentes da

Autoridade Marítima na:

Execução da inspeção naval

Fiscalização dos procedimentos para a segurança do transporte de

cargas perigosas e material nuclear

Fiscalização das embarcações quanto ao seguro obrigatório de danos

pessoais (DPEM)

Apuração das responsabilidades sobre os incidentes com embarcações

6.1.3 O Comando do Controle Naval do Tráfego Marítimo (COMCONTRAM)

O Comando do Controle Naval do Tráfego Marítimo (COMCONTRAM) é

uma organização militar subordinada ao Comando de Operações Navais – COM e

tem por missão contribuir para a segurança do tráfego marítimo de interesse do

Brasil e de atender à compromissos internacionais assumidos pelo País, relativos ao

controle naval do tráfego marítimo. Ao COMCONTRAM compete acompanhar o

tráfego marítimo de embarcações brasileiras e estrangeiras em águas sob jurisdição

nacional, em particular na área marítima do Atlântico Sul e nas áreas sujeitas a

ações hostis de países em guerra limitada.

6.2 O Comando da Marinha e a atuação junto à IMO

O Decreto nº 3.402/2000 atribui à Marinha do Brasil a Representação

Permanente do Brasil junto à Organização Marítima Internacional. A ANTAQ, como

órgão especialista no transporte aquaviário internacional, assessora o Comando da

Marinha na análise de propostas que objetivam defender as posições brasileiras na

IMO (International Maritime organization) que têm de estar alinhadas aos Princípios

Fundamentais previstos na Constituição Federal, na Política Externa, na Política

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Marítima Nacional, nas Políticas Nacionais setoriais e nos atos internacionais dos

quais o Brasil é parte.

Acompanhamento das Principais Convenções em discussão:

Convenção Internacional para o Controle e Gestão de Água de Lastro e

Sedimentos de Navios

Convenção Internacional sobre Controle de Sistemas Anti-Incrustantes

Nocivos em Navios

Convenção Internacional sobre Responsabilidade e Compensação por

Danos relativos ao transporte por mar de Substâncias Potencialmente

Perigosas e Nocivas

7 Sistema Brasileiro de defesa da Concorrência

O Sistema Brasileiro de defesa da Concorrência é composto pelos seguintes

órgãos:

SEAE – Secretaria de Acompanhamento Econômico66. Órgão do

Ministério da Fazenda responsável pela instrução probatória nos processos

administrativos do CADE relativos aos Atos de Concentração (Fusões e Aquisições)

e na investigação da formação de cartéis e de outras estruturas danosas à

concorrência. Também é competente para a análise das condutas a que se refere o

art. 20 da Lei nº 8.884/94 e serve como órgão consultivo na área econômica e

financeira, fornecendo o embasamento necessário ao CADE.

SDE – Secretaria de Direito Econômico67. Órgão vinculado à estrutura do

Ministério da Justiça. É responsável pelas averiguações preliminares e pela

instrução probatória prévia. Na fase posterior, atua também na instrução probatória

na fase do processo administrativo. Normalmente sua atividade de fiscalização

ordinária do mercado inicia o processo administrativo no CADE.

66

<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJ29715BC8ITEMIDCEF35B5AB2E84F6A8CA8858B129BB4EF

PTBRIE.htm>, acessado em 17/07/2015: A SDE é o órgão responsável por instruir a análise concorrencial dos atos de concentração econômica (fusões, aquisições, etc.), bem como investigar infrações à ordem econômica. 67<http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJ29715BC8ITEMIDCEF35B5AB2E84F6A8CA8858B129BB4E

FPTBRIE.htm>, acessado em 17/07/2015: A Seae, por sua vez, é responsável por emitir pareceres econômicos em atos de concentração, investigar condutas para oferecer representação à SDE, bem

como elaborar facultativamente pareceres em investigações sobre condutas anticoncorrenciais.

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97

CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica68. Órgão central

do SBDC. Ganhou status de autarquia especial através da Lei no 8.884/94. É

responsável pelo julgamento e controle das estruturas e condutas concorrenciais,

atuando precipuamente e corretivamente, vez que, hoje, os atos de concentração e

as condutas tratadas no art. 20 da Lei no 8.884/94 são julgados depois de realizados.

8 Organizações internacionais

8.1 Organização Marítima Internacional (OMI)69

Criada em 1958, é a Agência da ONU especializada em matérias técnicas

da embarcação. Tem 165 países membros e Conselho com 32 membros - inclui

Brasil.

Possui Comitês de:

Segurança da Navegação

Poluição do Meio Ambiente Marinho

Aspectos Legais

Facilitação do tráfego internacional - documentação

Cooperação Técnica - Assistência técnica (países em desenvolvimento)

Principais Convenções:

SOLAS - Segurança da Vida Humana no Mar

MARPOL - Prevenção da Poluição por Navios

STCW - padrões de treinamento, certificação e serviço de marítimos

Controle do Estado do Porto (1982)

Memorandos de Paris, Tóquio e Viña del Mar

Afetam:

Projeto, construção e vida útil das embarcações

Novos equipamentos e tecnologias de segurança

Melhores padrões de treinamento

68http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJ29715BC8ITEMIDCEF35B5AB2E84F6A8CA8858B129BB4EFPTBRIE.htm>, acessado em 17/07/2015: o Cade é responsável pela decisão final, na esfera

administrativa, dos processos iniciados pela SDE ou Seae. Assim, após receber os pareceres da SDE e Seae, que não são vinculativos, o CADE tem a tarefa de julgar tanto os processos administrativos que tratam de condutas anticoncorrenciais quanto as análises de atos de concentração econômica. 69

Em inglês, IMO – International Maritime Organization

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98

8.2 International Association of Marine Aids to Navigation and Lighthouse

Authorities (IALA)

A IALA é um fórum de discussão e regulação sobre sinalização náutica.

8.3 Organização Internacional do Trabalho (OIT)

Através da Convenção nº 147 (1976), “Normas Mínimas da Marinha

Mercante”, estabelece que os estados membros devam garantir, através de lei:

Normas de segurança

Regime de seguridade social

Condições de emprego e vida a bordo

Procedimento para processamento de queixas de marítimos, dar

conhecimento à OIT e ao país do navio

8.4 Federação Internacional dos Trabalhadores em Transporte (ITF)

Tem como principal foco o combate às condições de trabalho nos navios

operando sob bandeira de conveniência (normas mínimas para bandeira de

conveniência mais elevadas, contrato Coletivo da ITF, tabela salarial, boicotes aos

navios de bandeira de conveniência) – Hoje prefere agir através de organismos

internacionais.

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APÊNDICE E - A ordenação jurídica nacional70

1 O Regime Jurídico da Navegação Nacional

Como se verá adiante, a legislação que trata da construção naval no Brasil

está atrelada àquela que regulamenta a navegação. Trata-se de política praticada

pelo Governo com vistas a proteger o parque industrial naval, política esta criticada

por parte dos agentes envolvidos no setor de navegação.

2 A Ordenação do Transporte Aquaviário

O principal instrumento a regulamentar a exploração comercial da

navegação é a Lei nº 9.432/97, da Ordenação do Transporte Aquaviário. O foco na

questão do emprego comercial dos navios fica evidente ao definir que (art. 1º) ela se

aplica a armadores, empresas de navegação e às embarcações por eles

empregadas, enquanto exclui, de sua abrangência, navios de guerra e de Estado,

embarcações de esporte, recreio, turismo, pesca e pesquisa.71

A Lei dispõe sobre os seguintes temas:

a) Direito das embarcações a arvorar a bandeira brasileira (art. 3º) –

aquelas inscritas Registro de Propriedade Marítima ou, caso estrangeiras, sob

contrato de afretamento a casco nu, por empresa brasileira de navegação, com

suspensão provisória de bandeira no país de origem.

b) Modalidades de navegação (art. 2º) – definidas 5 modalidades, a saber:

I. Navegação de longo curso;

II. Navegação de cabotagem;

III. Navegação de apoio portuário;

IV. Navegação de apoio marítimo; e

70

Centro de Estudos, Pesquisa e Atualização em Direito, Curso de Direito Marítimo (2005) - Notas de aula. 71

Lei nº 9.432/97 Art. 1º Esta Lei se aplica:

I - aos armadores, às empresas de navegação e às embarcações brasileiras; II - às embarcações estrangeiras afretadas por armadores brasileiros; III - aos armadores, às empresas de navegação e às embarcações estrangeiras, quando amparados

por acordos firmados pela União. Parágrafo único. Excetuam-se do disposto neste artigo: I - os navios de guerra e de Estado que não estejam empregados em atividades comerciais;

II - as embarcações de esporte e recreio; III - as embarcações de turismo; IV - as embarcações de pesca;

V - as embarcações de pesquisa.

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100

V. Navegação Interior.

c) Embarcação brasileira: a que tem o direito de arvorar a bandeira

brasileira (art. 1º).

d) Apoio ao Desenvolvimento da Marinha Mercante (art. 11) – instituído o

Registro Especial Brasileiro – REB, no qual poderão ser inscritas embarcações

brasileiras, operadas por empresas brasileiras de navegação. As embarcações

inscritas no REB gozam dos seguintes privilégios:

I. Não recolhimento da taxa do Fundo de Ensino Profissional Marítimo

II. Possibilidade de contratação de seguro de casco e máquinas no

exterior

III. Financiamento oficial para construção

IV. Obrigatoriedade de serem brasileiros apenas o comandante e o chefe

de máquinas

e) Afretamento de embarcações estrangeiras – uma Empresa Brasileira

de Navegação pode afretar embarcações por meio de uma das três seguintes

modalidades (art. 8º):

I. A casco nu (“Bareboat Charter”) – contrato no qual o afretador tem a

posse, o uso e o controle da embarcação, por tempo determinado,

incluindo o direito de designar o comandante e a tripulação; logo, o

afretamento a casco nu é a locação de embarcação desarmada e sem

tripulação, caracterizando a transferência de posse;

II. A tempo (“Time Charter”) – contrato em virtude do qual o afretador

recebe a embarcação armada e tripulada, ou parte dela, para operá-la

por tempo determinado; portanto, é aquele no qual a embarcação fica a

disposição do afretador, realizando as viagens por ele determinadas

durante o prazo contratualmente estabelecido – não há transferência

de posse; e

III. Por viagem (“Voyage Charter”) – contrato em virtude do qual o fretador

se obriga a colocar o todo ou parte de uma embarcação, com

tripulação, à disposição do afretador para efetuar transporte em uma

ou mais viagens; portanto, é um contrato de transporte – não há

transferência de posse.

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101

O afretamento nessas modalidades somente poderá ser realizado, visando a

atividade comercial, por uma empresa brasileira de navegação (EBN), autorizada

pela ANTAQ.

São características comuns aos afretamentos previstos na Lei, o emprego

de navio individualizado, descrito no contrato de afretamento, que não são contratos

de adesão e o emprego de nomenclatura comum: fretador e afretador (partes) e frete

(preço).

Os contratos de afretamento podem ser qualificados de acordo com a gestão

da embarcação, empregando-se os seguintes conceitos:

Gestão Náutica – Atos relativos à condução e manobra da embarcação no

mar (contratação da tripulação, aprovisionamento do navio, contratação de seguro,

custos portuários, etc.); e

Gestão Comercial – Atos relativos à gerência comercial de uma expedição

marítima (angariamento de cargas, assinatura dos contratos de transporte, etc.).

Nesse caso, quanto à responsabilidade de cada parte, temos o seguinte

quadro:

Contrato Objeto Gestão Resp. pela carga

Resp. perante terceiros

Casco nu Locação Náutica e comercial com o afretador

Afretador Afretador

A tempo Prestação de serviços

Náutica – afretador

Comercial – fretador

Afretador Fretador

Por viagem Transporte Náutica e comercial com o fretador

Fretador Fretador

O proprietário da carga não realiza contrato de afretamento – restrito à

relação entre empresas de navegação e/ou proprietários de embarcações – mas,

sim, contratos de transporte. Em geral, contrata-se por viagem ou em linha regular.

O contrato de transporte de linha regular, denominado Carta Partida (art.

566, Código Comercial), se caracteriza por:

Predominar no segmento da carga geral, solta ou conteinerizada; diversos

lotes de carga provenientes de diferentes embarcadores são embarcados

em portos de escala;

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102

Por isso mesmo, é adequado ao tráfego de linhas regulares; implica em

roteiros fixos e diversas escalas pré-determinadas;

Cada embarque é representado por um conhecimento de carga (B/L),

precedido de contratação verbal ou por escrito; é um contrato de adesão; e

Por suas características, o transporte não está vinculado a um navio

individualizado (objetiva o direito ao transporte, não ao navio).

Em suma, comparando-se o contrato por viagem e o de transporte de linha

regular, temos:

Contrato por viagem Transporte de linha regular

Navio individualizado Navio não individualizado

Cargas especiais (granéis) ou não atendidas por linhas regulares

Carga geral, conteinerizada ou não

Não é contrato de adesão Contrato de adesão

Por que estabelecer uma política de afretamentos? Quando falamos de

política de afretamentos estamos, em especial, tratando do afretamento de

embarcações estrangeiras, uma vez que o afretamento de embarcações brasileiras

deve ser livre, sem interferência direta do Estado (desde que, é claro, não acarrete

prática que caracterize abuso de poder econômico).

O afretamento de embarcação estrangeira interfere diretamente na

economia do país quando:

Representa significativa remessa de divisas ao exterior

Desestimula a bandeira brasileira

De fato, como no momento a frota nacional não comporta o mercado e esse

mercado está crescendo, se tornou necessário permitir o afretamento. A solução

para o problema é estabelecer uma política que possibilite suprir o mercado com as

embarcações necessárias, buscando embarcações estrangeiras operadas por

empresas brasileiras por prazo determinado e, ao mesmo tempo, estimular o

aumento da frota nacional e a construção de embarcações em estaleiros brasileiros

e, com isso, substituir, paulatinamente, as embarcações estrangeiras por

embarcações nacionais.

A Lei, por questões políticas ou de mercado, estabelece regras distintas, por

modalidade de navegação, para permitir o afretamento. São elas:

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103

No longo curso:72

A única modalidade de navegação onde o afretamento de embarcação

estrangeira independe de autorização é a do longo curso, pois ela é aberta aos

armadores, às empresas de navegação e às embarcações de todos os países,

observados os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade.

Logo, não havendo obstáculos para a operação de empresas estrangeiras no Brasil

no longo curso, por isonomia, não se justifica impor qualquer restrição à operação

das empresas brasileiras com embarcações estrangeiras afretadas.

Na cabotagem:73

A definição da política de transporte relativa à cabotagem, leva em conta que

o mercado é restrito às EBN, a procura por transporte é, especialmente no

escoamento da produção agrícola, sazonal e influenciada pelo mercado

internacional de commodities. A frota está envelhecida e com custos operacionais

elevados. O emprego de embarcações estrangeiras afretadas, nos momentos de

pico de procura, é essencial.

O afretamento na Cabotagem (art. 9º) é permitido nas modalidades por

viagem ou por tempo, depende de autorização e só poderá ocorrer nos casos de

inexistência ou indisponibilidade de embarcação de bandeira brasileira do tipo e

porte adequados para o transporte pretendido ou quando em substituição a

embarcações em construção no País, em estaleiro brasileiro, com contrato em

eficácia, enquanto durar a construção, por período máximo de 36 meses, até o limite

da tonelagem de porte bruto contratada.

Excepcionalmente (art. 10), independe de autorização o afretamento de

embarcação estrangeira a casco nu, com suspensão de bandeira, limitado ao dobro

da tonelagem de porte bruto das embarcações, de tipo semelhante, por ela

encomendadas a estaleiro brasileiro instalado no País, com contrato de construção

em eficácia, adicionado de metade da tonelagem de porte bruto das embarcações

brasileiras de sua propriedade, ressalvado o direito ao afretamento de pelo menos

uma embarcação de porte equivalente.

No Apoio Portuário:74

72

O afretamento no Longo Curso e o transporte de carga prescrita são o objeto da Norma da Resolução nº 195-ANTAQ. 73

O afretamento na cabotagem é o objeto da Norma da Resolução nº 193-ANTAQ.

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104

No apoio portuário, utiliza-se uma extensa frota (mais de um milhar de

embarcações) pulverizada por todo o país. O mercado, fora em questões pontuais,

não carece de maiores incentivos, o que balizou a política de afretamento.

O emprego de embarcações estrangeiras afretadas é eventual. Assim,

diferentemente do caso da cabotagem, onde independe de autorização o

afretamento de embarcação estrangeira a casco nu, com suspensão de bandeira,

em substituição às encomendadas a estaleiro brasileiro, no apoio portuário o

afretamento a casco nu de embarcação estrangeira depende, sempre, da

circularização (art. 9º).

Apoio Portuário – caso especial: dragagem

A questão da dragagem é um bom exemplo da atuação do governo

regulando uma área sensível e estratégica. Devido a características peculiares, que

assemelham e aproximam a dragagem a obra de engenharia, causando confusão

sobre a qual setor do governo esse serviço estaria subordinado, em 1999 o MT

enquadrou na navegação de apoio portuário a execução dos serviços de dragagem

portuária e hidroviária dos canais de acesso, dos berços de atracação, das bacias

de evolução e de fundeio, até a desobstrução e a regularização da navegabilidade

marítima e hidroviária interior.

No passado, o serviço de dragagem era realizado por empresa estatal, a

Companhia Brasileira de Dragagem – CBD. Ainda dentro da política neoliberal em

voga, a atividade foi privatizada: a CBD foi extinta e suas dragas, vendidas.

Empresas privadas passaram a realizar a atividade antes de responsabilidade da

CBD mas, como os principais clientes eram os portos organizados, administrados

pelas companhias docas, de capital misto, continuou sob forte intervenção do

Estado, a quem cabe a aprovação das verbas destinadas a esse fim.

O contingenciamento, anos seguidos, das verbas governamentais, restringiu

a contratação de dragagens tendo ocorrido, por consequência, assoreamento dos

portos e hidrovias. Com o aquecimento da economia mundial, a necessidade da

movimentação de riquezas, o aumento do porte das embarcações e de seu fluxo, o

início do século trouxe uma enorme demanda pelo serviço de dragagem, o que

74

O afretamento no apoio portuário é o objeto da Norma da Resolução nº 191-ANTAQ, com exceção

da dragagem.

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105

determinou uma medida de exceção da ANTAQ, suspendendo a exigência de

circularização, para o afretamento de dragas estrangeiras, até o final de 200775.

Essa medida não provocou o efeito desejado. A demanda por dragas pelo

mundo afora estava aquecida e o custo e prazos de mobilização destas

embarcações dos mercados europeu e asiático tornaram o mercado brasileiro pouco

atrativo.

O Governo, em um último e tardio impulso de sua política

desregulamentadora (ocorreu em 2007), interveio novamente eliminando a reserva

de mercado para as empresas de dragagem76. Essa medida também não teve o

efeito desejado, ao contrário, as duas maiores dragas do país foram vendidas para o

exterior, uma vez que a empresa proprietária passou a ter que concorrer com

megaempresas estrangeiras e decidiu se retirar do mercado. A demanda externa

continuou mais atrativa e o custo de mobilização77 tornou impeditivo trazer dragas

modernas para o Brasil. A solução do problema ficou nas mãos da “providência”: a

crise financeira do final do ano 2008 interrompeu empreendimentos no exterior

tornando disponíveis algumas dragas.

A Lei nº11.610/07 foi substituída pela Lei nº 12.815/2013, a nova “Lei dos

Portos”, a qual, surpreendentemente, manteve a política anterior preservando o

interesse das empresas estrangeiras, que continuam operando livremente no país,

onerando a conta-serviços da balança de pagamentos, desestimulando o

crescimento das empresas brasileiras e restringindo o papel da frota de dragas

nacionais (envelhecidas, obsoletas, mal mantidas) à extinção.78

75

Resolução

nº. 434-ANTAQ.

76 Lei nº11.610/07

77

Custo de mobilização de embarcação – é o custo de armação do navio para adaptá-lo ao serviço para o qual foi afretado acrescido dos custos da viagem até o destino onde será realizado o serviço e

da viagem de retorno a sua sede, após a realização do serviço, e os custos do serviço que deixou de realizar durante o período dessas duas viagens. 78

Lei nº 12.815/2013, que dispõe sobre a exploração direta e indireta pela União de portos e

instalações portuárias e sobre as atividades desempenhadas pelos operadores portuários : Art. 54. A dragagem por resultado compreende a contratação de obras de engenharia destinadas ao aprofundamento, alargamento ou expansão de áreas portuárias e de hidrovias, inclusive canais de

navegação, bacias de evolução e de fundeio e berços de atracação, bem como os serviços de sinalização, balizamento, monitoramento ambiental e outros com o objetivo de manter as condições de profundidade e segurança estabelecidas no projeto implantado.

§ 1o As obras ou serviços de dragagem por resultado poderão contemplar mais de um porto, num

mesmo contrato, quando essa medida for mais vantajosa para a administração pública. § 2

o Na contratação de dragagem por resultado, é obrigatória a prestação de garantia pelo

contratado.

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106

No Apoio Marítimo79

A navegação de apoio marítimo é fruto da exploração de petróleo na

plataforma continental. A Lei do Petróleo abriu o mercado de exploração a novas

empresas além da Petrobras o que, somado ao aumento do preço internacional do

barril, acelerou a expansão da exploração de petróleo offshore.

O quadro mostra que existe uma forte demanda por embarcações de apoio

marítimo. Cerca da metade da frota tem bandeira estrangeira, muito embora o

mercado seja reservado a empresas e embarcações nacionais. Assim, a política de

afretamentos é similar àquela praticada para a cabotagem.

Fonte: ANTAQ

f) Carga Prescrita e Proteção à Bandeira Brasileira

A carga prescrita é a reservada aos navios de bandeira brasileira. O

Decreto-lei nº 666, de 2 de julho de 1969, Institui a obrigatoriedade de transporte em

navio de bandeira brasileira – a carga prescrita.80

§ 3

o A duração dos contratos de que trata este artigo será de até 10 (dez) anos, improrrogável.

§ 4o As contratações das obras e serviços no âmbito do Programa Nacional de Dragagem Portuária e

Hidroviária II poderão ser feitas por meio de licitações internacionais e utilizar o Regime Diferenciado

de Contratações Públicas, de que trata a Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011. § 5o A administração pública poderá contratar empresa para gerenciar e auditar os serviços e obras contratados na forma do caput.

Art. 55. As embarcações destinadas à dragagem sujeitam-se às normas específicas de segurança da navegação estabelecidas pela autoridade marítima e não se submetem ao disposto na Lei nº 9.432, de 8 de janeiro de 1997. 79

O afretamento no apoio marítimo é o objeto da Norma da Resolução nº 2919-ANTAQ.

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107

O transporte pode ser realizado em navio de bandeira estrangeira, afretado

por EBN, quando comprovada a inexistência ou indisponibilidade de embarcações

operadas por empresas brasileiras de navegação, do tipo e porte adequados ao

transporte pretendido, ou quando estas não oferecerem condições de preço e prazo

compatíveis com o mercado internacional. Nesse caso, mediante circularização ou

em substituição a embarcação em construção em estaleiro brasileiro.81

Além do disposto no D.L. nº 666/69, outra fonte de cargas prescritas são os

acordos de divisão de carga firmados com outros países. Esses têm as seguintes

características:

Reciprocidade de Tratamento – Direito de tráfego e atracação mútua,

documentos de tripulantes, certificados de navios, salvamento, etc.

Conflito de Leis de Reserva de Carga – Estende benefício ao Parceiro

Restringir terceiras Bandeiras – Acordos de Pool, estabelecimento de

cotas em Conferências de Frete

Impedir terceiras Bandeiras - Tráfego Fechado. Proíbe armadores não

nacionais (Cone Sul)

O Brasil possui acordos de transporte marítimo com os seguintes países:

Alemanha, Argélia, Argentina, Bulgária, China, Chile, França, Polônia,

Portugal, Romênia, Rússia e Uruguai.

g) Acordos Operacionais

O Acordo Operacional é aquele celebrado entre empresas brasileiras e

estrangeiras de navegação, com o propósito de racionalizar o emprego da frota em

serviços regulares, através da troca de espaços segundo os princípios da

equivalência e reciprocidade, no transporte marítimo internacional de contêineres,

entre embarcações operadas por empresas estrangeiras, e embarcações, próprias

ou afretadas, operadas por empresas brasileiras de navegação. De certa forma, vale

como um afretamento.

80

DL nº666/69 Art. 2º Será feito, obrigatoriamente, em navios de bandeira brasileira, respeitado o

princípio da reciprocidade, o transporte de mercadorias importadas por qualquer órgão da administração pública federal, estadual e municipal, direta ou indireta, inclusive empresas públicas e sociedades de economia mista, bem como as importadas com quaisquer favores governamentais e,

ainda, as adquiridas com financiamento, total ou parcial, de estabelecimento oficial de crédito, assim também com financiamentos externos, concedidos a órgãos da administração pública federal , direta ou indireta. 81

Lei 9.432/97, art. 5º, § 3º.

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108

O acordo operacional passa a representar uma política de incentivo À EBN

quando homologado pela ANTAQ. Neste caso, os espaços disponibilizados para as

empresas brasileiras participantes de Acordo poderão ser considerados para

bloquear solicitações de afretamento por viagem para transporte de carga prescrita e

as embarcações estrangeiras indicadas a participar no acordo podem ser

empregadas no transporte de cargas entre os países com os quais o Brasil tem

acordos de divisão de carga.82

h) Incentivo à construção naval

A Lei nº 9.432/97, art. 9º e 10, ao permitir o afretamento de embarcação

estrangeira em substituição a embarcações em construção no País, em estaleiro

brasileiro, com contrato em eficácia, enquanto durar a construção, por período

máximo de trinta e seis meses, estabelece uma medida de incentivo à construção

naval no Brasil. No entanto, o maior incentivo está no Fundo de Marinha Mercante

(FMM) e o Adicional de Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM).

O AFRMM nasceu como receita especial, como disposto no Decreto-Lei nº

3.100, de 7 de março de 1941 que criou a Comissão de Marinha Mercante. Ao final

da década de 50, foi instituído o Fundo da Marinha Mercante (FMM), e a receita

especial substituída por Taxa de Renovação da Marinha Mercante (TRMM), com a

figura de adicional ao frete líquido devido, na importação, exportação ou cabotagem,

pelo transporte de qualquer carga.

Em 1966, as operações de exportação foram excluídas da cobrança da taxa;

em dezembro de 1970 a legislação relativa ao Fundo da Marinha Mercante foi

alterada, instituindo-se, para a sua manutenção, recursos decorrentes de “produto

do adicional de frete para renovação da Marinha Mercante”.

Pela legislação em vigor, o Adicional ao Frete para Renovação da Marinha

Mercante – AFRMM, instituído pelo artigo 1º do Decreto-Lei no 2.404, de 1987,

destina-se a atender aos encargos da intervenção da União no apoio ao

desenvolvimento da marinha mercante e da indústria de construção e reparação

naval brasileiras, e constitui fonte básica do FMM.83

82 Tais privilégios fazem com que a ANTAQ tenha incluído requisitos rigorosos para a homologação desses acordos na Norma da Resolução nº 194, que trata do assunto. 83

Art 3º, Lei nº 10.893/04.

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109

A Lei nº 10.893, de 13 de julho de 2004, estabelece normas sobre o

Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante – AFRMM e o Fundo da

Marinha Mercante – FMM e, no artigo 5º, determina que o Adicional incide sobre o

frete, que é a remuneração do transporte aquaviário da carga de qualquer natureza

descarregada em porto brasileiro.

A “remuneração do transporte aquaviário”, pelo disposto no parágrafo 1º, do

artigo 5º, é entendida como “a remuneração para o transporte da carga porto a

porto, incluídas todas as despesas portuárias com a manipulação de carga,

constantes do conhecimento de embarque, anteriores e posteriores a esse

transporte, e outras despesas de qualquer natureza a ele pertinentes”. Entende-se

por frete marítimo o preço do serviço prestado pelo armador para o transporte de

mercadorias, de um porto de origem para um destino, recebendo a carga ao costado

do navio, e retirando-a para terra no ponto de destino. 84

Os contratos entre o tomador de serviços de transporte marítimo e o

armador/transportador definem as despesas que podem integrar a cotação do frete,

ou não, por não serem específicas do próprio transporte da carga, que são as

relativas a carregamento, estiva, e descarga no porto de destino, segundo regras

praticadas internacionalmente.

Quanto à destinação dos recursos do FMM, parte é rateada entre as EBN da

cabotagem e da navegação interior, proporcionalmente ao total de fretes por elas

gerado no comércio exterior do País (art. 18), a ser utilizado para a aquisição de

embarcações novas, para uso próprio, jumborização, conversão, modernização,

docagem ou reparação de embarcação própria, inclusive para aquisição e instalação

de equipamentos necessários, quando as obras forem realizadas por estaleiro

brasileiro (art. 19).

A parcela restante dos recursos do FMM é aplicada no financiamento de até

90% (noventa por cento) do valor do projeto aprovado para a construção e demais

obras de embarcação em estaleiro brasileiro, tanto à EBN quanto ao estaleiro

brasileiro, este último podendo utilizá-los, também, para expansão e modernização

de suas instalações ou para construção de novas instalações (art. 26).

84

Direito Marítimo, Leandro Raphael.

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110

O FMM tem como agente financeiro o Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social – BNDES e, nas condições fixadas em ato do CDFMM85, os

bancos oficiais federais (art. 29). Também cabe ao CDFMM estabelecer as

prioridades de utilização dos recursos para a realização dos projetos das EBN e

estaleiros.

3 O incentivo à construção naval

A legislação estabelece, claramente, o vínculo da exploração do transporte

por EBN com a construção naval no Brasil, prevendo mecanismos casados de

fomento para uma atividade (transporte) e a outra (construção)86.

A Lei nº 11.196/05, decorrente da Medida Provisória nº 255-D (“MP do

Bem”), estabelece a isenção da contribuição para o PIS/Pasep-Importação e da

Cofins-Importação ao estaleiro naval brasileiro, no caso de aquisição ou importação

de bens de capital destinados à incorporação ao seu ativo imobilizado para

utilização nas atividades de construção, conservação, modernização, conversão e

reparo de embarcações pré-registradas ou registradas no Registro Especial

Brasileiro – REB.87

“É setor em que os produtores (estaleiros) observam com grande rivalidade intra-setorial, em

que há baixas barreiras à entrada, em que ocorre alta pressão de fornecedores (aço, equipamentos de

propulsão) e forte poder de barganha de

85

Decreto nº 5.269/2004 - Dispõe sobre a competência, composição e funcionamento do Conselho Diretor do Fundo da Marinha Mercante - CDFMM - órgão colegiado de caráter deliberativo, integrante da estrutura básica do Ministério dos Transportes, tem a finalidade de administrar o Fundo da

Marinha Mercante - FMM, bem assim acompanhar e avaliar a sua aplicação. 86

Lei nº 9.432/97 Art. 9º O afretamento de embarcação estrangeira por viagem ou por tempo, para operar... na navegação de cabotagem... depende de autorização do órgão competente e só poderá

ocorrer nos seguintes casos: I - quando verificada inexistência ou indisponibilidade de embarcação de bandeira brasileira do tipo e porte adequados para o transporte... pretendido;

II - quando verificado interesse público, devidamente justificado; III - quando em substituição a embarcações em construção no País, em estaleiro brasileiro, com contrato em eficácia, enquanto durar a construção, por período máximo de trinta e seis meses, até o

limite... da tonelagem de porte bruto contratada” Art. 10. Independe de autorização o afretamento de embarcação: I - de bandeira brasileira para a navegação... de cabotagem;

III - estrangeira a casco nu, com suspensão de bandeira, para a navegação de cabotagem, . .. limitado ao dobro da tonelagem de porte bruto das embarcações, de tipo semelhante, por ela encomendadas a estaleiro brasileiro instalado no País, com contrato de construção em eficácia, adicionado de

metade da tonelagem de porte bruto das embarcações brasileiras de sua propriedade, ressalvado o direito ao afretamento de pelo menos uma embarcação de porte equivalente. 87

Inciso II, § 3º, art. 13.88

ABDI – Relatório de Acompanhamento Setorial – Construção Naval -

Volume II - junho de 2008.

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111

compradores (armadores). É um setor exposto a

forte ciclicalidade e que convive com altos riscos, devido ao amplo lag temporal entre a encomenda e

a entrega do produto, o que provoca grande instabilidade na lucratividade dos estaleiros. ... A demanda por novas embarcações é fortemente

correlacionada com os ciclos de crescimento da economia mundial que, por sua vez, condicionam o

crescimento elástico de fluxos de comércio marítimo.”88

A conjuntura atual. Vemos o seguinte cenário:

Estaleiros antigos – O longo período de “vagas magras” deixou marcas,

cicatrizes que não estão sendo removidas sem muito sacrifício. Alguns fecharam, e

quase todos os outros foram negociados com empresas estrangeiras, se voltando

para a manutenção ou para a indústria “offshore”. Alguns passam por dificuldades

de renegociar dívidas fiscais e trabalhistas, o que leva à impossibilidade de participar

de licitações e prestar serviços ao Estado.

Estaleiros novos – O mercado esteve bastante favorável à participação de

novas empresas, sem passivos fiscais e trabalhistas; e é o que se viu, com a

abertura de estaleiros em Pernambuco – Suape; Rio Grande – RS, salvador – BA,

Navegantes – SC. No entanto, como a construção naval está enormemente

dependente das atividades de exploração do petróleo, esse setor está muito

vulnerável às flutuações do mercado de petróleo e derivados. O que se observa,

com a queda do preço do barril, é uma grande retração no mercado de construção

naval.

4 O Registro da Propriedade Marítima89

O registro da propriedade tem por objeto estabelecer a nacionalidade,

validade, segurança e publicidade da propriedade de embarcações (art. 2º). Com o

registro, a embarcação adquire individualidade jurídica própria, num paralelo com as

pessoas naturais. Passa a ter nome, nacionalidade (bandeira), domicílio (porto de

inscrição) e registro de identificação - “RG” (provisão de registro).

Toda embarcação (exceto a de emprego militar) deve ser inscrita na

Capitania dos Portos ou órgão subordinado, em cuja jurisdição for domiciliado o

88

ABDI – Relatório de Acompanhamento Setorial – Construção Naval - Volume II - junho de 2008. 89

Lei nº 7.652/98.

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112

proprietário ou armador ou onde for operar (art. 3º), sendo obrigatório o registro da

propriedade no Tribunal Marítimo, se a embarcação possuir arqueação bruta

superior a cem toneladas, para qualquer modalidade de navegação. Em suma, o

registro de propriedade é realizado no Tribunal Marítimo mas a embarcação,

obrigatoriamente, deve ser inscrita na unidade do Sistema de Segurança do Tráfego

Aquaviário (SSTA) com jurisdição sobre a região onde ela será utilizada.

O proprietário da embarcação pode ser pessoa física ou jurídica. A aquisição

de uma embarcação pode ser feita através de sua construção ou de outro meio

regular em direito permitido, mas a transmissão de sua propriedade, assim como o

registro de direitos reais e de outros ônus que gravem a embarcação, só se

consolida pelo registro no Tribunal Marítimo (art. 4º e 12).

Diversos ônus ou gravames reais podem incidir sobre as embarcações, tais

como:

Hipotecas navais;

Privilégios marítimos; e

Alienação fiduciária.

A Lei estabelece uma distinção entre o armador da embarcação e seu

proprietário. Armador é a pessoa física ou jurídica que, em seu nome e sob sua

responsabilidade, apresta a embarcação para sua utilização com finalidade lucrativa,

pondo-a ou não a navegar por sua conta (art. 16), sendo obrigatório seu registro no

Tribunal Marítimo mesmo quando a atividade for exercida pelo proprietário (art. 15).

O armador é aquele que detém o exclusivo controle da expedição, sob

qualquer modalidade de cessão, embora recebam a embarcação devidamente

aparelhada e tripulada, desde que possuam sobre ela poderes de administração. A

armação, qualquer que seja a sua modalidade, deverá ser averbada à margem do

registro da embarcação e na respectiva Provisão (art. 19).

Para os navios apenas em construção, é viável fazer-se um pré-registro no

REB.90

5 Normas de Direito Comercial

Quanto ao direito comercial, é importante ressaltar os aspectos:

90

Decreto nº 2.256/97, art. 4º.

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113

O Contrato de Transporte Marítimo. O Conhecimento de Transporte

A Responsabilidade Civil: abalroações e faltas/avarias de cargas. A

limitação de responsabilidade no Direito Marítimo

As avarias particulares e as avarias grossas

O Seguro Marítimo – Seguro casco e seguro de P&I (Protection and

Indemnity)

a) O Conhecimento de Transporte Marítimo

As empresas de navegação que operam no transporte de cargas emitem

conhecimentos de transporte com denominações distintas, a saber:

Na navegação de longo curso, conhecimento de embarque ou B/L – “Bill

of Lading”

Na navegação de cabotagem, Conhecimento de Transporte Aquaviário de

Carga (CTAC).

O Conhecimento de Transporte Marítimo serve como:

Recibo de mercadorias embarcadas

Documento que prova a existência do contrato de transporte

Título representativo da mercadoria 91

Quando da sua emissão, a descrição da mercadoria no conhecimento deve

ser a mais fiel possível à vista das suas condições no momento do carregamento,

com base nos recibos provisórios de embarque (“mate’s recepts”) e outras ressalvas

opostas na ocasião por quaisquer meios diversos válidos de direito. As ressalvas

podem ser:

Quanto à quantidade embarcada

Quanto à qualidade da mercadoria

Quanto ao seu estado

Quanto à inadequação da embalagem

A não emissão e entrega dos conhecimentos no prazo legal – 24 (vinte e

quatro) horas depois de ultimada a carga – expõe à pena de serem responsáveis por

todos os danos que resultarem do retardamento da viagem, tanto o capitão como os

91

Decreto nº 19.473/30.

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114

carregadores que houverem sido remissos na entrega dos mesmos

conhecimentos92, bem como:

Busca e apreensão judicial

Perda da cobertura do seguro

Resgate da Mercadoria

b) Abalroações

Abalroação é o choque de embarcação com outra embarcação. A

abalroação difere da colisão, que é o choque da embarcação com um objeto fixo ou

flutuante diverso de uma embarcação. O assunto é tratado no Código Comercial.

Sendo um navio abalroado por outro, o dano inteiro causado ao navio

abalroado e à sua carga será pago por aquele que tiver causado a abalroação, se

esta tiver acontecido por falta de observância do regulamento do porto, imperícia, ou

negligência do capitão ou da tripulação (art. 749).

Todas as perdas resultantes de abalroação pertencem à classe de avarias

particulares ou simples; excetua-se o único caso em que o navio, para evitar dano

maior de uma abalroação iminente, pica as suas amarras, e abalroa a outro para sua

própria salvação (art. 764). Os danos que o navio ou a carga, neste caso, sofre, são

repartidos pelo navio, frete e carga por avaria grossa (art. 752).

c) Faltas e Avarias de Cargas

A legislação sobre faltas e avarias de cargas visa caracterizar os problemas

físicos-materiais ocorridos com cargas transportadas por via marítima, e definir as

responsabilidades do transportador.

Tudo aquilo (carga/parte do navio) que for alijado (sacrificado) ao mar, em uma aventura marítima, em benefício de todos, para possibilitar que a aventura

chegue ao destino, deve ser pago por todos que chegaram ao destino).93

A Convenção internacional de York-Antuéria (1877) estabeleceu 11 Regras

sobre a questão; nesse mesmo ano foi criado o Comité Maritime Internacional (CMI)

que passou a ser o guardião dessas regras, que tiveram sua última atualização em

2004 – hoje já são 32 regras.

92

Código Comercial Art. 578. 93

Lei do Mar (Rodes – Mediterrâneo – 800 a.C.).

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115

O Brasil não é signatário desta Convenção, de modo que o Código

Comercial é que estabelece o regime jurídico tanto para as avarias-danos (problema

físico-material) ao navio ou às cargas, como para as avarias-despesas da operação

de transporte marítimo.

Todas as despesas extraordinárias feitas a bem do navio ou da carga,

conjunta ou separadamente, e todos os danos acontecidos àquele ou a esta, desde

o embarque e partida até a sua volta e desembarque, são reputadas avarias (art.

761).

As avarias são de duas espécies: avarias grossas ou comuns, e avarias

simples ou particulares. A importância das primeiras é repartida proporcionalmente

entre o navio, seu frete e a carga; e a das segundas é suportada, ou só pelo navio,

ou só pela coisa que sofreu o dano ou deu causa à despesa (art. 763).

São avarias grossas, entre outras:

Tudo o que se dá ao inimigo, corsário ou pirata por composição ou a título

de resgate do navio e fazendas, conjunta ou separadamente.

As coisas alijadas para salvação comum.

Os danos feitos deliberantemente ao navio para facilitar a evacuação

d’água e os danos acontecidos por esta ocasião à carga.

O tratamento, curativo, sustento e indenizações da gente da tripulação

ferida ou mutilada defendendo o navio.

As soldadas e sustento da tripulação durante arribada forçada.

Custos extraordinários decorrentes de arribada forçada.

Os danos acontecidos ao corpo e quilha do navio, que premeditadamente

se faz varar para prevenir perda total, ou presa do inimigo.

As despesas feitas para pôr a nado o navio encalhado, e toda a

recompensa por serviços extraordinários feitos para prevenir a sua perda

total, ou presa.

E, em geral, os danos causados deliberadamente em caso de perigo ou

desastre imprevisto, e sofridos como consequência imediata destes eventos, bem

como as despesas feitas em iguais circunstâncias, depois de deliberações

motivadas (Art. 509), em bem e salvamento comum do navio e mercadorias, desde a

sua carga e partida até o seu retorno e descarga.

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116

São avarias simples e particulares, entre outras:

O dano acontecido à carga por borrasca, presa, naufrágio, ou encalhe

fortuito, durante a viagem, e as despesas feitas para a salvar.

A perda de cabos, amarras, âncoras, causada por borrasca ou outro

acidente do mar.

As despesas de reclamação, sendo o navio e carga reclamadas

separadamente.

O conserto particular de embalagens e as despesas feitas para conservar

os efeitos avariados.

O aumento de frete e despesa de carga e descarga; quando declarado o

navio inavegável, as fazendas são levadas ao lugar do destino por um ou

mais navios.

E, em geral, as despesas feitas e o dano sofrido só pelo navio, ou só pela

carga, durante o tempo dos riscos.

d) A responsabilidade do transportador

A responsabilidade civil no Direito Marítimo segue, como regra, os mesmos

princípios do direito civil em geral, ressalvados alguns assuntos que são regidos por

normas especiais.

As mercadorias devem ser entregues ao destinatário, ou a quem apresentar

o conhecimento endossado, devendo aquele que as receber conferi-las e apresentar

as reclamações que tiver, sob pena de decadência dos direitos (art. 754).

Aquele que, por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo

(art. 927). O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou

força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado (art. 393).

Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua

indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto

com a do autor do dano (art. 945).

6 Normas de Direito Ambiental

Da Constituição Federal:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do

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povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes

e futuras gerações.

§3º - As condutas e atividades consideradas lesivas

ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas

físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de

reparar os danos causados.

Poluir enseja responsabilidade penal, administrativa e cível (obrigação de

indenizar o dano patrimonial causado).

Há diversas Convenções Internacionais sobre a matéria ambiental em vigor

no Brasil; são exemplos:

MARPOL (Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição

causada por Navios – decreto n° 2.508/98)

Dumping Convention (Convenção sobre a Prevenção de Poluição

Marinha por alijamento de Resíduos e outras Matérias – Decreto n°

87.556/82)

OPRC (Convenção Internacional sobre Preparo, Prevenção, Resposta e

Cooperação em caso de Poluição por Óleo – Decreto n° 2.870/98)

As infrações administrativas ambientais, no âmbito federal, encontram

respaldo, fundamentalmente, na Lei n° 9.605/98 (intitulada Lei de Crimes

Ambientais, dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de

condutas e atividades lesivas ao meio ambiente) e no Decreto n° 6.514/2008, de 22

de julho de 2008, que revogou o Decreto n° 3.179/99 e as principais situações de

poluição decorrente de incidentes com embarcações estão determinadas citado

decreto, acrescidas das disposições da Lei nº 9.966/00 (“Lei do Óleo”) que

estabelecem, de forma complementar, princípios básicos na movimentação de óleo

e outras substâncias nocivas ou perigosas em portos, instalações portuárias, navios

e plataformas.

Os incidentes são averiguados pela Capitania dos Portos94 e o culpado é

passível de penalidades:

Multa;

94

Arts. 70/76 da Lei n° 9.605/98.

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118

suspensão de atividade; e

restrição de direitos (suspensão/cancelamento de registro, licença,

permissão ou autorização; restrição/ perda de incentivos ou benefícios fiscais;

restrições de financiamentos oficiais; e proibições de contratar com a Administração

Pública).

Também a ANTAQ tem atribuições na área do meio ambiente, dentro da

esfera de sua competência95.

O dano ao próprio meio ambiente e o dano causado ao patrimônio e

terceiros são prejuízos indenizáveis. A responsabilidade é objetiva (independe da

existência de culpa), bastando identificar o vínculo entre o dano e a atividade que

gera risco ambiental, responsabilizando o respectivo empreendedor. É a chamada

“teoria do risco integral” baseada no princípio do “poluidor pagador”96. Está em vigor

no país a Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil em Danos

Causados por Poluição por Óleo, Bruxelas 1969 – CLC/69 (Decreto no 79.437/77).

Contempla a limitação da responsabilidade como contrapartida da responsabilização

do proprietário da embarcação (mesmo estando o navio afretado a casco nu a

terceiros) e da prestação de garantia financeira para poder trafegar.

No aspecto criminal, as situações possíveis de caracterizarem crime

ambiental são as previstas nos artigos 54 e 60 da Lei nº 9.605/98, que dispõe sobre

as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao

meio ambiente. A responsabilidade é subjetiva - depende da existência de dolo ou

culpa.

Estão sujeitas a processo penal:

Pessoas físicas: quem concorre para o fato, bem como o diretor,

administrador, membro do conselho e do órgão técnico, auditor, gerente

preposto ou mandatário, que deixar de evitar o crime quando podia para

evitá-lo (art. 2º)

Pessoas jurídicas: quando a infração for cometida por decisão de seu

representante legal ou contratual, ou seu órgão colegiado no interesse ou

benefício da entidade (art. 3º)

95

Art. 11, inciso V e art. 12, inciso V da Lei n° 10.233/01. 96

Art. 14, § 1° da Lei 6.938/81.

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119

As penas aplicáveis (art. 21) são:

Multa;

Restrição de direitos (suspensão de atividades, interdição de

estabelecimento e proibição de contratar com o Poder Público); e

Prestação de serviços à comunidade (custeio de programas/projetos

ambientais, recuperação de áreas degradadas, manutenção de espaços

públicos, contribuições a entidades públicas).

O dano econômico a terceiros é quantificável da mesma forma que as

demais espécies de danos patrimoniais. Extremamente problemático é, contudo, o

dano ao meio-ambiente em si, aquele subsistente após as medidas de combate à

poluição (controle da emissão de poluente e limpeza dos resíduos poluidores), por

não poder ser associado a um custo comercial e ser, por vezes, não estimável.

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120

APÊNDICE F – A ordenação jurídica Internacional

1 Antecedentes

1.1 A importância do tratado de Tordesilhas

Portugal e Espanha foram as duas primeiras nações do mundo ocidental a

se aventurarem em alto mar. Até então, havia um considerável e importante tráfego

marítimo ao longo do litoral europeu, que alcançava o médio oriente e a África

mediterrânea, gerando um rico comércio do qual esses dois países pouco

participavam.

O tratado de Tordesilhas foi um acordo entre nações (Portugal e Espanha)

que dividia entre as elas o ainda não descoberto – mares, terras e suas riquezas. À

época, a Espanha já sabia das descobertas de Colombo e Portugal empreendia

suas travessias à costa da África, vislumbrando a chance de descobrir o acesso

marítimo ao rico comércio do Oriente.

O Tratado de Tordesilhas - (Também chamado de Partição do Mar Oceano)

Como se sabe, o Tratado partilhava terras descobertas pelos navegantes;

traçava uma linha imaginária a 370 léguas das ilhas de Cabo Verde - as descobertas

a leste dessa linha ficariam para Portugal e as encontradas a oeste, para a Espanha.

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121

Assinado em 7/6/1494, trata-se de um acordo bilateral ratificado pela Espanha em

Arévalo (em 2/7/1494) e por Portugal em Setúbal (em 5/9/1494).

Como ato formal, de um acordo entre Nações, possuía as características

exigíveis à época, muito similares às praticadas atualmente - qualificação das partes,

descrição clara de seu objeto, definição de obrigações e direitos, homologação por

autoridade reconhecida, publicidade, etc.

A abertura dessa nova fronteira tinha um enorme potencial e aos dois países

interessava garantir a propriedade do que viessem a descobrir incluindo, aí, o direito

exclusivo de exploração de terras e de vias de navegação. Para possuir

reconhecimento internacional, o acordo precisava ser homologado por uma

autoridade reconhecida - a Igreja -, que o sancionou por meio da Bula “Ea, quae pro

bono pacis”, do Papa Júlio II, de 26 de janeiro de 1506. Mesmo assim, as demais

nações marítimas europeias manifestaram seu desacordo - Francisco I, monarca

Francês, questionando a autoridade da Igreja de legitimar um ato da justiça dos

homens, não da justiça de Deus, ironicamente argumentou com um diplomata

espanhol que gostaria de ver a cláusula do testamento de Adão que o afastara da

partilha do mundo. Em pouco tempo, embarcações holandesas e inglesas passaram

a explorar a navegação no Atlântico e frequentar a nossa costa, em especial atrás

do pau-brasil.

Para Portugal, o controle do tráfego no Atlântico Sul era vital. Portanto, era

necessário que seus navios exercessem esse controle com rigor, policiando as vias

navegáveis e atacando ferozmente as embarcações de outras nações que lá se

aventurassem. Esses atos deveriam ser reconhecidos internacionalmente como

legítimos. No entanto, se tratava de algo novo – a exploração de vias oceânicas!

Fez-se necessário estabelecer um novo conceito jurídico de direito dos

mares prevalecendo, inicialmente, o conceito conhecido como “mare clausum” onde

aos mares dava-se o mesmo reconhecimento dado aos territórios quanto à

propriedade, ou seja, pertenciam a quem os controlava..

Em 1603, o apresamento na Ásia de um navio português por um

comandante holandês gerou um amplo debate em cortes internacionais sobre o uso

e a propriedade dos mares. A Companhia Holandesa das Índias Orientais contratou

os serviços de um pouco conhecido advogado - Hugo Gröutius – que formulou o que

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veio a ser conhecido como o Princípio das Liberdades dos Mares - DE MARE

LIBERUM, peça publicada anonimamente em 1609, que defendia a

internacionalidade das águas oceânicas97.

Gröutius defendia que devido à imensidade dos oceanos, à inexistência de

limites estabelecidos de territoriedade sobre eles e o direito das nações de manter

linhas de acesso e de comunicação entre elas, nenhuma nação poderia restringir a

passagem de embarcações em águas abertas. A Inglaterra contrapôs através da

obra "Mare clausum" (John Selden – 1635) cuja tese residia no conceito de que o

mar era equiparado a um território continental e, como tal, podia ser conquistado.

A partir de então dominou os tribunais internacionais a necessidade de ser

estabelecido um limite territorial para as águas costeiras, aquelas sobre as quais o

país teria soberania.

Holandeses e ingleses passaram a liderar as discussões a respeito do direito

de uso dos mares até que, na virada do século XVIII o jurista holandês Cornelius van

Bynkershoek formulou seu trabalho "De dominio maris" (1702), onde propôs que o

mar deveria ser dividido em "mar proximal" e "mar distal" e que a definição do mar

territorial poderia ser do limite de alcance máximo dos canhões em terra. 98

Muitos consideram que a publicação do texto com as idéias de Gröutius a

respeito do direito das nações ao uso do mar (1609), é o ponto de partida da atual

política internacional sobre os direitos dos mar. No entanto, o fato que deu origem a

toda essa nova vertente do Direito Marítimo ocorreu 100 anos antes: a assinatura do

tratado de Tordesilhas, que vigorou por mais de dois séculos e meio. Foi

formalmente revogado apenas em 1750.99

97

http://www.abrapat.org.br/forum/esp_mar_1.html - Em 1603 o navio mercante português "Santa Catarina" foi capturado em alto-mar, ao largo de Singapura, pelo capitão holandês Jacob Van

Heemskerk, então a serviço da Companhia Holandesa das Índias Orientais. O feito gerou protestos internacionais, e até mesmo nos Países Baixos. Para defender-se, os representantes da companhia procuraram o jovem e renomado jurista Hugo Grotius.

98 Wikipédia - Na controvérsia gerada pelo conflito entre estas duas visões (“mare liberum” e “mare

clausum”), os estados marítimos acabariam por moderar as suas exigências de domínio marítimo, baseando-se no princípio de que o território se estendia para o largo a partir de terra. Uma base sustentável foi encontrada, restringindo o domínio marítimo até à distância em que um tiro de canhão

seria capaz de defendê-lo. Este seria universalmente adotado e estabelecido no limite das três milhas marítimas da costa. 99

Jorge Couto, coletânea “A Abertura dos Portos”, pp 315: O Tratado dos Limites, assinado em 14 de

janeiro de 1750..., revogava formalmente todas as cláusulas referentes a domínios ultramarinos

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1.2 A evolução do Direito Internacional Marítimo

Em 1651, durante a gestão de Cromwell, é promulgado o “Ato de

Navegação” (Navigation Act), uma atitude unilateral onde Inglaterra impõe seu

domínio dos mares que durou séculos. Por meio dele, se restringiu aos navios

ingleses todo o tráfego entre o Reino Unido e suas colônias, assim como, no

comércio com as demais nações europeias independentes, determina a divisão igual

entre as frotas dos dois países. O Ato de Navegação vigorou até 1849.

Já sob nova ordem mundial, quando os Estados unidos assumem a posição

de potência econômica mundial, esses publicam o “Jones Act” (1920), proposto e

defendido pelo senador Wesley Jones, motivado por conceitos nacionalistas

decorrentes das dificuldades da 1º Guerra Mundial. Tem quatro vertentes principais:

a) A formação de uma marinha mercante forte, bem estruturada, capaz de

suprir as necessidades estratégicas do país tanto em tempos de guerra

quanto de paz100;

b) Indústria de construção e reparação navais bem aparelhada, com mão-

de-obra de excelente formação, sendo restringido o uso de peças e

assessoria estrangeiras;

c) A prescrição de cargas a navios de proprietários norte-americanos101; e

d) A proteção dos tripulantes norte-americanos102.

É uma política protecionista, imposta de forma unilateral, que balizou a

política dos demais países com transporte aquaviário e construção naval

expressivos ou com pretenções a sê-lo.

constantes dos acordos anteriormente firmados pelas duas potências ibéricas, nomeadamente os tratados de Tordesilhas (1494), de Lisboa (1671), de Utrecht (1715) e o acordo de Saragoça (1529). 100

Jones Act - A navegação de cabotagem deve ser realizada por embarcações construídas e

registradas nos EUA, utilizando preferencialmente mão-de-obra de cidadão americano e suprida preferencialmente por fornecedores norte-americanos, de propriedade de cidadão americano, cuja tripulação seja formada por, ao menos, 75% de cidadãos norte-americanos. 101

Jones Act – “Nenhuma mercadoria, incluindo aquelas pertencentes ao governo dos Estados Unidos ou de um estado, poderá ser transportada por água ou por terra e por água, sob pena de aplicação de multa ou de arresto da mercadoria, entre portos dos Estados Unidos, incluindo distritos,

territórios e suas possessões, abrangidos pelas leis costeiras, diretamente ou através de um porto estrangeiro, ou qualquer parte do transporte em navio que não seja construído e registrado nas leis dos Estados Unidos e pertencentes a pessoas que não sejam cidadãos dos Estados Unidos”. 102

Jones Act - Criou benefícios extremamente abrangentes para a tripulação: qualquer marinheiro que está acidentado em viagem tem direito à tratamento e cuidados médicos a serem providos pelo armador (empregador), que será responsabilizado e deverá indenizar danos causados por

negligência por parte dos proprietários do navio ou outros membros da tripulação.

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2 Mecanismos de Proteção

Em reação à política unilateral dos EUA de proteção à sua navegação, os

demais países também passaram a praticar Mecanismos de Proteção103 em defesa

de interesses estratégicos ou logísticos, fomento de emprego ou para manter

equilíbrio da Balança de Pagamentos, universalizando esses mecanismos, que tem,

como principais agentes:

Proteção de mercado

Tolerância ao registro de embarcações em bandeiras de conveniência

Proteção à Cabotagem

Auxílio financeiro (financiamentos, condições fiscais privilegiadas,

subsídios)

A seguir, se tece considerações a respeito de cada um desses tópicos.

a) A proteção de mercado

Historicamente, o primeiro mecanismo de proteção de mercado praticado no

Brasil foi o Pacto Colonial, onde toda mercadoria traficada de/para a colônia deveria,

obrigatoriamente, passar por portos portugueses. Com a evolução das discussões

sobre o direito internacional e, posteriormente, a derrocada da estrutura colonialista,

passou-se a seguir o modelo do acordo Reino Unido/Calcutá (1875), um acordo

103

Tipos de subsídios: 1) Subsídios à Construção – fundos e verbas para operações em andamento, reestruturação e

produção, crédito para sucateamento e entrega do navio como parte do pagamento, e programas de taxa cambial; 2) Programas de Financiamento – empréstimos a taxas reduzidas e garantias de empréstimos para

estaleiros, tomados por estaleiro ou diretamente pelo comprador do navio, por meio de governos ou instituições afins; 3) Acordos Bilaterais

4) Créditos à Exportação 5) Depreciação e Taxas com Beneficiamento 6) Tratamento Fiscal Diferenciado Mediante Redução de Impostos

7) Empresa de Navegação Governamental 8) Reserva de Cabotagem 9) Auxílio à Pesquisa e Desenvolvimento

10) Reserva de Carga e Preferência de Bandeira 11) Subsídios Operacionais 12) Auxílio Seguro Marítimo

13) Auxílio à Construção e Sucateamento 14) Programas Sociais ou Econômicos 15) Registros Abertos / Segundo Registro

16) Auxílio de Reestruturação

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bilateral, dando início ao que se chamou “Conferências de Fretes”104. Esse acordo

surgiu sob os efeitos da evolução tecnológica que introduziu a propulsão a vapor, o

que alterou significativamente os parâmetros de transporte. Isso determinou a

firmatura desse acordo, estabelecendo limites para cargas e fretes e dando início a

uma nova prática que perdurou por mais de um século, chegando a haver mais de

300 conferências de frete pelo mundo, hoje a prática se rege por regras da OMC.

A prática restritiva da proteção de mercado pode ter caráter ”fechado”,

atendendo interesses de uma única nação, ou “aberto”, favorecendo um bloco de

nações. Como exemplo, temos:

EUA promulgam seu “Shipping Act” (1916/1984), por meio do qual

reconhecem o sistema e a excepcionalidade da lei anti-cartel americana,

bem como o registro de tarifas na FMC (Federal Maritime Commission) –

Prática fechada

A União Europeia, no Tratado de Roma (1957), estabelece a

excepcionalidade das Regras anti-cartel da U. E., o “Shippers’ Council” –

Prática aberta

A Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento

(UNCTAD) 105 é um fórum permanente de discussão de questões econômicas. Criou,

em 1974, o Código de Conduta para as Conferências de Frete originando princípios

que visam a estabilidade de tarifas e a participação de terceiras bandeiras nos

acordos bilaterais, onde os dois países diretamente envolvidos no tráfego tem o

104

Lacerda, Sander Magalhães, REVISTA DO BNDES, RIO DE JANEIRO, V. 11, N. 21, P. 209-232, JUN. 2004, Transporte Marítimo de Longo Curso no Brasil e no Mundo. 105 <http://eduquenet.net/unctad.htm>, acessado em 15/06/2015 - Criada em 1964, a Conferência das

Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD/CNUCED) é um órgão permanente da Assembleia Geral das Nações Unidas e conta com a participação de 188 Estados-membros (março

2000). Contribui para a redução dos desequilíbrios e das desigualdades na economia mundial, designadamente através do comércio internacional, o qual constitui, para esta Organização, um importante instrumento ao serviço do crescimento econômico especialmente nos países em vias de

desenvolvimento (PVD). Os trabalhos da UNCTAD têm especial incidência nas seguintes áreas: análise do impacto dos acordos da OMC relacionados com o comércio e o desenvolvimento econômico, especialmente nos

PVD, e a contribuição para a expansão do comércio internacional, sobretudo entre os PVD e outros países com níveis mais baixos de desenvolvimento. Desde a sua formação, a UNCTAD tem vindo a ocupar-se de um conjunto diversificado de temas, tais

como a política comercial (que inclui áreas como a concorrência, o ambiente e os serviços) os produtos de base (café, madeira tropical, e açúcar, entre outros), a eficácia comercial (v.g., harmonização dos procedimentos alfandegários, estabelecimento de pontos de contato – "Trade

Points"), e questões macroeconômicas e financeiras.

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direto a 40%, cada, dos fretes decorrentes, enquanto que os 20% restantes ficam

disponíveis para terceiras bandeiras, chamados “outsiders”.

b) Bandeiras de Conveniência

No pós 1ª Guerra (1919), os EUA emergiram como potência mundial, mas

ainda necessitados de estimular sua economia, voltaram-se para adotar medidas de

redução dos custos logísticos de transporte, atacando as parcelas que mais incidem

no custo do frete. A solução adotada foi de permitir o registro de embarcações

americanas em países de menor expressão econômica – no caso, Panamá, a partir

de 1919, e Libéria, desde 1940 -, onde as exigências tributárias e os custos sociais

eram significativamente menores, mesmo que, com isso, tenha vindo a ocorrer a

perda do vínculo substancial com o país de origem, a queda dos padrões de

segurança das embarcações e tripulações socialmente desamparadas.

Tal decisão causou a adoção de política similar pelas demais nações

detentoras de grandes frotas, tais como Holanda e Inglaterra. Mais tarde, quando o

custo do combustível passou a pesar significativamente na composição do frete,

logo após a crise do petróleo (anos 1970), a prática se universalizou. Essas medidas

se mostram eficientes no seu intuito de baratear custos operacionais, principalmente

os referentes aos salários dos tripulantes. Ocorreu, então, uma corrida das

empresas com grandes frotas de longo curso para as bandeiras de conveniência,

agora como política interna de cada corporação.

Em reação a essa debandada, e temendo o risco de perdas estratégicas e

de receitas em decorrência de não mais deter o controle sobre as frotas, alguns

países adotam uma política alternativa de incentivo ao retorno dos navios à bandeira

nacional, qual seja a criação de registros especiais ou Segundo Registro, onde

benefícios eram concedidos na condição de o proprietário do navio realizar a

suspensão da bandeira original de registro e adoção temporária de outra bandeira.

Foi o caso da Noruega – NIS, Dinamarca – DIS, Espanha – CSR, França – FIS,

Portugal – Madeira, Alemanha – GIS, Luxemburgo e, até mesmo, o Brasil, com o

seu Registro Especial Brasileiro– REB.

O quadro a seguir resume a situação descrita:

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127

Fonte: ANTAQ

No entanto, o esforço dos países de forte referência marítima de

reconquistar as frotas para suas áreas de influência, não vem surtindo o efeito

desejado, como mostra o gráfico abaixo, onde se verifica a tendência de crescimento

do número de navios sob regime de bandeira de conveniência.

Fonte: ANTAQ

c) Proteção à Cabotagem

A reserva de mercado na navegação de cabotagem é praticada por diversos

países com tradição marítima. Sua aplicação é solidamente respaldada por questões

estratégicas e aceita, internacionalmente, já há séculos. No Brasil, remonta ao Pacto

Colonial e, mais tarde (1816, 1891 e 1997) foi motivo de legislação específica.

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Como já relatado, nos EUA a cabotagem é restrita a empresas americanas,

empregando embarcações construídas e registradas no próprio país (“Jones Act”), e

a Comunidade Européia também protege a navegação entre os Estados-Parte.106

Murillo Barbosa, diretor da Agência Nacional de Transportes Aquaviários –

ANTAQ, sita107 o levantamento realizado pelo US Department of Transportation –

Maritime Administration (MARAD), em 1987108, onde, no universo 56 países

pesquisados, que preencheram um ou mais dos seguintes critérios:

Frota oceânica com no mínimo 50 embarcações com mais de 1000 TPB;

Litoral aberto para águas internacionais;

Governo estável sem existência de conflitos armados; e

Interesse comercial ou político dos EUA.

Praticam privilégios109:

40 países – Cabotagem restrita a navios nacionais

17 países – subsídios diretos em favor da frota nacional

13 países – subsídios indiretos

43 países – restrições sobre a composição das tripulações

37 países – restrições sobre a propriedade das embarcações

3 A Legislação Internacional

A discussão política do direito do mar nos diversos fóruns internacionais se

consubstancia na forma de convenções. Estas convenções necessitam ser

aprovadas no legislativo de cada nação e atingir um quórum mínimo de aprovações

para que entre em vigor. A partir de então, os países membros da Convenção se

obrigam a fazer cumprir suas determinações. São relacionadas, a seguir, as

convenções mais importantes:

106

Regulamento CCE nº 3577/92 do Conselho da Comunidade Européia. 107

1º Seminário sobre o Desenvolvimento da Navegação de Cabotagem Brasileira (Agosto/2009). 108

Revalidado em 2004, e citado na Avaliação da Política Marítima dos EUA para os próximos 30

anos (07/01/2009). 109

Argumentação:

“to develop a merchant marine”

“to give preference to labor and national industry”

“to generate employment for nationals”

“to support national security”

“to protect the domestic economy”

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a) CNUDM - Convenção das Nações Unidas sobre o direito do mar -

promulgada pelo Decreto nº 99.165/90, em vigor em 1994

b) Convenção em matéria de abalroamento - Decreto nº 10.773/14

c) Convenção sobre limitação de responsabilidade de proprietários de

embarcações marítimas - Decreto nº 350/35

d) Convenção em matéria de privilégios e hipotecas marítimas (parte) -

Decreto nº 351/35)

e) Acordo do Mercosul de alcance parcial para a facilitação do transporte

multimodal - Decreto nº1.563/95

f) Convenção para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar (SOLAS-74) -

Decreto nº 87.186/82

g) Regras Internacionais para Evitar o Abalroamento no Mar (RIPEAM) -

Decreto nº 80.068/77

h) Acordo de Viña Del Mar (matéria de Controle de Estado do Porto)

i) Convenção sobre Responsabilidade Civil em danos por Poluição por Óleo

(CLC-69) - Decreto nº 79.437/77

j) Convenção sobre Prevenção da Poluição no Mar (MARPOL) - Decreto nº

2.508/98

k) Convenção sobre Preparo, Prevenção, Resposta e Cooperação em caso

de Poluição por Óleo - Decreto nº 2.870/98

l) Convenção sobre a Prevenção Marinha por Alijamento de Resíduos e

Outras Matérias (Londres-72) - Decreto nº 87.566/82

m)Convenção de Arresto de Embarcações - somente assinada, ainda não

ratificada - não está em vigor no Brasil

n) Convenção para a Supressão dos Atos Ilícitos de Violência contra a

Segurança da Navegação Marítima, Roma, 1998 (SUA) - não está em

vigor no Brasil

Há, ainda, convenções internacionais que tratam do transporte de cargas;

são elas:

Regras de Haia (“Hage Rules”)

Regras de Haia Visby (“Hage-Visby Rules”)

Regras de Hamburgo (“Hamburg rules”)

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130

As Regras de Haia, complementadas pelas de Haia Visby, limitam as

responsabilidades dos transportadores (nos casos de falha náutica, incêndio,

perigos do mar, embalagem inadequada, atrasos, etc.); por isso, foram ratificadas

em geral por países com grandes frotas. Já as regras de Hamburgo incluem o

conceito de culpa presumida do transportador e indenização por atraso na entrega.

Foram ratificadas por países de menor participação no transporte marítimo. No

Brasil, estas convenções não estão em vigor e adota-se o Código Comercial.

4 O Regime jurídico dos Mares

A carência de um arcabouço jurídico universal tratando do Direito marítimo

levou à promoção das Conferências das Nações Unidas sobre o Direito do Mar,

realizadas em Genebra em 1958 e 1960, das quais foram elaboradas 4 Convenções

sobre:

o mar territorial e a zona contígua;

o alto mar;

a pesca e conservação dos recursos vivos do alto mar; e

a plataforma continental.

Muito embora a aceitação dessas novas convenções não tenha sido

abrangente, com o crescimento das relações econômicas e a evolução tecnológica

que levou a novos patamares a capacidade de exploração dos recursos do mar, elas

serviram para estimular a discussão entre as nações sobre a necessidade de se

chegar a um entendimento sobre o direito internacional marítimo. Amadurecida a

questão, se fez necessário estabelecer o Regime dos Mares (1993): a natureza

jurídica do mar territorial, da zona contígua, da zona econômica exclusiva e da

plataforma continental brasileiros110, realizado a partir da Convenção das Nações

Unidas sobre o direito do mar – CNUDM111, da qual se extrai o texto do Anexo I.

O Brasil, com seu imenso litoral e, praticamente, sem conflitos territoriais

marítimos, se antecipou à Convenção (que entrou em vigor apenas em 1994).

110

Lei n º 8.617/93 - Dispõe sobre o mar territorial, a zona contígua, a zona econômica exclusiva e a plataforma continental brasileiros. 111

Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar (CNUDM), assinada por 119 delegações em

Montego Bay (Jamaica), a 10 de dezembro de 1982, que entrou em vigor em 16 de novembro de 1994, e da qual fazem parte 137 Estados. O Brasil ratificou a Convenção em 22 de dezembro de 1988 e a definição de seus limites, de acordo com esta nova Convenção, ocorreu em 4 de janeiro de

1993. Promulgada pelo Decreto nº 99.165/90.

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Essa Convenção estabelece, de modo essencialmente jurídico, que a

largura da ZEE não poderá estender-se além das 200 milhas marítimas (art. 57),

salvo no caso em que a plataforma continental se estenda além das 200 milhas, o

que dá o direito ao Estado costeiro de estender a sua ZEE a até 350 milhas.

Sua delimitação é de fundamental importância, o que levou o Governo

Brasileiro a implementar o Plano de Levantamento da Plataforma Continental

Brasileira (LEPLAC), com o objetivo de determinar, por meio de mapas e

informações pertinentes, incluindo dados geodésicos, que descrevam

permanentemente as fronteiras exteriores da sua plataforma continental, o limite

além das 200 mn, no termos em que a mesma é definida no artigo 76 da CNUDM.

O êxito desse empreendimento possibilitou o reconhecimento da ONU com

respeito à uma extensa área adicional de sua zona econômica exclusiva, levando ao

que foi chamado de “Amazônia Azul”.

ANEXO 1 - Introdução ao texto da Convenção das Nações Unidas sobre o

direito do mar

Os Estados Partes nesta Convenção,

Animados do desejo de solucionar, num espírito de compreensão e

cooperação mútuas, todas as questões relativas ao direito do mar e conscientes do

significado histórico desta Convenção como importante contribuição para a

manutenção da paz, da justiça e do progresso de todos os povos do mundo,

Verificando que os fatos ocorridos desde as Conferências das Nações

Unidas sobre o Direito do Mar, realizadas em Genebra em 1958 e 1960, acentuaram

a necessidade de uma nova Convenção sobre o direito do mar de aceitação geral,

Conscientes de que os problemas do espaço oceânico estão estreitamente

inter-relacionados e devem ser considerados como um todo,

Reconhecendo a conveniência de estabelecer por meio desta Convenção,

com a devida consideração pela soberania de todos os Estados, uma ordem jurídica

para os mares e oceanos que facilite as comunicações internacionais e promova os

usos pacíficos dos mares e oceanos, a utilização equitativa e eficiente dos seus

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recursos, a conservação dos recursos vivos e o estudo, a proteção e a preservação

do meio marinho,

Tendo presente que a consecução destes objetivos contribuirá para o

estabelecimento de uma ordem econômica internacional justa e equitativa que tenha

em conta os interesses e as necessidades da humanidade em geral e, em particular,

os interesses e as necessidades especiais dos países em desenvolvimento, quer

costeiros quer sem litoral,

Desejando desenvolver pela presente Convenção os princípios consagrados

na resolução 2749 (XXV) de 17 de dezembro de 1970, na qual a Assembléia Geral

das Nações Unidas declarou solenemente, interalia, que os fundos marinhos e

oceânicos e o seu subsolo para além dos limites de jurisdição nacional, bem como

os respectivos recursos são patrimônio comum da humanidade e que a exploração e

o aproveitamento dos mesmos fundos serão feitos em beneficio da humanidade em

geral, independentemente da situação geográfica dos Estados,

Convencidos de que a codificação e o desenvolvimento progressivo do

direito do mar alcançados na presente Convenção contribuirão para o fortalecimento

da paz, da segurança, da cooperação e das relações de amizade entre todas as

nações, de conformidade com os princípios de justiça e igualdade de direitos e

promoverão o progresso econômico e social de todos os povos do mundo, de

acordo com os Propósitos e Princípios das Nações Unidas, tais como enunciados na

Carta,

Afirmando que as matérias não reguladas pela presente Convenção

continuarão a ser regidas pelas normas e princípios do direito internacional geral,

Acordaram o seguinte...