Telma Oliveira Soares Velloso

68
UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA ESTRATÉGIAS POLÍTICO-TERRITORIAIS E EMANCIPAÇÃO POLÍTICA-ADMINISTRATIVA DE CONCEIÇÃO DE MACABU (1948-1952) DISCENTE: TELMA OLIVEIRA SOARES VELLOSO ORIENTADOR: PROF. LEONARDO CIVALE VIÇOSA - MINAS GERAIS 2015

Transcript of Telma Oliveira Soares Velloso

  • 1

    UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIOSA

    CENTRO DE CINCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

    DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

    ESTRATGIAS POLTICO-TERRITORIAIS E

    EMANCIPAO POLTICA-ADMINISTRATIVA DE CONCEIO DE

    MACABU (1948-1952)

    DISCENTE: TELMA OLIVEIRA SOARES VELLOSO

    ORIENTADOR: PROF. LEONARDO CIVALE

    VIOSA - MINAS GERAIS

    2015

  • 2

    TELMA OLIVEIRA SOARES VELLOSO

    ESTRATGIAS POLTICO-TERRITORIAIS E

    EMANCIPAO POLTICA-ADMINISTRATIVA DE CONCEIO DE

    MACABU (1948-1952)

    Monografia, apresentada ao Curso de

    Geografia da Universidade Federal de

    Viosa como requisito para obteno do

    ttulo de bacharel em Geografia.

    Orientador: Leonardo Civale

    VIOSA - MINAS GERAIS

    2015

  • 3

    TELMA OLIVEIRA SOARES VELLOSO

    ESTRATGIAS POLTICO-TERRITORIAIS E

    EMANCIPAO POLTICA-ADMINISTRATIVA DE CONCEIO DE

    MACABU (1948-1952)

    Monografia apresentada

    Universidade Federal de Viosa,

    como parte das exigncias do

    Programa de Graduao em

    Geografia, para Obteno do ttulo

    de Bacharel em Geografia.

    APROVADA:

    _____________________________________

    Leonardo Civale (Orientador) DGE/UFV

    _____________________________________

    Marilda Teles Maracci - DGE/UFV

    _____________________________________

    Gustavo Soares Iorio - DGE/UFV

    Viosa-MG, 02 de julho de 2015

  • 4

    Irmo, voc no percebeu que voc

    o nico representante do seu sonho na

    face da Terra?

    Se isso no fizer voc correr, chapa

    Eu no sei o que vai

    (...)

    E jamais volte pra sua quebrada de mo e

    mente vazia Emicida.

    Aos meus pais, minhas irms, amigos,

    professores, namorado e todos que

    acreditam que os sonhos podem se tornar

    realidade atravs da ao...

    O sonho representa a realizao de um

    desejo Sigmund Freud.

  • 5

    AGRADECIMENTOS

    Agradeo primeiramente ao destino, que foi capaz de criar inmeros

    caminhos que me fizeram chegar aqui, mas que tambm criou outros diversos

    atalhos que poderiam ter me tirado dessa estrada. Esse mesmo destino foi o

    agente que me possibilitou encontrar pessoas maravilhosas, viver situaes

    que jamais pensaria que viveria, e tudo isso posso guardar na memria e

    analisar o meu prprio espao nesse mundo.

    Dentre todas as pessoas que contriburam com mais essa etapa da vida,

    tenho a imensa gratido ao meu lar, base do que eu sou, por isso dedico todas

    as vitrias aos meus pais, Ldia e Svio, por me proporcionarem o primeiro e

    verdadeiro amor desde quando estava no ventre, com os primeiros tombos, por

    todos os abraos e vezes que foram o porto seguro que precisava para no ter

    medo de seguir. Eles foram os primeiros a acreditar em mim e no que eu

    escolhi seguir. Mas a famlia cresceu e ganhei duas prolas como irms.

    Agradeo aos sorrisos, brincadeiras, carinho, ao amor sem fronteiras e at as

    brigas que fazem parte da irmandade, por isso dedico e desejo tudo que

    conseguir de melhor nessa vida para Jlia e Lis.

    Aos meus avs e bisavs, agradeo aos bons momentos, ao amor que

    tive dos que conheci e ao amor que teria se tivesse encontrado com todos

    nessa vida. Vocs me proporcionaram inmeras alegrias, comidinhas gostosas,

    abraos como se fossem meus pais, cuidaram de mim com tamanho zelo e

    estimularam a criatividade quando contavam coisas do passado.

    Aos meus tios e primos, em especial a dinda Leila, agradeo por todas

    as oportunidades, por se tornarem tambm uma extenso do meu lar, por

    terem sido a base quando eu no estava em casa, pelos acolhimentos, pelas

    conversas, por acalmarem meu nimo e de alguma forma, por acreditarem na

    minha capacidade e nos meus sonhos.

    Aos amigos que esto nas estradas da vida, em especial aqueles de

    Macabu e de Campos, que mesmo na distncia no perderam suas essncias

    e mantivemos o contato, que souberam o valor da amizade mesmo quando no

    nos vemos todos os dias.

  • 6

    Aos amigos de Viosa eu agradeo por estarem ao meu lado nos

    inmeros sorrisos ou quando fazia as tpicas piadas ruins da Telma, mas

    principalmente, por estarem comigo no momento dos choros, que no foram

    poucos... Vocs me ensinaram que existe uma famlia que podemos escolher

    ao longo da vida repleta de irmos que no so de sangue, mas so de

    corao e isso que importa. Obrigada por proporcionarem dias que levarei

    para sempre na saudade e na memria. Por isso agradeo aos amigos que fiz

    durante as festas, aos nens que so como eu, encontros acadmicos, a turma

    de 2010 da Geografia, aos que viraram amigos por morarem nas repblicas

    dos amigos, aos companheiros de estudos na bbt, de C.A, PIBID, monitorias,

    estgios, projetos, NEAd, Rebele-se UFV, UJR, e todos os espaos que foram

    usados ou que ainda esto por vir destinados para os encontros dos nossos

    caminhos.

    Agradeo especialmente as amigas que se tornaram minhas irms e

    estiveram presentes nesses anos de Viosa, Las e Thuany, s vocs

    conhecem o verdadeiro sentido do termo vergonha alheia e tentaram de todas

    as formas afastar o pessimismo com a agitao.

    Ao meu orientador Leonardo Civale, agradeo por ter sido uma

    referncia para mim nesse tempo de Viosa, ao ponto de t-lo como um pai e

    poder encher minha boca para falar com tanto orgulho e carinho sobre todas as

    situaes que passamos.

    Aos professores do DGE minha gratido, pois com vocs aprendi que a

    Geografia era realmente o que eu esperava de formao da vida.

    Aos funcionrios da secretaria do DGE, agradeo por todas as tardes e

    conversas que fizeram o dia melhor.

    Ao professor Gustavo e a professora Marilda, por terem sido to solcitos

    para compor a banca da monografia e por todas as consideraes feitas, estas

    que daro suporte para novas pesquisas.

    E nessa fase de final de curso o destino pregou uma pea para me fazer

    agradecer todos os dias ao acaso e de estimular minha capacidade de

    proporcionar bons motivos para ter uma pessoa ao lado, por isso agradeo ao

    Natan, que no se tornou meu namorado toa. Nos encontramos nessa vida

    para aprender o verdadeiro significado da palavra companheirismo, e com ele

  • 7

    tenho aprendido todos os dias que existe amor mesmo que no se planeje o

    futuro. Obrigada por resgatar quem eu esquecia que era e por tudo de bom que

    j passamos em to pouco tempo. Que o destino possa proporcionar coisas

    ainda melhores para ns dois.

    Agradeo imensamente a todos e todas que de forma direta ou indireta,

    foram importantes para que eu me tornasse a pessoa que sou e chegasse at

    aqui, pois atravs das relaes sociais que edificamos nosso carter, nossos

    sentimentos e aes. Que nossos caminhos se cruzem e que possamos

    aprender todos os dias. Ao destino mais uma vez, minha gratido e o desejo de

    no terminar aqui o caminho acadmico.

  • 8

    SUMRIO

    Resumo ............................................................................................................ 09

    Lista de figuras ................................................................................................. 10

    Lista de tabelas ................................................................................................ 11

    Introduo ........................................................................................................ 12

    Captulo 1: A primeira emancipao 1891

    1.1 Contextualizando Conceio de Macabu ........................................ 16

    1.2 A Freguesia ..................................................................................... 19

    1.3 A primeira e rpida emancipao (1891-1892) ............................... 22

    1.4 O fracasso da rpida emancipao ................................................. 31

    Captulo 2 Getlio Vargas e a Constituio de 1946, uma nova esperana

    para a emancipao de Conceio de Macabu

    2.1 O contexto de Getlio Vargas e o Golpe de 1930 ........................... 34

    2.2 Macabu na Era Vargas .................................................................... 36

    2.3 A Constituio de 1946 ................................................................... 37

    Captulo 3 A emancipao de 1952

    3.1 A brecha poltica do Fundo de Participao dos Municpios ........... 42

    3.2 A construo do processo emancipatrio ....................................... 44

    3.3 A oposio e seus ataques ............................................................. 50

    3.4 Os dados e a viabilidade ................................................................. 54

    3.5 A emancipao se torna realidade .................................................. 57

    Consideraes Finais ...................................................................................... 63

    Referncias ...................................................................................................... 66

  • 9

    RESUMO

    Esta pesquisa realizou um estudo sobre Conceio de Macabu, cidade

    localizada no Norte Fluminense do Estado do Rio de Janeiro, a qual teve em

    seu territrio explicitamente a disputa entre grupos sociais por mais poder e

    influncia na regio, o que culminou na emancipao do seu territrio e na

    articulao de mobilizao da populao. O objetivo desta pesquisa foi de

    analisar o processo de emancipao poltica e administrativa do territrio de

    Conceio de Macabu em 1952, utilizando assim de documentos e bibliografias

    sobre o local e as transformaes espaciais que ocorreram na articulao entre

    os grupos sociais que visavam ou no a separao territorial. Os resultados

    mostraram que Conceio de Macabu foi uma das primeiras cidades a se

    emancipar atravs de plebiscito e com uma aprovao expressiva, assim

    evidenciando o sucesso da articulao poltica local e da organizao pr-

    emancipao com as estratgias de comprovao de dados pertinentes para o

    processo emancipatrio, o desenvolvimento econmico local, a consolidao

    da identidade e pertencimento ao territrio por parte da populao que era

    mobilizada para participar do plebiscito.

    PALAVRAS CHAVE: Plebiscito; Emancipao de Cidade; Estratgias

    Polticas; Poder; Territrio.

  • 10

    LISTA DE FIGURAS

    Imagem 1: Mapa poltico da Regio Norte Fluminense do Estado do Rio de Janeiro ............................................................................................................. 16

    Imagem 2: Mapa poltico do Estado do Rio de Janeiro, com delimitaes das

    regies ............................................................................................................. 17

    Imagem 3: Mapa dos Aldeamentos no Rio de Janeiro Colonial ..................... 20

    Imagem 4: Praa 1 de Maio e as primeiras ruas de Macabu ........................ 26

  • 11

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1: Disposio dos votos do plebiscito de emancipao de Conceio de

    Macabu ............................................................................................................ 60

  • 12

    Introduo

    Os passos de uma pesquisa consistem na subjetividade e nos objetivos

    do autor, tendo em muitos casos uma afinidade com o tema escolhido e

    buscando observ-lo com outros olhares, aqueles lapidados na trajetria de

    vida, mas tambm no percurso acadmico.

    Falar sobre o local a qual foi pesquisado neste trabalho em muito me

    alegra, no s por ter nascido e crescido ouvindo as histrias da pequena e

    pacata Conceio de Macabu, mas por saber da grandiosidade dos homens e

    mulheres que tinham um sonho, este que se realizou com muita articulao e

    mobilizao poltica.

    Quando somos crianas no temos uma compreenso to crtica do

    mundo em que vivemos, por isso precisamos de pessoas que nos auxiliem

    nessa construo diferenciada de se entender o espao em que estamos

    inseridos. A minha infncia foi rica de curiosidades e saber que tiveram homens

    e mulheres de luta, me faz querer lutar tambm por uma sociedade em que as

    foras polticas sejam condizentes com os anseios da sociedade.

    Crescer ouvindo meu bisav Luiz Dias de Oliveira falando sobre como

    foi a sua participao e o processo de emancipao de Conceio de Macabu

    me fazia viajar imaginando cada passo dado. Por isso, atravs da Geografia

    tenho a possibilidade de identificar esse processo e contribuir para o resgate da

    memria de um povo que planejou e efetivou a to sonhada emancipao. A

    luta desses homens e mulheres entre 1891 e 1952 uma prova de que

    podemos transformar o espao, as relaes sociais, quebrar com foras

    polticas hegemnicas e nos sentirmos pertencentes a um territrio.

    Esta pesquisa um retorno que posso dar para todos que conhecem

    Conceio de Macabu, mas que desconhecem suas histrias, como a do

    processo de emancipao diferenciado que a mesma teve se comparada s

    outras cidades do Estado do Rio de Janeiro e pela sua aprovao histrica,

    jamais alcanada em outro municpio do Brasil.

    A Geografia Poltica reflete e compreende as intencionalidades de

    grupos sociais, do Estado, formao de identidades, reconhecimento com o

  • 13

    espao, as fronteiras e a ao de poder das pessoas que esto no comando

    poltico, seja um governo, por exemplo, ou ainda, organizaes sociais. As

    intencionalidades podem ser encontradas em discursos, documentos ou at

    mesmo nas aes desses grupos.

    Atravs da poltica pode-se identificar a retomada de alguns discursos,

    como pode ser observado atravs da Constituio Federal de 1946, a qual se

    utilizou dos princpios federalistas da Constituio Federal de 1891, e que

    posteriormente a 1946, foi na Constituio Federal de 1988 que esse ideal foi

    novamente retomado, inclusive de forma mais estruturada com as

    necessidades das esferas municipais, estaduais e da Unio. O perodo que

    compreende entre as Constituies de 1946 e 1988, foi marcado pela Ditadura

    Militar, por isso so caracterizadas pelo enfraquecimento do federalismo,

    evidenciando que as polticas e at as leis so exercidas de acordo com o

    contexto social da nao.

    Para uma cidade se emancipar de acordo com a Constituio Federal de

    1946, o Governo do Estado na qual esse territrio estava compreendido,

    deveria primeiramente fazer um levantamento das condies da regio e se era

    vivel uma possvel emancipao, para depois aprovar em forma de lei.

    Posteriormente seria feita uma consulta populao, o que chamamos de

    plebiscito. Todo esse aparato era garantido na Lei Orgnica das

    Municipalidades, datada em 1938, pois ainda faltava na Constituio Federal

    de 1946 o debate sobre a emancipao de cidades.

    Ao buscar referncias e delimitar o objeto de estudo, notou-se que a

    cidade de Conceio de Macabu, no Estado do Rio de Janeiro, foi uma das

    primeiras cidades a se emancipar no Brasil atravs de plebiscito, em 15 de

    maro de 1952 e teve o maior ndice de aprovao da populao para o seu

    desmembramento da cidade de Maca-RJ. Mas para entender esse fato, deve-

    se buscar reconhecer os diferentes grupos sociais e suas intencionalidades, os

    discursos adotados, a mobilizao social em prol da emancipao, formao

    da identidade, a relao com o governo do Estado, a abertura dessa poltica

    presente na Constituio Federal de 1946 (vigente na poca) e os princpios

    federalistas.

  • 14

    A relevncia deste estudo consiste em diferentes escalas, pois se refere

    populao local, a histria do Estado do Rio de Janeiro, evidenciando fatos

    inditos tambm na (re) organizao do territrio estadual e nas foras polticas

    que se relacionavam. Alm de ter significado a nvel nacional, por se tratar de

    um estudo que evidencia a diferenciao e importncia do processo de

    emancipao de Conceio de Macabu, tambm pelo contexto social, poltico e

    econmico do conjunto de leis que geriam nosso territrio na poca.

    De tal forma, vale ressaltar que o objetivo desta pesquisa consiste em

    analisar como foi o processo de emancipao poltica e administrativa de

    Conceio de Macabu atravs da realizao de plebiscito no ano de 1952.

    Permeando assim, na identificao dos sujeitos que a articularam, as relaes

    locais com os representantes polticos em Maca (cidade a qual foi

    desmembrado o territrio de Conceio de Macabu) e no Governo do Estado

    do Rio de Janeiro.

    Os materiais exploratrios utilizados foram de fontes documentais e

    bibliogrficas das literaturas j produzidas. Para isso foram consultadas as leis

    que serviram de base para a estruturao jurdica do processo de

    emancipao, as leis criadas sobre Conceio de Macabu, a ata de apurao

    do plebiscito, alm de livros que ressaltam os dados histricos da poca.

    Ressaltando a dificuldade em se obter certos dados com as idas a

    campo nos arquivos pblicos, pois os mesmos foram arquivados como

    documentos histricos, no estando facilmente acessveis a populao e

    ocasionou atrasos na pesquisa. As dificuldades s puderam ser superadas

    atravs das poucas e to vlidas referncias bibliogrficas encontradas.

    As anlises propostas so reflexivas, com carter de abordagem

    qualitativa, por se tratar de analisar grupos sociais e suas aes, que levaram a

    uma mobilizao da populao em prol de um motivo coletivo, e ao mesmo

    tempo, o aparato do Estado como facilitador da permanncia estrutural das

    cidades e agente modelador poltico, social, econmico e espacial. Esta

    pesquisa caracteriza-se como estudo de caso por se tratar de um objeto que

    ser analisado e comparado ao fenmeno de emancipao de cidade

    encontrado na Constituio vigente da poca, assim relatando as

    especificidades locais, os grupos sociais, motivaes polticas e o aparato

  • 15

    Estatal. Pois, em relao metodologia, esta consiste em levantamento e

    anlise de dados atravs de leituras conceituais e das situaes da poca,

    interpretao das ideologias subentendidas na histria da cidade e a

    compreenso sobre a formao do territrio a luz do pensamento geogrfico.

    Desta forma, atravs do percurso adotado e dos dados obtidos, o

    presente trabalho foi estruturado em captulos pertinentes ao levantamento que

    foi realizado e visa refletir sobre a temtica escolhida por meio de uma

    trajetria histrica de transformao poltica, social e econmica do territrio.

    O primeiro captulo consiste em fazer o levantamento da rea escolhida

    como objeto de estudo e contextualizando a sua consolidao econmica como

    principal fator estruturador da poltica local, transformando a localidade em

    Freguesia. Seguindo nessa perspectiva, com o crescimento demogrfico e

    econmico a ento Freguesia se torna local de jogos e foras polticas, o que

    culminou na sua breve estadia de um ano como cidade, assim, retornando a

    ser distrito.

    O segundo captulo contextualiza a dcada de 40 e 50, abarcando as

    relaes da poltica brasileira e local. Para isso faz um levantamento do que

    estava acontecendo no cenrio nacional atravs do comando de Getlio

    Vargas, seguido da criao da Constituio Federal de 1946 e as relaes

    sociais, polticas e econmicas especificamente de Conceio de Macabu na

    interao com as transformaes nacionais.

    O terceiro captulo foca diretamente nos anos de 1951 at 1953,

    analisando a conjuntura e mobilizao dos grupos polticos que almejavam ou

    no a emancipao de Conceio de Macabu e a culminncia dos sessenta

    anos da tentativa de conseguir tornar o ento distrito de Maca em uma cidade.

  • 16

    Captulo 1: A primeira emancipao 1891

    1.1 Contextualizando Conceio de Macabu

    Conceio de Macabu um municpio localizado na regio Norte

    Fluminense do Estado do Rio de Janeiro (imagem 1), atualmente possui uma

    populao de 21.211 habitantes (IBGE 2010), faz divisa territorial com os

    municpios de Santa Maria Madalena, Trajano de Morais, Maca, Carapebus,

    Quissam e Campos dos Goytacazes, estando compreendido numa rea de

    347.272km2, como pode ser observado na Imagem 2, que o mapa do Estado.

    Imagem 1: Mapa poltico da Regio Norte Fluminense do Estado do Rio de Janeiro, em que pode-se localizar a cidade de Conceio de Macabu com a cor verde Sudoeste. Fonte:http://www.mapabrasil.com/Mapa_Regiao_Norte_Fluminense_Estado_Rio_Janeiro_Brasil.htm.

  • 17

    Imagem 2: Mapa poltico do Estado do Rio de Janeiro, com delimitaes das regies. Fonte:http://www.mapa-brasil.com/Mapa_Divisao_Politico-Administrativa_Estado_Rio_Janeiro_ Brasil.htm.

    Para analisar um lugar deve-se considerar que o espao e o tempo so

    conceitos bsicos na formulao da teoria social (FONT e RUFI, 2006, p.37).

    Por isso devem ser usados para localizar e contextualizar o objeto de estudo e

    os fenmenos que os compreendem, principalmente nas cincias sociais, o

    que inclui a Geografia Poltica e as foras de poder que transformam os

    espaos, as relaes sociais e os territrios.

    Assim, caracterizando a regio que atualmente o municpio de

    Conceio de Macabu e os municpios circunvizinhos, a mesma inicialmente foi

    habitada por tribos indgenas nmades, como os sacurus, goitacs e coroados,

    a qual tambm fazia parte da Capitania de So Tom, posteriormente essas

    terras foram doadas aos Sete Capites em forma de sesmaria.

    Com o fracasso da sesmaria, a regio foi dividida e as terras que

    compreendem o municpio de Conceio de Macabu, foram doadas aos padres

    jesutas, estes que adentraram o territrio a partir do vale do Rio Macabu para

    catequizar os ndios sacurus. Porm, no ano de 1759 os jesutas foram

    expulsos das terras pela Coroa Portuguesa, assim, alguns anos depois os

    indgenas voltaram para o vale do Rio Macabu e formaram os primeiros

  • 18

    povoados nessa rea, que foram atingidos posteriormente pelo progresso

    econmico atravs do cultivo de caf.

    A grande quantidade de fazendas de plantaes de caf e a proximidade

    com outras localidades tambm produtoras, levou uma grande quantidade de

    escravos africanos para a regio, formando uma populao miscigenada e rea

    de refgio de escravos fugitivos por causa da formao geomorfolgica de

    serras e de florestas da Mata Atlntica, assim, formando o Quilombo de Cruz

    Sena e o Quilombo do Carucango (ou Carukango), esse ltimo que segundo

    fontes da poca, como jornais e relatos pessoais, pode ter sido o maior do

    Estado do Rio de Janeiro.

    J no sculo XIX, com a construo de portos fluviais, da estrada de

    ferro que ligava Cantagalo Maca e o ramal ferrovirio de Conde de

    Araruama em Quissam, a regio passou a trocar mais informaes e manteve

    mais fluxos, o que contribuiu para o povoamento, crescimento econmico e

    poltico, ao ponto que as terras que compreendem Conceio de Macabu,

    passaram a ser Freguesia em 1855.

    Segundo Haesbaert (2004) o territrio teria primeiramente trs vertentes

    bsicas, sendo a poltica, a cultural e a econmica, posteriormente o acrscimo

    da vertente natural. Essa concepo pode ser usada para explicar as relaes

    sociais encontradas no territrio de Conceio de Macabu, pois a forma como

    as vertentes so utilizadas evidenciam as relaes dos grupos sociais com o

    territrio e como os mesmos se apropriam do espao geogrfico,

    principalmente aquele compreendido nas delimitaes das fronteiras

    macabuenses.

    No territrio tem-se segundo SOUZA (2008) as caractersticas naturais,

    o que ou quem produz o espao e tambm as relaes de identidade de um

    grupo social com seu espao, que podem ser utilizadas para a compreenso

    da gnese de um territrio ou para tomar e manter relaes de poder no

    mesmo. Para melhor compreender Conceio de Macabu e o processo de

    emancipao do seu territrio, preciso v-lo como um espao definido e

    delimitado por e a partir de relaes de poder (SOUZA, 2008, p.78).

    De tal maneira, se levou em considerao como o espao desse

    territrio foi apropriado pelos grupos sociais atravs da poltica, dos fatores

  • 19

    naturais do lugar, da economia e a cultura atravs das interaes sociais.

    Destacando o espao e o territrio de Macabu atravs das relaes de poder

    existentes e criadas pelos grupos sociais da poca da emancipao, pois,

    quanto ao territrio, j se viu que este se define a partir de dois ingredientes, o

    espao e o poder (SOUZA, 2008, p.106).

    1.2 A Freguesia

    O atual Estado do Rio de Janeiro era composto por trs capitanias, a de

    So Tom, a capitania real do Rio de Janeiro, e a segunda parte da capitania

    de So Vicente. Estas que eram divididas em comarcas, abarcando os termos

    das vilas e cidades e estes se fracionavam em parquias (FRIDMAN, 2008,

    p.2), ressaltando que tanto o poder civil quanto o poder religioso, estavam

    atrelados desde a colonizao brasileira, muita das vezes no tendo como

    distingui-los na construo do espao, perdurou at a Proclamao da

    Repblica em 1889 a pouca ou falta da distino entre freguesia e parquia,

    por causa da relao existente entre o poder civil e o religioso. Essa primeira

    delimitao poltica do territrio de Macabu evidenciava as relaes de poder

    que prevaleciam at a Proclamao da Repblica, em que a Igreja Catlica

    exercia o poder das tomadas de decises em grande parcela do territrio

    brasileiro.

    Segundo Fridman (2008, p.02-03):

    A freguesia, designao portuguesa de parquia, um territrio submetido jurisdio espiritual de um cura que tambm exerce a administrao civil. A palavra parquia vem do grego parochos (aquele que fornece as coisas necessrias) ou paroikia (vizinhana; para, perto e oikos, casa). Trata-se de uma circunscrio eclesial em que se divide a diocese, palavra igualmente de origem grega e utilizada no imprio romano, que tem o sentido de governo. Sua multiplicao vertiginosa estabilizou-se nos sculos XII e XIII quando submeteu-se aos cuidados espirituais de um bispo pago pelo rei com rendas do dzimo.

    O termo Freguesia foi herdado do Imprio Portugus, e segundo Ribeiro

    (2007), pode-se dizer que essa delimitao territorial seria a representao da

    menor poro administrativa de um municpio, sendo assim como um distrito

  • 20

    das vilas da poca, e cada vila deveria ter pelo menos uma freguesia. Pela falta

    de separao entre as aes cabveis ao Estado e a Igreja Catlica na poca

    do Imprio, cabia aos representantes religiosos as funes burocrticas de

    registro dos nascimentos, casamentos e bitos. Com a Proclamao da

    Repblica, houve uma separao entre o Estado e a Igreja Catlica, a qual

    essa ltima teve outras funes no mais burocrticas como anteriormente, e

    as provncias passaram a ser Estados autnomos.

    Conceio de Macabu era apenas uma localidade pertencente

    Freguesia de Nossa Senhora das Neves, como pode-se notar na Imagem 3

    sobre as freguesias existentes desde o perodo colonial, poucas eram os

    aldeamentos populacionais no Estado. Assim, tanto as questes polticas,

    sociais e at religiosas da localidade de Macabu, estavam subordinadas a

    jurisdio da Freguesia de Nossa Senhora das Neves.

    Imagem 3: Aldeamentos no Rio de Janeiro Colonial. Fonte: FRIDMAN (2001) e GESTHU. (FRIDMAN, 2003, p.06).

    Com o crescimento da localidade de Macabu, segundo Silva e Gomes

    (1997), foi criada a Freguesia de Nossa Senhora da Conceio de Macabu no

    dia 6 de outubro de 1855, atravs da Lei Provincial n 812, tendo por

  • 21

    justificativa o crescimento populacional e econmico, gerado pelo cultivo de

    caf e cana-de-acar, bem como, pela necessidade de ter um representante

    religioso no local para as questes burocrticas e sociais.

    Segundo Gomes (2013), houve uma acelerada ocupao no decorrer do

    vale do Rio Macabu, gerando problemas polticos e fundirios, pois as pessoas

    passaram a ocupar as terras de forma ltica e ilcita, alterando os padres

    demogrficos e gerando conflitos fundirios de acesso a terra. A criao da

    Freguesia visava solucionar esses problemas, bem como, ao dos novos grupos

    de lideranas polticas regionais que foram criadas e estabelecidas em

    Macabu, que conflitavam com os grupos das freguesias vizinhas Nossa

    Senhora das Neves e a de Carapebus. Exemplo dessas movimentaes

    polticas, percebemos na acomodao de lideranas estabelecidas no local, j

    que vrios cargos eram criados automaticamente (GOMES, 2013, p.169),

    assim, a terra era sinnimo de poder e riqueza, repassada de gerao em

    gerao e ressaltava a importncia local de determinadas famlias. Estas

    famlias em sua maioria ocupavam os cargos de organizao pblica e social

    que no dependiam apenas da Igreja.

    Essa relao de poder local evidenciava a questo da terra com as

    tomadas de decises da freguesia. O poder administrativo estava tambm nas

    mos da recm surgida elite agrria em Macabu, e isso j gerava problemas

    relacionados ao acesso a terra por parte de outras pessoas que no fossem

    dessas famlias que estavam no poder e, at mesmo, conflitos com outras

    freguesias no que tange disputa por mais terras ou pelo poder do municpio

    que engloba essas freguesias.

    Segundo Arendt (2012), a coexistncia e associao de homens

    diferentes o que diz respeito poltica, por isso os homens se organizavam

    politicamente segundo certos atributos comuns essenciais existentes em, ou

    abstrados de, um absoluto caos de diferenas (ARENDT, 2012, p.145), assim

    independente da organizao social, os homens j se organizavam

    politicamente no espao, principalmente na ocupao do territrio gerando

    inclusive, diferenas sociais. A importncia que o territrio ia ganhando atravs

    da sua ocupao por grupos humanos o levava a ser diferenciado ou

    apropriado por grupos com maior poder, o que pode ser compreendido tambm

  • 22

    em Conceio de Macabu nesse perodo. Por isso, quando passou a ser

    Freguesia em 1855, por mais que parecesse ser algo natural pelo crescimento

    que estava ocorrendo, era na verdade uma forma de se ter controle do territrio

    e de desses grupos exercerem o poder atravs da poltica.

    Cabe dizer ento, que a Freguesia de Nossa Senhora da Conceio de

    Macabu foi criada pelo crescimento econmico que atraiu diversas pessoas e

    houve a necessidade de se ordenar o territrio por causa dos conflitos que se

    consolidavam por aqueles que detinham mais poder. Os fatores atrativos do

    seu territrio estavam relacionados com a sua localizao entre a serra e o

    mar, pela disponibilidade de terras e por ter vias de acesso entre Cantagalo e

    Maca. Isso ressaltou na necessidade da localidade virar freguesia para se ter

    um maior controle sobre o vale do Rio Macabu e na melhor contemplao dos

    grupos sociais dominantes, bem como, resultou em inmeras transformaes

    sociais, econmicas e polticas. Assim, pode-se dizer que a elevao para

    Freguesia foi uma medida de controle territorial que garantiu ainda mais

    poderes para aquelas pessoas que dominavam a terra, ou seja, a elite agrria

    teve uma maior ascenso poltica desde essa poca.

    1.3 A primeira e rpida emancipao (1891-1892)

    No dia 1 de maio de 1891 a Freguesia de Nossa Senhora da Conceio

    de Macabu foi elevada categoria de vila, perdurando at 29 de abril de 1892.

    Foi um fato marcante para a histria e a geografia local, pois evidenciou como

    as relaes de poder e a concentrao nas mos de determinados grupos

    sociais foram essenciais na elevao categoria de Vila, e decisivos na

    transformao do espao.

    A Proclamao da Repblica ocorreu no ano de 1889 e a emancipao

    da Freguesia de Nossa Senhora da Conceio de Macabu em 1891, cabendo

    ressaltar que teoricamente a emancipao deveria seguir novas determinaes

    garantidas em lei no perodo da Repblica para a criao de vilas, mas, isso

    no ocorreu, prevalecendo assim o modelo de municipalizao prevista na

    Constituio Imperial de 1824, pois no havia ainda uma Constituio

    Republicana.

  • 23

    A partir desse contexto da Repblica, surgiu um novo projeto de cidade

    para o pas, a qual o territrio foi integrado e contribuiu para a formao das

    primeiras redes urbanas. Houve uma intensificao das relaes entre as

    cidades atravs das vias de circulao, como as estradas de ferro,

    dinamizando o territrio e conduzindo uma nova organizao territorial do

    trabalho (FARIA, DUARTE e NEVES, 2007).

    Segundo Faria (2003), no processo de integrao e articulao do

    territrio na Regio Norte Fluminense, a rede urbana se estruturou

    economicamente pela indstria sucro-alcooleira e da pecuria, figurando a

    criao de um sistema de circulao para articular os diferentes ncleos

    urbanos, a qual o territrio era ordenado e hierarquizado por aquelas cidades

    que tinham maior influncia na regio. Nesse sentido, Macabu estava

    nitidamente ligada aos ncleos urbanos da regio, embora na hierarquia no

    fosse um territrio to evidenciado, e essa ligao se dava principalmente por

    j ter uma estrutura de sistema de circulao que era anterior ao projeto de

    cidade do perodo republicano.

    Figurando essas relaes de transformaes do espao, o primeiro

    governador estadual do Rio de Janeiro, que esteve no cargo de 1889 1891,

    se deparou com uma freguesia que estava em plena prosperidade por causa

    da sua produo agrcola (caf e cana-de-acar), alm de estar no percurso

    favorvel ao transporte de pessoas e escoamento da produo vinda da regio

    serrana para os portos do litoral, por isso tal caracterstica tornara-se admirada

    pelo prprio governador do Estado, Dr. Francisco Portela, que resolveu premiar

    os esforos e as aspiraes de um povo to trabalhador e patriota, criando a

    intendncia de Macabu, ou seja, o municpio de Macabu. (TAVARES, 2006,

    p.43).

    A deciso de Francisco Portela em criar um novo municpio pode ser

    analisada pelo seu poder, j que ocupava o maior cargo do Estado do Rio de

    Janeiro. Para assegurar foras polticas e a prpria manuteno poder do

    Estado, pois aquilo que Estado e poltica tm em comum (e inclusive a

    razo da sua intercambialidade) a referncia ao fenmeno do poder

    (BOBBIO, 2009, p.76). Bem como, Francisco Portela almejava ter maior

    influncia e poder no Estado, alm de propagar os ideais republicanos, por isso

  • 24

    fez inmeros acordos polticos com elites locais, fato que tambm ocorreu em

    Macabu atravs da sua relao com a elite agrria.

    No ano de 1891 a criao de vilas era realizada atravs de um decreto

    de lei assinado pelo presidente da provncia que tornava aquela freguesia em

    vila, ou seja, o governador do estado assinava um decreto tornando

    determinado distrito em um municpio. Neste decreto eram nomeados os

    intendentes e o intendente geral. O decreto que elevou a Freguesia de Nossa

    Senhora da Conceio de Macabu Vila de Macabu foi o de nmero 205, que

    dizia:

    DECRETO N205, de 1 de maio de 1891. O Dr. Francisco Portella, Governador do Estado do Rio de Janeiro, Decreta: Art. 1 - Fica criado o Municpio de Macabu, que divide em dois distritos: o de Conceio e o de Santa Catarina, limitados entre si pelo rio Santa Catarina, serra e crrego de Santo Antnio. PARGRAFO NICO Este municpio ser desmembrado de Maca, fazendo parte da Comarca do mesmo nome e ter sua sede no povoado de Conceio, que elevada categoria de Vila. Art. 2 - O novo Municpio se dividir com os Municpios de Campos e Santa Maria Madalena pelos limites atuais,e com o de Maca pelos limites existentes at estrada de rodagem da Ingazeira, e da por esta estrada at estao de Santana, e, depois, pela linha frrea Maca e Campos at o rio Macabu e por este rio acima pelos limites atuais. Art. 3 - Ficam revogadas as disposies em contrrio. Palcio do Governo do Estado do Rio de Janeiro, 1 de maio de 1891. Dr. Francisco Portela. (TAVARES, 2006, p.44).

    As pessoas que foram nomeadas para a Intendncia e a Intendncia

    Geral no processo de criao da Vila pertenciam ao grupo social que j

    dominava a regio, por se tratarem da ento formada elite agrria local, bem

    como, estavam relacionadas com Francisco Portela atravs dos ideais

    republicanos, tendo o vnculo ideolgico poltico e sendo representantes do

    poder e influncia do governador. Assim, no h teoria poltica que no parta

    de alguma maneira, direta ou indiretamente, de uma definio de poder e de

    uma anlise do fenmeno do poder (BOBBIO, 2009, p.76-77), pois o poder

    existe em toda e qualquer relao social. A relao das nomeaes realizadas

    favorecia e dava mais poder ao grupo da elite agrria, que de certa forma j o

    detinha na escala local e a poderiam ser representantes tambm dos ideais

    republicanos no lugar. Ao analisar os registros das nomeaes, torna-se

    evidente que a inteno era de manter e dar mais poder ao grupo social que

  • 25

    Francisco Portela confiava para manuteno do prprio poder e consolidao

    dos seus ideais polticos na regio Norte Fluminense. Os intendentes

    nomeados por Francisco Portela evidenciavam a segmentao da elite local e

    seu poder no territrio. Como podemos ver na seguinte parte do decreto de lei

    que fundava a Vila de Macabu os nomes dos seus intendentes:

    Finda a leitura deste ato de nomeao do Conselho de Intendncia, o cidado Jos Manoel Tavares de Castro apresentou o seu ttulo de nomeao de Presidente da mesma Intendncia e convidou os outros cidados nomeados: Jos da Natividade de Castro Vice Presidente; Henrique Jos Bellas; Roberto Reid; Leonardo de Oliveira Gomes, membros da mesma, a exibirem seus ttulos, o que imediatamente fizeram. Tomando ento o Capito Jos Manoel Tavares de Castro assento no topo da mesa, para o fim preparado, convidou os nomeados a tomarem assento em torno dela, e para secretrio ad-hoc o cidado Eugnio de Oliveira Lobo Viana, declarando ao mesmo tempo, que, no havendo ainda o livro prprio, rubricado, numerado e encerrado para inserir-se s atas, que se fizesse em livro em branco, que ento apresentou, e que, uma vez empossado, supriria aquela falta. (TAVARES, 2006, p.44).

    Outro fato do prprio decreto de lei da elevao da Freguesia para Vila

    que deve ser ressaltado a questo da apropriao do espao, atravs da

    toponmia com os nomes dos polticos que marcaram esse processo, possuam

    certo prestgio na localidade e tambm para homenage-los, o que evidencia a

    questo de que os espaos em sua maioria remetem s relaes de poder por

    determinados grupos.

    Em seguida, o Intendente Jos da Natividade de Castro props que, em sinal de reconhecimento, se denominassem as principais ruas de modo seguinte: A primeira, Rua do Governador Portela; a 2 Rua Dr. Valentim; a 3 Rua Vieira da Fonseca e a praa principal, Praa 1 de Maio, perpetuando, assim, a data do Decreto que elevou esta localidade a Vila. Foi tambm aprovada por, unanimidade, essa proposta. (TAVARES, 2006, p.45).

    Essa relao de poder e apropriao do espao evidenciou que as

    relaes polticas da poca se davam majoritariamente por anseios de grupos

    sociais locais, e que estes em sua maioria exerciam os cargos administrativos

    e pblicos na tomada de decises da populao. Essas relaes eram em

    muitos casos impositivas e no consideravam outros grupos sociais que eram

    em grande parte, pessoas excludas dos espaos de poder, por isso vale

  • 26

    ressaltar que a geografia poltica acabou se tornando um instrumento de

    poder, encarregada de oferecer as representaes do espao necessrias para

    argumentar as prticas territoriais das instituies polticas. (FONT e RUF,

    2006, p.47).

    As primeiras ruas da ento Vila de Macabu tinham os nomes de polticos

    republicanos que apoiaram sua emancipao e faziam parte da base poltica

    do ento governador da provncia, Francisco Portela. Ou seja, Jos Vicente

    Valentim e Manoel Vieira da Fonseca, eram deputados do Rio de Janeiro e

    tinham uma base poltica muito importante na regio de Campos,

    principalmente por tentarem diminuir as foras dos monarquistas na regio e

    fortalecer os republicanos. A praa passou a se chamar de 1 de maio para

    relembrar o feito da emancipao e ficar na memria da populao esse dia. A

    imagem 4 mostra como era essa praa e as ruas com toponmia referentes as

    polticos que participaram do ato da emancipao.

    Imagem 4: Praa 1 de Maio e as primeiras ruas de Macabu. Datada do ano de 1891. Fonte: Marlia Tassara.

    A criao das Vilas se dava basicamente pela vontade do presidente da

    provncia (governador) e seu interesse local em resguardar politicamente

    algumas reas de acordo com os grupos sociais que o apoiassem. Essa

  • 27

    situao mudou atravs da criao da Constituio de 1946 e da Lei Orgnica

    das Municipalidades, a qual foi substituda a forma de legislao sobre os

    municpios, assim, no seria por decreto, mas por consulta popular plebiscito

    e por estudos da viabilidade da municipalizao em saber se posteriormente

    o local poderia se manter economicamente, socialmente e politicamente.

    Foi justificada a elevao de Vila por causa do crescimento demogrfico

    e econmico, gerados pela produo agrcola e sua comercializao, pelo

    aumento da urbanizao, o que levou a ascenso de uma elite agrria,

    entretanto, as relaes entre os grupos sociais dominantes na poca,

    conseguiram a elevao de Macabu a vila por causa dos interesses polticos

    locais na manuteno do poder e do controle do territrio, para isso a elite

    agrria local manteve uma relao harmoniosa com o governador Francisco

    Portela e foram tambm influentes quanto aos ideais republicanos no territrio

    de Macabu. O entorno da Freguesia de Nossa Senhora da Conceio de

    Macabu estava crescendo economica e demograficamente por causa da

    influncia das vias de acesso regio, como ressalta Gomes (2013):

    Vale lembrar que, Ponto do Pinheiro Maia, Nossa Senhora do Amparo, Sossego, Santa Maria, Santo Antnio e em especial, So Joo de Macabu, Pacincia (Macabuzinho) e Curato de Santa Catharina, eram localidades que pertenciam e orbitavam em torno da freguesia. Essas reas, dentre outras, tambm cresciam, dinamizando a produo local, contribuindo para o ganho demogrfico regional. (GOMES, 2013, p.181).

    O crescimento demogrfico em sua maioria estava relacionado com dois

    grupos sociais importantes para a constituio do espao, sendo elas de

    escravos, inclusive de origem nordestina; e homens livres (GOMES, 2013,

    p.181) que migraram de outros pases, como Portugal, Espanha, Sua, dentre

    outros. As condies que levaram ao crescimento comprovado de Conceio

    de Macabu no perodo de 1878 a 1889 eram importantes nas anlises que

    resultaram na criao do novo municpio (GOMES, 2013, p.181), pois esse

    crescimento foi capaz de gerar arrecadao para a construo de obras

    necessrias e da administrao pblica.

    Essa relao se evidenciava por causa da produo agrcola e comercial

    que crescia ao ponto que no contexto regional, a freguesia de Nossa Senhora

  • 28

    da Conceio de Macabu j era uma das maiores de Maca, hora suplantada

    por Carapebus e Quissam, hora superando-os (GOMES, 2013, p.182), bem

    como, cabe lembrar que territorialmente, a Freguesia de Nossa Senhora da

    Conceio de Macabu era menor que a de Quissam e a de Nossa Senhora

    das Neves, mas era bem maior que a da cidade (Maca), a de Carapebus, do

    Sana, e outras do municpio (GOMES, 2013, p.184) e possua condies para

    ser independente, assim, se tornar um municpio.

    Com a Proclamao da Repblica em 1889, a realidade da Freguesia foi

    ainda mais propcia para se tornar um municpio, alm das condies

    demogrficas e econmicas, por ser uma Freguesia de Maca. No perodo

    Imperial seria improvvel que houvesse a emancipao por causa da

    importncia de Maca, seja pela infra-estrutura, produo agrcola e at pelas

    relaes sociais, pois a elite agrria macaense era influente em todo o Estado

    do Rio de Janeiro. Mas principalmente, por causa das famlias tradicionais da

    regio, que eram da oligarquia rural fluminense e no davam espao para

    desmembramentos territoriais no perodo Imperial, ocasionando uma disputa

    de poderes entre a elite agrria macaense e a recente elite agrria

    macabuense, que j se destacava pela ascenso social e econmica. As

    pessoas que compunham essas famlias da oligarquia rural fluminense eram

    em sua maioria representantes polticos a nvel estadual e defendiam os

    anseios dos grupos dominantes de Maca, como podemos ver:

    Arajo, Carneiro da Silva, Queirs Mattoso, Almeida Pereira, Barcelos Martins, entre outras, eram famlias que representavam Maca na esfera poltica estadual, tornando qualquer balana favorvel cidade, sem qualquer possibilidade de confrontao por parte dos sobrenomes presentes na pequena oligarquia da freguesia de Macabu. (GOMES, 2013, p.185).

    Evidenciando que o desmembramento territorial da Freguesia de Nossa

    Senhora da Conceio de Macabu poderia representar uma perda econmica

    para Maca e para a elite agrria macaense, essa que detinha muitos

    investimentos nas terras macabuenses e eram influentes nas tomadas de

    decises da provncia. Por isso, com o surgimento da Repblica, essa relao

    hierrquica das elites agrrias foi modificada, pois os grupos polticos da regio

    que defendiam o Imprio comearam a disputar foras com os grupos polticos

  • 29

    que eram a favor da Repblica. Com a proclamao esses grupos republicanos

    precisavam de apoio na regio, assim seria um facilitador para a

    municipalizao de Conceio de Macabu. Principalmente aps Francisco

    Portela ter assumido o comando estadual, pois era um poltico republicano

    vindo de Campos.

    Francisco Portela foi o governador que mais emancipou municpios no

    Estado do Rio de Janeiro, sendo inclusive ativista em prol da abolio da

    escravido, tendo a adeso de inmeras pessoas e atendeu vrias elites

    locais, sendo principalmente, os grupos republicanos. Embora no tenha sido

    capaz de criar um partido republicano forte para resolver os problemas

    estaduais e to pouco para se manter sem inimigos no poder. Por mais que as

    suas decises no compactuassem em alguns casos com as do Partido

    Republicano, principalmente no que tange a nomeao de cargos, estas

    nomeaes eram estratgicas na criao de bases polticas.

    Ao diagnosticar que seus adversrios polticos estavam em Quissam e

    Carapebus, Francisco Portela manteve essas freguesias ligadas Maca e

    mudou os intendentes do poder, substituindo-os para aqueles que defendiam

    as pautas republicanas e no da monarquia. Como tambm, emancipou a

    Freguesia de Nossa Senhora da Conceio de Macabu e a Freguesia de

    Nossa Senhora das Neves, que na poca equivalia a 50% de Maca, alm de

    80% da produo cafeeira (GOMES, 2013, p.188), representariam um

    fortalecimento poltico de Francisco Portela e enfraquecimento da elite agrria

    de Maca que defendia a monarquia.

    Toda criao de vilas gerava tambm a criao de cargos polticos

    pblicos e uma manuteno poltica de quem estivesse no poder, por isso

    Francisco Portela poderia colocar aliados polticos da regio nesses cargos e

    os mesmos o ajudariam revertendo populao para as ideias republicanas.

    No caso de Macabu, foram personalidades locais convertidas aos

    iderios republicanos que fomentaram a luta pela emancipao, sendo

    principalmente os coronis que compunham a elite agrria, mas estes no

    conseguiriam competir com os outros coronis de Maca, at porque em

    muitos casos os mesmos se uniam a esses grupos mais fortes.

  • 30

    De tal modo, pode-se dizer que a Proclamao da Repblica gerou

    primeiramente o enfraquecimento da elite de Maca, Carapebus e Quissam

    que defendia o Imprio, bem como, a possibilidade de uma nova organizao

    poltica se instalar na regio, o que ocorreu quando Francisco Portela foi

    nomeado governador, e por sua relao com as famlias Ribeiro e Silva Castro,

    na Freguesia de Nossa Senhora da Conceio de Macabu, o governador

    atendendo as vontades desses grupos e visando seu fortalecimento poltico na

    regio, por decreto de lei, criou a Vila de Macabu, ou municpio de Macabu.

    Embora a freguesia tivesse razes para se tornar um municpio, por

    causa do seu crescimento poltico, demogrfico e econmico, ficou notrio que

    esse processo se deu basicamente como uma estratgia para a afirmao

    poltica de Francisco Portela na regio Norte Fluminense. Mas a Vila de

    Macabu no durou muito, com um ano de existncia a mesma foi desfeita

    atravs de decreto de lei e voltou a pertencer ao territrio de Maca. O

    responsvel por essa tomada de deciso foi o governador da poca, Carlos

    Baltazar da Silveira, que ocupou o cargo posteriormente a Francisco Portela.

    Infelizmente, porm, no durou muito tal autonomia. Motivado por um golpe poltico, cujo movimento revolucionrio culminou jogando por terra o governo Portela e fazendo com que os revolucionrios fluminenses, em 11 de dezembro de 1891, aclamassem seu governador Carlos Baltazar da Silveira, este, por meio do Decreto n52, de 24 de abril de 1892, extinguiu a referida Intendncia. (TAVARES, 2006, p.46).

    Essa mudana no Estado do Rio de Janeiro ocorreu porque o Marechal

    Deodoro da Fonseca renunciou o cargo de presidente por conta de inmeras

    crises internas e externas em que se encontrava seu governo, sendo assim,

    sucedido pelo seu vice, Marechal Floriano Peixoto, este que substituiu todos os

    cargos anteriores. Incluindo Francisco Portela no Rio de Janeiro e nomeando

    em seu lugar Carlos Baltazar da Silveira ainda em 1891, mas no dia 02 de

    janeiro de 1892 o mesmo foi efetivado no cargo.

    O Almirante Carlos Baltazar da Silveira era um representante da velha

    ordem, evidenciado por ter sido um ex membro do Conselho do Imperador, ou

    seja, o novo governador do Estado do Rio de Janeiro era ligado s elites

    imperiais. Essa mudana gerou inmeras reviravoltas nas intendncias do

  • 31

    estado, ao ponto que os intendentes que foram nomeados por Francisco

    Portela pediram demisso dos cargos e logo foram substitudos, em 23 de

    dezembro de 1891: presidente Evaristo Alves da Silva Ribeiro; Antonio de

    Oliveira Gomes; Francisco Norberto da Silva Freire; Jos Augusto da Silva

    Guimares; Laurentino Jos Gomes da Rocha. (GOMES, 2013, p.209). Pelo

    fato do novo governador no possuir posturas republicanas, estando ligado ao

    perodo Imperial e ser politicamente contrrio ao ex-governador Francisco

    Portela, o municpio de Macabu foi desfeito atravs de decreto de lei, assim

    como outros feitos do antecessor de Carlos Baltazar da Silveira.

    Assim, no dia 29 de abril de 1892, a Vila de Macabu deixou de existir e

    esta localidade voltou a pertencer Maca. Nessa mesma poca, houve uma

    tentativa frustrada do movimento popular em forar Carlos Baltazar da Silveira

    em no anular o decreto que tornava Macabu um municpio. Bem como, no dia

    03 de maio de 1892 o Estado do Rio de Janeiro ganhava seu primeiro

    governador eleito, sendo este o Jos Thomas de Porcincula, porm, isso no

    mudou os rumos e nem a posio adotada por Carlos Baltazar da Silveira.

    De tal modo, o contexto da elevao da Freguesia de Nossa Senhora da

    Conceio de Macabu para a categoria de Vila, ou municpio, s evidenciou

    disputas locais. Seja de grupos sociais, principalmente das oligarquias rurais

    fluminenses (ligadas aos ideais monarquistas), ou da elite agrria macabuense

    (relacionada aos ideais republicanos), seja por questes polticas destes

    mesmos grupos citados e tambm daqueles governantes que disputavam

    espao atravs dos seus partidos relao entre monarquistas e republicanos.

    Essas relaes modificaram no s as relaes sociais, econmicas e

    polticas, mas sua constituio no espao que cada vez ficava mais

    fragmentado pelo acesso a terra, transformando-se em cada mudana

    exercida, e no territrio que em pouco tempo parecia to fludo.

    1.4 O fracasso da rpida emancipao

    Por mais que a populao pedisse a manuteno do decreto assinado

    por Francisco Portela para o ento governador Jos Toms da Porcincula, o

    mesmo no o fez motivado a manter o decreto que desfazia o municpio e que

  • 32

    tinha sido assinado por Carlos Baltazar da Silveira. Essa deciso deixava clara

    a postura de Jos Toms e sua posio poltica, a qual prevalecia os iderios

    ainda monarquistas e de favorecimento da oligarquia macaense. Nenhum outro

    governador aceitou os pedidos dos macabuenses em manter a localidade

    como municpio.

    O poder poltico dos macaenses e sua influncia no Estado tiraram

    qualquer possibilidade de movimentao dos macabuenses em prol da

    retomada do municpio de Macabu. Alguns de seus nomes mais influentes

    eram: Oliveira Botelho (1906, 1910-1914), Alfredo Backer (1906- 1910), Raul

    Veiga (1918-1922), Feliciano Sodr (1923-1927) (GOMES, 2013, p.234), este

    ltimo que foi governador do Estado do Rio de Janeiro por duas vezes. Alm

    disso, em 1926 o ento amigo dos macaenses, Washington Lus, foi tambm

    Presidente da Repblica, e mesmo se houvesse uma organizao que fosse

    alm das fronteiras estaduais para reivindicar a retomada da emancipao de

    Macabu, a mesma no seria efetivada, j que a influncia macaense iria

    tambm ao mbito nacional.

    Os idealizadores da emancipao de Macabu e membros da elite agrria

    macabuense ocuparam diversos cargos a nvel local ou estadual, trazendo

    muita das vezes, benefcios para a localidade. Porm, no era o suficiente para

    competir a questo do poder e da influncia com outros polticos de Maca.

    Alm da instabilidade poltica, Macabu entrou tambm em crise

    econmica, gerada pela desvalorizao do caf e da cana-de-acar. Por isso,

    mesmo se politicamente estivesse em um perodo favorvel para a retomada

    da emancipao, a mesma no se efetivaria por causa da crise econmica,

    pois um dos principais motivadores para emancipar uma cidade seria a

    possibilidade da mesma, ser autnoma economicamente.

    O governo estadual tomou diversas medidas para tirar o Estado da crise

    cafeeira, e Macabu tambm foi privilegiada com essas aes, conseguindo

    diversificar a sua economia e expandi-la para outros setores. Por isso diminuiu

    as tenses na regio, e a efetiva mobilizao para a emancipao s voltou no

    final da dcada de 1940 com a criao da Constituio Federal de 1946 e

    politicamente se efetivou em 1952, atravs das foras polticas macabuenses

    que criaram alianas, estavam ocupando cargos importantes de comando

  • 33

    regional e at na esfera estadual e tambm por resgatarem essa identidade

    territorial de ser macabuense como estratgia poltica de terem mais poder.

    Assim, surgindo uma nova correlao de foras entre os agentes sociais e uma

    nova ordem produtiva, gerada pela diversificao da produo agrcola e na

    prestao de servios.

  • 34

    Captulo 2 Getlio Vargas e a Constituio de 1946, uma nova esperana

    para a emancipao de Conceio de Macabu

    2.1 O contexto de Getlio Vargas e o Golpe de 1930

    O ano em que Macabu conseguiu sua efetiva emancipao foi o de 1952

    e tendo por base a Constituio Federal de 1946. Podemos afirmar que a

    Constituio a lei fundamental que rege a organizao poltica-jurdica de um

    Estado (PAULO e ALEXANDRINO, 2003, p.2). Por isso cabem anlises do

    processo que culminou na construo desta Constituio e da conjuntura em

    que se encontrava o nosso pas atravs da Geografia e da contextualizao

    histrica, pois:

    Com relao histria e no a primeira vez que isso acontece reconhece-se hoje como nunca a necessidade absoluta de se contemplar seriamente a dimenso espacial do fato histrico segundo uma metodologia e que so evidentes os emprstimos e as conexes com a geografia. Trata-se de falar no tanto de histria local, como de histria territorial ou de histria dos espaos. Na geografia, estamos assistindo a uma reconsiderao do papel da cultura, a uma revalorizao do papel do lugar e a um crescente interesse por uma nova geografia regional que seja capaz de conectar o particular com o geral. (FONT e RUF, 2006, p.38).

    Por isso, para entender o lugar as anlises territoriais devem permear

    tambm nas especificidades da cultura e de outros fatores que so

    compreendidos no que tange o espao geogrfico, como a poltica, economia e

    as relaes sociais. Para Santos (1994), o espao geogrfico o sinnimo de

    territrio usado, compreendendo uma mediao entre as escalas locais,

    nacionais e do mundiais.

    As escalas so de suma importncia nessa perspectiva, pois para

    entender as relaes existentes em um lugar especfico deve-se analisar as

    foras hegemnicas que compreendem as relaes sociais, polticas e

    econmicas que esto em outras escalas e influenciam diretamente esses

    lugares. Ou seja, para analisar um dado lugar, como uma cidade ou distrito,

    preciso tambm discutir sobre as relaes existentes nos territrios do Estado,

    da Federao e at o global.

  • 35

    Para se efetivar a emancipao foi necessrio planejamento e uma

    contextualizao propcia tanto no Estado do Rio de Janeiro, quanto dos

    fatores que influenciavam todo o pas. A conjuntura poltica na escala estadual

    e regional foram essenciais para toda organizao e movimentao dos

    separatistas macabuenses.

    O ex-presidente Washington Lus, ento amigo dos macaenses,

    governou o Brasil at 24 de outubro de 1930, quando ocorreu o Golpe de 1930,

    liderado por polticos e partidos de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraba.

    Nesse perodo que sucedeu 1930, tivemos toda ordem de subverso, rompimentos e quebras da ordem institucional. A engenharia constitucional do perodo no foi capaz de condicionar positiva, seno negativamente, o modelo poltico, sujeito, desde ento, a toda ordem de experincias dramticas. A ruptura de 1930, com a qual se dissolveu o Congresso, exilaram-se os adversrios, cassando-lhes os direitos polticos, extinguiram-se os partidos, revogou-se a Constituio, suspenderam-se as garantias individuais, instituiu-se a censura e o Executivo passou a legislar por decretos-leis, tornou-se perigoso precedente utilizado sete anos depois, ainda com maiores requintes. a que entra a Constituio de 1946, discutida, votada e promulgada, como a promessa de restaurao da ordem democrtica que, lamentavelmente, frustrou-se mais brevemente do que seria lcito esperar. (NOGUEIRA, 2005, p. XX-XXI).

    Esse golpe ocorreu pelo rompimento da oligarquia paulista com a

    mineira, da chamada poltica caf com leite. A oligarquia paulista apoiou a

    candidatura de Jlio Prestes, e o governador mineiro, Antnio Carlos Ribeiro de

    Andrada, apoiou o gacho Getlio Vargas como candidato. Tendo as eleies,

    Jlio Prestes foi eleito, mas com o Golpe de 1930, impediram a sua posse, o

    exilaram, e culminou no fim da Primeira Repblica.

    O que o pas reclamava intensamente era uma ordem nova, uma nova Repblica, ajustada s suas condies de existncia, apta a resolver seus problemas fundamentais, no s no plano poltico, mas tambm no plano econmico e social, garantindo-lhe a unidade, desenvolvendo-lhe as fontes de riqueza, amparando-lhe o trabalho, cujas reivindicaes mais elementares eram tidas como casos de polcia. (SCHWARTZMAN, 1983, p.24).

    Foi instaurado o Governo Provisrio Federal em 3 de novembro de

    1930, exatamente um ms aps a deflagrao do movimento insurrecional, que

    em apenas vinte e um dias se tornara triunfante, assumiu o Sr. Getlio Vargas

  • 36

    o governo da Repblica (SCHWARTZMAN, 1983, p.28), este que nomeou

    vrios governadores para o Estado do Rio de Janeiro entre 1930-1945 e ficou

    caracterizado pela falta de estabilidade administrativa, embora tivesse

    estabilidade poltica, por seus seguidores realizarem os iderios propostos.

    2.2 Macabu na Era Vargas

    No perodo que compreende de 1930 a 1934, o governo de Getlio

    Vargas foi de cunho Provisrio e de 1934 a 1937, Constitucional. Em diversos

    lugares no Brasil eram travadas disputas polticas entre integralistas e

    aliancistas. A justificativa para Macabu no se emancipar era poltica, houve

    uma estagnao da luta pela emancipao causada pela desmotivao do

    predomnio do no separatismo em todo territrio brasileiro, bem como, no

    havia, nessa poca, uma organizao efetiva em prol da emancipao. Por

    isso no perodo do Estado Novo (1937-1945) em todo o territrio nacional, era

    difcil que os grupos conseguissem se organizar para uma emancipao, pois o

    desmembramento de territrios poderia ser entendido como um problema para

    a ordem que havia sido instaurada pelo governo brasileiro.

    No perodo em que o Brasil vivia o Estado Novo (1937-1945), um dos

    governadores do Estado do Rio de Janeiro foi o contra-almirante Ernani do

    Amaral Peixoto, que na sua primeira gesto (1937-1945) j chamava a ateno

    por ser um grande articulador poltico e planejador de obras, estas que foram

    importantes por impulsionar o distrito Macabu e de gerar base para a

    emancipao, embora essa no tenha sido sua inteno. Mas foi atravs de

    obras realizadas por Ernani do Amaral Peixoto, que o general Hlio de Macedo

    Soares e Silva foi para a regio de Macabu, e este foi de grande importncia

    para a efetiva emancipao posteriormente.

    Hlio de Macedo Soares e Silva fez amizades e alianas polticas em

    Macabu, sendo fundamental na emancipao efetiva, pois tornou-se deputado

    e seu irmo Edmundo Macedo Soares e Silva foi governador do Estado (1947-

    1951), no perodo que consolidou a movimentao em prol da emancipao e

    antecedeu a volta de Ernani do Amaral Peixoto ao governo do Estado entre

    1951 a 1955.

  • 37

    Um outro fato importante para se entender a conjuntura local, foi o fato

    de que os polticos de Macabu ocuparam diversos cargos, de secretrios e

    deputados do Estado, bem como, conseguiram estar dentro das tomadas de

    decises macaenses, ocupando cargos de vereadores, como foi o caso de

    Rozendo Fontes Tavares, Francisco Barbosa de Andrade e Coronel Etelvino da

    Silva Gomes, e at de prefeito de Maca, cargo ocupado por Milne Evaristo da

    Silva Ribeiro. Nesse sentido, vrias alianas foram feitas na busca por mais

    aliados polticos, os macabuenses se destacaram na regio e em todo o

    Estado na tentativa de consolidar a emancipao.

    Para compreender as relaes dos grupos nos lugares e as suas foras

    polticas, segundo Miranda (1947) deve-se extrair o carter do Estado e por

    isso os dados histricos que conseguiram situ-lo na sistemtica jurdica. Por

    isso foi necessrio analisar o contexto poltico do Estado Nacional para

    relacionar e entender as relaes polticas locais, pois a conjuntura nacional

    influenciou na formao dos territrios e foi incisivo na aplicao das leis

    encontradas na Constituio Federal vigente, ou seja, tambm do setor

    jurdico.

    2.3 A Constituio de 1946

    Para a criao de uma Constituio Federal, necessrio uma

    Assemblia Nacional Constituinte para a definio de princpios gerais e de um

    conjunto orgnico de regras leis - pois ela ocupa o vrtice do ordenamento;

    todas as demais normas jurdicas devem, em ltima instncia, buscar na

    Constituio o seu fundamento de validade, tanto sob o aspecto formal, quanto

    sob o prisma material. (PAULO e ALEXANDRINO, 2003, p.2).

    As leis possuem inmeras aes e influncias do que est acontecendo

    no presente, evidenciando inclusive, pactos criados entre grupos polticos nas

    entrelinhas de cada resoluo. Sobre a criao da Constituio parte do poder

    constituinte, pode-se dizer que este seja:

  • 38

    aquele que cria, extingue ou modifica, e pe em vigor normas jurdicas de valor constitucional. Seu papel consiste fundamentalmente na criao e distribuio das competncias supremas do Estado, bem como na limitao de seu exerccio por meio do regramento constitucional (PAULO e ALEXANDRINO, 2003, p.12-13).

    Assim, a criao de uma Constituio Federal nada mais do que a

    prova da autonomia de um Estado-Nao em gerir com suas prprias leis o

    territrio, principalmente se utilizar-se da origem desse termo, pode-se

    perceber que esta est ligada diretamente com a sociedade que consegue se

    organizar atravs de leis e us-las para manter as relaes sociais e o territrio

    pelos grupos que conseguem gerir essas leis. O significado da autonomia vem

    da:

    palavra oriunda do grego, e que designa uma realidade poltico-social concretizada pela primeira vez atravs da plis grega, significa, singelamente, o poder de uma coletividade se reger por si prpria, por leis prprias. (SOUZA, 2008, p.105).

    No caso do Brasil, com a Constituio Federal, nota-se que houve uma

    autonomia por ter dentro do territrio nacional as leis que fossem prprias, mas

    nem sempre significa que sua aplicabilidade seja realmente condizente com os

    casos especficos ou com as demandas da sociedade no determinado contexto

    de sua vigncia, pois a o poder de uma coletividade por se reger pode explicitar

    o poder daqueles grupos hegemnicos e a opresso dos demais grupos

    minoritrios.

    No dia 2 de dezembro de 1945, foi eleita a Constituinte de 1946, que

    iniciou seus trabalhos em um contexto impactado pela derrota do nazi-fascismo

    na Europa e pelo fim do Estado Novo no Brasil em 2 de fevereiro de 1946.

    Foi um perodo de heterogeneidade poltica e ideolgica, contando com

    a participao de deputados e senadores eleitos por nove partidos. Dentre eles

    Artur Bernardes (PR) e Lus Carlos Prestes (PCB) podem ser citados como

    exemplo. A maior preocupao entre os parlamentares presentes na

    Constituinte era da necessidade de se delimitar e formular a ao dos poderes:

    Executivo, Legislativo e Judicirio, afim de evitar conflitos nas tomadas de

    decises.

  • 39

    Outras medidas que foram estabelecidas e marcaram a Constituinte de

    1946 foi a fixao do mandato em cinco anos e a proibio da reeleio para

    os cargos executivos, todas as aes administrativas federais deveriam passar

    pelo Congresso, e este teve seu fortalecimento atravs das fiscalizaes que

    poderia fazer do poder executivo federal. A composio da Cmara dos

    Deputados beneficiou os Estados menos populosos com a concesso de mais

    cadeiras, sendo justificada pela necessidade de se manter o equilbrio

    federativo. Porm, algumas medidas foram caracterizadas pela postura

    conservadora, como o direito greve, que passou a ser reconhecida mas no

    foi regulamentada pelo Congresso e o fato do sindicato continuar sendo

    compreendido como uma colaborao do Estado.

    Mas, dentre todas as medidas criadas, as que mais possuem

    importncia para esse estudo esto relacionadas questo do voto. No que se

    refere s mulheres, que s poderiam votar se ocupassem cargos pblicos, mas

    na Constituio de 1946, qualquer mulher poderia votar e exercer sua

    cidadania, ganhando assim mais espao e contribuindo para decises polticas.

    Houve uma garantia de que os votos seriam diretos e secretos para a

    populao, em casos especficos na tomada de algumas decises, seriam

    criados plebiscitos, buscando assim, uma maior adeso da participao nos

    processos eleitorais e consulta popular.

    Tambm, foi na Constituio de 1946 que o princpio federalista foi

    retomado, j que inicialmente a primeira Constituio que havia nela esses

    princpios, era a de 1891. Com a Constituio Federal de 1946, houve o

    estabelecimento da cooperatividade e uma diviso de atribuies entre os

    poderes nas escalas municipais, estaduais e da Unio. Esse princpio foi muito

    importante para Macabu, pois pode auxiliar na manuteno da sua

    emancipao e na autonomia municipal, que embora no fosse um lugar to

    prspero como na primeira emancipao, poderia captar recursos e firmar

    parceirias atravs do pacto federalista. Muitas cidades e at Estados, no

    conseguiam arrecadar o mesmo tanto de recursos atravs dos impostos, o que

    gerava inmeras diferenas sociais. Desde a Constituio de 1946, esta

    desigualdade horizontal de capacidade de arrecadao tem sido compensada

    por um sistema de transferncias fiscais (ARRETCHE, 2004, p.18), a qual a

  • 40

    Unio repassa recursos para os Estados e os Estados repassam para os

    municpios.

    A autonomia poltica e fiscal dos governos estaduais e municipais permite que estes adotem uma agenda prpria, independente da agenda do Executivo Federal. As relaes verticais na federao brasileira do governo federal com Estados e municpios e dos governos estaduais com seus respectivos municpios so caracterizadas pela independncia, pois Estados e Municpios so entes federativos autnomos (ARRETCHE, 2004, p.20).

    As propostas de federalismo foram melhor elaboradas e aplicadas a

    partir da Constituio de 1988, mas no pode-se falar da Constituio de 1946

    sem evidenciar esse fato, pois no perodo entre essas constituies federais, o

    Brasil vivenciou uma ditadura militar, que para ter o melhor controle do

    territrio, no executou os princpios federalistas, e ainda as retirou da

    Constituio.

    Assim, os convencionalmente chamados de ciclos de centralizao (Reforma Tributria de 1965-68) e descentralizao (Constituies Federais de 1946 e 1988) do sistema fiscal brasileiro no se referem a processos de mudana na distribuio da autoridade para tributar, mas esto diretamente associados s alquotas aplicadas aos impostos de repartio obrigatria, bem como autonomia de gasto dos governos locais sobre os recursos recebidos. (ARRETCHE, 2004, p.18).

    Os estudos sobre o federalismo, seja quanto sua organizao ou sua

    aplicabilidade, eram poucos no perodo em que a Constituio Federal de 1946

    era constituda, ao ponto que na prpria geografia poltica, em poucos lugares

    estava tendo essa discusso. Segundo COSTA (2008) foi na geografia poltica

    norte-americana do perodo de 1940 e 1950 que explicitamente o federalismo

    foi abordado dentro dessa vertente da cincia geogrfica, pois antes s era

    discutido pela cincia poltica, e haveria diversos tipos de federalismo, que

    dependessem dos processos histricos e polticos para a organizao dos

    povos atravs do mesmo. Evidenciando que as naes que nesse contexto

    estavam se organizando com os princpios do federalismo, tinham relaes e

    propostas de federalismo diferente umas das outras, pois os seus ideais eram

    organizados de acordo com as especificidades e demandas da nao.

  • 41

    De tal maneira, em 18 de setembro de 1946, foi aprovada na Assemblia

    Nacional Constituinte o texto da nova Constituio Federal, evidenciando uma

    maior participao e autonomia dos poderes: executivos, legislativos e

    judicirio, em suas escalas de atuao: Unio, Estaduais e Municipais, e at

    mesmo da populao em diversos seguimentos pblicos, seja atravs de

    consulta para elaborao tcnica de planos urbansticos, ou pelo direito

    conquistado pelas mulheres de votar, eleies diretas, plebiscitos e a garantia

    de voto secreto nas eleies.

    As tomadas de decises da Constituio de 1946 evidenciaram a

    autonomia dos grupos sociais que estavam no poder no Brasil atravs das leis

    que foram criadas, na prpria gesto do territrio e todo o contexto social,

    poltico e econmico que foram propulsores dessas escolhas de como seriam

    as leis e sua aplicao, assim, em muitos aspectos as leis aprovadas

    apontavam para seus idealizadores polticos e a quais grupos sociais eles

    poderiam afetar de forma positiva ou negativa quanto aos acessos, direitos e

    deveres. Evidenciando que os territrios so compreendidos por foras de

    poder de determinados grupos sociais que ocupam principalmente, os cargos

    de tomadas de decises, ou seja, cargos pblicos e polticos.

    Segundo Souza (2008) a autonomia de uma sociedade ocorre quando a

    mesma visa defender e gerir o seu territrio, de forma livre, que tenha uma

    identidade cultural e com recursos que possam ser acessveis para a

    populao, valendo ressaltar que essas aes so afirmativas do poder, pois

    uma sociedade autnoma no uma sociedade sem poder, o que alis,

    seria impossvel. (SOUZA, 2008, p.106).

    Evidenciou-se com a Constituio de 1946 todas as foras de poder

    exercida por seguidores de Getlio Vargas politicamente e as relaes do

    Brasil com outros pases, pois o contexto da mesma era de relaes

    geopolticas conflituosas pelo mundo e tambm de abertura de alguns ideais,

    como por exemplo, o direito do voto da mulher.

  • 42

    Captulo 3 A emancipao de 1952

    3.1 A brecha poltica do Fundo de Participao dos Municpios

    A Constituio de 1946 deu mais poderes aos Estados e Municpios

    atravs da participao popular e tambm pelos princpios federalistas, o que

    em partes foi importante para os macabuenses, mas no era o bastante para

    auxiliar na emancipao, pois faltava uma legislao que pautava a criao de

    novos municpios especificamente. Alguns avanos foram ntidos com a

    Criao da Constituio de 1946, pois:

    Traduzem-se nos seus preceitos alguns benefcios: 1) a noo de Constituio, lei superior s outras leis e pela qual tm de ser conferidas (judicial control); 2) a noo de Estado federal, cuja relatividade a tcnica da Constituio, mais moderadamente que a 1937, demonstra; 3) a noo de liberdade individual, independente da intrusa e falsa liberdade econmica; 4) a noo de democracia; 5) certa programaticidade social-democrtica. Longe est de ser escorreita a Constituio de 1946 nos cinco pontos referidos; mas alguma coisa fez, e cumpre realizar o que nela se ordena, sem ter ido at onde deveria, - ela afastou o ditatorialismo de 1937-1946. (MIRANDA, 2005, p.10).

    Embora no tivesse na Constituio uma lei especfica, cabia a

    aplicao da lei anterior no que se refere emancipao de cidades, sendo a

    da Lei Orgnica Nacional de 02 de maro de 1938, que discutia sobre as

    municipalidades e estabelecia critrios rigorosos para a criao de novos

    municpios. Cada Estado teria as suas leis das municipalidades de acordo com

    suas especificidades, mas seguindo hierarquicamente a Lei Orgnica Nacional.

    Essa lei dificultava a movimentao de muitas localidades e grupos sociais no

    processo separatista em todo o pas, pois delimitava funes territoriais,

    econmicas e demogrficas para que cada distrito se emancipasse, o que em

    muito no se aplicava no caso de Macabu, pois mesmo tendo passado por

    problemas econmicos com a crise do caf, o ento distrito de Maca teve

    muito apoio de polticos fluminenses nas polticas de auxlio do Estado, o que

    diversificou sua economia e no deixou a crise perdurar por muito tempo.

    As leis auxiliam na administrao pblica e dos territrios quanto a sua

    aplicabilidade. O Estado o responsvel por essa administrao visando

  • 43

    estruturar os lugares, principalmente aqueles que passam por problemas, como

    foi o caso de Macabu na crise do caf. De tal maneira,

    A administrao ento constituda de um conjunto de organizaes que participam da execuo de mltiplas tarefas de interesse geral que cabem ao Estado. Neste sentido, a funo administrativa o prolongamento da funo poltica que compreende a funo legislao e a funo governamental. Entre estas funes est a de promover polticas pblicas, ou seja, a prestao de bens e servios s coletividades e aos territrios. (CASTRO, 2010, p.127).

    A Lei Orgnica das Municipalidades do Estado do Rio de Janeiro, de

    1938, em seu item I, pargrafo primeiro do artigo 10 da lei 109 de 16 de

    fevereiro de 1938 e atravs da Constituio do Estado do Rio de Janeiro nos

    itens I, II e III do artigo 84, evidenciava que para ter a criao de um novo

    municpio era necessrio territrio, populao mnima de 10.000 habitantes,

    arrecadao para sua existncia e tambm possuir edifcios necessrios para a

    instalao pblica, como de Prefeitura e Cmara de Vereadores. Era

    necessrio ter territrio, demografia e arrecadao para poder administrar de

    forma coerente com as necessidades sociais e manter o espao da cidade

    atravs das polticas pblicas.

    Macabu era o 5 Distrito de Maca e no tinha problemas territoriais ou

    econmicos que justificassem a sua no emancipao, mas teria problemas

    quanto demografia, que foi solucionada no processo de emancipao com a

    adeso do 10 Distrito de Maca, Macabuzinho. Essa relao foi outra

    particularidade da emancipao: a juno de dois distritos macaenses para

    formar um novo municpio. Se a emancipao de um distrito parecia difcil, a de

    dois, unidos, ao contrrio, facilitaria a questo. (GOMES, 2013, p.241).

    Porm, o contexto poltico do Estado do Rio de Janeiro entre 1945 e

    1947 no eram favorveis emancipao de Conceio de Macabu, por causa

    da rotatividade de seus governadores no poder e a influncia de Maca na

    esfera estadual. Mas em 24 de fevereiro de 1947 Edmundo Macedo Soares e

    Silva tornou-se governador, estando no cargo at 1951, e o mesmo era

    solidrio a emancipao de Macabu por causa das alianas polticas que seu

    irmo Hlio Macedo Soares e Silva criou. Inclusive, este ltimo tambm foi

    eleito, ocupando o cargo de deputado estadual neste perodo. Outro fator

  • 44

    decisivo para a emancipao foi a abertura encontrada na Constituio de

    1946 que criava atravs dos princpios federalistas o Fundo de Participao

    dos Municpios, este que auxiliou na questo da movimentao em prol da

    emancipao de Macabu.

    O Fundo de Participao dos Municpios era um sistema de tributos

    partilhados entre as escalas da Unio para os Estados, e dos Estados para os

    Municpios. Por isso, muitos estados estimularam a criao de novos

    municpios para captar recursos da Unio. O Fundo de Participao dos

    Municpios foi um dos argumentos que fortaleceu a movimentao Pr-

    Emancipao, porque aumentaria a arrecadao no s do municpio, mas

    tambm do Estado.

    No Estado do Rio de Janeiro muitos municpios se emanciparam atravs

    de decreto de lei nesse perodo e pela influncia poltica, mas tambm no foi o

    caso de Macabu, pois mais uma vez o peso de ser um distrito de Maca foi

    maior do que os anseios da populao.

    Macabu conseguiria sua emancipao em 1952 atravs do estmulo do

    Fundo de Participao dos Municpios, que muito interessava ao Estado do Rio

    de Janeiro, por causa da arrecadao que receberia e iria alm das foras

    polticas da regio.

    3.2 A construo do processo emancipatrio

    A geografia tem a tarefa de compreender o espao quanto a sua

    produo, diferenciao e organizao, e isso no fcil de fazer. Para

    entender o espao em muitos casos necessrio relacionar a poltica e o

    territrio, pois so componentes essenciais no processo histrico de formao

    das sociedades (CASTRO, 2010, p.15), significando dizer que a poltica seria

    a mediao dos conflitos sociais e o territrio seria a base material e simblica

    da sociedade, relacionando esses temas, temos o campo da geografia poltica,

    esta que essencial para se compreender como foi o processo de

    emancipao de Macabu, tendo em vista os marcos conceituais da poltica

    como modo de organizar interesses e do territrio como recorte e contedo

    desses interesses (CASTRO, 2010, p.39). Assim, a emancipao nada mais

  • 45

    do que o interesse de grupos sociais em organizar o territrio atravs das suas

    vontades e foras de poder exercidas com a poltica.

    Arendt (1998) alegou que quando h algo em comum entre os homens,

    estes se organizam politicamente, principalmente quando vivem em um

    determinado caos absoluto ou de diferenas. A poltica surgiria nas relaes

    entre os homens e as escolhas que fazem historicamente para realizar as

    vontades do grupo, ter o apoio da maior parcela da populao seria ento a

    possibilidade de maior organizao poltica.

    O intervalo de tempo entre a primeira e a segunda emancipao de

    Macabu foi caracterizado pelo enfraquecimento do ideal separatista e por

    crescimento econmico diversificado, porm, prevalecendo a produo agrcola

    e a ascenso da elite agrria, esta que conflitava com as elites de outros

    distritos, principalmente Quissam e Carapebus, disputando o controle social

    do territrio e a sua ascenso econmica. Ao ponto que as relaes que

    existiam da cidade de Maca com seus distritos evidenciava que aqueles que

    mais compartilhavam de suas propostas conseguiam maior destaque, prestgio

    e investimentos, gerando conflitos polticos e disputas entre os distritos.

    Em meados da dcada de 40 e 50, os grupos polticos de Macabu

    comearam as articulaes em prol da efetiva emancipao. Tendo por

    estratgia primeiramente a criao de alianas polticas atravs de

    macabuenses que ocupavam cargos de importncia tanto na regio quanto no

    Estado.

    O segundo passo realizado pelo grupo separatista foi de estudo das leis

    e coletas de dados. Utilizando a Constituio de 1946 para amparar as aes

    tomadas, embora no tivesse uma lei especfica no que tange a emancipao

    das cidades, essa Constituio foi essencial ao ressaltar os princpios

    federalistas expostos atravs da Lei do Fundo de Participao dos Municpios,

    por ter uma maior participao popular atravs do voto secreto, direto, do

    direito das mulheres e por consultas populares pelos plebiscitos.

    Alm dos fatos mencionados, o trabalho poltico realizado com o

    restante da populao macabuense foi primordial para a realizao do

    plebiscito de emancipao e para a unanimidade deste nas urnas ao dizer sim,

    queremos nos emancipar. Pois o trabalho articulador com a populao gerou o

  • 46

    reconhecimento de pertencimento ao territrio de Macabu, exaltando a

    identidade de ser macabuense e de querer sua independncia poltica, social e

    econmica se efetivando, podendo ser caracterizado como uma prtica de

    dimenso popular, ou seja, populista. Essa mobilizao da memria coletiva

    dos macabuenses teve por sentido de que a populao deveria ser favorvel e

    lutar para ter novamente a autonomia administrativa, e o resgate foi atravs do

    reconhecimento da identidade local na histria e sem dvidas, o pice das

    estratgias polticas da elite local em prol da emancipao e evidenciando a

    dimenso do poder no territrio e nas relaes entre as pessoas por parte do

    grupo que organizava-se em prol da emancipao.

    O trabalho realizado pelo grupo que liderou o processo e as articulaes

    polticas em prol da emancipao foi o de resgate de um sentimento do

    passado. Os sujeitos de destaque entre 1948 e 1952 no eram os mesmos do

    perodo de 1891 a 1892. Mas foi a partir do reconhecimento da primeira

    emancipao e de seu fracasso gerado por foras polticas que houve o

    despertar do sentimento de pertencimento do territrio, que foi aceito pela

    populao macabuense atravs da memria e da identidade. Compreende-se

    essa realidade e vale ressaltar que:

    o poder est tambm circunscrito ao campo das vontades e inclui-se no universo dos valores sociais, que definem uma vontade comum, ou seja, tudo aquilo que socialmente aceito e valorizado (CASTRO, 2010, p.99).

    O sonho de ver a Macabu se tornando uma cidade, no se tornou

    apenas dos grupos polticos que por anos se articularam para tal feito ou de

    suas intencionalidades do poder, mas tornou-se tambm da populao do 5

    Distrito Macabu e do 10 Distrito Macabuzinho. Por causa do resgate da

    memria e da identidade atravs da estratgica articulao poltica com a

    populao para uma organizao social que pudesse realmente quebrar com a

    fora poltica de Maca.

    A organizao entre 1950 e 1952 foi marcada por polticos macabuenses

    ocuparem cargos importantes em Maca, como Milne Evaristo da Silva Ribeiro,

    que foi prefeito entre de 1947 a 1951. Rozendo Fontes Tavares, Francisco

    Barbosa de Andrade, Coronel Etelvino Gomes e Joo Barbosa Moreira,

  • 47

    ocuparam cargos de vereana tambm em Maca. Estes tiveram acesso a

    documentos que puderam auxiliar na comprovao da viabilidade de Macabu

    se tornar um municpio.

    Iniciou-se a mobilizao dos polticos macabuenses para a comprovao

    da viabilidade separatista de Macabu, gerando inmeros encontros polticos

    internos e com polticos regionais e estaduais.

    Segundo Francisco Ferreira do Cabo, o popular Cabinho, as Semanas Ruralistas realizadas na antiga FEEM foram os eventos cvicos que reuniram os simpatizantes do separatismo com as autoridades e polticos estaduais competentes. Cabinho, em mais de trs horas de entrevistas, a mim concedidas em 1997, assim falou: Na Semana Ruralista de 1949, com a presena do governador, de vrios secretrios estaduais e do prefeito Milne Ribeiro, foi proposta a organizao de um encontro para se traar os rumos da emancipao. (GOMES, 2013, p.243-244).

    Articulada a mobilizao com outros polticos, iniciou um trabalho

    intensivo de organizao social com os moradores do distrito para ouvi-los

    sobre a possvel emancipao e tambm para argumentar sobre a importncia

    para tal feito, sendo assim, a populao deveria participar e compartilhar dos

    ideais separatistas. Essa mobilizao ficou entendida como uma prtica de

    dimenso poltica do populismo.

    Renato Barbosa Fernandes procurou primeiramente o proprietrio do

    cinema de Macabu, o Jos Gomes, para poder usar do espao para as

    reunies, estas que se iniciaram em julho de 1950 e contou com pessoas que

    eram da elite agrria e tambm por outros que no compunham esse grupo,

    mas que participaram na mobilizao para a emancipao por acreditarem que

    era possvel ter o territrio com autonomia para gerir suas prprias aes sem

    depender de Maca. Nas mesmas foram discutidas, segundo Gomes (2013) a

    criao de uma comisso pr-emancipao e como mobilizar a populao,

    justamente no resgate da memria coletiva, mas essa comisso s foi definida

    em dezembro, no local do ento Clube do Bosque.

  • 48

    A partir de ento, o trabalho