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1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – JORNALISMO
Gabriela Cleveston Gelain
CONSUMO DE MÍDIA E SUBCULTURA ZINEIRA
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
SANTA MARIA, RS
2013
1
Gabriela Cleveston Gelain
CONSUMO DE MÍDIA E SUBCULTURA ZINEIRA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Curso de Comunicação Social da
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM,
RS), como requisito parcial para obtenção do
grau de Bacharel em Comunicação Social –
Habilitação em Jornalismo.
Orientadora: Profª. Drª. Veneza Mayora Ronsini
SANTA MARIA, RS
2013
3
Gabriela Cleveston Gelain
CONSUMO DE MÍDIA E SUBCULTURA ZINEIRA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Comunicação Social da
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como requisito parcial para obtenção do
grau de Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo.
__________________________________________________
Profª Drª Veneza Mayora Ronsini
(Orientadora)
_________________________________________________
Profª Drª Rosane Rosa
(UFSM)
____________________________________________
Ms. Gustavo Dhein
(Cásper Líbero)
Aprovado em:....... de............... de 2013
5
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, agradeço à professora Veneza, pelos ensinamentos, por me fazer
crescer intelectualmente e despertar em mim o fascínio pela pesquisa.
Agradeço a todos os zineiros entrevistados por terem colaborado com esta pesquisa e
enviado seus fanzines impressos e suas cartas. À Jéssica Nakaema, por ser a amiga zineira
mais talentosa.
Aos amigos que encontrei na Faculdade de Comunicação Social (FACOS), no Estúdio
21 e na Rádio Universidade. Ao Renato Molina, pelos ensinamentos sobre a música e sobre a
vida. Ao pessoal do Santa Demo, por me encherem de orgulho.
À Bruna Homrich, amiga que ganhei neste percurso de quatro anos de graduação.
À Flávia Amaral, por compartilhar comigo esta trajetória na pesquisa e na monografia.
À Gisele Dotto Reginato, Sandra Depexe, Júlia Schnorr, Laura Wottrich e Laura
Storch, por me inspirarem, pelos conselhos, pela amizade e pelos ensinamentos nesta
trajetória.
Aos meus pais, Ademir e Isabel, pelo apoio de sempre e pelo seu amor infinito.
7
“Na cena Do It Yourself, os zines são mais que
uma prática de publicação, é uma forma de
pensar, ser e criar. É a visão subterrânea que
precisamos nutrir e compartilhar. Os zines
fazem isso, e é o que importa. Eles são, ainda,
as notícias do underground” (Duncombe, em
Notes from Underground: Zines and Politics
of Alternative Culture)
9
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo central compreender como o capital subcultural se articula à
classe social na vida e nas publicações dos editores de fanzines impressos, os zineiros da cena
punk hardcore. Realizamos um estudo de caso com onze zineiros de diferentes classes
sociais: quatro de classe média alta, quatro de classe média e três de classe média baixa.
Também realizamos a análise de conteúdo de trinta e quatro publicações impressas dos
zineiros, que foram organizadas em seis categorias. A descrição e análise dos dados revelaram
que os zineiros realizam um diferente consumo de mídia hegemônica como leitura de jornais,
revistas, programação de canais de TV por assinatura e programas de rádio. A mídia preferida
dos zineiros é o livro, assim como a internet, que é utilizada com alta frequência. O capital
subcultural pode ser percebido nos fanzines pela questão estética e nos zineiros através das
falas sobre bens culturais adquiridos, como coleções de CDs e discos de vinil de punk e
hardcore, das tatuagens e da opção ou não pelo vegetarianismo. A observação dos “rituais” de
criação dos fanzines revelou notórios contrastes de classe social entre a subcultura zineira.
Palavras-chave: Mídia. Consumo. Capital Subcultural. Fanzines. Estudo De Caso. Análise De
Conteúdo.
11
ABSTRACT
This work has as main objective to understand how subcultural capital is linked to social class
in reality and publications of the publishers of printed fanzines, zinesters of the hardcore punk
scene. We conducted a case study with eleven zinesters from different social classes: four
from the upper middle class, four from the middle class and three from lower-middle class.
We also conducted a content analysis of thirty-four zinesters printed publications which have
been organized into six categories. The description and analysis revealed that zinesters
perform a different consumption of mainstream media as reading newspapers, magazines,
cable TV channels and radio programs. The preferred media‟s subculture is the book, as well
as the internet, which is used with high frequency. The subcultural capital can be perceived by
the fanzines aesthetics and zinesters through the words of acquired cultural goods , such as
collections of CDs and vinyl records from punk and hardcore , the tattoos and the option or
not vegetarian . The observation of the “rituals” of creating fanzines revealed notable
contrasts in social class between the zinester subculture.
Keywords: Media. Consumption. Subcultural Capital. Fanzines. Case Study. Content
Analysis.
13
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Terceira edição do Sniffin’ Glue. ............................................................................. 51
Figura 2 - Primeira edição da Maximumrocknroll em 1982. ................................................... 53
Figura 3 - Trecho da carta enviada por Daniel Hogrefe (classe média alta), em maio de 2013.
.................................................................................................................................................. 96
Figura 4 - Carta enviada por Rogério Alves (classe média alta), em abril de 2013. ............... 97
Figura 5 - Carta enviada por Renato Donisete (classe média), em abril de 2013. ................... 97
Figura 6 - Trecho de carta enviada por Flávio Grão (classe média alta), em abril de 2013. ... 98
Figura 7 - Carta de Jeison Placinsh (classe média baixa), escrita em maio de 2013. .............. 99
Figura 8 - Carta de Guilherme Gonçalves (classe média), postada em 26 de abril de 2013. 100
Figura 9 – Street Ground. ...................................................................................................... 103
Figura 10 – Manufatura. ........................................................................................................ 103
Figura 11 – Trecho sobre veganismo, do fanzine True Lies, de Carla Duarte (1). ................ 107
Figura 12 – Trecho sobre veganismo, do fanzine True Lies, de Carla Duarte (2). ................ 107
Figura 13 - Trecho do fanzine Conversas Paralelas, de Guilherme Gonçalves. ................... 108
Figura 14 – Fanzine Cortex, de Flávio Grão. ......................................................................... 113
Figura 15 - Classe média alta: Zines Cortex de Flávio Grão e zine Tralha 4 de Daniel
Hogrefe................................................................................................................................... 113
Figura 16 – Classe média alta: Zine de Daniel Hogrefe 3M3M............................................. 114
Figura 17 - Classe média alta: Zine Street Ground de Rogério Alves. .................................. 114
Figura 18 – Marca da editora independente de Rogério Alves “Art Till Death”, presente em
seus zines................................................................................................................................ 115
Figura 19 -Classe média: Zine Histérica de Carla Duarte ..................................................... 115
Figura 20 -Classe Média: Zine Aviso Final de Renato Donisete. .......................................... 116
Figura 21 - Classe média: Zine Paranóia e Cale a Boca de Júlio César Baron. ................... 116
Figura 22 -Classe Média: zine Seja Você Mesmo de Guilherme Gonçalves. ........................ 117
Figura 23 - Editorial e página 3 do fanzine Seja Você Mesmo, de Guilherme Gonçalves. ... 117
Figura 24 -Classe média: contracapa do zine feminista True Lies de Carla Duarte. ............. 118
Figura 25 -Classe média baixa: zine sobre vegetarianismo Linhaça de Wender Zanon. ...... 119
Figura 26 -Classe média baixa: fanzine Impasse #2, de Kamila Lin. .................................... 120
14
Figura 27 - Classe média baixa: fanzine Café Sem Açúcar, de Jeison Placinsch, com capa feita
pelo amigo e colaborador Daniel Hogrefe (entrevistado zineiro de classe média alta). ........ 121
Figura 28 - Retirado do fanzine Café Sem Açúcar de Jeison Placinsch. ................................ 122
Figura 29 - Publicidade no fanzine Street Ground, de Rogério (classe média alta). ............. 122
Figura 30 - Exemplo de propaganda no fanzine Aviso Final ................................................. 123
Figura 31 – Publicidades no fanzine Outono ou Nada, de Guilherme Gonçalves 1. ............. 123
Figura 32 - Publicidades no fanzine Outono ou Nada, de Guilherme Gonçalves 2. .............. 124
Figura 33 – Fanzine Manufatura #2 de Flávio Grão. ............................................................. 126
Figura 34 – Fanzine Aviso Final #31 de Renato Donisete. .................................................... 126
15
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Zineiros de classes distintas e seus fanzines. ......................................................... 25
Tabela 2 – Edições dos fanzines impressos. ............................................................................ 27
Tabela 3 – Categorias de zines (classe média alta) ................................................................ 110
Tabela 4 – Categorias de zines (classe média) ....................................................................... 110
Tabela 5 – Categorias de zines (classe média baixa) ............................................................. 112
17
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 19
2 METODOLOGIA ............................................................................................................... 25
3 MÍDIA E FANZINES ......................................................................................................... 33
3.1 RESISTÊNCIA E MÍDIA RADICAL ALTERNATIVA .................................................. 33
3.2 DO CONSUMO AO FAÇA VOCÊ MESMO (DO IT YOURSELF) ................................ 37
3.3 A HISTÓRIA DOS FANZINES ........................................................................................ 43
3.4 PUNK E FANZINES ......................................................................................................... 48
3.4.1 Fanzines Punk e Sniffin’ Glue ......................................................................................... 49
3.4.2 Fanzines Flipside e Maximumrocknroll .......................................................................... 51
3.4.3 Fanzines punks no Brasil................................................................................................. 53
4 SUBCULTURAS ................................................................................................................. 57
4.1 CLASSE E CAPITAL CULTURAL ................................................................................. 57
4.2 CLASSE E CAPITAL SUBCULTURAL ......................................................................... 61
4.2.1 Capital Subcultural .......................................................................................................... 61
4.2.2 Contracultura x Subcultura ............................................................................................. 63
4.2.3 Subculturas ...................................................................................................................... 66
4.2.4 Punk e hardcore .............................................................................................................. 70
4.2.5 Hardcore ......................................................................................................................... 74
5 ZINES E ZINEIROS .......................................................................................................... 77
5.1 PERFIS DOS ZINES E ZINEIRO ..................................................................................... 78
5.1.1 Zine Aviso Final .............................................................................................................. 78
5.1.2 Zines Manufatura e Cortex ............................................................................................. 78
5.1.3 Zine Acesso Público ........................................................................................................ 79
5.1.4 Zines Outono ou Nada, Seja Você Mesmo e Conversas Paralelas ................................ 80
5.1.5 Zine Paranóia e Cale a Boca .......................................................................................... 80
5.1.6 Zine Impasse ................................................................................................................... 81
5.1.7 Zines Histérica, True Lies e Dialética ............................................................................ 81
5.1.8 Zines Street Ground, Last Call e Isto Não é Um Fanzine .............................................. 83
5.1.9 Zine Linhaça ................................................................................................................... 83
5.1.10 Zines Tralha, The Rising, Quase e 3M3M (Três Mãos de Terceiro Mundo) ................ 84
18
5.1.11 Zine Café Sem Açúcar ................................................................................................... 85
6 CONSUMO DE MÍDIA ...................................................................................................... 87
7 CAPITAL SUBCULTURAL .............................................................................................. 95
7.1 FANZINES ......................................................................................................................... 95
7.2 EXPRESSÕES DA SUBCULTURA ZINEIRA .............................................................. 127
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 131
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 137
GLOSSÁRIO ........................................................................................................................ 143
APÊNDICE ........................................................................................................................... 147
ANEXO .................................................................................................................................. 155
19
1 INTRODUÇÃO
Essa investigação visa analisar como o capital subcultural (Thornton, 1995), articula-
se com a classe social na vida e nas publicações dos editores de fanzines impressos, os
zineiros. Por capital subcultural entendemos os comportamentos e estilos que manifestam
“autenticidade”, “diferença”, “singularidade” e “sofisticação”, os quais levam ao
reconhecimento, à admiração e ao prestígio dentro de uma subcultura. Definidos e
distribuídos pela mídia, tais saberes e competências podem ser materializados e
corporalizados na aparência (através do corte de cabelo ou de tatuagens, por exemplo), na
disposição de discos (coleções, discos raros), entre outros. Para Thornton (1995), a ideia de
capital subcultural não está tão ligada à classe como o capital cultural proposto por Bourdieu.
O que explicaria o ofuscamento das origens de classe no capital subcultural seria o fato de que
ele é definido como um conhecimento extracurricular, não sendo ensinado na instituição
escolar. Entretanto, nossa intenção é observar o consumo de mídia dos zineiros e perceber as
temáticas e características recorrentes nas suas publicações, como elas são perpassadas pelo
capital subcultural e por questões de classe.
A investigação também apontará o consumo de mídia da subcultura zineira e sua
relação com os meios de comunicação alternativos e hegemônicos, bem como a observação
de indicadores do capital subcultural nos zines e nos sujeitos da pesquisa. Realizamos, então,
um estudo de caso dos zineiros e uma análise de conteúdo de títulos de zines que englobam 34
edições produzidas por essa subcultura. As publicações foram organizadas em categorias.
Nossa amostra compreende 11 zineiros (nove homens e duas mulheres), de 20 a 41
anos, de diferentes classes sociais (classes média alta, média e média baixa), segundo os
grupos ocupacionais propostos por Quadros e Antunes (2001). São zineiros que, de alguma
forma, vinculam-se à cena musical do punk e do hardcore e residem em diversos estados,
como Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás, Alagoas e Rio Grande do Sul, onde residem seis dos
sujeitos entrevistados. O contato com os zineiros ocorreu via facebook e e-mail. Foram
selecionados aqueles que recentemente vêm publicando fanzines impressos e estão imersos no
cenário musical do punk e do hardcore brasileiro (também chamado de “cena independente”),
seja por distribuírem suas publicações em shows, por terem bandas que compartilham dessa
ideologia e desse estilo de música ou por serem apreciadores do estilo musical, vivenciando,
assim, de algum modo, o underground. Selecionamos uma ou mais publicações dos sujeitos
20
pesquisados, com títulos e temáticas distintas. Ressaltamos que as temáticas dos fanzines
selecionados são variadas; há zines sobre feminismo, poesia, assuntos pessoais, artes e, claro,
sobre música punk. Todos os zineiros têm algum vínculo com a cena do punk e do hardcore,
mesmo que não abordem tais assuntos em suas produções zinísticas.
Hoje, a música - a música especialmente do punk - compreende o maior gênero de
zines. E até mesmo escritores cujas zines abrange outros temas que a música muitas
vezes tem sua primeira experiência pelo mundo do punk rock (DUNCOMBE, 1997,
p. 125).
Nossa pesquisa justifica-se em função de os estudos acerca dos fanzines ainda estarem
em processo de consolidação. De acordo com Sno (2012), registros apontam que os primeiros
fanzines surgiram no Brasil na década de 1960, porém, as pesquisas sobre o assunto só
começariam três décadas depois. Para quem hoje realiza pesquisas sobre o fanzine no Brasil, a
primeira dificuldade encontrada refere-se às referências bibliográficas disponíveis, pois a
produção sobre este tema é bastante recente; os primeiros títulos de pesquisas sobre fanzines
datam de 1993, época em que a produção zineira atingiu sua melhor fase. Antes disso, não
existiam publicações acadêmicas sobre os fanzines no país.
Já na visão de Grão (2002), os fanzines têm sido bem recebidos e aplicados do ensino
fundamental à pós-graduação. Grande parte dos trabalhos acadêmicos sobre fanzines
encontram-se ainda na área de Educação, devido à possibilidade da aplicação destas
publicações como recurso eficiente de aprendizagem dadas algumas características inerentes a
elas, como o exercício da criatividade e o olhar crítico, a possibilidade de deslocamento da
posição do aluno de mero consumidor a produtor ativo e autor de textos críticos.
Uma das características principais dos fanzines é sua circulação restrita a nichos e
culturas específicas. Esta restrição dificulta seu acesso a pessoas que não fazem
parte destes círculos culturais e gera uma das maiores dificuldades relatadas pelos
pesquisadores: a do acesso às publicações. Esta dificuldade soma-se ao fato de haver
algum preconceito por parte do meio acadêmico em considerar os fanzines como
publicações dignas de serem foco de estudo ou pesquisa. (GRÃO, 2002, p. 57,).
Nossa preferência por zines impressos justifica-se pelo fato de, atualmente, serem
raras as publicações feitas de papel em relação às publicações dos anos 90 no Brasil, quando a
produção zineira era forte e possuía um outro objetivo principal, o de circular informações à
respeito do underground. A necessidade de circulação de fanzines era muito maior, pois não
existiam os blogs ou weblogs e as redes sociais para disseminar tais informações. A cultura
zineira acabou por migrar para a internet devido ao surgimento da rede, na qual as
21
ferramentas disponibilizadas fizeram com que a criação e atualização, por exemplo, de um
blog, para divulgar informações do cenário independente se tornasse mais fácil para os
indivíduos expressarem-se. A maior vantagem de blogs e zines virtuais em relação às
publicações impressas é que, além da audiência “global”, estão em constantes atualizações.
Além disso, os fanzines impressos levam muito mais tempo para serem produzidos e
distribuídos (SILVA, 2002).
Embora as práticas de publicação e produção sejam completamente diferentes, a
essência dos weblogs e dos fanzines impressos é a mesma. A função primária de
ambos (comunicar) e seus ideais em torno expressão individual começou a tomar
corpo a partir da década de 70 (em especial com o surgimento do movimento punk
na Inglaterra). Blogs, assim como fanzines impressos, são uma deflagração da auto-
expressão. Cada um deles é uma evidência de uma vertiginosa mudança de um
tempo marcado pela difusão de informações controladas por autoridades, artistas e
corporações sancionadas para uma oportunidade sem precedentes de expressão
individual numa escala planetária (SILVA, 2002, p.10)
Sobre as pesquisas relacionadas a fanzines no Brasil, Muniz (2010) ressalta que, no
banco de teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES),
por exemplo, o tema dos fanzines e revistas alternativas é abordado em seis produções1,
oficialmente cadastradas, em nível de mestrado. Na época (meados de 2010), houve o
surgimento de comunidades virtuais em redes sociais cujo tema principal era o fanzine
tradicional. No sítio de relações da rede social do Orkut, em 2007, por exemplo, constavam
266 comunidades relacionadas à palavra-chave “fanzine” e 423 à palavra “zines”. No
facebook (conforme consulta realizada em 13 de novembro de 2013), foram encontrados 97
grupos ao pesquisarmos o termo “zine” e outros 98 grupos quando pesquisamos “fanzine”.
Sendo assim, faz-se necessário pesquisar fanzines na comunicação para impulsionar o
interesse sobre esta mídia. Não encontramos nenhum trabalho que trate de consumo cultural e
classe social relacionado especificamente aos fanzines, tampouco aos fanzineiros do punk e
do hardcore em específico.
1 “As dissertações mencionadas são: Fanzines de histórias em quadrinhos: o espaço crítico do quadrinho
brasileiro, de Henrique Magalhães; Grupos de estilo jovens – o rock underground e as práticas (contra)culturais
dos grupos punk e thrash em São Paulo, de Kenia Kemp; O Hip-Hop e a (in)visibilidade no cenário midiático, de
Deisimer Gorczevski; Skinheads no Brasil: trajetória e nacionalismo, de Alessandro Bracht; Fanzine: expressão
cultural de jovens de uma escola da periferia de São Paulo, de Hildebrando Cesário Penteado; e Fanzine
Madame Satã: uma análise, de Arthur de Toledo Verga” (MUNIZ, 2010).
22
Gallo (2010) ressalta que, na comparação dos rumos do punk entre a cidade de São
Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, é percebida uma distinção de classes sociais, uma vez que o
grupo de Brasília é formado, sobretudo, pela classe média e por filhos de diplomatas,
enquanto que, em São Paulo e no Rio de Janeiro, os grupos são predominantemente formados
por filhos de operários que habitavam as periferias destes centros urbanos. É interessante
pontuarmos que não há menção, por parte dos grupos punks, a desentendimentos ou
confrontos dentro dos grupos provocados por dissidências ideológicas ou de classe com
outros grupos cuja base é a etnia. Acreditamos, então, ser relevante em nosso trabalho a
análise da subcultura zineira do punk e do hardcore vinculada à classe social e aos estilos de
vida, bem a análise do capital subcultural dos indivíduos inseridos nessa subcultura e de seus
fanzines impressos.
Levamos em consideração as observações de Downing (2004) sobre mídia radical
alternativa e hegemonia, para refletirmos sobre os fanzines como mídia radical. O autor
refere-se a esta mídia como sendo uma mídia, em geral, de pequena escala e que se apresenta
sob muitas formas diferentes, expressando uma visão alternativa às políticas, prioridades e
perspectivas hegemônicas. Sua missão é a de não apenas de fornecer ao público os fatos que
lhe são negados, mas também de pesquisar novas formas de desenvolver uma perspectiva de
questionamento do processo hegemônico e fortalecer o sentimento de confiança do público
em seu poder de engendrar mudanças construtivas. O rompimento das regras é a base comum
dos meios alternativos, embora, raramente, os fanzines consigam quebrar todas elas, em todos
os aspectos.
De acordo com Quines (2013), nossas escolhas partem de motivações e gostos que são
construídos ao longo de nossas trajetórias de vida e que, muitas vezes, parecem emergir
naturalmente de indagações espontâneas, quando, na realidade, já estão sendo moldadas e
cultivadas antes mesmo de reunirmos as questões dispersas em um mosaico que faça sentido.
Cabe, então, uma breve retrospectiva para descrever como a pesquisadora chegou a esta
investigação. A motivação maior para a realização deste trabalho, possivelmente, é
proveniente do contato que estabeleci, via correspondência, a partir dos 13 anos de idade, com
zineiros de todo o Brasil. Através de cartas, a pesquisadora cresceu observando as
publicações, passando, então, a produzi-las, imersa nessa rede muito bem articulada e
“subterrânea”, que é a cena independente, o underground. O contato intenso com os zineiros
durante esses anos despertou, na pesquisadora, uma forte vontade de conhecer mais sobre a
cultura dos zines e de estudá-la na academia, não somente como pesquisadora, mas como
zineira e oficineira de fanzines. Sendo assim, o contato estabelecido com os entrevistados
23
aconteceu naturalmente, pois, já inserida no cenário independente, a pesquisadora pode
observar detalhadamente e escolher os sujeitos que julgou serem relevantes e ativos
atualmente neste meio, com publicações interessantes e diferentes entre si.
No primeiro capítulo, assinalamos a relação entre os fanzines e a mídia. Alguns
aspectos-chave serão descritos neste capítulo, como, por exemplo, o conceito de fanzine para
diversos autores, um pouco da história das publicações (como a Punk Magazine, a
Maximumrocknroll e a Sniffin’ Glue) e os fanzines punks no Brasil. Além disso, tratamos de
conceitos de resistência, segundo João Freire Filho (2007), e os conceitos de mídia radical
alternativa e contra-hegemonia – este último, derivado de Gramsci –, segundo a visão de
Downing (2004).
No segundo capítulo, explicamos o conceito de classe social e a teoria do capital
cultural, proposta por Bourdieu (2008), para, assim, conceituarmos o capital subcultural
postulado por Thornton (1995), expondo as diferenças entre esses capitais e a ausência da
discussão de classe no trabalho da autora. Ademais, o capítulo apresenta uma introdução ao
mundo das subculturas juvenis e os contrastes entre as definições de contracultura e
subcultura, que são, muitas vezes, confundidos. Discorremos, ainda, sobre a história e o estilo
de vida e de música do punk e do hardcore, cenários em que os sujeitos pesquisados, os
zineiros, estão, de certa forma, imersos.
No terceiro capítulo, descrevemos os perfis dos zineiros e seus fanzines. Realizamos o
consumo de mídia desta subcultura para compreender com que frequência veem, assistem e
ouvem determinada mídia, quais os contrastes existentes, na perspectiva dos editores de
fanzines, entre os fanzines e as revistas, como observam o fanzine na grande mídia, o ritual de
criação de suas publicações e suas formas de autenticidade e resistência. Além disso, através
das metodologias de estudo de caso (quanto aos zineiros) e da análise de conteúdo (quanto aos
34 fanzines), observamos algumas características do capital subcultural nos zineiros e em seus
zines, os quais foram divididos em seis categorias (musical, vegetariano, feminista, pessoal,
artístico e literário). Assim, apontamos quais temáticas são mais recorrentes e o modo de
abordagem das mesmas nas publicações.
25
2 METODOLOGIA
Os pressupostos metodológicos que norteiam esta pesquisa são o estudo de caso e a
análise de conteúdo. O primeiro foi escolhido em função de sua característica sobre estudar
um caso particular, a partir do qual as respostas emergem de uma análise de dados
particulares. Nesse caso, utilizamos a técnica de entrevista em profundidade, em que
elaboramos um questionário com 74 perguntas que foram respondidas por 11 zineiros (nove
homens e duas mulheres), que compõem a nossa amostra. A entrevista foi elaborada e
aplicada com a finalidade de coletarmos as informações para analisar o consumo de mídia e o
capital subcultural de quatro zineiros das classes média alta, quatro da classe média e três de
média baixa, segundo a classificação dos grupos ocupacionais de Quadros e Antunes (2001).
“O estudo de caso é uma inquirição empírica que investiga um fenômeno contemporâneo
dentro de um contexto da vida real, quando a fronteira entre o fenômeno e o contexto não é
claramente evidente e onde múltiplas fontes de evidência são utilizadas” (YIN apud
DUARTE, 2005, p. 216).
Abaixo (tabela 1), para melhor visualização, uma tabela que apresenta os 11 zineiros
investigados, idade, classe social e seus fanzines:
Tabela 1 – Zineiros de classes distintas e seus fanzines.
(continua)
ZINEIROS IDADE CLASSE SOCIAL FANZINES
Daniel Hogrefe
25 anos Classe média alta Tralha, 3M3M, Quase e
The Rising
Flávio Grão
37 anos Classe média alta Manufatura e Cortex
Rogério Alves
25 anos Classe média alta Street Ground, Last Call
e Isto Não É Um Fanzine
Gregory Debaco
22 anos Classe média alta Acesso Público
Guilherme Gonçalves
30 anos Classe média Seja Você Mesmo,
Conversas Paralelas e
Outono ou Nada
Carla Duarte
24 anos Classe média Histérica, True Lies e
Dialética
Júlio César Baron
23 anos Classe média Paranóia e Cale a Boca
Renato Donisete
41 anos Classe média Aviso Final
26
(conclusão)
Jeison Placinsch
26 anos Classe média baixa Café Sem Açúcar e Aonde
Foi Parar Aquele
Sorriso?
Kamila Lin
20 anos Classe média baixa Impasse
Wender Zanon
23 anos
Classe média baixa Linhaça
Fonte: Elaborado pela autora (2013).
Observamos características do capital subcultural nos fanzines que compõem nosso
corpus, por meio da análise de conteúdo. Segundo Moraes (1999), a análise de conteúdo
constitui uma metodologia de pesquisa usada para descrever e interpretar o conteúdo de toda
classe de documentos e textos. Essa análise, conduzindo a descrições sistemáticas,
qualitativas ou quantitativas, ajuda a reinterpretar as mensagens e a atingir uma compreensão
de seus significados em um nível que vai além de uma leitura comum: essa metodologia de
pesquisa faz parte de uma busca teórica e prática, com um significado especial no campo das
investigações sociais e constitui-se em bem mais do que uma simples técnica de análise de
dados, representando uma abordagem metodológica com características e possibilidades
próprias.
A análise de conteúdo, enquanto método, constitui-se em um conjunto de técnicas de
análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de
descrição do conteúdo das mensagens. As fases da análise de conteúdo organizam-se
em torno de três polos: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos
resultados: a inferência e interpretação (BARDIN, 2009, p. 27).
Na sua evolução, a análise de conteúdo tem oscilado entre o rigor da suposta
objetividade dos números e a fecundidade sempre questionada da subjetividade. Entretanto,
ao longo do tempo, têm sido cada vez mais valorizadas as abordagens qualitativas, utilizando
especialmente a indução e a intuição como estratégias para atingir níveis de compreensão
mais aprofundados dos fenômenos que se propõe a investigar. Em qualquer de suas
abordagens, a análise de conteúdo fornece informações complementares ao leitor crítico de
uma mensagem, seja ele linguista, psicólogo, sociólogo, educador, crítico literário, historiador
ou outro. A matéria-prima da análise de conteúdo pode constituir-se de qualquer material
oriundo de comunicação verbal ou não verbal, como cartas, cartazes, jornais, revistas,
informes, livros, relatos autobiográficos, discos, gravações, entrevistas, diários pessoais,
filmes, fotografias, vídeos, etc. Contudo os dados advindos dessas diversificadas fontes
chegam ao investigador em estado bruto, necessitando, então, serem processados para, dessa
27
maneira, facilitar o trabalho de compreensão, interpretação e inferência a que aspira a análise
de conteúdo (MORAES, 1999).
As edições dos fanzines analisadas totalizam 34 publicações impressas, que vão de
2006 até 2013. Porém, possuímos alguns fanzines não datados. Abaixo, a Tabela 2 apresenta
o nome dos zines, o número, data e editor da publicação (zineiro):
Tabela 2 – Edições dos fanzines impressos.
(continua)
ZINE NÚMERO DATA ZINEIRO
The Rising #3 2006 Daniel Hogrefe
Quase #3 “Verão” de 2008 Daniel Hogrefe
Aviso Final #23 Agosto de 2008 Renato Donisete
True Lies #5 “Verão” de 2009 Carla Duarte
Last Call #03 2009 Rogério Alves
Histérica #1 1º semestre 2009 Carla Duarte
Seja Você Mesmo #1 Março de 2009 Guilherme
Gonçalves
Seja Você Mesmo #2 Maio de 2009 Guilherme
Gonçalves
Histérica #2 Janeiro 2011 Carla Duarte
Aviso Final #28 Abril de 2011 Renato Donisete
Conversas Paralelas #8 Maio de 2011 Guilherme
Gonçalves
Manufatura #02 2011 Flávio Grão
Cortex #01 2011 Flávio Grão
Aviso Final #29 Janeiro /Fevereiro
de 2012
Renato Donisete
Café Sem Açúcar #10 Fevereiro de 2012 Jeison Placinsch
Street Ground #02 1º semestre 2012 Rogério Alves
Tralha #2 Agosto de 2012 Daniel Hogrefe
Tralha 04 Agosto de 2012 Daniel Hogrefe
Aviso Final #30 Setembro de 2012 Renato Donisete
28
(conclusão)
Outono ou Nada #1 Outubro de 2012 Guilherme
Gonçalves
Street Ground #03 2º semestre 2012 Rogério Alves
10M3M (Dez Mãos de
Terceiro Mundo)
#1 Dezembro de 2012 Daniel Hogrefe
Aonde foi parar aquele
sorriso?
Sem
número
Dezembro de 2012 Jeison Placinsch
Manufatura #03 2012 Flávio Grão
Paranóia e Cale a Boca #01 2012 Júlio César Baron
Linhaça #01 2012 Wender Zanon
Aviso Final #31 Março/Abril de 2013 Renato Donisete
Café Sem Açúcar #23 Maio de 2013 Jeison Plascinsch
Impasse #02 Não datado Kamila Lin
Dialética #1 Não datado Carla Duarte
Conversas Paralelas #1 Não datado Guilherme
Gonçalves
Conversas Paraleas #5 Não datado Guilherme
Gonçalves
Acesso Público - Não datado Gregory Debaco
Isto Não É Um Fanzine #01 Não datado Rogério Alves
Fonte: Elaborado pela autora (2013).
Dividimos as 34 publicações em seis categorias: fanzines que abordam assuntos
pessoais ou mantém um caráter de diário (categoria “pessoal”); fanzines que tratam sobre
vegetarianismo (categoria “vegetariano”); fanzines que exponham artes ou em que a arte seja
uma das pautas principais (categoria “artístico”); fanzines que possuam poesias, contos ou
textos literário (categoria “literário”); fanzines que abordem o feminismo como pauta
principal (categoria “feminista”) e fanzines que coloquem como tema central a música
(categoria “musical”). Em nossa tabela, visualizamos um total de quatro fanzines pessoais, um
vegetariano, quatro feministas, sete de arte, três de poesia e 14 de música.
Partindo disso, apontamos quais temáticas são mais recorrentes nos zines, bem como
as características de capital subcultural e as diferenças nas publicações de editores de classes
distintas. Pesquisamos suas redes sociais para descrever alguns detalhes, que não constavam
29
nas respostas do questionário, sobre os perfis deles (por exemplo, se pertenciam a alguma
banda punk). Além do questionário aplicado com 74 perguntas, enviamos três questões
abertas para explorarmos o que pensam os zineiros de diferentes classes sobre os objetivos do
fazer zinístico, as suas temáticas preferidas nas publicações e a importância dos fanzines para
cenário independente. Primeiramente pedimos que nos respondessem por cartas, mas,
posteriormente, a maior parte dos zineiros respondeu via e-mail às perguntas. Mesmo antes da
popularização da internet, os fanzines já funcionavam como uma espécie de comunidade
virtual, reunindo através das publicações fãs geográfica e socialmente distantes uns dos outros
(CARRIJO, 2012).
Nossa investigação possui uma amostra composta por 11 zineiros de classes distintas:
classes média alta, média e média baixa. Já a seleção do corpus (os fanzines) de nossa
investigação ocorreu através de contatos estabelecidos com zineiros, que nos enviaram suas
publicações. Já possuíamos fanzines mais antigos em nosso acervo pessoal. Após a coleta de
dados da entrevista, composta por 74 questões e pelas três perguntas abertas, as questões
foram divididas em duas categorias – o consumo de mídia e o capital subcultural –, que
servem para articular melhor os resultados. Algumas questões sobre consumo midiático
referem-se ao caráter quantitativo, ou seja, à frequência com que os zineiros assistem a,
ouvem ou leem determinada mídia, já outras questões referem-se ao aspecto qualitativo ou
aos modos de consumo da mídia, como são comprados e colecionados CDs, discos e DVDs
de bandas e que lugares são frequentados para a realização destas compras. Entre as
perguntas, não nos atemos apenas às mídias tradicionais como o rádio, a televisão e os jornais,
mas também a mídias como os blogs, os sites e as redes sociais, que são um meio de
manutenção de contato entre a subcultura zineira. O capital subcultural, proposto por
Thornton (1995), considera a mídia um fator pertinente para entender as distinções culturais
por meio do consumo de mídia, sendo impossível compreender tais diferenças sem alguma
investigação desse consumo midiático, uma vez que a mídia é entendida como uma rede
decisiva para o sentido e a distribuição de conhecimento cultural.
Questionamos nossos entrevistados também sobre o canal televisivo MTV, que, por
algum tempo, deu visibilidade para bandas independentes. A transmissão da MTV foi iniciada
em 1º de outubro de 2013, surgindo após a devolução da marca MTV pelo Grupo Abril, que a
manteve como canal de TV aberta no país por mais de 20 anos através da MTV Brasil. Hoje,
a MTV é um canal de TV por assinatura e apresenta uma programação diferente da anterior.
30
Para finalizar, outras questões abordadas referem-se aos primeiros contatos que os zineiros
estabeleceram com o punk e o hardcore; à sua aparência, com relação a serem ou não
tatuados; à autenticidade e atitude do fazer zinístico; à relação entre a mídia nacional e os
fanzines; e aos meios de divulgação tradicionais e virtuais.
É relevante assinalar que um dos trabalhos em destaque que aborda a temática de
fanzines encontra-se na área da Antropologia, intitulado Grupos de Estilo Jovens: o Rock
Underground e as práticas (contra)culturais dos grupos punk e trash de São Paulo, em que
Kemp (1993) denomina os grupos de estilo underground2 como sendo grupos situados no
meio de produções contraculturais, recusando o aspecto comercial com os bens simbólicos
gerados; proposição com a qual concordamos. Em seu trabalho, a autora realizou o contato
individual com os entrevistados zineiros através de observação participante e etnografia,
visualizando que não existissem turmas constituídas apenas de editores de fanzines, e, sim,
grupos de estilos que utilizam o fanzinato como uma das atividades, entre outras, das quais
participam pessoas que fazem parte de um grupo de estilo, como, por exemplo, os punks e os
thrashers3.
Ainda que hoje visualizemos alguns encontros de zineiros e publicações alternativas
anuais, grupos sobre zines fechados no facebook, trocas de publicações alternativas e eventos
voltados apenas para o fanzinato (como a Fanzinada4, o Faça Você Mesmx Zine Fest
5, por
exemplo) voltados apenas ao fanzinato, encontramos os zineiros dentro desses grupos de
estilo diferentes, como o gótico, o punk, o nerd, a cultura japonesa, ou, como pretendemos
analisar aqui, os grupos que participam de alguma forma da cena punk/hardcore, levando o
fanzine circunscrito à esfera do lazer mais do que um estilo de vida, sendo assim, enquadrado
em uma subcultura.
Durante as observações, Kemp (1993) constatou que é comum, nos fanzines e em
conversas entre pessoas envolvidas com o estilo do rock underground, o uso constante da
denominação “cena” para se referirem ao meio musical-social desse estilo em um lugar
2 Termo que designa o espaço não cooptado e/ou coberto pela grande mídia – jornais, rádios, TVs, revistas –
onde circula uma produção artística mais comprometida com a arte do que com o comércio. 3 “Thrash significa açoitar, bater rapidamente. Inicialmente designou uma derivação do heavy metal tradicional,
que pode ser entendida como uma radicalização da estética metal com músicas mais pesadas e muito mais
rápidas do que o metal dos anos 70. Aos poucos, o thrash do metal influenciou bandas punk que deram origem
ao crossover – mistura de hardcore com metal- e, finalmente já nos anos 90, com o fim das bandas de metal
thrash e das bandas de crossover, o termo foi recuperado pelas bandas punks que resgatam a sonoridade mais
crua, rápida e direta dos anos 80” (O‟HARA, 2005, p. 193). 4 “A fanzinada é um encontro nacional de fanzines e publicações independentes, uma celebração entre zineiros,
organizado por Thina Curtis em São Paulo” (FANZINADA, 2013). 5 “Faça Você Mesmx Zine Fest é um encontro entre zineiros que acontece em Porto Alegre e está em sua
segunda edição. O evento é organizado por Daniel Hogrefe, Jamer Mello, Jeison Platinsch e Wender Zanon”
(FAÇA VOCÊ MESMX, 2013).
31
qualquer, sintetizando as significações que estão presentes na noção de estilos do universo da
produção underground. A cena refere-se à produção musical ou a um público que divulga,
edita fanzines e auxilia em espaços para performances musicais, de modo qualitativo e
quantitativo, seguindo a filosofia do “faça você mesmo”. Em nosso trabalho, utilizamos a
expressão “cena independente” para abordar o ambiente a que os sujeitos pesquisados estão,
de alguma forma, vinculados.
33
3 MÍDIA E FANZINES
3.1 RESISTÊNCIA E MÍDIA RADICAL ALTERNATIVA
Em nosso trabalho, ansiamos refletir sobre como os fanzines produzidos pela
subcultura zineira – os zineiros ligados ao punk e ao hardcore, que editam zines impressos –
podem ser avaliados como uma mídia radical alternativa, segundo as perspectivas de
Downing (2004), bem como uma forma de resistência, segundo Freire Filho (2007). Além
disso, no decorrer deste capítulo apresentamos a ideologia Do It Yourself e contamos a
história dos fanzines, aprofundando-nos quanto aos zines e o punk e, mais especificamente,
quanto aos zines punks no Brasil.
Ao empregar a expressão mídia radical, Downing (2004) refere-se, como já
pontuamos, à mídia que é, em geral, de pequena escala e que se apresenta sob muitas formas
diferentes, ou seja, àquela que expressa uma visão alternativa às políticas, prioridades e
perspectivas hegemônicas. “Não existe nenhuma alquimia instantânea, nenhum procedimento
socioquímico inconteste, capaz de distinguir, num relance ou com resultados definitivos, a
mídia verdadeiramente radical da mídia aparentemente radical ou mesmo não radical”
(DOWNING, 2004, p. 24).
Segundo Silva (2002), os fanzines são um veículo de livre expressão que ainda
resistem à hegemonia cultural. Essa visão teve sua lógica originada a partir dos anos 70,
quando os zines encontraram o movimento punk, em uma época em que o acesso aos bens
culturais e aos meios de produção destes concentravam-se nas mãos de poucos. Para Oliveira
(2006), o fanzine é uma mídia alternativa, com base na qual foi criado um movimento cultural
alternativo internacional. É uma expressão viva, concreta e palpável de que os movimentos
sociais também educam, inclusive e principalmente, os movimentos culturais juvenis.
Transitar em um espaço “subterrâneo” (ou underground) pode ser uma forma de
resistência do indivíduo ao convencional, uma forma de contestar ou, simplesmente, uma
possibilidade de criação e exposição da própria prática social de um indivíduo. A cena
underground constitui-se, assim, como uma atitude para sobreposição do pensar do indivíduo
sobre a censura e o modismo da mídia comercial, que define modelos de acordo com o
interesse financeiro do mercado. Apropriar-se de uma mídia, mesmo que de pouco alcance,
para sentir-se menos domesticado pelo sistema, traduz, em parte, o desejo por emancipar-se
do modismo, do incentivo ao consumismo proposto pela mídia consagrada, o que ganha
34
forças a cada vez que o fanzine encontra mais um leitor ou zineiro que se identifica com a
mensagem dita (NASCIMENTO, 2010).
O fanzinato é um mundo no qual a liberdade de expressão e a dedicação são as bases
para a criação das publicações, principalmente das impressas, que demandam uma atenção
diferenciada quanto à diagramação, que, muitas vezes, é feita com o auxílio de uma tesoura,
sem recursos digitais, com a utilização do xerox e com o investimento financeiro pessoal.
Nesse sentido, Silva (2002, p. 11-12) propõe que:
Publicar um fanzine, na esfera coletiva ou individual, significa colocar para o mundo
o que o zineiro pensa, o que é de suma importância para ele. Este objetivo está na
essência dos fanzines impressos, que têm o poder de transformar ambos escritores e
leitores de “audiência” em “público”, de “consumidor”, em “criador”, estejam seus
leitores e editores conscientes disso ou não.
Na perspectiva de Downing (2004), a mídia radical alternativa apresenta-se em uma
enorme variedade de formatos. O autor centrou-se quase que exclusivamente na mídia
impressa e de rádio e televisão, com o objetivo de entender como os ativistas da mídia,
geralmente remunerados ou mal remunerados, conseguem persistir dia após dia, ano após ano.
Ao se referir à diversidade de formas que a mídia radical pode tomar, foi empobrecedor, pois
esses meios podem se ver inseridos em um contexto de mídia que lhes é estranho,
exemplificando com os cartuns de esquerda que, muitas vezes, são alocados,
desconfortavelmente, em jornais conservadores.
Os meios alternativos têm em comum o fato de romperem com as regras, embora
raramente quebrem todas elas, em todos os aspectos. Esses meios são tipicamente de pequena
escala, dispondo de raros fundos, às vezes pouco conhecidos. “Às vezes têm vida curta, como
uma espécie de epifenômeno; outras perduram por muitas décadas. Às vezes, são atraentes; às
vezes entediantes e repletos de jargões; às vezes, alarmantes; e, às vezes, dotados de um
humor inteligente” (DOWNING, 2004, p. 29).
A mídia radical alternativa geralmente serve a dois propósitos precedentes: a)
expressar verticalmente, a partir dos setores subordinados, oposição direta à
estrutura de poder e seu comportamento; obter, horizontalmente, apoio e
solidariedade e construir uma rede de relações contrária às políticas públicas ou
mesmo à própria sobrevivência da estrutura de poder. Qualquer exemplo pode
incluir ambos os propósitos, vertical e horizontal (DOWNING, 2004, p. 29-30).
Para utilizar o conceito de contra-hegemonia, Downing (2004) deriva de Gramsci a
ideia de que, para resistir ao poder da classe capitalista, nas nações em que o poder desta é
35
avançado, é necessário desafiar e destronar o domínio cultural e a liderança (hegemonia) das
classes dominantes, com uma visão alternativa coerente e convincente de como a sociedade
poderia organizar-se. No decorrer de sua expansão, o capitalismo consolidado manteve e
organizou sua liderança através de órgãos de informação e cultura. As perspectivas sobre a
sociedade mais ampla, geradas no âmbito desses órgãos produziram, segundo Downing
(2004), uma visão de mundo inconteste, que adquiriu o status quo de inevitável, do poder da
classe dominante assentado na sua habilidade singular de dirigir a nação com sucesso. De
acordo com Edgard e Sedgwick (2003), o termo hegemonia deriva do grego hegemon, que
significa líder, guia ou designa aquele que dita as regras. No marxismo do século XX, esse
termo foi desenvolvido por Gramsci, sendo de central importância para o desenvolvimento
dos estudos britânicos, principalmente no trabalho do Birmingham Centre for Contemporary
Cultural Studies, facilitando a análise das formas pelas quais os grupos subordinados
respondem e resistem à dominação política e econômica.
Com exceção dos projetos fascistas, essa hegemonia acabou surgindo após longos
períodos, e não como algo imediato. A hegemonia socialista foi construída com o passar do
tempo através do engajamento das massas. Esse movimento político majoritário foi, em
grande parte, liderado, de forma não tirânica, por um partido comunista. Influenciados pelo
teórico italiano, alguns escritores começaram a utilizar os termos contra-hegemonia e contra-
hegemônico, embora Gramsci não tenha empregado os termos desta forma. Ainda assim, os
conceitos de contra-hegemonia passaram a ser posteriormente empregados com frequência
para classificar tentativas de suplantar a hegemonia com uma visão radical alternativa
(DOWNING, 2004).
Acreditamos que os zines, principalmente os vinculados ao punk, são uma forma de
mídia radical alternativa, pois, segundo Downing (2004), a mídia radical tem o objetivo não
apenas de mostrar ao público os fatos que lhe são negados, mas também de criar novas
alternativas de pesquisar e desenvolver perspectivas de questionamento do processo
hegemônico, fortalecendo, assim, o sentimento de confiança do público devido ao sentimento
de mudança construtiva. O autor resume o modelo de contrainformação baseado em Gramsci,
que apresenta uma nova perspectiva para entender a mídia radical, a qual tem um forte
elemento de validade, especialmente sob regimes repressores e extremamente reacionários. O
papel da mídia radical pode ser compreendido como o de tentar quebrar o silêncio e refutar as
mentiras da sociedade, fornecendo-lhe a verdade.
36
Afirmo que o uso dos fanzines e seus elementos inconstantes e mutáveis, não como
fórmula, mas como estratégia fugidia e suporte volátil, não-durável, pode provocar
algum tipo de desgaste iconológico em oposição aos símbolos transformados em
clichês, de forma experimental de disseminação e distribuição da contra-informação.
Uma tática de disseminação de um pensamento não científico, acadêmico, erudito,
formal. Tais estratégias foram bastante utilizadas na cultura underground, na arte
marginal, na contracultura, na literatura independente, na ficção científica, nos
quadrinhos, no punk e em diversas outras instâncias da cultura – quando utilizada
como experimento e intensidade – no decorrer das últimas décadas (MELLO, 2010,
p. 28).
A noção de resistência passou a ser frequentemente relacionada, desde os anos 1980,
às ações das mais prosaicas ou sutis e aos gestos menos tipicamente heroicos da vida
cotidiana, não vinculados a derrubadas de regimes políticos ou mesmo a discursos
emancipatórios, nos quais eram tradicionalmente associados a protestos organizados ou a
insurreições coletivas de larga escala contra instituições e ideologias expressivas (FREIRE
FILHO, 2007). Podemos visualizar, no subcapítulo a seguir, intitulado Punk e Zines, que o
fanzine punk surgiu com força no Brasil a partir da década de 1980, podendo ser considerado
também um elemento de resistência. Nesse sentido:
Dependendo, pois, da formação cultural, da posição social e das inclinações teóricas
e políticas do analista, uma mesma atividade pode ser descrita como “resistente”,
“rebelde”, “rude”, “anômica”, “desviante”, “diversionista”, “delinqüente” ou
“patológica”, conforme atestam as copiosas pesquisas sobre o comportamento
juvenil, realizadas no âmbito das ciências humanas e sociais (FREIRE FILHO, 2007
p. 19).
A amplitude das ações e dos comportamentos qualificados como “resistentes” em
todos os níveis da vida social (individual, coletiva e institucional) e em diferentes cenários
(partidos políticos, cultura popular, entretenimento massivo, escola, prisão, rua, local de
trabalho, quarto de dormir) é bastante grande. Nos registros pródigos dos dicionários, o
vocábulo “resistência” e seus correlatos remetem a um desnorteamento de modos ativos e
dinâmicos ou mais passivos e estáticos de lidar com situações e manobras julgadas adversas
ou opressivas. O principal ponto de controvérsia entre as discrepantes abordagens dos
parâmetros conceituais do termo “resistência” é a necessidade ou não de intencionalidade por
parte de quem resiste e o reconhecimento de determinada ação como de resistência por parte
dos alvos desta e dos demais membros da sociedade. Para alguns autores, determinar a
intenção de indivíduos e grupos é uma tarefa difícil ou mesmo impossível, devido não só às
dificuldades de acesso às motivações internas dos atores sociais como também a diferenças
culturais. Indivíduos, comunidades, subculturas e categorias sociais inteiras são flagradas
37
resistindo (de variadas formas, manifestas ou tácitas) à exploração, à marginalização, à
frustração pessoal e ao imperialismo cultural (FREIRE FILHO, 2007).
De acordo com Freire Filho (2007, p. 19), uma amostra das inúmeras atividades e
condutas realçadas como expressão de resistência são: os estilos de vida “alternativos” ou
“antimaterialistas”; o não votar; a interpretação a contrapelo de mensagens reacionárias,
patriarcais ou infamantes da mídia; a assimilação de mensagens de caráter progressista ou
“empoderador” latentes na mídia; o uso, de maneira desfigurada ou customizada, de peças de
roupas da moda; a incorporação de trajes e cortes de cabelo ligados a tradições culturais ou
religiosas; a fala ou a escrita na língua nativa; o rompimento com o discurso de vítima; e o
silenciamento deliberado.
3.2 DO CONSUMO AO FAÇA VOCÊ MESMO (DO IT YOURSELF)
Conforme salientado Bauman (2008), a sociedade de consumidores interpela seus
membros, dirigindo-se a eles e questionando-os na condição de consumidores. Essa sociedade
representa o tipo de sociedade que promove, encoraja ou reforça a escolha de um estilo de
vida e de uma estratégia existencial consumista, rejeitando todas as opções culturais
alternativas. Em contraposição, os zineiros modernos utilizam suas publicações para propor
outras perspectivas à cultura de consumo. Enquanto a relação de consumo é compreendida
como uma relação de passividade (o consumidor paga com o seu dinheiro, recebe o produto e
vai para casa seguindo as instruções para seu uso), os zineiros insistem em interagir com o
produto de maneiras que vão muito além destes limites (DUNCOMBE, 1997, tradução
nossa).
O potencial do consumo como resistência política surgiu, primeiramente, em
associação com a teoria subcultural, pois as subculturas dos anos 50 em diante eram vistas
como consumidoras dos produtos do capitalismo, mas não de acordo com as expectativas dos
produtores. Ao consumidor foi, então, atribuída a habilidade de fazer seu valor de uso da
mercadoria (EDGARD; SEDGWICK, 2003). Para Duncombe (1997), em uma sociedade
construída com base no consumo, como podemos perceber pelos alimentos que comemos,
pelas roupas que vestimos, pela cultura com que nos identificamos, o ideal de ser “o artista de
mim mesmo” é desafiador. Esse ideal é também compartilhado pelos zineiros em suas vidas.
Se os fanzines são a expressão de uma cultura underground, que marca sua identidade em
38
oposição a de um mundo à parte, hoje a onipresença do consumo de massa caracteriza a
sociedade em geral tão distintamente como qualquer outra característica. Qualquer crítica ao
consumismo e qualquer nova visão de mundo deve incluir uma nova perspectiva sobre como
a cultura e os produtos serão produzidos e consumidos.
No entanto, há algo sobre a crítica e sobre resistência ao consumo que não consegue se
sustentar. Ao contrário dos desafios em relação à quantidade e qualidade do trabalho – que
têm uma história longa e nobre inserida na luta da classe operária – a crítica do consumo
parece um privilégio dos privilegiados. Com tanta demanda de produtos para, rapidamente,
tornarem-se parte do público consumidor, a ideia de criticar o consumismo parece absurda.
Entretanto, vivemos em um mundo estranho, no qual, nos Estados Unidos, por exemplo, ser
pobre não significa estar fora do mundo de consumo. As pessoas podem não ser capazes de
manter uma habitação decente, educação ou cuidados de saúde, mas os tênis e os jogos de
vídeo que são lançamentos e os refrigerantes, por exemplo, estão ao alcance de todos, mesmo
dos cidadãos mais pobres: o consumo foi democratizado (DUNCOMBE, 1997).
Ao escreverem comentários, resenhas ou darem entrevistas sobre suas bandas
favoritas, falando sobre a sua cena local, os zineiros que publicam zines musicais estão
tomando um produto que é comprado e vendido como uma mercadoria e posicionando-o em
um relacionamento íntimo: em vez de depender dos mediadores sancionados como a Revista
Rolling Stone e a Spin, estes editores afirmam seu próprio direito de abordar com autoridade a
música que amam, tornando esta a sua própria cultura. O maior gênero de zines que existiu, e
existe, é o vinculado à música (DUNCOMBE, 1997, tradução nossa).
Se a cultura dominante é comercial, no entanto, de muitas maneiras os zineiros estão
fazendo a mesma coisa que as pessoas têm feito há anos: utilizar a cultura dominante e recriar
a sua relação com ela, e, consequentemente, com o mundo. Um dos exemplos mais
interessantes deste fenômeno, segundo Duncombe (1997), é o descrito por Camille Bacon-
Smith em sua excelente etnografia da comunidade predominantemente feminina de fãs de
mídia nos Estados Unidos. Saindo da cena de fãs de ficção científica, Bacon-Smith descreve o
seu interesse na televisão dramática e mostra Star Trek6 como o elemento definidor de sua
comunidade, a qual se reúne através de uma série de convenções e comunica-se através de
fanzines. O que é particularmente interessante sobre esta comunidade é o que as fãs fazem
com a matéria de mídia massiva: através de vídeos de músicas editados em casa, poemas e
6 “Em 1966 era exibido o primeiro episódio de Jornada nas Estrelas (Star Trek) série de ficção científica criada
por Gene Roddenberry que marcou época e tornou-se uma das mais cultuadas franquias da cultura pop de todos
os tempos” (OMELETE, 2011).
39
histórias, elas literalmente recriam as narrativas desses programas. Além disso, redesenham as
fronteiras de mundos dos personagens, dando a eles histórias, famílias, emoções e
relacionamentos que fogem ao previsto pelos programas originais. As histórias, que circulam
através de fanzines, tornam-se a base para outras, resultando na construção de um universo
alternativo de Star Trek, atraindo outros fãs.
A mediação, no entanto, não é o único tipo de relacionamento que os zineiros cultivam
com a cultura de consumo. Enquanto alguns questionam implicitamente a separação entre si
mesmo e o consumo de cultura, tentando preencher essa lacuna, outros explicitamente
criticam todo o sistema, tentando demolir as pontes entre si e o mundo de consumidores. Os
zineiros anticonsumistas utilizam seus zines para destruir a ilusão reconfortante posta pelo
consumismo, ressaltando que a “casca” brilhante deste esconde as realidades de má-fé do
sistema capitalista (DUNCOMBE, 1997, tradução nossa).
A filosofia que abarca a ideia de simplesmente “sair e fazer”, ou, como popularmente
é expresso no mundo underground, a ideia do “Faça Você Mesmo”, ou a ética Do It Youserlf,
surgiu da necessidade de construir, de criar algo dentro do movimento punk. Apesar de o punk
rock ter se tornado um grande – e rentável – movimento musical na Inglaterra e nos Estados
Unidos, na década de 1970, as indústrias fonográficas e revistas demonstraram pouco
interesse nele. Voltadas para as estrelas do final dos anos 1960 e início dos anos 1970 e da
nova música de dança em discotecas, tais indústrias e revistas não consideraram o punk como
algo que merecesse investimento. Assim, um músico punk, se quisesse ter um público, teria
de alugar com o próprio dinheiro os salões para se apresentar. Se quisesse fazer um registro
(gravar um show, uma demo-tape), teria de financiá-lo sozinho. Se quisesse falar sobre sua
música, teria de criar um fanzine. Na cena musical e cultural cujos sucessos incluem canções
como Blank Generation de Richard Hell, os zines eram um esforço para preencher esse vazio
(DUNCOMBE, 1997, tradução nossa).
“Eu pertenço à geração em branco (geração vazia)
Eu posso levá-la ou deixá-la”
(Blank Generation, de Richard Hell, tradução nossa) (LETRAS, 2013).
Na obra Mate-me Por Favor, de McCain e Mcneil (2004), Richard Hell afirma que
“quando qualquer coisa chegava à análise final não me interessava mais” e que a canção
Blank Generation foi escrita porque o autor tinha uma visão oposta a das pessoas que estava
40
tentando analisar. A canção passava a ideia de pertencimento a uma geração vazia e de que
isto era como “uma lacuna” (HELL apud MCCAIN; MCNEIL, 2004, p. 77). Para Mary
Harron, escritora de reportagens especiais para o fanzine punk da época, era niilismo:
Eu não gostava da cultura hippie, achava nauseante, afetada, sentimental e com
carinha de smiley. Aí Richard Hell chegou e disse: “É isso que somos, a geração
vazia. Acabou”. Foi muito excitante. O que foi tão emocionante é que a gente estava
indo em direção ao futuro e não fazia idéia de que futuro era. Senti como se fosse
tudo novo – não havia definições, ou limites, era ir em frente, em direção à luz, era o
futuro, tudo novo, sem regras, sem nada, sem definições. Levou anos para perceber
que era niilismo, ou coisa que o valha (HARRON apud MCCAIN e MCNEIL, 2004,
p. 77).
Ao longo dos anos 1970 e 1980, uma geração inteira foi, em grande parte, ignorada
pela indústria da cultura comercial. A hegemonia cultural da geração baby boomer7 (o locus
do qual havia se mudado da contracultura para a indústria de cultura mainstream8) – estava
segura de que tudo no “mundo-de-acordo-com-a-cultura-de-massa” voltava-se para as suas
experiências ou para a sua geração. O fato de que esta geração também compôs o maior grupo
demográfico em termos de poder de compra garantia sua representação consistente. Ter
pertencido ao período pós-anos 1960, sendo um punk rocker ou não – significava ter
pertencido a um mundo cultural que foi sufocante, no qual se escutava “fizemos tudo isso
antes e melhor nos anos sessenta”' e sentir-se em um vácuo, em uma geração vazia. Zines e
outras formas de cultura underground tornaram-se o espaço em que os membros da geração
pós-anos 1960 – ou alguém revoltado ou deixado de fora da releitura mainstream da década
de sessenta – poderiam trabalhar na definição de quem eles eram e do que eles acreditavam ou
do porquê, quando eles fizeram, fizeram horrivelmente errado. “Faça Você Mesmo” era
também uma reação ao modo como a mídia massiva estava trabalhando (DUNCOMBE, 1997,
tradução nossa).
7 “A Geração Baby Boomer surgiu logo após o fim da Segunda Guerra Mundial. Hoje, estas pessoas estão com
mais de 45 anos e se caracterizam por gostarem de um emprego fixo e estável. No trabalho seus valores estão
fortemente embasados no tempo de serviço, e preferem ser reconhecidas pela sua experiência à sua capacidade
de inovação. O termo em inglês „Baby Boomer‟ pode ser traduzido livremente para o português como „explosão
de bebês‟, fenômeno social ocorrido nos Estados unidos no final da Segunda Guerra, ocasião em que os soldados
voltaram para suas casas e conceberam filhos em uma mesma época. Os Boomers também são identificados
como inventores da era „paz e amor‟, pois tinham aversão aos conflitos armados. Preferiam a música, as artes e
todas as outras formas de cultura como instrumentos para evolução humana do que as guerras” (COISA &
TALE, 2012). 8 “A corrente de pensamento e ideologia predominante e, por extensão, o que é transmitido e divulgado pela
grande mídia como relevante cultural e artisticamente. Forma par em oposição a underground” (O‟HARA, 2005,
p. 188).
41
A filosofia do Do It Yourself, a corporificação do espírito punk, ocupa uma posição de
liderança no mundo dos zineiros. O “Faça Você Mesmo” é, ao mesmo tempo, uma crítica ao
modo dominante de cultura do consumidor passivo e a criação ativa de uma cultura
alternativa, que não implica apenas criticar o presente, mas também fazer algo diferente;
velho ideal no mundo dos fanzines. Além de fazer exigências quanto à cultura comercial, fãs
de ficção científica criaram a sua própria cultura. Enquanto a noção de participação de estar
“fazendo você mesmo” e criando sua própria publicação remonta ao começo da cultura fan
fiction. Entretanto, abraçou outra ideia, além da ficção científica, no mundo dos fanzines: o
punk rock (DUNCOMBE, 1997). Para Silva (2002), entre as discussões que sempre
permearam o universo dos fanzines estão, juntamente à filosofia do “Faça Você Mesmo”, a
busca de canais bidirecionais de comunicação, de acesso mais democrático aos meios para
experimentação estética sem comprometimento comercial e de ambientes para a formação de
comunidades virtuais. De modo geral, todos esses problemas sempre estiveram no cerne das
questões levantadas pela “ideologia” de produção, circulação, distribuição e de conteúdo dos
fanzines.
Nesse sentido, o Do It Yourself vai além do impulso de resgate da autonomia de se
fazer coisas e escolhas por si próprio, representando algo mais profundo: uma independência
conquistada em virtude de não se dever nada a ninguém. A obra intitulada Não devemos nada
a você, de Sinker (2009), da editora Edições Ideal, apresenta entrevistas em que o Do It
Yourself é tido como base para os entrevistados. A publicação é originada do zine Punk
Planet, de Daniel Sinker, que o editou por um período de treze anos, antes de extinção do zine
em 2007. No seu ápica, circularam 20 mil do zine cópias eu seu ápice.
A motivação por trás do punk é, quase que sem pensar, atribuída ao DIY hoje em
dia. Isso significa: faça você mesmo. É algo subestimado no punk rock, mas é a base
sobre a qual a cultura inteira foi construída. Escritores punks não estão sentados em
casa esperando que seus artigos sejam publicados, eles mesmos os publicam. Os fãs
não estão esperando alguém lançar um disco de sua banda predileta, eles mesmos os
lançam. Não estamos esperando um clube abrir e realizar shows que atendam ao
público com menos de 21 anos, nós mesmos o abrimos. O punk nunca esperou
aprovação de ninguém para fazer algo por conta própria. DIY é a resposta para “por
quê?” (SINKER, 2009, p. 9).
As entrevistas selecionadas por Sinker (2009) apresentam questões interessantes,
trazendo personagens atuantes nos primórdios do punk, como Ian Mackaye, do Fugazi. Na
entrevista, Mackaye relata sua relação com o straight edge – filosofia punk totalmente livre de
42
drogas –, com o Do It Yourself e com a música; relação que se dá de tal forma que o trabalho
não se dissocie de suas próprias opções de vida. Outras surpresas nos são reveladas por Sinker
na entrevista com Kathleen Hanna (vocalista do Bikini Kill) quando nos deparamos com o
relato da discriminação feminina no universo de bandas majoritariamente masculinas. Com
certa mágoa, ela relata como as garotas da banda eram agredidas, nas suas apresentações, pela
plateia, maltratadas por pessoas do meio punk e hardcore e oprimidas pela concorrência,
experiências traumáticas que a fez desistir da banda e partir em busca de outras experiências
(GALLO, 2010).
Mesmo para jovens com pouco afinidade com a música ou o visual punk, a índole
antiestabelecimento e a filosofia do “Faça Você Mesmo” do movimento têm encorajado a
constituição de novas comunidades instáveis de dissenso artístico, social e político (FREIRE
FILHO, 2007). Na Inglaterra, há manifestações da contrapartida urbana da florescente
subcultura do Do It Youserlf, como o Reclaim The Streets, movimento anárquico de cunho
ecológico que ocupa coletivamente espaços públicos, colocando-se contra o automóvel como
meio de transporte principal na vida urbana. Colocados à margem da economia por décadas
de governo conservador e com poucos motivos para responder às políticas de centro-direita do
Novo Trabalhismo de Tony Blair, uma infraestrutura muito autoconfiante de cooperativas de
alimentos, ocupação ilegal de terras, mídia independente e festivais gratuitos de música surgiu
em todo o país. A ocorrência de festas espontâneas na rua, por exemplo, é uma extensão do
estilo de vida do “Faça Você Mesmo”, pois demonstra que as pessoas podem criar sua própria
diversão sem pedir permissão a nenhum Estado ou depender da generosidade de nenhuma
corporação (KLEIN, 2002). Ao contrário dos eventos anuais sancionados pelo Estado como
válvula de escape para as tensões sociais e a sensaboria cotidiana, os carnavais anticapitalistas
animados pelo Reclaim The Streets são claramente ilegais: um ato de desobediência civil. Sob
a ameaça constante da repressão policial, os participantes do movimento desenvolveram
estratégias inovadoras para as suas ocupações de ruas, cruzamentos ou trechos de rodovias.
Milhares de participantes são convocados (via internet ou panfletos) para se reunirem em
determinado lugar da cidade, de onde partem em massa para o local da manifestação,
conhecido apenas por alguns dos organizadores, onde o trânsito é bloqueado com uma
performance teatral ou uma marcha de bicicletas (FREIRE FILHO, 2007).
O underground não consegue transcender o individualismo que dilacera a sociedade
da qual os indivíduos estão tentando se distanciar. Entretanto, o prazer que os zineiros sentem
43
em controlar o produto de seu trabalho não é totalmente solipsista9. O fato de que zines são
um meio de comunicação garante a interação entre os indivíduos, reforçando algo que se
aproxima de uma norma comunitária implícita. A função “em rede” do underground e o
compromisso que os produtores individuais de zines têm de participar neste “subterrâneo”,
atenua um isolamento pessoal debilitante. Repletos de queixas sobre a distorção, por parte dos
meios de comunicação e de fundamentos para uma representação justa de queers10
, punks,
mulheres, geração X, fãs de futebol, entre outros, os zineiros, baseados nas tradições da
imprensa alternativa, almejam criar sua própria expressão e fabricar sua própria identidade
através das páginas de um zine. Zines, como expressões físicas de seus criadores, isto é, como
mídia impressa, transformam representação em apresentação. Os zineiros criticam o consumo
e os valores da sociedade de consumo, mas não abandonam o prazer trazido pelo ato de
consumir. Em vez disso, têm imenso prazer na própria prática de criticar a cultura de consumo
e produzir – assim como consumir – a sua própria cultura (DUNCOMBE, 1997, tradução
nossa).
3.3 A HISTÓRIA DOS FANZINES
É importante aprofundarmo-nos nas origens e na história dos fanzines para
compreendermos o que, de fato, são as publicações desenvolvidas pela subcultura zineira,
pois ambos, zineiros e zines, são analisados no presente trabalho. Para Muniz (2010), o termo
fanzine surgiu da aglutinação de fanatic (fã) e magazine (revista), tendo emergido na década
de 1930, nos Estados Unidos, remetendo às publicações de leitores de ficção que, não
podendo participar do mercado profissional, criavam, editavam e distribuíam por conta
própria suas próprias histórias. O primeiro fanzine publicado teria sido o The Comet, criado
em 1930, por Ray Palmer, para o Science Correspondance Club, seguido do The Planet,
publicado em junho do mesmo ano, editado por Allen Glasser para o The New York
Scienceers. Outro fanzine, dentre os pioneiros, foi o The Time Traveler, criado por Julius
9 “A base do conceito solipsista é a negação de tudo aquilo que esteja fora da experiência do indivíduo. Seria, no
caso, um ceticismo extremado. Tão extremo que a concepção do termo leva em conta, até mesmo, a inexistência
do mundo, caso não haja alguém para experimentá-lo. Dessa forma, a sustentação do solipsismo é o empirismo,
ou seja, a prática do indivíduo” (FILOSOFANDO, 2011).
10 “O Queercore é considerado um movimento musical e cultural que teve início em meados da década de 80 e
musicalmente protesta, grita, é pesado e “sujo” como o punk, mas gay em suas letras e atitudes: um braço do
estilo punk que resolveu caminhar pelas ruas gays da música” (SOARES, 2007).
44
Schwarts, em parceria com Mort Weisinger, futuro editor da DC Comics11
(MAGALHÃES,
2004).
Os fanzines são, muitas vezes, chamados apenas de “zines” no Brasil, embora em
lugares como os Estados Unidos e na Europa se evite o uso da partícula “fan” em publicações
que não têm o objetivo de ser uma publicação de fã, ou seja, em publicações autorais de que
acabam por não usarem a denominação de “fanzine”. Entretanto, no Brasil, os zineiros não
veem problemas quanto à essa denominação. Desse modo, no presente trabalho utilizamos os
termos “fanzine” e “zine” como sinônimos.
Para Guimarães (2005) o termo fanzine disseminou-se de tal forma que, atualmente,
engloba todo tipo de publicação que tenha caráter amador e seja feita sem intenção de lucro,
motivada pela simples paixão sobre o assunto enfocado. Assim, são fanzines as publicações
impressas que agregam textos diversos, histórias em quadrinhos do editor e dos leitores,
reprodução de histórias em quadrinhos (HQs) antigas, poesias, divulgação de bandas
independentes, contos, colagens, experimentações gráficas e tudo aquilo que o editor julgar
interessante para sua publicação. Embora, em sua definição do termo, Guimarães (2005)
afirme que os zines têm caráter amador, podemos visualizar muitos que apresentam caráter
profissional, com anúncios de lojas e assinaturas, como a Maximumrocknroll, por exemplo,
que tratamos a seguir.
Já na visão de Oliveira (2006), os fanzines são publicações geralmente feitas em
xerox, de pequenas tiragens, vendidas em lojas e distribuidoras especializadas e também pelos
próprios editores. As publicações podem ser adquiridas em pontos de encontro, via correio ou
em shows. Essas publicações se divulgam mutuamente, uma vez que, em quase todos os
fanzines, é possível encontrar endereços de outras publicações, inclusive de outros estados e
países. A variedade é vasta e difícil de ser classificada em estilos. Segundo Duncombe (1997),
existem algumas categorias como: ficção científica, música, fanzines pessoais, fanzines de
uma cena local (sobre uma cena musical ou literária), metazines (resenhas sobre outros),
quadrinhos, poesia, arte, fotografia etc.
Por não possuírem periodicidade, geralmente os zines são organizados de acordo com
o tempo de que cada zineiro dispõe, que os utilizam como forma de expressão individual ou
11
“A DC é uma editora dos EUA especializada na edição de histórias em quadrinhos, englobando também todos
os veículos referentes à crítica e divulgação deste gênero narrativo. Além disso, tem em sua posse os direitos
intelectuais de alguns dos mais renomados personagens das histórias em quadrinhos dos Estados Unidos. Entre
eles constam os heróis Superman, Batman, Mulher-Maravilha, Aquaman, e os grupos aos quais eles pertencem,
como Liga da Justiça da América, Novos Titãs, Patrulha do Destino, Legião dos Super-Heróis, e outros mais”
(SANTANA, 2013).
45
de um grupo: são roqueiros falando de sua banda, criticando ou elogiando demais bandas; são
jovens que ousam expor produções literárias ou, simplesmente, expressar seus conflitos,
desabafos e questionamentos. Outros zines têm como expressão os quadrinhos, repletos de
personagens inventados e jamais divulgados na mídia convencional (NASCIMENTO, 2010).
Para Mello (2010), a utilização de qualquer recurso que esteja relativamente disponível é uma
das forças evidentes na produção de fanzines quando o objetivo é proporcionar fluxo a uma
necessidade de expressão. Um recurso bastante utilizado nestas produções caseiras e
artesanais é a união de materiais escritos com materiais visuais de diversas origens, sem a
necessidade de respeitar princípios estéticos na diagramação.
Outras características importantes dos fanzines são interesses por assuntos estranhos
ao grande público, a utilização do humor ácido, a criação de narrativas surreais, e a
despreocupação com a autoria dos materiais empregados em sua composição.
Potencializa-se, assim, uma ação limítrofe que não leva em conta a obrigatoriedade
de respeito aos cânones da produção intelectual (MELLO, 2010, p. 29)
As revistas alternativas, na maioria das vezes, são editadas por determinado grupo de
artistas que têm como objetivo divulgar e discutir os trabalhos por eles produzidos. Os jornais,
mesmo que tenham um foco, abordam vários assuntos e contam normalmente com um
jornalista que assina como responsável pelo conteúdo publicado. Diferentemente dessas
mídias, os fanzines são produtos de um grupo de aficionados por determinado assunto (entre
os mais comuns estão o rock, até a metade da década de 1990, quando decai o número de
publicações do gênero com a chegada da internet, os quadrinhos e a poesia), desprovidos de
comprometimento jornalístico, representando outra forma de expressão e comunicação
impressa. A falta de recursos financeiros, que resulta na forma de produção artesanal, a
distribuição independente, a periodicidade irregular e a divulgação de trabalhos artísticos sem
muito espaço na grande mídia são comuns nessas publicações (DEFAVARI, 2008).
Nos fanzines, são experimentadas visões e formas de compreensão do mundo, que, às
vezes, não possuem espaço em outras mídias. Ser um zineiro não deixa de ser uma forma de
exprimir uma experiência, uma forma de potencializar maneiras de intervir e enxergar a
experiência de estar inserido no mundo. Ao escrever uma crítica, desenhar, enaltecer um tema
ou anunciar um horizonte expressivo, os zineiros dão vazão àquilo que está guardado em seus
íntimos e que tem pressa para se libertar, colocando, muitas vezes, em xeque verdades
46
instituídas e a própria vontade secretada por saberes hegemônicos que definem as estéticas
dominantes do que dizer e de como dizer a respeito do mundo (NASCIMENTO, 2010).
Foi graças ao acesso ao mimeógrafo, na década de 1970, e à popularização da
fotocópia, ocorrida na década de 1980, que a produção e circulação dos fanzines impressos
cresceu. Desde então, muitos catálogos e espécies de guias mostrando como produzir uma
publicação independente foram lançados na intenção de popularizar a produção. De fato,
muitos historiadores atribuem um crescimento do número de publicações a partir dos anos
1980 por causa da presença das máquinas fotocopiadoras, fato que permitiu a possibilidade de
uma publicação mais barata (SILVA, 2002). Por falta de recursos financeiros e tecnológicos,
no caso dos zines mais antigos, muitos tinham sua montagem concluída por meio de recortes,
seguidos de colagens, de textos e matérias. Pelo mesmo motivo, a reprodução era feita pelo
mimeógrafo, já que somente as mais estruturadas recorriam às gráficas (DEFAVARI, 2008).
Os zines são publicações vinculadas à imprensa alternativa (DEFAVARI, 2008) pois
são próprios dessa imprensa os trabalhos que não obedecem a um formato específico, não
apresentam periodicidade regular, usam a linguagem coloquial, apresentam produção
artesanal e que se valem de formas de divulgação diversas, tais como: via postal, pelas mãos
dos editores, distribuição gratuita em pontos específicos, trocas de colecionadores, assinantes
e fãs, e até a tradicional venda em bancas. Independentemente da posição que assumam em
relação a temáticas ou modos de comunicação, um posicionamento destaca-se na história
dessas práticas de linguagem intituladas fanzines: a liberdade de expressão (MUNIZ, 2010).
No Brasil, o primeiro fanzine de que se tem registro é o Ficção, criado por Edson
Rontani, em Piracicaba (SP), no ano de 1965. Na época, utilizava-se o termo “boletim” para
designar as publicações amadoras. O termo fanzine só começou a ser usado a partir de
meados da década de 1970. Nos anos seguintes a 1965, surgiram outras publicações, como:
Boletim do Clube do Gibi, Na Era dos Quadrinhos, Focalizando os Quadrinhos, Boletim do
Herói (que depois se chamou Boletim dos Quadrinhos) etc. Em 1970, em Porto Alegre, Oscar
Kern lançou a primeira fase de Historieta, que seria lançada como revista alternativa em
1980. Historieta teve uma edição distribuída em bancas em 1986 e voltou a ser fanzine na
década de 1990 (GUIMARÃES, 2005)
Apesar do amadorismo, da experimentação e da distribuição feita de mão em mão,
surgiram mudanças ocorridas no mundo dos zines. Primeiramente, houve uma explosão tanto
em termos de quantidade quanto de popularidade. Grandes distribuidoras e redes de lojas em
todo os Estados Unidos começaram a aceitar zines para venda e exposição em suas gôndolas
de revistas e jornais. Para os zineiros, foi uma chance espetacular de alcançar um público
47
maior, e, para outros, a oportunidade de conhecer a cultura underground. O lado negativo
deste “boom” é que os zines foram pressionados para se tornarem mais “profissionais” ou
mainstream, a fim de ganhar aceitação da massa (O‟HARA, 2005).
Desenhados em estilo profissional e compostos inteiramente de anúncios, resenhas e
entrevistas chatas, esses picaretas não demonstram a mesma criatividade e paixão
dos seus antecessores mais toscos. Além disso, livros sobre zines tornaram-se lugar-
comum, assim como livros em formato grande de zineiros compilando edições
antigas de zines fora de circulação (O‟HARA, 2005, p. 70-71)
Como veículos de opinião, os fanzines propagam as mais diversas linhas de
pensamento. Aqueles voltados para a contestação política e social, que se colocavam contra o
capitalismo e todo o sistema estabelecido, de modo geral, eram denominados de anarquistas.
O anarquismo pregado nos fanzines quase sempre servia apenas como veículo para o
extravasamento do protesto juvenil. As publicações vistas como anarquistas ficaram marcados
pela caótica programação visual, fazendo um apelo à radicalização estética contra as já
convencionais colagens de matérias das outras publicações. Entretanto, se, por um lado,
pecavam pela falta de consistência ideológica, por outro, mostraram seu empenho militante,
que era visto com desconfiança (MAGALHÃES, 2004).
A quase completa ausência de mercado profissional para os artistas brasileiros levou-
os a buscar o fanzine como forma de expressão (GUIMARÃES, 2005). A década de 1980 foi
o período em que os movimentos preservacionistas ganharam espaço na imprensa a nível
mundial e com eles, surgiram os fanzines voltados à ecologia. No Brasil, foram publicados os
zines Esperma de Baleia e Xeiro de Terra, do Rio de Janeiro, promovendo um debate poético
e militante. Temas inusitados e pouco enfocados pela imprensa convencional ganharam
espaço nas páginas das publicações. As rádios livres, que entraram no ar nas grandes cidades
brasileiras a partir de meados dos anos 1980, contaram com o fanzine Garrafa, de Poá (SP),
para sua difusão. Decadance, um fanzine também dirigido um tema pouco enfocado, a
questão homossexual, destacou-se pelo projeto gráfico bem elaborado e pela boa impressão,
além, claro, de seu conteúdo considerado polêmico. Finalmente, os esportes radicais também
tiveram seus fanzines, a exemplo do Pró-Skate, do SKT News e do Skatzine, todos do estado
de São Paulo, de acordo com Magalhães (2004).
Para editar um fanzine, o indivíduo precisa possuir a ânsia de expressar opiniões,
ideias e pensamentos e ter acesso a uma copiadora barata, pois, geralmente, as lojas não se
48
interessam por produtos com pequena margem de lucro e público irrisório, então são vendidos
principalmente pelo correio (O‟HARA, 2005). De acordo com Guimarães (2005), a extinção
de muitas publicações ocorre pela dificuldade de encontrar informações sobre a existência dos
fanzines, pelos custos sempre crescentes, pela renúncia ao lucro e pelo considerável trabalho
que é organizar novas edições de maneira sistemática.
3.4 PUNK E FANZINES
Com o crescimento das cenas punks em Nova York e Londres, em meados dos anos
1970, surgiram os fanzines. Os trabalhos que atingiram maior visibilidade foram o Sniffin’
Glue, da Inglaterra, e Punk, de Nova York. Como a maioria das publicações independentes,
esses também tiveram vida curta, pequena tiragem e estética amadora, se comparada ao
padrão das revistas profissionais e lustrosas (O‟HARA, 2005). Nesse período, milhares de
fanzines foram escritos manifestando o ponto de vista dos autores sobre o que é o punk, sua
política, sua música e sobre o objetivo dos autores ao se expressarem (O‟HARA, 2005).
Os zines não disseminaram apenas o movimento punk, serviram também como
grandes disseminadores de informações acerca de outros estilos musicais, como, por exemplo,
o heavy metal, que teve suas revistas especializadas como um prolongamento dos zines,
inspiradas nos punks dos anos 1970. As publicações zineiras costumavam circular entre os fãs
do gênero que tinham o propósito de falar sobre as bandas e seus lançamentos, sendo
instrumento que incitava a troca de fitas, fotos, discos e informações, como também ocorre no
cenário independente do punk e do hardcore.
O Brasil foi um dos países pioneiros na produção midiática metálica, com a revista
Rock Brigade. A publicação começou como um fanzine, em 1982, e evoluiu até
converter-se na “bíblia” dos headbangers nacionais, em 1985, quando ganhou status
de revista. Gradualmente passou a ter a companhia de outras publicações, incluindo
as já falecidas, Rock Hard, Metalhead e Valhalla, e as ainda ativas Roadie Crew e
Comando Rock (DHEIN, 2012, p. 122).
Os fanzines punks trouxeram ideias novas e contestadoras em relação à já desgastada
contracultura da década de 1960. Sua importância deve-se não só pelo fato de terem criado
uma onda irrefreável de novas publicações, mas também pelo fato de terem massificado o
termo fanzine, que ganhou popularidade e passou a denominar, de forma definitiva, os
boletins de fã-clubes ou grupos de fãs (GUIMARÃES, 2005).
49
A existência de uma imprensa alternativa punk demonstrou que não era apenas a roupa
ou a música que poderia ser imediatamente produzida e barateada a partir dos limites dos
recursos à mão. Nesse sentido, Hebdige (1979, p. 111) afirma que “os fanzines são revistas
editadas por um indivíduo ou um grupo, consistindo em comentários, editoriais e entrevistas
com punks proeminentes, produzidos em pequena escala, o mais barato possível, grampeadas
e distribuídas através de um pequeno número de lojas”).
Essa crescente produção de fanzines é resultado de uma diferenciação do movimento
punk em relação a outros movimentos: o punk dissolveu a produção de si em cada indivíduo
pertencente a este movimento. É interessante também destacarmos que o hardcore foi “berço”
para a formação de outras vertentes estético-políticas, como, por exemplo o grindcore, o raw
punk, o straight edge, o noisecore e o anarcopunk (FERNANDES, 2013).
3.4.1 Fanzines Punk e Sniffin’ Glue
Segundo Duncombe (1997, tradução nossa), o primeiro fanzine punk
(apropriadamente intitulado Punk) surgiu em Nova York no início de janeiro de 1976. Na
edição de estreia, o zine incluía dados sobre bandas, como o Ramones, e seus integrantes, o
proto-punk Lou Reed, além de uma entrevista fictícia, de histórias em quadrinhos e de uma
canção de protesto. As entrevistas presentes nas outras edições, estas, verídicas, começaram
bem, mas logo degeneram-se por causa da intoxicação do entrevistador e cofundador da Punk,
Leggs McNeil, que, certa vez, vomitou ao entrevistar Richard Hell, da banda Television. A
edição vendeu três mil edições locais e 25 mil edições no mundo todo. O zine foi editado por
quatro anos. Segundo McCain e McNeil (2004), Legs McNeil batizou o movimento punk com
este nome, em 1975, ao intitular o zine de música e cultura pop dos anos 1970 de punk.
Sete meses depois, em setembro de 1976, o jovem Mark Perry, bancário de 19 anos,
residente em South London, ao frequentar lojas de discos importados, comprou um disco do
Ramones. Perry ficou empolgado com o quão diferente era tanto a banda, quanto sua música.
Após procurar revistas em que pudesse ler críticas sobre esta e demais bandas e não encontrar,
os vendedores de uma filial da loja Rock On sugeriram irreverentemente que o próprio Perry
fizesse a sua “revista” e, assim, surgiu o famoso zine Sniffin’ Glue (EVERETT, 2013). Segue
um trecho do depoimento dado por Perry em entrevista:
50
Foi o que fiz. Consegui uma máquina de escrever, fiz toda a velha diagramação com
o marcador com ponta de feltro. „Now I wanna Sniff Some Glue” é minha música
favorita daquele álbum – e glue (cola) é também a droga mais punk, a que você
escolhe se não tem dinheiro. Estava tão de acordo com o que eu pensava sobre a
nova música (PERRY apud EVERETT, 2013, p. 92).
Na terceira edição do zine (figura 1), Perry sugeriu que seus leitores saíssem e
assistissem a todas as bandas punks que pudessem ver, pois se a demanda aumentasse, outras
pessoas passariam a se interessar em abrir espaços para shows. Segundo Oliveira (2006), na
edição de número quatro, a tiragem do zine já ultrapassava mais de mil cópias, e, na décima
edição, o zine já tinha atingido o âmbito internacional, com oito mil cópias em off-set e sendo
considerado a melhor publicação do momento, uma vez que refletia a realidade dos que a
confeccionavam e daqueles a quem se dirigia. A empresária do Ramones na época, Linda
Stein (apud EVERETT, 2013, p. 93), comentou sobre o cenário do surgimento dos zines na
época:
Deve ter havido por volta de vinte fanzines. Todo garoto tinha um fanzine. Nunca
havia existido fanzines antes. Decidi fazer uma coletiva com eles em nosso
apartamento em Gloucester Place, em Londres. Havia tanta gente bonita e
interessante. Os fanzines eram mimeografados. Alguns dos editores eram na verdade
muito brilhantes e academicamente astutos
Na quinta edição do Sniffin’ Glue, o zineiro Perry (apud BIVAR, 1982, p. 55)
direcionou-se novamente aos leitores: “Todos vocês, garotos que leem o Sniffin’ Glue, não se
satisfaçam com o que nós escrevemos. Saiam e comecem seus próprios fanzines, ou mandem
suas críticas para a imprensa do Sistema, vamos pegá-los pelos nervos e inundar o mercado
com a escrita punk!”. De acordo com Duncombe (1997), parte da missão dos fanzines de punk
rock, além de divulgar notícias e entrevistas sobre as bandas punks, era a de convencer seu
leitor a sair do comodismo e fazer sozinho seus próprios shows, fanzines, bandas etc.
Corajosamente ilustrando essa filosofia existia um zine britânico intitulado chamado
Sideburns, que apresentava impresso em sua capa um desenho com três acordes de guitarra,
seguido pelo mandamento: “Agora forme uma banda”.
51
Figura 1 - Terceira edição do Sniffin’ Glue.
Fonte: Masque of infamy (2013).
3.4.2 Fanzines Flipside e Maximumrocknroll
Depois do Sniffin’ Glue ter surgido na cena britânica, a febre do fanzine ganhou força
nos Estados Unidos, apresentando diversas bandas e seus seguidores. O fanzine Flipside
surgiu em Whittier, Califórnia, custando 25 centavos de dólar e apresentando um aspecto
grosseiro, uma visão autenticamente adolescente da cena punk e de seus fãs. Embora ainda se
concentrasse na cena local, o Flipside foi um dos primeiros a entrevistar punks de diferentes
lugares da Europa. Apesar de rapidamente virar uma revista de “música nova”, menos
interessada pelo punk, com o lema “be more than a witness” (seja mais do que uma
testemunha), o zine mostrou ao mundo que qualquer um poderia e deveria fazer suas
publicações por conta própria (O‟HARA, 2005).
Com uma perspectiva diferente do Flipside e inserindo mais política e cenas diferentes
em suas publicações, surgiu o Maximumrocknroll (figura 2), em São Francisco, proveniente
de um próspero programa de rádio com o mesmo nome, em meados de 1982. Com foco muito
52
mais abrangente que apenas o cenário da Califórnia, o zine publicava scene reports escritos
por leitores de toda parte do mundo. Ao divulgar anúncios, bandas e endereços para leitores
de todos os lugares da América do Sul, do Japão, da Europa (oriental e ocidental) e até da
União Soviética, a Maximumrocknroll ajudou a montar uma comunidade punk mundial de
verdade (O‟HARA, 2005 p. 67). Na edição de junho de 1994, o zine listou noventa e sete
indivíduos como contribuintes. Mais da metade dessas pessoas eram chamadas de
shitworkers, uma categoria que não costuma colaborar em manchetes de revistas renomadas.
No entanto, a Maximumrocknroll é conhecida até hoje por sua grande produção e
organização, por sua complexidade e por sua eficiência. Diferentemente de qualquer
publicação comercial, grande ou pequena, a Maximumrocknroll não possui fins lucrativos
(DUNCOMBE, 1997, tradução nossa). Embora Duncombe afirme isso, acreditamos ser
questionável o caráter sem fins lucrativos, uma vez que, embora a Maximumrocknroll seja um
zine, também funciona como uma revista, encaixando-se nas duas funções, inclusive com
assinaturas e vendas de produtos.
A Maximumrocknroll recebe críticas por promover políticas específicas, mas as
críticas legítimas vêm daqueles que acreditam que o fanzine exerce muito poder sobre a cena
punk mundial. Muitos punks dependem da Maximumrocknroll para serem informados quanto
a quem apoiar ou boicotar, uma vez que esse zine publica boas resenhas de discos e fanzines
de seus colaboradores voluntários, garantindo boas vendas (O‟HARA, 2005). O‟Hara (2005)
concorda com parte das opiniões editoriais desse zine, embora acredite que seu poder recém-
descoberto seja extremamente influente sobre os punks mais jovens, muitas vezes, levando-o
a abusar deste empoderamento.
Ainda que os zines Flipside e Maximumrocknroll não tenham sido os únicos lidos em
toda a América do Norte e Europa, foram, certamente, os mais influentes. Não serviram
apenas para repercutir as atitudes e os atos da cena punk, mas também para determinar o seu
curso: cada país europeu passou a ter sua própria coleção de zines, grandes e pequenos, apesar
de a maior parte ser escrita na língua do país e cobrir a cena local. Milhares de diferentes
publicações foram produzidas nos últimos vinte anos, entretanto, Flipside e
Maximumrocknroll são usados como as principais fontes de disponibilidade e aceitação que
têm tido na cena punk (O‟HARA, 2005).
53
Figura 2 - Primeira edição da Maximumrocknroll em 1982.
Fonte: Degen Erik (2011).
3.4.3 Fanzines punks no Brasil
De acordo com Gallo (2010), o punk surgiu no Brasil por volta de 1977, na cidade de
São Paulo e no ABC paulista. Logo depois, tomou vulto também nos estados do Rio de
Janeiro, Salvador, Recife, Rio Grande do Sul, Paraná e no Distrito Federal. A disseminação
do punk para diversos países pronunciou-se de forma mais marcante a partir dos anos 1980,
coincidindo com o momento da autorreflexão a respeito dos parâmetros que norteariam o
punk e a sua crítica social desgastada pela mídia e pela moda. Segundo aponta Fernandes
(2013), é neste momento que revistas de música como a Pop, a Música e a Somtrê, jornais,
como a Folha de São Paulo, e a revista Veja ao publicarem matérias com imagens de sangue
ou modelos que desfilavam nas passarelas com a dita, na época, “tendência punk
apresentavam uma construção discursiva do punk ligado à moda ou à violência.
54
No Brasil, a corrente mais crítica do punk entrou em confronto com a ditadura, o que
acarretou perseguições policiais, censura, interrompimento do fluxo natural das produções,
além da criminalização pela imprensa e pela mídia. Para Bivar (1982), as primeiras bandas
punks datam de 1978 e tinham nomes como AI5, Condutores de Cadáver e Restos de Nada.
Em 1982, quando a imprensa local e nacional tomou ciência do ressurgimento do movimento,
mais de 20 bandas já estavam apresentando-se em shows periféricos, e outras bandas, embora
ainda em processo de formação, já divulgavam seus nomes: Olho Seco, Cólera, Fogo
Cruzado, Lixomania, Mack, Suburbanos, Ratos de Poerão, Ulster, Guerrilha Urbana, Juízo
Final, Psykose (compostas exclusivamente por integrantes homens), Skizitas e Zona X
(compostas apenas por mulheres). Além disso, havia dezenas de gangs suburbanas. A partir
dos nomes desses grupos, podemos ter uma ideia do humor, da mensagem e da agressividade
do punk paulistano.
Os primeiros fanzines punks surgiram no Brasil na cidade de São Paulo, em 1981, e, a
seguir, nas cidades próximas e no interior do estado. Na década de 1960, o termo ainda
designava publicações underground. Na década seguinte, muitas dessas publicações foram
feitas principalmente por punks vinculados a bandas. Em um primeiro momento, esses punks
visavam socializar e divulgar informações da banda, e aos poucos, foram progressivamente
atingindo um público cada vez mais amplo e diversificado (OLIVEIRA, 2006) De acordo
com Milani (2010), os zines punks no país estabeleceram-se também como um dos principais
meios de os punks divulgarem saberes referentes a si mesmos, em face do que era veiculado a
respeito deles pela mídia comercial.
Para Gallo (2010), as primeiras publicações brasileiras já traziam, em 1981, muitos
folhetos de bandas que contam sobre sua história, sua formação, seus shows, seus discos e
suas fitas. Assim, foi possível resgatar esse período anterior ao próprio surgimento do fanzine,
que já faz parte da evolução e do amadurecimento do movimento punk, uma vez que os zines
surgem para transmitir e socializar informações, muitas das quais estavam sendo deturpadas
ou omitidas pela grande imprensa que influenciava os iniciantes. Faz-se necessário também
pontuar que o movimento, apesar da afirmação dos punks de serem a expressão da realidade
brasileira, são fortemente influenciados pela grande mídia, através de informações sobre o que
acontecia no exterior. Isto é, antes do desenvolvimento de uma cultura própria, há um
processo de cópia. Na obra Mulheres do Rock: o rock do DF e do entorno sob o ponto de
vista feminino, encontramos um depoimento de Alice (integrante das bandas Silente, Toda
Dor do Mundo e Gulag), no qual ela relata seu contato com os zines punks no Brasil:
55
Pois bem, mas com essa coisa de fazer zine eu fui aprendendo aos poucos o que é o
famoso fvm ou faça-você-mesma. Essa foi uma das coisas que me apaixonaram no
hardcore/punk: você tem uma idéia na cabeça? Faça um zine! Não existe uma voz
privilegiada, ou uma divisão rígida entre quem produz conhecimento ou música e
quem “consome” (acho até que em muitos casos o termo consumir não se aplica, ou
não deveria se aplicar, já que a idéia é que todas nós somos um pedaço da cena) há,
pelo menos teoricamente, espaço para a dissonância. As macacas e macacos peladxs
(um jeito bem mais massa de chamar a gente, bem mais massa do que „seres
humanos‟) tem espaço suficiente para montar suas bandas, aprender a tocar e se
divertir (ALICE, 2010, p. 15).
De acordo com Oliveira (2006), os primeiros fanzines punks do Brasil, publicados em
1981, foram o Factor Zero, de São Paulo, e o Exterminação, de São Bernardo do Campo, que
era confeccionado por Wlade, integrante da banda Ulser. Já para Guimarães (2005), o
primeiro fanzine punk do Brasil foi o Manifesto Punk, zine editado por Tatu, da banda
Coquetel Molotov. A publicação abordava as bandas cariocas, paulistas e de todo o mundo.
Mesmo com pouca divulgação, outros fanzines punks surgiram, como o Descarga Suburbana,
Lixo Reciclado, Revolução Punk, Vitória Punk e Horizonte Negro, que eram ligados a grupos
de música punk de garagem e propagavam ideias anarquistas.
Desde o surgimento dos primeiros fanzines, os punks manifestam uma posição
contrária à restrição de sua produção somente ao público punk. Assim, os fanzines, bem como
os shows, são alguns dos instrumentos que foram usados também no Brasil para trazer novas
pessoas para o movimento (OLIVEIRA, 2006). Os punks estavam envoltos em uma série de
questões de gênero, de ideologia e de classe, que se manifestavam em discussões presentes
nos fanzines. Tais questões não eram mais do que manifestações de relações de poder, pois
eram ao mesmo tempo exercício e resistência dessas relações (MILANI, 2010).
A possibilidade de que qualquer um confeccionasse seu próprio fanzine impediu que
essa rede “subterrânea” estabelecesse um local privilegiado de produção de saberes, de modo
que os skinheads, por exemplo, ao mesmo tempo em que eram duramente condenados por
alguns fanzines, eram aceitos por outros e possuíam até suas próprias publicações. Da mesma
forma, os discursos machistas, muito presentes nos fanzines, especialmente através de
anedotas e imagens pornográficas, foram progressivamente sendo combatidos, inclusive com
trabalhos dedicados exclusivamente à disseminação de saberes advindos de movimentos
feministas. Tudo o que era apresentado em um fanzine poderia ser questionado em outro com
a mesma veemência (MILANI, 2010).
O „boom’ do movimento punk em São Paulo aconteceu em 1982, quando houve o
aumento do número de publicações alternativas publicadas, assim como do número de bandas
56
– as que já existiam anteriormente adquiriram experiência suficiente para promover mais
shows, e, consequentemente, o público acabou por se conscientizar cada vez mais sobre o
punk. Os fanzines surgiram para resolver o problema da falta de informação sobre o
movimento, principalmente porque as revistas importadas, além de serem de alto custo, eram
carentes sobre o assunto (OLIVEIRA, 2006).
Em 1983, devido à constante associação do movimento punk à violência, os shows,
muitas vezes, eram cancelados e, segundo os próprios relatos encontrados nos fanzines, havia
um desinteresse pelo movimento. Por causa dessa dificuldade, os punks começaram a pensar
em mais locais para shows, ensaios e palestras. Aprofundaram, também, em suas publicações,
a reflexão sobre anarquismo, ecologia e energia nuclear. Já em 1984 os fanzines refletiam, de
forma bastante crítica, a situação do Brasil, que se encontrava endividado, com hiperinflação
e com o povo subnutrido. No ano das Diretas Já os punks estavam atentos e participativos:
desde 1982 os zines tratam de temas políticos (como candidatos e suas propostas)
demonstrando uma conscientização de jovens não alienados, que apresentavam uma visão
particular do assunto. Os fanzines passaram, então, a enfocar mais o cotidiano não só dos
punks, que agora demonstravam amadurecimento, dada a maior consciência e ação política
organizada, como também da sociedade como um todo (OLIVEIRA, 2006).
57
4 SUBCULTURAS
4.1 CLASSE E CAPITAL CULTURAL
Para realizarmos a análise de conteúdo dos zines impressos e o estudo de caso acerca
dos zineiros, observando quais temáticas são mais recorrentes nos fanzines e como elas são
perpassadas pelo capital subcultural e por questões de classe, faz-se necessário definir tais
conceitos, o que fazemos no decorrer deste capítulo. Também apontamos contrastes entre o
que é definido como sendo contracultura e subcultura, bem como apresentamos um pouco da
história das subculturas, incluindo chegar o punk e o hardcore, cenários em que nossos
entrevistados zineiros encontram-se imersos de algum modo. Primeiramente, explicamos o
capital cultural proposto por Bourdieu, que serviu como base para conceber a teoria do capital
subcultural elaborada por Thornton (1995).
As classes sociais podem ser primariamente entendidas como agrupamentos
econômicos, embora os fatores que servem para identificar uma classe possam ser postos em
discussão. Na tradição marxista, as classes são definidas em relação à posse da riqueza
produtiva, enquanto outras tradições levam em consideração diferenças entre renda ou
ocupação. As divisões de classe são tipicamente vistas como fundamentais para a
estratificação da sociedade e podem ser associadas a diferenças de poder e cultura.
As classes não são entendidas como agregados de indivíduos em que a análise
poderia estar preocupada em classificar algum atributo comum compartilhado por
esses indivíduos. Em vez disso, as classes são compreendidas como entidades
sociais que têm uma realidade independente dos indivíduos que as formam. Desse
modo, a classe pode ser um fator causal decisivo para explicar a constituição do
sujeito humano individual (EDGARD; SEDGWICK, 2003, p. 59).
De acordo com Hall e Jefferson (1976), a cultura refere-se ao nível no qual grupos
sociais desenvolvem padrões de vida distintos e expressam sua experiência de vida social e
material. A cultura de um grupo ou classe é o seu modo de vida peculiar e distinto, do qual
fazem parte os significados, os valores e as ideias incorporadas pelas instituições em relações
sociais, nos sistemas de crenças, nas morais e nos costumes, nos usos dos objetos e da vida
material. As classes dominantes e subordinadas têm culturas diferentes. No entanto, quando
uma cultura ascende em relação à outra e a cultura subordinada experiencia a si mesma em
58
termos prescritos pela cultura dominante, esta última também se torna base de uma ideologia
dominante.
Para explicar os trabalhos do sistema educacional em uma sociedade capitalista dividia
em classes, Pierre Bourdieu estabeleceu uma analogia quanto ao acesso de um indivíduo aos
recursos culturais. Conforme o autor, se crianças tiverem diferentes níveis de competências
culturais (incluindo informações e habilidade), adquiridas, o sistema educacional não irá fazer
discriminações em favor da criança da classe dominante. Em vez disso, todas as crianças
serão avaliadas “imparcialmente” no que diz respeito a suas habilidades de execução de
acordo com os mesmos critérios de excelência. Esses critérios serão derivados da cultura
dominante. As crianças da classe dominante desenvolverão melhor as habilidades na escola,
satisfazendo os interesses (com relação ao “poder simbólico”) do investimento de seus pais no
chamado “capital culturais” (EDGARD; SEDGWICK, 2003)
De acordo com Silva (1995), o capital cultural é uma expressão cunhada e utilizada
por Bourdieu para analisar situações de classe na sociedade. Com efeito, uma grande parte da
obra de Bourdieu é dedicada à descrição minuciosa da cultura, em um sentido amplo que
engloba gostos, estilos, valores, estruturas psicológicas etc., a qual decorre das condições de
vida específicas das diferentes classes e molda suas características, contribuindo para
distinguir, por exemplo, a burguesia tradicional da nova pequena burguesia e esta da classe
trabalhadora. Entretanto, o capital cultural é tido como um recurso de poder que equivale e se
destaca (tanto no sentido de separação quanto no de ter relevância especial) de outros
recursos, especialmente e tendo como referência básica, os recursos econômicos. Daí o termo
capital associado ao termo cultura: é uma analogia ao poder e ao aspecto utilitário relacionado
à posse de determinadas informações, aos gostos e as atividades culturais.
Além do capital cultural existem as outras formas básicas de capital: o capital
econômico, o capital social (os contatos) e o capital simbólico (o prestígio), que, juntos,
formam as classes sociais ou o espaço multidimensional das formas de poder.
Inicialmente, podemos identificar a existência de uma forma incorporada de capital
cultural, que o indivíduo “cultiva” no decorrer de sua formação, associada à idéia de
Cultura em seu sentido mais elementar, e ao mesmo tempo mais distintivo: ser culto
implica investimento, não propriamente de dinheiro, mas de tempo – tempo
necessário para se construir o repertório desejado ou exigido por certas
circunstâncias. Por estar tão sobremaneira vinculado ao indivíduo, pensado aqui
como ser biológico, o capital cultural acumulado não pode ser transmitido
instantaneamente, como presente, doação, herança ou “moeda de troca”. Bens
culturais agregam valor simbólico, e embora possam ser vendidos ou passados
adiante, isso em nenhuma medida garante a transmissão do “modo correto” de
apreciá-los, e são os modos de consumo de determinados bens culturais que vão
endossar o capital cultural acumulado (BOURDIEU apud MONTEIRO, 2008).
59
O conceito de capital cultural desempenha um papel-chave na análise de classes.
Posições definidas objetivamente são diferenciadas uma das outras por características
culturais, as quais funcionam como fatores “objetivos” na produção e na reprodução das
estruturas de classe. Esta teoria de classes não reconhece apenas uma forma cognitiva
instrumental de expressar a estrutura de classe, isto é, a ocupação determinando direitos e
vantagens materiais na sociedade, ela também reconhece a forma cultural de expressão: o
conhecimento e a educação adquiridos ao se ter uma ocupação (EDER, 2002). O conceito em
questão fundamentava-se na hipótese de este novo tipo de capital funcionar como uma espécie
de “retradução” do capital econômico em hierarquias culturais, nas sociedades em que o
poder e os privilégios não se traduziam mais pelas propriedades e pelos títulos de nobreza
(BRANDÃO; MARTINEZ, 2006)
Um capital cultural é adotado em ocupações que ultrapassam os requisitos clássicos de
uma posição de classe (capital econômico), que não pode mais ser relacionada simplesmente
ao conceito de “posse de trabalho bruto”, visto que o trabalho é cada vez mais determinado
por definições culturais.
O treinamento adquirido em processos de aprendizagem na escola e no trabalho
assim como elementos do capital social (tais como relações sociais e contatos ou
domínios de formas de comportamento) são a chave para uma construção estatística
da estrutura de classe a partir de estatísticas ocupacionais (EDER, 2002, p. 119).
A existência do capital cultural pode se dar em três formas: no estado incorporado,
isto é, sob a forma de disposições duráveis do organismo (por exemplo, a prática de um
instrumento musical); no estado objetivado, sob a forma de bens culturais (como quadros,
livros, CDs, DVDs, discos, dicionários, instrumentos, máquinas, que constituem indícios ou a
realização de teorias ou de críticas dessas teorias, de problemáticas etc.); e, por fim, no estado
institucionalizado, forma de objetivação que é preciso colocar à parte porque, como se
observa em relação ao certificado escolar, ela confere ao capital cultural, de que é,
supostamente, a garantia, propriedades inteiramente originais (NOGUEIRA; CATANI, 1999).
Segundo Ortiz (1983), a relação, por exemplo, que os membros das classes populares
mantêm com a cultura dominante, não só literária ou artística, mas também científica, não é
tão diferente da que mantêm com seu universo de trabalho. Excluídos da propriedade dos
instrumentos de produção, eles são também desapossados dos instrumentos de apropriação
simbólica das máquinas a que servem, não possuindo o capital cultural incorporado, que é a
60
condição de apropriação conforme (ao menos na definição legítima) do capital cultural
objetivado nos objetos técnicos. É sob a forma da oposição entre a competência (saber, que
implica um poder) e a incompetência, entre o domínio prático e o domínio teórico, entre o
conhecimento dos princípios e o dos discursos de acompanhamento, que eles sentem
concretamente seu desapossamento. Dominados pelas máquinas a que servem e por aqueles
que detêm os meios legítimos, isto é, teóricos, de dominá-los, os membros das classes
populares reencontram a cultura como um princípio de ordem que não tem necessidade de
desmontar sua utilidade prática para ser justificado.
A obra de arte deve, sem dúvida, boa parte de sua legitimidade ao fato de que a
experiência que dela podem ter aqueles que estão desprovidos de saberes inúteis dos
quais ela é solidária nada mais é do que o limite de uma experiência mais
fundamental e mais ordinária: a do corte entre os saberes práticos, parciais e tácitos e
os conhecimentos teóricos, sistemáticos e explícitos (que tende a reproduzir-se até o
terreno do político), entre a ciência e a técnica, entre a “concepção” e a “execução”,
entre o “criador”, que dá seu nome à obra “original” e “pessoal” e se atribui, assim, a
propriedade e o operário sem qualificação, simples servidor de uma intenção que o
ultrapassa, executor desapossado do pensamento de sua prática (ORTIZ, 1983, p.
20).
Sendo assim, ouvir estações de rádio mais “eruditas” e as transmissões musicais ou
culturais, possuir uma eletrola, ouvir discos, frequentar museus e apresentar habilidades para
pintura, por exemplo, são traços que têm forte correlação entre si, são estritamente funções do
capital cultural que hierarquizam brutalmente as diferentes classes e frações de classe.
Aqueles que têm acesso a esse capital cultural, a essas informações, terão maior valor, mais
“distinção” perante a sociedade, assim como acesso facilitado a outros recursos escassos.
Uma das características consideradas típicas do grupo dominante é que este consegue
legitimar-se e legitimar sua cultura como a melhor, como aquela que tem valor simbólico.
Também a classe dominante teria o poder de delimitar as informações que serão ou não
incluídas no conjunto das informações legítimas:
Os objetos dotados do mais elevado poder distintivo são aqueles que dão melhor
testemunho da qualidade da apropriação, portanto, da qualidade do proprietário,
porque sua apropriação exige tempo ou capacidades que, supondo um longo
investimento de tempo, como a cultura pictórica ou musical, não podem ser
adquiridas à pressa ou por procuração; portanto, aparecem como os testemunhos
mais seguros da qualidade intrínseca da pessoa. Por isso, explica-se o espaço
reservado pela procura da distinção a todas as práticas que, à semelhança do
consumo artístico, exigem uma despera pura, sem qualquer retorno, assim como à
coisa, sem dúvida, mais preciosa e rara, ou seja, o tempo, tempo consagrado ao
consumo ou à aquisição da cultura pressuposta no caso de consumo adequado
(BOURDIEU, 2008, p. 263).
61
Como coloca Thornton (1995, tradução nossa), Bourdieu escreve extensivamente
sobre o que ele chama de capital cultural ou conhecimento que é acumulado por meio de
educação, a qual confere status social àqueles que a detêm. O capital cultural é o elemento
central de um sistema de distinção em que as hierarquias culturais correspondem a hierarquias
sociais e os gostos das pessoas que são predominantemente a uma marca de classe. Por
exemplo, na Grã-Bretanha, o sotaque tem sido um indicador-chave do capital subcultural e os
diplomas universitários têm sido o capital cultural institucionalizado. Entretanto, o capital
cultural é diferente do capital econômico. O indivíduo pode ter alto capital cultural e capital
econômico, mas os dois também podem entrar em conflito. Comentários sobre o “novos
ricos” divulgam os possíveis atritos entre sujeitos ricos em capital cultural, mas relativamente
pobres em capital econômico (como artistas ou acadêmicos), e os ricos em capital econômico,
porém menos ricos em capital cultural (como executivos de negócios e os jogadores de
futebol profissional).
4.2 CLASSE E CAPITAL SUBCULTURAL
4.2.1 Capital Subcultural
Além dos três principais tipos de capital (cultural econômico e social), Bourdieu
(2008) elabora muitas subcategorias de capital que se inserem nessas áreas específicas, como
o linguístico, o acadêmico, o intelectual, o informacional e o artístico. Uma característica que
unifica esses capitais é que todos eles estão em jogo dentro do próprio campo de Bourdieu,
dentro de seu mundo social de jogadores com altos volumes de capital cultural
institucionalizado. No entanto, é possível observar uma “subespécie” do capital operando em
domínios menos privilegiados. Ao pensar sobre teorias do autor em relação ao terreno da
cultura jovem, Thornton (1995) concebe o capital subcultural.
O capital subcultural pode ser objetivado ou incorporado, conferindo status e afetando
a posição dos jovens, bem como do seu equivalente como adulto. Ao passo que o capital
cultural se refere ao conhecimento de música erudita, quadros, dicionários, livros, pinturas,
instrumentos, o subcultural refere-se a cortes de cabelo, à aparência, bem como aos bens
culturais adquiridos, como coleções de discos (como edições limitadas, doze polegadas, white
label) e CDs. São comportamentos e estilos que manifestam, conforme Thornton (1995),
autenticidade, diferença, singularidade e sofisticação, e que são recompensados com
62
reconhecimento, admiração e prestígio dentro de uma subcultura. O capital subcultural
também difere do cultural porque considera a mídia um fator pertinente para entender as
distinções culturais juvenis por meio de seu consumo de mídia. Para a autora, é impossível
compreender essas diferenças sem alguma investigação sistemática do consumo midiático:
muito mais do que apenas outro bem simbólico, a mídia é entendida como uma rede crucial
para a definição e distribuição de conhecimento cultural.
A cobertura negativa da mídia de massa sobre subcultura não age como um
mecanismo de difusão, pelo contrário, pode ajudar a tornar a subcultura subversiva e
aumentar a sua longevidade. A mídia de nicho, como a imprensa musical e as revistas de
moda, são, muitas vezes, compostas por pessoas que foram ou são os próprios membros de
subculturas. Tais meios contribuem ativamente para compor e estruturar as entidades
subculturais estáveis de movimentos reais, no entanto, com nebulosos fragmentos culturais. Já
as micromídias (como fanzines, cartazes e panfletos) também são parte integrante do processo
de criação de redes dos indivíduos, uma multidão com um propósito específico e imbuída de
uma identidade particular. Além disso, em uma inversão irônica de ideologias subculturais, os
meios de comunicação sensacionalistas podem, muitas vezes, ser superiores em relação a
certas micromídias em sua cobertura de novos desenvolvimentos na arena subcultural
(MUGGLETON, 2000, tradução nossa)
Thornton (1995, p. 12) argumenta que o que define o capital cultural como capital é a
sua “convertibilidade” em capital econômico, ao passo que o capital subcultural não poderá
ser convertido em capital econômico com a mesma facilidade ou “recompensa” financeira que
o cultural. Há uma variedade de ocupações que podem ser obtidas pelo subcultural, como DJs,
organizadores de boates, designers, jornalistas musicais e de moda e outros diversos
profissionais da indústria fonográfica, que ganham a vida a partir de seu capital subcultural.
Sobre questões de classe, a autora acredita que, embora se converta em capital econômico, o
capital subcultural não é tão vinculado à classe com o capital cultural. Isso não significa que a
classe seja irrelevante, a autora apenas não acredita que o econômico se correlaciona com
qualquer forma aos níveis de capital subcultural juvenil. Exemplo disso são os clubbers12
, que
12
“Os clubbers surgiram em conseqüência do panorama da música de dança e do chamado clubbing, que mais
não é do que a freqüência assídua a determinadas casas noturnas (clubs, ou discotecas) onde domina a música de
estilo house, techno, trance, e drum n´ bass, quatro gêneros de música eletrônica.A formação das tribos de
clubbers e ravers tem como referencial comum o gosto pela música eletrônica, que corresponde, para estes
agrupamentos, a um conjunto de manifestações associadas a esta música (e-music), como estilos de vestuário,
moda em geral, culto ao DJ, cultura gay, uso underground de tecnologias contemporâneas (webzines, sites, listas
de discussão, chats), festas ravers em clubs, cibercultura e o caracter hedonista da busca do prazer coletivo
através da música, do uso de drogas, do prazer aqui e agora” (CHIES, [200-?]).
63
foram pesquisados por Thornton (1995, tradução nossa) em seu livro Club Cultures: “na
verdade, a classe é deliberadamente ofuscada por distinções subculturais. Por exemplo, não é
incomum para os jovens (clubbers) que são público de escolas elitizadas adotarem gírias ou
sotaques da classe trabalhadora durante seus anos de festas em boates”.
O capital subcultural, portanto, é abastecido por uma “revolta”, uma “fuga” das
armadilhas da classe pertencente aos país. Para a autora, a distinção subcultural dependente,
em parte, de uma fantasiosa ausência de classes.
Esta pode ser uma das razões pelo qual a música é a forma cultural privilegiada
dentro do mundo subcultural juvenil. A idade é o grupo demográfico mais
significativo quando se trata de gosto musical, na medida em que a reprodução de
música na família é a fonte mais comum de conflito de gerações. Em contraste, a
relação entre classe e bom gosto musical é muito mais difícil de traçar
(THORNTON, 1995, p.12).
4.2.2 Contracultura x Subcultura
De acordo com Pereira (1992), o conceito de contracultura pode referir-se ao conjunto
de movimentos de rebelião da juventude que marcaram os anos 1960: o movimento hippie, a
música rock, certa movimentação nas universidades, as viagens de mochila, as drogas, o
orientalismo etc., que são levados à frente com forte espírito de contestação, de insatisfação,
de experiência, de busca de uma outra realidade, um outro modo de vida. “O movimento
hippie dos anos 1970 aprofundou uma crítica no sentido da contracultura clamando pela paz e
pelo amor, enquanto cobrava da humanidade o restabelecimento dos laços entre homem e
natureza, inexistentes nas sociedades modernas” (GALLO, 2010, p. 4).
O termo contracultura foi cunhado em grande parte como resposta ao surgimento de
movimentos da classe média jovem, para se referir a grupos que questionavam os valores da
cultura dominante, como os hippies. Centrada na oposição à Guerra do Vietnã, a contracultura
hippie também mostrou sua insatisfação com os valores e objetivos do capitalismo, como o
consumismo, com o trabalho ético e com a dependência da tecnologia.
Em seus primórdios, a religião cristã foi uma contracultura, em oposição às culturas
dominantes judaica e romana. No primeiro período do capitalismo britânico, os quakers e os
metodistas representaram contraculturas em oposição aos valores dominantes do anglicanismo
(EDGARD; SEDGWICK, 2003). De acordo com Abramo (1994), o saldo dos anos 1960 teria
sido o desenvolvimento da consciência ecológica, a aspiração a um novo equilíbrio entre
64
homem e natureza, a uma nova relação entre os gêneros, a uma nova concepção de família, a
uma liberalização da moral e dos costumes e a uma nova relação com o lazer e com o prazer.
O fenômeno contracultural também pode ser empregado em outro sentido, referindo-
se a algo mais geral, abstrato, certo espírito ou modo de contestação, de enfrentamento diante
da ordem vigente, de caráter profundamente radical e bastante estranho a formas mais
tradicionais de oposição a ordem dominante. Esse fenômeno apresenta-se como um tipo de
crítica anárquica que, de certa maneira, “rompe com as regras do jogo”, em termos de modo
de se fazer oposição a uma determinada situação (PEREIRA, 1992, p. 21). Para Edgard e
Sedgwick (2003), o conceito de contracultura pode ser estendido aos valores, às crenças e às
atitudes de qualquer grupo de minorias que se oponha à cultura dominante, mas que, de modo
mais preciso, o façam de maneira relativamente articulada e reflexiva.
A denominação contracultura, então, implica o estabelecimento de uma série de
práticas sociais que, gerando produtos culturais e todo tipo de bens simbólicos, contrapõe-se
às práticas determinadas pela cultura de consumo e pela massificação imposta como requisito
para seu funcionamento. O underground, por exemplo, localiza-se nessa oposição; está “em
baixo”, “no subterrâneo”, oculto, enfim, em relação à visibilidade massificada dos produtos
da cultura dominante (KEMP, 1993, p. 16).
O rock, a partir dos anos 1960, também ser citado como exemplo da transição de um
estilo transgressor da moral vigente, movido pelo impulso de uma contracultura, que foi, aos
poucos sendo, tolerado e acomodado no interior da indústria cultural e na vida cotidiana como
algo inofensivo ou como uma solução rebelde e restrita de um grupo de músicos e seu séquito
de fãs (RONSINI, 2007). Segundo Bivar (1982), desde o seu começo, em meados dos anos
1950, o rock vem causando impactos, choques, modas, comportamentos, estilos, políticas,
revoluções, ideias, entretenimentos, contando, sempre, com a energia dos jovens.
Como um todo, o rock tem sido apenas uma outra parte da indústria do
entretenimento em constante crescimento. O rock‟n‟roll antigo falava vagamente das
barreiras que a política, de uma maneira distinta, foi enfocada por ele. Foi nessa
época que o rock mostrou seu poder e a subcultura se tornou uma contracultura
(O‟HARA, 2005, p. 30).
Após os anos 1970, a contracultura perdeu sua força e vigor. Desapareceu a ideia de
uma “revolução juvenil”, da reinvenção do mundo sobre outros princípios, levantados pela
vontade de prazer e beleza, de paz e amor, do investimento utópico de uma juventude
preocupada em transformar o mundo. “O sonho acabou”: os analistas que se referem aos
65
jovens dos anos 1980 repetem as palavras de John Lennon, pronunciadas vinte anos antes
(ABRAMO, 1994).
Já as chamadas subculturas referem-se aos valores, às crenças, às atitudes e aos estilos
de vida de uma minoria (ou “sub-”) dentro da sociedade. A cultura dessa minoria divergirá
daquela do grupo dominante. Embora seja, atualmente, associada em grande parte às culturas
de pessoas jovens (mods, roqueiros, skinheads, punks), também podem ser aplicadas a grupos
étnicos, de gênero e sexuais. Grande parte do conceito subcultural foi desenvolvido pela
sociologia do desvio, referindo-se, por exemplo, à cultura de delinquentes, criminosos e
usuários de drogas.
Uma explicação inicial do comportamento dos delinquentes da classe trabalhadora
de seus pais – como dureza e masculinidade, malandragem contra o risco de ser
enganado, correr riscos – e que, com essa superconformação, vinham violar as
normas dominantes da cultura de classe média (EDGARD; SEDWICK, 2003, p.
323)
Enquanto o velho conceito de cultura jovem tende a aceitar uma cultura única e
homogênea entre os jovens, a visão subcultural destaca a fragmentação dessa cultura,
especialmente entre as linhas de classe. Assim como acontece com o conceito de
contracultura, a subcultura tende a pressupor alguma forma de resistência à cultura
dominante. Entretanto, a contracultura refere-se, mais especificamente, a grupos capazes de
justificar e avaliar intelectualmente sua posição. Já as subculturas articulam sua oposição
principalmente servindo-se da exploração do significado de estilos de vestimenta e de padrões
de comportamento ou rituais ((EDGARD; SEDWICK, 2003).
Segundo Ronsini (2007), guardadas os aspectos históricos que originaram as
subculturas nos países centrais, mantivemos a ideia de que se trata de um mito ver o
esmaecimento do conflito de classes na sociedade contemporânea, quando, na verdade, ele
desloca-se do campo de produção para o do consumo, com todas as contradições, os
consensos, os repúdios e as incorporações que são típicas do processo hegemônico. Para
Edgard e Sedgwick (2003), as interpretações semióticas, decodificando a vestimenta e o
comportamento das subculturas, têm sido, a esse propósito, de grande influência. O uso de
suspensórios, cabelo raspado e sapatos da marca Doc Martins pelos skinheads fazem sentido
como um comentário sobre um passado industrial imaginado, além de ser uma tentativa de
aceitar a falta de poder em face de uma cultura predominantemente de classe média, da qual o
66
skinhead não faz parte por falta de recursos financeiros e culturais. Para Jefferson e Hall
(1976), as subculturas da classe trabalhadora são claramente articuladas, próximas entre si,
quase organizadas como gangues, ao passo que as contraculturas da classe média são difusas,
menos centradas em grupos e mais individualizadas.
Um ponto contrastante entre as subculturas e as contraculturas é que estas, aos se
oporem a aspectos da organização social vigente, reivindicam transformações globais da
experiência que não se restringem aos rituais exibidos no tempo livre e que tendem a
prolongar-se para além da fase juvenil, ou seja, toda contracultura é movimento cultural e
possui um estilo peculiar (código regulador do comportamento, da aparência e da linguagem
do corpo), enquanto a subcultura ou o estilo subcultural distingue-se do movimento por se
restringir a uma mobilização circunscrita à esfera do lazer (RONSINI, 2007).
Resumidamente, a distinção entre subcultura e contracultura diz respeito ao fato de
aquela consistir em alternativa de resistência, restrita à esfera do lazer, enquanto esta consiste
em uma forma global de vida que se opõe aos mecanismos opressivos. Portanto, acreditamos
que os zineiros vinculados à cena punk e hardcore analisados em nosso trabalho são
pertencentes a uma subcultura zineira. Tanto a subcultura como a contracultura têm em
comum o fato de já terem inspirado a criação de movimentos culturais e de lidarem com a
posição de classe de uma forma menos fluida que o estilo.
O conceito de subcultura ainda é útil para entender padrões de consumo e de produção
cultural, como a música e a dança, que não revelam somente as estruturas incorporadas de
ação, percepção e comportamento, mas também a reação a elas e o desejo manifesto de outras
formas de pertencimento. Dizer que uma subcultura é uma resposta de classe não é o mesmo
que afirmar que ela seja exclusiva de uma classe, pois podemos pensar como jovens de
diferentes classes se agregam em torno de valores contrários à racionalidade dominante.
Assim, jovens de classe média, média baixa ou baixa podem reagir às especificidades da
cultura parental em termos de continuidades e disjunções e também ao modo de organização
social como um todo (RONSINI, 2007).
4.2.3 Subculturas
Nos anos 1970, os pesquisadores do Center for Contemporary Cultural Studies
(CCCS), da Universidade de Birmingham, desenvolveram uma série de estudos propondo
uma reinterpretação da caracterização e do significado dos grupos juvenis surgidos na década
de 1950. Hall e Jefferson (1976), em Resistence Through Rituals, problematizam a noção de
67
uma cultura juvenil: os grupos tinham uma clara origem de classe. Isso significa que as
subculturas juvenis eram referentes à cultura da classe da qual os grupos eram originários. As
subculturas juvenis são explicadas como sendo um fenômeno, que apareceu no período pós-
guerra (Segunda Guerra), e que foi investigado de modo mais profundo do que o feito pela.
As subculturas são compreendidas como conjuntos menores dentro das culturas de
classe, sendo estruturas mais localizadas e diferenciadas, dentro de uma rede cultural
maior. A cultura de classe é chamada de cultura dos pais. Assim, as subculturas
devem ser analisadas primeiramente em relação à cultura de seus pais, depois em
relação à cultura dominante, e quando são distinguidas por idade e geração, podem
ser chamadas de culturas juvenis. Os jovens exercem adaptações, negociações e
resistência, elaborada pela cultura dos pais (HALL; JEFFERSON, 1976, p.13-14).
Para os autores do CCCS, essas subculturas não são simplesmente construtos
ideológicos, elas também se tornam meios expressivos para negociar espaços e sentidos no
campo da luta cultural, entendida como uma luta pela manutenção e conquista da hegemonia
entre classes dominantes e subordinadas. As subculturas, assim, podem articular e expressar
novos sentidos e valores culturais formulados por esses jovens e conquistar espaços efetivos
para eles, como lugares de diversão, de circulação e manifestação. Tais subculturas são vistas
como formas de negociação e resistência frente à cultura dominante (ABRAMO, 1994).
Segundo Edward e Sedgwick (2003), houve críticas contra a abordagem das
subculturas da forma como foram desenvolvidas pelos Estudos Culturais, pois estas foram
vistas como excessivamente seletivas nas subculturas estudadas. De fato, muito dos tabalhos
dos Estudos Culturais voltou-se para as atividades masculinas, com a exclusão ou o não
reconhecimento de subculturas femininas distintas ou da participação feminina na subcultura.
Podemos pressupor que a abordagem feita pelos Estudos Culturais preocupou-se com as
subculturas das classes trabalhadoras, levando a um romantismo da subcultura como fonte de
resistência e que essa “superênfase” pode servir para distorcer o retrato que estes estudos têm
da juventude como um todo. Já para Muggleton (2000, p. 162, tradução nossa), parece que a
distinção que o CCCS faz entre as subculturas de classe trabalhadora, colocando-as como
claramente articuladas, estruturas coletivas – muitas vezes quase ou quase gangues – e a
contracultura da classe média, colocando-a como “difusa, menos centrada no grupo” e mais
individualizada não é particularmente apropriada para o contexto cultural contemporâneo.
Conforme Abramo (1994), as subculturas são vistas como modos de elaboração e
projeção de respostas culturais aos problemas colocados pela especificidade de determinado
grupo no interior da classe de origem. Isto é, são subculturas por que são filiadas e referem-se
68
a determinada cultura de classe, lidando com problemas que lhes são peculiares, dados pela
sua posição etária e geracional. Nesse sentido, estão inseridas na luta pela hegemonia cultural
em dada situação histórica. É no período que se iniciou após a Segunda Guerra Mundial que
ocorreram mudanças significativas na configuração e problematização da juventude,
centradas na ampliação e na vinculação desta aos espaços de lazer, à indústria cultural e aos
meios de comunicação. A ampliação, dada principalmente pelo aumento do período escolar
para outros setores sociais além das classes burguesas, levou alguns autores a afirmar que foi
nesse momento que a juventude “nasceu” como um amplo contingente social. Para Hebdige
(1979), devemos nos perguntar quais os grupos e as classes que têm o quanto dizer para
definir, ordenar e classificar o mundo social.
Por exemplo, se pararmos para refletir por um momento, que deveria ser óbvio que o
acesso aos meios pelos quais as idéias são disseminadas em nossa sociedade (ou
seja, principalmente os meios de comunicação) não é o mesmo para todas as classes.
Alguns grupos têm mais a dizer, mais uma oportunidade para tornar organizarem
significados, enquanto outros são menos favoráveis colocados, têm menos poder de
produzir e impor suas definições do mundo sobre o mundo (HEBDIGE, 1979, p.
14).
As subculturas não são grupos privilegiados, porém não ficam fora do circuito de
produção e de reflexiva reprodução, que se ligam, ao menos em um nível simbólico, às peças
fragmentadas da totalidade social. As subculturas são, mesmo que apenas em parte, as
representações das representações de elementos retirados da “imagem” da vida da classe
trabalhadora (e do todo em geral) que são obrigadas a encontrar algum eco nas práticas
significativas de várias subculturas. Não há razão para supor que as subculturas
espontaneamente concordem apenas com as leituras não veiculadas pelo rádio e pelos jornais.
Elas também articulam, em maior ou menor grau, alguns dos significados preferidos e das
interpretações transmitidas através dos canais autorizados de comunicação de massa
(HEBDIGE, 1979).
Os membros típicos de uma cultura jovem da classe trabalhadora, em parte,
contestam, e em parte, estão de acordo com as definições dominantes de quem são e
o que eles são, e há uma quantidade substancial de terreno ideológico compartilhada
não só entre eles e a cultura adulta de classe trabalhadora (com sua tradição
silenciada de resistência), mas também entre eles e a cultura dominante (pelo menos,
nas suas formas mais “democráticas” e acessíveis) (HEBDIGE, 1979, p. 56).
Portanto, os meios de comunicação desempenham um papel crucial para se descobrir
que muito do que se encontra codificado nas subculturas já foi sido submetido a uma prévia
69
manipulação por parte da mídia. Assim, na Grã-Bretanha do período pós-guerra, o conteúdo
carregado de estilo subcultural foi chamado, por Hall, de “efeito ideológico” dos meios de
comunicação como uma reação às mudanças experientes no institucional quadro de vida da
classe trabalhadora.
Como grupos e classes sociais podem viver , se não em sua produtividade e em
seguida, nas suas relações "sociais" com vidas cada vez mais fragmentadas e
setorialmente diferenciadas; os meios de comunicação de massa são cada vez mais
responsáveis ( a) para a prestação da base sobre a qual os grupos e classes constroem
uma imagem das vidas , significados, práticas e valores de outros grupos e classes ,
(b ) para fornecer as imagens, representações e idéias em torno do qual a totalidade
social é composta por todos estes pedaços fragmentados e separados podendo ser
compreendidos de forma coerente (HALL, 1997 apud HEBDIGE, 1979, p. 85).
Como coloca Abramo (1994, p. 35-36), essas subculturas juvenis surgidas após a
Segunda Guerra surgiram entre jovens operários ingleses como resposta às transformações
vividas pelo working-class nesse período, como a segmentação interna provocada pelas
mudanças tecnológicas, acentuando a divisão entre trabalhadores qualificados e não
qualificados; a entrada de trabalhadores imigrantes; e a mudança na configuração social dos
bairros, provocada pela instalação de novas indústrias. Tudo isso teria provocado uma
mudança no modo de vida e na configuração da identidade cultural desses jovens operários.
Esta identidade iria sofrer uma fragmentação, um enfraquecimento do núcleo de solidariedade
e da noção de pertencimento à classe. Segundo essa interpretação, os jovens de classe operária
tiveram de lidar com um conflito que dizia respeito às possibilidades de ingressar no novo
estrato, socialmente ascendente, de operários qualificados, ou de permanecer entre os
desqualificados e, em um outro nível, à contradição entre o puritanismo tradicional da classe
operária e a nova ideologia de consumo. Frente ao enfraquecimento das referências da classe,
esses sujeitos buscaram construir um polo positivo de referências e de autovalorização no
novo espaço do lazer e da diversão, criando atividades e símbolos próprios e utilizando, entre
outros elementos, os bens de mercado, com o rock’n’roll, por exemplo.
Na busca de elaborar uma resposta diferenciada daquelas disponíveis, esses jovens
apropriaram-se de forma peculiar de objetos providos pelo mercado e pela indústria cultural,
imprimindo novos significados, por meio da inversão de uso ou da reunião de diferentes
objetos em um conjunto inusitado, criando, assim, um estilo subcultural. De acordo com
Abramo (1994), a função dessas subculturas seria expressar e resolver “magicamente” as
contradições que permaneciam escondidas ou não resolvidas na cultura da geração anterior.
70
4.2.4 Punk e hardcore
Conforme O‟hara (2005), uma exceção à política e às ações previsíveis do rock’n’roll
foi o movimento do punk rock ou, simplesmente, punk. A data e o local de nascimento do
punk, segundo o autor, são discutíveis: pode ter sido em Nova York, no final dos anos 1960
ou no início dos anos 1970, ou surgido através dos punks ingleses em 1975-1976. Para
Abramo (1994), o punk apareceu como uma nova subcultura juvenil que se articulou, ao
mesmo tempo, em torno de uma reversão musical do rock e de um modo de vestir inusitado e
extremamente “anormal” (mesmo após o afastamento dos padrões provocado pela juventude
dos anos 1960 e 1970). Os grupos punks têm como fundamentos atitudes como a rejeição de
aparatos grandiosos e de conhecimento acumulado, bem como a utilização da miséria e
aspereza como elementos básicos de criação, o uso da dissonância e da estranheza para causa
choque, o rompimento com os parâmetros de beleza e virtuosismo, a valorização do caos, a
cacofonia de referências e signos para produzir confusão, além da intenção de provocar e de
produzir interferências perturbadoras da ordem.
Movimentos de massa sempre são muito caretas. Isso é que foi genial no punk. Foi
um antimovimento, porque ali desde o começo se soube que com o apelo de massa
vêm todas aquelas pessoas chatas pra quem tem que se dizer o que elas devem
pensar. Um lance esperto jamais poderia ser um movimento de massa. O que foi
genial a respeito da cena é que a curiosidade das pessoas pareceu mais forte que o
medo delas. A época foi abundante de exploração genuína, mas não pro lado de
movimento de massa da moda. E sempre fui fascinado pelo que as pessoas fazem
pra agüentar o dia, o que realmente fazem para manter a sanidade, ou perdê-la,
quando as luzes se apagam (MCNEIL apud MCCAIN e MCNEIL, 2004, p. 68).
Na visão de Gallo (2010), o punk, em suas origens, apareceu de forma muito diferente
das manifestações anteriores de outros grupos: os principais adeptos do punk eram filhos de
operários das periferias de Londres e de cidades da América do Norte, que, sob os governos
de Tatcher e Reagan, viram suas expectativas de vida frustradas. O punk londrino, desde seu
início, emergiu com um discurso mais facilmente identificado com o político, ao passo que o
norte-americano estava mais focado no visual e na música, que, entretanto, hoje,
compreendemos não apenas como expressão artística e cultural mas também política. “Em
geral, pensa-se que foram os nova-iorquinos que inventaram o estilo musical, enquanto os
ingleses popularizaram a atitude política e o visual colorido” (O‟HARA, 2005, p. 31). Para
Bivar (1982), o punk transformou-se em um “movimento de revolta adolescente”, de “uma
geração insatisfeita com tudo, invocando o espírito de mudança”, aparecendo como uma
71
crítica e um ataque contra a sociedade exploradora, que estava mergulhada em seus próprios
vícios.
Os punks são principalmente garotos das classes trabalhadoras dos subúrbios,
vivendo nesse momento uma situação de desesperança: a crise econômica e os
índices de desemprego atingem duramente os jovens proletários que, ao saírem do
ciclo básico não encontram emprego e, além disso, vêem boa parte dos serviços
públicos antes existentes ser encerrada pela política de desestatização de Thatcher
(ABRAMO, 1994, p. 45).
Segundo Fernandes (2013), apesar de as duas cenas serem “berços” do punk,
apresentavam suas distinções. A cena estadunidense, composta por jovens de classe média,
diferentemente da inglesa, composta de maneira mista por jovens de classe média e
proletarizados, ainda preserva certas ligações com movimentos anteriores (movimento hippie
e o glam rock13
), as quais foram motivo de crítica ao movimento punk por parte das gerações
posteriores do movimento. Para Edgard e Sedgwick (2003, p. 270) “culturalmente, o punk
usou diversas influências, incluindo a vestimenta associada aos mods dos anos 1960, ao
rastafári, ao rock de Nova York e mesmo aos glam rock”.
Tratando-se de bandas, McNeill e McGain (2009) defendem que o punk rock (como
teria sido conhecido inicialmente o punk) começou nos Estados Unidos, com bandas como
Iggy Pop, The Stooges, New York Dolls, MC5 (proto punks), dentre outras que influenciaram
a banda The Ramones (tida como a primeira banda punk) e, após, o surgimento de bandas
como o Sex Pistols e o The Clash. “O punk foi uma visão da música pop e uma subcultura
jovem que chamou enfaticamente a atenção pública, ao menos no Reino Unido, no verão de
1976 (sobretudo quando o entrevistador Bill Grungy encorajou a banda punk The Sex Pistols
a falar palavras extremamente rudes durante um programa regional de notícias ao vivo, na
hora do chá) (EDGARD; SEDGWICK, 2003, p. 270).
13
O glam rock (ou glitter rock) foi um movimento musical que surgiu na virada dos anos 60 para a década de
70 na Inglaterra e nos Estados Unidos. Mais do que pela sonoridade, que misturava rockabilly dos anos 50,
música de cabaré e sons pesados de guitarras e baterias, o glam rock caracterizou-se pelos temas de suas canções
e pelo visual andrógino e escandaloso dos artistas. Ele surgiu como uma reação à contracultura hippie e ao rock
progressivo. Contra o despojamento e o engajamento hippie e a seriedade do rock progressivo, o glam rock
propôs canções inspiradas em quadrinhosde ficção científica, em provocações sexuais, bissexualidade e temas do
então submundo gay. Além disso, ele adotou um visual glamuroso (daí o termo glam rock), com os músicos
usando maquiagens pesadas e trajes coloridos que criavam figuras andróginas. Um dos primeiros artistas do
glam rock a fazer sucesso foi Gary Glitter e um dos expoentes do movimento foiDavid Bowie. Outros nomes
importantes do glam rock foram Roxy Music, New York Dolls, T. Rex e Kiss (ANAZ, 2013),
72
Um comparativo entre o primeiro disco do The Ramones de 1976 (autointitulado), e
do Sex Pistols de 1977 (Never mind the bollocks), esclarece a diferenciação nas
composições musicais e a presença de uma crítica política mais acentuada na banda
Sex Pistols, além de uma sonoridade mais ríspida, ou seja, com composições curtas
e com a utilização mais presente de efeitos distorcidos na guitarra elétrica,
característica essa que predominou na sonoridade de vertentes punks posteriores
(FERNANDES, 2013, p. 64).
Musicalmente, então, o punk representou um retorno ao básico, em reação às
pretensões e aos apelos predominantes da classe média do rock progressivo de bandas como o
Pink Floyd e o Yes. “Nos excitantes dias de 1976, não era difícil fazer carreira na música.
Guitarras eram compradas na Woolworth‟s e um conhecimento de três acordes era geralmente
considerado suficiente. Lendas de cantores que estavam três músicas a frente do resto da
banda proliferavam” (EDGARD; SEDGWICK, 2003, p. 270).
O punk apareceu como uma música ágil e autêntica, ligada às experiências dos jovens
no cotidiano das ruas: uma música que faz sentido de novo para os jovens e suas experiências
reais. O resultado desse surgimento é um retorno à estrutura básica do rock, um som seco,
mais percursivo, sem solos, mais gritado do que cantado: o punk rock foi uma retomada do
significado e da função original do rock’n’roll. Era a revolta contra a pasteurização da
rebeldia e a acomodação do rock, que, lentamente, havia se transformado em um
“divertimento leve”, superproduzido, longe da vida e do cotidiano das ruas.
A música punk aparece como uma reação ao estrelismo do rock progressivo
imperante nos anos 70, que necessitava de um enorme esquema empresarial e
envolvia muito dinheiro; aparece como busca de uma música simples e rudimentar,
sem necessidade de grandes aparatos e virtuosismo, que qualquer garoto com
vontade de divertir-se e expressar-se pudesse fazer (ABRAMO, 1994, p. 44).
Em uma conjuntura de crises econômicas e constantes ataques políticos, econômicos e
sociais às parcelas mais empobrecidas da juventude e à classe trabalhadora, a resposta da cena
punk inglesa foi a música “No future!” (não há futuro!), da banda Sex Pistols, interpretada
erroneamente como “niilismo” ou “revolta adolescente sem objetivo”. O “no future!” surge
em um contexto histórico de crises econômicas, críticas ao conservadorismo cultural inglês e
sob a disputa de dois poderes que não respondiam às bandeiras mais elementares da
juventude. De um lado estava o capitalismo, espoliando países subordinados, semeando
ditaduras, guerras e retirando direitos históricos conquistados pelo movimento dos
trabalhadores; do outro, a burocracia stalinista que contaminava grande parte dos partidos
comunistas, virando as costas para a classe que outrora defendia: os trabalhadores
(FERNANDES, 2013).
73
Uma das intervenções mais famosas dos punks ingleses ocorreu durante a
comemoração do jubileu da rainha Elizabeth, que completava 25 anos de reinado. O
governo havia programado festas públicas para distrair o povo das questões
econômicas. Para as celebrações, o Sex Pistols criou a música “No Future!”, cujos
versos resgatam, indubitavelmente, o mais puro estilo irônico das classes
trabalhadoras inglesas (GALLO, 2010, p. 294).
O punk, em vez de apresentar-se como continuação de um suposto movimento de
jovens anterior a ele, reporta-se como uma ruptura, apesar de reconhecer a música, a literatura
e o comportamento de algumas gerações anteriores. Como coloca Gallo (2010, p. 287):
Descrente dos valores do amor e da amizade e da esperança, dos quais se tornaram
incrédulos pela própria força avassaladora do capitalismo na sua versão moderna
neo-conservadora, assumiam em revanche, uma atitude violenta e irreverente. Em
busca de uma autonomia frente à civilização, recusaram-se à adesão aos canais
propostos de participação política, afastando-se igualmente dos partidos de
esquerda, por quem eram criticados, e assumindo uma independência nas várias
instâncias da vida, expressa no lema que o caracteriza Do It Yourself. A convivência
com as comunidades hippies logo tornou-se insuportável, pois nelas cultivava-se um
modo de vida compartilhado que para muitos punks se convertia num terrível
aprisionamento.
Para os punks que conviveram com os hippies, sob o discurso de liberdade que faziam
questão de anunciar a todo instante, existia, na realidade, uma grande hipocrisia, de acordo
com Gallo (2010 p. 288). Enquanto os homens usufruíam de plena liberdade, suas mulheres
passavam os dias a esfregar o chão, a servi-los e a realizar as tarefas que as mantinham presas
à comunidade. Os maus-tratos às mulheres e as traições de seus companheiros, que também
não admitiam que elas se entregassem a outros parceiros, marcava a contradição entre
discurso e prática e foi a gota d‟água para o rompimento entre o punk e o hippie. A
discordância vinha também das formas e expressões culturais (a conversa intelectualizada
parecia irritante, a adesão aos transcendentalismos e religiões orientais uma bobagem, o rock
maçante, a melodia complicada, as músicas muito extensas). Ao contrário do que faziam os
hippies o lema adotado pelo punk foi o “faça você mesmo, pois ninguém fará nada por você”.
No começo do punk todo mundo pensou – sem dúvida quando o punk inglês
começou, e até mesmo o punk americano -, todo mundo pensou que fosse uma coisa
horrível de direita nazi – violenta, racista e contra todas as coisas boas da vida. Eu
era a favor do punk instintivamente, mas tive que me guiar pelo meu gosto institivo,
por causa dos símbolos. Levei um tempo para elaborar isto, porque agora é banal
que as pessoas usem símbolos de maneira irônica. Mas na época hippie, modos de
vestir ou símbolos não eram usados ironicamente. Era tipo: “Isso é o que você é;
você tem cabelo comprido; você veste isso; você é uma pessoa de paz”. Por isso, se
você usava suásticas, você era um názi. E de repente, sem nenhuma transição, sem
74
ninguém dizer nada, surge um movimento, e estão usando suásticas e não têm a ver
com aquilo; é uma roupa e é uma agressão. Tem a ver com alguma coisa
completamente diferente – tem a ver com encenação e tática de choque (HARRON
apud MCCAIN e MCNEIL, 2004, p. 32).
De acordo com Edgard e Sedgwick (2003, p. 270), infelizmente, o punk foi
rapidamente codificado e incorporado pela cultura dominante. Segundo os autores:
No final de 1976, a estilista de moda Zandra Rhodes apropriava-se de elementos da
vestimenta punk e declarava que era “chique chocar”. Porém, sua influência na
cultura popular e na alta cultura ainda se espraiou - e pode ser encontrada, para citar
um único e arbitrário exemplo, na forma de fazer filmes de Derek Jarman.
4.2.5 Hardcore
Se os anos de 1976 a 1980 foram os anos do punk e do new wave, os de 1980 a 1986
foram os do hardcore. Ao passo que o punk atingiu seu ápice em 1977, os dias gloriosos do
hardcore viriam a acontecer em 1981 e 1982, quando o movimento ainda era indefinido e
imprevisível. O hardcore foi um fenômeno americano alimentado por bandas suburbanas de
Los Angeles. Nascido de um ideal condenado pela utopia da classe média, o punk acabou por
ser espremido por seu niilismo (BLUSH; PETROS, 2001). De acordo com Caiafa (1985), o
hardcore “enxugou” o rock de qualquer harmonia, tirou dele toda a musicalidade. “Das
„entranhas‟ da contracultura punk surgiria o hardcore, agora, efetivamente, sem deuses, sem
mestres” (FERNANDES, 2013, p. 67). “Em relação ao hardcore, há algumas discussões sobre
a origem deste estilo. Alguns o consideram como uma derivação do punk, outros como um
novo estilo que surge nos Estados Unidos na década de 1980” (CARRIJO, 2012).
Segundo Blush e Petros (2001), o termo hardcore foi utilizado pela primeira vez no
Long play (LP) da banda canadense DOA, formada em 1978. É comum encontrar o termo
vinculado ao “pornô hardcore” ou a fãs sedentos por futebol. Independentemente da origem
precisa do termo, quando os punks utilizaram a palavra hardcore, outros punks souberam o
que isso significava. O hardcore é o mais absoluto do punk. Cada país possuía sua própria
cena musical: no Reino Unido, havia as bandas Exploited, Discharge, Crass, Doom, Varukers,
GBH, Disorder; nos Estados Unidos, Black Flag, Seven Seconds, Circle Jerks, Minor Threat;
na Finlândia, Terveet Kädet, Rattus, Kaaos, Lämä, Riistetyt; no Brasil, Ratos de Porão, Olho
Seco, Ulster, Brigada do Ódio, Armagedom, Atack Epiléptico e Câmbio Negro
(FERNANDES, 2013).
75
Se o punk deu voz ao “faça você mesmo” (filosofia do punk que será melhor explicada
no próximo capítulo deste trabalho) e democratizou a cena rock, o hardcore transcendeu
todos os interesses comerciais e corporativos. A rede independente do hardcore começou com
os garotos fazendo seus próprios shows, lançando seus próprios registros e suas próprias
turnês. Se alguém entrasse para o hardcore, provavelmente não seria pelo dinheiro, e, sim, por
satisfação própria. Já se entrasse para alcançar o estrelato, seria em direção a decepção. É uma
nova definição para um outro modelo de sucesso musical: em termos não econômicos
(BLUSH; PETROS, 2001).
Na questão estética, o hardcore trazia uma arte-denúncia para além da música e do
desempenho corporal, utilizando-se de outras vias de confronto estético como os fanzines, as
pichações, entre outros. Especificamente na música, é possível verificar a presença de
composições minimalistas cada vez mais distantes da forma-padrão comerciável. A forma
política era a ampliação de modos de vida inconformistas, como o vegetarianismo, o incentivo
à autogestão individual e coletiva, a defesa de pautas de luta contra o machismo, o racismo, a
homofobia e a aproximação com movimentos classistas autogestionários. Com o hardcore, a
luta por uma consciência contra o conformismo tornou-se ainda mais presente no punk
(FERNANDES, 2013).
Conforme Carrijo (2012), a maioria dos zines vinculados ao punk autodenominam-se
como punk ou hardcore, não apenas como um estilo musical, mas também como um estilo de
vida. Esta é uma tendência que se mantém nas produções atuais. Dessa forma, os integrantes
da cena colocam a cultura punk como algo que se diferencia do punk rock. Para eles, a cultura
envolve bem mais do que a música, pois está ligada também ao estilo de vida, às visões de
mundo, à moda, ao comportamento e à atitude. Já o punk rock refere-se ao estilo musical.
77
5 ZINES E ZINEIROS
A partir do que foi detalhado no primeiro capítulo sobre subculturas (os conceitos de
capital cultural e capital subcultural), bem como no segundo capítulo sobre mídia e fanzines,
aplicamos uma entrevista (semiestruturada) composta por 74 questões referentes à classe
social, ao capital cultural, ao capital subcultural e ao consumo de mídia para onze zineiros,
dos quais nove são homens e duas são mulheres, entre 20 e 41 anos, que publicam fanzines
impressos e estão vinculados à cena do punk e do hardcore de alguma forma. De acordo com
a tabela dos grupos ocupacionais proposta por Quadros e Antunes (2001), quatro
entrevistados correspondem à classe média alta, quatro à classe média e três à classe média
baixa, na qual a categorização é realizada de acordo com a posição do membro melhor situado
na família. Além da entrevista em profundidade, pedimos para que os zineiros respondessem
primeiramente a três perguntas abertas sobre os fanzines.
Alguns pontos são explorados na entrevista em profundidade, como os aspectos que
influenciaram o gosto musical dos entrevistados; o ritual de escutar música; as questões sobre
a relação entre mídia e fanzines; a atitude, a autenticidade e a resistência na produção zineira;
os modos como elaboram suas produções e quem são seus públicos. As perguntas sobre
profissão, sustento da família e escolaridade, indicaram-nos apontamentos para a definição de
suas classes sociais.
O presente capítulo é subdividido de acordo com os pontos analisados. Primeiramente,
descrevemos um perfil de cada um dos zineiros que foram entrevistados e apresentamos uma
breve descrição sobre as publicações investigadas. Posteriormente, visamos compreendemos a
relação dos zineiros das classes média alta, média e média baixa com a mídia, tanto os meios
de comunicação alternativos quanto os hegemônicos. Por último, observamos quais as
relações entre o capital subcultural (expressões do estilo subcultural), proposto por Thornton
(1995) e a classe social de zineiros de diferentes classes e de seus fanzines.
Segundo (2002), o universo dos fanzines é marcado por grupos que ocupam uma área
de interesse mais ou menos definida, formando uma comunidade não geográfica. Pelo fato de
os zineiros estarem dispersos geograficamente, constroem suas redes de interesses, formando
parte de uma comunidade virtual: seus participantes, além de estarem em consonância com
um desejo latente, têm as ferramentas para tornarem públicas suas opiniões, formando, assim,
uma relação íntima entre si ao longo do tempo.
78
5.1 PERFIS DOS ZINES E ZINEIRO
5.1.1 Zine Aviso Final
O fanzine Aviso Final teve sua primeira edição lançada em setembro de 1990,
portanto, é um dos mais antigos em circulação no país. Há 23 anos ativo, o conteúdo do zine
traz resenhas de bandas, entrevistas sobre figuras da cena punk e hardcore nacionais, resenhas
de outros fanzines e quadrinhos de colaboradores. O nome do fanzine refere-se, segundo o
autor, Renato Donisete:
A uma falta de perspectiva de futuro. Olha só que interessante, um aviso final que
persiste há mais de 23 anos. Ele foi inspirado de uma música do Ratos de Porão, do
álbum Descanse em Paz (1986). O público do zine são outros fanzineiros e
apreciadores de música punk e hardcore. O fanzine, como publicação independente,
é fundamental para o underground.
Distante dos veículos de informação formal, o fanzine apresenta credibilidade, pois
não obtém nem espera o lucro. Dessa forma, faz as informações circularem
livremente. É um excelente meio para divulgar conceitos, ideias e informações
(RENATO).
Renato Donisete tem 41 anos e vive em São Caetano do Sul (São Paulo), onde atua
como coordenador de ação educacional no Centro Educacional Unificado Parque Brisol e é
professor de educação física no Ensino Fundamental I na Escola Estadual Melvin Jones.
Graduado em educação física e pedagogia e com pós-graduação em Educação Física Escolar,
é autor de “Fanzines na Educação: algumas experiências em sala de aula”, lançado em 2013,
pela editora Marca de Fantasia14
. Vive com a mãe e a irmã, com quem divide as despesas da
casa. A mãe de Renato e sua irmã são comerciantes, donas de uma cantina escolar. A família,
portanto, enquadra-se na classe média, segundo Quadros e Antunes (2001).
5.1.2 Zines Manufatura e Cortex
O zine Manufatura existe desde 2010 e tem esse nome porque privilegia a confecção
manual de ilustrações. Já o zine Cortex surgiu em 2011, em formato A5, da mesma forma
ilustrativo. Ambos os zines possuem miolo em papel vergê, o que proporciona um diferencial
tátil, além de a capa e sobrecapa serem em papel color plus vermelho e papel vegetal, o que
14
“A Marca de Fantasia é uma editora independente dedicada às Histórias em Quadrinhos, Artes, Comunicação,
Linguística e à Cultura Pop (expressões da indústria cultural, como as séries televisivas, a ficção científica, o
rádio, a música popular etc.)” (MARCA DE FANTASIA, 2013).
79
demonstra a preocupação do autor com a estética do fanzine. “Sobre o público do Manufatura,
acho que em geral são pessoas interessadas em artes e design, também tem o pessoal do punk
e hardcore, que é uma cena que frequento” (Flávio Grão).
Flávio Eduardo Azevedo Alves Volcov, mais conhecido por Flávio Grão, tem 34 anos
e é um fanzineiro ativo na cena do ABC paulista e de São Paulo há alguns anos. O zineiro é
ilustrador, já tocou em bandas, produziu flyers e capas de CDs e publicou vários zines, como
o The Answer. Lançou um livro intitulado Tudo que é Grande se Constrói sobre a Grande
Mágoa, pela editora Ugra Press15
.
Formado em letras e pedagogia pela Universidade do Grande ABC, é educador na
Secretaria da Educação do Município de São Paulo. Mora na Vila Mariana (São Paulo) com a
mulher, que exerce a profissão de advogada. Ambos são responsáveis pelo sustento da casa.
Na questão de classe social, a família enquadra-se na classe média alta, devido à profissão de
sua esposa, membro mais bem remunerado na família.
5.1.3 Zine Acesso Público
O zine Acesso Público está em circulação desde dezembro de 2012. É gratuito e seu
conteúdo mescla “distopia e realidade”, segundo o autor. O Acesso Público é “para quem
quiser, na nossa expressão impressa”.
Distribuímos o zine sempre nos eventos que nós mesmos fazemos com as bandas
locais, então a galera que curte o teto do punk já se identifica com o lance e acaba
lembrando dos eventos com cada zine. É uma maneira de fazer um material gráfico
poderoso com quase nada de dinheiro (GREGORY).
Gregory Elias Debaco tem 22 anos, reside em Caxias do Sul (Rio Grande do Sul), é
estudante de jornalismo e trabalha como estagiário de comunicação na assessoria de imprensa
na Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Caxias do Sul. Seu pai é empresário,
responsável pelo sustento da família e possui empresa que presta serviço de pintura predial, a
qual conta com dez funcionários. A mãe é dona de casa. Tendo em vista as proposições de
15
“Ugra Press é uma editora independente, uma produtora de eventos dedicados à cultura alternativa e agora
também uma loja virtual. São responsáveis pelo “Anuário de Fanzines, Zines e Publicações Alternativas”, um
guia completo para editores e leitores interessados no assunto que caminha agora para sua terceira edição”
(UGRA PRESS, 2011).
80
Quadros e Antunes (2001) e que o membro mais bem remunerado na família é o proprietário
empregador, a família, então, enquadra-se na classe média alta.
5.1.4 Zines Outono ou Nada, Seja Você Mesmo e Conversas Paralelas
O fanzine Outono ou Nada está em circulação desde março de 2012 e traz matérias
sobre bandas de hardcore, arte de rua e skate. Possui este nome para homenagear a estação do
ano favorita do editor. Já o fanzine Conversas Paralelas vem sendo publicado desde março de
2012 e é um fanzine pessoal, com textos que se assemelham a um diário. Seu nome vem
justamente das “conversas paralelas” que o editor tem em sua mente. Já o zine Seja Você
Mesmo é uma “brincadeira” com a Revista Veja, imitando o formato e diagramação em
formato zinístico, no qual até as “páginas amarelas” da revista surgem, porém, com
entrevistas voltadas a figuras do cenário independente.
A importância do fanzine está na sua essência. É uma maneira de divulgar as coisas
que acontecem no meio independente sem depender dos interesses e apoio da grande
mídia. Em virtude disso, o fanzine representa a circulação e a troca de ideias,
informações e experiências (GUILHERME).
O autor dos zines, Guilherme Gonçalves, é formado em publicidade, tem 30 anos e é
guitarrista em duas bandas que compõem parte do cenário punk do Rio Grande do Sul:
Ornitorrincos e XAmorX. Guilherme é publicitário na empresa Full Gauge Controls, em Porto
Alegre (Rio Grande do Sul), onde mora sozinho e se sustenta, enquadrando-se, então, na
classe média (média classe média assalariada), segundo Quadros e Antunes (2001).
5.1.5 Zine Paranóia e Cale a Boca
O zine Paranóia e Cale a Boca existe desde o primeiro semestre de 2012 e possui este
nome pela identificação pessoal do autor com a música de mesmo nome, da banda punk
Morte Asceta.
Até hoje fiz ou participei ativamente de três zines impressos, com objetivos
completamente diferentes em cada um. Tô falando isso pra deixar claro que não
existe (não pra mim) uniformidade quando o assunto é fanzine; o negócio é livre e
cada qual que faça como, quando, com quem e pra quem quiser. Meu denominador
comum sempre foi compartilhar o que passa na cabeça num momento. Vem uma
vontade doida de falar algo e eu uso o zine como recurso. Outro ponto interessante é
a rede de contatos que o fanzine traz (JÚLIO CÉSAR).
81
O editor, Júlio César Kohler Damasceno Baron, tem 23 anos e reside em Goiânia
(GO), onde vive com o pai e o irmão mais novo. Atualmente, é baterista nas bandas punks
Tirei Zero, Ímpeto, Eulália Muda e Ameaça Cigana e já tocou na WCM e Possuído Pelo Cão.
Estuda jornalismo na Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC/GO) onde trabalha
como agente administrativo. As despesas da casa são sustentadas pelo pai, representante
comercial de indústria têxtil, que vende tecido para fabricantes de jeans. Sua família
enquadra-se na classe média, segundo Quadros e Antunes (2001), devido à ocupação de Júlio
como técnico científico de nível médio.
5.1.6 Zine Impasse
O Impasse, fanzine de Kamila Lin, possui este nome porque vem “dessa turbulenta
descarga de sentimentos e emoções do dia a dia”, a qual, segundo a autora, a deixa em um
impasse total, uma indecisão com relação a fatos cotidianos. “É aquilo: crises existenciais,
mas sem elas, como saberia que estou „viva‟? Ou melhor, como saber que não sou mais um
número, mais uma alienada/manipulada? Acho que vem daí, dessa icógnita entre mente e
coração” (KAMILA LIN)
Kamila Barcellos Lin, mais conhecida como Kamila Lin, possui ensino médio
completo e é tatuadora. Reside em Canoas (Rio Grande do Sul), onde mora com seu irmão e
seu padrasto, que exerce a profissão de artesão, trabalhando com junco, e a mãe, que atua
como caixa de supermercado. Todos são responsáveis pelo sustento da casa. A família
enquadra-se na classe média baixa. Porém, a mãe seria de baixa classe média assalariada e o
padrasto trabalhador autônomo, segundo as ocupações de Quadros e Antunes (2001).
5.1.7 Zines Histérica, True Lies e Dialética
O zine Histérica está atualmente em circulação e é feito pelas amigas Carla Duarte
(Rio de Janeiro), Íris Nery (Bahia) e Julie Oliva (São Paulo) que, mesmo distantes
geograficamente, uniram-se para fazer um zine riot grrrl (movimento feminista dentro da
cena punk). A primeira edição do zine foi lançada em janeiro de 2009, a segunda em 2011 e a
terceira será lançada ainda em 2013. O nome do fanzine vem de um deboche à histeria,
doença atribuída às mulheres no século XIX, e a tudo que ela representa, segundo Carla,
82
“mulher chata, que dá chilique”. O público dos zines de Carla são pessoas interessadas em
riot grrrl, no feminismo, na contracultura e no punk feminino.
É uma forma de nos apropriarmos do termo sexista “Histérica” e dar nosso próprio
significado a ele, que é: confrontar o machismo, ser você mesma independente dos
arranjos sociais. O objetivo do nosso zine era ser um zine grosso, substancial e que
falasse exclusivamente sobre riot grrrl, feminismo e assuntos afins. Todas as
edições foram feitas por mim, Julie Oliva e Íris Nery, sempre com contribuição de
mulheres. Seja na arte, ou como tema de nossos assuntos. Nós sentíamos falta de
algo que representasse ou falasse do feminismo a partir de uma perspectiva punk e
contracultural (CARLA).
O zine Dialética provavelmente foi criado em 2005 (a zineira diz não ter certeza da
data). Carla trocava cartas com sua amiga Camila Puni, que ainda não havia conhecido
pessoalmente, apenas através de correspondências. O zine teve apenas uma edição, na qual as
zineiras expuseram suas perspectivas feministas e contraculturais. Boa parte das cópias foi
colorida à mão na última página, além de textos sobre assuntos que têm relação com a mulher.
Já o zine True Lies objetivava abordar o punk e o hardcore, trazendo sempre
entrevistas ao menos uma banda que tivesse mulheres em sua composição. O zine foi
mudando com o tempo, mas sempre manteve sua preocupação com questões de gênero.
A diferença do Histérica para os zines anteriores é ser pensado e executado
politicamente para registrar o punk feminista com o qual nos conectamos. Foi o zine
que mais gostei de fazer e que mais olho com amor. Foi uma experiência que mudou
a forma que eu encaro os zines como um todo. O processo, de ler e pesquisar,
alargou e modificou a minha visão sobre o papel dos zines no movimento riot grrrl
como um todo (CARLA).
A zineira já publicou outros fanzines, entre eles: XT zine, Antena zine (com Marcela
Fernandes), Chato zine, Desconfio zine, True Lies zine (Com Marcela Fernandes), Memórias
Vivas de Uma Vulva Nada Comportada zine (com Íris Nery) e Riot Grrrl zine. Carla é
estudante de jornalismo e atua como estagiária na Assessoria de Comunicação do Instituto
Federal do Rio de Janeiro (campus Volta Redonda). A jovem mora junto de seu pai, sua mãe e
seu irmão. O pai de Carla é técnico em eletrônica e a mãe técnica em contabilidade. O pai é
responsável pelo sustento da família, a qual se enquadra na classe média, pois, segundo
Quadros e Antunes (2001), o pai de Carla situa-se na ocupação técnico científico de nível
médio (média classe média assalariada).
83
5.1.8 Zines Street Ground, Last Call e Isto Não é Um Fanzine
O zine Street Ground é publicado por Rogério de Moraes Alves, que, desde o segundo
semestre de 2011, coloca-o em circulação. Até agora quatro edições já foram fechadas e
distribuídas. Já o Isto Não é Um Fanzine é uma publicação de 2009, um zine com caráter mais
experimental: o editor não pretendida fazer várias edições, portanto ficou apenas uma edição.
O zine Last Call foi feito apenas para mostrar ao público o que o editor achava interessante na
época, como música, informações do que estava conhecendo e, mais tarde, arte também.
Olhando essas 2 publicações anteriores (Last Call e Isto Não É Um Fanzine) ao
Street Ground, dá pra afirmar que foi um preparativo daquilo que eu iria desenvolver
2 anos depois com uma identidade já definida com tudo aquilo que eu testei e passei
a conhecer mais e me envolver mais. foi uma evolução ao longo dessas
publicações... em questão de elaboração, diagramação, conteúdo (ROGÉRIO).
Quando pensei em fazer o zine Street Ground, queria que ele tivesse um nome
relacionado a rua. Por trazer fotos e assuntos que se relacionam facilmente a rua, o
nome teria que ter essa relação a tudo. Ao skate, à música e arte urbana. E como
sempre, em todos os projetos pessoais que fiz e tenho até hoje, sempre penso no
nome em inglês pra facilitar a identificação dentro e fora do Brasil. E foi
pesquisando e juntando alguns nomes que pensei em Street Ground, algo como chão
da rua na tradução livre (ROGÉRIO).
Rogério tem 25 anos e reside em Butantã (São Paulo), onde trabalha como designer
gráfico (possui graduação na área) e vive com a esposa, que é analista de sinistro massificado
na empresa Crawford e é graduada em administração. A família enquadra-se na classe média
alta devido ao emprego da esposa, que é o membro mais bem situado na família, enquadrada
na alta classe média assalariada (administradores), segundo as definições de Quadros e
Antunes (2001).
5.1.9 Zine Linhaça
O zine Linhaça tem a proposta de ser um zine experimental e curto, de apenas uma
página A4 frente e verso, dobrada, em que o zineiro Wender Zanon expõe seu ponto de vista
ideológico sobre vegetarianismo e autoexpressão. Teve apenas uma edição e cerca de 50
tiragens entregues pessoalmente e em shows. Segundo o zineiro, há uma segunda edição do
Linhaça que foi engavetada; está pronta, mas ainda não foi lançada.
84
Tê fazendo um fanzine agora que vai se chamar “Sujeira do umbigo”. É uma
referência ao undeground, essa coisa do sub... Mas, também é aquela coisa de que o
zine trata de assuntos que são deixados de lado por outras mídias também. Meu
último zine tinha sido o “Linhaça”, porque era algo que eu tava comendo bastante na
época que produzi o zine, hehe, gosto dos nomes do zine, acho que é a parte que dá
pra se viajar e ser bastante criativo. E assim como o zine, pode seguir ou não alguma
linha editorial e por ai vai. A liberdade ali é realmente livre (Wender).
Wender Zanon é vocalista da banda estilo powerviolence Change Your life, e vive em
Canoas (Rio Grande do Sul), com os pais. Sua mãe é costureira (trabalhadora autônoma) e seu
pai é metalúrgico da AGCO. Todos são responsáveis pelo sustento da casa, logo, de acordo
com Quadros e Antunes (2001), a família pertence à classe média baixa.
5.1.10 Zines Tralha, The Rising, Quase e 3M3M (Três Mãos de Terceiro Mundo)
O fanzine Tralha é produzido por Daniel Hogrefe e está em circulação desde março de
2012. Tralha leva este nome, segundo o editor, porque “tralha é aquele monte de coisa que
ocupa espaço e não serve pra nada. O nome é uma brincadeira com essa ideia, de pegar uma
coisa que pros outros poderia ir pro lixo e dar valor praquilo, contar uma história através
daquilo”. Já o The Rising e o Quase são fanzines antigos do zineiro, que trazem em suas
edições entrevistas com músicos, publicidades de lojas do cenário independente e resenhas de
colaboradores, textos de autoexpressão, artes. O 3M3M, Três Mãos de Terceiro Mundo, foi
um fanzine elaborado em edição especial para comemorar os dez anos de uma coletânea
bastante importante para o cenário independente do punk e do hardcore nacional, o CD Faces
do Terceiro Mundo (coletânea com as bandas Dead Fish, Reffer, Street Bulldogs e Noção de
Nada).
Meu objetivo principal é me expressar, dizer para as pessoas o que penso, mesmo
com o Tralha zine ou o Quase zine, minha ideia é falar: “Porra, olhem para isso, é
foda! Prestem atenção, isso é muito bom e tá passando despercebido!” E de quebra,
ajudar na divulgação de coisas que acho boas (Daniel).
Daniel Hogrefe tem 25 anos, tocava na banda punk Morra Tentando e começou a fazer
zines em Maceió (Alagoas), onde morava. Atualmente faz tatuagens por hobbie (pretende
virar profissional) e é designer gráfico na empresa Grendene em Farroupilha (Rio Grande do
Sul), onde vive com a namorada Jéssica Nakaema, a qual também zineira, editora do zine No
Make Up Tips e Bikini Kill. Jéssica atua como designer de produto na empresa Grunge
Design. Ambos são graduados em design; ele em design gráfico, ela em design de produto).
Segundo Quadros e Antunes (2001), o casal enquadra-se na classe média alta devido ao fato
85
de suas profissões constarem como ocupações técnicas e científicas de nível superior, as quais
se encontram na alta classe média assalariada.
5.1.11 Zine Café Sem Açúcar
O zine Café sem Açúcar está em circulação desde 2011 e vem sendo publicado
constantemente pelo editor Jeison Placinsch, um dos mais ativos na cidade de Porto Alegre.
Segundo o editor, o público são pessoas que ele não fazia ideia que pudessem se identificar
com o que escrevia. O zine é xerocado em preto e branco com folha de ofício branca e possui
formato A4. “O nome do fanzine? Café Sem Açúcar: porque é assim que se toma café. E as
coisas que escrevo são um tanto amargas, também” (Jeison Placinsch). Já a publicação Aonde
Foi Parar Aquele Sorriso? é um zine que reúne sete contos escritos pelo autor sobre cada dia
da semana, sem data do ocorrido, de forma pessoal. Possui 20 páginas em formato A5.
O zineiro Jeison Placinsch tem 26 anos, toca na banda Imoral e possui, com sua
namorada, uma pequena editora de publicações independentes, chamada Coisa Edições,
através da qual divulga seus fanzines e expõe seus trabalhos independentes. Mora sozinho em
Porto Alegre, onde se sustenta atuando como barman. Segundo Quadros e Antunes (2001), é
pertencente à classe média baixa pois é um assalariado popular (baixa classe média
assalariada).
87
6 CONSUMO DE MÍDIA
O consumo de mídia foi analisado a partir de 22 questões, selecionadas entre as 74 do
questionário completo. A entrevista foi aplicada via internet, usando redes sociais como o
facebook e, principalmente, o e-mail. As perguntas sobre consumo midiático não estão em
uma ordem dada, misturando-se às questões realizadas para a elaboração dos perfis dos
zineiros de diferentes classes sociais e para a análise do capital subcultural. Alguns dos
questionamentos podem ser enquadrados como quantitativos, como, por exemplo, qual a
recorrência com que veem, leem ou ouvem determinada mídia, embora outras questões se
voltem ao caráter qualitativo, abordando o costume de consumo da mídia. A investigação
também aponta o que os zineiros de classes sociais distintas pensam sobre a MTV, a relação
entre os fanzines e a grande mídia e as diferenças entre revistas comerciais e as publicações
independentes.
Há uma cultura veiculada pela mídia cujas imagens, sons e espetáculos ajudam a
urdir o tecido da vida cotidiana, dominando o tempo de lazer, modelando opiniões
políticas e comportamentos sociais, e fornecendo o material com que as pessoas
forjam sua identidade. [...] A cultura da mídia também fornece o material com que
muitas pessoas constroem o seu senso de classe, de etnia e raça, de nacionalidade, de
sexualidade, de “nós” e “eles”. Ajuda a modelar a visão prevalecente de mundo e os
valores mais profundos. [...] Essa cultura é constituída por sistemas de rádio e
reprodução de som; de filmes e seus modos de distribuição; pela imprensa, que vai
de jornais à revistas; e pelo sistema de televisão, situado no cerne desse tipo de
cultura (KELLNER, 2001, p. 9).
Em nosso questionário, os sujeitos deveriam assinalar quanto tempo passavam
assistindo à televisão. Percebemos que é comum, para os entrevistados de classe média baixa,
o hábito de assistir pouco à televisão (baixa frequência16
), quando comparados com os
entrevistados das classes média e média alta, que assistem a menos de uma hora de TV por
dia. O entrevistado que mais assiste à televisão é Rogério Alves, da classe média alta, classe
que indica grande frequência de tempo em frente à televisão e a canais de TV por assinatura
16
Os parâmetros utilizados são expostos como segue.: a) frequência diária com que assiste à TV: alta (acima de
4 horas); mediana (entre 3 e 4 horas ou de 2 a 3 horas); baixa (entre 1 e 2 horas e menos de uma hora); b)
frequência de horas diárias de internet: alta (mais de 4 horas ou de 2 a 4 horas); mediana (de 1 a 2 horas); baixa
(menos de 1 hora); c) ffrequência com que escuta rádio: alta (diariamente ou 2 a 3 vezes por semana), mediana
(semanalmente ou quinzenalmente); baixa (raramente); d) frequência de leitura de revistas e jornais: alta
(diariamente ou de 2 a 3 vezes por semana), mediana (semanalmente), baixa (quinzenalmente ou raramente); e)
frequência de leitura de livro: alto (diariamente ou de 2 a 3 vezes por semana); mediana (semanalmente); baixa
(quinzenalmente ou raramente).
88
como o Netflix, a Fox, o Discovery Chanel, National Geographic e Cartoon Network. Já nas
classes média e média baixa, aparecem canais como a Globo News, TV Cultura, Canal Brasil
e Rede Globo. Apenas um dos entrevistados de classe média baixa relata não ter um canal
favorito (Wender), pois diz ficar passando de canais até encontrar algum que o interesse.
Os jornais impressos citados pelos entrevistados foram Diário do Vale, O Globo, Zero
Hora, O Pioneiro, Folha de Caxias, Correio do Povo, Folha de São Paulo, O Popular, Jornal
ABCD Maior, Diário de São Paulo, O Vale, Diário de Canoas. Porém, quatro entrevistados
não leem jornais, dos quais dois são de classe média alta (Daniel e Flávio) e dois de classe
média baixa (Kamila e Jeison). Entretanto, todos possuem o hábito diário de leitura de livros.
Sendo assim, a baixa leitura do jornal não seria explicada pela baixa escolaridade dos sujeitos
de classe média baixa. Já todos os quatro zineiros pertencentes à classe média leem jornais
diariamente, sendo mais parecidos com os de classe média alta (Gregory e Rogério).
Na questão sobre quais revistas geralmente costumam ler, todos os entrevistados de
classe média baixa afirmaram não possuir o hábito de leitura de revistas, indicando baixo
capital cultural neste caso. Visualizamos que, nas classes média e média alta existe o hábito
de leitura de revistas; Renato e Rogério, respectivamente, fazem assinaturas. É interessante
assinalar que as revistas internacionais como a Trasher, Jenken Mag e Surfers Journal foram
todas citadas por entrevistados pertencentes à classe média alta, o que assinala alto capital
cultural, pois são revistas com publicações em língua inglesa. Os entrevistados que possuem
alta frequência de leitura de revistas pertencem à classe média alta (Daniel, Gregory e
Rogério). A situação da classe média neste caso é mais próxima da classe média alta, pois
todos os entrevistados responderam “sim” quando indagados sobre esta questão. As revistas
citadas foram: Vista, +Soma, Vice, Surfer Journal, 100% skate, INKED, Revista Prego,
Revista Samba, Super Interessante, Tribo Skate, Rolling Stone, Jenkem Mag, Trasher, TPM e
Língua Portuguesa.
Quando indagados sobre se existem contrastes entre uma revista comercial e um
fanzine, foi unânime entre os sujeitos pesquisados, indiferentemente da classe social, a
resposta de que existem contrastes e características marcantes, o que ressalta o alto capital
subcultural dos zineiros neste ponto. Segundo os zineiros, nas publicações independentes
existe a própria maneira de se pensar a pauta, o baixo orçamento, a liberdade de expressão; a
despreocupação com a linha editorial, sem a necessidade do lucro. Além disso, os fanzines
seriam mais pessoais. Já as revistas são mais voltadas para a publicidade e a informação;
exerceriam uma falsa imparcialidade nas notícias e privilegiam propagandas comerciais, além
de terem uma grande tiragem e linha editorial comprometida com o lucro.
89
Tipo de edição – a revista tem sua política editorial que vai de encontro com a
política de sua editora, e que provavelmente atenderá requisitos corporativos,
capitalistas e de manutenção do status quo, enquanto o fanzine vai ser pensado a
partir da política de quem o faz e que provavelmente não está atrelado à grande
mídia. E ainda dentro disso está a própria maneira que se pensa a pauta, nos fanzines
pode-se falar de todo e qualquer assunto, enquanto que na revista não existe essa
liberdade (CARLA, classe média).
O fanzine é livre; não necessariamente comercializado, não necessariamente
periódico, não necessariamente vinculado a uma instância maior que a vontade de
quem produz. A revista comercial tem um planejamento editorial engessado (que
envolve, sei lá, política partidária, tendência de moda, fofoca sobre gente “influente”
etc), tem que vender e tem que obedece (JÚLIO CÉSAR, classe média).
E geralmente, os zines falam sobre tudo aquilo não interessam as grandes revistas...
Como a banda nova do bairro ou aquele filmão B que não saiu no Cinemark. Essas
coisas (KAMILA, classe média baixa).
Sobre a leitura de livros, a grande maioria dos entrevistados de todas as classes sociais
lê, indicando um alto capital cultural (foi unânime, entre as classes média baixa e média alta, a
resposta “sim” sobre se costumam ter o hábito leitura de livros). Apenas um zineiro,
pertencente à classe média, não possui este hábito (Guilherme). Observando as respostas, o
menor índice de leitura foi assinalado entre os entrevistados de classe média, que leem
semanalmente (Júlio César) ou de duas a três vezes na semana (Carla). Porém, ainda assim,
enquadram-se em uma média e alta frequência de leituras de livro. Já entre os entrevistados de
classe média baixa (Jeison, Wender), a frequência é alta, pois leem diariamente, assim como
dois zineiros da classe média alta (Daniel e Flávio). Quando indagados sobre qual livro
relacionado ao punk já leram, apenas Gregory (classe média alta) relata não ter lido nenhum.
Os demais citaram livros como Una Gira em Sur da America com o conjunto de musica rock
Merda, O que é fanzine, Mate-me Por Favor, Historias Del Buenos Aires Hardcore, Dias de
Guerra Noites de Amor, The Best of Punk Magazine, O que É punk, A filosofia do Punk,
Coração Envenenado Minha Vida Com Ramones, Punk – Anarquia Planetária e Cena
Brasileira, Tudo o que é grande se constrói sobre mágoa. O livro mais citado foi a coletânea
de entrevistas da Punk Planet, intitulada Não Devemos Nada a Você, lido apenas por zineiros
das classes média e média alta.
O hábito de ouvir rádio possui uma recorrência maior na classe média, entre três de
quatro zineiros. Na classe média alta, apenas Flávio e Rogério ouvem programas de rádio. As
programações citadas pelos zineiros foram Rádio USP, Gaúcha, Band News, 97.1 FM (CBN
Goiânia), 90.1 FM (Rádio Brasil Central), 730 AM (Rádio 730). Porém, nenhum dos
90
entrevistados de classe média baixa ouve qualquer tipo de programação, o que indica um
contraste entre as classes da subcultura zineira, assim como o hábito de ler a revistas.
Como nossos entrevistados estão ligados à cena musical punk e hardcore,
questionamo-los a respeito de suas compreensões sobre o canal televisivo MTV (nos moldes
da MTV antiga, pois a partir de outubro de 2013 passou a ser um canal pago) e sobre o que
poderia ser diferente em sua programação. Apenas quatro entrevistados relataram não
assistirem ao canal, dos quais dois pertencem à classe alta (Gregory e Rogério) e dois à classe
média (Renato e Guilherme). Entre os zineiros da classe média baixa, não houve negação
sobre assistir ao canal.
Particularmente não assisto e não gosto da MTV. Acredito que por questões
mercadológicas seu espaço destina-se prioritariamente a vender e criar produtos dito
culturais (RENATO, classe média).
Entretanto, três dos entrevistados, um de cada classe, afirmaram gostar do canal e
simpatizar, de alguma forma, com sua programação (Daniel, Wender e Carla, esta última,
acredita que a MTV possui uma forma diferente da grande mídia, ainda que seja
despolitizada). Para Jeison, pertencente à classe média baixa, a essência do canal é boa, “mas
aos poucos é obrigada a ceder aos padrões de TV pra se manter funcionando, não adianta”.
Wender, também da classe média baixa, afirmou que, apesar de a emissora ainda trabalhar
com uma lógica comercial, essa lógica é menor do que nas demais, o que pode ter sido um
fator para a emissora ter fechado.
Acho que cumprem sua função, eu gosto da MTV, conheci muitas bandas através
dela, embora tenha dado uma bela caída, mas não dá pra exigir muito, eles têm que
vender, né? (DANIEL, classe média alta).
É uma opção para quem quer consumir uma cultura diferente da tradicional cultura
de massa veiculada pela grande mídia, mas ainda assim é despolitizada (CARLA,
classe média).
Acho legal até. Tem tanta coisa ruim na TV que algo como a MTV não é de tão mal
assim. Ainda trabalham em uma lógica comercial, mas me parece ser menor que as
outras emissoras. Mas, também. A MTV vai fechar, vai saber se não é exatamente
por essa lógica comercial deles não ter funcionado, né? Cresci influenciado por
Hermes e Renato e Jackass e ambos passavam na MTV. Acho que a emissora teve
um papel importante no desenvolvimento da cultural popular brasileira dos anos 90
pra cá. Muitas coisas passaram por lá (WENDER, classe média baixa).
Quando indagados sobre o que poderia ser diferente na emissora, algumas das
sugestões foram: mais foco em vídeos e programas de produtores independentes e menos
91
programas sobre comportamento (Flávio, classe média alta); o canal deveria mudar
completamente, ser mais subversivo e não “comum” (Kamila, classe média baixa).
Faz muito tempo que não vejo MTV. E agora ela está encerrando as atividades aqui
no Brasil. Na minha opinião, faz mais ou menos dez anos que o canal perdeu sua
identidade em uma tentativa frustrada de se adaptar a um novo público ao invés de
fidelizar os antigos telespectadores (GUILHERME, classe média).
Deixei de assistir a MTV há muito tempo, quando os programas que veiculavam
clipes de bandas underground – Fúria MTV, Programa do João Gordo e outros –
deixaram de ser exibidos (ROGÉRIO, classe média alta).
Dez dos onze entrevistados possuem alta frequência de acesso à internet,
permanecendo mais de quatro horas diárias online, evidência observada em todas as classes
sociais da subcultura zineira. A entrevistada que menos tempo fica online é a tatuadora
Kamila Lin, de classe média baixa, que usa a internet de uma a duas horas por dia
(considerada uma frequência mediana). Com relação aos blogs, sites e redes sociais que os
zineiros utilizam, foram relatados: Facebook, Youtube, Flickr, Vimeo, Skoob, Pinterest,
LastFM, Tumblr, Ffffound, UOL, O Estadão, Omelete, G1, Gmail, Terra, Vice, Folha de São
Paulo, Chiveta17
, Zona Punk18
, Trasher, blogs de filmes, Cantinho Vegetariano19
e Vista-Se20
.
Os blogs Zinismo21
, Zinescópio22
e Sirva-se23
foram os que mais apareceram como
resposta quando os entrevistados foram indagados sobre quais blogs sobre zines acessavam.
Apenas um dos zineiros respondeu que não acompanham nenhum blog sobre as publicações
17
“Chiveta é um fanzine online que possui música independente em geral, celebridades, ironia, glamour, trash,
cultura “inútil” e mais. O jornalismo de celebridades é uma grande influência/alvo” (CHIVETA, 2008). 18
“Sem se prender a estilos, sub-grupos ou rótulos, com a liberdade artística e editorial que os fanzines do meio
punk ensinaram, o site abrange várias vertentes musicais, dando unidade e espaço igual para bandas novas
independentes, lado a lado de grandes nomes do rock alternativo mundial. Além de abordar outros temas extra-
música, pertinentes a cultura pop e alternativa em geral em seus mais variados formatos” (ZONA PUNK, 1999). 19
“Cantinho Vegetariano é blog que traz receitas, artigos, vídeos e textos sobre vegetarianismo” (CANTINHO
VEGETARIANO, 2013). 20
“O Vista-se é um projeto que começou em 09/05/2007 e hoje é o maior portal sobre veganismo e Direitos
Animais do Brasil. O conteúdo é composto por notícias, receitas, vídeos e muitas dicas. É atualizado
diariamente. O Vista-se foi fundado e é mantido por Fábio Chaves, profissional de comunicação que trabalhou
10 anos no mercado publicitário digital e hoje se dedica inteiramente ao projeto” (VISTA-SE, 2007). 21
“Zinismo é um blog coletivo, autoral e independente formado por uma confraria de fanzineiros separados pela
distância física e aproximados pela era digital” (ZINISMO, 2008). 22
“Zinescópio é uma coleção pessoal de fanzines que está sendo digitalizada e disponibilizada semanalmente
para download em formato pdf. São centenas de fanzines que estarão disponíveis aqui no blog ao longo de 2011”
(ZINESCOPIO, 2011). 23
“A Sirva-se é obra de um grupo de pessoas que acredita na possibilidade de transformação através da arte e da
cultura. O projeto nasceu a partir da idéia de criar um produto e unir nossos esforços para criação de um produto
gratuito, auto-gerível e de qualidade. Cultura alagoana para o mundo e cultura do mundo para Alagoas”
(SIRVA-SE, 2009).
92
(Guilherme, de classe média). Outros blogs citados foram Um Zine Por Dia24
, Biblioteca
Feira Plana, Ugrapress, Tralha LAB, Coisa Edições. Muitos dos entrevistados afirmaram que
procuram se atualizar quanto aos fanzines via facebook.
Criei uma lista no facebook com zines, e recebo informação de vários que são
produzidos pelo mundo. Acompanho o POC (People of Color) Zine Project, leio
ocasionalmente o Sirva-se e em meu próprio blog (Cabeça Tédio) falo sobre o
assunto. Participo de uma rede social só de zineiros e me mantenho atualizada do
trabalho de zineiros que gosto pelas suas páginas na internet ou através de contato
pessoal (CARLA, classe média).
Quatro dos onze entrevistados nunca viram algo sobre os fanzines na grande mídia.
Entre os demais, um já conhecia os fanzines quando ouviu algo na mídia sobre o assunto
(Carla, classe média), um lembra-se de ter visto algo, mas nada que tenha chamado a atenção
(Daniel, classe média alta) e outro (Flávio, classe média alta) recorda-se de um programa dos
anos 90 chamado “Fanzine”, apresentado por Sergio Groismann. Para Wender (classe média
baixa), as publicações atravessam um momento de valorização novamente na mídia:
Recentemente, o fanzine passa por um momento de valorização novamente. Já vi
matéria no O Globo, Folha de São Paulo e por aí vai. Eu trabalha em um programa
de TV aqui em Canoas e uma vez levei alguns amigos pra falarem sobre fanzine lá
também (WENDER, classe média baixa).
Do mesmo modo que Wender (classe média baixa), Jeison, de mesma classe, acredita
que atualmente existe uma certa “paixão” pelos zines, uma valorização. Apesar disso, acredita
que seja muito vazio, que a valorização é muiro rasa. Júlio César comentou sobre a
visualização de uma matéria sobre a “explosão” de fanzineiros em Brasília. Em contraste às
opiniões dos demais, apenas Renato Donisete (classe média) fala de seu zine sendo veiculado
na mídia, em um tom de simpatia aos jornais que o divulgaram.
Hoje tem uma certa “paixão” de uma galera nova pelos zines, do nada. Acho muito
vazio, vindo de gente que nunca viu nadinha sobre e já ama tanto. Não que seja ruim
gostar do esquema, mas dá pra perceber quando é forçado (JEISON, classe média
baixa).
24
“Um Zine por Dia é um blog idealizado por Carol Brandini e Kauê Garcia a partir do interesse comum por
fanzines. A proposta do blog é a de atualizar diariamente os fanzines durante o ano de 2013, porém na data de
acesso a última postagem consta de maio deste ano. De forma breve e sem muita enrolação é isso, uma tentativa
bem simbólica e utópica de transformar em história esse importante ferramenta de comunicação tão recorrente
nos circuitos independentes” (UM ZNE POR DIA, 2013).
93
Vi zines na revista Samba e também sobre a explosão de fanzineiros em Brasília no
Correio Brasiliense (acho que esse ano), e mais alguma divulgação de evento que
envolvia produção de fanzine. Só não me lembro qual (JÚLIO CÉSAR, classe
média).
Para divulgarem suas publicações, os zineiros de todas as classes sociais utilizam
fortemente a internet, via redes sociais, como o facebook, e também e-mails, tumblrs, blogs e
fotologs. O único entrevistado que diz não divulgar seu zine na internet é Gregory (classe
média alta), que, apesar de ter afirmado isso, também disponibiliza seu zine para visualização
em um site para download, mesmo que não o anuncie em redes. A divulgação de seu zine
Acesso Público ocorre em eventos de que o zineiro participa e os quais dão apoio ao fanzine.
Apenas um entrevistado citou divulgar suas publicações via correios (Daniel, de classe
média alta). Os demais também o fazem, porém não como fonte principal de divulgação.
Cinco responderam que fazem suas divulgações em eventos e shows, entre eles dois de classe
média alta (Daniel e Gregory), dois de classe média (Guilherme, Júlio) e um de classe média
baixa (Jeison). Um zineiro de cada classe divulga em blogs (Carla, Rogério, Wender), um de
classe média alta em resenhas de revistas (Flávio), dois de classe média em mailing list
(Carla, Renato), um de classe média em troca com amigos (Carla), um de classe média em
fotolog (Renato), um de classe média alta em flickr (Rogério), dois em twitter (Rogério de
classe média alta e Guilherme de classe média), e todos divulgam no facebook, com exceção
ao zineiro Gregory. Apesar de Kamila, classe média baixa, afirmar que usa o tumblr e o
facebook para divulgar seu zine na internet, ainda assim acredita que o melhor modo de
divulgação é “o boca a boca mesmo”. Por fim, observamos que independentemente de classe
social, as divulgações entre os zineiros são similares, sendo um marcador de capital
subcultural do grupo.
Ah, pra zines é o velho boca a boca mesmo. Acho que internet não ajuda muito, é
muito melhor falar com a pessoa, já trocar uma ideia e deixar um zine (KAMILA,
classe média baixa).
Com banca em todos os eventos que conseguir ir, distribuindo na mão em qualquer
lugar que me der vontade, deixando alguns em lugares fixos (JEISON, classe média
baixa).
É observável que cinco zineiros, pertencentes a classes distintas, acreditam que a
mídia nacional não veicula informações sobre fanzines (Gregory, Guilherme, Jeison, Kamila,
94
Rogério). Curioso, exótico, pitoresco: são algumas das características que a mídia veicularia
acerca dos fanzines, na visão de dois entrevistados:
Acho que sempre como se fosse algo que as pessoas fazem por falta de opção de se
ter uma revista, ou como algo meio exótico (CARLA, classe média).
Veicula esporadicamente com algo curioso, pitoresco. Algumas abordagens recentes
têm dado destaque ao valor de que estes atingem (FLÁVIO, classe média alta).
Para três dos zineiros, um de cada classe (Júlio de média, Renato de média alta e
Wender de média baixa), o fanzine passou recentemente por um momento de razoável
valorização. Wender lembra-se de matérias relacionadas ao fanzinato no jornal O Globo e na
Folha de São Paulo. Além disso, divulgou a temática em um programa de televisão onde
trabalhava (TV Ulbra, em Canoas, Rio Grande do Sul). Na visão de Júlio, ultimamente
existem webjornais e impressos divulgando e discorrendo sobre o assunto, mas, apesar disso,
a grande mídia desconsidera os fanzines, insistindo em divulgar apenas enquanto a temática
estiver em alta. Para Renato, ultimamente a grande visualização dos fanzines na grande mídia
ocorre muito em função dos diversos eventos que estão ocorrendo, como a Fanzinada, a Ugra
Fest, a Feira Plana, mas, ainda assim, a mídia trata o tema de forma superficial. Nesta
pergunta, não foram visualizados contrastes entre as classes.
95
7 CAPITAL SUBCULTURAL
7.1 FANZINES
O capital subcultural será analisado a partir de algumas questões dentre as 74 do
questionário aplicado aos zineiros, além da análise de conteúdo dos zines impressos dos
sujeitos entrevistados. Dentro da amostra, composta por 11 zineiros, dividimos o nosso
corpus (34 fanzines) em seis categorias: a) musical (a grande maioria abordando a cena punk
e a hardcore, sua arte ou música), b) vegetariano, c) feminista, d) pessoal (com textos
autoexpressivos), e) artístico (apenas desenhos) e f) literário. Dentro de um fanzine
enquadrado em uma categoria, como a musical, por exemplo, também podemos encontrar
zines com textos pessoais e artes, porém, a classificação dos zines nas categorias que
selecionamos foi feita tendo em vista o tipo de assunto que prevalecia. Pretendemos, neste
capítulo, observar o capital subcultural nos zineiros e nos seus zines impressos e quais as
temáticas que são mais recorrentes, bem como o modo de abordagem das mesmas nas
publicações.
Primeiramente, em 17 de abril de 2013, aplicamos três perguntas para os zineiros
selecionados, que deveriam nos responder à mão, por cartas, ou via internet (esta última, caso
não houvesse tempo disponível para ir aos correios). As perguntas eram:
1) Quais são as razões, por que você considera importante o fanzine para a cena
punk/para o underground?
2) Qual o seu objetivo ao fazer um fanzine?
3) Quais as temáticas que você considera mais importante em um fanzine?
Até o final de maio de 2013, cinco zineiros haviam respondido à mão as cartas (figuras
3 a 8), enviando suas respostas pelo correio. Dentre os cinco zineiros, três pertenciam à classe
média alta (Rogério, Flávio e Daniel) e dois à classe média (Guilherme, Renato). Apenas
Rogério e Renato enviaram também zines e outras publicações junto com a carta postada. Os
demais seis entrevistados acabaram respondendo por e-mail, alguns alegando falta de tempo,
esquecimento de sentar e escrever as respostas; outros, pela rapidez e facilidade
proporcionada pelo e-mail. O objetivo do exercício era fazer com que os zineiros
reproduzissem o antigo modo de trocas de zines, que se deu principalmente nos anos 1980 e
1990 via correios. Mesmo não solicitando publicações extras (pedimos apenas as respostas às
96
questões enviadas), Rogério e Renato reproduziram o que os zineiros faziam na era pré-
internet: enviar, junto com qualquer carta, ao menos um flyer, uma divulgação da cena
independente, um fanzine. Os entrevistados de classe baixa não responderam, porém, meses
após o pedido feito por nós, Jeison escaneou a carta escrita à mão que não teve tempo de
postar e enviou-nos por e-mail (figura 7).
Figura 3 - Trecho da carta enviada por Daniel Hogrefe (classe média alta), em maio de 2013.
Fonte: Acervo pessoal.
97
Figura 4 - Carta enviada por Rogério Alves (classe média alta), em abril de 2013.
Fonte: Acervo pessoal.
Figura 5 - Carta enviada por Renato Donisete (classe média), em abril de 2013.
Fonte: Acervo pessoal.
98
Figura 6 - Trecho de carta enviada por Flávio Grão (classe média alta), em abril de 2013.
Fonte: Acervo pessoal.
99
Figura 7 - Carta de Jeison Placinsh (classe média baixa), escrita em maio de 2013.
Fonte: Acervo pessoal.
100
Figura 8 - Carta de Guilherme Gonçalves (classe média), postada em 26 de abril de 2013.
Fonte: Acervo pessoal.
Na primeira questão, que indagava sobre a importância do fanzine para o cenário do
punk e do hardcore, as respostas apontaram para as seguintes ideias: ser independente da
mídia hegemônica (chamada de “grande mídia”, por zineiros de classe média alta e média);
divulgar conceitos, ideias e informações (o que é fundamental para o underground); a
importância seria devido ao zine ser o registro da produção contracultural; a relevância do
fanzine seria a de um fazer jornalístico despretencioso, sem persuasão ou jogo de interesses
(opinião de Júlio César, classe média); estabelecer novos contatos e expandir a cooperação, a
amizade e o conhecimento. O fanzine tem certa importância dependendo da época em que se
encontra (segundo a opinião de Daniel, de classe média alta); é a essência da ideologia do
Faça Você Mesmo (Jeison, de classe média baixa); expõe ao mundo o que o zineiro vê e
sente, voltando-se para algo mais pessoal (Kamila, de classe média baixa).
É como se fosse o fazer jornalístico que a gente aprende na faculdade, só que
despretencioso com formato e escrita, horizontal entre emissor e comunicador, sem
101
persuasão e sem o jogo de interesses. Muito melhor, né? Expectadores, entusiastas e
envolvidos direta ou indiretamente com o hardcore/punk também querem e gostam
de se informar sobre o que acontece (JÚLIO CÉSAR, classe média)
Depende da época. Nos anos 80 em Washington ou em SP nos anos 90 o zine tinha
uma importância na formação de um público e na divulgação de bandas e ideias.
Hoje, antes de tudo é um meio de expressão dos mais eficientes, é um meio que dá
suporte para você fazer tudo, de ilustração a poesia, falar o que você pensa, das
bandas que você gosta, qualquer coisa, botar para fora tudo que tá dentro de você e
compartilhar com as outras pessoas (DANIEL, classe média alta).
Para registrar, anotar, expor para o mundo o que o zineiro vê e sente. Para expor
seus sentimentos, angústias, aflições, algo mais pessoal. Serve como um manual
teórico sobre esse meio que você vive. Uma extensão daquilo que se vivencia
(KAMILA, classe média baixa).
Já quando questionado sobre quais os seus objetivos ao produzirem um fanzine, as
respostas apontaram para: a) expressarem-se de alguma maneira, uma forma de autoexpressão
(três respostas de entrevistados de classe média alta, uma de classe média, todos de classe
média baixa); b) compartilhar informações do meio independente (três de classe média, um de
classe média alta); c) atingir realização pessoal (um de classe média); d) exercitar a sua
criatividade (um de classe média); e) formar uma rede de contatos (um de classe média). Para
Jeison e Kamila, zineiros de classe média baixa, produzir um zine seria uma forma de
desabafo, de descarrego.
Se eu deixar dentro de mim tudo que eu tenho acho que morro. Pode ser escrito ou
conversar com alguém ou cantar ou sei lá o que mais. O zine é mais uma forma que
eu tenho para mostrar essas coisas (JEISON, classe média baixa).
Dentre as temáticas tomadas como importantes pelos zineiros, pela subcultura, ocorreram em
todas as classes sociais respostas de zineiros que consideram que um fanzine necessita de uma
temática específica (por exemplo, um fanzine que fale sobre skate, música ou
vegetarianismo). Na classe média, Carla assinalou os zines riot grrrl, os sobre feminismo e os
sobre veganismo. Já o zineiro Guilherme destacou zines que abordam bandas independentes e
têm ideias positivas sobre o cenário hardcore. Na classe média alta, Gregory apontou fanzines
que tratam de música, arte, drogas, skate, crítica social e política. Para Rogério, de mesma
classe, as temáticas relevantes são as que tratam de arte urbana, música punk e hardcore e
também do skate. Dois zineiros não apreciam zines panfletários, que tratem sempre da mesma
temática (Guilherme, de classe média, e Jeison, de classe média baixa). Embora Jeison afirme
isso, simpatiza com a política e a crítica presentes nos zines: apenas não suporta publicações
102
radicais que tomam uma ideologia como verdade única. Os demais zineiros de classe popular
(Wender e Kamila) afirmam que qualquer temática é importante em um fanzine, desde que o
façam.
Algumas expressões-chave foram recorrentes nas respostas às primeiras três perguntas
abertas aplicadas à subcultura dos zineiros: grande mídia; mídia; movimento punk; produção
contracultural; underground; cena ou cena punk; feminismo; veganismo; skate. É interessante
observarmos que a expressão grande mídia é empregada apenas por zineiros das classes média
alta (Flávio e Daniel) e média (Guilherme), como sinônimo de mídia hegemônica; A palavra
mídia é uma vez usada por Rogério, de classe média alta.
Os fanzines geralmente não são submetidos à censuras e interesses econômicos,
como vínculos à publicidade ou anunciantes o que condiciona os temas e abordagens
dos veículos de informação da grande mídia. (FLÁVIO, classe média alta, grifo
nosso)
Nos zines circulavam informações que só podiam ir adiante através daquele meio,
informações que não encontrariam caminho na grande mídia e que não tinham
nenhuma outra forma de divulgação antes da internet. (DANIEL, classe média alta,
grifo nosso)
A importância do fanzine está na sua essência. É uma maneira de divulgar as coisas
que acontecem no meio independente sem depender dos interesses e apoio da
grande mídia. (GUILHERME, classe média, grifo nosso)
A palavra-chave observada mais empregada nas respostas é cena, como sinônimo de
cenário independente. Ela foi utilizada 18 vezes pelos zineiros de todas as classes, embora sua
recorrência tenha sido maior nos zineiros de classe média alta: todos, em algum momento,
utilizaram a expressão. Rogério Alves empregou seis vezes a palavra cena nas respostas,
Flávio três vezes e Daniel e Gregory uma vez cada. Na classe média, apenas Júlio citou cena
uma vez. Na classe média baixa, quem empregou a palavra foram Wender (duas vezes) e
Kamila (quatro vezes). Outra palavra utilizada foi veganismo, por pelo menos um zineiro de
cada classe: Kamila (classe média baixa), Daniel (classe média alta) e Carla (classe média); O
termo underground foi empregado por dois zineiros das classes média. A palavra feminismo
aparece apenas nas respostas das duas mulheres produtoras de fanzines de nossa pesquisa
(Carla, de classe média, e Kamila, de classe média baixa), o que demonstra a preocupação de
discussões sobre gênero partindo do sexo feminino. A expressão movimento punk foi
empregada por Gregory, de classe média alta, e produção contracultural foi empregada por
Carla, de classe média. Skate foi citado por zineiros das classes média alta, Gregory e Rogério
Alves.
103
Identificamos características que remetem ao capital subcultural nos sujeitos
pesquisados de classes distintas (os zineiros vinculados ao punk e ao hardcore) quando
analisamos seus bens culturais adquiridos, como coleções de CDs e discos, a aparência
(tatuagens, por exemplo) e sua concepção de que fanzinar (publicar, editar, distribuir
fanzines) é uma expressão de atitude e resistência, além de ser um ato autêntico. Ainda assim,
a característica mais marcante que expressa o capital subcultural no grupo pesquisado são as
publicações que produzem, os fanzines Nos fanzines, são experimentadas visões e formas de
compreensão do mundo, às vezes sem espaço em outras mídias. Ser um zineiro não deixa,
pois, de ser uma forma de exprimir uma experiência, uma forma de potencializar maneiras de
intervir e enxergar a experiência de estar no mundo. Ao escreverem uma crítica, desenharem,
enaltecerem um tema ou anunciarem um horizonte expressivo, os zineiros não deixam de
darem vazão àquilo que está guardado em si e têm pressa para se libertar. Desse modo,
colocam, muitas vezes, em xeque verdades instituídas e a própria vontade secretada por
saberes hegemônicos que definem as estéticas dominantes do que dizer e de como dizer a
respeito do mundo (NASCIMENTO, 2010).
Identificamos em dois fanzines dos entrevistados de classe média alta (Flávio e
Renato) a ideologia do Faça Você Mesmo, a “corporificação” do espírito punk, como já
explicado nos capítulos teóricos. A seguir, trechos dos zines Street Ground #3 (figura 9) e
Manufatura #3 (figura 10):
Figura 9 – Street Ground.
Fonte: Acervo pessoal.
Figura 10 – Manufatura.
Fonte: Acervo pessoal.
104
Nove dos onze zineiros afirmam que o fanzine impresso e o ato de fanzinar são
indiscutivelmente formas de resistência, e todos abordam, em algum momento, sobre a
internet e a era digital de forma crítica. Para os zineiros de classe média baixa, fazer um
fanzine é ir contra toda a praticidade imposta pela internet. O produto inteiramente digital não
seria adequadamente valorizado, cairia em um fácil esquecimento. Apesar disso, Wender
alerta que os zineiros devem utilizá-la de uma forma que proporcione algum auxílio, por
exemplo, na hora de divulgar as publicações.
Claro! Com tanta modernidade hoje em dia, tudo pode ser visto/lido através dessa
tela do computador. Mas há ainda os que amam escrever a mão em papel, xerocar,
colar, recortar... Isso não só é uma resistência, mas também um tesão, uma paixão
muito grande. E sem contar que é incrível e inesperado a reação das pessoas quando
você entrega um zine em suas mãos. Acho que, se fosse um link, na internet, a
pessoa nao daria tanta importância, e logo esqueceria. Um zine impresso é algo que
sempre que tu pegar nas mãos pra ler de novo, vai ter aquela coisa de "novidade",
mesmo sendo velho. Tu sempre vai ler com "outra cabeça". (KAMILA, classe média
baixa)
É. Ir contra toda a praticidade que a internet impõe. Sem contar o prazer de pegar
um papel, guardar ele e em outra ocasião poder voltar os olhos nele. É bem
prazeroso isso. Mas também não dá pra ir contra a maré, saca? A internet tá ai pra
auxiliar. Temos que utilizar de uma forma correta o que ela nos proporciona.
(WENDER, classe média baixa)
É sim. Eu não consigo dar valor a algo unicamente digital, como produto final. É tão
sem graça, e amanhã ninguém mais lembra que viu (JEISON, classe média baixa)
O único ponto de vista otimista é o de Guilherme, de classe média, que acredita que o
fanzine ainda existirá por muito tempo e não deve ser considerado um símbolo resistente.
Júlio César, de mesma classe, traz uma opinião diferente dos demais zineiros quando afirma
que é um tanto quanto fetichista a produção de fanzines impressos em um mundo sustentável
e digital.
Num mundo onde tudo é virtual e tudo e todos te mandam poupar papel por causa da
tal sustentabilidade, acho que é uma subversão fetichista e tanto fazer fanzine
impresso (JÚLIO CÉSAR, classe média).
O fanzine impresso nunca deixou de existir e certamente ainda vai durar por muito
tempo. Acho que ainda é cedo para se tornar um símbolo de resistência
(GUILHERME, classe média).
Já Daniel Hogrefe (classe média alta) afirma que os fanzines vão contra a sociedade de
consumo no momento em que o zineiro produz algo, ao invés de comprá-lo pronto. Para o
zineiro Renato Alves (classe média alta), o fanzine seria uma forma resistente não pela era
105
digital, mas por ser um formato mais fácil de distribuição e leitura do que os zines virtuais, e
atualmente existem modelos gráficos atrativos aos zineiros para produzirem suas publicações
em papel.
Acho que na verdade ficou mais como um formato fácil de distribuição e leitura. O
digital se for bem feito até rende um bom alcance de leitores e interessados no
conteúdo. Já o zine ele impresso, é por causa de toda a sua história contextual. Na
época em que surgiu não havia internet e tal, e nos dias de hoje se tem uma grande
variedade de zines impressos por haver também bons experimentos gráficos sendo
feitos além do A4 dobrado ao meio. O impresso te permite utilizar essas técnicas e
acabamento gráficos pra diferenciar e chamar a atenção (ROGÉRIO, classe média
alta)
Sim, é algo palpável num mundo digital, é algo que você troca num mundo regido
pelo consumismo, é algo que você faz ao invés de comprar pronto, é um meio de se
expressar e dizer o que eu ninguém quer ouvir, e uma coisa que pode aprender sua
atenção por uns momentos nesse mundo onde tudo é virtual e onde você faz vinte
coisas ao mesmo tempo (DANIEL, classe média alta).
A ação de publicar um fanzine (o ato de fanzinar) é, indubitavelmente, para os zineiros
da cena punk e hardcore, um modo de expressar uma atitude. Com exceção de Guilherme
(classe média), todos concordaram que a ação de fazer um fanzine é uma atitude em si
mesmo: o simples fato de sair da imobilidade ou da passividade cultural já seria uma atitude,
por meio da qual, além de expressarem-se “verdadeiramente”, saem da mesmice, expressando
opiniões, expondo seu gosto cultural pessoal e movimentando informações. Além de uma
atitude, fanzinar é uma extensão do universo particular de cada zineiro, expressa quando estes
se utilizam das técnicas manuais e expõem ao mundo seus pensamentos. De acordo com
Nascimento (2010), uma vez que, através do fanzine, o zineiro tem seu direito de autor, ele se
expõe e introjeta naquele ideal de revista características subjetivas, com o intuito de
particularizar seu trabalho criativo.
Claro, esse é o ponto. No zine podemos escrever o que pensamos e até o que não
pensamos, de forma que a gente consiga se expressar da maneira que agente
realmente é. É uma forma de estimularmos nossas cabeças e agregarmos cultura na
própria contra-cultura. Tu vai num role, vê um show e ganha uma zine. Acho que
cria uma certa identidade pra quem faz e pra quem lê (GREGORY, classe média
alta).
Ah, acho que sim. O próprio fazer zine, antes de conteúdo, já uma atitude por si só.
A expressão que ele carrega, por mais diversificada que seja (e às vezes até
inteligível) denota a atitude de alguém, seja lá sobre o que (JÚLIO CÉSAR, classe
média).
106
Acho que isso varia de acordo com o fanzine ou a pessoa que o faz. Um fanzine
pode ser um amontoado de conteúdo que não expressa nenhuma atitude, como pode
também ter isso como ponto principal (GUILHERME, classe média).
Conforme Duncombe (1997), a afirmação tantas vezes repetida de que os zines são um
produto feito por amor, e não por dinheiro, leva a outro aspecto: sobre o tipo de trabalho que é
feito por dinheiro versus o tipo de trabalho que é feito por amor. Para o cerne da ética dos
zines, é uma definição de criação e trabalho que é verdadeiramente gratificante: o trabalho em
que você tem o controle completo sobre o que você está criando, como você está fazendo isso,
e quem está fazendo isso, ou seja, trabalho autêntico.
Quanto a esta autenticidade, oito dos zineiros acreditam que o fanzine é
indiscutivelmente um fazer autêntico, pois é desenvolvido de forma criativa e autoral, de
maneira sincera. Mesmo que copie e reproduza informações já veiculadas em outras
publicações, o fazer zinístico proporciona a liberdade de reproduzi-las (Wender, classe média
baixa). A liberdade da elaboração do fanzine torna-o autêntico, se comparado ao padrão do
fazer jornalístico (Júlio César, classe média). A autenticidade não se baseia na veracidade do
conteúdo, mas na sinceridade do material (Gregory, classe média alta). Além disso, para o
zine ser autêntico, o zineiro também deve sê-lo, sendo, desse modo, o seu fanzine, o seu
reflexo. No entanto, na visão de Jeison, pertencente à classe média baixa, existem pessoas que
apenas publicam zines para “ser alguma coisa”, pertencerem à subcultura dos zineiros,
sentirem-se parte de um grupo.
Não todos. Alguns querem ser alguma coisa, querem mostrar que também são
“fanzineiros”, só pra fazer parte de mais um grupo. Mas isso é muito pessoal, posso
estar errado. Eu que tento ser o mais despretencioso sempre, só fazendo essas coisas
escritas porque ali realmente sou eu (JEISON, classe média baixa).
Já vi uns zines aí que pagavam de vanguarda e underground, mas eram financiados
por cinco empresas da cidade, além de terem apoio da prefeitura, que submeteu o
material a censura. O zine é verdadeiro se quem faz for sincero e verdadeiro também
(GREGORY, classe média alta).
Quanto ao ritual de elaboração de seus fanzines, encontramos marcas de classe na
subcultura zineira. Os zineiros de classe média alta Daniel, Rogério e Flávio fazem um
boneco para montarem suas publicações, têm uma preocupação no desenvolvimento das
etapas (como apuração, entrevistas, colagens, impressões) para a criação do fanzine. Flávio
também imprime suas publicações em gráfica, diferentemente dos demais zineiros da
subcultura, que fazem xerox de seus fanzines. Os zineiros de classe média também apuram
informações, pensam no conteúdo, fazem resenhas e possuem uma grande preocupação com o
107
xerox. Diferentemente dos zineiros das classes média alta e média, os zineiros de classe média
baixa são imprevisíveis quanto a elaboração de suas publicações, o fazem da maneira mais
manual possível e quando têm disposição e tempo livre.
Geralmente ando com um bloquinho na minha mochila. Tenho uma ideia anoto.
Quando tiver na pilha de fazer um zine, pego o bloquinho e começo a “criar”. As
vezes, esse processo pode demorar. As vezes pode ser uma tarde. Depende da
empolgação, energia, tempo disposto pra isso hehe. Geralmente faço meus fanzines
com colagem e recortes. Tento fazer o mais manual possível (WENDER, classe
média baixa).
Ah, os meus pelo menos, nunca são bem elaborados ou pensados... Vão fluindo
conforme vão passando os dias e situações. Sempre faço um zine pra botar algo pra
fora, seja bom ou ruim, é sempre assim. Descobrir, conhecer e compartir (KAMILA,
classe média baixa).
Escrevo, digito, edito, imprimo. Tudo em casa e sem frescura (JEISON, classe
média baixa).
Por vezes, os fanzines que se encontram em certa categoria específica podem trazem
brevemente outros assuntos na publicação. Nas Figuras 11 e 12, abaixo, dois trechos do
fanzine True Lies, de Carla Duarte, que se enquadra na categoria feminista, porém, em certo
momento também aborda o tema veganismo no fanzine:
Figura 11 – Trecho sobre veganismo, do fanzine True Lies, de Carla Duarte (1).
Fonte: Acervo pessoal.
Figura 12 – Trecho sobre veganismo, do fanzine True Lies, de Carla Duarte (2).
Fonte: Acervo pessoal.
108
Para Thornton (1995), a mídia é entendida como uma rede crucial para a definição e
distribuição de conhecimento cultural. Isto é, o capital subcultural considera a mídia um fator
pertinente para entender as distinções culturais juvenis por meio de seu consumo de mídia, e
seria impossível compreender essas diferenças sem uma investigação do consumo midiático.
Eu gosto da MTV, conheci muitas bandas através dela, embora tenha dado uma bela
caída, mas não dá pra exigir muito, eles tem que vender né. Meu envolvimento foi o
punk/hardcore foi gradual, mas tenho bem forte na memória o dia que baixei a
música anarquia Corporation do Dead Fish, até baixar esse som meu contato era
com bandas menos envolvidas politicamente na parada que na época passavam
direto na MTV, tipo o Offspring. A partir desse som comecei a ver que tinha algo a
mais ali no meio (DANIEL, classe média alta).
Particularmente, o Aviso Final zine sempre saiu na mídia; principalmente jornais.
Sempre divulgou meu fanzine com o maior respeito (RENATO, classe média).
Me lembro de ver a mídia falando sobre fanzines depois que eu já conhecia o
assunto. Sempre falando que os zines de papel não tinham morrido ou de algum
artista, como o Lourenço Mutarelli, que começou a carreira lançando seus desenhos
em fanzines (CARLA, classe média).
Abaixo (figura 13), um trecho do fanzine Conversas Paralelas, de Guilherme
Gonçalves (classe média):
Figura 13 - Trecho do fanzine Conversas Paralelas, de Guilherme Gonçalves.
Fonte: Acervo pessoal.
Dividimos os 34 fanzines de nossos 11 zineiros em seis categorias para fazer a análise
de conteúdo destes. Muito embora os zines abordem mais de um assunto, há sempre um tema
que prevalece. As categorias são: fanzines que abordam assuntos pessoais ou mantêm um
caráter de diário pessoal (categoria “pessoal”); fanzines que tratam sobre vegetarianismo ou
veganismo (categoria “vegetariano”); fanzines que possuem desenhos e artes ou que a arte
109
seja uma das pautas principais nos textos, resenhas e entrevistas (categoria “artístico”);
fanzines que possuem poesias, contos ou textos literários (categoria “literário”); fanzines que
abordem o feminismo como pauta principal (categoria “feminista”) e fanzines que coloquem
como tema central os estilos musicais punk e hardcore (categoria “musical”). Na tabela
abaixo, visualizamos um total de quatro fanzines pessoais, um vegetariano, quatro feministas,
sete de arte, três de poesia e 13 de música.
Dando atenção ao mais antigo gênero de zines, a música, o maior hoje, demonstra a
continuidade desta linha. Ao escrever comentários, resenhas, entrevistas sobre suas
bandas favoritas e comentando sobre sua cena musical local, as pessoas que fazem
zines musicais estão tomando um produto que é comprado e vendido como uma
mercadoria e forçando-o em um relacionamento íntimo. Em vez de depender dos
mediadores sancionados como as revistas Rolling Stone e Spin, os zineiros afirmam
seu próprio direito de falar com autoridade sobre a música que eles amam - tornando
a cultura deles (DUNCOMBE, 1997, p.115, tradução nossa).
Na Tabela 3, abaixo, visualizamos 12 publicações pertencentes aos zineiros da classe
média alta, das quais sete enquadram-se na categoria “artístico” e cinco na categoria
“musical”. Mesmo que os zines Street Ground e Last Call de Rogério Alves tratem de
música, o zine é assinado por sua editora intitulada Art Till Death, com foco em street arte
(arte urbana), skateboard e música underground. O zineiro tem por costume procurar imagens
de arte urbana em seu computador, e caso não as encontre, sai às ruas com sua máquina
digital onde captura novos registros de arte (por exemplo, pichações, adesivos e pinturas em
muros), bem como fotografa eventos que não são comumente divulgados. O fanzine é
elaborado no programa InDesign, principalmente ao que se refere a tratamento de imagens e
diagramação. Além disso, Rogério faz testes de impressão para verificar se o xerox não sairá
muito claro ou muito escuro.
Os fanzines de Flávio Grão (artísticos), de classe média alta, são elaborados a partir de
desenhos que o permitem seguir uma narrativa. A partir desta narrativa o zineiro produz
pinturas para retratar este universo na publicação, e imprime suas publicações em gráfica.
Também faz gravuras com a finalidade de encartar edições de capa dura do zine Manufatura,
aproximando-se do gênero conhecido como “Livro de Artista”.
110
Tabela 3 – Categorias de zines (classe média alta)
ZINES - CLASSE MÉDIA ALTA CATEGORIA ZINEIRO
10M3M #1 Musical Daniel Hogrefe
Tralha #2 Musical Daniel Hogrefe
Tralha #3 Musical Daniel Hogrefe
The Rising #3 Musical Daniel Hogrefe
Acesso Público Musical Gregory Debaco
Manufatura #3 Artístico Flávio Grão
Cortex #1 Artístico Flávio Grão
Acesso Público Artístico Flávio Grão
Street Ground #2 Artístico Rogério Alves
Street Ground #3 Artístico Rogério Alves
Isto Não é Um Fanzine Artístico Rogério Alves
Last Call #3 Artístico Rogério Alves
Fonte: Elaborado pela autora (2013).
Observamos 16 publicações pertencentes aos zineiros da classe média: quatro
enquadradas na categoria “feminista”, três na “pessoal” e nove na “musical” (tabela 4).
Tabela 4 – Categorias de zines (classe média)
(continua)
ZINES – CLASSE MÉDIA CATEGORIA ZINEIRO
Dialética Feminista Carla Duarte
True Lies Feminista Carla Duarte
Histérica #2 Feminista Carla Duarte
Histérica #1 Feminista Carla Duarte
Conversas Paralelas Pessoal Guilherme Gonçalves
Conversas Paralelas Pessoal Guilherme Gonçalves
Conversas Paralelas Pessoal Guilherme Gonçalves
Seja Você Mesmo 1 Musical Guilherme Gonçalves
Seja Você Mesmo 2 Musical Guilherme Gonçalves
Outono Ou Nada Musical Guilherme Gonçalves
Paranóia e Cale a Boca Musical Júlio César Baron
111
(conclusão)
Aviso Final #29 Musical Renato Donisete
Aviso Final #28 Musical Renato Donisete
Aviso Final #23 Musical Renato Donisete
Aviso Final #1 Musical Renato Donisete
Aviso Final #30 Musical Renato Donisete
Fonte: Elaborado pela autora (2013).
Na última tabela, sobre a classe média baixa, visualizamos um número reduzido de
publicações dos zineros. Porém, Jeison publica um número muito maior de zines do que
possuímos em nosso corpus, o que indica que é um zineiro bastante ativo, com mais de 30
publicações de seu zine de poesias Café Sem Açúcar, que trata sobre assuntos cotidianos e
pessoas que cercam a vida do zineiro. Ele diz não se inspirar diretamente em autores ou
bandas para o que escreve não parecer simplesmente uma cópia. Seu outro fanzine, intutulado
Aonde foi parar aquele sorriso? possui sete contos, cada um sobre um dia da semana, porém
sem a data dos dias.
Escrevo sobre alguns autores que eu gosto muito, milhões de bandas, minha mãe,
meu irmão, minha mulher, sair na rua e ver esse caos todo, gente que eu convivo
(legal ou idiota)... é muito mais a gente que ta na minha volta do que as coisas que
leio em casa que me influenciam. Não desmerecendo nenhum livro que eu goste,
muito pelo contrário né! Só que se eu "me inspirar" neles, seria uma simples cópia.
Quando comecei a escrever, até teve muito mais influencia de coisa ja feita, claro.
Acho que o que mexeu muito comigo foi uma cena de um filme sobre o Bob Dylan,
"I'm not there", onde uma mulher diz pra ele que "cantar sobre o seu tempo". Na
época em que ele queria seguir os passos do Woody Guthrie. Entende? As coisas
que eu leio já estão mortas, então preciso ir além. (JEISON, classe média baixa).
Já Wender e Kamila produziram poucas publicações. A seguir (tabela 5), podemos
visualizar quatro zines na categoria “literário”, um na categoria “pessoal” e um em
“vegetarianismo”.
112
Tabela 5 – Categorias de zines (classe média baixa)
ZINES–CLASSE MÉDIA BAIXA CATEGORIA ZINEIRO
Aonde foi parar aquele sorriso? Literário Jeison Placinsch
Café Sem Açúcar Literário Jeison Placinsch
Café Sem Açúcar #10 Literário Jeison Placinsch
Café Sem Açúcar #23 Literário Jeison Placinsch
Impasse Pessoal Kamila Lin
Linhaça Vegetariano Wender Zanon
Fonte: Elaborado pela autora (2013).
É relevante observar que os zines que trazem arte como tema principal (pintura com
nanquim, colagens, arte urbana) são elaborados por zineiros das classes média alta, indicando
um alto capital cultural destes. Outro ponto muito interessante analisado é a recorrência de
zines literários na classe média baixa, também um indicador de alto capital cultural. Como
citado anteriormente no perfil de Flávio Grão, um de seus fanzines de arte também virou
livro. A música é abordada fortemente em zines das classes alta (cinzo fanzines) e média (seis
fanzines). Abaixo (figuras 14 a 27), exemplos de fanzines de zineiros das classes média alta,
média e média baixa. Percebemos que os zines das classes alta e média são mais coloridos e
elaborados. Já os das classes mais baixas, são elaborados em preto e branco. Os textos das
publicações dos zineiros das classes média e média alta são mais elaborados se comparado
aos zines de dois dos zineiros de classe média baixa (Wender e Kamila), que possuem frases
soltas e colagens. As publicações das classes médias e médias altas são preenchidas por
entrevistas, resenhas, textos pessoais e editorial, diferentemente dos zineiros de classe média
baixa (exceto por Jeison, que produz os zines da categoria literária).
113
Figura 14 – Fanzine Cortex, de Flávio Grão.
Fonte: Acervo pessoal.
Figura 15 - Classe média alta: Zines Cortex de Flávio Grão e zine Tralha #4 de Daniel Hogrefe.
Fonte: Acervo pessoal.
114
Figura 16 – Classe média alta: Zine de Daniel Hogrefe 3M3M.
Fonte: Acervo pessoal.
Figura 17 - Classe média alta: Zine Street Ground de Rogério Alves.
Fonte: Acervo pessoal.
115
Figura 18 – Marca da editora independente de Rogério Alves “Art Till Death”, presente em seus zines.
Fonte: Acervo pessoal.
Figura 19 -Classe média: Zine Histérica de Carla Duarte
Fonte: Acervo pessoal
116
Figura 20 -Classe Média: Zine Aviso Final de Renato Donisete.
Fonte: Acervo pessoal.
Figura 21 - Classe média: Zine Paranóia e Cale a Boca de Júlio César Baron.
Fonte: Acervo pessoal.
117
Figura 22 -Classe Média: zine Seja Você Mesmo de Guilherme Gonçalves.
Fone: Acervo pessoal.
A seguir (figura 23), o editorial do fanzine Seja Você Mesmo, imitando a diagramação
da Revista Veja.
Figura 23 - Editorial e página 3 do fanzine Seja Você Mesmo, de Guilherme Gonçalves. Fonte: Acervo pessoal.
118
Figura 24 -Classe média: contracapa do zine feminista True Lies de Carla Duarte.
Fonte: Acervo pessoal.
119
Figura 25 -Classe média baixa: zine sobre vegetarianismo Linhaça de Wender Zanon.
Fonte: Acervo pessoal.
121
Figura 27 - Classe média baixa: fanzine Café Sem Açúcar, de Jeison Placinsch, com capa feita pelo amigo e
colaborador Daniel Hogrefe (entrevistado zineiro de classe média alta).
Fonte: Acervo pessoal.
Muitas vezes os zineiros buscam patrocínio para darem sequência às publicações,
principalmente quando são lançadas com periodicidade. As publicações, por vezes, ocorrem
com tiragem pré-estabelecida pelos editores. Esse é o caso de Jeison, de classe média baixa,
que busca amigos e apoiadores para custear seu fanzine, especializado em poesias (categoria
literário). O fanzine, que tem como nome Café Sem Açúcar (figura 28) é patrocinado por uma
loja de skate, um estúdio de tatuagem e uma marca de alargadores. Coisa Edições é o nome da
marca da editora de zines que possui com sua namorada.
122
Figura 28 - Retirado do fanzine Café Sem Açúcar de Jeison Placinsch.
Fonte: Acervo pessoal.
Observamos, também, a presença de uma marca de camisetas, a Risk, sendo divulgada
no fanzine de Rogério (figura 29), de classe média alta. Ao iniciar a elaboração do fanzine
Street Ground, Rogério procurou ajudar um amigo que estava começando com a Risk e deu
espaço ao trabalho, gratuitamente.
Figura 29 - Publicidade no fanzine Street Ground, de Rogério (classe média alta).
Fonte: Acervo pessoal.
Outras publicidades foram encontradas nas publicações, como em o Aviso Final
(figura 30), de Renato Donisete (classe média). Assim como o zineiro Jeison (classe média
baixa), ele publica seu fanzine com certa periodicidade e estabelece uma tiragem. Muitas
vezes, não há patrocínio ou divulgação de marcas, fazendo com que Renato arque com a
despesa de impressão do seu fanzine, assim como todos os demais zineiros das outras classes
sociais o fazem.
123
Figura 30 - Exemplo de propaganda no fanzine Aviso Final
Fonte: Acervo pessoal.
No fanzine Outono ou Nada (figuras 31 e 32), de Guilherme Gonçalves (classe
média), observamos publicidades de lojas independentes de discos e de uma loja de camisetas.
Segundo o zineiro, houve apoio nas primeiras publicações, porém, a intenção é divulgar
marcas e lojas do cenário independente, o que significa que, mesmo se não recebesse apoio
financeiro das marcas, ele divulgaria estas.
Figura 31 – Publicidades no fanzine Outono ou Nada, de Guilherme Gonçalves 1.
Fonte: Acervo pessoal.
124
Figura 32 - Publicidades no fanzine Outono ou Nada, de Guilherme Gonçalves 2.
Fonte: Acervo pessoal.
No editoral de seus zines, os zineiros escrevem sobre fatos cotidianos, agradecem a
quem colaborou e informam sobre os assuntos que a edição irá tratar. Por exemplo, no zine
Histérica, de Carla (classe média), há a explicação do nome dado ao título da publicação,
além de agradecimentos a bandas e a entrevistados.
Em relação ao editorial, todos os zineiros de classe média desenvolvem editoriais nas
publicações, à exceção de Renato Donisete (classe média), que não costuma apresentar
editorial em seu zine Aviso Final. Foi encontrado apenas um editorial na edição número 31.
Dos quatro zineiros de classe média alta, apenas Gregory não desenvolveu um
editorial em seu zine. A classe média baixa é a que menos possui publicações com editoriais.
De três entrevistados dessa classe, apenas Jeison (editor do Café Sem Açúcar) reserva uma
parte da publicação para a editoria.
Ao analisarmos os Os fanzines investigados, quando comparados entre si, percebemos
que não seguem uma diagramação padrão. A singularidade é o que torna o fanzine autêntico,
pois os formatos variam de acordo com o zineiro.
Porém, há marcas de classe social dentre os zineiros pesquisados. Elas encontram-se
nos formatos escolhidos. Os fanzines que possuem capas coloridas, com folhas de ofícios de
outras cores ou impressões diferenciadas são, em sua maioria, publicações dos zineiros de
125
classe média alta, como Daniel Hogrefe e Flávio Grão. Eles possuem edições elaboradas e
coloridas, além de utilizarem texturas diferentes, como stêncil, papel vegetal, papel cartolina e
impressão, ao invés de fotocópia. Como exemplo, temos os zines Cortex (capa vermelha com
papel vegetal sobreposto, de Flávio), 3M3M (capa azul, de Daniel) e Tralha (capa amarela, de
Daniel).
Nas publicações dos zineiros de classe média, os fanzines que possuem capas
diferenciadas são os de Carla Duarte, que utiliza a sobreposição com papel vegetal no fanzine
Histérica e colagens. As capas são personalizadas, uma a uma, o que exige um trabalho
minucioso. O fanzine Aviso Final, de Renato Donisete (classe média), algumas vezes é
fotocopiado em folhas de ofícios recicladas. Apenas uma publicação (número 38) do fanzine
foi lançada com capa amarela e em um formato menor do que o usual.
Em relação à presença de entrevistas nas edições, constatamos que estas não existem
nas publicações dos zineiros de classe baixa. Nas de zineiros de classe média, encontramos 11
publicações que possuem entrevistas, e, nas de zineiros de classe média alta, encontramos seis
publicações com entrevistas. A presença de entrevistas ocorre principalmente nos fanzines
musicais. As entrevistas são, comumente realizadas com bandas e artistas, voltados aos estilos
musicais do punk e do hardcore. Um exemplo é o fanzine Tralha #2 de Daniel (classe média
alta), que traz entrevistas com criadores de flyers (cartazes) sobre shows de punk e hardcore
no país.
Algumas contracapas contêm o número de tiragem da publicação e qual o número que
o leitor está lendo. A exemplo, temos o zine de Flávio Grão (classe média alta), conforme
Figura 33, e o de Renato Donisete (classe média), conforme Figura 34. A inscrição “93/100”
indica que o leitor está com a 93ª edição das 100 cópias publicadas.
126
Figura 33 – Fanzine Manufatura #2 de Flávio Grão.
Fonte: Acervo pessoal.
Figura 34 – Fanzine Aviso Final #31 de Renato Donisete.
Fonte: Acervo pessoal.
127
7.2 EXPRESSÕES DA SUBCULTURA ZINEIRA
Quanto à questão sobre estética, oito dos entrevistados afirmaram possuir tatuagens.
Na classe média alta, todos possuem, já na classe média apenas dois de quatro zineiros são
tatuados e, na classe baixa, apenas Wender não é tatuado. Em nossa amostra de 11 zineiros,
dois são tatuadores, (Kamila Lin, tatuadora profissional, de classe média baixa, e Daniel
Hogrefe, tatuador por hobbie, de classe média alta). Quando questionados sobre o porquê de
se tatuarem, todos afirmaram ser algo muito pessoal.
Sim. Porque eu acho bonito e romântico representar meus gostos em minha
“eternidade”. Gostar muito do disco TNT, do Tortoise, e me identificar com o
desenho tosco e com os significados que ele pode trazer (JÚLIO CÉSAR, classe
média).
Tenho tatuagem, sim, várias. Para lembrar sempre. Acho que não tem “a” mais
importante. Porque todas lembram pessoas e momentos distintos e de importâncias
distintas também. Cada uma é um pedacinho de vida que já passou e que tu
eternizou de alguma forma. Acho que, o maior sentimento vai vir quando eu tiver lá
com minhas ruguinhas, minhas pernas fracas e meu corpo fechado de momentos.
Pequenos fragmentos da minha vida que eu posso voltar a viver a hora que eu
quiser, bastando apenas olhar e relembrar aqueles dias, aquela sensação, aquela
pessoa, aquele sentimento... (KAMILA, classe média baixa).
Quanto ao vegetarianismo, observamos que, no meio punk e hardcore, é visível a
circulação de muitos vegans (vegetarianos radicais). Questionamos nossos entrevistados para
saber se aderem ou não à dieta vegetariana ou vegana, principalmente como um ato político
em prol da vida dos animais, e encontramos contrastes entre as classes. Cinco entrevistados
responderam que sim. Dos zineiros de classe média baixa dois são veganos (Kamila e
Wender) e um é vegetariano (Jeison); já dos de classe média Carla afirmou ser vegana e
Guilherme vegetariano. Porém, dentre os zineiros de classe média alta, três dos quatro não são
vegetarianos: apenas Daniel afirmou ser, porém, sem radicalismos, podendo “cair” (termo
utilizado para dizer que “caiu” da ideologia ou da causa pela qual acredita, deixando
momentaneamente de ser vegetariano) e comer carne se não tiver outra opção. Júlio César
(classe média) relata que já foi vegetariano, mas, atualmente, consome carne.
Eu sou vegetariano, mas odeio quem fica postando foto de tomate e xingando quem
posta de churrasco, sabe? Por mais que eu sei que PRA MIM isso é bom, não quer
dizer que seja bom pra todos. Vai saber se a gente não é idiota por não comer carne?
Pra alguém certamente que somos (JEISON, classe média baixa).
128
Digo que sou, não como, mas quando dá vontade eu como e dane-se. Os
vegetarianos mais radicais que eu conheci na minha vida não são mais vegetarianos,
comem no Mc Donalds e fazem churrasco hoje em dia, então prefiro evitar, mas sem
radicalismo, se dá vontade, ou se não tem muita opção fora carne eu como e já era
(DANIEL, classe média alta).
Eu virei vegano por não concordar com a exploração que os animais são submetidos.
Eu não concordo, só isso. Acho cruel comer um animal ou algo que venha dele
(WENDER, classe média baixa).
Sou vegana por amor, não só aos animais, mas às pessoas também. E também
porque acredito que tudo é energia nesse mundo, e tipo, se nos alimentarmos de
energias ruins, como vamos nos manter bem? Nos alimentar de dor, sofrimento,
abusos... Não acredito que isso faça bem pro corpo e pra alma (KAMILA, classe
média baixa).
Sobre o hábito de comprar CDs, é expressivo o número de entrevistados que
afirmaram consumir este formato: apenas dois pesquisados da classe média alta responderam
“raramente” (Flávio, Grégory). Flávio assegurou ter comprado CDs, no máximo, um mês
antes de responder à entrevista, mesmo que o faça raramente. Os demais entrevistados
garantiram comprar CDs toda semana (resposta mais recorrente nas classes média e baixa),
sempre que vão a algum show (resposta repetida em todas as classes sociais) ou quando se
interessam por algum CD nas lojas de música (resposta das classes média e alta). O consumo
de DVDs também é expressivo, já que nove dos zineiros alegaram comprar ou já terem
alguma vez adquirido o formato, exceto Flávio (média alta) e Wender (média baixa).
De acordo com Quines (2013), o estado objetivado do capital cultural relaciona-se aos
objetos materiais e textos da mídia e é transmitido na sua materialidade. Quem coleciona
discos está agregando valor, aumentando o seu capital cultural no estado objetivado. Os
discos simbolizam o conhecimento distinto de quem reconhece o valor da música e não se
contenta apenas com o “tira-gosto” de downloads em mp3 ou de streaming na internet. A
maior parte dos zineiros coleciona CDs e LPs25
(dez entrevistados), justificando adquiri-los
por gostarem do registro físico (Daniel, Guilherme, Carla), pela possibilidade de observarem a
arte do encarte, a composição, as letras das músicas (Carla, Guilherme), pela incomparável
sonoridade (Gregory), para apoiarem as bandas e mantê-las ativas (Guilherme, Kamila) e,
também, para pesquisarem bandas no acervo (Renato). Apenas um entrevistado, de classe
média baixa não coleciona CDs ou LPs devido ao custo e acaba por colecionar zines e livros
(Wender). Flávio, pertencente à classe média alta, explicou que não os reúne por falta de
25
Utilizamos a expressão de long-play (LP) como sinônimo de discos de vinil, embora a palavra “disco” tenha
um sentido mais amplo.
129
espaço e porque geralmente ouve música enquanto faz outras tarefas, escolhendo os CDs ou o
mp3 por sua praticidade e portabilidade. Júlio César (classe média) colecionava LPs, mas
acabou desfazendo-se da maioria por desapego, relatando que o sentimento de colecionar não
é o mesmo. Em contraste, Jeison, zineiro de classe média baixa, não consegue mais manter
sua coleção de mais de duzentos discos por falta de espaço, conservando atualmente sua
compilação de CDs e desfazendo-se aos poucos dos vinis, não por desapego, nem por falta de
vontade de colecioná-los.
Coleciono, por ter visto meu pai colecionar alguns LPs do Kiss, Queen e Jimi
Hendrix. Achei interessante e passei a ter gosto pelo vinil. Depois de começar a
ouvir punk, vi que parte da história do punk estava escrita nos discos e daí uma coisa
foi puxando a outra e fui percebendo a infinita possibilidade de conhecer bandas
novas através do vinil (ROGÉRIO, classe média alta).
O número de discos CDs e LPs colecionados são de mais de 200 unidades no acervo
de Jeison (classe média baixa), no de Guilherme e no de Renato (classe média); acima de 100
LPs nos acervos de Daniel e Rogério, pertencentes à classe média alta; e de mais de 50 CDs e
LPs nos de zineiros de todas as classes, como Carla e Júlio César (média), Gregory (média
alta) e Kamila (média baixa).
Inicialmente, as gravações copiavam os concertos ao vivo, mas o estúdio de
gravação passou a ser a aura, dispersaram-na e a reposicionaram. As mudanças no
consumo de música colaboraram no processo de assimilação da música gravada,
numa transformação gradual da circulação, sentido, estrutura e valor tanto dos
discos quanto das culturas musicais. Os valores associados à aura passaram a ser o
de discos novos, raros e exclusivos (THORNTON, 1995).
Segundo Thornton (1995), o capital subcultural é abastecido por uma revolta da classe
a que pertencem os pais dos indivíduos, e a distinção subcultural seria dependente de uma
fantasiosa ausência de classes. A música seria a forma cultural privilegiada dentro do mundo
subcultural juvenil. A idade seria o grupo demográfico mais significativo quando se trata de
gosto musical, na medida em que a reprodução de música na família é a fonte mais comum de
conflito de gerações, e, em contraste, a relação entre classe e o bom gosto musical seria muito
mais difícil de traçar.
Quando questionados sobre quem teria influenciado seu gosto pela música punk e
hardcore, os zineiros apontaram fortemente as influências de amigos, das mídias, como a
internet, dos videogames (resposta da classe média alta), dos professores de escola (Wender,
130
de classe média baixa) e o panorama cultural da época, por engajamento político (Renato, de
classe média). Apenas um entrevistado (Carla, de classe média) apontou também a influência
familiar.
Amigos, internet e Tony Hawk Pro skater 2 (videogame) (DANIEL, classe média
alta).
Pessoal velho do punk em Goiânia e Brasília (Bacural, Guga, Didi, CDC, Barbosa,
Márcio Mob Ape), os amigos com quem tive minha primeira banda (Alexandre,
Slake, Theo, Gabriel), Tony Hawks Pro Skater (videogame), as bandas Raimundos,
Ratos de Porão, Mukeka di Rato. (JÚLIO CÉSAR, classe média).
Ramones. Ouvi um cover deles numa compilação de bandas dos anos 80 brasileiras
e fui ouvir a música deles e nunca mais parei. Mas minha família é muito musical, e
sempre comprou CDs e LPs e ouviu rock brasileiro dos anos 80 (CARLA, classe
média).
Acredito que o panorama cultural e político dos anos 80, no ABC paulista,
favoreceu meu engajamento na música punk (RENATO, classe média).
131
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a pesquisa sobre produção de fanzines e classes sociais, buscamos compreender
como se dá a relação entre o capital subcultural (THORNTON, 1995) articulado à classe
social na subcultura zineira. O enfoque dado foi em relação aos zineiros do Brasil que se
vinculam ao cenário do punk e do hardcore. Para isso, estudamos o consumo de mídia e as
publicações impressas de 11 sujeitos investigados, nas quais encontramos marcas de classe
dentro da subcultura. Constatamos que os sujeitos consomem mídia de forma distinta e de
acordo com suas classes sociais. Foram analisados, especificamente, mídias tradicionais,
como rádio, jornal, revista e televisão.
Em comparação às outras classes, a que menos assiste à televisão é a média baixa. No
entanto, existem notáveis contrastes quanto à programação, já que os entrevistados de classe
alta consomem canais de televisão por assinatura (como Fox e Discovery Chanel), enquanto
que os zineiros de classe média e média baixa costumam assistir a canais de TV aberta, como
a Globo. Ainda assim, a subcultura como um todo possui assiste pouco à televisão: sete
zineiros, dos 11 entrevistados assistem a esse meio de comunicação menos de uma hora por
dia.
A maioria dos fanzines têm relação com a música. Quando questionados sobre a
programação da MTV, emissora especializada em música, quatro (pertencentes às classes
média e média alta) dos 11 zineiros afirmaram não assistir ao canal. Todos os sujeitos de
classe baixa assistem ou assistiam ao canal, e pelo menos um entrevistado de cada classe
social simpatiza com a emissora. Entretanto, o zineiro mais velho da amostra (Renato, de
classe média) relata que não gosta da programação da MTV pelo fato de ela ter uma
concepção mercadológica, acreditando que seu espaço seja voltado à venda e criação de
produtos “ditos” culturais.
A principal mídia consumida em todas as classes, indubitavelmente, é o livro, com alta
frequência nas classes baixa, média e alta. Na classe média, um dos sujeitos possui média
frequência de leitura de livros. Em relação ao jornal, quanto a diferenças entre as classes
sociais, constatamos que a frequência mais baixa de leitura deu-se entre os sujeitos
pertencentes à classe média baixa. Entretanto, enquanto na classe média todos leem jornais,
na classe média alta metade dos sujeitos investigados não o fazem (mas possuem outros
hábitos de leituras, como revistas nacionais e internacionais e livros).
132
As revistas são consumidas por zineiros das classes média e média alta (estes últimos,
as consomem com uma maior frequência). Um zineiro de cada uma destas classes faz
assinatura de revistas (Revista TRIP e Super Interessante, respectivamente). No entanto, a
classe média baixa apontou para uma baixa frequência dessa leitura.
Sobre os contrastes entre as revistas comerciais e os fanzines, todos os entrevistados
indicaram a existência de características distintas entre os dois suportes. Não visualizamos
diferenças de classe social neste quesito. Algumas das características ressaltadas dos zines
foram: a maneira própria de se pensar a pauta, o baixo orçamento e a liberdade de expressão.
Além disso, foi citada a despreocupação com a linha editorial sem a necessidade do lucro e a
possibilidade de os fanzines serem mais pessoais. Para os zineiros, as revistas são
caracterizadas por serem voltadas à publicidade e à informação e exercem uma falsa
imparcialidade em suas notícias, além de possuírem grande tiragem e linha editorial
comprometida com o lucro.
O rádio, quanto a questões musicais, não parece ser um hábito tão comum entre os
zineiros. Isso se explica porque são apreciadores do punk e do hardcore, estilos que
dificilmente são veiculados na maioria das grandes rádios. No entanto, o consumo do veículo
é maior na classe média: três de quatro entrevistados possui o hábito de ouvir rádio para se
manterem atualizados. Na classe média alta, apenas dois entrevistados ouvem rádio, e, na
classe baixa, nenhum dos zineiros costuma ouvir qualquer tipo de programação, o que indica
que o consumo de rádio também apresenta maior contraste entre as classes sociais da
subcultura zineira, assim como o hábito de leitura de revistas e jornais.
A internet é a mídia com maior frequência de acesso entre os sujeitos de todas as
classes sociais: dez dos 11 zineiros permanecem mais de quatro horas diárias online. Os sites
mais acessados pelo grupo são as redes sociais, como o facebook, o Youtube e endereços
eletrônicos. Entre os blogs visitados pelos entrevistados, três deles abordam fanzines:
Zinismo, Zinescópio e Sirva-Se. Muitos utilizam o facebook para se manterem atualizados a
respeitos dos fanzines.
Quanto a perceberem os fanzines na grande mídia, zineiros de todas as classes
recordam-se de algo, mas nada que tenha lhes chamado a atenção. Quatro entrevistados não se
lembram de ocorrência alguma. Para quatro zineiros das três classes sociais, o fanzine foi
abordado pela grande mídia: para Flávio (classe média alta), em um programa dos anos 90
chamado “Fanzine” de Sergio Groismann; para Wender (classe média baixa), as publicações
atualmente atravessam um momento de valorização na mídia, em que os fanzines foram
anunciados em matérias do jornal O Globo e Jornal de São Paulo; Júlio César (classe média)
133
observou matérias sobre a “explosão” dos fanzineiros no jornal Correio Brasiliense; e Renato
Donisete (classe média) já teve seu fanzine divulgado em jornais e acredita que os fanzines
têm tido certa visualização na grande mídia, ainda que de forma superficial, em decorrência
de eventos que ocorrem sobre o fanzinato.
Quanto à divulgação de suas publicações, os zineiros de todas as classes sociais
utilizam fortemente a internet: redes sociais, correio eletrônico, Tumblrs, Twitter, Flickr,
blogs e fotologs. Outros meios de divulgação são a correspondência e a divulgação em
eventos e shows. Observamos que, independentemente de classe social, as divulgações entre
os zineiros são similares, sendo um marcador do capital subcultural do grupo.
Sobre as formas de resistência dos fanzines, os sujeitos investigados, de todas as
classes sociais, afirmam que o fanzine impresso e o ato de fanzinar são indiscutivelmente
formas resistentes e argumentam em algum momento sobre a era digital de forma crítica. Para
o grupo, as publicações são resistentes à era digital e à evolução tecnológica, às grandes
corporações midiáticas, indo contra a praticidade do virtual e a sociedade de consumo, uma
vez que os zineiros decidem por elaborá-los escrevendo à mão, recortando, colando,
xerocando – mesmo que por vezes utilizem certos recursos digitais, como por exemplo,
programas para auxiliarem na diagramação. A internet, embora prática seria bastante fugaz e
os endereços de fanzines disponibilizados apenas na web logo seriam esquecidos pelos
leitores, diferentemente do fanzine de papel que podem ser guardados, favorecendo um
grande prazer também no momento em que o consumidor pode voltar à leitura com uma
maior facilidade.
O fanzine é considerado pelos entrevistados como elemento de grande importância
para o cenário punk e hardcore. Os motivos são diversos: manutenção de independência da
mídia hegemônica; divulgação de ideias e informações vinculadas ao underground, registro
da produção contracultural, realização de um jornalismo despretensioso e sem jogo de
interesses mercadológicos, estabelecimento de novos contatos, expansão do conhecimento e
da cooperação, promoção da essência ideológica do Faça Você Mesmo e exposição das visões
particulares de mundo.
Além de questionarmos os entrevistados sobre a importância das publicações para o
cenário, perguntamos quais os objetivos em elaborá-las. O “expressar-se” é a resposta mais
relatada pelos sujeitos de todas as classes sociais. Outras respostas foram: compartilhar
informações no meio independente, exercitar a criatividade e formar uma rede de contatos.
134
Para os zineiros de classe média baixa, o zine seria uma forma de desabafo, de descarrego. Já
entre as temáticas tomadas como importantes para o grupo, as respostas dos zineiros que
preferem fanzines com temáticas específicas (por exemplo, zines feministas, zines que falem
sobre arte, música) sobressaíram-se nas classes média e média alta.
Observamos expressões-chaves recorrentes nas primeiras três perguntas aplicadas à
subcultura zineira, dentre elas: grande mídia; mídia; movimento punk; produção
contracultural; underground; cena ou cena punk; feminismo; veganismo e skate. A expressão
grande mídia é empregada apenas por entrevistados das classes média alta (Flávio e Daniel) e
média (Guilherme), como sinônimo de mídia hegemônica. A palavra mais empregada
repetidas vezes foi cena (cenário independente), utilizada 18 vezes pelos zineiros de todas as
classes. Sua recorrência foi maior nas respostas dos zineiros de classe média alta: todos, em
algum momento, utilizaram a expressão.
A grande maioria dos entrevistados acredita que elaborar fanzines impressos é uma
forma de resistência e de atitude. O simples fato de saírem da imobilidade ou da passividade
cultural já seria uma atitude, pois sentem a necessidade de saírem da mesmice, expondo seus
gostos culturais pessoais e movimentando informações. Quanto a esta autenticidade, grande
parte da subcultura acredita que o fanzine é indiscutivelmente um fazer autêntico, pois é
desenvolvido de forma criativa e autoral, um fazer sincero.
Quanto à questão estética, oito dos entrevistados possuem tatuagens, e grande parte
das justificativas de tê-las apontam para uma opção bastante pessoal. Entretanto, dois zineiros
são tatuadores e encontram-se em diferentes classes: Daniel (classe média alta) trabalha por
lazer, ao passo que Kamila (classe média baixa) é profissional. Já quanto à opção de aderirem
ou não ao vegetarianismo (ideologia bastante recorrente no meio do cenário do punk e do
hardcore), cinco dos zineiros são vegetarianos ou veganos. Aqui visualizamos um contraste
de classes, pois os zineiros que pertencem à classe baixa são todos veganos, já na classe
média metade aderem a esta dieta. Na classe alta, apenas um adere, mas de forma não radical,
preferindo não ser rotulado como vegetariano.
O CD é uma mídia bastante consumida na subcultura, pois é expressivo o número de
entrevistados que coleciona este formato (nove dos 11 entrevistados). Nas classes média e
média baixa, os CDs são mais consumidos, adquiridos, normalmente, em apresentações
musicais geralmente do punk e do hardcore e lojas de música. O consumo de DVDs também
é significativo: nove dos 11 zineiros compram ou já compraram o formato. Além do consumo
de CDs e DVDs, há LPs nos acervos da maioria dos entrevistados de todas as classes sociais.
Os zineiros justificam a aquisição destes por gostarem do registro físico, pela possibilidade de
135
observarem a arte do encarte, a composição e as letras das músicas. Também foi registrado
que os entrevistados acham que o LP tem uma sonoridade melhor. Apoiar as bandas e mantê-
las ativas também é uma preocupação. Assim, notamos que é forte o hábito de colecionar CDs
e LPs entre os zineiros, o que demonstra certo comportamento autêntico, singular, diferente
ou sofisticado dentro da subcultura, indício de capital subcultural (disposição de discos).
Ao dividirmos o nosso corpus (34 fanzines) em seis categorias (pessoal, vegetariano,
artístico, literário, feminista e musical), visualizamos um total de quatro fanzines pessoais, um
sobre vegetarianismo, quatro sobre feminismo, sete sobre arte, três sobre poesia e treze sobre
música. Observamos que os zines que trazem a arte (como arte urbana, fotografia, ilustrações,
pinturas) como tema principal são elaborados por zineiros da classe média alta. Os literários
têm recorrência na classe média baixa, que abordam em poesias e contos a vida cotidiana do
autor (Jeison Placinsch). Os zines musicais são maioria e foram abordados apenas nas classes
média alta e média, onde todos abordam a música punk e hardcore através de figuras de
bandas, entrevistas, resenhas e textos opinativos. Estes são notavelmente mais coloridos e
elaborados em comparação às publicações dos zineiros da classe média baixa. Além disso, a
busca por patrocínios para custearem os gastos com xerox é visualizada na classe média baixa
(no zine Café Sem Açúcar, de Jeison), enquanto que na classe média alta a divulgação de
marcas partiu de relações de amizade, por opção própria (no zine Street Ground, de Rogério).
Na classe média, algumas vezes há o apoio financeiro de lojas e marcas de materiais
independentes que são divulgados no fanzine, como é observado dos zines Aviso Final e
Outono ou Nada (de Renato e Guilherme, respectivamente).
Percebemos que, no editorial dos fanzines, os sujeitos discorrem sobre fatos
cotidianos, agradecem outras colaborações em sua publicação, informando brevemente sobre
quais assuntos o fanzine irá tratar. Em relação ao editorial estar presente ou ausente nos
fanzines, visualizamos que todos os zineiros de classe média desenvolvem editorais em suas
publicações. A classe média baixa é a que menos possui publicações com editorial. Outro
ponto que pudemos perceber é que os zineiros não seguem um design fixo entre um e outro
que publicam: a singularidade de cada fanzine é o que o torna autêntico.
Os fanzines que possuem capas coloridas, com folhas de ofício de outras cores ou
impressões diferenciadas são, em sua maioria, publicações dos zineiros de classe média alta,
que usam stêncil, papel vegetal, folhas com texturas diferentes, papel cartolina e, algumas
vezes, impressão no lugar da fotocópia. Quanto às entrevistas presentes nas publicações,
136
percebemos que, nos zines dos sujeitos de classe média baixa, elas estão ausentes, enquanto
que, na classe média e média alta, foram encontradas 17 publicações com entrevistas.
Principalmente nos fanzines musicais é comum a presença de entrevistas com bandas e
artistas, todos voltados aos estilos musicais do punk e do hardcore.
A premissa da qual Thornton (1995) parte para discorrer sobre a distinção subcultural
é a da fantasia da ausência de classe dentro das subculturas. As publicações dos zineiros
mostraram-se como o elemento mais expressivo de sua subcultura. Nas entrevistas, o capital
subcultural pode ser percebido através das falas sobre bens culturais adquiridos, como
coleções de CDs e discos de vinil de punk e hardcore, bem como através das tatuagens e da
opção ou não pelo vegetarianismo. Os indicadores de contrastes entre os zineiros de distintas
classes sociais são fortemente percebidos no consumo de diferentes suportes midiáticos
(jornais, TV, revistas e o rádio), que evidenciam as marcas classistas. Observamos que o livro
é a mídia preferida da subcultura, bem como a internet, que apresenta alta freqüência de
consumo por parte dos zineiros. Seria interessante um estudo futuro que realizasse a análise
de conteúdo apenas de publicações com uma temática específica, elaboradas por zineiros de
classes distintas, para visualizarmos maiores recorrências entre suas classes. Outra pesquisa
interessante seria a análise do capital subcultural de subculturas zineiras imersas em outros
cenários que não os do hardcore e do punk.
Ainda que existam diferenças de classe nos zines da subcultura investigada, não
conseguimos identificá-las como sendo aquilo que eles pensam e dizem sobre os fanzines,
mas sim, ao observarmos as suas publicações, que possuem notáveis contrastes em sua
estética, na escolha de suas temáticas e também nas expressões da subcultura, a exemplo da
opção ou não pelo vegetarianismo. A ritualidade de produção zinística traz notórios contrastes
de classe, uma vez que os zineiros das classes médias altas e médias de nossa amostra fazem
apurações, pensam detalhadamente na diagramação, na escolha da impressão, no número de
páginas, em como vão dispor os elementos no papel, enquanto os zineiros de classe média
baixa elaboram seus fanzines conforme a empolgação e energia disponíveis, em datas
imprevisíveis, em que a criação surge com um impulso momentâneo. Possivelmente, isso
ocorre porque os zineiros de classe média baixa têm menos tempo para um planejamento de
criação em função do trabalho que lhes dá sustento. Já os de classe média alta e média,
possuem capital cultural escolar alto para produzirem textos com maior facilidade, ao passo
que os outros acabam discorrendo sobre temas pessoais, elaborando textos menos analíticos.
137
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GLOSSÁRIO
Anarcopunk: Originado entre as décadas de 1970 e 1980, este movimento, vertente do punk,
que alia o movimento punk a pautas autogestionárias, é construído por bandas, coletivos e
indivíduos que defendem bandeiras de luta política, como o antifascismo, o combate às
opressões, a antimercantilização da arte, dentre outros.
Baby boomer: A geração baby boomer surgiu logo após o fim da Segunda Guerra Mundial.
Hoje, estas pessoas estão com mais de 45 anos e caracterizam-se por gostarem de um
emprego fixo e estável. O termo em inglês “baby boomer” pode ser traduzido livremente para
o português como “explosão de bebês”, fenômeno social ocorrido nos Estados Unidos no final
da Segunda Guerra, ocasião em que os soldados voltaram para suas casas e conceberam filhos
em uma mesma época. Também são identificados como inventores da era “paz e amor”, pois
tinham aversão aos conflitos armados. Preferiam a música, as artes e todas as outras formas de
cultura como instrumentos para evolução humana do que as guerras.
Cena: Uma das palavras mais pronunciadas no meio punk, designa o ambiente em que estes
circulam. Assim, a “cena” é composta pelas casas onde acontecem os shows, pelas lojas que
vendem discos punks, pelos discos que distribuem material punk e, obviamente, pelos
próprios punks, como pode ser notado na expressão “fulan(o) faz parte da cena”.
Contracultura: Movimentos culturais que possuem como referência a mobilização e a
contestação de padrões culturais da sociedade.
Demo-tape: Gravação musical amadora de caráter demonstrativo, reproduzido em formato fita
cassete (K7).
Do It Yourself (DIY) (ou Faça Você Mesmo): Princípio propositivo de ação individual ou
coletiva que se propagou por meio do movimento punk. É a corporificação do espírito punk:
não dependa de ninguém para fazer na cena, faça você mesmo.
144
Fanzine: Publicação/revista artesanal independente. O termo é um neologismo resultado na
contração de fanatic (fã) e magazine (revista).
Fanzineiro ou zineiro: Editor de fanzine.
Flyer: Panfleto utilizado para divulgação de fanzines, bandas, festivais etc.
Grindcore: Vertente do punk caracterizada pela fusão de elementos musicais e políticos do
punk e do hardcore com o heavy metal. Musicalmente, utiliza-se de recursos como o vocal
gutural (rouco, grave) e músicas minimalistas.
Hardcore: Movimento originado na década de 1980. Musicalmente, trouxe a característica de
músicas com curta duração e som dissonante. Em termos de movimento, trouxe ações de
caráter mais politizado ao punk.
LP: Do inglês Long Play (Gravação Longa), é um disco de vinil com duração de 45 minutos,
em média, podendo alcançar até 60 minutos de gravação sem grande perda de qualidade. Com
o advento do CD, os LPs ficaram limitados a determinados nichos de mercado no meio
fonográfico: punk, música eletrônica e projetos especiais/artesanais.
Noisecore: Literalmente, significa barulho ou ruído. É uma espécie de antimúsica ou “a última
fronteira do punk”. Em geral, circula por meio de fitas cassete entre os apreciadores do
gênero.
Punk: Com origem na década de 1970, no Reino Unido e nos Estados Unidos, é um
movimento contracultural juvenil que interliga música, política e demais formas artísticas e
comportamentais inconformistas.
Queercore: Inicialmente denominado como homocore, esta vertente do movimento punk teve
sua origem na década de 1980, trazendo pautas sobre o direito homossexual e, atualmente,
sobre o LGTB.
Riot Grrrl (ou Riot Girl): É uma vertente do movimento punk surgida na década de 1990 que
defende pautas feministas e de libertação do gênero.
145
Skinhead: Movimento juvenil surgido no final da década de 1960, no Reino Unido.
Atualmente, divide-se entre skinheads trad (ligados às tradições dos primeiros anos de
surgimento deste movimento); rash (socialistas); sharp (antirracistas); white Power
(nazifascistas); carecas do Brasil (brasileiros nacionalistas), dentre outros.
Straight Edge: Movimento associado ao movimento punk, que defende pautas como o
vegetarianismo, a sustentabilidade e o combate às drogas.
Vegan: Vegetarianismo radicais. Seus adeptos não consomem qualquer tipo de produtos de
origem animal (como couro, gelatina, algumas pastas de dentes, alguns tecidos de roupas
etc.).
Vegetarianismo: Dieta à base de produtos vegetais, com a exclusão de carne e seus derivados.
149
APÊNDICE A – ENTREVISTA
Data: / /
1. Nome completo:
2. Idade:
3. Endereço completo:
4. Bairro:
5. Número de pessoas que residem na casa:
6. Profissão:
7. Onde trabalha:
8. Se for casado(a):
Profissão do marido/onde trabalha:
Profissão da esposa/onde trabalha:
9. Religião:
10. Responsável pelo sustento da família:
11. Profissão da Mãe:
12. Profissão do pai:
13. Profissão dos avós com os quais tem mais proximidade (apenas a profissão, não
precisa colocar nomes):
14. Filhos: Sim ( ) Não ( ) / Quantos:
15. A sua escolaridade:
( ) Ensino Fundamental Incompleto ( ) Ensino Fundamental Completo
( ) Ensino Médio Incompleto ( ) Ensino Médio Completo
( ) Ensino Superior Incompleto ( ) Ensino Superior Completo
( ) Pós-graduação
150
16. Estado Civil: ( ) Solteira/o ( ) Casado(a) ( ) Divorciado(a) ( ) Viúva(o) ( ) União
estável
17. Qual sua atividade de lazer favorita?
18. Qual o número de horas dedicadas à televisão?
( ) menos de 1h ( ) entre 1h e 2h ( ) entre 2h e 3h ( ) entre 3h e 4h ( ) mais de 4h
19. Que companhia costuma ter quando assiste tv?
( ) família
( ) sozinho(a)
( ) namorado(a), noivo(a)
( ) amigos
( ) outros:
20. Qual o seu canal de televisão favorito? Por quê?
21. Lê jornais? ( )Sim ( )Não
Quais? : _______________
22. Com que frequência?
( ) Diariamente ( ) 2 a 3 vezes por semana ( )Semanalmente
( )Quinzenalmente ( )Raramente
23. Lê revistas? ( )Sim ( )Não Quais? __
24. Com que frequência?
( ) Diariamente ( ) 2 a 3 vezes por semana ( )Semanalmente
( )Quinzenalmente ( )Raramente
25. Assina alguma revista? ( )Sim ( )Não Quais? ___
26. Encomenda muitos zines? Quais?
27. O que você acha que que difere entre uma revista comercial e um fanzine?
28. Você tem o hábito de ler livros? ( )Sim ( )Não
29. Com que frequência você lê livros?
151
( ) Diariamente ( ) 2 a 3 vezes por semana ( )Semanalmente
( )Quinzenalmente ( ) Raramente
30. Cite algum livro que tenha lido e que tenha alguma relação com o punk/hardcore? (Se leu
mais de um, cite os dois que tenha achado mais interessante. Se não leu nenhum, só responda
“não li”)
31. Você tem o hábito de ouvir rádio? ( )Sim ( )Não Qual (is) rádios? _____
32. Com que frequência você escuta rádio?
( ) Diariamente ( ) 2 a 3 vezes por semana ( )Semanalmente
( )Quinzenalmente ( )Raramente
33. O que você acha de canais como a MTV? O que poderia ser diferente?
34. Por quantas horas diárias você usa a internet?
( ) menos de 1 hora ( ) de 1 a 2 horas ( ) de 2 a 4 horas ( ) mais de 4 horas
35. Quais sites/blogs/redes sociais você costuma acessar?
36. Você acompanha algum site/blog que fale de fanzines?
( )Sim ( )Não Qual (is)?
37. Com que frequência você faz download de música?
38. Você possui tatuagens?
( ) sim ( ) não
Se não, pode pular para a questão 41.
39. Porque você se tatua? (pode responder brevemente sobre o que pensa a respeito)
40. Qual o sentido da tatuagem mais “importante” para você, que já tenha feito?
41. Com que frequência você compra CDs?
( ) toda a semana ( ) raramente ( ) sempre que vou a algum show ( ) quando
encontrava algum que me intessava em lojas ( ) não compro mais
42. Qual foi a última vez em que comprou CD?
( ) no máximo há um mês ( ) há mais de 6 meses ( ) há mais de um ano ( ) há mais
de dois anos
152
43. Você já comprou DVDs de bandas?
( )Sim ( )Não
Qual (is)?
44. Você coleciona CDs ou LPs?
( )Sim ( )Não
45. Se coleciona, porque coleciona?
Se não coleciona, porque não coleciona?
46. Se sim, qual a média de CDs+Lps você acha que tem?
( ) menos de 50 cds e lps
( ) mais de 50 cds e lps
( ) acima de 100 cds e lps
( ) acima de 200 lps e CDs
47. Você teve contato com fitas cassete para conhecer alguma banda punk/hardcore?
( ) sim ( ) não
48. Se teve contato, por onde se deu este contato com fitas cassete?
49. Onde você costuma ouvir música?
50. Enquanto escuta música, costuma realizar outras atividades?
( )Sim ( )Não
Quais?
51. Quem tu acredita que tenha te influenciado no gosto pela música punk/hardcore?
52. Qual a recordação mais antiga que você tem do momento em que passou a
gostar de punk/hardcore?
53. Como você entrou pela primeira vez em contato com os fanzines?
54. Você lembra de algo que a mídia já tenha falado sobre os fanzines?
55. Cite exemplos de bandas (3) que tu acredita que tenham uma trajetória
autêntica, alternativa. E exemplos (3) de bandas que tenham se vendido.
56. Quais bandas você já citou em seu zine, se já citou alguma?
57. Quanto tempo por dia você ouve música (em horas)?
153
58. Qual o melhor show ao qual você já foi. Por quê?
59. Qual show você gostaria de assistir. Por quê?
60. Em se tratando de música, o que tu não gosta (estilos musicais que não gosta)?
61. Como tu definiria os temas presentes nas letras de música das bandas que tu costuma
ouvir?
62. Em quais lugares geralmente você vê shows?
63. Já participou de algum festival? Quais? Em que lugar e em qual cidade?
64. Você é vegetariano ou vegan?
65. Quais mídias ou meios de divulgação você utiliza/utilizava para divulgar o teu fanzine?
66. Na internet, quais sites você usa/ou usava para divulgar o seu zine?
67. Você recebe ajuda de outras pessoas do cenário independente ao fazer seu zine?
68. Como a mídia nacional veicula informações sobre os zines? (Se acha que não veicula, só
responde “não veicula”)
69. Você acredita que fazer um fanzine é expressar uma atitude? Por quê?
70. Você acredita que um zine é autêntico? Em relação a que?
71. Há quanto tempo o zine existe/ por quanto tempo está em circulação?
72. Explicação do nome do fanzine que faz parte:
73 . Como, geralmente, você produz seu fanzine? (etapas)
74. Você acredita que o fanzine impresso é uma forma de resistência? Porque?
157
ANEXO A– FOTOS DOS FANZINES
Figura 1 - Zines Tralha (Daniel Hogrefe) e Aviso Final (Renato Donisete)
Fonte: Acervo pessoal.
159
Figura 3 - Contracapa do fanzine Histérica enquadrado na categoria feminista, de Carla Duarte.
Fonte: Acervo pessoal.
160
Figura 4 - Contracapa do fanzine Paranóia e Cale a Boca de Júlio César Baron.
Fonte: Acervo pessoal.
161
Figura 5 - Exemplo de uma temática diferente dentro do fanzine True Lies, feminista de Carla Duarte (classe
média).
Fonte: Acervo pessoal.
162
Figura 6 - Indicações de leituras, retirado do fanzine Street Ground de Rogério Alves.
Fonte: Acervo pessoal.
164
Figura 8 - Trecho do fanzine Impasse de Kamila Lin (escaneado pela zineira).
Fonte: Acervo pessoal.
165
Figura 9 - Trecho do zine Impasse, de Kamila Lin (escaneado pela zineira).
Fonte: Acervo pessoal.