Sonhos, Religião E Psicologia analítica

70
1 MARIA DANÚZIA CARVALHO PROENÇA SONHOS, RELIGIÃO E PSICOLOGIA ANALÍTICA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA

Transcript of Sonhos, Religião E Psicologia analítica

Page 1: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

1

MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA

SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA

Curitiba PR 2008

PONTIFIacuteCIA UNIVERSIDADE CATOacuteLICA DO PARANAacute

CENTRO DE CIEcircNCIAS BIOLOacuteGICAS E DA SAUacuteDECURSO DE ESPECIALIZACcedilAtildeO EM PSICOLOGIA

ANALIacuteTICA

2

MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA

SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA

Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista

Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016

Curitiba PR 2008

3

MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA

SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA

Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista

COMISSAtildeO ORGANIZADORA

Prof

Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute

Prof

Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute

Prof

Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute

Curitiba PR 2008

4

RESUMO

Analisar o sonho principal agente do sono buscando melhor compreender os motivos que fizeram com que o mesmo fosse relegado a segundo plano ao esquecimento ou pior ainda passasse a ser encarado trabalho de charlatatildeo interpretar o significado do que foi sonhado essa eacute a proposta do presente estudo Fazendo uma modesta revisatildeo de literatura sobre os sonhos encontramos em vaacuterios periacuteodos da histoacuteria e em culturas completamente diferentes entre si o tema ldquosonhordquo aparecer com encantamento mas tambeacutem como uma incoacutegnita Constatamos que as mesmas perguntas repetem-se ao longo dos seacuteculos Qual a finalidade do sonho existe por capricho ou necessidade satildeo enviados por deuses ou democircnios podemos acreditar neles ou natildeo Diversos estudos foram e outros estatildeo sendo realizados buscando uma resposta satisfatoacuteria e nesta busca observamos o afastamento dos povos do ocidente em relaccedilatildeo ao oniacuterico mais especificamente entre os cristatildeos que foram encorajados pela igreja a natildeo valorizar os sonhos Surge entatildeo uma nova ciecircncia a psicologia e com ela ressurge a proposta de resgatar esta preciosa fonte de informaccedilotildees que nos eacute entregue enquanto dormimos e que ao longo de nossas vidas enquanto caminhantes da jornada terrena nos auxiliaraacute promovendo nosso auto-conhecimento rumo agrave individuaccedilatildeo

Palavras-chave sono sonho religiatildeo psicologia auto-conhecimento

ABSTRACT

To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization

Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge

5

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO06

2 SONHOS E RELIGIAtildeO21

3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47

REFEREcircNCIAS49

6

1 INTRODUCcedilAtildeO

Sonhar

Sonhar eacute transportar-se em asas de ouro e accediloAos paacuteramos azuis da luz e da harmoniaEacute ambicionar o ceacuteu eacute dominar o espaccediloNum vocirco poderoso e audaz da fantasia

Fugir ao mundo vil tatildeo vil que sem cansaccediloEngana e menospreza e zomba e caluniaEncastelar-se enfim no deslumbrante paccediloDe um sonho puro e bom de paz e de alegria

Eacute ver no lago um mar nas nuvens um casteloNa luz de um pirilampo um sol pequeno e beloEacute alccedilar constantemente o olhar ao ceacuteu profundo

Sonhar eacute ter um grande ideal na ingloacuteria lidaTatildeo grande que natildeo cabe inteiro nesta vidaTatildeo puro que natildeo vive em plagas deste mundo

Helena Kolody

ldquoHaacute quinhentos anos um grupo de corajosos exploradores cruzou o oceano

em busca de um novo continente uma terra misteriosa oculta por um mar nunca

explorado do qual natildeo existia mapa algum Nesses tempos muitos eram aqueles que

consideravam tais viagens uma perda de tempo e de recursos De fato a civilizaccedilatildeo

ateacute entatildeo tinha evoluiacutedo durante seacuteculos sem este tipo de exploraccedilatildeo

Contra todos os prognoacutesticos este grupo de exploradores arriscou-se a

prosseguir atraiacutedos pelo desconhecido por uma intensa vontade de descobrir

Abandonaram a comodidade dos seus lares para embarcar numa viagem aleacutem dos

horizontes conhecidos Enfrentando os seus medos e as suas duacutevidas assim como

os da sociedade mantiveram-se firmes no seu objetivo ateacute que finalmente

alcanccedilaram a sua meta a sua descoberta

7

Atualmente encontramo-nos perante um idecircntico tipo de exploraccedilatildeo temos

um oceano de energia por explorar agrave espera de ser conquistado por quem possua a

visatildeo e o valor suficientes para ir mais aleacutem dos seus horizontes fiacutesicos Como no

passado a visatildeo do explorador deve superar a fronteira fiacutesica Da mesma forma que

anteriormente o explorador deve possuir o impulso e tomar a decisatildeo de viajar para

aleacutem dos limites conhecidos pela sociedade e pela ciecircncia Deve viajar sozinho

longe das massas que se agarram com tudo o que podem agrave seguranccedila da terra

firme

Hoje assim como no passado um uacutenico motivo impulsiona os exploradores

a necessidade de descobrir por si mesmos porque aceitar algo que natildeo seja um

conhecimento em primeira matildeo seraacute render-se agraves ideacuteias e agraves suposiccedilotildees de quem

soacute conhece a terra soacutelida

Neste momento cada um de noacutes tem a oportunidade de ir mais aleacutem das

fronteiras do universo fiacutesico e de se converter num explorador Todos podemos

compartilhar esta fantaacutestica aventura (Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures

Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman) Site 1

Este breve estudo propotildee a tentativa de compreender o lugar ocupado pelo

sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que sempre o valorizou

desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua importacircncia para a

psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a anaacutelise e para o

auto-conhecimento do paciente

Hall nos auxilia nesta busca por compreender os sonhos fazendo uma

ligaccedilatildeo entre duas realidades inseparaacuteveis

ldquoEm todas as religiotildees e em todas as civilizaccedilotildees antigas os sonhos tecircm sido considerados uma importante via de ligaccedilatildeo entre o mundo cotidiano e outro mundo ndash o mundo espiritual o mundo dos deuses o reino arquetiacutepico em linguagem moderna o inconscienterdquo (2003 p 119)

Todos os fenocircmenos que satildeo vivos e dinacircmicos e natildeo se enquadram agraves

foacutermulas tradicionais jaacute estabelecidas encontram-se enredados em misteacuterios e

situaccedilotildees inexplicaacuteveis assim tambeacutem ocorre com os sonhos eles natildeo podem mais

ser interpretados como fantasias nem permanecer reduzidos agraves foacutermulas e

explicaccedilotildees mecanicistas que guiaram a velha ciecircncia A rapidez com que estaacute se

8

desenvolvendo a aacuterea cientiacutefica necessita com urgecircncia de um novo paradigma e a

academia lentamente estaacute aceitando a probabilidade do imponderaacutevel que nem

tudo pode ser explicado racionalmente e que a dinacircmica e o misteacuterio da vida estaacute

por ser descoberto

Utilizando o saber de Edinger e sua definiccedilatildeo sobre a importacircncia atribuiacuteda

agrave psicologia nos diz que uma nova era estaacute iniciando e que convenccedilotildees e

convicccedilotildees estatildeo sendo colocadas agrave prova e remodeladas

ldquoA descoberta da psicologia profunda no seacuteculo XX eacute na minha opiniatildeo pelo menos tatildeo importante quanto e igual em grandeza agrave descoberta da fiacutesica nuclear Vejam o que aconteceu Por milhares de anos a humanidade possui o conceito de alma de psique de uma consciecircncia elementar de que a subjetividade humana eacute um fator muito importante mas a humanidade estava tatildeo proacutexima a essa realidade que natildeo conseguia trataacute-la de maneira empiacuterica ou cientiacutefica A imagem que gosto de usar eacute de um peixe nadando numa lagoa Existe uma anedota agradaacutevel uma anedota oriental que chegou a mim certa vez O mestre Zen pergunta ao aprendiz ldquoQuem descobriu a aacutegua O aprendiz natildeo sabe entatildeo o mestre responde ldquoBom eu tambeacutem natildeo sei mas sei quem natildeo descobriu o peixerdquo Como vocecircs podem ver os seres humanos estatildeo exatamente na mesma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave psique Eles vivem dentro dela E foi isso que abriu as portas para o estudo cientiacutefico da psique Essa eacute realmente uma enorme revoluccedilatildeo copernica que ainda mal comeccedilou a penetrar na consciecircncia coletivardquo (2004 p 14 - 15)

Whitmont reforccedila este alerta ao dito mundo moderno onde prevalece o

racional o meacutetodo exato pleno de saber cientiacutefico ao dizer que

ldquoNa nossa eacutepoca este racionalismo extrovertido chegou a tal extremo que jaacute se comentou que ldquonatildeo apenas o mundo ocidental mas a humanidade como um todo corre o rico de perder sua alma para as coisas externas da vida Nossas forccedilas extrovertidas do intelecto estatildeo preocupadas com a alimentaccedilatildeo adequada com os cuidados higiecircnicos das regiotildees subdesenvolvidas do mundo assim como com a elevaccedilatildeo do nosso padratildeo de vida que as funccedilotildees irracionais o coraccedilatildeo e a alma estatildeo cada vez mais ameaccedilados de atrofiardquo Alguns dos resultados desta ecircnfase unilateral satildeo as neuroses individuais e de massa que encontramos atualmente com o perigo sempre presente de erupccedilotildees explosivas Os viacutecios do aacutelcool dos narcoacuteticos e das ldquodrogas para expansatildeo da menterdquo tambeacutem expressam uma busca de experiecircncias emocionais que se perderam no decorrer da nossa extrema intelectualizaccedilatildeo Mas natildeo eacute apenas o viacutecio do aacutelcool e das drogas o ldquoviacutecio do trabalhordquo a ldquodoenccedila do gerenterdquo a necessidade compulsiva de sempre se ter algo para fazer a fim de parecer ocupado tambeacutem indicam a incapacidade do homem moderno de encontrar sentido na vidardquo (2002 p17)

9

A importacircncia dos sonhos que se perdera com o passar do tempo e a

absorccedilatildeo de dogmas religiosos incentivando seu abandono fez com que eles

passassem a ser desencorajados de ser interpretados e ateacute mesmo de serem

reconhecidos como algo de valor pessoal os sonhos passaram a ser vistos como

manifestaccedilotildees simploacuterias e desprovidas de qualquer sentido de loacutegica poreacutem no

iniacutecio do seacuteculo XX um meacutedico jaacute entatildeo reconhecido por seu trabalho publicou um

livro sobre sonhos e como narra o professor psicoacutelogo e padre episcopaliano

Kelsey

ldquoSigmund Freud publicou A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos em 1900 Aiacute se mapeava um modo de explorar a relaccedilatildeo do sonho com o inconsciente humano Eacute difiacutecil dar a real dimensatildeo da importacircncia de seu trabalho mesmo sabendo que o proacuteprio Freud tinha consciecircncia disso pois enfatizara mais de uma vez que a publicaccedilatildeo de seu livro fora sincronizada para coincidir com o iniacutecio de uma nova era Claro que ele natildeo foi o primeiro a falar na existecircncia do inconsciente e na importacircncia dos sonhos a partir do ponto de vista cientiacutefico Mas foi o primeiro a relacionar essa duas dimensotildees e a realizar um estudo empiacuterico de focirclego sobre o assunto escrevendo com clareza e na verdade com forccedila tatildeo convincente que suas opiniotildees natildeo poderiam ser ignoradasEntretanto Freud encontrou pouco mais que desprezo entre os proacuteprios colegas de profissatildeo Soacute depois de oito anos eacute que se esgotou a primeira ediccedilatildeo de seiscentos exemplares de A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Embora fosse difiacutecil ignorar o que dizia suas ideacuteias eram ridicularizadas e por muito tempo esse tipo de riso se constituiu em boa defesa contra a sua contribuiccedilatildeordquo (1996 p 270 271)

Para falar sobre os sonhos e sua relevacircncia temos que falar primeiramente

sobre o sono e diferentemente do que muitos ainda pensam o sono natildeo eacute um

estado passivo inerte ldquouma quase morterdquo nosso ceacuterebro continua a pleno vapor

trabalhando neste periacuteodo em que nosso corpo fiacutesico descansa

No ano de 1937 Alfred Loomis fisiologista na universidade de Princeton

estudou imagens de um indiviacuteduo dormindo num aparelho novo o

eletrencefalograma (EEG) e descobriu que o ceacuterebro natildeo descansava ele

permanecia ativo Loomis detectou uma intensa atividade eleacutetrica noturna no ceacuterebro

de seus pacientes comparou-o a um diacutenamo e concluiu que o sono se desenvolve

em fases com frequumlecircncia eleacutetrica diferente em cada uma delas Mais tarde isso

permitiria distinguir as cinco etapas do sono conhecidas atualmente

Somente agora transcorridos 70 anos da descoberta eacute que os cientistas

comeccedilaram a fazer uso das conclusotildees de Loomi para procurar entender a

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 2: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

2

MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA

SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA

Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista

Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016

Curitiba PR 2008

3

MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA

SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA

Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista

COMISSAtildeO ORGANIZADORA

Prof

Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute

Prof

Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute

Prof

Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute

Curitiba PR 2008

4

RESUMO

Analisar o sonho principal agente do sono buscando melhor compreender os motivos que fizeram com que o mesmo fosse relegado a segundo plano ao esquecimento ou pior ainda passasse a ser encarado trabalho de charlatatildeo interpretar o significado do que foi sonhado essa eacute a proposta do presente estudo Fazendo uma modesta revisatildeo de literatura sobre os sonhos encontramos em vaacuterios periacuteodos da histoacuteria e em culturas completamente diferentes entre si o tema ldquosonhordquo aparecer com encantamento mas tambeacutem como uma incoacutegnita Constatamos que as mesmas perguntas repetem-se ao longo dos seacuteculos Qual a finalidade do sonho existe por capricho ou necessidade satildeo enviados por deuses ou democircnios podemos acreditar neles ou natildeo Diversos estudos foram e outros estatildeo sendo realizados buscando uma resposta satisfatoacuteria e nesta busca observamos o afastamento dos povos do ocidente em relaccedilatildeo ao oniacuterico mais especificamente entre os cristatildeos que foram encorajados pela igreja a natildeo valorizar os sonhos Surge entatildeo uma nova ciecircncia a psicologia e com ela ressurge a proposta de resgatar esta preciosa fonte de informaccedilotildees que nos eacute entregue enquanto dormimos e que ao longo de nossas vidas enquanto caminhantes da jornada terrena nos auxiliaraacute promovendo nosso auto-conhecimento rumo agrave individuaccedilatildeo

Palavras-chave sono sonho religiatildeo psicologia auto-conhecimento

ABSTRACT

To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization

Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge

5

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO06

2 SONHOS E RELIGIAtildeO21

3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47

REFEREcircNCIAS49

6

1 INTRODUCcedilAtildeO

Sonhar

Sonhar eacute transportar-se em asas de ouro e accediloAos paacuteramos azuis da luz e da harmoniaEacute ambicionar o ceacuteu eacute dominar o espaccediloNum vocirco poderoso e audaz da fantasia

Fugir ao mundo vil tatildeo vil que sem cansaccediloEngana e menospreza e zomba e caluniaEncastelar-se enfim no deslumbrante paccediloDe um sonho puro e bom de paz e de alegria

Eacute ver no lago um mar nas nuvens um casteloNa luz de um pirilampo um sol pequeno e beloEacute alccedilar constantemente o olhar ao ceacuteu profundo

Sonhar eacute ter um grande ideal na ingloacuteria lidaTatildeo grande que natildeo cabe inteiro nesta vidaTatildeo puro que natildeo vive em plagas deste mundo

Helena Kolody

ldquoHaacute quinhentos anos um grupo de corajosos exploradores cruzou o oceano

em busca de um novo continente uma terra misteriosa oculta por um mar nunca

explorado do qual natildeo existia mapa algum Nesses tempos muitos eram aqueles que

consideravam tais viagens uma perda de tempo e de recursos De fato a civilizaccedilatildeo

ateacute entatildeo tinha evoluiacutedo durante seacuteculos sem este tipo de exploraccedilatildeo

Contra todos os prognoacutesticos este grupo de exploradores arriscou-se a

prosseguir atraiacutedos pelo desconhecido por uma intensa vontade de descobrir

Abandonaram a comodidade dos seus lares para embarcar numa viagem aleacutem dos

horizontes conhecidos Enfrentando os seus medos e as suas duacutevidas assim como

os da sociedade mantiveram-se firmes no seu objetivo ateacute que finalmente

alcanccedilaram a sua meta a sua descoberta

7

Atualmente encontramo-nos perante um idecircntico tipo de exploraccedilatildeo temos

um oceano de energia por explorar agrave espera de ser conquistado por quem possua a

visatildeo e o valor suficientes para ir mais aleacutem dos seus horizontes fiacutesicos Como no

passado a visatildeo do explorador deve superar a fronteira fiacutesica Da mesma forma que

anteriormente o explorador deve possuir o impulso e tomar a decisatildeo de viajar para

aleacutem dos limites conhecidos pela sociedade e pela ciecircncia Deve viajar sozinho

longe das massas que se agarram com tudo o que podem agrave seguranccedila da terra

firme

Hoje assim como no passado um uacutenico motivo impulsiona os exploradores

a necessidade de descobrir por si mesmos porque aceitar algo que natildeo seja um

conhecimento em primeira matildeo seraacute render-se agraves ideacuteias e agraves suposiccedilotildees de quem

soacute conhece a terra soacutelida

Neste momento cada um de noacutes tem a oportunidade de ir mais aleacutem das

fronteiras do universo fiacutesico e de se converter num explorador Todos podemos

compartilhar esta fantaacutestica aventura (Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures

Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman) Site 1

Este breve estudo propotildee a tentativa de compreender o lugar ocupado pelo

sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que sempre o valorizou

desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua importacircncia para a

psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a anaacutelise e para o

auto-conhecimento do paciente

Hall nos auxilia nesta busca por compreender os sonhos fazendo uma

ligaccedilatildeo entre duas realidades inseparaacuteveis

ldquoEm todas as religiotildees e em todas as civilizaccedilotildees antigas os sonhos tecircm sido considerados uma importante via de ligaccedilatildeo entre o mundo cotidiano e outro mundo ndash o mundo espiritual o mundo dos deuses o reino arquetiacutepico em linguagem moderna o inconscienterdquo (2003 p 119)

Todos os fenocircmenos que satildeo vivos e dinacircmicos e natildeo se enquadram agraves

foacutermulas tradicionais jaacute estabelecidas encontram-se enredados em misteacuterios e

situaccedilotildees inexplicaacuteveis assim tambeacutem ocorre com os sonhos eles natildeo podem mais

ser interpretados como fantasias nem permanecer reduzidos agraves foacutermulas e

explicaccedilotildees mecanicistas que guiaram a velha ciecircncia A rapidez com que estaacute se

8

desenvolvendo a aacuterea cientiacutefica necessita com urgecircncia de um novo paradigma e a

academia lentamente estaacute aceitando a probabilidade do imponderaacutevel que nem

tudo pode ser explicado racionalmente e que a dinacircmica e o misteacuterio da vida estaacute

por ser descoberto

Utilizando o saber de Edinger e sua definiccedilatildeo sobre a importacircncia atribuiacuteda

agrave psicologia nos diz que uma nova era estaacute iniciando e que convenccedilotildees e

convicccedilotildees estatildeo sendo colocadas agrave prova e remodeladas

ldquoA descoberta da psicologia profunda no seacuteculo XX eacute na minha opiniatildeo pelo menos tatildeo importante quanto e igual em grandeza agrave descoberta da fiacutesica nuclear Vejam o que aconteceu Por milhares de anos a humanidade possui o conceito de alma de psique de uma consciecircncia elementar de que a subjetividade humana eacute um fator muito importante mas a humanidade estava tatildeo proacutexima a essa realidade que natildeo conseguia trataacute-la de maneira empiacuterica ou cientiacutefica A imagem que gosto de usar eacute de um peixe nadando numa lagoa Existe uma anedota agradaacutevel uma anedota oriental que chegou a mim certa vez O mestre Zen pergunta ao aprendiz ldquoQuem descobriu a aacutegua O aprendiz natildeo sabe entatildeo o mestre responde ldquoBom eu tambeacutem natildeo sei mas sei quem natildeo descobriu o peixerdquo Como vocecircs podem ver os seres humanos estatildeo exatamente na mesma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave psique Eles vivem dentro dela E foi isso que abriu as portas para o estudo cientiacutefico da psique Essa eacute realmente uma enorme revoluccedilatildeo copernica que ainda mal comeccedilou a penetrar na consciecircncia coletivardquo (2004 p 14 - 15)

Whitmont reforccedila este alerta ao dito mundo moderno onde prevalece o

racional o meacutetodo exato pleno de saber cientiacutefico ao dizer que

ldquoNa nossa eacutepoca este racionalismo extrovertido chegou a tal extremo que jaacute se comentou que ldquonatildeo apenas o mundo ocidental mas a humanidade como um todo corre o rico de perder sua alma para as coisas externas da vida Nossas forccedilas extrovertidas do intelecto estatildeo preocupadas com a alimentaccedilatildeo adequada com os cuidados higiecircnicos das regiotildees subdesenvolvidas do mundo assim como com a elevaccedilatildeo do nosso padratildeo de vida que as funccedilotildees irracionais o coraccedilatildeo e a alma estatildeo cada vez mais ameaccedilados de atrofiardquo Alguns dos resultados desta ecircnfase unilateral satildeo as neuroses individuais e de massa que encontramos atualmente com o perigo sempre presente de erupccedilotildees explosivas Os viacutecios do aacutelcool dos narcoacuteticos e das ldquodrogas para expansatildeo da menterdquo tambeacutem expressam uma busca de experiecircncias emocionais que se perderam no decorrer da nossa extrema intelectualizaccedilatildeo Mas natildeo eacute apenas o viacutecio do aacutelcool e das drogas o ldquoviacutecio do trabalhordquo a ldquodoenccedila do gerenterdquo a necessidade compulsiva de sempre se ter algo para fazer a fim de parecer ocupado tambeacutem indicam a incapacidade do homem moderno de encontrar sentido na vidardquo (2002 p17)

9

A importacircncia dos sonhos que se perdera com o passar do tempo e a

absorccedilatildeo de dogmas religiosos incentivando seu abandono fez com que eles

passassem a ser desencorajados de ser interpretados e ateacute mesmo de serem

reconhecidos como algo de valor pessoal os sonhos passaram a ser vistos como

manifestaccedilotildees simploacuterias e desprovidas de qualquer sentido de loacutegica poreacutem no

iniacutecio do seacuteculo XX um meacutedico jaacute entatildeo reconhecido por seu trabalho publicou um

livro sobre sonhos e como narra o professor psicoacutelogo e padre episcopaliano

Kelsey

ldquoSigmund Freud publicou A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos em 1900 Aiacute se mapeava um modo de explorar a relaccedilatildeo do sonho com o inconsciente humano Eacute difiacutecil dar a real dimensatildeo da importacircncia de seu trabalho mesmo sabendo que o proacuteprio Freud tinha consciecircncia disso pois enfatizara mais de uma vez que a publicaccedilatildeo de seu livro fora sincronizada para coincidir com o iniacutecio de uma nova era Claro que ele natildeo foi o primeiro a falar na existecircncia do inconsciente e na importacircncia dos sonhos a partir do ponto de vista cientiacutefico Mas foi o primeiro a relacionar essa duas dimensotildees e a realizar um estudo empiacuterico de focirclego sobre o assunto escrevendo com clareza e na verdade com forccedila tatildeo convincente que suas opiniotildees natildeo poderiam ser ignoradasEntretanto Freud encontrou pouco mais que desprezo entre os proacuteprios colegas de profissatildeo Soacute depois de oito anos eacute que se esgotou a primeira ediccedilatildeo de seiscentos exemplares de A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Embora fosse difiacutecil ignorar o que dizia suas ideacuteias eram ridicularizadas e por muito tempo esse tipo de riso se constituiu em boa defesa contra a sua contribuiccedilatildeordquo (1996 p 270 271)

Para falar sobre os sonhos e sua relevacircncia temos que falar primeiramente

sobre o sono e diferentemente do que muitos ainda pensam o sono natildeo eacute um

estado passivo inerte ldquouma quase morterdquo nosso ceacuterebro continua a pleno vapor

trabalhando neste periacuteodo em que nosso corpo fiacutesico descansa

No ano de 1937 Alfred Loomis fisiologista na universidade de Princeton

estudou imagens de um indiviacuteduo dormindo num aparelho novo o

eletrencefalograma (EEG) e descobriu que o ceacuterebro natildeo descansava ele

permanecia ativo Loomis detectou uma intensa atividade eleacutetrica noturna no ceacuterebro

de seus pacientes comparou-o a um diacutenamo e concluiu que o sono se desenvolve

em fases com frequumlecircncia eleacutetrica diferente em cada uma delas Mais tarde isso

permitiria distinguir as cinco etapas do sono conhecidas atualmente

Somente agora transcorridos 70 anos da descoberta eacute que os cientistas

comeccedilaram a fazer uso das conclusotildees de Loomi para procurar entender a

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 3: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

3

MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA

SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA

Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista

COMISSAtildeO ORGANIZADORA

Prof

Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute

Prof

Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute

Prof

Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute

Curitiba PR 2008

4

RESUMO

Analisar o sonho principal agente do sono buscando melhor compreender os motivos que fizeram com que o mesmo fosse relegado a segundo plano ao esquecimento ou pior ainda passasse a ser encarado trabalho de charlatatildeo interpretar o significado do que foi sonhado essa eacute a proposta do presente estudo Fazendo uma modesta revisatildeo de literatura sobre os sonhos encontramos em vaacuterios periacuteodos da histoacuteria e em culturas completamente diferentes entre si o tema ldquosonhordquo aparecer com encantamento mas tambeacutem como uma incoacutegnita Constatamos que as mesmas perguntas repetem-se ao longo dos seacuteculos Qual a finalidade do sonho existe por capricho ou necessidade satildeo enviados por deuses ou democircnios podemos acreditar neles ou natildeo Diversos estudos foram e outros estatildeo sendo realizados buscando uma resposta satisfatoacuteria e nesta busca observamos o afastamento dos povos do ocidente em relaccedilatildeo ao oniacuterico mais especificamente entre os cristatildeos que foram encorajados pela igreja a natildeo valorizar os sonhos Surge entatildeo uma nova ciecircncia a psicologia e com ela ressurge a proposta de resgatar esta preciosa fonte de informaccedilotildees que nos eacute entregue enquanto dormimos e que ao longo de nossas vidas enquanto caminhantes da jornada terrena nos auxiliaraacute promovendo nosso auto-conhecimento rumo agrave individuaccedilatildeo

Palavras-chave sono sonho religiatildeo psicologia auto-conhecimento

ABSTRACT

To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization

Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge

5

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO06

2 SONHOS E RELIGIAtildeO21

3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47

REFEREcircNCIAS49

6

1 INTRODUCcedilAtildeO

Sonhar

Sonhar eacute transportar-se em asas de ouro e accediloAos paacuteramos azuis da luz e da harmoniaEacute ambicionar o ceacuteu eacute dominar o espaccediloNum vocirco poderoso e audaz da fantasia

Fugir ao mundo vil tatildeo vil que sem cansaccediloEngana e menospreza e zomba e caluniaEncastelar-se enfim no deslumbrante paccediloDe um sonho puro e bom de paz e de alegria

Eacute ver no lago um mar nas nuvens um casteloNa luz de um pirilampo um sol pequeno e beloEacute alccedilar constantemente o olhar ao ceacuteu profundo

Sonhar eacute ter um grande ideal na ingloacuteria lidaTatildeo grande que natildeo cabe inteiro nesta vidaTatildeo puro que natildeo vive em plagas deste mundo

Helena Kolody

ldquoHaacute quinhentos anos um grupo de corajosos exploradores cruzou o oceano

em busca de um novo continente uma terra misteriosa oculta por um mar nunca

explorado do qual natildeo existia mapa algum Nesses tempos muitos eram aqueles que

consideravam tais viagens uma perda de tempo e de recursos De fato a civilizaccedilatildeo

ateacute entatildeo tinha evoluiacutedo durante seacuteculos sem este tipo de exploraccedilatildeo

Contra todos os prognoacutesticos este grupo de exploradores arriscou-se a

prosseguir atraiacutedos pelo desconhecido por uma intensa vontade de descobrir

Abandonaram a comodidade dos seus lares para embarcar numa viagem aleacutem dos

horizontes conhecidos Enfrentando os seus medos e as suas duacutevidas assim como

os da sociedade mantiveram-se firmes no seu objetivo ateacute que finalmente

alcanccedilaram a sua meta a sua descoberta

7

Atualmente encontramo-nos perante um idecircntico tipo de exploraccedilatildeo temos

um oceano de energia por explorar agrave espera de ser conquistado por quem possua a

visatildeo e o valor suficientes para ir mais aleacutem dos seus horizontes fiacutesicos Como no

passado a visatildeo do explorador deve superar a fronteira fiacutesica Da mesma forma que

anteriormente o explorador deve possuir o impulso e tomar a decisatildeo de viajar para

aleacutem dos limites conhecidos pela sociedade e pela ciecircncia Deve viajar sozinho

longe das massas que se agarram com tudo o que podem agrave seguranccedila da terra

firme

Hoje assim como no passado um uacutenico motivo impulsiona os exploradores

a necessidade de descobrir por si mesmos porque aceitar algo que natildeo seja um

conhecimento em primeira matildeo seraacute render-se agraves ideacuteias e agraves suposiccedilotildees de quem

soacute conhece a terra soacutelida

Neste momento cada um de noacutes tem a oportunidade de ir mais aleacutem das

fronteiras do universo fiacutesico e de se converter num explorador Todos podemos

compartilhar esta fantaacutestica aventura (Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures

Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman) Site 1

Este breve estudo propotildee a tentativa de compreender o lugar ocupado pelo

sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que sempre o valorizou

desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua importacircncia para a

psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a anaacutelise e para o

auto-conhecimento do paciente

Hall nos auxilia nesta busca por compreender os sonhos fazendo uma

ligaccedilatildeo entre duas realidades inseparaacuteveis

ldquoEm todas as religiotildees e em todas as civilizaccedilotildees antigas os sonhos tecircm sido considerados uma importante via de ligaccedilatildeo entre o mundo cotidiano e outro mundo ndash o mundo espiritual o mundo dos deuses o reino arquetiacutepico em linguagem moderna o inconscienterdquo (2003 p 119)

Todos os fenocircmenos que satildeo vivos e dinacircmicos e natildeo se enquadram agraves

foacutermulas tradicionais jaacute estabelecidas encontram-se enredados em misteacuterios e

situaccedilotildees inexplicaacuteveis assim tambeacutem ocorre com os sonhos eles natildeo podem mais

ser interpretados como fantasias nem permanecer reduzidos agraves foacutermulas e

explicaccedilotildees mecanicistas que guiaram a velha ciecircncia A rapidez com que estaacute se

8

desenvolvendo a aacuterea cientiacutefica necessita com urgecircncia de um novo paradigma e a

academia lentamente estaacute aceitando a probabilidade do imponderaacutevel que nem

tudo pode ser explicado racionalmente e que a dinacircmica e o misteacuterio da vida estaacute

por ser descoberto

Utilizando o saber de Edinger e sua definiccedilatildeo sobre a importacircncia atribuiacuteda

agrave psicologia nos diz que uma nova era estaacute iniciando e que convenccedilotildees e

convicccedilotildees estatildeo sendo colocadas agrave prova e remodeladas

ldquoA descoberta da psicologia profunda no seacuteculo XX eacute na minha opiniatildeo pelo menos tatildeo importante quanto e igual em grandeza agrave descoberta da fiacutesica nuclear Vejam o que aconteceu Por milhares de anos a humanidade possui o conceito de alma de psique de uma consciecircncia elementar de que a subjetividade humana eacute um fator muito importante mas a humanidade estava tatildeo proacutexima a essa realidade que natildeo conseguia trataacute-la de maneira empiacuterica ou cientiacutefica A imagem que gosto de usar eacute de um peixe nadando numa lagoa Existe uma anedota agradaacutevel uma anedota oriental que chegou a mim certa vez O mestre Zen pergunta ao aprendiz ldquoQuem descobriu a aacutegua O aprendiz natildeo sabe entatildeo o mestre responde ldquoBom eu tambeacutem natildeo sei mas sei quem natildeo descobriu o peixerdquo Como vocecircs podem ver os seres humanos estatildeo exatamente na mesma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave psique Eles vivem dentro dela E foi isso que abriu as portas para o estudo cientiacutefico da psique Essa eacute realmente uma enorme revoluccedilatildeo copernica que ainda mal comeccedilou a penetrar na consciecircncia coletivardquo (2004 p 14 - 15)

Whitmont reforccedila este alerta ao dito mundo moderno onde prevalece o

racional o meacutetodo exato pleno de saber cientiacutefico ao dizer que

ldquoNa nossa eacutepoca este racionalismo extrovertido chegou a tal extremo que jaacute se comentou que ldquonatildeo apenas o mundo ocidental mas a humanidade como um todo corre o rico de perder sua alma para as coisas externas da vida Nossas forccedilas extrovertidas do intelecto estatildeo preocupadas com a alimentaccedilatildeo adequada com os cuidados higiecircnicos das regiotildees subdesenvolvidas do mundo assim como com a elevaccedilatildeo do nosso padratildeo de vida que as funccedilotildees irracionais o coraccedilatildeo e a alma estatildeo cada vez mais ameaccedilados de atrofiardquo Alguns dos resultados desta ecircnfase unilateral satildeo as neuroses individuais e de massa que encontramos atualmente com o perigo sempre presente de erupccedilotildees explosivas Os viacutecios do aacutelcool dos narcoacuteticos e das ldquodrogas para expansatildeo da menterdquo tambeacutem expressam uma busca de experiecircncias emocionais que se perderam no decorrer da nossa extrema intelectualizaccedilatildeo Mas natildeo eacute apenas o viacutecio do aacutelcool e das drogas o ldquoviacutecio do trabalhordquo a ldquodoenccedila do gerenterdquo a necessidade compulsiva de sempre se ter algo para fazer a fim de parecer ocupado tambeacutem indicam a incapacidade do homem moderno de encontrar sentido na vidardquo (2002 p17)

9

A importacircncia dos sonhos que se perdera com o passar do tempo e a

absorccedilatildeo de dogmas religiosos incentivando seu abandono fez com que eles

passassem a ser desencorajados de ser interpretados e ateacute mesmo de serem

reconhecidos como algo de valor pessoal os sonhos passaram a ser vistos como

manifestaccedilotildees simploacuterias e desprovidas de qualquer sentido de loacutegica poreacutem no

iniacutecio do seacuteculo XX um meacutedico jaacute entatildeo reconhecido por seu trabalho publicou um

livro sobre sonhos e como narra o professor psicoacutelogo e padre episcopaliano

Kelsey

ldquoSigmund Freud publicou A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos em 1900 Aiacute se mapeava um modo de explorar a relaccedilatildeo do sonho com o inconsciente humano Eacute difiacutecil dar a real dimensatildeo da importacircncia de seu trabalho mesmo sabendo que o proacuteprio Freud tinha consciecircncia disso pois enfatizara mais de uma vez que a publicaccedilatildeo de seu livro fora sincronizada para coincidir com o iniacutecio de uma nova era Claro que ele natildeo foi o primeiro a falar na existecircncia do inconsciente e na importacircncia dos sonhos a partir do ponto de vista cientiacutefico Mas foi o primeiro a relacionar essa duas dimensotildees e a realizar um estudo empiacuterico de focirclego sobre o assunto escrevendo com clareza e na verdade com forccedila tatildeo convincente que suas opiniotildees natildeo poderiam ser ignoradasEntretanto Freud encontrou pouco mais que desprezo entre os proacuteprios colegas de profissatildeo Soacute depois de oito anos eacute que se esgotou a primeira ediccedilatildeo de seiscentos exemplares de A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Embora fosse difiacutecil ignorar o que dizia suas ideacuteias eram ridicularizadas e por muito tempo esse tipo de riso se constituiu em boa defesa contra a sua contribuiccedilatildeordquo (1996 p 270 271)

Para falar sobre os sonhos e sua relevacircncia temos que falar primeiramente

sobre o sono e diferentemente do que muitos ainda pensam o sono natildeo eacute um

estado passivo inerte ldquouma quase morterdquo nosso ceacuterebro continua a pleno vapor

trabalhando neste periacuteodo em que nosso corpo fiacutesico descansa

No ano de 1937 Alfred Loomis fisiologista na universidade de Princeton

estudou imagens de um indiviacuteduo dormindo num aparelho novo o

eletrencefalograma (EEG) e descobriu que o ceacuterebro natildeo descansava ele

permanecia ativo Loomis detectou uma intensa atividade eleacutetrica noturna no ceacuterebro

de seus pacientes comparou-o a um diacutenamo e concluiu que o sono se desenvolve

em fases com frequumlecircncia eleacutetrica diferente em cada uma delas Mais tarde isso

permitiria distinguir as cinco etapas do sono conhecidas atualmente

Somente agora transcorridos 70 anos da descoberta eacute que os cientistas

comeccedilaram a fazer uso das conclusotildees de Loomi para procurar entender a

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 4: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

4

RESUMO

Analisar o sonho principal agente do sono buscando melhor compreender os motivos que fizeram com que o mesmo fosse relegado a segundo plano ao esquecimento ou pior ainda passasse a ser encarado trabalho de charlatatildeo interpretar o significado do que foi sonhado essa eacute a proposta do presente estudo Fazendo uma modesta revisatildeo de literatura sobre os sonhos encontramos em vaacuterios periacuteodos da histoacuteria e em culturas completamente diferentes entre si o tema ldquosonhordquo aparecer com encantamento mas tambeacutem como uma incoacutegnita Constatamos que as mesmas perguntas repetem-se ao longo dos seacuteculos Qual a finalidade do sonho existe por capricho ou necessidade satildeo enviados por deuses ou democircnios podemos acreditar neles ou natildeo Diversos estudos foram e outros estatildeo sendo realizados buscando uma resposta satisfatoacuteria e nesta busca observamos o afastamento dos povos do ocidente em relaccedilatildeo ao oniacuterico mais especificamente entre os cristatildeos que foram encorajados pela igreja a natildeo valorizar os sonhos Surge entatildeo uma nova ciecircncia a psicologia e com ela ressurge a proposta de resgatar esta preciosa fonte de informaccedilotildees que nos eacute entregue enquanto dormimos e que ao longo de nossas vidas enquanto caminhantes da jornada terrena nos auxiliaraacute promovendo nosso auto-conhecimento rumo agrave individuaccedilatildeo

Palavras-chave sono sonho religiatildeo psicologia auto-conhecimento

ABSTRACT

To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization

Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge

5

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO06

2 SONHOS E RELIGIAtildeO21

3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47

REFEREcircNCIAS49

6

1 INTRODUCcedilAtildeO

Sonhar

Sonhar eacute transportar-se em asas de ouro e accediloAos paacuteramos azuis da luz e da harmoniaEacute ambicionar o ceacuteu eacute dominar o espaccediloNum vocirco poderoso e audaz da fantasia

Fugir ao mundo vil tatildeo vil que sem cansaccediloEngana e menospreza e zomba e caluniaEncastelar-se enfim no deslumbrante paccediloDe um sonho puro e bom de paz e de alegria

Eacute ver no lago um mar nas nuvens um casteloNa luz de um pirilampo um sol pequeno e beloEacute alccedilar constantemente o olhar ao ceacuteu profundo

Sonhar eacute ter um grande ideal na ingloacuteria lidaTatildeo grande que natildeo cabe inteiro nesta vidaTatildeo puro que natildeo vive em plagas deste mundo

Helena Kolody

ldquoHaacute quinhentos anos um grupo de corajosos exploradores cruzou o oceano

em busca de um novo continente uma terra misteriosa oculta por um mar nunca

explorado do qual natildeo existia mapa algum Nesses tempos muitos eram aqueles que

consideravam tais viagens uma perda de tempo e de recursos De fato a civilizaccedilatildeo

ateacute entatildeo tinha evoluiacutedo durante seacuteculos sem este tipo de exploraccedilatildeo

Contra todos os prognoacutesticos este grupo de exploradores arriscou-se a

prosseguir atraiacutedos pelo desconhecido por uma intensa vontade de descobrir

Abandonaram a comodidade dos seus lares para embarcar numa viagem aleacutem dos

horizontes conhecidos Enfrentando os seus medos e as suas duacutevidas assim como

os da sociedade mantiveram-se firmes no seu objetivo ateacute que finalmente

alcanccedilaram a sua meta a sua descoberta

7

Atualmente encontramo-nos perante um idecircntico tipo de exploraccedilatildeo temos

um oceano de energia por explorar agrave espera de ser conquistado por quem possua a

visatildeo e o valor suficientes para ir mais aleacutem dos seus horizontes fiacutesicos Como no

passado a visatildeo do explorador deve superar a fronteira fiacutesica Da mesma forma que

anteriormente o explorador deve possuir o impulso e tomar a decisatildeo de viajar para

aleacutem dos limites conhecidos pela sociedade e pela ciecircncia Deve viajar sozinho

longe das massas que se agarram com tudo o que podem agrave seguranccedila da terra

firme

Hoje assim como no passado um uacutenico motivo impulsiona os exploradores

a necessidade de descobrir por si mesmos porque aceitar algo que natildeo seja um

conhecimento em primeira matildeo seraacute render-se agraves ideacuteias e agraves suposiccedilotildees de quem

soacute conhece a terra soacutelida

Neste momento cada um de noacutes tem a oportunidade de ir mais aleacutem das

fronteiras do universo fiacutesico e de se converter num explorador Todos podemos

compartilhar esta fantaacutestica aventura (Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures

Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman) Site 1

Este breve estudo propotildee a tentativa de compreender o lugar ocupado pelo

sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que sempre o valorizou

desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua importacircncia para a

psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a anaacutelise e para o

auto-conhecimento do paciente

Hall nos auxilia nesta busca por compreender os sonhos fazendo uma

ligaccedilatildeo entre duas realidades inseparaacuteveis

ldquoEm todas as religiotildees e em todas as civilizaccedilotildees antigas os sonhos tecircm sido considerados uma importante via de ligaccedilatildeo entre o mundo cotidiano e outro mundo ndash o mundo espiritual o mundo dos deuses o reino arquetiacutepico em linguagem moderna o inconscienterdquo (2003 p 119)

Todos os fenocircmenos que satildeo vivos e dinacircmicos e natildeo se enquadram agraves

foacutermulas tradicionais jaacute estabelecidas encontram-se enredados em misteacuterios e

situaccedilotildees inexplicaacuteveis assim tambeacutem ocorre com os sonhos eles natildeo podem mais

ser interpretados como fantasias nem permanecer reduzidos agraves foacutermulas e

explicaccedilotildees mecanicistas que guiaram a velha ciecircncia A rapidez com que estaacute se

8

desenvolvendo a aacuterea cientiacutefica necessita com urgecircncia de um novo paradigma e a

academia lentamente estaacute aceitando a probabilidade do imponderaacutevel que nem

tudo pode ser explicado racionalmente e que a dinacircmica e o misteacuterio da vida estaacute

por ser descoberto

Utilizando o saber de Edinger e sua definiccedilatildeo sobre a importacircncia atribuiacuteda

agrave psicologia nos diz que uma nova era estaacute iniciando e que convenccedilotildees e

convicccedilotildees estatildeo sendo colocadas agrave prova e remodeladas

ldquoA descoberta da psicologia profunda no seacuteculo XX eacute na minha opiniatildeo pelo menos tatildeo importante quanto e igual em grandeza agrave descoberta da fiacutesica nuclear Vejam o que aconteceu Por milhares de anos a humanidade possui o conceito de alma de psique de uma consciecircncia elementar de que a subjetividade humana eacute um fator muito importante mas a humanidade estava tatildeo proacutexima a essa realidade que natildeo conseguia trataacute-la de maneira empiacuterica ou cientiacutefica A imagem que gosto de usar eacute de um peixe nadando numa lagoa Existe uma anedota agradaacutevel uma anedota oriental que chegou a mim certa vez O mestre Zen pergunta ao aprendiz ldquoQuem descobriu a aacutegua O aprendiz natildeo sabe entatildeo o mestre responde ldquoBom eu tambeacutem natildeo sei mas sei quem natildeo descobriu o peixerdquo Como vocecircs podem ver os seres humanos estatildeo exatamente na mesma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave psique Eles vivem dentro dela E foi isso que abriu as portas para o estudo cientiacutefico da psique Essa eacute realmente uma enorme revoluccedilatildeo copernica que ainda mal comeccedilou a penetrar na consciecircncia coletivardquo (2004 p 14 - 15)

Whitmont reforccedila este alerta ao dito mundo moderno onde prevalece o

racional o meacutetodo exato pleno de saber cientiacutefico ao dizer que

ldquoNa nossa eacutepoca este racionalismo extrovertido chegou a tal extremo que jaacute se comentou que ldquonatildeo apenas o mundo ocidental mas a humanidade como um todo corre o rico de perder sua alma para as coisas externas da vida Nossas forccedilas extrovertidas do intelecto estatildeo preocupadas com a alimentaccedilatildeo adequada com os cuidados higiecircnicos das regiotildees subdesenvolvidas do mundo assim como com a elevaccedilatildeo do nosso padratildeo de vida que as funccedilotildees irracionais o coraccedilatildeo e a alma estatildeo cada vez mais ameaccedilados de atrofiardquo Alguns dos resultados desta ecircnfase unilateral satildeo as neuroses individuais e de massa que encontramos atualmente com o perigo sempre presente de erupccedilotildees explosivas Os viacutecios do aacutelcool dos narcoacuteticos e das ldquodrogas para expansatildeo da menterdquo tambeacutem expressam uma busca de experiecircncias emocionais que se perderam no decorrer da nossa extrema intelectualizaccedilatildeo Mas natildeo eacute apenas o viacutecio do aacutelcool e das drogas o ldquoviacutecio do trabalhordquo a ldquodoenccedila do gerenterdquo a necessidade compulsiva de sempre se ter algo para fazer a fim de parecer ocupado tambeacutem indicam a incapacidade do homem moderno de encontrar sentido na vidardquo (2002 p17)

9

A importacircncia dos sonhos que se perdera com o passar do tempo e a

absorccedilatildeo de dogmas religiosos incentivando seu abandono fez com que eles

passassem a ser desencorajados de ser interpretados e ateacute mesmo de serem

reconhecidos como algo de valor pessoal os sonhos passaram a ser vistos como

manifestaccedilotildees simploacuterias e desprovidas de qualquer sentido de loacutegica poreacutem no

iniacutecio do seacuteculo XX um meacutedico jaacute entatildeo reconhecido por seu trabalho publicou um

livro sobre sonhos e como narra o professor psicoacutelogo e padre episcopaliano

Kelsey

ldquoSigmund Freud publicou A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos em 1900 Aiacute se mapeava um modo de explorar a relaccedilatildeo do sonho com o inconsciente humano Eacute difiacutecil dar a real dimensatildeo da importacircncia de seu trabalho mesmo sabendo que o proacuteprio Freud tinha consciecircncia disso pois enfatizara mais de uma vez que a publicaccedilatildeo de seu livro fora sincronizada para coincidir com o iniacutecio de uma nova era Claro que ele natildeo foi o primeiro a falar na existecircncia do inconsciente e na importacircncia dos sonhos a partir do ponto de vista cientiacutefico Mas foi o primeiro a relacionar essa duas dimensotildees e a realizar um estudo empiacuterico de focirclego sobre o assunto escrevendo com clareza e na verdade com forccedila tatildeo convincente que suas opiniotildees natildeo poderiam ser ignoradasEntretanto Freud encontrou pouco mais que desprezo entre os proacuteprios colegas de profissatildeo Soacute depois de oito anos eacute que se esgotou a primeira ediccedilatildeo de seiscentos exemplares de A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Embora fosse difiacutecil ignorar o que dizia suas ideacuteias eram ridicularizadas e por muito tempo esse tipo de riso se constituiu em boa defesa contra a sua contribuiccedilatildeordquo (1996 p 270 271)

Para falar sobre os sonhos e sua relevacircncia temos que falar primeiramente

sobre o sono e diferentemente do que muitos ainda pensam o sono natildeo eacute um

estado passivo inerte ldquouma quase morterdquo nosso ceacuterebro continua a pleno vapor

trabalhando neste periacuteodo em que nosso corpo fiacutesico descansa

No ano de 1937 Alfred Loomis fisiologista na universidade de Princeton

estudou imagens de um indiviacuteduo dormindo num aparelho novo o

eletrencefalograma (EEG) e descobriu que o ceacuterebro natildeo descansava ele

permanecia ativo Loomis detectou uma intensa atividade eleacutetrica noturna no ceacuterebro

de seus pacientes comparou-o a um diacutenamo e concluiu que o sono se desenvolve

em fases com frequumlecircncia eleacutetrica diferente em cada uma delas Mais tarde isso

permitiria distinguir as cinco etapas do sono conhecidas atualmente

Somente agora transcorridos 70 anos da descoberta eacute que os cientistas

comeccedilaram a fazer uso das conclusotildees de Loomi para procurar entender a

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 5: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

5

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO06

2 SONHOS E RELIGIAtildeO21

3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47

REFEREcircNCIAS49

6

1 INTRODUCcedilAtildeO

Sonhar

Sonhar eacute transportar-se em asas de ouro e accediloAos paacuteramos azuis da luz e da harmoniaEacute ambicionar o ceacuteu eacute dominar o espaccediloNum vocirco poderoso e audaz da fantasia

Fugir ao mundo vil tatildeo vil que sem cansaccediloEngana e menospreza e zomba e caluniaEncastelar-se enfim no deslumbrante paccediloDe um sonho puro e bom de paz e de alegria

Eacute ver no lago um mar nas nuvens um casteloNa luz de um pirilampo um sol pequeno e beloEacute alccedilar constantemente o olhar ao ceacuteu profundo

Sonhar eacute ter um grande ideal na ingloacuteria lidaTatildeo grande que natildeo cabe inteiro nesta vidaTatildeo puro que natildeo vive em plagas deste mundo

Helena Kolody

ldquoHaacute quinhentos anos um grupo de corajosos exploradores cruzou o oceano

em busca de um novo continente uma terra misteriosa oculta por um mar nunca

explorado do qual natildeo existia mapa algum Nesses tempos muitos eram aqueles que

consideravam tais viagens uma perda de tempo e de recursos De fato a civilizaccedilatildeo

ateacute entatildeo tinha evoluiacutedo durante seacuteculos sem este tipo de exploraccedilatildeo

Contra todos os prognoacutesticos este grupo de exploradores arriscou-se a

prosseguir atraiacutedos pelo desconhecido por uma intensa vontade de descobrir

Abandonaram a comodidade dos seus lares para embarcar numa viagem aleacutem dos

horizontes conhecidos Enfrentando os seus medos e as suas duacutevidas assim como

os da sociedade mantiveram-se firmes no seu objetivo ateacute que finalmente

alcanccedilaram a sua meta a sua descoberta

7

Atualmente encontramo-nos perante um idecircntico tipo de exploraccedilatildeo temos

um oceano de energia por explorar agrave espera de ser conquistado por quem possua a

visatildeo e o valor suficientes para ir mais aleacutem dos seus horizontes fiacutesicos Como no

passado a visatildeo do explorador deve superar a fronteira fiacutesica Da mesma forma que

anteriormente o explorador deve possuir o impulso e tomar a decisatildeo de viajar para

aleacutem dos limites conhecidos pela sociedade e pela ciecircncia Deve viajar sozinho

longe das massas que se agarram com tudo o que podem agrave seguranccedila da terra

firme

Hoje assim como no passado um uacutenico motivo impulsiona os exploradores

a necessidade de descobrir por si mesmos porque aceitar algo que natildeo seja um

conhecimento em primeira matildeo seraacute render-se agraves ideacuteias e agraves suposiccedilotildees de quem

soacute conhece a terra soacutelida

Neste momento cada um de noacutes tem a oportunidade de ir mais aleacutem das

fronteiras do universo fiacutesico e de se converter num explorador Todos podemos

compartilhar esta fantaacutestica aventura (Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures

Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman) Site 1

Este breve estudo propotildee a tentativa de compreender o lugar ocupado pelo

sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que sempre o valorizou

desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua importacircncia para a

psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a anaacutelise e para o

auto-conhecimento do paciente

Hall nos auxilia nesta busca por compreender os sonhos fazendo uma

ligaccedilatildeo entre duas realidades inseparaacuteveis

ldquoEm todas as religiotildees e em todas as civilizaccedilotildees antigas os sonhos tecircm sido considerados uma importante via de ligaccedilatildeo entre o mundo cotidiano e outro mundo ndash o mundo espiritual o mundo dos deuses o reino arquetiacutepico em linguagem moderna o inconscienterdquo (2003 p 119)

Todos os fenocircmenos que satildeo vivos e dinacircmicos e natildeo se enquadram agraves

foacutermulas tradicionais jaacute estabelecidas encontram-se enredados em misteacuterios e

situaccedilotildees inexplicaacuteveis assim tambeacutem ocorre com os sonhos eles natildeo podem mais

ser interpretados como fantasias nem permanecer reduzidos agraves foacutermulas e

explicaccedilotildees mecanicistas que guiaram a velha ciecircncia A rapidez com que estaacute se

8

desenvolvendo a aacuterea cientiacutefica necessita com urgecircncia de um novo paradigma e a

academia lentamente estaacute aceitando a probabilidade do imponderaacutevel que nem

tudo pode ser explicado racionalmente e que a dinacircmica e o misteacuterio da vida estaacute

por ser descoberto

Utilizando o saber de Edinger e sua definiccedilatildeo sobre a importacircncia atribuiacuteda

agrave psicologia nos diz que uma nova era estaacute iniciando e que convenccedilotildees e

convicccedilotildees estatildeo sendo colocadas agrave prova e remodeladas

ldquoA descoberta da psicologia profunda no seacuteculo XX eacute na minha opiniatildeo pelo menos tatildeo importante quanto e igual em grandeza agrave descoberta da fiacutesica nuclear Vejam o que aconteceu Por milhares de anos a humanidade possui o conceito de alma de psique de uma consciecircncia elementar de que a subjetividade humana eacute um fator muito importante mas a humanidade estava tatildeo proacutexima a essa realidade que natildeo conseguia trataacute-la de maneira empiacuterica ou cientiacutefica A imagem que gosto de usar eacute de um peixe nadando numa lagoa Existe uma anedota agradaacutevel uma anedota oriental que chegou a mim certa vez O mestre Zen pergunta ao aprendiz ldquoQuem descobriu a aacutegua O aprendiz natildeo sabe entatildeo o mestre responde ldquoBom eu tambeacutem natildeo sei mas sei quem natildeo descobriu o peixerdquo Como vocecircs podem ver os seres humanos estatildeo exatamente na mesma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave psique Eles vivem dentro dela E foi isso que abriu as portas para o estudo cientiacutefico da psique Essa eacute realmente uma enorme revoluccedilatildeo copernica que ainda mal comeccedilou a penetrar na consciecircncia coletivardquo (2004 p 14 - 15)

Whitmont reforccedila este alerta ao dito mundo moderno onde prevalece o

racional o meacutetodo exato pleno de saber cientiacutefico ao dizer que

ldquoNa nossa eacutepoca este racionalismo extrovertido chegou a tal extremo que jaacute se comentou que ldquonatildeo apenas o mundo ocidental mas a humanidade como um todo corre o rico de perder sua alma para as coisas externas da vida Nossas forccedilas extrovertidas do intelecto estatildeo preocupadas com a alimentaccedilatildeo adequada com os cuidados higiecircnicos das regiotildees subdesenvolvidas do mundo assim como com a elevaccedilatildeo do nosso padratildeo de vida que as funccedilotildees irracionais o coraccedilatildeo e a alma estatildeo cada vez mais ameaccedilados de atrofiardquo Alguns dos resultados desta ecircnfase unilateral satildeo as neuroses individuais e de massa que encontramos atualmente com o perigo sempre presente de erupccedilotildees explosivas Os viacutecios do aacutelcool dos narcoacuteticos e das ldquodrogas para expansatildeo da menterdquo tambeacutem expressam uma busca de experiecircncias emocionais que se perderam no decorrer da nossa extrema intelectualizaccedilatildeo Mas natildeo eacute apenas o viacutecio do aacutelcool e das drogas o ldquoviacutecio do trabalhordquo a ldquodoenccedila do gerenterdquo a necessidade compulsiva de sempre se ter algo para fazer a fim de parecer ocupado tambeacutem indicam a incapacidade do homem moderno de encontrar sentido na vidardquo (2002 p17)

9

A importacircncia dos sonhos que se perdera com o passar do tempo e a

absorccedilatildeo de dogmas religiosos incentivando seu abandono fez com que eles

passassem a ser desencorajados de ser interpretados e ateacute mesmo de serem

reconhecidos como algo de valor pessoal os sonhos passaram a ser vistos como

manifestaccedilotildees simploacuterias e desprovidas de qualquer sentido de loacutegica poreacutem no

iniacutecio do seacuteculo XX um meacutedico jaacute entatildeo reconhecido por seu trabalho publicou um

livro sobre sonhos e como narra o professor psicoacutelogo e padre episcopaliano

Kelsey

ldquoSigmund Freud publicou A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos em 1900 Aiacute se mapeava um modo de explorar a relaccedilatildeo do sonho com o inconsciente humano Eacute difiacutecil dar a real dimensatildeo da importacircncia de seu trabalho mesmo sabendo que o proacuteprio Freud tinha consciecircncia disso pois enfatizara mais de uma vez que a publicaccedilatildeo de seu livro fora sincronizada para coincidir com o iniacutecio de uma nova era Claro que ele natildeo foi o primeiro a falar na existecircncia do inconsciente e na importacircncia dos sonhos a partir do ponto de vista cientiacutefico Mas foi o primeiro a relacionar essa duas dimensotildees e a realizar um estudo empiacuterico de focirclego sobre o assunto escrevendo com clareza e na verdade com forccedila tatildeo convincente que suas opiniotildees natildeo poderiam ser ignoradasEntretanto Freud encontrou pouco mais que desprezo entre os proacuteprios colegas de profissatildeo Soacute depois de oito anos eacute que se esgotou a primeira ediccedilatildeo de seiscentos exemplares de A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Embora fosse difiacutecil ignorar o que dizia suas ideacuteias eram ridicularizadas e por muito tempo esse tipo de riso se constituiu em boa defesa contra a sua contribuiccedilatildeordquo (1996 p 270 271)

Para falar sobre os sonhos e sua relevacircncia temos que falar primeiramente

sobre o sono e diferentemente do que muitos ainda pensam o sono natildeo eacute um

estado passivo inerte ldquouma quase morterdquo nosso ceacuterebro continua a pleno vapor

trabalhando neste periacuteodo em que nosso corpo fiacutesico descansa

No ano de 1937 Alfred Loomis fisiologista na universidade de Princeton

estudou imagens de um indiviacuteduo dormindo num aparelho novo o

eletrencefalograma (EEG) e descobriu que o ceacuterebro natildeo descansava ele

permanecia ativo Loomis detectou uma intensa atividade eleacutetrica noturna no ceacuterebro

de seus pacientes comparou-o a um diacutenamo e concluiu que o sono se desenvolve

em fases com frequumlecircncia eleacutetrica diferente em cada uma delas Mais tarde isso

permitiria distinguir as cinco etapas do sono conhecidas atualmente

Somente agora transcorridos 70 anos da descoberta eacute que os cientistas

comeccedilaram a fazer uso das conclusotildees de Loomi para procurar entender a

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 6: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

6

1 INTRODUCcedilAtildeO

Sonhar

Sonhar eacute transportar-se em asas de ouro e accediloAos paacuteramos azuis da luz e da harmoniaEacute ambicionar o ceacuteu eacute dominar o espaccediloNum vocirco poderoso e audaz da fantasia

Fugir ao mundo vil tatildeo vil que sem cansaccediloEngana e menospreza e zomba e caluniaEncastelar-se enfim no deslumbrante paccediloDe um sonho puro e bom de paz e de alegria

Eacute ver no lago um mar nas nuvens um casteloNa luz de um pirilampo um sol pequeno e beloEacute alccedilar constantemente o olhar ao ceacuteu profundo

Sonhar eacute ter um grande ideal na ingloacuteria lidaTatildeo grande que natildeo cabe inteiro nesta vidaTatildeo puro que natildeo vive em plagas deste mundo

Helena Kolody

ldquoHaacute quinhentos anos um grupo de corajosos exploradores cruzou o oceano

em busca de um novo continente uma terra misteriosa oculta por um mar nunca

explorado do qual natildeo existia mapa algum Nesses tempos muitos eram aqueles que

consideravam tais viagens uma perda de tempo e de recursos De fato a civilizaccedilatildeo

ateacute entatildeo tinha evoluiacutedo durante seacuteculos sem este tipo de exploraccedilatildeo

Contra todos os prognoacutesticos este grupo de exploradores arriscou-se a

prosseguir atraiacutedos pelo desconhecido por uma intensa vontade de descobrir

Abandonaram a comodidade dos seus lares para embarcar numa viagem aleacutem dos

horizontes conhecidos Enfrentando os seus medos e as suas duacutevidas assim como

os da sociedade mantiveram-se firmes no seu objetivo ateacute que finalmente

alcanccedilaram a sua meta a sua descoberta

7

Atualmente encontramo-nos perante um idecircntico tipo de exploraccedilatildeo temos

um oceano de energia por explorar agrave espera de ser conquistado por quem possua a

visatildeo e o valor suficientes para ir mais aleacutem dos seus horizontes fiacutesicos Como no

passado a visatildeo do explorador deve superar a fronteira fiacutesica Da mesma forma que

anteriormente o explorador deve possuir o impulso e tomar a decisatildeo de viajar para

aleacutem dos limites conhecidos pela sociedade e pela ciecircncia Deve viajar sozinho

longe das massas que se agarram com tudo o que podem agrave seguranccedila da terra

firme

Hoje assim como no passado um uacutenico motivo impulsiona os exploradores

a necessidade de descobrir por si mesmos porque aceitar algo que natildeo seja um

conhecimento em primeira matildeo seraacute render-se agraves ideacuteias e agraves suposiccedilotildees de quem

soacute conhece a terra soacutelida

Neste momento cada um de noacutes tem a oportunidade de ir mais aleacutem das

fronteiras do universo fiacutesico e de se converter num explorador Todos podemos

compartilhar esta fantaacutestica aventura (Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures

Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman) Site 1

Este breve estudo propotildee a tentativa de compreender o lugar ocupado pelo

sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que sempre o valorizou

desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua importacircncia para a

psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a anaacutelise e para o

auto-conhecimento do paciente

Hall nos auxilia nesta busca por compreender os sonhos fazendo uma

ligaccedilatildeo entre duas realidades inseparaacuteveis

ldquoEm todas as religiotildees e em todas as civilizaccedilotildees antigas os sonhos tecircm sido considerados uma importante via de ligaccedilatildeo entre o mundo cotidiano e outro mundo ndash o mundo espiritual o mundo dos deuses o reino arquetiacutepico em linguagem moderna o inconscienterdquo (2003 p 119)

Todos os fenocircmenos que satildeo vivos e dinacircmicos e natildeo se enquadram agraves

foacutermulas tradicionais jaacute estabelecidas encontram-se enredados em misteacuterios e

situaccedilotildees inexplicaacuteveis assim tambeacutem ocorre com os sonhos eles natildeo podem mais

ser interpretados como fantasias nem permanecer reduzidos agraves foacutermulas e

explicaccedilotildees mecanicistas que guiaram a velha ciecircncia A rapidez com que estaacute se

8

desenvolvendo a aacuterea cientiacutefica necessita com urgecircncia de um novo paradigma e a

academia lentamente estaacute aceitando a probabilidade do imponderaacutevel que nem

tudo pode ser explicado racionalmente e que a dinacircmica e o misteacuterio da vida estaacute

por ser descoberto

Utilizando o saber de Edinger e sua definiccedilatildeo sobre a importacircncia atribuiacuteda

agrave psicologia nos diz que uma nova era estaacute iniciando e que convenccedilotildees e

convicccedilotildees estatildeo sendo colocadas agrave prova e remodeladas

ldquoA descoberta da psicologia profunda no seacuteculo XX eacute na minha opiniatildeo pelo menos tatildeo importante quanto e igual em grandeza agrave descoberta da fiacutesica nuclear Vejam o que aconteceu Por milhares de anos a humanidade possui o conceito de alma de psique de uma consciecircncia elementar de que a subjetividade humana eacute um fator muito importante mas a humanidade estava tatildeo proacutexima a essa realidade que natildeo conseguia trataacute-la de maneira empiacuterica ou cientiacutefica A imagem que gosto de usar eacute de um peixe nadando numa lagoa Existe uma anedota agradaacutevel uma anedota oriental que chegou a mim certa vez O mestre Zen pergunta ao aprendiz ldquoQuem descobriu a aacutegua O aprendiz natildeo sabe entatildeo o mestre responde ldquoBom eu tambeacutem natildeo sei mas sei quem natildeo descobriu o peixerdquo Como vocecircs podem ver os seres humanos estatildeo exatamente na mesma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave psique Eles vivem dentro dela E foi isso que abriu as portas para o estudo cientiacutefico da psique Essa eacute realmente uma enorme revoluccedilatildeo copernica que ainda mal comeccedilou a penetrar na consciecircncia coletivardquo (2004 p 14 - 15)

Whitmont reforccedila este alerta ao dito mundo moderno onde prevalece o

racional o meacutetodo exato pleno de saber cientiacutefico ao dizer que

ldquoNa nossa eacutepoca este racionalismo extrovertido chegou a tal extremo que jaacute se comentou que ldquonatildeo apenas o mundo ocidental mas a humanidade como um todo corre o rico de perder sua alma para as coisas externas da vida Nossas forccedilas extrovertidas do intelecto estatildeo preocupadas com a alimentaccedilatildeo adequada com os cuidados higiecircnicos das regiotildees subdesenvolvidas do mundo assim como com a elevaccedilatildeo do nosso padratildeo de vida que as funccedilotildees irracionais o coraccedilatildeo e a alma estatildeo cada vez mais ameaccedilados de atrofiardquo Alguns dos resultados desta ecircnfase unilateral satildeo as neuroses individuais e de massa que encontramos atualmente com o perigo sempre presente de erupccedilotildees explosivas Os viacutecios do aacutelcool dos narcoacuteticos e das ldquodrogas para expansatildeo da menterdquo tambeacutem expressam uma busca de experiecircncias emocionais que se perderam no decorrer da nossa extrema intelectualizaccedilatildeo Mas natildeo eacute apenas o viacutecio do aacutelcool e das drogas o ldquoviacutecio do trabalhordquo a ldquodoenccedila do gerenterdquo a necessidade compulsiva de sempre se ter algo para fazer a fim de parecer ocupado tambeacutem indicam a incapacidade do homem moderno de encontrar sentido na vidardquo (2002 p17)

9

A importacircncia dos sonhos que se perdera com o passar do tempo e a

absorccedilatildeo de dogmas religiosos incentivando seu abandono fez com que eles

passassem a ser desencorajados de ser interpretados e ateacute mesmo de serem

reconhecidos como algo de valor pessoal os sonhos passaram a ser vistos como

manifestaccedilotildees simploacuterias e desprovidas de qualquer sentido de loacutegica poreacutem no

iniacutecio do seacuteculo XX um meacutedico jaacute entatildeo reconhecido por seu trabalho publicou um

livro sobre sonhos e como narra o professor psicoacutelogo e padre episcopaliano

Kelsey

ldquoSigmund Freud publicou A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos em 1900 Aiacute se mapeava um modo de explorar a relaccedilatildeo do sonho com o inconsciente humano Eacute difiacutecil dar a real dimensatildeo da importacircncia de seu trabalho mesmo sabendo que o proacuteprio Freud tinha consciecircncia disso pois enfatizara mais de uma vez que a publicaccedilatildeo de seu livro fora sincronizada para coincidir com o iniacutecio de uma nova era Claro que ele natildeo foi o primeiro a falar na existecircncia do inconsciente e na importacircncia dos sonhos a partir do ponto de vista cientiacutefico Mas foi o primeiro a relacionar essa duas dimensotildees e a realizar um estudo empiacuterico de focirclego sobre o assunto escrevendo com clareza e na verdade com forccedila tatildeo convincente que suas opiniotildees natildeo poderiam ser ignoradasEntretanto Freud encontrou pouco mais que desprezo entre os proacuteprios colegas de profissatildeo Soacute depois de oito anos eacute que se esgotou a primeira ediccedilatildeo de seiscentos exemplares de A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Embora fosse difiacutecil ignorar o que dizia suas ideacuteias eram ridicularizadas e por muito tempo esse tipo de riso se constituiu em boa defesa contra a sua contribuiccedilatildeordquo (1996 p 270 271)

Para falar sobre os sonhos e sua relevacircncia temos que falar primeiramente

sobre o sono e diferentemente do que muitos ainda pensam o sono natildeo eacute um

estado passivo inerte ldquouma quase morterdquo nosso ceacuterebro continua a pleno vapor

trabalhando neste periacuteodo em que nosso corpo fiacutesico descansa

No ano de 1937 Alfred Loomis fisiologista na universidade de Princeton

estudou imagens de um indiviacuteduo dormindo num aparelho novo o

eletrencefalograma (EEG) e descobriu que o ceacuterebro natildeo descansava ele

permanecia ativo Loomis detectou uma intensa atividade eleacutetrica noturna no ceacuterebro

de seus pacientes comparou-o a um diacutenamo e concluiu que o sono se desenvolve

em fases com frequumlecircncia eleacutetrica diferente em cada uma delas Mais tarde isso

permitiria distinguir as cinco etapas do sono conhecidas atualmente

Somente agora transcorridos 70 anos da descoberta eacute que os cientistas

comeccedilaram a fazer uso das conclusotildees de Loomi para procurar entender a

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 7: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

7

Atualmente encontramo-nos perante um idecircntico tipo de exploraccedilatildeo temos

um oceano de energia por explorar agrave espera de ser conquistado por quem possua a

visatildeo e o valor suficientes para ir mais aleacutem dos seus horizontes fiacutesicos Como no

passado a visatildeo do explorador deve superar a fronteira fiacutesica Da mesma forma que

anteriormente o explorador deve possuir o impulso e tomar a decisatildeo de viajar para

aleacutem dos limites conhecidos pela sociedade e pela ciecircncia Deve viajar sozinho

longe das massas que se agarram com tudo o que podem agrave seguranccedila da terra

firme

Hoje assim como no passado um uacutenico motivo impulsiona os exploradores

a necessidade de descobrir por si mesmos porque aceitar algo que natildeo seja um

conhecimento em primeira matildeo seraacute render-se agraves ideacuteias e agraves suposiccedilotildees de quem

soacute conhece a terra soacutelida

Neste momento cada um de noacutes tem a oportunidade de ir mais aleacutem das

fronteiras do universo fiacutesico e de se converter num explorador Todos podemos

compartilhar esta fantaacutestica aventura (Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures

Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman) Site 1

Este breve estudo propotildee a tentativa de compreender o lugar ocupado pelo

sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que sempre o valorizou

desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua importacircncia para a

psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a anaacutelise e para o

auto-conhecimento do paciente

Hall nos auxilia nesta busca por compreender os sonhos fazendo uma

ligaccedilatildeo entre duas realidades inseparaacuteveis

ldquoEm todas as religiotildees e em todas as civilizaccedilotildees antigas os sonhos tecircm sido considerados uma importante via de ligaccedilatildeo entre o mundo cotidiano e outro mundo ndash o mundo espiritual o mundo dos deuses o reino arquetiacutepico em linguagem moderna o inconscienterdquo (2003 p 119)

Todos os fenocircmenos que satildeo vivos e dinacircmicos e natildeo se enquadram agraves

foacutermulas tradicionais jaacute estabelecidas encontram-se enredados em misteacuterios e

situaccedilotildees inexplicaacuteveis assim tambeacutem ocorre com os sonhos eles natildeo podem mais

ser interpretados como fantasias nem permanecer reduzidos agraves foacutermulas e

explicaccedilotildees mecanicistas que guiaram a velha ciecircncia A rapidez com que estaacute se

8

desenvolvendo a aacuterea cientiacutefica necessita com urgecircncia de um novo paradigma e a

academia lentamente estaacute aceitando a probabilidade do imponderaacutevel que nem

tudo pode ser explicado racionalmente e que a dinacircmica e o misteacuterio da vida estaacute

por ser descoberto

Utilizando o saber de Edinger e sua definiccedilatildeo sobre a importacircncia atribuiacuteda

agrave psicologia nos diz que uma nova era estaacute iniciando e que convenccedilotildees e

convicccedilotildees estatildeo sendo colocadas agrave prova e remodeladas

ldquoA descoberta da psicologia profunda no seacuteculo XX eacute na minha opiniatildeo pelo menos tatildeo importante quanto e igual em grandeza agrave descoberta da fiacutesica nuclear Vejam o que aconteceu Por milhares de anos a humanidade possui o conceito de alma de psique de uma consciecircncia elementar de que a subjetividade humana eacute um fator muito importante mas a humanidade estava tatildeo proacutexima a essa realidade que natildeo conseguia trataacute-la de maneira empiacuterica ou cientiacutefica A imagem que gosto de usar eacute de um peixe nadando numa lagoa Existe uma anedota agradaacutevel uma anedota oriental que chegou a mim certa vez O mestre Zen pergunta ao aprendiz ldquoQuem descobriu a aacutegua O aprendiz natildeo sabe entatildeo o mestre responde ldquoBom eu tambeacutem natildeo sei mas sei quem natildeo descobriu o peixerdquo Como vocecircs podem ver os seres humanos estatildeo exatamente na mesma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave psique Eles vivem dentro dela E foi isso que abriu as portas para o estudo cientiacutefico da psique Essa eacute realmente uma enorme revoluccedilatildeo copernica que ainda mal comeccedilou a penetrar na consciecircncia coletivardquo (2004 p 14 - 15)

Whitmont reforccedila este alerta ao dito mundo moderno onde prevalece o

racional o meacutetodo exato pleno de saber cientiacutefico ao dizer que

ldquoNa nossa eacutepoca este racionalismo extrovertido chegou a tal extremo que jaacute se comentou que ldquonatildeo apenas o mundo ocidental mas a humanidade como um todo corre o rico de perder sua alma para as coisas externas da vida Nossas forccedilas extrovertidas do intelecto estatildeo preocupadas com a alimentaccedilatildeo adequada com os cuidados higiecircnicos das regiotildees subdesenvolvidas do mundo assim como com a elevaccedilatildeo do nosso padratildeo de vida que as funccedilotildees irracionais o coraccedilatildeo e a alma estatildeo cada vez mais ameaccedilados de atrofiardquo Alguns dos resultados desta ecircnfase unilateral satildeo as neuroses individuais e de massa que encontramos atualmente com o perigo sempre presente de erupccedilotildees explosivas Os viacutecios do aacutelcool dos narcoacuteticos e das ldquodrogas para expansatildeo da menterdquo tambeacutem expressam uma busca de experiecircncias emocionais que se perderam no decorrer da nossa extrema intelectualizaccedilatildeo Mas natildeo eacute apenas o viacutecio do aacutelcool e das drogas o ldquoviacutecio do trabalhordquo a ldquodoenccedila do gerenterdquo a necessidade compulsiva de sempre se ter algo para fazer a fim de parecer ocupado tambeacutem indicam a incapacidade do homem moderno de encontrar sentido na vidardquo (2002 p17)

9

A importacircncia dos sonhos que se perdera com o passar do tempo e a

absorccedilatildeo de dogmas religiosos incentivando seu abandono fez com que eles

passassem a ser desencorajados de ser interpretados e ateacute mesmo de serem

reconhecidos como algo de valor pessoal os sonhos passaram a ser vistos como

manifestaccedilotildees simploacuterias e desprovidas de qualquer sentido de loacutegica poreacutem no

iniacutecio do seacuteculo XX um meacutedico jaacute entatildeo reconhecido por seu trabalho publicou um

livro sobre sonhos e como narra o professor psicoacutelogo e padre episcopaliano

Kelsey

ldquoSigmund Freud publicou A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos em 1900 Aiacute se mapeava um modo de explorar a relaccedilatildeo do sonho com o inconsciente humano Eacute difiacutecil dar a real dimensatildeo da importacircncia de seu trabalho mesmo sabendo que o proacuteprio Freud tinha consciecircncia disso pois enfatizara mais de uma vez que a publicaccedilatildeo de seu livro fora sincronizada para coincidir com o iniacutecio de uma nova era Claro que ele natildeo foi o primeiro a falar na existecircncia do inconsciente e na importacircncia dos sonhos a partir do ponto de vista cientiacutefico Mas foi o primeiro a relacionar essa duas dimensotildees e a realizar um estudo empiacuterico de focirclego sobre o assunto escrevendo com clareza e na verdade com forccedila tatildeo convincente que suas opiniotildees natildeo poderiam ser ignoradasEntretanto Freud encontrou pouco mais que desprezo entre os proacuteprios colegas de profissatildeo Soacute depois de oito anos eacute que se esgotou a primeira ediccedilatildeo de seiscentos exemplares de A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Embora fosse difiacutecil ignorar o que dizia suas ideacuteias eram ridicularizadas e por muito tempo esse tipo de riso se constituiu em boa defesa contra a sua contribuiccedilatildeordquo (1996 p 270 271)

Para falar sobre os sonhos e sua relevacircncia temos que falar primeiramente

sobre o sono e diferentemente do que muitos ainda pensam o sono natildeo eacute um

estado passivo inerte ldquouma quase morterdquo nosso ceacuterebro continua a pleno vapor

trabalhando neste periacuteodo em que nosso corpo fiacutesico descansa

No ano de 1937 Alfred Loomis fisiologista na universidade de Princeton

estudou imagens de um indiviacuteduo dormindo num aparelho novo o

eletrencefalograma (EEG) e descobriu que o ceacuterebro natildeo descansava ele

permanecia ativo Loomis detectou uma intensa atividade eleacutetrica noturna no ceacuterebro

de seus pacientes comparou-o a um diacutenamo e concluiu que o sono se desenvolve

em fases com frequumlecircncia eleacutetrica diferente em cada uma delas Mais tarde isso

permitiria distinguir as cinco etapas do sono conhecidas atualmente

Somente agora transcorridos 70 anos da descoberta eacute que os cientistas

comeccedilaram a fazer uso das conclusotildees de Loomi para procurar entender a

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 8: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

8

desenvolvendo a aacuterea cientiacutefica necessita com urgecircncia de um novo paradigma e a

academia lentamente estaacute aceitando a probabilidade do imponderaacutevel que nem

tudo pode ser explicado racionalmente e que a dinacircmica e o misteacuterio da vida estaacute

por ser descoberto

Utilizando o saber de Edinger e sua definiccedilatildeo sobre a importacircncia atribuiacuteda

agrave psicologia nos diz que uma nova era estaacute iniciando e que convenccedilotildees e

convicccedilotildees estatildeo sendo colocadas agrave prova e remodeladas

ldquoA descoberta da psicologia profunda no seacuteculo XX eacute na minha opiniatildeo pelo menos tatildeo importante quanto e igual em grandeza agrave descoberta da fiacutesica nuclear Vejam o que aconteceu Por milhares de anos a humanidade possui o conceito de alma de psique de uma consciecircncia elementar de que a subjetividade humana eacute um fator muito importante mas a humanidade estava tatildeo proacutexima a essa realidade que natildeo conseguia trataacute-la de maneira empiacuterica ou cientiacutefica A imagem que gosto de usar eacute de um peixe nadando numa lagoa Existe uma anedota agradaacutevel uma anedota oriental que chegou a mim certa vez O mestre Zen pergunta ao aprendiz ldquoQuem descobriu a aacutegua O aprendiz natildeo sabe entatildeo o mestre responde ldquoBom eu tambeacutem natildeo sei mas sei quem natildeo descobriu o peixerdquo Como vocecircs podem ver os seres humanos estatildeo exatamente na mesma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave psique Eles vivem dentro dela E foi isso que abriu as portas para o estudo cientiacutefico da psique Essa eacute realmente uma enorme revoluccedilatildeo copernica que ainda mal comeccedilou a penetrar na consciecircncia coletivardquo (2004 p 14 - 15)

Whitmont reforccedila este alerta ao dito mundo moderno onde prevalece o

racional o meacutetodo exato pleno de saber cientiacutefico ao dizer que

ldquoNa nossa eacutepoca este racionalismo extrovertido chegou a tal extremo que jaacute se comentou que ldquonatildeo apenas o mundo ocidental mas a humanidade como um todo corre o rico de perder sua alma para as coisas externas da vida Nossas forccedilas extrovertidas do intelecto estatildeo preocupadas com a alimentaccedilatildeo adequada com os cuidados higiecircnicos das regiotildees subdesenvolvidas do mundo assim como com a elevaccedilatildeo do nosso padratildeo de vida que as funccedilotildees irracionais o coraccedilatildeo e a alma estatildeo cada vez mais ameaccedilados de atrofiardquo Alguns dos resultados desta ecircnfase unilateral satildeo as neuroses individuais e de massa que encontramos atualmente com o perigo sempre presente de erupccedilotildees explosivas Os viacutecios do aacutelcool dos narcoacuteticos e das ldquodrogas para expansatildeo da menterdquo tambeacutem expressam uma busca de experiecircncias emocionais que se perderam no decorrer da nossa extrema intelectualizaccedilatildeo Mas natildeo eacute apenas o viacutecio do aacutelcool e das drogas o ldquoviacutecio do trabalhordquo a ldquodoenccedila do gerenterdquo a necessidade compulsiva de sempre se ter algo para fazer a fim de parecer ocupado tambeacutem indicam a incapacidade do homem moderno de encontrar sentido na vidardquo (2002 p17)

9

A importacircncia dos sonhos que se perdera com o passar do tempo e a

absorccedilatildeo de dogmas religiosos incentivando seu abandono fez com que eles

passassem a ser desencorajados de ser interpretados e ateacute mesmo de serem

reconhecidos como algo de valor pessoal os sonhos passaram a ser vistos como

manifestaccedilotildees simploacuterias e desprovidas de qualquer sentido de loacutegica poreacutem no

iniacutecio do seacuteculo XX um meacutedico jaacute entatildeo reconhecido por seu trabalho publicou um

livro sobre sonhos e como narra o professor psicoacutelogo e padre episcopaliano

Kelsey

ldquoSigmund Freud publicou A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos em 1900 Aiacute se mapeava um modo de explorar a relaccedilatildeo do sonho com o inconsciente humano Eacute difiacutecil dar a real dimensatildeo da importacircncia de seu trabalho mesmo sabendo que o proacuteprio Freud tinha consciecircncia disso pois enfatizara mais de uma vez que a publicaccedilatildeo de seu livro fora sincronizada para coincidir com o iniacutecio de uma nova era Claro que ele natildeo foi o primeiro a falar na existecircncia do inconsciente e na importacircncia dos sonhos a partir do ponto de vista cientiacutefico Mas foi o primeiro a relacionar essa duas dimensotildees e a realizar um estudo empiacuterico de focirclego sobre o assunto escrevendo com clareza e na verdade com forccedila tatildeo convincente que suas opiniotildees natildeo poderiam ser ignoradasEntretanto Freud encontrou pouco mais que desprezo entre os proacuteprios colegas de profissatildeo Soacute depois de oito anos eacute que se esgotou a primeira ediccedilatildeo de seiscentos exemplares de A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Embora fosse difiacutecil ignorar o que dizia suas ideacuteias eram ridicularizadas e por muito tempo esse tipo de riso se constituiu em boa defesa contra a sua contribuiccedilatildeordquo (1996 p 270 271)

Para falar sobre os sonhos e sua relevacircncia temos que falar primeiramente

sobre o sono e diferentemente do que muitos ainda pensam o sono natildeo eacute um

estado passivo inerte ldquouma quase morterdquo nosso ceacuterebro continua a pleno vapor

trabalhando neste periacuteodo em que nosso corpo fiacutesico descansa

No ano de 1937 Alfred Loomis fisiologista na universidade de Princeton

estudou imagens de um indiviacuteduo dormindo num aparelho novo o

eletrencefalograma (EEG) e descobriu que o ceacuterebro natildeo descansava ele

permanecia ativo Loomis detectou uma intensa atividade eleacutetrica noturna no ceacuterebro

de seus pacientes comparou-o a um diacutenamo e concluiu que o sono se desenvolve

em fases com frequumlecircncia eleacutetrica diferente em cada uma delas Mais tarde isso

permitiria distinguir as cinco etapas do sono conhecidas atualmente

Somente agora transcorridos 70 anos da descoberta eacute que os cientistas

comeccedilaram a fazer uso das conclusotildees de Loomi para procurar entender a

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 9: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

9

A importacircncia dos sonhos que se perdera com o passar do tempo e a

absorccedilatildeo de dogmas religiosos incentivando seu abandono fez com que eles

passassem a ser desencorajados de ser interpretados e ateacute mesmo de serem

reconhecidos como algo de valor pessoal os sonhos passaram a ser vistos como

manifestaccedilotildees simploacuterias e desprovidas de qualquer sentido de loacutegica poreacutem no

iniacutecio do seacuteculo XX um meacutedico jaacute entatildeo reconhecido por seu trabalho publicou um

livro sobre sonhos e como narra o professor psicoacutelogo e padre episcopaliano

Kelsey

ldquoSigmund Freud publicou A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos em 1900 Aiacute se mapeava um modo de explorar a relaccedilatildeo do sonho com o inconsciente humano Eacute difiacutecil dar a real dimensatildeo da importacircncia de seu trabalho mesmo sabendo que o proacuteprio Freud tinha consciecircncia disso pois enfatizara mais de uma vez que a publicaccedilatildeo de seu livro fora sincronizada para coincidir com o iniacutecio de uma nova era Claro que ele natildeo foi o primeiro a falar na existecircncia do inconsciente e na importacircncia dos sonhos a partir do ponto de vista cientiacutefico Mas foi o primeiro a relacionar essa duas dimensotildees e a realizar um estudo empiacuterico de focirclego sobre o assunto escrevendo com clareza e na verdade com forccedila tatildeo convincente que suas opiniotildees natildeo poderiam ser ignoradasEntretanto Freud encontrou pouco mais que desprezo entre os proacuteprios colegas de profissatildeo Soacute depois de oito anos eacute que se esgotou a primeira ediccedilatildeo de seiscentos exemplares de A Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Embora fosse difiacutecil ignorar o que dizia suas ideacuteias eram ridicularizadas e por muito tempo esse tipo de riso se constituiu em boa defesa contra a sua contribuiccedilatildeordquo (1996 p 270 271)

Para falar sobre os sonhos e sua relevacircncia temos que falar primeiramente

sobre o sono e diferentemente do que muitos ainda pensam o sono natildeo eacute um

estado passivo inerte ldquouma quase morterdquo nosso ceacuterebro continua a pleno vapor

trabalhando neste periacuteodo em que nosso corpo fiacutesico descansa

No ano de 1937 Alfred Loomis fisiologista na universidade de Princeton

estudou imagens de um indiviacuteduo dormindo num aparelho novo o

eletrencefalograma (EEG) e descobriu que o ceacuterebro natildeo descansava ele

permanecia ativo Loomis detectou uma intensa atividade eleacutetrica noturna no ceacuterebro

de seus pacientes comparou-o a um diacutenamo e concluiu que o sono se desenvolve

em fases com frequumlecircncia eleacutetrica diferente em cada uma delas Mais tarde isso

permitiria distinguir as cinco etapas do sono conhecidas atualmente

Somente agora transcorridos 70 anos da descoberta eacute que os cientistas

comeccedilaram a fazer uso das conclusotildees de Loomi para procurar entender a

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 10: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

10

correlaccedilatildeo do sono o caminho do aprendizado e a sua fixaccedilatildeo na memoacuteria

Sabemos que continuamos aprendendo durante o sono separando o que eacute bom e

permaneceraacute em nossa memoacuteria e o que natildeo eacute bom nem importante seraacute

descartado

O sono eacute um processo bioloacutegico e durante o periacuteodo que dormimos ocorre

uma aboliccedilatildeo da consciecircncia viacutegil as respostas dadas ao meio ambiente satildeo

reduzidas ao miacutenimo poreacutem acompanhadas por mudanccedilas em diversas funccedilotildees no

nosso organismo e eacute exatamente neste momento que o sonho tem um papel

importante

Atraveacutes de estudos e acompanhamento de cientistas sabemos que a

grande maioria dos seres humanos dorme em meacutedia 13 do tempo que vive assim

sendo uma pessoa com setenta anos passou em meacutedia vinte anos dormindo e

desses vinte anos cinco deles foram ocupados pelos sonhos portanto o sono e os

sonhos natildeo devem somente fazer parte do ciclo baacutesico corporal como respirar por

exemplo em que natildeo precisamos pensar para que o processo aconteccedila mas

certamente eles devem atender a uma necessidade bioloacutegica fundamental para

promover o equiliacutebrio mental e corporal de todo o complexo organismo humano

Estaacute comprovado que a privaccedilatildeo do sono e em particular dos sonhos

podem provocar efeitos fiacutesicos e mentais danosos encontramos na literatura meacutedica

relatos de meacutetodos usados como tortura em eacutepoca de guerra para desestabilizar o

inimigo sem feri-lo visivelmente ldquonatildeo deixar o prisioneiro dormir nem sonharrdquo

A falta de sono a curto prazo acarreta Faacutecil irritabilidade bruscas alteraccedilotildees

de humor perda da memoacuteria de fatos recentes maior cansaccedilo e sonolecircncia durante

o dia menor criatividade a capacidade de planejar e executar tarefas corriqueiras

fica comprometida o raciociacutenio fica lento e surge dificuldade de concentraccedilatildeo

E a falta de sono a longo prazo proporciona O sistema imunoloacutegico fica mais

sensiacutevel a alteraccedilotildees externas tendecircncia a obesidade menor vigor fiacutesico

envelhecimento precoce reduccedilatildeo do tocircnus muscular possibilidade de desenvolver

diabetes doenccedilas cardiovasculares e gastrointestinais e perda gradual da memoacuteria

Kelsey exemplifica que a privaccedilatildeo do sono e consequumlentemente dos sonhos

pode ser o gatilho para desencadear processos patoloacutegicos pois ambos estatildeo

intimamente associados

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 11: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

11

ldquoO organismo humano tem necessidade de sonhar De iniacutecio esta necessidade baseia-se em certos mecanismos fisioloacutegicos Mas a certa altura do iniacutecio do processo como observa Fischer ldquoos mecanismos fisioloacutegicos cedem o comando ao processo psicoloacutegico do sonhar emergindo daiacute uma nova funccedilatildeo ou seja a regulaccedilatildeo da descarga dos processos das pulsotildees instintivas atraveacutes da realizaccedilatildeo alucinatoacuteria do desejo em oposiccedilatildeo agrave descarga fisioloacutegica atraveacutes de padrotildees motoresrdquo Em suma o animal humano comeccedila a sonhar o seu caminho no sentido de tornar-se um ser humano (1996 p304)

Para um indiviacuteduo normal se ocorrer a privaccedilatildeo total do sono ele natildeo

sobreviveraacute poreacutem se a privaccedilatildeo for prolongada sua vida seraacute prejudicada por

diversos distuacuterbios que iratildeo surgindo ao longo do tempo e agravados na mesma

proporccedilatildeo

Estudos comprovam que aproximadamente 25 da populaccedilatildeo adulta

possui algum distuacuterbio do sono que pode ser distribuiacutedo da seguinte forma

A hipersocircnia (51 ) eacute o aumento do nuacutemero de horas de sono em

aproximadamente 25 do padratildeo de sono considerado normal para a idade do

indiviacuteduo eacute um sintoma que frequumlentemente indica a possibilidade de uma lesatildeo

grave

A insocircnia (31 ) eacute a dificuldade que surge para iniciar ou manter o sono

durante a noite e na manhatilde seguinte aparece a sensaccedilatildeo de sono natildeo reparador

Quase 13 dos adultos apresenta insocircnia durante a vida e a metade destes

necessitam de cuidados meacutedicos

As parassocircnias (15 ) satildeo disfunccedilotildees associadas ao sono a estaacutegios do

sono ou a despertares parciais fazem parte o sonambulismo o terror noturno e a

enurese Tambeacutem podemos citar outras disfunccedilotildees relacionadas ao sono ( 3)

como Crises epileacutepticas Bruxismo Refluxo gastroesofaacutegico etc

Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por

diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo

divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros

reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 12: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

12

A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios

Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia

Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono

leve

Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo

Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements)

momento em que ocorrem os sonhos

Todas as fases do sono possuem determinada importacircncia seja para o

crescimento e desenvolvimento do corpo eou do ceacuterebro humano Durante os

estaacutegios 3 e 4 do Sono Profundo ocorre uma grande liberaccedilatildeo do Hormocircnio do

Crescimento (GH) e de outros hormocircnios e aminoaacutecidos importantes para todo o

organismo estatildeo associados a reparos teciduais e a recuperaccedilatildeo fiacutesica estatildeo

relacionados tambeacutem aos processos sinteacuteticos cerebrais e na recuperaccedilatildeo

psicoloacutegica do indiviacuteduo poreacutem observamos que na pessoa idosa ocorre uma

diminuiccedilatildeo deste estaacutegio de sono profundo reduzindo inclusive o nuacutemero total de

horas que dorme agrave noite eacute um processo inverso do que ocorre com receacutem-nascidos

que dormem mais da metade das 24 horas do dia

De acordo com os achados bibliograacuteficos histoacutericos talvez o mais completo e

antigo tratado sobre o sono e os sonhos venha da antiguumlidade claacutessica a

ldquoOnirocriacuteticardquo de Artemidoro de Daldis que viveu em Eacutefeso no seacuteculo II dC na Aacutesia

Menor A obra eacute composta por cinco livros e permaneceu desaparecida por longo

tempo foi reeditada no final do seacuteculo XV graccedilas ao mecenas Lourenccedilo o

Magniacutefico e cuja versatildeo existem publicaccedilotildees modernas a partir de 1970 (ver Ed

Akal 1999) Este eacute o uacutenico texto do gecircnero que nos chegou na iacutentegra e que resume

e sintetiza vaacuterias outras obras do gecircnero da antiguumlidade

Artemidoro de Daldis redigiu um tratado de interpretaccedilatildeo dos sonhos baseado

diretamente na observaccedilatildeo do povo com que convivia sempre frisando com

extrema atualidade que os mesmos siacutembolos surgidos em sonhos tecircm significado

diferente de pessoa para pessoa e que deveriam ser adequados agraves diversas

situaccedilotildees vividas pelo sonhador seja ele um escravo ou um nobre

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 13: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

13

O oneirocriacutetico da antiguumlidade tinha como funccedilatildeo determinar se a partir das

produccedilotildees oniacutericas os acontecimentos que ocorreriam seriam favoraacuteveis ou natildeo

essa interpretaccedilatildeo dos sonhos era muito importante natildeo somente para o povo mas

para os monarcas tambeacutem fato este que originou uma classe intermediaacuteria de

profissionais respeitados eles transmitiam sua arte de interpretaccedilatildeo de pai para

filho

Analisando o sono e os sonhos encontraremos centenas de relatos sobre

descobertas cientiacuteficas invenccedilotildees que promoveram mudanccedilas na vida do homem

previsotildees iluminadas antecipaccedilatildeo ou comunicado de cataacutestrofes poreacutem o que

existe em comum entre todas eacute que foram recebidas atraveacutes de sonhos e como

bem disse Friedrich Nietzsche todos somos artistas em nossos sonhosrdquo

Kelsey narra com precisatildeo exemplos de momentos da histoacuteria em que o

sonhos se fizeram presente e trouxeram atraveacutes de seus sonhadores grandes obras

literaacuterias que influenciaram e continuam influenciando geraccedilotildees

ldquoDesde o renascimento ateacute nossos dias a literatura estaacute repleta de sonhos que satildeo considerados ora o reflexo de um estado de personalidade ora uma instruccedilatildeo do aleacutem ou de um niacutevel mais profundo de nosso ser Dante Chaucer Shakespeare Rabelais Milton Tolstoacutei Goethe e Dickens satildeo apenas alguns dos que basearam incidentes e ateacute histoacuterias inteiras em sonhos O Meacutedico e o Monstro deve-se a um sonho de Stevenson Mary Shelley escreveu Frankenstein sob a mesma inspiraccedilatildeo A influecircncia dos conteuacutedos oniacutericos e do inconsciente sobre o teatro moderno eacute assunto de obra interessante de autoria de W David Siever Freud on Broadway Em Demian Hesse escreve sobre os sonhos como uma parte integrante e profunda da histoacuteria de sua proacutepria vidardquo (1996 p 452)

O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio

de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para

passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o

processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com

uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila

despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha

obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do

tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 14: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

14

Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees

musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite

levantava as transcrevia e voltava a dormir

O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o

responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno

e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito

estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda

comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante

de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo

distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves

vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute

aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante

dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto

da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese

Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura

dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute

desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em

que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores

surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de

suas mais belas obras

Figura 1- Quadro de Salvador Dali

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 15: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

15

O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no

Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia

determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do

Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e

adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em

sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar

maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de

aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que

durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha

esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto

de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso

No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala

descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois

trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia

mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que

havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro

O psicoacutelogo Otto Loewi no ano de 1929 estudando as sinapses descobriu a

transmissatildeo quiacutemica dos impulsos nervosos e atribuiu sua descoberta a um sonho

em que observando as imagens surgidas concluiu que a maioria das drogas que

agiam no sistema nervoso funcionavam afetando as sinapses liberando pequenas

quantidades de uma substacircncia quiacutemica a acetilcolina A substacircncia era liberada na

sinapse pelo neurocircnio que trazia a informaccedilatildeo (preacute-sinaacuteptico) e captada por

receptores localizados no neurocircnio que a recebiam (poacutes-sinaacuteptico)

Os sonhos tambeacutem foram a base para as poesias eloquumlentes de T S Elliot e

para os famosos romances de Gabriel Garcia Marques onde os personagens e as

tramas desenvolvidas iniciaram-se por vezes em sonho e com a forccedila da escrita

ganharam vida chegando alguns a tornar-se Best-Sellers

Esses casos natildeo satildeo uacutenicos nem raros se pesquisarmos o valor atribuiacutedo

aos sonhos no decorrer da Histoacuteria e nas mais diversas culturas ficaremos

realmente surpresos a ldquooniromanciardquo eacute usada desde os primoacuterdios da humanidade

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 16: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

16

bruxos sacerdotes e sacerdotisas pagatildeos e xamatildes todos buscavam a

interpretaccedilatildeo ou previsatildeo do futuro pelos sonhos A oniromancia sempre teve

grande credibilidade no antigo Egito foi encontrado um papiro da eacutepoca Rameacutessida

que foi escrito por volta de 2000 a 1785 aC que contecircm uma lista de significados

profeacuteticos para os siacutembolos oniacutericos a ldquoChave dos Sonhosrdquo

Nas religiotildees judaico-cristatildes a oniromancia eacute parte integrante da Toraacute e da

Biacuteblia No Islamismo acredita-se que os sonhos bons satildeo inspirados por Alaacute e

podem trazer mensagens divinatoacuterias ao passo que os pesadelos satildeo consideradas

armadilhas de satatilde e devem ser exorcizados

Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo

real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente

de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade

Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo

Mas afinal o que satildeo os sonhos

Podemos obter vaacuterias respostas para esta pergunta a primeira delas pode

ser cliacutenica e de forma simplificada tentar explicar que atraveacutes de estimulaccedilatildeo fiacutesica

do coacutertex sensorial surgem locais em nossa mente com imagens dos nossos

pensamentos sentimentos emoccedilotildees intuiccedilotildees e sensaccedilotildees tanto bons como ruins

sem podermos optar por um ou outro livremente eles aparecem tomam forma e

vatildeo embora da mesma forma que vieram

A ciecircncia ao falar sobre o sono diz que eacute um processo fisioloacutegico que a

natureza desenvolveu durante o processo da evoluccedilatildeo para o crescimento e

desenvolvimento do ceacuterebro e dos proacuteprios seres vivos visando aumentar as

nossas defesas e poupar energia e os sonhos satildeo uma descarga emocional da

vivecircncia diaacuteria

Jaacute a medicina fala que o sono serve para restaurar os processos quiacutemicos

e fiacutesicos extenuados pela consciecircncia durante as atividades do dia em que temos

que aprender e fixar dados na memoacuteria e que o sono e os sonhos principalmente

nos auxiliam a apagar e descarregar emoccedilotildees negativas para que possamos

manter nossa sauacutede mental

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 17: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

17

Tambeacutem podemos recorrer agrave mitologia grega para tentar entender de onde

vecircm os sonhos e de imediato descobrimos que existe uma grande confusatildeo em

relaccedilatildeo a figura de Morfeu que tem como pai Hypnos e como matildee a Noite

Morfeu eacute na realidade o deus dos ldquosonhosrdquo e seu pai Hypnos que eacute o

responsaacutevel por fazer as pessoas dormir eacute o deus do sono Hypnos

misteriosamente penetrava no organismo dos homens e fazia repousar seu corpo

esquecer a fadiga e descansar a mente Hypnos era representado sob a figura de

uma crianccedila ao fundo de uma gruta silenciosa e impenetraacutevel agrave luz do dia

segurava com as matildeos um dente e uma cornucoacutepia Hypnos Sono era irmatildeo

gecircmeo de Tacircnatos a morte daiacute podemos entender a antiga correlaccedilatildeo existente de

que a pessoa que dorme e sonha enxerga aleacutem da morte e eacute capaz de entrar em

contato com os antepassados e os deuses

Figura 2 ndash Hypnos e Tacircnatos ndash 1874 (Sono e Morte)

Hypnos teve trecircs filhos chamados de Oneiroi que personificavam os sonhos

dos humanos Eles dormiam dispersos sobre papoulas e como sabemos a papoula

ou oacutepio eacute uma planta de onde eacute obtido a morfina Morfeu eacute considerado o filho mais

importante ldquoo que molda-se toma forma humanardquo eacute o deus grego dos sonhos

divinos O segundo filho eacute Icelus rdquofrighteningrdquo eacute o deus dos pesadelos chamado

de Phobetor ldquophobiardquo surge nos sonhos humanos em forma de animal ou de

monstro O terceiro eacute Fantasos rdquoapparitionrdquo este deus dos sonhos aparece como

algo que faz parte da natureza e tambeacutem toma a forma de objetos inanimados

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 18: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

18

E como natildeo poderia faltar a religiatildeo tambeacutem fala sobre os sonhos Sabemos

que a ldquointercessatildeo divinardquo nos processos de cura seja cura do corpo mente ou

alma acompanha o homem desde seu primeiros passos na terra poreacutem existe uma

diversidade tatildeo grande de religiotildees e crenccedilas que acabamos por natildeo compreender

nem encontrar uma resposta uacutenica que satisfaccedila nossa forma de compreender

essas mensagens enviadas em sonhos as curas realizadas e as premoniccedilotildees

concretizadas as visotildees antecipatoacuterias ou a narraccedilatildeo de fatos ocorridos a distacircncia

com extrema precisatildeo sem a presenccedila do indiviacuteduo no exato momento do fato

ocorrido

Atualmente voltou-se a acreditar como nossos antepassados biacuteblicos

acreditavam que o sono e os sonhos satildeo fundamentais natildeo somente para o

fiacutesico mas tambeacutem para a mente humana obter a tatildeo almejada paz de espiacuterito

William Shakespeare escreveu que ldquoo sono desembaraccedila a seda enredada

das preocupaccedilotildees eacute o baacutelsamo que alivia as dores do trabalho e o principal

alimentador do festim da vidardquo

Sanford nos esclarece que os sonhos possuem uma textura diferenciada e

que natildeo devem encarados como uma continuidade loacutegica e racional eles natildeo

podem ser vistos com olhos materialistas pois satildeo feitos de outro material nosso

inconsciente utiliza-se de outros sentidos e diversos meios para nos enviar

mensagens que parecem num primeiro momento desprovidas de qualquer senso de

loacutegica

O comportamento humano natildeo eacute racional e a humanidade se comporta em todo o mundo como se fosse possessa Para o homem primitivo tudo isso era sinal oacutebvio da realidade do mundo espiritual que lhe aparecia nos sonhos () Persistimos em nosso materialismo racionalista sob a ilusatildeo de que somos racionais e os outros natildeo Se haacute distuacuterbios em nossos sentimentos e em nossa afetividade atribuiacutemos a causa ao que os outros nos fazem e continuamos pensando que soacute tem sentido o que nos parece loacutegico e racional que soacute eacute real o que vemos ouvimos cheiramos tocamos e provamos Os sonhos tem sentido mas um sentido que natildeo eacute loacutegico Satildeo muito reais mas sua realidade natildeo eacute apreendida por nenhum dos sentidos do nosso corpo (1988 p 14)

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 19: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

19

Existem tantos tipos de sonhos que se torna oacutebvio a dificuldade que

encontramos para fazer sua interpretaccedilatildeo eles satildeo modos encontrados para

comunicar e fazer a ligaccedilatildeo entre o consciente e o inconsciente a integraccedilatildeo do

corpo e da alma

Os sonhos podem ser classificados de diversas maneiras modalidades

temas a variedade eacute imensa e depende ateacute mesmo de regiatildeo para regiatildeo a sua

variabilidade tantas que a seguir temos um pequeno esquema destas variaccedilotildees

deixando claro que eles podem variar infinitamente dentro de um mesmo tema

Os Sonhos profeacuteticos satildeo entendidos como um aviso sobre determinado

acontecimento relevante a Biacuteblia traz diversos sonhos profeacuteticos que foram

importantes para definir rumos e atitudes de um povo

Os Sonhos iniciatoacuterios ocorrem em indiviacuteduos que congregam alguma

crenccedila eou religiatildeo e encontram-se encarregados de mostrar ou guiar outros

homens para uma nova visatildeo de mundo menos concreta

Os sonhos telepaacuteticos atualmente estatildeo sendo estudados com seriedade

principalmente por instituiccedilotildees militares pois tecircm interesse em transmissotildees

sem aparelhos Nestes sonhos as comunicaccedilotildees satildeo enviadas atraveacutes de

pensamentos e sentimentos de pessoas ou ateacute mesmo por grupos que se

encontram a distacircncia do sujeito que sonhou

Os sonhos visionaacuterios tecircm maior ocorrecircncia entre os miacutesticos orientais e

eles relatam que estes sonhos a nossa civilizaccedilatildeo ocidental atrofiou ou paralisou

com o passar do tempo nosso materialismo excedeu o volume miacutenimo

necessaacuterio de recolhimento e introspecccedilatildeo a algum tempo deixamos de entrar

em contato com nossos pensamentos e desejos reais

Os sonhos pressentimentos fazem com que o sujeito que sonhou escolha

uma possibilidade entre diversas outras opccedilotildees disponiacuteveis e acerte na mesma

Os jogos de azar satildeo um exemplo deste tipo de sonho

Os sonhos mitoloacutegicos reproduzem algum arqueacutetipo da humanidade e

refletem uma busca fundamental e universal o heroacutei salvador siacutembolo de

nobreza e garra - Airton Sena o priacutencipe que busca um grande amor e por natildeo

encontrar uma mulher que seja ideal quer vaacuterias ao mesmo tempo - Dom Juan

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 20: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

20

a grande matildee protetora - Madre Teresa a donzela que aguarda indefinidamente

seu priacutencipe encantado ndash Cinderela o homem que natildeo amadurece

psicologicamente nem assume responsabilidades compatiacuteveis com sua idade

cronoloacutegica - Peter Pan o Puer Aeternus todos satildeo exemplos de sonhos

recorrentes em todas as idades e classes sociais representados no mundo

inteiro adequando-se sempre a eacutepoca vigente

Jung falou sobre um outro tipo de sonho o sonho recorrente muitos

indiviacuteduos relatam ter a repeticcedilatildeo de determinado sonho durante grande

periacuteodo de sua vida e natildeo entendem o motivo dele repetir sempre agrave mesma

temaacutetica agraves vezes com pequenas alteraccedilotildees mas o conteuacutedo permanece o

mesmo

ldquoOsonho recorrente eacute um fenocircmeno digno de apreciaccedilatildeo Haacute casos em que as pessoas sonham o mesmo sonho desde a infacircncia ateacute a idade adulta Este tipo de sonho eacute em geral uma tentativa de compensaccedilatildeo para algum defeito particular que existe na atitude do sonhador em relaccedilatildeo agrave vida ou pode datar de um traumatismo que tenha deixado alguma marca Pode tambeacutem ser a antecipaccedilatildeo de algum acontecimento importante que estaacute por acontecerrdquo (2002 p 53)

Edinger cita Jung em Ego e Arqueacutetipo (1992) ao defender a importacircncia do

simboacutelico em nossas vidas tatildeo agitadas acredita que o homem moderno pode

acabar somente passando pela vida sem se dar conta que estaacute num ir e vir sem um

sentido verdadeiro e profundo e acabar natildeo aproveitando as possibilidades e

oportunidades a que temos direito

ldquoO homem necessita de uma vida simboacutelica Mas natildeo temos vida simboacutelica Acaso vocecircs dispotildeem de um canto em algum lugar de suas casas onde realizam ritos como acontece na Iacutendia Mesmo as casas mais simples daquele paiacutes tecircm pelo menos um canto fechado por uma cortina no qual os membros da famiacutelia podem viver a vida simboacutelica podem fazer seus novos votos ou meditar Noacutes natildeo temos isso Natildeo temos tempo nem lugar Soacute a vida simboacutelica pode exprimir a necessidade do espiacuterito - a necessidade diaacuteria do espiacuterito natildeo se esqueccedilam E como natildeo dispotildeem disso as pessoas jamais podem libertar-se desse moinho - dessa vida angustiante esmagadora e banal em que as pessoas satildeo nada senatildeordquo

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 21: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

21

2 SONHOS E RELIGIAtildeO

ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)

Desde a histoacuteria primitiva ateacute a era cristatilde a religiatildeo eacute considerada um guia espiritual da humanidade e a Biacuteblia tanto no novo como no velho testamento nos fala que Deus se utiliza de sonhos para comunicar-se com os homens Atraveacutes deles Deus abenccediloa cura guia alerta adverte pune portanto os sonhos tiveram uma importacircncia capital para os homens deste periacuteodo eles consideravam o sonho como um companheiro leal em que podiam confiar sem medo de errar ou ser traiacutedo

De acordo com Hall

ldquoAo longo da histoacuteria da maioria das tradiccedilotildees religiosas os sonhos tecircm sido considerados uma fonte de informaccedilotildees acerca da vontade de Deus e da existecircncia de um mundo espiritual atraacutes acima ou dentro do mundo da realidade cotidianardquo (1994 p 33)

E noacutes que papel atribuiacutemos aos sonhos Que valor damos as coisas surgidas

no estado oniacuterico e que por natildeo podermos compreendecirc-las em sua totalidade

preferimos consideraacute-las apenas mais uma simples etapa um resquiacutecio do dia que

se foi

Jaacute que a religiatildeo cristatilde deixou de ser o guia maior para os homens do

ocidente vaacuterias outras religiotildees seitas filosofias e ciecircncias surgiram e ocuparam

esse lugar vago onde o que importa eacute o real o palpaacutevel o possiacutevel de mensurar

Segundo Hall a igreja aconselhando o terapeuta ouvindo o paciente

compreendendo e tudo mais que puder somar deveraacute ser usado para que

possamos acessar o inconsciente

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 22: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

22

ldquoEm nossos dias os sonhos tendem a ser deixados de lado tanto na psicoterapia secular como no aconselhamento pastoral apesar de sua tradicional importacircncia na maioria das religiotildees e do papel central que tecircm desempenhado no desenvolvimento da psicologia profunda Nas primeiras e influentes obras de Freud os sonhos eram nada menos que ldquoa via reacutegia para o inconscienterdquo (1994 p 36)

Kelsey nos esclarece sobre a trajetoacuteria histoacuterica cristatilde dos sonhos e inicia

com uma pergunta Onde estamos hoje e eacute ela que nos nortearaacute para seguirmos

em frente em nosso trabalho de busca por algo maior atraveacutes dos sonhos

ldquoSempre houve alguma justificativa para natildeo se dar muita atenccedilatildeo aos sonhos Mas hoje a causa fundamental para a indiferenccedila cristatilde eacute bem especiacutefica Eacute que natildeo haacute quase mais lugar para o sonho dentro do cientificismo loacutegico e materialista que substitui quase por completo o pensamento e a filosofia originais do cristianismo A visatildeo aristoteacutelica proposta por Tomaacutes de Aquino refinada por descartes e aceita como verdade final pelo positivismo afirma muito simplesmente que soacute existem duas realidades Haacute a realidade material e a consciecircncia da razatildeo e fora disso natildeo existe mais nada que a humanidade possa conhecer Essa proposiccedilatildeo eacute a coisa mais distante que existe do pensamento tradicional hebraico e do cristatildeordquo (1996 p 306)

Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura

conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus

Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias

Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a

narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado

por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas

na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida

sobre a morte

Apolo confiou a educaccedilatildeo de seu filho Esculaacutepio ao centauro Quiacuteron ele era

filho de Saturno e da ninfa Filira e que ao nascer (tinha a cabeccedila e o torso humanos

e o corpo de cavalo) foi abandonado por seus pais poreacutem Apolo (deus do Sol dos

gregos) o adotou e ensinou todos os seus conhecimentos artes muacutesica poesia

eacutetica filosofia artes divinatoacuterias e profecias terapias e a arte de curar os doentes

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 23: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

23

Quiacuteron com enorme reconhecimento e gratidatildeo a Apolo por tecirc-lo adotado

dedicou-se agrave educaccedilatildeo de Esculaacutepio que cresceu e tornou-se extremamente haacutebil

na arte da cura tanto que acabou por descobrir o princiacutepio de ressuscitar os mortos

Esculaacutepio apaixonou-se e casou-se com Epione que mais tarde se tornaria a

deusa que alivia as dores deusa da anestesia Tiveram dois filhos Machaon e

Podaliacuterio que foram os meacutedicos dos gregos na Guerra de Troacuteia e quatro filhas

Hiacutegia a deusa da sauacutede Iaso a deusa dos curativos Panaceacuteia a deusa da cura e

Aqueso a deusa do processo da cura

Zeus deus do Oliacutempo temendo que as ressuscitaccedilotildees alterassem a ordem

do mundo terreno e que este conhecimento fosse passado para os homens

fulminou Esculaacutepio com um relacircmpago Apolo comovido divinizou seu filho

transformando-o na constelaccedilatildeo Serpentaacuterio Esculaacutepio nasceu humano poreacutem

apoacutes sua morte foi-lhe concedido a imortalidade ele eacute um deus que natildeo estaacute no

Oliacutempo nem no Hades ele caminha entre os homens ensinando a medicina e

aliviando-os das doenccedilas

Figura 3 - Esculaacutepio

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 24: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

24

Com o passar do tempo a lenda de Esculaacutepio foi tornando-se popular e

consequumlentemente enriquecendo ele eacute representado com um bastatildeo em uma das

matildeos onde se encontram duas serpentes enroladas que originou o caduceu e eacute o

siacutembolo da medicina ateacute hoje pois a terriacutevel serpente possui o veneno que mata

mas quando bem usado tambeacutem promove a cura

Natildeo sabemos ao certo se Esculaacutepio homem que foi mencionado por grandes

personalidades como Hesiacuteodo Piacutendaro e na Iliacuteada de Homero realmente existiu

poreacutem os primeiros santuaacuterios destinados a ele foram construiacutedos por volta de 770

a C proacuteximos a bosques e fontes de aacutegua natural onde a serpente passou a ser

cultuada Estes santuaacuterios eram um misto de ambiente religioso sagrado e hospital

para o povo a cura acontecia durante o sono revelada em sonho pela forccedila do

mito

Eacute curioso saber que existiam apenas duas restriccedilotildees para acesso aos

templos agraves mulheres era proibido dar agrave luz no interior do santuaacuterio e os moribundos

deviam ser afastados mantidos longe destes lugares Curiosamente estes mesmos

dois interditos seratildeo encontrados alguns seacuteculos mais tarde nos hospitais franceses

do Antigo Regime que foi de 1453 a 1789 onde reinavam o absolutismo no plano

poliacutetico e o mercantilismo no plano econocircmico

Os santuaacuterios mais famosos denominados Asklepieia foram os de Epidauro e

Coacutes onde iniciou a famosa escola meacutedica de Coacutes da qual Hipoacutecrates fazia parte e

que viria a dar origem agrave Medicina Ocidental Os templos de Peacutergamo e Cirema ainda

eram visitados no seacuteculo V dC quando o tratamento com ldquomeacutedicosrdquo falhava as

pessoas recorriam aos santuaacuterios de Esculaacutepio onde recebiam orientaccedilatildeo e

tratamento

ldquoInicialmente o devoto precisava oferecer um sacrifiacutecio ao deus Depois de um banho de purificaccedilatildeo tinha de adormecer dentro do recinto sagrado mdash processo chamado de ἐγκοίμησις ou incubatio incubaccedilatildeo mdash quando entatildeo a cura lhe chegava em sonhos No sonho o deus ou aparecia em pessoa com uma ou vaacuterias de suas filhas e tratava pessoalmente o suplicante ou entatildeo fazia uma serpente lamber o ferimento ou a regiatildeo afetada pela doenccedila Outras vezes Ascleacutepio simplesmente sugeria um tratamento banhos massagens plantas medicinais oferecimento de sacrifiacutecios viagens e outros procedimentos salutares

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 25: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

25

Os doentes curados deviam ainda agradecer ao deus com presentes estelas esculpidas com dedicatoacuteria placas de pedra com o relato da cura modelos do oacutergatildeo curado moedas de ouro e prata mdash de certa forma a oferenda votiva era parte integrante do ritual E eacute claro que tanto os sacerdotes ajudavam os suplicantes na interpretaccedilatildeo dos sonhos como tambeacutem o proacuteprio deus que natildeo dava conta sozinho de tantos animais sacrificados e muitas outras daacutedivasrdquo (Site 2)

Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes

realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a

Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas

com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos

recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles

ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-

los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa

Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente

tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos

terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente

natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito

moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando

um mesmo fim o restabelecimento

Os templos receberam um eacutedito firmado em 385 dC pelo Imperador

Constantino para serem fechados e substituiacutedos por hospitais cristatildeos pois o

cristianismo havia sido eleito a religiatildeo oficial poreacutem levou mais de um seacuteculo desde

esta proibiccedilatildeo ateacute a aceitaccedilatildeo pelo povo grego e durante todo este periacuteodo de

tempo as praacuteticas e os ritos de cura dedicados a Ascleacutepio natildeo deixaram de ser

praticados

Jung fala sobre a imensa forccedila que um siacutembolo exerce e que natildeo eacute faacutecil

derrubar ou extinguir um mito ele seguiraacute seu proacuteprio curso e tempo de duraccedilatildeo

que seraacute natildeo determinado por nenhum indiviacuteduo lei decreto ou autoridade

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 26: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

26

Sob a forma abstrata os siacutembolos satildeo ideacuteias religiosas sob a forma de accedilatildeo satildeo ritos ou cerimocircnias Satildeo manifestaccedilotildees e expressotildees do excedente da libido Constituem ao mesmo tempo degraus que levam a novas atividades que especificamente devemos chamar culturais para distingui-las das funccedilotildees instintivas que seguem seu curso regular de acordo com as leis da natureza (Jung 1997 pp 45-46)

Para Jung a religiatildeo era encarada como uma atitude da mente e o credo ou

qualquer atividade praacutetica em si seria uma forma codificada simboacutelica de dar vida a

um sentimento real da experiecircncia religiosa original

Encaro a religiatildeo como uma atitude do espiacuterito humano atitude que de acordo com o emprego originaacuterio do termo religio poderiacuteamos qualificar a modo de uma consideraccedilatildeo e observaccedilatildeo cuidadosas de certos fatores dinacircmicos concebidos como potecircncias espiacuteritos democircnios deuses leis ideacuteias ideais ou qualquer outra denominaccedilatildeo dada pelo homem a tais fatores dentro de seu mundo proacuteprio a experiecircncia ter-lhe-ia mostrado suficientemente poderosos perigosos ou mesmo uacuteteis para merecerem respeitosa consideraccedilatildeo ou suficientemente grandes belos e racionais para serem piedosamente adorados e amados (1995 p10)

Jung acreditava que a religiatildeo e o poder exercido por ela sobre os homens

tinha como funccedilatildeo maior evitar as dissociaccedilotildees neuroacuteticas da psique e isto somente

seria possiacutevel de ser alcanccedilado atraveacutes do autoconhecimento confrontando Ego e

Self e o mesmo fazendo com a realidade fiacutesica e a realidade psiacutequica

Ele deixou bastante claro que o motivo do surgimento de diversas neuroses

estaacute relacionado ao fato de natildeo ser levado em conta as necessidades religiosas da

alma ou seja o que realmente importante para o homem alcanccedilar e manter sua

sauacutede mental eacute desenvolver uma atitude religiosa espiritual independente de credo

ou dogmas

ldquodevido agrave paixatildeo infantil do entendimento racional () o que importa jaacute natildeo satildeo os dogmas e credos mas sim toda uma atitude religiosa que tem uma funccedilatildeo psiacutequica de incalculaacutevel alcancersquo (1999 p 44)

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 27: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

27

Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser

humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio

ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e

meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de

seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-

los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e

explica o que significa

ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)

Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda

pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido

ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)

Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial

que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos

costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de

Agostinho e Cipriano

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 28: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

28

ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)

No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria

eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a

igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da

palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em

sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho

Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos

sujos

Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja

deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar

demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)

Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno

perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas

positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver

dissociaccedilotildees

ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)

A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo

utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos

aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou

maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que

partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 29: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

29

Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em

relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados

ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)

Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no

Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e

faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos

ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)

Na Biacuteblia encontramos Deus comunicando-se com os homens passando instruccedilotildees acompanhando-os repreendendo-os fazendo com que o homem daquele periacuteodo se torna-se menos rude e pouco a pouco se afasta-se de seus instintos primitivos para partilhar a vida em uma sociedade humanizada organizada constituiacuteda e hierarquizada

As organizaccedilotildees ou sistemas satildeo siacutembolos que capacitam o homem a estabelecer uma posiccedilatildeo espiritual que se contrapotildee agrave natureza instintiva original uma atitude cultural em face da mera instintividade Esta tem sido a funccedilatildeo de todas as religiotildees (JUNG 1997 p 57)

Para Jung a religiatildeo tinha precisamente a funccedilatildeo de ligar o consciente do

homem a fatores inconscientes extremamente importantes para o seu pleno

desenvolvimento Ele acreditava que a libido era a fonte que originava as imagens

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 30: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

30

religiosas e nos remetia agrave nossa origem e os sonhos por sua vez eram um caminho

de acesso a este material quando interpretados e bem aproveitados

Kelsey analisa as diversas formas que aparecem os sonhos e as visotildees na

biacuteblia e considera que atraveacutes dela seja possiacutevel encontrar um caminho a mais para

quem pretende compreender mais acerca dos sonhos pois em seus escritos

encontram-se natildeo apenas descriccedilotildees de uma eacutepoca previsotildees e advertecircncias de

um periacuteodo histoacuterico nela encontra-se quase que um tratado para evoluccedilatildeo e junccedilatildeo

da realidade fiacutesica com a natildeo-fiacutesica

ldquoEacute pena que as visotildees transes e mesmo os sonhos da Biacuteblia tenham sido considerados apenas como manifestaccedilotildees religiosas sobrenaturais Na verdade ainda eacute muito comum ocorrerem experiecircncias assim E embora as vezes elas manifestem um conteuacutedo ldquoaleacutem do naturalrdquo satildeo natildeo obstante fatos naturais que podem observados e analisados E se originam num mundo com o qual eacute natural seres humanos se depararem Na verdade os autores neotestamentaacuterios tinham uma visatildeo bem mais sofisticada desse assunto do que podemos imaginar Apresentavam uma teoria consistente sobre os seres humanos onde os sonhos e visotildees ocupavam um espaccedilo definido Viam perfeitamente que estamos em contato com um mundo ao mesmo tempo fiacutesico e natildeo-fiacutesico e de cuja totalidade necessitamos Nenhuma das duas dimensotildees poderia omitida caso se quisesse viver a realidade tal qual ela eacute Portanto os sonhos e as visotildees eram importantes por serem uma das formas pelas quais a dimensatildeo natildeo fiacutesica irrompia diretamente na psique humana E esse era um ponto de vista extremamente platocircnico Eacute claro que hoje isto nos parece estranho Eacute difiacutecil alterar a nossa convicccedilatildeo cultural de que os seres humanos soacute estatildeo em contato com uma uacutenica realidade Mas se quisermos penetrar na visatildeo de mundo daqueles cristatildeos temos que ouvir esses escritores que sentiam a importacircncia bem como a dificuldade de escrever tantos encontros com a realidade natildeo-fiacutesica Se despojarmos o novo Testamento de todas essas experiecircncias seraacute realmente muito difiacutecil captar o que seus livros transmitemrdquo (1996 p 134)

Giglio amp Giglio (2006) definem o que especificamente Jung queria dizer ao

usar o termo religiatildeo ele acaba fugindo completamente do lugar comum e nos daacute

uma amplitude de interpretaccedilatildeo acerca do termo

ldquoExistem duas possiacuteveis raiacutezes etimoloacutegicas para a palavra ldquoreligiatildeordquo Uma vem de religare etimologia privilegiada pelos padres da igreja medieval que remete a uma alianccedila com Deus o clero julgava ser a casta eleita para fazer a intermediaccedilatildeo ndash a ligaccedilatildeo- entre os homens comuns e Deus A outra vem de religere que significa uma observaccedilatildeo cuidadosa de si mesmo Literalmente poderiacuteamos traduzir por ldquore-leiturardquo palavra bem ao gosto

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 31: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

31

contemporacircneo inspirada pela semioacutetica Jung deu preferecircncia a esta uacuteltima interpretaccedilatildeo (1983) Portanto no contexto da psicologia analiacutetica esse sentido sobrepotildee-se agravequele da teologia cristatilde medieval que nos eacute mais familiar A atitude religiosa autecircntica eacute no sentido junguiano aquela que facilita o processo de individuaccedilatildeo enquanto atenccedilatildeo ao mundo interno (imagens fantasias que sinalizam a emergecircncia da sabedoria do niacutevel arquetiacutepico) e observaccedilatildeo cuidadosa do mundo em busca de sinais do sobrenatural Ou seja a atitude religiosa implica numa leitura do mundo ndash e de si ndash que supotildee a existecircncia de manifestaccedilotildees do sobrenatural passiacuteveis de serem descobertas e interpretadasrdquo ( p 151 152)

No relato abaixo temos a prova de que Jung discordava frontalmente da visatildeo

de Freud em relaccedilatildeo aos sonhos Jung acreditava nos seus significados e na

importacircncia para o desenvolvimento pleno do homem

ldquoNunca pude concordar com Freud que o sonho eacute uma ldquofachadardquo atraacutes da qual seu significado se dissimula significado jaacute existente mas que se oculta quase que maliciosamente agrave consciecircncia Para mim os sonhos satildeo natureza e natildeo encerram a menor intenccedilatildeo de enganar dizem o que podem dizer e tatildeo bem quanto o podem como faz uma planta que nasce ou um animal que procura pasto Os olhos tambeacutem natildeo procuram nos enganar talvez sejamos noacutes que nos enganemos porque nossos olhos satildeo miacuteopes Ou entatildeo ouvimos mal porque nossos ouvidos satildeo um pouco surdos mas natildeo satildeo eles que nos querem enganar Muito antes de conhecer Freud eu considerava o inconsciente - da mesma forma que os sonhos sua expressatildeo imediata ndash como um processo natural desprovido de qualquer arbitrariedade e acima de tudo de qualquer intenccedilatildeo de prestidigitaccedilatildeordquo (2002 p145)

Kelsey afirma com extrema simplicidade e coerecircncia sobre determinadas

ldquocoisasrdquo que os sonhos fazem ou poderiam fazer por noacutes desde que prestemos

atenccedilatildeo a sua dinacircmica por vezes um tanto confusa quase que uma brincadeira

poreacutem o seu conteuacutedo eacute expresso da melhor forma que o inconsciente encontra para

cada indiviacuteduo porque somos noacutes que fornecemos o material de trabalho para os

sonhos portanto eacute responsabilidade nossa saber o que fazer com eles quem toma

a decisatildeo de modificar aprender corrigir incluir ou banir algo eacute o proacuteprio sonhador

usando da faculdade do livre arbiacutetrio

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 32: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

32

ldquoAgraves vezes os sonhos falam com uma clareza impossiacutevel de ser ignorada mas em sua maioria comunicam-se pela linguagem dos quadros siacutembolos contos de fada e mitos Natildeo haacute meacutetodo faacutecil para entendecirc-los sendo necessaacuterio esforccedilo para entrar em contato com seu significado Deus nos envia sonhos para ajudar a dirigirmos nossa vida e tornar o sagrado mais real para noacutes O Divino natildeo toma a direccedilatildeo fazendo tudo por noacutes como erroneamente pensam alguns entusiastas religiosos Os sonhos e visotildees nos proporcionam chaves que sugerem formas para cuidarmos de nossa vida mas exigem cooperaccedilatildeo e trabalho Aprender a ouvir esses mensageiros noturnos pode significar aprender a ouvir e trabalhar ativamente com Deusrdquo (1996 p 323324)

Sobre a igreja cristatilde Jung exemplifica a diversidade de siacutembolos utilizados e

sem que se perceba a analogia existente entre os profetas e os animais o homem e

seus instintos baacutesicos estatildeo presentes em nossa vida natildeo podemos simplesmente

isolar determinadas coisas de nossa personalidade pois devemos primeiramente

conhecer e depois do reconhecimento domesticar e incorporaacute-los integraacute-los em

nosso dia-a-dia

ldquoMesmo no cristianismo o simbolismo animal representa um papel surpreendentemente importante Trecircs dos evangelistas tecircm emblemas de animais Satildeo Lucas o boi Satildeo Marco o leatildeo e Satildeo Joatildeo a aacuteguia Apenas Satildeo Mateus eacute representado como um homem ou um anjo O proacuteprio Cristo aparece simbolicamente como o Cordeiro de Deus ou como o Peixe eacute tambeacutem a serpente louvada na cruz o leatildeo e em alguns casos raros um unicoacuternio Estes atributos animais de Cristo indicam que mesmo o filho de Deus (a personificaccedilatildeo suprema do homem) natildeo prescinde da sua natureza animal do mesmo modo que sua natureza espiritual Considerando-se tanto o subumano como o sobre-humano como partes do reino divino Esta relaccedilatildeo entre os dois aspectos do homem eacute admiravelmente simbolizada na imagem do nascimento de Cristo em um estaacutebulo entre animaisrdquo (2002 p 238)

Leonardo Boff polecircmico teoacutelogo da libertaccedilatildeo escritor professor e

conferencista no ano de 1984 em razatildeo de suas teses ligadas agrave Teologia da

Libertaccedilatildeo apresentadas no livro Igreja Carisma e Poder foi condenado a um ano

de silecircncio obsequioso e deposto de todas as suas funccedilotildees em 1992 sendo de

novo ameaccedilado com uma segunda puniccedilatildeo pelas autoridades de Roma renunciou

agraves suas atividades de padre suas convicccedilotildees falaram mais alto aqui ele expotildee sua

visatildeo do objetivo da religiatildeo

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 33: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

33

ldquoVida interior natildeo eacute monopoacutelio das religiotildees Estas vecircm depois Vida interior eacute uma dimensatildeo do humano Por isso eacute universal Estaacute em todos os tempos e em todas as culturas As religiotildees cumprem sua missatildeo quando suscitam e alimentam a vida interior de seus seguidores quando lhes criam condiccedilotildees de fazerem a viagem para o seu interior rumo ao coraccedilatildeo onde habita o Misteacuterio Vida interior supotildee escutar as vozes e os movimentos que vecircm de dentro Haacute um eu profundo carregado de anseios buscas e utopias Haacute uma exigecircncia eacutetica que nos convida para o bem natildeo apenas para si mesmo pessoalmente mas tambeacutem para os outros Haacute uma Presenccedila que se impotildee maior que a nossa consciecircncia Presenccedila que fala daquilo que realmente conta em nossa vida daquilo que eacute decisivo e que natildeo pode ser delegado a ningueacutem Deus eacute outro nome para esta experiecircncia que preenche a nossa busca insaciaacutevel Cultivar esse espaccedilo eacute ter vida interior O efeito mais imediato desta vida interior eacute uma energia que permite enfrentar os problemas cotidianos sem excessivo estresse Quem possui vida interior irradia uma atmosfera benfazeja e confere repouso agravequeles que estatildeo agrave sua volta (Site 3)

As Escrituras contidas na Biacuteblia Sagrada levaram aproximadamente mil anos

para serem escritas Comeccedilou por volta de 1250 aC e terminou cerca 100 anos

apoacutes o nascimento de Jesus Cristo eacute uma coletacircnea escrita realizada em diversos

paiacuteses mas basicamente os manuscritos que a compotildeem estavam em trecircs idiomas

o hebraico o grego e o aramaico e o material usado para escrita era o papiro (folha

comprida de erva do Rio Nilo) ou pergaminho (pele de cabra de ovelha ou de outro

animal macerada em cal raspada e polida)

ldquoO assunto Biacuteblia natildeo eacute soacute uma doutrina sobre Deus Por intermeacutedio de suas paacuteginas podemos encontrar histoacuterias (fascinantes os livros de Samuel e Reis) proveacuterbios profecias romance (Cantares de Salomatildeo ou Cacircnticos dos Cacircnticos - o livro sensual que registra o romance do rei Salomatildeo com uma sulamita) salmos lamentaccedilotildees cartas sermotildees meditaccedilotildees filosofias romances cantos de amor biografias genealogias poesias paraacutebolas comparaccedilotildees tratados contratos leis para a organizaccedilatildeo do povo leis para o bom funcionamento da liturgia coisas alegres e coisas tristes fatos verdadeiros fatos simboacutelicos coisas do passado coisas do presente coisas do futuro enfim uma infinidade de bons assuntosrdquo (Site 4)

Na Biacuteblia destaca-se em diversos livros do Antigo e do Novo Testamento o

valor atribuiacutedo aos sonho ele era respeitado pelo povo livre escravos profetas reis

todos o viam como um aliado abaixo estatildeo listados alguns versiacuteculos onde fica

expressa a sua importacircncia

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 34: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

34

Atos 217

ldquoE nos uacuteltimos dias aconteceraacute diz Deus quendo meu espiacuterito derramarei sobre

toda carne E os vossos filhos e as vossas filhas profetizaratildeo os vossos jovens teratildeo

visotildees e os vossos velhos teratildeo sonhosrdquo

Genesis 203

Deus poreacutem veio a Abimeleque em sonhos de noite e disse-lhe Eis que morto

seraacutes por causa da mulher que tomaste porque ela tem marido

Joacute 3312-18

Eis que nisso natildeo tens razatildeo eu te repondo porque maior eacute Deus do que o

homem Por que razatildeo contendes com ele sendo que natildeo responde acerca de

todos os seus feitos Antes Deus uma e duas vezes poreacutem ningueacutem atenta para

isso Em sonho ou em visatildeo noturna quando cai sono profundo sobre os homens e

adormecem na cama Entatildeo o revela ao ouvido dos homens e lhes sela a sua

instruccedilatildeo para apartar o homem daquilo que faz e esconder do homem a soberba

Figura 4 - Sonho de Jacoacute

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 35: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

35

Mateus 118 - 20

Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim Estando Maria sua matildee

desposada com Joseacute antes de se ajuntarem achou-se ter concebido do Espiacuterito

Santo Entatildeo Joseacute seu marido como era justo e a natildeo queria infamar intentou

deixaacute-la secretamente E projetando ele isto eis que em sonho lhe apareceu um

Anjo do Senhor dizendo Joseacute filho de David natildeo temas receber a Maria tua

mulher porque o que nela estaacute gerado eacute do Espiacuterito Santo

Nuacutemeros 1246

E disse Ouvi agora as minhas palavras se entre voacutes houver profetas eu o

Senhor em visatildeo a ele farei conhecer ou em sonhos falarei com ele

I Reis 35

E em Gibeom apareceu o Senhor a Salomatildeo de noite em sonhos e disse-lhe

Deus Pede o que queres que eu te decirc

Figura 5 - Sonho de Joseacute

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 36: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

36

Salmos 1262

Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Siatildeo estaacutevamos como

os que sonham

Samuel 2815

Samuel disse a Saul por que me inquietaste fazendo-me subir Entatildeo Saul

disse ldquoMui angustiado estou porque os filisteus guerreiam contra mim e Deus se

tem desviado de mim e natildeo me responde mais nem pelo ministeacuterio dos profetas

nem por sonhosrdquo

Figura 6 - Adoraccedilatildeo dos Pastores

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 37: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

37

Kelsey reforccedila a ideacuteia de que somente o conteuacutedo material natildeo eacute suficiente

para o ser humano o espiritual eacute um componente de que natildeo podemos prescindir

ldquoVimos que ao longo do Antigo Testamento dos apoacutecrifos e dos evangelhos o sonho eacute considerado importante veiacuteculo atraveacutes do qual o Divino se comunica com os seres humanos Essa tradiccedilatildeo ainda continua viva na Igreja ortodoxa oriental e existiu no cristianismo do ocidente ateacute a cosmovisatildeo onde Aristoacuteteles e a ciecircncia do seacuteculo XX gradualmente ir se impondo ao pensamento do mundo ocidental Essa visatildeo da realidade e a nossa maneira de compreendecirc-la natildeo deixam espaccedilo para um mundo natildeo fiacutesico nem para qualquer experiecircncia que dele se venha a ter No seacuteculo XIX as pessoas mais cultas aceitavam como coisa taacutecita a conclusatildeo de que apenas a realidade material e o pensamento fundado no racionalismo tinham sentido e levavam agraves uacutenicas experiecircncias relevantes Natildeo havia lugar para o sonho e a revelaccedilatildeo e assim simplesmente desapareceu a concepccedilatildeo do sonho como uma via de comunicaccedilatildeo com o mundo espiritual ou com o Divinordquo (1996 p 339340)

O monge beneditino OSB usando seu conhecimento sobre religiatildeo feacute e

ciecircncias humanas faz um apanhado sobre o papel da religiatildeo atualmente e o

relevante papel a ser cumprido para a obtenccedilatildeo de algo maior a totalidade do ser

ldquoA feacute cristatilde natildeo obstante a sua mensagem de amor trataria cruelmente a pessoa exigiria muito e teria em definitivo em efeito dilacerante Infelizmente no passado a igreja tem muitas pessoas pesando-lhe na consciecircncia porque as colocou em uma tensatildeo insuportaacutevel Por consequumlecircncia eacute uma obrigaccedilatildeo do nosso tempo reaprender com a rica tradiccedilatildeo espiritual da igreja e desenvolver novamente aquela espiritualidade integral que marca todas as grandes escolas cristatildes seja a do monaquismo primitivo ou da miacutestica grega seja a da espiritualidade inaciana ou da miacutestica meister Eckhart ou de muitas grandes mulheres que frequumlentemente foram vistas com suspeita Um espiritualidade integral natildeo pode se permitir a pocircr entre parecircntesis o corpo e desleixar os sonhos Somente quando a pessoa humana eacute considerada na sua totalidade pode ela vir a ser completamente salvardquo (2002 p 61)

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 38: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

38

3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS

Carl Gustav Jung foi um homem que por sua genialidade destacou-se no seu

tempo possuiacutea um conhecimento fabuloso sobre Filosofia Alquimia Astrologia

Antropologia Liacutenguas Antigas Histoacuteria Arqueologia Fiacutesica esta somatoacuteria

diversificada possibilitou a formulaccedilatildeo de suas teorias de forma amplamente

embasadas

Encontra por toda parte os elementos de suas pesquisas em mitos antigos e em contos de fada modernos nas religiotildees do mundo oriental e ocidental na alquimia na astrologia na telepatia mental e na clarividecircncia nos sonhos e visotildees de pessoas normais na antropologia na histoacuteria na literatura e nas artes e na pesquisa cliacutenica e experimental (HALL e LINDZEY 1973 122)

Sendo ele um indiviacuteduo altamente investigativo logo despertou seu interesse

pelas religiotildees orientais fato este que o levaria agrave Iacutendia no ano de 1938 para que

pudesse ampliar seu conhecimento sobre o tema Giglio e Giglio nos falam deste

periacuteodo

ldquoApoacutes 1930 Jung passa a comparar o processo de individuaccedilatildeo agraves vias de aperfeiccediloamento propostas por certas disciplinas espirituais De uma certa forma ele muda sua posiccedilatildeo de analista-cliacutenico-observador para uma espeacutecie de hermeneuta-historiador das religiotildees e sua pesquisa natildeo se deteacutem no cristianismo abrangendo tambeacutem o budismo tibetano a yoga e a alquimia ocidental Nesta uacuteltima disciplina ele vai pioneiramente descobrir um conhecimento oculto que projeta na mateacuteria constructos inconscientes de natureza arquetiacutepica de tal forma que a pretensa intenccedilatildeo de fabricar ouro a partir de metais menos nobres significaria metaforicamente a transformaccedilatildeo e evoluccedilatildeo da psique em direccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo do si-mesmordquo (2006 p150)

Jung utilizou seu conhecimento e perspicaacutecia para analisar e interpretar mais

de quarenta mil sonhos ao longo de sua vida sempre afirmando a importacircncia que

eles representam para a vida diaacuteria do ser humano a vida simboacutelica que atualmente

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 39: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

39

encontra-se desvalorizada e relegada ao esquecimento independente de raccedila

credo ou classe social

Hall nos explica a interpretaccedilatildeo da teoria junguiana sobre os sonhos e sua

atuaccedilatildeo na rotina dos indiviacuteduos quer eles tenham consciecircncia ou natildeo

ldquoMesmo quando os sonhos natildeo satildeo interpretados eles parecem agraves vezes ter um profundo efeito sobre a consciecircncia viacutegil Atraveacutes da observaccedilatildeo do impacto de sonhos natildeo analisados eacute possiacutevel inferir que mesmo quando natildeo recordados os sonhos satildeo parte vital da vida total da psique Na concepccedilatildeo junguiana os sonhos estatildeo continuamente funcionando para compensar e complementar (uma forma mais branda de compensaccedilatildeo) a visatildeo viacutegil que o ego tem da realidade A interpretaccedilatildeo de um sonho permite que se preste um pouco de atenccedilatildeo consciente na direccedilatildeo em que o processo de individuaccedilatildeo jaacute estaacute se desenrolando embora inconscientemente Quando bem-sucedida tal asssociaccedilatildeo de vontade consciente e dinamismo inconsciente promove e favorece o processo de individuaccedilatildeo com mais rapidez do que eacute possiacutevel quando os sonhos ficam por examinar Um benefiacutecio adicional decorrente da interpretaccedilatildeo dos sonhos eacute o fato de o ego reter na memoacuteria consciente um resiacuteduo do sonho que permite agrave pessoa identificar motivos semelhantes na vida cotidiana e assumir uma atitude ou accedilatildeo apropriadas resultando em menor necessidade de compensaccedilatildeo inconsciente dessa aacuterea problemaacutetica especiacuteficardquo (2005 p 33)

Jung distinguiu entre sonhos insignificantes que trabalham problemas do

cotidiano e sonhos significativos que satildeo um caminho de transmissatildeo da sabedoria

milenar da humanidade Esses uacuteltimos trazem siacutembolos que independentes das

narrativas tecidas ao redor deles pela pessoa que sonha tecircm uma vida proacutepria por

serem produtos espontacircneos do inconsciente coletivo Enquanto o inconsciente

pessoal eacute o resultado da vivecircncia do indiviacuteduo os conteuacutedos do inconsciente

coletivo natildeo foram adquiridos durante a vida individual (Jung 19431975)

Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez

o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo

teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito

ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou

descartaremos os mesmos

ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 40: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

40

serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)

Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas

ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)

O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar

nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o

enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo

Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para

crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um

sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas

ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados

em nossa vida diaacuteria

ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 41: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

41

vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)

Jung faz uma diferenciaccedilatildeo clara entre o estado de sonho e o e estado vigil

onde a consciecircncia quando luacutecida usa a loacutegica para transmitir seus pensamentos

opiniotildees e desejos sequumlecircncia que natildeo ocorre no estado de sono sonho

ldquoComo jaacute assinalei um sonho em nada se parece com uma histoacuteria contada pela mente consciente Na nossa vida cotidiana refletimos sobre o que queremos dizer escolhemos a melhor forma de dizecirc-lo e tentamos dar aos nossos comentaacuterios uma coerecircncia loacutegica Uma pessoa instruiacuteda evitaraacute por exemplo o emprego de metaacuteforas complicadas a fim de natildeo tornar confuso o seu ponto de vista Mas os sonhos tecircm uma textura diferente Neles se acumulam imagens que parecem contraditoacuterias e ridiacuteculas perde-se a noccedilatildeo de tempo e as coisas mais banais se podem revestir de um aspecto fascinante ou aterradorrdquo (2002 p 39)

Sanford acredita que a ciecircncia hoje estaacute iniciando uma investigaccedilatildeo seacuteria

baseada em pesquisas cuidadosas e se propondo a encarar os desafios que os

sonhos trazem excluindo charlatotildees e indiviacuteduos que se utilizam de amadorismo e

misticismo para descrever decifrar e compreender o conteuacutedo dos sonhos

Atualmente estamos nos aproximando da mudanccedila Durante o seacuteculo XX o sonho volta a se tornar objeto vaacutelido de estudo e investigaccedilatildeo E temos por exemplo as pesquisas seacuterias relativas ao sono e aos sonhos que comeccedilaram a ser feitas depois da Segunda Guerra Mundial (1988 p15)

O sonho para efeito de compreensatildeo pode ser comparado a uma projeccedilatildeo de

um filme em que somos ao mesmo tempo todos os personagens e atuamos como

mocinho bandido santo ou qualquer outro papel que se fizer necessaacuterio naquele

enredo

ldquoEacute produzido e visto apenas por noacutes Podemos dizer que somos simultaneamente autores diretores atores e espectadores dessas cenas que falam de nossa alma onde nos reconhecemos ou natildeo como agente desse enredoE exatamente pelo fato de produzirmos encenarmos e retratarmos experiecircncias que o mundo real jamais nos permitiria vivenciar eacute que o sonho torna-se o maior veiacuteculo para escoar nossos sentimentos Eacute nesse lugar que o sonhador desempenha a seu bel-prazer todos os papeacuteis possiacuteveis desde os mais loucos aos mais santos aterrorizantes e carismaacuteticos sendo capazes

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 42: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

42

de converter uma emoccedilatildeo de criar produzir e construir as mais fantaacutesticas cenas A elaboraccedilatildeo do sonho eacute um trabalho aacuterduo para o sonhador pois tem um sentido profundamente enraizado na vida da pessoa que o elaborardquo (Site 5)

Ao pesquisar sobre os sonhos nos detivemos alguns momentos para pensar

sobre como eacute o sonhar para os cegos Eacute sabido que para as pessoas cegas o

sentido que predomina ao sonhar eacute o da audiccedilatildeo os sonhos dos cegos natildeo tecircm

imagens isto parece loacutegico pois eles natildeo conhecem as formas

Errado eacute o que afirma Heacutelder Beacutertolo fiacutesico teoacuterico da Faculdade de Medicina

da Universidade de Lisboa em seu artigo intitulado ldquoO que ldquovecircrdquo quem natildeo vecircrdquo

Beacutertolo confirma que ao sonhar a imaginaccedilatildeo eacute o que importa e eacute certo que os

cegos tecircm extrema sensibilidade ao movimento ao odor ao som e ao contato

Sabemos que todas essas sensaccedilotildees estatildeo presentes tambeacutem nos sonhos

das pessoas que enxergam mas como nelas o sentido da visatildeo eacute o que prevalece

os outros sentidos agraves vezes ficam esmaecidos passam quase que despercebidos

ou deixam de ter tanta importacircncia em relaccedilatildeo ao que pode ser visualizado Beacutertolo

explica que

ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)

Beacutertolo fala sobre os resultados surpreendentes que obteve em sua pesquisa

com cegos congecircnitos eles demonstraram que natildeo haacute grande distinccedilatildeo entre o

sonho de um cego e o de um normovisual ao comparar desenhos realizados por

ambos apoacutes sonharem

Eles descrevem as cenas sonhadas chegando a colocar pequenos detalhes

pessoas com estilos de cabelos diferentes por exemplo caracteriacutesticas de animais

paisagens com sol chuva folhas frescas ou mortas desenhos que nos lembram

crianccedilas de preacute-escola desenhando colorido com fortes contornos detalhes

elaborados com coerecircncia com certo exagero nas coisas e pessoas que gostam e

nas que deixam de gostar tambeacutem provando que a imaginaccedilatildeo eacute uma habilidade

que nosso ceacuterebro utiliza com vigor nas pessoas que natildeo tecircm a visatildeo e atraveacutes dos

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 43: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

43

sonhos elas entram em contato e expressam com desenhos essa qualidade ateacute

entatildeo pouco conhecida

ldquoA distinccedilatildeo entre imaginaccedilatildeo e realidade desaparece no sonho Como Jean-Paul Sartre diz no livro A Psicologia da Imaginaccedilatildeo no estado oniacuterico falta-nos a ldquocategoria do realrdquo a consciecircncia fica desesperadamente prisioneira do sonho e natildeo tem outra alternativa senatildeo passear por entre as suas produccedilotildees imaginaacuterias Durante o sonho ateacute os estiacutemulos externos satildeo integrados no sonho como dele provindo Esta perda de ligaccedilatildeo ao mundo real tem duas consequumlecircncias importantes Em primeiro lugar as imagens visuais que satildeo fracas ou tecircnues durante o pensamento viacutegil tornam-se imagens ou cenas reais e niacutetidas no sonho porque natildeo concorrem com as distraccedilotildees da vida praacutetica durante a qual muitas coisas competem pela atenccedilatildeo Os sonhos satildeo os exemplos mais puros da capacidade do ceacuterebro para condensar sentimentos em imagens que formam uma estrutura narrativa Estes enredos dos sonhos por mais bizarros que possam parecer ao acordar satildeo notaacuteveis natildeo soacute pela sua vivacidade mas pela coerecircncia que alcanccedilam em termos de continuidaderdquo (2006 p6)

Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute

uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica

qual caminho estamos tomando

ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto-representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)

Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem

resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas

de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo

Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a

necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma

mensagem ateacute que assimilemos a realidade

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 44: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

44

Por isso nas experiecircncias traumaacuteticas os sonhos constantemente revivem a

cena original ou nos fazem reviver o choque embora usando outras situaccedilotildees ou

imagens como substituiccedilatildeo para melhor compreensatildeo do fato ocorrido

ldquoEm busca da resoluccedilatildeo de problemas os sonhos despertam em noacutes as mais distintas emoccedilotildees sempre apontando para o que desconhecemos ou natildeo suportamos admitir ou seja o nosso lado sombrio Muitas vezes quando natildeo entendemos a linguagem do sonho ela pode se tornar perturbadora exagerando para ser ouvida - enchentes terremotos mareacutes altas precipiacutecios - assim como uma crianccedila que grita para chamar atenccedilatildeo Assim que a imagem toma forma o significado torna-se claro quando a principio privilegiamos a contemplaccedilatildeo agrave espera da compreensatildeo psicoloacutegica Compreender as imagens eacute uma tarefa difiacutecil portanto natildeo tentar decifraacute-las rapidamente eacute da maior importacircncia A atitude adequada para ouvir a voz interna eacute de calma pois soacute assim ela se tornaraacute mais expressiva natildeo para dizer o que gostariacuteamos mas a verdade que precisamos ouvir Daiacute a importacircncia de aprendermos a conviver com os sonhos e de usarmos teacutecnicas que nos auxiliem nessa convivecircnciardquo ( Site 6 )

Figura 7 - Sonho em Antares

Whitmont exemplifica de modo pedagoacutegico a loacutegica do sonho

ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 45: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

45

simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)

Eacute importante neste momento discutir a tiacutetulo de resumo algumas regras

gerais que norteiam o sonho pois querendo ou natildeo lembrando ou natildeo ele faz parte

de nossa vida diaacuteria eacute um companheiro constante e no entanto o conhecemos tatildeo

pouco

Todo mundo sonha mesmo as pessoas que dizem que natildeo sonham eacute porque

natildeo estatildeo conseguindo lembrar dos seus sonhos Faz parte da nossa natureza e eacute

necessaacuterio para equilibrar o fiacutesico e o psiacutequico

O sonho vecircm para o nosso bem e natildeo tecircm a pretensatildeo de querer assustar

ou enganar Sabemos que alguns sonhos se repetem sejam por dias ou anos

seguidos e isto ocorre para que pessoa possa em algum momento entender o que

passa ao seu redor consigo mesmo ou com situaccedilotildees que o envolvem

Os sonhos variam de importacircncia alguns satildeo meros ajustes de nosso dia-a-

dia outros satildeo mais importantes e portanto eacute necessaacuterio considerar seu valor

simboacutelico e estudar o significado que eles estatildeo nos enviando como uma

mensagem cifrada

Tudo que surge em nossos sonhos pessoas animais lugares objetos que

podem falar satildeo representaccedilotildees da nossa personalidade que se mostram mesmo

que consideremos um pouco confuso eacute um modo para melhor compreendermos

nosso funcionamento

Um apecto muito importante eacute saber que quando algo vecircm agrave tona num

sonho eacute que o inconsciente sabe que a pessoa estaacute preparada para enfrentar ou

necesita disso para poder viver com mais seguranccedila e tranquumlilidade

Os sonhos usam sempre a linguagem simboacutelica por este motivo eacute preciso

tomar cuidado com os dicionaacuterios de sonhos o que realmente importa eacute aprender

a conhecer os siacutembolos a mitologia pode nos ajudar a interpretar os nossos

siacutembolos mas eacute necessaacuterio a nossa investigaccedilatildeo pessoal

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 46: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

46

Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras

ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre

com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar

ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)

Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se

chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando

como ferramenta os sonhos

ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 47: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

47

4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Iniciamos este estudo com a seguinte proposta A busca por compreender o

lugar ocupado pelo sonho na atualidade fazendo um paralelo com a religiatildeo que

sempre o valorizou desde as mais remotas eras e agora o desconhece e a sua

importacircncia para a psicologia analiacutetica visto que o sonho tecircm papel relevante para a

anaacutelise e para o auto-conhecimento do paciente ao longo de sua vida

No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o

que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser

entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas

variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente

racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute

atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no

entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da

evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares

Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do

Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser

palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples

atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a

sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre

sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem

A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam

o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila

e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta

balanccedila com pesos tatildeo desiguais

Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria

exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 48: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

48

do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do

auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que

redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar

histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando

mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou

para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como

um todo

Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma

temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo

nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a

certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num

crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas

Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas

e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas

suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos

reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os

historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante

diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para

que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos

Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que

eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso

corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria

o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo

Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem

interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser

possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta

caminhada de busca e auto-conhecimento

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 49: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

49

ldquoSonhar permite que cada um e todos de noacutes sejamos loucos silenciosamente e com seguranccedila cada noite de nossas vidasrdquo

(William C Dement - pesquisador de sono e sonhos)

REFEREcircNCIAS

BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7

BIacuteBLIA Portuguecircs Biacuteblia Sagrada Traduccedilatildeo Joatildeo ferreira de Almeida Ed cor e rev Satildeo Paulo Sociedade Biacuteblica Trinitariana do Brasil 1994

EDINGER Edward F Ciecircncia da Alma Uma Perspectiva Junguiana Satildeo Paulo Paulus 2004 p14 -15

EDINGER Edward F Ego e Arqueacutetipo Satildeo Paulo Cultrix 1992

FISH Jefferson Morris Placebo Terapia A Feacute no Processo de Cura Satildeo Paulo Papirus 1988 p 20 - 21

GIGLIO Joel Sales GIGLIO Zula Garcia Cadernos Junguianos Satildeo Paulo AJB v 2 n 2 p 150 151- 152 2006

HALL Calvin S LINDZEY Gardner Teorias da Personalidade Satildeo Paulo EPU Ed Da Universidade de Satildeo Paulo 1973 p 122

HALL James A A Experiecircncia Junguiana Anaacutelise e Individuaccedilatildeo 3ordf ed Satildeo Paulo Cultrix 2003 p 119 121-122

HALL James A Jung e a Interpretaccedilatildeo dos Sonhos Manual de Teoria e Praacutetica 9ordf ed Satildeo Paulo Pensamento-Cultrix 2005 p33 144

HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91

JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57

___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44

___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145

___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238

JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 50: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

50

___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566

KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452

KOLODY Helena Viagem no Espelho e Vinte e um Poemas Ineacuteditos Pr Criar Ediccedilotildees 2001 p209

OSB Anselm Gruumln Os Sonhos no Caminho Espiritual Paranaacute Lyra Editorial 2002 p14 61

ROBLES Teresa A Magia de Nossos Disfarces Belo Horizonte Diamante 2001 p 54

SANFORD J A Os Sonhos e a Cura da Alma (Dreams and Healing) 3ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1988 p14 15

WHITMONT Edward C A Busca do Siacutembolo Conceitos Baacutesicos de Psicologia analiacutetica 5ordf Ediccedilatildeo Satildeo Paulo Cultrix 2002 p 17 35 301

SITE

1 Disponiacutevel em http arcadesonhos googlepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgoo glepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)

2 Disponiacutevel em http greciantigaorg ciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008

3Disponiacutevel em httpwww leonardoboff comsitelboffhtm A dimensatildeo esquecida a vida interior 15022008 Acesso em 20 de Agosto de 2008

4 Disponiacutevel em httpwwwjornaldosamigoscombra_bibliahtmsuntos Acesso em 21 de Agosto de 2008

5 Disponiacutevel em httpwww revistapsicologia combrmateriasabordagenssonhos_refugioDesejosh tm Acesso em 20 de fevereiro de 2008

6 Disponiacutevel em httpwww sbpa-rjorgbr convivendosonhoshtm Acesso em 25 de Abril de 2008 Reis Marfisa Ramalho

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008
Page 51: Sonhos, Religião E Psicologia analítica

51

FIGURAS

httpimagesgooglecombrimages Acesso em 12 de Maio de 2008

  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • Orientador Prof Neacutelio Pereira da Silva CRP 08 0016
  • Curitiba PR 2008
  • MARIA DANUacuteZIA CARVALHO PROENCcedilA
  • SONHOS RELIGIAtildeO E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA
  • Monografia apresentada ao curso de Especializaccedilatildeo em Psicologia Analiacutetica da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute Campus Prado Velho como requisito agrave obtenccedilatildeo do tiacutetulo de especialista
  • COMISSAtildeO ORGANIZADORA
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Prof
  • Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica do Paranaacute
  • Curitiba PR 2008
    • To analyse the dream the main agent of sleep searching to better understand the reasons that made it be placed at the second flat to oblivion or worse to be considered as charlatan work to interpret the meaning of what was dreamed this is the proposal of this study Making a modest review of literature about dreams wersquove found in many periods of the history and in completely different cultures the theme dream appearing as enchantment but also as a mystery Wersquove verified that the same questions are repeted over the centuries What is the reason of the dream there is a need or itrsquos just a whim are sent by gods or demons can we believe in them or not Several studies have been made and others are still being to find a satisfactory answer and in this search we observed the removal of the western people in relation to dreams especially among Christians that were encouraged by the church to not valorize the dreams Appear then a new science psychology and with it reappear the proposal to redeem this valuable source of information that is given to us while we sleep and that throughout our lives while walkers of the day it will help us promoting our self-knowledge toward individualization
    • Keywords sleep dream religion psychology self-knowledge
      • SUMAacuteRIO
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO06
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO21
      • 3 SONHOS E PSICOLOGIA ANALIacuteTICA38
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS47
      • 1 INTRODUCcedilAtildeO
      • Como observamos o sono humano pode ser afetado negativamente por diversos fatores tanto internos como externos e as fases deste periacuteodo de sono satildeo divididos em estaacutegios de alternacircncia sono-vigiacutelia que atuam como verdadeiros reloacutegio neuronais ciacuteclicos que determinam o momento do sujeito sonhar
      • A evoluccedilatildeo do sono ocorre gradualmente passando por quatro estaacutegios Estaacutegio 1- Sono Lento inicia com uma sensaccedilatildeo de sonolecircncia
      • Estaacutegio 2- Sincronizado ou Sono NREM (natildeo-REM) evoluccedilatildeo para um sono leve
      • Estaacutegio 3 - Sono Paradoxal passagem para um sono profundo
      • Estaacutegio 4 - Dessincronizado ou Sono REM (do inglecircs Rapid Eye Movements) momento em que ocorrem os sonhos
      • O inventor Elias Howe (1819-1867) projetou a maacutequina de costura por meio de um sonho Sabemos que uma agulha de costura comum tem abertura para passagem do fio na extremidade oposta agrave ponta mas Howe ao tentar automatizar o processo natildeo conseguia que essas agulhas funcionassem Certa noite sonhou com uma tribo que o ameaccedilava com lanccedilas que tinham um orifiacutecio na ponta da lanccedila despertou e percebeu que se colocasse o orifiacutecio perto da extremidade da agulha obteria o resultado almejado Feito isto a maacutequina funcionou e com o passar do tempo a produccedilatildeo de roupas em escala industrial foi alcanccedilada
      • Wolfgang Amadeus Mozart revelou que muitas das suas composiccedilotildees musicais lhe ocorriam em sonhos e que ao acordar ou mesmo durante a noite levantava as transcrevia e voltava a dormir
      • O quiacutemico Friedrich August Kekuleacute von Stradonitz em 1865 foi o responsaacutevel pela descoberta do anel hexagonal da estrutura molecular do benzeno e propagou sem receio de ter seu nome abalado por amadorismo que apoacutes muito estudo sua descoberta foi baseada em figuras de um sonho e aceito por toda comunidade cientiacutefica Em suas proacuteprias palavras Os aacutetomos saracoteavam diante de mim () Os olhos de minha mente aguccedilados pelas repetidas visotildees desse tipo distinguiam agora estruturas maiores de conformaccedilatildeo muacuteltipla fileiras longas agraves vezes mais cerradas tudo girava e se contorcia como uma cobra Mas veja O que eacute aquilo Uma das cobras agarrou a proacutepria cauda e se pocircs a girar danccedilando diante dos meus olhos Como se fosse atingido por um raio eu acordei () Passei o resto da noite trabalhando nas consequumlecircncias da hipoacutetese
      • Os sonhos influenciaram os quadros de Salvador Dali assim como a leitura dos trabalhos psicoloacutegicos de Freud na sua tentativa de interpretar os sonhos e eacute desta fase uma de suas pinturas mais conhecidas ldquoA persistecircncia da Memoacuteriardquo em que aparecem alguns reloacutegios derretendo Pablo Picasso e outros tantos pintores surrealistas e abstratos tambeacutem elegeram os sonhos como fonte inspiradora de suas mais belas obras
      • Figura 1- Quadro de Salvador Dali
      • O grande poema lsquoKubla Khanrsquo escrito no veratildeo de 1797 foi inspirado no Livro das Maravilhas de Marco Polo O poeta Samuel Taylor Coleridge lia determinada passagem deste livro que relatava a construccedilatildeo do ceacutelebre palaacutecio do Imperador chinecircs Kubla Khan (1215-1294) na cidade de Shang-tu (Xanadu) e adormece Ao acordar comeccedila a transcrever freneticamente o texto recebido em sonho o poema descreve detalhadamente a cidade de Xanadu como um lugar maacutegico e misterioso a capital do impeacuterio de Kublai Khan um rico poema de aproximadamente 300 versos poreacutem Coleridge foi interrompido por uma visita que durou aproximadamente uma hora ao voltar a escrever deu-se conta que tinha esquecido muito sobre o sonho e o que nos foi legado por Coleridge eacute um conjunto de cinquumlenta versos que foi suficiente para tornaacute-lo famoso
      • No ano de 1922 Igor Stravinsky sonhou que estava sentado numa sala descontente com oito muacutesicos que tocavam uma flauta uma clarineta dois trompetes dois trombones e dois fagotes uma peccedila que quanto mais ele ouvia mais o desagradava Ao acordar Stravinski imediatamente anotou a melodia que havia escutado no sonho e desta forma surgiu o famoso ldquoOctetordquo para instrumentos de sopro tocada por orquestras do mundo inteiro
      • Algumas culturas acreditavam que tanto o mundo dos sonhos como o mundo real eram verdadeiros e tinham o mesmo valor aqui natildeo estamos falando somente de tribos ou sociedades isoladas mas tambeacutem das grandes civilizaccedilotildees da Idade Meacutedia e de culturas contemporacircneas nossas que tecircm a mesma convicccedilatildeo
      • 2 SONHOS E RELIGIAtildeO
      • ldquoOs cristatildeos muitas vezes perguntam por que Deus natildeo se dirige a eles como se acredita que fazia em tempos passados Quando ouccedilo este tipo de questionamento lembro-me sempre do rabi a quem perguntaram por que ningueacutem mais vecirc Deus quando no passado Ele aparecia agraves pessoas com tanta frequumlecircncia Resposta do rabi eacute que hoje jaacute natildeo mais existe gente capaz de curvar-se o bastanterdquo (JUNG 2002 p 102)
      • Para iniciarmos uma busca histoacuterica sobre a junccedilatildeo sonhos - religiatildeo - cura conta-nos a mitologia grega que Esculaacutepio (ou Ascleacutepio) nasceu da uniatildeo do deus Apoacutelo e da mortal Coronis uma bela princesa da Tessaacutelia filha do rei Fleacutegias Esculaacutepio nasceu na cidade de Epidauro ao peacute do Monte Mirtiatildeo De acordo com a narrativa mitoloacutegica cantada pelo poeta Piacutendaro (522-443 aC) Esculaacutepio foi tirado por seu pai Apolo do ventre de sua matildee no momento em que esta ardia em chamas na pira funeraacuteria fato este que lhe conferiu o simbolismo da superaccedilatildeo da vida sobre a morte
      • Atraveacutes de descobertas arqueoloacutegicas foi comprovado que os doentes realmente deixavam registradas suas curas como forma de agradecimento a Esculaacutepio foram descobertos quadros inscriccedilotildees em pilares e paredes esculpidas com descriccedilotildees de doenccedilas e os respectivos procedimentos utilizados todos recebidos em sonhos e considerados bons para determinadas doenccedilas Eles ficavam em exposiccedilatildeo para que os meacutedicos e seus aprendizes pudessem consultaacute-los seria o equivalente atual a uma biblioteca para pesquisa
      • Para os gregos o adoecer e a cura estavam intimamente ligados o doente tinha que participar do processo atraveacutes do sonho receber os procedimentos terapecircuticos indicados e colocaacute-los em praacutetica esta participaccedilatildeo era vital o paciente natildeo ficava inerte ele atuava na sua recuperaccedilatildeo vemos que este eacute um conceito moderno da psicossomaacutetica da doenccedila o corpo e a mente atuando juntos visando um mesmo fim o restabelecimento
      • Para Fish tudo pode ser usado para o desenvolvimento e crescimento do ser humano ele proacuteprio como psicoacutelogo cliacutenico e professor universitaacuterio nos EUA veio ao Brasil como convidado do mestrado da PUCCAMP e deixou registrado teorias e meacutetodos de trabalho que ele proacuteprio utiliza em seu trabalho diaacuterio as ldquocrenccedilasrdquo de seus pacientes para auxiliaacute-los a identificar problemas e sempre que possiacutevel sanaacute-los para tanto utiliza um meacutetodo que ele proacuteprio cunhou de ldquoplaceboterapiardquo e explica o que significa
      • ldquoPosso apenas especular sobre esta questatildeo mas o meu pensamento tende a mergulhar nas teses centrais deste livro Acredito que os rituais de cura em si mesmos natildeo tecircm sido tomados tatildeo seriamente quanto as ervas de cura porque estas podem ser tocadas enquanto que os comportamentos natildeo Eacute certo que um comportamento eacute algo real e pode ser visto Parece-me entretanto que os cientistas questionam a validade de coisas que natildeo podem ser tocadas mensuradas ou subdivididas Acredito que somente a ignoracircncia deliberada de fenocircmenos importantiacutessimos como por exemplo o da feacute seja capaz de explicar a razatildeo pela qual os psicoacutelogos natildeo se juntam aos antropoacutelogos neste campo de estudosrdquo (1988 p 20)
      • Dando continuidade a seu pensamento Fish fala sobre a feacute e seu poder ainda pouco utilizado pelo homem moderno sobre o simboacutelico e o medo do desconhecido
      • ldquoApesar do ponto de vista preponderante e a reconfortante constataccedilatildeo de que somos pessoas racionais que apenas manifestam sua feacute nas manhatildes dominicais estou inteiramente de acordo com os teoacutelogos ao afirmarem que a feacute estaacute presente em todos os aspectos da nossa vida De fato natildeo vejo qualquer diferenccedila entre os modos de vida dos povos primitivos que eram conduzidos pela crenccedila maacutegica de sua cultura e os modos pelos quais nossas vidas satildeo governadas pela feacute cientiacutefica de nossa desenvolvida sociedade A uacutenica diferenccedila eacute que o culto agrave ciecircncia (o culto agrave tecnologia ou culto agrave iniciativa pessoal) assume um papel maacutegico tal como numa sessatildeo de Vodu em termos de nossa visatildeo de mundo Perguntemos ao homem da rua se ele sabe que a terra gira em torno do Sol e esta questatildeo tornar-se-aacute mais clara entre noacutesrdquo (1988 p 20 ndash 21)
      • Kelsey cita Tertuliano seacutec III como representante e primeiro liacuteder eclesial que escreveu com sabedoria e seriedade sobre os sonhos relatou haacutebitos costumes e teorias de uma eacutepoca em sua obra inspiraram-se cristatildeos do porte de Agostinho e Cipriano
      • ldquo pois Tertuliano nos deixou um quadro conciso e excelente de sua teoria sobre os sonhos relacionando-os agrave doutrina cristatilde da revelaccedilatildeo em sua obra-prima Sobre a Alma Essas conclusotildees expressam as crenccedilas baacutesicas dos cristatildeos do seacuteculo III e que se mantiveram como atitude comum entre os fieacuteis do Ocidente durante os mil e duzentos anos seguintes ateacute o pensamento de Tomaacutes de Aquino comeccedilar a dominar a Europa Ocidentalrdquo (1996 p171)
      • No seacutec XIII a Igreja Catoacutelica instituiu ao povo que os sonhos na sua maioria eram trabalho do democircnio com esta medida estrateacutegica mais poliacutetica que cristatilde a igreja protegia seu enorme poder sobre os fieacuteis jaacute que ela era a uacutenica detentora da palavra de Deus na terra e portanto quaisquer revelaccedilotildees feitas aos indiviacuteduos em sonhos soacute poderiam vir de fontes diaboacutelicas assim tambeacutem o alematildeo Martinho Lutero (1484-1546) era desta mesma opiniatildeo ldquoo pecado eacute o aliado e pai de sonhos sujos
      • Corroborando com o paraacutegrafo acima Sanford nos diz que ldquohellip a Igreja deixou de dar atenccedilatildeo aos sonhos de seus filhos quando comeccedilou a se preocupar demais com a instituiccedilatildeordquo (1988 p 14)
      • Para Jung todo o racionalismo imediatista fez com que o homem moderno perdesse a capacidade inerente a todo ser humano de entrar em contato com forccedilas positivas e com isso passasse a correr o perigo iminente de desenvolver dissociaccedilotildees
      • ldquoO homem moderno natildeo entende o quanto seu ldquoracionalismordquo (que lhe destruiu a capacidade de reagir a ideacuteias e siacutembolos numinosos) o deixou agrave mercecirc do ldquosubmundordquo psiacutequico Libertou-se das ldquosupersticcedilotildees (ou pelo menos pensa tecirc-lo feito) mas neste processo perdeu seus valores espirituais em escala positivamente alarmante Suas tradiccedilotildees morais e espirituais desintegraram-se e por isto paga agora um alto preccedilo em termos de desorientaccedilatildeo e dissociaccedilatildeo universaisrdquo (2002 p 94)
      • A Biacuteblia Sagrada estaacute repleta de narraccedilotildees e relatos em que os sonhos satildeo utilizados como fonte direta de comunicaccedilatildeo e informaccedilatildeo divina os sonhos aconteciam por uma razatildeo determinada e quando continham mensagens boas ou maacutes tinham um objetivo para quem sonhou eou para os demais homens que partilhavam o mesmo local e o mesmo modo de encarar o sonho
      • Kelsey utiliza-se da Biacuteblia para demonstrar esta forma de pensar e agir em relaccedilatildeo aos sonhos a seriedade com que eram tratados
      • ldquoDesde Paulo e ao longo da Idade Meacutedia nunca faltou a igreja gente que usasse os dons da sabedoria e da interpretaccedilatildeo para compreender as imagens oniacutericas e visionaacuterias Paulo foi apenas o primeiro entre muitos a fazer um esforccedilo consciente para compreender seus sonhos e em grande medida deixaacute-los guiar sua proacutepria vidardquo (1996 p 298)
      • Tambeacutem OSB nos fala que na Biacuteblia tanto no Novo Testamento como no Antigo Testamento eacute Deus que quer se fazer ouvir e ser entendido pelos homens e faz isto atraveacutes do sono e dos sonhos
      • ldquoQuando a Biacuteblia fala de visotildees natildeo pensa em acontecimentos fora do comum em fatos que poderiacuteamos fixar em um filme Trata-se sempre de apariccedilotildees pensadas pelas pessoas de apariccedilotildees que tornam perceptiacuteveis por nossa psique e que podemos perceber por nosso olho interior Natildeo se trata de imaginaccedilotildees mas de experiecircncias iguais aos sonhos que nos sobrevecircm sem a nossa iniciativa No Antigo e no Novo Testamento Deus se daacute a conhecer continuamente em visotildees No sono e no sonho Deus quer nos encontrar porque eacute por eles que pode ser tirado o veacuteu de nossos olhos e noacutes podemos reconhecer claramente qual eacute o misteacuterio de nossa vida e qual eacute para noacutes o misteacuterio de Deusrdquo (2002 p14)
      • 3 PSICOLOGIA ANALIacuteTICA E OS SONHOS
      • Hall define com propriedade esta falta de interesse pelo sonhos e que talvez o primeiro fator seja pela dificuldade de traduccedilatildeo pelas imagens que carregam pelo teor das palavras poreacutem nos alerta que independente de nossa opiniatildeo a respeito ele estaraacute agindo em nossas vidas pouco importando se o valorizaremos ou descartaremos os mesmos
      • ldquoO sonho eacute um fragmento de realidade cuja origem eacute pessoal mas obscura cujo significado eacute fecundo mas incerto e cujo destino no mundo do ego viacutegil estaacute em nossas proacuteprias matildeos Se o tratarmos com respeito e interesse serve-nos de muacuteltiplas maneiras Se desprezarmos o sonho ele nos impressiona de qualquer modo operando suas transformaccedilotildees alquiacutemicas nas profundezas da psique buscando o mesmo objetivo de individuaccedilatildeo com ou sem a nossa ajuda consciente Os sonhos satildeo entidades misteriosas com mensagens de um amigo desconhecido que eacute solicito mas objetivo Sua caligrafia e linguagem satildeo por vezes obscuras mas nunca haacute qualquer duacutevida quanto agrave preocupaccedilatildeo subjacente com o nosso bem-estar fundamental ndash que pode se diferente do bem-estar que imaginamos ser a nossa metardquo (2005 p144)
      • Jung nos fala sobre as mensagens que o inconsciente nos envia atraveacutes dos sonhos nos alertando para que prestemos atenccedilatildeo a seus conteuacutedos eles trazem informaccedilotildees que podem nos auxiliar e por vezes ateacute mudar o rumo de nossas vidas
      • ldquoA funccedilatildeo geral dos sonhos eacute tentar restabelecer a nossa balanccedila psicoloacutegica produzindo um material oniacuterico que reconstitui de maneira sutil o equiliacutebrio psiacutequico total Eacute ao que chamo funccedilatildeo complementar (ou compensatoacuteria) dos sonhos na nossa constituiccedilatildeo psiacutequica Explica porque pessoas com ideacuteias pouco realiacutesticas ou que tecircm um alto conceito de si mesmas ou ainda que constroem planos grandiosos em desacordo com a sua verdadeira capacidade sonham que voam ou que caem O sonho compensa as deficiecircncias de suas personalidades e ao mesmo tempo previne-as dos perigos dos seus rumos atuaisrdquo (2002 p 49)
      • O sonho possui caracteriacutesticas proacuteprias natildeo podemos decidir o que sonhar nem como sonhar ou quando sonhar assim como tambeacutem natildeo podemos alterar o enredo apresentado quer gostemos dele ou natildeo
      • Robles nos fala sobre momentos de crise que podem ser alavancas para crescimento pessoal e natildeo podemos deixar de comparar tal aprendizado a um sonho em relaccedilatildeo ao estado de vigiacutelia onde podemos aprender das duas formas ambos trazem conteuacutedos que natildeo somente podem como devem ser aproveitados em nossa vida diaacuteria
      • ldquoCrise atraacutes de crise ao longo da vida vamos resolvendo dificuldades enfrentando outras novas e resolvendo-as tambeacutem Eacute como se cada vez que resolvemos uma dificuldade tiraacutessemos uma casca de uma cebola deixando agrave vista a que estava em baixo coberta E assim temos que seguir tirando as cascas ateacute que natildeo haja mais para tirar Eu acredito que enquanto estivermos vivos sempre haveraacute cascas para tirar Entretanto algumas pessoas natildeo podem tirar algumas destas cascas Ficam presas numa espeacutecie de ciacuterculo vicioso repetem e repetem os mesmos erros sem querer e sem perceberrdquo (2001 p 54)
      • ldquoSonhamos a imagem natildeo a partir de uma fotografia arquivada na memoacuteria mas a partir da imaginaccedilatildeo ou seja a partir de uma biblioteca neuronal de semelhanccedilas metafoacutericas a imagem eacute meio sentimento e meio objeto Ateacute as proacuteprias ideacuteias se podem tornar objetos nos sonhosrdquo (2006 p7)
      • Podemos complementar com Hall que nos esclarece que este mecanismo eacute uma forma de compensaccedilatildeo natildeo somente fiacutesica mas psiacutequica tambeacutem que indica qual caminho estamos tomando
      • ldquoOs sonhos podem fazer piadas resolver problemas ou mesmo lidar com questotildees de ordem religiosa e filosoacutefica Para Jung os sonhos satildeo uma auto- representaccedilatildeo do estado da psique apresentada sob uma forma simboacutelica O propoacutesito dos sonhos na teoria junguiana eacute compensar distorccedilotildees unilaterais do ego viacutegil por conseguinte o sonhos estatildeo a serviccedilo do processo de individuaccedilatildeo auxiliando o ego viacutegil a encarar-se a si mesmo de forma mais objetiva e conscienterdquo ( 2003 p 121-122)
      • Os sonhos refletem sentimentos e atitudes que natildeo ficaram muito bem resolvidos em nossas vidas sentimentos mal resolvidos que incluem perdas suacutebitas de pessoas queridas ou o final abrupto de um relacionamento amoroso por exemplo Geralmente devem-se a natildeo aceitarmos alguma verdade em nossas vidas daiacute a necessidade de precisarem ficar repetindo por tempo indefinido a mesma mensagem ateacute que assimilemos a realidade
      • ldquoVemos entatildeo que o sonho fala na linguagem simboacutelica arcaica da psique objetiva Ele fala a seacuterio e exprime em termos simboacutelicos o lado desconhecido da situaccedilatildeo de vida da maneira que eacute aprendida e espelhada pelo inconsciente Os sonhos portanto natildeo satildeo sintomaacuteticos mas simboacutelicos Eles satildeo simboacutelicos visto que a psique objetiva natildeo conceitualiza ela natildeo fala inglecircs francecircs alematildeo ou chinecircs ela fala imagens que satildeo as forma aboriacutegenes de percepccedilatildeo e expressatildeoAs camadas mais profundas falam atraveacutes de imagens Estas imagens devem ser consideradas como se nos apresentassem descriccedilotildees de noacutes mesmos ou de nossas situaccedilotildees inconscientes na forma de analogias ou paraacutebolasrdquo (2002 p 35)
      • Jung deteve-se num toacutepico relevante o natildeo apegar-se fielmente agraves figuras ao que eacute dito ou sugerido num sonho deve-se ter cautela analisar o sonho sempre com vistas a atual situaccedilatildeo do sonhador e somente depois tentar interpretar
      • ldquo ndash Os sonhos agraves vezes provam ser armadilhas ou pelo menos parece que o satildeo Em certas ocasiotildees comportam-se como o oraacuteculo de Delfos quando disse ao rei Creso que se atravessasse o rio Haly destruiria um grande reino Soacute depois de derrotado numa batalha apoacutes ter transporto o rio eacute que descobriu que o reino a que o oraacuteculo se referia era o seu proacutepriordquo (2002 p51)
      • Hall encerra num paraacutegrafo com simplicidade e sabedoria o ideal para se chegar ao grau de conhecimento e busca ideal de sabedoria pessoal utilizando como ferramenta os sonhos
      • ldquoQue cada um encontre seu proacuteprio caminho voltado para o exterior se possiacutevel ou para o interior se necessaacuterio E que em todos os casos o nosso movimento ao longo desse caminho nos decirc um sentido do misteacuterio abrangente embora pessoal que permanece mais proacuteximo de noacutes do que os nossos sonhosrdquo (1994 p 91)
      • 4 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
      • No decorrer do trabalho de pesquisa confirmamos que as perguntas sobre o que satildeo os sonhos de onde eles vecircm e o que significam ainda estatildeo longe de ser entendidas e respondidas devido ao seu alto grau de complexidade e as diversas variantes envolvidas Significados simplistas preconceituosos ou teorias puramente racionais jaacute natildeo satildeo o bastante para explicar os sonhos pois o elemento psiacutequico eacute atuante movimenta-se e desemboca no fiacutesico realidade e sonho se tocam no entanto natildeo se misturam cada um ocupa um lugar preacute-determinado na histoacuteria da evoluccedilatildeo humana eles satildeo indissociaacuteveis e complementares
      • Muito mais do que possamos aceitar ou acreditar somos uma parte do Zeitgeist e em nossa eacutepoca onde tudo pode ser considerado desde que possa ser palpaacutevel racional praacutetico mensuraacutevel natildeo percebemos que nossas mais simples atitudes e accedilotildees diaacuterias satildeo tomadas em funccedilatildeo do apelo subjetivo do coletivo a sociedade dita regras imperativas seja magro de preferecircncia bonito sempre sorridente bem sucedido profissionalmente e se possiacutevel amorosamente tambeacutem
      • A religiatildeo por sua vez estabelece dogmas que mais aprisionam que libertam o pecado original inferno ou seja estamos recebendo cargas imensas de cobranccedila e informaccedilotildees nem sempre conexas mas e a alma o espiacuterito como ficam nesta balanccedila com pesos tatildeo desiguais
      • Eacute neste momento de confusatildeo solidatildeo e despreparo que a religiatildeo deveria exercer e ocupar sua real funccedilatildeo servir de alento ao homem posicionar-se diante do sagrado e alavancar com seu conhecimento histoacuterico secular a propagaccedilatildeo do auto-conhecimento falar sobre a importacircncia dos sonhos libertar seus fieacuteis para que redescubram a oportunidade de fazer parte da histoacuteria pois falar de Deus eacute falar histoacuteria do homem que no dizer de Jung eacute um ser naturalmente religioso chegando mesmo a comparar o poder da funccedilatildeo religiosa da psique ao instinto para o sexo ou para a agressividade devido sua importacircncia para o bem estar do indiviacuteduo como um todo
      • Portanto aceitar somente ldquoumardquo teoria para explicar os sonhos seria uma temiacutevel e irresponsaacutevel reduccedilatildeo de horizontes que natildeo podemos nos dar ao luxo nesta nova era onde paradigmas satildeo quebrados descobertas que modificam a certeza de seacuteculos da ciecircncia acontecem de forma quase banal estamos num crescente descobrir a uma velocidade sequer imaginada a poucas deacutecadas
      • Diversas pesquisas e descobertas em torno do sono estatildeo sendo realizadas e com os sonhos ocorreraacute o mesmo proximamente ainda natildeo temos respostas suficientes nem conclusivas mas temos uma uacutenica certeza a de que devemos reunir e ouvir o que tecircm a dizer as diversas religiotildees do planeta os cientistas os historiadores os filoacutesofos ocidentais e orientais todos com visotildees bastante diferenciadas sobre o tema mas com um mesmo objetivo enfim tudo eacute vaacutelido para que possamos dar o merecido lugar de destaque aos sonhos
      • Somente quando acolhermos e compreendermos os sonhos sabendo que eles satildeo uacutenicos e intransferiacuteveis e que trazem importantes mensagens para o nosso corpo nossa mente e nosso espiacuterito poderemos entatildeo orientar com mais sabedoria o caminho de nossas vidas neste longo e ininterrupto processo
      • Que a psique diurna consciente e a psique noturna inconsciente continuem interagindo para que tudo que realmente somos e tudo que poderemos vir a ser possam trabalhar em harmonia e utilizem os sonhos como um grande aliado nesta caminhada de busca e auto-conhecimento
      • REFEREcircNCIAS
      • BEacuteRTOLOHeacutelder Revista Proformar O que ldquovecircrdquo quem natildeo vecirc Bimensal Ediccedilatildeo 14 Marccedilo 2006 p 6 7
      • HALL James A Sonhos Siacutembolos Religiosos do Inconsciente Satildeo Paulo Loyola 1994 p 33 36 91
      • JUNG Carl G A Energia Psiacutequica Petroacutepolis Vozes 1997 p 45 - 46 57
      • ___________ A Praacutetica da Psicoterapia Petroacutepolis Vozes 1999 p 44
      • ___________ Memoacuterias Sonhos e Reflexotildees 22ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p145
      • ___________ O Homem e seus Siacutembolos 22ordf Impressatildeo Rio de Janeiro Nova Fronteira 2002 p39 49 51 53 94 102 238
      • JUNG CG Psicologia e Religiatildeo Petroacutepolis Vozes 1995 p 10
      • ___________ Psicologia e Alquimia 2ordf Ediccedilatildeo Rio de Janeiro Vozes 1994 p566
      • KELSEY Morton T Deus Sonhos e Revelaccedilatildeo Satildeo Paulo Paulus 1996 p134 - 135 171 270- 271 298 304 306 323 ndash 324 339- 340 452
      • SITE
      • 1 Disponiacutevel em httparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeohttparcadesonhosgooglepagescomoeuincorporeo Acesso em fev2008(Traduzido do prefaacutecio de ldquoAdventures Beyond the Bodyrdquo de William Buhlman)
      • 2 Disponiacutevel em httpgreciantigaorgciecie02fasp Acesso em 15 de junho de 2008