Serviço militar

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1 Unidade de Instrução de Cumeré (UIC) Para o cumprimento do dever da cidadania, fui alistado em 1989, para o Serviço Militar Obrigatório através do Departamento de Recrutamento e Mobilização da Direcção de Pessoal do Estado-Maior General das FARP (Forças Armadas Revolucionárias do Povo). Apto na inspeção médica, fui integrado no segundo contingente de mancebos para a incorporação do mesmo ano, mas que não viria a ter lugar por motivos alheios ao grupo. O dia 15 de Maio de 1990, pelas antenas da Radiodifusão Nacional (RDN) o nosso grupo foi convocado a comparecer ao local de concentração - Escola “23 de Janeiro” junto ao Estado-Maior do Exercito, sito no ex-QG (Quartel General na era colonial). Já sem demora, o contingente foi despachado para o Centro de Instrução Militar de Cumeré. Éramos cerca de 600 homens e mulheres que formamos o batalhão de recrutas. Fui registado com o número mecanográfico de 000807/90 e pertencia a 2ª secção do 3º pelotão da 2ª Companhia. O nosso batalhão era composto de 6 companhias e tinha apenas 6 mulheres sendo uma em cada companhia. Para além da minha participação obrigatória na instrução militar como recruta, era frequentemente solicitado à Secretaria do Centro para ajudar nos trabalhos administrativos do Centro como escriturário/dactilógrafo. A nossa incorporação fez o juramento de Bandeira no dia 8 de Julho de 1990. O serviço militar obrigatório por lei tem a duração de dois anos, fim do qual, o soldado recruta pode requerer a sua desvinculação ou passa automaticamente para a efetividade de serviço iniciando a sua carreira militar. Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA) Semanas depois do Juramento de Bandeira, iniciou-se a 17 de julho, o processo de colocação de soldados/recrutas às diferentes unidades militares dos três ramos das Forças Armadas (Exército, Marinha de Guerra Nacional ou Armada e Força Aérea).

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Unidade de Instrução de Cumeré (UIC)

Para o cumprimento do dever da cidadania, fui alistado em 1989, para o Serviço

Militar Obrigatório através do Departamento de Recrutamento e Mobilização da Direcção de

Pessoal do Estado-Maior General das FARP (Forças Armadas Revolucionárias do Povo). Apto

na inspeção médica, fui integrado no segundo contingente de mancebos para a

incorporação do mesmo ano, mas que não viria a ter lugar por motivos alheios ao grupo.

O dia 15 de Maio de 1990, pelas antenas da Radiodifusão Nacional (RDN) o nosso

grupo foi convocado a comparecer ao local de concentração - Escola “23 de Janeiro” junto

ao Estado-Maior do Exercito, sito no ex-QG (Quartel General na era colonial). Já sem

demora, o contingente foi despachado para o Centro de Instrução Militar de Cumeré.

Éramos cerca de 600 homens e mulheres que formamos o batalhão de recrutas. Fui

registado com o número mecanográfico de 000807/90 e pertencia a 2ª secção do 3º

pelotão da 2ª Companhia. O nosso batalhão era composto de 6 companhias e tinha apenas

6 mulheres sendo uma em cada companhia.

Para além da minha participação obrigatória na instrução militar como recruta, era

frequentemente solicitado à Secretaria do Centro para ajudar nos trabalhos administrativos

do Centro como escriturário/dactilógrafo.

A nossa incorporação fez o juramento de Bandeira no dia 8 de Julho de 1990.

O serviço militar obrigatório por lei tem a duração de dois anos, fim do qual, o

soldado recruta pode requerer a sua desvinculação ou passa automaticamente para a

efetividade de serviço iniciando a sua carreira militar.

Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA)

Semanas depois do Juramento de Bandeira, iniciou-se a 17 de julho, o processo de

colocação de soldados/recrutas às diferentes unidades militares dos três ramos das Forças

Armadas (Exército, Marinha de Guerra Nacional ou Armada e Força Aérea).

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De início, fui parar no Departamento de Artilharia Terrestre que comanda o Grupo de

Artilharia Terrestre (GAT) chefiado pelo Tenente-Coronel Aliu Camara e o adjunto era o Major

Veríssimo Correia Seabra, que foi o 2º Comandante da Junta Militar na guerra civil de 7 de

junho de 1998, dirigido pelo Brigadeiro Ansumane Mané, e mais tarde viria a ser nomeado

pelo Presidente Kumba Iala, Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas e

promovido a General de 3 estrelas. Permaneci no GAT durante 7 dias.

No 21 de julho, fui informado pelo Major Seabra aquando da colocação dos novos

soldados na plantilha do GAT de que não seria colocado na unidade mas segundo

indicações iria para o Gabinete do Ministro de Estado e das FARP, na altura o Coronel Iafai

Camará, promovido em 1992 a General de 3 Estrelas.

Na manhã do dia 23 de julho, deixei o GAT a caminho do EMGFA, mas acabaria por

ser colocado na 3ª Secção de Sargentos e Praças do Departamento de Pessoal e Quadros

da Direcção do Pessoal do Estado-Maior General das Forças Armadas como

Escriturário/Datilógrafo na categoria de Soldado. Não tinha direito ao salário inerente a

função porque estava a cumprir o Serviço Militar Obrigatório como Soldado/Recruta tem o

seu salário estipulado nom valor de 7.500,00PG (sete mil e quinhentos pesos guineenses).

Actualmente, o país tem outra moeda – o Franco CFA, devido a sua adesão em Maio de

1997, a União Monetária Oeste Africana (UMOA) que congrega 8 países da sub-região.

A secção era chefiada pelo 1º Sargento Mussa Joaquim Gomes e o Chefe do

Departamento de Pessoal e Quadros, era o Oficial do Exército, Almame Alam Camará

equiparado a Major enquanto a Direcção de Pessoal era chefiada pelo Tenente António

Afonso Té, também equiparado a Coronel do Exército.

Em Fevereiro de 1991, fui transferido para a Secretaria e Secção Secreta do mesmo

Departamento para as funções de adjunto-chefe da Secretaria e Financeiro da Direcção na

categoria Furriel, sem igualmente o direito ao salário compatível à patente.

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A Direcção do Pessoal do EMGFA era organicamente estruturada pelo Departamento

de Pessoal e Quadros, Departamento de Recrutamento e Desmobilização e a Unidade de

Instrução de Cumeré que tutela a Escola de Formação de Oficiais e Sargentos e o Centro de

Recrutamento Militar. Cumeré, devido a sua localização geográfica era uma unidade

independente e tinha o seu próprio financeiro.

Secção de Informática do EMGFA

De Julho a Setembro de 1991, tirei o curso de informática na óptica do utilizador que

deu o início ao processo de informatização das Forças Armadas da Guiné-Bissau.

Inicialmente, os computadores foram instalados nos gabinetes de chefes de

Direcções sendo já um obstáculo na sua utilização devido as audiências de um lado, e do

outro, dependendo da confidencialidade do assunto, o pessoal informático é pedido a

retirar-se do gabinete.

A 11 de Outubro de 1992, por orientação do então Chefe do Estado-Maior General

das Forças Armadas, o Tenente-Coronel Sanussi Soares Cassamá vulgo Major Saco

Cassamá, foi criada a Secção de Informática (SINFOR) do EMGFA. O Comandante artilheiro

Sanussi Sorares Cassama um dia antes (10 de Outubro) foi promovido a Coronel e a

Brigadeiro a título póstumo.

No mesmo dia (11 de Outubro de 1992), fui nomeado pelo Chefe da Direcção do

Pessoal, para chefiar a Secção de Informática e equiparado a Tenente do Exército com

direito ao salario uma vez passado a efectividade de serviço.

Na altura foram instalados nos computadores os programas, DISPLAYWRITE4

(programa de tratamento de texto), DBASE (programa de base Dados) e LOTUS 123 (Folha

de Cálculo).

O Serviço de Informática agrupou os computadores da Direção do Pessoal, da

Direcção das Operações e Reconhecimento e da Direcção de Logística e Transportes,

ambas as Direcções do EMGFA. Funciona na directa dependência do chefe da Direcção do

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Pessoal, Tenente António Afonso Té, que um dia antes (10 de Outubro de 1992) foi

promovido a Capitão em Cumeré no acto de Juramento de Bandeira de recrutas, e um mês

depois (16 de Novembro de 1992), igualmente promovido a Major e graduado a Tenente-

Coronel do Exército por despacho do então Ministro da Defesa Nacional, o Eng. Samba

Lamine Mané.

Graduado a Patente de Furriel do Exército

No dia 16 de Novembro de 1992 (Dia das Forças Armadas), fui promovido e

graduado a Furriel do Exército.

Entre 1993 e 1994, frequentei o curso de inglês no laboratório da língua inglesa

instalado na Base Aérea com o apoio das Forças Armadas dos EUA.

Em Maio de 1995, tirei o curso de Oficiais das Forças Armadas mas nunca cheguei a

ser graduado a oficial do Exército. Aliás, o grupo não foi graduado por decisão do Chefe do

Estado-Maior do Exército, o Coronel Augusto Costa de Sá vulgo Augusto Patchanga.

O Abandono das Forças Armadas

Estive a servir as Forças Armadas durante 7 anos, até Maio de 1997 quando fui

autorizado pelo Chefe da Direcção do Pessoal para participar em duas acções de formação

nomeadamente, no Curso de Aperfeiçoamento em Jornalismo de Rádio e no Curso de

formação de Animadores de Rádio. Os referidos cursos decorrem de 5 a 16 de Maio de

1997, nas dependências da Radiodifusão Nacional (RDN) tendo na altura como a Directora-

Geral, a Jornalista Maria da Conceição da Silva Évora vulga São. Foram ministrados pelo

Centro Protocolar de Formação Profissional para Jornalistas (CENJOR) no âmbito do Acordo

de Cooperação no domínio da Comunicação Social entre os Governos da Guiné-Bissau e de

Portugal. Após a formação decidi abandonar as minhas funções e consequentemente as

Forças Armadas. Nunca mais pus os meus pés no Estado-Maior General das Forças

Armadas e também não fui obrigado a voltar ao meu posto de trabalho.

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Não participei na revolta militar – o conflito político-militar de 7 de junho de 1998.

Infelizmente, após alguns dias de tréguas, quando ia visitar a minha casa no bairro militar

vindo do refúgio na tabanca de Có (terra dos meus avos maternos), fui preso e detido na

prisão militar da Base Aérea de Bissalanca pelas forças de segurança da Junta Militar. Os

agentes dos serviços de contrainteligência militar que me detiveram alegaram as funções

de Responsável de Informática que exercia no Estado-Maior General das Forças Armadas.

Ordenaram a minha prisão. Uma voz alta deu ordem de comando: Prendam-no é “braço

direito” de Afonso Té. Foi um escândalo no posto de controlo montado pela Junta Militar

junto ao Aeroporto de Bissau na estada que liga Bissau e Safim. Embora o Tenente-Coronel

Afonso Té, dias antes ter sido nomeado a Vice-Chefe do Estado-Maior General das Forças

Armadas por Decreto-Presidencial assinado por General João Bernardo Vieira (Nino),

Presidente da República, que também nomeou o Brigadeiro Humberto Gomes para

CEMGFA, eu já tinha abandonado as Forças Armadas a mais de um ano.

O caso da minha detenção só chegou ao conhecimento do comando da Junta Militar

dois dias depois. De imediato fui libertado por ordem do Major Emílio Costa, a 3ª figura da

hierarquia do comando da Junta Militar. Erámos pessoas conhecidas. Eu chefiava os

Serviços de Informática do EMGFA e o Major Costa que vinha transferido das Alfandegas de

Bissau onde esteve em comissão de serviço viria a exercer a chefia da Direcção das

Operações do EMGFA. No entanto, o agente da contrainteligência envolvido da minha

detenção foi imediatamente suspenso das suas funções, segundo as palavras do Major

Costa, contraria os princípios da revolta.

De salientar que as Forças Armadas foram criadas a 16 de Novembro de 1966

durante a luta armada de libertação nacional, por recomendação do IIº Congresso do PAIGC

(Movimento libertador) – para a formação do Exército.