Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

22
Intolerância a religiões de matriz africana: abordagem de casos na mídia brasileira Alessandro Ricardo Pinheiro Brandão* Raquel Schorn de Oliveira** Resumo: Este artigo tem por objetivo apresentar, discutir e analisar a prática da intolerância religiosa pela mídia. Aduzindo esta, em sentido amplo, como principal instrumento de divulgação por intermédio de todos os meios a ela seja inerente acerca desses crimes, bem como a aceitação das religiões de matriz africana pela sociedade. Evidência através do levantamento de dois eventos, casos em que a intolerância religiosa ceifa a integridade pessoal, moral e física dos indivíduos e seus desdobramentos. Trata-se da diversidade entre as religiões, o respeito de crença e difusão de conhecimento, do conflito nessa esfera, conceituada aqui, através da subtração de adeptos e a negação dessas manifestações de expressões religiosas. Palavras-chave: Religiões de Matriz Africana. Intolerância Religiosa. Jornalismo Online. Abstract: This article aims to present, discuss and analyze the practice of religious intolerance by the media. In this sense, it is widely used as the main means of dissemination through all means inherent in these crimes, as well as the acceptance of religions of African origin by society. It is evidenced by the raising of two events, cases in which religious intolerance harvests the personal, moral and physical integrity of individuals and their unfolding. It is about the diversity between religions, the respect of belief and the diffusion of knowledge, the conflict in this sphere, which is conceptualized here, through the subtraction of adherents and the denial of these manifestations of religious expressions. Keywords: African Matrix Religions. Religious intolerance. Online Journalism. * Mestrando em História Social pela Universidade Federal do Amapá (PPGH/Unifap). Graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Faculdade Estácio de Macapá (2017). Graduando em Licenciatura Plena em Letras - Português e Francês - e suas respectivas Literaturas pela Universidade Federal do Amapá (Unifap). Membro pesquisador em Religião, Política, Mídia e Religiosidades do Centro de Estudos Políticos, Religião e Sociedade na Amazônia (Cepres/Unifap) e do Núcleo de Pesquisas Pós-coloniais (NePC/Unifap) em Identidade Narrativa em Literaturas de Resistência - Inalar. ** Mestre em Extensão Rural pela Universidade Federal de Santa Maria (2001), e Bacharel em Comunicação Social pela Universidade Federal de Santa Maria (1998). Revista Tempo Amazônico

Transcript of Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Page 1: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Intolerância a religiões de matriz africana: abordagem de casos na mídia

brasileira

Alessandro Ricardo Pinheiro Brandão*

Raquel Schorn de Oliveira**

Resumo: Este artigo tem por objetivo apresentar, discutir e

analisar a prática da intolerância religiosa pela mídia. Aduzindo

esta, em sentido amplo, como principal instrumento de

divulgação por intermédio de todos os meios a ela seja inerente

acerca desses crimes, bem como a aceitação das religiões de

matriz africana pela sociedade. Evidência através do

levantamento de dois eventos, casos em que a intolerância

religiosa ceifa a integridade pessoal, moral e física dos indivíduos

e seus desdobramentos. Trata-se da diversidade entre as religiões,

o respeito de crença e difusão de conhecimento, do conflito nessa

esfera, conceituada aqui, através da subtração de adeptos e a

negação dessas manifestações de expressões religiosas.

Palavras-chave: Religiões de Matriz Africana. Intolerância

Religiosa. Jornalismo Online.

Abstract: This article aims to present, discuss and analyze the

practice of religious intolerance by the media. In this sense, it is

widely used as the main means of dissemination through all

means inherent in these crimes, as well as the acceptance of

religions of African origin by society. It is evidenced by the

raising of two events, cases in which religious intolerance

harvests the personal, moral and physical integrity of individuals

and their unfolding. It is about the diversity between religions,

the respect of belief and the diffusion of knowledge, the conflict

in this sphere, which is conceptualized here, through the

subtraction of adherents and the denial of these manifestations of

religious expressions.

Keywords: African Matrix Religions. Religious intolerance.

Online Journalism.

* Mestrando em História Social pela Universidade Federal do Amapá (PPGH/Unifap). Graduado em Comunicação

Social com habilitação em Jornalismo pela Faculdade Estácio de Macapá (2017). Graduando em Licenciatura

Plena em Letras - Português e Francês - e suas respectivas Literaturas pela Universidade Federal do Amapá

(Unifap). Membro pesquisador em Religião, Política, Mídia e Religiosidades do Centro de Estudos Políticos,

Religião e Sociedade na Amazônia (Cepres/Unifap) e do Núcleo de Pesquisas Pós-coloniais (NePC/Unifap) em

Identidade Narrativa em Literaturas de Resistência - Inalar.

** Mestre em Extensão Rural pela Universidade Federal de Santa Maria (2001), e Bacharel em Comunicação

Social pela Universidade Federal de Santa Maria (1998).

Revista Tempo

Amazônico

Page 2: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

17

INTRODUÇÃO

A diversidade cultural, étnica e religiosa brasileira, abrangente para tudo e todos.

Todavia, a harmonia desses povos não é sempre tão humana e pacífica como queremos confiar,

no lugar onde se estabelece o mito de país unido, sem preconceitos, sem racismo. Nos dias de

hoje, no século XXI, apesar das leis visando combater o racismo e a valorização cultural e

religiosa, existe muita intolerância, quando se devota do patrimônio descendente africano.

Disfarçando seus preconceitos através das crenças de fé, o racismo é presente na nossa

sociedade na forma de violência contra essas religiões, discriminando pelas suas práticas

ocultas e sem escrituras comprobatórias de seus conceitos e preceitos. Naturalmente, com a

democratização e a facilidade de acessar as informações, vários casos vêm à tona através de

portais de notícias e redes sociais, tornando mais explícito as diferentes proporções da

discriminação existente na sociedade. Com a chegada das tribos africanas, trouxeram consigo

a sua cultura e doutrinas, que hoje fazem parte do nosso convívio. Unidos com o catolicismo,

espiritismo e indígenas, o brasileiro tomou para si a pluralidade religiosa, onde se pode ter mais

que uma religião, basta crer e praticar. Observamos os comportamentos nítidos das

discriminações étnicos raciais e de desrespeito com os símbolos afro-ameríndios, em situações

variadas, expondo os crimes de intolerância existentes na espiritualidade africana. A orientação

escolhida para trabalhar a questão de como os portais de notícias da internet lida com a

intolerância religiosa contra as religiões de Matriz Africana nosso meio se faz a partir do estudo

de dois casos, uma de violência física e outra, material contra adeptos e terreiros de Umbanda

e Candomblé. Pretende- se tecer uma análise e discussão das notícias, particularmente dentro

da perspectiva do preconceito racial e da intolerância religiosa, conforme aporte teórico atual

em debate sobre a questão, enfocando o papel da mídia na divulgação de violência e religião.

Page 3: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

18

CENÁRIO DAS RELIGIÕES NO BRASIL

HISTÓRICO DA FORMAÇÃO RELIGIOSA NO BRASIL

Durante implementação do catolicismo em 1500, segundo Alberto dos Santos1, já

havia no Brasil, cerca de três a cinco milhões de indígenas. Sendo assim, a primeira crença

religiosa brasileira constituiu-se dos mitos e cultos indígenas. Com a geopolítica do Vaticano

e expansão colonial europeia, no século XVI, a “Santa Igreja” juntamente com Portugal, veio

com a missão de uma “colonização pacífica” (LIDÓRIO e SOUZA 2008)2. Portugueses

entendiam que o único jeito de “transformar” os índios em humanos e salvar suas almas seria

por meio de catequização. Para Alderi Matos3, essa ordem atuou ininterruptamente no Brasil

durante 210 anos (1549- 1759), exercendo enorme influência sobre sua história religiosa e

cultural. Já nos séculos XVI e XVII, o Brasil foi invadido por outras nações europeias,

França e Holanda. Muitos dos invasores eram protestantes, o que causou a atuação dos

portugueses para deter e suprimir o protestantismo e Contrarreforma.

A Constituição de 1824, concedeu liberdade de culto ao protestantismo, ao mesmo

tempo em que confirmou o catolicismo como religião oficial. Matos afirma que até a

Proclamação da República, os protestantes enfrentaram sérias restrições no casamento civil,

uso de cemitérios e educação. “Tais ideias tornaram-se especialmente influentes entre os

intelectuais, políticos e sacerdotes, e tiveram dois efeitos importantes na área religiosa: o

enfraquecimento da Igreja Católica e uma crescente abertura ao protestantismo”4. As

primeiras organizações protestantes que atuaram junto aos brasileiros foram as sociedades

bíblicas: Britânica em 1804 e a Americana em 1816. Havendo duas traduções da Bíblia em

português, uma protestante, feita pelo Rev. João Ferreira de Almeida (1628-1691), e outra

católica, do padre Antônio Pereira de Figueiredo (1725-1797).

Em fevereiro de 1891, a primeira Constituição republicana confirmou a separação

entre a igreja e o estado, decretando liberdade de culto, o casamento civil obrigatório e a

secularização dos cemitérios. Com a imigração após a declaração republicana, muitos

protestantes norte-americanos e europeus fizeram-se presentes no nosso país para fundar

1 SANTOS, Alberto Pereira dos. Geopolítica das Igrejas e Anarquia Religiosa no Brasil: por uma geoética / Alberto

Pereira dos Santos. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Gramma, 2015. p. 40 2 LIDÓRIO, Ronaldo; SOUZA, Isaac Costa de. A questão indígena -- uma luta desigual: missões, manipulação e

sacerdócio acadêmico - Viçosa, MG: Ultimato, 2008. 3 MATOS, A. S. de. Breve história do Protestantismo no Brasil. 2010, p. 02. Disponível em: <https://maniadehistoria.wordpress.com/historia-do-protestantismo-no-brasil/> 4 MATOS. 2010, p. 06.

Page 4: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

19

suas igrejas, para Matos5 essa foi a ordem de construção e formulação das igrejas protestante

no Brasil:

As três ondas ou fases do pentecostalismo brasileiro foram: a) décadas de 1910-

1940: chegada simultânea da Congregação Cristã no Brasil e da Assembléia (sic) de

Deus, que dominaram o campo pentecostal por 40 anos; b) décadas de 1950-

1960: fragmentação do pentecostalismo com o surgimento de novos grupos –

Evangelho Quadrangular, Brasil Para Cristo, Deus é Amor e muitos outros (contexto

paulista); c) anos 70 e 80: advento do neopentecostalismo – Igreja Universal do

Reino de Deus, Igreja Internacional da Graça de Deus e outras (contexto carioca).

A chegada do Candomblé no Brasil, para FONTENELLE (1953), foi precisamente no

século XVI, nos primeiros navios negreiros destinados a trabalhar na lavoura, aportando no

estado da Bahia. Trazendo as tribos Nagôs (Iorubas), Jejes (Fons), Bantus, Guinés, Angola,

Barbadianos, Malês e Loandas. Com seus cultos e línguas distintas, juntos formavam o

Candomblé e suas nações6.

Das lendas africanas, surgiram as divindades principais, que com a denominação

de Orixás Maiores, [...] que, com a imposição sofrida pelos negros, quando os

missionários católicos proibiram terminantemente que eles praticassem esses cultos

fetichistas, administrando-lhes, entretanto, as crenças católicas, esses negros

procuraram furtar-se à perseguição, fingindo que admitiam perfeitamente os deuses

cristãos, dizendo, que na sua linguagem os seus deuses, eram os mesmos deuses

católicos. (FONTENELLE, 1953, p. 53)

Fundada no dia 15 de novembro de 1908, pelo médium Zélio de Moraes, a Umbanda

veio para acolher os cristãos, “[...] assim como Maria acolheu Jesus da mesma forma a

Umbanda acolheria seus filhos” (CUMINO, 2016, p. 71). Nascendo como dissidência de um

kardecismo que rejeitava a presença de espíritos de negros e caboclos. Para Prandi7, a

umbanda carrega consigo uma parte de regras do candomblé, que é a do segredo, do

recolhimento iniciático, da infalibilidade do pai-de-santo, culto a natureza, da autoridade do

orixá acima de qualquer preceito, tendo por consequências enormes dificuldades de unificação

doutrinária e institucional. Chamada por Cumino8 e Prandi9 de “a religião brasileira”, a

umbanda juntou o catolicismo branco, a tradição dos orixás africanos, rituais e espíritos

indígenas, inspirando-se, assim, nas três fontes básicas do Brasil mestiço.

No início, a nova religião denominou-se espiritismo de umbanda, e não é incomum,

ainda atualmente, os umbandistas se chamarem de espíritas, quando não de católicos.

5 MATOS. 2010, p. 22. 6 A palavra nação é usada no candomblé para distinguir seus segmentos, diferenciados pelas línguas utilizado nos

rituais, o toque dos atabaques e a liturgia. A ação também indica a procedência dos escravos que lhe deram origem

na nova terra e das divindades por eles cultuadas. 7 PRANDI, Reginaldo. Os candomblés de São Paulo: a velha magia na metrópole nova, 1991, p. 68 8 CUMINO. 2016, p. 75 9 PRANDI, Reginaldo. O Brasil com axé: candomblé e umbanda no mercado religioso. 2004, p. 02.

Page 5: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

20

A umbanda conservou do candomblé o sincretismo católico: mais que isto,

assimilou preces, devoções e valores católicos que não fazem parte do universo

do candomblé. Na sua constituição interna, a umbanda é muito mais sincrética que

o candomblé. (PRANDI, 2004, p. 6)

Com tudo, os gráficos populacionais realizado pelos institutos especializados nos

mostra como o sincretismo é presente na vida do brasileiro ao ponto de negar uma de suas

práticas habituais. Mostrando que o cidadão pode perpassar em uma ou mais religiões, tendo

aquela “não-cristã” a mais subalterna.

COMO O BRASILEIRO SE DECLARA.

Segundo o Censo Demográfico de 2010 do IBGE (2010), o catolicismo representa

64,6% da população do Brasil, enquanto as igrejas evangélicas somam 22,2%. Já o Espiritismo

aparece com 2% da totalidade e a Umbanda e Candomblé, em última posição, com 0,3%. Nos

censos anteriores, o número de católicos vem reduzindo (1991: 83%; 2000: 73,6%) e de

evangélicos crescendo (1991: 9%; 2000: 15,4%), enquanto adeptos do Espiritismo (1991:

1,1%; 2000: 1,3%) e de Umbanda e Candomblé (1991: 0,4%; 2000: 0,3%) mantiveram a média.

Por tudo isso, é muito comum, mesmo atualmente, quando a liberdade de escolha

religiosa já faz parte da vida brasileira, muitos seguidores das religiões afro-

brasileiras ainda se declararem católicos, embora sempre haja uma boa parte que

declara seguir a religião afro-brasileira que de fato professa. Isso faz com que as

religiões afro-brasileiras aparecem subestimadas nos censos oficiais do Brasil, em

que o quesito religião só pode ser pesquisado de modo superficial. (PRANDI, 2004,

p. 5)

Primeiro com os índios, com suas crenças animistas (SCHOCK, 2012)10, depois

com a chegada dos colonizadores trazendo o cristianismo, assim como os imigrantes

europeus deslocando suas culturas e religiões, os africanos, orientais e judeus também

vieram para enriquecer culturalmente o Novo Mundo, transportando em suas bagagens

conceitos e crenças, que ficou preservada por um período de 400 anos, por conta da Igreja

Católica e a luta da Contrarreforma. A expressão cultural e religiosa do Brasil é reflexo desse

pluralismo, sincretizado no idioma, comportamento e fé. Para ANDRADE11 (2015 apud

QUEIRÓZ 1988, p. 2), os estudos sobre a religiosidade no Brasil tiveram seu início no século

XIX, quando os letrados brasileiros buscavam as características do ser nativo, para diferenciar

o Brasil do restante do mundo.

10 SCHOCK, Marlon Leandro. Aportes epistemológicos para o ensino religioso na escola: um estudo analítico-

propositivo. 2012, p. 36. 11 ANDRADE, Solange Ramos de. Os intelectuais e a identidade religiosa no Brasil. ANPUH – XXIII SIMPÓSIO

NACIONAL DE HISTÓRIA – Londrina, 2005, p. 02

Page 6: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

21

O pluralismo religioso se expressa nas frestas de uma pretensa homogeneidade; ele

brilha na “metamorfose das práticas e crenças reelaboradas” ou reinventadas.

Não há dúvida, este é um país de sincretismo religioso e de intenso trânsito entre

tradições que aparentemente se opõem, mas que de forma enigmática deixam no outro

as marcas de sua tatuagem. (TEIXEIRA, 2005, p. 22)

Marcas essas que acabam culturalmente tendo seus dogmas e preceitos retidos ou

agredidos por ideologias religiosas opostas, causando desconforto e historicamente as Guerras

Santas.

TOLERÂNCIA RELIGIOSA X INTOLERÂNCIA RELIGIOSA.

A diversidade cultural e religiosa vem causando incômodo à liberdade de expressão

no Brasil, onde vários casos vêm à tona na imprensa sobre agressões e violências contra

as religiões minoritárias ou excluídas. Seria a falta de educação/informação ou impor sua

ideologia religiosa à sociedade? Abaixo segue o histórico dessas perseguições de intolerância

no Brasil.

A Constituição brasileira de 1824 traz pela primeira vez o tema sobre liberdade de

culto às outras religiões, havendo, antes disso, a Colônia Portuguesa, que era católica.

Porém, de maneira doméstica e sem semiótica de identificação. Expressos pelos artigos 113

e 153 da Constituição de 1824, reafirmada na Constituição de 1891, a verdadeira liberdade de

crença religiosa é decretada com o país transformado em estado laico, fazendo-se assim,

livre de crença e tolerante entre as religiões. Virou Lei específica em 1989, de número 7.716,

tornando crime qualquer tipo de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou

procedência nacional. Para Ferreira (2005, p. 851), “tolerância é o respeito ao direito que os

indivíduos têm de agir, pensar e sentir de modo diverso do nosso.” Gabatz (2015) explica

que a tolerância é o alicerce dos direitos humanos, do pluralismo, da democracia e do Estado

de Direito. Para Corral (2015), a falta de informação é um dos principais alicerces da

intolerância religiosa pelas especulações que acercam as religiões e crenças africanas. Corral12

e Oro13 responsabilizam a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) de encabeçar os

grupos truculentos de igrejas que elegeram as religiões de matriz africana como o principal

inimigo por motivos de poder político-social.

As agressões são primeiramente verbais, ou seja, ocorrem mediante um reiterado

discurso acusatório - como esse, escrito pelo seu fundador (Edir Macedo): “Essa

religião (afro-brasileira) que está tão popular no Brasil é uma fábrica de loucos e

uma agência onde se tira passaporte para a morte e uma viagem para o inferno.

12 CORRAL, Janaina Leite de Azevedo. Mídia & Cidadania: Websites de Templos Afro-religiosos como

ferramenta de combate à Intolerância. 2015, p. 01. 13 ORO, Ari Pedro. Neopentecostais e afro-brasileiros: quem vencerá esta guerra? 1997, p. 01-02.

Page 7: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

22

(Macedo, 1987: 86). Além disso, seus centros seriam “morada de demônios”; seus

deuses “espíritos malignos”, seus cultos “rituais do demônio”; seus líderes religiosos

“serviçais do diabo”; seus fiéis e cliente “pessoas ignorantes que caíram na

armadilha de satanás”. (ORO, 1997, p. 5)

Em um período de tantos casos e, devido ao tema ter sido abordado na redação14 da

edição de 2016 do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), a mídia e o Governo Federal

divulgaram informações e números de ocorrências. O Brasil teve 697 denúncias de

intolerância religiosa entre 2011 e 2015, segundo dados da Secretaria Especial de Direitos

Humanos (2016). O estado do Rio de Janeiro lidera o ranking com maior número de denúncias

de casos de discriminação, que têm como principal alvo as religiões afro-brasileiras. Segundo

o relatório da Secretaria de Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos e

Cidadania, houve um aumento de 3.706% no número de denúncias de intolerância religiosa

nos últimos cinco anos. Em 2016, a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos recebeu

133.061 denúncias de violação de direitos humanos, as denúncias de intolerância religiosa

foram 759 casos, um aumento de 36,51% comparado ao ano de 2015 que foram 556

denúncias, segundo dados divulgados pelo Ministério dos Direitos Humanos.15

Para GABATZ (2015, p. 03), “a liberdade religiosa não pode ser confundida com

liberdade de promoção religiosa em espaço de órgãos públicos e a interferência da religião

e seus sistemas de verdade nos atos civis de interesse público.” Explicando sobre o respeito

à diversidade no aprendizado de s epa r ação da s i n t o l e rânc i a s . Gabatz16 ainda de s t aca

a participação da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) no Congresso Nacional, “vem se

notabilizando pela forte tomada de posição em relação a temas relevantes na agenda pública

nacional”. Aprovando e debatendo causos de máxima visibilidade, leia-se polêmicas, que

são pautas de movimento de minorias, como LGBTQ+17, juventude, mulheres e negros, para

assim padronizar suas ideologias religiosas para a população em geral do país.

Gabatz fazendo referência à vários autores como P. Montero e R. Almeida, Carlos

Alberto Steil, Henrique Cristiano José Matos, diz que “Terreiros de candomblé, umbanda,

macumba, rodas de tambores, benzedeiras e curandeirismo eram atacados inclusive sob

acusação de charlatanismo, taxados como um problema de saúde pública e, por conseguinte,

criminalizadas” (2015, p. 10-11).

14 A prova de redação do Enem 2016 teve como tema “Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil”. 15 Ouvidoria recebeu mais de 133 mil denúncias de violações de direitos humanos em 2016. Ministério dos

Direitos Humanos, Brasília, 11 abr. 2017. Disponível em: <http://www.sdh.gov.br/noticias/2017/abrc/disque-100-

recebeu-mais-de-131-mil-denuncias-de-violacoes-de-di reitos-humanos-em-2016> 16 GABATZ, Celso. Diversidade e Intolerância religiosa na Sociedade Brasileira Contemporânea. 2015, p. 10. 17 LGBTQ+ é a sigla de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Transgêneros, Queer, Intersex,

Assexuais e Pansexuais.

Page 8: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

23

A ABORDAGEM MIDIÁTICA DA INTOLERÂNCIA ÀS RELIGIÕES DE MATRIZ

AFRICANA.

A mídia tem um papel fundamental de prevenção e incentivo ao diálogo para tais

práticas não acontecerem, de modo que sejam mais pacíficos a maneira e o comportamento

de pessoas intolerantes ao abordarem suas vítimas, provocando debates e exibindo os conceitos

e a natureza de todas as religiões, para gerar conhecimento e formar pessoas menos ignorantes

no dia a dia. A sapiência é modo principal para chegarmos no centro da tolerância e respeito.

Em 2017, é possível relembrar a veiculação de matérias policiais que fazem

referência ao tema, como em Nova Iguaçu-RJ em que criminosos obrigaram a mãe de santo

a destruir o próprio terreiro, relatada site da CBN; também na Baixada Fluminense, uma

idosa de 65 anos foi agredida a pedradas por uma vizinha que não aceita a religião praticada

por ela, que é candomblecista, relatada pelo Portal O Dia; na cidade de Jundiaí-SP, terreiro

de Mãe de Santo é incendiado por fanáticos religiosos, relatada pelo site Portal Brasil 247;

no Distrito Federal, manicure é demitida de salão de beleza por ser adepta do Candomblé,

relatada pelo site Metrópolis; no Piauí, Pai de Santo foi vítima de boatos de WhatsApp e

denunciou à Polícia como intolerância, relatado pelo Portal O Dia. Terreiros de umbanda

de Teresina sofreram quatro ataques em um mês; na Bahia, policiais invadem terreiro e

fazem danos materiais, relatado pelo site CidadeVerde.Com; em Pernambuco, Sacerdote de

umbanda é condenado por perturbação de sossego, relatado pelo site Diário de Pernambuco.

Criminosos invadem terreiro e praticam assalto durante culto religioso em Olinda, relatada

pelo portal G1 PE e TV Globo; e no Amapá, Deputada é vítima de intolerância religiosa e

preconceito racial dentro do Pronto de Atendimento Infantil (PAI) quando acompanhava uma

sobrinha, caso relatado pelo site do Jornal do Amapá. Jornalista acusado de ofensa racista e

preconceituosa durante a apresentação de um grupo de afoxé em evento tradicional do

carnaval na capital, relatado pelo blog de Alcinéa Cavalcante.

Na Era Digital, atualmente, a internet tem o papel de aproximar, democratizar e

informar a todos, através de pesquisas, sites de notícias etc. Lidando com a informação de todo

tipo, os meios de entretenimento hoje ganham forças para abordagem de conflitos étnicos,

guerras, manifestações, relacionamentos e protestos. Sendo assim, a internet é uma rede

livre para todas as pessoas exporem suas ideias. Diferentemente dos sites informativos, de

notícia, que tem o dever de transmitir os fatos como ocorreram, sem as entre linhas de

opinião e sobre por ideologias de crença e política.

Page 9: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

24

INTOLERÂNCIA ÀS RELIGIÕES DE MATRIZ AFRICANA.

O Brasil ainda é considerado uma das poucas “democracias raciais” do mundo,

o que Impediu, por muito tempo, o reconhecimento de grande parcela da sociedade

da existência de um problema racial no país. A história nos mostra que vários fatores

contribuíram para isso, dentre eles, o econômico. A população negra, bem como os

nativos brasileiros, são os que mais sofreram e ainda sofrem com as desigualdades

sociais e com o preconceito (LIMA e WILLEMAN, 2010, p. 73).

“Cabe lembrar aqui que Racismo não é preconceito, embora este último seja uma

das práticas atreladas a manifestação do racismo” (BERTH, 2017). Para Aurélio Ferreira18,

racismo é doutrina que sustenta a superioridade e discriminação em relação a indivíduos

considerados de outras raças. O racismo é crime pela Constituição Federal19 que apresenta

diversas formas de punição para estes casos, crime inafiançável com pena de até 3 anos de

prisão. De acordo ainda com Aurélio20, preconceito é intolerância, ou aversão, suspeita, má

vontade gratuitas contra pessoas, povos e crenças. O culto desconhecido e reservado das

religiões de matriz africana faz com que essas práticas sejam sujeitas a interpretações

deturpadas e, consequentemente, gera esse tipo de preconceito. Racismo e intolerância

religiosa andam próximos, no sentido de pregar a fé do brasileiro. Com tanta diversidade

cultural e ideológica vemos o aumento de crimes contra as crenças minoritárias, como as

de matriz africana, por exemplo. Embora às vezes ocorra também disputas entre algumas

religiões cristãs, eles acabam sendo menos violentos “porque essas religiões têm uma origem

comum e compartilham os mesmos valores” (CAULYT e WELLE, 2013). “Um lado o

racismo e a discriminação que remontam à escravidão e que desde o Brasil colônia rotulam

tais religiões pelo simples fato de serem de origem africana” (PUFF, 2016), então vemos

o quanto o conceito de racismo é presente nessas religiões. Outra forma de intolerância pode

ser gerada pela disputa de poder econômico, onde a religião neopentecostal tem essa

rivalidade para conseguir cooptar os fiéis das religiões afro-ameríndias para seus templos,

gerando renda e domínio monopolista. Racismo e preconceito são divergentes na teoria

e próximos na prática, sua junção com a intolerância se dá pelo colorismo21. Pessoas são

julgadas e humilhadas por suas crenças e raças por serem quem são e suas origens.

Escondendo seus símbolos e impedidos de realizar sua fé pelo histórico que carrega de

18 FERREIRA, 2005, p. 727. 19 Art. 5, inc. XLII da Constituição Federal de 88. 20 FERREIRA, 2005, p. 694. 21 O termo colorismo foi usado pela primeira vez pela escritora Alice Walker no ensaio “If the Present Looks Like

the Past, What Does the Future Look Like?”, que foi publicado no livro “In Search of Our Mothers’ Garden” em

1982. Segundo Aline Djokic, o colorismo quer dizer que, quanto mais pigmentada uma pessoa, mais exclusão e

discriminação essa pessoa irá sofrer.

Page 10: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

25

discriminação, na negação das tradições não cristãs22. A falta de fiscalização nas aplicações

das nossas leis é o “tendão de Aquiles” do governo brasileiro para impedir esses crimes quanto

a honra e liberdade de expressão e fé.

A seguir, reportagens retiradas dos sites O Dia e Estadão sobre o caso da menina

que foi apedrejada na cabeça após sair de um culto de Candomblé.

22 CAULYT, Fernando. WELLE, Deutsche. Religiões africanas são principal alvo da intolerância religiosa no Brasil.

Page 11: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

26

23

23 ARAÚJO, Flavio. Intolerância religiosa leva menina a ser apedrejada na cabeça. O Dia, 2015. Disponível em:

http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2015-06-16/intolerancia-religiosa-leva-menina-a-ser-apedrejada-

nacabeca.html

Page 12: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

27

Page 13: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

28

24

As duas reportagens são divergentes, tanto pela abordagem do fato como pelas

características do mesmo. A reportagem de O Dia trata o caso como intolerância religiosa,

foca no artigo 20 da Lei 7.716, afirmando ter sido crime de intolerância. O aspecto da

primeira reportagem nomeia os acusados como grupo de evangélicos, já a outra menciona

que foram dois homens os agressores. As fotografias encontradas no Estadão são mais ricas

que a do O Dia, mostrando mais detalhes sobre o que foi denunciado. O Dia usa um efeito de

24 Bacelar, Carina. Villela, Danielle. Menina leva pedrada na cabeça na saída de culto de candomblé no Rio. O

Estado de S. Paulo, 2015. Disponível em:

http://brasil.estadao.com.br/noticias/rio-de-janeiro,menina-leva-pedrada-na-cabeca-na-saida-de-culto-de-cando

mble,1707182

Page 14: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

29

editoração gráfica para embaçar a face da menina, assim evitando sua identificação. Enquanto

o Estadão revela sua identidade com a imagem da menina segurando o mesmo cartaz com

seu rosto à mostra. Quanto à imagem no O Dia a legenda não condizendo à fotografia, já

que a campanha só surgiu após o caso, prova disso é o curativo que se encontra na região

afetada. “Antes da agressão, a menina já defendia o direito de usar as cores de sua religião de

forma pacífica” (ARAÚJO, 2015), com a legenda não condizendo a fotografia. No Estadão,

a legenda da fotografia é objetiva e apenas citando as frases do cartaz. O jornalista Flávio

Araújo do O Dia entrevistou a avó, uma autoridade da roça25 de Candomblé que a menina é

iniciada e o presidente da Comissão de Combate à Intolerância do Rio de Janeiro. Já as

jornalistas Carina Bacelar e Danielle Villela do Estadão entrevistam somente a avó. Em ambas

reportagens não há eufemismo, pois, a nomenclatura utilizada é ideal para se referir às religiões

de matriz africana. Exemplos: adeptos, iniciação, filhos e irmãos de santo. No O Dia, segundo

uma testemunha, a vítima, apesar do ocorrido, seguiu sua rotina normalmente, enquanto no

Estadão a avó relata que a menina era mais reservada. O Dia utiliza a palavra “apenas” ao

se referir a idade da menina como se houvesse idade para “apresentação” de intolerância

religiosa, o termo protesto foi empregado equivocadamente, pois pelo dicionário26 a palavra

significa reclamar; se queixar; a palavra adequada seria “manifestação”, pois tem o significado

“expressar sentimento ou opinião”27. As duas reportagens se encontram na coluna Cidades,

uma em “Rio” e outra em “Brasil”, respectivamente.

25 Mesmo que “Ilê Axé”, terreiro e barracão, que é o espaço onde são realizadas as festas públicas de um

Candomblé 26 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Júnior: dicionário escolar da língua portuguesa.

2005, p. 710. 27 FERREIRA, 2005, p. 564

Page 15: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

30

Page 16: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

31

28

28 ARAGÃO, Jarbas. Traficante clama “sangue de Jesus” enquanto obriga mãe de santo a destruir próprio terreiro.

Gospel Prime, 2017. Disponível em: https://noticias.gospelprime.com.br/traficante-sangue-de-jesusobriga-mae-

santo-destruir-terreiro/

Page 17: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

32

Page 18: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

33

As divergências encontradas nas reportagens são nas abordagens e nos termos usados.

Gospel Prime aborda o caso na editoria “Brasil” e trata como violência, enquanto site UOL

lida como violência e intolerância religiosa que acontece no dia a dia, pelas séries de casos

Page 19: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

34

citados na reportagem e por ela se encontrar na editoria de “Cotidiano”. As fotos são

semelhantes às dos vídeos, modificando o momento da ação dos mesmos. As nomenclaturas

usadas para os acusados de cometerem o ato foram ditas: traficantes, homens armados e

criminosos no Gospel Prime e no UOL são apenas criminosos, por este único ato. Outras

terminologias utilizadas no Gospel Prime foram “traficante gospel", “bruxaria”, “filhos de

santo” e “guias”, todas entre aspas podendo indicar ênfase ou ironia. O jornalista Jarbas

Aragão do Gospel Prime entrevistou o secretário de Segurança do Rio de Janeiro, o secretário

estadual de Direitos Humanos e Políticas para Mulheres e Idosos (SEDHMI-RJ) e o presidente

da Comissão de Combate à Intolerância do Rio de Janeiro (CCIR). Já o jornalista Eduardo

Carneiro do UOL entrevistou somente o presidente da CCIR.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da colonização, tivemos vários conflitos, passamos pelo período da

escravidão, crises econômicas e migrações. Logo, houve descendências culturais e religiosas

vindas de várias partes do mundo agregando fundamentos. Desde então, negros passaram a

sofrer discriminações e viraram marginalizados perante a sociedade, tornando invisíveis

para o poder público. Aos poucos, legislações o tornam importantes e as fazem representantes

no corpo social. Assim, possuindo o que está presente nos dias de hoje, a mistura cultural

e religiosa fragmentada e dispersa no âmbito nacional. E a mídia vem com o papel de

converter essas ideias de discriminações, tornando-se responsável pela difusão de sapiência,

mostrando os fatos e abordando nos espaços atuantes de forma harmônica e pacífica. Portanto,

é um problema que deve ser exposto para que seja efetiva a realização de modificação da

prática, com isso, tornando compreensível a transmissão da informação coesa. Analisando,

em específico, o uso das abordagens das notícias sobre os casos relatados, percebe-se a não

utilização dos termos corretos na divulgação à população usufruir do comunicado. Para tanto,

sublinha-se a importância do uso da ética profissional e do princípio da proporcionalidade

de casos envolvendo a intolerância religiosa na mídia, tendo as noções legislativas e aplicá-

las. Nesse caso, converte-se à observação imprescindível das peculiaridades do caso em

concreto. Por fim, não se pode omitir que os valores éticos, da diversidade e da tolerância

devem ser guias absolutas a qualquer notícia. A mídia tem a tarefa, dever e a responsabilidade

de difundir o conhecimento para que seja um dos principais meios de diminuição da

intolerância religiosa. Somente, assim, pode-se dizer que se está caminhando na busca real

na direção da efetivação de canais transparentes, educativos e livres de preconceitos.

Page 20: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

35

REFERÊNCIAS

ANDRADE, Solange Ramos de. Os intelectuais e a identidade religiosa no Brasil. ANPUH – XXIII

SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA – Londrina, 2005.

AREIAS, Karilayn. Idosa é agredida por intolerância religiosa em Nova Iguaçu. O Dia, Rio de Janeiro,

20 ago. 2017. Disponível em: <http://odia.ig.com.br/rio-de-janeiro/2017-08-20/idosa-

e-agredida-por-intolerancia-religiosa-em-nova-iguacu.html> Acesso: 19 set. 2017

BERTH, Joice. Intolerância religiosa: a livre expressão do racismo brasileiro. Carta Capital, set.

2017. Disponível em: <http://justificando.cartacapital.com.br/2017/09/18/intolerancia-religiosa-livre-

expressao-do- racismo-brasileiro/>. Acesso em: 24 out. 2017.

BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934. Promulgada em 16 de

julho de 1934. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm>

____. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituição.htm>.

____. IBGE. Censo Demográfico, 2010. Disponível em

https://censo2010.ibge.gov.br/

____. Lei n.7.716, de 5 de janeiro de 1989. Define os crimes resultantes de preconceito de raça ou

de cor. Brasília-DF, jan. 1989. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7716compilado.htm>

CAVALCANTE, Alcinéa. Nota de Repúdio do Sindjor-Fenaj. Macapá, fev. 2016. Disponível em:

<https://www.alcinea.com/2016/02/09>. Acesso em: 9 out. 2016.

CAULYT, Fernando. WELLE, Deutsche. Religiões africanas são principal alvo da intolerância

religiosa no Brasil. Carta Capital, fev. 2013. Disponível em:

<https://www.cartacapital.com.br/sociedade/religioes-africanas-sao-principal-alvo-da- intolerancia-

religiosa-no-brasil>. Acesso em: 24 out. 2017.

CHAVES, José Reis. A vivência da essência das religiões é o que nos salva. O Tempo. Belo Horizonte,

dez. 2009. Disponível em: <http://www.otempo.com.br/opini%C3%A3o/jos%C3%A9-reis-chaves/a-

viv%C3%AAncia- da-ess%C3%AAncia-das-religi%C3%B5es-%C3%A9-o-que-nos-salva-1.220736>.

Acesso em: 24 out. 2017.

COELHO, André. Criminosos obrigam mãe de santo a destruir próprio terreiro em Nova Iguaçu. CBN,

Rio de Janeiro, 13 set. 2017. Disponível em: <https://goo.gl/cs6mwK> Acesso: 19 set. 2017

CORRAL, Janaina Leite de Azevedo. Mídia & Cidadania: Websites de Templos Afro- religiosos

como ferramenta de combate à Intolerância. X Conferência Brasileira de Mídia Cidadã e V

Conferência Sul-Americana de Mídia Cidadã UNESP | FAAC | Bauru-SP | abril de 2015.

CRIMINOSOS invadem terreiro e praticam assalto durante festa de Oxum, em Olinda. G1 PE e TV

Globo, Olinda, 25 set. 2017. Disponível em: <https://goo.gl/aDEiLe> Acesso: 17 out. 2017

CUMINO, Alexandre. A umbanda e o umbandista: quem é e o que é? / Alexandre Cumino. - - São

Paulo: Mandras, 2016.

Page 21: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

36

DENÚNCIAS de intolerância religiosa crescem 3.706% nos últimos 5 anos. Jornal do Commercio,

São Paulo, 06 nov. 2016. Disponível em:

<http://jconline.ne10.uol.com.br/canal/mundo/brasil/noticia/2016/11/06/denuncias-de-intoler ancia-

religiosa-crescem-3706_porcento-nos-ultimos-5-anos-259518.php>. Acesso em 17

out. 2017.

DEPUTADA é vítima de intolerância religiosa e preconceito racial no Amapá. Jornal do Amapá,

Macapá, 12 jul. 2017. Disponível em: <https://www.diariodoamapa.com.br/2017/07/12/deputada-e-

vitima-de-intolerancia-religiosa

-e- preconceito-racial-no-amapa/>. Acesso em 31 out. 2017.

DJOKIC, Aline. Colorismo: o que é, como funciona. Geledés, fev. 2015. Disponível em:

<https://www.geledes.org.br/colorismo-o-que-e-como-funciona/>. Acesso em 16 nov. 2017.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Júnior: dicionário escolar da língua

portuguesa / Aurélio Buarque de Holanda Ferreira; coordenação Marina Baird Ferreira e Margarida

dos Anjos. Curitiba: Positivo, 2005.

FONTENELLE, Aluízio. A Umbanda através dos séculos. Edição da “Organização Simões” - Rio de

Janeiro, 1953.

GABATZ, Celso. Diversidade e Intolerância religiosa na Sociedade Brasileira Contemporânea.

Protestantismo em Revista, São Leopoldo, v. 37 Ed. Esp. Extra, p. 03-19. jun. 2015.

LIDÓRIO, Ronaldo; SOUZA, Isaac Costa de (org.). A questão indígena -- uma luta desigual: missões,

manipulação e sacerdócio acadêmico. Viçosa, MG: Ultimato, 2008

LIMA, Guiomar Rodrigues de. WILLEMAN, Estela Martini. O preconceito e a discriminação racial nas

religiões de matriz africana no Brasil. Revista UNIABEU, Belford Roxo, RJ, v. 3, n. 5, set./dez. 2010.

Disponível em: <https://goo.gl/CGiVA5>. Acesso em 16 nov. 201

MATOS, A. S. de. (2010). Breve história do Protestantismo no Brasil. Disponível em:

<https://goo.gl/Ph6PWR>. Acesso em 14 out. 2017

ORO, Ari Pedro. Neopentecostais e afro-brasileiros: quem vencerá esta guerra? Debates do NER,

ano 1, n. 1, p. 10-36. nov. 1997.

OUVIDORIA recebeu mais de 133 mil denúncias de violações de direitos humanos em 2016.

Ministério dos Direitos Humanos, Brasília, 11 abr. 2017. Disponível em: <https://goo.gl/vHtdRx>.

Acesso em 17 out. 2017

PELLEGRINI, Luís. Intolerância Religiosa. Terreiro de Mãe Rosana foi incendiado na madrugada.

Portal Brasil 247, Jundiaí, 28 set 2017. Disponível em:

<https://www.brasil247.com/pt/247/revista_oasis/319801/Intoler%C3%A2ncia-religiosa-Ter reiro-de-

M%C3%A3e-Rosana-foi-incendiado-na-madrugada.htm> Acesso: 17 out. 2017

PIMENTEL, Izabella. Em 1 mês, terreiros de umbanda de Teresina sofreram quatro ataques.

CidadeVerde.Com, Teresina, 07 jul. 17. Disponível em:

<https://cidadeverde.com/noticias/251417/em-1-mes-terreiros-de-umbanda-de-teresina-

Page 22: Revista Intolerância a religiões de matriz africana ...

Revista Tempo Amazônico

Revista Tempo Amazônico - ISSN 2357-7274| V. 7 | N.2 | jan-jun de 2020| p. 16-37

37

sofreram-quatro-ataques> Acesso: 19 set. 2017

PORTELA, Cícero. Pai de Santo é vítima de boatos de WhatsApp e denuncia à Polícia. Portal

O Dia, Teresina, 05 jul. 2017. Disponível em: <https://goo.gl/fhQPGH> Acesso: 19 set. 2017

PRANDI, Reginaldo. Os candomblés de São Paulo: a velha magia na metrópole nova /

Reginaldo Prandi. -- São Paulo: HUCITEC: Editora da Universidade de São Paulo, 1991.

PRANDI, Reginaldo. O Brasil com axé: candomblé e umbanda no mercado religioso.

Estud. av. vol.18 no.52 São Paulo Set./dez. 2004. Disponível em:

<http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142004000300015> Acesso: 19 set. 2017

PUFF, Jefferson. Por que as religiões de matriz africana são o principal alvo intolerância

no Brasil? BBC Brasil, Rio de Janeiro, jan. 2016. Disponível em: <https://goo.gl/FvH9zj>

Acesso: 24 set. 2017

SACERDOTE de umbanda é condenado por perturbação de sossego. Diário de Pernambuco, Olinda,

12 abr. 2017. Disponível em: <http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/vida-

urbana/2017/04/12/interna_vidau rbana,698777/sacerdote-de-umbanda-e-condenado-por- perturbacao-

de-sossego.shtml> Acesso: 19 set. 2017

SANTOS, Alberto Pereira dos. Geopolítica das Igrejas e Anarquia Religiosa no Brasil: por uma

geoética / Alberto Pereira dos Santos. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Gramma, 2015.

SCHOCK, Marlon Leandro. Aportes epistemológicos para o ensino religioso na escola: um estudo

analítico-propositivo. 2012. 317 f. Tese (Doutorado em Teologia) - Programa de Pós- Graduação,

Escola Superior de Teologia, São Leopoldo.

TEIXEIRA, Faustino. Faces do catolicismo brasileiro contemporâneo. REVISTA USP, São Paulo,

n.67, p. 14-23, setembro/novembro 2005

VILLELA, Flávia. Mais de 70% dos casos de intolerância no Rio atingem religiões afro-brasileiras.

Agência Brasil EBC, Rio de Janeiro, 21 jan. 2016. Disponível em: <https://goo.gl/UMgDL6>. Acesso

em: 9 out. 2016

WENTZ, Raiane. Manicure diz ter sido demitida de salão por intolerância religiosa. Metrópolis, Distrito

Federal, 04 set. 2017. Disponível em: <https://goo.gl/nDfHSJ> Acesso: 19 set. 2017