Resumo - ProPEd
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REFLEXÕES SOBRE O SISTEMA PENITENCIÁRIO: PERSPECTIVAS SOCIAIS E
PEDAGÓGICAS
Laura Marconi da Silva Pereira
Link plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/8277926273901553
Palavras-chaves: Sistema penitenciário, criminalização, educação prisional
GT5: Aspectos inquisitórios do Processo Penal e Criminogênese.
Direitos Humanos e Sistema Penitenciário
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo apresentar algumas reflexões acerca da
sociedade brasileira em seu processo de desenvolvimento econômico e social ocorridos
a partir da década de 70. Demonstrando como foi a atuação dos governos em gerir
políticas sociais para atender as demandas prioritárias da sociedade que estava em
processo de desenvolvimento do capitalismo. Diante dos problemas urbanos que
emergiram e a falha da efetivação dos programas sociais, repercutiu a falência do
sistema penitenciário do nosso país. Neste sentido, acerca da execução penal será
abordado o caráter pedagógico da pena, em seu duplo sentido: na educação escolar
presente nos presídios e no caráter de cumprimento da pena.
Introdução
Pouco mais de meio milênio após a chegada dos portugueses em terras
brasileiras e quase 200 anos após a sua independência, os cidadãos brasileiros ainda
estão enraizados em um misto de esperanças e incertezas.
O marco da reconstrução, melhor dizendo, construção da democracia no Brasil,
ganhou ímpeto após o fim da ditadura militar, com o início da Nova República, em
1985. Em 1988, a Constituinte que redigiu e aprovou uma constituição mais
democrática com maiores direitos e liberdades civis, também conhecida como
Constituição Cidadã, vem há 30 anos tentando desenvolver políticas públicas e políticas
sociais para driblar os principais problemas sociais da realidade brasileira.
No entanto, não podemos deixar de considerar que a estabilidade da democracia
brasileira não pode ser considerada fora de perigo, o comprometimento governamental
não resolveu os problemas econômicos e sociais mais sérios até os dias atuais.
Não é necessário fazer uma grande análise para listar os problemas que são
presentes em conversas de bares, nas ruas, nos escritórios, nos noticiários e nas redes
sociais: baixa oferta de empregos, trabalho informal, insuficiência e precariedade dos
transportes públicos coletivos, trânsito violento e congestionado a qualquer hora do dia,
gerando caos a população que mais utiliza desse meio de transporte, falta de saneamento
básico aliada a fatores socioeconômicos e culturais, falta de habitações em condições
básicas para a população de baixa renda, a educação cada vez mais deficitária e pouco
estimulante aos alunos que vivem em situação de estrema vulnerabilidade social,
marcadas pelo abandono e baixa escolaridade dos alunos, expressando o descaso das
autoridades públicas com a educação pública do país, falta de segurança pública,
falência da saúde pública, discriminação racial, exclusão social, a criminalização da
miséria e as contradições do sistema carcerário, entre outras.
Esses fatores apresentados, são alguns dos casos que expressam a falta de
credibilidade da população na atuação dos governantes, quando deveriam se preocupar
em promover programas socioeducacionais, políticas afirmativas e preventivas visando
mudar o cenário crítico que se encontra o país.
Todos os problemas expostos acima, traduzem a crise política e econômica do
Brasil, colocando em xeque o descaso das Administrações Públicas com a população e a
falência do sistema carcerário.
A descrença da população na capacidade das autoridades públicas em gerir
programas contra a violência urbana aumenta o sentimento de medo e de constante
vigilância. Nos dias de hoje, o medo faz parte da “personalidade urbana”, e muitos
cidadãos estão munindo-se do porte de arma, com a suposição de fazer justiça com as
próprias mãos na tentativa de mostrar para a justiça “especializada” e “preparada”, que
ela ainda é deficitária para distribuir punições líquidas e certas.
Neste sentido, visando ampliar a discussão sobre esse tema, o presente trabalho
buscará reflexões nas políticas sociais iniciadas a partir da década de 70, nas politicas
públicas penais em suas perspectivas sociais e pedagógicas, acerca no movimento da
criminalidade urbana, demonstrando que a atuação das agências de controle e repressão
ao crime não são efetivas, e ferem diariamente os direitos humanos.
Para ampliar nossos debates e contribuir com as reflexões, iremos dialogar com
os pensamentos e estudos de alguns autores de diferentes áreas, mas que convergem
entre si, estão no campo das ciências humanas e socias, como Maria Helena Oliva
Augusto (1989) sobre as políticas sociais e as políticas públicas acerca do planejamento
estatal; Michel Foucault (2000), principalmente sobre a história das prisões; Sergio
Adorno (1991), sobre os problemas e desafios enfrentados no sistema penitenciário
brasileiro; Elionaldo Julião (2017), que aborda a educação implementada em um
ambiente prisional.
Por fim, serão analisados alguns documentos que norteiam o sistema penal, os
marcos legais da execução penal brasileira e a Declaração Universal dos Direitos
Humanos, para contextualizar com os referenciais teóricos e trazer um maior
aprofundamento sobre o tema.
Breve reflexão sobre as políticas sociais no Brasil
Ao fazer um recorte na história da economia brasileira, especificamente no
processo de desenvolvimento econômico e social do Brasil ocorrido a partir da década
de 70, observamos que afloraram grandes críticas ao modelo de intervenção estatal
vigente na Era Vargas (1930 - 1945), e logo após, no período da ditadura militar (1964 -
1985).
Nesses dois períodos de tempo, o Brasil iniciou um programa de
desenvolvimento estatal, visando o crescimento econômico e a modernização do país
com base no entendimento de que o progresso social seria derivado do crescimento
econômico, segundo George Martine (1989), citado por Medeiros (2001, p.14).
O período da ditadura perde o caráter populista dos antigos governos e passa a
focar em políticas compensatórias e assistencialistas, que buscavam minimizar os
efeitos provocados pelas desigualdades crescentes que ocorreram após a aceleração do
desenvolvimento do capitalismo (em termos de modernização, industrialização e
urbanização) que o Brasil estava passando, e, com isso, buscou-se um viés produtivista,
investindo em políticas de educação para atender as demandas dos trabalhadores e
aumentar a produtividade da mão-de-obra (que era pouco qualificada), de acordo com
Medeiros (2001. p. 15).
Podemos relacionar essas ações implementadas, com a influência do modelo de
desenvolvimento que ocorreu nos Estados Unidos, chamado de Welfare State1, que uma
de suas implementações foi buscar uma proximidade do público com o privado, e com
isso uma maior participação da iniciativa privada aplicando seus recursos em políticas
sociais, como exemplifica Martine (1989, p. 100) citado por Medeiros (2001).
Os recursos que circulavam pela área social passaram a ser
estreitamente articulados com a política econômica, sendo
subordinados, em várias áreas, ao critério da racionalidade econômica. A iniciativa privada foi, assim, estimulada a assumir importantes
fatias dos setores de habitação, educação, saúde, previdência e
alimentação. Com essas inovações, a política social passou, inclusive,
a ser um dinamizador importante da iniciativa privada (p.15).
Martine (1989, p. 107) ainda conclui:
A privatização da política social criou uma tensão entre os objetivos redistributivistas e as necessidades do processo de acumulação. Se,
por um lado, favoreceu sua expansão, por outro, tornou-a regressiva,
transferindo recursos para estratos de maior renda. Em razão de sua maior capacidade de mobilização política e, portanto, de influenciar as
decisões do poder público, esses estratos conseguiram orientar as
políticas sociais de modo a atender a seus interesses políticos e
particulares, produzindo ações ineficazes, ineficientes e regressivas
(p.15).
Até a década de 80 o governo brasileiro era marcado pelo autofinanciamento,
pela centralização política, pelas privatizações, pelos interesses políticos e pela
fragmentação institucional nas políticas sociais do governo. Pode-se concluir facilmente
que essas características não conseguiam cumprir seus objetivos de proteção social e
que também não tinham pretensão em funcionar como um mecanismo redistributivo da
economia.
Diante dessa falta de comprometimento sucessiva dos governos brasileiros em
tornar ações efetivas nas políticas sociais, sendo incapaz de distribuir competências e
utilizar seus recursos de forma impessoal, tiveram como resultado várias deficiências do
sistema, como exemplifica Draibe (1989, p.15; 1998a, p. 302), citado por Medeiros
(2001),
1 De acordo com Nilton Marques de Oliveira e Luana Borges de Sousa “ O Estado de bem-estar social
(Welfare State) é uma forma de organização econômica e política, em que o Estado é o principal agente
regulamentador nos aspectos sociais, políticos e econômicos do país. O Estado de bem-estar social
emergiu em alguns países europeus devido à expansão do capitalismo após a Revolução Industrial e o
Movimento de um Estado Nacional. Suas bases foram criadas por John Maynard Keynes na década de
1930com a Grande Depressão, consolidando-se após a Segunda Guerra Mundial. ” Disponível em:
https://www.academia.edu/4108091/ESTADO_DE_BEM-
ESTAR_SOCIAL_%C3%A0_luz_do_pensamento_de_Gunnar_Myrdal_e_Amartya_Sen – acessado em
04/12/2018.
[…] como ineficiência e ineficácia dos programas sociais;
superposições de competências, objetivos e clientelas alvo; regressividade dos gastos sociais; altos custos de implementação e
administração; distanciamento entre formuladores e executores e os
beneficiários das políticas; quase total ausência de avaliação dos programas; instabilidade e descontinuidade das políticas; e peso
desproporcional dos interesses burocráticos, corporativos e privados
nas definições e na dinâmica de funcionamento da máquina social do
Estado (p. 16).
Há uma necessidade de superar as desigualdades existentes, principalmente as
que atingem as famílias com nível de renda abaixo do mínimo quanto à alimentação,
educação, saúde e habitação.
A Constituição Federal de 1988, no Capítulo II - Dos Direitos Sociais, diz que,
“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o
transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” 2, entretanto,
podemos concluir que as políticas sociais não são prioritárias e as autoridades públicas
falham ao desempenhar seu papel de cumprir o estabelecido na Constituição.
Diante disso, Augusto (1989) enfatiza que o Estado expressa sua capacidade de
atender a uma multiplicidade heterogênea de interesses através de políticas que possuam
caráter universalizante, mas que se direcionam para um lado oposto, assumindo um
caminho que privilegia outros grupos por interesses, posições e lugares. Por mais que o
Estado busque o interesse no geral, não consegue se isentar totalmente, uma vez que é
um espaço de poder, domínio e de conflitos, contrariando dessa forma, sua essência, que
deveria ser a neutralidade.
É importante destacar que as políticas sociais têm boas intenções, entretanto não
são suficientes para distribuir seus benefícios e atingir seus objetivos com todos os
segmentos da sociedade.
Ao longo dos governos brasileiros a implementação das políticas sociais não
representaram uma melhora substantiva na qualidade dos serviços sociais produzidos no
país, na "qualidade de vida" da população que mais necessita desses serviços. Um dos
grandes problemas enfrentados nos últimos anos é o fato da procura ter sido maior que a
oferta, e assim a expansão quantitativa não conseguiu alcançar a melhora qualitativa, de
acordo com Augusto (1991).
2 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm
Podemos chegar a conclusão de que a consolidação das políticas sociais tem
assumido um caráter assistencialista, apenas amenizando o direito que toda população
que vive a margem da sociedade deveria receber. Esses indivíduos devem ter a
percepção e autocriticidade de que são cidadãos e merecem ser respeitados como
qualquer outro grupo pertencente a camadas sociais superiores.
Há uma necessidade de maior intervenção na área social. Apesar de haver
aumento de recursos disponíveis e criação de inúmeros programas sociais, as áreas
básicas de bem-estar coletivo ainda permanecem sem alcançar grandes sucessos e
melhorias. Augusto (1989, p.114) exemplifica a atuação do governo neste sentido,
Esse conjunto de características permite explicar a "paradoxal posição
ocupada pela política social no conjunto das atividades de Governo:
central, mas extremamente ineficaz" (Draibe, 1986, p.16) e a constatação de que "tudo se transforma", mas a miséria permanece"
(Andrade, 1980, p.110).
Políticas Públicas Penais e seus desdobramentos na sociedade brasileira
Como visto anteriormente, a capacidade dos governantes em investir em
políticas socais de qualidade, resultam em uma descrença da população no próprio
governo que elegeram através do sufrágio universal.
Ocorre que as políticas sociais fazem parte do rol das ações de políticas públicas
do governo, ou seja, são políticas de governo que visam atender (ou deveriam atender)
as demandas prioritárias da sociedade para que o Estado cumpra com seus deveres e
com o funcionamento da máquina pública.
Falando especificamente sobre as políticas públicas penais, deve-se fazer uma
análise que diversos fatores estão envolvidos nesse tema, como por exemplo, a falha dos
governos em gestar programas econômicos-sociais adequados e eficazes ao escopo dos
problemas urbanos. Há uma precariedade de investimentos nas ações de saúde,
educação, alimentação, moradia, segurança e infraestrutura, o que certamente atinge a
base da pirâmide social brasileira.
O Brasil desde a implementação de políticas sociais nunca conseguiu alcançar
seus objetivos, o que até os dias atuais essa situação ainda é presente, e tem o seu
“ponto final” na situação crítica que é o sistema carcerário do país.
De acordo com os dados do Institute for Criminal Policy Research - ICPR, o
Brasil já ocupa a terceira posição no ranking mundial, a China está em segundo lugar
com 1.649.804 presos e em primeiro lugar os Estados Unidos, com 2.121.600
indivíduos presos. O Brasil já ultrapassa a posição da Rússia3.
Segundo os dados prisionais do Brasil, Pereira (2017, p.17), indica,
De acordo com o último relatório produzido pelo Infopen - Departamento Nacional Penitenciário- em 2016 (reflete a coleta
realizada na data-base considerada para o respectivo relatório
analítico, junto a gestores de cada unidade prisional das unidades geridas pelas Secretarias de Administração Penitenciária no Estado e
também aos gestores das carceragens nas unidades de Polícia Civil
para fins de complementação de dados, sendo os últimos dados
publicados datados de 31 de junho de 2016), o Brasil vem apresentando um aumento na população carcerária, em níveis
preocupantes, com um total de 726.712 pessoas presas.
A situação caótica da superlotação que se encontram as penitenciárias do país se
resume numa série de políticas públicas de criminalização em massa, que recebem o
respaldo do universo moral da cultura das classes predominantes que dão a máxima
ênfase à proteção do patrimônio privado.
Segundo Adorno (1991), as políticas penais consistem em um conjunto de
normas e leis adotadas pelo Estado que tem o objetivo a contenção da criminalidade e
da delinquência, pela promoção da reparação de um bem atingido pela ofensa criminal,
através da condenação do indivíduo pelo judiciário e na manutenção destes presos, para
por fim, realizar a segurança da população. As políticas penais enfatizam a repressão
contra o crime definido na letra da lei, e assim punem o ato criminoso contra aqueles
que não cumpriram com o contrato social4 e violam os direitos consagrados à proteção
das liberdades e do bem privado e público.
Neste sentido, as políticas públicas penais nas últimas décadas vêm promovendo
a segregação e o isolamento dos sentenciados, cada vez mais há condenações altíssimas
de reclusão, inclusive para crimes de menor potencial ofensivo, deliberando um
encarceramento em massa e uma superpopulação carcerária. Adorno (1991, p. 4) elenca
os principais efeitos dessa política:
[...] ampliação da rede de coeção; superpopulação carcerária;
administração inoperante; enrijecimento da disciplina e da segurança sem quaisquer consequências no sentido de deter a escalada da
violência e da sucessão de rebeliões que o sistema penitenciário vem
assistindo nos últimos anos; timidez nas medidas de alcance técnico
incompatíveis com o programa de expansão física elaborado
3 Conforme dados da ICPS – International Center for Prisions Studies. 4 Rousseau, O contrato social, O termo contrato social apresentado está relacionado a interpretação de Jean-Jacques Rousseau (2007) , sobre o contrato que a sociedade cria em conjunto, respeitando as leis a fim de afastar as desigualdades e injustiças, visando o bem-estar social da população.
independente de avaliações e projeções dotadas de confiabilidade;
falta de explicação de objetivos, o que se manifesta na ausência de um programa articulado, integrado e sistemático de intervenção, seja no
âmbito das políticas organizacionais administrativas ou de
ressocialização; confronto entre grupos que disputam influência sobre o poder institucional, expressos na eficácia da ideologia da ordem e da
segurança, da vigilância e disciplina.
Podemos concluir que todos esses efeitos elencados convergem para o mesmo
ponto: o poder público até os dias de hoje ainda é incapaz em gerenciar competências
para alcançar uma justiça criminal eficiente.
Com isso, gera a falta de credibilidade da população na atuação das polícias
preventivas e repressivas, bem como na atuação dos governantes em produzir políticas
eficazes contra o aumento da criminalidade. Vale ressaltar que aqui não estamos falando
do aumento da repressão contra o crime com mais violência e aumento das penas dos
crimes, e sim, em atender a classe que se faz maior presente no sistema carcerário e
nunca teve acesso ao básico da vida, aos direitos inerentes a qualquer cidadão do país.
Esse mesmo grupo que não mais acredita nas atuações dos governantes criou o
sentimento do medo constante. Os altos índices de violência urbana fazem com que
sociedade desacreditada no aparato policial realize suas funções, e com isso, munem-se
do porte de arma (muitas vezes ilegalmente) e praticam atos de espancamentos com a
suposição de fazer justiça com as próprias mãos contra aqueles que violaram as leis para
o convívio em sociedade.
Essa sensação de insegurança e o medo de se tornar mais uma vítima da ofensa
criminal não é infundado. De acordo com os dados do Infopen - Departamento Nacional
Penitenciário, através do seu último relatório produzido em 2016, os crimes de tráfico
de drogas, roubo e furto representam as maiores incidências penais pelas quais as
pessoas privadas de liberdade foram condenadas ou ainda aguardam julgamento 5.
As estatísticas das práticas delituosas estão em ascensão, cada vez mais o crime
fica organizado e se desdobra de acordo com as tecnologias utilizadas ao seu combate,
como por exemplo, os moldes empresariais que o tráfico de drogas segue, e incluindo a
camada mais alta da sociedade.
Certo é, conforme já observado acima esse quadro emergencial da política
criminal só irá conseguir alcançar novos voos investindo na base. Os governantes
precisam entender que políticas emergenciais apenas aumentando as penas dos tipos
5 Disponível em: http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-de-
informacoes-penitenciarias-2016/relatorio_2016_22111.pdf - acessado em 04/12/2018.
penais, e com isso cada vez mais elevando o tempo da população carcerária dentro das
prisões, como se isso fosse de fato resolver o problema, e não acentuá-lo. Esse fato é
debatido por Baratta (2002, p, 184) acerca do tempo de prisão do indivíduo no cárcere,
Exames clínicos realizados com os clássicos testes de personalidade mostram os efeitos negativos do encarceramento sobre a psique dos
condenados e a correlação destes efeitos com a duração daquele. A
conclusão que chegam estudos deste gênero é que “a possibilidade de transformar delinquente anti-social violento em um indivíduo
adaptável, mediante uma longa pena carcerária, não parece existir” e
que o “instituto da pena não pode realizar a sua finalidade como
instituto de educação”.
Nessa mesma linha de pensamento Baratta (2002) afirma que há uma natureza
contraditória da ideologia penal de reinserção social dos condenados. Não se pode ao
mesmo tempo excluir e incluir. A sociedade que exclui (e sempre excluiu a classe social
das pessoas privativas de liberdade) quer um retorno positivo dos excluídos após o
tempo que se passaram no cárcere.
As relações sociais que se criam dentro do ambiente carcerário não se diferem
muito das características típicas da sociedade capitalista: marcadas pelo egoísmo, pelo
jogo de interesses, pela corrupção dos funcionários dos presídios e na violência.
Portanto falar em inserção e reeducação social em um ambiente totalmente promíscuo e
que fere os direitos humanos a todo instante é incontroverso.
Deve-se fazer uma reeducação da nossa sociedade antes dos condenados. Antes
de buscar mudanças nos excluídos, é preciso mudar a nossa sociedade excludente,
atingindo assim, a raiz do mecanismo da exclusão, como afirma Baratta (2002).
É de notório saber que o sistema prisional não recupera ninguém e as políticas
públicas penais atreladas as políticas sociais perpetuam o sistema que presenciamos
hoje.
As perspectivas pedagógicas do sistema penitenciário brasileiro
O caráter da pena privativa de liberdade além de punir o indivíduo também tem
um viés pedagógico. A pessoa privada de liberdade deve ser penalizada pelo ato
criminoso que praticou e de certa forma analisar a sua “falha com a sociedade” durante
o cumprimento da pena.
É fato notório que essa função pedagógica da pena é não cumprida, e apenas a
sua função de punir o preso é observada. Para Foucault (2000), o caráter suplicante que
existiu no processo de humanização das penas no início do século XX, ainda é ambíguo
no processo de compreensão do desenvolvimento da punição moderna.
Essas novas punições das penas estariam retomando as penas suplicantes, com
prisões mais rígidas, e tratamentos cruéis de torturas, sem a necessidade de punir os
corpos fisicamente, mas com outras formas de punição como: psicológicas,
jurisdicionais, morais - que muitas vezes trazem danos irreversíveis – de acordo com
Alvarez (2007).
O conceito de ressocialização e reinserção social – acerca das prisões – contraria
o sentido da socialização que está impregnado na concepção político-pedagógica de
execução penal, onde o indivíduo é posto totalmente fora da sociedade livre e
introduzido em uma sociedade reclusa, como explica Julião (2017).
Acerca da educação nos espaços de restrição de liberdade, há muito ainda que
ser debatido e implementado, visto que para grande parte da população que desconhece
o assunto, entende que a educação nos presídios é um benefício para os apenados, sendo
este um direito garantido constitucionalmente e em leis.
Conforme previsto na Lei de Execução Penal nº 7.210/84, os seus artigos 10 e
11, abordam a assistência ao preso, sendo dever do Estado, com o objetivo de prevenir o
crime e orientá-lo no retorno à sociedade; elenca que a assistência deverá ser material, à
saúde, jurídica, educacional, social e religiosa. Seguindo os direitos e garantias
assegurados ao preso, previsto no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, “é
assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”.
É importante ressaltar que os indivíduos em restrição de liberdade, mantém a
titularidade dos demais direitos, como o de integridade física, psicológica e moral,
liberdade de expressão, liberdade religiosa e direito à educação.
De acordo com a Lei de Execuções Penais, em seu artigo 83, diz que todo “[...]
estabelecimento penal, conforme a sua natureza, deverá contar em suas dependências
com áreas e serviços destinados a dar assistência, educação, trabalho, recreação e
prática esportiva.” Dessa forma, a educação é um dever do Estado, devendo ser
respeitado e oferecido a todos os internos dos presídios.
Especificamente sobre a educação escolar no sistema prisional, esta integra a
modalidade de ensino intitulada como Educação de Jovens e Adultos (EJA). Segundo a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº 9.394, de 1996, em seu
artigo 37, afirmando que, “a educação de jovens e adultos será destinada àqueles que
não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade
própria”, conforme Pereira (2017, p. 30).
De acordo com os dados do Infopen (2016) sobre a escolaridade, informa que os
detentos alfabetizados informalmente e com o ensino fundamental completo,
representam 20% da população prisional, o que revela um número aproximadamente de
145 mil pessoas6. Enquanto os detentos com ensino médio completo ou incompleto e
ensino superior completo ou incompleto, revelam um valor numérico de 25% de
pessoas, representando um número aproximadamente de 181 mil pessoas. Pouco mais
da outra metade de presos ainda não concluíram o ensino fundamental completo.
Embora haja previsão legal em diversos dispositivos estaduais, federais,
nacionais e documentos mundialmente reconhecidos, tanto na área educacional quanto
na jurisdicional, a educação nos espaços de privação de liberdade ainda é um direito que
poucos têm acesso. Não são todas as unidades prisionais que comportam espaço
disponível para escola.
A educação escolar nos presídios traz enormes benefícios para aqueles que
estudam, analisando o ato de aprender como uma bagagem cultural que é adquirida e
não pode ser retirada, a educação é algo que soma dentro da vida no cárcere. A função
da educação no espaço privativo de liberdade é vista como algo que positivo e contribui
para que a pena seja vivida de forma mais humana diante de um convívio do ódio, da
vingança, de um ambiente hostil e degradante, e que não recupera ninguém sozinho.
Assim como esclarece o Parecer CNE/CEB Nº: 4/2010,
As ações educativas devem exercer uma influência edificante na
vida do interno, criando condições para que molde sua
identidade, buscando, principalmente, compreender-se e aceitar-
se como indivíduo social; construir seu para a sua vida em
sociedade. (Parecer CNE/CEB Nº: 4/2010, sobre as Diretrizes
Nacionais para a oferta de educação para jovens e adultos em
situação de privação de liberdade nos estabelecimentos penais.
p. 14.).
A escola retorna para seus alunos a sensação de pertencimento, resgata e ensina novas
formas de se relacionar, é um processo de desconstrução e construção de identidade,
desfaz a perversidade do estabelecimento penal e busca trazer em um ambiente
amigável e prazeroso uma nova identidade.
6 Esse número aproximado é em razão do quantitativo de 726.712 pessoas presas, segundo os dados do Infopen, 2016.
Considerações Finais
Através de uma breve reflexão sobre as políticas sociais do Brasil a partir da
década de 70, podemos ter maior percepção sobre o processo de desenvolvimento do
capitalismo ocorrido no nosso país e os inúmeros problemas sociais e econômicos
presentes a décadas e que até hoje não conseguimos erradica-los.
Houve uma tentativa de contornar a situação pelo governo, que buscou uma
proximidade entre o público e o privado para auxiliá-lo financeiramente nas ações das
políticas sociais, e assim poder alcançar os parâmetros de um país desenvolvido.
Entretanto, essa proximidade não concretizou o desejado pelas autoridades
públicas, visto que as parcerias público-privadas passaram a ser de interesses e jogo de
poder e o objetivo central para melhorar a qualidade dos serviços sociais não se fez
presente.
Essa falta de comprometimento das ações governamentais em gerir políticas
públicas de qualidade, resultam no falido sistema penitenciário que temos em nosso
país. As políticas públicas penais não se mostram de forma efetivas e não gerenciam
programas para alcançar uma justiça criminal eficiente.
Podemos concluir que o preso está enraizado em um ciclo vicioso, pois pertence
a uma classe desfavorecida na camada social - excluída pela sociedade e muitas vezes
marginalizada - com poucas condições de mudança na pirâmide social, pois não tem
acesso às políticas sociais básicas como: saúde, educação, habitação, moradia e
saneamento básico.
Dessa forma, após o cumprimento da pena, sem nenhuma mudança de
perspectiva de vida, voltam para a vida do crime, pois é onde conseguem dinheiro fácil
e rápido para sobreviver. Entretanto, o mesmo dinheiro que chega fácil e rápido, não
traz futuro, pois, rapidamente são interrompidos com a prisão, quando não pela morte.
De acordo com Julião (2017), não como falar políticas públicas penais do
sistema penitenciário sem abordar a política de educação para jovens e adultos nos
espaços de restrição de liberdade. A necessária presença de uma instituição de ensino
dentro de um espaço que priva as pessoas do convívio em sociedade e fere diariamente
os direitos humanos é algo primordial para desconstruir e construir uma nova identidade
nos presos, se mostrando capaz de restaurar a autoconfiança dos valores até então
esquecidos ou apagados.
Certo é que se não houver mudanças na nossa sociedade excludente para uma
sociedade mais inclusa, nada irá mudar. A população precisa entender que não são todos
os cidadãos que tiverem iguais direitos e oportunidades na vida, a sociedade capitalista é
cruel e não aceita aqueles que fogem da regra, sendo estes mais uma vez excluídos por
seus pares.
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O CENÁRIO DE CRISE DOS PROGRAMAS SOCIAIS NO BRASIL
Laura Marconi da Silva Pereira 1
Professora Orientadora: Helenice Pereira Sardenberg2
GT 3: As diferentes perspectivas no contexto dos Direitos Humanos.
RESUMO
Este artigo irá abordar sobre a entrada do modelo político neoliberal, no Brasil, no
governo de Fernando Collor de Mello (1990-1992) e, notadamente, como esse modelo
influenciou as políticas sociais no país. Será demonstrado que desde a entrada do
neoliberalismo os programas sociais encontram obstáculos de ordem política e
econômica, dificultando a sua proposta integradora para a sociedade. Ademais, observa-
se que essa forma de atuação do Estado reduz a democracia e fere os direitos humanos,
priorizando uma parcela da sociedade, isto é, a classe dirigente. Importante destacar que
a pesquisa é exploratória, bibliográfica e documental, cujo o método é o
fenomenológico
Palavras-chave: Políticas públicas, democracia, cidadania, direitos humanos e direitos
sociais.
INTRODUÇÃO
Fazendo um recorte na política brasileira, no fim do século XX, podemos
observar que a entrada do neoliberalismo no Brasil se deu no governo Collor (1990 –
1992). A princípio o Brasil rejeitou o receituário neoliberal em função do modelo de
desenvolvimento e da política econômica extensa, pois havia um projeto de
industrialização e reserva de mercado para indústrias do capital no campo da
informática e desenvolvimento tecnológico.
Diante desse cenário emergem alguns problemas internos, como a crise da
dívida externa, o desequilíbrio das contas públicas (devido ao pagamento do serviço da
dívida externa), a crise fiscal, a altíssima inflação e a perda de competitividade da
economia, ligadas a fatores externos, como o fim da Guerra Fria e ao conjunto de
1 Bacharel em Direito e Licenciada em Pedagogia - Link plataforma Lattes:
http://lattes.cnpq.br/8277926273901553 2 Professora nos Cursos de Direito e Administração do Centro Universitário La Salle (Polo Niterói/RJ)
http://lattes.cnpq.br/0129280993959064
sistemáticas sobre a economia, preconizadas pelo chamado “Consenso de
Washington3”.
O governo Collor introduziu o ideário neoliberal no Brasil, com a ideia de trazer
um liberalismo radical e alinhar suas estratégias com os EUA, como liberação do
efetivo do regime de importações, abertura do mercado brasileiro ao mercado
Americano, visando o retorno do país aos círculos financeiros internacionais, a
renegociação da dívida a partir da condição dos credores (o próprio EUA ditava as
regras) e o processo de privatizações das empresas estatais.
Diante disso, podemos compreender o cenário em que o modelo econômico
neoliberal foi adentrando no Brasil e nos é presente até os dias atuais.
De acordo com Leda Paulani (2006, p. 71), o neoliberalismo é um modelo
político econômico que tem como base o fortalecimento do mercado como
“comandante” em todas as instâncias no processo de reprodução material da sociedade,
sendo que para manter esta ideologia é preciso reduzir o Estado ao mínimo necessário
para garantir as regras do jogo capitalista, isto é, impedir que o Estado faça regulações
que interfiram no mercado; segurando, também, os gastos do Estado (cortar verbas
“desnecessárias”, por exemplo, educação, saúde, programas sociais e segurança – como
o atual governo vem fazendo); aumentar o controle do Estado e impedir os problemas
inflacionários; privatizar as empresas estatais (impedir que o Estado desempenhe o
papel de produtor); abrir a economia ao mercado internacional; garantir a concorrência e
a competitividade; diminuir as regras trabalhistas e favorecer a terceirização.
A lógica do Estado, nessa nova era, busca preservar os interesses de uma parcela
específica da sociedade - da classe dominante e dirigente, deixando de lado a classe dos
trabalhadores (que é a grande maioria da população), não dando atendimento ao
emprego, nem proporcionando o aumento de renda, a proteção social, a educação, entre
outros.
3 De acordo com Thais Caroline Lacerda Mattos, “Aspecto importante do contexto em que o governo
Collor inicia as suas políticas liberalizantes, foi a difusão das ideias do “Consenso de Washington” na América Latina e 8 nos países do antigo bloco soviético. O “Consenso” decorreu de uma série de reuniões
entre os dirigentes do FMI, Banco Mundial, BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento e Tesouro
dos Estados Unidos, além de políticos e economistas latinoamericanos. A primeira delas, convocada pelo
economista inglês, John Williamson, do Institute for International Economics, ocorreu em novembro de
1989, em que foram debatidos os problemas enfrentados pelos países da região (inflação e crise
econômica), além de discutir as experiências adotadas com “sucesso”, como as do Chile e México, que
então se abriam ao capital estrangeiro e aparentemente conseguiam enfrentar tais problemas. Também ali
foram reafirmados os princípios neoliberais, tal como preconizado pelo governo norte-americano.”
Disponível em https://www.marilia.unesp.br/Home/Eventos/2015/xiiisemanaderelacoesinternacionais/o-
projeto-da-reforma_thais-caroline.pdf, acessado em 29/10/2109
Entretanto, vale ressaltar que a diminuição dos direitos sociais da classe
proletária também atinge a classe dominante e dirigente, pois são os que mais precisam
da força de trabalho deles. Os problemas sociais começam a emergir como aumento da
violência, falta de investimentos na segurança pública, falta de investimentos na
educação, falta de investimentos em programas sociais etc.
O Estado com medo dessa pauperização e para evitar uma possível convulsão
social, cria políticas pautadas em medidas compensatórias, entretanto, sem evitar a
superação da pobreza (pois faz parte do ideário neoliberal manter/ter parcela da
população na linha da pobreza – que é onde se encontra a grande massa dos
trabalhadores).
Diante desse modelo político, a democracia foi reduzida. O neoliberalismo adota
alguns elementos da democracia, com o objetivo de buscar uma aceitação pela
sociedade, entretanto essa democracia não é exercida plenamente.
De acordo com Wood (2003), há uma divisão entre a “esfera política” e a “esfera
econômica”, de modo que as questões econômicas não se relacionam com as questões
políticas, elas assumem posições específicas na sociedade. O Estado - que é separado da
economia, embora intervenha nela – pode aparentemente pertencer (por meio do
sufrágio universal) a todos, sem revelar o poder de exploração da classe dirigente.
Wood (2003) esclarece, ainda, que é dessa forma que a democracia assume seu
papel no modelo político de ideário neoliberal, seguindo a ideologia do capitalismo,
fazendo com que as atividades de produção e apropriação estejam alocadas no controle
privado, de forma que o próprio capitalismo cria mecanismo para a democracia ficar
confinada à esfera jurídico-política, tornando restrito o terreno político e,
consequentemente, sem repercussões nas questões econômicas.
Essa ideia afasta o controle democrático das instâncias que decidem sobre a
produção e aproximação da riqueza, direciona a democracia para atuar nos limites do
Estado e mantem a economia intocada.
É nesse contexto político-histórico que o presente trabalho irá abordar os direitos
sociais no atual cenário do Brasil e como podemos mudá-lo através de políticas públicas
democráticas e liberais.
ABORDAGEM TEÓRICA
Tendo em vista que os direitos sociais são os que permitem ao cidadão uma
participação mínima do que é produzido coletivamente pela sociedade, seja qual for o
país, eles se tornam de extrema importância na sociedade, assim como os direitos civis e
políticos que também são direitos sociais, como afirma Coutinho (1997).
Podemos observar que o cenário brasileiro, desde a implementação do modelo
neoliberal, assumiu o papel de restringir, por muito tempo, os direitos sociais, sob a
alegação de que ajudar financeiramente a população, através dos auxílios, concedendo
isenções nas áreas econômicas, educacionais e de saúde e, ainda, garantir direitos
políticos e civis, violariam as leis do mercado (e, portanto, o direito individual à
propriedade).
Embora a presença desses direitos na Constituição e em algumas leis, o
reconhecimento legal não garante, automaticamente, a sua materialização. Inclusive, há
uma força para que os direitos já garantidos sejam alterados e eliminados da própria
Constituição (caso recente da Reforma Trabalhista e da Reforma Previdenciária).
Neste sentido, para ampliar nossos debates e para contribuir com o
entendimento, a partir do ingresso do neoliberalismo no Brasil, no governo Collor
(1990-1992), e a mudança nas políticas sociais desde a sua implementação, que levaram
à grave crise no país, iremos dialogar com os pensamentos e estudos de alguns autores
de diferentes áreas, mas que conversam entre si. Entre eles destacamos Carlos Nelson
Coutinho (1997) sobre o processo histórico-político da cidadania na modernidade, seus
avanços e recuos. Maria Helena Oliva Augusto (1989) sobre as políticas sociais e as
políticas públicas acerca do planejamento estatal; Michael Foucault (1979) acerca da
existência de formas de exercício do poder diferentes do Estado, sendo indispensáveis à
sua sustentação e atuação eficaz; Lucia Neves e Julio Lima (2006), com textos de
diversos autores abordando o processo mais amplo de reflexão sobre a educação
brasileira contemporânea e Ellen Wood (2003) que discute sobre a noção de democracia
e a sua relação com o capitalismo como um sistema de relações sociais de poder
político.
CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
A ideologia do neoliberalismo, assumida pela burguesia, pugna pelo fim dos
direitos sociais. Diante da queda da taxa de lucro que abala não só o Brasil, mas outras
grandes potências mundiais, os atuais governantes buscam pôr fim ao Estado de Bem-
Estar Social, ao conjunto dos direitos sociais já conquistados pelos trabalhadores,
propondo devolver ao mercado a regulação de questões como educação, saúde,
previdência, transporte, etc., como argumenta Coutinho (1997).
Não restam dúvidas que há um desinteresse dos governantes neoliberais em gerir
programas sociais que efetivem os direitos de parcela da sociedade, aquela, inclusive,
que mais precisa haja vista a ineficiência da Seguridade Social, tal como inscrita na
Constituição de 1988, que ainda não teve sua implementação de fato.
As leis que regulamentam a saúde, a assistência social e a previdência foram
elaboradas durante o modelo político em questão, logo percebe-se o contingenciamento
de gasto social e privatizações, ou seja, estas leis não priorizam sua efetivação e nem há
interesse, mesmo que aparente, dos governantes em promovê-las.
A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL
Sabe-se que a Política de Assistência Social no Brasil, historicamente, sempre
esteve inscrita no campo da caridade e da filantropia, excluindo assim, a
responsabilidade do Estado. Esse cenário, ganha novas forma a partir da Constituição
Federal de 1988, que traz um capítulo especial para a seguridade social, estabelecendo a
competência ao Poder Público organizar a seguridade social dando universalidade ao
atendimento.
A seguridade é financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta,
conforme previsto na Constituição de 1988, mediante recursos provenientes dos
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
De acordo com a Constituição de 1988, a seguridade social abrange três campos:
assistência social, previdência social e saúde. A introdução dessas áreas na seguridade
social traz uma noção de universalização dos direitos sociais como parte da concepção
de cidadania, que antes era restrita apenas aos beneficiários da Previdência Social,
conforme Monnerat e Souza (2011). As autoras explicam a atuação desses campos no
Brasil:
A incorporação da noção de seguridade no Brasil implicou em um
redimensionamento significativo das três políticas que a integram. No
caso da saúde, o reconhecimento de que “a saúde é direito de todos e um dever do Estado” (BRASIL, 2002, art. 196) marcou uma mudança
significativa com o modelo securitário representado pela medicina
previdenciária, ampliando, assim, a própria concepção de direito à
saúde. Na assistência social, é preciso reconhecer que, pela primeira
vez, esta adquiriu o estatuto de política pública, entendida como área de intervenção do Estado, o que abriu possibilidades de rompimento
com o legado assistencialista. E mesmo na Previdência Social, na qual
se mantém a lógica contributiva que requer uma base atuarial para garantir sua sustentabilidade, verificou-se o afrouxamento do vínculo
contributivo como princípio estruturante do sistema, legitimando
programas de transferência de renda do porte da aposentadoria rural
(FLEURY, 2006; VIANNA, 2001; MONNERAT; SENNA, 2007). (Monnerat e Souza, 2011. p. 42)
Embora esse tripé esteja dentro de uma mesma arena setorial, não há articulação
entre os campos. Ocorre uma sedimentação nas fontes de financiamento da seguridade
por área de política social, tendo em vista que não há um orçamento único para a
seguridade social. Dessa forma pode-se observar, por exemplo, a previdência social, que
tem sua arrecadação própria e não “se preocupa” em fortalecer a causa, bem como a
área da saúde, pois esta entende que redistribuir seus recursos pode enfraquecer a
construção do Sistema Único de Saúde – SUS, podendo perder a identidade, conforme
Monnerat e Souza (2011).
Neste sentido, observa-se que o abandono por parte dos governos na seguridade
social e a desarticulação interna da área social repercutem negativamente no
atendimento da política social no Brasil. Esses três setores devem agir em conjunto para
que as políticas sociais sejam alcançadas, caso contrário enfraquecem cada vez mais os
programas e ações sociais no nosso país.
As autoras Monnerat e Souza (2011. p. 43) esclarecem que:
[...] o constante contingenciamento de recursos para o campo social que poderia ter sido minimizado não fosse a ausência de cooperação
entre as três áreas envolvidas na Seguridade Social. Da mesma forma,
como segunda repercussão, a não adoção da perspectiva sistêmica, traduzida na desarticulação entre saúde, assistência social e
previdência, obstaculizou o desenvolvimento de uma cultura do
diálogo e da promoção de ações intersetoriais no campo das políticas
sociais, com consequências marcantes no contexto atual. De fato, o abandono da perspectiva de integração da política social e o
simultâneo reforço da competitividade entre setores sociais reiteraram
a fragilidade no enfrentamento da fragmentação dos programas e ações nessa área, no país. Por tudo isso, diz-se que a noção de
seguridade social contém valores políticos que precisam ser
resgatados de modo a rever os descaminhos da reforma até aqui empreendida (FLEURY, 2006).
A seguridade social esbarra em viscerais obstáculos de ordem política e
econômica para a sua implementação. Esses fatores estão ligados à negação dos direitos
sociais pelos governos. De acordo com Coutinho (1997), os governos atuam dessa
forma, pois entendem que investir em seguridade social é gastar um dinheiro que não
retorna para o governo.
Além disso, vale ressaltar que as leis orgânicas que regulamentam os diferentes
campos sociais (saúde, assistência social e previdência) foram feitas com base em uma
conjuntura política bastante diversa4. Observa-se que as mudanças trazidas Constituição
de 1988, não foram capazes de alterar o histórico de problemas enfrentados pela
seguridade social.
Um exemplo que elucida esse histórico é a assistência social que vem
apresentada na Constituição de 19885 como um dos pilares da seguridade social,
entretanto, ela não se apresenta como uma política em si, mas como texto legal,
tipificando a seguridade social. A assistência social só vai ser regulamentada em 1993,
com a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), só vai ter uma política concisa
nacional em 2005, Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Em 2011, através da
Lei nº 12.435, o Sistema Único de Assistência Social - SUAS passa a integrar
plenamente o escopo da Lei Orgânica da Assistência Social, sendo este um marco
histórico para a seguridade social. Ou seja, ainda é muito recente.
Outro exemplo é o Sistema único de Saúde. A conquista para a implementação
no Brasil se deu após a Constituição Federal de 1988, na década de 90, com a Lei
Orgânica da Saúde. Entretanto devido a política de contenção de gastos à época da
regulamentação da lei, os recursos destinados ao SUS foram reduzidos à metade, o que
dificulta até os dias de hoje uma saúde pública eficaz6.
BREVE SÍNTESE SOBRE A INFLUÊNCIA DO MODELO NEOLIBERAL NOS
DIREITOS SOCIAS – CASO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA
4 Momento em que o no Brasil o Governo Collor (1990- 1992) aprofunda o desenvolvimento das políticas
neoliberais no país, e são acompanhadas de fortes contingenciamentos de gasto social e de privatizações, segundo explica Monnerat e Souza (2011). 5 A nomenclatura “assistência social” está presente nas Constituições brasileiras desde a Constituição de
1931, entretanto, somente na Constituição de 1988 a assistência social aparecer dentro de uma arena
social, buscando maior efetividade política na área da seguridade social. 6 Aqui estamos falando sobre as diversas crises que os hospitais públicos enfrentam como, falta de corpo
médico, falta de materiais para trabalhar, falta de recursos para a saúde, entre outros. Entretanto, com
todos esses pesares, o SUS é um sistema de saúde referência mundialmente e principalmente por ser um
sistema universal de saúde, que atende qualquer pessoa que necessite de um atendimento hospitalar,
incluindo brasileiros e estrangeiros.
Conforme exposto acima, podemos observar que não há uma integração entre os
setores da seguridade social internamente e além disso, há uma fragilidade no
enfrentamento da fragmentação dos programas. A questão da seguridade social contém
valores políticos e econômicos que precisam ser resgatados de forma que haja uma
reformulação dos caminhos já percorridos.
Em consonância, os direitos sociais também recebem influência do modelo
neoliberal, no sentido de que as políticas sociais têm boas intenções, entretanto, não é
suficiente para distribuir seus benefícios e atingir seus objetivos com todos os
segmentos da sociedade, pois esbarram em fatores também políticos e econômicos.
A Constituição Federal de 1988, no Capítulo II - Dos Direitos Sociais, diz que,
“Art. 6º- São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia,
o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição ”, entretanto,
podemos concluir que as políticas sociais não são prioritárias e o Estado falha ao
desempenhar seu papel de cumprir o estabelecido na Constituição.
Fazendo uma curta análise na área educacional, podemos ter uma maior
compreensão com algumas ideias que o autor Gramsci traz sobre a educação e a atuação
do Estado.
De acordo com Barbosa (2018) citando Gramsci, diz que ele entende que o
Estado é coerção e consenso, de forma que desempenha a função de dirigir intelectual e
moralmente as massas - seguindo interesses do modelo de produção capitalista. Sem
dúvidas, um dos aparelhos que o Estado utiliza para alcançar a consensualidade é a
escola.
Gramsci defende a ideia de que a escola deve ser unitária, formando e educando
todos de forma igual. Traz a ideia de uma escola unitária e comum, única e
desinteressada, onde os conteúdos sejam ser dados sem interesse a uma determinada
classe social. Barbosa (2018) complementa essa concepção, dizendo que a escola
unitária “expressa o princípio da educação como direito de todos e de que todos tenham
acesso aos conhecimentos, à cultura e às mediações necessárias para trabalhar e
produzir a existência e a riqueza social”.
Esse modelo de escola busca a emancipação humana pela aquisição e pela
maturidade intelectual, formando sujeitos autônomos, intelectuais e críticos - elevando
culturalmente as classes. O papel da escola não é formar somente para o trabalho, é
ensinar a prática da cidadania e a formação humana - uma formação integradora.
Infelizmente não é o que vem acontecendo na política educacional do Brasil,
cada vez se vê mais cortes de recurso para educação, priorizando o Ensino
Fundamental, com responsabilidades divididas entre Estado e Município; formação
menos abrangente e mais profissionalizante, (por exemplo a reforma do Ensino Médio e
profissionalizante, flexibiliza o currículo e algumas disciplinas podem ser optativas,
escondendo o fato de algumas escolas não terem condições de oferecerem todas as
disciplinas obrigatórias e somente ofertar aquilo que for mais possível - isso inviabiliza
o poder de escolha do aluno, que terá que optar pelo único ensino daquela escola);
privatização do ensino - aceleração da aprovação para desocupar vagas, tendo o
agravante da menor qualidade; descentralização da gestão, o Estado passa as suas
funções da Educação de Jovens e Adultos para a privatização, por exemplo o projeto
“Amigos da Escola” – mostra a desresponsabilizarão do Estado com a escola e a
educação, tirando a responsabilidade do governo em ofertar uma educação séria e de
qualidade.
Diante desses problemas apresentados, o autor Mészaros (2008), no livro A
educação para além do capital, vai dizer que é necessária uma mudança na sociedade
por um todo. Para que aconteça uma reforma educacional profunda e eficaz devemos
romper com a lógica do capital na área educacional, substituir a enraizada forma de
internalização por uma educação mais abrangente.
Segundo o autor, os processos educacionais e os processos sociais mais
abrangentes de reprodução estão altamente ligados, e explica que as reformulações que
possam acontecer na educação são inconcebíveis sem a transformação também no
quadro social.
Para elucidar essa questão o Mészaros, (2008. p.17) afirma que:
Ao pensar a educação na perspectiva da luta emancipatória, não poderia senão reestabelecer os vínculos - tão esquecidos educação e
trabalho, como que afirmando: digam-me onde está o trabalho em um
tipo de sociedade, e eu te direi aonde está a educação.
E conclui que (2008. p.17):
Romper com a lógica do capital na área de educação equivale,
portanto, a substituir as formas onipresentes e profundamente enraizadas de internalização mistificadora por uma alternativa
concreta abrangente.
Neste sentido, observamos que o Estado exerce o monopólio do controle de
diversas áreas da sociedade brasileira e as diferentes políticas por ele implementadas são
demonstradas pelo projeto político que está em hegemonia.
Em uma sociedade do capital, a educação, a saúde, a assistência social e as
questões previdenciárias, se subordinam a essa dinâmica, seguidas pelo grupo que têm
maior grau de “importância” na sociedade como, o grupo econômico. Assim como foi
falado acima, de acordo com Wood (2003) na nossa sociedade há uma divisão entre a
“esfera política” e a “esfera econômica”, de modo que as questões econômicas não se
relacionam com as questões políticas, elas assumem posições específicas na sociedade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Buscou-se neste presente trabalho argumentar que, desde a entrada do
receituário neoliberal no Brasil, que tinha a ideia de trazer um liberalismo para o país e
alinhar estratégias econômicas e políticas com os EUA, preservou os interesses de uma
parcela específica da sociedade - da classe dominante e dirigente, deixando de lado a
classe dos trabalhadores (que é a grande maioria da população), não dando atendimento
ao emprego, nem proporcionando o aumento de renda, a proteção social, a educação,
entre outros.
A questão social no Brasil passa por uma grave crise pela falta de investimentos
dos nossos governantes que seguem a lógica do modelo de produção capitalista
globalmente universalizado.
Sabe-se que a formulação e a execução dos programas sociais pelo Estado, busca
prevalecer os interesses econômicos sobre as metas de maior grau social, e sua
intervenção nessas áreas vem se fazendo, prioritariamente, através da articulação do
aparelho governamental com o setor privado, que é o maior produtor de bens, conforme
explica Augusto (1989).
O setor da seguridade social que abrange as três esferas: assistência social, saúde
e previdência, merece toda atenção e investimento. O desafio atual desse setor é criar
mecanismos inovadores que favoreçam uma reformulação do sistema de Seguridade
Social, principalmente buscar uma integração interna entre as áreas e transversar esse
sistema para outros setores, por exemplo, a educação e a segurança.
Esse mesmo caminho deve ser seguido na educação, segundo o autor Mészaros
(2008), é necessária uma mudança na sociedade por um todo para que aconteça uma
reforma educacional profunda e eficaz. Devemos romper com a lógica do capital na área
educacional, substituir a enraizada forma de internalização por uma educação mais
abrangente.
Dessa forma, podemos concluir que cabe a nós, pessoas da sociedade,
reivindicar uma educação de formação humana, uma educação plena para toda a vida,
que possibilite desenvolver nossas personalidades e maiores graus de estima.
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O DIREITO À EDUCAÇÃO: A SITUAÇÃO DAS MULHERES PRIVATIVAS DE
LIBERDADE NO PRESÍDIO NELSON HUNGRIA.
LAURA MARCONI DA SILVA PEREIRA
RESUMO:
Através de um levantamento de dados é possível constatar que o sistema penal brasileiro
ainda segue as matrizes deixas do século XVIII, visto que até hoje, não observa as
garantias previstas na Constituição e nos demais ordenamentos jurídicos: buscando
trazer condições dignas de vida no cumprimento da pena e para auxiliar a pessoa
privativa de liberdade no processo de ressocialização. Este presente trabalho tem o
objetivo de compreender e descrever como funciona a educação nos presídios através de
um estudo bibliográfico e documental sobre a educação escolar nas prisões do Brasil. E
com um recorte mais específico, no Presídio Nelson Hungria, no Rio de Janeiro. Sabe-se
que a educação prisional é uma forte aliada em trazer mais humanidade dentro da prisão.
Tem o objetivo de trazer uma identidade ressignificada, restaurando a autoconfiança e
valores éticos e morais do preso.
Palavras-chaves: Humanização das penas. Educação Prisional. Ressocialização da pessoa
privativa de liberdade.
INTRODUÇÃO
A Carta Magna instituída, em 1988, preconizou o novo projeto político societário hegemônico,
no Brasil, um Estado Desenvolvimentista, caracterizado por valorizar os direitos societários
com forte intervenção do Estado a fim de garantir um desenvolvimento econômico. É nesse
contexto pós-ditatorial que os direitos fundamentais são garantidos constitucionalmente, com
conquistas no campo das liberdades individuais, nos direitos de natureza social e política.
Revelando-se assim, mais humanista.
Uma das garantias não diferente das demais conquistadas, em grau de importância, foi a
educação, que se consolida na Constituição Federal, de 1988, quando fala dos direitos sociais,
especificamente, no artigo 6º. Tornando a educação um direito assegurado a todos, inclusive,
aos que se encontram em situação privativa de liberdade, no caso, os presidiários.
Além da nossa Constituição, no ordenamento jurídico, tem-se o Código Penal, o Código de
Processo Penal e a Lei de Execuções Penais (LEP) que tratam dos crimes e cada tipo de
infração, a trajetória na Justiça e as circunstâncias em que o apenado irá cumprir a pena.
Neste trabalho, iremos focar nos objetivos traçados e estabelecidas pela LEP por se tratar de
uma lei que visa as condições do indivíduo privativo de liberdade dentro das instituições
carcerárias, e, especificamente, no que trata a educação para essa população.
Segundo a LEP, todos os presos condenados no Brasil deveriam ter iguais oportunidades de
trabalho, educação e treinamento profissional. Embora haja um dispositivo que declare
expressamente esta norma, apenas uma reduzida parte dos presos tem oportunidade de estudar,
trabalhar e se aperfeiçoar. Esse fato fere, claramente, o objetivo que a lei propõe da reintegração
que deve ser feita com a educação e o trabalho, visto que há um benefício legal da redução das
penas, pois para cada três dias estudados e/ou trabalhados, reduz um dia da pena e,
consequentemente, o livramento condicional. A carência desses meios contribui, também, para
a perpetuação da superlotação, pois retarda a saída dos presos do sistema prisional.
Com isso, é de fundamental importância uma intervenção pedagógica educacional, visando
uma reeducação do sujeito para que possa melhor compreender novas formas de se
relacionar com o mundo, fornecendo elementos para quebrar os antigos padrões da vida que
tinham.
Este trabalho faz um levantamento de dados e informações sobre as prisões de modo geral,
considerando a importância e a urgência sobre a realidade prisional brasileira que se distancia
das políticas educacionais de abrangência dentro das prisões, buscou-se desenvolver uma
pesquisa quanto às práticas educacionais, uma vez que a pena tem um papel não só punitivo,
mas pedagógico também, a fim de proporcionar condições para que o indivíduo retorne à
sociedade e não pratique mais crimes.
A abordagem desse tema traz grande divergência nas diferentes camadas sociais, há quem diga
que a educação é papel fundamental na ressocialização do preso para que, futuramente, quando
estiver em liberdade ter chances de buscar um trabalho digno e assalariado. Há quem diga que
preso não tem direito de estudar, tem que cumprir a pena sem gerar mais gastos públicos com
escolas prisionais e trabalhar, sim, dentro da unidade prisional para pagar os seus gastos.
Grande parte dessa ideologia é transmitida através dos meios de comunicação, a mídia
sensacionalista, principalmente, os telejornais, programas que se intitulam como jornais e
fornecem à população que assiste apologia à violência policial, abrindo espaço para o discurso
de que "bandido bom é bandido morto", ou seja, são responsáveis em grande parte pela
manutenção da ignorância da população sobre o sistema carcerário e os diversos assuntos
relacionados a esse tema.
Analisando a questão da educação prisional pode-se observar uma grande porcentagem de
pessoas que não voltam a reincidir na vida do crime, confirmando o papel da educação como
transformadora na vida de qualquer pessoa, independente da condição que se encontra. A
educação é capaz de abrir caminhos antes jamais percorridos e planejados por pessoas
privativas de liberdade, e isto se concretiza quando eles se veem dentro de uma unidade
prisional e ao mesmo tempo estudando. Possibilitando-os a construir um novo caminho de vida.
O presente trabalho tem por finalidade compreender a prática pedagógica das escolas prisionais
com os alunos e os demais profissionais da educação em seu caráter eficiente e eficaz como
uma das formas de ressocialização do preso.
Sendo analisada a atuação dos profissionais, segundo documentos que lhes dão base para
reconhecer os indivíduos privados de liberdade como sujeitos de direitos às ações e políticas
educacionais que levam em consideração a diversidade e a inclusão, através de uma pesquisa
bibliográfica e de campo, de cunho descritivo, cujo o método observacional, analisou o
ambiente de uma escola prisional e as suas práticas pedagógicas; a atuação dos professores
com seus alunos e do diretor com seus professores e coordenadores, inclusive, das presas com
as demais presas.
Foi feito levantamento de alguns documentos que norteiam a educação em geral, os Pareceres,
as Diretrizes, os Parâmetros Curriculares e o Projeto Político Pedagógico, (PPP). E de forma
mais estrita o currículo dessas escolas prisionais pela Diretrizes Nacionais para a oferta de
educação nos estabelecimentos penais e a Diretoria Especial de Unidades Escolares Prisionais
e Sócioeducativas (DIESP) que é a divisão das escolas prisionais, onde se definem metas,
diretrizes e dinâmicas no desenvolvimento da educação, por intermédio de programas e
projetos que estabeleçam uma política administrativa que atenda as especificidades das
Unidades Escolares Prisionais e Socioeducativas, zelando pelo cumprimento da legislação em
vigor, em consonância com a política educacional promovida pela Secretaria de Educação do
Estado do Rio de Janeiro.
Importante se fez, também, trabalhar com as leis que asseguram os direitos ao apenado estudar,
como a Constituição Federal de 1988, a Lei de Execuções Penais, LEP, e a Declaração
Universal dos Direitos Humanos (DUDH).
AS PRISÕES NO BRASIL
Para pensarmos historicamente nas prisões no Brasil devemos nos remeter a chegada dos
portugueses, e, assim como ocorreu na Europa, a forte influência pelo movimento iluminista
ocorrida no Brasil, contrariando o desproporcional, cruel e sanguinário "direito penal"
existente. Especialmente, após a chegada da família real em 1808, a separação política do
Brasil-colônia de Portugal, em 1822, e com a primeira Constituição Brasileira, em 1824,
criaram-se maiores condições para a criação de uma legislação penal mais humana.
Em 1830, nasceu o Código Criminal que seguiu as linhas humanas que a Constituição de
1824 afirmava, como diz no "TITULO 8º - Das Disposições Geraes, e Garantias dos Direitos
Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros.", o art. 179 e os incisos XVIII E XIX
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos
Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.
XVIII. Organizar–se-ha quanto antes um Codigo Civil, e Criminal, fundado
nas solidas bases da Justiça, e Equidade. XIX. Desde já ficam abolidos os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e
todas as mais penas crueis1.
Pode-se observar, desta forma, a influência do Iluminismo no Brasil. A Constituição
estabeleceu que o código penal deveria ser criado com base na justiça e na igualdade, com as
penas cruéis sendo abolidas. Apesar das novidades, a pena de morte ainda se fazia presente.
O inciso XXI diz: “As Cadêas serão seguras, limpas, bem arejadas, havendo diversas
casas para separação dos Réos, conforme suas circunstâncias, e natureza dos seus crimes".
Logo, a Constituição, de 1824, apresentava, pelo menos, proposta de dignidade humana. Havia
uma preocupação quanto a sua integridade física e a saúde do preso e, também, assegurava que
os "réus" deveriam ficar separados conforme a gravidade dos seus delitos. Já se pensava em
não se "misturar" os réus, isto é, os primários e/ou pouco violentos com os reincidentes e mais
violentos.
Segundo Engbruch e Morais di Santis (2012), o próprio Código já apresentava uma
alternativa de prisão, quando não fosse possível a prisão nas condições previstas em lei, como
diz o art 49:
Emquanto se não estabelecerem as prisões com as commodidades, e arranjos
necessarios para o trabalho dos réos, as penas de prisão com trabalho serão substituidas pela de prisão simples, acrescentando-se em tal caso á esta mais
a sexta parte do tempo, por que aquellas deveriam impôr-se.
1Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm - acessado em 29/10/2017
às 19:09.
Infelizmente, o previsto expresso na lei não se realizava na prática, mesmo a Constituição
de 1824 “garantindo” prisões arejadas e com boa higiene, havia incompatibilidade de
adequação dos prédios prisionais, além disso, certos Municípios não tinham sequer prisão.
As Câmaras Municipais foram criadas em 1º de outubro de 1828, por D. Pedro I, entre
as diversas atribuições estabelecidas, destaca-se o art 56, pois este indica que deverá haver uma
comissão para realizar visitas periódicas às prisões relatando tudo o que for visto.
Art. 56. Em cada reunião, nomearão uma commissão de cidadãos probos, de
cinco pelo menos, a quem encarregarão a visita das prisões civis, militares, e
ecclesiasticas, dos carceres dos conventos dos regulares, e de todos os estabelecimentos publicos de caridade para informarem do seu estado, e dos
melhoramentos, que precisam.
Essas comissões relatavam a realidade lastimável das prisões, como demonstra Engbruch
e Morais di Santis (2012):
Ao descrever o sórdido ambiente, imundo e cheio de fumaça, deixa-se claro
que os presos faziam pequenos objetos (pentes, colheres) com chifres de boi. Assistência médica precária, alimentação ruim e pouca, mistura de presos
condenados e não condenados, falta de água, acúmulo de lixo fizeram a
comissão concluir que tal era “o miserável estado da Cadea capas de revoltar ao espírito menos philantropo”.
Em 1850, nasce a primeira Casa de Correção no Rio de Janeiro, de acordo com Pessoa2
(2014), também, era chamada de Casa de Correção da Corte, criada em 6 de julho, pelo Decreto
nº 678, que aprovou o seu primeiro regulamento.
A Casa de Correção tinha o objetivo de executar a pena de prisão com o trabalho, dentro
da própria prisão, como diz o artigo 1º do regulamento. Os presos que chegavam para cumprir
a pena se alocavam em uma das cem celas prontas e outras cem ainda em construção. Dois
anos após as demais celas que foram concluídas, passaram a receber um maior quantitativo de
condenados suprindo a demanda de vagas. (Pessoa, 2014)3.
Amaral (2016) afirma que ainda em 1864 - 40 anos de vigência da Constituição - as
prisões estavam muito longe de atender os fins da humanização das penas previstas na
Constituição. E não havia resposta diferente para tal situação: a escassa destinação de recursos
financeiros para adaptação das unidades prisionais através das mudanças trazidas pela
Constituição.
Assim como ocorreu na Europa, o Brasil também passou por um processo de
humanização das penas. O mesmo movimento iluminista que influenciou as penas cruéis que
2 PESSOA, Tomaz de Aquino Gláucia. Casa de Correção. 2014. Disponível em:
<http://linux.an.gov.br/mapa/?p=6333> acessado em 03/11/2017 - às 01:25 3 Ibidem
existiam na Europa, foi trazido para o Brasil para combater as atrocidades que eram feitas para
punir os corpos.
A abolição da escravidão, em 1888, foi um marco importante para diversas alterações
que incidiam no fim do período Imperial. A pena de morte foi expressamente revogada pelo
código penal de 1890 e, posteriormente, em 15 de novembro de 1889 foi proclamada a
República4.
Aspirando aos bons ares que trouxe o iluminismo, no final do século XVIII, o Brasil foi
capaz de estabelecer, na primeira Constituição do país, garantias na forma de punir o réu. Ainda
que de 1824 a 1988 ocorra um longo período, pouco podemos observar na prática a
“humanização das penas”. Há previsão expressa em lei, há quase 200 anos, que marcam o fim
da crueldade na punição do réu, o que hoje ainda ocorre, haja vista as péssimas condições de
encarceramento presente no país. Faz-se necessário, portanto, buscar os antigos ares que
influenciaram nossa primeira Constituição, mas não somente isso, importante por,
efetivamente, em prática todas as ideias que fizeram mudar a forma de punição.
QUADRO GERAL DO SISTEMA PENITENCIÁRIO
Sabemos que nosso sistema punitivo foi planejado seguindo as matrizes deixadas pelo
patrimonialismo, pela escravidão, pelas penas de torturas, pela exclusão de certas camadas da
sociedade, consagrando um modelo estrutural dos estabelecimentos penais que violam, todo
tempo, os direitos humanos das pessoas privativas de liberdade.
Podemos relembrar que desde o século XVIII, com o processo de humanização das penas
no Brasil, conforme visto no capítulo anterior, já havia críticas ao sistema punitivo existente
naquela época, inclusive, sobre a primeira prisão criada, visto que não observava as garantias
trazidas na Constituição.
Sendo assim, o reconhecimento dessas críticas deve ser usado como força motriz para
buscar novas mudanças no atual sistema penal e inspirar a política penitenciária com novas
alternativas para realinhar as diretrizes antigas e tradicionais.
Dados e informações pertinentes ao quantitativo sobre as prisões no Brasil, com
levantamentos feitos por órgãos governamentais e não governamentais, apontam uma
4 Disponível em: Apesar de abolida a pena de morte ainda tem aplicação no Brasil, em casos de crimes cometidos
em tempos de guerra. - http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/01/150117_morte_fd - acessado
em 29/10/2017 às 20:11
considerável diferença entre o número de presos de acordo com a metodologia adotada ou a
sua respectiva fonte de informação, mas que se complementam em alguns quesitos.
De acordo com o último relatório produzido pelo Infopen5 - Departamento Nacional
Penitenciário- em 2016 (reflete a coleta realizada na data-base considerada para o respectivo
relatório analítico, junto a gestores de cada unidade prisional das unidades geridas pelas
Secretarias de Administração Penitenciária no Estado e também aos gestores das carceragens
nas unidades de Polícia Civil para fins de complementação de dados, sendo os últimos dados
publicados datados de 31 de junho de 2016), o Brasil vem apresentando um aumento na
população carcerária, em níveis preocupantes, com um total de 726.712 pessoas presas.
O Conselho Nacional de Justiça, instituiu o Geopresídios, relatório dinâmico alimentado
mensalmente pelos relatórios de Inspeção, realizado por juízes com competência na área de
execução penal, extraídos do Cadastro Nacional de Inspeções nos Estabelecimentos Penais e
publicados de forma dinâmica, com base no último relatório judicial de inspeção preenchido6.
De acordo com o Geopresídios o Brasil apresenta um quadro de 682.060 pessoas presas,
trazendo um número diferente dos dados informados pelo Infopen, 2016.
Nessa mesma linha de pesquisa, a plataforma online World Prison Brief, gerida pelo
Institute for Criminal Policy Research - ICPR, da Escola de Direito da Universidade de
Londres7, realizou um estudo sobre o aumento da massa carcerária no Brasil estar em constante
crescimento, concluindo que em maio de 2018, já havia 682.901 pessoas privadas de liberdade
nas prisões, um número ainda maior do último dado feito pelo Geopresídios. Destacou que a
capacidade oficial do sistema prisional de vagas é de 408.116 e o nível de ocupação é de
165,4% em abril de 2018.
De acordo com o Institute for Criminal Policy Research - ICPR, o Brasil já ocupa a
terceira posição no ranking mundial, a China está em segundo lugar com 1.649.804 presos e
em primeiro lugar os Estados Unidos, com 2.121.600 indivíduos presos. O Brasil já ultrapassa
a posição da Rússia.
Pode-se observar que não há como se obter um número preciso sobre o quatitativo de
total de presos nos presídios, visto que há a influência de alguns fatores como, a falta de
informação de algumas unidades prisionais e a grande rotatividade de presos entrando e saindo
diariamente do sistema penal. Por isso os dados aqui apresentados mesclam as fontes de
5http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-de-informacoes-penitenciarias -
2016/relatorio_2016_22111.pdf 6http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php e
http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2017/02/b5718a7e7d6f2edee274f93861747304.pdf 7 http://www.prisonstudies.org/country/brazil
informações, pois são complementares, sendo capazes de apresentar um maior esclarecimento
ao quadro das pessoas privativas de liberdade.
O Brasil hoje contém 1.460 estabelecimentos penais estaduais e federais cadastrados,
presentes em todos os 26 Estados e o Distrito Federal, disponibilizando apenas 368.049 vagas
e totalizando um déficit de 358.663 vagas, de acordo com o Infopen, em 2016. Neste
contingente, o total de presos provisórios e sem condenação são de 292.450.
Pode-se observar que o número de presos provisórios, 292.450 indivíduos, é pouco
abaixo do déficit de vagas no sistema. Estamos falando de aproximadamente 40% de 726.712
mil pessoas, são quase 300 mil pessoas presas antes de serem julgadas em primeiro grau, sendo
que, grande parte dessas pessoas poderia responder em liberdade, como explica o relatório da
pesquisa “A Aplicação de Penas e Medidas Alternativas”, realizada pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada – IPEA, por demanda do DEPEN8,
É gravíssima a informação de que em 37,2% dos casos pesquisados em que os réus estiveram presos provisoriamente não houve condenação à prisão ao
final do processo. Projetando esse achado para o gritante número de presos
provisórios no país, que ultrapassou a marca de 240 mil pessoas em dezembro de 2013, é provável que tenhamos cerca de 90 mil homens e mulheres
encarcerados que, por diversas razões, não serão condenados à prisão, na
maior parte dos casos com sentenças de absolvição ou condenação a penas
alternativas.
Não restam dúvidas que o Brasil vive uma tendência a aumentar sua população
carcerária, a taxa é de mais de 300 presos para cada 100 mil habitantes maiores de 18 anos,
enquanto a taxa mundial de aprisionamento encontra-se no patamar de 144 presos por 100 mil
habitantes9.
O encarceramento desse enorme contingente de pessoas aponta para uma maioria de
jovens, sendo que 55% dos presos têm até 29 anos, representados por uma maioria negra, isto
é, 64% da população carcerária é de jovens negros, com alto número de déficit educacional,
pois apenas 9% desta população têm o ensino médio completo (enquanto a média nacional se
encontra no patamar de 32%).
O Infopen, 2016 revela que a cada 100 mil homens na população brasileira, acima dos
18 anos, 418,44% estão presos, esse mesmo número em relação às mulheres com a maioridade
atingida são de 43,28% de pessoas. Sendo um total de 665.482 homens presos e 42.355
mulheres presas10.
8 http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/politicas-2/alternativas-penais-anexos/pmas_sum-
executivo-final-ipea_depen-24nov2014.pdf 9 Conforme dados da ICPS - International Centre for Prison Studies 10 http://depen.gov.br/DEPEN/depen/sisdepen/infopen-mulheres/infopenmulheres_arte_07-03-18.pdf
O perfil criminal das pessoas privativas de liberdade é caracterizado por alguns fatores
influenciados pela dinâmica criminal, como as alterações na legislação, (dada a importância a
certos crimes), a justiça comum e judiciária - principalmente pelo estereótipo criado em
conjunto com a mídia, pois esta, além de influenciar é, também, tendenciosa contribuindo
fortemente para que a massa telespectadora assimile uma ideia de criminoso que não é muito
comum no sistema prisional. Os casos bárbaros de mortes que proporcionam um grande
número de audiência, como os crimes de homicídios ou os casos de latrocínio, quando são
seguidos de morte, de acordo com os dados do Infopen (2016), juntos representam 14% do
total de crimes cometidos das 726.712 mil pessoas, o que representam aproximadamente 101
mil pessoas.
As pressuposições feitas da atual situação do sistema penitenciário são de pessoas
pobres, negras e com baixa escolaridade e é, de fato, este o perfil da maioria das pessoas presas.
De acordo com o Infopen (2016), 64% dos presos são negros/pretos e pardos, 35% são brancos,
1% são amarelos, 0,13% são indígenas e 1% são outros.
Sobre a escolaridade, os dados informam que os detentos alfabetizados informalmente e
com o ensino fundamental completo, representam 20% da população prisional, o que revela
um número aproximadamente de 145 mil pessoas. Enquanto os detentos com ensino médio
completo ou incompleto e ensino superior completo ou incompleto, revelam um valor numérico
de 25% de pessoas, representando um número aproximadamente de 181 mil pessoas. Pouco
mais da outra metade de presos ainda não concluíram o ensino fundamental completo.
A educação básica, que engloba a educação infantil dos quatro anos aos dezessete anos
de idade, desde a pré-escola até o ensino médio, segundo o art 4º, da nº 9.394/96, Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, serve para assegurar que crianças e jovens recebam
uma educação com os padrões mínimos de qualidade de ensino, com os insumos indispensáveis
ao desenvolvimento e ao processo de ensino-aprendizagem.
Priorizar investimentos públicos em educação é de extrema importância para as pessoas
oriundas de extratos sociais desfavorecidos, pois contribui diretamente na diminuição da
pobreza e da criminalidade, visto que manter os jovens na escola, até o término do ensino
fundamental traz uma maior escolaridade e um fator protetivo aos jovens e, consequentemente,
a possível redução da massa carcerária. Hoje, somente, o ensino fundamental incompleto, sem
conclusão, traz uma porcentagem de 51% de pessoas privativas de liberdade.
O SISTEMA PENAL E AS MULHERES
Segundo dados do World Female Imprisonment List, relatório produzido pelo Institute
for Criminal Policy Research da Birkbeck, University of London, o número de mulheres presas
no mundo está aumentando em um ritmo mais acelerado do que os níveis de prisão masculina.
Os casos de aumento aparecem em todos os continentes desenvolvidos e menos desenvolvidos.
De acordo com o último relatório produzido, a população carcerária feminina mundial é de
mais de 714 mil mulheres. Demonstrando um aumento desde 2000 de mais de 50% na taxa de
crescimento.
De acordo com o ranking mundial das mulheres presas, os EUA estão em primeiro lugar
(cerca de 211.870), seguido da China (cerca de 107.113 ), Rússia (cerca de 48.478), e na quarta
posição, o Brasil (cerca de 44.700).
De acordo com o Infopen – Mulheres (2016), o número de mulheres presas no Brasil vem
aumentando constantemente em relação ao número de presos masculinos. No lapso temporal
de 2000 a 2016, o aumento foi de 656%,11 enquanto a média nacional de crescimento
masculino, no mesmo período, foi de 293%, refletindo, assim, uma curva ascendente no
encarceramento em massa de mulheres.
Este ritmo acelerado de crescimento da população carcerária masculina e feminina se
contrapõe a tendência mundial dos países que investiram em políticas públicas para diminuir o
encarceramento de massa, como alguns países da Europa.
A cada 100 mil mulheres acima dos 18 anos, há aproximadamente, mais de 55 mulheres
presas. No ranking das Unidades da Federação, São Paulo é o estado com o maior número
absoluto de presos e tem a maior população feminina encarcerada, representando (15.104
mulheres) 36% das mulheres presas no país, de acordo com o Infopen, (2016). Seguido de
Minas Gerais (aproximadamente 3.279 mulheres presas), Paraná (aproximadamente 3.251
mulheres presas) e do Rio de Janeiro, (aproximadamente 2.254 mulheres presas) e 12.
A prevalência de certos perfis de mulheres encarceradas não se diferencia muito dos
homens presos, a grande maioria é negra e com baixa escolaridade. Os dados feitos pelo
Infopen – Mulheres (2014), abordaram diferentes aspectos das mulheres presas, como: a
natureza da prisão, a raça/cor/ etnia da mulher presa, estado civil, escolaridade e a razão da sua
prisão. O conjunto de dados demonstrando a realidade das mulheres presas, permite esclarecer
as eventuais falhas da política criminal e, também, as políticas públicas, que poderiam ser mais
11 Segundo dados Ministério da Justiça, a partir de 2005, dados do Infopen/MJ, a população carcerária feminina
era de aproximadamente 5.601 mulheres no ano de 2000. Infopen - Mulheres p.15. 12 http://depen.gov.br/DEPEN/depen/sisdepen/infopen-mulheres/infopenmulheres_arte_07-03-18.pdf
eficientes e eficazes, proporcionando maiores oportunidades às mulheres de classe social
menos favorecida.
De acordo com o Infopen – Mulheres (Ibidem), as mulheres condenadas com penas de
prisão de até oito anos, representam um número expressivo de 70%. Sendo que 32% das
mulheres cumprem a pena em regime fechado, enquanto aproximadamente 16% das mulheres
cumprem em regime semiaberto, isto demonstra que a pena de prisão como medida
sancionatória é uma regra e não exceção, inclusive, para os casos de crimes menos graves,
impactando diretamente no total de mulheres encarceradas no Brasil.
O quadro geral da faixa etária das mulheres presas no Brasil é representado por 50% com
idades entre 18 e 29 anos, e outra grande parcela em destaque é de mulheres entre 30 e 45 anos,
representadas por 39% do total de mulheres presas. O perfil etário da maioria das mulheres
privadas de liberdade repete o padrão nacional dos homens também, a maioria é jovem com
idade até 29 anos. Pode-se observar que a idade apresentada é classificada como um período
economicamente ativo da vida, sendo realidade brasileira ter um maior número de jovens
presos. Segundo o Institute for Criminal Policy Research da Birkbeck, University of London,
há uma tendência no Brasil para o crescimento da população carcerária cada vez mais jovem.
Em relação à raça/cor/etnia das mulheres presas, 62% são negras, 37% são brancas, 1%
amarela. Duas em cada três presas são negras. Os dados levantados não são diferentes em
relação aos homens, que também têm a sua maioria a população maior encarcerada.
Sobre o estado civil das mulheres encarceradas, a maior parte é solteira (62%), e a outra
parte é casada ou possui união estável (32%). Este pode ser um identificador da quantidade de
mulheres presas serem jovens.
Em relação ao grau de escolaridade das mulheres privadas de liberdade, 5% são
analfabetas ou alfabetizadas em cursos regulares, 45% com o Ensino Fundamental Incompleto,
15% com o Ensino Fundamental Completo, 17% com o Ensino Médio Incompleto, 15% com
Ensino Médio Completo, e apenas 1% tem o Ensino Superior Completo. Ainda que em níveis
baixos, o grau de escolaridade das mulheres em comparação aos homens encarcerados é um
pouco maior.
Em relação à razão dos crimes cometidos pelas mulheres encarceradas, há um grande
destaque para o crime de tráfico, que corresponde ao expressivo número de 62% das mulheres
presas, seguido do crime de roubo com 11% das mulheres presas, do crime de furto, com 9%
das mulheres presas e homicídio com 6% das mulheres presas. Os padrões de criminalidade do
público feminino são bastante distintos em relação ao público masculino. Apenas 26% dos
homens cometerem o crime de tráfico, enquanto esse número chega a 62% com as mulheres.
De acordo com A Rede Justiça Criminal, informativo nº 8, Janeiro de 2016, não há como
negar a relação entre o uso e o comércio de drogas e o quantitativo de mulheres presas.
Em toda a América Latina, mulheres negras, pardas e indígenas, de baixa
escolaridade, chefes de família e sem acesso ao mercado formal de trabalho,
têm se valido do comércio de pequenas quantidades de drogas como estratégia de complementação de renda e sustento de filhos e familiares dependentes.
Via de regra, a inserção nesse mercado se dá de modo bastante subalterno e
sem vinculação aos altos níveis hierárquicos de tomada de decisão ou controle financeiro das organizações criminosas. No entanto, a opção política por lidar
com o tema das drogas por meio de ações repressivas e criminalizantes tem
como principais vítimas os indivíduos que desempenham funções de pouca
relevância, baixa remuneração e fácil substituição no mercado transnacional das drogas: exatamente a posição ocupada pela imensa maioria das mulheres,
que cada vez mais são trancafiadas nas já superlotadas unidades prisionais
brasileiras13.
Os dados aqui apresentados pelo Infopen – Mulheres, julho de 2016, padecem de certos
vícios, como a omissão de informações de certos quesitos, as divergências dos números
apresentados no Infopen, 2016; alguns temas silenciados como, disponibilidade de informação
sobre o número de filhos por mulher presa, o tempo de espera por julgamento. Estes são dados
importantes que dificultam uma maior precisão sobre a situação das mulheres presas.
O SISTEMA PENAL NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
De acordo com o Geopresídios, 201714, o Rio de Janeiro é o terceiro Estado que mais
encarcera no país, com um total de 50.219 pessoas presas. Neste ranking fica atrás do Estado
do Paraná com uma população total de 51.700, do Estado de Minas Gerais com uma população
total de 68.354 pessoas e do Estado de São Paulo, com o contingente de 240.061 pessoas presas.
Estes quatro Estados juntos somam mais da metade da população presa nacional. De acordo
com os dados do IBGE (2010)15, a população do Estado do Rio de Janeiro é de 15.989.929
pessoas, há uma média, aproximadamente, de 252 pessoas presas para cada 100 mil habitantes.
13 Disponível em:
http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/02/b948337bc7690673a39cb5cdb10994f8.pdf - acessado em
28/11/2017 às 23:46 14 http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/gera_relatorio.php?tipo_escolha=comarca&opcao_escolhida=26&tipoVis
ao=presos 15 https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rj/panorama
Do total de 1.460 estabelecimentos penais no Brasil, 56 deles estão situados no Rio. São
três presídios femininos e cinquenta e três são presídios masculinos16. Segundo o CNJ (2017),
o Estado do Rio apresenta uma quantidade de 31075 vagas nos presídios, entretanto a
quantidade de presos é de 52.383, o que gera um déficit de 20.506 vagas no sistema carcerário
do Rio.
O total de presos provisórios é de 22.876 pessoas, sendo que quase a metade do total de
presos no Estado do Rio, ainda, não recebeu condenação em primeiro grau. O uso da prisão
provisória se tornou abusivo, mais da metade dos presos provisórios estão custodiados há mais
de 90 dias, sem nenhuma previsão de audiência ou sentença próxima (dados coletados a partir
da pesquisa de campo realizada no Presídio Nelson Hungria, o que será pormenorizado no
quarto capítulo).
Este fato está inteiramente ligado a grande demanda de processos penais que o Rio de
Janeiro tem, combinada com a quantidade de profissionais que atuam na área, o que dificulta a
celeridade processual e, consequentemente, o aumento de presos provisórios sem audiência ou
sentença em prazo razoável.
As principais características do quadro de pessoas restritas de liberdade que compõem as
prisões, hoje, no Rio de Janeiro, são de maioria negra, solteira, com baixa instrução escolar,
viciados/usuários de drogas, e integrantes de Igreja Evangélica, segundo o Infopen (2016).
Alguns presídios, no Estado do Rio de Janeiro, são separados por facções, pois há um
grande quantitativo de presos que pertencem a um determinado grupo e, por isso, os internos
não são separados pela gravidade do crime pelo qual respondem, mas, normalmente, pelos
laços firmados, a fidelidade e o pertencimento às facções de origem, por isso não “podem” se
misturar com outras. Caso aconteça, os próprios internos ao perceberem que um dos presos
pertence a uma organização criminosa diferente da sua, impõe a lei da cadeia, espancando
podendo, muitas vezes, levar ao óbito.
De acordo com os dados apresentados podemos observar que os estabelecimentos penais
são uma verdadeira “caixa-preta”. A falta de dados e a dificuldade dos acessos às unidades
prisionais traz uma distância cada vez maior da temática da prisão. Os poucos dados que se
têm, muitas vezes, são inconsistentes, pois algumas unidades deixam de fornecê-los, além
disso, as metodologias adotadas pelos órgãos de pesquisa trazem números diferentes de cada
dado pesquisado.
16
http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/gera_relatorio.php?tipo_escolha=comarca&opcao_escolhida=26&tipoVis
ao=presos
UMA BREVE REFLEXÃO SOBRE O SENTIDO DA EDUCAÇÃO NOS PRESÍDIOS
Conforme visto no capítulo anterior, o sistema penitenciário brasileiro tem se apresentado para
os governantes como uma verdadeira “caixa preta”. Muito se discute, fazem levantamento de
dados, mas pouco se sabe sobre a realidade do sistema. As penitenciárias são locais onde portas
não se abrem e pouco se sabe para além dos seus muros altos. O que chega de informação para
a população são as destruições de instalações e equipamentos; a morte de presos e funcionários,
quando há motins e rebeliões; as atrocidades que os próprios presos cometem contra seus pares,
por serem de facções rivais; ou, ainda, a intolerância de alguns crimes, como, recentemente,
ocorreu em alguns presídios do Norte e Nordeste do Brasil.
Ao realizar a pesquisa de campo no Presídio Nelson Hungria, no Complexo Penitenciário
de Gericinó, em Bangu, Rio de Janeiro, se teve como objetivo compreender a relação escolar
como uma das formas de ressocialização das presas dentro do sistema prisional.
Por meio de uma pesquisa de campo, qualitativa e descritiva, analisou-se as experiências
vividas e os conteúdos coletados e observados de um modelo implementado de educação
Prisional, no Estado do Rio de Janeiro, sendo este um “programa de ressocialização”, conforme
previsto na legislação de execução penal.
A pesquisa não se preocupou em saber qual/quais crimes cada interna cometeu e nem vê-
las como “vítimas da sociedade”, pois cada pessoa sabe dos seus motivos e valores, e, carrega
consigo uma história que é particular e que as levou a estarem ali. De modo geral, pretendeu-
se evidenciar nesta pesquisa, através da análise do material empírico coletado, algumas
questões sobre a realidade da vida no cárcere, ressaltando que embora haja a escola, a Igreja e
o trabalho interno no presídio, nada terá eficácia na ressocialização se não partir da própria
presa a vontade e o desejo de mudar de vida.
A presença de escolas prisionais em presídios, no Estado do Rio de Janeiro, vem sendo
executada já há algumas décadas, mas poucos são os dados e as informações sobre o assunto
no Estado, e, principalmente, no país.
EDUCAÇÃO NAS PRISÕES: PREVISÃO LEGAL
A educação escolar recebe respaldo em previsões legais nacionais e internacionais. São
executadas, através de políticas públicas implementadas pelos estados e pelo governo, como
explica Oliveira (2012).
De acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo 26, todo ser
humano tem direito à instrução. A educação será orientada para conceber “o pleno
desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos
humanos e pelas liberdades fundamentais”.
Segundo a Lei de Execuções Penais nº 7.210/84, os seus artigos 10 e 11, abordam a
assistência ao preso, sendo dever do Estado, com o objetivo de prevenir o crime e orientá-lo no
retorno à sociedade; elenca que a assistência deverá ser material, à saúde, jurídica, educacional,
social e religiosa. Seguindo os direitos e garantias assegurados ao preso, previsto no artigo 5º,
inciso XLIX, da Constituição Federal, “é assegurado aos presos o respeito à integridade física
e moral”.
É importante ressaltar que os presos, embora privados de liberdade, mantêm a titularidade
dos demais direitos fundamentais, como é o caso da integridade física, psicológica e moral.
Ainda assim, no âmbito nacional, a educação escolar prisional é seguida por Pareceres,
como o Parecer CNE/CEB, nº: 4/2010, sobre as Diretrizes Nacionais para a oferta de educação
para jovens e adultos em situação de privação de liberdade, nos estabelecimentos penais,
esclarecendo que a educação nos presídios é considerada como um meio para a promoção da
integração social e aquisição de novos conhecimentos que permitam ao preso buscar novos
caminhos quando saírem da prisão. O papel da educação nos presídios tem como um de seus
principais pilares a reintegração social e o desenvolvimento do potencial humano, como diz o
Parecer CNE/CEB, nº: 4/2010,
Segundo diversos estudiosos do tema, a educação em espaços de privação de liberdade pode ter principalmente três objetivos imediatos que refletem as
distintas opiniões sobre a finalidade do sistema de justiça penal: (1) manter
os reclusos ocupados de forma proveitosa; (2) melhorar a qualidade de vida na prisão; e (3) conseguir um resultado útil, tais como ofícios, conhecimentos,
compreensão, atitudes sociais e comportamento, que perdurem além da prisão
e permitam ao apenado o acesso ao emprego ou a uma capacitação superior, que, sobretudo, propicie mudanças de valores, pautando-se em princípios
éticos e morais. (p. 13)
A educação no sistema prisional integra a modalidade de ensino intitulada como
Educação de Jovens e Adultos (EJA). Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), nº 9.394, de 1996, em seu artigo 37, afirmando que, “a educação de jovens e
adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino
fundamental e médio na idade própria”.
Além do mais, o artigo 18, da Lei de Execuções Penais, assevera que o Estado é obrigado
a promover a educação fundamental nos estabelecimentos penitenciários, devendo integrar-se
no sistema escolar da unidade federativa. O artigo 18-A, também, estende essa obrigação ao
ensino médio, regular ou supletivo.
Há outras legislações internacionais e nacionais que abordam a questão da educação
prisional, a pesquisa fez um recorte nas legislações que se apresentaram mais relevantes para
o tema pesquisado.
A PESQUISA
Em paralelo a pesquisa bibliográfica e documental sobre a educação escolar nas prisões,
foi realizada uma pesquisa de campo, buscando contextualizar as informações coletadas com
as experiências observadas na vida do cárcere, como já foi dito anteriormente.
A pesquisa foi realizada, no período de setembro a novembro, do ano de 2017, através
de visitas quase que diárias à unidade prisional Nelson Hungria. O foco da pesquisa foi
compreender, através de observações das aulas na escola prisional, a relação construída entre
alunas e professores, analisando os significados que a escola possui no contexto de uma
unidade prisional.
A presente pesquisa foi realizada no Colégio Estadual 1º Tenente PM Hailton dos Santos,
que fica dentro da unidade prisional Nelson Hungria, no Complexo Penitenciário de Bangu,
trata-se de um presídio feminino, com a presença de mulheres sentenciadas e mulheres que
ainda aguardam julgamento em primeiro grau, visto que a Cadeia Pública Joaquim Ferreira17,
encontra-se com um grande contingente de mulheres, fazendo com que muitas sejam alocadas
diretamente no Presídio Nelson Hungria.
A escola fica localizada no mesmo corredor onde ficam as demais celas do presídio, no
“miolo”, foram desativadas duas celas para dar espaço para a escola; tem a quantidade de 150
alunas matriculadas; sua estrutura é pequena, contém seis salas de aula, todas com ar
condicionado, cadeiras e mesas para todas as alunas, uma biblioteca, repleta de livros separados
por temas, uma coordenação, uma copa com refrigerador e armário para alocar os lanches das
alunas, um banheiro para as alunas e outro banheiro para os professores, dois espaços para
guardar materiais escolares e materiais de limpeza.
Nos dias de aula a coordenadora pedagógica entrega a listagem de alunas para serem
retiradas das celas para que possam ir à escola. Foram observadas inúmeras vezes atrasos na
remoção das alunas, por alguns motivos, como: a comida dos presídios é terceirizada, e, muitas
17 De acordo com o art 102, da Lei nº 7.210, a cadeia pública é destinada aos presos provisórios.
vezes, chega com atraso, visto que a escola no segundo turno começa às 13 horas, enquanto a
comida, também, é distribuída nesse mesmo horário; a falta de agentes penitenciárias para
cuidar dos corredores, ao mesmo tempo, que liberam as presas das celas, a falta de água e luz
no presídio ou na escola, esta não se importava em não ter aula no dia.
Durante a pesquisa foi observado a metodologia e os materiais pedagógicos que eram
utilizados em sala de aula, e, nenhum professor infantilizou os conteúdos, mesmo a escola
concentrada na produção de material e textos para a apresentação do Projeto de Leitura Escolar
(PLE)18.
Segundo Beiseguel (1997), a Educação de Jovens e Adultos deve ser pensada nos espaços
da escola e nos espaços a sua volta, para construir propostas curriculares mais adequadas aos
alunos. É um passo fundamental para se pensar nas possibilidades de novos desenhos
curriculares destinados a essa modalidade da educação. Os objetivos do trabalho pedagógico
precisam incorporar as possibilidades de relacionar os alunos a situações da sua vida cotidiana,
até mesmo para melhorar a sua própria qualidade de vida em relação à vida em sociedade.
Significando deixar de lado alguns conteúdos formais clássicos para que outras operações
possam contribuir para capacitação dos alunos. Saberes que contribuam para o
desenvolvimento da consciência crítica e para capacitação.
No término das aulas foi observada uma preocupação das alunas em assinarem a lista de
presença da aula, pois a lista é encaminhada para a administração do presídio para fazer a
contagem de remição da pena.
De acordo com a Lei de Execuções Penais a remissão da pena acontecerá seguindo o
previsto:
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto
poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.
§ 1o A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:
I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar - atividade
de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;
§ 5o O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3
(um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente
do sistema de educação.
18 De acordo com a SEEDUC “O Projeto de Leitura Escolar (PLE) consiste em um conjunto de propostas e
orientações que visam a garantir o acesso e a permanência de diferentes práticas leitoras, fundamentais para o
desenvolvimento cognitivo, cultural e social de nosso aluno, já que a leitura é essencial na contextualização dos
conteúdos, em todas as disciplinas das áreas do conhecimento.” Disponível em:
http://www.rj.gov.br/web/seeduc/exibeconteudo?article-id=2380038 – acessado em 01/12/2017 às 18:38.
A resolução da Seap nº 621, de 01 de julho de 2016, institui no âmbito do sistema
penitenciário do Estado do Rio de Janeiro, a remição da pena através de leituras. Na presente
resolução esclarece que “a leitura contribui para processo de reinserção social do custodiado
agregando valores éticos - morais e desenvolvimento de sua capacidade crítica”. E explica que
podem participar do projeto os presos da unidade que tenham capacidade de ler e escrever para
a elaboração de uma resenha da obra literária escolhida.
O participante receberá um exemplar da obra literária com o direito de levá-la para a cela.
Será concedido o prazo de 30 dias para a leitura e elaboração individual da resenha. Ao final,
alcançando uma nota igual ou superior a 10 e atingindo os objetivos, isto permitirá que o preso
possa remir quatro dias da sua pena.
É importante ressaltar que, a remissão da pena através da leitura será assegurada de forma
cumulativa com a remissão concedida pelo trabalho e pelo estudo. O participante no prazo de
12 meses poderá remir até 48 dias de sua pena.
É importante observar que a remissão pela leitura veio para agregar mais chances para
quem esteja em restrição de liberdade. A remissão pelo estudo é contada a cada 12 horas de
aula, concedendo um dia de remissão da pena. Contudo, a escola objeto desta pesquisa funciona
no período da manhã, de 9 horas às 12 horas, e no período da tarde, de 13 horas às 16 horas. A
cada dia, as detentas, recebem 4 horas de aula, precisando de mais dois dias para somar às 12
horas de remissão pela frequência escolar. Eis uma matemática complicada!
Outro ponto importante observado foi a forma de tratamento dos professores com as
alunas homossexuais, que preferiam ser chamadas pelo nome social.
A grande maioria das alunas está há demasiado tempo sem contato com a educação
escolar, muitas abandonaram a escola ainda jovens e não apresentam limites e disciplina para
permanecerem sentadas com atenção à aula, atrapalhando. Esse fato ocorre, também, devido a
realidade das alunas no sistema prisional, os desafios da vida de mulher restrita de liberdade
recebendo pouco ou nenhuma visita, sem um relacionamento afetivo estável dentro e fora da
prisão.
O relacionamento afetivo entre as próprias mulheres presas, também, interfere na escola.
Muitas presas se automutilam19 quando brigam com suas parceiras ou quando são separadas de
celas. Chegam à escola para as aulas automutiladas e passando mal. Inclusive, o uso de
remédios para dormir entre as presas é comum. Segundo relatos, quando elas estão “surtando”
19 Muitas presas têm o costume de se cortarem, nos braços como uma forma de extravasar a dor que estão
sentindo no momento. Outras afirmam que as automutilações são uma forma da presa “querer chamar atenção”,
e não se trata de um problema psicológico.
ingerem remédios para dor e ficam “dopadas” para suportarem o dia a dia insuportável que é a
prisão.
A FUNÇÃO DA ESCOLA NO AMBIENTE PRIVATIVO DE LIBERDADE
Sobre os diversos papéis que são apontados para a escola - passar o tempo, sair das celas,
encontrar amigos de outras celas (inclusive familiares), conquistar benefícios jurídicos,
aprender a ler e escrever, fazer conta, passar de ano escolar - é percebido como algo positivo
pelas alunas dentro do sistema e contribui para que a pena seja vivida de forma mais humana.
A oportunidade de estudar dentro da prisão associa-se a uma vontade pessoal, cujas
motivações se apresentam de diversas formas, haja vista as definições abaixo de algumas presas
que frequentam a escola:
_ “A gente vem pra escola para aprender e distrair a mente.”
_ “A escola representa muito aqui dentro, “a gente” se sente mais livre.”
_ “A escola é boa para remir a pena e para sair da cela um pouco.”
As tensões ali dentro da escola são aliviadas, o saber ganha força, a vontade de aprender
e a atenção voltada para o educador se mostram de forma leve; o convívio do ódio, da vingança,
da rejeição não entram no ambiente escolar, ficam do lado de fora das grades que separam a
escola das demais grades das celas. Uma presa diz que:
_ “Os professores trazem novidade do mundo lá fora, conversam com a gente sobre vários
assuntos, várias coisas, que não nos remetem a prisão”.
Essa troca de experiências com os professores e com os alunos justifica um dos
objetivos da ressocialização do preso. A escola oferece ao interno a possibilidade de resgatar
ou aprender outra forma de se relacionar, diferente do seu cotidiano no cárcere, há um processo
de desconstrução e reconstrução de identidades, desfaz-se a perversidade do estabelecimento
penal e traz a sensação de pertencimento20, um lugar que é seu, um ambiente amigável e
prazeroso para uma nova identidade ressignificada, que vai restaurando a autoconfiança e
valores éticos e morais.
Outrossim, cabe ressaltar que
As ações educativas devem exercer uma influência edificante na vida do interno, criando condições para que molde sua identidade, buscando,
principalmente, compreender-se e aceitar-se como indivíduo social; construir
20 De acordo com os relatos das presas, elas entram no sistema e se desvinculam de seus objetos pessoais, desde
a roupa até os documentos, estão sempre mudando de celas e, muitas, não são chamadas pelos nomes, recebem
apelidos, um número e até mesmo o número do artigo de seu crime.
seu projeto de vida, definindo e trilhando caminhos para a sua vida em sociedade. (Parecer CNE/CEB Nº: 4/2010, sobre as Diretrizes Nacionais para
a oferta de educação para jovens e adultos em situação de privação de
liberdade nos estabelecimentos penais. p. 14.).
Na escola, as bagagens culturais que as alunas adquirem jamais lhes serão roubadas. Elas
exercitam os novos valores conquistados na escola que é, sobretudo, o novo local de
pertencimento e orgulho, pois que se percebem progredindo pessoal e profissionalmente.
ENTREVISTAS E RODAS DE CONVERSAS
Houve uma preocupação em fazer entrevistas com as alunas presas, pois o tempo que se
tem na escola é pouco, ainda mais com os atrasos; além dos dias em que não há aulas. Portanto,
foi autorizada pela diretora do presídio a realização das entrevistas e rodas de conversas no
local onde recebem as visitas dos familiares e onde fica a cantina do presídio.
A escolha das alunas para a roda de conversa não teve muito critério, apenas uma
indicação do corpo pedagógico da escola e dos professores. Ao iniciar-se a conversa com as 10
alunas escolhidas aleatoriamente, foi mencionado que a educação nos presídios é respaldada
em lei como um direito garantido a todos os internos no sistema prisional, sem fazer distinções,
e que, em tese, deveria ser oferecido a todos pelo Estado. Este direito não é um favor, mas, sim
um dever do Estado.
Foi feito um pequeno questionário com algumas perguntas, conforme indicado abaixo:
1- Há quanto tempo está estudando?
2- Por que parou/não estudou enquanto não estava presa?
3- Qual foi seu maior interesse em buscar a escola dentro da unidade prisional?
4- Acredita que a escola cumpre o seu papel de socializar seus alunos e dar educação?
5- Como se sente em relação aos professores? A relação de aluno / professor é amigável?
6- Após ganhar a liberdade, pretende continuar estudando?
7- A escola traz algo positivo para você aqui dentro?
8- A escola é capaz de ressocializar você?
9- Qual o seu sonho?
As respostas das internas foram variadas, mas a grande maioria foi positiva em relação à
escola. Na primeira pergunta muitas responderam que estão na escola a aproximadamente um
ano, outras há 9 meses, 7 meses, 15 dias. Observou-se que no presídio há uma grande
rotatividade, toda semana entra e sai mulheres.
Na segunda pergunta, muitas responderam que pararam de estudar porque engravidaram,
outras porque precisaram trabalhar e não conseguiam conciliar o estudo com o trabalho, outras
porque seguiram a vida com o namorado.
Na terceira pergunta, a grande maioria respondeu que buscou a escola porque querem
aprender. Com unanimidade a escola para elas é como se fosse um ambiente “fora da prisão”,
quando estão em sala, se sentem em outro ambiente diferente da prisão. Esta unanimidade é
apontada em três falas diferentes, como exemplo.
_ “A escola é um local de distração da mente e de aprendizado.”
_ “A escola é uma fuga da realidade.”
_ “A escola pra mim é pra ter mais conhecimento, para sair da cela, pois nada na cela é construtivo.”
A quarta pergunta teve resposta positiva por todas, afirmando que a escola cumpre o
papel dela dentro do espaço privativo de liberdade, é capaz de ressocializar as alunas.
Ressalvaram que a escola cumpre seus objetivos para quem realmente quer estudar, pois
existem algumas alunas que “não têm interesse em nada, apenas em sair das celas e conversar
com as colegas de sala”.
A quinta pergunta responderam que a relação com os professores é bastante respeitosa, e
são tratadas como alunas, como seres humanos, diferente do tratamento que recebem algumas
vezes por agentes penitenciárias.
_ “Os professores tratam a gente bem, chama a gente pelo nosso nome, se preocupam com a gente
também.”.
Na sexta pergunta algumas afirmaram que pretendem seguir com os estudos e outras
indicaram que pretendem concluir o ensino médio no presídio para terem melhores condições
em conseguir um emprego quando ganharem a liberdade.
A sétima pergunta, por unanimidade também foi dito que a escola traz uma calma para
as presas em um ambiente conturbado e cheio de problemas. Para todas que estudam, a escola
melhora o humor, o convívio, a disciplina, a concentração e a busca de sonhos.
Na oitava pergunta, algumas responderam que a escola é capaz de ressocializar a pessoa
presa, algumas responderam que a escola sozinha não consegue ressocializar as presas.
Indicaram que ficam pouco tempo dentro da escola e que precisam ocupar mais o tempo delas
no dia a dia, ficar na cela é muito ruim física e psicologicamente.
Na última pergunta, a maioria disse que pretende seguir estudando para buscar um bom
emprego; pretendem trabalhar, não querem mais seguir a vida do crime, pois sabem que o
ambiente que vivem é horroroso e ninguém se preocupa com elas ali dentro.
A entrevista realizada com a agente penitenciária foi seguida das seguintes perguntas:
1- Como é a sua relação com as presas? Elas respeitam?
2- Acredita que o sistema penal do Rio de Janeiro funciona?
3- Qual a maior dificuldade em lidar com as presas?
4- Acredita na recuperação do preso com o atual sistema de prisão?
5- A escola funciona para as presas?
6- A escola é capaz de mudar a vida delas como presas
7- Além da escola, o que mais contribui para o processo de ressocialização?
8- A vontade de mudar de vida só depende delas?
Em resposta à primeira pergunta as agentes afirmam que mantém uma boa relação com
as presas e buscam sempre manter um respeito mútuo. As presas sabem as regras do presídio e
da disciplina que têm que manter no dia a dia, como por exemplo, a limpeza nas celas.
A segunda pergunta foi consensual, afirmando que o Presídio Nelson Hungria funciona,
mas os demais não. Principalmente, porque “os presos não têm disciplina e fazem o que querem
no presídio”.
Na terceira pergunta as agentes informaram que não enfrentam dificuldades para lidar
com as presas.
Na quarta pergunta, afirmam que o sistema prisional é capaz de recuperar o preso sim,
pois oferecem cursos profissionalizantes, educação, acesso à religião, e “só não muda de vida
quem não quer”. Afirmam que já presenciaram a reincidência de roubo de presa, logo após
ganhar a liberdade, casos de mulheres que “saem ganham a liberdade na semana e na semana
seguinte retornam para o presídio por ter cometido mais um crime”.
Na quinta pergunta, com unanimidade, responderam que a escola funciona e,
principalmente, ensina a ler e escrever.
Na sexta pergunta, afirmam que a escola é capaz “de mudar a vida de quem deseja,
inclusive, a nossa vida”.
A sétima pergunta, indica que todo o contexto do presídio contribui para a ressocialização
das presas.
A última pergunta enaltece que a vontade de mudar de vida só irá depender de vontade
própria, pois “as presas têm recursos para seguirem novos caminhos”.
Ao conversar com as presas e com as agentes penitenciárias e a diretora do presídio,
foram observados pensamentos diversos da realidade ali apresentada. As presas sempre se
remeteram as falas de que o presídio é um péssimo ambiente, não são tratadas como seres
humanos e, sim, como “bichos”, por mais que tenham cometido um crime, merecem ser
tratadas com dignidade, são chamadas por pseudônimos pejorativos a todo tempo, e são
lembradas como pessoas ruins.
Segundo as agentes penitenciárias, a relação com as presas é boa, há um respeito mútuo.
Afirmam que o presídio auxilia as presas para mudarem de vida, com a presença da escola, da
Igreja, da assistência social, de médicos, sempre no intuito de auxiliarem as presas a buscar
uma nova vida quando retornarem à sociedade.
A diretora do presídio busca implementar projetos para garantir uma maior dignidade de
vida para as mulheres presas, mas é ciente da falência que se encontra o Estado do Rio de
Janeiro e da dificuldade de recursos para os projetos. O Presídio Nelson Hungria é um dos
poucos presídios, do Estado do Rio de Janeiro, que não está superlotado, que é limpo, que tem
disciplina - por mais que haja imposição de regras, as presas cumprem. E, ainda, assim a
diretora reconhece que, como ela mesma diz, “aqui é um lugar que a sociedade não quer saber,
a gente tenta resgatar a dignidade delas, promovemos algumas ações, cursos, implementação
de novos projetos”.
Não sem razão, ao falarmos da prisão falamos de uma arquitetura invisível, os presos são
figuras vistas como indesejáveis, todavia, falamos de gente que é fruto de uma sociedade
indigente que subtrai da maioria o direito de ser.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil foi marcado historicamente por punições cruéis, assim como aquelas que ocorreram
na Europa; o país, também, recebeu influências do Iluminismo que contrariava o cruel direito
penal existente pelas Ordenações Afonsinas.
Apenas com a vinda da família real para o Brasil e a separação do Brasil - colônia e com
a criação da primeira Constituição, em 1824, que se criaram maiores condições para uma
legislação penal mais humana.
Mesmo com a influência do Iluminismo na criação do Código Penal Brasileiro e com a
criação das primeiras casas de correção no Rio de Janeiro, as prisões estavam muito longe de
atender às exigências previstas em lei. Já em 1840 havia a superlotação das celas.
Este mesmo quadro vem se repetindo no atual sistema penitenciário brasileiro,
consequentemente, proporcionando o aumento da massa carcerária, pois não há uma política
de contenção e, sim, de perpetuação.
Os presídios são locais de onde a sociedade quer distância, os muros são altos, não se
abrem as portas e pouco se sabe da realidade do sistema.
Justamente por esse motivo, foi feita a pesquisa para observar as práticas da escola
prisional como uma das formas de ressocialização da pessoa restrita de liberdade, pois o preso
merece assistência, sendo dever do Estado prevenir o crime e reorientá-lo para o retorno da
vida em sociedade.
Infelizmente, a conclusão que se chega é que o preso está enraizado em um ciclo vicioso,
pois já pertence a uma classe social desfavorecida das demais, com poucas condições de vida
digna, sem direito a saúde, educação, trabalho formal e lazer, muitos acabam se rendendo a
vida do crime, onde o dinheiro chega fácil e rápido, mas também não traz futuro, até porque,
rapidamente são interrompidos com a prisão, quando não pela morte.
Na prisão, a situação é pior ou igual a vida que se vivia socialmente, sem expectativa de
futuro. Assim que ganha a liberdade, a situação volta a ser a mesma antes de ser preso, o que
faz com que muitos retornem à vida do crime.
Por isso a escola e as demais forças no contexto prisional devem contribuir para a
ressocialização da pessoa privativa de liberdade, sendo extremamente importante para a
ressignificação de uma nova identidade que seja capaz de restaurar a autoconfiança e os valores
éticos e morais esquecidos ou apagados.
Sabemos que hoje a situação carcerária no Brasil é falida, parece que nunca foi pensada
para dar certo, principalmente, pela sua arquitetura e a massa de pessoas que entra no sistema
a cada dia, sobrecarregando os espaços das celas.
Não podemos mudar essa realidade e nem fugir dela, mas é preciso buscar caminhos para
repensar a instituição penal que temos e a que teremos no futuro.
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em 05/06/2018 às 22:20
CENTRO UNIVERSITÁRIO LA SALLE DO RIO DE JANEIRO
Unilasalle- RJ
CURSO DE DIREITO
A EDUCAÇÃO COMO UMA DAS FORMAS DE RESSOCIALIZAÇÃO
DA PESSOA PRIVATIVA DE LIBERDADE
LAURA MARCONI DA SILVA PEREIRA
NITERÓI – RJ
2017
LAURA MARCONI PEREIRA
A EDUCAÇÃO COMO UMA DAS FORMAS DE RESSOCIALIZAÇÃO
DA PESSOA PRIVATIVA DE LIBERDADE
Monografia apresentada ao Curso de Direito
da Unilasalle como requisito parcial para
obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientadora: Profª Drª: Helenice Pereira Sardenberg
NITERÓI-RJ
2017
LAURA MARCONI DA SILVAPEREIRA
A EDUCAÇÃO COMO UMA DAS FORMAS DE RESSOCIALIZAÇÃO
DA PESSOA PRIVATIVA DE LIBERDADE
Monografia apresentada ao Curso de Direito
da Unilasalle como requisito parcial para
obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Aprovada em:
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________
Profª. Orientadora Drª. Helenice Pereira Sardenberg
_______________________________________________________
Profª.
_______________________________________________________
Prof.
NITERÓI-RJ
2017
Não será preferível corrigir, recuperar e
educar um Ser Humano do que cortar-lhe a
cabeça?
Fedor Dostoievsky (1821-1881)
“Se os governantes não construírem escolas,
em 20 anos faltará dinheiro para construir
presídios”.
Darcy Ribeiro (1922-1997)
Dedico este trabalho à minha mãe e minha avó
que me dão o maior e puro amor, que são o
meu escudo, que nunca mediram esforços para
me ajudar e sempre estão ao meu lado para me
reerguer e mostrar mais uma vez que vale a
pena tentar de novo. E a todas as mulheres
presas do Presídio Nelson Hungria, que me
ajudaram a construir este trabalho.
5
Agradeço ao Universo por conspirar positivamente em minha vida, por me fazer uma
mulher centrada, batalhadora e capaz de consquistar meus objetivos.
Agradeço a minha família, por estarem ao meu lado, se preocupando com o meu bem-
estar, por aceitarem as minhas ausências, serem compreensiveis nos momentos de desespero
em dias de fracaços.
Agradeço a todos meus professores da graduação de Pedagogia na Universidade do
Estado do Rio de Janeiro, que me ensinaram sobre a importancia do papel da educação na
sociedade. Deixando-me um importante legado para sempre agregar valores e auxiliar
positivamente na construção da educação do nosso país.
Agradeço igualmente a todos meus professores da graduação de Direito da
Universidade Unilasalle/RJ, por construirem um saber em mim sobre as diversas áreas do
Direito. Por me ensinarem que sempre devemos ser pessoas justas, verdadeiras e éticas na
nossa profissão. Nem sempre iremos ganhar, mas a vida é assim, um dia ganhamos e em outro
perdemos. Devo estar em busca da justiça.
Agradeço especialmente a minha professora orintadora Drª Helenice Sardemberg, por
ter paciencia na minha orientação, pelas conversas e todo apoio recebido na elaboração deste
presente trabalho.
Agradeço aos meus amigos por me apoiarem, por terem me dado força no dia a dia, por
aceitarem algumas vezes o meu mau humor e por muitas vezes transformarem meu dia em um
ótimo dia! Voces foram e são essenciais na minha vida!
Agradeço também aqueles que de alguma forma me desanimaram com a minha
pesquisa de campo, que falaram para desistir, que não me encorajaram a entrar em um
presídio sozinha e longe de casa, vocês me deram mais força ainda para continuar no meu
objetivo e a cada vez me tornar uma pessoa melhor. Que toda inveja e energia negativa
despejada retornem em forma de amor!
6
RESUMO
Este presente trabalho tem o objetivo de mostrar as influencias iluministas no processo
de humanização das penas ocorridos na Europa e no Brasil, e como esse movimento
influenciou na criação do sistema punitivo até os dias de hoje, principalmente sobre a atual
situação das prisões no Brasil. Desde o século XVIII, já havia críticas as primeiras
carcerágens, pois não obedeciam as regras constitucionais estabelecidas. Atavés de um
levantamento de dados é possível constatar que o sistema penal brasileiro ainda segue as
matrizes deixas do século XVIII, visto que até hoje, não observava as garantias previstas na
Constituição e nos demais ordenamentos jurídicos. Buscando trazer condições dignas de vida
no cumprimento da pena e para auxiliar a pessoa privativa de liberdade no processo de
ressocialização, a educação prisional se apresenta como uma forte influencia em trazer mais
humanidade dentro da prisão. A educação busca trazer uma nova identidade ressignificada,
restaurando a autoconfiança e valores éticos e morais do preso.
Palavras-chaves: Humanização das penas. Educação Prisional. Ressocialização da pessoa
privativa de liberdade.
7
ABSTRACT
This work has the purpose to show the illuminist influence on the humanization process
of the sentences occurred in Europe and Brazil, and how this movement influenced the
creation of a punitive system untill today, especially in the current prison situation in Brazil.
Since the eighteenth century, there were bad reviews about the first prisons for not following
the contitutional laws estabilished at that time. Through some research is possible to verify
that the brazilian penal system is still following the same rules as if it was the eighteenth
century, since there are no guarantees that their contitutional rights will be assure. To look for
better conditions to the condemned in their sentences and to assist them in the process of
resocialization, the prisional education presents it self as a Strong influence to bring more
humanity into prison. The education tries to bring a new identity, restoring the self esteem,
ethical and moral values of the prisoner.
Keyworlds: Humanizationof the sentences. Prision education. Resocialization the person
deprived of liberty.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................9
CAPÍTULO 1. O processo de humanização das penas na Europa e no Brasil. ...13
1.1 As prisões na Europa...........................................................................................13
1.2 As prisões no Brasil..............................................................................................17
CAPÍTULO 2. Quadro geral do sistema penitenciário. ........................................21
2.1 O Sistema Penal e as mulheres. ..........................................................................24
2.2 O sistema penal no Estado do Rio de Janeiro. ..................................................27
CAPÍTULO 3. Uma breve reflexão sobre o sentido da educação nos presídios. ..29
3.1 Educação nas prisões: previsão legal. .................................................................29
3.2 A pesquisa. ...........................................................................................................31
3.2.1 A função da escola no ambiente privativo de liberdade. ...............................34
3.2.2 Entrevistas e rodas de conversas. ....................................................................35
CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................39
REFERENCIA.............................................................................................................40
9
INTRODUÇÃO
A Carta Magna instituída, em 1988, preconizou o novo projeto político societário
hegemônico, no Brasil, um Estado Desenvolvimentista, caracterizado por valorizar os direitos
societários com forte intervenção do Estado a fim de garantir um desenvolvimento
econômico. É nesse contexto pós-ditatorial que os direitos fundamentais são garantidos
constitucionalmente, com conquistas no campo das liberdades individuais, nos direitos de
natureza social e política. Revelando-se assim, mais humanista.
Uma das garantias não diferente das demais conquistadas, em grau de importância, foi a
educação, que se consolida na Constituição Federal, de 1988, quando fala dos direitos sociais,
especificamente, no artigo 6º. Tornando a educação um direito assegurado a todos, inclusive,
aos que se encontram em situação privativa de liberdade, no caso, os presidiários.
Além da nossa Constituição, no ordenamento jurídico, tem-se o Código Penal, o Código
de Processo Penal e a Lei de Execuções Penais (LEP) que tratam dos crimes e cada tipo de
infração, a trajetória na Justiça e as circunstâncias em que o apenado irá cumprir a pena.
Neste trabalho, iremos focar nos objetivos traçados e estabelecidas pela LEP por se
tratar de uma lei que visa as condições do indivíduo privativo de liberdade dentro das
instituições carcerárias, e, especificamente, no que trata a educação para essa população.
Segundo a LEP, todos os presos condenados no Brasil deveriam ter iguais
oportunidades de trabalho, educação e treinamento profissional. Embora haja um dispositivo
que declare expressamente esta norma, apenas uma reduzida parte dos presos tem
oportunidade de estudar, trabalhar e se aperfeiçoar. Esse fato fere, claramente, o objetivo que
a lei propõe da reintegração que deve ser feita com a educação e o trabalho, visto que há um
benefício legal da redução das penas, pois para cada três dias estudados e/ou trabalhados,
reduz um dia da pena e, consequentemente, o livramento condicional. A carência desses
meios contribui, também, para a perpetuação da superlotação, pois retarda a saída dos presos
do sistema prisional.
Com isso, é de fundamental importância uma intervenção pedagógica educacional1,
visando uma reeducação do sujeito para que possa melhor compreender novas formas de se
1"A intervenção pedagógica é uma interferência que um profissional, tanto o educador quanto o psicopedagogo,
faz sobre o processo de desenvolvimento ou aprendizagem do sujeito, o qual no momento apresenta problemas
de aprendizagem. Entende-se que na intervenção o procedimento adotado interfere no processo, com o objetivo
de compreendê-lo, explicitá-lo ou corrigi-lo. É preciso introduzir novos elementos para que o sujeito, pense,
elabore de uma forma diferenciada, quebrando padrões anteriores de relacionamento com o mundo das pessoas
das ideias." por COLUNISTA PORTAL - EDUCAÇÃO
10
relacionar com o mundo, fornecendo elementos para quebrar os antigos padrões da vida que
tinham.
Desta forma, este trabalho faz um levantamento de dados e informações sobre as prisões
de modo geral, considerando a importância e a urgência sobre a realidade prisional brasileira
que se distancia das políticas educacionais de abrangência dentro das prisões, buscou-se
desenvolver uma pesquisa quanto às práticas educacionais, uma vez que a pena tem um papel
não só punitivo, mas pedagógico também, a fim de proporcionar condições para que o
indivíduo retorne à sociedade e não pratique mais crimes.
A escolha do tema se deu por ser uma questão social, tendo em vista que é um grande
tabu, para a maioria da sociedade, o sistema carcerário, pois envolve os sentimentos mais
profundos do ser humano, se expressando, principalmente, na vingança que a sociedade nutre
por aqueles que não cumpriram as regras do contrato social2 e por isso cumprem pena nas
prisões.
Dar educaçãoa um preso enquanto muitas crianças e jovens não têm acesso e condições
de frequentar uma escola, pode até trazer um pouco de controvérsia. Contudo, por que não dar
educação a um preso? Seráque o preso não se ressocializaria mais facilmente?
Logo, o presente trabalho pretende mostrar que a educação é capaz de mudar, e muito, a
vida de quem está privativo de liberdade, independente do crime que tenha praticado e para os
que já estão na reincidência, a educação é, sim, a saída para que não voltem a cometer mais
crimes.
A abordagem desse tema traz grande divergência nas diferentes camadas sociais, há
quem diga que a educação é papel fundamental na ressocialização do preso para que,
futuramente, quando estiver em liberdade ter chances de buscar um trabalho digno e
assalariado. Há quem diga que preso não tem direito de estudar, tem que cumprir a pena sem
gerar mais gastos públicos com escolas prisionais e trabalhar, sim, dentro da unidade prisional
para pagar os seus gastos. Grande parte dessa ideologia é transmitida através dos meios de
comunicação, a mídia sensacionalista, principalmente, os telejornais, programas que se
intitulam como jornais e fornecem à população que assiste apologia à violência policial,
abrindo espaço para o discurso de que "bandido bom é bandido morto", ou seja, são
https://www.portaleducacao.com.br/pedagogia/artigos/45449/o-que-sao-intervencoes-pedagogicas - acessado
em 10/11/2016 às 22:49 2ROUSSEAU, J. J. O Contrato Social/Jean-Jaques Rousseau. p. 20-22. O termo contrato social apresentado
está relacionado a interpretação de Jean-Jacques Rousseau , sobre o contrato que a sociedade cria em conjunto,
respeitando as leis a fim de afastar as desigualdades e injustiças, visando o bem-estar social da população.
11
responsáveis em grande parte pela manutenção da ignorância da população sobre o sistema
carcerário e os diversos assuntos relacionados a esse tema.
Analisando a questão da educação prisional pode-se observar uma grande porcentagem
de pessoas que não voltam a reincidir na vida do crime, confirmando o papel da educação
como transformadora na vida de qualquer pessoa, independente da condição que se encontra.
A educação é capaz de abrir caminhos antes jamais percorridos e planejados por pessoas
privativas de liberdade, e isto se concretiza quando eles se veem dentro de uma unidade
prisional e ao mesmo tempo estudando. Possibilitando-os a construir um novo caminho de
vida.
Diante do exposto, destaca-se que o principal referencial teórico da pesquisa é Foucault
(2014), com sua discussão sobre a relação entre o poder e o saber e como eles são usados
como forma de controle social, por meio de instituições. Além deste autor, far-se-á importante
refletir o que falam Elionaldo Julião (2012), pois que aborda a temática de jovens e adultos
privativos de liberdade no contexto educacional; Cláudio Prado do Amaral (2016), Chiaverini
(2009) e Paulo Freire (2013).
O presente trabalho tem por finalidade compreender a prática pedagógica das escolas
prisionais com os alunos e os demais profissionais da educação em seu caráter eficiente e
eficaz como uma das formas de ressocialização do preso.
Sendo analisada a atuação dos profissionais, segundo documentos que lhes dão base
para reconhecer os indivíduos privados de liberdade como sujeitos de direitos às ações e
políticas educacionais que levam em consideração a diversidade e a inclusão, através de uma
pesquisa bibliográfica e de campo, de cunho descritivo, cujo o método observacional,
analisou o ambiente de uma escola prisional e as suas práticas pedagógicas; a atuação dos
professores com seus alunos e do diretor com seus professores e coordenadores, inclusive, das
presas com as demais presas.
Foi feito levantamento de alguns documentos que norteiam a educação em geral, os
Pareceres, as Diretrizes, os Parâmetros Curriculares e o Projeto Político Pedagógico, (PPP). E
de forma mais estrita o currículo dessas escolas prisionais pela Diretrizes Nacionais para a
oferta de educação nos estabelecimentos penais e a Diretoria Especial de Unidades Escolares
Prisionais e Sócioeducativas (DIESP) que é a divisão das escolas prisionais, onde se definem
metas, diretrizes e dinâmicas no desenvolvimento da educação, por intermédio de programas
e projetos que estabeleçam uma política administrativa que atenda as especificidades das
Unidades Escolares Prisionais e Socioeducativas, zelando pelo cumprimento da legislação em
12
vigor, em consonância com a política educacional promovida pela Secretaria de Educação do
Estado do Rio de Janeiro.
Importante se fez, também, trabalhar com as leis que asseguram os direitos ao apenado
estudar, como a Constituição Federal de 1988, a Lei de Execuções Penais, LEP, e a
Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH).
O primeiro capítulo do presente trabalho irá abordar fatos históricos ocorridos a partir
do processo de humanização das penas do século XVIII na Europa, e como esse processo de
humanização das penas ocorreu no Brasil. Ambos tiveram forte influência do iluminismo com
uma justificativa o estopim da crueldade do sistema punitivo.
O segundo capítulo foi feito a partir de um levantamento de dados sobre o atual sistema
prisional do nosso país. Foram levantados diversos dados sobre a prisão de forma geral, a
prisão masculina e a prisão feminina. Os dados coletados são alarmantes e demonstram a
emergência em buscar novas formas de contenção da quantidade de massa de pessoas que
entram no sistema penitenciário a cada dia.
O terceiro capítulo irá abordar a educação prisional como uma das formas de
ressocialização da pessoa privativa de liberdade. Devido ao enorme contingente de pessoas
encarceradas nos estabelecimentos penais no Brasil, devem ser ofertadas possibilidades para a
pessoa presa buscar uma nova condição de vida quando ganhar a liberdade. A educação é uma
dessas formas, pois é capaz de construir uma nova identidade no preso através da restauração
de valores éticos e morais. Criando laços desprovidos de ameaças, ódios, vinganças, é um
local que busca construir pessoas melhores para retornarem a sociedade fora da vida do crime.
13
CAPÍTULO 1. O PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO DAS PENAS NA EUROPA E NO
BRASIL
1.1 As prisões na Europa
A pena privativa de liberdade e o sistema penal contemporâneo apontam historicamente
as transformações sociais, econômicas e políticas que deram origem a sociedade capitalista na
qual vivemos hoje. Inicialmente, o processo de industrialização ocorrido no século XVIII, na
Europa, gerou grande impacto na transação do sistema feudal pelo de produção capitalista,
com um forte aumento do comércio, crescimento das cidades e das populações,
desenvolvimento de manufaturas, entre outros, marcando a revolução social que substituiu o
modelo de produção e introduziu novos atores na cena política até então vigente.
Podemos fazer uma rápida observação ocorrida neste período, pois segundo Foucault
(2014), a substituição da mão de obra humana pelo maquinário, alterou não só os meios de
produção, mas as relações sociais também. As novas formas de organização social são
representadas pela lógica do capital, do lucro, com o intuito de produzir maior riqueza.
Consequentemente, a substituição da mão de obra gerou um grande número de
desempregados e pessoas expulsas de suas terras, sem lugar digno de moradia. Por conta
disso, parte dessas pessoas passavam a mendigar e a viver de pequenos furtos, aumentando a
criminalidade moderna.
No início do século XVIII, as punições feitas contra as pessoas que entravam para a
criminalidade eram demasiadamente severas, era a era dos "espetáculos punitivos", quanto
mais fosse dolorosa e perfeita a execução do condenado, maior a euforia e aplausos à morte
espetacular. As formas cruéis de punição eram um instrumento político para gerar dominação
e intimidação a toda população. Ainda, havia a vingança do soberano em defesa da sociedade
contra aqueles que praticavam os crimes.
As atrocidades que eram "espetáculos punitivos" podem ser compreendidas como um
ritual político, mesmo que de um modo menor, são formas pelas quais se manifesta o poder.
De acordo com o sistema punitivo do Absolutismo, além da infração cometida produzir um
dano, prejudica também o direito de quem faz a lei. Para Foucault (2014), além do crime
atacar a vítima, ataca o soberano, pois, a lei é a vontade do soberano, é a força do príncipe.
A atrocidade que paira sobre o suplício desempenha portanto um duplo
papel: sendo princípio da comunicação do crime com a pena, ela é por outro
14
lado a exasperação do castigo em relação ao crime. Realiza ao mesmo tempo
a ostentação da verdade e do poder; é o ritual do inquérito que termina a
cerimônia onde triunfa o soberano. (p. 57).
O sistema penal começa a entrar em colapso com as novas ideias iluministas que iam
surgindo e com a decadência do Absolutismo. Segundo Chiaverini (2009), alguns fatores
favoreceram essa mudança, como, o fato dos suplícios, embora cruéis, não conseguirem
conter o aumento da criminalidade; a necessidade da força de trabalho nas indústrias; a
economia da Europa que precisava desenvolver o capitalismo, visto que, em dias de suplícios,
os trabalhadores interrompiam seus trabalhos para assistirem ao espetáculo, aumentando,
inclusive, os crimes de roubo e furto nos dias das cerimônias. Como relata Foucault (2014):
O pavor dos suplícios na realidade acendia focos de ilegalismo: nos dias de
execução o trabalho era interrompido, as tavernas ficavam cheias, lançavam-
se injúrias ou pedras ao carrasco, aos policiais e aos soldados; procurava-se
apossar do condenado, para salvá-lo ou para melhor matá-lo; brigava-se, e os
ladrões não tinham ocasião melhor que o aperto e a curiosidade em torno do
cadafalso. (p. 63).
No final do século XVIII e início do século XIX, as cerimônias das punições cruéis,
começam a desaparecer, aflorarando pensamentos sobre o "revisionismo" do sistema penal,
com base em ideias teleológicas e humanísticas. Essas ideias começam a ser repensadas por
alguns fatores. Foucault (2014) aponta que o Estado via a necessidade de uma nova estratégia
no poder de punir, de acordo com a "nova economia" que se instaurava e precisava
estabelecer as finalidades economicistas na Europa.
Amaral (2016) dispõe, em contrapartida, que alguns críticos afirmam que a raiz da
reforma humanista no sistema penal se deve ao ideário cristão de forçar o condenado a
repensar o ato que praticou e proporcionar seu arrependimento, através do encarceramento.
Defendiam que ao invés de punir o corpo do condenado, deveria punir sua "alma".
Contudo, a ideia de Foucault (2014), faz maior sentido se observamos que a tática era
buscar “lucrar” de alguma forma com a prisão. Apenas a morte do condenado não era possível
para movimentar a economia do capital.
O verdadeiro objetivo da reforma, e isso desde as suas formulações mais
gerais, não é tanto fundar um direito de punir a partir de princípios mais
equitativos; mas estabelecer uma nova "economia" do poder de castigar,
assegurar melhor distribuição dele, fazer com que não fique concentrado
demais em alguns pontos privilegiados (...), que possam ser exercidos em
toda parte, de maneira contínua e até o mais fino grão do corpo social.
(FOUCAULT, 2014, p. 80).
15
Ele ainda completa, dizendo que “Diminuir seu custo econômico e político aumenta a
eficácia, muntiplicando seus circuitos. Em resumo, construir uma nova economia e uma nova
tecnologia do poder de punir: tais são sem dúvida as razões de ser essenciais da reforma penal
no século XVII”. (Ibidem)
Portanto, a reforma penal deve ser entendida como uma estratégia do poder de punir de
forma mais regular, mais eficaz em seus efeitos, principalmente, diminuindo seu custo
econômico e seu custo político.
Segundo Chiaverini (2009), a Europa passava por um momento de queda demográfica
em função das guerras religiosas e dos conflitos internos de alguns países. E ao mesmo
tempo, com algumas conquistas das colônias de exploração como nas regiões da África, da
Ásia e da América - importando matérias-primas para a industrialização – o que gerou
prosperidade e desenvolvimento para os centros urbanos, aumentando a necessidade de mão-
de-obra para a quantidade de oferta de trabalho que surgia.
A Idade Moderna teve, como um de seus méritos, a humanização da pena, o processo
industrializador trouxe a necessidade de racionalizar o novo mercado que estava em
formação. Havia a preocupação com a nova forma de dominação e disciplina voltadas a
socializar a produção e criar uma força de trabalho perfeitamente moldada e regulada.
Segundo Chiaverini (2009),
[...] a principal preocupação continuava a ser a necessidade de uma grande
reserva de força de trabalho para o crescimento continuado da indústria. Era
interesse comum do governo e dos donos dos meios de produção a existência
de força de trabalho a baixo custo e uma legislação definindo regras para o
trabalho nas fábricas. (p. 83).
A Inglaterra foi o primeiro país a presenciar a queda do absolutismo com a revolução
industrial. O capitalismo era o sistema que mais tinha poder para influenciar as decisões
políticas e econômicas da Europa.
Havia uma preocupação com os mendigos, ociosos, vagabundos e os ladrões de
pequenos furtos, pois a Europa passava por transformações sociais, políticas e econômicas
devido à guerras religiosas, doenças devastadoras e pobreza, não existindo mão-de-obra para
executarem o novo modelo que vinha surgindo. Com isso, começaram a desenvolver ao
máximo as “casas de correção”, que ofereciam trabalho aos desempregados ou obrigava a
trabalhar quem oferecia resistência.
16
Segundo Chiaverini (2009), as “houses of correction” ou “workhouses”, primeiro,
surgiram na Inglaterra, em 1555, e ofereciam trabalho em péssimas condições, com o objetivo
claro de explorar a força de trabalho dos trabalhadores. A ideia era transformar a força de
trabalho dos indesejáveis, tornando-a socialmente útil. Os prisioneiros adquiriam novos
hábitos para a produção industrial, o trabalho profissional era elevado e exigido a exaustão.
Rusche e Kirchheimer (2004), apontam que os prisioneiros, muitas vezes, eram
demandados a continuar trabalhando por um longo período, depois de concluído o
treinamento, para poder pagar os custos da manutenção e da educação que receberam, isto
feito como uma forma de garantir ao máximo o sucesso financeiro da casa de correção.
Juntamente com as casas de correção, havia as galés que tinham como objetivo único a
exploração do trabalho humano com as condições mais baratas possíveis. Como explica
Rusche e Kirchheimer (2004, p.85), “O que é significativo no uso das galés como método de
punição é o fato de ser uma iniciativa calcada em interesses somente econômicos e não
penais”.
As galés forneciam homens para a formação de tripulação de remadores,
principalmente, em países onde havia a expansão marítima e a sentença mínima para as galés
era de 10 anos, o que nem sempre se cumpria, devido as mínimas condições existenciais,
sendo assim, muitos não sobreviviam para ganhar a liberdade.
Desta forma, começam a surgir alguns focos de luz na sociedade sobre a eficácia da
forma de punição que os vagabundos, as prostitutas, os vagos, os criminosos de pequenos e
grandes furtos e roubos, os homicidas, os órfãos, os loucos, recebiam sem alguma distinção.
Pois não havia uma separação nas casas de correção ou nas galés para o tipo de crime ou com
sentença diferenciada. Todos eram colocados nas galés para terem a sua força de trabalho
explorada.
De acordo com Krohne (1889), citado por Rusche e Kirchheimer (2004, p.109), não
havia como diferenciar o propósito e a natureza do cárcere sobre o encarceramento de todos
que eram considerados indesejáveis, das pessoas que não contribuíam para o crescimento da
economia. Não havia critérios na aplicação das sentenças, muitas eram consideravelmente
pequenas, mas a maioria era absurdamente grande.
Não sem razão, muitos filósofos começaram, à época, a buscar no estudo sobre a prisão,
as diferentes formas de encarceramento, como: Beccaria (1738- 1774), Voltaire (1694-1778),
Montesquieu (1689-1755), Jeremy Benthan (1748- 1832), John Howard (1725- 1790), entre
17
outros. Apesar de não terem vivido no mesmo período de tempo, conheceram as casas de
correção e as galés, que foram criadas.
A afirmação de Chiaverini (2009) está correta ao apontar que o iluminismo não foi o
responsável pela criação das prisões modernas, mas foi a mola propulsora, que finalizou esse
capítulo da história, ao combater as penas cruéis e trazer a realidade da situação que acontecia
na Europa - enfraquecimento da questão econômica das instituições, devido a consolidação do
capitalismo e a não necessidade de intimidar e disciplinar os trabalhadores. O iluminismo
contribuiu então, para a manutenção da prisão e impediu o retrocesso às penas cruéis.
A partir de agora iremos fazer um novo recorte na história, e vamos observar o início da
pena de prisão no Brasil a partir da Constituição de 1824.
1.2 As prisões no Brasil
Para pensarmos historicamente o processo de humanização das penas no Brasil,
devemos nos remeter a chegada dos portugueses que trouxeram as Ordenações Afonsinas,
vigentes em Portugal, com a chegada, logo após o descobrimento, de outras ordenações.
Todas, entretanto eram marcadas por formas cruéis de punição, bem como pela pena de
morte.
Para Amaral (2016), deve ser feita reflexão sobre este período histórico, pois foi
marcado pelo terror. As Ordenações sofreram forte influência do direito romano e canônico e
seus "delitos mais graves eram aqueles que atacavam a religiosidade, o Reino e os bons
costumes" (p. 65). A pena de prisão raramente era usada. Eram priorizadas as punições cruéis
e a pena de morte, que eram "frequentes nas previsões normativas como a aplicação e
execução" (Amaral, p.66).
As formas bárbaras de executar os corpos com degolação, açoitamento em pelourinho,
corte multilateral de braços, pernas, mãos, dedos, orelhas, extração de olhos, torturas, servia
de intimidação e imposição pelo sangue, através da dor física e moral, para aqueles que
ousassem pensar em violar a ordem estabelecida.
Segundo Amaral (2016), a primeira representação do direito penal, neste período, foi
em 1643, com as Ordenações Filipinas. O Livro V, das Ordenações Filipinas abordava o
sistema penal e previa a aplicação das penas desproporcionais aos delitos cometidos, a
crueldade e a injustiça e a perpetuação da pena de morte, mais comum do que a pena de
prisão.
18
Assim como ocorreu na Europa, o Brasil foi fortemente influenciado pelo movimento
iluminista, contrariando o desproporcional, cruel e sanguinário "direito penal" existente.
Especialmente, após a chegada da família real em 1808, a separação política do Brasil-colônia
de Portugal, em 1822, e com a primeira Constituição Brasileira, em 1824, criaram-se maiores
condições para a criação de uma legislação penal mais humana.
Em 1830, nasceu o Código Criminal que seguiu as linhas humanas que a Constituição
de 1824 afirmava, como diz no "TITULO 8º - Das Disposições Geraes, e Garantias dos
Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros.", o art. 179 e os incisos XVIII E XIX
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos
Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a
propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira
seguinte.
XVIII. Organizar–se-ha quanto antes um Codigo Civil, e Criminal, fundado
nas solidas bases da Justiça, e Equidade.
XIX. Desde já ficam abolidos os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e
todas as mais penas crueis3.
Pode-se observar, desta forma, a influência do Iluminismo no Brasil. A Constituição
estabeleceu que o código penal devevia ser criado com base na justiça e na igualdade, com as
penas cruéis sendo abolidas. Apesar das novidades, a pena de morte ainda se fazia presente.
O inciso XXI diz: “As Cadêas serão seguras, limpas, bem arejadas, havendo diversas
casas para separação dos Réos, conforme suas circumstancias, e natureza dos seus crimes".
Logo, a Constituição, de 1824, apresentava, pelo menos, proposta de dignidade humana.
Havia uma preocupação quanto a sua integridade física e a saúde do preso e, também,
assegurava que os "réus" deveriam ficar separados conforme a gravidade dos seus delitos. Já
se pensava em não se "misturar" os réus, isto é, os primários e/ou pouco violentos com os
reincidentes e mais violentos.
O Código Criminal também trouxe novas formas de prisão: a prisão simples e a prisão
com trabalho que poderia ser perpétua. Como diz no Título II - Das Penas
Art. 34. A tentativa, a que não estiver imposta pena especial, será punida
com as mesmas penas do crime, menos a terça parte em cada um dos gráos.
Se a pena fôr de morte, impôr-se-ha ao culpado de tentativa no mesmo gráo
a de galés perpetuas. Se fôr de galés perpetuas, ou de prisão perpetua com
trabalho, ou sem elle, impor-se-ha a de galés por vinte annos, ou de prisão
com trabalho, ou sem elle por vinte annos. Se fôr de banimento, impôr-se-ha
a de desterro para fóra do Imperio por vinte annos. Se fôr de degredo, ou de
desterro perpetuo, impôr-se-ha a de degredo, ou desterro por vinte annos.
3Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm - acessado em 29/10/2017
às 19:09.
19
Segundo Engbruch e Morais di Santis (2012), o próprio Código já apresentava uma
alternativa de prisão, quando não fosse possível a prisão nas condições previstas em lei, como
diz o art 49:
Emquanto se não estabelecerem as prisões com as commodidades, e arranjos
necessarios para o trabalho dos réos, as penas de prisão com trabalho serão
substituidas pela de prisão simples, acrescentando-se em tal caso á esta mais
a sexta parte do tempo, por que aquellas deveriam impôr-se.
Infelizmente, o previsto expresso na lei não se realizava na prática, mesmo a
Constituição de 1824 “garantindo” prisões arejadas e com boa higiene, havia
incompatibilidade de adequação dos prédios prisionais, além disso, certos Municípios não
tinham sequer prisão.
As Câmaras Municipais foram criadas em 1º de outubro de 1828, por D. Pedro I, entre
as diversas atribuições estabelecidas, destaca-se o art 56, pois este indica que deverá haver
uma comissão para realizar visitas periódicas às prisões relatando tudo o que for visto.
Art. 56. Em cada reunião, nomearão uma commissão de cidadãos probos, de
cinco pelo menos, a quem encarregarão a visita das prisões civis, militares, e
ecclesiasticas, dos carceres dos conventos dos regulares, e de todos os
estabelecimentos publicos de caridade para informarem do seu estado, e dos
melhoramentos, que precisam.
Essas comissões relatavam a realidade lastimável das prisões, como demonstra
Engbruch e Morais di Santis (2012):
Ao descrever o sórdido ambiente, imundo e cheio de fumaça, deixa-se claro
que os presos faziam pequenos objetos (pentes, colheres) com chifres de boi.
Assistência médica precária, alimentação ruim e pouca, mistura de presos
condenados e não condenados, falta de água, acúmulo de lixo fizeram a
comissão concluir que tal era “o miserável estado da Cadea capas de revoltar
ao espírito menos philantropo”.
Em 1850, nasce a primeira Casa de Correção no Rio de Janeiro, de acordo com Pessoa4
(2014), também, era chamada de Casa de Correção da Corte, criada em 6 de julho, pelo
Decreto nº 678, que aprovou o seu primeiro regulamento.
A Casa de Correção tinha o objetivo de executar a pena de prisão com o trabalho, dentro
da própria prisão, como diz o artigo 1º do regulamento. Os presos que chegavam para cumprir
a pena se alocavam em uma das cem celas prontas e outras cem ainda em construção. Dois
anos após as demais celas que foram concluídas, passaram a receber um maior quantitativo de
condenados suprindo a demanda de vagas. (Pessoa, 2014)5.
4
PESSOA, Tomaz de Aquino Gláucia. Casa de Correção. 2014. Disponível em:
<http://linux.an.gov.br/mapa/?p=6333> acessado em 03/11/2017 - às 01:25 5 Ibidem
20
Amaral (2016) afirma que ainda em 1864 - 40 anos de vigência da Constituição - as
prisões estavam muito longe de atender os fins da humanização das penas previstas na
Constituição. E não havia resposta diferente para tal situação: a escassa destinação de recursos
financeiros para adaptação das unidades prisionais através das mudanças trazidas pela
Constituição.
Assim como ocorreu na Europa, o Brasil também passou por um processo de
humanização das penas. O mesmo movimento iluminista que influenciou as penas cruéis que
existiam na Europa, foi trazido para o Brasil para combater as atrocidades que eram feitas
para punir os corpos.
A abolição da escravidão, em 1888, foi um marco importante para diversas alterações
que incidiam no fim do período Imperial. A pena de morte foi expressamente revogada pelo
código penal de 1890 e, posteriormente, em 15 de novembro de 1889 foi proclamada a
República6.
Aspirando aos bons ares que trouxe o iluminismo, no final do século XVIII, o Brasil foi
capaz de estabelecer, na primeira Constituição do país, garantias na forma de punir o réu.
Ainda que de 1824 à 1988 ocorra um longo período, pouco podemos observar na prática a
“humanização das penas”. Há previsão expressa em lei, há quase 200 anos, que marcam o fim
da crueldade na punição do réu, o que hoje ainda ocorre, haja vista as péssimas condições de
encarceramento presente no país. Faz-se necessário, portanto, buscar os antigos ares que
influenciaram nossa primeira Constituição, mas não somente isso, importante por,
efetivamente, em prática todas as ideias que fizeram mudar a forma de punição.
6 Disponível em: Apesar de abolida a pena de morte ainda tem aplicação no Brasil, em casos de crimes
cometidos em tempos de guerra. - http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/01/150117_morte_fd -
acessado em 29/10/2017 às 20:11
21
CAPÍTULO 2 - QUADRO GERAL DO SISTEMA PENITENCIÁRIO
Sabemos que nosso sistema punitivo foi planejado seguindo as matrizes deixadas pelo
patrimonialismo, pela escravidão, pelas penas de torturas, pela exclusão de certas camadas da
sociedade, consagrando um modelo estrutural dos estabelecimentos penais que violam, todo
tempo, os direitos humanos das pessoas privativas de liberdade.
Podemos relembrar que desde o século XVIII, com o processo de humanização das
penas no Brasil, conforme visto no capítulo anterior, já havia críticas ao sistema punitivo
existente naquela época, inclusive, sobre a primeira prisão criada, visto que não observava as
garantias trazidas na Constituição.
Sendo assim, o reconhecimento dessas críticas deve ser usado como força motriz para
buscar novas mudanças no atual sistema penal e inspirar a política penitenciária com novas
alternativas para realinhar as diretrizes antigas e tradicionais.
Dados e informações pertinentes ao quantitativo sobre as prisões no Brasil, com
levantamentos feitos por órgãos governamentais e não governamentais, apontam uma
considerável diferença entre o número de presos de acordo com a metodologia adotada ou a
sua respectiva fonte de informação, mas que se complementam em alguns quesitos.
De acordo com o último relatório produzido pelo Infopen7 - Departamento Nacional
Penitenciário- em 2014 (reflete a coleta realizada na data-base considerada para o respectivo
relatório analítico, junto a gestores de cada unidade prisional, limitando-se apenas às unidades
geridas pelas Secretarias de Administração Penitenciária no Estado (excluindo as carceragens
nas unidades de Polícia Civil), sendo os últimos dados publicados datados de 31 de dezembro
de 2014), o Brasil vem apresentando um aumento na população carcerária, em níveis
preocupantes.
Em relação à taxa de encarceramento geral (número de pessoas presas por
grupo de 100 mil habitantes), o Brasil encontra-se na sexta colocação
mundial, com uma taxa de 306,2 detentos por 100 mil habitantes,
ultrapassada apenas por Ruanda, Rússia, Tailândia, Cuba e Estados Unidos.
Em 2004, a taxa brasileira era de 135 presos por 100 mil habitantes. Se
considerada apenas a taxa de encarceramento feminino, saltou de 13,58 em
2005 para 32,25 detentas por 100 mil habitantes.
O diagnóstico aponta ainda que, se considerado o número de pessoas que
entraram e saíram do sistema penitenciário nacional ao longo de 2014, pelo
menos um milhão de brasileiros vivenciaram a experiência do
encarceramento, no período de um ano8.
7 http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/documentos/infopen_dez14.pdf
8 http://www.justica.gov.br/noticias/populacao-carceraria-brasileira-chega-a-mais-de-622-mil-detentos
22
O Conselho Nacional de Justiça, instituiu o Geopresídios, relatório dinâmico alimentado
mensalmente pelos relatórios de Inspeção, realizado por juízes com competência na área de
execução penal, extraídos do Cadastro Nacional de Inspeções nos Estabelecimentos Penais e
publicados de forma dinâmica, com base no último relatório judicial de inspeção preenchido9.
De acordo com o Geopresídios o Brasil apresenta um quadro de 654.372 pessoas presas,
trazendo um número ainda maior que os dados informados pelo Infopen, 2014.
Nessa mesma linha de pesquisa, a plataforma online World Prison Brief, gerida pelo
Institute for Criminal Policy Research - ICPR, da Escola de Direito da Universidadede
Londres10
, realizou um estudo sobre o aumento da massa carcerária no Brasil estar em
constante crescimento, concluindo que em julho de 2017, já havia 657.680 pessoas privadas
de liberdade nas prisões, um número ainda maior do último dado feito pelo Geopresídios.
Destacou que a capacidade oficial do sistema prisional de vagas é de 393.953 e o nível de
ocupação é de 163,9%, em janeiro de 2017.
De acordo com o Institute for Criminal Policy Research - ICPR, o Brasil já ocupa a
terceira posição no ranking mundial, a China está em segundo lugar com 1.649.804 presos e
em primeiro lugar os Estados Unidos, com 2.145.100 indivíduos presos. O Brasil já ultrapassa
a posição da Rússia.
Pode-se observar que não há como se obter um número preciso sobre o quatitativo de
total de presos nos presídios, visto que há a influência de alguns fatores como, a falta de
informação de algumas unidades prisionais e a grande rotatividade de presos entrando e
saindo diariamente do sistema penal. Por isso os dados aqui apresentados mesclam as fontes
de informações, pois são complementares, sendo capazes de apresentar um maior
esclarecimento ao quadro das pessoas privativas de liberdade.
O Brasil hoje contém 1.424 estabelecimentos penais estaduais e federais, presentes em
todos os 26 Estados e o Distrito Federal, disponibilizando apenas 371.884 vagas e totalizando
um déficit de 250.318 vagas, de acordo com o Infopen, em 2014. Neste contigente, o total de
presos provisórios são de 249.668 pessoas e os presos sem condenação ainda, totalizam
212.224 indivíduos.
Pode-se observar que o número de presos provisórios, 249.668 indivíduos, é quase igual
ao déficit de vagas no sistema, soamando-se 250.318 vagas. Estamos falando de pouco mais
de 40% de 622 mil pessoas, são quase 250 mil pessoas presas antes de serem julgadas em
9http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php e
http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2017/02/b5718a7e7d6f2edee274f93861747304.pdf 10
http://www.prisonstudies.org/country/brazil
23
primeiro grau, sendo que, grande parte dessas pessoas poderia responder em liberdade, como
explica o relatório da pesquisa “A Aplicação de Penas e Medidas Alternativas”, realizada pelo
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, por demanda do DEPEN11
,
É gravíssima a informação de que em 37,2% dos casos pesquisados em que
os réus estiveram presos provisoriamente não houve condenação à prisão ao
final do processo. Projetando esse achado para o gritante número de presos
provisórios no país, que ultrapassou a marca de 240 mil pessoas em
dezembro de 2013, é provável que tenhamos cerca de 90 mil homens e
mulheres encarcerados que, por diversas razões, não serão condenados à
prisão, na maior parte dos casos com sentenças de absolvição ou condenação
a penas alternativas.
Não restam dúvidas que o Brasil vive uma tendência a aumentar sua população
carcerária, a taxa é de mais de 300 presos para cada 100 mil habitantes maiores de 18 anos,
enquanto a taxa mundial de aprisionamento encontra-se no patamar de 144 presos por 100 mil
habitantes12
.
O encarceramento desse enorme contingente de pessoas aponta para uma maioria de
jovens, sendo que 55,07% dos presos têm até 29 anos, representados por uma maioria negra,
isto é, 61,67% da população carcerária é de jovens negros, com alto número
de déficit educacional, pois apenas 9,5% desta população têm o ensino médio completo
(enquanto a média nacional se encontra no patamar de 32%).
O Infopen, 2014 revela que a cada 100 mil homens na população brasileira, acima dos
18 anos, 418,44% estão presos, esse mesmo número em relação às mulheres com a
maioridade atingida são de 43,28% de pessoas. Sendo um total de 612.980 homens presos e
44.700 mulheres presas13
.
O perfil criminal das pessoas privativas de liberdade é caracterizado por alguns fatores
influenciados pela dinâmica criminal, como as alterações na legislação, (dada a importância a
certos crimes), a justiça comum e judiciária - principalmente pelo estereótipo criado em
conjunto com a mídia, pois esta, além de influenciar é, também, tendenciosa contribuindo
fortemente para que a massa telespectadora assimile uma ideia de criminoso que não é muito
comum no sistema prisional. Os casos bárbaros de mortes que proporcionam um grande
número de audiência, como os crimes de homicídios ou os casos de latrocínio, quando são
11
http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/politicas-2/alternativas-penais-anexos/pmas_sum-
executivo-final-ipea_depen-24nov2014.pdf 12
Conforme dados da ICPS - International Centre for Prison Studies 13
http://www.justica.gov.br/noticias/mj-divulgara-novo-relatorio-do-infopen-nesta-terca-feira/relatorio-depen-
versao-web.pdf
24
seguidos de morte, de acordo com os dados do Infopen (2014), juntos representam 13% do
total de crimes cometidos das 622 mil pessoas, o que representam 80.886 pessoas.
As pressuposições feitas da atual situação do sistema penitenciário são de pessoas
pobres, negras e com baixa escolaridade e é, de fato, este o perfil da maioria das pessoas
presas. De acordo com o Infopen (2014), 61,67% dos presos são negros/pretos e pardos,
37,22% são brancos, 0,65% são amarelos, 0,13% são indígenas e 0,32% são outros.
Sobre a escolaridade, os dados informam que os detentos analfabetos, alfabetizados
informalmente, e com o ensino fundamental completo, representam 75,08% da população
prisional, o que revela um número aproximadamente de 467.149 mil pessoas. Enquanto os
detentos com ensino médio completo ou incompleto e ensino superior completo ou
incompleto, revelam um valor numérico de 24,92% de pessoas, representando um número
aproximadamente de 155.052 de pessoas.
A educação básica, que engloba a educação infantil dos quatro anos aos dezessete anos
de idade, desde a pré-escola até o ensino médio, segundo o art 4º, da nº 9.394/96, Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, serve para assegurar que crianças e jovens recebam
uma educação com os padrões mínimos de qualidade de ensino, com os insumos
indispensáveis ao desenvolvimento e ao processo de ensino-aprendizagem.
Priorizar investimentos públicos em educação é de extrema importância para as pessoas
oriundas de extratos sociais desfavorecidos, pois contribui diretamente na diminuição da
pobreza e da criminalidade, visto que manter os jovens na escola, até o término do ensino
fundamental traz uma maior escolaridade e um fator protetivo aos jovens e,
consequentemente, a possível redução da massa carcerária. Hoje, somente, o ensino
fundamental incompleto, sem conclusão, traz uma porcentagem de 49,58% de pessoas
privativas de liberdade.
2.1 O Sistema Penal e as mulheres.
Segundo dados do World Female Imprisonment List, relatório produzido pelo Institute
for Criminal Policy Research da Birkbeck, University of London, o número de mulheres
presas no mundo está aumentando em um ritmo mais acelerado do que os níveis de prisão
masculina. Os casos de aumento aparecem em todos os continentes desenvolvidos e menos
desenvolvidos. De acordo com o último relatório produzido, a população carcerária feminina
é de mais de 714 mil mulheres. Demonstrando um aumento desde 2000 de mais de 50% na
taxa de crescimento.
25
De acordo com o ranking mundial das mulheres presas, os EUA estão em primeiro lugar
(cerca de 211.870), seguido da China (cerca de 107.113 ), Russia (cerca de 48.478), e na
quarta posição, o Brasil (cerca de 44.700).
De acordo com o Infopen – Mulheres (2014), o número de mulheres presas no Brasil
vem aumentando constantemente em relação ao número de presos masculinos. No lapso
temporal de 2000 a 2014, o aumento foi de 567,4%,14
enquanto a média nacional de
crescimento masculino, no mesmo período, foi de 220,20%, refletindo, assim, uma curva
ascendente no encarceramento em massa de mulheres.
Este ritmo acelerado de crescimento da população carcerária masculina e feminina se
contrapõe a tendência mundial dos países que investiram em políticas públicas para diminuir
o encarceramento de massa, como alguns países da Europa.
A cada 100 mil mulheres acima dos 18 anos, há aproximadamente, mais de 36 mulheres
presas. No ranking das Unidades da Federação, São Paulo é o estado com o maior número
absoluto de presos e tem a maior população feminina encarcerada, representando (14.810
mulheres) 39% das mulheres presas no país, de acordo com o Infopen, (2014). Seguido do
Rio de Janeiro, (aproximadamente 4.139 mulheres presas) e de Minas Gerais
(aproximadamente 3.070 mulheres presas)15
.
A prevalência de certos perfis de mulheres encarceradas não se diferencia muito dos
homens presos, a grande maioria é negra e com baixa escolaridade. Os dados feitos pelo
Infopen – Mulheres (2014), abordaram diferentes aspectos das mulheres presas, como: a
natureza da prisão, a raça/cor/ etnia da mulher presa, estado civil, escolaridade e a razão da
sua prisão. O conjunto de dados demonstrando a realidade das mulheres presas, permite
esclarecer as eventuais falhas da política criminal e, também, as políticas públicas, que
poderiam ser mais eficientes e eficazes, proporcionando maiores oportunidades às mulheres
de classe social menos favorecida.
De acordo com o Infopen – Mulheres (Ibidem), as mulheres condenadas com penas de
prisão de até oito anos, representam um número expressivo de 63%. Sendo que 45% das
mulheres cumprem a pena em regime fechado, enquanto aproximadamnete 22% das mulheres
cumprem em regime semiaberto, isto demonstra que a pena de prisão como medida
sansionatória é uma regra e não exceção, inclusive, para os casos de crimes menos graves,
impactando diretamente no total de mulheres encarceradas no Brasil.
14
Segundo dados Ministério da Justiça, a partir de 2005, dados do Infopen/MJ, a população carcerária femenina
era de aproximadamente 5.601 mulheres. Infopen - Mulheres p.10. 15
http://www.justica.gov.br/noticias/estudo-traca-perfil-da-populacao-penitenciaria-feminina-no-brasil/relatorio-
infopen-mulheres.pdf
26
O quadro geral da faixa etária das mulheres presas no Brasil é representado por 50%
com idades entre 18 e 29 anos, e outra grande parcela em destaque é de mulheres entre 30 e
45 anos, representadas por 39% do total de mulheres presas. O perfil etário da maioria das
mulheres privadas de liberdade repete o padrão nacional dos homens também, a maioria é
jovem com idade até 29 anos. Pode-se observar que a idade apresentada é classificada como
um período economicamente ativo da vida, sendo realidade brasileira ter um maior número de
jovens presos. Segundo o Institute for Criminal Policy Research da Birkbeck, University of
London, há uma tendência no Brasil para o crescimento da população carcerária cada vez
mais jovem.
Em relação à raça/cor/etnia das mulheres presas, 68% são negras, 31% são brancas, 1%
amarela. Duas em cada três presas são negras. Os dados levantados não são diferentes em
relação aos homens, que também têm a sua maioria a população maior encarcerada.
Sobre o estado civil das mulheres encarceradas, a maior parte é solteira (57%), e a outra
parte é casada ou possui união estável (35%). Este pode ser um identificador da quantidade de
mulheres presas serem jovens.
Em relação ao grau de escolaridade das mulheres privadas de liberdade, 12% são
analfabetas ou alfabetizadas em cursos regulares, 50% com o Ensino Fundamental
Incompleto, 10% com o Ensino Fundamental Completo, 14% com o Ensino Médio
Incompleto, 11% com Ensino Médio Completo, e apenas 1% tem o Ensino Superior
Completo. Ainda que em níveis baixos, o grau de escolaridade das mulheres em comparação
aos homens encarcerados é um pouco maior.
Em relação à razão dos crimes cometidos pelas mulheres encarceradas, há um grande
destaque para o crime de tráfico, que corresponde ao expressivo número de 68% das mulheres
presas, seguido do crime de furto, com 9% das mulheres presas, crime de roubo com 8% das
mulheres presas, e homicídio com 7% das mulheres presas. Os padrões de criminalidade do
público feminino são bastante distintos em relação ao público masculino. Apenas 26% dos
homens cometerem o crime de tráfico, enquanto esse número chega a 68% com as mulheres.
De acordo com A Rede Justiça Criminal, informativo nº 8, Janeiro de 2016, não há
como negar a relação entre o uso e o comércio de drogas e o quantitativo de mulheres presas.
Em toda a América Latina, mulheres negras, pardas e indígenas, de baixa
escolaridade, chefes de família e sem acesso ao mercado formal de trabalho,
têm se valido do comércio de pequenas quantidades de drogas como
estratégia de complementação de renda e sustento de filhos e familiares
dependentes. Via de regra, a inserção nesse mercado se dá de modo bastante
subalterno e sem vinculação aos altos níveis hierárquicos de tomada de
decisão ou controle financeiro das organizações criminosas. No entanto, a
27
opção política por lidar com o tema das drogas por meio de ações
repressivas e criminalizantes tem como principais vítimas os indivíduos que
desempenham funções de pouca relevância, baixa remuneração e fácil
substituição no mercado transnacional das drogas: exatamente a posição
ocupada pela imensa maioria das mulheres, que cada vez mais são
trancafiadas nas já superlotadas unidades prisionais brasileiras16
.
Os dados aqui apresentados pelo Infopen – Mulheres, julho de 2014, padecem de certos
vícios, como a omissão de informações de certos quesitos, as divergências dos números
apresentados no Infopen, 2014; alguns temas silenciados como, a quantidade de filhos por
mulher presa, o tempo de espera por julgamento. Estes são dados importantes que dificultam
uma maior precisão sobre a situação das mulheres presas.
2.2 O sistema penal no Estado do Rio de Janeiro
De acordo com o CNJ, 201717
, o Rio de Janeiro é o terceiro Estado que mais encarcera no país,
com um total de 50.937 pessoas presas. Neste ranking fica atrás do Estado de Minas Gerais com uma
população total de 67.000 pessoas e do Estado de São Paulo, com o contigente de 233.663 pessoas
presas. Estes três Estados juntos somam metade da população presa nacional. De acordo com os dados
do IBGE (2010)18
, a população do Estado do Rio de Janeiro é de 15.989. pessoas, há uma média,
aproximadamente, de 252 pessoas presas para cada 100 mil habitantes.
Do total de 1.424 estabelecimentos penais no Brasil, 56 deles estão situados no Rio. São três
presídios femininos e cinquenta e três são presídios masculinos19
. Segundo o CNJ (2017), o Estado do
Rio apresenta uma quantidade de 30.196 vagas nos presídios, entretanto a quantidade de presos é de
50.996, o que gera um déficit de 20.947 vagas no sistema carcerário do Rio.
O total de presos provisórios é de 22.876 pessoas, sendo que quase a metade do total de
presos no Estado do Rio, ainda, não recebeu condenação em primeiro grau. O uso da prisão
provisória se tornou abusivo, mais da metade dos presos provisórios estão custodiados há
mais de 90 dias, sem nenhuma previsão de audiência ou sentença próxima (dados coletados a
partir da pesquisa de campo realizada no Presídio Nelson Hungria, o que será pormenorizado
no quarto capítulo).
Este fato está inteiramente ligado a grande demanda de processos penais que o Rio de
Janeiro tem, combinada com a quantidade de profissionais que atuam na área, o que dificulta
16
Disponível em:
http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/02/b948337bc7690673a39cb5cdb10994f8.pdf - acessado em
28/11/2017 às 23:46 17
http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2017/02/b5718a7e7d6f2edee274f93861747304.pdf 18
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rj/panorama 19
http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/gera_relatorio.php?tipo_escolha=comarca&opcao_escolhida=26&tipoVisa
o=presos
28
a celeridade processual e, consequentemente, o aumento de presos provisórios sem audiência
ou sentença em prazo razoável.
As principais características do quadro de pessoas restritas de liberdade que compõem
as prisões, hoje, no Rio de Janeiro, são de maioria negra, solteira, com baixa instrução
escolar, viciados/usuários de drogas, e integrantes de Igreja Evangélica, segundo o Infopen
(2014).
Alguns presídios, no Estado do Rio de Janeiro, são separados por facções, pois há um
grande quantitativo de presos que pertencem a um determinado grupo e, por isso, os internos
não são separados pela gravidade do crime pelo qual respondem, mas, normalmente, pelos
laços firmados, a fidelidade e o pertencimento às facções de origem, por isso não “podem” se
misturar com outras. Caso aconteça, os próprios internos ao perceberem que um dos presos
pertence a uma organização criminosa diferente da sua, impõe a lei da cadeia, espancando
podendo, muitas vezes, levar ao óbito.
De acordo com os dados apresentados podemos observar que os estabelecimentos
penais são uma verdadeira “caixa-preta”. A falta de dados e a dificuldade dos acessos às
unidades prisionais traz uma distância cada vez maior da temática da prisão. Os poucos dados
que se têm, muitas vezes, são inconsistentes, pois algumas unidades deixam de fornecê-los,
além disso, as metodologias adotadas pelos órgãos de pesquisa trazem números diferentes de
cada dado pesquisado.
29
CAPÍTULO 3 - UMA BREVE REFLEXÃO SOBRE O SENTIDO DA EDUCAÇÃO
NOS PRESÍDIOS
Conforme visto no capítulo anterior, o sistema penitenciário brasileiro tem se
apresentado para os governantes como uma verdadeira “caixa preta”. Muito se discute, fazem
levantamento de dados, mas pouco se sabe sobre a realidade do sistema. As penitenciárias são
locais onde portas não se abrem e pouco se sabe para além dos seus muros altos. O que chega
de informação para a população são as destruições de instalações e equipamentos; a morte de
presos e funcionários, quando há motins e rebeliões; as atrocidades que os próprios presos
cometem contra seus pares, por serem de facções rivais; ou, ainda, a intolerância de alguns
crimes, como, recentemente, ocorreu em alguns presídios do Norte e Nordeste do Brasil.
Ao realizar a pesquisa de campo no Presídio Nelson Hungria, no Complexo
Penitenciário de Gericinó, em Bangu, Rio de Janeiro, se teve como objetivo compreender a
relação escolar como uma das formas de ressocialização das presas dentro do sistema
prisional.
Por meio de uma pesquisa de campo, qualitativa e descritiva, analisou-se as
experiências vividas e os conteúdos coletados e observados de um modelo implementado de
educação Prisional, no Estado do Rio de Janeiro, sendo este um “programa de
ressocialização”, conforme previsto na legislação de execução penal.
A pesquisa não se preocupou em saber qual/quais crimes cada interna cometeu e nem
vê-las como “vítimas da sociedade”, pois cada pessoa sabe dos seus motivos e valores, e,
carrega consigo uma história que é particular e que as levou a estarem ali. De modo geral,
pretendeu-se evidenciar nesta pesquisa, através da análise do material empírico coletado,
algumas questões sobre a realidade da vida no cárcere, ressaltando que embora haja a escola,
a Igreja e o trabalho interno no presídio, nada terá eficácia na ressocialização se não partir da
própria presa a vontade e o desejo de mudar de vida.
A presença de escolas prisionais em presídios, no Estado do Rio de Janeiro, vem sendo
executada já há algumas décadas, mas poucos são os dados e as informações sobre o assunto
no Estado, e, principalmente, no país.
3.1 Educação nas prisões: previsão legal.
A educação escolar recebe respaldo em previsões legais nacionais e internacionais. São
executadas, através de políticas públicas implementadas pelos estados e pelo governo, como
explica Oliveira (2012).
30
De acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo 26, todo
ser humano tem direito à instrução. A educação será orientada para conceber “o pleno
desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos
humanos e pelas liberdades fundamentais”.
Segundo a Lei de Execuções Penais nº 7.210/84, os seus artigos 10 e 11, abordam a
assistência ao preso, sendo dever do Estado, com o objetivo de prevenir o crime e orientá-lo
no retorno à sociedade; elenca que a assistência deverá ser material, à saúde, jurídica,
educacional, social e religiosa. Seguindo os direitos e garantias assegurados ao preso, previsto
no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, “é assegurado aos presos o respeito à
integridade física e moral”.
É importante ressaltar que os presos, embora privados de liberdade, mantêm a
titularidade dos demais direitos fundamentais, como é o caso da integridade física, psicológica
e moral.
Ainda assim, no âmbito nacional, a educação escolar prisional é seguida por Pareceres,
como o Parecer CNE/CEB, nº: 4/2010, sobre as Diretrizes Nacionais para a oferta de
educação para jovens e adultos em situação de privação de liberdade, nos estabelecimentos
penais, esclarecendo que a educação nos presídios é considerada como um meio para a
promoção da integração social e aquisição de novos conhecimentos que permitam ao preso
buscar novos caminhos quando saírem da prisão. O papel da educação nos presídios tem
como um de seus principais pilares a reintegração social e o desenvolvimento do potencial
humano, como diz o Parecer CNE/CEB, nº: 4/2010,
Segundo diversos estudiosos do tema, a educação em espaços de privação de
liberdade pode ter principalmente três objetivos imediatos que refletem as
distintas opiniões sobre a finalidade do sistema de justiça penal: (1) manter
os reclusos ocupados de forma proveitosa; (2) melhorar a qualidade de vida
na prisão; e (3) conseguir um resultado útil, tais como ofícios,
conhecimentos, compreensão, atitudes sociais e comportamento, que
perdurem além da prisão e permitam ao apenado o acesso ao emprego ou a
uma capacitação superior, que, sobretudo, propicie mudanças de valores,
pautando-se em princípios éticos e morais. (p. 13)
A educação no sistema prisional integra a modalidade de ensino intitulada como
Educação de Jovens e Adultos (EJA). Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), nº 9.394, de 1996, em seu artigo 37, afirmando que, “a educação de jovens e
adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino
fundamental e médio na idade própria”.
31
Além do mais, o artigo 18, da Lei de Execuções Penais, assevera que o Estado é
obrigado a promover a educação fundamental nos estabelecimentos penitenciários, devendo
integrar-se no sistema escolar da unidade federativa. O artigo 18-A, também, estende essa
obrigação ao ensino médio, regular ou supletivo.
Há outras legislações internacionais e nacionais que abordam a questão da educação
prisional, a pesquisa fez um recorte nas legislações que se apresentaram mais relevantes para
o tema pesquisado.
3.2 A pesquisa
Em paralelo a pesquisa bibliográfica e documental sobre a educação escolar nas prisões,
foi realizada uma pesquisa de campo, buscando contextualizar as informações coletadas com
as experiências observadas na vida do cárcere, como já foi dito anteriormente.
A pesquisa foi realizada, no período de setembro a novembro, do ano de 2017, através
de visitas quase que diárias à unidade prisional Nelson Hungria. O foco da pesquisa foi
compreender, através de observações das aulas na escola prisional, a relação construída entre
alunas e professores, analisando os significados que a escola possui no contexto de uma
unidade prisional.
A presente pesquisa foi realizada no Colégio Estadual 1º Tenente PM Hailton dos
Santos, que fica dentro da unidade prisional Nelson Hungria, no Complexo Penitenciário de
Bangu, trata-se de um presídio feminino, com a presença de mulheres sentenciadas e
mulheres que ainda aguardam julgamento em primeiro grau, visto que a Cadeia Pública
Joaquim Ferreira20
, encontra-se com um grande contingente de mulheres, fazendo com que
muitas sejam alocadas diretamente no Presídio Nelson Hungria.
A escola fica localizada no mesmo corredor onde ficam as demais celas do presídio, no
“miolo”, foram desativadas duas celas para dar espaço para a escola; tem a quantidade de 150
alunas matriculadas; sua estrutura é pequena, contém seis salas de aula, todas com ar
condicionado, cadeiras e mesas para todas as alunas, uma biblioteca, repleta de livros
separados por temas, uma coordenação, uma copa com refrigerador e armário para alocar os
lanches das alunas, um banheiro para as alunas e outro banheiro para os professores, dois
espaços para guardar materiais escolares e materiais de limpeza.
Nos dias de aula a coordenadora pedagógica entrega a listagem de alunas para serem
retiradas das celas para que possam ir à escola. Foram observadas inúmeras vezes atrasos na
20
De acordo com o art 102, da Lei nº 7.210, a cadeia pública é destinada aos presos provisórios.
32
remoção das alunas, por alguns motivos, como: a comida dos presídios é terceirizada, e,
muitas vezes, chega com atraso, visto que a escola no segundo turno começa às 13 horas,
enquanto a comida, também, é distribuída nesse mesmo horário; a falta de agentes
penitenciárias para cuidar dos corredores, ao mesmo tempo, que liberam as presas das celas, a
falta de água e luz no presídio ou na escola, esta não se importava em não ter aula no dia.
Durante a pesquisa foi observado a metodologia e os materiais pedagógicos que eram
utilizados em sala de aula, e, nenhum professor infantilizou os conteúdos, mesmo a escola
concentrada na produção de material e textos para a apresentação do Projeto de Leitura
Escolar (PLE)21
.
Segundo Beiseguel (1997), a Educação de Jovens e Adultos deve ser pensada nos
espaços da escola e nos espaços a sua volta, para construir propostas curriculares mais
adequadas aos alunos. É um passo fundamental para se pensar nas possibilidades de novos
desenhos curriculares destinados a essa modalidade da educação. Os objetivos do trabalho
pedagógico precisam incorporar as possibilidades de relacionar os alunos a situações da sua
vida cotidiana, até mesmo para melhorar a sua própria qualidade de vida em relação à vida em
sociedade. Significando deixar de lado alguns conteúdos formais clássicos para que outras
operações possam contribuir para capacitação dos alunos. Saberes que contribuam para o
desenvolvimento da consciência crítica e para capacitação.
No término das aulas foi observada uma preocupação das alunas em assinarem a lista de
presença da aula, pois a lista é encaminhada para a administração do presídio para fazer a
contagem de remição da pena.
De acordo com a Lei de Execuções Penais a remissão da pena acontecerá seguindo o
previsto:
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou
semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de
execução da pena.
§ 1o A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:
I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar -
atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou
superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo, em
3 (três) dias;
§ 5o O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3
(um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior
21
De acordo com a SEEDUC “O Projeto de Leitura Escolar (PLE) consiste em um conjunto de propostas e
orientações que visam a garantir o acesso e a permanência de diferentes práticas leitoras, fundamentais para o
desenvolvimento cognitivo, cultural e social de nosso aluno, já que a leitura é essencial na contextualização dos
conteúdos, em todas as disciplinas das áreas do conhecimento.” Disponível em:
http://www.rj.gov.br/web/seeduc/exibeconteudo?article-id=2380038 – acessado em 01/12/2017 às 18:38.
33
durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão
competente do sistema de educação.
A resolução da Seap nº 621, de 01 de julho de 2016, instituti no âmbito do sistema
penitenciário do Estado do Rio de Janeiro, a remição da pena através de leituras. Na presente
resolução esclarece que “a leitura contribui para processo de reinserção social do custodiado
agregando valores éticos - morais e desenvolvimento de sua capacidade crítica”. E explica
que podem participar do projeto os presos da unidade que tenham capacidade de ler e escrever
para a elaboração de uma resenha da obra literária escolhida.
O participante receberá um exemplar da obra literária com o direito de levá-la para a
cela. Será concedido o prazo de 30 dias para a leitura e elaboração individual da resenha. Ao
final, alcançando uma nota igual ou superior a 10 e atingindo os objetivos, isto permitirá que
o preso possa remir quatro dias da sua pena.
É importante ressaltar que, a remissão da pena através da leitura será assegurada de
forma cumulativa com a remissão concedida pelo trabalho e pelo estudo. O participante no
prazo de 12 meses poderá remir até 48 dias de sua pena.
É importante observar que a remissão pela leitura veio para agregar mais chances para
quem esteja em restrição de liberdade. A remissão pelo estudo é contada a cada 12 horas de
aula, concedendo um dia de remissão da pena. Contudo, a escola objeto desta pesquisa
funciona no período da manhã, de 9 horas às 12 horas, e no período da tarde, de 13 horas às
16 horas. A cada dia, as detentas, recebem 4 horas de aula, precisando de mais dois dias para
somar às 12 horas de remissão pela frequência escolar. Eis uma matemática complicada!
Outro ponto importante observado foi a forma de tratamento dos professores com as
alunas homossexuais, que preferiam ser chamadas pelo nome social.
A grande maioria das alunas está há demasiado tempo sem contato com a educação
escolar, muitas abandonaram a escola ainda jovens e não apresentam limites e disciplina para
permanecerem sentadas com atenção à aula, atrapalhando. Esse fato ocorre, também, devido a
realidade das alunas no sistema prisional, os desafios da vida de mulher restrita de liberdade
recebendo pouco ou nenhuma visita, sem um relacionamento afetivo estável dentro e fora da
prisão.
O relacionamento afetivo entre as próprias mulheres presas, também, interfere na
escola. Muitas presas se automutilam22
quando brigam com suas parceiras ou quando são
22
Muitas presas têm o costume de se cortarem, nos braços como uma forma de extravasar a dor que estão
sentindo no momento. Outras afirmam que as automutilações são uma forma da presa “querer chamar atenção”,
e não se trata de um problema psicológico.
34
separadas de celas. Chegam à escola para as aulas automutiladas e passando mal. Inclusive, o
uso de remédios para dormir entre as presas é comum. Segundo relatos, quando elas estão
“surtando” ingerem remédios para dor e ficam “dopadas” para suportarem o dia a dia
insuportável que é a prisão.
3.2.1 A função da escola no ambiente privativo de liberdade
Sobre os diversos papéis que são apontados para a escola - passar o tempo, sair das
celas, encontrar amigos de outras celas (inclusive familiares), conquistar benefícios jurídicos,
aprender a ler e escrever, fazer conta, passar de ano escolar - é percebido como algo positivo
pelas alunas dentro do sistema e contribui para que a pena seja vivida de forma mais humana.
A oportunidade de estudar dentro da prisão associa-se a uma vontade pessoal, cujas
motivações se apresentam de diversas formas, haja vista as definições abaixo de algumas
presesa que frequentam a escola:
_ “A gente vem pra escola para aprender e distrair a mente.”
_ “A escola representa muito aqui dentro, “a gente” se sente mais livre.”
_ “A escola é boa para remir a pena e para sair da cela um pouco.”
As tensões ali dentro da escola são aliviadas, o saber ganha força, a vontade de
aprender e a atenção voltada para o educador se mostram de forma leve; o convívio do ódio,
da vingança, da rejeição não entram no ambiente escolar, ficam do lado de fora das grades
que separam a escola das demais grades das celas. Uma presa diz que:
_ “Os professores trazem novidade do mundo lá fora, conversam com a gente sobre vários
assuntos, várias coisas, que não nos remetem a prisão”.
Essa troca de experiências com os professores e com os alunos justifica um dos
objetivos da ressocialização do preso. A escola oferece ao interno a possibilidade de resgatar
ou aprender outra forma de se relacionar, diferente do seu cotidiano no cárcere, há um
processo de desconstrução e reconstrução de identidades, desfaz-se a perversidade do
estabelecimento penal e traz a sensação de pertencimento23
, um lugar que é seu, um ambiente
amigável e prazeroso para uma nova identidade ressignificada, que vai restaurando a
autoconfiança e valores éticos e morais.
Outrossim, cabe ressaltar que
As ações educativas devem exercer uma influência edificante na vida do
interno, criando condições para que molde sua identidade, buscando,
principalmente, compreender-se e aceitar-se como indivíduo social; construir
23
De acordo com os relatos das presas, elas entram no sistema e se desvinculam de seus objetos pessoais, desde
a roupa até os documentos, estão sempre mudando de celas e, muitas, não são chamadas pelos nomes, recebem
apelidos, um número e até mesmo o número do artigo de seu crime.
35
seu projeto de vida, definindo e trilhando caminhos para a sua vida em
sociedade. (Parecer CNE/CEB Nº: 4/2010, sobre as Diretrizes Nacionais
para a oferta de educação para jovens e adultos em situação de privação de
liberdade nos estabelecimentos penais. p. 14.).
Na escola, as bagagens culturais que as alunas adquirem jamais lhes serão roubadas.
Elas exercitam os novos valores conquistados na escola que é, sobretudo, o novo local de
pertencimento e orgulho, pois que se percebem progredindo pessoal e profissionalmente.
3.2.2 Entrevistas e rodas de conversas.
Houve uma preocupação em fazer entrevistas com as alunas presas, pois o tempo que se
tem na escola é pouco, ainda mais com os atrasos; além dos dias em que não há aulas.
Portanto, foi autorizada pela diretora do presídio a realização das entrevistas e rodas de
conversas no local onde recebem as visitas dos familiares e onde fica a cantina do presídio.
A escolha das alunas para a roda de conversa não teve muito critério, apenas uma
indicação do corpo pedagógico da escola e dos professores. Ao iniciar-se a conversa com as
10 alunas escolhidas aleatoriamente, foi mencionado que a educação nos presídios é
respaldada em lei como um direito garantido a todos os internos no sistema prisional, sem
fazer distinções, e que, em tese, deveria ser oferecido a todos pelo Estado. Este direito não é
um favor, mas, sim um dever do Estado.
Foi feito um pequeno questionário com algumas perguntas, conforme indicado abaixo:
1- Há quanto tempo está estudando?
2- Por que parou/não estudou enquanto não estava presa?
3- Qual foi seu maior interesse em buscar a escola dentro da unidade prisional?
4- Acredita que a escola cumpre o seu papel de socializar seus alunos e dar educação?
5- Como se sente em relação aos professores? A relação de aluno / professor é amigável?
6- Após ganhar a liberdade, pretende continuar estudando?
7- A escola traz algo positivo para você aqui dentro?
8- A escola é capaz de ressocializar você?
9- Qual o seu sonho?
As respostas das internas foram variadas, mas a grande maioria foi positiva em relação à
escola. Na primeira pergunta muitas responderam que estão na escola a aproximadamente um
ano, outras há 9 meses, 7 meses, 15 dias. Observou-se que no presídio há uma grande
rotatividade, toda semana entra e sai mulheres.
36
Na segunda pergunta, muitas responderam que pararam de estudar porque
engravidaram, outras porque precisaram trabalhar e não conseguiam conciliar o estudo com o
trabalho, outras porque seguiram a vida com o namorado.
Na terceira pergunta, a grande maioria rspondeu que buscou a escola porque querem
aprender. Com unanimidade a escola para elas é como se fosse um ambiente “fora da prisão”,
quando estão em sala, se sentem em outro ambiente diferente da prisão. Esta unanimidade é
apontada em três falas diferentes, como exemplo.
_ “A escola é um local de distração da mente e de aprendizado.”
_ “A escola é uma fuga da realidade.”
_ “A escola pra mim é pra ter mais conhecimento, para sair da cela, pois nada na cela é construtivo.”
A quarta pergunta teve resposta positiva por todas, afirmando que a escola cumpre o
papel dela dentro do espaço privativo de liberdade, é capaz de ressocializar as alunas.
Ressalvaram que a escola cumpre seus objetivos para quem realmente quer estudar, pois
existem algumas alunas que “não têm interesse em nada, apenas em sair das celas e conversar
com as colegas de sala”.
A quinta pergunta responderam que a relação com os professores é bastante respeitosa,
e são tratadas como alunas, como seres humanos, diferente do tratamento que recebem
algumas vezes por agentes penitenciárias.
_ “Os professores tratam a gente bem, chama a gente pelo nosso nome, se preocupam com a gente
também.”.
Na sexta pergunta algumas afirmaram que pretendem seguir com os estudos e outras
indicaram que pretendem concluir o ensino médio no presídio para terem melhores condições
em conseguir um emprego quando ganharem a liberdade.
A sétima pergunta, por unanimidade também foi dito que a escola traz uma calma para
as presas em um ambiente conturbado e cheio de problemas. Para todas que estudam, a escola
melhora o humor, o convívio, a disciplina, a concentração e a busca de sonhos.
Na oitava pergunta, algumas responderam que a escola é capaz de ressocializar a pessoa
presa, algumas responderam que a escola sozinha não consegue ressocializar as presas.
Indicaram que ficam pouco tempo dentro da escola e que precisam ocupar mais o tempo delas
no dia a dia, ficar na cela é muito ruim física e psicologicamente.
Na última pergunta, a maioria disse que pretende seguir estudando para buscar um bom
emprego; pretendem trabalhar, não querem mais seguir a vida do crime, pois sabem que o
ambiente que vivem é horroroso e ninguém se preocupa com elas ali dentro.
A entrevista realizada com a agente penitenciaria foi seguida das seguintes perguntas:
37
1- Como é a sua relação com as presas? Elas respeitam?
2- Acredita que o sistema penal do Rio de Janeiro funciona?
3- Qual a maior dificuldade em lidar com as presas?
4- Acredita na recuperação do preso com o atual sistema de prisão?
5- A escola funciona para as presas?
6- A escola é capaz de mudar a vida delas como presas
7- Além da escola, o que mais contribui para o processo de ressocialização?
8- A vontade de mudar de vida só depende delas?
Em resposta à primeira pergunta as agentes afirmam que mantém uma boa relação com
as presas e buscam sempre manter um respeito mútuo. As presas sabem as regras do presídio
e da disciplina que têm que manter no dia a dia, como por exemplo, a limpeza nas celas.
A segunda pergunta foi consensual, afirmando que o Presídio Nelson Hungria funciona,
mas os demais não. Principalmente, porque “os presos não têm disciplina e fazem o que
querem no presídio”.
Na terceira pergunta as agentes informaram que não enfrentam dificuldades para lidar
com as presas.
Na quarta pergunta, afirmam que o sistema prisional é capaz de recuperar o preso sim,
pois oferecem cursos profissionalizantes, educação, acesso à religião, e “só não muda de vida
quem não quer”. Afirmam que já presenciaram a reincidência de roubo de presa, logo após
ganhar a liberdade, casos de mulheres que “saem ganham a liberdade na semana e na semana
seguinte retornam para o presidio por ter cometido mais um crime”.
Na quinta pergunta, com unanimidade, responderam que a escola funciona e,
principalmente, ensina a ler e escrever.
Na sexta pergunta, afirmam que a escola é capaz “de mudar a vida de quem deseja,
inclusive, a nossa vida”.
A sétima pergunta, indica que todo o contexto do presídio contribui para a
ressocialização das presas.
A última pergunta enaltece que a vontade de mudar de vida só irá depender de vontade
própria, pois “as presas têm recursos para seguirem novos caminhos”.
Ao conversar com as presas e com as agentes penitenciárias e a diretora do presídio,
foram observados pensamentos diversos da realidade ali apresentada. As presas sempre se
remeteram as falas de que o presídio é um péssimo ambiente, não são tratadas como seres
humanos e, sim, como “bichos”, por mais que tenham cometido um crime, merecem ser
38
tradas com dignidade, são chamadas por pseudônimos pejorativos a todo tempo, e são
lembradas como pessoas ruins.
Segundo as agentes penitenciárias, a relação com as presas é boa, há um respeito mútuo.
Afirmam que o presídio auxilia as presas para mudarem de vida, com a presença da escola, da
Igreja, da assistência social, de médicos, sempre no intuito de auxiliarem as presas a buscar
uma nova vida quando retornarem à sociedade.
A diretora do presídio busca implementar projetos para garantir uma maior dignidade de
vida para as mulheres presas, mas é ciente da falência que se encontra o Estado do Rio de
Janeiro e da dificuldade de recursos para os projetos. O Presídio Nelson Hungría é um dos
poucos presídios, do Estado do Rio de Janeiro, que não está superlotado, que é limpo, que tem
disciplina - por mais que haja imposição de regras, as presas cumprem. E, ainda, assim a
diretora reconhece que, como ela mesma diz, “aqui é um lugar que a sociedade não quer
saber, a gente tenta resgatar a dignidade delas, promovemos algumas ações, cursos,
implementação de novos projetos”.
Não sem razão, ao falarmos da prisão falamos de uma arquitetura invisível, os presos
são figuras vistas como indesejáveis, todavia, falamos de gente que é fruto de uma sociedade
indigente que subtrai da maioria o direito de ser.
39
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Antes de a prisão assumir seu papel na história, as punições eram feitas para impor uma
ordem e respeito às regras do príncipe que as criava. A execução penal era feita em praça
pública através dos “espetáculos punitivos”, havia uma necessidade do soberano impor os
castigos cruéis contras aqueles que iam contras as regras do contrato social. Sendo assim,
intimidava a população, através de crueldades contras os corpos dos que entravam para a vida
da criminalidade.
A forte influência da nova economia que estava surgindo com o fim do feudalismo e o
início do mercantilismo necessitava da força de trabalho nas indústrias, pois a economia na
Europa precisava desenvolver o capitalismo.
O início do século XIX é marcado pelo fim das cerimônias das punições cruéis e
começas a aflorar pensamentos sobre um revisionismo penal com base em ideias teleológicas
mais humanistas.
Com isso surgem as primeiras casas de correção, oferecendo trabalho aos
desempregados ou obrigando a trabalhar quem oferecia resistência. A ideia principal era
transformar a força de trabalho dos indesejáveis da sociedade em algo socialmente útil.
Ficando claro que o único objetivo das casas de correção era a exploração do trabalho
humano nas condições mais baratas. O Iluminismo contribuiu para a manutenção da prisão e
impediu o retrocesso as penas cruéis.
O Brasil foi marcado historicamente por punições cruéis, assim como aquelas que
ocorreram na Europa; o país, também, recebeu influências do Iluminismo que contrariava o
cruel direito penal existente pelas Ordenações Afonsinas.
Apenas com a vinda da família real para o Brasil e a separação do Brasil - colônia e
com a criação da primeira Constituição, em 1824, que se criaram maiores condições para uma
legislação penal mais humana.
Mesmo com a influência do Iluminismo na criação do Código Penal Brasileiro e com a
criação das primeiras casas de correção no Rio de Janeiro, as prisões estavam muito longe de
atender às exigências previstas em lei. Já em 1840 havia a superlotação das celas.
Este mesmo quadro vem se repetindo no atual sistema penitenciário brasileiro,
consequentemente, proporcionando o aumento da massa carcerária, pois não há uma política
de contensão e, sim, de perpetuação.
Os presídios são locais de onde a sociedade quer distância, os muros são altos, não se
abrem as portas e pouco se sabe da realidade do sistema.
40
Justamente por esse motivo, foi feita a pesquisa para observar as práticas da escola
prisional como uma das formas de ressocialização da pessoa restrita de liberdade, pois o preso
merece assistência, sendo dever do Estado previnir o crime e reorientá-lo para o retorno da
vida em sociedade.
Infelizmente, a conclusão que se chega é que o preso está enraizado em um ciclo
vicioso, pois já pertence a uma classe social desfavorecida das demais, com poucas condições
de vida digna, sem direito a saúde, educação, trabalho formal e lazer, muitos acabam se
rendendo a vida do crime, aonde o dinheiro chega fácil e rápido, mas também não traz futuro,
até porque, rapidamente são interrompidos com a prisão, quando não pela morte.
Na prisão, a situação é pior ou igual a vida que se vivia socialmente, sem expectativa de
futuro. Assim que ganha a liberdade, a situação volta a ser a mesma antes de ser preso, o que
faz com que muitos retornem à vida do crime.
Por isso a escola e as demais forças no contexto prisional devem contribuir para a
ressocialização da pessoa privativa de liberdade, sendo extremamente importante para a
ressignificação de uma nova identidade que seja capaz de restaurar a autoconfiança e os
valores éticos e morais esquecidos ou apagados.
Sabemos que hoje a situação carcerária no Brasil é falida, parece que nunca foi pensada
para dar certo, principalmente, pela sua arquitetura e a massa de pessoas que entra no sistema
a cada dia, sobrecarregando os espaços das celas.
Não podemos mudar essa realidade e nem fugir dela, mas é preciso buscar caminhos
para repensar a instituição penal que temos e a que teremos no futuro.
41
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ABORDAGENS PEDAGÓGICAS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS
Laura Marconi da Silva Pereira
Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ
Resumo:
Através de uma pesquisa bibliográfica e documental podemos observar que a desde a implementação
da modalidade de ensino educação de jovens e adultos no Brasil na década de 1940, ainda apresenta
algumas inconstâncias na sua atuação. A educação de jovens e adultos ainda carrega um currículo
tradicional, dando pouca abertura para o diálogo e troca de das experiências de um alunado que já
carrega uma bagagem de vida. Esta é uma das críticas acerca de como é pensado o currículo voltado
para as turmas de jovens e adultos. O presente trabalho tem por finalidade demostrar de forma crítica
as abordagens pedagógicas na educação de jovens e adultos. Exemplificado um Projeto Político
Pedagógico dentro do Colégio Estadual Anacleto de Medeiros, na Unidade Prisional Evaristo de
Moraes, no Rio de Janeiro.
Palavras-chaves: Educação de Jovens e Adultos, Currículo, Educação Prisional.
Introdução.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é a lei fundamental e suprema do
Brasil, sendo parâmetro para as demais leis e ordenamentos jurídicos que buscam ter validade em
todas as espécies normativas.
A nova Constituição traz um caráter mais humanista, garantindo constitucionalmente os
direitos fundamentais, o direito no campo das liberdades individuais e coletivas, os direitos de
natureza social e política.
Abordando especificamente sobre os direitos sociais, a educação se consolida na Constituição
Federal no artigo 6º, tornando a educação um direito assegurado a todos. Bem como, estabelece em
seu artigo 22º, a competência privativa da União de legislar sobre as diretrizes e bases sobre a
educação nacional.
A educação de jovens e adultos é uma modalidade de ensino que teve seu início na década de
1940, com o fim do Estado Novo, quando foram criadas campanhas de alfabetização como Campanha
Nacional de Educação de Adolescentes e Adultos, CEAA, Campanha Nacional de Educação Rural,
CNER, Sistema Rádio Educativo Nacional, SIRENA e outras.
Segundo os dados do IBGE1, o censo da população em 1940 apresentava mais de 56%
pessoas analfabetas com mais de 10 anos. Esse dado teve grade relevância pois o pais estava em fase
de crescimento, acelerando o processo de industrialização e, consequentemente, o processo de
urbanização.
Com o passar do tempo a educação de jovens e adultos começou a ganhar maior visibilidade e
espaço no cenário da educação. Hoje a regulamentação dessa modalidade de ensino está prevista na
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96, especificamente na “SEÇÃO V - Da
Educação de Jovens e Adultos”.
Apesar da legislação para essa modalidade de ensino prevê que as práticas educacionais
devem ser adaptadas, considerando as características do alunado, seus interesses, suas condições de
vida e de trabalho2, ainda observamos amplas divergências quanto a sua aplicabilidade na prática.
Foi feito levantamento de alguns documentos que norteiam a educação em geral, as Diretrizes
e o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola Anacleto de Medeiros. E de forma mais estrita a
forma como é criado o currículo dessa modalidade de ensino.
O presente trabalho não pretende concluir este assunto, mas sim trazer reflexão sobre as
questões curriculares, passando pela construção do conhecimento em rede e suas propostas
curriculares, sobre a infantilização desta educação e o formalismo dos currículos e como superar essa
tendência geral, apresentando concepções de currículo e deixando em aberto esse debate para
aprofundamento e construção.
Contexto da educação de jovens e adultos
Historicamente a educação de jovens e adultos começou a ser pensada nas características do
ensino regular, de forma fragmentada e com um currículo tecnicista com pouco diálogo as
experiências vividas dos alunos adultos. Essa era uma crítica que Paulo Freire (2011) fazia quanto ao
método de ensino desses alunos.
Até os dias atuais ainda encontramos dificuldades na atuação dos educandos na modalidade de
ensino destinada aos jovens e adultos. Muitos professores não conseguem abordar uma temática
menos infantil àqueles que já possuem uma trajetória na vida, que por diversos motivos não
conseguiram dar continuidade ao ensino regular na idade estabelecia pelas leis educacionais.
Ao longo de toda a trajetória, e até os dias atuais a educação de jovens e adultos vem trazendo
problemas na organização do currículo, os educadores não estão preparados para atuar com os adultos
em sala de aula.
1 https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv34956.pdf - acessado em 10/09/2018 2 De acordo com art.37, § 1º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96.
Esse problema, como explica Ribeiro (1999), ocorre pela defasagem na formação dos
educadores na constituição da educação de jovens e adultos como campo pedagógico, o que implica na
existência de um conjunto de práticas e saberes minimamente articulados em torno de princípios,
objetivos ou outros elementos comuns da educação.
Confirmando ainda, que os educadores não estão aptos a repensar a organização disciplinar, no
sentido de abrir possibilidades para que os educandos realizem percursos formativos mais
diversificados, mais apropriados às suas condições de vida. Os jovens e adultos devem experimentar
novos meios de aprendizagem e progressão nos estudos, e não aqueles que provavelmente os
impediram de levar a termo sua escolarização anteriormente.
Conhecimento em rede e as propostas do currículo.
A tessitura do conhecimento se baseia nas experiências que vivenciamos cotidianamente e a
maneira como agimos em sociedade. Essa noção busca superar o ideal de educação ainda existente
hoje, principalmente na educação de jovens e adultos, onde existe uma necessidade maior devido a
bagagem de vida que cada aluno carrega e leva para dentro da sala de aula.
Dessa forma, é preciso trabalhar de forma que as redes de conhecimento possam se enredar
com redes anteriores, é necessário que haja ligações dos assuntos trabalhados em sala de aula com
assuntos já aprendidos anteriormente por esses alunos para que possibilite a compreensão e o
aprendizado dos conteúdos trabalhados, e não se restringir apenas ao ensino formal, mas levar em
consideração toda bagagem cultural desses alunos.
Como demonstra Oliveira, (2009):
“Um dos problemas enfrentados pela EJA, historicamente, tem sido decorrente
da tendência predominante das propostas curriculares a fragmentação do
conhecimento e à organização do currículo numa perspectiva cientificista,
tecnicista e disciplinarista que dificulta o estabelecimento de diálogos entre as experiências vividas, os saberes anteriormente tecidos pelos educandos e os
conteúdos escolares”.
É necessário respeitar e entender a singularidade presente na sala de aula, trabalhar a
individualidade, os interesses de cada aluno e suas crenças, pois cada um tem uma maneira singular de
estabelecer conexões, bem como, tem suas experiências e saberes individuais.
Podemos observar nitidamente essa falha pedagógica na EJA ao perceber que a proposta
curricular dessa modalidade de ensino segue a lógica infantil dos currículos destinados às crianças que
frequentam as escolas regulares. Ou seja, toda a particularidade voltada às vivências sociais e culturais
desses alunos são ignoradas.
Experiências X Práticas na EJA
A educação de jovens e adultos é uma modalidade de ensino que trabalha com pessoas adultas,
que já possuem experiências nos mais variados âmbitos da vida e que em sua maioria já trabalham.
Esse público dotado de informações sobre as eventualidades do seu dia a dia merecem uma prática que
se aplica totalmente a eles e as suas realidades, levando em consideração que o ato de aprender é
subjetivo, mas a prática do professor deve favorecer o público a qual se atende.
Freire (2011)3 explica essa temática quando fala da “educação bancária”, criticando a
educação rígida, autoritária e antidialógica na qual o professor tem o papel de transferir o seu saber
para alunos, como se fossem uma “folha de papel em branco”. Enfatiza que a educação deve ser
problematizadora, deve trazer o diálogo e a participação de todos da sala de aula; deve ser questionada
e levantar dúvidas. Professor e alunos devem buscam juntos e construir conhecimento valorizando o
que já sabem.
Muitos professores da EJA usam a mesma didática para o ensino fundamental de crianças e o
ensino fundamental de jovens e adultos, acreditam que a forma de ensinar deve ser a mesma, até
mesmo na interação professor – aluno. Quando o professor constrói suas aulas dessa forma ele não
leva em conta toda a bagagem social que os adultos já possuem e ainda os infantiliza, restringe-se de
falar alguns assuntos por acreditar que os alunos não irão alcançar o diálogo.
Quando se trabalha com crianças a escola tem como uma das finalidades apresentar o mundo e
os problemas a qual toda sociedade passa, torna-las críticas, mas para os adultos que já conhecem esse
mundo e que já passam com toda clareza por problemas sociais a escola deve ser esclarecedora, e,
portanto, se apropriar do vivido pelos alunos para ensinar sobre suas realidades de forma mais crítica.
Isso implicaria no currículo e nos conteúdos programáticos da escola que muitas vezes não atribuem
esse aspecto de representar suas realidades dentro das práticas escolares.
Atualizando o esquema curricular
A criação formalista dos currículos nas escolas do Brasil hoje é baseada por uma lógica do
modelo predominantemente hegemônico político da nossa sociedade, o neoliberalismo, com sua raiz
no capitalismo. É assim que se tem o pensamento em um currículo que prioriza o saber teórico sobre o
prático, os saberes formais sobre os saberes de quem vivência situações do trabalho intelectual sobre o
manual.
Acerca dos debates enfrentados, as propostas curriculares destinadas a educação de jovens e
adultos são organizadas com os mesmos modelos destinados ao ensino regular. Percebe-se o
desinteresse dos órgãos superiores para esse modelo de ensino. Para eles pouco importa a experiência
de vida de quem busca esse ensino, visto que se formos observar a lógica capitalista, a população que
busca a EJA já tem uma posição na sociedade, e então, não teria porque investir nessa educação.
3 FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 50ª edição. São Paulo: Paz e Terra, 2011
Certamente esse entendimento congela e negligência riquezas dos processos da vida social dos
alunos, sendo necessário superar esse entendimento formalista e cientificista do currículo e buscar
compreendê-lo como oriundo de múltiplos processos de tessitura de saberes do cotidiano.
A pratica curricular consistente só poderá ser encontrada se aceitar os saberes de quem pratica
o currículo (os alunos). Para isso, a EJA deve ser pensada nos espaços da escola e nos espaços a sua
volta, para construir propostas curriculares mais adequadas aos alunos. É um passo fundamental para
se pensar nas possibilidades de novos desenhos curriculares destinados a essa educação.
Tanto em um ensino regular e principalmente em um ensino de jovens e adultos, os alunos
trazem para dentro da sala de aula uma rede de saberes pelas suas múltiplas experiências. Na
integração entre os diferentes alunos, novas redes são tecidas e é na riqueza desse processo de
aprendizagem que possibilita a cada aluno o que vai ser aproveitado e descartado. Ou seja, uma sala de
aula sempre será constituída por sujeitos que sabem uma série de coisas e outros que deixam de saber
algumas coisas. O currículo deve proporcionar essa abertura para dar conta da multiplicidade de
saberes que se encontram, e para se inserir no cotidiano da experiência escolar. A escola não deve ser
prescrita, e sim ter uma proposta que dialogue com o que ela é.
Quando o corpo pedagógico define os conteúdos que serão integrados na proposta curricular,
deixam outros de lado. Essas propostas devem diferenciar daquelas vigentes no ensino regular, pois os
objetivos desse modelo de ensino são diferentes. Ribeiro (1999), apresenta um exemplo da construção
dos conteúdos curriculares acerca dos adultos que concluíram o ensino na escola regular e se
perguntam por que aprenderam tal conteúdo em detrimento de outros, e por que foram ensinados de tal
forma e não de outra. Foram tantos conteúdos que não faziam e não fazem sentido até hoje.
A infantilização do conteúdo piora as indagações feitas pelos alunos, muitas informações não
fazem sentido para a classe, pois a significação se torna incompreensível para eles.
Oliveira (2009), indaga que talvez eles saibam o conteúdo, mas há uma dificuldade em fazer
uma relação dos conteúdos que são passados em sala com a sua vida. Isso acontece justamente porque
o currículo de jovens e adultos é um retrato perfeito da escola regular, este currículo não leva em
consideração que os jovens e adultos tem diferentes faixas etárias, modos de fazer e aprender dos mais
distintos, e necessitam de um currículo que faça significância em suas vidas.
Um dos objetivos do trabalho pedagógico é incorporar as possibilidades de relacionar os
alunos a situações da sua vida cotidiana, para melhorar a sua qualidade de vida em relação à vida em
sociedade. Significando deixar de lado alguns conteúdos formais clássicos para que outras operações
possam contribuir para capacitação dos alunos. Saberes que contribuem para o desenvolvimento da
consciência crítica e para essa capacitação
Como exemplifica Ribeiro, (1999):
“Entretanto, também é de extrema relevância a análise de como saberes e
competências relacionados aos contextos existenciais dos jovens e adultos
trabalhadores poderiam ser abordados pedagogicamente de modo a fazer
avançar sua capacidade crítica, criatividade e autonomia, e não meramente
como capacitação para tarefas específicas, sem maior relevância cognitiva ou
atitudinal. ”
A educação de jovens e adultos deve incorporar prioridades na seleção dos conteúdos que irão
nortear e organizar o seu trabalho. Deve haver uma articulação entre os saberes tecidos nas práticas
sociais dos sujeitos com saberes formais que possam ser articulados para dar maior conhecimento
político e técnico para intervirem na vida cotidiana.
Observando essas articulações temos o princípio da transversalidade no currículo, onde vários
saberes se relacionando com as experiências de vida e as disciplinas, dando um maior significado a
escola na vida de uma turma de jovens e adultos.
Projeto Político Pedagógico na escola prisional
Em paralelo a pesquisa documental e bibliográfica sobre a educação de jovens e adultos no
Brasil, foi realizada uma participação em 2015, no VIII Café Literário no Colégio Estadual Anacleto
de Medeiros, situado no Presídio Evaristo de Moraes, no Bairro de São Cristóvão, Rio de Janeiro,
onde foram observados alguns pontos acerca da modalidade de ensino do colégio.
A participação no VIII Café Literário se deu através do convite da diretora do colégio, Sônia
Maria, a alguns alunos e pesquisadores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ.
O procedimento para autorização da entrada dos convidados foi bastante rigoroso. A diretora
da escola entregou uma lista com os dados completos (nome, identidade, CPF, endereço) dos
convidados ao diretor do presídio e à Secretaria de Administração Penitenciária, SEAP, onde foi feito
um levantamento dos dados, desde antecedentes criminais e relações pessoais com algum preso da
unidade, e a partir desses critérios é concedido o aval para a entrada na escola.
O Colégio Anacleto de Medeiros fica dentro da Unidade Prisional Evaristo de Moraes, trata-se
de um presídio masculino, com a presença de homens já sentenciados e homens que ainda estão
aguardando uma condenação.
Segundo os dados do Geopresídios4, o presídio tem a capacidade projetada para 1.497 pessoas,
mas a lotação atual é de 3.288 pessoas.
A escola funciona no horário diurno, com dois turnos – de 9h às 12h, 13h às 16h –, tem
aproximadamente 300 alunos, que são selecionados por documentação ou prova de nivelamento,
podendo ser matriculados no Ensino Fundamental (do 1º ao 9º ano) e no Ensino Médio (do 1º ao 3º
ano).
4 De acordo com Recibo de Cadastro de Inspeção do Presídio Evaristo de Moraes. Disponível em:
http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/gera_relatorio.php?tipo_escolha=rel_estabelecimento&opcao_escolhida=7
37-2114&tipoVisao=presos - acessado em 09/09/2018 às 1:15
A estrutura da escola é fortalecida pela parceria e pelo diálogo, que se evidencia pelas
propostas interdisciplinares e a relação com os apenados não-alunos, funcionários e direção da
Unidade Prisional. O corpo discente formado por professores, coordenação e direção é participativo
tanto nas atividades pedagógicas quanto no apoio para a manutenção e conservação das estruturas do
colégio.
A base da escola segue os ideais de Paulo Freire, onde o homem pode se reinventar, mesmo na
adversidade, e assim reconstruir sua própria história. Desse modo, são propostos temas geradores, que
mobilizam o colégio para a prática pedagógica e conduzem os alunos para a reflexão sobre o mundo e
também sobre a sua vida.
A escola por estar inserida em uma Unidade Prisional apresenta características diferentes das
demais escolas regulares. O espaço físico, o alunado específico, a comunidade ao redor da escola, a
rotatividade dos alunos (devido a transferências), a superlotação do presídio, as rebeliões e motins,
entre outas, são algumas características que fazem da escola estar inserida em um ambiente complexo
e ter uma peculiaridade maior.
Dessa forma, é preciso pensar em um currículo que converse com todas as características que
envolvem o contexto da escola. Para isso, são utilizadas ferramentas pedagógicas diferenciadas a fim
de alcançar o sucesso. Dentre elas, podemos citar: a participação em olimpíadas escolares, concursos
educativos, confecção de vídeos5, paródias, painéis, produção e participação em festival de música,
como também produção e participação de café literário. Todas essas ferramentas servem de suporte a
todos os segmentos e disciplinas, propiciando uma integração horizontal e vertical de toda escola.
O VIII Café Literário, ocorrido em 24 de novembro de 2015, foi uma compilação do Projeto
Político Pedagógico da escola e das ações pedagógicas estabelecidos buscando uma
interdisciplinaridade entre as disciplinas da escola.
O espaço onde ocorreu o Café Literário foi em uma antiga cela transformada em auditório6 e
foi aberto com as palavras da diretora da escola, que agradeceu os esforços de todos os alunos e
professores que participaram e construíram seus trabalhos para as apresentações, parabenizando-os
orgulhosamente. Após a abertura começaram as apresentações dos trabalhos das turmas.
As turmas de alfabetização realizaram apresentaram de dança de hip hop e de capoeira. As
turmas de NEJA I, II, III, apresentaram com o tema " Afro descendência e saúde", através da releitura
dos poemas de Gregório de Matos.
A turma de NEJA I e III apresentou o tema "O sol e a saúde", abordando a questão da
tuberculose de forma crítica às condições vivenciadas pelos alunos dentro do presídio. Os alunos
5 A escola tem uma câmera fotográfica onde todas as fotos tiradas e vídeos feitos passam pelo crivo do diretor da
Unidade Prisional que autoriza ou não a divulgação para os professores. 6 De acordo com a direção da escola o auditório também serve para as aulas de Educação Física, reforço escolar
e ao efetivo prisional, visto que ela é cedida, sempre que possível, para palestras, reuniões dos Narcóticos
Anônimos, para o grupo Arte de Viver, para os Alcoólicos Anônimos e exposições em geral - propiciando uma
integração entre os alunos da escola e os internos não-alunos e os servidores da unidade prisional.
preparam uma cartilha em papel A4, feita a mão, sobre a tuberculose, (uma das principais doenças
contagiosas dentro do presídio, segundo os alunos). A cartilha foi entregue a todos os alunos,
professores e convidados, e explicava as formas de contágio, os sintomas da doença e as formas de
tratamento. E realizaram uma encenação sobre a situação da vida deles dentro a prisão, a questão da
superlotação, a forma de tratamento dos agentes penitenciários com os internos e a questão do banho
de sol. Enceram como tudo isso acontece no dia a dia deles.
Além disso, as duas turmas também apresentaram o tema "Saúde financeira", trazendo alguns
dados sobre os gastos da saúde e sobre a tuberculose.
A turma de NEJA II apresentou o tema "Poesia abolicionista", citando poemas e textos sobre a
abolição da escravidão ocorrida no Brasil. Por fim, a turma NEJA IV apresentou o tema "Farmácia
Baldia no Colégio Estadual Anacleto de Medeiros.
No encerramento a diretora agradeceu a todos que estavam presentes e convidou alguns alunos
e pesquisadores presentes para que pudessem comentar sobre o Café Literário. Alguns dos falaram
fizeram comentários positivos e incentivando os alunos a não desistirem do estudo, a buscarem sempre
o melhor para si mesmo, pois dias melhores virão.
O Café Literário foi uma forma de reinventar o currículo. Buscou novas formas de
organização do espaço-tempo e novos meios de aprendizagem e progressão para os alunos. Toda
comunidade escolar e ao seu redor interagiu e trabalhou junto.
Houve uma simultaneidade da educação geral com a educação profissional, a teoria com a
prática, o universal com o contextualizado, reconhecendo os saberes construídos dos alunos ao longo
de suas vidas, com o objetivo de avançar sua capacidade crítica, a criatividade e autonomia.
Considerações finais
O currículo na EJA sempre apresentou falhas deste seu início no Brasil, suas concepções
consolidaram ideias que hoje são difíceis de mudar. As práticas curriculares formalistas e
infantilizantes atrapalham o desenvolvimento da educação apropriada de acordo com o perfil dos
alunos e não levam em consideração a vivência e cotidiano dos alunos para as práticas educacionais.
Aprisionam a possibilidade de aprendizagem concreta, aplicando arbitrariamente um pensamento
dominante, com propostas tradicionais, o que nos deixam poucas alternativas de mudanças.
Porém, as transformações que tanto pensamos e discutimos são possíveis através de pequenas
ações e mudanças começando pela sala de aula na relação de professor-aluno. Deve-se criar novas
formas de promover a aprendizagem fora dos limites da estrutura escolar tradicional.
Mas cabe considerar que toda problemática relacionada a educação de jovens e adultos merece
compor o currículo de formação básica de todos educadores, para que se aproximem da realidade
existente que ainda está em defasagem no nosso contexto educacional.
É preciso desenvolver esforços no afã de proporcionar acesso a educação a todos. Lutar contra
a exclusão social e educativa e viabilizar múltiplas trajetórias de formação para toda população. A
educação é o único caminho para ter um país melhor desenvolvido.
Referências Bibliográficas.
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