Religião e globalização relação de reciprocidade ou de conflito
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RELIGIÃO E GLOBALIZAÇÃO: RELAÇÃO DE RECIPROCIDADE OU DE
CONFLITO ?
RELIGION AND GLOBALIZATION: RELATIONSHIP OF RECIPROCITY OR
CONFLICT?
RESUMO
Este trabalho procura entender a natureza das relações que existem entre religião e
globalização. O debate sobre como entender, analisar e interpretar esta relação é
caracterizado pela dificuldade de saber quais são a natureza e o estatuto de uma em
relação à outra. Nessa situação, várias teses apareceram dentre as quais três foram
predominantemente evocadas. A primeira sustenta que é pelo intermediário do
pensamento religioso que o fenômeno da globalização surgiu desde a antiguidade,
então, no início elas tinham uma relação de simbiose. A segunda defende os argumentos
segundo os quais se a religião tem um papel no processo de globalização, seu destino é
pouco desprezível e problemático porque a globalização vem transformando o universo
religioso. Por fim, a terceira tese discute a ideia da religião universal como uma das
consequências da globalização. É em torno dessas três ideias que se articulará o artigo.
Para isso, vamos passar em revista algumas abordagens teóricas sobre o assunto a fim
de ver que entre religião e globalização se cria uma zona ao mesmo tempo de conflito,
de interinfluência e de ação recíproca.
ABSTRACT
This paper seeks to understand the nature of the relations between religion and
globalization. The debate on how to understand, analyze and interpret this relationship
is characterized by the difficulty of knowing what are the nature and status relative to
each other. In this situation, several theses appeared among which three were
predominantly evoked. The first maintains that it is the intermediary of religious
thought that the phenomenon of globalization has emerged since antiquity, then, at the
beginning they had a symbiotic relationship. The second supports the argument that if
religion has a role in the globalization process, their fate is little sleazy and problematic
because globalization is transforming the religious universe. Finally, the third thesis
discusses the idea of universal religion as one of the consequences of globalization. It is
around these three ideas that will shape the article. For this, we go over some theoretical
approaches on the subject to see that between religion and globalization creates a zone
at the same time of conflict, interinfluence and reciprocal action.
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“La globalisation que nous connaissons est portée par des croyances, c´est
un phénomène spirituel (DIDIER, 2008, p. 2)”
INTRODUÇÃO
Enquanto um tema muito complexo a ser debatido, a religião se vincula numa
definição tradicional do Ocidente. A esta tradição se opõe a do Oriente que desenvolve
uma cultura religiosa totalmente diferente daquela do Ocidente. Embora não importe
tratar longamente da origem da religião, retomar sua definição etimológica e teórica de
vários autores como Durkheim e Weber, mas gostaríamos de sublinhar que na visão
ocidental da religião, a natureza das relações entre homens e deus é essencialmente
vertical, por conseguinte, entre os indivíduos se cria um elo sociohorizontal e
compartilham entre eles fé, cultura, tradição e valor idênticos (MESLIN, 2006). Nesse
sentido, achamos que Durkheim tem razão dizendo que a religião é « um sistema
solidário de crenças e de práticas relativas às coisas sagradas ».
Por outro lado, se na prática religiosa ocidental o conceito de deus é
indispensável, na definição oriental ele é quase ausente, a religiosidade oriental se
preocupa mais a entender as razões pelas quais os seres e as coisas existem no mundo. É
o caso, por exemplo, do budismo que se considera como uma religião moral sem deus.
Isso significa que o discurso religioso divide os dois mundos. Não é na verdade o único
elemento que os opõe, a questão da racionalidade é também muito forte nesta oposição
entre Oriente e Ocidente (GOODY, 1996). Mas, se a religião divide, a globalização
tende a aproximar os dois mundos em relações de caráter internacional e transnacional.
Com efeito, segundo tema da discussão, a globalização é de difícil definição. Essa
dificuldade é o fato de que o tema abrange aspectos amplos e dimensões diversas.
Apesar das dificuldades de definição, é importante sublinhar que a globalização não é
somente um processo objetivo que se defini como nova forma de dominação, mas é
também um processo subjetivo que tem a ver com uma outra ordem de colonização
moderna das consciências. (PACE, 1999). Definida assim, a globalização deve ser
percebida como um fenômeno cuja lógica ultrapassa a dimensão do Estado-nação.
Novos conceitos surgem como sociedade global, modernidade-mundo, world system e
colocam em xeque o Estado-nação (RENATO, 2006).
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A globalização é um anglicismo de mundialização no vocabulário francês. No
dicionário francês, Larousse, a palavra globalização significa literalmente ação de
globalizar, isto é, as estratégias, as técnicas e os esforços de construir um mundo
unificado sobre o plano econômico, político e cultural pela criação de um mercado
planetário. Segundo Beck, a globalização seria o sinônimo do assassinato da distancia.
As ações que acontecem e os produtos que circulam no global não têm territórios nem
fronteiras, e isso afeta consideravelmente as diferentes esferas das atividades humanas
como a informação, a cultura, a economia, a ecologia, a técnica (BECK, 1999). Na sua
obra, O que é a globalização?, Beck sublinhou como a globalização já atinge essas
esferas mostrando que a globalidade delas é uma espécie de desorganização do mundo
para facilitar sua melhor reorganização. Eis como ele fala do tema:
Globalidade significa o desmanche da unidade do Estado e da sociedade nacional, novas relações de poder e de concorrência, novos conflitos e incompatibilidades entre atores e unidades do Estado nacional por um lado e, pelo outro, atores, identidades, espaços sociais e processos sociais transnacionais » (BECK, 1999, p. 49).
Perante esta ressignificação do mundo trazida pela globalização, a religião se
encontra então ameaçada. Portanto, o debate atual que se coloca entre religião e
globalização está procurando entender se é uma relação de influencia recíproca ou de
conflito. Em outras palavras, trata-se de saber se há uma certa interação ou interconexão
entre a religião, um dos componentes da cultura, e a globalização, processo de
transformação do mundo. Nossa preocupação aqui é tentar decifrar a complexidade
dessa relação pela formulação das perguntas seguintes às quais vamos tentar responder:
A globalização significaria o fim da religião? Uma religião universal é possível? Qual
será o destino da religião dentro da globalização?
1. A GLOBALIZAÇÃO SIGNIFICARIA O FIM DA RELIGIÃO?
Os argumentos de vários autores que trabalham sobre o tema da relação entre
globalização e religião como, por exemplo, Jean Boissonnat, Olivier Roy, Elie Arié,
Renato Ortiz e Jean-Paul Willaim parecem se concordar sobre a idéia segunda a qual as
grandes religiões monoteístas mundiais como o cristianismo, o budismo, o islamismo, o
judaísmo não somente são mais aptas a se conformar às exigências da globalização pelo
fato de que elas já possuem o que Hans Küng chama um ethos mundial que lhes permite
esta facilidade de adaptação, mas sobretudo estão mais capazes de exercer uma sobre a
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globalização uma influência considerável enfrentando potencialmente esse fenômeno.
Jean Boissonnat é o primeiro que defende essa idéia apontando que a religião
particularmente a religião judeu-cristã com as suas crenças e seus ensinamentos, é a
primeira que começou a expandir uma visão universal e global do mundo pela
veiculação de uma mensagem segundo a qual a humanidade é única porque foi criada
por um Deus único e este Deus está em todo lugar ao mesmo tempo sem, no entanto,
residir num lugar particular. Todavia, segundo ele, embora as religiões universais
contribuem a veicular a mensagem de um mundo unificado, o papel decisivo da
substituição de um mundo fragmentado para um mundo globalizado cabe também à
economia1.
Para Olivier Roy a secularização – sendo redefinida pelo processo de globalização
como a transformação do religioso em vez do seu fim – significa o destacamento da
religião da esfera cultural, principalmente a cultura percebida como indiferente e hostil.
Segundo ele, para se tornar autônoma, pura, universal e, realmente global, a religião
deve se libertar da cultura. (ROY, 2008). Esta argumentação de Roy está em
contradição flagrante com a concepção antropológica pela qual a religião é um elemento
fundamental da cultura. Mas, se antes as religiões se oponham radicalmente, hoje elas se
encontram num ponto comum que é a globalização. O professor Renato Ortiz, por sua
vez, tratando desse mesmo assunto sublinhou que, no contexto da globalização a
compreensão das religiões ditas universais releva do domínio de história e de doutrina.
(ORTIZ, 2006). Enfim, os estudos de Jean-Paul Willaim sobre a sociologia moderna da
religião mostraram que desde o fim do século XX, sob o efeito da globalização, o
mundo está conhecendo o aparecimento de várias formas de religiosidades
arbitrariamente chamadas NMR (Novos Movimentos Religiosos) em vez de seitas na
França ou cults nos Estados Unidos.
Estas considerações nos obrigam a levantar nesse debate entre religião e
globalização ao menos quatro ideias que precisam ser destacadas. Primeiro, a religião
seria um elemento catalisador para a globalização. Segundo, ela seria um ponto de
encontro e de cruzamento entre as diferentes religiões, em particular, as que são
chamadas de grandes religiões. Terceiro, a globalização oferece uma possibilidade para
outras formas religiosas poderem aparecer, enfim, o processo de globalização marcaria
1 BOISSONAT, Jean. Les religions et mondialisation. Disponivel em: http://www.teilhard.org/panier/P/site/Bernardins/Boissonnat.Bernardins.pdf. Último acesso em: 18. Nov. 2012.
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uma ruptura entre religião e cultura. Em face dessa situação, não é possível dizer que o
objetivo da globalização seria colocar fim à religião, pois em todas as considerações
acima mencionadas a religião aparece como uma instituição forte que, como as outras,
conhece momentos baixos e altos. Em resumo, para ir mais longe em nossas reflexões,
duas grandes ideias merecem ser aprofundadas: primeiro, a globalização como produto
do pensamento religioso, principalmente o cristianismo, segundo, a globalização como
elemento imprescindível para a expansão e transformação da religião tanto do ponto de
vista político como econômico. Antes de abordar a primeira ideia, é necessário lembrar
rapidamente que o debate ocorrido no século XIX entre modernidade e religião toma a
mesma conotação que domina hoje o debate entre religião e globalização. Neste
período, foi defendida a tese segundo a qual o progresso da técnica e da ciência na
sociedade industrial produzido pela modernidade colocaria um fim brutal à religião.
Portanto, hoje a mesma problemática reaparece com a globalização de uma maneira
mais acentuada.
A primeira argumentação a partir da qual precisamos considerar a religião um
elemento catalisador da globalização é, aparentemente, muito recente. Ela é a obra das
grandes religiões monoteístas mundiais que, em certo momento da historia, veiculavam
uma mensagem de visão global do mundo. Esta mensagem é tirada dos ensinos
teológicos e messiânicos de Jesus. Com efeito, segundo Jean Boissonnat, o fato de que
Jesus não deixou a seus discípulos judeus mensagem e instruções escritas, isso limitaria
a possibilidade de captar o inteiro conteúdo da sua mensagem, a dominar
completamente seu ensino fazendo dele uma obra judaica e a deformar sua palavra. Esta
atitude traduz o caráter global e universal do evangelho de Jesus. Uma das palavras
interessantes que pode nos ajudar a compreender essa visão é a seguinte: Allez! Faites
de toutes les nations des disciples, certo, trata-se de messianismo, de proselitismo, de
evangelismo ou ainda de propagantismo religioso, mas, é difícil de não enxergar numa
tal declaração os aspectos globais e universais. Em outras palavras, o evangelho de
Jesus, apesar de ter nascido numa sociedade local, teria por dever de ultrapassar este
local para se transpor no global levando em consideração as diferencias sociais e a
diversidade cultural.
Nesse sentido, qualquer sociedade, comunidade e estrutura social será capaz de
interpretar facilmente esta mensagem tentando acomodá-la à sua própria cultura, de
aceitá-la ou rejeitá-la. O cristianismo parece ser a religião mais apta a poder influenciar
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a globalização não apenas pela sua mensagem de caráter universal e sua organização2,
mas também pela sua expansão linguística3. O sociólogo francês, Didier Long, continua
nessa mesma linha de pensamento dizendo que a globalização que conhecemos hoje é
fruto das crenças, ela é um fenômeno espiritual. Com efeito, ele acrescenta que as
conquistas civilizacionais começando por as de Alexandre Le Grand (Macedônia,
Roma...) na história da antiguidade, passando pelo Islã que invadiu o Gilbratar até Induz
para chegar até o desembarque violenta dos espanhóis na América, todas essas
conquistas que se fizeram num âmbito global foram motivadas pelas crenças (LONG,
2008, p. 2 a seguir).
Fruto do pensamento judeu-cristão – se devermos admiti-lo assim – a
globalização atual nasceu na sociedade ocidental. Agindo dentro da globalização, o
religioso conhece hoje uma mutação que se caracteriza por um processo de
desterritorialização que tende a criar neo-religiões como os evangélicos, o islã
fundamentalista, e, as forças dessas neo-religiões são sua capacidade de constituir-se em
redes mundiais e sua adaptação ao mercado religioso. A demarcação que o cristianismo
faz entre o político e o religioso lhe permite de ser mais apto a influenciar o
desenvolvimento da globalização, ou seja, mesmo nos períodos de cristandade, o
imperador e o papa não foram em conflito. Embora não estejamos fazendo uma história
das religiões, mas é importante lembrar que o catolicismo europeu, o cristianismo e o
islamismo desempenharam um papel muito relevante nas atividades políticas e
econômicas que caracterizam hoje a globalização. Enfim, essa primeira idéia nos
permite compreender em que sentido o pensamento religioso pode ser um elemento
muito útil à globalização para o alcance do seu objetivo que é o de criar uma cidade
global com uma monocultura e uma religião global motivando a humanidade a mudar
seu modelo de desenvolvimento.
Gostaríamos de começar com a segunda idéia sublinhando que a globalização
das religiões encontra-se estimulada pela invenção das novas tecnologias de
2 S’agissant du monde chrétien, il convient de commencer par le catholicisme, religion qui est à la
fois la plus universalisée et la plus unie quant à la doctrine et à l’organisation. La préservation de son unité a été rendue possible par deux phénomènes d’apparence contradictoire : La centralisation romaine croissante et l’utilisation très souple des ordres monastiques. En effet, depuis 1870, date du premier concile du Vatican, le pape a accentué son autorité sur l’« administration centrale » de l’Église que forment la Curie et le Collège des cardinaux et sur les « services extérieurs » qui comprennent, en 2002, les diocèses et leurs 490 évêques (THUAL, 2003, p. 197). 3 Vingt siècles après la prédication du Christ en araméen, les 1 950 langues dans lesquelles l’Évangile a été traduit témoignent d’une façon irréfragable de la mondialisation du christianisme (Ibid, p. 198).
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comunicação (a Internet) e pela globalização das esferas de ações sociais muito
importantes, a saber, a política e a economia. Entre religião e globalização existe uma
certa interconexão e reciprocidade de tal modo de que não é possível falar da religião
sem globalização, nem falar da globalização sem considerar como os impactos
religiosos podem influenciar o começo, o lançamento, o avanço e o progresso da
globalização. No seu livro, Mendieta e Batstone se propõem explorar as tensões e os
entrelaçamentos fundamentais e formativos entre religião e globalização. Segundo eles,
a globalização da cultura que financia o monopólio capitalista é ela mesma uma
religião, o deus da religião da globalização se torna a concentração do monopólio e o
financiamento da riqueza capitalista (MENDIETA e BATSTONE, 2001, p. 1-4).
Hoje o pentecôtismo considerado como o novo avatar do imperialismo norte-
americano, é a religião que cresce com uma rapidez impressionante através do mundo.
Assim, é preciso compreender que a globalização é esse fenômeno do século XX que
traduz homogeneização, heterogeneização e interdependência das grandes esferas de
atividades humanas como a economia, a política, a cultura e a religião. Além disso,
trata-se de um processo que se acompanha constantemente dessas esferas que podemos
considerar seu braço direito. A globalização das religiões é marcada então por dois
fenômenos: desterritorialização e desculturação.
Com efeito, a desterritorialização da religião não se resume à circulação da
população mundial de um lugar a outro, mas significa que, pelo meio das ideias, dos
objetos culturais, da informação e do modo de consumo, as religiões podem circular
além do seu território de origem. Em outras palavras, elas podem transitar de um local a
outro sem, no entanto, ter abandonado seu locar original. Para realizar com facilidade
esta circulação desterritorializada, as religiões precisam ser desculturalizadas. Sobre
esse aspecto Olivier Roy disse o seguinte:
La déterritorialisation n´est pas seulement liée à la circultation des personnes (qui ne concerne que quelque pourcent de La population mondiale), mais plutôt à la circultation des idées, des objets culturels, de l´information et des modes de consommation en general dans un espace non territorial. Mais pour circuler l´objet religieux doit paraître universel, non lié à une culture spécifique qu´il faudrait comprendre avant de saisir le message. Le religieux circule donc en dehors du savoir. Le salut ne demande pas de savoir mais de croire. Les deux, évidemment, sont loin d´être incompatibles dans les religions enchassées dans la culture et développant une réflexion théologique stimulée par le contact avec la philosophie et la littérature. Mais cette connexion, non seulement n´est plus nécessaire, mais deviant un obstacle quand il s´agit de circuler en «temps réel» dans un espace où l´information a remplacé le savoir (ROY, 2008, p. 21).
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A desterritorialização que vai de par com a desculturação, são dois fatores
inerentes à globalização da religião no sentido de que para ser universal e global ao
mesmo tempo, toda religião deve se destacar da sua cultura primitiva para poder se
adaptar e integrar às outras culturas. Este abandono provisório não faz com que a
religião perde suas raízes, mas lhe permitirá de ser accessível e compatível a outras
culturas. Trata-se assim para a religião de um deslocamento, de uma reorientação e da
busca de outros horizontes. Ou seja, só por esta desterritorialização, que é em si mesma
um destacamento e não um abandono total e completo da cultura primitiva, que a
religião poderá se tornar um objeto global e mundial capaz de circular através do mundo
e penetrar em todas sociedades.
A desculturação deve ser entendida como a ruptura brutal entre a religião e a
cultura. Ela é causada pela secularização e pela globalização que compelem a religião a
construir-se como autônoma tornando-se cada vez mais hostil à cultura, em outras
palavras, como afirmam Jean Boissonnat; Olivier Roy; Elie Arié; François Thual, a
globalização seria o tempo da religião sem cultura e não tempo sem religião. O que
devemos entender por religião sem cultura? Se durante algum tempo, a religião fazia
parte da esfera cultural é porque ela era fortemente marcada pela territorialidade, ou
seja, ligada e agarrada a uma nação, a uma sociedade, a uma comunidade, a uma
civilização, portanto a uma cultura específica. Alhures, se a religião encontrava-se
compatível e indissociável da cultura é porque ela se considerava menos pagã, secular e
profana. Então, hoje, para poder responder às condições da globalização o único
caminho que ela deve tomar é oposição explicita à cultura. Ainda segundo Olivier Roy,
a desculturação significa que o religioso está circulando além de todo sistema de
dominação política, ela traduz igualmente a perda da evidencia social do religioso. Uma
das religiões que representa o protótipo dessa desculturação é o Pentecôtismo pela sua
capacidade de ser, de um lado, ao mesmo tempo uma religião local e não territorial, pela
sua competência de criar uma língua universal chamada glossolalia[8] do outro. Eis
como ele fala desta nova forma de comunicação entre crentes que não compartilham
língua comum:
Le pentecôtisme, on l´a vu met en avantl´émotion, la guérison et le parler en langues (glossolalie). Sous l´influence de l´Esprit saint, à l´imitation des apôtres, certains croyants se mettent à «parler en langues», de telle sorte que des personnes avec qui ils n´ont aucune langue commune comprennent ce qu´ils disent. Mais les pentecôtistes qui prêchent en «langues», comme on l´a vu plus haut, ne prêchent en aucune langue réelle: la glossolalia n´est qu´une succession de sons. Le «message» passe néanmoins: la parole de Dieu n´a plus besoin de
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s´inscrire dans une langue et une culture précises. C´est précisément parce que l´esprit est déconnecté de la lettre que le message est universel. Le Saint-Esprit est au-delà de la culture, même si le Christ s´est incarné (OLIVIER, 2008, p. 234).
Esses argumentos enfatizados sobre a desterritorialização e a desculturação –
duas faces de uma mesma moeda chamada globalização – não significam que a religião
vai acabar ou vai cessar de exercer seu papel de coesão social, de harmonia social e de
integração social por causa da globalização. Além disso, no âmbito local, a religião
permanece um elemento potente da cultura mesmo se no contexto da globalização,
cultura e religião são dois elementos em conflito. E como não há global sem local e que
o global e local estão em perfeita conexão, então, nem a desterritorialização nem a
desculturação nunca significarão negação ou fim da religião. Todavia, é importante
lembrar que as duas esferas, a saber, religião e cultura, permanecem independentes.
Segundo François Mabille, a globalização como a revolução das técnicas da informação
e da comunicação é também o tempo de transnacionalismo religioso. “Le
transnationalisme, dit-il, repose sur une mobilité des hommes et des idées, sur des
transferts de fonds également, bref, postule un décloisonnement géographique, une
déterritorialisation que la logique du travail en réseau acentue” (MABILLE, 2003, p. 3).
Alhures, a globalização é um fenômeno no qual o ser humano se adquire pessoal e
livremente novos deuses como o sexo, o dinheiro, a Internet (ROY, 2008; THUAL,
2003). Caracterizada também pelo aparecimento de novas formas de religiosidade, as
setas[9] que os sociólogos chamamos Novos Movimentos Religiosos (NMR) como, por
exemplo, os Testemunhos de Jeová, a globalização vem não para acabar com a religião,
mas para mostrar a distinção entre religião e esfera cultural. A cultura é problemática
para pensar a desterritorialização, a universalização, por fim, a globalização da religião.
Em vez de acabar com as atividades religiosas, a globalização com todos os seus meios
e poderes lhes oferece a oportunidade de se tornar cada vez mais forte e imponente.
Enfim, as duas ideias nos parecem complementares, pois, de um lado, sem a
capacidade de adaptar-se à globalização, a religião não poderia desenvolver-se indo
vender além das fronteiras seus produtos, do outro, as mensagens religiosas de um
mundo unificado em um só personagem, a saber Jesus, seria de uma difícil circulação
transnacional no processo da globalização política, cultural e econômica. De uma certa
maneira, a influencia pareceria recíproca, mesmo se algumas religiões ainda não
respondem às condições para entrar na globalização. Abordaremos esse aspecto no
terceiro ponto. Assim, no contexto da globalização, não podemos falar da negação nem
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do fim da religião na sociedade moderna ou pós-moderna, mas da transformação do
pensamento religioso.
2. UMA RELIGIÃO UNIVERSAL É POSSÍVEL?
Há, na sociologia contemporânea, uma discussão muito intensa, polêmica e
complexa entre o que é universal e particular. Cada tema se insere numa esfera de ação
diferente, o que significa que o universal é o contrário do particular. Nesse sentido, é
Renato Ortiz que nos ajuda a compreender melhor essa distinção por esta frase: “O
universal se associa à idéia de amplitude e mobilidade enquanto o particular tenderia ao
enraizamento, ao confinamento no interior de fronteiras bem construídas” (ORTIZ,
2006, p. 120).
Com efeito, no seu livro mundialização: crenças e saberes, Renato destacou que
por religião universal (judaísmo, confucionismo, bramanismo, budismo, cristianismo,
islamismo) devemos entender as crenças cuja apreensão do mundo propõe uma ética na
qual o indivíduo escolheria, com maior ou menor grau de autoconsciência, o caminho
da sua salvação. (ORTIZ, Op. cit). A abordagem de Ortiz como a de Roy Olivier, de
Jean-Paul e de outros autores, nos leva a compreender que a igreja perdeu seu poder
sobre os indivíduos, tal poder consiste em forçá-los a escolher um tipo de crença. A
globalização se torna ao mesmo tempo um motor de expansão para essas grandes
religiões mundiais e um ponto de encontro comum entre elas. Nas analises de Olivier
Roy e de Jean-Claude Guillebaud, a universalidade dessas religiões encontra-se
inscrever numa capacidade de desterritorializar-se, ou seja, de se expandir além do seu
próprio território, assim elas se tornam não territoriais. Um exemplo interessante é o
evangelismo protestante que se expande na América Latina principalmente no Brasil
com 25 bilhões de membros em 2007,na África do oeste e no Oriente (ROY, 2008).
Da mesma forma, estamos assistindo ao regresso de um cristianismo cada vez
menos europeu e americano, o islamismo e o budismo estão ocidentalizando-se
também. Os budistas e os muçulmanos que vem instalando-se no Ocidente declaram
que o cristianismo não é mais ocidental assim como o budismo e o islamismo não são
mais orientais. Essa desterritorialização do religioso produz algumas interações e
influencias de diversa natureza (GUILLEBAUD, 2008). Nesse sentido, a religião
universal seria a expressão de um cruzamento de civilizações além do território e da
confissão religiosa, assim o conceito de "choque das civilizações" de Samuel
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Huntington, e o dialogo entre as civilizações promovido pelo papa Jean Paul II, embora
insuficientes, poderiam nos ajudar a enxergar na globalização um ponto onde as
civilizações se confundem. Mas conforme Guillebaud vale melhor falar de "mestiçagem
cultural", ou seja, uma situação na qual a fé religiosa não será mais percebida como uma
identidade, pois essa fortaleza identitária será rompida pela globalização. Então ele
acrescentou dizendo: “Ce que j’appelle « mondialisation du religieux », c’est la
déconnexion de plus en plus avérée entre une confession et un territoire”
(GUILLEBAUD, 2008, p. 477).
Um outro estudo interessante sobre essa questão de religião global merece ser
abordado, é François Fourquet. Com efeito, o autor nos mostra que no contexto da
globalização, o resto da humanidade se vê imposto uma religião laica global
caracterizada pela democracia, pelos direitos humanos e pelo mercado econômico do
Ocidente. Esta forma de religião global deveria ser universalmente aceitada. Mas, o
Oriente se opõe a ela por três razões. Primeiro, essa religião é contestada pelo fato de
que ela é de origem cristã. Segundo, porque o Ocidente não tem mais a autoridade de
impor sua religião ao resto do mundo, enfim, em terceiro lugar, essa religião ocidental
não pode ser universal porque ela está demais dominada pela cultura ocidental. As
religiões orientais se opõem ferozmente à religião universalo-ocidental, elas recusam o
imperialismo religioso ocidental porque a civilização ocidental não detém mais o
monopólio do mundo. Assim, para nos esclarecer mais sobre esse ponto Fourquet
sublinha:
C’est le fond du problème. Devant la montée en puissance des civilisations non occidentales, l’Occident est sur la défensive; il se raidit, se protège, impose sa religion par le chantage ou la violence. Il agit comme au XVIe siècle les missionnaires qui convertissaient les Indiens d’Amérique à l’aide de la douceur évangélique des soudards espagnols. Une religion se transmet par le coeur, pas par la force. Si elle répond à un désir collectif, elle se répand comme une traînée de poudre et rien ne peut y faire obstacle. L’imposer est contre-productif, suscite la haine. C’est une vérité désagréable à entendre pour nous : les civilisations jadis assujetties n’acceptent plus le leadership occidental; ells ont acquis assurance et puissance, surtout l’Asie orientale, portée par une longue vague de croissance… L´occident perdra son leadership, c´est inéluctable (Fourquet, 2002, p. 29).
Ainda tem uma reflexão de Olivier Roy sobre a questão de religião universal que
não deveria nos escapar porque interessante e pertinente. Esta reflexão defende a
possibilidade de existência de uma religião universal. Com efeito, como já vimos, por
religião universal ele entende aquela religião que não será dominada por uma cultura
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específica, será uma religião totalmente livre de todas as culturas particulares a fim de
ser accessível a toda sociedade. Na medida em que a religião se torna não-cultural, ela
detém um caráter universal que a caracteriza dentro do processo da globalização. “Or,
affirme Roy, c´est seulement si une religion se pose, même abstraitement, comme non
culturelle qu´elle peut répondre aux conditions de la mondialisation et s´universaliser”
(ROY, Op. cit. p. 45).
Considerando uma outra perspectiva de Roy, o conceito de religião universal
não se entende no mesmo sentido que Ortiz já colocou, isto é, a existência de uma
religião única ou idêntica na qual toda humanidade se reconhece. Mas o fato é que as
grandes religiões mundiais como o cristianismo, o budismo, o judaísmo, o islamismo já
estão universalizadas, isto é, presentes sobre todos os territórios pelo meio da Internet,
das missões humanitárias e da evangelização. Abordando a discussão sobre a religião
universal, Meslin e Tillich voltam à discussão sobre a oposição entre religião e cultura
onde salienta que a relação entre os dois domínios foi sempre complexa e inelutável. De
acordo com ele, a cultura é um adquirido, pois ninguém nasce cultivado. Por sua vez,
Tillich citado por Meslin, sublinhou que a cultura é autônoma, auto-suficiente, portanto
ela não tem ordem a receber da religião, cabe a religião de conformar-se à cultura, pois
“La religion est la substance de la culture, la culture est la forme de la religion”
(MESLIN, 2006, p. 535-536). Ambos os autores concluem dizendo que, apesar de as
diferencias que as caracterizam, entre a religião e a cultura não deveria ter nem ruptura
nem divórcio, mas complementaridade, explicação de uma pela outra e continuidade.
Assim, se para falar de religião universal, é preciso haver uma ruptura total entre
religião e cultura; se a religião universal não significa uma religião única e idêntica para
todo o mundo; se a cultura e a religião permanecem dois elementos estreitamente
ligados; se uma religião pode ter uma dupla natureza, territorial e não territorial; então é
muito difícil e complicado responder pelo afirmativo que uma religião universal é
possível. Enfim, se para Roy e Guillebeaud uma religião universal não parece
totalmente impossível, para Renato é o contrário. Se segundo ele é difícil falar de uma
"cultura global" da mesma maneira não faz sentido de falar de uma "religião global",
pois o mundo globalizado não significa que tudo se torna idêntico, mesmo dentro da
globalização cada religião conserva suas próprias características. Perceber um mundo
no qual existe uma religião única para todo mundo não é possível, acrescentou ele. A
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religião, além de tudo, permanece um elemento crucial da cultura (ORTIZ, Op. cit.
2006).
3. QUAL SERÁ O DESTINO DA RELIGIÃO DENTRO DA
GLOBALIZAÇÃO?
Se a resposta a essa questão tiver elementos vantajosos para algumas religiões,
para outras a situação é complexa, em outras palavras, se a globalização oferece
aberturas, privilégios e possibilidades favoráveis a algumas religiões, ela coloca,
entretanto, em obstáculos e dificuldades o desenvolvimento de outras que, por causa da
sua estrutura, se sentem incapazes e impotentes para enfrentar esse fenômeno. Portanto,
nessa situação, um destino positivo, feliz, proveitoso e agradável dentro do processo da
globalização não é garantido identicamente a todas as religiões. Com efeito, voltando ao
Olivier Roy, ele sublinha que o cristianismo inclusive suas diversas formas religiosas, a
saber, protestantismo, evangelismo, pentecôtismo, assim como o islamismo e o budismo
são religiões que já tiverem e têm ainda uma estrutura organizacional accessível à
globalização, portanto não elas terão problema nenhum para aproveitar dos seus
benefícios. Essa facilidade é traduzida, por uma outra vez, pela capacidade dessas
religiões de se desterritorializarem e se desculturalizarem.
Como já foi dito por Olivier Roy, uma religião que se agarra fortemente a sua
cultura de origem, terá grandes dificuldades para se adaptar à globalização e seus
efeitos. É o caso, por exemplo, da ortodoxia russa e do catolicismo romano. A ortodoxia
russa e o catolicismo romano estão em crise porque conhecem o que Olivier Roy chama
la sainte ignorance (a santa ignorância). A santa ignorância, segundo o autor, é o fato de
ignorar uma cultura percebida como pagã para salvar a pureza da sua fé, isso faz muito
tempo desde que a igreja católica considera a moral moderna como pagã, o papa a tratou
de culture de mort (cultura de morte), assim a ortodoxia russa e o catolicismo romano
ficam fechados à cultura europeia sem poder abrir-se ao resto do mundo4. A
globalização cria um mercado universal dentro do qual circulam igualmente os produtos
religiosos que, na percepção cristã, em particular, no protestantismo, não têm lugar fixo
4 Para avançar mais no assunto ver Entretien accordé par Olivier Roy au journal Le Monde le 20.12.08. Disponível em: http://seraphim.over-blog.com/article-les-religions-a-l-epreuve-de-la-mondialisation-37768932.html. Último acesso em: 2 Sep. 2012.
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do mesmo modo só o Espírito Santo não precisa de um lugar fixo para se manifestar. O
cristianismo na sua essência é, segundo Michel Fedou, uma religião que está apta a
receber a globalização. Essa aptidão se explica não somente pela sua história quando
disser isto:
Divers facteurs avaient permis cette évolution: des événements d’ordre politique, tels que les conquêtes d’Alexandre et l’avènement de l’Empire romain; le développement d’échanges commerciaux et de migrations à l’époque hellénistique; l’essor de la philosophie stoïcienne, qui élargissait l’idéal de la cité antique et présentait l’homme comme citoyen du monde; l’ouverture à des sagesses et religiosités venues de l’Asie mineure ou même de l’Inde (FEDOU, 2002, p. 218).
mas também pela sua tradição doutrinal. Sobre um tal aspecto, seria bom retomar suas
palavras:
Le christianisme a toujours été convaincu d’avoir une responsabilité particulière par rapport à l’avenir de la «terre habitée» (oikoumenè). Cette conviction n’éclaire pas seulement le développement des missions jusqu’aux pays les plus lointains; elle a aussi joué comme un puissant facteur d’invention dans l’histoire des techniques et des sciences, dans l’ordre social et politique, et, plus largement, dans tous les domaines où il s’avérait possible d’humaniser la nature et le monde (Ibid, p. 219).
Essas duas dimensões do cristianismo podem ser encontradas nas palavras
bíblicas em Gálatas 3, 28 onde é dito: “Dessarte, não pode haver judeu nem grego; nem
escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo
Jesus”. Do outro, em Marcos 16, 15 é explicitado a missão evangélica confiada aos
discípulos que transformará o cristianismo em uma religião universal, então é dito: “E
disse-lhes: Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura”. Essas palavras
bíblicas mostram a tal ponto que o cristianismo se torna uma religião não cultural e não
territorial com objetivo principal de expandir a mensagem do Cristo-Jesus a todo o
mundo sabendo que finalidade dessa mensagem é chegar a criar uma sociedade global
em Jesus. Porém, dois aspectos fazem obstáculo principalmente a esse princípio de
evangelizar e o de submeter a terra ao evangelismo cristão.
Com efeito, a história cristã é marcada por cenas violentas que se relacionam
com este princípio sacramental de evangelizar o mundo. Houve muita violência contra
os outros grupos sociais de crenças diferentes para aceitar a religião cristã que pretende
se afirmar como « verdadeira religião ». Por outro lado, o princípio de submeter a terra
causou também algumas ações destrutivas contra a natureza. Segundo alguns autores, o
cristianismo é a religião cristão é a mais desrespeitosa da natureza, principalmente,
durante suas guerras contra a magia e a feiticeira nos séculos XVII a XIX.
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O islamismo opondo-se cada vez mais à religião ocidental está conhecendo uma
expansão considerável no mundo (Europa, Ásia e África) pelo fato de que o oumma que
é a comunidade dos crentes é por definição supranacional. No seu texto, René Otayek
mostrou como o islamismo pôde atingir o oeste da África. Segundo ele, a
transnacionalização do islamismo que se limita à África subsaariana não é apenas uma
questão das instituições de redes político-comerciais ou da civilização material, mas
também uma questão de cultura e de símbolos, pois a globalização é um fenômeno que
se constrói e se desconstrói. (OTAYEK, 2003).
Como uma das grandes religiões mundiais, o budismo é por natureza universal,
pois não dogmático, ele transmite uma mensagem baseada na abordagem racional e
científica. Ele se destaca completamente da idéia de deus porque ele é considerado
como uma religião moral. Ele começa a se expandir no resto do mundo a partir do
século XX. Na Europa, os países mais atingidos pelo budismo são o Reino Unido com
1,2 % e a França com 1,1 de budistas. Nos Estados Unidos também o budismo atinge
um nível considerável de 2 %. Alguns autores como Jean-Paul Willaim e Olivier Roy
falam de um budismo ocidentalizado. Na América do sul a presença do budismo é quase
desprezível, sobretudo no Brasil (0, 130 %) e na Argentina (0,1 %), mas em Costa Rica
com seus 2,4 %, é o país mais budista do continente5. Enfim, o estatuto de universal
reconhecido a cada uma dessas religiões ditas grandes religiões (cristianismo, judaísmo,
islamismo, budismo) encontra sua força na sua capacidade de responder às ofertas do
mercado religioso internacional caracterizado pela evangelização via órgãos de
comunicação principalmente a TV e a Internet, pelas missões de caráter humanitário; e
de se adaptar às condições impostas pela globalização que são em geral a
desterritorialização e a desculturalização.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma, se a globalização parece favorável para as religiões universais é
porque a visão delas de viver numa cidade-mundo encontra-se compatível a ela. Por
exemplo, com a Internet, isto não é mais um sonho, mas uma realidade, o mundo é
reduzido a uma pequena aldeia. Com o Telê evangelismo também que já atinge um
nível extraordinário, nós estamos assistindo a uma circulação rápida dos produtos
5 Consultar: http://fr.wikipedia.org/wiki/Bouddhisme_dans_le_monde. Último acesso em: 2 Sep. 2012.
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religiosos. O mercado religioso é transnacional, universal e ao mesmo tempo local, ou
seja, sem precisar sair da casa ou do território respectivo, alguém pode participar nas
ações desse mercado pelo meio da Internet. Por outro lado, se a globalização é um
grande obstáculo para algumas outras religiões é porque estas não se deixam
transformar por ela, pois ela é, na sua essência, um processo de homogeneização e de
heterogeneização; de construção e de desconstrução; de ordem e de desordem; de
organização e de desorganização.
A relação entre religião e globalização não é simples, mas é muito complexa. É
muito difícil então fechar o debate dizendo que religião e globalização estão totalmente
em conflito ou se influenciam continuamente, pois as considerações históricas e
sociológicas acabaram de mostrar que entre elas se cria uma zona de tensão, de conflito,
de interinfluência e de ação recíproca. Falando dessa reciprocidade, Mendieta e
Barstonne sublinham que hoje a religião é inseparável da globalização da mesma
maneira que a economia, a política e a tecnologia (MENDIETA e BARSTONNE, op.
cit. 2001). Talvez a globalização possa colocar fim às religiões mais territoriais e
fortemente concentradas sobre a sua cultura de origem. Todavia, entre a religião e a
globalização não pode existir vencedor nem perdedor, trata-se de um jogo a suma igual.
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