Relatório Sobre o Retorno de Brasileiros
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permitida a reproduo deste texto e dos dados contidos, desde que citada fonte. Reprodues para fins comerciais so proibidas. Como citar esse texto:
BOTEGA, Tula; CAVALCANTI, Leonardo; OLIVEIRA, Antnio Tadeu (Orgs.). Migraes Internacionais de Retorno no Brasil. Braslia: Relatrio, 2015
URL: http://portal.mte.gov.br/obmigra/home.htm Apoio:
Coordenao Geral de Imigrao -CGIg
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SUMRIO
INTRODUO ............................................................................................................. 3
1. CONTEXTUALIZAO TERICA ....................................................................... 4
1.1 Tipologias de retorno ........................................................................................ 11
1.2 O retorno luz de Abdelmalek Sayad ............................................................... 15
1.3 Preparao do retorno e reinsero na sociedade de origem ............................. 17
2. O CASO BRASILEIRO .......................................................................................... 20
2.1 Dados do censo 2010 ........................................................................................ 23
2.2 Perfil dos migrantes de retorno no Brasil .......................................................... 26
3. MIGRAO DE RETORNO DESAFIOS E PERSPECTIVAS ......................... 38
ANEXOS PORTAL DO RETORNO ....................................................................... 40
BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................... 49
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LISTA DE QUADROS E GRFICOS
Quadro 01: As teorias da migrao de retorno .............................................................. 9
Quadro 02: Tipologias de retorno ................................................................................ 14
Quadro 03: Atividades do Programa de Apoio ao Retorno Voluntrio da OIM ......... 54
Grfico 01: Distribuio etria dos migrantes de retorno ............................................ 28
Grfico 02: Nvel de instruio dos migrantes retornados........................................... 30
Grfico 03: Distribuio de migrantes brasileiros retornados, por condio de
ocupao, segundo pas de residncia anterior ............................................................ 34
LISTA DE TABELAS
Tabela 01: Fluxos migratrios para o Brasil, segundo pas de residncia anterior ...... 24
Tabela 02: Fluxos migratrios por nacionalidade, segundo pas de residncia anterior
Brasil, 2010 ............................................................................................................... 25
Tabela 03: Fluxos migratrios segundo as principais Unidades da Federao .......... 25
Tabela 04: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por sexo, segundo pas de
residncia anterior ....................................................................................................... 27
Tabela 05: fluxos migratrios de brasileiros retornados, por grupos de idade, segundo
pas de residncia anterior ............................................................................................ 29
Tabela 06: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por nvel de instruo,
segundo pas de residncia anterior ............................................................................ 31
Tabela 07: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por condio de atividade,
segundo pas de residncia anterior ............................................................................ 32
Tabela 08: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por condio de ocupao,
segundo pas de residncia anterior ............................................................................ 33
Tabela 09: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, segundo grupos
ocupacionais, por pas de residncia anterior ............................................................. 35
Tabela 10: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por rendimento mdio
mensal domiciliar per capita, em salrios mnimos, segundo pas de residncia
anterior ........................................................................................................................ 36
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LISTA DE FIGURAS
Figura 01: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, segundo as principais UFs de
residncia, Brasil, 2010 ................................................................................................ 26
Figura 02: Portal do Retorno........................................................................................ 41
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
APS Agncias da Previdncia Social
ARB Autorizao de Retorno ao Brasil
ASBRAD Associao Brasileira de Defesa da Mulher, da Infncia e da Juventude
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
CBM Conferncia Brasileiros no Mundo
CIAAT Centro de Informao e Assessoria Tcnica
CPF Cadastro de Pessoa Fsica
CRBE Conselho de Representantes de Brasileiros no Exterior
EJA Educao de Jovens e Adultos
ENCCEJA Exame Nacional de Certificao de Competncias de Jovens e Adultos
FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Servio
FIES Fundo de Financiamento Estudantil
ISEC Instituto de Solidariedade Educacional e Cultural
LATAM Rede Europia e Latino-americana de Retorno
MDS Ministrio de Desenvolvimento Social e Combate Fome
MEC Ministrio da Educao
MJ Ministrio da Justia
MRE Ministrio das Relaes Exteriores
NIATRE Ncleo de Informao e Apoio a Brasileiros retornados do Exterior
OEI Organizao dos Estados Iberoamericanos
OIM Organizao Internacional para as Migraes
PRONATEC Programa Nacional de Acesso ao Ensino Tcnico e Emprego
PRV Programa de Retorno Voluntrio
PRVR Programa de Apoio ao Retorno Voluntrio e Reintegrao
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SBPE Brasileiro de Poupana e Emprstimos
SEBRAE Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas
SENAC Servio Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI Servio Nacional de Aprendizagem Industrial
SINE Sistema Nacional do Emprego
TEM Ministrio do Trabalho e Emprego
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3
MIGRAES INTERNACIONAIS DE RETORNO NO BRASIL1
Tula Botega2
Leonardo Cavalcanti3
Antnio Tadeu de Oliveira4
INTRODUO
O fenmeno da migrao internacional, no final do sculo XX, experimenta
uma srie de mudanas a partir da globalizao, da heterogeneidade em relao aos
pases de origem e de destino, polticas restritivas, novas formas de migrao,
preocupao com as questes de integrao, surgimento de espaos e comunidades
transnacionais, entre outros (MASSEY, 1999; ARANGO, 2000).
Nesse contexto, e com a crise econmica que atingiu os Estados Unidos,
pases da Europa e Japo, no perodo a partir de 2007, h um significativo aumento no
nmero de migrantes retornados, o que faz com que este fenmeno ganhe relevncia
nas agendas tanto de pesquisa quanto das autoridades pblicas.
Segundo o Censo de 2010, 65,6% (ou 174.597 mil indivduos) dos imigrantes
internacionais no Brasil so nacionais, ou seja, imigrantes de retorno, sendo estes,
majoritariamente, provenientes dos Estados Unidos (43,72%), Japo (36,88%) e
Paraguai (13,74%).
Mais do que presena numrica dos retornados nos fluxos de imigrantes
internacionais que adentram no Brasil, as implicaes sociais, econmicas,
psicolgicas, familiares e laborais da reinsero desses migrantes na sociedade de
origem se colocam como desafios que precisam ser melhor investigados.
1 Este relatrio traz alguns captulos da dissertao de mestrado de Tula Botega, intitulada Migrao
internacional de retorno e mobilidade social: uma anlise a partir do caso de migrantes retornados do
estado de Gois, que est sendo desenvolvida no mbito do Programa de Ps-Graduao em Estudos Comparados sobre as Amricas do CEPPAC, sob a orientao do Prof. Dr. Leonardo Cavalcanti. 2 Pesquisadora do Observatrio das Migraes Internacionais OBMigra. Mestranda em Cincias
Sociais no Programa de Ps-Graduao do Centro de Pesquisa e Ps-Graduao sobre Amricas CEPPAC/UnB. Integra tambm a equipe de pesquisa do Centro Scalabriniano de Estudos Migratrios CSEM/Braslia. 3 Coordenador Cientfico Observatrio das Migraes Internacionais OBMigra e Professor da
Universidade de Braslia (UnB), CEPPAC. 4
Coordenador Estatstico Observatrio das Migraes Internacionais OBMigra e doutor em demografia, IBGE.
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4
dentro desse contexto que o presente relatrio busca abordar aspectos
tericos da migrao internacional de retorno em geral (captulo 1) e,
especificamente, o caso brasileiro a partir da anlise dos dados do Censo de 2010
(captulo 2). Por fim, esto nossas consideraes finais, onde refletimos sobre os
desafios e perspectivas que o incremento dos fluxos de migrao de retorno para o
Brasil coloca para as pesquisas e para as aes governamentais e de organismos
internacionais. Destacamos ainda a descrio das informaes reunidas no Portal do
Retorno, principal poltica do Ministrio das Relaes Exteriores (MRE) no que diz
respeito migrao de retorno, que se encontra anexada ao presente relatrio.
1. CONTEXTUALIZAO TERICA
Tradicionalmente, a migrao de retorno definida como o regresso de
migrantes para a terra de origem ou de trnsito, depois de terem residido em outro
lugar, o que pode ocorrer dentro dos limites territoriais de um pas ou fora de suas
fronteiras. Alm disso, o retorno pode ser forado devido a uma deciso
administrativa ou judicial ou voluntrio caso seja produto da livre escolha do
indivduo. Temos tambm o retorno assistido quando o migrante volta para a terra de
origem com o apoio logstico e financeiro de um Estado, Organizao no
governamental ou organizao internacional, ou retorno espontneo, quando o
regresso se d por conta prpria (CSEM, 2011).
Entretanto, o carter complexo e dinmico do retorno revela que este no o
fim do processo migratrio, mas sim uma parte dele. Em outras palavras, o retorno
no necessariamente definitivo e permanente, mas uma fase do processo migratrio,
que tem efeitos sobre as pessoas e os lugares, tal como a emigrao (RIVERA-
SNCHEZ, 2013; p. 57 grifos nossos).
Neste sentido, tendo em vista a diversidade dos fluxos migratrios
internacionais e dos tipos de migrantes, a diminuio dos custos de transporte e as
facilidades dos meios de comunicao, o retorno se torna um processo de mltiplas
fases. Todos esses fatores apontam que em termos de experincias migratrias, sair ou
permanecer, os padres de mobilizao de recursos, status legal, motivaes e
projetos e impactos nos pases de origem, os retornados constituem, hoje, um grupo
de atores extremamente heterogneo (CASSARINO, 2004; p. 270 grifos nossos).
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Segundo Durand (2006), a deciso de retornar uma resoluo semelhante
que se d no momento da partida, podendo-se afirmar que se reinicia o processo
migratrio, porm, no sentido inverso, e que, portanto, se ingressa novamente em uma
fase de tomada de decises. Contudo, no se pode simplesmente transportar
mecanicamente as teorias da migrao para entender o retorno, uma vez que este tem
suas especificidades, as quais obrigam a repensar teoricamente este fenmeno
(DURAND, 2006; p. 168).
Assumindo, ento, que o retorno tem uma complexidade prpria, faz-se
necessrio revisitar as teorias de migrao internacional para entender como estas
abordam o tema retorno (CASSARINO, 2004; DURAND, 2006; RIVERA-
SNCHEZ, 2013).
A explicao sobre a migrao de retorno perpassa por cinco abordagens
tericas, basicamente. Primeiramente, na perspectiva neoclssica, o retorno
entendido como resultado de uma migrao mal sucedida, onde os resultados
esperados em relao ao salrio e ao emprego no foram alcanados, o que implica
assumir uma falha no clculo de custo-benefcio que levou diminuio e/ ou
interrupo do tempo de migrao (CASSARINO, 2004; DURAND, 2006; RIVERA-
SNCHEZ, 2013).
Uma das crticas teoria neoclssica que ela desconsidera um fator
importante na tomada de deciso de retornar: o acmulo de informao e a situao
atual do migrante, que muito diferente da inicial. A mudana de perspectiva, a partir
do destino, permitiria ao migrante realizar o clculo de custo-benefcio com
conhecimento de causa, isto , saber por experincia prpria o que significa viver e
trabalhar no estrangeiro. Assim, tomar a deciso de retorno, a partir da sociedade de
destino, significa que o custo psicolgico da ausncia, a saudade e as dificuldades de
adaptao j foram experimentadas pelo migrante e tais elementos so fundamentais
nesse clculo de custo-benefcio de carter econmico (DURAND, 2006).
J a teoria da nova economia da migrao argumenta que o retorno o
resultado de uma estratgia calculada e definida (coletivamente) pela unidade familiar
do migrante, situando-se no mbito do projeto migratrio. Neste sentido, seria uma
evidncia de sucesso, tendo em vista que o objetivo de buscar melhores condies de
vida, haja vista o diferencial de salrios entre os pases, teria sido alcanado com a
migrao. Nesta perspectiva, as remessas, o conhecimento e as habilidades adquiridas
no exterior seriam fatores influentes sobre a probabilidade de retornar (RIVERA-
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SNCHEZ, 2013). Tais abordagens, por no fazerem referncia ao ambiente social,
econmico e poltico do pas de origem, acabam reduzindo os atores e suas
motivaes para retornar aos fatores financeiros e econmicos e, consequentemente,
tratam as experincias de migrao de retorno isoladamente (CASSARINO, 2004; p.
257).
O entendimento contextual da migrao de retorno trazido pela abordagem
estruturalista. Aqui o retorno no analisado somente com referncia experincia
individual do migrante, mas em correspondncia com a realidade econmica e social
do pas de origem e em relao s suas prprias expectativas, o que constitui uma
relao complexa (CASSARINO, 2004).
A relao assimtrica entre os pases de origem e de destino pode impor-se
tambm ao retorno e no oferecer condies suficientes para uma mobilidade social
ascendente e talvez nem sequer para uma readaptao ou reajuste de expectativas
sociais. Isso porque esta perspectiva parte do princpio de que no existe um processo
de intercmbio de recursos permanente entre ambos os pases, ou seja, assume que o
migrante se manteve desconectado do ambiente social e das informaes relativas ao
pas de origem durante o tempo de estada em outro pas, o que implica em no
reconhecer a circulao e a mobilizao de recursos entre estes dois contextos
(RIVERA-SNCHEZ, 2013; p. 60). Por essa razo os migrantes so vistos como
despreparados para o retorno devido dificuldade de ter as informaes necessrias e
reais acerca das mudanas que aconteceram na sociedade de origem, as quais so
fundamentais para um retorno seguro (CASSARINO, 2004).
Alm disso, essa dicotomia estrutural entre centro e periferia delimita um
pessimismo em relao s iniciativas dos retornados, o que se revela tambm na
esfera do consumo, tendo em vista que os retornados tendem a orientar seus padres
de consumo para investimentos improdutivos e ostentatrios (bens de luxo, grandes
casas, dentre outros), sendo que este padro de consumo reproduz as relaes
desiguais entre centro (destino) e periferia (origem) (CASSARINO, 2004). Em outras
palavras, o impacto dos retornados no necessariamente seria visto como uma
possibilidade de efeitos multiplicadores de desenvolvimento na medida em que est
mediado justamente por condies diferenciadas dos contextos de destino e origem.
Na medida em que o ato de retornar implica em uma readaptao a outro
ambiente, pode, por outro lado, conduzir a uma re-emigrao, no caso de que tal
ajuste no seja satisfatrio. Dessa forma, no somente as habilidades adquiridas e o
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dinheiro acumulado pelo migrante interferem no retorno, mas os fatores contextuais
tambm operam um papel central (RIVERA-SNCHEZ, 2013).
A perspectiva transnacional questiona a interpretao da migrao de retorno
como algo definitivo e unilateral e assume que este possui mltiplas dimenses, tendo
em vista os laos que unem os migrantes com seus lugares de origem e de destino.
Dessa forma, afirma que as concepes binrias (baseadas na dicotomia entre origem
e destino) j no do conta de capturar toda a complexidade da migrao internacional
contempornea, tendo em vista que os imigrantes desenvolvem redes, atividades,
estilos de vida e ideologias que englobam a sociedade de origem e de destino, o que
requer novas conceitualizaes para dar conta da diversidade de perfis que se
apresentam (CAVALCANTI; PARELLA, 2013; p. 10).
Em suma, esta corrente vai alm da concepo do retorno como o inverso da
emigrao e pressupe uma viso dinmica e transitria sobre ele, tendo em vista a
multiplicidade de configuraes de tempo e espao das migraes contemporneas e
tambm a imerso em uma dinmica de circularidade e das relaes transnacionais
que vinculam sociedades de origem e destino (CAVALCANTI; PARELLA, 2013;
p.14).
Neste contexto, a migrao de retorno parte do processo migratrio e se
inscreve na rota sistmica e complexa do mesmo processo, ao qual se inclui relaes
econmicas, sociais e culturais entre as sociedades de origem e as de destino,
mediadas por uma constante troca de recursos, dinheiro, bens, ideias, informaes e
valores. Para Cassarino (2004), os retornados so vistos como atores que renem os
recursos necessrios para proteger e preparar o seu regresso, a partir da manuteno5
de laos fortes com a origem, de visitas peridicas e regulares e do envio peridico de
remessas para seus familiares (CASSARINO, 2004).
Desde essa perspectiva, o retorno deve ser estudado considerando as
caractersticas e modalidades de envolvimento tanto dos lugares de origem como dos
de destino, mais, ainda, tomando em conta que o ambiente social e as estruturas
institucionais de ambas as sociedades delineiam o retorno, o qual pode tratar-se,
inclusive, de uma escala no trajeto da vida como imigrante (RIVERA-SNCHEZ,
2013; p. 61) ou gerar uma re-emigrao para um terceiro local.
5 preciso considerar a possibilidade de o migrante, durante o processo migratrio, diminuir ou perder
os contatos com a origem. Isto , a dinmica da migrao pode desestruturar os laos do migrante com
o local de origem e afetar o preparo de seu retorno, assim como a maneira com que este se efetivar e
os processos de reinsero na sociedade de origem.
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Por fim, est a teoria das redes sociais. Nesta perspectiva os migrantes
retornados so vistos como atores que renem os recursos necessrios para proteger e
preparar o seu regresso, por meio da mobilizao de recursos disponveis no nvel de
redes sociais e econmicas transfronteirias, isto , os recursos necessrios para
assegurar o retorno derivam dos padres de relaes interpessoais oriundos de
experincias passadas de migrao dos retornados (CASSARINO, 2004; p. 266).
Aqui, o capital social ganha destaque e entendido em termos de recursos providos
pelas famlias ou parentes dos retornados, sendo importante para o sucesso das
iniciativas e projetos dos migrantes no retorno.
As estruturas sociais sobre as quais se assentam as redes sociais e seu
constante intercmbio conformam certos capitais que so teis tanto para emigrar
quanto para retornar. Segundo Durand (2006), o capital social pode servir tanto para
empreender uma aventura migratria como para retornar, explicando tanto a
permanncia como a factibilidade do retorno (DURAND, 2006; p. 179). No entanto,
nem todos os migrantes tm acesso homogneo a tal capital e nem esto inseridos da
mesma forma nas redes, logo, as possibilidades e condies do retorno tambm se
configuram heterogneas e dependero do acesso ao capital social, em consequncia,
das posies dos atores nos campos sociais (RIVERA-SNCHEZ, 2013; p. 60).
Em suma, nesta perspectiva, os migrantes de retorno so atores sociais que
esto envolvidos em uma srie de ramificaes relacionais, as quais influenciam seu
comportamento. Nesse sentido, diferentes estruturas de rede oferecem diferentes
oportunidades, orientaes e estratgias em dado contexto.
Desde a perspectiva de redes resulta relevante estudar as relaes entre os
retornados e os imigrantes que no retornam, mas tambm, de maneira paralela, dar
conta da mobilizao de recursos que ocorre atravs das redes que atravessam as
fronteiras (RIVERA-SNCHEZ, 2013; p. 61)
Alm disso, preciso reconhecer o papel que as redes sociais exercem sobre
as migraes de retorno. Tendo em vista o grande impacto que estabelecem sobre o
processo social das migraes, contribuindo definitivamente para o fortalecimento e
expanso dos fluxos migratrios. Dito isso, aqueles que retornam ocupam posies
estruturais fundamentais para a organizao e sustentao dos sistemas de migrao,
em especial, posies estruturais de intermediao dos fluxos entre origem e destino,
utilizando seus laos fortes nas redes pessoais para recrutamento, agenciamento e
suporte aos novos migrantes (SOARES, 2009).
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Uma sntese da anlise das teorias sobre migrao internacional a partir do
enfoque do retorno aparece no quadro 01.
Quadro 01: As teorias da migrao de retorno
Economia
Neoclssica
Nova
Economia da
Migrao
Estruturalismo Transnacionalismo Redes
Sociais
Migrao de
retorno
Aqueles que
ficam no pas de
destino so os
bem-sucedidos. O
retorno uma
anomalia, seno o
fracasso da
experincia
migratria.
O retorno faz
parte do
projeto
migratrio
(visto como
uma
estratgia calculada). Ele ocorre
quando os
objetivos do
migrante so
alcanados no
pas de
destino.
Dicotomia
centro/periferia. O
retorno ao pas de
origem ocorre sem
que haja mudanas
ou compensaes
nas limitaes
estruturais nos
pases de origem
perifricos. O
retorno tambm se
baseia em
informaes
incompletas sobre
o pas de origem.
O retorno no
necessariamente
permanente. Ele
ocorre quando so
reunidos recursos
financeiros e
benefcios
suficientes para
sustentar a famlia
e quando as
condies no pas de origem so
favorveis. Ele
preparado. O
retorno tem fundo
social e histrico.
O retorno
garantido e
sustentado
por redes
transfrontei-
rias de
relaes
sociais e
econmicas
que
transmitem
informaes.
Voltar
constitui
apenas um
primeiro
passo para a
concluso do
projeto
migratrio.
O migrante
retornado
Abarca o
migrante
malsucedido que
no pde
maximizar sua
experincia no
exterior.
Abarca o
migrante bem-
sucedido cujos
objetivos
foram
alcanados no
pas de
destino. O
retornado um
intermedirio
financeiro e
um assalariado
visado.
O retornado
(migrante que no
bem nem
malsucedido) leva
de volta suas
economias ao pas
de origem. As
expectativas de
retorno so
reajustadas e
adaptadas ao
contexto estrutural
do pas de origem.
Divergncias comportamentais
ocorrem no
retorno. Somente o
retorno por doena,
velhice,
aposentadoria e
falta de talento, ou
seja, o custo do
Pertence a um
grupo tnico (ou
seja, a conscincia
de dispora)
globalmente
disperso.
Experincia
migratria bem-
sucedida antes de
retornar. O
retornado define
estratgias para
manter a
mobilidade
transfronteiria e os
vnculos embutidos
em sistemas
globais de relaes
tnicas e parentais.
Um ator
social que
tem valores,
projetos e
sua prpria
percepo do
ambiente de
retorno.
Rene
informaes
sobre o
contexto e as
oportunida-
des nos
pases de
origem. Os
recursos so
mobilizados
antes do
retorno.
Pertence a
redes
-
10
retorno reduzido. transfrontei-rias que
envolvem
migrantes e
no
migrantes.
Motivao
dos
retornados
A experincia
migratria falhou.
Precisa retornar
para o pas de
destino.
Apego ao lar e
famlia.
Metas so
atingidas.
Apego ao lar e
famlia, nostalgia.
As motivaes so
reajustadas de
acordo com as
realidades do
mercado e relaes
de poder do pas de
origem.
Apego ao lar e
famlia. Laos
familiares so
cruciais. Condies
sociais e
econmicas do
retorno so
percebidas como
suficientemente
favorveis para
motivar o retorno.
Inserido e
moldado por
oportunida-
des sociais,
econmicas e
institucionais
no pas de
origem, bem
como, pela
relevncia
dos seus
prprios
recursos.
Capital
financeiro
Nenhuma renda
ou economia
repatriada do
exterior.
As remessas
constituem em
uma segurana
contra eventos
inesperados.
Ajuda os
membros da
famlia.
Economias e
remessas no tm
impacto real sobre
o desenvolvimento
do pas de origem.
Os membros da
famlia
monopolizam os
recursos
financeiros. No h
efeito
multiplicador.
Penses e
benefcios sociais
so partes das
remessas. Recursos
financeiros so
usados de acordo
com as condies
institucionais do
pas de origem.
Transforma a
estrutura
econmica e
poltica das reas
de destino.
Remessas e
economias
constituem
apenas um
tipo de
recursos.
Podem ser
investidos
em projetos
produtivos
que visam
garantir o
retorno.
Capital
humano
As habilidades
adquiridas no
exterior
dificilmente
podem ser
repassadas no
pas de origem.
Capital humano
desperdiado.
O desenvolvi-
mento de
habilidades
varia de acordo
com a
probabilidade
de retorno.
As habilidades
adquiridas no
exterior so
desperdiadas
devido a limitaes
estruturais dos
pases de origem.
Status social no
muda.
As habilidades so
aperfeioadas e a
experincia
educacional
adquirida no
exterior permite
uma mobilidade
ascendente.
Habilidades
adquiridas no
exterior,
assim como
conhecimen-
to e
experincias,
contatos e
valores so
fatores que
contribuem
para garantir
um retorno
bem-
sucedido. Fonte: CASSARINO (2004).
-
11
Feita essa reviso terica, importante perceber que nenhuma das teorias
capaz de explicar isoladamente as motivaes, os contextos scio-econmicos e as
formas de insero no pas de destino dos migrantes, o que tambm se aplica aos
contextos de retorno. Isso porque a migrao demasiada diversa e complexa para ser
explicada por uma nica teoria (ARANGO, 2000: 33).
Nesse sentido, a teoria nos faz perceber que o retorno no necessariamente
de uma estratgia calculada, mas pode ser o resultado de circunstncias desfavorveis
e inesperadas no pas de destino que obrigam o emigrante a retornar. Em outras
palavras, o retorno no um processo automtico, uma consequncia direta de uma
varivel externa, mas implica em um processo complexo de tomada de decises e de
avaliaes pessoais e familiares (DURAND, 2006; p. 176).
1.1 Tipologias de retorno
Alm das teorias, na literatura sobre o retorno nota-se a tentativa constante de
categorizar o fenmeno a partir de tipologias para retratar a diversidade de
circunstncias e motivaes que permeiam a volta do migrante para o local de origem.
Para Cassarino (2004) os tipos de retorno so definidos a partir do grau de
mobilizao de recursos e preparao de migrante, o que implica na seguinte
categorizao: 1) retornados com alto nvel de preparo (preparedness): so aqueles
que organizam o retorno de forma autnoma, mobilizando os recursos necessrios.
Em geral, envolve os migrantes que consideram j ter acumulado recursos (tangveis e
intangveis) suficientes para efetivar seus projetos na origem; avaliam custos e
benefcios do retorno considerando o contexto da origem; tentam garantir a
mobilidade entre as fronteiras a partir da documentao. 2) retornados com baixo
nvel de preparo: houve pouco tempo de migrao para acumular os recursos
necessrios; algo interrompeu abruptamente a migrao e os custos em voltar so
menores do que os de permanecer; depender dos recursos disponveis na origem para
sua reintegrao. 3) sem nvel de preparo: so aqueles que foram obrigados a retornar
seja por deportao, seja por recusa do pedido de asilo (CASSARINO, 2004; p. 274).
Durand (2006), por sua vez, estabelece seis modalidades diferentes: 1)
Retorno voluntrio do migrante estabelecido: refere-se ao migrante que regressa
voluntariamente depois de um grande perodo no estrangeiro; tem documentos e j
-
12
adotou outra nacionalidade; h uma mudana de residncia e um novo processo de
estabelecimento. Incluem-se nesta categoria: migrantes econmicos que voltam
depois de muito tempo com poupanas; migrantes que retornam porque as condies
no pas de origem esto melhores; exilados polticos ou refugiados; e migrantes
aposentados. 2) Retorno do migrante temporrio: refere-se a trabalhadores
temporrios, os quais se enquadram em programas especficos em que o contrato
exige ou obriga o retorno. 3) Retorno transgeracional: trata-se do retorno dos
descendentes dos migrantes filhos, netos e bisnetos. Utilizam-se os laos sanguneos
e culturais para facilitar o ingresso ou a naturalizao. 4) Retorno forado: o retorno
se d em condies foradas por razes econmicas, polticas e raciais como no
caso dos refugiados ou deportados. 5) Retorno do fracassado: do migrante que se v
forado a voltar para o pas de origem pelas circunstncias no destino; o fracasso se
d porque no conseguiu cumprir com suas expectativas. 6) Retorno programado:
aquele de carter oficial, promovido pelos pases, onde busca-se, a partir de polticas
migratrias, fomentar a migrao de retorno e manter vnculos formais com a
populao que reside no exterior (DURAND, 2006; p. 170-173).
Por fim, Siqueira (2009) considera cinco categorias de retorno para o caso
brasileiro: 1) Retorno temporrio: aquele em que o migrante define o pas de
destino como seu local de moradia. L tem sua famlia, seu trabalho, e seus
investimentos. Muda seu padro de vida e consumo, pois j no tm a preocupao de
fazer poupana para voltar e investir no Brasil. Vem ao Brasil em ocasies
espordicas, como frias ou festas familiares. 2) Retorno continuado: durante o tempo
de vivncia em outra sociedade o emigrante trabalha e poupa dinheiro no intuito de
retornar sociedade de origem e investir em algum imvel. Porm, ao retornar no
obtm sucesso em seus investimentos financeiros e nem em sua readaptao vida no
Brasil, com isso re-emigra. 3) O Retorno permanente: aquele em que o emigrante
retorna e consegue estabelecer-se na sua cidade ou pas de origem, no pretende
emigrar novamente. Consegue se readaptar ao estilo de vida da sua cidade de origem
e credita a sua condio ao seu projeto migratrio. Engloba aqueles que tornaram
autnomos ou conseguiram se inserir no mercado de trabalho; so considerados bem
sucedidos, pois concretizaram o projeto de ascenso social ou melhoria de vida. 4) O
transmigrante: refere-se aqueles que vivem nos dois lugares. Em sua maioria so
documentados, tm vida estabilizada no pas de destino e no Brasil. Possuem casa,
fazem investimentos e trabalham nos dois lugares. Transitam, tm visibilidade e so
-
13
atores sociais nos dois lugares. 5) Os retornados da crise: A partir do ano de 2007, a
crise atingiu diretamente as ocupaes situadas no mercado de trabalho secundrio6,
onde houve reduo de trabalho e ganhos. Nessa situao o custo-benefcio da
emigrao deixa de ser positivo e muitos optaram por retornar diante da inviabilidade
de continuar vivendo nos EUA e em outros pases que foram tambm atingidos pela
crise (Portugal, Itlia, Espanha, etc.). Para muitos o projeto emigratrio tornou-se um
projeto interrompido, frustrado (SIQUEIRA, 2009).
Dessa forma e tendo em vista que durante o perodo de migrao, dadas as
condies sociais, econmicas e culturais, o projeto migratrio reelaborado, o
retorno pode apresentar diferentes nuances. Como vimos, vrios autores constataram
uma diversidade de perfis de migrantes retornados, o que encontra-se sintetizado no
quadro 02.
6 Refere-se existncia de setores com caractersticas diferenciadas no mercado de trabalho (PIORE,
1979). O mercado secundrio se refere s ocupaes que os imigrantes desempenham, tendo em vista a
vulnerabilidade reforada pela sua condio de documentao irregular (PORTES; GUARNIZO, 1991).
Dessa forma, se inserem em atividades como o servio domstico ou na rea de construo civil, tendo
em vista que tais atividades no exigem o conhecimento do idioma e nem a documentao formal.
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14
Quadro 02: Tipologias de retorno
Fonte: Elaborao prpria com base em Cassarino (2004); Durand (2006) e Siqueira (2009).
Autor Tipologia
Cassarino
(2004) Retornados com alto nvel de preparo (preperdeness): so os que organizam o
retorno de forma autnoma, considerando o contexto do pas de origem e
mobilizando os recursos necessrios para l efetivar seus projetos.
Retornados com baixo nvel de preparo: so aqueles que tm pouco tempo de migrao para acumular os recursos necessrios e dependem dos recursos disponveis
na origem para sua reintegrao.
Sem nvel de preparo para retornar: so aqueles que foram obrigados a retornar (deportao ou recusa do pedido de asilo).
Durand
(2006) Retorno voluntrio do migrante estabelecido: refere-se ao migrante que regressa
voluntariamente depois de um grande perodo no estrangeiro, aps ter adquirido os
documentos e outra nacionalidade.
Retorno do migrante temporrio: refere-se a trabalhadores temporrios, os quais se enquadram em programas especficos em que o contrato exige ou obriga o retorno.
Retorno transgeracional: trata-se do retorno dos descendentes dos migrantes filhos, netos e bisnetos. Utilizam-se os laos sanguneos e culturais para facilitar o ingresso
ou a naturalizao.
Retorno forado: o retorno se d em condies foradas por razes econmicas, polticas e raciais como no caso dos refugiados ou deportados.
Retorno do fracassado: do migrante que se v forado a voltar para o pas de origem pelas circunstncias no destino; o fracasso se d porque no conseguiu cumprir com
suas expectativas.
Retorno programado: aquele de carter oficial, promovido pelos pases, visando fomentar a migrao de retorno e manter vnculos formais com a populao que
reside no exterior.
Siqueira
(2009) Retorno temporrio: aquele em que o migrante define o pas de destino como seu
local de moradia, fazendo visitas espordicas ao pas de origem.
Retorno continuado: refere-se ao migrante que ao retornar no obtm sucesso em sua reinsero e em sua readaptao vida no pas de origem e com isso re-emigra.
O Retorno permanente aquele em que o emigrante retorna e consegue estabelecer-se na sua cidade ou pas de origem, no pretende emigrar novamente.
O transmigrante aquele que vive nos dois lugares. Em sua maioria so documentados, tm vida estabilizada no pas de destino e no Brasil. Transitam, tm
visibilidade e so atores sociais nos dois lugares.
Os retornados da crise: refere-se aos imigrantes que foram atingidos pela crise econmica, que se deu a partir de 2007, os quais optaram por retornar diante da
inviabilidade de continuar vivendo nos EUA e em outros pases que foram tambm
atingidos pela crise (Portugal, Itlia, Espanha, etc.).
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15
1.2 O retorno luz de Abdelmalek Sayad
Feita essa reviso terica, conceitual e tipolgica, e luz da anlise de
Abdelmalek Sayad, autor clssico sobre o tema, temos o retorno como a categoria
fundamental do fenmeno migratrio, caracterizando-se como o elemento constitutivo
da condio do migrante.
Cavalcanti e Boggio (2004) ajudam na reflexo quando chamam ateno sobre
como a condio de imigrante pode ajudar a compreender a dinmica do retorno.
Primeiramente, as diferenas presentes nas denominaes de estrangeiro e de
imigrante implicam em diferentes estatutos sociais, diferentes tratamentos jurdicos,
diferentes deveres e direitos no que diz respeito presena e permanncia dentro dos
limites de um territrio nacional. Ao passo que ao estrangeiro se associa um pas
desenvolvido e as possibilidades de enriquecimento para o pas de acolhida, o
imigrante sempre visto como proveniente de um pas subdesenvolvido, o qual
representa um problema para a sociedade receptora.
Ao relembrarem a condio transitria inerente ao termo imigrante (conjugado
no particpio do presente), os autores afirmam que esta condio provisria se observa
tanto na sociedade de emigrao quanto na de imigrao. Na primeira, percebe-se a
tendncia de se preservar o lugar social, com a iluso e a exigncia, explcita ou
implicitamente, de um retorno, no qual o benefcio para o grupo supere os custos e as
dores da emigrao, levando, em geral, a obter reconhecimento do grupo de origem e
permite negociar o sentido de sua emigrao e de sua ausncia. J na segunda, o
imigrante sempre classificado a partir do critrio de nacionalidade, o que, por
definio, o coloca na condio de estranho. Isso tambm corrobora para a situao de
transitoriedade, no se reconhecendo a possibilidade de a migrao ser algo definitivo
(CAVALCANTI; BOGGIO, 2004).
Para Sayad (2000), um imigrante essencialmente uma fora de trabalho
provisria, temporria e em trnsito uma vez que o trabalho que justifica sua
emigrao (SAYAD, 2000; p. 21). Esta condio provisria do imigrante faz com que
ele seja um ser social ao qual se atribuiu naturalmente a possibilidade de um retorno a
seu grupo nacional, o que contribui para que o retorno seja parte inerente do processo
migratrio. Assim, a ideia do retorno algo central no fenmeno migratrio e se
conforma como uma questo que perpassa as sociedades de emigrao e de imigrao
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16
e, de modo transversal, o projeto migratrio (CAVALCANTI; BOGGIO, 2004; p.
10).
Neste sentido, o retorno acompanha o migrante durante toda sua jornada
migratria, envolvendo o perodo pr-partida, a efetivao da migrao e os planos de
voltar ao pas de origem. Em outras palavras, o retorno, ou pelo menos a inteno de
retornar, encontra-se implcita ao prprio ato de emigrar, pr-existindo partida, e
sendo programado ao longo de toda a ausncia (SAYAD, 2000).
Assim, no fenmeno migratrio, a coeso entre os acontecimentos e os
significados percebidos e atribudos ao longo da experincia em um pas estrangeiro,
de indivduos e grupos sociais, possvel devido ao retorno. a noo de retorno que
confere sentido e explica a unidade das relaes complexas entre emigrao e
imigrao, ausncia e presena, excluso e insero, sendo a nostalgia e a saudade da
origem que confere a uma pessoa sua condio de migrante (SAYAD, 2000).
Sayad (2000) apresenta como o retorno remete, necessariamente, s relaes
do migrante com o tempo, o espao fsico e com o grupo. Primeiramente, o migrante
e seu grupo de origem concebem o tempo como uma retrospectiva emigrao, onde
a memria est atrelada nostalgia, na qual sempre se sente falta da situao inicial
que no pode mais voltar, constatando-se a impossibilidade de verdadeiramente
retornar ao idntico: ao tempo de partida, de tornar-se novamente o que era ou s
mesmas situaes. Quanto ao espao, geogrfico ou social, este sempre
compreendido como algo nostlgico e carregado de afetividade. Por fim, sobre o
grupo, tanto no pas de origem quanto no de destino, forma-se uma relao ambgua,
pois o indivduo afetado pelas relaes dos dois grupos simultaneamente. Por um
lado, deseja manter as relaes no pas de origem para assegurar que este no foi
abandonado afetivamente e, por outro, h a necessidade de interao e insero na
sociedade de destino buscando a adaptao (SAYAD, 2000; p. 12-13).
Consta no imaginrio do emigrante que, em sua volta, ele ir reencontrar o
grupo como se nada tivesse acontecido, como se nada tivesse mudado durante a sua
ausncia e, sobretudo, como se o tempo de emigrao no houvesse mudado a si
mesmo. Tais iluses se inscrevem no migrante e se traduzem nos sentimentos de
nostalgia, sendo que toda essa carga de dramaticidade, compartilhada entre os que
partem e os que ficam, faz com que a migrao seja sempre pensada como provisria,
por mais longa que seja e mais durvel que se enuncie. por isso que o retorno no
diz respeito ao espao fsico em si, mas principalmente ao espao social, o que
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17
implica em uma grande impossibilidade prtica, pois o migrante nunca retorna
mesma estrutura social que havia antes de migrar, apesar de estar de volta ao espao
fsico (SAYAD, 2000; p. 14).
Em suma, os migrantes que retornam so pessoas do entre-dois entre-dois-
lugares, entre-dois-tempos, entre-duas-sociedades so tambm, e principalmente,
homens-entre-duas-maneiras-de-ser ou entre-duas-culturas. Assim, o retorno une
esses dois aspectos e ilustra simultaneamente a relao que o emigrante estabelece
com a sociedade de origem, da qual se separou devido migrao, e tambm a
relao que ele mantm com a sociedade de imigrao e sua condio de imigrante.
Em outras palavras, trata-se de um emigrante-imigrante, que est aqui e est
l, presente e ausente ou ausente e presente. Est duas vezes presente e duas vezes
ausente: aqui, ele est presente fsica e materialmente e de maneira corporal, mas
ausente moral e em esprito. L, ele est ausente fsica, material e corporalmente, mas
est presente moral, mental, imaginria e espiritualmente. Tudo isso consiste em um
dos paradoxos da imigrao: ausente onde est presente e presente onde est ausente
(SAYAD, 2000; p. 19-20).
1.3 Preparao do retorno e reinsero na sociedade de origem
O entendimento do retorno como um processo, traz os temas de preparao e
de reinsero na sociedade de origem para o debate.
O entendimento de Cassarino (2004) sobre a relao entre retorno e
desenvolvimento, ou seja, o impacto do retorno no local de origem, se d em termos
de boa vontade, preparo e mobilizao de recursos. O autor supera a dicotomia
sucesso/fracasso ao olhar para os fatores micro e macro que configuram os padres de
retorno e a volta dos migrantes como potenciais atores de desenvolvimento local
(CASSARINO, 2004; p. 274).
A mobilizao de recursos tangveis (capital financeiro) e intangveis
(contatos, relaes, habilidades) adquiridos na experincia migratria e tambm os
recursos que o migrante leva consigo de seu pas de origem (capital social) somado ao
ato voluntrio do migrante, que suportado pelo acmulo de recursos e informaes
sobre as condies de ps-retorno na origem, indo alm da livre escolha, explicam o
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18
porqu de alguns migrantes se tornarem atores de desenvolvimento no local de
origem e outros no (CASSARINO, 2004).
Tal perspectiva colabora na desconstruo da ideia de que o retorno seria um
ato voluntrio, isto , no se trata de o migrante querer regressar, mas sim de ele estar
preparado para tal, o que implica reunir recursos e informaes acerca das condies
posteriores ao retorno para poder proceder ao processo de reintegrao no seu pas de
origem. O retorno se refere a um processo atravs do qual os emigrantes valorizam os
recursos disponveis, de acordo com as circunstncias especficas existentes no pas
emissor e receptor, para garantir sua reintegrao (CASSARINO, 2007; p.73)
Dessa forma, o tipo de retorno pode afetar o status ocupacional dos retornados
no pas de origem. Ademais, a durao da experincia migratria tambm uma
varivel explicativa da reintegrao social e profissional dos retornados. Essas duas
variveis no podem se afastar do marco analtico que inclui as condies prvias e
posteriores ao retorno, uma vez que tais fatores contextuais so parte integrante do
processo de preparao do retorno (CASSARINO, 2007; p.74).
Sobre a durao da experincia migratria, Cassarino (2007) argumenta que a
migrao pode ter um impacto positivo sobre a capacitao profissional,
especialmente dos emigrantes que decidiram retornar, e isto estaria relacionado a uma
durao tima, isto , nem to curta que no d para aprender nenhuma habilidade e
nem to longa a ponto de romper com a origem e impedir que se tenha tempo e
energia para utilizar os conhecimentos e capacidades adquiridas (KING RUSSEL,
1986 apud CASSARINO, 2007; p. 75).
Sobre este tema, Durand (2006) sugere que h uma estratgia do retorno, a
qual seria uma maneira de fixar limites, impor objetivos e de obrigar-se de algum
modo a retornar. Alguns voltam quando tem condies financeiras de adquirir as
metas estabelecidas, por exemplo, comprar a casa ou quitar dvidas. Outros retornam
aps conseguirem a documentao, o que lhes permite transitar com mais facilidade
entre os pases de origem e destino. A partir da documentao possvel que os
migrantes experimentem a vida novamente no pas de origem, mantendo a
possibilidade de re-emigrar, caso a reinsero no seja bem sucedida (DURAND,
2006; p. 181).
No mbito familiar tambm h uma relao direta entre a durao da
migrao, o retorno e os custos que deve suportar a famlia do migrante. Em muitos
casos o dilema se resume em optar entre o nvel e a qualidade de vida; entre um maior
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19
ingresso econmico e um menor ritmo e presso de trabalho; mais tempo de descanso,
ambiente conhecido e contato familiar (DURAND, 2006; p. 184).
A durao da experincia migratria constitui somente um fator explicativo na
capacidade dos emigrantes em investir em negcios empresariais em seu retorno. Esta
varia de pas para pas e est correlacionada com a forma em que os emigrantes
percebem as mudanas e reformas que aconteceram em seu pas de origem, e isso
acontece porque o retorno no somente uma questo pessoal, mas tambm
contextual. Assim, investir em uma atividade empresarial ou no varia com a durao
da migrao, o contexto do pas de origem, as polticas governamentais, as remessas,
o apoio familiar e a rede social na qual o migrante se insere, as habilidades
profissionais adquiridas no estrangeiro e as visitas peridicas ao pas de origem
(CASSARINO, 2007).
Considerar se o retorno se d ou no por escolha prpria fundamental no
momento de identificar os fatores adicionais que caracterizam as condies prvias e
posteriores ao retorno. Sendo assim, a distino entre aqueles que voltaram por
prpria iniciativa e aqueles que se viram obrigados a retornar constitui uma outra
varivel fundamental para explicar as perspectivas de reintegrao scio-profissional
dos retornados uma vez de volta a sua origem (CASSARINO, 2007; p.66).
Para Rivera-Snchez (2013) o estudo sobre a reinsero social e laboral dos
migrantes retornados em um espao urbano pode contribuir para entender os efeitos
sobre: 1) A probabilidade de conseguir emprego no mercado de trabalho local, as
formas como opera o capital social, a escolaridade e em geral as habilidades e
capacidades adquiridas na estada como imigrante internacional ao regressar ao pas de
origem; 2) As relaes familiares e pessoais, o processo de reajuste a outra dinmica
social em um contexto que se modificou. Em outras palavras, o efeito da readaptao
ou reincorporao, o ajuste de expectativas ou de conflitos, que geram as mobilidades
humanas; 3) A relao mobilidade-estabelecimento (RIVERA-SNCHEZ, 2013; p.
58).
Se, por um lado, a vivncia no estrangeiro permite ao migrante adquirir certos
ofcios ou habilidades que fazem com que o retorno seja factvel em melhores
condies (DURAND, 2006), por outro, podem representar entraves integrao
(HIRANO, 2005). Na primeira perspectiva, o capital humano idioma ou o domnio
de ferramentas modernas adquirido durante a estada fora do pas de origem poderia
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20
converter-se em estmulo ao retorno e facilitar a obteno de um melhor emprego ou a
abertura do prprio negcio (DURAND, 2006; p. 182).
J na segunda perspectiva, as habilidades adquiridas na migrao no seriam
aproveitadas no retorno ao Brasil, em virtude de os migrantes terem exercido
trabalhos de pouca qualificao. Alm disso, a sua ausncia no mercado de trabalho,
em virtude da migrao, torna o migrante despreparado e atrasado profissionalmente
para o contexto brasileiro.
Desta forma, a reintegrao dos migrantes de retorno torna-se um processo
difcil e que, em muitos casos, estimula uma nova migrao, adiando o retorno.
Corroborando esta ideia, atender s exigncias do mercado de trabalho; conseguir um
emprego satisfatrio e bem pago; retornar ao emprego anterior; o medo de abrir um
pequeno negcio e perder todo o capital poupado; e no ter capital suficiente para
abrir um negcio so dificuldades encontradas pelos migrantes dekassguis no retorno
ao Brasil (SASAKI, 2000 apud HIRANO, 2005; p. 4), o que nos ajuda tambm a
refletir sobre aqueles que retornam de outros pases. Alm desses fatores, as
mudanas que ocorreram no estilo de vida e no consumo tambm podem representar
entraves reintegrao na sociedade de origem.
2. O CASO BRASILEIRO
O fenmeno migratrio brasileiro algo bastante dinmico e diverso, se
revelando como um complexo objeto de estudo. Para compreender a migrao de
retorno, faz-se necessrio entender as fases e processos da migrao no pas.
Sol, Cavalcanti e Parella (2011) analisam a migrao brasileira a partir de
idades (SOL; CAVALCANTI; PARELLA, 2011; p. 25-47). Desde essa perspectiva,
a primeira idade refere-se ao perodo de intenso recebimento de imigrantes
europeus, no sculo XIX e XX, provenientes da Itlia, Alemanha, Portugal e Espanha.
A segunda idade diz respeito aos fluxos de migrao interna, no incio do sculo
XX, sendo estes tambm marcados pelos processos de urbanizao e de
industrializao no pas. Neste contexto, os deslocamentos de xodo rural e,
posteriormente, os interregionais para os grandes centros urbanos do Sudeste, com
destaque para So Paulo e Rio de Janeiro, e do Sul do pas, caracterizavam-se como
uma estratgia para alcanar mobilidade social. A terceira idade se d no contexto
de descenso ou estabilidade do nmero de imigrantes internacionais e se caracteriza
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21
pelo aumento da emigrao. Os fluxos emigratrios para os Estados Unidos, Japo,
pases da Europa, como Reino Unidos, Portugal e Espanha, e na Amrica do Sul, para
o Paraguai, Argentina e Uruguai, ganham destaque. Disto, pode-se inferir a
heterogeneidade da migrao brasileira e preciso lembrar que cada um desses fluxos
migratrios possui sua especificidade e caractersticas prprias. Por fim, a quarta
idade marcada pela diversificao dos fluxos e pelo acontecimento simultneo de
emigrao e imigrao. A partir de uma anlise contempornea dos fluxos migratrios
no Brasil, a esta quarta idade, acrescentamos a migrao de retorno.
Em suma, o histrico brasileiro acerca do fenmeno da migrao internacional
foi tradicionalmente retratado na literatura a partir de dois perodos: primeiramente,
no sculo XIX, no qual o pas recebia imigrantes (europeus, africanos, orientais entre
outros); e posteriormente, ao final do sculo XX dcadas de 70 e 80 no qual os
brasileiros se tornam emigrantes e deixam o pas em direo aos Estados Unidos,
Canad, Europa Ocidental e Japo. Assim, o Brasil teria se incorporado, pouco a
pouco, ao conjunto das naes que abastecem o mercado mundial com trabalhadores,
a partir da emigrao (SALES, 1999, 2001; ASSIS, 1999; FUSCO, 2001;
FLEISCHER, 2002; MARGOLIS, 2003; SIQUEIRA, 2009). Entretanto, a anlise
contempornea do cenrio migratrio brasileiro deve considerar a exportao de
emigrantes em paralelo com a entrada de imigrantes no pas, o que seria uma nova
questo social situada no contexto da globalizao (PATARRA, 2005; p. 25). Dessa
forma, a crise financeira, o estancamento do processo de desenvolvimento, o
excedente de mo de obra, a pobreza, a ausncia de perspectiva de mobilidade social,
entre outras causas, seriam os principais determinantes.
Ainda que a produo brasileira sobre a migrao internacional seja extensa, o
interesse terico tem se concentrado sobre trs tpicos principais: a origem de fluxos
populacionais, os determinantes da sua estabilidade/continuidade; e a adaptao dos
migrantes na sociedade de destino (SOARES, 2000), sendo o retorno uma lacuna nos
estudos migratrios. No perodo a partir de 2007 h um significativo aumento no
nmero de migrantes retornados e isso faz com que este fenmeno ganhe relevncia
nas agendas tanto de pesquisa quanto das autoridades pblicas.
No que diz respeito ao fluxo migratrio Brasil Estados Unidos, nos anos
2000, dois acontecimentos so significativos e desencadeiam aes que afetam
diretamente a populao migrante no que se refere ao direcionamento, ao volume e
intensidade dos fluxos: os atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001 e a crise
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22
econmica desencadeada a partir de 2007-2008 (PEREIRA; SIQUEIRA, 2013;
FERNANDES; KNUP, 2012).
O primeiro pode ser considerado, para a histria da migrao para os Estados
Unidos, um marco de mudana definitiva, pois, ainda que o pas j adotasse medidas
restritivas s migraes, a partir deste momento que a questo se torna mais
fortemente associada a uma ameaa segurana interna no pas. Vrias medidas
foram tomadas pelas autoridades americanas, inclusive em parceria com o governo do
Mxico, o que aumentou as dificuldades e os riscos para aceder aos Estados Unidos
via este pas. O segundo, a crise econmica e suas consequncias sobre o emprego e a
cotao do dlar, atua como fator de desestmulo permanncia dos brasileiros no
pas. A crise atingiu principalmente o mercado imobilirio e, consequentemente, a
construo civil, chegando tambm a afetar outras ocupaes como o servio
domstico e o mercado tnico, nichos de trabalho de grande parte dos brasileiros. Para
o trabalhador a crise se traduziu em reduo de oferta de trabalho e reduo do valor
pago pela hora de trabalho. Alm disso, com a queda do valor do dlar em relao
moeda brasileira houve uma reduo do dinheiro enviado para o Brasil
(FERNANDES; KNUP, 2012).
A significativa reduo dos ganhos e o aumento do custo de vida somado ao
medo da deportao tornou o custo/benefcio da emigrao negativo em termos
econmicos para o emigrante brasileiro. Por outro lado, no se pode perder de vista a
situao da economia brasileira que, no momento de crise e em anos posteriores, teve
respostas positivas marcadas pela criao de postos de trabalho e pela ampliao da
renda dos trabalhadores. Em suma, por um lado, esto as dificuldades legais e a
conjuntura da economia americana dificultando a permanncia de brasileiros nos
EUA, funcionando como fatores de expulso, e, por outro lado, as melhorias na
condio de trabalho no Brasil funcionando como fatores de atrao
(FERNANDES; KNUP, 2012). No entanto, importante ressaltar que os fluxos
migratrios vo alm das questes econmicas.
Segundo Fernandes e Castro (2013), duas causas foram apontadas para o
retorno de imigrantes de Portugal para o Brasil: as questes familiares e, em segundo
lugar, a crise econmica. O mesmo se evidencia nos processos recentes de retorno de
brasileiros vindos dos Estados Unidos estudados por Pereira e Siqueira (2013).
Ambos os estudos demonstram que alm dos motivos estritamente econmicos, como
aqueles relacionados com a crise econmica de 2007-2008, as circunstncias
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23
familiares e a saudade so elementos importantes na constituio de projetos de
retorno.
Tal situao contribuiu para que vrios brasileiros resolvessem retornar ao
Brasil, movimento que j podia ser observado em 2007, mas que toma maior
amplitude aps 2008. Dessa forma, o grande nmero de retornados no pas revela as
dificuldades com a readaptao na vida no Brasil, colocando para alguns um forte
desejo de re-emigrar (FERNANDES; KNUP, 2012).
Vejamos na seo seguinte o perfil do migrante brasileiro retornado, com base
nos dados do Censo de 2010.
2.1 Dados do censo 2010 (IBGE)
Segundo dados do Censo de 2010, 65,6% dos imigrantes no Brasil so
nacionais, ou seja, brasileiros que residiram no exterior, o que chamamos de
imigrantes de retorno (OLIVEIRA, 2013).
De acordo com estas estatsticas oficiais, temos um total de 455.335 migrantes
internacionais que retornaram ao Brasil, sendo que este nmero compreende os
estrangeiros, os brasileiros natos e as pessoas naturalizadas brasileiras.
A Tabela 01 demonstra a predominncia dos fluxos imigratrios para o Brasil
desde os Estados Unidos (17,42%), Japo (13,54%) e Paraguai (9,73%).
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24
Tabela 01: Fluxos migratrios para o Brasil, segundo pas de residncia anterior,
2010
A intensidade do fluxo migratrio de retorno para o Brasil se torna ainda mais
evidente quando as pessoas naturalizadas so consideradas. Nesta situao o
percentual passa de 65,6% para 73%. Dito isso, a distribuio dos fluxos migratrios
por nacionalidade, segundo pas de residncia anterior, pode ser observada na Tabela
02.
Tabela 02: Fluxos migratrios por nacionalidade, segundo pas de residncia
anterior Brasil, 2010
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25
Ainda de acordo com os dados do Censo de 2010, e conforme se encontra
ilustrado na Tabela 03, dentre as principais Unidades da Federao que receberam
fluxos de imigrantes internacionais esto: So Paulo (30,7%), Paran (14,6%), Minas
Gerais (9,8%) e Rio de Janeiro (7,6%), o que evidencia a importncia das regies
Sudeste e Sul no que diz respeito ao fenmeno migratrio no Brasil.
Tabela 03: Fluxos migratrios segundo as principais Unidades da Federao
Especificamente, no que se refere distribuio de migrantes de retorno por
Unidades da Federao, o Mapa 01 evidencia que: So Paulo o principal Estado,
com um fluxo de mais de 70.000 pessoas; o Paran aparece em segundo lugar com
um fluxo que compreende de 45.000 a 70.000 pessoas, seguido de Minas Gerais, com
um fluxo de 25.000 a 45.000 pessoas. Os Estados do Rio de Janeiro, Santa Catarina,
Rio Grande do Sul, Gois e Mato Grosso do Sul, ocupam a mesma categoria
recebendo at 25.000 pessoas retornadas.
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Figura 01: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, segundo as principais
UFs de residncia, Brasil, 2010.
2.2 Perfil dos migrantes de retorno no Brasil
Nesta seo ser apresentado o perfil dos migrantes de retorno no Brasil, com
base nas anlises dos dados do Censo de 2010, segundo os critrios de: sexo, grupo de
idade, nvel de instruo, condio de atividade, condio de ocupao, grupos
ocupacionais e rendimento mdio mensal.
Sexo
Os dados sobre a distribuio dos fluxos migratrios de brasileiros retornados
(no caso dos brasileiros natos), segundo o sexo e o pas de residncia anterior,
aparecem na Tabela 04 e revelam que 52,5% dos migrantes que retornam ao Brasil
so homens e 47,5% so mulheres.
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Tabela 04: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por sexo, segundo pas
de residncia anterior Brasil, 2010
Analisando os dados listados na tabela acima, percebe-se que na maior parte
dos pases o nmero de homens que retorna para o Brasil maior do que o de
mulheres, exceto nos casos de Espanha e Itlia, onde o nmero de mulheres supera o
de homens.
Pode-se supor que um dos fatores que determinam este diferencial por sexo,
no momento do retorno, o fato de a crise econmica que atingiu os Estados Unidos,
Japo e pases da Europa tenha tido maior influncia sob as ocupaes dos migrantes
homens, como o caso do setor da construo civil, por exemplo, e que as ocupaes
tipicamente femininas, no trabalho domstico e no setor de cuidados, tenham se
mantido estveis. Entretanto, tal inferncia carece de dados que permitam uma
reflexo mais profunda e abre espao para novas pautas de pesquisa.
Idade
A distribuio etria dos migrantes de retorno encontra-se apresentada no
grfico a seguir.
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Grfico 01: Distribuio etria dos migrantes de retorno
Fonte: IBGE, Censo Demogrfico 2010
Em sntese, 14% dos migrantes de retorno tm menos de 15 anos de idade;
13% esto na faixa dos 15 a 24 anos; 43% na dos 25 a 39 anos; 27% entre 40 e 64
anos; e 3% com mais de 65 anos.
Na Tabela 05 encontra-se a distribuio dos fluxos migratrios de brasileiros
retornados, por grupo de idade, segundo o pas de residncia anterior. Os mais jovens,
com menos de 15 anos de idade, retornaram predominantemente do Japo7. J a maior
parte daqueles que tm entre 15 e 24 anos, 25 e 39 anos e 40 e 64 anos teve como
ltimo pas de residncia os Estados Unidos. Isso tambm acontece com a maioria dos
retornados com mais de 65 anos.
7Para esta anlise, e as subsequentes, no consideramos os dados da categoria Demais pases e
ignorados.
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Tabela 05: fluxos migratrios de brasileiros retornados, por grupos de idade,
segundo pas de residncia anterior Brasil, 2010
As categorias de menores de 15 anos e de 15 a 24 anos, referem-se,
provavelmente, aos filhos dos migrantes e, consequentemente, a um fluxo de retorno
para acompanhar os pais ou por motivos de reunificao familiar.
A faixa mais expressiva compreende a idade economicamente ativa de 25 a
39 anos, o que revela a conexo da emigrao com motivos de trabalho. Ademais, no
se pode desconsiderar o efeito da crise econmica que atingiu aos Estados Unidos,
Japo e pases da Europa a partir de 2007, e tambm o momento de expanso e
estabilidade econmica que se tem projetado sobre o Brasil no cenrio internacional.
A segunda maior compreende a faixa etria dos 40 aos 64 anos. Uma das
possveis explicaes para esse fenmeno, segundo a literatura, seria a busca por uma
melhor qualidade de vida, no sentido de estar mais prximo famlia e da diminuio
do ritmo de trabalho (se comparado ao do pas de emigrao).
Por fim, o nmero menos expressivo diz respeito aos imigrantes que
retornaram com mais de 65 anos, o que pode indicar um retorno com a finalidade de
aposentadoria (para aqueles com maior idade) ou motivos de sade.
Todas essas questes carecem de uma ateno maior e de pesquisas
especficas para maiores generalizaes.
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Nvel de instruo
No que se refere ao nvel de instruo dos retornados brasileiros (brasileiros
natos), temos o seguinte panorama:
Grfico 02: Nvel de instruo dos migrantes retornados
Fonte: IBGE, Censo Demogrfico 2010
Em suma, 30% se enquadram na categoria dos sem instruo e nvel
fundamental incompleto; 13% na de nvel fundamental completo e ensino mdio
incompleto; 31% nvel mdio completo e superior incompleto; 25,5% em nvel
superior e 0,4% no determinado.
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Tabela 06: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por nvel de instruo,
segundo pas de residncia anterior Brasil, 2010
As informaes da Tabela 06 sugerem que, no tocante ao nvel de instruo
dos migrantes brasileiros retornados, temos uma populao com nvel mdio de
escolaridade abarcando o nvel mdio completo e o nvel superior incompleto.
Porm, se consideramos tambm o percentual com nvel superior completo, possvel
inferir que os migrantes brasileiros retornados possuem um nvel de instruo de
mdio a alto.
Quando comparamos a distribuio desses dados dos brasileiros retornados
por pases de residncia anterior possvel perceber que a maioria dos pases segue
essa tendncia (de ter a maior parte dos migrantes retornados com nvel mdio
completo e superior incompleto), exceto para os migrantes retornados do Paraguai,
onde a maior parte sem instruo e com nvel fundamental incompleto. Outra
exceo o fluxo proveniente do Reino Unido, onde a maioria possui nvel superior
completo.
No podemos esquecer que cada fluxo emigratrio, e de retorno, possui
caractersticas prprias e elementos histricos e scio-culturais que os particularizam
e exigem uma anlise mais aprofundada e especfica. Por essa razo, as anlises aqui
feitas no pretendem esgotar as possibilidades de reflexo, mas sim suscitar questes
para novas pesquisas.
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Condio de atividade
Segundo o IBGE8, a populao economicamente ativa compreende o potencial
de mo-de-obra com que se pode contar o setor produtivo. Isso envolve a populao
ocupada empregados, os que trabalham por conta prpria, os empregadores, e os
no remunerados, e a populao desocupada que compreende aqueles que no tm
um emprego no momento, mas esto a procura de um no mercado de trabalho. J a
populao no economicamente ativa, envolve aqueles que no so classificados
como ocupados e nem como desocupados.
Tal definio importante para analisarmos as informaes sobre as condies
de atividades e as condies de ocupao dos migrantes brasileiros retornados que
aparecem nas Tabelas 07 e 08, respectivamente.
Sobre a condio de atividade dos brasileiros retornados, a Tabela 07 revela
que 71% so economicamente ativos e 29% no so economicamente ativos.
Tabela 07: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por condio de
atividade, segundo pas de residncia anterior Brasil, 2010
Tal dado corroborado quando retomamos os dados de idade, os quais
apontam para uma predominncia de migrantes retornados na faixa etria de 25 a 39,
o que corresponde populao em idade economicamente ativa.
8 http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/trabalhoerendimento/pme/pmemet2.shtm
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Isso demonstra que os migrantes quando retornam para o Brasil ainda esto
em idade para se reinserir no mercado de trabalho. Entretanto, resta saber como so as
condies, as facilidades e as dificuldades enfrentadas por estes migrantes ao
retornarem ao mercado de trabalho.
Condio de ocupao
Alm de analisarmos as condies de atividade, faz-se pertinente entender as
condies de ocupao destes migrantes retornados, sendo este o assunto da Tabela
08.
Tabela 08: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por condio de
ocupao, segundo pas de residncia anterior, Brasil 2010
Nota-se que 91,7% dos migrantes brasileiros retornados esto ocupados e
8,3% encontram-se desocupados, segundo dados do Censo 2010.
De modo geral, essa tendncia se aplica quando analisamos a distribuio por
pases de residncia anterior, conforme podemos visualizar no grfico abaixo.
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Grfico 03: Distribuio de migrantes brasileiros retornados, por
condio de ocupao, segundo pas de residncia anterior
Fonte: IBGE, Censo Demogrfico 2010
Dos pases analisados, o Paraguai aquele que tem mais retornados ocupados
(94,5%). Em seguida, temos os Estados Unidos e o Reino Unido (com 92,5%) e Itlia
(92,3%) e Espanha (91,2%).
Por outro lado, Japo e Portugal so os pases que apresentam maior nmero
de desocupados: 11,5% e 9,1%, respectivamente.
Este dado significativo quando aliamos a ele as informaes de idade e
condio de atividade, pois percebemos que os retornados chegam ao Brasil, em
geral, com uma idade que ainda lhes permite trabalhar e por isso enquadram-se na
categoria de economicamente ativos. Apesar dos indcios e inferncias que os dados
nos possibilitam fazer, para compreender a existncia de diferenciais para a ocupao
aps a migrao e os motivos de estarem ou no ocupados so necessrias anlises
mais aprofundadas.
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Grupos ocupacionais
A Tabela 09 apresenta a distribuio dos migrantes brasileiros retornados
segundo grupos ocupacionais, de acordo com os dados do Censo de 2010.
Tabela 09: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, segundo grupos
ocupacionais, por pas de residncia anterior Brasil, 2010
H uma predominncia dos profissionais da cincia e intelectuais (22,8%),
especialmente os que tiveram como pas de residncia anterior os Estados Unidos. Em
segundo lugar aparecem os trabalhadores dos servios, vendedores dos comrcios e
mercados (14,6%), desses destacam-se os que tiveram o Japo como pas de ltima
residncia. Os diretores e gerentes aparecem como o terceiro grupo ocupacional que
mais abarca migrantes retornados (10,8%), com destaque para os que retornam dos
Estados Unidos. Destacamos ainda os tcnicos e profissionais de nvel mdio, quarto
maior grupo ocupacional (9,5%), que tambm abarca os retornados dos Estados
Unidos.
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Em geral, tais dados vo de encontro s caractersticas apontadas
anteriormente sobre o nvel de instruo, sendo possvel perceber uma
correspondncia com essas ocupaes e o nvel de escolaridade mdio dos migrantes
brasileiros retornados, que o de nvel mdio completo e nvel superior incompleto.
Conforme j alertamos, tais dados tambm precisam ser melhor investigados,
especialmente, quando consideramos a particularidade de cada fluxo migratrio e de
cada local onde esses migrantes se restabelecem (contexto local).
Rendimento mdio mensal
Por fim, quanto ao rendimento mdio mensal domiciliar per capita,
apresentado na Tabela 10, temos uma predominncia entre os maiores nveis salariais:
22% ganhando de 5 a 10 salrios mnimos; 17% de 3 a 5 salrios mnimos; e 15% e
15% com rendimento de 10 a 20 salrios mnimos ou superior a 20 salrios mnimos,
respectivamente.
Tabela 10: Fluxos migratrios de brasileiros retornados, por rendimento mdio
mensal domiciliar per capita, em salrios mnimos, segundo pas de residncia
anterior Brasil, 2010
Se olharmos esses dados segundo os pases de residncia anterior, os
migrantes retornados dos Estados Unidos so a maioria dos que ganham entre 10 e 20
salrios mnimos e mais de 20 salrios mnimos; os retornados do Japo so a maioria
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dos que ganham entre 3 e 5 salrios mnimos e quase empatam com os retornados dos
Estados Unidos na categoria de 5 a 10 salrios mnimos.
No outro extremo, os retornados do Paraguai so a maioria dos que ganham
at um salrio mnimo, elemento que dialoga com o fato de terem majoritariamente
um nvel baixo de escolaridade.
Dessa forma, quando pensamos esses dados em correspondncia aos de
escolaridade, podemos inferir uma relao diretamente proporcional entre os
migrantes retornados com maior nvel de escolaridade e o maior rendimento mensal.
Em suma, o perfil do migrante de retorno brasileiro, segundo o Censo de
2010, caracterizado por: predomnio de homens (52,5%), faixa etria de 25 a 39
anos, o que sinaliza para a migrao por motivos de trabalho. Corroborando esta
ideia, percebemos que a maioria dos migrantes brasileiros retornados tem como grau
de escolaridade o nvel mdio completo e o nvel superior incompleto, so
economicamente ativos e encontram-se ocupados no mercado de trabalho,
especialmente nas atividades relacionadas cincia e ao setor de servios, o que gera
um rendimento mdio que varia de 5 a 10 salrios mnimos.
Dito isso, percebe-se que os fluxos de retorno trouxeram para o Brasil uma
mo de obra qualificada e jovem, que, ao mesmo tempo, agregaria valor ao mercado
de trabalho e minimizaria os custos de investimento na formao de capital humano
(OLIVEIRA, 2013; p. 201). Entretanto, vlido ressaltar que nem todas as
habilidades e os conhecimentos adquiridos pelos migrantes so aproveitados no
momento de seu retorno ao pas de origem (HIRANO, 2005), sendo necessria a
implementao de polticas pblicas voltadas aos imigrantes de retorno (vide anexo).
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3. MIGRAO DE RETORNO DESAFIOS E PERSPECTIVAS
O incremento dos fluxos de migrao de retorno para o Brasil que se d a
partir de 2007 coloca importantes desafios para pesquisas e para as aes
governamentais e de organismos internacionais.
No mbito das pesquisas, este tema foi, por muito tempo, invisvel e quando
retratado era feito a partir da compreenso de que se tratava de um movimento
definitivo. Em um contexto de globalizao, dinmico e complexo, os movimentos
populacionais tambm se dinamizam, as relaes entre origem e destino se tornam
mais prximas e, cada vez mais, estabelecem-se relaes transnacionais, nas quais os
migrantes mantm-se conectados aos locais de origem e de destino. necessrio
perceber o retorno dentre desse dinamismo e considerar a circularidade na migrao e
as possibilidades de re-emigrao para outros locais.
J no mbito das aes governamentais, dois aspectos chamam ateno.
Primeiramente, o predomnio da ideia de que, em geral, os emigrantes brasileiros tm
por objetivo trabalhar e juntar dinheiro para adquirir bens ou iniciar seu prprio
negcio ao retornar ao Brasil (SIQUEIRA, 2009). Isso faz com que muitas das
iniciativas do governo e de instituies no-governamentais associem o migrante
retornado s atividades de empreendedorismo. Tal fato no pode ser generalizado,
considerando que aqueles que voltaram ao pas por algum motivo que tenha
interrompido sua migrao (como a crise econmica, por exemplo) possivelmente
estaro em grande situao de vulnerabilidade, a ponto de no terem recursos
financeiros e nem estrutura psicolgica para investir em uma atividade e abrir o seu
prprio negcio.
Em segundo lugar, o migrante retornado no visto pelas polticas pblicas (e
muitas vezes tambm no se percebe) como aquele que passa por uma nova migrao
quando volta para seu local de origem. Isso faz com que eles sejam tratados pelo
Estado como brasileiros comuns, desconsiderando sua especificidade e seus
diferenciais por terem passado por uma experincia de migrao. Consequentemente,
esses retornados se tornam invisveis para as polticas pblicas destinadas aos
brasileiros em geral e tambm para aquelas destinadas aos imigrantes.
Sayad (2000) nos explica muito bem esta contradio. Consta no imaginrio
do emigrante que, em sua volta, ele ir reencontrar o grupo como se nada tivesse
mudado durante a sua ausncia e, sobretudo, como se o tempo de emigrao no
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tivesse mudado a si mesmo. por isso que o retorno no diz respeito ao espao fsico
em si, mas principalmente ao espao social, o que implica em uma grande
impossibilidade prtica, pois o migrante nunca retorna mesma estrutura social que
havia antes de migrar, apesar de estar de volta ao espao fsico (SAYAD, 2000; p.
14).
Em suma, nas polticas migratrias falta a percepo de que o retorno uma
nova migrao para um local ainda mais desconhecido. A invisibilidade do retornado
dificulta o equacionamento de polticas e a falta de informao torna a sua situao
ainda mais vulnervel (CSEM, 2014). Isso se torna ainda mais grave no caso dos
migrantes indocumentados, que muitas vezes no se sentem seguros o suficiente para
buscar informaes para preparar o seu retorno ainda quando esto no exterior e
quando chegam ao Brasil no se adequam aos critrios dos programas sociais
existentes.
Dito isso, a migrao, e o retorno em particular, permite interpretaes de
variadas ordens, entre elas: demogrfica, com o enfoque nos fluxos de populao, os
pontos de origem e destino; econmica, uma vez que os movimentos populacionais
podem ser desencadeados por motivaes ou mudanas de cunho econmico; poltica,
na esfera das polticas migratrias, onde restries e condicionantes so aplicados
queles que pretendem atravessar as fronteiras entre os pases; psicolgica social, no
sentido em que considera as dimenses da personalidade do indivduo, assim como
envolve aspectos como o da integrao dos migrantes sociedade de destino e/ou de
origem (no caso do retorno); entre outros campos disciplinares, tambm pode ser um
problema de ordem sociolgica, haja vista que a estrutura social e o sistema cultural,
tanto dos lugares de origem como de destino, so afetados pela migrao e, em
contrapartida, afetam o migrante (Botega, 2011). Desenvolver abordagens que
extrapolem a perspectiva economicista e instrumentalista sobre o migrante em geral, e
o migrante de retorno especificamente, permanece um desafio tanto para as pesquisas
quanto para as iniciativas governamentais e de instituies no-governamentais.
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ANEXOS PORTAL DO RETORNO
A partir do final da dcada de 1980 e incio da dcada 90, a ateno
governamental e da academia, no que diz respeito migrao, concentrava-se na
presena de emigrantes brasileiros no exterior. Nesse sentido, a questo do retorno
tinha pouca relevncia, no se contemplava idas e vindas e partia-se do entendimento
de que o retorno seria um movimento definitivo.
Entretanto, nos anos 2000, e especialmente, aps a crise de 2007 o retorno
passa a ocupar um lugar de destaque na poltica migratria, especialmente no mbito
do Ministrio das Relaes Exteriores (MRE), de entidades da sociedade civil e de
organizaes internacionais.
Dentro deste contexto, em 2007, o Ministrio das Relaes Exteriores, com o
apoio do Ministrio do Trabalho e Emprego, do Ministrio da Previdncia Social, da
Secretaria de Polticas para as Mulheres, da Secretaria da Receita Federal, da Caixa
Econmica Federal e do Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas
(SEBRAE), fez sua mais importante ao no que diz respeito ao retorno: lanou9 o
Portal do Retorno10
, um site destinado aos emigrantes brasileiros que desejam retornar
em definitivo ao pas.
Devido crise econmica houve um incremento no nmero de retornados ao
Brasil. Segundo o MRE, estima-se que tenha havido reduo, entre 2008 e 2013, de
cerca de 20% no nmero11
de brasileiros residentes no exterior, passando a dispora
brasileira de 3 milhes para aproximadamente 2,5 milhes. As principais causas de
re-emigrao seriam a incapacidade em reinserir-se no mercado de trabalho;
insucesso dos empreendimentos no Brasil; e queda de nvel de vida e de renda em
relao ao perodo passado no exterior. Dessa forma, o retorno se mostrou um desafio
no s para os migrantes, mas tambm para o governo, que passou a ser demandado a
orientar esses brasileiros que queriam voltar ao pas.
Dito isso, o site busca centralizar todas as informaes disponveis sobre os
programas e os servios no Brasil que possam ser teis a nacionais que retornam ao
9 http://www.brasileirosnomundo.itamaraty.gov.br/noticias/lancamento-do-portal-do-retorno/ ;
http://sistemas.mre.gov.br/kitweb/datafiles/Retorno/pt-br/file/Portal%20do%20Retorno%20Release.pdf 10
http://retorno.itamaraty.gov.br 11
Sabe-se a dificuldade que as estatsticas oficiais tm em mensurar o nmero de brasileiros no exterior,
devido ao fato de muitos estarem em situao irregular de documentao.
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pas, buscando atender especialmente aos que esto em situao de maior
vulnerabilidade. , portanto, uma das principais iniciativas governamentais no que diz
respeito orientao e difuso de informaes sobre o retorno ao Brasil.
Figura 03: Portal do Retorno
Fonte: Portal do Retorno
As informaes reunidas no Portal do Retorno, seja as iniciativas
governamentais ou das organizaes internacionais, para orientar os migrantes
brasileiros e para ajud-los a preparar sua volta para o pas seguem descritas a seguir:
Providncias documentais antes de retornar 12 : informa sobre os
documentos que o migrante precisa providenciar ainda no pas em que se
encontra e que sero teis quando da sua entrada no Brasil, tais como:
passaporte, certificado de residncia, legalizao consular dos documentos,
registro de casamento e nascimento, autorizao de viagem para menor,
documentos que o migrante deve ter consigo (e no despachar) na chegada ao
Brasil e certificado de vacinao. Alm disso, alerta a necessidade de
providenciar documentos do tipo: declarao de seguradora estrangeira,
12
http://retorno.itamaraty.gov.br/pt-br/providencias_documentais_antes_de_retornar.xml
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42
declarao de quitao de servios, encerramento de conta bancria e cartes
de crdito, a fim de evitar cobranas indevidas.
Providncias documentais aps a chegada ao Brasil13: lista os documentos
que o migrante deve estar atento e buscar regularizar quando da chegada ao
Brasil, tais como: situao eleitoral, servio militar, carteira de identidade,
carteira de habilitao, Cadastro de Pessoa Fsica CPF e revalidao de
diplomas (link para o site do Ministrio da Educao MEC).
Informaes sobre bagagens e mudanas14: disponibiliza informaes da
Receita Federal a fim de orientar o migrante quanto legislao brasileira que
regulamenta a entrada de bagagens no Brasil. O guia destinado a migrantes e
viajantes que regressam ao Brasil em carter permanente de mudana. Alm
disso, facilita o link de acesso s informaes do Ministrio da Agricultura,
Pecuria e Abastecimento sobre o transporte de animais.
Volta ao mercado de trabalho brasileiro15: rene informaes que buscam
atualizar e preparar o migrante sobre a situao atual do mercado de trabalho
no Brasil. As informaes da seo Como est o mercado de trabalho
brasileiro? apontam para uma economia dinmica e um mercado de trabalho
em expanso, com aumento no nmero de criao de empregos. Em suma,
evidencia-se um bom momento no mercado de trabalho brasileiro, o que pode
ser um atrativo para a volta dos imigrantes.
Alm disso, disponibiliza informaes sobre onde o migrante poder se
informar sobre qualificao profissional e vagas de emprego no pas e nos
municpios brasileiros, com destaque para o Portal Mais Emprego16
do MTE.
Neste item divulgam-se os programas do Programa Nacional de Acesso ao
Ensino Tcnico e Emprego (PRONATEC) do MEC, assim como as iniciativas
do Sistema S, como Servio Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC),
Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e
Servio Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI).
13
http://retorno.itamaraty.gov.br/pt-br/providencias_documentais_apos_a_chegada_ao_brasil.xml 14
http://retorno.itamaraty.gov.br/pt-br/bagagens_e_mudancas.xml 15
http://retorno.itamaraty.gov.br/pt-br/volta_ao_mercado_de_trabalho_brasileiro.xml 16
http://maisemprego.mte.gov.br/portal/pages/home.xhtml
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Nesta seo constam ainda informaes sobre os locais de apoio ao
trabalhador brasileiro retornado. O objetivo destes postos atender aos
trabalhadores retornados visando orient-los para a reintegrao ao Brasil, o
acesso a direitos e os deveres que compem a cidadania brasileira e auxili-los
na reinsero ao mercado de trabalho no pas. At o momento existem dois
postos de atendimento:
o NIATRE 17 Ncleo de Informao e Apoio a Brasileiros
retornados do Exterior (So Paulo/SP): trata-se de uma parceria entre
o MTE e o Instituto de Solidariedade Educacional e Cultural ISEC.
Disponibiliza informaes sobre: trabalho e emprego,
empreendedorismo e associativismo, assuntos ligados educao,
sade e previdncia social, assuntos jurdicos, imposto de renda,
documentos e outras. Alm disso, se dispe a intermediar o contato
entre empresas e os trabalhadores retornados e a ajud-los na
reinsero ao Brasil. A