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Reflexões sobre os recursos cabíveis
na impugnação ao cumprimento de sentença.
Miriam Costa Faccin
Mestranda em Direito Processual Civil pela PUC/SP.
Advogada.
Sumário: 1. Introdução. 2. Considerações iniciais. 3.
Natureza jurídica da impugnação. 4. Cognição em sede
impugnação. 5. Matérias alegáveis na impugnação: (i) falta
ou nulidade de citação se o processo correr à revelia; (ii)
inexigibilidade de título; (iii) penhora incorreta ou
avaliação errônea; (iv) ilegitimidade das partes; (v) excesso
de execução; (vi) qualquer causa impeditiva, modificativa
ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação,
compensação, transação ou prescrição, desde que
superveniente à sentença. 6. Procedimento. 7. Sentença
que julga a impugnação. 8. Recurso cabível contra a
decisão da impugnação. 9. Conclusão. 10. Referências
bibliográficas.
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1. Introdução
Pela estrutura originária do Código de Processo Civil brasileiro em
vigor, a execução constituía um processo autônomo, regulado em livro próprio.
Com a mudança trazida pela Lei n. 11.232/2005 extinguiu-se o processo
autônomo de execução fundada em título executivo judicial, passando a
sentença a ser objeto de simples cumprimento. Desta forma, o cumprimento de
sentença passou a fazer parte, de maneira mais freqüente, do nosso sistema de
execução. Essa alteração levou o legislador a criar mecanismos para o executado
reagir contra a execução que se desenvolva de maneira injusta ou ilegal.
Dentro da perspectiva almejada pelas alterações no sistema da
execução, objetivando o sincretismo processual, o cumprimento de sentença
passou a ser uma mera fase procedimental desse processo sincrético. Para essa
nova fase de cumprimento de sentença o legislador criou uma defesa típica do
executado, diferentemente dos embargos à execução, denominando-a de
“impugnação”.
Atualmente, os tipos de execução variam a depender do título
executivo. Sendo o título judicial, adota-se a sistemática do cumprimento de
sentença, com procedimento previsto nos artigos 475-L e 475-M do Código de
Processo Civil. Em se tratando de título extrajudicial, a execução mantém a
disciplina prevista no Livro II do Código, através de um processo autônomo.
Em termos de procedimento encontramos previsão no artigo 475-M
do Código de Processo Civil. Uma questão pertinente sobre o assunto diz
respeito à previsão tão somente do início e do fim do procedimento, nada
dispondo a respeito do desenrolar dos atos procedimentais. Há aqui um evidente
vácuo na direção e na previsão do recurso cabível ao final. O que se pretende, no
presente ensaio é analisar os efeitos que a decisão da impugnação pode gerar e
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qual o recurso cabível na hipótese de alegação do quanto previsto no artigo 475-
L, inciso I, onde temos como fundamento da impugnação, a nulidade ou a falta
de citação.
2. Considerações iniciais
Não nos resta dúvidas há cerca da possibilidade de defesa por parte
do executado na fase executória, seja em procedimento autônomo como ocorre
na execução de título executivo extrajudicial, seja em fase continuativa do
processo cognitivo na condenação para pagamento de quantia certa. Tal
possibilidade de defesa decorre obviamente da garantia constitucional do devido
processo legal, princípio esse assegurado expressamente pela Constituição
Federal, em seu artigo 5°, inciso LIV, segundo o qual “ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
A mudança trazida pela Lei n. 11.232/2005 na estrutura da
execução, em busca da efetividade e celeridade, evitando desta forma etapas
tidas como desnecessárias do ponto de vista processual, proporcionou alteração
também nos meios de defesa, inserindo um mecanismo interno e incidental de
oposição à execução, manejável no âmbito da própria relação processual em que
foi proferida a decisão exeqüenda, como uma etapa ou fase procedimental dessa
última.
Assim, a resposta típica do executado, oposta incidentalmente
contra os atos executivos e a pretensão a executar denominada de cumprimento
de sentença pelo Código de Processo Civil, dá-se por meio da “impugnação”.
Com efeito, o artigo 475-J, § 1º, in fine, do Código de Processo Civil, com
redação dada pela Lei 11.232/2005, prevê a impugnação como meio de defesa
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da execução, que deverá ser feita no prazo de quinze dias contados da intimação
do auto de penhora e avaliação.
3. Natureza jurídica da impugnação
Existe muita polêmica na doutrina a respeito da natureza jurídica da
impugnação. Suscitam questões no seguinte sentido: teria a impugnação herdado
dos embargos à execução natureza de ação? Ou a autonomia procedimental
conferida pela Lei n° 11.232/05 teria o condão de modificar sua natureza
jurídica consistindo em mera defesa do executado?
Nesse sentido, é praticamente unânime a opinião de que trata-se de
um incidente processual, sem acarretar uma ação autônoma. Assim, a
impugnação seria um meio de defesa endoprocessual, a exemplo da contestação,
na fase cognitiva do processo, ou seja, um incidente defensivo não fazendo
nascer uma ação autônoma, como bem ressalta Cassio Scarpinella Bueno:
“A impugnação deve ser entendida como
defesa do executado na execução fundada em título
executivo judicial porque não tem sentido, sem agredir o
“modelo constitucional do direito processual civil”, exigir
(impor, verdadeiramente) que alguém, para reagir a um
pedido de tutela jurisdicional formulado por outrem, tenha
de tomar a iniciativa de romper a inércia da jurisdição para
pedir uma tutela jurisdicional em sentido oposto ou, mais
amplamente, que, de alguma forma, impeça que a iniciativa
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anterior surta seus regulares efeitos. A hipótese é,
claramente, de defesa e não de ação. Reage-se; não se age”.1
Exemplificando a questão, da mesma forma como ocorre na
sentença declaratória que acolhe a alegação de pagamento alegada pelo réu em
contestação, é possível alegar a invalidade de um ato jurídico em defesa, sem a
necessidade de propositura de uma ação com esse objetivo. Assim, não é porque
a impugnação pode ter por conteúdo a alegação de um defeito no título que ela
terá natureza de ação, pois o executado está apenas reagindo e não, agindo.
Apesar de o entendimento defendido pela maioria dos
processualistas de que a impugnação ao cumprimento de sentença tem natureza
de mero incidente processual de defesa, bem como o entendimento de que tal
estrutura permite maior celeridade ao processo, evitando etapas desnecessárias,
há aqueles que defendem pensamento diverso, no qual a natureza da
impugnação é a mesma dos embargos à execução, ou seja, natureza de ação
incidental, uma vez que, a impugnação teria o mesmo conteúdo e objetivos dos
embargos à execução. Para aqueles que compartilham tal entendimento, como é
o caso de Araken de Assis, “a finalidade defensiva e reativa da impugnação não
lhe retira o que é essencial: o pedido de tutela jurídica do Estado, corrigindo os
rumos da atividade executiva ou extinguindo a pretensão a executar”.
Argumenta ainda o autor que “reservar a qualidade de autêntica oposição à
ação autônoma, reduzindo os embargos e, agora, a impugnação ao papel de
simples contestação, ou de incidente, sem definir-lhe a exata natureza jurídica,
obscurece o fato de que por seu intermédio o executado põe barra, susta no
todo ou em parte a execução”.2
1 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 526-527. 2 ASSIS, Araken. Cumprimento da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 250.
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De forma oposta, defende outra parcela doutrinária que, a natureza
da impugnação depende das matérias alegadas pelo executado. No caso de a
alegação da defesa voltar-se aos vícios procedimentais, como o excesso de
penhora ou avaliação incorreta, a natureza da impugnação será de incidente
processual. Em sendo a alegação voltada à matéria de mérito, ou seja, à
obtenção de um bem jurídico, tal como existência de causa impeditiva,
modificativa ou extintiva da obrigação, a natureza da impugnação será de ação
incidental.3 Assim, para os compartilham tal entendimento, a impugnação tem
natureza híbrida, ora sendo ação, ora defesa.
Embora predomine na doutrina a natureza da impugnação à
execução como meio de defesa do executado, uma vez que se realiza
incidentalmente no mesmo procedimento em que estão realizados os atos
executivos, há situações, para àqueles que entendem tratar-se de instituto com
natureza híbrida, em que a impugnação assume a forma de ação de
conhecimento, ainda que movida incidentalmente no curso da execução.
Considerando o teor do exposto no artigo 475-L do Código de
Processo Civil a impugnação somente poderá versar sobre as matérias nele
arroladas. Assim, parece-nos imprescindível citar a forma exposta por José
Miguel Garcia Medina, no que tange à maneira de se agruparem tais matérias:
“As matérias que podem ser veiculadas na impugnação
podem ser assim agrupadas: a) inexistência dos
pressupostos da própria tutela executiva, como a
inexigibilidade do título executivo (artigo 475-L, II), a
ilegitimidade das partes (artigo 475-L, IV) etc.; b) validade
e adequação dos atos executivos, como no caso de
3 ALVIM, Arruda. A natureza jurídica da impugnação prevista na Lei 11.232/2005. Aspectos polêmicos da nova execução 3. Coord. Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: RT, 2006, p. 47.
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incorreção da penhora (artigo 475-L, III); c) inexistência da
obrigação contida no título executivo judicial, em razão da
ocorrência de fato superveniente (defesa indireta), a que se
refere o inciso VI do artigo 457-L”.4
Pela análise dos temas referidos no artigo 475-L podemos perceber
que em determinados casos, a impugnação amplia o objeto posto à cognição do
magistrado, que se não fossem colocadas à sua apreciação através desse meio de
defesa não poderiam ser examinadas. Daí surge a dúvida se estaríamos de fato
diante de uma simples defesa, similar à contestação no processo de
conhecimento, ou uma ação de conhecimento declaratória cujo objeto seja
distinto da ação posta em curso.
Interessante questão surge ao analisarmos o inciso VI do artigo 475-
L do Código de Processo Civil, o qual prevê as hipóteses de impedimento,
modificação ou extinção da obrigação; tais causas se alegadas na impugnação
assemelham-se mais a uma ação propriamente dita do que uma mera defesa.
Nessa hipótese entende o ilustre José Miguel Garcia Medina:
“É que, caso se entenda que a impugnação não tem natureza
de defesa, seu não acolhimento não ensejaria a
“procedência” de qualquer pedido, já que quem pede a
execução, nos termos do art. 475-J e ss. do CPC, não pede a
prolação de sentença, mas, apenas a realização de atos
executivos voltados à realização do direito contido no título
judicial.
Como, em princípio, só se pode conceber a existência de
sentença que declare a existência/inexistência da obrigação
se houver pedido veiculado em uma ação, infere-se que, 4 MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: RT, 2011, p. 462.
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como o exeqüente não fez tal pedido, isto só pode decorrer
de ação ajuizada pelo executado, que, de fato, no caso pede
que se reconheça a existência da obrigação (diferentemente,
caso, em uma ação de conhecimento, o réu apresente na
contestação defesa de mérito indireta, o resultado do
julgamento será a procedência ou improcedência do pedido
veiculado pelo autor).
Não fosse assim, acolhida a impugnação, caso se entendesse
que esta não é uma ação, se estaria diante de uma sentença
proferida sem pedido, e que não teria condições de transitar
em julgado, qualquer que fosse seu resultado. Assim, caso a
impugnação fosse rejeitada, decidindo o juiz que não teria
havido pagamento, tal questão não ficaria acobertada pela
coisa julgada, nada impedindo que o réu/executado,
posteriormente, movesse ação declaratória de inexistência
de dívida, fundada em seu pagamento..”5
Em que pese o respeitável entendimento dos ilustres
processualistas, ousamos nos filiar ao posicionamento adotado pela doutrina
majoritária, visto ser o que mais se aproxima do sincretismo processual, hoje
regra no nosso sistema processual. Considerando que, o objetivo do legislador
ao estruturar o cumprimento de sentença foi no sentido de eliminar a ação de
execução. Assim, não teria sentido manter a defesa do executado como ação
incidental, mas apenas e tão somente como uma mera fase procedimental.
O sincretismo processual trazido pela Lei n°. 11.232.2005 objetiva
melhorar o desempenho processual, vez que o título executivo judicial formado
no processo cognitivo elimina o grau de incerteza que é próprio da tutela de 5 MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: RT, 2011, p. 463.
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cognição. Desta maneira, a defesa apresentada pelo executado ao cumprimento
de sentença, limita-se apenas a um incidente processual, eliminando a
possibilidade de ajuizamento de uma ação incidental, como ocorre nos embargos
opostos na execução de título executivo extrajudicial, com o propósito de tornar
a execução de sentença por quantia num procedimento ágil e eficiente.
Em sendo o caso de alegação da hipótese prevista no inciso VI do
artigo 475-L, o qual dispõe sobre “qualquer causa impeditiva, modificativa ou
extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou
prescrição, desde que superveniente à sentença”, ou seja, alegação das
chamadas exceções substanciais, pensamos que, ainda que a impugnação tenha
como fundamento tal hipótese, essa não lhe retira a natureza de defesa, data
vênia, àqueles que entendem de maneira diversa. Na verdade, a impugnação ao
cumprimento de sentença é a forma encontrada pelo legislador de possibilitar a
resistência do executado face à pretensão executiva do credor.
Como visto alhures, ao se considerar o tratamento dado à
impugnação levando em conta sua natureza jurídica, tem-se não apenas uma
discussão acadêmica, pois a depender da posição adotada ter-se-á conseqüências
processuais distintas. Essa é a opinião de João Batista Lopes, para quem
“qualificar a impugnação como simples incidentes ou como ação não é questão
meramente acadêmica. Conseqüências teóricas e práticas decorrem dessa
orientação”.6 No mesmo sentido é o entendimento de Melo, segundo o qual, as
conseqüências processuais são distintas a depender do tratamento adotado:
“Não se trata, por óbvio, de discussão puramente
acadêmica; porquanto, o tratamento jurídico que será
6 LOPES, João Batista. Impugnação do Executado: Simples Incidente ou Ação Incidental? In CIANCI, Mirna e QUARTIERI, Rita de Cássia Rocha Conte (coord.). Temas atuais da execução civil: estudos em homenagem ao professor Donaldo Armelin. São Paulo: Editora Saraiva, 2007. p. 341-346.
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dispensado ao novel instituto em muito dependerá da
natureza jurídica que, ao cabo das discussões, vier a
prevalecer na jurisprudência.
Com efeito, em sendo considerada uma ação autônoma, a
impugnação sofrerá aplicação das disposições inerentes ao
processo de conhecimento, notadamente quanto aos
requisitos da petição inicial (art. 282 do CPC), aos ônus da
sucumbência (art. 20 do CPC), ao recolhimento prévio de
custas processuais (art. 257 do CPC), à atribuição de valor à
causa (arts. 258 e 259 do CPC), etc. Todavia, diferente
regramento legal será aplicável caso venha sagrar-se
vitoriosa a tese de se tratar de mero incidente”.7
4. Cognição em sede de impugnação
Por aplicação subsidiária do artigo 740 do Código de Processo
Civil, todos os meios de prova serão admitidos na fase de impugnação,
considerando que a limitação da cognição é horizontal, em atenção às matérias
alegáveis, e não vertical, com relação à profundidade na análise dos
fundamentos e alegações.
No procedimento executivo o contraditório é eventual, uma vez que
depende da manifestação do demandado, que não é chamado à juízo para
defender-se, mas sim para cumprir a obrigação contida no título. O contraditório
está previsto no procedimento executivo como decorrência lógica da garantia
constitucional.
7 MELO, Manuel Maria Antunes de. A impugnação do executado e a efetividade do novo cumprimento de
sentença. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10688>. Acesso em 23.11.2011.
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Não se pode, portanto, negar a existência da cognição no
procedimento executivo. E, não nos parece correta a lição de que, a cognição no
processo de execução é “tênue ou rarefeita”, consoante escreve Kazuo
Watanabe8, pois ao magistrado é permitido controlar de ofício a questões
relativa à admissibilidade da execução (pressupostos processuais), além de
manifestar-se sobre questões relativas à existência ou exigibilidade da própria
obrigação ou ao desenvolvimento dos atos executivos.
É cediço que o processo de execução é de índole satisfativa, isto é,
a execução volta-se à realização de atos executivos e, não à discussão da
pretensão. Contudo, no curso do processo de execução surgem várias questões a
serem resolvidas pelo juiz a fim de que se possa alcançar o resultado esperado,
qual seja, a satisfação do crédito. Assim como ocorre no processo de
conhecimento, também no processo de execução há uma categoria de matérias
que, para serem conhecidas pelo magistrado, devem ser argüidas pela parte, são
as chamadas exceções.
Ensina-nos Pontes de Miranda que “a exceção opera no plano da
eficácia: não pretende o demandado extinguir a pretensão contra si exercida,
mas apenas retirar-lhe a eficácia”.9 Assim, quem excetua não nega a eficácia,
busca retardá-la ou neutralizá-la. Da mesma maneira que se fala em direito de
ação como direito de provocar a atividade jurisdicional, fala-se em exceção
como o direito do réu de resistir à demanda.
5. Matérias alegáveis na impugnação
8 WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p. 83.
9 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. 4 ed. São Paulo: RT, 1984, p. 10.
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Como dito alhures, assumimos que a impugnação é o meio de
defesa que a lei reserva para o executado questionar a prática dos atos
executivos voltados à execução fundada em título executivo judicial. Desta
maneira, todas as matérias que possam, de alguma maneira, favorecer o
executado devem ser alegadas nessa oportunidade, sob pena de preclusão. A
razão desta preclusão é impedir a retroação da marcha do cumprimento de
sentença, com alegação de questões já superadas no processo, pois não haveria
sentido permitir-se rediscutir na fase de cumprimento, questões que deveriam ter
sido alegadas na fase de conhecimento antecedente.
Ocupa-se o artigo 475-L e seus incisos dos fundamentos, ou seja,
das hipóteses de cabimento da impugnação. De forma que cada um dos incisos
poderá justificar ou não a impugnação na casuística. Ademais, a impugnação
pode ser total ou parcial, a depender se o executado pretende questionar a
totalidade dos atos executivos ou apenas parte deles.
O executado não poderá alegar qualquer matéria em sua defesa,
pois entende a doutrina que a cognição tem conteúdo limitado pelo artigo 475-L
do Código de Processo Civil. Assim, apresentada a impugnação, instaura-se a
atividade cognitiva que permite ampla instrução probatória, porém limitada
pelas questões que podem ser alegadas.
Importante mencionar que a formação do título executivo pressupõe
a prévia participação das partes em uma fase de conhecimento, onde as matérias
de defesa já foram alegadas. Assim, as matérias que o legislador reserva para a
impugnação não podem servir de meio para que o executado possa trazer a tona
discussões, que já deveriam ter sido alegadas em etapa destinada à formação do
título executivo, título esse que fundamenta a execução. A etapa cognitiva já foi
superada justamente pela formação do título executivo.
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Cabe-nos fazer uma breve análise das hipóteses contidas no artigo
475-L do Código de Processo Civil, que podem ser veiculadas na impugnação,
são elas:
(i) Falta ou nulidade da citação se o processo correr à revelia
A decisão proferida em desfavor do réu, em processo que correu à
revelia, seja porque não fora citado ou porque o fora de maneira defeituosa, é
caso de decisão judicial inexistente ou inválida, a depender do entendimento
adotado. O presente inciso faz referência a fatos anteriores à formação do título
executivo que tem relevância para desconstituí-lo e que, não estão acobertados
pela eficácia preclusiva da coisa julgada.
Pela doutrina, a invalidação da sentença nesses casos pode dar-se
através do ajuizamento de uma demanda incidental ou com o acolhimento da
argüição de nulidade feita pelo executado na defesa. Importante relembrar que,
há na doutrina aqueles que entendem que a citação não é pressuposto de
existência do processo, se entendermos dessa forma a argüição não seria de
inexistência da sentença, mas sim de invalidade. Importante tal distinção tendo
em vista que, a gravidade do vício retratado nesse dispositivo é tão grave,
mesmo para aqueles que negam a categoria de inexistência processual, que a
falta ou nulidade da citação sobrevive ao prazo que o executado tem para
oferecer a impugnação, podendo inclusive ser questionada a qualquer momento
que o executado tomar ciência do processo, sendo assim desfeitos não só os atos
executivos e seus efeitos, mas também o título sobre o qual eles se
fundamentam.
No caso de acolhimento dessa nulidade, tem-se sérias
conseqüências, como a desconstituição do título, o desfazimento da penhora, e a
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extinção da execução, visto que o processo retroage até o momento em que se
deveria realizar a citação válida do executado.
(ii) Inexigibilidade do título
O dispositivo refere-se não à exigibilidade do título, mas sim à
inexigibilidade da obrigação retratada no título, pois o artigo 580 do Código de
Processo Civil teve sua redação atualizada pela Lei 11.383/2006, onde dispõe
que a obrigação representada pelo título executivo deve ser certa, líquida e
exigível. Perante tal modificação entende alguns que o artigo 475-L, inciso II
não mais se justifica pelo fato de prever a inexigibilidade do título, quando na
realidade a inexigibilidade se refere à obrigação representada no título. Trata-se
de hipótese sem muita relevância prática, pois a correção “automática” já é
aceita pela maioria da doutrina.
Por obrigação inexigível entende-se aquela obrigação que não reúne
as condições necessárias de ser exigida pelo credor. Daí a possibilidade de o
executado voltar-se à execução pela inexigibilidade do direito retratado no
título.
A maior parte da doutrina ao comentar tal dispositivo, o faz sob a
perspectiva de que a inexigibilidade da obrigação deve ser entendida como a
existência de algum impedimento, como condição ou termo, que impede a
eficácia do direito reconhecido na sentença. Assim, em caso de obrigação a
termo sujeita à condição ou dependente de uma contraprestação, a obrigação só
será exigível quando determinado evento ocorrer, cabendo ao exeqüente
demonstrar que a ocorrência de tal evento para evitar a extinção do cumprimento
de sentença por carência de ação.
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(iii) Penhora incorreta ou avaliação errônea
Esse inciso permite ao executado voltar-se à penhora ou avaliação
incorreta. Trata-se de uma novidade trazida pela Lei 11.232/2005, vez que pelas
regras atuais, a penhora e a avaliação precedem a intimação do executado, que
após a realização de tais atos flui o prazo para apresentação da impugnação.
A penhora incorreta pode ser analisada sob a ótica formal, como os
requisitos de realização da penhora, ou material, como a constrição de bens
impenhoráveis. Os vícios da avaliação também podem ser alegados na
impugnação. Como ressalta o processualista Alexandre Freitas Câmara, “este é
certamente um dos pontos mais positivo da reforma empreendida pela Lei
11.232/2005, uma que trouxe para o momento da impugnação toda a discussão
a respeito da avaliação, que antes acontecia em momento posterior.” 10
Com relação à impenhorabilidade importante mencionar o princípio
da disponibilidade, segundo o qual, é lícito ao devedor alterar a condição do
bem impenhorável, concordando com a sua constrição, da mesma forma que,
antes da execução é possível aliená-lo para pagar a dívida ou até mesmo gravá-
lo com direito real de garantia. Os vícios da penhora, quanto à
impenhorabilidade, geram nulidade relativa, pois dizem respeito ao interesse
subjetivo do devedor, devendo ser alegados na primeira oportunidade, sob pena
de preclusão.
(iv) Ilegitimidade de partes
É possível ao executado alegar, através da impugnação, a
ilegitimidade passiva ou ativa. Embora nos pareça incoerente, é possível que a
10
CÂMARA, Alexandre Freitas. A Nova Execução de Sentença. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006, p. 131.
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parte ilegítima passivamente se legitime para alegar a própria ilegitimidade e
excluir-se da execução.
Trata-se de matéria de ordem pública que pode ser alegada
inclusive fora do âmbito da impugnação, por não haver preclusão.
(v) Excesso de execução
Estabelece o artigo 743 do Código de Processo Civil as diversas
espécies de excesso de execução, porém interessa à impugnação, apenas o inciso
I, segundo o qual, há excesso de execução “quando o credor pleiteia quantia
superior à do título”.
Caracteriza-se o excesso de execução quando o credor pleiteia
quantia superior a do título. Em consonância ao teor do artigo 475-L, §2° cabe
ao impugnante declarar de imediato o valor que entende correto, sob pena de
rejeição liminar da impugnação.
(vi) Qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação,
como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição,
desde que superveniente à sentença
Conforme expõe o referido inciso exige-se que as causas
impeditivas, modificativas e extintivas da obrigação tenham ocorrido após a
prolação da sentença, em atenção à eficácia preclusiva da coisa julgada.
Conforme assente na doutrina a enumeração deste inciso é
meramente exemplificativo, podendo-se alegar outras causas de impedimento,
modificação ou extinção da obrigação, como a remissão da dívida, a dação em
pagamento, a confusão, etc.
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6. Procedimento
A impugnação, meio de defesa do executado nas execuções
fundadas em título executivo judicial, tem procedimento próprio, que não se
confunde com os dos embargos à execução.
Além do artigo 475-J, §1° que, prevê o prazo de quinze dias
contados a partir da intimação da penhora e da avaliação do bem, para
apresentação de defesa por parte do executado, apenas o artigo 475-M dispõe a
respeito do procedimento dessa espécie de defesa. Pela simples leitura do artigo
475-M é possível perceber rapidamente que esse artigo não contempla todo o
procedimento, o que exige aplicação subsidiária das regras dos embargos à
execução, conforme autoriza o artigo 475-R do Código de Processo Civil.
Diferentemente do acontecia anteriormente com os embargos à
execução fundada em sentença (antigo artigo 741 do Código de Processo Civil),
que sempre recebiam o efeito suspensivo, a impugnação, consoante disposto na
primeira parte do caput do artigo 475-M, em regra não suspenderá o
cumprimento da sentença. Aduz o artigo 475-M que a impugnação não terá
efeito suspensivo, podendo o juiz atribuir-lhe tal efeito desde que relevantes seus
fundamentos e o prosseguimento da execução seja manifestamente suscetível de
causar ao executado grava dano de difícil ou incerta reparação. Refere-se aos
clássicos requisitos para concessão de qualquer espécie de tutela de urgência: a
probabilidade de a parte ter razão em suas alegações e a necessidade de
concessão de tutela sob pena de perecimento do direito. Embora silente a lei, a
concessão do efeito suspensivo depende de pedido da parte, não podendo ser
concedido de ofício pelo juiz.
De outro lado, cumpre mencionar que, mesmo preenchidos os
requisitos para concessão de efeito suspensivo à impugnação, possibilitou o §1°
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do artigo 475-M o prosseguimento da execução, oferecendo e prestando caução
suficiente e idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos. Trata-se de
medida que possibilita o prosseguimento da execução, em homenagem ao
princípio da efetividade. O §2° do artigo 475-M prevê a forma de autuação da
impugnação, em havendo efeito suspensivo, será autuada nos próprios autos; e
não sendo concedido efeito suspensivo, será autuada em apenso, em autos
apartados.
Partindo da premissa de que a impugnação não é uma ação, e isso é
o entendimento majoritário, e não sendo uma ação, não é necessário articular a
defesa em forma de petição inicial. Na verdade, significa que é uma petição que
vincula uma pretensão, afinal o executado está se insurgindo contra o exeqüente.
É uma peça que obrigatoriamente deve conter fundamentação e pedido.
Independentemente do entendimento que se adote a respeito da
natureza da decisão da impugnação, se decisão interlocutória ou sentença, o
artigo 475-M resolve, de maneira expressa, a questão do recurso cabível: da
decisão que apreciar a impugnação caberá agravo de instrumento. Na hipótese
de a decisão não colocar fim ao cumprimento de sentença, o recurso cabível é o
agravo de instrumento, sendo a apelação cabível na hipótese de a decisão
importar em extinção da execução (quando comprovada uma causa
superveniente extintiva da obrigação, por exemplo). Observa-se que o critério
válido para se determinar o recurso cabível é o efeito da decisão impugnada.
Tema esse que será enfrentado adiante.
7. Sentença que julga a impugnação
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Antes de adentramos nos aspectos que envolvem a sentença na
impugnação ao cumprimento de sentença, é necessário esclarecer o que é uma
sentença. A Lei 11.232/2005 alterou o artigo 162, §1° do Código de Processo
Civil, que passou a ter a seguinte redação: “sentença é o ato do juiz que implica
algumas das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta lei”. Essa alteração
foi alvo de diversas críticas por parte da doutrina, mas a questão está em saber
qual a natureza do ato judicial, se sentença ou decisão interlocutória. Neste
sentido se manifestam Fredie Didier, Paulo Sarna Braga e Rafael Oliveira:
A despeito das incorreções técnicas da lei e da reforma por
que ela passou, decisão interlocutória é o pronunciamento
pelo qual o juiz resolve questão (incidente ou principal,
pouco importa) sem pôr fim ao procedimento em primeira
instância ou a qualquer de suas etapas. Já a sentença é o
pronunciamento pelo qual o juiz, analisando ou não o mérito
da causa, põe fim a uma etapa (cognitiva ou executiva) do
procedimento em primeira instância.11
Verifica-se nos dias atuais a tentativa da doutrina de enquadrar
determinados fenômenos jurídicos ocorridos no processo de execução nas
categorias do processo de conhecimento. Parece-nos que a tutela jurisdicional
adéqua-se à pretensão do demandante, a depender do caso, em atividades
cognitivas e executivas independentemente da modalidade do processo. Para
exemplificar essa possível tendência podemos citar a execução da liminar de
antecipação de tutela, prevista no artigo 273, §3° do Código de Processo Civil,
que deverá ser executada na pendência do processo de conhecimento.
11 DIDIER, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil: direito
probatório, decisão judicial, cumprimento e liquidação da sentença e coisa julgada. Vol 2. Salvador: Editora Jus Podivm, 2007.
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Nesse viés, ilustrativas são as palavras de José Miguel Garcia
Medina:
O artigo 5.º, inc. XXXV, da Constituição Federal (“a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito”) deve ser entendido no sentido de se
possibilitar a concessão de providência jurisdicional mais
efetiva, ainda que seja necessária a “mescla” de atividades
jurisdicionais cognitivas e executivas numa mesma ação.12
A tutela jurisdicional executiva consiste na prática de atos
executivos visando à realização material do direito violado e, não a discussão da
pretensão do exeqüente. O objetivo do processo de execução é a satisfação do
crédito exeqüendo. Ocorre que, no curso do processo, surgem várias questões a
serem resolvidas pelo juiz a fim de se chegar ao resultado esperado, levando-nos
a dizer que há cognição na ação de execução. A amplitude da cognição variará
conforme a existência ou não de processo precedendo ao título formado.
Na impugnação do artigo 475-L a cognição do magistrado se
encontra limitada às hipóteses expressamente previstas e à análise dos requisitos
mínimos para que o processo de execução exista e se desenvolva validamente.
Há, porém hipóteses que, em razão de sua natureza, devem ser conhecidas de
ofício pelo juiz, ainda que não se refiram às hipóteses mencionadas, é o caso das
nulidades processuais absolutas.
A dúvida instala-se quanto à natureza da decisão que julga a
impugnação. A impugnação à execução de título executivo judicial, disciplinada
nos artigos 475-L e 475-M do Código de Processo Civil, não se desenvolve de
12 MEDINA, José Miguel Garcia. Breves Notas Sobre a Exceção de Pré-Executividade. Disponível na Internet: <http://www.mundojuridico.adv.br>. Acesso em 23 de novembro de 2011.
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modo procedimentalmente autônomo como ocorre com os embargos à execução
fundados em título executivo extrajudicial, mas sim incidentalmente, no mesmo
procedimento executivo. E o artigo 475-M, §3° estabelece que a decisão da
impugnação é recorrível por agravo de instrumento, a menos que extinga a
execução. Não diz, porém que espécie de pronunciamento é a decisão da
impugnação, se interlocutória ou se sentença, mas prevê um recurso cabível o
que leva a doutrina a conclusões quanto à espécie de decisão.
Ensina-nos Teresa Arruda Alvim Wambier que, as sentenças que
extinguem o processo de execução, não são sentenças, tampouco de mérito, pois
para a ilustre processualista, as expressões “sentenças” e “de mérito” são
expressões utilizadas em relação ao processo de conhecimento e, não podem ser
usadas no processo executivo, a menos que seja em outro sentido, com
finalidade e natureza compatível do processo executivo. Para a processualista,
são pronunciamentos judiciais apeláveis e não rescindíveis.13
Conforme definido de forma expressa no artigo 475-M, §3° do
Código de Processo Civil, “a decisão que resolver a impugnação é recorrível
mediante agravo de instrumento, salvo quando importar extinção da execução,
caso em que caberá apelação”.
A par desse dispositivo, convém recordar que a Lei n°.
12.232/2005, instituindo o processo sincrético e, dentre outras alterações, aboliu
a tradicional divisão e autonomia dos processos de conhecimento e executivo,
trazendo uma fase executiva voltada à satisfação da obrigação, como seqüência
e continuidade da sentença proferida na fase de cognição. Diante dessas
alterações, a sentença não mais poderia ser entendida como ato que encerrava a
atividade do juiz e colocava fim ao processo. Mas, diferentemente, ao ser
proferida a sentença na fase cognitiva, o processo teria uma regular seqüência na
13 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. São Paulo: RT, 2007, p. 501.
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fase executiva. Desta forma, não teria o magistrado colocado fim ao processo
com a prolação da sentença.
Nesse sentido, ensina-nos Araken de Assis que “a sentença de
procedência, por suposto julgando o mérito favoravelmente ao autor, não
extinguirá o processo, como decorria da antiga redação do artigo 162, §1°, e
269, caput, nem o juiz ao proferi-la cumpre e acaba o ofício jurisdicional,
conforme estabelecia anteriormente o art. 463, caput, pois o processo
prosseguirá, a requerimento do vencedor, para executar o provimento”.14
Pela redação do artigo 475-M, §3° verifica-se uma incoerência com
o novo conceito de sentença, uma vez que adota o antigo critério finalístico para
identificar a natureza jurídica do pronunciamento, exigindo que a haja a extinção
da execução para que o ato tenha caráter de sentença, sendo assim recorrível por
apelação.
Diferentemente é a decisão que resolve os embargos à execução
fundados em título executivo extrajudicial, que têm natureza jurídica de
sentença, conforme preceitua os artigos 740 e 520, inciso V do Código de
Processo Civil, que inclusive prevê a concessão apenas de efeito devolutivo à
apelação quando a decisão rejeitar liminarmente ou julgar improcedentes os
embargos.
Parece-nos que não haveria motivos para tratamento diferenciado
para a impugnação, mesmo adotando o entendimento no sentido de que a
impugnação não tenha natureza jurídica de ação, mas sim de mero incidente.
Desta maneira, a decisão que resolver a impugnação, aceitando-a ou não, tem
natureza jurídica de sentença, sendo recorrível por apelação. Mas, diante da
clareza do dispositivo legal, quanto ao cabimento do agravo, não cabe à parte
nem mesmo socorrer-se do princípio da fungibilidade.
14
ASSIS, Araken de. Cumprimento de sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 19.
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8. Recurso cabível contra a decisão da impugnação
Dispõe o artigo 475-M, §3° do Código de Processo Civil sobre os
recursos cabíveis da decisão que julgar a impugnação. De acordo com a
disposição contida no referido artigo, a decisão que resolver a impugnação ao
cumprimento de sentença desafiará recurso de agravo na modalidade de
instrumento, exceto se o acolhimento da impugnação ensejar a extinção da
execução, hipótese em que o recurso cabível será o de apelação.
Pela redação legal do artigo é possível perceber que existe um
vácuo procedimental, visto que o dispositivo não revela todas as situações que
envolvem a questão das decisões proferidas na impugnação. A questão ganha
destaque quando o acolhimento da impugnação ensejar a extinção parcial da
execução. Surge então a dúvida a respeito da natureza dessa decisão e
conseqüentemente do recurso cabível.
Neste aspecto entende a melhor doutrina que a extinção parcial da
execução não enseja um recurso de apelação, pelo fato de haverem ainda
atividades jurisdicionais a serem praticadas em primeiro grau de jurisdição.
O recurso de agravo, cabível nos casos de rejeição da impugnação
(total ou parcial) tem efeito suspensivo apenas ope judicis. Assim, se o
executado demonstrar a presença dos elementos contidos no caput do artigo 558,
deve ser concedido o efeito suspensivo.
Já a apelação é cabível nos casos de acolhimento total da
impugnação e, será recebida com efeito suspensivo por ser esta a regra geral,
contida no caput do artigo 520. Diz o artigo que se a decisão da impugnação
extinguir a execução cabe o recurso de apelação e, a doutrina majoritária vem e
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conclui que será uma sentença que porá fim na execução. E, no caso da
execução continuar cabe agravo de instrumento, porque segundo a doutrina,
estar-se-ia diante de uma decisão interlocutória.
O critério para determinar se cabe apelação ou agravo é
simplesmente a análise do efeito da decisão sobre a execução. É exatamente isso
que se deve analisar, pois se a decisão tiver como efeito a extinção da execução
cabe apelação; se a decisão não tiver como efeito a extinção da execução cabe
agravo de instrumento.
Por opção legislativa, o conteúdo da decisão que julga a
impugnação é irrelevante para fins de definição do recurso cabível. Se, ao
deparar-se com uma decisão que rejeita a impugnação é óbvio que nesse caso a
execução segue, e é óbvio que o recurso cabível é o agravo de instrumento. O
problema surge quando o juiz acolhe a impugnação, ou seja, quando o juiz julga
procedente a impugnação, porque a execução pode ser extinta ou pode
continuar.
A título de exemplo, podemos imaginar a seguinte situação: o
impugnante (executado) alega que, depois de constituído o título ele pagou a
dívida. Se o juiz acolher a alegação do impugnante, a qual ele afirma que pagou
a dívida extingue-se a execução. Por outro lado, se o impugnante (executado)
alegar excesso de execução e o juiz acolher essa alegação, a execução prossegue
pelo valor excedente. Assim, o recurso cabível será o agravo de instrumento,
ainda que o impugnante logre-se vencedor, pois a execução não se extingue, mas
prossegue-se.
A questão ganha relevo quando o acolhimento da impugnação
ocorrer com fundamento ao quanto estabelecido no artigo 475-L, I que prevê
que o impugnante pode alegar na impugnação ausência ou vício de citação
quando o processo correr a sua revelia. A fim de aclarar a questão trataremos
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de exemplificá-la: suponhamos que o impugnante (executado) alegue em sua
impugnação que não foi devidamente citado para o processo de conhecimento e,
que a citação ocorreu na pessoa de seu homônimo. Em caso de o magistrado
acolher essa alegação, providenciar-se-á a anulação do processo desde o
momento da citação viciada. Desta forma, acontecerá uma situação singular,
qual seja, a extinção da execução e, por conseqüência lógica do título que fora
formado, pois vigora na execução o princípio do nulla executio sine titulo,
segundo o qual, não haverá execução por carência de título executivo. Nesse
caso, excepcionalmente ocorrerá a extinção da execução por carência de título,
mas não haverá extinção do processo.
Diante de tal situação, anula-se todo o processo por conter nulidade
insanável, qual seja, a citação viciada. Diante de tal constatação, é necessário
tratar do tema das nulidades dos atos processuais no que tange à geração de
efeitos da decretação da nulidade não só em relação ao ato nulo, mas também
aos outros atos a ele ligados que serão anulados, apesar de formalmente
perfeitos, em razão do efeito expansivo das nulidades.
O tratamento aplicado ao efeito expansivo das nulidades encontra
previsão no artigo 248 do Código de Processo Civil ao dispor que, anulado o
ato, reputam-se de nenhum efeito todos os atos subseqüentes, que dele
dependam; todavia, a nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras,
que dela sejam independentes. É o que ocorre quando, anulado um processo em
que a citação tenha sido viciada, preserva-se a petição inicial, que é ato
praticado antes do vício.
Em decorrência do efeito expansivo das nulidades, anula-se todo o
processo por conter nulidade insanável: a citação viciada. Perceba que, o
processo não foi extinto; mas a execução foi extinta porque essa depende de
título executivo.
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O artigo 475-M, §3° do Código de Processo Civil estabelece como
recurso cabível a apelação, em virtude de ter ocorrido a extinção da execução. A
apelação, a teor do que estabelece o artigo 513 do Código de Processo Civil,
pode ser interposta contra toda e qualquer sentença, tenha ou não sido apreciado
o mérito.
Diante de tal cenário, a questão insurge-se a respeito de qual seria o
objetivo do legislador ao criar o artigo 475-M. Teria o legislador previsto a
ocorrência da extinção da execução sem a extinção do processo? O fato de o
processo encontrar-se em fase execução; e essa última ser extinta é natural
pensar que o todo processo seria extinto também. Tal pensamento enquadra-se
perfeitamente em todas as hipóteses de matérias que podem ser veiculadas na
impugnação, constantes do artigo 475-L, apenas não se aplica ao fundamento
previsto no inciso I do artigo 475-L.
Nesse diapasão, torna-se imprescindível saber se a intenção do
legislador ao criar a norma prevista no artigo 475-M, o fez com a intenção de
que se aplicasse a literalidade do artigo, ou seja, na hipótese de alegação de
ausência ou vício de citação, por extinguir a execução interpor-se-ia o recurso de
apelação; ou se a verdadeira intenção do legislador era de considerar a ratio da
norma, a razão de ser da norma, pois diante de situação colocada, interpor-se-ia
o recurso de agravo na modalidade de instrumento.
Certamente a redação legal do dispositivo não revela a situação em
que a execução poderia ser extinta, mas o processo continuaria. O legislador não
imaginou tal situação, pois ao extinguir-se a execução, extinguiria também o
processo. O fato de autos subirem ou não tribunal, não revela importância
alguma. Agora, se a execução continua, o recurso cabível é o agravo na
modalidade de instrumento, para que não interfira no andamento da execução.
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Em nosso sentir, trata-se de típica hipótese de fungibilidade
recursal, vez que pela ratio, pela razão de ser da norma, interpor-se-ia o recurso
de agravo na modalidade de instrumento e, pela literalidade da norma, interpor-
se-ia o recurso de apelação.
9. Conclusão
Como sabemos, com a novidade trazida pela Lei n° 11.232/2005, o
cumprimento de sentença passou a fazer parte de maneira mais freqüente do
nosso sistema de execução. Com isso, o legislador entendeu conveniente criar
uma defesa típica para o executado, diferentemente dos embargos à execução,
para o cumprimento de sentença, por tratar-se de uma mera fase procedimental,
dentro de uma ação sincrética, denominando-a de impugnação.
O sincretismo processual trazido pela Lei n°. 11.232/2005 objetiva
melhorar o desempenho processual, vez que o título executivo judicial formado
no processo cognitivo elimina o grau de incerteza que é próprio da tutela de
cognição. Desta maneira, a defesa apresentada pelo executado ao cumprimento
de sentença, limita-se apenas a um incidente processual, eliminando a
possibilidade de ajuizamento de uma ação incidental, como ocorre nos embargos
opostos na execução de título executivo extrajudicial, com o propósito de tornar
a execução de sentença por quantia num procedimento ágil e eficiente.
A par desse dispositivo, convém recordar que, dentre outras
alterações, a referida lei rompeu com a tradicional divisão e autonomia dos
processos de conhecimento e executivo, trazendo uma fase executiva voltada à
satisfação da obrigação, como seqüência e continuidade da sentença proferida na
fase de cognição. Diante dessas mudanças, a sentença não mais poderia ser
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entendida como ato que encerrava a atividade do juiz e colocava fim ao
processo. Mas, diferentemente, ao ser proferida a sentença na fase cognitiva, o
processo teria uma regular seqüência na fase executiva. Desta forma, não teria o
magistrado colocado fim ao processo com a prolação da sentença.
Desta maneira, não haveria motivos para tratamento diferenciado
para a impugnação, mesmo adotando o entendimento no sentido de que a
impugnação não tenha natureza jurídica de ação, mas sim de mero incidente. A
decisão que resolver a impugnação, aceitando ou rejeitando, tem natureza
jurídica de sentença, sendo recorrível por apelação. Mas, diante da clareza do
dispositivo legal, quanto ao cabimento do agravo, não cabe à parte nem mesmo
socorrer-se do princípio da fungibilidade.
Por opção legislativa, o conteúdo da decisão que julga a
impugnação é irrelevante para fins de definição do recurso cabível. Se, ao
deparar-se com uma decisão que rejeita a impugnação é óbvio que nesse caso a
execução segue, e é óbvio que o recurso cabível é o agravo de instrumento. O
problema surge quando o juiz acolhe a impugnação, ou seja, quando o juiz julga
procedente a impugnação, porque a execução pode ser extinta ou pode
continuar.
Diante de tal cenário, a questão ganha relevo quanto ao que seria o
objetivo do legislador ao criar o artigo 475-M. Teria o legislador previsto a
ocorrência da extinção da execução sem a extinção do processo? O fato de o
processo encontrar-se em fase execução; e essa última ser extinta é natural
pensar que o todo processo seria extinto também. Nesse diapasão, torna-se
imprescindível saber se a intenção do legislador ao criar a norma prevista no
artigo 475-M, o fez com a intenção de que se aplicasse a literalidade do artigo,
ou seja, na hipótese de alegação de ausência ou vício de citação, por extinguir a
execução interpor-se-ia o recurso de apelação; ou se a verdadeira intenção do
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legislador era de considerar a ratio da norma, a razão de ser da norma, pois
diante de situação colocada, interpor-se-ia o recurso de agravo na modalidade de
instrumento.
Parece-nos tratar-se de típica hipótese de fungibilidade recursal, vez
que pela ratio, pela razão de ser da norma, interpor-se-ia o recurso de agravo na
modalidade de instrumento e, pela literalidade da norma, interpor-se-ia o recurso
de apelação.
10. Referências bibliográficas
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