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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA E PESQUISA
Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local
IARA LAMAS
REEDUCAÇÃO ALIMENTAR: um estudo com ênfase nos aspectos
subjetivos relacionados à mudança de hábito
Belo Horizonte
2015
Iara Lamas
REEDUCAÇÃO ALIMENTAR: um estudo com ênfase nos
aspectos subjetivos relacionados à mudança de hábito
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local, do Centro Universitário UNA, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Inovações Sociais, Educação e Desenvolvimento Local. Linha de pesquisa: Educação e Desenvolvimento Local.
Orientadora: Dra Matilde Meire Miranda Cadete.
Belo Horizonte
2015
Ficha catalográfica desenvolvida pela Biblioteca UNA campus Guajajaras
L215r Lamas, Iara
Reeducação alimentar: um estudo com ênfase nos aspectos subjetivos
relacionados à mudança de hábito. / Iara Lamas. – 2015.
139f.
Orientadora: Profa. Dra. Matilde Meire Miranda Cadete.
Dissertação (Mestrado) – Centro Universitário UNA, 2015. Programa
de Pós-graduação em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local.
Inclui bibliografia.
1. Hábitos alimentares. 2. Desenvolvimento social. I. Cadete, Matilde
Meire Miranda. II. Centro Universitário UNA. III. Título.
CDU: 658.114.8
Para os meus filhos, André e Isabella,
que são o meu orgulho,
meu espelho e continuidade da minha vida.
AGRADECIMENTOS
A minha recente trajetória acadêmica foi marcada por várias mulheres sábias e
mestras maravilhosas.
Sinto-me uma pessoa privilegiada por ter sido orientada pela querida Professora
Matilde Meire Miranda Cadete. Durante esta caminhada, construímos juntas o
nosso trabalho e a cada dia fui aprendendo a verdadeira lição de educar: a
partilha gratuita do conhecimento, o respeito e a aposta no potencial e capacidade
de desenvolvimento do outro. Obrigada pela confiança, pela paciência em
respeitar o meu tempo e me fazer acreditar que é possível inovar as experiências
acumuladas em nossas vidas.
Quando ingressei no mestrado da UNA, encontrei mulheres excepcionais.
Verdadeiras mestras, todas elas. Resumo aqui, na figura da nossa coordenadora,
a Professora Lucília Machado, pessoa brilhante, a minha admiração pela
competência, comprometimento e dedicação de todos do corpo docente.
Agradeço, em especial, às professoras Maria Lúcia Afonso e Wânia Maria de
Araújo, pela leitura atenciosa do projeto e pelas valiosas contribuições para a
pesquisa no momento da minha qualificação.
O meu encantamento por essas grandes mulheres teve início quando conheci a
primeira grande mestra que me tocou profundamente. Foi a Professora Sandra
Azeredo, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde cursei a
disciplina isolada sobre Gênero e Raça, oferecida pelo Departamento de
Psicologia Social da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FAFICH), em
2010. Surpreendeu-me a forma como ela conduziu um assunto tão complexo de
maneira tão responsável, corajosa, profunda e respeitosa. Ao mergulharmos no
universo feminino e nas questões de gênero e raça, mudei totalmente a minha
visão do mundo.
A segunda experiência marcante foi a oportunidade de assistir, como ouvinte, às
aulas sobre Análise da Práxis Científica da Professora Maria Teresa Aguiar, na
Escola de Engenharia da UFMG, em 2011. Sua assertividade despertou em mim
o senso crítico e a objetividade. Aprendi a buscar o conhecimento na observação
simples do cotidiano e das artes. Em meio a tantos raciocínios lógicos,
característicos das ciências exatas, surge uma sensata lucidez que nos diz: “São
nos pontos fora da curva que se observa a inovação”.
Logo depois, tive o privilégio de estar com a doce Professora Maria de Lourdes
Gouveia, sábia, encantadora e que nos proporcionou deliciosos momentos em
que “pensamos juntas” a história da Filosofia.
Agradeço à minha família, principalmente a minha mãe, que me acolheu de forma
muito especial para que eu pudesse realizar este projeto profissional.
Como falei, estou mergulhada no universo feminino cheio de histórias, mistérios e
desafios. Dessa forma, não poderia deixar de agradecer às mulheres que fizeram
parte da minha pesquisa e que contribuíram para aumentar a compreensão sobre
o tema investigado. Mulheres admiráveis que me ajudaram a delinear este
trabalho e cujo resultado expressa a magia do encontro, do despertar, do buscar,
do caminhar junto e do realizar.
Finalmente, agradeço a todos os meus colegas pelo companheirismo, alegria e
espírito de coletividade que desfrutamos durante esses dois anos. A nossa
convivência foi saudável, singular, fruto dos nossos valores e crenças e marcou
para sempre as nossas vidas como uma prazerosa experiência de solidariedade.
“[...] Muda, que quando a gente muda o mundo muda com a gente.
A gente muda o mundo na mudança da mente.
E quando a gente muda a gente anda pra frente.
E quando a gente manda ninguém manda na gente!
Na mudança de atitude não há mal que não se mude, nem doença sem cura.
Na mudança de postura a gente fica mais seguro.
Na mudança do presente a gente molda o futuro! [...]”
Gabriel o Pensador.
RESUMO
A compreensão dos fatores que influenciam o comportamento alimentar e uma abordagem nutricional adequada são fundamentais para auxiliar a mudança de hábitos alimentares. Este trabalho explorou a reeducação alimentar realizada com grupos de profissionais da saúde no próprio ambiente de trabalho. Trata-se de uma pesquisa qualitativa cujo objetivo foi identificar as estratégias para a construção de novos hábitos alimentares. Para a construção do referencial teórico, foi realizada revisão bibliográfica narrativa sobre a produção científica publicada acerca da motivação e do processo de abordagem nutricional para se alcançar resultados efetivos para a mudança de hábitos alimentares saudáveis. O cenário da pesquisa de campo foi a Maternidade Odete Valadares da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG), em Belo Horizonte. A coleta dos dados foi feita por meio de entrevista semiestruturada, respondida por 12 sujeitos participantes do grupo de reeducação alimentar, utilizando-se a técnica da análise de conteúdo de Bardin para tratamento dos dados. Os resultados produziram categorias denominadas “relação do indivíduo com a comida”; “processo de reeducação alimentar”; “relação cultural” e “saúde”. A análise dos dados demonstrou que aspectos subjetivos e o meio social influenciam o comportamento alimentar do sujeito; os sentimentos de ansiedade e tristeza podem funcionar como indutores do comer compulsivo; e o apoio de familiares e amigos ajudam a sustentar o desejo de mudança. Deu-se ênfase à informação como elemento fundamental para o desenvolvimento da consciência crítica e da valorização da qualidade dos alimentos em vez da quantidade. A autonomia do sujeito para a condução das alterações nas práticas alimentares serviu como motivação, enquanto a administração de tempo e dinheiro foi fator dificultador para a sua manutenção. A saúde é o grande eixo motivador para a mudança e a realização de atividade física foi uma das estratégias mais utilizadas pelos sujeitos na modificação do estilo de vida. As ações educativas realizadas no local de trabalho demonstraram fortalecer as relações interpessoais e proporcionaram ambiente favorável para adequação de novas rotinas e hábitos. O estudo permitiu compreender que a intervenção nutricional deve levar em consideração não só as necessidades orgânicas individuais, mas as expectativas do sujeito e os aspectos subjetivos e simbólicos que os alimentos representam. Como forma de contribuição para promoção da saúde e mudança de hábitos alimentares, apresenta-se um produto técnico com vistas a auxiliar os profissionais nas intervenções nutricionais para que estas se tornem mais adequadas à realidade do sujeito e que efetivamente possibilitem transformações em sua vida. Palavras-chave: Educação alimentar e nutricional. Comportamento alimentar. Educação para Saúde.
ABSTRACT
The comprehension of the factors that influence eating behavior and an adequate nutritional approach are fundamental to aid in eating habits change. This paper explored the eating reeducation realized with heath professional’s groups at their own workplace. It is a qualitative research that has the objective of identifying the strategies for the construction of new eating habits. Therefore, a narrative bibliographic review about the published scientific production concerning the motivation and the process of nutritional approach to achieve effective results regarding healthy eating habits change was carried out. The research scenery field was the Maternidade Odete Valadares of Hospitalar Fundation Estado de Minas Gerais – FHEMIG, at Belo Horizonte and the data collection was done through semi-structured interviews answered by 12 individuals, participants of the eating reeducation group, and the Bardin content analysis technique was used for data treatment. The results produced categories that were named: “individual relation with food”; “eating reeducation process”; “cultural relation” and “health”. The data analysis has shown that subjective aspects and the social environment can influence the individual eating behavior. The feeling of anxiety and sadness can work as inductors for compulsive eating, and familiar and friend support can help sustain the change desire. The results emphasize that information as a key element for critical conscience development, and for food quality valorization instead of quantity valorization. The autonomy of the individual for conduction of eating habits change worked as motivation, while time and money administration was hardening factor for its maintenance. Health is the biggest motivational element for change, and realization of physical activities was one of the most used strategies by the individuals for life style changes. Educative actions that took place in the workplace seemed to strengthen the interpersonal relations and provided a favorable environment for the new routine and habits adequacy. The research allowed the understanding that nutritional intervention should consider not only individual organic necessities, but also individual expectations and the subjective and symbolic aspects that food represents. As a way to contribute for health and eating habits change promotion, it is presented a technical product which aims to aid professionals during nutritional interventions so they can became more adequate to the individual reality and that effectively allows transformations in their lives. Keywords: Food and nutrition education. Feeding behavior. Education for health.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BVS Biblioteca Virtual de Saúde
CEP Comitê de Ética em Pesquisa
DCNT Doenças Crônicas Não Transmissíveis
ESF Equipes de Saúde da Família
FHEMIG Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais
GAPB Guia Alimentar para a População Brasileira
GTH Grupo de Trabalho de Humanização
IMC Índice de Massa Corporal
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
MOV Maternidade Odete Valadares
OMS Organização Mundial da Saúde
PBH Prefeitura de Belo Horizonte
PNH Política Nacional de Humanização
PNPS – SUS Política Nacional de Promoção da Saúde dos Trabalhadores
do Sistema Único de Saúde – SUS
POF Pesquisa de Orçamento Familiar
SciELO Scientific Electronic Library Online
TCC Terapia Cognitiva Comportamental
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UBS Unidade Básica de Saúde
UFMG Universidade Federal de Minas Gerais
SUMÁRIO1
1 INTRODUÇÃO............................................................................................ 11
2 ASPECTOS RELACIONADOS À MUDANÇA DE HÁBITO ALIMENTAR:
UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA..................................................................
15
3 DO DESEJO À AÇÃO: FATORES QUE INTERFEREM NA ABORDAGEM
NUTRICIONAL PARA MUDANÇA DE HÁBITO ALIMENTAR.......................
36
4 PRODUTO TÉCNICO: CARTILHA DE ORIENTAÇÃO NUTRICIONAL..... 94
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 130
REFERÊNCIAS.............................................................................................. 135
ANEXO E APÊNDICES................................................................................. 141
1 Este trabalho foi revisado de acordo com as novas regras ortográficas aprovadas pelo Acordo
Ortográfico assinado entre os países que integram a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), em vigor no Brasil desde 2009. E foi formatado de acordo com a ABNT NBR 14724 de 17.04.2011.
11
1 INTRODUÇÃO
A efetividade do processo de mudança de hábitos alimentares requer
fundamental e adequada abordagem nutricional. A necessidade de compreender
melhor os fatores que influenciam o comportamento alimentar é essencial, pois
este é dependente de questões socioeconômicas determinantes das escolhas
alimentares, que estão relacionadas aos aspectos subjetivos referentes ao ato de
comer. É possível analisar a relação dos indivíduos com os alimentos, procurando
identificar os condicionantes dos processos sociais e culturais a partir da
perspectiva de que os alimentos não contêm apenas nutrientes necessários à
sobrevivência, eles “representam um conjunto de normas ou crenças que um
grupo de pessoas compartilha em relação aos alimentos e sua manipulação”. O
alimento, além de seu caráter nutritivo, constitui-se em uma linguagem cheia de
significações (CARRASCO I PONS, 2005, p. 118).
Conforme afirmam Daniel e Cravo (2005), o homem é resultado de uma
construção social e os elementos culturais de cada sociedade são responsáveis
pela caracterização de suas ações, e é esse processo que vai determinar suas
escolhas alimentares. O alimento sempre esteve presente em momentos de
congregação entre as pessoas, simbolizando união, fartura e alegria. As
experiências vividas nesses momentos acompanham o sujeito como uma marca
da sua identidade dentro de um grupo e representa um registro da forma como
esse sujeito vai agir e responder aos estímulos externos ao longo de sua vida.
Gallian (2007, p. 180) expressa, de maneira delicada e sutil, o conceito de
refeição:
[...] a refeição será sempre uma das formas mais recorrentes de congregação, de transmissão de ideias, valores, verdades, de comemoração. Ou seja, a refeição acabou por se constituir, em grande parte das culturas e civilizações, num espaço privilegiado de experiência do humano e de humanização. [...] Toda verdadeira refeição, seja simples seja mais sofisticada, significa, comunica e evoca algo que é preciso decifrar e identificar. E, nesse sentido, a refeição acaba por envolver não apenas a dimensão da sensibilidade, mas igualmente a da afetividade e da inteligência humanas.
12
O processo de mudança de hábito requer uma reestruturação desses
registros de referências simbólicas e constitui-se no grande desafio para o sujeito
e também para o profissional que vai orientá-lo. A educação alimentar e
nutricional pautada na relação dialógica entre o profissional e o indivíduo parece
ser um caminho para auxiliar nesse momento de compreensão da necessidade
de mudança de hábitos alimentares e adesão a uma dieta saudável.
Partindo dessas reflexões, esta pesquisa teve como foco gerador as
estratégias e recursos utilizados por profissionais da saúde que conseguiram
superar dificuldades de mudar hábitos, bem como os estímulos para adesão a
uma alimentação mais saudável.
Esses profissionais são funcionários da Maternidade Odete Valadares – da
Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG), em Belo Horizonte,
que participaram de um grupo de reeducação alimentar realizado no próprio local
de trabalho, no período de 2009 a 2012. A experiência permitiu aos profissionais o
acesso à orientação nutricional, atendimento individual e em grupo por um
período de, aproximadamente, seis meses, tempo necessário para avaliar as
mudanças alcançadas pelos participantes. O grupo foi idealizado a partir da
demanda de melhorar os hábitos alimentares para promoção da saúde e perda de
peso e foi apoiado pelo Grupo de Trabalho de Humanização (GTH) em
cumprimento às diretrizes referentes à valorização do trabalhador da Política
Nacional de Humanização de 2003 e da Política Nacional de Promoção à Saúde
dos Trabalhadores do SUS de 2011.
A análise dos resultados da classificação do estado nutricional dos
participantes do grupo, realizada antes da intervenção nutricional, desvelou alto
índice de sobrepeso e obesidade, confirmando os dados apresentados pela
Pesquisa de Orçamento Familiar (POF, 2008/2009), realizada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os resultados desta pesquisa
mostram que houve aumento contínuo e significativo do percentual de pessoas
com excesso de peso e obesidade, nas últimas décadas, chegando a atingir 48%
das mulheres e 50% dos homens acima de 20 anos, em todas as faixas de renda
e em todas as regiões do Brasil.
A análise dos resultados do POF (2008/2009) também evidenciou a
inadequação do padrão alimentar da população brasileira, caracterizada pelo alto
consumo de alimentos ricos em gorduras, açúcar e sódio, aliado à baixa ingestão
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de frutas, verduras, legumes e grãos integrais. E particularmente o consumo
elevado de bebidas com adição de açúcar (sucos, refrigerantes e refrescos).
O mesmo panorama de inadequação alimentar foi encontrado na
população pesquisada, ratificando a necessidade e importância de se propor e
concretizar uma intervenção em educação nutricional para minimizar danos e
promover a saúde do trabalhador. A partir dessas constatações foram feitos os
questionamentos que fundamentaram a pesquisa: com que estratégias e recursos
os profissionais da saúde têm conseguido superar as dificuldades de mudar o
hábito alimentar e aderir a uma dieta mais saudável? Quais estímulos motivaram
ou desmotivaram a mudança de hábito alimentar? E quais são os significados
simbólicos e afetivos do ato de comer para esses sujeitos?
Acredita-se que a mudança de hábitos alimentares é mais efetiva quando o
indivíduo consegue estabelecer um sentido entre as ações necessárias para
obtenção de uma alimentação saudável, o seu referencial simbólico e o valor
afetivo incorporado aos alimentos e ao ato de comer, fatores esses determinantes
das suas escolhas (MARQUES; GUTIERREZ, 2009). A mudança pode ser
estimulada ou não, se o indivíduo encontrar apoio do meio em que está inserido,
seja no ambiente familiar ou no trabalho, colaborando, dessa forma, para superar
as dificuldades em mudar hábitos, fortalecer as relações interpessoais e
proporcionar um ambiente favorável à adequação de novas rotinas.
Com base nesse contexto, crê-se que o significado das ações e
motivações que determinaram a mudança de hábito alimentar e se tornaram
experiências exitosas seja explicitado por meio da linguagem oral, a fim de se
identificar elementos envolvidos na construção de novos hábitos alimentares mais
saudáveis.
Assim, o objetivo geral deste estudo foi analisar as estratégias e recursos
utilizados por profissionais da saúde no enfrentamento das dificuldades em adotar
hábitos alimentares mais saudáveis para subsidiar a preparação de um produto
técnico-educativo para mudanças de hábitos alimentares.
E como objetivos específicos, almejou-se:
a) Realizar revisão teórica sobre a produção científica publicada acerca da
motivação e do processo de abordagem nutricional para se alcançar
resultados efetivos a mudança de hábitos alimentares saudáveis;
14
b) Identificar estímulos que motivaram ou desmotivaram a mudança de hábito
alimentar;
c) Conhecer os significados simbólicos e afetivos do ato de comer;
d) Elaborar um produto técnico como proposta de intervenção na realidade,
com características de inovação social na área de educação nutricional.
Para se alcançar os objetivos propostos, o presente trabalho foi dividido da
seguinte forma: introdução, em que se faz a apresentação do tema; o primeiro
capítulo discorre sobre o referencial teórico, com base em pesquisas de artigos
científicos na plataforma da Biblioteca Virtual da Saúde (BVS), na base de dados
da “Scientific Electronic Library Online” (SciELO), com os descritores “educação
alimentar e nutricional”, “motivação” e “comportamento alimentar”, com enfoque
nas estratégias de enfrentamento das dificuldades para mudar hábito e aspectos
subjetivos envolvidos no ato de se alimentar. Outras pesquisas foram realizadas
em livros, leis e programas do Ministério da Saúde que abordassem o tema. O
segundo capítulo descreve a metodologia e a análise dos dados coletados na
pesquisa de campo, realizada por meio de entrevista semiestruturada e
investigada segundo a análise de conteúdo de Bardin (2010).
E, por se tratar de um programa de mestrado profissional, fez-se a
construção de um produto técnico como uma proposta para intervenção na
realidade estudada, derivado da revisão teórica e dos resultados da pesquisa
realizada. O terceiro capítulo, portanto, apresenta uma cartilha de orientação
nutricional e um vídeo educativo, com informações básicas sobre alimentação
saudável, que foram construídos para contribuir como ferramentas de apoio em
intervenções nutricionais individuais e coletivas que visam à mudança de hábito
alimentar, a promoção da saúde e educação nutricional.
E, finalmente, a última parte do trabalho, em que se tecem as
considerações finais.
15
2 ASPECTOS RELACIONADOS À MUDANÇA DE HÁBITO
ALIMENTAR: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Iara Lamas12
Matilde Meire Miranda Cadete23
RESUMO A nutrição humana sofreu profundas modificações nas últimas décadas, levando à transição alimentar caracterizada pela diminuição do consumo de alimentos naturais e aumento de alimentos industrializados e com alto valor energético. Há forte evidência na relação entre alimentação inadequada e doenças crônicas não transmissíveis, que têm a obesidade como fator de risco. Assim, realizou-se revisão bibliográfica narrativa sobre a produção científica publicada acerca da motivação e do processo de abordagem nutricional para se alcançar resultados efetivos à mudança de hábitos alimentares saudáveis. Para tal, buscaram-se publicações na Biblioteca Virtual em Saúde, na base de dados SciELO, com os descritores: “educação alimentar e nutricional”, “motivação” e “comportamento alimentar”. Também foram pesquisados livros e programas do Ministério da Saúde. A leitura do material identificado revelou que os aspectos subjetivos e o meio social influenciam o comportamento alimentar do sujeito e o pressionam a responder aos estímulos externos; a rede de apoio familiar ajuda na sustentação do desejo de mudança; a informação é elemento fundamental para o desenvolvimento da consciência crítica; a autonomia na condução das práticas alimentares significa motivação para mudar; e a administração do tempo e do dinheiro é fator dificultador para manutenção da alimentação saudável. A adequação aos padrões estéticos é um dos eixos motivadores para a mudança de estilo de vida. E ações humanizadoras no trabalho fortalecem as relações e proporcionam um ambiente favorável para implementação de novas rotinas. Concluiu-se que a intervenção nutricional deve considerar não só a adequação das necessidades orgânicas individuais, mas as expectativas do sujeito e os aspectos subjetivos e simbólicos que os alimentos representam. Palavras-chave: Educação alimentar e nutricional. Motivação. Comportamento alimentar.
1
Mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, Belo Horizonte, MG. Nutricionista da Maternidade Odete Valadares (FHEMIG), Belo Horizonte, MG. 2 Orientadora e Professora Doutora do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social,
Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, Belo Horizonte, MG
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ABSTRACT Human nutrition went through deep changes during the last decades taking it to food transition characterized by lowering the consumption of natural foods and the increase in consumption of industrialized food that contains high energetic value. There is strong evidence of relation between inadequate feeding and the non-transmittable chronic diseases, which presents obesity as a risk factor. Therefore, a narrative bibliographic review about the published scientific production concerning the motivation and the process of nutritional approach to achieve effective results regarding healthy eating habits change was carried out. For that purpose, publications on the Virtual Library were searched, along with the data base of SciELO with descriptions such as: “eating education”, “motivation” and “habits change”. Books and Ministry of Health Programs were also searched. The reading of the identified material revealed that the subjective aspects and the social environment influences the personal eating behavior and presses them to answer to external stimulus. The family network support helps on the change desire sustention. Information is the main element for critical conscience development. The autonomy guidance for eating practices means motivation to change and time and money administration are complication factors for the maintenance of healthy eating. Adequacy to esthetic standards is one of the motivational pivots for life style changes. Humanizing actions at work also strengthens relations and provide a favorable environment for new routines implementations. It concludes that nutritional intervention should consider not only adequacy of personal organic necessities, but also personal expectations and subjective and symbolic aspects that food represents. Key words: Food and nutrition education. Motivation. Food behavior.
2.1 INTRODUÇÃO
O progresso tecnológico e as melhorias das condições de vida observados
no mundo contemporâneo deveriam resultar em benefício para a qualidade de
vida e, consequentemente, para as práticas alimentares. Apesar de essa
evolução ter contribuído para reduzir, significativamente, as taxas de desnutrição
nas últimas décadas, a nutrição humana foi direta e profundamente afetada.
Observou-se, a partir daí, um fenômeno denominado transição nutricional, que é
caracterizado pela diminuição do consumo de alimentos naturais e aumento da
ingestão de alimentos industrializados e com alto valor energético. Essa transição
alimentar teve impacto negativo na saúde do homem e no cenário de morbidade e
mortalidade da população (BRASIL, 2011b; BRASIL, 2012; BRASIL, 2010b; KAC;
SICHIERI; GIGANTE, 2007; MEDRONHO et al., 2005).
17
Um desses impactos negativos é a obesidade, considerada uma doença
crônica. O aumento da sua incidência, em decorrência da mudança de hábito
alimentar, é fator de risco para doenças graves, principalmente diabetes, doenças
cardiovasculares e hipertensão. A obesidade pode também ser causa de
sofrimento e de comportamentos de esquiva social, que prejudicam a qualidade
de vida do indivíduo. Os padrões de consumo alimentar no Brasil sofreram
modificações radicais nessas últimas décadas, agravando o cenário
epidemiológico dessas doenças. Os fatores ambientais são reconhecidos como
um dos mais influentes, tanto na gênese como na prevenção do ganho excessivo
de peso e obesidade (BRASIL, 2011b; BRASIL, 2012; BRASIL, 2010b; KAC;
SICHIERI; GIGANTE, 2007; MEDRONHO et al., 2005).
São várias as características do mundo globalizado consideradas
responsáveis pela grande transformação dos hábitos alimentares e do
comportamento social dos brasileiros. A melhoria relativa das condições de vida e
a disponibilidade de alimentos contribuíram para a modificação do comportamento
alimentar, tanto em quantidade como em qualidade. Também contribuíram a
facilidade de acesso às informações e às grandes redes de supermercados e,
sobretudo, a alimentação fora de casa, que deslocou a refeição do eixo central
das relações parentais, resultado da mudança na estrutura familiar e da presença
da mulher no mercado de trabalho (HAWKERS, 2007).
Ao mesmo tempo, as pessoas diminuíram o gasto energético, em função
da redução da atividade física. Aspectos decorrentes dessas mudanças levaram
as pessoas a assumirem vida mais sedentária, com excesso de carga horária de
trabalho, falta de tempo para o lazer, estresse, pressão e competitividade nas
relações profissionais e interpessoais. A incidência de sobrepeso e obesidade
aumentou de maneira geral na população brasileira, atingindo crianças,
adolescentes e adultos de diferentes situações socioeconômicas e culturais. Esse
fato justifica a necessidade de intervenções com foco na diminuição de agravos e
promoção da saúde (BRASIL, 2011b; BRASIL, 2012; BRASIL, 2010b; PIMENTA,
2011).
Paralelamente a esse contexto, o Ministério da Saúde lançou, em 2003, a
Política Nacional de Humanização (PNH), com o objetivo de produzir mudanças
nos modos de gestão e cuidado na assistência em saúde e a Política Nacional de
Promoção da Saúde do Trabalhador do SUS (PNPST – SUS). Entre as diretrizes
18
da PNH, é relevante destacar o acolhimento e a valorização do trabalhador, que
visam a promover o reconhecimento dos sujeitos implicados na produção da
saúde. Importante aspecto nesse processo é o incentivo à saúde do trabalhador.
Portanto, oferecer suporte aos profissionais para que eles possam lidar com as
próprias dificuldades no local de trabalho torna-se uma estratégia positiva para o
fortalecimento das relações profissionais. Espera-se que essa atenção possibilite
aos profissionais assumirem nova postura no cuidado de si e do outro. O
acolhimento, por sua vez, preconiza a importância da escuta no atendimento ao
indivíduo, ou seja, a necessidade de levar em consideração a influência de
aspectos subjetivos relacionados ao processo saúde-doença de cada sujeito
(BRASIL, 2011a; BRASIL 2011b; BRASIL, 2010a; BRASIL, 2008; BRASIL, 2003).
Uma intervenção multidisciplinar mais humanizada, voltada para a
realidade em que o indivíduo está inserido e o conhecimento dos fatores que
interferem no comportamento alimentar podem melhorar a efetividade da
abordagem nutricional. Também podem auxiliar o indivíduo a estabelecer um
sentido entre as práticas necessárias para adequar as suas necessidades
orgânicas e seus recursos emocionais e subjetivos que irão subsidiar e sustentar
as mudanças de hábitos (MARQUES; GUTIERREZ, 2009).
Torna-se desafio para o profissional de saúde adotar uma postura
humanizadora no atendimento ao paciente, em um contexto em que a assistência
à saúde também se tornou um serviço pautado na lógica da produtividade, de
ações intervencionistas, condutas restritivas e com excesso de prescrições.
Atualmente, agrega-se valor capital ao tempo disponibilizado nas intervenções, o
que, consequentemente, limita a investigação dos aspectos subjetivos e
individuais relacionados ao ato de comer. Questiona-se, portanto, neste estudo:
“qual é o conhecimento científico produzido em relação aos fatores fundamentais
a serem considerados em uma abordagem nutricional visando à mudança de
hábitos alimentares? Ou seja, o que foi estudado e divulgado em periódicos
científicos, livros, dissertações e documentos do Ministério da Saúde a esse
respeito?”
Assim, este estudo objetivou realizar uma revisão teórica sobre a produção
científica publicada acerca do processo de abordagem nutricional para se
alcançar resultados efetivos à mudança de hábitos alimentares saudáveis.
19
Procura-se, dessa forma, contribuir com a formulação de estratégias de
enfrentamento desse problema, além de subsidiar informações necessárias para
novas pesquisas e proposições que possibilitem a divulgação do conhecimento
produzido e o bem-estar do indivíduo.
2.2 METODOLOGIA
Para se investigar os recursos utilizados como estratégias para a
construção de um processo de mudança de hábito alimentar, foi realizada revisão
bibliográfica narrativa em 14 artigos científicos em português, publicados a partir
de 2010, na plataforma da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e na base de dados
do Scientific Electronic Library Online (SciELO). Os descritores foram “educação
alimentar e nutricional”, “motivação” e “comportamento alimentar”, com enfoque
nas estratégias de enfrentamento das dificuldades para mudar hábito e aspectos
subjetivos envolvidos no ato de se alimentar. Prosseguiu-se, também, com
pesquisas em 15 livros e quatro programas do Ministério da Saúde que
abordassem o assunto, sendo excluídos os artigos que não tinham relação com a
questão de pesquisa e fora do contexto da alimentação e mudança de hábito
alimentar.
A partir de leituras e releituras do material identificado foi possível
categorizar os estudos para melhor análise e compreensão do objetivo proposto,
dividindo-os em subtemas denominados: “Aspectos socioeconômicos que
influenciaram a transição nutricional e o aumento da incidência de doenças
crônicas não transmissíveis (DCNT)”; “O alimento como elemento social e
cultural”; “Motivação e mudança de hábito”; “Educação nutricional”; e
“Humanização e saúde do trabalhador”.
2.3 REVISÃO TEÓRICA
2.3.1 Aspectos socioeconômicos, transição nutricional e o aumento da
incidência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT)
Existe consenso em afirmar a importância da alimentação para a saúde
humana. Vários estudos demonstram a relação entre o aparecimento de doenças
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chamadas crônicas não transmissíveis, como diabetes, hipertensão, obesidade e
câncer, e hábitos alimentares não saudáveis. Esse fenômeno, denominado de
transição alimentar, ocorreu devido à modificação dos hábitos alimentares em
função das mudanças do panorama econômico do país e que se caracteriza pelo
aumento do consumo de alimentos industrializados, ricos em calorias, açúcar,
gordura e sal e baixo consumo de frutas, legumes e verduras (BRASIL, 2010b;
BRASIL, 2010c; BRASIL, 2011b; BRASIL, 2012; DUNCAN; SCHMIDT, 2011;
HAWKERS, 2007; KAC; SICHIERI; GIGANTE, 2007; MEDRONHO et al., 2005).
No que se refere à produção, comercialização e aproveitamento dos
alimentos, as bases da economia mundial e a imensa desigualdade na
distribuição das riquezas criaram um cenário preocupante e difícil de recuperar o
equilíbrio e a diminuição dos agravos à saúde. Apesar dos avanços tecnológicos
gerados pelo modelo de crescimento econômico capitalista, que parecem
sustentar todo o processo da cadeia de produção de alimentos, parte da
população ainda encontra dificuldades para ter acesso a esses produtos. Esse
panorama caracteriza-se por duas situações extremas: de um lado, a escassez de
alimentos; e de outro, a facilidade de acesso a grandes quantidades e variedades,
produtos industrializados, muitas vezes importados, de custos mais elevados, que
foram sendo incorporados na rotina alimentar da população, com valor agregado
que traduz significado de bem-estar e poder (CARRASCO i PONS, 2005).
Segundo Marques e Gutierrez (2009), uma alimentação saudável pode se
tornar um referencial simbólico importante na sociedade capitalista, a partir do
momento em que esse comportamento represente ascensão social, abrangendo,
também, aspectos culturais, financeiros e até políticos.
Também é consenso para Canesqui e Garcia (2005, p. 119) que, “em uma
sociedade homogênea culturalmente, o comportamento orçamentário levará à
adaptação do modelo alimentar dominante”.
Santos (2003, p. 35) proclama como a emergência da dupla tirania, a do
dinheiro e a da informação, forma a base do capitalismo globalizado. E alerta para
o fato de que “[...] sem o controle dos espíritos seria impossível a regulação pelas
finanças”. Entende-se como controle dos espíritos o controle praticado pelos
processos hegemônicos aceitos e legitimados pelo “pensamento único”. Santos
(2003, p. 37) acrescenta que “a dupla tirania [...], juntas, fornecem as bases do
sistema ideológico que legitima as ações mais características da época e, ao
21
mesmo tempo, buscam conformar segundo um novo ethos as relações sociais e
interpessoais, influenciando o caráter das pessoas”. Entende-se ethos como a
característica comum a um grupo de indivíduos pertencentes a uma mesma
sociedade.
A mídia exerce uma força muito grande sobre o indivíduo, influenciando-o a
seguir regras de comportamento social ditadas pelos interesses do modelo de
consumo dominante. Essa força é sutilmente expressa em forma de valores e
crenças que vão sendo construídas ao longo do tempo de forma que o indivíduo,
realmente, acredita que é necessário manter o modelo padrão de comportamento
estabelecido (GOMES; CASTRO; MONTEIRO, 2010; SANTOS, 2003).
Os padrões de beleza estabelecidos socialmente valorizam, acima de tudo,
o corpo magro e desconsideram as inúmeras desigualdades e diversidades
existentes, sobretudo os aspectos relacionados à saúde. A demanda estética
contradiz a demanda de consumo de alimentos, uma vez que a adoção de hábitos
alimentares inadequados caminha na contramão da conquista de um corpo
saudável e magro. Essa contradição provoca uma esquizofrenia social (PADUA,
2007), pois, ao mesmo tempo em que o indivíduo é estimulado a consumir cada
vez mais alimentos calóricos que, inevitavelmente, vão causar o aumento do
peso, lhe é imposto um padrão de beleza magro.
Witt e Schneider (2011, p. 3910) afirmam que “o padrão de beleza do corpo
magro é veiculado a mensagens de sucesso, controle, aceitação e felicidade.
Assim, mulheres acreditam que, sendo magras, poderão alcançar todos os seus
objetivos, sendo a perda de peso a solução para todos os seus problemas”. As
pessoas passam a buscar freneticamente alternativas para compensar as
consequências do ganho de peso e consomem mais produtos e serviços que
prometem ajudar na conquista de um corpo perfeito.
O estilo de vida contemporâneo impõe às pessoas uma rotina em que se
considera normal comer qualquer coisa, o que tiver disponível no momento, um
improviso, algo prático, rápido e fácil de fazer. Planejar a refeição passa a ser um
sacrifício, uma função desvalorizada e delegada a segundo plano, um peso para
quem é responsável por ela. Há necessidade de se manter produtivo e ativo a
maior parte do dia e isso se torna incompatível com o tempo necessário para o
preparo do alimento. Dessa forma, perde-se o contato com as texturas, aromas e
com a tênue linha que nos liga à consciência da nossa condição humana. Perde-
22
se também a oportunidade de trocas afetivas e tão simbólicas que caracterizam
esses momentos.
Atualmente, terceiriza-se a produção de alimentos, paga-se pelo serviço e
comodidade. O que tem valor é o status de ter acesso ao alimento e quanto mais
sofisticado o serviço, melhor. A relação com o ato de comer tornou-se tão
impessoal que não se toca mais nos alimentos. Basta um toque na tecla do
telefone para chamar o “delivery” e um toque na tela do micro-ondas para aquecer
a preparação, e sua refeição está pronta! Essa despersonalização não deixa de
ser uma expressão da cultura consumista da atualidade e de como as relações,
em todas as esferas, estão sendo construídas baseadas em valores de interesse
do mercado.
As indústrias de alimentos, os serviços de alimentação e a mídia,
procurando atender às características do mercado atual e à cultura do consumo,
tentam igualar ou padronizar os comportamentos humanos e os hábitos,
desconsiderando, muitas vezes, a real necessidade dos indivíduos e a
diversidade. Toda essa complexa rede de símbolos que representa as relações
humanas contribui para as escolhas alimentares que são tão diversas e ao
mesmo tempo tão singulares de acordo com o espaço e o tempo de cada um.
Kac, Sichieri e Gigante (2007, p. 354) afirmam que “um padrão dietético
inadequado não é privilégio de pessoas com sobrepeso”; portanto,
independentemente do estado nutricional da população, é necessário
implementar hábitos alimentares mais saudáveis. A prevenção primária da
obesidade contribui também para diminuir os impactos e os custos em saúde
pública, associados às doenças crônicas decorrentes da transição nutricional.
2.3.2 O alimento: elemento social e cultural
O alimento, como elemento social e cultural, está sempre presente no
cotidiano de todos nós e se associa à ideia de reunião, nas diversas relações e
classes sociais. Seu caráter simbólico não se limita às ocasiões festivas, ele
atravessa as relações de negócios e política e perpassa também a amizade e
rituais religiosos de nossa sociedade (DANIEL; CRAVO, 2005).
Carvalho et al. (2011), em seu estudo sobre interpretação e conceituação
dos termos comer, alimentar e nutrir, asseveram que o alimento tem a função
23
biológica de nutrir o homem, promovendo saúde e evitando doenças. Já a comida
incorpora sentidos e significados culturais simbólicos. A alimentação do homem,
em determinado tempo e espaço, é resultado da criação histórico-cultural das
sociedades, assume sentidos e significados, é expressa em ritos e símbolos e é
preservada pela transmissão de saberes e práticas.
A alimentação se expressa como características significativas da cultura e
pode ser interpretada por meio de símbolos que o indivíduo utiliza para se
reconhecer como sujeito na construção de sua própria realidade. Nesse sentido,
cabe trazer à tona os dizeres de Freitas, Minayo e Fontes (2011, p. 34) a respeito
de habitus alimentar:
[...] adoção de um tipo de prática que tem a ver com costumes estabelecidos tradicionalmente e que atravessam gerações, com as possibilidades reais de aquisição dos alimentos e com uma sociabilidade construída tanto no âmbito familiar e comunitário como compartilhada e atualizada pelas outras dimensões da vida social. A partir do exemplo citado, pode-se concluir que o habitus alimentar pode ser compreendido através da linguagem, das atitudes e práticas e se traduz em ritos, valores, mitos, crenças e tabus.
O ato de se alimentar, por conseguinte, não supre apenas uma
necessidade orgânica e calórica para a sobrevivência, ele representa um
elemento social e cultural que está presente nas relações humanas, nas
diferentes classes, nos ritos de passagem com expressão de crenças e valores e
sempre se associando à ideia de reunião. O comportamento alimentar está
relacionado a fatores emocionais e socioculturais. A identidade construída a partir
das experiências vividas acompanha o sujeito ao longo da sua vida e determina a
relação do indivíduo com a comida, estruturando as suas práticas alimentares
(MACIEL, 2005).
Marques e Gutierrez (2009, p. 104) contribuem com a seguinte reflexão:
A tentativa de ensinar pessoas a melhorar seus hábitos alimentares só vai atingir seu objetivo se fizer sentido para os agentes, em seu espaço social. Ou seja, não basta dizer ao sujeito que ele deve se alimentar de maneira correta se isto demandar a adoção de hábitos alimentares pouco valorizados em seu meio, ou que não sejam de fácil acesso. Transformar o hábito alimentar dos sujeitos e, mais do que isso, fazer com que outras formas de alimento sejam valorizadas e aceitas como capital simbólico é com certeza um caminho difícil.
24
O homem é resultado de uma construção social e os elementos culturais
de cada sociedade são responsáveis pela caracterização de suas ações. E é esse
processo que vai determinar suas escolhas alimentares. Os processos sociais e
culturais são mais complexos do que a simples satisfação de uma necessidade
fisiológica. Portanto, em uma intervenção nutricional é importante considerar as
expectativas dos sujeitos, os aspectos subjetivos relacionados ao ato de se
alimentar, o seu momento histórico e o meio em que ele está inserido.
2.3.3 Mudança de hábito e motivação
Considerando as questões subjetivas que estão relacionadas ao
comportamento alimentar, a escolha de uma linguagem adequada na abordagem
ao paciente em uma intervenção nutricional é fator imprescindível para a
efetividade da adesão às mudanças propostas.
Observa-se, em muitos casos, que os indivíduos apresentam grande
dificuldade em mudar hábitos alimentares para aderir a uma dieta saudável.
Acredita-se que essa dificuldade não aconteça pela falta de conhecimento ou
orientação, pois, atualmente, a facilidade de acesso à informação e o volume de
orientações sobre o assunto são muito grandes. As pessoas normalmente alegam
saber o que é preciso fazer para ter uma boa alimentação, mas não conseguem
sustentar a mudança e voltam para o velho padrão alimentar.
Busnello et al. (2011 p. 220), em estudo sobre o impacto da intervenção
nutricional na adesão ao tratamento em pacientes com síndrome metabólica,
apuraram que pacientes submetidos a intervenções nutricionais, tanto a curto
como a longo prazos, frequentemente têm baixa adesão ao tratamento nutricional.
As causas para a desistência do acompanhamento são diversas. Os autores
associaram também melhora significativa de parâmetros clínicos ao que eles
denominaram motivação prévia. Nesses casos, os indivíduos já chegaram
motivados à primeira consulta. Eles concluem, portanto, que “a motivação prévia
e a prática de um estilo de vida favorável às mudanças é fator independente para
adesão ao tratamento e alcance das metas estipuladas”.
Ao discutir a adesão e a motivação de indivíduos portadores de doença
crônica participantes de programas de saúde, Costa (2011) verificou a
importância da rede de apoio (família e amigos) para aumentar a conscientização
25
da necessidade de mudança de estilo de vida e adesão ao tratamento. Destaca,
também, a importância da atuação de uma equipe multidisciplinar no cuidado à
saúde dos pacientes e orientação aos familiares, sobretudo quanto à
possibilidade de o paciente, portador de doença crônica, poder levar vida normal
e de boa qualidade.
Costa (2011, p. 2007) também alerta a equipe a estar atenta às
características do paciente antes de iniciar o aconselhamento específico, que
podem ser:
[...] padrões individuais de resposta do paciente em relação aos seus sentimentos, angústias, ansiedades, conflitos e necessidades, estabelecendo um vínculo afetivo para, posteriormente, em conjunto, traçar estratégias, a serem alcançadas a curto, médio e longo prazo, que visem ao controle metabólico do paciente.
A reeducação alimentar por meio da motivação e o estímulo parece
substituir a forma de “controle-repressão” que marca as dietas tradicionais, sendo
a sua base a valorização da autonomia do sujeito e a responsabilização dos
indivíduos no cuidado de si.
A mudança de hábitos alimentares é mais efetiva quando o indivíduo
consegue estabelecer um sentido entre as ações necessárias para obtenção de
alimentação saudável, o seu referencial simbólico e o valor afetivo incorporado
aos alimentos e ao ato de comer. Esses são fatores determinantes das suas
práticas alimentares. A mudança pode ser estimulada ou não, se o indivíduo
consegue estabelecer redes ou encontrar apoio do meio em que está inserido,
seja no ambiente familiar ou no trabalho, colaborando, dessa forma, para superar
as dificuldades em mudar hábitos. A abordagem nutricional adequada torna-se,
portanto, um aspecto importante nas proposições de mudanças nos hábitos
alimentares.
2.3.4 Educação nutricional
Santos (2013) refere que a educação nutricional e alimentar precisa
associar o conhecimento a um processo de conscientização do indivíduo,
ampliando a sua visão de maneira que o auxilie a tomar novas decisões e o torne
mais seguro nas suas escolhas. Entretanto, deve-se respeitar a autonomia do
26
sujeito, ressaltar a importância da sua responsabilização com o cuidado de si e
levar em conta os aspectos sociais que caracterizam o seu estilo de vida.
O psicólogo soviético Vygotsky [1896-1934†] contribuiu para a
compreensão do comportamento humano como fenômeno histórico e social. Um
dos pontos centrais da sua teoria é que “a complexidade da estrutura humana
deriva do processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas relações
entre história individual e social” (REGO, 2012, p. 26), sendo o pensamento
culturalmente mediado pela linguagem.
De acordo com Vygotsky (2007), o pensamento humano e a linguagem são
entrelaçados, uma vez que os significados das palavras, que são construídos
socialmente, cumprem tanto a ação de representação quanto a de generalização,
o que permite a reconstrução do real no nível do simbólico. Essa reconstrução
representa a condição de criação de um universo cultural e a construção de
sistemas lógicos de pensamento, que possibilitam a elaboração de sistemas
explicativos da realidade. Do mesmo modo, essa dupla função permite a
comunicação da experiência individual e coletiva.
Vygotsky (2007) discorre sobre o que ele chamou de sistema de signos,
formados pela linguagem, a escrita e os números. Ele considera que a
internalização desses sistemas simbólicos, produzidos culturalmente, constitui-se
em elementos estruturantes do desenvolvimento individual. Uma das teses de
Vygotsky refere-se à relação indivíduo-sociedade, conforme explicita Rego (2012,
p. 41):
As características tipicamente humanas não estão presentes desde o nascimento do indivíduo, nem são mero resultado das pressões do meio externo. Elas resultam da interação dialética do homem e seu meio sociocultural. Ao mesmo tempo em que o ser humano transforma o seu meio para atender às suas necessidades básicas, transforma-se a si mesmo.
A abordagem psicológica histórico-cultural de Vygotsky entende o sujeito
inserido socialmente em um meio historicamente construído. Dessa forma, a
educação, a partir dessa perspectiva, deve considerar toda a experiência de vida
do indivíduo. Os autores afirmam, ainda, que “a interação social é condição
indispensável para a aprendizagem, pois é constituída a partir de uma ação
27
partilhada, que implica um processo de mediação entre sujeitos” (MARQUES;
OLIVEIRA, 2005, p. 4).
A dialética marxista ajuda a compreender o complexo sistema que constitui
as relações externas ao sujeito, mas também as representações sociais que
expressam objetivamente as experiências vividas por ele e os significados que lhe
são atribuídos (DESLANDES; GOMES; MINAYO, 2011).
Minayo et al. (2004, p. 225) reconhecem que “numa sociedade marcada
por relações sociais de produção profundamente desiguais, a comunicação está
sistematicamente perturbada. A linguagem é um índice de alienação que
expressa a dominação dos homens sobre seus semelhantes”.
Dialogando com Paulo Freire, Marques e Oliveira (2005, p. 2), lembram
que:
[...] é preciso perceber as particularidades na totalidade, porque nenhum fato ou fenômeno se justifica por si mesmo, isolado do contexto social onde é gerado e se desenvolve. O homem e a mulher como seres sociais são capazes de agir, de representar sua ação e expressá-la de modo objetivado. No momento de criar e recriar a realidade procuram representá-la. No entanto, o discurso que os homens e as mulheres fazem da sua situação concreta é conflituoso, visto que o lugar que ocupam na sociedade também o é. Seus discursos são submetidos a pressões particulares de interesses de classes sociais. Dessa forma, as representações ideológicas são determinadas pelas estruturas das relações sociais. É a unidade dialética que gera um atuar e um pensar crítico sobre a realidade para transformá-la.
Baseado na perspectiva mencionada anteriormente, em outro campo
científico de observação, o economista Dawbor (2007, p. 77), em seu texto sobre
educação e apropriação da realidade local, fez importante associação sobre a
forma de difusão do conhecimento e o desenvolvimento local. O autor acredita
que, “ao estudarem de forma científica e organizada a realidade que conhecem
por vivência [...], as crianças tendem a assimilar melhor os próprios conceitos
científicos, pois é a realidade delas que passa a adquirir sentido”. E é esse
sentido, esse reconhecimento e apropriação do conhecimento que possibilitam a
transformação da realidade.
A partir dessa discussão acredita-se que o conhecimento é um produto
cultural. As formas verbais de comunicação produzidas consolidam a experiência
histórica do homem, uma vez que, por meio da linguagem, internalizam-se os
conteúdos (MARQUES; OLIVEIRA, 2005).
28
Diante do desafio de propor alterações na mudança de hábitos, é
fundamental que se leve em conta a integralidade do indivíduo, a realidade e o
contexto em que vive, considerando também, como afirma Carrasco i Pons (2005,
p. 116), que “em determinadas circunstâncias históricas os pressupostos teóricos
de uma disciplina podem apontar para uma mudança progressiva de problemática
que repercute nas disciplinas relacionadas com o mesmo grupo de fenômenos”.
Cezaretto (2010) e Santos (2010) demonstraram que as intervenções em
grupo interdisciplinar são propostas eficazes para mudança de hábitos e
construção de competências relacionadas à saúde e qualidade de vida na
população. Além de serem iniciativas de baixo custo, beneficiam elevado número
de pessoas e estimulam a motivação e fortalecimentos das relações intergrupais.
França et al. (2012, p. 338) ressaltam que “a prevenção e o tratamento de
enfermidades crônicas não transmissíveis por meio de mudança no estilo de vida
apresentam adesão de apenas 25%”. Acreditam, ainda, que a baixa adesão pode
estar relacionada à inadequação das estratégias e intervenções utilizadas, pois “o
conhecimento só serve de instrumento de mudança se existir no indivíduo o
desejo de mudar”.
O processo de reeducação alimentar e construção de novos hábitos
alimentares deve pautar-se, sobretudo, no diálogo e na autonomia do sujeito,
ressaltando o valor da sua responsabilização com o cuidado de si, além de levar
em conta os aspectos sociais, culturais e econômicos que fazem parte da sua
realidade. A partir dessa perspectiva, é possível propor uma estratégia de
intervenção em que seja respeitado o tempo de cada pessoa nesse processo, que
é único e singular.
2.3.5 Humanização e promoção da saúde do trabalhador como base da
proposta de intervenção
O ambiente profissional representa, atualmente, o local onde as pessoas
passam a maior parte do seu dia. Esse pode ser um fator facilitador ou dificultador
para a mudança ou adesão a uma alimentação saudável. O acesso à alimentação
no trabalho pode ser considerado um dos fatores determinantes para a qualidade
do padrão alimentar, tendo em vista que a alimentação no trabalho pode
29
representar a única refeição saudável realizada no dia ou, dependendo da
atividade realizada, o trabalho pode até inviabilizar a realização das refeições.
Ademais, as formas de atividade laboral influenciam no desgaste da saúde
e no adoecimento profissional. A saúde do trabalhador, como um bem que tem
custo crescente, constitui uma preocupação dos indivíduos, da sociedade e da
saúde pública. A hegemonia do sistema capitalista levou à exploração do
trabalhador em virtude das estratégias de competitividade e individualismo. A
ênfase na exclusão dos diferentes e indução à massificação dos modos de
atuação violou a qualidade de vida do trabalhador tanto em termos materiais
como subjetivos (D’ALENCAR, 2010).
As relações estabelecidas no ambiente de trabalho refletem-se na vida
cotidiana dos sujeitos e a implantação de ações humanizadoras se torna um
grande desafio a ser alcançado. A prática humanizadora no trabalho é possível
quando os sujeitos se encontram a partir da compreensão e abertura para o outro,
aceitando suas características, diferenças, saberes, desejos e necessidades
(BRASIL, 2010a; BRASIL, 2003).
Vale a pena destacar que o Ministério da Saúde aprovou, em 2003, a
Política Nacional de Humanização (PNH), com o objetivo de produzir mudanças
nos modos de gestão e cuidado na assistência em saúde. E avançou mais em
2011, quando publicou a Política Nacional de Promoção da Saúde do Trabalhador
do SUS. Essa Política visa à promoção da melhoria das condições de saúde do
trabalhador do SUS, por meio do enfrentamento dos aspectos gerais e
específicos dos ambientes e organização do trabalho que possam propiciar a
ocorrência de agravos à saúde, do empoderamento dos trabalhadores - atores
sociais dessas transformações - e mediante a garantia ao acesso, às ações e aos
serviços de atenção integral à saúde (BRASIL, 2003; BRASIL, 2011a). Acredita-
se que oferecer suporte aos profissionais de saúde para que eles possam lidar
com as próprias dificuldades parece ser uma estratégia positiva para o
fortalecimento das relações no trabalho. As dificuldades tendem a ser superadas
na medida em que o trabalhador se sente parte integrante do processo de
promoção da saúde, assumindo nova postura no cuidado de si e do outro
(BRASIL, 2003).
As pessoas não se limitam a ser as expressões das doenças de que são
portadoras. Alguns problemas, como a baixa adesão a tratamentos, resistência,
30
negação da doença, entre outros, evidenciam a complexidade dos sujeitos e os
limites da prática clínica centrada na doença. E esses aspectos são
características do ser humano, que se manifestam tanto no usuário como no
trabalhador da saúde, que se torna paciente quando se trata do cuidar de si
(BRASIL, 2003; FRANÇA et al., 2012).
Quando o indivíduo recebe apoio do meio em que se encontra, seja no
ambiente familiar ou no trabalho, sente-se mais estimulado a superar as
dificuldades em mudar hábitos. As ações humanizadoras no ambiente do trabalho
fortalecem as relações interpessoais e proporcionam um ambiente favorável para
adequação de novas rotinas e hábitos. E as ações de promoção da saúde
também trazem benefícios para os serviços de saúde pública, devido ao caráter
preventivo da intervenção, que tem como objetivo diminuir o impacto no
atendimento da atenção primária e secundária.
Portanto, a ampliação do conhecimento sobre os determinantes do
comportamento alimentar é fundamental para se propor estratégias de
enfrentamento das dificuldades de mudança de hábito. Essa medida aumenta a
efetividade das intervenções nutricionais, leva a informação adequada ao
indivíduo no próprio ambiente de trabalho, ajuda-o a mudar sua postura no
cuidado de si e do outro e torna-o, assim, multiplicador de práticas alimentares
saudáveis.
2.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com os autores pesquisados, há consenso em afirmar que são
várias as características do mundo globalizado consideradas responsáveis pela
grande transformação dos hábitos alimentares. Esses fatores contribuíram para a
modificação do padrão alimentar e essas práticas favorecem, efetivamente, a
ocorrência de desequilíbrios nutricionais e o aumento da incidência de doenças
crônicas não transmissíveis, que têm a obesidade como importante fator de risco.
E os aspectos ambientais são reconhecidos como um dos mais influentes, tanto
na gênese como na prevenção do ganho excessivo de peso e obesidade.
O homem constrói a sua identidade social sob forte influência do meio
externo e dos elementos culturais da realidade em que está inserido. Essa
identidade social é responsável pela caracterização das ações do sujeito e de
31
suas escolhas alimentares. Entende-se que esses processos sociais e culturais e
o ato de se alimentar são mais complexos do que a simples satisfação de uma
necessidade fisiológica. O indivíduo, quando se percebe pertencente a
determinado grupo e reconhece as práticas alimentares como regras sociais
legítimas e que devem ser seguidas, é levado a se adequar ao ambiente,
repetindo os modelos de comportamentos coletivos.
Aliado à economia capitalista que valoriza, indiscriminadamente, o
consumo, os padrões de beleza prezam, acima de tudo, o corpo magro e não
consideram as desigualdades e diversidade existentes e, sobretudo, os aspectos
relacionados à saúde. A demanda estética contradiz a demanda de consumo de
alimentos, uma vez que hábitos alimentares inadequados caminham na
contramão da conquista do corpo saudável e magro. Esse contrassenso,
sutilmente, induz o indivíduo a consumir mais, o que levará, inevitavelmente, ao
sobrepeso. Esse comportamento o faz sofrer por não se adequar aos padrões
estéticos sociais. Cabe ao profissional da saúde despertar o espírito crítico do
indivíduo nesse sentido, no intuito de auxiliá-lo na adoção de escolhas mais
assertivas e benéficas à sua saúde.
Os estímulos e a motivação que impulsionam a mudança contínua de
hábitos são identificados pelo valor do apoio familiar e do trabalho interdisciplinar
durante o processo de transição das práticas alimentares; pelo significado da
autonomia ao conduzir as mudanças na sua alimentação; e pela compreensão da
necessidade de mudar e o reconhecimento da sua capacidade de vencer
obstáculos. A intervenção nutricional torna-se mais significativa quando pautada
em uma abordagem que leva em consideração não só a adequação das
necessidades orgânicas individuais, mas as expectativas do sujeito e os aspectos
subjetivos e simbólicos que os alimentos representam para cada indivíduo.
O conhecimento dos fatores que interferem no comportamento alimentar
auxilia na melhoria da efetividade das intervenções nutricionais. A reeducação
alimentar, por meio da motivação e o estímulo, parece substituir a forma de
“controle-repressão” que marca as dietas tradicionais, auxiliando na construção
de um sentido para as ações de mudança. E sua base torna-se a valorização da
autonomia do sujeito e a responsabilização dos indivíduos no cuidado de si.
Acredita-se que ações humanizadoras no ambiente do trabalho contribuam
para a promoção da saúde do trabalhador, a fim de que ele se torne multiplicador
32
de condutas alimentares saudáveis, refletindo esse comportamento no meio
familiar e nas relações profissionais.
Baseado nos argumentos discutidos anteriormente, acredita-se que a
promoção da saúde deve ser um conjunto de ações integradas e dialogadas entre
os diversos saberes, oposta à fragmentação do cuidado em disciplinas
específicas. E deve considerar, sobretudo, os aspectos subjetivos dos indivíduos,
inserindo-os no seu contexto sociocultural e apostando nos recursos individuais
para melhorar o autocuidado em saúde e para a transformação da sua realidade.
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36
3 DO DESEJO À AÇÃO: FATORES QUE INTERFEREM NA
ABORDAGEM NUTRICIONAL PARA MUDANÇA DE HÁBITO
ALIMENTAR
Iara Lamas14
Matilde Meire Miranda Cadete25
RESUMO Compreender os fatores que influenciam o comportamento alimentar é fundamental para aumentar a efetividade das intervenções nutricionais que visam à mudança de hábito alimentar. Este trabalho originou-se de questionamentos provenientes de atividades de reeducação alimentar realizadas em grupo com profissionais da saúde no próprio local de trabalho. Trata-se de um relato de pesquisa com abordagem qualitativa, realizada na Maternidade Odete Valadares, em Belo Horizonte, que teve como objetivo analisar as estratégias utilizadas pelos profissionais no enfrentamento das dificuldades em adotar hábitos alimentares mais saudáveis. A coleta de dados se deu por meio de entrevista semiestruturada, com 12 sujeitos selecionados aleatoriamente e fez-se a análise temática dos depoimentos a partir da análise de conteúdo de Bardin (2010). Desses depoimentos, produziram-se quatro categorias: relação do indivíduo com a comida; processo de reeducação alimentar; relação cultural e saúde e suas respectivas subcategorias. A análise dos resultados identificou que aspectos subjetivos influenciam o comportamento alimentar; a memória afetiva pode relacionar a comida como um escape prazeroso das pressões diárias; a ansiedade e a tristeza podem ser indutores de comer compulsivo e o apoio familiar auxilia na manutenção da mudança. Mostrou, ainda, ser a informação elemento fundamental para o desenvolvimento da consciência crítica. E a autonomia foi fator motivacional para a condução das mudanças nas práticas alimentares. A saúde é o grande eixo motivador para a mudança do padrão alimentar e a atividade física foi uma das estratégias mais utilizadas para a mudança do estilo de vida. Acredita-se que considerar os aspectos subjetivos do indivíduo em uma intervenção nutricional é importante para a efetividade da adesão às mudanças propostas. Palavras-chave: Educação alimentar e nutricional. Comportamento alimentar. Educação para saúde.
1
Mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, Belo Horizonte, MG. Nutricionista da Maternidade Odete Valadares (FHEMIG), Belo Horizonte, MG. 2
Orientadora e Professora Doutora do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, Belo Horizonte, MG.
37
ABSTRACT To understand the factors that can influence eating behavior is fundamental to increase nutritional interventions effectiveness that aim the change of eating habits. This paper originated from the questions that came up with eating reeducation activities performed in a health professional’s group at their own workplace. It is a research with a qualitative approach that took place at the Maternidade Odete Valadares, Belo Horizonte, which object of study was analyzing the strategies used by the professionals to face the obstacles of adopting healthier eating habits. The data collection was processed through semi-structured interviews, with 12 randomly selected individuals and a thematic analysis of the testimonials was done from a Bardin (2010) content analysis. From this testimonials four categories were produced: individual relation with food; eating reeducation process; cultural and health relation and it’s respective subcategories. The result analysis identified that subjective aspects influenced the eating behavior; the affective memory can relate food as a pleasant escape route for daily stress; the anxiety and sadness can be inductors of compulsive eating and familiar support helps during change maintenance. It has shown yet, that information is a fundamental element for critical conscience development, and autonomy was a motivation factor for eating habits change conduction. Health is the main motivational element for eating pattern change and physical activities was one of the most used strategies for life style changes. It is believed that considering the subjective aspects of the individual for an nutritional intervention is important for the effectiveness adhesion of the proposed changes. Key words: Food and nutrition education. Feeding behavior. Education for health.
3.1 INTRODUÇÃO
A abordagem nutricional adequada é fundamental para garantir efetividade
na mudança de hábitos alimentares. A necessidade de compreender melhor os
fatores que influenciam o comportamento alimentar é essencial, pois ele é
dependente de questões emocionais, culturais e socioeconômicas determinantes
das escolhas alimentares, que estão relacionadas aos aspectos subjetivos
referentes ao ato de comer.
O tema sobre reeducação alimentar surgiu a partir de um trabalho
desenvolvido com os profissionais de saúde na Maternidade Odete Valadares
(MOV) pertencente à Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG),
em Belo Horizonte. O objetivo foi estimular a mudança de hábitos alimentares e
promover a saúde do trabalhador. A experiência permitiu a esses profissionais o
acesso à orientação nutricional, atendimento individual e em grupo pelo período
38
de, aproximadamente, seis meses, tempo necessário para avaliar as mudanças
alcançadas pelos participantes. Esse grupo foi idealizado a partir da demanda de
melhorar os hábitos alimentares para promoção da saúde e perda de peso e foi
apoiado pelo Grupo de Trabalho de Humanização (GTH), em cumprimento às
diretrizes referentes à valorização do trabalhador da saúde estabelecidas nas
Política Nacional de Humanização (PNH) e Política Nacional de Promoção da
Saúde dos Trabalhadores do SUS (PNPS – SUS).
Os trabalhadores da saúde ficam longos períodos de permanência no
ambiente de trabalho e, devido à dificuldade de locomoção nos grandes centros
urbanos, bem como ao tempo gasto com deslocamentos, são impelidas a buscar
a comodidade de se alimentarem no próprio local de trabalho ou nas suas
proximidades. Junta-se a esse contexto, além do apelo da mídia e do mercado
para o consumo, o sedentarismo, que contribui para dificultar a adoção de hábitos
alimentares e de vida mais saudáveis.
Os resultados da classificação do estado nutricional dos participantes do
grupo em estudo mostrou alto índice de sobrepeso e obesidade, confirmando os
dados encontrados na literatura. Esse dado justifica a necessidade de intervenção
em educação nutricional para minimizar danos e promover a saúde do
trabalhador. E foi nesse panorama que se instalou o seguinte questionamento:
com quais estratégias e recursos profissionais da saúde se tem conseguido
superar a dificuldade de mudar o hábito alimentar e aderido a uma dieta mais
saudável? Com foco nessa argumentação investigaram-se as estratégias e
recursos que possibilitaram aos profissionais da saúde superar as dificuldades em
mudar o hábito alimentar para aderirem a uma dieta mais saudável.
Acredita-se que o conhecimento das estratégias, recursos e motivações
que determinaram a mudança de hábito alimentar, e se constituíram em
experiências exitosas e explicitados por meio da linguagem oral dos sujeitos que
as vivenciaram, possibilitem a identificação de elementos envolvidos na
construção de um novo hábito alimentar mais saudável que possa ser socializado
nos diversos espaços de saúde e correlatos em prol da saúde do trabalhador.
O estudo teve como objetivo geral analisar as estratégias e recursos
utilizados por profissionais da saúde no enfrentamento das dificuldades em adotar
hábitos alimentares mais saudáveis. E como objetivos específicos: identificar
39
estímulos que motivaram ou desmotivaram a mudança de hábito alimentar e
conhecer os significados simbólicos e afetivos do ato de comer.
3.2 DISCUSSÃO TEÓRICA
A incidência dos casos de obesidade cresceu muito nas últimas décadas,
desencadeando uma epidemia que acomete indivíduos de todas as idades. A
mudança dos hábitos alimentares tem influência direta nesse panorama atual, que
se caracteriza pela ingestão de alimentos com alto índice de gorduras, açúcar e
sal e baixa quantidade de vitaminas, minerais e fibra. A literatura é vasta em
afirmar a importância da nutrição para a saúde do indivíduo, sobretudo a relação
do baixo consumo de frutas, verduras, legumes e da maior frequência de
refeições realizadas fora de casa, com o consequente aumento do consumo de
alimentos industrializados e com alto teor energético. A mudança do perfil
alimentar da população e o inevitável aumento da incidência de obesidade na
população estão diretamente relacionados ao aparecimento de doenças crônicas
como diabetes, hipertensão, obesidade e certos tipos de câncer (BRASIL, 2010b;
BRASIL, 2011b; BRASIL, 2012; DUNCAN; SCHMIDT, 2011; HAWKERS, 2007;
LEVY et al., 2012; PIMENTA, 2011).
A transformação do comportamento social dos brasileiros interferiu na
mudança do padrão alimentar, uma vez que houve aumento da sua carga de
trabalho, passou a se alimentar fora de casa, assumiu estilo de vida mais
sedentário em função da falta de tempo para o lazer, além de estresse, pressão e
competitividade nas relações sociais e profissionais. Essas práticas contribuem,
efetivamente, para a ocorrência de desequilíbrios nutricionais (BRASIL, 2010b;
BRASIL, 2011b; BRASIL, 2012; HAWKERS, 2007; KAC; SICHIERI; GIGANTE,
2007; MEDRONHO et al., 2005).
Considerando a realidade dos profissionais da área da saúde, é importante
destacar que o Ministério da Saúde aprovou, em 2003, a Política Nacional de
Humanização (PNH), com o objetivo de produzir mudanças nos modos de gestão
e cuidado na assistência em saúde. Uma das diretrizes da PNH é a valorização
do trabalhador (BRASIL, 2003; BRASIL, 2008). Em 2011, o Ministério da Saúde
avançou ainda mais com a Política Nacional de Promoção da Saúde do
Trabalhador do SUS, visando promover a saúde do trabalhador mediante, entre
40
outros aspectos, a garantia ao acesso às ações e aos serviços de atenção
integral à saúde (BRASIL, 2011a). Acredita-se que a iniciativa de ações
humanizadas e de acesso à informação e atendimento especializado no próprio
local de trabalho seja uma estratégia positiva para o fortalecimento das relações
no trabalho, valorização do sujeito e uma nova postura no cuidado de si e do
outro (BRASIL, 2003; BRASIL, 2011a; BRASIL, 2010a).
O Ministério da Saúde também aprovou em 2006 a Política Nacional de
Promoção da Saúde. Essa política tem o objetivo de promover a qualidade de
vida e reduzir vulnerabilidade e riscos à saúde relaciona) os aos seus
determinantes e condicionantes – modos de viver, condições de trabalho,
habitação, ambiente, educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços
essenciais. A proposta procura garantir o fornecimento de informações corretas
para facilitar decisões por escolhas saudáveis e possibilitar programas adequados
de educação e promoção de saúde (BRASIL, 2010b).
Considerando também as questões subjetivas que estão relacionadas ao
comportamento alimentar, a escolha de linguagem adequada na abordagem ao
paciente em uma intervenção nutricional é fator importante para a efetividade da
adesão às mudanças propostas (TORAL; SLATER, 2007).
Santos (2005, p. 688) afirma que “o papel da educação alimentar e
nutricional está vinculado à produção de informações que sirvam como subsídios
para auxiliar a tomada de decisões dos indivíduos convocando-os a ampliar o seu
poder de escolha e decisão”. Porém, deve-se respeitar a autonomia do sujeito,
ressaltar a importância da sua responsabilização com o cuidado de si e levar em
conta os aspectos sociais em que está inserido.
O alimento, como elemento social e cultural, está sempre presente se
associando à ideia de reunião, nas diversas relações e classes sociais. Seu
caráter simbólico não se limita às ocasiões festivas, ele atravessa as relações de
negócios e política e perpassa também a amizade e rituais religiosos de nossa
sociedade (DANIEL; CRAVO, 2005).
O homem é resultado de uma construção social e os elementos culturais
de cada sociedade são responsáveis pela caracterização de suas ações, e é esse
processo que vai determinar suas escolhas alimentares. Daniel e Cravo (2005, p.
63) acrescentam que, “de acordo com as variáveis sociais, os alimentos também
41
se apresentam de forma diferente”. Os processos sociais e culturais são mais
complexos do que a simples satisfação de uma necessidade fisiológica.
Segundo Marques e Gutierrez (2009), uma alimentação saudável pode se
tornar um importante referencial simbólico na sociedade capitalista, a partir do
momento em que esse comportamento represente a ascensão social,
abrangendo, também, aspectos culturais, financeiros e até políticos.
Também é consenso para Canesqui e Garcia (2005, p. 119) que “em uma
sociedade homogênea culturalmente, o comportamento orçamentário levará à
adaptação do modelo alimentar dominante”.
Maciel (2005, p. 49) contribui com a seguinte reflexão: “[...] na alimentação
humana, natureza e cultura se encontram, pois se comer é uma necessidade vital,
o que, quando e com quem comer são aspectos que fazem parte de um sistema
que implica atribuição de significados ao ato alimentar”.
A desarticulação em torno do ato de comer reflete a precarização das
relações afetivas. Sentar-se à mesa para compartilhar o ato de se alimentar tem
pouco espaço na sociedade contemporânea. Com isso, perde-se a oportunidade
de trocas afetivas e simbólicas que são tão características e marcantes desses
momentos (GALLIAN, 2007).
O Guia Alimentar para a População Brasileira publicado em 2014 pelo
Ministério da Saúde aborda a questão da comensalidade, sua importância no
fortalecimento das relações sociais e no resgate e preservação de costumes e
tradições culturais (BRASIL, 2014, p. 96):
Seres humanos são seres sociais e o hábito de comer em companhia está impregnado em nossa história, assim como a divisão da responsabilidade por encontrar ou adquirir, preparar e cozinhar alimentos. Compartilhar o comer e as atividades envolvidas neste ato é um modo simples e profundo de criar e desenvolver relações entre pessoas. Dessa forma, comer é parte natural da vida social.
É possível analisar a relação dos indivíduos com os alimentos procurando
identificar os condicionantes dos processos sociais e culturais a partir da
perspectiva de que os alimentos não são apenas veículos de nutrientes
necessários à sobrevivência. Representam, também, “uma ordem social e
material atribuídas por um determinado grupo humano, ou seja, um conjunto de
normas ou crenças que um grupo de pessoas compartilha em relação aos
42
alimentos e sua manipulação”. O alimento, além de seu caráter nutritivo, constitui-
se em uma linguagem, cheia de significações (CARRASCO i PONS, 2005, p.
118).
Goldenberg (2004) assegura que as pessoas agem conforme seu conjunto
de valores e experiências inserido num contexto permanentemente mutável e
cujos aspectos culturais, sociais, econômicos e históricos não podem ser
controlados e são, portanto, de difícil interpretação, generalização e reprodução.
Lev Vygotsky, grande psicólogo do século XX, muito contribuiu para a
compreensão do comportamento humano como fenômeno histórico e social. Um
dos pontos centrais da sua teoria é que “a complexidade da estrutura humana
deriva do processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas relações
entre história individual e social” (REGO, 2012, p. 26).
Continuando, ainda pautada em Rego (2012, p. 31), tem-se que “o
pensamento adulto é culturalmente mediado, sendo a linguagem o principal meio
desta mediação”. Com isso, seu trabalho suscitou importantes reflexões sobre as
relações entre ensino, aprendizagem e desenvolvimento.
Uma das teses de Vygotsky refere-se à relação indivíduo-sociedade,
conforme explicita Rego, (2012, p. 41):
As características tipicamente humanas não estão presentes desde o nascimento do indivíduo, nem são mero resultado das pressões do meio externo. Elas resultam da interação dialética do homem e seu meio sociocultural. Ao mesmo tempo em que o ser humano transforma o seu meio para atender às suas necessidades básicas, transforma-se a si mesmo.
A abordagem psicológica histórico-cultural de Vygotsky entende o sujeito
inserido socialmente em um meio historicamente construído. Dessa forma, a
educação, a partir dessa perspectiva, deve considerar toda a experiência de vida
do indivíduo. Ele assegura, ainda, que “a interação social é condição
indispensável para a aprendizagem, pois é constituída a partir de uma ação
partilhada, que implica um processo de mediação entre sujeitos” (MARQUES;
OLIVEIRA, 2005, p. 4). O autor também contribuiu muito para a discussão dos
mecanismos que levam a cultura a se tornar parte integrante da natureza
humana.
43
Minayo et al. (2004, p. 225) prelecionam que “numa sociedade marcada
por relações sociais de produção profundamente desiguais, a comunicação está
sistematicamente perturbada. A linguagem é um índice de alienação que
expressa a dominação dos homens sobre seus semelhantes”.
A dialética marxista ajuda a compreender o complexo sistema que constitui
as relações externas ao sujeito, mas também as representações sociais que
expressam objetivamente as experiências vividas por ele e os significados que lhe
são atribuídos (DESLANDES; GOMES; MINAYIO, 2011).
Dialogando com Paulo Freire, a partir de Marques e Oliveira (2005, p. 2),
apreende-se:
[...] é preciso perceber as particularidades na totalidade, porque nenhum fato ou fenômeno se justifica por si mesmo, isolado do contexto social onde é gerado e se desenvolve. O homem e a mulher como seres sociais são capazes de agir, de representar sua ação e expressá-la de modo objetivado. No momento de criar e recriar a realidade procuram representá-la. No entanto, o discurso que os homens e as mulheres fazem da sua situação concreta é conflituoso, visto que o lugar que ocupam na sociedade também o é. Seus discursos são submetidos a pressões particulares de interesses de classes sociais. Dessa forma, as representações ideológicas são determinadas pelas estruturas das relações sociais. É a unidade dialética que gera um atuar e um pensar crítico sobre a realidade para transformá-la.
Nessa perspectiva, pode-se afirmar que o conhecimento é um produto
cultural. As formas verbais de comunicação produzidas consolidam a experiência
histórica do homem. “É através da linguagem que se dá a interiorização dos
conteúdos, pois ela faz com que a natureza social das pessoas se torne também
sua natureza psicológica” (MARQUES; OLIVEIRA, 2005, p. 6).
Santos (2005, p. 609), em seu trabalho sobre educação nutricional,
mostrou que:
As tecnologias da informação e comunicação são de extremas relevâncias na garantia do direito ao acesso à informação. No entanto, tais tecnologias não podem substituir a educação, que tem no diálogo um dos elementos centrais. Esse diálogo, mesmo intermediado pelas tecnologias, é que oferece sentido para as ações educativas e para o
processo de mudanças das práticas alimentares das populações.
França et al. (2012, p. 338) enfatizam que “a prevenção e o tratamento de
enfermidades crônicas não transmissíveis por meio de mudança no estilo de vida
apresentam uma adesão de apenas 25%”. Acreditam que a baixa adesão pode
44
estar relacionada à inadequação das estratégias e intervenções utilizadas, pois “o
conhecimento só serve de instrumento de mudança se existir no indivíduo o
desejo de mudar”.
O modelo transteórico descrito por Prochaska (1986 e 1994) explica que as
mudanças no comportamento acontecem em cinco estágios distintos: pré-
contemplação, contemplação, decisão, ação e manutenção. No estágio de pré-
contemplação, o indivíduo não reconhece a necessidade da mudança
comportamental e não há intenção de adotá-la num futuro próximo. Os indivíduos
são mais resistentes, apresentam pouca motivação e não estão prontos para
iniciar o plano de mudança de hábito, pois não consideram suas práticas
alimentares inadequadas. No estágio de contemplação a pessoa reconhece o
problema, está decidido a superá-lo, mas ainda não está comprometido com isso.
E apresenta, frequentemente, desculpas para não adotar uma alimentação
saudável, atribuindo à falta de tempo, à dificuldade de acesso, aos preços
elevados e ao sabor desagradável dos alimentos sugeridos. No estágio de
decisão, o indivíduo pretende mudar o seu comportamento em breve. Realiza
pequenas mudanças, mas não consegue assumir um compromisso definitivo com
as mesmas. Caracteriza-se pela conhecida expressão: “Começarei a dieta na
próxima segunda feira”. Os indivíduos em ação superam as dificuldades
encontradas e mudam de fato o seu comportamento, suas escolhas e seu
ambiente. Podem acontecer recaídas, mas eles já reconhecem os benefícios das
alterações dos hábitos alimentares. No estágio de manutenção, o indivíduo já
alterou o seu comportamento alimentar e conseguiu mantê-lo por mais de seis
meses. O objetivo nessa fase é evitar recaídas e garantir os ganhos obtidos. Os
autores ressaltam, ainda, que essas fases não se apresentam de maneira linear e
consecutiva e sua evolução é dinâmica, podendo haver reclassificação do
indivíduo em estágios anteriores (BUTTRISS, 1997; PROCHASKA; DI
CLEMENTE, 1994; TORAL; SLATER, 2007).
Cezaretto (2010) e Santos P. (2010) demonstraram que as intervenções
em grupo interdisciplinar são propostas eficazes para mudança de hábitos e
construção de competências relacionadas à saúde e qualidade de vida na
população. Além disso, são iniciativas de baixo custo, beneficiam representativo
número de pessoas e estimulam a motivação e fortalecimentos das relações
intergrupais.
45
O conhecimento dos fatores que interferem no comportamento alimentar
auxilia na melhoria da efetividade das intervenções nutricionais. Portanto, os
objetivos desta pesquisa foram analisar as estratégias e os recursos utilizados
nos processos de construção da mudança de hábitos alimentares dos
profissionais da saúde; identificar estímulos que motivaram ou desmotivaram a
mudança de hábito; e conhecer os significados simbólicos e afetivos do ato de
comer.
3.3 METODOLOGIA
Para investigar o objetivo geral da pesquisa – analisar a motivação e
recursos utilizados como estratégias para a construção de um processo de
mudança de hábito –, o método qualitativo foi o mais adequado, por se tratar da
compreensão de um fenômeno complexo do comportamento humano (GIL, 2011).
A escolha pela abordagem qualitativa se justifica pela necessidade de aprofundar
na compreensão do fenômeno estudado – comportamento alimentar de
profissionais da saúde, em seu ambiente e contexto social – e analisá-lo a partir
da perspectiva dos próprios participantes.
Deslandes, Gomes e Mainayo (2011) abalizam que a pesquisa qualitativa
permite a aproximação com a realidade, porque considera os aspectos subjetivos
como valores, crenças, desejos, motivações, significados e atitudes que
correspondem a um universo mais profundo e complexo das relações, dos
processos e dos fenômenos sociais.
A abordagem de pesquisa baseada nas representações sociais mostrou-se
como uma possibilidade para desenvolver este estudo, uma vez que Mazzotti
(2008), ao discutir o conceito de representação social, muito contribui para
ampliar nossa compreensão a respeito da sua influência no comportamento
alimentar do sujeito (MAZZOTTI, 2008, p. 20):
O estudo das representações sociais parece ser um caminho promissor [...] na medida em que investiga justamente como se formam e como funcionam os sistemas de referência que utilizamos para classificar pessoas e grupos e para interpretar os acontecimentos da realidade cotidiana. Por suas relações com a linguagem, a ideologia e o imaginário social e, principalmente, por seu papel na orientação de condutas e das práticas sociais, as representações sociais constituem
46
elementos essenciais à análise dos mecanismos que interferem na eficácia do processo educativo.
Entende-se representação social (MAZZOTTI, 2008) como sendo a
maneira que o indivíduo interpreta a realidade humana, organizando o seu
pensamento e orientando seu comportamento. Essa relação com o meio externo
se constrói sempre mediada pela linguagem, com base na bagagem cultural,
pessoal, histórica e ideológica de cada um, de forma a vincular suas posições em
relação às diversas situações sociais. Essa construção mental e simbólica
incorpora-se como um recurso singular do sujeito para que ele se torne
compreensível e útil no meio em que vive.
O objeto do estudo está intrinsecamente relacionado a aspectos subjetivos
e de impacto emocional, numa relação dinâmica entre mundo real e o sujeito.
Portanto, não foram necessários abordagem numérica e tratamento estatístico de
dados (DESLANDES; GOMES; MINAYO, 2011). A intenção foi apreender os
significados das experiências individuais de modo a compreender como
constroem sua relação com o ato de se alimentar e como realizam as suas
escolhas e transformam seus hábitos (FRASER; GODIM, 2004).
O cenário para a realização desta pesquisa foi a Maternidade Odete
Valadares (MOV) da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG),
que é referência na atenção à gestação de alto risco e saúde da mulher, em Belo
Horizonte. Foram sujeitos deste estudo funcionários que participaram do grupo de
reeducação alimentar realizado no próprio local de trabalho, no período de 2009 a
2012.
A proposta do grupo foi proporcionar encontros com duração de uma hora
e meia, distribuídos ao longo de seis meses, para a discussão de temas
relacionados a: nutrição, alimentação e hábitos saudáveis, utilizando os recursos
pedagógicos como relato de experiências, leitura de textos motivacionais, aulas
teóricas expositivas e distribuição de material informativo sobre os temas
abordados. Os critérios de inclusão foram: o funcionário devia trabalhar na MOV,
estar comprometido com a proposta de tratamento e assinar o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido; frequentar no mínimo 70% das reuniões,
discutir previamente com o seu chefe imediato sobre a sua liberação para
participar dos encontros durante o seu horário de trabalho, para que não
47
houvesse descontinuidade do tratamento; realizar os exames solicitados no início
e no final do programa; e comparecer às consultas individuais quando solicitado.
O trabalho também contou o importante apoio da direção da MOV, que
autorizou a sua realização, viabilizando as seguintes condições: a realização dos
exames de sangue necessários para admissão dos participantes, no próprio
laboratório da MOV (glicemia, triglicérides, colesterol e frações); liberação do
profissional nutricionista e demais funcionários para participarem das reuniões, no
horário de trabalho; disponibilidade do local das reuniões coletivas e atendimentos
individuais; o uso de material do ambulatório e pronto-atendimento para aferição
das medidas antropométricas e pressão arterial; disponibilidade do material
pedagógico e informativo para serem utilizados nas reuniões.
Foram avaliados 161 funcionários e apenas 22% apresentaram índice de
massa corporal (IMC) normal. Os outros foram classificados como sobrepeso
(43%), obesidade grau I (23%), obesidade grau II (8%) e obesidade grau III (4%).
A porcentagem de inadequação de peso (sobrepeso e obesidade) de acordo com
a classificação do estado nutricional em relação ao IMC foi de 78%.
Para a escolha da amostra foi consultada a lista com os nomes dos 161
funcionários que participaram do grupo. Desse total, foram encontrados 108
funcionários que ainda estavam trabalhando na MOV no período da coleta dos
dados. Eles foram contatados aleatoriamente e convidados a relatar quais foram
as motivações, dificuldades, estratégias e recursos utilizados para alcançarem a
mudança de hábito alimentar.
A coleta de dados se deu por meio da entrevista semiestruturada com
perguntas norteadoras do tema a ser explorado, conforme roteiro de entrevista
(APÊNDICE A). O número de entrevistas não foi determinado a priori, tendo em
vista que o critério de saturação dos dados relatados é o definidor da
amostragem, ou seja, “interrompe-se a coleta de dados quando se constata que
elementos novos para subsidiar a teorização almejada (ou possível naquelas
circunstâncias) não são mais depreendidos a partir do campo de observação”
(FONTANELLA et al., 2011, p. 389). A análise dos resultados se restringiu às
entrevistas realizadas com 12 participantes e não foram considerados os
resultados de exames clínicos, pesos e medidas aferidos durante o período de
realização dos grupos.
48
Os depoimentos dos 12 sujeitos foram analisados a partir da técnica da
análise de conteúdo, proposta por Bardin (2010). Esta obedeceu ao princípio ético
da confidencialidade de forma a preservar a identidade do respondente e a
fidelidade dos resultados. Portanto, cada sujeito será identificado neste trabalho
com a letra E de entrevista e o número ordinal de acordo com a ocorrência
sequencial de cada entrevista. Ressalva-se que o projeto, antes do início da
realização das entrevistas, foi aprovado pelo Comitê de Ética da FHEMIG.
3.4 ANÁLISE DOS DADOS
A leitura dos depoimentos e respectiva análise permitiram a identificação
de diversos núcleos de sentido que convergiram para três categorias e
subcategorias temáticas apresentadas no Quadro 1.
Quadro 1: Categorias e subcategorias identificadas a partir da narração dos
entrevistados
Categorias O Indivíduo e a
Comida Reeducação Alimentar
Cultura e Alimentação
Subcategoria 1
Relação Emocional
Informação e Conscientização
Aspectos relacionados ao ambiente
Subcategoria 2
Sentimentos despertados
Motivação e Estratégias
O culto ao corpo
Subcategoria 3
Desafio de mudar Comportamento
Maus hábitos alimentares e Saúde
Relação com o tempo e o dinheiro
3.4.1 Categoria 1: O indivíduo e a comida
A análise da primeira pergunta da entrevista teve como objetivo identificar qual o
entendimento do sujeito sobre a sua relação com a comida e procurar destacar
pontos que pudessem indicar quais são os aspectos determinantes no
comportamento alimentar desses indivíduos que dificultam a mudança de hábitos
alimentares.
De acordo com as afirmações expressas pelos sujeitos, foi possível
identificar aspectos ligados à afetividade que remetem às relações interpessoais,
à necessidade de se ter persistência, à força de vontade e disciplina para
49
alcançar a mudança de hábito e até mesmo às ideias contraditórias em relação ao
comportamento alimentar.
Os depoimentos deixam clara a recorrência de significados afetivos
relacionados ao ato de comer, o que levou à definição de subcategorias
denominadas relação emocional, sentimentos despertados e desafio de mudar
comportamento.
3.4.1.1 Relação emocional
A refeição sempre representou um momento de união e de transmissão de
valores e sentimentos no processo de construção das relações sociais do homem.
O comportamento alimentar é apreendido muito cedo e geralmente é repassado
ao indivíduo por adultos com os quais se tem uma relação afetiva muito forte, o
que confere à relação com o ato de se alimentar um poder sentimental duradouro
e simbólico (MINTZ, 2001). As experiências daí decorridas, porém, podem ser
positivas ou negativas, definindo os aspectos subjetivos que acompanham o
sujeito e influenciam o seu comportamento alimentar. A memória afetiva16pode
interferir na resposta frente aos estímulos sociais para o consumo ou para atender
a um padrão de beleza preestabelecido, por exemplo. Muitas vezes, a comida se
apresenta como um refúgio, um escape prazeroso das pressões que o indivíduo
enfrenta no dia-a-dia. Esse sentimento remete às lembranças em que o alimento
foi sentido como um objeto que significou a satisfação de um desejo não só
fisiológico, mas como uma carga extremamente afetiva, preenchendo, assim, um
espaço importante nas relações do sujeito com o meio externo. As unidades de
registro, a seguir, confirmam esses dizeres:
[...] a minha relação com a comida é muito, é mais emocional, porque quando eu me sinto bem, [...] eu consigo perder peso. Qualquer coisa que acontece, emocionalmente, comigo isso me abala. Então eu como demais, eu como fora de hora, eu fico muito tempo sem comer [E1].
1 Em 1899 Freud escreveu um artigo no qual chamou de Lembranças Encobridoras as
recordações cujo conteúdo manifesto parece, normalmente, banal, mas cujo o conteúdo traz detalhes, sensações precisos e intensos que parecem quase alucionatórios. Assim sendo, sob o manto de um evento aparentemente banal parece haver outros fatos das vída psíquica, anteriores ou posteriores, significativos e que encontram nessa memória o substrato para se manifestarem sob a forma de símbolos (Edição Standard das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, vol. III, p. 333-358, Ed. Imago, RJ, 1980).
50
Eu não sei te explicar por que, mas é como se fosse um refúgio [...] é como se tivesse relação de quando você não está feliz, então você tem que estar magra, se está triste, tem algum problema, você se descuida [...] [E1]. Hoje eu uso a comida, eu me alimento de forma mais racional, antes dependendo do meu estado emocional eu usava como uma válvula de escape, dependendo da situação eu comia desmedidamente [E9]. A gente compensa no alimento uma fragilidade sua, né? É essa pressão mesmo que a gente sofre com o dia-a-dia, a gente acaba descontando [...] [E4]. [...] eu também aderi ao grupo porque a gente foi acolhida psicologicamente, né? Porque a obesidade atrapalha a cabeça da gente também [...] [E5].
Os discursos dos sujeitos desvelam sentimentos de ansiedade e tristeza
como indutores de comer em maior quantidade para se satisfazer. Porém, quando
se toma consciência da necessidade de mudança, a pessoa é capaz de utilizar a
comida de forma mais racional, ou seja, alimentar-se para nutrir-se, preservando
o prazer de comer aquilo que gosta. E, sobretudo, não perder o controle e usar o
alimento como uma válvula de escape prazerosa ou recompensa afetiva. É
reconhecer não só a necessidade de restrição dos excessos de alimentos, mas
ressignificar a sua representação e estabelecer outra relação com o prazer que o
alimento proporciona.
Eu acho que no meu caso a minha relação com a comida é essa questão de ansiedade. [...] me ajudou muito saber que eu não preciso comer uma caixa de bombom pra ficar satisfeita [...] aprendi a sentir o gosto da comida [...] [E1]. [...] eu percebia que eu comia não era nem por questão de fome, acho que era mais questão de ansiedade [...] até surpreende porque antes eu não tinha esse controle não, começava a comer e não parava não, [...] [E12]. Ah, eu não tinha medidas pra comer [...]. Era assim, enquanto eu tivesse vendo eu tava querendo comer mesmo. Eu não tinha essa noção que não tem que ter uma quantidade exagerada pra satisfação [E4].
A caminhada em direção às mudanças de hábitos alimentares se faz por
meio de força de vontade, de querer muito, de renúncias, superação e
ressignificação. Faz-se, também, por meio de pensamentos e palavras, ações e
intervenções, tudo isso materializado pelo compartilhamento afetivo e
51
compreensivo, e de presença significativa de familiares. O ambiente familiar se
adere ao processo de mudança para fortalecer as tomadas de decisão e, como
tal, todos entram na roda viva do vir a ser saudável. As unidades de registro
descritas a seguir ensejam esses dizeres:
Outra coisa que eu acho importante primeiro é a gente querer, a força de vontade e o apoio também das pessoas que te amam [...], a sua família também te apoiar, aí passa a ser uma coisa que lá em casa [...] mudou para todo mundo, entendeu? [E7]. [...] então a pessoa tem que fazer sim, [...] tem que tentar, e ainda que ela não vá até o fim, que deveria ir, mas o que ela aprender não vai esquecer nunca, ela vai levar pra vida inteira e pra família também, vai com certeza [E5]. A pessoa, ela tem que ter força de vontade, né? E persistir porque é uma coisa boa, uma coisa boa pra vida, pra saúde e serve até de exemplo pra outros também [...]. Engraçado que lá em casa o meu marido também acabou aderindo a isso e ele também perdeu peso porque ele come aquilo que eu faço [E11]. E eu na verdade em casa consigo manter mais a dieta do que no serviço, sabe? [...] e é pra todo muito lá em casa, né? Todo mundo não só a minha alimentação mudou melhorou, mas da minha família também [E12].
É muito forte a referência feita à força de vontade e persistência
necessárias para se alcançar um objetivo, de acordo com os relatos dos
entrevistados. Fica explícita a necessidade de se esperar o tempo certo, de
amadurecer a ideia e tomar consciência para que essa força possa surgir
naturalmente, como um despertar, acompanhada de outra relação com a comida.
E a importância de a iniciativa e atitude partirem da própria pessoa e não ser
imposta por terceiros, não havendo, desta forma, controle externo nem
cerceamento da sua autonomia.
[...] acho que tudo que a gente faz a gente tem que fazer com vontade, vou fazer porque eu quero porque eu preciso disso e não, ah, porque fulano falou que eu preciso, sicrano falou que eu preciso, não, a gente tem que ter essa consciência que eu preciso disso, mas não só agora mas pro resto da minha vida, eu tenho que aprender a comer [E1]. Força de vontade, tem que ter muita, muita força de vontade. Se não tiver não faz, não adianta, tem que vir de dentro não adianta ninguém ficar falando com você, tem que vir de você. [...] Então, assim, é uma persistência que a pessoa tem que ter, é uma força interior [E2].
“Vir de dentro”. O discurso, por si só, não muda hábito. É vazio se não se
concretiza na ação. A falácia é oca de significados porque é imprescindível que
52
“seu interior, seu desejo, seu querer, sua motivação” falem mais alto. E aí, você
escuta ou se escuta a voz interior e a exterior. Você está aberto agora para
aprender e mudar.
Quando eu fiz o projeto, quando eu tomei iniciativa de seguir a sua dieta, surgiu um efeito muito bom! [E8]. Eu acho que depende só da pessoa, eu sou a prova disso. Acho que qualquer mudança de hábito alimentar ou em qualquer outra esfera é uma questão da pessoa tomar a decisão e a pessoa agir pra isso acontecer [E10].
Daniel e Cravo (2005) salientam que o homem é resultado de uma
construção social e suas ações são caracterizadas a partir dos elementos
culturais de cada sociedade. Esses complexos processos sociais e culturais são
determinantes nas escolhas alimentares do indivíduo.
Montagner (2006, p. 518) muito contribui com a análise do conceito de
habitus descrito por Bourdieu:
Do ponto de vista de Bourdieu, é impossível captar esse todo humano que escapa ao próprio sujeito, histórico, determinado socialmente, imerso em um universo social fora de nossos controles. Mesmo perdendo parte da riqueza da vastidão humana, o que podemos realizar é a objetivação do habitus, justamente resultado estável, mas não imutável, desse processo de interiorização do social e de incorporação, na pele, de nossa persona social. Como apontava Bourdieu, tudo acontece como nos descreveu Kafka em seu conto “Na colônia penal”, no qual “o corpo é o espaço de inscrição da nossa condenação ao social – inscrição das regras familiares e de classe, nossas limitações coletivas, nosso imaginário grupal – no corpo biológico”. Na nossa sociedade, o corpo é o suporte de uma construção identitária realizada pela estrutura social sobre a pessoa, construção da qual o próprio indivíduo não é inteiramente sujeito: [...] a sentença a ser escrita sobre nossa pele não nos é dada a conhecer.
O habitus incorporado pelo indivíduo implica a ideia de relações sociais, de
interações sociais, principalmente a de interações simbólicas, em um espaço
determinado, carregadas de significados e relações desiguais entre sujeitos que
possuem diferentes capitais sociais. Montagner (2006, p. 517) conclui que “o
habitus gera diferenças contínuas entre indivíduos como maneira de arranjá-los
estruturalmente. Essas diferenças são os estilos de vida”.
Por isso, a compreensão das particularidades de cada indivíduo contribui
para uma abordagem mais assertiva, não desvinculando o sujeito do meio social,
historicamente construído, em que está inserido. A partir dessa perspectiva é
53
importante considerar toda a experiência de vida desse indivíduo em uma
intervenção de educação nutricional para motivar a mudança de hábito.
E mesmo com o acesso à informação disponível atualmente e a divulgação
do conhecimento sobre a importância dos hábitos de vida saudáveis, o indivíduo
ainda apresenta justificativas para a não adoção de uma alimentação mais
equilibrada. Com isso, a pessoa adia a decisão de mudar hábitos e expressa de
alguma forma a negação de seus problemas, sua resistência em enfrentar as
dificuldades e lidar com os sentimentos envolvidos no processo de construção de
novas rotinas e um novo comportamento alimentar. Esses aspectos podem ser
observados nas falas de E2 e E10.
[Silêncio]. Não sei nem o que te dizer como é minha relação com a comida. Não, na verdade ela é pra mim um problema. A comida pra mim é obrigação, desse jeito mesmo, é uma obrigação. Eu tenho que comer. Só isso [E10]. Minha relação com a comida é meio problemática [risos], eu amo comer, nossa! É, na verdade minha vida toda eu tive problema com a comida, porque eu amo comer, como muita “besteira”, e eu não gosto de comida saudável. Não gosto, eu odiava, [...], então era só “besteira”, [...] [E2].
A dificuldade de adaptar a vida para conseguir uma alimentação saudável,
mesmo sabendo da sua importância, a relação de amor e ódio com a comida e a
resistência em deixar de comer “besteiras” e introduzir novos alimentos mais
saudáveis apareceram no texto como contradições dos sujeitos, demostrando
como o racional e o emocional de uma pessoa influenciam, ao mesmo tempo, a
sua relação com a comida.
É, têm dias que eu como “besteira” sim, não vivo sem, é lógico, mas evito comer, [...] [E2]. É só uma questão de não ter conseguido adaptar minha vida pra isso. [...] Realmente comida pra mim é uma coisa muito secundária. [...] Tudo pra mim é um pouco mais importante do que a comida. [...] o sono pra mim é mais importante do que a comida. [...] porque o entendimento que eu teria que ter mudado, eu tenho né? Saber que isso mudaria minha vida completamente pra melhor, porque eu tenho muito problema pela falta de alimentação, mas não consegui mudar. E eu não sei te dizer exatamente o porquê (grifo nosso) [E10].
A contradição desvelada na unidade de registro de E2 emerge na ideia
objetada de não conseguir viver sem comer “besteiras” e a lógica da “besteira” ser
54
essencial para a vida. Da mesma forma, na unidade E10, a contradição se
anuncia no momento em que há o reconhecimento de ter consciência dos muitos
problemas causados pela falta de uma alimentação saudável e, posteriormente, a
afirmação de que a alimentação é uma coisa secundária na vida.
O discurso da negação é reforçado com frases afirmativas nas quais se
percebe uma mensagem de que aquela situação é única, definitiva, como se não
fosse possível encontrar uma alternativa, ou seja, um caso sem solução. A
pessoa se fecha para a mudança e todas as sugestões apresentadas são sempre
rebatidas com justificativas que, do ponto de vista da pessoa, são difíceis de
superar. As pequenas mudanças, quando não são frustradas ou abandonadas,
demandam um esforço muito grande e vêm carregadas de sofrimento e de
sentimentos negativos que caracterizam a sua dificuldade em mudar hábito.
3.4.1.2 Sentimentos despertados
As unidades de registro são permeadas por sentimentos afetivos, muitas
vezes contraditórios, e sua expressividade e pungência no vir a ser pessoa
saudável justificam dar-lhes destaque em separado. As releituras e a imersão
cada vez com maior profundidade no texto possibiliaram visualizar fortes
sentimentos vividos no processo de reeducação alimentar.
Na fase inicial da mudança aparecem os sentimentos negativos. Quando o
indivíduo toma consciência e começa a sentir os benefícios dos novos hábitos
alimentares, relata sentimentos mais positivos e motivadores. A conquista da
autonomia em relação às dificuldades de mudança de hábito pode ser observada
nas falas em que o indivíduo acredita na sua capacidade de agir, sente-se
convicto em continuar e valoriza o seu bem-estar e o investimento do seu esforço
nesse processo de mudança.
O Quadro 2 apresenta os sentimentos negativos de acordo com a definição
dos entrevistados, da sua relação com a comida no início da reeducação. Os
sentimentos positivos e de autonomia demonstram como o indivíduo passa a
dirigir “novo olhar” para sua relação com o ato de se alimentar após a mudança
de hábito.
55
Quadro 2: Comparação de sentimentos positivos, negativos e de autonomia
referentes à relação com a comida
Sentimentos Negativos Sentimentos Positivos Sentimentos Autonomia
- Odeio comida saudável - Sofro de gula - É uma tristeza não comer - Baixa autoestima - Sinto-me excluído - Ter que cortar é a morte - Insatisfação/incômodo - Ansiedade/impulsividade - Perda do controle - Raiva/Mau humor - Quando estou doida... - Ang;ustia/Eu pequei - Problema/obrigação - Comer desesperadamente
- Amo comer - Adoro comer - É uma alegria comer - Autoestima lá em cima - Sentir-se acolhida - Comer o que me deixa feliz - Sentir-se melhor - Tranquilidade - Controle emocional - Vida mais saudável - Aprender a dosar
- Consegui vencer obstáculos - Consigo ver onde foi que eu errei - Valorizar o processo educativo - Mudança de visão - Primeiro tenho que estar bem comigo
Observa-se forte oposição de ideias nas duas fases do processo de
mudança, expressas por verbos e palavras praticamente antônimos como amar e
odiar; sofrer e adorar; tristeza e alegria; excluído e acolhido; baixa e alta
autoestima; ansiedade e tranquilidade, assim por diante. Esse antagonismo
marca a transição de postura de forma positiva e exitosa. A autonomia se
expressa na valorização do processo educativo, na capacidade de reconhecer os
erros, vencer os obstáculos e mudar “o olhar”. E a importância de estar bem
consigo mesmo ganha prioridade no novo estilo de vida adotado.
Vieira et al. (2011) afirmam que as representações negativas da dieta
tornam um fator que dificulta as mudanças de hábitos.
Os significados de perda do prazer e da liberdade atribuído à dieta foram vistos entre sujeitos de um estudo brasileiro. Os alimentos doces identificados como os mais atraentes e apreciados, ao adquirirem o sentido de proibição e cerceamento de uma fonte de prazer em seu cotidiano, transformaram-se em algo ainda mais atrativo, o que poderia justificar a conhecida transgressão como uma nova fonte de prazer (“o gosto do doce proibido”) e o efeito paradoxal da prescrição dietética.
O Quadro 3 reúne os sentimentos negativos relacionados à percepção
corporal do indivíduo. Os sentimentos positivos e de autonomia demonstram
como o indivíduo se define a partir do reconhecimento dos benefícios alcançados
com as mudanças.
56
Quadro 3: Comparação de sentimentos positivos, negativos e de autonomia
referentes à percepção corporal
Sentimentos Negativos Sentimentos
Positivos Sentimentos Autonomia
- Parecia um monstro, feia e gorda - Sentir-se mal na hora de vestir - Cansada fisicamente/ preguiça
- Gosto de me ver - Sentir-se bonita - Vaidosa - Mais energia
- Eu sou eu, eu sou único, não importa se tem outra pessoa mais bonita. Eu tenho a minha beleza.
- Não tenho vergonha de chegar em determinado lugar e ter pessoas diferentes. Temos nossas diferenças, mas somos, em comum, pessoas iguais.
Os relatos referem-se ao incômodo causado pelo excesso de peso e à
dificuldade de se adequar ao vestuário, em consonância, possivelmente, aos
padrões de beleza e de moda estabelecidos socialmente. O cansaço físico e o
desânimo enredam-se no cotidiano e tomam conta de um corpo que se faz
presente no mundo, mas que tem roubadas suas energias. Esse sentir-se
desenergizada contrapõe-se à satisfação de se sentir bonita (atendendo aos
padrões sociais) e pela disposição que o corpo mais magro proporciona.
O Quadro 4 relaciona os sentimentos vividos durante o processo de
mudança, período em que o indivíduo precisa vencer as suas dificuldades e se
apropriar de novas condutas alimentares.
Quadro 4: Comparação de sentimentos positivos, negativos e de autonomia
referentes ao processo de mudança
Sentimentos Negativos Sentimentos Positivos Sentimentos Autonomia
- Antes sofrimento - Assustei - Frustração/dilema - Vontade de renunciar - Muito difícil/esforço - Receio/fragilidade - Medo de sofrer, de mudar. - Pressionada/passei por
uma prova - Luta que não tem fim - Adaptar-se sem - Ilusão de que ia ser difícil - Não consigo explicar/ sinto-
me ignorante - Não estou curada - Não combina comigo - Não sinto vontade de comer
- Hoje tranquilidade - Surpreende - Resultado dá satisfação - Incentivo/encorajar - Dar força - Alívio - Coragem - Vale a pena - Equilíbrio
- Adaptei superbem - Responsabilização - Compromisso - Consciência/racionalidade - Tô cursando a faculdade. Faculdade
não é pra rico, é pra quem quer, igual à saúde.
- Todo mundo deveria fazer - Por que não fiz isso antes? - Não foi tão difícil - A gente não tem que fazer forçado, a
gente tem que fazer as coisas com prazer.
- Tudo que a gente faz tem que fazer com vontade, vou fazer porque eu quero, porque eu preciso e não porque fulano falou.
- Vira outra pessoa
57
Fica evidente a divisão do antes e depois como uma transposição de
etapas em que a pessoa sai de uma situação de sofrimento para um estado de
tranquilidade e como os sentimentos de autonomia remetem à responsabilização
do cuidado e da iniciativa pessoal, a partir da conscientização e do
comprometimento com a mudança. A autonomia vem com o espírito crítico em
relação às regras sociais e com o reconhecimento da sua própria identidade.
Ao profissional de saúde cabe reconhecer o grau de compreensão de cada
paciente sobre o seu processo de mudança e adesão ao tratamento,
considerando a complexidade e singularidade de cada sujeito. A partir dos
estudos de Morin (2007), pode-se pensar a complexidade como uma forma de
compreender as relações e inter-retroações entre cada fenômeno e seu contexto,
muitas vezes complementares, concorrentes e antagônicas; reconhecer a unidade
na diversidade, o diverso na unidade; e, sobretudo, a unidade e a singularidade
humana em meio às diversidades individuais e culturais.
3.4.1.3 Desafio de mudar comportamento
Os indivíduos, quando iniciam o processo de conscientização a partir da
reflexão de suas limitações, sentem-se mobilizados para a mudança e fazem
surgir vários caminhos possíveis e viáveis que reforçam a sua convicção e o
desejo de acertar. O esforço, nesse sentido, é para vencer as barreiras que foram
herdadas do seu meio social e, muitas vezes, mantidas como verdades absolutas
e seguidas automaticamente.
Recorrendo a Bourdieu (2010, p. 49):
A força do pré-construído está em que, achando-se inscrito ao mesmo tempo nas coisas e nos cérebros, ele se apresenta com as aparências da evidência, que passa despercebida porque é perfeitamente natural. A ruptura é, com efeito, uma conversão do olhar [...]. Trata-se de produzir, senão um homem novo, pelo menos um novo olhar, um olhar sociológico. E isso não é possível sem uma verdadeira conversão, [...], uma revolução mental, uma mudança de toda a visão do mundo social.
Os depoimentos a seguir sutilmente revelam essa afirmação:
58
Você se torna uma pessoa diferente assim, por valorizar, valorizar, [...] você pode comer de tudo do jeito certo, né? Você não se agride porque tem pessoas que tem que fazer uma dieta, [...] e aí põe dificuldade em tudo, eu não pus dificuldade, eu falei não, não vai ter dificuldade, é uma realidade a ser enfrentada. Então vamos encarar de frente e foi muito bom, muito, muito bom [E7]. Então, eu falo que é uma experiência pessoal mesmo e que não é tão difícil quanto aparentemente parece ser. Cada caso é um caso, cada indivíduo tem as suas limitações, suas dificuldades, mas eu acho que a pessoa, ela precisa muito ter certo aquele objetivo primeiramente, [...] [E4].
A conscientização do indivíduo prepara-o para o enfrentamento das
dificuldades, levando a ações transformadoras. Ele passa a atuar na sua
realidade transformando-se a si e aos outros e escreve uma nova trajetória como
sujeito de sua história. Os sentimentos de frustração e tristeza dão lugar à
tranquilidade e serenidade de falar sobre a experiência vivida. O novo
comportamento alimentar, o “novo olhar”, é sentido como uma vitória individual e
vem carregado de satisfação de ter suplantado os obstáculos pelo esforço
próprio. Observa-se mais engajamento e comprometimento com as propostas de
mudança e a responsabilização do cuidado de si:
Sinto assim, que eles deveriam fazer o que fiz [risos], é verdade. Porque quando eu vejo alguém comendo demais eu me incomodo, sabe? Meu Deus eu já passei por aquilo ali e não vai fazer bem nenhum”, é isso [risos] [E11].
As dificuldades para mudar hábito alimentar narradas pelos participantes
evidenciam como o convívio social interfere nas escolhas do indivíduo, causando
forte influência nas suas decisões, sejam essas positivas ou negativas do ponto
de vista nutricional.
Uai a dificuldade é essa, porque as pessoas, a cultura, todo lugar que você vai você tem comida, exposição [E5]. Ah! Festa, por exemplo, uma situação de uma confraternização. Foi muito difícil olhar a quantidade de coisas que tinha e saber que nem tudo convinha e o que convinha eu tinha de não exagerar, [...] esse tipo de situação foi mais difícil pra mim. [...] mas a dificuldade maior foi essa, senti excluído. Senti excluído, pô, todo mundo pode e eu não posso [E3].
59
[...] tanto que até hoje eles pegam no meu pé, falam assim, "nossa você é muito chata, agora não come doce". Eles pegam no pé quando vão no aniversário, começam a comer demais, porque em vez de comer um salgadinho ou dois, enquanto tem você tá comendo [risos], então eles pegam no meu pé [E11]. Ah churrasco [risos], acaba que o churrasco [...] vem tudo agregado, pãozinho, queijo, nunca vem só a carne, e a carne normalmente vem com gordurinha e vem acompanhado de cerveja, que vem acompanhado... acho que o pior é o churrasco é a coisa que eu mais gosto [E4].
Vieira et al. (2011, p. 3164) citam, em seu estudo, significados da dieta e
mudanças de hábitos, os conflitos inerentes ao processo de convivência com as
restrições dietéticas:
O conflito entre o processo de assumir a responsabilidade por sua saúde e a tendência a evitar a responsabilidade resultam em culpar a “situação injusta”, imposta pela condição de doente, bem como a necessidade de comparar-se com outras pessoas. Acreditam que suas dietas e práticas alimentares sejam equivalentes ou melhores, julgando-se submetidos à sua condição de portadores de agravos irremediáveis, especialmente no caso da presença da obesidade.
Outras dificuldades, nesse processo de mudança, relatadas pelos
participantes referem-se à falta de tempo para o preparo dos alimentos; carga
horária de trabalho exaustiva; falta de acesso à alimentação saudável no trabalho;
adequação de horários e fracionamento das refeições; e deixar de comer
alimentos da sua preferência, nem sempre saudáveis.
[...] quando a gente trabalha, trabalhava em dois empregos, [...] às vezes você chega cansada, não tem tempo de fazer as coisas, [...] não teve tempo de você comprar [...] [E1]. Em quais momentos eu tive dificuldade? Na verdade, todos! Dentro do trabalho, parar aqui pra comer é uma coisa muito complicada pra mim, até mesmo porque eu não tenho horário de almoço, [...]. Na minha casa sozinha ou com outras pessoas [E10]. [...] a minha dificuldade toda era essa, assim, tinham momentos que eu queria comer uma coisa que me deixava feliz e não podia comer, comia outras coisas pra substituir [E2]. Enfrentei sim, não foi fácil não. Analisar, ver tudo que eu comia, e você ter que se adequar ali, foi um esforço grande, né? [...] as minhas situações mais difíceis foram no café da manhã, que eu comia demais, e o meu horário de almoço [...] foi adequar os meus horários, [...] [E6].
60
A minha dificuldade foi sempre a pausa, porque eu passava um longo período sem me alimentar, então no início me policiar pra comer de três em três horas foi pra mim muito difícil, controlar a disciplina com os horários também [E9]. Então, criar novos hábitos é difícil, tanto é que eu ainda não cheguei lá, assim, não como da maneira que eu queria [...] [E5].
Vieira et al. (2011) entendem que durante a intervenção nutricional deve-se
ter cuidado em não rotular os pacientes simplesmente como os resistentes às
mudanças ou os que aderem às prescrições. Isso não ajuda no processo de
mudança nem representa a realidade do sujeito. A convivência com os agravos e
as restrições dietéticas impostas pelas doenças são complexas e, portanto, deve-
se respeitar a individualidade e evitar estereótipos e generalizações inadequadas
ao propor mudanças nas práticas alimentares. Acolher o sujeito e escutar as suas
necessidades o faz sentir mais à vontade para expressar as suas dificuldades. A
partir dai é possível propor e negociar as mudanças possíveis de serem feitas
naquele momento.
É importante analisar a frase: “A situação da minha vida em que eu
encontrei mais dificuldade de manter as mudanças foi a morte da minha mãe,
[choro] entendeu? Só isso. […], mas a pior dificuldade da minha vida foi essa, o
adaptar sem. Só” [E7].
Há uma declaração, no não dito, que relaciona a dificuldade de manter as
mudanças alcançadas ao sentimento de dor referente à perda de um ente querido
à sua dificuldade de lidar com a “falta”. Para Campos (2013, p. 2773), “a dor não
é, portanto, a dor de perder, mas a dor da presença constante do objeto perdido e
a representação da sua ausência”. O “adaptar-se sem” diz muito sobre o processo
de construção de estratégias para lidar com a falta e sobre a busca de recursos
que possam sustentar novas atitudes que visam à mudança de comportamento. O
aspecto emocional do indivíduo, nesse momento, tem forte influência no êxito ou
fracasso dessas tentativas e se manifestam como cicatrizes de experiências
afetivas que foram estruturantes na história cultural e social desse indivíduo.
A partir dessa perspectiva, é possível propor uma estratégia de intervenção
em que seja respeitado o tempo de cada pessoa nesse processo de mudança. A
aposta na capacidade do indivíduo em encontrar recursos para lidar com as suas
dificuldades parece ser um aspecto de motivação para a mudança e de conquista
61
da autonomia do sujeito no processo de responsabilização do cuidado da sua
saúde.
3.4.2 Categoria 2: Reeducação alimentar
A segunda categoria destaca a educação como importante estratégia para
mudança de hábito alimentar e enfatiza a informação como elemento fundamental
que contribui para a conscientização da necessidade de adotar hábitos
alimentares e de vida mais saudáveis. A educação desenvolve a consciência
crítica e proporciona mais assertividade nas escolhas relacionadas ao ato de
comer, valorizando principalmente a qualidade em vez da quantidade. As
subcategorias encontradas no processo de “reeducação alimentar” foram
organizadas em informação e conscientização; motivação e estratégias; e maus
hábitos alimentares e saúde.
3.4.2.1 Informação e conscientização
O sujeito, quando se apropria da informação recebida e encontra sentido
nas suas atitudes, caminha para a conquista da sua autonomia no processo de
tomada de decisão e fluição da experiência.
Freire (1987, p. 114) contribui com a sua reflexão ao afirmar que a
conscientização “não para, estoicamente, no reconhecimento puro, de caráter
subjetivo, da situação, mas, pelo contrário, prepara os homens, no plano da ação,
para a luta contra os obstáculos à sua humanização”. A consciência crítica
proporciona o engajamento do sujeito nas ações que vão gerar transformações
efetivas.
Fazendo um paralelo com Prochaska e Di Clemente (1994) em relação aos
estágios de mudança de comportamento, a consciência crítica supera os estágios
de pré-contemplação, contemplação e decisão; fortalece as ações e instaura um
novo hábito alimentar mediado pela mudança de comportamento de forma
madura, consistente e permanente.
É possível observar o despertar da consciência do sujeito expressa com
serenidade ao relatar as mudanças alcançadas e a convicção proporcionada pelo
62
acesso ao conhecimento e a postura de responsabilidade diante do desafio do
cuidado em saúde.
Hoje eu tenho mais consciência de que eu devo comer as coisas certas, que eu sei que meu corpo exige, que não adianta ficar sem comer, não vou emagrecer [...] [E2]. [...] quando se falava em reeducação alimentar pra mim era simplesmente parar de comer e na realidade eu vi que não é isso. Você poderia continuar comendo, mas da forma adequada e eu fui procurando me adequar [...]. Muito difícil, mas através de uma disciplina eu fui adequando [...] [E3]. [...] eu aprendi, principalmente, que é possível, é possível ter educação, é possível emagrecer sem medicamento [...]. E é possível comer o doce, que eu gosto, e ainda assim emagrecer, porque você fez uma dieta pra mim que não era totalmente restritiva de tudo. Então, o que eu achei bom foi isso, e mudou [E5].
A intervenção nutricional visa à produção de informações que esclareçam o
indivíduo e o auxiliem nas tomadas de decisão, promovendo a consciência crítica
da sua realidade e a liberdade das suas ações. Esse processo de conscientização
deve respeitar a autonomia do indivíduo e ressaltar a responsabilização do sujeito
com a importância do autocuidado da saúde (RODRIGUES; BOOG, 2006;
SOUZA; PIMENTA, 2013).
Hoje eu sei que é pra minha vida toda, que eu tenho que ter escolhas, mas não precisa ser tão radical de não comer pra sempre, mas eu tenho que ter escolhas e se for comer, comer pouco [E2]. [...] ao longo dos trabalhos dos encontros eu já fui mudando a minha mentalidade com relação à alimentação. Fui me responsabilizando mais em relação ao que estou ingerindo [...] e hoje eu já consigo equilibrar melhor a ingestão [...] [E4]. [...] eu já incorporei a alimentação na minha rotina, eu vejo que no meu processo de trabalho eu tenho aquela pausa, aquele compromisso comigo mesmo de parar e me alimentar. Antes de participar do grupo não era assim [E9].
As garantias e o direito ao acesso às informações são hoje uma realidade
que avança cada vez mais em sua amplitude com a globalização, principalmente
nos grandes centros urbanos. Ressalta-se, porém, a importância do diálogo como
elemento central no processo de educação que visa às mudanças no
comportamento alimentar das pessoas. Costa (2011), em seu estudo sobre
promoção da saúde e diabetes, discutiu a adesão e a motivação de indivíduos
63
participantes de programas de saúde e constatou que a aquisição do
conhecimento não se traduz, necessariamente, em mudança de comportamento.
Por mais desenvolvida que seja uma tecnologia, sem diminuir a sua relevância
como ferramenta de transmissão do conhecimento, ela não consegue substituir a
educação por meio do diálogo que facilita e proporciona o sentido às ações
educativas e promove mudanças efetivas nas práticas alimentares dos sujeitos.
Os fragmentos de discurso confirmam e valoram a comunicação dialógica,
horizontalizada e carregada de sentido para quem a vive e compartilha:
Ué, me motivou por ser um grupo, aí uma dá força pra outra, a gente ensinava receitinha, a Iara mandava e-mail, né? [...] isso incentiva e você vê que não é só você, vê que tem outras pessoas iguais precisando de ajuda e alguém interessado, que no caso era você que interessou pelo nosso problema [E5]. Porque é muito importante você aprender as dicas [...]. Porque não adianta você pegar um papel, você vai ao médico pega um papel – “come isso aí” - você olha aquilo lá e diz, “nossa só vou comer isso aqui todo dia”. Não, no grupo eu aprendi que você pode mudar uma coisa pela outra [...]. Então foi muito importante mesmo, você aprende as trocas, as substituições para você não cair nessa rotina [E1]. Eu diria que o caminho é esse mesmo, não são dietas radicais, que a gente tem uma oferta muito grande de dietas malucas, né, [...], sendo que você tem que valorizar mesmo é o processo educativo, essa reeducação é que vai fazer a diferença, porque essas dietas elas vão, elas vêm e quando você termina essas dietas, o corpo sente [E9]. É uma questão de reeducar né, é mostrar que você vive sem aquilo numa boa, e está sendo muito bom. [...] porque motiva, né, e é bom, nas reuniões a gente conversa, discute, um fala uma coisa, outro fala outra coisa e a gente vai tirando muita coisa boa, eu gostei demais [E7]. Por diversas vezes durante a reeducação, não sei se você se lembra que eu chegava pra você e – “mas o meu intestino não está aguentando, [...] posso tomar remédio?” [risos]. E você respondia, “Não, ingira mais líquido [...]”, então isso pra mim foi um ponto marcante [E9.] [...] você realmente foi uma luz para gente começar a caminhar de forma diferente [E6]. Porque a gente sabe disso, só que às vezes é difícil, [...] tem uma coisa que te impede de fazer [...], eu sei o que eu preciso, mas eu não sei como fazer, às vezes, a gente precisa de um empurrãozinho, como o grupo foi um empurrão, né? Então assim, são coisas que ajudam a gente a tomar essa decisão, né? [E1].
Freire (1996) refere-se à autonomia do sujeito como um processo de
tomada de decisão e de humanização que vai sendo construído a partir das
experiências vividas ao longo da vida. A autonomia torna-se uma experiência de
64
liberdade quando o profissional é capaz de ajudar o indivíduo a alcançar esse
estágio, valorizando as suas potencialidades e respeitando o tempo de agir e
mudar de cada um.
3.4.2.2 Motivação e estratégias
O estudo descrito por Prochaska e Di Clemente (1994) sobre o modelo
transteórico explica os cinco estágios de motivação para mudanças no
comportamento alimentar: pré-contemplação, contemplação, decisão, ação e
manutenção. A maioria dos entrevistados passou pelos estágios de contemplação
e decisão e permaneceu por mais tempo nos estágios de ação e manutenção. Os
indivíduos na fase da ação superaram as dificuldades encontradas e mudaram,
de fato, o seu comportamento, suas escolhas e seu ambiente. Aconteceram,
entretanto, algumas recaídas, mas eles já conseguiam reconhecer os benefícios
das alterações dos hábitos alimentares. E no estágio de manutenção, os
participantes já alteraram o seu comportamento alimentar e conseguiram mantê-lo
por mais de seis meses, sendo o principal objetivo dessa fase evitar recaídas e
garantir os ganhos obtidos.
A evolução das fases é dinâmica, ao longo do processo de mudança de
hábito, e não acontece, necessariamente, de forma linear e consecutiva. A fala de
alguns sujeitos reforça essa teoria:
Tem que ser uma coisa bem disciplinada porque senão você não dá conta porque a tentação tá lá, você quer comer o doce [...] e depois que passa aquela fase você olha com outro olhar, é impressionante, você não tem vontade, é superinteressante isso, né? Depois que você cria o hábito alimentar, eu passei dessa fase então hoje pra mim é mais fácil falar (grifo nosso) [E4]. Conforme a coisa já não me faz falta mais, uma coisa que eu imaginava a princípio que eu não ia viver sem, convivo numa boa, convivo numa boa e bem, que é o mais importante, né? [E7]. Mas assim, isso não é com uma semana não, isso vai mês, vai mudando, hoje você cai, tem uma recaída, “ah hoje vou comer”, mas aí com o passar de uns dois meses, você vai sentindo que o seu organismo está mais ou menos, fazendo o que você pretende [E6].
Entre as estratégias usadas para introduzir novos hábitos alimentares, o
planejamento da alimentação mostrou-se eficaz para melhorar a adesão à dieta.
65
Outro aspecto importante foi a iniciativa de provar novos alimentos e preparações
não usuais na rotina alimentar dos entrevistados. O fato de a dieta não ser muito
restritiva também estimulou a adesão, porque a pessoa não está proibida de
comer o que gosta e tem liberdade para conduzir as suas escolhas, tendo a
consciência de comer nas quantidades adequadas. As respostas a seguir
demonstram essa afirmação:
Muitas coisas eu aprendi a provar pelo menos a tentar fazer uma coisa variada, conhecer mais o sabor mesmo que eu não goste [...] [E1]. Sim, mudei bastante, eu me alimento de forma mais planejada […], hoje eu procuro já à noite planejar o meu café da manhã, o que eu vou trazer, [...] eu tenho que sair com uma marmitinha de casa, [...] [E9]. Durante a semana eu me seguro mais [...], eu me dedico na dieta, mas quando eu preciso, quando eu posso comer outras coisas eu como sem culpa [E12]. [...] à medida que eu fui reduzindo, engraçado parece que o corpo da gente se adapta. O meu dia-a-dia, a minha rotina interferiu lá no meu fim de semana, que é quando eu saio da rotina e fico mais livre [...]. Eu não consegui trabalhar lá na situação do fim de semana, no churrasco, mas a situação anterior que é o meu dia-a-dia foi me disciplinando, aí eu chego lá no churrasco eu consigo […] [E4]. [...] o cardápio que você fez pra mim foi possível e eu aprendi bastante coisa [E5].
A motivação para mudar hábito alimentar é um processo que estimula a
pessoa a agir, que instiga um comportamento diferente, mostra a direção e o
propósito da mudança e conduz às escolhas e preferências mais saudáveis. A
motivação pode ser intrínseca ou extrínseca, pode ser traçada a curto ou longo
prazo e pode, inclusive, mudar ao longo do tempo. A motivação intrínseca surge
do indivíduo, pertence aos seus desejos, necessidades, direções ou metas.
Fatores externos ou extrínsecos podem suplementar positiva ou negativamente
essa motivação. Alguns fatores externos que atuam positivamente no indivíduo
são o suporte familiar, o prazer e as recompensas materiais. Porém, fatores
externos podem influenciar negativamente e ser prejudiciais no caso de falta do
suporte familiar e de amigos, e até mesmo devido à cobrança de padrões sociais
preestabelecidos (TORAL; SLATER, 2007).
França et al. (2012) descrevem o impacto imediato dos aspectos
nutricionais e psicológicos em um grupo psicoeducativo que teve como foco a
mudança do comportamento alimentar. Nesse grupo foi utilizada a técnica da
66
distração e a modificação de crenças disfuncionais que são estratégias da
Terapia Cognitiva Comportamental (TCC). O indivíduo, ao desviar o foco das suas
sensações negativas internas para o meio externo, muda o seu padrão de
pensamentos. Ao evitá-los, sente-se mais motivado a agir de forma positiva e
proativa para alcançar os seus objetivos. As autoras defendem, ainda, que, de
forma semelhante, “outros programas de educação nutricional têm associado às
informações sobre hábitos alimentares as teorias motivacionais e treinamento de
autocontrole a fim de obter um resultado melhor”.
Esse processo de transição em que o sujeito consegue ir diminuindo as
quantidades progressivamente permitiu que as próprias pessoas percebessem
que não precisavam comer em grandes quantidades para se satisfazerem; o
alimento tão desejado não fazia tanta falta assim e, ao contrário, poderia
comprometer a qualidade da sua alimentação. A manutenção das mudanças, ao
longo do tempo, fez surgir um novo hábito alimentar mais saudável, que passou a
ser vivenciado de maneira natural e sem sacrifícios.
3.4.2.3 Maus hábitos alimentares e saúde
A recuperação e a manutenção da saúde representam o grande eixo
norteador e motivacional de enfrentamento das dificuldades de mudança de
hábito. O incômodo causado por limitações impostas pelas doenças decorrentes
de hábitos alimentares inadequados ou pela pressão social de se enquadrar a
padrões estéticos predeterminados e fortemente veiculados pelos meios de
comunicação é o estímulo que impulsiona e mobiliza a mudança de atitude frente
às rotinas estabelecidas no cotidiano de cada um.
As mudanças no padrão alimentar relatadas pelos participantes desta
pesquisa foram, principalmente, a diminuição do volume de comida ingerido;
introdução de alimentos considerados “saudáveis”, como frutas, legumes,
verduras, alimentos integrais; aumento do consumo de água; a regularidade dos
horários das refeições de três em três horas; diminuição do consumo de
refrigerante, açúcar, doces, pão, arroz; o planejamento das refeições e a
substituição correta dos alimentos. Esses aspectos são identificados nas
narrativas a seguir:
67
Eu aprendi que eu tenho que aprender a comer, tem que aprender a comer na hora certa e as coisas certas porque também não adianta eu comer de três em três horas, ir lá e comer um tanto de bobagens [E1]. Eu comia demais! Agora eu tô aprendendo a dosar [E8]. Antes eu tinha dificuldade, [...] eu comia qualquer coisa, aí depois desse grupo de reeducação, eu até hoje consigo comer aquilo que é mais saudável, né? Concentro mais nas verduras, legumes, frutas, né? Não como doce, cortei definitivamente o açúcar, só tomo adoçante mesmo e evito o máximo refrigerante [...] tomo mais é suco natural, nem é suco de caixinha, esse suco de caixinha também acho que tem muito açúcar, [...]. Como massa, mas assim, de vez em quando, mas evito salgadinho, essas coisas [E11]. [...] hoje eu como comida saudável, não como fritura, refrigerante sem chance, evito açúcar, muito açúcar e muita coisa, mas eu não deixei de comer açúcar porque eu não tomo adoçante. Então, tem que ter o meu açúcar lá, mas é pouco [E2]. A qualidade é muito superior, a questão da quantidade a gente reduziu muito. [...] verdura ainda estou com um pouco de dificuldade, mas eu como, em termos de quantidade eu coloco pouco ainda, mas eu coloco de tudo [E4].
Algumas vezes na semana eu estou substituindo o arroz pela batata-doce, né? [...] iogurte eu não gosto muito, mas é o derivado do leite, o queijo eu como todos os dias, né? [...] Muito mais saudável, eu tomo muito mais líquido, muita água, eu como mais fruta, estou substituindo o pão pelo pão integral, biscoito integral também [E12]. [...] eu coloquei comida integral que eu não usava [E5]. [...] pra lanchar na rua eu estou dando preferência a uma vitamina de frutas, a um bolo do que o sanduíche, o refrigerante [E7].
Todas essas revelações confirmam as afirmativas de que as inadequações
da alimentação relacionadas ao desenvolvimento de doenças crônicas, sobrepeso
e obesidade estão diretamente ligadas à baixa ingestão de frutas, legumes,
verduras e o alto consumo de alimentos calóricos, industrializados, ricos em sal,
açúcar, gordura. E, principalmente, quanto ao volume de comida consumida, que
não corresponde à necessidade energética, devido ao estilo de vida sedentário
(COSTA; MACHADO, 2010; FERREIRA, 2010; HAWKERS, 2007; JACKIX, 2013;
KAC; SICHIERI; GIGANTE, 2007).
O processo de reeducação alimentar permitiu às pessoas organizar melhor
as suas refeições, valorizando, principalmente, a qualidade e a introdução de
alimentos saudáveis que não faziam parte da rotina alimentar anteriormente.
A fala dos entrevistados reforça a afirmação de que a grande preocupação
é a possibilidade de desenvolver alguma doença, principalmente com o avanço da
68
idade; e a experiência positiva de ter beneficiado a saúde pelos resultados de
uma adequação alimentar.
Saúde. Saúde porque eu faço controle de hipertensão, já fiz um tratamento pra depressão, esse tipo de coisa, e eu fui em busca mais de saúde mesmo. O que me motivou foi saúde mesmo, o que eu estou ganhando hoje [E3]. [...] foi a correção da saúde, [...] a gente vai pegando as suas orientações, a gente vai lendo, vai analisando que uma hipertensão, um colesterol alto, é um grande prejuízo pra nossa vida, né? [E6]. Antes eu tinha um problema sério intestinal, o meu intestino só funcionava à base de medicamento [...] [E 9]. [...], eu fiz 40 anos agora então eu fico com medo de desenvolver alguma diabetes, algum outro problema, pressão alta, alguma coisa assim [...] [E1]. [...] eu tinha triglicérides alterado, colesterol, anemia, sempre que eu fazia exame. Por diversas vezes eu fui impedida de até doar sangue por conta dessa alimentação [E9]. Primeiro eu tava incomoda por causa da obesidade mesmo, por causa de saúde, até a autoestima baixa [E5]. Então, a partir desse princípio de boa saúde, gostar da vida e até o gostar do comer, que o comer é bom demais, então você começa assim, a ter um esforço e a fazer esse pequeno jejum, né? [E6]. [...] eu estava bem incomodada porque eu estava adquirindo muito peso, [...] essas orientações acho que foram até um suporte para eu estar dando conta de bancar essas mudanças. E essas orientações me ajudaram, me fortaleceram até pra diminuir um pouco a ansiedade, [...] [E4].
O indivíduo sente-se motivado a mudar os seus hábitos a partir de
estímulos positivos para se sentir saudável e ter bem-estar ou negativos quando
as doenças relacionadas à alimentação já impõem alguma limitação ou restrição
que repercutem principalmente no seu convívio social e na sua qualidade de vida
(VIEIRA et al., 2011).
O modelo de intervenção biomédica enfatiza a evolução da doença com
foco em excessivas restrições e prescrições e investe muito pouco em conhecer o
histórico que levou o paciente à enfermidade e/ou o que pode tirá-lo dela. A
abordagem nutricional pode reforçar esse modelo quando não leva em
consideração a ressignificação das práticas alimentares pelo sujeito a partir de
suas condições sócio-históricas e os processos simbólicos e emocionais que
69
atravessam tanto a doença como o tratamento dietético (CARVALHO et al., 2011;
FREITAS; MINAYO; FONTES, 2011).
A oportunidade de acesso à informação e à assistência no próprio local de
trabalho constitui um meio de promoção de saúde e, principalmente, de
valorização do trabalhador. As ações humanizadoras proporcionam um ambiente
favorável e fortalecem as relações interpessoais. A saúde do trabalhador, como
um bem que tem custo crescente, constitui uma preocupação, inclusive para a
saúde pública, uma vez que as relações estabelecidas no ambiente de trabalho
refletem-se na vida cotidiana dos sujeitos. Portanto, oferecer suporte aos
profissionais de saúde para que eles possam lidar com as próprias dificuldades
parece ser uma estratégia positiva para a melhoria das relações no trabalho e
consequente aumento da produtividade.
3.4.3 Categoria 3: Cultura e alimentação
A terceira categoria demonstra que o aspecto cultural é primordial na
formação do hábito alimentar, e não há dúvida da influência do meio no
comportamento individual e na sua resposta aos estímulos externos gerados pela
construção da identidade de cada grupo, a partir da sua perspectiva histórica,
social, econômica e tecnológica. As subcategorias relacionadas à cultura e
alimentação referem-se aos aspectos ambientais, ao culto ao corpo, e à relação
com o tempo e dinheiro.
3.4.3.1 Aspectos relacionados ao ambiente
Sabe-se que o comportamento alimentar além de complexo contém
determinantes externos e internos ao sujeito e as práticas alimentares são
definidas pelo poder socioeconômico, afetivo e cultural do indivíduo. A construção
do hábito alimentar é determinada pela conduta da família ou do meio em que a
criança foi criada. A herança comportamental, muitas vezes carregada de valor
afetivo, vai influenciar as escolhas do indivíduo ao longo da sua vida adulta. Essa
memória afetiva é um fator determinante na capacidade da pessoa de alcançar
mudanças com mais ou com menos facilidade.
70
Bourdieu (2010, p. 83) refere que a “relação com o mundo social não é
uma relação de causalidade mecânica que frequentemente se estabelece entre o
meio e a consciência, mas sim uma espécie de cumplicidade”. E continua: “a
relação dóxica com o mundo natal, esse empenhamento ontológico que o senso
prático instaura, é uma relação de pertença e de posse na qual o corpo
apropriado pela história se apropria, de maneira absoluta e imediata, das coisas
habitadas por essa história”. Nesse sentido, as unidades de registro a seguir
encontram eco:
Enfrentei dificuldade porque é uma cultura, na verdade a gente é criada [...], no meu caso que eu sou filha única, eu comia o que eu queria, então se eu não queria uma verdura já era banido isso pra sempre, não gosta da verdura, então eu não era incentivada [E5]. [...] porque não foi essa a educação que eu tive. A educação alimentar que eu tive, na minha casa, sempre prezou muito por alimento, muita fruta, verdura e quando você passa a viver longe dos pais, às vezes você relaxa, esquece aquilo que você aprendeu lá atrás [...] [E9]. [...] às vezes meu pai chegava com uma fruta diferente e a gente falava, ah eu não gosto disso, aí minha mãe nunca forçou a gente a provar a fruta [E1].
A dificuldade em perceber os hábitos alimentares inadequados, de mudar e
manter as alterações de hábitos muitas vezes é reforçada pelo meio social. Este
determina padrões de comportamento, de beleza, hábitos de consumo alimentar e
até de valores relacionados à identidade social de acordo com o estilo de vida e
acesso a determinados serviços que ganham o significado simbólico de ascensão
e estratificação social (FERREIRA, 2010).
Uai, é porque eu aprendi, é hábito, eu aprendi a comer porque você vê todo mundo comer, [...] todo mundo come você come também, né? Você reúne na casa da família [...] então todo mundo está comendo você acaba comendo, é envolvido mesmo pelos outros, é hábito mesmo, o ambiente que você está [E11]. E a comida que engorda ela é mais barata, então você acha pizza e refrigerante com açúcar em todo lugar, [...] o brasileiro tem a cultura de tomar café, dar café mais um bolinho para o visitante, então você falar o não, essa é a dificuldade, você falar o primeiro não para uma coisa que você gosta [E5]. Só que, ao conviver de outra forma, de ter um companheiro novo, eu extrapolei e mudou meus hábitos alimentares, [...] [E8].
71
Mas eu aprendi coisas que eu não sabia, tipo a comida integral que é gostosa, porque a gente tem um preconceito né, de já não gostar sem usar [...] [E5].
A orientação nutricional torna-se mais rica quando, aliada aos aspectos
intervencionistas, é possível fazer uma análise cultural do comportamento
alimentar, interpretando os significados simbólicos das ações e fenômenos sociais
determinantes da formação do hábito alimentar do indivíduo.
3.4.3.2 O culto ao corpo
A busca pela reeducação alimentar, em alguns casos, foi motivada pelo
incômodo com o excesso de peso e insatisfação com o corpo, que está fora dos
padrões de estética e beleza socialmente aceitos. Os produtos colocados no
mercado, pela lógica da economia capitalista, destinam-se, principalmente, a um
modelo de corpo magro. A pessoa para alcançá-lo precisa de um grande
investimento de tempo, dinheiro e disposição. Isso faz com que o mercado esteja
sempre aquecido, porque é impossível alcançar o corpo ideal. E essa se torna
uma estratégia para que os produtos e serviços que prometem esse benefício
nunca deixem de ser consumidos (WITT; SCHNEIDER, 2011).
Camargo (2011, p. 258) contribui para essa reflexão a partir das
representações sociais:
As representações sociais assumem um papel importante na elaboração de maneiras coletivas de ver e viver o corpo, difundindo assim modelos de pensamento e de comportamento relacionados ao corpo, que envolvem tanto aspectos relacionados à estética quanto à saúde corporal.
Os relatos a seguir confirmam essas afirmativas:
Todo mundo tava me criticando, todo mundo tava me perguntando o porquê. Eu tava me sentindo mal, minhas roupas não tavam me cabendo mais. Eu tava me sentindo um monstro, tava feia, gorda! [E8]. Senti necessidade, porque o corpo tava feio, a partir de uma foto que eu vi minha, num casamento, vi o tamanho que eu tava. Mas era mais roupa [...], tava muito gorda, precisava mudar o meu corpo, minha alimentação toda [E2]. E também por uma questão estética porque o corpo estava naquele efeito sanfona engoda emagrece, engorda emagrece [E9].
72
É o incômodo mesmo que o peso traz na hora de vestir uma roupa, a gente se sente muito mal, eu estava me sentindo incomodada, a gente fica incomodada com o excesso de peso, principalmente, na vestimenta, [...] [E11]. Eu precisava mudar até porque eu sabia que se eu chegasse numa determinada idade eu não ia mais conseguir emagrecer o meu corpo ia ficar feio pra sempre e que eu não ia mais conseguir voltar [E2]. [...] a gente fica incomodada com o excesso de peso, [...] é muito ruim, também eu senti meio cansada, mesmo [risos], cansa, né? Fisicamente também não é bom, aí eu senti necessidade por isso, mudar o manequim, [...] [E11].
Marchesini (2010, p. 109) destaca que:
O ser humano não se constitui só; existe sempre em relação aos seus pares e ao meio ambiente. Toda mudança corresponde a uma reação social e a uma resposta emitida em forma de comportamento. Desta feita, a pessoa que perde peso aumenta seu senso de valor próprio, se traja com mais propriedade, sente-se mais adequada, é percebida como objeto de desejo. Tende a pensar o mundo, a sentir a vida e a emitir comportamentos diferenciados.
O vestuário é um aspecto que aparece com frequência nas queixas dos
entrevistados. A vestimenta padroniza os corpos, iguala os semelhantes,
expressa ascensão social, status e exclui os diferentes. O poder simbólico que a
vestimenta assume no imaginário do indivíduo cria a sua identidade e a sensação
de pertencimento ao grupo em que está inserido, ao mesmo tempo em que o
exclui, discrimina ou dificulta a sua inserção nos grupos diferentes. Há todo um
movimento para produzir, comercializar e consumir as roupas e acessórios
destinados aos corpos magros, e nisso a mídia exerce importante papel na
formação de opinião (SANTOS L, 2010). Quem não se encaixa nesse padrão
sente-se excluído, prejudicado e até mesmo em desvantagem, seja nas relações
sociais ou no mercado de trabalho, que é extremamente competitivo e valoriza, de
maneira acentuada, a aparência do indivíduo.
Assim como os outros aspectos da economia capitalista, a atividade física
também se tornou um produto a ser consumido. Existe um modelo para praticar a
atividade física e que deve ser seguido. As academias estão por todos os lugares
e configuraram-se como a maneira urbana e moderna de realizar exercícios. A
educação física nas escolas há muito tempo foi, contraditoriamente, desvalorizada
e desestimulada. O sistema educativo não incorporou a necessidade de manter
essa prática de maneira natural e prazerosa. Essa distorção não permite que os
73
jovens criem o hábito e o levem para a sua vida adulta automaticamente.
Somente quando eles constatam as limitações e consequências causadas à
saúde, pela não prática de atividade física, é que a pessoas se sentem
pressionadas a se exercitarem e, portanto, pagam pelo serviço (SOARES et al.,
2013).
Pode-se observar, recentemente, um incentivo à prática de exercícios
físicos por meio de investimentos sociais em aparelhos, destinados à prática de
atividade física, instalados em praças públicas para facilitar o acesso pelas
pessoas que não conseguem frequentar as academias. Trata-se de uma política
pública de promoção da saúde, de baixíssimo custo, que auxilia a diminuir os
impactos na saúde e, consequentemente, as despesas dos serviços de saúde
pública. As academias ao ar livre são implantadas com o objetivo de oferecer à
população uma forma de atividade física sem custos, como alternativa de
promoção da saúde e qualidade de vida (KRUCHELSKI et al., 2011; MENEZES et
al., 2011; WENDLING et al., 2010).
Outro exemplo é a iniciativa da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), Minas
Gerais, que seguiu as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS)
para que serviços públicos de saúde desenvolvam reformas estruturais que
garantam comunidades mais saudáveis e implantou em 2006 as “Academias da
Cidade”. Sua concepção contempla a integralidade da atenção à saúde,
ampliando as estratégias de atendimento à população usuária do SUS no que diz
respeito às ações de promoção da saúde por meio de incentivo à prática de
atividade física e da alimentação saudável. Para se inserir no serviço o usuário
deve ser encaminhado pelas Equipes de Saúde da Família (ESF) da Unidade
Básica de Saúde (UBS) de referência ou apenas se apresentar por demanda
espontânea (COSTA et al., 2013)
França et al. (2012, p. 343) salientam que “a realização de atividade física
foi a estratégia predominante utilizada pelos sujeitos do seu estudo sobre
mudança no comportamento alimentar”. Assim também a fala dos entrevistados
expressa a consciência da importância da atividade física para a saúde e como a
prática regular de exercícios físicos auxiliou cada um nesse processo de mudança
de hábito.
74
[...] foi realmente esse planejamento, a alimentação, essa preocupação também com a atividade física, porque eu aliei a alimentação à atividade física, o que me proporcionou bem-estar e fez que eu alcançasse um equilíbrio no peso, com as medidas, [...] [E 9]. [...] eu já faço uma caminhadinha. Mudou muito [E5]. Tava dormindo demais, com preguiça de fazer as coisas mais habituais que eu costumo fazer, arrumar minha casa, andar, que eu não tava andando [...] [E8]. A partir do momento que eu comecei a perder peso eu comecei a fazer mais exercício físico. [...] eu com o peso maior eu não fazia caminhada, minha vida era sedentária [...] [E3]. Até a minha rotina, eu tenho uma rotina exaustiva de 12 horas diária de trabalho, então eu não tinha ânimo pra fazer as coisas, pra fazer uma atividade física [E9].
É atribuição de todos os profissionais da saúde estimular a prática de
exercícios físicos tanto para melhorar a saúde do indivíduo e conquistar bem-
estar como para tentar mudar essa cultura que desestimula a atividade física de
forma prazerosa. E estimular uma nova perspectiva de praticar o exercício físico
de maneira natural e rotineira, com prazer, sem ser uma obrigação e sem
sacrifícios. E quanto mais cedo as crianças e os jovens apreenderem essa
concepção, mais saúde estaremos promovendo para o futuro.
3.4.3.3 Relação com o tempo e o dinheiro
O comportamento alimentar, além de complexo, contém determinantes
externos e internos ao sujeito e as práticas alimentares são definidas pelo poder
socioeconômico, afetivo e cultural.
A mercantilização das relações humanas alterou profundamente a maneira
como o homem lida com o tempo e com o dinheiro, levando a uma precarização
da qualidade de vida e, consequentemente, do ato de se alimentar.
A produção, comercialização e utilização dos alimentos sofrem influência
do mercado e dos interesses políticos. O modelo econômico capitalista dispõe de
recursos agressivos para impor a cultura do consumo e induzir a manutenção de
um comportamento alimentar que beneficia a lógica de seus interesses voltada
para a produção de capital e geração de lucro. A mídia tem papel estratégico na
formação de hábitos sociais, ditando as regras de como fazer, como agir, o que
consumir e quem deve consumir o quê. Ela determina também o status social a
75
partir da capacidade de acesso a certos produtos. O capital simbólico formado no
imaginário do sujeito a partir dessa perspectiva cria uma representação da
identidade individual e coletiva, forçando-o a se adequar ao meio. A pessoa
precisa trabalhar mais para ganhar cada vez mais, para conseguir consumir
produtos e serviços, ofertas e os intermináveis lançamentos de novos modelos de
comportamentos apresentados ao mercado a todo o instante (GOMES; CASTRO;
MONTEIRO, 2010).
O impacto dessa relação com o tempo e dinheiro sobre a alimentação é de
aumentar o consumo de alimentos industrializados, que sejam de preparo fácil e
rápido, porque não há tempo a perder, as pessoas precisam se manter produtivas
a maior parte do dia. E uma alimentação natural e saudável requer certa
dedicação, tempo e disponibilidade (FERREIRA, 2010).
[...] quando a gente trabalha, trabalhava em dois empregos, [...] às vezes você chega cansada, não tem tempo de fazer as coisas, [...] não teve tempo de você comprar [...] [E1]. Então a falta de tempo de você fazer, de você se organizar pra fazer uma dieta, porque às vezes é mais prático você ter um biscoito no seu armário que não estraga, que você ter uma fruta na sua geladeira que estraga [E1]. E a comida que engorda ela é mais barata, então você acha pizza em todo lugar, refrigerante com açúcar em todo lugar [E5]. [...] E dinheiro também, porque hoje em dia você fazer uma reeducação alimentar custa dinheiro, porque você não vai comer todo dia a mesma fruta, o mesmo legume, então você quer variar, fazer alguma coisa diferente, um pão integral é mais caro, tudo que é assim é mais caro [E1]. Então, quando eu soube que a empresa estava oferecendo, gratuito, essa oportunidade de uma nutricionista nos acompanhar, aí foi muito interessante, porque foi mais acessível pra gente, foi mais fácil, né [E5].
O conceito de poder simbólico de Bourdieu (2010) ajuda na compreensão
da influência que o meio externo exerce sobre as condutas e padrão de
comportamento das pessoas e, consequentemente, na dificuldade de mudança
de hábito.
Segundo Bourdieu (2010), o poder simbólico é um poder de construção da
realidade, o sentido imediato do mundo, denominado conformismo lógico. Os
símbolos têm a função de integração social. São instrumentos necessários para
obter o consenso sobre o sentido do mundo e contribuem para a ordem social. Os
76
sistemas simbólicos exercem forte influência, pois proporcionam uma forma
irreconhecível de relações de sentido por meio de relações de força que neles se
manifestam. O poder simbólico como poder de transformar a visão do mundo,
capaz de obter o equivalente daquilo que se consegue pela força (física ou
econômica), graças ao efeito específico de mobilização, só se concretiza se for
legitimamente reconhecido ou ignorado como arbitrário. O poder simbólico é uma
forma transfigurada e legitimada das outras formas de poder, que produz efeitos
reais sem o gasto aparente de energia. O poder simbólico transforma diferentes
espécies de capital em capital simbólico, em uma dissimulação eufemizada, que
ignora a violência nelas contida.
A ruptura dos laços construídos socialmente e o reconhecimento da sua
própria identidade permitem ao sujeito se tornar protagonista da sua história,
traduzindo essa vivência em um sentimento de satisfação por ser uma
experiência libertadora e transformadora.
3.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Nutrição constitui-se em um dos campos científicos de apoio terapêutico
com o objetivo de informar o que se deve comer para ter saúde e evitar as
doenças. Torna-se um desafio para o profissional da área promover saúde em um
cenário no qual se instalou uma profunda transição nutricional caracterizada,
principalmente, pela adoção do consumo de alimentos industrializados, com alto
teor energético e sódio e pobres em fibra e micronutrientes.
As práticas alimentares são resultado da construção da identidade social
do homem caracterizada por elementos culturais da realidade em que está
inserido e fortemente influenciada pelo meio externo.
Entende-se que esses processos sociais e culturais e o ato de se alimentar
são mais complexos do que a simples satisfação de uma necessidade fisiológica.
O capital simbólico formado no imaginário do sujeito, a partir dessa perspectiva,
cria uma representação da identidade individual e coletiva, forçando-o a se
adequar ao meio.
Os resultados deste estudo corroboram a literatura ao identificar os
benefícios advindos da intervenção nutricional pautada em uma abordagem que
leva em consideração não só a adequação das necessidades orgânicas
77
individuais, mas as expectativas do sujeito e os aspectos subjetivos e simbólicos
que os alimentos representam para cada indivíduo.
Os estímulos e a motivação que impulsionaram os participantes a
mudarem seus hábitos também encontram ressonância em outros estudos que
demonstraram o valor do apoio familiar e do trabalho em grupo durante o
processo de transição das práticas alimentares; o significado da autonomia ao
conduzir as mudanças na sua alimentação, principalmente no que se refere à
redução de quantidades e restrição de certos alimentos da sua preferência; e a
compreensão da necessidade de mudar e o reconhecimento da sua capacidade
de vencer obstáculos.
A valorização do processo educativo baseado principalmente no diálogo e
no referencial simbólico de cada um permite ao indivíduo encontrar um sentido
nas novas práticas alimentares e promove mudanças mais efetivas no seu
comportamento alimentar. A intervenção nutricional não deve reproduzir os
estereótipos de pacientes aderidos e não aderidos ao tratamento, e sim respeitar
a individualidade e complexidade da convivência com os agravos e restrições
dietéticas. Dessa forma, devem-se evitar as generalizações inadequadas ao
estabelecer mudanças nas práticas alimentares. Também é atribuição dos
profissionais da saúde estimular o indivíduo a praticar exercícios físicos para
melhorar a sua saúde; conscientizar a respeito de prover mudanças na cultura
que desestimula a atividade física; e criar uma nova perspectiva de práticas
realizadas com prazer e de uma maneira natural e rotineira, sem ser uma
obrigação e sem sacrifícios.
A partir dessa perspectiva, é possível propor uma estratégia de intervenção
em que seja respeitado o tempo de cada pessoa nesse processo, que é único e
singular. Também se torna relevante apostar na capacidade e na iniciativa do
indivíduo em encontrar recursos para lidar com as suas dificuldades a partir da
conscientização e do comprometimento com a mudança. A autonomia será
conquistada com o fortalecimento do espírito crítico em relação às regras sociais
e com o reconhecimento da sua própria identidade e riscos ao individualismo.
É importante ressaltar que o processo educativo não visa impor verdades
que devem ser simplesmente seguidas, mas criar uma relação de ajuda entre o
profissional e o paciente. Ele estabelece um vínculo com a pessoa para
possibilitar o diálogo, a problematização dos seus hábitos alimentares e a reflexão
78
acerca dos fatores que interferem no seu comportamento alimentar. Sobretudo,
deve-se estar atento para interpretar o que não é dito explicitamente, ou seja, a
mensagem que está subentendida na fala e também nas expressões corporais.
Dessa forma, é possível pactuar estratégias de enfrentamento dos problemas e
estimular o espírito crítico do indivíduo para que ele possa transformar a sua
própria realidade. A identificação de aspectos pedagógicos eficazes é
fundamental para o aumento da motivação e da adesão aos programas de
intervenção, no intuito de conciliar conhecimento e práticas pessoais promotoras
da saúde.
As análises dos depoimentos são referentes aos profissionais da saúde da
Maternidade Odete Valadares e expressam a sua realidade, o seu momento
histórico e temporal. Esses dados não são generalizáveis a toda população,
principalmente por se tratar de aspectos subjetivos do comportamento humano.
São necessárias análises pertinentes para aproveitamento desses resultados em
outras populações.
Acredita-se que ações humanizadoras no ambiente do trabalho contribuam
para a promoção da saúde do trabalhador, a fim de que ele se torne multiplicador
de condutas alimentares saudáveis, refletindo esse comportamento no meio
familiar e nas relações profissionais.
A intenção deste estudo foi captar e analisar as experiências individuais de
como se constrói a relação com o ato de se alimentar e como se realizam as
escolhas e transformação dos hábitos alimentares. Espera-se, com isso, ter
contribuído com reflexões que ajudem na condução de uma abordagem
nutricional adequada e estimulem a discussão e outras pesquisas sobre o tema.
Sobretudo, que promovam o diálogo interdisciplinar para produção do
conhecimento em educação nutricional, bem como o ensino, a formação e
capacitação dos profissionais da saúde.
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84
4 PRODUTO TÉCNICO: CARTILHA DE ORIENTAÇÃO NUTRICIONAL
Iara Lamas17 Matilde Meire Miranda Cadete28
RESUMO Trata-se da descrição do produto técnico organizado como proposta de material pedagógico para ser utilizado em intervenções nutricionais com o objetivo de contribuir para a promoção da saúde e no enfrentamento das dificuldades de mudança de hábito alimentar. Elaborou-se uma cartilha de orientação nutricional e um vídeo educativo com informações básicas sobre alimentação saudável. As informações foram retiradas do Guia Alimentar para a População Brasileira, publicado pelo Ministério da Saúde em 2014. Para a apresentação dos dados as recomendações do guia foram sintetizadas em forma de “Os dez passos para uma alimentação saudável”. O vídeo foi elaborado utilizando-se um aplicativo para criação de apresentações animadas, disponível na internet, e a cartilha traz as informações e ilustrações referentes ao conteúdo. Espera-se que a produção deste material possa auxiliar os profissionais no desafio de conscientizar as pessoas da importância de uma alimentação saudável e da necessidade de adoção de hábitos alimentares mais saudáveis. Palavras-chave: Guias alimentares. Vídeos educativos. Educação nutricional e alimentar. ABSTRACT It concerns the description of the technical product organized as an educational
material proposition to be used for nutritional interventions with the objective of
contribute to health promotion, and when facing the difficulties of feeding habits
change. A brochure with nutritional guidance was elaborated along with and
educational video that contained basic information about healthy feeding. The
information were taken from the Feeding Guide for the Brazilian Population
published by the Health Ministry in 2014. For the presentation of the data, the
guide recommendations were synthesized in a “Ten Steps For a Healthy Feeding”
process. The video was elaborated using an app for creating animated
presentations, available on the internet, and the brochure has information and
pictures referring to the content. It is expected that the production of this material
can aide professionals with the challenge of making people aware of the
importance of healthy feeding and the necessity of adopting healthier eating habits.
1
Mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, Belo Horizonte, MG. Nutricionista da Maternidade Odete Valadares (FHEMIG), Belo Horizonte, MG. 2
Orientadora e Professora Doutora do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, Belo Horizonte, MG.
85
Keywords: Food guide. Instructional videos. Food and nutrition education. 4.1 INTRODUÇÃO
Este capítulo trata da descrição do produto técnico organizado a partir do
referencial teórico da pesquisa empírica em congruência com as informações
contidas no Guia Alimentar para a População Brasileira, publicado pelo Ministério
da Saúde em 2014. A pesquisa teve como instrumento de coleta de dados a
entrevista semiestruturada e resultados analisados à luz da literatura. A pesquisa
foi realizada na Maternidade Odete Valadares (BH-MG), no período de 2009 a
2012, com profissionais da saúde que obtiveram êxito no programa de
reeducação alimentar. O objetivo foi analisar as estratégias e recursos utilizados
no enfrentamento das dificuldades em adotar hábitos alimentares mais saudáveis.
Com base na análise dos resultados acredita-se que a elaboração de uma
Cartilha de Orientação Nutricional e um Vídeo Educativo possa contribuir para a
promoção da saúde e educação nutricional como ferramentas de apoio em
intervenções nutricionais individuais e coletivas.
As transformações sociais, políticas e econômicas pelas quais o Brasil
passou nos últimos anos modificaram o estilo de vida da população. Como
consequência, observou-se rápida transição epidemiológica e nutricional
caracterizada por importantes mudanças no padrão de saúde e consumo
alimentar. O sobrepeso e obesidade já são uma realidade em 50% da população
brasileira, atingindo pessoas de todas as idades. A maior causa de morte no
Brasil é proveniente de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), que tem a
obesidade como um dos fatores de risco mais importantes. E para o
enfrentamento dessa situação, a necessidade de ampliar as ações para a
promoção da alimentação adequada e saudável é imprescindível. A Política
Nacional de Alimentação e Nutrição e a Política Nacional de Promoção da Saúde
expressam o compromisso de incentivar ações de apoio e proteção à saúde e o
direito à alimentação saudável para a população brasileira (BRASIL, 2010;
BRASIL, 2011a; BRASIL, 2011b; BRASIL, 2012; DUNCAN; SCHMIDT, 2011;
HAWKERS, 2007; KAC; SICHIERI; GIGANTE, 2007; PIMENTA, 2011).
Existe forte evidência na relação entre inadequação alimentar e o
aparecimento de DCNT. A literatura é rica nessa abordagem e esse panorama
86
torna a atuação do profissional nutricionista fundamental. O material pedagógico
informativo pode auxiliar o profissional nas intervenções nutricionais que visam à
mudança de hábito alimentar. Por isso, optou-se por um recurso simples, objetivo
e atraente, em formato de cartilha e vídeo. O material foi idealizado a partir das
informações contidas na segunda edição do Guia Alimentar para População
Brasileira (GAPB) publicada pelo Ministério da Saúde em outubro de 2014. Essa
segunda edição atualizada do guia substituiu a anterior, publicada em 2006,
quando se tornou um marco referencial para indivíduos, profissionais da saúde e
governo sobre a promoção da alimentação adequada e saudável. A publicação
também foi um importante auxílio na formulação de políticas públicas
direcionadas para as práticas alimentares saudáveis daquela época (BRASIL,
2014).
Da mesma forma, a segunda edição atualizada do guia apresenta as
diretrizes para uma alimentação saudável levando em consideração a realidade e
necessidade dos brasileiros. Fazendo um paralelo com os dados coletados na
pesquisa, encontra-se ressonância nas recomendações do guia e no longo
caminho que se tem a percorrer entre o discurso da política e a prática do
profissional da saúde diante do grande desafio de promover hábitos alimentares
mais saudáveis.
Essa edição aborda também os múltiplos determinantes das práticas
alimentares brasileiras, a complexidade e os desafios que envolvem a
conformação dos sistemas alimentares atuais, além de reforçar a
“institucionalização da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e o
reconhecimento e inclusão do direito à alimentação como um dos direitos sociais
na Constituição Federal” (BRASIL, 2014, p. 8).
A elaboração do guia teve a contribuição de consulta pública realizada com
diversos segmentos da população brasileira e procurou-se empregar uma
linguagem simples para que todos os cidadãos pudessem utilizá-lo. Dessa forma,
o Ministério da Saúde aposta na sua ampla divulgação, principalmente por parte
dos profissionais da saúde, para que seu conteúdo seja compreendido por todos.
Esse contexto suscita reflexões acerca da capacitação dos profissionais de
saúde para o enfrentamento dos desafios de levar o conhecimento para os
indivíduos e promover transformações em suas vidas. Os profissionais de saúde,
em específico os nutricionistas, têm a percepção e o conhecimento das
87
dimensões objetivas e, principalmente, subjetivas que envolvem o ato de comer?
E também das implicações desses aspectos na dificuldade em mudar hábitos
alimentares? Eles são estimulados a compreender os mecanismos que cada
indivíduo utiliza no enfrentamento das limitações e desafios impostos pelas DCNT
e excesso de peso?
Assim, esses produtos objetivaram contribuir como um instrumento
informativo de apoio em educação nutricional, com vistas ao enfrentamento das
dificuldades de mudança de hábito alimentar e para a promoção da saúde. E, de
certa forma, na divulgação das informações contidas na 2ª edição do Guia
Alimentar para População Brasileira (GAPB).
Para melhor compreensão dos produtos técnicos, descrevem-se, a seguir,
o conteúdo e os princípios nos quais o GNPB baseou as suas informações. Logo
após, explicita-se o formato em que foram desenvolvidos a cartilha e o vídeo
educativos que apresentam os dados de forma sintética, evidenciando “Os dez
passos para uma alimentação adequada e saudável” descritos no guia.
4.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO PRODUTO TÉCNICO
A revisão bibliográfica realizada para compor o referencial teórico da
pesquisa e as informações obtidas a partir de entrevistas sinalizaram a
importância de uma abordagem adequada nas intervenções nutricionais que
visam à mudança de hábito alimentar. Destaca-se a necessidade de considerar
os aspectos subjetivos do sujeito e a realidade social em que ele está inserido.
Daí, a relevância em utilizar um recurso metodológico que facilite a linguagem e a
intermediação do conhecimento entre os sujeitos, o profissional nutricionista e o
indivíduo, para alcançar os objetivos propostos (BRASIL, 2014; FRANÇA et al.,
2012; MARQUES; OLIVEIRA, 2005; SANTOS, 2005; SANTOS, 2013).
Diante do desafio de propor alterações nos hábitos alimentares, é
primordial que se leve em conta a integralidade e autonomia do indivíduo e a
valorização do processo educativo. Este deve ser baseado, principalmente, no
diálogo e no referencial simbólico de cada um, permitindo ao indivíduo encontrar
um sentido nas novas práticas alimentares. A partir dessa perspectiva é possível
propor uma estratégia de intervenção única e singular, respeitando o tempo e os
88
recursos de cada pessoa nesse processo de mudança (MARQUES; GUTIERREZ,
2009; SANTOS, 2013).
Optou-se pela elaboração da cartilha, por se tratar de um material
pedagógico simples, de fácil reprodução, que agrupa as informações de forma
sintética e objetiva, pode ser facilmente reproduzida e serve como consulta
permanente para o indivíduo e familiares. O vídeo depende de recursos de
multimídia para ser reproduzido, também tem informações objetivas, imagens e
áudio que atraem a atenção do receptor, facilitando a assimilação do conteúdo.
Torna-se relevante conhecer o formato do GAPB, de onde foram retiradas
as informações, para melhor compreensão da proposta da Cartilha de Orientação
Nutricional e do Vídeo Educativo. A descrição do guia se dá sempre dialogando
com os autores do referencial teórico da pesquisa, como forma de corroborar as
informações apresentadas e aspectos discutidos anteriormente.
O GAPB é apresentado em cinco capítulos que descrevem os princípios
que nortearam a sua elaboração; as recomendações gerais sobre a escolha dos
alimentos; as orientações de como combinar os alimentos na forma de refeições;
orientações sobre o ato de comer e a comensalidade; e, finalmente, os fatores
que podem ser obstáculos para a adesão das pessoas às recomendações do
guia.
O GAPB sintetiza todas as recomendações ao final da edição, em forma de
“Os dez passos para uma alimentação adequada e saudável”, e apresenta,
também, sugestões de leituras para aprofundar os temas abordados.
Os princípios que orientaram a elaboração do GAPB citados no capítulo 2
são:
Alimentação é mais do que a ingestão de nutrientes. O alimento e a
alimentação dizem respeito à ingestão de nutrientes, aos alimentos que os
contêm, como os alimentos podem ser combinados entre si e preparados, às
características do ato de comer e às dimensões culturais e sociais das práticas
alimentares. Considera-se que todos esses aspectos influenciam a saúde e o
bem-estar. Carvalho, Luz e Prado (2011) e Maciel (2005) concordam com a
afirmativa de que, além da necessidade vital de se alimentar os aspectos
socioeconômicos e culturais, implicam atribuição de significados ao ato de comer
e são responsáveis pelos determinantes das condutas alimentares.
89
Alimentação adequada e saudável deriva de sistema alimentar social
e ambientalmente sustentável. “Recomendações sobre alimentação devem
levar em conta o impacto das formas de produção e distribuição dos alimentos
sobre a justiça social e a integridade do ambiente” (BRASIL, 2014, p. 19).
Guias alimentares ampliam a autonomia nas escolhas alimentares. “O
acesso a informações confiáveis [...] contribui para que pessoas, famílias e
comunidades ampliem a autonomia para fazer escolhas alimentares e para que
exijam o cumprimento do direito humano à alimentação adequada e saudável”
(BRASIL, 2014, p. 21). Freire (1996) refere-se à autonomia do sujeito como um
processo de tomada de decisão e de humanização que vai sendo construído a
partir das experiências vividas ao longo da vida. A autonomia torna-se uma
experiência de liberdade quando o profissional é capaz de ajudar o indivíduo a se
empoderar do conhecimento para se tornar sujeito da sua própria história.
Recomendações sobre alimentação devem estar em sintonia com seu
tempo. ”Recomendações feitas por guias alimentares devem levar em conta o
cenário da evolução da alimentação e das condições de saúde da população”
(BRASIL, 2014, p. 17).
Diferentes saberes geram o conhecimento para a formulação de guias
alimentares. As recomendações sobre alimentação são geradas por diferentes
saberes, em virtude das suas várias dimensões e da complexa relação entre
essas dimensões e a saúde e o bem-estar das pessoas.
Freitas, Minayo e Fontes (2011, p. 34) ilustram as afirmativas dos dois
últimos princípios com o conceito de habitus alimentar:
[...] adoção de um tipo de prática que tem a ver com costumes estabelecidos tradicionalmente e que atravessam gerações, com as possibilidades reais de aquisição dos alimentos e com uma sociabilidade construída tanto no âmbito familiar e comunitário como compartilhada e atualizada pelas outras dimensões da vida social. A partir do exemplo citado, pode-se concluir que o habitus alimentar pode ser compreendido através da linguagem, das atitudes e práticas e se traduz em ritos, valores, mitos, crenças e tabus.
A cartilha apresenta-se como uma forma direta de comunicação e
transferência de conteúdo e utiliza recursos da metacomunicação para dar ênfase
ao que queremos informar e como queremos ser interpretados, sobretudo para
que o receptor receba a mensagem da forma mais clara e original.
90
O capítulo 2 trata das recomendações gerais sobre a escolha dos
alimentos para adequação nutricional e cultural do indivíduo, ao mesmo tempo em
que promove sistemas de alimentação social e ambientalmente sustentáveis. As
recomendações enfatizam que a forma de processamento pelo qual o alimento
passa antes de ser adquirido, preparado ou consumido pode influenciar o perfil
dos nutrientes, além de causar impactos sociais e ambientais.
O guia descreve quatro categorias de alimentos de acordo com o
processamento empregado na sua produção.
1- A primeira categoria reúne alimentos in natura ou minimamente
processados. Esses alimentos são essencialmente partes de plantas ou de
animais. Não são processados e não sofrem alterações após sua colheita
(alimentos in natura). Os alimentos minimamente processados são “submetidos a
limpeza, remoção de partes não comestíveis ou indesejáveis, porcionamento,
moagem, secagem, pasteurização, refrigeração, congelamento e processos
similares que não envolvam agregação de sal, açúcar, óleos, gorduras ou outras
substâncias ao alimento original” (BRASIL, 2014, p. 29).
De acordo com o guia, são exemplos de alguns alimentos in natura ou
minimamente processados: legumes, verduras e frutas in natura ou embalados,
porcionados, refrigerados ou congelados; arroz e outros cereais; feijão e outras
leguminosas; raízes e tubérculos; cogumelos congelados ou secos; frutas secas e
sucos de frutas sem adição de açúcar ou outras substâncias; castanhas e nozes
sem sal ou açúcar; especiarias e ervas frescas ou secas; carnes, aves e peixes
frescos, resfriados ou congelados; leite fresco ou pasteurizado, iogurte (sem
adição de açúcar); ovos; chás, cafés e água.
Vários estudos demonstram a relação entre o aparecimento de doenças
chamadas crônicas não transmissíveis (DCNT) e hábitos alimentares não
saudáveis, caracterizados pela diminuição do consumo de frutas, legumes,
verduras e o aumento no consumo de alimentos com alto teor calórico (açúcar e
gorduras) e ricos em sódio (BRASIL, 2011b; 2012; DUNCAN; SCHMIDT, 2011).
Por essa razão, o guia reforça a importância e justifica as razões biológicas e
culturais, sociais e ambientais em adotar uma alimentação bem variada e
baseada em alimentos predominantemente de origem vegetal para que ela seja
nutricionalmente equilibrada. A variedade, neste caso, significa alimentos de
91
todos os tipos, incluindo variedades dentro de cada grupo (diferentes grãos,
cereais, diferentes verduras, legumes e frutas).
2- A segunda categoria de alimentos diz respeito aos óleos, gorduras,
sal e açúcar. A orientação é “utilizar óleos, gorduras, sal e açúcar em pequenas
quantidades ao temperar e cozinhar alimentos e criar preparações culinárias.
Desde que utilizados com moderação [...] óleos, gorduras, sal e açúcar
contribuem para diversificar e tornar mais saborosa a alimentação” sem
comprometer o seu valor nutricional. Óleos, gorduras e açúcar são alimentos
muito calóricos e, além disso, óleos e gorduras, sal e açúcar têm alta
concentração de nutrientes, como gorduras saturadas, sódio e açúcar,
respectivamente, cujo consumo pode ser prejudicial à saúde. “A ingestão
excessiva de sódio e de gorduras saturadas aumenta o risco de doenças do
coração, enquanto o consumo excessivo de açúcar aumenta o risco de cárie
dental, obesidade e de várias outras doenças crônicas” (BRASIL, 2012; BRASIL,
2014, p. 33-35; DUNCAN; SCHMIDT, 2011; KAC; SICHIERI; GIGANTE, 2007).
3- A terceira categoria de alimentos constitui-se de produtos prontos
para consumo processados. “Eles são fabricados pela indústria com a adição
de sal ou açúcar [...] para torná-los duráveis” e mais palatáveis e atraentes. “São
produtos derivados diretamente de alimentos e são reconhecidos como versões
dos alimentos originais”. Esses alimentos são, em geral, preservados em
salmoura ou em solução de sal e vinagre (cenoura, pepino, ervilhas, palmito,
cebola, couve-flor); frutas preservadas em açúcar (compotas de frutas e frutas
cristalizadas); carnes salgadas e eventualmente defumadas como presunto,
toucinho e carne seca; peixes conservados em sal e óleo e, eventualmente
defumados; queijos; e pães. “Embora produtos processados mantenham a
identidade básica e a maioria dos nutrientes do alimento original, as técnicas e os
métodos de processamento utilizados na fabricação alteram de modo
desfavorável a composição nutricional”. O sal, o açúcar e o óleo incorporam-se
aos alimentos, alterando sua natureza e aumentando o teor de nutrientes
associados a doenças cardiovasculares. O guia recomenda também que se limite
a utilização de produtos alimentícios prontos para consumo processados
(BRASIL, 2014, p. 38; COSTA; MACHADO, 2010; JACKIX, 2013).
92
4- A terceira categoria é representada pelos produtos prontos para
consumo ultraprocessados. “Evite alimentos ultraprocessados”. A fabricação
desses produtos envolve várias etapas de processamento e acréscimo de muitos
ingredientes e por isso os alimentos ultraprocessados são nutricionalmente
desbalanceados. “Por conta de sua formulação e apresentação, tendem a ser
consumidos em excesso e a substituir alimentos in natura ou minimamente
processados e preparações culinárias”, além de serem alimentos muito calóricos.
“As formas de produção, distribuição, comercialização e consumo afetam de
modo desfavorável a cultura, a vida social e o meio ambiente”. São exemplos de
produtos prontos para o consumo e ultraprocessados, segundo o guia, os
biscoitos recheados, salgadinhos “de pacote”, refrigerantes e macarrão
“instantâneo” (BRASIL, 2014, p. 39; LEVY et al., 2012).
A regra de ouro do Guia Alimentar para a população brasileira é: “prefira
sempre alimentos in natura ou minimamente processados e preparações
culinárias a alimentos ultraprocessados” (BRASIL, 2014, p. 47).
O capítulo 3 fornece orientações específicas para a população brasileira
sobre como combinar alimentos na forma de refeições.
A alimentação saudável e adequada à realidade e costumes dos brasileiros
deve basear-se na combinação de alimentos que são tradicionais na sua cultura
alimentar (FREITAS; MINAYO; FONTES, 2011). O guia sugere que a mistura de
alimentos como feijões, cereais, raízes, tubérculos, farinhas, macarrão, legumes,
verduras, frutas, castanhas, leite, carnes, ovos, café, chá e água permite criar
uma infinidade de alternativas saudáveis, diversificadas e saborosas para as
refeições e os lanches.
Para assegurar a qualidade da alimentação e evitar riscos de
contaminação por micro-organismos, os alimentos devem ser escolhidos,
conservados e manipulados de forma correta.
O guia também descreve as principais características dos alimentos de
cada grupo específico, de acordo com os nutrientes que eles fornecem.
E recomenda que “o grupo dos feijões, assim como todas as demais
leguminosas, são fontes de proteína, fibras, vitaminas do complexo B e minerais,
como ferro, zinco e cálcio. O alto teor de fibras e a quantidade moderada de
93
calorias por grama conferem a esses alimentos alto poder de saciedade”
(BRASIL, 2014, p. 67).
O arroz é o principal representante do grupo dos cereais na alimentação do
brasileiro. “Arroz, milho, trigo e todos os cereais são fontes importantes de
carboidratos, fibras, vitaminas (principalmente do complexo B) e minerais.
Combinados ao feijão ou outra leguminosa, os cereais constituem também fonte
de proteína de excelente qualidade”. Cereais polidos como o arroz branco e
farinhas de trigo apresentam menos quantidade de fibras e micronutrientes. Por
essa razão, é recomendada a versão integral desses alimentos (BRASIL, 2014, p.
70).
A diversidade de legumes e verduras é imensa no Brasil e são
comercializados em quase todos os meses em todas as regiões do país. Os
produtos locais e no período de safra apresentam baixo preço e mais qualidade e
sabor. Legumes e verduras podem ser preparados de diversas maneiras, são
opções saudáveis e excelentes fontes de várias vitaminas e minerais. “Além de
serem fontes de fibras, fornecem muitos nutrientes em uma quantidade
relativamente pequena de calorias, características que os tornam ideais para a
prevenção da obesidade e das DCNTs”. Por essas propriedades nutricionais e
versatilidade culinária, constitui-se em boa alternativa para diminuir o consumo
excessivo de carnes vermelhas. O grupo das raízes e tubérculos é opção de
substituição do arroz ou pão para variar as preparações (BRASIL, 2011b;
BRASIL, 2012; BRASIL, 2014, p. 73-75).
O Brasil também possui grande variedade de frutas que, igualmente às
verduras e legumes, apresentam preço baixo e mais sabor quando consumidos
no período da safra e cultivados em localidades próximas. “Elas podem ser
consumidas frescas ou secas (desidratadas), como parte das refeições principais”
ou como pequenas refeições. Assim como os legumes e verduras, “as frutas são
alimentos muito saudáveis e excelentes fontes de fibras, de vitaminas e minerais
e de vários compostos que contribuem para a prevenção de muitas doenças”
(BRASIL, 2011b; BRASIL, 2012; BRASIL, 2014, p. 76-77).
As frutas oleaginosas incluem vários tipos de castanhas, nozes, amêndoas
e amendoim. Elas “têm vários usos culinários, podendo ser usadas como
ingredientes de saladas, molhos e várias preparações culinárias salgadas e
doces, e também ser adicionadas a saladas de frutas”. Por serem práticas de
94
transportar e armazenar, são excelentes opções para os lanches entre as
refeições. São ricas em minerais, vitaminas, fibras e gorduras saudáveis
(gorduras insaturadas) e, “como frutas e legumes e verduras, contêm compostos
antioxidantes que previnem várias doenças” (BRASIL, 2014, p. 78; LEVY et al.,
2012).
O grupo dos laticínios inclui alimentos minimamente processados, como
leite, coalhadas e iogurtes naturais; e alimentos processados, como queijo. São
fontes de proteínas, vitamina A e, principalmente, cálcio. A gordura dos laticínios
é predominantemente saturada (não saudável), por isso a versão desnatada ou
semidesnatada pode ser mais adequada para adultos. “Os queijos, como todos os
alimentos processados, devem ser consumidos sempre em pequenas
quantidades”, pois são produtos calóricos e com grande quantidade de sódio.
“Bebidas lácteas e iogurtes adoçados e adicionados de corantes e saborizantes
são alimentos ultraprocessados e, como tal, devem ser evitados” (BRASIL, 2014,
p. 79-80).
Carnes de vários tipos e ovos são muito valorizados na alimentação
brasileira, em face do sabor que agregam à refeição. As carnes vermelhas são
fontes de proteína de alto valor biológico e também em ferro, zinco e vitamina
B12. Normalmente são ricas em gorduras, principalmente as saturadas que, se
consumidas em excesso, aumentam o risco de doenças cardiovasculares e de
outras DCNTs (BRASIL, 2011b; BRASIL, 2012; BRASIL, 2014, p. 82; DUNCAN;
SCHMIDT, 2011).
As carnes de aves também têm proteínas de boa qualidade, além de
minerais e vitaminas, porém a quantidade de gorduras saturadas é elevada. Estas
ficam concentradas na pele das aves, por isso “recomenda-se que as carnes de
aves sejam consumidas sem a pele” (BRASIL, 2014, p. 82).
“O grupo de pescados inclui peixes (de água doce e de água salgada),
crustáceos (camarão, caranguejos e siris) e moluscos (polvos, lulas, ostras,
mariscos)”. O Brasil possui extensa área litorânea e muitos rios de grande porte,
porém o consumo de peixes ainda é muito reduzido e os preços são altos em
relação às outras carnes. “Os peixes são ricos em proteína de alta qualidade e em
muitas vitaminas e minerais. Apresentam menor conteúdo de gorduras e, em
particular, maior proporção de gorduras saudáveis (gorduras insaturadas),
95
portanto, são excelentes substitutos para as carnes vermelhas” (BRASIL, 2011a;
BRASIL, 2014, p. 83).
Os ovos são alimentos acessíveis e baratos. “São ricos em proteínas de
alta qualidade, em minerais e em vitaminas, especialmente as do complexo B, e
também são considerados bons substitutos para as carnes vermelhas” (BRASIL,
2014, p. 84).
A água é essencial para a manutenção da vida. Deve-se “estar atento aos
primeiros sinais de sede e satisfazer de pronto a necessidade de água sinalizada
por nosso organismo”. A água que ingerimos, assim como a água utilizada nas
preparações dos alimentos, deve ser potável, livre de micro-organismos e de
substâncias químicas. A “alimentação baseada em alimentos naturais e
minimamente processados fornece cerca de metade da água que precisamos
consumir diariamente, o que já não acontece com alimentos processados e
ultraprocessados” (BRASIL, 2014, p. 87).
O capítulo 4 aborda aspectos sobre o ato de comer e a comensalidade
cujas dimensões influenciam, entre outros aspectos, o aproveitamento dos
alimentos consumidos e o prazer proporcionado pela alimentação. Nessa
perspectiva, entende-se a comensalidade como a maneira com que os indivíduos
vivenciam a alimentação em relação à sua importância e ao tempo que dedicam
ao ato de comer, envolvendo também o ambiente onde se alimentam e a partilha
de refeições (BRASIL, 2014; CARVALHO; LUZ; PRADO, 2011). Três orientações
básicas sobre a comensalidade são apresentadas pelo guia:
a) Comer com regularidade e com atenção. Recomenda-se fazer as
refeições, preferencialmente, nos mesmos horários, evitar “beliscar” nos
intervalos entre as refeições, comer devagar e sempre apreciando o que
está comendo, reservar um momento tranquilo para realizar as refeições,
sem se envolver em outra atividade paralela.
b) Comer em ambientes apropriados. “Prefira alimentar-se em locais
limpos, confortáveis e tranquilos e onde não haja estímulos para o
consumo de grandes quantidades de alimentos”. Os restaurantes fast-food,
como o próprio nome diz, são programados para a realização de refeições
rápidas. Dificilmente oferecem alimentos in natura ou minimamente
processados e sutilmente nos induzem a comer em maior quantidade, seja
96
pela combinação dos alimentos ou pelas promoções. Portanto, são lugares
particularmente inapropriados para comer (BRASIL, 2014, p. 96; SANTOS,
2010).
c) Comer em companhia, sempre que possível. “Sempre que possível
prefira comer em companhia de familiares, amigos, colegas de trabalho ou
escola. Compartilhe também as atividades domésticas que antecedem ou
sucedem as refeições”, como o planejamento, aquisição, preparo e limpeza
de todo o material utilizado. Essa prática proporciona o convívio familiar,
promovendo experiências afetivas entre seus membros. “Atualmente, no
mundo inteiro, culturas alimentares tradicionais, baseadas no consumo de
alimentos in natura [...] e em refeições compartilhadas, vêm perdendo
espaço e valor, por isso, torna-se cada vez mais importante a preservação
das nossas melhores tradições”. É característica na rotina das pessoas a
falta de tempo para realizar todas as atividades profissionais e domésticas.
Por isso, dividir responsabilidades é essencial para evitar sobrecarga de
trabalho para alguns e o desestímulo para executar essa atividade
(BRASIL, 2014, p. 96-97; FERREIRA, 2010).
O capítulo 5 trata da compreensão e superação de obstáculos para a
adoção das recomendações desse guia. “Foi dada grande importância à
viabilidade das proposições, de modo que o recomendado fosse efetivamente
possível de ser adotado. Neste sentido, com frequência, o guia emprega termos
como ‘prefira’ e não ‘faça’ e ‘na maior parte das vezes’ em vez de ‘sempre’”. Evita
também quantificar as porções diárias dos alimentos devido às inúmeras
possibilidades de combinações saudáveis (BRASIL, 2014, p. 103; SANTOS,
2010).
A superação dos obstáculos vai ser mais ou menos difícil, dependendo da
sua natureza, dos recursos de que as pessoas dispõem ou do meio ambiente
onde vivem. Em muitos casos as pessoas precisarão refletir sobre a importância
da alimentação em suas vidas e valorizar mais o ato de comer. Mas, em outros, “a
remoção dos obstáculos exigirá políticas públicas e ações regulatórias de Estado
que tornem o ambiente mais propício para a adoção das recomendações
propostas” (BRASIL, 2014, p. 104). Nesse caso, a ação do Estado é
imprescindível, por isso o guia ressalta tanto a necessidade de as pessoas
97
assumirem um papel mais participativo socialmente, reivindicando, em todas as
esferas, o seu direito a uma alimentação adequada e saudável.
Uma das esferas que mais influenciam atualmente o comportamento
alimentar é a publicidade (GOMES; CASTRO; MONTEIRO, 2010). Santos (2003)
contribui com a reflexão acerca da influência que a mídia exerce sobre o
indivíduo, impelindo-o a seguir regras de comportamento social ditadas pelos
interesses do modelo de consumo dominante. Essa força é sutilmente expressa
em forma de valores e crenças que vão sendo construídas ao longo do tempo, de
forma que o indivíduo realmente acredita que é necessário manter o modelo
padrão de comportamento estabelecido. Dessa forma, ele segue consumindo o
que foi sugerido, agregando suposto valor ao seu comportamento, favorecendo e
mantendo a lógica do mercado. Isso se aplica também ao alimento e à forma de
se alimentar.
Os obstáculos para a adoção das recomendações identificados pelo guia
são: informação, oferta, custo, habilidades culinárias, tempo na organização do
trabalho e publicidade. Atualmente, a quantidade de informação sobre
alimentação é muito grande e a forma como são veiculadas é bastante
diversificada, atingindo cada vez mais um número maior de pessoas, porém, nem
todas são confiáveis. Os alimentos ultraprocessados, por não serem perecíveis,
conseguem estar em todos os lugares possíveis de comercialização, dão a falsa
impressão de baixo custo e estão sempre em promoção ou com descontos. A
propaganda investe forte nesse segmento e exerce grande influência no
consumidor, principalmente crianças e adolescentes. Apesar de parecer o
contrário, “o valor da alimentação baseada em alimentos naturais e minimamente
processados ainda é menor no Brasil do que a baseada em alimentos
ultraprocessados”. E devido à falta crônica de tempo das pessoas, que se tornou
uma realidade atualmente, a transmissão de habilidades culinárias entre gerações
descaracterizou-se e favoreceu o consumo de alimentos ultraprocessados. Adotar
uma alimentação saudável significa investir mais tempo no seu planejamento,
execução e manutenção da regularidade de horários das refeições (BRASIL,
2014, p. 110; FERREIRA, 2010; GOMES; CASTRO; MONTEIRO, 2010;
SANTOS, 2010).
A discussão sobre os obstáculos destacados pelo guia sugere que as
pessoas assumam postura de cuidado pessoal com a saúde, ao mesmo tempo
98
em que as convoca para uma participação social mais cidadã, reivindicando o
direito de uma alimentação mais saudável.
Ao final da edição o GNPB apresenta uma síntese de todas as
recomendações em forma de “Os dez passos para uma alimentação adequada e
saudável”, descritos a seguir:
1- Fazer de alimentos in natura ou minimamente processados a base da
alimentação.
2- Utilizar óleos, gorduras, sal e açúcar em pequenas quantidades ao
temperar e cozinhar alimentos e criar preparações culinárias.
3- Limitar o consumo de alimentos processados.
4- Evitar o consumo de alimentos ultraprocessados.
5- Comer com regularidade e atenção em ambientes apropriados e, sempre
que possível, em companhia.
6- Fazer compras em locais que ofertem variedades de alimentos in natura ou
minimamente processados.
7- Desenvolver, exercitar e partilhar habilidades culinárias.
8- Planejar o uso do tempo para dar à alimentação o espaço que ela merece.
9- Dar preferência, quando fora de casa, a locais que servem refeições feitas
na hora.
10- Ser crítico quanto a informações, orientações e mensagens sobre
alimentação veiculadas em propagandas comerciais.
Apresentam-se a cartilha e o vídeo elaborados com as recomendações dos
“dez passos para uma alimentação adequada e saudável”.
4.3 DESCRIÇÃO DO PRODUTO TÉCNICO
A cartilha e o vídeo educativo foram construídos a partir das informações
contidas no Guia Alimentar para a População Brasileira (2014), evidenciando
todas as recomendações do guia sintetizadas na forma de “Os dez passos para
uma alimentação saudável”.
O objetivo das cartilhas é apresentar o conhecimento científico em
linguagem simples e didática que possibilite a qualquer pessoa, de qualquer nível
99
de escolaridade, compreender as informações e fazer uso delas em seu
benefício, o que favorece o próprio leitor e também os seus familiares. É possível
guardar as informações para serem consultadas posteriormente, além da
vantagem de ser um material de baixo custo (BARROS et al., 2012; ECHER,
2005; TORRES et al., 2009).
A construção de uma cartilha se assenta em alguns princípios norteadores:
define-se o tema a ser abordado; faz-se um recorte das informações mais
relevantes; apresenta-se o conteúdo em frases curtas, claras e objetivas; utiliza-
se a ilustração como recurso didático atrativo que auxilia a assimilação das
informações; e adéqua-se o material pedagógico ao público-alvo com o objetivo
de facilitar o processo de ensino e aprendizagem. É importante, também,
promover a relação dialógica entre o profissional e o sujeito para a construção do
conhecimento, levando-se em conta os diversos saberes envolvidos no cuidado à
saúde, baseada em uma ação multidisciplinar. A proposta de encorajar a reflexão
sobre o tema escolhido parece ser uma boa estratégia para despertar a
curiosidade, facilitar a adesão às mudanças, o desenvolvimento de habilidades e
a conquista de autonomia (BARROS et al., 2012, p. 97; ECHER, 2005; TORRES
et al., 2005).
A cartilha apresentada como produto técnico da dissertação (APÊNDICE F)
foi organizada destacando-se “Os dez passos para uma alimentação saudável”.
Apesar desse conteúdo já ter sido publicado pelo Ministério da Saúde, é
recomendado que toda cartilha seja validada por profissionais especializados na
área e também por usuários, com o objetivo de garantir a clareza do conteúdo
exposto, a adequação aos diferentes públicos e a proposta efetiva de
transferência de conhecimento (ECHER, 2005).
Para a elaboração do vídeo educativo, de aproximadamente três minutos,
utilizou-se um aplicativo denominado Powtoon, que é disponibilizado
gratuitamente na internet, destinado a estudantes, educadores e profissionais de
marketing, de maneira geral. Esse programa é uma ferramenta que permite a
criação de apresentações e vídeos de animação, vídeos de divulgação, spots
promocionais, para segmentos de educação e outros conteúdos. Ele pode ser
utilizado como alternativa para os programas de apresentação de slides
multimídia, como, por exemplo, o Power Point. A diferença é que esse aplicativo
tem a opção do modo de apresentação, com pausa entre os slides e modo vídeo
100
com vários formatos, efeitos, animações predefinidas, recursos para gravação de
voz ou importação de outros tipos de som e imagens, além de diversos
personagens que podem ser usados em uma infinidade de aplicações de acordo
com o objetivo e a criatividade do usuário.
O aplicativo PowToon está disponível na plataforma on-line,
www.powtoon.com, em uma versão gratuita que permite a criação de vídeos de
até cinco minutos e em outras versões pagas que disponibilizam mais opções de
recursos tecnológicos para atender a empresas e profissionais da área. Os vídeos
podem ser visualizados on-line no site Powtoon ou transferidos para
computadores particulares ou para o site de compartilhamento de vídeos,
YouTube.
O vídeo produzido como produto técnico desta dissertação está disponível
em: https://www.youtube.com/watch?v=pdrDDrjS1QI. E os slides referentes ao
vídeo são apresentados no APÊNDICE G.
A expectativa é de que a produção desse material pedagógico contribua
como ferramenta de apoio para ações de promoção da saúde e intervenções
nutricionais que visam à mudança de hábito alimentar e adesão a uma
alimentação saudável. Espera-se, também, que estimule a iniciativa e criatividade
do profissional da saúde no desenvolvimento de materiais pedagógicos.
4.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os produtos técnicos apresentados neste trabalho constituem-se de uma
cartilha de orientação nutricional e um vídeo educativo elaborados como material
pedagógico para serem utilizados como recurso auxiliar nas intervenções
nutricionais. Trata-se de uma proposta simples, que organiza as informações de
forma sintética, objetiva e ilustrada, que pode ser facilmente reproduzida e serve
de consulta permanente para o indivíduo e familiares. O vídeo de animação atrai
o interesse do receptor, pelo recurso de áudio e imagem, facilitando a assimilação
do conteúdo.
As informações retiradas do GAPB para compor a cartilha são muito
apropriadas, pois são baseadas na realidade e nas necessidades dos brasileiros.
Ancoram-se em princípios que consideram os aspectos subjetivos referentes ao
ato de comer, defendem os sistemas alimentares ambiental e socialmente
101
sustentáveis e, sobretudo, são apresentadas em forma de recomendações, são
sugestivas e não impositivas. Esclarecem também sobre os processos pelos
quais os alimentos são submetidos para a sua industrialização e justificam o
porquê de não consumi-los. Propõem possíveis soluções individuais e coletivas
para aumentar a adesão às recomendações e a todo o momento convocam o
sujeito a assumir uma postura mais participativa e cidadã.
Acredita-se que o conhecimento é elemento fundamental para a
conscientização e, a partir desta, é possível ocorrerem mudanças que
efetivamente vão causar transformações na vida do sujeito. A conscientização é o
primeiro passo para avançar nesse sentido. A mobilização é necessária para
possibilitar a mudança no comportamento individual e coletivo. A vontade política
e o envolvimento dos órgãos competentes e responsáveis pela execução das
mudanças institucionalizáveis são fundamentais para promover esse
desdobramento na concepção da educação alimentar, da cadeia produtiva, de
distribuição, comercialização, preparação e consumo dos alimentos. As agências
regulatórias e de proteção ao consumidor são de extrema importância para a
viabilidade das proposições do guia.
Diante do desafio de propor alterações nos hábitos alimentares da
população, a atuação do profissional nutricionista é fundamental e os recursos
pedagógicos são grandes aliados nas intervenções nutricionais que visam à
mudança de hábito. Acredita-se que a integralidade e a autonomia do indivíduo
devem ser levadas em consideração, bem como a valorização do processo
educativo que almeja a adesão a uma alimentação saudável. A partir dessa
perspectiva, espera-se conseguir mais êxito na proposição de uma estratégia de
intervenção única e singular, respeitando o tempo e os recursos de cada pessoa
nesse processo de mudança.
REFERÊNCIAS BARROS, E. J. L. et al. Gerontotecnologia educativa voltada ao idoso estomizado à luz da complexidade. Revista Gaúcha de Enfermagem, Porto Alegre, v. 33, n. 2, p. 95-101, jun, 2012.
102
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105
APÊNDICE F - CARTILHA DE ORIENTAÇÃO NUTRICIONAL
CARTILHA DE ORIENTAÇÃO NUTRICIONAL
Cartilha
Instrucional
CARTILHA DE ORIENTAÇÃO NUTRICIONAL
Iara Lamas
Matilde Meire Miranda Cadete (Orientadora)
106
Cartilha Instrucional
Iara Lamas19
Matilde Meire Miranda Cadete210
Cartilha de orientação nutricional baseada nas informações
contidas no Guia Alimentar para a População Brasileira 2014
Belo Horizonte
Janeiro/2015
1
Mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, Belo Horizonte, MG. Nutricionista da Maternidade Odete Valadares (FHEMIG), Belo Horizonte, MG. 2
Orientadora e Professora Doutora do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UMA, Belo Horizonte, MG.
107
APRESENTAÇÃO
Esta cartilha é um produto técnico proveniente da dissertação intitulada:
“Reeducação alimentar: um estudo com ênfase nos aspectos subjetivos
relacionados à mudança de hábito”, apresentada à banca de avaliação do
Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do
Centro Universitário UNA Belo Horizonte - Minas Gerais, como requisito parcial
para obtenção do título de mestre.
A cartilha foi elaborada pela mestranda Iara Lamas, nutricionista da
Maternidade Odete Valadares da rede FHEMIG em BH, MG. A orientadora do
trabalho foi a Professora Dr.ª Matilde Meire Miranda Cadete, professora do
Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local, do
Centro Universitário UNA em BH, MG.
INTRODUÇÃO
A cartilha de orientação nutricional foi idealizada a partir das informações
contidas na 2ª edição do Guia Alimentar para População Brasileira publicado pelo
Ministério da Saúde em outubro de 2014.
Este material tem como objetivo ser utilizado como ferramenta de apoio em
ações de promoção da saúde e educação nutricional; nas intervenções
nutricionais que visam ao enfrentamento das dificuldades de mudança de hábito
alimentar; e na divulgação das informações contidas na 2ª edição do Guia
Alimentar para a População Brasileira.
108
SUMÁRIO
1 Guia alimentar para a população brasileira......................................................108
2 Cartilha de orientação nutricional.....................................................................110
Referências..........................................................................................................116
Guia alimentar para a população brasileira
O Guia Alimentar para a População Brasileira (GAPB) publicado pelo
Ministério da Saúde em outubro de 2014 substituiu a primeira edição que em
2006 tornou-se um marco referencial para indivíduos, profissionais da saúde e
governo para a promoção da alimentação adequada e saudável e formulação de
políticas públicas.
O guia apresenta as diretrizes para uma alimentação saudável levando em
consideração a realidade e necessidade dos brasileiros; aborda os múltiplos
determinantes das práticas alimentares brasileira; a complexidade e os desafios
que envolvem a conformação dos sistemas alimentares atuais; e reforça a
institucionalização da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
O GAPB é apresentado em cinco capítulos que descrevem os seguintes
109
temas:
Capítulo 1. Os princípios que nortearam a sua elaboração:
1- Alimentação é mais do que a ingestão de nutrientes.
2- Recomendações sobre alimentação devem estar em sintonia com seu
tempo.
3- Alimentação adequada e saudável deriva de sistema alimentar social e
ambientalmente sustentável.
4- Diferentes saberes geram o conhecimento para a formulação de guias
alimentares.
5- Guias alimentares ampliam a autonomia nas escolhas alimentares.
Capítulo 2. As recomendações gerais sobre a escolha dos alimentos.
Capítulo 3. As orientações de como combinar os alimentos na forma de
refeições.
Capítulo 4. As orientações sobre o ato de comer e a comensalidade.
Capítulo 5. Os fatores que podem ser obstáculos para a adesão das pessoas às
recomendações do guia.
O GAPB sintetiza todas as recomendações, ao final da edição, em forma
de “Os dez passos para uma alimentação adequada e saudável”.
110
A Cartilha
Recomendações gerais sobre a escolha dos alimentos
O guia descreve quatro categorias de alimentos de acordo com o
processamento empregado na sua produção, descritas a seguir:
1- A primeira categoria reúne alimentos in natura ou minimamente
processados, que devem ser a base da sua alimentação. São alguns
exemplos: todas as frutas, legumes e verduras; suco de frutas pasteurizado
sem adição de açúcar; arroz; cereais; feijões; farinhas; massas;
especiarias; leite e iogurte sem adição de açúcar; carnes; ovos; chá e café.
2- A segunda categoria de alimentos diz respeito aos óleos, gorduras, sal e
açúcar. A orientação é utilizar em pequenas quantidades ao temperar e
cozinhar alimentos e criar preparações culinárias. Exemplos: óleos
vegetais; azeite; manteiga; gordura de porco e de coco; sal e açúcar.
111
3- A terceira categoria de alimentos constitui-se de produtos prontos para
consumo processados. O guia recomenda que se limite a sua utilização,
pois muitos favorecem o consumo excessivo de calorias, além de afetarem
negativamente a vida social, a cultura e o ambiente. São exemplos:
conservas; extrato de tomate; frutas em calda e cristalizadas; carne seca;
toucinho; sardinha e atum enlatados; queijos; e pães.
4- A quarta categoria é representada pelos produtos prontos para consumo
ultraprocessados. Evite alimentos ultraprocessados. Eles são
nutricionalmente desbalanceados. Por conta de sua formulação e
apresentação, tendem a ser consumidos em excesso e a substituir
alimentos in natura ou minimamente processados. Exemplos: biscoitos;
sorvetes; balas e guloseimas em geral; cereais açucarados; bolos e
misturas para bolo; barras de cereal; sopas; macarrão instantâneo;
salgadinhos “de pacote”; refrescos; refrigerantes; iogurtes e bebidas
lácteas adoçados e aromatizados; bebidas energéticas; produtos
congelados; extratos de carne de frango ou peixe empanados do tipo
nuggets; salsichas e outros embutidos; produtos panificados cujos
ingredientes incluem substâncias como gordura vegetal hidrogenada,
açúcar, amido, soro de leite, emulsificantes e outros aditivos.
A Regra de Ouro do Guia Alimentar para a População Brasileira é: “prefira
sempre alimentos in natura ou minimamente processados e preparações
culinárias a alimentos ultraprocessados”.
112
Orientações sobre como combinar alimentos na forma de refeições
A alimentação deve basear-se na combinação de alimentos que são
tradicionais na cultura alimentar brasileira. A mistura de alimentos como feijões,
cereais, raízes, tubérculos, farinhas, legumes, verduras, frutas, castanhas, leite,
carnes, ovos e água permite criar uma infinidade de alternativas saudáveis,
diversificadas e saborosas para as refeições e os lanches. Os cereais
combinados ao feijão ou outra leguminosa constituem fonte de proteína de
excelente qualidade.
O ato de comer e a comensalidade
As dimensões do ato de comer e a comensalidade influenciam, entre
outros aspectos, o aproveitamento dos alimentos consumidos e o prazer
proporcionado pela alimentação.
Três orientações básicas sobre a comensalidade são apresentadas pelo
guia:
1- Comer com regularidade e com atenção.
113
2- Comer em ambientes apropriados.
3- Comer em companhia, sempre que possível.
A compreensão e a superação de obstáculos para a adoção das
recomendações deste guia
Os obstáculos para a adoção das recomendações identificados pelo guia
são: informação, oferta, custo, habilidades culinárias, tempo e publicidade.
1- Informação. Acredita-se que existe muita informação sobre alimentação,
mas poucas são confiáveis. Tenha este guia como fonte confiável de
informação e recomendações sobre alimentação saudável. Discuta as
informações e recomendações deste guia com as pessoas que estão ao
seu redor. Procure organizar-se para colocá-las em prática.
2- Oferta. A oferta de alimentos ultraprocessados está em toda parte e estão
sempre acompanhados de muita propaganda e descontos e promoções.
Evite fazer compras em locais que comercializem somente alimentos
ultraprocessados e evite comer em redes de fast food. Prefira produtores e
comerciantes que ofereçam alimentos in natura ou minimamente
processados, como mercados, feiras livres e “sacolões”.
114
3- Custo. Embora os preços de legumes, verduras e frutas pareçam ser
maiores do que dos alimentos ultraprocessados, o valor da alimentação
baseada em alimentos naturais e minimamente processados ainda é
menor no Brasil do que a baseada em alimentos ultraprocessados.
Consuma sempre alimentos da safra. Dê preferência a locais que
comercializam alimentos direto dos produtores, evitando assim os
intermediários. Participe de grupos de compras coletivas. Se for fazer sua
refeição na rua, prefira restaurantes de “comida a quilo”. Leve sua comida
de casa, reivindique condições adequadas para realizar as suas refeições
no seu local de trabalho.
4- Habilidades culinárias. O enfraquecimento da transmissão de habilidades
culinárias entre gerações favorece o consumo de alimentos
ultraprocessados. Valorize o ato de cozinhar alimentos como prática social
e cultural. Desenvolva habilidades culinárias e estimule as pessoas à sua
volta a fazê-lo. Compartilhe esse prazer.
5- Tempo. Seguir as recomendações deste guia pode implicar, para algumas
pessoas, maior demanda de tempo em virtude da seleção e preparo dos
alimentos e dos horários regulares das refeições. O domínio das técnicas
culinárias pode reduzir muito o tempo de preparo dos alimentos.
Distribuição das tarefas domésticas entre os familiares também é uma
forma de otimizar o tempo. O planejamento das compras e das
preparações que serão consumidas, durante o dia ou semana, também
deve ser levado em consideração.
115
6- Publicidade. A publicidade de alimentos ultraprocessados domina os
anúncios comercias na mídia e atinge principalmente crianças e jovens.
Tenha em mente que a função da propaganda é essencialmente aumentar
a venda do produto. Discuta isso com as pessoas ao seu redor, amplie o
seu espírito crítico. Esclareça as crianças, mas, sobretudo, pratique o que
você orientou. Diminua o tempo de exposição das crianças à televisão e
estimule-as a serem mais ativas.
“Os dez passos para uma alimentação adequada e saudável”
1- Fazer de alimentos in natura ou minimamente processados a base da
alimentação.
2- Utilizar óleos, gorduras, sal e açúcar em pequenas quantidades ao
temperar e cozinhar alimentos e criar preparações culinárias.
3- Limitar o consumo de alimentos processados.
4- Evitar o consumo de alimentos ultraprocessados.
5- Comer com regularidade e atenção, em ambientes apropriados e,
sempre que possível, com companhia.
6- Fazer compras em locais que ofertem variedades de alimentos in natura
ou minimamente processados.
7- Desenvolver, exercitar e partilhar habilidades culinárias.
8- Planejar o uso do tempo para dar à alimentação o espaço que ela
merece.
9- Dar preferência, quando fora de casa, a locais que servem refeições
feitas na hora.
10- Ser crítico quanto a informações, orientações e mensagens sobre
alimentação veiculadas em propagandas comerciais.
116
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Saúde. Guia alimentar para a população brasileira. Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. 2 ed., Brasília, 2014. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf As figuras ilustrativas são imagens disponíveis na internet. APÊNDICE G – SLIDES REFERENTES AO VÍDEO EDUCATIVO
117
118
119
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte no país. A alta
incidência de sobrepeso e obesidade é uma realidade no Brasil e os problemas
decorrentes dessa situação estão diretamente ligados à ocorrência dessas
doenças crônicas não transmissíveis. Para enfrentar essa situação, torna-se
imprescindível ampliar as ações para a promoção da alimentação adequada e
saudável. A Nutrição constitui-se em um dos campos científicos de apoio
terapêutico cujo objetivo é estimular a alimentação saudável e alertar sobre os
riscos da inadequação nutricional para a saúde da população.
As práticas alimentares, entretanto, são caracterizadas pelos elementos
culturais presentes na realidade em que o indivíduo está inserido, tornando-se
sua identidade, e esta sofre forte influência do meio externo. Entende-se que
esses processos sociais e culturais e o ato de se alimentar são mais complexos
do que a simples satisfação de uma necessidade fisiológica. O indivíduo, quando
se percebe pertencente a um determinado grupo e reconhece as práticas
alimentares como regras sociais legítimas e que devem ser seguidas, é levado a
se adequar ao ambiente, repetindo os modelos de comportamentos coletivos.
O conhecimento dos fatores que interferem no comportamento alimentar
auxilia na melhoria da efetividade das intervenções nutricionais. A valorização do
processo educativo baseado principalmente no diálogo e no referencial simbólico
de cada um permite ao indivíduo encontrar um sentido nas novas práticas
alimentares e promove mudanças mais efetivas no seu hábito alimentar. A base
da reeducação alimentar, nessa perspectiva, torna-se a valorização da autonomia
do sujeito e a responsabilização dos indivíduos no cuidado de si.
Os resultados deste estudo corroboram a literatura ao identificar os
benefícios advindos da intervenção nutricional mais humanizada. Os estímulos e
a motivação que impulsionaram a mudança de hábitos também encontram
ressonância em outros estudos que demonstraram o valor do apoio familiar e do
trabalho em grupo durante o processo de transição das práticas alimentares; a
compreensão da necessidade de mudar; e o reconhecimento da capacidade de
vencer obstáculos.
A reeducação alimentar, por meio da motivação e do estímulo, parece
substituir a forma de “controle-repressão” que marca as intervenções tradicionais.
120
Evoca-se uma reeducação que busca desenvolver a capacidade das pessoas
para que tenham condições de perseguir as metas às quais se propõem
livremente. Torna-se relevante também apostar na capacidade e na iniciativa do
indivíduo em encontrar recursos para lidar com as suas dificuldades, a partir da
conscientização e do comprometimento com a mudança. Conquista-se a
autonomia com o desprendimento dos laços sociais e com o reconhecimento da
sua própria identidade. Transcendem-se as condições de heteronomia para o “ser
para si”, a autonomia.
Dessa forma, o processo educativo não visa a impor verdades que devem
ser simplesmente seguidas, mas criar uma relação de ajuda, de escuta e de
compreensão entre o profissional e o paciente. Estabelecer um vínculo com a
pessoa para possibilitar o diálogo, a problematização dos seus hábitos
alimentares e a reflexão acerca dos fatores que interferem no seu comportamento
alimentar. Sobretudo, é preciso estar atento para interpretar o que não é dito
explicitamente, ou seja, a mensagem que está subentendida na fala e também
nas expressões corporais. É muito importante não julgar o comportamento dos
pacientes classificando-os como aderidos e não aderidos ao tratamento.
Recomenda-se, sim, respeitar a individualidade e complexidade da convivência
com os agravos e restrições dietéticas, evitando-se, dessa forma, generalizações
inadequadas ao estabelecer mudanças nas práticas alimentares.
Acredita-se que assim é possível pactuar estratégias de enfrentamento dos
problemas, respeitando o tempo de cada pessoa, que é único e singular,
estimulando seu espírito crítico para que ele possa fazer escolhas mais assertivas
que beneficiem a sua saúde e para que ele mesmo possa transformar a sua
própria realidade. Também é atribuição dos profissionais da saúde encorajar o
indivíduo a praticar exercícios físicos para melhorar o seu condicionamento e a
sua saúde; conscientizar a respeito de prover mudanças na cultura que
desestimula a atividade física; e criar uma nova perspectiva de práticas realizadas
com regularidade e com prazer, sem se tornar uma atribuição obrigatória e cheia
de sacrifícios.
Acredita-se também que ações humanizadoras no ambiente do trabalho
contribuam para a promoção da saúde do trabalhador a fim de que eles se tornem
multiplicadores de condutas alimentares saudáveis, refletindo esse
comportamento no meio familiar e nas relações profissionais.
121
Torna-se um desafio para o profissional da área promover saúde em um
cenário em que a assistência também se tornou um serviço pautado na lógica da
produtividade, no qual o valor do tempo disponibilizado nas intervenções tem
representativo peso e, muitas vezes, limita a investigação dos aspectos subjetivos
e individuais relacionados ao ato de comer. Nesse sentido, a atuação
especificamente do nutricionista é fundamental e os recursos pedagógicos são
um grande aliado nas intervenções nutricionais que visam à mudança de hábito. A
identificação de aspectos pedagógicos eficazes contribui para o aumento da
motivação e da adesão aos programas de intervenção, no intuito de conciliar
conhecimento e práticas pessoais promotoras da saúde.
Acredita-se que o conhecimento é elemento fundamental para a
conscientização e a partir dela é possível ocorrerem mudanças que, efetivamente,
vão causar transformações na vida do sujeito. A conscientização é o primeiro
passo para avançar nesse sentido. A mobilização é necessária para possibilitar a
mudança no comportamento individual e coletivo. A vontade política e o
envolvimento dos órgãos competentes e responsáveis pela execução das
mudanças institucionalizáveis são fundamentais para promover esse
desdobramento na concepção da educação alimentar, da cadeia produtiva, de
distribuição, comercialização, preparação e consumo dos alimentos. As agências
regulatórias e de proteção ao consumidor são de extrema importância para a
viabilidade das proposições do guia.
Sabe-se da dificuldade de mudar hábitos, não só os hábitos alimentares,
mas toda uma cultura de produção, distribuição, comercialização, preparação e
consumo dos alimentos. São vários os aspectos que influenciam essa dinâmica: o
sistema econômico capitalista e a globalização, que aproxima as pessoas e as
culturas e ao mesmo tempo as distancia ou as exclui e muitas vezes induz a
padronização dos comportamentos, tentando igualar sujeitos cujas necessidades
são tão diferentes e singulares.
O enfrentamento dos desafios para mudança pessoal e coletiva é uma
tarefa complexa. Espera-se que a apropriação do saber permita refletir sobre as
atitudes e a importância que se dá às relações familiares, profissionais,
alimentares, à saúde e em todas as esferas. Sobretudo, o quanto estamos
dispostos a investir na mudança. Mudar exige comprometimento, perseverança,
empenho, tempo e dedicação. Os sentimentos que serão experimentados a partir
122
da adoção de uma nova conduta ou uma nova prática alimentar vão ser sempre
desconhecidos, portanto, não se pode ter garantias. Mas a necessidade de
mudança é essencial à vida, à preservação da saúde.
As evidências científicas mostram que o estilo de vida e consumo atuais
são destrutivos e prejudiciais ao homem e à natureza, portanto, a mudança é
inadiável. O como fazer é que deve ser descoberto. Será preciso desconstruir um
modelo para reconstruir uma nova maneira de se fazer, inventar uma nova
conduta e reinventar o comportamento. E não há mudança sem o desejo de
mudar. E o desejo é uma força propulsora para a ação. "Tem que ser uma força
interior, tem que vir de dentro”.
Acredita-se que é preciso ter humildade para reconhecer os obstáculos e a
necessidade de mudar, ou seja, é preciso despertar. E a partir daí buscar os
caminhos, com persistência, para a concretização do desejo. Aceitar o novo e o
diferente. Fazer diferente sem esperar os estímulos externos ou grandes
acontecimentos, grandes resultados. É simplesmente fazer a sua parte, o que é
possível, o que está ao seu alcance. São as pequenas mudanças que causam as
grandes transformações. É preciso acreditar que é possível mudar para ter mais
saúde e qualidade de vida.
A mudança não se restringe à esfera pessoal, individual. O despertar
envolve também a reflexão sobre as atitudes de cidadania. As mudanças
coletivas podem ser alcançadas se houver mais participação cidadã, por meio da
articulação, mobilização e cobrança dos direitos, com responsabilidade.
Não é possível ficar imobilizado, permanecer queixando-se das
dificuldades e obstáculos e terceirizando as causas dos seus problemas. Torna-se
necessário fazer a sua parte, cumprir os seus deveres como cidadão também,
pensar mais no coletivo, juntar outras forças para caminhar junto. E mesmo
quando parecer não ter solução, acreditar que sempre tem um jeito diferente de
fazer as coisas, em todas as esferas. Portanto, informe-se, converse, pergunte,
movimente-se e mude. Mude a você mesmo, a sua vida e a realidade que está à
sua volta. Compartilhe, seja multiplicador de uma experiência exitosa.
Baseado nos argumentos discutidos anteriormente, acredita-se que a
promoção da saúde deve ser um conjunto de ações integradas e dialogadas entre
os diversos saberes. Deve ser oposta à fragmentação do cuidado em disciplinas
específicas e que considere, sobretudo, os aspectos subjetivos dos indivíduos,
123
inserindo-os no seu contexto sociocultural e apostando nos recursos individuais
para melhorar o autocuidado em saúde e para a transformação da sua realidade.
As análises dos depoimentos referentes aos profissionais da saúde da
Maternidade Odete Valadares expressam a realidade daquele local, o seu
momento histórico e temporal. Esses dados não são generalizáveis a toda
população, principalmente por se tratar de aspectos subjetivos do comportamento
humano. São necessárias análises pertinentes para aproveitamento destes
resultados em outras populações.
A intenção deste estudo foi captar e analisar as experiências individuais de
como se constrói a relação com o ato de se alimentar e como se realizam as
escolhas e transformação dos hábitos alimentares. Espera-se, com isso, ter
contribuído com reflexões que ajudem na condução de uma abordagem
nutricional adequada e estimulem a discussão e outras pesquisas sobre o tema.
Sobretudo, que promovam o diálogo interdisciplinar para produção do
conhecimento em educação nutricional, bem como o ensino e a formação dos
profissionais da saúde.
Finalizando: este estudo é o início modesto de novas partidas.
124
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130
ANEXO E APÊNDICES
ANEXO A – Parecer ético
131
132
133
APÊNDICE A – Roteiro de temas da entrevista semiestruturada
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e
Desenvolvimento Local
Roteiro de pesquisa para ser aplicado na coleta de dados da pesquisa
denominada “Reeducação alimentar: estratégias de sucesso usadas para
obtenção de novos hábitos alimentares pelos profissionais da saúde no
ambiente de trabalho”
Gostaria de conversar livremente com você sobre os seguintes temas:
1- Como participou das nossas discussões por ocasião dos grupos de reeducação
alimentar da Maternidade Odete Valadares, conte para mim, como é a sua
relação com a comida?
2- Você acha que sua alimentação é mais saudável agora? Você mudou os seus
hábitos alimentares? Sim ( ) Não ( )
Se sim:
3- O que mudou na sua alimentação? O que aconteceu na sua vida para que
você aderisse a uma dieta mais saudável?
4- O que o(a) motivou a mudar seus hábitos alimentares?
5- Você enfrentou dificuldades nesse processo de mudança de hábitos
alimentares? Se sim, quais tipos de dificuldades? Dessas, quais foram as mais
difíceis?
6- Em quais situações da sua vida você encontrou dificuldades para mudar os
hábitos? Como você se sentiu?
7- E em quais situações da sua vida você encontrou dificuldades para manter a
mudança de hábito? Como você se sentiu?
134
8- O que mais gostaria de dizer a partir da sua experiência exitosa para quem
deseja viver o mesmo processo que você viveu, ou seja, conseguir mudar e
manter uma alimentação saudável?
Se não:
3- O que acha que aconteceu para você não aderir a uma dieta mais saudável?
4- Que dificuldades você enfrentou nesse processo de mudança de hábitos
alimentares? Quais foram as mais difíceis?
5- A que você atribui o fato de não ter mudado seus hábitos alimentares?
6- Em quais situações da sua vida você encontrou mais dificuldades para mudar?
Como você se sentiu?
7- E o que mais gostaria de dizer a partir de sua experiência para quem deseja
mudar hábito alimentar?
135
APÊNDICE B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – Entrevista
Título da Pesquisa: Reeducação alimentar: estratégias de sucesso usadas
para obtenção de novos hábitos alimentares por profissionais da saúde no
ambiente de trabalho
Pesquisador responsável: Iara Lamas
Orientadora: Matilde Meire Miranda Cadete
Instituição a que pertencem: Centro Universitário UNA
O(a) Sr.(a) está sendo convidado a participar de uma pesquisa que tem
como finalidade compreender quais são as estratégias e recursos utilizados por
profissionais da saúde no enfrentamento das dificuldades em adotar novos
hábitos alimentares mais saudáveis, no seu local de trabalho, tendo em vista a
valorização e a promoção de saúde do trabalhador.
Ao participar deste estudo o(a) Sr.(a) contribuirá para a produção e
sistematização de conhecimento sobre o enfrentamento das dificuldades em
adotar hábitos alimentares mais saudáveis, no seu local de trabalho, de modo a
subsidiar processos de gestão social comprometidos com a qualidade de vida no
trabalho.
O(a) Sr.(a) tem a liberdade de desistir de participar a qualquer momento
deste estudo, sem qualquer prejuízo para o(a) Sr.(a) e sempre que quiser poderá
pedir mais informações sobre este trabalho pelo telefone da aluna ou orientadora
e, se necessário, por meio do telefone do Comitê de Ética em Pesquisa da UNA.
Gostaria, então, que o(a) Sr.(a) respondesse a umas perguntas que lhe
farei e que serão gravadas, se assim o permitir. Seu nome não será mostrado em
momento algum. Sua participação neste trabalho não traz problemas legais e se
ocorrer algum constrangimento ou desconforto diante de alguma pergunta é de
sua livre escolha responder ou não, podendo, inclusive, cancelar sua participação
na pesquisa no decorrer da entrevista.
Toda a nossa conversa durante a entrevista é sigilosa e somente a aluna e
a professora terão conhecimento dos dados.
O(a) Sr.(a) não terá algum tipo de despesa para participar deste trabalho,
bem como nada será pago por sua participação.
136
Caso você queira nos procurar ou tirar dúvidas após participar desta
pesquisa, colocamo-nos à sua inteira disposição. Pode também nos telefonar
caso queira saber em que momento se encontra nosso trabalho.
Esta pesquisa obedece aos Critérios da Ética em Pesquisa com Seres
Humanos conforme Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.
Após essas informações, pedimos o seu consentimento de forma livre e
esclarecida para participar deste trabalho.
Obs.: Não assine esse termo se ainda tiver dúvidas a respeito.
Consentimento Livre e Esclarecido
Tendo em vista os itens acima apresentados, eu _____________________, de
forma livre e esclarecida, manifesto meu consentimento para participar da
pesquisa. Declaro que recebi cópia deste termo de consentimento e autorizo a
realização da pesquisa e a divulgação dos dados obtidos neste estudo.
Belo Horizonte, ______ de _____________ de 2014.
Nome do participante da pesquisa:
Assinatura do participante da pesquisa:
Assinatura da Pesquisadora:
Assinatura da Orientadora:
Aluna: Iara Lamas Contato: (31) 93136776 (31) 3224-3384 e-mail: [email protected] Orientadora: Matilde Meire Miranda Cadete. (31) 9972-8033. E-mail: [email protected].
137
APÊNDICE C - TERMO DE COMPROMISSO DE CUMPRIMENTO DA
RESOLUÇÃO 466/2012
Nós, Iara Lamas, RG. xxxxxx, e Matilde Meire Miranda Cadete, RG. xxxxx,
responsáveis pela pesquisa intitulada “Reeducação alimentar: estratégias de
sucesso usadas para obtenção de novos hábitos alimentares por
profissionais da saúde no ambiente de trabalho”, declaramos que:
Assumimos o compromisso de zelar pela privacidade e pelo sigilo das
informações que serão obtidas e utilizadas para o desenvolvimento da
pesquisa.
Os materiais e as informações obtidas no desenvolvimento deste trabalho
serão utilizados para se atingir o(s) objetivo(s) previsto(s) na pesquisa.
O material e os dados obtidos ao final da pesquisa serão arquivados sob a
nossa responsabilidade.
Os resultados da pesquisa serão tornados públicos em periódicos científicos
e/ou em encontros, quer sejam favoráveis ou não, respeitando-se sempre a
privacidade e os direitos individuais dos sujeitos da pesquisa, não havendo
qualquer acordo restritivo à divulgação.
Assumimos o compromisso de suspender a pesquisa imediatamente ao
perceber algum risco ou dano, consequente à mesma, a qualquer um dos
sujeitos participantes, que não tenha sido previsto no termo de
consentimento.
O Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Centro Universitário UNA será
comunicado da suspensão ou do encerramento da pesquisa, por meio de
relatório apresentado anualmente ou na ocasião da interrupção da pesquisa.
As normas da Resolução 466/2012 serão obedecidas em todas as fases da
pesquisa.
Belo Horizonte, 5 de dezembro de 2013
Iara Lamas Matilde Meire Miranda Cadete
CPF 681175076-68 CPF 276766096-15
138
APÊNDICE D - TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
Eu __________________________________________, CPF
___________, RG___________, depois de conhecer e entender os objetivos,
procedimentos metodológicos, riscos e benefícios da pesquisa, bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem e/ou depoimento,
especificados no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE),
AUTORIZO, por meio do presente termo, as pesquisadoras Iara Lamas e Matilde
Meire Miranda Cadete, do projeto de pesquisa intitulado “Reeducação alimentar:
estratégias de sucesso usadas para obtenção de novos hábitos alimentares
por profissionais da saúde no ambiente de trabalho”, a realizar as fotos e/ou
vídeos que se façam necessárias e/ou a colher meu depoimento sem quaisquer
ônus financeiros a nenhuma das partes.
Ao mesmo tempo, libero a utilização dessas fotos e/ou vídeos (seus
respectivos negativos ou cópias) e/ou depoimentos para fins científicos e de
estudos (livros, artigos, slides e transparências), em favor dos pesquisadoras
especificadas, obedecendo ao que está previsto nas leis que resguardam os
direitos das crianças e adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente –
ECA, Lei nº 8.069/ 1990), dos idosos (Estatuto do Idoso, Lei n.° 10.741/2003) e
das pessoas com deficiência (Decreto Nº 3.298/1999, alterado pelo Decreto nº
5.296/2004).
BH, ____ de ___________ de 20_____.
Participante da pesquisa
Pesquisador responsável pelo projeto
139
APÊNDICE E - AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS
Eu, ____________________________________________________, ocupante
do cargo de_____________________ do(a) _____________________________,
AUTORIZO a coleta de dados do projeto “Reeducação alimentar: estratégias
de sucesso usadas para obtenção de novos hábitos alimentares por
profissionais da saúde no ambiente de trabalho” dos pesquisadores Iara
Lamas e Matilde Meire Miranda Cadete nas instalações físicas da Maternidade
Odete Valadares, após a aprovação do referido projeto pelo Comitê de Ética em
pesquisa (CEP) da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG).
BH, ___ de_________________ de ______
ASSINATURA:
CARIMBO: