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Rem: Revista Escola de Minas ISSN: 0370-4467 [email protected] Escola de Minas Brasil Araújo, Elisângela Rodrigues da Silva; França, Klaydson D. Lopes; Araújo, Ernani Carlos de; Souza, Henor Artur de A restauração do Teatro Municipal de Ouro Preto - MG Rem: Revista Escola de Minas, vol. 62, núm. 3, julio-septiembre, 2009, pp. 379-384 Escola de Minas Ouro Preto, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=56416739018 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

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Rem: Revista Escola de Minas

ISSN: 0370-4467

[email protected]

Escola de Minas

Brasil

Araújo, Elisângela Rodrigues da Silva; França, Klaydson D. Lopes; Araújo, Ernani Carlos de; Souza,

Henor Artur de

A restauração do Teatro Municipal de Ouro Preto - MG

Rem: Revista Escola de Minas, vol. 62, núm. 3, julio-septiembre, 2009, pp. 379-384

Escola de Minas

Ouro Preto, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=56416739018

Como citar este artigo

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Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal

Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

379REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 62(3): 379-384, jul. set. 2009

Elisângela Rodrigues da Silva Araújo et al.

Engenharia Civil

A restauração doTeatro Municipal

de Ouro Preto - MG

(The restoration of Ouro Preto´s CityTheater building)

ResumoNesse trabalho, faz-se uma avaliação das intervenções, em sistemas estrutu-

rais, destinadas à restauração do teatro municipal de Ouro Preto-MG. O atual pro-cesso de intervenção se baseia em observações de outras intervenções, já realiza-das ao longo da história, nas diretrizes estabelecidas pelo Comitê Internacionalpara Análise e Restauração de Imóveis do Patrimônio Arquitetônico (ICOMOS) eem análises laboratoriais. A recuperação de edificações de importância históricadeve ser precedida de um planejamento detalhado para que o processo de inter-venção não venha a comprometer a construção original.

Palavras-chave: Edificações históricas, avaliação de intervenções, restauração.

AbstractThis work presents the results of an assessment of interventions performed in

structural systems for the restoration of Ouro Preto´s City Theater building. The

current process of intervention is based on observations of other interventions

performed along the previous years, on guidelines established by the International

Council on Monuments and Sites (ICOMOS), and on laboratory tests. The

restoration of buildings of historical importance must be preceded by a detailed

planning in order to avoid having an intervention process that compromises the

original structure.

Keywords: Historical buildings, assessment of interventions, restoration.

Elisângela Rodrigues daSilva Araújo

Engenheira Civil, Escola de Minas,UFOP, Ouro Preto, MG

E-mail: [email protected]

Klaydson D. Lopes FrançaPrograma de Pós-Graduação em

Engenharia Civil, DECIV, Escola deMinas,UFOP, Ouro Preto, MG

E-mail: [email protected]

Ernani Carlos de AraújoProfessor, Programa de Pós-Graduaçãoem Engenharia Civil, DECIV, Escola de

Minas, UFOP, Ouro Preto, MGE-mail: [email protected]

Henor Artur de SouzaProfessor, Programa de Pós-Graduaçãoem Engenharia Civil, DECIV, Escola de

Minas, UFOP, Ouro Preto, MGE-mail: [email protected]

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 62(3): 379-384, jul. set. 2009380

A restauração do Teatro Municipal de Ouro Preto - MG

1. Introdução1.1 Vila Rica-MG e aimportância do teatro

Desde os primórdios da coloniza-ção do Brasil, o teatro, aliado à religião,vem contribuindo para a formação danação. Embora pareça que o objetivo doscolonizadores fosse a exploração das ri-quezas do país, houve, também, preocu-pação com o aspecto cultural, não só naCorte, mas em quase todas as vilas. Essefato não foi diferente em Vila Rica, fun-dada em 1711. O ouro abundante propi-ciou um progresso jamais visto no inte-rior do Brasil, transformando Vila Ricana maior cidade das Américas. A produ-ção cultural era tão profícua quanto aaurífera na Capital das Minas Gerais.Assim, na Rua Santa Quitéria, em 1769/1770, inaugurava-se a Casa da Ópera deVila Rica. João de Souza Lisboa, cons-trutor e proprietário da obra, também oContratador dos reais quintos e entra-das, foi apoiado pelo Conde de Valada-res, governador da Capitania, e por Cláu-dio Manoel da Costa, Secretário de Go-verno (CTAC, 1997).

Hoje, a Casa da Ópera de Vila Rica,é o Teatro Municipal de Ouro Preto, queostenta, segundo a tradição, o título demais antiga casa de espetáculos em fun-cionamento da América do Sul. A casade espetáculo traz também no seu histó-rico o fato de ter sido o primeiro teatroonde mulheres pisaram em um palco noBrasil.

Em 1778, com a morte de seu funda-dor, a Casa da Ópera passou por sua pri-meira crise, ressurgindo, oito anos de-pois, nas festas dos desposórios do in-fante D. João, com três noites de ópera.A partir daí, a Casa da Ópera viveu altose baixos, sem nunca deixar de funcionar.

No período de 1817 a 1820, o teatropassa por sua primeira reforma, consoli-dando-se como o centro cultural da so-ciedade, que o lotava semanalmente. Em1882, o governo provincial planeja aconstrução de um novo teatro, mais dig-no de uma Capital. Segundo o governa-dor que estava deixando o cargo, Fran-cisco Diogo Pereira de Vasconcelos, o

próximo governador, Herculano FerreiraPenna, deveria prover a Capital de umacasa de espetáculos maior e mais con-fortável, já que o antigo teatro estaria adesabar. Na verdade uma segunda refor-ma foi executada com perfeição e econo-mia e devolveu o teatro à população,embora a idéia de um novo teatro nãosaísse da mente, nem dos governantes,nem da população.

Com a chegada do fonógrafo e docinema no final do século XIX, a freqüên-cia da Casa da Ópera minguou, levandoalgum tempo para que o novo e o antigose harmonizassem, cada qual ocupandoseu espaço.

1.2 O Teatro Municipal deOuro Preto

O estilo do Teatro Municipal deOuro Preto é o chamado luso-brasileiro,possuindo uma fachada singela, lem-brando a austeridade da arquitetura daépoca. A construção apresenta empenafrontal, de vaga inspiração neoclássica,em contraste com aberturas em arco aba-tido, de tradição barroca, e elementosmedievalizantes, óculo quadrilobado earcaturas, acompanhando a cornija da

empena (Figuras 1 e 2). Essa aparênciade estilo eclético, provavelmente foi ad-quirida durante sua reforma e remodela-ção interna, ocorridas em 1882.

Ao longo de sua história, inúmerasreformas aconteceram, sendo a mais sig-nificativa em 1882, quando a estruturadas quatro ordens de camarotes foi tam-bém alterada, adquirindo a forma de fer-radura e recebendo piso em declive. To-das essas modificações visaram a adap-tá-lo às exigências de conforto dos usu-ários do século XIX. Durante o séculoXX, outras reformas se deram e a maisimportante foi em 1985 com a descobertade pinturas sobre dramas e comédias emcima da boca de cena e no camarote real(CTAC, 1997).

O Teatro Municipal de Ouro Pretoestá em nova fase. A casa de espetácu-los, desde o início de 1993, apresentanovas diretrizes de programação. Umareforma está sendo feita em etapas, parase adequar aos recursos disponíveis enão privar a comunidade ouro-pretanade uma de suas principais opções de cul-tura e lazer.

No decorrer de 1993, a Casa da Ópe-ra teve reformada sua estrutura de cama-

Figura 1 - Fachada após retirada das luminárias e restauração das portas nos anosde 1958 e 1959. Fonte: IPHAN, sd.

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rins e banheiros, com o rebaixamento dopiso das instalações internas e criaçãode uma sala de aquecimento e ensaio dosartistas. O projeto de reforma, assinadopelo arquiteto e cenógrafo Raul BelémMachado, incluiu a modernização detodo o equipamento de som, luz e vesti-mentas do palco, além da mudança nalocalização das cabines técnicas. Foi fei-to o restauro dos adornos em madeirano foyer de entrada e também o sistemaelétrico foi substituído. O Teatro foi in-teiramente pintado de acordo com a des-crição feita pelo explorador inglês Ri-chard Burton, que visitou Ouro Preto noséculo XIX.

Em 1998, foi dada uma concreta va-lorização do Teatro, tanto histórica quan-to social, ressaltando o fato de que oTeatro, apesar de ser uma obra de extre-ma importância, não tinha tombamentoindividualizado e exclusivo.

Nesse século XXI, proporcionadapela Prefeitura Municipal de Ouro Preto,em parceria com o Projeto Monumenta/BID, ocorreu uma nova reforma impor-tante no Teatro. Cabe aqui ressaltar quea Casa da Ópera é mais que um atrativoturístico, constituindo-se em um catali-sador da arte, da cultura, da alma ouro-pretana (Figura 3) (Araújo, 2006).

2. A restauraçãoO teatro apresenta grande valor

arquitetônico, isto no que diz respeito atodos os seus componentes, represen-tando um produto único da tecnologiade construção específica de seu tempo.No processo de restauração, levam-seem consideração a complexidade histó-rica e as peculiaridades existentes na edi-ficação.

Para a intervenção e/ou execuçãoda restauração no Teatro Municipal dacidade de Ouro Preto, fez-se um levanta-mento sobre a história da edificação eanalisaram-se os documentos sobre in-tervenções anteriores já realizadas, alémde um levantamento fotográfico. Numasegunda etapa, foram estudadas e ob-servadas as normas e diretrizes sugeri-

Figura 2 - Fachada atual do Teatro Municipal. 1 - Lira; 2 - Óculo quadrilobado; 3 -Ornato; 4 - Arcatura; 5 - Cornija; 6 - Empena.

Figura 3 - Vista recente do interior do Teatro. Fonte: Neto, 2002.

das pelo Comitê Internacional para Aná-lise e Restauração de Imóveis do Patri-mônio Arquitetônico (ICOMOS, 2001).Durante o processo de intervenção, fo-ram, também, realizadas análises labora-toriais da argamassa encontrada.

Como já citado, o teatro passou pordiversas intervenções, sendo a maiordelas concluída em 1882 e que alterousignificativamente, sua arquitetura.Após essa data, ocorreram outras inter-venções, consideradas inadequadas,que estão sendo corrigidas, na medida

do possível, na atual restauração. A cadanova etapa, de execução no projeto derestauração, são reavaliadas e buscadasinformações que podem retornar a edifi-cação às características originais.

A seguir são apresentadas algumasdestas peculiaridades e tratamentos de-senvolvidos que levam em consideraçãoos critérios éticos e técnicos de conser-vação e restauração.

• Todos os funcionários foram orien-tados a mostrar e guardar todo e qual-quer material encontrado. Na remo-

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A restauração do Teatro Municipal de Ouro Preto - MG

ção das caixas d’água do palco fo-ram encontradas inscrições e no te-lhado foram encontradas telhas emadeiras datadas, fazendo-se, assim,remoção e substituição das peçasdeterminadas (Figuras 4 e 5). Nas fri-sas e platéia, foram encontrados umbarrote datado e um carrinho inglês.Nas áreas de escavação, foi realiza-do peneiramento e todo inseto en-contrado foi coletado.

• As pinturas da Boca de Cena do Ca-marote e Foyer foram protegidas con-tra poeira ficando o acesso facilitadopara avaliação e elaboração do Pro-jeto de Restauração.

• As cadeiras da platéia foram todasmapeadas antes da remoção para seutratamento.

• Antes da execução dos rebocos fo-ram realizados testes laboratoriaispara determinação do traço da arga-massa original. As prospecções fo-ram realizadas em 4 pontos distintos.

• Ao ser iniciado o tratamento da fa-chada principal, foi observado que amaior parte do revestimento era com-posto por cimento. Tal revestimentoapresentava-se em péssimo estado,devido a areia empregada ser de máqualidade e por não ser adequada à

construção. Optou-se, então, por seremover totalmente esse revestimen-to, e retornar a técnica antiga utili-zando cal e areia.

• Sobre o frontão, há um lajeado de pe-dra, local de infiltrações. O rejuntamen-to foi refeito e aplicado silicone parase evitarem futuras infiltrações.

• O nível das salas de aquecimento e onível do piso dos camarins foram re-baixados em intervenção anterior, fi-cando como registro desse nível asbases dos pilares existentes, sendoem pedra revestidos com madeira. Emavaliação da fiscalização e IPHAN,

Figura 4 - Remoção de peças deterioradas do telhado.

Figura 5 - Restauração do telhado: (a) colocação de manta aluminizada; (b) colocação das telhas.

(a) (b)

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definiu-se a remoção de duas basesdeixando uma como registro (Figura 6).

• Todo o madeiramento recebeu trata-mento contra insetos xilófagos. Al-teraram-se o produto especificado ea técnica por produto de maior efeitoresidual e eficácia.

• No remanejamento e substituição dotabuado de piso, observou-se a ne-cessidade de substituição do barro-teamento, que, pela proximidade dasparedes, se deteriorou. O novo bar-roteamento recebeu aplicação demanta asfáltica, junto às paredes,para proteção contra umidade. Os ta-buados de pisos da platéia e frisas,substituídos em intervenção anteri-or por tábuas de 10 cm, não seriamsubstituídos, mas, devido a existên-cia de tabuado não uniforme (tábuascom largura e tamanho diferentes),decidiu-se pela substituição total, se-guindo as dimensões encontradas.O barroteamento da platéia estavadeteriorado pela proximidade do solo.Nesse caso, foi aumentado o espa-çamento para maior ventilação. Defi-niu-se a criação de câmara de venti-lação para conservação do tabuadode piso e do barroteamento da salade aquecimento (Figura 7).

• No tratamento do suporte do fecha-mento sob o palco, foram realizadospequenos enxertos, consolidações,contenção de rachaduras e coloca-ção de molduras para sua fixação jun-to ao piso, evitando a utilização depregos. Para a realização dos servi-ços, as tábuas foram mapeadas e fo-ram tomados os cuidados com a po-licromia.

• No tratamento do telhado, foram en-contrados vestígios do forro origi-nal, sendo liso e, aproximadamente,15 cm acima do forro tipo saia e cami-sa existente.

• No tratamento do tabuado de pisodos diferentes níveis, observou-secoloração em seu verso. Por meio deprospecções e policromia encontra-da, presume-se que não havia forrosanteriormente, tanto no Foyer, comonos níveis dos Camarotes e Frisas.Assim, decidiu-se pela remoção doforro saia e camisa existentes noFoyer e pela restauração da pinturados barrotes e tabuados.

• As pinturas das paredes internasapresentam várias camadas de repin-

turas. O projeto decidiu-se pela utili-zação de tinta à base de resina PVA(acetado de vinila), continuando oque existia. No entanto, o processoserá alterado de modo que toda a pin-tura à base de resina PVA existenteserá removida e se retornará à técni-ca original utilizando-se caiação.

• Nos elementos como tabiques, esca-das, guarda-corpos e colunas, foramrealizadas novas prospecções resul-tando em alterações das cores. O pro-cesso de tratamento dos citados ele-mentos será realizado por pessoal ca-pacitado.

3. Comentários finaisNa recuperação e/ou restauração de

edificações antigas, de importância his-tórica, deve-se fazer um planejamentodetalhado para que o processo de inter-venção não venha a comprometer a edi-ficação original. Na intervenção realiza-da, foram observadas as diretrizes doComitê Internacional para Análise e Res-tauração de Imóveis do Patrimônio Ar-quitetônico como referências básicas eadequadas em intervenções históricas.

Figura 6 - Remoção da sapata central com auxílio de escoramentos e colocação de pilar e de viga de madeira maciça.

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 62(3): 379-384, jul. set. 2009384

A restauração do Teatro Municipal de Ouro Preto - MG

Figura 7 - Restauração do piso.

4. Referências bibliográficasARAÚJO, E. R. S. Restauração do Teatro Municipal de Ouro Preto.

Ouro Preto: Curso de Engenharia Civil, Universidade Federal deOuro Preto, 2006. 80 p. (Relatório de Estágio Supervisionado,Engenharia Civil).

CTAC - CENTRO TÉCNICO DE ARTES CÊNICAS. Teatros do

Brasil. 1997. Disponível em: <http://www.ctac.gov.org.br/tdb/portugues/teatro_ouropreto.asp>. Acesso em: 6 jul. 2006.

ICOMOS - COMITÊ CIENTÍFICO INTERNATIONAL PARAANÁLISE E RESTAURAÇÃO DE IMÓVEIS DOPATRIMÔNIO ARQUTETÕNICO. Recomendações para

análise, conservação e restauração estrutural do patrimônio

arquitetônico. 2001. 42 p. Disponível em: <http://www.icomos.org.br/icomos/>. Acesso em: 8 mar. 2006.

NETO, G. Teatro Ouro Preto. Ouro Preto, MG, 2002. 1 fotografia.

Artigo recebido em 07/03/2007 e aprovado em 18/05/2009.

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