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365 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 61(3): 365-369, jul. set. 2008 Abstract Human activity in the micro basin of Granjeiro river, in the township of Crato/ Cariri, Ceará causes excessive runoff, producing sediment deposition in watercourses and causing floods along the river. In this investigation we try to understand the environmental impacts on the hydrology of the area through: (i) a morphometric characterization of the Granjeiro river micro basin and two adjacent ones, (ii) a comparison of the morphometric parameters for the three micro basins, (iii) an environmental evaluation of the Granjeiro micro basin and (iv) a correlation of environmental impacts and morphometric parameters. Morphometric characterization is made through parameters that describe the geometry of the basin, its drainage system and its relief. Environmental evaluation is based on the spot diagnoses. According to morphometry, the Granjeiro micro basin should be less floods prone than the outher two. However, antropic environmental problems invert this order transferring a higher incidence of floods to the first. In order to minimize environmental impacts, actions through structural and non-structural measures, in accordance with social- environmental local reality, are proposed. Keywords: Morphometric analysis, Granjeiro river, environmental impacts. Engenharia Civil Análise morfométrica e ambiental da microbacia hidrográfica do rio Granjeiro, Crato/CE (Morphometric and environmental analyses of the Granjeiro river micro basin, Crato/ CE) Resumo As ações antrópicas na microbacia hidrográfica do rio Granjeiro, município do Crato, Ceará, estão levando a excessivo escoamento superficial, que produz assorea- mento dos cursos d’água e enchentes nos bairros por onde o rio passa. Nesse trabalho, objetivou-se entender os impactos ambientais no comportamento hidrológico da área através: (i) da caracterização morfométrica da mi- crobacia do rio Granjeiro e de duas microbacias adjacen- tes, (ii) da comparação dos parâmetros morfométricos das três microbacias, (iii) da avaliação ambiental da microba- cia do rio Granjeiro, e (iv) da correlação dos impactos ambientais avaliados com os parâmetros morfométricos. A caracterização morfométrica foi feita através de parâ- metros que caracterizam a forma da bacia, o sistema de drenagem e o relevo. A avaliação ambiental foi feita a partir de um diagnóstico da área. Constatou-se, pela mor- fometria, que a microbacia do rio Granjeiro deveria ser a menos propensa a cheias, mas os problemas ambientais por ações antrópicas contribuem com a inversão do qua- dro. Para minimizar os impactos ambientais, são sugeri- das ações através de medidas estruturais e não-estrutu- rais, compatíveis com a realidade sócio-ambiental local. Palavras-chave: Análise morfométrica, rio Granjeiro, impactos ambientais. Raimundo Teixeira Lima Neto Graduado. Tecnólogo em Saneamento Ambiental pela Faculdade de Tecnologia CENTEC - Unidade Cariri. E-mail: [email protected] Luiz Alberto Ribeiro Mendonça Dr., Professor Adjunto do Curso de Engenharia Civil da UFC - Campus Cariri. E-mail: [email protected] José de Araujo Pereira MSc., Professor do CEFET/CE - Unidade Juazeiro do Norte. E-mail: [email protected] Claire Anne Viana de Sousa MSc., Geóloga da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará (COGERH - Crato) E-mail: [email protected] José Yarley de Brito Gonçalves Graduado. Geólogo da COGERH - Crato E-mail: [email protected] Horst Frischkorn Dr., Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental da UFC E-mail: [email protected]

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Raimundo Teixeira Lima Neto et al.

AbstractHuman activity in the micro basin of Granjeiro river,

in the township of Crato/ Cariri, Ceará causes excessiverunoff, producing sediment deposition in watercoursesand causing floods along the river. In this investigationwe try to understand the environmental impacts on thehydrology of the area through: (i) a morphometriccharacterization of the Granjeiro river micro basin andtwo adjacent ones, (ii) a comparison of themorphometric parameters for the three micro basins,(iii) an environmental evaluation of the Granjeiro microbasin and (iv) a correlation of environmental impactsand morphometric parameters. Morphometriccharacterization is made through parameters thatdescribe the geometry of the basin, its drainage systemand its relief. Environmental evaluation is based on thespot diagnoses. According to morphometry, theGranjeiro micro basin should be less floods prone thanthe outher two. However, antropic environmentalproblems invert this order transferring a higherincidence of floods to the first. In order to minimizeenvironmental impacts, actions through structural andnon-structural measures, in accordance with social-environmental local reality, are proposed.

Keywords: Morphometric analysis, Granjeiro river,environmental impacts.

Engenharia Civil

Análise morfométrica e ambiental damicrobacia hidrográfica do rio Granjeiro,

Crato/CE(Morphometric and environmental analyses of the Granjeiro

river micro basin, Crato/ CE)

ResumoAs ações antrópicas na microbacia hidrográfica do

rio Granjeiro, município do Crato, Ceará, estão levando aexcessivo escoamento superficial, que produz assorea-mento dos cursos d’água e enchentes nos bairros poronde o rio passa. Nesse trabalho, objetivou-se entenderos impactos ambientais no comportamento hidrológicoda área através: (i) da caracterização morfométrica da mi-crobacia do rio Granjeiro e de duas microbacias adjacen-tes, (ii) da comparação dos parâmetros morfométricos dastrês microbacias, (iii) da avaliação ambiental da microba-cia do rio Granjeiro, e (iv) da correlação dos impactosambientais avaliados com os parâmetros morfométricos.A caracterização morfométrica foi feita através de parâ-metros que caracterizam a forma da bacia, o sistema dedrenagem e o relevo. A avaliação ambiental foi feita apartir de um diagnóstico da área. Constatou-se, pela mor-fometria, que a microbacia do rio Granjeiro deveria ser amenos propensa a cheias, mas os problemas ambientaispor ações antrópicas contribuem com a inversão do qua-dro. Para minimizar os impactos ambientais, são sugeri-das ações através de medidas estruturais e não-estrutu-rais, compatíveis com a realidade sócio-ambiental local.

Palavras-chave: Análise morfométrica, rio Granjeiro,impactos ambientais.

Raimundo Teixeira Lima NetoGraduado. Tecnólogo em Saneamento Ambiental

pela Faculdade de Tecnologia CENTEC - UnidadeCariri. E-mail: [email protected]

Luiz Alberto Ribeiro MendonçaDr., Professor Adjunto do Curso de Engenharia Civil

da UFC - Campus Cariri. E-mail: [email protected]

José de Araujo PereiraMSc., Professor do CEFET/CE - Unidade Juazeiro

do Norte. E-mail: [email protected]

Claire Anne Viana de SousaMSc., Geóloga da Companhia de Gestão dos

Recursos Hídricos do Ceará (COGERH - Crato)E-mail: [email protected]

José Yarley de Brito GonçalvesGraduado. Geólogo da COGERH - Crato

E-mail: [email protected]

Horst FrischkornDr., Professor Adjunto do Departamento deEngenharia Hidráulica e Ambiental da UFC

E-mail: [email protected]

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Análise morfométrica e ambiental da microbacia hidrográfica do rio Granjeiro, Crato/ CE

1. IntroduçãoO rio Granjeiro é o rio principal da

microbacia 03 da sub-bacia hidrográficado rio Salgado, que drena parte do muni-cípio do Crato/ CE e é afluente do rioJaguaribe (COGERH, 1999). Ele nasce naencosta da Chapada do Araripe (comdeclividade elevada, >70%) e possuitalvegue de 8,0 a 0,1% (IBGE, 1999).

No topo da chapada aflora a forma-ção geológica Exu, composta, basica-mente, de arenitos quartzosos, em geralcaulínicos. Nas três microbacias anali-sadas, essa área é protegida na FlorestaNacional do Araripe. Na encosta da cha-pada, sotopostas à formação Exu, decima para baixo, afloram as formaçõesArajara e Santana. A primeira composta,basicamente, de arenitos finos, siltitos eargilitos e a segunda, por calcário, gipsi-ta e folhelhos. No Vale do Cariri, soto-posto à formação Santana, aflora a for-mação Rio da Batateira, composta, basi-camente, por arenitos com intercalaçõesde lentes de argila e folhelhos. Ainda novale, encontram-se os sedimentos aluvi-ais (DNPM, 1996).

Na região, as chuvas são distribuí-das, principalmente, entre uma pré-esta-ção e uma estação chuvosa. A pré-esta-ção, de dezembro a janeiro, contribui com23% da precipitação anual e a estaçãochuvosa, de fevereiro a maio, com 62%(INMET, 1993).

Na sub-bacia do rio Salgado, os riose riachos são intermitentes, mas, em al-guns lugares, são perenizados por nas-centes na encosta da Chapada do Arari-pe, ou, ainda, por águas superficiais ar-mazenadas em açudes.

Para entender os impactos ambien-tais ocorridos na microbacia hidrográfi-ca do rio Granjeiro, serão feitas uma ca-racterização morfométrica e uma avalia-ção ambiental. Através da morfometria,serão obtidos índices quantitativos, osquais auxiliarão nos estudos hidrológi-cos da microbacia hidrográfica e no en-tendimento dos impactos ambientais ve-rificados. Serão, também, determinadosos parâmetros morfométricos de duasmicrobacias adjacentes para fins com-parativos.

Christofoletti (1970) ressalta queanálises morfométricas relacionadas àdrenagem, ao relevo e à geologia podemlevar à elucidação e compreensão de di-versas questões associadas à dinâmicaambiental local. No entanto, é importan-te frisar que os índices determinados naanálise morfométrica, isoladamente, nãosão capazes de simplificar a complexadinâmica de uma bacia hidrográfica, quetem forte variação temporal.

2. Material e método2.1 Área de trabalho

A Figura 1 mostra as microbaciashidrográficas dos rios Granjeiro (com de-clividade principal a sudoeste), Batatei-ra (a noroeste do rio Granjeiro) e Saco (asudeste do rio Granjeiro), no municípiodo Crato, sul do Estado do Ceará, locali-zadas entre as coordenadas 7° 10’ 44’’ e7° 17’ 57’’ de latitude sul e 39° 29’ 42’’ e39° 21’ 31’’ de longitude oeste deGreenwich.

Segundo o IPECE (2007), na encos-ta da Chapada, o clima é do tipo tropical

quente subúmido e, no vale, do tipo tro-pical quente semi-árido brando, com pre-cipitação média anual de, aproximada-mente, 1.090 mm.

Nessa área, encontram-se, princi-palmente, solos dos tipos aluviais, la-tossolos vermelho-amarelo e podzólicovermelho-amarelo.

2.2 Parâmetrosmorfométricos

Maiores detalhes sobre a metodo-logia adotada nesse trabalho encontram-se na literatura especializada de Villela eMattos (1975), Lima (1986) e Silva et alii(2004).

Os dados utilizados no cálculo dosparâmetros morfométricos das três mi-crobacias hidrográficas, como a delimi-tação dos divisores de águas, os perí-metros, as áreas de drenagem e o com-primento total dos cursos d’água, foramfeitos com uso do aplicativo AutoCad apartir do mapa georreferenciado da áreana escala 1:70.000.

Figura 1 - Localização da área de trabalho (P: perímetro, A: área, L: comprimento totaldos cursos d’água).

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2.2.1 Forma da bacia

Esse parâmetro é um dos mais difí-ceis de expressar em termos quantitati-vos, podendo ser representado pelosíndices:

• Coeficiente de compacidade (Kc): de-terminado através da razão entre pe-rímetro da bacia (P) e o de um círculo

de área igual a da bacia ( )Aπ2 , dado

pela expressão ( )APKc 28,0= ,onde P e A são, respectivamente, operímetro (em km) e a área da bacia(em km²).

• Fator de forma (Ff): determinado atra-vés da razão entre a largura média da

bacia ( )L e o comprimento axial docurso d’água (L); a largura média éobtida pela divisão da área por L, queé obtido medindo-se o curso d’águamais longo, desde a cabeceira maisdistante até o exutório.

2.2.2 Sistema de drenagem

Segundo Horton (1945) e Strahler(1957), as características de uma rede dedrenagem podem ser descritas pelos ín-dices:

• Razão de bifurcação (Rb): determina-do com base na ordem dos cursosd’água (u) e na contagem das mes-mas (Nu), a partir da construção dográfico Nu x u, de onde obtém-se areta de correlação Nu = a + bu, daqual define-se a razão de bifurcaçãoRb = b = ΔNu/Δu.

• Densidade de drenagem (Dd): deter-minada pela razão entre o comprimen-to total dos cursos d’água de uma

bacia ( )∑ il , sejam eles intermiten-tes ou perenes, e a área total da mes-ma (A).

2.2.3 Relevo da bacia

As características do relevo de umabacia podem ser avaliadas através dasdeclividades médias:

• Da bacia ( D ): determinada atravésdo método das quadrículas, queconsiste em lançar uma malha qua-driculada sobre o mapa topográficoda bacia, com os pontos de interse-ção das linhas assinalados; em cadaponto, a partir das curvas de níveis,determina-se uma declividade; apósa determinação da declividade dospontos, constrói-se uma tabela dedistribuição de freqüência, tomando-se uma amplitude para as classes, deonde se calcula a declividade médiada bacia.

• Do rio principal ( d ): obtida atravésda média harmônica ponderada da raizquadrada das declividades dos diver-sos trechos retilíneos, tomando-secomo peso a extensão de cada trecho,

( )[ ]2∑∑= iii dlld , onde l é

a extensão de cada trecho do rio e di,a declividades dos diversos trechosretilíneos.

3. Avaliação ambientalA avaliação ambiental da microba-

cia hidrográfica do rio Granjeiro foi feitaa partir da identificação, em campo, dosimpactos ambientais e de suas causas.

4. Resultados ediscussão4.1 Parâmetros morfométricos

A Figura 1 mostra a delimitação dasmicrobacias dos rios Granjeiro, Batateirae Saco, com seus respectivos perímetros,áreas e comprimentos dos cursos d’água.A Tabela 1 mostra a síntese dos parâme-tros morfométricos obtidos para as trêsmicrobacias analisadas.

Quanto à forma das bacias, apesarde os coeficientes de compacidade (Kc)estarem muito próximos (1,65 para a mi-crobacia do rio Granjeiro; 1,53 para a dorio Batateira; 1,43 para a do rio Saco),esses valores associados ao fator de for-ma (Ff) indicam que a microbacia do rioGranjeiro é a mais irregular quanto à for-ma (maior Kc) e a mais estreita e alonga-da (menor Ff) entre as três microbacias,indicando que há menor possibilidadede ocorrência de chuvas intensas co-brindo simultaneamente toda área.

Quanto ao sistema de drena-gem, as densidades de drenagem(Dd) indicam que as três microba-cias são medianamente drenadas(0,5 km/km² < Dd < 3,0 km/km², segundoVilela & Mattos, 1975).

Tabela 1 - Síntese dos parâmetros morfométricos obtidos para as microbacias dos rios Granjeiro, Batateira e Saco. (Kc: coeficiente

de compacidade, Ff: fator de forma, Dd: densidade de drenagem, Rb: razão de bifurcação, D : declividade média da

microbacia e d : declividade média do rio principal).

Kc Ff Dd Rb (m/m) (m/m)

Rio Granjeiro 1,65 0,1 1,02 -1,0 0,0679 0,0141

Rio Batateira 1,53 0,2 0,85 -4,0 0,1076 0,0062

Rio Saco 1,43 0,3 0,94 -2,5 0,1068 0,015

MicrobaciaForma Sistema de drenagem Relevo

D d

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Análise morfométrica e ambiental da microbacia hidrográfica do rio Granjeiro, Crato/ CE

Apesar de os valores de Dd esta-rem muito próximos e dentro do interva-lo proposto para bacias medianamentedrenadas (1,02 km/km² para a microbaciado rio Granjeiro; 0,85 km/km² para a dorio Batateira; 0,94 km/km² para a do rioSaco), esses valores, associados aos darazão de bifurcação (Rb), indicam que amicrobacia do rio Granjeiro é a menospropensa a cheias entre as três por pos-suir maior Rb.

Quanto ao relevo das bacias, a mi-crobacia do rio Granjeiro possui menor

declividade média ( D ) entre as três, in-dicando que a mesma deveria apresen-tar escoamento superficial mais lento emaior tempo de concentração. Essa con-dição indica que os tributários conduzi-rão água para o rio principal de formamais lenta. Esse maior tempo de concen-tração deveria contribuir também comuma maior infiltração nos arenitos da for-mação Rio da Batateira, que compõem ageologia da bacia no vale, bem como coma evaporação, contribuindo com umamenor chegada de água por escoamentosuperficial ao rio Granjeiro, que é o prin-cipal.

Com relação à declividade média do

rio principal ( d ), entre os quatro riosanalisados, o rio Granjeiro possui 0,0141m/m, valor muito próximo da declividadedo rio Saco que é de 0,0150 m/m. Isto in-dica que o rio Granjeiro deve conduzirágua com maior velocidade que, por exem-plo, o rio Batateira, que possui declivi-dade média de 0,0062 m/m. Mas, comoos tributários do rio Granjeiro contribu-em lentamente para ele, esse efeito de-veria ser minimizado.

Com base nessa análise, pode-seobservar que a microbacia do rio Gran-jeiro deveria ser a menos propensa a chei-as. Mas os problemas identificados naavaliação ambiental contribuem com ainversão do quadro, tornando-a maispropensa a cheias.

4.2 Avaliação ambientalA identificação dos problemas am-

bientais e a determinação de suas cau-

sas, citadas a seguir, corroboram com osproblemas citados por Sousa et alii (2006).

Identificação dos problemas ambi-entais:

• Ocupação irregular nas áreas depreservação permanente nas pro-ximidades da encosta da Chapada(Figura 2a).

• Desmatamento na encosta da Cha-pada e retirada da mata ciliar ao lon-go dos rios e riachos, causando des-lizamentos e assoreamento dos cur-sos d’água.

• Impermeabilização nos interflúviosdevido à urbanização crescente(Figura 2b), reduzindo a infiltração eaumentando o escoamento superfi-cial, muitas vezes tornando trágica aquadra chuvosa da região, que vaide fevereiro a maio (Figura 2d).

• Impermeabilização da área de inun-dação do rio Granjeiro na zona urba-na, onde o rio encontra-se contido

num canal de concreto estreito, comelevado risco de extravasamento(Figura 2c).

• Lançamento de esgotos e a disposi-ção inadequada de resíduos sólidosdentro do canal, causando poluiçãodas águas e poluição visual (o lança-mento de esgotos residenciais nocanal do rio Granjeiro chegou a pro-duzir uma voçoroca, conhecida comovulcãozinho (Ribeiro & Guerra,2003)).

• Incompatibilidade da atual situaçãodo canal do rio Granjeiro com a reali-dade ambiental invariável (as mudan-ças bruscas na declividade dos tal-vegues do rio Granjeiro e seus aflu-entes, considerados de alta declivi-dade nas nascentes da encosta daserra e baixa declividade no Vale doCariri).

• Existência de um canal conhecidocomo Levada do Lameiro, que trans-põe parte das águas da fonte Bata-

Figura 2 - Ocupação i rregular nas áreas de preservação permanente (a),impermeabilização dos interflúvios devido à urbanização crescente (b), rio Granjeirocontido num canal de concreto estreito (c) e quadra chuvosa trágica (d).

(a) (b)

(c) (d)

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teira, localizada na microbacia vizi-nha, e que, durante o período chu-voso, também faz transferência decheias para o rio Granjeiro. A capaci-dade máxima do canal é de 163 m³/h.Durante o período seco, a vazão li-berada para irrigação é de, aproxima-damente, 35 m³/h. No período chu-voso, essa vazão é acrescida do es-coamento superficial, podendo atin-gir a capacidade máxima. Mas, comonão há monitoramento do canal, porparte dos usuários, ele é gradativa-mente obstruído pelo transporte desedimentos. Assim, dependendo dograu de obstrução e da intensidadeda chuva, ele pode contribuir comsignificativa vazão.

Determinação das causas dos pro-blemas ambientais identificados:

• Plano diretor urbano incompatível coma hidrologia e hidráulica da microbacia.

• Urbanizações progressivas, feitassem planejamentos e disciplinamen-to do uso e ocupação do solo, ocu-pando com quase totalidade a micro-bacia do rio Granjeiro.

• Ocorrência de vazões de pico extra-ordinárias, acima do valor máximoconsiderado para a capacidade dasobras de drenagem.

• Falta de órgão gestor e coordenadorpara a drenagem urbana.

• Falta de conscientização da popula-ção com o problema de drenagem ecom o lançamento de esgotos e resí-duos sólidos nos rios, riachos, gale-rias e canais.

• Falta de investimento, tanto no pla-nejamento, como na execução de ma-nutenção de obras civis.

• Ocupação irregular do solo, sem umprograma de controle de erosão.

• Falta de controle e fiscalização de áre-as ocupadas e de obras irregulares.

Para uma melhor avaliação das con-dições ambientais da área, deve-se fazerum diagnóstico sócio-ambiental que con-temple os impactos ambientais de forma

mais detalhada; as condições socioeco-nômicas da população; a qualidade daágua; as características da flora e fauna;entre outras. Esse detalhamento resulta-rá num diagnóstico integral mais amplo,que possibilite a geração de um bancode dados para determinar, não só os fa-tores naturais, mas, também, os fatoressócio-ambientais que contribuem paradegradação da área. Esse diagnósticodeverá incluir as demais microbacias quenão apresentaram cheias no baixocurso, mas que englobam parte da zonaurbana.

5. AgradecimentosÀ Faculdade de Tecnologia

CENTEC - unidade do Cariri e à Compa-nhia de Gestão dos Recursos Hídricosdo Estado do Ceará (COGERH), peloacolhimento e incentivo na elaboraçãodesse trabalho.

6. ReferênciasbibliográficasCHRISTOFOLETTI, A. Análise

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Artigo recebido em 24/05/2007 eaprovado em 14/05/2008.