Radioweb: Outra rádio, diferentes processos de produção ... Aparecida... · próprio meio e a...
-
Upload
nguyenthuy -
Category
Documents
-
view
216 -
download
0
Transcript of Radioweb: Outra rádio, diferentes processos de produção ... Aparecida... · próprio meio e a...
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP
Arlete Aparecida Taboada
Radioweb: Outra rádio, diferentes processos
de produção, roteirização e edição
MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de Mestre
em Comunicação e Semiótica, na Área de
Signo e Significação nas Mídias sob a
orientação da Prof. Doutora Jerusa Pires
Ferreira
SÃO PAULO
2012
3
Banca examinadora
4
Agradecimentos
À professora Jerusa Pires Ferreira,
pelo pacto de orientação que me proporcionou esta chegada;
À parceira desta e de outras caminhadas, Carmen Lúcia José,
com quem tenho o privilégio de continuar aprendendo e me orientando;
Ao companheiro Everaldo Gouveia,
pela paciência e estímulo sempre presentes;
A todos os alunos e ex-alunos e aos demais parceiros que contribuem e contribuíram
com a realização da Radioweb São Judas.
A Vanderlei Carvalho (in memoriam):
“Tenho muito orgulho de você, Téta.”
5
Resumo
Esta pesquisa teve o objetivo de verificar a composição estrutural dos sistemas de
linguagem do rádio hertziano e da radioweb e, a partir da natureza distinta de ambos,
identificar diferenças e semelhanças entre eles para apontar os deslocamentos ocorridos,
em termos de linguagem sonora, e as possíveis transformações decorrentes nos
processos de produção, roteirização e edição de programas radiofônicos, quando da
relação de fronteira entre o rádio e a radioweb.
Há experiências variadas na Internet, desde o transporte do modelo sistêmico do rádio
para a web até experiências sonoras acompanhadas de legendas em verbal-escrito e de
imagens visuais estáticas. No entanto, pouco se pensou até agora em como ocorrem os
deslocamentos da linguagem radiofônica de um sistema para outro e quais
transformações ocorrem nos processos de produção de programas radiofônicos.
Partimos das seguintes hipóteses:
1. A radioweb é obrigada a apresentar uma programação que pode ser ouvida em
diferentes momentos: a) repetidamente e no tempo planejado e decidido pelo ouvinte-
internauta, quando acessa a internet; b) após arquivar o programa para escuta posterior;
c) como no rádio, o programa também pode ser ouvido no tempo presente – “ao vivo” –
da emissora, desde que o horário da transmissão seja previamente estabelecido e o
ouvinte-internauta avisado com antecedência.
2. Muda o fluxo temporal na produção, roteirização e edição da programação. Se no
rádio hertziano é ele quem planeja a transmissão dos seus programas, preenchendo
sequencialmente as 24 horas, na web, o fluxo temporal da programação não é
seqüencial, pois os programas estão disponíveis permanentemente para atender aos
diferentes momentos de escuta, citados no item anterior. A programação “está no ar”
sempre que o ouvinte-internauta entrar no ar.
A metodologia deste estudo é a comparação qualitativa dos dois sistemas de linguagem
dos meios radio e radioweb, tendo por corpus uma emissora web constituída, a
educativa Radioweb São Judas, para analisar os deslocamentos ocorridos na linguagem
sonora e as transformações nos processos de produção, roteirização e edição dos
programas radiofônicos que passaram a considerar esse novo fluxo temporal, o tempo
presente do ouvinte-internauta, receptor e emissor ao mesmo tempo, e não mais o tempo
presente do emissor.
Esta pesquisa teve a fundamentação teórica nos estudos sobre semiosfera e fronteira, de
Iuri Lotman, sobre meios de comunicação, de Marshall Mcluhan, sobre rádio, de
Armand Balsebre, Carmen Lúcia José e Marcello Medeiros; e sobre hipermídia, de
Lúcia Santaella.
Palavras-chave: radio, radioweb, fluxo temporal, produção, programa
6
Abstract This research had the objective of verifying the structural composition of the language
systems of the Hertzian radio and web radio, parting from the distinguished nature of
both, identify the differences and likenesses between them to point out the movements
occurred in terms of sound language, and the possible transformations resulting of the
production, writing, and editing processes of radio programs in the relation of the
boundary line between radio and web radio.
There are various experiences on the internet, since the transportation of the systemic
model of radio to the web, until sound experiences with subtitles and static pictures.
However, little have been thought on how radio language changes from one system to
another and which transformations occurs on the processes of radio programs
production.
We part from the following hypothesis:
1. Web radio is obligated to present a programming that can be listened to in different
moments: a) repeatedly and in a time that was decided and planned by the web listeners,
when accessing the internet; b) filing the programs for posterior listening; c) as much as
the radio the program can also be listened at the present time – “live” – as long as the
time have been previously established and the web listener have also been previously
informed.
2. In the production, writing and editing of the programming the time flux changes. If in
the traditional broadcasting stations it is the programming that defines the time of
transmission filling in sequence the whole of the 24 hours, on the web, the time flux has
no sequence, because the programs are permanently available regarding the different
listening moments summoned on the previous item. The programming is “live” every
time the web listener is online.
The methodology of this study is the qualitative comparison of language systems, both
radio and web radio, having as information a constituted wed broadcasting station, the
educational Radiowed São Judas, to analyze the movements occurred in sound language
and the transformations on the production, writing and editing processes of radio
programs that started to consider this new time flux, the present time of the web listener,
receiver and emitter at the same time, and no longer the present time of the emitter.
This research had its theoretic foundation on studies about semiosphere and boundaries,
from Iuri Lotman, about means of communication, from Marshal Mcluhan, about radio,
from Armand BALSEBRE, Carmen Lúcia José and Marcelo MEDEIROS; and about
hypermedia, from Lúcia SANTAELLA.
Keywords: radio, web radio, time flux, production, program
7
Sumário Introdução .................................................................................................. 9
Capítulo 1 – Rádio e radioweb: linguagem .............................................. 13
1.1. Rádio ................................................................................................. 13
1.2. Constituintes da linguagem radiofônica ............................................. 15
1.2.1. Palavra falada .................................................................................... 15
1.2.2. Trilha musical .................................................................................... 17
1.2.3. Efeito sonoro ..................................................................................... 18
1.3. Especificidades radiofônicas ...................... ...................................... 19
1.4. Radioweb .......................................................................................... 23
1.5. Especificidades da radioweb ............................................................ 26
1.6. Síntese das especificidades dos dois espaços semióticos .............. 29
Capítulo 2 – Rádios em fronteira ............................................................... 30
2.1. Tradução das estruturas radiofônicas .............................................. 32
2.1.1. Audição e visualização .................................................................... 33
2.1.2. Trânsito e permanência das mensagens .......................................... 36
2.1.3. Intensificação da interatividade ......................................................... 37
2.2. Síntese das traduções em fronteira dos dois espaços semióticos .. 39
Capítulo 3 – Temporalidade dos espaços ................................................ 41
3.1. Relógio radiofônico ........................................................................... 41
3.2. Linearidade e alinearidade ............................................................... 45
3.3. Duração temporal flexibilizada ......................................................... 47
3.4. Instantaneidade e interatividade ...................................................... 49
3.5. Difusão e expressão ....................................................................... . 52
3.6. Síntese das traduções temporais dos dois espaços semióticos ..... 54
Capítulo 4 – Radioweb São Judas ............................................................. 56
4.1. Apresentação do objeto ..................................................................... 56
4.2. Análise do corpus ............................................................................... 59
4.2.1. Da visualidade .................................................................................... 59
8
4.2.2. Da sonoridade .................................................................................... 62
4.2.3. Programação Musical ......................................................................... 64
4.2.4. Programa Lado B ................................................................................ 68
4.2.5. Em Pauta – programas jornalísticos ................................................... 72
4.2.6. Programa Língua Portuguesa ............................................................ 74
4.2.7. Programa Navitrola ............................................................................ 79
Considerações finais ................................................................................... 86
Bibliografia ................................................................................................... 90
Anexos .......................................................................................................... 95
Anexo A – Programação da Radioweb São Judas ........................................ 95
Anexo B – Face da Radioweb ........................................................................ 97
Anexo C – Seleção do Programa ................................................................... 98
Anexo D – Escuta do Programa ..................................................................... 99
Anexo E – Programação Musical .................................................................. 100
Anexo F– Lado B .......................................................................................... 101
Anexo G – Lado B ......................................................................................... 102
Anexo H – Em Pauta .................................................................................... 103
Anexo I – Língua Portuguesa .................................................................... 104
Anexo J – Língua Portuguesa ...................................................................... 105
Anexo K – Navitrola ..................................................................................... 106
Anexo L – Navitrola ...................................................................................... 107
9
Introdução
Depois de muitos anos atuando em diversas funções no rádio e recentemente em
uma emissora web, a Radioweb São Judas, da Universidade São Judas Tadeu, à medida
que desenvolvia as atividades de produção, roteirização e edição dos programas que
seriam veiculados, tornavam-se cada vez mais visíveis as diferenças e semelhanças no
sistema de linguagem sonora das duas mídias. Ao transformar esta experiência em uma
pesquisa de mestrado, não poderia deixar de lembrar o que a professora Jerusa Pires
Ferreira dissera em um dia de abril de 2011, durante uma de suas aulas no curso de pós-
graduação da PUC-SP, quando explanava sobre os semióticos russos e mencionava o
processo de aprendizagem de V.V. Ivanov, no qual também se espelhava: “teoria e
vivência”. Assim, percebi que, intuitivamente, havia saído em busca da teoria que
permitisse fundamentar minha vivência, neste caso, profissional.
Esta pesquisa teve o objetivo de verificar a composição estrutural dos sistemas
de linguagem do rádio hertziano e da radioweb e, a partir da natureza distinta de ambos,
analisar diferenças e semelhanças dos dois modelos sistêmicos de rádio, atualmente em
fronteira, para apontar quais os elementos constitutivos da linguagem sonora do rádio
são traduzidos quando deslocados para o radioweb e quais mudanças são operadas nos
processos de roteirização, produção e edição de programas radiofônicos.
Algumas hipóteses configuraram-se em pontos de partida para esta pesquisa:
primeira, a de que a radioweb é obrigada a apresentar uma programação que pode ser
ouvida em diferentes momentos: a) repetidamente e no tempo planejado e decidido pelo
internauta, quando acessa a internet; b) após arquivar o programa para escuta posterior;
c) como no rádio, também no tempo presente – “nas transmissões ao vivo” – da
emissora, desde que o horário da transmissão seja previamente estabelecido e o
ouvinte/internauta avisado com antecedência.
A segunda hipótese sugere a mudança de fluxo temporal na produção,
roteirização e edição dos programas para atender a esses diferentes momentos de escuta
citados anteriormente, considerando que, se no rádio hertziano é a própria emissora que
planeja a transmissão da programação, preenchendo sequencialmente as 24 horas em
que ficar no ar, na web, o fluxo temporal da programação não é seqüencial, pois os
programas permanecem disponíveis permanentemente para atender aos diferentes
momentos de escuta decididos e planejados pelo ouvinte-internauta.
10
Fundamentamos o presente trabalho em pensamentos consagrados de teóricos
sobre texto cultural, comunicação, rádio, programação radiofônica e hipermídia. De Iuri
Lotman, adotamos os conceitos sobre semiosfera e fronteira, localizando, nesta
pesquisa, os processos de produção, roteirização e edição de programas radiofônicos
como os mecanismos bilíngües existentes na fronteira, necessários à tradução que
resulta no deslocamento de constituintes do sistema de linguagem do radio para a rádio
transmitida pela internet, a radioweb.
De Marshall Mcluhan, nos baseamos no desenvolvimento da consolidada
proposição de que o meio é a mensagem representada por estudos que levam em conta o
próprio meio e a matriz cultural em que atua; de Armand Balsebre, recorremos ao seu
estudo sobre linguagem radiofônica, apresentada como o conjunto de elementos
expressivos, tais como a palavra, a música ou trilha musical, os efeitos sonoros e o
silêncio que, em suas combinações, resultam em textos de comunicação com diferentes
sentidos.
Os distintivos da palavra oral mediatizada traçados por Paul Zumthor em sua
pesquisa sobre poesia oral também foram base deste trabalho, bem como as definições
sobre matrizes da linguagem e hipermídia, de Lúcia Santaella, e sobre estruturas do
sistema de linguagem radiofônico de Carmen Lúcia José, Eduardo Meditsch e Marcelo
Medeiros. Por fim, buscamos outro semioticista, Aaron Gurevitch, para fundamentar as
questões referentes à temporalidade.
O método utilizado nesta pesquisa foi o comparativo qualitativo, com a
formulação de um problema, inserção de quadro teórico de referência, observação e
análise dos dados, teste das hipóteses e generalização das conclusões. Antes, porém, foi
feita revisão bibliográfica sobre rádio, comunicação e sistemas de linguagem, para obter
o que Juremir Machado da Silva define por “inventariar o que já foi dito sobre o
assunto” (2001: 64).
Segundo tipificação do autor, a observação dos dados da pesquisa foi atuante à
medida que a autora teve participação prática na execução dos processos de produção,
roteirização e edição de programas radiofônicos nos dois espaços de radiofonia, em
emissoras cuja programação é transmitida pelo sistema eletromagnético e na de
transmissão digital pelo computador. Assim, essa observação contribuiu com a
elaboração do que Silva chama de hipóteses de confirmação, “em geral, partem dos
fatos, do „real‟, do concreto, do vivido” (2003:33).
11
Um esclarecimento, nos parece, se faz necessário: o ouvinte de rádio ou o
ouvinte-internauta de radioweb não são protagonistas nesta pesquisa. O que se buscou
foi mostrar os deslocamentos ocorridos na linguagem sonora e as transformações na
produção, roteiro e edição de programas quando em fronteira do rádio com o novo
espaço semiótico radiofônico. Em outras palavras, buscou-se mostrar que os produtores,
roteiristas e editores de áudio devem atender as especificidades das estruturas dessa
nova mídia para a construção das modelizações radiofônicas e seus significados,
confirmando Mcluhan (o meio é a mensagem) e Lotman (um espaço não semiótico,
quando em fronteira, pode resultar em ouro espaço semiótico).
Este relatório tem a seguinte apresentação: o primeiro capítulo traz informações
e dados sobre o surgimento do rádio e da radioweb e explicita sobre a constituição do
sistema de linguagem radiofônica, para, em seguida, iluminar as especificidades das
duas mídias. Ainda neste capítulo são estudadas as modelizações radiofônicas e
elencadas as diferenças e semelhanças entre os dois espaços semióticos radiofônicos
também estão presentes neste capítulo.
No capítulo dois foi defendida a primeira hipótese deste trabalho. No encontro
em fronteira dos dois espaços semióticos, a estrutura da programação disponibilizada ao
receptor e, no caso da radioweb, ao receptor e também emissor é traduzida: no rádio a
grade de programação tem o desenho de uma lista de programas sequencialmente
transmitidos sob planejamento da emissora; na radioweb muda o desenho da
programação - ela passa a ser visualizada e não apenas audibilizada.
Em Temporalidade nos dois espaços semióticos radiofônicos, título do terceiro
capítulo, está a hipótese de que a produção, roteiro e edição de programas passa a
atender ao novo fluxo temporal da programação disponível permanentemente e sempre
no tempo presente do ouvinte-internauta da radioweb e não mais no tempo presente da
emissora que trasnsmite sequencialmente seus programas.
Para ilustrar a defesa das hipóteses apresentadas, o objeto selecionado para
análise foi a Radioweb São Judas, no ar desde maio de 2009, emissora com fim
educativo, implementada pela Pró-Reitoria de Extensão da Universidade São Judas
Tadeu, cuja grade de programação alia conteúdo artístico e acadêmico com programas
produzidos, roteirizados e apresentados por estagiários, alunos do curso de
Comunicação Social.
Compuseram o corpus de análise trecho de uma Programação Musical
denominada Chico Buarque e seus intérpretes, além de quatro programas denominados:
12
Lado B, Navitrola, Língua Portuguesa e Em Pauta, todos apresentando as matrizes
visual e sonora, com predominância da segunda. Esses programas, bem como a própria
Radioweb São Judas, podem ser ouvidos no endereço eletrônico
www.usjt.br/radio_web. Uma outra alternativa de escuta para os programas
selecionados é a utilização do CD, na extensão mp3, que está afixado na contracapa
deste trabalho.
13
Capítulo 1 – Radio e Radioweb: linguagem
1.1. Rádio
Meio quente, surgido no século passado, com transmissão analógica, o rádio
configura-se como mídia em que comunicadores, produtores, redatores e técnicos, de
um lado, interagem com ouvintes, e de outro, ouvintes interagem com a mídia por meio
de cartas e telefonemas para sugestões, críticas ou elogios sobre os programas
transmitidos pelas ondas hertzianas.
Implantado no Brasil em 1.922 como meio de comunicação para a elite
(ORTRIWANO, 1985: 14), com sistema de radiodifusão pluralista em que convivem
emissoras estatais e privadas ou comerciais, seu caráter de entretenimento reforçou-se
na década de 30, ao transformar-se em meio de comunicação de massa, transmitindo
programas de auditórios, shows e radionovelas. Após a era do ouro, com o advento da
televisão e a fuga dos anunciantes, o rádio buscou sua sobrevivência na veiculação de
música, notícias e prestação de serviços.
Transmitido em ondas eletromagnéticas primeiramente em AM (Amplitude
Modulada) e a partir da década de 60, em FM (Freqüência Modulada), o rádio tem seu
mapa estendido com a formação das redes transmitidas via satélite nos anos 80. Na
década de 90, nova expansão, com o surgimento das rádios comunitárias. Entre
emissoras comerciais, educativas e comunitárias, o Ministério das Comunicações
registrava em junho de 2011 cerca de 9.300 emissoras no país.
Programas, vinhetas, chamadas, blocos comerciais e blocos jornalísticos são
veiculados em tempo real. Som, produz apenas som e esta é a natureza da linguagem
radiofônica. Basta virar ou apertar o botão para procurar uma emissora que comungue
sua direção artística com o interesse do ouvinte, no que está programado e disponível
para ouvir, obrigatoriamente respeitando-se a distribuição de horário e programas das
respectivas grades.
Segundo Armand Balsebre:
“Existe lenguaje cuando hay un conjunto sistemático de signos que
permite un cierto tipo de comunicación. Que un lenguaje se caracterice
por una agrupación de signos es lo que lo define como sistema semiótico.
La función comunicativa del lenguaje encierra un doble aspecto: El
código o repertório de posibilidades para producir unos enunciados
significantes; El mensaje o variaciones particulares sobre la base del
código.” (2004:18)
14
A linguagem radiofônica é o conjunto de elementos expressivos, tais como a
palavra, trilha musical, efeitos sonoro e o silêncio que, em suas inúmeras
modelizações1, resultam em textos de comunicação com os mais diferentes enunciados e
sentidos: “[...] perdem sua unidade conceitual ao fundir-se no sistema de transmissão
que é a linguagem radiofônica” (PRADO, 1989: 36).
Para Balsebre, a tecnologia também pertence à linguagem radiofônica,
destacando a presença de microfones, dos sistemas de propagação eletromagnética,
filtros, reverberadores, recursos de gravação e reprodução, além da audição do ouvinte
ou a situação de escuta desse ouvinte, por considerá-la parte da cadeia significante que
confecciona significado à mensagem sonora. (2004: 27)
A análise da ocorrência de trânsito da estruturalidade do rádio para a
estruturalidade da radioweb proposta nesta pesquisa se assenta nos constituintes palavra
falada, trilha musical, música, efeito sonoro e silêncio, bem como nas modelizações
resultantes da interação existente entre suas estruturalidades como programas, vinhetas,
grade de programação, direção artística e chamadas, considerando os estudos de
Marshall Mcluhan de que “as mais recentes abordagens ao estudo dos meios levam em
conta não apenas o „conteúdo‟, mas o próprio meio e a matriz cultural em que um meio
ou veículo específico atua” (1964:25); de Balsebre (2004), que defende a tecnologia e
seus recursos de gravação e propagação como integrante deste sistema de linguagem; e
os de Paul Zumthor2 (2010), que em sua pesquisa sobre poesia oral tipificou alguns
tipos de oralidade, colocando a do rádio como oralidade mediatizada.
1 O Grupo Oktiabr, em Semiosfera: exploração conceitual nos estudos semióticos da cultura, publicado
em Semiótica da Cultura e Semiosfera, organizado por Irene Machado, esclarece que há sistemas
modelizantes do tipo primário, como o da linguagem verbal que é dotada de estrutura, e sistemas
secundários, os que constroem uma estruturalidade ou outras possibilidades de combinação de signos,
apesar de manterem, na linguagem verbal, uma estrutura referencial. (...) a palavra modelização deve ser
entendida como um „programa para a análise e constituição de arranjos‟ e não simples „reprodução de um
modelo‟”. (2007:29) 2 Paul Zumthor (2010) define três situações de oralidade: a primária ou pura, sem contato com a escrita;
a que coexiste com a escrita, funcionando de dois modos, como mista, cuja influência permanece externa,
ou como segunda, “que se recompõe a partir da escrita”, de uma cultura letrada “na qual toda expressão é
marcada pela presença da escrita”; a terceira situação diz respeito à oralidade mecanicamente
mediatizada, realizada por meios auditivos e audiovisuais. (2010:36)
15
1.2. Constituintes da linguagem radiofônica
1.2.1. Palavra falada
Definida acusticamente pelo timbre (ligado à constituição física) e pelos níveis
variados de tom ou altura (alta ou baixa, agudo ou grave) e de intensidade e sonoridade
(forte ou suave, alta ou baixa), a palavra falada, no rádio, baseia a locução radiofônica,
dirigida a públicos de diversas faixas sócio-econômico-culturais, de gênero, idade e
hábitos de escuta diferenciados. Desenvolve-se em seus diversos tipos - locutor
anunciador ou comercial, para textos comerciais ou chamadas institucionais, locutor
apresentador e apresentador animador, para programas de diversos gêneros,
comentarista, narrador, noticiarista e entrevistador – com performances3 diferenciadas
para atendimento dos respectivos públicos.
A configuração, com exceções, foi estabelecida pelo rádio e sua própria história
mostra: a voz jovem, com tom alto, é dirigida ao público jovem; a voz mais contida,
tom mais grave, para o público adulto; se a locução é feita com ritmo veloz e forte
intensidade, portanto com alta estimulação, é adequada para o dia; com ritmo lento e
intensidade suave, de baixa estimulação, é apropriada para a noite.
Dentre as características da locução radiofônica estão a articulação ou
vocalização, que permite a projeção da palavra para o exterior do aparelho fonador; a
harmonia, ligada à maneira como são pronunciadas as palavras, se simultaneamente, ou
de forma suave ou tensa, e suas variadas combinações de sons justapostos ou
sobrepostos; a entonação ou melodia da palavra que, segundo Balsebre, definem a
expressão musical da palavra e sua significação lingüística:
La expresión musical de la palabra radiofônica y su significación
lingüística se definen conjuntamente por la melodia o entonación. La
curva melódica que la voz produce en la pronunciación de las palabras y
frases expresa la actitud psicológica del sujeto hablante [...] (2004:57)
O ritmo também é característica da locução radiofônica, traçado pela alternância
de velocidade com que são proferidas as unidades melódicas ou sonoras “porção
3 No Introdução à poesia oral, Zumthor discorre sobre as regras da performance vocal: “o ouvinte „faz
parte‟ da performance. O papel que ele ocupa, na sua constituição, é tão importante quanto o do
intérprete” ,distinguindo a ele dois papéis, “o de receptor e o de coautor. (2010: 257)
16
mínima de discurso com uma forma musical determinada” (2004: 59), separadas por
pausas que são incorporadas ao texto sonoro com a função rítmica.
Para delimitar a pausa não basta obedecer a pontuação estabelecida pelas regras
gramaticais do texto escrito, pois além de permitir a respiração do locutor, a pausa
atende a outra característica da palavra falada: a naturalidade. Na oralidade mediatizada
e mista em que a oralidade coexiste com a palavra escrita, mesmo quando o texto é
escrito deve ser falado com a naturalidade do texto oral, seja quando o locutor estiver
lendo ou improvisando.
Assim, as regras estabelecidas para a redação do texto radiofônico, entre elas,
frases curtas, concisas, busca da precisão e objetividade, não cortar palavras ao mudar
de linha, não cortar frases ao mudar de página, escrever por extenso siglas, abreviações
e números (FERRARETTO, 2001: 204-228; PORCHAT, 1993: 79-80;) vem ao
encontro das características do texto sonoro, ou seja, não é mais a palavra escrita, mas a
palavra escrita para ser falada.
Essa combinação de características do texto escrito com as do texto sonoro é o
que leva Balsebre a denominar
[...] palavra radiofônica e não voz radiofônica, como “al sistema
expresivo del lenguaje radiofônico producido por la voz humana. [...] El
concepto „palavra radiofônica‟ connota la acción enunciativa del sonido
verbal de una función comunicativa”. (2004: 42)
Ou seja, a palavra radiofônica é mais que som, é ação enunciativa com
significado. Se para Balsebre é palavra radiofônica, para Zumthor é vocalidade no lugar
de oralidade: “[...] a voz ultrapassa a palavra. [...] A voz não traz a linguagem: a
linguagem nela transita, sem deixar traço” (2010: 11). E ele estabelece as regras da
performance
[...] a ação complexa pela qual uma mensagem poética é
simultaneamente, aqui e agora, transmitida e percebida. Locutor,
destinatário, circunstâncias se encontram concretamente confrontados,
indiscutíveis. Na performance se redefinem os dois eixos da comunicação
social: o que junta o locutor ao autor; e aquele em que se unem a situação
e a tradição. (2010: 31)
Também na locução radiofônica a performance vocal constrói sentidos.
17
1.2.2. Trilha musical
A trilha musical, recorte ou fragmento ressignificado da música, é outro
constituinte da linguagem radiofônica. Ao inserir-se em um contexto de comunicação e
agregar-se a outros sistemas expressivos como o da palavra e o dos efeitos sonoros para
compor a linguagem radiofônica, os distintivos da música – harmonia, melodia e ritmo
– passam a ser avaliados na seleção da trilha adequada à construção de sentido de
determinada mensagem. Ou seja, a música, transformada em trilha, expande-se nas suas
singularidades de ser tocada, cantada, dançada ou ouvida em sua totalidade, e adquire
funções diversas para construir novos significados resultantes da combinação com os
demais constituintes da linguagem radiofônica. Essa pseudo-fragmentação da música
quando transformada em trilha, ao combinar-se com os outros constituintes sonoros
passa a conformar outra unidade, esta, chamada mensagem radiofônica.
Balsebre dá à trilha o nome de música radiofônica: “La música en la radio es la
música radiofónica, valor de uso comunicativo y expresivo especificamente
radiofônico” (2004:90). Em suas combinações com os outros constituintes da linguagem
radiofônica, resultados diversos vão sendo construídos de acordo com o propósito das
mensagens e assim, a trilha musical passa a cumprir função diferenciada da música.
Carmen Lúcia José e Marcos Júlio Sergl (2006) elencam possíveis situações e
funções de uso da trilha musical no rádio, entre elas: quando associada à locução
radiofônica, a personagens, produtos comerciais e programas; para denotar mudança de
temas ou assuntos; quando é o próprio assunto, portanto reconhecida como parte de uma
composição integral; para dar ritmo à locução; e quando é elemento de contato para
atrair audiência para o que vai ser falado.4
Os autores também destacam que no rádio, a trilha e os efeitos sonoros
constituíram a sonoplastia, composição de recursos sonoros para referencializar
ambientes para a locução do texto verbal oral. Ao ampliar-se em seus constituintes,
apropriando-se de outras estéticas sonoras, a sonoplastia é renomeada como Paisagem
Sonora. “A sonoplastia pode ser entendida como o conjunto de elementos sonoros
disponíveis para a composição da Paisagem Sonora5.
4 JOSÉ, Carmen Lúcua e SERGL, Marcos Júlio.Paisagem sonora. Intercom, 2006. Disponível em
www.galaxy.intercom.org.br 5 Ibidem
18
Vale lembrar, e os próprios autores mencionam, que Paisagem Sonora é uma
expressão originária da música. Murray Schafer, em O Ouvido Pensante, já a havia
utilizado quando tomou a definição de “música de John Cage „sons à nossa volta, não
importa se estamos dentro ou fora das salas de concerto‟” (1991:187) para analisar a
possibilidade de uso dos vários sons do mundo na composição musical.
1.2.3. Efeito sonoro
Produzidos com o registro de sons ambientes naturais ou criados
tecnologicamente, os efeitos podem descrever determinada cena, conotar atmosferas
psicológicas, ilustrar assuntos ou fazer parte da narrativa das peças radiofônicas,
interagindo com a percepção e reconhecimento do ouvinte a respeito do que está
ouvindo.
Balsebre apresenta funções básicas na combinação dos aspectos denotativos e
conotativos dos efeitos, com resultados diferenciados. São elas: a) Função ambiental ou
descritiva, quando, pela denotação semântica, o efeito sonoro restitui a realidade; b)
função narrativa, quando podem se articular pela justaposição e sobreposição de
distintos segmentos sonoros da mesma realidade, do mesmo espaço temporal ou de
distintas seqüências radiofônicas, entre programas, temas ou seqüências radiofônicas; c)
função expressiva, em que predomina o uso da metáfora para expressar algo, cuja
analogia entre a fonte sonora e a idéia que representa vem determinada por convenções
culturais, mitos ou simples semelhanças rítmicas; d) função ornamental ou ilustrativa,
que não apresenta denotação semântica como o descritivo. (2004:125-132)
Além dos constituintes palavra, trilha e efeito e também das duas noções
consideradas por Balsebre como constituintes da linguagem radiofônica - tecnologia,
conjugando a presença de microfones, sistemas de propagação eletromagnética, filtros,
reverberadores, recursos de gravação e reprodução e audição do ouvinte ou a situação
em que ocorre a escuta considerando seu sistema sensorial que ressignifica uma
mensagem - o silêncio é o quarto elemento constituinte que pode inserir-se de variadas
formas na produção de uma peça radiofônica.
Considera-se, no entanto, que o silêncio somente faz parte da linguagem
radiofônica quando é apresentado, além de como fator essencial à respiração do locutor,
de forma propositada para construção de significado.
19
1.3. Especificidades radiofônicas
O conjunto dos programas ou peças radiofônicas, diferenciados em suas
inúmeras modelizações construídas pela combinação dos constituintes da linguagem
radiofônica, forma a grade de programação de uma emissora, sequencialmente
transmitida ao longo das 24 horas em que fica no ar.
Desse conjunto fazem parte: chamadas comerciais ou spots publicitários,
apresentados em forma de texto locutado ou cantado, denominado jingle, utilizados para
venda de produtos dos anunciantes da emissora; chamadas institucionais que fazem a
propaganda, em meio às 24 horas, de programas constantes da grade da emissora;
programas de vários formatos, durações e gêneros6; programetes
7; programação
musical, que se constitui no horário específico para veiculação de músicas selecionadas
do play-list da emissora, ou seja, do conjunto de músicas que são tocadas porque
atendem à direção artística da emissora; e vinhetas, que, em suas combinações
diferenciadas da palavra com a trilha e efeito sonoro, vão carimbando o nome e a
identidade artística das emissoras, dos programas, dos comunicadores, ou fazendo
passagem entre músicas nas programações musicais, abrindo e fechando programas, ou
ainda, a cada hora cheia, situando o ouvinte sobre a emissora que está ouvindo ao
divulgar seu nome, dial e potência de transmissão.
Atualmente a grade de programação pode ser construída de forma segmentada,
dirigida a públicos heterogêneos na faixa etária, classe social, gênero e nível de
escolaridade, considerando as preferências e hábitos de escuta respectivos. Pode-se
dizer que a primeira segmentação do rádio ocorreu com a implantação da FM e a
conseqüente melhoria na qualidade técnica de transmissão de sons. A predominância na
grade dessas emissoras consolidou-se na programação musical dirigida ao público
6 Pesquisadores defendem tipificação diferenciada quando se trata de gêneros radiofônicos. André
Barbosa Filho, em seu livro Gêneros Radiofônicos: os formatos e os programas em áudio, classifica os
gêneros segundo a função da mensagem radiofônica: Jornalístico, Educativo-cultural, de Entretenimento,
Publicitário, Propagandístico, de Serviço e Especial. Luiz Artur Ferraretto, na obra Rádio: o veículo, a
história e a técnica, divide os programas pelos seus objetivos, separando-os em dois grupos: no primeiro
grupo, denominado Informativos, estão inseridos o Noticiário, o Programa de entrevista, o Programa de
opinião, a Mesa-redonda e o Documentário. O segundo grupo, o De Entretenimento, é composto pelo
Programa humorístico, Dramatização, Programa de auditório e Programa musical. Ao mesclar
componentes dos dois grupos, Ferraretto afirma surgir o que chama de Radiorrevista ou Programa de
variedades. A co-existência de gêneros diferentes em um mesmo programa é bastante comum no rádio.
Por exemplo, em um programa musical, portanto, do Entretenimento, a informação também pode estar
presente. O mesmo ocorre em um debate esportivo: gêneros Entretenimento e Informativo juntos. 7 O programete é uma peça radiofônica de curta duração, geralmente temático, de diferentes formatações
ou gêneros, com vinheta de abertura e de encerramento também de curta duração, atemporal. Pode ser
inserido na grade de programação de uma emissora ou em programas específicos.
20
jovem. A segmentação difunde-se após meados de 80 quando as rádios passam a
vincular seus produtos a públicos cada vez mais perfilados. Até a década de 60, no
entanto, a programação das rádios atingia públicos mais amplos.
É a direção artística que garante a combinação das modelizações estruturantes da
emissora para caracterização do perfil editorial-artístico que orienta, considerando o
conjunto das peças radiofônicas, a segmentação de público-alvo, performance vocal de
locução e conteúdo artístico, sejam essas emissoras comunitárias, educativas, populares,
jornalísticas, esportivas, musicais, religiosas, com transmissão em AM ou FM. A
direção artística, portanto, também é da estruturalidade do rádio.
Por exemplo, na emissora segmentada esportiva, no programa esportivo – cuja
modelização é predominante nesse tipo de emissora - destaca-se a performance vocal
que tem ritmos diferenciados e podem ser observados na mudança de locução: do
narrador, como se acompanhasse o ritmo da bola de futebol em campo; do comentarista,
como se desse uma pausa para o pensamento do torcedor; e do repórter que privilegia a
informação jornalística sobre o que acontece no campo durante e em paralelo ao jogo.
Na combinação da palavra falada com os efeitos sonoros, pontua-se a marcação
do gol, a interrupção de jogo ou o término e abertura de partida. No campo de futebol,
com o radinho de pilha ao pé da orelha, o ouvinte indica ao locutor a reação que deve
ser comentada transformando-se, nesse momento, em emissor – recebe e emite – para o
locutor que transforma-se, cor um momento, também em recedptor – ele emite, mas
recebe para reemitir.
Nas rádios populares com programação voltada ao entretenimento, as
combinações modelizantes colocam a palavra e a trilha, mais a palavra do que a trilha,
como elementos principais na construção de sentido, pois o locutor apresentador é a
espinha dorsal na transmissão da mensagem radiofônica ao ouvinte. Apesar de já ser
possível observar certo deslocamento para as rádios FM, é nas AM que predomina o
modelo do comunicador popular que em sua performance vocal fideliza e se faz
companheiro do ouvinte, despertando a curiosidade em torno de quem está falando:
“logo ao ouvir a voz do locutor o ouvinte tente visualizar o que ouve, criando na mente
a figura do dono da voz”. (MCLEISH, 2001:15)
Geralmente se comunicando ao vivo, informando a hora, as condições do tempo,
do trânsito ou destacando assuntos específicos a seu público-ouvinte, esse comunicador
popular responde cartas ou conversa por telefone com ouvintes que participam da
mensagem. Necessário dizer que essa participação que pode levar à transformação do
21
receptor em emissor ocorre no contexto de conteúdo determinado pela emissora. Esse
recém-emissor somente interferirá no conteúdo dos programas se tal interferência vier
ao encontro do interesse dos comunicadores ou donos de emissoras. Ou seja, apesar da
participação e interatividade com o comunicador, quem determina conteúdos da
programação é a emissora.
As rádios comunitárias surgidas no final da década de 90 foram boa tentativa em
aumentar a participação do ouvinte na transmissão da mensagem. A legislação que
delimita área de alcance da emissora a, no máximo, um km a partir de sua antena
transmissora e define que o objetivo deve ser o de proporcionar informação, cultura,
entretenimento e lazer a pequenas comunidades, para contribuir com seu
desenvolvimento, propiciava que os próprios integrantes dessas comunidades fossem
receptores-emissores de mensagens de interesse das respectivas comunidades. Isso
poderia ocorrer se, de forma geral, com exceções, as rádios comunitárias não
reproduzissem o modelo tradicional do rádio comercial.
Já em uma emissora jornalística, segmentada em textos jornalísticos, apesar do
predomínio também da palavra falada, também há a trilha e os efeitos sonoros, porém
como figurantes de segundo plano para dar ritmo à notícia veiculada e pontuar mudança
de assuntos e de programas, pois o conteúdo noticioso é o mais importante nas
modelizações ou programas desse tipo de emissora. Transmitidos ao vivo, disseminam
notícias, repercutidas ao longo do dia não só pelos ouvintes, mas também pelos
chamados formadores de opinião de outras mídias de massa, como jornais, revistas e
TVs e, mais atualmente, pela própria internet. Na cobertura jornalística radiofônica,
repórteres e entrevistados levam o som ambiente das ruas para as mensagens emitidas.
Combinados com trilhas, às vezes associadas a personagens, às vezes dando
ritmo à palavra falada, criando cenários ou expressando emoções, os efeitos tiveram
predominância no gênero dramático privilegiado no rádio nos anos 40, chamados de
Era do ouro do rádio, através das radionovelas. Na combinação com a palavra falada,
levavam o ouvinte a imaginar cenários e acompanhar narrativas em que mocinhos e
mocinhas se beijavam ao som da chuva e desviavam-se de trovões e relâmpagos, heróis
andavam à cavalo, policiais e bandidos trocavam tiros, mãe e filho se reencontravam
após anos de sofrimento.
De certa forma, a radionovela foi substituída na recepção do ouvinte pela
telenovela da TV, mas os efeitos sonoros estão ainda hoje nos spots comerciais que
continuam a usar os recursos da dramaturgia para a construção de sentidos apelativos à
22
venda de produtos e marcas. Com durações curtas, mas variadas, os spots são
distribuídos em blocos dividindo programas ou, ao longo da programação, passam a
integrar a grade de programação de uma emissora.
Também peças curtas são as vinhetas que, em modelizações variadas pela
combinação da palavra, trilha e efeitos, apontam identidade da rádio, denotam direções
editoriais e artísticas, indicam, abrem e fecham programas ou harmonizam a
programação ao servirem de ponte ou passagem entre músicas.
Outra peça de curta duração constituinte da grade de uma emissora é a chamada
institucional. Como o spot comercial, também traz as qualidades de determinado
produto, porém, neste caso, as qualidades de programas da própria emissora, em busca
da audiência. Ao pé da letra, pode-se dizer que no rádio comercial a chamada
institucional gera a venda indireta de produtos e marcas, pois quanto maior a audiência
de determinado programa, objetivo da chamada, maior será o número de anunciantes e a
venda dos produtos comerciais nele anunciados pelos spots comerciais.
23
1.4. Radioweb
O verbo pode saltar do papel para a tela eletrônica;
a foto, virar digital; o cinema, se tornar soft, trans, inter;
a televisão, ser on demand, mas suas linguagens,
mesmo transformadas pelo meio, sobrevivem.
(SANTAELLA, 2007:209)
Meio frio, segundo Mcluhan (1064), a radioweb está situada na era da
fragmentação, do efêmero, enfim, da pós-modernidade8. Todos participando de um
fluxo de informações, gerando, acessando e distribuindo, protagonistas da mudança de
paradigma: da comunicação de massa existente no rádio, em que um emissor se
comunica ao mesmo tempo com um coletivo de receptores, para a web e a comunicação
um para um, todos para todos, emissor e receptor ao mesmo tempo9. Uma rede
composta por nós, sendo cada internauta um nó.
O computador surge em 1940. A internet é criada 30 anos depois pelo
Departamento de Defesa dos Estados Unidos e completada posteriormente pelo
“WWW – Word-Wide Web, recurso de informação desenvolvido por um centro
europeu de pesquisa na área de Física, capaz de transmitir documentos na forma de
hipertextos” (MOREIRA, 1999: 210).
8 Jair Ferreira dos Santos (2005) analisa o atual contexto sócio-político-econômico, considerando:
a) O indivíduo: “O indivíduo na condição pós-moderna é um sujeito blip, alguém submetido a um
bombardeio maciço e aleatório de informações parcelares, que nunca formam um todo, e com importantes
efeitos culturais, sociais e políticos” (p.27);
b) A sociedade: “A massa pós-moderna, no entanto, é consumista, classe média, flexível nas idéias e nos
costumes. Vive no conformismo em nações sem ideais e acha-se seduzida e atomizada (fragmentada)
pelos mass media, querendo o espetáculo com bens e serviços no lugar do poder. Participa, sem
envolvimento profundo, de pequenas causas inseridas no cotidiano (p.91);
c) Isolamento: “O sujeito se converte assim num terminal de informação. Mas um terminal isolado de
outros terminais, pois as mensagens não se destinam a um público reunido, mas a um público disperso
(cada um em sua casa, seu carro, seu micro). Eis porque a massa pós-moderna é atomizada
(ultrafragmentada). (p.95) ;
d) Fluxo temporal: “O sujeito pós-moderno é a glorificação do ego no instante, sem esperança alguma no
futuro”. (p.105) 9 Definindo o computador como nova mídia em contraponto às midias tradicionais, Wilson Dizard Jr
afirma que essas novas tecnologias não se adequam à antiga definição de meios de comunicação de massa
se considerado que mídia de massa “significa produtos de informação e entretenimento centralmente
(grifo nosso) produzidos e padronizados, distribuídos a grandes públicos através de canais distintos. Os
novos desafiantes eletrônicos modificam todas essas condições”. (2000:23)
24
Em sua evolução, transforma-se em extensão “do nosso cérebro. Com sua
habilidade de armazenar e manipular símbolos, o computador imita a mente na sua
capacidade de funcionar como um meio de computação e um meio de representação”
(cf. JORNA, 1990:195 apud SANTAELLA, 2003: 233). Com capacidade para fornecer,
processar e comunicar dados, passou a ser chamado de mídia,
[...] palavra usada para se referir tanto aos sistemas de comunicação, tais
como revistas, jornais, rádio, televisão etc., quanto a uma peça de
propaganda que pode estar no rádio, num programa de TV, jornais etc.
(2003: 213)
Na década de 90 surgem na internet as redes sociais. O marco inicial propiciou a
interatividade em tempo real entre usuários, com o sistema monomodal de
relacionamentos MSN, passando pela monomodal múltipla, a Rede 2.0, utilizada para
entretenimento, contatos profissionais, marketing social e compartilhamento de
arquivos por meio de sites como Orkut e Myspace, chegando na multimodal Rede 3.0,
que permite o uso de aplicativos e de mídias móveis, como o Facebook e o Twitter.
As RSIs são plataformas-rebentos da web 2.0, que inaugurou a era das
redes colaborativas, tais como wikipédias, blogs, podcasts, o Youtube, o
Second Life para compartilhamento e intercâmbio de arquivos como [...]
entre elas o Orkut, My Space, Goowy, Hi5, Facebook e Twitter com sua
agilidade para microbloging . (LEMOS E SANTAELLA, 2010: 7)
Apenas para contextualizar onde está inserida a radioweb, alguns dados
estatísticos: em 2008, havia mais de 133 milhões de blogs (DELARBRE, 2009)10
, além
de webcans, youtube, ipod e twitter, entre tantas outras ferramentas que permitem a
apropriação de conteúdos. Pesquisa11
mostra que a cada dia, 500 mil pessoas entram
pela primeira vez na Internet e estima que em 2012 o número de usuários chegará a 2
bilhões.
10
Raúl Trejo DELARBRE Internet como expressão e extensão do espaço público, artigo publicado na
Revista Matrizes, da Escola de Comunicação e Artes da USP, Ano 2, n.2, primeiro semestre de 2009,
p.89 11
Dados extraídos de pesquisa feita pelo Ibope Nielsen Online, publicados em www.teleco.com.br
Acesso em 3.05.2011, às 10h47
25
Ligia Trigo de Souza12
diz que há três tipos de emissoras na web. No primeiro
tipo está a transmitida pelas ondas eletromagnéticas, que a partir de 1996 começou a
funcionar também na internet. A este tipo de emissora, segundo a autora, pertencem as
que funcionam em off-line, ou seja, utilizam a rede para divulgar seu trabalho no dial
eletrônico e não disponibilizam o áudio como seu principal serviço.
Há de se considerar que a velocidade dos avanços tecnológicos e a facilidade de
acesso e de uso dos seus recursos fazem com que cada vez mais se reduza a ocorrência
desse tipo de emissora, aumentando, em conseqüência, o segundo tipo definido por
Souza: a on-line, que da mesma forma existe fora da internet, mas disponibiliza o áudio
na rede como seu produto principal. Transmite concomitantemente pelas ondas
magnéticas e pelo sistema digital. O terceiro tipo é a emissora que não existe fora da
internet, designada pela autora de NetRádio, e que será denominada nesta pesquisa
como Radioweb.
A transmissão pela internet é digital, em cujo sistema a informação é
transformada em dados, na combinação binária de 0 e 1. Existem duas possibilidades de
transmissão: ao vivo e on demand. Na transmissão ao vivo, em streaming13
, o sinal de
áudio do programa é enviado a um computador que o codifica como se fosse sub-
arquivos, em formato de pacotes de dados. Ligado a um servidor, esse computador lhe
envia os pacotes. Os usuários, conectados ao servidor, passam a receber em seus
computadores os pacotes da transmissão, tendo acesso independentemente de o arquivo
ter sido transmitido totalmente. Após a transmissão ao vivo os pacotes são apagados
imediatamente.
Na transmissão on demand, os arquivos digitais do programa ficam disponíveis
no servidor e são acionados quando o ouvinte decide escutá-los. Em ambos os casos, a
transmissão se dá via streaming, o chamado fluxo de transmissão contínua, e o arquivo
não fica armazenado no computador do usuário.
12
A análise da autora consta de sua dissertação de mestrado Rádios@Internet: o desafio do áudio na rede
na Escola de Comunicações e Artes, USP, 2003. 13
A transmissão em streaming tem a propagação contínua, sem interrupção. Também é chamado de
síncrono: em sincronia com o tempo real.
26
1.5. Especificidades da radioweb
Funcionando em ambiente digital, a radioweb tem em sua estruturalidade as três
matrizes da linguagem, a sonora, a visual e a verbal, cuja presença em suas variadas
modelizações é característica da linguagem hipermidiática14
. Para ouví-la é necessário
acessar determinado endereço eletrônico no computador e, por meio de índices, ícones
e símbolos, visualizar a programação que pode ser selecionada para audição. Portanto,
além da oralidade, estão presentes a palavra escrita e a imagem.
No que diz respeito à matriz sonora, como no rádio, compõem a estruturalidade
da radioweb as combinações resultantes da palavra falada, música, a trilha musical e os
efeitos sonoros, com o intercâmbio recorrente entre eles que resulta em outras
modelizações. Assim, são consideradas estruturas nucleares os programas que se
apresentam em seus diversos gêneros15
e durações temporais, as vinhetas e as chamadas
institucionais.
Temos, portanto, em fronteira, o diálogo permanente entre os diversos textos em
que novas estruturas vão se formando na radioweb, permitindo ressaltar que cada
gênero de programa pertencente à grade de programação se transforma em outra
estrutura nuclear, a estrutura dos programas de Entretenimento, a dos programas de
Variedades ou a dos programas Informativos ou Jornalísticos, a estrutura da direção
artística, enfim, a própria estrutura do que é chamado no rádio de grade de
programação.
Necessário esclarecer como está sendo utilizada, nesta pesquisa, a nomenclatura
radioweb. Recebe esta denominação a emissora operada exclusivamente no computador
e não a que tem transmissão simultânea, pelas ondas eletromagnéticas e digital.
Considera-se, neste caso, que esse tipo de mídia tem maior proximidade com uma
homepage que oferece arquivos em diferentes sistemas de linguagem e reproduz o áudio
transmitido pelas ondas hertzianas. Ter a transmissão feita exclusivamente pelo sistema
digital é uma das características da radioweb.
14
Lúcia Santaella denomina hipermídia como “síntese inaudita das matrizes de linguagem e pensamento
sonoro, visual e verbal com todos os seus desdobramentos e misturas possíveis. [...] a hipermídia
pressupõe um desenho estrutural para a inserção interativa do leitor imersivo”. (2005: 392) 15
Adotamos nesta pesquisa a seguinte tipificação: programas do gênero Informativo ou Jornalístico para
aqueles que tem por base principal a notícia; de Entretenimento para aqueles cujo objetivo é propiciar
diversão ao ouvinte; e de Variedades ou radiorrevista, quando há a mistura dos dois gêneros anteriores.
27
Outra característica considerada neste trabalho é que, diferentemente do
podcast16
, a radioweb apresenta apenas programas de áudio, enquanto o podcast pode
oferecer arquivos na linguagem audiovisual, apesar de existir a nomenclatura videocast
denominativa de para este sistema.
Mais uma diferença entre radioweb e podcast é a existência da Direção Artística
como constituinte da estruturação de uma emissora radiofônica. É por meio da Direção
Artística, espécie de coluna vertebral, que se tornam pertinentes as diferenciações de
conteúdos e de estéticas entre as emissoras, garantindo o cumprimento da proposta
editorial-artística de cada uma delas.
Sobre esta estruturalidade no rádio, José comenta:
[...] importante tratar da direção artística porque tudo decorre dela em
uma emissora de rádio: a formação da carteira de clientes, a seleção de
vozes para a locução para os diferentes horários e programas, os temas e
conteúdos a serem tratados como programa e/ou programete, a editoria
jornalística e a constituição do playlist da emissora; por playlist entenda-
se o amplo repertório sonoro-musical a ser usado nas diferentes durações
programáticas da emissora [...]17
O estabelecimento da transmissão de programas ao vivo e a periodicidade
planejada na atualização da programação radiofônica também são componentes da
proposta editorial-artística da emissora web, executada pela Direção Artística.
Ao encontro desse pensamento, o pesquisador Marcelo Medeiros18
aponta como
descaracterizadores do modelo rádio na internet, a falta de regularidade na produção de
programas, a interrupção da continuidade de transmissão, e a não-centralização da
produção.
Ao conceituar um programa de rádio, ele19
defende a presença de elementos
radiofônicos principais ou conceituais - que são a linguagem radiofônica e o discurso
radiofônico - e também a presença dos elementos estruturais da linguagem radiofônica -
16
Forma de transmissão de arquivos de áudio que podem ser atualizados mediante assinatura do
internauta e indexação de RSS, mecanismo que permite o download atualizado. A palavra une os termos
Pod – Personal On Demand com Broadcast, ligado à transmissão. 17
JOSÉ, Carmen Lúcia. Essa foi pra tocar no rádio. 6º. Encontro de Música e Midia, do Centro de
Estudos em Música e Mídia, Música de/ Para. São Paulo: Musimid, 2010 18
MEDEIROS, Marcelo. Podcasting: um antípoda radiofônico. XXIX Congresso Brasileiro de Ciências
da Comunicação, 2006. Brasília: Intercom, 2006 19
Idem. Artigo Transmissão sonora digital: Modelos radiofônicos e não radiofônicos na comunicação
contemporânea. XXX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Santos: Intercom, 2007
28
entre eles, a presença do locutor/apresentador, da grade de programação, vinhetas,
chamadas, blocos comerciais e blocos jornalísticos.
Eduardo Meditsch ilumina outras características do rádio:
é um meio de comunicação sonora, invisível e que emite em tempo real.
Se não for feito de som não é rádio, se tiver imagem junto não é mais
rádio, se não emitir em tempo real (o tempo da vida real do ouvinte e da
sociedade em que está inserido) é fonografia, também não é radio20
.
Como ponto de partida, ao considerar as características dos meios de
comunicação citadas por José, Medeiros e Meditsch, denota-se que uma emissora de
rádio, para funcionar no computador, precisa configurar-se a partir da natureza da
internet, enquanto ocorre o diálogo metalingüístico com a estruturalidade do rádio, em
fronteira.
Assim, nesta pesquisa está sendo considerada radioweb, a rádio que: 1) funciona
exclusivamente pela internet; 2) disponibiliza apenas arquivos sonoros; 3) possui
direção artística para orientar e garantir a editoria temática e artística; 4) tem
possibilidade das duas formas de transmissão, on demand e ao vivo; 5) apresenta
periodicidade planejada para a atualização da produção de programas.
Como diz Balsebre, não é possível compreender o conceito de mensagem se não
estiver referida a um contexto comunicativo, “un mensaje es alguien interpretando un
mensaje. Sin la interacción emissor-receptor, sin la mediación de un proceso de
percepción, considero que la producción de mensajes no tiene sentido” (2004:19)
20
MEDITSCH, Eduardo. O ensino do radiojornalismo em tempos de internet. In Moreira, Sonia
Virginia.; Del Bianco, Nelia. (Org.). Desafios do Rádio no Século XXI. Rio de Janeiro: UERJ/Intercom,
2001.
29
1.6. Síntese das especificidades dos dois espaços semióticos
Antes de saber quais mudanças são operadas pelos processos de roteirização,
produção e edição de programas radiofônicos na fronteira entre radio e radioweb, torna-
se necessário sintetizar as estruturalidades dos dois modelos sistêmicos de rádio para,
posteriormente, nos capítulos seguintes, iluminar a tradução dos elementos constitutivos
da linguagem sonora do rádio quando deslocados para a radioweb.
Assim, consta da estruturalidade do rádio, a presença de:
a) constituintes da linguagem radiofônica, a palavra falada, trilhas, efeitos e
silêncio;
b) a programação é ouvida segundo o relógio radiofônico estabelecido pela
emissora;
c) estruturas modelizantes como programas, vinhetas, chamadas e spots
comerciais que resultam em grade de programação;
d) direção artística como elo dos formantes da editoria temática e artística
(conteúdo, programação, performance vocal);
e) oralidade mediatizada.
Na radioweb:
a) soma-se à linguagem sonora os demais sistemas de linguagem, o verbal e o
visual e o encontro resultante dessas matrizes;
b) a programação é visualizada pelo ouvinte-internauta no espaço físico onde
funciona; c) transmissão é feita de duas formas: on demand e ao vivo.
30
Capítulo 2 - Rádios em fronteira
Nesta pesquisa predomina o estudo da linguagem sonora presente nos meios
rádio e radioweb e as transformações nela decorrentes quando deslocada de um meio
para outro ao passar por mecanismos de tradução aqui estabelecidos como os processos
de produção, roteirização e edição dos programas radiofônicos.
Para embasar este estudo foram utilizados os conceitos de semiosfera21
e de
fronteira do semioticista Yuri Lotman (1996), pois o trânsito entre os dois sistemas se
encontram numa zona bilíngüe que traduz metalinguisticamente uma modelização
textual em outra, a partir da estruturalidade da nova mídia.
Así como en la matemática se llama frontera a un conjunto de puntos
perteneciente simultáneamente al espacio interior y al espacio exterior, la
frontera semiótica es la suma de los tradutores –filtros bilingües pasando
através de los cuales un texto se traduce a otro lenguaje (o lenguajes) que se
halla fuera de la semiosfera dada. (1996: 24)
Na fronteira, os processos de tradução vão transformando, misturando e ao
mesmo tempo distinguindo o que é modelização do rádio e o que é modelização da
radioweb, cujo diálogo entre ambas as mídias ocorre no interior da natureza de cada
uma porque, afinal, cada meio produz sua respectiva mensagem.
Ao adotar os conceitos de Lotman nesta pesquisa comparativa de linguagem
entre rádio e rádio pela internet, foi possível perceber que ao encontro de seu
pensamento vem o de outro semioticista russo, Aaron Gurevitch, para quem “[...] ao
comparar e encontrar grandes similaridades, é preciso sempre mostrar as diferenças [...]
Só é possível comparar fenômenos semelhantes, mas é o estudo das diferenças, das
especificidades, das particularidades que faz clara a percepção dos objetos [...]”22
Também foi possível entender que para traçar a fronteira entre os dois espaços
semióticos propostos seria necessário o conhecimento dos elementos componentes
respectivos, chamados por Lotman de estruturas nucleares, e, assim, apontar diferenças
e especificidades entre ambos.
21
Segundo Lotman, semiosfera é o espaço composto por estruturas nucleares e periféricas formadas por
diversos textos e linguagens que se relacionam em níveis diferentes de hierarquização em um continuum
semiótico. Apresenta as características da delimitação, traçada pela homogeneidade e individualidade dos
códigos, e da irregularidade, marcada pela diversidade de códigos, ambas determinantes da fronteira com
o espaço extrassemiótico, onde ocorrem os processos semióticos. (1996: 22-31) 22
In Artigo A visita, em que a autora, Jerusa Pires Ferreira, relata o encontro com o pesquisador, em
Moscou, em novembro de 1997.
31
Temos, neste estudo, dois espaços semióticos delimitados pela fronteira
ambivalente, que une e ao mesmo tempo separa, onde estão localizados os mecanismos
tradutores “através de los cuales un texto se traduce a outro lenguaje (o lenguajes) que
se halla fuera de la semiosfera dada.” (1996:24). O autor explica que na fronteira, parte
indispensável da semiosfera, o mecanismo bilíngüe traduz as mensagens externas em
linguagens internas da semiosfera e o inverso também.
É por meio dela que a semiosfera faz o contato com os espaços não semióticos e
alossemióticos “[...] todos os mecanismos de tradução que estão a serviço dos contatos
externos pertencem à estrutura da fronteira da semiosfera” (1996: 26, tradução nossa).
Esse encontro de desiguais gera novos textos culturais, novas semiosferas, novas
fronteiras e periferias de intensos processos dinâmicos.
Com a web 2.0 como plataforma para transmissão de áudio, considerado até
então um espaço assemiótico frente à linguagem radiofônica, consolida-se um espaço de
interação em que ocorrem processos de tradução entre estruturalidades diferenciadas.
Consolida-se, portanto, a fronteira entre as distintas estruturalidades radiofônicas.
Nela, estão os processos de produção, roteirização e edição de programas
radiofônicos como mecanismos de tradução das estruturas nucleares do rádio em
estruturas periféricas dessa outra estruturalidade, da radioweb, para, por fim,
conduzirem-se ao núcleo do novo espaço semiótico.
La frontera tiene tambiém otra función en la semiosfera: es un dominio
de procesos semióticos acelerados que siempre transcurrem más
activamente en la periferia de la oikumena cultural, para de ahí dirigir-se
a las estructuras nucleares y desalojarlas. (1996:28)
Se, como diz Lotman, da posição do observador depende por onde passa a
fronteira de uma cultura dada, no caso do ponto de vista do observador interno do rádio,
alguns elementos encontram-se no espaço extrassemiótico ou alossemiótico; no entanto,
do ponto de vista do observador externo dessa estruturalidade radiofônica, tais
elementos podem apresentar-se como pertencentes à sua periferia semiótica.
Na posição do observador interno, os elementos que se encontram em fronteira,
ao serem traduzidos, passam a integrar outro espaço semiótico, transformamdo-se em
estruturas nucleares dessa nova semiosfera.. “El espacio no-semiótico, de hecho, puede
resultar el espacio de otra semiótica”. (1996: 29) Ou seja, a estruturalidade do rádio, por
conta dos processos semióticos acelerados em fronteira, transforma-se em periferia de
32
outro espaço semiótico e, posteriormente, ruma ao centro dele. Essas estruturas
semióticas, ao serem transportadas para o centro, transformam-se em estruturas
dominantes nesse novo espaço semiótico – o da radioweb.
2.1. Tradução das estruturas radiofônicas
Uma das hipóteses apresentada por este trabalho é que, diferentemente do rádio,
a radioweb é obrigada a apresentar uma programação que pode ser ouvida em diferentes
momentos: repetidamente, no tempo decidido pelo ouvinte-internauta quando acessa a
internet ou após o arquivamento do programa; e, ainda, como no rádio, também no
tempo presente da emissora, o chamado ao vivo, desde que o horário da transmissão seja
previamente estabelecido e o ouvinte-internauta avisado com antecedência por alguma
modelização possível nessa outra semiosfera.
A possibilidade desta nova programação que pode ser ouvida em diferentes
momentos está fundamentada no encontro em fronteira dos dois espaços semióticos da
radiofonia com suas respectivas estruturalidades: a radioweb, com transmissão
exclusivamente digital, e o rádio, com transmissão pelas ondas eletromagnéticas.
Apesar de não ser proposta desta pesquisa, é importante mencionar que o rádio
hertziano também vai assimilando em sua estruturalidade constituintes de outro espaço
semiótico, o da internet. Por exemplo, a veiculação de sua programação no dial
eletrônico reproduzida concomitantemente no endereço da internet. Outro exemplo é a
interatividade com o ouvinte de rádio. Ela aumenta com o uso dos estruturantes da
internet: antes do sistema digital, o contato entre emissor e receptor, no rádio, restringia-
se ao telefone ou correio; atualmente, somam-se a esses recursos os canais digitais,
como twitter, facebook, e-mail e demais tipos de mensagens transmitidas digitalmente.
Aumentam não só as formas de contato com os produtores da rádio, mas também a
velocidade com que ocorrem.
33
2.1.1. Audição e visualidade
A garota voltava para o escritório e ligava seu radinho de pilha após almoçar
rapidamente para não perder seu programa de rádio preferido. Todo dia debruçava-se
na mesa e lá ficava, ouvindo, encantada pela voz e palavras do apresentador do
programa. Foram anos e anos a fio seguindo-o com os ouvidos, até perderem-se no
cotidiano diferenciado que a vida obriga. Muito tempo se passa e ela, já adulta,
jornalista formada trabalhando em rádio, recebe a notícia de que o ídolo de anos atrás
participaria ao vivo no jornal falado da mesma emissora. No dia seguinte, ao chegar
cedo na rádio, percebe a roda de profissionais em animada conversa, no corredor em
frente a porta do estúdio. Presente na roda, ela reconhece a voz que por tantos tempo
admirara a imaginar seu rosto. E mediante a oportunidade de finalmente conhecer o
rosto da voz, percorre rapidamente o corredor até chegar ao final e fecha a porta sem
olhar para trás. Preferiu ficar com a imaginação.
Estruturado pelas combinações dos elementos da matriz sonora - a palavra
falada, trilhas, efeitos e silêncio - o rádio apresenta modelizações diversas como
programas, programetes, vinhetas, spots publicitários e chamadas institucionais,
interligados em uma grade de programação pela direção editorial-artística, e que podem
ser ouvidos durante as 24 horas em que a emissora fica no ar. Nesse relógio radiofônico,
a transmissão das peças ocorre sequencialmente ou com a linearidade estabelecida pela
emissora, ou seja, o ouvinte pode escolher o programa que quer ouvir, porém, deve se
sujeitar ao horário de transmissão determinado pela emissora.
Tanto o rádio como a radioweb apresentam oralidade mediatizada, mas na
estruturalidade da radioweb somam-se, aos constituintes da linguagem sonora, os
constituintes das matrizes de linguagem verbal e visual, resultando na visualidade de
suas modelizações no espaço físico em que funciona a emissora digital. O conceito de
visualidade vem de Lucrécia Ferrara, ao comparar com visibilidade. Se este
“corresponde à elaboração perceptiva e reflexiva das marcas visuais”, o de visualidade é
“para designar a imagem que frouxamente se insinua na constatação receptiva do visual
físico e concreto [...]” (2002: 120).
Essas modelizações radiofônicas libertam-se do que no rádio é chamado “grade
de programação”, a listagem de programas em ordem temporal transmitidos
sequencialmente para ocupar as 24 horas em que a emissora fica no ar. Um exemplo de
34
grade de programação, com transmissão sequencial temporal dos programas é a da
Rádio Clube.
ade de
Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado Domingo
05:00 - 06:30 A Hora do Trabalhador Lucas Siqueira
06:30 - 08:00 Bom Dia Cidade
Alexandre Pereira, Kátia Regina e Cristiano
Silva
08:00 - 11:30 Show da Manhã Rose Leite
11:30 - 12:30 A Hora do Povo
Kátia Regina, Napoleão Bernardes e Edélcio
Vieira
12:30 - 13:30 Assembléia de Deus Igreja Assembléia de Deus
13:30 - 16:00 Show da Tarde Farley Jota Santos
16:00 - 17:50 BlumenauFest Elza Aparecida
17:50 - 18:00 Palavras Amigas Pastor Marcos Giústi
18:00 - 19:00 Sucessos da Clube Locutores
19:00 - 20:00 A Voz do Brasil
20:00 - 22:00 Clube da Noite Cristiano Nunes
PATROCINADORES
Em uma radioweb, os programas passam a compor uma “programação” também
vinculada por determinada direção editorial-artística, mas não precisa ser mais uma
grade de progamação na forma de uma listagem.
[...] estão simultaneamente expostos e disponíveis, sem pontuações fixas
para entrar no ar, porque a qualquer tempo, o ouvinte-internauta pode
clicar e ouvir qualquer um deles. (JOSÉ, 2010)23
23
Cf. NR 17, p. 27
35
Ou seja, o desenho da programação pode ser traçado pelos próprios programas
visualizados na tela do computador, cuja disponibilidade temporal permanente
extinguiu a obrigatoriedade de preencher as 24 horas de transmissão existente no rádio.
Há de se registrar, no entanto, que ainda é comum na internet a repetição visual de uma
grade na forma de lista de programas, repetindo o modelo do rádio eletromagnético.
Mas, como dito, há outra possibilidade de desenho de programação. Segue um exemplo,
o da Rádio Uol:
A transmissão da radioweb é feita de duas formas: on demand, quando os
arquivos dos programas ficam na tela permanentemente postados e arquivados no
endereço eletrônico da radioweb, à disposição do ouvinte-internauta, e ao vivo,
modelização também presente na estruturalidade do rádio. Nele, mesmo quando os
programas são gravados, a transmissão é feita em tempo real com o do ouvinte que
sintoniza a emissora.
36
Na tradução em fronteiras, uma das estruturas do rádio, a reprise de programas,
ou o momento em que se ouve pela segunda vez um programa após a emissora
informar a nova data de transmissão - o que geralmente acontece aos finais de semana –
é modelização transformada. De estrutura nuclear do rádio que antes estabelecia o
horário de retransmissão de determinado programa, na radioweb a reprise deixa de
ocorrer, pois é o ouvinte quem decide o quê e quando acessar as peças radiofônicas. Na
estruturalidade da radioweb, é ele quem passa a decidir se haverá a retransmissão, qual
o programa a ser retransmitido e quando quer ouví-lo.
No encontro em fronteira da radioweb com o rádio, há tradução de outra
estrutura nuclear do rádio, a chamada institucional. Nele, além de ser usada para
informar sobre reprises de programas, a função principal da chamada institucional é a de
convidar o ouvinte a sintonizar a emissora para audição específica de um programa em
determinado dia e horário, trazendo para isso, em diferentes combinações, os atributos
qualitativos do programa ao qual se refere. Ou, em outras palavras, no rádio, a
programação ou programas específicos, somente serão conhecidos com antecedência
pelo ouvinte se houver divulgação por meio de chamadas institucionais24
.
Na radioweb a chamada também pode ocorrer, porém, mantida em um espaço
específico, visível na espacialização da programação ou na modelização do programa
Ao vivo. Se no rádio a chamada informa data temporal em que o programa será
transmitido, na radioweb ela informa sobre a disponibilidade do programa na tela do
computador, portanto, o espaço a ser acessado.
2.1.2. Trânsito e permanência das mensagens
Os programas radiofônicos também são traduzidos na fronteira entre as duas
semiosferas e novas modelizações podem surgir na radioweb. Tendo por característica a
natureza transitória e um ouvinte que, no geral, desenvolve outras atividades enquanto o
rádio está ligado ou que não pode pedir para o locutor repetir o que acabou de dizer, o
rádio é obrigado a abordar temas e assuntos de forma simples, rápida e objetiva, na
busca da audição e compreensão de sua mensagem pelo ouvinte. “Trata-se, de fato, de
um meio de comunicação efêmero, e se o ouvinte não estiver ali para ouvir o noticiário
este já terá sido transmitido e ele terá de esperar pelo próximo”. (MCLEISH, 2001:17).
24
Com a internet, tornou-se possível às rádios com transmissão em ondas eletromagnéticas
disponibilizarem em seus respectivos sites, entre outras informações, a programação e a equipe de
locutores, além de reproduzirem o áudio concomitantemente.
37
Na radioweb, ouvida, mas também vista em sua espacialização, é possível o
aprofundamento de temas e assuntos divididos em vários programas que permanecerão
disponíveis, todos ao mesmo tempo, e por tempo indeterminado, à disposição do
ouvinte-internauta, em uma mesma programação que poderá acessá-los para ouvir
quantas vezes quiser.
Nessa espacialização da radioweb, a programação musical também se
desvencilha dos períodos fixos da grade linear do rádio e pode adquirir nova proposta
com agrupamentos variados de músicas, seja com intérpretes diferenciados, de épocas
variadas, de canções temáticas etc25
, transformando cada agrupamento em uma
programação musical. No rádio, a programação musical atende à direção artística da
emissora não só na escolha de músicas adequadas ao seu público-alvo, mas também na
seleção que mistura, em um mesmo período de transmissão, músicas com estimulações
rítmicas diferentes, músicas interpretadas por bandas com as interpretadas por solistas,
cantoras com cantores etc.
2.1.3. Intensificação da interatividade
O programa Ao vivo está modelizado conforme arranjo pertencente à estrutura
nuclear dos dois espaços semióticos. Original do rádio, na fronteira com a radioweb é
traduzido e transforma-se em estrutura nuclear desse novo espaço trazendo os mesmos
constituintes: palavra falada, trilhas, efeito e silêncio, estruturantes de vinhetas de
abertura, encerramento e passagem, e de blocos de conteúdo temático dos diversos
gêneros radiofônicos.
A participação do ouvinte, ou a comunicação em tempo real com locutores e
produtores do programa que está no ar, também é do núcleo do Ao vivo e é este texto
que, traduzido na fronteira com a semiosfera da radioweb, tem um de seus elementos
transformados: o canal por onde ocorre essa participação. Antes, no rádio, o ouvinte
conversava com os profissionais do rádio por telefone ou por carta enviada pelo
correio; com a radioweb, além do telefone, somam-se os canais digitais como twitter,
facebook, e-mail e demais tipos de mensagens possibilitadas pela transmissão digital.
Aumenta a velocidade da interatividade com o ouvinte, não só pelo maior
número dos recursos de participação advindos com o sistema digital, mas por ser
25
No artigo Essa foi pra tocar no rádio apresentado por Carmen Lúcia José no 6º. Encontro de Música e
Mídia, em 2010, a autora cita vários exemplos possíveis de composição de programação musical
38
característica da internet, onde está situada a radioweb, a “inserção interativa do leitor
imersivo”26
.
26
Conforme NR 14, p. 26.
39
2.2. Síntese das traduções em fronteira dos dois espaços semióticos
Sintetizam-se aqui as traduções ocorridas em fronteira entre as duas semiosferas
radiofônicas, na defesa da hipótese de que, diferentemente do rádio que transmite sua
programação em tempo real pelo relógio radiofônico de 24 horas em que fica no ar, a
radioweb deve apresentar uma programação que pode ser ouvida em diferentes
momentos: repetidamente, no tempo presente do ouvinte-internauta quando a acessa, ou
posteriormente ao arquivo do programa em seu computador. É o ouvinte-internauta
quem passa a decidir o quê e quando ouvir.
a) de meio sonoro, ao ser traduzido para a radioweb, o radio recebe elementos das
matrizes de linguagem verbal e visual. Os programas libertam-se da “grade de
programação” que antes era apenas ouvida e passam a compor uma programação
espacializada e visualizada;
b) no rádio, a distribuição seqüencial da programação pelo relógio de 24 horas é
determinada pela emissora; com a espacialização e visualização na radioweb, a
seqüencialidade de escuta é feita pelo ouvinte-internauta pois é ele quem escolhe
o quê e quando ouvir;
c) na radioweb o acesso à programação pode ser feito em duas modalidades: on
demand, quando os arquivos ficam à disposição do ouvinte internauta, e ao vivo;
no rádio, mesmo quando o programa é gravado, ainda assim, para o ouvinte, a
transmissão será ao vivo;
d) a reprise, estrutura nuclear do rádio, na estruturalidade da radioweb é eliminada,
pois é o ouvinte-internauta quem passa a decidir se haverá a retransmissão, qual
o programa a ser retransmitido e quando ouví-lo;
e) as chamadas institucionais que no rádio são veiculadas em meio à programação,
na radioweb são galgadas a espaço específico para visualização ou, também
como no rádio, na modelização do Ao vivo. No rádio, a chamada informa a data
temporal em que o programa será transmitido; na radioweb, informa sobre sua
disponibilidade no espaço físico da emissora;
f) novas modelizações estruturantes se formam no encontro do rádio, de natureza
transitória e efêmera, com a radioweb, que mantém a programação por tempo
indeterminado: temas e assuntos podem ser aprofundados em uma mesma
40
programação, o que no rádio está limitado à programação que preenche o
espaço-tempo de 24 horas;
g) o rádio registra a interatividade do ouvinte por carta e telefone; na radioweb
intensifica-se a velocidade da interatividade, não só pelo maior número de
recursos de participação advindos do sistema digital, mas por estar inserida em
um meio que tem em sua estruturalidade a “inserção interativa” do usuário.
41
Capítulo 3 - Temporalidade nos espaços semióticos radiofônicos
Ainda assim acredito
Ser possível reunirmo-nos
Tempo tempo tempo tempo
Num outro nível de vínculo
Caetano Veloso27
No filme Meia noite em Paris, escrito e dirigido por Woody Allen, o
protagonista, um roteirista frustrado com seu trabalho, contemporâneo deste milênio,
em hipotética viagem pelo tempo é transportado para o ano 1930 e lá conhece uma
garota por quem se apaixona. Juntos, transportam-se novamente pelo tempo até o final
do século XIX. Deslumbrada com a noite parisiense da Belle Époque, a garota nega-se a
regressar ao futuro alegando que em sua época -1930 - todos vivem correndo, sem
tempo para apreciar as belas coisas da vida.
Esse filme pode ilustrar o pensamento do semioticista Aaron Gurevitch, pois ele
considera o sentimento do tempo como parâmetro essencial da personalidade e avalia
que “não é possível compreender um tipo historicamente particular de estrutura da
personalidade humana sem ter estudado os modos de percepção e de apercepção do
tempo inerentes à cultura correspondente”. (1975:263). Ele também ensina que o
indivíduo compreendeu o significado do tempo quando tomou consciência de si situado
numa perspectiva temporal, “desenvolvendo suas capacidades durante o período
limitado que lhe era concedido nesta vida”. (1975: 282)
A mudança de fluxo temporal na produção, roteirização e edição de programas e
a transformação do relógio radiofônico no diálogo entre os dois sistemas estruturais, do
rádio para a radioweb, é hipótese desta pesquisa.
3.1. Relógio radiofônico
No rádio, os programas que compõem a grade de programação são transmitidos
pelas ondas eletromagnéticas e preenchem seqüencialmente as 24 horas em que ela fica
no ar. Essa distribuição sequencial dos programas, com transmissão linear decidida pela
27
Música Oração ao Tempo, composta por Caetano Veloso
42
própria emissora, desenha o relógio radiofônico temporal. Na radioweb, como a
programação está espacializada, os processos de produção devem gerar a apresentação
de uma programação que possa ser acessada alinearmente pelo ouvinte-internauta, pois
nesse novo espaço semiótico é ele quem decide o quê e quando ouvir, conforme
demonstrado no capítulo anterior. A não sequencialidade da programação da radioweb
realizada pelos processos tradutórios elimina o desenho convencionalizado do relógio
radiofônico, pois nela há outro fluxo temporal, construído pelo ouvinte-internauta.
Hipotética e simplesmente, se fossem transpostos os conceitos lingüísticos de
sincronia28
e diacronia às programações apresentadas pelas emissoras, portanto, vistos
pelos olhos do produtor, roteirista e editor, e não pelos do ouvinte ou do ouvinte-
internauta, seria possível afirmar que no rádio predomina a diacronia; na radioweb, a
sincronia.
Ainda de acordo com a simples transposição dos conceitos lingüísticos de
Saussure, no rádio predomina o sintagma; na emissora web, o paradigma. Os dois
sistemas semióticos radiofônicos exigem processos de produção, roteirização e edição
de programas que devem privilegiar fluxos temporais diferentes: a linearidade do rádio,
realizada pela transmissão em ondas eletromagnéticas, e a alinearidade da radioweb,
pela disponibilização dos programas expostos espacialmente no endereço digital.
A alinearidade temporal da escuta é realizada por esse indivíduo participante do
atual nível evolutivo das Redes Sociais, a 3.0, que permite o uso de aplicativos móveis
para navegação permanente na internet e que apresenta a velocidade como forte
característica temporal: “a conexão é tão contínua a ponto de se perder o interesse pelo
que aconteceu dois minutos atrás. Apenas o movimento do agora interessa.”
(SANTAELLA & LEMOS, 2010:62)
A não linearidade de navegação proporcionada pela internet já havia sido
discutida anteriormente pela autora, quando a colocou como característica típica da
hipermídia, extensão do hipertexto,
28
Para Ferdinand Saussure, a sincronia descreve o estado estrutural da língua em um dado momento; a
diacronia descreve a evolução história da língua, que leva em conta os diferentes estágios sincrônicos. Na
sincronia está o eixo das simultaneidades, no qual devem ser estudadas as relações entre os fatos
existentes ao mesmo tempo num determinado momento do sistema linguístico, que pode ser tanto no
presente quanto no passado. Na diacronia está o eixo das sucessividades, que estuda a relação entre um
determinado fato e os que lhe precederam ou lhe sucederam.
43
“texto digitalizado, fluido, reconfigurável à vontade, que se organiza de modo
não linear [...] Nas redes, aliás, não há senão arquitetura hiper, visto que a
informação estocada é sempre recuperada por cada usuário por caminhos
alineares, cada um fazendo um percurso próprio dentro de um vasto labirinto de
possibilidade.” (2005: 24)
Em fronteira entre os dois espaços semióticos, o tempo social permanece sendo
marcado por durações respectivas. O semioticista Aaron Gurevitch, ao discorrer sobre o
tempo social diferente entre culturas e sociedades em função das estruturas internas que
possuem, diz que
Se nas épocas anteriores as diferenças entre os tempos passado, presente e
futuro eram relativas [...] com o triunfo do tempo linear, essas diferenças se
tornaram muito precisas, e o tempo presente ficou comprimido e chegou a ser
apenas um ponto continuamente fugidio sobre a linha que vai do passado ao
futuro e que transforma o futuro em passado. O tempo presente se tornou
efêmero, irreversível e inapreensível. Pela primeira vez o homem verificou que
o tempo, cujo fluir ele descobria apenas através dos eventos, não pára, mesmo
quando não há eventos. (1975:282)
Tempo linear do relógio que substitui o tempo cíclico da sociedade arcaica cujo
movimento social era regido pelos fenômenos naturais, mitos e alternância das estações
e dos ciclos de produção. O sociólogo Norbert Elias já indicou que “os relógios exercem
na sociedade a mesma função que os fenômenos naturais – a de meios de orientação
para homens inseridos numa sucessão de processos sociais e físicos” (1998: 8). E
continua:
[...] o tempo não se reduz a uma idéia que surja do nada, por assim dizer, na
cabeça dos indivíduos. Ele é também uma instituição cujo caráter varia
conforme o estágio de desenvolvimento atingido pelas sociedades. (1998:15)
Gurevitch lembra que “a percepção e a apercepção do tempo são relativas à
própria essência da vida cultural. O conceito se liga intimamente à idéia de evolução.”
(1975:283) Ele ensina que o valor da velocidade cresceu incomensuravelmente e
transformou o ritmo da própria vida. E diz que “O tempo social não só difere entre as
diversas culturas e sociedades, mas também se diferencia em cada sistema sócio-cultural
em função de sua estrutura interna” (1975: 277)
44
Complementando com a conceituação já citada de Mcluhan desenvolvida em Os
meios de comunicação como extensão do homem, é possível avaliar que o ouvinte-
internauta, por ser usuário de uma mídia que lhe proporcionou não só a velocidade no
acesso, mas também no processo de informações e dados, adquiriu um ritmo
diferenciado do que tem o ouvinte do rádio eletromagnético, o que faz retornar a outras
palavras de Gurevitch:
Jamais em sua história a humanidade teve um sentimento do tempo como o que
domina hoje nos países desenvolvidos. A percepção atual do tempo tem muito
pouca relação com a das outras épocas. (1975:265)
45
3.2. Linearidade e alinearidade
No rádio que preenche as 24 horas, com transmissão seqüencial e linear
decididas pela própria emissora, estão convencionalizados temporalmente no relógio
radiofônico a identificação ao ouvinte do nome e endereço da emissora durante as horas
cheias, isto é, a veiculação de uma vinheta identificadora a cada 60 minutos
completados; a transmissão obrigatória por lei, às 19 horas, do programa governamental
“A voz do Brasil”; a interrupção planejada de programas, em média a cada 15 minutos,
para transmissão de blocos comerciais compostos por peças publicitárias de 15
segundos, 30 e até mesmo um minuto, além dos teasers, com menos de 10 segundos de
duração, que são a assinatura do patrocinador comercial/anunciante do programa; a
interrupção de programas para a veiculação da notícia, dados a instantaneidade e
imediatismo caracterizadores desse meio de comunicação, bem como para a veiculação
das chamadas institucionais sobre a programação da emissora. E durante a
programação, o locutor informa periodicamente as horas, ao vivo ou gravada – neste
caso, colocada no ar pelo operador em atividade.
A estrutura temporal oferecida ao ouvinte de rádio de forma linear é traduzida
pelos filtros existentes na fronteira com o espaço digital e transforma-se em estrutura
temporal alinear, passando a compor e dominar o espaço semiótico da emissora web,
tal qual a estrutura linear do rádio nele é dominante: “Las partes no entran em el todo
como detalles mecânicos, sino como órganos em um organismo.”(LOTMAN,1996: 31).
Neste outro espaço semiótico com fluxo temporal diferente, que permite ao
ouvinte-internauta construir seqüências diferenciadas de escuta dos programas,
escolhendo ouvir aquilo que gosta, em seu tempo presente, acomodam-se modelizações
transformadas pelas traduções em fronteira ou que também podem ser eliminadas, que
os processos de produção, roteirização e edição devem contemplar.
As vinhetas veiculadas nas horas cheias, a cada uma hora, identificadoras de
endereço e potência de transmissão, são eliminadas, permanecendo apenas as
identificadoras de programas, de direção artística ou que fazem a ponte ou passagem
entre programas ou músicas; deixa de existir a obrigatoriedade de transmissão da Voz do
Brasil, já que a radioweb não é regida pela legislação da radiodifusão; o locutor que
informa periodicamente as horas permanece apenas em uma modelização de programa
radiofônico, no Ao vivo; os spots comerciais não estão mais reunidos em blocos para
dividir os programas ou programação.
46
Com a estrutura nuclear do tempo traduzida, em que o ouvinte-internauta acessa
e escolhe o quê ouvir, os filtros bilíngües de Lotman, aqui constituídos pelos processos
de produção, roteirização e edição, obrigatoriamente passam a considerar não mais o
aqui, agora, do enunciador/emissor do rádio, mas sim o do
enunciatário/receptor/emissor da radioweb, eliminando nos enunciados, com exceção
dos programas ao vivo, todos os deícticos temporais, por exemplo, hoje, agora, ontem,
amanhã etc ou expressões que marcam datas do calendário ou o tempo do relógio.
Em O inumano, Jean-François Lyotard analisa o tempo afirmando que:
Enquanto ocorrência, cada frase é um „agora‟. Apresenta agora um sentido, um
referente, um destinador e um destinatário. Em relação à apresentação, devemos
imaginar o tempo de uma ocorrência como, e apenas como, presente. Este
presente não se pode apreender enquanto tal,é absoluto (1997: 65).
Na radioweb, a programação espacialmente visualizada e à disposição por
tempo indeterminado, ao ser acessada, sempre estará no tempo presente de quem a
acessa, mas esse presente não pode ser apreendido pelos deícticos temporais nos
respectivos enunciados da programação.
47
3.3. Duração temporal flexibilizada
Antes limitadas pelo tempo diacrônico estabelecido pela emissora e cercadas
pelos anúncios publicitários, as peças, no espaço físico em que compõe a programação
visualizada e não sequencial da radioweb, libertam-se e passam a apresentar conteúdos
com outras durações.
“[...] mais que isso, tornaram-se abertas, isto é, não dependem da
regulamentação e se abrem para a conformidade de múltiplos critérios (por
exemplo: diversidade na apresentação de conteúdos e temas, singularidade das
mercadorias culturais, elasticidades variadas dos materiais sonoros, níveis
diferenciados de desdobramentos nas coletas de sonoras) e totalmente
independente da audiência [...]29
(JOSÉ, 2010)
Ou seja, os programas não mais precisam cumprir a obrigatoriedade das
durações convencionalizadas pelo rádio eletromagnético. A duração temporal das peças
radiofônicas da grade de programação da radioweb é flexibilizada. E nesta
flexibilização, os programetes, como já dito peças radiofônicas de curta duração,
consolidam a nova predominância da programação da semiosfera da radioweb,
originada pelo fluxo temporal de uma mídia que tem por uma de suas características a
velocidade na ação de processar informações, dados etc.
Se no rádio a inserção do programete interrompe determinado programa ou da
grade de programação, várias vezes ao dia, quando transportado para a radioweb perde a
característica da interrupção, pois transforma-se em modelização de predominância da
programação desse outro espaço semiótico radiofônico.
Lotman diz que “El intercambio dialógico de textos no es um fenómeno
facultativo del proceso semiótico” (1996: 35), comprovando que o programete não só
se transforma em constituinte específico do novo espaço semiótico, mas, pela
predominância necessária, transforma-se em um dos elementos principais da estrutura
nuclear da programação da radioweb.
Ao transportar-se da estrutura nuclear do rádio, passa primeiramente para a
periferia da radioweb e depois conquista posto central desse novo espaço semiótico. E
29 Conforme NR 17, p.27
48
na “zona de bilingüismo que garante os contatos semióticos entre dois mundos”
(1996:27, tradução nossa) o que era da periferia conquista o núcleo central de outra
semiosfera.
Nessa tradução em que as durações temporais das peças – programa, programete
e programação - se transformam quando deslocadas para o outro espaço semiótico, é
possível supor que a nomenclatura “programete” seja substituída, na radioweb, por
“programa”.
49
3.4. Instantaneidade e interatividade
Balsebre já afirmou que “No contexto comparativo da função jornalística dos
distintos meios, o rádio se ergue como o que transmite notícias com maior rapidez”.
(2004:15, tradução nossa) Na sua opinião, isto contribui com uma concepção
exclusivamente funcionalista que impede o reconhecimento de sua tripla função, a de
meio de difusão, comunicação e expressão. Com o rádio brasileiro isso também ocorre.
Na maior parte de sua existência predomina o caráter disseminador de informações
garantido pela instantaneidade da transmissão da notícia.
Gisela Ortriwano registrou que “o imediatismo na transmissão é fundamental
para atender os objetivos do rádio” (1985: 95) e como bem lembra a autora, o rádio foi o
“[...] primeiro dos meios de comunicação de massa que deu imediatismo à notícia,
graças à possibilidade de divulgar os fatos no exato momento em que eles ocorrem”.
(1985:84)
Ao conceituar a notícia, Manuel Carlos Chaparro traz algumas definições de
outros autores, entre elas:
“Notícia é um fato ou uma idéia precisos que interessa a um amplo número de
leitores. Entre duas notícias, a melhor é a que interessa a um maior número de
pessoas.” [...] “Os periódicos publicam um variado tipo de informação segundo
os diferentes núcleos de interesse em seus leitores.” (SHEERHAN, 1972;
SPENCER, 1917, apud CHAPARRO, 1994: 118, grifo dos autores)
Ele conclui que “só é notícia o relato que projeta interesses, desperta interesses
ou responde a interesses”, (1994: 119) e destacou que esse atributo de definição tem sua
intensidade alcançada dependendo da existência de “atributos de relevância no
conteúdo”, denominados por Carl N. Warren de “elementos da notícia”. Ele propõe que
sejam oito: “atualidade, proximidade, proeminência, curiosidade, conflito, suspense,
emoção e conseqüências” (WARREN, 1975, apud CHAPARRO, 1994: 119)
No rádio, a notícia adquire mais distintivos, segundo Faus Belau. O autor afirma
que é possível ela se configurar com cinco níveis de informação. No primeiro nível, a
informação é emitida assim que se tenha conhecimento da ocorrência do fato:
50
É composto exclusivamente por notícias relevantes ou de grande interesse
público. Trata-se de uma emissão sem periodicidade fixa, ocasional, que
começa e termina em si mesma, não fazendo parte de nenhum programa,
podendo estar presente em todos eles. Interessa, nesse caso, dar a conhecer a
notícia com a máxima rapidez possível. (FAUS BELAU, 1972, apud
ORTRIWANO, 1985: 94)
No segundo nível, há a aparição ocasional de grandes notícias com enfoque
histórico “ou recompondo os acontecimentos e avaliando seu significado. São os
especiais [...]”. Para ele, no terceiro nível está o conjunto de notícias selecionadas que
“não participa de outro gênero jornalístico que não seja o informativo”. No quarto nível
a informação é tratada com mais profundidade, o comentário pode estar presente e sua
periodicidade é fixa: “São os nossos jornais „falados‟”. E no último nível ocorre a
informação integrada “com outros assuntos não propriamente jornalísticos [...] adequada
ao contexto do campo de interesse do programa de variedades”. (1985: 94-95)
No rádio, quando há interrupção de programas ou programação com transmissão
instantânea sobre o que ocorre naquele momento, a notícia aparece com o primeiro nível
de informação de Faus Belau. Após a tradução em fronteira, na radioweb pode mudar o
tratamento dado à notícia.
O primeiro nível de informação “dar a conhecer a notícia com a máxima rapidez
possível” ocorrerá apenas na transmissão Ao Vivo, quando a notícia, como no rádio,
poderá interromper a programação, ou apresentar-se no formato de jornal falado.
Assim, na radioweb, a notícia com o primeiro nível de informação, definido por Faus
Belau, perde a predominância.
Estrutura nuclear do rádio, a notícia, presente em variadas modelizações,
também rumará para o núcleo central do espaço semiótico da radioweb, porém, só
depois da tradução em fronteira que coloca sua instantaneidade hierarquicamente
subordinada à interatividade entre usuários, receptores e emissores ao mesmo tempo,
pois é o ouvinte-internauta que ao acionar o computador decidirá onde e quando buscá-
la.
Fora da modelização Ao Vivo, a notícia, assim como a publicidade, pode
transformar-se em estrutura de espaços específicos30
, confirmando o que foi dito no
Capítulo 2 desta pesquisa, que a programação visualizada da radioweb permite o
30
Não só na radioweb, na internet de forma geral há espaços diferenciados específicos à notícia, como,
por exemplo, os sites jornalísticos. O mesmo ocorre com a publicidade, como estrutura nuclear estática
nos respectivos espaços ou em movimento, na forma de span.
51
aprofundamento de assuntos e temas divididos em vários programas, o mesmo
acontecendo com o de notícias.
52
3.5. Difusão e expressão
Depois da chegada da TV no Brasil, programas e profissionais migraram para a
nova mídia da época, o rádio. Modelizações radiofônicas que exigiam atores, cantores,
instrumentistas e roteiristas, como radionovelas, programas de auditório, de humor etc
foram aos poucos sendo reduzidas. O rádio teve de se adequar a essa realidade e o
resultado foi a predominância, a partir daí, da notícia, da prestação de serviços e da
música para preencher sua programação distribuída sequencialmente pelo relógio
radiofônico de 24 horas em que fica no ar.
Convertida la radio en un altavoz de noticias, que se suceden ininterruptamente
a través del discurso de la palabra de los periodistas; o convertida también en un
instrumento de las compañías discográficas que utilizan la radio como altavoz
de sus novedades musicales, no es extraño que algunos piensen que la razón de
la existência de la radio está em su función técnica de canal transmisor de la
palabra-notícia o del disco-música. (BALSEBRE, 2004:15)
Em sua análise, o autor chama a atenção para o fato de programações
radiofônicas do mundo inteiro terem suprimido, de maneira geral, o gênero dramático
“aquel gênero que más contribuyó a la estructuración de um genuíno código de
expresión” (2004: 12). Para ele, a mensagem radiofônica necessita do equilíbrio entre
informação semântica, que denota e designa signos para nomear objetos, e estética,
portadora do segundo nível de significação, que conota valores afetivos, emocionais e
sensoriais, ou equilíbrio entre conteúdo e forma.
La conjunción de los factores semántico y estético en el uso del lenguaje
radiofónico es esencial si se quiere comprender la dimensión artística de la
creación radiofônica. (2004: 13)
No rádio que difunde, as modelizações de gêneros e programas com
predominância da notícia, da música e da prestação de serviços tornam-se repetitivas.
No rádio que expressa, é possível a busca do equilíbrio das funções semântica e estética
variando mais nas possíveis combinações entre os elementos constituintes da linguagem
radiofônica que resultem em modelizações diferenciadas das repetidas do rádio de
difusão.
53
Se na radioweb, espaço semiótico em fronteira com o rádio, como já afirmado
anteriormente, pode apresentar em sua estruturalidade programas de durações temporais
flexibilizadas com predominância dos mais curtos, dada a velocidade da interatividade
com o ouvinte-internauta, e também a notícia modelizada a nem sempre interromper a
programação, pois sua instantaneidade é submetida à escolha de audição do ouvinte-
internauta, então é possível afirmar que há espaço para a produção de modelizadores
que explorem mais a combinação dos constituintes da linguagem radiofônica com
conseqüente equilíbrio entre o semântico e o estético, aumentando a função de
expressão na comparação com a função de difusão.
54
3.6. Síntese das traduções temporais dos dois espaços semióticos
Antes de ilustrar, com a análise do corpus recortado para esta pesquisa, segue a
síntese das traduções em fronteira que fundamentam a hipótese de que na produção,
roteirização e edição de programas ocorre a mudança de fluxo temporal e que o desenho
do relógio radiofônico é suspenso quando traduzido em fronteira entre os dois sistemas
semióticos, o rádio e a radioweb.
a) no rádio, os programas são apresentados ao ouvinte de forma linear no
preenchimento das 24 horas em que a emissora fica no ar; na radioweb, com a
programação espacializada, os processos de produção devem gerar a
apresentação de uma programação que possa ser ouvida alinearmente;
b) no rádio a produção é diacrônica e sintagmática e na radioweb, sincrônica e
paradigmática. A não sequencialidade da programação oferecida pelos processos
de produção, roteirização e edição na radioweb elimina o desenho
convencionalizado do relógio radiofônico, pois traz outro fluxo temporal,
construído pelo ouvinte-internauta.
c) a vinheta que transmite a cada uma hora, a identidade, endereço e potência de
transmissão da emissora, na radioweb espacializada é eliminada, permanecendo
apenas as identificadoras de programas, de direção artística ou que fazem a
ponte ou passagem entre programas ou músicas;
d) na radioweb é eliminada a obrigatoriedade de transmissão da Voz do Brasil,
programa governamental veiculado no rádio hertziano de segunda à sexta-feira,
às 19 horas, de Brasília;
e) se no rádio o locutor informa periodicamente as horas, mesmo que esta voz esteja
gravada e seja colocada no ar pelo operador de áudio, na radioweb a informação
periódica do tempo permanece apenas em uma modelização de programa
radiofônico: no Ao vivo;
f) os spots comerciais não estão mais reunidos em blocos para dividir os programas
ou programação, tal qual acontece no rádio; na radioweb acomodam-se em
espaços específicos à publicidade;
g) nos enunciados produzidos, roteirizados e editados na radioweb, os deícticos
temporais que referem datas do calendário ou o tempo do relógio são
eliminados, com exceção dos usados em programas ao vivo;
55
h) se no rádio a duração temporal era uma das características que distinguia
programa, programação musical e programete, na radioweb, com programação
espacializada, a duração temporal das peças se flexibiliza e todas podem passar
a ser chamadas de “programas”, sendo possível supor que a nomenclatura
“programete” seja substituída por “programa”.
i) na radioweb a notícia só interrompe a programação na transmissão Ao vivo. A
característica da instantaneidade, típica dessa estrutura, ao ser traduzida,
submete-se à interatividade presente na radioweb. Fora da modelização Ao Vivo,
a notícia, assim como a publicidade, pode inserir-se em estruturas de espaços
específicos a ela.
j) com programas de durações temporais mais curtas para atender à velocidade da
interatividade com o ouvinte-internauta e com a instantaneidade da notícia
legada a segundo plano, aumenta o espaço para produção de programas que
explorem a combinação entre o expressivo e o estético. Na tradução entre
semiosferas radiofônicas, a função de difusão do rádio se enfraquece ao mesmo
tempo em que se fortalece na radioweb a função de expressão.
56
Capítulo 4 - Radioweb São Judas
Nos capítulos anteriores foi defendido que: a) a radioweb é obrigada a
disponibilizar uma programação que pode ser ouvida em diferentes momentos no tempo
planejado e decidido pelo internauta; b) muda o fluxo temporal para produção e
veiculação dos programas ao desvencilhar-se de uma programação transmitida
sequencialmente para preencher o relógio de 24 horas, como ocorre no rádio, pois os
programas ficam permanentemente disponíveis ao ouvinte-internauta.
Neste capítulo ilustraremos as hipóteses mostrando na programação da
Radioweb São Judas, objeto desta pesquisa, como os processos de produção,
roteirização e edição passam a contemplar esse novo fluxo temporal. Vale lembrar que
tais processos estão aqui colocados como mecanismos de tradução situados na fronteira
entre os espaços semióticos radiofônicos, o rádio e a radioweb, segundo conceituação de
Lotman:
[...] todos los mecanismos de traducción que están al servicio de los contactos
externos pertenecen a la estructura de la frontera de la semiosfera. La fronteira
general de la semiosfera se interseca con las fronteras de los espacios culturales
particulares (1996:26)
4.1. Apresentação do objeto
Considerou-se importante, antes da análise do corpus, apresentar o objeto frente
ao pensamento desenvolvido por alguns teóricos a respeito do meio de comunicação:
primeiro, o de Mcluhan em sua consolidada proposição “o meio é a mensagem”
(1964:21), que também embasou a direção artística da Radioweb São Judas; o de
Santaella:
[...] o meio através do qual uma linguagem é veiculada tem importância
soberana para se compreender a maneira como suas mensagens são produzidas,
transmitidas e recebidas.” (2005: 27)
e, ainda, o de Balsebre, porque o autor se refere às “chaves de produção” das
mensagens, nem sempre conhecidas, apesar da familiaridade que o ouvinte tem com os
signos que as constituem, surgida na rotina da audição.
57
Através da reiteração do hábito rotineiro de consumir filmes ou programas, as
audiências aprendem a ler a mensagem, se familiarizam com as chaves do
repertório de signos que constrói a mensagem e fazem possível sua
decodificação, mas ignoram as chaves de sua produção: aprender a falar as
linguagens modernas supõe um processo muito mais complexo, especialmente
pela incorporação ao repertório de elementos da noção tecnologia. (2004:18-
19, grifos do autor, tradução nossa)
A Radioweb São Judas nasce em 28 de maio de 2009, sob a direção artística
traçada pelos pensamentos de Mcluhan, conforme já posto, e de Lotman. No primeiro,
a constatação de que uma mídia nova se define a partir das mídias que lhe antecederam
e, no segundo, de que a cultura se dinamiza na fronteira onde estão os diferentes textos.
Emissora com fim educativo vinculada à Pró-Reitoria de Extensão da
Universidade São Judas Tadeu, teve origem em um projeto que propunha a instalação
de uma rádio que funcionasse internamente na universidade, apresentado em 2004 na
disciplina Projeto Experimental em Rádio como conclusão do curso de Radialismo
pelas alunas Mara Beatriz Dionísio e Tatiana Martins.
Repensado, o projeto foi readequado para se transformar em um espaço
radiofônico com transmissão pelo computador e que traduzisse o encontro dos textos,
do rádio com a radioweb, o que já pode ser visto em sua face na tela do computador,
criada em parceria com o Setor Web da Universidade, nas várias associações sígnicas:
ícones representativos das válvulas pertencentes ao rádio tradicional mesclam-se aos
dos programas, às fotografias da equipe de produtores, aos símbolos verbais ou aos
denotativos das possíveis relações de interatividade com o ouvinte-internauta, como o
do facebook e o do twitter.
Vê-se ícones, índices e símbolos, constituídos pela relação triádica entre
fundamento do signo, seu objeto e o interpretante (SANTAELLA, 2005), misturarem-se
na tela da Radioweb São Judas predominando ora a primeiridade ou a relação de
semelhança ou de qualidade com o objeto do quali-signo ou ícone; ora a secundidade ou
a relação indicial do sin-signo ou índice; ora a terceiridade ou a relação
convencionalizada do legi-signo ou símbolo.
Ao traduzir Charles Sanders Peirce, Santaella alerta:
58
As três categorias, que presidem as divisões triádicas, são onipresentes, de
modo que tudo e qualquer coisa pode ser um primeiro, tudo e qualquer coisa é
um segundo e tudo e qualquer coisa deve ser um terceiro. Assim, o modo de ser
de um signo depende do modo como esse signo é apreendido, isto é, depende do
ponto de referência de quem o apreende. (1995: 126)
O que faz o ouvinte-internauta “ligar” a rádio em questão é o click do mouse do
computador em seu endereço eletrônico www.usjt.br/radio_web. Colocá-la no ar
depende da triangulação operacional entre estúdio de áudio, setor web e provedor da
internet. Feita a triangulação, percursos de múltiplas escolhas podem surgir com novos
cliques nos ícones indicativos dos programas sonoros que trazem os mesmos
constituintes da linguagem radiofônica: palavra falada, trilha musical, efeitos e silêncio,
em variadas combinações de formatos e durações, com conteúdo artístico e acadêmico.
A programação da Radioweb São Judas (Anexo A) é composta por
modelizações que podem ser visualizadas por signos específicos. São programas com
conteúdos distintos e gêneros diversos que contemplam: produções experimentais
realizadas pelos alunos de 4º ano de Radialismo, jornalísticos, musicais, especiais de
homenagem a personalidades ou comemorativos que no rádio são chamados de tributo
ou sazonal e entrevistas temáticas.
São produzidos, roteirizados, dirigidos e apresentados por estagiários, estudantes
do curso de Radialismo e Jornalismo, e postados no endereço eletrônico de duas
diferentes formas: em arquivo On-Demand, semanalmente, e também Ao vivo,
quinzenalmente, em horário pré-determinado.
59
4.2. Análise do corpus
Um clik com o mouse no endereço eletrônico da Radioweb São Judas na tela do
computador e programas com vinhetas, locutores e formatações, gêneros e durações já
pertencentes como modelização nuclear do rádio são visualizados e,
metalinguisticamente, vão conduzindo o ouvinte-internauta a uma viagem sonora em
que é possível ouvir, por exemplo, Jakson do Pandeiro e Luiz Gonzaga junto com os
contemporâneos Lenine e Zeca Baleiro ou jovens vozes de personagens em programas
ficcionais que remetem à radionovela não mais presente no rádio. Enfim, uma viagem
sonora à composição de textos culturais que resultam dessa experiência na radioweb, a
partir da dinamização das estruturas modelares já nucleadas no rádio.
4.2.1. Da visualidade
Na face da radioweb visualizada no computador mesclam-se signos de tempos
culturais diferentes. Do lado esquerdo, dentro de uma ilustração gráfica que remete a
um desenho do rádio utilizado nas décadas de 40, 50 e 60 – feito de madeira, com
grandes botões redondos na frente ou ao lado para mudar de estação ou regular o
volume – os símbolos verbais intitulando os programas (Anexo B).
60
À medida que um deles é clicado nova página digital é aberta, repetindo o ícone
do rádio antigo à esquerda, hospedando o ícone representativo do programa clicado e,
abaixo, seta indicativa para audição da sinopse do programa, também representada em
seu título pelo símbolo verbal. No lado direito dessa mesma página, a listagem dos
títulos referentes ao programa escolhido, mantendo-se acima, junto com o ícone de um
alto-falante, o mais recente programa postado. Abaixo, seta indicativa para retorno à
página anterior (Anexo C).
Outro clic, novo ícone do rádio antigo em tamanho menor se sobrepõe e inicia-
se a audição do programa selecionado (Anexo D).
61
Na parte de cima da face da radioweb, abaixo de seu título, outro ícone remete
ao equipamento de rádio antigo: a imagem de quatro válvulas – peças que fizeram o
rádio funcionar em décadas passadas (Anexo B).
62
Com os títulos escritos Expediente, Especial, Programação Musical e Em
Pauta, hospedam conteúdos específicos que, à medida que vão sendo clicadas, outra
página digital surge apresentando uma lista de programas respectivos a cada uma delas.
Na válvula Especial estão os sazonais, programas de homenagem ou
comemorativos a personalidades, datas ou eventos. Nas válvulas denominadas
Programação Musical e Em Pauta são acondicionadas modelizações musicais e
jornalísticas, respectivamente. Na do Expediente, informações sobre a Direção Artística,
a identificação e o pensamento de seus realizadores e executores, pertencentes a Pro-
Reitoria, Diretoria de Extensão, Diretoria de Marketing, Coordenação, Direção
Artística, Coordenação, Setor Web e Estúdio de Áudio, sobre a radioweb.
Na parte central da face da radioweb permanecem os ícones indicativos dos
programas que vão se revezando na atualização da programação feita às quintas-feiras,
que compõem a chamada sonora institucional .
4.2.2. Da sonoridade
Com palavra escrita, imagens estáticas e áudio, a matriz sonora predomina na
Radioweb São Judas. Os programas podem ser ouvidos cada um em sua totalidade ou
interrompidos de acordo com a escolha do ouvinte-internauta, mas não há link ou
qualquer elo semântico que possibilite a interação entre eles, ou seja, a interatividade,
característica da linguagem hipermidiática do computador, está restrita à seleção de
escuta alinear feita pelo ouvinte-internauta ou às modelizações transmistidas ao vivo,
por meio da utilização dos recursos digitais twitter e facebook quando ele contata os
produtores para algum tipo de participação ou interferência nos conteúdos da
transmissão ao vivo.
Ao abrir a página da radioweb com o clik inicial, o ouvinte-internauta conectado
inicia o percurso da audição por uma vinheta que identifica o título da emissora,
chamada vinheta carimbo e, em seguida, ouve a chamada institucional que informa qual
a programação da semana, seguida de uma programação musical que gira em torno de
uma hora, com músicas agregadas por temas variados, anunciadas por locutor ou
locutora e entremeadas por vinhetas que nominam a radioweb e informam a direção
artística por meio de slogans ou intertítulos, como, por exemplo: Radioweb São Judas –
Na fronteira das culturas.
Essa chamada institucional que informa a programação semanal, no rádio é
transmitida ao longo da programação de 24 horas, conforme demonstrado no Capítulo 2
63
deste trabalho. Feita a tradução, a chamada institucional passa a ocorrer na Radioweb
São Judas em apenas dois momentos específicos: ao iniciar o percurso de navegação-
audição da radioweb, como já afirmado, e durante os programas Ao vivo realizados
quinzenalmente.
A vinheta que faz a ponte ou a passagem entre as músicas da programação
musical ouvida no primeiro acesso à radioweb é da estrutura do rádio e transformou-se
também em estrutura da radioweb. No entanto, na tradução de uma mídia para a outra,
outra vinheta, a que é veiculada no rádio a cada uma hora para identificação da
emissora, foi eliminada. No deslocamento, foi substituída na Radioweb São Judas por
outra estrutura, a Válvula Expediente.
No encontro entre textos culturais, pode-se perceber que a válvula Expediente é
resultante de dois diálogos: com o rádio, que a cada uma hora veiculava uma vinheta
para identificação, localização no dial eletrônico e potência de transmissão da emissora,
descrita no Capítulo três deste trabalho, em cuja tradução foi eliminada; e com o jornal e
revista impressos, que elegem um espaço variável para identificar nomes dos
responsáveis pelos departamentos, endereços, formas de contato e até a tiragem do
veículo.
Na parte de baixo da face da Radioweb São Judas a fotografia dos integrantes da
equipe de estagiários. No clic individual surge a palavra falada sobreposta a uma trilha
escolhida por cada um deles, em que se identificam ao ouvinte-internauta, desejando-
lhe boa audição. A performance vocal dos locutores da Radioweb São Judas, de modo
geral, tem os seguintes distintivos: ritmo e altura de média estimulação e intensidade
suave.
Com a imagem dos produtores e locutores na face da radioweb, elemento da
matriz visual presente nesse meio, a curiosidade que o rádio proporcionava no ouvinte
em conhecer “o dono da voz” ou a possibilidade de criar “um rosto para a voz” não
ocorre necessariamente na radioweb. A fotografia do rosto ou do dono da voz faz parte
da estruturalidade da radioweb e está disponível para conhecimento do ouvinte-
internauta.
A duração temporal dos programas foi flexibilizada e apresentam formatos com
dois, seis ou trinta minutos, com exceção dos programas transmitidos Ao vivo,
planejados em sua execução para ocupar uma, às vezes duas horas a cada quinze dias.
O enunciado textual na programação da Radioweb São Judas, no encontro entre
textos, também sofre modificações. Visualmente exposta por data temporal
64
indeterminada e que por isso pode ser ouvida em diferentes momentos sob decisão e
escolha do ouvinte-internauta - repetidamente ou após arquivamento do programa – o
enunciado textual de seus programas contempla esse novo fluxo temporal para a
produção de programas, considerando ainda que cada vez que o ouvinte-internauta
acessa a radioweb é em seu tempo presente.
Ou seja, não é mais o aqui ou agora, deícticos do tempo presente do produtor,
roteirista e editor que determinam o enunciado textual dos programas, mas, sim, o aqui
e agora do ouvinte-internauta nas variadas possibilidades temporais de escuta que a
programação exposta lhe apresenta. O aqui ou agora do programa deve conjugar
tempos diferentes, o da produção com o da escuta, sendo determinante o tempo da
escuta do ouvinte-internauta que o fará, conforme dito, no seu aqui ou agora, no seu
tempo presente.
No início dos programas transmitidos on demand, gravados e postados, ao
cumprimentar o ouvinte-internauta as expressões Bom dia, Boa tarde e Boa noite
deixam de existir e passam a ser substituídas, em geral, por Olá. Da mesma forma são
evitados os advérbios de tempo hoje, ontem, cedo etc e grupos preposicionais em cinco
minutos, de tarde etc pela produção, roteiro e edição dos programas em cuja
modelização predomina a informação jornalística com instantaneidade da notícia
submetida ao tempo presente da navegação-audição do ouvinte-internauta. Também
neste caso, a exceção é o programa transmitido Ao vivo.
Para continuar a análise da programação da Radioweb São Judas e dos
deslocamentos ocorridos no encontro em fronteira entre os dois espaços radiofônicos,
foram selecionados trecho da Programação Musical Chico e seus intérpretes e os
programas Lado B, Em Pauta, Língua Portuguesa e Navitrola
4.2.3. Programação Musical
Na Radioweb São Judas há duas modelizações do Ao vivo realizadas também
em revezamento a cada quinze dias: Radiorrevista31
e Programação Musical. Das duas,
pode-se dizer que a Programação Musical foi traduzida quando deslocada de uma mídia
para outra. Ela está hospedada na Válvula Programação Musical (Anexo B).
31
Conforme definição de Luiz Artur Ferraretto, visto no Capítulo 1
65
Clicando-a, nova página surge trazendo a listagem com os títulos dos distintos
programas, tendo ao lado esquerdo de cada um deles a imagem de um alto falante, signo
icônico que indicia a ação de ouvir o programa escolhido. Do lado direito da listagem
dos títulos, setas indiciam a escolha do programa pela rolagem da lista para cima e para
baixo quando manuseadas pelo mouse (Anexo E).
66
Novo clic e o ícone do rádio antigo se sobrepõe para início da escuta do
programa selecionado. A programação musical da radioweb manteve da modelização do
rádio a aglutinação de músicas que são tocadas sequencialmente durante determinado
período do dia ou da noite, de acordo com a direção artística da emissora, com locutor
ou locutora anunciando e desanunciando canções entremeadas por vinhetas que fazem a
ponte entre elas. Mas, na tradução, outras combinações musicais passaram a ser feitas
na radioweb, além das realizadas pelo rádio (bandas com solistas, cantores com
cantores, estimulações rítmicas, conforme explicado em capítulo anterior).
Além disso, à produção da programação musical na radioweb, conforme
defendido no capítulo três deste trabalho, é possível privilegiar o novo fluxo temporal
que disponibiliza os programas no espaço digital, ou seja, desvencilhar-se da linearidade
ou do eixo sintagmático da transmissão do rádio, oferecendo ao ouvinte-internauta, para
audição de acordo com sua preferência, músicas aglutinadas por temas, cantores de
época, ritmos, gêneros musicais ou reinterpretações da mesma canção, enfim, tendo um
traço comum e de aproximação que justifique tal aglutinação, transformando-se em
paradigmas musicais.
Por vezes transmitidas primeiramente ao vivo, em seguida são postadas na
Válvula Programação Musical, transformando-se, a partir daí, em programas distintos.
Como assinala José:
Na radioweb, cada opção de programação musical aparece como peça única,
mesmo que alguma delas seja estendida em várias edições; elas podem ou não
estar divididas em blocos e, necessariamente, a divisão/duração dos blocos não
está mais determinada pelas pontuações da barra comercial, que deve ocupar
outro lugar [...] cada programação musical passa a ser um texto cultural único e
singular, impossibilitado de se repetir a não ser em outra versão.32
No programa parcialmente transcrito abaixo, veiculado na Programação
Musical intitulada Chico Buarque e seus intérpretes, o traço que aproxima as canções é
a variada reinterpretação dada por múltiplas vozes às músicas compostas por um único
artista.
32
In Essa foi pra tocar no rádio, c.f. NR 17, p.27. Nesse texto, a autora registra as exigências acrescidas
ao perfil do programador musical para atender a nova modelização de programação Musical.
67
TEC VINHETA ABERTURA
LOC OLÁ, OUVINTE INTERNAUTA
EU SOU JULIANE ISTCHUK E VOU APRESENTAR A
PROGRAMAÇÃO MUSICAL, CHICO E SEUS INTÉRPRETES.
CHICO BUARQUE DE HOLANDA É UM DOS COMPOSITORES
DA MPB MAIS GRAVADOS NACIONAL E
INTERNACIONALMENTE.
ALGUNS DE SEUS INTÉRPRETES DESFILAM PELA
PROGRAMAÇÃO MUSICAL DA RADIOWEB SÃO JUDAS.
COMEÇAMOS COM A CANÇÃO INTITULADA SENTIMENTAL,
NA VOZ DE RENATO BRAZ.
A SEGUNDA É A CANÇÃO MORENA DOS OLHOS D’ÁGUA,
INTERPRETADA POR GAL COSTA.
E MAIS UMA: HOMENAGEM AO MALANDRO, NA
PERFORMANCE INCONFUNDÍVEL DE JOÃO BOSCO.
TEC ARQ.1 - SENTIMENTAL, RENATO BRAZ (2’02”)
ARQ. 2 - MORENA DOS OLHOS D’ÁGUA, GAL (3’22”)
ARQ. 3 – HOMENAGEM AO MALANDRO ((4’02)
VINHETA PASSAGEM RADIOWEB SÃO JUDAS
ARQ. 4 – PARTIDO ALTO, MONICA SALMASO (4’50)
ARQ. 5 – QUEM TE VIU, QUEM TE VÊ, BENO LOBO (2’38”)
LOC CHICO BUARQUE É O COMPOSITOR DE QUEM TE VIU, QUEM
TE VÊ, APRESENTADA POR BENO LOBO.
ANTES, MONICA SALMASO ACOMPANHADA PELA BANDA
PAU B RASIL APRESENTOU A CANÇÃO PARTIDO ALTO.
TEC VINHETA PASSAGEM RADIOWEB SÃO JUDAS
68
LOC A RADIOWEB SÃO JUDAS ESTÁ APRESENTANDO
COMPOSIÇÕES DE CHICO BUARQUE DE HOLANDA, NAS
MÚLTIPLAS VOZES DE SEUS IN[ÉRPRETES.
DESTA VEZ, A CANÇÃO É A VOZ DO DONO E O DONO DA
VOZ, NA VOZ DE CIDA MOREIRA.
DEPOIS É .....
Na apresentação variada dos intérpretes, a cada duas ou três músicas anunciadas
e desanunciadas pela locutora é veiculada uma vinheta que carimba o nome da radioweb
e faz a passagem ou a ponte entre as músicas, mantendo a estruturalidade do rádio na
radioweb.
4.2.4. Programa Lado B
É um programa que audibiliza uma tradução ocorrida no encontro das mídias.
Antes, sobre o título: o nome é referencializado por um dos lados do disco compacto de
vinil que apresentava no lado A a música selecionada pelos representantes da indústria
fonográfica, em conjunto com os da radiodifusão - programadores, diretores ou
proprietários de emissoras radiofônicas - para integrar a grade de programação das
emissoras e veiculá-la inúmeras vezes33
, e, no lado B, outra música para completar o
disco. Ressignificado, lado B passou a representar na década de 70 a música que não
tocava no rádio independentemente de apresentar qualidade artística e cultural, ou, em
outras palavras, que não havia sido escolhida para fazer parte da grade de programação.
O signo icônico do programa Lado B da Radioweb São Judas constitui-se dos
símbolos da linguagem verbal “Lado B”, com a letra “o” iconizada e transformada em
um disco de vinil e dentro desse disco, a letra “B”. (Anexo F ).
33
O procedimento foi gerador da expressão Jabá, conhecida no meio radiofônico pelo pagamento não
oficializado nem divulgado publicamente que a indústria do disco fazia para que a rádio tocasse
determinada música várias vezes ao dia e, consequentemente, alavancasse a venda do disco.
69
O acesso aos programas dá-se da mesma forma. Na página em que aparece a
listagem dos programas, seleciona-se um deles para audição e o ícone do rádio antigo se
sobrepõe para dar início a essa escuta (Anexo G).
70
De seu conteúdo fazem parte entrevistas com produtores, críticos e artistas,
mescladas com trilhas musicais. O critério de seleção do entrevistado é a atuação
profissional que tem na área musical que lhe permita, de alguma maneira, resgatar pela
memória músicas que não fizeram parte das programações das emissoras de rádio
quando o sistema de reprodução fonográfica era o disco de vinil, antes do CD, do MD,
do download em computador, enfim, antes das invenções tecnológicas ocorridas após os
anos 80.
A estrutura do programa é composta pelo depoimento gravado em que o
entrevistado aponta uma música que considera, metafóricamente, ter sido Lado B no
rádio comercial, ou seja, aquela que apesar de apresentar boa qualidade técnica e
musical, não tocou ou foi pouco tocada pelas mídias comerciais. As sonoras do
entrevistado, recortes ou fragmentos selecionados da entrevista, são mescladas com
trechos de músicas de sucesso do intérprete ou compositor da música citada para buscar
o reconhecimento pelo ouvinte-internauta do artista comentado e, na parte final do
programa, toca-se, na íntegra, a música considerada Lado B pelo entrevistado.
Para ilustrar, está transcrito abaixo o roteiro do Lado B intitulado Jornalista
Zuza Homem de Mello / Elis Regina.
TEC VINHETA ABERTURA (7”)
SONORA 1 CRÍTICO MUSICAL E JORNALISTA (T 24”)
DI - MEU NOME É ZUZA HOMEM DE MELO, SOU ....
DF – ... E CONTINUO ESCREVENDO
TEC TRILHA ELIS REGINA – 6” – BG
SONORA ZUZA 2 - (T 13”)
DI – A ELIS REGINA QUANDO GRAVOU...
DF – É O DISCO QUE TEM ROMARIA
TEC SOBE TRILHA NO REFRÃO – 15” - BG
(SOU CAIPIRA, PIRAPORA, NOSSA SENHORA DE
APARECIDA...)
71
SONORA ZUZA 3 – (T: 2”)
DI – CAXANGÁ...
TEC TRILHA CAXANGÁ – 8” – BG
SONORA ZUZA 4 – (T: 31”)
DI – A MÚSICA QUE EU IMAGINAVA...
DF - ...DE LANÇAMENTO DO DISCO DE ESTÚDIO.
TEC MUSICA COLAGEM (T: 3’40”)
LOCUTOR PRODUÇÃO ADRIANO ABNER E ALINE CAMPANA.
ÁUDIO: MARCELO FERNANDES
TEC SOBE MÚSICA ATÉ O FINAL
MIXA COM
VINHETA ENCERRAMENTO (T: 8”)
VINHETA IDENTIFICAÇÃO RADIOWEB SÃO JUDAS
A palavra falada está presente na voz do entrevistado (Zuza Homem de Mello) e,
só ao final do programa, na voz do locutor para informar a ficha técnica. As sonoras e as
trilhas musicais vão sendo roteirizadas de acordo com a proposta do programa:
primeiramente o entrevistado se identifica profissionalmente (Meu nome é Zuza....), em
seguida apresenta o artista (A Elis Regina quando....), depois cita músicas de sucesso
(Romaria...Caxangá...) para reconhecimento do ouvinte-internauta e, por fim, toca-se a
música considerada por ele como Lado B (A música que eu imaginava... Colagem).
O programa Lado B da radioweb é uma estrutura em que a música que não fez
sucesso, depois de deslocada da estrutura do rádio, passou a predominar no novo espaço
radiofônico. Em síntese: na estruturalidade da Radioweb São Judas a música que não
fez sucesso ocupou a lugar da música que fez sucesso no rádio e, tal qual esta, passou a
ser tocada integralmente, atendendo à Direção Artística da emissora web que, como
educativa, não restringe a veiculação aos sucessos musicais que tocam nas emissoras
comerciais.
72
4.2.5. Em Pauta – programas jornalísticos
Em capítulo anterior foi analisada a notícia no rádio que, no encontro em
fronteira, é traduzida e pode perder um dos atributos denominado por Faus Belau como
primeiro nível de informação que é o de “conhecer a notícia com a máxima rapidez
possível”, transmitida instantaneamente no momento do acontecimento.
Na Radioweb São Judas ocorre o que foi explicitado no capítulo três deste
trabalho. Dentre os cinco níveis de informação que a notícia pode apresentar, definidos
pelo autor, relacionados aos formatos de programas ou formas de veiculação da notícia,
ela está presente em três: no segundo nível, com os programas especiais que recompõem
os acontecimentos; no terceiro nível, composto por notícias selecionadas que participam
apenas de programas do gênero jornalístico; e no quinto nível, nos programas de
variedades. Isto significa que no objeto analisado, a notícia não apresenta o primeiro
nível de informação – transmissão instantânea no momento do acontecimento – nem o
quarto, estabelecido por Faus Belau como o nível de informação oferecido pelos jornais
falados do rádio.
A estrutura da notícia na Radioweb São Judas é traduzida quando a
instantaneidade, característica do primeiro e do quarto nível de informação, já que um
jornal falado também deve transmitir os acontecimentos no momento em que ocorrem,
passa a ocorrer apenas na modelização do Ao Vivo, a cada quinze dias.
Sem o imediatismo da veiculação, a notícia se faz presente fisicamente na
estruturalidade da Radioweb em dois locais: na Válvula Em Pauta, estrutura nuclear que
reúne programas nos quais a informação jornalística é conteúdo predominante e cujas
modelizações são na forma de boletim informativo34
, de entrevistas temáticas ou
grandes reportagens que são visualizadas após o clicar na Válvula; e nos programas
Dicionário das Ruas e Palavra de Especialista, modelizações temáticas que também
mantém a predominância da informação jornalística, seja na voz do locutor-repórter ou
do especialista-entrevistado. São atualizados e disponibilizados ao ouvinte-internauta a
cada quinze dias, mas todos permanecem à disposição do ouvinte-internauta por tempo
indeterminado no endereço eletrônico da Radioweb.
O nome do programa Em Pauta é resultante de vários diálogos em fronteira.
Primeiro, entre a estruturalidade do jornal e revista impressos com outros significados
34
Noticiário que não aprofunda sobre o acontecimento informado, de curta duração.
73
explicitados pelo dicionário de língua portuguesa35
, entre eles, o de “expediente
predeterminado dos trabalhos de cada dia” e ainda “conjunto de linhas horizontais
produzidas por papel”.
Adotado pelos veículos de comunicação de massa, em princípio, pelas revistas,
generalizou-se nos jornais brasileiros na década de 1950. Nilson Lage resgata que antes
da instituição da pauta,
[...] o noticiário do dia-a-dia dependia da produção dos repórteres que cobriam
setores. Estes se obrigavam a trazer diariamente sua cota de textos, o que
significava, na prática, ter uma programação de notícias frias ou reportagens
adiáveis (grifo do autor) para os dias de menor atividade. (2001: 29-33)
Na estruturalidade do jornalismo é usada em três situações: a) para planejamento
e organização da cobertura dos acontecimentos que deverão ser transformados em
notícia, geralmente traçados em reunião realizada entre editores e repórteres, quando
também se define a forma como será feita essa cobertura jornalística como, por
exemplo, “eventuais indicações logísticas e técnicas: ângulo de interesse, dimensão
pretendida da matéria, recursos disponíveis para o trabalho, sugestões de fontes etc”
(LAGE, 2001: 34); b) como lista de perguntas a serem feitas pelos jornalistas aos
possíveis entrevistados, fontes de informação para a confecção do texto jornalístico; c)
como instrumento de trabalho do pauteiro que, após participar da elaboração da pauta,
distribui os assuntos aos repórteres para produção das matérias jornalísticas.
Na Radioweb São Judas a palavra pauta tem o mesmo significado interpretado
pelo jornalismo que a usa para planejamento da produção. Reuniões de pauta são
realizadas com as equipes de produção em dois momentos: para planejar os conteúdos
dos programas e após as transmissões ao vivo para avaliação do produto que acabou de
ir ao ar.
O signo icônico do Em Pauta, um desenho de uma folha com linhas horizontais
e uma caneta sobreposta, com o título do programa sobrescrito à mão, resulta em uma
metáfora que remete ao que está agendado e por isso não pode sair da pauta (Anexo H).
35
Cf. Dicionário Aurélio, pauta pode ser a) conjunto de linhas horizontais produzidas por papel ou
máquina apropriada; b) cada uma delas; c) sistema de uma a cinco linhas sobre as quais se escrevem as
notas musicais; d)lista, rol; e) expediente predeterminado dos trabalhos de cada dia.
74
A metáfora, lembra Santaella sobre Peirce, é uma das faces do signo icônico,
junto com a imagem e o diagrama:
As metáforas fazem um paralelo entre o caráter representativo do signo com o
caráter representativo de um possível objeto. (...) elas representam o caráter
representativo de um signo e traçam um paralelismo com algo diverso. Caráter
representativo refere-se àquilo que dá ao signo poder para representar algo
diverso dele.” (1995: 157)
4.2.6. Programa Lingua Portuguesa
No Língua Portuguesa peças de ficção são produzidas para orientar o ouvinte-
internauta sobre a utilização em seu dia-a-dia de termos e expressões da língua
portuguesa. Alunos de comunicação interpretam personagens que contextualizam, em
determinada cena do cotidiano, o termo selecionado para o conteúdo do programa,
seguida da participação de um professor de língua portuguesa vinculado a Universidade
São Judas para explicar o significado do termo e se foi inserido corretamente pelos
personagens do programa.
O signo icônico do Língua Portuguesa, visualizado após o clic do internauta na
primeira página da Radioweb São Judas, é composto pelo título escrito em letras
75
maiúsculas com as cores verde e amarela, convencionalizadas na bandeira brasileira,
quali-signos para representar a floresta e o ouro brasileiros. (Anexo I )
Para contextualizar a análise desse programa, vale a pena a transcrição mais
longa sobre o que Balsebre considerou como seu objeto de estudo, pois vem ao encontro
da proposta desta modelização na busca da exploração das combinações de todos os
contituintes da linguagem radiofônica para a construção de significados.
(...) el lenguaje radiofônico es el instrumento que hace posible la difusión de
noticias con mayor rapidez, la comunicación entre públicos masivos y
heterogêneos, pero al mismo tiempo permite la creación artística. Si la
información estética en el lenguaje se genera a través de uma excitación
sentimental em el proceso comunicativo, y esta guarda una gran conexión con
lo simbólico y lo connotativo, el lenguaje radiofônico necesita integrar en su
sistema semiótico aquellos elementos expresivos que codifican el sentido
simbólico. La utilización de la música y los efectos sonoros en la producción de
enunciados significantes, como signos sustituvos de uma determinada idea
expresiva o narrativa, pueden superar muchas veces el própio sentido simbólico
y connotativo de la palabra. (2004: 29)
No Lingua Portuguesa a trilha musical e o efeito sonoro são utilizados para a
composição de paisagens sonoras descritivas dos cenários onde as situações ficionais
76
ocorrem. Na combinação da paisagem sonora com performances vocais configurativas
dos personagens, interpretados vocalmente pelos alunos, é ressaltado o poder de
expressão que o rádio pode apresentar. Na Radioweb São Judas percebe-se a
intensificação da função de expressão, conforme possibilidade aventada no capítulo três.
E isso é notável principalmente se for considerado que a notícia, na emissora, não
apresenta o primeiro nível de informação, contribuindo com a redução da função de
difusão que no rádio predomina.
A expressão que se concretiza na integração da informação semântica ou
conteúdo com a informação estética ou forma, defendida por Balsebre para o
enriquecimento da criação artística radiofônica, explanado no capítulo anterior, está
presente na Radioweb São Judas e, para demonstrá-lo, foi selecionado o programa
Língua Portuguesa - Hipérbole (Anexo J):
77
TEC VINHETA (T: 7”)
MIXA TRILHA CHICO CESAR – 10” – BG
LOC 1 AI, QUE DEMAIS ESSE SHOW. QUANDO TERMINAR EU VOU LÁ
PEDIR UM AUTÓGRAFO PRA ELE.
LOC 2 E VOCÊ ACHA QUE O CHICO CESAR É DE DAR AUTÓGRAFO
ASSIM, É?
LOC 1 SE ELE É, EU NÃO SEI. SÓ SEI QUE VOU ATÉ LÁ.
LOC 2 ENTÃO FINGE QUE VOCÊ NEM ME CONHECE.
LOC 1 LARGA DE SER BOBO...
LOC BOBO NÃO, VOCÊ MAI ME MATAR DE VERGONHA
TEC CORTA TRILHA
EFEITO DE PASSAGEM (T: 2”)
PROFESSOR – EXPLICAÇÃO SOBRE SIGNIFICADO HIPÉRBOLE
LOCUTOR FICHA TÉCNICA
TEC VINHETA DE ENCERRAMENTO (T: 7”)
VINHETA IDENTIFICAÇÃO RADIOWEB SÃO JUDAS
O programa se inicia com uma trilha musical em que o cantor Chico Cesar está
em primeiro plano. Ao passar para a situação de background, a voz do primeiro
personagem é sobreposta à canção, trazendo um enunciado que, combinado com a
palavra cantada em BG, constrói o significado de que ele está em um show de Chico
César. Ou seja, conforme abordado no primeiro capítulo, a trilha musical passou a
cumprir uma outra função que não a da música tocada para cantar, dançar etc. Neste
78
programa, ela está compondo a paisagem sonora – o cenário onde ocorre o diálogo dos
personagens é o show de quem está cantando.
TEC VINHETA (T: 7”)
MIXA TRILHA CHICO CESAR – 10” – BG
LOC 1 AI, QUE DEMAIS ESSE SHOW. QUANDO TERMINAR EU VOU LÁ
PEDIR UM AUTÓGRAFO PRA ELE.
.
A combinação dos constituintes trilha com palavra falada resulta na informação
estética de que o diálogo se desenvolve durante a realização do show de Chico César,
sem que os personagens, em nenhum momento, dissessem que estavam em um show,
que era do Chico Cesar ou o que é um show. Após o diálogo, um efeito sonoro de dois
segundos expressa o término do esquete ficcional para a entrada do professor concluir a
proposta do programa, com a explicação sobre o que é hipérbole, conteúdo escolhido
dessa peça.
LOC BOBO NÃO, VOCÊ MAI ME MATAR DE VERGONHA
TEC CORTA TRILHA
EFEITO DE PASSAGEM (T: 2”)
PROFESSOR – EXPLICAÇÃO SOBRE SIGNIFICADO HIPÉRBOLE
O efeito pontua e expressa a mudança de “cena”: o ouvinte-internauta sai do
show de Chico César com os dois personagens e vai para um outro espaço para receber
a informação semântica do professor.
Ao realizar modelizações que exigem performances vocais diferenciadas,
desenvolvidas pelos próprios alunos na representação de personagens e a criação de
paisagens sonoras específicas para os diversos programas Língua Portuguesa, a
79
Radioweb São Judas indica certa predominância na função expressiva que o rádio pode
oferecer.
4.2.7. Programa Navitrola
Outro programa em que é possível perceber o encontro de textos culturais é o
Navitrola (Anexo K).
Representado pelas imagens de uma vitrola antiga dentro do rádio antigo,
surgem após o clic na listagem de programas da face da radioweb. Ao lado direito de
seu ícone representativo, também são indiciados para escuta por meio do diminuto alto-
falante ao lado esquerdo de cada título verbal-escrito. Acima, separado da listagem, o
programa mais recentemente postado, na atualização da programação feita
semanalmente. Clicado, a página do programa selecionado aparece na tela do
computador (Anexo L).
80
O Navitrola resgata a história de compositores do século passado na voz do
locutor focando em determinada canção que, ao final, é veiculada com três
interpretações: a primeira, original; a segunda reinterpretação feita em período após e
diferente do da original; e a terceira, por um cantor da contemporaneidade.
A proposta do Navitrola é realizar o encontro de artistas de datas temporais
diferentes para que o ouvinte-internauta possa reconhecer no novo o antigo ou vice-
versa, a tradição que recebe novos elementos e se mantém presente na
contemporaneidade. Fazem parte do roteiro e edição do programa as vinhetas de
abertura e encerramento, seguido pela de identificação da Radioweb; a narração é feita
com trilhas em BG, encerrando-se sempre com a justaposição das três unidades
musicais. O Navitrola escolhido para análise foi o Jackson do Pandeiro – Lenine, com
roteiro transcrito a seguir:
81
TEC VINHETA DE ABERTURA (T 5”)
MIXA COM
TRILHA LENINE – JACK SOUL BRASILEIRO – 10” - BG
LOC PARAIBANO, ELE JÁ FOI ZÉ JACK, ZÉ DO PANDEIRO PARA,
FINALMENTE, VIRAR JACKSON DO PANDEIRO.
TEC TRILHA JACKSON – CHICLETE COM BANANA – 5” – BG
LOC CARREGOU O NOME DO INSTRUMENTO QUE IMORTALIZARIA
SUA TRAJETÓRIA.
NAS SUAS COMPOSIÇÕES É POSSÍVEL PERCEBER UMA
CONSTRUÇÃO VOCAL DIFERENTE E VÁRIOS RITMOS EM UMA
MESMA MÚSICA.
TAMBÉM FOI ELE QUE TROUXE PARA O RÁDIO E A TV AS
MARCAS DOS CANTADORES DE FEIRA LIVRE DO NORDESTE.
CASOU-SE E FEZ DUPLA COM ALMIRA CASTILHO, QUE TINHA
UM JEITO PECULIAR DE DANÇAR.
JACKSON DO PANDEIRO FOI REGRAVADO INÚMERAS VEZES.
SUA PRIMEIRA GRAVAÇÃO JÁ PASSOU DE MEIO SÉCULO....
TEC TRILHA JACKSON SEBASTINA - BG
LOC FOI EM 1.951, O XAXADO SEBASTIANA, DE ROSIL
CAVALCANTI.
EM SEBASTIANA, A HOMENAGEM DE GAL COSTA E DEPOIS,
DO TAMBÉM NORDESTINO, LENINE
TEC SOBE MÚSICA (8”) - MIXAR COM GAL COSTA (25”) - MIXAR
COM LENINE ATÉ 3’40” – BG
LOC PRODUÇÃO DE CARLOS BARRETO E DANIEL TAVARES.
ÁUDIO, MARCELO FERNANDES
82
TEC SOBE MUSICA ATÉ O FINAL
MIXA VINHETA DE ENCERRAMENTO (T 5”)
MIXA VINHETA RÁDIO (T 3”)
O encontro de textos culturais de datas temporais respectivas ocorre já na
vinheta de abertura, também usada para encerramento do programa. Ela dá o nome ao
programa – Navitrola - , juntando a preposição na com o substantivo vitrola, remetendo
o ouvinte- internautaouvinte, quando ouve o início da pronúncia desse título - navi -,
por ser sonoramente semelhante ao início do verbo navegar- nave -, à ação de quem usa
a internet e onde é veiculada a peça.
Nessa palavra oral incide um efeito sonoro tecnológico de retorção da voz nas
duas últimas sílabas do termo criado - trola – transformando-se na simulação do som de
um disco de vinil sendo tocado em velocidade baixa, de 78 rpm (rotações por minuto).
A palavra começa a ser falada em ritmo natural e em tempo normal, para depois ser
retorcida, resultando em uma performance vocal produzida por mecanismo tecnológico.
Além da palavra falada com efeito tecnológico de retorção, a vinheta apresenta
mais dois efeitos constituintes. O primeiro é o que simboliza o som característico de
quem está tentando acessar a internet, antecedendo a fala das duas primeiras sílabas da
palavra navitrola; o segundo efeito constituinte da vinheta é o do som da agulha no
disco de vinil na vitrola após as duas últimas sílabas retorcidas que simulam o efeito do
disco rodado em 78 rpm.
A vinheta, portanto, com os efeitos, expressa um possível percurso do tempo
atual (som de quem acessa a internet) para o tempo passado, quando se usava a vitrola
para tocar um disco de vinil. É a função expressiva do efeito sonoro, denominada por
Balsebre e explicitada no Capítulo 1 desta pesquisa e também a junção dos constituintes
– efeito e palavra falada - para expressar significado.
Os recortes das músicas Jacksoul Brasileiro, Chiclete com Banana e Sebastiana,
transformados em trilhas, trazem marcas distintas dos tempos em que foram gravadas.
Em Jacksoul Brasileiro, a interpretação de Lenine é acompanhada por arranjo moderno
de violão e iniciada pela simulação de um vocal. Lenine transita pelo universo da
música pop e é admirado pelo público jovem e o jovem-adulto. Nessa música, faz o
trocadilho com o nome de Jackson do Pandeiro - Jack soul brasileiro e o som do
pandeiro é certeiro e tem direção - e enaltece o pandeiro, instrumento não comum na
música pop.
83
Em Chiclete com Banana e em Sebastiana, que entram em seguida no programa,
um mergulho no século passado. Ambas são cantadas pelo próprio Jackson do Pandeiro.
A primeira é introduzida pelo som do pandeiro, cuja utilização marcou o trabalho
artístico do artista; na segunda, a sanfona introduz a canção. Ambas apresentam-se em
gravação original, mantendo os primeiros arranjos recebidos.
A música final do programa é Sebastiana, apresentada em três recortes e
versões, cantadas por Jackson do Pandeiro, Gal Costa e Lenine. Os recortes, justapostos
e mixados, recompõem a unidade musical de Sebastiana e, metalinguisticamente, as
trilhas (fragmentos musicais que tem funções diferenciadas na composição de uma
mensagem) voltam a ser uma música, recuperando suas singularidades de ser tocada,
cantada ou dançada, conforme visto no Capítulo primeiro.
São arranjos instrumentais e formas de cantar diferenciados que traçam um
percurso temporal do antigo para o atual. Na gravação de Jackson permanece o pandeiro
e a sanfona, instrumentos musicais tradicionais em sua música; na de Gal, a diversidade
dos instrumentos de percussão em ritmo acelerado; e na de Lenine, presentifica-se o
hip-hop, com fragmentos de música eletrônica e no ritmo de canto pontuado que se
assemelha à palavra falada, estilo amplamente divulgado nos dias de hoje.
Nos recortes abaixo do roteiro do Navitrola os exemplos mostram como a edição
dos elementos sonoros resultou em variantes de fluxo temporal ou no encontro de
tempos diferentes ou, ainda, em textos culturais diferentes:
a)Sobreposição da palavra falada à trilha cantada por Lenine:
TEC TRILHA LENINE – JACKSOU BRASILEIRO – 9” – BG
LOC PARAIBANO, ELE JÁ FOI ZÉ JACK, ZÉ DO PANDEIRO PARA,
FINALMENTE, VIRAR JACKSON DO PANDEIRO.
84
b) Justaposição da palavra falada à trilha seguinte, antiga gravação do pandeiro,
antecedendo outra sobreposição – a da palavra falada quando a trilha vai para BG.
LOC (...) VIRAR JACKSON DO PANDEIRO.
TEC TRILHA JACKSON – CHICLETE COM BANANA – 5” – BG
LOC CARREGOU O NOME DO INSTRUMENTO QUE (...)
c)Justaposição de trilhas, Chiclete com Banana com Sebastiana, e, ao entrar para BG,
nova sobreposição da palavra falada à trilha.
LOC (...) SUA PRIMEIRA GRAVAÇÃO JÁ PASSOU DE MEIO SÉCULO....
TEC TRILHA JACKSON SEBASTINA - BG
LOC FOI EM 1.951, O XAXADO SEBASTIANA, DE ROSIL CAVALCANTI.
EM SEBASTIANA (...)
d) O encontro explícito de textos culturais ocorre no final do programa, quando três
trechos da mesma música de três gravações diferentes são justapostos e mixados em
continuidade, reconstruindo a unidade musical.
TEC SOBE MÚSICA (8”) - MIXAR COM GAL COSTA (25”) - MIXAR COM
LENINE ATÉ 3’40” – BG
O programa Navitrola se inicia no atual, com a vinheta e em seguida ocorre a
primeira produção de sentido, com a palavra falada sendo sobreposta às trilhas com
gravações antigas.
Retorna-se ao atual, quando Lenine, ao final do programa, interpreta no estilo
hip-hop a primeira gravação de Jackson. Desse efeito atual o ouvinte-internauta volta
para o antigo com a vinheta de encerramento – que sai da voz atual e normal para a voz
distorcida, bem como do efeito de internet para o efeito da agulha no disco de vinil.
85
Consolida-se, assim, na construção de sentido, o reconhecimento da tradição na
música contemporânea, ou vice-versa, o novo no antigo, com o atual Lenine, ouvido na
vitrola, resgatando o tradicional Jackson do Pandeiro, tocado na internet.
86
Considerações Finais
(...) nosso saber resulta de um longo processo de aprendizagem, que não teve um começo na
história da humanidade. Todo indivíduo, por maior que seja sua contribuição criadora,
constrói a partir de um patrimônio de saber já adquirido, o qual ele contribui para aumentar.
(Norbert Elias, 1998: 10)
Veículo de comunicação de massa e, como tal, integrante da indústria cultural, o
rádio, desde seu nascimento, foi visto com certa resistência por parte dos intelectuais.
Basta resgatar Edgar Morin: “rádio e televisão foram o refúgio dos jornalistas ou
comediantes fracassados” (1987:17). No entanto, só quem já “passou” pelo rádio,
conhece bem o significado da velha metáfora: “É uma cachaça que vicia”.
Talvez por ser da oralidade e visto como liberto das regras da cultura letrada –
diga-se, uma visão preconceituosa e equivocada porque na oralidade mediatizada em
que se situa o rádio também há a convivência com a mista que “procede da existência
de uma cultura escrita” (ZUMTHOR, 2010: 36) - seu sistema de linguagem apresenta
um histórico de pesquisa restrito, apesar de algumas enriquecedoras, como a de Armand
Balsebre, um dos teóricos que fundamentaram este trabalho.
Atualmente, esse rádio passa pela segunda grande transformação. A primeira
ocorreu após a chegada da televisão, quando para ela migraram profissionais e
patrocinadores, e o veículo se obrigou à mudança de programação que passou a
apresentar a predominância da música, da prestação de serviços e do jornalismo.
Nesta segunda grande transformação promovida pelo surgimento da internet,
plataforma que reúne todas as linguagens e dá origem à linguagem hipermidiática em
que todos acessam, processam, se encontram e se transformam em receptores e
emissores ao mesmo tempo, elementos do rádio se transportam para a web ao mesmo
tempo em que o rádio recebe constituintes estruturais da internet. Mas, isto já é tema
para outra pesquisa.
O presente trabalho foi embasado nos conceitos de semiosfera e fronteira de
Yuri Lotman e no pensamento de Marshall Mcluhan de que uma mídia resgata
constituintes de outra e, dependente de sua localização sócio-político-cultural, se
expande, e o meio torna-se mensagem comunicada de outra forma.
87
Esses autores, assim como outros citados ao longo desta pesquisa – Gurevitch,
Elias, Balsebre, José, Prado, Ortriwano, Santaella, Meditsch, Medeiros, Ferraretto,
Barbosa, Del Bianco, Moreira, Lyotard, Zumthor - proporcionaram as condições
teóricas para comparar as especificidades das duas mídias, do rádio e da radioweb,
iluminar os deslocamentos ocorridos do primeiro para a segunda, tendo os processos de
produção, roteirização e edição de programas como mecanismos de tradução e, a partir
daí, analisar quais estruturas nucleares do rádio transportaram-se para a nova mídia e de
que forma se constituíram no novo espaço radiofônico. Resgatando Lotman, foi possível
analisar, na tradução em fronteira, o que se transformou em estrutura pertencente ao
novo espaço semiótico após cumprir o percurso periferia-centro ou, com base em
Mcluhan, perceber que um novo meio, sendo ele mesmo a mensagem e extensão de nós
mesmos,
introduz mudança de escala, cadência ou padrão nas coisas humanas. A estrada
de ferro não introduziu movimento, transporte, roda ou caminhos na sociedade
humana, mas acelerou e ampliou a escala das funções humanas anteriores,
criando tipos de cidades, de trabalho e de lazer totalmente novos. (MCLUHAN,
1964: 21-12)
Foram averiguadas similaridades aos dois espaços semióticos: presença dos
constituintes da linguagem sonora, da direção artística, de programação atualizada e
periódica, de estrutura de programas com locutores e vinhetas, chamada e notícia.
Também foram analisados distintivos e, em seguida, elencadas as estruturas modelares
da radioweb resultantes do encontro em fronteira com as estruturas do rádio, a saber: a
espacialização da programação do rádio na web com constituintes da linguagem verbal
e visual somadas à sonora, transmissão diferenciada, nomenclatura transformada,
espaços destinados especificamente para determinadas peças, como os spots, chamadas
e também para a notícia cuja instantaneidade foi legada a segundo plano e enunciados
temporais diferentes conseqüentes do novo fluxo temporal para a produção de
programas permanentemente disponíveis ao acesso do ouvinte-internauta.
Ao discutirmos nesta pesquisa o que distingue o rádio da radioweb, por meio da
análise de um objeto específico, a Radioweb São Judas, foi possível comprovar que
feitos os deslocamentos, as mídias apresentam distintivos que devem ser respeitados nos
processos de produção, ou do fazer. Ou seja, saber as condições da temperatura, do
trânsito, do que abre e fecha no feriado, dos últimos acontecimentos, pelo rádio, sim;
88
pela internet, sim, mas pela radioweb, não necessariamente. Ouvir a mensagem e voltar
a ela quando quiser – ou ir para a frente? - para ouvir de novo, só na radioweb. Ouvir a
voz e imaginar o rosto de quem fala, só no rádio.
Deslocamento importante averiguado nesta pesquisa foi a apresentação da grade
de programação: no rádio, uma listagem por ordem temporal, cuja transmissão
seqüencial é determinada pela própria emissora para o preenchimento do relógio
radiofônico de 24 horas em que ela fica no ar; na radioweb, programas desvinculados
desse relógio temporal, espacialmente visualizados, permanentemente disponíveis para
o acesso do ouvinte-internauta que decide quando ouvir e, sempre que ouvir, estará no
seu tempo presente.
Há de se registrar que ainda é comum na internet a visualização de uma grade na
forma de lista de programas, repetindo o modelo do rádio eletromagnético que transmite
a sequencialidade das 24 horas ou o relógio radiofônico que atende o tempo de
transmissão da emissora e não a necessidade de disponibilidade de acesso que essa nova
mídia oferece como distintivo. Modelos estruturantes do rádio predominam na radioweb
desconsiderando, assim, as novas extensões por ela proporcionadas.
Quando as rádios comunitárias foram regulamentadas e oficializadas na década
de 90, com estruturação proposta para atendimento às respectivas comunidades, era
comum, como ainda é até hoje, cerca de 20 anos depois, a reprodução do modelo de
programação do rádio comercial em que predomina o entretenimento e a prestação de
serviços às grandes massas, prejudicando o objetivo a que se propõe a rádio comunitária
que é priorizar a voz da comunidade, a prestação de serviços à localidade e o estímulo
ao desenvolvimento social da respectiva comunidade. A reprodução do modelo
comercial - com exceções – impediu a aplicação da mais importante especificidade da
rádio comunitária.
O que nos parece é que a ocorrência de novas extensões proporcionadas por um
meio recente não se traduz necessariamente em sua assimilação imediata, mas o uso e
aplicação na prática ou no processo de fazer dessas extensões podem acelerar essa
assimilação.
Voltando à radioweb que reproduz o desenho de apresentação da programação
do rádio: o ouvinte-internauta até pode ligar o computador para audição de determinado
programa, mas ele decide quando ouvir esse programa independemente do horário
estabelecido pela emissora, pois não é da característica dessa mídia o mesmo hábito de
recepção do ouvinte de rádio que se utiliza do veículo como companheiro que o segue
89
no carro, no campo de futebol, no trabalho etc, para ouvir tal programa no tempo
estabelecido pela emissora. No processo de fazer uma radioweb, isso, por exemplo,
deve ser considerado. Assim, se por um lado o “conteúdo de qualquer meio ou veículo é
sempre um outro meio ou veículo” (MCLUHAN, 1964: 22) também já disse o autor
que
[...] as mais recentes abordagens ao estudo dos meios levam em conta não
apenas o „conteúdo‟, mas o próprio meio e a matriz cultural em que um meio ou veículo específico atua (MCLUHAN, 1964: 25).
Ou seja, o rádio é rádio, não é radioweb; a radioweb é radioweb, não é rádio.
Pelo menos ainda.
Esta pesquisa não se esgota e acreditamos que os resultados da análise e da
comparação podem contribuir com a configuração do perfil desse novo ouvinte aqui
denominado de ouvinte-internauta, aquele que não é mais só receptor, mas também
emissor, e que adquire novos hábitos de ouvir traduzidos em impacto trazido pela nova
mídia. Quais são os constituintes desse impacto e como alteram as formas de audição ou
hábitos de recepção do ouvinte-internauta também podem transformar-se em tema para
outra pesquisa.
Por fim, se considerarmos as inúmeras análises que continuam permeando a vida
desse vovô que se materializa nas casas, nos escritórios, nos carros, bares, postos de
gasolina e tantos outros lugares, informando, entretendo, fazendo companhia e
estimulando o imaginário popular com o som que se instala nos corações e mentes, em
comparação com os estudos sobre a jovenzinha web, sem dúvida, esta proposta de
estudo é apenas um começo, mas indicativa da necessidade de se continuar a pensar o
áudio. Se este trabalho lançar prognósticos sobre um outro modo de ouvir e de escutar,
já terá valido a pena. Afinal, segundo PLAZA,
Operar sobre o passado encerra um problema de valor. Não é escolher um dado
do passado, uma referência passada; é uma referência a uma situação passada de
forma tal que seja capaz de resolver um problema presente e que tenha
afinidade com suas necessidades precisas e concretas de modo a projetar o
presente sobre o futuro. (1987: 6)
E, por último, lembrar o que Juremir Machado da Silva brilhantemente afirmou:
“O mais importante, ao final de uma pesquisa, não é saber que método foi usado, mas o
que foi des(en)coberto” (2001:93). Ou o que poderá ser.
90
Bibliografia
Da comunicação
ADORNO, Theodor W. A Indústria Cultural. In: COHN, Gabriel (org.). Comunicação e
Indústria Cultural. São Paulo: T.A. Queiroz, 1989.
BENJAMIN, Walter. A Obra de Arte na Época de Sua Reprodutibilidade Técnica. In:
COSTA LIMA, Luiz (org.). Teoria da Cultura de Massa. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1978.
CAPARELLI, Sérgio. Comunicação de massa sem massa. São Paulo: Summus, 1986
CHAPARRO, Manuel Carlos. Pragmática do jornalismo:buscas práticas para uma
teoria da ação jornalística. 2.ed. São Paulo: Summus, 1994
COSTA, Cristina. Ficção, comunicação e mídias. São Paulo. Editora Senac, 2002
DIZARD JR., Wilson. A nova mídia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000
ELIAS, Norbert. Sobre o tempo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
FERREIRA, Jerusa Pires. Armadilhas da memória e outros ensaios. Cotia, SP: Ateliê
Editorial, 2003
__________. In TOMÁS, Lia. Org. De sons e signos: música, mídia e
contemporaneidade. São Paulo: EDUC, 1998
FIORIN, José Luiz. Elementos de análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2005
GOSCIOLA, Vicente. Roteiro para as novas mídias – do cinema às mídias interativas.
2. ed. São Paulo: Senac, 2008
GREIMAS A.J. e COURTÉS J. Dicionário de Semiótica. São Paulo: Ed. Contexto,
2008
GUREVITCH, A. Y. O tempo como problema de história cultural. in RICOUER,
PAUL & A.Y.GOUREVITCH & C. LARRE & R. PANIKKAR, As culturas e o
tempo: estudos reunidos pela Unesco. São Paulo: Vozes/Edusp, 1975
JOSÉ, Carmem Lúcia. Trânsito entre oralidades: do corpo-mídia ao corpo inserido na
mídia. In MACHADO Irene (org.). Semiótica da Cultura e Semiosfera. São Paulo:
Annablume/Fapesp, 2007.
LÉVY, Pierre. O que é o virtual. São Paulo. Editora 34, 1996
LAGE, Nilson. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. Rio
de Janeiro: Record, 2001.
LOTMAN, Iuri M. La semiosfera: semiótica de la cultura y del texto. Vol . I. Trad.
91
Desiderio Navarro. Madrid: Ediciones Cátedra, 1996
LYOTARD, Jean-François. O inumano – considerações sobre o tempo. 2.ed. trad. Ana
Cristina Seabra e Elisabete Alexandre. Lisboa: Editorial Estampa: 1997
MACHADO, Arlindo. A televisão levada a sério. 3. ed. São Paulo: Editora Senac,
2003
MARTINO, Luís Mauro Sá. Teoria da Comunicação: idéias, conceitos e métodos. Rio
de Janeiro: Vozes, 2009
MATTELART, Armand e Michele. História das Teorias da Comunicação. São Paulo:
Edições Loyola, 2006
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. Trad.
Décio Pignatari. São Paulo: Cultrix, 1964
MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX: o espírito do tempo – I – neurose.
Rio de Janeiro: Forense-Universitária,1987
ORTIZ, Renato. A moderna tradição brasileira: cultura brasileira e indústria cultural.
São Paulo: Brasiliense, 2006
PERNIOLA, Mario. Contra a comunicação. Rio Grande do Sul: UNISINOS, 2006
PLAZA, Julio. Tradução intersemiótica. São Paulo: Perspectiva, 1987
ROCHA, Amara. Na ondas da modernização: o rádio e a TV no Brasil de 1950 a 1970.
Rio de Janeiro: Aeroplano: FAPERJ, 2007
SANTAELLA, Lúcia. A teoria geral dos signos. São Paulo: Ática, 1995
_______________. Cultura das Mídias. 3. ed. São Paulo: Experimento, 2003
_______________. Matrizes da Linguagem e Pensamento: sonora, visual, verbal. 3.ed.
São Paulo: Iluminuras: FAPESP, 2005
_______________ Linguagens líquidas na era da mobilidade. São Paulo: Paulus, 2007
_______________. O que é semiótica. 27. ed. São Paulo: Brasiliense, 2008
_______________ & LEMOS, Renata. Redes Sociais Digitais, a cognição conectiva
do Twitter. São Paulo: Paulus, 2010
SANTOS, Jair Ferreira dos. O que é pós-modernismo. São Paulo: Brasiliense, 2005
SCHAFER, Murray. O ouvido pensante. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1991
SFEZ, Lucien. A comunicação. São Paulo: Martins, 2007
SILVA, Juremir Machado da. O que pesquisar quer dizer: como fazer textos
acadêmicos sem medo da ABNT e da CAPES. Porto Alegre: Sulina, 2010
SCHWARTZ Tony. Mídia: o segundo Deus. São Paulo: Summus, 1985
WOLF, Mauro. Teorias das comunicações de massa. São Paulo: Martins Fontes, 2008
92
ZUMTHOR, Paul. A letra e a voz. Trad. Amalio Pinheiro (Parte I) e Jerusa Pires
Ferreira (Parte II). São Paulo: Companhia das Letras, 1993
________________. Performance, recepção e leitura. 2.ed. Trad. Jerusa Pires Ferreira
e Suely Fenerich. São Paulo: Cosac Naify, 2007
________________. Introdução à poesia oral. Trad. Jerusa Pires Ferreira, Maria Lúcia
Diniz Pochat e Maria Inês de Almeida. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010
Do Rádio
ARNHEIM, Rudolf. Estética radiofônica. Tradução castelhana de Manuel Figueras
Blanch. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 1980
BALSEBRE, Armand. El Linguaje radiofônica. 4.ed. Madrid: Ediciones Cátedra, 2004
BARBEIRO, Heródoto e LIMA, Paulo Rodolfo de. Manual do Radiojornalismo:
produção, ética e internet. Rio de janeiro: Campus, 2001
BARBOSA Filho, André. Gêneros radiofônicos: Os formatos e os programas em
áudio. São Paulo: Paulinas, 2003
CORDEIRO, P.. Rádio e Internet: novas perspectivas para um velho meio. 2004.
Disponível em www.bocc.ubi.pt/pag/cordeiro-paula-radio-internet-novas-
perspectivas-velho-meio.pdf Acesso em: 15 mar. 2010
CUNHA, M. Não é mais possível pensar o rádio como antes. 2006. Disponível
em
www.cem.itesm.mx/dacs/publicaciones/logos/anteriores/n48/bienal/mesa3.pdf
Acesso em: 15 mar. 2010
DEL BIANCO, Nélia R. e MOREIRA, Sonia Virginia, org. Rádio no Brasil, Tendências
Perspectivas. Coleção GTs da Intercom nº 8. Brasília: Eduerj e UnB, 1999.
FERRARETTO, Luiz Artur. Rádio: o veículo, a história e a técnica. Porto Alegre:
Sagra Luzzatto, 2001
GOLDFEDER, Mirian. Por trás das ondas da rádio nacional. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1980
JOSÉ, Carmen Lúcia. Poéticas do Ouvir: 1a versão. Verso & Reverso. Revista de
Ciências da Comunicação/ 80 Anos de Rádio no Brasil. RS: Ed. UNISINOS,
AnoXVI, n.35, 2002
_________________. Vozes e Intérpretes da Radiofonia. Seminário Musi-Mídia, SP,
Santos: 2005.
__________________. A programação musical na Radioweb. 6º. Encontro de Música e
93
Mídia, do Centro de Estudos em Música e Mídia, SP, São Paulo: 2010
___________________ e SERGL, Marcos Júlio. Paisagem sonora. Intercom, 2006.
Disponível em www.galaxy.intercom.org.br Acesso em 21 agos 2010
MCLEISH, Robert. Produção de Rádio: um guia abrangente de produção radiofônica.
São Paulo: Summus, 2001.
MEDEIROS, Marcello S. D.. Transmissão sonora digital: Modelos radiofônicos e não
radiofônicos na comunicação contemporânea. XXX Congresso Brasileiro de
Ciências da Comunicação. Santos: Intercom, 2007. Disponível em:
www.intercom.org.br/papers/nacionais/2007/resumos/R0773-1.pdf Acesso em 18
set 2008
MEDEIROS, Marcello S.D. Podcasting: um antípoda radiofônico. XXIX Congresso
Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2006. Brasília: Intercom, 2006. Disponível
em www.intercom.org.br/papers/nacionais/2006/resumos/R0776-1.pdf Acesso
em 20 out 2008
MEDITSCH, Eduardo. O ensino do radiojornalismo em tempos de internet. In:
Moreira, Sonia Virginia.; Del Bianco, Nelia. (Org.). Desafios do Rádio no Século
XXI. 1 ed. Rio de Janeiro/São Paulo: UERJ/Intercom, 2001. Disponível em
www.intercom.org.br/papers/nacionais/2001/papers/NP6MEDITSCH.pdf Acesso
em 23 out. 2008
NEVES, Paulo. Mixagem: o ouvido musical do Brasil. São Paulo: Max Limonad, 1985.
NUNES, Mônica R.F. O Mito no Rádio. A voz e os signos de renovação periódica. São
Paulo: Annablume, 1993.
ORTRIWANO, Gisela Swetlana. A informação no rádio. São Paulo: Summus, 1989
PRADO, Emilio. Estrutura da Informação Radiofônica. São Paulo: Summus, 1989.
SILVA, Júlia Lúcia de Oliveira Albano. Rádio: oralidade mediatizada: o spot e os
elementos da linguagem radiofônica. São Paulo: Annablume, 1999.
SOUZA, Ligia Trigo de. Rádio & Internet: o desafio do áudio na rede. São Paulo.
Dissertação de mestrado. Escola de Comunicações e Artes da USP. São Paulo: USP
2003
SPERBER, George Beranrd (org.). Introdução à peça radiofônica. São Paulo, EPU,
1980.
TAVARES, Reynaldo C. Histórias que o rádio não contou. São Paulo: Harbra, 1999
URIBE, E. V. O rádio digital e o radio em internet: além das transformações
tecnológicas. 2006. Disponível em
94
www.unirevista.unisinos.br/_pdf/UNIrev_Villegas.PDF Acesso em 12 mar. 2008
95
Anexos
Anexo A – Programação da Radioweb São Judas
Ponto Literário – Programa que veicula as produções em áudio realizadas pelos alunos
de 4º ano de Radialismo, na disciplina Adaptação Literária e Didática que tem como
foco principal a tradução e a releitura de textos literários, portanto escritos, quando
deslocados para o áudio, predominando a natureza e os traços da oralidade.
Doc.com – Programa que veicula as produções em áudio, no gênero documentário,
realizadas pelos alunos de 4º ano de Radialismo, na disciplina Projeto Experimental em
Rádio, conforme conteúdo do 1º semestre da disciplina. A peça em áudio é destinada à
Rádio Brasil AM, conforme edital público, ao Programa do Estudante.
Língua Portuguesa - Esclarecimentos sobre o uso correto da língua, quando falada no
dia a dia nos mais diferentes contextos.
Navitrola – Programa que resgata a história de compositores do século passado,
focando em canções específicas, veiculando-as com interpretação e arranjo feitos por
artistas contemporâneos.
Na Íntegra - Programa apresenta lançamentos musicais, com informações sobre o
artista, sua obra e o novo álbum.
Lado B – Entrevistas com artistas, programadores, críticos e produtores musicais em
que analisam e indicam músicas que nunca ou pouco tocaram nas mídias comerciais.
Dicionário das Ruas – Jornalístico, traz a história e origem de nomes de ruas e das
personalidades homônimas.
Palavra de especialista – professores e especialistas explicam termos e expressões
temáticas utilizados no dia-a-dia.
96
Em Pauta - Programa jornalístico que traz reportagens sobre temas sociais de interesse
dos alunos e divulga atividades e eventos que compõe o calendário da universidade.
Programação musical - Constituída do que é possível chamar de paradigmas musicais,
isto é, são conjuntos de 20 músicas/canções que se aproximam por traços de
equivalência, ou seja, sempre existe um traço que aproxima as diferentes canções,
permitindo ao ouvinte-navegador a escolha dos paradigmas de preferência. Além disso,
predominantemente, as canções que já foram grandes sucessos de audiência radiofônica
reaparecem na programação da Radioweb São Judas em novas versões e interpretadas
por novos intérpretes, abrindo espaço para nomes e composições que ainda não foram
eleitos pelas emissoras tradicionais. A orientação musical da Radioweb São Judas
suspendeu a exclusividade da estimulação e da seleção musical totalmente dirigida pela
repetição de sucessos.
Especial - Constituído pelo que o rádio analógico convencionou chamar de tributos e
de sazonais. Ambas são peças radiofônicas que ainda mantém as funções de marcar e
recordar datas, não contando dia por dia do calendário na medida em que, na web, o
tempo não é cronológico, mas o é da duração. O foco principal dos sazonais é a
remontagem do ambiente comemorativo; dos tributos é reflexão sobre a importância do
nome para a área de conhecimento ou artística; além disso, rememorar nomes culturais
que ou foram totalmente esquecidos ou estão sendo relançados para atender a data
comemorativa.
Balaio – hospeda programas que tiveram suas produções limitadas a determinado
período que não são mais atualizados: Trilheiras, que destaca trilhas sonoras do
universo da televisão e do cinema, acompanhadas de comentários e informações sobre
as peças musicais, Duetos, que promove encontros vocais de artistas unidos na mesma
canção; e Diálogos Improváveis, áudio/ficção que aproxima versos que pertencem a
canções distintas, criando diálogos e personagens.