Quimeras

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Uma eletrizante história de ação em um futuro distante onde duas raças travam uma batalha inclemente pelo ultimo reduto da humanidade no sistema solar, cujo destino é entregue na mão de dois contrabandistas que darão inicio a uma revolução nunca antes vista.

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  • Quimeras Por: Stefan Plnio da Costa

  • Prlogo

    Segundo a mitologia grega Aegis, tambm chamado de gide, era o

    escudo forjado pelo rei-deus Zeus, era capaz de repelir qualquer ataque

    direcionado a ele vindo de qualquer direo, no entanto era intil se

    usado para lutar diretamente.

    Aparentemente inerte na rbita do terceiro planeta do sistema solar

    apadrinhado por um sol amarelado de tamanho mdio, cuja cor azul se

    destacava estava a maior obra de engenharia e arquitetura da histria

    humana. Milhes de toneladas de metal branco como marfim formavam

    um conjunto de anis, sendo que o maior media duzentos e cinqenta

    quilmetros de dimetro por vinte e trs de largura e o menor cento e

    vinte e cinco quilmetros, interligados por quatro hastes que

    sincronizavam o giro constante de quarenta voltas por hora em sentido

    anti-horrio de ambos os anis.

    Do segundo anel mais quatro hastes de conectavam a uma estrutura

    esfrica que tinha menos da metade do raio do anel menor. Tal

    disposio havia sido pensada com um olhar puramente tcnico e

    cientifico, mas o formato irremediavelmente lembrava um escudo

    branco e brilhante no a toa ela foi conseqentemente batizada de Aegis

    por algum tcnico mais extrovertido.

    No entanto, ao invs de se tratar de uma ferramenta de guerra, a estao

    atuava como um refgio o que imediatamente a fez ser conhecida como

    A Arca uma fez que ela era um refugio... O ultimo refugio da

    humanidade.

    O planeta milhares de quilmetros abaixo foi outrora rico em vida,

    prspero em recursos e em populao agora se encontrava morto e

    tomado pela radiao, todo humano e animal que havia ali deixou de

    existir.

  • A Colnia: Zona de Quarentena

    A tela de cristal transparente brilhou mais intensamente quando a

    mensagem comeou a ser exibida. Um homem aparentemente alto com

    cabelos finamente curtos e aparados que pareciam casar perfeitamente

    com o cavanhaque curto que usava, seu uniforme lembrava um macaco,

    mas conservava o aspecto oficial com uma carga de imponncia e

    autoridade, os olhos castanhos vazios s afirmavam o que todos sabiam,

    aquele era comandante da Arca.

    Ao fundo tremeluzia a imagem digitalmente tratada exibindo a flmula

    smbolo do governo Colono, um foguete cruzando uma lua, ambos

    escarlates sob um fundo amarelo. Houve um instante de silncio e ento

    ele comeou a discursar.

    - Meus caros cidados! Hoje venho lhes parabenizar, pois nesse dia

    completamos mais um ano sob a proteo infinita de nossa amada Arca

    Aegis, H exatos duzentos anos nossos patriarcas, homens sos que

    sonharam em construir um lugar livre da ganncia e da corrupo, um

    paraso intelectual em um mar de ignorncia e poder, chegaram a este

    santurio... Este paraso que chamamos de lar! A voz do comandante

    apesar de carregar um grande formalismo tambm portava uma frrea

    convico em suas prprias palavras.

    - Porm... Prosseguiu Ainda hoje h aqueles que se agarram

    obsessivamente a insanidade de nosso passado, eles se escondem entre

    ns e como todos sabem vm nos atacando periodicamente. Um dio por

    nossa paz que os levou a corromper seu prprio DNA, por essa razo

    todos que so suspeitos ou que foram vitimas genticas das maquinaes

    destes... Terroristas esto devidamente isolados em quarentena

    temporariamente! O comandante tomou um novo flego

    - De que serve o passado seno para nos guiar rumo a um futuro melhor?

    Os impuros homens que habitaram a Terra a destruram com suas

    bombas nucleares e envenenaram a gua e o solo com a radiao, mas

  • ns somos Colonos, somos puros e agora cabe a ns defender nosso modo

    de vida, nossas famlias... Nossa Superioridade!

    O militar desaparece da tela e resta apenas flmula digital ondulante,

    em seguida surge uma mensagem escrita que apesar de no ser narrada

    soa como se o comandante as sussurrasse. eja sua famlia,

    aliste-se no exrcito pacificador Colono

    As instrues do alistamento vieram em seguida e depois a tela se apagou

    para instantes depois retornarem ao que originalmente transmitiam.

    Uma delas em particular, na qual Edan assistiu o pronunciamento o

    informe dirio voltou a ser exibido relatando um ataque atribudo ao

    grupo rebelde conhecido como vaga-lumes, o informe dizia que uma

    bomba havia sido detonada em um trem e que as vitimas fatais j

    passavam de duzentas pessoas.

    uma palhaada atrs da outra!-Pensou consigo mesmo enquanto

    retomava o seu caminho. As ruas da colnia haviam sido originalmente

    projetadas para serem amplas e largas possibilitando um fluxo maior de

    indivduos, um padro que se mantinha at aquele dia... Com exceo do

    setor de Quarentena que mesmo conservando os grandes edifcios

    parecia sufocar-se com a falta de espao, as ruas largas foram quase todas

    tomadas por barracos e cortios improvisados, transformando as avenidas

    em ruelas estreitas e apinhadas de pessoas em um vai e vem constante.

    Um olhar para o horizonte revelava a curva acentuada da Arca assim

    como o teto de metal, um conjunto de poderosas lmpadas forneciam

    uma simulao de luz solar, alimentadas diretamente por painis solares

    na parte externa da estao, porm acima de tudo a prpria curvatura

    revelava a Colnia alm da zona de Quarentena, parecia um lugar limpo

    e organizado com grandes manchas verdes que no podiam ser nada

    alm grandes parques e jardins que garantiam que a maior parte do ara se

    renovasse de modo natural, algo que h muito desapareceu daquele

    lugar.

  • Em razo do choque evidente de realidades Edan, assim como a maioria

    mantinha os olhos no cho ou nos ombros de quem quer que estivesse a

    frente, movia-se com agilidade e de modo quase dissimulado com os

    olhos atentos a sua volta, no preocupava-se com os estranhos ao seu

    redor (apesar de no descuidar com eles tambm), mas sim com algum

    andride ou drone que passasse por ele.

    No demorou muito para que visse o primeiro, mas esse no continha as

    cores cinzentas e uniformes das foras de segurana, na verdade no

    continha cor nenhuma, era um modelo civil, provavelmente feito com

    peas contrabandeadas. Tinha uma aparncia nenhum pouco simptica,

    a comear pela cabea que no era muito diferente de uma caixa preta

    retangular pouco menor que a de um humano, uma cmera e dois

    sensores o orientavam, o resto do corpo como um todo lembrava o de

    uma marionete antiga de madeira, porm apoiada sob um tipo de

    exoesqueleto permitindo-os se mover livremente, a forma da carcaa

    bem como a aparncia de ps e mos variam segundo a funo

    desempenhada.

    Mais dois andrides passaram por ele, porm todos civis, logo em seguida

    reconheceu um drone patrulha passando sob um telhado cinco metros

    acima dele, esgueirou por uma sombra at que passasse. Drones so

    praticamente idnticos aos andrides, a cabea tem o mesmo formato e

    se liga ao tronco do mesmo modo, mas as semelhanas acabam ai. O

    tronco por sua vez mais fino e curto feito de uma liga metlica menos

    densa, da juno dos ombros duas hlices de meio metro cada, na altura

    da cintura estava posicionado seu armamento, sua pintura cinzenta com

    o emblema da arca gravado discretamente em seu peito o identificavam

    como uma mquina das foras de segurana.

    Para indivduos como Edan esse equipamento era especialmente

    incomodo uma vez que seus sensores so mais sensveis. Esperou at ter

    certeza que mais nenhum apareceria e retomou o seu caminhar gil por

    mais cinco ruas estreitas, observou distraidamente casais, pais e filhos,

  • crianas correndo e comerciantes tentando vender algo sucateado ou

    consertar quase todo o tipo de sucata, um ou dois postos onde se podia

    trocar seus cartes de comida pela comida em si.

    Tudo naquele lugar era sujo e velho, sem o menor trao de

    individualidade com grande parte da populao, apenas alguns poucos

    - vestiam os uniformes de pea nica distribudos

    anualmente pelo Anel Interno, o resto adquiria roupas manufaturadas

    em bazares e lojas pequenas, um esforo desesperado em busca de

    identidade.

    O jovem adentrou uma avenida mais larga atento a um endereo,

    encontrou-

    improvisada com folhas de metal e chapas armadas de forma retangular e

    fixadas sabe-se l Deus como. Na entrada lia-se em uma placa de ao:

    Oficina do Rgis.

    Negcios Ilegais

    mais do que comprovado que ao se criar um setor marginalizado em

    qualquer tipo de ncleo populacional, a limitao de espao e recursos

    leva a uma crescente taxa de criminalidade, motivada principalmente

    , ainda que aja

    um combate do mesmo por parte das autoridades sempre haver

    inmeras formas de burlar os sistemas de controle e preveno

    elaborados, na Zona de Quarentena isso no era diferente.

    Edan pertencia a essa porcentagem da populao o como todos que

    atuavam no mesmo ramo de atividades ele foi at a Oficina do Rgis,

    tratar de negcios. A loja em si era pouco mais do que um corredor

    comprido com uma variada exposio de peas do mais diversos

    mecanismos nas paredes, tanto a venda quanto aguardando o concerto,

    acima de qualquer suspeita, um senhor de idade que convenientemente

  • era o prprio Rgis limpava distraidamente o balco com um trapo velho

    enquanto seu andride assistente empilhava caixa no fundo da loja.

    Edan se aproximou batendo uma camada fina de p do sobretudo escuro

    e ajeitando a camiseta de cor neutra, o velho ergueu o olhar e disse quase

    sem mexer os lbios.

    - O que tem pra mim dessa vez rapaz?

    - Infelizmente nada, mas o que eu tenho talvez interesse alguns

    companheiros no poro! Edan respondeu com um sorriso irreverente.

    - Voc est ficando muito indiscreto garoto, isso vai acabar te matando!

    - V se no me amola velhote! O tom agora era de brincadeira.

    - Pois bem... S.A.M venha aqui!

    - Pois no?- O Andride reportou-se prontamente

    - Vigie a loja sim vou tratar de negcios em particular!

    O velho Rgis sorriu e acionou um interruptor oculto no balco que

    abriu no cho pouco a frente de Edan uma passagem, similar a um

    bueiro, dando acesso aos tneis de manuteno interna que h muito no

    eram utilizados. Para o governo eles haviam sido selados e de fato

    muitos, principalmente os que davam acesso a outras partes da colnia

    permaneciam assim, no entanto vrios bolses como aquele

    permaneciam intactos.

    exatos dez por dez metros quadrados, que lembrava um cubo, ocupada

    por quatro mesas onde dez pessoas por vez negociavam ou trocavam um

    dos produtos mais valiosos da Zona de Quarentena: A informao.

    Mais do qualquer tipo de droga ou bebida a Informao, era o produto

    mais restringido desde o inicio da atual gesto da colnia, era do

    conhecimento comum que o governo filtrava todo o tipo de dados que

  • circulavam nos meios da comunicao, uma palavra mal interpretada em

    um simples e-mail podia ser o suficiente para ser mandado para a

    Quarentena, isso fez surgir uma atividade ilegal completamente indita.

    O trafico de informao funcionava basicamente com o transporte de

    mensagens simples, muitas sem a menor relevncia, mas que exigiam,

    por parte se seus respectivos remetentes, privacidade, porm acima de

    tudo esse era o principal canal de comunicao de agiotas ou contatos

    das mais variveis atividades criminosas

    apenas ser um mensageiro, mas tambm ser neutro e protegido.

    Em uma mesa Edan viu um grupo de homens em uma discusso

    acalorada a respeito da distribuio de alguns exemplares do Alcoro, da

    Bblia e do Talmud, em outra mesa v

    distribuidor, no viu o que se passava nas outras mesas e francamente

    no se importava muito, sua mente e sua ateno estavam voltadas para

    uma mesa no fundo sala de metal onde uma figura que s pode ser

    descrita como no mnimo extica encarava o resto da sala com um ar

    quase divertido.

    Spidra era uma mulher linda, rosto redondo de traos sutis, lbios rubros

    como sangue olhos de um azul profundo cabelos loiros cortados at a

    altura do queixo, um corpo magro e busto mdio, porm na altura da

    cintura seus quadris se tornavam mais largos, anormalmente mais largos

    e a partir dele surgiam parcialmente cobertas por sua saia, quatro pernas

    articuladas tal como as de um aracndeo, ainda que conservassem a cor

    de sua pele e segundo a prpria Spidra a mesma maciez do resto de sua

    pele.

    - Ora quanto tempo Edan, como vo s coisas?

    - Agitadas como sempre, mas e voc? Perdeu peso?

    A mulher Quimera sorriu e fez um gesto de desdm antes de responder.

  • - - Ela suspirou e prosseguiu Pois bem ambos

    sabemos que no est aqui apenas por cortesia, diga o que tem pra mim!

    - direto ao ponto, tenho isso! Tomar que lhe interesse!

    Edan tirou uma pequena lmina de cristal do bolso, retangular medindo

    sete por cinco centmetros, pressionou o polegar direito contra ela at

    que emitisse um tnue brilho azul, posteriormente entregou-o a

    negociante.

    - Esta uma comunicao do centro de controle de alimentos, esto

    querendo reduzir o valor dos cartes de comida de rao no prximo

    ms, imaginei ento que alguns ativistas ou ladres capazes pagariam

    muitos cartes de comida por uma informao dessas!

    - E voc quer uma fatia do bolo ao invs dele inteiro?

    - No sou ganancioso! Edan pensou um pouco antes de continuar - E se

    toda essa fortuna parasse de circular eu correria risco de morte, afinal as

    paredes tem ouvidos no?

    - E o que garante que eu no te roube agora e fique com toda a grana s

    pra mim?

    - Porque eu no disse de quanto ser a reduo e porque o arquivo est

    decodificado e qualquer tentativa de quebr-lo vai apagar-lo

    imediatamente!

    Spidra voltou a sorrir, fazia negcios com Edan h anos e a parceria

    sempre provou-se muito lucrativa, porm jogos como aqueles eram teis

    quando se pretendia confirmar a veracidade da informao, perguntas

    inquisitivas ou acusaes falsas podiam delatar mentiras e meias

    verdades por meio das hesitaes e gaguejos em suas reaes.

    - Cheio de recursos... Como sempre!

    - Obrigado, agora quanto ao valor...

  • - Claro! Como de costume vai ter metade do pagamento adiantado e a

    outra depois que eu vender, por digamos... Cinqenta cartes de comida

    de uma rao inteira!

    -Sessenta! Edan rebateu Foi difcil de obter!

    - Tudo bem! A resposta veio acompanhada de uma careta azeda

    Abriu sua bolsa e entregou a ele quinze cartes de comida, do tipo

    poro completa com evidente relutncia em se desfazer deles.

    - sempre bom fazer negcios com voc Spidra!

    O traficante ajeitou o casaco, girou os calcanhares e caminhou at a sada

    junto de outros trs traficantes que como ele j haviam concludo seus

    assuntos ali. Enquanto a porta anexa a sala (que muitas dcadas atrs

    manuteno como aquelas, agora uma sada discreta para indivduos que

    no desejavam ter seus movimentos rastreados ou para aqueles que

    tinham que se esconder como Spidra) se abria lentamente entrada que

    dava acesso loja de Rgis explodiu com uma onda de choque e um

    estalo seco de metal estilhaado.

    Dois drones entraram com os seus arpes em ponto de disparo na altura

    de se sua cintura mecnica. seguidos por dois andrides policiais e mais

    dois soldados com suas fardas cinzentas vestindo um exoesqueleto leve

    sobre o uniforme, a estampa com a flmula da Arca se destacava em seus

    ombros, os rostos cobertos por capacetes de lentes espelhadas do topo da

    testa at o queixo. No portavam armas de fogo, mas adagas e bestas,

    algumas movidas presso que disparavam setas afiadssimas.

    Era sabido que devido aos recursos mais do que limitados da Arca, o uso

    de armas de fogo tornou-se invivel, de modo que as armas necessitavam

    ser mais durveis de modo que o combate foi reduzido s artes marciais,

    adagas, machados, lanas e bestas que em sua maioria funcionavam de

    modo automtico com uma cadncia de tiro entre cinco e sete segundos,

  • desse modo as setas poderiam ser reutilizadas e as lminas amoladas

    novamente.

    A mira lazer dos drones marcou quatro indivduos e com um estalido

    surdo dispararam os projteis nas gargantas dos negociadores, um deles

    caiu com sua pistola em ponto de disparo em mos. Tudo aconteceu em

    questo de milsimos de segundos.

    - Rendam-se agora! Esto presos por adulterar e divulgar falsas

    informaes contra a Colnia! Ordenou um dos soldados.

    Nesse momento um dos traficantes que estava com Edan resolveu

    aproveitar o momento de choque em que todos estavam e tentar apanhar

    os cartes que ele havia negociado com a Quimera, desembainhou sua

    faca, uma pea simples com cabo de prata e lmina de fio duplo de vinte

    centmetros, com a inteno de furar o pulmo dos dois e deix-los para

    os guardas encobrindo sua fuga, em tese um excelente plano, apenas em

    tese.

    A folha de metal riscou o ar em linha reta procurando uma abertura um

    pouco abaixo da axila esquerda do segundo traficante, pois considerou

    Edan como menos perigoso, o mesmo percebeu o movimento e estando

    desprovido de uma adaga ou arpo, por considerar-los um obstculo

    durante suas transaes, ele girou os calcanhares e acertou um chute na

    panturrilha do agressor fazendo-o cair de joelhos e finalizando-o no ato

    com uma joelhada no rosto.

    O segundo traficante surpreso com a curta briga que se iniciou tentou

    tambm tirar proveito da situao com um punhal curto em riste mirou

    na nuca do jovem traficante que reagiu de igual rapidez agarrando o seu

    pulso e detendo a queda da arma sobre si. O mesmo no teve tempo de

    reagir, pois acidentalmente serviu como escudo quando a as flechas das

    armas de presso dos andrides o atingiu nas costas matando-o quase que

    na hora.

  • Edan sentiu o peso do corpo caindo sobre si, chutou-o na altura do peito

    para fora do corredor fechando a porta logo em seguida enquanto os

    virotes dos soldados ricocheteavam na porta. Quando a porta se fechou

    ele estilhaou a fechadura a pontas-p e destruiu a trava eletrnica com

    um cano de metal de pouco espessura que em algum momento se

    quebrou formando uma haste pontiaguda de quinze centmetros.

    Bem nesse momento o traficante nocauteado recobrou a conscincia e

    investiu contra ele aproveitando-se de ainda estar armado, porm ainda

    seu movimento foi muito lento, lento o bastante para que tivesse seu

    golpe bloqueado pela haste de metal pouco antes fincada no teclado

    digital que transcreveu um circulo no ar antes de fincar-se novamente

    no peito do agressor. Seu corpo tombou no piso frio ainda quente

    enquanto Edan corria pelo corredor revestido de canos contando os

    cartes de comida subtrados dos dois traficantes de antes.

    Mais um dia como qualquer outro!- Pensou.

    Revirando o Passado

    Maiko desligou o computador porttil cuja tela de cristal perdeu logo seu

    brilho e retraiu juntamente com teclado at ficar parecido como uma

    caixa fina e retangular. A moa esfregou os olhos cansados dando assim o

    dia como encerrado, consultou o relgio digital na parede que marcava

    sete e meia da noite, ou pelo menos da simulao de noite na Colnia.

    Ele j deve estar chegando!- Sups E quando chegar estarei bem bonita

    para ele! Sua imaginao procurou projetar a situao e fez com que se

    sentisse satisfeita consigo mesma.

    Foi at o banheiro cujas paredes de azulejos impecavelmente brancos

    refletiam suas curvas esculturais e bem definidas, tirou a blusa, a saia

  • curta e por fim a roupa intima, esquentou a gua da banheira larga de

    metal pintado de branco para combinar com o ambiente,

    Mergulhou o seu corpo longo na gua sentindo um arrepio subir por seu

    brao, deixou apenas o pescoo de fora da gua e passou a mo pelos

    cabelos longos e os deixou flutuando soltos. Relaxou a musculatura e

    inclinou-se confortavelmente, fechando os olhos e deixando sua mente

    viajar at algum momento de seu passado, uma memria um tanto

    sombria seno dolorosa, mas que em certo ponto tornava-se agradvel

    para ela.

    Sua mente a projetou para dez anos no passado. Lembrou-se de estar

    escondida dentro de um armrio escuro e poeirento do qual apenas uma

    fina fresta no material sinttico pela qual um facho de luz cortava a

    negritude dava-lhe uma turva viso do que estava acontecendo.

    Viu seu pai, um homem robusto e alto de pele alva, mas de cabelos

    negros, empunhava uma besta automtica na forma de pistola. Com um

    brao levantado ele procurava manter sua me atrs de si, ela usava um

    vestido amarrotado e com pequenas manchas de sujeira, suas mos

    tremiam enquanto segurava uma faca tosca aparentemente improvisada

    na direo da porta do quarto, lgrimas escorriam de seu rosto.

    - Vamos ficar bem querida, vamos ficar bem!- Seu pai repetia

    incontrolavelmente.

    A esposa em resposta balbuciou algo, estava amedrontada, porm ao

    olhar de soslaio para os olhinhos de Maiko atravs da fresta, ela

    encontrou de alguma forma foras para se recompor, ficar de p, enxugar

    as lgrimas e pensar com clareza novamente.

    Um baque forte foi ouvido quando algum tentou forar a porta para o

    quarto, porm sem sucesso, a segunda e terceira investidas seguintes

    foram igualmente infrutferas, mas na quarta as dobradias comearam a

    ceder e na quinta tentativa ela finalmente cedeu. A placa de metal com

  • reforo e o dobro da espessura tradicional se estatelou no cho e apenas

    uma figura entrou ordenando para os demais no corredor.

    - Apenas cubram a retaguarda! Eu cuido disso! O tom de sua voz era o

    mesmo como se relatasse algo trivial.

    O homem, diferentemente dos soldados no portava capacete. Trajava

    um uniforme aparentemente imprprio para combate, tendo inclusive as

    mesmas caractersticas dos usados pelas foras policiais convencionais

    com o acrscimo do exoesqueleto de combate sobre ele, portava apenas

    uma faca de fio nico e base serrilhada com cerca de quarenta

    centmetros, que refletia de maneira bruxelenta a luz provinda do lado

    de fora.

    - Armados, no? Se querem uma morte de guerreiros ento no irei me

    opor, na verdade os admiro por isso! Ele suspirou como se

    reconsiderasse o que ia fazer uma pena que sejamos inimigos ao invs

    de irmos de armas!

    O pai de Maiko sentindo os msculos de enrijecerem ante a adrenalina

    em resposta a declarao do oficial escarrou estrondosamente em suas

    botas e disse de modo desafiador:

    - Pro inferno com sua irmandade ou sua admirao!

    Pressionou o gatilho e a as cordas se relaxaram lanando a seta no ar que

    se encravou na parede onde um instante antes estivera cabea do

    soldado. O homem teve tempo apenas de ver o cintilar da lmina contra

    o seu peito transpassando-o logo em seguida com um som seco seguido

    de um aguado quando foi removida.

    - No!

    A esposa investiu contra o soldado sendo tomada por uma fria assassina

    tpica de sua espcie, a sua calda de serpente cortou o ar enquanto a faca

    presa a ela mirava o pescoo do agressor, o golpe foi desviado, mas o

    ngulo da faca em suas mos era incorrigvel, ou deveria ser, o

  • movimento foi bloqueado por um pea da armadura, a mulher ento

    mudou o jogo de ps e puxou algo parecido com um pigarro do fundo da

    garganta, mas antes que pudesse cuspir o veneno to veloz quanto um

    raio a folha de metal atravessou sua garganta enquanto outra transpassou

    o peito.

    Torrentes de lgrimas brotaram da face juvenil de Maiko enquanto ela se

    jogava para fora do armrio, havia abandonado a razo e s pensava em

    escapar foi em direo a janela, mas sentiu-se puxada novamente pelo

    assassino, agitou os braos em desespero e sentiu suas unhas

    transpassarem algo macio, imediatamente ela foi solta em meio um urro

    de dor, escorregou pela abertura da janela e caiu em um toldo logo

    abaixo caindo em seguida na rua para desaparecer em meio confuso.

    A sua mente ento mais uma vez viajou, ignorando os dois anos

    seguintes de lembranas difusas relacionadas apenas com sobreviver s

    ruas, at o dia em que o conheceu... O dia que mudou sua vida.

    Maiko revirava uma lixeira procurando qualquer coisa que pudesse usar

    para trocar por cartes de comida ou ento teria que roubar algum,

    apesar de detestar roubar ela preferia faz-lo a passar fome. J havia

    desistido da busca quando encontrou quatro cartes plsticos verdes,

    cartes de comida de meia rao que haviam sido acidentalmente

    descartados por algum idiota.

    - Hey aberrao de quem voc roubou isso?- Uma voz aguda acusou.

    Ela se virou e viu trs garotos que no deviam ter mais do que quinze

    anos, pelo jeito com que se portavam eles nitidamente no eram

    Quimeras, mas sim colonos normais, que por estarem ali s podiam ter

    sido banidos.

    - Na...Nada! Respondeu tmida agarrando com mais firmeza os cartes

    - Mentira! Contra disse o segundo Quimeras nojentas como vocs

    no so inteligentes o suficiente para ganhar uma coisa assim!

  • - Exato essa comida para humanos, v comer lixo seu pedao intil de

    merda! Completou o terceiro.

    - Acabem logo com essa palhaada e peguem aqueles cartes! Ordenou

    o que aparentemente era o lder.

    - Mas e quanto a Quimera, Wade?

    - No machuquem muito ela! Seu rosto se converteu em uma careta

    sdica Conheo um bordel aqui perto que pagaria uma boa grana por

    ela!

    - No! Se afastem de mim! Maiko ordenou em vo

    Os delinqentes se armaram com pedaos de metal e avanavam contra

    ela seguros de seu medo e de sua vantagem numrica. A jovem tentou

    fugir, mas foi atingida com uma pancada violenta nas costas, caiu e rolou

    no cho sentindo um doloroso fluxo sangue se acumular na ferida.

    Sentiu-se tonta pela dor forte e em seu interior comeou a ecoar um

    pensamento desesperadamente. Por favor, Deus, no me deixe morrer

    assim, mande algum, qualquer, mas no me deixe morrer assim!-

    Suplicou.

    - Fim da linha aberrao!

    Ao terminar de pronunciar essas palavras a confiana do lder se

    evaporou quando ele viu em um lampejo sua mo ser cortada fora e

    transcrever dois crculos no ar devido violncia com que a carne se

    partiu.

    - Mas que diabos...

    O segundo no concluiu a frase, pois ela se afogar numa lufada de

    sangue expelida pela boca em conseqncia de um soco muito forte na

    altura do umbigo, que embora ele no soubesse (e to pouco se agressor)

    romper seu bao, uma leso interna grave que o mataria em meio a

    fortes dores em poucas horas.

  • O terceiro marginal se desesperou, comeou a gritar e sacudir a barra de

    metal procurando o atacante na escurido parcial do beco, em um

    movimento ele sentiu sua arma mais leve s para ento perceber que ela

    havia sido cortada pela metade.

    - muito fcil ser corajoso quando se est armado e junto da sua

    turminha no vagabundo? Perguntou uma voz sinistra vinda da

    escurido. Vamos ver o que voc pode fazer por conta prpria!

    O ser se manifestou emergindo de uma sombra difusa, ainda sim s era

    possvel ver sua silueta, que imediatamente revelou que ele era bem mais

    baixo que o delinqente o mesmo avanou contra ele brandindo o

    pedao de cano, mas tudo que se ouviu foi o som aguado de um corte

    profundo e um gemido de dor.

    Maiko se encolheu perto de uma lixeira ignorando sua dor e sentindo as

    lgrimas brotarem de seus olhos, os passos da figura misteriosa chegaram

    mais perto at que ele se exps a luz ela pode v-lo nitidamente. Era um

    garoto, no muito mais velho que ela que trajava trapos em uma situao

    pouco melhor do que suas mos sujas de sangue podia-se ver uma

    coleo de cicatrizes que cobriam seus braos, tinha a pele negra cabelo

    muito ralo e olhos dourados que a lembravam ouro derretido.

    - Voc est bem? Meu nome Edan!- Sua voz transmitia simpatia

    - Ma... Maiko!- Ela no sabia o por que, mas sentiu-se a vontade para lhe

    dizer seu nome.

    - Bom... Maiko, voc parece perdida e com fome e admito que eu no

    estou muito melhor, mas tenho alguns cartes aqui comigo e no me

    importaria de te dar alguns!

    Ela relutou e inevitavelmente pensou nos agressores agonizando com

    seus ferimentos provavelmente letais. O tal Edan pareceu perceber isso e

    tratou de tranqiliz-la.

  • - No se preocupe eles no vo mais te machucar! Havia um tom de

    repulsa nas suas palavras. Afinal eu estou aqui pra te proteger no?

    Ele sorriu ao fim da frase.

    Sentimentos Ocultos

    A sua mente voltou ao presente nesse momento. Ela tentou, mas no

    pode deixar de sorrir ao rever est ultima memria.

    Desde aquele dia ela no havia mais se separado dele, Edan havia

    cumprido sua palavra e a protegia sempre, inclusive a ensinou a se

    proteger, apenas depois de inmeros apelos por sua parte. Suas origens

    no eram muito diferentes, apenas divergiam com relao ao tempo que

    haviam passado desamparados nas ruas da Zona de Quarentena, tempo

    que tinha transformado crianas em sobreviventes.

    To logo os talentos marciais de Edan se tornaram to teis quanto

    habilidade com eletrnica de Maiko, tornarem-se traficantes de

    informao foi escolha mais natural e desde ento o acesso privilegiado

    ao submundo, bem como o poder de barganha abriram novas portas para

    a dupla e os permitiu sair das ruas e morar em um dos vrios sales de

    manuteno desativados abaixo das avenidas.

    No a vida ideal, uma vez que as perseguies do comando da arca se

    tornavam mais intensas e o risco de serem mortos se estendeu para alm

    das batidas policias realizadas diariamente na Zona, onde a ordem era

    matar qualquer um que fosse flagrado em algum delito, que tivesse um

    mandado ou se simplesmente fosse um estorvo em seu caminho (eram

    juzes, jris e executores segundo o Comando). Ainda sim ela no se

    arrependia de nada, na verdade morar ali e tomar banho em uma

    banheira de gua quente eram motivo de orgulho.

  • Maiko deixou a gua escorrer para os recicladores e deslizou para fora,

    apanhou um par de toalhas e se enrolou nelas. Quando saiu assustou-se

    ao olhar para o relgio digital, ele devia estar quase chegando.

    Correu para o seu quarto e arrumou-se apressadamente da melhor

    maneira que pode, mal deu ateno para a roupa que escolheu e deslizou

    por uma haste de ao feita especialmente para ela que ia at o segundo

    territrio quase que exclusivo dela, j que evidentemente Edan era um

    pssimo cozinheiro.

    O pensamento dele elogiando sua comida, novamente, a fez sentir-se

    aquecida por dentro, abriu a dispensa e recolheu os ingredientes obtidos

    tanto de forma legal, quanto ilegal assim como os alimentos trocados

    com os cartes de comida que enchiam a dispensa quase todos os dias.

    -Aproximao na porta da frente! Anunciou o sistema de segurana

    Checando a identidade, um individuo, identidade confirmada Edan,

    morador 2!

    Maiko colocou as panelas no fogo e as deixou cozinhando enquanto

    ajeitava a roupa e subia para o andar de cima pela mesma haste de antes,

    chegando no momento em que ele passava pela porta.

    - Porta trancada! Sistema de segurana reativado!

    - Ento... Suspeitaram que a informao era falsa? Perguntou carinhosa

    A jovem Quimera perdeu o flego ao ver o garoto, agora transformado

    em um homem, com os mesmos olhos dourados intensos que pareciam

    arder em chamas eternas, estava muito mais alto, mas no passava de um

    metro e oitenta, era magro, mas no muito e apesar de evidentemente

    cansado, e com ms noticias a contar, sorriu para ela com carinho, como

    se sua simples presena bastasse para alegr-lo.

    - No, mas acho que no vamos mais negociar com a Spidra!

  • - Tenho certeza que vamos dar um jeito, temos sempre como consultar o

    Stannys no?

    - Esperta como sempre Maiko!

    - Nada que voc no teria pensado!

    Talvez fosse apenas um caso de extrema lerdeza por parte de Edan, mas

    ele mal havia percebido que Maiko no fazia a menor questo de

    esconder os seus sentimentos por ele. Havia se apaixonado por Edan h

    anos quando ainda roubavam desatentos nas avenidas e mendigavam em

    becos para comer, a principal razo para isso era o fato simples de ele

    trat-la como um ser humano, como uma garota acima de tudo.

    Um sino agudo tocou no andar de baixo indicando que o jantar j estava

    pronto. Maiko no perdeu tempo e deslizou seu longo corpo reptiliano

    pela haste.

    Da cintura para baixo o corpo de Maiko alongava-se em um majestoso

    corpo de serpente com aproximadamente oito metros de escamas lisas e

    vermelhas no mesmo tom de seus cabelos ruivos, seus olhos eram de

    verde esmeralda com ris horizontais que muitos definiriam como

    sedutoras, sua pele era caucasiana a sua metade humana era marcada por

    curvas bem definidas e finas dando a ela certa graciosidade ao se

    movimentar. Para muitos, inclusive Edan, aquele modo de se

    movimentar era algo hipnotizante.

    - Olha Maiko...

    - Sim?

    - No quero ser indiscreto, mas...

    - O que?

    - Voc est s de blusa!

  • De fato na pressa a jovem lmia (criatura mitolgica meio mulher, meio

    cobra, a nomeao usada para classificar certo tipo de Quimera) na

    pressa vestiu uma blusa grande, geralmente usada como pijama pensando

    distraidamente ser um vestido. Imediatamente corou e sentiu como se

    bochechas ardessem a mil graus.

    Aps poucos segundos de vergonha ambos riram da situao tola. J

    vestida corretamente a jovem Quimera ouv

    vivida por seu amado naquela tarde, orgulhou-se em saber que ningum

    havia desconfiado da falsa veracidade da informao, provocar um caos

    temporrio os ajudaria a negociar melhor suas informaes e estipular

    um preo mais alto por elas.

    A cada detalhe que ele narrava a sua imaginao voava e se via ao seu

    lado, ficar esperando em casa por ele era devers frustrante, mas sabia

    bem que para Quimeras como ela ou Spidra ficar abaixo do solo era a

    nica garantia de uma vaga segurana, porm graas a isso ela tinha

    acesso aos melhores informantes e ao mesmo tempo os dados mais

    confiveis.

    -... As batidas esto cada vez mais freqentes e imprevisveis! Edan

    suspirou insatisfeito. Esto mais violentos e ousados, como se

    quisessem nos exterminar! Droga! Bateu o punho com fora na mesa.

    Maiko segurou sua mo esquerda tentando acalm-lo. Desde que se

    conheceram ambos compartilhavam de um sentimento de revolta muito

    grande com relao ao Comando da Arca, porm novamente divergiam

    no como cada um lidava com tal sentimento, ela em particular o

    ignorava e se mantinha concentrada no seu futuro (que ela via

    intimamente relacionado ao futuro dele.), mas Edan reprimia um rancor

    muito forte por eles que vez por outra mostrava sua fora em situaes

    como aquela.

    - ... Reconheo que a situao no fcil, mas o que podemos fazer?

    Excluram nossos antepassados para esse buraco por sermos diferentes e

  • enquanto o formos ficaremos aqui! Alm de que foi aqui que nascemos e

    crescemos, aqui podemos... Sei l... Construir um futuro! Maiko tentou

    conciliar.

    - E que belo futuro! Respondeu ironicamente depois divagou Um

    dia... Algum vai se erguer contra eles... Um dia vo nos tratar como

    er

    - Acho que no to cedo querido! Todos sabemos o que aconteceu com

    quem tentou fazer a diferena!

    - Eu sei, eu sei, mesmo assim...

    Rastros

    Eles tinham resistido bastante, mas no fim foi intil. O comandante no

    fez questo de esconder a expresso orgulhosa que sentia quando descia

    as escadas para o posto de manuteno que fedia a sangue e corpos

    mortos abafados. Normalmente ele no se dava ao trabalho de checar

    todos os esconderijos de criminosos que sofriam uma batida, mas aquele

    lugar em especial lhe chamou a ateno quando lhe foi reportado.

    - Sargento qual a situao? Perguntou de modo simptico

    - Senhor... Temos cerca de vinte e dois mortos, quinze deles Quimeras,

    sete deles classe 2! O sargento parecia agitado.

    - Limpeza de vermes na toca deles! Excelente trabalho... Mas esse ainda

    um procedimento normal! O que houve de to especial aqui para que me

    chamassem?

    O soldado olhou o superior de cima a baixo observando-o com cuidado,

    alvo de cabelos ruivos escuros, olhos cinzentos , ao menos pelo que se

    supunha visto que seu olho direito estava coberto por um tapa-olho, era

  • alto com quase dois metros e em seu rosto no se via um nico fiapo de

    barba, no seu peito uma plaqueta dourada o identificava como

    Comandante da dcima oitava diviso do Centro de Comando 6 da

    Colnia, Willian Maller, considerado por muitos uma lenda viva.

    -Bom... Senhor...Durante a ao um de nossos andrides gravou uma

    srie de imagens que o senhor deveria ver!

    Maller assentiu de modo paciente e sinalizou para que o sargento

    continuasse sua explicao, o homem ento o conduziu pela sala

    evitando pisar nos corpos crivados de balas, feridas de facadas e fraturas

    de todos os tipos possveis, o comandante por sua vez no teve a mesma

    preocupao, pois via tais indivduos como seres inferiores, criaturas

    repulsivas, mais baixas do que qualquer tipo de escria.

    O andride cumpria sua funo secundria de recolher os corpos e matar

    qualquer um que ainda agonizasse, dando-

    quando os dois se aproximaram ele estacou, bateu uma perfeita

    continncia e indagou:

    - Em que posso ajud-lo senhor?

    O comandante trocou um olhar confuso com o sargento que

    simplesmente assentiu com a cabea. Algo no est me cheirando

    bem!- Desconfiou.

    - Quero que me mostre gravao da abordagem que vocs fizeram s

    dezessete horas e quarenta e cinco minutos!

    -Sim senhor!

    Algo parecido com uma mini lmpada emergiu dos ombros do sinttico,

    feixes de luz se projetaram h sua frente formando uma espcie de domo

    hologrfico de cinqenta centmetros de dimetro revelando a tudo o

    que a viso de cento e oitenta graus capitados pelas cmeras e sensores de

    sua cabea. Toda ao desde que a equipe fora informada por um espio

  • do centro de negociao at o arrombamento e subseqente execuo

    dos suspeitos, nada fora do normal, mas ento algo aconteceu.

    Trs meliantes tentaram escapar por uma sada de emergncia lateral que

    aparentemente havia sido adaptada como uma rota de fuga, porm

    algum quis se aproveitar da oportunidade para, sups o comandante

    roubar os demais, em menos de um segundo uma violenta luta

    protagonizada por lminas de aspecto ameaador teve inicio.

    Porm o menor e mais magro deles sem o menor esforo acabou com

    seus oponentes, um deles inclusive tinha quase o dobro do seu tamanho,

    a imagem ento assumiu o aspecto infravermelho quando a porta se

    fechou e o meliante finalizou de vez um dos inimigos selando o caminho

    atrs de si.

    - Pela Arca! Esse o nosso homem?- O comandante se fez de

    impressionado para esconder sua preocupao.

    - Temo que no senhor!- O homem engoliu seco Acreditamos que seja

    uma Quimera tambm!

    - Mas ele no age como um mero marginal... Ele... Ele foi treinado!

    Maller fez uma pausa Se houverem mais como ele o comando vai ter

    uma crise nas mos! Mantenha a discrio sargento e pressione todos os

    nossos informantes, quero que descubra quem ele !

    - Ed... Edan?- Sussurrou uma voz gaguejante no fundo da sala

    Imediatamente uma mo glida e de aparncia esqueltica se fechou em

    volta da garganta de Spidra fazendo a inacreditvel presso de duzentos e

    oitenta quilos contra sua traquia.

    - Pare!

    A mquina obedeceu, mas no a soltou, tinha o vestido rasgado e fora

    crivada com cerca de sete arpes, trs deles na altura do peito, que

    milagrosamente no atingiram nenhum rgo vital apesar da gravidade

  • dos ferimentos. Maller se aproximou em trs passadas largas com um

    olhar de desprezo e uma careta enojada ao falar com ela.

    - Seno vejamos, nos deixaram rastros, parece que voc conhece o nosso

    se nos disser quem ele !

    Spidra puxou um pigarro da garganta e cuspiu no rosto do comandante,

    sendo esbofeteada logo em seguida. Toda a postura simptica e paciente

    do Comandante Maller evaporou um menos de um milsimo de

    segundo, ele acreditava que tais caractersticas garantiam uma melhor

    resposta de seus subordinados e traziam segurana em um interrogatrio,

    porm havia limite para o que seu orgulho podia suportar.

    - V... Pro... Inferno! Declarou a Quimera

    - No minha cara voc vai! O comandante sussurrou antes de fazer sua

    faca atravessar o pulmo esquerdo e o corao de Spidra.

    - Mande-a para o setor de bio-armas e vamos voltar ao trabalho!

    Ordenou secamente.

    O comandante se viu com um desafio em mos, uma Quimera com tais

    habilidades de combate representava uma presa perfeita para um caador

    experiente e quando se trata de caar ningum era melhor que ele.

    Formigueiro

    -se referir tanto a um mundo

    subterrneo ou um mundo oculto, essa ultima pode variar de uma

    existncia etrea a literalmente todo um mundo que permanece

    escondido de certo grupo de indivduos ou sociedade.

    dessa palavra, na

    prtica um imenso mercado ilegal, com zonas habitacionais nas suas

  • periferias que em sua maioria eram at mesmo mais dignas que as ruas

    trinta andares acima. Mesmo na zona de Quarentena uns poucos

    indivduos com as conexes corretas conheciam aquele lugar, ainda sim

    Diferentemente da colnia na superfcie

    mesma simulao de luz solar, na verdade, no contava com qualquer

    tipo de iluminao geral, as nicas luzes eram aquelas provindas das

    construes, que atravs de uma complexa rede de gambiarras roubam

    energia para si, a distribuio da mesma feita por uma faco mafiosa,

    que se auto-

    Tinha entradas nos quatro pontos cardeais na forma de grandes tneis de

    trs metros de dimetro. Aquele era o epicentro ilegal da zona de

    Quarentena onde se podia literalmente comprar e vender qualquer coisa

    e era exatamente com isso que Edan contava.

    Maiko

    vontade nas caladas menos caticas e vigiadas do que as do mercado

    acima havia algum vestgio de seu traumtico passado nas ruas, seu corpo

    era extico e chamativo, fazendo dela um alvo constante. Seus olhos

    verdes esmeralda vasculhavam tudo ao redor com inquietao, segurava

    o brao esquerdo de Edan com tanta fora que ele sentiu como se fosse

    quebr-lo.

    Apesar disso, ela ainda tentava mostrar um sorriso e manter uma

    aparncia normal, a sua volta caminhavam todo o tipo de pessoas e

    Quimeras. H trs tipos de Quimeras: Classe Um so aquelas que

    aparentam serem humanos normais, com exceo de pequenos detalhes

    como dentes, olhos ou orelhas. Indivduos Classe Dois so aqueles que

    como Maiko ou Spidra tem membros inteiros de seus corpos mudados.

    vez que conseguem ocultar seus traos quimerianos que muitas vezes ao

    serem revelados faz com que sejam confundidos com Classes Dois.

  • Ao seu redor viam-se minotauros, pessoas que geralmente possuam

    cornos bovinos emergindo das testas, que podiam ou no ser

    acompanhadas de patas bovinas nos membros inferiores, Papillions com

    suas caractersticas insectides produziam em suas lojas e farmcias uma

    inominvel variedade de nctares que eram usados para quase tudo,

    desde fabricar remdios e bebidas alcolicas at mesmo drogas

    alucingenas poderosssimas. Passaram por uma loja de armas onde um

    Dracon mal encarado anunciava aos berros os descontos em facas de

    quinze centmetros e a promoo de arpes de mola, os Dracons talvez

    fossem as Quimeras com parentesco mais prximo das Lmias (que por

    razes desconhecidas representada em sua maioria por mulheres)

    sendo meio-humanos, meio-crocodilos.

    Porm a dupla s esteve em meio verdadeira variedade populacional do

    circunstancias normais Edan, e to pouco Maiko, teria evitado cruzar

    aquela parte da micro-cidade subterrnea, mas perder um contato

    influente como Spidra representava um prejuzo enorme para eles, e no

    conheciam ningum melhor do que Stannys para negocia-lhes outro

    distribuidor, pois assim funcionava o submundo da zona de Quarentena,

    tudo dependia dos seus contatos.

    O tal distrito era na verdade uma larga e extensa avenida com dois

    quilmetros em linha reta. T

    pudesse conceber ou comprar por uma quantia justa de cartes de

    comida, a variedade dos estabelecimentos em contraste com a de

    espcies e classes de Quimeras possveis que se encontrava ali, no

    variava muito com alguns destaques para pequenos motis aqui e ali.

    - Hei garoto! Chamou um sujeito alto, um Dracon classe 2 com um

    olhar guloso Quantos cartes de comida para uma hora ou duas com

    essa jia ai com voc?

    Edan apenas o ignorou e seguiu seu caminho sentindo a raiva emanar de

    Maiko como se fosse uma fogueira.

  • -Hey idiota eu te fiz uma pergunta! O Dracon armrio pousou uma de

    suas mos no ombro de Edan e j puxava Maiko para si pelo punho.

    - E ai gracinha c no quer aproveitar o tempo com um homem de

    verdade ao invs dessa vareta ai! Passou a lngua entre os lbios

    Garanto que te fao ver o paraso!

    O soco de Edan foi to sbito que embora no tenha sido muito forte fez

    com que o incomodo lagarto casse sentado no cho chamando a ateno

    ao seu redor.

    - Qual a sua imbecil? No tem medo de morrer! Berrou Ela s

    uma Lmia, so TODAS prostitutas!

    O comentrio foi seguido de outro golpe repentino do traficante, porm

    dessa vez foi um chute, calculadamente mais forte que o soco, na altura

    dos dentes do Dracon insolente. Ele gorgolejou e cuspiu uma massa mista

    de sangue, saliva e

    - Pea desculpa a ela! Ordenou firmemente.

    - V a mer...

    Outro chute agora na altura do abdmen, roubando-lhe o flego e

    jogando-o no cho mais uma vez.

    - Pea desculpa para ela agora! O tom de voz de Edan agora era quase

    homicida.

    - Des... Desculpe! Disse em meio a um careta de dor.

    - timo!

    Enquanto andava na direo de Maiko o pobre coitado forou-se para

    falar ainda de modo desafiador.

    - Nem sempre ele estar por perto para te proteger prostituta!

  • To rapidamente quanto Edan, a calda de Maiko enroscou-se no brao

    direito do insolente, forou a estic-lo e depois o torceu em um ngulo

    doloroso resultando em uma grave fratura exposta juntamente com um

    olhar frio como gelo.

    - No sou prostitua!- Disse secamente.

    Alguns conhecidos do ferido foram ao seu socorro, mas as pessoas ao

    redor em sua maior parte ignoraram o ocorrido, no havia autoridade no

    formigueiro, apenas faces criminosas que controlavam certos setores

    da mini-capital. Assim sendo a dupla seguiu por seu caminho sem serem

    perturbados novamente podendo assim chegar ao seu destino em pouco

    mais de dez minutos depois.

    lado de fora a identificava como Sweet Night. Do lado de fora parecia

    apenas uma caixa preta gigante com luzes rosadas na parede, porm no

    interior toda a iluminao podia ser descrita por uma cor: Roxo.

    Luzes roxas piscavam ou mudavam de tom at quase ser Rosa enquanto a

    pista de dana se amontoava cada vez mais assim como o bar onde uma

    projeo em trs dimenses em um espelho anunciava uma promoo

    nas cervejas de nctar Ambrosio. Porm era em uma sala Vip nos fundos

    que era convenientemente isolado da batida eletrnica que inundava o

    ambiente, que estava o contato.

    bar e comprou uma cerveja, Maiko se arrastou pelas mesas como se

    procurasse algum contornando a pista de dana, viu algumas lmias

    danando, outras em uma mesa conversando, seno flertando com algum

    fregus, o perturbador foi perceber que quase todas elas eram garotas de

    programa ou vigaristas, que a olhavam em grande parte como uma rival.

    Quando uma delas lanou-lhe um olhar no mnimo indiscreto na altura

    de seu busto, ela no pode evitar pensar na noite em que conheceu Edan,

    se ele no estivesse l naquele dia muito provavelmente ela estaria em

  • um lugar como aquele, ou ento em algum buraco sujo, se comportando

    da mesma maneira. Sentiu-se grata e passou a am-lo ainda mais.

    Encontraram-se na porta do setor Vip que era convenientemente

    guardada por uma dupla de seguranas Classe 2, um Papillion com olhos

    que pareciam vitrais de uma igreja, todos os trs pares, de pele morena e

    garras afiadas nas pontas dos dedos dos grandes braos em forma de

    carapaa tais como as patas de Spidra. O outro era um verdadeiro

    Minotauro para ningum botar defeito, com cornos enormes, patas

    bovinas da cintura para baixo, usava uma cala ao menos, e como se para

    intimidar algum tinha um piercing em forma de argola no nariz. Antes

    que se dissesse alguma coisa uma voz na sombra disse;

    - Est tudo bem rapazes! Eles podem passar... Afinal somos amigos, no?

    Velhas Amizades

    - Ol Stannys!- Maiko cumprimentou com um sorriso

    - Seus primos? Edan perguntou com ironia enquanto passava pelos

    seguranas.

    - Funcionrios da casa! Cuja especialidade garantir a privacidade de

    clientes como... Eu!

    Stannys vestia um terno preto fino e sem muitos detalhes, mas que

    inegavelmente transmitia um aspecto comercial, no usava gravata, mas

    em compensao usava uma camisa chique de cor neutra que de alguma

    forma destacava sua pele morena, seus cabelos curtos escuros e seus

    olhos completamente vermelhos.

    - Como vo as coisas Angeline? Cumprimentou Edan

    - Prsperas como sempre, e voc sabe que gosto que me chamem de

    Angie!

  • Maiko lanou um discreto olhar torto para a Quimera Classe 2 a sua

    frente. Tinha traos to finos quanto os de uma boneca, curvas sinuosas e

    pele alva, os cabelos eram tingidos de azul claro cortados at a altura do

    queixo, os olhos de cinza opacos, no lugar dos braos havia duas longas

    asas brancas com mos perfeitamente normais nas dobras das asas de

    semelhante modo a um morcego, porm este detalhe no diminua sua

    beleza nem o charme sedutor que ela se esforava para transmitir.

    - Ento... Previses para um herdeiro?

    A Harpia pareceu no se abalar com a indiscrio e respondeu

    calmamente.

    - Ainda no... Sabe... Eu gostaria de aproveitar mais a vida de casada

    antes de pensar nisso!

    -Agora enquanto aos negcios... Stannys interveio Devo confessar

    na

    - Vai por mim, eu no teria feito se no fosse urgente!

    - Sou todo ouvidos!

    Edan se remexeu no estofado aparentando estar desconfortvel, um

    antigo truque para deixar a outra metade mais confiante de suas

    propostas.

    - Acredito que j saiba da Spidra!

    - Sim claro... Meus psames, ela era uma tima negociadora! Stannys

    fez uma pausa e acendeu um cigarro Esse ramo de trabalho est cada

    vez mais perigoso com essas batidas constantes, quando ramos crianas

    mal se via uma por semana, agora j so trs ou mais por dia!

    - E sobre isso que eu vim conversar! Maiko e eu conversamos e alm

    dos contratos de sempre queramos um negociante mais discreto, algum

    bom em agir por debaixo dos panos!

  • O traficante fez uma careta pensativa, aps mais de uma dcada de

    amizade e parceria, ele sabia bem que Stannys estava considerando sua

    proposta. Ambos j se conheciam antes de morarem na rua depois de se

    tornarem rfos ficaram ainda mais unidos, agindo conjuntamente como

    crebro e msculos eles rapidamente progrediram na escalada criminal

    da Zona de Quarentena, porm a parceria teve fim um pouco antes de

    ele conhecer Maiko.

    - Olha cara eu queria te ajudar, mas a verdade que ningum mais quer

    trabalhar com voc! Essa j a segunda batida da qual voc escapa

    inteiro e isso infelizmente gera dois tipos muito distintos de boatos, em

    um voc muito habilidoso, no outro voc no passa de um traidor

    safado!

    - E...

    - Infelizmente o boato negativo o que tem ganhado mais fora e isso

    afasta padrinhos e negociantes!

    - Mas voc um cara influente, no pode falar com algum dos seus

    scios!

    - Quem sabe alguns tenentes! Interveio Maiko

    Stannys baixou o olhar.

    - Desculpe, mas no posso fazer isso, j falei com eles, mas nenhum quer

    trabalhar com voc, disseram que se eu o fizesse a sociedade estaria

    lamento.

    Edan observou-o de cima abaixo, constatou com pesar que ele estava

    sendo sincero. Em meio a um oceano de mentiras e meias verdades que

    cercavam o trafico de informao, ter um amigo honesto, ou algo

    prximo era reconfortante, no entanto Stannys nunca havia sido um

    sujeito carinhoso, se ele concordou com aquela reunio era por que

    lucraria de alguma forma com ela.

  • - Sabe... Cara, voc sempre pode voltar para as lutas, ou ento sei de

    algumas pessoas que poderiam requisitar seus servios para cobrar

    dividas! Eu sei que no muito se colocarmos tudo na balana, mas...

    - No, ta tudo bem eu dou um jeito!

    Edan se levantou ajeitou o casaco, estava a um passo dos seguranas

    quando...

    - Olha... Stannys, e aquela galera nova?- Lembrou Angie.

    - - Indagou Maiko com certa desconfiana.

    - So um grupo de hackers novos, esto ativos a menos de um ano, mas

    tem lucrado bastante, no me pergunte o que eles fazem pois ningum

    alvez algum

    como Maiko possa ser til, alm de que todo mundo precisa de

    segurana, principalmente aqueles nerds!

    Angeline abriu sua bolsa, tirou um carto de plstico barato e o entregou

    ao traficante, o que quer que estivesse escrito antes havia sido

    completamente apagado, restando apenas um borro com um endereo

    escrito.

    - Ta de brincadeira!- Reclamou Maiko ao ler o endereo Isso quase

    no muro limite da Zona!

    - Este s um ponto de encontro! Esclareceu o negociante S preciso

    mandar um Drone com uma mensagem e pronto!

    Maiko puxou se esticou um pouco e sussurrou no ouvido de seu amado:

    - Confia nesse cara? Parece ser uma cobra!

    - Voc tambm! Olha s ele pode no ser exatamente um modelo de

    cidadania, mas no mentiu sobre isso, deve achar que pode me cobrar

    um favor no futuro se essa jogada der certo!

    - Ele pode?

  • - Ele acha que pode!

    Ambos se viraram para o casal e disseram:

    - Obrigado Stannys... Angie! Marque o encontro, afinal o melhor que

    vou conseguir!

    Massacre

    Um massacre quando uma pessoa ou grupo mata cruelmente um

    grande nmero de pessoas indefesas, ou sem dar chance para que se

    defendam. um ato que no faz distino de sexo ou idade, que a

    histria humana j provou inmeras vezes ser o principio de um

    genocdio.

    Edan acompanhado de Maiko deixava Sweet Night quando o som

    silenciado por uma distante exploso, que em primeira instncia

    produziu um som agudo e ensurdecedor atirando todos no raio da micro-

    cidade ao cho com as mos inutilmente cobrindo os ouvidos. Em

    seguida algo parecido com uma redoma branca de energia se formou,

    expandindo seu dimetro em poucos segundos para uma massa

    ameaadora.

    - Levanta! Pelo amor de Deus... Maiko, levanta! A voz de Edan chegava

    abafada em seus ouvidos, e ela teve a impresso que o mesmo se aplicava

    a ele.

    Pegou-a pelo pulso e ajudou a se levantar, a redoma estava cada vez

    maior, estava desorientada e mal se manteve em p. Sentiu suas costas se

    estatelarem contra uma parede e sua calda se contrair junto ao resto de

    seu corpo, ergueu os olhos e viu o rosto assustado de Edan quase colado

    ao seu, de tal modo que sentia o calor de sua pele atravs de sua testa que

  • encostava-se na sua, ele segurava seus braos com firmeza para mant-la

    ereta, voltou a ouvir plenamente no instante em que a redoma atingiu

    seu pice explodindo em uma poderosa onda de choque que destruiu

    muitos edifcios e casas pelo caminho, deixando apenas quarenta por

    cento do Formigueiro em p.

    Edan caiu de quatro no cho com a carne de suas costas gravemente

    queimadas e fumegando, era impressionante o fato de ele continuar

    consciente. Maiko recuperou os sentidos e olhou horrorizada a carne

    grelhada das costas de seu amado, imediatamente colocou seu brao

    direito sobre seu pescoo, sua mente trabalhava a toda velocidade

    procurando um jeito de escapar.

    - Na... Hora... Certa!- Disse com a voz entrecortada por gemidos de dor.

    - Mas que infernos! Stannys praguejou ao sair de Sweet Night.

    Tinha uma pistola na mo esquerda, umas das poucas na Arca, resqucio

    da Terra de antes, e abraava Angie que parecia estranhamente

    indiferente aos acontecimentos ao seu redor.

    - E...Ele me salvou da exploso... O som me... Desorientou! Maiko

    engolia suas lgrimas.

    - No consegue deixar de bancar o heri, no?

    Rugidos dos motores de dornes e gritos desesperados ecoaram

    assustadoramente prximos

    - Temos que dar o fora daqui! Angie v frente com Maiko eu vou logo

    atrs pra dar cobertura!

    Angeline deu um curto, porm apaixonado beijo em Stannys, limitou-se

    apenas assentir com a cabea e se ergueu trs metros do cho. Maiko por

    sua vez no pode evitar desconfiar do casal, desde o comeo nunca

    tiveram razes para ajud-los, at onde sabia seu relacionamento com

    Edan era puramente comercial. A lmia passou o brao de seu amado

  • envolta de seu pescoo, notando que o mesmo era muito mais pesado do

    que aparentava, A harpia a ajudou mesmo a contragosto de Maiko

    - Aqui princesa!- Disse Stanys com rispidez enquanto iniciavam a

    corrida No sei qual o problema que voc tem comigo ou com minha

    esposa, mas saiba que estamos arriscando nossas peles apenas porque

    Edan faria o mesmo por mim...

    Essa ltima frase deixou Maiko desconcertada, j havia conhecido sua

    naquele buraco, mas Stannys, no agiu nem falou ou agiu

    como um deles, ele agiu... Agiu como um amigo.

    - Desde quando vocs se conhecem?

    - Desde garotos, roubamos cartes de comida por um bom tempo, ai eu

    apostadores, nos distanciamos, mas nunca perdemos contato... Ele falou

    muito bem de voc, alis!

    Maiko sorriu e olhou para o rosto oscilante entre a lucidez e

    inconscincia de Edan, sentiu orgulho de conhec-lo e prometeu a si

    mesmo que o tiraria dali custe o que custasse.

    - Qual a situao ai em cima amor?

    Angeline estava a pouco mais de sete metros do cho, no arriscava um

    vo mais alto por assim se tornar alo fcil para drones ou qualquer um

    que estivesse armado. Desceu at voar em paralelo com eles.

    - uma invaso e tanto! Tem drones de patrulha e andrides por todo

    lado, vi s alguns soldados, mas sempre coordenando o ataque!

    - Quantos, no total?

    - Chutando por baixo? Duzentos ou Quatrocentos!

  • Um clima pesado caiu sobre o quarteto, se moviam muito devagar se

    comparados aos vrios pedestres que passavam enlouquecidos por eles,

    logo as tropas os alcanariam e seria o fim. Stannys explicou sobre uma

    sada de emergncia pouco conhecida e usada, no era muito longe de

    onde estavam e sai e um local reservado na superfcie onde poderiam

    fugir ilesos.

    Passaram por dezenas de pequeno prdios, tendas de metal, barracos de

    todo tipo e at prdios melhor acabados como Sweet Night, a qual teve o

    teto arrancado pela exploso, quase tudo havia sido destrudo, se via

    restos de membros, sangue e morte por todos os lados alm gritos

    sufocados daqueles que ficaram presos sob destroos, sem poder fazer

    nada por eles o quarteto simplesmente seguiu em frente.

    - Por que isso agora? Disse Angeline quebrando o silncio.

    - Estamos perto! Avisou Stannys

    - Como?

    - Por que decidiram realizar um ataque to ousado, justo agora? Quer

    dizer... J tiveram chance de faz-lo, h muito tempo acabaram com os

    movimentos populares e as manifestaes, para que toda essa violncia

    gratuita?

    Maiko ento lembrou-se da conversa na noite anterior, no desabafo de

    seu amado havia uma certa lgica agora ela a enxergava com clareza.

    - Porque eles querem nos exterminar! O realismo de tais palavras soou

    frio e insensvel.

    - Eles que tentem! Bradou Angeline confiante.

    - aqui! Chegamos!

    Um tiro zuniu perto da cabea de Stannys e ricocheteou em uma parede,

    as moas se atiraram no cho levando Edan junto que na queda ganhou

    um pequeno corte acima da sobrancelha esquerda. O negociante

  • disparou trs vezes no atirador encoberto por uma cortina de fumaa,

    resultado de um de vrios focos de incndios dispersos.

    Estavam literalmente em um beco sem sada as suas costas uma parede,

    cercados por duas construes que mantinham-se precariamente em p.

    Os tiros de Stannys foram revidados, Angeline sacou sua prpria pistola

    e fez quatro disparos cegos.

    - Pra sada agora!

    A sada era nada mais que uma portinhola de um metro de dimetro

    lacrada magneticamente, cuja trava requeria uma combinao, razo por

    praticamente nunca ser usada. Angeline digitou a seqncia de dez

    nmeros, suas asas tremiam apesar de seu rosto parecer uma rocha, no

    transparecendo quase nenhuma emoo mediante a situao

    desesperadora.

    A porta se abriu com um rangido e liberando no ar um odor

    caracterstico de locais com pouco, ou nenhuma, ventilao Maiko

    verificou rapidamente a passagem, havia um corredor escuro e no final

    algo parecido com escadas. Os tiros recomearam e dessa fez as duas

    tiveram que se espremer contra a parede a fim de evitar a rajada de balas

    escaldantes enquanto Stannys se protegia atrs de uma parede cada pela

    metade.

    - Vo logo, eu dou cobertura! Berrou Stannys impaciente

    - No sem voc amor! Pela primeira vez Angeline deixou transparecer

    alguma emoo e o medo que exalou de sua voz foi to profundo que

    Maiko sentiu como se tivesse sido atingida no peito.

    - Vai ficar tudo bem Angie, mas preciso que v com eles, Edan est mal e

    no acho que ela v conseguir ir muito longe com ele naquelas

    condies, precisam de sua ajuda!

    A Harpia olhou de soslaio para a dupla que j se esgueirava passagem

    adentro.

  • - Acho bom voc voltar vivo!

    - Relaxa boneca! Agora vai enquanto eu os distraio!

    Stannys saltou como uma mola de seu abrigo dando uma cambalhota e

    rolou, deitado deu mais dois tiros que atingiram a cabea de um andride

    e o joelho de um soldado. Angie correu para a passagem se arrependendo

    por no olhar para trs.

    Mais trs homens chegaram adentrando pela passagem em seus

    uniformes cinzentos, a passos pesados de seus exoesqueletos, seus

    capacetes filtravam a imagem a sua frente, que estava difusa dificultando

    a viso de um soldado ferido no joelho cujo capacete fora danificado e do

    andride cujo sensor fora confundido pela fumaa.

    Viram apenas um alvo que sem razo aparente atirou contra a parede as

    suas costas. No houve ordem de rendio ou mesmo aviso prvio eles

    simplesmente invadiram o beco e atiraram, suas ordens eram claras, no

    deveriam fazer prisioneiros apenas mandarem corpos para os

    recicladores.

    Com o painel para a sada destrudo Stannys morreu com um sorriso

    irnico no rosto, no fim no pode cumprir o que prometeu para sua

    esposa, ainda sim morreu feliz.

    - Setor de Ataque 126-5 limpo, todos os vermes Quimeras eliminados!

    Anunciou um dos soldados via rdio Iniciando limpeza do Setor de

    Ataque 126-6, Quimeras resistindo armadas. Unidade 7 a caminho!

    Quando partiram tudo o que se ouviu foram os sons abafados de um

    choro na passagem cuja porta jamais se abriria novamente. Assim se

  • O Bom Soldado

    Maller liderava uma unidade no centro do combate na queda

    ,

    descarregou as ultimas dez flechas do cartucho da besta automtica nas

    costas de uma garota jovem em um vestido lils muito bonito, do qual

    brotavam asas muito parecidas com as de uma borboleta, quando

    verificou o corpo observou satisfeito que tinha em seus braos uma

    criana com pouco mais de dois anos que tambm havia morrido.

    Dois com uma s cajadada! Regozijou-se. Havia meses que

    investigavam a existncia de tal fortaleza inimiga, quando levou as

    imagens da Quimera guerrilheira da ultima batida que coordenou a

    autorizao para o ataque foi enfim dada.

    Teve at mesmo autorizao para usar canhes de som, desorientando

    qualquer tipo de sentinela e usando as bombas de emisso de calor para

    enterrar qualquer armamento ou estoque de munio que tivessem sob

    toneladas de escombros. Como todo bom patriota ele sentia-se orgulhoso

    de participar daquele momento histrico, naturalmente haveria crditos

    para os seus superiores e para os outros comandantes em ao, ainda

    sim...

    - Isso parecia muito vulnervel para uma base terrorista, no? Indagou

    um tenente enquanto Maller recarregava a automtica.

    - H quanto tempo estamos fazendo batidas? Dez anos... Trinta?

    Ironizou Ns os enfraquecemos, cortamos suprimentos e pessoal, mas

    agora... Demos o golpe definitivo.

    - Mas por que teriam aqui mulheres e crianas? Alm de que ali atrs

    havia um bordel, eu acho!

    - Voc quer mesmo tentar entender a cabea desses degenerados, veja s

    o que fizeram com eles mesmos em nome do dio que sentem por ns!

  • O soldado deu de ombros aparentemente satisfeito com a resposta,

    ascendeu um cigarro, mesmo sob o olhar desaprovador do comandante e

    correu para as linhas mais a frente. Produtos como tabaco e substncias

    alucingenas (Tais como LCD e Metanfetamina) eram proibidos na

    Colnia, mas em certos lugares, principalmente na Zona de Quarentena,

    esses produtos eram fabricados e comprados facilmente.

    Maller recalibrou o seu exoesqueleto, para aumentar sua agilidade,

    atravessou uma pilha de escombros que antes havia sido um cortio,

    ouviu gemidos fantasmagricos vindos de baixo, provavelmente de uns

    pobres coitados que haviam sido soterrados quando a estrutura cedeu,

    por um momento pensou ter ouvido o choro de um beb entre placas de

    concreto, ignorou-o. Todos os seres daquela espcie lhe eram

    repugnantes mesmo que ainda usassem fraldas.

    Escorregou pelos restos de uma parede e chegou outra rua ouviu gritos

    de algum pedindo socorro, seguido por berros enraivecidos. No so

    Colonos! Devem ser marginais ou ento terroristas!- Pensou.

    Os sons vinham de um prdio tombado a cinqenta metros de onde

    estava, se no fosse silncio sepulcral entrecortado por rugidos de

    metralhadoras que tomou conta do Formigueiro, nem mesmo o receptor

    de freqncias externas de seu capacete teria sido capaz de identificar

    cautela, podia ser uma armadilha, ou obra de criminosos resolvendo suas

    desavenas, porm em contrapartida havia a alguns meses lido um

    relatrio de um dos espies dentro da Zona que afirmava ter falhado em

    rastrear um grupo de jovens Colonas seqestradas a mando de um bordel

    em um lugar de difcil acesso dentro da Zona.

    Maller no queria perder uma noite de sono com a dvida de ter feito ou

    no a coisa certa. Concluiu que se fosse uma armadilha, seria

    perfeitamente incapaz de matar de seus inimigos. Correu em direo ao

    prdio, que alm de ser feito quase que inteiramente de metal estava em

    um estado deplorvel, com paredes gastas e desbotadas, torto em um

  • ngulo antinatural, s no havia cado, pois se escorava no prdio

    igualmente decrpito ao seu lado.

    -

    alcanou-o contra uma janela ainda intacta em menos de um minuto, o

    vidro se partiu em milhares de pedaos, ouviu os gritos mais uma vez e

    correu escada acima, um, dois... Quatro andares at ouvir vozes

    novamente, abafadas atrs de uma porta do nico apartamento ainda

    intacto daquele andar, todos os outros tiveram as portas, o ento suas

    prprias estruturas destrudas pelas sucessivas ondas de choque e calor.

    Tomou um leve impulso e desferiu um violento chute contra a porta que

    rangeu dobrou-se de modo impressionante, mas no cedeu. Mais vozes

    abafadas vinham do cmodo, podia ouvir apenas parte do que diziam.

    - Mas que... Foi aquilo?

    -... Melhor sermos rpidos!... V com o Ramirez e procure uma sada

    pela janela!

    Agora era uma voz feminina que falava com sons vacilantes de medo e

    entrecortada por choro.

    - Voc o matou, matou o...

    - Faa essa... Calar a boca ou eu fecho... Na bala!

    - O que... Vo fazer com a gente?

    Um som de algo parecido com uma pancada forte pode ser ouvido

    enquanto Maller ajustava o traje para aumentar a fora fsica.

    - Quieta vadiazinha! Voc vai saber... For hora!

    O comandante nesse momento se chocou com a porta batendo com o

    ombro protegido com uma fora monstruosa que no s fez as resistentes

    dobradias cederem como tambm atirou a mesma do outro lado do

  • cmodo acertando um bandido que morreu na hora, porm ainda

    haviam mais cinco no ambiente.

    Maller no deu chance de se levantarem sacou a automtica de suas

    costas e abateu um dos criminosos, fez um rolamento esquivando-se dos

    tiros em resposta dos outros quatro, usavam pistolas e uma semi-

    automtica sucatas do passado, do cho acertou o joelho de um deles.

    Levantou de um jeito torto e se abrigou atrs de uma mesa, olhou sobre o

    ombro trs garotas se esgueirando por de trs de alguns mveis

    arrastando o corpo de um homem com elas.

    - Vocs vo ficar bem, prometo! Gritou para elas acima dos tiros

    Atirou as cegas e ouviu quando um dos meliantes urrou de dor enquanto

    outro, o mesmo que fora empalado no joelho gritava aparentemente em

    choque.

    - Meu olho, meu olho... O desgraado acertou o meu olho!

    Uma bala ricocheteou na automtica e se enterrou no teto, Maller sentiu

    o cabo da besta romper-se. Bastardo sortudo! Praguejou.

    A arma era intil agora, no portava nenhuma granada consigo e s

    restava-lhe a pistola na cintura, mas no tinha munio para manter um

    tiroteio continuo com ela. Recalibrou o exoesqueleto para velocidade

    novamente, arrancou uma perna da mesa e atirou contra eles gritando.

    - Granada!

    Imediatamente os tiros cessaram no breve momento em que a razo dos

    criminosos levou para identificar o p da mesa e constatar que no

    representava uma ameaa, esses dois segundos de hesitao e surpresa

    foram tudo o que Maller precisava. Como um andride ele simplesmente

    ficou de p e descarregou o cartucho de dezesseis disparos em seus alvos

    antes mesmo que o p da mesa parasse de rolar sobre o cho e quando o

    fez s haviam corpos crivados de setas ao seu lado.

  • - Vocs esto bem? Perguntou enquanto trocava os cartuchos.

    As jovens assentiram vagamente aliviadas, mas aparentemente ainda

    confusas devido ao tiroteio. O corpo que elas haviam arrastado era de um

    Quimera Classe 2, era um Papillion com um par a mais de olhos roxos e

    inchados, das suas costas brotavam um par de asas rasgadas, o corpo

    estava plido e rgido... Para todos os efeitos ele estava morto.

    As garotas estavam com as roupas destrudas, uma delas estava semi-nua.

    Se eu tivesse demorado mais alguns minutos...

    Todas aparentavam ser humanas, no exibindo nenhum movimento

    involuntrio ou sinal das alteraes genticas.

    O capacete fez um scanner dos rostos das jovens e os registros as

    identificavam como trs das sete garotas seqestradas na colnia. Suas

    fichas eram impecveis, como poucos, mas havia uma denncia nvel 1

    feita por uma delas que o comandante simplesmente ignorou.

    - No se preocupem, vou proteger vocs, soltem esse lixo e vamos

    embora, sou da Colnia!

    A garota que, por alguma razo desconhecida para o comandante,

    chorava a morte da Quimera olhou para ele com uma expresso furiosa

    nos olhos apenas meio segundo antes de desferir uma bofetada que fez

    arder o rosto do comandante, em considerao ao que deviam ter

    passado ele no reagiu.

    - Nunca mais fale do meu marido desse jeito seu bastardo miservel!

    - Ma... Marido!- O comandante estava chocado e enojado ao mesmo

    tempo.

    Tinha acabado de ler a ficha da jovem. Dezessete anos, batizada de Aline,

    mais velha de uma famlia com trs irms (as outras duas que estavam

    com ela), adotadas segundo o estatuto de controle populacional, no era

    fichada e todos os testes feitos ao longo de sua vida indicavam uma moa

  • mentalmente saudvel e responsvel. Mas ento por que ela diria

    tamanha insanidade? Maller questionou-se.

    Sndrome de Estocolmo! Concluiu a nica explicao lgica!

    No havia outra forma de uma jovem humana se apegar

    emocionalmente aquele ser deformado. O fruto pobre que se infiltrou na

    arca, contaminados pela radiao da Terra, mutantes cuja pestilncia se

    alastrava DNA adentro, uma maldio ampliada posteriormente por eles

    mesmos. Seres inferiores que nem sequer deveriam ser tratados como

    animais.

    - Senhorita... Maller usou seu tom de voz mais calmo e simptico Sei

    que deve ter sido difcil ter que lidar com os abusos que sofreu, mas se

    vierem comigo... Tero minha garantia pessoal de que receberam o

    melhor atendimento psicolgico possvel, sero heronas!

    O olhar de nojo se espalhou pelo rosto das trs jovens, Aline ento

    pousou inconscientemente a mo sobre o ventre que s agora o

    comandante reparou estar levemente inchado.

    - Aline... Ele estuprou voc?

    - Qual o seu problema? Perguntou furiosa O que raios disseram pra

    voc?

    - Irms Harison, seqestradas sete meses atrs por um grupo que vende

    colonas como escravas para bordeis!

    - No somos escravas, somos uma famlia! Ela comeou a chorar

    Robert fazia parte dela! Tocou carinhosamente o ventre.

    - Olha! O tom de voz de Maller se tornou autoritrio No tenho

    tempo para isso, venham comigo e garanto que iro tirar essa... Essa...

    Essa coisa de dentro de voc!

    - Voc no entendeu ainda? Idiota! No vamos a lugar algum, aqui o

    nosso lar e nada do que voc diga ou faa nos far mudar de idia!

  • As duas outras irms ainda em choque apenas assentiram e murmuraram

    umas poucas palavras de consentimento Maller revirou os olhos e

    apontou a pistola para as trs.

    - Venham agora e vamos tirar esse MONSTRO de dentro de voc!

    A mais nova das trs irms, tentou pegar uma das pistolas largadas no

    cho a menos de meio metro dela, mas acabou flechada no peito, a do

    meio partiu para cima do comandante arranhado seu rosto, a seta

    automtica da arma a atingiu no estmago, a garota tombou gemendo de

    dor e com a mo encharcada de sangue.

    Aline entrou em choque, no teve qualquer reao, apenas chorou e

    chorou. Sua sanidade fragmentara-se.

    - Agora... O soldado falou devagar Levante-se e vamos nos encontrar

    com o resto da tropa!

    Aline obedeceu, Maller assentiu satisfeito consigo. O povo da Colnia

    precisa de proteo... Mas s vezes eles preciso se proteger deles

    mesmos! Voc ter sua sndrome tratada e quanto se recuperar um dia

    ir me agradecer! Pensou consigo e no se arrependeu do que acabar

    de fazer, ele no devia se arrepender, afinal era um bom soldado.

    Danos

    - Algum, por favor, me diga que essa dor nas minhas costas, no por

    que a Maiko me abraou de novo! Edan disse, sentindo a voz rouca e

    abrindo os olhos com dificuldade.

    - Edan!

    Maiko se conteve ao abraar seu amado, ignorou os curativos speros e

    se concentrado em sua respirao e na sua pele marcada por cicatrizes.

    - Hey calma ai valentona ta acabando comigo!

  • -Desculpe!

    Edan se sentou na cama sentindo o corpo dormente e uma fisgada

    incomoda de dor nas costas, estava em um quarto com pouca iluminao

    e que alm da cama era mobilhado apenas com um criado mudo e duas

    cadeiras, em uma delas sentada de ccoras estava Angeline que o olhava

    com expresso cansada acompanhada de olheiras que ele no sabia dizer

    se eram por falta de sono ou por choro excessivo (embora ele achasse que

    Angeline no fosse do tipo que chorasse.).

    - Quanto tempo eu apaguei?

    - Trs semanas! Angie respondeu sem rodeios.

    - O que? Mas eu... Eu s consigo lembrar de uma exploso, estvamos do

    lado de fora da Sweet Night e a Maiko tava desorientada ento eu...

    - Me protegeu usando seu corpo foi assim que... Voc se machucou!-

    Maiko deixou cair uma lgrima.

    Edan esfregou os olhos e ento notou algo: As duas estavam

    terrivelmente magras, como se no se alimentassem h dias, alm de que

    no reconhecia o local onde estava, porm o mais estranho era o

    paradeiro de Stannys, Maiko e Angie no se davam muito bem ento

    como ele as tinha deixado juntas e o pior por que no trouxera-lhes

    comida. Mudou seu semblante, agora tinha a mesma expresso de

    quando lutava com algum ou bolava um plano, uma mscara fria e

    imparcial, porm ao mesmo tempo podia-se ver o que ele sentia.

    Santo Deus! Ele mudou totalmente, o... Olhar dele... Parece um

    psicopata! - Pensou Angie

    - O que houve? Vocs esto com uma pssima aparncia e duvido que

    Stannys as deixaria aqui sozinhas se tivesse escolha!

  • Perspicaz como sempre! Se alegrou Maiko Ele to... To perfeito,

    no entanto... Eu odeio dar ms noticias, porm pior seria se eu no o

    fizesse!

    As duas ento contaram-lhe em detalhes a fuga da micro-cidade, bem

    como as circunstncias de sua destruio, a morte de Stannys, cujo corpo

    foi encontrado e divulgado pelas autoridades que o identificaram como

    lder

    Depois da fuga elas conseguiram se esconder naquele velho abrigo em

    uma rea neutra da Zona, ficaram trancafiadas ali dias cuidando de Edan

    da melhor maneira que puderam (Em especial Maiko que se dedicava a

    viglias com fervor s vezes passando dias sem dormir), quando as

    primeiras noticias chegaram souberam que praticamente todo o

    subterrneo, no s O Formigueiro havia sido destrudo ou ento

    tomado por drones, conseguiram recuperar uma boa quantia de cartes

    em suas casas, uma grande parte desse dinheiro fora gasta com

    medicamentos para infeco justamente para ele.

    -... Em resumo perdemos tudo querido! Maiko concluiu

    - Malditos! Edan acertou um soco na parede cujo metal rangeu de

    maneira preocupante.

    - Edan...

    - sempre assim! Por que? Por que eles nos odeiam tanto? Por que

    ningum os enfrenta?

    - Pode no ser bonito, mas a nossa realidade, no h como fugir dela e

    nem mudar quem somos!- Angeline agora era to fria quanto ele. No

    importa o que percamos no caminho! Baixou o olhar como se no

    acreditasse que havia dito aquilo.

    Maiko olhou para Angie com um olhar de reprovao, Edan percebeu e

    disse:

  • - No se zangue com ela por dizer a verdade!

    - No me zangar? Maiko se transtornou Quer que eu aceite que o

    nosso futuro apenas isso? Que tudo pelo que passamos at agora no

    serviu de nada alm de prolongar nosso sofrimento!

    - Bom isso ou uma Terra radioativa e to morta quanto ns aqui! A

    Harpia respondeu com ironia.

    - Ela tambm no est errada... Mas... s que eu no sei mais o que

    fazer!

    Ningum se atreveu a dizer mais nada, um pesado silncio recaiu sob o

    quarto diminuto que pareceu ficar ainda menor, Maiko saiu para vender

    o que sobrou dos medicamentos, tentaria tambm obter comida, mas

    acima de tudo precisa pensar. Angeline trocou a cadeira do quarto por

    um sof na sala no qual no fez mais do que tentar dormir um pouco,

    passou a noite em claro e mesmo assim no conseguiu pregar os olhos.

    Os dias seguintes se passaram da mesma forma, as noticias vinham aos

    poucos e de maneira picada, as batidas e patrulhas de Drones se

    intensificaram de um modo nunca antes visto, soube de casos em que

    no s Quimeras, mas famlias inteiras dos poucos humanos na Zona

    tambm foram executadas por abrigarem aqueles acusados de serem

    Quimeras. O Anel Interno estava matando sem fazer distino ou

    mesmo de se importar com os limites de suas leis corruptas, o grande

    responsvel pela matana, se que se podia atribuir a culpa a uma s

    pessoa, era um comandante de diviso chamado Willian Maller.

    Maiko mal havia acabado de contar a noticia para o traficante, que

    observava a Zona de Quarentena da varanda do prdio, um dos originais,

    quando seu rosto assumiu a expresso de desolao que o havia tomado

    nos ltimos meses. A lmia mal podia reconhecer Edan, o apartamento

    no subsolo era um sonho da dupla que havia trabalhado duo para obter-

    lo, porm ela sabia que para ele aquele lugar representava sua esperana

  • de uma vida melhor, era um smbolo e agora que tinha sido destrudo

    parecia que toda a esperana tinha morrido nele.

    Quase rebeldes

    - Essa simplesmente a idia mais idiota que eu j ouvi na vida!

    Angeline pontuou a ultima palavra com seriedade.

    O rosto da Harpia estava contorcido em uma careta irritada, equivalente

    ao absurdo que tinha acabado de ouvir. Desde que a Guerra na Terra

    acabou ningum conseguiu mudar alguma coisa! Em cento e oitenta anos

    todos que se opuseram, que buscaram outro caminho foram mortos e

    agora esse imbecil me vem com essa! Quem ele pensa que sou?

    -... E voc Maiko? Eu no entendo essa lealdade obsessiva que voc tem

    para com Edam, mas pense por si mesma agora!

    - Estou pensando! Me surpreende voc que perdeu tanto quanto ns, at

    mais se pensar bem, o que estamos oferecendo uma oportunidade de

    - Mas fundar um grupo de resistncia armada? Onde vo conseguir as

    coisas de que precisam? Pelo que vo lutar, droga?

    Ainda que Angeline no soubesse, a deciso ainda pesava para a dupla,

    originalmente proposta por Edan a idia de fundar um grupo rebelde,

    dessa vez um real, pois todos sabiam que no existia nenhum grupo do

    tipo na Zona, soava um tanto tola e extremamente suicida, mas em

    contra partida eles no tinham recursos com contar e com muito menos

    meios de se obter-lo.

    Ao mesmo tempo a Zona de Quarentena parecia querer sustentar uma

    aparncia de normalidade, mas a verdade era que nem mesmo as outrora

    poderosas faces criminosas do submundo estavam conseguindo se

  • sustentar. O desespero da situao somado a dor da perda do cnjuge fez

    Angeline sentir-se como se seu corao tivesse sido arrancado de seu

    peito, ela respirou fundo e depois soltou o ar de uma vez.

    -

    defender, algo que justifique suas aes, se que vocs realmente tm

    alguma!

    Edan se endireitou na cadeira, era isso que queria ouvir.

    - A liberdade e igualdade de direitos para as Quimeras so causa

    suficiente pra voc?

    - Mas ai entram outras duas questes: Como vo conseguir recursos e

    gente disposta a lutar? E mais importante que isso voc precisa dar um

    objetivo a eles. O que voc quer? Liberdade e igualdade! timo, mas

    como planeja instaur-la? Pedindo independncia para a Zona de

    Quarentena? Tomando toda a colnia para si? Compreende?

    Dessa vez foi vez de Maiko responder:

    - J ouviu falar do manifesto comunista? Foi escrito por um homem

    chamado Carl Marx, nele entre outras coisas ele descreve uma sociedade

    onde todos so iguais, acredito que com as limitaes que temos impostas

    pela prpria estrutura da Arca, bem como a necessidade de

    racionamento, podem viabilizar que algo do tipo de certo aqui! Porm

    nada ser imposto, um conceito novo, um... Comunismo Democrtico!

    - Comunismo Democrtico? Acredita mesmo nisso?

    - Se for uma chance de fazer da colnia um lugar melhor para viver,

    ento sim! A jovem lmia baixou o olhar para suas mos No

    podemos permitir que os erros do passado se repitam, mas tambm no

    podemos deixar que o medo de repeti-los nos impea de querer um

    futuro melhor!

  • - Angeline... Edan pigarreou Sabemos que essa deciso no cabe a

    ns, as pessoas que tero que decidir, mas do jeito que as coisas esto

    ns no teremos voz. Precisamos nos unir e fazer com as pessoas deixem

    de ser passivo a tudo o que acontece aqui!

    - E para alcanar esse objetivo... Para desestabilizar o Anel Interno... At

    onde est disposto a ir? O que est disposto a sacrificar?

    Silncio, a dupla se entreolhou rapidamente, um leve gesto de aprovao

    de Maiko e a resposta veio com a mais simples e pura convico.

    - Tudo!

    Ai est aquele olhar frio de novo!... De fato ele um classe trs, sem

    dvida h muito mais em Edan Argent do que os olhos podem ver!

    Pensou Angeline Ainda sim como apenas ns podemos fazer alguma

    diferena? Stannys... Se estivesse aqui saberia o que dizer, eu me apoiei

    em sua confiana por tanto tempo que agora eu me sinto perdida e

    desmotivada, mas agora ouvindo esse discurso daquele seu amigo

    metido...

    Naqueles quase dois meses desde a queda do Formigueiro, a morte de

    Stannys abriu os olhos da dupla para algo maior que sua prpria

    sobrevivncia, ao observarem passivos a reao da sociedade da Zona

    aps aquele dia deu-lhes a per