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Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no
Ensino, na Pesquisa e na Extensão – Região Sul
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PROJETOS DE INTEGRAÇÃO TRANSDISCIPLINAR NO ÂMBITO
UNIVERSITÁRIO: experiência do NMD/UFSC
Carolina Cavalcanti do Nascimento UFSC – [email protected]
Kátia Maria Zgoda Parizotto UFSC - [email protected]
RESUMO
A universidade precisa estar atenta à discussão acerca dos desafios educacionais que se estabelecem
frente à crise socioambiental à luz do Pensamento Complexo-Sistêmico. Portanto, é urgente propor, através
do tripé ensino-pesquisa-extensão, alternativas a essas questões elaborando “estratégias de integração
decididamente inter e transdisciplinar de produção e democratização do conhecimento técnico-científico”
(FONTAN, VIEIRA, 2011, p. 20). O artigo propõe uma reflexão sobre a atuação universitária, desafios e
limitações, a partir das ações desenvolvidas pelo Projeto Experimental de Educação para o
Ecodesenvolvimento na Zona Costeira Catarinense na comunidade de Ibiraquera, no município de Imbituba,
e conduzido pelo Núcleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e Desenvolvimento (NMD) da Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC). Discute as limitações e os desafios enfrentados ao desenvolver projetos
de integração transdisciplinar no âmbito universitário a partir do enfoque de Educação para o
Ecodesenvolvimento. Procura contribuir para o debate sobre as condições efetivas de propostas de
integração transdisciplinar no âmbito universitário, apontando as limitações envolvidas e as possíveis
contribuições da universidade para seu avanço. Destaca ainda a relevância de uma experiência de construção
coletiva da incipiente linha de pesquisa sobre antropoformação transdisciplinar que, atualmente, permanece
marginal na dinâmica de atuação das instituições de ensino superior do País como a desenvolvida por
estudantes de graduação e pós-graduação, vinculados ao NMD/UFSC.
Palavras-chave: Universidade; Educação para o Ecodesenvolvimento; Integração Transdisciplinar.
Eixo temático: Teoria e Prática da Interdisciplinaridade
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1. Crise socioambiental e a universidade: reflexões preliminares
1.1. Pressupostos da crise socioambiental
A humanidade, atualmente, depara-se com complexos e graves problemas socioambientais. Vivemos
uma situação de crise socioambiental sem precedentes, na qual se multiplicam os riscos ambientais que nos
apontam para a necessidade de entendermos as características, limites e transformações das sociedades
modernas. A grande questão que se incorpora ao debate é a viabilidade da existência humana a partir de um
sistema que mantém e privilegia a alienação, a destruição da natureza e a acumulação de riquezas.
Alguns movimentos da sociedade e instituições, entre elas a Universidade, passam a reconhecer que
existem limites para as relações materiais e energéticas que se estabelecem entre sociedade e natureza para
manter a produção e oferta de mercadorias nos moldes do modelo hegemônico, atualmente, consideradas
essenciais pelo sistema econômico capitalista para a reprodução e legitimação de relações sociais desiguais.
A grande questão aqui é: como sustentar o padrão de vida de alguns, em detrimento das péssimas
condições de vida de outros, mantendo o uso abusivo dos recursos da natureza? Essa é uma questão que se
torna eticamente abominável e materialmente insuportável, uma vez que a riqueza de poucos acentua, de
forma reversa, a pobreza de muitos (LOUREIRO, 2011).
A crise socioambiental vivenciada pela sociedade moderna é, sem dúvida, uma crise civilizatória. É
uma crise da própria humanidade. É principalmente uma crise estabelecida por um sistema econômico
perverso (BOFF, 2012; VIEIRA, 2007). Uma crise configurada pelo esgotamento do estilo hegemônico de
desenvolvimento global e acentuada por atividades econômicas pensadas a partir de uma lógica
individualista, materialista e acumulativa que desconsidera tanto os aspectos sociais quanto os ambientais
em suas relações.
Boff (2011) defende que esta é uma crise terminal do capitalismo ao mesmo tempo em que estremece
estruturas conjunturais. O fortalecimento desta crise está baseado, segundo o autor, em duas premissas. A
primeira é de que ela é terminal, tanto para a humanidade quanto para o capitalismo por estarem ambos se
aproximando vertiginosamente dos limites planetários em que ocupações e depredações afetam o sutil
equilíbrio da Terra, exaurindo seus bens e serviços. Não pode o capitalismo se reproduzir sem a natureza. O
atual sistema usa de forma indistinta os recursos naturais e a força de trabalho dos cidadãos.
A segunda premissa, apontada por Boff, está relacionada às questões humanitárias impostas pelo
capitalismo, uma vez que não pode resolver os problemas financeiros a partir do desmonte de toda uma
sociedade – considerando que a mesma não aceita mais a lógica perversa imposta pelo sistema sob a forma
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de uma ditadura econômica que submete de forma indistinta os Estados aos interesses dos capitais
especulativos. “A crise ecológica não é apenas um resultado „indesejado‟ do modelo, é o desencontro dos
mortais com suas raízes.” (LEIS e D‟AMATO, 2009, p. 83).
Fica evidente que a sociedade não percebe de forma nítida a dimensão desta crise, mas seria ingênuo
responsabilizar apenas a essência humana por este grave problema. São as relações sociais determinadas
pelo modelo hegemônico de economia que acabam por determinar as formas de uso e de apropriação da
natureza. Apropriação essa que está pautada, principalmente, na exploração intensa dos recursos naturais
vitais ainda disponíveis (LOUREIRO, 2011).
A falta de consciência da sociedade sobre as implicações do modelo econômico tornam o caminho
rumo a um desenvolvimento mais durável cheio de obstáculos. É comum o discurso que alega, em nome da
obtenção e acumulação de capital, que se justificam as medidas de segregação espacial, de degradação
ambiental e de desarticulação política que enfraquece as populações mais empobrecidas. São problemas
recorrentes e associados ao fenômeno de degradação ambiental o uso predatório dos recursos naturais, a
perda intensiva da biodiversidade, a explosão demográfica, a hiperurbanização, a industrialização poluente e
assimetrias nas relações norte-sul, o desmatamento, entre outros. É preciso, em contraposição a esta
corrente, defender a inclusão da noção de justiça ambiental e privilegiar a busca da produção, da
distribuição e da reprodução dos múltiplos atributos de um ambiente com qualidade para todos
(ACSELRAD, 2001; VIEIRA, 2007).
Um esforço inicial em reconhecer os limites do crescimento material do planeta, a partir da pesquisa
sistêmica, foi empreendido no final do século 1960 pela equipe de Dennis Meadows que, em seu relatório,
destacaram o aspecto interdependente dos impactos destrutivos gerados pela ação do ser humano sobre os
sistemas socioecológicos e as ameaças diretas as precondições de sobrevivência das espécies no longo prazo
(VIEIRA, BERKES, SEIXAS, 2005, p. 24).
É preciso um agir complexo para superar a crise planetária. Num primeiro momento é preciso
restaurar os sistemas ambientais afetados e depois mobilizar as sociedades para o exercício de mudança.
Uma mudança que vai além do social, implica na elaboração de um novo modelo que supere o vigente e
assegure a manutenção e expansão dos valores de democracia participativa, tão necessária para o
enfrentamento da crise que presenciamos.
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1.2. Noções sobre o Ecodesenvolvimento
Foi na busca de formas de enfrentamento da crise socioambiental planetária que cientistas passaram a
buscar uma redefinição dos estilos de desenvolvimento para os hemisférios Norte e Sul e das formas de
organização que estão a eles associadas. Em decorrência desta preocupação, surge o termo
ecodesenvolvimento apresentado por Maurice Strong na Conferência de Estocolmo, em 1972, numa alusão a
necessidade de se repensar o modelo econômico vigente e a participação da sociedade em processos de
elaboração de políticas públicas. Este conceito foi retomado e ampliado por Ignacy Sachs, ainda na década
de 1970, em um estudo que foi realizado no âmbito do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
– PNUMA (SACHS, 2007).
Ecodesenvolvimento é interpretado como uma nova teoria, um novo paradigma científico, que
reformula a maneira de pensar o desenvolvimento incorporando o fator social, cultural, ambiental e histórico
das sociedades. Procura re-estabelecer a harmonia entre o desejo de desenvolvimento das sociedades e o
meio ambiente perdido durante o processo de evolução e industrialização da sociedade moderna. Seu
conceito “emergiu e se disseminou como expressão crítica radical da civilização industrial-tecnológica –
herdeira de uma visão cartesiana do mundo e impulsionada pela ideologia economicista.” (VIEIRA, 1999).
Vieira esclarece que o ecodesenvolvimento aponta para um novo estilo de desenvolvimento ao
mesmo tempo em que apresenta um novo enfoque simultaneamente preventivo e proativo de planejamento e
gestão. Esse enfoque está baseado no princípio participativo para o fortalecimento do planejamento.
Participação que deve acontecer em todos os estágios do planejamento com amplo envolvimento das
comunidades que devem agir em oposição à manipulação casuística de recursos humanos tão comuns nos
processos de implantação de programas de desenvolvimento e impostos à população de forma muitas vezes
autoritária. A participação, no ecodesenvolvimento, é pressuposto decisivo para o fortalecimento de sistemas
comunitários de gestão de recursos comuns (VIEIRA, 2007; 2009).
Em seus pressupostos éticos o ecodesenvolvimento defende a interdependência entre o atendimento
das necessidades fundamentais dos seres humanos, a promoção da self-reliance das populações envolvidas e
o fortalecimento da prudência ecológica. O termo self-reliance não deve ser entendido ingenuamente como
sinônimo de autossuficiência ou autoconfiança. Antes sua interpretação deve priorizar a noção de ser em si
uma opção consciente por uma estratégia de regeneração do tecido cultural em contraposição à síndrome da
dominação-dependência (VIEIRA, 2007).
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O planejamento e a gestão de estratégias de desenvolvimento, neste enfoque, possuem como
característica a tomada de decisão de longo prazo com visão prospectiva de criação de cenários futuros
desejados. Os cenários e diagnósticos propostos por esse enfoque devem “levar em conta a gestão da
tecnologia, o abastecimento de matérias-primas, a gestão de recursos naturais de uso comum, o suprimento
energético, e a organização territorial das atividades produtivas.” (VIEIRA, 2007, p. 14).
Em resumo, ecodesenvolvimento é:
Uma abordagem de planejamento e gestão de estratégias alternativas de desenvolvimento inspiradas
na busca de harmonização das dimensões social, econômica e ecológica. Distinguimos esta
abordagem da interpretação dominante do conceito de desenvolvimento sustentável, que subordina a
ecologia à economia e tende a colocar em segundo plano o imperativo de priorizar o atendimento das
necessidades básicas das coletividades locais. (VIEIRA, 2011, p. 14)
O ecodesenvolvimento procura oferecer respostas aos problemas e aspirações das comunidades,
potencializando a utilização dos recursos ociosos e a liberação de energia social. Em se tratando de respostas
aos problemas locais esse enfoque, no campo cientifico, procura privilegiar necessariamente ações
transdisciplinares que dêem ênfase a pesquisa-ação de corte sistêmico e que integre conhecimento cientifico
e saber local nas diferentes esferas do planejamento territorial.
Sua função principal é dotar os cidadãos para o enfrentamento da crise socioambiental e dos riscos
advindos do „mau desenvolvimento‟ (SACHS, 1974; VIEIRA, 2011). Para seus defensores, o sucesso da
proposta está condicionado à necessidade de acontecer uma reforma profunda da educação atual e para tanto
sugere que se conceitue de forma clara o que se pretende com a educação para o ecodesenvolvimento.
É importante ressaltar que para esse enfoque a educação é uma premissa, ou seja, não poderá existir
ecodesenvolvimento sem educação para o ecodesenvolvimento. (SACHS, 1980, 2007; VIEIRA, 1999). Esta
proposta está centrada na construção de processos educativos pautados nos princípios de igualdade,
participação, pluralismo, promoção da descentralização e do empoderamento em todos os níveis da
sociedade. Empoderamento daqueles que são marginalizados e que se refletirá com “o enganjamento crítico
dos cidadãos em ações geradoras de novos tipos de saber, de novas práticas e de novos padrões de
organização da vida coletiva no nível local/territorial” (VIEIRA, 2011, p. 22).
Atualmente, o enfoque de Educação para o Ecodesenvolvimento (EPE) vem se configurando como
uma alternativa de educação voltada para o desenvolvimento local, considerando o panorama de crise
socioambiental de escopo global. Trata-se de uma revisão drástica dos paradigmas educacionais instituídos,
das estratégias e situações concretas de ensino-aprendizagem, a partir do pensamento complexo-sistêmico,
diante da problemática contemporânea do meio ambiente e do desenvolvimento (NASCIMENTO, 2013).
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Os pressupostos que fundamentam a educação para o ecodesenvolvimento e as estratégias de ação do
NMD/UFSC, são: (i) fomentação de novos projetos de sociedade e de civilização; (ii) recriação dos sistemas
educacionais formais e informais; e (iii) elaboração e fomentação de novos projetos político-pedagógicos,
tanto no Ensino Básico quanto no Ensino Superior. Cabe ressaltar que todos estes pressupostos citados estão
baseados em uma visão de mundo co-construída, sistêmica e nas relações interdependentes entre sujeito-
objeto.
Neste sentido, de acordo com Vieira (1999) entre os princípios básicos que fundamentam a EPE e
condicionante para um papel mais proativo da Universidade está a necessidade da integração progressiva de
conteúdos fragmentados, através da integração inter e transdisciplinar.
A perspectiva transdisciplinar, em especial, é uma modalidade interativa e comunicativa de se fazer
pesquisa socioecológica. Ela incorpora práticas da pesquisa-ação num processo de aprendizagem recíproco
envolvendo os diversos atores do contexto sociocultural no local onde os problemas estudados afetam a
comunidade como um todo. Tais grupos de aprendizagem envolvidos em ações de ensaio e erro e que
integram cientistas, leigos, tecnólogos são chamados de comunidades de aprendizagem. (SAUVÉ, 1997 e
2001; VIEIRA, BERKES, SEIXAS, 2005).
1.3. Refletindo o papel da Universidade
O paradigma científico analítico-reducionista, hegemônico na Universidade, está comprometido com
um estilo de desenvolvimento ambientalmente degradante e socialmente excludente e vem inviabilizando a
compreensão dos problemas socioambientais em sua complexidade e interdependência. Através de seu
princípio fragmentador segrega o conhecimento em várias disciplinas e reproduz a relação dual entre homem
e natureza, teoria e prática, saber científico e saber tradicional.
A crise ecológica exige transformações substanciais das universidades pelos seus sistemas instituídos
de ciência, tecnologia e inovação. É preciso que as universidades atuem no sentido de reforçar o potencial
existente nas sociedades contemporâneas de se renovar ou de se reeducar mesmo que esse processo de
antropoformação ainda represente um grande desafio diante do paradigma científico hegemônico. A
pesquisa, principalmente através da inovação – inter e transdisciplinar - dos programas de pós-graduação, é
a mola propulsora para o progresso do conhecimento numa perspectiva de longo prazo. As pesquisas
deverão desenvolver sua capacidade de previsão mediante a análise de cenários e tendências sociais que
possam surgir. O ensino superior deverá dar atenção especial ao conhecimento de questões fundamentais das
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sociedades modernas como a eliminação da pobreza, o desenvolvimento sustentável, o diálogo intercultural
e a construção de uma cultura de paz. (FONTAN e VIEIRA, 2011; NASCIMENTO, 2013)
A Universidade precisa estar atenta à discussão acerca dos desafios educacionais que se estabelecem
frente à crise socioambiental e à luz do Pensamento Complexo-Sistêmico. A Universidade tem um papel
importante no desenvolvimento das sociedades contemporâneas. “A transdisciplinaridade indica o
movimento epistemológico que mais nos mobiliza atualmente e que, em nossa opinião, coloca o movimento
sistêmico em relação com o do pensamento complexo” (PINEAU, 2005, p. 110).
Para Gaëtan Tremblay (2011) tanto a extensão universitária quanto o pensar e o agir para o
desenvolvimento territorial local são questões negligenciadas pelos estudos acadêmicos. Portanto, a
universidade deve estar atenta às questões referentes à sociedade e ao meio ambiente e propor, através do
ensino, pesquisa e extensão, alternativas a essas questões elaborando “estratégias de integração
decididamente inter e transdisciplinar de produção e democratização do conhecimento técnico-científico”
(FONTAN, VIEIRA, 2011, p. 20). Sua capacidade de colaborar na elaboração de um novo estilo de
desenvolvimento local não tem sido explorada. A questão primordial é, sem dúvida, “fomentar uma revisão
em profundidade das práticas universitárias convencionais de ensino, pesquisa e extensão.” (VIEIRA et al,
2011, p. 261)
Para mudar as relações dos seres humanos com a natureza é preciso transformar a cultura de uma
sociedade. É preciso mudanças nos valores, nas atitudes e nos comportamentos dos seus atores sociais. O
modelo cartesiano de educação, tradicionalmente dividido por disciplinas que não se comunicam, contribui
para a falta de compreensão da complexidade do conhecimento e do mundo. Passamos a compreender
apenas pequenos pedaços da realidade e não a sua totalidade.
E a complexidade dos problemas socioambientais que obriga o pesquisador/educador a buscar uma
aproximação com a Transdisciplinaridade. Nicolescu (1999) afirma que a transdisciplinaridade aponta para
aquilo que está ao mesmo tempo entre, através e além das diferentes disciplinas e sugere que deve existir um
diálogo aberto sobre as descobertas cientificas entre as diferentes áreas.
É a corrente transdisciplinar que poderá traçar um novo caminho para o Ensino Superior nos
diferentes países do mundo. É preciso que as universidades, que desejarem desenvolver-se, devem redefinir
as relações entre as disciplinas e os novos modelos de integração de saberes.
A inserção da integração transdisciplinar a partir do pensamento complexo-sistêmico ainda é
incipiente e marginal nos ambientes de ensino formal mesmo com o aparente crescimento das preocupações
com o meio ambiente nos últimos anos, devido à gravidade e à complexidade dos problemas
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socioambientais devido ao aumento da crise planetária (PINEAU, 2005; SOMMERMAN, 2003;
NASCIMENTO, 2013).
É um novo paradigma para tratar dos problemas pós-modernos. Porque a sociedade moderna se
desenvolveu com as disciplinas e estas são sempre necessárias, mas não são suficientes, há novos
problemas que as transbordam. Se as universidades querem desenvolver-se, devem estar abertas a este
movimento para tratar as relações entre as disciplinas e fora das mesmas. Mas levará o seu tempo. As
revoluções científicas levam várias gerações. Estamos numa situação de transição entre os velhos
modelos e os novos que emergem, mas se estenderá por várias gerações. Contudo, é o que me parece
interessante, porque há que construir, criar os instrumentos de construção (PINEAU, 2010, s.p.).
De acordo com Thiollent (2008), propostas de pesquisa alternativa, como a pesquisa-ação, podem vir
a desempenhar um importante papel nos estudos, na aprendizagem dos pesquisadores e de todas as pessoas
ou grupos implicados em situações problemáticas. Isto tendo em vista que um dos seus objetivos consiste
em dar aos pesquisadores e grupos de participantes os meios de se tornarem capazes de responder com
maior eficiência aos problemas da situação em que vivem, em particular sob a forma de diretrizes de ação
transformadora.
As abordagens de pesquisa-ação e de movimento sistêmico nasceram polemicamente da herança da
pesquisa educativa normal e das pressões de novos problemas educativos. Elas emergem nas turbulências de
uma crise paradigmática, na qual se entrechocam antigos modelos educativos mais ou menos anacrônicos e
germes de novos modelos, em diferentes estados de gestação. Essa situação turva abala os hábitos, as
profissões e as instituições estabelecidas de pesquisa (PINEAU, 2005).
Josso (1991) destaca, como característica dessa proposta metodológica, o sentido de “experiência”: a
pesquisa-ação e a pesquisa-formação geram uma experiência que apresenta uma natureza específica. Se, no
positivismo, encontramos uma separação entre sujeito e objeto, na perspectiva que analisamos, é no
movimento intersubjetivo, no encontro e na partilha do processo de investigação, que o conhecimento é
produzido e, assim, a pesquisa-ação-formação assenta-se sob uma experiência existencial que produz
conscientização.
A crise do paradigma da “conscientização” levou à procura e formas para transcendê-lo [...] A pedra
filosofal de transcendência de um paradigma a outro radicou-se na ideia de que o conhecimento para a
transformação social não se radicava na formação libertadora da consciência, mas na prática dessa
consciência. Além disso [...], dessa passagem e desse sentir da práxis também se produzem um saber
e um conhecimento científicos. Até este momento, estabelecia-se nas ciências sociais uma diferença
taxativa entre teoria, de um lado, e prática, de outro. Havia uma tendência para definir a ciência como
pura e aplicada. Reconhecia-se certa relação entre uma e outra, no sentido de que a teoria permitiria
maior eficácia da prática, que prática se inspiraria na teoria e, desse modo, que essa combinação faria avançar o conhecimento científico. Foi essa possibilidade que, em minha opinião, permitiu superar as
dificuldades ideológicas e políticas do paradigma da conscientização. Durante aqueles primeiros anos
da década de setenta, esta passagem foi denominada investigação-ação (BORDA, 1981, 163).
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O postulado da pesquisa-ação-formação é, pois, de que a intensidade dessa experiência pode produzir
conscientização, como processo que não pode ser ensinado, mas que é vivido de maneira muito pessoal pelo
sujeito: um movimento que leva à busca de transformação. Essa perspectiva de investigação não nega o
carácter científico, mas considera as múltiplas dimensões implicadas na pesquisa (JOSSO, 1991).
De acordo com Bragança e Oliveira (2011), em contexto de interação efetivamente humana, o
desenvolvimento do trabalho de investigação produz, assim, um movimento de formação, de
autodesenvolvimento para o investigador e para os que participam como sujeitos da pesquisa. A pesquisa-
ação-formação implica uma experiência significativa de articulação de saberes, não busca a produção de um
saber dicotomizado, que futuramente “poderá ser aplicado” socialmente, mas o desenvolvimento da pesquisa
pressupõe a mobilização de saberes, experiências e práxis vitais.
Segundo Pineau (2005), parece existir uma massa crítica de novos atores sociais que se sentem
responsáveis pela função pesquisa em formação. E essa massa crítica pode ser vista como emergência de
uma nova força paradigmática, cuja pressão ainda pode aumentar. Esses novos atores de pesquisa
introduzem, além de sua pessoa, suas preocupações e seus problemas, que se traduzem em objetos de
pesquisa, que ultrapassam largamente o campo educativo habitual. Mas, de maneira muito menos
perceptível, conforme as visões recebidas, esses objetos também projetam a pesquisa numa vertente não
instituída da formação: aquela que chamamos, de maneira residual, indiferenciada e um pouco negativa, de
formação in ou não formal.
Neste sentido, na pesquisa-ação-formação, os pesquisadores não são mais apenas os profissionais
especializados da pesquisa, nem os professores-pesquisadores universitários, mas também responsáveis por
formação e consultores, que produzem novos saberes próximos às intervenções. Além disso, a função da
pesquisa estende a todo sujeito querendo se formar, mais pela produção do que pelo consumo de saber
(PINEAU, 2005).
A metodologia de pesquisa-ação-formação possibilita o processo de antropoformação
transdisciplinar1 que propulsa, como horizonte, um objetivo ambicioso, mas necessário. Ele lança, num
período de transição paradigmática incerta e propícia ao desenvolvimento – mesmo proliferante – novos
traços de união entre pesquisa-ação-formação por todos e para todos (PINEAU, 2005).
1 O conceito de ecoformação transdisciplinar ou antropoformação transdisciplinar foi desenvolvido com o objetivo de dar conta
dos movimentos centrípetos paradoxais, que tentam unificar os movimentos de personalização, socialização e ecológicos de fortes
tendências centrífugas. Os três movimentos são expressos a partir dos conceitos de autoformação, heteroformação e ecoformação,
respectivamente. A autoformação tem em conta o polo do sujeito, remetendo à formação de si por si e para si; a heteroformação é
o polo social da formação; e a ecoformação apareceu progressivamente com a re-inclusão de uma terceira dimensão excluída durante muito tempo - a eco - e que contribui para a formação (PINEAU, 2010).
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Porém, o paradigma antropoformador de pesquisa-ação-formação transdisciplinar ainda não é
entendido como uma necessidade pelas comunidades acadêmicas apesar de que as experiências
transdisciplinares, forjadas na pesquisa-ação-formação, demonstrem favorecer a elaboração participativa de
um novo tipo de saber (PINEAU, 2005; VIEIRA, 2011; NASCIMENTO, 2013).
2. Um Coletivo e a pesquisa-ação-formação: metodologias e atuação do NMD
O coletivo de pesquisa do Núcleo Transdisciplinar de Meio Ambiente e Desenvolvimento (NMD),
vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC), mesmo exposto à hegemonia do paradigma científico analítico-reducionista, vem possibilitando aos
pesquisadores-ativistas-formadores que o integram, ações que contribuem para o processo de
antropoformação transdisciplinar à luz dos enfoques de Ecodesenvolvimento e de Educação para o
Ecodesenvolvimento.
Mais precisamente, o NMD/UFSC constitui um espaço de promoção de atividades integradas de
pesquisa-ação-formação comunitária, que contribui para o avanço teórico e metodológico da pesquisa
socioambiental no País, nos níveis básico e aplicado.
Entre suas metas, estão: (i) estimular uma reflexão permanente sobre os fundamentos
epistemológicos e éticos desta nova área de conhecimento inter e transdisciplinar; (ii) acolher e orientar
estudantes de graduação e pós-graduação, estagiários e pesquisadores brasileiros e estrangeiros; (iii)
oferecer cursos de capacitação em gestão compartilhada de recursos naturais de uso comum; (iv) oferecer
assessoria técnica a instituições governamentais e não-governamentais interessadas na criação de Agendas
21 locais; e (v) contribuir para a difusão de informação científica mediante a promoção de conferências,
seminários e simpósios, além da manutenção de uma linha editorial e de um centro de documentação aberto
à comunidade (www.nmd.ufsc.br).
A partir de 1995, em parceria com núcleos e centros de pesquisas internacionais, o coletivo do
NMD/UFSC passou a concentrar esforços na revisão de literatura sobre a problemática dos modos de
apropriação e de gestão compartilhada de recursos naturais de uso comum (VIEIRA, WEBER, 2000;
WEBER, 1992 e 2000 apud VIEIRA, 2011), que, mais tarde, subsidiou estudos de caso inseridos na linha de
reflexão chamada gestão patrimonial negociada (MONTGOLFIER, NATALI, 1987; GODARD, 2000;
OLLAGNON, 2000; MERMET, 1992 apud VIEIRA, 2011). Tais pesquisas foram realizadas, sobretudo, na
zona costeira centro-sul do estado de Santa Catarina.
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Os estudos convergiam no sentido da crítica ao pressuposto de que a solução dos problemas de
degradação socioambiental estaria na privatização de bens comuns e/ou na ação estatal, baseada na adoção
de práticas regulatórias tecnocráticas, em detrimento da potencialidade dos sistemas mistos, capazes de
possibilitar novos arranjos institucionais para uma gestão compartilhada dos commons2. Neste sentido, os
conhecimentos ecológicos tradicionais das populações passam a ser considerados também como fonte de
conhecimento em trabalhos de pesquisa (BERKES, 1999 apud VIEIRA, 2011).
E, a partir de 1999, com a aproximação do NMD/UFSC à comunidade de Ibiraquera, no município
de Imbituba, centro-sul da zona costeira catarinense, houve a criação do Fórum de Agenda 21 local da
Lagoa de Ibiraquera e a zona costeira catarinense passou a ser assumida como região-laboratório de
desenvolvimento territorial sustentável.
Localizada entre os municípios de Imbituba e Garopaba, a cerca de 70 km ao sul da cidade de
Florianópolis, capital do estado de Santa Catarina, a região do entorno da Lagoa de Ibiraquera abrange
atualmente dez comunidades: Grama, Limpa e Campo D´una, pertencentes ao município de Garopaba; e
Araçatuba, Alto Arroio, Arroio, Ribanceira, Barra, Ibiraquera ou Teixeira e Rosa, pertencentes ao município
de Imbituba. A chamada “Lagoa de Ibiraquera” é na verdade uma laguna costeira, composta por quatro
bacias interconectadas: a Lagoa de Cima, a Lagoa do Meio, a Lagoa de Baixo e a Lagoa do Saco (FREITAS,
2005).
A região é interessante, devido à presença de comunidades pesqueiras tradicionais de origem
açoriana, ameaçadas pela ocupação desordenada do espaço, pela expansão do turismo de massa predatório e
pela especulação imobiliária.
Entre as várias atuações do NMD/UFSC na comunidade de Ibiraquera, que vão desde pesquisas de
cunho interdisciplinar e de pesquisa-ação até a participação na criação e fomentação do Fórum da Agenda
21 Local da Lagoa de Ibiraquera, está a condução do Projeto Experimental de Educação para o
Ecodesenvolvimento na Zona Costeira Catarinense.
O projeto do coletivo está inserido numa das linhas-mestras de intervenção do NMD ao longo dos
últimos dez anos. Na sequência dos trabalhos desenvolvidos no período de 2011-2013, o projeto inscreve-se
também no aprofundamento teórico do enfoque do ecodesenvolvimento no que diz respeito à sua aplicação
no campo educacional (formal e informal), tendo em vista os desafios impostos pelo agravamento tendencial
da crise contemporânea do meio ambiente e do desenvolvimento (www.nmd.ufsc.br).
2 Enfoque voltado para a gestão democrática dos recursos naturais de uso comum (BERKES, FOLKE, 1998;
BROMLEY, 1992; DIEGUES, 2000; GADGIL, GUHA, 1992; GADGIL, 1998, 1999; HANNA et al., 1996; SINGH et al., 2000 apud VIEIRA, 2011).
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A equipe que conduz o projeto é multidisciplinar e conta com a dedicação voluntária de graduandos,
mestrandos, doutorandos, pós-doc e egressos. Atualmente, estão envolvidos diretamente, aproximadamente,
dez pessoas – duas contam com o apoio de bolsas de extensão concedidas pela Universidade.
A proposta do Projeto Experimental de Educação para o Ecodesenvolvimento na Zona Costeira
Catarinense é estimular o desenvolvimento de práticas transdisciplinares em espaços educacionais visando a
criação de comunidades de aprendizagem, priorizando o desenvolvimento humano integral e a satisfação das
necessidades locais.
Trata-se de um projeto de longo prazo constituído de estratégias de ações que envolvem: a
capacitação de educadores do ensino formal e público no manejo dos princípios básicos de uma nova
concepção de educação ambiental, a educação para o ecodesenvolvimento; o experimento de práticas
didático-pedagógicas alternativas com estudantes do ensino básico; a busca por espaços de aprendizagem
contemplando a comunidade em geral, e; o acompanhamento e fomentação para a elaboração de projetos
político-pedagógicos inseridos em propostas de Agenda 21 Escolares.
Com o apoio financeiro do Edital Novos Talentos da Capes, no ano de 2011, foi possível executar a
primeira etapa do projeto que corresponde a condução do Curso de Introdução ao Enfoque de Educação
para o Ecodesenvolvimento (EPE) para educadores de duas escolas públicas que atendem a comunidade de
Ibiraquera. O público-alvo foi constituído por um grupo de professores e gestores escolares da Escola de
Educação Básica Visconde do Rio Branco, da Escola de Educação Básica Profª Justina da Conceição Silva e
do Programa Pró-Jovem Campo. No rol das metas estratégicas perseguidas foram incluídos (i) a oferta de
um espaço de reflexão crítica sobre a consistência das práticas de educação ambiental (EA) que vinham
sendo desenvolvidas nos ambientes de aprendizagem; (ii) o compartilhamento dos fundamentos conceituais,
teóricos e metodológicos do enfoque de EPE; e, finalmente, (iii) o fomento de um processo de integração
sinérgica dos professores e gestores, tendo em vista a concepção e o teste experimental de novas opções de
ensino-aprendizagem baseadas neste enfoque.
De acordo com o Relatório de Atividades do projeto, entregue ao Programa Novos Talentos, de
dezembro de 2011, no que diz respeito aos impactos positivos das ações/atividades do projeto relacionados à
dinâmica de formação de professores, pode-se destacar a formação de uma representação ampliada e melhor
fundamentada: (i) da complexidade envolvida no agravamento da crise socioambiental em escala global; (ii)
da relevância, neste cenário, do papel dos pesquisadores-educadores operando em coletivos
transdisciplinares; e (iii) da necessidade de uma transformação paradigmática dos enfoques educacionais
dominantes face aos desafios historicamente inéditos desvelados pelo agravamento da crise, e face à
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urgência de se levar em conta os seus reflexos no nível das dinâmicas em curso de desenvolvimento
local/territorial. Além disso, foi possível constar um processo expressivo de maturação do grupo-alvo não
só em termos de capacitação profissional, mas também de resignificação criativa de posturas existenciais.
Do nosso ponto de vista, passamos a dispor assim de um horizonte especialmente favorável tendo em vista a
busca de continuidade do projeto. Quanto aos impactos gerados no nível do sistema de educação básica, vale
a pena registrar o desenvolvimento de um trabalho concentrado inicialmente na reciclagem dos educadores,
mas que considera a interação com os alunos como a próxima meta a ser alcançada.
E no que diz respeito às licenciaturas envolvidas, o Relatório salienta o esforço investido na criação
de espaços favoráveis ao cultivo do diálogo de saberes em comunidades de aprendizagem, considerado
como um pressuposto básico para uma articulação eficiente entre teoria e prática na busca de reorientação
estratégica de processos de ensino-aprendizagem à luz dos princípios de ecodesenvolvimento. Por sua vez,
no nível da pós-graduação, destaca o esforço investido na preparação de material didático-pedagógico
ajustado a um enfoque de integração transdisciplinar, bem como a oportunidade de envolvimento dos
estudantes com um estilo de inovador de extensão universitária que leva em conta a formação de
comunidades de aprendizagem num horizonte de longo prazo.
3. Considerações finais
Na medida em que estudantes de graduação e pós-graduação, vinculados a diferentes áreas de
especialização científica, trabalham juntos na concepção de metas e estratégias do projeto desenvolvido pelo
NMD/UFSC, destaca-se a relevância de uma experiência de construção coletiva da incipiente linha de
pesquisa sobre antropoformação transdisciplinar que, atualmente, permanece marginal na dinâmica de
atuação das instituições de ensino superior do País, conforme mencionado anteriormente.
Esta constatação foi alcançada, essencialmente, durante a execução do Projeto Experimental de
Educação para o Ecodesenvolvimento na Zona Costeira Catarinense. O processo de condução do projeto
está em estágio inicial, com a formação e capacitação de professores de escolas públicas de educação básica
que atendem a comunidade de Ibiraquera.
Porém, essa aproximação do núcleo pesquisa junto à realidade das escolas públicas de Ensino
Básico, apresentando uma proposta de mudanças no âmbito escolar e comunitário, revelou limitações tanto
estruturais quanto paradigmáticas da universidade entorno da fragmentação do tripé ensino-pesquisa-
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extensão, da prática educacional reducionista e da cultura produtivista hegemônica nos programas de pós-
graduação – tudo isso respaldado por órgãos de fomento à pesquisa.
As limitações estruturais estão essencialmente relacionadas: (i) à tímida contrapartida dos recursos
logísticos disponibilizados à comunidade em geral em períodos limitados; (ii) ao excesso de burocracia para
utilizar os serviços disponibilizados por projetos de extensão devidamente aprovados pela própria
universidade; (iii) à escassa quantidade de bolsas de estudo associadas às práticas de extensão, além de
serem destinadas apenas aos alunos de graduação – o que contribui para o envolvimento de discentes de um
nível de formação acadêmica em projetos de pesquisa-ação; e (iv) à restrição burocrática dos projetos de
extensão serem coordenados apenas por professores em exercício na graduação.
Essas limitações estruturais estão associadas ao paradigma reducionista e fragmentado de processo
formativo e do papel da universidade frente aos desafios socioecológicos atuais. Apesar das tentativas bem
intencionadas de investimento em projetos voltados para o desenvolvimento social e cultural das
comunidades em torno da universidade, ainda insiste a dissociação setorial entre o ensino, a pesquisa e a
extensão. A maior parte dos cursos de graduação e de pós-graduação não contempla em suas propostas
curriculares de ensino a participação dos discentes em projetos de pesquisa-ação como metodologia voltada
para a formação e desenvolvimento integral dos mesmos – um acadêmico pode sair da universidade sem ter
qualquer tipo de envolvimento com projetos de extensão. Relacionado a isso, o corpo docente universitário
também não tem o mesmo compromisso com ações extensionistas assim como tem com o ensino e a
pesquisa. A valorização curricular, acadêmica, é evidentemente desigual, além de desarticulada.
O mesmo “fenômeno” ocorre entre a pesquisa e a extensão, expresso mais claramente nos cursos de
pós-graduação. Projetos que envolvem pesquisa-ação são negligenciados como propostas de trabalhos de
conclusão de curso, dissertações e teses. O pouco incentivo e as limitações conjunturais entorno da
participação dos graduandos e pós-graduandos em projetos de pesquisa-ação nos leva a crer que o papel
social da universidade está estritamente voltado para o mercado.
Atualmente, o coletivo do NMD vem se preparando para assumir a continuidade do Projeto
Experimental de Educação para o Ecodesenvolvimento na Zona Costeira Catarinense nas escolas,
retomando as atividades na E.E.B. Visconde do Rio Branco e se inserido em outras escolas da mesma
localidade. O ano de 2013 foi destinado, pelo coletivo, ao processo de capacitação interna e na busca
incessante por recursos financeiros, tendo em vista que os órgãos de fomento à pesquisa que incentivam a
aproximação da universidade à comunidade não reconhecem em seus editais a necessidade de investimento
na continuidade dessa relação para vislumbrar outro estilo de desenvolvimento e de formação de sujeitos.
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Neste sentido, não podemos ignorar que a universidade e os órgãos de fomento à pesquisa são
instituições que constitui um sistema socio-político-econômico à disposição da lógica capitalista e da
manutenção do status quo. Porém, também não podemos ignorar que a mesma universidade é um espaço
passível de mudanças e que sua capacidade de reafirmar paradigmas que reduzem o processo formativo a
processo formatativo pode ser superada através de propostas sérias de pesquisa-ação-formação
transdisciplinares.
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