PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE E DIDÁTICA: UMA QUESTÃO … · política pública educacional pode...
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PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE E DIDÁTICA: UMA QUESTÃO PARA
AS POLÍTICAS PÚBLICAS?
Ao longo da história da humanidade a educação tornou-se indispensável e passou por
diferentes configurações conforme o contexto e a cultura em que foi sendo construída.
Por ser uma prática eminentemente humana, precisa acompanhar a evolução dos
sujeitos, os quais são constituídos por ela e ao mesmo tempo constituidores dela.
Entendida como uma ação intencional e política, a educação escolar assume a formação
pessoal e profissional e garante, a cada geração, além da apropriação dos objetos
cognitivos e culturais, a criação de novos conhecimentos e a modificação dos aspectos
culturais da sociedade. Para isso, é imprescindível a formação inicial e continuada dos
professores para todos os níveis e modalidades da educação formal; tema que ocupa as
pautas das políticas públicas e dos espaços acadêmicos. Primeiramente, o texto “A
DIDÁTICA NAS LICENCIATURAS E A PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE” fala
sobre as políticas públicas educacionais e as disciplinas pedagógicas, especialmente a
didática, no currículo da formação profissional do professor e a importância da
construção do trabalho docente reflexivo-crítico. O segundo texto,
“DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE NA EDUCAÇÃO
SUPERIOR”, aborda a integração curricular a partir de uma pesquisa-ação realizada
com professores e acadêmicos de um curso de licenciatura, tema decorrente da prática
profissional integrada, cujos referenciais foram amplamente analisados, auxiliando na
compreensão da relação teoria e prática em integração. Por fim, o texto “FORMAÇÃO
DOCENTE HUMANIZADORA: REGISTROS DE UM PROJETO DE EXTENSÃO À
LUZ DO PENSAMENTO FREIREANO” relata as reflexões realizadas acerca de um
projeto de extensão, cuja formação de professores, na perspectiva freireana, ressalta a
boniteza de sua obra e a contribuição dela para a educação, evidenciando a valorização
dos sujeitos nesse processo.
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A DIDÁTICA NAS LICENCIATURAS E A PROFISSIONALIZAÇÃO
DOCENTE
Luisa Cadorim Facenda
Universidade de Passo Fundo - UPF
Márcia Adriana Rosmann
IF Farroupilha – Campus Santo Augusto
Resumo: A prática docente nas licenciaturas vem enfrentando uma série de questões
que afetam diretamente o professor, especialmente o professor das disciplinas da área
pedagógica, nos cursos de licenciatura, respingando, muitas vezes, de forma negativa na
formação dos professores da educação básica. Entre tantas, podemos destacar o
engessamento dos cursos por ordem das políticas públicas e a sobrecarga de trabalho do
professor, em todos os níveis e modalidades de ensino, da educação infantil ao ensino
superior, exceto nas Instituições Federais, onde o professor atua quarenta horas com
dedicação exclusiva, aliviando um pouco sua carga horária. Nesse sentido,
especialmente ao se tratar de professores formadores, permanece a dificuldade em
conciliar o processamento do tripé ensino, pesquisa e extensão, pelo motivo de que os
requisitos impostos pelo próprio sistema de avaliação brasileiro imprimem numerosos
anseios em prol da melhoria nos resultados. Políticas públicas e educação é um tema
que vem sendo cada vez mais abordado nas pautas acadêmicas e governamentais, além
de preocupar a comunidade da escola básica, principalmente aos pais e aos alunos. Este
artigo, no entanto, vai abordar essas questões com maior profundidade, dando ênfase à
importância da disciplina de Didática, à profissionalização e ao trabalho docente, que
diante das inúmeras modificações sociais, culturais e econômicas, decorrentes do
avanço da ciência e da tecnologia, sobretudo com o advento da internet, precisam ser
tomados e realizados com muita responsabilidade e conhecimento, sem, no entanto,
esgotar as temáticas descritas. Vale destacar que as reflexões a seguir, são oriundas dos
encontros de um grupo de pesquisa, envolvendo docentes e de acadêmicos dos cursos
de licenciaturas de duas instituições, uma pública e uma particular/comunitária, dos seus
estudos e das suas práticas.
Palavras-chave: Licenciatura. Didática. Trabalho Docente.
1 Questões introdutórias: políticas públicas e educação
Ao considerar a questão legal e política da educação, a docência, e
principalmente a formação docente, que constitui tema relevante em diferentes países, o
presente artigo propõe-se discutir a prática pedagógica nas licenciaturas - e a partir dela
a profissionalização docente - no que tange a dimensão das disciplinas pedagógicas,
especialmente da disciplina de Didática. Assim, iniciamos o texto trazendo alguns
conceitos fundamentais sobre políticas públicas para que possamos entender o debate e
o embate delas na educação, mais especificamente sobre a profissionalização docente.
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Antes, porém, e de acordo com estudos realizados por Caimi (2004, p. 83-97),
vale destacar a exposição em períodos, a partir dos anos de 1930, sob a perspectiva de
diferentes concepções, presentes nas políticas públicas para a formação docente, a
saber: “1930-1950: a noção de prática como imitação; 1960-1970: a prática concebida
como treinamento; 1980: o esforço pela indissociabilidade entre teoria e prática; 1990: a
formação do professor como profissional reflexivo e a prática como ponto de partida e
de chegada”. Apoiadas em diferentes propostas e referenciais teóricos, foram ao longo
das últimas décadas, ainda que a passos lentos, acompanhando o desenvolvimento e a
evolução da sociedade.
Políticas públicas é sempre um tema atual na comunidade acadêmica e na
sociedade civil como um todo. Historicamente as políticas públicas para as licenciaturas
são elaboradas longe da realidade, tanto da docência acadêmica quanto da prática
pedagógica na educação básica, o que nem sempre reflete de forma positiva nessa etapa,
campo profissional dos licenciados. Analisando de forma positiva, as políticas
específicas sobre os currículos das licenciaturas estão cada vez melhores elaboradas,
considerando as diversidades e adversidades que caracterizam a sociedade atual.
Políticas públicas “[...] são programas de ação governamental visando a
coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização de
objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados”. Assim, entendemos
que elas regulamentam e ao mesmo tempo regulam os currículos dos cursos de
licenciatura, por exemplo, pois, “[...] políticas públicas são implementadas por atores
políticos através de instituições públicas, em geral [...] estatais” (BUCCI, 2002, p. 241).
Para Abreu (1993, p. 5), as políticas públicas para a educação, são uma fração
(ou esfera) da política pública. A primeira referência quando se fala em políticas
públicas remete a “uma decisão ou de medidas políticas implementadas pelos aparelhos
estatais ou agências governamentais”, isto porque políticas públicas estão ligadas à
função reguladora do Estado, exercida basicamente no final do século XIX e início do
século XX, e cristalizada pelo senso comum que entende o Estado como um “Grande
Pai”. Nesse sentido, ao definir política educacional, é preciso ter o seguinte cuidado:
A política educacional também não pode receber uma definição terminal.
Como processo, ela se revela em cada época histórica, em cada contexto, em
cada momento dado da organização dos seres humanos em uma ou várias
formas concomitantes da ação humana, com uma dinâmica, uma força motora
própria, que a impulsiona e dita sua relação com as demais esferas do mundo
social (MARTINS, 1993, p. 08).
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Em amplos traços, pode-se caracterizar políticas públicas para área da educação
os programas governamentais (a relação de forças político-partidárias e de grupos
sociais no seio de projetos educativos mais amplos); a continuidade e continuísmo de
propostas; aportes em fenômenos como globalização e neoliberalismo, bem como suas
consequências no campo educacional. Nas escolas emergem aspectos como raça,
gênero, novas formas de comunicação, cultura jovem, violência, exclusão social e os
professores nem sempre estão preparados para fazer o enfrentamento. No entanto, pode-
se contar com políticas que dão aporte teórico-prático, tanto à formação de professores
(inicial e continuada) para atuar com tais temáticas, quanto para que as escolas possam
promover outras atividades envolvendo-as. (WITTMANN; GRACINDO, 2001, p. 11).
Uma política educacional é composta por “determinantes concretos”: medidas,
atos, ações articuladas que mudam as configurações do que já vinha sendo feito - como
alterações no elenco dos conteúdos por série em determinadas disciplinas, projetos de
amplo alcance, avaliações externas, etc. (MARTINS, 1993, p. 09). As intenções, por sua
vez, são indicativos de um projeto social ou político, manifestado, a priori, por uma
determinada ação. O referido plano político, ou plano de governo “define-se no interior
de uma proposta que, se majoritária eleitoralmente, deverá transformar-se em política
pública, porque não basta a aprovação eleitoral de propostas para que a população
assuma como suas as necessidades sociais e as soluções advogadas por planos
governamentais” (COLLARES; MOYSÉS; GERALDI, 1999, p. 214). Logo, uma
política pública educacional pode até ser (ou vir de) um plano de governo, porém, nem
todos os planos de governo tornam-se, de fato, uma política pública educacional.
Há pouca prioridade de investimentos para as licenciaturas (FREITAS, 2005) e
as políticas existentes são de caráter compensatório para atender à demanda desenfreada
de formação de professores em massa, com custos reduzidos e com comprometimento
da qualidade de formação. Nestas condições os cursos de licenciatura já existentes
também se encontram num contexto de resistência cujas ações são gestadas nas próprias
condições de trabalho sendo que delas emergem novas possibilidades de organizações
coletivas. Talvez a legislação não seja a única a determinar regras que se sedimentam
em ideias que parecem ser inquestionáveis, mas a ela acaba influenciando as atitudes de
profissionais da educação.
As pesquisas de Silva et al. (2006) mostram que o espaço-tempo da formação e
do trabalho docente está diretamente afetado pelo atual contexto político neoliberal. O
sistema vigente, tanto pelas políticas públicas como pelo modelo comportamental da
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sociedade, produz efeitos prejudiciais à saúde e ao ambiente escolar. As condições
infraestruturais de atuação docente são inadequadas e insuficientes e o parco resultado
produzido pelo seu trabalho, ligeiramente demonstrado pelas avaliações internas e
externas, têm causado insatisfação, pessoal e social. Além disso, e especialmente aos
professores formadores, permanece a dificuldade em conciliar o processamento do tripé
ensino, pesquisa e extensão, por ter de destinar maior atenção à pesquisa, ao considerar
os requisitos impostos pelo próprio sistema, pela Coordenação de aperfeiçoamento de
pessoal de nível superior - Capes, por exemplo.
O reconhecimento de que as universidades e as demais instituições de ensino
superior precisam repensar seu atual modelo de formação de professores e buscar uma
nova cultura institucional das licenciaturas. Essa noção de nova cultura institucional dos
cursos de formação de professores deve ser entendida como a capacidade de as
universidades, especialmente as públicas, responderem, de maneira qualitativa, aos
desafios propostos pela nova conjuntura política e socioeconômica brasileira. Assim,
cabe às universidades públicas e privadas, assumir o desafio e o compromisso social de
formar, de maneira diferenciada, profissionais da educação capazes de atuar como
agentes de mudança na escola básica, no Brasil.
2 O currículo nas licenciaturas e as disciplinas da área pedagógica
A partir de 1980 a educação básica passou por diversas e significativas
mudanças. Inúmeras políticas forma elaboradas e implementadas, com vistas a melhoria
da qualidade do ensino e da aprendizagem. A universalização do ensino fundamental, os
investimentos para sua qualificação e que passou a ter matrícula obrigatória; o aumento
da oferta de matrículas para o ensino médio e para a educação infantil na rede pública de
ensino; o estabelecimento de diretrizes curriculares nacionais para a educação básica, as
quais consolidaram importantes características dos debates nacional e internacional
sobre a educação, nos remete a pensar e construir a formação de professores com
dinâmicas que o tempo atual exige e com grandes responsabilidades.
Logo, a superação da fragmentação do currículo das licenciaturas, por meio da
integração da prática educativa aos componentes curriculares é um dos principais
aspectos recomendado pelas Diretrizes Curriculares Nacionais, e vai ao encontro das
políticas da educação básica. Entende-se que a intenção da legislação vigente é a de que
as IES busquem melhorar a profissionalização docente no sentido de articular os
conteúdos específicos das licenciaturas com as metodologias apropriadas, desde o
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momento em que o acadêmico entra na Instituição. É preciso que as disciplinas teóricas
e práticas sejam desenvolvidas de forma articulada, no decorrer de todo o curso.
Nenhum professor consegue criar, planejar, realizar, gerir e avaliar situações
didáticas eficazes para a aprendizagem e para o desenvolvimento dos alunos
se ele não compreender, com razoável profundidade e com a necessária
adequação à situação escolar, os conteúdos das áreas do conhecimento que
serão objeto de sua atuação didática, os contextos em que se inscrevem e as
temáticas transversais ao currículo escolar (Brasil, 2001, p. 20).
Diante disso, é imprescindível a utilização de metodologias que estimulem a
observação, a criatividade e a reflexão, evitando a apresentação de soluções prontas e
buscando atividades que desenvolvam habilidades necessárias para solução de
problemas. Nesse momento entra em cena a Didática do professor da disciplina de
Didática. Outro fator importante a ser considerado, para a formação de professores, é a
história da educação sempre relacionada aos aspectos atuais, sem ficar estanque, um
conhecimento vago, apenas história. Aos acadêmicos devem ser apresentados novos
desafios, para que busquem retratar a realidade a ser enfrentada como sujeito e como
profissional, no exercício da docência.
A concepção do currículo dos cursos de licenciatura precisa considerar a
premissa da articulação entre a formação acadêmica e o mundo do trabalho. Essa
articulação decorre dos conhecimentos que devem ser construídos nas diferentes
disciplinas e na prática real de trabalho do acadêmico: a sala de aula da educação básica.
Além disso, proporcionar a flexibilização curricular e a ampliação do diálogo entre as
diferentes áreas de formação. A interdisciplinaridade e o raciocínio crítico devem ser
construídos pelo uso de técnicas metodológicas que tragam a realidade educacional à
sala de aula acadêmica, proporcionando reflexão, discussão e avaliação, para a
construção das disciplinas e consequentemente da profissionalização docente.
A pesquisa articulada ao ensino das disciplinas pedagógicas é uma importante
ferramenta nos cursos de formação de professores, especialmente porque o ensino é
uma tarefa complexa, especificamente humana. Nesse sentido, Pimenta e Anastasiou
afirmam que:
[...] é preciso considerar a importância dos saberes das áreas de
conhecimento (ninguém ensina o que não sabe), dos saberes
pedagógicos (pois o ensinar é uma prática educativa que tem
diferentes e diversas direções de sentido na formação do humano),
dos saberes didáticos (que tratam da articulação da teoria da educação
e da teoria de ensino para ensinar nas situações contextualizadas), dos
saberes da experiência do sujeito professor (que dizem do modo como
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nos apropriamos do ser professor em nossa vida). (PIMENTA;
ANASTASIOU, 2002, p. 70).
Desse modo, considera-se que as práticas cotidianas contribuem para que os
saberes acerca do ensinar sejam revisitados, redirecionados e transformados, o que torna
a pesquisa um núcleo fundante na ressignificação do trabalho docente nos cursos de
licenciatura e no processo de quem está em formação, cuja profissionalização se faz a
partir do “pesquisar o que ensinar”, nas licenciaturas pelos formadores de professores e
na educação básica pelo acadêmico licenciado.
Acerca dessa premissa, considerada por (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p.
189) como uma “nova tendência”, e que valoriza a pesquisa no processo de ensino e
aprendizagem, pois é sabido que o ensino requer o domínio de métodos pelo docente,
podemos dizer que a docência das disciplinas pedagógicas, especialmente da Didática,
exige responsabilidade metódica e científica. A primeira consiste em delinear a prática
pela prática docente, e a segunda consiste no despertar dos conhecimentos necessários
para a própria docência de cada disciplina.
É importante, ainda, ressaltarmos que a prática é aqui entendida como ação
intencional, ou seja, é a ação pretendida institucionalmente com o processo educativo. A
cientificidade ilumina o trabalho docente e oferece, portanto, “instrumentos e esquemas
para análise e investigação, que permitem investigar as práticas e ao mesmo tempo pôr
as teorias em questionamento, uma vez que são explicações sempre provisórias da
realidade” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 179).
Diante disso, voltamos à discussão sobre a importância da pesquisa no ensino e
da aprendizagem com pesquisa. A formação docente nestes termos, e diante da
legislação vigente e das mudanças sociais, econômicas e culturais, provocadas pelo
desenvolvimento da ciência e da tecnologia, tem provocado docentes e acadêmicos a
investirem cada vez mais no conhecimento científico da sua área e a investigarem suas
próprias práticas a luz das teorias educacionais, especialmente da Didática. Autores
como Schön (1992), Sacristán (1992), Contreras (1997), Pimenta (2001), Freire (2011),
entre outros tem denominado essa tendência investigativa “epistemologia da prática” ou
“epistemologia da práxis”. Retomaremos essa questão no terceiro tópico.
É preciso, então, a formação de um profissional que tenha vivências na escola
básica, desde a infância, com a adolescência e jovens/adultos, e conheça seu cotidiano,
suas construções, sua realidade. É interessante conceber um profissional que, ao assumir
seu trabalho com alunos adolescentes, por exemplo, possa compreender questões da
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infância e da fase adulta, pois, apesar de agir em um momento específico da
escolarização, essa etapa faz parte de um conjunto maior: a educação básica.
2.1 A disciplina de Didática em questão
A educação, em sua amplitude, é um processo inerente à sociedade humana, no
entanto, algumas instituições assumiram a responsabilidade de desenvolvê-la
intencionalmente, com objetivos e finalidades, que são: os sistemas educativos que
envolvem as escolas e seus desdobramentos em órgãos dos sistemas de ensino, em
instituições de formação de profissionais, de pesquisa (PIMENTA; ANASTASIOU,
2002, p. 64). Libâneo (1991) apresenta a ideia da presença do pedagógico na sociedade
como um todo, ao reconhecer a presença de ações pedagógicas que extrapolam a
educação formal e não formal.
Quando falamos nas origens do campo da Didática moderna, seu histórico,
concepções e abordagens, não podemos deixar de citar João Amós Comênio (1592-
1670). Pensador tcheco, considerado o “pai da didática moderna”, e também da moderna
história da educação, dedicou sua vida à construção da Didáctica Magna, cuja obra
deveria expandir-se ao máximo possível, levando o conhecimento de “tudo para todos”
e respeitando a inteligência, aptidões, sentimentos e limites das crianças. Desse modo,
podemos considerar que a partir da grande obra:
[...] o pensador realiza uma racionalização de todas as ações educativas, indo
da teoria didática até as questões do cotidiano da sala de aula. A prática
escolar, para ele, deveria imitar os processos da natureza. Nas relações entre
professor e aluno, seriam consideradas as possibilidades e os interesses da
criança. O professor passaria a ser visto como um profissional, não um
missionário, e seria bem remunerado por isso. E a organização do tempo e do
currículo levaria em conta os limites do corpo e a necessidade, tanto dos
alunos quanto dos professores, de ter outras atividades. (FERRARI, 2016, p.
1/4).
Para além de uma disciplina técnica, a Didática vem sendo objeto teórico de
grande reflexão. Assim, ela contribui para mudar o pensamento do professor e a ter
cumplicidade com a escola, pois ele nunca deixa de ser importante na sala de aula, é
aquele que ajuda os alunos. Mesmo em tempos de grandes avanços científicos e
tecnológicos, de mídias importantes como a internet, o trabalho docente é fator relevante
para o desenvolvimento da educação formal. Na prática pedagógica atual o processo de
planejamento da educação escolar tem sido alvo de constante indagação. A Didática,
enquanto teoria do ensino, possibilita ao professor esses momentos que são cruciais ao
desenvolvimento de uma educação qualitativa.
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Ao extrapolar a simples a elaboração de um plano de ensino e de aula, o
professor demonstra seu cuidado e compromisso, assumidos a partir da sua
profissionalização, em dar sua matéria com direcionamento para alcançar as finalidades
da educação, prescritas nas políticas públicas e ensejadas pela sociedade, e
concretização dos princípios firmados no projeto pedagógico da escola, além do
desenvolvimento do saber pessoal e profissional de cada aluno.
Desta forma, a prática pedagógica crítica se traduz por um trabalho realizado
pelo professor e pelo aluno, atuando de acordo com um objetivo comum.
Implica na presença do sujeito crítico, capaz de desenvolver uma prática
pedagógica que procura, de um lado, superar a relação pedagógica
autoritária, paternalista e, de outro, busca uma ação recíproca entre professor
e aluno (VEIGA, 2011, p. 22).
E para ser um bom professor, reconhecido profissionalmente por seus saberes e
sua identidade, é preciso ter autonomia, se atualizar, fazer uso das ferramentas
disponíveis e sempre buscar informações novas (desenvolver autonomia e curiosidade
científicas). Selecionar os conteúdos (não aceitá-los como conhecimentos prontos e
acabados), saber o tom da linguagem que vai utilizar e refletir criticamente sobre cada
aula desenvolvida. Observar o sistema organizacional da escola e de cada professor,
analisar o currículo da escola para organizar o planejamento, e por fim, mas não menos
importante, saber avaliar o ensino e a aprendizagem, de si e dos alunos.
3 Profissionalização e trabalho docente em questão
O que identifica um professor como profissional da educação? O professor
torna-se profissional quando requer maior qualificação. (PIMENTA; ANASTASIOU,
2002). Para além da formação inicial, realizada em cursos de licenciatura, a
profissionalização docente importa a formação continuada, especialmente aquela
realizada em serviço, onde a escola se torna o principal e o mais importante contexto
para tal. (ANTÓNIO NÓVOA, 1992/1995). Assim ocorre, além da valorização do
trabalho docente, a construção e o fortalecimento da identidade desse profissional, tão
frágil em tempos de grandes instabilidades na sociedade.
A profissionalização, por ser permanente, é processual. Ganha força e
credibilidade quando valoriza o coletivo, cuja intencionalidade e envolvimento político
do professor são constantes. “O processo de profissionalização assim configurado
possibilita a busca de pistas e indícios individuais e coletivos, num posicionamento
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investigativo, que pode ir envolvendo o coletivo e ir se „alastrando‟ nas instituições”
(PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 116).
O espaço-tempo do curso de licenciatura, princípio da profissionalização, é
imprescindível para a apropriação dos saberes da área de formação, inerentes à condição
da docência em todos os níveis e modalidades de ensino. A tomada de consciência
reflexiva sobre a prática, a predisposição para mudanças e o enfrentamento da realidade
educacional são fatores imprescindíveis a esse processo. Não raro, a profissionalização
docente requer atitude e bom senso.
Nesse processo é necessário dar voz ao professor, presenciar a subjetividade
e a singularidade como elementos distintos, possibilitar a interação dos
diferentes sujeitos no processo, ouvir as dúvidas, os pares, lidar com os
confrontos, estabelecer o diálogo de cada um consigo mesmo e entre os
sujeitos do processo educativo, analisar o contexto social, compreender
determinantes da historicidade, dar espaço para as surpresas, os sustos, as
constatações. (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 116).
A profissão de professor é dotada de um caráter dinâmico, uma prática social
complexa, modificadora do pensar e agir dos sujeitos. Diante do enfrentamento e da
análise crítica da realidade, confrontada com a teoria, é que a profissão se constrói e se
modifica, com base em sua história de vida, cultura e saberes. “A profissão de professor
emerge em um dado contexto e momento histórico, tomando contornos conforme
necessidades apresentadas pela sociedade, e constrói-se com base nos significados
sociais que lhe são dados” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 189). Embora o
prestígio social profissional dele anda pouco elevado, essa mesma sociedade requer uma
profissionalização a altura das suas modificações, com estabilidade e dinamismo
necessários ao espaço-tempo atual.
É notório que uma forma de construir e manter essas características profissionais
é o investimento que se faz, o professor e o Estado, em formação continuada. O
fortalecimento de sua identidade profissional - e também pessoal, dado seu prestígio
pouco elevado - ocorre, principalmente, a a partir das reflexões realizadas acerca da sua
prática pedagógica, cuja feitura não deve distanciar-se da realidade concreta da escola e
dos aspectos sociais, culturais e econômicos que a circundam. “A identidade não é um
dado imutável nem extremo, mas se dá em processo, na construção do sujeito
historicamente contextualizado” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 189). O ideal,
ainda, é que tais reflexões ocorram no coletivo escolar.
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As ações reflexivas decorrentes da prática pedagógica, por assumirem caráter
teórico, são a base para a efetivação da formação continuada. É importante compreender
que “a teoria e a prática não existem isoladas, uma não existe sem a outra, mas
encontram-se em indissolúvel unidade. Uma depende da outra e exercem uma influência
mútua, não uma depois da outra, mas uma e outra ao mesmo tempo” (VEIGA, 2011, p.
18). A disciplina de Didática, por ser de natureza teórico-prática, possibilita a inserção
do acadêmico, e depois dele já professor, nessa logística tendência denominada por
Schön (1992), e outros autores, de “epistemologia da prática docente”, ou ainda,
“epistemologia da práxis”, ocupando, inclusive, grande parte da pauta dos debates
educacionais, especialmente no que tange a formação inicial e continuada dos
professores.
Nesse movimento é importante clarear que “refletir”, não se trata apenas de uma
ação do profissional docente, mas é um importante e indispensável conceito de sua
profissionalização. Por conta da cultura que caracteriza o ser humano, e por caracterizá-
lo a partir de determinados contextos, ele é reflexivo por natureza. Porém, a
reflexividade é manifestada em diferentes graus ou níveis, podendo ou não ocasionar
mudanças no seu ser, dependendo da intencionalidade e historicidade do seu pensar e
fazer, que, aliás, é um processo contínuo, duradouro e permanente (GHEDIN, 2010, p.
129).
A compreensão da tendência reflexiva, enquanto conceito de “professor
reflexivo” e sua execução teórico-prática, se transforma em um conhecimento resultante
da ação, por esta estar embebida de teoria, e, isso reforça a tese de unidade da teoria e
da prática. Esse “movimento intelectual do professor deve conduzi-lo à autonomia
emancipadora da crítica”. Quando a “epistemologia da prática” ou a “epistemologia da
práxis” for uma constante no trabalho docente, sua profissionalização se efetiva de fato,
pois ele passa a dar “sentido e significado ao seu ser e fazer pedagógico num dado
contexto histórico” (GHEDIN, 2010, p. 129-130). É importante ressaltar que todo esse
movimento não ocorre solitário, mas se constrói no coletivo, e mais, levando em
consideração toda a comunidade escolar.
Considerações: perspectivas e possibilidades em Didática
As mudanças da e na sociedade, decorrentes especialmente a partir do
desenvolvimento científico e tecnológico; as novas exigências para o campo de trabalho
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e de perfil docente e os desafios para a educação neste século nos remetem ao
pensamento e à efetivação da formação docente como aliada para a melhoria da
qualidade da educação. Além disso, pensar e desenvolvê-la em uma perspectiva
educacional humanizadora fortalece a ideia da construção de uma sociedade mais
consciente e humanamente mais solidária.
Entendemos que se o curso de formação de professores estiver dirigido por
e para uma prática pedagógica crítica, que reflete sobre suas próprias ações, com vistas
às transformações sociais necessárias, possibilitará, então, ao professor maior segurança
para lidar com as relações pessoais e pedagógicas que ocorrem na sala de aula e na
escola de um modo em geral. Se professores formadores e acadêmicos - e esses, depois,
com seus alunos relacionarem seus conhecimentos, com aqueles já construídos pela
humanidade, poderão melhorar os já existentes e construir novos, e assim, “estariam de
fato consolidando seu poder de contribuir para a transformação da sociedade” e
construindo a humanidade no ser.
Currículos bem estruturados, construídos no coletivo escolar e comunitário,
visionários das diversidades sociais, econômicas e culturais, com objetivos e finalidades
em acordo com os novos moldes do mundo do trabalho, e o trabalho docente realizado
de modo crítico e construtivo, só trarão resultados muito positivos à educação. Logo, e
diante de tudo isso, e a partir da efetivação da “epistemologia da prática”, cuja
profissionalização docente fortalece seus saberes e sua identidade, o planejamento de
ensino e de aprendizagem do professor tornar-se-á uma ação essencial, intencional e
comprometida com a qualificação da educação em todos os níveis e modalidades.
REFERÊNCIAS
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democrático. Revista Proposta, no. 59 – dezembro / 1993, Rio de Janeiro: FASE, 1993.
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Gestão da Educação (1991-1997). Brasília/DF: Mec/Inep/Comped, 2001.
_____________________________________ 1 Registramos o agradecimento às pessoas ligadas à Coordenação de Ações Inclusivas da Reitoria do
Instituto Federal Farroupilha pelo trabalho de prover acessibilidade aos livros solicitados.
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1 Disponível em <https://moodle.org>. Acesso em dez. 2015.
1 Para esse estudo utilizamos um Ambiente Virtual de Ensino e Aprendizagem e Correio eletrônico para
potencializar as interações. 1 MOODLE é o acrônimo de "Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment" - sistema
modular de ensino a distância orientado a objetos. Ou ainda, um Sistema de Gerenciamento de
Aprendizagem em trabalho colaborativo (SGA), disponível para download em: http://www.moodle.org. 1 “Lançado em 2007, o sistema Rede e-Tec Brasil visa à oferta de educação profissional e tecnológica a
distância e tem o propósito de ampliar e democratizar o acesso a cursos técnicos de nível médio, públicos
e gratuitos, em regime de colaboração entre União, estados, Distrito Federal e municípios”. Acessado em:
portal.mec.gov.br. 1 Além de pesquisador faço parte do grupo de professores do curso de LC, o que demarca ainda mais a
dinâmica de pesquisa-ação. 1 Resolução CNE/CP n. 02/2002 estabelece a carga horária dos cursos de Licenciatura e define que essa
prática deve possuir um total de 400 horas distribuídas ao longo do curso. 1 Os textos estão listados na Figura 1. A análise das discussões realizadas nesses encontros não é intenção
neste artigo. 1 Posterior a apresentação do texto no evento e os diálogos estabelecidos, um professor me abordou
questionou: Trabalho em uma instituição que a maioria dos professores estão sobrecarregados com aulas.
Todo mundo sempre está ocupado fazendo alguma coisa. Nesse caso, é possível desenvolver essa
proposta? Em que momento?” Respondi que se trata de uma exigência que precisamos fazer para que seja
reservado tempo para esses estudos em nossas instituições. Caso contrário, deixamos de lado nossa
principal ferramenta de trabalho, a reflexão fundamentada. 1 Importante ressaltar, mais uma vez, que o DPDLiC não se trata apenas do Habitat Digital e sim
contempla toda a proposta de estudos e os encontros presenciais. 1 No livro intitulado “Estágio Curricular Obrigatório e Prática como Componente Curricular: que prática
é essa?” de Vera Rejane Coelho e Marilane Maria Wolf Paim e no artigo intitulado “A prática como
componente curricular na formação de professores” de Júlio Emilio Diniz-Pereira, encontramos uma
reflexão acerca dos distanciamentos e aproximações entre essas práticas. 1 “Chamamos de internalização a reconstrução interna de uma operação externa” (VIGOSTKI,
2003, p. 74).
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DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE NA EDUCAÇÃO
SUPERIOR
Adão Caron Cambraia
IF Farroupilha - Campus Santo Augusto
Maristela Stolz Brizzi
Universidade Regional do Noroeste do RS - UNIJUÍ
Resumo: A dinâmica de integração curricular está direcionada para a sua relação com o
desenvolvimento profissional, particularmente, no contexto do Curso de Licenciatura
em Computação do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha -
Campus Santo Augusto. Para tal, se organizou um grupo de pesquisa-ação para discutir
e refletir sobre a integração curricular desenvolvida no componente curricular de Prática
do Ensino da Computação. Esse espaço foi denominado de Desenvolvimento
Profissional Docente na Licenciatura em Computação (DPDLiC). As interações e
discussões aconteceram em reuniões presenciais e a distância. Essas interações foram
gravadas em áudio e transcritas. As postagens no ambiente virtual também serviram de
material para análise. Este texto é, portanto um recorte dessa pesquisa-ação e está
organizado em dois tópicos. O primeiro, apresenta a organização do Habitat Digital do
DPDLiC – enfatizando o envolvimento dos participantes de forma voluntária, o que
caracteriza um movimento de pesquisa-ação. O segundo tópico, são contribuições sobre
a concepção dos professores referente ao conceito de integração curricular postadas e/ou
discutidas no DPDLiC, que auxiliaram na compreensão das práticas e teorias envolvidas
no movimento e desenvolvimento desse processo. A preocupação deste texto foi
descrever e analisar um primeiro ciclo da pesquisa-ação, a criação do DPDLiC e esforço
para promover um coletivo que compartilha suas preocupações, discussões, descobertas
e criações. Esse ciclo perpassou pelo planejamento, intervenção, observação e reflexão
sobre o DPDLiC. Tratou-se da criação de uma base para permanentes interações entre
os professores da LC. Com o DPDLiC estruturado se espera a continuidade desse
processo. Esse é um espaço que precisa ser exigido pelos professores, pois somos
profissionais da reflexão, profissionais da escrita, seres inacabados em permanente
desenvolvimento.
Palavras-chave: Desenvolvimento Profissional Docente. Licenciatura. Pesquisa-ação.
Introdução
Para entender como se criou e instituiu um processo de Desenvolvimento
Profissional Docente (DPD) no curso de Licenciatura em Computação (LC) do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha (IF Farroupilha) campus Santo
Augusto é que se organizou espaços coletivos com interlocução presencial e a distânciai,
um protótipo que se denominou de Desenvolvimento Profissional Docente na
Licenciatura em Computação (DPDLiC). Com esse espaço em rede, foi possível
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identificar um entrelaçamento de linguagens (oral e escrita) que ocorreu nesse processo
e suas contribuições para esse processo formativo.
Os excertos analisados nesse texto foram retirados do Habitat Digital da
comunidade (WENGER, WHITE, SMITH, 2009) identificados com a sigla “HD” e dos
encontros presenciais, identificados como “PRES”. Trata-se de um estudo para entender
como esse processo interativo proporciona novas formas de comunicação,
compartilhamento de relatos/ideias/argumentos, contribuindo com a constituição de um
professor reflexivo/pesquisador com autonomia para produção do currículo.
Com isso, se constituiu um grupo de pesquisa-ação como ciência educativa
crítica (CARR & KEMMIS, 1988) com vistas a desenvolver estudos, planejamentos,
discussões e ações coletivas pertinentes à realização de uma integração curricular,
potencializando a interlocução entre os sujeitos para entender o que eles sabem e
aprendem nesse processo. Este artigo é um recorte de uma pesquisa de maior
abrangência e está organizado em dois tópicos, o primeiro apresenta a organização do
Habitat Digital do DPDLiC. O segundo tópico, são contribuições sobre a concepção dos
professores referente ao conceito de integração curricular postadas e/ou discutidas no
DPDLiC, que auxiliaram na compreensão das práticas e teorias envolvidas no
movimento e desenvolvimento desse processo.
1 O Habitat digital para o DPDLiC
O DPDLiC foi construído de acordo com as discussões e reflexões do grupo.
Nos primeiros encontros foram discutidos, planejados e pensados os projetos
integradores. Desses encontros, com o incentivo do pesquisador, surgiram as propostas
de criação de um habitat digital para quem desejasse escrever sobre suas práticas. Nos
espaços presenciais também se disponibilizou um tempo para socialização de relatos das
práticas com o intuito de avançar na concretização das atividades de integração
curricular.
Uma das ferramentas utilizadas para criação do Habitat Digital para a
comunidade foi o MOODLEii, pois a maioria dos professores da LC conhecem e
utilizam esse ambiente nas aulas dos cursos da Rede e-Tec Brasiliii
. Além desse
ambiente também se considerou o correio eletrônico institucional (utilizado por todos os
professores) como uma forma de interação que facilitou a partilha das diferentes
concepções sobre a integração curricular. Então, não foi necessário desenvolver
atividades de familiarização e/ou treinamento com o ambiente. A proposta não foi
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forçar o uso da internet, mas proporcionar o compartilhamento de reflexões, opiniões e
concepções sobre a integração curricular na prática docente, potencializando uma
interação entre os sujeitos.
Para isso, se promoveu encontros presenciais (terças-feiras), para organizar e
acompanhar o andamento das atividades, que posteriormente, passaram para as quartas-
feiras (momento destinado para reuniões de professores). Esses encontros são
pertinentes para desenvolver um trabalho mais articulado e que proporcione uma maior
reflexão sobre a prática. Essa demanda é destacada na fala da Professora 6: “Eu acho
que isso de sentar numa terça-feira é um avanço, mas nem todos vão poder estar aqui,
ai darei uma outra ideia, memória dos encontros, onde podemos pensar sobre o que já
se avançou. A gente vai registrar”(PRES), e a professora 7 complementa “podemos
criar um fórum”(PRES). Então, “se todas as primeiras terças feiras do mês ficar
instituído que nós vamos discutir [...], vamos fazer como se fossem grupos de estudos.
Bom, hoje foi socializado um texto; no próximo encontro nós vamos discutir esse texto”
(Professora 7, PRES). Ambas as professoras destacam a importância de se proporcionar
encontros para estudos e reforçam a importância de manter e ampliar o registro de
relatos sobre as práticas docentes. Então, essa dinâmica formativa não foi colocada em
movimento pela obrigação de fazê-la, mas pela necessidade de mudanças percebida pelo
grupo de professores, que conforme Carr e Kemmis (1988) uma condição básica para
que ocorra uma pesquisa-ação é o envolvimento do próprio grupoiv
.
No Habitat Digital se disponibilizou textos estudados nos encontros presenciais,
projetos integradores, memória do trabalho desenvolvido nas turmas e fóruns para
estudos-discussões. Para que os professores se sentissem à vontade no ambiente, se
postou uma mensagem de boas vindas, em que se fez uma exposição dos objetivos do
projeto. Se destacou a importância em construir espaços coletivos para promover o
desenvolvimento da integração curricular e, por conseguinte, o desenvolvimento de
professores. Em outras palavras, se trata de proporcionar um Desenvolvimento
Profissional Docente (DPD) que ocorra de “dentro para fora” - para teorizar sobre a
complexidade da prática docente e torná-la compartilhável -, como Fiorentini e Crecci
(2013) definem o DPD, em que “remete também ao processo ou movimento de
transformação dos sujeitos dentro de um campo profissional específico. Um processo,
portanto, de vir a ser, de transformar-se ao longo do tempo ou a partir de uma ação
formativa” (FIORENTINI, CRECCI, 2013, p. 13).
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O DPD vem sendo defendido na área da educação como essencial à constituição
dos conhecimentos profissionais, pois desenvolvem análises de práticas, que inter-
relacionam formação docente e mudança curricular. Na concepção de Chistopher Day
(2001, p.16), permite uma permanente atualização pedagógica e científica, contribui
para renovar mentalidades. Esse intento ficou expresso na mensagem de recepção dos
professores no Habitat Digital, que serviu para destacar o objetivo da criação do
DPDLiC: “A formação de professores é complexa. A maioria dos desafios que
encontramos em nossa prática não foram e nem poderiam ser abordados ou discutidos
em nossa formação inicial, pois geralmente são casos singulares, característicos da
cultura, do espaço e da turma de alunos que interagimos e desenvolvemos nossas
atividades didático-pedagógicas. O trabalho de integração curricular é um exemplo
disso, pois é algo novo, não possuímos modelos de como proceder, precisamos
construir a nossa caminhada. Este contexto exige a formação de um professor-
pesquisador, o diálogo com o Outro para uma reflexão partilhada, um diálogo com a
teoria para não cairmos em um pragmatismo puro (achar que nossa prática está
correta e seguir sem reflexão). Esse espaço é um convite para que cada professor tenha
a pesquisa como inerente a sua prática docente”.
Com essa mensagem esperamos que cada professor se sinta a vontade nesse
ambiente e sujeito no processo de ensino e aprendizagem, contribuindo na construção
do componente curricular das Práticas do Ensino da Computaçãov (PEC),
compartilhando suas reflexões e assim, enfrentando “os limites do trabalho prescrito
para tornar a tarefa suportável e para realizá-la da melhor maneira possível quando as
prescrições são falhas” (PERRENOUD, 2002, p.11). Trata-se de um espaço coletivo
para permanentes interações, de forma a construir autonomia e superar os desafios que a
sociedade contemporânea impõe, sabendo que “a autonomia e a responsabilidade de um
profissional dependem de uma grande capacidade de refletir em e sobre sua ação”
(PERRENOUD, 2002, p.13).
O acesso ao habitat digital ocorreu antes do primeiro encontro presencial e teve
como finalidade proporcionar um reconhecimento do ambiente e da proposta de
estudos, bem como disponibilizar esse espaço para relatar sobre as atividades
desenvolvidas nas PEC. Também, para se escolher textos e definir os grupos para
discutir, compartilhar e apresentar reflexões. Então, se disponibilizou na biblioteca do
habitat digital textos referentes a cada encontro e também complementares para que
pudéssemos acessar em qualquer momento e de qualquer local. O intuito de selecionar e
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disponibilizar esses materiais foi promover novas discussões sobre a integração
curricular, que é desenvolvida na Licenciatura em Computação através da PEC.
No primeiro encontro presencial, conforme Figura 1, foi apresentada uma
proposta de estudos para apreciação. Assim, nos organizamos em grupos e escolhemos
um texto para apresentarvi
. No habitat digital se disponibilizou um espaço para
compartilhar experiências e discussões sobre a PEC. Também foi possível acessar a
agenda do dia, um fórum para escrever sobre nossas concepções de integração
curricular e a proposta de elaboração de um artigo para compor um livro sobre
experiências com a PEC na LC (entendemos a escrita como uma ferramenta
fundamental para o desenvolvimento profissional docente).
No processo de escrita do artigo, com relato do trabalho desenvolvido, também
se caracterizou como momento formativo no DPDLiC, pois nos possibilitou novas
leituras, escritas, reflexões e compartilhamento das produções. Para tal, se propôs esse
desafio para cada professor ou grupo de professores. Esse convite foi ampliado para
professores de outros cursos de LC do Brasil. Mas, conforme e-mail de um dos
convidados: “as coisas complicaram-se e o mais cedo que eu consigo terminar é no dia
10 de junho, que é feriado e que, depois do fim de semana, me dará um dia inteiro sem
telefones e sem reuniões todas para ontem”. Em um e-mail posterior o professor desiste
de escrever o capítulo, com a justificativa da falta de tempo. O que nos leva a entender,
de acordo com Barroso (2013), que se vive em uma autonomia “meramente
instrumental” em detrimento de uma “autonomia substantiva” (domínio da organização
e do currículo) que permita aos professores serem autores e os alunos e comunidade
participarem da construção de uma instituição pautada em seus interesses e
necessidades. Isso ocorre muito pela sobrecarga de trabalho docente, como se
transpareceu no excerto anterior.
Se percebeu que a definição do prazo para o encerramento do texto não
provocou um “parar” para pensar. Então, para desencadear um processo reflexivo pela
escrita, o professor precisa estar comprometido com seu texto, envolvido com o
problema de uma forma que não exista outra coisa mais importante para realizar. Com
isso, se encontra tempo para esse exercício reflexivo. Com isso, o livro recebeu
contribuições de outros cursos de LC e é composto por quatro artigos de sete convites
realizados, demonstrando como o processo de escrita para que ocorra um
desenvolvimento profissional docente se torna algo quase inviável pelo volume de
afazeres e tarefas diárias que os professores precisam desenvolver em suas instituições.
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No grupo de professores da LC do IF Farroupilha que participaram do DPDLiC,
foi disponibilizado um espaço para que postassem a ideia inicial do artigo, conforme
Figura 1. No entanto, as ideias eram discutidas na sala dos professores em momentos de
intervalo ou em conversas na sala do café. Algumas propostas de artigo foram
compartilhadas por correio eletrônico, o que foram analisadas e respondidas na tentativa
de aperfeiçoá-las. Participaram sete professores da LC do IF Farroupilha, dois do Curso
de Tecnologia em Agronegócios, dois estudantes da LC e a bolsista de Iniciação
Cientifica, vinculada a essa pesquisa. Os textos foram escritos coletivamente,
totalizando onze artigos: sete artigos locais e quatro de LC de outros IFs.
Figura 1 – Agenda do primeiro encontro presencial, publicada no ciberespaço.
Também, se disponibilizou um texto, intitulado “Prática docente universitária e a
construção coletiva de conhecimentos: possibilidades de transformações no processo de
ensino-aprendizagem”, de autoria de Maria Amélia de Santoro Franco. Além deste
texto, se discutiu a proposta de pesquisa e formação do grupo de pesquisa-ação através
de um texto que seria apresentado no XXXIV Congresso da Sociedade Brasileira de
Computaçãovii
, intitulado: “A formação continuada de professores num curso de
Licenciatura em Computação: a integração curricular no desenvolvimento profissional”
na tentativa de envolver, cada vez mais, os professores nas discussões sobre a temática.
Nesse texto, foi socializado a ideia de criar o DPDLiC para realizar estudos e
discussões de forma permanente na licenciatura. Esse material foi disponibilizado para
os professores com o intuito de esclarecer a proposta de realizar uma pesquisa-ação.
Em resposta ao texto, o professor 4, salientou que “o uso das comunidades
virtuais viriam como uma ferramenta integradora e de construção coletiva do
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conhecimento, auxiliando no desenvolvimento de trabalhos conjuntos entre as
disciplinas[...]”(HD) e o professor 7, afirmou que “é uma iniciativa para melhorarmos
as nossas PPIs [sigla utilizada no PPC 2013 para as Práticas do Ensino da
Computação]. Elas precisam ser documentadas”(HD). Em ambas as afirmações, o
professor reforça a importância desse processo interativo e levanta questões importantes
para a criação e o desenvolvimento do DPDLiC: a participação e o compartilhamento de
reflexões através do relato e documentação das atividades planejadas e desenvolvidas.
Além disso, se destaca a importância em superar a fragmentação, que é discutida
no texto citado anteriormente, sobre a cisão entre disciplinas do Núcleo Básico,
Pedagógico e Específico da Computação, que conforme o professor 4 precisamos
ampliar as discussões para “linkar, interagir um pouco mais as disciplinas da
Pedagogia com a Informática, associando o uso das tecnologias educacionais em rede
nos estudos propostos”(HD). Ao mesmo tempo que, o professor percebe essa
dificuldade de ligação entre as disciplinas técnicas e pedagógicas sugere uma ampliação
do “uso das tecnologias educacionais em rede nos estudos propostos”, deixando claro
que precisamos incorporar esses recursos tecnológicos na formação docente e ampliar
esse trabalho para nossa prática docente. Com esse intuito que se criou o DPDLiCviii
que
é visualizado na Figura 1.
Nesse ambiente, diversos Fóruns foram propostos com a intenção de promover
uma maior interação. Assim, questões desde “O que entende por Prática Pedagógica
Integrada?”, “A relação da formação com o mundo do trabalho”, fóruns para que se
disponibilizar concepções sobre integração curricular, para sugerir modificações e para
realização de relatos sobre essa prática, uma espécie de memória descritiva das
atividades e dificuldades encontradas em sala de aula. No próximo tópico se analisa as
respostas atribuídas ao fórum “O que entende por Prática Pedagógica Integrada?” bem
como as interlocuções presenciais a esse respeito ocorridas no DPDLiC.
2 As interações para reconstrução da integração curricular nas PEC
A proposta de pensar a integração curricular no coletivo está presente no curso
de LC. Com intensão de promover um maior diálogo e consequentemente, uma maior
integração curricular que o DPDLiC foi criado. Nesse espaço ocorre uma interação
pela linguagem escrita e oral, permitindo uma análise e reflexão das ações e discussões,
gerando novas compreensões sobre o processo de integração curricular desencadeado
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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nessas práticas. Entender a dinâmica de organização das PEC, superar as dificuldades,
construir novas possibilidades na incerteza são desafios para qualquer professor. Neste
tópico, se busca construir uma reflexão sobre algumas concepções e os posicionamentos
em relação a essa prática. Trata-se de esforço de entendimento sobre como o professor
da LC pensa a PEC, a partir de alguns relatos e declarações pontuais realizadas em
reuniões e dos textos postados em Fóruns no Habitat Digital do DPDLiC.
Ao mesmo tempo em que se desenvolve uma integração curricular, se percebeu
a importância em realizar estudos de forma contínua, pois precisamos compreender
melhor essa dinâmica, conforme relato: “para mim não está claro, mas penso que seria
um momento em que alguns professores de disciplinas e/ou áreas diferentes reúnem-se
para propor atividades para os estudantes trabalhar e utilizar os conhecimentos de
várias áreas de forma „macro‟ " (Professor 3, HD). Demonstrando uma concepção de
integração curricular ligada a ideia de interdisciplinaridade, ou um desejo de realizar
uma interdisciplinaridade, pois percebe-se, neste excerto, a necessidade de superar a
ideia do trabalho interdisciplinar como uma soma de disciplinas que reúnem-se para
desenvolver atividades para os alunos.
Já o professor 6, afirma: “não consigo perceber a diferença entre essas práticas
e os estágios, parece que realizamos duas coisas iguais em paralelo”(PRES), o que é
compreensível, pois em ambas as situações se percebe uma tentativa de aproximação
reflexiva com a prática, deixando que se crie interpretações de que são atividades que se
justapõe. Mas, pelo contrário são trabalhos que se complementam, de um lado
possibilitando um trabalho reflexivo de aproximação com a escola desde o primeiro
semestre e de outro um trabalho de aproximação com a sala de aula para iniciar o
exercício da docência, geralmente nos quatro últimos semestresix
. Destes últimos
excertos analisados se percebe a necessidade de novos estudos e aprofundamentos
práticos e teóricos para entendermos esse processo e concretizar as PEC.
O professor 4 após explicar sobre a dificuldade em estabelecer uma ligação entre
as disciplinas Pedagógicas e da Computação, reforça que um “fator importante a ser
trabalhado é associar atividades como as PPIs entre as disciplinas [...], seja na
elaboração de pesquisas, trabalhos, artigos [...] é um desafio, mas, seria algo
importante para a construção do conhecimento de forma coletiva”(HD).
Transparecendo nesse excerto, a compreensão do caráter interdisciplinar também
presente na PEC. Ou seja, mesmo ao ser organizada por professores de um único
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Núcleo, a responsabilidade em promover uma interdisciplinaridade permanece.
Exigindo a criação de espaços como o DPDLiC para a concretização dessas ações.
Assim, conforme postagem no Habitat Digital, a PEC “são espaços formativos
que possibilitam que os estudantes possam, pela mediação de algum sujeito, integrar os
conteúdos estudados no curso entre eles e, também, relacioná-los com o cotidiano”
(Professor 2). Nesse excerto, se percebe que o papel da mediação docente é
fundamental, pois, trata-se da possibilidade de ativação das Zonas de Desenvolvimento
Proximal (ZDP). Na ZDP se soluciona determinados problemas com a ajuda dos outros,
pois se compartilha novas ideias, conceitos e reflexões. Com isso, vai se construindo
pequenos “andaimes”, que, progressivamente é compartilhado entre os sujeitos,
estabelece-se uma rede interativa de aprendizagem.
Nesse contexto, é que se desenvolve atividades com projetos integradores, que é
uma proposta inspirada nos projetos de trabalho (HERNÁNDEZ & VENTURA, 1998).
Conforme esses autores, a função do projeto é favorecer a criação de estratégias de
organização dos conhecimentos escolares em relação a:
1)O tratamento da informação, e 2) a relação entre os diferentes conteúdos
em torno de problemas ou hipóteses que facilitam aos alunos a construção de
seus conhecimentos, a transformação da informação procedente dos
diferentes saberes disciplinares em conhecimento próprio. (HERNANDÉZ &
VENTURA, 1998, p. 61)
Na maioria dos semestres se valoriza uma interlocução dos futuros docentes com
experiências relacionadas ao espaço da escola. Assim, se faz contatos com professores
que já atuam na área para aplicação de entrevistas aliadas a estudos teóricos e,
semestralmente, através do Seminário Integrador (SI) se proporciona que as reflexões
sejam compartilhadas com colegas e professores do curso, transformando em
aprendizagens as interações sociais, pois conforme Vigostki, o indivíduo somente
aprende imerso no caldo da cultura.
Geralmente, se segue algumas etapas para o desenvolvimento do projeto: a)
apresentação da proposta de estudos aos alunos (temáticas); b) formulação do problema
de pesquisa por grupos de alunos, auxiliados pelos professores; c) identificação e
seleção de materiais de pesquisa – visitas a escolas, bibliotecas; d) estudo e análise dos
materiais coletados; e) sistematização dos trabalhos através de um artigo ou resumo; f)
apresentação do artigo no SI. Embora, não exista um documento que prevê essa
organização, essa tem sido nossa principal forma de organização dessas atividades.
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Conforme reunião para organização dos projetos, o professor 1 destaca que:
“Assim, sempre no início do semestre vamos pensar as PEC. Trata-se de 50 horas por
semestre. Então, a gente vai sentar aqui e vai perguntar: que disciplinas podem se
envolver nas PEC? Entendem, isso que a gente vai fazer. Esse grupo vai se articular e
geralmente vai ser um da área técnica e um da área especifica [para orientar cada
turma]. Pode ter todos os professores do semestre. Pode ter dois no mínimo, entende
professora 7? NO PPC anterior, nós tínhamos definido como as disciplinas de
„Tecnologias Educacionais na Educação‟ e „História da Educação‟. Como a gente
retirou a disciplina de Tecnologias Educacionais do PPC e a gente estava iniciando o
semestre, ficou „Introdução a Informática‟ que se aproximava mais. Essas duas. Nada
impede que o próximo semestre na hora de pensar o projeto a gente pense envolvendo
todas áreas. Depende do projeto que a gente vai pensar”. Nesse excerto fica claro a
importância do movimento na construção do projeto. Para tal, em cada semestre se
propõe novas articulações, mantendo o fio condutor, que é a temática de cada semestre,
mas as articulações entre as disciplinas são modificadas (podendo ser as mesmas
disciplinas ou outras que planejam e desenvolvem o projeto). Ainda, como se trata de
uma nova turma de alunos com características diferentes, a elaboração do conhecimento
é singular, pois cada grupo elabora uma pesquisa que permeia a temática definida para o
semestre e que é, posteriormente, socializada no grande grupo, geralmente através do
seminário integrador.
[...] como nos sonhos, a oralização da escrita lhe dá sentido, os muitos
sentidos que muitas possíveis leituras irão desvendar, ou melhor configurar,
pois só a virtual oralização faz do escrever um ato de significar. A escrita se
configura como rebus, isto é, como passagem da materialidade da letra para a
significância que lhe confere a oralidade (MARQUES, 2001, p. 38).
O DPDLiC foi criado para potencializar a escrita seguida de discussões orais e
reflexão dos professores envolvidos com a LC. Nesse espaço ocorre uma interação pela
linguagem escrita e oral, permitindo uma análise e reflexão das discussões, gerando
novos entendimentos das práticas, pois, de acordo com Vigostki (2003), o
desenvolvimento do ser humano ocorre nas relações sociais que os indivíduos
estabelecem com o meio em que vivem e esse meio oferece um conjunto de sentidos e
significados que são internalizadosx pelos professores. Para o autor, a interação social é
o veículo fundamental para a internalização do conhecimento social, histórico e
culturalmente construído. Assim, cada professor dá um sentido próprio para um
conjunto de signos que o meio social lhe oferece, ou seja, se apropria dos mesmos.
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Considerações
O processo de interação em rede no DPDLiC através da escrita e da oralidade
proporcionou uma sistematização e criou uma dinâmica que potencializou os diferentes
significados sobre a integração curricular, de forma a propiciar um trabalho coletivo.
Nesse texto, observou-se que a internalização é alavancada pelo entrelaçamento da
oralidade e escrita coletiva, que ora se escreve para organizar o pensamento, ora pela
oralidade se comunica essa escrita, criando novos sentidos e significados.
A preocupação deste texto foi descrever e analisar um primeiro ciclo da
pesquisa-ação, a criação do DPDLiC, um esforço para promover um coletivo que
compartilha suas preocupações, discussões, descobertas e criações. Esse ciclo perpassou
pelo planejamento, intervenção, observação e reflexão sobre o DPDLiC. Tratou-se da
criação de uma base para permanentes interações entre os professores da LC. Com o
DPDLiC estruturado se espera a continuidade desse processo. Esse é um espaço que
precisa ser exigido pelos professores, pois somos profissionais da reflexão, profissionais
da escrita, seres inacabados em permanente desenvolvimento.
Nesse processo dialógico se desencadeou um desenvolvimento do currículo, um
trabalho mais significativo de integração curricular, principalmente por causa da
disponibilidade docente em estudar, pensar e discutir novas alternativas, o que
proporcionou um desenvolvimento profissional docente. Ou seja, ao desenvolver o
currículo se desenvolveu os professores e ao desenvolver os professores se desenvolveu
o currículo, uma espécie de efeito “bola de neve”, que é assunto para um próximo texto.
REFERÊNCIAS
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de Letras), Out. 2013, acessado no endereço:
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XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
8771ISSN 2177-336X
27
FORMAÇÃO DOCENTE HUMANIZADORA: REGISTROS DE UM PROJETO
DE EXTENSÃO À LUZ DO PENSAMENTO FREIRIANO
Leonardo Matheus Pagani Benvenutti
Evandro de Godoi
IF Farroupilha – Campus Santo Augusto
Resumo: Realizar uma reflexão sobre a formação docente inspirada em ideais freirianos
de educação através de registros do projeto de extensão “Construindo itinerários
mediatizados pelas ideias de Paulo Freire: EEEF 29 de Outubro e IF Farroupilha” é o
tema central deste texto. Iniciamos com a exposição da existência de um projeto anterior
que culminou na necessidade deste, “Interlocuções com Paulo Freire”, denotando seu
caráter processual, de continuidade da proposta anterior, porém, com um novo contexto,
de ir além do nosso espaço acadêmico em busca de elementos e experiências que
proporcionassem maiores interlocuções e interlocutores. Para tanto, lançamos mão de
parceria entre o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha
Campus Santo Augusto e a Escola Estadual de Educação Fundamental 29 de Outubro.
Posteriormente analisamos os três módulos do projeto que consistiram na análise
histórica das instituições, leituras de obras referentes ao pensamento freiriano e, por fim,
de leituras de Paulo Freire. Em seguida apontamos caminhos à formação docente crítica,
coerente com a concepção por nós defendida: a construção de espaços formativos que
dialoguem com a realidade do trabalho pedagógico e com os saberes construídos no
percurso da formação inicial. Trabalhamos a relação indissociável entre pesquisa,
ensino e extensão presentes como políticas públicas, mas, além disso, como
compromisso de responsabilidade e ética com os sujeitos do ato educativo, indicada
através da formação inicial e continuada dos participantes do projeto, que, ao exemplo
do legado freiriano, aprendem ao ensinar e ensinam ao aprender, contextualizando,
criticando, superando a si enquanto profissionais da educação, sobretudo cidadãos
sujeitos de suas histórias.
Palavras-chave: Trabalho educativo. Itinerários formativos. Diálogo.
Introdução
Refletir sobre a formação docente com viés crítico, transformador, de caráter
humanizador, pensado sob a luz das ideias de Paulo Freire, é o objeto de estudo deste
trabalho. Procuramos analisar os trabalhos desenvolvidos em 2015 no projeto de
extensão intitulado “Construindo itinerários mediatizados pelas ideias de Paulo Freire:
EEEF 29 de Outubro e IF Farroupilha” (CITFREIRE), no qual participaram docentes,
técnicos administrativos em educação e acadêmicos do Curso de Licenciatura em
Computação do Instituto Federal Farroupilha Campus Santo Augusto (IF) e docentes da
Escola Estadual de Educação Fundamental 29 de Outubro (EEEF29).
Para tal tarefa lançamos mão de registros efetuados no decorrer das ações
previstas e encontros com o intuito de sistematizarmos criticamente as atividades
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
8772ISSN 2177-336X
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realizadas, que consistiram em leituras críticas de obras referentes a Paulo Freire e de
autoria do próprio, culminando em círculos de cultura, presenciais e virtuais, que foram
estabelecidos entre as pessoas que participaram do projeto. Caracteriza-se, portanto,
como um trabalho de relato e avaliação qualitativa, interpretativa.
No primeiro momento contextualizaremos o objeto de estudo, relatando a
existência de um projeto anterior, precursor, que tornou a elaboração do CITFREIRE
possível. Após, apresentaremos o projeto CITFREIRE, refletindo e avaliando as
atividades, organizadas em módulos, devido às questões didático-metodológicas.
Trabalharemos na ideia de avaliar o projeto apontando aspectos positivos,
aprendizagens, bem como pontos que não tomaram os rumos idealizados, nem por isto
negativos. Conhecer os limites e possibilidades da realização concreta dos objetivos faz
parte da formação permanente que acreditamos necessária enquanto educadores-
educandos. Ao final, teceremos uma síntese apontando, considerando nossas limitações,
caminhos à formação docente para a humanização inspirada no pensamento freiriano,
possibilidades contemporâneas engajadas em processos emancipatórios. Concordamos
com Paulo Freire no tocante que
[...] a nossa luta, como mulher, como homem, como negro, como negra,
como operária, como brasileiro, norte-americano, francês ou boliviana, em
que pesem os diferentes e importantes condicionamentos de sexo, de cor, de
classe, de cultura, de história que nos marcam, é a que, partindo da
concretude condicionante, converge na direção do SER MAIS, na direção
dos objetivos universais, Ou, para mim, pelo menos, não tem sentido a luta
(2013, p. 260).
A realização destas atividades vem ao encontro da intenção de reforçarmos a
relação indissociável entre atividades de pesquisa, ensino e extensão, pois, embora em
termos estruturais se trate de um projeto de extensão, ele engloba outras dimensões
educativas. Caracteriza-se como extensão por ser realizado com professores e
acadêmicos da LC e comunidade externa, em espaços internos e externos ao IF, em
atividades substancialmente de pesquisa, de re-conhecer ideias, formar saberes
concernentes à educação e, por consequência das práticas de socialização, ensinar e
aprender os conhecimentos constituídos nas relações entre as leituras e as experiências
contextuais dos participantes. Tal relação está expressa como política pública no Artigo
207 da Constituição Federativa do Brasil de 1988 ao expor que “as universidades gozam
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
8773ISSN 2177-336X
29
de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e
obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.
O IF, criado posteriormente ao supracitado marco legislativo, legitima o
princípio ao apontar que
Ao falarmos em indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão
pretendemos ressaltar que cada uma dessas atividades, mesmo que possa ser
realizada em tempos e espaços distintos, tem um eixo fundamental: constituir
a função social da instituição de democratizar o saber e contribuir para a
construção de uma sociedade ética e solidária (BRASIL, 2014b, p. 52).
Acreditamos que o envolvimento dos acadêmicos da LC nas atividades tem
grande importância em termos de integralidade educativa, ou seja, de desenvolvimento
humano, profissional e cultural ao passo que estes sujeitos podem conscientizar-se da
complexidade de relações teórico-práticas que envolvem a escola e a formação de
educadores, "afinal, o espaço pedagógico é um texto para ser constantemente lido,
interpretado, escrito e reescrito" (FREIRE, 2011, p. 95).
De interlocuções a itinerários: Gênese do CITFREIRE
A ideia de estudar a obra de Paulo Freire para além do espaço formal do Curso
de Licenciatura em Computação (LC) do IF emergiu a partir da curiosidade de discentes
e docentes que perceberam que no espaço dos componentes curriculares, devido à
necessidade de trabalhar outras ideias e conhecimentos, dificilmente se aprofunda, se
pesquisa rigorosamente o trabalho de tão significativo pensador do século XX, que
embora tenha publicado até a década de 90, permanece atual sendo reinventado
contemporaneamente por trabalhadores de diversos âmbitos.
Então, como grupo de estudo, que envolveu também egressos da LC,
caracterizado por aproximadamente 13 pessoas, no qual estávamos incluídos, foi
constituído o projeto de extensão “Interlocuções com Paulo Freire”, que buscou
caminhar no sentido de re-conhecer a vida e obra de Freire, consequentemente se
caracterizando também como espaço de formação integral, voltado aos diversos valores
defendidos por este educador. Como estratégia metodológica estabelecemos leituras
para serem feitas individualmente e, mensalmente, constituíamos círculo de cultura para
socializar aprendizados, dúvidas e chaves de leitura envolvendo as obras escolhidas.
O projeto “Interlocuções com Paulo Freire” (INTERFREIRE) foi desenvolvido
em 2013 e 2014, de caráter aberto, com entradas e saídas de componentes, sendo
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8774ISSN 2177-336X
30
sempre receptivo à entrada de participantes, mesmo no decorrer das atividades
previstas, conseguindo propiciar críticos diálogos envolvendo as seguintes obras: A
história das ideias de Paulo Freire e a atual crise de Paradigmas, de Afonso Celso
Scocuglia (2006), Pedagogia do Oprimido (2013a) e Cartas à Cristina (2013b), ambos
de autoria de Paulo Freire. A partir dos diálogos alguns membros sistematizaram ideias
e elaboraram artigos científicos que foram apresentados em eventos de caráter local,
regional e nacional. A participação nos eventos veio a contribuir com mais
conhecimentos, maior introdução à comunidade acadêmica e a certeza de não
isolamento do grupo, de pertencimento e esperança por saber que outras e outros
também trilham suas caminhadas à luz das ideias freirianas.
Quanto à organização do INTERFREIRE é importante ressaltar que a escolha
das obras e o trabalho de mediação dos diálogos se deram de forma participativa, sendo
que a opção por dadas obras foi votada e em cada encontro uma pessoa diferente
mediava as falas, portanto a horizontalidade nas relações foi percebida como uma
atitude democrática e responsável. Outro ponto importante é que todos participantes
sentiam-se convidados a dizer a sua palavra, propiciando, assim, que os círculos não se
transformassem em “aulas” de um “para” outros, mas em momentos privilegiados de
interlocução entre a leitura de mundo com as leituras de Freire. Tal movimento
evidenciou-se no decorrer da execução das atividades, onde para além do roteiro de
leituras, sempre alguma situação da experiência dos participantes era problematizada,
possibilitando dessa forma outras interlocuções com a realidade prática dos envolvidos;
a exemplo, situações de sala de aula, assuntos estavam em evidência na sociedade e
mídia, dentre outros. Essas características, por considerarmos construtivas, mais tarde
permaneceram como estratégias utilizadas no CITFREIRE.
O último círculo de cultura do INTERFREIRE aconteceu na EEEF29, situada na
Comunidade 16 de Março - Pontão/RS, local recentemente denominado Assentamento
16 de Março, território conquistado através da luta do Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra em conhecida ocupação da Fazenda Annoni, que completou trinta
anos em 2015. Esta escola, criada em 1985 por educadores acampados, atualmente é
composta por membros da comunidade e da zona urbana, tendo seu projeto e práticas
pedagógicas construídas coletivamente em torno de um desejo de emancipação dos
sujeitos através do conhecimento de sua história de lutas e o compromisso com outra
forma de ser/estar no mundo, num horizonte de transformação da sociedade que
percebemos ser condizentes com o legado freiriano,
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8775ISSN 2177-336X
31
[...] apontando para um projeto que integra o conhecimento escolar aos
saberes/fazeres da vida em comunidade, pautado pelo trabalho como
princípio educativo. A Escola também foi representante da Região Sul no
evento Rio +20, que aconteceu no ano de 2012, por ter uma proposta
pedagógica de estímulo à sustentabilidade (BRASIL, 2015, p. 2).
A EEEF29, após contato facilitado através de uma docente participante do
INTERFREIRE, acolheu os membros e, durante o círculo de cultura, demonstrou
interesse em participar do projeto. Os educadores desta escola relataram que sentiam a
necessidade de estudar a obra de Freire com o intuito de lhes propiciar bases teóricas
para refletir sobre as ações realizadas na escola. A entrada dos membros da EEEF29,
constituída pela quase totalidade de docentes da escola, ampliou nossos horizontes,
demandou uma organização maior e um programa a ser reconstruído.
Portanto, partindo do objetivo de continuarmos estudando as ideias de Paulo
Freire, agora com um maior número de participantes e uma instituição externa,
coletivamente criamos o CITFREIRE, que significou “construir outros itinerários”
dando visibilidade a práticas pedagógicas e iniciativas as quais situamos dentro de uma
proposta ora emancipadora, ora resistente a mudanças e tensões de uma escola que por
ser estadual deve adequar-se aos dispositivos legais da política educacional, porém com
as fortes marcas de sua constituição histórica, percebidas na sua organização curricular,
na sua proposta pedagógica (BONAMIGO, 2007) e nas relações entre os sujeitos no
cotidiano escolar.
CITFREIRE: Caminho comum para diversos pensares
O referido projeto foi selecionado para desenvolvimento através de processo
específico (BRASIL, 2014a) que propiciou recursos materiais básicos para as atividades
previstas. A questão propulsora, que buscamos avançar na(s) resolução(ões), foi a
seguinte: “Qual é a importância, enquanto educandos e educadores em formação inicial
e continuada, de dialogarmos mediatizados pelas ideias de Paulo Freire?” (BRASIL,
2015). Para garantir espaços de diálogo sobre essa e demais questões organizamos as
atividades a serem realizadas.
Mantivemos a ideia do projeto INTERFREIRE de encontros mensais, porém,
devido à distância geográfica entre o IF e a EEEF29 (aproximadamente 150
quilômetros), combinamos que em um dado mês o círculo de cultura se daria de forma
fracionada, em dois grupos, um nas dependências do IF e outro na EEEF29, sendo que
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8776ISSN 2177-336X
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no outro mês se realizaria o círculo do grande grupo, nas dependências da EEEF29, por
questões de logística e recursos materiais. Além dos espaços físicos, com a finalidade de
prover acessibilidade a um membro cegoxi
, facilitar a comunicação à distância entre os
participantes e servir como repositório de mídias foi estabelecido um espaço virtual
educativo (EVA), utilizando a plataforma gratuita Moodlexii
. Este espaço dinamizou as
relações entre os participantes, foi possível participar de diálogos envolvendo chaves de
leitura freirianas, além da escrita de documentos que sintetizavam os encontros mensais.
Uma questão que nos preocupou durante a elaboração da proposta de projeto foi
a de que alguns membros novos já tinham experiências de leitura de trabalhos de Paulo
Freire, contudo a maioria não tinha esta experiência específica (embora alguns
vivenciem a educação humanizadora em seus trabalhos), então, visando unir pessoas
com saberes múltiplos a partir de um itinerário comum, mas com diversas
possibilidades, o CITFREIRE foi organizado metodologicamente em três módulos.
O primeiro módulo consistiu na contextualização histórico-cultural das
instituições participantes do projeto, abrangendo a análise histórica da EEEF29 e do IF
através de relatos de experiência e estudo de publicações selecionadas pelos membros,
como forma de cada grupo conhecer a história do outro e permitir que o outro fale de si,
conte sua história, sua caminhada, princípio freiriano, de respeito à voz e à história de
cada sujeito (FREIRE, 2011). Foi muito tocante o relato de membros do projeto que
participaram de movimentos históricos da luta pela reforma agrária brasileira na década
de oitenta, as diversas situações de opressão, de precariedade material, mas também de
importantes lições de coletividade, dignidade, resistência e projetos sociopolíticos
menos injustos, menos condizentes à lógica de acumulação de bens e desigualdades
ainda tão latentes em nosso tempo. Acrescenta-se ainda a validade do processo reflexivo
ao pensarmos a história do IF enquanto uma conquista, ainda em construção, também
situada nas tensões inevitáveis no cenário das políticas públicas. Os institutos federais
nascem por força de lei ao transformar escolas técnicas e demais instituições já
existentes (BRASIL, 2008) que também torna cada instituição, embora inserida em uma
dinâmica de padronização em nível federal, possuidora de uma história prévia, que se
evidencia no cotidiano das vivências pedagógicas.
O segundo módulo foi dedicado à análise de obras sobre o pensamento freiriano,
pois concordamos em iniciar os estudos pelo trabalho de pesquisadores que trilham
caminhos de pesquisa semelhantes ao nosso, porém a mais tempo, com maior rigor
metódico, afim de contextualizarmos as ideias de Freire, compreendermos melhor o
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
8777ISSN 2177-336X
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contexto em que determinadas obras foram escritas. É importante pontuar que
compreendemos os riscos de introduzir o estudo através das posições de terceiros, da
forma que podemos condicionar nossa atenção ou opinião sobre aspectos trabalhados
nas obras destes, como por exemplo, a organização didática de Scocuglia em abordar
“[...] o primeiro, o segundo e o terceiro Paulo Freire” (2006, p. 26, grifos do autor)
conforme momentos históricos de publicações e desenvolvimento de temas. Tal
separação, na obra do autor, de forma alguma significa uma linearidade estanque, mas
uma organização da evolução do pensamento de Freire, que, por ser “um homem do seu
tempo” soube desenvolver suas ideias livre de determinismos e dialogando sempre com
o movimento da sociedade em suas diversas esferas.
Optamos por este módulo com a criticidade e respeito necessárias ao árduo
trabalho de pesquisadores como Scocuglia, sem o qual talvez não conseguiríamos
estabelecer reflexões satisfatórias e contextualizadas das obras posteriormente
estudadas. A partir de Scocuglia, por exemplo, obtivemos subsídios para coletivamente
optar por quais obras seriam escolhidas para leitura. Cabe salientar, portanto, que neste
módulo alguns membros leram Scocuglia (2006), enquanto outros, que já o haviam
estudado no decorrer do INTERFREIRE, optaram por analisar a obra A pedagogia da
libertação Em Paulo Freire (FREIRE, A., 2001), importante registro de pesquisadores
que analisaram a Pedagogia do Oprimido (FREIRE, 2013a). Deste modo os
participantes que já haviam percorrido caminhos de pesquisa em educação através do
INTERFREIRE puderam continuar a estudar novas obras, não obrigatoriamente
retornando à obra de Scocuglia.
O terceiro módulo foi dedicado às leituras de Paulo Freire. O grande grupo
optou pelo estudo das obras Pedagogia da Autonomia (2011) e Cartas a Cristina
(2013b), algo que denotou a dinamicidade do projeto, pois nos primeiros momentos de
início das atividades foram sugeridos determinados títulos diferentes. Alguns
participantes já haviam iniciado a leitura de Cartas a Cristiana durante o
INTERFREIRE, porém de modo introdutório ou parcial, então eles puderam retomar as
leituras, trazer novos elementos aos diálogos. Alguns membros, com maior
disponibilidade de tempo, conseguiram efetuar a leitura das duas obras, enquanto outros
analisaram capítulos que lhes chamaram a atenção. Nosso interesse, do ponto de vista
formal, mensurável, foi de que todos membros conseguissem ler as obras por completo,
mas acima disso, com vista à qualidade, de caráter menos objetivo, das leituras,
reflexões, elementos a serem levados ao grande grupo, aos pares. Portanto, foi
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
8778ISSN 2177-336X
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facultativa a “meta” de leitura das obras completas. Alguns participantes, por exemplo,
fizeram leituras coletivas de capítulos, excertos, seguidas de diálogo, algo muito
interessante em termos de consciência crítica colaborativa do que em quantificação de
páginas lidas. Com isso não pretendemos negar o desejo de bons resultados em termos
mensuráveis, de o quanto cada participante conseguiu avançar nas leituras, “é equívoco
pretender confronto dicotômico entre qualidade e quantidade, pela razão simples de que
ambas as dimensões fazem parte da realidade e da vida. Não são coisas estanques, mas
facetas do mesmo todo” (DEMO, 1994, p. 9).
A formação, a pesquisa, precisa de respeito ao tempo próprio das pessoas, de re-
trabalhar ideias, construir novos arranjos e concepções, também de respeito à
disponibilidade e dedicação dos sujeitos. Em termos avaliativos, é possível constatar
que alguns participantes, a princípio dispondo de condições materiais e temporais de
estudar mais, acabaram por estudar menos, por razões diversas, contudo assumimos este
risco procurando desafiar o grupo a desempenhar as atividades propostas.
Após estes módulos, um seminário foi realizado para apresentação de sínteses,
sistematizações, avaliações do projeto, além do diálogo acerca de duas cartas
pedagógicas (CAMINI, 2012) escritas coletivamente e compartilhadas no EVA. O
projeto e algumas reflexões envolvendo temas emergidos (educação e tecnologias
digitais, autoridade, liberdade, democracia, direitos humanos) foram socializadas em
eventos científicos do Instituto Federal Farroupilha (Pré-Mostra da Educação
Profissional e Tecnológica do IF e VI Mostra da Educação Profissional e Tecnológica
do Instituto Federal Farroupilha) , bem como no XVII Fórum de Estudos Leituras de
Paulo Freire, em Santa Maria/RS e no VIX Seminário Nacional Diálogos com Paulo
Freire, em Igrejinha/RS.
Caminhos à formação docente inspirada em Freire
Em pesquisa recente, Gatti; Barreto; André (2011) realizaram estado da arte das
políticas voltadas à formação docente. Compreendemos, a partir do estudo, que são
muitos os desafios que estão imbricados nos processos de formação. Todavia, é
perceptível o avanço da questão enquanto uma preocupação no plano das políticas
educacionais mais amplas, tornando possível que se criem alternativas para a formação
docente.
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
8779ISSN 2177-336X
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Com a intenção, considerando o caráter inicial de nossa imersão na temática da
formação enquanto processo de humanizar-se, de apontar caminhos à formação docente
inspirada na obra freiriana, gostaríamos de expor alguns de seus saberes que nos são
caros, “a coerência entre o que digo, o que escrevo e o que faço” (FREIRE, 2011, p.
101) e, também, referindo-se à Marx, “[...] da necessária radicalidade que me faz
sempre desperto a tudo o que diz respeito à defesa dos direitos humanos” (IDEM, p.
98). Nesse sentido pensar uma formação docente humanizadora requer que assumamos
que tal tarefa aconteça para além dos espaços e momentos reservados à formação.
Pensando nisso, a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, mais que
compromisso das instituições formadoras, deve ser evidenciada como resultado de um
itinerário formativo efetivamente humanizador. É impossível realizar qualquer prática
isenta de uma intencionalidade e ao mesmo tempo de um impacto no seu entorno.
Constituir-se docente no mundo implica assumir que as práticas que nos constituem
dialoguem com a realidade em níveis micro e macro.
Os relatos aqui trazidos são delimitados a um espaço acadêmico pensado para
cumprir a tarefa da indissociabilidade entre o corpo de conhecimentos que são
construídos no percurso formativo e a realidade com a qual nos relacionamos e
afetamos. O espaço em questão, projeto de extensão, buscou proporcionar aos
participantes em torno do objeto de estudo acadêmico, as leituras de Paulo Freire,
aprendizado da realidade abordada, a EEEF29, os elementos que proporcionassem
avançar qualitativamente numa formação onde o diálogo com a realidade é condição
sem a qual a formação se tornaria menos significativa. Evidenciamos esta premissa no
relato dos alunos do curso de Licenciatura que em momentos de reflexão puderam
perceber que na referida escola em estudo se concretizavam práticas identificadas com o
ideal freiriano de educação.
Da mesma forma os educadores da EEEF29, em seu itinerário de formação
continuada, relataram que muitas vezes as demandas de atividades para executar a
proposta pedagógica da escola esbarram na inviabilidade de realizar estudo aprofundado
de alguma obra ou autor. No entanto, refletiram que o espaço formativo dialógico criado
proporcionou que percebessem suas práticas em interlocução com o referencial freiriano
ainda que de uma maneira tácita, ratificando a premissa já citada de Freire de coerência
entre o que se escreve e o que se faz. Pouco adiantaria uma escola que trouxesse
explícito referenciais humanistas e progressistas se na concretização de seus atos não há
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
8780ISSN 2177-336X
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o esforço de corresponder a teoria e a prática, de superar a burocratização, inevitável,
domesticadoras das ideias e da possibilidade de criar algo novo.
A reflexão a que nos propomos aponta para uma perspectiva de que tanto a
formação inicial como a continuada trazem consigo um desejo de transformação da
escola que temos. Aproximar tais itinerários, tarefa a qual nos propusemos, oportuniza
que este sonho de transformação seja partilhado, motivado pela experiência de quem já
está na prática a mais tempo e as ideias de quem está iniciando seu trajeto de
educador/a. Acerca dessa concepção de formação concordamos com Freire:
A responsabilidade ética, política e profissional do ensinante lhe colocam o
dever de se preparar, de se capacitar, de se formar antes mesmo de iniciar sua
atividade docente. Esta atividade exige que sua preparação, sua capacitação,
sua formação se tornem processos permanentes. Sua experiência docente', se
bem percebida e bem vivida, vai deixando claro que ela requer uma formação
permanente do ensinante. Formação que se funda na análise crítica de sua
prática. (1997, p.19)
Breves Considerações
Avaliamos o itinerário construído até o momento como um espaço de
possibilidades, sujeito às contradições e aos percalços que emergem. Constituir espaços
de diálogo e reflexão requer valorização de momentos muitas vezes considerados
simples, como reuniões, situações desafiadoras no espaço escolar, que conduzem os
educadores a pensar formas alternativas de administrar as demandas. Sem tirar o mérito
dos grandes eventos acadêmicos de formação, apostamos aqui que pensar e investigar a
prática cotidiana de ensino transforma qualitativamente o trabalho pedagógico.
Nesse contexto, consideramos de alto valor e enriquecedora a parceria entre as
instituições formadoras, especialmente dos seus estudantes em formação inicial com os
profissionais já no exercício da sua carreira; essa concepção é fundamentada na práxis
de Freire, onde “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensinar ao aprender”.
A profissionalização docente carece desses espaços-tempos coletivos de interação, que
são, aliás, momentos de intensos estudos e calorosas reflexões, indispensáveis à
educação em todos os níveis e modalidades.
REFERÊNCIAS
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XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
8782ISSN 2177-336X
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8783ISSN 2177-336X