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j^^^H stá prestes a regressar ao tra-balho, precisa de ir às comprasou pretende somente dar urapasseio no parque ao final datarde para descomprimir esabe que vai cruzar-se com ou-trás pessoas? Bom, não existe
solução mágica para se prote-ger da Covid-19, mas, no finaldo mês, vai passar a dispor&h de mais uma ferramenta paraprevenir a propagação do vírus.
Bastará descarregar uma aplicação para oseu smartphone (ou gcidget equivalente) e
o rastreio será simplificado. A ferramentachama-se StayAway e está a ser desenvol-vida, desde 3 de abril, pelo Instituto de
Engenharia de Sistemas e Computadores,Tecnologia e Ciência (INESC TEC), como apoio do Instituto de Saúde Pública daUniversidade do Porto. Tem a bênção dasautoridades de saúde, já foi apresentadaao poder político, mas subsistem as dú-vidas técnicas e legais.
Só aderimos se quisermos? Os dados
permitem identificar os cidadãos conta-giados? Há algum perigo de geolocaliza-ção? Haverá um servidor que centralizea informação recolhida? Que entidadesterão acesso e administrarão os nossosdados? A informação poderá ser usada
para fins que não os relacionados com a
salvaguarda da saúde, como publicidadede perfil ou propaganda política? Haveráarticulação com apps de outros países? Fi-caremos à mercê de piratas informáticos?
Rui Oliveira, professor do INESC TECe coordenador do projeto, procura res-ponder a algumas dessas inquietações.Desde logo, garante, em conversa coma VISÃO, que a adesão será voluntá-ria, que "não haverá centralização dedados" e que estes "não serão anoni-mizados". "Todos os dados que a apli-cação manipula nascem anónimos. Emnenhum momento há um processo de
anonimização", explica o investigador,sublinhando que o software funcionarácom base em códigos aleatórios, todosdiferentes, gerados automaticamente acada 15 minutos.
"Os códigos não têm a mínima relaçãoconsigo ou com a pessoa com quem se
cruzar, são números de lotaria", asse-gura. E onde ficarão guardados? Numservidor, adianta, que será público,porque todos os códigos não serão maisdo que "lixo digital". Com eles, afiançaRui Oliveira, pouco ou nada se poderáfazer - dificilmente se transformaránum paraíso para hackers.
Monitorização Apps estãoa ganhar adeptos em todoo mundo. A centralizaçãodos dados é uma das principaisameaças à privacidade
Ao fim de 14 dias (correspondentes ao
período de incubação da doença), esse
lixo será destruído permanentementedos telemóveis e do servidor. "E quandoo Governo disser que a pandemia estácontrolada o servidor desaparece, com a
informação que lá estiver", sublinha Rui
Oliveira, para tranquilizar os mais céticos.
Ora, o princípio subjacente à aplica-ção é o do aperto de mão digital o nosso
telemóvel recebe e armazena também os
códigos dos dispositivos dos indivíduoscom quem nos cruzarmos e, entretanto,caso saibamos que fomos infetados como coronavírus, podemos introduzir umachave no sistema (validada previamentepor um profissional de saúde) que servi-rá de alerta, também sem qualquer refe-rência de identidade ou de localização,àqueles que estiveram a menos de doismetros de nos (sobretudo, se expostospor dez ou mais minutos).
Problema que o académico anteci-pa: "Nunca vamos eliminar os falsos
positivos", ou seja, as pessoas a quema StayAway venha a recomendar o des-
piste (em função do risco calculado) e
que, depois, não correspondam a mfe-tados reais.
OS ALERTAS DE PORTAS
Quem tem falado abundantemente sobre
esta app - que estará pronta depois de
uma outra, a CovidApp, desenvolvida
pela HypeLabs, uma startup do Porto, e
que já está a ser usada, por exemplo, naColômbia - é Paulo Portas. O antigo vi-ce-primeiro ministro é "tendencialmen-te favorável" a aplicações desta natureza,mas, em declarações à VISÃO, mostra-seprudente. "Sou a favor, sabendo aquiloque estou a sacrificar. Para podermosfazer o desconfmamento em segurança,teríamos de dispor de certezas sobre a
questão da imunidade, e não as temos.Ou as autoridades de saúde tinham evi-dências suficientes sobre o progressoda imunização de grupo ou tinham decontinuar a rastrear os contágios. A únicaforma praticável e eficaz é esta, atravésde uma aplicação digital", observa o
comentador que se debruçou sobre as
várias dimensões da pandemia no espaçoEstado da Emergência, na TVI.
Ainda assim. Portas defende que "é
preciso ficar absolutamente claro que,mesmo durante os 14 dias, em nenhumacircunstância os dados serão cedidos a
entidades terceiras". "Tem de ficar con-tratualmente blindado que quem gere o
sistema não pode cedê-lo", apela. O an-
tigo presidente do CDS apresenta aindaoutras reservas. Quem vai administrar a
aplicação e gerir o servidor?Para a primeira questão Rui Oliveira
ainda não tem resposta. "Muito prova-velmente será a FCT [Fundação para a
Ciência e Tecnologia] ou o Ministérioda Saúde ou a DGS [Direção-Geral da
Saúde], mas este servidor até podia estarem minha casa, porque a informação queele tem é pública e, por si, é lixo digital",contrapõe. E qual vai ser o papel das
empresas tecnológicas, como a Googleou a Apple, em todo o processo? Alémde disponibilizarem a app nas suas lojasvirtuais, ainda não é claro.
SAÚDE VS. PRIVACIDADE?Um pouco por todo o mundo, estas so-luções têm gerado discussão sobre até
que ponto a privacidade dos seus utili-zadores estará assegurada. O advogadoTiago Félix da Costa encontra dois tiposde risco nestas ferramentas: "A própriasegurança e a monitorização massiva domovimento das pessoas." Algumas das
aplicações que foram aparecendo, recor-da o sócio da Morais Leitão, ''funcionamcom base no controlo da localização":"Algo deste género representaria umaenorme intromissão na vida privada,com o Estado a poder controlar os mo-vimentos. Obviamente, todas as opera-
TECNOLOGIA
A app em
cinco perguntas
e cinco respostas
1. Como saberá seesteve com alguéminfetado?
Na StayAway, na CovidApp e nas
aplicações da Googlee Apple, os smartphones interagematravés de bluetooth ou wi-fi.0 encontro é detetado mediante
códigos aleatórios gerados, queambos os telemóveis recebem,No caso da StayAway, uma pessoainfetada introduz no sistema umachave (validada pelas autoridadesde saúde), que permitirá que todosos aparelhos com que se tenhacruzado nos 14 dias anteriores
sejam notificados.
2. Vai conhecera identidade dessapessoa e vice-versa?
Não. Os dados são anónimos
e não há geolocalização associada.
3. Quem garantea segurança dos dadose do sistema?
Os dados, emitidos e recebidos,ficarão no telemóvel de cada um.No entanto, haverá um servidorcentral para comunicações pré-definidas e fins estatísticos, queserá controlado por uma entidadenacional a definir. Até a app estardisponível, será preciso parecerfavorável do Centro Nacional de
Cibersegurança e da ComissãoNacional de Proteção de Dados.
4. Estará protegidose viajar parao estrangeiro?
Depende. Para já, estão a
ser trabalhadas soluções de
interoperabilidade com paísesda União Europeia. Não é liquidoque a app venha a ser eficientenoutras partes do mundo.
5. Qual o prazode validade dos dados?Duas semanas. Depois
disso, são eliminados do seutelemóvel. Quando a pandemiaestiver controlada, até o servidorcentral desaparecerá.
doras têm essa informação, e esta podeser usada nalguns processos judiciais,mas, ao estarmos a replicar essa in-formação em bases de dados distintas,estaríamos a aumentar muito os riscos
para a segurança."Ao que tudo indica, esse não será
um problema em Portugal, dado que,à semelhança do que recomenda a Co-missão Europeia, a tecnologia que estáa ser testada recorre ao bluetooth e nãoà geolocalização. Ainda assim, qualquerque seja a "porta" do smartphone que se
abre para a recolha destas informações,outro risco estará sempre associado: o da
discriminação. "Independentemente de
uma aplicação ter mais ou menos preo-cupações com a privacidade, é muitofácil que entidades públicas e privadasvenham a controlar acessos e entradascom base na informação que consta da
app", alerta Félix da Costa. "Imagine que
quer entrar num restaurante e que lhe
perguntam se tem a aplicação. E quese não tiver não entra. Mesmo sendo a
aplicação de utilização voluntária, o riscode discriminação dos que não usaremaumenta brutalmente."
O advogado, que nos últimos anostem ajudado diversas empresas a im-plementarem programas de reforçoda proteção de dados pessoais, admiteestarem a ser respeitados os princípios
do regulamento geral sobre essa ma-téria e reconhece menos danos para a
privacidade através do uso da tecnolo-gia bluetooth. Tal não significa, porém,que a aplicação deixe de levantar ques-tões. Desde logo, sobre a sua utilidadee eficiência: "Só funciona se o bluetooth
estiver ligado? Convém que se cumpraum requisito de necessidade, que ao fimdo dia não seja inútil." E há outro risco,alerta: gerar "alarme social desneces-sário". "Esta aplicação só fará sentidose houver uma grande capacidade defazer testes. O alerta no telemóvel passaa ser um critério para a linha Saúde 24mandar fazê-los? Ou as pessoas vão ficar14 dias em casa só a vigiar sintomas?Sem testes rápidos, poderá lançar o
pânico"
DIREITOS IRRENUNCIÁVEISE eis que surge outro problema. Umapessoa diagnosticada com Covid-19 e
que fure a quarentena está a cometer umcrime. "Até que ponto alguém que rece-beu um alerta por ter estado em contactocom um infetado também estará se nãose autoconfinar?", interroga. Além disso,alerta o advogado, "do ponto de vistatécnico, a partir do momento em que é
recolhida informação de um telemóvel,é muito difícil que esta seja totalmenteanónima". "Uma coisa é a anonimiza-ção, outra é a pseudoanonimização",justifica. A primeira só existe "quandonão for de todo possível associar esta
informação a uma pessoa", a segundapassa por técnicas que simplesmentesegregam a informação. "Isto é, separaos elementos identificadores dos outros,só que estes podem voltar a ser juntos,para bons ou para maus fins. Daí a im-portância de saber quem vai gerir esta
informação", reforça.Para o constitucionalista Paulo Ote-
ro, mesmo que a aplicação seja de usovoluntário, "só o poder legislativo podelegalizar o seu uso". Como a Lei de Ba-ses da Proteção Civil, na qual se enqua-dra o estado de calamidade, não prevêrestrições a liberdades fundamentais,Otero reitera que só o Parlamento tempoder para legislar sobre matérias re-lacionadas com direitos, liberdades e
garantias.Ou seja, teria de ser criada uma lei
para que a app pudesse extrair os dados
dos telemóveis no contexto da pande-mia. Isto porque tanto os promotoresdo software como os utilizadores "es-tão a dispor de direitos fundamentaisno âmbito da privacidade e acesso a
dados", na perspetiva do professor da
Faculdade de Direito da Universidadede Lisboa. "E isso leva-nos a perguntarse estes são direitos disponíveis ou se
todos os nossos direitos fundamentaissão irrenunciáveis. Foi o que discutimos
Detalhes A StayAway foi
apresentada ao pormenorao poder político no dia28 de fevereiro, na reuniãono Infarmed, em Lisboa
"COM ADESÃO
VOLUNTÁRIA E
GARANTIA DE QUE OS
DADOS SÃO ANÓNIMOS,
A QUESTÃO DA
ÇONSTITUCIONALIDADEÉ ULTRAPASSADA"
ISABEL MOREIRA, deputada do PS
há uns anos sobre o caso de um anãoque aceitava ser arremessado em festas.Ele tinha autonomia para o fazer ou a
Constituição deveria protegê-lo no con-texto do direito fundamental à dignidadehumana? Outro exemplo: alguém, porsua livre vontade, pode tornar-se escravode um credor?"
UM QUARTO DOS PORTUGUESESDESPROTEGIDOSPor sua vez, Isabel Moreira, deputadado PS, nota que, embora não conheçaem concreto a StayAway, "os problemasde constitucionalidade" são superáveis."Havendo adesão voluntária, consenti-mento das pessoas e a garantia de queos dados são anónimos, essa questão é
ultrapassada", clarifica. A grande reservada constitucionalista reside, contudo, naeficácia do sistema. Em primeiro lugar,destaca, "porque não basta que a app sejanacional", visto que estamos a combateruma pandemia e o rastreio precisariade ser feito também a estrangeiros quevenham a Portugal e a portugueses quese desloquem para países terceiros. Alémdisso, aponta Isabel Moreira, o sucesso
da app estará dependente da "adesãomassiva ao sistema". Simplificando, "quetoda a gente tivesse smartphone e quetoda a gente quisesse aderir".
Rui Oliveira assegura que a sua equi-pa, composta por 18 especialistas, nãodesconsiderou nenhuma das variáveis.Para que a app esteja cá fora, diz, faltaassegurar a "interoperabilidade euro-peia", ou seja, mecanismos para "avaliaro risco quando formos ao estrangeiro evice-versa''.
Quanto ao universo potencialmenteabrangido, os números nacionais são
encorajadores, mas haverá sempre umângulo morto nestas soluções para acrise sanitária. Segundo dados da Au-toridade Nacional de Comunicações(Anacom), no final de 2018, 96,8% da
população tinha telemóvel. Dessa fatia,os smartphones representariam 79,5%dos dispositivos. Conclusão: em média,um em cada quatro portugueses nãoconseguiria instalar a StayAway. RuiOliveira não escamoteia as dificuldadesque possam surgir. "Quem não usar a
aplicação está fora do jogo", remata. [email protected]
Dúvida Graça Freitasou Marta Temido podem ficarresponsáveis pelo sistema.Terceira hipótese: a FCT
"É PRECISO FICAR CLARO
QUE, MESMO DURANTE
OS 14 DIAS, EM NENHUMA
CIRCUNSTÂNCIA
OS DADOS SERÃO
CEDIDOS A ENTIDADES
TERCEIRAS"
PAULO PORTAS, ex-ministro
TECNOLOGIAJ=^