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PONTÍFICA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
Grazziani Barreto Colombo
Participo logo existo: Uma análise sobre a propagação de informações e a percepção de
existência nas redes sociais
MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
SÃO PAULO
2015
1
PONTÍFICA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
Grazziani Barreto Colombo
Participo logo existo: Uma análise sobre a propagação de informações e a percepção de
existência nas redes sociais
MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título de
Mestre em Comunicação e Semiótica, sob a
orientação do Prof. Doutor Rogério da Costa.
SÃO PAULO
2015
2
Banca Examinadora:
___________________________________________________
___________________________________________________
____________________________________________________
3
Dedico este trabalho a minha família pelo
apoio e motivação e em especial a
Lizandra e Alice, pelo companheirismo,
amor e paciência.
4
RESUMO
Esta pesquisa tem como objeto as redes sociais, especificamente o Facebook, compreendendo
participações e interações na rede. O objetivo é investigar o fenômeno da propagação de
informações sob o seguinte ângulo: participar é existir. Para tanto, foram estudadas as
variáveis de influência, comunicação e reputação implicadas na propagação e nas formas de
participação, as quais qualificam a existência dos indivíduos na rede. A problemática
envolvida é que as formas de participação dos usuários nas redes sociais estão em um
movimento transitório que altera sua percepção de existência no meio. Não há uma
estabilidade entre os tipos de interação que geram a propagação de informação. Essas formas
estão ligadas às atuais estruturas das redes sociais: se elas mudam, as formas de participação
também se alteram e por consequência o feedback dos pares e a sua percepção de existir na
rede. A propagação também depende do algoritmo da rede, que define as regras e os limiares
de distribuição de conteúdo. Assim, para que a difusão aconteça, será necessário o alcance de
dois limiares de decisão: o do usuário e o do algoritmo. A hipótese é que a participação do
usuário qualifica sua existência nas redes sociais on-line. Participar é existir. Através dos
estudos de Granovetter – sobre as forças entre as conexões dos usuários e dos limiares de
decisão em participações coletivas, Gladwell e Christakis – sobre as influências das conexões
em rede – o projeto apresenta bases teóricas para avançar no entendimento da difusão de
informações nas redes sociais. Os laços fortes dos usuários são engrenagens fundamentais
para o alcance dos dois limiares dentro da rede. O caso analisado é o “Desafio do balde de
gelo” (Ice Bucket Challenge), um movimento em prol da Associação Americana de Esclerose
Lateral Amiotrófica (ALSA). A operação funcionava da seguinte forma: uma pessoa
derramava um balde de água com gelo sobre a cabeça e desafiava três outras pessoas a fazer o
mesmo dentro de 24 horas ou doar US$ 100 para a associação. A propagação atingiu dezenas
de milhões de pessoas e fez com que a Associação arrecadasse 45 vezes mais doações que o
ano anterior. O esclarecimento que se buscou sobre como a propagação de informações nas
redes sociais e sua relação direta com a existência dos indivíduos possibilita levantar novas
questões e análises em relação ao limiar de decisão dos algoritmos, bem como as novas
definições do que é participar na rede.
Palavras-chave: Redes sociais. Propagação de informação. Existência. Indivíduo conectado.
Laços fortes. Participação.
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ABSTRACT
This research has as object social networks, specifically Facebook, including participations
and interactions on the network. The aim is to investigate the phenomenon of the spread of
information under the following approach: to participate is to exist. To that end, variables of
influence, communication and reputation involved in the spread and in the forms of
participation, which qualify the existence of individuals in the network were studied. The
issue involved is that user's forms of participation on social networks are in a transitional
movement that changes his perception of existence in the digital environment. There is no
stability among the types of interactions that generate the spread of information. These forms
are linked to the current structures of social networks: if they change, the forms of
participation are also changed, and therefore, the feedback from peers and their perception of
existence on the network. The spread also depends on the network algorithm, which defines
the rules and content distribution thresholds. Thus, for the diffusion to happen, two decision
thresholds will be needed: the user's and the algorithm's. The hypothesis is that user
participation qualifies its existence on online social networks. To participate is to exist.
Through Granovetter's studies - on the forces between the connections of users and decision
thresholds in collective participation, Gladwell and Christakis - about the influences of
network connections - the project presents theoretical grounds to advance in the
understanding of the dissemination of information on social networks. Users' strong ties are
crucial cogs to the scope of the two thresholds within the network. The analyzed case is the
"Ice Bucket Challenge", a movement in favor of the Amyotrophic Lateral Sclerosis
Association (ALSA). It worked as follows: a person would pour a bucket of water with ice on
his head and challenge three others to do the same within 24 hours or donate $ 100 to the
association. The message reached tens of millions of people and led the Association to raise
45 times more donations than the previous year. The clarification sought about how the spread
of information in social networks and its direct relationship with the existence of individuals,
makes it possible the raise of new issues and analysis related to algorithms decision
thresholds, as well as new definitions of what is to participate of/to belong to a social
network.
Keywords: Social Networks. Spread of information. Existence. Connected individual. Strong
ties. Participation.
6
SUMÁRIO
1. Introdução ................................................................................................................................................. 9
2. Mundo Conectado................................................................................................................................ 12
2.1 O fórum e seus especialistas .................................................................................. 12
2.2 Redes sociais e laços de conexões ......................................................................... 16
2.3 Sobre o Facebook e o controle da rede ................................................................. 23
2.4 Capital Social ........................................................................................................ 29
3. Propagação de Informações ............................................................................................................ 36
3.1 Contágio ............................................................................................................... 36
3.2 Tecnologia e informação ....................................................................................... 40
3.3 O que é mesmo participar? ................................................................................... 44
3.4 Feedback da rede pra percepção de existência ...................................................... 45
4. Estudo de Caso: Desafio do balde de gelo ................................................................................. 52
4.1 Elementos da propagação ...................................................................................... 56
4.2 Participar pelo feedback ......................................................................................... 58
4.3 Motivadores e gatilho ............................................................................................ 60
5. Considerações finais............................................................................................................................ 63
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................................................ 66
7
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Orson Wells em seu programa de radio em 1938 ........................................... 10
Figura 2: Mapa de rede de um fórum de discussão ........................................................ 13
Figura 3: Detalhe do mapa de rede do fórum com o especialista no centro. .................. 14
Figura 4: Interface num fórum de discussão com interação entre usuários.................... 15
Figura 5: Mapa de uma rede social, ilustrando as conexões de laços fortes e fracos. .... 19
Figura 6: Mapa do Facebook de um usuário. ................................................................. 21
Figura 7: Mapa do Facebook de um usuário. O usuário central da rede está destacado em
vermelho e está conectado a todos os outros usuários da sua rede................................. 22
Figura 8: Separação dos grupos sociais e conectores sociais no mapa do facebook de um
usuário. ........................................................................................................................... 22
Figura 9: Mapa do facebook de um usuário, identificando os conectores sociais que fazem a
ponte entre grupos. ......................................................................................................... 23
Figura 10: Diagrama de limiares de decisão do algoritmo Edgerank do facebook ........ 25
Figura 11: Mapa de uma rede com marcação para alguns usuários com diferentes
centralidades ................................................................................................................... 32
Figura 12: Gráfico sobre a mudança de comportamento entre os usuários do facebook de
acordo com a mudança de relacionamento através do volume de publicações. ............. 47
Figura 13: Gráfico sobre a mudança de comportamento entre os usuários do facebook de
acordo com a mudança de relacionamento através do volume de publicações emotivas.48
Figura 14: Visualização da relação de dois indivíduos conectados no facebook. .......... 49
Figura 15: Fluxograma da percepção de existência dos indivíduos no facebook. ......... 50
Figura 16: Primeira publicação que originou a propagação do “Desafio do balde do gelo”
........................................................................................................................................ 52
8
Figura 17: Duas outras publicações do “Desafio do balde do gelo” porém ligada a outro objeto
........................................................................................................................................ 53
Figura 18: Publicação no facebook de Pete Frates que deu início da propagação. ........ 54
Figura 19: Gráfico de adoção dos americanos e não americanos na participação do “Desafio
do balde de gelo”. ........................................................................................................... 55
Figura 20: Adoção de mais de 26 milhões de pessoas em pouco mais de 10 dias no facebook.
........................................................................................................................................ 56
Figura 21: Mapa das celebridades participantes da propagação do “Desafio do balde de gelo”
........................................................................................................................................ 59
Figura 22: Mapa macro da propagação do “Desafio do balde de gelo” ......................... 60
9
INTRODUÇÃO
A noite do dia 30 de outubro de 1938 parecia ser como todas as outras nos Estados
Unidos, se não fosse pela histeria coletiva por acreditar que o país estava sob ataque de forças
alienígenas. Assim como milhões de outras pessoas em todo o planeta, os americanos
encerravam seu dia ouvindo rádio. E naquele dia a Columbia Broadcasting System (CBS)
interrompeu sua programação musical para noticiar uma suposta invasão de marcianos. A
“notícia em edição extraordinária”, que na verdade era o começo de uma peça de radioteatro,
desencadeou pânico em várias cidades norte-americanas. “Guerra dos Mundos”, uma ficção
de Herbert George Wells e adaptada por Orson Welles, durou apenas uma hora, mas marcou
definitivamente a história do rádio. A CBS calculou, na época, que o programa foi ouvido por
cerca de seis milhões de pessoas, das quais metade o sintonizou quando ele já havia
começado, perdendo a introdução que informava tratar-se do radioteatro semanal. Pelo menos
1,2 milhão de pessoas acreditou ser um fato real. Dessas, meio milhão teve certeza de que o
perigo era iminente, entrando em pânico, sobrecarregando linhas telefônicas, com
aglomerações nas ruas e congestionamentos causados por ouvintes apavorados tentando fugir
do perigo.
Não há dúvida de que a informação advinda da peça de Welles foi propagada para
muitas pessoas. Alguns pontos são interessantes de serem observados. O formato escolhido já
era do costume dos ouvintes, como: reportagens externas, entrevistas com testemunhas,
opiniões de peritos e autoridades, efeitos sonoros, sons ambientes, gritos, a emoção dos
supostos repórteres e comentaristas. Tudo dava a impressão de o fato estar sendo transmitido
ao vivo. Outro ponto foi a intencionalidade de Welles influenciando os ouvintes a realmente
acreditar que aquilo estava acontecendo. Davidson Taylor, supervisor da CBS, queria que
Welles interrompesse a transmissão e tranquilizasse os ouvintes que bloquearam as linhas da
rádio. Welles teria se recusado, dizendo que o público tinha mesmo é de ficar apavorado. Por
último, pelas características do meio, os ouvintes não tinham a possibilidade de se
comunicarem entre si de forma rápida, gerando uma propagação localizada. O medo paralisou
três cidades e houve pânico principalmente em localidades próximas a Nova Jersey, de onde a
CBS emitia e onde Welles ambientou sua história (figura 1). Houve fuga em massa e reações
desesperadas de moradores também em Newark e Nova York.
10
Figura 1 – Orson Welles em seu programa de rádio em 1938
Fonte: Time (2008).
Mais de meio século após o acontecido, têm-se a internet e as redes sociais como os
maiores meio e plataforma para a replicação e propagação de informações. Se o mesmo
“trote” de Welles acontecesse hoje com a internet e as redes sociais, ocorreria uma
propagação não localizada, muito mais rápida, mas com um ponto em comum: o mesmo grau
de superficialidade. O rádio na época, com o espanto das pessoas frente ao que estava
acontecendo e somente o telefone como dispositivo rápido para troca de informações com
outras pessoas, não tinha possibilidade de se aprofundar muito no assunto. A comunicação era
um para um e acabava assim não formando uma opinião coesa sobre o ocorrido. O fluxo de
conteúdo reproduzido leva consigo o filtro e repertório do agente transmissor, que imprime a
sua verdade baseada em suas referências sociais e culturais. Com essa impressão do
transmissor, o receptor se questiona muitas vezes sobre a verossimilhança da informação,
como aborda Charaudeau (2010, p. 37, grifo do autor):
[...] O que é a “autenticidade” de um fato? O que é a “verossimilhança” de um fato?
Qual é a sua “pertinência” enquanto fato de informação? Tais indagações
correspondem a questões que o receptor poderia formular: “será que isso existe?” (é
“existencialmente” verdadeiro?); “será que isso é possível?” (é possivelmente
verdadeiro?); “será que isso precisa ser comunicado?” (será pertinente?). [...]
11
No caso das redes sociais, as informações circulam de todos para todos, mas cada um
possui seu grau de influência perante a sua rede, fazendo com que seu compartilhamento
sobre alguma informação, muitas vezes, não passe por um aprofundamento da informação por
parte de quem a recebe. Assim, a informação é propagada muito rapidamente e, assim como
aconteceu com o rádio, pode não representar a realidade.
12
1 MUNDO CONECTADO
1.1 O fórum e seus especialistas
A relação e o encontro das pessoas com a informação na internet se deram através das
comunidades e fóruns de discussão. Desde a Tripod (comunidade on-line), que nasceu no
início dos anos 90, e o Geocities, que veio logo após, abriu-se a primeira massa de conteúdos
na internet, estes centralizados no assunto de cada site, grupo ou discussão.
As pessoas ou membros desses grupos utilizavam tal plataforma e até hoje é comum a
utilizarem para se aprofundar em determinado assunto, desde como comprar uma TV,
conhecer e discutir as suas características e funções a aprender novas receitas e discutir
formas de aprimoramento do prato. Os tópicos ou threads, como são chamados, formam um
agregador de informações de todas as mensagens que são enviadas para os membros. A forma
de chamar a atenção dos usuários ficava concentrada nas mensagens correspondentes àqueles
assuntos. Existia também uma moderação por parte do administrador do fórum e uma
automoderação por parte dos membros em relação à redundância e relevância dos assuntos
abordados, afinal threads que foram abertas, discutidas e fechadas não poderiam mais receber
a mesma informação. Os próprios membros direcionavam os novos para os assuntos já
abordados. Acontecia uma espécie de acolhimento dos novos membros do fórum.
[...] O acolhimento depende diretamente da conectividade do sistema, ou seja, dos
mecanismos de atração, repulsão e seleção de novos elementos. Normalmente todo
elemento deve satisfazer às condições de permanência do sistema como um todo, ou
seja, deve ser de interesse do sistema acolher o novo elemento. [...] Os novos
tornam-se assim obrigados a aceitar rituais de iniciação, rituais de passagem, testes,
exames, provas, etc. (VIEIRA, 2007, p. 116).
Esse acolhimento é condicional, afinal era necessária para o fórum a chegada de novos
elementos para poder fazer circular informações e conhecimento. E os novos usuários
estavam à procura de novas informações e aprofundamento sobre seu assunto. Toda mesa de
discussão possui um ou mais especialistas – experts nos assuntos discutidos na comunidade e
que detêm o respeito dos demais – e nos fóruns on-line era exatamente dessa forma. Os
especialistas, assim como os demais usuários, eram rotulados no fórum de acordo com a sua
maturidade, atividade e volume de respostas no grupo. Essa era a forma com que a atenção
dos membros era direcionada dentro das discussões. Esse rótulo ou avaliação era como uma
gratificação e reconhecimento do sistema para o membro, como explica Vieira (2007, p. 118):
13
[...] O novo elemento pode agora usufruir a partilha das propriedades sistêmicas, das
grandes formas de autonomia que isso garante. Reconhecimento, valor, respeito,
fama, salário, etc. No caso de intelectuais, geralmente a forma mais esperada de
gratificação é o valor gerado pelo reconhecimento e pelo respeito. Como dizia o
velho tocador de blues, “o que a gente quer é que eles digam: ele era bom, ele sabia
tocar”.
Os membros do fórum influenciavam uns aos outros mesmo sem ter algum vínculo
social, pois a sua influência não dependia de tais vínculos. Elas eram concedidas através de
suas discussões bem sucedidas e do feedback do sistema através dos rótulos. Os novos
membros que lançavam suas perguntas nos threads e recebiam a visita e mensagem de um
membro com o rótulo de especialista que concedia respeito como se o especialista fosse o
líder daquele local, daquela sociedade.
Figura 2 – Mapa de rede de um fórum de discussão
Fonte: SNAPP (2015 ).
Na figura 2 é possível perceber alguns estudantes no centro das discussões do grupo.
Eles são os grandes provedores de informação para os demais estudantes. Os estudantes do
centro (especialistas) só distribuem a informação, não recebem, pois não há conteúdos da
maioria que possam acrescentar em seu campo de estudo dos novos membros. Visualizando
outro mapa, com o centro aproximando, pode-se ver o especialista (tutor) recebendo
perguntas e enviando respostas para os outros membros, como mostra a figura 3 a seguir.
14
Figura 3 – Detalhe do mapa de rede do fórum com o especialista no centro
Fonte: Google (2015).
Outro elemento interessante nos fóruns de discussão é a presença de avatares. Como
os membros não precisam se valer de conexões sociais para ter uma participação fluida nos
grupos, eles lançam mão de apelidos e avatares para compor o seu perfil e ficam conhecidos
no fórum através de suas próprias composições. O termo avatar foi utilizado em 1986 no jogo
de videogame Habitat para representar corpos virtuais (MORABITO, 1986). Segundo Castells
(1999), assim como os avatares, a realidade como é vivida sempre foi virtual porque é
inevitavelmente percebida por meio de símbolos:
Quando os críticos da mídia eletrônica argumentam que o novo ambiente simbólico
não representa a “realidade”, eles referem-se a uma absurda ideia primitiva de
experiência real “não-codificada” que nunca existiu. Todas as realidades são
comunicadas por intermédio de símbolos. E na comunicação interativa humana,
independente do meio, todos os símbolos são, de certa forma, deslocados em relação
ao sentido semântico que lhes são atribuídos. (CASTELLS, 1999, p. 459).
Em alguns fóruns de discussão os usuários relacionam seus avatares a seus nomes
verdadeiros, mas o que prevalece em importância é a sua contribuição e feedback dentro do
grupo.
15
Figura 4 – Interface num fórum de discussão com interação entre usuários
Fonte: HTFORUM (2015).
No caso da figura 4, têm-se dois usuários de um fórum. O primeiro usuário é o
especialista, agente centralizador e criador de conteúdo dentro do grupo. Como visto
anteriormente, ele possui diversas conexões com outros usuários, gerando conteúdo e
recebendo feedback. Normalmente este tipo de usuário não trabalha como ponte para outros
grupos de outros assuntos dentro do fórum. Ele atua como o expert em determinados assuntos.
Ele não faz a propagação para outros usuários no fórum. Quem tiver interesse, acessa a thread
e consome a informação. O especialista é apenas um dos personagens da propagação de
informações. O segundo usuário na imagem da figura 4 é o consumidor. Ele acessa o
conteúdo do especialista e dá o feedback, agradecendo-lhe o material criado. Na mecânica dos
fóruns de discussão esse tipo de interação não atua na propagação, apesar de influenciar
outros usuários a dar feedback. Em outras plataformas com contexto social, verifica-se que a
interação dos usuários é agente propagador independente do tipo de mensagem. Os
especialistas criam conteúdos de forma espontânea, o que leva a que se questione qual seria
sua motivação, já que não há retorno financeiro e muitas vezes também não há feedback das
pessoas que consomem. De acordo com Gladwell (2009), a grande motivação dos
especialistas é que, uma vez sabendo ou descobrindo algo, eles querem divulgar essa
informação. Eles possuem uma motivação social acerca do seu conhecimento. Eles querem
que todos saibam o que eles sabem e que aproveitem esse conhecimento em suas vidas. O
curioso é que suas motivações não estão ligadas ao fato de quererem ajudar as pessoas em
suas decisões, e sim sobre as suas paixões sobre tais assuntos. Eles compartilham o conteúdo
16
que sabem porque adoram o assunto e não porque querem ajudar outras pessoas. Ajudar
outras pessoas e não a elas próprias é consequência de suas motivações. É como se eles
precisassem do aproveitamento de outras pessoas sobre os seus conteúdos para atingir suas
plenitudes como especialistas. Ser especialista sem que outras pessoas se beneficiem não vale.
O valor não está na propagação de seu conhecimento, e sim na aplicação. Há outros
personagens e elementos na propagação de informações, que serão vistas mais adiante.
1.2 Redes sociais e laços de conexões
Uma rede social é definida como um conjunto de dois elementos: atores (pessoas,
instituições ou grupos; os nós da rede) e suas conexões (interações ou laços sociais)
(WASSERMAN; FAUST, 1994; DEGENNE; FORSE, 1999). Uma rede, assim, é uma
metáfora para observar os padrões de conexão de um grupo social com base nas conexões
estabelecidas entre os diversos atores. A abordagem de rede tem, assim, seu foco na estrutura
social, na qual não é possível isolar os atores sociais nem suas conexões (RECUERO, 2009).
As redes sociais como são conhecidas surgiram com o SixDegrees.com em 1997. A rede
permitia enviar mensagens, postar conteúdos para amigos, familiares e conhecidos em até três
graus de separação e poderia também visualizar a sua conexão com qualquer usuário da rede.
Pela primeira vez o assunto não era mais o agente centralizador, ele passava a ser a
informação que transitava entre as pessoas nas redes sociais através de conexões. O recurso
distintivo das redes sociais é que elas tornam nossa rede de conexões visível ao usuário e aos
outros. Além disso, diferentemente de outros tipos de grupos on-line ou comunidades, como o
wikis, as redes sociais são organizadas em torno de pessoas, não de tópicos. As redes sociais
on-line atuais refletem basicamente interações off-line. Embora nos permitam manter contato
com pessoas com as quais teríamos de outro modo apenas vínculos fracos (como antigos
companheiros de quarto, colegas do colégio, pessoas que encontramos brevemente em festas e
assim por diante), as redes não são organizadas em torno da apresentação de estranhos. Um
dos pontos de sucesso da rede social da atualidade, o Facebook e dos fracassos das antigas,
como o SixDegrees, foi a restrição da visualização dos usuários na rede. Diferentemente do
SixDegrees, que mostrava até três graus de conexão e visualização de qualquer usuário da
rede, o Facebook permitiu que as pessoas visualizassem apenas amigos diretos (um grau) e,
ocasionalmente, amigos de amigos (dois graus, por meio do recurso “Amigos em comum”).
Isso reduz o número de links entre pessoas totalmente desconhecidas e faz os usuários
sentirem que sua vida on-line é relevante para suas redes sociais reais (CHRISTAKIS;
17
FOWLER, 2010). As redes sociais que criamos têm vida própria. Elas crescem, mudam,
reproduzem, sobrevivem e morrem. As coisas fluem e mudam dentro delas. Uma rede social é
um tipo de superorganismo humano, com anatomia e fisiologia – estrutura e função –
próprias. O superorganismo humano faz o que nenhuma pessoa pode fazer sozinha. Nossas
contribuições locais para a rede social têm consequências globais que tocam a vida de
milhares de pessoas diariamente e nos ajudam a alcançar muito mais do que a construção de
torres ou destruição de muralhas.
[...] as redes sociais têm propriedades emergentes. Propriedades emergentes são
novos atributos de um todo que resultam da interação e da interconexão das partes.
A ideia da emergência pode ser entendida com uma analogia: um bolo tem um gosto
não encontrado em nenhum de seus ingredientes. Nem seu gosto é a média dos
sabores dos ingredientes – algo, digamos, a meio caminho entre a farinha e os ovos.
Ele é muito mais do que isso. O gosto de um bolo transcende a soma simples de seus
ingredientes. Do mesmo modo, o entendimento das redes sociais permite entender
como, de fato, no caso dos seres humanos, o todo vem a ser maior do que a soma de
suas partes. (CHRISTAKIS, 2010, p. 20, grifo do autor).
As conexões de uma rede social são formadas através de seus laços sociais,
constituídos das interações entre os pares. Os laços sociais podem ser fortes e fracos. De
acordo com Granovetter (1973, p. 1.361), “the strength of a tie is a (probably linear)
combination of the amount of time, the emotional intensity, the intimacy (mutual confiding)
and the reciprocal services which characterize the tie”. Laços fortes constituem-se em vias
mais amplas e concretas para as trocas sociais (WELLMAN, 2001), enquanto os fracos
possuem trocas mais difusas. Granovetter (1973) constatou que os chamados “Laços Fracos”
são fundamentais para a disseminação da inovação, por serem redes constituídas de
indivíduos com experiências e formações diversas. Nas redes de “Laços Fortes” há
intimidade, proximidade, maior confiança, familiaridade, maiores interesses em comum. As
trocas e dinâmicas construídas nessas interações não se estendem além do pequeno grupo, por
isso mesmo, nas referidas redes, procuram-se referências para a tomada de decisão; são
relações com alto nível de credibilidade e influência. Indivíduos que compartilham “Laços
Fortes” comumente participam de um mesmo círculo social, ao passo que os indivíduos com
os quais se tem relações de “Laços Fracos” são importantes porque nos conectam com vários
outros grupos, rompendo a configuração de “ilhas isoladas” dos clusters e assumindo a
configuração de rede social. Nesse sentido, as relações baseadas em “Laços Fortes” levam a
uma topologia da rede, isto é, definem a configuração dos nós da rede de conexões entre os
indivíduos na rede, no qual as relações de “Laços Fracos” funcionam como bridges (pontes)
desses clusters. Quanto menos relações de “Laços Fracos” existirem numa sociedade
18
estruturada em clusters (“Laços Fortes”), menos bridges e menos inovação. Para
exemplificar, podem ser consideradas duas situações. A primeira é a necessidade de se pedir
um conselho a algum amigo sobre uma questão pessoal ou enviar um convite para a festa de
aniversário de sua filha. Nos dois exemplos você recorrerá a pessoas próximas à sua rede, que
possuem um certo grau de intimidade e proximidade. Em outra situação você recebe uma
novidade sobre um avanço científico, informações sobre a turnê do Paul McCartney ou
mesmo um vídeo sobre um escândalo político. Mesmo recebendo por ventura do seu grupo
próximo, muito provavelmente você venha a receber de pessoas relacionadas à sua rede,
pessoas que não possuem uma relação próxima a você. Tais pessoas são fundamentais para
você perceber e consumir novos conteúdos e disseminá-los. Entretanto, apesar de enfatizar a
relevância dos “Laços Fracos” na difusão de inovações, Granovetter (1973) alerta para o fato
de que não há uma aceitação direta e imediata das mesmas. Para que os indivíduos adotem as
inovações, é necessário que haja sentimentos de identificação e confiança entre os membros
da comunidade, o que remete ao papel das redes de “Laços Fortes”. Em síntese, pode-se
pensar os “Laços Fracos” como redes eficientes no transporte de informação, mas não tão
eficientes para provocar uma decisão (GRANOVETTER, 1973). Costa (2002, p. 6-7)
complementa:
[...] para se incrementar os laços sociais é preciso investir na construção e no
desenvolvimento de relações de confiança e isso requer, no mínimo, anos de
encontros e interações. É fato que a confiança é mais facilmente destruída do que
construída e que sua produção não é sem custos, requer investimento, pelo menos de
tempo e esforço, se não financeiro.
Para complementar sobre a força dos laços fracos, Gladwell (2009) descreve que
Granovetter (1995) no seu clássico estudo de 1974, Getting a Job, examinou centenas de
profissionais e técnicos do subúrbio de Newton, em Boston, entrevistando-os sobre detalhes
de como eles conseguiram seus postos de trabalho. Granovetter descobriu que 56% obtiveram
seu emprego por intermédio de alguém conhecido. Outros 18,8% usaram os meios formais –
anúncios e caçadores de talentos – e cerca de 20% se apresentaram diretamente. Isso não é
novidade – a melhor maneira de entrar em algum lugar é por meio de um contato pessoal.
Mas, curiosamente, Granovetter descobriu que, desses contatos pessoais, a maioria eram laços
“fracos”. Dos que recorreram a alguém para conseguir um emprego, apenas 16,7% viam esse
indivíduo com frequência – como um amigo – e 55,6% o viam apenas de vez em quando.
Vinte e oito por cento o viam raramente. As pessoas não estavam conseguindo se empregar
por intermédio de amigos, e sim de conhecidos. Granovetter diz que isso acontece porque, na
19
hora de encontrar um novo emprego – ou novas informações e novas ideias –, os “laços
fracos” são sempre mais importantes do que os fortes. Nossos amigos, afinal de contas,
ocupam o mesmo mundo que nós. Talvez trabalhem ao nosso lado ou morem perto de nós,
frequentem a mesma igreja, escolas ou festas. O que mais eles saberiam, então, que ainda não
sabemos? Os simples conhecidos por sua vez ocupam por definição um mundo bem diferente
do nosso. É mais provável que estejam a par de algo que ignoramos. Os conhecidos, em
resumo, são uma fonte de poder social, e, quanto mais numerosos eles forem em nossa vida,
mais poderosos seremos. Dependemos deles para ter acesso a oportunidades e mundos a que
não pertencemos.
Figura 5 – Mapa de uma rede social, ilustrando as conexões de laços fortes e fracos
Fonte: Sentinel (2015).
20
A figura 5 ilustra os laços fracos e as pessoas que fazem estas conexões de um grupo
para o outro são importantes para a propagação de informações. Elas são responsáveis por
pegar informação de um grupo pequeno e transmitir para demais grupos. Esses conectores
serão chamados de Comunicadores (GLADWELL, 2009).
Para ilustrar o que foi abordado até o momento, foi feito um mapeamento da minha
própria rede no Facebook em que pude visualizar os grupos separados por afinidade e os
usuários que têm um papel de conector social entre grupos.
A figura 6 representa o mapa da minha própria rede. Já é possível visualizar um
grande grupo, dois grupos médios e um menor. A vida do usuário no Facebook reflete a vida
do indivíduo, quanto tempo passa mais com determinados grupos, comunidades e com
quantas pessoas mantêm contato rotineiramente. Nesse caso, o maior grupo representado na
figura 6 é o do meu trabalho, que representa mais a conexão literal do que a troca de
informações e experiências pessoais na rede. O que eu quero dizer é que se temos uma
conexão no trabalho, poderemos ter no Facebook, mesmo que não troquemos nenhuma
informação pessoal. As informações trocadas nesse grupo são compostas muitas vezes de
novidades e inovações advindas dos amigos (estas conexões) e dos amigos destes amigos
(laços fracos). Os dois grupos médios são grupos de familiares, compostos de laços próximos,
em que se trocam majoritariamente informações pessoais. Informações estas que giram em
assuntos já conhecidos, apesar de interessantes.
21
Figura 6 – Mapa do Facebook de um usuário
Fonte: YASIF (2015).
De forma destacada, na figura 7 é possível me observar no centro da minha fazendo
conexão com cada usuário de cada grupo.
22
Figura 7 – Mapa do Facebook de um usuário. O usuário central da rede está destacado em vermelho e está
conectado a todos os outros usuários da sua rede
Fonte: YASIV (2015).
Figura 8 – Separação dos grupos sociais e conectores sociais no mapa do Facebook de um usuário
Fonte: YASIF (2015).
23
Com o destaque é possível perceber com mais clareza os grupos e os usuários que
fazem a conexão social entre eles. Cada usuário com que estou conectada também possui suas
conexões e sua rede. Alguns destes possuem um papel importante na minha rede. Ao fazer a
conexão entre os grupos da rede, significa que eles são os que possuem mais amigos em
comum da minha rede comigo, assim se tornam usuários com alta afinidade para mim,
fazendo com que eu receba seus conteúdos em praticamente todas as suas publicações. Mais
adiante será explanado como funciona o recebimento dos conteúdos dentro da rede pelos
usuários, mas, pela experiência da minha própria rede, duas das variáveis que considero
importantes são o compartilhamento de conexões e a recência de interações entre eles.
Como mostrado, a centralidade de uma rede social de um determinado usuário é o
próprio usuário. Mas o que acontece caso se retire o próprio usuário da sua rede? Novos
protagonistas assumem o comando, a centralidade. São eles os conectores sociais, que,
possuindo amigos em comum, conectam usuários de diferentes grupos, fazendo com que a
rede não se desintegre. Esses usuários estão destacados de azul (figura 8). Se eles são
retirados, a rede se desmonta em grupos soltos e menores, formando novos usuários com
conexões compartilhadas (figura 9).
Figura 9 – Mapa do Facebook de um usuário identificando os conectores sociais que fazem a ponte entre grupos
Fonte: YASIF (2015).
24
1.3 Sobre o Facebook e o controle da rede
Em 2004, Mark Zuckerberg, Dustin Moskovitz e Chris Hughes, três estudantes da
Universidade de Harvard, lançaram um site projetado para colocar os estudantes em contato
uns com os outros a fim de compartilharem suas fotos e encontrarem novas pessoas. Eles o
chamaram thefacebook.com, e logo o site se tornou extremamente popular no campus de
Harvard. Um mês após seu lançamento, os criadores o expandiram para incluir estudantes de
Stanford, Columbia e Yale. Em 2005, os estudantes em 800 redes universitárias ao longo dos
Estados Unidos podiam se unir à rede, e a sua filiação cresceu para mais de 5 milhões de
usuários ativos. Em agosto do mesmo ano, o nome do site mudou para Facebook. Após 10
anos de atividade, a rede social analisada nesta dissertação, já ultrapassa 1 bilhão de usuários
ao redor do mundo.
Dentro do Facebook há uma série de interações responsáveis pelo trânsito das
informações através das conexões entre os usuários da rede. Essas interações podem ser
geradas por meio de comentários, compartilhamentos, curtidas, visualização de vídeos, fotos,
além de marcar amigos. As únicas interações não analisadas neste trabalho são aquelas
geradas a partir da comunicação de dois usuários (inbox ou messenger) ou grupos controlados
criados por usuários (grupos de bate-papo ou comunidades). Será analisada neste trabalho
toda e qualquer interação criada e enviada para a rede. O motivo da exclusão de parte das
interações é que nos tipos citados não há possibilidade de propagação de informações, visto
que a informação não está circulando pelas conexões da rede social. Toda interação e
produção de conteúdo, como uma publicação de um post gera uma comunicação do usuário
para a sua rede. Essa comunicação na rede cria uma história entre o usuário e seus pares. Cada
par tem a sua história particular mesclada com a da própria rede. Com o crescimento do
volume de usuários da rede social, a quantidade de informação gerada na rede aumentava
proporcionalmente e ficava muito difícil para os usuários acompanharem todo o conteúdo
gerado por sua rede. Cada usuário possui em média 338 amigos. Multiplique isso por três
conteúdos criados por dia e totalizamos mais de mil publicações diárias que o usuário pode
visualizar, isso sem contar publicações de páginas de marca (fan pages). Essa massificação de
conteúdos diversos entregues todos os dias ao usuário não combinava com a relevância e
contexto que cada usuário possui perante a sua rede no momento da recepção da informação e
o risco de desinteresse pela rede era iminente.
25
Seria completamente irritante e entediante se o Facebook mostrasse todas as histórias
de seus amigos. Assim, o Facebook criou um algoritmo para prever como cada história será
interessante para cada usuário. Esse algoritmo se chama “EdgeRank” porque ele classifica os
edges. Em seguida, ele filtra o feed de notícias de cada usuário para mostrar apenas as
histórias do topo do ranking para um usuário particular. O algoritmo oculta as histórias sem
relevância suficiente. Se a sua história não atingir um bom score, ninguém vai vê-la.
A primeira coisa que alguém vê quando entra no Facebook é o feed de notícias. Este é
um resumo do que vem acontecendo recentemente entre seus amigos na rede. Toda ação
tomada para a rede possui um potencial de gerar uma história no resumo de notícias. O
Facebook chama estas ações de “edges”. Isso significa que sempre que um amigo envia uma
atualização de status, comentários sobre uma outra atualização de status ou marcação de uma
foto, ele se torna fã de uma página, compartilha e curte uma foto, vídeo, texto, ou RSVP para
um evento, gera um “edge”, e uma história sobre esse edge pode aparecer no feed de notícias
de um ou mais usuários.
Figura 10 – Diagrama de limiares de decisão do algoritmo EdgeRank do Facebook
Fonte: Elaborada pelo autor.
26
Na figura 10 se pode observar que uma ação (edge) executada por um usuário para a
sua rede passa pelo EdgeRank, onde somente as mais bem posicionadas viram histórias nos
feeds de notícias dos amigos. A maioria das ações não chega aos feeds dos amigos na rede e
isso fará toda a diferença na propagação de informações, que será analisada adiante.
De acordo com o Facebook, o feed de notícias publica apenas um pouco mais do
que 0,2% das histórias que considerar. Isso significa que dos 1,2 trilhões de histórias
candidatas que o Facebook considera todos os dias, apenas 2,4 mil milhões são de fato
publicadas nos feeds de notícias. Em uma base por usuário, isso significa que cada usuário vê
apenas 60 dos cerca de 30.000 possíveis candidatos à história em um determinado dia.
EdgeRank é como um rating de crédito: é invisível, é importante, é único para cada
usuário e ninguém mais do que o Facebook sabe exatamente como ele funciona. Na
conferência anual do Facebook de 2010, três variáveis do algoritmo foram reveladas:
1. Índice de Afinidade (U)
2. Peso do Edge (W)
3. Deterioração do tempo (D)
Índice de afinidade
O índice de afinidade significa o quanto “conectado” um usuário em particular está
para o Edge. Por exemplo, eu sou amigo de meu irmão no Facebook. Além disso, eu escrevo
com frequência em seu mural (timeline), e nós temos 50 amigos em comum. Eu tenho um
índice muito alto de afinidade com o meu irmão, então o Facebook sabe que eu
provavelmente vou querer ver suas atualizações de status.
O Facebook calcula o índice de afinidade coletando as ações explícitas que os usuários
executam e alguns fatores, como: 1) a força da ação através das conexões e histórico de
interações, 2) o quão perto a pessoa que tomou a ação está de você e 3) há quanto tempo eles
tomaram a ação. As ações explícitas incluem clicar, curtir, comentar, etiquetar, compartilhar e
outras interações. Cada uma dessas interações tem um peso diferente que reflete o esforço
necessário para a ação – mais esforço do usuário demonstra mais interesse no
conteúdo. Comentando sobre algo vale mais do que meramente gostando, que vale mais do
que apenas clicando sobre o conteúdo. Passivamente a visualização de um conteúdo em seu
feed de notícias (newsfeed) não conta para o índice de afinidade, a menos que haja uma
27
interação. A mensuração do índice de afinidade não é só calculada pelas minhas ações, mas
também as ações dos meus amigos e dos amigos dos meus amigos. Por exemplo, se eu
comentei sobre uma publicação, vale a pena mais do que se o meu amigo comentou, que vale
mais do que se um amigo de um amigo comentou. Não são todas as ações dos amigos que são
tratados de forma igual. Se eu clicar numa atualização de status de alguém e escrever na sua
timeline com regularidade, as ações dessa pessoa passam a influenciar o meu índice de
afinidade significativamente mais do que um outro amigo com quem eu não interajo com
frequência. Por último, se eu era acostumado a interagir muito com alguém, mas não tanto
agora, em seguida, sua influência vai começar a diminuir. Tecnicamente, o Facebook está
apenas multiplicando cada ação por 1/x, em que x é o tempo desde que a ação aconteceu. O
índice de afinidade é unidirecional. Meu irmão tem um índice de afinidade diferente para mim
do que eu para ele. Se eu escrever na timeline do meu irmão, o Facebook sabe que eu me
importo com meu irmão, mas não sei se meu irmão se preocupa comigo.
Peso do Edge
Cada categoria de edge tem um peso padrão diferente. Isso significa, por exemplo, que
os comentários valem mais do que as curtidas. Cada ação que um usuário faz cria um edge, e
cada um desses egdes, exceto para os cliques, cria uma história potencial. Por padrão, você
provavelmente vai ver uma história em seu feed de notícias através de um comentário que um
amigo publicou algum conteúdo de uma história gerada através de uma curtida. O Facebook
muda os pesos dos edges para refletir que tipo de histórias eles acham que o usuário achará
mais envolvente. Por exemplo, fotos e vídeos têm um peso maior do que os links. É possível
que o peso dos edges possa ser modificado em um nível por usuário – eu tenho costume de
comentar em fotos, e meu amigo comenta sobre links, em seguida, eu terei um peso de edge
superior para fotos e meu amigo terá um peso maior para os links. Não está claro se o
Facebook faz isso ou não, pois a rede social não divulga os detalhes do algoritmo.
Adicionalmente o Facebook pode realmente classificar o ato de comentar, gostar, visitar uma
fan page, e mais interações dependendo da fonte. Por exemplo, tornando-se um fã através de
um anúncio pode ter uma pontuação de edge menor do que se tornar um fã ao procurar uma
fan page e, em seguida, tornar-se um fã. Apesar do Facebook não revelar alguns detalhes, essa
possibilidade faz sentido, pois, quando o usuário procura um conteúdo ou fan page,
geralmente ele se preocupa mais com histórias contidas ali do que alguém que teve um
impulso através de um anúncio. As novas funcionalidades do Facebook geralmente têm um
28
peso elevado de edge a fim de promover o recurso aos usuários. Exemplificando: quando o
Facebook Places foi lançado, os check-ins tinham um peso padrão muito alto por alguns
meses e os feeds de notícias dos usuários foram inundados com histórias como “João está no
Parque do Ibirapuera”. Geralmente, depois de algumas semanas ou meses do lançamento, o
Facebook volta a classificação da feature para um peso mais razoável.
Deterioração do Tempo
Com o tempo de criação de uma história, ela vai ficando velha e consequentemente vai
perdendo pontos. O EdgeRank é uma pontuação em execução – e não uma pontuação estática,
gerada uma única vez. Quando um usuário acessa o Facebook, a sua newsfeed é preenchida
com as histórias que possuem as edges de maior pontuação naquele exato momento no
tempo. O conteúdo do seu amigo só vai aparece em sua newsfeed se tiver uma pontuação mais
elevada naquele momento no tempo do que as outras histórias possíveis. O Facebook
multiplica a história por 1/x, em que x é o tempo desde que a ação aconteceu. Quanto maior o
tempo, menor será o valor do decaimento do tempo e impactará de forma negativa no score
do EdgeRank. Além disso, o Facebook parece estar ajustando esse fator de tempo de
atenuação com base em: 1) quanto tempo se passou desde o último acesso do usuário no
Facebook, e 2) a frequência com que o usuário acessa o Facebook.
Com a explicação dos três fatores acerca do EdgeRank, tem-se o seguinte:
∑ (edges e) = Ue x We x (1/U)e
Vale lembrar que, além do que foi exposto, não há detalhes sobre como é composto o
EdgeRank e, mesmo assim, o Facebook pode alterar as regras de coleção e distribuição de
histórias no newsfeed dos usuários.
Para possibilitar uma distribuição de histórias verdadeiramente relevantes, o Facebook
efetua a coleta de todas as informações que os usuários preenchem diretamente ou deixam
espalhadas através de suas interações. Local de nascimento, local de moradia, em qual
empresa trabalha, se está longe da família, se parou de fumar, a quais filmes assistiu, quais
esportes pratica, quais trajetos de corrida fez, quais foram as datas importantes da vida
(casamento, nascimento dos filhos), qual smartphone possui, para qual local está planejando a
próxima viagem, se viaja a trabalho, se faz transporte de casa para o trabalho, proximidades
com diferentes grupos de convivência (família, trabalho, amigos), comidas preferidas, carros,
29
sistemas operacionais e muitas outras informações. Com essa grande coleta e processamento
de informações o Facebook consegue prever qual história pode ser mais relevante para este ou
aquele usuário.
Claro que, com essa quantidade de informação pessoal, há sempre um ângulo de
privacidade necessário. De acordo com a política de privacidade do Facebook, ele se reserva o
direito de registrar tudo o que os usuários fazem no site a fim de oferecer recursos
personalizados:
Quando você usa o Facebook, você pode configurar o seu perfil pessoal, criar
relacionamentos, enviar mensagens, realizar pesquisas e consultas, formar grupos,
configurar eventos, adicionar aplicativos, e transmitir informações através de vários
canais. Coletamos essas informações para que possamos fornecer-lhe o serviço e
oferecer recursos personalizados. (POLÍTICA..., 2015).
Enquanto o Facebook oferece controles extensos de privacidade, não dá aos usuários a
possibilidade de optar por sair da coleta de dados para recursos personalizados. Isso significa
que, se você é um usuário do Facebook, ele está mantendo os dados de tudo o que você faz,
você sabendo ou não. Enquanto essa informação é sempre usada corretamente, o Facebook
será cada vez mais capaz de fornecer melhores características em sua rede como o newsfeed.
1.4 Capital Social
Nos anos 1980, surge o conceito de “Capital Social” como um ativo social decorrente
da virtude e força da conexão dos indivíduos, inserido numa visão de sociedade como
estrutura de redes. Para Putnam (2000), capital social refere-se a práticas sociais, normas e
relações de confiança entre os cidadãos; quanto maior o grau de confiança entre os membros
de uma sociedade, maior o volume de capital acumulado. Para Bourdieu (1986, p. 248-249,
tradução nossa),
O capital social é o agregado dos recursos reais ou potenciais que estão conectados à
posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de mútuo
conhecimento e reconhecimento – ou em outras palavras, a associação a um grupo –
que fornece cada um dos seus membros, com o apoio do capital de propriedade
colaborativa, uma “credencial”, que lhes dá direito a crédito, nos vários sentidos da
palavra.
O capital social pode estar nos indivíduos e em suas relações, como afirma Putnam
(2000) e presente também no coletivo através do reconhecimento concedido por meio de
associações e relações entre membros do grupo, como define Bourdieau (1986). O grau de
30
confiança nas relações sociais, abordado por Putnam (2000) como agente de potencialização
de capital social, também é comentando por Costa (2002) como um indicador do nível de
negociação entre as pessoas para estabelecer a confiança e, por consequência, seu capital
social em níveis proporcionais:
Mais profundamente pode-se constatar que o nível de capital social de uma
comunidade, além de ser um fato que aponta para o potencial de inter-relação das
pessoas e para essa capacidade de construção da confiança coletiva, é também um
indicador do nível de negociação das preferências de cada indivíduo. Nesse sentido,
avaliar o capital social de um coletivo é compreender em que etapa ou estágio se
encontra a negociação das pessoas naquele momento, se ele é precário, com
instituições fracas e violência social, ou se ele é rico, com ações coletivas claras e
nível de confiança elevado. (COSTA, 2002, p. 7 ).
O capital social e a força das relações estão diretamente ligadas ao poder de percepção
do outro. Essa percepção seria como uma espécie de feedback entre as relações. Assim como
em outras atividades, a percepção só é construída através da recorrência de interações entre os
indivíduos. Segundo Costa (2002, p. 5):
Quanto mais um indivíduo interage com os outros, mais ele está apto a reconhecer
comportamentos, intenções, valores, competências, e conhecimentos que compõem
seu meio. Inversamente, quanto menos alguém interage (ou interage apenas num
meio restrito), menos tenderá a desenvolver plenamente essa habilidade fundamental
que é a percepção do outro.
A recorrência só é possível através de alguns fatores: afinidade, relevância,
centralidade e reputação. Com os níveis de cada um desses fatores, tem-se nessa percepção a
influência exercida nas relações. A afinidade é constituída a partir do interesse em comum que
as pessoas partilham. É um tipo de modelagem que fazemos em nossa rede a partir da
associação dos perfis, como comenta Christakis (2010, p. 12-13, grifo do autor):
Os seres humanos criam e recriam deliberadamente suas redes sociais o tempo todo.
O principal exemplo disso é a homofilia, a tendência consciente ou inconsciente de
se associar a pessoas que se parecem conosco (a palavra significa, literalmente,
“amar um igual”). Sejam Hells Angels ou Testemunhas de Jeová, viciados em
drogas ou bebedores de café, democratas ou republicanos, colecionadores de selos
ou praticantes de bungee jump, a verdade é que buscamos aquelas pessoas que
compartilham nossos interesses, histórias e sonhos.
A relevância é uma variável que é diferente conforme a força do laço social.
Certamente, nos laços fortes, a relevância de determinado assunto com afinidade ao grupo se
torna forte, ao contrário dos laços fracos que podem se tornar absurdamente chatos. É fácil
perceber que aquele contato em sua rede social só fala de determinado assunto. Ele não é tão
próximo a você e, após uma série de interações do mesmo assunto, ele perde a relevância para
31
você, enfraquecendo a relação e diminuindo o capital social. Dentro de um laço forte há uma
maior percepção de relevância por ter um grau de conhecimento daquele indivíduo e
reconhecimento de suas ações. Sendo assim, há uma tolerância maior, por mais que a
relevância tenha uma tendência a cair, ela é recompensada pela proximidade e afinidade dos
pares. Outro fator gerador de relevância é originado da influência que um usuário exerce
sobre outro nas redes sociais, principalmente em usuários que influenciam um grande volume
de pessoas. A repetição de um determinado conteúdo ou conteúdos aleatórios por parte do
agente influenciador não gera diminuição da relevância. Justamente o contrário: quanto mais
próximo o influenciador estiver do influenciado, mais relevante ele será. A relevância só
diminuirá quando, por fatores externos ao agente influenciador, sua influência diminuir
perante o grupo. Com menos influência, ele passa a competir sua relevância com os demais
usuários do grupo. Continuando a publicar conteúdos de forma periódica, poderá gerar
irritação e desinteresse por parte do grupo e, caso publique de forma esporádica, distanciar-se-
á. Um exemplo desse tipo de usuário são as celebridades (artistas, atores, esportistas, etc.).
Com grande influência no mundo off-line, eles passaram a utilizar as redes sociais como
ferramenta de aproximação, relacionamento com os seus fãs e propagação de seus conteúdos,
trabalhos, estilo de vida. Nessa plataforma, os fãs puderam pela primeira vez se relacionar e
conversar com seus ídolos como pessoas comuns. Nas redes, com mais ou menos influência,
todos são usuários. Esses fãs quase que instantaneamente utilizaram suas redes para propagar
o conteúdo de seus ídolos e esses agentes influenciadores no mundo off-line tiveram a
possibilidade de exercer com mais potência sua influência no mundo on-line. Se por um lado
a propagação é uma importante ação no processo de influência, por outro lado qualquer fator
externo negativo no mundo off-line será potencializado nas redes sociais, onde,
diferentemente dos outros meios, os usuários irão falar de igual para igual com seus
influenciadores e o risco de tensão e desinteresse aumenta muito.
Outro elemento importante entre as conexões é a sua centralidade, ou seja, qual é a sua
localização e de que forma isso afeta seu capital social. Antes é necessário elencar um
elemento importante que influencia totalmente a sua localização na rede: a transitividade.
Uma relação é transitiva quando há uma relação fechada entre os elementos da rede, como a
pessoa A na figura 11 que está ligada a outra pessoa que ela liga a ela novamente. É como se
fosse um circuito fechado. Aquelas pessoas com alta transitividade normalmente estão
profundamente integradas a um grupo único, enquanto essas com baixa transitividade tendem
32
a fazer contato com pessoas de vários diferentes grupos que não se conhecem, tornando-os
mais suscetíveis a agir como ponte entre diferentes grupos (CHRISTAKIS, 2010).
Figura 11 – Mapa de uma rede com marcação para alguns usuários com diferentes centralidades
Fonte: Christakis (2010, p. 10).
Christakis (2010) cita o exemplo do divórcio de um casal para explicar o impacto de
um relacionamento transitivo. Se os pais de uma criança são casados (conectados), eles, então,
provavelmente conversam entre si, mas, se estiverem divorciados (desconectados), é provável
que não conversem. O divórcio significa que a comunicação muitas vezes tem de passar pela
criança e é muito mais difícil coordenar a educação do filho. O notável é que, embora o filho
continue profundamente conectado a ambos os pais, seu relacionamento com cada um deles
muda como consequência do divórcio. Essas mudanças resultam da perda de uma conexão
entre os pais – única conexão com a qual o filho tem pouco a ver. O filho ainda tem dois pais,
mas a sua vida é diferente dependendo de eles estarem conectados o não (CHRISTAKIS,
2010).
A centralidade de um indivíduo na rede vai depender da força das conexões das
pessoas com as quais ele está conectado. Quanto mais bem conectadas as pessoas estiverem,
menor se torna a distância que o indivíduo terá de percorrer entre uma pessoa e outra dentro
da rede. Quanto menor for a distância, mais central esse indivíduo se tornará dentro da rede.
Christakis (2010) mostra que, por exemplo: a pessoa C na figura 11 é mais central que a
pessoa D. Pergunte-se qual pessoa você gostaria de ser se uma fofoca se espalhasse, você
33
deve ser a pessoa C. Agora pergunte qual pessoa você gostaria de ser se um germe mortal se
espalhasse pela rede, certamente a pessoa D. Essa preferência é óbvia ainda que C e D tenham
o mesmo número de laços sociais. Quanto mais central o indivíduo estiver na rede, mais
possibilidades de influência ele terá para exercer sobre suas conexões, visto que ele é
percebido por muitos.
Por último, tem-se a reputação como uma das variáveis que geram a influência. A
reputação é o resultado de uma interação. Ela se caracteriza como uma avaliação das
conexões sobre suas interações e se configura justamente como a percepção do outro, o
feedback. Influenciando ou não, o indivíduo é avaliado perante seus pares. Dependendo do
resultado, a reputação pode aumentar gerando potencial de influência. Se o resultado for
negativo, gera um efeito de afastamento da conexão frente à má reputação.
O julgamento da reputação é condicional aos interesses da pessoa que está julgando.
Para a rede dela, ela é o líder e seleciona quem é relevante e qual assunto e conexão merecem
sua atenção e gratificação. Atualmente nas redes sociais, mais especificamente no Facebook,
essa gratificação que gera uma reputação é mensurada através de fãs, curtidas (likes),
compartilhamentos e outros tipos de interação. Outro aspecto importante da reputação é que
ela tem dupla função. Para a pessoa que concedeu a gratificação, a reputação serve como uma
negociação de futuras interações e, com a avaliação da pessoa, essa reputação é transitada
para suas conexões. Quanto mais fortes forem essas conexões, maior será o grau de reputação
e, consequentemente, maior o poder de influência.
A influência do usuário é mensurada atualmente por ferramentas que quantificam o
poder de influência que cada agente possui em cada rede social em que ele atua. Os números
criam uma percepção de existência em cada usuário de que as suas atividades, conteúdos
gerados e discutidos estão sendo visualizados pela rede e de alguma forma seguido e
influenciado. Essa percepção estimula o usuário a participar mais, pois funciona como uma
recompensa. Você está numa atividade em que a ferramenta mostra o seu desempenho e leva
você a se movimentar de forma coordenada. Outro fator essencial nessa mensuração é o fato
de que você não vê somente seu score de influência, mas também o dos demais usuários.
Perceber que você existe na rede, com atividade plena e feedback dos usuários sem ter
parâmetros para referência da própria rede, não seria forte o bastante para que as atividades
fluíssem e propagassem. A ferramenta que atualmente é a mais conhecida na mensuração de
influência é o Klout. Eles possuem mais de 600 milhões de usuários cadastrados e com grau
de influência visualizado através das mais de 10 bilhões de atividades sociais diárias. Os
34
usuários buscam e se engajam fortemente cada vez mais com estatísticas, números,
infográficos, ilustrações que retratam eles como centro da rede e suas influências sobre o
grupo no qual se está localizado.
Sam Fiorella foi recrutado para uma posição de VP de uma grande agência de
marketing em Toronto. Com 15 anos de experiência em consultoria para grandes marcas
como AOL, Ford e Kraft, Fiorella se sentiu confiante em suas qualificações. Mas, no meio da
entrevista, ele foi pego de surpresa quando seu entrevistador perguntou-lhe por sua pontuação
no Klout. Fiorella hesitou desajeitadamente antes de confessar que não tinha ideia do que era
uma pontuação do Klout. O entrevistador acessou o site do Klout para ver a pontuação do
candidata: 34/100. “Ele encurtou a entrevista depois disso”, diz Fiorella. Mais tarde ele soube
que tinha sido eliminado especificamente porque sua pontuação no Klout era muito
baixa. “Eles contrataram um profissional cuja pontuação era 67”. Intrigado, Fiorella passou os
seis meses após a entrevista trabalhando febrilmente para aumentar sua pontuação no Klout.
Sua pontuação aumentou, assim como o número de ofertas de emprego. “Quinze anos de
realizações não eram tão importantes quanto essa pontuação”, diz ele (STEVENSON, 2012).
Assim como o motor de busca do Google tenta classificar a relevância de cada página
web, o Klout tem a missão de classificar a influência on-line de cada pessoa. Seus algoritmos
funcionam através de dados de mídia social: se você tem uma conta pública com o Twitter, o
que torna as atualizações disponíveis para qualquer pessoa, você tem uma pontuação Klout,
quer você saiba disso ou não (a menos que você opte por ocultar ativamente no site do
Klout). Você pode complementar essa pontuação conectando mais contas como Google+,
Facebook, Instagram, Foursquare, Flickr, LastFM, Youtube ou LinkedIn. As pontuações são
calculadas usando as variáveis que podem incluir o número de seguidores, a frequência de
atualizações, a pontuação do Klout de seus amigos e seguidores, e o número de curtidas,
retweets, compartilhamentos e mais interações que recebem suas atualizações. Mas, mesmo se
você não tem ideia do que sua pontuação Klout é, há uma chance de que ela já esteja afetando
sua vida. No Palms Casino Resort em Las Vegas, no verão em 2012, recepcionistas
discretamente olhavam a pontuação do Klout dos hóspedes no momento do check-in. Alguns
hóspedes com pontuações elevadas receberam upgrades de quartos instantâneos, às vezes,
mesmo sem ser dito o porquê. Outro exemplo de mensuração de influência foi o lançamento
de um serviço pela empresa de software Salesforce.com que permitiu às empresas monitorar a
pontuação do Klout de seus clientes que publicam elogios e reclamações. Aqueles com as
pontuações mais elevadas obtinham com mais velocidade a atenção dos representantes de
35
serviço ao cliente. O site de compras de luxo Gilt Groupe, por exemplo, começou a oferecer
descontos proporcionais à pontuação Klout de um cliente.
Matt Thomson, vice-presidente de plataforma do Klout, diz que uma série de grandes
empresas de linhas aéreas e grandes varejistas estão discutindo a melhor forma de usar
pontuação do Klout. Em breve, ele prevê que as pessoas com altas pontuações vão embarcar
em aviões mais cedo, terão acesso gratuito a salas VIP, ficarão em melhores quartos de hotel e
receberão grandes descontos em lojas de varejo. “Dizemos às marcas que estas são as pessoas
em que elas deveriam prestar mais atenção”, diz Thomson (STEVENSON, 2012, tradução
nossa). As pontuações no Klout são compiladas usando algoritmos proprietários que
pretendem quantificar a influência on-line. O tamanho importa: muitos seguidores no Twitter
ou Facebook podem impulsionar o seu rating. Mas é mais importante ter uma alta
porcentagem de mensagens que são curtidas, comentadas ou compartilhadas. E apenas
interagindo com alguém que tem uma pontuação alta no Klout, pode fazer subir a sua
pontuação.
Ter noção de sua pontuação de influência acaba sendo uma forma de perceber sua
centralidade na rede como um ponto de conexão com os demais e de qual forma se é
percebido. As marcas se aproveitam desse desejo e criam interfaces muito interessantes de
visualização, como é o exemplo da Intel com o Museum of me, onde ele convida o usuário
para uma jornada em sua própria vida, uma visualização de si mesmo. Quando se inicia a
experiência é possível ver suas conexões mais próximas, as ideias trocadas e
compartilhamentos e mais uma série de exibições de sua vida social digital.
36
2 PROPAGAÇÃO DE INFORMAÇÕES
2.1 Contágio
A propagação de informações nas redes sociais pode ser entendida como epidemia. E
o contágio – o limiar entre a informação e sua propagação – pode se dar através de pequenas
mudanças no percurso da informação. Como seres humanos, somos fortemente condicionados
a fazer uma espécie de aproximação grosseira entre causa e efeito. Quando queremos
expressar uma profunda emoção ou quando pretendemos convencer alguém do nosso amor,
por exemplo, entendemos que precisamos falar com paixão e franqueza. Se a intenção é
transmitir uma notícia ruim, baixamos o tom de voz e escolhemos as palavras com cuidado.
Somos treinados para pensar que, em qualquer transação, relacionamento ou sistema, o que
entra deve estar associado de modo direto, em intensidade e dimensão, com o que sai.
Gladwell (2009, p. 16) explica com um exemplo:
Considere, por exemplo, o seguinte quebra-cabeça. Eu lhe dou uma folha bem
grande de papel e peço que a dobre uma vez e, depois, mais uma vez, e assim
sucessivamente até que você tenha repetido essa operação uma 50 vezes. Que altura
você acha que esse papel dobrado terá no final? Antes de responder, a maioria das
pessoas dobrará a folha mentalmente e dirá, num palpite, que ela terá a espessura de
uma lista telefônica ou, se forem de fato corajosas, a altura de uma geladeira. Mas a
resposta certa é que a altura desse papel dobrado seria quase igual à medida da
distância entre a Terra e o Sol. E, se ele for dobrado mais uma vez, sua altura
corresponderá ao dobro dessa distância. Em matemática isso se chama progressão
geométrica. As epidemias são outro tipo de progressão geométrica: quando um vírus
se dissemina numa população, ele vai se duplicando até chegar ao Sol em 50 etapas.
Assim como nas epidemias, existem de acordo com Gladwell (2009) três agentes na
propagação de informações:
a) A ação das pessoas que transmitem agentes infecciosos, que são os usuários nas redes
sociais;
b) Agente infeccioso em si, que é a mensagem propagada;
c) Ambiente em que o agente atua, que é o contexto da mensagem.
Existem três tipos de usuários envolvidos na propagação de informações: especialistas,
comunicadores e vendedores. Os especialistas são os bancos de dados. Os comunicadores são
a cola social: eles a espalham. E, por fim, os vendedores, que são capazes de nos convencer
quando não acreditamos no que estamos ouvindo.
37
Cada personagem na propagação possui seu grau de influência e seu capital social. O
gatilho para a propagação está em acreditar ou não que a informação trará valores positivos a
sua rede. Após acreditar, ainda é necessário retransmitir a mensagem. É preciso outros
usuários para convencer essa ação de replicação.
Os especialistas estão espalhados na rede. Eles conhecem todo o tipo de assunto e
fazem questão de explicar o que conhecem para que outros usuários possam aproveitar de
alguma forma. Nos últimos anos aumentou muito o volume de tutorais, artigos e posts com
textos, imagens e vídeos dos mais diversos assuntos, desde como se maquiar, cozinhar até
consertar e construir coisas. Esse movimento se mescla com a maneira “Do it yourself” de
fazer as coisas. Essa maneira de fazer as coisas por si mesmo invadiu as redes sociais,
ajudando muitos usuários a fazer coisas que não imaginavam que poderiam ser tão fáceis e
possíveis. Os especialistas não são os usuários que possuem grande volume de conexões com
outros grupos e não possuem características de persuasão. Os comunicadores são os
responsáveis por transmitir a informação dos especialistas para outros grupos da rede. Eles
possuem menor grau de influência do que os especialistas, porém possuem muito mais
conexões com outros usuários e com o seu grau de influência conseguem atingir muitas
pessoas na rede. Os comunicadores consomem e transmitem conteúdos de diversos assuntos,
são agentes centralizadores da rede, com muitos amigos e conexões para outros grupos. Uma
vez transmitida a mensagem, é necessário convencer os usuários sobre sua adoção e
retransmissão. É aí que entram os vendedores. Esse convencimento pode ser de diferentes
formas verbais e não verbais. O que os três personagens têm em comum é o uso de sua
influência e reputação na distribuição de suas mensagens.
Sobre o uso de influência, Christakis (2010) cita o famoso experimento da calçada
feito pelo psicólogo Stanley Milgram, que ilustra a importância do reforço – persuasão – a
partir de diversas pessoas. Em duas tardes frias do inverno de 1968, em Nova York, Milgram
observou o comportamento de 1.424 pedestres à medida que caminhavam ao longo de uma
rua com mais ou menos 15 metros. Ele posicionou na calçada “grupos de estímulo”, cujo
tamanho variava de 1 a 15 assistentes de pesquisa. No momento correto, esses grupos
artificiais parariam e olhariam para uma janela no sexto andar de um edifício próximo, por
precisamente um minuto. Não haveria nada de interessante na janela, apenas outro assistente
de Milgram. Os resultados foram filmados e os assistentes, mais tarde, contaram o número de
pessoas que pararam ou olharam para onde o grupo de estímulo olhava. Embora 4% dos
pedestres tenham parado ao lado de um “grupo” composto de uma única pessoa olhando para
38
cima, 40% pararam quando havia 15 pessoas no grupo de estímulo. Evidentemente, as
decisões do transeunte de copiar um comportamento foram influenciadas pelo tamanho do
grupo que o exibia. Uma porcentagem ainda maior de pedestres copiou o comportamento
incompletamente: eles olhavam para cima na direção do olhar fixo do grupo de estímulo, mas
não paravam. Embora uma pessoa tenha influenciado 42% dos transeuntes para que olhassem
para cima, 86% dos transeuntes olhavam para cima se 15 pessoas olhassem. Mas, mais
interessante do que essa diferença, era o fato de o grupo de estímulo de cinco pessoas ter sido
capaz de induzir quase o mesmo número de transeuntes a olhar para cima que um grupo de 15
pessoas. Isto é, nesse cenário, o efeito de grupos maiores do que cinco não foi muito maior
sobre as ações dos transeuntes.
O ambiente ou contexto da mensagem também possui papel fundamental na
propagação de informação. Para a mensagem ser propagada, é necessário o trabalho dos três
personagens enquadrados no timing e contexto corretos. Gladwell (2009, p. 138) cita um
exemplo de como o contexto (ambiente) pode influenciar as ações das pessoas:
A teoria das janelas quebradas é fruto da imaginação dos criminologistas James Q.
Wilson e George Kelling. Os dois argumentaram que o crime é o resultado
inevitável da desordem. Se uma janela está quebrada e não é consertada, quem passa
por ali conclui que ninguém se importa com aquilo e que não há ninguém no
controle. Em breve, outras janelas aparecerão quebradas, e a sensação de anarquia se
espalhará do prédio para a rua, enviando a mensagem de que ali vale tudo. Segundo
Wilson e Kelling, em uma cidade, problemas relativamente insignificantes, como
pichação, desordem em locais públicos e mendicância agressiva, são o equivalente
das janelas quebradas – convites para crimes mais graves.
Nas redes sociais acontece o mesmo movimento. Quando um determinado conteúdo é
publicado na rede e há comentários negativos, o próximo comentário tende a ser negativo. É
como se fosse mais seguro manter o teor das interações, sem grande exposição. Contudo, se
há no meio das interações um comentário positivo, novos conteúdos positivos aparecem. O
ritmo fica equilibrado entre as opiniões dos influenciadores e a onda de imitação dos seus
seguidores. Um exemplo que mescla as repetições do sentimento de interações e é claro o
contexto é a história de Justine Sacco. Diretora Sênior de comunicações corporativas na
InterActiveCorp (IAC), foi visitar a família na África do Sul, em 2013, nas festas de fim de
ano. Durante a longa viagem – o avião saía de Nova Iorque –, começou a enviar tuítes
polêmicos. Um deles falava de um de seus companheiros no voo: “Alemão Bizarro: Primeira
Classe. Ano: 2014. Por que não usar desodorante? Monólogo interior aspirando cê-cê.
Bendita indústria farmacêutica” (RONSON, 2015). Houve uma escala em Londres: “Muito
frio – sanduíches de pepino – dentes horríveis. De volta a Londres!”. E no dia 20 de
39
dezembro, antes do trecho final de sua viagem até a Cidade do Cabo: “Partindo para a África.
Espero não pegar Aids. Brincadeirinha. Sou branca!”. Disparou esse último tuíte e passou
meia hora vagando pelo terminal internacional Heatrhow, conferindo esporadicamente o
celular. Nenhuma resposta, mas isso não a surpreendeu. Tinha menos de 170 seguidores no
Twitter. O voo levaria 11 horas e ela dormiu. Quando o avião pousou na Cidade do Cabo e já
taxiava na pista, ela ligou o celular. Recebeu imediatamente uma mensagem de texto de
alguém que não via desde os tempos de colégio: “Estou passada com isto que está
acontecendo.” Atônita, ficou olhando para a mensagem. E então mais uma: “Ligue para mim
agora mesmo.” Era sua melhor amiga, Hannah. E então de seu telefone jorraram torpedos e
alertas. E depois ele tocou. Era Hannah. “Você virou o maior trending topic mundial do
Twitter”, ela disse. A timeline do Twitter de Sacco tinha uma enxurrada de comentários
negativos: “Como @JustineSacco conseguiu um emprego em RP?! Seu racismo e ignorância
só se comparam ao nível da Fox News. #AidsAfetaTodoMundo!” e “Sou funcionário da IAC
e não quero que @JustineSacco cuide mais das nossas comunicações. Nunca mais.” E então
um tuíte da empresa onde ela trabalhava, a IAC: “Comentário ofensivo e inaceitável.
Funcionária em questão fora de alcance em voo internacional.” Não havia um só comentário
de algum usuário considerando um possível sarcasmo. O contexto nesse caso comando e ela
não era nenhuma comediante. “Já posso ver @JustineSacco quando o avião pousar, tendo o
momento mais desagradável de checagem de telefone de toda a história” e “Daqui a pouco
vamos ver esta vaca @JustineSacco ser demitida. Em tempo real. E nem vai estar sabendo
que perdeu o emprego.” O furor em torno do tuíte de Justine Sacco não era mais uma simples
cruzada ideológica contra seu suposto racismo, mas convertera-se numa forma de
entretenimento, um linchamento virtual. Enquanto seu voo percorria a África, uma nova
hashtag se espalhava: #HasJustineLandedYet (#SeráQueJustineJáPousou). “Na verdade eu
quero ir pra casa, mas todo mundo no bar está ligado em #SeráQueJustineJáPousou. Não dá
pra sair agora” e “Ninguém na Cidade do Cabo vai até o aeroporto para tuitar assim que ela
desembarcar? Queremos fotos! #SeráQueJustineJáPousou.” E um usuário do Twitter se deu
ao trabalho de ir até o aeroporto acompanhar o pouso do avião. “Pronto”, escrevia ele,
“@JustineSacco Já pousou no aeroporto perto da Cidade do Cabo. E desembarcou de óculos
escuros para disfarçar.” No momento em que o avião de Justine aterrissava, dezenas de
milhares de tuítes enfurecidos já haviam sido escritos em resposta ao seu tuíte. Hannah,
enquanto isso, numa atividade frenética, apagou o tuíte original da amiga e a conta dela. “Foi
mal @JustineSacco”, escreveu um usuário, “agora o seu tuíte vai viver para sempre.” Nesse
exemplo, pode-se perceber algumas variáveis responsáveis pela propagação desse tuíte: 1) o
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contexto: ela tuitou sobre um assunto polêmico de forma racista enquanto ia para a África do
Sul, 2) relevância: ironicamente, ela trabalhava numa posição de destaque numa empresa de
relações públicas, 3) recência: enquanto ela estava dentro do avião rumo à África do Sul, uma
hashtag feita para ela virava trending topic mundial.
2.2 Tecnologia e informação
As relações entre as pessoas estão mudando atualmente e essa transformação não tem
como responsável as redes sociais, mas a tecnologia. Ela é a agente transformadora e alimenta
diversas formas de as pessoas se socializarem. Fazendo um balanço, atualmente, um indivíduo
possui um grupo muito próximo de amigos e familiares, com o qual compartilha suas
informações mais pessoais, conquistas, angústias, marca encontros de lazer; um grupo maior
de conhecidos, com o qual compartilha notícias, acontecimentos, troca estudos, vai a festas; e
um grupo ainda maior de pessoas, não necessariamente conhecidos, para o qual pede ajuda,
ensina coisas, compartilha e recebe outras. Fora da internet há o grupo mais próximo –
formado por amigos, familiares, colegas do trabalho – que, por razões óbvias, está muito mais
em contato com o indivíduo, gerando uma rede local de interações. A possibilidade de
“esbarrar” em novos assuntos ficaria condicionada aos relacionamentos “locais”, alimentados
pela mídia de massa. Com a tecnologia, mais particularmente com a internet, o contato entre
os indivíduos passou por uma transformação. O que antes era um encontro face a face,
limitado fisicamente num mesmo ambiente, passou a ser virtual, sem a necessidade presencial
dos pares. Chat, fóruns de discussão, SMS, utilizando dispositivos como o computador ou o
celular, foram responsáveis por essa expansão territorial dos relacionamentos. Sim, era
possível obter um relacionamento com outra pessoa através de mensagens de texto na tela do
celular, ou debater sobre assuntos e se relacionar com outras pessoas nos fóruns de discussão.
O que parecia superficial foi se revertendo com tecnologias de telepresença, que permitiram
dois indivíduos se verem e falarem de forma não presencial. Com as redes sociais, tudo se
intensificou, porque desta vez não se teria somente os indivíduos ativamente participadores e
entusiastas tecnológicos, mas também pessoas comuns, que não estavam nos fóruns, chats,
trocando SMS. Essas pessoas agora poderiam se relacionar nas redes sociais, assim como
faziam no mundo físico, com uma diferença: elas conseguiriam agora expandir muito suas
redes.
41
Relacionando o modelo de Difusão de Inovação de Everett Rogers à chegada das redes
sociais e explicando anteriormente tal modelo, constata-se que os inovadores são os primeiros
a estabelecer contato com outras pessoas através da tecnologia. Os inovadores são os
primeiros a testar, quando todos não têm nem conhecimento, não vêem importância
simplesmente ou acham no mínimo estranho e não usual. Pois bem, eles se mesclam como os
próprios desenvolvedores, desbravadores e primeiros utilizadores. Uma das características dos
inovadores é que eles têm contato com uma tecnologia, mas geralmente não permanecem com
ela após a chegada da grande maioria. Os primeiros adeptos (early adopters) são os primeiros
a ver a onda criada pelos inovadores e passam a adotar o movimento. Eles são os usuários das
redes sociais de hoje que são os responsáveis pelos tutoriais que muitas e muitas pessoas
consultam, unboxing e reviews de diversos produtos. Eles são peça chave para a adoção de
tecnologia pela grande maioria. Faça uma experiência: pesquise sobre qualquer novidade ou
veja qualquer novidade em sua rede social. Você verá quem postou. Essa pessoa pode ser um
usuário referenciando outro ou o próprio early adopter compartilhando o conteúdo. Em
alguns casos o caminho dos referenciadores é extenso, formado por um ou mais early adopter
e chegando mesmo a ser compartilhado pela maioria, quando o assunto sobrevive entre um e
outro.
Entre os primeiros adeptos e a grande maioria há um abismo, que leva a maioria das
inovações tecnológicas a morrer antes de ser midiatizada e consumida pelo grande público.
Esse abismo só é ultrapassado se houver alguma tradução do Early Adopter para a Maioria
Inicial. Hoje muitos produtos de alta tecnologia falham, sem passarem dos primeiros adeptos,
porque as empresas que os fabricam não encontram um meio de transformar a ideia que faz
sentido para um primeiro adepto em outra que pareça sensata para alguém da maioria. Quando
essa tradução funciona e finalmente a ideia ou produto chega à Maioria Inicial, ela é
propagada com força para a Maioria Posterior e depois de algum tempo acaba impactando os
Retardatários. Como exemplo, o smartphone: no seu início eram poucos que se aventuraram
nesse mundo. E esses inovadores eram vistos de forma estranha pela maioria, afinal
carregavam aparelhos grandes, telas muito pequenas, com canetas, câmeras embutidas,
software com capacidade de programação por parte do usuário. Para que carregar e “sofrer”
com aquilo se existiam computadores ou mesmo laptops. Os primeiros adeptos olharam
aquilo e rapidamente adotaram para si, focando em algumas tarefas como games, ferramentas
de produtividade (agenda, e-mail, editores de texto, etc.). Essa adaptação no uso, ora
profissional, ora pessoal foi bem recebida pela Maioria Inicial, mesmo que a Maioria
42
Posterior e os Retardatários não enxergassem necessidade naquele momento. E assim
aconteceu com diversas tecnologias. Esse modelo de difusão funciona como uma janela,
enquanto está chegando à Maioria, os Inovadores já estão em outra ideia. Enquanto está
alcançando os Retardatários, os early adopters já não usam mais. O surgimento das redes
sociais pode ser lido como produto final de uma tradução dos primeiros adeptos para a adoção
da massa. O elemento de tradução foi aos fóruns de discussão, onde o centro das relações era
o assunto. Com as redes sociais, esse centro passou a ser as pessoas. Os fóruns permaneceram
até hoje, pois a sua relação com o assunto faz surgir novos movimentos e transformações,
como o crownsourcing, retendo assim os inovadores e primeiros adeptos.
Uma das principais diferenças nas relações entre as pessoas após as redes sociais é a
do individualismo. No mundo de indivíduos em rede, o indivíduo é o foco, não a família, a
unidade de trabalho, o bairro ou o grupo social. Cada pessoa cria sua própria rede adaptada às
suas necessidades, mantendo-a através de seu endereço de e-mail e catálogo de endereços,
nome de tela, filtros sociais e tecnológicos, e número de celular (WELLMAN, 2001). O
individualismo não quer dizer isolamento, pois as pessoas conectadas na rede permanecerão
relacionadas com os seus laços mais próximos, entretanto eles ocupam uma pequena parte da
rede. A maior parte é formada pelos laços mais fracos e, por mais que sejam eles os
conectores para novos assuntos e relacionamentos, ainda assim diferem do modelo de
relacionamento em que os indivíduos se conhecem e compartilham informações pessoais.
Quanto mais fraco é o laço, maior o volume de pessoas conectadas e mais fraco é o grau de
relação.
Quando se fala em rede social, logo vêm à cabeça: falar com os amigos, adicionar e
remover contatos, publicar e/ou compartilhar fotos, vídeos, textos, comentar, marcar, curtir,
assinar, avaliar, colocar em favoritos, customizar e outras atividades conhecidas. Essas são
algumas e as mais conhecidas atividades dentro de uma rede social. No entanto, uma
atividade, talvez a mais importante, acontece assim que o indivíduo acessa pela primeira vez
uma rede social e se mantém por todo o tempo de utilização. Essa atividade é o cadastro. Mais
do que um simples preenchimento de dados, na rede social é importante para o indivíduo
inserir suas informações pessoais, demográficas, psicográficas. É como se fosse um
nascimento de um novo indivíduo, com imagem e conteúdo. Com as tecnologias atuais, a
tarefa de “formação” desse indivíduo é executada ao longo de sua vida na rede social e as
informações solicitadas são provenientes não de forma aleatória, mas de um conjunto de
cruzamentos com as conexões de sua rede e informações publicadas. Informações como time
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de futebol, estilo de música, filmes de que gosta e que já assistiu, escola na qual estudou, local
de trabalho, viagens que já fez e as que pretende fazer, se está esperando um filho. Todas
essas informações, quando são solicitadas dentro de um contexto que mistura “adivinhação”
(o que alguns usuários alegam, mas na verdade é a execução do algoritmo na própria rede) e
pertinência (elas aparecem no momento de afinidade com o mesmo conteúdo que você está
interagindo), são facilmente respondidas pelo indivíduo, nesse caso usuário da rede social.
Quanto mais tempo o usuário passa na rede social, mais se vai formando como esse indivíduo
está conectado.
Na rede social as formas de participação desse indivíduo são divididas em dois
principais tipos: criação e compartilhamento, em que o primeiro é infinitamente inferior em
volume de atividade ao segundo. Como foi visto anteriormente, no modelo de difusão, as
atividades de criação e produção de conteúdo ficam concentradas entre os Inovadores e os
early adopters. Os demais personagens do modelo também criam, mas o seu maior volume é
definitivamente no compartilhamento de conteúdos. Um dos motivos pelo qual o
compartilhamento é maior do que a criação, além do maior esforço em produzir algum
conteúdo, é que o ato de compartilhar está relacionado à influência, à reputação e ao capital
social. Além do que, já foi exposto anteriormente acerca do capital social, vale ressaltar que a
influência e a reputação são as consequências e produtos finais do capital. Se existe mais
compartilhamento é porque o produtor ou até mesmo o indivíduo que compartilhou aquele
conteúdo influenciou o usuário a propagar em sua rede. O usuário que compartilhou irá
influenciar da mesma forma (não na mesma intensidade) sua rede e assim por diante. Além
dos fatores pertencentes aos indivíduos, há outros fatores que têm relação direta com o
ambiente e o contexto. Por exemplo: alguém compartilhou uma publicação sobre as
manifestações nas ruas de São Paulo. É uma publicação de algo ocorrido recentemente e a
mídia está comentando também. Outros fatores são desencadeados com este acontecimento
fora da rede social, enfim, algo dentro do ambiente e contexto. Essa relação ganha tanta força
quanto o capital social de quem está propagando. O usuário acaba propagando para a sua rede,
o mesmo acontece para os outros usuários e muito rapidamente tem-se uma propagação
grande desse conteúdo. Além das variáveis citadas, evidentemente há outras variáveis
implicadas no ato de propagar uma informação na rede. Mais à frente, nos estudos de caso,
elas serão abordadas com o acontecimento em análise.
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2.3 O que é mesmo participar?
Existe um problema envolvido na participação nas redes sociais: O que é participação
hoje pode mudar completamente “amanhã”. Não há uma estabilidade no formato das
interações. Com o avanço tecnológico mudam-se as formas de participação e seus conceitos.
Participar pressupõe a ação de um usuário na rede social? Não. Pode-se classificar a
participação dos indivíduos na rede social como ativa e passiva. Na participação ativa, a mais
óbvia para a compreensão, o usuário executa algum comando em sua rede, criando ou
compartilhando alguma informação. Na participação passiva, o indivíduo de carne e osso não
está atuando na rede social, mas o indivíduo conectado sim. Ele atua a todo o momento. Por
exemplo: algum amigo pertencente a sua rede marca (tagging) você numa publicação para
que os outros amigos vejam que você está marcado e para que você mesmo veja. Ao marcar,
os seus amigos já são avisados que você foi marcado, comentam, compartilham, fazem uma
série de tarefas e, a cada execução, você – indivíduo conectado – acompanha a propagação.
Quando você literalmente se conecta na rede, finalmente visualiza toda a propagação que
ocorreu. O indivíduo que está conectado permanece nesse estado mesmo na sua ausência
temporária ou em sua própria morte. Têm-se visto diversos casos de pessoas falecidas que
permanecem com seus usuários ativos na rede, recebendo informação de outros usuários,
marcados pelos amigos e conhecidos. Eles estão vivos na rede e para a rede é isso que
importa. Não existe hoje uma jurisprudência que regula a desativação do usuário quando não
há mais o “dono” do perfil. O Facebook, a principal rede social atualmente, com mais de 1
bilhão de usuários ativos no mundo não desativa nenhuma página de pessoas falecidas. Há um
caso recente de uma mãe que entrou na justiça para a remoção do perfil de sua filha do
Facebook, pois, segundo ela, havia mais de 300 mensagens para a sua filha na rede social,
mesmo após o seu falecimento. Recentemente a rede social criou uma feature que permite aos
usuários que possuem o acesso ao perfil da pessoa falecida solicitar a alteração de status de
perfil para um memorial. Mesmo assim, nesse caso, o indivíduo ainda permanece conectado.
A participação passiva se intensifica com os dispositivos móveis. Esses dispositivos utilizam
a geolocalização dos usuários e seu status de disponibilidade em tempo real para a sua rede. A
característica passiva da participação leva a uma discussão sobre a autenticidade de ser um
usuário da rede social. Como o indivíduo pode ser um usuário na rede se ele não se comporta
como tal em todas as ocasiões? Será que o correto é referenciar ao indivíduo virtual e
realmente fazer esta separação entre os dois mundos? Outro exemplo para adicionar nessa
discussão é o Glass – óculos inteligentes do Google. O exemplo aqui é do Glass, mas podem
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servir também outros dispositivos vestíveis (wearable devices). O indivíduo utiliza os óculos
e fica conectado 100% do tempo. A diferença entre ele e um smartphone – que também fica
on-line o tempo todo – é que no caso do Glass, a figura do indivíduo e seu perfil ficam
mesclados e durante o dia ele interage sem necessariamente executar a ação. A tecnologia
nesse caso se torna ubíqua e o indivíduo passa aos poucos a não mais distinguir o real do
virtual, o que é ativo e o que passivo. A leitura e conclusão com esses fatos é que está
ocorrendo uma diluição nessas formas de participação, dispositivos, realidades. Não há mais
uma atividade singular e exclusiva para um determinado dispositivo. Todos eles – TV,
smartphone, computador, laptop, tablet, foblet, media center, câmera, relógio, roupa, calçado,
automóvel, moto, bicicleta, caneta, refrigerador, panela e até talher – estão conectados e
compartilham informações na rede, na mesma rede. Não há mais separação do off-line e do
on-line no cotidiano. A vida é conectada e, utilizando a tecnologia, não há mais espaço para
esta distinção off/on. Educação, relacionamento, trabalho, política, entretenimento estão se
transformando e utilizando todo o potencial de propagação que a internet e as redes sociais
possibilitam. Não há dúvida de que o ambiente em que os indivíduos se encontram sofreu
grande mudança com a internet, tecnologia e as redes sociais, mas e o indivíduo em si? Ele
acompanhou e está acompanhando essas transformações? Como ele se percebe na rede?
2.4 Feedback da rede para percepção de existência
De acordo com Recuero (2009), os atores são o primeiro elemento da rede social,
representados pelos nós (ou nodos). Trata-se das pessoas envolvidas na rede que se analisa.
Como partes do sistema, os atores atuam de forma a moldar as estruturas sociais através da
interação e da constituição de laços sociais. Quando se trabalha com redes sociais na internet,
no entanto, os atores são constituídos de maneira um pouco diferenciada. Por causa do
distanciamento entre os envolvidos na interação social, principal característica da
comunicação mediada por computador, os atores não são imediatamente discerníveis. Assim,
nesse caso, trabalha-se com representações dos atores sociais, ou com construções identitárias
do ciberespaço.
Essa representação pode ser mediada, por exemplo, através de um perfil no Facebook.
Dou o nome para este ator social de indivíduo conectado mencionado anteriormente. Ele é
uma representação do seu indivíduo e realiza diversas tarefas na rede social para expressar
elementos de sua personalidade, individualidade e assim obter a qualificação de sua
46
existência. Recuero (2009) analisa o ator social utilizando sites pessoais como meio de
construção do self e apropriações individuais do ciberespaço. Atualmente pode-se empregar
essa análise para o feed de notícias do Facebook. A diferença é que, como o volume de
interações dos outros usuários é muito maior e mais rápido que as páginas pessoais, há uma
ansiedade maior pelo feedback. O indivíduo conectado é uma expressão virtual e identitária
criada pelo indivíduo e, para que ele exista, precisa ser alimentado com a percepção do outro.
Ele precisa ser notado, ser visto por outros conectados na rede. Recuero (2009, p. 27) busca
autores como Sibília e Efimova para analisar essa criação do indivíduo da rede social:
Sibilia (2003) chama de “imperativo da visibilidade” da nossa sociedade atual essa
necessidade de exposição pessoal. Esse imperativo, decorrente da intersecção entre o
público e o privado, para ser uma consequência direta do fenômeno globalizante,
que exacerba o individualismo. É preciso ser “visto” para existir no ciberespaço. É
preciso constituir-se parte dessa sociedade em rede, apropriando-se do ciberespaço e
constituindo um “eu” ali (Efimova, 2005). Talvez, mais do que ser visto, essa
visibilidade seja um imperativo para a sociabilidade mediada pelo computador.
Assim, entender como o os atores constroem esses espaços de expressão é também
essencial para compreender como as conexões são estabelecidas. É através dessas
percepções que são construídas pelos atores que padrões de conexões são gerados.
Outra autora citada por Recuero (2009), Judith Donath (1999), sustenta que a
percepção do outro é essencial para a interação humana. Ela mostra que, na internet, pela
ausência de informações que geralmente permeiam a comunicação face a face, as pessoas são
julgadas e percebidas por suas interações. Essas interações, constituídas como expressões de
alguém, legitimadas pelos grupos sociais, constroem as percepções que os indivíduos têm dos
atores sociais. A construção deste indivíduo conectado passa por todas as informações do
indivíduo inseridas em seu perfil na rede social: suas informações demográficas, fases de
vida, fotos, informações da família, emprego, objetos de desejo e outros interesses. As suas
conexões e os grupos aos quais pertencem na rede também ajudam a construir o seu perfil.
Para o indivíduo conectado viver na rede, ele precisa estar ligado ao seu indivíduo. Os dois
são a mesma pessoa e compartilham das mesmas informações. Na rede social ele pode se
valer de representações para compor positivamente suas interações e relações. O Facebook
especificamente não permite que usuários criem perfis falsos e, mesmo que o usuário crie um
perfil verdadeiro com informações falsas, esse tipo de atitude seria antagônico à composição
de seu individualismo com interações de suas conexões prejudiciais ao seu indivíduo
conectado.
Os indivíduos projetam a mesma expectativa dos relacionamentos no mundo físico
para o mundo virtual, o seu indivíduo para sua representação conectada. A questão é que nas
47
redes sociais, o número de conexões é muito maior e invariavelmente o feedback dos outros
usuários não vai acontecer da maneira que se espera. Imagine a seguinte situação: tudo ou
quase tudo o que você fala é ignorado; você faz uma apresentação em um auditório vazio;
você concorda com uma opinião de um amigo, mas ninguém o percebe; você faz uma
pergunta e ninguém lhe responde; você chama um amigo e faz uma pergunta ou comentário e
ele simplesmente não o vê e sai. Isso seria muito triste, frustrante e angustiante. Em nossa
vida, isso dificilmente poderia acontecer, principalmente porque sua rede é formada por
pessoas mais próximas. Sua característica é mais partilhada e não individual. Mas nas redes
sociais essa possibilidade é muito factível e causa angústia, ansiedade e medo nos usuários de
não serem percebidos e assim não existirem na rede. Um exemplo que ilustra a relação de
interação e o impacto do indivíduo no indivíduo conectado é um estudo que o Facebook
divulgou identificando quando um usuário está prestes a iniciar um relacionamento a partir de
suas interações na rede social. Utilizando dados anônimos, a rede social examinou a média de
postagens compartilhadas entre duas pessoas antes de iniciarem um namoro e mudarem seu
status de “solteiro” para “em um relacionamento sério”. Durante os 100 dias que antecederam
essa mudança, os pesquisadores observaram um aumento lento, mas constante no número de
postagens entre o futuro casal. A partir do primeiro dia com a mudança de status, a
quantidade de posts compartilhados começa a cair. O Facebook atribuiu essa atitude a uma
decisão do casal de passar mais tempo juntos, criando uma interação no mundo físico (figura
12).
Figura 12 – Gráfico sobre a mudança de comportamento entre os usuários do Facebook de acordo com a
mudança de relacionamento através do volume de publicações
Fonte: Diuk (2014).
48
Mas essa queda na interação não significa algo ruim. Pelo contrário. Segundo a rede
social os compartilhamentos se tornam mais carinhosos e positivos. Os pesquisadores
analisaram o número de palavras associadas a emoções positivas como “amor” e “feliz” em
comparação a palavras negativas como “ódio” e “mágoa”. E a proporção de palavras positivas
aumentou drasticamente dentro dos primeiros dias de namoro (figura 13).
Figura 13 – Gráfico sobre a mudança de comportamento entre os usuários do Facebook de acordo com a
mudança de relacionamento através do volume de publicações emotivas
Fonte: Diuk (2014).
O Facebook também observou o volume de interações com usuários que recentemente
terminaram um relacionamento e mudaram seu status para “solteiro”. A rede social registrou
um aumento de 225% nessa interação, que atribui a palavras de conforto enviadas por
familiares e amigos por meio de mensagens privadas, comentários ou postagens na timeline.
No Facebook há uma forma de visualizar a amizade entre duas pessoas através das histórias
compartilhadas em que os dois estiveram presentes através de algum tipo de interação. É
interessante observar que essa amizade entre os dois indivíduos são retratadas no Facebook
para seus indivíduos conectados e suas histórias na rede. Na figura 14, o Facebook chama de
“Amigos no Facebook desde 2009” o período em que os indivíduos conectados se tornaram
amigos, mesmo que no mundo real eles já se conheçam há mais tempo. Os indivíduos são os
mesmos, mas com representações e relações próprias no meio.
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Figura 14 – Visualização da relação de dois indivíduos conectados no Facebook
Fonte: Facebook (2015).
Heidegger (2006), em seus estudos sobre a existência do indivíduo, afirmou que a
angústia é provocada pela pura e simples exposição ao mundo, pela incerteza e pela indecisão,
como não se sentir em sua própria casa e o medo referente a um fato preciso. Exemplificando:
se o medo da morte coloca o indivíduo na impropriedade (não aceitando quem realmente ele
é), a angústia produz o efeito contrário, ela provoca a sensação de “ficar sem chão”. Ela revela
ao indivíduo uma compreensão do seu morrer. Ele percebe que não pode escapar da
convocação e a angústia o faz viver na propriedade (quem realmente ele é). Ou seja, a
possibilidade de ser ele mesmo. Fazendo um paralelo com as redes sociais, há esta mesma
relação. O medo de não ter uma relação “correspondida”, um feedback dos outros usuários e a
angústia permanente pelo fato de estar lá e viver conectado à sombra da solidão. A percepção
do indivíduo na rede social está condicionada ao feedback de outros indivíduos. Ele não
consegue se perceber somente com suas ações. Essa percepção de sua existência está
dependente de suas conexões fortes ou fracas, ou seja, para ter o feedback de outros
indivíduos, é essencial a participação na rede. É importante salientar que o fato de existir uma
participação do indivíduo na rede não quer dizer que existirá uma interação, pois toda ação no
Facebook é mediada pelo próprio Facebook antes de “vencer” o algoritmo de relevância e se
tornar uma história, uma interação. Com a interação realizada pode ocorrer ou não o retorno
do grupo e assim transmitir a percepção de que o indivíduo existe na rede. A cada interação
realizada e trocada, essa existência do indivíduo é mensurada pelo algoritmo em forma de
pontos de afinidade e por ferramentas medidoras de influência que o próprio indivíduo pode
utilizar como seu prêmio de existir e influenciar seus pares. Ou seja, para existir, é preciso que
haja interação entre as partes. Para existir interação, é necessário que o algoritmo do
50
Facebook considere relevante para o usuário destinatário o conteúdo enviado baseado nas
variáveis do EdgeRank. E, antes de tudo, para que haja interação, é necessária a participação
do usuário.
Figura 15 – Fluxograma da percepção de existência dos indivíduos no Facebook
Fonte: Elaborada pelo autor.
No fluxograma da figura 15 é possível observar onde estão as posições decisórias que
podem transformar uma ação em história na timeline de um usuário ou gerar a partir dessa
história um feedback, uma ação que torne tangível esse retorno do usuário mediado através da
rede, emulando o feedback do mundo real (um sorriso, um comentário, um abraço, um
agradecimento). Quando o usuário A compartilha um conteúdo para a sua rede, essa ação é
processada pelo algoritmo do Facebook que determina quais usuários devem receber o
conteúdo ou não. Essa ação pode morrer antes de se tornar uma história – uma ação conectada
a um determinado número de pessoas num determinado tempo. A relevância com que o
algoritmo busca é calculada sob as três variáveis (afinidade, peso e deterioração do tempo)
divulgadas pelo Facebook, denominada EdgeRank. Quando o algoritmo determina que o
conteúdo direcionado a um determinado grupo de usuários não é relevante, a ação do usuário
A não chega ao destino e consequentemente não há feedback, mesmo havendo participação.
Com o score do EdgeRank ultrapassando o limiar de aceitação do algoritmo, a ação do
usuário A se transforma numa história na timeline dos usuários (representados na ilustração
pelo B) que de acordo com o algoritmo estão aptos a receber o conteúdo. Para que haja a
percepção de existência do usuário A, os usuários ainda precisam se decidir se interagem ou
não com a história. As variáveis de decisão passam por influência, relevância e reputação,
desta vez não analisadas pelo algoritmo, mas sim pelos usuários. Com o feedback gerado na
51
rede social, finalmente o usuário A recebe de forma tangível uma ação de resposta à
comunicação original e passa a perceber que existe na rede, que é correspondido. A sua
participação o qualifica para existir na rede, mas há dois limiares de decisão para o trânsito da
informação: o do algoritmo e o do próprio usuário destinatário.
52
3 ESTUDO DE CASO: DESAFIO DO BALDE DE GELO
Em julho de 2014 se iniciou um desafio na internet de pequena escala que acabou
atingindo todo o mundo. O estudo de caso a seguir vai analisar quais foram as motivações e
os gatilhos que fizeram com que o “Desafio do balde de gelo” gerasse doações recordes para a
caridade, levantando cerca de US$ 114 milhões em contribuições para o grupo e suas afiliadas
nacionais, em comparação com US$2,5 milhões no mesmo período do ano passado.
A Associação ALS tem como objetivo apoiar os que sofrem com a esclerose lateral
amiotrófica, ou Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), vulgarmente conhecida como doença
de Lou Gehrig, doença do neurônio motor, que afeta cerca de 5.000 pessoas no Reino Unido.
Figura 16 – Primeira publicação que originou a propagação do “Desafio do balde do gelo”
Fonte: Kennedy (2015).
A figura 16 é do primeiro vídeo que iniciou a propagação do “Desafio do balde de
gelo”. Como que a partir de uma ação de um usuário sem grandes influências na rede, sua
ideia foi propagada para o mundo? Primeiramente é necessário verificar os fatos e os gatilhos
da propagação.
53
Jeanette Senerchia recebeu uma mensagem de seu primo Chris Kennedy para verificar
seu perfil do Facebook onde tinha um desafio. Senerchia ia doar o dinheiro para a associação,
mas, para não ser superado por Kennedy, aceitou o desafio e postou o vídeo em seu perfil do
Facebook em 16 de julho de 2014 desafiando mais pessoas. No início, eles usaram as
hashtags #takingiceforantsenerchiajr e #StrikeOutALS para apoiar um torneio sem fins
lucrativos de beisebol recém-formado para homenagear Anthony Senerchia Jr, marido de
Jeanette, que há 11 anos convive com o ELA.
O “Desafio do balde de gelo” havia começado dois dias antes, quando Gary Player,
um jogador profissional de golfe sul-africano sempre lembrado como um dos melhores
jogadores de golfe da história, postou em sua conta do Twitter seu vídeo do “Desafio do balde
de gelo” para a causa dos desabrigados (Depaul UK, parte de Depaul International, um grupo
de instituições de caridade que trabalham para apoiar desabrigados e pessoas marginalizadas
em todo o mundo). Isso mesmo, a causa não era o ASL, e sim qualquer causa à escolha do
desafiado. O valor de doação também não era fixo. No tweet do Gary Player era de US$ 10
mil (figura 17). Antes de a propagação iniciar com a causa ASL, Jon Bullas, outro jogador de
golfe, amigo do Kennedy, postou seu desafio para a sua causa escolhida, desta vez com a
doação de US$ 100.
Figura 17 – Duas outras publicações do “Desafio do balde do gelo”, porém ligadas a outro objeto
Fonte: Player (2015). Fonte: Bullas (2015).
Senerchia, prima de Kennedy, disse que na sua pequena cidade – Pelham, NY, o
desafio começou a se espalhar rapidamente entre todos, incluindo as suas famílias e até
54
mesmo amigos da escola. Logo, eles não podiam manter o controle do número de vídeos.
Eventualmente, ele atingiu um outro homem com ALS, Pat Quinn de Yonkers, NY. Quinn e
Senerchia tinham um casal de amigos em comum no Facebook e o desafio se propagou pelo
seu grupo. Quinn foi diagnosticado com ELA em março de 2013.
Quinn era conectador a um agente influenciador, o Pete Frates em Boston, com uma
grande rede de apoiadores, e é muito envolvido com a comunidade ALS. Frates foi
diagnosticado um ano antes de Quinn e, uma vez que os dois tinham muito em comum (Frates
era um ex-capitão do time de beisebol Boston College e jogador de beisebol profissional na
Europa), Frates tornou-se amigo e mentor de Quinn. Frates manteve amizades e conectou-se
com diversas pessoas que se tornaram com o tempo sua rede de apoio, seus seguidores.
Quando em 31 de julho de 2014 ele postou no Facebook seu vídeo, o gatilho para a
propagação estava dado (figura 18).
Figura 18 – Publicação no Facebook de Pete Frates que deu início à propagação
Fonte: FRATES (2015).
Num curto espaço de tempo (29 de julho a 29 de agosto), o desafio se expandiu dos
grupos próximos para figuras públicas, celebridades, esportistas, políticos. De Mark
Zuckerberg a Bill Gates, de Oprah Winfrey a Usain Bolt. No Youtube a busca por “Ice bucket
challenge” já retorna atualmente mais de 8 milhões de vídeos indexados. As buscas no Google
retornaram mais de 90 milhões de resultados. No Facebook mais de 28 milhões de pessoas
55
interagiram com o desafio, comentando, compartilhando, curtindo e publicando. Foram mais
de 50 políticos, 200 atores famosos, 200 atletas, 220 músicos participantes do desafio.
A Associação ALS disse que começou a ver um pequeno aumento inexplicável em
doações em 29 de julho e, em 4 de agosto, o número realmente havia decolado. A Associação
reportou em 20 de agosto que havia recebido mais de US$ 100 milhões existentes e 1,9
milhão de novos doadores. Em 22 de setembro o valor de doações tinha superado a marca dos
US$ 114 milhões, mas, definitivamente, a propagação já havia terminado. Para comparar
financeiramente o poder dessa propagação, no ano anterior o ASLA tinha arrecadado em
doações US$ 2,5 milhões, um número 45 vezes menor que o valor arrecadado com a
propagação.
Uma pequena homenagem de Chris Kennedy a Anthony Senerchia Jr se tornou um
grande objeto de propagação. A propagação espalhou-se além dos Estados Unidos e atingiu
ao todo mais de 150 países (figura 19). Ela foi considerada pelo YouTube uma das maiores
propagações de conteúdo da história da internet até o momento.
Figura 19 – Gráfico de adoção dos americanos e não americanos na participação do “Desafio do balde de gelo”
Fonte: YouTube (2015).
A propagação ainda foi mais intensa, pois, enquanto o país de origem atingia a grande
maioria e os retardatários na adoção da participação, os demais países eram impactados
através dos seus early adopters e celebridades, empurrando para a maioria. Isso fez com que a
participação explodisse ao redor do mundo e em menos de três semanas já havia atingindo seu
pico (figura 20).
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Figura 20 – Adoção de mais de 26 milhões de pessoas em pouco mais de 10 dias no Facebook
Fonte: Facebook (2015).
3.1 Elementos da propagação
O “Desafio do balde de gelo” é, sem dúvida, uma das campanhas sem fins lucrativos
mais bem sucedida de todos os tempos. Ao estudar os elementos que fizeram tanto sucesso,
pode-se perceber quais foram os motivadores e os gatilhos responsáveis pela propagação.
a) Emoção
O “Desafio do balde de gelo” começou com Pete Frates, 29 anos, e Patrick Quinn, 31
anos, amigos de faculdade, ambos diagnosticados com ELA. Assistindo uma doença atacar
dois jovens bate uma emoção humana. Quando as pessoas são apresentadas a um método que
possa ajudar pessoas como Frates e Quinn, elas ajudam.
b) Qualquer pessoa pode participar
Qualquer pessoa com um smartphone e mídia social pode participar no “Desafio do
balde de gelo”. E o desafio é basicamente livre – tudo de que você precisa é de gelo e um
balde.
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c)A aceitação em um círculo maior
Quando as pessoas vêem todos os seus amigos e familiares participando de algo, eles
se sentem inclinados a participar. O desafio também cria uma conexão entre as pessoas
“normais” e de grande celebridades, como Justin Timberlake, Jimmy Fallon, Lady Gaga e
outros que tenham participado.
d)Simples e chamada clara para participação
Outra razão para que a propagação tenha acontecido são suas regras simples e a
chamada para participação. O desafio utiliza técnicas bem elaboradas para envolver mais
participantes, mas não promete recompensa e, portanto, evita quaisquer questões legais. A
chamada é clara: se você foi indicado por alguém que aceitou o desafio, você tem 24 horas
para completá-lo. Essa é a razão pela qual o desafio tenha se espalhado tão rapidamente. Além
disso, as regras são simples: uma vez nomeado, você tem que gravar um vídeo de si mesmo
derramando o gelo em sua cabeça. Se você não fizer isso, você deve doar para a ALS.
e)Doar para uma boa causa
Além de ser simples, o “Desafio do balde de gelo” dá às pessoas uma maneira fácil de
ser parte de uma boa causa. Não há nenhuma razão para recusar um desafio quando é
divertido e ajuda a espalhar a consciência e o financiamento para a doença.
f)Bom timing
O desafio, obviamente, não teria surtido o mesmo efeito se ocorresse durante a
temporada de inverno. Mas, durante os meses quentes de julho e agosto, o desafio foi uma boa
desculpa para se refrescar ao espalhar a consciência para uma boa causa.
g)Hashtag
Uma maneira infalível para alcançar a propagação foi acompanhá-la com hashtags
simples e originais. #IceBucketChallenge é fácil de lembrar, e muitos participantes fizeram
questão de incluí-lo em seus vídeos.
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3.2 Participar pelo feedback
Outro ponto interessante da análise é que os participantes do desafio, ao se engajarem
com o movimento, tinham como moeda de troca exatamente o feedback dos demais
participantes desafiados. A verdade é que se percebe através da análise que a participação
massiva não foi causada essencialmente pelo movimento da ELA, mas sim complementada de
forma substancial pela exposição e reputação alcançadas com a participação. Muitos
influenciadores participaram e os seus seguidores imitaram o mesmo comportamento, uma
vez que foi factível. Muitas pessoas nem sabiam o verdadeiro motivo de estarem ali
derramando o balde de gelo em suas cabeças, mas queriam mesmo era ter feedback e ser
percebido no grupo. Quando uma propagação atinge níveis elevados, os influenciadores não
querem ficar de fora, os seguidores muito menos. Todos querem aproveitar e se envolver na
curva de adoção do movimento e nesse caso a exposição era composta de elementos do
mundo off-line (vídeo com a pessoa realizando o desafio).
A forma de percepção de existência nas redes nesse caso combina a exposição do
indivíduo real além de seu avatar (indivíduo conectado) e a interligação com suas conexões
próximas ou influentes. Toda essa propagação aconteceu através de conexões de laços fortes
dos mais diversos grupos ou conexões com indivíduos de grande influência. Cada grupo com
laços fortes continha um elemento com ligação com outro grupo e assim por diante, como é
possível observar de forma resumida a seguir na figura 21, em que está mapeada apenas a
participação das celebridades.
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Figura 21 – Mapa das celebridades participantes da propagação do “Desafio do balde de gelo”
Fonte: Cucci (2014).
Vale lembrar que, a cada vídeo gerado por um usuário, levava a marcação dos usuários
que eram desafiados. Assim, nenhum usuário queria aceitar ou repassar o desafio para outro
usuário que sabia que não teria influência suficiente para levar sua marcação para a rede. Essa
decisão do usuário é como se fosse uma negociação entre a causa em si e todos os
mecanismos necessários para elevar o grau de sua percepção de existência na rede através da
propagação.
A mecânica da exposição do usuário na rede social é parecida com uma pirâmide, em
que você desafia três, que desafiam mais três e assim por diante contrariamente ao que ocorre
60
com a caridade e a doação, em que as pessoas que participam não querem aparecer e o fazem
de forma anônima. Até as pessoas que doaram grandes somas de dinheiro fizeram questão de
produzir o seu vídeo e espalhar para a maior quantidade possível de conexões. Esta análise
leva para uma direção de pensamento de que o que motivou as pessoas à participação massiva
não foi a causa ELA, e sim uma brincadeira divertida em formato de desafio com pessoas
próximas e distantes, anônimas e famosas. A causa foi o fio condutor, o gatilho de propagação
e provavelmente as pessoas que iniciaram não o fizeram pela vaidade e exposição na rede, até
porque não imaginavam no que ia se transformar.
3.3 Motivadores e gatilho
A seguir, é possível observar na figura 22 quais foram os motivadores, gatilhos e
porque a causa ELA foi a vencedora na propagação e não as outras duas que foram divulgadas
no mesmo dia.
Figura 22 – Mapa macro da propagação do “Desafio do balde de gelo”
Fonte: Elaborada pelo autor.
Quando Gary Player, Jon Bullas e Chris Kennedy iniciaram suas publicações, o propósito era
ter um desafio de 24 horas para caridade. Cada um foi desafiando amigos e escolhendo suas
causas. Se fosse julgar antes da publicação qual desafio iria se propagar, esse seria o de Gary
Player, famoso jogador de golfe e muito influente nas mídias sociais. Mas o que Player nem
Bullas tinham era uma pessoa que representasse a causa de maneira verídica e emocionante.
Kennedy tinha e na publicação do seu desafio fez uma homenagem a Antony Senerchia Jr
(ex-jogador de basebol que foi diagnosticado há 11 anos com ELA) em resposta ao desafio da
61
sua prima e esposa de Antony. Após o desafio de Kennedy, o conteúdo chegou até Pat Quinn,
amigo de Frates e também diagnosticado com ELA. Frates, que possui diversas conexões e
amigos que ajudam na causa, entrou para o desafio espalhando o conteúdo. Ele foi o gatilho
principal para a propagação. No vídeo dele, ele “convocou” alguns amigos que jogam basebol
no time Boston Red Sox. Os pais de Frates também entraram para ajudar no movimento e,
poucas horas após o gatilho, o “Desafio do balde de gelo” já havia se espalhado e ultrapassado
a barreira de adoção do movimento. O time do Red Sox e os moradores da cidade de Boston
fizeram o vídeo e, com o material espalhando na rede, começou a participação das primeiras
celebridades, como Mark Zuckerberg e Bill Gates. Chris Kennedy, Pat Quinn e Pete Frates
foram os inovadores na curva de adoção. Eles almejavam a ajuda para a causa e não possuíam
grandes influências para propagar a mensagem. Eles eram a mensagem! Eles faziam parte da
rotina da doença, estavam se expondo em benefício real da causa. Os jogadores de basebol
foram os early adopters, pois tinham uma forte identidade com a causa. Todos eram
portadores de ELA: Chris, parente de um ex-jogador de basebol, Antony Senerchia, Pete
Frates, também ex-jogador de basebol, e Pat Quinn, amigo próximo de Frates. Além de tudo,
o outro nome para o ELA é doença de Lou Gehrig (Henry Louis “Lou” Gehrig, jogador
de basebol norte-americano que atuou entre 1923 e 1939 na Major League Baseball. Sua
carreira foi interrompida aos 36 anos, falecendo em razão de uma esclerose lateral
amiotrófica, que agora é conhecida nos Estados Unidos e no Canadá como A doença de Lou
Gehrig) que também, de certa forma, fortalece a relação de afinidade, veracidade e contexto
com os primeiros participantes e ex-jogares de basebol. Como early adopters e influentes, os
jogadores de basebol influenciaram outros early adopters: celebridades e figuras públicas que
queriam fazer parte da causa. O empurrão para a maioria foi fácil, pois já havia no próprio
desafio a tradução para adoção fácil por parte da maioria. O desafio continha regras claras, era
social, divertido e de certa forma inesperado. A grande maioria aderiu ao movimento mais
pela propagação do que pela causa. Muitos não sabiam qual era o motivo, mas sabiam que
tinham que fazer em 24 horas e desafiar mais amigos. Muitos descobriram o que afinal era
essa tal de ELA ou ASL, mas o que importava era que o desafio foi feito, que ela era parte
disso e que todos sabiam disso. Mais uma vez o que mais importava era o feedback. Sem o
retorno, a participação se torna vazia e angustiante. A expectativa era ser lembrado e que
houvesse adesão ao desafio pelo maior número de pessoas, se sentir importante, parte
existente e pulsante da rede. E, assim, com o término da participação das celebridades, a
fogueira foi apagando e junto com ela a conclusão da participação dos retardatários que
estavam descobrindo e se engajando no final do movimento.
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Sete meses após o término da propagação, Pete Frates foi homenageado pelo time do
Red Sox, que tinha seu nome em todos os uniformes dos jogadores.
63
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Participar na rede social para existir. Quando se fala atualmente em participação no
Facebook, remete-se aos formatos de produção de conteúdo textual e audiovisual, através de
atualizações de status (sentindo, assistindo, lendo, escutando, celebrando, procurando,
jogando, viajando, bebendo, exercitando, comendo), convites de eventos, eventos de vida
relacionados ao trabalho, educação, família, relacionamentos, casa, aquisição, saúde, bem-
estar, viagens, experiências e mais. Todas essas formas de participação no Facebook têm
como ponto de partida o usuário e suas informações para toda a sua rede, grupos ou usuários
específicos definidos pelo próprio. Outra forma de participação no Facebook se dá através de
compartilhamentos e outras interações. Já falado no capítulo 1 item 1.3, todas as participações
que alcançam o limiar de decisão do algoritmo se tornam histórias entre o usuário remetente e
os usuários que receberam o conteúdo. De acordo com Shirky (2011), os compartilhamentos
de informações que estão envolvidos na difusão de informações nas redes sociais abrangem
quatro tipos: pessoal (troca de informações pessoais entre indivíduos na rede), comum
(informações de interesse comum formadas em determinados grupos), público (ativação de
um recurso público de forma colaborativa, como um desenvolvimento de um software) e
cívico (quando um grupo está tentando ativamente transformar a sociedade). De acordo com
Shirky (2011), o espectro que vai do pessoal ao comum e do público ao cívico descreve o
degrau de valor criado para participantes versus não participantes. Com o compartilhamento
pessoal, a maior parte ou a totalidade do valor vai para os participantes, enquanto do outro
lado do espectro, tentativas de compartilhamento cívico são especificamente construídas para
gerar mudança real na sociedade a que pertencem os participantes. De modo que toda a
publicação de conteúdo no Facebook por parte do usuário, seja ela formada por informações
pessoais ou por informações de terceiros, tornam-se compartilhamentos para a sua rede. Para
Shirky (2011), compartilhar uma foto na rede social on-line constitui um compartilhamento,
mesmo que ninguém jamais a veja. A participação na rede social é ponto de partida para a
difusão de informação e percepção de existência por parte do indivíduo conectado. A
informação do usuário passa por duas fases no trânsito de difusão: limiar do algoritmo
EdgeRank do Facebook e a interação do usuário que recebe a mensagem. Se a participação do
usuário não for relevante para os membros de sua rede seguindo as variáveis de afinidade,
peso e deterioração do tempo, a sua mensagem não chegará ao destino, parando no meio do
caminho. Portanto, pode haver participação – envio de conteúdo para a rede, mas, dependendo
64
da relevância, não haver entrega. Havendo entrega por parte do algoritmo do Facebook, a
mensagem chega à timeline do destinatário gerando uma história entre os dois usuários. Com
a interação por parte do usuário que recebeu a mensagem, o usuário remetente é avisado de
forma quantitativa de que seu conteúdo recebeu feedback. Esse é o momento em que o
usuário percebe que existe na rede. Sua existência é percebida e quantificada através de
números de comentários, curtidas e grau de influência. Para a percepção de existência do
usuário, sua mensagem passou pelos seguintes pontos: 1)
produção/compartilhamento/publicação, 2) processamento do EdgeRank, 3) entrega, 4)
visualização da mensagem e 5) interação. Com a interação do usuário no passo 5, a sua ação é
direcionada para o EdgeRank novamente para analisar se é relevante para a sua rede visualizar
a história entre ele e o usuário remetente. O processo é contínuo e assim o Facebook equilibra
a distribuição de informação entre os membros da rede.
Outro aspecto importante analisado além dos limiares do algoritmo na difusão das
informações e existência dos usuários é a importância dos laços fortes. Os laços fracos são
responsáveis e importantes por trazer novidades para o grupo e difundir informações entre
grupos na rede, mas os laços fortes são fundamentais para a percepção de existência e
propagação de informações.
Percepção de existência porque a afinidade entre os usuários com laços fortes é alta,
pois há mais proximidade e densidade na troca de informações, gerando mais interações com
maior intensidade. Quanto mais conexões de laços fortes o usuário tiver em sua rede, mais
haverá possibilidade de interação, pois existirá mais compartilhamento de informação dos
usuários de laços fortes nas informações do usuário remetente, como, por exemplo, um álbum
de fotos contendo usuários da rede, um evento em que parte dos usuários estavam presentes,
um conteúdo pessoal compartilhado pelos usuários em que os seus pares de laços fortes
conhecem do cotidiano.
Propagação de informações, pois a informação só é difundida após ultrapassar o limiar
de decisão do algoritmo do Facebook. Todas as variáveis do EdgeRank (afinidade, peso da
ação e deterioração do tempo) favorecem a troca de informações entre conexões de laços
fortes. A afinidade é maior entre pessoas com muitos fatores em comum, como o número de
amigos e informações pessoais. O peso da ação tende a ser maior entre indivíduos mais
próximos, pois a abertura de interação é maior, mais íntima. A deterioração do tempo é menor
entre pessoas mais próximas, visto que a velocidade de troca de informações é maior. Um
problema nesta possível priorização das conexões dos laços fortes é a falta de novidades na
65
rede, a falta de serendipidade – o encontro casual ou fortuito com o que não se espera. É
possível perceber, mas sem afirmar, que o Facebook periodicamente recomenda conteúdos e
conexões aos usuários, influenciando-os na relação com as conexões de laços fracos dentro da
rede. Quando o Facebook recomenda na timeline do usuário um conteúdo de um amigo de
conexão de laço fraco e o usuário compartilha, a tendência novamente é que essa propagação
se inicie através das conexões de laços fortes. Assim, pode-se perceber, ainda sem afirmar
(pois o Facebook não abre mais informações sobre o algoritmo), que a propagação se inicia
sempre pelas conexões de laços fortes, independentemente se chegou para um usuário através
de uma conexão de laço fraco com outro indivíduo. O algoritmo deve receber uma série de
atualizações periódicas para manter o equilíbrio na rede, promovendo encontros
aparentemente casuais entre os usuários e moderando as trocas de informações entre os seus
membros.
As formas de interações vêm se alterando de acordo com as redes sociais que vêm
surgindo. A tendência que se percebe é que as redes estarão cada vez mais transparentes nas
relações entre os seus membros. Eles consumirão conteúdo, trocarão informações de maneira
ubíqua, sem necessariamente passar ou perceber que estão passando por um determinado local
ou dispositivo. O encontro tenderá a ser mais natural e a distinção do que é usuário e estar
numa rede social será menos perceptível. O próprio termo usuário pode ser redefinido de
acordo com a forma como se participa na rede. A percepção de existência dos usuários pode
envolver outras variáveis além do feedback e influência quantificada na rede a partir deste
movimento transitório de formas de participação nas redes sociais.
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