POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO NO ESTADO DE SÃO …...menos 1 bilhão de dólares ao país por...
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POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO NO ESTADO DE SÃO PAULO: 20 ANOS
DE UM GOVERNO?1
Vitória Azevedo da Fonseca
A partir de 1995, o governo do Estado de São Paulo, tendo à frente políticos do PSDB,
configurou, em 2015, 20 anos de administração voltada para o mesmo “programa” de
governo, os mesmos ideais e os mesmos princípios políticos. Inspirada pela pesquisa de
Borges (2002), e, considerando que desde 1995 o Estado de São Paulo é governado por
quadros do PSDB, propomos uma análise diacrônica das ações de governo ao longo de 20
anos (1995-2015) a fim de compreender, através dos dispositivos legais, a implementação de
“políticas públicas” na área educacional.
Pensar uma análise de 20 anos, neste caso, se justifica, pois existe um projeto político
partidário, e, de acordo com Borges, “...são os partidos políticos os grandes definidores das
políticas sociais, nas quais a educação está inserida” (2002, p.1). Neste sentido, o autor indica
a importância de compreender as ações partidárias considerando que os espaços partidários
são os locais onde são traçadas as políticas educacionais e são também os espaços de atuação
democrática.
A partir da situação presente na qual se encontra o sistema de ensino da Rede Estadual
de São Paulo, podemos propor um olhar retrospectivo e levantar algumas questões: as ações
legais implementadas podem ser identificadas como “política pública”? Seriam políticas de
Estado ou de Governo? Nestes anos, as gestões psdbistas foram eficientes conforme defendem
em seus discursos? Tentemos.
Mário Covas, assumindo o governo em 1º de janeiro de 1995, cumpriu o seu primeiro
mandato e foi reeleito em 1998, permanecendo oficialmente como governador até 6 de março
de 2001, quando faleceu. Ele afastou-se em 22 de janeiro do mesmo ano, tendo sido
governador do estado durante 6 anos, de 1995 a 2000. Geraldo Alckmin, seu vice-governador,
assumiu o cargo masfoi eleito em seguida, permanecendo, desta maneira, oficialmente, de 6
1 Texto escrito a partir do relatório de pós doutorado supervisionado pelo professor Dr. Paulo Gomes Lima, na UFSCar-So, no PPGED.
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de março de 2001 a 30 de março de 2006, ou seja, ocupando o cargo de governador do estado
por mais 6 anos. Alckmin, no entanto, se afastou antes de terminar o mandato para concorrer
às eleições presidenciais, deixando lugar para seu vice Claudio Lembo, que governou de 30
de março de 2006 a 1º de janeiro de 2007. Considerando que Geraldo Alckmin havia
concorrido ao cargo de Presidente da República em 2006, o candidato a governador de São
Paulo, de seu partido, foi José Serra, que venceu as eleições, governando o estado de 1º de
janeiro de 2007 a 2 de abril de 2010. José Serra também não terminou seu mandato em função
da sua candidatura às eleições presidenciais de 2010, sendo substituído pelo seu vice Alberto
Goldman, no período de 2 de abril de 2010 a 1º de janeiro de 2011. Geraldo Alckmin, que
concorreu as eleições para a prefeitura de São Paulo, sem sucesso, voltou a ser eleito
governador de São Paulo de 1º de janeiro de 2011, sendo reeleito em 2014.
Ao longo desses 20 anos de governo do PSDB, Geraldo Alckmin foi Governador do
Estado, pelo menos, durante 12 anos. Nesse sentido, considerando ser o mesmo partido
político, e ter uma grande participação, 60% do tempo, de uma única personalidade,
poderíamos dizer que deveria existir um direcionamento coeso das políticas públicas,
podendo as mesmas não carecerem da estabilidade cuja ausência padecem as unidades
administrativas que sofrem com as constantes mudanças de diretrizes políticas. Nesse sentido,
poderíamos supor que as políticas públicas educacionais encontrariam terreno fértil para a
características de políticas de Estado, e não de Governo, esta última identificada pela sua
interrupção e instabilidade.
Partimos do pressuposto de que, se existe uma coerência entre projeto político
partidário sua efetivação pode ser observadaatravés de dispositivos legais. Como nos indica
Borges, nenhum dispositivo legal, “...nenhum decreto, nenhuma portaria oriundos de um
órgão público são emitidos sem o concurso dos partidos políticos nos quais estão filiados seus
vereadores, deputados, prefeitos, governadores, enfim, o que receberam o mandato para ser
exercido” (BORGES, 2002, p.2). Assim, através da análise dos dispositivos legais voltados
para a Educação, podemos, em primeiro lugar, identificar políticas públicas, se elas existem,
projetos políticos voltados para a educação para além dos discursos eleitorais e, em última
instância, a competência de um determinado grupo político em efetivar suas propostas.
Assim, partimos, em primeiro lugar, para uma breve análise dos discursos políticos e
propostas educacionais que permeiam o ideário educacional psdbista, discursos envoltos de
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conceitos advindos de uma vertente da Teoria da Administração, que apela para uma suposta
racionalização de recursos para a efetivação de uma “eficiência”. Em seguida, apresentamos
os dispositivos legais e as diferentes gestões dos secretários de governo, partido para uma
análise das políticas salariais e, por fim, concluindo com uma reflexão sobre a efetivação, ou
não, das propostas apresentadas no início deste período.
Carta de intenções ou o ideário psdbista de educação
Em um artigo da revista Exame, de 1996, sobre a educação no Brasil, são apresentadas
as opiniões e pontos de vista de figuras importantes do ideário educacional do PSDB. Dentre
as questões a serem destacadas, estão a defesa de uma gestão eficiente, a proposta de
progressão continuada, o despreparo dos professores, a política salarial e a gestão financeira.
Neste último caso, há um esforço em identificar supostos “desperdícios” que justificariam
ações voltadas para a racionalização do sistema, com enxugamentos de “gastos”.
Um dos enfoques do discurso é a questão do “desperdício” na educação. Para a
secretária de educação de São Paulo naquele momento, Teresa RoserleyNeubauer (Rose
Neubauer), “O Brasil tem sido, há décadas, campeão em desperdício de recursos materiais e
humanos na área da educação"(grifo nosso). A ideia é persistente:
‘Se colocarmos mais dinheiro, sem mudar a estrutura e os mecanismos de
funcionamento do ensino, só vai aumentar o desperdício’, diz Paulo Renato.
O professor Heraldo Vianna concorda com o ministro. ‘De cada 100 reais
destinados à educação, menos de 50 chegam às salas de aula’, diz Vianna. ‘O
restante se perde pelo caminho’. Essa situação, diga-se, não é privilégio da
educação. (grifo nosso) (EXAME, 1996)
Atrelado ao discurso do desperdício financeiro vem a ideia de que é necessário
racionalizar a administração, com medidas de descentralização, para economizar.
Com uma rede de 7 000 escolas, 6 milhões de alunos e 300 000 funcionários,
a Secretaria da Educação de São Paulo movimenta um orçamento gigantesco
de 3,5 bilhões de reais por ano. Essa máquina, até pouco tempo, padecia de
excesso de centralização. A saída foi apelar para um processo de
reengenharia [...] A reorganização resultou num enxugamento da estrutura:
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148 escolas foram fechadas por absoluta ociosidade e 40 000 funcionários
(professores não concursados e auxiliares) demitidos. [...] diz Alquéres.
(EXAME, 1996) (grifo nosso).
Desperdício, reengenharia e reorganização, são ideias que permeiam o ideário
educacional de início de governo. Os docentes, elemento importante no processo educacional,
aparece nesse discurso, com raras exceções, como um “gasto” a ser gerido.Os professores,
categorizados a partir de uma visão generalizada, visão esta que influencia muito na definição
das políticas públicas, aparecem nos discursos como mal preparados e, em certo sentido,
desonestos por“abusarem dos direitos de faltas e licenças”. Assim, não se assume, a princípio,
a necessidade de uma política salarial de valorização desse profissionalmuito mais pelo fato
deste não ser “merecedor” de valorização e muito menos por falta de recursos. Conforme o
ministro da Educação da época, Paulo Renato, e, posteriormente secretário de educação de
São Paulo, “O maior problema de educação no Brasil não é a falta de escolas nem de dinheiro,
mas a falta de preparo dos professores” (EXAME, 1996). Assume-se os baixos salários dos
professores, mas, a responsabilidade por isso também é atribuída aos próprios.
Que os professores recebem salários incompatíveis com a responsabilidade
de seu trabalho todo mundo sabe. O que não se pode é cair na tentação de
atribuir suas mazelas a uma conspiração de mentes doentias, que
deliberadamente teriam optado por conduzi-los à miséria. Até porque, em
boa parcela a responsabilidade é também deles. As greves que já se tornaram
corriqueiras nas escolas públicas, em prejuízo dos alunos que perdem dias e
até meses preciosos de aulas, em nada contribuem para a melhoria da
situação. (EXAME, 1996)
Esse discurso de “início” de governo, traz concepções do trabalho docente, da figura
dos professores, que marcará as medidas tomadas posteriormente. E é interessante que são
apresentados dados como se fossem neutros e objetivos e, portanto, mostrando uma realidade.
No entanto, esses dados também indicam situações que o conceito pré-estabelecido a respeito
da classe de professores não permite enxergar.
Uma década depois, Maria Helena Castro, já como secretária de educação de São
Paulo, em uma entrevista à revista Veja, de fevereiro de 2008, reproduzida no site do governo
de São Paulo, apresenta, sem muitos pudores, as suas concepções administrativas e
educacionais.
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Em pleno século XXI, há pessoas que persistem em uma visão sindicalista
ultrapassada e corporativista, segundo a qual todos os professores merecem
ganhar o mesmo salário no fim do mês. Essa velha política da isonomia
salarial passa ao largo dos diferentes resultados obtidos em sala de aula, e aí
está o erro. Ao ignorar méritos e deméritos, ela deixa de jogar luz sobre os
mais talentosos e esforçados e, com isso, contribui para a acomodação de
uma massa de profissionais numa zona de mediocridade. Por isso, demos um
passo na direção oposta. (CASTRO, 2008) (grifo nosso)
Ou seja, é bastante clara a posição desvalorizada ocupada pelos docentes, e a secretária
reafirma que o problema do ensino são os professores: “A falta de professores preparados
para desempenhar a função é, afinal, um mal crônico do sistema educacional brasileiro. Sem
desatar esse nó, não dá para pensar em bom ensino.” (CASTRO, 2008)
Em relação ao processo de aprendizagem, surge a bandeira da “progressão
continuada”, que implica na não retenção de alunos em algumas etapas do processo de
aprendizagem. No entanto, novamente, na base da proposta está a ideia do uso racionalizado
dos recursos financeiros. É interessante que a justificativa apresentada pela futura secretária
de educação de São Paulo, Maria Helena Castro, não é educacional, mas, financeira.
“A repetência é um câncer do sistema educacional brasileiro", diz a
professora Maria Helena Guimarães de Castro, secretária de Informação e
Avaliação Educacional do MEC. "Cria uma geração de derrotados já nos
primeiros anos de estudo e custa rios de dinheiro." [...] Os gastos para
manutenção dos alunos na escola, “Pelos cálculos do professor Heraldo
Vianna, da Fundação Carlos Chagas, as altas taxas de repetência custam pelo
menos 1 bilhão de dólares ao país por ano. É dinheiro pura e simplesmente
jogado fora, pela inépcia maciça com que se administra o sistema. "Ao
permanecerem quase três ou quatro anos acima do tempo normal na escola,
os alunos que repetem acabam ocupando os lugares reservados aos que estão
chegando", diz Vianna. (EXAME, 1996)
Pensando na concepção de projeto educacional a partir de alocamento de verbas, as
ideias apresentadas dizem respeito à economia de verbas a partir de uma redução de salas, e,
portanto, de fechamento de escolas, a progressão continuada que levariam os estudantes a não
continuarem ocupando vagas, o que gera gasto, e, por fim, considerando que uma política de
investimento em melhores salários não implicaria em melhoria na educação, onde as verbas
deveriam ser aplicadas para melhorar a educação de São Paulo? De acordo com Maria Helena
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Castro, o que melhora o ensino é produção de currículo e material didático, além da formação
continuada e premiação (bonificação) dos melhores docentes.
A produção de material didático, cursos de formação continuada e
Bonificação por resultados, são bandeiras importantes da política
educacional do Estado de Paulo. Para Castro, esses são os três “...tipos de
uso do dinheiro que surtem mais efeito em sala de aula, conforme apontam
as pesquisas: além do investimento em produção de material didático, os
cursos para melhorar a formação dos professores e os programas de
valorização aos bons docentes”. (CASTRO, 2008)
Os discursos em torno das políticas educacionais em São Paulo, desta forma, giram em
torno de gestão financeira, seja na suposta redução do desperdício, seja na alocação “correta”
dos gastos. Mas, este discurso se efetiva? O sistema educacional do estado de São Paulo
torna-se eficiente e eficaz? Gasta-se menos e melhora-se a educação?
Instrumentos legais de efetivação do discurso educacional
No período de 1995 a 2015 passaram pela Secretaria de Educação seis secretários de
estado que impuseram suas marcas nas ações do governo. A partir da análise de documentos,
declarações públicas e os atos legais, será possível estabelecer categorias de análise para
comparar a coerência entre os documentos e observar os projetos que efetivamente foram
implementados nas diferentes gestões.
Para levantamento da documentação legal, foi consultado, a partir do ano 2000, o
portal do Governo do Estado de São Paulo, que reúne Leis, Leis complementares e decretos
do executivo e, para anos anteriores, a legislação está disponível no site da Assembleia
Legislativa do Estado de São Paulo. As resoluções foram levantadas também no Portal da
Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. 2
A tabela 1 indica a documentação previamente levantada, bem como os respectivos
governos e secretários de educação. A partir da tabela é possível identificar o número de leis e
decretos produzidos no âmbito educacional em comparação ao número total. A partir do
levantamento realizado possível identificar programas e ações, dentre elas, os programas
2 Através do endereço http://www.educacao.sp.gov.br/lise/sislegis/pesqorient_ano.asp ;
http://www.educacao.sp.gov.br/lise/legislacaocenp/default.asp e http://www.educacao.sp.gov.br/lise/legislacaocenp/
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voltados para a formação continuada, planos de carreira, ações voltadas para expansão da rede
com a criação de escolas; políticas de convênios nacionais e internacionais; a relação entre
Estado e municípios, organização da estrutura administrativa (reforma administrativa), com o
discurso de eficiência da estrutura administrativa, financiamento da Educação com o uso
constante do mecanismo de “crédito suplementar”, supostamente usado para casos
excepcionais; além da Política de Gratificações versus Política salarial.
Tabela 1 – Instrumentos legais no Governo de São Paulo (1995-2015)
Tabela 1 -Levantamento de instrumentos legais de 1995-2015. Elaboração própria. Fonte: Assembleia Legislativa de São Paulo, Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, 2016
A partir dos levantamentos apresentados na Tabela 1, é possível observar, em termos
gerais, algumas características das diferentes fases do governo, nestes 20 anos. Analisando a
Tabela 1, podemos identificar um grande número de leis promulgadas referentes à Educação
no período de 1997, na gestão de Rose Neubauer. No entanto, este número, que ultrapassa
100, refere-se, em sua grande maioria, em leis que nomeiam escolas, a partir de PLs
apresentados por parlamentares, movimento este que, esgotadas uma grande onda de alteração
de nomes de escolas ocorridas entre 1995 e 1997, o número de Leis relacionadas à Educação
diminuiu consideravelmente ao longo dos anos, chegando a zero entre 2010 e 2011.
Um aspecto que chama a atenção é o grande número de Leis promulgadas na gestão de
José Serra, entre os anos de 2008 e 2009, ultrapassando, a média das outras gestões. É
interessante notar que, no início da gestão Neubauer, o número de Leis Complementares
relacionadas à Educação é menor que em outros períodos, e, novamente, há um número
grande de Leis Complementares, que destoa do restante, no ano de 2008, na gestão de José
Serra, número que também aumenta no que diz respeito a LCs relacionadas à Educação.
Na linha de decretos do Executivo, notamos que há um aumento de decretos na área
educacional, entre 2008 e 2010.No entanto, diferença maior, em termos de instrumentos
legais, pode ser observadana linha das Resoluções,na qual é visivelmente a tendência de
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aumento da utilização deste instrumento para implementação de normas na área educacional.
O número de resoluções aumenta consideravelmente com o passar dos anos, saindo de menos
de 10, em 1995, indo para mais de 50 em 2015.
No Gráfico 1, com dados exclusivamente da área educacional, os números indicam
uma tendência de utilização de instrumentos legais para implementação de políticas públicas
para Educação. É perceptível uma tendência ao aumento na utilização de Resoluções,
principalmente nos últimos 10 anos, bem como um aumento no número de Decretos na área
educacional a partir da primeira gestão de Geraldo Alckmin, com um pico na gestão de José
Serra, e uma tendência de diminuição nos anos seguintes. Além disso, o número de Leis e
Leis Complementares também diminuem com o passar do tempo, o que indica poucas
alterações, ou inovações educacionais por meio destes instrumentos legais.
Gráfico 1 - Número de Leis, Leis Complementares, Decretos e Resoluções, promulgadas e editadas entre 1995-2015, com relação à área educacional. Elaboração própria. Fonte: Tabela 1
A partir deste levantamento, foram selecionados instrumentos normativos mais
relevantes para a análise empreendida3. Conforme Kemp, as gestões de Covas e Alckmin são
3A análise completa é parte do relatório de Pós-doutorado, supervisionado pelo prof. Dr. Paulo Gomes Lima, na Universidade
Federal de São Carlos, Campus Sorocaba. Dentre as Leis, foram descartadas aquelas que não foram criadas a partir de Projeto
de Lei do Executivo. Além disso, em diversos momentos, os decretos referentes a crédito suplementar, uma prática constante,
principalmente nos finais de anos, foram excluídos. Instrumentos da Secretaria de Educação, referentes à, inicialmente,
FEBEM, e, posteriormente, Fundação Casa, também não foram analisados. Além disso, não foram selecionadas Leis, Leis
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COVAS ALCKMIN LEMBO SERRA GOLD. ALCKMIN
Leis, Leis Complementares, Decretos e Resoluções (Educação)
Leis LC Decretos Res.
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momentos em que a noção de “modernização” é a tônica das reformas, nas gestões
posteriores, foi investido em convencimento da sociedade, e na gestão Serra as “orientações
neoliberais ganham materialidade, resultando em maior ênfase nos valores do tipo
gerencialista, com o mergulho irrestrito na lógica mercadológica” (KEMP, 2013, p.14), e, nas
gestões seguintes, a sedimentação da proposta.
Rose Neubauer4 e as bases da política educacional (1995 – 03/2002)
Rose Neubauer, assume a secretaria de Educação em 1995, juntamente com o
governador Mário Covas, e terá início ao longo ciclo de governo que ultrapassa 20 anos.De
acordo com Dantas, este foi o momento da gênese da mudança.
Em termos de instrumentos normativos, considerando as Leis, propostas pelo Poder
Executivo, as Leis Complementares, os Decretos e as Resoluções, uma das primeiras ações do
Poder Executivo foi a reestruturação burocrática da Secretaria de Educação, que, de acordo
com declarações de Rose Neubauer, era ineficiente pois inchada.
De acordo com Ramos, a gestão dela pode ser resumida na seguinte atuação:
podem ser destacadas dentre as principais ações de Neubauer na pasta da
educação: a extinção do Programa Escola Padrão, criado pelo governo de
Luiz Antônio Fleury Filho; a extinção das Divisões Regionais de Ensino e
criação das Diretorias Regionais de Ensino; a criação do Programa Escola
em Parceria; a organização do Ensino Fundamental em dois ciclos; a
instituição do Regime de Progressão Continuada no Ensino Fundamental; a
criação da política de Reorganização da Rede Física; a criação das Classes
de Aceleração; a implantação do Programa de Ação de Parceria Educacional
Estado-Município (municipalização do ensino); a criação do Sistema de
Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP); a
criação do Programa de Educação Continuada (PEC) e do Programa de
Educação Continuada-Universitário (PEC-Universitário); a informatização
da rede administrativa da educação, entre outras.” (RAMOS, 2016, p.551)
Complementares e Decretos que dizem respeito a criação de escola, seja ela escola técnica ou de ensino regular, ou, de
nomeação de escola. Outro aspecto também não analisado diz respeito às Escolas Técnicas, e depois, as CEETPS. Nesse
sentido, foram selecionados os instrumentos referentes a gestão do ensino regular e a implantação de medidas que iriam
impactar sob esse segmento de ensino. 4 Teresa Roserley Neubauer da Silva foi professora da Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo) e
pesquisadora sênior na Fundação Carlos Chagas. Foi coordenadora de Estudos e Normas Pedagógicas da Secretaria da
Educação do Estado de São Paulo (governo Quércia).
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Comparando o número de instrumentos legislativos entre o período da gestão de Rose
Neubauer com os outros secretários, o número é menor. No entanto, foram medidas de grande
impacto, o que não significa necessariamente melhoria na qualidade da educação. Investiu-se
em uma reorganização, mas, pouco investimento em salários e carreira, como veremos.
Houve continuidade da gestão de Rose Neubauer? Em termos gerais sim pois os
outros seguiram a mesma lógica. No entanto, isso não significa que não houve críticas e
denúncias, por parte de pessoas do mesmo partido político, de falta de continuidade e de
abandono de ações já iniciadas.
Gabriel Chalita5 (abril/2002 a abril/2006)
Geraldo Alckmin, o novo governador, deu continuidade, junto a Rose Neubauer, o que
vinha sendo implementado. No entanto, no último ano do mandato, antes de vencer as
eleições, houve a troca de secretário da Educação, passando a ser Gabriel Chalita. Assumindo
como governador eleito, em 2003, lançou o seu próprio documento e diretrizes para a área
educacional.
De acordo com Ramos (2016) Chalita teria dado continuidade às práticas
administrativas anteriores,
... conservou as políticas iniciadas na administração de Neubauer. Todavia,
Chalita acabou se destacando também por algumas políticas próprias, como
aquelas voltadas para a capacitação do magistério (Programa Letra e Vida,
Programas Teia do Saber e Rede do Saber, Bolsa Mestrado, entre outras) e
para inclusão social por intermédio da escola (Programa Escola de Tempo
Integral, Programa Escola da Família, entre outras), fortalecendo o slogan de
“Governo Educador, Solidário e Empreendedor” impresso por Alckmin em
sua gestão. (RAMOS, 2016, p.551)
No entanto, de acordo com algumas críticas da própria Rose Neubauer e também de
Paulo Renato Souza, houve um rompimento na gestão de Gabriel Chalita.Em uma entrevista
com Rose Neubauer, a ex-secretária critica a falta de continuidade na gestão de Chalita.
5 Gabriel Benedito Issaac Chalita. Entrevista disponível em:
http://www.rodaviva.fapesp.br/materia/274/entrevistados/gabriel_chalita_2002.htm
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O reforço semanal, a recuperação nas férias e a capacitação do professor a
partir da avaliação. Não adianta haver a avaliação, ficarmos discutindo, e
isso não redundar em uma capacitação de professor, por escola, nas áreas
onde os estudantes foram pior. Não adianta ficarmos comprando curso de
capacitação para aquilo que o professor tem interesse se não trabalharmos
uma capacitação muito bem pontuada [refere-se aos programas de formação
continuada da gestão Chalita]. Escolas com notas seis podem ter dificuldades
diferentes. Não adianta dar bolsas de pós-graduação para o professor se a
secretaria não faz uma capacitação voltada para a correção da problemática
do desempenho dos alunos [outra referência a um programa da gestão
Chalita, o Bolsa Mestrado]. É uma pena. Se São Paulo tivesse utilizado esses
instrumentos, estaria melhor.(NEUBAUER, 2007)6
No mesmo dia, é publicada uma entrevista com Paulo Renato de Souza, que, para
justificar a piora nos resultados das avaliações dos estudantes das escolas estaduais de São
Paulo, responsabiliza a falta de continuidade na gestão de Gabriel Chalita.7
Maria Lúcia Vasconcelos8 (abril de 2006 a junho 2007)
Com o afastamento de Geraldo Alckmin para concorrer às eleições, Claudio Lembo
assumiu o lugar, escolhendo Maria Lúcia Vasconcelos para assumir a secretaria de educação.
No entanto, no início de 2007, já com José Serra como governador, ela continuou na pasta até
meados do ano. A secretaria Maria Lúcia Vasconcelos, de acordo com Ramos, “que, em ritmo
definal de mandato, acabou basicamente dando continuidade aos programas emeducação
criados ou mantidos durante o governo Alckmin.” (RAMOS, 2016, p.552)
No entanto, José Serra apresentou suas próprias propostas. Em seu mandato, sua
principal ação foi o corte no Programa Escola da Família e o Programa de contratação de
estagiários de Pedagogia para as aulas de alfabetização, apresentado para a sociedade como “o
segundo professor em sala aula”.
O discurso é semelhante àde início de governo, que pretende solucionar os problemas
começando pelo que acha mais importante. Assim, o foco é a alfabetização, a base do
processo educacional e o currículo do Ensino Médio, que, segundo a secretária, não leva a
nada. Iniciando a gestão de José Serra em janeiro de 2007, Vasconcelos foi um dos quatro
secretários mantidos no governo.Em julho de 2007, supostamente por problemas pessoas, mas
6 Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1203200718.htm 7http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1203200717.htm 8 Maria Lucia Marcondes Carvalho Vasconcelos, Ex-reitora do Mackenzie.
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com indícios de que isso ocorreu em função de “resultados ruina”, ocorre uma substituição da
secretária de educação por Maria Helena Castro, que permanecerá no cargo até 2009. Dos
meses que permaneceu à frente da secretaria, Vasconcelos apresentou resistência e
contrariedades em relação ao secretário anterior, inclusive, com corte de programas. Fez
críticas em relação ao uso de verbas, não deu continuidade a programas. Parecia evidente a
oposição entre eles.
No geral, poucas alterações foram feitas, nesse período e a ênfase da administração
recaiu sob a questão da alfabetização, nas escolas regulares.
Maria Helena Guimarães de Castro (julho de 2007 a abril de 2009)
Maria Helena Castro, responsável por medidas significativas e o processo de
implementação de uma Proposta Curricular do Estado de São Paulo, foi a segunda secretária
da gestão José Serra. Ela assumiu a pasta em 25 de julho de 2007 e sua saída é anunciada no
dia 27 de março de 2009, sendo que, efetivamente deu lugar ao novo secretário no dia 13 de
abril de 2009.
A secretária apresenta o discurso de que houve universalização do ensino e de que a
próxima etapa é investir em qualidade, e, portanto, é necessário uma nova agenda9. “O
esforço pela busca de qualidade e de resultados tem que começar desde o início da vida
escolar.”(CASTRO, 2007).
Os instrumentos legais identificados durante sua gestão foram em número maior do
que nas outras gestões. No entanto a diferença se deve, principalmente, ao grande número de
Decretos que se referem a pedidos de crédito suplementar, e também referentes às Escolas
Técnicas (CEETPS). Além disso, até o final do ano de 2007, os instrumentos estiveram
relacionados às já conhecidas anuais alterações no bônus, dentre outras.
A imprensa, principalmente através da Folha de São Paulo, noticiou, frequentemente,
os resultados negativos do SARESP, em diversos anos. E frequentemente surge o
questionamento da ausência de bons resultados frente aos altos investimentos. No entanto, a
falta de efeito dos investimentos, é uma crítica às políticas anteriores, como já observamos
9 CASTRO, MARIA HELENA GUIMARÃES DE. Nova agenda da educação de São Paulo. Opinião. Folha de São Paulo.
20/08/2007. Disponível em:http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2008200709.htm
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estar presente nas falas dos diferentes secretários. Ou seja, a secretária culpa os cursos de
formação e, também, as políticas anteriores do governo, que “parecem não ter surtido efeito”.
Maria Helena sai da pasta, de acordo com editorial da Folha de São Paulo “nó no
ensino paulista”, apenas 20 meses depois de assumir. Segundo o mesmo editorial, em
circunstâncias não esclarecidas. De acordo com a Folha de São Paulo, José Serra muda o
secretário pela terceiravez. Maria Helena alega problemas pessoais, mas a reportagem indica
que o governador estava insatisfeito com a atuação da mesma. Precedido por manchetes de
resultados negativos na educação, como, por exemplo, o fato de grande número de
professores terem tirado nota zero em uma avaliação e isso ter sido levado à Justiça; os
resultados negativos dos alunos, abaixo das metas, e erros em materiais didáticos.
De acordo com as declarações, o novo secretário, Paulo Renato, iria manter as
diretrizes políticas e a mesma equipe. No entanto, apesar da suposição de desagrado com o
desempenho de Maria Helena, e isso pode ser observado pelas polêmicas noticiadas pelo
jornal Folha de São Paulo, há algumas indicações de que a troca do cargo teria implicações
políticas. A própria Maria Helena sugere isso e, de acordo com a mesma reportagem citada
acima, o presidente do Conselho Estadual da Educação, na época, Arthur Fonseca Filho.
"Para a mudança, pesou o fato de o Paulo Renato, como deputado, ter pretensões políticas e
necessidade de projeção, o que a Maria Helena não tem."
Assim, apesar da atuação técnica de Maria Helena Vasconcelos, o seu perfil,
semelhante a Rose Neubauer no que diz respeito a imposição de algumas propostas e o
embate com professores e líderes sindicais, esse perfil não parece ser o desejado em função da
publicidade negativa que gera. Por outro lado, a questão política também é significativa e não
deve ser ignorada.
Paulo Renato Costa Souza (abril de 2009 a dezembro de 2010)
Paulo Renato Souza, saído do Ministério da Educação, assumiu a secretaria de
educação no dia 13/04/2009, noticiado junto a uma reportagem da Folha de São Paulo sob o
título.“Nenhuma escola de ensino médio atinge meta em SP”. Ao ser questionado sobre o
desempenho ruim da rede estadual de ensino, Paulo Renato, em 17/04/2009, responsabilizou
os professores e sua formação deficitária, de acordo com ele, um problema nacional.De
14
acordo com declarações o desafio seria melhorar a qualidade de ensino, pois, segundo as
avaliações do próprio estado, o desempenho dos alunos em matemática é baixo e nenhuma
escola tem um padrão “primeiro mundo” almejado pelo governo. A proposta, para a atuação
do novo secretário, é de continuidade.
A gestão de Paulo Renato, em termos de instrumentos normativos, dentre Leis, Leis
Complementares, Decretos e Resoluções, foi marcada por normas referentes ao FDE, várias
referentes ao Bônus, uma prática recorrente nos outros anos, também a criação de uma Escola
de Formação, convênios referentes a Educação Especial, várias normatizações referentes a
Carreira, Educação de Jovens e Adultos, Centro de Estudos de Línguas, vários programas,
alguns referentes a currículo e merenda escolar.
De acordo com Ramos,
Nesse curto período, Paulo Renato conseguiu lançar ações bastante
impactantes no setor com a criação do Programa + Qualidade na Escola, que
envolveu, dentre outras coisas: a criação da Escola de Formação de
Professores do Estado de São Paulo; as alterações no modelo de ingresso dos
profissionais do magistério, com a introdução de curso de formação após o
processo seletivo; e a criação de uma avaliação para os professores
temporários como parte dos requisitos na escolha de aulas. (RAMOS, 2016,
p.552)
Com a nova eleição de Geraldo Alckmin ao governo do estado, os secretários
identificados com o “serrismo” foram afastados, incluindo o de educação. Aliás, segundo
noticiado pela Folha de São Paulo, não houve uma boa aceitação da mudança por parte de
Paulo Renato de Souza que foi substituído pelo ex-reitor da Unesp, Herman Voorwald.
Herman Jacobus Cornelis Voorwald (2011 a 2015)
A atuação de Voorwald é marcada pelo que chama de “correção de rumo”. Dentre
suas primeiras ações foi a criação de Polos a partir do qual ele estabeleceria um contato mais
próximo dos professores. Através de uma série de encontros, foram levadas as demandas e
problemas, às vezes de simples resolução, enfrentados nas escolas e de desconhecimento da
gestão superior. Problemas desde o atraso na entrega de materiais até questões relacionadas ao
Plano de Carreira.
15
Em uma reportagem, publicada na Folha de São Paulo, em janeiro de 2011, uma
entrevista é publicada na qual Voorwald descreve suas primeiras impressões. O título da
reportagem é “Estado não se preocupou em ter docente motivado”, título, aliás, aparentemente
óbvio para quem atua ou está próximo do sistema educacional público paulista. 10
Em uma apresentação, os autores afirmam que o secretário já tinha uma avaliação da
rede: “os professores estão desmotivados e com salários baixos”; “o Estado não se preocupou
em aumentar o comprometimento dos servidores”. Aponta para a necessidade de resgatar a
dignidade, aumentar salários, promover uma carreira mais atrativa.
Dentre os pontos ressaltados, está a falta de contato com a rede, termo usado para
referir-se ao conjunto de professores e gestores, que, na visão do secretário, é um problema.
A informação que tive das entidades é que há muito pouco contato [da
administração] com a rede. Se o objetivo é dar o melhor aprendizado ao
aluno, a pessoa que dá o aprendizado precisa se manifestar sobre as
atividades que fará na aula. (VOORWALD, 2011)
Ou seja, essa falta de contato, a falta de respeito e a criação de um sentimento de
descaso em relação aos professores é problemático na medida em que afeta o
comprometimento e a motivação, fundamentais para que o trabalho, o qual se propõe realizar
um sistema de ensino, seja realizado com eficácia. Assim, afirma o secretário “a qualidade de
ensino está relacionada ao comprometimento das pessoas”. Ele compara a situação com as
universidades. “Em 1989, quando conseguiram autonomia, sempre priorizaram recursos
humanos, para assegurar um quadro de servidores que garantisse qualidade institucional.” Isso
na compreensão de que a qualidade institucional e a autonomia seriam necessários ao trabalho
de qualidade na área educacional. No entanto, o mesmo não ocorre no sistema estadual: “Não
sinto o mesmo na educação fundamental e média. Honestamente, em uma semana que estou
aqui, não sinto que a preocupação seja ter um quadro comprometido”. O secretário deixa claro
que não há valorização do corpo docente.
Na visão de Voorwald, o que não significa que suas ideias foram totalmente
implementadas, a falta de respeito com os professores é um responsável por um sentimento
geral de desconforto.
10CHIARATO, D.; TAKAHASHI, F.Estado não se preocupou em ter docente motivado. Folha de São Paulo. Cotidiano,
10/01/2011.
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Senti uma desmotivação, uma leitura de desconsideração do papel do
professor. Há o sentimento que o Estado não tem preocupação em formar
bem os jovens. Esse sentimento não é bom. A fala foi geral, e a sinalização
foi o quanto se paga para um professor que ingressa [R$ 1.835, para jornada
de 40 horas semanais]. Como você quer ter alguém comprometido, formado
em boa universidade? (VOORWALD, 2011)
Por este trecho podemos perceber que sua visão é diferente da, por exemplo, visão
expressa por Castro para a qual melhores salários não significam melhoria na educação. Para
o secretário, parece claro que aqueles que são formados em boas universidades não vão se
interessar em ganhar baixos salários. Não necessariamente isto é verdade, no entanto, talvez
possa ser aplicado a uma grande maioria. De qualquer maneira, o valor pago ao trabalho
reflete a valorização que se atribui a ele. Baixos salários é equivalente a baixa valorização.
Para completar, Voorwald traz uma visão administrativa diferente da visão corrente,
que é uma visão que não foge do viés administrativo, mas que é centrado no enfoque
comportamental, que valoriza a atuação do trabalho para construir a eficácia do sistema.
Quando perguntado sobre qual o motivo de, em pleno 2011, considerando que o PSDB
governa o estado desde 1995, o sistema educacional ainda ser precário e não ter bons
resultados, Voorwald responde:
Não sei dizer se foram apenas implicações econômicas ou de prioridade. Sei
que minha prioridade é que recursos humanos serão o diferencial. Os
programas da secretaria são bons, a gestão é boa, o material é bom. Podemos
fazer reformas de prédios, se necessário. Tudo isso é administrável. O que
não se consegue administrar matematicamente é o sentimento daquele que
ministra dentro da sala de aula. (VOORWALD, 2011)
Em sua gestão várias alterações foram feitas, e, inclusive, houve um processo de
reajuste salarial mais constante do que em outras gestões, como veremos abaixo.
tentou-se imprimir no Estado a ideia de educação como compromisso central
da referida gestão, pelo Programa Educação-Compromisso de São Paulo
(SÃO PAULO, 2011). Assim, além da manutenção da política educacional
em vigência, esse governo teve ações significativas nesse campo. Destacam-
se nesse sentido: a reestruturação da Secretaria da Educação; a
reestruturação da carreira do magistério; a reformulação do programa de
Valorização pelo Mérito; a implantação de uma nova divisão do Ensino
Fundamental em três ciclos (do 1o ao 3º ano, do 4º ao 6º ano e do 7º ao 9º
ano); entre outras. (RAMOS, 2016, p.553)
17
Voorwald identifica as falhas no sistema educacional de São Paulo e aponta para sua
ineficiência, ressalta a importância da valorização do trabalho docente através de Planos de
Carreira e Política Salarial. Neste sentido, podemos dizer que é uma voz dissonante nas
propostas anteriores quanto à concepção de trabalho docente. Isso não significa deixar de
enxergar a gestão educacional a partir da Teoria da Administração, mas, considerar outros
elementos da mesma teoria. Analisamos abaixo, a “política salarial” ao longo das gestões
psdbistas e podemos identificar os poucos momentos de alguma “leve mudança”.
O “fator humano” na política educacional e a política salarial
Organizando esta análise a partir dos referenciais apresentados pelo próprio objeto de
estudo, desconsiderando, propositadamente os amplos debates na área educacional, vamos
analisar a concepção de trabalho docente a partir da compreensão de que este, no espaço
escolar, é um dos agentes principais na efetivação da ação educacional, objeto das políticas
públicas.
A Teoria da Administração, que pauta os discursos educacionais neste modelo
apresentado, como uma área de conhecimento, é permeada por diversos debates e embates,
muita produção intelectual e diversos enfoques. Houve momentos dessa teoria, na qual, com a
baixa mudança nos sistemas de produção houve um alto índice de estabilidade nas práticas de
gestão empresarial, enquanto que, a partir da entrada de novos atores produtores, a
complexidade dos mercados em suas demandas e dinâmicas, caminhando para um mercado
globalizado, a partir da década de 1980, as empresas passaram a ter que investir cada vez mais
premente, em inovação. Com uma dinâmica mais acelerada, as práticas mecanicistas,
repetitivas e estáticas precisaram dar lugar a novos processos, nos quais o fator “humano”
com novas ideias para superar os novos desafios precisavam ser considerados. Grande parte
da Teoria da Administração desenvolveu-se no período de estabilidade das formas de
produção e, mesmo em momentos diferenciados, algumas ideias passaram a ser simplesmente
repetidas e reiteradas, desconsiderando os debates existentes (MAXIMIANO).
O autor de Teoria Geral da Administração, Antônio César Maximiano, apresenta os
diversos elementos e termos que compõe a teoria geral da administração. Segundo sua
18
definição o “Modelo de Gestão” (ou de administração) é o conjunto das doutrinas e técnicas
do processo administrativo. Já o “Modelo de organização” está mais relacionado ao conjunto
de características que definem as organizações e as formas como são administradas. Ou seja, é
o produto da utilização de determinado modelo de gestão. As “Doutrinas” e “técnicas” são
definidas, respectivamente como “princípio de conduta, que contém valores, implícitos ou
explícitos” e “soluções de problemas”. O autor cita como exemplo “o movimento da
administração científica tinha uma doutrina da eficiência de recursos. O movimento da
qualidade tem uma doutrina da satisfação do cliente” (MAXIMIANO, 2012, p.8). Neste
sentido, podemos inserir os discursos das políticas educacionais em uma “doutrina da
eficiência de recursos”. No entanto, seria esta abordagem, nessa mesma perspectiva, a mais
adequada para conceber a administração de um sistema educacional? Existem inúmeras outras
“trilhas” na selva das teorias administrativas composta pelas Escola Clássica; a Escola
Neoclássica; o Enfoque (ou escola) comportamental e o Enfoque (ou pensamento) sistêmico.
Nesse viés da doutrina da “eficiência dos recursos”, o “fator humano” na “produção”
educacional, que é o docente, tem, em seu salário, um dos elementos de valorização e
incentivo para a geração de melhores resultados. Assim, selecionamos a “Política Salarial”
como enfoque desta análise, a fim de observar, nos atos legislativos, a efetivação da
concepção do trabalho docente. Neste sentido, houve movimentações legais referentes à
construção de uma Carreira Docente, as ações voltadas para a Bonificação de Resultados, os
programas de Formação Continuada e, por fim, a política salarial. Apresento abaixo os
instrumentos legais referentes à política salarial.
Vamos observar, que, apesar de toda a movimentação legal, criação de Comissão
para debater o plano de Carreira e implementar políticas salariais, ao longo dos 20 anos, o
salário dos docentes da rede estadual, não teve aumento, e seus reajustes não chegaram a
corrigir as perdas inflacionárias, exceto nos anos de 2013 e 2014, quando gratificações foram
incorporadas ao salário. Nesse sentido, é claramente deliberado a ausência de investimento no
“fator humano” da educação.
Ao analisar o valor do vencimento do professor, em 30 horas de trabalho semanais,
classificado na faixa 1, nível 1, em 1997, era de 610,00 e, em 2014, de 1.811,91, ou seja, em
17 anos, houve um aumento no valor bruto de 197%. Enquanto o salário mínimo, que era de
19
120,00, em 1997, passou a ser de 724,00 em 2014, configurando um aumento de 500%.
Percentual bastante diferente do “aumento salarial” dos docentes do Estado de São Paulo.
Além disso, podemos observar, pela tabela abaixo, que, considerando o índice
inflacionário, em 2014, o salário docente estava se aproximando do salário com correção
inflacionária, no entanto, considerando que não houve aumento em 2015 e 2016, novamente
os salários voltam a ficar distante da correção inflacionária. Nesse sentido, nos últimos 20
anos os docentes não tiveram aumento real de salário, e os vencimentos não chegaram nem a
ter correção inflacionária. Assim, com o passar dos anos, os salários foram, de fato,
diminuindo.
Apesar da política de valorização dos professores, principalmente na gestão de
Voorwald, não houve um aumento real de salário, se analisado em termos de reajuste
inflacionário. Nesse período, houve claramente a ação de reajustar
anualmente/semestralmente os salários, apesar de não ter sido uma política que se manteve na
gestão seguinte, como podemos observar pela tabela abaixo.
20
Tabela 2 - Reajustes salariais ao longo do tempo comparado a indices inflacionários. 1995-2015. Elaboração
própria. Fonte: Assembleia Legislativa de São Paulo.
Através dos diversos levantamentos apresentados neste item, foi possível elaborar
uma tabela, a partir da qual podemos visualizar as gestões nas quais houve reajuste salarial, a
porcentagem de ajuste, bem como o índice inflacionário daquele ano (de acordo com
21
informações do Banco Central), e, uma projeção de qual seria o valor do salário se corrigido a
partir da inflação. Nas últimas colunas apresentados as diferenças, ou, perdas salariais, em
reais e em porcentagem, o que deu origem ao gráfico que pode ser visto abaixo.
Gráfico 2 - Evolução dos reajustes salariais, PEB II, 30 horas, faixa 1, nível 1, 1997-2016. Elaboração própria. Fonte: Tabela
21.
O Gráfico 2 mostra a diferença entre o valor do salário caso fosse reajustado pelo
índice inflacionário, e o valor dos salários a partir dos reajustes apresentados na legislação
consultada. É perceptível que os únicos dois anos nos quais houve um pequeno aumento
salarial de fato, que não chegou a 5%, foi nos anos de 2013 e 2014, na gestão de Herman
Voorwald. Ou seja, apesar de insuficiente, houve, efetivamente, uma tentativa de melhoria
dos salários docentes.
Ao longo dos anos, ao invés de ganho salarial, houve, ao contrário, perdas, cujos
valores, tomando como base o índice inflacionário do Banco Central, e, como referência, o
valor salarial de 1997. Essa defasagem salarial poderia ser questionada a partir da prática de
gratificações, muito comum na política educacional analisada. No entanto, gratificações
R$ 0,00
R$ 500,00
R$ 1.000,00
R$ 1.500,00
R$ 2.000,00
R$ 2.500,00
Evolução Salarial 1997-2016
Valor PEB II, 30 horas, Faixa 1/Nível I
Valor se Corrigido inflação do ano anterior em reais
22
representam valores pequenos, e, muitas vezes de oferecimento incerto considerando ser uma
prática anual, atualizada a cada ano, por instrumentos legais específicos e pontuais, como é
possível analisar pela legislação. Assim, diferente de uma política salarial confiável, a prática
de gratificações e bonificações acabam por configurar uma postura que gera desvalorização
do profissional e insegurança financeira.
Política de estado ou de governo? Incompetência administrativa? Conceitos
equivocados? Um plano perfeito para acabar com a educação pública? Ou...?
Na gestão de Rose Neubauer, houve o processo de racionalização, enxugamento,
reorganização da rede. Orgãos extintos, alunos cadastrados, sistema de avaliação
implementada. Parecia que a qualidade da gestão estaria nesse processo de enxugamento. As
ações foram feitas, escolas fechadas, durante oito anos de sua gestão, o sistema foi
“organizado”. Com Gabriel Chalita, o foco voltou-se para a formação continuada dos
professores. Se, ao longo dos oito anos, a rede estadual não se transformou na melhor rede de
ensino do Brasil, é porque algum problema ocorreu. E, este problema, de acordo com Chalita,
estaria na formação docente. Portanto, era necessário qualificar os docentes.
Na gestão de Vasconcelos, muitas ações anteriores foram abandonadas e o foco
voltou-se para a alfabetização e as primeiras séries. Sua sucessora, Maria Helena Castro, com
ideias bem claras e uma atuação mais definidas, diversas mudanças são feitas. Em sua gestão,
é implementado o Bônus atrelado aos resultados do SARESP, principalmente. Nesse processo
de avaliação, é implementado uma Proposta Curricular, com estabelecimento de metas de
aprendizagem. Além disso, foram criados espaços para formação continuada.
Herman Voorwald, último secretário analisado neste trabalho, faz um balanço das
gestões anteriores ressaltando o que deixaram de legado. Segundo ele, nas primeiras gestões,
de Covas e Alckmin, “São Paulo implantou medidas com foco na universalização do acesso à
escola, na correção das distorções de idade/ série e na redução da evasão.”. Ou seja, de acordo
com ele, foi possível chegar a quase 99% de jovens de 7 a 14 na escola, e, de 15 a 17 anos,
chegar a 86,4% na escola. Na gestão de José Serra, ele ressalta como legado, a “a
padronização curricular, com orientações aos docentes para todas as séries, inclusive por meio
dos programas Ler e Escrever e São Paulo Faz Escola.”, ressalta a avaliação por meio de
metas específicas para as unidades escolares. Também ressalta o atrelamento do Bônus a
23
resultados. Ou seja, é como se, ao longo dos 16 anos anteriores, essas fossem as conquistas e
as melhorias implementadas na rede de ensino estadual.
Há, no entanto, um aspecto que o secretario aponta como sendo necessário
modernizar: “a estrutura da Secretaria da Educação, que gerencia cerca de 5 milhões de
alunos, 230 mil professores e 5,3 mil escolas e é baseada em um modelo administrativo
anacrônico e burocrático.”. Ou seja, aquele discurso se “eficiência” e de modelo de gestão
“gerencial” contra um modelo de gestão “burocrático”, criticado pelo documento lançado em
1995 não foi efetivado em 2011.
Em 2011, o governo de São Paulo lançou um novo programa “Educação -
Compromisso de São Paulo” tendo à frente, como novo secretário de estado da educação
Herman Voorwald, que, em entrevista intitulada “Correção de Rumo” apresentou as suas
diversas concepções. Sua proposta era “revolucionar” a carreira do magistério, e “tornar a
carreira do magistério uma das dez mais procuradas pelos jovens do país em dez anos”. O seu
discurso, no início da gestão, era da valorização da opinião dos professores “...eles é que estão
fazendo o ensino na ponta, então é importante que se manifestem”, afirmou.
Sobre a remuneração pelo desempenho, afirmou ser importante ter uma evolução na
carreira baseada na produtividade “A carreira acadêmica tem de privilegiar o
comprometimento para com a atividade-fim e permitir que avancem aqueles que quiserem,
tiverem compromisso e se esforçarem”. Sobre a política de bonificação, uma bandeira
defendida nas políticas anteriores, para onde caminharam as ações educacionais, não é vista
com bons olhos pelo secretário.
Apesar, no entanto, das propostas levemente divergentes de seus antecessores, o
secretário não implementa várias de suas propostas, com a justificativa que não encontra
aprovação para isso.
Depois de 20 anos, implementando, alterando, realizando estudos para que a rede
estadual de ensino chegasse a um nível de excelência, podemos dizer que, a partir de ações,
em geral, autoritárias, e “eficazes”, as medidas foram tomadas e foram sendo implementadas,
com poucas vozes de discordância, exceto a dos professores, e líderes sindicais.
Assim, apesar de um governo de 20 anos, com suposto projeto e valorização da área
educacional, por que o estado de São Paulo não atinge os resultados esperados, por que não é
a melhor rede de ensino do Brasil? Por que não atinge os melhores índices? Por que a
24
promessa do “São Paulo faz escola” não se concretiza? Estaria o problema nos conceitos?
Seria possível responsabilizar os professores? Foram criados cursos de formação continuada.
Seria responsabilidade do material didático? Mas, a rede possui uma enorme gama de
materiais didáticos, apostilas, materiais de apoio, bibliotecas. Seria problemas de
informatização? São Paulo possui computadores em todas as escolas, com acesso à internet.
Um sistema de informatização funcional complexo e em funcionamento, um sistema
informatização de Boletim escolar, de Secretaria Digital. Onde o discurso falha? Onde as
ideias não se efetivam? Ou será que, está se investindo no lugar errado?
Eduardo Andrade, em um debate organizado pelo jornal Folha de São Paulo,
apresenta uma questão que me parece significativa e que pode ser observado através da
análise diacrônica das diversas gestões.
As políticas educacionais no Brasil são de governo e não de Estado [ou seja,
não têm continuidade]. Entra um governo, até do mesmo partido, como é o
caso do PSDB em São Paulo, e as mudanças são gritantes. A política do
governo Alckmin, por exemplo, era fortemente contrária à colocação de
metas para as escolas. Agora, entra um novo governo, que implanta tal
medida. (ANDRADE)
Ou seja, mesmo sendo de um mesmo partido, não é possível afirmar que existe uma
coerência de ações a partir das quais é implementado um processo de melhoria que vai sendo
aprimorada ao longo do tempo, com envolvimento da comunidade escolar, e, de uma maneira
“racional”, pragmática e eficiente, vai se direcionando a um objetivo. Apesar de um discurso
gerencialista, focado em qualidade e eficiência, parece que a prática, a longo prazo, está longe
disso. Talvez possamos dizer que se vive um ciclo de “constrói/destrói” cujo objetivo
principal seja superar os anteriores, criar impactos imediatos em busca de capitalização
política. Investe-se em programas que possam gerar imagens positivas do governo, criam-se
estratégias articuladas para maquiar situações e parecer algo que não é, e, efetivamente,
apesar de orçamento não desprezível, o sistema é inchado e pouco eficiente.
Em uma entrevista com um diretor de uma das melhores escolas, segundo as
avaliações de 2009, do estado de São Paulo. O diretor, com uma visão questionável de
educação, mas, com um discurso semelhante ao do governo, explica como o próprio governo
atrapalhava em suas metas. Ou seja, é como se este diretor estivesse seguindo na direção
25
proposta pelo ideário apresentado, mas, é atrapalhado por cada gestão em particular. O Estado
trabalha contra suas próprias ideias. De acordo com o diretor, para que a escola pudesse ter os
melhores resultados, ele deixou de seguir as normatizações da secretaria de Educação. “Aqui
é uma escola maldita, que vai contra os modismos de cada secretário.”, afirmou. Ele faz um
balanço das diferentes gestões:
Depois da Rose Neubauer [gestão Mario Covas], em que as escolas perdiam
aulas para treinamento de professores em horário de serviço, veio um que
nem sabe o que é rol de conteúdos [Gabriel Chalita, gestão Geraldo
Alckmin]. A escola, que já não funcionava, ficava uma semana em feira de
ciências ou excursões para zoológico. Melhora o ensino? Vi que era fria e
tirei a escola disso. No governo Serra, temos o terceiro secretário em dois
anos e meio. Se o meu projeto dependesse do governo, estaria esfacelado. A
menina do Mackenzie [Maria Lúcia Marcondes Carvalho Vasconcelos,
primeira secretária da gestão José Serra] era bem intencionada, mas não
conseguiu nada. A segunda [Maria Helena Guimarães de Castro] eu respeito
porque sabe que escola é avaliação. E sabe que para avaliar precisa de um rol
de conteúdos. Mas teve problemas de gestão. Por exemplo, a prova de
temporários era uma boa ideia. Mas a implementação foi péssima, sem
preparo jurídico, o que melou o sistema. Ou seja, o governo não tem a menor
ideia do que fazer com as escolas. Deveríamos nos preocupar com o que
realmente interessa, que é a aprendizagem dos alunos. Depois se acerta a
burocracia.
Este diretor, com uma visão mais pragmática, apresenta o ponto de vista daquele que
está em contato direto com o “chão da escola”. No entanto, logo percebeu que os diferentes
direcionamentos apresentados nas diferentes gestões, caso fossem seguidas, deixariam a
escola à mercê da maré, como deve ter ocorrido em diversas unidades escolares. Aliás, a
prática de contrariar e não aceitar os direcionamentos é comum e combatida pela secretaria de
educação, que, cada vez mais investe em gestores que sejam alinhados com suas políticas.
Assim, gestores “rebeldes” como este, não são estimulados, apesar de atingir a meta
pretendida.
Análises foram feitas, ao longo das gestões, que indicaram as falhas, que indicavam a
necessidade de melhoria no sistema e a atenção a alguns aspectos. No entanto, ainda falta uma
política de Estado que pense a educação a longo prazo e não em termos de resultados
imediatos para a publicidade da próxima eleição.
A jornalista Laura Capriglione, no texto “Insustentável leveza”, publicado na Folha
de São Paulo em agosto de 2010, faz uma análise semelhante. Após lançamento de uma
26
medida para supostamente incentivar o aprendizado, o “vale-presente”, que seria dado a
crianças com dificuldade no aprendizado, que frequentasse as aulas de reforço, o mesmo foi
retirado antes de ser implementado. Isso virou mote para a jornalista fazer uma análise de uma
prática recorrente na área educacional de São Paulo. A autora ressalta “a leveza beirando a
irresponsabilidade com que o secretário Paulo Renato Souza anunciou o cancelamento do
programa, ontem, na Folha: "É um projeto que está muito cru", disse ele. "Muito cru",
secretário?”. Capriglione refere-se ao fato de ter sido anunciada uma medida sem que a
mesma fosse pensada e refletida. E ela identifica a prática como sendo recorrente, de acordo
com o que afirma no trecho abaixo:
Tem sido assim a condução da educação pública paulista.
Projetos ditos sensacionais em um dia evaporam no dia seguinte. Isso ajuda a
explicar por que são pífios os indicadores de desempenho escolar no Estado
mais rico.(CAPRIGLIONE, 2010)
A visão de uma administração sem foco, voltado para resultados imediatos, para
programas que gerem mídia é recorrente. O próprio secretário de educação Herman
Voorwald, ao assumir a pasta, reconheceu esse tipo de falha no sistema.
Foi possível perceber, a partir da análise da documentação que houve uma
movimentação legislativa em torno da secretaria de educação de São Paulo nestes 20 anos, o
que demonstra, no mínimo, um não abandono desse setor, e uma preocupação para atingir
bons resultados, tanto em termos das avaliações técnicas, quanto em termos de satisfação do
“cliente” (eleitor). E, ao contrário do que se afirma, não podemos dizer que havia um projeto
definido a princípio, a não ser em termos gerais e que houve diversas adaptações, mudanças e
até a anulação de ações das gestões anteriores, e, juntamente com isso, o fato das metas não
serem atingidas. Isso pode gerar uma imagem não da construção de uma organização sólida e
eficiente, mas, uma organização com diversos direcionamentos, especializada em mudar as
regras.
O sistema de implantação de mudanças parece ter sido, ao longo do tempo,
impositivo, de cima para baixo, a partir da visão iluminada de algum especialista, que,
finalmente, descobriu a melhor maneira de resolver um problema e impõe, estrutura
27
hierárquica abaixo, essa nova ideia genial que vai revolucionar o sistema. É comum nos
discursos oficiais, a utilização de termos que funcionam como construtores de legitimidade
tais como “nos países avançados é assim”, sem que seja definido quais países e como fazem;
ou, “as pesquisas indicam que isso é melhor”, sem que se cite as fontes de tais pesquisas,
como foi o caso dos argumentos para a “reorganização das escolas”; “os dados informam que
ocorreu tal coisa” sem que se informe de onde foram retirados os dados, ou, quando
informam, são instituições, no mínimo, tendenciosas e/ou governamentais.
A relação que se estabelece com a Teoria da Administração, por outro lado, parece
frágil, sendo elencados termos e técnicas que aparentemente melhor se encaixam naquele
momento, por exemplo, o uso do PDCA na gestão das Escolas de Tempo Integral, sem que a
aplicação seja refletida em relação às últimas consequências, e, quando a proposta não
funciona, responsabiliza-se o professor, que não entendeu, que não soube aplicar, que “fez
corpo mole”.
Considerando a diversidade de possibilidade da Teoria da Administração, a
utilização de ideias genéricas de “eficiência” administrativa, ou, racionalização da
administração, pautados por uma concepção mecanicista, configura-se apenas como uma
forma possível, dentro da teoria da administração. De acordo com Maximiano não há teoria
melhor, e sim a mais adequada a determinada situação.
Assim, pensando na adequação da Teoria da Administração para gerenciar uma rede
de ensino é importante considerar a especificidade das diferentes instâncias. Em termos de
processos administrativos repetitivos e burocráticos, com baixo índice de necessidade de
adaptação, a atuação “mecanicista” pode ser bastante adequada e desejada, inclusive, para
melhor controle da máquina pública em termos de gastos e processos. No entanto,
considerando processos de gestão com alto índice de necessidade de adaptação pois conta
com grandes fatores de imprevisibilidade, como pode ser considerado uma escola, e, mais
ainda, uma sala de aula, então, o modelo mecanicista, e, por vezes, altamente burocratizado,
não se adequa.
Nesse sentido, se a opção é utilizar teorias desenvolvidas no âmbito da
Administração, ou gestão da produção, então, seria mais conveniente e adequado buscar
teorias que incorporam em seus processos a necessidade de adaptações, a imprevisibilidade, a
inovação e, principalmente, o ser humano. Além disso, como o próprio Herman Voorwald
28
apontou, na área de gestão educacional é impossível desconsiderar o importante papel de
professores motivados e valorizados, a partir de uma política salarial atraente e um plano de
carreira. Como vimos, no entanto, esta foi a área da administração bastante negligenciada nos
primeiros anos, e passou a ser minimamente valorizada apenas nos últimos 5 anos, em função
da atuação de um gestor.
Assim, podemos concluir que o discurso da efetividade não se concretiza, que a
administração gerencial prometida nos primeiros anos continua sendo burocrática por muitos
e muitos anos seguintes e que a marca dos últimos 20 anos de administração é a utilização da
área educacional como uma vitrine, que, no entanto, insiste em quebrar borrando a bela
imagem que se tenta criar.
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