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FACULDADE CESMAC DO SERTÃO
CÍCERO CIDIRLÂNIO DA SILVA
OS PRINCIPAIS ASPECTOS DA HISTÓRIA E DA
ATUALIDADE DO PEDÁGIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO
BRASILEIRO
PALMEIRA DOS ÍNDIOS - ALAGOAS 2019/2
CÍCERO CIDIRLÂNIO DA SILVA
OS PRINCIPAIS ASPECTOS DA HISTÓRIA E DA
ATUALIDADE DO PEDÁGIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO
BRASILEIRO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito final, para conclusão do curso de Bacharel em Direito, da Faculdade CESMAC do Sertão, sob a orientação do professor Me. José Ailton da Silva Júnior.
PALMEIRA DOS ÍNDIOS - ALAGOAS 2019/2
CÍCERO CIDIRLÂNIO DA SILVA
OS PRINCIPAIS ASPECTOS DA HISTÓRIA E DA
ATUALIDADE DO PEDÁGIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO
BRASILEIRO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito final, para conclusão do curso de Bacharel em Direito, da Faculdade CESMAC do Sertão, sob a orientação do professor Me. José Ailton da Silva Júnior.
APROVADO EM: ___/____/_____
____________________________________________________________
Orientador: Professor Mestre José Ailton da Silva Júnior
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Prof. Membro 1
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Prof. Membro 2
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Prof. Membro 3
AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar a Deus, pois é essencial em minha vida,
permitindo que tudo acontecesse, Ele é o autor do meu destino, guia e socorro bem
presente na hora da angústia, o maior mestre quе alguém pode conhecer.
Agradeço à minha mãе, uma mulher heroína quе me apoiou e incentivou nаs
horas difíceis, de desânimo е cansaço.
Ao orientador, Mestre Ailton Júnior, pelas suas correções е incentivos.
A todos os meus familiares e amigos quе de forma direta оu indiretamente
fizeram parte dа minha formação, о mеu muito obrigada!
OS PRINCIPAIS ASPECTOS DA HISTÓRIA E DA ATUALIDADE DO PEDÁGIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
MAIN ASPECTS OF HISTORY AND CURRENT PEDAGIUM IN BRAZILIAN
LEGAL ORDINATION
Cícero Cidirlânio da Silva Graduando do Curso de Direito
José Ailton da Silva Júnior Professor Mestre da Faculdade CESMAC do Sertão
RESUMO Assim como no restante do mundo, a cobrança de pedágio é constatada na mais remota história, como uma forma de remuneração do governo por oferecer um componente de infraestrutura que implica em altos gastos de construção e manutenção, mas é imprescindível para o desenvolvimento econômico, diminuindo tempo e riscos na locomoção de pessoas e bens no território. A intensificação da utilização das rodovias, contudo, se deu especialmente desde a década de 1950, no país. Desde então, os automóveis se tornaram o principal modal de transporte individual, coletivo e comercial no Brasil, aumentando as pressões quantitativas e qualitativas sobre as rodovias. Também houve importantes modificações no ordenamento jurídico nacional, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que prevê a possibilidade da exploração de serviços públicos por particulares e a legislação infraconstitucional que regula as concessões, na segunda parte da década de 1990. Desde essas modificações nos contextos fático e jurídico do Brasil, instalaram-se duas discussões mais importantes sobre a cobrança de pedágios: a sua conformidade com o direito constitucional de ir e vir, e sua classificação como tributo ou preço público, que implica na aplicação de normas jurídicas específicas de cada caso. Esse trabalho expõe, brevemente, a história dos tributos e do pedágio no Brasil, para discutir essas duas questões desde a doutrina sobre o assunto, bem como a jurisprudência sobre ele. Palavras-chave: Pedágio. Tributo. Preço Público.
ABSTRACT In a similar way to the rest of the world, charging values over using roads is verified over the most remote history, as a way of paying the government for offering a infrastructural feature, that demands high spending to being built and maintained, but is essential to the economic development, lowering time and risks for the moving of people and goods over the territory. The intensification of the use of roads, however, ocurred, especially, since the 1950’s, in the country. Since then, automobiles have become the main transportation means for individuals, groups and commercial usage in Brazil, increasing the quantitative and qualitative pressures over roads. There also have been important modifications in the national law, with the promulgation of the federal Constitution, in 1988, which provides about the possibility of the exploitation of public services by private initiative, and the infraconstitutional legislation that regulates the concessions, over the last part of the 1990’s. Since those modifications in the factual and legal contexts in Brazil, two main discussions about charging tolls in roads have been made: its conformity to the constitutional right to come and go, and its classification as a tax or as a public price (or tariff), which implies in the applications of different laws of each one of the hypothesis. This work briefly exposes the history of charging tributes and tolls in Brazil, to discuss these two issues according to the doctrine about the theme, as well as the jurisprudence concerning it. Keywords: Tolls. Tributes. Public Price.
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 – Concessões de rodovias no Brasil, período de 1995-1998 ..................15
Quadro 02 – Concessões de rodovias no Brasil, período de 2008-2009 ..................17
Quadro 03 – Concessões de rodovias no Brasil, período de 2013-2014 ..................18
Quadro 04 – Evolução das tarifas de pedágio ..........................................................19
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 7
2 BREVE HISTÓRICO DOS TRIBUTOS E DO PEDÁGIO NO BRASIL .................... 8
3 O PEDÁGIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ATUAL ................. 19
3.1 Classificação jurídica da cobrança do pedágio: taxa ou preço público ....... 20
3.2 A cobrança de pedágios e o direito à livre locomoção no território nacional
....................................................................................................................................27
4 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 31
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 32
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1 INTRODUÇÃO
A cobrança de pedágio remonta aos períodos mais iniciais das civilizações
humanas, de forma que, na Índia, há registros da existência de pedágios no ano 321
a. C. (MORIS, 2013). Na Roma da Antiguidade, já era cobrado daqueles que
utilizassem as vias construídas pelo governo, e o instituto perdurou ao longo da
história europeia, como conta MORIS (2013):
Foi assim em Roma com a criação do administrador de estradas (curatoresviarum), que tinha a atribuição de impor contribuição, denominada pedágio. Foi assim também na idade média com o duques, marqueses e condes, vassalos diretos do rei, que detendo o comitatus (espécie de privilégio real) cobravam em nome do rei o pedágio, passando pelos alcaides reais no século XI, que detinham o poder policial sobre o reino, fazendo a cobrança do pedágio.
No Brasil, a cobrança de pedágio é registrada, pelo menos, desde quando o
Estado de Pernambuco teve um governo proveniente da Holanda (SEMEGHINI,
2015), quando foi instituída sobre uma ponte.
Desde então, mudanças no ordenamento jurídico causadas pelas mudanças
políticas no país influenciaram a ordem tributária existente no país, variando,
especialmente, conforme se objetivava maior concentração de poder no governo
central, ou se aumentava a autonomia de estados e municípios.
Prevista na Constituição Federal de 1988, ora vigente, a cobrança de pedágio
é questionada no Poder Judiciário, principalmente em dois aspectos principais: qual
a sua natureza jurídica, de taxa ou preço público (tarifa); e se é atentatória ao direito
de locomoção garantido pela Carta Magna (artigo 5º, XV).
Este trabalho aborda os principais aspectos da história dos tributos e do
pedágio, no país, bem como esses dois principais questionamentos jurídicos sobre a
cobrança de pedágio no Brasil.
Para tanto, foi realizada uma seleção e leitura crítica da doutrina sobre o tema
para, posteriormente, colacionar-se a mais relevante jurisprudência sobre as
questões discutidas pela doutrina.
A metodologia a ser utilizada para a elaboração do trabalho será a
modalidade de pesquisa descritiva, já que a após a devida análise, chegou-se à
conclusão de que essa seria a melhor forma para o desenvolvimento do trabalho.
Será feito levantamento bibliográfico, bem como a leitura de obras, doutrina, artigos
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de periódicos, consultas à internet e suas plataformas digitais, notícias e afins que
contenha esclarecimento sobre o tema abordado.
2 BREVE HISTÓRICO DOS TRIBUTOS E DO PEDÁGIO NO BRASIL
MORIS (2013) assim resume a legislação brasileira sobre os pedágios:
Os pedágios rodoviários no Brasil tiveram três fases distintas. Antes da Constituição de 1988, eram exigidos desde 1969, nas rodovias federais de pista dupla, inclusive na ponte Rio - Niterói e, desde 1947, nas auto-estradas de São Paulo. Nesta fase, estes pedágios eram operados pelos próprios governos e a maioria era deficitária. A segunda fase se refere à desativação dos pedágios federais, logo após a promulgação da Constituição de 1988, com a instituição do selo pedágio na área federal, na tentativa frustrada de generalizar a cobrança de pedágio. O selo pedágio foi extinto em 1990 e a antiga forma de cobrança de pedágio não foi restabelecida. A terceira e atual fase é caracterizada pela intensificação do pedágio, com adoção do regime de concessões à iniciativa privada, a partir de 1996, por meio da lei 9.277 (...).
De acordo com SEMEGHINI (2015), entender os tributos do Brasil atual
requer uma análise, ainda que breve, da história da tributação no país, desde os
tempos em que o país era colônia de Portugal até os dias de hoje.
O autor conta que a palavra “tributo” vem do latim tributum, que significa
“divisão entre tribos”. Ele explica que, embora a expressão “prestação pecuniária”
utilizada pelo Código Tributário atual seja considerada redundante, muitas vezes, ela
reforça um conceito que nem sempre foi válido no ordenamento jurídico brasileiro,
pois, durante a colonização portuguesa do país, os tributos podiam ser pagos em
matéria-prima, já que sequer existia moeda, naqueles tempos.
Assim, ele completa o raciocínio mencionando que, ainda que não houvesse
a instituição formal de tributos no período colonial, a exploração de riquezas naturais
do país consistia em um tributo pago à Coroa Portuguesa. Essas mesmas riquezas,
inclusive, ensejaram a vinda de “saqueadores” das mais diversas nacionalidades ao
país.
Esse fato, somado à vastidão do território brasileiro, constituía uma grande
dificuldade na administração, pela metrópole portuguesa, das atividades que se
desenvolviam no território brasileiro (SEMEGHINI, 2015). Por consequência o
controle sobre a própria exploração econômica de seus recursos naturais também
era difícil.
Nesse contexto, foram criadas as primeiras formas de tributação pelo poder
central. A divisão do território nas quinze Capitanias Hereditárias foi uma das
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medidas tomadas para tanto e, com elas, foram instituídos os primeiros órgãos
governamentais tributários, o “capitão-Mor” de cada uma das Capitanias
(SEMEGHINI, 2015), que era responsável por controlar o destino dos bens extraídos
nas áreas de que era incumbido.
Nessa época, conta SEMEGHINI (2015), apenas as sesmarias estavam livres
de destinar riquezas a Portugal:
Somente terras concedidas através da carta de sesmaria estariam livres de tais tributos. Tais terras pagavam apenas dízimos para a chamada Ordem de Cristo, que era destinada à catequese e cristianização dos nativos. Uma espécie de imunidade tributária que atualmente é destinada às igrejas, por exemplo, que já se manifestava desde os primórdios da civilização brasileira. Porém, em 1548, foi criado um governo-geral para substituir a atuação das capitanias hereditárias, porém mantendo-as como divisão, e foi nomeado um governador-geral, chamado Thomé de Souza, para representar os interesses do rei no Brasil. (SEMEGHINI, 2015).
A partir da instituição de um poder centralizador na própria colônia, portanto, é
que as sesmarias passaram a se sujeitar também ao pagamento de tributos.
Iniciava-se, assim, a fase seguinte da administração tributária no país (SEMEGHINI,
2015).
Nessa mesma fase, foi instituído um novo órgão administrativo com
competências tributárias, embora já com as características desse aspecto mais
centralizador da nova fase da administração tributária do país. Foi criado o cargo de
provedor-mor da Real Fazenda, cujo primeiro ocupante foi Antônio Cardoso de
Barros, que era auxiliado por provedores-parciais responsáveis por cada uma das
províncias.
Assim funcionava o sistema, como explica SEMEGHINI (2015):
Quanto aos agentes, o papel do provedor-mor, primariamente, era superintender e fiscalizar a arrecadação dos tributos ao Tesouro da Coroa, bem como julgar causas que excediam as alçadas de provedores-parciais (de 10.000 réis). Por sua vez, o papel destes últimos, era basicamente o mesmo, porém com competências localizadas em suas capitanias, e arrecadando, também, bens de pessoas falecidas sem herdeiros ou testamento (...) Anualmente, os provedores-parciais tinham o dever de prestar contas ao provedor-mor sobre a receita e despesa de cada uma. Além do papel de arrecadar, providenciavam a segurança da capitania, sendo por meio de construção de navios destinados à vigilância. (SEMEGHINI, 2015).
Também, passa-se a uma sistematização um pouco mais intensa da ordem
tributária no país, sendo que os tributos foram divididos entre ordinários e
extraordinários. Os primeiros, chamados “derramas”, eram destinados às atividades
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bélicas do Estado, e os segundos, denominados “fintas”, eram destinados às
despesas internas do país, cobrados conforme os ganhos do contribuinte com a
atividade que desenvolvia. Uma inovação trazida por essa sistematização foi a
determinação de se cobrarem tributos de forma proporcional à capacidade
contributiva do cidadão (SEMEGHINI, 2015).
Não muito tempo depois, foi criada a primeira alfândega do país, localizada na
cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro (a cidade do Rio de Janeiro, RJ),
intensificando-se assim cada vez mais o controle sobre as atividades comerciais e,
consequentemente, a possibilidade da cobrança de tributos sobre elas. Em 1649 foi
instituída a Companhia Geral do Comércio, de forma que o controle da Fazenda
Nacional sobre as atividades econômicas tributadas passou a ser quase que total
(SEMEGHINI, 2015).
No mesmo período, foi instituído o primeiro pedágio extraoficial do país, no
Pernambuco governado pela Coroa Holandesa. Ali, vigia uma Constituição
específica, que incluía previsões advindas do governo holandês – uma delas era o
órgão tributário do “escuteto”, que cobrava os tributos na região (SEMEGHINI,
2015).
Sobre o pedágio extraoficial, ele foi instituído sobre a passagem em uma
ponte:
Historiadores contam que, durante o domínio holandês, o governante Maurício de Nassau construiu uma ponte no Brasil. No entanto, no meio da obra, a verba para a construção acabou e ele teve que fazer um empréstimo para dar continuidade aos trabalhos. Depois de concluir a ponte, Nassau determinou que, durante a inauguração da obra, a população tivesse que pagar uma taxa para atravessar a ponte. Assim, ele conseguiria o dinheiro para saldar a dívida contraída por causa da obra. Esse foi o primeiro pedágio não-oficial do Brasil. (Site de Curiosidades).
A descoberta de ouro em território brasileiro ensejou mudanças na tributação
brasileira, com a concessão de benefícios para quem descobrisse jazidas do mineral
no país. Os exploradores de jazidas, contudo ainda eram sujeitos a serem obrigados
a pagar tributos à Coroa Portuguesa (SEMEGHINI, 2015).
A vinda da família Real portuguesa ao país e a consequente abertura dos
portos do país às “nações parceiras” ensejou a criação dos impostos sobre
importação (SEMEGHINI, 2015). Também foi criado o primeiro imposto sobre a
transmissão intervivos da propriedade de bens de raiz.
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A declaração de independência do país, em 1822, e a promulgação da
Constituição do Brasil independente, em 1824, trouxe mudanças na conformação do
sistema tributário que, até então, se desenvolvera no país (BARROS, 2012):
Com a independência do Brasil em 1822 e a promulgação de sua primeira Constituição em 1824, deu-se início a um processo de descentralização do Estado, influenciado pela doutrina do Estado liberal. A nova Constituição, em seu artigo 15, inciso X, atribuía competência ao Poder Legislativo para estabelecer montantes para despesas públicas, assim como a sua distribuição entre as duas casas - Câmara dos Deputados e Senado. (p, 6).
Idealizada desde os parâmetros da ideologia liberal de Estado, a Constituição
previa a atuação estatal mínima; entretanto, esses mesmos conceitos não
impediram que o sistema tributário vigente fosse “caótico’, inclusive com a cobrança
de um mesmo tributo mais de uma vez (SEMEGHINI, 2015). Entretanto, já se
instituía uma divisão de receitas entre os níveis “geral”, “provincial” e “municipal” de
arrecadação (SEMEGHINI, 2015).
Essa divisão foi mantida após a Proclamação da República brasileira, em
1891, com a promulgação da Constituição que previa a divisão das receitas
tributárias entre Estados e União. Excluídos os Municípios, essa Carta retomava um
caráter mais centralizador de organização do Estado (SEMEGHINI, 2015).
Em 1932, foram instituídas no sistema tributário brasileiro as contribuições de
melhoria, que objetivavam a obtenção de recursos para os custos do país com a
guerra da Revolução de 1930 (SEMEGHINI, 2015).
Uma mudança mais significativa do sistema tributário do país veio somente
com a promulgação da Constituição Federal de 1934, que previa o Imposto de
Renda “como tributo federal”, bem como o imposto sobre consumo, também de
natureza federal. Um tributo similar ao atual ICMS (Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços) também era previsto na Carta, assim como a sua natureza
estadual: o imposto sobre vendas e consignações (SEMEGHINI, 2015).
A Constituição Federal de 1937 instituiu uma porcentagem maior devida a
título de Imposto de Renda por “pessoas solteiras, viúvas e casais sem filhos”
(SEMEGHINI, 2015), visando o estímulo do crescimento demográfico no país
(SEMEGHINI, 2015). Também se unificaram impostos sobre consumo e renda em
um mesmo tributo federal.
À Constituição Federal de 1937, sobreveio a Constituição de 1946, que,
explica BARROS (2012):
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A Constituição de 1946 ofereceu uma nova forma de discriminação das rendas tributárias, estruturando-se, essencialmente, em alguns fundamentos básicos: a coexistência de um sistema tributário autônomo para cada unidade da federação, ou seja, União, Estados e Municípios, e a aceitação legal de uma classificação jurídica dos impostos. Os valores a serem cobrados na forma de impostos passaram a ser calculados com base nos custos e despesas do ano fiscal anterior.
De acordo com SEMEGHINI (2015), a Carta, ao se eximir de mencionar as
possibilidades de bitributação ensejou o entendimento de sua inconstitucionalidade.
Ainda, ela trazia previsões do pagamento de contribuições de melhoria em
caso de valorização de imóvel devido à realização de obra pública; o repasse de
valores obtidos com tributos federais aos Estados e Municípios; a ampliação dos
limites do poder de instituir tributos, vedando sua criação sobre templos religiosos e
papel destinado à impressão de jornais, livros e periódicos.
Democrática, a Carta ainda determinava, de forma expressa, a cobrança de
impostos de acordo com a capacidade contributiva, e trazia previsões para diminuir
a regressividade do sistema tributário, desonerando pessoas com renda menor.
Nela, estava a primeira previsão expressa, no ordenamento jurídico brasileiro,
sobre a cobrança de pedágios. Na exposição de COIMBRA (2016):
Em nosso país, o pedágio foi instituído através da Carta Magna de 1946. Nessa Constituição o pedágio foi estipulado no artigo 27, dentre as taxas destinadas a indenizar despesas de construção, conservação e melhoramento de estradas: Art. 27- É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer limitações ao tráfego de qualquer natureza por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de taxas, inclusive pedágio, destinada exclusivamente à indenização das despesas de construção, conservação e melhoramento de estradas.
Conforme esse texto constitucional, portanto, a cobrança de valores a título
de pedágio tinha a natureza de tributo. Ainda mais especificamente, era um tipo de
taxa, de forma que, ao seu pagamento, devia corresponder uma obrigação estatal
específica, ou uma contraprestação identificável.
No caso do pedágio, conforme se depreende da própria leitura do artigo
citado, a contraprestação do Estado pelo pagamento da taxa era realizar obras de
construção das estradas e de zelar por elas.
Nas décadas seguintes, continua o autor, a cobrança de pedágio ainda teve
mudanças significativas no ordenamento jurídico brasileiro:
A partir das décadas de quarenta e cinqüenta, as construções de rodovias ganharam uma extensão devido a alguns fatores, tais como: a criação do
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Fundo Nacional Rodoviário (Decreto nº. 8.463/1945) – estabeleceu uma modalidade de imposto sobre combustíveis destinando a sua arrecadação para custear a construção de malhas rodoviárias e o forte crescimento da indústria automobilística nacional, no ano de 1957. Entretanto, no final dos anos setenta o país começou a sofrer graves dificuldades financeiras, acabando por afetar diretamente as construções de novas rodovias e a manutenção das já existentes pelo poder público. (COIMBRA, 2016).
Como explica o autor, essas mudanças se deveram, em grande parte, pela
disseminação dos meios de transporte automotivos no país, tanto para particulares,
como para o transporte de bens.
Por certo, esse aumento causou, também, uma correspondente ampliação
dos gastos públicos para construção e manutenção das rodovias, que demandavam
mais materiais e um conhecimento técnico ainda maior.
Em 1965, uma nova Constituição Federal modificou mais profundamente o
sistema tributário no país:
Sob o ponto de vista fiscal, a Constituição de 1965 buscava reestruturar a economia e, para isso, o Governo adotou um plano composto por três etapas que se relacionavam entre si. No seu primeiro momento, a adoção de medidas emergenciais; em seguida estabeleceria formas para melhorar a arrecadação de impostos; num terceiro e último momento, a criação de uma comissão para manejar os temas relacionados à tributação. (pág. 7-8).
BARROS (2012) explica que a Carta previa a autonomia de Federação,
Estados e Municípios para legislarem sobre os tributos de sua competência. Para
SEMEGHINI (2015), foi a partir desse ano, com a promulgação da Emenda
Constitucional 18/1965, que o sistema tributário nacional passou a ter uma
sistematicidade efetiva.
O Código Tributário Nacional, promulgado em 1966, foi considerado
inconstitucional após a promulgação da Constituição de 1967, que exigia lei
complementar nas disposições sobre tributos. Apenas com a edição do Ato
Complementar nº 36, o Código Tributário Nacional pôde ser considerado
recepcionado pela Constituição Federal de 1967.
Finalmente, em 1988, adveio a Constituição Federal ora vigente que além de
prever direitos fundamentais aos cidadãos, dispôs especificamente sobre a ordem
tributária do país:
O alicerce do Sistema Tributário Nacional está contido na Constituição Federal, assim como os princípios orientativos ao poder do Estado para a criação dos tributos, suas formas de arrecadação e repartição das receitas. A “Constituição Cidadã” inovou por meio dos princípios tributários relatados no Título VI, da Tributação e do Orçamento, Capítulo I, do Sistema
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Tributário Nacional, Seção II, das limitações ao poder de tributar. Tais princípios funcionam verdadeiramente como mecanismos de defesa do contribuinte frente a voracidade do Estado no campo tributário. (p.17).
Assim, a Constituição Federal de 1988 tem uma série de dispositivos que
normatizam os mecanismos de obtenção de recursos pelo Estado, além de uma
série de direitos e garantias individuais e que, eventualmente, aplicam-se às
relações com Estado.
Para tanto, a Carta traz uma série de disposições versam sobre a atuação
estatal nas relações sociais, em geral, e sobre a economia – temas que sofreram
uma série de modificações ao longo da história do Brasil, em consonância com as
modificações que ocorriam, especialmente no continente europeu.
Essa diferenciação é especialmente importante para a presente análise
porque a principal diferenciação entre tributos e preço público, duas categorias nas
quais a cobrança de pedágio vinha sendo classificadas, dependem em se definir se
a cobrança de pedágios decorre de se fundamentar na atuação política do estado.
Como explica COIMBRA (2016):
Pois bem, alguns autores que defendem a natureza jurídica do pedágio como tributo (taxa), utilizam como principal argumento o fato de que o artigo 150, V, da Constituição Federal de 1988, legitima sua cobrança. Como se trata de norma integrante do capítulo referente ao Sistema Constitucional Tributário, mais exatamente dentro da seção das limitações do poder de tributar, sendo por conseqüência necessariamente um tributo. Abaixo, segue a transcrição literal do dispositivo acima mencionado:.
A análise acerca da natureza da cobrança de valores a título de pagamento
de pedágio será analisada, mais detalhadamente, em item posterior deste trabalho.
Cabe destacar, como menciona o autor, que a cobrança de pedágio está prevista na
Constituição Federal de 1988.
Outro fator relevante para discussão da classificação jurídica da cobrança de
pedágios é o fato de a administração das estradas serem passível de concessão à
iniciativa privada, de forma que é facultado ao Poder Público transferir à particulares
essa atividade, mantendo-se a titularidade do serviço do Estado.
No mesmo ano da promulgação da Constituição Federal vigente, mais uma
mudança na legislação específica sobre a cobrança de pedágios foi feita, conforme
relata COIMBRA (2016):
Em 1988, o Fundo Nacional Rodoviário foi extinto, e com a falta de verba para a criação e manutenção de rodovias, foi instituído pelo Estado algumas alternativas, como, por exemplo, a concepção do Selo-Pedágio, através da Lei nº. 7.712/1988. A lei do selo-pedágio tratava a respeito da cobrança de
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pedágio nas pontes e obras especiais que as integravam, bem como, em rodovias federais.
Em 1995 foram, finalmente, promulgadas as Leis que normatizam os
processos de licitação, possibilitando assim, a total eficácia do artigo 175 da
Constituição Federal – norma de eficácia contida, que dependia, portanto da
promulgação de legislação infraconstitucional para que pudesse ser efetivamente
aplicada (MORIS, 2013).
Assim, tanto a Lei 8.987/1995, quanto a Lei 9.074/1995 versam sobre
concessões e permissões da prestação de serviços públicos previstos naquele artigo
da Constituição Federal, possibilitando finalmente a exploração desses serviços pela
iniciativa privada (MORIS, 2013).
A promulgação das Leis proporcionou já em 1995 a concessão da exploração
de algumas rodovias (IPEA, 2018, p.9):
Quadro 01- Concessões de rodovias no Brasil, período de 1995-1998. Fonte: IPEA, 2018
Nos contratos das concessões listadas acima, havia previsão da
obrigatoriedade das concessionárias em investir nas rodovias já nos primeiros
meses de vigência dos contratos de concessão (IPEA, 2018, p. 17), além da
obrigação de durante toda a vigência dos contratos, realizar obras de manutenção
que viessem a ser necessárias nelas (IPEA, 2018, p.17). As tarifas de pedágio
podiam passar a ser cobradas pelas empresas após um semestre desde o início da
vigência do contrato, e os valores das tarifas podiam sofrer reajustes anuais, ou,
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conforme o contrato a qualquer momento, respeitadas as regras de reajuste (IPEA,
2018, p.17).
Há que se considerar para análise dessas tarifas, o contexto econômico da
época, todavia. Entre 1995 e 1997, o Brasil tinha taxa de juros básica (chamada taxa
Selic) bastante alta, “repercutindo diretamente no custo de oportunidade do capital
(COC) e nos financiamentos internos, o que requeria que a taxa interna de retorno
(TIR) dos projetos fosse compatível com essa situação (...)” (IPEA, 2018, p.17). O
índice de riscos do país também aumentava as taxas de juros sobre empréstimos
internacionais de capital ao país e a novidade do instituto da concessão da
administração das rodovias brasileiras causava incertezas sobre o negócio (IPEA,
2018, p.17). Todos esses fatores influenciaram no preço final das tarifas das
rodovias operadas sob o regime de concessão.
O modelo de concessão da administração, entretanto prosperou como forma
de exploração das rodovias, de forma que uma segunda fase das concessões
ocorreu entre 2008 e 2009:
Quadro 02 - Concessões de rodovias no Brasil, período de 2008-2009. Fonte: IPEA, 2018
Nota-se então, que a menor tarifa de pedágio foi adotada como o menor
critério para a seleção do licitante vencedor, onde o cenário econômico favorável
contribuiu consequentemente com a diminuição das tarifas mínimas de pedágio.
Entre 2007 e 2008, a taxa de Juros Selic foi reduzida 11% ao ano, mais da metade
se comparada ao ano 1996, na qual se encontrava na faixa dos 25% ao ano.
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Nesta segunda fase das concessões, a proposta com menor tarifa continuava
sendo a escolhida (IPEA, 2018, p. 21) e os processos já ocorriam em um contexto
econômico melhor – a taxa de juros caíra por quase metade, desde 1996, passando
de 25% anuais naquele ano, para 11% nos anos 2007 a 2008 (IPEA, 2018, p. 21).
Também não se apresentavam as duas outras condições haviam influenciado
os preços das tarifas na primeira fase de concessões, com o risco país associado ao
Brasil já bem menor, e o aumento da segurança acerca desse tipo de investimentos
(IPEA, 2018, p.21), e o índice de reajuste fora modificado para o IPCA/IBGE. (IPEA,
2018, p.21). Tudo isso resultou em um valor das tarifas em cerca de um terço dos
valores da primeira fase (IPEA, 2018, p.21).
Quadro 03 – Concessões de rodovias no Brasil, período de 2013-2014. Fonte: IPEA, 2018
De fato, a possibilidade da exploração por particulares de serviços públicos,
ainda que polêmica se mostrou como uma forma de mitigação de uma série de
dificuldades apresentadas, ao longo da história do século XX, ao fornecimento de
bens e serviços pelo Estado.
Uma alternativa a essas dificuldades, sem a necessidade de se recorrer,
novamente, a um Estado de cunho puramente liberal, foi essa possibilidade de se
permitir que particulares explorassem as atividades estatais.
No caso das estradas, assim como outras obras que exigem investimentos de
alta monta, mas imprescindíveis para o crescimento econômico do país, evidenciou-
se como uma forma de se atenderem às demandas por infraestrutura e restrições
orçamentárias públicas:
18
O desenvolvimento e a expansão dos serviços de infraestrutura, essenciais para o crescimento econômico de um país, têm-se mostrado complexos e envolvem uma variedade de desafios em muitos países. Trata-se de projetos de grande porte, que demandam investimentos significativos e longo prazo de maturação, realizados sob incerteza e gerando externalidades, para os quais se encontram dificuldades de financiamento de ativos e implantação de serviços de infraestrutura. No âmbito do setor público, há uma restrição fiscal que afeta a maior parte dos países, que se defrontam com pesadas dívidas e elevado deficit fiscal. (IPEA, 2018, p.9).
Por certo, busca-se assim o fornecimento de serviço estatal, ao cidadão, sem
que isso implique onerosidade excessiva nos valores cobrados pelo serviço –
embora, conforme será analisado mais à frente neste trabalho, uma série de
parâmetros sejam considerados, no processo licitatório, para escolha do prestador
de serviços, sendo o preço final ao consumidor apenas um deles.
A carga tributária, muitas vezes considerada excessiva no Brasil, no caso dos
pedágios, ganha maior especificidade de ocorrência, sendo cobrada apenas,
efetivamente, de quem utiliza as estradas. Também tem a vantagem de já estar
separada para a sua finalidade específica, já que as arrecadações com os pedágios
não se juntam aos demais tributos.
Nesse mesmo sentido, WALD (2003) escreve que:
9. É importante considerar que, no atual contexto econômico. a cobrança de pedágio representa um instrumento imprescindível ao adequado funcionamento do sistema rodoviário, melhorando as condições físicas de pavimentação e sinalização das estradas e a adoção de mecanismos hábeis a trazer segurança e prevenção de acidentes, com benefícios ao tráfego e aos usuários. Por tais obras e serviços, no regime da concessão, pagam apenas os usuários da estrada, não constituindo um ônus para toda a coletividade, como aconteceria se tais investimentos fossem suportados a partir do orçamento estatal. (p. 415).
Assim, é pertinente expor a evolução do preço dos pedágios nas rodovias
federais operadas sob o regime de concessão:
19
Quadro 04- Evolução das tarifas de pedágio. Fonte: IPEA, 2018
Para MORIS (2016), não resta dúvida que, desde uma perspectiva histórica, o
pedágio sempre foi um tipo de taxa, no Brasil, fundando-se exclusivamente no
“poder soberano do Estado”, ou em nome dele. O autor menciona que inclusive a
criação do pedágio dependia, exclusivamente de lei, configurando a obediência ao
princípio da legalidade estrita que rege a criação de tributos.
Para uma discussão apropriada acerca da natureza jurídica da cobrança de
pedágios, e, assim, um exame sobre a constitucionalidade de sua cobrança, impõe-
se distinguir, exatamente, o que seja taxa uma espécie de tributo, e o que é preço
público.
3 O PEDÁGIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ATUAL
O conhecimento sobre o desenvolvimento da história da cobrança de tributos
no Brasil, e a relação desse histórico com a cobrança de pedágios no país, tem
relevância para uma compreensão mais profunda acerca dessa cobrança, mas essa
análise desde o ordenamento jurídico atual é de maior pertinência na definição de
qual seja a sua natureza jurídica.
Em que pese à existência de uma série de garantias constitucionais sobre os
direitos fundamentais dos cidadãos e residentes no país, o que, por si só, já seria
suficiente para limitar a atuação do Estado, inclusive, nas questões relativas a
tributos, a própria Carta prevê uma série de exigências específicas para a instituição
e cobrança de tributos.
20
Assim, além da própria legitimidade da cobrança de pedágio face ao direito de
ir e vir assegurado pela Constituição Federal cabe definir a natureza jurídica dessa
cobrança, para concluir sobre as garantias que recaem sobre sua cobrança.
Mesmo a definição sobre a natureza das cobranças de pedágio como preço
público também trazem uma série de consequências, nomeadamente, aquelas
determinadas pela legislação que regula as concessões acima citadas.
Em seguida, portanto, o trabalho expõe e discute essas importantes questões
sobre a cobrança de pedágios, que, embora sempre tenham existido, continuam
imprescindíveis para conclusões acertadas sobre o tema, além de, possivelmente,
ressignificadas pela legislação constitucional e infraconstitucional vigentes.
3.1 Classificação jurídica da cobrança do pedágio: taxa ou preço público
A primeira característica que diferencia a taxa do preço público é que, sendo
um tributo, seu pagamento é obrigatório ao contribuinte, de forma que sua fonte é o
próprio poder de império do Estado (IRIGON, 2013).
Conforme explica o autor:
Os tributos são receitas derivadas (se originam do patrimônio dos particulares) obtidas mediante prestação compulsória, já que é decorrente de lei. Por outro lado, as tarifas são tidas como receitas originárias (derivam-se da exploração econômica do patrimônio do Estado, agindo como se particular fosse) obtidas mediante acordo de vontades (...). (IRIGON, 2013).
Já os preços públicos, por derivarem de exploração, pelo Estado, de atividade
que se caracteriza pelo cunho econômico, não têm fundamento no poder de império
do Estado, mas na própria natureza contratual que caracteriza as relações
econômicas.
Muito embora taxas e preço público sejam cobrados, apenas, com a utilização
do contribuinte do bem ou serviço fornecido, a taxa é cobrada pela prestação de
serviço público regido, exclusivamente, pelo regime de Direito Público, enquanto que
o preço público é cobrado pele exploração econômica de bens ou serviços de
titularidade estatal, conforme o raciocínio de IRIGON (2013) acima exposto.
No dizer de MORIS (2016), assim se caracteriza o preço público:
Os preços públicos não nascem da lei, e sim do acordo de vontade entre as partes. Eles existem nas obras públicas, nas compras públicas, na contratação de empresas privadas para a prestação de serviços gerais, nas alienações onerosas feitas pelo poder público ao particular, e em outras
21
circunstâncias que dependam de um ajuste entre administração e particular para o surgimento do preço. (...) Na obra pública, a administração contrata particular para a sua execução, mediante ajuste de preço a ser feito através de processo licitatório, geralmente adjudicando o objeto a empresa que oferecer o menor preço. O mesmo ocorre na contratação de empresa para prestação de serviços gerais.
Portanto, conforme ressalta IRIGON (2013), no entender do Supremo Tribunal
Federal, diferenciam-se taxa e preço público desde os respectivos aspectos de
compulsoriedade do pagamento das taxas, em oposição ao de facultatividade dos
preços públicos.
Esse entendimento foi fixado, pela Corte, na Súmula 545, segundo a qual
“Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas,
diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à
prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu.”.
Resta diferenciar, assim, quais são as atividades de fornecimento de bens e
serviços, pelo Estado, que podem, apenas, ser prestadas pelo Estado, para uma
devida caracterização do serviço público que enseja a cobrança de pedágio.
BANDEIRA DE MELLO (2002, p. 615) assim escreve sobre o que determina a
Constituição Federal de 1988 sobre os serviços públicos, no país:
a) serviços de prestação obrigatória e exclusiva do Estado; b) serviços de prestação obrigatória do Estado e em que é também obrigatório outorgar em concessão a terceiros; c) serviços de prestação obrigatória pelo Estado, mas sem exclusividade; e d) serviços de prestação não obrigatória pelo Estado, mas não os prestando é obrigado a promover-lhes a prestação, tendo, pois que outorga-los a terceiros.
De acordo com o autor, o rol constitucional dos serviços públicos não é
exaustivo (BANDEIRA DE MELLO, 2002, p. 613), e os serviços públicos de
prestação obrigatória e exclusiva pelo Estado são, apenas, “os de serviço postal e
correio aéreo nacional” (BANDEIRA DE MELLO, 2002, p.615).
Portanto, não restaria dúvida, de acordo com esse raciocínio, de que o
serviço público de construção e manutenção das estradas não é, necessariamente,
de prestação direta pelo estado, sendo passível de exploração pela iniciativa
privada, pela letra da própria Constituição Federal de 1988.
Essa mesma característica não impede, contudo, que essas atividades sejam
consideradas como serviço público, de forma que se submetem ao regime de direito
público. De acordo com MORIS (2016):
22
É possível indagar-se agora, quais então seriam os serviços públicos? A
pergunta deve seguir a dinâmica imposta pela evolução das instituições,
das necessidades humanas, e da legislação. Juridicamente, e de forma
estática, poderíamos dizer que todos os serviços que possam ser extraídos
das competências e atribuições estabelecidas nos artigos 21 e 23 da CF
poderiam em tese ser considerados serviços públicos, nem todos
específicos e divisíveis. Exemplos indiscutíveis são os serviços de emissão
de moeda, serviços de telecomunicação e radiodifusão, serviços de
correios, serviços de instalação de energia elétrica, serviços de organização
e manutenção do poder judiciário, dentre outros.
De acordo com ele, não há dúvidas de que as atividades que ensejam a
cobrança de pedágio são serviços, públicos, eis que“são atribuições primordiais do
Poder Público e como tal podem ser caracterizadas como prestações públicas
direcionadas ao administrado, sendo, portanto, serviços públicos.” (MORIS, 2016).
Para o autor, todos os aspectos relacionados às vias públicas, sejam
municipais ou estradas estaduais e federais são de competência da cada esfera
administrativa correspondente, de forma que se constituem em serviço público.
(MORIS, 2016).
Assim, a forma de remuneração desse serviço, no seu entender, não pode ser
outra, se não a taxa, o tipo de tributo que se destina à remuneração de serviços
prestados pelo Estado, na seguinte forma:
No caso da utilização das estradas, dúvidas não restam acerca da divisibilidade e especificidade do serviço. É típico serviço que é possível de ser destacado em unidades autônomas de prestação (manutenção de determinada rodovia, trecho ou parte de determinada via) e serviço passível de ser utilizado de forma divisível (quantidades de vezes de sua utilização, dias de utilização, semanas de utilização, kilometros rodados). E, por fim, a efetiva utilização é auferida no momento que o usuário ingressa na rodovia ou dela pretende sair. (MORIS, 2016).
Ele também menciona que a cobrança de pedágios está prevista no inciso V
do artigo 150 da Constituição Federal, de forma que a Carta versa sobre ela no
Título destinado à Ordem Tributária. O artigo veda a restrição, pelo poder estatal, do
direito de circulação de pessoas e bens no território nacional, excetuando,
expressamente, a possibilidade da instituição de pedágios.
Entretanto, a previsão da possibilidade da cobrança de pedágios no mesmo
Título que dispõe sobre a ordem tributária, no país, não é o único motivo
fundamentando o entendimento do autor.
Para ele, ainda mais significativo é o fato de que a cobrança não está
especificamente limitada, na própria Constituição Federal, de forma que o próprio
23
legislador constituinte não o limitou, nos mesmos termos em que limitou os poderes
de tributar relativos aos demais tributos.
Para WALD (2003), contudo, essa sistemática não é suficiente para se
caracterização apropriada da natureza jurídica dos pedágios:
33. Nem se diga que o art. 150, V, da Constituição Federal, ao excetuar a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público da vedação imposta aos tributos caracterizaria o pedágio pago ao concessionário como taxa. A análise sistemática dos dispositivos constitucionais aplicáveis à matéria não deixa dúvidas de que a ressalva feita pelo legislador se refere exclusivamente ao pedágio cobrado nas rodovias exploradas diretamente pelo Estado. (p. 419).
O autor menciona que o parágrafo único do artigo 175 da Constituição
Federal, determina que cabe à lei ordinária fazer as previsões sobre “a política
tarifária” (inciso II), de forma que se mantenha “o equilíbrio econômico-financeiro do
contrato” (WALD, 2003, p. 418).
Nesse sentido, o instituto da concessão, no contexto político e jurídico atuais,
revela-se adequado para diminuir as pressões orçamentárias e técnicas sobre a
Administração Pública, de forma que a remuneração das concessionárias por preço
público é o mecanismo para que sejam oferecidas vantagens maiores às empresas.
WALD (2003) complementa o raciocínio sobre a natureza de preço público
dos valores cobrados a título de pedágio:
79. Note-se, pois, que se o usuário optar por fazer uso do serviço, deverá pagar o seu preço, assim como o faz quando se utiliza de qualquer serviço público prestado por particular. É assim com o serviço de telefonia. Eletricidade, transporte, etc. É assim, também, com o acesso a museus e jamais se cogitou qualquer violação ao direito à educação, assegurado pelo art. 6°. caput, da Constituição Federal. (p. 427).
Outra parte da doutrina busca determinar se a cobrança de pedágios é taxa
(portanto, tributo) ou tarifa (preço público) enfatizando sua característica de
compulsoriedade de pagamento pelo cidadão. Isso caracterizaria a utilização do
poder de império do Estado para sua instituição, e, assim, definiria a cobrança como
tributo.
É em relação a esses parâmetros que BAPTISTA (2014) discute a natureza
jurídica da cobrança de pedágios, ressaltando que existem divergências na doutrina
acerca do tema, inclusive na atualidade – ou seja, mesmo após a promulgação da
Constituição Federal de 1988 e a edição das leis que regulam as concessões
públicas no país.
24
Ela ressalta, ainda, a importância da classificação correta da natureza jurídica
da cobrança de tributos, eis que a Carta prevê uma série de garantias ao
contribuinte no que tange à instituição de tributos, o que não ocorre com as tarifas.
Para a autora, é importante, para definir a compulsoriedade da cobrança de
pedágios, aferir não apenas sobre sua obrigatoriedade legal, mas, sim, verificar as
possibilidades reais que o contribuinte tem de escolher entre trafegar pela via
operada sob concessão ou não (BAPTISA, 2014).
Portanto, defende BAPTISTA (2014), compulsoriedade da cobrança de
pedágios se dá pela inexistência de alternativas lícitas ao contribuinte para realizar o
mesmo direito:
A meu ver, de acordo com o melhor entendimento acerca do tema em estudo, o critério a ser adotado, enquanto não houver legislação específica, deve ser analisado caso a caso. Por exemplo: Se o cidadão puder, LICITAMENTE, se deslocar de um ponto até o outro, não necessitando da rodovia com pedágio, este possuirá natureza jurídica de tarifa (preço público); Ao passo que, se para se locomover de um ponto a outro, o indivíduo não dispuser de via alternativa (lícita e sem pedágio), a natureza jurídica da cobrança será de taxa. (BAPTISTA, 2014).
GAGO (2010) menciona que as divergências sobre a cobrança de pedágios
não se restringe à esfera federal, recaindo, também, sobre as cobranças nas
rodovias de administração dos Estados Federados.
Além da existência de outras vias para tráfego, nas quais não haja cobrança
de pedágio, o autor menciona mais dois parâmetros de discussão sobre o tema,
discutindo-o o, também, desde o aspecto da restrição do direito de ir e vir, garantido
constitucionalmente e à questão da determinação dos preços cobrados.
Sobre a necessidade da existência de alternativa de tráfego sem cobrança, o
entendimento do autor difere do acima exposto:
No que se refere à compulsoriedade da tarifa, pela inexistência de uma rota alternativa gratuita, a realidade é que a legislação de regência das concessões é expressa no sentido de sua desnecessidade para a cobrança de pedágio. Ainda que entediante a menção de diplomas legais, por sua clareza, merece menção o artigo 9º, parágrafo 1º, da lei 8.987/95 (clique aqui), que dispõe que a cobrança de tarifa poderá ser condicionada à existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário, mas somente nos casos expressamente previstos em lei. O STJ, diga-se de passagem, em seus recentes julgados, tem aplicado referida lei tal como sua literalidade disciplina. (GAGO, 2010).
Nesse mesmo sentido, WALD (2003) entende que a oferta de uma via de
trânsito gratuita, em alternativa às vias em que se cobram valores a título de
25
pedágio, não é um parâmetro correto para que se avalie a natureza jurídica dessas
cobranças.
De acordo com ele, a alternativa que deve ser apresentada é a de trafegar
pela via administrada por um concessionário e a via administrada por outra empresa
concessionária. Esse seria o entendimento que se depreende da leitura do artigo 7º
da Lei nº 9.648/98.
Assim, escreve o autor:
78. Efetivamente, se a lei se referisse à liberdade de escolha entre a utilização da rodovia mediante o pagamento de pedágio e a utilização da estrada gratuita, ter-se-ia que entender que, para cobrar tarifa para a prestação de qualquer serviço público, dever-se-ia disponibilizar uma alternativa para o usuário. Uma vez que a lei não faz distinção entre a concessão de serviço público e de obra pública. Não é isso o que ocorre, entretanto, com os serviços públicos de telecomunicações, água, esgoto, energia ou gás canalizado, por exemplo. (WALD, 2003).
O tema já foi objeto de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, em sede
de controle direto de constitucionalidade (ADI 800/RS). A Corte decidiu que a
cobrança de valores de pedágio consiste em cobrança de tarifa (preço público), e
não de tributo.
Na petição inicial, a parte autora da Ação Direta de Inconstitucionalidade
questionava a conformidade do Decreto que definia os preços a serem cobrados a
título de pedágio. Fundamentando-se na concepção da cobrança de pedágio como
uma cobrança de tributos, em virtude do disposto no inciso V do artigo 150 da Carta
de 1988, defendeu que a cobrança dos pedágios deveria obedecer ao princípio da
legalidade estrita, que rege a instituição de tributos no país por disposição
constitucional (p. 08, do inteiro teor do acórdão).
A argumentação não foi acolhida, entretanto, conforme o acórdão proferido na
ação, cuja ementa está transcrita abaixo:
EMENTA: TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL. PEDÁGIO. NATUREZA JURÍDICA DE PREÇO PÚBLICO. DECRETO 34.417/92, DOESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. CONSTITUCIONALIDADE. 1. O pedágio cobrado pela efetiva utilização de rodovias conservadaspelo Poder Público, cuja cobrança está autorizada pelo inciso V, partefinal, do art. 150 da Constituição de 1988, não tem natureza jurídica detaxa, mas sim de preço público, não estando a sua instituição, consequentemente, sujeita ao princípio da legalidade estrita. 2. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. (ADI 800/RS, Pleno, rel. Min. Teori Zavaski. j. 11/06/2014, DJe 27/06/2014).
No seu voto, o Exmo. Sr. Ministro Relator defendeu o mesmo conceito acima
exposto: a simples previsão dos pedágios no artigo 150 da Constituição Federal, em
26
conjunto com os demais tributos, não confere, por si, essa natureza jurídica ao
pedágio (p. 12, inteiro teor do acórdão).
Verdadeiramente, continua ele, entender a natureza jurídica do pedágio como
tributo deveria ser correto, apenas, caso essa cobrança correspondesse à definição
de tributo dada pelo Código Tributário Nacional, o que não é o caso (p. 12, inteiro
teor do acórdão).
Embora a Constituição Federal determine que a legislação tributária do país
deve se dar, exclusivamente, por Lei Complementar, e o Código Tributário tenha
sido promulgado atendendo aos critérios de lei ordinária previstos sob a égide da
Constituição Federal vigente à época, a recepção do Código Tributário Nacional pela
Constituição Federal é amplamente aceita.
Nesse sentido:
A aplicabilidade atual do CTN, sob a égide da Constituição de 1988 decorre do fenômeno, teoria ou princípio da recepção (art. 34, §5 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias). Através do princípio da recepção, todas as normas jurídicas em vigência anteriores a um ordenamento constitucional e que não entrem em conflito com este último, são absorvidas pelo sistema jurídico, permanecendo em vigor. O CTN - Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966, cumpre as funções da lei complementar exigida pela Constituição Federal de 1988 para tratar de prescrição e de decadência tributárias no art. 150, parágrafo quarto; no art. 156, inciso V; no art. 173 e no art. 174 do texto constitucional. (PORTAL TRIBUTÁRIO).
Esse não foi o único critério, contudo, utilizado para fundamentar a decisão da
Corte na decisão sobre a natureza jurídica das cobranças a título de pedágio, pelas
empresas concessionárias de administração de estradas no país.
Um acórdão proferido pela Corte na definição da natureza das cobranças pela
utilização de energia elétrica é citado, para demonstrar o entendimento do STF
acerca dos conceitos de taxa e preço público (tarifa).
A definição preço público utilizada no acórdão seguiu a seguinte definição
prévia:
“(...) I - Os encargos de capacidade emergencial e de aquisiçãode energia elétrica emergencial, instituídos pela Lei 10.438/02, não possuem natureza tributária. II - Encargos destituídos de compulsoriedade, razão pelaqual correspondem a tarifas ou preços públicos.III - Verbas que constituem receita originária e privada,destinada a remunerar concessionárias, permissionárias eautorizadas pelos custos do serviço, incluindo sua manutenção,melhora e expansão, e medidas para prevenir momentos deescassez.IV - O art. 175, III, da CF autoriza a subordinação dosreferidos encargos à política tarifária governamental.V - Inocorrência de afronta aos princípios da legalidade,da não-afetação, da moralidade, da isonomia,
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daproporcionalidade e da razoabilidade.VI - Recurso extraordinário conhecido, ao qual se negaprovimento” (RE 576189/RS, Pleno, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 22/04/2009, DJe de 26/06/2009).
3.2 A cobrança de pedágios e o direito à livre locomoção no território nacional
A definição da cobrança de pedágio como taxa ou preço público, todavia, não
é o único questionamento sobre o assunto.
Outro aspecto que se analisa sobre o tema é a constitucionalidade da
possibilidade de se cobrar pelo tráfego nas estradas em virtude do direito de ir e vir,
também assegurado pela Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, inciso XV).
BAPTISTA (2014) assim escreve sobre essa discussão:
Muito se discute acerca da constitucionalidade da cobrança do pedágio. O tema em análise gera profundas discussões, sendo que parte dos juristas e cidadãos entendem como constitucional a cobrança, ao passo que outra parcela, entende como inconstitucional. Alegando, principalmente, dentre outras teses, a ofensa ao artigo 5°, inciso XV, da CF/88, que versa a respeito do direito de ir e vir do cidadão. Do referido artigo e inciso, é que se extraiu o princípio tributário da “não limitação ao tráfego de pessoas e bens”. Tal princípio visa, em síntese, evitar que o Poder Público impeça a liberdade de locomoção de pessoas e bens, com a atribuição de um fato gerador, criador de tributo em situações de transposição de fronteiras.
A autora continua, mencionado um dos argumentos que se contrapõem a
essa teste, qual seja, que a própria Constituição Federal de 1988 prevê a cobrança
de pedágio nas rodovias de titularidade pública, no já mencionado artigo 150, V,
inciso II.
Portanto, assim como o direito de ir e vir, em território nacional, sem sofrer
constrangimentos, está garantido pela Carta, também ela previu a cobrança de
pedágios, de forma que, no mesmo grau de hierarquia, ambas as hipóteses estão
determinadas.
No mesmo sentido, GAGO (2010) escreve que:
E não se pode sucumbir às alegações de que a exigência de pedágio, notadamente quando ausente via alternativa gratuita, caracterizaria violação ao direito de livre locomoção. Obviamente, o aludido direito não garante acesso gratuito às rodovias onde existe cobrança de pedágio, pois a própria Constituição Federal prevê a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público. A lei, por sua vez, autoriza a cobrança de pedágio, não condicionando sua exigência à existência de via alternativa de trânsito gratuita, razão pela qual a interposição de praça de pedágio não configura ilegalidade ou inconstitucionalidade alguma, tampouco violação ao direito de locomoção. (GAGO, 2010).
28
Também WALD (2003) defende que não há qualquer violação ao direito de ir
e vir garantido constitucionalmente, pela cobrança de pedágios nas vias públicas – o
qual se caracteriza, especialmente, pelo dever imposto ao Estado de se omitir em
constranger o direito de locomoção em território nacional.
Esse dever de se omitir não se confunde com a cobrança pela utilização de
um serviço público, qual seja trafegar em uma via que pertence ao Poder Público e
é, por ele, administrada, ainda que indiretamente, por concessão.
De acordo com WALD (2003):
Mas isso, o direito de ir e vir, não gera nenhum dever de atuação ativa do Estado. (...) não gera o dever de o Estado atuar ativamente. O Estado preenche, satisfaz o requisito fundamental do direito constitucional quando ele simplesmente se abstém de atuar. Logo, nós podemos supor que o particular pode invocar o direito de ir e vir em face do Estado para impedir que ele estabeleça obstáculos ou impedimentos ao deslocamento. Mas, não é possível que seja invocado o direito de ir e vir para obstaculizar a prestação do serviço público, que se submete a outro regime jurídico constitucional (...). (p. 423).
Portanto, o direito de locomoção que a Carta Magna garante aos cidadãos
não sofre qualquer atentado pela cobrança de pedágio nas vias públicas, conquanto
não é vedado, ou limitado, esse direito. O que há é a cobrança por trafegar por
determinado local, que é público, e se aproveitando de uma série de condições,
também promovidas pela atuação do Poder Público.
Além das áreas em que correm as rodovias pertencerem ao governo, é certo
que também há inocorrência em custos específicos para que aquela área se torne
uma via apropriada ao tráfego - desde o conhecimento técnico necessário para
determinação do desenho, em função do terreno e outros fatores; o material
necessário e mais apropriado; e para determinar outras questões de segurança; até
a manutenção das rodovias e serviços de emergência, para mencionar apenas
alguns dos aspectos importantes para uma rodovia.
Esse fator se mostra ainda mais presente na atualidade, em que os
transportes automotivos não apenas são muito disseminados, mas há uma
complexidade ainda maior relacionada a esse modal. Os veículos, hoje, atingem
velocidades muito maiores, de forma que as mudanças não são apenas
quantitativas, mas qualitativas – acostamentos, pistas duplas, e áreas entre as pistas
em cada sentido são alguns exemplos de como o tráfego por veículos automotores
exige investimentos governamentais.
Nas palavras de GAGO (2010):
29
É fato que a exigência de pedágio pode despertar antipatia dos usuários, mas traduz legítima e indispensável contrapartida exigida para a manutenção e a implantação de melhorias nas rodovias, gerando inúmeros e conhecidos benefícios no que toca à segurança do tráfego e dos usuários. A própria experiência comum é suficiente para fazer perceber a verdadeira revolução de excelência que recaiu sobre as estradas paulistas após a implementação do programa de concessões rodoviárias no estado de São Paulo, naturalmente acompanhadas pelos ônus de custeio tarifário dos pedágios. (GAGO, 2010).
Essenciais que são – e, por isso, chamados fundamentais -, os direitos
previstos na Constituição Federal não são absolutos. Por certo, o objetivo é sempre
que as limitações a seu exercício sejam as menores possíveis, mas a necessidade
de integração entre valores protegidos pela Constituição Federal é uma constante na
interpretação e aplicação das normas que os protegem, inclusive devido à ampliação
dos bens da vida protegidos juridicamente.
No caso do pedágio, além de remunerarem todos os itens dos quais o usuário
da via se beneficia ao utilizá-la, paga-se pela função que o Estado desempenha ao
possibilitar o exercício do direito de ir e vir, em rodovias, por diversos cidadãos.
Some-se a isso o fato de que a os valores cobrados a título de pedágio são
determinados, tão somente, conforme a legislação infraconstitucional específica para
tanto, e fundada, devidamente, na Constituição Federal de 1988.
Em consequência, ainda que não se apliquem às cobranças de pedágio as
mesmas garantias determinadas para a instituição e cobrança de tributos, outras
regras que protegem os interesses dos cidadãos em relação à atuação do Poder
Público o são – como os processos licitatórios para a concessão, que, conforme
explicado acima, podem ser, até, decididos em favor de uma determinada proposta
em função do menor preço oferecido ao usuário.
Sobre a determinação dos preços dos pedágios, GAGO (2010) discorre:
Para a formação dos valores da tarifa, a Administração Pública tem adotado o sistema denominado Trecho de Cobertura de Praça de Pedágio (TCP), segundo o qual cada praça de pedágio corresponde à determinada extensão rodoviária e dos acessos à disposição do usuário. A tarifa, no sistema TCP, assim, é fixada considerando determinada extensão rodoviária e a utilização potencial dos serviços postos à disposição do usuário. Inconsistentes são as alegações de que o sistema TCP seria ilegal por não considerar, para a formação do valor da tarifa, a quilometragem percorrida pelo usuário, o trecho da rodovia efetivamente utilizado. (GAGO, 2010).
Mais recentemente, o Supremo Tribunal decidiu que sequer o fato de uma
rodovia passar na área de um determinado município, com a colocação de praças
30
de pedágio em área urbana, enseja a vedação à cobrança de pedágio, mesmo dos
veículos com placa do próprio município.
Por unanimidade, a Corte decidiu por declarar inconstitucional uma lei do
Estado de Santa Catarina (14.824/2009), que eximia do pagamento do pedágio nas
praças instaladas em um determinado munícipio os veículos lá emplacados, com
fundamento em que isso afetaria o equilíbrio contratual estabelecido no ato de
concessão.
Assim escreveu o Exmo. Sr. Ministro Relator da Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 4382:
Na linha dos precedentes mencionados, considero que lei impugnada, por estabelecer, na cobrança de pedágio, tratamento mais vantajoso a veículos emplacados em Municípios determinados, viola o art. 19, III, da Constituição Federal. Verifico de outro lado, que as rodovias BR-101 e BR-116 são objeto de contratos de concessão celebrados pelas concessionárias Autopista Litoral S.A. e Autopista Planalto Sul S.A. com a União, por intermédio da Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT. (p. 6, inteiro teor do acórdão).
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4 CONCLUSÃO
A cobrança de pedágio, no Brasil, ocorre desde a época em que o país era
colônia de Portugal, e, embora a cobrança de tributos tenha se modificado, bastante,
ao longo da história do país, um maior questionamento sobre a cobrança passou a
ser feito, apenas, desde a Constituição Federal de 1946.
Desde então, intensificou-se a utilização dos automóveis no país, contribuindo
para a importância do tema. Mais ainda, a modificação do ordenamento jurídico
ofereceu novos parâmetros para as discussões sobre a cobrança de pedágio no
Brasil.
Além da Carta de 1988, que trouxe definições mais detalhadas sobre a esfera
de atuação estatal e a prestação de serviços públicos, as Leis que regulam a
concessão da exploração da administração das rodovias por empresas privadas,
promulgadas na segunda metade da década de 1990, são o sistema jurídico no qual
se situam as discussões sobre essa cobrança.
Em que pesem as diversas posições doutrinárias, a jurisprudência vem se
assentando no sentido de que a cobrança de pedágio consiste em preço público (ou
tarifa), de forma que, a ela, não se aplicam as normas relativas a tributos, mas as
que concernem à prestação de serviços públicos por particulares.
Como serviço público, entretanto, não deixa de ser aplicáveis as normas de
Direito Público, eis que a transferência do desempenho das atividades de
administração pública não implicam na transferência da titularidade do serviço, de
forma que cabe assegurar que todos os direitos do usuário sejam garantidos com
fundamento na legislação específica das concessões, protegendo o cidadão.
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